atelectasia - Hospital Garcia de Orta
Transcrição
atelectasia - Hospital Garcia de Orta
REVISTA DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM ENFERMAGEM www.nursingportuguesa.com Nº283 • setembro 2012 • Ano 24 • € 6,00 ATELECTASIA ESTUDOS DE CASO – INTERVENÇÃO DO ENFERMEIRO ESPECIALISTA DE REABILITAÇÃO CATETERISMO CARDÍACO INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM A PERDA E O LUTO… UMA CONDIÇÃO HUMANA? SUPLEMENTO Revista indexada à base de dados 2 I NORMAS DE PUBLICAÇÃO SETEMBRO .12 REVISTA DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM ENFERMAGEM INSTRUÇÕES AOS AUTORES b) Ilustrações, abreviaturas, símbolos e notas de ro- bem como o processo de obtenção do Termo de Consen- dapé: as tabelas, quadros e figuras (fotografias, desenhos, timento Informado, dos participantes. A Revista Nursing Portuguesa recebe submissões de gráficos, etc) devem ser numeradas consecutivamente, e)Tipos de Artigos aceites pela Revista artigos, de acordo com as seguintes secções: com algarismos árabes, na ordem em que foram citadas - Investigação/Revisões Sistemáticas da Literatura: tra- - Investigação/Revisões Sistemáticas da Literatura no texto. Para ilustrações extraídas de outros trabalhos, balho de investigação, inédito, e que contribua para o de- - Revisão, previamente publicados, os autores devem enviar a res- senvolvimento da disciplina Enfermagem, com um limite - Reflexão/ Relato de Experiência, pectiva autorização. O título e resumo não devem con- de 15 páginas. Este tipo de artigos deve conter, pelo me- - Espaço do leitor. ter abreviaturas. Devem evitar-se notas de rodapé. nos, Introdução; Objectivos; Revisão da Literatura; Méto- A Revista Nursing adopta as orientações das Normas de c) Citação de Referências Bibliográficas: As referências do; Resultados; Discussão e Conclusões. Vancouver. Estas normas estão disponíveis na URL: devem ser numeradas forma consecutiva de acordo com - Artigo de Revisão: Revisão teórica de literatura http://www.icmje.org/index.html. a ordem em que forem mencionadas pela primeira vez no actual e relevante para o conhecimento em Enferma- O artigo deve ser elaborado no Editor de Texto MS Word corpo de texto. Identificar as referências no texto por nú- gem. Limite de 10 páginas. com a seguinte formatação: todas as margens de 2 cm; meros árabes, entre parêntesis e superiores à linha. - Reflexão/Relato de experiência: aceitam-se estudos fonte Arial ou Times, tamanho 11, com espaçamento en- Quando se trate de citação sequencial os números devem de caso e experiências de estratégias de cuidado inova- trelinhas de 1,5 pt. separar-se por traço (ex: 1-3) e quando intercalados, por doras, ou eticamente dilemáticas, que possam conduzir a) Página Inicial: Deverá conter os seguintes dados e na vírgula (ex: 1,3,9). à reflexão sobre a profissão. Limite de 8 páginas. seguinte ordem: 1) título do artigo (conciso mas informa- • Exemplos de Listagem das Referências - Espaço do leitor: este possibilita comentários de tivo e em português e inglês); 2) nome do(s) autor(es), in- Livros leitores/recensão crítica, sucinta, sobre os artigos publica- dicando para cada um deles o(s) título(s) universitário(s), Martin R. La psicología de humor: un enfoque integrador. dos na revista, bem como outro tipo de notas que o leitor ou cargo(s) ocupado(s), nome do Departamento e Insti- Madrid: Orión Ediciones, S. L.; 2008. deseje fazer chegar ao Editor ou Conselho Científico. tuição aos quais o trabalho deve ser atribuído, Cidade, Dis- Capítulo de livro f) Descrição dos procedimentos trito e endereço electrónico; 3) resumo, abstract (português Simons C, McCluskey-Fawcett K, Papini D. Theoretical and Recebido o artigo este é analisado face ao cumpri- e inglês); 4) descritores nestes dois idiomas. functional perspectives on the development of humor du- mento das normas estabelecidas nas Instruções aos Resumos e Descritores: o resumo terá que ter, no má- ring infancy childhood, and adolescence In: Mahemow K, Autores, sendo liminarmente rejeitado se estas não ximo, 120 palavras e quando de investigação deve con- McCluskey-Fawcett K, McGhee P. (Eds). Humor and aging. forem cumpridas. Quando aceite, o artigo passa por ter: objectivo da investigação, metodologia, procedimen- Orlando: Academic Press; 1986. p. 53-80. um processo de avaliação de dois revisores, que emi- tos de selecção dos participantes do estudo, principais Artigos de periódicos tem pareceres independentes. Quando existir discor- resultados e conclusões. Deverão ser destacados os Sudres J. La créativité des adolescents: de banalités en dância dos pareceres, um Membro do Conselho Cien- novos e mais relevantes aspectos do estudo. Seguida- aménagements. Neuropsychiatr Enfance Adolesc. 2003; tífico, que não esteja envolvido em conflito de interesses, emitirá o parecer definitivo. Se existirem altera- mente ao resumo incluir 3 a 5 descritores. De acordo 51, 49–61. com a Associação Portuguesa de Documentação e In- A exactidão das referências é de responsabilidade dos ções a efectuar, ao artigo, estas serão enviadas, como formação em Saúde os artigos publicados na área da autores. sugestão, para os autores. Em caso de co-autoria deve saúde, deverão adoptar como base de indexação, a lis- Solicita-se que estes consultem as normas de Vancouver ser bem explícita a contribuição de cada autor. ta de Descritores em Ciências da Saúde - DeCS para a correcta referenciação de todos os tipos de docu- g) Agradecimentos – Podem surgir de acordo com (http://decs.bvs.br), a qual corresponde à tradução bra- mentos utilizados. Sempre que possível e adequado, o au- o desejo dos autores e centram-se no agradecimento sileira do Medical Subject Headings (MeSH) disponí- tor deve incluir duas ou mais referências, de publicações a pessoas/entidades que contribuíram, efectivamente, vel em http://www.nlm.nih.gov/mesh/MBrowser.html e da Nursing Portuguesa, no artigo. para o trabalho em causa, desde que estas tenham elaborado pela NLM (National Library of Medicine). De- d) Aspectos Éticos dado autorização expressa. verão, no entanto, salvaguardar as diferenças de termi- Nas pesquisas que envolvem seres humanos os autores (Nota: artigo escrito de acordo com a ortografia antiga da Língua nologia usada em Portugal e no Brasil. deverão deixar claro a aprovação da Comissão de Ética Portuguesa) AVISO Nenhuma das partes desta revista pode ser além do uso legal como breve citação em arti- conta através do tel. 213 584 300 ou do e-mail utilizada ou reproduzida, no todo ou em parte, gos e críticas) sem autorização prévia por escri- [email protected] por qualquer processo mecânico, fotográfico, to da Informação em Saúde. electrónico ou de gravação, ou qualquer outra Se desejar reproduzir qualquer dos artigos desta Edições especiais, incluindo capa personalizada forma copiada, para uso público ou privado, revista, deverá contactar os nossos gestores de estão disponíveis. 3 ÍNDICE I SETEMBRO .12 06 SETEMBRO 2012 EDIÇÃO Nº283 23 31 04 Editorial 12 Cardiologia 24 Cuidados Paliativos 06 Tema de Capa Cateterismo cardíaco – Intervenções de enfermagem A perda e o luto… 19 Saúde Infantil 30 Agenda Atelectasia – Estudos de Caso Intervenção do enfermeiro especialista de reabilitação O recém-nascido com sepsis na unidade de cuidados intensivos neonatais Uma condição humana? 31 Suplemento Feridas REVISTA DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM ENFERMAGEM FUNDADA EM 1988 - Periodicidade: Mensal DIREÇÃO CIENTÍFICA Francisco Vidinha [email protected] DIREÇÃO EDITORIAL Aida Borges CORPO DE REVISÃO Andreia Silva, Escola Superior de Saúde de Portalegre Amélia Matos, Hospital de Santa Maria Artur Batuca, INEM Carlos Melo-Dias, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra Cristina Miguéns, Centro de Saúde da Figueira da Foz Elaine Pina, Coordenadora da Comissão Nacional de Controlo de Infeção Emília Costa, Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve Filipa Veludo, ICS – Universidade Católica Portuguesa Filomena Matos, Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve Helena Arco, Escola Superior de Saúde de Portalegre Ilda Lourenço, CHCL – Hospital de São José José Vilelas, Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa PARCERIAS Luísa Brito, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra Manuela Néné, Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa Maria Adelaide Soares Paiva, Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve Maria da Conceição Silva Farinha, Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve Maria Filomena de Oliveira Martins, Escola Superior de Saúde de Portalegre Mário de Oliveira Martins, Escola Superior de Saúde de Portalegre Nuno Salgado, IPO de Coimbra Paula Sapela, Escola Superior de Saúde Lopes Dias Paulo Alves, UCP Porto Pedro Lopes Ferreira, Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra Pedro Parreira, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra Raul Cordeiro, Escola Superior de Saúde de Portalegre DEPARTAMENTO DE PUBLICIDADE DIRETORA COMERCIAL Andrea Lima DIRETORA DE PUBLICIDADE Fátima Lima - [email protected] Tlm. 919 673 470 ASSISTENTE DE PUBLICIDADE Nádia Neto - [email protected] Tel. 21 358 43 00 GESTORA DE PUBLICIDADE Filomena Valente DEPARTAMENTO DE ASSINATURAS [email protected] Tel. 21 358 43 02 Fax. 21 358 43 09 PROJETO GRÁFICO E PRÉ-IMPRESSÃO TED-Tempora Design Registo ICS n. 112 746 • Direitos de autor: Todos os artigos Direitos de Autor e não podem ser total ou parcialmente reproduzidos sem a permissão prévia por escrito da empresa editora da revista. A NURSING envidará todos os esforços para que o material mantenha total fidelidade ao original, pelo que não pode ser responsabilizada por gralhas ou outros erros gráficos entretanto surgidos. As opiniões expressas em artigos assinados não correspondem necessariamente às opiniões dos editores. EDITORA ENDEREÇO Rua Padre Luís Aparício n 11 - 3ºA 1150-248 LISBOA CONTACTOS Telef.: 21 358 43 00 • Fax: 21 358 43 09 PREÇOS DE ASSINATURAS ANUAIS desenhos e fotografias estão sob a protecção do Código de TIRAGEM - 9 000 exemplares DEPÓSITO LEGAL - 21 227/88 IMPRESSÃO E ACABAMENTOS Finepaper-Atelier de Produção Gráfica, Lda. Rua da Prata, nº208, 3º 1100-422 Lisboa INDEXAÇÃO À BASE DE DADOS DA CINAHL PORTUGAL Enfermeiros e estudantes Institucional* €130,00 Assinatura Digital Combi (Revista + Digital) ESTRANGEIRO Enfermeiros e estudantes Institucional* € 40,00 € 25,00 € 50,00 €94,00 €180,00 *Escolas, hospitais, centros de saúde, bibliotecas Estes preços incluem IVA à taxa de 6%. O número no qual se inicia a assinatura corresponde ao mês seguinte ao da recepção do pedido de assinatura nos nossos serviços. 4 I EDITORIAL SETEMBRO .12 VINCULAÇÃO À PROFISSÃO … PASSADO E PRESENTE FRANCISCO VIDINHA Nos últimos anos temos sido convidados cumprir e fazer cumprir os códigos deonto- Os tempos mudam e as cerimónias pela Ordem dos Enfermeiros, entidade lógicos e morais, no que apelidávamos de organizadas pela Escola enquadram-se que regula a atividade profissional da “juramento de Florence Nightingale”. agora em eventos maiores, frequente- Enfermagem em Portugal, a participar na Faz parte do nosso álbum de recorda- mente integrados na “bênção das pas- cerimónia de vinculação à profissão, ou ções, e que presentemente muitos de tas”, sendo mais uma atividade no ali- seja, o momento solene, em que os diplo- nós divulgam nas redes sociais, a foto nhamento do programa da semana aca- mados com um curso de enfermagem de grupo, as fotos com os professores e démica de cada Instituição de Ensino são apresentados à comunidade como colegas a que atribuíamos mais significa- Superior ou academia duma cidade. possuindo as competências para exercer do no nosso percurso académico, já que Sinais dos novos tempos… talvez… a profissão de enfermeiro, pelo que lhes tal evento era promovido pela Escola, mas penso que tal como eu, muitos é entregue a sua cédula profissional. que com orgulho apelidamos de nossa. dos enfermeiros irão sempre recordar Este acontecimento ativa memórias e Assim como a Ordem dos Enfermeiros, mais as cerimónias “mais privadas” do recordações transportando-me, eventual- também as Escolas estão em processo que as megaproduções… embora mente com alguma nostalgia, até ao de receção aos caloiros… o que difere possa enquadrar todas nos rituais de momento em que, solenemente, jurávamos, são as atividades, já que os “rituais” passagem próprios de cada etapa em cerimónia frequentemente religiosa, parecem-me semelhantes! do ciclo de vida. 6 I TEMA DE CAPA SETEMBRO .12 ATELECTASIA - ESTUDOS DE CASO INTERVENÇÃO DO ENFERMEIRO ESPECIALISTA DE REABILITAÇÃO ATELECTASIS – CASE STUDY Intervention by the nurse specialist rehabilitation CRISTINA ALEXANDRA FERNANDES RODRIGUES Enfermeira Especialista de Reabilitação, no Serviço de Neurocirurgia do Hospital Garcia de Orta, em Almada ESTELA MARIA GUERREIRO VARANDA Enfermeira Especialista de Reabilitação, no Serviço de Neurocirurgia do Hospital Garcia de Orta, em Almada ABÍLIO JOSÉ ALMEIDA DA COSTA Enfermeiro Especialista de Reabilitação, no Serviço de Neurocirurgia do Hospital Garcia de Orta, em Almada Recebido para publicação: Abril de 2011 Aprovado para publicação: Maio de 2011 RESUMO A atelectasia é uma complicação respiratória frequente no doente em cuidados intensivos que pode desencadear uma insuficiência respiratória grave. Requer tratamento atempado no qual é fundamental a cinesiterapia respiratória. Este trabalho teve como objetivo principal comprovar a eficácia da intervenção do Enfermeiro Especialista de Reabilitação no tratamento das atelectasias, na UCI do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Garcia de Orta. Neste estudo selecionámos três casos de doentes com atelectasia. A metodologia seguida passou pela avaliação de cada doente, seguida das intervenções do Enfermeiro Especialista de Reabilitação. Finalmente apresentamos os resultados obtidos. Nestes verificou-se a resolução imediata da atelectasia, comprovada pelo RX tórax e auscultação pulmonar. Conclui-se que o Enfermeiro Especialista de Reabilitação tem um papel relevante no tratamento das atelectasias. Palavras-chave: Atelectasia Pulmonar; Cinesiterapia Respiratória; Enfermagem Reabilitação. ABSTRACT Atelectasis is frequently described as a common breathing complication in intensive care patients, which may further develop in an acute respiratory failure. It requires an immediate, accurate diagnosis and prompt treatment in which respiratory kinesiotherapy plays a decisive role. This aim of the present study was to assess the efficiency and key role Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 6 played by a rehabilitation specialist nurse in addressing atelectasis, conducted in the Intensive Care Unit of the Neurosurgery Unit in Garcia da Orta Hospital. A total of three cases of atelectasis patients were chosen to the present study. The method followed was first, the evaluation of each patient, secondly, the intervention of the rehabilitation specialist nurse and finally the results obtained from the available data. The cases under analysis were evaluated clinically by chest x-rays and lungs auscultation. The results as well as the conclusion have clearly shown the key role played by the rehabilitation specialist nurse in the treatment of atelectasis. Keywords: Pulmonary Atelectasis; Respiratory Kinesiotherapy; Rehabilitation Nursing. INTRODUÇÃO Na nossa prática diária, como Enfermeiros Especialistas de Reabilitação, verificámos empiricamente que a nossa intervenção, junto dos doentes com atelectasia, era uma importante mais valia no tratamento desta complicação respiratória. Resolvemos por isso comprovar a eficácia da nossa atuação através de estudos de caso. Começaremos por uma breve revisão teórica sobre as causas, avaliação/ diagnóstico e prevenção/tratamento das atelectasias. De seguida apresentamos 3 casos com avaliação, intervenções e resultados que demonstram, inequivocamente, a eficácia das intervenções do Enfermeiro Especialista de Reabilitação. TEMA DE CAPA I SETEMBRO .12 7 Os objectivos pretendidos com este estudo são: • Dar a conhecer o papel do Enfermeiro Especialista de Reabilitação no tratamento das atelectasias. • Demonstrar resultados da intervenção do Enfermeiro Especialista de Reabilitação, no tratamento das atelectasias. • Demonstrar vantagens para o doente e instituição. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Antes da apresentação dos casos, faremos uma pequena revisão bibliográfica sobre as atelectasias, abordando a sua classificação e etiologia, avaliação e diagnóstico, assim como a sua prevenção e tratamento. CLASSIFICAÇÃO E ETIOLOGIA As atelectasias, consoante o mecanismo que as origina, podem classificar-se em (Quadro I): Quadro 1 – Tipos e Causas de Atelectasia Tipos Causas Atelectasias de Absorção Obstrução das vias aéreas Secreções Corpo estranho Tumor Padrão respiratório ineficaz Cirurgia/Anestesia Dor Imobilidade Paralisia dos músculos respiratórios Iatrogénicas Administração de altas concentrações de oxigénio Tubo endotraqueal inadequadamente introduzido Aspiração de secreções demasiado prolongada Atelectasias de compressão Pneumotórax, derrame pleural, perturbações da parede torácica, obesidade, distensão abdominal. Atelectasias por deficiência de surfactante Doença da Membrana Hialina, pneumonia, edema pulmonar, Síndrome de Dificuldade Respiratória do Adulto (SDRA). 1 - Atelectasias de absorção 2 - Atelectasias de compressão 3 - Atelectasias por deficiência de surfactante 1 - Atelectasias de absorção A atelectasia de absorção surge quando há impedimento, total ou parcial, da entrada de ar renovado aos alvéolos. O ar existente é reabsorvido ocorrendo colapso alveolar. A causa mais comum é a obstrução das vias aéreas provocada pela acumulação anormal de secreções. As atelectasias desenvolvem-se porque o Foto: Andrei Malov I Dreamstime DEFINIÇÃO As atelectasias pulmonares surgem como consequência do colapso dos alvéolos, por ausência ou deficiente ventilação destes. Podem atingir extensões variáveis, desde um segmento ou lobo pulmonar até todo um pulmão. Ocorrem quando o volume residual decai para níveis que não permitem a manutenção da distensão alveolar. A atelectasia é uma complicação respiratória frequente no doente em cuidados intensivos que pode desencadear uma insuficiência respiratória grave. Requer tratamento atempado no qual é fundamental a cinesiterapia respiratória. muco bloqueia parcial ou completamente a entrada de ar. As doenças que se caracterizam pela produção de muco, tais como a fibrose quística, DPCO, bronquiectasias, pneumonia, estão relacionadas com o aparecimento deste tipo de atelectasias. No entanto a obstrução das vias aéreas também poderá estar relacionada com outros fatores como a aspiração de corpo estranho e tumor das vias aéreas. Um padrão respiratório ineficaz é outra das causas, pois provoca uma diminuição do volume pulmonar. Poderá ocorrer em situações de cirurgias com anestesia, dor, imobilidade, paralisia dos músculos respiratórios (LVM; doenças neurológicas). A anestesia geral reduz a distensibilidade pulmonar e da parede torácica, interfere com a ação diafragmática normal e redução da capacidade residual funcional. A posição que os doentes são colocados durante a cirurgia, nomeadamente em decúbito dorsal, diminui cerca de 30% a capacidade residual funcional, assim com a mudança da posição de pé para a posição de deitado, a insuflação pulmonar diminui. A presença de dor impede que o doente suspire normalmente, e apresente hipoventilação, bem como o efeito secundário de alguns fármacos (sedativos, hipnóticos, tranquilizantes). A Imobilidade de doentes acamados também interfere com a expansão pulmonar normal. A insuflação pulmonar é facilitada com a posição de semi-Fowler, e alternância de decúbito lateral direito e esquerdo. Na origem de uma atelectasia de absorção pode estar também a administração de altas concentrações de oxigénio. Nesta situação, o azoto, que contribui para manter os alvéolos permanentemente distendidos, desvanece-se, tanto mais quanto maior for a concentração de oxigénio. Por isso não é recomendada a administração de oxigénio com um FiO2 superior a 40% - 50%. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 7 8 I TEMA DE CAPA SETEMBRO .12 De referir ainda que causas iatrogénicas, como um tubo endotraqueal inadequadamente introduzido ou aspiração de secreções demasiado prolongada, podem também ser causa de uma atelectasia de absorção. 2 - Atelectasias de compressão A atelectasia de compressão surge quando há compressão do tecido pulmonar, que pode impedir a entrada de ar nos alvéolos. A diminuição das forças de distensão que interferem com as forças normais de insuflação pulmonar podem ocorrer em situações de pneumotoráx, derrame pleural, perturbações da parede torácica, obesidade, distensão abdominal, com compromisso do funcionamento normal do diafragma e formação de A humidificação das vias aéreas permite uma melhor mobilização das secreções. Pode ser feita com reforço hídrico e nebulizações com soro fisiológico. Estas são particularmente eficazes cerca de 15 minutos antes da cinesiterapia. No doente ventilado a nebulização é feita através da adaptação de copo humidificador com soro fisiológico no circuito inspiratório. As intervenções médicas, podem coadjuvar no tratamento da atelectasia com broncodilatadores/mucolíticos, oxigenoterapia se hipoxémia, broncofibroscopia, para limpeza das vias aéreas obstruídas e Ventilação Mecânica, se ocorrer insuficiência respiratória. A Cinesiterapia Respiratória é, no entanto, o tratamento fundamental das bolhas de enfisema. 3 - Atelectasias por ausência de surfactante (ARDS). As atelectasias por deficiência de surfactante surgem por aumento da tensão superficial dos alvéolos, o que promove o colapso alveolar e produz atelectasias difusas. As causas mais comuns são Doença da Membrana Hialina, pneumonia, edema pulmonar e Síndrome de Dificuldade Respiratória do Adulto (SDRA) atelectasias. Tal como irá ser referido nos exemplos por nós apresentados, os Enfermeiros Especialistas de Reabilitação tiveram um papel fundamental na resolução imediata da atelectasia. A cinesiterapia respiratória é referida como a terapêutica pelo movimento aplicada ao aparelho respiratório. Inclui técnicas como a drenagem postural, percussões, vibrações e compressões torácicas. Podem ser usadas isoladamente ou associadas, de forma a mobilizar as secreções e também conjuntamente com exercícios respiratórios, técnica da tosse e/ou aspiração de secreções. A drenagem postural é utilizada para drenar as secreções, provenientes dos diversos segmentos pulmonares. A gravidade é o princípio usado para facilitar a mobilização e eliminação das secreções, consoante o local a drenar. São usadas doze posições para drenar os vários lobos e segmentos broncopulmonares. Nas posições que exigem que a cabeça fique a nível inferior de tronco e o doente não tolere ou quando há risco de hipertensão intracraneana, utiliza-se a drenagem postural modificada, a qual foi utilizada nos nossos casos. A percussão torácica é realizada com as mãos em concha, por meio de pancadas rítmicas na região pretendida do toráx. Ajuda a desprender as secreções que estão aderentes às paredes dos brônquios. Não deve ser realizada sobre o esterno, vértebras, ou áreas dolorosas e está contra-indicada em pessoas com patologia cardíaca, osteoporose ou derrame pleural. A vibração torácica é realizada sobre a parede do toráx na fase expiratória. Facilita a progressão das secreções através da árvore brônquica. As mãos assentam abertas sobre a região do toráx que vai ser drenada, tendo os braços estendidos. As vibrações são realizadas alternando a tensão e contração dos músculos dos braços e ombros, durante toda a expiração. Estimular a tosse ou incentivar o doente a tossir a seguir às vibrações, ou aspirar se necessário. As percussões e vibrações são frequentemente associadas à drenagem postural de forma a facilitar que as secreções se dirijam para as vias aéreas superiores e serem expelidas pela tosse ou aspiradas. A cinesiterapia respiratória não deverá ser feita imediatamente após as refeições, pelo risco de aspiração de vómito. AVALIAÇÃO E DIAGNÓSTICO As manifestações clínicas, resultantes da atelectasia, dependem também do compromisso respiratório subjacente, da extensão da atelectasia e da rapidez com que se instalou. À observação do doente, atelectasias mais extensas podem produzir um desvio da traqueia para o lado afetado, como também diminuição da expansão torácica desse lado. Na auscultação pulmonar pode-se verificar diminuição ou ausência do murmúrio vesicular na zona atelectasiada. No entanto, na periferia, podem ser auscultadas crepitações. Os valores da gasimetria arterial podem evidenciar hipoxémia. Mas a confirmação do diagnóstico é realizada com a Radiografia de Tórax. Nesta poderá ser visível a opacificação da zona; deslocamento das fissuras lombares; elevação do diafragma do lado afetado e apagamento dos contornos de referência, como o cardíaco, e retração dos arcos costais. PREVENÇÃO E TRATAMENTO Um dos aspetos importantes na prevenção e tratamento da atelectasia consiste no ensino ao doente - quando este tem capacidades para tal - de exercícios respiratórios com inspirações profundas, mantidas durante 3 ou mais segundos, podendo também utilizar-se a espirometria incentivadora ou o IPPB (Intermittent Positive-Pressure Breathing). A inspiração profunda é mais eficaz na posição de Fowler, pois a gravidade ajuda a empurrar o diafragma e o abdómen para baixo. No doente com entubação endotraqueal, podem realizar-se insuflações com ressuscitador manual, de forma a aumentar a expansão pulmonar. A aspiração de secreções nos doentes ventilados deve ser efetuada por períodos breves, para evitar colapso alveolar, e se possível em circuito fechado. A alternância de decúbito frequente favorece a expansão alternada de cada um dos hemitóraxes e favorece a drenagem das secreções. O levante precoce é essencial para a mudança de padrão respiratório, com aumento da frequência e profundidade das inspirações. No doente já com atelectasia privilegiar o posicionamento para o lado oposto ao da atelectasia. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 8 APRESENTAÇÃO DE CASOS A metodologia seguida na apresentação dos três casos foi a seguinte: 1 - Avaliação dos doentes 2 - Intervenções de Enfermagem de Reabilitação 3 - Reavaliação/Resultados TEMA DE CAPA I SETEMBRO .12 9 1 - AVALIAÇÃO DOS DOENTES ESTUDO DE CASO 1 MHSMF, do sexo feminino, 75 anos. Cefaleia súbita, com perda de conhecimento. Realizou Angio TAC-CE a 18/12/2010 que revelou Aneurisma da carótida interna esquerda. Antecedentes pessoais de DPOC. Submetida a embolização de aneurisma a 21/12/2010. Situação a 31/12/2010: Doente com score de Glasgow de 6 (sedada com midazolan em perfusão), ventilada em BIPAP, frequência respiratória de 25, Fio2 70%, Peep 5. Auscultação Pulmonar – Diminuição do murmúrio vesicular à esquerda; roncos à direita. Secreções brônquicas - Em grande quantidade espessas. Períodos de dessaturação - 9:00h Saturação de O2 de 87% R.X Tórax a 31/12/2010 às 0:52h - revela atelectasia pulmonar à esquerda. (Figura 1) horário PÓS-LABORAL conhecimentos para a vida PÓS-GRADUAÇÕES NA ÁREA DE ENFERMAGEM ANESTESIOLOGIA E CONTROLO DA DOR URGÊNCIA E EMERGÊNCIA HOSPITALAR Figura 1 – (Caso 1) Rx Tórax dia 31/12/2010 ás 00:52h. Antes da cinesiterapia SAÚDE DA MULHER E DA CRIANÇA respiratória. ESTUDO DE CASO 2 JMDG, do sexo masculino, 86 anos. Queda no domicílio a 11/10/2010, com TCE sem perda de conhecimento e TVM cervical. RMN a 14/11/2010, revelou fratura do corpo e base de C2, sub-luxação C1-C2. Diagnosticada pneumonia bilateral e entubado orotraquealmente a 23/10/2010, com necessidade de suporte ventilatório. Realizada traqueostomia a 5/11/2010. Derrame pleural bilateral drenado a 04/12/2010. Iniciou períodos de desconexão do URGÊNCIA E EMERGÊNCIA: NEONATAL E PEDIÁTRICA CUIDADOS INTENSIVOS PARA ENFERMEIROS BLOCO OPERATÓRIO GESTÃO E LIDERANÇA EM SERVIÇOS DE SAÚDE EMERGÊNCIA E REABILITAÇÃO DO AVC ENFERMAGEM FORENSE todos os cursos de Pós-Graduação têm a duração de 1 ano Figura 3 - (Caso 2) RX Tórax, dia 10/12/2010 às 00:13h. Antes da cinesiterapia Fábrica da Pólvora de Barcarena 2730-036 Barcarena, Oeiras respiratória. Tel. 21 439 82 44 Fax 21 430 25 73 [email protected] Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 9 www.uatlantica.pt 10 I TEMA DE CAPA ventilador (Aerox), após as sessões de cinesiterapia e levante para cadeirão. Situação a 10/12/2010: Doente com score de Glasgow 14. Em respiração espontânea mas superficial, com aporte de O2 a 10l/min. Auscultação Pulmonar – Diminuição do murmúrio vesicular à esquerda. Secreções brônquicas - Em moderada quantidade, espessas. R.X Tórax a 10/12/2010 às 0:13h - Apresenta opacificação de todo o campo pulmonar à esquerda, sugestivo de atelectasia pulmonar. (Figura 3) ESTUDO DE CASO 3 AMSCP, do sexo feminino, 65 anos. Recorreu ao Serviço de Urgência de Setúbal por alteração do estado de consciência e foi transferida para HGO em 17/01/11. TAC-CE a 17/01/2011, revela Hematoma Temporal Direito com efeito de massa e desvio da linha média e Hemorragia Subaracnoideia. Craniotomia a 18/01/2011 para drenagem de hematoma e clipagem de aneurisma. Situação a 19/01/2011: Doente com score de Glasgow 6 (sedada), Ventilada em SIMV, Fr. 10; FiO2 50%, PA 15. Secreções brônquicas – Acastanhadas, espessas e quantidade abundante. Auscultação Pulmonar – Diminuição do murmúrio vesicular na base do hemitórax esquerdo. (Figura 5) SETEMBRO .12 • Posicionamento final em decúbito lateral direito. • Orientação dos colegas para favorecerem os decúbitos semi-dorsal e lateral direito e para realizarem insuflações regulares e fluidificação de secreções na aspiração. 3 - RESULTADOS/REAVALIAÇÃO APÓS CINESITERAPIA CASO 1 Libertação de secreções em grande quantidade, espessas, amareladas e com rolhões. Auscultação Pulmonar - murmúrio vesicular normal em ambos os hemitoráx. Melhoria da Saturação de O2 de 87% para 95%. Gasimetria arterial – discreta hipercápnia e hipoxémia (DPCO) R.X tórax dia 31/12/2010 às 15:06h, após cinesiterapia, apresenta franca melhoria. (Figura 2) Figura 2 – ( Caso 1) Rx Tórax dia 31/12/2010 às 15:06h. Após cinesiterapia respiratória Figura 5 – (Caso 3) RX Tórax, dia 19/01/2011 às 11.50h. Antes da cinesiterapia respiratória 2 - INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM DE REABILITAÇÃO - CINESITERAPIA RESPIRATÓRIA Estas intervenções foram efetuadas no turno da Manhã, após observação das radiografias de tórax, realizadas frequentemente no turno da noite. • Inaloterapia com soro fisiológico, antes da Cinesiterapia Respiratória Caso 1 - com copo acessório do ventilador, visto o doente estar ventilado. Caso 2 - com nebulizador ultrasónico. • Drenagem postural bilateral modificada associada a vibrações, percussões e compressões torácicas com maior incidência no hemitoráx esquerdo. • Insuflações com prévia fluidificação das secreções com soro fisiológico, em drenagem postural esquerda. Associação com compressões e vibrações no final da insuflação. • Aspiração de secreções, associada a compressões e vibrações. • Abertura costal esquerda em sincronia com os ciclos inspiratório e expiratório do ventilador, no caso 1 e 3 e do doente no caso 2. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 10 CASO 2 Libertação de secreções em moderada quantidade, esbranquiçadas e espessas. Auscultação Pulmonar - murmúrio vesicular normal em ambos os hemitoráx. Saturação de O2 - 100 %. R.X tórax dia 10/12/2010 às 17:07h, após cinesiterapia, apresenta franca melhoria. (Figura 4) Figura 4 – (Caso 2) RX Tórax, dia 10/12/2010 às 17:07h. Após cinesiterapia respiratória TEMA DE CAPA I SETEMBRO .12 11 e orientação da equipa. É de referir que as intervenções foram semelhantes dado que os três casos apresentavam atelectasia à esquerda. Demonstrámos a eficácia das nossas intervenções com a resolução imediata da atelectasia, cujo comprovativo é evidente através da comparação da auscultação pulmonar e do RX tórax, antes e após cinesiterapia respiratória. Os resultados foram semelhantes, com a respetiva expansão pulmonar à esquerda, como ficou comprovado, excepto no caso 3, que apareceu nova atelectasia apical direita, sendo também tratada, com intervenções dirigidas para essa nova situação. Nestes 3 casos é de referir que se evitaram técnicas invasivas, como bron- Figura 6 – (Caso 3) RX Tórax, dia 19/01/2011 às 19:24h. Após cinesiterapia respiratória CASO 3 Libertação de secreções em grande quantidade, espessas e amareladas. Auscultação Pulmonar - Murmúrio vesicular normal em ambos os hemitórax. Saturação O2 - 100 %. R.X tórax dia 19/01/2010 às 19:24 após cinesiterapia, apresenta melhoria à esquerda. Atelectasia apical à direita. (Figura 6) Perante esta nova atelectasia, foi repetida a cinesiterapia respiratória, dirigida especialmente ao ápice direito. Tendo a situação revertido: Auscultação Pulmonar - murmúrio vesicular normal em ambos os hemitoráx. R.X tórax dia 21/01/2011 às 00h. 09h. - melhoria apical direita (Figura 7) Figura 7 – (Caso 3) Rx Tórax dia 21/01/2011 às 00:09h. Após cinesiterapia respiratória CONCLUSÕES No final deste estudo consideramos ter atingido os objetivos a que nos propusemos. Demos a conhecer o papel relevante do Enfermeiro Especialista de Reabilitação no tratamento das atelectasias, nomeadamente na avaliação do doente, intervenções específicas/cinesiterapia respiratória; reavaliação cofibroscopias, com riscos associados, desconforto para o doente e altos custos para a instituição. Estes casos alertam-nos para a necessidade da prevenção e tratamento continuados destas situações de risco. Bibliografia 1. Couto A, Ferreira R. O Diagnóstico Funcional Respiratório na Prática Clínica. Lisboa: Serviço de educação, Fundação Calouste Gulbenkian; 1992. 2. Duggan MMB, Kavanagh BP. Pulmonary Atelectasis, Anesthesiology. 2005; 102,838–54 3. Esmond G. Enfermagem das Doenças Respiratórias. Loures: Lusociência; 2005. 4. Gomes MJ. Sotto MR. Tratado de Pneumologia. 1 ed. Lisboa: Sociedade Portuguesa de Pneumologia; 2003 5. Hedenstierna G, Edmark L. Mechanisms of atelectasis in the perioperative period, Best Practice&ResearchClinicalAnaesthesiology. 2010; 24, 157 -169 6. Heitor MC. Canteiro MC. Reeducação Funcional Respiratória. 2 ed. Lisboa: Boehringer Ingelheim; 1998. 7. Heitor MC. Sousa M. Reabilitação Respiratória, In Freitas Costa (Ed.) Pneumologia na Prática Clínica. 2 ed. Lisboa; 1997. 8. Hoeman SP. Enfermagem de Reabilitação: Aplicação e Processo. 2 ed. Loures: Lusociência; 2000. 8. Peroni D G, Boner A L. Atelectasis: Mechanisms, Diagnosis And Management, Paediatric Respiratory Reviews. 2000; 1, 274–278 9. Rama-Maceiras P. Peri-Operative Atelectasis and Alveolar Recruitment Manoeuvres, Archivos de Bronconeumologia. 2010; 46(6), 317-324 10. Saraiva C, Magalhães J, Sousa M. Respirar uma Energia Vital. Lisboa: Escola Superior de Enfermagem Calouste Gulbenkian; 2007 11. Thelan LA, Davie JK, et al. Enfermagem em Cuidados Intensivos Diagnóstico e Intervenção. Lusodidacta; 1993 12. Radiografias de Toráx [Imagens]. Almada. Hospital Garcia de Orta EPE; 2010 Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 11 12 I CARDIOLOGIA SETEMBRO .12 CATETERISMO CARDÍACO – INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM CARDIAC CATHETERIZATION - NURSING INTERVENTIONS RICARDO SANTOS VERA SANTOS Enfermeiro no serviço de Especialidades Médicas do Centro Hospitalar Enfermeira no serviço de gastrenterologia do Centro Hospitalar Cova da Cova da Beira, EPE. Beira, EPE. Recebido para publicação: Maio de 2011 Aprovado para publicação: Junho de 2011 RESUMO O cateterismo cardíaco é um procedimento invasivo utilizado para avaliação, diagnóstico e controle de pacientes com doença cardíaca. Realizado no Laboratório de hemodinâmica em utentes em ambulatório ou internados, tem como indicação confirmar ou definir a extensão da cardiopatia, determinar a gravidade da doença, bem como analisar a presença ou ausência de condições relacionadas1. O enfermeiro inserido na equipa multidisciplinar tem um papel fundamental neste tipo de doentes, tanto a nível dos cuidados imediatos, como no internamento nos cuidados intensivos e mais tarde na preparação para a alta. O apoio, psicológico, formas de alívio da dor, alterações do sono e repouso, e o ensino para alta, devem ser de essencial importância para atenuar a ansiedade e a dor ao doente e suas famílias, para encararem a nova situação de uma forma mais optimista. Palavras-chave: Caterismo cardíaco; Intervenções de enfermagem; Doença cardíaca; Cuidados intensivos. ABSTRACT Cardiac catheterization is an invasive procedure used for evaluation, diagnosis and management of patients with heart disease. Held at Catheterization laboratory in users of ambulatory or hospitalized, is indication confirm or define the extent of heart disease, determine the disease severity, as well as assess the presence or absence of conditions Related 1. The nurse inserted the multidisciplinary team has a key role in such patients, both at the level of immediate care, as in hospitalization in intensive care and later in preparation for discharge. The support, psychological forms of pain relief, sleep and rest, and for high school, must be essential to alleviate the anxiety and pain to patients and their families to face the new situation in a way more optimistic. manece como um procedimento eficaz para avaliação e diagnóstico da doença coronária. Além dos riscos do procedimento em si, o utente entra em contacto com novas situações, movimentos, sons e experiências que podem ser ameaçadores durante o tempo na unidade de hemodinâmica1. Nesse sentido, as intervenções de enfermagem dirigidas ao utente submetido ao cateterismo cardíaco são indispensáveis para o estabelecimento de condições seguras, além da promoção e adaptação à nova condição de vida destes utentes e seus cuidadores. Este artigo tem como objetivo geral conhecer a importância do cateterismo cardíaco como meio complementar de diagnóstico e respetivos cuidados de enfermagem. O artigo está organizado em duas partes fundamentais. A primeira parte é constituída pela fundamentação teórica, onde abordamos as artérias coronárias e acessos vasculares. A segunda parte é constituída pelo exame cateterismo cardíaco, razões para sua realização, cuidados de enfermagem pré, durante e pós exame. Finalizamos com a conclusão na qual fazemos referência a algumas sugestões. Esperamos que este artigo possa vir a contribuir para uma melhor compreensão da problemática do cateterismo cardíaco e seus cuidados de enfermagem, concedendo deste modo um suporte teórico a todos aqueles que, de forma direta ou indireta, têm um papel ativo sobre este exame tão importante, onde, uma vez mais, o enfermeiro tem um papel determinante. ARTÉRIAS CORONÁRIAS A circulação coronária compreende todos os vasos que suprem as estruturas cardíacas com sangue oxigenado (artérias coronárias) e que devolvem o sangue à circulação sistémica (veias coronárias)2. Keywords: Cardiac catheterization; Nursing interventions; Heart disease; Intensive care. INTRODUÇÃO Embora as técnicas não invasivas (eletrocardiograma, ecocardiografia, prova de esforço cardíaco) representem um papel importante, o cateterismo cardíaco per- Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 12 Figura 1 – Artéria coronária direita Figura 2 – Artéria descendente anterior Fonte: Gurgel, (2005). Fonte: Gurgel, (2005). CARDIOLOGIA I SETEMBRO .12 13 Existem duas artérias coronárias principais: • Artéria Coronária Direita (ACD). • Artéria Coronária Esquerda (ACE). A ACD irriga a aurícula e ventrículo direitos, sendo também responsável pela irrigação dos nódulos sinoauricular (SA) e auriculoventricular (AV) e uma parte do septo. Fornece sangue para: • Parede inferior do ventrículo esquerdo; • Parede anterior do ventrículo direito; • Átrio direito; • Parte posterior do septo; • Braquial - é o acesso menos utilizado, mais utilizado em PTCA (angioplastia transluminal percutânea), tendo indicações restritas a procedimentos onde o utente apresenta doenças aorto ilíacas. • Femoral - é o acesso vascular mais utilizado. Utiliza um introdutor (bainha) que pode variar o seu calibre, permitindo assim a utilização e troca de cateteres guia durante o procedimento. • Radial - é a mais recente técnica e ainda pouco difundida no nosso meio. • Nodulos sinoatrial e atrioventricular. A ACE divide-se em duas ramificações: • Artéria Anterior Esquerda Descendente (AED); • Artéria Coronária Circunflexa (ACC). A AED abastece o miocárdio ventricular esquerdo, o septo, o músculo papilar anterior e partes do ventrículo direito. Além disso, abastece geralmente o vértice anterior, como também uma parte do vértice posterior. Fornece sangue para: • 2/3 anteriores do ventrículo esquerdo. • Parte anterior do ventrículo direito. • Ápice e septo interventricular, incluindo o feixe de HIS. A ACC e as suas ramificações abastecem a maior parte da aurícula esquerda, a parede lateral do ventrículo esquerdo e parte da parede posterior do ventrículo esquerdo. Fornece sangue para: • Paredes lateral e posterior do ventrículo esquerdo. • Átrio esquerdo. • Nodulo sinoatrial (SA). Os seus ramos são chamados de ramos marginais obtusos. cavidades, válvulas cardíacas e dos grandes vasos. A cateterização cardíaca poderá incluir estudos do lado direito e do lado esquerdo do coração e das artérias coronárias. Figura 3 – Artéria coronária circunflexa Figura 4 - Sistema cardiovascular Fonte: Gurgel, (2005). Fonte: Gurgel, (2005) ACESSO VASCULAR O acesso ao sistema vascular faz-se habitualmente por via percutânea, através de punção venosa ou arterial, mas em casos raros pode ser necessária a dissecção com exposição direta do vaso. A abordagem (figura 4) é quase sempre e preferencialmente pela femoral, geralmente direita, podendo a femoral esquerda ser também necessária quando se introduz mais de um cateter simultaneamente. Outras vias de acesso são raramente usadas e incluem a branquial, subclávia, jugular e umbilical (em recém-nascidos). Deste modo, os acessos mais utilizados são os seguintes2: CATETERISMO CARDÍACO É um meio auxiliar de diagnóstico invasivo, extremamente valioso para a obtenção de informações detalhadas acerca da estrutura e função das INDICAÇÕES Assim, nos grandes centros mundiais de Cardiologia, foi ganhando progressivo relevo o cateterismo terapêutico, que se tornou a indicação principal do exame hemodinâmico, continuando o cateterismo de diagnóstico a ser fundamental para o estudo minucioso de certas cardiopatias e, em particular, para o estudo dos grandes vasos e cálculos hemodinâmicos precisos1. Para o mesmo autor, o cateterismo de diagnóstico está indicado sempre que não seja possível esclarecer completamente a cardiopatia por meios não invasivos e que esse esclarecimento seja relevante para o tratamento da doença. Perante uma malformação congénita é fundamental o estabelecimento da anatomia da lesão, da fisiologia cardíaca particular e do padrão de fluxos sanguíneos dentro do coração e nos grandes vasos. Embora a anatomia e os fluxos intra-cardíacos sejam perfeitamente identificados com a ecocardiografia complementada pelo estudo de Doppler, a avaliação correta das pressões intra-cardíacas, o estudo dos débitos e resistências vasculares e os fluxos nos grandes vasos só são possíveis através do cateterismo cardíaco complementado pela angiocardiografia. O cateterismo terapêutico está indicado sempre que exista uma lesão com indicação para tratamento e que esse tratamento seja possível e eficaz por via percutânea com menores riscos que através de cirurgia cardíaca3. Apesar do exame físico, do eletrocardiograma, da prova de esforço e do ecocardiograma fornecerem consideráveis informações sobre a função cardíaca, o cateterismo cardíaco reveste-se, ainda assim, de fundamental importância para a visualização das artérias coronárias e para a determinação com exatidão do grau de obstrução nestes vasos. De entre as diversas indicações para a execução de uma cateterização cardíaca, destacam-se as seguintes3: • Confirmação da presença da doença cardíaca de que se suspeita, incluindo doença cardíaca congénita, doença valvular e doença miocárdica; • Determinação da função do músculo cardíaco; • Determinação da localização e gravidade do processo patológico; • Determinação da presença e gravidade de estreitamentos ou bloqueios nas artérias coronárias; • Determinação da presença de aneurismas ventriculares; • Avaliação das pressões hemodinâmicas medidas na raiz da aorta, nos ventrículos esquerdo e direito, nas aurículas esquerda e direita e na artéria pulmonar; Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 13 14 I CARDIOLOGIA • Avaliação de utentes com enfartes do miocárdio e infusão de agentes trombolíticos no interior das artérias coronárias ocluídas; • Avaliação pré-operatória para determinar se a cirurgia cardíaca se afigura indicada; • Avaliação da função ventricular após revascularização cirúrgica; • Avaliação do efeito das modalidades de tratamento médico na função cardiovascular; • Realização de técnicas cardíacas especializadas, como a colocação de um pacemaker interno. CONTRA-INDICAÇÕES Este tipo de exame está contra-indicado nas seguintes situações1: • Utentes que não querem ou não são capazes de cooperar durante o exame; • Utentes que recusam o tratamento; • Utentes com alergia aos contrastes ionizados que não foram dessensibilizados; • Utentes grávidas; • Utentes com certas alterações renais graves, na medida em que o contraste pode ser nefrotóxico; • Utentes com alterações hemorrágicas não tratadas. POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES A manipulação de um cateter dentro do coração não é isenta de riscos e, por vezes, a estimulação do miocárdio auricular ou ventricular desencadeia arritmias importantes. É frequente o aparecimento de extrassístoles e taquicardia, tanto auricular como ventricular, habitualmente benignas e auto-limitadas. A simples retirada do cateter é suficiente para as reverter. Mais grave é o aparecimento de bloqueio Auriculo-ventrivular (BAV) completo por lesão do nó aurículo-ventricular que, se for prolongada e causar deterioração hemodinâmica do doente, obriga a suspender o cateterismo e a instituir tratamento urgente. A fibrilhação ventricular, seguida ou não de assistolia, é excecional1. Uma complicação a temer em alguns doentes e com determinados procedimentos é a perfuração cardíaca com tamponamento, que necessita intervenção cirúrgica urgente para drenar o sangue da cavidade pericárdica e suturar a laceração. Doentes particularmente sensíveis, como pessoas portadores de Trissomia 21, podem sofrer depressão respiratória e broncoespasmo durante o exame, rapidamente revertidos com cuidados gerais respiratórios. Outra complicação muito rara mas sempre temível é a embolia cerebral, por coágulos ou gasosa, provocando por vezes alterações neurológicas focais ou crises convulsivas generalizadas. Mais frequentes são as complicações locais no membro ou membros cateterizados, as quais devem sempre fazer parte da vigilância de rotina destes doentes: hemorragias no local da punção, que devem ser imediatamente detetadas e tratadas por compressão manual, hematomas subcutâneos e, principalmente, isquémia do membro afetado por espasmo ou trombose da artéria femoral1. A isquémia é facilmente detetada pela temperatura e palidez do membro e confirmada pela ausência de pulso pedioso homolateral. Outra complicação possível, mas muito rara atualmente, é a infeção do local de punção, resultante de uma assépsia inadequada. O tratamento é fácil com desinfeção local e antibióticos apropriados. As reações alérgicas, muito vulgares alguns anos atrás, são hoje em dia muito raras com os novos fármacos utilizados em sedação e analgesia. É frequen- Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 14 SETEMBRO .12 te o aparecimento de um "rash" cutâneo facial, que desaparece em poucas horas. A alergia ao iodo do produto de contraste é bem mais grave e pode acontecer em doentes suscetíveis pelo que essa possibilidade deve sempre ser pesquisada junto da família3. EQUIPA DE INTERVENÇÃO A equipa multidisciplinar responsável pelo cateterismo cardíaco é geralmente composta pelos seguintes profissionais, onde o enfermeiro tem sempre um papel fundamental: • Um técnico especialista em euipamento de hemodinâmica; • Um técnico de cardiopneumologia; • Uma enfermeira; • Um ou dois cardiologistas especialistas em cateterismo. Estes profissionais constituem uma equipa multidisciplinar fundamental, para o cateterismo cardíaco trabalhando para os mesmos objetivos: diminuir o risco de infeção, obter a colaboração do doente durante e após a técnica e diminuir risco de disritmia, dor e hemorragia. É ainda uma equipa que deverá ter ainda como principais princípios: acolhimento do doente, comunicação e assepsia. PROCEDIMENTO NO CATETERISMO CARDÍACO A rotina do laboratório de hemodinâmica é semelhante à de qualquer bloco operatório pelo que se procede à desinfeção e assepsia do doente e pessoal técnico antes de iniciar a intervenção. Durante a realização do cateterismo, o utente permanece numa mesa angiográfica, encontrando-se sobre a sua cabeça ou ao seu lado a câmara cujo braço móvel, em forma C ou de U, permite visualizar o coração sob diversos ângulos. No decorrer de todo o procedimento, é fundamental que o utente se encontre acordado e alerta, a fim de poder informar os profissionais caso sinta alguma alteração1. Após a desinfeção da região tricotomizada com uma solução anti-séptica, o cardiologista injeta um anestésico local na região onde será introduzido o cateter – cujas configurações e diâmetros são bastante diversificadas. Consoante o estudo a efetuar, o catéter é introduzido na artéria femoral, a fim de cateterizar o coração esquerdo, incluindo as artérias coronárias, ou na veia femoral, se se visa cateterizar o coração direito. O procedimento de introdução do cateter consiste na realização de um pequeno corte na pele com cerca de meio centímetro, utilizando para tal um bisturi. Em seguida, é introduzido no vaso sanguíneo um filamento flexível (fioguia), que, com o auxílio de raio X, confirma-se que chega ao coração. O cateter é passado sobre o fio-guia, sendo colocado em posição com a ajuda de uma televisão e de leituras diretas da pressão arterial. Durante o procedimento, o utente é heparinizado, a fim, de diminuir o risco de embolias. Tendo o cateter atingido o local pretendido, solicita-se ao utente que respire fundo, injetando-se um contraste nos vasos sanguíneos e nas câmaras do coração a fim de possibilitar a sua observação por fluoroscopia e de se obterem imagens radiográficas permanentes, gravadas em filme e destinadas a auxiliar um posterior diagnóstico definitivo. A injeção do contraste nas artérias coronárias poderá provocar uma sensação dolorosa no peito e na ventriculografia poderá causar uma sensação de calor por todo o corpo, cuja duração não ultrapassa cerca de 15 a 20 SETEMBRO .12 CARDIOLOGIA I 15 segundos. Refira-se, porém, que os contrastes mais modernos provocam menor incidência de sensações desagradáveis. Após este desenvolvimento, pensamos agora, e de acordo com uma estrutura lógica do trabalho, ter condições para descrever os cuidados de enfermagem aos doentes submetidos a cateterismo cardíaco. Figura 5 - Sala de hemodinâmica CUIDADOS DE ENFERMAGEM A DOENTES SUBMETIDOS A CATETERISMO CARDÍACO O conhecimento do procedimento, indicações, contra-indicações e complicações são pilares essenciais que os enfermeiros devem ter presentes. Dessa forma, um aumento de conhecimentos teóricos, e posteriormente práticos, confirmará a importância dos cuidados de enfermagem junto da equipa multidisciplinar. Neste contexto, os cuidados de enfermagem a doentes submetidos a cateterismo cardíaco serão apresentados segundo três fases que considerámos fundamentais: antes, durante e após a realização do cateterismo. ANTES DO CATETERISMO CARDÍACO Na admissão do doente na enfermaria, deverá ter-se em conta vários aspetos4: Acolhimento do doente na unidade: • Confirmar o nome do doente com o nome do doente em plano; • Apresentar-se ao doente; • Apresentar o serviço ao doente; • Informar os familiares que acompanham o doente quanto ao: - Número de cama onde o doente irá ficar instalado; - Número de telefone do respetivo serviço; - Horário de visitas; - Data provável da alta. • Apresentar o doente aos restantes doentes da respetiva enfermaria. Preparação psicológica do doente: • Informar o doente acerca do exame que vai realizar, esclarecendo-o da sua finalidade, riscos e complicações, obtendo desta forma a sua máxima colaboração; • Esclarecer o doente acerca das sensações que poderá sentir durante a realização do cateterismo cardíaco: - Explicar ao doente que durante o procedimento estará monitorizado para vigilância de sinais vitais e traçado eletrocardiográfico para despiste de eventuais arritmias; - Explicar ao doente que durante o procedimento estará sob o efeito de anestesia local, sendo que a dor que irá sentir será mínima ou nula; - Explicar ao doente que durante o procedimento estará deitado e imóvel durante cerca de duas horas pelo que poderá sentir desconforto, fadiga ou dores musculares; Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 15 16 I CARDIOLOGIA - Explicar ao doente que à medida que o cateter passa no interior do coração poderá sentir sensação de vibração e/ou palpitações; - Explicar ao doente que poderá sentir sensação de calor pelo corpo durante cerca de 10 a 15 segundos, efeito adverso aquando da injeção do contraste iónico; - Explicar ao doente que irá ouvir sons estridentes provocados pelo funcionamento dos equipamentos de fluoroscopia. • Permitir que o doente verbalize os seus medos diminuindo desta forma a sua ansiedade; • Providenciar consentimento livre e esclarecido do doente uma vez que se trata de um exame complementar de diagnóstico invasivo cujo consentimento escrito do doente é obrigatório por lei; • Administrar pré-medicação prescrita (sedativos ou analgésicos) a fim de manter o doente calmo, diminuir a sua ansiedade e diminuir o traumatismo psicológico provocado pelo exame. Preparação física do doente: • Pesquisar história prévia de alergias a fim de prevenir reações anafiláticas ao contraste radiopaco, sendo possível a administração prévia de anti-histamínicos ou corticosteróides; • Providenciar jejum de alimentos sólidos de 6 a 8 horas e líquidos de 4 horas no sentido de prevenir náuseas e vómitos e a aspiração de conteúdo alimentar; • Determinar o peso e altura do doente a fim de calcular posteriormente a quantidade de contraste radiopaco a injetar; • Retirar eventuais próteses (próteses dentárias entre outras); • Fornecer uma camisa do hospital ao doente explicando-lhe que não poderá usar roupa interior; • Se abordagem femoral, realizar tricotomia inguinal bilateral a fim de evitar riscos de infecão; • Puncionar acesso venoso periférico no membro superior esquerdo para administração de eventual terapêutica de urgência e colocar Soro Fisiológico (SF) em curso; • Se o doente for diabético realizar pesquisa de glicemia capilar e colocar soro glicosado em curso (Dextrose 5% ou Polielectrolítico com Glicose 5%); •Aguardar chamada da sala de hemodinâmica. Durante os momentos prévios à realização do cateterismo cardíaco cabe ao enfermeiro que acompanha o doente: • Reavaliar sinais vitais; • Verificar permeabilidade do cateter venoso periférico; • Providenciar um saco de areia para realização de compressão no local de punção após a cateterização cardíaca; • Transmitir ocorrências do doente ao colega da sala de hemodinâmica. Qualquer doença que afete o coração provoca ansiedade não só ao doente como também à respetiva família. Em muitos casos, esta ansiedade não é infundada, mas noutros ela é maior do que a gravidade que a doença sugere. Neste último caso, está incluída a angústia que geralmente antecede a realização do cateterismo cardíaco. Assim, os cuidados de enfermagem, a prestar antes da execução do referido exame, englobam a preparação física do doente, a sua preparação psicológica, bem como da respetiva família. Habitualmente, o cardiologista explica ao doente e respetiva família, todos os procedimentos que irão ser realizados. No entanto, o enfermeiro pode reforçar e esclarecer algumas das informações que eles receberam, incutindo confiança e Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 16 SETEMBRO .12 tranquilidade3. Deve ser permitido aos familiares que colaborem na preparação do doente, explicando-lhes todos os procedimentos que antecedem o exame: • Preparação física • A hora a que irá ser realizado o respetivo procedimento; • Local onde fica situada a sala de cateterismo; • Local onde poderão esperar pelo seu familiar. Possibilitar que a família acompanhe o respetivo doente à sala de cateterismo, providenciando que consigam falar com o médico após a realização do exame contribuirá para que a angústia e ansiedade diminuam gradualmente. DURANTE O CATETERISMO CARDÍACO As unidades de cateterização cardíaca, também denominadas por salas de hemodinâmica, requerem habitualmente equipamento e recursos humanos especializados, entre os quais enfermeiros. O aparato tecnológico inerente à realização deste tipo de procedimento constitui uma fonte acrescida de ansiedade para o doente pelo que, uma vez mais, é preponderante o apoio psicológico ao doente durante esta fase. Os procedimentos técnicos e o tipo de material utilizado poderão variar consoante o local ou os respetivos profissionais envolvidos, contudo apresentaremos o material e os cuidados inerentes a este tipo de procedimento, com base na pesquisa realizada no âmbito deste trabalho. Material necessário: Trousse angiográfica composta por: • Campo de mesa; • Campo grande auto-adesivo com dois orifícios (para as regiões inguinais); • Saco esterilizado para o intensificador de imagem; • Compressas esterilizadas 10x10 - 20; • Toalhetes - 4; • Batas esterilizadas - 2; • Agulha intramuscular (IM); • Agulha subcutânea (SC); • Cateter venoso periférico 16G; • Seringas de 10cc - 5; • Seringas de 20cc - 3; • Pinça hemostática; • Cabo com lâmina de bisturi n.º 11; • Manifold 2 vias; • Sistema de injeção manual de contraste; • Guia telefonado 0.35mm/175cm curvo 3mm; • Taças pequenas - 4; • Taças médias (capacidade 500cc) - 2; • Taça grande; • Rótulos de identificação de medicamentos. A este material junta-se: - Prolongamento de alta pressão para o injetor de contraste; - Sistema de monitorização de pressões; - Sistema de perfusão de soros; - Introdutor de 5 a 8F (indicação médica) com via lateral; - Soro fisiológico isotónico; - Seringa de 10cc com 10 000 U de heparina; CARDIOLOGIA I SETEMBRO .12 - Cateter de diagnóstico pré-formado (indicação médica); - Penso transparente em spray; • Penso pós-operatório. Soluções: • Iodopovidona dérmica; • Lidocaína 1% - 10cc; • Soro fisiológico isotónico 500cc heparinizado com 10 000 U de Heparina; • Soro fisiológico isotónico. Durante a cateterização cardíaca os cuidados de enfermagem assentam em três princípios: acolhimento do doente, comunicação e assépsia, tendo como principais objetivos: obter a colaboração do doente durante o procedimento, diminuir o risco de infeção e vigiar e despistar eventuais complicações. Neste contexto, apresentaremos os cuidados de enfermagem considerados relevantes nesta fase: • Acolher o doente na sala de hemodinânica estabelecendo uma relação empática favorecendo um clima propício ao esclarecimento de dúvidas e alívio da ansiedade, de modo a obter a colaboração do doente durante o procedimento; • Posicionar o doente na mesa angiográfica; • Tomar conhecimento com o doente sobre o que ele sabe em relação ao exame e/ou esclarecê-lo em relação à técnica; • Confirmar jejum do respetivo doente; • Verificar permeabilidade do acesso venoso periférico; • Verificar funcionalidade do equipamento; • Verificar material de reanimação; • Preparar material necessário à realização do respetivo procedimento: - Introdução de contraste no injetor automático; - Preparar a manga de pressão com soro fisiológico isotónico heparinizado 500cc/5000U (para sistema de monitorização de pressão); - Preparar a manga de pressão com soro fisiológico isotónico (para permeabilizar a via lateral do introdutor); - Montar e expurgar o sistema de monitorização de pressão, com técnica asséptica; - Montar e expurgar o sistema para a via lateral, com técnica asséptica; - Montar e expurgar o sistema de contraste, com técnica asséptica; - Adaptar e expurgar o prolongamento de alta pressão do injetor, com técnica asséptica. • Monitorizar sinais vitais e traçado electrocardiográfico; • Dar apoio na colocação do campo angiográfico; • Lavar com soro fisiológico e secar bem o local de inserção do introdutor; • Explicar ao doente os procedimentos efetuados, esclarecendo-o acerca das sensações que poderá sentir, já descritas no capítulo anterior; • Manipular o intensificador de imagem; • Explicar e pedir ao doente a sua colaboração na remoção do introdutor e colocação do compressor; • Depois do exame, o cateter é removido e é aplicada compressão sobre esse local. Essa compressão poderá ser manual ou mecânica e tem a duração de 30 minutos; • Após a hemostase, aplicar penso transparente em spray e penso pós-operatório e um saco de areia (+/- 2Kg). Após a realização do cateterismo cardíaco cabe ao enfermeiro proceder Figura 6 - Agulhas e fio guia Figura 7 - Introdutores (bainhas) Fonte: Gurgel, (2005 Fonte: Gurgel, (2005) 17 aos respetivos registos, focando-se nos seguintes aspetos: • Procedimento efetuado/via de acesso; • Estado de consciência do doente; • Sinais vitais: pressão arterial, frequência cardíaca e frequência respiratória; • Morfologia do traçado eletrocardiográfico; • Sinais e/ou sintomas apresentados pelo doente; • Duração da compressão; • Características do penso; • Cuidados a ter na vigilância do penso; • Ensino realizado ao doente. APÓS O CATETERISMO CARDÍACO Após a realização do cateterismo cardíaco, os cuidados de enfermagem prestados têm como principais objetivos: a avaliação do doente, a prevenção de eventuais complicações e a deteção precoce destas complicações. De seguida apresentamos os cuidados de enfermagem que consideramos relevantes nesta fase5. • Proporcionar a instalação cómoda do doente na enfermaria; • Avaliar sinais vitais (frequência cardíaca e tensão arterial) de 15 em 15 minutos durante 1 hora e posteriormente de 30 em 30 minutos durante 3 horas; • Monitorizar ritmo e frequência cardíaca e vigiar sinais de dor torácica a fim de despistar eventuais arritmias cardíacas ou outras complicações (complicações vasovagais ou EAM); • Manter extensão do membro onde foi efetuada a punção: - Se abordagem femoral, manter o doente em repouso absoluto no leito não devendo elevar a cabeceira acima dos 30º durante 12 a 24 horas com o membro inferior em extensão e com um peso (saco de areia) sobre a região femoral; - Se abordagem braquial ou radial, o doente poderá realizar levante, contudo deverá manter o braço estendido durante várias horas com a ajuda de um suporte, não podendo levantar qualquer tipo de peso durante as 24 horas seguintes ao exame. • Verificar pulsos periféricos, coloração, temperatura e sensibilidade, presença de dor na extremidade distal do membro puncionado de 15 em 15 minutos durante a primeira hora a fim de despistar sinais de insuficiência arterial, entre os quais: perda de pulso periférico, parestesias, pele fria, pálida e cianótica; • Vigiar o penso compressivo no local da punção para despiste de hemorragia. Colocar um peso (saco de areia) durante 4 a 6 horas a fim de facilitar uma adequada compressão e prevenir eventual hemorragia; • Proporcionar dieta ligeira após 3 horas do cateterismo; Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 17 18 I CARDIOLOGIA • Vigiar o doente quanto à presença de náuseas, vómitos, rubor ou erupções cutâneas que constituem sinais de hipersensibilidade ao contraste injetado; • Estimular o doente a ingerir líquidos de modo a facilitar uma adequada reposição hídrica e eliminação renal do contraste; Proporcionar um ambiente confortável ao doente, esclarecendo eventuais dúvidas pós-cateterismo; • 24 Horas após o cateterismo cardíaco retirar penso do local da punção vigiando eventuais complicações, entre as quais: hematoma, hemorragia, inflamação e/ou edema. O apoio, psicológico, formas de alívio da dor, alterações do sono e repouso, e o ensino para alta, devem ser de essencial importância para atenuar a ansiedade e a dor ao doente e suas famílias, para encararem a nova situação de uma forma mais otimista. A realização deste procedimento de diagnóstico pressupõe a existência de uma equipa especializada, na qual o enfermeiro assume um papel fundamental. Neste contexto, é preponderante que os enfermeiros sejam detentores de conhecimentos que lhe permitam prestar cuidados de enfermagem de qualidade ao doente submetido a cateterismo cardíaco. CONCLUSÃO Os problemas, que envolvem o sistema cardiovascular, incluem grande variedade de alterações frequentes e menos frequentes. As alterações do sistema cardiovascular apresentam situações de desafio para o tratamento médico e as intervenções de enfermagem. A avaliação de enfermagem de um doente com problemas cardiovasculares internado é de extrema importância, uma vez que permite determinar as necessidades fundamentais afetadas, permitindo estabelecer o planeamento de cuidados, estratégias e objetivos para a resolução dos problemas. O doente com perturbações cardíacas apresenta à equipa e profissionais especializados nestes cuidados um desafio único. O êxito no tratamento do doente depende do conhecimento e do empenhamento dos membros da equipa. Um papel importante da parte dos enfermeiros é o apoio emocional aos utentes e sua família e uma avaliação diária dos cuidados a prestar ao doente/família. O enfermeiro inserido na equipa multidisciplinar tem um papel fundamental neste tipo de doentes, tanto a nível dos cuidados imediatos, como no internamento nos cuidados intensivos e mais tarde na preparação para a alta. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 18 Bibliografia 1. WOODS S. L., FROELICHER E. S. S. e MOTZER S. U. Enfermagem em Cardiologia (4. ed.) Barueri: Manole. 2005. 2. GURGEL, E. Cateterismo cardíaco e angioplastia coronária. Acedido em Janeiro, 25, 2010, em http://www.huwc.ufc.br/arquivos/biblioteca_cientifica/1210635976_68_0.pdf.2005. 3. CARVALHO, F. A Criança submetida a Cateterismo Cardíaco. Porto: Universidade do Porto, Tese de Mestrado em Ciências de Enfermagem Pediatria, 2001. 4. SVAVARSDOTTIR, E. K. e MCCUBBBIN, M. Parenthood transition for parents of an infant diagnosed with a congenital heart condition. Journal of Pediatric Nursing, 4 (11), 1996. pp.207-216. 5. BRUNNER L. S. e SUDDARTH D. S. Textbook of Medical-Surgical Nursing (10. ed.). Philadelphia: J.B.Lippincott Co, 2006. SAÚDE INFANTIL I SETEMBRO .12 19 O RECÉM-NASCIDO COM SÉPSIS NA UNIDADE DE CUIDADOS INTENSIVOS NEONATAIS THE NEWBORN WITH SEPSIS IN THE NEONATAL INTENSIVE CARE UNIT ANA CRISTINA DE NÓBREGA MACHADO GOMES Enfermeira Especialista de Saúde Infantil e Pediatria Mestre em Enfermagem Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais e Pediátricos do SESARAM, E.P.E. – Funchal Recebido para publicação: Abril de 2012 Aprovado para publicação: Maio de 2012 RESUMO A sépsis consiste numa infeção bacteriana generalizada na corrente sanguínea, a qual pode ser adquirida no período pré-natal, durante ou após o parto, podendo ser classificada como: sépsis de início precoce; sépsis de início tardio ou sépsis hospitalar. Devido ao índice significativo de mortalidade e morbilidade da sépsis neonatal, os recém-nascidos com esse diagnóstico ou suspeita são geralmente internados numa Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN). O internamento do recém-nascido numa UCIN, representa uma situação inesperada e de stress para a família, o que pode afetar a organização estrutural do sistema familiar e acarretar diversos condicionalismos para a parentalidade e vinculação entre os pais e o recém-nascido. Palavras-chave: Sépsis; Recém-nascido; Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN). ABSTRACT Sepsis is a generalized bacterial infection in the bloodstream that can be acquired in the prenatal period, during or after birth and may be classified as early-onset sepsis, late-onset sepsis or hospital-acquired sepsis. Due to the significant rate of morbidity and mortality of neonatal sepsis, neonates with this diagnosis or suspicion are usually hospitalized in a Neonatal Intensive Care Unit (NICU). The admission of the newborn in a NICU represents an unexpected and stressful experience for the family which may affect the structural organization of the family system and lead to several constraints on the parenthood and bonding between both parents and the newborn. Keywords: Sepsis; Newborn; Neonatal Intensive Care Unit (NICU). O RECÉM-NASCIDO COM SÉPSIS A sépsis, que tem como sinónimo septicémia, consiste numa “(…) infeção bacteriana generalizada na corrente sanguínea”(1) (p.282). No período neonatal a sépsis “(…) é descrita como a enfermidade mais importante no período neo- natal devido à sua frequência, alta mortalidade e inúmeras sequelas”(2) (p.307). A incidência global de sépsis varia de 1-10/1000 nados vivos mundialmente(3). A sépsis neonatal tem uma incidência e mortalidade associada inversamente proporcionais à idade gestacional e peso ao nascimento(3). “A septicémia atinge 0,1% dos recém-nascidos de termo e até 20% dos recémnascidos de muito baixo peso, sendo de 10% em recém-nascidos com peso ao nascimento entre 1000-1500g, 35% em recém-nascidos com peso inferior a 1000g e 50% se peso inferior a 750g”(3) (p.4). A mortalidade associada à septicémia permanece globalmente elevada, entre 2-50%, apesar do tratamento anti-infecioso apropriado, dependendo do peso ao nascimento e da idade gestacional(3). Nos Estados Unidos da América estima-se que sejam gastos cerca de 5 a 10 biliões de dólares por ano no tratamento de sépsis entre os adultos e as crianças, bem como se estima que, nos prematuros, a sépsis seja responsável por 50% dos óbitos(2). Os recém-nascidos de muito baixo peso (inferior 1500 g) encontram-se sob maior risco de infeção por fatores endógenos intrínsecos (imaturidade do sistema imunitário; níveis reduzidos de anticorpos adquiridos transplacentariamente) e fatores exógenos (maior necessidade de cuidados prolongados em Unidades de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN) e consequente exposição a patogéneos oportunistas, dispositivos invasivos e frequentes manipulações pelos profissionais de saúde)(3). Os neonatos são altamente suscetíveis a infeções devido à sua imunidade diminuída(1). Os anticorpos, nomeadamente os IgG, IgM e IgA, possuem a função de reconhecer os antígenos bacterianos e neutralizar as substâncias estranhas, permitindo que se tornem suscetíveis à fagocitose(4). Nos recém-nascidos de termo, segundo os mesmos autores, os níveis dos anticorpos IgG são superiores aos maternos, porque estes anticorpos passam através da placenta a partir das 34 semanas de gestação. No entanto, os anticorpos IgM, que são responsáveis pela defesa do organismo contra as bactérias gram-negativas, não atravessam a barreira placentária, razão pela qual os recém-nascidos apresentam uma maior suscetibilidade às infeções causadas Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 19 20 I SAÚDE INFANTIL SETEMBRO .12 e ouvidos, bem como através dos órgãos internos como o sistema respiratório, nervoso, urinário e gastrointestinal. Na sépsis de início tardio, os organismos agressores são geralmente o stafilococcus, a klebsiella, o enterococos e as pseudomonas. Os casos de sépsis neonatal de início tardio são geralmente acompanhados por meningite, tendo uma taxa de mortalidade menor à da sépsis de início precoce, cerca de 5 a 20%(2). por estas bactérias. Deste modo, se houver IgM presente no sangue do cordão umbilical é indicativo de infeção fetal ou imunização ativa materna(4). Por sua vez, os anticorpos IgA, são anticorpos sintetizados intra-útero e são transmitidos da mãe para o recém-nascido através do leite materno. No período neonatal muitas situações maternas constituem risco infecioso para o recém-nascido(5). O risco infecioso bacteriano perinatal consiste na probabilidade de ocorrência de infeção bacteriana no recém-nascido. A sépsis no período neonatal “(…) pode ser adquirida no período pré-natal a partir da corrente sanguínea materna, através da placenta, ou durante o parto, pela ingestão ou aspiração de líquido amniótico infectado”(1) (p.282). Os fatores de risco infecioso de causa obstétrica podem ser: rotura prema- A sépsis hospitalar ocorre principalmente nos recém-nascidos doentes e com hospitalização prolongada e tem uma taxa de mortalidade de cerca de 5 a 10%(2). A sépsis hospitalar tem maior incidência nos prematuros de muito baixo peso (inferior a 1500 gramas), acometido de doenças que debilitam o sistema imunitário como a doença da membrana hialina, atraso de tura de membranas – superior a 18 horas; rotura prematura das membranas – inferior a 37 semanas de gestação; febre materna; infeção intra amniótica; colonização materna por streptococcus do grupo B; bateriúria por streptococcus do grupo B; antecedentes de recém-nascido com infeção por streptococcus do grupo B e infeção urinária periparto(5). O risco associado à infeção por streptococcus do grupo B deve-se ao facto de que nos recém-nascidos os monócitos têm a capacidade fagocitária diminuída para os streptococcus do grupo B e uma atividade menor para a morte intracelular no caso dos staphylococcus aureus e streptococcus do grupo B(4). Os streptococcus do grupo B “(…) têm emergido como organismos extremamente virulentos em neonatos, com uma alta taxa de mortalidade (50%) entre os neonatos afetados”(1) (p.282). Durante o período intra-uterino pode ocorrer a transferência transplacentária de organismos e vírus, tais como o citomegalovírus, a toxoplasmose e a treponema pallidum (sífilis), os quais podem atravessar a barreira placentária durante a segunda metade da gestação(1). Outro fator de risco para ocorrer sépsis neonatal é a prematuridade, na qual o risco aumenta proporcionalmente com a diminuição do peso ao nascer. Os recém-nascidos com menos de 1500 gramas têm um risco relativo 8 a 11 vezes maior que os recém-nascidos de termo de adquirirem sépsis(2). Outros fatores de risco para a sépsis neonatal são os procedimentos invasivos, nomeadamente a monitorização com aparelhos invasivos e a assistência ventilatória prolongada com permanência prolongada do tubo endotraqueal(2). A sépsis neonatal pode ser classificada como: sépsis de início precoce; sépsis de início tardio e a sépsis hospitalar(1,2). A sépsis de início precoce ocorre com menos de três dias após o parto e é adquirida no período neonatal, sendo os organismos infetantes mais comuns os streptococcus do grupo B e escherichia coli, que podem estar presentes na vagina da mãe. No entanto, também se pode observar na sépsis com início precoce os seguintes patogéneos: haemophilus influenzae, cândida albicans, herpes simples, listeria e clamídias. A sépsis de início precoce tem uma incidência variável de 1 a 10 em cada 1000 natos vivos, com uma taxa de mortalidade alta de 15 a 70%, sendo mais frequente em prematuros(1,2). Estas situações manifestam-se de forma “(…) fulminante, com predomínio do sofrimento respiratório de forma semelhante da membrana hialina (…)”(2) (p.308). A sépsis de início tardio ocorre entre uma a três semanas após o parto(1). Esta infeção pós-natal é adquirida por contaminação cruzada com outros neonatos, profissionais ou objeto no ambiente. A invasão bacteriana, em consonância com os autores supramencionados, pode ocorrer através do coto umbilical, da pele, das membranas mucosas dos olhos, nariz, faringe crescimento intra-uterino, asfixia, bem como o uso de métodos invasivos nomeadamente medidas de ventilação invasiva, técnicas cirúrgicas, administração de drogas via endovenosa, nutrição parentérica, entre outras. Nestes casos, a frequência e os germes predominantes dependem do sistema de controlo de infeção hospitalar podendo-se encontrar como agentes patogénicos: staphylococcus aureus multirresistente, staphylococcus epidermidis e gram-negativos como as pseudomonas e a klebsiella(2). O diagnóstico de sépsis baseia-se habitualmente na presença clínica de sinais e sintomas, sendo o seu diagnóstico definitivo estabelecido por avaliação laboratorial(5). “Os sinais clínicos de sépsis não são específicos e há patologias infeciosas que cursam com o quadro clínico sobreponível”(5) (p.188). As manifestações da sépsis neonatal podem ser perspetivadas segundo os sinais gerais, o sistema circulatório, o sistema respiratório, o sistema nervoso central, o sistema gastrointestinal e o sistema hematopoiético(1). Relativamente aos sinais gerais, o recém-nascido com sépsis apresenta-se com mau estado geral e com um controle térmico inadequado manifestando hipotermia ou hipertermia. No que concerne às manifestações no sistema circulatório, os recém-nascidos podem apresentar: palidez; cianose; manchas cutâneas; pele fria e pegajosa; hipotensão; edema e frequência cardíaca irregular com bradicardias e/ou taquicardia(1). A nível do sistema respiratório os recém-nascidos podem manifestar: ventilação irregular; apneia; taquipneia; cianose; roncos; dispneia e tiragem(1). No sistema nervoso central o recém-nascido pode manifestar: atividade reduzida com letargia; hiporreflexia; coma; atividade aumentada com irritabilidade; tremores; convulsões; fontanela abaulada; tónus aumentado ou diminuído e movimentos oculares anormais(1). No que respeita ao sistema gastrointestinal o recém-nascido pode apresentar as seguintes manifestações: vómitos; diarreia ou obstipação; distensão abdominal; hepatomegália e sangue oculto nas fezes(1). Finalmente, no que concerne ao sistema hematopoiético, o recém-nascido pode manifestar: icterícia; palidez; petéquias; equimoses e esplenomegália(1). O rastreio laboratorial da sépsis envolve exames laboratoriais indiretos que auxiliam o diagnóstico precoce de infeção invasiva no recém-nascido, tendo indicação para a sua realização nas seguintes duas situações: quando o recém-nascido mostra sinais evidentes de infeção (neste caso os exames servem para confirmar a suspeita clínica) e nas situações em que existe risco de infeção mas o recém-nascido está clinicamente bem (neste caso os exames são pedidos na expectativa de serem encontrados resultados anormais antes do recém-nascido manifestar sinais da doença)(5). Os exames indiretos de infeção mais utilizados para auxiliar o diagnóstico de sépsis no recém-nascido são: a proteína C-reativa (PCR), a contagem de leucócitos, a contagem de neutrófilos imaturos/neutrófilos totais e a contagem de plaquetas porque o recém-nascido geralmente responde ao processo inflamatório Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 20 SETEMBRO .12 SAÚDE INFANTIL I 21 e infecioso com um aumento dos níveis plasmáticos de alfa e beta-globulinas, com aumento da PCR e ainda o aumento de formas imaturas de leucócitos(4). O reconhecimento e o diagnóstico precoce da sépsis no recém-nascido, bem como a instituição de medidas terapêuticas adequadas são essenciais para aumentar as possibilidades de sobrevivência do neonato e reduzir a probabilidade de lesões neurológicas permanentes(1). Perante uma situação clínica de suspeita de sépsis neonatal, a terapia antibiótica é iniciada antes da confirmação e identificação do organismo infecioso por exames laboratoriais. No recém-nascido “(…) os sinais clínicos de infeção são inespecíficos e a possibilidade de deterioração rápida é uma realidade, pelo que a atitude a tomar deverá ser caracterizada por um elevado grau de suspeição para iniciar antibióticos, CUIDAR DO RECÉM-NASCIDO E SUA FAMÍLIA NA UCIN Com o nascimento do bebé real a família começa a operar o ajustamento do sub-sistema conjugal que a parentalidade e as crianças exigem, caracterizada por novas funções, novas tarefas e reorganizações relacionais intra e inter-familiares, bem como sistémicas(6). No momento do nascimento, a mãe defronta-se mantendo contudo firmeza e sabedoria para os parar às 48/72 horas se a clínica, os exames complementares de diagnóstico e culturas foram negativas”(5) (p.185). O tratamento da sépsis neonatal consiste no suporte circulatório e respiratório, na administração agressiva de antibióticos e imunoterapia(1). Após o início da terapia antibiótica, nos quadros clínicos de sépsis, os sinais e sintomas habitualmente persistem por mais de 12 horas(5). Nestas situações, a terapia antibiótica deverá ser mantida por 7 a 10 dias se as culturas forem positivas e interrompidas em três dias se as culturas foram negativas e o recém-nascido estiver assintomático(1). Além do tratamento clínico da sépsis no recém-nascido, a vigilância e a observação dos recém-nascidos por parte dos enfermeiros é também de primordial importância. “O reconhecimento do problema existente é de importância inestimável, é geralmente a enfermeira que observa e avalia os neonatos, e identifica que ‘algo está errado’ com eles”(1) (p.284). Tal facto ressalta a importância sobre a compreensão dos modos de transmissão da infeção, porque auxilia o enfermeiro a identificar os recém-nascidos sob risco de desenvolverem sépsis. Além disso, o conhecimento dos efeitos colaterais do antibiótico específico, a regulação e administração apropriadas do medicamento são essenciais nos cuidados de enfermagem a estes recém-nascidos. Os enfermeiros, durante a prestação de cuidados aos recém-nascidos com sépsis, devem promover a redução de qualquer stress fisiológico ou ambiental(1). Deste modo, o enfermeiro deve promover a manutenção de um ambiente idealmente termorregulado e a antecipação de potenciais problemas, como a desidratação ou hipóxia. Outro aspeto importante nos cuidados ao recém-nascido com sépsis envolve a observação de sinais de complicações, nomeadamente a meningite e o choque séptico(1). A terapia antibiótica prolongada apresenta riscos adicionais para os recémnascidos com sépsis. Os antibióticos predispõem o recém-nascido ao crescimento de organismos resistentes e superinfeção por agentes fúngicos como, por exemplo, a candida albicans(1). Ao longo do internamento, os enfermeiros devem de promover a implementação de medidas preventivas face ao risco de disseminação da infeção para outros recém-nascidos. Deve ser fomentada a lavagem adequada das mãos, o uso de equipamento descartável, a eliminação de excreções e higienização adequada do ambiente e dos equipamentos(1). O prognóstico da sépsis neonatal é variável. “A mortalidade da sépsis precoce varia de 15-70%, enquanto que nas sépsis tardia e hospitalar é de 5 a 20%”(2) (p.320). Além disso, podem ocorrer diversas sequelas neurológicas e respiratórias na sequência da sépsis de início precoce(1). Por sua vez, na sépsis de início tardio, também podem induzir a resultados desforáveis em recém-nascidos imunocomprometidos(1). O nascimento de um recém-nascido com necessidade de cuidados especiais representa uma situação de stress na família que advém de problemas não normativos de adaptação do sistema familiar, consistindo num problema inesperado que pode afetar fortemente a organização estrutural da família(6). A experiência de hospitalização após o nascimento exige a capacidade de adaptação da família, uma vez que as expectativas dos pais em relação ao filho idealizado durante a gravidez são frustradas quando este, ao nascer, necessita de ser hospitalizado numa Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN)(8). A experiência dos pais que vivem o internamento do seu recém-nascido numa UCIN pode comportar diversas perdas, nomeadamente: “(…) a perda de uma gravidez que se esperava normal; a perda de uma criança saudável e, por vezes, a perda real do bebé”(9) (p.264). Os pais deparam-se com um ambiente pouco familiar e desconhecido da UCIN, confrontando-se com obstáculos ao desenvolvimento dos seus papéis parentais(10). O recém-nascido que no parto normal não necessita de ser hospitalizado numa UCIN, funciona “(…) como um elemento fundamental na estimulação das atitudes interativas e reforçador dos comportamentos e emoções de vinculação, apresenta-se aqui como um parceiro claramente diminuído, vulnerável e pouco competente. Em vez dos habituais sentimentos de satisfação, ternura, curiosidade e orgulho parental, estes pais têm de lidar com emoções complexas de medo, ansiedade, raiva, culpabilidade, e alguns sentem mesmo uma incapacidade de olhar aquele ser tão estranho e vulnerável rodeado de tantos aparelhos e instrumentos ameaçadores.”(9) (p.305). O nascimento de um recém-nascido de risco representa uma crise muito difícil para os pais, normalmente associada a reações emocionais intensas, caracterizadas por grande confusão, ansiedade, medo, perturbação, depressão e labilidade(11). Nas situações em que o prognóstico sobre a morbilidade e a mortalidade do recém-nascido é incerta, os pais poderão apresentar algumas diferenças na iniciativa de atitudes interativas e alguns podem recusar em estabelecer um relacionamento com o recém-nascido enquanto a sua sobrevivência não estiver assegurada(1, 11). Quando a sobrevivência do bebé de risco ainda não está assegurada “(…) as mães tendem a ser menos ativas do que as dos bebés saudáveis, e algumas podem mesmo mostrar-se apáticas e desinteressadas”(11) (p.243). Os pais “(…) se preparam para a morte do neonato enquanto esperam pela recuperação. O luto antecipado e a hesitação em estabelecer um relacionamento são evidenciados por comportamentos como o retardo na escolha do nome do recém-nascido, a relutância em visitá-lo (…) e a hesitação em tocar e manusear o neonato quando lhes é dada oportunidade”(11) (p.249). Alguns estudos de investigação destacaram que quando o bebé recém-nascido é admitido na UCIN as mães experienciam sentimentos de ansiedade; com as seguintes tarefas: o fim abrupto da sensação de fusão com o feto; das fantasias de perfeição e omnipotência fomentadas pela gravidez; a adaptação a um novo ser, que provoca sentimentos de estranheza; lamentar a perda do filho imaginário e adaptar-se às características específicas do bebé real; dominar o medo de fazer mal ao filho indefeso e aprender a tolerar e a desfrutar as exigências do bebé, dada a sua dependência total da mãe(7). Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 21 22 I SAÚDE INFANTIL SETEMBRO .12 angústia; depressão; choque; infelicidade; sofrimento e sentimentos de impotência; desesperança e manifestam estar assustadas; preocupadas; estar fora de controlo devido à instabilidade emocional; culpa e insegurança(12). Os sentimentos de impotência e de incapacidade podem ser agravados pelas barreiras físicas colocadas ao contacto com o bebé, nomeadamente a incubadora e os aparelhos de monitorização e de suporte ventilatório, que reduzem as possibilidades de interação. “Estas máquinas são, por isso, sentidas, simultaneamente, como imprescindíveis à sobrevivência do bebé e ameaçadoras, porque anulam o papel da mãe”(13) (p.264). Alguns estudos de investigação evidenciaram a existência de problemas nos pais de neonatos hospitalizados na UCIN que decorrem do stress cau- Os Enfermeiros devem promover a consecução do papel parental o que implica “(…) aumentar a auto-estima dos pais; respeitar as crenças culturais; promover interações pai-bebé e mãe-bebé; ouvir o que os pais têm para dizer, nomeadamente as suas expectativas e esperanças; motivá-los para a competência e avaliar as relações conjugais e o funcionamento familiar”(16) (p.39). sado pela hospitalização em si, os quais podem levar a sintomas de transtorno de stress agudo, um precursor de stress pós-traumático(10). Com a análise das fontes específicas de stress, identificaram que a alteração no papel parental foi a mais fortemente associada aos sintomas de stress agudo. Nesses estudos, os pais relataram que a impossibilidade de ajudar, pegar, cuidar, proteger da dor e compartilhar a convivência do bebé com outros membros da família, foram as principais fontes de stress(10). A separação física entre os pais e o recém-nascido decorrente do internamento na UCIN pode induzir a algum afastamento emocional por parte dos pais, o que pode prejudicar a capacidade de assumir os seus papéis familiares frente ao neonato (p.249)(1). A separação precoce do binómio pais-bebé aumenta a tensão sobre a relação pais-bebé, especialmente durante longas estadias na UCIN, porque os pais precisam ser capazes de ver, segurar e tocar seu recém-nascido, a fim de facilitar a vinculação precoce e criação de laços(12). Existem evidências que indicam que a separação emocional que acompanha a separação física entre mães e recém-nascidos podem interferir no processo de criação de laços familiares, nomeadamente na vinculação(1). “A interrupção desta relação, por necessidades de tratamento, tem efeitos altamente nefastos levando com maior incidência a abandonos, negligência e maus-tratos”(14) (p.28). Além disso, existe o risco do recém-nascido ser rejeitado devido à diferença entre o bebé idealizado pelos pais e o real(7). A condição emocional dos pais “(…) é hoje conhecida como da maior importância para o estabelecimento da interação, para o desenvolvimento de uma relação de vinculação positiva e para atitudes educativas em geral”(11) (p.246). A vinculação é um foco de atenção na prestação de cuidados de enfermagem, definida pela CIPE versão 1, como uma “ação de parentalidade com as seguintes características específicas: ligação entre a criança e a mãe e/ou pai; formação de laços afetivos”(15) (p.43). A ligação mãe-filho, de acordo com a fonte supracitada, caracteriza-se pelo “(. . .) estabelecimento de relações próximas entre a mãe e o filho, procura de mútuo contacto visual com a criança, iniciando o toque com os dedos da criança e chamando-a pelo nome”(15) (p.41). A aquisição da identidade parental processa-se de acordo com quatro fases: a fase antecipativa (em que os pais começam a experimentar o papel e adaptam-se às mudanças sociais e psicológicas); a fase formal (que começa com o nascimento do bebé e o desempenho do papel de acordo com as expectativas dos outros); a fase informal (quando os pais efetuam o seu papel como uma forma única de lidar com o seu bebé e que não é transmitido pelo sistema social) e a fase de identidade do papel (quando os pais sentem confiança e competência no desempenho do seu papel) (16). ximo do bebé e seus pais na UCIN, encontra-se numa posição privilegiada para agir como promotor do processo de parentalidade no binómio pais-bebé prematuro, envolvendo-os através dos cuidados centrados na família. De modo a ajudar os pais de recém-nascidos com sépsis internados na UCIN no estabelecimento do seu papel parental, diminuição do stress parental e promoção da vinculação pais–recém-nascido, os enfermeiros devem envolvê-los desde o início do processo de cuidados ao bebé internado. “Os cuidados de neonatos de alto risco centrados na família incluem o encorajamento e a facilitação do envolvimento dos pais, em vez de isolálos do neonato e de cuidados associados a ele”(1) (p.249). Valorizar o papel da família como principal cuidador tem como fundamento a “(…) função protetora da família, pois cuida e cria os seus filhos, e promotora da saúde, pois influencia significativamente a saúde física e mental dos indivíduos”(17) (p.19). A implementação dos cuidados centrados na família na UCIN tornou-se na ponte que liga as famílias aos profissionais de saúde em parceria para cuidar das crianças hospitalizadas(18). Os cuidados centrados na família têm sido associados a vários contributos, que incluem: a diminuição da duração do internamento; o reforço da vinculação e da ligação pais-filho; a melhoria no bem-estar dos bebés prematuros; melhores resultados de saúde mental; melhor alocação de recursos; diminuição da possibilidade de processos legais e maior satisfação do paciente e da família(19). Os enfermeiros devem fundamentar os seus cuidados na filosofia dos cuidados centrados na família, reconhecendo “(…) a diversidade entre as estruturas e culturas familiares, as metas, os sonhos, as estratégias e os comportamentos da família; e as necessidades de apoio, serviço e informação da família”(1) (p.10). Os Enfermeiros devem permitir e estimular os pais a verem e tocarem os seus recém-nascidos imediatamente após o parto e antes que sejam transferidas para a UCIN, uma vez que esta intervenção parece diminuir sentimentos de culpa e ressentimento, podendo ajudar os pais a se adaptarem à situação(20). Além disso, os pais devem ser encorajados a visitar o seu bebé na UCIN o mais cedo possível. No entanto, antes da primeira visita à UCIN, os pais devem ser previamente avisados da aparência do recém-nascido, do equipamento ligado à criança e receber algumas indicações sobre o ambiente físico da unidade(1). Ao longo do internamento na UCIN, os enfermeiros devem envolver os pais em algum tipo de atividade dos cuidados, permitindo-lhes o assumir de um papel mais ativo, como por exemplo: o mudar a fralda, a alimentação, a leitura de um livro de histórias infantis e cantar canções de embalar numa voz suave e tranquila(1). Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 22 Compete aos Enfermeiros “(. . .) ajudar os pais a ultrapassar os obstáculos inerentes a paternidade/maternidade e a estabelecer uma relação afetiva precoce com os seus filhos”(16) (p.42). “É fundamental ajudar os pais a desenvolver competências para cuidar do seu bebé pois, na transição para o domicílio, estes passam a ter que desempenhar um papel mais ativo e de maior responsabilidade no seu cuidado”(17) (p.18). O Enfermeiro, cuidador mais direto e pró- SETEMBRO .12 SAÚDE INFANTIL I 23 O período de hospitalização do bebé, em que os pais estão em “(…) contacto diário com os diferentes profissionais e com os outros pais, e o próprio processo de adaptação ao filho, é um tempo crucial de ensaio de novas significações e construções sobre este filho e sobre o papel de pais”(11) (p.249). As expectativas e crenças dos pais sobre o recém-nascido contribuem de forma significativa para a definição da relação pais-filho. Deste modo, a persistência de crenças e expectativas inadequadas, pode induzir a efeitos negativos nas atitudes dos pais a médio prazo, mesmo quando os problemas da criança já foram corrigidos ou ultrapassados(11). A equipa de enfermagem da UCIN tem um papel fundamental na inserção do recém-nascido na sua família, pelo que a educação para a saúde e a parce- 7. Brazelton, B. & Cramer, B. A relação mais precoce: os pais, os bebés e a ria dos cuidados devem ser direcionadas no sentido de assegurar aos pais a aquisição de competências para que possam garantir o desenvolvimento harmonioso do bebé após a alta hospitalar. No entanto, “a maioria dos bebés e famílias que passam por esta experiência vão ser capazes de um conjunto de adaptações e compensações que lhes permitirão um futuro adaptado, numa ilustração clara da capacidade de resiliência humana”(11) (p.236). Psicologia da gravidez e maternidade. Coimbra: Quarteto; 2001. p. 235-251. 12. Obeidat, H., Bond, E. & Callister, L. The parental experience of having an Infant in the newborn intensive care unit. The Jornal of Perinatal Education. Summer, 2009; 18 (3), 23-29. [Consulta: 21.Maio.2011]. http://web.ebscohost.com/ehost/pdfviewer/pdfviewer?vid=43&hid=107&sid=07d2d 9dd-d17d-400c-b6fc 13. Barros, L. A unidade de cuidados intensivos de desenvolvimento como unidade de promoção do desenvolvimento. In M. Canavarro (Eds.). Psicologia da gravidez e maternidade. Coimbra: Quarteto; 2001. p. 297-316. 14. Jorge, A. Família e hospitalização da criança: (re)pensar o cuidar em enfermagem. Loures: Lusociência; 2004. 15. International Council of Nurses. Classificação internacional para a prática de enfermagem – CIPE versão 1. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros; 2006. 16. Lopes, S. & Fernandes, P. O papel parental como foco de atenção para a prática de enfermagem. Sinais Vitais, Novembro, 2005 (63), p. 36-42. 17. Nunes, S. et al. A dinâmica familiar após a alta do pré-termo. Sinais Vitais, Junho, 2010 (91), p. 16-20. 18. Malusky, S. A concept analysis of family-centered care in the NICU [versão electrónica]. Neonatal Network, Novembro/Dezembro, 2005, 24 (6), p. 25-32. [Consulta: 18.Dezembro.2010]. http://web.ebscohost.com/ehost/pdfviewer/pdfviewer?vid=93&hid=106&sid=07d2d 9dd-d17d-400c-b6fc-24e907f1a12c%40sessionmgr110 19. Cooper, L. et al. Impact of a family-centered care initiative on NICU care, staff and families [versão electrónica]. Jornal of Perinatology, 2007, 27, 3237. [Consulta:20.Dezembro.2010]. http://www.nature.com/jp/journal/ v27/n2s/full/7211840a.html 20. Aita, M. & Snider, L. The art of developmental care in the NICU: a concept analysis. Journal of Advanced Nursing, 2003; 41 (3), 223-231. Bibliografia 1. Hockenberry, M., Wilson, D. & Winkelstein, M. Wong Fundamentos de Enfermagem Pediátrica (7 ed.). São Paulo: Elsevier; 2006. 2. Miura, E. Sepse bacteriana. In E. Miura & R. Procianoy (Eds.). Neonatologia princípios e prática (2 ed.). Porto Alegre: Artes Médicas; 1997. p.307-321. 3. Alves, R. Tratamento das infecções neonatais bacterianas e fúngicas: fundamentos teóricos para uma aplicação prática - Dissertação de candidatura ao grau de Mestre em Medicina, submetida ao Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, da Universidade do Porto. Porto, Junho de 2011. [Consulta: 20.Maio.2012].http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/62199/2/Tratamento%20das%20infeces %20neonatais%20bacterianas%20e% 20fngicas.pdf 4. Tamez, R. & Silva, M. Enfermagem na UTI Neonatal: assistência ao recémnascido de alto risco (2 ed.). Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002. 5. Pereira, A. et al. Risco infeccioso e rastreio séptico. In A. Valido et al. (Eds.). Consensos Nacionais em Neonatologia. Secção de Neonatologia da Sociedade Portuguesa de Pediatria: Coimbra; 2004. p.185-190. 6. Alarcão, M. (Des)Equilíbrios familiares: uma visão sistémica. Coimbra: Quarteto; 2000. interacção precoce (4 ed.). Lisboa: Terramar; 2004. 8. Silva, M. et al. Experiência dos pais com filhos recém-nascidos hospitalizados. Referência, Dezembro, 2009 (11), p. 37-46. 9. Barros, L. Perdas e luto durante a gravidez e puerpério. In M. Canavarro (Eds.). Psicologia da gravidez e maternidade. Coimbra: Quarteto; 2001. p. 255-293. 10. Cleveland, L. Parenting in the neonatal intensive care unit. 2008 [Consulta: 22.Maio.2011]. URL: http://web.ebscohost.com/ehost/pdfviewer/pdfviewer?vid=80&hid=106&sid=07d2d9dd-d17d-400c-b6fc24e907f1a12c%40sessionmgr110. 11. Barros, L. O bebé nascido em situação de risco. In M. Canavarro (Eds.). Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 23 24 I CUIDADOS PALIATIVOS SETEMBRO .12 A PERDA E O LUTO… UMA CONDIÇÃO HUMANA? THE LOSS AND MOURNING ... A HUMAN CONDITION LILIANA LOURENÇO Enfermeira com Pós-Graduação em Cuidados Paliativos e Pós Graduação em Enfermagem Oncológica, Escola Superior de Saúde de Viana do Castelo. Recebido para publicação: Julho de 2010 Aprovado para publicação: Janeiro de 2011 RESUMO A percepção das vivências de morte tem sofrido transformações ao longo da história, passando de uma experiência tranquila e até mesmo desejada, a uma possibilidade impregnada de angústias e que deve ser evitada a todo o custo. Neste contexto, os profissionais de saúde têm deveras grande responsabilidade em discutir e reflectir sobre a questão, de modo a que possam prestar e proporcionar um Cuidado Autêntico ao ser Humano, em toda a sua Plenitude. Na continuidade dos aspectos já referidos, posso afirmar então, que a reflexão sobre a questão da morte como parte inerente da existência humana, considerando a necessidade de se compreender as relações de cuidado e as formas de relacionamento humano, assume-se como crucial. Aqui, destaca-se também a importância da preparação dos profissionais de Enfermagem para compartilhar com o doente e família um momento existencial que pode e deve ser vivido com Dignidade. Perante tal, a filosofia dos Cuidados Paliativos, apresenta-se como o caminho para melhor assistir a pessoa/família na sua morte, bem como no luto, afinal o cuidar é sempre possível ainda que a cura não faça parte do seu horizonte de possibilidades. best way to watch the person / family at his death and in mourning, after all the care is always possible even if the cure is not part of their horizon of possibilities. Keywords: Death; Grief; Palliative Care; Nursing Intervention. INTRODUÇÃO A morte é sem sombra de dúvida, condição da vida. Perante tal, porque não estudá-la, compreendê-la e reflectir sobre ela? Já Carvalho, 2006, p.2, considerava que, o que é verdadeiramente mórbido não é falar da morte, mas antes nada dizer sobre ela.1 Com efeito, morrer faz parte da vida, sendo que a morte corresponde ao passo final de uma dança emocional que começou muito antes de nascermos, e como em todas as danças, os últimos passos querem-se sentidos e nunca sozinhos. ABSTRACT The perception of the experiences of death has been transformed throughout history, from experience a quiet, even want, a chance steeped in anguish and should be avoided at all costs. In this context, health professionals have very big responsibility to discuss and reflect on the issue, so that they can provide and provide Genuine Care to be human, in all its fullness. Following on the aspects already mentioned, I can say then, that reflection on the question of death as an inherent part of human existence, considering the need to understand the relationships of care and forms of human relationship, it is assumed as crucial. Here, we highlight the importance of preparation of nursing professionals to share with the patient and family an existential moment that can and should be lived with dignity. Given such, the philosophy of Hospice Care, presents himself as the Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 24 Foto: Andrei Malov I Dreamstime Palavras-chave: Morte; Luto; Cuidados Paliativos; Intervenção de Enfermagem. A percepção das vivências de morte tem sofrido transformações ao longo da história, passando de uma experiência tranquila e até mesmo desejada a uma possibilidade impregnada de angústias e que deve ser evitada a todo o custo. SETEMBRO .12 Porém, aquilo que se verifica frequentemente é que a ciência médica na ânsia de “matar a morte” esquece-se do Homem. Neste contexto, urge, que a filosofia inerente aos Cuidados Paliativos impregne na sociedade, como caminho de descoberta no apoio à pessoa em luto. Contudo, não basta o conhecimento dos seus princípios, mas sim fundamental, é a sua integração e aplicação ao processo de tomada de decisão. Neste artigo procede-se à análise da importância da intervenção no luto na prática de Enfermagem, particularmente no âmbito dos Cuidados Paliativos, aprofundando-se alguns aspectos mais complexos provenientes sobretudo da reflexão sobre as experiências e vivências neste contexto, que muitas vezes não são abordados na bibliografia existente. Afinal como já nos dizia Nóvoa, 1988, p. 115, Formar-se, não é instruir-se, é antes de mais, reflectir, pensar numa experiência vivida. 2 Os trajectos estão traçados, compete-nos a nós profissionais de saúde, escolher o caminho, percorrê-lo e aplicá-lo, nunca esquecendo que Humanizar a Morte é de facto, reencontrar um Sentido para a Vida. ABORDAGEM HISTÓRICA E SOCIAL DO FENÓMENO MORTE Numa época em que vários tabus começam a ser quebrados, a morte continua a ser um tema que a sociedade persiste em ignorar. Porém, este é um acontecimento perante o qual cada indivíduo se vê inevitavelmente confrontado.1 Desde sempre o homem se inquietou com a sua existência e mais ainda com a sua finitude. Na verdade, tomamos consciência de forma mais clara dessa finitude a partir da morte dos outros, principalmente daqueles que nos são próximos. Contudo, é também sobre a nossa morte que emergem as nossas angústias. Apesar dos grandes feitos históricos associados ao homem, desde as descobertas cientificas aos avanços tecnológicos, o certo, é que a morte teima em ser um dos mistérios que ele ainda não conseguiu desvendar. Segundo Carvalho, 2006, p. 3, a vivência da morte varia de sociedade para sociedade, de cultura para cultura, de família para família e de indivíduo para indivíduo. 1 Neste sentido, é fundamental que na abordagem de enfermagem ao doente em situação de morte, bem como a abordagem à pessoa em luto sejam respeitadas e conceptualizadas as crenças e os contextos culturais de determinada personalidade, pois nunca poderemos intervir e apoiar convenientemente a pessoa na sua dor, se não encontrarmos e não percebermos o seu conceito de morte e o seu significado. Na minha opinião, crucial, não se trata de acreditar no que outro acredita, mas sim acreditar que o outro acredita. Outro dos aspectos que é possível constatar, perante a realidade que nos envolve actualmente, diz respeito àquilo que designamos por “matar a morte ou vender a morte”. Com efeito, se até ao século XII, a morte era considerada familiar, próxima, na qual a morte era aguardada com maior naturalidade, em meados do século XIX, a visão da morte sofre uma grande transformação, precisamente pela troca desse espaço pelo hospital. Outrora, competia aos familiares o cuidar na morte. Actualmente, cabe ao profissional de saúde esta responsabilidade, ainda que constate muitas vezes nos profissionais de saúde, uma ânsia de “matar a morte”, com consequente esquecimento da pessoa. De facto, segundo Neves (2000) 70% da população francesa morre em hospitais ou serviços de internamento prolongado para pessoas idosas. CUIDADOS PALIATIVOS I 25 Aqui, a hora não é mais de acompanhamento dos doentes terminais, mas de prolongamento da vida. 3 A morte passa a ser vista como vergonhosa, assunto interdito ou fracasso. Hoje, a morte parece dotar-se do seu carácter sombrio, na medida em que, são realizados os maiores esforços no sentido de silenciá-la, ocultar todo o sofrimento e dor por ela causados. Perante tal, precisamos com urgência de caminhar rumo à humanização da morte e ao encontro com vida real que fica depois da morte. Afinal, a possibilidade de morte e a própria morte dão sentido ao nosso existir, sendo que esta jornada só tem sentido porque há um fim. O PROCESSO DE LUTO O luto é uma experiência que todos nós vivenciamos ao longo da nossa vida, constituindo um processo sempre difícil e doloroso. Carvalho (2006) defende que o luto é uma reacção normal à perda de um objecto importante, constituindo uma fase transitória e necessária da readaptação do investimento em novos objectos.1 Já Sanders, cit por, Carvalho, 2006, p.4, considera o luto como a representação de um estado experiencial que a pessoa sofre após tomar consciência da perda.1 Contudo, mesmo sendo universal, o luto é profundamente marcado pela forma como cada indivíduo, membro de determinada cultura, o experiencia na sua individualidade. Desta forma, a dor da perda não pode ser quantificada, e cada indivíduo deve ser compreendido na sua necessidade pessoal, com características e reacções particulares. Como nos diz Chambel, 2007.p.9, uns partem suavemente num sabor agridoce, outros deixam-nos chagas por dentro, no coração.4 Porém, a isto não é alheia a teia relacional que connosco construíram, afinal existimos por dentro dos outros e só por isso, quando a morte chega para os que mais amamos, a ausência física impõe um processo de desvinculação, a que chamamos luto, e que verificamos que se divide em três fases: negação, desorganização e reorganização emocional. Com efeito, é da nossa condição humana, reagirmos à morte com a força do instinto de vida. Porém, quando tal não se verifica, surgem os lutos prolongados e complicados com comportamentos depressivos para além do razoável, aquilo que designamos por luto patológico. Este está associado à intensificação, inibição, adiamento, ou prolongamento das respostas decorrentes do luto em si. Aqui, podemos então pensar que o luto nada mais faz do que pôr a nu a fragilidade estrutural preexistente. No âmbito do acompanhamento no luto, é fundamental, primeiramente conhecermos os nossos medos e termos consciência daquilo que sentimos, para podermos apoiar efectivamente o outro. Frequentemente, aquilo que verifico neste contexto, no profissional de saúde, é o reflexo de uma postura de defesa, que impede de facto a empatia, o encontro real com alguém. Portanto, é emergente “tirar a máscara” e criar uma ligação autêntica e profunda com o outro, no sentido de Cuidar verdadeiramente. Na infância, o luto é ainda ignorado, nesta altura temos tendência quase inata para proteger a criança, romanceando a morte ou ocultando a verdade. Porém, a verdade é que a criança já sente, vê e sofre, e tal influencia o seu desenvolvimento e a forma como ela vai viver. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 25 26 I CUIDADOS PALIATIVOS SETEMBRO .12 Muitas vezes, a criança entende que a pessoa partiu porque quis, e para tal contribuem explicações como: “foi fazer uma viagem…está num sítio melhor”…ou então, uma espécie de silêncio ensurdecedor, onde a voz cala e os olhos gritam. Com efeito, não devemos, pela ausência da verdade, pela mentira ou pelo silêncio, deixar a criança entregue à sua imaginação, é fundamental enquadrar a fantasia da criança numa base realista, assim sim para sua protecção. Proteger a criança, pela negação da dor, pode ser conveniente para os familiares mais angustiados, mas desvaloriza a criança. 4 As crianças não precisam ser infantilizadas, precisam de sinceridade e disponibilidade afectiva, afinal elas tudo percebem, excepto a mentira. do todo, ainda que numa intervenção técnica, não deixamos de atender ao sofrimento sobre o acto, estamos perante um momento de Cuidar. Não esqueçamos que o corpo manifesta a pessoa. Vários estudos demonstram que o conhecimento e a valorização dos sistemas de crenças dos doentes colaboram com a aderência do indivíduo à terapia, assim como com melhores resultados das intervenções. 6 A compreensão dos profissionais de saúde sobre a espiritualidade, religiosidade ou crenças pessoais da pessoa, contribui de facto, para um cuidado efectivo. Neste sentido, é fundamental a abordagem da dimensão espiritual pelos profissionais de saúde. Embora, os primeiros passos Se elas se sentirem parte do todo, irão expressar-nos os seus sentimentos com maior facilidade. Neste sentido, no âmbito do acompanhamento da criança em luto, como profissionais de saúde que somos, torna-se crucial, olhar a criança, não como superiores adultos, mas como alguém que já foi criança, estando atentos às suas necessidades. Para tal, podemos recorrer a um vasto conjunto de técnicas, desde o desenho à utilização de plasticinas, entre outras, no sentido de diminuir o seu sofrimento e o da sua família, afinal não é através da fuga, mas sim incluindo a criança em todo o processo que poderemos intervir adequadamente. nessa caminhada já tenham sido dados, inclusive, verificamos recentemente o estabelecimento de regulamentação da assistência espiritual e religiosa nos hospitais (Dec. Lei n 253/2009 de 23 de Setembro), não há dúvida, que existe ainda um longo caminho a percorrer. 7 Neste contexto, aquilo que penso é que seria extremamente vantajosa a inclusão desta temática na formação dos profissionais de saúde, dado que pouca tem sido a discussão destes aspectos. Torna-se necessária a realização de estudos na área para uma melhor compreensão da espiritualidade e suas implicações no contexto da saúde. Na minha opinião, é importante mudarmos conceitos e mentalidades, mas somente alcançaremos tal objectivo, através da difusão do nosso trabalho, das evidências e resultados das nossas intervenções, da nossa experiência e da dinamização da investigação neste âmbito. Obviamente, que a mudança não será fácil, até porque esta, é sempre um processo gradual e progressivo, porém cabenos também a nós não desistir e Acreditar! Quando falamos em CP, como nos diz a OMS, 1990, cit por, Cerqueira, 2005, p.26, falamos de “(…) cuidados activos, totais, prestados a doentes que não respondem a tratamentos curativos com o grande objectivo de controlo da dor e de outros sintomas, dos problemas psicológicos, sociais e espirituais, proporcionando a melhor qualidade de vida aos doentes e familiares.”8 Neste sentido, não podemos prestar CP, sem atendermos à dimensão espiritual, no respeito pela autonomia e vulnerabilidade inerentes a todos nós seres humanos. Portanto, os CP não surgem por acaso, eles pretendem dar resposta ao valor supremo da solidariedade. Na prática, lidamos com pessoas que apresentam necessidades espirituais. Mas como identificá-las? Esta responsabilidade de promover a espiritualidade das pessoas interpela as nossas próprias emoções. Portanto, se não conhecermos a cartografia do nosso próprio mundo interior nunca poderemos ajudar. Tal como nos diz Mendes (2005) é fundamental que estejamos conscientes da necessidade de analisarmos também nós, o nosso próprio sentido da vida, para que as convicções pessoais sobre o mundo e sobre o homem que defendemos estejam em consonância como o corpo de conhecimentos que sustenta a nossa intervenção profissional. 5 A DIMENSÃO ESPIRITUAL NOS CUIDADOS DE SAÚDE Desde sempre o ser humano possui uma propensão para a busca de significado para a vida, por meio de conceitos que transcendem o tangível. Todos nós somos “buscadores de sentido”. Esta busca e crença num sentido de conexão com algo maior que nós próprios, é aquilo que designamos de espiritualidade. De acordo com Mendes, 2005.p.160, a espiritualidade é o princípio de vida que se propaga à totalidade do ser humano, inclui as dimensões da vontade própria, emocional, moral e ética, intelectual e psicológica, gerando a capacidade para formação de valores transcendentes.5 A espiritualidade é assim, parte constituinte de todos nós, seres humanos, manifestando-se sob a forma de sentimentos, sendo a razão para a existência humana.5 O estudo do contributo da espiritualidade para a saúde conduziu à emergência do conceito de bem-estar espiritual. Segundo Carvalho, 2006, p.7, o bem-estar espiritual, é uma forma de estar dinâmica que se reflecte na qualidade das relações que o indivíduo estabelece em quatro domínios da existência humana, ou seja, consigo próprio, com os outros, com o ambiente e com algo ou Alguém que transcende o humano. Assim, o nosso bem-estar espiritual global será então resultante do efeito combinado do bem-estar espiritual em cada um destes domínios. Por outro lado, é importante que não se confundam os conceitos de espiritualidade e religião, pois a espiritualidade pode estar ligada à religião, mas não necessariamente, dado que esta antecede a religiosidade. A espiritualidade e a sua relação com a saúde têm se tornado claro paradigma a ser estabelecido na prática de cuidados. A doença permanece como entidade de impacto amplo sobre aspectos de abordagem desde a fisiopatologia, até a sua relação social, psíquica e espiritual, e aqui é fundamental reconhecer que estes diversos aspectos estão correlacionados e em múltipla interacção. Quando cuidamos alguém, é crucial a integração Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 26 UMA COMPETÊNCIA, REFLEXO DA EXPERIÊNCIA Se não tivéssemos emoções ou sentimentos não sentíamos angústias, medo, dor …porém também não tínhamos ilusões, sonhos ou desejos…Seria isso bom?! Não sei se seria… SETEMBRO .12 CUIDADOS PALIATIVOS I 27 Quando confrontada com a perda de alguém que muito AMO, a vida pareceu perder o sentido. Senti-me perdida. Emocionalmente, senti que nada em mim seria mais profundo e doloroso do que esse sentimento de perda irremediável. Pensei que nada, nem ninguém podia preencher o sentimento de vazio que quem partiu deixou em mim. Nada, nem ninguém poderia acalmar a angústia e as feridas interiores… Agarro-me a todos os bens que me deixou, mas sinto saudade das suas palavras serenas, das tardes de gargalhadas, do seu cheiro doce e da sensação de protecção que em mim despertava. Sinto saudade dos momentos que vivemos, mas sinto também uma certa Sofre-se duas vezes, por uma ferida interior dispersa, que nos remete para o sofrer sem significado, e para uma vida sem sentido. Precisamos então mudar a nossa realidade, a realidade dos nossos serviços, onde nós profissionais de saúde, utilizando como defesa emocional, a redução afectiva, impedimos que a pessoa se despeça de si própria, da vida e dos que mais ama. Ainda se morre sozinho, no meio de alta tecnologia… Neste contexto, não podemos deixar a nossa intervenção pelo modelo biopsicossocial, devemos ir além deste, contemplando também a vertente espiritual que se traduz nos valores, nos significados, nas crenças e propó- tristeza, por não lhe ter dito todos os dias, incessantemente, o quanto gostava dele…como me arrependo dos silêncios, das palavras não ditas… Há lágrimas que tem de ser choradas, há gritos que tem de ser gritados, a nossa condição pede-o. Como diria alguém que conheci: quem desconhece o amargo da tristeza não se poderá deliciar com o doce da alegria… Porém, acredito plenamente que há vida depois da morte, e o seu encontro físico comigo, não foi em vão, pois o que dele ficou em mim, aquilo que me transmitiu e a mensagem que me deixou é para mim motivo de orgulho. A morte é o contrário da vida? Para mim, definitivamente não, quem morre continua a viver por dentro dos sobreviventes. Assim, todos nós somos seres eternos, e esta eternidade não começa quando acaba a morte, mas sim quando começa a vida. Aqui não há passado, nem futuro, mas sim o Presente, saibamos Vivê-lo… Quem melhor do que alguém que já sentiu a perda, que já vivenciou um turbilhão de emoções e que já conhece a cartografia do seu próprio mundo interior existencial, para ter a sensibilidade necessária no sentido de acompanhar o outro neste caminho?! De facto, esta experiência acarreta inúmeras aprendizagens, aplicáveis à vida profissional. O que poderei dizer a uma criança ou adolescente que perdeu o pai ou a mãe para aliviar o seu sofrimento? O que poderei dizer a um pai ou mãe que perdeu um filho? Provavelmente nada…a profundidade da questão não é da mesma ordem de grandeza das palavras, é da dimensão do inexplicável. Por isso, muitas vezes talvez só possa ajudar com uma presença serena, disponível e sincera na afectividade. Talvez um silêncio sentido que respeite a dor alheia. Talvez um espaço de aceitação emocional incondicional, para que a pessoa não se feche e encontre mecanismos capazes de transformar a angústia da perda, em actividades satisfatórias de vida. Na maioria das vezes, aquilo que ouço dizer a alguém em luto é que “é preciso seguir em frente”. Para mim, quando assumimos esta atitude transparecemos duas coisas: “desculpe, mas eu não tenho tempo para ouvir as suas lágrimas e por favor não acorde em mim um sofrimento maior do que o seu”. Entender o luto do outro, é então encontrar em nós os caminhos das experiências emocionais de perda e angústia, talvez por isso se diga tanto “esquece e segue em frente”. Esta, não é a atitude profissional correcta, pois é a negação humana, é alimentar o sofrimento, é colocar-nos ao serviço da doença. Negar o sofrimento, é sofrer duas vezes, “esquecer e seguir em frente” nunca foi acto de coragem, não é mais do que fugir de chorar a aceitação da verdade. Perde-se o controlo, o rumo, o sentido da vida. sito da vida da pessoa. Urge a criativa disponibilidade emocional nos profissionais. Retiremos o melhor partido das diferenças! Afinal, como alguém dizia, o facto de não existirem clones emocionais confere a cada ser humano a possibilidade de percorrer mares nunca dantes navegados, e consequentemente a nós, profissionais, a oportunidade de crescimento pessoal na tentativa da realização profissional. Neste sentido, não nos esqueçamos também de nós, cuidadores, pois essencial é também cuidar de quem cuida. Trabalhar na área da prestação de cuidados, implica também a aceitação das nossas vulnerabilidades e limitações com humildade. Afinal, a vulnerabilidade não é sinónima de incompetência. Assumirmos uma postura de defesa, impede efectivamente a empatia. “Tirar a máscara” é saudável, pois permite criar a verdadeira ligação com o outro, algo mais profundo. Numa fase em que estamos a ultrapassar o tecnicismo, precisamos desenvolver “uma terceira orelha”, é fundamental a escuta activa, afinal viver é comunicar. Obviamente, todos nós temos medos, nomeadamente, o medo da solidão, o medo do abandono, o medo de não viver uma vida plena, porém, é crucial possuirmos consciência dos nossos sentimentos. Não esqueçamos que sem qualidade relacional, nunca poderá haver absoluta qualidade assistencial. Assim, por mais desgastante e extenuante que possa ser a nossa actividade, o privilégio de acompanhar alguém na sua viagem para a finitude, com uma tranquilidade reconfortante, supera de facto tudo, e enriquece verdadeiramente a nossa própria vida. RUMO AO CUIDAR COM QUALIDADE A perda não é condição humana. Portanto, quando falamos de perda, falamos de uma condição terrestre e biológica. Por sua vez, o processo de luto é uma reacção vital, essencialmente inerente à condição humana. Este representa a resposta à perda de algo ou de alguém e inclui um conjunto de sentimentos que levam determinado tempo a serem resolvidos, dependendo de pessoa para pessoa, bem como da particularidade de cada situação (GPAP, 2007). 9 O processo de luto não se constitui como processo linear, muito pelo contrário, envolve uma série de etapas ou componentes sequenciais, que são subjectivas, na medida em que variam de acordo com as características e vicissitudes de cada um de nós. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 27 28 I CUIDADOS PALIATIVOS SETEMBRO .12 Desde os primórdios da humanidade, que o humano tem necessidade de ritualizar a morte. De acordo com Carvalho (2006) retratando os tempos mais longínquos, os mortos dos povos musterenses eram cobertos de pedras com o intuito de protegê-los dos animais e evitar que voltassem para junto dos vivos.1 Mais tarde, eram ainda depositados alimentos sobre a sepultura dos mortos. Portanto, sempre valeu a pena a atitude pela morte serena e em paz. Neste contexto, podemos compreender que há de facto rituais distintos, provenientes de realidades distintas, e a este nível, é importante também adaptar a nossa abordagem, na medida em que a compreensão da diferen- nhamos para propostas de intervenção em saúde mais direccionadas para questões das reais necessidades do ser humano enquanto passível de morte, porém, ainda temos um longo caminho a percorrer para que a morte, na nossa sociedade seja respeitada e vivida com dignidade. Por outro lado, sejamos francos, o acompanhamento no luto não acontece na maioria dos nossos serviços, não intervimos para além da morte, este é um cuidado que deveras não se presta, embora a descoberta deste caminho delineado no apoio à família em luto seja precioso. Chambel (2007) considera o luto, antes de qualquer acção comportamental, um processo interior que não se condiciona com exteriores ça gera melhor acompanhamento à pessoa que está a morrer. Esta consciência atenua o sofrimento no processo de luto, afinal não nos sentimos sós neste momento. A religião assume, neste sentido, também grande relevo, na medida em que é uma das dimensões mais importantes da vida humana. Erikson, cit por Carvalho, 2006. p.8, descreve religião como força ordenadora capaz de traduzir e dar sentido escuridão que rodeia a vida humana, e a luz que permeia além de toda a compreensão.1 Mas relativamente ao acompanhamento no luto, no âmbito dos Cuidados Paliativos, o que acontece na nossa realidade? O que precisamos mudar para que deixem de estar ao nível da teoria e se transponham para a prática? Aquilo que constato é que na maioria dos nossos serviços, a equipa é ainda depositária do saber, ou seja, baseada no princípio da beneficência, de se fazer o bem e evitar o sofrimento adicional, a equipa age unilateralmente, considerando que sabe o que é melhor para o doente, não valorizando aquilo que ele sente como melhor para si próprio. Esta reflexão é neste contexto crucial, pois está em jogo a busca da dignidade, não só durante a vida, mas também com a aproximação da morte, envolvendo a valorização das necessidades e a diminuição do sofrimento. Portanto, como nos diz o princípio da justiça, que envolve a propriedade natural das coisas e o bem-estar colectivo entendido como equidade, cada pessoa deve ter as suas necessidades atendidas, reconhecendo-se as diferenças e as singularidades. Não esqueçamos que de acordo com o Código Deontológico do Enfermeiro, 2003, p.5, é dever do enfermeiro “defender e promover o direito do doente à escolha do local e das pessoas que deseja que o acompanhem na fase terminal da vida”; “respeitar e fazer respeitar as manifestações de perda expressas pelo doente em fase terminal, pela família ou pelas pessoas que lhe são próximas” e “respeitar e fazer respeitar o corpo após a morte”, para desta forma respeitar-mos com dignidade não só a pessoa, mas também a sua família e pessoas significativas.10 Quando se trata de um utente em fim de vida, a palavra “curar” é substituída por “cuidar”, auxiliando, aliviando a dor, escutando, promovendo o máximo de autonomia, bem-estar e qualidade de vida, centrando-se nas necessidades da pessoa e da família. Ainda que recentemente tenha sido criada regulamentação da assistência espiritual e religiosa nos hospitais e outros estabelecimentos do SNS, através do Dec. -Lei n . 253/2009, e que constitui de facto já um passo significativo, a nossa caminhada ainda é longa. Efectivamente, parece que cami- ornamentados. Portanto, o luto como tudo o que é do psíquico, íntimo e afectivo humano, é pouco dado a catalogações objectivas, observações directas ou outras técnicas racionalizantes. Daí que exige de nós, profissionais de saúde uma delicadeza que vai para além do físico, e que atinja a dimensão espiritual.4 Porém, sejamos realistas, não podemos idealizar a “boa morte”, pois tal é utopia. Todas estas situações são extremamente difíceis quer para o doente/família, quer para nós, não podemos eliminar todo o sofrimento, contudo, podemos ajudar o doente e família a encontrar o significado desse sofrimento. A nossa dificuldade está muitas vezes associada ao facto de tais situações, nos remeterem para a nossa condição humana, o que implica lidar com emoções, aspecto com o qual temos enorme dificuldade em lidar desde sempre. Não podemos pensar que não irão existir momentos de melancolia, choro e por vezes até descrença, o importante é não desistir e trabalhar incessantemente na área, com exigência e rigor. Na minha opinião, era importante a criação de momentos de reflexão e seminários de discussão sobre a temática por todos os grupos profissionais que integram a equipa de saúde. A formação nesta área seria também pertinente, embora deve realçar que a grande dificuldade neste âmbito, não se prende somente com o “saber fazer”, pois a este nível seria simples, mas sim, com o “Saber Ser”. Por outro lado, no seio de uma verdadeira equipa, uma equipa coesa, todo o processo seria mais facilitado. Actualmente, aquilo que verificamos são grupos profissionais, nomeadamente, o grupo dos enfermeiros, o dos médicos, psicólogos…que se reúnem por momentos apenas. Esta constitui para mim, outra das nossas maiores dificuldades, pois se não tivermos efectivamente uma verdadeira equipa, não poderemos aliviar o sofrimento severo. E aqui, é fundamental sobretudo a persistência. Como ouvi alguém dizer uma vez, é fundamental “passar pelo meio de dois pingos de chuva e não parar porque está a chover”. A filosofia e perspectiva inerente aos CP deveria ser, na minha opinião, transversal a todas as fases dos cuidados de saúde. E porque não? Porque só o morrer é merecedor de tal Atitude? E o nascer, e o crescer, e o idoso…? Somente assim, se Cuidaria plenamente e verdadeiramente. A nossa vida é então uma construção contínua, e para nós profissionais de saúde, é uma construção muito mais rica, dadas as enormes oportunidades de aprendizagem, que temos o privilégio de encontrar no nosso dia-a-dia, pautado por grandes Mestres, que descobrimos nos doentes que cuidamos. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 28 CUIDADOS PALIATIVOS I SETEMBRO .12 Pode ser que com eles aprendamos a valorizar a vida, a enaltecer os seus “pequenos” valores, que na realidade são os mais importantes, e que infelizmente somente valorizámos quando os perdemos. Será que no meio da nossa azáfama diária, temos tempo para viver, ou somente estamos vivos? Arriscaria ser ambiciosa ao dizer, que para mim, pensar sobre todas estas questões e ponderar conscientemente sobre esta última, foi de facto, o maior contributo desta reflexão. Assim sendo, tal como Neves, 2000, p.19, eu acredito que o amanhã nunca será como hoje. A dinâmica dos CP está lançada, o espírito paliativo ganha terreno, mas exige de nós muita imaginação e energia…3 CONCLUSÃO A partir das reflexões contempladas neste artigo, depreendemos que a morte, apesar de ser uma parte da existência humana, acarreta de facto uma grande carga de angústias e temores, para quem dela se aproxima, bem como para os profissionais de saúde. Neste sentido, somente pela compreensão dessa possibilidade existencial, é que nós profissionais de saúde poderemos experimentar o cuidado autêntico com o ser que adoece, assumindo compromisso com uma assistência que não vise única e exclusivamente a cura, mas que favoreça o cuidado do doente como um ser pleno de humanidade, com necessidade afectivas, sociais e com direito de viver o seu morrer com respeito e dignidade. Não poderia concluir este artigo, sem reafirmar uma frase na qual acredito plenamente e que para mim traduz o verdadeiro sentido da vida: Talvez um dia aceitemos a nossa condição de Humanos simplesmente finitos em vida, mas infinitos de vida nos outros Homens… 29 Bibliografia 1. Carvalho, C.(2006). Luto e Religiosidade. Monografia realizada no âmbito da Licenciatura em Psicologia. Maia. 2. Nóvoa, A. (1988). A formação tem de passar por aqui: As histórias de vida no projecto prosalus. Universidade de Lisboa. Lisboa. 3. Neves, C. (2000). Cuidados Paliativos. Formasau. Coimbra. 4. Chambel, H. (2007). Processo de luto e humanização da morte – coordenadas de um percurso emocional. Recuperado em 5 Março, 2010, de http://www.psicologia.com 5. Mendes, J. (2005). Como inserir a espiritualidade no processo terapêutico. Servir, N 54,158-164. 6. Gouveia, M. ; Ribeiro, J.; Marques, M. (2000). Adaptação Portuguesa do Questionário de Bem-estar Espiritual. Resultados psicométricos preliminares. Actas do 7 congresso nacional de psicologia da saúde, 423-426. 7. Dec.-Lei n . 253/2009 – Assistência espiritual. “D.R.” - I-A Série, n . 185/09 (2009-09-23), p. 6794-6798. 8. Cerqueira, M. (2005). O cuidador e o doente paliativo. Formasau. Coimbra. 9. Gabinete de psicologia e apoio psicopedagógico da Universidade do Algarve. (2007). Perda e Luto. Recuperado em 21 Fevereiro, 2010, de http://www.gpap.pt 10. Ordem dos Enfermeiros. (2003). Competências do enfermeiro de cuidados gerais. Ordem dos Enfermeiros. N 10, 49-56. (Nota: artigo escrito de acordo com a ortografia antiga da Língua Portuguesa) Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág. 29 AGENDA 30 9 e 10 de novembro de 2012 1ºCongresso de Enfermagem em Urgência Pediátrica das Beiras Local: Grande Auditório Faculdade Ciências da Saúde - UBI, Covilhã A Associação das Beiras dos Enfermeiros de Urgência Pediátrica organiza o seu 1º Congresso. O encontro, que decorrerá nos dias 9 e 10 de novembro, no Grande Auditório Faculdade Ciências da Saúde - UBI – Covilhã, abordará diversas temáticas como Infeções respiratórias: novos caminhos, Interrelações humanas em urgência pediátrica, Dor: do mito à realidade, Comportamentos desviantes: distúrbios alimentares e depressão, Comportamentos adversos: deteção, acompanhamento, encaminhamento e Morte em Pediatria. Para mais informações contactar o site www.chcbeira.pt 13 a 17 de outubro de 2012 25ºCongresso Anual da Sociedade Europeia de Medicina de Cuidados Intensivos (ESICM) Local: Centro de Congressos de Lisboa O Congresso Anual da Sociedade Europeia de Medicina de Cuidados Intensivos (ESICM) vai ter lugar no Centro Congressos de Lisboa, entre os dias 13 e 17 de outubro de 2012. Para aceder a mais informações sobre a 25ª edição do Congresso consulte o site http://www.esicm.org ou o E-mail: [email protected] 12 e 13 de outubro de 2012 III Congresso da Fundação Portuguesa do Pulmão Local: Lisboa Sob a temática central «Acompanhamento do doente respiratório crónico», o III Congresso da Fundação Portuguesa do Pulmão vai realizar-se em Lisboa, no anfiteatro da Associacão Nacional das Farmácias, nos dias 12 e 13 de outubro de 2012. A conferência inaugural é da responsabilidade do Professor Viriato Soromenho Marques, que apresentará a preleção «Crise, Ambiente e Doença». Para mais informações contactar o E-mail: [email protected] ou o site http://www.fundacaoportuguesadopulmao.org/ 11 a 13 de outubro de 2012 VI Congresso Nacional e I Congresso Lusófono de Cuidados Paliativos Local: Porto, no Hotel Ipanema Park A Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos vai realizar, entre os dias 11 e 13 de outubro de 2012, no Hotel Ipanema Park, Porto, o VI Congresso Nacional e I Congresso Lusófono de Cuidados Paliativos. Do programa fazem parte Workshops, Encontros com peritos e Sessões plenárias e pararelas. Controle de sintomas em CP pediátricos, Feridas em CP, Avaliação das necessidades especiais e Referenciação para CP são alguns dos temas a abordar. Para mais informações contactar o E-mail: [email protected] ou o site http://www.apcp.com.pt VI NACIONAL SUPLEMENTO • Edição 283 • setembro de 2012 A EXPERIÊNCIA DO ELO DE LIGAÇÃO À COMISSÃO DE CONTROLO DE INFEÇÃO HOSPITALAR ................................................. pag. 02 2 I SUPLEMENTO SETEMBRO.12 A EXPERIÊNCIA DO ELO DE LIGAÇÃO À COMISSÃO DE CONTROLO DE INFEÇÃO HOSPITALAR Modus Vivendis vs Modus Operandis FERNANDA PEREIRA SANTOS Enfermeira. Comissão de Controlo de Infeção Hospitalar do Centro Hospitalar de Lisboa Central/Pólo Hospital de Santa Marta. SUSANA DOMINGOS SILVA Enfermeira. Unidade de Cuidados Intensivos de Cardiologia do Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE/ Pólo Hospital de Santa Marta. RESUMO As Infeções Associadas aos Cuidados de Saúde (IACS) são um problema de saúde pública com impacto socioeconómico e mesmo demográfico, que perduram na história e que podem ser prevenidas. As comissões de controlo de infeção hospitalar têm tido um papel ativo nesta área e são os elos de ligação, elementos da prática clínica que articulam não só informação, como monitorizam as práticas de prevenção da infeção nos cuidados prestados. Pretende-se um olhar crítico e reflexivo de uma experiência de um elo de ligação à Comissão de Controlo de Infeção Hospitalar (CCIH), explanando dificuldades, obstáculos, mas essencialmente as construções e competências pessoais e profissionais adquiridas. Palavras-chave: Elo de Ligação; Comissão de Controlo de Infeção Hospitalar; Infeções Associadas aos Cuidados de Saúde. ABSTRACT Health Care Associated Infections (HAI) are a preventable public health problem, with a long-standing socio-economic and even demographic burden. Infection Control Committees (ICC) have had an active role in this problem and local clinical healthcare personnel in connexion with these departments not only provide concerning data, but also monitor the implementation of infection prevention policies. The aim of this study is to provide a critical and reflexive experience of a dynamic link between these local healthcare workers and the other ICC constituents, explaining their difficulties, obstacles and the development and acquisition of personal and professional skills. Keywords: Liaison Infection Control Elements; Infection Control Committee; Health Care Associated Infections. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág.2 INTRODUÇÃO A problemática das Infeções Associadas aos Cuidados de Saúde (IACS) que apresentam taxas de morbilidade e mortalidade elevadas para além do prolongamento do tempo de internamento hospitalar e custos económicos adicionais tem sido estudada e revisada numa abordagem estatístico-epidemiológica. O percurso metodológico de análise das IACS, em que se incluem taxas, números de redução e aumento, estimativas e médias, contribuem para a reflexividade crítica, estruturada e sistematizada de uma realidade que tem de ser explanada em toda a sua abrangência. Ou seja, como o epicentro do problema clínico situa-se na prática diária de cuidados, sendo neste cenário de cultura organizacional que surgem as IACS, será também determinante para além da estatística, uma reflexão de experiências e vivências dos profissionais de saúde que cuidam do doente. Esta reflexão pretende demonstrar um percurso pessoal e profissional enquanto elo de ligação à Comissão de Controlo de Infeção Hospitalar (CCIH), revelando não só pontos históricos evolutivos, como posições favoráveis, handicaps e constrangimentos. PINCELADAS DE HISTÓRIA Quando comecei a estudar a temática de Infeções Nosocomiais remeteu-me para uma panóplia de informação historial e conhecimentos às quais: a história do Hospital de Santa Marta (local da prestação de cuidados), Florence Nightingale, a «dama do lampião», e Pasteur, «o pai da microbiologia», se evidenciaram. O Convento de Santa Marta, fundado no século XVI, em 1569, acolhia as vítimas da grande Peste de Lisboa, em 1890 albergava as vítimas de um surto de Gripe e posteriormente funcionou como Hospital de doenças venéreas. Um historial ligado às doenças infeciosas. Na génese da Enfermagem situa-se Florence Nightingale, em 1863, com a sua experiência na Guerra da Crimeia, no contexto de Hospital Militar, em que descreve um conjunto de cuidados aos doentes, com a noção de assepsia e ao meio, com as ideologias do sanitário/higienização, SETEMBRO.12 SUPLEMENTO I 3 com o objetivo de diminuir o risco de infeção hospitalar. Também referencia uma forma de vigilância em saúde, tornando-se um propósito inovador dirigido ao cuidado de Enfermagem (LOPES, 2001). Louis Pasteur, por outro lado, expõe a teoria microbiana das doenças infeciosas entre 1877 e 1887, que, apesar de cientista ligado à física e química, cria laços com a medicina com a descoberta de microrganismos responsáveis pelas infeções, a descoberta das vacinas (1881) e a imunologia, obrigando, por exemplo, os médicos dos hospitais militares a «ferverem» o material dos procedimentos médico-cirúrgicos (conceito de esterilização). Mas o crescente desenvolvimento da sociedade, a difusão de novas tecnologias vadas. Para além da transversalidade a toda a comunidade, nos transportes públicos e todos os serviços públicos, nas escolas e nos hospitais, começou-se a falar uma linguagem comum, em que os próprios familiares reconhecem a necessidade de lavagem das mãos, procurando esses mesmos recursos, tal como o uso de barreiras de proteção adequadas. O próprio conceito de higiene brônquica substituído pela etiqueta respiratória tornou-se um ícone importante, como gesto repetido em toda a comunidade. e terapêuticas também facilitaram a introdução de novas concetualizações. O próprio conceito de saúde tem sofrido transformações, mas até o conceito de infeção nosocomial foi substituído pelo de IACS, o que lhe dá de imediato um juízo de operacionalização. A esta definição também lhe foi agregado o nível de cuidados de que é independente, isto é, não terá que ser adquirida exclusivamente a nível hospitalar, mas ligada aos cuidados de pessoas em fase aguda, em reabilitação, em ambulatório ou domiciliários (GRUPO COORDENADOR DO PNCI, 2008). A nomenclatura Bundle constitui o mais recente desafio na prática, o designado desafio do «Tudo ou Nada», na adesão a políticas e procedimentos, que requer coesão multi e pluriprofissional. Este termo desenvolvido pelo Corpo Docente do Institute for Healthcare Improvement, descreve um conjunto de processos fundamentados, mais ou menos 3 a 5 práticas simples, que melhorem os resultados clínicos. A nossa realidade com aplicação do cumprimento de Bundles surgiu no transato ano de 2012, com a prevenção de infeções nosocomiais relacionadas com dispositivos intravasculares no Adulto e no nosso caso específico a observar - cateter venoso central (CVC) - que apresenta Central Line Bundle, com cinco componentes chave: 1 - higiene das mãos, 2 – barreiras de proteção máxima, 3 – antissépsia da pele com clorohexidina a 2% em álcool isopropílico a 70,4 – seleção ótima do local de inserção, preferencialmente artéria subclávia, seguindo-se jugular e por último femural, 5 – avaliação diária da necessidade de manter cateter, removendo imediatamente cateteres desnecessários (PROCEDIMENTO MULTISSETORIAL CIH124, 2011). O Big Bang da Comissão de Controlo de Infeção Hospitalar (CCIH) surge em 2008, com o manual de operacionalização do programa nacional de prevenção e controlo das IACS emanado pela Direção-Geral de Saúde (disponível no microsite) e, em 2009, com o surgimento da estratégia nacional mutimodal para a higiene das mãos, através da campanha, medidas da Organização Mundial de Saúde (OMS) «Medidas Simples Salvam Vidas». Todos estes instrumentos tornaram-se alicerces imprescindíveis do cuidar, que padronizam procedimentos, com o objectivo de melhorar a qualidade dos cuidados. Talvez o momento mais marcante nesta viagem tenha sido em 2009, com a epidemia de gripe suína, designada por gripe A, mais evidente que a gripe aviária em 2006, que não teve expressividade em termos de números, comparativamente à taxa de infeção anual de pessoas pelo vírus da Gripe. Acabou por ser sim, uma mais valia no alerta da população em geral e dos profissionais de saúde, em particular. As medidas preventivas e de controlo como: as precauções básicas e de isolamento e o uso racional de antibióticos começaram a ser uma prática real, cumprindo-se novas rotinas na sua aplicabilidade. A lavagem higiénica das mãos foi uma das mais obser- como elo de ligação à CCIH, na Unidade de Cuidados Intensivos de Cardiologia (UCIC) do Hospital de Santa Marta (HSM), do Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), EPE (publicado no Boletim Informativo n 084/CA de 14/06/2006). Este duplo papel, não é nada mais nada menos do que saber e aplicar na prática políticas e procedimentos vigentes, que constantemente são atualizados segundo guidelines baseadas em evidências científicas, conforme novas realidades. É-se o elo, uma ponte de ligação e dinamizadora, em que se dá informação de retorno da teoria para a prática e da prática para a teoria. Segundo a organização das atividades da CCIH do Plano Nacional de Controlo da Infeção (GRUPO COORDENADOR DO PNCI, 2008:48-49) encontro-me integrada no núcleo de membros dinamizadores da CCIH, que tem como funções específicas: • Sensibilizar os pares para as questões de prevenção e controlo da infeção; • Participar na elaboração de normas para a respetiva unidade, com base nas recomendações da CCIH, pôr em prática e acompanhar o cumprimento das mesmas; • Identificar problemas de estrutura, de processo e/ou de resultados, e informar a CCIH em caso de suspeita de surto epidémico ou de outras situações de risco em controlo da infeção; • Propor à CCIH a realização de estudos na Unidade, ou a adoção de medidas que consideradas necessárias para a prevenção e controlo de infeção; • Colaborar na recolha de dados para os estudos de vigilância epidemiológica e nas auditorias às práticas na respetiva unidade; • Assegurar que os cuidados prestados a cada doente são apropriados, relativamente à prevenção e controlo da infeção; • Participar e dinamizar as ações de formação promovidas na unidade na área da prevenção e controlo da infeção e colaborar com a CCIH na identificação de necessidades de formação na unidade. O meu desenvolvimento nesta área teve maior representação a partir do momento em que tive um papel ativo na Comissão. Eu diria um papel ativo na prestação de cuidados e junto dos profissionais de saúde e pares. Vejase a importância da formação na CCIH, não só na responsabilização da transmissão da informação, como na sua aplicabilidade. Dentro da experiência formativa participei em múltiplos debates, jornadas e encontros, no âmbito da formação contínua e direcionado para a área do controlo de infeção hospitalar (CIH). Destaco em 2005 as primeiras temáticas que me despoletaram interesse nesta vertente, Jornadas Técnicas em Cuidados Intensivos, sob o tema «Sépsis» do Hospital de S. José, CHLC, EPE. Neste evento científico houve uma abordagem mais preventiva do que o próprio tratamento em si. Por outro lado, já como elemento integrante EXPERIÊNCIA DO ELO DE LIGAÇÃO NA CCIH Desde 2006 que tenho desempenhado funções de enfermeira na articulação Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág.3 4 I SUPLEMENTO SETEMBRO.12 da CCIH, a ação de formação sobre «Antibioterapia Profilática em Cirurgia», em 2010, vislumbrou novas medidas terapêuticas e de precaução na administração de antimicrobianos, mesmo que de forma empírica. Ministrei também diversas ações de formação em serviço e sessões de sensibilização a enfermeiros e assistentes operacionais sobre os grandes conteúdos temáticos do CIH, referenciando-se: • Precauções básicas de isolamento; • Mãos como veículo de transmissão de infeção e Higienização das Mãos; • Equipamento de proteção individual; junto da CCIH foram o reverso da medalha, um Know-How efetivo no uso adequado de materiais, equipamentos e recursos. Esta atitude de treino consciente facilitou uma abordagem multidisciplinar, orientando para novos comportamentos e atitudes. Não se esqueça que: comportamento gera comportamento. Porém, esta mudança é um processo lento na formação de novos hábitos profissionais, mas é gratificante observar essas alterações passo a passo. Eu diria uma cultura institucionalizada, que necessita de disrupção com o velho, para dar razão ao novo agir. Veja-se a apresentação dos relatórios de prevalência de infeção, que dei- • Higiene respiratória/Etiqueta respiratória; • Transporte de produtos para exame microbiológico; • Manuseamento de sacos coletores em doentes críticos. Neste mesmo contexto participei numa pluralidade de atividades, que discrimino: • Reunir com os outros elementos da CCIH e partilhar experiências, esclarecer dúvidas e conferir sugestões de melhoria/ação/intervenção; • Dinamizar como observadora e formadora no 1ºdesafio da Organização Mundial de Saúde (OMS) «Clean Care is Safer Care», no âmbito da implementação da Campanha Nacional de Higiene das Mãos, na UCIC do HSM, CHLC, EPE, desde 2009; • Integrar a equipa auditora na realização da Auditoria à Norma 6 – Gestão do Risco – Controlo Infecioso «Higiene das Mãos», no contexto do Programa de Auditoria Interna, em 2008 e 2009, da CCIH do HSM; • Realizar diversas auditorias no serviço às práticas de CIH (higiene das mãos, uso de equipamento individual, ambiente, manuseio e remoção de resíduos, manuseio e remoção de corto-perfurantes, manutenção de equipamento do doente, quartos de isolamento, copa), com instrumentos próprios de auditoria da CCIH, do CHLC, avaliando níveis de conformidade e identificando sugestões de intervenção; • Efetuar a vigilância epidemiológica através dos estudos de prevalência de infeção, com inquéritos de prevalência, realizados em 2009, 2010 e o último em Maio de 2012. Este trabalho permitiu descrever doentes, procedimentos invasivos e infeções/antimicrobianos prescritos, divulgar os resultados a nível local, tal como disponibilizar uma ferramenta padronizada para identificar metas para a melhoria de qualidade; • Produzir posters para afixar em eventos científicos, com o intuito de divulgar o trabalho e alertar para a temática (Vide Figura 1). A formação tem tido, sem dúvida, o seu contributo no meu crescimento profissional e no desenvolvimento de competências técnico-científicas. Foi também a especialização em Enfermagem de Reabilitação, concluída em 2011, que assentiu aprimorar competências comuns partilhadas por todos os enfermeiros especialistas nos domínios de: responsabilidade profissional, ética e legal, melhoria contínua da qualidade, gestão dos cuidados e aprendizagens profissionais. Mas entenda-se, é na prestação direta de cuidados que se é confrontado com interrogações e colocado à prova nessas mesmas competências. No início tornou-se até constrangedor perante alguns colegas, mas a permanente pesquisa, envolvimento e atualização de conhecimentos xaram de ser olhados pelos profissionais como uma crítica com conotação negativa, mas algo construtivo a melhorar e a reduzir essas mesmo taxas de infeção, com uma perspetiva detalhada dos procedimentos e incidência nos comportamentos de melhoria, envolvendo, na maioria das vezes, toda a equipa. O conhecimento dos microrganismos isolados, os fatores extrínsecos, os locais das infeções permitiram a adoção de estratégias que confluíram numa sinergia e uniformização da metodologia a adotar. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág.4 Figura 1 – Poster alusivo à temática da Higienização das Mãos, integrado no evento de lançamento da estratégia Multimodal da OMS para a melhoria da Higiene das Mãos no HSM, CHLC, EPE, decorrido na semana de 22 a 26 de Junho de 2009. SUPLEMENTO I SETEMBRO.12 Esta adesão é sem dúvida a chave do sucesso que funciona como importante indicador de qualidade dos cuidados. O conceito de auditoria também deixou de ter um cariz autoritário ou ditatorial, começando a ter expressividade na monitorização dos resultados, permitindo corrigir atempadamente erros de implementação ou interpretações inadequadas, promovendo boas práticas de prevenção. Para mim, a dicotómica incursão dos enfermeiros no núcleo executivo da CCIH dos Hospitais e dos Hospitais em Centros Hospitalares foram determinantes para as mudanças profissionais e institucionais. No que diz respeito à Enfermagem, esta decisão, permitiu um reconhecimento do papel psicossocial da Enfermagem, revalorizando o nosso estatuto social, reconhecendo qualidades e competências dos enfermeiros. Prevê-se uma orientação mais dirigida e valorizada pelos pares, que reconhecem uma voz importante para a concretização prática e execução com segurança, dos princípios de CIH. Tornam-se insiders na aplicação prática de procedimentos. Por outro lado, a agregação dos Hospitais em Centros Hospitalares abriram outros horizontes: deixou-se de olhar para o problema local e abrangeu o regional, permitiu contactar com outras realidades, partilhar experiências, melhorar a comunicação intra-equipa e acima de tudo trabalhar para confluirmos para um mesmo resultado e processo - a segurança do doente. Esse trabalho tem vindo a ser desenvolvido na construção de procedimentos multissetoriais que exigem incessante pesquisa do enquadramento legal de suporte nesta área, através de circulares e uniformização de medidas em contextos díspares. Também estes mesmos procedimentos, encontram-se acessíveis a um duplo click, via intranet, com consulta no momento, garantindo a rapidez e segurança na sua execução. Constata-se que a partir destes momentos, a divulgação da finalidade e importância das atividades da CCIH e a ampliação do número de profissionais de saúde, nomeadamente enfermeiros, que colaboram com a CCIH são imprescindíveis na dinamização do CIH nos serviços, conjuntamente com a restante equipa e em articulação contínua com a CCIH (BOLETIM INFORMATIVO nº 84, CA, 2006). Enfatiza-se a aproximação que estes profissionais têm das necessidades e problemas do dia-a-dia. CONCLUSÃO É na praxis clínica que ganha sentido e efetividade todo o trabalho epidemiológico e científico realizado pela CCIH, que apresenta outcomes relevantes para mudar uma realidade, muitas vezes enraizada e intoxicada de hábitos nocivos para o ambiente hospitalar e para as pessoas. Abrem-se novos caminhos, apela-se a uma consciencialização e responsabilização através do conhecimento, que muitas vezes é apenas despoletado por nós: os que trabalham com e para o doente. São os elos de ligação à CCIH que zelam pela prevenção, deteção e controlo das infeções através da aquisição de formação. A capacidade para conhecer e partilhar o saber com consciência, mobiliza para um modus operandis de pensar. A experiência, como modus vivendis, exige aquisição de saberes e atualização de conhecimentos, que conduzirão a uma prática dotada de qualidade na prevenção e controlo de infeção. 5 Bibliografia 1. BOLETIM INFORMATIVO N 84 – Elementos de Ligação à Comissão de Controlo de Infecção Hospitalar, de 14/06/2006 CA HSM, CHLC, EPE 2. CARAPINHEIRO, Graça – Saberes e Poderes no Hospital. Uma sociologia dos serviços hospitalares. Porto: 1993. ISBN: 972-36-0306-3. 3. CENTRES FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION – Guideline for hand hygiene in health-care settings. 2002. Acedido em Agosto 2012. Disponível em: http://www.cdc.gov/handhygiene/. 4. CIRCULAR INFORMATIVA Nº205 – Inquérito de Prevalência de Infecção no CHLC, de 23/05/2012 CA HSM, CHLC, EPE. 5. COLLIÉRE, Marie Françoise – Promover o Cuidar. Da prática das mulheres de virtude aos cuidados de Enfermagem. Lisboa: Lidel, 1999. ISBN: 972-757-109-3. P.385. 6. EUROPEAN CENTER FOR DISEASE PREVENTION AND CONTROL – The First European Communicable Disease Epidemiological Report. [Em linha] Stockholm: 2007. ISBN 978-92-9193-062-3. 390p. [Consult. 08 Out. 2011]. Disponível em: http://ecdc.europa.eu/en/publications/Publications/0706_SUR_First_%20Annu al_Epidemiological_Report_2007.pdf. 7. GRUPO COORDENADOR DO PNCI: COSTA, ANA CRISTINA; SILVA, MARIA GORETI; NORIEGA, ELENA – Programa Nacional de Prevenção e Controlo de Infecção associada aos Cuidados de Saúde. Manual de Operacionalização. Ministério da Saúde. Direcção Geral de Saúde. Fev. 2008. 8. HEALTH PROTECTION SCOTLAND. Central Vascular Catheter Maintenance Bundle. [Em linha] Infection Control Teliam, 2008 [Consult. 20 Out. 2011]. Disponível em: http://www.hps.scot.nhs.uk/haiic/ic/CVCMaintenanceCare Bundle.aspx. 9. LOPES, Noémia Mendes – Recomposição Profissional da Enfermagem. Estudo Sociológico em contexto Hospitalar. Coimbra: Quarteto, Dez 2001. ISBN: 972-8717-17-2. 10. MINISTÉRIO DA SAÚDE, DIRECÇÃO GERAL DE SAÚDE – Orientação de Boas Práticas para a higiene das mãos na Unidade de Saúde. N 13/DQS/DSD de 14/06/2010. 11. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Decreto de Lei 437/9, Conteúdo Funcional de Enfermeiro Especialista, n 3 a). 12. O’GRADY, N. [et al] - Guidelines for the Prevention of Intravascular Catheter-Related Infections 2011. [Em linha] Center of Disease Control, 2011. 83p. [Consult. 21 Out. 2011]. Disponível em: http://www.cdc.gov/hicpac/pdf/guidelines/bsi-guidelines-2011.pdf. 13. PINA, ELAINE [et al]. Infecções associadaos aos cuidados de Saúde e Segurança do doente. In: Revista Portuguesa de Saúde Pública. (2010) Vol. 10.p.27-39. Acedido em: 3/09/2012. Disponível em: http://www.elsevier.pt/rpsp. 14. PROCEDIMENTO MULTISSECTORIAL – CIH.124 Prevenção da Infecção Relacionada com Dispositivos Intravasculares no Adulto, 2011. Disponível na Intranet CHLC. 15. http://ecdc.europa.eu/en/publications/Publications/0706_SUR_First_%20 Annual_Epidemiological_Report_2007.pdf, acedido em 2010. 16. http://www.cdc.gov/hicpac/pdf/guidelines/bsi-guidelines-2011.pdf, acedido em 2011. 17. http://www.chlc.min-saude.pt/content.aspx?menuid=445, acedido em Setembro de 2012. 18. http://www.hps.scot.nhs.uk/haiic/ic/CVCMaintenanceCareBundle.aspx, acedido em 2012. 19. http://www.pasteur.fr/ip/easysite/pasteur/fr/institut-pasteur/histoire/loeuvre-de-louis-pasteur, acedido em Setembro de 2012. Revista Nursing; Edição setembro 2012; pág.5