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TecSaúde - CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO 2010/2011 Programa de Formação de Profissionais De Nível Técnico para a Área da Saúde no Estado de São Paulo CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO 1 2 Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de SãoPaulo CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO TCCs Selecionados Fundação do Desenvolvimento Administrativo 3 Governador do Estado Geraldo Alckmin Secretário da Saúde Giovanni Guido Cerri Secretário Adjunto da Saúde José Manoel de Camargo Teixeira Chefe de Gabinete da Saúde Maria Iracema Guillaumon Leonardi Coordenador da Coordenadoria de Recursos Humanos da Saúde Haino Burmester Secretário da Gestão Pública Júlio Semeghini Secretário de Desenvolvimento Paulo Alexandre Barbosa Secretário da Educação Herman Jacobus Comelis Voorwald Diretora Superintendente do Centro Paula Souza Laura Laganá 4 Diretor Executivo Geraldo Biasoto Junior Diretora Técnica de Políticas Sociais Leda Zorayde de Oliveira Analista administrativa Angelina Alves de Oliveira Coordenação Técnica-Pedagógica Emília Emi Kawamoto, Julia Ikeda Fortes, Omair Guilherme Tizzot Filho, Solange Cezário Gomes Ribeiro Cruz, Solange de Carvalho Oliveira, Tomoko Matsui Coordenação de Execução e Monitoramento Andrea Terumi Okida Shimura, Carlos Alberto Bricoli, Gabriela Ferreira Granja, Glauciane de Oliveira, Juliana Helena Bonat, Maria Cecília Ribeiro, Priscila Pereira Monteiro, Teresa Christine Pereira Morais Coordenação de Planejamento e Informação Paula Regina Di Francesco Picciafuoco, Rafael Barros Soares, Teresa Mazza, Vânia de Carvalho Ferreira Coordenação de Contratos, Contas e Pagamentos Andréa Costa, Bruno Marcel Alcântara, Carlos Augusto Bim, Lindomar José Figueiredo, Luciana da Cunha Figueiredo Pires, Pedro do Prado Barizon, Sérgio Félix, Waldir Salvadore Coordenação de Comunicação Nino Dastre, Patrícia Bacchin Zappa Assessoria de Sistemas de Informação Alessandra Sayuri Fugimoto, Denise Dolcemasculo, Gabriel Monteiro Rodrigues Gulias Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de SãoPaulo CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO TCCs Selecionados Primeira edição São Paulo, 2011 Fundação do Desenvolvimento Administrativo 5 CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO TCCs Selecionados Coordenação Editorial Fundap Projeto gráfico Nino Dastre Catalogação na fonte Elena Yukie Harada Normalização bibliográfica Ana Cristina de Souza Leão Ruth Aparecida de Oliveira Fundação do Desenvolvimento Administrativo Rua Cristiano Viana 428 - 05411-902 - São Paulo SP - Tel (11) 3066 5500 6 Apresentação O Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde) iniciou suas atividades em 2009 com a implementação do Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem – Módulo de Habilitação, instituído pelo Decreto Estadual n. 53.848 de 19/12/2008. O programa almeja ampliar o nível de escolaridade dos trabalhadores de saúde por meio de formação qualificada de profissionais de nível técnico. Os cursos nele previstos são voltados para o ingresso e a promoção do trabalhador no campo profissional da saúde, melhorando a qualidade dos serviços prestados à população no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado de São Paulo. O Programa TecSaúde vem sendo implementado pela Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) em parceria com as Secretarias Estaduais de Saúde, Secretaria de Educação, de Gestão Pública e de Desenvolvimento, esta última representada pelo Centro Estadual de Educação Tecnológica “Paula Souza” (Ceeteps). Os cursos, em suas diferentes etapas, são executados por instituições formadoras com sólida experiência no âmbito da educação profissional em saúde, principalmente pelos Centros Formadores (Cefor) da Rede de Escolas Técnicas do SUS – RETSUS mediante convênio com a Fundap. E, para que a cobertura da formação no Estado seja sempre a mais ampla possível, a Fundap também credencia e contrata, suplementarmente, instituições públicas e privadas que possuem condições plenas de cumprir os requisitos indispensáveis de qualidade exigidos em edital. Atento à necessidade de proporcionar um curso de alta qualidade em todo o Estado de São Paulo, a Fundap oferece, aos professores das escolas contratadas pelo TecSaúde que não possuem licenciatura ou outra qualificação reconhecida para a prática da docência, um curso de pós-graduação lato sensu. Este Curso de Formação de Docentes foi desenvolvido pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz), em parceria com seis instituições de ensino superior do Estado de São Paulo. É oferecido na modalidade ensino a distância (EaD), com duração de 540 horas. Em face ao sucesso do Curso de Formação de Docentes em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, a Fundap e a ENSP/Fiocruz decidiram organizar esta publicação, que traz ao conhecimento do grande público o rico material produzido pelos alunos-docentes em seus Trabalhos de Conclusão 7 de Curso. São importantes contribuições não só para a prática de saúde como também para o processo de trabalho docente, especialmente em cursos da modalidade de ensino à distância e com grande relevância social de sua ação educativa na formação de trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS). Geraldo Biasoto Júnior Diretor Executivo - Fundap Antônio Ivo de Carvalho Diretor ENSP/Fiocruz 8 INTRODUÇÃO A crescente incorporação tecnológica e as importantes mudanças organizacionais do trabalho verificadas em período recente trazem à tona a necessidade da formação de trabalhadores mais autônomos e capazes de tomar decisões, com maior poder de intervenção no processo de produção. Esta realidade demanda por quadros profissionais de níveis intermediários suficientemente capacitados para atenderem estas novas exigências, impulsionando a valorização da formação de nível técnico e tecnológico. É justamente neste contexto que se inserem as reformas do ensino médio e da educação profissional, iniciadas na segunda metade dos anos 1990, assim como programas de melhoria e expansão da educação profissional implementados pelas três esferas de governo. Neste processo, a área de saúde se destaca, pois ao mesmo tempo em que é responsável por um enorme contingente de postos de trabalho, é importante incorporadora de novas tecnologias. Soma-se a isso o processo em curso de consolidação do SUS, que define a necessidade de melhoria no acesso e na qualidade do atendimento à população. Nesse sentido, a incorporação de pessoal de nível intermediário qualificado aos serviços é essencial para que se possam obter ganhos de qualidade nos mesmos. Atento a esta nova realidade, o Governo do Estado de São Paulo toma a decisão de focalizar ações para a formação de profissionais de nível técnico para o setor saúde, contribuindo para a ampliação da escolaridade e da empregabilidade da população e para a melhoria da qualidade dos serviços de saúde prestados à população no âmbito do Sistema Único de Saúde no Estado. Assim, através do Decreto Estadual nº. 53.848, de 19/12/2008, surge o programa denominado Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo - TecSaúde. Estabelecido através de um convênio entre a Fundação do Desenvolvimento Administrativo - Fundap, a Secretaria Estadual de Desenvolvimento, através do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza – CEETEPS, a Secretaria Estadual da Educação e a Secretaria Estadual da Saúde, o TecSaúde é um programa de formação de profissionais de nível técnico para a área de saúde no Estado de São Paulo. O Programa possui três linhas centrais de atuação. O módulo de Habilitação do Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem (carga de 690 9 horas), oferecido a todos os auxiliares de enfermagem do Estado; os Cursos de Especialização Profissional de Nível Técnico em Enfermagem, oferecidos aos Técnicos em Enfermagem que trabalham nos hospitais públicos, nas áreas de Urgência e Emergência, Oncologia, Neonatologia de Risco e Terapia Renal Substitutiva; e o Curso de Formação de Docentes, oferecido aos professores das escolas credenciadas e conveniadas com o Programa e que não possuem licenciatura ou outra qualificação reconhecida para docência. Tendo em vista a necessidade de contratar diversas escolas técnicas no intuito de oferecer a maior capilaridade possível, levando o Programa a todas as regiões do Estado, emerge o desafio de se garantir a alta qualidade dos cursos nestas diversas localidades. É justamente no enfrentamento deste desafio que nasceu a proposta do Curso de Formação de Docentes, pois um dos principais elementos que promovem um ensino de qualidade é a boa formação do docente. O Curso em questão trata-se uma pós-graduação lato sensu na modalidade a distância (EaD), com momentos presenciais obrigatórios, cujo objetivo é formar especialistas para atuar na qualificação inicial e continuada de trabalhadores e na educação profissional técnica de nível médio na área de saúde, atendendo, assim, não só a uma exigência legal, mas a diversos compromissos sociais. Com dez meses de duração, possui carga horária de 540 horas. Considerando a experiência pedagógica, administrativa e institucional acumulada no desenvolvimento de cursos de formação de docentes em educação profissional técnica na área da saúde para o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem- PROFAE, um programa do Governo Federal, a Fundap firmou parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), para a realização do Curso de Formação Docente oferecido aos professores das escolas contratadas pelo Programa TecSaúde. O Curso propõe complementar o itinerário educativo dos profissionais graduados nas diversas subáreas da saúde, situando-se no conjunto de iniciativas que materializam a relação intersetorial e interdisciplinar entre saúde e educação, indispensável tanto à promoção da qualidade de vida quanto ao cuidado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Diferentemente de outras ações formativas, que apenas capacitam professores de forma rápida e pragmática, a principal referência deste curso, como uma ação no conjunto das ações do TecSaúde, é o significado social da ação educativa no âmbito de uma política de formação de profissionais de saúde. Outra importante e inovadora característica é a sua natureza 10 interdisciplinar e a conseqüente contribuição que potencialmente gera para uma nova configuração do processo de trabalho em Saúde e do modelo de produção do cuidado. Sua proposta visa, portanto, a capacitação de docentes compromissados com a formação de novos coletivos de trabalhadores, comprometidos eticopoliticamente com a radical defesa da vida individual e coletiva. A realidade vivida pelos profissionais da saúde - múltiplos vínculos, falta de tempo para freqüentar aulas convencionais e impossibilidade de locomoção aos centros formadores – definiu o formato de educação a distância (EaD) como a estratégia metodológica mais apropriada, de modo que fossem superadas distâncias espaciais e temporais, sem abrir mão de processos educativos qualificados e orgânicos às necessidades formativas do SUS. Para a implantação do Curso de Formação Docente, a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) estabeleceu parceria com seis Instituições de Ensino Superior do Estado de São Paulo: Universidade de São Paulo (USP-SP); Universidade de São Paulo, Campus de Ribeirão Preto (USPRibeirão Preto); Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); Universidade Estadual Paulista de Botucatu (UNESP – Botucatu); Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA); e Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Nelas foram instalados os Núcleos Interdisciplinares de Apoio Docente (Niad), instâncias de coordenação local e base de apoio docente, acadêmico e administrativo. Nos Niad são disponibilizados espaços físicos e recursos tecnológicos destinados ao trabalho dos tutores e dos coordenadores, para fins de estudo, reuniões e atendimento aos alunos-docentes. Cabe a cada Niad a construção coletiva de um projeto político-pedagógico de implementação do Curso, envolvendo as subáreas da Saúde. Desde o início, em 25 de janeiro de 2010, foram criadas 12 turmas e formaram-se 473 alunos. Durante todo o desenvolvimento do Curso, como expressão da sua concepção teórico-metodológica e como parte essencial do processo pedagógico, a avaliação do aluno-docente vincula-se, de forma direta, aos objetivos formativos a serem atingidos. O desempenho do aluno-docente é avaliado mediante um conjunto de produções realizadas presencialmente e a distância, individual e coletivamente, atribuindo-se, ao aluno, conceitos em cada um dos Complexos Temáticos1 e no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). A alta qualidade dos TCCs apresentados pelos alunos-docentes e 1. O Curso de Formação Docente é estruturado em três Complexos Temáticos: CT1: Trabalho, saúde e educação; CT2: O SUS e os processos de trabalho em saúde e CT3: A organização pedagógica do trabalho docente em saúde. 11 a pertinência dos temas tanto para a área da Saúde quanto para o trabalho do docente fez com que as coordenações do TecSaúde e da ENSP/Fiocruz tomassem a decisão de ampliar o acesso do material ao grande público. Nasce, assim, esta publicação. Os artigos aqui publicados foram escolhidos entre os TCCs das turmas 1 e 2 do Curso de Formação Docente, através de um processo dividido em duas etapas. Na primeira delas, os tutores e coordenadores de cada Niad selecionaram artigos de cada núcleo para a Comissão Editorial, formada por membros da Fundap e da ENSP/Fiocruz. Em seguida, esta Comissão avaliou novamente os artigos enviados emitindo o parecer para a publicação. Foi também solicitado às coordenações de cada Niad e à ENSP/Fiocruz um artigo que tratasse da experiência vivenciada no curso. Assim, este livro apresenta 35 artigos publicados, sendo 23 dos alunos-docentes; dez das coordenações dos Niad e dois artigos da ENSP/Fiocruz. Na parte I do livro estão os artigos dos tutores de cada Niad, além dos artigos dos coordenadores e orientadores da ENSP/Fiocruz. Na parte II, estão os artigos selecionados dos alunos-docentes, organizados segundo a ordem alfabética dos títulos. É importante ressaltar que no intuito de permitir o acesso a todos os artigos produzidos no Curso de Formação Docente - e não somente aos escolhidos para esta publicação - a Fundap e a ENSP/Fiocruz disponibilizarão os artigos em CDs a serem distribuídos simultaneamente ao livro. Leda Zorayde de Oliveira Valéria Morgana Paula R. Di Francesco Picciafuoco Rafael Barros Soares 12 Sumário Apresentação.............................................................................................................. 7 Introdução.................................................................................................................. 9 Parte i A fluência digital do docente da educação profissional de enfermagem.........19 Caracterização dos profissionais de saúde que se utilizam da educação a distância em sua formação.................................................................33 Diante dos desafios do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde na modalidade EaD.............................41 Educação a distância: perfil do aluno-docente no niad-ufscar................51 Enfrentando o mito do Trabalho de Conclusão de Curso junto aos especializandos – docentes do nível técnico.................................................65 Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: experiência do niad usp/rp..................................................................77 O conhecimento de alunos do Curso de Formação Docente do niad/ Rio Preto sobre concepções pedagógicas e avaliação de aprendizagem..........95 O desafio da mediação pedagógica na educação a distância...........................105 Participação dos docentes no planejamento do processo educacional após o Programa TecSaúde..................................................................................115 Sentido conferido ao Curso de Formação Docente em educação profissional técnica na área da saúde..................................................................130 Temas dos Trabalhos de Conclusão do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde realizado no estado de São Paulo...............................................................................................143 Trabalhos de Conclusão de Curso: reflexões a partir do processo de educação permanente dos tutores . ...............................................................153 13 Parte ii Acolhimento: uma proposta de ensino para alunos do nível médio em enfermagem - Trabalhadores do SUS...........................................................165 A formação de educadores para o ensino de nível técnico em enfermagem............................................................................................................177 A formação do técnico e auxiliar de enfermagem para atuar no SUS............193 Análise de projetos pedagógicos de cursos de formação de técnicos de enfermagem......................................................................................................221 Anotação de enfermagem e sua abordagem nos cursos de formação do técnico de enfermagem...................................................................................233 As dificuldades dos estudantes-trabalhadores do sus na realização do curso de habilitação técnica em enfermagem..............................................251 Atividades de articulação como instrumentos mediadores de reflexão e discussão da prática docente: um relato de experiência................................271 Avaliação na educação a distância: revisão de literatura..................................285 Condições de trabalho dos enfermeiros que atuam no ensino técnico de enfermagem......................................................................................................299 De Paulo Freire a Demerval Saviani: uma análise das concepções e metodologias..........................................................................................................311 Educação profissional em enfermagem e a infecção relacionada à assistência a saúde..............................................................................................325 Elaboração compartilhada de cartilha para limpeza nos serviços de saúde..................................................................................................................339 Estratégias de ensino em escolas técnicas na área da saúde e sua articulação ao processo de consolidação do sus..............................................358 Inserindo a integração de conteúdos em um curso técnico de enfermagem............................................................................................................379 14 O aluno-trabalhador e o sus: construção de um plano de ensino................393 O resgate das relações interpessoais por meio da partilha de histórias de vida de alunos-trabalhadores da enfermagem: Um relato de experiência.............................................................................................405 Perfil e competência docente na educação profissionalizante em enfermagem............................................................................................................413 Políticas públicas e a relação com a educação profissional técnica na área da saúde.....................................................................................................429 Prazer e sofrimento no trabalho: vivências e percepções de alunos-trabalhadores do sus..............................................................................455 Preconceito na área de saúde sob a ótica de alunos-trabalhadores de um curso técnico em enfermagem.................................................................477 Programa de formação de profissionais de nível técnico para a área da saúde: avaliação na perspectiva de alunos de uma classe descentralizada do interior paulista....................................................................487 Reflexões para formação docente de acordo com as atividades de articulação do Complexo Temático 3, por meio da visão de um aluno-docente........................................................................................................503 Vantagens e desvantagens da educação a distância..........................................513 15 16 Parte I 17 18 A FLUÊNCIA DIGITAL DO DOCENTE DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DE ENFERMAGEM Maria Madalena Januário Leite 1 Claudia Mara de Melo Tavares 2 Rika Miyahara Kobayashi 3 Heloísa Helena Ciqueto Peres 4 Cláudia Prado 5 Lúcia Tobase 6 Tatiana Gabriela Brassea Galleguillos 7 Renata F. Takahashi 8 INTRODUÇÃO A tecnologia de informação no mundo atual está interconectando os seres humanos e possibilitando uma socialização e democratização da informação e do conhecimento científico. A sociedade está se apropriando desse estoque de informação, com a possibilidade de criar um fluxo contínuo de saber, em um processo de construção de conhecimento coletivo e permanente (LEITE; PERES, 2005). O cenário educacional foi transformado pela introdução de tecnologias da informação e comunicação, que acrescidas da interface com a computação, promoveram a criação de novas perspectivas para a Educação, alicerçadas em 1. Professora Associada do Departamento de Orientação Profissional (ENO), da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP). Coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) – EEUSP, do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 2. Doutora em Enfermagem. Orientadora de Aprendizagem do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) – EEUSP, do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 3. Doutora em Enfermagem. Tutora da Turma 1, do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) – EEUSP, do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 4. Professora Associada do Departamento de Orientação Profissional (ENO) da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP). Tutora da Turma 1, do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (NIAD) – EEUSP, do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 5. Professora Doutora do Departamento de Orientação Profissional (ENO) da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP). Tutora da Turma 1, do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) –EEUSP, do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 6. Mestre em Enfermagem. Tutora da Turma 1, do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) – EEUSP do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 7. Doutora em Enfermagem. Tutora da Turma 1, do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) – EEUSP do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 8. Professora Associada do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva (ENS), da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP). Tutora da Turma 1, do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) – EEUSP, do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 19 ambientes virtuais, que ampliaram o acesso à informação pela integração de múltiplas mídias, linguagens e recursos, possibilitando o desenvolvimento de um processo educacional interativo. A construção de projetos educacionais não é um trabalho isolado e individualizado, mas uma ação compartilhada, de produção coletiva, desse modo, é importante que a informática no ensino seja implementada de forma planejada, a partir de uma análise criteriosa das concepções pedagógicas, para o alcance de objetivos concretos e integrados ao ensino, de acordo com os interesses dos alunos e das necessidades sociais, culturais e regionais. Caso contrário corre-se o risco de ser apenas mais uma maneira de transmissão de informação e mais um modismo a ser aplicado à prática educacional (PERES, 2001). O ensino mediado pelo computador, associado ao uso da Internet, teleconferência, videoconferências e seminários on-line, configura-se como uma das estratégias educacionais cuja aprendizagem é realizada em grupo, em tempo real, integrando os alunos de diferentes locais, mediante programas interativos, oferecendo-lhes múltiplas oportunidades de interação. Assim, a incorporação dos ambientes virtuais no ensino suscita questões sobre a fluência digital dos docentes de Enfermagem, o desenvolvimento do processo de capacitação dos docentes e a utilização dos ambientes virtuais nas atividades educativas. BREVE PANORAMA DA QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL EM ENFERMAGEM Os dados do Conselho Regional de Enfermagem mostram que a força de trabalho em Enfermagem, no Estado de São Paulo, é constituída por 60.277 (18,13%) enfermeiros, 76.607 (23,04%) técnicos e 195.616 (58,83%) auxiliares de Enfermagem (CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM, 2010). É inegável que a qualidade da assistência em Saúde tem como um de seus determinantes, a qualificação dos profissionais dessa área, o que tem impulsionado o governo a intensificar e priorizar investimentos na formação e educação permanente dos profissionais de Saúde, redefinido as políticas de desenvolvimento de recursos humanos. Na área de Enfermagem, projetos de qualificação de profissionais para a formação de auxiliar de Enfermagem, no município de São Paulo, são desenvolvidos desde a década de 80, quando se exigia um projeto político de inclusão social. Esse projeto, denominado “Larga Escala” (PLE), surgiu como 20 alternativa política, a fim de resolver o problema da qualificação profissional dos atendentes de Enfermagem, no qual se propôs uma formação específica para alunos trabalhadores do setor de Saúde, por meio de nova metodologia de ensino (PBL) e da preparação de instrutores/supervisores e de material didático, conforme a metodologia, tanto para os alunos quanto para os instrutores (SANTOS; SOUZA; VIEIRA, 1987). Tal projeto adotou o trabalho como princípio pedagógico, tendo como ponto de referência a realidade da prática dos alunos, utilizou como corpo docente os próprios profissionais da rede de serviço e garantiu aos egressos a identidade profissional, por meio do reconhecimento pelo sistema formal de ensino (ALMEIDA, 2000). Em 2000, foi desenvolvido o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE), iniciativa do Ministério da Saúde, através da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, inserindo-se numa política mais ampla de valorização profissional dos trabalhadores da área de Enfermagem. O objetivo do PROFAE foi o de melhorar a qualidade da atenção hospitalar e ambulatorial, por meio da oferta de qualificação profissional, além de reduzir o déficit de auxiliares de Enfermagem qualificados e apoiar a dinamização do mercado de trabalho no setor de Saúde (BRASIL, 2001). Para atender as mudanças políticas, conceituais, legais e práticas advindas da reforma educacional para a educação profissional, desencadeada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o PROFAE promoveu um processo de capacitação de enfermeiros docentes, viabilizando o ensino nas disciplinas da educação profissional em nível técnico. No ano de 2005 foi estabelecida uma política articulada de Educação em Saúde, institucionalizada pela Portaria Interministerial nº 2.118, de 3 de novembro de 2005, a qual oficializa a cooperação técnica entre os Ministérios da Educação e da Saúde, para a formação e desenvolvimento de profissionais nessa área (INPE, 2006). Como consequência desse ato, emerge o Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (PRÓ-SAÚDE), destinado a projetos da Enfermagem, Odontologia e Medicina (ALMEIDA; FERRAZ, 2008). Atualmente, o investimento realizado na formação de recursos humanos de Enfermagem ocorre por meio do TecSaúde, um Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo, desenvolvido pelo Governo do Estado de São Paulo, com a participação das Secretarias da Saúde, Desenvolvimento, Gestão Pública 21 (por meio da Fundação do Desenvolvimento Administrativo – FUNDAP, órgão executor do Programa) e Educação, instituído pelo Decreto Estadual nº 53.848, de dezenove de dezembro de 2008. Esse Programa é dirigido aos profissionais da área de Saúde, que buscam complementar a sua formação com qualificação profissional e certificação reconhecida. Além disso, o Programa gera impacto na qualidade dos serviços de saúde prestados pelo Sistema de Saúde, face à qualificação desses profissionais e contribui para o aumento do nível de escolaridade da população por meio da formação de trabalhadores técnicos (TECSAÚDE, 2010). O desenvolvimento do TecSaúde requereu a criação de um curso de formação de docentes. A Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) coordenam um curso de Pós-Graduação lato sensu, na modalidade Ensino a Distância (EaD), com duração de dez meses, com carga horária de 540 horas, em parceria com Instituições de Ensino Superior (IES), do Estado de São Paulo, destinado aos professores das escolas participantes do TecSaúde, profissionais que não fizeram curso de licenciatura ou não possuem outra qualificação reconhecida para docência. Atento à necessidade de construir coletivamente novos caminhos, esse Curso adotou como marco conceitual e como eixo de sustentação de toda a estrutura curricular, a Reforma Sanitária, com seus valores e princípios, a história das lutas sociais por saúde no Brasil, a fim de promover a necessária reflexão e aperfeiçoamento dos pactos em defesa da Vida, do Sistema Único de Saúde e de Gestão, resultando na qualificação diferenciada dos profissionais (BOMFIM, 2009). O referido Curso confere o título de especialista em docência, em Educação Profissional Técnica de Nível Médio na Área da Saúde, titulação que equivale à licenciatura plena na área de educação profissional. Em se tratando da metodologia de EaD, foram selecionados tutores residentes no Estado de São Paulo, para garantir o acompanhamento pedagógico dos alunos matriculados no Curso de Formação Docente em Educação Profissional na Área da Saúde a ser realizado no Estado, em parceria com as seguintes Instituições de Ensino Superior: Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo/SP (EEUSP/SP); Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo/Ribeirão Preto (USP/RP); Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP); Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA); Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); Universidade Estadual Paulista (UNESP/ Botucatu). Em cada uma dessas Instituições de Ensino Superior funcionou um Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad). 22 A EaD é uma modalidade de ensino, em que o processo de ensinoaprendizagem ocorre sem o encontro físico do professor e aluno, de forma síncrona e no mesmo espaço geográfico. Dentro deste conceito, a EaD pode ser realizada utilizando-se várias mídias ou instrumentos, evoluindo ao longo do tempo da mídia impressa até a Internet (RODRIGUES; PERES, 2008). A regulamentação da educação a distância está pautada na seguinte legislação: Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que autoriza, em seu Artigo 80, a Educação a Distância (EaD) como modo de ensino. A Portaria 4.059, de 10 de dezembro de 2004, trata da introdução de disciplinas semipresenciais em até 20% da carga horária total de cursos superiores reconhecidos e a Portaria 4.361, de 29 de dezembro de 2004, regulamenta o processo de credenciamento de instituições de ensino para o uso regular da Educação a Distância em seus processos. A Lei de Diretrizes e Bases, no Decreto 5.622, de 19 de dezembro de 2005, regulamenta, no Artigo 80, a política oficial de educação a distância no país (CAMACHO, 2009). Para que a EaD possa ocorrer, a apropriação da informática no ensino deve ser fundamentada em novas experiências pedagógicas, estratégias que questionem os sistemas educacionais tradicionais, aderindo às novas tecnologias, como instrumentos potencializadores da aprendizagem libertadora e dialógica, em favor da promoção humana e da cidadania (LEITE; PERES, 2005). Portanto, o domínio da ferramenta tecnológica e a fluência digital são imprescindíveis aos docentes atuantes na educação profissional, a fim de que possam desenvolver estratégias alternativas de inclusão de sua população de formandos. As tutoras do referido Curso desenvolveram o presente estudo visando o diagnóstico inicial do grupo de alunos frente às considerações anteriores, ao desafio da formação de docentes da educação profissional em Saúde, na modalidade de EaD e no referencial da pedagogia histórica-crítica, levando em conta também o conhecimento do perfil profissional e das atividades realizadas pelos alunos no local de trabalho, no intuito de facilitar a intermediação do processo educativo. OBJETIVOS • • caracterizar o perfil dos docentes da educação profissional técnica na área da Saúde; identificar e analisar a fluência digital desses docentes. 23 METODOLOGIA Esta pesquisa caracteriza-se como uma pesquisa exploratória descritiva. O local de estudo foi o Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente, o Niad da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (Niad – EEUSP). POPULAÇÃO E AMOSTRA A Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo é parceira da Ensp/Fiocruz, na formação de docentes e constitui um Niad, responsável pelo Curso na região da Grande São Paulo e Baixada Santista e contou com sete tutores. A população foi composta por noventa e nove docentes de cursos técnicos em Enfermagem, alunos da 1ª Turma do Niad, da Universidade de São Paulo (SP), do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. Participaram da pesquisa sessenta e seis (66%) alunos. INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS E PROCEDIMENTO Para a coleta de dados foi utilizado um questionário composto por duas partes: a primeira para caracterizar o perfil do docente, quanto à idade, ao sexo e à formação pedagógica. A segunda parte para identificar a fluência digital do docente, relacionada à posse e ao uso de computador; considerando o acesso à Internet, aos ambientes virtuais e os recursos da Internet; além da capacitação para o uso da Internet e o uso do computador na sua prática profissional. A coleta de dados ocorreu em janeiro de 2010, no primeiro encontro presencial do Curso. No que diz respeito ao procedimento de coleta de dados, esse projeto foi enviado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da USP (Processo nº 648/2007/CE-EEUSP). Antes de aplicar o questionário, os sujeitos foram esclarecidos quanto aos objetivos da pesquisa, assegurando-lhes a garantia do anonimato e a liberdade em participar ou não do estudo, sem que isso lhes causasse prejuízo de qualquer natureza. Foi aplicado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que após leitura e concordância, foi assinado por cada participante, individualmente. Os resultados foram apresentados em números absolutos e percentuais, utilizando-se o programa de Excel, para posterior análise. 24 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Em relação ao perfil dos 60 docentes participantes deste estudo, verificou-se que a maioria, 58 (69,9%), era composta por mulheres, cujo sexo prevalece nessa profissão historicamente. A faixa etária de 30 a 39 anos foi predominante. De acordo com Cuenca (2004), a variável idade de usuários das novas tecnologias de informação tem sido discutida em vários estudos. Segundo Zhang (1999), em estudo realizado nos Estados Unidos, o grupo de jovens e de adultos-jovens (com idade média de 45,4 anos) possui mais habilidades para o uso da Internet e o faz com maior frequência. A maioria dos docentes (77 - 91,7%) foi graduada em escolas de Enfermagem do setor privado (73 - 87%) e, mais da metade, (52 - 61,9%) possuía pós-graduação (lato sensu), principalmente nas áreas de UTI, Obstetrícia, Saúde Pública e Gerenciamento. A formação pedagógica não foi contemplada nesses cursos (79,8% e 35,7%, respectivamente) e poucos a consideraram suficiente para a atuação no ensino (17,9% e 11,9%, respectivamente), o que justifica a matrícula em cursos desse gênero. No que diz respeito à capacitação pedagógica em Cursos de Graduação e Pós-Graduação, 67 (79,8%) e 30 (35,7%), respectivamente, relataram que não tiveram conteúdo sobre didática. Esses resultados são esperados em relação à Pós-Graduação, uma vez que a finalidade dos cursos de especializações é a de formar especialistas para a atuação em instituições de Saúde, enquanto o mestrado deveria formar docentes e o doutorado formar pesquisadores. Quanto aos Cursos de Graduação, os resultados evidenciaram que a ênfase da função educativa do enfermeiro é insuficiente nos Cursos de Graduação, apesar de se constituir em uma das dimensões do processo de trabalho do enfermeiro. A iniciação profissional se deu pela assistência, 65 (77,4%), seguida pelo ensino, com doze (14,3%). Houve diversidade no tempo de docência, sendo que mais da metade, cinquenta (59,5%), dos entrevistados apresentou um tempo de atuação como docente na educação profissional de até dois anos, revelando que possuem pouco tempo de experiência na área de ensino. A faixa salarial da maioria deles, de cinquenta e nove (70,2%), variou entre R$1000,00 a R$3.999,00. Nas instituições de Saúde, a maioria, quarenta e dois (50%), ocupava o cargo de enfermeiro assistencial, quase um quinto deles, dezesseis (19,05%), exercia a função de chefe, coordenador, supervisor ou era Responsável Técnico (RT), e quinze (17,86%), possuíam um segundo vínculo empregatício, como 25 docente. A carga horária prevalente no primeiro emprego foi de 40 horas semanais, para vinte e oito (33,3%) deles e, no segundo, foi de 20h semanais para doze (14,3%) docentes, sendo que todos eram efetivos, em pelo menos um deles; sendo cinquenta e cinco (65,5%) no considerado primeiro emprego e, vinte e três (27,4%), no segundo. Esta condição mostra que os alunos acumulam frequentemente dois vínculos empregatícios, além de estudar, apontando para uma qualidade de vida precária, sendo trabalhadores em primeiro lugar e alunos em segundo. Os modos de produção e reprodução social em sistemas capitalistas distribuem as pessoas em classes sociais, gerando oposições, antagonismos e conflitos de interesses, além de criar condições de luta entre elas. Tanto a classe que se apropria do trabalho de outros seres humanos, como a classe que vive do trabalho assalariado, ambas dependem do mercado. A expansão desse modo de produção no último século foi surpreendente, definindo o ritmo do processo de trabalho como um todo, inclusive no setor de serviços, como é o caso da Saúde e da Educação. Com isso, o mercado tende a transformarse em centro da vida social, pois tudo tem custo, ampliando-se a competição entre os indivíduos. A dimensão comunitária na existência das pessoas vai se reduzindo e a comunidade não é mais a matriz dos valores humanos, gerando sofrimentos e precarização do trabalho (BOMFIM, 2009). O mercado de trabalho, no tocante à área de ensino, explicita cada dia mais, a difícil situação e condição de trabalho dos professores, em função da falta de salários dignos, garantias sociais para todos e constantes irregularidades nas contratações. O trabalho é pouco valorizado, muitas vezes instável, sem as garantias sociais que o conjunto dos trabalhadores lutou por décadas para conquistar (BOMFIM, 2009). Na escola dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde, pautada pelo trabalho vivido por alunos e professores nos espaços de Saúde, não se pode desconhecer a existência de uma histórica fragmentação do trabalho e de uma valorização social diferenciada entre os profissionais da Enfermagem, e mais do que isso, não se pode esquecer que todos nós somos (de alguma forma) um pouco dessa história. Por esse motivo, a escola também é o local apropriado para se discutir as origens dessa fragmentação e as possibilidades do trabalho coletivo, com base em outras práticas conscientes, compartilhadas e negociadas pelos sujeitos envolvidos (BOMFIM, 2009). Com relação ao motivo da inserção profissional na área da Educação em Saúde, os docentes referiram gostar de lecionar. Relataram ainda que as atividades desenvolvidas compreendiam: a elaboração de plano de aula, 26 32 (38,1%); a participação na elaboração de plano de curso, 20 (23,8%); a supervisão de alunos no estágio com 12 (14,3%); e a participação na elaboração de projeto político-pedagógico com 9 (10,7%). É interessante observar que apesar de pequeno percentual, a participação do docente na elaboração do projeto político-pedagógico, revela a importância de sua participação na dimensão político-pedagógica, frente às mudanças no mundo do trabalho. Em relação à fluência digital, os resultados demonstram que 82 (97,6%) dos sujeitos possuem computador com Internet na residência, 47 (56%) com banda larga, sendo que 77 (91,7%) acessam, principalmente, em casa e, 69 (82,1%), o fazem diariamente. Tais dados levam à reflexão de que o domínio e o uso dessas tecnologias podem provocar transformações, não só no âmbito pessoal, mas também na esfera profissional. Há ainda 71 (84,5%) que afirmaram usar o computador no local de trabalho, isto é, para a realização de atividades, tanto assistenciais como administrativas. Entretanto, nas atividades desenvolvidas como docente, o seu uso foi relatado com menor frequência. Essa situação pode ser explicada, principalmente, devido à falta de capacitação docente para o uso das tecnologias no ensino e de infraestrutura das instituições para o uso de computadores em rede e outros equipamentos adequados. No que diz respeito à realização de algum curso ou disciplina à distância, 60 (71,4%) responderam que nunca participaram. Dos que realizaram cursos na modalidade EaD, relataram tê-lo feito como atualização. Vale destacar que 64 (76,2%) afirmaram não haver oferta de cursos de informática na instituição em que trabalham. Nas últimas décadas o EaD teve um grande avanço no tocante à formação dos profissionais de Saúde e de Enfermagem. A literatura mostra a necessidade de adoção, por parte das instituições de ensino de Saúde, de políticas de investimento na capacitação tecnológica docente e discente, bem como a de implementar uma infraestrutura para o desenvolvimento de projetos, de educação a distância, estruturados em propostas pedagógicas que viabilizem a construção de competências, habilidades e conhecimento nas áreas de tecnologia da informação e de educação, utilizando novas estratégias de ensino (CAMACHO, 2009). Autores como Applebee, Clayton e Pascoe (1997) mostraram que a maioria (75%) dos docentes australianos de ensino superior necessita de treinamento para usar e conhecer as facilidades da Internet. Bruce (1999) referiu que, na sua maioria, os docentes adquirem o conhecimento para o uso da Internet por meio da autoaprendizagem, acompanhada da ajuda significativa 27 de amigos e colegas. As Tabelas 1 e 2 mostram o uso de ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) pelos docentes, bem como as ferramentas da Internet. Tabela 1 - Distribuição das respostas segundo o uso de ambientes virtuais. São Paulo, janeiro de 2010. AVA Moodle Sim Não Nº 66 % 97,1% Nº 2 Total % 2,9% Nº 68 % 100% AulaNet 59 86,8% 9 13,2% 68 100% WebAula 60 88,2% 8 11,8% 68 100% TelEduc 65 95,6% 3 4,4% 68 100% WebCT 67 98,2% 1 1,5% 68 100% Wiki Blackboard COL Viask 64 67 67 66 94,1% 98,2% 98,2% 97,1% 4 1 1 2 5,9% 1,5% 1,5% 2,9% 68 68 68 68 100% 100% 100% 100% Outros 66 97,1% 2 2,9% 68 100% Na Tabela 1 evidencia-se que a maior parte dos docentes não citou o uso das plataformas que constituem um ambiente virtual de aprendizagem (AVA). Esse resultado já era esperado, uma vez que a maioria não fez cursos/ disciplinas à distância, portanto, não possuíam vivência no AVA. Além disso, a maior parte das instituições não investe nesta tecnologia em função do custo. Tabela 2 - Distribuição das respostas, segundo experiência/conhecimento em ferramentas virtuais/eletrônicas. São Paulo, Janeiro de 2010. Experiência/conhecimento Não Sim MSN Freq 2 % 2,9% Freq 66 % 97,1% Chat 26 38,2% 42 61,8% Total Freq % 68 100% 68 100% Correio eletrônico 9 13,2% 59 86,8% 68 100% Fórum 41 60,3% 27 39,7% 68 100% Vídeo/tele/audioconferência 38 55,9% 30 44,1% 68 100% Software educacional/gerencial 58 85,3% 10 14,7% 68 100% Comunidade virtual de aprendizagem 50 73,5% 18 26,5% 68 100% 28 Dentre as ferramentas da Internet, observa-se que a maioria, 66 (97,1%), dos docentes usa mensagens instantâneas para comunicação, caracterizadas pelo MSN Messenger (The Microsoft Network)®, seguido do uso do correio eletrônico, 59 (86,8%) e 42 (61%), do chat. De acordo com Terra e Gordon (2002) estima-se que nos Estados Unidos as pessoas enviem cerca de 1,5 bilhão de mensagens por dia. Entretanto, isto não significa que utilizem estas ferramentas como instrumentos de ensino. Ressalta-se, ainda, que boa parcela dos docentes referiu-se ao uso de videoconferência (30, o que equivale a 44,1%) e de fórum (27 docentes, o equivale a 39,7%). A citação do uso de videoconferência era esperada, uma vez que este recurso no Brasil tem sido utilizado com maior frequência no meio acadêmico, não só para reuniões virtuais, mas também no ensino, para complementação das aulas presenciais e palestras. Ainda foi possível verificar as possibilidades citadas pelos docentes quanto ao uso do computador no cotidiano, da sua prática docente de educação profissional, durante a apresentação prática da plataforma VIASK, no AVA, no laboratório de informática. Os docentes referiram-se ao fato de que o computador facilita a atualização contínua do professor e, também, do aluno, na medida em que permite o acesso rápido às imagens e vídeos, além de pesquisas em acervos bibliográficos, favorecendo o aprimoramento das aulas e dos trabalhos desenvolvidos pelos alunos. Afirmaram ainda, que a globalização e a democratização do uso dos equipamentos de informática e da Internet obriga o professor a buscar capacitação, a fim de se tornar apto para o uso das tecnologias disponíveis para a sua atuação como docente, ainda que seja como uma ferramenta para pesquisa. O uso de tecnologias na Educação transforma a maneira com que as pessoas se comunicam, trabalham, decidem e pensam, bem como permite a criação de situações de aprendizagem ricas, complexas e diversificadas, possibilitando a aprendizagem contínua e permanente (PRADO; MARTINS; ALAVARCE, 2011). Portanto, os depoimentos dos sujeitos corroboraram os achados de Fontes (2001), que considera a Internet um instrumento que propicia aos professores o desenvolvimento e a transmissão do conteúdo à distância, oferecendo novos métodos e ferramentas para um ensino mais amplo. Apesar dos docentes reconhecerem a importância dessas ferramentas, eles manifestaram o pensamento de que ainda há barreiras a serem vencidas para um uso ampliado. É interessante destacar que, dentre as respostas, alguns sujeitos 29 afirmaram que, na atualidade, não faziam uso do computador, mas que pretendiam fazê-lo na sua prática profissional como docente. CONSIDERAÇÕES FINAIS A revolução da comunicação provocada pela invenção dos recursos computacionais, em meados do século XX, propiciou o desenvolvimento de plataformas que podem se constituir em ambientes virtuais de aprendizagem, aumentando as oportunidades educacionais, especialmente por permitir a criação de novos métodos de ensino e aprendizado. Atualmente, há um grande volume de investimentos e uma crescente expectativa em torno da utilização dos AVAs, e um enorme progresso já ocorreu em relação às estratégias institucionais e pedagógicas. Os ambientes virtuais de aprendizagem estão se tornando, de forma gradual, parte integrante da estrutura da sociedade e devem se consolidar, cada vez mais no futuro, como auxílio constante na formação dos nossos educandos. A tecnologia da informação tem seu maior produto na Internet, considerada um poderoso instrumento de comunicação, capaz de diminuir as distâncias, formando redes de comunicação entre os docentes e alunos. Diante do exposto, conclui-se neste estudo, a importância dos docentes se prepararem para o uso dos AVAs. Destacando, nesse caso, que qualquer ferramenta a ser implementada nos processos educacionais, só será eficaz com a mediação do professor. No entanto, para fazer uso efetivo dos AVAs, os professores precisam oferecer aos alunos, experiências educacionais que os capacitem para as demandas vindouras, presentes na sociedade moderna. A inclusão na sociedade da informação exige habilidades (que na maioria dos cenários de aprendizagem não estão sendo desenvolvidas), o que requer mudança nos currículos. Outro fator que evidencia ainda a necessidade de capacitação dos professores para o uso dessa tecnologia é o de que os alunos, especialmente os mais jovens, possuem conhecimentos tecnologicamente avançados e têm acesso pleno ao universo de informações disponíveis nos múltiplos espaços virtuais. Por outro lado, é fundamental que nas políticas das instituições de ensino sejam incluídas diretrizes voltadas, tanto para o desenvolvimento do corpo docente e colaboradores, como para as condições de trabalho, disponibilizando recursos para equipar os espaços educacionais com as mais modernas tecnologias digitais. 30 Concluindo, faz-se necessário ressaltar que a utilização da Internet e das tecnologias da comunicação e informação para o processo educacional relaciona-se a uma mudança de postura de todos os sujeitos envolvidos – professores, gestores, coordenadores pedagógicos – e, até mesmo, da própria comunidade em que a escola está inserida. Além disso, é importante ressaltar que não basta somente a utilização dos meios tecnológicos nos ambientes de ensino, mas que se faz necessário um planejamento e uma organização de todos os elementos que constituem o processo educacional. REFERÊNCIAS ALMEIDA, A. H. 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CAMACHO, A. C. L. F. Análise das publicações nacionais sobre educação à distância na enfermagem on-line. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v. 62, n. 4, p. 588-593, 2009. CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM (São Paulo). Tabela de profissionais, autorizações e instituições organizada por sub-seção. São Paulo, 2009. Disponível em: <http:// www.coren-sp.gov.br/internet/072005/consulta/estatistica/pdf_estatistica.php?TIPO=sub&ME SANO=052009&SUBS=todas>. Acesso em: 7 jan. 2010. CUENCA, A. M. B. O uso da internet por docentes da área da saúde pública no Brasil. Tese (Doutorado) - Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004. FONTES, C. de A. Usos e efeitos da internet na prática bibliotecária: estudo exploratório junto ao sistema integrado de bibliotecas da Universidade de São Paulo. Dissertação (Mestrado) - Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. INPE. A trajetória dos cursos de graduação na área da saúde: 1991-2004. 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Este estudo busca caracterizar o profissional da área de Saúde que utiliza a EaD, com base nas seguintes variáveis: acessibilidade ao computador e à internet; domínio técnico das ferramentas tecnológicas; experiências anteriores com EaD; e expectativas em relação ao curso que estão realizando a distância. Participaram deste estudo 52 alunos das duas turmas do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica de Nível Médio na Área de Saúde, ministrado pelo Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente da Universidade Federal de São Carlos. Trata-se de uma população predominantemente feminina, graduada em Enfermagem, com média de idade de 33,9 anos. Quanto ao acesso e domínio da informática, a maioria dos entrevistados refere ter acesso à internet por banda larga e considera o domínio do computador como suficiente para participar do curso. A maioria dos alunos trabalhadores possui mais de um vínculo empregatício, apontando para a necessidade de o curso prever estratégias que possibilitem mantê-los comprometidos com os objetivos propostos. Atrelado a isso, destaca-se a importância da estruturação e organização do curso para bem responder aos desafios do processo de formação profissional. Descritores: Educação a distância, Educação em enfermagem, Enfermagem. 1. Tutores do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente da Universidade Federal de São Carlos (Niad–UFSCar). 33 INTRODUÇÃO A educação a distância (EaD) – modalidade de ensino na qual o aprendiz não está fisicamente presente no ambiente formal de ensino-aprendizagem – é vista como um tipo de inserção social uma vez que possibilita a formação de cidadãos conscientes de seu papel sociopolítico, ainda que resida em regiões distante (JACOMINI, PIAI e FIGUEIREDO, 2008; OLIVEIRA, 2007). A comunicação entre o facilitador da aprendizagem e o aprendiz se dá por meio de tecnologias, principalmente a internet, mas podem também ser utilizados o correio, o rádio2, a televisão, o vídeo, o telefone e outros. Historicamente, existem registros de EaD desde o século XIX, mas apenas nas últimas décadas a modalidade passou a ter maior importância do ponto de vista pedagógico, ante a necessidade de preparar profissionalmente pessoas impossibilitadas de frequentar o ensino presencial, tendo evoluído de acordo com as tecnologias disponíveis a cada momento. No Brasil, considerados os recursos tecnológicos e de comunicação disponíveis, podem-se identificar três momentos marcantes da utilização da EaD: 1. o ensino por correspondência, feito por meio do envio de material impresso3; 2. a teleducação e os telecursos, que utilizam programas radiofônicos e televisivos com aulas expositivas, fitas de vídeo e material impresso4; e 3. ambientes interativo, nos quais a comunicação é assíncrona e o tempo fixado para acesso foi eliminado. Para isso, as informações são armazenadas e acessadas a qualquer tempo, sem perda da interatividade, pois as plataformas de ambientes virtuais possibilitam a interação entre aprendizes e tutores (PROJETOS DE EDUCAÇÃO, 2007; ZEM-MASCARENHAS, 2004). Atualmente, com o surgimento de novas tecnologias da informação e da comunicação (TIC), o paradigma do ensino/aprendizagem e das relações 2. Um exemplo de educação via rádio, o projeto Minerva, está referido em artigo veiculado em http://www.eps.ufsc.br/ disc/tecmc/bahia/grupo8/site/pag6.htm. 3. O pioneiro no Brasil foi o Instituto Monitor, que, em 1939, ofereceu, por correspondência, curso de radiotécnico. Logo após, foi criado o Instituto Universal Brasileiro, atuando por diversas décadas no ensino por correspondência. 4. Merece destaque, no Brasil, o Projeto Minerva criado pelo Serviço de Radiodifusão Educativa do Ministério da Educação e Cultura e iniciado em setembro de 1970, com ênfase na educação de adultos. Tinha como objetivo a extensão do ensino, definindo claramente as funções básicas do ensino supletivo: suplência, suprimento, qualificação e aprendizagem. Valiase do rádio para atingir o homem (onde ele estivesse), ajudando-o a desenvolver suas potencialidades, tanto como ser humano quanto como cidadão participativo e integrante de uma sociedade. Neste período, a comunicação era síncrona, com tempo fixado para acesso. 34 entre o indivíduo, o trabalho e a sociedade está se modificando. O mundo globalizado exige que o indivíduo se mantenha de permanente e continuamente atualizado para exercer de forma efetiva sua cidadania (BRASIL, MEC, 1996). Com a utilização das TIC, observa-se a retomada do ensino a distância a partir da publicação da nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996), que fomenta a implantação e o desenvolvimento de cursos utilizando a metodologia para graduação, cursos de extensão, cursos sequenciais, pós-graduação, educação de jovens e adultos, aperfeiçoamento de professores e educação continuada (ALMEIDA, 2003). A EaD pela internet tem-se mostrado adequada e vantajosa como processo de ensino-aprendizagem não apenas pelas características de acessibilidade em qualquer tempo e lugar, mas principalmente pela multiplicidade de recursos que oferece, pela interatividade e diversidade de estímulos que possibilita, além da oportunidade de integração e de trabalho cooperativo que pode proporcionar(ALMEIDA, 2003). A Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) em pareceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz), coordena o oferecimento do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica de Nível Médio na Área de Saúde, foco deste trabalho. Trata-se de curso de pós-graduação latu sensu, desenvolvido a distância, com situações presenciais obrigatórias, com duração de até 10 meses e carga horária mínima de 486 horas, em articulação com instituições de ensino superior do Estado de São Paulo, que compõem os Núcleos Interdisciplinares de Apoio Docente (Niad) Para o Departamento de Enfermagem da UFSCar, trata-se de experiência inédita nessa modalidade de ensino, razão pela qual surgiu a necessidade de caracterizar os profissionais que se utilizam da EaD na sua formação, contribuindo assim para eventuais adequações do ensino a distância para essa população. JUSTIFICATIVA Tendo em vista que os tutores deste núcleo não tinham experiência prévia com alunos de ensino a distância, consideramos que conhecer o perfil dessa população contribuiria para o processo de formação, além de facilitar a interação entre tutores e discentes. 35 OBJETIVO Caracterizar o profissional de Saúde que utiliza a EaD, levando em conta variáveis como: acessibilidade ao computador e à internet, domínio técnico das ferramentas tecnológicas, experiências anteriores com educação à distância e expectativas com cursos nessa modalidade. METODOLOGIA Trata-se de estudo quantitativo, exploratório e descritivo. A população estudada foi alunos das duas turmas inscritas no Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica de Nível Médio na Área de Saúde, oferecido pelo Niad-UFSCar, na modalidade de ensino a distância (TecSaúde), que concordaram em participar do projeto assinando termo de consentimento livre e esclarecido. Os dados foram coletados em questionário estruturado, composto de questões fechadas e abertas, autoaplicável, fornecido a todos os alunos do curso e preenchidos por ocasião do primeiro encontro presencial de cada turma. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de São Carlos (Parecer n. 252/2010). RESULTADOS E DISCUSSÃO Dos 79 alunos inscritos no curso, 52 (65,9%) responderam ao questionário, sendo 26 alunos de cada turma. A média de idade dos participantes foi de 33,9 anos, sendo 13,4% deles do sexo masculino. Esse perfil reflete o cenário da força de trabalho da categoria profissional, sabidamente feminino (LOPES e LEAL, 2005). Em relação à média de idade, observamos que se trata de uma população de adultos jovens. 36 Figura 1: Distribuição da população estudada quanto a sexo e idade. Niad – São Carlos, 2011. Quanto à formação, 96,2% (50) dos alunos eram graduados em Enfermagem, 1,9% (1) em Farmácia e 1,9 % (1) em Psicologia; desses, 32,7% (17) eram provenientes de escolas públicas e 67,3% (35) de escolas privadas. O tempo médio de formação é de 8,3 anos. Em relação à formação pós-graduada, 57,8% (29) dos alunos já possuíam especialização em áreas diversas e 1,9 % (1) já havia concluído o doutorado. Quando questionados sobre seus vínculos empregatícios, 30,8% (16) dos alunos informaram possuir apenas um vínculo; 59,6% (31) mantinham dois vínculos; 7,7% (4) chegavam a ter três vínculos; e um aluno não respondeu a essa questão. O elevado número de alunos com mais de um vínculo trabalhista provocou surpresa nos tutores, pois sabe-se que o desempenho acadêmico pode ficar comprometido nesse contexto. Figura 2: Tipo de vínculo empregatício da população estudada. Niad –São Carlos, 2011. 37 A EaD é uma modalidade de grande valia para qualificar profissionais, em especial os de enfermagem, dada a extensa carga horária de trabalho, geralmente em dois empregos. Acrescenta-se o fato de tratar-se de população predominantemente feminina, cujo tempo restante acaba sendo dedicado ao trabalho doméstico e à maternidade (JACOMINI, 2008). Apesar de tratar-se de curso de formação docente, apenas 65,4% (34) disseram manter vínculo com escolas técnicas, sendo 23,5% (8) em escolas públicas e 76,5% (26) em escolas privadas. Questionados sobre se exercem atividades profissionais no SUS, apenas 69,2% (36) reconhecem-se como trabalhadores do sistema, enquanto 30,8% (17) afirmam não manter vinculação com o sistema. Essa informação aponta para uma possível fragilidade do conceito e da abrangência do SUS, em profissionais da Saúde. Entretanto, 57,7% (30) dos alunos entrevistados classificam como suficiente seu conhecimento prévio sobre o SUS; 32,7% (32) como bom; e 9,6% (5) consideram insuficiente os seus conhecimentos. Quanto ao acesso e domínio da informática, 84,6% (44) dos entrevistados responderam que têm acesso à internet por banda larga e 46,1% (24) consideram seu domínio do computador como suficiente, contra 50% (26) que consideram apenas bons os seus conhecimentos, fato que se tem mostrado constante em estudos realizados com a população de Enfermagem (PERES, DUARTE, MAEDA e COLVERA, 2001; PERES, MEIRA e LEITE, 2007). O próprio domicílio ainda é o local mais utilizado para acesso ao curso, segundo informaram 86,5% (45) dos alunos, o que talvez indique que o ambiente de trabalho ainda não oferece disponibilidade para acesso ou desvalorize a EaD como meio de socialização do conhecimento e inclusão social. As expectativas sobre o curso concentram-se em: qualificar a prática profissional; estimular a reflexão crítica; qualificar a atuação pedagógica; melhorar o uso de tecnologia; trocar experiências; ampliar conhecimentos; atender aos objetivos do curso; e aprender com a EaD, como ilustram os trechos abaixo, extraídos dos depoimentos de entrevistados: “Qualificar minha experiência prática, estimular minha reflexão crítica e qualificar minha atuação pedagógica.” “Aprender muito, compartilhar saber...” “... acredito que me auxiliará muito, pois poderei fazer meu horário de estudos, sem atrapalhar minha rotina de trabalho.” 38 “Ampliar e obter conhecimentos e ferramentas para a atuação profissional na área de educação.” “... conseguir realizar todas as atividades propostas.” “Poder aprimorar e obter conhecimentos na área de educação em horários diversificados, com bastante mobilidade.” CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir dos resultados apresentados, conclui-se que o perfil dos alunos, no que diz respeito ao recorte sexo, permanece o mesmo daquele descrito na literatura como prevalente para a categoria profissional. Destacase ainda o empenho dos alunos em buscar qualificação profissional, percebido nos cursos já realizados e na inserção no curso em questão. Ressaltamos que parte deles, apesar de não manter vínculo com instituições de ensino, busca capacitação prévia para isso. Os índices de vinculação a mais de um local de trabalho também reforçam o perfil traçado na literatura disponível, ou seja, o de alunos trabalhadores que em sua maioria mantêm mais de um vínculo empregatício. Tal fato aponta para a necessidade de o curso criar estratégias que favoreçam o comprometimento e o envolvimento dos alunos, a fim de garantir o atendimento, com qualidade, dos objetivos propostos. Atrelado a isso, destaca-se a importância de bem estruturar e organizar o curso tendo em vista responder aos desafios do processo de formação profissional, ainda mais especificamente quando realizada a distância. ReferênciaS Jacomini RA, Piai TH, Figueiredo RM. Avaliação de um curso de educação á distância sobre Hepatite C. Investig Educ Enfermería, Medellín, 2008; 26(2):98:104 sup. Oliveira MAN. Educação à distância como estratégia para a educação permanente em saúde: possibilidades e desafios. Rev Bras Enferm., 2007; 60(5): 585-89. Projetos de educação via rádio: exemplos históricos e atuais. [Citado 2010 mar 24]. Disponível em: http://www.eps.ufsc.br/disc/tecmc/bahia/grupo8/site/pag6.htm Zem-Mascarenhas SH. Apenenf: ambiente web de apoio ao ensino de enfermagem. In: Anais do 9º Congresso Brasileiro de Informática em Saúde; 2004. 7-10; Ribeirão Preto. SP. Disponível em: http://telemedicina.unifesp.br/pub/SBIS/CBIS2004/trabalhos/arquivos/247.pdf. Brasil. Ministério da Educação e Cultura. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília; 1996. Disponível em: http://www.6senado. gov.br/legislação/ListaPublicacoes. 39 Almeida MEB. Educação a distância na internet: abordagens e contribuições dos ambientes digitais de aprendizagem. Educ Pesq. 2003; 29(3):327-40. Lopes MJM, Leal SMC. A feminização persistente na qualificação profissional da enfermagem brasileira. Cad Pagu 2005;(24):105-25. Peres HHC, Duarte YAO, Maeda ST, Colvero LA. Estudo exploratório sobre a utilização dos recursos de informática por alunos de graduação em enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 2001;35(1):88-94. Marques IR, Marin HF. Enfermagem na WEB: O processo de criação e validação de um WEB site sobre doença arterial coronariana. Rev Lat Am Enferm [periódico na Internet]. 2002[citado 2004 jul. 20];10(3):[cerca de 10 p.]. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sciarttext&pid=S0104- 11692002000300005&lng=pt&nrm=iso Peres HHC, Meira KC, Leite MMJ. Ensino de didática em enfermagem mediado pelo computador: avaliação discente. Rev. esc. enferm. USP [periódico na Internet] 2007 [citado 2011 fev 02] 41(2). Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid. 40 Diante dOS DESAFIOS DO CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE EM EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA NA ÁREA DA SAÚDE NA MODALIDADE EaD Maria de Lourdes da Silva Marques Ferreira1 Sílvia Helena de Carvalho Sales Peres2 Maria Paula Soares Pozati3 Maria Lúcia Araújo Sadala4 Resumo A Educação a Distância tem um papel essencial neste novo século na disseminação do conhecimento, pois permite o acesso para as pessoas que estão excluídas do processo de educação formal. Metodologia: Trata-se de estudo descritivo, que se caracteriza por buscar descrever um fato. A experiência frente aos vários desafios no exercício da tutoria refere-se aos tutores do Departamento de Enfermagem - UNESP- Botucatu. Objetivo: Discutir sobre desafios vivenciados pelos tutores do núcleo com o aporte teórico necessário para reflexão. Resultados e discussão: O NIAD Botucatu na primeira e segunda turma do Curso totalizou 112 alunos inscritos, quatro tutores em cada turma e coordenação regional que exerceu a tutoria com menor número de alunos. Deste total, 11 alunos foram matrículas automaticamente canceladas, 17 abandonos e 86 concluintes. Foi discutido o desafio de ser tutor e o Trabalho de Conclusão do Curso. Na educação a distância, as várias tarefas e papéis exigidos podem ser classificados em quatro áreas: pedagógica, gerencial, técnica e social. Outro desafio foi à dificuldade na elaboração de textos científicos, cuja maioria, não vivencia essa experiência. Inclui-se no TCC as dificuldades e tipos de pesquisa, efetividade, tema e desafios do orientador. Considerações finais: Uma política 1. Enfermeira. Profª. Ass. Drª. – Departamento de Enfermagem da Faculdade de Medicina – Unesp - Botucatu. Coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente do CFDEPTAS/EaD/Fiocruz, Niad–Botucatu. 2. Cirurgiã-Dentista. Profa. Associada do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo – USP. 3. Enfermeira. Profª. Especialista – Centro Estadual Tecnológico Paula Souza, ETEC de Presidente Venceslau. 4. Enfermeira. Profª. Adjunta – Departamento de Enfermagem da Faculdade de Medicina – Unesp - Botucatu. Tutora do CFDEPTAS/EaD/ Fiocruz, Niad–Botucatu. 41 de formação continuada dos docentes, que envolva efetiva relação teoria e prática faz-se necessária para avanço na construção da gestão democrática e qualidade do processo de ensino-aprendizagem na educação presencial ou a distancia. Descritores: educação a distancia, tutoria, conhecimento. INTRODUÇÃO Vivemos na atualidade em uma sociedade da aprendizagem, na qual aprender constitui uma exigência social crescente. A cultura atual nos demanda uma formação permanente e uma reciclagem profissional que alcança quase todos os âmbitos produtivos, como consequência, em boa medida, de um mercado de trabalho complexo, flexível, junto a um acelerado ritmo de mudança tecnológica que nos obriga a estar aprendendo sempre coisas novas(1,2). O século XX presenciou um intenso desenvolvimento tecnológico. Com isso, a sociedade tem vivenciado grandes avanços na tecnologia. Isso tem refletido em diversos âmbitos da sociedade, ocasionando a reconfiguração das relações sociais(3). Tais avanços, iniciados na segunda metade do século passado impulsionados pelo desenvolvimento acelerado de novos instrumentos e recursos da informática, têm repercutido na cultura, economia, nos meios de comunicação, na gestão de empresas e na direção e funcionamento dos serviços públicos. No campo da educação, a conexão promovida por essas tecnologias, considerando os diversos sistemas sociais, econômicos, políticos e culturais, possibilita superar as barreiras disciplinares tradicionais, integrando diversas perspectivas teóricas, ferramentas metodológicas e experiências profissionais. Sendo assim, o uso das tecnologias e as transformações profundas que elas imprimem são elementos essenciais para a compreensão da sociedade atual e para desenvolver, de forma competente, atividades variadas, particularmente cursos de formação profissional a distância(4). Nos últimos dez anos, a modalidade da educação a distância (EaD) difundiu-se no Brasil, de tal forma a possibilitar a realização de ensino superior para diversas cidades de interior dos estados, cujos cursos presenciais não seriam viáveis. Assim, a educação a distância tem um papel essencial neste novo século na disseminação do conhecimento, pois permite o acesso a pessoas que estão excluídas do processo de educação formal(3). Sendo a modalidade de EaD considerada um novo modo de educar para muitos tutores, constata-se a necessidade de mais investimento para 42 esse aprendizado, em uma proposta formativa, na perspectiva da inclusão e participação de todos. Na EaD ocorre o desenvolvimento das competências de comunicação e tecnológicas. Ambas as competências referem-se a um domínio mínimo das tecnologias que serão utilizadas no dia a dia pelo tutor, na perspectiva do uso de mídias que podem favorecer o relacionamento entre os seres humanos e, com a troca de informações, gerar conhecimentos(5). METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo, que se caracteriza por buscar descrever um fato, um problema. A pesquisa descritiva é um levantamento das características conhecidas que são componentes do fato, do problema em estudo(6). O estudo descritivo procura abranger aspectos gerais e amplos de um contexto social. O estudo descritivo possibilita o desenvolvimento de um nível de análise em que se permite identificar as diferentes formas do que se deseja investigar, sua ordenação e classificação(7). A experiência perante os vários desafios no exercício da tutoria referese aos tutores do Departamento de Enfermagem da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista (Unesp) – Botucatu, no decorrer do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, na modalidade a distância, com momentos presenciais, pós-graduação lato sensu, com duração de dez meses e carga horária de 486 horas – desenvolvido pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz) em parceria com a Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) e seis instituições de ensino superior (IES) do estado de São Paulo, de forma descentralizada. Em cada uma das IES funciona um Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad). O Departamento de Enfermagem constitui-se sede do Niad–Botucatu, disponibiliza espaço físico para os momentos presenciais, salas individuais para a tutoria, salas de informática para a prática do ambiente virtual de aprendizagem (AVA) e biblioteca. O objetivo deste estudo é discutir sobre os desafios vivenciados pelos tutores do Núcleo com o aporte teórico necessário para a reflexão dos mesmos. O Niad–Botucatu em sua primeira e segunda turma do curso totalizou 112 alunos inscritos, quatro tutores em cada turma e coordenação regional, que exerceu a tutoria com menor número de alunos. Deste total, 11 alunos foram considerados matrículas automaticamente canceladas e 17 caracterizados como abandono. Concluíram o curso 86 alunos. 43 RESULTADOS E DISCUSSÕES O desafio de ser tutor. Para o exercício da tutoria, surgem questionamentos, tais como: o que significa ser tutor? Qual é o seu papel? O que é ser bom tutor? Como se forma um tutor? Qual tarefa deve realizar? Que formação deve ter um tutor? A definição semântica da palavra “tutoria” refere-se à tutela, ação de proteger, guardar, preservar e amparar, mas vem sendo ressignificada para caracterizar o exercício da docência na educação a distância. O tutor tem como papel a preparação de material didático e o acompanhamento das atividades desenvolvidas. Espera-se também que ele seja responsável pelas ferramentas de avaliação, assim como pela análise dos trabalhos dos alunos. Além disso, tem por tarefa o esclarecimento de dúvidas dos alunos, promovendo maior interatividade entre os mesmos. Atua, ainda, no esclarecimento de dúvidas dos alunos por meio de e-mail, fórum, telefone ou pessoalmente, no recebimento e controle de entrega dos trabalhos. Um ponto fundamental é estar atento às necessidades do aluno, podendo agir de maneira a solucionar as questões tanto teóricas quanto de situações do dia a dia. Isso quer dizer que o tutor deverá estar atento ao nível de interatividade dos alunos, para então identificar quais alunos não estão interagindo e tentar resgatar a relação interativa(8). À tutoria atribui-se uma dimensão relevante do curso a distância, pela necessidade de um docente para educar e desenvolver as potencialidades dos alunos, por ser a atuação do tutor muitas vezes decisiva na permanência e êxito do aluno, por exercitar outra relação de poder na mediação pedagógica, por exercitar outra forma de comunicação, dentre outras. Muitas vezes, “exige-se mais do tutor de que de cem professores convencionais”(9). O tutor necessita ter uma formação acadêmica e pessoal. Na formação acadêmica, pressupõem-se capacidade intelectual e domínio do conteúdo que será desenvolvido, destacando-se as técnicas metodológicas e didáticas. Além disso, deve conhecer com profundidade os assuntos relacionados com a matéria e a área profissional em foco. A habilidade para planejar, acompanhar e avaliar atividades, bem como motivar o aluno para o estudo, também são relevantes. Na formação pessoal, deve ser capaz de lidar com o heterogêneo quadro de alunos e ser possuidor de atributos psicológicos e éticos: maturidade emocional, empatia com os alunos, habilidade de mediar questões, liderança, cordialidade e, especialmente, capacidade de ouvir (10). Na complexidade do papel do tutor em 44 educação a distancia, as várias tarefas e papéis exigidos podem ser classificados em quatro áreas: pedagógica, gerencial, técnica e social(11). Área pedagógica: a função pedagógica do professor em qualquer ambiente educacional é garantir que o processo educativo ocorra entre os alunos. No ambiente virtual o professor torna-se um facilitador desse processo na condução do grupo de forma livre, autônoma, e estimulaos a explorar o material disponibilizado pelo curso. O tutor deve comentar sempre as mensagens enviadas pelos alunos, como também questioná-los visando ao estímulo para o pensamento crítico. Área gerencial: a função refere-se ao agendamento do curso, seu ritmo, objetivos traçados, elaboração de regras e à tomada de decisões(11). Sugere-se que no início do curso sejam enviados plano de ensino, diretrizes e o código de normas de comportamento que deve ser seguido. Área técnica: implica o conhecimento da tecnologia usada no desenvolvimento de suas atribuições como tutor. É preciso ter consciência do impacto que a EaD online tem na aprendizagem e facilitar a mudança de paradigma necessária ao aluno(10). Área social: a função social do professor online significa facilitação educacional. À distância se faz importante que o professor facilite e esteja aberto aos aspectos pessoais e sociais dos alunos(11). A função social pode ser um “estímulo às relações humanas, com a afirmação e o reconhecimento da contribuição dos alunos; isso inclui manter o grupo unido, ajudar de diferentes formas os participantes a trabalharem juntos por uma causa comum e oferecer aos alunos a possibilidade de desenvolver sua compreensão da coesão do grupo”. Nesse contexto, é importante a promoção de estratégia que facilite a aproximação dos alunos, bem como de trabalho em equipe(10). Enfim, acreditamos que ser tutor é ser um professor à distância, implicando inúmeras atividades que a docência demanda, e na modalidade à distância acrescenta-se o domínio das tecnologias. O estímulo às relações humanas é importante para que cada aluno se perceba no grupo, e perceba todos os integrantes desse grupo. Assim fica possível a criação de vínculo de fato, surgindo a cooperação, a responsabilização e o trabalho em equipe. Também é importante a motivação da coesão do grupo, bem como a participação no processo de crescimento individual. O tutor, além de possuir conhecimentos técnicos, domínio do conteúdo 45 e ferramentas tecnológicas, é um profissional que deverá estar sempre aberto a mudanças, elaborando com isso estratégias que venham a facilitar as atividades para os alunos. Trabalho de conclusão de curso Outro desafio foi a dificuldade percebida de forma geral nos alunos para a elaboração de textos científicos, pois a maioria não vivencia essa experiência. A duração do curso – 10 meses – é fator dificultador para o alcance das competências necessárias para a realização do trabalho científico. Contudo o curso não tem esse objetivo específico, mas sim contribuir para a formação docente. Perante a dificuldade na elaboração do TCC, foram discutidos no Niad vários tópicos relacionados ao trabalho final: dificuldades para a pesquisa, efetividade do TCC, avanços dos alunos, temas dos TCCs e desafios para os tutores na orientação. Dificuldade para a pesquisa ParaaelaboraçãodoTCCénecessáriaautilizaçãodosprincípiosdapesquisa científica. Existem muitas modalidades de pesquisa, e a classificação das mesmas pode ser com base em seus objetivos e nos procedimentos técnicos adotados. A classificação com base nos objetivos divide-se em três grandes grupos: pesquisas exploratórias, pesquisas descritivas e pesquisas explicativas. A classificação com base nos procedimentos técnicos adotados (pois, para analisar os fatos do ponto de vista empírico, para confrontar a visão teórica com os dados da realidade, é necessário traçar o modelo conceitual e também o operatório) pode ser pesquisa bibliográfica, pesquisa documental, pesquisa experimental, pesquisa ex-pos-facto, levantamento, estudo de caso e pesquisaação(12). A esta classificação pode ser acrescentada a classificação com destaque para a caracterização das pesquisas segundo as fontes de informação, ou seja, pesquisa de campo, pesquisa de laboratório e pesquisa bibliográfica(13). O tempo de duração do curso parece ser um fator dificultador no alcance das competências necessárias para maior embasamento científico nos TCCs; também restringe determinados tipos de pesquisa, que demandam o trâmite do comitê de ética, uma coleta maior de dados, análises estatísticas, dentre outros. No entanto, mesmo considerando não ser o objetivo do curso o desenvolvimento da competência científica, reconhece-se a importância da reflexão na elaboração do trabalho de conclusão do curso, na aquisição de conhecimento nessa oportunidade, uma vez que muitas vezes o profissional 46 que não pertence à academia acaba ficando distante das questões teóricas. A utilização de pesquisa é relevante nas atividades cotidianas, pois há possibilidade de maior compreensão da realidade e consequentemente maior embasamento teórico nas atividades práticas. O TCC é um produto resultante das atividades de pesquisa e de reflexão; deve atender às normas e às exigências, para que seja garantida a validade do seu conteúdo. Efetividade do TCC O TCC é de grande importância para a elaboração de estratégias de trabalho diário. Por meio dele o discente poderá ser capaz de identificar os problemas que possam estar dificultando o trabalho a ser desenvolvido, buscando com isso um melhor entendimento para que as estratégias sejam revistas e/ou elaboradas. A grande dificuldade apresentada no decorrer do curso foi exatamente a falta de afinidade e conhecimento relacionado à pesquisa. Um curso efetivo deve aprimorar a base de conhecimento de um aluno, alterar seu comportamento ou ainda ser uma conjunção de ambos. A efetividade diz respeito à capacidade de se promover resultados pretendidos. Ao se analisar a efetividade da construção do TCC, pode-se observar que é um processo de amadurecimento científico que precisa ser construído. Para que se possa atingir esse degrau, é necessária a contribuição e a experiência do tutor para nortear o desenvolvimento do estudo. Temas dos TCCs O tema a ser escolhido teve ser um assunto com o qual o aluno possua afinidade e deve ser procurado por meio de perguntas. Uma grande dúvida deve ser o início de um trabalho acadêmico. Algo que não foi respondido ainda, que esteja diretamente relacionado à área do curso escolhido que ainda tenha algo escondido dos pesquisadores. A abrangência do tema é uma questão delicada, quando se trata de defini-lo. Outro ponto que deve ser observado é relacionar teoria e práxis. Pensar conceitualmente e realidade empírica só têm sentido um com o outro. O tema é uma área de conhecimento ou um aspecto de uma área de conhecimento que se deseja investigar e desenvolver. É a área na qual se vai trabalhar, não é objetivo(14). Para a elaboração do TCC os alunos receberam orientação de seu tutor, e conforme manual de orientação do curso, o foco do trabalho deveria estar relacionado ao significado social da ação educativa na formação dos 47 trabalhadores do SUS. Considerando o tempo do curso e as implicações éticas, conforme a classificação com base nos procedimentos técnicos adotados para o desenvolvimento da pesquisa, os TCCs do Niad–Botucatu constituíram-se em pesquisa bibliográfica. A pesquisa bibliográfica refere-se à pesquisa elaborada a partir de documentos já publicados, encontrados por fontes impressas, isto é, livros, artigos de periódicos e por fontes digitais, sendo estas por meio de material disponibilizado na internet. As orientações seguiram os passos: 1. Listar os periódicos (incluindo os gerais) e eventos relevantes para o tema de pesquisa. 2. Obter uma lista dos artigos publicados nesses veículos nos últimos cinco (ou mais) anos. 3. Selecionar os artigos que tenham relação com o tema de pesquisa. 4. Ler o resumo (abstract) desses artigos e classificá-los por sua relevância (alta, média ou baixa). 5. Ler os artigos de alta relevância e fazer fichas de leitura. Anotar também referências relevantes mencionadas nesses artigos que pareçam relevantes para o trabalho de pesquisa. 6. Dependendo do caso, ler também os artigos de relevância média ou baixa. 7. Decidir se já há material suficiente para a elaboração de uma ideia de pesquisa consistente. Se não houver, expandir a pesquisa, examinando artigos mais antigos (expansão do passo 2) ou ampliando o leque de periódicos e eventos considerados (expansão do passo 1)(14). Desafios do orientador A demanda dos trabalhos e o tempo a ser realizada e concluída a pesquisa tornam-se um grande desafio para o orientador, ao passo que o mesmo deve possuir argumentos suficientes para estimular o aluno à pesquisa, haja vista que a maioria não tem experiência com tal prática. Em relação ao cruzamento do trabalho pedagógico com o organizacional, quando o espaço profissional é invadido pelo espaço institucional mais amplo é possível tecer alguns comentários. A capacitação didático-pedagógica específica e a possibilidade de participação em estratégias visam ao desenvolvimento do papel profissional e devem ser desenvolvidas pelos orientadores. Dados 48 os pressupostos das abordagens referidas aos orientadores, a postura ética de busca constante da autonomia como preâmbulo básico no processo de construção de saberes é imprescindível. CONSIDERAÇÕES FINAIS O exercício da função do tutor deve ser valorizado, uma vez que a atividade promove um grande desenvolvimento profissional e pessoal e pode ocorrer quando se assume a posição de formador. Uma política de formação continuada dos docentes, que envolva ação-reflexão-ação, ou seja, a efetiva relação teoria e prática, faz-se necessária para que ocorra um avanço na construção da gestão democrática e na qualidade do processo de ensinoaprendizagem, qualquer que seja a modalidade do ensino, presencial ou à distância. Ter participado dessa experiência possibilitou a construção de novos conhecimentos no que se refere ao exercício da tutoria e contribuiu para a continuidade e o fortalecimento da parceria entre as instituições, o que vem ao encontro da ideologia da instituição de ensino superior, de ir para além dos muros da universidade. Esta é uma função social, cuja parceria viabilizou essa ideologia. Esse curso tornou possível a realização de uma especialização com o objetivo de desenvolvimento de competências importantes para o papel docente, com destaque à responsabilidade na formação de trabalhadores do SUS. REFERÊNCIAS 1. MININNI-MEDINA, N.; LUZZI, D.; LUSWARGHI, D. A educação a distância no contexto iberoamericano. São Paulo: ABED, [200-]. Disponível em: <http://www2.abed.org.br/ visualizaDocumento.asp?Documento_ID=4>. Acesso em: 5 maio 2011. 2. POZO, J. I. A sociedade da aprendizagem e o desafio de converter informação em conhecimento. In: TECNOLOGIAS na educação: ensinando e aprendendo com as TIC. 2 mar. 2009. Disponível em: <http://cursoproinfo100h.blogspot.com/2009/03/sociedade-da-aprendizagem-e-o-desafio. html>. Acesso em: 21 jun. 2011. 3. CARVALHO, A. B. A educação a distância e a democratização do conhecimento. In: CARVALHO, A. B. (Org.). Educação a distância. 22. ed. Campina Grande: UEPB, 2006. p. 47-58. 4. SANTOS, H. Qualificação de gestores do SUS: caderno do aluno. Rio de Janeiro: Fiocruz/ ENSP/EaD, 2009. 5. BELLONI, M. L. Educação a distancia. Campinas: Autores associados, 1999. 6. SANTOS, A. R. Metodologia científica: a construção do conhecimento. Rio de Janeiro: DP&A, 1999. 49 7. SANTOS, J.; PARRA FILHO, D. Metodologia científica. São Paulo: Futura, 1988. 8. JAEGER, F. P.; ACCORSSI, A. Tutoria em educação à distância. São Paulo: ABED, [200-]. Disponível em: <http://www2.abed.org.br/visualizaDocumento.asp?Documento_ID=86>. Acesso em: 21 jun. 2011. 9. SÁ, I. M. A. Educação a distância: processo contínuo de inclusão social.Fortaleza: C.E.C., 1998. 10. MACHADO, L. D.; MACHADO, E. C. O papel da tutoria em ambiente de EaD. São Paulo: ABED, 2004. Disponível em: <http://www.abed.org.br/congresso2004/por/htm/022-TC-A2. htm>. Acesso em: 21 jun. 2011. 11. PALLOFF, R.; PRATT, K. Construindo comunidades de aprendizagem no ciberespaço. Porto Alegre: Artmed, 2002. 12. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1994. 13. SANTOS, A. R. Metodologia científica: a construção do conhecimento. Rio de Janeiro: DP&A, 1999. 14, WAZLAWICK, R. S. Metodologia de pesquisa para ciência da computação. [S.l.]: Elsevier, 2009. 50 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: PERFIL DO ALUNO-DOCENTE NO NIAD-UFSCar Wilson José Alves Pedro Eliete Maria Scarfon Ruggiero Marildy Aparecida de Freitas Monika Wernet Rosely Morales de Figueiredo Giselle Dupas 1 Resumo O presente artigo relata aspectos da experiência das atividades de tutoria em educação a distância de um grupo de docentes vinculados ao Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente da Universidade Federal de São Carlos (Niad–São Carlos), junto ao Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. Com a participação na formação das três turmas realizadas no período 2009-2011, com atividades presenciais nas cidades de São Carlos e São Paulo, sistematiza-se alguns aspectos das dimensões objetivas e subjetivas, postos na interação dos atores envolvidos e na práxis das relações ensino-aprendizagem. Descritores: Educação a distância. Tutoria. Saúde. INTRODUÇÃO “Como processo de conhecimento, formação política, manifestação ética, procura de boniteza, capacitação científica e técnica, a educação é uma prática indispensável aos seres humanos e deles específica na História como movimento, como luta”. Paulo Freire A vivência, ora relatada pelos autores do presente texto, um grupo de docentes vinculados ao Departamento de Enfermagem – Cursos de Graduação em Enfermagem e em Gerontologia, da Universidade Federal de São Carlos 1. Tutores do Niad–UFSCar e docentes do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). 51 (UFSCar), se inicia com o interesse comum em participar do processo de seleção de tutores para o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com a Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), em setembro de 2009. A inserção da Universidade Federal de São Carlos nesse projeto havia se consolidado recentemente, ao lado de outras instituições de ensino superior (IES) de excelência – Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Medicina de Rio Preto (Famerp), Faculdade de Medicina de Marília (Famema) e Universidade Estadual Paulista (Unesp); formadoras de recursos humanos para a Saúde. Mobilizado, esse grupo de docentes passou a dialogar intensamente sobre o projeto, os objetivos e as demandas da educação a distância (EaD). Algumas das pessoas já traziam consigo outras experiências prévias na área de EaD, mas essa proposta demonstrava um caráter inovador. Os objetivos do curso estavam sintonizados diretamente com a formação e as ações dos envolvidos: trabalhar na formação docente de profissionais que atuam na educação profissional técnica na área da Saúde, por meio de uma metodologia inovadora – EaD, e com uma orientação pautada na educação crítica e socialmente significativa, visando incorporar os valores e princípios da Reforma Sanitária como marcos conceituais, adotando a história das lutas sociais por saúde no Brasil, como eixo de sustentação da estrutura curricular (FIOCRUZ, 2009). Diante do proposto, quem se candidataria? Quem teria disponibilidade? Os pressupostos do curso são básicos para todos nós que atuamos na área da Saúde. Paulatinamente as pessoas se manifestaram e encaminharam as demandas do edital. O grupo foi se compondo, visando à integração de formações e experiências interdisciplinares. À medida que os resultados das etapas do edital eram divulgados, as pessoas individualmente reafirmavam o interesse, e assim teve início a experiência do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente, denominado Niad–UFSCar. Há de se observar que as trajetórias acadêmicas e profissionais das pessoas envolvidas nesse projeto, apesar das especificidades das áreas – família, criança, mulher, homem, pessoa idosa –, gradativamente foram reveladoras de pontos comuns: engajamento, maturidade, responsabilidade social em educação profissional em Saúde atrelada a uma intensa vontade de engajamento em um novo universo: a educação a distância. Nos encontros desse grupo também se tornou cada vez mais presente o desejo de compreender e mediar as ações pedagógicas em Saúde com o uso das 52 novas tecnologias da aprendizagem: como se dá na prática? É possível? Quais os desafios? Quais os aspectos favoráveis e desfavoráveis? Para nós educadores(as) é pressuposto básico que o processo ensinoaprendizagem tenha na interação social a sua centralidade. Tal como Giddens (2005, p. 569) nos coloca: “interação social é qualquer forma de encontro social entre indivíduos. A interação social, de um tipo ou de outro, compõe a maior parte de nossa vida”. Mas como se dá este processo em EaD nesse curso? Apesar de algumas experiências prévias em EaD, o projeto tem uma delimitação e especificidade: para que e para quem formar? Formação crítica? Como realizar? As etapas da seleção de tutores foram se consolidando – ora a distância, ora presencialmente, e na interação muitas dessas questões foram plenamente respondidas, outras tantas novas perguntas (re)formuladas. Hoje, o Niad–UFSCar está em pleno funcionamento, com atividades presenciais nas cidades de São Carlos e São Paulo. Do ponto de vista da equipe, conta com uma coordenação, quatro tutores (já fomos seis) e uma bolsista de apoio administrativo. Desde 2009 o Niad–UFSCar tem participado das três turmas do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, totalizando 11 grupos (sendo quatro grupos na Turma 1, três grupos na Turma 2 e quatro grupos na Turma 3). Dois destes grupos aconteceram na cidade de São Paulo. Nesse sentido o que se apresenta neste artigo é uma breve sistematização da vivência do Niad–UFSCar nas atividades de tutoria do curso, acreditando que esta é uma história recente, que merece ser compartilhada para que possamos (res)significar e avançar cautelosamente nas demandas da educação a distância, em especial no contexto da Saúde. Gostaríamos ainda de observar que o presente relato tem uma aderência à longa experiência que a UFSCar possui na integração das atividades de ensino-pesquisa-extensão. De modo particular a educação a distância na UFSCar tem ocupado a pauta no Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS, 2004, p. 27), e desde 2007 integra o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) de educação a distância – pública, gratuita e de qualidade – para estudantes que por algum motivo não possuem condições de frequentar aulas presenciais. Assim, os propósitos de um Niad que visa à formação de especialistas para a atividade docente na área técnica em Saúde é sem dúvida uma oportunidade e mais um empreendimento de democratização e inclusão social na promoção da saúde e da cidadania. 53 Sobre a proposta do curso de formação docente em educação profissional técnica na área da Saúde Para uma melhor compreensão da proposta do curso consideramos que é necessário o resgate de elementos da história da educação profissional em Saúde no Brasil, perpassando aspectos jurídicos e políticos dessa temática, sem a pretensão de esgotá-la. Apesar da vasta produção bibliográfica sobre a temática, mas coerentes com as concepções pedagógicas histórico-críticas com as quais temos nos identificado e atuado, consideramos imprescindível delinear aspectos relevantes para promover uma melhor reflexão e interação com o leitor. São questões complexas, históricas e conceituais sobre saúde, educação e trabalho, que remontam ao final da primeira década do século XX e atingem os contornos da contemporaneidade, desafiando-nos hoje em nossas ações, em especial na formação de recursos humanos para a área da Saúde, particularmente no projeto ora relatado. Segundo Pereira e Lima (2009), a educação profissional em Saúde foi regulamentada no Brasil através da Lei 4.024/61, sendo o ensino técnico organizado até então baseado nas Leis Orgânicas de Ensino, promulgadas no Estado Novo. Apesar de tratar especificamente de quadros profissionais voltados para indústria, comércio, agricultura e formação de professores, na década de 1940 a legislação educacional para a área de Enfermagem, por exemplo, regulou a formação técnica dos práticos em Enfermagem pelo Decreto Lei 8.778/1946, e Lei 775/1949, dos auxiliares de Enfermagem. Na segunda metade da década de 1960 e regulamentada pela Lei 5.692/1971, que reformulou o ensino de primeiro e segundo graus no Brasil, é que a educação profissional na área de Saúde vai assumindo seus delineamentos e contornos. São conhecidas, e não se podem perder de vista, as mudanças conjunturais – sociais, econômicas, jurídicas e políticas – da sociedade brasileira, com a ampliação de postos de trabalhos para a emergente categoria de profissionais de Saúde nas décadas de 1960, 1970 e 1980, bem como as consequências dos movimentos sociais de luta, organização e reivindicações da sociedade civil e das próprias categorias profissionais e sindicais, que materializaram a Reforma Sanitária, hoje um marco conceitual da história das lutas sociais pela Saúde no Brasil, que nesta reflexão merece menção.) Além disso, também merecem destaque as dimensões políticoideológicas que impactaram diretamente na formação dos profissionais da área de Enfermagem, em especial no nível técnico, pautadas em uma 54 concepção tecnicista de educação profissional. Segundo Pereira e Lima (2009, p. 184 apud PEREIRA; RAMOS, 2006), essas dimensões político-ideológicas contribuem para “naturalizar as ações feitas pelos trabalhadores técnicos em saúde: reduzir a formação profissional a meros treinamentos, conformar os trabalhadores à divisão técnica do trabalho em saúde; manter a hegemonia do ideário cientificista na área; incentivar a crença nas técnicas pedagógicas como instrumento para resolver problemas da formação técnica e de saúde da população; estabelecer análises lineares e imediatas entre educação e mercado de trabalho em saúde, de modo a adequar a formação às necessidades desse mercado, reduzindo o ensino às tarefas dos postos de trabalho. Contribui, em síntese, para adaptação e conformação dos trabalhadores ao existente, numa perspectiva economicista, instrumentalista, pragmática e moralizadora”. Nesse contexto o Brasil transita do período da ditadura militar para os avanços da democracia. Concomitantemente às transformações do mundo do trabalho, da saúde e da educação, recebem também forte impacto os avanços das novas tecnologias, tendo ainda na década de 1990 uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996) que consolida importantes desdobramentos na educação brasileira e na formação profissional técnica em Saúde. Do ponto de vista legal “a educação profissional em saúde compreende a formação inicial ou continuada, a formação técnica média e a formação tecnológica superior. Ela pode ser realizada em serviços de saúde (formação inicial continuada) e em instituições de ensino (formação inicial ou continuada, formação técnica e tecnológica). A formação técnica compreende as formas de ensino integrado, concomitante ou subsequente ao ensino médio. Tanto a formação técnica como a formação tecnológica se organiza atualmente em doze subáreas de formação em saúde, conforme Referenciais Curriculares Nacionais da área (BRASIL, 2000). São elas: biodiagnóstico, enfermagem, estética, farmácia, hemoterapia, nutrição e dietética, radiologia e diagnóstico por imagem, reabilitação, saúde bucal, saúde visual, segurança do trabalho e vigilância sanitária. A área profissional na saúde diz respeito às ações integradas referentes às ações individuais e coletivas, com base em modelo que ultrapasse a ênfase na assistência médico-hospitalar”(PEREIRA; LIMA, 2009, p. 187-188) Nesse macro contexto o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde foi engendrado. Sua principal referência é a compreensão coletiva do “significado social da ação educativa no âmbito da saúde pública”, visando à promoção de cursos de pós-graduação lato sensu para profissionais graduados na área da Saúde: assistentes sociais, biólogos, 55 biomédicos, enfermeiros, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, médicos, médicos veterinários, nutricionistas, odontólogos, psicólogos e terapeutas ocupacionais. Para realizarem seus estudos, os profissionais deverão estar integrados a instituições que qualificam trabalhadores do Sistema Único de Saúde em nível médio, ou seja, precisam estar vinculados a uma instituição credenciada de educação profissional e devem estar atuando como docentes, instrutores, supervisores de estágio ou de práticas nos diferentes espaços de formação em Saúde (BOMFIM, 2009a). Através das diretrizes do curso constata-se que um dos maiores desafios é transcender a educação profissional predominantemente tecnicista, e ter docentes também profissionais de Saúde, “comprometidos com a transformação das práticas atuais em saúde e educação” (BOMFIM, 2009a, p.14). Os objetivos do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde são assim apresentados (BOMFIM, 2009a, p. 14): Oferecer elementos essenciais à formação dos alunos-docentes das diferentes categorias profissionais envolvidas, na educação profissional técnica em nível médio, tendo como referência central o significado social da ação educativa, no âmbito do SUS. Propiciar aos alunos-docentes os requisitos necessários à compreensão ampla e crítica da realidade na qual se inscrevem as práticas de saúde e em educação, condição fundamental à participação ativa no processo ensinoaprendizagem e à atuação crítica nas lutas coletivas pela transformação dessa mesma realidade. Desenvolver uma formação docente teórico-prática consistente para a adoção de uma ação docente crítica e emancipada, que possibilite ao coletivo de professores escolher e desenvolver, com autonomia social e ética, formas melhores de atuação, com base nas necessidades de saúde das pessoas e das populações. Quanto ao desenvolvimento do curso, apesar da característica prioritária – ser de ensino a distância – há momentos presenciais, com o apoio pedagógico do Niad. As práticas educativas a distância ocorrem não apenas no ambiente virtual de aprendizagem (onde o material pedagógico básico e complementar está disponibilizado; salas de bate-papo chats, fóruns, encaminhamento e correção das atividades de articulação e afins), mas também com a utilização de material didático impresso, com a realização de oito atividades de articulação com fins investigativos, reflexivo-dialógicos e proposição de práticas educativas; sugestões de estudos complementares e realização de 56 trabalhos de conclusão de curso (TCC). Os encontros presenciais acontecem em número de quatro (4) e duas (2) oficinas de apoio à realização do TCC, onde, mediante planejamento integrado no Niad, os tutores sistematizam estratégias e prioridades de cada encontro, visando apreender de modo abrangente e profundo as Unidades de cada um dos Complexos Temáticos (CTs). O curso tem duração de dez meses e carga horária de 540 horas. Para nós, o grande diferencial, entretanto, está na concepção pedagógica que alicerça a proposta explicitada do curso, em indicações político-pedagógicas pautadas nas ideias de Paulo Freire e Demerval Saviani, que, consequentemente, norteiam todo o processo de ensino-aprendizagem por meio de estratégias de educação permanente de formação de tutores e de qualificação dos próprios especializandos, visando fomentar e disseminar a prática docente significativa na área da Saúde. Os três CTs que alicerçam o curso estão estruturados nas seguintes temáticas: • CT1 – Trabalho, saúde e educação; • CT2 – O SUS e os processos de trabalho em saúde; • CT3 – A organização pedagógica do trabalho docente em saúde. É claro que o recorte ora esboçado articula aspectos da proposta do curso por nós considerados relevantes e que em nosso entender são avanços extremamente significativos no âmbito político-pedagógico de formação de recursos humanos para a Saúde, e que integram nosso cotidiano e empreendimentos na UFSCar. Para nós, o caráter inovador desse projeto foi a possibilidade de articulação da parceria com a Ensp, a Fiocruz e a Fundap; a coparticipação em uma meta de formar mil especialistas na área da Saúde com a expertise de outras instituições parceiras, com amplo reconhecimento internacional; a oportunidade de potencializar a educação a distância na área da Saúde; mas, principalmente, a continuidade da necessária “luta pelo SUS”, com atores sociais comprometidos com a transformação das práticas atuais em saúde e educação, com tecnologias inovadoras. Hoje, revisando esse processo, a palavra que talvez melhor traduza a experiência ora relatada é práxis. Na acepção da palavra, encontra-se que “práxis é ação, em contraste direto com a teoria”. É mais ação sobre o que fazemos do que sobre o que pensamos. Johnson afirma que “Marx utilizou o termo para referir-se a toda ação intencional, ao processo criativo através do qual pessoas trabalham, produzem bens e agem umas sobre as outras e sobre 57 o mundo. É a práxis, argumentava Marx, que está no âmago da existência humana, e o que pensamos é importante apenas na medida em que molda e dá objetivo à ação” (JOHNSON, 1997, p. 180) É nessa perspectiva – dar objetivo à ação – que avançamos no compartilhamento das concepções de tutoria e das experiências do Niad– UFSCar. Da concepção de tutoria à práxis no Niad–UFSCar: desafios de tornar-se tutor(a) Compartilhar a nossa práxis implica revisar brevemente a concepção histórica de tutoria; a proposição da Ensp é a partir disso discorrer sobre a nossa experiência. Não se pode perder de vista que as atividades da tutoria, para nós, Niad–UFSCar, se dão no entrecruzamento de duas complexas frentes: a formação de recursos humanos em Saúde e a educação mediada por novas tecnologias. Há de se observar ainda que as atividades de tutoria, ao lado de outras atividades características da educação em saúde – preceptoria, supervisão, mentoring – têm sido amplamente disseminadas, com especificidades e complementaridades, visando a uma melhor qualificação dos profissionais que atuam na Saúde. Na modalidade de ensino a distância, os termos “tutoria” e “tutor” também são empregados, caracterizando respectivamente o processo ou aquele que media ou facilita a construção de conhecimentos, promovendo interações entre os diversos atores sociais constitutivos das relações ensino-aprendizagem e das mediações pedagógicas. Botti e Rego (2008), ao analisarem o contexto da educação em saúde, afirmam que os significados das diferentes denominações – “tutor”, “preceptor”, “supervisor”, “mentor” não ficam claros nos documentos oficiais quanto a funções, intervenções e atividades, demandando assim esforços das regulações e práticas de ensino-aprendizagem na graduação e pós-graduação em Saúde. Os mesmos autores analisam o termo “tutor”: palavra de origem latina tutor, oris, termo utilizado no direito romano designando “aquele que se encarregava de cuidar de um incapaz” (como um órfão, por exemplo). Na língua portuguesa a palavra “já era usada no século XIII e tinha o significado de guarda, protetor, defensor, curador; significa também aquele que mantém outras pessoas sob sua vista, que olha, encara, examina, observa e considera; é o que tem função de amparar, proteger e defender, é o guardião, ou aquele que 58 dirige e governa” (BOTTI; REGO, 2008, p. 367). Para os ingleses, “tutor” pode significar um professor para pequenos grupos, que presta atenção especial para esses alunos, podendo significar ainda “um professor para adultos ou com papel especial na escola”. Apontam ainda que, na agricultura, o tutor é uma designação para uma “estaca que ampara uma planta frágil durante seu crescimento”. Na história do Brasil, José Bonifácio de Andrada e Silva assumiu importante papel, quando nomeado para cuidar da formação de Dom Pedro II, quando o Imperador Dom Pedro I abdicou do trono e regressou para a Europa. Mas é nos contextos educacionais e por extensão nas literaturas americana e europeia que o termo “tutor” designa o professor que se preocupa em ensinar o estudante a “aprender a aprender”. O tutor é considerado um “guia” e/ou um “facilitador” que auxilia nos processos de ensino-aprendizagem centrados no estudante. No sistema universitário do Reino Unido, as atividades de tutoria passam a assumir características específicas para ensinar e orientar estudantes. Tendo por objetivo “zelar pelo cumprimento do programa do curso, além de buscar as metas pessoais do aluno”, o tutor “orienta, ensina, ajuda na busca de conhecimento e tem também um papel importante como avaliador”. Nos anos de 1960 (vigorando até os anos 1990), surge o conceito e uma prática do “tutor clínico”, em Centros de Pesquisas do Reino Unido. O título era conferido ao “profissional que tem a função de coordenar e desenvolver o programa educacional desses centros, identificando as necessidades de treinamento dos alunos, assegurando uma boa aprendizagem, organizando a estrutura da pósgraduação e cuidando da qualidade e da atualização dos professores” (BOTTI; REGO, 2008, p. 367). Hoje, a tutoria tem sido amplamente disseminada em várias áreas, e na Saúde de modo bastante particular. Uma das concepções mais hegemônicas do termo é: “aquele que orienta a formação de profissionais já graduados e que atuam no sistema de saúde. É a aprendizagem que acontece em ambientes de atenção primária” (BOTTI; REGO, 2008, p. 367). Considerando-se as especificidades e particularidades da tutoria, pode-se aproximar a proposta do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde deste cenário ora esboçado. O efetivo exercício da tutoria contempla o domínio de conteúdos, a identificação com concepções pedagógicas e o domínio da plataforma. Visa ao atendimento individual a cada aluno-docente, cujas interações a distância se dão por meio do uso de correio postal e eletrônico, telefone, fax e também, 59 presencialmente, conforme cronograma e agenda. De acordo com as diretrizes do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, os(as) tutores(as) do curso têm as seguintes atribuições: • assumir integralmente o apoio ao processo de aprendizagem dos alunos-docentes, tendo como referência que a saúde é construção social e histórica e expressa valores em disputa; • identificar as diferenças entre as trajetórias de seus alunos-docentes, respeitando ritmos próprios, valorizando conquistas, procurando integrá-los e ajudando-os a enfrentar os desafios que o curso impõe na busca de uma aprendizagem significativa fundada na discussão dos processos de trabalho em Saúde e Educação; • desenvolver procedimentos que garantam a interação e a comunicação mediatizada com os alunos-docentes, com ênfase no diálogo, com base nos valores e princípios da Reforma Sanitária, tendo em vista o desafio de tornar o SUS pleno; • avaliar o percurso de cada aluno-docente do curso, a partir do compromisso ético com o seu progresso e com o significado social da ação docente em saúde; • analisar, selecionar e fazer uso de outras tecnologias, além das previstas para o curso, que possam complementar o processo de formação do aluno-docente, na busca de um novo pensar, sentir e agir em educação em saúde (FIOCRUZ, 2009, p. 24-25) À medida que nos engajávamos no projeto do curso, fomos incorporando cada uma dessas atribuições. É certo que muitas inquietações se manifestavam: como poderemos consolidar tais objetivos e vivenciar essas atribuições em nosso contexto de trabalho? Qual o processo de trabalho? Como se dará? Educação a distância é de fato viável para uma aprendizagem significativa? Quais recursos e estratégias de mediação pedagógica são mais adequados e estão disponíveis para nós e para os alunos-docentes? Os questionamentos e propósitos nos mobilizavam e desencadearam reflexões, afinal tratava-se de um projeto que sintetizava várias das instâncias conceituais, históricas, jurídico-políticas, dentre outras, de formação de recursos humanos para o SUS. Tais reflexões hoje revisitadas nos remetem a vários conceitos-chave no processo formativo. Mas é na reflexão sobre a nossa práxis que vamos avançar no presente relato. 60 O termo práxis deriva do grego prattein, agir. “Prática ou conjunto de práticas, que, em Marx, permitem que o homem transforme a natureza por intermédio de seu trabalho transformando-se a si mesmo numa relação dialética” (DUROZOI; ROUSSEL, 1993, p. 377) Na acepção da palavra práxis, encontra-se que “práxis é ação, em contraste direto com a teoria”. É mais ação sobre o que fazemos, do que sobre o que pensamos. Johnson afirma que “Marx utilizou o termo para referirse a toda ação intencional, ao processo criativo através do qual pessoas trabalham, produzem bens e agem umas sobre as outras e sobre o mundo. É a práxis, argumentava Marx, que está no âmago da existência humana, e o que pensamos é importante apenas na medida em que molda e dá objetivo à ação” (JOHNSON, 1997, p. 180). No marxismo a teoria e prática são inseparáveis. Durozoi e Roussel (1993) sintetizam: “os verdadeiros problemas que se colocam ao homem são de ordem prática, e todas as teorias encontram a explicação na práxis humana”. A sistematização e a consolidação da proposta do Niad–UFSCar eram de ordem prática. Como transformar, portanto, os objetivos em ação? Foi então por intermédio da construção de uma agenda coletiva, com encontros semanais, a partir do início das atividades de formação pedagógica em EaD promovidas pela Ensp que os integrantes do Niad iniciaram a discussão de estratégias a serem desenvolvidas para as mediações a distancia, bem como para os encontros presenciais. Todo o conteúdo pedagógico do curso estava sistematizado nos três Complexos Temáticos. As atividades de articulação e as diretrizes do trabalho de conclusão de curso estavam também claras e precisas. Com a identificação das turmas dos alunos-docentes, era preciso agir. A primeira ação foi planejar como sensibilizar os participantes a respeito das vantagens e dos desafios desse curso. Mas concomitantemente era preciso romper com mitos e estigmas da educação a distância, estabelecer vínculos e pactuar estratégias. O primeiro encontro presencial foi muito importante para o acolhimento e o comprometimento do grupo. Mas a promoção da ambientação da plataforma também. Desde a primeira turma, os tutores do Niad–UFSCar têm planejado coletivamente, passo a passo, a integração da turma e as estratégias a serem viabilizadas em cada encontro presencial e nas mediações a distância. O acolhimento, a integração da turma, o levantamento de informações e o perfil dos alunos-docentes, a sintonia com os primeiros conteúdos que seriam trabalhados, a visão panorâmica do curso são aspectos imprescindíveis para 61 a sua viabilização. Fóruns, chats, exercícios e atividades complementares, recomendações, via de regra, são objetos de discussão e análise dos tutores, nas reuniões semanais. Não poderíamos deixar de registrar que também entre os rápidos encontros nos corredores do Departamento de Enfermagem e o cafezinho necessário, a expectativa: “como trabalhar isso tudo no próximo encontro?”; “O que você está pensando?”; o que fazer? como fazer? “Olha, eu acho que...” É importante registrar que os pactos necessários para a educação a distância foram também compartilhados e sistematizados pelos tutores do Niad. Desde a importância da observância da frequência de acesso à plataforma, dos prazos, da participação nos fóruns e chats, até aspectos mais específicos dos encontros presenciais, bem como o processo de avaliação formativa do alunodocente e critérios dessa avaliação foram analisados e consensuados, fazendo do Niad um espaço de interação, diálogo e compartilhamento. Apesar de tempos diferentes – a equipe tem composições distintas para cada uma das três turmas e consequentemente para todo o processo de capacitação –, as estratégias compartilhadas têm proporcionado uma experiência processual e uma aprendizagem significativa para os envolvidos. Os “cuidados pedagógicos” problematizados nas reflexões da organização pedagógica do trabalho docente em Saúde também são objeto de preocupação em nosso Niad. Tal como é expressa no CT3, “a `boniteza’, para usar uma expressão de Paulo Freire, do trabalho docente está exatamente na capacidade de compreender cada um dos nossos alunos-trabalhadores, na sua singularidade e em sua totalidade, de reconhecer que a educação e a saúde são práticas sociais construídas pelos homens e mulheres, que, portanto, podem ser transformadoras e que, para isso, será preciso agir com intencionalidade, sem improvisos” (BOMFIM, 2009d, p. 104). Outro destaque do Niad–UFSCar é que, considerando o caráter dialógico e reflexivo desse curso, foi sistematizado um projeto de pesquisa intitulado “Caracterização dos profissionais de Saúde que se utilizam do ensino a distância na sua formação”, cujos sujeitos da pesquisa são os alunos vinculados ao Niad–UFSCar, visando conhecer o perfil desses profissionais, a vinculação ao Sistema Único de Saúde e as condições de trabalho e acesso aos recursos tecnológicos de informação para a formação profissional (FIGUEIREDO et al., 2010) Há de se observar ainda que nesse processo, hoje em andamento na Turma 3, além do planejamento, a avaliação de ações, as estratégias e os resultados são também objetos de análise e busca de alternativas. 62 Certamente, não poderíamos deixar de considerar que o compartilhamento da experiência, tanto nos encontros formais da educação permanente, como nos espaços informais com os outros Niads e projetos similares (dentro e fora da universidade), são momentos importantíssimos para (res)significar a nossa ação. Outros tantos recortes poderão propiciar novas reflexões, papers e projetos de investigação sobre a prática docente, a educação em saúde e temas afins. Não se trata aqui de uma finalização de um relato de experiência com reflexões exclusivamente exitosas. Há vários aspectos e dimensões que merecem e podem ser analisados e aprimorados. Finalizamos aqui o presente relato, convictos de que nossas experiências e nossa práxis continuam em processo. Trouxemos o relato à tona, para compartilhar e – oxalá – avançar. Todos os esforços para consolidar a construção de condições objetivas e subjetivas para um SUS para valer continuam. Há um grande desafio à sociedade brasileira como um todo, e aos profissionais de Saúde de um modo particular. Compreender e agir é nossa meta. Sejamos tutores, docentes, alunos, profissionais engajados nos diversos contextos da Saúde, somos todos protagonistas e precisamos cada vez mais de formação adequada para a garantia dos direitos e dos deveres dos usuários da Saúde. Referências BOTTI, S. H. O.; REGO, S. Preceptor, supervisor, tutor e mentor: quais são seus papéis? Revista Brasileira de Educação Médica, Rio de Janeiro, v. 32, n. 3, p. 363-373, set. 2008. DUROZOI, G.; ROUSSEL, A. Dicionário de filosofia. Campinas: Papirus, 1993. BOMFIM, M. I. R. M. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: orientações. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Nacional de Saúde Publica Sergio Arouca/ Coordenação de Educação a Distância, 2009a. BOMFIM, M. I. R. M. e cols. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: trabalho, saúde e educação. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Nacional de Saúde Publica Sergio Arouca/Coordenação de Educação a Distância, 2009b. BOMFIM, M. I. R. M.e cols. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: o SUS e os processos de trabalho em saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Nacional de Saúde Publica Sergio Arouca/Coordenação de Educação a Distância, 2009c. BOMFIM, M. I. R. M. e cols. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: a organização pedagógica do trabalho docente em saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Nacional de Saúde Publica Sergio Arouca/Coordenação de Educação a Distância, 2009d. FIGUEIREDO, R. M. et al. Caracterização dos profissionais de saúde que se utilizam do ensino à distância na sua formação. São Carlos: UFSCar, 2010. Projeto de Pesquisa. Mimeografado. FIOCRUZ. Edital para seleção de tutores para o curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na área da saúde. Rio de janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública Sergio 63 Arouca/EaD, 18 set. 2009. Disponível em: <http://www.ead.fiocruz.br/editais/?id=888>. Acesso em: 17 jun. 2011. FIOCRUZ. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: caderno do aluno. 2. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Nacional de Saúde Publica Sergio Arouca/ Coordenação de Educação a Distância, 2010. GIDDENS, A. Sociologia. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2005. JOHNSON, A. G. Dicionário de sociologia: guia prático da linguagem sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1997. PEREIRA, I. B.; LIMA, J. C. F. Educação profissional em saúde. In: PEREIRA, I. B.; LIMA, J. C. F. (Org.). Dicionário da educação profissional em saúde. 2. ed. Rio de Janeiro: EPSJV, 2009. p. 182-189. PEREIRA, I. B.; RAMOS, M. N. Educação profissional em saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2006. (Coleção Temas em saúde). UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS. Plano de desenvolvimento institucional. São Carlos, 2004. 64 ENFRENTANDO O MITO DO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO JUNTO AOS ESPECIALIZANDOS – DOCENTES DO NÍVEL TÉCNICO Adriana Paula Congro Michelone1 Cláudia Mara de Melo Tavares2 Maria José Sanches Marin3 Mário do Carmo Martini Bernardo4 Silvia Franco da Rocha Tonhom5 Resumo O trabalho de conclusão de curso (TCC) ou trabalho monográfico se constitui atualmente como requisito parcial para conclusão de cursos de graduação ou de pós-graduação lato sensu. A construção do trabalho monográfico implica a utilização dos princípios da pesquisa científica e demanda a obtenção de conhecimento sobre um determinado assunto, na perspectiva de superação da percepção superficial e aparente do mundo que nos cerca. No entanto, ele se apresentava no Curso de Formação de Docente, oferecido pelo TecSaúde em parceria com a ENSP/Fiocruz, como um obstáculo a ser transposto, quer pela complexidade de execução, quer pelo sentimento de incapacidade e falta de condições para tal, tanto para aqueles que já tinham a vivência de realizá-lo, ao fim da graduação, como para os que se defrontavam com ele pela primeira vez. Assim, considerando a relevância da realização do trabalho de conclusão de curso na formação profissional e a necessidade da desmistificação dessa construção, o presente estudo propõe-se 1. Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela Universidade de São Paulo. Docente da Disciplina de Enfermagem Clínica da Faculdade de Medicina de Marília. Coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente do CFDEPTAS/EaDFiocruz, locado na Faculdade de Medicina de Marília. [email protected] 2. Enfermeira. Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora Titular da Escola de Enfermagem da Universidade Federal Fluminense (UFF). Orientadora de Aprendizagem do CFDEPTAS/EaD-Fiocruz. [email protected] 3. Enfermeira. Docente da Disciplina de Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina de Marília. Pós-Doutora em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Tutora do CFDEPTAS/EaD-Fiocruz. [email protected] 4. Médico. Docente da Disciplina de Pediatria da Faculdade de Medicina de Marília. Mestre em Pediatria pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Tutor do CFDEPTAS/EaD-Fiocruz. [email protected] 5. Enfermeira. Docente da Disciplina de Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina de Marília. Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Tutora do CFDEPTAS/EaD-Fiocruz. [email protected] 65 a descrever a trajetória do desenvolvimento dos trabalhos monográficos no Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, em nível de especialização, na modalidade a distância, com a finalidade de evidenciar uma trajetória possível. Descritores: formação docente, trabalhos de conclusão de curso, monografia, ensino técnico. Introdução O trabalho de conclusão de curso (TCC) ou trabalho monográfico se constitui atualmente como requisito parcial para conclusão de cursos de graduação ou de pós-graduação lato sensu. A construção do trabalho monográfico implica a utilização dos princípios da pesquisa científica e demanda a obtenção de conhecimento sobre um determinado assunto, na perspectiva de superação da percepção superficial e aparente do mundo que nos cerca. Busca-se, portanto, ultrapassar os fatos, desvelar processos, explicar e descrever, com consistência e plausividade, fenômenos a partir de determinado referencial (GIL, 1999). Embora existam muitas modalidades de pesquisa, as quais podem ser classificadas de acordo com a natureza (básica e aplicada), com a abordagem (qualitativa e quantitativa), os objetivos (exploratória, descritiva e explicativa), e o procedimento técnico (bibliográfica, documental, levantamento, experimental, estudo de caso, ex-post facto, pesquisa ação e pesquisa participante), todas elas seguem, para sua realização, o método científico (GIL, 1999). O método científico compreende as etapas: a) observação da realidade e análise crítica dos fatos; b) formulação de uma pergunta ou definição de um problema; c) formulação da hipótese, ou seja, sugerir uma resposta; d) experimentação; e) análise dos dados e conclusão, momento em que se aceita ou rejeita as hipóteses (GIL, 1999). Desta forma, realizar o trabalho monográfico como requisito parcial para obtenção do título de especialista possibilita, acima de tudo, uma prática profissional crítica, transformadora e constantemente acrescida de novos conhecimentos. Ao se utilizar o método científico nas atividades cotidianas é possível uma maior compreensão da realidade, devido à busca de respostas para as indagações que constantemente os profissionais se deparam na sua prática. Nesta perspectiva, Demo (2000, p. 34) considera a pesquisa como uma 66 atitude, um “questionamento sistemático, crítico e criativo, mais a intervenção competente na realidade, ou o diálogo crítico permanente com a realidade em sentido teórico e prático”. Indubitavelmente fazer um TCC representa uma condição relevante no processo de formação profissional; no entanto, também se configura como um desafio, por exigir um raciocínio lógico, além da perspectiva de acréscimos ao conhecimento, o que parece distante do cotidiano dos profissionais e estudantes. Para Baggio (2006), algumas vezes, a educação profissional coíbe a criatividade e a individualidade dos estudantes, por oferecer uma alternativa formal às necessidades e uma aquisição passiva de conhecimentos. No Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, que ora nos inserimos como tutores, observa-se que a condição de fator condicional para a aprovação imposta ao TCC já lhe imprime um caráter desafiador e bastante sentido pelos alunos. O trabalho de conclusão de curso se apresentava como um obstáculo a ser transposto, quer pela complexidade de execução, quer pelo sentimento de incapacidade e falta de condições para tal, tanto para aqueles que já tinham a vivência de realizá-lo, ao fim da graduação, como para os que se defrontavam com ele pela primeira vez. A sensação transmitida pelos alunos, portanto, era de estarem perante um grande desafio que, aliado à sensação de impotência, já os desanimava de saída. Diante dessa situação vem a pergunta: o TCC para os alunos ter-se-ia transformado em um mito? O dicionário Aurélio (FERREIRA, 1988) traz como significados da palavra “mito”: 1 - narrativa simbólica referente a deuses e/ou aspectos da condição humana. 2 - representação de fatos ou personagens reais, exagerada pela imaginação popular e/ou pela tradição. 3 - ideia falsa sem correspondente na realidade. 4 imagem simplificada de pessoa ou acontecimento, não raro ilusória, elaborada ou aceita pelos grupos humanos, e que representa significativo papel em seu comportamento. 5 - coisa irreal, utopia. O dicionário da língua inglesa American Heritage Dictionary (apud LILIENFELD et al., 2010) define mito como uma “crença popular (porém, falsa) ou uma narrativa associada a uma pessoa, instituição ou acontecimento” ou, ainda, “uma história fictícia ou meia-verdade, especialmente a que faz parte de uma ideologia”. Raoul Girardet, professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris, em seu livro Mitos e mitologias políticas (1987), apresenta na introdução do 67 mesmo a pluralidade de interpretações que cercam o termo – mito. Uma das interpretações ele vai buscar em Mircea Eliade, para quem o “mito conta uma história sagrada; relata um acontecimento no tempo imemorial, o tempo fabuloso dos começos”. O mito contaria “como uma realidade chegou à existência, quer seja uma realidade total, o cosmos, ou um fragmento: uma ilha, um comportamento humano, uma instituição”. Outra interpretação é que a noção de mito está “confundida com a de mistificação: ilusão, fantasma ou camuflagem”. Segundo Girardet (1987), o mito alteraria a observação experimental, contradizendo as regras do raciocínio lógico interpondo-se como uma tela entre a verdade dos fatos e as exigências do conhecimento. Por fim, a terceira consideração sobre mito o autor vai buscar em Georges Sorel, para quem o mito é essencialmente apreendido em sua função de animação criadora, ou seja, “o mito é um conjunto ligado de imagens motrizes”, que, segundo Sorel, tem a capacidade de apelar para um movimento, incitando à ação como um estimulador de energias de excepcional potência. Ao discutir o TCC nos cursos de especialização, é comum observar as reações de medo, preocupação e sentimento de incapacidade em realizá-los, dando a ideia da constituição de um mito em torno da atividade Acrescenta-se, no entanto, que, seguindo a analogia do “Mito da caverna” descrito por Platão, o crescimento seria um longo caminho que todos precisam percorrer para adquirir a necessária sabedoria. Para tanto, é preciso tolerar a ideia de que aquilo que está à nossa volta pode ser muito diferente do que imaginamos ou esperamos que seja (SIGNORELLI,2007). Considerando a relevância da realização do trabalho de conclusão de curso na formação profissional e a necessidade da desmistificação dessa construção, o presente estudo propõe-se a descrever a trajetória do desenvolvimento dos trabalhos monográficos no Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, em nível de especialização, na modalidade a distância, com a finalidade de evidenciar uma trajetória possível. Metodologia Trata-se de um estudo descritivo, o qual é considerado como forma de se obter um delineamento da realidade; possibilita descrever, registrar, analisar e interpretar a natureza atual ou o processo dos fenômenos (SANTOS; CLOS, 1998). 68 A experiência na orientação do TCC aconteceu, com os tutores da Faculdade de Medicina de Marília (Famema), no decorrer do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, na modalidade a distância, com momentos presenciais, executado pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), em parceria com seis instituições de ensino superior (IES) do Estado de São Paulo, com a finalidade de qualificar trabalhadores para o SUS (FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, 2009). As IES disponibilizam espaço físico para as atividades presenciais, bem como os recursos de informática e de biblioteca, constituindo os Núcleos Interdisciplinares de Apoio ao Docente (Niad). Destes núcleos, um encontrase sediado na Famema e atende à macrorregião da Diretoria Regional de Saúde (DRS) IX e XI. No curso em questão, buscam-se, a partir das condições e vivências da atividade docente, elementos para a reflexão crítica sobre o processo de trabalho, considerando o seu determinismo histórico, na perspectiva de identificar as fortalezas das ações cotidianas e as possibilidades de transformação da realidade. O Niad de Marília iniciou o curso com 40 especializandos e três tutores, com uma média de 12 estudantes/tutor, e a coordenadora do Núcleo assumiu o processo tutorial de quatro estudantes. As atividades foram desenvolvidas em um período de dez meses, seguindo um cronograma prévio e as orientações para o TCC tiveram início já no primeiro encontro presencial. RESULTADOS 1. Apresentando a proposta do TCC desenvolvida no Niad-Marília Conforme o Manual de Orientações do curso, o foco do TCC deve estar voltado para o significado social da ação educativa na formação dos trabalhadores do SUS em nível médio, uma vez que tal temática representa o eixo de ancoragem do curso. Apesar de ser um assunto amplo, deve ser explorado e transformado em um tema específico, original, relevante, que incorpore as produções realizadas no decorrer do curso e que contribua para a adoção de novas práticas de educação profissional na escola. Nesta perspectiva, é possível apresentar o trabalho de conclusão de curso em vários formatos, além da possibilidade da pluriautoria, o que valoriza a criatividade, a versatilidade, a construção coletiva, o compartilhamento das ideias e o planejamento das ações conjuntas. 69 Embora exista flexibilidade na proposta do TCC, o tempo de duração do curso e a disponibilidade do estudante para o mesmo inviabilizam, muitas vezes, alguns tipos de estudo, especialmente os trabalhos de campo que demandam o parecer de um Comitê de Pesquisa com Seres Humanos. Sendo assim, os tutores do Niad-Marília tiveram como foco a orientação de estudos na modalidade de revisão de literatura. O texto a seguir subsidiou as orientações dos tutores aos especializandos: A pesquisa bibliográfica é elaborada a partir de material já publicado, constituído principalmente de livros, artigos de periódicos e de material disponibilizado na internet (SILVA; MENEZES, 2005). É importante salientar, no entanto, que todo trabalho científico necessita de uma revisão da literatura, o que se refere à fundamentação teórica que o autor irá adotar para tratar o tema e o problema de pesquisa. A revisão da literatura resulta do levantamento e análise do que já foi publicado sobre o tema e o problema de pesquisa escolhido, permitindo um mapeamento de quem já escreveu e o que já foi escrito sobre o mesmo. Na pesquisa bibliográfica, também será realizada uma revisão da literatura que servirá para justificar o seu tema de pesquisa, o que se constituirá na introdução do trabalho. Já para a pesquisa em si, que será apresentada nos resultados e análise, é preciso a definição de interrogações (perguntas) que serão respondidas a partir da revisão da literatura. O objetivo do estudo deverá, necessariamente, estar pautado na pergunta realizada. Nesta modalidade de pesquisa, a revisão da literatura deve, necessariamente, ser sistemática, com clara definição dos unitermos utilizados, os mecanismos de busca e o período de tempo. Deve-se também deixar claro o número de fontes localizadas sobre o tema e a forma de seleção da literatura que será utilizada na análise. A descrição deste procedimento irá se constituir na metodologia do trabalho. Na pesquisa bibliográfica, verifica-se, entre os autores, as opiniões similares e diferentes a respeito do tema ou de aspectos relacionados ao tema ou ao problema de pesquisa. É possível, ainda, conhecer como se porta um determinado fenômeno em diferentes contextos, elaborar novas formas de enfrentamento de situações da prática profissional a partir das contribuições de diferentes autores, entre outras possibilidades. É importante destacar que a pesquisa bibliográfica não se trata de fazer colagem de citações; deve-se buscar respostas para as perguntas elaboradas, 70 ou seja, solucionar o problema de pesquisa, por meio de discussão pautada nas ideias ou achados dos autores, fazendo elo entre as citações com considerações próprias. Ao se debater as ideias dos autores e responder aos questionamentos dos estudos, elabora-se a etapa de resultados e discussão do estudo. Por fim, elaboram-se as considerações finais/conclusões, por meio de um apanhado geral dos resultados encontrados, na tentativa de responder aos objetivos propostos. A redação do texto de qualquer pesquisa científica deve ter começo, meio e fim, além de prezar pela objetividade, clareza, precisão, consistência, linguagem impessoal e uso de vocabulário técnico (SILVA; MENEZES, 2005). Desta forma, as partes do texto devem formar um todo geralmente subdividido em Introdução, Metodologia, Resultados/discussões e Conclusão. Vale ressaltar que todas as obras e os autores citados devem ser listados nas referências bibliográficas. Salienta-se que fazer um trabalho monográfico significar trazer acréscimos para o conhecimento na área estudada, uma vez que sua realização parte de um problema, um questionamento ou de uma lacuna a ser preenchida frente aos aspectos já conhecidos da temática escolhida. A trajetória de demandas dos alunos por orientação Para desenvolver o TCC, os estudantes foram comunicados e incentivados desde o início do curso. Lembrando que, nesse momento, houve grande mobilização pela crença de que teriam dificuldades, uma vez que, para a maioria, seria a primeira experiência com trabalho científico. A preocupação com as ferramentas da EaD, que também se constituíam em novidade, nem de perto se comparou com as reações perante o trabalho de conclusão de curso. No primeiro encontro presencial, momento em que teve início o curso, foi preciso direcionalidade para outras prioridades, uma vez que os questionamentos e demandas a respeito do TCC preenchiam sobremaneira as suas necessidades. Foi preciso, então, uma reflexão a respeito do sentido do trabalho de conclusão de curso e o apontamento de que no cronograma das aulas havia momentos específicos para se tratar do assunto. Transcorridos em torno de três meses de início do curso, os tutores retomaram as discussões por meio de chamadas no mural e de fóruns, com vistas à definição da temática. No terceiro encontro presencial houve um momento específico para discussão do trabalho de conclusão de curso, ocasião em que se realizou uma exposição geral sobre o significado do mesmo e suas etapas. Embora houvesse um esforço para o desenvolvimento do TCC 71 com ênfase no tema central do curso, existia um desejo muito forte dos especializandos de focar na área assistencial, uma vez que a atividade docente, na maioria das vezes, é exercida por contrato temporário, com carga horária parcial e que se acresce à atividade assistencial que já realizam. Salientase também que, no processo de mediação tutorial, nem todos os estudantes tinham participação ativa, alegando existir muitas demandas dos serviços e das demais atividades propostas no curso. Além disso, eles apresentavam as dificuldades próprias da delimitação do tema e pouca aproximação com os mecanismos de busca sistematizada de material bibliográfico. O apoio dos tutores mostrou-se fundamental nessa superação. A interlocução foi intensa, considerando que esta fase é essencial para a continuidade do estudo de forma coerente. Mesmo com o incentivo à definição do tema por meio do ambiente virtual, foi marcado um encontro presencial para discutir individualmente os trabalhos de conclusão de curso e, nesta ocasião, os especializandos tinham a ideia da temática; no entanto, faltava o “recorte”, ou seja, a clara definição do objeto de estudo. De maneira geral, após esse encontro, todos conseguiram delimitar os temas. No desenvolvimento do TCC também foi necessário o acompanhamento intenso, com muitas “idas e vindas”, via e-mail, o que possibilitou a problematização da temática, definição do objetivo e demais etapas do trabalho, sendo que as discussões pelo fórum foram pouco produtivas no aprofundamento das discussões. Salienta-se também a dificuldade apresentada por eles na redação do texto e no referenciamento de autores. Por fim, chegou o momento da apresentação pública do trabalho, o que também causou grande movimento de preparo e organização, com vistas a obter o melhor resultado possível e, mais uma vez, a mediação tutorial foi imprescindível. No entanto, nem todos conseguiram qualificar suficientemente o trabalho para a apresentação na data programada. Diante de tal situação, foram apresentados os trabalhos considerados adequados ao proposto – 12 (75%) e, aos demais, foi solicitado que participassem da apresentação e prorrogado em 15 dias o prazo para as adequações necessárias, o que possibilitou o aprofundamento dos mesmos para a subsequente apresentação pública. A avaliação dos TCCs foi realizada pelos próprios tutores do curso, sendo que cada trabalho contou com o parecer de outros dois tutores, sendo possível um novo olhar, com sugestões que possibilitaram melhorias na qualidade. A apresentação dos trabalhos ocorreu em uma condição formal, mediado pela coordenadora do Niad-Marília e contando com representantes 72 da Fundap, da Fiocruz e da Famema, além de pessoas da comunidade externa. Os especializandos realizaram cuidadosa apresentação, todos em PowerPoint, com dez minutos de explanação e cinco para o debate, e contaram com uma banca examinadora composta pelo orientador e dois outros tutores. Resultados alcançados Dos 40 alunos ingressantes, 33 (82,5%) concluíram o curso e, portanto, apresentaram o trabalho monográfico. Considerando a possibilidade de construção pluriautoral, obteve-se um total de 16 trabalhos de conclusão de curso, sendo que seis (37,5%) foram realizados em trios, outros seis (37,5%) em duplas e os demais, quatro (25%), individualmente. A definição das duplas ou trios deu-se por afinidade e proximidade profissional. Quanto ao tipo de estudo, embora tivesse como foco a revisão de literatura, duas das pesquisas foram de campo, pois os especializandos apresentaram disponibilidade e interesse e, para isso, submeteram os temas ao Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos da Faculdade de Medicina de Marília. Além disso, houve também um relato de experiência. Na análise das temáticas abordadas foi possível classificá-las em três grandes grupos: aquelas que tratam do ensino 10 (62,5%), incluindo temas como avaliação da aprendizagem, políticas de formação profissional, técnicas pedagógicas e metodologias ativas de aprendizagem; outro, que se refere à prática assistencial dois (12,5%), com temas referentes à educação em saúde; e um terceiro grupo, que envolve as políticas públicas de atenção à saúde com quatro (25%) trabalhos e temas sobre acolhimento e humanização. O momento de apresentação dos TCCs foi revestido de grande satisfação, tanto para os especializandos como para os tutores, que tiveram a clara compreensão de que haviam conseguido elaborar um produto com significativas reflexões a respeito do processo de ensinar e de cuidar no âmbito do SUS, com vistas à sua transformação. Considerações finais A realização do trabalho de conclusão de curso revelou-se como uma condição de extrema relevância, por permitir o desenvolvimento do raciocínio científico, melhoria na capacidade de busca de informação e de redação do texto. As diferentes aproximações dos especializandos com a construção 73 do TCC e de temas selecionados fazem com que as necessidades de acompanhamento se tornem extremamente individualizadas; além disso, existem aqueles que empenham maior esforço na sua realização, enquanto outros necessitam de constantes cobranças e estímulo. Perante a pluralidade de reações dos alunos, o tutor precisou agir de forma construtiva e motivadora para o cumprimento dessa trajetória, reforçando-se, assim, o papel da mediação nesta construção. Salienta-se, no entanto, que a oportunidade de acompanhar o desenvolvimento dos estudantes na busca desse processo de criação também foi bastante gratificante ao docente, pois possibilitou agregar saberes ao papel de educador. Considerando que nesse espaço transita sofrimento/medos do desconhecido e prazeres a cada descoberta, reconhece-se o momento como algo importante na (des)construção dos mitos, por meio do acolhimento das necessidades dos estudantes. Ao refletirmos sobre as reações dos alunos, referentes ao trabalho de conclusão de curso, podemos ter a percepção de que cada uma das interpretações ou formulações inicialmente descritas sobre mito corresponde ao que poderíamos denominar de “Mito do TCC”. Contudo, acreditamos que nenhuma das formulações por si só abarca ou esgota o “Mito do TCC”. Em um grupo extremamente heterogêneo, como ocorreu no Niad de Marília, seria de se esperar que cada um encontrasse faces distintas para o enfrentamento do mito, resultando, consequentemente, em diferentes reações e/ou posturas perante a obrigatoriedade de elaborar um trabalho de conclusão. Por fim, ao considerar que a superação do mito se faz pelo enfrentamento da realidade, com sucessivas aproximações, pode-se afirmar que houve avanço, pois os produtos se apresentaram dentro das normas estabelecidas e com os acréscimos necessários à superação dos problemas cotidianos. Referências BAGGIO, M. A. O significado de cuidado para profissionais da equipe de enfermagem. Revista Eletrônica de Enfermagem, Goiânia, v. 8, n. 1, p. 9-16, 2006. Disponível em: <http://www.fen. ufg.br/revista/revista8_1/original_01.htm>. Acesso em: 29 out. 2011. DEMO, P. Metodologia do conhecimento científico. São Paulo: Atlas, 2000. DYNEWICZ, A. M. Metodologia da pesquisa em saúde para iniciantes. 2. ed. São Caetano do Sul: Difusão Ed., 2009. FERREIRA, A. B. de H. Dicionário Aurélio básico da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988. FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Escola Nacional de Saúde Pública. Projeto pedagógico do 74 Curso de Especialização em Formação Docente em Educação Profissional Técnica de Nível Médio na Área da Saúde. [Rio de Janeiro], 2009. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas,1999. GIRARDET, R. Mitos e mitologias políticas. São Paulo: Ed. Schwarcz, 1987. LILIENFELD, S. O. et al. Os 50 maiores mitos populares da psicologia. São Paulo: Ed. Gente, 2010. SILVA, E. L.; MENEZES, E. M. Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. 4. ed. Florianópolis: UFSC, 2005. 138 p. Disponível em: <http://wwwportaldeconhecimentos.org.br/ index.php/por/content/view/full/10232>. Acesso em: 18 jul. 2010 SANTOS, I.; CLOS, A. C. Pesquisa quantitativa e metodologia. In: GAUTHIER, J. H. M. et al. Pesquisa em enfermagem: novas metodologias aplicadas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. p. 1-17. SIGNORELLI, E. C. A caverna de Platão. [S.l.]: Integral Escolas Inteligentes, 31 abr. 2007. Disponível em: http://www.integral.br/artigos/resultado.asp?categoria=43&codigo=146. Acesso em: 28 dez. 2010. 75 76 FORMAÇÃO DOCENTE EM EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA NA ÁREA DA SAÚDE: experiência do NIAD USP/RP Adriana Katia Corrêa1 Ana Maria Pimenta Carvalho2 Fernando Silveira3 Maria Conceição Bernardo de Mello e Souza4 Maria Suely Nogueira5 RESUMO O presente estudo tem por objetivo relatar a experiência do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad–USP/RP) no processo de formação de professores do ensino profissionalizante da primeira e segunda turmas do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica da Área da Saúde. Tanto na turma I quanto na turma II, 28 alunos concluíram o curso, totalizando portanto 56 alunos concluintes; deste total, a maioria estava vinculada a escolas profissionalizantes privadas e haviam concluído a graduação há menos de cinco anos. A experiência possibilitou identificar avanços e limites no processo de formação de professores junto ao programa TecSaúde. Os resultados reafirmam a complexidade que envolve a formação de professores em educação profissional, exigindo cada vez mais o compromisso permanente das instituições formadoras, quer de nível superior ou de ensino técnico, com vistas à superação dos limites das condições de trabalho e da precária formação pedagógica dos docentes. Descritores: educação profissional; enfermagem; formação docente; TecSaúde. 1. Enfermeira. Professora-Doutora da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. Tutora do Curso Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde – Niad–USP/RP. 2. Psicóloga. Professora associada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. Tutora do Curso Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde e Coordenadora do Niad–USP/RP. 3. Cirurgião-dentista da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. Tutor do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde – Niad–USP/RP. Doutorando em Ciências pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. 4. Enfermeira. Professora associada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. Tutora do Curso Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde – Niad–USP/RP. 5. Enfermeira. Professora associado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. Tutora do Curso Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde e Coordenadora do Niad–USP/RP. 77 INTRODUÇÃO Nas últimas décadas, no Brasil, o sistema público de saúde tem se caracterizado pela expansão progressiva de serviços aliada à implementação de modelos assistenciais que estejam centrados no sujeito, na comunidade, na prevenção, na promoção da saúde e na resolução dos agravos à saúde, partindo da compreensão ampliada do processo saúde-doença-cuidado e da elaboração coletiva de projetos terapêuticos (BRASIL, 2006). Nesse contexto, dentre outros aspectos, é fundamental a atuação comprometida dos trabalhadores da Saúde com saberes e práticas de atenção à saúde e, especificamente com relação ao setor público, com os princípios do Sistema Único de Saúde. Destaca-se a prática social de auxiliares e técnicos de Enfermagem como trabalhadores que, quantitativamente, representam o maior contingente profissional nos serviços de Saúde. Dados do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) (CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2009) indicam que, no estado de São Paulo, atuam 60.277 enfermeiros, 76.607 técnicos de Enfermagem e 195.616 auxiliares de Enfermagem. Os auxiliares e técnicos de Enfermagem são categorias profissionais reconhecidas pela Lei do Exercício Profissional de Enfermagem 7.498/86 (BRASIL, 1986), cuja formação é regulamentada pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico - Resolução CNE/CEB 04/99 (BRASIL, 1999). Essas diretrizes trazem uma perspectiva de formação ampliada que ultrapassa o foco procedimental, envolvendo ações de cuidado voltadas aos aspectos biopsicossociais da prática em Saúde, atuação em espaços coletivos e o desenvolvimento de processos de trabalho em equipe multiprofissional, pautados na interdisciplinaridade. Tal perspectiva exige uma nova proposta de formação, na qual o projeto pedagógico deverá incluir conteúdos para além dos aspectos biológicos e procedimentais, ampliar a compreensão do processo saúde-doença-cuidado pela determinação social da doença, promover a articulação entre esses conteúdos, entre teoria e prática, e ampliar os espaços de prática profissional para além do hospital, incluindo os espaços coletivos. Nesse contexto, a formação não tem como foco a aprendizagem procedimental e a doença por ela mesma, mas envolve aspectos relacionais e políticos, bem como o exercício da prática interdisciplinar. A formação profissional exige articulação com as necessidades e demandas da sociedade, propiciando desenvolvimento econômico, cultural 78 e social da mesma, possibilitando ao indivíduo o exercício eficiente de seu trabalho, a participação consciente e crítica no mundo do trabalho e social e autorrealização (AMÂNCIO FILHO, 2004). A construção dessa nova proposta de formação demanda, dentre outros elementos, a atuação de um docente que não apenas operacionalize técnicas de ensino e repasse os conteúdos de natureza procedimental, mas que seja capaz de reconhecer-se como um ator social, comprometido com as atuais políticas públicas de Saúde e de Educação, e de reconhecer o Sistema Único de Saúde (SUS) para além de um grande empregador, mas como conquista social. Assim, ser professor exige mais que simplesmente o domínio de conhecimentos específicos. É preciso ter a compreensão das questões que envolvem o seu trabalho, a capacidade de identificá-las e resolvê-las com autonomia e atitude crítica, que permitam avaliar as opções e decisões. Implica exercer cooperativamente a prática de educar (LOBO NETO, 2002). Nossa vivência tem mostrado que, embora haja esse ideal de formação construído e formalizado do ponto de vista político-legal, de modo geral a docência em educação profissional em Enfermagem apresenta limites tanto no que se refere aos referenciais acima descritos quanto aos saberes pedagógicos. Cabe ressaltar que, contrariando a legislação vigente, a maioria dos professores não tem formação específica para a docência. Alguns estudos que vêm sendo realizados com enfermeiros, professores do ensino técnico, apontam que muitos profissionais inseridos nesse nível de ensino não têm formação pedagógica, seja em curso de licenciatura ou em especializações reconhecidas como cursos de formação pedagógica (BASSINELLO, 2002; EBISUI, 2004; PADOVAN, 2007). O documento “Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Profissional de Nível Técnico” (BRASIL, 2000) aponta que têm se proliferado cursos de educação profissional de nível técnico na área da Saúde que apresentam dificuldades: além da presença de corpo docente sem experiência, infraestrutura deficiente, currículos com ênfase na dicotomia saber-fazer, estágios mal ou não supervisionados, gerando como produto um profissional com conhecimentos e atitudes inadequados. Nesse contexto, dentre outros aspectos, recomenda a formação pedagógica docente, a partir de processos pedagógicos crítico-reflexivo-participativos que auxiliem os professores a exercer o papel de mediadores do processo ensino-aprendizagem. Ao longo dos anos, no Brasil, têm sido implementados, pelo Ministério da Saúde, projetos voltados à formação dos trabalhadores de Enfermagem que também contemplam a capacitação/formação para a docência em educação 79 profissional. Dentre esses, destaca-se, na década de 1980, o Projeto Larga Escala e, na década de 90, o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae). Atualmente, no Estado de São Paulo, está sendo implementado o Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde (TecSaúde), instituído pelo Decreto Estadual número 53.848, de 19 de dezembro de 2008, com os objetivos de: “ampliar a escolaridade da população por meio da formação de profissionais de nível técnico com habilitação para ingresso no mercado de trabalho e melhorar a qualidade dos serviços de saúde prestados à população no âmbito do SUS” (FORTES; OLIVEIRA; FERREIRA, 2009). Este Programa é promovido pela Fundação de Desenvolvimento Administrativo do Estado de São Paulo (Fundap), Centro Paula Souza, Secretaria da Educação, Secretaria de Desenvolvimento, Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo. Inserido no Programa TecSaúde, está sendo viabilizado o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, em parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz) e com instituições públicas de ensino superior do Estado de São Paulo (IES) (Fundap, 2009). Cada IES parceira da Ensp/Fiocruz se constitui em um Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad), para desenvolvimento desse curso, na modalidade a distância, organizado de forma descentralizada. Cada Niad agrega um grupo de docentes/tutores, sob a coordenação de um professor indicado pela IES. Trata-se de curso de especialização, com carga horária de 540 horas, a serem cumpridas em dez meses, distribuídas em três complexos temáticos: Trabalho, Saúde e Educação (120 horas), O SUS e os Processos de Trabalho em Saúde (100 horas) e a Organização Pedagógica do Trabalho Docente em Saúde, incluindo o trabalho de conclusão de curso (TCC - 320 horas). Esse curso tem por objetivo geral “formar docente cujo perfil profissional contemple uma visão crítica e ampla da sociedade às competências da sua área de atuação, que atue de forma interdisciplinar, nas lutas pelo atendimento integral e de qualidade ao usuário do SUS e concorra para a transformação da realidade, com autonomia intelectual, social e ética”. Como objetivos específicos são apontados: oferecer elementos essenciais à formação dos alunos docentes das diferentes categorias profissionais envolvidas na educação profissional técnica em nível médio, tendo como referência central o significado social da ação educativa no âmbito do SUS; Propiciar aos alunos docentes os requisitos necessários à 80 compreensão ampla e crítica da realidade na qual se inscrevem as práticas em saúde e em educação, condição fundamental à participação ativa no processo de ensino-aprendizagem e à atuação crítica nas lutas coletivas pela transformação desta mesma realidade; Desenvolver uma formação teórico-prática consistente para a adoção de uma ação docente crítica emancipadora, que possibilite ao coletivo de professores escolher e desenvolver, com autonomia social e ética, formas melhores de atuação, com base nas necessidades de saúde das pessoas e da população (BOMFIM et al., 2009). A Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, historicamente tem se preocupado e se envolvido com a educação profissional em Enfermagem, e, especificamente, com a docência para a atuação nessa área, com a participação institucional nos projetos Larga Escala, Profae e TecSaúde. Cabe salientar que, no período de 1994 a 2002, a Escola foi responsável pelo oferecimento de Curso de Licenciatura na modalidade complementar. Desde 2006, está implementando o Curso de Graduação de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem. Este curso, ao mesmo tempo, forma o enfermeiro generalista, com competência para atuar na docência em educação profissional e em ações educativas de promoção à saúde na educação básica. A inserção nesses projetos e o desenvolvimento do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem têm fortalecido as parcerias dessa instituição com as escolas técnicas de Enfermagem, o que favoreceu a sua participação atual no Programa TecSaúde. O objetivo deste artigo é relatar a experiência do Niad USP/RP no processo de formação de professores do ensino profissionalizante da primeira e segunda turmas do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica da Área da Saúde. NIAD– USP/RP: caracterização e organização O Niad–USP/RP foi constituído a partir da seleção, pela Ensp/Fiocruz, dos tutores previamente inscritos. De um total de nove inscritos, mediante classificação por análise de currículo e carta de intenção, foram selecionados quatro tutores, sendo dois inseridos na primeira turma, iniciada em 18 de janeiro de 2010, além do coordenador, e dois inseridos na segunda turma, iniciada em 1º de julho de 2010. Assim, dos cinco tutores atuantes, na primeira e na segunda turmas, três são enfermeiros, um é odontólogo e um é psicólogo. Destes, quatro já 81 tinham participado de outros projetos de formação de professores enfermeiros do ensino técnico. Como tutores, atuamos no acompanhamento da aprendizagem dos alunos a distância e nos momentos presenciais. Para tanto, realizávamos encontros semanais, com duração de uma hora, para organizar as atividades, os encontros presenciais, discutir as situações/demandas dos alunos-professores. Além disso, participávamos das oficinas programadas pela Ensp/Fiocruz e das atividades de formação propostas pelo orientador de aprendizagem da Ensp/ Fiocruz, no ambiente virtual de aprendizagem. Na primeira turma estavam inscritos 40 alunos, todos enfermeiros, sendo oito vinculados ao Centro de Formação (Cefor) Araraquara (Classe Descentralizada de Ituverava, Franca e Ribeirão Preto - SP) e 32 vinculados ao Colégio Técnico Projeção, instituição privada do município de Ribeirão Preto. Do total de alunos matriculados, 28 concluíram o curso na turma de origem, sendo que um aluno irá concluí-lo junto à segunda turma; oito desistiram do curso, um abandonou e dois foram reprovados. Cabe salientar que, dos alunos matriculados, 34 eram do sexo feminino e seis do sexo masculino; 25 eram egressos de curso de graduação de escola privada e 15 de escola pública; 22 dos alunos concluintes finalizaram a graduação há menos de cinco anos e seis alunos estão formados já há entre treze e vinte e seis anos. Dos alunos concluintes, os sete enfermeiros do Cefor Araraquara estavam engajados em atividades teórico-práticas, tanto em sala de aula como em cenários de prática, junto à formação dos técnicos de Enfermagem, e seis enfermeiros do Colégio Técnico Projeção estavam envolvidos com aulas teóricas em sala de aula no curso de formação dos técnicos de Enfermagem. Oito enfermeiros também do Colégio Técnico Projeção apenas atuavam, de modo pontual, na supervisão dos estágios, e sete não tinham nenhuma inserção efetiva nas escolas profissionalizantes. Dos alunos com experiência na docência, a maioria apresentava experiência inferior a um ano, sendo que apenas dois alunos já atuavam na docência há mais de cinco anos. Dos concluintes, 19 trabalhavam em serviços de Saúde, sendo sete no setor privado e 12 no setor público. Na segunda turma participamos com duas tutoras do Niad – USP/RP; entretanto os alunos eram oriundos dos Departamentos Regionais de Saúde (DRS) II – Araçatuba, DRS V – Barretos e DRS XV – São José do Rio Preto, e pela distribuição pertenciam ao Niad – Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp); somente cinco alunos eram oriundos da DRS XIII e, 82 portanto, pertenciam ao Niad–USP/RP. Assim, tivemos na segunda turma 38 alunos inscritos, dos quais 36 eram enfermeiros, um era farmacêutico e um fisioterapeuta. Desse total, oito estavam vinculados ao Cefor Araraquara (Classe Descentralizada de Olímpia e Bebedouro), quatro ao Colégio Star Word, de Araçatuba, 15 ao Colégio 20 de novembro de Auriflama, seis à Fundação de Ensino Oswaldo Bertazoni de José Bonifácio e cinco ao Colégio Técnico Projeção, de Ribeirão Preto. Deste total de inscritos somente 34 iniciaram o curso em junho de 2010. Dos matriculados, 27 eram do sexo feminino e sete do sexo masculino; 29 eram egressos de curso de graduação de escola privada e cinco de escola pública. Do total de alunos matriculados, 28 alunos concluíram o curso; destes 19 haviam concluído o curso de graduação há menos de cinco anos, e nove alunos estavam formados já há entre seis e dezessete anos. Entre os alunos concluintes, 18 atuavam em ensino e assistência, seis atuavam no ensino, mas somente em atividade prática de supervisão de estágio, e quatro não exerciam nenhuma atividade profissional quando iniciaram o curso. Dentre aqueles que atuavam na assistência, 15 indicaram atuar em serviço público. Em relação à experiência na docência, a maioria indicou meses; cinco indicaram experiência de no máximo dois anos e apenas um indicou experiência no ensino de cinco, sete e doze anos, respectivamente. O desenvolvimento do curso seguiu as orientações gerais da Ensp/ Fiocruz, mas já no início percebemos a necessidade de serem feitas algumas propostas, considerando a especificidade da nossa clientela e a experiência prévia com um Curso de Especialização em Docência em Educação Profissional em Enfermagem, coordenado por um dos tutores deste curso e recentemente finalizado na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (Eerp/USP). Assim, foram feitas as seguintes propostas: Ampliação do número de encontros presenciais, de quatro para dez; Participação de outros professores convidados para discussão de temas como processo de trabalho em Saúde e tendências pedagógicas, em encontros presenciais; Participação de outros enfermeiros professores que estavam em sala de aula do Programa TecSaúde, mas não inseridos, no momento, no curso de formação de professores, especificamente na turma I; Realização de um encontro conjunto entre alunos-professores do Programa TecSaúde e aqueles do Curso de Especialização oferecido pela Eerp/USP, sendo feita a discussão sobre modelos curriculares, com participação de palestrantes de diversas escolas técnicas de Saúde. 83 Destaca-se que muitos alunos de ambos os cursos atuavam juntos em uma mesma escola e este encontro foi potencializador das discussões sobre propostas de mudanças na formação dos técnicos de Enfermagem (turma I); Pactuação para realização de estágio em docência em sala de aula, considerando que muitos alunos não estavam inseridos na docência, com duração de vinte e quatro horas, envolvendo observação e atuação como professor, com foco na elaboração de plano e no desenvolvimento de aula, como atividades de articulação previstas nesse curso. Essa proposta exigiu negociações permanentes com as escolas técnicas envolvidas; Realização de um encontro presencial para orientação do processo de elaboração de planos de aula a serem desenvolvidos pelos alunos como parte das exigências da atividade de articulação voltada à investigação e ao planejamento de prática pedagógica; Realização de uma oficina de busca bibliográfica para subsidiar a construção do TCC; Proposta de discussão e construção coletiva de um projeto de TCC, com a elaboração de projeto de pesquisa relacionado ao perfil dos alunos do curso técnico de Enfermagem do Programa TecSaúde e ao perfil dos professores do mesmo programa. A coleta e a análise dos dados foram realizadas por grupos de alunos-professores em classes específicas. A partir dos dados obtidos, cada aluno-docente analisou um aspecto pertinente ao objetivo do curso que mais lhe chamou atenção, configurando seu TCC individual (turma I); Realização de um encontro para apresentação prévia dos TCCs, com orientação conjunta dos tutores envolvidos; Estímulo à discussão compartilhada entre alunos-professores desse curso de formação docente com alunos do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem da Eerp/USP, em alguns encontros presenciais e em momentos de estágio em docência em sala de aula, contribuindo para a troca de experiências e conhecimentos (turma I); Participação de alunos de programas de pós-graduação da Eerp/ USP e de enfermeiros licenciados no apoio ao acompanhamento das aulas ministradas pelos alunos-professores na atividade de articulação voltada à investigação e planejamento de prática pedagógica e na 84 avaliação dos TCCs, incluindo a participação nas orientações gerais aos projetos e elaboração de planos de aula; É importante ressaltar que as propostas realizadas foram compartilhadas com a orientadora de aprendizagem da Ensp/Fiocruz e sua implementação foi gerada, principalmente, pelo fato de muitos enfermeiros, alunos do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica para a Área da Saúde, não estarem atuando em sala de aula como professores, e por sua incipiente aproximação aos conteúdos do curso, marcados por complexidade e especificidade. A seguir, apresentamos algumas considerações sobre os avanços e os limites no processo de formação de professores do ensino profissionalizante em Enfermagem da primeira e segunda turmas do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica da Área da Saúde, a partir de nossa experiência como tutores do Niad–USP/RP. Avanços no processo de formação de professores – Programa TecSaúde Para muitos alunos-docentes, houve a possibilidade de rever e até mesmo aproximar-se, pela primeira vez, dos aspectos referentes às políticas sociais, em Saúde e Educação, incluindo a construção do SUS. Chama-nos a atenção que, embora a maioria dos alunos desse curso tenha se formado recentemente, há em torno de cinco a seis anos, mostravam conhecimentos incipientes nas discussões sobre o SUS, levando-nos a questionar como a temática vem sendo trabalhada nos cursos de graduação, principalmente nas universidades privadas, das quais a maioria é procedente. Na segunda turma, cinco alunos estavam formados há mais tempo, entre dez e dezessete anos, e apresentavam também limites nos seus conhecimentos em relação ao SUS. Além disso, muitos dos alunos da primeira turma não estavam atuando na prática assistencial em serviços, quer na rede pública ou privada, não tendo, portanto, vivência no contexto de Saúde. Por outro lado, na segunda turma, quase todos os alunos estavam inseridos na assistência em Saúde. Os alunostrabalhadores, pelos relatos nos momentos presenciais, pareciam ter reduzidos espaços para reflexão sobre o trabalho cotidiano que, muitas vezes, pode restringir-se ao cumprimento das tarefas, o que se constitui um limitante para a discussão acerca do trabalho em Saúde em sua dimensão de prática social. Nesse contexto, a temática da humanização do cuidado em saúde mostrou-se, principalmente, na segunda turma, como foco de interesse dos 85 alunos que se sensibilizaram para a construção de práticas relacionais mais respeitosas e acolhedoras. Se por um lado isso pode ser um avanço, por outro, pode ser fator limitante por reduzir a compreensão da complexidade do cuidado no contexto do SUS, que extrapola aspectos relacionais imediatos, envolvendo também questões de natureza política e organizacional. Essa situação trouxe muitas demandas ao Niad–USP/RP, como a necessidade de investir em mais encontros presenciais para a discussão dessas temáticas, trazendo situações concretas do cotidiano a serem refletidas. Nesses encontros, pudemos trabalhar com os alunos a possibilidade de ampliar a compreensão sobre o SUS e alguns aspectos gerais das políticas públicas de saúde e educação, com a intenção de não apenas possibilitar a apreensão de informações, mas potencializar a construção de compromissos com a formação de profissionais para o SUS. Nas diversas atividades que conformaram o curso, tais como as atividades de articulação, os encontros presenciais, o TCC, dentre outros, os alunos-professores puderam trazer a realidade das suas condições de trabalho para serem discutidas, envolvendo contratos de trabalho precários, baixa remuneração, dupla/tripla jornada de trabalho, limitado apoio institucional à docência interferindo nas condições de ensino em sala de aula e estágios nos serviços de Saúde. Embora se trate de reconhecimento de problemáticas da docência em educação profissional em Enfermagem, à medida que alunos e tutores se reconheceram nesse cenário foi possível de modo compartilhado compreender e analisar criticamente as situações da inserção dos alunosprofessores nas escolas técnicas e no Programa de Formação TecSaúde, com vistas à compreensão de que mudanças passam pela construção coletiva de propostas e requerem engajamento político, técnico e ético. Sobre esse aspecto entendemos que o saber profissional dos professores relaciona-se com os lugares onde atuam/trabalham, com as organizações que os formam, com as fontes de aquisição dos saberes e com o modo como integram esses aspectos no seu cotidiano de trabalho docente. De acordo com Tardif (2002), a função docente está no equilíbrio de aplicação de um conhecimento, no contexto em que se aplica, no compromisso ético de sua função social e na estrutura de participação social. A parceria institucional entre Eerp/USP e as escolas técnicas, viabilizada pela participação em projetos de formação de professores, bem como pelo desenvolvimento do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem, favoreceu a adequação desse curso de formação docente em educação profissional técnica na área da saúde às necessidades da clientela, 86 proporcionando rearranjos na programação e criação de espaços para a discussão das problemáticas da escola técnica e do próprio curso de formação docente. Dessa forma, foi possível promover, na primeira turma, a inserção dos enfermeiros que não tinham contato com sala de aula nem estágios ou apenas supervisionavam estágios em discussões mais ampliadas e ancoradas na realidade, nos encontros presenciais, com a presença de coordenadores e diretores das escolas técnicas e centros formadores. Esta estratégia também possibilitou discutir situações que envolviam a prática pedagógica do trabalho docente, como a construção coletiva do projeto político-pedagógico, modelos de currículo, metodologias de ensino, elaboração de planos de aula, entre outros. Na segunda turma não foi possível utilizar-se da mesma estratégia, tendo em vista a distância entre o Niad e as diversas localidades de origem dos alunos. Alunos-professores puderam reconhecer que a prática docente se articula com a prática do enfermeiro, mas dela se diferencia, pois comporta intencionalidades, saberes, prática e organização próprios, que se articulam em um projeto político-pedagógico de formação de nível técnico. Tal reconhecimento tem influência positiva em seu engajamento profissional nas escolas técnicas e está relacionado com a construção da identidade profissional do docente. A esse respeito comentam Pimenta e Anastasiou (2005, p. 77) que a identidade profissional se constrói com base na significação social da profissão, na revisão constante dos significados sociais da profissão, na revisão das tradições, mas também com base na reafirmação de práticas consagradas culturalmente que permanecem significativas [...] Identidade que se constrói com base no confronto entre as teorias e as práticas, análises sistemáticas de práticas à luz das teorias existentes e construção de novas teorias [...] significado que cada professor enquanto ator e autor confere à atividade docente no seu cotidiano, com base em seus valores, em seu modo de situar-se no mundo, em sua história de vida, em suas representações, em seus saberes, angústias e anseios, no sentido que tem em sua vida o ser professor. Assim como mediante sua rede de relações com outros professores, nas instituições de ensino, nos sindicatos e em outros agrupamentos. Outro aspecto considerado importante foi a oficina preparatória para o trabalho dos tutores, que possibilitou contato prévio com o material pedagógico, a plataforma de ensino a distância, e as diretrizes gerais do curso, favorecendo o planejamento do desenvolvimento do mesmo pelo Niad–USP/RP. 87 Limites no processo de formação de professores – Programa TecSaúde O material utilizado no curso de formação docente em educação profissional técnica na área da saúde, embora constituído por ideias essenciais sobre os temas enfocados, apresentava conteúdos densos de modo, às vezes, muito sintético e, como o aluno não dispunha de muitas oportunidades de outras leituras, tinha dificuldade em acompanhar, com mais clareza, como os conceitos foram construídos. Nesse sentido, em relação a alguns conteúdos foram possíveis apenas aproximações, fazendo-se necessário o aluno compreender o caráter inicial desse curso, se a intenção for realmente desenvolver-se como especialista na área. Isso aponta para a necessidade de continuidade dessa formação e o fortalecimento de compromissos das escolas técnicas com a formação de professores. Sobre esses aspectos, Gomes e Marins (2004) já indicavam que, em decorrência da explosão tecnológica que vivemos, o conhecimento constituise em matéria-prima da educação, recurso estratégico indispensável para atender às novas exigências profissionais, capaz de transpor o atual aporte científico, não no que se refere à expectativa de resultados comprovados, mas na capacidade de argumentar e contra-argumentar sobre as situações do cotidiano do trabalho, imprimindo no novo profissional uma postura de aprendizagem constante. Para Tavares (1996), a especificidade da ação docente não se constrói somente pela sua formação inicial, mas pela educação continuada, quer seja em ambientes formais ou informais, em atividades relacionais coletivas, em que o outro desempenha papel fundamental na troca de ideias, conhecimentos, valores, atitudes, fortalecendo a afirmação de aprendermos em diversas situações, uma vez que vivemos em uma sociedade aprendente, numa sociedade que aprende e se desenvolve. (se o que estiver em grifo for citação deve vir entre aspas. Procurei na rede mas não encontrei o período exato como está aqui) Outro aspecto que chama a atenção relaciona-se à realidade do alunoprofessor que está envolvido em dupla/tripla jornada de trabalho, com pouca autonomia para o estudo individual, com incipiente conhecimento das questões político-pedagógicas relacionadas à formação de profissionais da Saúde. Esta realidade, em alguns momentos, dificultou o envolvimento do aluno com o curso na modalidade EaD. Acresce-se a isso a dificuldade de alguns alunos em participar dos encontros presenciais, seja por limites na organização individual ou das instituições dos serviços de Saúde que tinham dificuldades na liberação 88 dos profissionais para as atividades junto ao curso. Apontamos ainda como elemento limitante o fato de alguns alunos apresentarem, como expectativa do curso, apenas a necessidade de se instrumentalizarem tecnicamente para a docência. Assim, ao se depararem com a proposta do curso que apresenta elementos político-pedagógicos que fundamentam a docência, demonstraram estranheza e dificuldades de compreensão, que foram sendo trabalhadas ao longo do curso. Isso também se relaciona à limitada valorização do aluno-professor quanto à especificidade da docência. Acresce-se a esses fatos que muitos alunos-professores da primeira turma não estavam atuando em sala de aula do ensino técnico ou mesmo na supervisão de estágios. Situação que limitou a inserção desses enfermeiros na proposta do Programa TecSaúde, além de dificultar a operacionalização da proposta pedagógica do curso de formação de professores, baseada, dentre outros referenciais, na problematização. Mesmo aqueles alunos-professores que estavam atuando em sala de aula apresentavam dificuldades na operacionalização da proposta do Programa TecSaúde, como, por exemplo, no uso do material didático específico ou até mesmo na operacionalização de referenciais como problematização, articulação de conteúdos, articulação teórico-prática e processo formativo de avaliação. Essas dificuldades relacionam-se às condições estruturais das instituições de ensino técnico envolvidas, sendo mais evidentes entre os alunos vinculados à escola privada. Cabe ressaltar que outro dificultador, na primeira turma, diz respeito ao fato de muitos alunos do curso técnico do Programa TecSaúde não estarem inseridos em serviços de saúde, limitando a sua participação como sujeito ativo do processo ensino-aprendizagem que já traz suas próprias experiências profissionais para serem ressignificadas. Nesse contexto, e a partir de um conteúdo que exigia o estudo de referenciais até então pouco conhecidos pelos alunos-professores, o tempo estabelecido oficialmente para a conclusão do curso, dez meses, tornou-se insuficiente para que melhor elaborassem e compreendessem os conteúdos propostos de modo articulado entre si e à prática. Houve o risco, em alguns momentos, de o curso ser transformado, por alguns alunos, em cumprimento de exigências burocráticas que fragmentam a compreensão do todo, limitando-se em tarefas a serem cumpridas. Isso exigiu do tutor o cuidado no acompanhamento do aluno, de modo a não restringir o curso ao cumprimento parcelar das atividades solicitadas, em detrimento da construção crítica da 89 prática docente no ensino técnico em Enfermagem, foco desse curso. Outro aspecto a salientar refere-se ao desafio de compatibilizar a formação de professores e profissionais da Saúde, comprometidos com o SUS, com a finalidade social instituições privadas, considerando que a maioria das escolas licitadas são de natureza jurídica particular. No Brasil, a educação profissional, em grande parte, é desenvolvida pelo setor privado de ensino em busca de lucro, o que leva, dentre outros aspectos, à precarização das relações de trabalho docente (BOMFIM et al., 2009). Considerando tratar-se de curso na modalidade a distância, em relação à utilização do ambiente virtual de aprendizagem (AVA) da Ensp/ Fiocruz alguns alunos não possuíam domínio da ferramenta e restringiam a sua participação ao envio das atividades exigidas, fato demonstrado também pela pequena participação nos fóruns de discussão, chats, acesso à biblioteca, dentre outros. Cabe reconhecer que algumas dessas dificuldades eram vividas pelos tutores que também se encontravam em processo de formação em relação ao uso de ambientes virtuais de aprendizagem. Discorrendo também sobre algumas dificuldades da EaD, Polak e Reich (2002) comentam a ocorrência de confusões entre flexibilização e não cumprimento de cronograma e do ritmo exigido pelo curso; não entrega das atividades, não aceitação de normas preestabelecidas, falta às avaliações presenciais, dificuldades em buscar orientações da tutoria por limites na fluência tecnológica. Algumas dessas dificuldades envolvem alunos e tutores. Por outro lado, destacamos que para alguns alunos desse curso a oportunidade de aprender em outra modalidade que não apenas presencialmente foi um estímulo e um desafio. Inicialmente, na primeira turma, a proposta do Niad–USP/RP em relação ao TCC era realizá-lo coletivamente, como já comentado, porém a análise dos dados referentes ao perfil de alunos e professores não se efetivou conforme previsto, tendo em vista o incipiente conhecimento dos alunos quanto à metodologia científica, o limitado espaço de tempo para a conclusão do TCC, a dificuldade de realizar mais encontros coletivos, seja presencial ou virtualmente, para discussão, além da necessidade de mais investimento em leituras específicas que contribuiriam para a análise dos dados. Além desses aspectos, houve algumas dificuldades relacionais para o trabalho coletivo. Apesar dessas limitações, houve avanços no aprendizado de conteúdos e das relações interpessoais, uma vez que os participantes tiveram oportunidades de trocar informações e conhecimentos que favoreceram o desenvolvimento de seus trabalhos individuais. Na segunda turma, tendo em vista a experiência da primeira, não houve a opção pelo trabalho coletivo; todavia, as dificuldades 90 enfrentadas no desenvolvimento dos TCCs foram as mesmas. Chama-nos a atenção, assim, que muitos alunos-professores demonstravam preocupação mais individualizada em relação ao cumprimento das atividades, com algumas dificuldades para a aprendizagem do trabalho coletivo, aprendizagem esta que estava prevista no desenvolvimento do curso, tendo em vista que uma das competências a serem desenvolvidas nesse curso refere-se à competência coletiva. Compreendemos que a jornada dupla/tripla de trabalho, a não inserção em sala de aula, as dificuldades com a aprendizagem de conteúdos complexos e com o ambiente virtual de aprendizagem, o não reconhecimento da especificidade da docência e as expectativas quanto aos aspectos técnicos do ensino foram elementos que dificultaram o envolvimento mais efetivo de alguns dos alunos-professores no curso, exigindo dos tutores um empenho no sentido de superação desses entraves. Diante dessas situações, entendemos que haveria necessidade de incrementar a avaliação em processo, visando ao alcance dos objetivos propostos e a possibilidade de implementar ações diferenciadas entre tutores, alunos e instituições envolvidas, o que de certo modo foi iniciado a partir de algumas propostas construídas pelo Niad–USP/RP em parceria com a Ensp/ Fiocruz, como já comentado. CONSIDERAÇÕES FINAIS A experiência como tutores do Curso Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde reafirmou a complexidade que envolve a formação de professores em educação profissional, exigindo cada vez mais o compromisso permanente das instituições formadoras de nível superior e de ensino técnico para a superação dos limites das condições de trabalho e da precária formação pedagógica dos docentes. Compreendemos ainda que esse curso representou, para a maioria dos alunos-professores, uma oportunidade de formação docente inicial, demandando esforços individuais e institucionais para a continuidade dos processos formativos, quer sejam relacionados aos aspectos pedagógicos quer sejam relacionados aos referenciais do campo da Saúde que fundamentaram o curso. Assim, foi possível realizar algumas reflexões sobre a docência em educação profissional em Enfermagem no contexto do SUS, viabilizando comprometimento dos alunos-professores. Ressalta-se, entretanto, que a 91 formação docente, no e para o SUS, demanda empreendimentos políticos e pedagógicos contínuos. Além disso, cabe salientar que para nós, tutores, a participação nesse curso levou-nos a refletir sobre o desafio de construir um processo de inclusão que considere as condições concretas de vida dos alunos e as condições organizacionais das instituições envolvidas, mas que garanta o desenvolvimento de compromisso com o estudo e o trabalho grupal envolvendo o tutor, seus alunos e o Niad, bem como com as instituições promotoras do curso. REFERÊNCIAS AMÂNCIO FILHO, A. Dilemas e desafios da formação profissional em saúde. Interface: comunicação, saúde e educação, Botucatu, v. 8, n. 15, p. 375-380, mar./ago. 2004. BASSINELLO, G. A. H. Perfil dos professores de ensino médio profissionalizante de enfermagem na região de Piracicaba. 2002. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) - Centro de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, 2002. BOMFIM, M. I. R. M. et al. (Coord.). Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: trabalho, saúde e educação. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz/Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca/Educação à Distância, 2009. BRASIL. Lei no 7.498, de 25 de junho de 1986. Regulamenta e profissão de Enfermagem. Diário Oficial da União, Brasília, D.F, 26 jun. 1986. Seção 1, p. 9273-9275. BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de atenção básica, 1: Programa de Saúde da Família. Brasília, 2000b. BRASIL. Ministério da Educação. Referenciais curriculares nacionais da educação profissional de nível técnico. Brasília, 2000. BRASIL. Ministério da Educação. Resolução CEB 04/1999. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional de Nível Técnico. Diário Oficial da União, Brasília, 7 out. 1999. Seção 1, p. 129. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília, 2006. (Série Pactos pela saúde, v. 4). CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM (Brasil). São Paulo, 2009. Disponível em <http:// www.portalcofen.gov.br>. Acesso em: 25 de janeiro de 2011. EBISUI, C. T. N. A identidade profissional do enfermeiro professor do ensino técnico de enfermagem. 2004. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2004. FORTES, J. I.; OLIVEIRA, S. C.; FERREIRA, V. C. (Coord.). Curso técnico de nível médio em enfermagem: módulo de habilitação: guia curricular. São Paulo: FUNDAP, 2009. FUNDAP. Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde do Estado de São Paulo. São Paulo, 2009. Disponível em: <http://novo.fundap.sp.gov.br >. Acesso em: 25 jan. 2011. GOMES, H. M.; MARINS, H. O. A ação docente na educação profissional. São Paulo: Ed. SENAC São Paulo, 2004. 92 LOBO NETO, F. J. S. Ser professor: necessidade de formação profissional específica. Formação, v. 2, n. 4, p. 5-13, jan. 2002. PADOVAN, O. 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Porto: Porto, 1996. 93 94 O CONHECIMENTO DE ALUNOS DO CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE DO NIAD/ RIO PRETO sOBRE CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS E AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM Nadia Antonia Aparecida Poletti Claudia Eli Gazetta Maria Silvia de Moraes RESUMO Este trabalho se refere à educação em saúde na formação de docentes que atuam no SUS e tem como objetivo relatar a experiência vivenciada em sala de aula sobre os conhecimentos relacionados a concepções pedagógicas e avaliação de aprendizagem. Os alunos-docentes reconhecem que existe uma fragmentação entre teoria e prática que causa prejuízo à continuidade do ensino nos estágios, que sua prática docente está fundamentada na pedagogia tradicional, com a utilização do Power Point, que promove a transmissão do conhecimento e é uma prática centrada no professor. Em relação à avaliação de aprendizagem, eles destacam que é somativa, classificatória, centrada na nota de uma prova escrita e não considera outras formas de avaliação. Embora os relatos dos alunos-docentes demonstrem uma tendência à utilização da pedagogia tradicional em sua prática docente, verificou-se que já existe uma reflexão crítica dessa prática. Descritores: educação em saúde; formação de docentes; avaliação de aprendizagem. INTRODUÇÃO A educação e a saúde são áreas de produção e aplicação de conhecimentos destinados ao desenvolvimento humano. As práticas educativas em saúde são voltadas para atividades de educação objetivando desenvolver capacidades individuais e coletivas com vistas à melhoria da qualidade de vida e saúde tanto na formação como na educação permanente (PEREIRA, 2003). Este trabalho se refere à educação em saúde na formação de docentes que atuam no Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse enfoque é essencial que o 95 docente construa competências de sua área de atuação com uma visão crítica e reflexiva, pautando sua atuação de forma a atender de maneira integral e com qualidade ao usuário do SUS, e que contribua para a transformação da realidade com autonomia intelectual, social e ética (FORMAÇÃO, 2009). Nessa visão, é preciso formar pessoas que tenham capacidade de intervir na realidade não só para mantê-la, mas para rejeitá-la ou transformála. Assim a proposta formativa pode ser conservadora ou transformadora, e, como indica Saviani, a escola deve ser capaz de formar trabalhadores com uma aguda consciência da realidade em que atuam, uma adequada fundamentação teórica que lhes permita uma ação coerente e uma satisfatória instrumentalização técnica que lhes possibilite uma ação eficaz. Assim, a construção deste trabalho tem a finalidade de apresentar as considerações realizadas pelos alunos-docentes do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área de Saúde do Niad de São José do Rio Preto sobre os temas “Concepções pedagógicas” e “Avaliação de aprendizagem”. Desta forma, após a delimitação do tema, expressa-se a seguir o objetivo da investigação. OBJETIVO Relatar a experiência vivenciada em sala de aula com os alunosdocentes sobre os conhecimentos relacionados a concepções pedagógicas e avaliações de aprendizagem. METODOLOGIA Essa investigação do tipo relato de experiência foi realizada com alunos-docentes e tutores da segunda turma do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área de Saúde no Niad de São José do Rio Preto. Os dados foram coletados durante as duas oficinas realizadas. A primeira foi centrada no tema “Concepções pedagógicas”, e originouse de uma enquete respondida pelos alunos. A segunda oficina foi motivada por um estudo de caso sobre o tema “Avaliação de aprendizagem”. O caso foi elaborado pelos tutores, enviado anteriormente aos alunos e teve como finalidade a construção de uma análise que deveria estar fundamentada nos conteúdos do Complexo Temático 3, e outras referências bibliográficas. Em ambas as oficinas foram colhidas as opiniões dos alunos, alicerçadas no conhecimento sobre concepções pedagógicas e avaliação de aprendizagem. 96 RESULTADOS E DISCUSSÃO Contextualizando o Niad e a tutoria O Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) de São José do Rio Preto está localizado na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp), que é uma instituição de ensino superior (IES) estadual, onde funcionam dois cursos de graduação: Medicina e Enfermagem. Além desses cursos conta ainda com um Departamento de Pós-Graduação stricto sensu, cuja área de concentração é Ciências da Saúde, e Pós-Graduação lato sensu. A cidade de São José do Rio Preto localiza-se na região noroeste do estado de São Paulo, onde esta situada a DRS XV, que é integrada por 101 municípios. Quanto ao número de componentes do Niad, atuam seis docentes, sendo uma coordenadora, cinco tutoras e uma secretária. A tutoria na turma 2 ocorreu da seguinte forma: duas tutoras iniciaram com 16 alunos e a coordenação realizou a tutoria com cinco alunos. Com o intuito de manter a harmonia e a coerência entre a equipe foram realizadas 12 reuniões, que podem ser classificadas da maneira seguinte: seis reuniões tiveram como finalidade estudar e aprimorar os conhecimentos dos Complexos Temáticos. Essas eram chamadas de reuniões de estudo, onde eram discutidos entre os tutores e a coordenadora os temas que também eram vivenciados pelos alunos naquele determinado momento. As outras seis reuniões tiveram como propósito organizar os encontros presenciais. Oficinas presenciais Foram realizadas três oficinas, para discutir respectivamente concepções pedagógicas, avaliação de aprendizagem e trabalho de conclusão de curso. Apresenta-se abaixo a descrição das primeiras oficinas, que representam o cerne deste relato de experiência. Concepções pedagógicas A primeira oficina realizada foi centrada no tema “Concepções pedagógicas”. Inicialmente formou-se um círculo na sala de aula pelos alunos e tutores; foi dado um tempo de quinze minutos para que respondessem à enquete “Concepções pedagógicas”, que tinha como finalidade possibilitar ao aluno-docente elementos que contribuíssem para a compreensão de que mesmo de modo não consciente ele se filia a alguma concepção pedagógica na sua ação educativa. Ao término, procedeu-se à análise dos resultados, que foram ainda apresentados aos participantes, e foi dado início à discussão. 97 A primeira questão proposta na enquete versa sobre a postura do professor em sala de aula no momento da discussão do conteúdo proposto na disciplina. Após a análise dos resultados, verificou-se que houve concordância de todos os docentes que estavam presentes quanto às seguintes alternativas indicadas: 1. Você utiliza diversos recursos didáticos como: vídeo, Power Point, dinâmicas como forma de motivar os alunos em um primeiro momento, para depois pensar na apresentação do conteúdo. O lema é aprender a aprender. 2. Você parte da realidade onde você e seu aluno estão inseridos para iniciar a exposição do conteúdo. Dessa discussão emergiram algumas considerações que serão apresentadas a seguir. A primeira delas pode ser descrita como a dicotomia entre teoria e prática. O questionamento inicial dos alunos-docentes foi se a enquete deveria ser respondida também pelos professores que atuam no ensino clínico nos campos da prática. Solicitou-se que fizessem uma adequação, no sentido de buscar entender como o ensino se realiza na prática. Nesse sentido, os alunos-docentes colocaram que existe uma dificuldade de dar continuidade ao ensino dos conteúdos estabelecidos, porque em algumas escolas os professores que atuam em sala de aula não são os mesmos que atuam na prática, e que eles também não se comunicam de modo a garantir a continuidade do ensino. Os docentes do ensino clínico buscam então informações junto aos estudantes sobre conteúdos aprendidos em sala de aula para de alguma forma dar continuidade nos campos da prática. Desta forma é muito difícil saber se esta é uma concepção pedagógica (partir da realidade... ou dos conhecimentos preexistentes) ou uma necessidade que se impõe ao docente que busca corrigir falhas estruturais na sua prática. Com relação à necessidade de valorização do ensino nos campos de estágio, é de grande valia destacar que esses são o local indicado para a construção do saber fazer e do saber ser. Os estágios clínicos podem proporcionar uma riqueza de aprendizagem que é inerente à atuação profissional, pois permitem experimentar o contexto real da atividade profissional na área de Saúde, concretizam o princípio do aprender a fazer fazendo, e possibilitam a reflexão que conduz ao desenvolvimento de competências específicas em ambiente real. É uma prática construtivista e transformadora que convida a repensar e aprofundar, construir e reconstruir os saberes profissionais; portanto devem 98 ser pensadas abordagens formativas que tenham em conta essas dimensões (ALARCÃO; RUA, 2005). Os alunos-docentes também se posicionaram quanto à utilização do Power Point em sala de aula. Para eles essa é uma prática pedagógica centrada no professor, no conteúdo que ele julga importante, onde verifica-se a transmissão de conhecimento, não havendo participação ativa do aluno no processo de aprendizagem. Se por um lado traz muitas imagens, por outro não permite a participação dos alunos, já que o professor prepara um número de slides e sente-se na obrigação de apresentar todos. Ao final da discussão foi colocado que o método precisa ser adequado à concepção pedagógica do professor e da instituição de ensino. Nessa mesma perspectiva, destacaram ainda que a pedagogia que está presente no processo de trabalho, segundo o posicionamento da maioria, é a tradicional (pedagogia da transmissão), onde o professor transmite o conteúdo a ser trabalhado e o aluno é apenas o receptor do conhecimento. Não há assim troca de experiência, nem espaço para problematizar situações do trabalho concreto, que deveriam ser ponto de partida para discussões sobre os temas trabalhados em sala de aula. Para Bordenave (1999), a pedagogia tradicional traz repercussões tanto individuais como sociais. As primeiras são assim sistematizadas: o hábito de tomar notas e memorizar; passividade do aluno e falta de atitude crítica; “profundo respeito” quanto às fontes de informação, sejam elas professores ou textos; distância entre teoria e prática; tendência ao racionalismo radical; preferência pela especulação teórica; falta de problematização da realidade. Já as repercussões sociais incluem: adoção inadequada de informações científicas e tecnológicas de países desenvolvidos; inadaptação cultural caracterizada pela adoção indiscriminada de modelos de pensamento elaborado em outras regiões; individualismo e falta de participação e cooperação; falta de conhecimento da própria realidade; imitação de padrões intelectuais, artísticos e institucionais estrangeiros, submissão à dominação e ao colonialismo; e manutenção das classes sociais. Dessa forma é preciso ressaltar que a aprendizagem é um fenômeno construtivo e político onde o sujeito é capaz de fazer sua própria história. O educador consciente de que o aluno é um ser em construção deve estabelecer novas relações de seu exercício de educar, desenvolvendo no aluno a prática de aprender com o outro. Assim a aprendizagem deve construir a habilidade emancipatória no ser humano (FREIRE, 2001; DEMO, 2000). A segunda questão da enquete tratava sobre o principal problema que 99 o educador identifica nos seus alunos. A maior parte dos alunos-docentes assinalou três alternativas: 1. Eles são desinteressados e por isso não aprendem. Não possuem conhecimento suficiente, por conta de uma educação precária e por isso não evoluem na vida; 2. Os alunos são sensíveis às questões do mundo moderno que atingem a nossa subjetividade e individualidade; o fato de se sentirem rejeitados acaba por não contribuir no processo de ensino-aprendizagem, acarretando desânimo e desestimulando os mesmos, por isso é necessário recuperar a espontaneidade do ato educativo; 3. Os alunos estão sujeitos a múltiplos vínculos de trabalho, sendo alguns bastante precários, e isso faz com que eles se sintam desestimulados ao ensino que se apresente descolado da sua realidade. Alguns aspectos emergiram da discussão sobre esta questão. Podem-se destacar as seguintes considerações: Houve inicialmente uma abordagem sobre a experiência que tiveram com os professores durante a graduação. Esses docentes trazem em sua experiência com o ensino exemplos dos seus professores, afirmando que muitas vezes não percebiam interesse ou comprometimento com o aprendizado. Ao final relataram que o professor precisa mostrar interesse genuíno nos alunos; para tanto, é preciso conhecê-los, conhecer seu ambiente de trabalho e acreditar nas suas potencialidades. Com relação às experiências anteriores com aprendizagem, ao tratar da educação de adultos, as experiências de aprendizagem desse grupo relacionam-se com o modelo tradicional e reforçam que o adulto torna-se apto a aprender quando sente necessidade de aprender ou fazer algo (DAVID; PATEL, 1995). Ainda sobre os problemas identificados nos alunos foi colocado pelos docentes que o cansaço e o desânimo são visíveis em sala de aula, já que muitos deles têm mais que um emprego e são funcionários muito antigos que demonstram desinteresse e pouca participação. Nesse caso, explicaram que é preciso buscar junto ao aluno os motivos do desânimo e apontaram que a aula que só transmite conhecimentos é cansativa, sendo necessário motivar os desinteressados com um método mais participativo. Nesses casos, segundo os alunos-docentes, o professor deve conversar particularmente com o discente e buscar formas para motivá-lo. 100 Com relação ao cansaço e ao desinteresse dos alunos no ensino clínico e na sala de aula, é essencial que se considere que os alunos auxiliares de Enfermagem já possuíam uma formação prévia, trabalhavam em sua maioria em mais que um emprego e chegavam cansados em sala de aula. Dessa forma é necessário criar situações de ensino e aprendizagem nas quais a relevância dos conteúdos selecionados permita que os alunos possam interagir com o conteúdo para propiciar a reconstrução do conhecimento. Portanto o docente pode optar pelo trabalho em grupo, onde ele deve planejar o processo educativo, distribuir o trabalho entre os alunos, organizar e estimular a discussão, colaborar no processo de sistematização e síntese, buscando trabalhar as disparidades e contradições e levar o grupo a conclusões sobre a temática em foco (SOUZA, 2000). A terceira questão da enquete versa sobre a maneira como o docente percebe o papel da educação na sociedade. A maioria respondeu a alternativa A, que diz “Só através da educação é possível a transformação da sociedade e o desenvolvimento de um país”; na discussão alguns colocaram que não é só a educação que transforma: existem outras variáveis e responsabilidades, entretanto a educação tem que transformar e emancipar o ser humano. E a quarta questão da enquete falava sobre avaliação – essa questão foi discutida na oficina de avaliação, como pode ser visto a seguir. Avaliação de aprendizagem Para a realização dessa oficina foi enviado anteriormente um caso para que os alunos fizessem uma análise, baseada nos conteúdos do Complexo Temático 3, e outras referências bibliográficas sobre o tema “Avaliação pedagógica”. Inicialmente em sala de aula foi solicitado aos alunos que, após a leitura de suas respostas, as questões que foram formuladas para o caso, entregassem o material produzido ao tutor. Apresentam-se abaixo os pontos relevantes que foram destacados pelos alunos-docentes durante a discussão. A avaliação na experiência dos alunos-docentes é regida por um único instrumento: a prova escrita. Para eles esse tipo de estratégia não privilegia a análise do percurso transcorrido pelo aluno, e explicaram que ao final do processo o aluno recebe uma nota. Apontaram que este tipo de avaliação é classificatória e, portanto, não demonstra o desenvolvimento, mas utiliza-se de um critério único que não individualiza as capacidades discentes e por isso deveria ser acompanhado de outras formas de avaliação. A respeito dessas afirmações, a avaliação da aprendizagem não pode ser encarada apenas como uma formalidade legal. A visão tradicional de 101 avaliação valoriza a ação individual e competitiva; na verdade ela precisa ser encarada como um mecanismo diagnóstico, e a partir disto desenvolver metodologias que considerem o ritmo de aprendizagem e sejam capazes de ajudar o aluno a alcançar graus ascendentes de competências, habilidades e atitudes, possibilitando o alcance dos objetivos do curso (NORONHA; XAVIER, 2003). As opiniões dos alunos-docentes sobre avaliação no campo de estágio foram unânimes – colocaram que, como trabalham com um número menor de alunos, é possível avaliar as atitudes, as habilidades e o comportamento. Entretanto pontuaram a deficiência e muitas vezes a falta de instrumentos de avaliação que possam ser utilizados por todos os docentes que atuam no ensino clínico. A avaliação em campos de estágio no ensino clínico, onde o número de alunos é reduzido, torna possível captar as necessidades particulares. Isso implica levar a uma mudança na forma de ensinar, criar novas oportunidades que favoreçam ao aluno expressar-se de outra forma e compreender aquilo que quis demonstrar ou dizer e ao qual o instrumento de avaliação não foi fiel (SORDI, 2008). Com relação aos instrumentos de avaliação a autora ainda coloca que se os processos de avaliação estiverem centrados em instrumentos pouco criativos, centrados em formas convencionais, explorando aspectos de memorização e não de problematização e de autonomia intelectual, dificilmente expressarão o que o aluno aprendeu (SORDI, 2008). Para os alunos-docentes os alunos são avaliados em sala de aula apenas pelo viés da assimilação de informações ao término do processo, portanto somativa. Diante disso somente restam duas alternativas, a aprovação e a reprovação, não resultando a priori em mudanças significativas no processo ensino-aprendizagem, além de não apresentar nenhuma forma de recuperação daquilo que foi perdido. Quanto mais o trabalho pedagógico é consequente e significativo para o aluno mais êxito ele tem na avaliação. O processo de aprendizagem deve levar o aluno à reflexão e à autonomia intelectual e ainda permitir-lhe levantar hipóteses, formular caminhos e construir linhas de raciocínio. Tudo isso é contrário à visão de avaliação classificatória, onde o aluno deve responder exatamente ao que foi tratado em sala de aula. É preciso construir uma nova cultura de avaliação, onde a nota deixe de ser a protagonista da cena, cedendo lugar ao conhecimento (SORDI, 2008). O processo ideal de avaliação, segundo as opiniões verbalizadas 102 pelos alunos-docentes, deve levar em consideração a individualidade, que é acompanhada durante todo o percurso de aprendizagem. Essa avaliação, para eles, privilegia a participação do aluno e a análise da superação individual, da melhor desenvoltura no equacionamento de problemas da vida diária, que é visto em seu todo individual e social. Afirmaram ainda que esse tipo de avaliação, denominado avaliação formativa, resgata do processo informações para a melhoria do ensino, por meio do diagnóstico das situações. Além disso, traz em seu bojo a horizontalidade das relações, sendo o educando e o educador parceiros na construção do conhecimento. Corroborando tais colocações, a avaliação não pode exercer coerção sobre o aluno para submetê-lo ou para controlá-lo; assim ela não cumpre o papel da avaliação, que é ajudar na aprendizagem, promover o desenvolvimento da pessoa. Nesse caso ela terá uma vertente muito mais burocrática, de certificação, de registro, do que propriamente ser reconhecida como um componente do processo ensino-aprendizagem. A avaliação deve ser articulada, como se fosse uma tríade – ensinar, aprender e avaliar –, deve ser referenciada ao projeto pedagógico do curso para que possa levar o aluno à emancipação (SORDI, 2008). Para finalizar os alunos-docentes apresentaram algumas sugestões que foram pontuadas durante as discussões, e essas incluem: a avaliação deve ser pactuada com os alunos e ambos, professor e aluno, devem estabelecer critérios para a avaliação; o aluno deve ser ouvido, utilizando-se também como instrumento a autoavaliação; a prova escrita pode ser realizada, mas deve ser oferecido feedback ao aluno, quanto à nota e quanto à correção das questões; o professor deve se importar com o aluno e demonstrá-lo; a avaliação tem que ser coerente com o método, o conteúdo e a concepção pedagógica; a avaliação deve ser descrita no plano de ensino; na sala de aula as atitudes e a participação do aluno também devem ser avaliadas. Considerações finais Ao final desta investigação, que buscou relatar o conhecimento dos alunos-docentes declarado durante a realização de oficinas sobre concepções pedagógicas e avaliação de aprendizagem, pode-se concluir que: em relação ao primeiro tema eles reconhecem que existe uma fragmentação entre teoria e prática que causa prejuízo à continuidade do ensino na interface sala de aula/ campos de estágio, que sua prática docente está fundamentada na pedagogia tradicional, com a utilização do Power Point, que promove a transmissão do conhecimento e é uma prática centrada no professor. 103 Em relação à avaliação de aprendizagem, destacam que é somativa, classificatória, centrada na nota de uma prova escrita e não considera outras formas de avaliação. Embora os relatos dos alunos demonstrem uma tendência à utilização da pedagogia tradicional em sua prática docente, verificou-se que já existe uma reflexão crítica dessa prática destacada no texto. Assim o docente precisa conhecer a realidade social onde atua, compreender os limites e possibilidades do seu trabalho, saber que o ato docente tem uma intencionalidade. Entretanto, cabe a ele estabelecer seus limites, ter uma visão para além das aparências, apoiarse nos resultados de pesquisas científicas, não se vincular a certos modismos no campo pedagógico, se interessar genuinamente pelo aluno, não ignorar os saberes construídos pelos alunos trabalhadores e não desconsiderar a necessidade de cada aluno de conquistar sua autonomia intelectual, social e ética. Referências ALARCÃO, I.; RUA, M. Interdisciplinaridade, estágios clínicos e desenvolvimento de competências. Texto & Contexto-Enfermagem, Florianópolis, v. 14, n. 3, set. 2005. Disponível em: <http://redalyc.uaemex.mx/pdf/714/71414308.pdf>. Acesso em: 7 ago. 2011. BONFIM, M. I. R. M. et al (Coord.). Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: trabalho, saúde e educação. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz, 2009. BORDENAVE, J. E. D. Alguns fatores pedagógicos. In: SANTANA, J. P.; CASTRO, J. L. Capacitação em desenvolvimento de recursos humanos (CADRHU). Natal: Ministério da Saúde; Organização Pan-Americana de Saúde; Ed. da UFRN, 1999. p. 266-268. DAVID, T. J.; PATEL, L. Adult learning theory, problem based learning, and paediatrics. Archives of Disease in Childhood, London, v. 73, n. 4, p. 357-363, 1995. DEMO, P. Política social do conhecimento: sobre futuros do combate à pobreza. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. FREIRE, P. Política e educação: ensaios. São Paulo: Cortez, 2001. NORONHA, A, B.; XAVIER, C. A pedagogia em EaD. Radis: comunicação em saúde, Rio de Janeiro, n. 6, p. 11-12, jan./fev. 2003. PEREIRA, A. L. F. As tendências pedagógicas e a prática educativa nas ciências da saúde. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 19, n. 5, p. 1527-1534, 2003. SORDI, M. Avaliação na universidade: alguns desafios. Revista Pedagógica Unochapecó, Florianópolis, v. 10, n. 21, p. 185-190, 2008. SOUZA, A. Educação em enfermagem na América Latina nos primórdios do século 21. In: SENA, R. R. Educacion de enfermeria em América Latina. Bogota: Ed. Real, 2000. p. 50-54. 104 O DESAFIO DA MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Adriana Paula Congro Michelone1 Elza de Fátima Ribeiro Higa2 Paulo Marcondes Carvalho Junior3 Resumo A revolução tecnológica nos últimos anos impulsionou o surgimento de novos canais de circulação do conhecimento organizando-se nas denominadas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) que trazem mudanças sociais significativas. As exigências econômicas do mundo globalizado para Behrens (2000) afetam a formação profissional em todas as áreas do conhecimento e, nesse sentido, a nosso ver, também impulsionam mudanças significativas nas relações sociais e profissionais. Frente a essa realidade, a postura do estudante não pode mais ser passiva. O que se espera, é que o processo de ensino/ aprendizagem tenha metodologias capazes de torná-lo crítico, atuante e pesquisador de maneira que assim, o mesmo seja autônomo, criativo, competente para solucionar problemas advindos do mundo do trabalho e apontar caminhos para as mudanças requeridas.Esse estudo relata a experiência das reflexões sobre como deve ser o papel do tutor na Educação a Distância (EaD) suscitadas durante o desenvolvimento da 2ª turma do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde (CFDEPTAS), nível especialização. Descritores: Ensino, Educação Técnica em Enfermagem, Educação a Distância. 1. Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela Universidade de São Paulo. Docente da Disciplina de Enfermagem Clínica da Faculdade de Medicina de Marília. Coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente do Curso de Especialização em Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde (CFDEPTAS)/EaD-Fiocruz, locado na Faculdade de Medicina de Marília. [email protected] 2. Enfermeira. Doutora em Enfermagem pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP)-USP. Docente da Disciplina de Educação em Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina de Marília. Tutora do CFDEPTAS/EaD-Fiocruz. hirifael@ gmail.com 3. Médico. Doutor em Engenharia Elétrica pela Universidade Estadual em Campinhas (Unicamp). Docente da Disciplina de Informática em Saúde da Faculdade de Medicina de Marília. Tutor do CFDEPTAS/EaD-Fiocruz. [email protected] 105 Introdução A revolução tecnológica nos últimos anos impulsionou o surgimento de novos canais de circulação do conhecimento, organizando-se nas denominadas tecnologias de informação e comunicação (TICs), que trazem mudanças sociais significativas. O uso da internet na educação destaca-se dentre as TICs, e vem contribuindo com a busca do constante aprimoramento da ciência. Na atualidade a disseminação de informação e conhecimento ganha novos espaços, sobretudo com a ampliação do uso da internet (KENSKI, 2003). As exigências econômicas do mundo globalizado para Behrens (2000) afetam a formação profissional em todas as áreas do conhecimento e, nesse sentido, a nosso ver, também impulsionam mudanças significativas nas relações sociais e profissionais. Perante essa realidade, a postura do estudante não pode mais ser passiva. O que se espera é que o processo de ensino-aprendizagem tenha metodologias capazes de torná-lo crítico, atuante e pesquisador de maneira que, assim, o mesmo seja autônomo, criativo, competente para solucionar problemas advindos do mundo do trabalho e apontar caminhos para as mudanças requeridas. Este estudo relata a experiência das reflexões sobre como deve ser o papel do tutor na educação a distância (EaD). Elas foram suscitadas durante o desenvolvimento da segunda turma do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, Nível Especialização. Segundo Bomfim et al. (2009) o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica em Saúde é desenvolvido em parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), órgão do Ministério da Saúde, articulado com instituições de ensino superior (IES) de todo o país, de modo descentralizado, onde em cada IES estrutura-se um Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) que se responsabiliza pelo desenvolvimento do curso na região. A Faculdade de Medicina de Marília (Famema), como representativa de uma IES, estruturou um Niad para o desenvolvimento desse curso. Os alunos matriculados são os profissionais de Saúde integrados a instituições que qualificam os trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS), e seu requisito de acesso indica que deve ser graduado na área da Saúde e estar vinculado a uma instituição credenciada na educação profissional, em nível médio, atuando como docente, instrutor ou supervisor de estágio. Essa proposta de formação de professores tem como referência o significado social da ação educativa no âmbito da saúde pública e busca a formação de 106 profissionais comprometidos com a transformação da educação e do cuidado em saúde. Assim, os objetivos do Curso são: oferecer elementos essenciais à formação dos alunos-docentes das diferentes categorias profissionais envolvidas na educação profissional técnica em nível médio, tendo como referência central o significado social da ação educativa, no âmbito do SUS; 2. propiciar aos alunos-docentes os requisitos necessários à compreensão ampla e crítica da realidade na qual se inscrevem as práticas em saúde e em educação, condição fundamental à participação ativa no processo de ensino-aprendizagem e à atuação crítica nas lutas coletivas pela transformação dessa mesma realidade; 3. desenvolver uma formação teórico-prática consistente para a adoção de uma ação docente crítica e emancipadora, que possibilite ao coletivo de professores escolher e desenvolver, com autonomia social e ética, formas melhores de atuação, com base nas necessidades de saúde das pessoas e das populações (BOMFIM et al. 2009, p. 14). Desse modo, foram selecionados nas IES tutores cujos perfis de atuação deveriam ser compatíveis com a sua centralidade do curso, que na sua concepção formativa busca formar cidadãos críticos e transformadores na realidade em que atuam. A concepção político-pedagógica do curso pauta-se: na capacidade de intervenção humana de modo individual e coletivo em seu contexto; no protagonismo em uma história que se constrói na formação e na saúde do país; no desenvolvimento da capacidade de intervenção crítica por meio da conscientização dos trabalhadores e formadores em saúde; nos valores e princípios da reforma sanitária brasileira e na luta permanente em busca da operacionalização do SUS. Para isso, o planejamento do curso ultrapassa a possibilidade de transmissão de conhecimentos com boas estratégias didáticas e materiais pedagógicos adequados, buscando problematizar a realidade de cuidados e formação em saúde. Assim sendo, o curso foi organizado em três Complexos Temáticos (CT), definidos a partir dos objetivos e da concepção pedagógica que se estruturou partindo do vínculo do mundo do trabalho com a escola. Sua organização favoreceu diferentes formas de pensar, sentir e agir em saúde: evitando a fragmentação, os conhecimentos teóricos estimulam a intervenção crítica transformadora dos alunos docentes nas realidades em que atuam; desse modo, cada complexo temático se constituiu em um elo de uma mesma corrente, tratando de temas com sentido real e como parte de um processo que busca a correlação entre teoria e prática, e impulsiona ações individuais e coletivas a partir da interpretação e transformação do mundo do trabalho 107 dos docentes, por meio de subsídios para interpretá-lo. Os CTs foram assim organizados: CT1 – Trabalho, saúde e educação; CT2 – O Sistema Único de Saúde (SUS) e os processos de trabalho em Saúde; e CT3 – Organização pedagógica do trabalho docente em saúde (BOMFIM et al., 2009, p. 19). Além da estrutura organizada nesses três CTs, o curso também disponibilizou textos complementares para discussão da prática articulada ao conteúdo. Diante disso o objetivo deste relato é descrever, na visão dos tutores, algumas das reflexões suscitadas durante o curso sobre o papel de mediador na EaD, à luz das atribuições tutoriais preconizadas pela Ensp/Fiocruz. Metodologia Relato de experiência que é por natureza descritiva, com clareza e precisão, a temática do estudo realizado, a trajetória metodológica para o alcance dos objetivos e os resultados obtidos (SANTOS, 2000; SAMPIERI; COLLADO; LÚCIO, 2006). Para esse processo, foi tomado como base o papel do tutor previamente estabelecido pela escola, acompanhado de reflexões durante o desenvolvimento da formação da segunda turma do Niad – Famema. Resultados e discussão Na proposta de atribuições da tutoria segundo Bomfim et al. (2009, p. 24-25), estão: • Assumir, integralmente, o apoio ao processo de aprendizagem dos alunos-docentes, tendo como referência que a saúde é construção social e histórica e expressa valores e projetos em disputa; • Identificar as diferenças entre as trajetórias de seus alunos, respeitando ritmos próprios, valorizando conquistas, procurando integrá-los e ajudando-os a enfrentar os desafios que o curso impõe na busca de uma aprendizagem significativa fundada na problematização dos processos de trabalho em Saúde e em educação; • Desenvolver procedimentos que garantam a interação e a comunicação mediatizada com os alunos, com ênfase no diálogo, com base nos valores e princípios da Reforma Sanitária, tendo em vista o desafio de tornar o SUS pleno; • Avaliar o percurso de cada aluno do curso, a partir do compromisso ético com o seu progresso e com o significado social da ação docente em saúde; 108 • Analisar, selecionar e fazer uso de outras tecnologias, além das previstas para o Curso, que possam complementar o processo de formação do aluno, na busca de um novo pensar, sentir e agir em educação e em saúde. O compromisso assumido nos instigou também à busca de aprofundamento teórico sobre essa especificidade educativa. Moran, Masetto e Behrens (2009) apontam que o uso da internet na educação abre novas possibilidades educacionais, favorece a pesquisa, a relação dos participantes, contribui com o planejamento educacional, para a avaliação da aprendizagem, a troca de experiências e materiais, mas, também, impõe aos educadores desafios e incertezas relacionadas ao processo de ensino e aprendizagem, gerando assim, dentre outros aspectos, a necessidade de compreensão da mediação pedagógica na EaD. Em busca de assumir integralmente esse apoio do processo de ensino-aprendizagem, foi muito importante o desenvolvimento da mediação pedagógica para o entendimento da expressividade de cada um em seu percurso individual, e que também pudesse fazer sentido ao docente em formação. Segundo Masetto (2000), a mediação pedagógica pode ser compreendida pela postura do professor que se coloca como facilitador, incentivador e motivador da aprendizagem, ou seja, o professor assume, com essa atitude, o papel de uma ponte móvel que se equilibra entre o aprendiz e seu esquema referencial e a aprendizagem requerida do fenômeno estudado, tendo em vista contribuir para que o estudante atinja os objetivos propostos para o alcance e o aprofundamento dos conhecimentos necessários. Ainda Masetto (2009) aponta que no processo de comunicação a distância os sujeitos são privados dos sinais físicos não verbais do processo comunicativo; no entanto, a EaD oferece outras novas possibilidades que são consideradas estimuladoras à aprendizagem. No que se refere à interação e à comunicação mediatizadas, entendemos como Freire, Andrade e Cavalcante (2006) que o ato de ensinar nem sempre apresenta como resultado final a aprendizagem do estudante; pois, na realidade, aprender depende muito mais da vontade do estudante do que do desejo do professor de ensinar e, com o ensino desatualizado em relação ao ritmo social vivenciado no contexto do estudante, ele está cada vez mais desmotivado para aprender em sala de aula. Nesse sentido, fatores externos à sala de aula, proporcionados pelas novas tecnologias de informação e comunicação (TICs) podem ser estimulantes. Acompanha as TICs uma diversidade de materiais 109 didáticos pedagógicos que facilitam os processos de mediação e, com isso, a aprendizagem, desde que ela seja efetivamente utilizada para aprofundamento nos processos pedagógicos, no currículo, na avaliação e na relação professor/ estudante para construção do conhecimento. Nesse aspecto, por mais que nos empenhássemos, pudemos perceber dificuldades dos estudantes trabalhadores do ponto de vista técnico da EaD, e também de conhecimentos específicos da formação para atuação em saúde pública, mas continuamos respeitando os ritmos individuais em busca da construção coletiva do conhecimento, pois acreditamos que a presença física apenas também não garante a aprendizagem do estudante. Entendemos, assim como Levy (1999), que a EaD apresenta-se como uma boa alternativa à educação convencional, pois combina tecnologias da informação e comunicação com metodologias educacionais, considerando pressupostos filosóficos e pedagógicos que podem fortalecer e consolidar o desenvolvimento da aprendizagem e a autonomia do estudante. Do ponto de vista do professor, em uma sociedade de informação é desejável uma prática além da produção individual, para uma produção coletiva do conhecimento por meio de comunicação, colaboração e criatividade. Esse mesmo autor aponta que a educação no mundo contemporâneo deve considerar a velocidade da produção de saberes, o que implica a aprendizagem humana continuada, e que o mundo do trabalho exige cada vez mais saberes e produção de conhecimentos e que, nesse contexto, as TICs são estratégias que ancoram e possibilitam as mudanças requeridas. Desse modo caminhamos estimulando a leitura dos CTs, bem como investindo no desenvolvimento das atividades de articulação (AA), que focalizavam a problematização da prática do trabalho docente, constituindo assim uma prática reflexiva que poderia impulsionar melhorias na educação e no cuidado em saúde. Nossas inquietações conduziram-nos ao encontro com Soek e Haracemik (2008), indicando que a EaD, na contemporaneidade, aponta para vários componentes: o material didático, as tecnologias envolvidas, o grupo de estudantes e de professores. Nesse cenário a relação educativa está fundamentalmente centrada na comunicação que possibilita novas maneiras de aprender em ambientes colaborativos. Indicam que o papel do tutor sustenta-se no processo de fazer e aprender, na criatividade, regulação e gestão do processo de aprendizagem, onde se estabelecem parcerias para ampliação do conhecimento. O professor que utiliza as TICs à metodologias ativas de aprendizagem, desenvolvem habilidades a tecnologia, prática pedagógica e teorias educacionais que possibilitam ao estudante a reflexão sobre sua 110 própria prática. Desse modo, é importante ao tutor da EaD o conhecimento da cooperatividade, da ética e da autonomia dos sujeitos envolvidos, tendo em vista o desenvolvimento de suas funções: acolher, acompanhar, avaliar, orientar, motivar, mediar e facilitar o processo de ensino-aprendizagem. Analisamos em nosso material didático pedagógico, nas estratégias educacionais que estávamos utilizando, o que realmente vinha fazendo sentido para aquele grupo de docentes trabalhadores, tendo a compreensão de que, no contexto da EaD, as possibilidades educacionais são múltiplas e atrativas; assim, é fundamental que se possibilite o acesso às tecnologias, à informação significativa e à mediação de professores adequadamente capacitados que são potencializadores da aprendizagem (LOPES; XAVIER, 2007). De alguma maneira, na realização das atividades, nos recados deixados no mural, nos encontros nos fóruns para construção coletiva do conhecimento e até mesmo nos e-mails e telefonemas procurávamos estimular a aprendizagem continuada. Garcia (2007) descreve que o tutor deve atentar à autonomia de si e do estudante, imposta pelo ciberespaço, e para duas variáveis inerentes à modalidade virtual de ensino e aprendizagem, que exigem um constante monitoramento: a distância transacional e o feedback. Indica também que a habilidade de comunicação do professor na EaD deve privilegiar as necessidades individuais dos estudantes, para que promova as relações necessárias que contribuam efetivamente com a construção de seu conhecimento. Para que ocorra uma aprendizagem significativa, a educação precisa problematizar e contextualizar os saberes, tendo em vista sua possibilidade de aplicação em diferentes situações. Para isso, na EaD é preciso que o professor assuma a responsabilidade de promover uma postura dialógica, aberta e colaborativa. O processo de ensino-aprendizagem, diante dos expressivos avanços tecnológicos, necessita levar em consideração a importância da educação permanente, a produção compartilhada de conhecimentos, a autonomia, a interação e a interatividade (MESSA, 2010). Mattei e Castro (2008) apontam que na EaD a maneira de comunicação dos tutores potencializa as interações socioafetivas, e a postura do professor não pode ser de transmissor de conhecimento, mas sim de mediador, orientador, incentivador e facilitador da troca de informações e de novas ideias, o que ocorre mediante a interação e a colaboração. As autoras indicam também que a comunicação que se estabelece na ação educativa, na EaD, deve dirigir-se no sentido de promover, orientar, estimular, auxiliar e desencadear processos de aprendizagem. 111 Considerações finais Essa experiência de assumir, integralmente, a condição de apoiar o processo de aprendizagem dos alunos-docentes, pautada na possibilidade de construção histórica e social de conhecimento, nos permitiu perceber a grande responsabilidade assumida na educação dos trabalhadores da Saúde em nosso país. E, mesmo com tantas dificuldades impostas na atuação dos estudantes no mundo do trabalho, foi possível manter a maioria dos participantes reflexivos – claro que cada um em seu ritmo. Nessa trajetória as diferenças individuais foram emergindo, e continuamos identificando e valorizando os pequenos passos em busca de uma aprendizagem significativa para cada um que se mantinha no curso. A participação dos estudantes nos encontros presenciais, nos fóruns, os recados deixados no mural, os emails enviados, os telefonemas que obtiveram êxito, articulados à concepção pedagógica e ao entendimento do papel de mediador, permitiram valorizar cada passo como uma conquista na garantia de procedimentos interativos, dialógicos e potencializadores da aprendizagem individual e coletiva. A avaliação do percurso de cada estudante e do processo de ensino-aprendizagem propiciou o avanço necessário em busca de uma formação contextualizada e humanizada, tão requerida na área da Saúde, em especial, na formação de docentes. De modo geral a experiência de tutor na modalidade de EaD exige saberes didático-pedagógicos, conhecimento da tecnologia e boa estratégia comunicacional. De certa maneira, é estimulante e desafiadora a possibilidade de construção coletiva de conhecimento, especialmente na educação técnica em Saúde, onde as Diretrizes Curriculares Nacionais apontam para uma formação em defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) em prol do resgate à cidadania. No curso desenvolvido no Niad – Famema caminhamos na ampliação do olhar para mediação pedagógica à medida que fomos vivenciando essa modalidade educacional, e consideramos que as atribuições do tutor, previamente estabelecidas, contribuíram para a trajetória percorrida. 112 Referências BEHRENS, M. A. Projetos de aprendizagem colaborativa num paradigma emergente. In: MORAN, J. M.; MASETTO, M.; BEHRENS, M. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2000. p. 67-132. BOMFIM et al. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: orientações. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz/Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Educação a Distância, 2009. 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Acesso em: maio 2011. 113 114 PARTICIPAÇÃO DOS DOCENTES NO PLANEJAMENTO DO PROCESSO EDUCACIONAL APÓS O programa TECSAÚDE Rika Miyahara Kobayashi Heloisa Helena Ciqueto Peres Claúdia Mara de Melo Tavares Maria Madalena Januário Leite Ana Maria Rojas Carrasco Danielly Negrão de Oliveira Guassú Deborah Rachel Audebert Delage da Silva Erica Gomes Pereira Jaqueline Alcântara Marcelino da Silva Teresa Cristina Prochet Yeda Aparecida de Oliveira Duarte RESUMO Este estudo busca identificar se os docentes participam do planejamento do processo educacional nas escolas de educação profissional de nível técnico, onde atuam, após a realização do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, além de verificar de que forma tem se dado a participação. O estudo é exploratório, descritivo, realizado no Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. A população foi composta por 72 alunos da segunda turma do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. Para a coleta de dados foi utilizado um questionário composto por duas partes: a primeira para caracterizar o perfil do docente quanto à formação acadêmica e a segunda para caracterizar a sua atuação docente no planejamento do processo educacional. Os resultados evidenciaram que os alunos, docentes da educação profissional, passaram a participar dos processos educativos de forma mais fundamentada, conhecendo como se dá a sua inserção no trabalho, em favor do ensino para o Sistema Único de Saúde (SUS). técnico. Descritores: formação docente; planejamento educacional; ensino 115 INTRODUÇÃO O TecSaúde é um Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo, desenvolvido pelo Governo do Estado de São Paulo com a participação das Secretarias da Saúde, Desenvolvimento, Gestão Pública (por meio da Fundação de Desenvolvimento Administrativo – Fundap, que é o órgão executor do Programa) e Educação e instituído pelo Decreto Estadual número 53.848, de 19 de dezembro de 2008. Esse Programa é dirigido aos profissionais da área de Saúde que buscam complementar sua formação com qualificação profissional e certificação reconhecida. Além disso, o Programa gera impacto na qualidade dos serviços de Saúde prestados pelo sistema de Saúde, em face da qualificação desses profissionais, e contribui para o aumento do nível de escolaridade da população por meio da formação de trabalhadores técnicos (SÃO PAULO, 2010). Para tanto foi realizada parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) para o desenvolvimento e execução de um curso de pós-graduação lato sensu, na modalidade ensino a distância (EaD), com duração de dez meses e carga horária de 540 horas, destinado aos professores das escolas participantes do TecSaúde, que não fizeram curso de licenciatura ou não possuem outra qualificação reconhecida para docência. O curso adotou como marco conceitual e como eixo de sustentação de toda a estrutura curricular a Reforma Sanitária, seus valores e princípios, a história das lutas sociais por saúde no Brasil, a fim de promover a necessária reflexão e o aperfeiçoamento dos pactos em defesa da vida, do SUS e de gestão, resultando na qualificação diferenciada dos profissionais (BOMFIM, 2009). O referido curso confere o título de especialista na docência em educação profissional técnica de nível médio na área da Saúde, titulação que equivale à licenciatura plena na área de educação profissional. É contemplado por três complexos temáticos (CT), em que o CT1 aborda a relação entre educação, trabalho e saúde; o CT2 aborda o SUS; e o CT3, a organização pedagógica do trabalho docente em Saúde, quando discute sobre o tema do planejamento educacional. Neste estudo, o planejamento será entendido como um processo dentro de uma escola real, destinado aos alunos-trabalhadores do SUS. Assim, o planejamento é rodeado de incertezas, imprecisões, surpresas, rejeições, apoio dos atores diversos (MATUS, 1991), no qual se organizam intencionalmente as ações, no qual se deve possuir um horizonte, mas ao mesmo tempo estar 116 ancorado na realidade que se define, que deve promover uma mediação entre o presente e o futuro, visto que nossas ações presentes terão desdobramentos futuros. O planejamento deve ter plasticidade necessária para incorporar as mudanças e os movimentos da realidade; deve ter coerência para a atuação de cada ator social comprometido com o projeto de sua sociedade, que se pretende construir. Nesse sentido, para cada docente a ação planejada deve estar coadunada com a proposta político-pedagógica da escola em que atua, a qual deve ter claramente definidos os objetivos político-pedagógicos, que não se esgotam no universo escolar, mas expressam compromisso com a sociedade, centrado na defesa dos direitos da classe trabalhadora e da população que tem direito ao SUS (BOMFIM, 2009a). Assim, considerando o planejamento enquanto um recurso essencial para o trabalho docente, este estudo busca identificar se os docentes elaboram ou participam dos planejamentos educacionais após a realização do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde e de que forma tem se dado esta participação. O planejamento no curso de formação docente para educação profissional em saúde. A educação, como processo, jamais pode ser desenvolvida fora do contexto social da escola, na qual o aluno está inserido como agente e paciente de suas circunstâncias existenciais. Por isso todo o processo educacional requer um planejamento que responda socialmente, como também um planejamento em nível de escola e um planejamento específico de ensino, relativo às diferentes disciplinas e aos diferentes conteúdos e atividades a serem ministrados na escola (MENEGOLLA; SANT’ANA, 2008) A ação de planejar faz parte da história do homem, pois a vontade de transformar aspirações em realidade objetiva é uma preocupação que acompanha a maioria das pessoas. Pensar e planejar são atos que agem concomitantemente (KLOSOUSKI; KLEVI, 2008; BAFFI, 2002). O ato de planejar, como todos os outros atos humanos, implica escolhas que subsidiam o ser humano no encaminhamento de suas ações e na obtenção de resultados desejados. São opções político-filosóficas que estabelecem os fins de uma determinada ação, quer no macro ou micro espaço da sociedade, na medida em que se está comprometido com as finalidades sociais e políticas; uma opção científica, pois, não se pode planejar sem um conhecimento da 117 realidade; e também técnica, considerando-se que o planejamento exige uma definição de meios eficientes para se obter os resultados (LUCKESI, 1992). O planejamento é, acima de tudo, uma atitude crítico-reflexiva do educador diante de seu trabalho docente. Essa reflexão filosófica busca a raiz do problema, faz uso do método científico e exige visão da totalidade na qual o fenômeno aparece (SAVIANI, 1987). Nesse sentido, pode-se, pois, afirmar que o planejamento do ensino é o processo de pensar que busca a raiz do problema, fazendo uso do método científico e que exige a visão de totalidade dos problemas da educação escolar, no processo ensino-aprendizagem (FUSARI, 1989). A atividade de planejar, como um modo de dimensionar política, científica e tecnicamente a atividade escolar, deve ser resultado da contribuição de todos aqueles que compõem o corpo profissional da escola. É preciso que todos decidam, conjuntamente, o que fazer e como fazer. Na medida em que é o conjunto de profissionais da escola que constitui o seu corpo de trabalho, o planejamento das atividades também deve ser um ato seu; portanto, coletivo. Decisões individuais e isoladas não são suficientes para construir resultados de uma atividade que é coletiva. As atividades individuais e isoladas não são inócuas, mas são insuficientes para produzir resultados significativos no coletivo (LUCKESI, 1992). Entretanto, na prática atual docente, o planejamento tem-se reduzido à atividade em que o professor preenche e entrega à secretaria da escola um formulário. Este é previamente padronizado e diagramado em colunas, onde o docente redige os seus “objetivos gerais”, “objetivos específicos”, “conteúdos”, “estratégias” e “avaliação”. Em muitos casos, os professores copiam ou fazem reproduções do plano anterior e o entregam à secretaria da escola, com a sensação de mais uma atividade burocrática cumprida (FUSARI, 1989). E, ainda, ao realizar-se a caracterização do perfil docente e da sua inserção no trabalho durante o desenvolvimento do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, foco deste estudo, verificou-se que poucos docentes informaram realizar o planejamento no processo educativo. E, quando o faziam, nem sempre tinham fundamentação científica e autonomia necessária para realizá-lo, o que motivou a realização deste estudo. OBJETIVOS Identificar a participação dos docentes da educação profissional de 118 nível técnico em Saúde no planejamento do processo educacional após realizar o Programa TecSaúde. METODOLOGIA Trata-se de um estudo exploratório, descritivo, realizado no Niad da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (Niad–EEUSP). Cenário do estudo e sujeitos da pesquisa A Escola de Enfermagem da USP, parceira da Ensp/Fiocruz na formação de docentes, constituiu um Niad responsável pelo curso na região da Grande São Paulo e Baixada Santista, e contou com nove tutores. A população foi composta por 94 docentes de cursos técnicos em Enfermagem, alunos da segunda turma do Niad da Universidade de São Paulo (SP), do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, e ao término do curso e 72 (76,6%) responderam ao questionário. Instrumento de coleta de dados e procedimento Para a coleta de dados foi utilizado um questionário composto por duas partes: a primeira para caracterizar o perfil do docente quanto à formação acadêmica e a segunda para caracterizar a sua atuação docente no planejamento do processo educacional. No que diz respeito ao procedimento de coleta de dados, esse projeto foi enviado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da USP (processo número 648/2007/CE-EEUSP). Antes de aplicar o questionário, os sujeitos foram esclarecidos quanto aos objetivos da pesquisa, assegurando-lhes a garantia do anonimato e a liberdade em participar ou não do estudo, sem que isso lhes causasse prejuízo de qualquer natureza. Foi aplicado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que, após leitura e concordância, foi assinado por cada participante, individualmente. A coleta de dados ocorreu posteriormente ao término do CT3 e anterior à finalização do curso, utilizando-se o mesmo instrumento com questões fechadas e duas abertas, verificando sobre a participação docente e a forma de participação na elaboração do projeto pedagógico da escola. Os resultados das questões fechadas foram apresentados em números absolutos e percentuais, utilizando-se o programa de Excel, e as questões abertas tiveram suas respostas classificadas, categorizadas para posterior análise. 119 RESULTADOS E ANÁLISE No que se refere ao perfil dos docentes, verificou-se que do total de 72 alunos respondentes ao questionário no final do curso, a maioria era do sexo feminino (83,3%), adulto com idade prevalente variando entre 24 e 34 anos (36,2%). Esses docentes iniciaram suas atividades laborativas na área assistencial (65,3%); entretanto, houve também quem tenha iniciado na área de ensino (19,4%). O fato ocasiona grande preocupação, considerando que o docente ainda não tem experiência profissional para atuação docente. Madeira e Lima (2010) apontam que a identificação das professoras se faz pelo saber prático ou da experiência, ou seja, elas se definem como profissionais de sala de aula que, para ensinar bem, necessitam do fazer pedagógico peculiar. Nesse sentido, enfatizam o papel da experiência como atividade intrínseca à profissão, mesmo reconhecendo que, por vezes, fatores externos podem regular sua prática, o que não reduz nem elimina a compreensão de que o fazer pedagógico do professor precisa ser, com certa constância, renovado e ressignificado. No que se refere ao perfil salarial, verificou-se que está entre R$ 2.000,00 e R$ 3.999,00 (65,2%), e carga horária de trabalho variando de trinta a até sessenta horas (30h a 60h). O dado da carga horária de trabalho, que varia de até trinta a sessenta horas, mostra a condição de precarização do trabalho do enfermeiro-docente. Há ainda os que acumulam mais de um trabalho, o que ocasiona sobrecarga de trabalho, além da condição de serem mulheres com responsabilidades domésticas ou maternas e que podem ter suas atividades, principalmente docentes por falta de tempo adequado e previsto para o planejamento de ensino, preparo de aulas, correção de atividades, entre outras que são atividades realizadas fora da sala de aula. quanto ao cargo ocupado no primeiro vínculo de trabalho, os prevalentes foram de enfermeira (45,7%), de docente (20%), de gestão (118,6%), e há os que atuam como profissionais de nível técnico (auxiliar ou técnico) (68,6%). No segundo vínculo, apontaram para docência (81,48%), e como enfermeiros assistenciais (18,5%). A atuação dos profissionais de nível superior nos cargos de nível técnico também demonstra a dificuldade dos profissionais de se inserirem no mercado de trabalho após conclusão dos cursos superiores. Assim, os mesmos buscam cursos de pós-graduação como um meio de continuar se qualificando para o trabalho. 120 Essa constatação reflete o aumento da procura por cursos de pósgraduação lato sensu, uma vez que 43 sujeitos (60%) que responderam à questão referiram que realizaram cursos de pós-graduação principalmente nas áreas de saúde do adulto (33,3%), nas áreas cardiovascular, urgências e emergências (27,1%) e saúde pública (14,6 %). Quanto à formação pedagógica, durante os cursos de pós-graduação a maioria de 25 (34%) informaram que não tiveram conteúdos nesta temática e, dos 23 (31,9%) que confirmaram, apenas 19 (26,49%) consideraram que o conteúdo foi suficiente. Atualmente a busca da qualificação por meio da pós-graduação lato sensu não é mais um privilégio e sim uma necessidade, considerando-se que houve um aumento do número de cursos de nível superior e que ainda falta em alguns profissionais a qualificação necessária ao trabalho. Assim, com a falta de absorção desses trabalhadores no mercado de trabalho, os mesmos partem para uma melhor qualificação, principalmente voltada para a inserção na área hospitalar, justificando as áreas de maior concentração (SANTOS; WHITAKER; ZANEI, 2007), e também na área da Saúde Pública, principalmente voltados para a atuação no Programa Saúde da Família (PSF). Analisando as condições de precarização do trabalho e da busca de qualificação para o trabalho, Kovacs (2002) aponta a globalização como um dos referenciais centrais da explicação de mudanças nos padrões de trabalho, emprego, qualificação e requisitos de formação. E que o ensino é um dos principais meios de adaptação, constituindo-se uma fonte importante da alta performance da manutenção ou aumento da produtividade, sendo subjacente a ideia de que a qualificação dos recursos humanos condiciona a posição competitiva das empresas, dos países e dos blocos econômicos, em uma economia na qual as atividades estratégicas se tornam intensivas em tecnologia de informação e conhecimento, o que reflete os dados obtidos. Na dimensão do trabalho docente, conforme consta na Tabela 1, a atuação docente ocorre em diferentes atividades pedagógicas. 121 Tabela 1. Distribuição de atividades realizadas ou não pelos docentes, na escola. São Paulo, 2011. Atividades Sim Não Total Nº % Nº % Nº % Participação na elaboração de projeto político-pedagógico 59 81,9 13 18,1 72 100 Elaboração de plano de aula 48 66,7 24 33,3 72 100 Participação na elaboração de plano de curso 21 29,2 51 70,8 72 100 Reuniões pedagógicas 57 79,2 15 20,8 72 100 Conselho de classe 37 51,4 35 48,6 72 100 Desenvolvimento de aulas em sala de aula 56 77,8 16 22,2 72 100 Supervisão de estágio 52 72,2 20 27,8 72 100 Avaliação da aprendizagem 54 75,0 18 25,0 72 100 Avaliação de curso/disciplina 31 43,1 41 56,9 72 100 Avaliação de egresso 9 12,5 63 87,5 72 100 Pesquisa na área de Enfermagem ou Educação 26 36,1 46 63,9 72 100 Participação em curso de atualização com investimento institucional 25 34,7 47 65,3 72 100 Organização de cursos, eventos de atualização para educação profissional 25 34,7 47 65,3 72 100 No âmbito do planejamento, participam da elaboração do projeto pedagógico, do plano de curso e de aula. Foi encontrada também a participação nas reuniões pedagógicas e conselhos de classe, que são alguns dos momentos de riqueza para a construção coletiva, quer no âmbito da capacitação docente ou para melhorias internas na escola, ou, ainda, para reavaliar coletivamente o progresso ou não de cada aluno, na escola. Dentre as atividades docentes, citam ainda aulas em salas de aula e a supervisão de estágios, e a avaliação também foi contemplada, quer no olhar da aprendizagem da disciplina ou do curso, e pouco no olhar dos egressos. A pesquisa ainda é pouco realizada pelos docentes, bem como há poucos investimentos na atualização e capacitação docente, na organização de eventos de atualização, por parte da instituição escolar. Essa condição pode dificultar a qualidade do ensino, considerando-se 122 que o mundo em contínua transformação requer dos profissionais a contínua condição de estar competente para o trabalho. Freitas (2007) salienta a necessidade de investir-se na criação de espaços de formação docente, pois assim poderão ser geradas mudanças importantes na qualidade do ensino, uma vez que busca a preparação política, científica e pedagógica de professores para o magistério... possibilitando, ainda, a revisão da prática daqueles que já são professores, o que também é uma realidade na educação profissional. Resgatando o planejamento enquanto processo de trabalho docente, este pode ser realizado em diferentes níveis de atuação docente; e, para aprofundar a compreensão sobre o assunto, foi perguntado como participava do planejamento após a realização do curso de formação docente. Nas respostas, obtivemos três categorias: os docentes informaram que passaram a participar da elaboração do projeto pedagógico por meio de reuniões pedagógicas, trabalhando sobre o núcleo estruturante, por meio de reuniões interdisciplinares, discutindo mudanças no processo pedagógico escolar, pela visão mais crítica da docência e de como a instituição lida com seus colaboradores e alunos. Com as reuniões de professores, todos passaram a ter o direito de manifestações e tal possibilidade ocasionou a participação na elaboração dos projetos, mas essa participação era muito mais facilitada enquanto atuavam como coordenadores (quatro respostas). Esses docentes, possivelmente, de alguma forma, iniciaram sua trajetória de intervenção no mundo do trabalho, com o direito à participação, à construção coletiva, a um planejamento participativo, perante uma realidade objetiva. Outros informaram não ter tido nenhum contato com o projeto pedagógico, mesmo durante ou após o curso. Entretanto, no decorrer do curso, puderam dar sugestões com o olhar crítico na elaboração do plano de curso e dos planos de aula, por meio das reuniões com outros docentes e supervisores de estágios. E, por fim, algumas respostas mostraram não ter havido participação na elaboração, discussão, revisão, do projeto pedagógico da escola em que desenvolviam aulas e acompanhavam estágio. As docentes informaram que não houve apresentações dos projetos pedagógicos, ou que, quando entravam em contato, era referido que os mesmos já estavam desatualizados. Essa apresentação ou reconhecimento do projeto pedagógico somente ocorria por meio da intermediação da coordenadora geral ou diretora da instituição. O resultado mostra indícios de que ainda se mantém a fragmentação do trabalho 123 de quem pensa e de quem realiza o trabalho, e manutenção e fortalecimento das relações de poder. No que se refere à percepção do docente em relação à diferença na sua participação no projeto pedagógico depois de realizar o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, os docentes informaram ter percebido diferença na sua participação do projeto pedagógico, apontando que esta passou a ser efetiva na elaboração do projeto político-pedagógico (PPP), por entenderem melhor e com maior visão. A escola passou a solicitar a participação dos docentes, pela nova visão de PPP, e discutiu-se a proposição de mudanças futuras relacionadas ao preparo dos alunos para uma realidade. Houve também uma melhor participação por meio da elaboração do plano de curso, de ensino ou ainda de aula, integrando a nova turma para elaboração. E também o estímulo da visão crítica e da forma de abordar os alunos, percebendo o aluno inserido em um contexto mais amplo como o social, o político, da comunidade e não isolado do mundo social, pois os assuntos abordados promoveram o conhecimento para compreender o projeto pedagógico, e a construção do plano de ensino. Por outro lado, alguns, apesar de não terem participado na elaboração ou discussão do PPP, perceberam mudanças na atuação docente, com aulas mais explicativas, e utilizaram os conteúdos apreendidos na prática docente; adquiriram conhecimento sobre a importância do planejamento no cotidiano da sala de aula, e que a prática seria outra, pois, a partir de então, com outra visão, principalmente sobre avaliação e como utilizá-la no processo pedagógico, adquiriram recursos para mediar reflexões acerca da prática docente. E, finalmente, informaram o aprimoramento de seu conhecimento sobre a visão do processo ensino-aprendizagem, os métodos de avaliação, a visão das políticas de ensino na instituição, o processo contínuo de aprendizado. A atuação pedagógica estruturada e com fundamentos; o despertar da necessidade de aprimorar e reconstruir novos conhecimentos; a facilitação nas relações interpessoais foram outras percepções de diferenças citadas. Foi descrito ainda que se permitiu uma aproximação maior entre docente e alunos, mostrando a importância em valorizar o contexto social do aluno-trabalhador e suas reais necessidades, valorizando suas vivências extraclasses, ou as experiências profissionais anteriores, bastante enriquecedoras para a trajetória profissional. Vale aqui salientar, perante os diferentes meios de participação propostos pelos docentes nas atividades escolares, alguns conceitos, onde, segundo Vasconcellos (1995), projeto pedagógico 124 é um instrumento teórico-metodológico que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, só que de uma forma refletida, consciente, sistematizada, orgânica e, o que é essencial, participativa. É uma metodologia de trabalho que possibilita ressignificar a ação de todos os agentes da instituição. E, para Veiga (2001, p. 11) o projeto pedagógico tem como características ser processo participativo de decisões; preocupar-se em instaurar uma forma de organização de trabalho pedagógico que desvele os conflitos e as contradições; explicitar princípios baseados na autonomia da escola, na solidariedade entre os agentes educativos e no estímulo à participação de todos no projeto comum e coletivo; conter opções explícitas na direção de superar problemas no decorrer do trabalho educativo voltado para uma realidade específica; explicitar o compromisso com a formação do cidadão; nascer da própria realidade, tendo como suporte a explicitação das causas dos problemas e das situações nas quais tais problemas aparecem; ser exequível e prever as condições necessárias ao desenvolvimento e à avaliação; ser uma ação articulada de todos os envolvidos com a realidade da escola; ser construído continuamente, pois, como produto, é também processo. Uma vez construído o PPP, outros planejamentos ou planos são passíveis de serem constituídos, visando facilitar o trabalho docente. Assim, enquanto o plano de curso organiza um conjunto de matérias que serão ensinadas e desenvolvidas em uma instituição educacional, durante o período de duração de um curso, ou seja, “sistematiza a proposta geral de trabalho do professor naquela determinada disciplina ou área de estudo, numa dada realidade” (VASCONCELLOS, 1995), o plano de ensino, ou da disciplina, define e operacionaliza toda a ação escolar existente no plano curricular da escola (SANT’ANNA et al., 1993); mas todos os planos convergem para o alcance dos objetivos traçados em seu planejamento escolar. Entenda-se aqui como planejamento escolar o planejamento global da escola, envolvendo o processo de reflexão, de decisões sobre a organização, o funcionamento e a proposta pedagógica da instituição. “É um processo de racionalização, organização e coordenação da ação docente, articulando a atividade escolar e a problemática do contexto social” (LIBÂNEO, 1992). O relato sobre a participação em reuniões pedagógicas discutindo mudanças no processo pedagógico escolar, com visão mais crítica da docência e de como a instituição lida com seus colaboradores e alunos, com melhor participação e argumentação e pela inclusão dos professores de teoria, e não os de estágio, encontra fundamento na afirmativa de LIBANEO (2001), que 125 cita que a participação é fundamental por garantir a gestão democrática da escola, pois é assim que todos os envolvidos no processo educacional da instituição estarão presentes, tanto nas decisões e construções de propostas (planos, programas, projetos, ações, eventos) como no processo de implementação, acompanhamento e avaliação. Mediante a busca da identificação da participação e da forma de participação nos planejamentos, após a realização do curso de formação docente verificou-se que o curso permitiu o despertar para a importância da educação enquanto processo e para o fato de que planejamento é um dos meios essenciais para a prática docente, e que essa tentativa de participação foi realizada de diferentes formas, quer por meio dos planejamentos intermediários ou por meio de espaços formais de participação docente, que incluem as reuniões pedagógicas ou de conselho de classe. Há a constatação de que uma visão do processo educativo, o aprimoramento de conhecimentos, a intencionalidade da educação foram explicitados, bem como a compreensão da necessidade de se conhecer os sujeitos do processo educativo. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir deste estudo, pode-se constatar que os enfermeiros-docentes da educação profissional passaram a participar dos processos educativos de forma mais fundamentada, conhecendo como se dá a sua inserção no trabalho, em favor do ensino para o SUS, entendendo o processo educativo como estratégia para realizar construções coletivas e em prol da saúde e da educação enquanto direitos sociais. Essa participação, inicialmente não passível de ocorrer pelo próprio desconhecimento, parece tender a mudar, uma vez que mais da metade dos docentes têm trabalhado em suas atividades docentes de modo a conquistar seu direito de participação ativa nos processos educativos, que vão desde o planejamento à avaliação, sem deixar de considerar a construção coletiva e democrática em defesa da consolidação do SUS na educação para a saúde. 126 REFERÊNCIAS BAFFI, M. A. T. O planejamento em educação: revisando conceitos para mudar concepções e práticas. In: BELLO, J. L. de P. 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Você iniciou suas atividades profissionais na área assistencial administrativa ensino pesquisa Vínculo empregatício: 5. Instituição Cargo Contrato: Carga horária semanal Efetivo temporário Forma de contratação: CLT assessoria ou consultoria prestação de serviço cooperativa carta-convite concurso público outros Especifique: 5. Instituição Cargo Contrato: Carga horária semanal Efetivo temporário Forma de contratação: CLT assessoria ou consultoria 128 prestação de serviço cooperativa carta-convite concurso público outros Especifique: 7. Atividades desenvolvidas como docente: participação na elaboração de projeto político-pedagógico avaliação de egresso participação na elaboração de plano de curso conselho de classe elaboração de plano de aula reuniões pedagógicas desenvolvimento de aulas em sala de aula participação em curso de atualização com investimento institucional supervisão de estágio organização de cursos, eventos de atualização para educação profissional avaliação da aprendizagem pesquisa na área de Enfermagem ou Educação 0 Avaliação do curso/disciplina 8. Você participa da elaboração do projeto-pedagógico da sua escola? Explique como é esta participação. 9. Você percebeu que ocorreu alguma diferença na sua participação no projeto pedagógico depois de realizar o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde? Justifique. 129 SENTIDO CONFERIDO AO CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE EM EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA NA ÁREA DA SAÚDE Lúcia Marinilza Beccaria* Claudia Bernardi Cesarino* Nádia Antonia A. Poletti* Vânia Zaqueu Brandão* RESUMO Este estudo teve como objetivo verificar o sentido conferido ao Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, pelos tutores e alunos que atuam como enfermeiros docentes, de cursos de complementação da qualificação profissional, de Auxiliar para Técnico de Enfermagem. Trata-se de uma pesquisa descritiva, de campo, com abordagem quantitativa. A população foi composta por trinta e seis alunos e quatro tutores do Niad – São José do Rio Preto. A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário estruturado e de relatórios do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente – Niad sobre a plataforma VIASK, considerando também o tutor, o material didático, o tempo destinado às atividades e entrega das mesmas, a avaliação da participação nos fóruns e o processo de aprendizagem. Com relação ao sentido conferido ao curso, os alunos e tutores consideraram que a plataforma VIASK foi de fácil acesso e possibilitou a troca de experiências; a mediação tutor-aluno foi considerada uma relação de ajuda, o material didático ótimo e de fácil interpretação, o tempo atribuído às atividades foi considerado insuficiente para os alunos, o fórum poderia ter sido mais participativo e o processo de ensino-aprendizagem possibilitou aprimoramento profissional. O estudo demonstrou a importância da formação de multiplicadores na formação de sujeitos ativos, com a responsabilidade de acompanhar e fiscalizar as políticas de saúde do Sistema Único de Saúde e garantir um bom atendimento ao usuário. Descritores: Motivação. Educação em Enfermagem. Educação a distância. 130 INTRODUÇÃO A motivação no processo educativo da Enfermagem contribui para o crescimento, o desenvolvimento e a formação de profissionais capacitados para desempenhar suas funções. Assim, a opção profissional é vista como um processo de crescimento, exploração de potencialidades, identificação de si próprio, integração dos motivos individuais e sociais, que acabam refletindo em um trabalho (PEREIRA; FÁVERO, 2001). O sucesso profissional advém do processo de alcançar ou ultrapassar o nível de aspiração do indivíduo e este sucesso é influenciado por um conceito admitido pela sociedade. Dessa forma, estabelece meios para concretizar seus objetivos. O desenvolvimento vocacional advém de um processo contínuo, que a partir das diversas experiências pessoais, escolares e profissionais, proporcionam a imersão das potencialidades, dos interesses e das necessidades que permearão a conduta vocacional do indivíduo. A mudança da lógica da formação dos profissionais de Saúde é uma exigência frente aos desafios da nova ordem mundial, o ensino crítico-reflexivo na área e sua contribuição para uma inserção dos profissionais no mercado de trabalho. Esta inserção deve ser regida pela ética da cidadania coletiva e deve estar disposta a enfrentar de forma organizada os interesses do projeto neoliberal (PRADO; REIBNITZ; GELBCKE, 2006). Paulo Freire propõe a necessidade de uma pedagogia emancipatória, em oposição à pedagogia da classe dominante, que contribua para a sua libertação e a sua transformação em sujeito cognoscente, e autor da sua própria história, através da práxis, enquanto unificação entre ação e reflexão, o educador, através de uma educação dialógica problematizante e participante, alicerçada na criação de um mundo onde cada homem seja valorizado pelo que é, onde a liberdade do povo deve atender à perspectiva da consciência ingênua à consciência crítica, com base nas fundamentações lógicas (SAVIANI, 2000). Exercer uma atividade docente nos dias de hoje é um processo dinâmico, a docência precisa ser constantemente questionada e reformulada para se adequar às novas exigências e atender às necessidades do educando, visando a formá-lo como um cidadão consciente e capaz de lutar por um lugar nesse mundo globalizado e exigente (PRADO; REIBNITZ; GELBCKE, 2006). Questionar e reformular a docência é uma tarefa tão difícil quanto importante e necessária à boa qualidade da Educação, e sua realização só é possível com uma mudança de postura dos profissionais da Educação, iniciando-se com uma formação crítico-reflexiva do professor, ou seja, o 131 conceito de professor como profissional prático-reflexivo deve ser uma preocupação de todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem, pois é certo que a formação geral de qualidade dos alunos depende da formação de qualidade dos professores (BOMFIM, 2009). Segundo uma das premissas básicas da pedagogia, o processo educacional se torna adequado na medida em que o educador conhece e leva em conta, conscientemente, os dados relativos às características do educando. A necessidade de se promover esforços para melhorar o aproveitamento escolar dos estudantes e como resultado, a eficiência dos futuros profissionais se impõe com toda urgência (NUNES, 2006). Trata-se de uma proposta que busca aprofundar uma análise crítica das lógicas e relações que dão forma e sentido ao modelo vigente de produzir os cuidados em Saúde. A atividade profissional é muito importante para o ser humano, pois culturalmente é uma forma de inserção social, de status, de interação entre indivíduo, cultura e sociedade. Pode-se levar ao prazer, ao crescimento profissional e à satisfação do trabalhador, como também pode gerar sofrimento e levar o indivíduo ao adoecimento psíquico (GLANIZER, 2008). O trabalho desempenha papel central na vida humana (CARDOSO, 2001). O Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde visa especializar os enfermeiros que ministram aula aos alunos trabalhadores do Sistema Único de Saúde, da rede pública e privada, possibilitando a complementação de sua qualificação profissional do nível auxiliar para o nível técnico de Enfermagem (SÃO PAULO, 2009). Diante do exposto, considerou-se fundamental reconhecer o sentido conferido ao curso na opinião de tutores e alunos. OBJETIVO Verificar o sentido conferido ao curso de formação docente em educação profissional técnica na área da Saúde, na opinião de tutores e alunos do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente – Niad, de São José do Rio Preto. MÉTODO Trata-se de uma pesquisa descritiva, com abordagem quantitativa, envolvendo quatro tutores e trinta e seis alunos do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. A coleta de dados envolvendo os alunos foi realizada no mês de maio de 132 2011, por meio de um questionário estruturado com questões sobre o ambiente virtual de aprendizagem (VIASK), considerando o tutor, o material didático, o tempo destinado às atividades, a avaliação da participação nos fóruns e o processo de aprendizagem. Os relatórios da coordenação do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente, que foram elaborados conjuntamente pelos tutores do curso, foram utilizados para a coleta de dados, porque retratam as experiências vivenciadas e as opiniões dos tutores no desenvolvimento do curso. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados deste estudo incluem duas representações: as variáveis dos tutores foram apresentadas de forma descritiva e as dos alunos/docentes em forma de tabela. Tabela 1. Distribuição do número absoluto e percentual das variáveis dos alunos do Curso de Formação Docente em Educação Profissional, na Área da Saúde do Niad, de São José do Rio Preto e região, 2010. VIASK Nº % Ótimo, troca de experiência, fácil acesso 15 41,7 Bom, dificuldade para acessar e para conseguir conexão 14 38,9 Teria que ser melhor, às vezes não consegue conexão 7 19,4 Clareza, disposição, competente 16 44,4 Excelente, disposição, prestativo 19 52,8 Precisaria ter um vínculo maior 1 2,8 27 75 TUTOR MATERIAL DIDÁTICO Ótimo, de fácil interpretação Bom, linguagem difícil dos complexos temáticos, às vezes repetitivo 7 19,4 Ajudou no meu trabalho como docente 1 2,8 Bom, mas deveria abordar as diferenças regionais do SUS 1 2,8 TEMPO DESTINADO ÀS ATIVIDADES Insuficiente 19 52,8 Suficiente 17 47,2 PARTICIPAÇÃO NOS FÓRUNS Regular, precisaria ter participado mais 19 52,8 Boa, participação efetiva com troca de informações e experiências 15 41,6 Dificuldade por não estar vivenciando a prática do SUS 2 5,6 133 PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM Compreensão do Sistema Único de Saúde, agente de transformação 9 25 Mudança na visão do SUS 2 5,6 Crescimento e aprimoramento profissional 20 55,5 Excelente, troca de experiências, encontros presenciais foram ótimos 4 11,1 Proporcionou crescimento profissional e pessoal 1 2,8 PLATAFORMA VIASK Os tutores relataram que os alunos apresentaram dificuldades no manuseio do VIASK, justificando o não cumprimento de prazos da entrega das atividades, porque tinham uma carga horária de trabalho longa (dois ou três empregos), além disso, buscavam utilizar o e-mail do tutor para um préenvio das atividades, que eram corrigidas e só então enviadas pelo VIASK. Foi registrado, tanto pelos alunos como pelos tutores, pequenos períodos em que eles não conseguiam acesso à plataforma VIASK. Com relação à utilização pelos alunos de um ambiente virtual de aprendizagem, 41,7% considerou uma prática ótima, que facilitou a troca de experiência, sendo essa a mesma opinião dos tutores. Percebe-se um encantamento pela descoberta de uma nova maneira de aprender, confirmada por autores, que enfatizam a cibercultura como um fator que possibilita o desenvolvimento de novos esquemas cognitivos, assim como favorece na área de Educação, novas compreensões sobre o processo de ensinar e de aprender, formas calcadas em recursos que conectam e criam relações entre sujeitos, pelas diversas redes de informação que vão sendo constituídas – do mundo científico, artístico e cultural (MORAES, 2001; ALONSO, 2000). Cada vez mais o mundo social e do trabalho necessita de sujeitos que saibam conviver e produzir coletivamente, para tanto a modalidade da comunicação no ambiente virtual de aprendizagem constitui um fator decisivo para a formação de redes cooperativas. Dentro desta visão destaca-se também a necessidade da inserção dos profissionais de Enfermagem com as Tecnologias de Informação e Comunicação que são importantes ferramentas para a transformação radical da Educação brasileira. Especialistas indicam que o Brasil moderno e justo só será possível se todos os estratos da sociedade estiverem ligados à comunidade digital e à grande rede de informações. Assegurar ambientes interativos, com base em novas tecnologias comunicacionais, precisa significar acesso digital ao 134 conjunto da sociedade brasileira (BRASIL, 2001). RELAÇÃO TUTOR-ALUNO Durante a realização do curso ocorreram várias situações positivas que as tutoras destacaram como situações que facilitaram um melhor relacionamento com os alunos, tais como: a realização de oficinas na cidade de origem dos alunos (Mirandópolis), para discussão dos complexos temáticos (CTs) e das atividades de articulação, na instituição de ensino, onde os alunos docentes atuam, em São José do Rio Preto, com objetivo de discutir com os docentes-enfermeiros e os alunos auxiliares o prazer e o sofrimento de trabalhar com o Sistema Único de Saúde. Cabe ressaltar que uma das tutoras teve dificuldades com a turma de alunos, com relação às questões filosóficas e práticas na área de Educação, mas, ao final de muito trabalho e dedicação todos alcançaram os objetivos. A atividade de articulação 8 (AA8), caracterizada pela apresentação de uma aula pelo aluno, foi uma experiência rica para todos, já que os alunosdocentes relataram as suas vivências em sala de aula. O telefone foi um meio de comunicação utilizado como mediação, principalmente para cobrar os atrasos com o envio das atividades. Inicialmente, o Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente realizava reuniões semanais com o objetivo de estudar os conteúdos dos complexos temáticos, de construir “consenso” para as orientações aos alunos e organizar conjuntamente a programação dos encontros e oficinas presenciais. Passado este período de compreensão dos conteúdos, as reuniões eram realizadas mensalmente para discutir e compartilhar os problemas encontrados com a mediação à distância. Os plantões semanais no início do Curso ajudaram na relação tutor-aluno. E na medida em que o curso avançava os alunos não recorriam mais aos plantões, mas ao próprio tutor pelo VIASK, através do telefone. Para Gonzalez (2005), na relação tutor-aluno em educação a distância é preciso considerar o papel do aluno e do tutor, assim, o aluno constrói o conhecimento, ou seja, aprende e desenvolve competências, habilidades, atitudes e hábitos relativos ao estudo, à profissão e à sua própria vida, no tempo e local que lhe são adequados, não com a ajuda em tempo integral da aula e do professor, mas com a mediação de tutores, que atuam ora a distância, ora em presença física ou virtual. Já o tutor deve estar atento para identificar os problemas relacionados 135 à aprendizagem dos alunos; relembrar sempre os objetivos de aprendizagem, bem como as etapas e o calendário a serem cumpridos; utilizar os diferentes meios de comunicação (impressos, áudio, vídeo, informática); organizar alternativas diferenciadas de aprendizagem; estimular o aluno a analisar os problemas de forma crítica; incentivar e reconhecer as contribuições dos alunos; criar um ambiente de confiança e solidariedade, estimular o interesse pelas atividades; valorizar a experiência de cada um; mediar os conflitos e solucionar os problemas relacionados à gestão educacional, fornecendo feedback e, assim, cumprir com os prazos definidos pelos diversos atores do processo de Educação a Distância. O tutor deve ter bem claro para si e para os alunos a consciência de que não é ele o detentor exclusivo do conhecimento, mas que é, antes de tudo, uma ponte para a fluência dos saberes em construção (GONZALEZ, 2005). MATERIAL DIDÁTICO O material didático deste curso, segundo os tutores, ofereceu subsídios para a formação docente em educação profissional técnica na área da Saúde e 75% dos alunos consideraram o material ótimo e de fácil interpretação. Os complexos temáticos 1, 2 e 3, na opinião dos tutores e alunos, constituíram os elemento fundamentais para a mediação do processo ensinoaprendizagem a distância e possibilitou a construção de atividades, debates e as orientações de aprendizagem. A ação pedagógica do profissional de Saúde necessita, além da formação técnica e científica, da formação ética, e o professor deve assumir uma forma competente, voltada para a transformação social (PINHEN; KURCGANT, 2007). Segundo Vasconcelos (1997), na Educação, em uma sociedade como a nossa, considerando a existência dos efeitos deseducadores de certas práticas em Saúde, podemos identificar um modo cultural de compreender o mundo em que a escola e os demais espaços formativos, por uma série de razões marcadas por processos históricos de subordinação aos interesses dominantes, muitas vezes se fecham aos múltiplos saberes de que os alunos são portadores, à sua cultura, ignorando-os ou desqualificando-os. 136 TEMPO DESTINADO ÀS ATIVIDADES E ENTREGA DAS ATIVIDADES Na Tabela 1 registra-se que o tempo destinado às atividades foi considerado insuficiente por 52,8% dos alunos, e os tutores tiveram dificuldades de cobrar o cumprimento dos prazos de entrega das atividades de articulação. A qualidade do uso do tempo, especialmente aquele dedicado aos estudos formais, bem como o padrão de utilização do tempo livre durante o período de formação são fatores que poderão ter impacto significativo no nível de competência e nas oportunidades ocupacionais futuras (DOIMO; LAGO; CAVALCANTI, 2008). Grande parte do tempo dos alunos é destinada às atividades do seu emprego e isto pode ter repercussão no desenvolvimento do curso. As políticas institucionais vêm construindo um padrão educacional para formar profissionais competentes e imbuídos de suas responsabilidades, como profissionais da Saúde, e valorizando o esforço despendido por eles para a realização de cursos. A partir da implantação do Sistema Único de Saúde, o trabalho educativo necessitou ser reestruturado de forma a contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população. Esse trabalho passou a ser pautado pelo entendimento da determinação social do processo saúde e doença, enfatizando que a inserção dos indivíduos nos meios de produção reflete os diferentes riscos de adoecer e morrer; pela adoção de um processo pedagógico problematizador, que valorize a reflexão crítica do cotidiano e pelo reconhecimento do direito à saúde, como um valor inalienável do indivíduo (CHIESA; WESTPHAL, 1997). PARTICIPAÇÃO NOS FÓRUNS Observou-se que o conteúdo e a utilização dos fóruns de discussão como ambiente de ensino ampliou e diversificou as formas de comunicação entre alunos e tutores e permitiu aquisição de novos conteúdos, além de facilitar o aprendizado. Os alunos perceberam que poderiam ter participado mais dos fóruns de discussão, como mostra a Tabela 1, considerando os mesmos como um espaço que possibilita o desenvolvimento da consciência crítica, através da discussão compartilhada e das atividades de articulação que estimulam a reflexão crítica acerca da prática do trabalho docente em educação profissional em Saúde. Estudo demonstra a preocupação com o suporte que este profissional 137 tem para desempenhar com consciência crítica esta função, tão importante por ser referência, tanto na sociedade como na própria profissão (DIAS, 2004). Em estudo com a finalidade de descrever a opinião dos discentes quanto à forma, ao conteúdo e à aplicação de um site educacional, como recurso instrucional no ensino da Disciplina de Didática em Enfermagem, de um Curso de Graduação em Enfermagem, de uma escola do município de São Paulo, verificou-se que apenas 33,3% dos discentes avaliaram como “muito boa” a forma de comunicação. Isso se deve ao fato de ter sido utilizado, apenas, o e-mail como recurso de comunicação; houve baixa interatividade; mostrando a necessidade de intensificar o uso de ferramentas como fóruns e chats (PERES; MEIRA; LEITE,2007). Na prática percebe-se que os alunos possuem pouca habilidade com fóruns e chats e é preciso que estas habilidades sejam desenvolvidas para que os discentes possam identificar quais as potencialidades e limitações destes recursos em sua prática profissional (PERES; MEIRA; LEITE, 2007). O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM Os tutores relataram que as orientações dos encontros para Educação Permanente foram pertinentes e necessárias para o processo de ensinoaprendizagem. No Rio de Janeiro, a primeira reunião para a educação permanente foi muito estratégica, pois, iniciou-se a discussão dos complexos temáticos – CT1 e CT2. A segunda reunião, realizada na cidade de Ribeirão Preto, que teve como objetivo discutir a avaliação e as concepções pedagógicas, ofereceu subsídios para a compreensão do complexo temático – CT3. Em relação ao processo de ensino-aprendizagem, a maioria (55,5%) dos alunos referiu-se ao crescimento e ao aprimoramento profissional, alguns deles afirmaram que o Curso proporcionou mudança na sua visão do Sistema Único de Saúde (Tabela 1). Os tutores destacaram como dificuldades no processo de ensinoaprendizagem a falta de clareza dos objetivos e a mediação à distância, cuja comunicação precisa ser assertiva. Destacaram que a educação permanente deveria ter sido realizada com mais frequência, a fim de possibilitar a discussão de um assunto a cada encontro. Outra sugestão é de que a atividade de articulação 8 possa ser realizada na Turma 2, tal como foi na Turma 1, já que a experiência foi muito rica. Os encontros presenciais e as oficinas representaram uma possibilidade de discussão, esclarecimento de dúvidas, socialização e troca de conhecimento. 138 Foram considerados pontos fortes nas avaliações, tanto dos tutores como dos alunos, porque permitiram a reflexão e o crescimento do grupo. É necessária a educação permanente para a manutenção e o desenvolvimento dos processos de mudanças nos serviços. A educação permanente parte do pressuposto da aprendizagem significativa e propõe que a transformação das práticas dos profissionais seja pautada na reflexão crítica do cotidiano no contexto do trabalho (CECCIM; FEUERWERKER, 2004). A falta de preparo profissional aumenta a dificuldade em lidar com a problemática da profissão, pois o comodismo e a falta de estímulos possibilitam que o profissional se habitue à submissão diante das decisões tomadas, sem chance de participação (STACCIARINI; TRÓCCOLI, 2000). A instituição de ensino tem um papel importante na produção do conhecimento comprometido com a transformação da realidade (DUARTE, 1999). CONSIDERAÇÕES FINAIS Constatou-se que a comunicação eficaz no curso, principalmente entre o aluno e tutor, garantiu a continuidade e a qualidade do curso. Um estilo de supervisão e liderança adequado influencia o comportamento dos alunos, isto é, um tutor com habilidade obtém lealdade, aumento de desempenho e alto compromisso. Verificou-se que os alunos precisam de uma formação profissional voltada para as atividades de promoção à saúde e para a prevenção de doenças e a integração multiprofissional, possibilitando assim, uma atuação coletiva, adequada para o novo modelo de atenção à saúde, com característica de visão global, com base nos princípios e nas diretrizes do SUS. A especificidade do Sistema Único de Saúde, como um momento singular das lutas institucionais, governamentais e populares por saúde na história mundial recente, coloca desafios novos para o campo da formação. A integralidade da atenção e uma educação dos profissionais orientada para a integridade, certamente, são partes importantes de um processo de mudança com repercussão na sociedade, na gestão setorial e na identificação com os usuários das ações e dos serviços de Saúde. As políticas institucionais vêm construindo um padrão educacional para formar profissionais competentes e imbuídos de suas responsabilidades como profissionais da Saúde, valorizando o esforço despendido para a realização de cursos. 139 REFERÊNCIAS ALONSO, K. Novas tecnologias e formação de professores. In: PRETTI, O. Educação a distância: construindo significados. Cuiabá: NEAD/IE; UFMT, 2000. BOMFIM, M. I. R. M. et al. Os alunos: trabalhadores do SUS. In: BOMFIM, M. I. R. M. et al. (Coord.). 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Publicado em parceria com Secretaria de Gestão Pública, Secretaria da Educação e Fundação do Desenvolvimento Administrativo. 140 SAVIANI, D. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2000. STACCIARINI, J. M. R.; TRÓCCOLI, B. T. Instrumento para mensurar o estresse ocupacional: inventário de estresse em enfermeiros. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 8, n. 6, p. 40-49, 2000. VASCONCELOS, C. S. Avaliação da aprendizagem: práticas de mudança. São Paulo: Libertad, 1988. 141 142 TEMAS DOS TRABALHOS DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE EM EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA NA ÁREA DA SAÚDE REALIZADO NO ESTADO DE SÃO PAULO Lilia Romero de Barros1 Claudia Mara de Melo Tavares2 RESUMO O trabalho de conclusão de curso (TCC) constitui-se em requisito obrigatório e indispensável à integralização do curso de especialização, sendo instrumento importante de avaliação do próprio curso. O objetivo deste estudo é analisar as temáticas dos TCC produzidos pelos alunos no Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, à luz do significado social da ação educativa na formação dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) e sua articulação com os complexos temáticos. O curso foi realizado em parceria com a Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) e seis instituições de ensino superior no Estado São Paulo, no contexto do programa TecSaúde. Trata-se de estudo documental e descritivo, realizado no período de dezembro de 2010 a janeiro de 2011. Os dados foram coletados em 225 monografias. Concluímos que o significado social da ação educativa na formação dos trabalhadores do SUS foi um assunto amplamente explorado pelos alunos na elaboração do TCC. Descritores: educação profissional; saúde; monografia; trabalho de conclusão de curso; avaliação. 1. Enfermeira. Especialista em Desenvolvimento de Recursos Humanos. Coordenadora do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde na Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/ Fiocruz). 2. Enfermeira. Mestre em Educação. Doutora em Enfermagem. Professora Titular da Escola de Enfermagem da Universidade Federal Fluminense (UFF). Orientadora de aprendizagem do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde na Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz). 143 INTRODUÇÃO A elaboração dos trabalhos de conclusão de curso (TCC) ou monografias é uma preocupação recente em cursos de pós-graduação lato sensu, posto que se trata de uma atividade inovadora à qual não estiveram obrigados alunos formados há mais tempo (SAUPE, 2004). O Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, objeto de nossa análise, configura-se como curso de pósgraduação lato sensu, desenvolvido a distância, com situações presenciais. O curso, com duração de até dez meses e carga horária mínima de 540 horas, confere o título de especialista para a docência em educação profissional técnica na área da Saúde, a graduados nas subáreas de Biologia, Farmácia, Fisioterapia, Medicina, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia, Serviço Social e Enfermagem, e a profissionais graduados em outras áreas que atuam em cursos de formação de trabalhadores do SUS. Sua estrutura curricular – organizada em três complexos temáticos: (1) trabalho, saúde e educação; (2) o SUS e os processos de trabalho em Saúde; e (3) a organização pedagógica do trabalho docente em Saúde – traduz concepções precursoras elaboradas para superar as fragmentações disciplinares, em busca da sedimentação da aprendizagem fundada em experiências e processos de trabalho vividos pelos sujeitos do curso. Os alunos são trabalhadores do SUS – professores de escolas de educação profissional do Estado de São Paulo credenciadas pela Fundap – que, por não possuírem licenciatura ou formação correspondente voltada para a área de Educação, são indicados pela escola na qual atuam. A elaboração do TCC constitui um desafio para a maioria dos alunos. Fernandes e Pelá (2001), ao investigarem como os alunos vivenciam o processo de elaboração de suas monografias, constataram que a maioria, ao iniciar o curso de graduação em Enfermagem, não acreditava ser capaz de desenvolver uma monografia e sequer conhecia o sentido dessa palavra. Segundo os autores, as principais dificuldades enfrentadas relacionavam a referências bibliográficas, à assistência prestada pelo orientador, à falta de treino em leitura e à própria redação. Para Silva et al. (2009), a pesquisa é uma atividade fundamental para a prática profissional, posto que é por meio dela que se aprende a detectar, conhecer e resolver situações, assim como propor ações que necessitam de intervenção. Porém, apesar disso, algumas vezes a educação profissional coíbe a criatividade dos estudantes e não favorece a capacidade crítica. 144 Com base no objetivo do curso, considerando-se que sua proposta pedagógica está voltada para a formação docente crítica e socialmente significativa, realizou-se um esforço no sentido de que os TCC representassem não somente um exercício acadêmico, mas também servissem de parâmetro para avaliar a integração de conteúdos propostos pelos complexos temáticos, contribuindo para a prática pedagógica dos alunos-docentes. O TCC constitui-se, assim, na sistematização de conhecimentos construídos ao longo do percurso, devendo o referido trabalho privilegiar questões relativas ao significado social da docência em educação profissional técnica na área da Saúde para a qualificação de trabalhadores do SUS. O presente artigo visa a analisar o conjunto de temas tratados nos TCC produzidos por alunos no âmbito do Curso de Formação Docente em Educação Profissional, à luz do significado social da ação educativa na formação de trabalhadores do SUS e sua articulação com os complexos temáticos. Esperase com este estudo estabelecer parâmetro adequado à avaliação do alcance dos objetivos do curso. METODOLOGIA Trata- se de estudo documental e descritivo que utilizou, como fonte para a coleta de dados, o Sistema de Informações Acadêmicas da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz). Os dados foram coletados em 225 monografias de alunos-docentes concluintes da primeira turma do Curso de Formação Docente realizado nos seis Núcleos Interdisciplinares de Apoio Docente (Niad)3, no período de dezembro de 2010 a janeiro de 2011. Os resultados foram apresentados em números absolutos e percentuais, utilizando-se o programa Excel. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os dados serão apresentados em tabelas, elaboradas com base nas seguintes categorias: caracterização da turma, quanto à qualificação profissional dos alunos e ao status dos alunos matriculados; e temáticas de interesse dos alunos para o desenvolvimento do TCC. 3. A implementação do Curso de Formação Docente ocorreu de forma regionalizada, numa parceria de seis instituições de ensino superior – Universidade de São Paulo (USP/SP); Universidade de São Paulo, Campus Ribeirão Preto (USP/ RP); Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); Universidade Estadual Paulista de Botucatu (Unesp); Faculdade de Medicina de Marília (Famema) e Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) –, que se constituíram como Núcleos Interdisciplinares de Apoio Docente (Niad), para servir como coordenação regional e base de apoio docente, acadêmico e administrativo. 145 CARACTERIZAÇÃO DA PRIMEIRA TURMA DE FORMAÇÃO DOCENTE EM SÃO PAULO A Tabela 1 mostra a qualificação dos alunos do curso por Niad, e nesse sentido chama a atenção o fato de a maior percentagem do total de alunos (27,6%) estar vinculada ao Niad USP/SP. Quanto à qualificação propriamente dita, 50,1% tinham apenas graduação; 46% eram especialistas. Dado que o curso em análise é de especialização, considera-se alto o índice de alunos já com títulos de especialista, embora não estivessem direcionados à área da Educação. Tal fato pode ser explicado pelo fato de o curso ser ministrado em São Paulo, onde há a maior oferta de cursos de pós-graduação do país. Contudo, em relação à titulação em nível de pós-graduação stricto sensu, o percentual de alunos é baixo: apenas 1,3% é mestre e 0,3% tem título de doutor. Assim sendo, pode-se considerar que o Curso de Formação Docente representa uma oportunidade significativa para a qualificação pedagógica de docentes de escolas de educação profissional até mesmo do Estado de São Paulo. Tal fato mostra, também, que a docência profissional em Saúde tem sido exercida por profissionais graduados sem formação docente. Tabela 1 - Qualificação dos alunos matriculados no Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, por Niad. São Paulo, 2010. NIAD USP-SP USP-RP UNESP UFSCAR FAMERP FAMEMA TOTAL DT ME ES N LC AP GR Total N % N % % N % N % - - 1 1,1 38 44,7 1 1,1 1 1,1 44 51,7 85 27.6 - - 2 5,2 17 44,7 - - - - 19 50,0 38 12,3 - - 1 1,7 15 26,7 - - - - 40 71,4 56 18,2 1 2,5 - - 21 52.5 2 5,0 2 5,0 14 35,0 40 13,0 - - - - 33 66,0 - - - - 17 34,0 50 16,2 N % - - - - 18 47,3 - - - - 20 52,6 1 0,3 4 1,3 142 46,2 3 0,9 3 0,9 154 50,1 N % 38 12,3 307 100 DT: Doutorado, ME: Mestrado, ES: Especialização, LC: Licenciatura, AP: Aperfeiçoamento, GR: Graduação. A Tabela 2 apresenta o status dos alunos matriculados. Vale ressaltar o baixo índice de evasão, de apenas 16,8% (abandono e não concluinte). Cursos na modalidade de educação a distância (EaD) costumam ter índices que variam de 30% a 50%, conforme apontam Palloff & Pratt (2004). O índice satisfatório pode ser atribuído a fatores situacionais, ao apoio acadêmico, ao controle de problemas com a tecnologia e ao apoio administrativo (ALMEIDA, 2007). 146 Importa destacar que a EaD é estratégia que amplia o acesso à educação. A educação de qualidade, oferecendo a um número maior de profissionais o acesso a informações significativas, torna possível a participação mais crítica e criativa na sociedade e amplia, assim, a democracia. Tabela 2 - Status dos alunos matriculados no Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. São Paulo, 2010. Status (*) N % Matrícula Automaticamente Cancelada 14 4,5 Abandono 49 16 Desistente 9 2,9 Não Concluinte 3 1,0 Transferidos 2 0,7 Concluintes (**) 230 74.9 Total de matriculados 307 100,0 (*) Segundo o regimento do curso de pós-graduação da Escola Nacional de Saúde Pública estipula os seguintes status para o aluno-docente: (a) terá matrícula automaticamente cancelada o aluno que não comparecer ao primeiro encontro presencial nem justificar sua ausência; (b) será considerado desistente o aluno que, a qualquer tempo, mesmo tendo começado o curso, não puder, por motivo justificado, continuar seus estudos; (c) será considerada como abandono a falta de contato, no período máximo de dois meses a partir da última atividade de articulação, do aluno após ter iniciado o curso; (d) será considerado não-concluinte o aluno-docente que não obtiver, no mínimo, conceito C em cada um dos complexos temáticos e no TCC. (**) Dos 230 alunos-docentes concluintes da 1ª Turma do Curso de Formação Docente, somente cinco apresentaram a versão final do TCC após o período de análise pela coordenação do curso (Ensp/Fiocruz). TEMÁTICAS DE TCC DESENVOLVIDAS PELOS ALUNOS DA PRIMEIRA TURMA E SUA RELAÇÃO COM O FOCO DO CURSO As principais temáticas contempladas nos estudos realizados pelos alunos do Curso de Formação Docente em Educação Profissional estão relacionadas na Tabela 3. Nos 225 TCCs apresentados foram identificadas 32 temáticas. A diversidade de temas reúne desde assuntos relacionados a condições de trabalho até modelos pedagógicos, demonstrando a amplitude da discussão propiciada no âmbito do curso. Os temas mais recorrentes – “Perfil dos alunos trabalhadores do SUS” (12,4%), “Humanização” (6,6%) e “Avaliação de ensino” (6,2%) – contemplam os três complexos temáticos e referem-se a atividades propostas pelo próprio curso. Acredita-se que a escolha feita demonstra a identidade do aluno com o eixo de discussão proposto pelo curso. 147 Os temas desenvolvidos representam um avanço na forma de compreender a docência em Saúde e em Enfermagem, já que em propostas anteriores de formação docente, como no Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores de Enfermagem (Profae)4, foram privilegiados temas relacionados ao processo saúde-doença e com abordagem biológica, enquanto neste curso a temática refere-se diretamente à educação, com ênfase na perspectiva histórico-social. Ressalta-se também que, de modo em geral, os TCC apresentados são analíticos, críticos, reflexivos e avaliativos. Diferem da produção acadêmica encontrada nas áreas de Saúde e Enfermagem, mais voltada para autorrelatos sobre a prática profissional ou a descrição de doenças. Em geral, os enfoques privilegiam a ação dos atores sociais, dos grupos de interesses, das condições históricas e da relação entre professor-aluno e os valores da construção de uma prática pedagógica crítica. 4. O Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores de Enfermagem (Profae) implantou a formação docente por meio do Curso de Formação Pedagógica em Educação Profissional, tendo formado 13.161 enfermeiros-docentes no período de 2000 a 2005. 148 Tabela 3 - Distribuição dos temas estudados nas monografias do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. São Paulo, 2010. N Tema n % 1 Perfil dos alunos trabalhadores do SUS 28 12,4 2 Humanização 15 6,6 3 Avaliação do ensino 14 6,2 4 Planejamento do ensino 13 5,7 5 Educação em saúde 12 5,3 6 Educação continuada e permanente 12 5,3 7 Práticas pedagógicas 11 4,8 8 História e políticas públicas de educação 11 4,8 9 Condições de trabalho – Prazer e sofrimento no trabalho 10 4,4 10 Metodologias de ensino 10 4,4 11 Estratégias pedagógicas 9 4,0 12 Projeto pedagógico e currículo 7 3,1 13 Trabalho: prazer e sofrimento 6 2,6 14 Satisfação do trabalho no SUS 6 2,6 15 Motivação 6 2,6 16 Temáticas específicas de formação técnica 6 2,6 17 Educação e mercado de trabalho 5 2,2 18 Percepção dos alunos sobre o SUS 5 2,2 19 Educação a distancia 4 1,7 20 Relação professor-aluno 4 1,7 21 Fatores intervenientes na aprendizagem 4 1,7 22 Participação e controle social em Saúde 4 1,7 23 Desafios da formação 3 1,3 24 Formação do enfermeiro-docente 3 1,3 25 Dificuldades de aprendizagem do aluno trabalhador 3 1,3 26 Evasão escolar na formação técnica em Saúde 3 1,3 27 Materiais pedagógicos 2 0,8 28 Formação do aluno não profissional 2 0,8 29 Conceito de integralidade na formação técnica 2 0,8 30 Análise do Curso de Formação Docente 2 0,8 31 Exercício profissional 2 0,8 32 Campo de estágio curricular na formação técnica 1 0,4 225 100,0 Total 149 A Tabela 4 mostra a relação das linhas de pesquisa propostas pelo curso com as temáticas desenvolvidas nos TCC. Observa-se que todas foram contempladas, embora não houvesse obrigatoriedade de os trabalhos se conformarem às linhas propostas. Destacamos que a linha que agrupou maior número de produções foi “Concepções pedagógicas assumidas pela escola” (28,1%), o que revela o interesse dos alunos pelos elementos componentes do agir pedagógico docente. A linha “Políticas públicas de educação profissional” foi a segunda mais escolhida (25,0%), o que é extremamente relevante, já que não é comum o aluno se interessar por temáticas políticas. Tal fato nos leva a crer na influência que a perspectiva teórica do curso exerce na motivação para a escolha da temática. Pode-se dizer que houve um avanço na produção de conhecimentos a partir das linhas priorizadas, já que o interesse temático, mesmo entre os pesquisadores da área de Ciências Sociais e Humanas na Saúde, ainda se concentra em abordagens disciplinares, sendo incipiente o diálogo das ciências da vida com as ciências sociais, conforme descreve Canesqui (2010). Tabela 4 - Temas tratados nos TCC em relação às linhas de pesquisa propostas pelo Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. São Paulo, 2011. Linhas de pesquisa N % Escola que forma trabalhadores do SUS, seus sentidos, suas finalidades e suas lutas, no âmbito do SUS. 6 18,7 Projeto político-pedagógico da escola e seu compromisso com a formação de trabalhadores para o SUS. 1 3,2 Alunos-trabalhadores, seus saberes, suas condições de trabalho, relação com os usuários dos serviços. 5 15,6 Profissionais-docentes, suas práticas pedagógicas na formação de trabalhadores. 3 9,4 Concepções pedagógicas assumidas pela escola, proposta curricular e plano de curso, processo de avaliação, estratégias pedagógicas, materiais pedagógicos e sua sintonia com as necessidades sociais em saúde e com o SUS. 9 28,1 Políticas públicas de educação profissional em Saúde e suas implicações para o trabalho pedagógico na escola. 8 25,0 Total 32 100 150 CONSIDERAÇÕES FINAIS Com base nos dados apresentados, concluímos que o significado social da ação educativa na formação dos trabalhadores do SUS foi um assunto amplamente explorado pelos alunos na elaboração dos TCC. Todas as linhas de pesquisa propostas pelo curso foram contempladas com trabalhos de conclusão, destacando-se as relacionadas a concepções pedagógicas e políticas públicas de educação profissional. Consideramos todos os temas apresentados relevantes para a área de formação de trabalhadores do SUS, com contribuições para a adoção de novas práticas de educação profissional na escola. REFERÊNCIAS ALMEIDA, O.C.S. Evasão em cursos a distância: validação de instrumento, fatores influenciadores e cronologia da desistência. 2007. 177 f. Dissertação (Mestre em Gestão Social e do Trabalho)Universidade de Brasília. Brasília, 2007. CANESQUI, A.M. Temas e abordagens das ciências sociais e humanas em saúde na produção acadêmica de 1997 a 2007. Revista Ciência & Saúde Coletiva. 15 (4): 1955-66, 2010. SAUPE, R.; WENDHAUSEN, A.L.P; MACHADO, H.B. Modelo para a implantação ou revitalização de trabalhos de conclusão de curso. Revista Latino Americana de Enfermagem, 2004 janeiro-fevereiro; 12(1):109-14. 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Monografia. Educação a distância. Introdução O Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde (CFDEPTAS), desenvolvido na modalidade a distância, de forma descentralizada, pelas instituições de ensino superior (IES) parceiras da Ensp/Fiocruz, segue as mesmas normas de um curso presencial onde a 1. Socióloga. Mestre em Educação. Doutoranda em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Orientadora de Aprendizagem do CFDEPTAS/EaD-Fiocruz. [email protected] 2. Enfermeira. Mestre em Educação. Doutora em Enfermagem. Professora titular da Escola de Enfermagem da Universidade Federal Fluminense (UFF). Orientadora de Aprendizagem do CFDEPTAS/EaD- Fiocruz. [email protected] 3. Psicóloga. Mestre em Educação. Doutoranda do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ). Orientadora de Aprendizagem do CFDEPTAS/ EaD- Fiocruz. [email protected] 153 produção do TCC é obrigatória. No entanto, os assuntos, os formatos de trabalhos propostos e os mecanismos de mediação são bem amplos, favorecendo a autonomia e a criatividade de tutores e alunos. O foco do curso é o significado social da ação educativa na formação dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) em nível médio, que pode ser explorado sob múltiplos enfoques e abordagens. Contudo, os alunos têm encontrado muita dificuldade para definição das temáticas e das abordagens metodológicas compatíveis com a proposta do curso. Nesse quesito recai uma das maiores dificuldades da elaboração de monografias: o acompanhamento e o contato com o orientador a distância, o perfil do aluno trabalhador e sua inserção nas escolas técnicas do SUS. Os conteúdos do curso são agrupados por complexos temáticos, o que significa uma sistematização orgânica de conceitos, práticas e teorias que estruturam e conformam uma ideia e suas inter-relações. O que por si só já traz alguns problemas para a mediação e a realização das atividades de avaliação, posto que a experiência geral de formação dos trabalhadores do campo da Saúde se deu baseado no currículo estruturado por disciplina. Nessa estrutura curricular por complexos temáticos, os objetivos e a concepção pedagógica previstos partem dos vínculos do trabalho com a escola, explicitam seu compromisso político-pedagógico com a transformação da realidade social em que vivemos (BOMFIM et al., 2009). Desta feita, para orientação do TCC o tutor precisa considerar a necessidade de aproximar a temática em estudo da realidade das escolas técnicas nas quais os alunos atuam. As discussões sobre TCC no âmbito das EPs realizadas com os tutores do Curso de Formação Docente foram capazes de trazer à tona alguns elementos sobre o desenvolvimento e a elaboração do TCC que aqui serão sistematizados. O fato de já ter ocorrido duas turmas do 11 criou condições para uma análise mais madura e precisa sobre os problemas e potencialidades de um TCC, inscrito nessa realidade específica. Acredita-se que essa sistematização poderá contribuir para uma ponderação mais precisa sobre os “limites e possibilidades” de um TCC no contexto do curso de especialização em formação docente. Metodologia Trata-se de um ensaio baseado nas discussões sobre TCC decorrentes do processo de educação permanente realizado pelas orientadoras de aprendizagem junto aos tutores do CFDEPTAS. 154 A natureza do relato é descritiva e procura abstrair alguns elementos relacionados à realização do TCC tratados nos processos de educação permanente. Procuramos expressar os principais elementos do que é abstrato e do que é concreto na nossa prática educativa. Resultados Elementos estruturais a serem considerados Para dar concretude a nossa discussão é necessário que façamos uma breve análise geral sobre a realidade em que a discussão sobre TCC está inserida. Trata-se de um curso de especialização a distância, de dez meses, com alguns momentos presenciais, tendo como foco a formação docente dos profissionais da Saúde que atuam no nível médio. O curso parte do referencial teórico do materialismo histórico e dialético, incorporando de maneira subalterna outros autores e referências bibliográficos. Ao longo desses quatro anos de experiência com o curso (do projetopiloto à terceira turma) foi possível identificar as dificuldades com a apropriação do referencial teórico expresso pelos Complexos Temáticos, o que levou a equipe pedagógica a propor e implementar oficinas presenciais de educação permanente, onde os tutores, conjuntamente com o auxílio das orientadoras de aprendizagem, tiveram a possibilidade de “mergulhar” e se aproximar mais do referencial teórico e conceitual do curso. A partir dessa estratégia de formação foi possível aproximar os tutores e mediar a relação de ensino-aprendizagem, de modo que o referencial teórico e conceitual foi se tornando mais palpável para o coletivo de educadores e educandos. Todavia esse é ainda um desafio a ser perseguido – uma maior apropriação do conteúdo do curso e do seu referencial. A compreensão dos sentidos do TCC no âmbito do CFDEPTAS é polissêmica e vem sofrendo ajustes para sua condução a partir das atividades de educação permanente dos tutores, sejam as que ocorrem nas rodas estabelecidas nos Núcleos Interdisciplinares de Apoio Docente (Niads), nos fóruns de discussão ou nas oficinas de educação permanente. Nas oficinas de Educação Permanente, alguns elementos foram postos a reflexão. De forma mais sistematizada foi possível identificar elementos estruturais a serem considerados na produção e elaboração do TCC. Perfil do aluno: tensão presente entre assistência e ensino, uma vez que esse aluno quando docente não deixa de estar presente na assistência. Relação do curso de especialização com as Escolas Técnicas do SUS – 155 como incluir os alunos que se encontram fora de sala? Envolver as Escolas Técnicas com o referencial teórico-metodológico do CFDEPTAS. Propostas de formato de TCC que propiciem uma explicitação maior do método: como superar a perspectiva de trabalho monográfico centrado apenas em uma enquete? Perfil do aluno Conhecer quem é o aluno do CFDEPTAS é essencial. Sua situação de trabalho, inserção no serviço de Saúde, a quantidade de tempo no que se refere à experiência como docente, quais as habilidades tecnológicas, dentre outras informações relevantes, para que seja possível definir quais possibilidades de desenvolvimento do TCC estão postas. A grande maioria destes alunos-docentes é proveniente da rede privada de ensino. São enfermeiros e enfermeiras que necessitam da complementação da licenciatura para lecionarem nas Escolas Técnicas de Saúde do Estado de São Paulo. Não foi realizada, até o momento, nenhuma pesquisa mais geral sobre a formação superior de tais alunos; todavia foi possível identificar empiricamente, por meio das falas dos tutores, que a grande maioria teve um ensino mais aligeirado e biologicista. Esse último, o caráter biologicista, não é uma característica específica ao ensino privado, sendo perceptível também nos cursos provenientes da universidade pública. Estudo realizado com concluintes da primeira turma constatou que 46,2% dos alunos realizaram curso de especialização, 1,3% de mestrado e 0,3% de doutorado (TAVARES et al., 2011). Com base nesses dados é possível identificar que quase a metade dos alunos possui o título de especialista, o que indica certa experiência do grupo com elaboração de TCC, já que esse é atividade obrigatória no curso de especialização. A grande e ampla maioria destes alunos-docentes não possui vínculo empregatício estável como docente de nível médio. A grande maioria das escolas técnicas contrata os professores em vínculos precários e frágeis, não possibilitando direitos assegurados. Ou seja, o próprio exercício da docência é realizado, em grande parte, por educadores precarizados, sem vínculo empregatício e, portanto, sem que a docência e a formação assumam centralidade na vida desse profissional. É importante caracterizar os docentes das escolas técnicas para que tenhamos clareza das condições objetivas e subjetivas sob as quais estão 156 imersos. Ou seja, são professores que não possuem a docência como laboro central; nesse sentido a tensão entre a docência e a assistência, que deveria ser um complemento, aparece como no cerne da relação de trabalho desse profissional da Saúde. A tensão é reforçada na grande maioria das escolas técnicas, quando definem o supervisor de estágio – o professor da prática – e o professor de teoria, separando dicotomicamente algo que deveria ser composto pela síntese. Esses alunos-docentes então são fruto de tal cenário multifacetado, estando à mercê, na sua grande maioria, de relações precárias de trabalho – assim como são fruto de uma tensão criada e construída no interior da docência no ensino técnico, onde o professor da prática não leciona teoria e vice-versa, dicotomizando o que deveria ser unificado. Com vínculos precários, os alunosdocentes, para além das salas de aula, vista por muitos como um “bico” para complemento salarial, estão inseridos mais fortemente na assistência, o que pode acabar sendo o espaço capaz de gerar mais reflexões e problemas para o seu cotidiano, sendo este o centro da sua reflexão e não necessariamente a docência. A comprovação dessa tese nos leva à necessidade de planejar um processo de mediação e intervenção pedagógica dirigido ao TCC que seja capaz de reconduzir a reflexão do aluno ao foco do curso, dialogando com a realidade específica da assistência, onde muitos dos alunos-docentes estão inseridos. Relação do CFDEPTAS com as Escolas Técnicas do SUS – como incluir os alunos-docentes que se encontram fora de sala de aula? Para além das ponderações apontadas no ponto acima, que auxilia a reconstrução do chão social desse aluno-docente, outro elemento importante também foi novamente apontado na Oficina de Educação Permanente – os alunos-docentes que não estão em sala de aula. O fato da questão ser recorrente evidencia ser essa uma realidade dos alunos do CFDEPTAS. Ocorre que no CFDEPTAS, além do TCC, todas as atividades de articulação de ensino, aprendizagem e avaliação estão relacionadas à prática docente. Portanto, estar fora da sala de aula, ou mesmo das “supervisões de estágio”, demanda uma nova tarefa para os tutores, de mediar e traduzir o sentido das atividades específicas, de modo que o objetivo proposto seja atingido. Algumas experiências sobre essa mediação e reorientação das atividades já foram realizadas, não sendo possível ainda identificar a qualidade do seu 157 impacto. O Niad da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto foi palco de uma dessas experiências. Vivia uma realidade onde cerca de 50% dos alunos da T1 não estavam em sala de aula, sendo recém-formados. Propuseram uma espécie de estágio docente, vinte e quatro horas de estágio dentro da sala de aula. Para isso o Niad entrou em contato com as escolas técnicas do TecSaúde e também do Cefor, espaço que serviu de campo para o estágio docente. Outra saída encontrada, de maneira mais comum em todos os Niads, foi a proposta de realizar as Atividades de Articulação (AAs) em dupla, de modo que o alunodocente que estivesse em sala de aula pudesse auxiliar o aluno com menor experiência na execução da atividade dentro de sua sala de aula. Todavia, é importante apontar que o contrato existente entre a Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) e as escolas técnicas aprovadas pós-licitação indica a responsabilidade destas em indicar os alunos docentes para o curso de especialização4. Esses alunos-docentes são docentes das escolas licitadas, logo devem estar em sala de aula, preferencialmente em salas de aula do TecSaúde. Percebe-se então, que mesmo diante de um compromisso firmado sobre a indicação ser de docentes das escolas técnicas, essas regras não foram cumpridas na sua totalidade, deixando para o CFDEPTAS a tarefa de encontrar mediações pedagógicas possíveis para mediar o conteúdo do curso proposto. Como já apontado, o impacto dessas experiências ainda não foi analisado. Entretanto avaliar tal condição dos alunos-docentes é necessário, pois poderá levar no futuro à necessidade de alteração do próprio material pedagógico, de modo que ele possa se adequar à realidade hoje existente, tendo impacto direto na elaboração dos TCCs. Envolver as escolas técnicas com o referencial teórico-metodológico do CFDEPTAS Diante das questões levantadas no ponto 2, a respeito do compromisso das escolas técnicas participantes do curso, nas EPs os tutores evidenciam a necessidade de aproximar as escolas em questão do referencial teórico e metodológico do curso. Trata-se de uma árdua tarefa, uma vez que está em pauta uma proposta de conteúdo baseada em uma concepção de sociedade outra. A proposta parte de uma análise crítica da sociedade, apontando as potencialidades na construção de uma nova proposta formativa mais orquestrada com as 4. “A INTERESSADA deverá se comprometer a contratar docentes e supervisores de estágio com a formação compatível com as normas vigentes, para cada Escola, incluindo as subcontratadas, por Região de Inscrição. Caso os profissionais contratados não tenham formação pedagógica, ou licenciatura, a INTERESSADA deverá se comprometer a matriculálos no Curso de Especialização de Formação Docente de Educação Profissional disponibilizado pela FUNDAP [....]” (FUNDAP, 2009). 158 demandas postas perante a construção de um SUS para valer! Envolver as escolas e aproximá-las não significa convencê-las a adotar esse novo método, fundamentado nas pedagogias críticas, mas sim em dialogar com outras referências metodológicas para além das tradicionais. Se de fato é comum que haja uma maior resistência das escolas privadas licitadas em debater a proposta, diante da sua própria condição como estabelecimento de educação privado, que não pode prescindir do lucro, as escolas técnicas da rede pública, ou seja, os Cefor, são espaços privilegiados onde essas discussões devem e necessitam ser alimentadas. Esse é um dos obstáculos encontrados pelos alunos-docentes. Ao estarem sob a formação de um curso de especialização pautado nos referenciais das pedagogias críticas, acabam por experienciar uma proposta de educação reflexiva e crítica, de modo a possibilitar um novo olhar para os problemas que emergem da realidade na qual estão inseridos. O que ocorre é que, em alguns casos, esse novo olhar se choca com os referenciais pedagógicos adotados pelas escolas técnicas. Entretanto, é salutar que o choque seja um elemento positivo, posto que é reflexo das forças sociais em disputa presentes na sociedade capazes de se revelarem nas propostas e referenciais pedagógicos. Abre-se a partir dessas tensões a possibilidade de dialogar com o projeto políticopedagógico da escola. Tal diálogo construído de maneira mais orgânica pode nos levar inclusive a pensar o TCC de maneira mais intervencionista, de modo a contribuir para o processo de discussão interna sobre o projeto políticopedagógico da escola técnica. Propostas de formato de TCC que propiciem uma explicitação maior do método: como superar a perspectiva de trabalho monográfico centrado apenas em uma enquete ou em uma pesquisa bibliográfica? Diante das questões apresentadas e das experiências com os TCCs já elaborados pelas turmas anteriores, foi possível identificar muitos limites a partir dos trabalhos finais. A grande maioria se pautou pela revisão bibliográfica não reflexiva. Uma outra parte considerável teve como foco o formato de trabalho apresentado pela AA2 (investigação sobre quem são os alunos das escolas técnicas), uma enquete de pesquisa e tabulação de dados, igualmente apresentado de modo não reflexivo e com frágeis análises dos dados. De uma maneira geral, em menor número, foram produzidos trabalhos finais de grande pertinência para o docente e que se utilizaram de outros formatos que não o monográfico e o artigo. Durante a EP algumas questões foram postas diante do fato de que a 159 maioria dos TCCs da T1 (12,4%) tiveram como base a AA2 (TAVARES et al., 2011). Qual teria sido o motivo do fenômeno? No mesmo sentido algumas hipóteses foram levantadas, que merecem aqui ser analisadas. A AA2 é uma atividade investigativa, os alunos-docentes elaboram uma enquete, com questões abertas e fechadas, com o objetivo de ao final tabular os dados e analisá-los perante o conteúdo trabalhado – o objetivo da AA2 é traçar o perfil dos alunos do curso técnico, dos alunos-docentes. Esse é um momento do curso em que os alunos-docentes apresentam algumas dificuldades em analisar os dados obtidos; todavia sentem-se estimulados ao compreender e apreender a tabulação e a sistematização dos dados. Em outro sentido, há também um maior incentivo por parte dos tutores em trabalhar com o formato do TCC, esta atividade que se aproxima mais dos formatos mais clássicos de pesquisa realizada hoje no interior dos departamentos das universidades. Essas são algumas das principais ponderações postas acerca do formato e da AA2. Nesse sentido, está posto um desafio: como superar a AA2, no que se refere a um trabalho mais reflexivo, considerando as condições concretas desse aluno-docente e a necessidade em dar condições para que o mesmo dê um salto de qualidade na análise da realidade? A oficina de EP trouxe importantes contribuições no que se refere à elaboração do TCC e ao seu formato, de modo a estimular mais a aproximação do conteúdo do curso. Propostas como o relato de experiência reflexivo, a elaboração de um plano de aula crítico, ou mesmo de um novo plano de curso, a partir da crítica do plano vigente, assim como um trabalho de campo a partir de um tema específico da docência, podem ser formatos mais coerente com o conteúdo proposto, no sentido de serem capazes de potencializar uma análise mais reflexiva da realidade. A tarefa agora é trabalhar melhor essas propostas com o coletivo de alunos-docentes, com vistas a atingir o objetivo do CFDEPTAS, que é o de formar docentes capazes de olhar e analisar criticamente a sua própria prática docente, na intenção de reconduzir o foco formativo de modo coerente com a construção de um SUS pleno. Considerações finais Este texto teve como objetivo refletir sobre alguns elementos que emergiram da prática docente, tutorial, em relação à elaboração dos TCCs. Partiu-se do princípio de que a elaboração do TCC passa por condicionantes estruturais da formação desses alunos-docentes que não devem ser subsumidos no conjunto do processo de orientação. 160 Compreender a fragilidade dos vínculos trabalhistas, assim como a tensão presente entre a docência e a assistência, pode nos levar a uma compreensão e uma caracterização de que esses elementos possam provocar temas para o estudo reflexivo do TCC. Cabe ao tutor trazer o aluno para as reflexões sobre a docência, inclusive sobre a sua própria condição docente, não dicotomizando o ensino em sala de aula com o ensino no serviço (supervisor de estágio). Essa não dicotomização pode ser inclusive uma forma de incluir os alunos que estão fora da sala de aula, sugerindo a estes um olhar reflexivo sobre a sua assistência e como eles poderiam pensar suas próprias práticas em uma perspectiva formativa e pedagógica. O esforço em conseguir uma maior aproximação entre as escolas técnicas e o CFDEPTAS pode gerar condições para a elaboração de TCC de caráter mais intervencionista: repensar o projeto político-pedagógico (PPP) da escola, propor um plano de curso, dentre outros, principalmente no caso do Cefor. Por fim, a questão de um formato, que propicie um olhar mais reflexivo da prática docente desse aluno, aparece como questão para o TCC. Nesse sentido e a partir dos elementos apontados acima aparecem propostas de formato como: pesquisa de campo, relato reflexivo da prática docente, portfólio, dentre outros, que não são trabalhos monográficos clássicos e que nem por isso deixam de ser rigorosos no que se refere à produção textual. O TCC é um trabalho finalístico, todavia processual. Localizá-lo dentro do seu contexto de produção – curso de educação a distância, novo referencial teórico, alunos-docentes com vínculos precários, duração de nove meses, tensões entre a docência e a assistência, entre outros – é necessário para pensarmos e planejarmos qual é o melhor TCC possível diante do contexto apresentado. Desse modo tornar-se-á possível contribuir para que novos olhares sejam lançados e que educadores focados em métodos antigos se permitam pensar em novas estratégias pedagógicas em face do desafio de um projeto coletivo: a construção de um SUS para valer! Referências BOMFIM, I. R. Caderno de orientações do curso de Formação Docente em Educação profissional Técnica na Área da Saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009. FUNDAP. Comunicados. São Paulo, 2009. Disponível em: <http://tecsaude.sp.gov.br/default. asp?dir=inc/comunicados.asp&esq=inc/menu_int.asp>. TAVARES, C. M. M et al. Temas dos trabalhos de conclusão do curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde realizado no Estado de São Paulo. Rio de Janeiro: Fiocruz/EaD, 2011. Mimeografado. 161 162 Parte II 163 164 ACOLHIMENTO: UMA PROPOSTA DE ENSINO PARA ALUNOS DO NÍVEL MÉDIO EM ENFERMAGEM - TRABALHADORES DO SUS Eliane Merlos Iramildes Souza Silva Rosenéia Braz de Souza Giselle Dupas RESUMO A Política Nacional de Humanização do Sistema Único de Saúde (SUS) traz o acolhimento como diretriz operacional e apresenta-se como possibilidade de arguir o processo de produção da relação usuário-serviço e propõe inverter a lógica de organização e funcionamento do serviço de Saúde a partir de princípios que envolvem: atender a todas as pessoas, garantindo acesso e reorganização do processo de trabalho. O objetivo do estudo é elaborar um instrumento pedagógico para a sensibilização de alunos-trabalhadores do SUS, com foco no acolhimento na Atenção Básica de Saúde. Trata-se de um estudo bibliográfico que enfatiza o acolhimento como proposta de ensino para alunos do nível médio em Enfermagem, com vistas à utilização de instrumento pedagógico para sensibilizá-los. Foi elaborado um instrumento pedagógico de fácil compreensão, utilizando a literatura de Cordel a fim de facilitar o conhecimento e a sensibilização do aluno-trabalhador da Saúde para a questão do acolhimento. Descritores: Acolhimento. Enfermagem. Atenção Primária. Educação. Introdução ao problema Muitas são as dimensões com as quais o Ministério da Saúde tem se comprometido, entre elas prevenir, cuidar, proteger, tratar, recuperar, promover – enfim, produzir saúde. Muitos são os desafios que aceitamos enfrentar quando estamos lidando com a defesa da vida e com a garantia do direito à saúde. No percurso de construção do Sistema Único de Saúde (SUS), muitas 165 demandas persistem, impondo a urgência do aperfeiçoamento do mesmo para mudanças de rumo (BRASIL, 2006). Nessa perspectiva a Política Nacional de Humanização do SUS traz o acolhimento como diretriz operacional e apresenta-se como possibilidade de arguir o processo de produção da relação usuário-serviço (SOUZA, 2008) e contribui para alterar esse processo na medida em que incorpora a análise e a revisão cotidiana das práticas de atenção e gestão implementadas nas unidades de saúde. Segundo Franco, Bueno e Merhy (1999), a diretriz propõe inverter a lógica de organização e funcionamento do serviço de Saúde a partir de princípios que envolvem: atender a todas as pessoas garantindo acesso; reorganizar o processo de trabalho, a fim de que este desloque seu eixo central do médico para uma equipe multiprofissional; qualificar a relação trabalhador-usuário com vistas a dar parâmetros humanitários, de solidariedade e cidadania. É de suma importância a implementação dessa diretriz, pois exige uma mudança de postura em todo o sistema de saúde, a fim de receber os casos e de responsabilizar-se de modo integral por eles, procurando reduzir a fragmentação dos atendimentos prestados pelas diversas áreas, resolver o problema da demanda e evitar as “listas de espera”, substituindo a triagem pela intervenção, buscando resgatar princípios fundamentais da prática em saúde: integralidade, humanidade e cuidado (ALMEIDA; FURTADO, 2006; HENNINGTON, 2005). Nesse sentido o acolhimento como postura e prática desenvolvida pelos trabalhadores, nas ações de atenção das unidades de Saúde, favorece a construção de uma relação de confiança e compromisso dos usuários com as equipes e os serviços, contribuindo para a promoção da cultura de solidariedade. O acolhimento, portanto, é uma ação que pressupõe a mudança da relação profissional/usuário(a), não se resume a um espaço ou local, mas a uma postura ética e solidária. Desse modo, ele não se constitui como uma etapa do processo, mas como ação que deve ocorrer em todos os locais e momentos da atenção à saúde (BRASIL, 2006). A partir do movimento de implantação do SUS vivencia-se, sem dúvida, uma melhora do acesso como a ampliação da oferta de serviços. Contudo, somente isto não basta, é essencial a eficácia de suas ações, ou seja, a capacidade destas de resolverem os problemas de saúde, buscando criar formas alternativas de solução, conforme a necessidade. A descoberta dos verdadeiros problemas e possíveis soluções inicia-se pela abertura com que se colocam trabalhadores e serviços para reconhecer o usuário e acolhê-lo assim como se apresenta (MATUMOTO, 1998). 166 Nesse contexto acolher pode ser entendido como sinônimo de admitir, aceitar, dar ouvidos, dar crédito a, agasalhar, receber, atender (FERREIRA, 1998), em uma perspectiva de olhar o outro como sujeito de direitos e desejos e como corresponsável pela produção da saúde, tanto na perspectiva da atenção individual como do ponto de vista coletivo (INOJOSA, 2005). Corroborando, Bueno & Merhy (1998 referência?) dizem que acolhimento na Saúde passa pela subjetividade, pela escuta das necessidades do sujeito, pelo processo de reconhecimento de responsabilização entre serviços e usuários e abre o começo da construção do vínculo (componentes fundamentais para um reinventar da qualidade da assistência). O acolhimento é descrito por Merhy (1997) como elemento inicial do processo de trabalho em Saúde, centrado em tecnologias leves as quais se referem ao cuidado no seu sentido mais amplo, operado pelo trabalho vivo em ato, não exigindo conhecimentos profissionais específicos. O acolhimento pressupõe uma posição de escuta e compromisso em dar respostas às necessidades de saúde trazidas pelo usuário, que inclua sua cultura e saberes (BRASIL, 2004; ABBÊS; MASSARO, 2001). Desse modo é um processo dinâmico, inacabado, nunca está totalmente pronto (ESMERALDO et al., 2009). Segundo Takemoto & Silva (2007), quando o serviço abre um canal de escuta com o usuário, abre uma possibilidade para que as pessoas tragam, para dentro do serviço de Saúde, as suas queixas, os seus problemas e as suas necessidades. Nem sempre é fácil ouvir. É mais fácil trabalhar com uma “queixa clínica”, uma parte do corpo que dói, uma doença que precisa de medicamento. Quando abrimos um espaço para o diálogo com o usuário, por mais reduzido que ele seja, abrimos uma porta para que a “vida lá fora” entre na dinâmica do trabalho da unidade. Em Saúde, acolhimento consiste também em uma tecnologia para reorganização dos serviços de Saúde que visa ao acesso universal, à resolubilidade e ao atendimento humanizado. Baseia-se na escuta de todos os pacientes, no intuito de oferecer uma resposta positiva aos seus problemas de saúde. Além disso, visa à descentralização do atendimento, classicamente centrado na figura do médico, estendendo-o para toda a equipe, o que aumenta a oferta de serviços (NASCIMENTO; TESSI; POLI NETO, 2008). Dessa forma o acolhimento emerge como um importante elemento a ser considerado na reestruturação dos processos de trabalho em Saúde, o que justifica o nosso interesse pela temática, tomando como base nesse particular que os alunos-trabalhadores do SUS estão inseridos diretamente no sistema 167 de Saúde e podem ser instrumentalizados para atuar de forma efetiva nos encontros que acontecem nos vários espaços da saúde. Com uma nova conformação da educação, voltada para a reelaboração dos conhecimentos, para a produção de novos conhecimentos e ainda para o desenvolvimento de competências e disposição para apreensão de habilidades necessárias para o trabalho, são envolvidas profundas modificações nas relações professor-aluno. Essas competências deverão expressar ações como a reflexão crítica, a curiosidade científica, a criatividade e a investigação, tendo por base a realidade dos educandos. Assim, o professor tem a responsabilidade de articular metodologias de ensino caracterizadas por uma variedade de atividades estimuladoras da criatividade dos alunos (FARIA, 2003). Ressaltamos que na investigação da literatura com foco no acolhimento percebemos uma escassez de material pedagógico destinado ao ensino do aluno-trabalhador de nível médio do SUS. Tal situação nos instigou a construir um instrumento pedagógico com vistas a sensibilizar esse aluno para o acolhimento. Objetivos Elaborar um instrumento pedagógico para a sensibilização de alunostrabalhadores do SUS, com foco no acolhimento na Atenção Básica de Saúde. Metodologia Realizamos uma pesquisa bibliográfica sobre o tema a fim de conhecer a produção científica existente sobre o mesmo. Esse tipo de estudo busca a resolução de um problema (hipótese) por meio de referenciais teóricos publicados, analisando e discutindo as várias contribuições científicas, trazendo subsídios para o conhecimento sobre o que foi pesquisado, como e sob que enfoque e/ou perspectivas foi tratado o assunto apresentado na literatura científica. Salomon (2004) descreve que a pesquisa bibliográfica fundamentase em conhecimentos proporcionados pela Biblioteconomia e Documentação, entre outras ciências e técnicas empregadas de forma metódica envolvendo a identificação, localização e obtenção da informação, fichamento e redação do trabalho científico. Esse processo solicita uma busca planejada de informações bibliográficas para elaborar e documentar um trabalho de pesquisa científica. Ainda sobre pesquisa bibliográfica, Lakatos & Marconi (1991) definem como sendo toda pesquisa realizada em documentos ou fontes secundárias que 168 abrangem a bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material cartográfico, banco de dados e outros, até meios de comunicações orais, como rádio, gravações em fita magnética, e audiovisuais, como filmes, televisão e internet. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto. Nesse sentido, a pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras, pela organização do material. Ela é um suporte imprescindível para qualquer outro tipo de pesquisa (LAKATOS; MARCONI, 1991). Nessa perspectiva foram realizadas buscas sistemáticas em importantes bases de dados bibliográficas nacionais: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Scientific Electronic Library on Line (Scielo), Biblioteca Virtual da Saúde (BVS). Foram consideradas seis expressões: acolhimento, atenção básica, ensino médio, trabalhadores do SUS, educação, enfermagem e literatura de cordel. Nos critérios de inclusão foram considerados: os registros de artigos publicados entre 1998 e 2010 que continham qualquer uma das expressões mencionadas em qualquer um dos campos da base de dados (ex.: título, resumo e palavras-chave), e artigos escritos na língua portuguesa, os quais foram identificados, armazenados e analisados. Foram excluídos os artigos que citavam o acolhimento em outras dimensões da Saúde que não na Atenção Primária. Do total de 53 artigos encontrados, 20 foram selecionados para o estudo após a leitura exploratória do material encontrado. Com a leitura, pôdese obter uma visão global do material, considerando-o de interesse ou não à pesquisa, e determinou-se qual material bibliográfico realmente correspondia ao estudo. Dentre toda bibliografia encontrada percebemos a falta de material em linguagem acessível, atrativa e convidativa para a reflexão sobre a temática “acolhimento”, o que fez emergir a necessidade da construção de um instrumento que pudesse ser utilizado para sensibilização dos alunos-trabalhadores, acreditando que os mesmos podem ser tocados por meio de uma linguagem de fácil compreensão, permitindo comunicação direta. Com o propósito de alcançar esse objetivo, recorremos à literatura de cordel, que, segundo Pagliuca et al. (2007), pode despertar a atenção e suscitar envolvimento das pessoas. A literatura de cordel é caracterizada por folhetos escritos e impressos, 169 com ilustrações nas capas na forma de xilogravuras feitas com canivetes, estiletes (gravuras feitas em madeira) e desenhos espontâneos e rudes. O cordel foi assim denominado porque em Portugal era exposto em barbantes para vendas em locais públicos (KAWALL, 2006; LIMA, 2006). Salientamos que na busca da literatura identificamos escassez de material que utilizasse a temática “literatura de cordel” como instrumento pedagógico. Resultados Este instrumento (Anexo I) nasceu da necessidade de construção de um material pedagógico que levasse o conhecimento e também produzisse a sensibilização do aluno-trabalhador da Saúde para a questão do acolhimento. Um material produzido pelo Ministério da Saúde utilizando a literatura de cordel e intitulado O dia que o SUS visitou o cidadão estimulou também a produção desse instrumento. As estrofes foram elaboradas em sextilhas e seguiram como orientação de conteúdo o manual de Acolhimento nas Produções de Saúde do Ministério da Saúde (BRASIL, 2006). Inicialmente realizamos a leitura sistemática do manual e construímos as sextilhas aleatoriamente, inspirando-nos também em nossa vivência de trabalho na Atenção Básica no SUS. Após a leitura procuramos organizar as mesmas em uma sequência que refletisse claramente o acolhimento. As estrofes se apresentam numa sequência lógica de construção baseada na seguinte caracterização, segundo discussão do grupo de trabalho: • criação do Programa Nacional de Humanização; • o acolhimento como parte desse processo; • alusão ao atendimento desumanizado; • o significado do acolhimento; • os princípios do acolhimento, como a atitude ética, a aceitação das diferenças, a escuta, a avaliação de risco; • as dificuldades para mudança; • o envolvimento da equipe e a importância do diálogo nas relações; • o acolhimento do trabalhador da saúde; • o acolhimento na comunidade. Observando as figuras de produções literárias em cordel por meio de informativos da internet, identificamos maneiras de produzir um material 170 com vestes simples e ao mesmo tempo revestido de um potencial de alcance das pessoas. As letras assumem formas desproporcionais e por isso optamos por aumentar a primeira letra de cada estrofe. As xilogravuras, desenhos característicos presentes nesses trabalhos, também foram incorporadas ao instrumento com a busca de imagens que caracterizavam o trabalho e o tema. Utilizamos papel-jornal para a impressão do cordel e consideramos a sua apresentação na forma originalmente portuguesa e difundida no nordeste brasileiro, ou seja, materiais expostos pendurados em barbante e presos por prendedores. Considerações finais O acolhimento deve ser olhado como elemento que configura acesso ao serviço de Saúde, que humaniza as relações usuário-serviço e sinaliza o caminho para a melhoria na qualidade do atendimento. Dessa forma acreditamos que a educação, seja na escola formal ou na educação permanente, se traduz em espaço valoroso para a implementação de métodos que impactem e transformem o trabalho e o trabalhador-aluno da saúde. Destacamos que esses métodos devem ter a profundidade suficiente para provocar mudança e a simplicidade que permita a acessibilidade. Assim, consideramos que a abordagem aqui proposta pode servir de ferramenta alternativa de comunicação no ensino, mediante a literatura de cordel. Referências ABBÊS, C.; MASSARO, A. Acolhimento com avaliação e classificação de risco: um paradigma ético estético no fazer em saúde. Campinas, 2001. Protocolo de Acolhimento e Classificação de Risco do Pronto Socorro do Hospital Municipal “Dr. Mário Gatti” de Campinas (SP). ALMEIDA, E. C. A. de; FURTADO, L. de. M. Acolhimento em saúde pública: a contribuição do fonoaudiólogo. Revista de Ciências Médicas, Campinas, v. 15, n. 3, p. 249-256, maio/jun. 2006. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. Acolhimento nas práticas de produção de saúde. 2. ed. Brasília, 2006. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Pré-natal e puerpério: atenção qualificada e humanizada: manual técnico. 3. ed. Brasília, 2004. BRASIL. Ministério da Saúde. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. O dia que o SUS visitou o cidadão. Brasília, [20--]. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ 171 publicacoes/cordel2.pdf>. Acesse em: 2011. ESMERALDO, G. R. O. V. et al. Análise do acolhimento na estratégia de saúde da família sob a perspectiva do usuário. Revista de APS, Juiz de Fora, v. 12, n. 2, p. 119-130, abr./jun. 2009. FARIA, J. I. L. Prática docente reflexiva na disciplina de administração de enfermagem hospitalar: uma experiência de desenvolvimento profissional de professores-pesquisadores. Tese (Doutorado) - Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2003. FERREIRA, A. B. H. Dicionário Aurélio básico da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. FRANCO, T. B.; BUENO, W. S.; MERHY, E. E. O acolhimento e os processos de trabalho em saúde: o caso de Betim, Minas Gerais, Brasil. Artigo. 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Giselle Dupas. 173 O DIA EM QUE O ACOLHIMENTO VISITOU O ALUNO-TRABALHADOR DA SAÚDE Caro trabalhador da saúde Hoje aluno para se aprimorar Venho aqui com um propósito O acolhimento lhe apresentar Aceite de bom grado O que tenho pra lhe falar O Ministério da Saúde Resolveu revolucionar E com intenção de mudar Criou a PNH Política de humanização Que veio para ficar Desde então vem implementando Novas políticas de atenção Levantando com entusiasmo A bandeira da humanização Com vários projetos vigentes Para um SUS de concretização O problema se inicia A partir do acolhimento O profissional da área Trata o povo desatento Deixa o coitado à espera Com o seu trabalho lento Sempre que chega o cliente É visto como um procedimento Ou pelo número do seu prontuário Ou pela doença em andamento Esquece-se de sua história E também do seu sofrimento Como você gostaria Que fosse atendido Com um lado de descaso Ou a acolhida de um ombro amigo Por um profissional alheio a tudo Ou por um profissional ativo Como profissional da Saúde Muito tem que aprender Com o HumanizaSUS É o momento de Acolher Pensar, mobilizar e agir Em uma nova forma de fazer Acolher significa Uma ação de aproximação Um “estar com”, “estar perto” Uma atitude de inclusão Você precisa abraçar esta causa Diga sim à humanização Olhe para o seu cliente E terá muito que pensar São pessoas com história E muita coisa pra contar Você também aprenderá com ele Basta oportunidade lhe dar Precisa ter uma atitude ética O compromisso de reconhecer o cliente Acolhê-lo em suas diferenças Suas alegrias, dores e no que sente Seu modo de viver e estar na vida E não ser indiferente Vá buscar o seu cliente Desde a recepção Responsabilize-se por ele E ouça a queixa com atenção Garanta resolutividade Para o caso em questão Ilustrações: Fig. 1 - http://xilogravurasb.blogspot.com/2008/09/xilogravura.html / Fig. 2 - Ministério da Saúde / Fig. 3- Nilo_-_xilogravura2-704212 174 Com perguntas muito simples Como “posso te ajudar?” Você pode abrir novos vínculos E novas formas de abordar Pode chegar com gentileza E ao cliente escutar Escutar com empatia Escutar com emoção Escutar com alegria E com muita dedicação E então propor formas Pra mudar a situação Pode avaliar o risco E então priorizar Pode resolver o problema Ou então encaminhar O importante nessa história É o atendimento integrar A demanda espontânea Atenda com equidade Ouça os medos e expectativas Identifique a vulnerabilidade Todos devem ser atendidos Num ato de solidariedade Como posso acolher? Como mudar meus conceitos? Sinto-me tão acomodado Será bom esse novo jeito? E dos meus colegas de trabalho Não sofrerei preconceito? Antes de tudo precisas Sair um pouco do usual Partir do trabalho individualizado Para o multiprofissional Descentralizando o atendimento E o tornando universal Hoje chegue na unidade E pense no que pode mudar Fazer com que sua equipe Possa se sensibilizar Ter uma nova visão E o acolhimento adotar Toda equipe deve estar Envolvida com a inovação E também os seus clientes Devem ter participação E num novo processo de trabalho Promover transformação O diálogo é uma constante Para um trabalho coletivo Fortalece as relações E torna o grupo cooperativo É preciso interação Para um trabalho construtivo O trabalhador da Saúde Também deve ser acolhido A equipe deve promover Escuta dos envolvidos Para que suas dúvidas e angústias Tenham espaço dividido O acolhimento também pode Acontecer na comunidade Por meio de grupos e rodas Com pessoas de qualquer idade Faça um levantamento E atenda suas necessidades Espero que no dia de hoje Seu coração seja tocado E com um novo pensamento Seja sensibilizado Levante também esta bandeira O acolhimento é nosso aliado. 175 176 A FORMAÇÃO DE EDUCADORES PARA O ENSINO DE NÍVEL TÉCNICO EM ENFERMAGEM Rafael Soares Tonelotti1 Ana Maria Pimenta Carvalho2 RESUMO O presente trabalho procura refletir sobre a formação de educadores para o ensino de nível técnico em Enfermagem e a prática pedagógica a ser aplicada no cotidiano da instituição educacional. Com o aumento do número de escolas profissionalizantes, a ação docente tem se constituído em campo de atuação profissional para o enfermeiro, mesmo sem ter recebido qualquer formação pedagógica inicial. Devido a isto, torna-se necessária a formação contínua de educadores que atuam no ensino técnico de Enfermagem, de forma que os mesmos possam aprimorar seus conhecimentos teóricopráticos. No decorrer deste trabalho, foram ressaltados aspectos relacionados à necessidade de capacitação contínua de profissionais, que ao tratar da formação de educadores envolve vários níveis de funções e responsabilidades. Em seguida, foi verificada a atividade do docente como expressão do saber relacionado principalmente aos serviços de saúde; dessa forma, o professor responsabiliza-se em oferecer informações aos educandos utilizando didática e metodologias de ensino relacionadas à realidade dos mesmos. E, por fim, ressalta-se que o processo de ensino-aprendizagem realiza-se por meio de ações educativas eficazes para a obtenção de melhores resultados. Os resultados deste trabalho de conclusão de curso mostraram, ainda, a grande importância dos educadores manterem-se informados e capacitados para serem atuantes e ativos no processo de ensino-aprendizagem dos cursos de ensino técnico em Enfermagem. Descritores: Ensino técnico. Educadores. Capacitação. Planejamento. Ensino-aprendizagem. 1. Aluno do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde – EaD – Fiocruz/Fundap/ Niad/USP/RP, 2011. 2. Tutora do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde – EaD – Fiocruz/Fundap/ Niad/USP/RP, 2011. 177 INTRODUÇÃO A preocupação com a qualidade do ensino técnico em Enfermagem fazse necessária, assim como a formação pedagógica dos docentes. Essa afirmação foi realizada por Isaia (2002), e indica que, além de corresponder à exigência de atualização permanente, o educador tornou-se o grande responsável pela formação de profissionais. Assim, colocar o conhecimento da área educacional e a formação pedagógica no mesmo patamar dos conhecimentos técnico-científicos tem sido o trabalho cotidiano de um número crescente de profissionais da educação que atuam na área de Saúde e contribuem para a formação de novos profissionais. Atuar na área de docência significa produzir diferentes discursos e modos de agir com a principal finalidade de contribuir para a formação de profissionais qualificados para o mercado de trabalho (RODRIGUES, 2007). De acordo com dados divulgados por Valente e Viana (2006), podese afirmar que inúmeros cursos técnicos profissionalizantes em Enfermagem foram implantados no Brasil em razão do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae), do Ministério da Saúde, que abriu um novo campo de trabalho para os egressos dos cursos superiores de Enfermagem no campo da docência. No entanto, o estudo realizado pelos autores acima citados ressaltou a preocupação com a qualidade do ensino técnico, assim como a formação pedagógica dos docentes. Ainda com base em Valente e Viana (2006), a competência profissional dos trabalhadores de nível técnico em Enfermagem representa um dos componentes fundamentais para a qualidade da assistência nos serviços de Saúde, visto que são esses profissionais que compõem o maior contingente no cuidado dos enfermos, pois são os profissionais que estão na linha de frente do atendimento e necessitam de uma formação competente para o desenvolvimento de habilidades que efetivem uma assistência com qualidade, cabendo ao enfermeiro docente desenvolver competências em sua formação para encontrar subsídios que favoreçam a prática dos técnicos de Enfermagem nos diversos níveis de atendimento à saúde pública e/ou privada. O interesse pelo tema surgiu devido à necessidade de os educadores estarem em constante aprendizado, capacitando-se a cada dia para que ofereçam maiores informações aos alunos e proporcionem maior riqueza nos conteúdos discutidos e nas experiências trocadas. Contudo, a principal ambição deste trabalho de conclusão de curso é a de identificar como é realizada a formação de educadores para o ensino técnico em Enfermagem e provocar mudanças de 178 atitudes e de práticas no trabalho docente. FORMAÇÃO DE EDUCADORES É importante ressaltar algumas considerações sobre a formação de educadores para o ensino técnico profissional, pois, de maneira geral, os professores que atuam no núcleo profissionalizante muitas vezes não apresentam formação específica para desempenhar a função de docentes, e consequentemente, a falta de didática e/ou diversificação de metodologias de ensino contribuem para que os mesmos apresentem dificuldades no desenvolvimento de sua prática pedagógica (ABREU, 2009). Ao considerar os estudos desenvolvidos por Rodrigues (2007), é possível afirmar que a formação, o desempenho e o desenvolvimento profissional do professor são apontados como alguns dos principais fatores que podem levar à melhoria da qualidade do ensino em Enfermagem. Entretanto, para muitos professores, a docência em Saúde é, geralmente, considerada uma atividade secundária, deixando eles de reconhecer e dedicar-se à existência de uma tarefa de grande responsabilidade. De acordo com Alarcão (2003, p. 155), na primeira década do século XX os tópicos tratados em textos de psicologia da educação mapeavam assuntos direcionados somente à didática e às metodologias de ensino. Por volta das décadas de 1950 e 1960, constatou-se a contínua ênfase nos aspectos genéricos e nos procedimentos que apontam a preocupação em determinar os efeitos do ensinar em estudantes, especialmente com respeito à realização de objetivos específicos. Ainda com base nos estudos realizados por Alarcão (2003), entre as décadas de 1970 e 1980, como reação às investigações descontextualizadas, procurou-se valorizar o estudo da vida mental do educador, começando a surgir pesquisas sobre o seu pensamento e o processo de tomada de decisões. Já na década de 1990, a globalização e a tecnologia cada vez mais sofisticadas contribuíram para as mudanças no sistema de ensino. Acompanhado pelo desemprego da época, o sistema passa a exigir um trabalhador que seja capaz de enfrentar situações imprevistas, tomar decisões, trabalhar em equipe e estar pronto para o mundo em constantes mudanças. Ao confrontar a atualidade, informa-se que no século XXI o mundo do trabalho não admite a presença de profissionais limitados apenas aos aspectos da profissão, mas sim que sejam competentes e preparados para 179 a vida. Assim, entende-se que a prática docente é determinante para a formação profissional e que a profissão de educador não limita-se somente à transmissão de informações (RODRIGUES, 2007). A autora citada no parágrafo acima salientou que uma das competências específicas para a docência no ensino técnico de Enfermagem é o domínio na área pedagógica, denominada como fator essencial do processo de ensino-aprendizagem, assim como o próprio conceito de processo ensinoaprendizagem, a compreensão da relação professor-aluno e aluno-aluno, e a teoria e a prática básicas da tecnologia educacional. Partindo dessas afirmações entende-se que para o enfermeiro assumir o papel de professor faz-se necessário apresentar conhecimento na área específica, bem como no processo educativo. Portanto, ser competente em uma área de conhecimento, possuir domínio da área pedagógica e exercer a dimensão política na prática da docência são fundamentais para a docência no ensino técnico de Enfermagem. Rodrigues (2007) salientou que, na busca de um processo de ensinoaprendizagem que contemple todas as dimensões necessárias ao exercício da docência, tais como técnica, política e ética, devem ser oferecidas condições de capacitação, qualificação e desenvolvimento do corpo docente no que diz respeito à área pedagógica. Desse modo, para superar esse modelo de formação baseado na racionalidade técnica, é essencial a formação continuada do educador. Historicamente, Bassinello (2002) descreveu que o ensino de pósgraduação caracteriza-se como grande responsável na formação de docentes, por meio das disciplinas de Metodologia do Ensino Superior e Didática, pois estas disciplinas compõem uma oportunidade de reflexão sistemática sobre o exercício da docência. Dessa forma, tais reflexões fazem examinar as fundamentações que embasam as atitudes dos professores e os estimulam a buscar as causas dos conflitos vividos no processo de ensinar e aprender, em uma permanente inquietação sobre as ações pedagógicas. Contudo, os docentes devem ser estimulados a buscar novos cursos de capacitação, a rever a própria prática, procurando meios de melhor exercerem o papel de mediadores do conhecimento. Competências e exigências aos Professores Ao considerar os estudos desenvolvidos por Ferreira Júnior (2007), pode-se afirmar que atualmente o ensino técnico profissionalizante está passando por mudanças significativas devido ao fato de ocorrer alterações na 180 formação tradicionalista, mecanizada e reprodutivista, para um novo modelo de ensino caracterizado por competências nas diversas áreas do conhecimento. De acordo com Nóvoa (2001) as instituições de ensino que eram organizadas nos moldes tradicionais e tecnicistas não atendem às exigências constituídas nos dias atuais, pelo avanço da sociedade, no que diz respeito aos conhecimentos que devem compor a formação dos alunos. Não mais se sustenta a fragmentação do conhecimento, acentuando-se, ao contrário, a necessidade de uma formação de caráter mais geral. Sendo assim, é papel fundamental do ensino técnico em Enfermagem formar cidadãos multicompetentes, curiosos, criativos, comprometidos e capazes de refletir sobre as situações do cotidiano, bem como demonstrar seus conhecimentos teóricos por meio das funções desempenhadas nos serviços de Saúde. Ao retornar aos estudos publicados por Ferreira Júnior (2007), verificou-se que, na prática do ensino profissionalizante, as habilidades requeridas pelo impactante avanço das tecnologias e das novas formas que o trabalho vem assumindo impõem a exigência de uma maior competência dos educadores para entenderem e interpretarem informações, o que implica o domínio cultural sobre as diferentes áreas do conhecimento relacionadas à área da Saúde e sobre as relações existentes entre elas. O autor Nóvoa (2001) ainda orientou que o docente não pode ser considerado somente como o responsável pela aula, pois sua ação não se esgota nos limites das quatro paredes da sala de aula e, nela, não se apresenta somente como representante do ofício escolhido, mas como pessoa que é composta de saberes, experiências, dúvidas, aspirações, conflitos, entre outros. Portanto, o processo de ensino-aprendizagem do ensino técnico deve ser constituído por alunos e professores em uma constante troca de informações e experiências, relacionando a teoria com a prática e, consequentemente, contribuindo para aquisição de novos conhecimentos: “A formação é um ciclo que abrange a experiência do docente como aluno (educação de base), como aluno-mestre (graduação), como estagiário (práticas de supervisão), como iniciante (primeiros anos da profissão) e como titular (formação continuada)” (NÓVOA, 2001, p. 133). Segundo Rodrigues e Mendes Sobrinho (2008), em sua análise reflexiva, a competência, solicitada aos educadores, parece ir bem além daquela referida aos saberes específicos às áreas do conhecimento; devido a isto, a estes se devem somar o conhecimento e a capacidade de lidar com o aluno, de trabalhar a informação que chega à sala de aula por vias diversas, de responder às expectativas inerentes a uma nova abordagem do currículo, 181 tanto no que diz respeito à seleção e ao tratamento conceitual e integrador de conteúdos quanto ao tratamento metodológico adotado. Exige-se, portanto, um profissional com saberes diferenciados e com sensibilidade para disponibilizá-los adequadamente, mostrando seu diferencial no ensino técnico em Enfermagem. Sendo assim, os mesmos autores salientaram que, na medida em que essa condição de saber não é definitiva, entende-se que a competência não pode ser conquistada por meio de um processo isolado, mas deve ocorrer por meio de uma aquisição complexa, diversa e exigente, inscrita em um tempo mais longo. Portanto, esse processo e essa mudança educacionais influenciam diretamente na formação dos educandos matriculados no ensino técnico de Enfermagem, considerando que os mesmos são responsáveis pela aquisição de novos conhecimentos na área da Saúde e, neste contexto, o docente exerce o papel de facilitador do processo de ensino-aprendizagem. Ainda nos estudos publicados por Rodrigues e Mendes Sobrinho (2008, p. 436), os enfermeiros docentes apresentam uma complexidade do trabalho educacional; no entanto, caracteriza-se como evidente a necessidade de comprometimento com as questões pedagógicas, a fim de que ocorra uma transformação no ensino de Enfermagem. Diante do exposto, verificou-se que muitos profissionais têm plena consciência da necessidade da formação pedagógica, bem como de que suas práticas docentes precisam estar em constantes mudanças. Porém, não basta somente ter consciência, mas sim estarem dispostos a redirecionar conceitos e superar um ensino focado restritamente na reprodução do conhecimento, a partir da adoção de uma prática pedagógica capaz de superar o tradicionalismo e que seja fundamentada na construção do conhecimento e no contexto social. CARACTERÍSTICAS E METODOLOGIAS DA DOCÊNCIA Segundo Pimenta (2002), diversas pesquisas têm demonstrado que os cursos de formação profissional, ao desenvolverem um currículo formal com conteúdos e atividades incapaz de captar as contradições presentes na prática social de educar, pouco têm contribuído para gestar uma nova identidade do profissional docente. O autor descreveu que, com relação à formação contínua, a prática mais frequente tem sido a de realizar cursos de atualização dos conteúdos de ensino, porém esses programas têm se mostrado pouco eficientes para alterar a prática docente, principalmente por não tomarem a prática docente e pedagógica escolar nos seus contextos. 182 Com relação às metodologias da docência, Rodrigues e Mendes Sobrinho (2007) publicaram que a formação do docente em Enfermagem deve ser baseada no domínio de conhecimentos científicos e na atuação investigativa no processo contínuo de ensinar e aprender, simulando situações de aprendizagem por busca de maiores informações e/ou investigação do conhecimento. A partir da finalidade de evidenciar as metodologias empregadas na prática docente, de acordo com Ferreira Júnior (2007) fica claro que as mesmas devem traçar formas de motivar os alunos de forma criativa para estimular o interesse pelo aprendizado em Enfermagem. Além disso, os professores devem incentivar a participação dos alunos no processo de construção do conhecimento, partindo da própria realidade cotidiana, por meio de exemplos relacionados à vida real, o que denota a competência de organizar e dirigir situações de aprendizagem. Construção da identidade do professor Ainda com base nos estudos realizados por Moraes (2004), além da finalidade de conferir o exercício profissional da docência, do curso de formação inicial se espera que forme o professor, ou pelo menos que colabore para sua formação. Acredita o autor que, de acordo com a natureza do trabalho docente, cuja principal finalidade é ensinar e contribuir com o processo de aprendizagem dos alunos, espera-se da licenciatura o desenvolvimento de conhecimentos e habilidades, atitudes e valores que possibilitem permanentemente a construção do educador capaz de educar e formar profissionais competentes para o exercício das atividades de Enfermagem. O autor conduz a descrever a profissão de professor como resposta a necessidades que estão postas pelas sociedades. Sendo assim, algumas profissões deixaram de existir e outras surgiram nos tempos atuais. Outras adquirem tal poder legal que se cristalizam a ponto de permanecerem com práticas altamente formalizadas e burocráticas. Outras não chegam a desaparecer, mas se transformam adquirindo novas características para responderem a novas demandas da sociedade. Portanto, ao contextualizar essas afirmações com a realidade, pode-se afirmar que esse é o caso da profissão de professor. Tais considerações apontam para o caráter dinâmico da profissão docente como prática social e, consequentemente, é na leitura crítica da 183 profissão diante das realidades sociais que se buscam os referenciais para modificá-la e torná-la cada vez melhor. Pimenta (2002) ainda direciona quanto às práticas que resistem a inovações. Do confronto entre as teorias e as práticas, da análise sistemática das práticas à luz das teorias existentes, da construção de novas teorias, constrói-se, também, o significado que cada professor, enquanto ator e autor, confere à atividade docente no seu cotidiano, a partir de seus valores, de seu modo de situar-se no mundo, de sua história de vida, de suas representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios, do sentido que tem em sua vida o ser professor. Por isso, assim como nas escolas, nos sindicatos e em outros agrupamentos é importante mobilizar os saberes da experiência, sendo considerado o primeiro passo no curso de didática que se propõe a mediar o processo de construção de identidade dos futuros professores. A prática pedagógica e os principais saberes da docência Com enfoque na prática pedagógica do ensino técnico, Behrens (2003) nos direciona para a perspectiva de um paradigma inovador na sociedade do conhecimento; mais especificamente, observa-se o estímulo do professor para sentir-se desafiado a buscar uma prática pedagógica que contemple a produção do conhecimento, como alicerce de sua prática cotidiana. Desse modo o paradigma emergente inclui uma visão sistêmica, que busca a superação do conhecimento estático, propondo uma abordagem progressiva, que promova o diálogo e a discussão coletiva, crítica e reflexiva dos alunos e dos professores, no ensejo de que o ensino e a pesquisa visem, sobretudo, à produção de conhecimento, com autonomia, espírito crítico e investigativo. Ao retornar aos estudos de Pimenta (2002), pode-se refletir acerca do processo educativo nas suas dimensões social, histórica, filosófica e instrumental, possibilitando a compreensão da educação como processo que acontece sob a forma de relações em espaços diferenciados, nos quais o sujeito, neste caso o professor, estabelece conexões entre sua subjetividade e o ambiente, produzindo, assim, os saberes necessários ao desenvolvimento da prática pedagógica. Segundo Perrenoud (1993), a prática pedagógica tem como principal finalidade possibilitar que os próprios professores ofereçam uma imagem de 184 pessoas que sabem o que fazem e que dominam o conteúdo e as situaçõesproblemas que surgem no decorrer do cotidiano escolar. Essa unidade dos saberes dos professores é dada pela ação, pelas necessidades e especificidades da prática, que compreende conhecimentos, experiências e vivências; daí a compreensão de que são heterogêneos e plurais , por serem constituídos dos saberes das disciplinas, dos saberes curriculares, dos saberes da formação profissional e dos saberes da experiência. Para tanto, o professor deve ser capaz de assimilar e exercitar, também, os saberes da tradição pedagógica, e, aliada a esses saberes, deve possuir uma competência cultural que o capacite a discutir com os alunos, ser autêntico, administrar a classe e mediar a aprendizagem do aluno, bem como identificar comportamentos e contribuir para modificá-los, quando necessário. A experiência À luz dos conhecimentos de Perrenoud (1993), quando os alunos chegam ao curso de formação universitária já apresentam saberes sobre o que é ser professor, pois os saberes de sua experiência de alunos que foram de diferentes professores em toda a sua vida escolar contribuíram para sua formação humana. Também sabem sobre o ser professor por meio da experiência socialmente acumulada, as mudanças históricas da profissão, o exercício profissional em diferentes escolas, a não valorização social e financeira dos professores, as dificuldades de estar diante de turmas jovens turbulentas, em escolas precárias; sabem um pouco sobre as representações e os estereótipos que a sociedade tem dos professores, pelos meios de comunicação. O autor referenciou que, em outro nível, os saberes da experiência são também aqueles que os professores produzem no seu cotidiano docente, em um processo permanente de reflexão sobre sua prática, mediatizada pela de outrem – seus colegas de trabalho, os textos produzidos por outros educadores. É aí que ganham importância na formação de professores os processos de reflexão sobre a própria prática e do desenvolvimento das habilidades. O conhecimento Valente e Viana (2006) constataram que o ato de conhecer implica o estágio de trabalhar com as informações classificando-as, analisando-as e contextualizando-as; é, portanto, nessa trama que se pode entender as relações entre conhecimento e poder, pois a informação confere vantagens a quem a possui, caso contrário, as sociedades não se armariam contra a divulgação de 185 informações, nem as manipulariam. Nessa mesma perspectiva, o autor Pimenta (2002) salientou que não basta produzir conhecimento, mas é preciso produzir as condições de produção do conhecimento. Ou seja, conhecer significa estar consciente do poder do conhecimento para a produção da vida material, social e existencial da humanidade. Segundo Pimenta (2002), a educação escolar está assentada fundamentalmente no trabalho dos professores e dos alunos, cuja finalidade é contribuir com o processo de humanização de ambos pelo trabalho coletivo e interdisciplinar destes com o conhecimento, em uma perspectiva de inserção social crítica e transformadora – ou seja, a sociedade civilizada, fruto e obra do trabalho humano, cujo elevado progresso evidencia as riquezas que a condição humana pode desfrutar, revela-se também uma sociedade contraditória, desigual, em que grande parte dos seres humanos está à margem dessas conquistas, dos benefícios do processo civilizatório. Moraes (2004) determinou que a finalidade da educação escolar na sociedade tecnológica, multimidiatizada e globalizada é possibilitar que os alunos trabalhem os conhecimentos científicos e tecnológicos, desenvolvendo habilidades para operá-los, revê-los e reconstruí-los com sabedoria. Os saberes pedagógicos Rodrigues (2007) alertou que, além da consideração dos aspectos epistemológicos característicos das áreas de conhecimento que denotam avanços intrínsecos e que colocam novas questões ao ensino, existem novos entendimentos da questão do conhecimento no mundo contemporâneo, tais como a renovação da didática, que apresenta por base os aspectos pedagógicos, ressaltando a importância de uma visão crítica das novas colaborações da psicologia e da sociologia educacionais e também das iniciativas institucionais, que têm procurado fazer frente ao fracasso escolar, apoiadas na renovação de métodos e de sistemáticas de organização e funcionamento das escolas, sendo as novas lógicas de organização curricular, assim como ciclos de aprendizagem, relacionadas à formação de professores e ainda articuladas à realidade das instituições de ensino técnico. A mesma autora registrou que os profissionais da educação, em contato com os saberes sobre a educação e sobre a pedagogia, podem encontrar instrumentos para se interrogarem e enriquecerem suas práticas, confrontando-as no cotidiano e na prática educacional. Os saberes sobre a educação e sobre a pedagogia não geram os saberes 186 pedagógicos, pois, ao refletir-se sobre os estudos de Ferreira Júnior (2007), afirma-se que tais saberes só se constituem a partir da prática, que os confronta e os reelabora. As práticas pedagógicas se apresentam nas ciências da educação com estatuto frágil: reduzem-se a objeto de análise das diversas perspectivas. Ferreira Júnior (2007) enfatizou que nessa mesma abordagem, inseridos nas práticas docentes estão contidos elementos extremamente importantes, como a problematização, a intencionalidade para encontrar soluções, a experimentação metodológica, o enfrentamento de situações de ensino complexas, as tentativas mais radicais, mais ricas e mais sugestivas de uma didática inovadora, que ainda não está configurada teoricamente. Segundo Pimenta (2002), a prática de documentação, no entanto, requer que se estabeleçam critérios. Documentar as escolhas feitas pelos docentes, o processo e os resultados. Não se trata de registrar apenas para a escola, individualmente tomada, mas de forma a possibilitar nexos mais amplos com o sistema. Documentar não apenas as práticas tomadas na sua concreticidade imediata, mas buscar a explicitação das teorias que se praticam, a reflexão sobre os encaminhamentos realizados em termos de resultados conseguidos. Quanto às metodologias o autor Pimenta (2002) afirmou que o conhecer é estabelecido por meio de estudos das realidades escolares e dos sistemas onde o ensino ocorre. Desse modo, comparecer às instituições de ensino e realizar observações, entrevistas, coletar dados sobre determinados temas abordados nos cursos, problematizar, propor e desenvolver projetos, dentre outras atividades, constituem alguns dos passos mais importantes para a tentativa de colaborar com a construção da identidade e a qualificação profissional dos docentes. O saber pedagógico é o saber que o professor constrói no cotidiano de seu trabalho e que fundamenta sua ação docente, ou seja, é o saber que possibilita ao professor interagir com seus alunos, na sala de aula, no contexto da escola onde atua e, por isso, a prática docente é, simultaneamente, expressão desse saber pedagógico construído e fonte de seu desenvolvimento (RODRIGUES, 2007). Ao considerar-se os estudos de Pérez-Gómez (1992), o professor pode ser identificado como alguém que pensa em seu trabalho e que, acima de tudo, constrói um saber e coloca-se diante da diferença entre o saber e o conhecimento propriamente dito. 187 Autonomia didática e pedagógica Embora certos estudos apontem a permeabilidade da escola à divisão do trabalho, tal como ocorre no processo de trabalho material, a qual é muitas vezes usada para explicar a desqualificação docente, isto é, a perda de sua autonomia e controle sobre o processo de trabalho, a prática docente observada por meio dos cursos de formação de professores suscitou questões que viriam a constituir o fio condutor da investigação, dirigindo o olhar para as possibilidades e os limites de autonomia e controle que o professor tem sobre seu processo de trabalho, e como eles têm sido exercidos. Cabe ressaltar que essa afirmação foi baseada nos estudos desenvolvidos pelo autore Moraes (2004). Ainda de acordo com o autor citado no parágrafo anterior, não se trata, pois, de acreditar que a qualificação docente pode, isoladamente, assegurar um ensino de qualidade. Ao contrário, acredita-se que uma política de democratização da escola que tenha como um de seus objetivos o ensino de qualidade, necessita, também, do professor de qualidade. Este deve ser buscado no aproveitamento dos que aí estão, por meio de sua formação contínua e também do investimento na formação de novos professores. Entretanto, o investimento na formação dos professores depende de uma política de valorização docente. Sendo assim, para exercer tais autonomia e controle, muitas vezes negados pelo próprio professor, é preciso que o docente sinta-se sujeito de seu próprio trabalho. Para construir o conceito de trabalho docente e a formação profissional, enquanto atividade historicamente construída, serão ressaltados alguns pressupostos embasados nos estudo desenvolvidos por Nóvoa (1992, p. 152): O trabalho docente é uma práxis em que a unidade teoria e prática se caracteriza pela ação-reflexão-ação; o trabalho docente só pode ser compreendido se considerado no contexto da organização escolar e da organização do trabalho no modo de produção, no caso, o capitalista; a compreensão do trabalho docente só pode ocorrer no processo de elaboração de seu conceito, que emerge após o estudo de suas condições históricas gerais e particulares. Moraes (2004) finalizou essa reflexão informando que tais pressupostos, ao mesmo tempo em que expressam uma síntese de nossa postura diante da questão proposta, apontam a trajetória do estudo desenvolvido para tal busca. Nesta, foi explicitada a especificidade do trabalho docente no contexto da sociedade capitalista contemporânea. 188 O trabalho docente Rodrigues e Mendes Sobrinho (2008) acreditam que, atualmente, a docência passou a ser vista como trabalho caracterizado por sua profissionalização, que, apesar de apresentar uma série de limitações sociais, econômicas, políticas e culturais, está caminhando para mudanças constantes que visam à formação de técnicos em Enfermagem capazes de realizar suas funções com autonomia, solucionando situações-problemas e visando acima de tudo contribuir de forma significativa para a melhoria da qualidade de vida dos enfermos que carecem de seus cuidados. Ainda fundamentado no estudo de Rodrigues e Mendes Sobrinho (2008), é importante divulgar que o trabalho docente constrói-se e transformase no cotidiano da vida social, como prática que visa à transformação de uma realidade, a partir das necessidades práticas do homem social. Ao retornar-se aos estudos desenvolvidos por Moraes (2004), verificouse que, embora o trabalho docente se desenvolva em instituições burocráticas e hierarquizadas onde o professor se depara com diversas formas de controle, seu trabalho não pode ser equiparado àquele decorrente da divisão detalhada do trabalho, pois o trabalho do professor é composto por uma função completa devido ao fato de considerar o ato de ensinar, mesmo sendo composto por atividades diversas e podendo se decomposto metodologicamente, só pode ser desenvolvido em sua totalidade. Na docência, mais que em outros trabalhos, utilizam-se e integram-se os diversos conhecimentos sociais e culturais que o mestre possui como pessoa, além de sua formação profissional. Este fato é iniludível, dada a complexidade da situação docente, complexidade que se dá tanto na relação com o conhecimento escolar como na relação social com os alunos (ROCKWELL; MERCADO, 1996, p. 69). Para finalizar essa perspectiva relacionada ao trabalho docente, consideram-se os dados de pesquisa apresentados por Rodrigues e Mendes Sobrinho (2008) de que, embora existam normas legais a serem seguidas, nem sempre a prática cotidiana das instituições técnicas de ensino em Enfermagem corresponde a essas normas, pois cada instituição possui sua própria lógica, sua realidade, suas possibilidades e limitações, que constituirão o contexto da prática docente. 189 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta reflexão sobre a formação de educadores para o ensino de nível técnico em Enfermagem permite afirmar que não podemos formar técnicos de Enfermagem generalistas, críticos e reflexivos sem que os enfermeiros professores tenham uma adequada formação. Outro ponto importante a ser ressaltado é que a formação inicial por si só não garante um bom desempenho da ação docente, o que requer também uma educação permanente. Neste contexto, é de fundamental importância o estabelecimento de programas de formação continuada voltados para a docência, como também as universidades incluírem em seu conteúdo programático disciplinas que exercitem a prática docente do aluno. Ao optar por dedicar-se ao ensino, o enfermeiro enfrenta desafios como a ausência de preparação de profissionais para lidar com as questões de ensino, decorrente da insuficiente formação nos cursos de graduação. Também, é possível citar com dificuldade o distanciamento entre a teoria e prática durante sua formação, o que irá refletir na formação de profissionais técnicos de Enfermagem. A riqueza dos dados sobre os saberes e os não saberes dos docentes a serem explorados está apenas esboçada neste texto, mas esperase que seja uma amostragem bem-sucedida das potencialidades e dos desafios que se apresentam à prática pedagógica. É possível concluir que um trabalho de formação deverá levar em conta o fato de que o mundo e a ciência que justificam a própria existência da educação passam por profundas mudanças, o que, certamente, implica novos problemas e desafios para a tarefa de produzir e disseminar conhecimentos e técnicas aos futuros profissionais que atuarão no ensino de nível técnico de Enfermagem. Assim, conclui-se que os enfermeiros docentes passam por desafios constantemente, mas cabe ao próprio profissional o interesse em buscar soluções para os obstáculos, respostas para as dúvidas e, portanto, tornar o seu processo de formação válido e significativo ao ponto de construir e formar profissionais técnicos de Enfermagem competentes e aptos a exercer as atividades de Enfermagem com qualidade. 190 REFERÊNCIAS ABREU, G. R. Ressignificação da formação do professor de ensino técnico-profissional: por uma prática reflexiva na reconstrução de sua identidade. Revista Profissão Docente, Uberaba, v. 9, n. 20, 2009. Disponível em: <http://www.uniube.br/propep/mestrado/revista/vol09/9917. pdf>. Acesso em: 20 mar. 2011. ALARCÃO, I. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2003. BASSINELLO, G. A. H. Perfil dos professores de ensino médio profissionalizante de enfermagem na região de Piracicaba. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Faculdade de Ciências Médicas, Campinas, 2002. Disponível em: <http://cutter.unicamp.br/ document/?down=vtls000287806>. Acesso em: 12 mar. 2011. BEHRENS, M. O paradigma emergente e a prática pedagógica. Curitiba: Champagnat, 2003. FERREIRA JÚNIOR, Marcos Antônio. Os reflexos da formação inicial na atuação dos professores enfermeiros. Revista Brasileira de Enfermagem, Campo Grande, 2007. Disponível em: <http:// www.scielo.br/pdf/reben/v61n6/a12v61n6.pdf>. Acesso em: 25 mar. 2011. ISAIA, S. M. A. Para (re) pensar os processos formativos do professor do ensino técnico. 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Codogno P. Castro Orientadora: Maria Lúcia Araújo Sadala RESUMO Considerando que a formação do trabalhador da Saúde é um fator determinante para que os princípios constitucionais de universalidade, integralidade e equidade sejam alcançados, este trabalho teve como objetivo realizar uma pesquisa bibliográfica sobre o tema da formação dos profissionais, procurando ressaltar no seu desenvolvimento a importância e a responsabilidade de se formar esses trabalhadores para atuarem junto ao SUS. Por meio da revisão bibliográfica, procurou-se analisar a produção científica sobre a formação técnica em Enfermagem nos últimos 20 anos. A formação técnica tem caminhado para um preparo direcionado para o trabalho no SUS; para isso é necessário o comprometimento primeiramente dos profissionais docentes. Descritores: Formação de Profissionais de Saúde. Formação de Técnicos em Saúde. Profissionais Técnicos de Saúde. iNTRODUÇÃO O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado pela Constituição Federal de 1988 para proporcionar atenção integral à saúde, com ênfase na promoção da saúde e prevenção de doenças, resultado de muita luta e mobilização da sociedade, que reconheceu a saúde como um direito de cidadania. Estima-se que mais de 80% da população brasileira seja atendida pelo SUS, que absorve um grande contingente de profissionais. Nesse sentido, a formação do trabalhador da Saúde é um fator determinante para que os seus princípios constitucionais de universalidade, integralidade e equidade sejam alcançados. Todas as funções e profissões, atualmente, exigem um nível de conhecimento muito além do que se 193 aprende nas instituições escolares e que satisfaça as exigências do mercado de trabalho, que está constantemente se modernizando. A inserção de novas tecnologias impõe aos profissionais do setor a adoção de uma prática profissional com qualidade técnica, científica e humana, segundo Oliveira e Rauli (2009), valorizando a capacidade de aprender a selecionar informações e conhecimentos, problematizando as diversas situações do cotidiano e, principalmente, propondo soluções para esses problemas. De acordo com Monteiro (2009), os princípios da universalização do acesso e da atenção integral à saúde exigem dos profissionais de Saúde uma formação cada vez mais qualificada. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os profissionais de nível técnico são responsáveis por 75% das ações de saúde junto à população no mundo, principalmente aquelas desenvolvidas pela equipe de Enfermagem (PIERANTONI, 2002 apud MONTEIRO, 2009). Por essa razão, uma grande preocupação quanto à formação dos profissionais técnicos em Enfermagem deu origem a este trabalho, considerando-se que a maior oferta de serviços de saúde encontra-se no setor público. Esses profissionais são formados segundo os princípios e diretrizes do SUS? Após o curso técnico de Enfermagem, estariam esses profissionais aptos a trabalhar no sistema público de saúde ou na iniciativa privada, obedecendo aos mesmos princípios de igualdade e integralidade? Estariam esses profissionais preparados para lidar com as desigualdades sociais e econômicas da população? Tais questionamentos levaram as autoras a explorar o assunto envolvendo a formação do profissional técnico em Enfermagem, procurando ressaltar no desenvolvimento deste trabalho a importância e a responsabilidade de se formar esses trabalhadores para atuarem junto ao SUS. Por meio da revisão bibliográfica, procurou-se analisar a produção científica sobre a formação técnica em Enfermagem nos últimos 20 anos. A discussão dos trabalhos encontrados é apresentada na sequência. São 30 artigos selecionados, que trazem informações a respeito das necessidades profissionais do sistema de Saúde, bem como diversas sugestões a respeito de cursos formativos, deixando clara a ideia da educação permanente como meta principal para a evolução desses profissionais. Focaremos a discussão em dois aspectos, como está descrito a seguir. Focaremos a integralidade como um dos princípios mais importantes no contexto da saúde. A integralidade em Saúde esteve sempre explicitada como intenção e necessidade da ação pública, isto é, como intervenções que consolidariam o Sistema Único de Saúde, o SUS (BRASIL, 2006). Por essa razão, a integralidade representa um enorme desafio nas práticas em 194 saúde, principalmente quando se trata de romper com formas cristalizadas de se entenderem e realizarem ações técnicas e que conformam padrões de intervenção médica ou em saúde já tornados tradição. Segundo Freitas et al. (2010), o significado de integralidade vai além da visualização da assistência em todos os níveis de atenção que se façam necessários, mas também da relação desse princípio com a ideia de um todo, de assistirmos integralmente o indivíduo como ser humano, que necessita de uma assistência humanizada e um acolhimento adequado, um tratamento digno, e com vínculo. Integralidade, segundo Mattos (2001), não é apenas uma diretriz do SUS definida constitucionalmente. Ela é uma “bandeira” de luta. É um ideal de uma sociedade mais justa e mais solidária. METODOLOGIA Para alcançar o objetivo proposto, realizou-se levantamento bibliográfico nos últimos 20 anos, buscando artigos sobre a trajetória da formação dos profissionais de Saúde concomitantemente à criação do Sistema Único de Saúde, o SUS. A maior fonte de pesquisa se deu pelo Banco de Dados de Enfermagem (BDENF), que direcionou a pesquisa para um número maior de artigos publicados sobre o assunto. Em seguida, procedeu-se à leitura dos artigos, ao fichamento das informações úteis ao desenvolvimento deste trabalho. Nesse processo foram selecionados 30 artigos, que datam de 1997 a 2010, relacionados ao processo de formação dos profissionais técnicos da área da Saúde. Após a identificação dos documentos e referências consultados, estes foram catalogados por ano de ocorrência do estudo, obedecendo à ordem cronológica. Após a análise, os dados foram organizados, descritos e contextualizados, culminados na discussão deste trabalho. RESULTADOS E DISCUSSÃO Entre os numerosos estudos encontrados, foram selecionados 30 artigos, como os de maior relevância, contribuindo com informações significativas para a discussão do tema. Obedecendo à ordem cronológica dos trabalhos, a tabela abaixo pretende dar uma visão geral desses artigos selecionados, que passarão a ser discutidos na sequência. 195 Nº AUTOR(ES) ANO RESUMO 1 MACHADO, CALDAS JUNIOR e BORTONCELLO 1997 Relato sobre a implantação de um projeto para articular a formação de profissionais de Saúde envolvendo a participação das universidades, do sistema local de Saúde e da comunidade. 2 PIERANTONI 2000 Esse estudo examina o desenvolvimento de recursos humanos nas políticas públicas, segundo as políticas nacionais de Saúde. 3 CAMPOS et al. 2001 Considerando que o SUS deve nortear a formação profissional na área da Saúde, os autores exploram a possibilidade de integração do processo de aprendizagem aos serviços de Saúde. 4 MOTTA, BUSS e NUNES 2001 Os autores promovem uma reflexão a respeito da formação profissional para o trabalho em Saúde. Enfatizam o desafio de buscar alternativas para o planejamento do ensino em consonância com a nova conjuntura do SUS. 5 DELUIZ 2001 A autora demonstra a importância de ampliar a qualificação dos trabalhadores em Saúde baseada em competências, assumindo como referência doutrinária a Reforma Sanitária e os princípios normativos e organizativos do SUS. 6 ALMEIDA e SOARES 2002 Trata-se de um estudo qualitativo, realizado a partir de entrevistas junto a profissionais que participaram do desenvolvimento de um projeto de formação de profissionais de Saúde, analisando a incorporação dos princípios do SUS aos cursos de formação de profissionais de Saúde de nível médio. 7 MARQUES 2002 A autora promove uma reflexão sobre a formação profissional na área da Saúde, tendo como foco principal a importância dessa formação estar referenciada na nova política de Saúde, priorizando a promoção da saúde e a prevenção de agravos. 8 FRIAS e TAKAHASHI 2002 Estudo realizado junto aos alunos de um curso de auxiliar de Enfermagem, buscando compreender o significado da avaliação para o educando, considerando que a forma com que o discente expressa o seu saber transparece o potencial de aprendizado. 9 CUTOLO 2003 Trata-se de um estudo que enfoca a relação entre as políticas de formação de recursos humanos do Ministério da Saúde e as diretrizes curriculares do Ministério da Educação, visando ao SUS. 196 10 FONTES 2003 Estudo sobre as mudanças advindas do modelo de formação profissional por competências do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae) e do sentido do trabalho do professor de ensino médio de Enfermagem. 11 COSTA e KURCGAN 2004 Trata-se de um estudo bibliográfico que analisa a trajetória da formação profissional do técnico de Enfermagem no Brasil, desde o surgimento dessa categoria profissional até a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação. 12 KOBAIASHI e LEITE 2004 Trata-se de um trabalho exploratório documental que teve como objetivo identificar as competências descritas nos Planos de Ensino da disciplina Noções de Administração em Enfermagem, em cursos técnicos de Enfermagem, em 26 escolas da cidade de São Paulo. 13 ROSSONI e LAMPERT 2004 Nesse estudo, as autoras objetivaram comparar as diretrizes curriculares dos cursos da Saúde e identificar os nós críticos na formação de profissionais para o SUS. 14 AMÂNCIO FILHO e TELLES 2003 Trata-se da reflexão a respeito da formação de recursos humanos para a construção de um sistema de Saúde democrático, preparando cidadãos conscientes de suas responsabilidades na construção de uma sociedade mais solidária e menos desigual. 15 MILHARCI 2004 A autora investigou como as escolas de ensino médio de Enfermagem de Campinas e região focalizavam as dimensões humanas na formação e como se posicionaram perante as mudanças das leis educacionais ocorridas a partir da LDB/96. 16 ESPERIDIÃO e MUNARI 2005 Trata-se de estudo teórico sobre formação dos profissionais de Saúde, tendo por base as Diretrizes Curriculares Nacionais para os referidos cursos, de acordo com propostas do Ministério da Educação. 17 ANDRADE, PINHO 2005 e SANTANA Nesse estudo, as autoras relatam suas experiências como docentes de um curso técnico de Enfermagem, no que diz respeito à construção de competências, ensinando o profissional a observar e questionar o contexto em que desenvolve seu trabalho. 18 NASCIMENTO e OLIVEIRA Nesse estudo, as autoras fazem uma reflexão interessante sobre a formação dos profissionais da Saúde com competência técnica e visão social, enfocando a modalidade de formação em serviço, apoiada pelo Ministério da Saúde. 2006 197 19 CHIESA et al. 2007 Nesse trabalho, as autoras discutem a formação dos profissionais de Saúde na perspectiva da implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), com enfoque na promoção da saúde. 20 BAGNATO et al. 2007 As autoras, enfermeiras, procuraram, nesse trabalho, analisar as políticas de educação profissional, problematizando aspectos das mudanças efetuadas no Ensino Médio no Brasil. 21 ARAÚJO, MIRANDA e BRASIL 2007 As autoras discutem nesse trabalho a integralidade como eixo norteador na formação de profissionais de Saúde do Sistema Único de Saúde (SUS), destacando que a formação na perspectiva da integralidade tem sido pouco problematizada para a sua relevância. 22 MACHADO et al. 2007 Nesse estudo as autoras buscam refletir sobre o princípio da integralidade como eixo norteador das ações de educação em Saúde. 23 NEVES e HECKERT 2007 Nesse trabalho, as autoras compartilharam reflexões acerca dos processos de formação dos profissionais de Saúde, pautadas na compreensão de que os processos de formação, os modos de cuidar e de gerir são indissociáveis, ainda que distintos. 24 SHIMIZU, LIMA e SANTANA 2007 Trata-se de um estudo qualitativo que teve como objetivo analisar a percepção de alunos egressos e gerentes dos serviços de Saúde sobre a abordagem por competências no processo de formação profissional de nível técnico em Enfermagem. 25 COTTA et al. 2007 Os autores enfocaram nesse estudo a necessidade de mudanças na formação laboral em Saúde, à luz dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), para a formação de profissionais capazes de responder às demandas da coletividade. 26 MONTEIRO e DO- 2008 NATO Nesse estudo, os autores analisaram os currículos desenvolvidos nas escolas técnicas do SUS do Estado de São Paulo, com o objetivo de identificar ênfases e reduções nos currículos dessas escolas. 27 OLIVEIRA et al. 2008 Nesse estudo, as autoras realizaram uma análise histórica sobre a educação profissional brasileira, procurando identificar os princípios da educação profissional e os princípios do SUS na assistência de Enfermagem. 28 MANGUEIRAS e FONTES 2008 Estudo documenta com o objetivo de examinar a matriz curricular de projetos político-pedagógicos de escolas formadoras de técnicos de Enfermagem do município de João Pessoa, na Paraíba. 198 29 ALMEIDA e FERRAZ 2008 Pesquisa documental com objetivo de identificar, segundo as Conferências Nacionais e de Recursos Humanos em Saúde, as políticas de formação de recursos humanos, de 1986 a 2005. 30 MONTEIRO 2009 O autor promove uma reflexão a respeito da formação de trabalhadores para atuarem na Saúde, segundo os princípios do SUS, como um aspecto fundamental para a efetiva consolidação do SUS. Começamos com o estudo de Machado, Caldas Junior e Bortoncello (1997), que relataram importante iniciativa no município de Botucatu, no período de 1993 a 1997, no que diz respeito à formação de profissionais de saúde para o município. Não se refere especificamente ao técnico ou auxiliar de Enfermagem, e sim aos graduandos em Medicina e Enfermagem. Mas retrata, naquela época, a preocupação com o serviço público de Saúde, buscando soluções criativas que provocaram mudanças na organização das instituições formadoras de profissionais de Saúde no que diz respeito a novas metodologias, dando ênfase à adequação da grade curricular, propondo, assim, novos modelos de formação de recursos humanos em saúde que articulem os avanços científicos e tecnológicos à necessidade da população. O projeto relatado por Machado, Caldas Junior e Bortoncello (1997) se desenvolveu por meio de uma parceria envolvendo diversos setores, como a Faculdade de Medicina de Botucatu, os serviços locais de Saúde e a comunidade, promovendo aos docentes e aos alunos essa integração entre o ensino e a prática nas unidades locais de Saúde. Em suma, Machado, Caldas Junior e Bortoncello (1997) alertam sobre a necessidade de mudanças no ensino das profissões, na medida em que há sinais de esgotamento nos atuais modelos de formação e capacitação de recursos humanos em Saúde. Campos et al. (2001) enfocaram em seus estudos a graduação de profissionais de Saúde, manifestando a preocupação dos autores com o processo de formação desses profissionais, à época centrada na assistência individual prestada em unidades hospitalares. A ideia central era estimular um processo de formação mais contextualizado, que levasse em conta as dimensões sociais, econômicas e culturais da população, preparando os profissionais para enfrentar os problemas do processo saúde/doença da população. Os autores enfatizaram o papel do Sistema Único de Saúde na ordenação do processo de formação profissional na área da Saúde, uma vez que se trata de uma responsabilidade constitucional. Os autores também mencionaram 199 à época a falta de articulação entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação, acentuando o distanciamento entre a formação dos profissionais e as necessidades do SUS. O objetivo desse estudo foi explorar as possibilidades de integração do processo de aprendizagem à rede de serviços de Saúde com o intuito de estimular a formação de profissionais mais preparados para a promoção de uma assistência à saúde mais efetiva, equânime e de qualidade. Para alcançar essa meta, os autores defendem a construção de um novo modelo pedagógico que “equilibre a excelência técnica e a relevância social, com métodos de ensino-aprendizagem centrados no aluno e desenvolvidos como processo permanente, com base nas relações de parceria da universidade com os serviços de Saúde, com a comunidade, com as entidades e outros setores da sociedade civil” (CAMPOS et al., 2001, p. 53). De acordo com um mecanismo de acompanhamento classificatório que inclui a orientação teórica predominante na instituição, a abordagem pedagógica e os cenários de práticas, os autores realizam uma avaliação da capacidade de cada instituição e sua posição em relação ao SUS. Nesse contexto, os autores julgam de extrema necessidade o papel (indutor) do SUS, em suas várias instâncias, para estimular as mudanças na formação profissional em Saúde de acordo com seus interesses e necessidades. Os autores corroboram com Feuerwerker e Sena (1999) sobre o modelo pedagógico ideal a ser conquistado, tendo como princípio norteador dessa política o equilíbrio entre excelência técnica e relevância social, sustentado na integração curricular, em modelos pedagógicos mais interativos, na adoção de metodologias de ensino-aprendizagem centradas no aluno como sujeito da aprendizagem e no professor como facilitador do processo de construção de conhecimento. Também defendem o pensamento de Feuerwerker e Sena (1999) quando afirmam que as mudanças devem estar sustentadas também em relações de parceria entre as universidades, os serviços e grupos comunitários, como forma de garantir o planejamento do processo de ensino-aprendizagem centrado em problemas sanitários prevalecentes, tal qual Machado, Caldas Junior e Bortoncello (1997). Os autores defendem uma maior integração entre os hospitais universitários e de ensino, as instituições de ensino superior e os gestores do SUS, a fim de efetivarem uma política de formação de profissionais de Saúde preparados para o SUS. Já Motta, Buss e Nunes (2001) promovem uma reflexão sobre a criação do SUS, que trouxe consigo a necessidade de requalificação profissional, reconhecendo a necessidade de criação de mecanismos para a reformulação dos 200 modelos e conteúdos da formação profissional de trabalhadores de Saúde. Referem-se a esse sistema como “um avanço no processo de gestão do sistema de Saúde e como tal exige a revisão dos modelos de formação até então adotados, tendo os princípios do SUS como definidores da metodologia e programas de formação”. Os autores discutem a globalização no final do século XX como indutora de grandes transformações no mundo do trabalho, que vem exigindo do trabalhador o exercício de sua capacidade de intervir no processo de trabalho, com iniciativas, autonomia e habilidades, exigindo do trabalhador a aquisição de novos conhecimentos. Os autores sugerem a adoção da estratégia de “mobilização e organização” pelas instituições de ensino e pelos gestores do Sistema Único de Saúde como caminho para a otimização dos recursos e potencialização dos resultados, favorecendo a renovação da estratégia de integração do ensino e do trabalho para o SUS. Deluiz (2001) demonstra em seu trabalho a importância de se ampliar a qualificação dos trabalhadores em Saúde, tanto na dimensão técnica especializada quanto na dimensão ético-política, comunicacional e de interrelações pessoais, para que eles possam participar como sujeitos integrais no mundo do trabalho. A autora defende um sistema de certificação profissional baseada em competências, entendida como “um conceito político-educacional abrangente, como um processo de articulação e mobilização gradual e contínua de conhecimentos gerais e específicos, de habilidades teóricas e práticas, de hábitos e atitudes e de valores éticos, que possibilite ao indivíduo o exercício eficiente de seu trabalho, a participação ativa, consciente e crítica no mundo do trabalho e na esfera social, além de sua efetiva autorrealização” (DELUIZ, 1995 apud DELUIZ, 2001, p. 13). Almeida e Soares (2002) realizaram um estudo qualitativo, por meio de entrevistas junto a profissionais que participaram do desenvolvimento de um projeto de formação de profissionais de Saúde, onde o principal objetivo foi analisar a incorporação dos princípios do SUS aos cursos de formação de profissionais de Saúde de nível médio. As autoras enfocaram nesse estudo a implementação do Sistema Único de Saúde no município de São Paulo, no período de 1989 a 1992. Essa mudança no modelo de Saúde culminou com a assunção de uma nova administração política, que tinha como estratégia fundamental a qualificação dos trabalhadores da Saúde. 201 Almeida e Soares (2002) explicam que esse projeto de reorganização dos serviços exigiu a adoção de uma política comprometida com a melhoria da inserção dos trabalhadores nos serviços de Saúde. Apoiando-se nos princípios da valorização, profissionalização e participação dos funcionários, essa decisão tinha como objetivo produzir mudanças na mentalidade e nas ações, mediante a qualificação e a incorporação de novos agentes. Propunha-se, dessa forma, recuperar uma “postura de respeito e dignidade ao trabalho e aos trabalhadores” (SÃO PAULO, 1987 apud ALMEIDA; SOARES, 2002). O estudo permitiu às autoras observar que a política e as práticas da gestão municipal estavam comprometidas com o SUS, que a administração priorizou a qualificação dos trabalhadores da Saúde que não haviam tido oportunidade, adotando uma pedagogia voltada à “transformação” dos agentes. Por sua vez, os coordenadores da Saúde municipal motivaram-se a desenvolver a qualificação, reconhecendo o processo como uma ferramenta de implementação do SUS. Marques (2002), em seus estudos, tratou de um assunto bastante discutido pelas instituições formadoras e pelos vários atores envolvidos com a questão da necessidade de mudanças no modelo de atenção à saúde no Brasil, com vistas à consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS): a formação profissional de trabalhadores comprometidos com estas mudanças. A autora defende, nesse estudo, que os espaços formadores devem investir esforços nas mudanças dos métodos de ensino e em novas propostas de formação docente e que os espaços de trabalho devem permitir aos trabalhadores a expressão de suas competências, em termos de autonomia, iniciativa, participação, diálogo, negociação e intervenção sobre as situações de trabalho (MARQUES, 2002, p. 5). Por outro lado, Marques (2002, p. 5) explica que na área da Saúde é fundamental que a nova visão de qualidade seja incorporada aos processos de formação, garantindo a perspectiva da humanização do cuidado, o que envolve os aspectos éticos, a organização do trabalho, a tecnologia, o processo de trabalho, a equipe de saúde e o usuário dos serviços. Considerando que a avaliação da aprendizagem como processo deve buscar a inclusão e não a exclusão dos educandos, Frias e Takahashi (2002) realizaram um estudo qualitativo buscando compreender o significado da avaliação escolar para os alunos de ensino médio de Enfermagem de uma escola particular na cidade de São Paulo. Os autores enfatizam que a formação de profissionais de nível técnico 202 deve proporcionar ao aluno “o desenvolvimento gradual das habilidades, um comportamento considerado ético, mostrar o quanto aprendeu e o quanto conseguiu desenvolver, em termos de capacidade e agilidade de raciocínio, e desenvolver a habilidade no manejo de materiais e equipamentos” (FRIAS; TAKAHASHI, 2002, p. 158). Por intermédio de entrevistas realizadas com os alunos, os autores puderam concluir que eles valorizam a responsabilidade, o interesse, a compreensão, a maturidade e a capacitação para exercer a profissão de Enfermagem, no caso de nível técnico, demonstrando que esses profissionais se preocupam com a qualidade de sua formação. Em um trabalho desenvolvido num programa de mestrado, Cutolo (2003) apresenta a relação entre as políticas de formação de recursos humanos do Ministério da Saúde e as diretrizes curriculares do Ministério da Educação, com vistas à construção do Sistema Nacional de Saúde. Nesse trabalho, o autor enfatiza a responsabilidade do Ministério da Saúde na formação de recursos humanos para atuação no sistema de Saúde. A referência a esse autor foi considerada neste trabalho pelo fato de enfocar a construção de polos de educação permanente (PEP) como instrumento de promoção de mudanças nas políticas de formação dos trabalhadores em Saúde, de acordo com os princípios e doutrinas do SUS. O autor, que é médico, comenta nesse trabalho sobre a importância da formação dos profissionais de nível técnico da Saúde, pois esses desempenham papel fundamental na base dos serviços, mantendo um vínculo sólido com a comunidade. Igualmente importante a observação desse autor quando relata que a formação de gestores também é fundamental em qualquer processo de mudança, pois pouco adiantaria investir em recursos humanos se os ordenadores, administradores e políticos não tivessem compromisso com os princípios e diretrizes do SUS. Fontes (2003) promove em seu trabalho uma reflexão sobre as mudanças advindas do modelo de formação profissional por competências e o papel do professor do ensino médio de Enfermagem, em meio às mudanças curriculares ocorridas nos últimos anos. A autora, que é enfermeira, afirma que essas mudanças curriculares afetam todas as categorias de profissionais de Enfermagem, sendo elas o enfermeiro graduado, atuando na assistência ou como professor de nível médio e os auxiliares e técnicos de Enfermagem. Segundo ela, o enfermeiro e professor, enquanto educador, tem um papel transformador no processo de 203 formação profissionalizante dos alunos. Segundo Fontes (2003), o papel do educador é estratégico como preparador e otimizador do trabalho na Enfermagem. A autora defende uma metodologia de ensino que envolve a avaliação constante da prática educativa como ferramenta fundamental para o desenvolvimento do ensino, beneficiando tanto a instituição e o professor quanto, principalmente, o aluno. O estudo realizado por Costa e Kurcgan (2004) teve por objetivo relatar a trajetória da formação profissional do técnico de Enfermagem no Brasil a partir de um estudo bibliográfico com o propósito de mostrar as transformações que ocorreram desde o surgimento dessa categoria profissional até a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Esse trabalho se mostrou importante no sentido de que traz à tona a história da profissão, além de demonstrar, por intermédio da experiência em docência de cursos de Enfermagem, as impressões das autoras em relação ao descontentamento dos alunos em relação aos cursos. Para as autoras, isso se deve à inadequação pedagógica dos cursos, à conformação curricular dissociada da demanda social, ao despreparo dos docentes e às deficiências de aprendizagem dos alunos. Para elas, as escolas, muitas vezes, não despertam o aluno para o seu conhecimento. Segundo Costa e Kurcgan (2004), é primordial que o professor tenha competência para organizar e dirigir situações de aprendizagem a partir do domínio dos conteúdos a serem ensinados. Kobaiashi e Leite (2004) realizaram um trabalho exploratório documental onde procuraram compreender como se dá a formação de competências administrativas nas escolas e cursos técnicos de Enfermagem. Segundo as autoras, há um subaproveitamento do profissional técnico em Enfermagem no mercado de trabalho. Muitas vezes, esses profissionais são contratados como técnicos em Enfermagem, mas acabam exercendo as funções inerentes aos auxiliares de Enfermagem, quando esse profissional deveria executar suas funções técnicas, participando do processo administrativo junto ao enfermeiro. Segundo as autoras, ao enfermeiro compete desenvolver competências de administração e gerenciamento, conforme a lei de diretrizes curriculares do ensino superior e, pela lei do exercício profissional, é atribuído ao técnico de Enfermagem a participação desse processo de trabalho ou o seu desenvolvimento, sob supervisão do enfermeiro. As autoras encerram seus estudos conjecturando a respeito da 204 organização deficitária dos cursos técnicos em relação ao preparo dos profissionais da Saúde para exercerem as suas funções. Rossoni e Lampert (2004) realizam seus estudos fazendo uma comparação entre as diretrizes curriculares dos diversos cursos de graduação da área da Saúde, procurando identificar os nós críticos para a formação de profissionais de Saúde para o SUS. As diretrizes curriculares para os cursos da área da Saúde mostram preocupação com a formação de profissionais, mantendo textos iguais ou semelhantes nas diretrizes de todos os cursos, quando determinam que a formação desses profissionais deva atender às necessidades sociais da Saúde, com ênfase no Sistema Único de Saúde (SUS), e assegurar a integralidade da atenção e a qualidade e a humanização do atendimento (BRASIL, 2001). Contudo, as autoras identificaram que durante a formação na graduação, os estudantes das diversas áreas da Saúde realizam, com ênfase, uma prática predominantemente individualizada, sendo o trabalho coletivo abordado mais nas atividades teóricas e, portanto, eles, como profissionais, encontrarão dificuldades para desenvolver um trabalho em equipe quando assumirem um serviço em que seja preciso interagir com saberes e ações. Então, é necessário propiciar, já na graduação, vivências interdisciplinares, onde o aluno possa interagir e construir, internamente, o conceito de trabalho em equipe. Embora esse estudo faça menção à formação dos profissionais de nível superior, traz uma importante experiência para a formação de auxiliares e técnicos em Enfermagem. Da mesma forma, o trabalho em equipe se faz importante para qualquer função na área da Saúde, uma vez que trabalhamos todos por um ideal: a saúde das pessoas. Amâncio Filho e Telles (2003) promoveram uma reflexão a respeito da formação de recursos humanos para a construção de um sistema de saúde democrático, preparando cidadãos conscientes de suas responsabilidades, seus direitos e deveres na construção de uma sociedade mais solidária e menos desigual. Os autores concluíram à época do estudo que a inexistência de uma política de formação de profissionais de Saúde adequada ao SUS, tanto de nível superior como médio, tem como resultados profissionais formados para uso intensivo de tecnologia e para a especialização. Os autores alertam para a necessidade de formar profissionais que tenham clareza de sua inserção e desempenho no processo de trabalho em Saúde, conscientes do compromisso com a qualidade e a humanização na 205 atenção à saúde. Milharci (2004) realizou um estudo com o objetivo de entender como as escolas de ensino médio de Enfermagem focalizam as dimensões humanas na formação e como estão se posicionando perante as mudanças das leis educacionais. Esse estudo foi realizado por meio de entrevistas com docentes dos cursos de nível médio de Enfermagem. Segundo a autora, a pesquisa evidenciou que as concepções de dimensões humanas ainda estão voltadas para uma formação predominantemente técnica e prática do cuidado humanizado. No plano discursivo, há esforços de ruptura com essa formação, mas existem dificuldades de operacionalização prática na incorporação do humano no sentido político, social e cultural, devido às condições históricas que envolvem o trabalho da Enfermagem. Milharci (2004) recomenda o aprofundamento no estudo dessa vertente e propõe a abertura de espaços para discutir, refletir e ampliar os conceitos sobre dimensões humanas na formação dos alunos de nível médio de Enfermagem, concluindo que a prática pedagógica é fragmentada, com predomínio da dimensão técnica e que, em virtude desse aspecto, deve ser revisada. A autora revela que encontrou em vários segmentos tanto na área da Educação como na de Saúde iniciativas e esforços para mudanças e ampliação desses conceitos, o que nos leva a depositar esperanças num projeto de formação e assistência que atenda o ser humano em toda a sua integralidade. Esperidião e Munari (2005) realizaram um estudo teórico que teve como objetivo refletir a formação dos profissionais de Saúde tomando por base as Diretrizes Curriculares Nacionais para os referidos cursos, de acordo com as propostas do Ministério da Educação. No decorrer da pesquisa, as autoras puderam observar que as tendências na área da Educação, como um todo, sugerem que a formação profissional seja focada não apenas nas competências técnicas, mas no desenvolvimento de competências relacionais, bem como em atitudes e valores que considerem princípios ético-humanísticos. As autoras relatam que, ao analisarem as diretrizes curriculares, perceberam que há um forte movimento para a formação dos recursos humanos para a Saúde fundamentada no referencial ético-humanista, contido na essência do documento que orienta a reforma curricular em todo o Brasil, constituindo-se em um dos grandes desafios para transformar a prática desses profissionais e, consequentemente, a assistência em Saúde. 206 Para Esperidião e Munari (2005), a experiência na área da docência levou-as à percepção de que a formação dos profissionais de Saúde tem privilegiado o conhecimento técnico-científico, limitando-se aos ensinamentos relativos ao fazer. Contudo, reconhecem que já despontam em algumas instituições de ensino iniciativas que visam romper com esse paradigma. As autoras chamam a atenção para a importância do desenvolvimento de habilidades técnicas necessárias ao exercício profissional na área da Saúde, principalmente de especialidades quando a tecnologia é cada vez mais desenvolvida e faz parte do cotidiano. No entanto, ressaltam a importância do preparo da pessoa, enquanto ser total, durante o processo de formação acadêmica, de modo a garantir o seu fortalecimento emocional, haja vista a constante exposição dos alunos das diversas áreas da Saúde a situações ansiogênicas, decorrentes das especificidades da atividade ocupacional, das condições de trabalho, das quais são sujeitos e que, inevitavelmente, interferem no seu ofício (ESPERIDIÃO; MUNARI, 2005, p. 163). Considerando que a educação como prática social pressupõe a emancipação do sujeito, o que, em Saúde, pode significar preparar profissionais com base no trabalho em Saúde para a construção, por meio de pesquisa, de conhecimentos que possam facilitar o enfrentamento dos desafios cotidianos, Andrade, Pinho e Santana (2005) relatam suas experiências como docentes do curso técnico de Enfermagem, no desenvolvimento da área de Introdução à Pesquisa em Enfermagem. Segundo as autoras, a inclusão dessa área no currículo do curso pode favorecer a construção de competências que permitam a constante “empregabilidade” do profissional adaptável às mudanças do mundo do trabalho, um indivíduo que aprende a aprender e, assim, com condições para observar e questionar o contexto em que desenvolve o seu trabalho. A experiência vivenciada pelas autoras nas aulas da área de conhecimento Introdução da Pesquisa em Enfermagem, inserida no itinerário curricular do Curso de Qualificação Profissional em Técnico de Enfermagem, revelou a importância de instrumentalizar os alunos para a observação e a reflexão sobre o ambiente de trabalho em que desenvolvem suas atividades, estimulando uma prática emancipadora e construtiva (ANDRADE; PINHO; SANTANA, 2005, p. 58). As autoras concluem a pesquisa com uma certeza: Que a qualificação dos profissionais tendo o trabalho e a pesquisa como princípios norteadores poderá facilitar a formação de sujeitos geradores de ações e soluções impostas pelos desafios do cotidiano dos nossos serviços de saúde que, historicamente, 207 tem seu pessoal técnico formado para fazer sem pensar, alienados que estão em compilar técnicas e aplicá-las acriticamente, assim que a ordem lhes é dada (ANDRADE; PINHO; SANTANA, 2005, p. 59). No estudo realizado por Nascimento e Oliveira (2006), as autoras fazem uma reflexão interessante sobre a formação de profissionais de Saúde com competência técnica e visão social, enfocando a modalidade de formação em serviço, apoiada pelo Ministério da Saúde. As autoras enfatizam a necessidade de recursos humanos capacitados e qualificados para atender às necessidades do Sistema Único de Saúde (SUS). Formação essa que deve visar ao desenvolvimento de habilidades e competências para realizar um diagnóstico situacional das condições de vida e de saúde dos grupos sociais em um dado território, planejar intervenções em saúde capazes de enfrentar os determinantes do processo saúde-doença, prestar assistência e desenvolver ações educativas estimulando o autocuidado e a emancipação, segundo Oliveira (2004 apud NASCIMENTO; OLIVEIRA, 2006, p. 436). Nascimento e Oliveira (2006) citam nesse estudo a estratégia Saúde da Família como um importante programa que também se propõe a humanizar as práticas de saúde, favorecendo o relacionamento com os usuários, buscando a satisfação destes e estimulando o reconhecimento da saúde como um direito de cidadania. As autoras concordam com outros autores, quando esses afirmam que a construção desse perfil de competências deve ser pensada no contexto de aproximação entre a instituição formadora e os cenários da prática em saúde, com a participação dos sujeitos nele envolvidos, ao mesmo tempo em que atribuem ao Programa Saúde da Família um importante mecanismo para o desenvolvimento dessa competência. Os estudos realizados por Baraldi e Car (2006) tiveram por finalidade evidenciar o sentido do trabalho de Enfermagem no processo de implementação de uma política de recursos humanos compensatória e específica para essa categoria, o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae), implementada em todo o território nacional. Essa pesquisa estudou o trabalho de supervisão do curso, executado por um profissional graduado na área de Enfermagem. Segundo relatam as autoras, os resultados demonstraram que o sentido do trabalho de supervisão realizado pelas coordenadoras e supervisores é diferenciado, tanto na execução da tarefa em si quanto na percepção pessoal e profissional desses enfermeiros. O processo de supervisão realizado 208 pelas enfermeiras supervisoras do projeto demonstrou ser fragmentado e majoritariamente vinculado ao controle, quer na enfadonha descrição das atividades articuladoras relacionadas à conferência das unidades (escolas, alunos, docentes, instrumentos e relatórios etc.), quer na hipervalorização do relatório e no baixo estabelecimento de articulações com atores políticos necessários a um processo de supervisão que garantisse a efetivação de suas finalidades e objetivos (BARALDI; CAR, 2006, p. 561). Chiesa et al. (2007) procuraram discutir em seus estudos a formação dos profissionais de Saúde na perspectiva da implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais, com enfoque na promoção da saúde. Segundo as autoras, a formação inicial dos profissionais de Saúde não os prepara para atuar no campo da promoção devido ao enfoque predominantemente biologicista, curativo, médico-centrado e desarticulado das práticas em Saúde (CHIESA et al., 2007, p. 237). Chiesa et al. (2007) afirmam que as atuais políticas nacionais de Saúde e de Educação apontam para a necessidade de mudanças nos processos de formação profissional e têm estimulado e apoiado iniciativas para ampliar a responsabilidade social e a pactuação de propostas para a definição de competências e para o desenvolvimento das diretrizes curriculares nacionais. As autoras concluem o estudo relatando que, para fazer face aos enfrentamentos colocados pelo mundo do trabalho, essa mudança paradigmática envolvendo as concepções de saúde e educação precisa ser vivenciada durante a formação, ampliando as possibilidades de horizontalização e democratização do conhecimento. Competências e habilidades também precisam ser desenvolvidas pelos profissionais de Saúde, para que se constituam como sujeitos comprometidos com a busca de equidade do cuidado, do acesso e da cidadania (CHIESA et al., 2007, p. 240). Bagnato et al. (2007) realizaram esse estudo com a finalidade de analisar as políticas de educação profissional, problematizando aspectos das mudanças efetuadas no ensino médio no Brasil. Em decorrência desse estudo, as autoras observaram que as legislações aprovadas manifestam interesses das políticas neoliberais, dos organismos multilaterais e as implicações da reorganização mundial produtiva e da redução da participação do Estado nas políticas sociais. Bagnato et al. (2007) fazem menção à percepção da maneira com a qual o país se articula ao processo de globalização mundial, em um papel dependente, mais consumidor do que produtor de conhecimentos, perdendo a oportunidade de conquista de sua autonomia, inclusive no campo de 209 formação profissional. As autoras concluem defendendo que o ensino profissionalizante em Enfermagem deve assumir uma perspectiva técnica integrada a uma educação geral, oferecida em um mesmo espaço, diminuindo o risco de uma formação minimalista e aligeirada. Araújo, Miranda, Brasil (2007) discutem em seus estudos a integralidade como eixo norteador na formação de profissionais do Sistema Único de Saúde, destacando que a formação na perspectiva da integralidade tem sido pouco problematizada para a sua relevância. As autoras, ao realizarem uma revisão de literatura sobre a formação dos profissionais da Saúde, verificaram que no Brasil há uma cisão entre os problemas da realidade e a organização disciplinar do conhecimento que orienta a formação inicial e continuada dos profissionais de Saúde. Assim como para Ribeiro (2004 apud ARAÚJO; MIRANDA; BRASIL, 2007), as autoras relatam a falta de espaços conjuntos entre instituições de ensino superior e unidades de Saúde, onde se possam confrontar as formas de “saber” e “fazer” com o que a realidade requer, entendendo que a prática não deve ser tida como um espaço apenas de verificação de ideias, mas também de construção de novas teorias. Machado et al. (2007), entendendo a integralidade no cuidado de pessoas, grupos e coletividade, tendo o usuário como sujeito histórico, social e político, articulado ao seu contexto familiar, ao meio ambiente e a sociedade na qual se insere, buscaram por meio desse estudo uma reflexão acerca do princípio da integralidade como eixo norteador das ações de educação em saúde. Para as autoras, a integralidade é um conceito que permite uma identificação dos sujeitos como totalidades, ainda que não sejam alcançáveis em sua plenitude, considerando todas as dimensões possíveis nas quais se pode intervir, pelo acesso permitido por eles próprios (NIETSCHE, 2006 apud MACHADO et al., 2007, p. 336). Como parte de suas reflexões, as autoras relatam que o atendimento integral extrapola a estrutura organizacional hierarquizada e regionalizada da assistência de Saúde, se prolonga pela qualidade real da atenção individual e coletiva assegurada aos usuários do sistema de Saúde, requisita o compromisso com o contínuo aprendizado e com a prática multiprofissional (MACHADO et al., 2007, p. 336). Assim como para Malta et al. (2004 apud MACHADO et al., 2007, p. 338), a importância de abordar a assistência de forma integrada está 210 fundamentada na articulação de todos os passos na produção do cuidado e no restabelecimento da saúde. Propõe-se mapear a integralidade da assistência pelo acompanhamento da linha do cuidado, evitando-se assim a sua fragmentação. Cada usuário deverá ser acompanhado segundo determinado projeto terapêutico instituído, comandado por um processo de trabalho cuidador, e não por uma lógica “indutora de consumo”. Conforme Pinheiro e Mattos (2003 apud MACHADO et al., 2007, p. 338), tal lógica contrapõe-se ao presente cotidiano dos serviços de saúde, onde frequentemente há confronto entre os profissionais que atuam ou que deveriam atuar com o mesmo objetivo, ou seja, o bem-estar do cliente e o desenvolvimento de ações curativas ou preventivas no processo de saúde/ doença. Com base no princípio da integralidade e do agir em saúde, os serviços devem ofertar ações de promoção à saúde, prevenção dos fatores de risco, assistência aos danos e reabilitação segundo a dinâmica do processo saúdedoença, e estas devem estar articuladas e integradas em todos os espaços organizacionais do sistema de Saúde (CAMPOS, 2003 apud MACHADO et al., 2007, p. 338). Nesse contexto, Machado et al. (2007) concluem que a educação em saúde como processo político-pedagógico requer o desenvolvimento de um pensar crítico e reflexivo, permitindo ao aluno desvelar a realidade e propor ações transformadoras, enquanto sujeito histórico e social capaz de propor e opinar nas decisões de saúde para o cuidar de si, de sua família e da coletividade. Neves e Heckert (2007) compartilharam em seus estudos reflexões acerca dos processos de formação dos profissionais de Saúde, pautadas na compreensão de que os processos de formação, os modos de cuidar e de gerir são indissociáveis, ainda que distintos. Para as autoras, os processos de produção de Saúde se fazem numa rede de relações que, permeadas como são por assimetrias de saber e de poder e por lógicas de fragmentação entre saber/práticas, requerem atenção inclusiva para a multiplicidade de condicionantes da Saúde que não cabem mais na redução do binômio queixa-conduta. Neves e Heckert (2007) referem que o cotidiano dos serviços de Saúde, em suas relações com os modos de fazer a atenção e a gestão, é matéria constituinte e, portanto, primordial na construção de processos de formação que busquem enfrentar os desafios da concretização do SUS, e de seu princípio de integralidade, alterando as práticas de saúde e dos sujeitos nelas implicados. 211 Nesse contexto, as autoras concluem que construir um processo de formação para trabalhadores de Saúde implica a atenção à complexidade que o processo exige, e, da mesma forma, fazer escolhas teórico-metodológicas que expressem um campo de interlocução entre os saberes indissociado de um método, de um modo de fazer a formação. Shimizu, Lima e Santana (2007) realizaram um estudo qualitativo que teve como objetivo analisar a percepção de alunos egressos e gerentes dos serviços de Saúde sobre a abordagem por competências no processo de formação profissional de nível técnico em Enfermagem. As autoras partiram do pressuposto de que os cursos de formação, tendo como núcleo do processo de trabalho de enfermagem o cuidar em todas as dimensões, deveriam preparar profissionais capazes de considerar a totalidade das necessidades do ser humano, no que tange aos aspectos éticos, sociocomunicativos e relacionais com o cliente-paciente e equipe, os quais tivessem capacidades e habilidades para provocar mudanças significativas nos serviços de Saúde. Os resultados, segundo as autoras, demonstraram que os trabalhadores alcançaram as competências necessárias para o exercício profissional, mas existem diversos aspectos do processo pedagógico que ainda precisam ser aprimorados, para que sejam capazes de transformar as práticas dos serviços de Saúde. Além do mais, defendem a educação permanente para a manutenção e o desenvolvimento dos processos de mudanças nos serviços. Cotta et al. (2007) propuseram-se a discutir a necessidade de mudanças na formação laboral em saúde, à luz dos princípios do SUS, considerando que a formação de profissionais de Saúde capazes de responder às demandas da coletividade tem sido motivo de intensos debates. Os autores enfatizam a crescente demanda por recursos humanos para a Saúde, destacando a necessidade desses profissionais estarem habilitados a atuar junto à realidade nacional, ou seja, onde a pobreza e a desigualdade são fatores determinantes e/ou agravantes dos processos de adoecimento. Os autores defendem que a educação em saúde deve ser voltada para as necessidades e demandas da comunidade, possibilitando um exercício da prática profissional que promova a autonomia, a cidadania, a participação social, a satisfação do usuário e a resolução de problemas por meio da produção de vínculo e de acolhimento entre profissionais e usuários do serviço (COTTA et al., 2007, p. 283). Monteiro e Donato (2008), respectivamente pesquisador e diretor de 212 Saúde, analisaram os currículos desenvolvidos nas escolas técnicas do SUS do estado de São Paulo, com o objetivo de identificar ênfases e reduções nos currículos dessas escolas. Para esses autores, a formação de trabalhadores para atuarem no setor Saúde segundo os princípios e as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) é, de fato, um desafio que deve ser encarado como aspecto fundamental para a própria consolidação do SUS. Princípios como o da universalização do acesso e da atenção integral à saúde, dentre outros (BRASIL, 1990), exigem uma nova perspectiva na formação desse trabalhador, independentemente do seu nível de formação (fundamental, médio, técnico ou universitário) (MONTEIRO; DONATO, 2008, p. 400). De acordo com os resultados obtidos nos documentos analisados e nas entrevistas, os autores concluíram que as aprendizagens que tendiam a ser enfatizadas nos currículos das escolas se referiam às dimensões ética e política. Em relação aos documentos curriculares, os autores encontraram diferenças entre as escolas no que diz respeito ao nível de discussão, elaboração e utilização de referências que visem nortear seus processos de ensinoaprendizagem. Nesse sentido, os autores referem que as Escolas Técnicas do SUS devem se constituir como espaços privilegiados de formação que possibilitem ao trabalhador conhecer e se apropriar de conceitos e de técnicas capazes de propiciar o desenvolvimento de aprendizagens que venham ao encontro desses princípios. Para tanto, faz-se necessário que sejam elaborados – e postos em prática – currículos que favoreçam, de maneira efetiva, o desenvolvimento do conjunto dessas aprendizagens (MONTEIRO; DONATO, 2008, p. 412). Oliveira et al. (2008) realizaram um estudo com a finalidade de analisar historicamente a educação profissional brasileira, os princípios do SUS na qualidade da assistência em Enfermagem, identificando os princípios da educação profissional, os princípios do SUS e suas relações com o ensino de Enfermagem, de onde concluíram que a educação profissional está diretamente ligada à qualidade da assistência e que com a qualidade no atendimento de Enfermagem tem-se a diminuição de custos com relação à saúde. Para as autoras, “os princípios norteadores do SUS não lograram êxito no campo da saúde, mas a educação utilizou-se de algumas características primordiais do SUS, como a igualdade, a equidade, a integralidade e a participação popular”. Considerando a atual conjuntura da Saúde, os programas e pactos 213 existentes, a pesquisa dessas autoras foi pouco relevante, no sentido em que desconhece a atual situação da Saúde no país. Evidentemente que o financiamento da Saúde deve ser preocupação constante dos gestores. Mas não se pode mixar a qualidade na assistência aos custos do sistema. Isso porque o que está em questão é a formação do profissional, dentro dos parâmetros da integralidade, para prestar serviços a uma comunidade que arca indiretamente com os custos desse sistema. Segundo a premissa de que o processo de enfermagem, definido como instrumento metodológico do cuidar, deve ser desenvolvido por todos os membros da equipe de Enfermagem, Mangueiras e Fontes (2008) realizaram um estudo documental que objetivou examinar a matriz curricular de projetos político-pedagógicos de escolas formadoras de técnicos de Enfermagem do município de João Pessoa (Paraíba) quanto ao ensino e à aplicação do processo de enfermagem, considerando que a participação desses profissionais é de fundamental importância para a sistematização do cuidado, sendo função da escola prepará-los adequadamente. O estudo em questão foi desenvolvido no ano de 2006, quando os autores constataram que nas matrizes curriculares das escolas participantes do estudo não havia indícios do ensino do processo de enfermagem em nenhuma disciplina, embora houvesse sua aplicação em poucas disciplinas de algumas escolas. Baseados nesses resultados, Mangueiras e Fontes (2008) sugerem às escolas reavaliarem as suas matrizes curriculares, de forma a inserir a temática de forma a capacitar melhor os técnicos de Enfermagem para a prestação de cuidado sistematizado e de qualidade. Almeida e Ferraz (2008) também realizaram uma pesquisa documental com o objetivo de identificar no marco das Conferências Nacionais e de Recursos Humanos em Saúde as políticas de formação de recursos humanos. Segundo as autoras, o movimento sanitário trouxe ao cenário da educação demandas de formação em Saúde orientada para atenção básica, tendo em vista o descompasso da atuação profissional diante das necessidades de saúde da população. Almeida e Ferraz (2008, p. 32) discorrem que no período anterior à formulação do SUS a área de recursos humanos em Saúde não apresentava relevância, sendo um tema com baixa repercussão no sistema de Saúde nacional. Contudo, por meio dos estudos foi possível observar que, com o debate social acerca do delineamento e implantação do SUS, os recursos humanos ganham visibilidade nas Conferências Nacionais de Saúde, somados à iniciativa da 214 criação de um espaço específico de discussão política, que são as Conferências Nacionais de Recursos Humanos. As autoras acreditam que uma qualificação adequada tenha o potencial de integrar um conjunto de estratégias para uma política de formação dos trabalhadores do SUS, de forma a atuar como coadjuvante na transformação das práticas em Saúde (ALMEIDA; FERRAZ, 2008, p. 35). Monteiro (2009), ao escrever seu artigo, promoveu uma reflexão a respeito da formação de trabalhadores para atuarem na Saúde segundo os princípios do SUS como um aspecto fundamental para a efetiva consolidação do SUS. Para o autor, os princípios da universalização do acesso e da atenção integral à saúde, dentre outros, exigem uma nova formação, cada vez mais qualificada, de todos os agentes sociais que, independentemente do seu nível de formação, envolvem-se no atendimento da população (MONTEIRO, 2009, p. 31). Monteiro (2009) relata que a formação do profissional de Saúde deve promover, acima de tudo, um atendimento melhor à população. Por essa razão, o autor afirma ser fundamental a elaboração e a implementação de políticas que promovam, de fato, mudanças reais no processo de trabalho no SUS. Por sua vez, o trabalhador deve, em sua formação, ter a possibilidade de desenvolvimento de aprendizagens que dizem respeito à cidadania de maneira geral e à sua própria condição de cidadão (MONTEIRO, 2009, p. 35). CONSIDERAÇÕES FINAIS Observa-se que o ponto comum a todos os trabalhos acima discutidos consiste na preocupação coletiva com a qualidade da formação do trabalhador da área da Saúde; todos apontam para a necessidade de vincular a qualificação aos princípios norteadores do Sistema Único de Saúde (SUS). Essa evolução é crucial para que ocorra uma mudança no cenário da atenção à saúde no Brasil, com a consolidação SUS e seus princípios. A ideia será formar profissionais comprometidos com esse movimento em direção ao SUS. A desigualdade social ainda é uma realidade no Brasil. Na Saúde não é diferente. Navegando contra os princípios do SUS, encontramos inúmeras diferenças: no atendimento, no acesso aos serviços, na qualidade oferecida pelos profissionais. O mesmo profissional oferece tratamento diferente em serviços públicos e particulares. Assim, ressaltamos a necessidade imediata de formarmos profissionais comprometidos com a saúde do cidadão, em seus três aspectos: prevenção, 215 promoção e recuperação, como dita o SUS. E não comprometidos com o registro em suas carteiras profissionais primeiramente. Profissionais comprometidos podem otimizar os recursos existentes de maneira que os usuários sejam beneficiados não só com um atendimento melhor, mas que tenham suas necessidades atendidas de forma mais ampla, com uma consequente melhora na qualidade de vida. O docente deve despertar no aluno o interesse pelo conhecimento, deve desafiá-lo e sensibilizá-lo para identificar os problemas e propor novas soluções. Como docentes, também somos desafiados a capacitar nossos alunos não só cientificamente, mas torná-los emocionalmente capazes de vivenciar seu dia a dia sem se conformar com ele, sem se amoldar às características da massa, sendo como sal que tempera e dá um sabor novo, e não como um agente conservador da realidade existente. Somos desafiados com esse rumo que a formação técnica está tomando. Para isso, faz-se necessário que interiorizemos em nós primeiro aquilo que pretendemos transmitir aos outros. O comprometimento deve começar em nós, docentes. Docentes e alunos precisam buscar juntos as respostas, utilizando ferramentas como o conteúdo científico e a prática social, tendo como objetivo único o ser humano. Como docentes somos responsáveis por quem formamos. Como profissionais da Saúde, somos responsáveis pelo completo bem-estar do ser humano. REFERÊNCIAS ALMEIDA, L. P. V. G.; FERRAZ, C. A. Políticas de formação de recursos humanos em saúde e enfermagem. 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A análise dos projetos foi baseada nas seguintes características: pré-requisitos para o ingresso no curso, aspectos do perfil profissional, carga horária total, carga horária prática, organização dos conteúdos, metodologia de ensino, cenário de prática e forma de avaliação. Observou-se tanto a existência de aspectos tradicionais do ensino, como elementos inovadores com vistas à formação de um profissional que atenda às atuais necessidades sociais. Revela-se que deve haver empenho na revisão das propostas pedagógicas para o seu constante aperfeiçoamento. Descritores: Sistemas de saúde. Ensino. Formulação de projetos. Planos e programas de ensino. 1. Enfermeiros, estudantes do curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, da Escola Nacional de Saúde Pública do Rio de Janeiro. 2. Enfermeira. Docente da Disciplina de Saúde Coletiva do Curso de Enfermagem da Faculdade de Medicina de Marília. Pós-Doutora em Ciências da Saúde pela UNIFESP. Tutora do CFDEPTAS/EaD-FIOCRUZ. Orientadora do Trabalho de Conclusão de Curso. 3. Enfermeira. Docente da Disciplina de Enfermagem em Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina de Marília – Famema. Doutora em Educação pela Unicamp. Tutora do CFDEPTAS/EaD-FIOCRUZ. Co-orientadora e Banca do Trabalho de Conclusão de Curso. 4. Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela Universidade de São Paulo. Docente da Disciplina de Enfermagem Clínica do Curso de Enfermagem da Faculdade de Medicina de Marília. Coordenadora do Núcleo de Apoio Docente do CFDEPTAS/ EaD-FIOCRUZ locado na Faculdade de Medicina de Marília. Co-orientadora do Trabalho de Conclusão de Curso. 221 INTRODUÇÃO O projeto pedagógico (PP) de um curso representa um aspecto altamente relevante, considerando que é por meio dele que se mantém a intenção e a direção da formação. Trata-se de um instrumento que deve ser apropriado pelo coletivo da escola e passível de mudanças com vistas ao seu contínuo aperfeiçoamento. Sendo assim, o projeto pedagógico deve ser construído com coerência e capacidade para ser modelado, adquirindo outras formas sem perder a essência, ou seja, com a capacidade de se adequar às situações que, embora sejam possíveis de previsão, não podem ser preditas, tal como uma forma de antecipar o futuro, dados os muitos aspectos que nele interferem (SHNEIDER, 2004). Para caminhar nesta direção, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, 9394/96, que dispõe sobre a construção do Projeto Político Pedagógico, define as diretrizes gerais e permite que cada escola construa o seu projeto, considerando a sua realidade, fortalezas e limites. Assim, se reconhece a capacidade da escola de planejar e organizar a sua ação política e pedagógica a partir da gestão participativa em todos os segmentos da comunidade escolar (corpo técnico-administrativo, docentes, alunos, pais e comunidade), num processo dinâmico e articulado (BRITO, 1997). O projeto pedagógico (PP) é um instrumento técnico-metodológico que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, de maneira refletida, consciente, sistematizada, organizada e participativa. Por estas características consegue explicitar o que vai ser feito, quando, de que maneira, por quem e que resultados pretende alcançar. Define uma filosofia e harmoniza as diretrizes da educação nacional com a realidade da escola, traduzindo a sua autonomia e definindo o seu compromisso com a clientela. Esta ideia implica em se ter um projeto aceito por todos os envolvidos, daí a importância de que seja elaborado participativa e democraticamente (VEIGA, 2001). Gurgel (2009) acrescenta que o projeto pedagógico deve conter a proposta curricular, incluindo o que e como se ensina, as formas de avaliação da aprendizagem, a organização do tempo e o uso do espaço na escola; deve contar com a efetiva participação dos professores e definir a maneira como a equipe vai se organizar para cumprir as necessidades originadas pelas intenções educativas, além de definir as atribuições da gestão administrativa que tem como função principal viabilizar o que for necessário para que os demais pontos funcionem dentro da escola, tal como se planejou. 222 Acredita-se que o desenvolvimento de um projeto pedagógico facilita rever e aperfeiçoar o currículo, aprimorar os processos avaliativos e, assim, lançar desafios estratégicos, como: “diminuir a repetência, introduzir índices crescentes de melhoria qualitativa, experimentar didáticas alternativas, atingir posição de excelência” (DEMO, 1998, p. 248). O projeto pedagógico é, em resumo, o marco referencial operativo da escola, representação da identidade, enunciação de um conceito de mundo, sociedade e educação, objetivos e metas da comunidade e da instituição educacional. Numa escola, têm-se objetivos a serem cumpridos, e isto significa que cada um não pode fazer o que quiser, do jeito que quiser. Com o projeto, fica claro o que se espera do educador e do educando (CALDERARO, 2007). O PP deve ser levado com seriedade, já que nele está contido o papel da escola na construção da identidade local de ensino (SILVA et al., 2009). Gadotti (1994) afirma que desenvolver um projeto é o mesmo que tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se a enfrentar um período de instabilidade, com o desafio de buscar nova estabilidade, em função da promessa que cada projeto contém de promover uma situação melhor do que a vivida no presente. Na elaboração de um projeto pedagógico a instituição deve preocuparse com a formação integral do aluno, buscando o todo e não simplesmente as partes. O aluno deve ter uma formação completa, que seja realizada de maneira contínua e geral, buscando a construção consciente e reflexiva do discente como cidadão (CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 1999). É importante que o projeto pedagógico passe por avaliação contínua, visando melhorar aspectos negativos, que de certa forma contribuem para o fracasso do projeto, e também para uma valorização dos aspectos positivos, que apresentam resultados satisfatórios. De acordo com Veiga (2001), o projeto pedagógico deve ser construído e reelaborado em todos os momentos de sua prática, com a participação de todos os envolvidos com o processo educativo da escola, e este é o motivo pelo qual o projeto se justifica por sua solidez política e social, congruentemente às propostas legais e educacionais vigentes. Além disso, deve levar o professor a dar prioridade a conteúdos significativos, integrando, na sala de aula, situações desafiadoras, e permitindo interações entre sujeitos para a melhor construção do conhecimento e das competências (REIS, 2001). Na formação técnica na área da Saúde tem se observado grande preocupação em adequar os projetos pedagógicos às necessidades do Sistema Único de Saúde e, nesta perspectiva, o Ministério de Saúde tem apresentado 223 o eixo para a formação desses profissionais. Como exemplo disso, cita-se o Programa de Profissionalização dos Trabalhadores na área de Enfermagem (PROFAE), que tem como finalidade a formação e qualificação, com foco na valorização dos profissionais, visando, de um lado, humanizar e melhorar o atendimento, e de outro, estimular a expansão de oportunidades para grandes contingentes de trabalhadores que possam dedicar-se ao exercício consciente e responsável da profissão (PIERANTONI, 2009). Atualmente o eixo da formação técnica encontra-se na necessidade de planejar os elementos do exercício docente, com base em novas competências e tecnologias para o ensino de nível técnico em Enfermagem, visando intervenções críticas, responsáveis e conscientes em benefício da coletividade, considerando o papel do educador, a relação teoria-prática e os significados dos conteúdos de um projeto político pedagógico (PIERANTONI, 2009). OBJETIVO Considerando a importância do projeto pedagógico e a necessidade dele com vistas ao enfrentamento dos desafios da formação de profissionais técnicos para o Sistema Único de Saúde, propõe-se, neste estudo, a análise das características dos projetos pedagógicos de três Cursos Técnicos de Enfermagem. METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo realizado a partir da análise dos projetos pedagógicos de três Cursos Técnicos de Enfermagem, de uma cidade do interior paulista, cada um de uma mantenedora diferente. O município em questão conta com 44.309 habitantes e situa-se na região oeste do Estado. Suas principais atividades estão centradas na indústria e comércio, com forte crescimento no setor sucroalcooleiro. Na área da Educação possui: dez escolas municipais de Ensino Fundamental Infantil; oito escolas de Ensino Infantil; quatro escolas estaduais de Ensino Médio, sendo que uma delas oferece o Curso Técnico de Enfermagem; duas escolas particulares de Ensino Fundamental e Médio, das quais uma conta com Curso de Técnico de Enfermagem e uma escola técnica estadual que também oferece o Curso Técnico de Enfermagem. No Ensino Superior possui uma universidade e um Centro de Ensino Superior. Em relação à Saúde, o município conta com uma Santa Casa, com 224 200 leitos; um Ambulatório Médico de Especialidades (AME); uma empresa Municipal de Saúde, que oferece exames especializados; seis Postos de Saúde e um Pronto Atendimento Municipal. Para a análise dos projetos pedagógicos, foi solicitada autorização aos respectivos diretores e com a finalidade de manter o anonimato, as escolas foram denominadas de escola 1, escola 2 e escola 3. Os projetos pedagógicos serão analisados considerando-se os seguintes aspectos: pré-requisitos para ingresso no curso, perfil profissional, carga horária total, carga horária prática, organização dos conteúdos, metodologia de ensino, cenário de prática e formas de avaliação. RESULTADOS e discussões Quadro I – Distribuição das principais características dos projetos pedagógicos de acordo com a escola 1, 2 e 3. Características do PP Escola 1 Escola 2 Escola 3 Pré-requisitos para ingresso no curso O interessado deve ter concluído o Ensino Médio ou estar cursando a segunda série do Ensino Médio concomitantemente. Três condições: 1) Candidatos que concluíram o Ensino Fundamental, aceitos sob condição de que devem concluir o Ensino Médio; 2) já concluíram ou estão cursando o Ensino Médio; e 3) portadores de certificado de auxiliar de Enfermagem. O interessado deve ter concluído, no mínimo, a primeira série do Ensino Médio e passar por um exame seletivo. 225 Aspectos do perfil profissional Relacionamento interpessoal; senso crítico, iniciativa, flexibilidade, senso de observação acurada, capacidade de autogestão e raciocínio lógico. Prática responsável e humana; consciência crítica de sua cidadania, dos direitos e deveres frente ao indivíduo e comunidade; atualização do conhecimento teórico e prático; respeito ao Código de Ética e à Lei do exercício Profissional; respeito ao paciente, colegas, hierarquia e normas institucionais; complementação e aprimoramento constante do conhecimento. O profissional executa atividades de assistência de Enfermagem sob a supervisão do enfermeiro para a promoção, prevenção, recuperação e reabilitação do cliente/paciente. Desenvolve ações de educação para o autocuidado, segurança no trabalho e biossegurança nas ações de Enfermagem. Carga horária do curso 1800 h 1920 h 1960 h – diurno 1901 h – noturno Carga horária prática 600 h 720 h 653 h Organização dos conteúdos Por tópicos: I – Organização do processo de trabalho em Saúde e em Enfermagem – Gestão; II – Promoção da biossegurança em Saúde – Proteção e Prevenção; III – Assistência à Saúde Coletiva – Proteção e Prevenção e IV – Recuperação e reabilitação. Por disciplina: Introdução à Enfermagem, Enfermagem Médica, Cirúrgica, Materno infantil, em Saúde Mental e Neuropsiquiátrica, em Saúde Pública e Administração em Saúde. Por Módulos: I- Apoio ao diagnóstico; II Educação em Saúde; III - Proteção e Prevenção e IV Recuperação e Reabilitação. Cenário de prática Santa Casa e Maternidades, Empresas, Escritórios, Sebrae e profissionais liberais, além de firmar convênio com Prefeituras Municipais. Instituições de Saúde pública ou privada. Instituições de Saúde. 226 Metodologia de ensino Aulas expositivas, discussões com professores e estudos em grupo, pedagogia de projetos, aulas práticas na sala ambiente, workshops e oficinas. Não faz referência. Aulas expositivas, estudo de caso, simulações, situações problemas, aula práticas na sala ambiente, workshops e oficinas. Forma de avaliação Compreende a avaliação do aproveitamento específico de cada disciplina, apuração da assiduidade e análise da ficha individual do aluno. Sugere a diversificação de instrumentos de medida, reforça a avaliação da aptidão do educando para realizar as tarefas pertinentes, bem como a assiduidade. Elaboração de Trabalho de Conclusão de Curso, provas, relatórios, roteiros, pesquisas, portfólio e projetos. Simulação de situações, observação direta e autoavaliação. Conforme se observa no quadro I, para ingressar no Curso Técnico de Enfermagem da escola 1 tem-se como exigência o fato de que o candidato esteja cursando a segunda série, ou tenha já concluído o Ensino Médio, não sendo necessária a realização de exame seletivo. Na escola 2 o candidato pode ingressar de acordo com três condições, primeiramente deve ter concluído o Ensino Fundamental, precisa desenvolver os módulos propostos para o curso técnico (I e II) e serem motivados para completar o Ensino Médio e, caso isso não ocorra, receberão apenas o título de Auxiliar de Enfermagem. Como segunda condição os candidatos devem ter concluído ou estar cursando o Ensino Médio, sendo necessário realizar os módulos I e II. A terceira condição refere-se aos que já possuem o título de auxiliar de Enfermagem, concluíram ou estão cursando o Ensino Médio, sendo que estes necessitam realizar apenas o módulo II do curso. As condições para o ingresso no curso são relevantes na elaboração do projeto pedagógico, tendo em vista que para os alunos que já atuam na área, o curso pode se desenvolver de forma diferenciada, pois se acredita que eles conseguem identificar com maior facilidade as fragilidades encontradas na assistência e avançar na perspectiva de transformação da realidade, desde que o curso tenha como direção a “ação-reflexão-ação”. Na escola 3, além de ser exigido que o candidato tenha cursado pelo menos a primeira série do Ensino Médio, realiza-se um exame seletivo. Referindo-se aos principais aspectos pontuados no perfil profissional 227 pelas três escolas, observa-se que as escolas 1 e 2 descrevem aspectos que vão ao encontro de uma formação mais integral, uma vez que a escola 1 destaca o “senso crítico”, a “flexibilidade” e o “relacionamento interpessoal”; e a escola 2 propõe, no seu perfil, “aspectos da humanização da atenção”, “respeito ao outro”, “consciência critica” e a “busca de aprendizagem”. Por sua vez, a escola 3 preconiza os aspectos técnicos da formação. Desta forma, parece claramente delimitada a urgência de investimentos para promover mudanças capazes de atenderem às necessidades do atual modelo de atenção, especialmente por se tratar de uma mudança paradigmática, com dificuldades explícitas de incorporação de novas tecnologias que contemplem a integralidade, a diversidade, a globalização e a incerteza no cuidado à saúde (MARIN et al., 2010). Na análise das principais características dos projetos pedagógicos dos três Cursos Técnicos de Enfermagem foi possível constatar que a carga horária total dos cursos apresenta diferenças significativas. A escola 1 apresenta uma grade com 1.800 horas, enquanto a escola 2 apresenta 120 horas a mais; por sua vez, a escola 3 apresenta 160 horas a mais em relação à escola 1, no período diurno, e 101 horas a mais, no período noturno. Entre a carga horária da escola 3, no período diurno, e a da escola 1 (no mesmo período), existe uma diferença de aproximadamente 8%. A Resolução CNE/CEB nº 04/99 fixa a carga horária mínima de 1.200 horas para as habilitações da área da Saúde, sendo assim, todas as três escolas funcionam em conformidade com a legislação. No entanto, acrescenta-se que embora a carga horária de um curso não garanta a sua qualidade, ela representa uma condição estrutural importante para que os processos ocorram de forma eficaz com vistas a se atingir resultados adequados (CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 1999). Quanto à carga horária prática, a escola 1 desenvolve as atividades com 120 horas a menos do que na escola 2, constituindo-se em uma diferença de, aproximadamente, 20%. A realização de atividades práticas é considerada um momento ímpar para o processo de formação na área da Saúde, uma vez que possibilita aos alunos uma reflexão sobre o contexto e a identificação das necessidades de mudanças para se atingir um novo modelo de atenção, conforme o proposto pelo Sistema Único de Saúde. No entanto, ao confrontar os alunos com a realidade é importante que sejam estimulados à reflexão, com vistas à transformação da prática, por meio da incorporação de novas formas de agir frente às necessidades de saúde das pessoas. É preciso considerar ainda que as situações reais estão imbuídas de grande complexidade; sem a análise 228 dessas situações qualquer iniciativa teórica fica desprovida de significado. Destaca-se neste aspecto que a realização do estágio representa um momento significativo do processo de ensino e aprendizagem, pois requer a ampliação das relações humanas, envolvendo outros atores que participam do contexto da prática, ou seja, do mundo do trabalho. Esse momento possibilita ao estudante exercer maior autonomia no contato direto com a realidade de saúde da população e do mundo do trabalho, possibilitando o desenvolvimento pessoal e profissional, e a intensificação da relação entre teoria e prática (COSTA; GERMANO, 2007). Propõe-se, assim, a formação pelo e para o trabalho, com vistas à compreensão do mundo físico e do social, para a formação de uma consciência crítica a respeito das práticas sociais, por meio da quais o mundo é construído. Tal consciência crítica também contribui para a organização política da sociedade, por compreender a Educação como prática social transformadora e a ação pedagógica como dependente do processo político no qual está inserida (ARANHA, 1989). Quanto à organização dos conteúdos, é observado que a escola 1, embora organize sua grade curricular por tópicos, nestes incluem as disciplinas, como por exemplo, no tópico Organização do Processo de Trabalho em Saúde e em Enfermagem, no que denominam de gestão, fazem parte as disciplinas: Ética Profissional, Introdução à Enfermagem, Psicologia Aplicada e Noções de Administração de Unidade de Enfermagem, dando ideia de que os conteúdos são desenvolvidos de forma fragmentada. Da mesma forma, a escola 2 apresenta a sua grade curricular por disciplinas. A escola 3 embora apresente os seus conteúdos por módulos, eles se mostram com foco tecnicista e fragmentado. Além disso, na escola 3, a organização curricular dos conteúdos teóricos está bem detalhada, de forma que o professor já encontra uma definição prévia do que irá ministrar, permitindo pouca possibilidade de autonomia e flexibilidade. A organização curricular das três escolas, portanto, revela as dificuldades de avançar para uma proposta que considere a complexidade e a integralidade das ações frente às situações de prática. Destaca-se, ainda, frente à necessidade de formação de profissionais para atuar no Sistema Único de Saúde, cuja ênfase está na atenção básica à saúde, um pequeno foco no cuidado coletivo em Saúde. Na escola 1, que conta com 600 h de carga horária prática, cem dessas horas são destinadas à Enfermagem em Saúde Pública, o que equivale a aproximadamente 16% da carga total de estágio. Na grade curricular da escola 2 encontra-se apenas 20 horas destinadas ao estágio de Enfermagem em Saúde 229 Pública. A escola 3, por sua vez, apresenta em sua grade curricular um módulo destinado ao ensino da educação para a saúde; no entanto, na descrição das habilidades e competências percebe-se que o conteúdo é desenvolvido com ênfase no controle de doenças infectocontagiosas e parasitárias. Trata-se, portanto, de outro aspecto que merece ser considerado na elaboração dos currículos dos cursos técnicos das escolas analisadas, uma vez que os mesmos estão privilegiando o cuidado ao indivíduo hospitalizado, enquanto a tendência atual da assistência à saúde busca modificar este modelo, propondo que a atenção à saúde deve ser direcionada para a promoção da saúde. Ressalta-se aqui a importância da diversificação do cenário de prática, com vistas a subsidiar o enfrentamento das diferentes realidades, que pode se conformar em atividade profissional. Percebe-se atualmente um movimento crescente de “des-hospitalização” no contexto do atendimento em Saúde, com grande parte das práticas assistenciais desenvolvidas em ambulatórios, na comunidade e nos domicílios. Essa tendência consolida a diversificação dos cenários de ensino, agregando-se ao processo de formação, além dos equipamentos de Saúde, os equipamentos educacionais e comunitários (CAMPOS et al., 2001). A metodologia de ensino, como condição essencial para que a aprendizagem ocorra de forma significativa, é descrita de forma semelhante nos projetos das escolas 1 e 3, nas quais é proposta a diversificação de atividades, incluindo aulas expositivas, estudos em grupo, estudo de caso, pedagogia de projetos, workshops e oficinas, simulações e situações problemas. Já no projeto pedagógico da escola 2 não encontramos a descrição de propostas metodológicas. Salienta-se que os métodos de ensino utilizados oportunizam ao aluno diferentes formas de apropriação do conhecimento, além de se constituírem em métodos que, na maioria das vezes, estimulam o raciocínio, a criatividade e a convivência com o outro. No processo de avaliação proposto pelas três escolas observa-se uma preocupação com a avaliação integral do aluno. Na escola 1, embora esteja descrita a avaliação específica de cada disciplina, nota-se que a escola leva em consideração a ficha individual do aluno. A escola 2 propõe a diversificação dos instrumentos de avaliação, possibilitando a avaliação de habilidades distintas daquelas que tradicionalmente priorizam o conhecimento cognitivo. Além disso, reforça o fato de que deve ser avaliada a aptidão dos alunos em realizar as tarefas pertinentes, sugerindo que o aluno será avaliado pela capacidade de agregar diferentes atributos no desempenho de suas atividades. 230 Na escola 3, merece destaque a elaboração de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), como método para avaliar o desempenho do aluno, o que proporciona ao mesmo a oportunidade de pesquisar um assunto com o qual teve afinidade durante o curso, fazer uma análise profunda e discutir com o seu orientador sobre suas dúvidas. Além do conhecimento específico sobre um assunto, estimula o desenvolvimento da autonomia, o senso investigativo e a flexibilidade. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao analisar os projetos pedagógicos dos três cursos de formação técnica em Enfermagem de uma cidade do interior paulista, não se teve a pretensão de uma abordagem definitiva sobre os cursos, uma vez que para o reconhecimento da sua qualificação como um todo seria necessário analisar outras condições, incluindo a forma de contratação dos docentes, o envolvimento da direção, docentes e discentes com o projeto pedagógico, o preparo dos docentes para atuar na área do ensino, além da estrutura física à disposição dos alunos. Referindo-se às características analisadas nos projetos pedagógicos e pautando-se nos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde, foi possível observar a existência de um caminhar, ora permeado por aspectos tradicionais do ensino, ora por tentativas de inovações, com vistas à formação de um profissional que atenda às necessidades sociais. Como exemplo da busca por inovação podemos citar o perfil profissional proposto pelas escolas 1 e 2, nos quais se valorizam o preparo para a constante busca do conhecimento, as relações interpessoais, a consciência crítica e o respeito ao outro. A diversificação dos cenários de aprendizagem proposta pela escola 1 pode ser compreendida como uma característica que vem ao encontro das diretrizes propostas nas políticas públicas de formação profissional. Destacam-se também as formas de avaliação, uma vez que as três escolas estabelecem proposições que vão ao encontro da perspectiva formativa, com ênfase nos aspectos qualitativos. No entanto, ainda se observa o desenvolvimento de conteúdos fragmentados em disciplinas e, muitas vezes, com ênfase nos procedimentos técnicos e no cuidado ao indivíduo hospitalizado. Revela-se, portanto, que para avançar na formação de profissionais que atendam às necessidades do SUS deve haver constante empenho na revisão das propostas pedagógicas, de forma a compreender, especialmente, as suas fragilidades e estimular constantes mudanças, com vistas ao seu aperfeiçoamento. 231 Referências ARANHA, M. L. A. Filosofia da educação. São Paulo: Moderna, 1989. BRITO, A. R. P. LDB da “conciliação” possível à lei “proclamada”. Belém: Graphitte, 1997. CALDERARO, L. H. A ação da professora coordenadora pedagógica na construção do projeto Hora da Leitura. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) – Universidade de Taubaté, 2007. Disponível em: <http://www.unitau.br/cursos/pos-graduacao/mestrado/ linguistica-aplicada/dissertacoes-2/dissertacoes-2007/Dissertacao%202005-2007%20Lucia%20 Helena%20Calderaro.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2010. CAMPOS, F. E. et al. Caminhos para aproximar a formação de profissionais de saúde das necessidades da atenção básica. 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Acesso em: 20 nov. 2010. VEIGA, I. P. A. Projeto Político Pedagógico: uma construção possível. São Paulo: Cortez, 2001. 232 ANOTAÇÃO DE ENFERMAGEM E SUA ABORDAGEM NOS CURSOS DE FORMAÇÃO DO TÉCNICO DE ENFERMAGEM Camila Maria Buso Weiller Viotto1 Profª. Drª. Ana Maria Pimenta Carvalho2 RESUMO O presente trabalho vem refletir a necessidade do profissional de Enfermagem de nível médio – auxiliar de Enfermagem – em praticar a anotação de enfermagem de forma completa e correta. O objetivo foi identificar artigos científicos com o tema Anotação de Enfermagem e sua aplicação pelos auxiliares de Enfermagem. Optou-se pela pesquisa descritiva por meio da revisão bibliográfica de artigos científicos. Como base de dados utilizaramse as fontes: Revista Brasileira de Enfermagem (REBEn), Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (Scielo) e os seguintes termos: anotações de Enfermagem, prontuário do paciente; ensino médio da Enfermagem, profissionalização na Enfermagem. Após análise obtiveram-se 30 publicações que foram novamente examinadas na íntegra, a fim de buscar estudos em forma de artigo científico, resultando em 12 artigos. Verificou-se escassez da literatura enfocando o auxiliar de Enfermagem e suas anotações, e os trabalhos em sua maioria trazem anotações realizadas pela equipe de Enfermagem, negligenciando este profissional. Assim, é necessário que sejam realizados mais estudos especificando as anotações dessa categoria, contribuindo para que a importância dessa prática seja abordada nos currículos dos cursos técnicos profissionalizantes, favorecendo o processo de enfermagem e a qualidade do cuidar. Descritores: Auxiliares de Enfermagem. Educação profissionalizante. Educação em Enfermagem. 1. Aluna do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde – EaD – Fiocruz/Fundap/ Niad/USP/RP, 2011. 2. Tutora do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde – EaD – Fiocruz/Fundap/ Niad/USP/RP, 2011. 233 INTRODUÇÃO O presente trabalho traz uma reflexão acerca da necessidade do profissional de Enfermagem de nível médio – auxiliar de Enfermagem – em buscar uma qualificação profissional baseada no modelo de competências, buscando um breve histórico na literatura por meio da busca sistematizada de artigos científicos que identificassem a prática do registro do paciente/anotação de Enfermagem por essa categoria, evidenciando a importância do ensino de tal prática de enfermagem de forma completa e correta, tornando esta um item primordial que deveria ter especial espaço nos componentes curriculares das escolas técnicas de Enfermagem. Segundo Almeida e Ferraz (2008), a reforma do setor da Saúde que se iniciou na década de 1980 com as Ações Integradas de Saúde (AIS1983), acompanhada pelo movimento sanitário brasileiro, com o apogeu na VIII Conferência Nacional de Saúde (1986), levou à criação do Sistema Único de Saúde, que se fortaleceu com a nova Constituição Brasileira (1988), contemplando a saúde como direito social, cuja garantia é responsabilidade de cada um e de todos, e em especial do Estado, assegurado mediante duas condições básicas: políticas públicas – econômicas e sociais – para redução de riscos, e acesso de todos os brasileiros a serviços e ações de saúde. Na atual mudança do processo de trabalho em saúde, com a introdução de inovações tecnológicas e de novas formas de organização de trabalho, tornase fundamental para o desenvolvimento das práticas profissionais considerar o contexto e a concepção de saúde, que têm como doutrina a reforma sanitária e como estratégia de reordenação setorial e institucional o Sistema Único de Saúde (SUS). Com os avanços tecnológicos adicionados ao crescimento da renda das populações, há a necessidade de uma força de trabalho mais especializada, mesmo com o aumento da necessidade de cuidados da atenção básica. Sem a melhora e o aperfeiçoamento da educação desses trabalhadores da Saúde, haverá lacunas crescentes que pressionarão e estimularão o aumento do grau de insatisfação dos próprios profissionais e da população em geral. Segundo Dantas e Aguillar (1999), o trabalho na Saúde, independentemente do conceito de saúde e do estágio de desenvolvimento de cada modalidade de sociedade, exige determinados pré-requisitos. No mundo todo, a aquisição de tais requisitos que credenciam o indivíduo para o trabalho nesta área depende de um processo formalmente atrelado e embutido na escolarização do mesmo. 234 A legislação educacional no Brasil prevê e estabelece normas e critérios que direcionam tanto a educação geral quanto a formação profissional. A formação profissional, na área da Saúde, é definida pelo sistema educacional, como sendo de primeiro e segundo graus (habilitações profissionais) e, também, no ensino superior (profissões universitárias). Nos últimos anos, o sucateamento dos serviços públicos de Saúde não se limitou às instalações físicas e aos equipamentos. Também os trabalhadores do setor de Saúde passaram por um processo de deterioração, pela ausência de investimento em suas formação e atualização, ao lado da inexistência de planos de carreira, cargos e salário (DAL POZ et al., 1992). Mesmo assim o incentivo à qualificação profissional ocorreu de forma sistematizada, como exemplo, na Escola de Formação Técnica em Saúde Enfermeira Izabel dos Santos, onde o ensino era voltado para qualificar os trabalhadores dos serviços públicos de Saúde do Estado do Rio de Janeiro (DAL POZ et al., 1992). Segundo o Conselho Federal de Enfermagem (SANTOS; CASSIANI, 2000), no que concerne ao pessoal qualificado, atualmente a Enfermagem apresenta o seguinte contingente: enfermeiros – 68.828; técnicos de Enfermagem – 60.667; e auxiliares de Enfermagem – 265.779; destacando-se que técnicos e auxiliares de Enfermagem somam 326.446 trabalhadores, ou seja, representam 60% da força de trabalho em Enfermagem no Brasil. Kobayashi, Frias e Leite (2001), em seu estudo descritivo exploratório, mostram que a força de trabalho na Enfermagem é predominantemente feminina, assalariada e segmentada, sendo constituída de profissionais qualificados, perfazendo um total de 35,7% de enfermeiros, 11,7% de técnicos de Enfermagem e 52,6% de auxiliares de Enfermagem, conforme dados estatísticos do Conselho Federal de Enfermagem – Cofen (1998). De acordo com Dantas e Aguillar (1999), a nova Lei 7.498/86 dispôs sobre o exercício profissional da Enfermagem estipulando que a mesma passaria a ser exercida privativamente pelo enfermeiro, pelo técnico e auxiliar de Enfermagem, e pela parteira, respeitando-se graus de habilitação. Determinou também a exclusão do atendente do quadro de Enfermagem, que se transformou em um caminho para a profissionalização do mesmo. Foram estabelecidas como competências do técnico de Enfermagem atividades que envolviam orientação e acompanhamento do trabalho de Enfermagem em grau auxiliar, e participação da assistência de Enfermagem. Já o auxiliar deveria exercer atividades de nível médio, de natureza repetitiva, envolvendo serviços auxiliares de Enfermagem sob supervisão, como também 235 participar das atividades de execução simples, no processo de tratamento. O serviço da Enfermagem compreende várias abordagens: assistir, cuidar, administrar, educar, pesquisar; sendo que a dimensão do assistir/cuidar está relacionada às atividades desenvolvidas diretamente junto à clientela, realizadas por enfermeiro, e principalmente por profissionais qualificados que integram a equipe de Enfermagem – auxiliares e técnicos de enfermagem (KOBAYASHI; FRIAS; LEITE, 2001). Essa força de trabalho, no que se refere ao técnico e auxiliar de Enfermagem, não tem controle individual sobre os principais elementos da produção no ramo dos serviços de Saúde, não detém controle sobre os seus objetos de trabalho, não domina a compreensão dos processos gerais que atuam sobre a saúde, não detém a posse dos meios materiais de trabalho, não tem condições concretas de autonomizar o seu trabalho no que se refere à venda dos seus serviços (KOBAYASHI; FRIAS; LEITE, 2001). Nesse contexto é necessário considerar a questão da educação do auxiliar e do técnico de Enfermagem, que, apesar de potencialmente serem capazes de intervir no contexto social, visando enfrentar os problemas de saúde da população, apresentam uma formação deficitária quanto ao preparo técnico científico e baixo comprometimento com as questões sociais, políticas e econômicas da sociedade brasileira. Dando sequência a esta questão para que a dimensão técnica tenha como referência a dimensão política, deve-se pensar em uma educação que permita aos trabalhadores de Enfermagem compreender a sua história, os limites de sua prática. Assim, espera-se um ensino em que os conteúdos sejam revestidos de atualidade e elaborados a partir da realidade vivenciada. Pois, segundo Bagnato et al. (2007), as transformações que ocorrem nos setores produtivos e de serviços articuladas à globalização da economia influenciam também a formação profissional, requerendo novas qualificações dos trabalhadores. Ainda segundo Kobayashi, Frias e Leite (2001), a educação profissionalizante, mediante a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), número 2 9.394/96, tem como objetivos a promoção da transição entre a escola e o mundo do trabalho, a qualificação, a reprofissionalização e a atualização, capacitando jovens e adultos com conhecimentos e habilidades gerais e específicas para o exercício das atividades produtivas dos jovens e adultos trabalhadores. Ao educador compete trabalhar junto a uma visão ampla de transformação do conhecimento prévio, a partir do processo de conscientização desse trabalhador, objetivando sua transformação. Marques (2002) relata que a adoção de modelo de competências para 236 a formação profissional de nível técnico em Saúde deve levar em conta que as competências profissionais são construídas pelos próprios trabalhadores, como sujeitos desse processo, e que tanto os espaços formativos quanto as organizações de trabalho deverão se constituir em “instâncias qualificadoras”, propiciando aos alunos condições de participação, de diálogo, de negociação e de intervenção, implicando mudanças nas estratégias pedagógicas de ensino profissionalizante. Nesse sentido, Aguiar Neto e Soares (2004) considera que os processos de qualificação que buscam integrar a educação e os serviços de Saúde devem ser praticados ao mesmo tempo em que distorções dos serviços de Saúde precisam ser enfrentadas, corrigidas e superadas, com a participação de trabalhadores qualificados, a partir de novo compromisso ético e político na construção de novo projeto social. Também uma qualificação adequada deve ter o potencial de integrar um conjunto de estratégias para uma política de formação dos trabalhadores para o SUS, de forma a atuar como coadjuvante no processo de transformação das práticas em Saúde. Nessa educação profissional devem-se considerar conhecimentos, experiências aprendidas e vivenciadas, valores e atitudes próprios, que são perceptíveis em suas atividades laborativas. Esses conhecimentos que provêm da educação não devem se restringir apenas à sala de aula, e sim promover um processo educativo contínuo que ocorra em qualquer momento, local ou situação, com qualquer pessoa ou por meio de diferentes estratégias. Martins et al. (2009 ) mostraram que desde os primórdios da história da vida do homem sobre a terra, uma de suas características mais evidentes é a comunicação,n necessidade inata que torna possível manifestar ou exteriorizar o que se passa na vida interior. Cianciarullo (2000) afirma que “o mundo social humano só pode existir quando nos comunicamos”. O ato de se comunicar torna o homem um ser capaz de viver em sociedade, promovendo relações que possibilitem o crescimento e a transformação do meio onde vive. Já Silva (2003) traz que somos por excelência seres de comunicação. No encontro comunicativo com os outros, nós descobrimos quem somos, nos compreendemos, crescemos em humanidade, mudamos para melhor e nos tornamos fator de transformação da realidade em que vivemos. Dentro do processo de comunicação existe a comunicação verbal, expressa por meio da linguagem falada ou escrita, que tem por finalidade a abordagem ao outro indivíduo; existe também a comunicação não verbal, aquela que surge na abordagem de pessoa a pessoa, por intermédio de gestos, 237 posturas, orientações do corpo e expressões faciais (CARVALHO, 2005). Dentre algumas formas de comunicação escrita na área da Saúde, destacase um instrumento conhecido como prontuário (CARRIJO, 2007). Ferreira (1986) assim define: “A palavra prontuário origina-se do latim promptuariu, que significa lugar em que se guardam ou depositam coisas que devem estar à mão, de que se pode precisar a qualquer momento. Outras definições encontradas, tais como: manual de informações e indicações úteis; ficha com dados de uma pessoa ou lugar em que se guarda aquilo que poderá ser necessário. Revendo um pouco do passado histórico dos registros em Saúde, Luz, Martins e Dynewicz (2007) revelam que os primeiros registros hospitalares foram encontrados no Antigo Egito, comprovando sua existência há cerca de dois mil anos. Já na Grécia Antiga encontraram-se traços de prontuários de hoje, mas foi Hipócrates – pai da Medicina – quem fez os primeiros registros sobre as doenças de seus pacientes no ano de 460 antes de Cristo. Efetivamente só em 1137, no Hospital Bartolomeu, de Londres, encontraram-se documentações de pacientes. Na Itália, Camilo de Lellis passou a exigir que, dentre os documentos dos pacientes, constasse a prescrição médica individual, a prescrição alimentar, a passagem de plantão e os relatórios de Enfermagem em cada plantão. Voltando à atualidade, de acordo com Possari (2007) as anotações de Enfermagem, além de meios de comunicação, são documentos legais, tendo outras finalidades como: • Relatarem de modo formal as observações e as ações. • Contribuírem com informações para o diagnóstico médico e de enfermagem. • Proporcionarem o acompanhamento da evolução do paciente. • Propiciarem informação para o planejamento do plano de cuidados de enfermagem. • Oferecerem base para avaliação da qualidade dos cuidados prestados ao paciente. • Serem úteis como fonte para a aprendizagem. • Serem recursos para o desenvolvimento de pesquisas. • Fornecerem elementos para a auditoria em enfermagem. • Serem instrumentos de defesa ou incriminação do enfermeiro e outros profissionais. • Servirem de instrumentos de comunicação entre os profissionais da equipe de Saúde. 238 Esse autor também traz que, entre todos os profissionais da área da Saúde, o enfermeiro, o auxiliar e o técnico de Enfermagem, por interagirem diretamente com os pacientes, precisam estar mais atentos ao uso adequado das técnicas da comunicação interpessoal, e, principalmente, da comunicação escrita, que é um importante instrumento gerador de relações entre as pessoas e entre os profissionais de Saúde, que, por meio de mensagens emitidas, serão identificados e interpretados pelo receptor, proporcionando a essência do processo comunicativo. O Cofen (CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 1993) relata os principais critérios que deve conter uma anotação de Enfermagem. São eles: • exatidão: os fatos devem ser anotados com precisão e veracidade e as observações devem ser exatas e específicas; • brevidade: os registros devem ser precisos, objetivos e completos; • legibilidade: ser escrita de forma nítida, legível e a tinta; • identificação: logo após seu término o profissional deve assinar seu nome, seguindo o número do Conselho Regional de Enfermagem (Coren). No caso de estagiário, deve colocar o seu nome seguido da instituição de ensino à qual pertence. Segundo o Manual de Anotações de Enfermagem do Conselho Regional de Enfermagem do Estado de São Paulo - Coren-SP (2008), os registros efetuados pela equipe de Enfermagem (enfermeiro, técnico e auxiliar de Enfermagem) têm a finalidade essencial de fornecer informações sobre a assistência prestada, assegurar a comunicação entre os membros da equipe de Saúde e garantir a continuidade das informações nas vinte e quatro horas, condição indispensável para a compreensão do paciente de modo global. Também, em concordância com os autores, cita que os registros são documentos legais de defesa dos profissionais, devendo, portanto, estar imbuídos de autenticidade e de significado legal, refletindo assim todo o empenho e a força de trabalho da equipe de Enfermagem, valorizando, portanto, suas ações. Também Vasconcellos, Gribel e Morales (2008) confirmam que o registro de Enfermagem é considerado critério de avaliação da qualidade da prestação de serviço de Saúde, sendo assim o reflexo da qualidade da assistência prestado. Algumas recomendações devem ser realizadas para tornar o registro autêntico e válido, como estar presente à assinatura do autor do registro (artigo 368 do Código do Processo Civil – CPC) e inexistência de rasura, entrelinhas, 239 emenda, borrão ou cancelamento, características que poderão gerar a desconsideração jurídica do documento produzido como prova documental (artigo 386 do CPC). A documentação de Enfermagem, inserida no prontuário do paciente, é fonte de ensino e pesquisa, servindo a auditoria, a avaliação do cuidado e a questões legais, o que determina a necessidade de conhecimento dos deveres e das obrigações por parte dos profissionais de Enfermagem. Ela assegura direito constitucional do paciente de decisão sobre sua vida e autonomia, reforçado pela Lei Estadual de São Paulo número 10.241/99, mais conhecida por Lei Covas. O Manual do Coren-SP (CONBSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM, 2008) também traz que o prontuário do paciente é todo acervo documental padronizado, organizado e conciso referente ao registro dos cuidados prestados ao paciente por todos os profissionais envolvidos na assistência. E, para essa assistência ter qualidade, o profissional da Saúde necessita de acesso a informações corretas, organizadas, seguras, completas e disponíveis, tendo o objetivo de: atender às legislações vigentes; garantir a continuidade da assistência, a segurança do paciente, a segurança dos profissionais, o ensino e a pesquisa e auditoria. O Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, na resolução Cofen 311/07 – artigo 72, quanto às responsabilidades e deveres, mostra que se deve “Registrar as informações inerentes e indispensáveis ao processo de cuidar de forma clara, objetiva e completa.” OBJETIVO Identificar artigos científicos que trouxessem o tema “Anotação de Enfermagem” e sua aplicação pelos auxiliares de Enfermagem integrantes da equipe de Enfermagem. METODOLOGIA Para o desenvolvimento do presente trabalho e alcance dos objetivos propostos, optou-se pela pesquisa por meio da revisão bibliográfica, da pesquisa descritiva e de informações presentes em artigos científicos. Segundo Gil (1991), pesquisa é um procedimento racional e sistemático onde o objetivo proporciona uma resposta aos problemas que são propostos. A pesquisa é requerida quando não se dispõe de informação suficiente para responder ao problema, ou então quando a informação disponível se encontra 240 em tal estado de desordem que não possa ser adequadamente relacionada ao problema. A pesquisa descritiva observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos sem os manipular, procurando descobrir a frequência com que um fenômeno ocorre, sua relação e conexão com outros, suas natureza e características (CERVO; BERVIAN, 2005). Após o levantamento da bibliografia necessária, realizou-se leitura dos artigos e a seleção dos mesmos sobre o tema proposto, para facilitar a montagem do trabalho. A leitura exploratória é uma leitura rápida do material bibliográfico, que tem por objetivo verificar em que medida a obra consultada interessa à pesquisa. Ao contrário da leitura seletiva, que é mais profunda, porém não definitiva, se possível há a volta de mais vezes ao mesmo material, com propósitos diferentes (MOREIRA, 1993). Por meio da revisão de literatura no que se refere à fundamentação teórica adotada para tratar o tema e o problema de pesquisa, foi realizada análise da literatura publicada, a partir da qual se estruturou o conceito que deu sustentação ao desenvolvimento da pesquisa. O resultado do processo de levantamento e análise do que já foi publicado e o problema de pesquisa escolhido permitiram a elaboração de um mapeamento de quem já escreveu e o que já foi escrito sobre o tema ou problema de pesquisa (SILVA; ESTERA, 2001). Como base de literatura para a pesquisa foram utilizadas fontes de informações da Revista Brasileira de Enfermagem (REBEn), da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e da Scientific Electronic Library Online (Scielo), e os seguintes termos: anotações de Enfermagem, registros de Enfermagem, prontuário do paciente; ensino médio da Enfermagem, profissionalização na Enfermagem. RESULTADOS E DISCUSSÃO Após a análise da bibliografia encontrada por meio dos descritores escolhidos, obtiveram-se 30 produtos, que foram novamente examinados na íntegra, a fim de buscar estudos em forma de artigos científicos publicados acerca do tema proposto: anotação de Enfermagem e seu uso pelos auxiliares de Enfermagem, tendo como resultado final 12 trabalhos científicos que contemplavam o tema escolhido. O Quadro 1 mostra a relação dos artigos selecionados de acordo com autoria, ano e país de publicação, e a base de dados. 241 Quadro 1: Relação dos artigos analisados segundo autoria, ano e país de publicação, e a base de dados. Nº do Autor artigo Título Ano País Base de Dados Revista 1 DALRI, M. B.; ROSSI, L. A.; CARVALHO, E. C. Aspectos éticos e legais das anotações de enfermagem nos procedimentos de doação de órgãos para transplantes 1999 Brasil Scielo Revista Escola de Enfermagem – USP 2 OCHOA-VIGO, K.; PACE, A. E.; ROSSI, L. A.; HAYASHIDA, M. Avaliação da qualidade das anotações de enfermagem embasadas no processo de enfermagem 2001 Brasil Google Acadêmico Revista Escola de Enfermagem – USP 3 LOURENÇO, M. R.; ZBOROWSKI, I. P.; CURY, A. M. B.; TREVISAN, M. A.; FÁVERO, N. Análise de conteúdo dos registros da equipe de enfermagem 2002 Brasil Scielo An. 8. Simp. Bras. Comun. Enferm. 4 ANGERAMI, E. L. S.; MENDES, I. A. C.; PEDRAZZANI, J. C. Conceitos teóricos acerca das anotações de enfermagem 2003 Brasil Google Acadêmico Enfermagem Atual 5 D’INNO-CENZO, M.; ADAMI, N. P. Análise da qualidade dos registros de enfermagem nos prontuários de pacientes de hospitais de ensino e universitários 2004 Brasil Scielo Acta Paulista de Enfermagem 6 JERICÓ, M. C.; RODRIGUES, V. A.; PERROCA, M. G. Glosas hospitalares: importância das anotações de enfermagem 2004 Brasil Google Acadêmico Arquivo Ciência de Saúde 7 MATSUDA, L. M. et al.. Anotações/registros de enfermagem: instrumento de comunicação para a qualidade do cuidado? 2006 Brasil Google Acadêmico Revista Eletrônica de Enfermagem 242 8 MATSUDA, L. Anotações/registros de enfermagem em M.; CARVALHO, A. um hospital-escola R. S.; ÉVORA, Y. D. M. 2007 Brasil Google Acadêmico Cienc. Cuid. Saúde 9 LUZ, A.; MARTINS, A. P.; DYNEWICZ, A. M. Características de anotações de enfermagem encontradas em auditoria 2007 Brasil Google Acadêmico Revista Eletrônica de Enfermagem 10 VENTURINI, D. A.; MARCON, S. S. Anotações de enfermagem em uma unidade cirúrgica de um hospital escola 2008 Brasil Scielo Revista Brasileira de Enfermagem 11 LONGARAY, V. K.; ALMEIDA, M. A.; CEZARO, P. Processo de enfermagem: reflexões de auxiliares e técnicos 2008 Brasil Scielo Texto Contexto Enfermagem 12 SETZ, V. G.; D’INNOCENZO, M. Avaliação da qualidade dos registros de enfermagem no prontuário por meio da auditoria 2009 Brasil Scielo Acta Paulista de Enfermagem Após a análise destes 12 artigos pôde-se dividi-los em três grupos que abordavam o tema “anotação de Enfermagem versus auxiliar de Enfermagem” de formas diferentes. O primeiro grupo abordou o profissional de Enfermagem – auxiliar de Enfermagem e seu papel de construção da anotação de enfermagem em prol de uma assistência de qualidade. Nesse grupo foram enquadrados quatro artigos: os artigos de números 1, 2, 5 e 11. Nestes inclui-se Longaray, Almeida e Cezaro (2008), pois relatam que, estando o técnico e o auxiliar de Enfermagem inseridos na equipe de Enfermagem, e participando da avaliação do paciente durante o cuidado prestado, é de fundamental importância que o seu conhecimento seja reconhecido e considerado, por intermédio de suas anotações e registros do cliente, para o desenvolvimento da sistematização da assistência de Enfermagem (SAE), concretizada por meio do processo de Enfermagem. Dalri, Rossi e Carvalho (1999) e Innocenzo e Adami (2004) trazem a importância de lembrar que os registros de Enfermagem retratam a prática desses profissionais, e portanto esses padrões devem ser adotados como guia para a assistência de Enfermagem a ser realizada. Essa documentação tem se constituído em foco de atenção de diferentes estudos, pois os registros 243 realizados nos prontuários dos pacientes são fonte inestimável de dados e são utilizados por todos os membros da equipe de Saúde, tendo também a finalidade de promover a comunicação de informações sobre o paciente, possibilitar o ensino, a pesquisa, a realização de auditorias e a verificação de aspectos legais. Ochoa-Vigo et al. (2001) citam que a documentação da assistência permite o acompanhamento das condições de saúde do paciente, favorecendo a avaliação dos cuidados prestados e expressando a natureza das ações dos profissionais da Enfermagem. Portanto deve ser realizada de forma clara, objetiva e de acordo com os princípios éticos e morais da profissão. Nesse sentido, as anotações são indispensáveis no prontuário do paciente, como parte da documentação do processo saúde-doença, especialmente considerandose que a equipe de Enfermagem acompanha todo esse decorrer de forma integral, pela permanência na unidade hospitalar durante vinte e quatro horas, garantindo qualidade e fidedignidade em suas observações. O segundo grupo estabelecido veio a abordar a equipe de Enfermagem no processo da anotação, lembrando que o profissional auxiliar de Enfermagem é parte integrante dessa categoria e, portanto, é incluído nessa abordagem. Neste grupo fazem parte quatro artigos: os de números 4, 6, 8 e 9. Dentre eles Angerami, Mendes e Pedrazzani (2003) escreve que as anotações de Enfermagem, quando realizadas de maneira correta, onde todos os dados básicos e as respostas às intervenções de Enfermagem são registrados, fornecem elementos para pesquisas em Enfermagem, contribuindo na construção da ciência da Enfermagem, impulsionando o avanço na profissão. As anotações de Enfermagem podem englobar tanto os registros de procedimentos de Enfermagem realizados, descrição de fatos, como dados que são resultados de uma avaliação do paciente, ou seja, a evolução de Enfermagem. Matsuda, Carvalho e Évora (2007) retratam em seu trabalho que no processo de atenção à saúde a documentação das atividades e dos seus resultados, por meio de registros escritos, constitui um dos instrumentos de comunicação efetivos para o replanejamento, a continuidade e a avaliação dos serviços prestados aos clientes. Portanto, quando na Enfermagem há escassez de documentos, isso demonstra a ocorrência de uma prática mal realizada pelos profissionais da área. Luz, Martins e Dynewicz (2007) trazem que, em relação à equipe de Enfermagem, a legislação prevê que é dever da equipe manter uma anotação de forma perfeita, como também organizar os documentos referentes ao paciente 244 em relação aos cuidados de Enfermagem. A Lei 7.498, de 25 de julho de 1986, em seu artigo 14, ressalta a incumbência de todo o pessoal da Enfermagem, e a necessidade de anotar no prontuário todas as atividades da assistência de Enfermagem. Jericó, Rodrigues e Perroca (2004) também consideram que o prontuário do paciente, onde estão anotadas todas as informações sobre seu estado, a cada dia vem se firmando legalmente como ferramenta importante na avaliação da qualidade da assistência prestada aos clientes no hospital, fornecendo informações vitais para processos judiciais e convênios de Saúde. Além disso, nos serviços de Saúde o controle da qualidade tem também se tornado condição indispensável à eficácia da assistência implementada. Um dos indicadores utilizados para verificação da qualidade é a forma como ela é prestada, considerando-se a competência do profissional que a executa, a segurança e a efetividade da ação de Enfermagem e a forma como ela é registrada. O último grupo de artigos a ser elaborado trouxe a anotação de Enfermagem e os erros cometidos pelas equipes, bem como soluções de melhoria por meio do ensino e do treinamento, citando as possíveis causas da não realização da anotação de Enfermagem no processo do cuidar. Os artigos escolhidos foram cinco: os de números 3, 7, 8, 10 e 12. Matsuda et al. (2006) em seu estudo destacaram que na maioria dos registros efetuados pelos enfermeiros e auxiliares de Enfermagem faltaram vários dados, como data, hora dos procedimentos realizados com os clientes, bem como a identificação do profissional. Desse modo, é observado que os registros analisados não refletiam a atuação do profissional, os cuidados recebidos pelo cliente e as suas respostas. Assim, essas anotações não fornecem dados necessários capazes de subsidiar o processo de cuidado aos clientes de maneira global, individualizada e contínua, possibilitando a interpretação de que tais registros não consistem em instrumentos sistemáticos de comunicação da e para a qualidade do cuidado de Enfermagem. Ainda Matsuda, Carvalho e Évora (2007) relatam que algumas das causas da não realização de uma efetiva anotação de Enfermagem são o baixo nível socioeducacional de muitos profissionais que atuam na Enfermagem, a complexidade da linguagem, o número reduzido de trabalhadores na equipe, a alta demanda por serviço, a pouca valorização da profissão e os escassos investimentos em processos de treinamento/educação permanente – fatores que dificultam a realização de registros frequentes e completos. Nesse sentido, considera-se fundamental que a Enfermagem faça 245 maiores investimentos na intenção de solucionar/minimizar os problemas identificados, para assim haver melhorias na qualidade da anotação de Enfermagem. Os mesmos autores consideram que os registros, por serem um meio que efetivamente alavanca e comprova a qualidade do cuidado, merecem especial atenção por parte das lideranças e de toda a equipe, visto que constituem parte inerente ao processo do cuidar. Assim, a anotação de Enfermagem continua sendo um tema de grande interesse dos enfermeiros assistenciais e dos docentes dos cursos de Enfermagem. Portanto, Lourenço et al. (2002) trazem que é necessário uma melhor abordagem desse tema, tanto na assistência à saúde como no ensino dessa prática – anotação de Enfermagem a todos os profissionais da Enfermagem. Uma vez que a anotação de Enfermagem é um excelente meio de comunicação multiprofissional, ela permite não só a continuidade da assistência, mas também a assistência de qualidade. Ainda sobre os registros em prontuários, observa-se que estes são realizados não só pelos enfermeiros, mas também pelos auxiliares de Enfermagem, por meio de observações baseadas no estado geral do paciente. Já Setz e D’Innocenzo (2009) consideram que esse registro escasso e inadequado vai comprometer a assistência prestada ao cliente, assim como a equipe de enfermagem e a instituição, havendo também comprometimento da segurança e da perspectiva de cuidado do paciente, além da dificuldade de mensurar os resultados assistenciais advindos da prática da Enfermagem. Desse modo, há sugestão de implementação de programas de orientação e treinamento sistemático dos profissionais que já atuam na prática, bem como a busca de estratégias mais eficientes de mobilização dos alunos nos cursos de formação dos enfermeiros, auxiliares e técnicos para o desempenho da tarefa de comunicação, de modo a realizar registros/anotações mais efetivos e que retratem o mais fielmente possível a sua prática. Venturini e Marcon (2008) concordam com os autores acima quando relatam que são necessários investimentos em treinamentos para melhoria dos preenchimentos e da qualidade das informações registradas, bem como afirmam que o emprego da educação permanente em serviço é uma das estratégias que pode contribuir para a melhoria das anotações, assim como nos cuidados prestados. 246 CONSIDERAÇÕES FINAIS Atentando para a atual e real necessidade da capacitação dos profissionais de Enfermagem de nível técnico, no enfoque “Anotação de Enfermagem”, o presente estudo buscou, por meio de levantamento bibliográfico, conhecimentos específicos para pesquisar, reunir e armazenar bagagem suficiente para justificar o quão essencial torna-se o registro de Enfermagem como prioridade nas práticas do auxiliar de enfermagem, visando à qualidade do cuidado ao cliente em seu processo saúde-doença nos diferentes níveis, hospitalar e de saúde pública. Almejando alcançar o objetivo geral proposto, verificou-se uma escassez de literatura com enfoque no auxiliar de Enfermagem e suas anotações. Os trabalhos em sua maioria trazem as anotações e sua realização pela equipe de Enfermagem, não especificando o profissional; assim, é necessário que sejam realizados mais estudos especificando as anotações dessa categoria, contribuindo para que a importância de tal prática de forma correta e completa seja abordada nos currículos dos cursos técnicos profissionalizantes, favorecendo o processo de enfermagem e a qualidade do cuidar. As organizações de Saúde precisam de profissionais capacitados para o alcance de suas metas e objetivos. Nesse sentido, necessitam não somente de processos de treinamento e reciclagem para esses profissionais técnicos, mas sim trazer à tona a prática de inclusão nos currículos dos cursos técnicos profissionalizantes de um aprofundamento maior sobre anotações de Enfermagem – sua função, sua elaboração e suas utilizações –, buscando sempre entrelaçar o tema a questões éticas do cotidiano da Enfermagem. Assim estimula-se os alunos trabalhadores a refletirem suas práticas e ações perante o cliente cuidado, integrando-os na própria função e no contexto institucional. Esta proposta sugere a possibilidade da prática desse ensino sem deixar de considerar a heterogeneidade cognitiva dos participantes, suas críticas, sugestões e possíveis soluções aos problemas de registros/anotações de Enfermagem. Nessa perspectiva, havendo um maior preparo na profissionalização dos alunos, os tornaremos colaboradores do resultado final do cuidado, que é a plena satisfação do cliente diante da assistência prestada de forma eficaz e humanizada, valorizando-os como parte integrante das decisões tomadas perante o tratamento do cliente, levando-os a ter uma maior satisfação no trabalho, melhorando sua produtividade, possibilitando a busca de novos conhecimentos e o desenvolvimento do potencial humano; capacitando247 os também a uma execução adequada do trabalho e preparando-os para futuras oportunidades profissionais, e, dessa maneira, objetivando tanto seu crescimento pessoal como profissional. Esta pesquisa veio aprofundar a reflexão sobre os meios e os modos como a formação profissional vem ocorrendo ao longo dos anos, baseado nas realizações incorretas das anotações de Enfermagem, atentando para a necessidade de melhoria dos conteúdos curriculares, permitindo ao aluno aprender os procedimentos técnicos indispensáveis ao exercício profissional de como entender e dar atenção devida à prática correta da anotação de Enfermagem, por ser ela um ato jurídico, desenvolvendo visão crítica em relação ao processo de trabalho e ao mundo que o cerca. REFERÊNCIAS AGUIAR NETO, Z.; SOARES, C. B. A qualificação dos atendentes de enfermagem: transformações no trabalho e na vida. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 12, n. 4, p. 614-622, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_serial&pid=01041169&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 10 jan. 2011. ANGERAMI, E. L. S.; MENDES, I. A. C.; PEDRAZZANI, J. C. 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Acesso em: 10 fev. 2011. 250 AS DIFICULDADES DOS ESTUDANTES-TRABALHADORES DO SUS NA REALIZAÇÃO DO CURSO DE HABILITAÇÃO TÉCNICA EM ENFERMAGEM Jicele Bruno de Oliveira, Luzete Fátima da Conceição Monteiro Orientador: Profº Drº Wilson José Alves Pedro RESUMO O aprender enfermagem tem suas dificuldades durante sua formação profissional; com isso o aluno pode ser afetado no seu processo de aprendizado. As barreiras no processo de aquisição do conhecimento, cada vez mais, são também atribuídas por educadores e pedagogos a causas externas, no âmbito da escola e das condições socioeconômicas dos estudantes. Independentemente de conceituações, o fracasso escolar é uma chaga pela forma que atinge os alunos e pela exclusão social que projeta na vida adulta (GONDO; BLANCO, 2009). Decidimos, assim, realizar este estudo a partir de alguns problemas evidenciados na prática desenvolvida em sala de aula e no campo de estágio, esperando poder contribuir para a ampliação e a disseminação de novos saberes relativos à educação profissional. Portanto a contribuição desta pesquisa é analisar quais as dificuldades desses alunos e as implicações no processo de formação profissional que podem oferecer subsídios para a elaboração de referenciais didático-pedagógicos que atendam às necessidades percebidas. Este estudo tem por objetivo descrever as dificuldades durante a realização do curso de Habilitação Técnica de Enfermagem no decurso da formação teórica e prática, com ênfase nos princípios do SUS. Quanto à metodologia, tratase de uma pesquisa exploratória, de natureza qualiquantitativa, levantamento bibliográfico, e com artigos científicos. As fontes bibliográficas levantadas foram encontradas no portal de revista científica Scientific Eletronic Liberary On-line (Scielo Brasil), Centro Latino-Americano e do Caribe de Informações em Ciências de Saúde (Lilacs), Base de Dados de Enfermagem (BDENF) e Acervo de Periódicos da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo 251 (Perienf) – artigos periódicos publicados em português no período de 1996 a 2009. Os resultados identificados na pesquisa são: falta de recursos financeiros para transporte e material didático; cansaço físico; dificuldade de conciliar o curso com o emprego e falta de tempo para estudo; dificuldade no aprendizado; material didático de difícil compreensão; didática utilizada pelo professor e falta de preparo do professor; relação com o professor e colegas; problemas pessoais; estrutura e recursos da escola; duração do curso e aprofundamento do conteúdo. Como conclusão, temos que o ensino no curso de habilitação técnica em Enfermagem deve propiciar aquisição de conhecimentos e mudanças de comportamentos, sem perder de vista a vinculação entre teoria e prática. Para isso, o docente precisa refletir acerca de suas atitudes, para valorizar o aluno como um ser em formação, respeitar suas experiências de vida e compreender os momentos de dificuldades por ele enfrentados, contribuindo para uma boa formação. Descritores: formação profissional; formação técnica em enfermagem; referenciais didático-pedagógicos. INTRODUÇÃO Ao abordar a profissionalização e a educação na área de Saúde, constata-se que o processo de globalização e o vertiginoso ritmo dos avanços científicos e tecnológicos têm exigido da Enfermagem um esforço cada vez maior no sentido de capacitação profissional. A enfermagem teve que assimilar, incorporar, adaptar-se às mudanças crescentes no ambiente intra-hospitalar, da Enfermagem e da Medicina. Tal realidade impõe enormes desafios na qualificação e na formação de um profissional preparado para atuar na área da Saúde. A inserção no mercado de trabalho também é um fator determinante para a procura de cursos de habilitação técnica de Enfermagem (GONDO; BLANCO, 2009). O processo de formação em habilitação técnica em Enfermagem no país passou por modificações ao longo dos anos; incorporando as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), como consequências surgiram alterações na grade curricular dos cursos de Enfermagem, mudança na formação do perfil do profissional de Saúde, em virtude das transformações no quadro políticoeconômico-social da Educação e da Saúde no país. O aprender enfermagem tem suas dificuldades durante sua formação profissional, composto pelas seguintes convergências: insuficiência da carga horária dos cursos; dificuldade 252 no processo de ensino-aprendizagem; investimento do curso; insuficiência de professores para plantão de dúvidas; despreparo dos docentes para a proposta pedagógica; despreparo do aluno devido a ensinos Fundamental e Médio deficientes. O estudo dos problemas educacionais, sobretudo com relação ao Ensino Médio do aluno-trabalhador, faz-se necessário a partir do pressuposto de que esse nível de ensino lida de forma prioritária com jovens e adultos que já estão no mercado de trabalho ou predispostos a pleitear uma colocação, onde educador e educando são os principais agentes nesse processo (STUTZ; JANSEN, 2006). Propondo mudanças na prática docente, refletindo sobre a difícil tarefa do professor em lidar com os alunos-trabalhadores que, muitas vezes, em consequência de determinadas funções que exercem, se obrigam a se ausentar das aulas, e analisando esses fatores, pretende-se encontrar meios que possibilitem um melhor relacionamento professor/aluno em prol de melhor qualidade de ensino. A condição de aluno-trabalhador talvez seja, dentre as dificuldades enfrentadas, a característica mais forte dos alunos-trabalhadores, condição esta de trabalhador desqualificado e explorado ao peso de um salário vil e de uma insuportável dupla jornada de trabalho: a da fábrica, loja, escritório ou rural, e a da escola noturna. O Ensino Médio do alunotrabalhador historicamente tem sofrido muitas transformações, tanto na sua concepção quanto na sua execução, seja por meio das práticas pedagógicas ou das legislações. Tal transformação advém das dinâmicas da própria sociedade, que tem na escola um reflexo. À medida que as demandas sociais vão surgindo, novas exigências são postas à escola e em especial ao ensino noturno, que tem um quadro de jovens estudantes inseridos no mercado de trabalho sem a devida qualificação, e com jornada de oito ou mais horas diárias, que lá estão por extrema necessidade de sobrevivência (GONDO; BLANCO, 2009). Conhecer as dificuldades dos estudantes de Enfermagem no processo de ser aluno, e perceber que a entrada brusca desses alunos, em um contexto ainda desconhecido da profissão de Enfermagem, contribui para o não surgimento de tensões e ansiedades. Nesse mundo desconhecido durante o processo de formação, os alunos poderão sofrer desgastes de natureza emocional que ressurgem no momento em que aparecem, sob sua ótica e as situações são avaliadas e interpretadas pelos alunos de enfermagem, tendo como base as suas experiências vivenciadas durante o seu processo de formação (GONDO; BLANCO, 2009). Outros fatores podem contribuir para aumentar os sentimentos negativos dos alunos, dentre eles a preocupação com o mercado de trabalho, 253 problemas de natureza econômica, financeira, relacionamento com professores, e outros. A forma de aprendizagem, o interesse em aprender, a motivação, o sofrimento relacionado à apreensão da futura profissão, a problemas financeiros, familiares, e de saúde, são vistos como preocupações mais presentes na vida dos alunos, que interferem no sistema de aprendizagem. Isso torna o papel do docente na formação dos alunos fundamental, devendo ser considerado como modelo de postura profissional. As atitudes assumidas pelo professor geralmente são referência para a vida futura dos alunos, por estar na condição de formador do indivíduo e do profissional (ESPERIDIÃO; MUNARI, 2004). Um fator relevante para essa discussão são as dificuldades encontradas pelos alunos-trabalhadores no seu processo de aprendizagem, que pode ser afetado pelo cansaço físico e mental. As dificuldades dos estudantestrabalhadores são superadas pela autoimagem de vencedores como recompensa pelo esforço pessoal. Já em relação à introdução do aluno no ambiente hospitalar, emergem os conflitos e as mudanças de comportamento na vida dos alunos, influenciando diretamente na qualidade de vida. No campo de estágio, o aluno passa a ser participante de seu processo de ensino, deixando de ser ouvinte do ensino tradicional e passando a envolver-se emocionalmente nas situações práticas em campos clínicos, adicionado a estes um novo processo de ansiedade quanto à nova situação (NUNES et al., 2007). O objetivo da prática pedagógica é o de atingir o aluno, estimulando-o a fazer a descoberta de si mesmo, preservando seus valores culturais e pessoais. Essas descobertas devem desenvolver, no educando, uma preparação para a vida, e para a atividade profissional diária. Considera-se a relação entre professor e aluno fundamental para a formação deste, pois as próprias relações interpessoais do aluno, quando profissional, serão influenciadas pelo modelo de relação compartilhada com os professores. Então, se faz necessário propiciar a reflexão sobre as vivências e suas repercussões no desenvolvimento pessoal do aluno, proporcionando o crescimento deste e do professor, o qual necessita estar apto para acolher o aluno dentro do contexto do relacionamento interpessoal (SOARES; BUENO, 2006). As mudanças nas concepções relativas ao modo como se aprende tanto nas formas de interação entre quem aprende e quem ensina, quanto ao modo como se reflete sobre a natureza do conhecimento. Nessa permanente mudança, o ensino tradicional, baseado na transmissão de um conjunto de conhecimento e na aprendizagem passiva e individual, não dá resposta às solicitações do indivíduo (STUTZ; JANSEN, 2006). As barreiras no processo de aquisição do conhecimento, cada vez mais, são também atribuídas por educadores e pedagogos às causas externas, 254 no âmbito da escola e das condições socioeconômicas dos estudantes. Independentemente de conceituações, o fracasso escolar é uma chaga pela forma que atinge os alunos e pela exclusão social vivenciada que se projeta na vida adulta (GONDO; BLANCO, 2009). Durante o nosso período de trajetória com os docentes surgiram reflexões em relação às dificuldades enfrentadas pelos alunos durante a formação do curso de habilitação técnica em Enfermagem, havendo a necessidade de buscar durante a realização do trabalho uma compreensão, para auxiliar os alunos nos enfrentamentos das dificuldades, para que eles possam concluir o curso com qualidade e melhor aprendizado. Decidimos, assim, realizar este estudo a partir de alguns problemas evidenciados na prática desenvolvida em sala de aula e no campo de estágio, esperando poder contribuir para a ampliação e a disseminação de novos saberes relativos à educação profissional. Inicialmente o trabalho seria quantitativo, com pesquisa direta com os alunos que já estavam cursando a habilitação técnica em Enfermagem; porém, devido ao tempo, foi realizado levantamento bibliográfico. A contextualização deste trabalho no âmbito do curso de Enfermagem e a tentativa de modificar as concepções pedagógicas utilizadas pelos docentes de Enfermagem no que se refere à identificação das dificuldades apresentadas pelos alunos durante o curso. Portanto a contribuição desta pesquisa é analisar quais as dificuldades desses alunos e as implicações no processo de formação profissional que podem oferecer subsídios para a elaboração de referenciais didático-pedagógicos que atendam às necessidades percebidas. Nesse sentido, o presente estudo tem como tema as dificuldades dos estudantes-trabalhadores do SUS na realização do curso de habilitação técnica em Enfermagem e vincula-se ao mesmo e prioriza o tema. Os alunostrabalhadores do SUS que foi estudado no CT1. A formação de trabalhadores da área da saúde objetiva proporcionar um processo dialético de ensino-aprendizagem, o que significa a adoção de um modelo educativo e de perspectivas pedagógicas que superem a mera transmissão de conhecimentos e que levem os profissionais a extraírem das situações complexas e contraditórias de seus exercícios profissionais diários a possibilidade de superação de obstáculos e de construção de alternativas. Para assegurar aos profissionais um processo de formação/capacitação não fragmentado e que contribua para uma reflexão sistemática e bem fundamentada sobre o modelo de atenção à saúde e sobre seus processos de trabalho, é preciso uma estratégia educativa que favoreça uma perspectiva 255 emancipadora (BOMFIM, 2009). OBJETIVO Este estudo tem por objetivo descrever as dificuldades durante a realização do curso de Habilitação Técnica de Enfermagem no decurso da formação teórica e prática, com ênfase nos princípios do SUS. METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa exploratória, de natureza qualiquantitativa, a partir da análise de publicações científicas sobre os as dificuldades apresentadas por alunos de Enfermagem na realização do curso de Habilitação Técnica de Enfermagem. Foi realizado um levantamento bibliográfico com busca informatizada nas bases de dados, constituídos de artigos científicos. As fontes bibliográficas levantadas referentes ao assunto foram encontradas no portal de revista científica Scientific Eletronic Liberary Online (Scielo Brasil), Centro Latino-Americano e do Caribe de Informações em Ciências de Saúde (Lilacs), Base de Dados de Enfermagem (BDENF) e Acervo de Periódicos da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (Perienf). O estudo é limitado a artigos periódicos publicados em português no período de 1996 a 2009. Os descritores utilizados foram: dificuldades, estudantes, trabalhadores, enfermagem, professores, ensino técnico. Dentre o conjunto de artigos identificados (39), selecionou-se um conjunto de 16 artigos, pelo critério de relevância dos estudos, por meio da análise das pesquisadoras. Após leitura dos artigos identificados (39), sistematizou-se para fins de análise, mediante identificação de aspectos relevantes na compreensão das pesquisadoras, a partir das próprias publicações e da experiência/vivência docente na área. As categorias definidas são as seguintes: • falta de recursos financeiros para transporte e material didático; • cansaço físico, dificuldade de conciliar o curso com o emprego e falta de tempo para estudo; • dificuldade no aprendizado, material didático de difícil compreensão, didática utilizada pelo professor e falta de preparo do professor; • relação com o professor e colegas; • problemas pessoais; 256 • • estrutura e recursos da escola; duração do curso e aprofundamento do conteúdo. RESULTADOS ESPERADOS Descrever as dificuldades dos alunos-trabalhadores do SUS para realização do curso de habilitação Técnica de Enfermagem e as implicações no processo de formação profissional que podem oferecer subsídios para a elaboração de referenciais didático-pedagógicos. RESULTADOS E DISCUSSÃO: DIFICULDADES APRESENTADAS PARA REALIZAÇÃO DO CURSO TÉCNICO DE ENFERMAGEM Com o vivenciar dessas situações, os alunos passam por momentos de dificuldades que são trabalhadas por eles de acordo com as suas experiências anteriores, a sua concepção da situação, a sua personalidade, podendo avaliar, reavaliar e encontrar mecanismos que possam ajustar-se ou adaptar-se à nova situação ou que poderão confirmar a crise. Crises estas denominadas como existenciais ou acidentais. As crises acidentais são difíceis de prever. Dentre as situações que têm desencadeado crises acidentais podem ser citadas as mudanças para um novo ambiente, novas responsabilidades sociais e ocupacionais, nascimento de um bebê prematuro, desemprego, doença, problemas interpessoais, conflitos entre o lar e trabalhos, entre outros (JORGE, 1996). Pelo levantamento realizado junto aos Cursos de Enfermagem no Brasil por Jorge e Rodrigues (1994), sobre os serviços de apoio ao estudante de Enfermagem verificou-se que existem duas formas de assisti-los: a que oferece informações pedagógico-administrativas e a que oferece algum tipo de atendimento voltado para as necessidades do estudante. Dentre os cursos que oferecem informações pedagógico-administrativas, extraímos de suas respostas a exata colocação da atividade desenvolvida, tais como: semana de orientação, atendimento das dificuldades do processo de aprendizagem, orientação para bolsa de estudo, e outros. Como se pode verificar, parece que esses cursos não demonstram preocupação com o aluno como pessoa que vivencia uma situação de dificuldade, quer na esfera física, psíquica ou socioeconômica. Interpretou-se dessa forma, visto que, com o oferecimento de informações sobre a estrutura do curso, a distribuição de disciplinas, ou recursos administrativos, o aluno fica orientado quanto aos aspectos formais, o 257 que é feito de maneira geral e impessoal. Porém a preocupação com os alunos, oferecendo orientação acadêmica, encaminhamento para outros serviços da comunidade quando necessário, atendimento individualizado durante todo o curso, não foi identificada (JORGE, 1996). Destaque-se também que os estudantes de Enfermagem, ao iniciarem o curso, enfrentam a sensação de independência, pois saem de casa e têm que administrar seu dia a dia, ou mesmo as atividades e o convívio com colegas independentes estimulam cobranças, muitas vezes colocando em reavaliação sua opção profissional, o que fazem constantemente, reafirmando sua escolha ou criando sérias dúvidas a esse respeito. Percebe-se que, em um processo educacional reflexivo, todas as etapas evolutivas da experiência dos indivíduos são sujeitas a modificações em sua estrutura de pensar e agir, pois o processo proporciona às pessoas a oportunidade de discutirem sobre sua atividade de vida diária ou de trabalho. Assim, elas são capazes de refletir sobre suas experiências e buscar a dimensão de sua própria vida em sua prática de trabalho; de passar as significações de experiências para contextos mais gerais como o social e o econômico; de tomar consciência das relações sociais de dominação extrapoladas por todos os segmentos do seu mundo. Dessa maneira, essas pessoas sentem-se mais capazes de ser o que são, tomando consciência de sua própria condição humana e social, adquirindo forças para superar as dificuldades perante o mundo, motivadas pela compreensão da situação vivenciada (JORGE, 1996). Como boa parte da nossa população, os alunos-trabalhadores têm uma repetida história de destituição de direitos sociais. Frequentaram muitas vezes escolas autoritárias nas quais o professor tudo sabia, ou nas quais processos formativos enfatizando a técnica em detrimento do resto ajudaram a nutrir uma consciência ingênua sobre o mundo e sobre o lugar que nele se ocupa. Não sabemos completamente quais expressões desse contexto são vividas pelos nossos alunos-trabalhadores, nem as repercussões nas condições reais de trabalho e na forma de cuidar. Estamos buscando conhecer o que é particular a eles sem deixar de compreendê-los dentro da realidade em que vivem – para planejar e organizar o trabalho pedagógico com significado social será preciso desvendar esse e outros “segredos” (BOMFIM, 2009). Falta de recursos financeiros para transporte e material didático Se o desemprego pode ser considerado como um estímulo para a profissionalização, por outro lado ele se torna uma barreira, tendo em vista a falta de recursos para custear as despesas de transporte, alimentação, materiais, 258 entre outras. Os baixos salários indicaram as inúmeras dificuldades que esses alunos precisaram enfrentar para estudar. A questão salarial também pode ter sido um dos aspectos motivadores para que eles tivessem investido nos cursos, pois a qualificação, para a maioria deles, representou a oportunidade de aumentar seus ganhos financeiros e de melhorar sua empregabilidade. Quanto à situação empregatícia dos alunos, a maioria estava trabalhando em um emprego (61,5% da qualificação profissional como auxiliar de Enfermagem e 71,3% de complementação de nível técnico). Um dado importante a ser destacado é que 35,8% dos alunos da qualificação profissional para auxiliar de Enfermagem estavam desempregados. Isso talvez explique a relevância desses cursos para suas vidas profissionais, pois eles representam uma abertura de oportunidades para sua inserção no mercado de trabalho (OLIVEIRA et al., 2007). Cansaço físico, dificuldade de conciliar o curso com o emprego e falta de tempo para estudo Em alguns trabalhos observamos que o cansaço físico é citado como uma dificuldade na realização do curso de habilitação técnica. Muitos alunos têm jornada dupla de trabalho para compensar o baixo salário. A baixa remuneração ocasiona acúmulo de empregos, estresse, esgotamento físico e baixa motivação, fazendo com que o profissional não se empenhe em participar dos processos de atualização profissional. Quanto à carga horária de trabalho, 62,1% dos alunos informaram trabalhar de 25 a 44 horas semanais. Os alunos que já exerciam a profissão de auxiliar de Enfermagem declararam que os profissionais da Enfermagem costumam ter uma carga horária de trabalho exaustiva, com dois ou três empregos, para compensar os baixos salários (OLIVEIRA et al., 2007). O “trabalho” aparece como grande motivo de evasão dos cursos profissionalizantes de habilitação técnica de Enfermagem, seja por dificuldades em compatibilizar horários com a presença às aulas e estágios, seja pela falta de liberação, por cansaço, ou por ter conseguido trabalho em outra área (NUNES et al., 2007). O estresse gerado por diversas atividades desenvolvidas pelos alunos de Enfermagem também interfere em sua aprendizagem no período escolar. Vários alunos iniciam seus estudos trabalhando em unidades hospitalares, como demonstrado no estudo realizado por Iglesias (2002), onde comprovase que 55,5% destes alunos dedicaram menos de duas horas por semana aos estudos; 7,8% não tinham tempo para estudar; 70,5% não conseguiam manter a atenção durante as aulas, atribuindo o fato a cansaço, estresse e sonolência; e 259 50,3% saíam mais cedo da aula alegando incompatibilidade entre os horários de suas atividades. Com essa descrição nota-se que a realidade de determinados grupos de alunos de Enfermagem sofre muitas dificuldades em cumprir seus deveres escolares, interferindo na conclusão do curso. A nova realidade vivenciada pelos alunos durante a realização do curso exigiu dos mesmos mais empenho e rigor para o cumprimento de horários e para a obtenção de bons resultados, acarretando alterações psicobiológicas associadas ao estresse: foram identificadas alterações em sono e repouso, exercícios e atividades físicas, mecânica corporal, nutrição e eliminação, e em menores proporções alterações de oxigenação, sexualidade e percepção visual. Evidenciaram-se também outras alterações, como: irritação, desânimo, discussão com amigos e familiares, ansiedade e esgotamento emocional (BONTORIM; MACHADO, 2007). O trabalho em Enfermagem sempre foi marcado pela presença feminina, sendo uma das profissões mais antigas para a mulher. O estresse que acompanha a vida feminina aumenta quando a mulher se dispõe a trabalhar ou continuar seus estudos, pois além desta opção tem que educar os filhos e cuidar da casa, sempre administrando os conflitos de inflexibilidade nos horários e nas condições do trabalho. Tal realidade exige dos docentes uma postura de melhor acolhida desse aluno, não limitando sua prática apenas em transmitir ou informar, mas sim auxiliar o discente a refletir e intervir na realidade com criatividade e criticidade (NUNES, 2006). Para o aluno em Enfermagem, faz-se necessário um acompanhamento que o auxilie no autoconhecimento, que trabalhe com seus medos e ansiedades, pois todo processo de cuidar do outro requer um equilíbrio emocional tanto para si como para o ser que será cuidado. Em estudos foi constatada nos alunos de Enfermagem a presença de depressão em 41,41%, variando de grave a leve, onde os sintomas mais frequentes foram autoacusação, irritabilidade e fadiga (BONTORIM; MACHADO, 2007). As situações conflitantes enfrentadas durante a formação em Enfermagem tanto pelos discentes como por docentes podem gerar processos que potencializam qualidades ou processos destrutivos, sendo assim a justificativa para o desenvolvimento do cuidado de si, que será o precedente da condição para o cuidar de outros. Há necessidade urgente de valorização dos alunos de Enfermagem; precisamos despertar nos alunos, por meio da valorização pessoal, sua satisfação em relação a todos os aspectos que influenciam no bom aprendizado (KLUTHCOVSKY, 2007) O cansaço ocasionado pela carga horária destinada ao estágio e a estudos 260 em sala de aula, assim como a desarmonia no ambiente de aprendizagem e as inseguranças, são apontados nos estudos como fatores desestimulantes para o aluno. Vale ressaltar que a carga horária cumprida pelo aluno ocorre esporadicamente, quando há necessidade de realizar o estágio supervisionado no período da manhã e as aulas práticas no período da tarde. Estas últimas são realizadas regularmente nos mesmos dias da semana. Há indecisão, ansiedade, desânimo em ir ao estágio devido à sensação de cansaço no dia anterior, baixa autoestima, sentimento de insegurança, incapacidade. Os alunos relatam uma enorme vontade de não ir para o hospital, devido à insegurança. Os impactos das experiências relatadas pelos alunos sobre sua motivação podem em parte ser explicados pelo fato de que grupos jovens geralmente são depositários das esperanças pelas partes fragmentadas das instituições, que constituem-se ao mesmo tempo ambiente propício para o trânsito de suas fraquezas e aspectos não resolvidos. O cuidado com a dimensão grupal é fundamental para o fortalecimento dos indivíduos, uma vez que a colaboração e a compreensão fortalecem os vínculos existentes, gerando diminuição do estresse (STUTZ; JANSEN, 2006). A instituição educacional precisa oportunizar tanto para docentes como para os discentes vivências para minimizar o estresse, que exercitem o respeito, a amorosidade e os sentimentos de solidariedade, criando espaços promotores de saúde e qualidade de vida. Outras ferramentas foram mensuradas para a aplicação no desenvolvimento da qualidade de vida do aluno. O autoconhecimento auxilia o indivíduo na percepção das suas capacidades e de suas habilidades, resultando em grande conhecimento de sua dimensão humana. Somente por intermédio dos bons sentimentos desenvolvidos entre discentes e docentes, onde o respeito seja aplicado entre ambos, surgirão melhores resultados na qualidade de vida dos alunos de enfermagem (BONTORIM; MACHADO, 2007). Dificuldade no aprendizado, material didático de difícil compreensão, didática utilizada pelo professor e falta de preparo do professor A aprendizagem está envolvida em múltiplos fatores, que se implicam mutuamente e que, embora os possamos analisar em separado, fazem parte de um todo que depende, quer na sua natureza, quer na sua qualidade, de uma série de condições internas e externas ao sujeito. O processo de aprender é pessoal, de construção e partilha de experiências passadas que influenciam as aprendizagens futuras. A resposta do aluno perante situações de saúde/ 261 doença tem por base a biografia e a personalidade dele, mas também o tipo de relação que os alunos estabelecem com os docentes e os profissionais no exercício da profissão é fundamental para minimizar o medo e a angústia e melhorar a segurança, a autoestima e o autoconceito, aspectos fundamentais para quem tem que estabelecer relação de ajuda. A relação professor/aluno em contexto clínico, a qualidade da relação e a afetividade são para a aprendizagem clínica do estudante. O sujeito tem sua modalidade de aprendizagem e os seus meios para construir o próprio conhecimento, e isso significa uma maneira muito pessoal para se dirigir e construir o saber. Porém, quando falamos em aprendizagem, não podemos relacionar o problema simplesmente ao aluno, pois a aprendizagem não é um processo individual, ou seja, não depende só do esforço de quem aprende, mas sim de um processo coletivo. A escola, como parte da sociedade, enfrenta significativos desafios e, para atingir os objetivos educacionais, necessita dar um suporte técnico e emocional ao docente, uma vez que se depara com situações que exigem dele, enquanto profissional, uma sólida formação acadêmica, tanto inicial quanto continuada. A aprendizagem, porém, não se baseia nas habilidades pedagógicas do professor, nem no conhecimento que tem sobre o assunto, nem em seu planejamento curricular, nem na utilização que faz dos recursos audiovisuais, nem em suas predileções e exposições, nem em abundância de livros, embora em certas ocasiões cada um desses itens possa ser utilizado. A aprendizagem se baseia na qualidade de atitudes que existem no relacionamento pessoal entre o professor (facilitador) e aquele que aprende (o aluno). Para que o processo ensino-aprendizagem ocorra de forma adequada e eficiente é necessário que haja respeito, ou seja, que o aluno respeite o docente, realizando as atividades propostas, e que o docente respeite o aluno, compreendendo seu momento de aprendizado, elaborando métodos que incentivem esse processo e respeitando-o como indivíduo em formação. Sabendo-se que o docente deve ser mediador do processo ensino-aprendizagem, o mesmo deve proporcionar aos alunos métodos de aprendizado que, no caso em questão, beneficiarão os dois lados. Portanto, cada professor é único em sua forma de montar estratégias de ensino que terão influência positiva ou negativa na apreensão de conhecimento pelo aluno em sala de aula. O docente deve ser o facilitador do processo de aprendizagem; ele deve criar oportunidades para as situações de aprendizagem, um oportunizador de experiências intensas e adequadas, capaz de despertar no aluno a motivação para a pergunta, para uma atitude investigativa que busque soluções e que fundamente sua intervenção na realidade. O aluno espera que o docente seja calmo e compreensivo, que entenda suas falhas por estar 262 começando, que comente seus erros particularmente, para que eles não se repitam (ZANI; NOGUEIRA, 2006). Os procedimentos didáticos implementados nos contextos de formação muitas vezes desconsideram as experiências e os saberes laborais construídos ao longo do processo de vida. A predominância de práticas diretivas centradas na ação docente exacerba o cansaço daqueles que acumulam jornadas de trabalho às quais é somada a “jornada de estudo”. Ainda, o enfoque na apropriação de conhecimentos leva a enfatizar atividades memorísticas em detrimento de atividades escolares e significativas – sem pretender propor uma generalização grosseira, essa realidade não pode ser negada diante da constatação de que as dificuldades relativas ao processo de ensino e aprendizagem constituíram a quarta razão a ensejar o abandono dos estudos (NUNES et al., 2007). O aluno, para aprender, precisa realizar um trabalho cognitivo de análise e revisão de seus conhecimentos, a fim de que os conhecimentos sejam realmente significativos e propiciem nível mais elevado de competência. A influência do docente e de sua intervenção pedagógica é que torna significativa a atividade do aluno, porém quando a didática imposta por alguns docentes não motiva o aprendizado, ela é vista pelos alunos como referência negativa ao seu aprendizado (ZANI; NOGUEIRA, 2006). Relação com o professor e colegas A qualidade no ensino tem ocupado, nos últimos anos, um lugar de destaque no discurso de agentes da educação, sendo o bom relacionamento professor/aluno um dos principais elementos discutidos como garantia da qualidade do ensino. No decorrer da vida profissional, o professor verifica que o relacionamento entre ele e o aluno mostra-se um fator primordial no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem, com destaque para a questão da disciplina em sala de aula. Por outro lado, professor e aluno parecem divorciados: o professor sente dificuldade em estar se relacionando com os alunos de forma aberta e conveniente; alguns são autoritários e tradicionais, desejam que os alunos sejam disciplinados, seguindo um currículo preestabelecido. Conforme Fleuri (1997), a prática pedagógica autoritária acaba gerando situações de conflito, prejudicando o relacionamento entre professor e aluno. O primeiro faz da sala de aula um local onde tudo é estabelecido por ele e pelas normas da instituição, acatadas passiva e comodamente, vendo o aluno como um receptor de conhecimentos; nesse caso não há espaço para discussão, nem momento para esclarecimento de dúvidas (CABRAL; CARVALHO; RAMOS, 2004). A dificuldade de relacionamento entre os alunos foi o fator que recebeu 263 número significativo de referências negativas na percepção docente. Sabe-se que o ser humano não foi criado para viver sozinho, necessitando conviver com outros seres humanos; porém, também se deve ter a consciência que a convivência em grupo é complexa e difícil, pois se deve lembrar de que o ser humano é um ser individual com opiniões, crenças e conflitos próprios. No curso de Enfermagem, a interação entre as pessoas de um grupo é de suma importância, uma vez que o aluno de Enfermagem deve ter consciência de que, para executar de forma adequada as atividades de sua profissão, terá que trabalhar constantemente em grupo e, para tal, terá que ocorrer um bom relacionamento. A interação oferece condições para troca de experiências e transformação do conhecimento. A comunicação serve de meio para que essa interação se efetue. O ensino é parte importante desse evento quando permite que o aluno seja participante de seu próprio desenvolvimento (ZANI; NOGUEIRA, 2006). O processo de aprendizagem vivenciado pelos alunos do curso técnico em Enfermagem é de tal modo influenciado pelo relacionamento com os profissionais da área, pacientes e seus familiares e professores, que se encontra na raiz da maioria dos problemas apresentados por eles, gerando grande desconforto e conflitos com os quais têm de lidar cotidianamente. Nota-se ainda que não há preparo e interesse de fato das equipes de trabalho, no interior das instituições de Saúde, para contribuírem de forma efetiva na formação do aluno, de modo a diminuir os impactos sofridos pelos aprendizes, ao se depararem com a complexidade que permeia o processo do cuidar (STUTZ; JANSEN, 2006). A formação de vínculos saudáveis no âmbito das relações interpessoais sem dúvida alguma contribui para a diminuição do estresse ocasionado pelas novas experiências, para o controle da ansiedade diante das dificuldades apresentadas e para a construção da identidade profissional, a fim de que o aluno reconheça-se como parte do grupo existente e não alguém à margem dele (STUTZ; JANSEN, 2006). Dentre os desafios, percebemos que a interação professor/aluno em sala de aula é de grande importância, por observar a interferência direta dessa interação nos resultados do processo ensino-aprendizado. Assim, reflexões a respeito do assunto aproximaram-nos das estratégias de ensino, sendo a escolha dessas ações diretamente ligadas à intenção educativa e aos resultados do processo ensino-aprendizagem, proporcionalmente melhores à medida que houver melhor interação professor/aluno, aluno/aluno e aluno/consigo mesmo, em sala de aula, para o desenvolvimento das atividades didático-pedagógicas. 264 Mudanças na prática pedagógica promovem, a nosso ver, uma nova relação aluno/professor e um processo ensino-aprendizagem inovador e dotado de necessidades que o ensino precisa prover para atender a essas exigências do mundo do trabalho, históricas, políticas, filosóficas e sociais que se darão nas relações entre todos (OKANI; TAKAHASHI, 2006). Portanto, as estratégias de ensino são ações didático-pedagógicas intencionais utilizadas para que se possam obter melhores resultados no processo ensino-aprendizagem, e envolvem as relações professor/aluno, aluno/aluno e aluno/consigo mesmo, imprescindíveis para o desenvolvimento cognitivo de aprender e ensinar. A interação entre professor e aluno em sala de aula é carregada de significados e valores, de intencionalidades, de subjetividades próprias de cada olhar, refletindo e garantindo no processo ensino-aprendizagem um olhar especial às estratégias de ensino, que, a nosso ver, são o “pano de fundo” que envolve todo o enredo, no qual contracenam os atores da educação (OKANI; TAKAHASHI, 2006). A educação é capaz de transformar a realidade, a partir do ser humano nela envolvido; e, principalmente, a postura futura dos alunos remete diretamente ao modelo formador e à relação professor/aluno no processo ensino-aprendizagem, de forma que, se há desejo de que o profissional de Enfermagem se forme para o SUS, de maneira humanizada e buscando a contextualização junto à realidade dos usuários do Sistema, é fundamental que a relação docente/discente reflita esses anseios em um novo modelo formativo. Ressalta-se também que, nesse universo conceitual, a historicidade e a postura dos diversos atores envolvidos no processo estão implicadas no que se produz do processo ensino-aprendizagem, de forma que a educação não pode ser tomada como redentora dos problemas da realidade. Longe de encarar a questão de maneira reducionista, Paulo Freire preconiza o distanciamento dessa perspectiva reducionista e ingênua, para o desenvolvimento de uma visão crítica do processo, assim como a contextualização de fato, pautada nas diversas dimensões e atores implicados no contexto (PIRES; BUENO, 2009). Problemas pessoais Como se pode perceber, tanto entre os alunos do curso de auxiliar como entre os do técnico prevaleceram como motivos de dificuldades “problemas pessoais”, dentre os quais são citados “gravidez”, “casamento” e “cuidado com os filhos” (NUNES et al., 2007). Observa-se que o predomínio do sexo feminino referenda uma das 265 características socio-históricas e sociais da profissão. A enfermagem brasileira organizada e estruturada pelo paradigma nightingaleano desenvolveu-se como uma profissão feminina, assim reconhecida em qualquer espaço da sociedade. As próprias escolas na década de 1970 que selecionavam seus candidatos aceitavam apenas mulheres. Ainda nos dias de hoje há presença maciça das mulheres no exercício dessas funções; com isso, elas têm o acúmulo de atividades que interfere na realização do curso (NUNES et al., 2007). Estrutura e recursos da escola As dificuldades em relação à estrutura e a recursos da escola são referidas pelos alunos durante a realização do curso, principalmente relacionadas ao campo de estágio, com uma limitação desse campo como processo formativo. Nas supervisões de estágio foram identificadas diversas deficiências relacionadas ao processo de formação, como: a inadequação de alguns campos de estágio, principalmente considerando-se a importância das vivências profissionais exigidas para a formação do auxiliar e do técnico em Enfermagem; o descumprimento do cronograma de estágio por parte de algumas escolas; o desconhecimento do projeto pedagógico das escolas, acentuando a insegurança dos sujeitos envolvidos, coordenadores, professores e alunos, quanto às formas de ação para a viabilização do curso; falta de integração entre os docentes responsáveis pelo desenvolvimento dos temas teóricos e os responsáveis pelo acompanhamento das práticas; domínio parcial do significado e da forma de aplicação da metodologia da problematização e incerteza acerca das formas de registro do processo de avaliação (NUNES et al., 2007). A presença do professor como suporte para o aluno durante a realização das atividades em campo de estágio é importante requisito no processo de aprendizagem. Além disso, a observação dos alunos pelos professores possibilita um conhecimento das dificuldades apresentadas pelos mesmos, permitindo o planejamento de estratégias de auxílio a eles e acompanhamento de sua evolução (STUTZ; JANSEN, 2006). Os espaços formativos precisam propiciar condições de participação, de diálogo, de negociação e de intervenção, o que demanda a implementação de alterações metodológicas e procedimentais, favorecendo experiências de vida que contribuam para o trabalhador formar sua personalidade, seu capital de conhecimentos, suas competências, sua relação com o saber e sua identidade (NUNES et al., 2007). 266 Duração do curso e aprofundamento do conteúdo Há uma compreensão por parte dos alunos que a duração do curso em período curto restringiu o aprofundamento dos conteúdos aprendidos, além da prática do campo de estágio. Algumas técnicas por parte dos alunos deveriam ter sido mais exercitadas e acompanhadas por um enfermeiro especialista. O curso técnico de habilitação em Enfermagem foi planejado para ser concluído em dez meses, tendo uma carga horária semanal de vinte horas, totalizando setecentas e cinquenta (750) horas ao final do curso. Entretanto as atividades previstas para esses cursos foram intensificadas, em virtude do limite disponibilizado pelo Ministério da Saúde; desta forma, as aulas teóricopráticas eram realizadas de segunda a sexta-feira e eventualmente aos sábados. O excesso de atividades vivenciadas pelos alunos-trabalhadores dificultou o seu processo ensino-aprendizagem, haja vista que acumularam as atividades profissionais com as educativas, não sendo liberados em alguns momentos pelos gestores (COSTA et al., 2009). CONSIDERAÇÕES FINAIS O ensino no curso de habilitação técnica em Enfermagem deve propiciar aquisição de conhecimentos e mudanças de comportamentos, sem perder de vista a vinculação entre teoria e prática. Para isso, o docente precisa refletir acerca de suas atitudes, para valorizar o aluno como um ser em formação, respeitar suas experiências de vida e compreender os momentos de dificuldades por ele enfrentados, contribuindo para uma boa formação. Durante a execução deste trabalho, foram identificados os aspectos relacionados às dificuldades no processo ensino-aprendizagem do curso de habilitação técnica de Enfermagem, sendo obtido um número significativo de referências no que se refere ao relacionamento interpessoal e ao preparo do docente. Assim, evidencia-se que os professores apresentam dificuldades para lidar com o despreparo e até mesmo com a imaturidade dos alunos durante sua formação no curso de Enfermagem. Isso se torna aparente em decorrência de o aluno atribuir à conduta do professor grande parte de suas angústias e medos visto que a relação professor/aluno deve ser considerada como pontochave em um processo em que se percebem pessoas distintas, com experiências únicas, sendo aproximadas com o objetivo de troca de conhecimentos, em ambientes e momentos específicos. Os alunos consideram que o processo ensino-aprendizagem em sala de aula pode ser satisfatório quando ocorre qualidade nas relações humanas; os alunos destacam os professores que dão 267 atenção, escutam, são honestos e respeitam o outro. Os professores de Enfermagem têm formação generalista e não têm preparo pedagógico para um desempenho satisfatório na docência. Conforme o método do arco o docente deve observar os problemas, identificar os pontos-chave, ter embasamento teórico, levantar hipóteses para uma solução e procurar aplicar na prática. O curso de formação docente em habilitação técnica proporcionou para nós um preparo para melhorar a prática de ensino, estimulando uma melhor participação do aluno no processo de formação. Procuramos assim integrar essas reflexões em nossa atuação pedagógica, para de melhorar o aprendizado desse aluno durante a realização do curso de habilitação técnica em Enfermagem. Concluímos que as dificuldades não são somente dos docentes e discentes, mas do contexto em que o aluno está inserido, em relação à escola, ao ambiente familiar, ao ambiente social, cultural e a vivências trazidas por esse aluno. Temos que ter uma visão ampla de cada aluno individualmente, para seu processo educacional e formativo. REFERÊNCIAS BOMFIM, M. I. R. et al. Formação em educação profissional técnica na área da saúde: a organização pedagógica do trabalho docente em saúde. Rio de Janeiro: Fundação Osvaldo Cruz/ Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Educação a Distância, 2009. Texto de apoio CT3, Unidade 1, p. 142. BONTORIM, A.; MACHADO, R. Qualidade de vida dos alunos de cursos de graduação em enfermagem: revisão da literatura. Trabalho apresentado no Encontro Latino Americano de Iniciação Científica, 13.; Encontro Latino Americano de Pós-Graduação, 9., Universidade do Vale do Paraíba, 2007. CABRAL, F. M. S.; CARVALHO, M. A. V.; RAMOS, R. M. 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Revista LatinoAmericana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 14, n. 5, set./out. 2006. 269 270 ATIVIDADES DE ARTICULAÇÃO COMO INSTRUMENTOS MEDIADORES DE REFLEXÃO E DISCUSSÃO DA PRÁTICA DOCENTE: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA Aluno: Alexandre Ming Orientadora: Claudia Mara de Melo Tavares Resumo O objetivo deste estudo foi relatar a experiência da utilização das atividades de articulação (AA) como instrumentos mediadores de reflexão e de discussão da prática docente. Trata-se de um relato de experiência, no qual foram apresentadas, discutidas e analisadas oito AA realizadas durante o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, coordenado pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ), em articulação com Instituições de Ensino Superior (IES) do Estado de São Paulo. O estudo foi desenvolvido na 1ª. Turma do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente da Universidade de São Paulo – NIAD USP/SP, no período defevereiro a novembro de 2010. Esta experiência permitiuidentificar e reconhecer a importância das AA, valorizando diferentes aspectos do cotidiano docente; possibilitando a transformação dos saberes, antes, estruturados em compartimentos fechados, em novas formas de pensar, sentir e agir em saúde, evitando-se, assim, a fragmentação dos saberes docentes e dos alunos-trabalhadores do SUS. Descritores: enfermagem; capacitação profissional; docente de enfermagem; ensino; aprendizagem. Introdução O Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde é coordenado pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), em articulação 271 com instituições de ensino superior (IES) do Estado de São Paulo. Em cada uma das IES funciona um Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (Niad) composto por tutores e alunos, estes profissionais da área da saúde graduados e já integrados a instituições que qualificam trabalhadores do SUS(1). O curso confere o título de especialista na docência em educação profissional técnica de nível médio na área da Saúde e destina-se a profissionais graduados nas subáreas de Biologia, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Medicina, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia e Serviço Social, além de profissionais graduados em outras áreas que atuam nos cursos de educação profissional em saúde(1). Trata-se de um curso de pós-graduação lato sensu, desenvolvido a distância, com momentos presenciais obrigatórios, com duração de até dez meses. Pretende formar especialistas para atuar na qualificação inicial e continuada de trabalhadores e na educação profissional técnica de nível médio na área de saúde, atendendo, assim, não só a uma exigência legal, mas aos compromissos sociais inerentes da profissão. Possui ainda como importante e inovadora característica sua natureza interdisciplinar e a consequente contribuição que potencialmente gera para uma nova configuração do processo de trabalho em saúde e do modelo de produção do cuidado. A principal referência do curso é o significado social da ação educativa no âmbito da saúde pública; exigências formativas compatíveis com um curso de pós-graduação lato sensu, isto é, de especialização, com 540 horas de carga horária total de estudo, sendo computados os momentos de estudo individual e coletivo, a participação nas atividades realizadas no ambiente virtual de aprendizagem (AVA), a elaboração e a apresentação do trabalho de conclusão de curso (TCC), a presença nos encontros no Niad e as demais atividades presenciais previstas. Organização curricular do curso A organização dos componentes curriculares do curso tem como eixo a necessidade de oferecer elementos que possibilitem a compreensão do processo histórico de defesa da saúde pública e sua relação com o processo mais amplo da constituição do Estado e da sociedade no Brasil. Abrigados por essa compreensão estão presentes, nos componentes curriculares, sob diferentes formas, a análise de questões relativas aos direitos sociais; modelos de proteção social, cidadania, saúde e desenvolvimento; saúde e democracia; 272 reforma sanitária; SUS; participação e controle social; igualdade, integralidade e equidade; universalidade e descentralização e força de trabalho em saúde. Tendo por base esse eixo estruturante, os conteúdos do curso se distribuem por meio três complexos temáticos (CTs), inspirados nas ideias do educador Moisey Pistrak(2), voltados para novas formas de pensar, sentir e agir em saúde, correspondendo a três cadernos didáticos, sendo eles: CT1 = Trabalho, saúde e educação(3); CT2 = O SUS e os processos de trabalho em saúde(4) e o CT3 = A organização pedagógica do trabalho docente em saúde(5). Esse modelo de organização curricular se justifica pela necessidade de superar a compartimentalização e a fragmentação do conhecimento, próprias de currículos baseados apenas em disciplinas; para poder proporcionar ao aluno-docente, em formação, uma visão abrangente do processo educativo, englobando suas diversas dimensões e unificando a compreensão, no interior do currículo, do que seja a formação dos diferentes profissionais da área da saúde e para garantir, ao longo de todo o processo de formação, a necessária articulação entre teoria e prática. Os CTs são constituídos de bases conceituais e de atividades de articulação (AA) que, juntas, compõem o itinerário formativo obrigatório em cada CT. Essas AAs foram realizadas e apresentadas à tutoria sob a forma de relatório de investigações, planejamentos, análise de documentos e debates em salas de aula. Este artigo se justifica à medida que o processo permitiu uma rica oportunidade de reflexão sobre a minha prática docente, e trata-se do relato de minha experiência, ou seja, minha imersão nos conteúdos dos CTs e nas oito AAs promovidas durante o curso desenvolvido na 1ª Turma do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente da Universidade de São Paulo – Niad USP/SP. Esta experiência permitiu, de forma clara, identificar e reconhecer a importância das AAs, valorizando diferentes aspectos do cotidiano docente; possibilitando a transformação dos saberes, antes estruturados em compartimentos fechados, em novas formas de pensar, sentir e agir em saúde, evitando-se, assim, a fragmentação dos saberes docentes e dos alunostrabalhadores do SUS. Objetivo Relatar a experiência da utilização das atividades de articulação como instrumentos mediadores de reflexão e de discussão da prática docente. 273 Metodologia Trata-se de um relato de experiência sobre a utilização das atividades de articulação como instrumentos mediadores de reflexão e de discussão da prática docente. Foram relatadas, discutidas e analisadas oito AAs realizadas durante o curso, no período de fevereiro a novembro de 2010, as quais se encontram individualmente descritas(6). Resultados A realização das atividades de articulação Resgatando as oito AAs realizadas, entendo que fui motivado a desenvolver atividades de investigação, de prática pedagógica, de planejamento e de elaboração do meu inventário pessoal. Algumas AAs foram realizadas individualmente e outras realizadas em grupo, em um único momento ou em dois momentos articulados, dependendo da atividade, onde também foi necessário recuperar a AA já realizada para elaborar a atividade seguinte. A esse movimento atribui-se o sentido amplo da palavra articulação, por meio do qual foi possível unir/articular experiências anteriores com novos saberes. No CT1, buscamos olhar para o embate de forças e sujeitos sociais atuando contra ou a favor de um ou outro SUS, resultando em um processo não linear que produziu avanços e recuos, gerou conquistas e estabeleceu novos obstáculos que precisam ser enfrentados para avançarmos na direção de um “SUS pra valer”. Por intermédio das AAs realizadas em tal CT ficou evidente a importância de que esse enfrentamento é dos profissionais e trabalhadores da saúde, dos usuários, dos sindicatos, da escola de educação profissional, dos movimentos sociais, das universidades, dos conselhos municipais e da sociedade como um todo. Partindo desse entendimento e, tendo por base que as reações das pessoas são as mais diversas, ao realizar a AA1, onde individualmente investiguei o prazer e o sofrimento de alguns colegas docentes e profissionais da saúde que atuam na educação profissional, foi possível identificar a importância da valorização das experiências dos alunos e dos docentes e submetê-las à análise crítica, para juntos compreendermos os caminhos dos alunos-trabalhadores, dos docentes-trabalhadores e dos usuários dos serviços de saúde. Analisando e compreendendo os caminhos que percorremos e, objetivando os que iremos percorrer, estaremos nos permitindo visualizar, de forma ampla, a sociedade em que vivemos e trabalhamos e, nesse exercício 274 diário de articulação, como docentes, iremos nos afastar das propostas pedagógicas que nos restringem à mera transmissão de conhecimentos. Articulando a AA1 com a minha experiência na docência, entendo que, por não valorizar a realidade explícita, o foco da minha prática pedagógica estava voltado para questões e abordagens sem relevância, visto que não pertenciam aos contextos existencial e profissional do aluno, e que, sem terem o interesse despertado, o aluno e o docente não chegam ao prazer do processo de ensino-aprendizagem. O prazer que vivenciei por muitas vezes e, até hoje o faço, é de perceber que na minha trajetória na docência, mesmo utilizando práticas pedagógicas tradicionais, consegui atingir muitos alunos-trabalhadores. De uma forma ou de outra, talvez sem compreender o real sentido da expressão “atividade de articulação”, consegui positivamente estimular meus alunos à reflexão e expor meus ideais, dentre eles a valorização e a atenção digna ao Ser Humano, razão do nosso trabalho e da assistência, seja da enfermagem ou da educação Ainda no CT1, em grupo, realizei a AA2 com o objetivo de conhecer melhor meus próprios alunos. Foi uma atividade que forneceu valiosos subsídios ao planejamento de meu trabalho como professor, o que exigiu um tempo maior para a sua realização. A necessidade da investigação realizada na AA2 foi a de saber quem eram os alunos, em que condições trabalhavam e que sentido davam ao trabalho em saúde no SUS. Durante a realização da AA2 pude refletir sobre a importância de aprofundar o conhecimento sobre meus alunos, encarando-os como sujeitos produtores de cultura e formadores de opinião, com a intenção de rever minhas práticas como professor. Para realizar a AA2, optei pela elaboração de um questionário com perguntas fechadas e abertas e considerei as dificuldades que o alunotrabalhador teria para escrever suas respostas ou assinalar a resposta com a qual mais se identificaria. Embora a AA2 tenha sido realizada em grupo, analisei os questionários individualmente e, tentando não perder de vista a finalidade da investigação proposta, trabalhei quatro eixos: perfil, formação, informações profissionais e o significado do trabalho no SUS. Criei uma tabela com os dados quantitativos, e os dados qualitativos obtidos sofreram uma análise crítica e minuciosa. Articulando e analisando os dados quantitativos com os qualitativos obtidos constatei que vários profissionais e usuários, por não compreenderem a visão do SUS, acabam desconhecendo ou mal interpretando seus direitos e deveres. Está nas mãos dos professores e dos alunos-trabalhadores a necessidade de articulação e ligação da teoria à prática, para redefinirmos a respeito da 275 forma de trabalho no SUS e assumirmos nossa parcela de responsabilidade, objetivando à melhoria na assistência à saúde. Ainda na AA2, tive oportunidade de propor o enfrentamento da programação e da realização de oficinas/dinâmicas, com professores, com alunos e com ambos, para realizarmos um brainstorming, ou seja, por meio da “tempestade de ideias”, explorarmos a potencialidade criativa dos indivíduos e do grupo como um todo, para identificarmos as situações problemáticas da nossa realidade diária, e, por meio da criatividade em equipe, evoluirmos nossas ideias até a solução efetiva. Estudar, compreender os assuntos abordados e realizar as duas AAs propostas no CT1 contribuiu muito para a minha formação e para o desenvolvimento de minhas atividades enquanto professor e enquanto enfermeiro assistencial, pois permitiu visualizar outras dimensões que estavam obstruídas em virtude do executar de atividades repetitivas e muitas vezes desenvolvidas sem refletir sobre o objetivo a ser alcançado. Além de aprofundar-me no conhecimento, fui estimulado a desenvolver, utilizar e respeitar o senso crítico, o que despertou a vontade de prosseguir. O CT2 bem como o CT1 ofereceram elementos para a reflexão sobre o porquê, o para que e em favor de quem se formam trabalhadores do SUS, nas diferentes especificidades. O CT2, por meio das AAs, trouxe conceitos que ajudaram a interrogar e a refletir sobre a realidade vivida nos espaços de saúde. Para realizar a AA3, uma atividade de planejamento de prática pedagógica, foi necessário articulá-la com a profunda reflexão sobre a luta pela saúde e por um “SUS pra valer”, sendo realizada em dois momentos, sucessivos e articulados. No primeiro momento foi realizado um debate em sala de aula, na escola em que atuei como professor, com a participação dos alunos do Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem; no segundo momento foi realizada reunião com a participação de alguns docentes da escola, inclusive alguns, na época, também alunos dessa Formação Docente, e coordenadores do Curso e da Instituição de Ensino já mencionada. Articulando o primeiro com o segundo momento, surgiram comentários, opiniões e reflexões que foram analisados individualmente. Classifico o debate como rico e proveitoso, principalmente pelos assuntos abordados e pelo nível das discussões e argumentações, onde discutimos sobre a necessidade de sairmos da posição de ouvintes e atuarmos como participantes na tomada de decisões. Os que participaram do debate acreditaram que essa participação ativa é um dos caminhos para tentar reverter 276 as falhas do SUS na região onde realizamos o debate. Na reunião discutimos os dois objetivos propostos pela AA3, ou seja, discutir as principais tendências dos debates realizados e a importância de aprofundá-las nos diferentes cursos oferecidos pela escola e, decidir, coletivamente, formas de divulgar as questões surgidas nos debates para além dos muros da escola, identificando e envolvendo outros atores sociais nessa discussão. Articulando a reunião com o debate, compreendo que é de extrema importância aprofundar os assuntos abordados, multiplicando-os entre as diferentes disciplinas/matérias estudadas no Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem, atentando para a não fragmentação do processo de ensino/ aprendizagem. Entendo que tal abordagem deve ser continuada e dinâmica, para, por exemplo, inserir o real significado dos princípios do SUS na realidade da comunidade local, ou seja, utilizar estratégias de ensino para transportar/ articular a teoria à realidade de tais princípios. Ao final da AA3, concluí que, para promover e viabilizar acesso e aplicabilidade dos objetivos e princípios do SUS, temos que trabalhar com ações práticas, reais e esclarecedoras, e para isso temos que dinamizar, reformular e inovar as estratégias de ensino para a orientação e para a divulgação. Os resultados da AA3 apontaram para uma necessidade urgente de reconstrução de saberes sobre o SUS, bem como da forma de trabalhar com esse conteúdo na formação dos profissionais de saúde. As AAs 4, 5, 6, 7 e 8 foram realizadas durante os estudos do CT3, onde tudo o que foi estudado durante o CT1 e o CT2, acrescido do material do CT3, referenciaram minhas escolhas pedagógicas como professor em educação profissional técnica na área da saúde. Recuperando algumas das principais ideias-chaves desenvolvidas no curso e, analisando com cuidado a educação profissional técnica na área da saúde, as convicções da prática educativa voltada para a transformação e as reflexões permanentemente necessárias, desenvolvi com clareza as cinco AAs propostas no CT3. Ao elaborar a AA4, que hoje penso que deveria ser proposta e realizada como última AA do Curso, fui instigado a refletir sobre o meu inventário para buscar algumas respostas para alguns questionamentos, como, por exemplo: o que sou realmente como professor? O que me fez assim? Hoje tenho por certo que, ao término do curso e finalizando-o com a realização do tema proposto pela AA4, ou seja, construir o próprio inventário, tal construção seria mais ampla e mais crítica, pois teríamos as demais conclusões e opiniões que elaboramos e atentamos durante a realização das AAs 5, 6, 7 e 8. Na AA5, uma atividade de investigação e planejamento da prática 277 pedagógica, foi solicitado à direção da escola o plano de curso em que na época eu atuava, no que fui atendido prontamente pela coordenadora do curso. Ficou evidente que tal solicitação não era, até aquela época, uma prática constante em tal escola. Na realidade, após quase quatorze anos atuando como professor na área da saúde, nos diferentes níveis do ensino profissionalizante, a AA5 realizada permitiu, enquanto docente, o meu primeiro contato com um plano de curso. Como coordenador de curso técnico, já havia entrado em contato com o plano de outra instituição de ensino, porém não tive a oportunidade de desenvolver minhas habilidades como docente. Analisando o plano de curso em que eu atuava, constatei as ideias pedagógicas assumidas pela escola e compreendi que elas comungam com os princípios do SUS, onde no perfil do profissional egresso se ressalta, em várias passagens, o conhecer de seus direitos e deveres como cidadão e como profissional, e, por meio de tais conhecimentos, defenderem os direitos e a cidadania dos indivíduos sob seus cuidados. Identifiquei no plano analisado a pedagogia histórico-crítica, a qual estimula a atividade e a iniciativa dos alunos, sem abrir mão da iniciativa do professor. Também fui motivado a favorecer o diálogo dos alunos entre si e deles com o professor, sem deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente. Atuando como docente em tal plano de curso, fui provocado a considerar e ouvir os interesses dos alunos-trabalhadores, respeitando os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, sem perder de vista a necessária sistematização lógica dos conhecimentos pela escola e definir o trabalho educativo como uma produção direta e intencional. Para realizar a AA6, uma atividade de planejamento da prática pedagógica, resgatei o plano de curso citado. Analisando a forma de avaliação do aluno, constatei que ela é abordada no sentido amplo da palavra, onde identifiquei que está presente em vários momentos e realmente se manifesta na forma educativa, configurando-se como processo pedagógico que reflete as especificidades próprias do nível e modalidade de educação em que se realizava. Lendo o plano de curso e comparando-o com a prática em que fui capacitado pela escola, a avaliação do processo formativo desenvolvido na época era executada e respeitada como um processo contínuo e cumulativo, tendo por objetivo acompanhar e avaliar o desenvolvimento global do aluno, o aperfeiçoamento do processo ensino-aprendizagem e sua prática profissional, preponderando os aspectos qualitativos sobre os quantitativos, sendo que a 278 avaliação acontecia nas aulas teórico-práticas e nos estágios supervisionados. Na realização da AA6 elaborei uma proposta sintética de avaliação pedagógica, na qual constam as “regras básicas do jogo”: são mencionados e detalhados os significados da avaliação pedagógica nos processos formativos dos alunos-trabalhadores do SUS, em favor do quê, em favor de quem, o que deve ser informado/pactuado com os alunos no início do seu processo formativo, onde se incluem critérios, resultados esperados, procedimentos e instrumentos a serem adotados. Concluindo a AA6, destaco o respeito à precisão e ao rigor na avaliação do processo formativo, pois implica um esforço que começa com a investigação e prossegue com a elaboração de instrumentos e procedimentos diversificados e que devem ser inter-relacionados(5). Para realizar a AA7, uma atividade de investigação e de planejamento da prática pedagógica, novamente recuperei o plano de curso citado, bem como os resultados das investigações já realizadas. Tal atividade teve como base o Guia Curricular da Área II do Módulo de Habilitação do Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem (7) e os seguintes aspectos foram avaliados e levados em consideração: os tipos de conteúdos que devem ser valorizados na direção da formação de um aluno-trabalhador que contribua para a consolidação de um “SUS pra valer”. Esses conteúdos devem possuir relevância social, pois, além de permitirem o estudo de técnicas, procedimentos e princípios científicos, deverão contribuir para a compreensão contextualizada dos problemas de saúde da localidade e da região, bem como a forma de avaliação proposta. Ao término da AA7, após avaliar, planejar, investigar e considerar os aspectos citados, constatei que o Guia Curricular mencionado, na época, contribuía para o aluno-trabalhador atingir o objetivo geral e os específicos contidos no início de cada unidade, onde tais objetivos articulam uma unidade com a outra, bem como uma área com a outra. Analisando a forma de avaliação diagnostiquei que ela é abordada no sentido amplo da palavra e identifiquei que o ato ou efeito de avaliar está presente em vários momentos e realmente se manifesta de forma educativa. Como síntese das minhas conclusões a respeito da AA7, nela enfatizei a necessidade constante de reforçar a importância da reflexão e da análise crítica após a conclusão de cada turma ou de cada grupo de estágio, pois, pelas razões técnicas, morais e sociais, devemos ser provocados a analisar de forma holística os impactos sociais, na educação e na saúde, causados e gerados pelos conteúdos, métodos e formas de avaliação que utilizamos, readequandoos sempre que julgarmos necessário e após análises e pareceres realizados 279 em conjunto à coordenação/direção da escola, demais docentes e alunostrabalhadores. A realização da AA8, a última atividade do CT3, foi desafiadora, visto que me motivou a utilizar diferentes estratégias de ensino e os conteúdos abordados durante o curso; foi prazerosa, pois pude exercitar/desenvolver os conhecimentos adquiridos. Foi surpreendente quando percebi que, além de ser capaz de elaborar o que foi proposto pela atividade, apontei propostas que julgo interessantes e pertinentes. Durante a elaboração da unidade de ensino, propus questões problematizadoras e suas respectivas dimensões, procurando ser o mais rico e reflexivo possível. Na metodologia de avaliação e na confecção da nota final procurei enriquecer os instrumentos de avaliação com especificidades pertinentes, com o intuito de explicitar os itens em detalhes; itens esses estudados e discutidos em vários momentos durante esse curso. Como em várias atividades desenvolvidas ao longo desse curso, hoje leio a AA8 como uma oportunidade que vai além na formação docente em educação profissional técnica na área da saúde, pois, após concluir tal atividade, destaco que também abordei os aspectos humanitários, hoje tão necessários e frágeis. Finalizando este artigo, considero agora a construção do meu próprio inventário e deixo as minhas conclusões finais articuladas à AA4, pois a julgo como ideal e oportuna. Se bem observarmos a AA4, perceberemos que ela está articulada com AA1, na qual foram abordados os prazeres e sofrimentos dos profissionais docentes na área da saúde, assuntos diretamente ligados com o meu inventário. Durante a elaboração da AA4 uma colocação feita na Unidade 1 do CT3 me proporcionou momentos de muita reflexão, visto que em minha história de vida é impossível dissociar a maneira pela qual nos formamos como profissionais do modo como atuamos como docentes. Tampouco é impossível deixar de reconhecer que, na formação acadêmica, determinados aspectos foram valorizados, outros deixados em segundo plano ou mesmo negados; basta tentar lembrar que peso teve, em nossa formação universitária, a luta pela saúde pública e o SUS. Vale destacar que todas as atividades de articulação foram apresentadas, refletidas e discutidas juntamente com o tutor no ambiente virtual, bem como com o tutor e demais colegas do curso nos encontros presenciais, situações essas que se complementaram de forma harmoniosa na formação dos alunos. Ao término desse curso e, na realização deste artigo, construir o meu próprio inventário é uma atividade oportuna e fundamental, principalmente 280 porque permite rever as condições, métodos, estratégias e técnicas que utilizei, utilizo e será possível utilizar, para empoderar os alunos do conhecimento disponível sobre o trabalho e a oportunidade de alcançarem, progressivamente, a consciência crítica das relações existentes entre o que fazem, os motivos e as consequências de seus atos. Considerações finais Esta experiência permitiu, de forma clara, identificar e reconhecer a importância das AAs, valorizando diferentes aspectos do cotidiano docente; possibilitando a transformação dos saberes, antes estruturados em compartimentos fechados, em novas formas de pensar, sentir e agir em saúde, evitando-se, assim, a fragmentação dos saberes docentes e dos alunostrabalhadores do SUS. Refletindo criticamente a respeito da minha experiência na docência e realizando a AA4, tive alguns questionamentos despertados sobre a minha prática docente anterior a esse curso. Ressalto a importância de valorizar a realidade explícita e as experiências dos alunos e dos docentes e submetêlas à análise crítica, para juntos compreendermos os caminhos dos alunostrabalhadores, dos docentes-trabalhadores e dos usuários dos serviços de saúde. Reitero a importância de ter a sociedade em que vivemos e trabalhamos como eixo central, para visualizarmos a realidade de forma ampla e de maneira coletiva, ou seja, instituições de ensino e de saúde, alunos-trabalhadores, docentes e diversos atores sociais, discutirmos conteúdos temáticos atualizados, que estejam incluídos no dia a dia de todos, mesmo que de forma implícita; a necessidade de estabelecer vínculos com o aluno-trabalhador e com sua “bagagem histórica-social-profissional-científica-ética-política”, sendo possível, assim, criar e transformar a realidade. Um grande desafio ainda é mediar os interesses de classes sociais diferentes, analisando criticamente e respeitando os interesses dos usuários do SUS, dos alunos-trabalhadores e dos demais docentes; a necessidade e a importância em sentir prazer como fruto da oportunidade em despertar nos alunos-trabalhadores e nos demais docentes, mesmo perante as adversidades, o interesse profissional, social, político, científico, ético e o entusiasmo em transmitir e receber conhecimento, e a possibilidade de cada vez mais ampliar nossas qualificações, assegurando a qualidade de nossas ações; ter como estratégia pedagógica o currículo integrado, onde a matriz curricular 281 é analisada e transmitida aos alunos-trabalhadores por meio dos conteúdos e não das disciplinas. Como nova forma de ver o mundo, devemos inserir em nossas práticas de educação a necessidade e a importância em falar e praticar a integralidade da atenção à saúde, uma proposta pedagógica que privilegia a construção coletiva do conhecimento, articulando saberes, práticas e atitudes a partir da experiência do aluno-trabalhador, do docente e do contexto em que trabalham e vivem. A partir das reflexões suscitadas ao longo desse curso, compreendo que é possível uma revisão a respeito da nossa maneira de ensinar sobre as doenças e sobre como tratar os indivíduos, suprimindo métodos que colocam o processo doença como protagonista e tornam o ser humano apenas um mero objeto passivo (paciente) daqueles que detêm o saber, ou seja, a concepção de saúde reducionista(8). Deixemos de reduzir o indivíduo à doença ou ao agente causador dela; ampliemos nossa visão sobre a realidade em que vivemos, conseguindo recuperar o significado do indivíduo em sua forma de vida cotidiana singular na relação com os outros e com o mundo. Reitero também minha crença de que ensinar em educação profissional técnica na área da saúde hoje tem por finalidade permitir às ciências da saúde a reaproximação da preocupação com o social e com o sujeito doente. Destaca-se a importância dos avanços tecnológicos, mas se faz oportuno demarcar que uma compreensão de saúde-doença centrada nos aspectos biológicos e individuais tem também implicações no modo de organizar a atenção à saúde. Sendo assim, os docentes ligados à área da saúde, e no atual momento do nosso país, precisam rever as suas práticas e formas de ensinar e a proposta curricular em que estão embasados. Refletindo sobre a área da saúde ao término do curso, concluímos que a educação profissional técnica realmente deve assegurar a qualidade da ação de cuidar de vidas humanas. Temos a responsabilidade profissional, a qual deve ser convertida em responsabilidade social, que é a de proporcionar aos alunos-trabalhadores as condições para se apropriarem do conhecimento disponível sobre o trabalho e a oportunidade de alcançarem, progressivamente, a consciência crítica das relações existentes entre o que fazem, os motivos e as consequências de seus atos. Por meio do constante estímulo e do uso habitual da consciência crítica por parte dos docentes e dos alunos-trabalhadores, conseguiremos prazer em nossos ambientes sociais e profissionais, possibilitando melhores condições de 282 participação nas lutas pelo direito à saúde e pelas transformações necessárias à igualdade social. Referências 1. TECSAÚDE. 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Rio de Janeiro: Fiocruz; Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, 2009. 6. BASTOS, L. R. et al. Manual para elaboração de projetos e relatórios de pesquisa, teses, dissertações e monografias. 5. ed. Rio de Janeiro: [s.n.], 2000. 7. FORTES, J. I. (Coord) et al. Guia curricular da área II do módulo de habilitação do curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem: cuidando do cliente em estado crítico. São Paulo: FUNDAP, 2009. 8. MATTOS, R. A. (Org.). Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. Rio de Janeiro: UERJ; IMS; ABRASCO, 2001. docente em saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz; Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, 2009. 9. BASTOS, L. R. et al. Manual para elaboração de projetos e relatórios de pesquisa, teses, dissertações e monografias. 5. ed. Rio de Janeiro: [s.n.], 2000. 10. FORTES, J. I. (Coord) et al. Guia curricular da área II do módulo de habilitação do curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem: cuidando do cliente em estado crítico. São Paulo: FUNDAP, 2009. 11. MATTOS, R. A. (Org.). Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. Rio de Janeiro: UERJ; IMS; ABRASCO, 2001. 283 284 Avaliação na educação A Distância: Revisão de literatura Claudia Eli Gazetta1 Nadia Polleti1 Ana Marcia Vilela Vitorio2 Renato de Souza Rosa 2 RESUMO A avaliação do processo ensino-aprendizagem é um importante fator para a aceitação e o sucesso de um ambiente de educação a distância; ela é muito mais crítica do que a avaliação do modelo educacional presencial; é um processo complexo e dependente dos seus componentes e instrumentos utilizados para se chegar a uma avaliação. Uma característica importante do modelo de avaliação é a capacidade de se adequar ou adaptar a diferentes modelos de avaliações existentes. Foi realizado um estudo de revisão de literatura sistemática que buscou descrever as características da avaliação na educação a distância por meio de consulta retrospectiva de artigos científicos veiculados na base de dados da Bireme, sendo atendidos os seguintes critérios de seleção: Educação a Distância; Avaliação da aprendizagem. As fontes foram artigos científicos da base de dados da Literatura Latino Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Scientific Eletronic Library Online (Scielo), período 1995 a 2011, totalizando 42 artigos. A avaliação vem dar pontos de referência para subsidiar um processo de qualidade na educação a distância, pois somente as tecnologias não são garantia de aprendizagem e formação das pessoas envolvidas. Assim posto, justifica-se o interesse em estudar, analisar, refletir para a compreensão do processo de avaliação na educação a distância. Conclui-se que o papel da educação a distância é formar sujeitos críticos, autônomos e criativos, pois um de seus objetivos é formar alunos com pontos de vista críticos diante de determinados conteúdos. Verificamos que a educação a distancia é uma modalidade que se diferencia do ensino presencial em diversos aspectos e possui especificidades pedagógicas. A autonomia 1. Docentes da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto. Tutoras do NIAD de São José do Rio Preto. 2. Alunos da Segunda Turma do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde/Fiocruz do NIAD de São José do Rio Preto. 285 e a dedicação do aluno são os principais aspectos diferenciadores, além do domínio das tecnologias pelos acadêmicos. Descritores: educação a distância; avaliação de aprendizagem; formação de docentes. INTRODUÇÃO A avaliação do processo ensino-aprendizagem é um importante fator para a aceitação e o sucesso de um ambiente de educação a distância; ela é muito mais crítica do que a avaliação do modelo educacional presencial; é um processo complexo e dependente dos seus componentes e instrumentos utilizados para se chegar a uma avaliação. Uma característica importante do modelo de avaliação é que ele tem uma grande capacidade de se adequar ou adaptar a diferentes modelos de avaliações existentes. Os critérios de avaliações podem ser utilizados conforme o professor achar necessário e quantas vezes for preciso, já que a estrutura que comporta os resultados da avaliação é dinâmica e comporta o uso indiscriminado desses critérios, desde que bem configurados (IMMIG, 2002). A avaliação é pensada enquanto sistema, ou seja, ela compõe o sistema de educação a distância (EaD) conjuntamente com os sistemas de gestão, sistema de tutoria (acompanhamento e apoio ao estudante), sistema de comunicação e tecnologia, sistema de elaboração de material didático (impresso, mídias, hipertexto, digital, etc.), permitindo, assim, que se avalie a proposta curricular. Enquanto sistema, os elementos da avaliação são específicos aos sistemas da EaD. Assim, por exemplo, no sistema de tutoria, serão elementos de avaliação o processo de ensino e aprendizagem do estudante, o material didático, o próprio sistema de tutoria e o curso/modalidade (OLIVEIRA, 2006). Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa, o termo “avaliação” pode ser entendido como o “ato de avaliar”. Avaliar significa: “determinar o valor de; compreender; conhecer o seu valor”. Na verdade, a avaliação é uma etapa do processo de ensino, cujo objetivo é garantir a aprendizagem, evidenciar posturas e escolhas metodológicas, bem como o resultado dos objetivos educacionais. Dentre as diferentes concepções de avaliação, apontamos que a avaliação deve se fazer presente, tanto como meio de diagnóstico do processo de ensino e aprendizagem quanto como instrumento de investigação da prática pedagógica, sempre com uma dimensão formadora, uma vez que o fim desse processo é a aprendizagem, ou a verificação dela (AMARAL, 2009). 286 Na concepção de Silva (2010), avaliar é dar valor, apreço ou merecimento. Logo, a ação de avaliar se constitui, inicialmente, de uma aferição de acordo com alguma escala de valores pré-fixada. Generalizando, pode-se dizer que avaliar é comparar uma “realidade” com um “modelo ideal”. Este “modelo ideal” expressa, por meio do delineamento de metas e objetivos, um padrão de qualidade a ser atingido. É aquele que faz um bom diagnóstico da realidade, que informa bem. É discriminador, é consistente, não é arbitrário. Sanavria (2008) ressalta que as preocupações pedagógicas, econômicas e sociais foram se entrelaçando no campo da avaliação nos últimos 30 anos, culminando em resultados que contribuíram para o desenvolvimento de novas políticas para a educação. É necessário refletir sobre o processo avaliativo, pois é parte do trabalho docente “verificar e julgar o rendimento dos alunos” e porque o progresso alcançado pelos alunos reflete a eficácia do ensino, e também ajuda no aperfeiçoamento do processo em si. Desse modo, a partir da segunda metade do século XX a evolução no tratamento da informação vem ocorrendo e se transformando em diversas áreas do conhecimento, destacando-se, entre elas, as áreas de comunicação e de processamento de informações. A conjunção dessas duas áreas está revolucionando a sociedade atual, abrindo fronteiras com novas formas de comunicação, onde as redes de computadores atuam como uma das fontes propulsoras de uma nova ordem geopolítica (globalização), tecnológica e computação em rede aberta e centrada no usuário, é organizacional, um mercado dinâmico, aberto e competitivo (GHEDINE; TESTA; FREITAS, 2006). Até quase o final do século XX, os cursos por correspondência do Instituto Universal Brasileiro e os telecursos de Primeiro e Segundo Graus da Fundação Roberto Marinho foram sinônimos de educação a distância no Brasil. Com isso, a educação não presencial acabou vinculada ao trabalhador menos qualificado e de baixa renda. Essa percepção começou a mudar em meados da década de 1990, a partir do salto tecnológico ocorrido com a disseminação da internet. A rede mundial de computadores, como também é conhecida, trouxe consigo um item fundamental para o processo de ensino-aprendizagem a distância: a interatividade. Assim, a educação a distância via internet, cuja sigla também é EaD, começou a colocar a EaD, em algumas situações, no mesmo patamar do ensino presencial (GHEDINE; TESTA; FREITAS, 2006). A atual Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9394), sancionada em 1996, reconheceu legalmente as práticas de EaD e, por um lado, abriu-lhes um leque de possibilidades ao permitir a existência de cursos a distância para todos os níveis e modalidades de ensino, em caráter de emergência e/ou 287 regularidade. Essa lei atual avançou bastante para além da LDB de 1971, que somente tinha permitido a existência de cursos a distância na modalidade supletiva. Tal abertura, por outro lado, ao mesmo tempo em que favoreceu a democratização das oportunidades, sobretudo para as populações distantes das cidades brasileiras do litoral, também criou a necessidade de se pensar o conceito de educação a distância, a atuação dos seus professores, a importância dos materiais instrucionais/educacionais utilizados e, particularmente, os seus processos de avaliação (GAMA; OLIVEIRA, 2003). De acordo com as pesquisas, percebemos a importância da investigação do processo de avaliação da aprendizagem na educação a distância. Além disso, podemos afirmar que, de acordo com os conceitos, essa modalidade não busca apenas a mera transmissão de conteúdos e sim uma formação completa do educando, auxiliando-o no processo de formação de um pensamento reflexivo e social (SANAVRIA, 2008). Assim, nessa perspectiva de complexidade da avaliação da aprendizagem, o objetivo do trabalho foi identificar e analisar nas publicações existentes a compreensão do processo de avaliação na educação a distância. OBJETIVO O objetivo deste trabalho é analisar as publicações que enfocam as concepções sobre os aspectos da avaliação na educação a distância por meio de revisão de literatura sistemática. METODOLOGIA Para viabilizar o desenvolvimento deste estudo, foi elaborada revisão de literatura sistemática. O período de coleta de dados ocorreu de 8 de novembro de 2010 a 12 de janeiro de 2011, nas seguintes bases de dados da biblioteca virtual da Saúde: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Scientific Eletronic Library Online (Scielo). Foram utilizados os seguintes descritores: Educação a Distância; Avaliação da Aprendizagem. Como critérios de inclusão as referências devem: possuir aderência ao objetivo proposto; conter articulação com as características da avaliação na educação a distância. A análise das referências foi baseada nas publicações dos últimos 16 anos (de 1995 a 2011), em virtude do grande avanço da educação a distância no ensino na Enfermagem, tanto em cursos de extensão como nos próprios cursos de graduação. Foi realizada a leitura inicial das referências e, portanto, 288 foram encontradas um total de 42 referências relacionadas com o tema. Os dados deste estudo foram analisados seguindo um instrumento para análise de dados confeccionado que contém identificação do título, classificação/nome da revista, autores, ano de publicação e idioma. RESULTADOS E DISCUSSÃO Das 42 fontes analisadas, todas foram no idioma português. Houve uma grande variedade de revistas (35,7%) selecionadas com artigos relacionados sobre avaliação na educação a distância, seguidas de sites (28,5%), logo após anais (23,8%), monografias e dissertações (4,7%) e, por fim, boletins 2,3%. Foi identificada uma alta concentração de publicações nos últimos cinco anos, o que caracteriza o crescente interesse de investigação nessa área. A demanda pode ser justificada pela nova modalidade de educação a distância, que vem crescendo e proliferando cursos nessa modalidade. Segundo dados do Censo da Educação Superior de 2006, no período entre 2003 e 2006 houve um aumento de 571% em número de cursos e de 315% no número de matrículas (PRIMO, 2008). A avaliação em EaD é um processo contínuo e complexo, onde aspectos como interesse, cooperação e participação nas atividades propostas influem na obtenção de um quadro global de avaliação. A avaliação em EaD tem acompanhado a tendência de se avaliar não somente o produto, mas todo o conjunto. Além disso, com o intuito de auxiliar o aluno a tornar-se mais autônomo, crítico, responsável, compreendendo seu desenvolvimento pessoal, os instrumentos da avaliação, associados a uma autoavaliação, devem buscar uma avaliação formativa (SANAVRIA, 2008). A avaliação deve ser um diagnóstico da transmissão do conhecimento e uma oportunidade de repensar as ações educacionais; é uma continuidade dos fóruns que se apresentam como espaços de debate e negociação de concepções e representações da realidade. A função do professor é facilitar a participação de todos e cada um no fórum de trocas simbólicas em que a aula deve transformar-se, oferecer instrumentos culturais de maior potencialidade explicativa (que enriqueçam o debate) e provocar a reflexão sobre as próprias trocas e suas consequências para o conhecimento e a ação. Os critérios de avaliações podem ser utilizados conforme o professor achar necessário e quantas vezes for preciso, já que a estrutura que comporta os resultados da avaliação é dinâmica e comporta o uso indiscriminado (IMMIG, 2002). Em se tratando especificamente da avaliação da aprendizagem, é visto 289 que a Educação a Distância requer rupturas com o modelo tradicional de avaliação solidificado na sala de aula no decorrer da história. Se o professor não quiser subutilizar as potencialidades próprias do digital online, ou se não quiser repetir os mesmos equívocos da avaliação tradicional, terá de buscar novas posturas, novas estratégias de engajamento no contexto mesmo da docência e da aprendizagem e aí redimensionar suas práticas de avaliar a aprendizagem e sua própria atuação. Em se falando em avaliação, podemos dizer que ela tem estreita relação com a interpretação que o/a professor/a faz das respostas dadas. Em se tratando de educação a distancia, lembramos que atualmente o que mais se questiona não é “como fazer” e sim “se estamos fazendo adequadamente”, ou seja, verificarmos o que condiz com as especificidades e necessidades da modalidade (SANAVRIA, 2008). Segundo Brasil (2003), a questão dos sujeitos envolvidos é outra especificidade da educação a Distância no que diz respeito à avaliação da aprendizagem. Nessa modalidade, espera-se a participação do aluno no processo avaliativo, principalmente por meio da autoavaliação. Na educação a distância, o aluno é instigado a refletir sobre sua aprendizagem, já que na maioria das vezes estuda individualmente. A autoavaliação incentiva o aluno a uma situação de comunicação, colocando em confronto com seus próprios limites, no melhor dos casos, auxiliando a ultrapassá-los. Na educação a distância, o modelo de avaliação da aprendizagem deve ajudar o estudante a desenvolver graus mais complexos de competências cognitivas, habilidades e atitudes, possibilitando-lhe alcançar os objetivos propostos. Para tanto, a avaliação deve comportar um processo contínuo, para verificar constantemente o progresso dos estudantes e estimulá-los a serem ativos na construção do conhecimento. Com o advento da internet e principalmente com a grande influência atual que ela representa no meio socioeconômico e no meio educacional, cresce a variedade de sistemas e ferramentas voltados para os ambientes de educação a distância. Um dos grandes aliados dos ambientes de aprendizagem online são os registros, pois é ali que se encontram impressões sobre as leituras, os posicionamentos, as dúvidas, tudo veiculado por meio das ferramentas do ambiente virtual, e, por ser escrita, toda participação do aluno no curso pode ser recuperada, evidenciada e debatida. Desse modo é necessário que nos preparemos para a aprendizagem e para a avaliação interativa na sala de aula online. Essa troca constante de experiências propiciadas pelo ambiente virtual evidencia uma possibilidade de ajuda mútua e construção coletiva do conhecimento (IMMIG, 2002). A avaliação em Educação a Distância envolve diversos aspectos, e não 290 deve se restringir apenas a aspectos cognitivos (projeto final, prova), mas englobar também aspectos comportamentais. Avaliar e acompanhar o aprendizado do aluno envolve, além das teorias pedagógicas, questões tecnológicas. O número de acessos e o tempo de permanência no ambiente virtual de aprendizagem, por exemplo, apesar de representarem a prioridade de uma avaliação quantitativa, se observados sob outro ponto de vista nos fornecem informações representativas no que concerne ao interesse e à participação do aluno. A avaliação em EaD é um processo contínuo, onde aspectos como interesse, cooperação e participação nas atividades propostas são extremamente importantes. Nesse contexto, é preciso definir o método de avaliação (o que será avaliado), os objetivos instrucionais (o que o aluno precisa apreender) e a melhor forma de acompanhamento desse aluno (VICTORINO, 2004). A avaliação do aluno em EaD deve ser instrumento de apoio e contínua motivação necessária ao processo de construção do conhecimento. A avaliação nesse cenário deixa de ser um termômetro para aferir o grau de conhecimento do aluno e passa a ser um instrumento para modificação de práticas, redefinição de estratégias de aprendizagens, replanejamento de metas e objetivos. Para o docente, um dos objetivos principais da avaliação de aprendizagem é monitorar o desempenho do aluno. Apesar de existirem estudos de como aperfeiçoar as ferramentas existentes para contemplar uma avaliação integral do aluno, tal objetivo ainda não foi alcançado. A estrutura conceitual de uma avaliação deve levar em consideração algumas circunstâncias: o momento, as funções, os conteúdos, os procedimentos, as ferramentas e os agentes; assim, é preciso analisar o processo de avaliação em razão de sua aplicabilidade (IMMIG, 2002). Outro ponto importante é a questão de relação aluno-professor. Grande parte dos docentes revela particularidades do trabalho na educação a distância em relação ao ensino presencial. Muitos argumentam que há uma dificuldade em lidar com a não presença do aluno numa sala de aula convencional, o que mudaria para eles a relação afetiva que se estabelece entre o professor e o aluno. Segundo os profissionais docentes, eles relatam que existem diferenças em relação ao aspecto afetivo, do calor humano, de você perceber nos olhos da pessoa se ela possui vontade de aprender. A avaliação a distancia, apesar do que as palavras que as pessoas escrevem no meio virtual possam transparecer, nem sempre se traduzem em uma verdade. A avaliação em educação a distância ganha uma dimensão mediadora, que projeta e vislumbra o futuro, subsidiando uma compreensão dos limites e possibilidades dos alunos e o permanente ajuste das estratégias pedagógicas (FONSECA, 2001). 291 Outro caso que merece destaque é a elaboração do material. É importante que o professor reflita sobre o processo de elaboração do material, ainda mais pelo fato de que, institucionalmente, todas as atividades consideradas na avaliação ocorrida durante a disciplina deverão constar no material impresso. O cuidado no planejamento é um reflexo da educação a distância, já que a assincronicidade citada não permitirá muitos ajustes no que for proposto previamente no material. De acordo com algumas pesquisas realizadas, os docentes apontam uma prévia do material didático como principal diferença entre a educação a distancia e o ensino presencial. No caso do ensino presencial há uma construção do material, já na EaD é um pouco diferente, porque se constrói tudo de uma vez, entrega-se o material todo do sistema e depois é que se trabalha (OLIVEIRA, 2006). Sabemos que um curso oferecido na modalidade a distância compreende a ação de diversos atores no processo de ensino-aprendizagem. O aluno é apenas um desses atores, além do professor, tutores, corpo técnico e pedagógico. O aluno deve ser autônomo, lidando com a não presença e o uso das tecnologias. O professor passa a exercer o papel de condutor de um conjunto de atividades que procura levar à construção do conhecimento. O aluno, por sua vez, deixa a condição de espectador: assim ele cria, modifica, constrói, aumenta e torna-se coautor da aprendizagem. Enfim, se o aluno não tiver perfil para a educação a distancia, dificilmente ele consegue continuar no curso ou gostar do curso. Segundo os artigos pesquisados, em relação à aprendizagem do aluno não há grande diferenças. Tanto nas duas modalidades existem bons e maus alunos. Esse conceito de bom aluno está diretamente relacionado à dedicação e à autonomia do aluno. Os alunos nas duas modalidades são os mesmos, eficientes, produtores, interessados, participativos. No caso da modalidade a distância, é fundamental um perfil de maturidade e dedicação por parte do aluno, que deve organizar seu estudo e cumprir rigorosamente com seu planejamento. Tudo isso requer uma disciplina muito grande e uma quantidade de horas de estudo bem definida para que ele (aluno) possa ter um aprendizado bom. De acordo com as pesquisas, a faixa etária é um fator decisivo para o sucesso do aluno na educação a distância, sendo os alunos mais velhos os que apresentam perfil mais adequado para a modalidade. Outra questão predominante na modalidade é o domínio das novas tecnologias. O aluno deve possuir intimidade com o uso das novas tecnologias, pois uma pessoa que não tem domínio de uma ferramenta, do computador, da internet, terá 292 muita dificuldade de trabalhar na educação a distância, o que será um fator limitante, pois grande parte é em torno dessa plataforma. Entendemos que o papel do professor que exerce essa modalidade é essencial para o sucesso do processo de ensino-aprendizagem, nesse contexto. O professor precisa ter habilidades para comunicar, coordenar suas atividades, como correção de tarefas e produção do seu material, de forma objetiva, precisa propor e provocar discussões a distância, via e-mail ou fórum, precisa estar conectado, online quase em tempo integral e com uma carga horária muitas vezes incompatível com seu retorno financeiro. O trabalho do tutor consiste em um apoio organizado e sistemático, que propicie o estímulo e a orientação individual, a facilitação de situações de aprendizagem e a ajuda para resolver as dificuldades do material didático. Se considerarmos os fatores acima citados, é na eficiência da avaliação do processo ensino-aprendizagem que a avaliação do rendimento do aluno e a orientação do professor proporcionam melhor controle, ajuste e melhoria dos métodos e formatos empregados no ambiente de educação a distância – fazendo assim com que o ambiente de educação a distância certifique-se de que, por meio da avaliação do rendimento dos alunos, eles estejam preparados tão bem ou melhor do que aqueles que passaram pelo mesmo curso, mas em outra modalidade educacional. Não é possível obter-se um ambiente de educação a distância sem possuir uma ferramenta capaz de avaliar os alunos que participarão do curso ou aula a que serão submetidos, já que a avaliação está diretamente relacionada com o rendimento do aluno ou o processo ensino-aprendizagem. E o processo ensino-aprendizagem é parte de um ciclo fundamental na construção do conhecimento dos alunos. Pois a avaliação faz parte desse ciclo, como um elemento sistemático de correção de falhas, auxiliando o professor a corrigir e melhorar o seu processo de ensino e auxiliando o aluno a perceber e rever onde está falhando e assim tomar um reforço onde for necessário. Caso o professor perceba dificuldades gerais no aprendizado dos alunos ele deve rever se não houve falhas ou carências no método de ensino utilizado e aí tomar as devidas atitudes para melhorar e aperfeiçoar o processo ensino-aprendizagem. A educação nos dias de hoje está bem diferente do que foi a educação há alguns anos. Se, ao falarmos em educação, logo pensávamos em escola, aluno, professor, livro, caderno, lápis e borracha, hoje, além dessas idéias, pensamos também em computador e internet, em “ambientes de aprendizagem” não delimitados em tempo ou espaço. Por intermédio da EaD, além de vencer as dificuldades de localização e tempo que anteriormente poderiam afastálo da escola, o aprendiz tem a oportunidade de viver uma nova experiência 293 de aprendizagem, atuando como um sujeito ativo na sua formação. Para isso, esse aprendiz precisa buscar sua própria motivação, investimento pessoal, autonomia, além de gerenciar seu próprio processo de construção de conhecimento. CONSIDERAÇÕES FINAIS Revisões sistemáticas de literatura são recursos importantes para o crescimento acelerado da informação científica. Este estudo ajudou a sintetizar a evidência disponível na literatura e os conceitos gerais sobre as concepções da avaliação na distância, podendo auxiliar profissionais clínicos e pesquisadores no seu cotidiano de trabalho. A avaliação deve ser planejada em função dos objetivos, e é importante que o ambiente de educação a distância esteja muito bem estruturado, de modo que as atividades desenvolvidas atendam aquilo que esteja sendo proposto ser avaliado. É importante que o ambiente tenha as atividades organizadas e estruturadas de tal forma que haja um vínculo ou uma relação de cada atividade ou parte dela com o instrumento ou parte dele, de modo que a avaliação reflita especificamente o que foi avaliado. Com essa relação é possível se ter informações que demonstrem a relação de rendimento da atividade com a relação da participação ou não da atividade proposta para o currículo. Por fim, o papel da educação a distância é formar sujeitos críticos, autônomos e criativos, pois um de seus objetivos é formar alunos com pontos de vista críticos diante de determinados conteúdos. A educação a distancia é uma modalidade que se diferencia do ensino presencial em diversos aspectos e possui especificidades pedagógicas. A autonomia e a dedicação do aluno são os principais aspectos diferenciadores, além do domínio das tecnologias pelos acadêmicos. Acreditamos que a análise aqui apresentada pode ser complementada por novos estudos, na medida em que surgirem novos questionamentos, dentro da temática abordada neste trabalho. O presente trabalho pretende contribuir para o início de uma discussão, além de motivar e encorajar o desenvolvimento de outras pesquisas na educação a distância. 294 REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. E. B. Educação à distância no Brasil: diretrizes políticas, fundamentos e práticas. In: CONGRESSO IBERO-AMERICANO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO, 2002, Vigo. 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Acesso em: 17 mar. 2010. 297 298 CONDIÇÕES DE TRABALHO DOS ENFERMEIROS QUE ATUAM NO ENSINO TÉCNICO DE ENFERMAGEM Andréia Pereira1 Fernando Silveira2 RESUMO O presente trabalho permitiu analisar as condições de trabalho do enfermeiro no exercício da docência no ensino técnico profissionalizante de enfermagem, enfermeiro-docente. Este estudo configurou-se como exploratório descritivo de abordagem quantitativa, realizado em 2010, com 13 enfermeiros- docentes do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, que atuam como docentes na formação de técnicos de enfermagem em salas do TecSaúde das Classes Descentralizadas vinculadas ao CEFOR Araraquara e localizadas nas cidades de Ituverava, Franca e Ribeirão Preto, Estado de São Paulo. Verificou-se que o modelo de contratação predominante é o temporário determinado, com uma jornada de trabalho de até 10 horas semanais no ensino, permitindo que a maioria possuísse mais de um emprego. A docência é atividade secundária para mais da metade dos participantes da pesquisa, embora a maioria procure capacitação na área docente. Conclui-se que há um desencontro entre as políticas de formação de recursos humanos e valorização da prática social do profissional de saúde e as condições de trabalho determinada pelas escolas de formação técnica, com perspectiva limitada de trabalho. Descritores: Educação em enfermagem; condições de trabalho; docente de enfermagem. 1. Enfermeira graduada pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP), Aluna do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto. Especialista em Gestão em Enfermagem. [email protected] 2. Cirurgião Dentista da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Tutor do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto. Doutorando em Ciências pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. [email protected] 299 Introdução A Enfermagem brasileira é a maior força de trabalho na área da Saúde ao mesmo tempo em que o país tem grande carência neste setor (EBISUI, 2004). A profissionalização dos trabalhadores de nível técnico na área de enfermagem começou a se intensificar a partir de 1986, com a publicação da Lei nº 7498, que regulamenta o exercício profissional (VIEIRA; OLIVEIRA, 2001). A formação profissional dos trabalhadores de nível técnico em enfermagem tem sido objeto de iniciativas assumidas pelo estado. São exemplos desta preocupação a criação dos Centros de Formação de Recursos Humanos em Saúde - CEFOR (TORREZ, 1994), e o Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde -TecSaúde, entre outros. No âmbito do governo Federal, tem-se as Escolas Técnicas e Centros Formadores do SUS – ETSUS. Instituições públicas criadas para atender as demandas locais de formação técnica dos trabalhadores que já atuam nos serviços de saúde, acompanhando o processo de municipalização do SUS no Brasil. A origem das ETSUS remete ao Projeto Larga Escala, iniciado em 1985 (TORREZ, 1994). O Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde no estado de São Paulo (TecSaúde), não só objetiva formar técnicos em enfermagem, fortalecendo o Sistema Único de Saúde, bem como preocupa-se em formar docentes através do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. O perfil deste profissional deve estar associado a uma visão crítica e ampla da sociedade, atuando de forma interdisciplinar na luta pelo atendimento integral e de qualidade ao usuário do SUS, concorrendo para a transformação da realidade, com autonomia intelectual, social e ética. O enfermeiro que exerce a função de docente nos cursos técnicos, enfermeiro-docente, é o elemento fundamental no ensino profissionalizante. Contribui para elevar os níveis de escolaridade, reduzindo o déficit de pessoal qualificado nas categorias auxiliar e técnico em enfermagem, colaborando no sentido de atender as diretrizes da Educação e do Sistema Único de Saúde (SUS) (EBISUI, 2004). Segundo Vasconcelos e Prado (2004), os enfermeiros-docentes convivem com situações que geram angústia em relação as suas condições de trabalho no ensino técnico profissionalizante em enfermagem, entre eles destaca-se a falta de vínculo empregatício com as escolas e a desvalorização social do trabalho, entre outros. 300 O interesse pela pesquisa visando o enfermeiro-docente e as suas condições de trabalho no ensino técnico profissionalizante vem da necessidade de, por um lado, conhecer melhor as condições de trabalho deste profissional e, por outro, abordar aspectos relevantes da situação atual do ensino técnico profissionalizante em enfermagem, que vem sofrendo evidente expansão e por último. Com isto, espera-se contribuir com a melhoria da qualidade dos cursos técnicos. OBJETIVO Analisar as condições de trabalho dos enfermeiros-docentes que atuam no Programa de formação de profissionais de nível técnico para a área da saúde no estado de São Paulo (TecSaúde). METODOLOGIA Trata-se de um estudo de natureza exploratório-descritivo. Segundo Polit e Hungler (1995), a pesquisa exploratória proporciona maior familiaridade com o problema visando torná-lo mais explícito. Geralmente envolvem levantamento bibliográfico, entrevista com pessoas que tiveram experiência práticas. A pesquisa descritiva propicia elementos que permitem a descrição das características da população entrevistada e juntamente com a exploratória possibilita captar conhecimentos e comprovações teóricas, a partir de uma investigação de determinado problema. O estudo foi realizado nas Classes Descentralizadas localizadas nas cidades de Ituverava, Ribeirão Preto e Franca, vinculadas ao CEFOR Araraquara, com Enfermeiros que atualmente estão matriculados e freqüentando o Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, e enfermeiros, que embora não tenham formação em docência, atuam como docentes na formação de técnicos de enfermagem. Ressalta-se que o trabalho somente foi realizado com aqueles docentes que estão em salas de aula de escolas contratadas pelo TecSaúde. Foi utilizado o questionário “Perfil de professores do programa de formação de profissionais e nível técnico para a área da saúde do estado de São Paulo” (Anexo 1), composto por perguntas fechadas e abertas e que aborda dados de identificação pessoal, profissional, escolar e cultural. A construção deste questionário fundamentou-se nos instrumentos utilizados por BASSINELLO (2002) para traçar o perfil dos professores de ensino médio 301 profissionalizante em enfermagem e nos questionários de pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os questionários foram aplicados no mês de outubro de 2010, pelos alunos do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde, sendo que alguns também se constituíram em sujeitos da pesquisa. A pesquisa observou rigorosamente as diretrizes da Resolução nº 196 sobre pesquisa que envolve seres humanos e no momento da coleta de dados. Foram apresentados, inicialmente, o objetivo e as contribuições deste estudo, bem como o termo de consentimento livre e esclarecido (Anexo 2). O termo foi assinado por cada sujeito, momento em que lhe foi fornecido uma cópia da pesquisa. Com o propósito de alcançar o objetivo deste estudo, ou seja, identificar as condições de trabalho dos enfermeiros na docência de cursos técnicos em enfermagem, foram selecionadas algumas questões presentes nos instrumental utilizado que serviram de base para a análise aqui realizada. Estas questões envolviam indagações sobre os dados socioeconômicos dos entrevistados (idade, sexo, estado civil), vem como caracterização profissional (profissão do docente, tempo em exercício, experiência na atividade de ensino, a existência de formação específica para docência e o grau de importância atribuída à docência. Com relação às condições de trabalho perguntou-se sobre o exercício de outras atividades além da sua atividade docente, a existência de outros locais de trabalho, qual a modalidade de contratação na docência, quantas horas em média se trabalha por semana no ensino técnico. Os dados obtidos a partir das questões fechadas foram tabulados e analisados com base no método da estatística descritiva e com os recursos do programa Excel 2007, um programa de informática da Microsoft®, para elaboração de tabelas e gráficos. Cabe ressaltar que este Projeto de Pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo e a coleta de dados somente foi iniciada após a sua aprovação em outubro de 2010 (Anexo 3). RESULTADOS E DISCUSSÃO Perfil sócio demográfico Fizeram parte do estudo 36 enfermeiros-docentes: 13 responderam o questionário (36% do total); 10 (27,7%) não foram encontrados, pois haviam 302 terminado as aulas teóricas e encontravam-se em campo de estagio com os alunos; 13 (36,1%) não efetuaram a devolução do instrumento de coleta. Dos 13 enfermeiros-docentes que responderam ao questionário, verificamos que 12 (92,31%) são do sexo feminino. A idade oscilou entre 25 a 54 anos, prevalecendo à faixa etária de 25 a 34 anos de idade - 07 indivíduos (53,85%). Em relação ao estado civil 08 (61,54%) são casados, seguidos de 03 (23,08%) solteiros e 02 (15,38%) amasiados, conforme se observa na Tabela 1. Tabela 1 – Distribuição da porcentagem de enfermeiros-docentes segundo variáveis: idade, sexo e estado civil. Ribeirão Preto – SP, 2010. Variáveis Sexo Faixa Etária Estado Civil Nº % Feminino 12 92,31 Masculino 1 7,69 25-34 anos 7 53,85 35-44 anos 2 15,38 mais de 45 anos 4 30,77 Solteiro 3 23,08 Casado 8 61,54 Amasiado 2 15,38 13 100,00 TOTAL Esta predominância do sexo feminino é verificada desde o início da história da enfermagem até os dias atuais. A presença das mulheres na profissão do professor é igualmente predominante, conforme dados do MEC/ INEP. Segundo o Censo do Professor de 1997, mais de 80% dos professores de nível médio são do sexo feminino (BOMFIM, 2003). A literatura consultada tem mostrado resultados controversos ao apresentado com relação à faixa etária. Em estudo de Ebisui (2004), os resultados indicam que a maior concentração de enfermeiros-docentes se encontra na faixa etária de 36 a 45 anos. O presente estudo mostra o ingresso de profissionais mais jovens no exercício da docência. Destaca-se também a concentração de enfermeiras professoras casadas, o que está em acordo com dados já verificados em outros estudos (EBISUI, 2004). Com as transformações sociais e a emancipação feminina, a mulher multiplicou seus afazeres para auxiliar no orçamento doméstico, o que pode ser uma das explicações para o fenômeno (BASSINELLO, 2002). 303 Perfil profissional O tempo de atuação na enfermagem variou de menos de 04 anos a mais de 25 anos, sendo que a maior parte (46,15%) a exerce a menos de 4 anos. Em segundo lugar aqueles que exercem a profissão de 5 a 9 anos, 15,38%; em terceiro aqueles que possuem de 10 a 24 anos de profissão, 23,08%; e, por fim, aqueles com mais de 25 anos, 15,38% (Tabela 2). Segundo Machado et al (1997), que ao estudar a vida profissional do médico propôs uma classificação a respeito das etapas do desenvolvimento profissional, o período de menos de 4 anos deve ser entendido como a fase inicial da vida profissional. Assim, podemos inferir que para esta população, a maior parte encontra-se em início de vida profissional. Tabela 2 – Distribuição da porcentagem de enfermeiros-docentes segundo tempo de profissão (enfermagem). Ribeirão Preto – SP, 2010. Tempo de Profissão (enfermagem) Nº % Menos de 4 anos 6 46,15 De 5 a 9 anos 2 15,38 De 10 a 24 anos 3 23,08 Mais de 25 anos 2 15,38 TOTAL 13 100,00 Com relação ao tempo de experiência em atividade de ensino, os dados variaram de até 04 anos a mais de 25 anos de experiência. Prevaleceu o intervalo de até 04 anos, representado por 09 sujeitos (69,23%) da população estudada, conforme se observa no Gráfico 1. Gráfico 1 - Distribuição percentual dos enfermeiros-docentes segundo experiência em atividade de ensino (anos). Ribeirão Preto – SP, 2010. 69,23% 7,69% Até 4 anos 304 De 5 a 9 7,69% De 10 a 24 15,38% >25 anos Segundo as fases perceptíveis da carreira do professor, na perspectiva de Huberman (1992), a maioria dos docentes encontra-se entrando na carreira, fase compreendida no período de 02 a 03 anos de carreira. É quando ocorre o choque do real, a confrontação inicial com a complexidade da situação profissional. Dos participantes da pesquisa, 8 (62%) possuem formação específica para docência, seguido de 3 (23%) que estão cursando e 2 (15%) que não possuem formação pedagógica e não estão cursando, como podem ser visualizados no Gráfico 2. Gráfico 2- Distribuição da porcentagem de enfermeiros-docentes segundo formação específica para docência. Ribeirão Preto – SP, 2010. Uma das explicações para este resultado pode ser a busca pelo enfermeiro/docente por uma oportunidade para sanar as suas deficiências com relação à formação pedagógica do enfermeiro, o que por outro lado tem sido viabilizado pela oferta do Curso de Formação Docente oferecido pelo TecSaúde em parceria com a ENSP/Fiocruz. Características das condições de trabalho Nesta parte serão apresentadas variáveis como: modalidade de contratação, jornada de trabalho, número de empregos. Verificou-se que 9 (69%) dos docentes da pesquisa estão submetidos a contrato de trabalho por tempo determinado e 1 (8%) por tempo indeterminado. Ou seja, 10 (77%) dos docentes são contratados temporariamente, conforme se observa no Gráfico 3. Gráfico 3 - Distribuição da porcentagem de enfermeiros-docentes segundo modalidade de contratação na docência. Ribeirão Preto – SP, 2010. Temporário determinado Temporário indeterminado CLT 305 De acordo com Bassinello (2002), os contratos de trabalho por tempo determinado e indeterminado são contratos temporários ou caracterizados por serviços prestados. É também a forma mais comum de contratação das escolas particulares: a admissão em caráter temporário (ACT) onde o docente é contratado para suprir deficiência de pessoal. Nas palavras de Angerami e Correia: “As transformações ocorridas no mercado de trabalho, chamada atualmente de reestruturação produtiva ou acumulação flexível, trouxeram uma tendência a se empregar cada vez mais uma força de trabalho que se emprega facilmente e é demitida sem custo” (1996). Segundo Santos e Assiani (2000), como a contratação dos enfermeirosdocentes para atuação na formação de técnicos de enfermagem nem sempre acontece com a garantia das Leis Trabalhistas, eles, em sua maioria, ministram uma determinada disciplina com um contrato por tempo determinado e, ao término deste, são desligados da instituição de ensino. Esse fato, que caracteriza um vínculo empregatício precário, contribui para que os enfermeirosdocentes não percebam a formação pedagógica como elemento fundamental para a prática da docência, já que está se apresenta em caráter temporário e complementar. A carga horária semanal dedicada à docência prevalecente em nossa pesquisa é de até 10 horas semanais, 06 indivíduos ou 46% da amostra; seguida de 20 a 30 horas semanais, 05 indivíduos ou 38% da amostra; e de até 20 horas semanais 02 indivíduos ou 15% (Gráfico 4). Gráfico 4 - Distribuição da porcentagem de enfermeiros-docentes segundo carga horária semanal no ensino técnico. Ribeirão Preto – SP, 2010. 46% Até 10 horas 15% Até 20 horas 38% De 20 a 30 horas A literatura consultada tem mostrado resultados controversos ao apresentado. Em estudo de Bassinello (2002), com população semelhante, a carga horária prevalecente foi a de até 20 horas semanais. Embora tenha apresentado 10 horas semanais a mais que o presente estudo, ambos possibilitam ao enfermeiro-docente possuir mais de um emprego. Ter mais de um emprego pode ser a única maneira de sobrevivência em um mercado de trabalho com condições precárias em termos de salário e contratos de trabalho. 306 Os dados da pesquisa apontam que 10 (77%) dos enfermeiros-docentes possuem dois empregos, 02 (15%) possuem três empregos e 01 (8%) dedicamse apenas à docência, conforme se observa no Gráfico 5. Gráfico 5- Distribuição da porcentagem de enfermeiros-docentes, segundo o número de empregos. Ribeirão Preto – SP, 2010. Bonfim e Torrez (2002) e Bassinello (2002) chamam a atenção para a circunstância em que o docente, possuindo mais de um emprego, acabará por prejudicar a sua atuação e dinâmica devido à falta de tempo para elaboração das aulas e de estratégias de ensino. Verificando a realidade dos entrevistados desta pesquisa, é possível inferir que situação também pode ser encontrada com grande parte destes profissionais. Um dos indicadores é o fato da docência ser atividade apenas secundária para 10 (77%) dos enfermeiros-docentes participantes da pesquisa, como podem ser visualizados no Gráfico 6. Gráfico 6 - Distribuição da porcentagem de enfermeiros-docentes segundo grau de importância na docência. Ribeirão Preto – SP, 2010. Principal 23% Secundária Terciária 77% 0% Em estudo realizado com enfermeiros-docentes, Bassinello (2002) também encontrou resultados parecidos, indicando que a docência é atividade secundária para a maioria destes profissionais. Embora possa ser até a mais gratificante, os enfermeiros-docentes contam com a área educacional apenas para aumentar seu rendimento mensal. Para Bomfim e Torrez (2002), ensinar não é a atividade principal do enfermeiro em virtude de uma variedade de determinantes, incluindo o modelo educacional e assistencial que se instalou no país e a desvalorização 307 da formação pedagógica. Muitos professores negam-se, então, a participar de qualquer projeto de formação pedagógica ou aperfeiçoamento na área. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo foi realizado com enfermeiros-docentes que ministravam aulas para o Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem do TecSaúde nas Classes Descentralizadas do CEFOR dos municípios de Ituverava, Ribeirão Preto e Franca. De forma resumida, os resultados indicaram predominância de docentes do sexo feminino (92,31%); que estavam na faixa etária de 25 a 34 anos (53,85%); e eram casados (61,54%). Estes números vão ao encontro do observado em outros estudos que também buscaram caracterizar o profissional enfermeiro-docente. Em relação às características profissionais, é possível afirmar que a maior parte dos entrevistados possui até 04 anos de formado e correlacionado e estão a menos de quatro anos atuando como docentes, ou seja, a maioria dos profissionais está iniciando sua carreira na enfermagem e na docência no ensino técnico de enfermagem simultaneamente. Por outro lado, 62% destes docentes possuem formação específica para docência, o que pode denotar envolvimento desta categoria de profissionais com a formação de recursos humanos na área da Saúde. Em contra partida, o mercado de trabalho demonstra não valorizar esta atividade em vista da constatação de que 77% dos docentes possuem contrato de trabalho temporário, gerando insegurança e ausência dos benefícios sociais assegurados pelas leis trabalhistas. A precariedade dos contratos de trabalho leva os enfermeirosdocentes a buscarem alternativas de trabalho - 77% possuem dois empregos e 46% empregam apenas 10 horas de sua jornada de trabalho nas atividades docente. Esta situação faz com que 77% dos enfermeiros-docentes das Classes Descentralizadas do CEFOR tratem a atividade docente como secundária no conjunto das atividades do cotidiano. Esta realidade nos leva a refletir em torno das Políticas direcionadas a Formação de Recursos Humanos para a Área da Saúde, que tem privilegiado metodologias críticas e a formação de profissionais comprometidos com as Diretrizes e Princípios do Sistema Único de Saúde. Tal opção metodológica exige comprometimento, formação e dedicação por parte dos docentes envolvidos. No entanto, verifica-se a ausência de uma Política de Recursos Humanos que garanta condições de trabalho mínimas no sentido de que a 308 atividade profissional de ensino não seja tratada como secundária. Embora as condições de trabalho citadas ofereçam aos enfermeirosdocentes perspectiva limitada de trabalho, estes profissionais buscam algum tipo de capacitação para a docência. Esta procura pode estar relacionada à constatação das próprias deficiências na formação em enfermagem, que frequêntemente está centrada na assistência e não na docência. Esses resultados fazem-nos refletir sobre a necessidade de novas pesquisas com intuito de conhecer melhor a realidade das condições de trabalho do enfermeiro-docente no ensino técnico profissionalizante em enfermagem, assim como as suas expectativas com esta atividade profissional. REFERÊNCIAS ANGERAMI, E. L. S.; CORREIA, F. A. A modernidade na formação do enfermeiro: aspectos acadêmicos. In: Anais do Encontro Nacional de Escolas de Enfermagem; 1996 jul 24-24; São Paulo, Brasil. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 1996. p1. BASSINELLO, G. A. H. Perfil dos professores de ensino médio profissionalizante em enfermagem. 2002. 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INTRODUÇÃO O interesse em desenvolver esta pesquisa se deu pela necessidade de aprofundar os conhecimentos relacionados à metodologia da problematização, e, ao utilizar Paulo Freire e Demerval Saviani como principais referências, despertou e estimulou o interesse em buscar nesta metodologia inovadora e completa subsídios para o trabalho com profissionais da área da saúde. O processo de desenvolvimento da educação brasileira é intrínseco às condições políticas, de saúde e educacionais. O Brasil do final do século XIX e início do século XX era o país das oligarquias, especialmente a do café. A maioria dos 15 milhões de brasileiros estava no campo, mas uma massa de trabalhadores livres, sem conseguir sobreviver nas lavouras, correu para as cidades em busca de trabalho (FORMAÇÃO, 2009a). 1. Alunas do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde. 2. Tutoras da segunda turma do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na Área da Saúde e docentes da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp). 311 Nas principais cidades já existiam algumas fábricas, oficinas, além de comércio e serviços. Trabalhava-se muito, ganhava-se pouco e pagava-se caro para viver mal (BADARÓ, 2002). A imprensa operária denunciava as péssimas condições de trabalho adulto e infantil. O movimento sindical era autônomo em relação ao Estado e, por isso, as tensões eram grandes e as greves sufocadas pela força policial (BADARÓ, 2002). A economia dependia de toda a força de trabalho, que precisava se adequar às exigências da produção da jovem indústria, e, ao mesmo tempo, ser capaz de manter os padrões de produção. O Estado, então, comprometido com os interesses das elites produtoras, intensifica seu processo de organização para assegurar o sucesso do projeto de industrialização, para que as ações em Saúde e em Educação fossem prioritárias, a fim de garantir uma força de trabalho em condições de produzir. O Estado tratou das epidemias que poderiam impactar a vida econômica (FORMAÇÃO, 2009a). Nesse contexto, o projeto de intervenção estatal em saúde era o campanhista/policial (ELIAS, 2002), pautado nos princípios da corrente bacteriológica, sob os cuidados da impopular Polícia Sanitária, que assegurava a moralidade e a disciplinização higiênica. Em nenhum momento a educação sanitária, ou educação em saúde, foi cogitada autenticando a ação da policia em prol da saúde, mantendo a massa da população na ignorância. Diante de tal cenário, em 1904, não sem motivos, explodiu a Revolta da Vacina. Ao contrário do que muitos pensavam, esse movimento não foi apenas uma reação de caráter compulsório da vacinação; a Revolta se explica, essencialmente, como a reação às precárias condições de vida da população, à carestia, às reformas urbanas e, também, à vacinação obrigatória (FORMAÇÃO, 2009a). No início do século XX foram instalados os serviços de Higiene, a Diretoria Geral de Saúde Publica, o Instituto Soroterápico de Manguinhos e o Instituto Butantã. Foi um tempo de importante desenvolvimento tecnológico e de um ativo Movimento Sanitário (FORMAÇÃO, 2009a). Nesse cenário, em 1923 foi criada a Escola de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, que em 1926 passou a ser chamada de Escola de Enfermagem Anna Nery, possibilitando a formação de profissionais de Enfermagem fora da influencia do clero, o que, provavelmente, apresentouse como uma ameaça ao poder e prestígio das ordens religiosas, força social que ainda hoje participa das disputas pela hegemonia na área da prestação da assistência e da formação em saúde (BATISTA, 2000). No início da década de 1920 um movimento sanitário chamado Redes 312 Locais Permanentes foi planejado. Esse movimento, que tinha a educação sanitária como instrumento das práticas médico-sanitárias, fazia parte da Reforma proposta pelo Departamento Nacional de Saúde Pública. Para tanto era necessário formar equipes profissionais que atuassem, de forma sistemática, junto à população. Nesse contexto introduzem a Educação Sanitária em unidades de saúde existentes. Em 1927, o Decreto número 17.943 cria o Código de Menores do Brasil, considerando as regras sobre a proteção, a assistência e controle das crianças e adolescentes (LÚCIA, 1999). Na passagem dos anos 1920 aos anos 1930, o país entra em uma crise econômica, afundando na miséria decorrente da depressão econômica mundial (1929-1933). A chamada Revolução de 1930 instaura uma ruptura no modelo socioeconômico e político do Brasil e representa a aliança entre a burocracia civil e militar e a burguesia industrial, com o objetivo de industrializar o país (FORMAÇÃO, 2009a). A legislação trabalhista criada a partir da década de 1930 destacouse como peça-chave nessa ruptura e na construção da hegemonia do novo grupo dominante junto aos setores populares urbanos. O operariado urbano, alvo de forte repressão anterior, não era mais tratado como questão de polícia, mas como questão de política. Para tanto, o Estado era agora mediador dos antagonismos entre as classes sociais, criando o salário mínimo, o aviso prévio e a estabilidade, a licença-maternidade, como formas de se evitar a pauperização excessiva da classe operária, o que deveria conter a resistência dos trabalhadores (FORMAÇÃO, 2009a). No campo da atenção à saúde, prevalece o modelo médico-sanitário. Nele evidencia-se a noção de que o processo saúde-doença é um fenômeno coletivo, mas determinado, em última análise, pelas questões próprias das pessoas. Assim, é na higiene do meio e do indivíduo e no processo educacional de produção de consciências que estariam as bases científicas da atuação da saúde publica (ELIAS, 1992). Em 1940 a situação da Segunda Guerra Mundial também repercutiu no setor de Saúde no Brasil. A implantação do Serviço Especial de Saúde Pública (Sesp) é um exemplo de iniciativa decorrente das relações do governo brasileiro com o governo norte-americano. Sob influência do pensamento de renovação pedagógica fundamentado nas contribuições da psicologia científica, inaugurava-se uma análise biopsicologizada do desempenho escolar do aluno, impondo estudos sistematizados e a aplicação dos processos técnicos, sobretudo dos testes de inteligência. A ideia era classificar os alunos e oferecer programas específicos, atendendo às aptidões individuais (FORMAÇÃO, 2009a). 313 Nesse mesmo período são criados o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), o Serviço Social da Indústria (Sesi) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), passos importantes para a modernização das relações do capitalismo no Brasil (FORMAÇÃO, 2009a). No governo Dutra (1946–1951), foram abandonadas as diretrizes políticas e as práticas de caráter nacionalista, privilegiando não mais o fortalecimento do capitalismo do tipo nacional, e sim uma política de associação de interdependência entre grupos nacionais e estrangeiros, traduzida por um compromisso fundamental com a “livre iniciativa”, compromisso esse que também se manifesta na área educacional, mediante a ampliação da participação de forças sociais sempre atuantes: o setor privado da educação e a Igreja Católica (FORMAÇÃO, 2009a). No modelo médico-sanitário do pós-guerra, apesar da dicotomia entre a assistência médica e a saúde pública, havia elementos que possibilitavam a introdução dos instrumentais clínicos como componentes das ações coletivas, dentro de uma perspectiva multicasual do processo saúde-doença, desde que inseridos no interior de um dado programa de Saúde3. Com a volta de Getúlio Vargas eleito (1951–1954), é criado o Ministério da Saúde separado do Ministério da Educação. Por volta de 1946 o número de ocupações em Saúde ampliou-se e diversificou-se; no entanto, a formação se manteve praticamente como no período anterior. A formação médica estava consolidada no país e, em geral, o médico respondia política e tecnicamente, não só pela formação dos demais profissionais de Saúde, como pelos serviços de Saúde (sua organização, seu funcionamento e sua administração) (FORMAÇÃO, 2009a). Já na década de 1950, em termos de política educacional, depois de anos tramitando no Congresso, é assinada a primeira Lei de Diretrizes e Bases: a Lei número 4.024/61. Ganham expressão os movimentos sociais de educação popular: o Movimento de Educação de Base (MEB), o Movimento de Cultura Popular (MCP), o Movimento de Cultura Popular de Pernambuco e a Campanha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler, do Rio Grande do Norte, os Centros Populares de Cultura (CPC), da União Nacional dos Estudantes (UNE), todos disputando a orientação de um plano nacional de alfabetização (FORMAÇÃO, 2009a). Entre 1961 e 1964, reduzidos os investimentos e a entrada de capital estrangeiro, agravou-se a inflação do país. Nem Jânio Quadros, que renunciou em 1961 alegando que forças terríveis o obrigavam a aquilo, nem João Goulart, que assumiu o governo com forte resistência das elites, estavam em condições 314 de resolver as contradições herdadas pelo governo de Juscelino Kubitschek. No inicio de 1964, a crise dominava o Brasil. Sem apoio das elites, Jango não teve sucesso nas reformas de base prometidas, abortadas por um golpe militar que contava com o apoio de setores mais conservadores da sociedade civil (FORMAÇÃO, 2009a). Nos anos 1970 desenvolveu-se acentuadamente o que se chamou de “tecnicismo educacional”, inspirado nas teorias behavioristas da aprendizagem e da abordagem sistêmica do ensino, que definiu uma prática pedagógica altamente controlada e dirigida pelo professor, com atividades mecânicas inseridas numa proposta educacional rígida e passível de ser totalmente programada em detalhes. A supervalorização da tecnologia programada de ensino trouxe consequências: a escola se revestiu de uma grande autossuficiência, reconhecida por ela e por toda a comunidade atingida, criando assim a falsa ideia de que aprender não é algo natural do ser humano, mas que depende exclusivamente de especialistas e de técnicas. O que é valorizado nessa perspectiva não é o professor, mas a tecnologia: o professor passa a ser um mero especialista na aplicação de manuais e sua criatividade fica restrita aos limites possíveis e estreitos da técnica utilizada. A função do aluno é reduzida a um indivíduo que reage aos estímulos de forma a corresponder às respostas esperadas pela escola, para ter êxito e avançar. Seus interesses e seu processo particular não são considerados e a atenção que recebe é para ajustar seu ritmo de aprendizagem ao programa que o professor deve implementar. Essa orientação foi dada para as escolas pelos organismos oficiais durante os anos 1960, e até hoje está presente em muitos materiais didáticos com caráter estritamente técnico e instrumental, inspirados nas ideias de eficiência e produtividade, tão claras ao regime militar. Em 1971, a Lei número 5.692 ampliou a escolarização obrigatória de quatro para oito séries e definiu mais de uma centena de habilitações profissionais (Parecer número 45/72) (FORMAÇÃO, 2009a). Voltada para as necessidades de desenvolvimento econômico de então e, especialmente, para a contenção do acesso ao ensino superior por uma demanda cada vez maior de alunos, a nova lei institui a profissionalização compulsória no ensino do então Segundo Grau, que perdurou até 1982. A obrigatoriedade caiu especialmente pela forte resistência do setor privado de ensino, cujos alunos tinham apenas o interesse nos prosseguimentos em direção ao nível superior (ACACIA, 1999). A saúde pública, por sua vez relegada ao segundo plano, tornou-se uma máquina ineficiente, realizando campanhas de baixa eficácia. Os efeitos 315 foram visíveis nas altas taxas de mortalidade nas áreas metropolitanas. Nesse cenário desenvolveu-se a história e a metodologia de Paulo Freire. Nas palavras de Ana Maria Araújo Freire (1996, p. 35 apud ROSAS, 2006), foi como autor do Relatório da Comissão Regional de Pernambuco, intitulado “A educação de adultos e as populações marginais – o problema dos Mocambos”, apresentado no II Congresso Nacional de Educação, realizado no Rio de Janeiro em julho de 1958, “que Paulo Freire firmou-se como educador progressista (ROSAS, 2006). Na medida em que se aprofundava na análise política e filosófica da educação, Paulo Freire definia sonhos e utopias possíveis; seu pensamento fazia-se mais consistente, seu fazer, mais criativo, sem perder a coerência entre o pensar e o fazer. Essa busca de coerência é reconhecida por muitos autores. De outra parte, provocou perplexidades e críticas, nem sempre formalmente expressas. Defender a rigorosidade ética e combater o rigorismo, tudo bem. Entretanto, agir de acordo com a rigorosidade ética, mas sem rigorismo, suscitou, muitas vezes, incompreensões (ROSAS, 2006). A substituição do formato convencional das salas de aula pela distribuição dos atores em círculos e o emprego de técnicas de grupo (a conversa, o grupo de estudo, o grupo de ação, o fórum, o grupo de debate e a carta temário), como alternativas à conferência e à exposição didática, preparavam o clima para o diálogo e a descoberta, pelos atores, de saberes já existentes entre eles, mas não percebidos como saberes. O “movimento” da consciência intransitiva para a transitivo-ingênua e, desta, para a consciência “fanatizada” (massificação) ou a consciência crítica foi, de certo, o ponto de partida para as construções futuras da pedagogia freireana – inclusive dos princípios do “método Paulo Freire de alfabetização”. A utilização de técnicas audiovisuais (projetores) facilitaria a prática do “método”, tanto quanto poderia facilitar, entre os alfabetizandos e os alfabetizados, sobretudo a partir da problematização e da pergunta/diálogo, a leitura ou releitura crítica do mundo (ROSAS, 2006). No processo de criação do “método”, Paulo Freire, do mesmo modo como ocorrera com sua própria alfabetização, salienta o universo vocabular do alfabetizando como ponto de partida. Descreve a Nilcéa Pelandré Lemos (2002): “[...] era preciso que eu fosse ao contexto de quem ia aprender a ler, para pesquisar o discurso da cotidianidade e de lá retirar o vocabulário a ser utilizado no processo”. Na simplicidade desse ato se encontra a origem do envolvimento dos alfabetizandos, não apenas quanto ao interesse por aprender a ler a palavra escrita, mas em se dispor a participar da problematização de situações e a dialogar quanto à busca de explicações lógicas para as situações/problemas. 316 A educação segundo Paulo Freire No processo de criação do “método”, Paulo Freire, do mesmo modo como ocorrera com sua própria alfabetização, salienta o universo vocabular do alfabetizando como ponto de partida (FREIRE, 1982). O Método Paulo Freire está dividido em 3 diferentes etapas, definidas abaixo, sendo: a investigação, a tematização e a problematização (FREIRE, 1982). Na etapa de investigação aluno e professor buscam, no universo vocabular do aluno e da sociedade onde ele vive, as palavras e temas centrais de sua biografia. Já na etapa de tematização eles codificam e decodificam esses temas, buscando o seu significado social, tomando assim consciência do mundo vivido; e na etapa da problematização aluno e professor buscam superar uma primeira visão mágica por uma visão crítica do mundo, partindo para a transformação do contexto vivido (FREIRE, 1982). O advento dos anos 1960 encontrou Paulo Freire com todo o delineamento de um pensamento político-pedagógico dialógico e libertador, conducente a atitudes indicativas da autonomia e do intercâmbio dos saberes entre o aprendiz e o educador. Nos anos 1970 e 1980 surgiram várias outras abordagens críticas em oposição à pedagogia tradicional e inspiradas nos princípios freireanos, e uma delas em especial merece destaque pela forte presença na área da Enfermagem. É a pedagogia da problematização (FORMAÇÃO, 2009b). A Educação segundo Demerval Saviani Segundo Demerval Saviani, a educação não tem o poder de determinar as relações sociais, mas ao mesmo tempo que é por ela determinada. Ela pressupõe erroneamente que, dada uma sociedade capitalista, a educação apenas e tão somente reproduz os interesses do capital (FIGUEIREDO, 2009). As ideias contidas no livro Pedagogia histórico-crítica, de Dermaval Saviani (1991 apud CHAVES, 2004), procuram aproximar o leitor do significado da concepção educacional que desde 1984 vem sendo denominada pedagogia histórico-crítica. Uma prática pedagógica que propõe uma interação entre conteúdo e realidade concreta, visando à transformação da sociedade por meio da ação-compreensão-ação do educando, que enfoca os conteúdos como produção histórico-social de todos os homens, como superação das visões não críticas e crítico-reprodutivistas da educação. Neste sentido dá continuidade e complementa as análises apresentadas no livro Escola e democracia, que 317 pode ser considerado uma introdução a esse novo paradigma educacional (CHAVES, 2004). Objetivo Analisar as concepções e metodologias dos educadores Paulo Freire e Demerval Saviani. Metodologia Na expectativa de elucidar a questão científica levantada, optou-se por realizar uma análise bibliográfica, utilizando trabalhos e livros que empregam assuntos relacionados a Paulo Freire e Demerval Saviani. A revisão literária tem por objetivo fundamental fazer uma pequena apresentação da informação disponível nos meios sobre as concepções pedagógicas, seus principais conceitos e marcos teóricos dos professores Paulo Freire e Demerval Saviani. O estudo da produção acadêmica sobre a temática foi realizada nas bases de dados Edubase, IBE-Unesco, Scielo, Book Google. As palavras utilizadas para a pesquisa foram: Paulo Freire, Demerval Saviani, pedagogia, metodologia. Análise e Discussão As práticas educativas são amplamente utilizadas na área da Saúde, tanto na formação contínua dos profissionais que atuam nesta área quanto no campo da educação em saúde para a população em geral. A interseção desses dois campos de conhecimento humano se dá por intermédio do desenvolvimento de práticas educativas norteadas por um conjunto de representações de homem e de sociedade que se quer efetivar. Essas representações são demonstradas por meio da discussão dos processos de ensino-aprendizagem utilizados nas tendências pedagógicas mais dominantes em nosso meio: a pedagogia tradicional, a renovada, por condicionamento e a libertadora. A partir dos princípios, métodos e consequências ao nível individual e social de cada pedagogia apresentada, concluímos que a pedagogia libertadora pode produzir melhores resultados que as demais correntes pedagógicas estudadas, por possibilitar a participação ativa do educando no processo da aprendizagem, propiciando o desenvolvimento contínuo das habilidades humanas tanto da clientela quanto dos trabalhadores da área de Saúde. 318 O método Paulo Freire não ensina a repetir palavras, não se restringe a desenvolver a capacidade de pensá-las segundo as exigências lógicas do discurso abstrato; simplesmente coloca o alfabetizando em condições de poder “reexistenciar” criticamente as palavras de seu mundo, para, na oportunidade devida, saber e poder dizer a sua palavra. Eis porque, em uma cultura letrada, o alfabetizando aprende a ler e escrever, mas a intenção última com que o faz, vai além da alfabetização. Atravessa e anima toda a empresa educativa, que não é senão aprendizagem permanente desse esforço de totalização – jamais acabada – por meio do qual o homem tenta abraçar-se inteiramente na plenitude de sua forma. É a própria dialética em que se “existência” o homem. Mas, para isto, para assumir responsavelmente sua missão de homem, há de aprender a dizer a sua palavra, pois, com ela, constitui a si mesmo e a cunha humana em que se constitui; instaura o mundo em que se humaniza, humanizando-o. A pedagogia da problematização parte da base que, em um mundo de mudanças rápidas, o importante não são os conhecimentos ou idéias, nem os comportamentos corretos e fáceis que se espera, mas sim o aumento da capacidade do aluno – participante e agente da transformação social – para detectar os problemas reais e buscar para eles soluções originais e criativas. Por essa razão, a capacidade que se deseja desenvolver é a de fazer perguntas relevantes em qualquer situação, para entendê-las e ser capaz de resolvê-las adequadamente. Em termos de capacitação em gestão e produtividade, não é tão importante, dentro do contexto dessa pedagogia, a transmissão fiel de conceitos, fórmulas, receitas e procedimentos, nem tampouco a aquisição de hábitos fixos e rotinas de trabalho que conduzem a uma boa gestão. Em certas situações, é mais importante e urgente desenvolver a capacidade de observar a realidade imediata ou circundante como a global e estrutural; detectar todos os recursos de que se possa lançar mão; identificar os problemas que obstaculizam um uso eficiente e equitativo dos ditos recursos; localizar as tecnologias disponíveis para usar melhor os recursos ou até inventar novas tecnologias apropriadas; e encontrar formas de organização do trabalho e da ação coletiva para conseguir o todo anteriormente citado. Essa pedagogia não separa a transformação individual da transformação social, pela qual ela deve desenvolver-se em situação grupal. Mas em 1979 confirmou-se mais claramente uma forma de conceber a educação, gestada desde o início da década por educadores críticos: a concepção histórico-crítica da educação, expressão cunhada pelo educador Demerval Saviani, recuperando uma dimensão ausente nos modelos pedagógicos 319 propostos até aquele momento, isto é, a dimensão histórica da educação. Segundo o autor, a educação é concebida como “produção do saber”, pois o homem é capaz de elaborar ideias, possíveis atitudes e uma diversidade de conceitos. O ensino como parte da ação educativa é visto como processo, no qual o professor é o “produtor” do saber e o aluno “consumidor” do saber. A aula seria produzida pelo professor e consumida pelo aluno. O professor, por possuir competência técnica, é o responsável pela transmissão e socialização do saber escolar, cabendo ao aluno aprender os conteúdos para ultrapassar o saber espontâneo. Saviani (1991, p. 29 apud SANTOS, 2010) enfatiza o currículo escolar, a escrita e o conhecimento científico, colocando a escola como mediadora entre o saber popular e o saber erudito, no sentido de sua superação. “Pela mediação da escola, dá-se a passagem do saber espontâneo ao saber sistematizado, da cultura popular à cultura erudita.” O saber popular seria o ponto de partida, e o saber científico, o ponto de chegada. A igualdade para Saviani estaria no acesso ao saber sistematizado, portanto, pelo ponto de chegada. Ele deixa clara a função direta e de intervenção do professor, na medida em que possui o saber teórico, sendo o responsável pela transmissão e socialização desse saber. Cabe ao educando aprender os conteúdos para ultrapassar o saber espontâneo e adquirir o conhecimento sistematizado (SANTOS, 2010). Na tentativa de classificar as teorias pedagógicas, Saviani faz, inicialmente, uma grande divisão: de um lado, as teorias pedagógicas críticas; de outro lado, as teorias pedagógicas não críticas. Uma teoria pedagógica é crítica se “leva em conta os determinantes sociais da educação”; é não crítica se “acredita [...] ter a educação o poder de determinar as relações sociais, gozando de uma autonomia plena em relação… à estrutura social”. Na interpretação de Saviani, esse critério nos leva a concluir que a teoria pedagógica tradicional e a escolanovista são não críticas e que a teoria pedagógica crítico-reprodutivista e a histórico-crítica são, como pretendem, críticas (CRESTANI, 1999). Enfocaremos aqui os pontos essenciais desenvolvidos nesse estudo. Quanto à pedagogia histórico-crítica, ficou evidenciado o porquê de esta ser chamada de histórico-crítica por Saviani – histórica: porque nessa perspectiva a educação também interfere sobre a sociedade, podendo contribuir para a sua transformação; crítica: por ter consciência da determinação exercida pela sociedade sobre a educação. Essa concepção nasceu das necessidades postas pela prática de muitos educadores, pois as pedagogias tradicionais, nova e tecnicista não apresentavam características historicizantes; faltava-lhes 320 a consciência dos condicionantes histórico-sociais da educação (SAVIANI, 2007). Portanto, é na realidade escolar que se enraíza essa proposta pedagógica (CRESTANI, 1999). Essa pedagogia objetiva resgatar a importância da escola, a reorganização do processo educativo, ressaltando o saber sistematizado, a partir do qual se define a especificidade do saber escolar. Essa é uma teoria de grande relevância para a educação brasileira, pois evidencia um método diferenciado de trabalho, especificando-se por passos que são imprescindíveis para o desenvolvimento do educando (primeiro passo: prática social; segundo passo: problematização; terceiro passo: instrumentalização; quarto passo: catarse; quinto passo: prática social) (CRESTANI, 1999). Os cinco passos que formam a didática da pedagogia histórico-critica exigem do educador uma nova forma de pensar os conteúdos: estes devem ser enfocados de maneira contextualizada em todas as áreas do conhecimento humano, evidenciando que o conhecimento advém da história produzida pelos homens nas relações sociais de trabalho. Essa didática objetiva um equilíbrio entre teoria e prática, envolvendo os educandos em uma aprendizagem significativa dos conhecimentos científicos e políticos, para que eles sejam agentes participativos de uma sociedade democrática e de uma educação política. A seguir os passos estruturados por Demerval Saviani (CRESTANI, 1999): 1º passo: prática social inicial – é o nível de desenvolvimento atual do educando. Expressa-se pela prática social inicial dos conteúdos. Tem seu ponto de partida no conhecimento prévio do professor e dos educandos. É o que o professor e alunos já sabem sobre o conteúdo, no ponto de partida, em níveis diferenciados (CRESTANI, 1999). Este passo desenvolve-se, basicamente, em dois momentos: a) o professor anuncia aos alunos os conteúdos que serão estudados e seus respectivos objetivos; b) o professor busca conhecer os educandos por meio do diálogo, percebendo quais as vivências próxima e remota cotidianas desse conteúdo antes que lhe seja ensinado em sala de aula, desafiandoos para que manifestem suas curiosidades, dizendo o que gostariam de saber a mais sobre esse conteúdo. 2º passo: problematização – consiste na explicação dos principais problemas postos pela prática social, relacionados ao conteúdo que será tratado. Este passo desenvolve-se na realização de: 321 a) uma breve discussão sobre esses problemas em sua relação com o conteúdo científico do programa, buscando as razões pelas quais o conteúdo escolar deve ou precisa ser aprendido; b) em seguida, transforma-se esse conhecimento em questões, em perguntas problematizadoras, levando em conta as dimensões científica, conceitual, cultural, histórica, social, política, ética, econômica, religiosa etc., conforme os aspectos sobre os quais se deseja abordar o tema, considerando-o sob múltiplos olhares. Tais dimensões do conteúdo são trabalhadas no próximo passo, o da instrumentalização. 3º passo: instrumentalização – o que se expressa no trabalho do professor e dos educandos para a aprendizagem. Para isso, o professor: a) apresenta aos alunos, por intermédio de ações docentes adequadas, o conhecimento científico, formal, abstrato, conforme as dimensões escolhidas na fase anterior; os educandos, por sua vez, por meio de ações estabelecerão uma comparação mental com a vivência cotidiana que possuem desse mesmo conhecimento, a fim de se apropriar do novo conteúdo; b) Neste processo usam-se todos os recursos necessários e disponíveis para o exercício da mediação pedagógica. 4º passo: catarse – é a expressão elaborada de uma nova forma para entender a teoria e a prática social. Ela se realiza: a) por meio da nova síntese mental à qual o educando chegou; manifesta-se em uma nova postura mental, unindo o cotidiano ao científico, em uma nova totalidade concreta no pensamento. Neste momento o educando faz um resumo de tudo o que aprendeu, segundo as dimensões do conteúdo estudadas. É a elaboração mental do novo conceito do conteúdo; b) esta síntese se expressa por uma avaliação oral ou escrita, formal ou informal, na qual o educando traduz tudo o que aprendeu até aquele momento, levando em consideração as dimensões sob as quais o conteúdo foi tratado. 5º passo: prática social final – é o novo nível de desenvolvimento atual do educando. Consiste em assumir uma nova proposta de ação a partir do que foi aprendido. Este passo se manifesta: a) pela nova postura prática, pelas novas atitudes, novas disposições 322 que se expressam nas intenções de como o aluno levará à prática, fora da sala de aula, os novos conhecimentos científicos; b) pelo compromisso e pelas ações que o educando se dispõe a executar em seu cotidiano, pondo em efetivo exercício social o novo conteúdo científico adquirido (GASPARIN; PETENUCCI, 2011). Trata-se de uma abordagem educativa mais explicitamente adotada nos anos 1980, época da implantação do Projeto Larga Escala, apoiado pelo Ministério da Saúde e pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Essa abordagem, inicialmente voltada para o ensino técnico em saúde nas escolas técnicas do Sistema Único de Saúde (SUS), foi sendo introduzida em cursos de graduação e pós-graduação como alternativa ao ensino tradicional. Conclusão Pode-se observar que a utilização conjunta das duas metodologias apresentadas neste estudo resulta em uma prática pedagógica completa e abrangente. O uso da experiência vivida, do contexto político-social e da construção de conhecimento a partir de experiências sugeridas por Paulo Freire compartilha da mesma essência da metodologia desenvolvida posteriormente por Demerval Saviani. Porém este autor tem como diferencial o desenvolvimento do pensamento histórico-crítico e a sistematização da educação, tornando a união desses dois métodos pedagógicos uma abordagem completa e construtiva tanto para o discente como para o docente. Concluindo, acreditamos que a pedagogia histórico-crítica descrita por Saviani traz em sua essência aspectos que complementam a pedagogia freireana, tornando o método sistematizado e estimulante tanto ao aluno quanto ao professor. Referências ACACIA, K. As políticas de formação: a construção da identidade do professor sobrante. Educação e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 68, p. 163-183, dez. 1999. BADARO, M. M. Trabalhadores e sindicato no Brasil. Rio de Janeiro: Vício de Leitura, 2002. BAPTISTA, S. D. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Biotempo, 2000. CHAVES, E. O. Pedagogia histórico-crítica: é preciso aproximar mais. [s.l.: s.n], 2004. 323 Disponível em: < http://chaves.com.br/TEXTSELF/PHILOS/dermeval.htm>. Acesso em: ago. 2011. CRESTANI, L. A. Pedagogia histórico-crítica na perspectiva de Dermeval. 1999. Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/33940715/dermeval>. Acesso em: ago. 2011. ELIAS, M. E. A saúde pública como política: um estudo sobre formuladores de política. São Paulo: Hucitec, 1992. FIGUEIREDO, N. M. Método e metodologia na pesquisa científica. São Caetano do Sul: YENDIS, 2009. FORMAÇÃO docente em educação profissional técnica na áera da saúde: a organização pedagógica no trabalho docente em saúde. Rio de Janeiro: Ediouro, 2009b. v. 3. FORMAÇÃO docente em educação profissional técnica na áera da saúde: trabalho, saúde e educação. Rio de Janeiro: Ediouro, 2009a. v. 1 FREIRE, P. Estudar não é um ato de consumir idéias, mas de criá-las e recriá-las. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. p. 9-12. GASPARIN, J. L.; PETENUCCI, M. C. Pedagogia histórico crítica: da teoria à prática no contexto escolar. 18 maio 2011. Disponível em: < http://pt.scribd.com/doc/55736152/ pedagogias>. Acesso em: ago. 2011. LEMOS, N. P. Ensinar e aprender com Paulo Freire: 40 horas, 40 anos depois. São Paulo: Cortez, 2002. LÚCIA, R. M. História da enfermagem em sua relação coma saúde pública. Goiania: AB, 1999. ROSAS, P. Paulo Freire: aprendendo com a própria história. [S.l: s.n., 2006]. Disponível em: < http://www.fundaj.gov.br/observanordeste/obex06.pdf>. Acesso em: ago. 2011. SANTOS, A. Que é educação segundo Demerval Saviani. 7 jun. 2010. Disponível em: <http:// www.webartigos.com/articles/39836/1/QUE-E-EDUCACAO-SEGUNDO-DEMERVALSAVIANI/pagina1.html>. Acesso em: ago. 2011. 324 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL EM ENFERMAGEM E A INFECÇÃO RELACIONADA À ASSISTÊNCIA A SAÚDE Aurivan Andrade de Lima1 Érica Gomes Pereira2 RESUMO Trata-se de um estudo de caso exploratório documental que objetiva propor uma reformulação do conteúdo pertinente à biossegurança/controle de infecção relacionada à assistência à saúde à luz da pedagogia histórico-crítica. Ainda existe um grande déficit de qualidade na formação do profissional de enfermagem no que se diz respeito à biossegurança. Portanto os cursos de formação profissional precisam ser revistos pelos responsáveis pela elaboração de planos e programas de ensino. Descritores: Formação Profissional; Biossegurança; Modelos Pedagógicos; Ensino Técnico em Enfermagem. INTRODUÇÃO “O Sistema Único de Saúde (SUS) é formado pelo conjunto de todas as ações e serviços de saúde prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público. À iniciativa privada é permitido participar desse Sistema de maneira complementar” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2000). Podemos entender o SUS da seguinte maneira: um núcleo comum, que concentra os princípios doutrinários, sendo eles: Universalização, Equidade e Integralidade. Observa-se que as escolas/cursos vêm encontrando dificuldades na incorporação das propostas para incrementar as mudanças na formação 1. Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Enfermeiro da Comissão de Controle da Infecção Hospitalar. Ex-aluno do curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na área da Saúde da ENSP/Fiocruz. Núcleo São Paulo/SP [email protected] 2. Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Enfermeira. Especialista em laboratório de ensino, pesquisa e extensão. Mestre em Enfermagem. Tutora do curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica na área da Saúde da ENSP/Fiocruz. Núcleo São Paulo/SP [email protected] 325 dos futuros profissionais, principalmente aquelas relativas à aquisição/ desenvolvimento/ avaliação das competências e das habilidades, dos conteúdos essenciais, das práticas/estágios e das atividades complementares. A articulação entre teoria e prática pressupõe ações pedagógicas que, ultrapassando os muros da academia, indicam a necessidade da inserção do aluno em realidades concretas na prática, numa continua aproximação do mundo do ensino com o mundo do trabalho. Para que esta articulação aconteça é necessária a interiorização de uma pedagogia histórico crítica que, conforme Saviani (2003), podem ser classificadas em “não crítica e crítico - reprodutivista”. No grupo não-crítico tem-se a pedagogia da escola tradicional, a da escola tecnicista e a da escola nova. Este grupo caracteriza-se, segundo o autor, por estarem descontextualizadas da realidade, não sofrendo as influências de questões que afetam os seres humanos em sociedade. As teorias críticas, por sua vez, são aquelas que se preocupam em compreender a educação como algo determinado socialmente. Para Saviani, o que condicionaria o ensino, neste caso, seria a estrutura socioeconômica. Nas teorias críticas, a sociedade é marcada por grupos ou classes antagônicas que se relacionam através da produção da vida material. As Infecções Relacionadas à Assistência a Saúde (IRAS), enquanto acontecimento entre cliente e procedimentos a ele executados pela equipe multiprofissional, têm sido um cenário permanente de discussões e reflexões entre profissionais da saúde e comunidade de maneira geral. As IRAS é um agravo de grande significado epidemiológico, no contexto da assistência a saúde, sendo suas conseqüências tanto do ponto de vista econômico quanto social de grande relevância. Azambuja, Pires e Vaz (2004), citando Ministério da Saúde 1994, comentam “que seus primeiros estudos a respeito de controle de infecção hospitalar, demonstraram que a taxa de infecção hospitalar no Brasil, é, em média de 15,5%. No entanto, a média mundial corresponde a 5%. Embora dentro da média aceita pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de 9 a 20%, para estes autores muito ainda precisa ser feito no país, pois apesar da existência de políticas voltadas à prevenção e controle das infecções hospitalares, tanto exigências externas (dos órgãos competentes) quanto exigências internas (própria de cada trabalhador), ainda não estão voltadas ao cumprimento de tais políticas. Diante disso, é essencial que se tenham profissionais cada vez mais qualificados no que se diz respeito a controle de infecção, uma vez que terão 326 que assessorar diversas áreas e seus conhecimentos, por muitas vezes, serão decisórios. A responsabilidade de prevenir e controlar a IRAS é individual e coletiva. De nada adianta o conhecimento do fenômeno e das medidas preventivas, se quem presta assistência não as adotam no seu fazer profissional. A enfermagem, através do cuidado prestado, integra o trabalho dos demais profissionais, possibilitando incrementar esta política institucional de controle de infecção. Grandes avanços científicos e tecnológicos ocorreram e, no entanto, as IRAS continuam a se constituir em séria ameaça à segurança dos pacientes hospitalizados, contribuindo para elevar as taxas de morbi-mortalidade, aumentar os custos de hospitalização mediante o prolongamento da permanência e gastos com procedimentos diagnósticos. Para Tipple (2003), muito se investe na formação de enfermagem no sentido de adquirir competência para executar um procedimento esperado, porém a ênfase no controle de infecção fica a desejar. Entendemos que atuar na formação dos profissionais de saúde é intervir num momento no qual estes estão construindo seus conhecimentos e desenvolvendo habilidades técnicas para o exercício profissional. Especialmente no momento em que as políticas públicas de implantação do SUS e a mudança do modelo assistencial estão ocorrendo, a formação e a educação continuada representam os esforços que alavancarão o controle de infecção, na sua interdisciplinaridade e intersetorialidade. Caminha-se para um novo fazer de Enfermagem, com modelos de cuidados mais seguros. Uma das preocupações crescentes refere-se a como preparar o profissional de saúde para o controle de infecção, considerando a sua interdisciplinaridade. Viabilizar o contato do estudante com todas as normas e legislação orientadora e reguladora da prevenção e controle de infecção é um importante caminho. Quanto mais precoce este contato for feito em sua formação, maior a chance do futuro profissional assimilar estes ensinamentos. Assim sendo, os princípios, normas e postulados relacionados à prevenção e controle das IRAS devem compor o currículo dos profissionais da saúde de modo integrado, onde os planos de ensino específicos para a formação profissional dos diferentes cursos possam carregar a filosofia e a prática da prevenção e controle de infecção hospitalar. Ferreira (1997) revelou que os conteúdos sobre infecção hospitalar oferecidos nos cursos de graduação, bem como em outros cursos realizados não foram suficientes para que pudessem atuar de forma efetiva na prevenção 327 e controle de infecção. Isto pois, os profissionais não conseguem visualizar com exatidão qual o seu papel nesta prática. Como consequência, a falta de conhecimento nesta área é um fator importantíssimo para limitar a atuação do profissional. Visando uma melhoria na atuação e atualização das equipes na prática da prevenção e controle de infecção hospitalar, foram sugeridos, pelos próprios participantes da pesquisa conduzida por Ferreira, o estabelecimento de uma disciplina especifica ao tema em questão, o enfoque das outras disciplinas do currículo à infecção hospitalar e a implementação de um programa de educação continuada. Para esta autora, os resultados demonstraram a necessidade de se repensar o currículo de enfermagem e os programas de educação continuada, bem como a introdução de uma política institucional voltada a este assunto. Pode-se acrescentar ainda a importância da criação de uma disciplina especifica em controle de infecção hospitalar, para que os profissionais da área de enfermagem possam ter uma visão completa do cliente, na integralidade de sua assistência e não de forma fragmentada como vem acontecendo dentro da maioria dos cursos de formação em Enfermagem (OLIVEIRA et. al, 2003). Devido a estas dificuldades, procuramos desenvolver o trabalho voltado para reformulação de um plano de ensino de uma escola técnica de enfermagem de um grande centro urbano sobre biossegurança/controle de infecção relacionada à assistência a saúde. OBJETIVOS Identificar potencialidades e limitações na organização curricular de um curso técnico em enfermagem num grande centro urbano com enfoque em biossegurança/controle de infecção relacionada à assistência a saúde; Propor uma reformulação do conteúdo pertinente à biossegurança/ controle de infecção relacionada à assistência a saúde à luz da pedagogia histórico-crítica. MATERIAIS E MÉTODOS Trata-se de um estudo de caso exploratório documental no qual foram pesquisados 17 artigos nos bancos de dados LILACS, MEDLINE e no portal SciELO, levando em consideração os artigos publicados de 1996 até 2009, nacionais e internacionais. Foram utilizados para a localização dos artigos os descritores: Infecção hospitalar, educação e enfermagem. 328 O estudo foi realizado em uma Escola Técnica de Enfermagem de um grande Centro Urbano, sendo utilizado para coleta de dados desta pesquisa o plano de curso e formulário de planejamento das aulas para o plano de Ensino de Biossegurança. RESULTADOS Utilizamos o plano de ensino de uma Escola de Enfermagem privada do Estado de São Paulo, tendo como base o Módulo de Núcleo Comum 1 no Eixo Proteção e Prevenção na Unidade Educacional de Biossegurança. A carga horária corresponde a 20 horas e traz em suas diretrizes a formação profissional de enfermagem de nível médio com competências para executar ações de enfermagem aplicando habilidades cognitivas, psicomotoras e afetivas. Estas diretrizes estão fundamentadas nos conhecimentos técnico-científicos, éticos, políticos e educacionais, a fim de contribuir para a qualidade do cuidar em enfermagem. Módulo Eixo Unidades educacionais I Núcleo comum Educação para a saúde Psicologia em saúde – 20h Ética e Cidadania – 20h Saúde Coletiva/Higiene e profilaxia – 20h Humanização – 20h Anatomia e Fisiologia Humana I – 30h Nutrição – 20h I Núcleo comum Proteção e prevenção Biossegurança – 20h Microbiologia e Parasitologia – 40h I Núcleo comum Recuperação Suporte básico à vida – 30h e reabilitação I Núcleo comum Gestão em saúde Políticas de saúde – 20h Informática – 30h II Qualificação Apoio ao diagnóstico Fundamentos de enfermagem – 150h Estágio de fundamentos de enfermagem – 120h Carga horária TP PE PPS 130 - - 60 - - 30 - - 50 - - 150 120 continua 329 II Qualificação Recuperação Dietética – 20h e reabilitaAnatomia e fisiologia humana II – 30h ção Enfermagem em clínica médica – 60h Enfermagem em doenças transmissíveis – 30h Estágio de enfermagem em clínica médica – 60h II Qualificação Gestão em saúde III Qualificação Recuperação Enfermagem em clínica cirúrgica – 60h e reabilitaEstágio de enfermagem em clínica ção cirúrgica – 60h Enfermagem em centro cirúrgico – 40h Estágio de enfermagem em centro cirúrgico – 20h Enfermagem em urgência e emergência – 60h Estágio de enfermagem em urgência e emergência – 60h Enfermagem em obstetrícia – 40h Estágio de enfermagem em obstetrícia – 40h Enfermagem em pediatria – 40h Estágio de enfermagem em pediatria – 40h Ética e legislação profissional – 20h IV Habilitação Recuperação Farmacologia – 30h e reabilitaEnfermagem em unidades críticas – 110h ção Estágio de enfermagem em unidades críticas – 110h Enfermagem em neonatologia – 30h Estágio de enfermagem em neonatologia – 40h IV Habilitação Gestão em saúde V Habilitação Recuperação Enfermagem em neuropsiquiatria – 50h Estágio de enfermagem em e Reabilitaneuropsiquiatria – 40h ção Enfermagem em saúde coletiva – 50h Estágio de enfermagem em saúde coletiva – 40h Enfermagem em saúde do idoso – 30h V Habilitação 330 Gestão em saúde Iniciação a metodologia de pesquisa – 40h Administração em enfermagem – 50h Estágio de administração em enfermagem – 50h 140 60 - 20 - - 240 220 - 170 150 - 40 - - 130 80 - 50 50 - Abaixo segue o Formulário de Planejamento de Aulas de Biossegurança da Escola Técnica de Enfermagem: Dia Hora/ aula Apresentação do professor. Sistemática de trabalho e critério de Avaliação. Normas disciplinares. - Apresentação do Conteúdo: Histórico dos Acidentes do Trabalho. Dia Hora/ aula Abordagem das principais normas regulamentadoras relacionadas aos serviços de saúde. Abordagem da NR 32 Segurança do Trabalho em Serviços de Saúde. Estatísticas de acidentes Legislação sobre segurança e saúde do trabalhador, Lei 6514/77 e Portaria 3214/78 Ministério do Trabalho e emprego – 34 Normas Regulamentadoras Comitê de perfurocortante – prevenção de acidentes com material biológico. Ricos ambientais: - Ergonômicos - de acidentes Resíduos de serviços de saúde. Prevenção de combate a incêndio. Revisão do conteúdo. 2ª Avaliação. Dia Hora/ aula Acidente do Trabalho (definição, tipos, caracterização). Benefícios previdenciários devidos aos acidentados. Dia Hora/ aula Medidas de controle dos acidentes: Medida administrativa, Proteção coletiva e individual. Dia Hora/ aula Correção da prova Riscos ambientais: - Químicos - Físicos - Biológicos 1ª Avaliação. Fatores determinantes dos acidentados do trabalho. Após a avaliação do Plano de Ensino, identificamos potencialidades e limitações, sendo elas: Potencialidades: conteúdo satisfatório para segurança do trabalhador. Limitações: a disciplina de Biossegurança atualmente é ministrada 331 por um docente formado em Engenharia e que trabalha com Segurança do Trabalho, tendo sido, o principal elaborador do referido plano de ensino. Provavelmente por este motivo o plano enfoque questões de segurança do profissional, dando menor atenção às questões de controle de infecção. Os principais recursos didáticos utilizados são audiovisuais. A avaliação da assimilação do conteúdo ministrado é feita por duas provas escritas. Não há estratégias pedagógicas participativas e o Plano atual é utilizado para todos os períodos com turmas variando de 15 a 60 alunos. Os conteúdos mais enfatizados no plano de ensino em questão são: teoria, procedimentos, técnicas e habilidades. Observa-se, no entanto, a ausência de conteúdos que abordem questões tais como os princípios e atitudes, fundamentais para que alunos/trabalhadores compreendam de forma mais clara como se deu o surgimento e a evolução das questões relacionadas à Biossegurança. Estas atitudes, quando bem sedimentadas, não serão utilizadas apenas no ambiente profissional, mas também no pessoal e coletivo. Os conteúdos dos cursos têm, de maneira geral, relevância social, mas acreditamos que alguns temas hoje vivenciados na profissão necessitam serem melhores explorados, tais como os benefícios advindos de uma adesão satisfatória às práticas de conhecimento desses alunos; os temas da higienização das mãos, da coleta seletiva de resíduos, das boas práticas, entre outros. Concordamos que a abordagem do conteúdo subsidia uma prática profissional crítica, que poderia ser melhor explorada se houvesse uma carga horária de prática, onde pudessem ser vivenciados os conceitos e informações obtidas, imprimindo maior capacidade crítica. O tratamento dado aos conteúdos interage com outros conhecimentos teóricos e práticos, mas por se tratar de uma disciplina de ações de suma importância na vida cotidiana, seja no aspecto de controle de infecção ou de risco ocupacional, não deveria ser nem apenas teórica nem estar apenas como uma matéria secundária dentro de outros temas, fragmentando-se no decorrer da formação nas diversas disciplinas. Tal situação lhe faz perder a relevância das ações aprendidas na teoria para a prática. A avaliação prevista é a escrita, sugerimos acrescentar aula de laboratório e visitas in loco nas unidades do hospital para contextualização e discussão de estatísticas/indicadores atuais. Os conteúdos são condizentes aos objetivos, à carga horária e à duração do curso, porém, na proposta metodológica da disciplina de Biossegurança apresentada nos currículos de formação de enfermagem como um todo, há uma tentativa de unificação de disciplinas de grande relevância para a formação 332 nesta área que acabam sendo fragmentadas e seus focos se dispersando, criando um “buraco” no aprendizado. Como solução a esta fragmentação, deve-se incluir na grade curricular disciplinas que se articulem em volta do tema da Biossegurança, tais como: Controle de Infecção Hospitalar, Gerência de Risco, Gerência de Resíduos dos Serviços de Saúde e Segurança do Trabalho. A carga horária definida para cada uma destas disciplinas, mesmo que reduzida, deve seguir os princípios e objetivos do conjunto, interligando-se assuntos e temas. Hoje há na área da Saúde um déficit de conhecimento nas áreas que envolvem biossegurança. A superficialidade de conhecimento em relação a este tema esta fortemente relacionada á fragmentação de seu ensino. Emerge, assim, a necessidade de uma reformulação global da grade curricular na formação de Enfermagem, seja em nível médio ou superior. Conforme as colocações mencionadas, segue abaixo uma proposta para o Plano de Ensino de Biossegurança: Plano de ensino de Biossegurança Objetivos: Proporcionar o embasamento teórico prático e despertar as responsabilidades sociais no que se diz respeito ao controle de infecção e riscos ocupacionais nos profissionais da área da saúde. Conteúdos abordados Tipo em cada aula de aula* Duração da aula Dimensões envolvidas em cada tema/aula Questões problematizadoras Legislações 15’ Política Quais são as legislações pertinentes ao CIH e a Segurança do Trabalho? História 30’ Histórica Aspectos éticos e fundamentos da epidemiologia 30’ Social / econômico Higienização das mãos 45’ Conceitual / cientifica Estação de Trabalho Higienização das mãos 60’ Como surgiu o controle de infecção e os cuidados com o risco ocupacional? Quem foram os principais teóricos e cientistas? Quais são os aspectos éticos envolvidos no CIH e a epidemiologia no Brasil e em outros países? O que é Higienização das mãos? Quais as camadas da pele e sua importância na colonização e disseminação de microrganismos? Quais são os tipos e a técnica? Quais são os produtos e matérias necessários? Quais as principais ações e trabalhos desenvolvidos na adesão a esta prática? TP 333 Precauções e Isolamentos. Uso EPI e EPC TP 60’ Controle de patógenos multirresistentes Conceitual / cientifica Conceitual / cientifica Microbiologia em CIH 30’ Estação / Dinâmica Paramentação e uso de EPIs e EPCs Controle de infecção nas respectivas topografias: pulmonar, urinária, corrente sanguínea e sítio cirúrgico. Partes moles e curativos 60’ 180’ Conceitual / cientifica Métodos de esteriliza- TP ção, limpeza e desinfecção 45’ Conceitual / cientifica Higiene ambiental e controle Integrado de pragas TP 45’ Conceitual / cientifica Imunização dos profissionais TP 45’ Conceitual / cientifica Abordagem das principais normas regulamentadoras e NR32 Segurança do Trabalho em Serviços de Saúde TP 45 Política / social / econômica 334 TP Conceitual / cientifica Quais são os tipos de precaução e as medidas para cada uma? Quais sãos os tipos de EPI e EPC e como utilizá-los? Quais são os microrganismos multirresistentes? Como os MR se disseminam? Quais são os cuidados com os MR? Como se dá o perfil de resistência? Quais são os procedimentos laboratoriais assim como transporte e acondicionamento de amostras? Quais as medidas de prevenção de IrAS com pacientes em uso de entubação traqueal ou aspiração traqueal? Quais as medidas de prevenção de IrAS em pacientes com uso de dispositivo urinário? Quais as medidas de prevenção de IrAS em pacientes com uso de dispositivo intravascular Quais as medidas de prevenção de IrAS em pacientes no pré e pós operatório? Quais as principais lesões de pele e seus cuidados? O que é úlcera por pressão, seus estágios e as medidas de prevenção de IrAS? Quais são os métodos de esterilização, limpeza e desinfecção? Como transportar, utilizar e acondicionar adequadamente os materiais esterilizados? Quais as principais soluções para desinfecção e os níveis de ação? Quais os tipos de limpeza ambiental? Qual a importância de trabalhar em local higienizado? Como controlar as pragas e qual sua importância na assistência a saúde? Quais os tipos de vacina que os PAS devam fazer uso? Por que é importante a imunização dos PAS profissionais da assistência a saúde? Qual é o fundamento e aplicabilidade da NR32 e das normas regulamentadoras de Segurança do Trabalho na vida cotidiana dos PAS? Riscos ambientais: TP químicos, físicos, biológicos, ergonômicos e de acidentes. Medidas de controle dos acidentes. Medida administrativa Resíduos do Serviço TP de Saúde 90’ Conceitual/ cien- Quais são os riscos ambientais e como tifica/ econômica preveni-los ou controlá-los? Como evitar acidentes de trabalho? Em casos de acidentes ocupacionais quais são as ações recomendadas? 60’ Conceitual/ cientifica/ política/ econômica Prevenção de controle TP de incêndio Visita no hospital para PE aplicação e discussão das questões teóricas / aplicação do check list 30’ Conceitual / cientifica Avaliação 120` TP Quais são os tipos de resíduos de saúde? Quais são as normas legislativas? Como acondicionar e transportar os resíduos de saúde? Quais são as medidas de controle de incêndio? 180` *Tipo de aula: a)TP – atividades teórico-práticas desenvolvidas em sala de aula e/ou laboratório da escola. b)PE – atividades desenvolvidas em outros ambientes que não a escola, p. ex. unidades básicas de saúde, creches, escolas públicas, hospitais e outros ambientes para a aprendizagem em situações reais de trabalho. c)PPS – atividades equivalentes ao estágio curricular e desenvolvidas com o princípio de proporcionar ao aluno a experiência profissional pela participação em situações reais de vida e trabalho. O Plano de Ensino foi elaborado como proposta para ser aplicado no período matutino, (pois na Escola estudada este período concentra-se a mediana referente a quantidade de alunos) para uma turma de 24 discentes e está focado em metodologias ativas de aprendizado, onde serão utilizadas estratégias participativas, conforme descrita anteriormente, como: Visita em unidades utilizando um check list que visa a observação prática dos conceitos obtidos na teoria sobre isolamento e precauções a partir da identificação das situações que envolvam exposição dos trabalhadores da área da saúde aos microrganismos, e da adoção das práticas de proteção/ precaução no controle das doenças transmissíveis; Estação de higienização das mãos: serão realizadas 2 estações concomitantemente, uma com a utilização de produto alcoólico e outra com sabonete e água. Cada estação será acompanhada por um docente, que orientará 12 alunos por 30 minutos, portanto, todos os alunos terão oportunidade de participar das 2 estações, totalizando uma hora de treinamento prático; Estação de Paramentação e Uso de Equipamentos de Proteção Individual e Coletiva (EPIs) – (EPCs): serão realizadas 2 estações com 1 docente e 12 discentes para cada um, com 1 hora de duração. As 2 estações terão a mesma metodologia, porém, optou-se na divisão da turma para melhor dinâmica com 335 o docente. A finalidade é fornecer aos alunos cartões contendo uma situação ou procedimento em que ele possa identificar qual a precaução a ser realizada e os EPIs utilizados Por exemplo, um cartão que contenha a seguinte informação “tosse, febre noturna e emagrecimento” deve identificar que é tuberculose, a precaução aerossóis devendo utilizar como medida quarto privativo, com porta fechada, luvas, máscara N95. Em seguida o aluno deverá identificar os EPIs e colocá-los no boneco. Sugerimos uma dinâmica interativa com os alunos. O objetivo dessas estratégias é fazer com que o aluno assimile com maior facilidade as informações teóricas, sabemos que uma quantidade excessiva de informações não necessariamente proporciona uma grande assimilação. Considerando que o fazer auxilia no processo de aprendizado, devemos educar com estratégias práticas participativas. Avaliação: A forma de avaliação consiste de uma avaliação escrita, contendo os temas de maior relevância; e uma segunda, que compreende a participação nas Estações de Trabalho e a visita ao hospital, cuja intenção é trazer para a prática questões desenvolvidas na teoria. Seria um check list onde o aluno observa os colaboradores e anota se as ações desenvolvidas estão corretas. O aluno se introduz no contexto, problematiza e discute as ações em grupo. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo corrobora a experiência enquanto controlador de infecção e docente, referente ao déficit na formação dos técnicos de enfermagem sobre o controle de infecção relacionada à assistência a saúde. Faz-se importante ressaltar a escassez de trabalhos e estudos voltados ao tema em questão. Pouco se aborda sobre estratégias participativas nos planos de ensino para técnico em Enfermagem. Frente a todas as colocações citadas, sugerimos uma reformulação nos planos de curso, principalmente referente à biossegurança. Propomos também que a elaboração do currículo e a docência sejam realizados por um especialista da área, que terá mais facilidade na sua construção devido suas habilidades. Outra questão de grande relevância, já abordada anteriormente, diz respeito à necessidade da inclusão de treinamentos práticos. Acreditar que um plano de ensino de biossegurança pautado num aprendizado inteiramente teórico consiga almejar uma assimilação satisfatória é algo que precisa ser revisto. Esta disciplina deve possibilitar que os alunos problematizem as questões abordadas da teoria para a prática. Nesse momento um docente precisa contextualizar, unindo esses dois meios de aprendizado às conseqüências 336 acarretadas na aquisição de uma infecção e em que contexto e quais as responsabilidades destes profissionais nessas questões. Finalizando, devemos abandonar a fragmentação e acreditar que o conteúdo ensinado neste momento será lembrado futuramente, os temas pertinentes a bioissegurança, necessitam ser continuadamente abordados nas demais disciplinas e reforçados durante todo o seu processo de aprendizagem. REFERÊNCIAS AZAMBUJA, Eliana Pinho de; PIRES, Denise Pires de; VAZ, Marta Regina Cezar. Prevenção e controle de infecção hospitalar: as interfaces com o processo de formação do trabalhador. Texto & Contexto enferm 13 ed. São Paulo; 2004. 79-86p. BOMFIM, Maria Inês do Rego Monteiro; et al. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: trabalho,saúde e educação. Fundação Oswaldo Cruz;Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca; Educação a Distância. Rio de janeiro; lv1. 2009. BOMFIM, Maria Inês do Rego Monteiro; et al. Formação docente em educação profissional técnica na área da saúde: a organização pedagógica do trabalho na área da saúde. Fundação Oswaldo Cruz;Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca; Educação a Distância. Rio de janeiro; lv3. 2009. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA EXECUTIVA. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS): princípios e conquistas / Ministério da Saúde, Secretaria Executiva – Brasilia: Ministério da Saúde, 2000. OLIVEIRA, Adriana Cristina de; et al. O estudante de enfermagem como controlador das infecções hospitalares: uma reflexão sobre sua formação, ensino e prática. São Paulo. Nursing, 2003. PLANO DE CURSO DE TÉCNICO EM ENFERMAGEM DA ESCOLA DE ENFERMAGEM DA SANTA CASA DE SÃO PAULO. SAVIANI, D. Escola e democracia. 36 ed. São Paulo:Cortez, 2003. TIPPLE, Anaclara Ferreira Veiga; et al. O ensino do controle de infecção: um ensaio teóricoprático. Rev. Latino-Am. Enfermagem vol.11 no.2 Ribeirão Preto. 2003. 337 338 ELABORAÇÃO COMPARTILHADA DE CARTILHA PARA LIMPEZA NOS SERVIÇOS DE SAÚDE Alice Cristhiane Dib Erika Mellenthin Lessi Eliete Maria Scarfon Ruggiero Resumo Desenvolvemos um estudo que objetivou elaborar um manual de técnicas de limpeza para os serviços de saúde, auxiliando na capacitação dos funcionários de limpeza que atuam no Sistema Único de Saúde (SUS). Foi elaborada uma cartilha educativa com orientações fidedignas e significativas, na perspectiva das auxiliares da limpeza. As etapas de elaboração da cartilha consistiram na sistematização de seu conteúdo com base na identificação das demandas de um grupo de auxiliares de limpeza mediante abordagem participativa. O conteúdo foi elaborado em bases científicas mediante revisão de literatura. A versão preliminar da cartilha foi submetida ao processo de validação, realizado com a colaboração de peritos que analisaram as informações da linguagem, das ilustrações, da apresentação da cartilha e deram sugestões para aperfeiçoá-la. Após esta etapa, foi realizada a última edição, a diagramação e a impressão da versão final da cartilha. O processo de construção da cartilha desenvolvida mediante estratégia participativa, dialógica e coletiva, como preconizada nas práticas de promoção à saúde, foi construtivo e muito enriquecedor. Esta foi considerada um instrumento eficiente na capacitação destes profissionais, sendo de fácil leitura e entendimento, e contendo figuras claras que favorecem uma melhor compreensão e assimilação. Descritores: Comunicação Educação Continuada. Auxiliares de Limpeza. Introdução Trabalhadores SUS e capacitação Para a análise de gestão e regulação do trabalho no SUS, são tomados como referência dois direitos de cidadania estabelecidos pela Constituição 339 de 1988: a obrigatoriedade universal do concurso público e os preceitos de acesso universal e de integralidade do atendimento no SUS. Num contexto de forte controle das despesas públicas e de desestruturação do aparato de Estado, que tem início em 1990, os governos locais se empenharam em atender aos aspectos do direito à saúde por meio da implantação e expansão do SUS, mas muitas vezes geraram relações irregulares de trabalho, em detrimento do direito do cidadão de concorrer a cargos públicos abertos a todos e plenamente regulados. Analisando este e outros problemas, o autor indica que uma nova política emerge para o setor público e o SUS a partir de 2003, que pode ser caracterizada como uma regulação das relações de trabalho, tendo como exemplo o governo federal, que vem recompondo e regularizando seu quadro de pessoal, de acordo como o espírito da Constituição (NOGUEIRA, 2005). Em 1988 foi criado o Sistema Único de Saúde (SUS) pela Constituição Federal, para que toda a população brasileira tivesse acesso ao atendimento público de saúde. Este sistema veio substituir o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) que, diferentemente do SUS, era restrito apenas aos empregados que contribuíssem com a previdência social, ou seja, que possuíssem emprego formal; os demais cidadãos eram atendidos apenas em serviços filantrópicos. Do Sistema Único de Saúde fazem parte os centros e postos de saúde, hospitais, incluindo os universitários, laboratórios, hemocentros (bancos de sangue), os serviços de Vigilância Sanitária, Vigilância Epidemiológica, Vigilância Ambiental, além de fundações e institutos de pesquisa, como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Vital Brazil (NOGUEIRA, 2005). A importância da capacitação profissional para a vida das pessoas encontra-se na possibilidade de acesso às oportunidades de trabalho, que, por sua vez, têm suas características modificadas a cada dia. Capacitar é tornar habilitado para o desempenho de uma função, é qualificar a pessoa para determinado trabalho. Anteriormente, a assistência médica estava a cargo do Instituto Nacional de Assistência (BERTONE, 2002). A capacitação não só dá condições para o exercício de determinadas profissões como também objetiva preparar para o mundo do trabalho, oferecendo a oportunidade de uma melhor adaptação ao mercado competitivo, uma vez que a pessoa deverá estar pronta, com hábitos e atitudes condizentes às exigências desse mercado (CARVALHO, 2007). No processo de capacitação, é importante que se trabalhe as habilidades básicas, específicas e de gestão, ou seja, além de aprender especificamente determinada profissão, a pessoa deverá ser estimulada a exercitar suas 340 competências básicas, que tratam de sua apresentação pessoal, aparência, autoestima, comunicação, relacionamentos interpessoais, e sua capacidade de se autogerir, tomar decisões, participar de trabalho em equipe, bem como de seu processo de desenvolvimento no trabalho (CARVALHO, 2007). A educação permanente vem sendo considerada como um processo amplo que envolve aspectos do desenvolvimento integral do ser humano, não se limitando a treinamentos técnicos formais. Deste modo, a educação continuada é um processo prolongado que vai além dos limites dos sistemas educacionais, fazendo-se presente por toda a vida dos indivíduos, situados em uma sociedade em contínuas transformações. Esta sociedade produz novas tecnologias, novos conhecimentos, mobilizando as possibilidades e os saberes dos profissionais, colocando a necessidade de continuidade na formação dos mesmos (BAGNATO, 1999). Os serviços de educação permanente nas instituições de saúde oferecem, em geral, oportunidades de aprendizado na forma de educação em serviço, mas quem vai aprender é a pessoa, conforme seu grau de necessidade e motivação. A educação continuada em ambiente hospitalar é geralmente utilizada com o intuito de racionalizar recursos por meio da padronização de procedimentos, como também do melhor desempenho dos profissionais (MONTEIRO; CHILIDA; BARGAS, 2004). O aprendizado, entendido como um processo ativo, contínuo e dependente de motivação, divide a responsabilidade da qualidade dos resultados obtidos nos programas de educação continuada entre seus organizadores e participantes. O enfermeiro educador pode promover um clima apropriado para facilitar o processo de aprendizado dos adultos, assegurando que os alunos estejam ativamente envolvidos nas discussões sobre a determinação das necessidades e dos resultados (MONTEIRO; CHILIDA; BARGAS, 2004). Segundo Monteiro, Chilida e Bargas (2004), os programas educativos devem ser compatíveis com os objetivos e prioridades da instituição, sendo a sua eficiência avaliada por meio da observação da prática, já que é o olhar sobre as práticas cotidianas que permite ao educador identificar novas necessidades. Compete ao enfermeiro propiciar suporte organizacional e administrativo para atingir os objetivos estabelecidos. A higiene hospitalar A higiene e a organização são elementos fundamentais para que a sensação de bem-estar, conforto e segurança possa ser garantida não apenas aos profissionais da área da saúde, mas também aos próprios pacientes e seus 341 respectivos familiares (BATISTA, 2010). Segundo Torres e Lisboa (2001), o termo limpeza hospitalar vem sendo frequentemente considerado sinônimo de higiene hospitalar, ou zeladoria hospitalar. Constitui o núcleo de todas as ações para os cuidados de higiene. É um processo de remoção de sujidades mediante a aplicação de energias química (produtos), mecânica (manual) e térmica (calor). A finalidade principal é a remoção da sujidade visível, redução ou destruição dos microorganismos e controle da disseminação de contaminação, estando, assim, intimamente ligada à prevenção das infecções hospitalares. A ocorrência de infecções no ambiente hospitalar pode estar diretamente relacionada ao emprego de técnicas de limpeza inadequadas, a não descontaminação de superfícies e artigos hospitalares críticos e ao manuseio do lixo hospitalar sem que a proteção adequada seja assegurada (FERNANDES, 2000). Reduzindo o número de microorganismos das superfícies, contribui para uma constante melhora da aparência e da imagem da instituição, promovendo conforto e segurança aos pacientes e funcionários, além de também prevenir a deterioração das superfícies, objetos e materiais (TORRES; LISBOA, 2001). Considerando-se as finalidades da limpeza hospitalar, há que se concordar que as mesmas não diferem, em essência, das finalidades de limpeza de outros locais de trabalho; porém, pode-se argumentar que a limpeza hospitalar deve ser a mais rigorosa, principalmente nas áreas críticas, no sentido de se garantir a remoção ou a destruição de microorganismos patogênicos. Justifica-se pelas características dos processos de trabalho que ocorrem no hospital, os quais são altamente invasivos ao organismo humano e com grande probabilidade de transmissão de microorganismos ao mesmo, levando a sua contaminação e ocorrência de infecções (YAMAUSHI; LACERDA; GABRIELLONI, 2001). Definições das áreas hospitalares O Ministério da Saúde classifica as diversas áreas dos hospitais conforme seu grau de risco de transmissão de infecção. Nesse sentido, existem três áreas, definidas a seguir: 342 Áreas críticas Oferecem maiores riscos de transmissão de infecções, ou seja, áreas que realizam grande número de procedimentos invasivos ou que possuem pacientes de alto risco, com o sistema imunológico comprometido. Exemplos: Unidade de Terapia Intensiva, Unidade de Transplante, Centro Cirúrgico e Obstétrico, Unidade de Quimioterapia, Berçário, Isolamento, Unidade de Diálise, Banco de Sangue, Laboratório, Central de Material, Lactário, Hematologia, Unidade de Emergência e Necrotério, Departamento de Desinfecção e Esterilização, Depósito de Central de Resíduos, Depósito Central de Roupa Suja, Endoscopia, Expurgo de enfermagem, Hemodinâmica, Pronto Socorro adulto e infantil, Quartos de isolamento, Sala de Resíduos, Salas de roupas sujas, Terapia Intensiva adulta e infantil e Ambulâncias. Áreas semicríticas Onde o risco de transmissão de infecções é menor, pois, embora existam pacientes, não requerem cuidados de alta complexidade. Áreas não críticas: Áreas não ocupadas por pacientes, áreas onde o risco de transmissão de infecções é menor. Áreas limpas: São todas as superfícies e mobiliários: teto, parede, luminárias, portas, réguas de gases, janelas, dispensadores de papéis e sabonetes, placas indicativas, bebedouros, geladeiras, mesas, balcões, etc. Áreas sujas As demais – piso, sanitários, pés dos mobiliários, local com presença de matéria orgânica (BATISTA, 2010). Tipos de limpeza hospitalar Limpeza concorrente É o processo de limpeza diária de todas as áreas, objetivando à manutenção do asseio, a reposição dos materiais, de consumo diário (papel toalha, sabonete, papel higiênico, sacos para lixo), proporcionando um ambiente limpo e agradável. Limpeza imediata É o processo de limpeza realizada quando ocorre sujidade após a limpeza concorrente, em qualquer período do dia. Esta sujidade referese principalmente àquelas de origem orgânica, radioativa ou química, com um grande risco de contaminação e disseminação se não contida imediatamente. A técnica a ser utilizada será de acordo com ao risco de contaminação. Limpeza terminal É o processo de limpeza de todas as áreas objetivando à redução da sujidade e, consequentemente, da população microbiana, reduzindo a possibilidade de contaminação local. É realizada periodicamente ou conforme cronograma, envolvendo teto, luminárias, parede, portas, mobiliários, piso e etc. Limpeza de manutenção ou revisões É constituída de alguns requisitos da limpeza concorrente. Limita-se mais ao piso, sanitários e esvaziamento de lixo, principalmente em locais de grande fluxo de pessoas e de procedimentos (BATISTA, 2010). 343 Equipamento de proteção individual (EPI) e coletiva (EPC). Segundo Batista (2010), os EPIs e EPCs destinam-se a proteger os profissionais durante o exercício das suas atividades, minimizando o risco por contato com sangue e outros fluidos corpóreos, vírus e bactérias. São EPIs: óculos, gorros, máscaras, luvas, aventais, sapatos de proteção; e os EPCs são caixas de descarte de materiais perfuro-cortantes, placas de sinalização, fitas zebradas, corrimãos. Há equipamentos de proteção individual adotados pelo serviço de higiene, que visam à proteção dos colaboradores dessa área, como a utilização de máscara N95, ao se entrar em isolamento para aerossóis, ou quando se utiliza luvas para fazer descontaminação de matéria orgânica. Faz parte das responsabilidades do empregador o fornecimento gratuito dos EPIs, assim como a capacitação para que façam o seu uso correto (MONTEIRO; CHILIDA; BARGAS, 2004). Após reconhecermos a complexidade da limpeza hospitalar e de todas essas particularidades, identificamos que é de extrema importância a capacitação dos auxiliares de limpeza que atuam no SUS, visto que as duas autoras da pesquisa têm contato direto com a equipe de apoio em seus locais de trabalho. Percebemos a necessidade de capacitar melhor os trabalhadores para que haja a redução do número de microorganismos nas superfícies, contribuindo assim para uma constante melhora da aparência e da imagem da instituição, promovendo conforto e segurança aos pacientes e funcionários que transitam no ambiente hospitalar. Decidimos então elaborar um manual de bolso de técnicas de limpeza, para auxiliar na capacitação dos auxiliares de limpeza que atuam no SUS, contribuindo assim para o controle e a prevenção de infecções hospitalares, e também garantindo a proteção aos trabalhadores durante a execução de suas atividades, orientando quanto aos tipos de limpeza e às técnicas de limpeza praticadas nas instituições de saúde. Metodologia O processo de elaboração da cartilha educativa em limpeza hospitalar teve por base os princípios da prática educativa dialógica aplicada à pedagogia da saúde. Tal processo trará subsídios à possibilidade de auxiliar o funcionário a modificar sua forma de trabalho e ser agente de transformação (FREIRE, 1996). O uso crescente de materiais educativos como recursos na educação em saúde tem assumido um importante papel no processo de ensino-aprendizagem. 344 É útil, pois melhora o conhecimento e a satisfação do funcionário, facilita-lhe a autonomia e o torna capaz de entender como suas ações influenciam no padrão de saúde. É necessário elaborar mensagens que tenham vocabulário coerente com o público-alvo, convidativas, de fácil leitura e entendimento. Utilizamos os seguintes passos na confecção da cartilha: Primeiro passo Caracterização preliminar dos sujeitos do estudo no atendimento individual por entrevista: participaram do estudo 15 auxiliares de limpeza que atuam em uma instituição pública de saúde, que aceitaram voluntariamente participar da pesquisa, além de demonstrarem interesse e a disponibilidade para participar do processo de elaboração do material educativo. Segundo passo Planejamos duas oficinas; na primeira os funcionários nos auxiliaram na montagem da cartilha, mostrando quais eram as suas dificuldades e dúvidas. O instrumento para coleta de dados consistiu em verbalização das dúvidas e dificuldades pelos participantes, que foram anotadas em um quadro para posterior análise. As informações coletadas foram devidamente organizadas e sistematizadas, estabelecendo os problemas prioritários dos indivíduos trabalhadores, e posteriormente foi elaborada a cartilha, tendo por base a literatura técnica científica e experiência profissional. Terceiro passo Grupos operativos e entrega do material educativo. Organizamos os grupos operativos, com os sujeitos participantes do estudo, para entrega das cartilhas com o intuito de discutir e fornecer sugestões para melhorar o material e facilitar sua compreensão. No segundo encontro, os colaboradores foram abordados por uma equipe composta por duas enfermeiras. Dessa equipe, uma foi a moderadora responsável pelo desenvolvimento do conteúdo temático; e a outra foi a observadora, responsável por anotar as falas e enfatizar as ideias nelas contidas. Após o contato com a cartilha, os colaboradores receberem um questionário com perguntas abertas para analisarem o conteúdo da publicação. A avaliação do material foi realizada identificando-se os aspectos relacionados à organização, ao estilo de escrita, à aparência e à motivação da cartilha. Assim, nossos objetivos para cada passo foram: Passo 1: definição dos participantes; Passo 2: apresentação dos temas a serem trabalhados, a elaboração da mensagem e a definição de estratégias para apresentar os conteúdos no material; Passo 3: avaliação dos conteúdos e da confecção. Foi desenvolvido um estudo do tipo qualitativo, com a utilização da metodologia da pesquisa-ação. Esta metodologia, que associa a ação com 345 atividade de pesquisa, pressupõe que os participantes da pesquisa devem ser considerados sujeitos ativos em todo o processo de desenvolvimento da pesquisa. Para isso são solicitados e motivados a buscar em conjunto com os pesquisadores soluções para os problemas em estudo (THIOLLENT, 2005). O processo de construção da cartilha foi composto tendo como base as demandas do serviço. Na etapa seguinte, de sistematização deste conteúdo, foi realizada uma revisão da literatura para garantir a fundamentação científica, pois isto é condição essencial para preservar a segurança do leitor e definir apropriadamente os conceitos constantes em um material educativo (ECHER, 2005). Também foi realizada a sistematização do conteúdo, segundo o critério das especificidades de cada área de limpeza. Todo o processo de construção da cartilha foi permeado pela atenção voltada à adequação da linguagem. Tal trabalho se caracterizou pela identificação dos termos técnicos e a transformação deles para linguagem popular, de modo a facilitar a compreensão da cartilha por suas usuárias. O cuidado em relação à adequação da linguagem, no sentido de facilitar sua compreensão, é importante aos trabalhos relacionados à educação e à promoção da saúde. Na seleção e elaboração das ilustrações consideramos a necessidade de incluirmos algumas ilustrações na cartilha, com o objetivo de tornar a leitura descontraída e de fácil compreensão (ECHER, 2005). Definiu-se que no início do trabalho seriam incluídas ilustrações prontas, selecionadas a partir de outros materiais, e que as respectivas fontes seriam citadas na cartilha. Esse trabalho foi realizado mediante consulta a livros-texto e imagens disponibilizadas em páginas eletrônicas. A composição da cartilha foi elaborada de acordo com a apresentação do material e foram feitas adequações no conteúdo. Houve a necessidade de reduzir as informações a serem inseridas na cartilha, porque a inclusão de todo o conteúdo seria excessivo, em se tratando de uma cartilha de bolso. Foi dada prioridade às informações relevantes, pois os textos extensos reduzem a velocidade da leitura e dificultam a compreensão das informações por parte do leitor (DOACK; ROOT, 1996). Concluída a etapa, foi feita a organização estrutural de formato do material: projetou-se a diagramação da cartilha e sua transformação para um formato passível de impressão. Os critérios adotados para todas as etapas do trabalho foram a facilitação da leitura e a simplificação visual de seu conteúdo. Para esse percurso, partiu-se do pressuposto de garantir o respeito ao futuro leitor. 346 Buscou-se adotar um texto em linguagem compreensível para a maior parte das pessoas, independente do grau de formação, e uma diagramação arejada, com visual suave. Foi estabelecido que devessem ser respeitadas algumas regras, como o uso de letras maiores do que usuais, de boa definição e sem contrastes de cores ao fundo; ilustrações claras que remetessem efetivamente ao texto; frases e parágrafos curtos e sintéticos, que concentrassem uma informação de cada vez; espaçamento e entrelinhamento que permitissem a leitura em várias situações. Adotamos um tipo de texto capaz de convencer os leitores da necessidade e da importância da leitura. O material, além de seu cunho educativo, deveria expressar toda a responsabilidade do gestor e do equipamento de saúde no atendimento adequado aos usuários, dentro dos protocolos estabelecidos pelo Ministério da Saúde. As regras acima expostas delinearam o formato final da cartilha, que ganhou sua identidade ao ser validada pelas funcionárias, entendidas como principais interessadas nesta leitura. A validação por peritos: a cartilha foi submetida inicialmente à validação por três enfermeiros que trabalhavam nas áreas onde são realizadas limpezas. A eles foi entregue, juntamente com a cartilha, um questionário no qual os peritos foram solicitados a registrar sugestões, no sentido de aperfeiçoar o material. O referido instrumento permitiu que os peritos fizessem recomendações quanto a estrutura, conteúdo, linguagem e ilustrações contidos na cartilha. A fase de validação por peritos foi desenvolvida mediante colaboração de profissionais da área da saúde, pois este cuidado é fundamental para valorizar as diferentes perspectivas envolvidas na atividade de promoção e educação para a saúde (ECHER, 2005). No primeiro encontro foram feitas explicações detalhadas da proposta da pesquisa, seus procedimentos, e reiterada a importância da colaboração de cada perito. Nesse momento foi feita a entrega da cartilha e o questionário de validação. Na sequência, foi feita a leitura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), no qual foram explicitados os objetivos da pesquisa e como ocorreria a participação na pesquisa para os peritos que aceitaram participar, e solicitada a assinatura no TCLE. Além disso, foi pedido o preenchimento de uma ficha que caracterizava o profissional perito. Foi dado um prazo de 48 horas para que os peritos pudessem manusear o material e respondessem aos questionários. Estes foram devolvidos aos pesquisadores em encontros agendados individualmente. No momento do recebimento desses instrumentos e das cartilhas, percebeu-se a necessidade de 347 obter esclarecimentos a respeito dos significados das sugestões feitas. Os registros contidos nos questionários e anotações feitas na própria cartilha foram lidas pelo pesquisador na presença de cada perito. Cada um forneceu esclarecimentos sobre as sugestões que não estavam claras e confirmou a interpretação das pesquisadoras sobre as respostas contidas no questionário de aperfeiçoamento do material, possibilitando reduzir a interpretação inadequada desses registros. Após tal processo, as pesquisadoras realizaram as adequações sugeridas no conteúdo da cartilha. O uso da técnica de verificação da interpretação foi sugerida por Polit, Beck e Hungler (2004), podendo ser realizada informalmente, de maneira constante, à medida que os dados são coletados e analisados. Estas autoras consideram importante a realização desta etapa para esclarecimento da credibilidade dos dados qualitativos. Também foram organizados os dados qualitativos para facilitar o processo de análise. E classificados, após leitura cuidadosa dos dados, visando identificar conceitos e conjunto de conceitos subjacentes. Uma vez obtidas as sugestões dos peritos para reformulação da cartilha educativa, elas foram acatadas e modificadas. A validação pelas funcionárias do serviço: a segunda fase de validação do material constou da colaboração das funcionárias de limpeza de uma instituição pública de saúde para idosos da cidade de Araraquara, em São Paulo. Essa etapa foi fundamental para que elas pudessem indicar as dificuldades encontradas no que se referia à compreensão da linguagem e das ilustrações contidas na cartilha. O trabalho foi realizado com a finalidade de diminuir a distância entre o que o profissional pensa e escreve e o mundo do leitor, tendo em vista que a cartilha é dirigida às auxiliares da limpeza (FONSECA, 2004). Avaliou-se a pertinência de validação por parte das funcionárias, pois elas vivenciavam a experiência da limpeza nas diversas áreas e o contato com este tipo de material lhes seria significativo. Acreditou-se que as funcionárias que estavam vivenciando o processo de limpeza seriam mais receptivas às informações referentes à sua condição e poderiam contribuir de maneira ativa no processo de aperfeiçoamento do material, no sentido de facilitar sua compreensão. As funcionárias foram selecionadas mediante o seguimento dos seguintes critérios de inclusão: estar trabalhando na limpeza, saber ler e escrever e aceitar participar do estudo. O procedimento adotado para validação 348 da cartilha junto às auxiliares da limpeza foi feito perante as seguintes etapas: solicitação e obtenção da autorização da chefia do serviço de limpeza da instituição para idosos. A abordagem utilizada para solicitar às funcionárias da limpeza deste local foi um convite pessoal, onde foi solicitada a leitura da cartilha e a validação dos aspectos relacionados à linguagem e às ilustrações contidas no referido material, e uma avaliação geral quanto à pertinência da cartilha em relação a esses aspectos. Na sequência foi realizada a leitura do TCLE para as funcionárias que consentissem em colaborar, no momento em que assinaram o termo de consentimento para realizar tal tipo de colaboração. Nele estavam explicitados os objetivos da pesquisa e a forma de participação. Também foi solicitado o preenchimento de uma ficha referente às características de cada funcionária. A cartilha foi entregue com uma folha destinada ao registro da opinião das auxiliares. Quando o tempo de espera mostrava-se insuficiente para leitura completa do material, era oferecida a possibilidade delas levarem para casa a cartilha, para que pudessem concluir a leitura e indicar as dificuldades encontradas. Enquanto as auxiliares faziam a leitura da cartilha e registravam suas sugestões nas folhas destinadas a esta finalidade, as pesquisadoras se mantiveram distantes, com a finalidade de propiciar liberdade, para que as funcionárias fizessem suas anotações sem se sentirem acuadas. Ao mesmo tempo, as pesquisadoras permaneceram disponíveis para dar esclarecimentos, que poderiam ser solicitados pelas auxiliares. No momento da devolução das cartilhas, quando havia o registro de dúvidas e sugestões na folha, elas foram lidas, e, quando necessário, foram solicitados os esclarecimentos adicionais. Na etapa da validação pelas funcionárias, elas foram incluídas até o momento em que não havia nenhuma dúvida a respeito das palavras e das ilustrações contidas na cartilha. Resultados e Discussão Caracterização dos sujeitos do estudo A partir das entrevistas pôde-se observar a baixa escolaridade desta população, visto que 70% referiram ter escolaridade entre 1ª e 7ª série do ensino fundamental, porém 100% eram alfabetizados. A maioria dos trabalhadores era do sexo feminino (80%), sendo que sua inserção no mercado de trabalho ocorreu em idade precoce, para ajudar a família no orçamento doméstico. Em relação à idade, 100% dos participantes tinham acima de 30 anos, variando de 349 32 a 57 anos. Em relação ao estado civil, 40% eram casados, 53,33% amasiados, 6,67% solteiros e nenhum dos participantes era separado ou viúvo. Os nossos resultados corroboram com outras pesquisas, onde a porcentagem da escolaridade da população também é baixa, 64% tinham escolaridade entre 1º e 7º, 74% do sexo feminino e a maioria era casada ou amasiada (MONTEIRO; CHILIDA; BARGAS, 2004). A construção da proposta de desenvolvimento da cartilha educativa A análise das entrevistas dos trabalhadores deu-se por meio dos seguintes temas: • O que eles esperavam da cartilha; • As dificuldades encontradas no trabalho em um serviço de saúde; • Se acreditavam que seu trabalho poderia afetar a sua saúde e de qual forma; • Como poderíamos tornar a cartilha interessante. O público-alvo mostrou-se interessado. Decidiram pela confecção de uma cartilha que pudesse ser levada para os locais de trabalho, facilitando a comunicação visual e o acesso por familiaridade com a linguagem escrita. A educação é um fenômeno próprio do ser humano que, por meio de ações intencionais, transforma a natureza para sua conveniência. Isso implica afirmar que a educação é uma exigência do processo de trabalho, sendo ela própria, em sua natureza, um processo de trabalho não material (SAVIANI, 1994). Houve relatos de dúvidas quanto ao fato de serem acometidos por doenças após trabalhar em um serviço de saúde e sobre a real segurança e eficácia dos EPIs. Foi dito pelos trabalhadores que muitas vezes não faziam o uso correto dos equipamentos de proteção individual, pois achavam desnecessários e incômodos. Em relação às dúvidas sobre a maneira como se realiza a limpeza nesse ambiente, relataram que não existe padronização de técnicas, e que o funcionário mais velho sempre ensina os mais novos. A dificuldade relatada foi que muitas vezes não têm certeza de que estão trabalhando da maneira correta, e acabam realizando o trabalho com insegurança, da maneira que julgam melhor. A escolha por construir um material de forma conjunta entre os funcionários e as enfermeiras favoreceu a ação educativa em que se busca a troca de experiências e informações, reflexão e problematização sobre os temas, assumindo suas experiências cotidianas de vida como fonte de conhecimento e de ação transformadora da realidade. 350 Os funcionários optaram pelo texto no formato de algumas perguntas e respostas, sendo sempre acompanhado por ilustração. Esse formato aumenta a retenção do conteúdo pelo leitor. Preocupou-se na elaboração de mensagens breves, considerando que frases longas reduzem a velocidade do processo de leitura e geralmente os leitores esquecem os itens de listas grandes. Além disso, foi utilizada linguagem simples, objetivando promover a identificação do funcionário com o texto e manter a sua iniciativa no processo da educação em saúde. Na cartilha, foram utilizados desenhos de forma a complementar e reforçar as informações e atrair o leitor para o interesse pela leitura e auxiliar na compreensão do texto. A versão da cartilha que foi submetida à validação consistiu de 19 páginas, impressas em papel sulfite 70 gramas, no tamanho 14,8 x 21 cm, presas a dois grampos. O título era Técnicas de Higiene em Serviços de Saúde. O conteúdo da cartilha continha os seguintes assuntos: higiene e limpeza; definição de limpeza; tipos de limpeza; resíduos (lixo); conceito de descontaminação; conceito de matéria orgânica; técnica de descontaminação de matéria orgânica; técnica de descontaminação de luvas; técnica de descontaminação de panos e mops; precauções padrão; precauções adicionais (isolamentos). Foram selecionadas as ilustrações de acordo com a bibliografia consultada e foram feitas de acordo com as relações com o conteúdo abordado no texto e na qualidade visual da imagem. A inclusão dessas ilustrações na cartilha teve a finalidade de facilitar a compreensão da mensagem contida no texto ou dar ênfase a um determinado assunto. A cartilha está disponível no endereço eletrônico http://bit.ly/hfPg8A Características dos peritos Três profissionais enfermeiros colaboraram enquanto peritos. Quanto ao sexo, dois eram do sexo feminino e o outro do sexo masculino. A idade deles variou de 27 anos a 45 anos. Avaliação do material didático Durante a reunião grupal, os participantes verbalizaram que o conteúdo da cartilha era novidade para eles, principalmente as técnicas de descontaminação de matéria orgânica e necessidade de uso de EPIs. Relataram sentir mais segurança ao trabalhar e ter certeza agora de que também estão auxiliando na transformação do serviço de saúde em um ambiente seguro para 351 eles, para os outros trabalhadores e para os pacientes. Demonstraram interesse em utilizar a cartilha e aprenderem cada vez mais. A compreensão de tais assuntos proporcionou ações que modificaram o comportamento no cotidiano. Nesse sentido destaca-se a necessidade do material impresso para assegurar uma assistência que atenda às necessidades do indivíduo, facilitando a autonomia e promovendo uma melhora na sua função. O desenvolvimento de uma cartilha educativa, na qual os indivíduos atuam efetivamente no processo de desenvolvimento do material, mostrouse eficaz na condução do alcance do objetivo proposto, estimulando novas estratégias educativas. Opinião dos peritos a respeito da cartilha Todos os peritos fizeram uma avaliação positiva do material analisado. Consideraram importante a decisão de construir um recurso didático. Avaliaram que o trabalho estava bem elaborado e apresentava subsídios para trabalhar na área da limpeza, como também para prevenção da própria saúde das funcionárias. Houve a consideração de que a leitura da cartilha remetia a uma visão integral das áreas de limpeza dos diversos locais A apresentação do material foi considerada como ótima e a arte final como excelente. A linguagem foi considerada de fácil compreensão, aspecto considerado vital para despertar o interesse das auxiliares. As sugestões das Auxiliares da Limpeza A leitura das sugestões feitas pelas auxiliares possibilitou verificar que elas diziam respeito às alterações referentes ao texto, quanto à linguagem, às ilustrações e à avaliação geral da cartilha. Todas as sugestões indicadas foram incorporadas. Apenas três funcionárias apresentaram dúvidas em relação à cartilha. Todas estavam relacionadas a informações contidas no texto. Uma delas também teve dificuldade na compreensão do texto em relação à linguagem e duas tiveram dificuldades na compreensão de ilustrações. Opinião das auxiliares da limpeza Opiniões foram dadas por 15 auxiliares a respeito da cartilha nas quais pudemos constatar uma avaliação bastante positiva. O conteúdo da cartilha, considerado de fácil entendimento, despertou o interesse das funcionárias. Esta constatação foi possível verificarmos em função da ausência de dúvidas após o término da leitura. “Não tive muitos problemas para entender a cartilha, ela está bem clara, tanto 352 em figuras como em seu vocabulário. Já fiz leitura de outras, mas esta foi a melhor que li, nela está tudo simples e bem colocado.” (E3) “Pelo que vi não precisa mudar nada. Achei muito interessante.” (E7) “Não tive dúvida em nada e gostei muito pelo conteúdo dela.” (E10) Os benefícios proporcionados com o aprendizado e o esclarecimento de dúvidas sobre os assuntos referentes a limpeza de áreas fizeram com que as auxiliares sentissem interesse e satisfação durante a leitura da cartilha. Isso se deve ao fato de que elas p assavam por determinada situação c o m correspondência na cartilha. “Eu amei ler essa cartilha. Ensinou muitas coisas, tirou dúvidas que eu tinha sobre doenças que pegamos no trabalho. Também explicou sobre a segurança das EPIs.” (E1) “Foi bom principalmente porque muitas vezes não fazia uso de proteção individual, pois achava desnecessário e incômodo.” (E4) “Achei esta cartilha muito interessante, porque podemos tirar nossas dúvidas sobre a maneira como se realiza limpeza neste ambiente.” (E2) “Eu achei muito importante e eu gostei de tudo o que está escrito na cartilha. E tudo o que eu entendi serviu muito pra mim.” (E6) “Eu achava que só o sangue era perigoso; urina e fezes, pensava que não. Meu Deus, nunca mais fico sem luvas!” (E4) As auxiliares recomendaram que a cartilha se tornasse um recurso amplamente disponível, devido a sua importância para o esclarecimento de dúvidas e fornecimento de orientações. “Eu adorei e aprendi muitas coisas que eu não sabia. Pois assim estou trabalhando da maneira correta e acabo realizando o trabalho com segurança.” (E15) “Não tive dificuldade de entender o que estava escrito, vai ser ótimo para outras colegas.” (E5) “Foi muito interessante, principalmente as técnicas de descontaminação de matéria orgânica e de uso de EPIs.” (E8) “Agora eu entendi o que significa o isolamento; antes, eu nem ligava.” (E1) Ainda que a educação continuada tenha a tendência de se restringir ao aspecto da qualidade formal e, algumas vezes, a “treinamentos”, é possível propiciar condições para a construção da consciência crítica, o que possibilita perspectivas mais favoráveis para a competência política. Frequentemente, 353 a qualidade do processo de educação continuada defronta-se com essa contradição, porque profissionais com maior empenho e atualização são mais exigentes quanto às suas expectativas políticas, sociais e no trabalho (MONTEIRO; CHILIDA; BARGAS, 2004). Considerações Finais Percorrendo os caminhos que foram se delineando neste estudo, retomaremos alguns pontos que nos parecem relevantes e que possibilitam explicitar, de forma direta e indireta, as atividades de educação continuada que ocorrem junto aos auxiliares de limpeza de uma instituição pública de saúde de longa permanência. A análise advinda desse percurso possibilitou destacar alguns fatos que nos pareceram significativos, inter-relacionados, possibilitando uma aproximação e compreensão do tema em estudo. O ensino é uma tarefa profissional, que exige um corpo de conhecimentos e saberes especializados e uma atuação racional e individual, tornando-se necessário aplicar técnicas pedagógicas adaptadas à situação concreta dos alunos e da turma, devendo ser pensado como um caminho de mão dupla. No processo pedagógico que objetiva à construção do saber, presenciase o estímulo à reflexão, à capacidade de observação, de análise, de síntese, de crítica, à autonomia de pensar, tentando ampliar os horizontes do sujeito, tornando-o agente ativo que busca interagir com a realidade no qual está inserido; a educação assume uma função mediadora de uma prática social mais global e, a nosso ver, a metodologia de formação necessária é aquela capaz de fazer o aluno compreender criticamente, de maneira contextualizada, a prática que exercerá profissionalmente, estabelecendo uma interação constante entre a teoria e prática (MONTEIRO; CHILIDA; BARGAS, 2004). As respostas dos trabalhadores são breves e “empobrecidas”. Talvez isso possa ser atribuído ao trabalho alienado realizado, no qual o trabalhador não tem a “noção” do produto final de seu trabalho, e, também, como às condições de vida/baixa escolaridade e/ou medo de perder o emprego. Concluímos que é fundamental que esses trabalhadores, em geral com baixa qualificação profissional, possam exercer seu trabalho com conhecimento e tenham condições adequadas para executá-lo, tendo em vista os riscos ocupacionais a que estão expostos. Por isso existe a real necessidade de elaboração de um material didático compatível, que se mostrou extremamente útil para esses profissionais. 354 Referências ANVISA. Resolução da Diretoria Colegiada, RDC n. 306, de 7 de dezembro de 2004. Dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. Diário Oficial da União, Brasília, 10 dez. 2004. BAGNATO, M. H. S. Educação continuada na área da saúde: uma aproximação crítica. Campinas: [s.n.], 1999. BATISTA, A. Manual de técnicas de higiene hospitalar. Versão atualizada. São Paulo: Maxlav Services, 2010. BERTONE, A. A. As idéias e as práticas: a construção do SUS. 2002. 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Infecção hospitalar e suas interfaces na área da saúde. São Paulo: Atheneu, 2000. 356 357 ESTRATÉGIAS DE ENSINO EM ESCOLAS TÉCNICAS NA ÁREA DA SAÚDE E SUA ARTICULAÇÃO AO PROCESSO DE CONSOLIDAÇÃO DO SUS Elda Garbo Pinto1 Wellington Rodrigo de Souza2 Silvia Helena de Carvalho Sales Peres3 RESUMO Trata-se de um estudo descritivo, que teve como objetivo identificar as estratégias de ensino das escolas técnicas na área da Saúde e sua articulação com o processo de consolidação do SUS, utilizando como referências os campos de Educação, Trabalho e Saúde. A necessidade de mudanças nos processos de trabalho, na gestão e na formação de recursos humanos é amplamente reconhecida e acompanhada de críticas à inércia do aparelho formador, particularmente às escolas técnicas da área da Saúde, onde permanecem sendo formados profissionais que realimentam modelos assistenciais; em uma sociedade onde competências profissionais, organização tecnológica do trabalho, sistema de saúde e mercado de trabalho regulamentado. À medida que, no país, a constituição do Sistema Único de Saúde (SUS) representa uma estratégia de transformação do sistema de Saúde, é necessário direcionar o processo e definir as grandes políticas e estratégias em atenção ao modelo escolhido. Descritores: Educação profissional. Qualificação profissional. Ensino técnico. Ensino médio. Competência profissional. 1. Enfermeira. Docente do Curso de Qualificação Técnica da Escola Técnica do SUS-Assis. Bauru/SP. bauruelda@yahoo. com.br 2. Enfermeiro. Docente do Curso de Qualificação Técnica da Escola Técnica do SUS-Assis. Bauru/SP. wrs_nurse@yahoo. com.br 3. Cirurgiã-Dentista. Profa. Associada do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo – USP. 358 Introdução O Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2008) tem como proposta pedagógica uma construção coletiva do conhecimento, articulando saberes, práticas e atitudes a partir da experiência do aluno e do contexto em que trabalha e vive, objetivando uma formação crítica, reflexiva, transformadora e capaz de provocar mudanças nos processos de trabalho em Saúde (FORTES; OLIVEIRA; FERREIRA, 2009). Essa proposta está em conformidade com o processo de formação de profissional técnico baseado no modelo de competências (SHIMIZU; LIMA; SANTANA, 2007). As autoras relataram que a formação de profissionais da Saúde deve considerar a totalidade das necessidades do ser humano, no que tange aos aspectos éticos, sociais e relacionais com o paciente e equipe. Esses profissionais devem ser capazes e também possuírem habilidades para provocar mudanças significativas nos serviços de Saúde, especialmente no acolhimento aos usuários. As alterações no perfil de morbimortalidade da população brasileira, associadas ao aumento da oferta de serviços de saúde e à necessidade de organização do sistema de Saúde, vêm demandando transformações no processo de trabalho do profissional técnico, a fim de assegurar, com rapidez, respostas eficazes às necessidades de saúde (FORTES; OLIVEIRA; FERREIRA, 2009). Sordi e Bagnato (1998) relacionam o desenvolvimento tecnológico, científico e econômico à prática e à educação em saúde, destacando a ênfase que é dada ao saber e ao saber-fazer em detrimento do saber-ser. Para reduzir o distanciamento entre teoria, prática e a realidade social vigente, Ferreira et al. (2007) propõem que o conhecimento e as habilidades integrantes das disciplinas demandem um trabalho conectado aos problemas emergentes da prática. BOMFIM et al. (2009, p. 92) afirmam que: No caso da prática social educativa, a questão da avaliação não pode estar isolada das questões que marcam as discussões sobre a responsabilidade docente. Não basta, portanto, ver a avaliação como um expediente capaz de prover elementos para uma mudança nos processos pedagógicos, apontando necessidades, aspirações ou expectativas dos alunos-trabalhadores. Mais do que isso, a avaliação se define a partir dos objetivos e modos de realização que o projeto político-pedagógico estabelece para as relações educando e 359 educador. Bem mais do que isso, a avaliação é uma prática constitutiva desse projeto, a partir do momento em traz informações criticamente analisadas sobre a execução e os resultados das práticas vivenciadas. Seguindo as propostas de Bomfim et al. (2009), experimenta-se e sistematiza-se a educação popular em saúde, que, com base em forte crítica aos efeitos negativos da medicalização, busca, pelo diálogo, romper com as práticas educativas autoritárias e normalizadoras da relação entre os serviços de Saúde e a população, valorizando trocas interpessoais e o saber popular (VASCONCELOS, 1997). Conforme Fortes; Oliveira; Ferreira (2009) e Shimizu; Lima; Santana (2007), se essa é uma tendência, é preciso dizer que a educação interessa e muito à classe trabalhadora. Certamente, aos trabalhadores não interessa qualquer educação. Interessam os conhecimentos sistematizados que lhes são negados no dia a dia do seu trabalho, razão pela qual a formação é estratégica para os trabalhadores, incluindo-se os do Sistema Único de Saúde (SUS). No que se refere a essa tendência, é preciso lembrar que o alunotrabalhador, sujeito que produz cultura, tem a capacidade de intervir na realidade não só para mantê-la tal como ela se apresenta, mas para rejeitá-la ou transformá-la. Sua capacidade de intervenção crítica, porém, dependerá do grau de consciência que ele tem dessa mesma realidade (BOMFIM et al., 2009). A importância desse trabalho se dá mediante os autores serem profissionais que assistem usuários do SUS e também vislumbram na qualificação dos profissionais técnicos de Saúde uma oportunidade de consolidação desse sistema, e percebem as distorções apresentadas no perfil do trabalhador da área de Saúde. Perante as publicações sobre esse tema, pode-se verificar que há um número reduzido de artigos científicos a respeito, ocasionando uma carência no assunto. Dessa forma, pensando na formação técnica profissional associada à determinação histórica e social da construção do SUS, o intuito deste trabalho foi desvelar se a formação técnica, enquanto política pública, tem contemplado as necessidades da coletividade e se possui articulação com o processo de construção do sistema de Saúde brasileira. REVISÃO DA LITERATURA Educação profissional no Brasil: contextualização A situação da educação profissional no Brasil permanece a mesma 360 existente no início do século, quando da criação dos cursos profissionalizantes, ou seja, educação para a burguesia e formação profissional para o povo, pois apenas aproximadamente 30% da clientela, oriunda das camadas sociais menos privilegiadas, optava por cursos profissionalizantes, cuja atração era o seu caráter terminal. Dessa forma, fica claro que a maioria dos alunos optava pelo ramo propedêutico e candidatos ao ensino superior, privilégio praticamente inatingível para as camadas populares (KUENZER, 1997a,b). Essa “divisão social da educação” é percebida pela dicotomia do ensino médio, que oferece a formação para compreensão do mundo em que vivemos, habilitando para o ensino superior, e a educação profissional, que habilita o aluno a ingressar no mercado de trabalho com uma profissão, dominando apenas uma parte do processo produtivo (ABRAHÃO; CASSAL, 2009). A partir de 1964 – especialmente no período chamado de “milagre econômico” (1968-1973) – ocorreram significativas transformações na estrutura do sistema de ensino e de formação profissional, em decorrência da proposta de racionalização de todos os setores da vida social, política e econômica do país, apresentada como ideário da ditadura militar. Segundo Pezzato (2001, p. 58): A partir do golpe militar de 64, instalou-se como orientação oficial e hegemônica do grupo de militares e tecnocratas que assumiram o poder, a tendência tecnicista de educação. Com uma ideologia “nacionalistadesenvolvimentista”, buscava-se o desenvolvimento tecnológico com forte interesse no mercado internacional. Devido a isso, o sistema de ensino foi se adequando às necessidades desse mercado, bem como ao modelo internacional de educação predominante, ou seja, aos pressupostos da Teoria do Capital Humano. Pela Teoria do Capital Humano, elaborada por Theodor Schultz na década de 1950, nos Estados Unidos, a profissionalização do ensino médio estaria articulada com a perspectiva de impulsionar o desenvolvimento nacional, e a educação ficaria reduzida à técnica que incrementa o aumento de capital, ou seja, potencializadora, qualificadora do trabalho, geradora do desenvolvimento e fator de produção (PEZZATO, 2001; OLIVEIRA; SOUZA, 2004). Para Kuenzer (1997a), os cursos eram “excessivamente acadêmicos” e não preparavam para o exercício das funções produtivas, não atendendo às necessidades do mercado de trabalho em sua maioria, o que a autora considerava um dos fatores explicativos para a crise econômica em que mergulhava o país naquela oportunidade. 361 A maior parte dos trabalhadores auxiliares continuava sem formação adequada. A “escola” desse grande grupo permanecia sendo o próprio trabalho (treinamento em serviço), pois não só as escolas (privadas), criadas para formar profissionais de Saúde de nível médio, não se colocavam na perspectiva de quem já trabalha como os estabelecimentos de Saúde. Estes tomavam a lei como algo que não lhes dizia respeito (CHRISTOFARO, 1999). Também foi desse celeiro que, sob a influência das propostas do educador Paulo Freire, experimenta-se e sistematiza-se a educação popular em saúde, que, com base em forte crítica aos efeitos negativos da medicalização, busca por meio do diálogo o rompimento com as práticas educativas autoritárias e normalizadoras da relação entre os serviços de saúde e a população, valorizando trocas interpessoais e o saber popular (VASCONCELOS, 1997). Com a LDB número 5.692/71, a equivalência entre os ramos secundário e propedêutico passa a ser substituída pela obrigatoriedade de habilitação profissional para todos os que cursassem o ensino de segundo grau, conforme se passou a chamar o curso secundário. Assim, o objetivo do ensino de primeiro e segundo graus passa a ser “proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de autorrealização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania” (KUENZER, 1997b). Para Chaves (1986), a reforma do ensino médio, estabelecida pela Lei 5.692/71, objetivou dar uma formação profissional para os jovens que, por não terem ingressado na universidade, ficaram sem qualificação para o mercado de trabalho. Criaram-se, assim, oportunidades que permitissem o desenvolvimento de um trabalho mais abrangente de reestruturação da mão de obra qualificada. Distorções ainda prevalecem no ensino de nível médio, em especial pelo fato de que “o ensino médio fica como uma espécie de nó, no centro da contradição: é profissionalizante, mas não é; é propedêutico, mas não é”. Constitui, portanto, o problema nevrálgico das reformas de ensino que revela em maior medida o caráter de abertura ou de restrição do sistema educacional de cada nação. Não existe clareza a respeito dos seus objetivos e métodos, e geralmente costuma ser o último nível de ensino a ser organizado (MACHADO apud AMÂNCIO FILHO; MACHADO; WERMELINGER, 2007). O responsável por organizar a estrutura ocupacional da área da Saúde, definindo cada nível funcional, atribuições e conteúdo curricular foi o extinto Departamento de Recursos Humanos para a Saúde (DRHUS) (CHAVES, 1986), em cuja área, no início da década de 1970, surgiram críticas ao 362 modelo de desenvolvimento vigente no país, inclusive as teorias de educação predominante, quando se tinha a formação do ensino médico no modelo flexneriano que [...] procurou implantar no ensino médico as exigências do paradigma científico que influenciou todas as áreas do conhecimento nos Estados Unidos no fim do século XIX: os problemas de origem social que exigiam soluções políticas foram transformados em problemas de ciência, exigindo soluções técnicas; difundiu-se a ideia de que a ciência poderia resolver qualquer problema, e negou-se a ideia de causalidade social da doença. Os aspectos preventivos e de promoção da saúde foram relegados o segundo plano (sic), o corpo humano foi considerado como uma máquina, em que qualquer parte poderia ser tratada individualmente, e o paciente abstraído da coletividade da qual fazia parte e do contexto social em que se inseria (MARSÍGLIA, 1998, p. 177). Para Tiriba e Picanto (2004), se a relação trabalho-educação tem como pressuposto que o conhecimento produzido na escola tem como fonte inspiradora o saber produzido nas relações sociais que os homens estabelecem em seu processo de trabalho, a possibilidade de uma ação se transformar em ação transformadora pode ganhar corpo quando os trabalhadores têm assegurado, pelo menos, o direito à educação básica (ensino fundamental e médio). No Brasil, uma das primeiras iniciativas de que se tem registro na preparação de pessoal na área da Saúde foi o Programa de Preparação Estratégica de Pessoal de Saúde (PPRES), desenvolvido pelos Ministérios da Saúde (MS) e da Educação (MEC), com a cooperação direta da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), a partir de 1976. O propósito do PPRES era dar suporte aos Programas de Extensão da Cobertura, que se ampliavam pela rede ambulatorial do setor público por meio de treinamentos do Programa de Interiorização das Ações de Saúde (Piass), preparando pessoal de nível elementar e médio – aproximadamente 170 mil trabalhadores –, cuja forma, no entanto, não era legitimada pelo sistema formal de ensino (HANSEN, 2002). Nos últimos anos, a educação profissional esteve em evidência por meio do seu reordenamento normativo e organizacional em todo o país, pelo Programa de Expansão da Educação Profissional (Proep) – iniciativa do Ministério da Educação (MEC) em parceria com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com o objetivo de desenvolver ações integradas de educação, trabalho, ciência com tecnologia em articulação com a sociedade –, sob a coordenação da Secretaria de Educação Média e Tecnológica (Semtec/MEC). Com o Proep/Semtec/MEC, houve a elaboração dos Referenciais 363 Curriculares Nacionais da Educação de Nível Técnico, com o objetivo de oferecer subsídios à formação de propostas curriculares em cada uma dessas áreas profissionais: Agropecuária, Artes, Comércio, Comunicação, Construção Civil, Design, Gestão, Imagem Pessoal, Indústria, Informática, Lazer, Desenvolvimento Social, Meio Ambiente, Mineração, Química, Recursos Pesqueiros, Saúde, Telecomunicações, Transporte, Turismo e Hotelaria (BRASIL, 2000). Os referenciais curriculares na área da Saúde desdobram-se em subáreas: biodiagnóstico, enfermagem (grifo nosso), estética, farmácia, hemoterapia, nutrição e dietética, radiologia e diagnóstico por imagem em saúde, reabilitação, saúde bucal, saúde visual, saúde e segurança no trabalho e vigilância sanitária (TOMAZEVIC, 2004). Educação profissional de nível médio A Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV) é uma unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ligada ao Ministério da Saúde (MS), tendo em seu escopo a educação profissional em Saúde, buscando articular os setores da Educação, Saúde, Ciência e Tecnologia. Vem realizando atividades relacionadas à produção de material didático distribuído para as Escolas Técnicas do SUS (ETSUS), cooperação técnica na área de educação a distância e capacitação de profissionais. Então, ela procura atender à demanda proposta pelo SUS e também as demandas sociais na área de sua competência como escola (LIÑAN; BOTAZZO, 2004). O MS, por meio de sua Secretaria de Gestão de Investimentos em Saúde, implementou o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área da Enfermagem (Profae), iniciado em 2000, com o intuito de fortalecer e modernizar as Escolas Técnicas do SUS já existentes e criar outras novas, abrindo perspectivas para a formação de trabalhadores da área da Saúde. O objetivo principal desse projeto foi qualificar trabalhadores de graduação média; para isso, também oferece cursos de complementação do ensino fundamental para os trabalhadores que o não possuam – pré-requisito para a inscrição na qualificação técnica (BIASOTO JÚNIOR, 2001). Esse projeto teve como parâmetros da estrutura curricular o conceito de competência e a metodologia de ensino-aprendizagem, privilegiando a problematização (FERREIRA et al., 2007). Diante disso o conhecimento e o desenvolvimento das habilidades estariam intimamente ligados às demandas necessárias do contexto da realidade onde os alunos estavam inseridos. O Profae foi financiado com recursos oriundos de empréstimo junto 364 ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), do Tesouro Nacional e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) (HANSEN, 2002). Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico observou-se que consta para a área da Saúde a carga horária de 1.200 horas para a habilitação, ou seja, para o curso de técnico em Enfermagem deverá haver correspondência a essa carga horária. A tal respeito, coloca Deluiz (2004) que a formação profissional com carga horária pequena, pouca quantidade de aulas práticas, pouca articulação entre teoria e prática e ênfase nos conteúdos mínimos específicos mostram uma forte base tecnicista e instrumental por parte de algumas instituições executoras. Assim, o simples conhecimento técnico não expressa a competência profissional; pode ser considerado uma parte dela, havendo necessidade de se trabalhar a formação do profissional com conhecimentos, valores, habilidades e atitudes. As Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional de Nível Técnico tornam-se, então, fundamentais para o planejamento e a organização dos cursos pelas escolas em conjunto com o Parecer 16/99, pois tratam sobre competência profissional, sendo esta identificada como “a capacidade de articular, mobilizar e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades pela natureza do trabalho”. Outra iniciativa em formação profissional de nível médio em Saúde teve início em 2009 no estado de São Paulo, por meio da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), que contempla as bases teóricas da formação por competências aliadas à metodologia problematizadora como pilares para o processo ensino-aprendizagem e que segue os moldes do Profae (FORTES; OLIVEIRA; FERREIRA, 2009). Competências profissionais O predomínio do modelo fordista de educação e de trabalho, no qual se aprende a fazer e dominar uma tecnologia (de base empírica ou intuitiva), já foi considerado suficiente para inserir e manter o profissional, até sua aposentadoria, no mercado de trabalho. Com a globalização e a complexidade no mundo do trabalho, e tendo em vista as necessidades de melhoria contínua dos processos de produção e bens de serviço, as novas exigências do trabalho requerem do trabalhador não somente uma flexibilidade técnico-instrumental, mas também a intelectual, ou seja, um trabalhador polivalente, integrado, que trabalhe em equipe, com 365 mais flexibilidade e autonomia, uma vez que deve exercer, cada vez mais, funções abstratas e exercer, cada vez menos, o trabalho manual (DELUIZ, 2001). Nesse contexto de rápidas mudanças no mundo do trabalho e das demandas do mercado de trabalho, a redefinição do perfil profissional baseado em habilidades e competências, além da formação de profissionais dinâmicos e com capacidade de adaptação, são preponderantes para responder aos problemas de emprego e de ocupação profissional (CATANI; OLIVEIRA; DOURADO, 2001). A proposição de um projeto político-pedagógico com o compromisso para uma transformação social pelo trabalho associado à educação teórica e prática baseada na reflexão e crítica pode ser o elemento de mudança do ensino profissional de nível médio, uma vez que estaria sendo assegurada a politécnica ou educação integral (ABRAHÃO; CASSAL, 2009). Essa mesma ideia foi apontada por Sordi e Bagnato (1998), que consideraram fundamental a apropriação de maneira significativa, crítica, criativa e duradoura do conhecimento para a construção da cidadania e transformação da realidade. Destacaram, ainda, que a formação profissional estava enfocada no saber e no saber-fazer, em detrimento do saber-ser. Apontaram que o processo pedagógico deve ser estimulador do ato reflexivo, desenvolvendo a capacidade de observação, análise crítica, autonomia de pensar e de idéias, tornando o aluno agente ativo nas transformações da sociedade, interagindo na realidade na qual está inserido. Frente ao exposto torna-se relevante investigar as competências profissionais propostas pelas escolas técnicas na área de Saúde. OBJETIVO Este estudo teve por objetivo identificar as estratégias de ensino das escolas técnicas na área de Saúde e sua articulação com o processo de consolidação do SUS, por meio de levantamento bibliográfico. METODOLOGIA Tratou-se de um estudo descritivo, baseado em pesquisa exploratória secundária, utilizando-se de revistas técnicas e científicas, além de artigos disponíveis nas bases de dados eletrônicas. A pesquisa bibliográfica foi delimitada pelo tema “Estratégias de ensino em escolas técnicas na área da Saúde e sua articulação ao processo de consolidação do SUS”. Os artigos eletrônicos foram identificados na base de dados Lilacs e 366 Scielo, sendo utilizada a Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) por se tratar de um banco de dados de referência brasileira para investigações na área da Saúde. Esta pesquisa utilizou-se da ferramenta de busca existente no próprio portal, adotando-se as palavras-chave: credenciamento – qualificação profissional/ formação profissional; educação em saúde; educação profissionalizante; educação técnica em Enfermagem. A partir da pesquisa bibliográfica feita com as palavras-chave acima citadas, houve sucessivas leituras, análise, síntese do material e posterior leitura seletiva com a inclusão do material pertinente ao tema. A sequência de seleção dos artigos foi feita por meio de levantamento bibliográfico, fazendo-se o fichamento de artigos científicos encontrados nas bases de dados. Posteriormente, foi elaborado um roteiro baseado nos dados coletados, obtendo assim um esboço do que seria descrito na redação preliminar do trabalho. A análise foi realizada seguindo o critério de assuntos pertinentes ao tema, bem como buscando responder à pergunta do estudo, procurando dessa forma respostas para o objetivo proposto. O levantamento bibliográfico foi realizado em quatro pesquisas com diferentes estratégias de busca, conforme demonstrado no Quadro 1, sendo que, por meio da leitura dos resumos e/ou da leitura completa dos artigos, foram selecionados 20 artigos, que compõem a amostra do estudo. Foi necessário utilizar o critério de exclusão para aquelas publicações que não estavam referendadas como artigos científicos, sem texto completo e também aquelas de caráter internacional e que não se relacionavam com o tema proposto. Quadro 1 – Estratégias de pesquisa e seleção de artigos para a amostra Nº Descritor(es) Limite Critério exclusão Artigos encontrados Artigos excluídos Artigos selecionados 1 Credenciamento 197 8 Credenciamento; Educação técnica em Enfermagem Credenciamento; Educação em saúde; Enfermagem Credenciamento; Educação profissionalizante Relação com tema Publicação 2005-2009 205 2 Idioma: português Idioma: português 11 7 4 Idioma: português Publicação 2005-2009 13 9 4 Idioma: português Publicação 2005-2009 11 7 4 3 4 TOTAL 20 367 368 2009 ABRAHÃO; CASSAL SISSON SHIMIZU; LIMA; SANTANA; PEDUZZI et al. AMÂNCIO FILHO; EMERLINGER 2007 AMÂNCIO FILHO FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS MARX SISSON 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Nacional Abran-gência Nacional Nacional Estadual Nacional 2001 2001 2001 2001 2001 2000 2000 2000 1998 1997 1997 10 BIASOTO JUNIOR 11 BRASIL 12 BRIANI 13 CATANI; OLIVEIRA; DOURADO 14 PEZZATO 15 BRASIL 16 LIÑAN 17 SAVIANI 18 SORDI; BAGNATO; 19 DELUIZ 20 KUENZER (1997a) Nacional Nacional Nacional Nacional Municipal Nacional Estadual Nacional Regional Nacional Estadual 2002 Institucional 2005 Institucional 2005 2005 Institucional 2006 2007 2009 Institucional Ano Nº Autor Sim Sim Sim Não Não Sim Sim Não Não Sim Sim Sim Não Sim Sim Sim Sim Sim Não Sim Participação social Qualificação Organização tecnológica Instrução Lutas sociais Consolidação Globalização Qualificação profissional No mundo de trabalho Formação integrada ou concomitante Socialização profissional Explora a determinação social do trabalho Tecnicismo Inter-relação Ensino crítico-reflexivo Situação atual Tradicionalista Políticas de Saúde Ramo propedêutico Divisão do trabalho Cidadania; Agente ativo de transformação Práticas sociais Ensino propedêutico Autonomia Socialização profissional Ideário capitalista Educação e empregabilidade hegemônico Problematização Articulado Valorização das relações Integrante Profae Modelos Assistenciais Desenvolvimento integral Problematização Próprio local trabalho Dualidade Verticalizada Espaços formativos Valorização das relações Integração e politécnica Formação técnica em Estratégia de ensino Saúde _ Sim Sim Sim _ Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim _ Sim Sim Sim _ _ _ Sim _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Sim _ _ Disciplinar Currículo Integrado RESULTADOS Tabela 1. Comparação de autores conforme assuntos abordados. Os resultados da revisão encontram-se sumarizados na Tabela 1. DISCUSSÃO Após a leitura e a análise dos artigos incluídos no presente estudo verificou-se que o Estado brasileiro, a partir da década de 1970, incorporou e ampliou a oferta de serviços de Saúde; entretanto, a força de trabalho não foi acompanhada por uma política de formação de recursos humanos que garantisse a qualidade das ações de Saúde executadas pelos novos trabalhadores. Nos anos 1980 e 1990 houve profundas alterações nas políticas públicas de Saúde, com a criação do SUS, promovendo mudanças na formação de recursos humanos, privilegiando a formação de pessoal de nível técnico e auxiliar (PEDUZZI et al., 2006). A partir desse contexto, observou-se que houve estratégias para a consolidação da democratização do SUS, as quais se relacionaram com o investimento na qualificação dos trabalhadores de saúde, principalmente dos níveis elementar e médio. A implementação dessas estratégias aconteceram por meio de iniciativas e de propostas para a formação e qualificação dos trabalhadores desses níveis para a área da Saúde em instituições públicas, tais como o Projeto de Formação de Pessoal de Nível Médio em Larga Escala, do Ministério da Saúde – conhecido como Projeto Larga Escala (PLE) e a criação da Escola Politécnica da Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), ligada à Fundação Oswaldo Cruz, em 1985, no Rio de Janeiro (PEZZATO, 2001). O objetivo do PLE foi qualificar e habilitar, pela via supletiva, pessoal de nível médio e elementar engajado na força de trabalho dos serviços públicos de Saúde, contribuindo na melhoria da qualidade dos serviços e promoção profissional e educacional do pessoal auxiliar. Ele foi destinado à formação desse pessoal pelas próprias instituições de Saúde, sob responsabilidade das secretarias estaduais de Saúde, tendo como nova proposta qualificar os trabalhadores já inseridos no mercado de trabalho. Essa qualificação estava alinhada ao processo educativo de adultos. Demonstra-se, então, a pertinência da iniciativa desse projeto ao processo de consolidação do SUS. Segundo Peduzzi et al. (2006) e Pezzato (2001), esse desafio requer buscar conhecimentos novos que, inicialmente, podem parecer complicados demais ou distantes dos problemas do dia a dia, mas são conhecimentos importantes para se compreender as possibilidades da formação de trabalhadores para o SUS. O PLE era uma proposta de experiência pedagógica (artigo 64 da LDB número 5.692/71 e artigo 33 da Resolução do Conselho Estadual de Educação – CEE – 23/83) para educação de adultos inseridos no processo de trabalho 369 com a pretensão de unir três elementos, o ensino supletivo, a formação em serviço, de acordo com a realidade e a habilitação reconhecida oficialmente pelo sistema educacional (SES, 90). Esse Projeto, baseado nos termos da Lei 9.394/96 (LDB), deixou de ser experiência pedagógica para ser “Lei” a partir da publicação da Deliberação do CEE número 23/97 pelo Diário Oficial do Estado (LIÑAN, 2000). Para possibilitar e execução do PLE, foram implantadas estratégias nas escolas técnicas ou centros formadores, como o desenvolvimento de metodologia adequada à sua concepção filosófica e às características da clientela, onde se utilizou a metodologia problematizadora ou freireana, na qual o homem é o elaborador e o criador do conhecimento, sujeito de sua práxis – não neutralidade do conhecimento. Essas estratégias deveriam promover diálogo entre professor-aluno, devendo ter uma relação horizontal, em que se valoriza a linguagem e a cultura do aluno, com a busca da resolução dos problemas realizada em conjunto, existindo a sociabilização e a democracia participativa. A avaliação permanente do professor e do aluno é feita por meio de autoavaliação. Como a proposta do PLE era utilizar profissionais de nível superior empregados na rede, necessitou-se capacitá-los para tal desempenho. Certamente essa necessidade era o rompimento de padrões e concepções educacionais bastante arraigados, pois possuíam um histórico educacional baseado na escola tradicional, onde o professor é o transmissor dos conteúdos que detém, e o aluno, um simples receptor desses conteúdos. A EPSJV estabeleceu convênios e parcerias com instituições de todo o território nacional para o desenvolvimento de cursos nos diferentes níveis de ensino e serviços, tanto para trabalhadores dos serviços de Saúde quanto para a comunidade, articulando a formação específica, enquanto o PLE se diferencia por atender os empregados nos serviços de Saúde e abordar apenas o conteúdo profissionalizante (PEZZATO, 2001). Essa diferenciação estabelece a EPSJV como uma escola técnica em cujo escopo articula dimensões sociais, profissionais e tecnológicas, o que se configura como uma estratégia de ensino que colabora com a consolidação do SUS. Saviani (2000, p. 65) destaca que a escola deverá ser capaz de formar trabalhadores com uma aguda consciência da realidade em que atuam, com uma adequada fundamentação teórica que lhes permita uma ação coerente e uma satisfatória instrumentalização técnica que lhes possibilite uma ação eficaz. 370 Já Marx (2005) menciona que, na escola politécnica, o trabalho como princípio educativo materializa-se pela união entre instrução e trabalho, articulase à luta dos trabalhadores pelo acesso às bases teórico-práticas que caracterizam a forma de produção moderna. Volta-se para o desenvolvimento integral do homem, com base no desenvolvimento intelectual, físico, e na formação científica e tecnológica, visto que “a união do trabalho produtivo com a instrução é um dos meios mais poderosos de transformação da sociedade atual”. Pelo histórico, observa-se que quando os ensinos médio e técnico eram independentes, o ensino técnico servia para mão de obra escassa no país. Agora, com o aumento de mão de obra qualificada, parece não ser mais interessante formar indivíduos “somente técnicos”, havendo necessidade de dupla jornada de estudos. Isso pode ser considerado desestimulante, pois é independente e articulado com o ensino médio, necessitando fazer dois cursos para a habilitação profissional, parecendo ser mais vantajoso fazer ensino médio e posteriormente um curso superior, por exemplo, o de curta duração, pois este parece ter mais status e ser mais valorizado profissionalmente nos dias atuais. Para Kuenzer (1997a), os cursos eram “excessivamente acadêmicos” e não preparavam para o exercício das funções produtivas, não atendendo às necessidades do mercado de trabalho, em sua maioria, o que a autora considerava um dos fatores explicativos para a crise econômica em que mergulhava o país. Os cursos e as capacitações poderão ser ofertados segundo itinerários formativos, entendendo o processo como o conjunto de etapas que compõem a organização da educação profissional em uma determinada área, possibilitando o aproveitamento contínuo e articulado dos estudos. Dessa forma, visa-se superar a oferta fragmentada e descontínua de formação profissional que não se convertia em créditos para os trabalhadores, seja para fins de exercício de uma ocupação, seja para prosseguimento dos estudos (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005). Isso, certamente, só dependerá de regulamentações e políticas articuladas entre si pelos Ministérios da Educação, do Trabalho e Emprego, e, no caso específico, da Saúde, mudança estratégica firmada nos processos de formação dos profissionais da Saúde, com ênfase para os de nível médio, tendo em vista a importância de formação, qualificação, treinamento e atualização de pessoas para atuar não apenas em nível de gerência. Porque é sobre esse contingente que recai enorme parcela de responsabilidade em sustentar e 371 garantir, técnica e politicamente, a permanência do sistema de Saúde. Todavia, decorridos tantos anos e acumuladas seguidas intenções de aproximar as áreas da Educação e da Saúde, a formação dos trabalhadores da Saúde não se orienta pela leitura das necessidades sociais em saúde. É conduzida sem debate com os organismos de gestão e de participação social do SUS, resultando em autonominação do Ministério da Educação, das universidades e das sociedades de especialistas nas decisões relativas às quantidades e características políticas e técnicas dos profissionais de Saúde a serem formados (BRASIL, 2001, p. 42-43). Conforme aponta Abrahão e Cassal (2009), a formação profissional técnica de nível médio dos futuros trabalhadores pode ser uma forma de se conseguir a implementação do SUS. Diante disso, a Educação vem formando profissionais para atuar na Saúde sem que exista um diagnóstico preciso em relação ás necessidades desse setor, o que ocasiona um descompasso entre as ações educacionais e as necessidades dos serviços de Saúde. Para que os serviços de Saúde sejam adequados, é primordial contar com “recursos humanos bem formados, comprometidos com a causa da saúde e conscientes da necessidade de garantir a qualidade e resolubilidade dos cuidados e dos serviços disponíveis para a população”, já que esse setor, parte do setor terciário da economia, integra o conjunto daquelas atividades denominadas serviços de consumo coletivo (AMÂNCIO FILHO; TELLES, 2005). É importante destacar que Amâncio Filho e Telles (2005) citam que as críticas se dirigem notadamente ao sistema de ensino, produtor formal de mão de obra para o mercado de trabalho; o serviço de Saúde naturalmente é o maior empregador desse contingente, desempenhando relevante papel na determinação das necessidades de profissionais competentes. Mesmo reconhecendo os esforços que vêm sendo efetivados nos últimos anos no tocante à formação de recursos humanos para a Saúde, sob o argumento de consolidar o modelo do Sistema Único de Saúde, de uma maneira geral a formação dos trabalhadores desse setor permanece centrada na doença, “fundamentada no paradigma biologicista, tendo como unidade de ação e de reflexão o indivíduo, considerado em sua dimensão anátomoclínica” (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO, 2003, p. 6). Pode-se observar a ausência ou a insuficiência de conteúdos que possibilitem (re)configurar a saúde como “a resultante das condições de alimentação, habitação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, lazer e acesso a serviços de saúde”. Desse modo, para intervir na realidade, é necessário que os setores 372 da Educação e da Saúde estabeleçam uma estreita e permanente parceria interinstitucional, objetivando desenvolver ações conjuntas e articuladas para a elaboração e a construção de uma proposta educacional que conjugue os conhecimentos produzidos e acumulados pelas duas áreas. Assim, as relações entre educação e trabalho em saúde assumem posições estratégicas e repletas de significados, e isso acontece porque a “função da educação se torna mais importante na preparação da força de trabalho, uma vez que as habilidades requeridas do novo trabalhador são muito relacionadas com aquelas desenvolvidas na escola, isto é, responsabilidade, capacidade de abstração, de resolver problemas, de trabalhar com símbolos e compreensão de textos abstratos, entre outras” (SALGADO apud AMÂNCIO FILHO; TELLES, 2005, p. 7). Para Briani (2001), a socialização de adultos ultrapassa os limites da educação e do treinamento e se desenvolve por meios de duas vias principais: aprendizado direto, mediante ensino didático de um ou outro tipo, e indireto, no qual atitudes, valores e padrões de comportamento são adquiridos como subprodutos do contato com instrutores, com pacientes e com membros da equipe de Saúde. O Ministério da Saúde (BRASIL, 2000) destaca que as deficiências de profissionais com perfil adequado ao enfrentamento das novas necessidades do setor Saúde e a falta de integração estrutural que impede a formação de recursos apropriados são apontadas por alguns como problemas centrais das reformas. É preciso, portanto, construir um processo educacional que articule a formação profissional com as necessidades e as demandas da sociedade, como estratégia eficaz para o desenvolvimento econômico, social e cultural dessa mesma sociedade, na perspectiva de possibilitar ao indivíduo o exercício eficiente de seu trabalho. Por meio desses princípios norteadores, pode-se notar que há uma intenção em melhorar o perfil do profissional egresso dos cursos profissionalizantes, onde ele aprende valores humanos, e nos quais a ideia de perfeição é absolutamente essencial, ao lado de valores políticos e éticos, com o desenvolvimento da solidariedade e da responsabilidade, e qualificando o fazer humano na medida em que a prática deve ser sensível a determinados valores. No processo de construção dessas capacidades e habilidades, é preciso propiciar uma formação que permita aos trabalhadores agir como cidadãos produtores de bens e de serviços e como atores na sociedade civil. Mais do que 373 nunca, “a educação deve possibilitar aos trabalhadores [...] sua participação na sociedade científica e tecnológica não como objetos, mas como sujeitos, resgatando assim a dimensão política: a construção da identidade social e a integração plena na cidadania” (DELUIZ, 1997). De acordo com Sisson (2002), nos cursos que oferecem experiências de ensino articuladas aos serviços públicos de Saúde, o deslocamento de estudantes aos centros de Saúde ou à comunidade com uma programação construída unilateralmente pelo professor é radicalmente diferente do deslocamento realizado com base em um plano conjunto, que leva em conta interesses dos serviços de Saúde e da comunidade e não apenas os de ensinoaprendizagem. Sendo assim, segundo Deluiz (1997), o conceito de educação deve ser entendido como um compromisso com os ideais da sociedade e refere-se a um conjunto de práticas sociais, com valores, crenças, atitudes, conhecimentos formais e informais que uma dada sociedade tende a desenvolver para preservar ou melhorar as condições da qualidade de vida da população. Amplia-se o conceito de competência, não somente de suas atribuições, tornando-se consciente da necessidade de sua atualização permanente, além de valorizar seu “ethos” profissional e respeitar as demais – política da igualdade em que está presente a constituição de uma relação de valor do próprio trabalho e do trabalho dos outros, conhecendo e reconhecendo sua importância para o bem comum e a qualidade da vida. Segundo Shimizu; Lima; Santana (2007), partindo do pressuposto de que os cursos de formação, tendo como o núcleo do processo de trabalho de Enfermagem o cuidar em todas as dimensões, deveria preparar profissionais capazes de considerar a totalidade das necessidades do ser humano, no que tange os aspectos éticos, sociocomunicativos e relacionais com o clientepaciente e equipe. A iniciativa do Profae é considerada como uma estratégia de ensino para consolidação do SUS, uma vez que fora elaborada sob bases teóricas de saber-fazer e saber-ser, que permitem ao aluno refletir sua prática a partir da realidade e assim ser agente de transformação dessa realidade, que no início do século XXI foi muito importante devido à gênese do SUS e a sua necessária implantação (BIASOTO JUNIOR, 2001). Sisson (2009) destacou que, na medida em que, no país, a constituição do Sistema Único de Saúde (SUS) representa uma estratégia de transformação do sistema de Saúde, é necessário direcionar o processo e definir as grandes políticas e estratégias em atenção ao modelo escolhido. 374 A aquisição, o domínio e a prática desse conjunto de saberes e de fazeres pelos trabalhadores da Saúde são primordiais para sustentar as ações e as atividades a serem implementadas, para estruturar e dar seguimento a uma política cuja abrangência alcance as esferas federais, estaduais, e municipais da administração, que inclua os setores públicos e privados que compõem o Sistema Único de Saúde e que tenha entre suas prioridades a formação e a gestão de pessoas, bem como a regulação e a regulamentação do trabalho em Saúde. O presente trabalho teve a limitação da ótica da formação profissional de nível médio em Saúde enquanto política pública. Não se pode estender nenhuma inferência ao ensino profissional privado e seu projeto políticopedagógico. Temática interessante para estudos futuros seria a comparação do perfil de competências dos alunos egressos dos cursos profissionalizantes privados e dos egressos de cursos promovidos por instituições implementadoras das políticas públicas de ensino profissionalizante na área de Saúde. A formação profissional de nível médio em Saúde enquanto política pública de Saúde tem sido elaborada e articulada conforme as mudanças das demandas sociais e de saúde. A federação, por intermédio do MS, do MEC e em cooperação com os estados, tem sido eficaz no planejamento e implantação dessas políticas, restando a avaliação do impacto dessas ações no processo de consolidação do SUS. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para que o Sistema Único de Saúde (SUS) represente efetivamente uma estratégia de transformação do sistema de Saúde, é fundamental identificar e trabalhar os fatores que podem determinar mudanças positivas nas práticas profissionais. As propostas políticas e o programa são vivenciados pelos profissionais em diferentes locais, situações e momentos históricos. Portanto, há sempre uma reconstrução do perfil profissional, uma vez que existem diferentes concepções sobre a definição de suas práticas e variações sobre a expectativa de impacto de suas ações e interações. Educar pessoas conscientes de seu papel social, com percepção macro dos problemas que afetam a humanidade, representa proporcionar a cada indivíduo a oportunidade de assumir e exercitar uma postura que alie, de modo simultâneo, despojamento e rebeldia. Nesse percurso, é necessário aprofundar a reflexão sobre os meios 375 e os modos como a formação profissional vem ocorrendo, isto é, se os conteúdos curriculares e as metodologias de ensino utilizadas permitem ao aluno apreender tanto os procedimentos técnicos indispensáveis ao exercício profissional como, também, desenvolver visão crítica em relação ao processo de trabalho e ao mundo que o circunda. É preciso instituir estratégias que escapem a padrões convencionais de educação, como a implantação e o desenvolvimento, na esfera da educação profissional, de projetos dinamizadores do uso de novas tecnologias, promovendo e articulando o conhecimento produzido com as necessidades que (re)configuram a sociedade atual. REFERÊNCIAS ABRAHÃO, A. L.; CASSAL, L. C. B. Caminhos para a integralidade na educação profissional técnica de nível médio em saúde. Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v. 7, n. 2, p. 249264, jul./out. 2009. AMÂNCIO FILHO, A.; MACHADO, H. M.; ERMELINGER, M. 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Rio de Janeiro, 2003. Mimeografado. VASCONCELOS, E. Educação popular nos serviços de saúde. São Paulo: Hucitec, 1997. 378 INSERINDO A INTEGRAÇÃO DE CONTEÚDOS EM UM CURSO TÉCNICO DE ENFERMAGEM Tânia Cristina Freitas Barbosa1 Tatiana Gabriela Brassea Galleguillos2 RESUMO Este trabalho descreve a experiência de Inserção da Integração de Conteúdos Disciplinares por Docentes do Curso Técnico de Enfermagem/ CEFORH Pariquera – Açu - Classe Descentralizada de Juquiá. Busca fundamentar os aspectos relacionados às especificidades da Integração de Conteúdos Disciplinares na estrutura curricular em Educação Profissional Técnica; analisar criticamente o plano de aula que integra as disciplinas da Unidade 1 “Processo Saúde Doença” do curso e identificar aspectos positivos e negativos da proposta pedagógica. O desenvolvimento foi subdividido em dois momentos: 1. Conhecendo o referencial teórico sobre o Processo de Integração de Conteúdos Disciplinares, que permite reconhecer que os planos de curso organizados por conteúdos divididos através de disciplinas são fragmentados, tem maior tendência a dissociar teoria e prática e predomina o ensino voltado para os procedimentos técnicos em detrimento das ações complexas referentes ao cuidado com o ser humano, enquanto o currículo Integrado tem se mostrado uma alternativa pedagógica que possibilita a integração de áreas disciplinares e visa desenvolver no aluno a capacidade de enxergar integralmente suas ações e de tornar-se capaz de solucionar problemas gerais durante a vida profissional; 2 - Vivenciando a Inserção da Integração de Conteúdos Disciplinares na Unidade 1 – “Processo Saúde Doença” no qual foram integradas as disciplinas Microbiologia e Parasitologia, Vigilância Epidemiológica e Sanitária e Doenças Transmissíveis, com uso da Pedagogia da Problematização, tendo como competência geral da Unidade a ser alcançada pelo estudante o desenvolver em equipe multiprofissional ações de Promoção da Saúde e prevenção de agravos aos indivíduos em diferentes ciclos da vida, a partir de reflexões 1. Enfermeira, Coordenadora Pedagógica do Curso Técnico de Enfermagem, do Centro Formador de Recursos Humanos para Pessoal da Saúde, o CEFORH de Pariquera-Açu. 2. Doutora em Educação e Mestre em Enfermagem em Saúde Coletiva. Tutora do Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica em Saúde – Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca – ENSP/Fiocruz – FUNDAP – Niad da Escola de Enfermagem da USP. 379 críticas sobre o processo de saúde e adoecimento, suas causas e determinantes e, como desempenhos a serem alcançados a compreensão dos determinantes do processo saúde-doença, o reconhecimento das doenças que acometem indivíduos e comunidades e a respectiva correlação com as condições de vida para o seu desenvolvimento. A estruturação da Integração de Disciplinas e do Currículo Integrado requer conhecimento, atitude e empenho por parte dos docentes e das instituições de ensino. Requer flexibilidade, uma vez que as reformulações devem ser realizadas constantemente, conforme as necessidades provenientes dos alunos, do curso, da Instituição e da própria organização da área da saúde. Descritores: currículo integrado, pedagogia da problematização, processo saúde-doença introdução O Centro de Formação de Recursos Humanos de Pariquera-Açu nasceu na década de 1970, a partir da necessidade de formar auxiliares de enfermagem capacitados para atender aos usuários do Hospital Regional do Vale do Ribeira (HRVR). Neste período, o hospital apresentava carências em recursos humanos para exercer ações de enfermagem, além de altos índices de mortalidade por causas evitáveis (FERRAZ et al., 2010). Paralelamente, no âmbito nacional das ações em Saúde, o Brasil encontrava-se em intensa crise política, econômica e social. Na década de 70, a Assistência à Saúde era regida pelo excludente modelo médico-assistencial privatista e a organização dos serviços era caracterizada pela predominância de práticas curativas e individuais, em detrimento de ações preventivas de caráter coletivo (CARVALHO; MARTIN; CORDONI, 2001). A década de 80 foi decisiva para modificações essenciais nos cursos da área da Saúde. Em 1986 foi realizada a 8ª Conferência Nacional de Saúde, na qual foi elaborado o Projeto de Reforma Sanitária Brasileira. O acesso à Saúde no Brasil passou a ser definido como um direito de todos e dever do Estado (CARVALHO; MARTIN; CORDONI, 2001). A Reforma Sanitária culminou com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), que inserido à Constituição Brasileira, em 1988, tem como objetivo prioritário a assistência à saúde de qualidade a toda população (GIL et al., 1996). A Constituição de 1988, especificamente no artigo 200, parágrafo III, estabelece como atribuição fundamental do SUS a ordenação da formação 380 de recursos humanos para a área da Saúde (BRASIL, 1990). A implantação deste novo Sistema de Saúde no Brasil trouxe novos cenários e possibilidades que exigiram estratégias de formação focadas nos pressupostos doutrinários do Sistema Único de Saúde: na universalidade, na equidade e na integralidade, visando garantir à população o acesso igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde. Para fortalecer a importância de reestruturações no âmbito da Formação em Saúde, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394/96 reforça a importância da Educação vinculada ao mundo do trabalho e da prática social (BRASIL, 1996). O perfil de formação profissional para a inserção no Sistema Único de Saúde deve atender à diversidade e à complexidade no campo de atuação, abrangendo as áreas da Atenção Básica e Hospitalar. Dos profissionais esperamse competências, conhecimentos, habilidades e atitudes, bem como uma visão ampla do conceito de saúde, possibilitando a atuação interdisciplinar e multiprofissional (REDE UNIDA apud SAKAY et al., 2001). Essa nova visão em saúde determinou a necessidade de reformular os cursos na área da Saúde. A Escola de Enfermagem de Pariquera-Açu passou por alterações expressivas. Em 1996, foi transformada em Centro Formador de Recursos Humanos para Pessoal da Saúde (CEFORH), de acordo com o Parecer do Conselho Estadual de Educação (CEE) nº 542/98, da Câmara de Ensino Médio (CEM) e Parecer CEE nº 187/99, também da Câmara de Ensino Médio, e pôde formar não só Auxiliares de Enfermagem, como também Trabalhadores para outras áreas da Saúde. Neste mesmo ano, o CEFORH de Pariquera-Açu uniu-se aos outros Centros Formadores e passou a compor a Rede de Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde (RET/SUS), do Estado de São Paulo (FERRAZ et al., 2010). A partir do ano 2000, o governo federal implantou, com recursos nacionais e internacionais, um programa de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE), visando atender as demandas legais deste setor e, ao mesmo tempo, a melhoria da qualidade nos serviços prestados pela rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS) em todos os Estados (FERRAZ et al., 2010). No ano 2000, houve também um aumento considerável na instrumentação, adequação e fortalecimento das Escolas Técnicas do SUS (ETSUS), na capacitação e especialização de docentes para ensino, aprendizagem e pesquisa. Atualmente a Instituição CEFORH de PariqueraAçu contabiliza a formação de mais de três mil trabalhadores para a área da 381 Saúde (FERRAZ et al., 2010). No ano de 2009, o CEFORH de Pariquera-Açu iniciou o processo de Formação de Técnicos de Enfermagem, pelo Programa TecSaúde, em parceria com a Fundação de Desenvolvimento Administrativo (FUNDAP) e o Programa de Formação de Profissionais da Saúde (PROFAPS). Quanto à Classe Descentralizada de Formação Técnica em Enfermagem de Juquiá, do CEFORH de Pariquera-Açu, esta iniciou a sua primeira turma em agosto de 2009, com conclusão em agosto de 2010, na qual instituiu o processo de Inserção da Integração de Conteúdos Disciplinares no Currículo de Formação Técnica em Enfermagem, foco deste trabalho. OBJETIVOS Geral Descrever a experiência de Inserção da Integração de Conteúdos Disciplinares por Docentes do Curso Técnico de Enfermagem, do Centro Formador de Recursos Humanos para Pessoal da Saúde, o CEFORH de Pariquera-Açu – na Classe Descentralizada de Juquiá. Específicos Fundamentar os aspectos relacionados às especificidades da Integração de Conteúdos Disciplinares na estrutura curricular em Educação Profissional Técnica; analisar criticamente o plano de aula que integra as disciplinas da Unidade 1 “Processo Saúde Doença”, do Curso Técnico de Enfermagem, o CEFORH de Pariquera-Açu, especificamente da Classe Descentralizada de Juquiá; e identificar aspectos positivos e negativos da proposta pedagógica. PROCEDIMENTO METODOLÓGICO Trata-se de um relato de experiência. A fim de compreender o Processo de Inserção da Integração de Conteúdos no Curso Técnico CEFORH de Pariquera-Açu – Classe de Juquiá utilizaram-se os referenciais teóricos sobre o Processo de Integração de Conteúdos Disciplinares; os referenciais teóricos elaborados especificamente para as aulas da Unidade 1 “Processo Saúde Doença”; e a discussão sistemática sobre o tema. 382 INTEGRAÇÃO DE CONTEÚDOS: referencial teórico e resultados obtidos Os resultados deste relato foram subdivididos em dois momentos para posterior análise e discussão: Momento 1 - Conhecendo o referencial teórico sobre o Processo de Integração de Conteúdos Disciplinares; Momento 2 - Vivenciando a Inserção da Integração de Conteúdos Disciplinares na Unidade 1 “Processo Saúde Doença”. Momento 1 - Conhecendo o referencial teórico sobre o Processo de Integração de Conteúdos Disciplinares. A estruturação curricular norteia todo processo de ensinoaprendizagem de uma instituição e tem como objetivo central o projeto de sociedade que se pretende construir. Assim, a adoção de um modelo curricular está intensamente associada ao contexto sociopolítico vivenciado na atualidade (BOMFIM et al., 2009). O Currículo em Educação Profissional Técnica na área da Saúde brasileira apresenta como tradição o referencial do paradigma biomédico. Este modelo apresenta raízes no ano de 1910, através do Relatório de Flexner, que fixou linhas mestras para a educação médica nos EUA. (BOMFIM et al., 2009). No modelo flexneriano são frequentes as propostas curriculares que isolam conhecimentos, reforçando uma visão fragmentada da realidade sociocultural e dos problemas relativos à saúde e à doença, desfavorecendo o desenvolvimento no aluno da criatividade para a resolução de problemas reais (BOMFIM et al., 2009). Em contrapartida, a concepção curricular adotada pelo Sistema Único de Saúde tem sua sustentação na produção social da saúde, sob a perspectiva da multicausalidade. Na atualidade, predominam dois modos de pensar e estruturar o currículo na área da Saúde: o currículo tradicional por disciplinas, vinculado à fragmentação de conhecimentos e o Currículo Integrado, vinculado à educação crítica transformadora, à integração de conteúdos disciplinares, bem como à integração ensino-serviço e comunidade. A estratégia curricular constitui atualmente um grande desafio na formação dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde (BOMFIM et al., 2009). A partir da análise crítica referente aos planos curriculares na formação Técnica em Saúde, é possível enumerar alguns problemas frequentes na atualidade, tais como: 383 • • • • Padronização nos Referenciais Curriculares e ausência de espaço para as experiências dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde durante o aprendizado; Conteúdos divididos através de disciplinas fragmentadas; Teoria e prática dissociadas; Predominância do ensino voltado para os procedimentos técnicos, em detrimento das ações complexas referentes ao cuidado com o ser humano. O Currículo Integrado tem se mostrado uma alternativa pedagógica que possibilita a integração de áreas disciplinares e visa, acima de tudo, desenvolver no aluno a capacidade de enxergar integralmente suas ações e de torná-lo capaz de solucionar problemas gerais durante a sua vida profissional. Além disso, quando associado a uma pedagogia crítica, o Currículo Integrado favorece o desenvolvimento: do raciocínio investigativo, da autonomia pela busca do saber e da criatividade. O Currículo Integrado traz como vantagens: • Permite inter-relações intelectuais e articulações entre as disciplinas; • Permite homogeneidade de ações entre professores e alunos; • Permite maior profundidade teórica; • Permite relações mais democráticas entre alunos e professores; • Confere maior iniciativa por parte dos alunos; • Possibilita a integração de saberes escolares com os saberes cotidianos; • Combate a visão hierárquica do conhecimento. Para Lopes (2004 apud BOMFIM et al., 2009), durante a integração disciplinar é importante o debate democrático entre alunos e professores, a fim de pensar acerca das atividades de integração possíveis. Momento 2 - Vivenciando a Inserção da Integração de Conteúdos Disciplinares na Unidade 1 “Processo Saúde Doença”. Considerando o objetivo primordial da Formação de Técnicos de Enfermagem, o de desenvolver no aluno a competência para cuidar de seres humanos, usuários do Sistema Único de Saúde, o CEFORH de Pariquera-Açu, em parceria com o Programa TecSaúde, direcionou docentes para construírem a integração de conteúdos disciplinares no decorrer da formação. 384 O curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem, desenvolvido pelo CEFORH de Pariquera-Açu, apresenta suas bases teóricas no material didático desenvolvido pela Fundação de Desenvolvimento Administrativo (Fundap). O material está dividido em áreas temáticas 1, 2 e 3: • Área 1 – Promovendo a Saúde; • Área 2 – Cuidando do cliente em estado crítico; • Área 3 – Atuando em gestão na Saúde. As áreas são entendidas como as maiores dimensões do conteúdo a ser trabalhado. Todas as áreas apresentam competências e habilidades, as quais norteiam o processo de ensino-aprendizagem. Posteriormente, para fins didáticos, os conteúdos são divididos em unidades de aprendizagem (FORTES; OLIVEIRA; FERREIRA, 2009). A partir das unidades de aprendizagem, em que as disciplinas encontram-se “diluídas”, os docentes apresentam autonomia para integrar as disciplinas, para explorar o conteúdo e para elaborar o plano de aula. O Corpo Docente do CEFORH de Pariquera-Açu, da Classe Descentralizada de Juquiá, elaborou, entre setembro e novembro de 2009, o conteúdo teórico-prático integrado da ÁREA 1 - Unidade 1 – Processo Saúde-Doença. A seguir a organização estrutural da Unidade 1: • Conteúdo Básico de apoio: Texto 1 – O processo saúde-doença; Texto 5 – Vigilância em Saúde. • Disciplinas integradas: Microbiologia e Parasitologia; Vigilância Epidemiológica e Sanitária; Doenças Transmissíveis. • Metodologia: Pedagogia da Problematização. • Competência geral da Unidade a ser alcançada pelo estudante: Desenvolver em equipe multiprofissional as ações de Promoção da Saúde e prevenção de agravos aos indivíduos em diferentes ciclos da vida, a partir de reflexões críticas sobre o processo de saúde e adoecimento, suas causas e determinantes. • Desempenhos a serem alcançados: compreender os determinantes do processo saúde-doença; reconhecer as doenças que acometem indivíduos e comunidades, relacionando-as com as condições de vida para o seu desenvolvimento. 385 Unidade 1 - Processo Saúde-Doença AULA 1 - Estruturação da aula Sequência norteadora Objetivos específicos Introduzindo a temática 1 – Identificar com os alunos as concepções de Saúde e Doença; 2 - Registrar em quadro negro o que foi descrito; 3 - Questionar posteriormente: Por que as pessoas adoecem? 4 - Quais os determinantes para a ocorrência da doença? 5 - O que uma família necessita para ser saudável? 6 - Registrar em quadro negro os determinantes para uma pessoa ser saudável. 7 - Em Juquiá, ou em sua cidade, como as doenças são tratadas? Quem são os responsáveis pela prevenção das doenças? 8 - No Brasil, existem ações do governo para sanar os problemas relacionados à Saúde? (Discutir modelos de atenção à Saúde) Teorização 9 - Organizá-los em grupos para sistematizarem: o que significa processo saúde-doença? 10 - Eleger um mediador, um apresentador e um secretário para registrar a discussão. Convergências e fechamento teórico 11 - Seguir com a apresentação dos grupos. 12 - O professor deverá fechar o conteúdo sintetizando o que foi relatado e acrescentando observações após as apresentações. 13 - A síntese do professor poderá contar com recurso audiovisual. 14 - O professor deverá fornecer material teórico/ referências para que os estudantes aprofundem o tema. 386 Favorecer o resgate de conceitos relacionados à Saúde e Doença. Levantar com os estudantes os determinantes relacionados ao processo saúde-doença, considerando: trabalho, renda e consumo. Estimular a descrição dos modos de vida no desenvolvimento da doença: meio ambiente, saneamento, moradia, transporte, alimentação, lazer, saúde, educação, posse de terra. Recapitular a existência da Política Nacional de Saúde e sua relevância. Sintetizar coletivamente aspectos fundamentais relacionados à concepção do processo saúde-doença. AULA 2 - Estruturação da aula Sequência norteadora Objetivos específicos Introduzindo a temática Construir o conceito de perfil epidemiológico. 1 – Identificar, com os alunos divididos em grupos: Quais as principais doenças que acometem os indivíduos no Brasil? 2 - Pedir para os representantes dos grupos registrarem em quadro negro, separando: doenças infecciosas das não-infecciosas. 3 - Pedir para que um dos alunos escreva em papel as doenças infecciosas relatadas. 4 - A incidência destas doenças em nosso país sempre foi assim? Houve mudança? Caso tenha havido, por quê? 5 - Resgatar as informações da aula anterior acerca do que uma pessoa precisa para ser saudável? Levá-los a refletir sobre a transição demográfica e social que desencadeou o atual perfil epidemiológico do Brasil. Recuperar as informações da aula anterior, estimulando os estudantes a construírem o conceito ampliado de saúde. Tornar o estudante capaz de definir os conceitos de Promoção da Saúde e de Prevenção de Agravos, correlacionando esses conceitos com o conceito de intersetorialidade. Teorização 6 - Organizar os alunos de modo que eles sistematizem em papel craft os conceitos de: Promoção da Saúde/ prevenção de agravos e Intersetorialidade. 7 - Eleger um mediador, um apresentador e um secretário para registrar a discussão. Convergências e fechamento teórico 8 - Seguir com a apresentação dos grupos. 9 - O professor deverá fechar o conteúdo sintetizando o que foi relatado e acrescentando observações após as apresentações. 10 - A síntese do professor poderá contar com recurso audiovisual. 11- O professor deverá fornecer material teórico para que os estudantes aprofundem o tema. 387 Estruturação da avaliação Unidade 1 Avaliação processual 1 avaliará 1- Os aspectos relacionados à atitude do estudante diante do grupo; 2- A criatividade; 3- A capacidade de relacionar a teoria apreendida com a realidade profissional; 4- O conhecimento apreendido e sua capacidade de expor coletivamente; 5- A capacidade de liderança compartilhada e o espírito de equipe. Avaliação teórico-prática: sequência norteadora 1- Os alunos serão numerados de 1 a 6 e agrupados de acordo com os números iguais; 2- Serão distribuídos seis temas relacionados à aula 1, com um tema para cada grupo; 3- Os temas serão: 1) A saúde e seus determinantes (lazer, educação, emprego, alimentação, atividade física, interação social); 2) As doenças e seus determinantes (ausência de trabalho, fome, ausência de saneamento básico, baixa renda, estresse, cultura alimentar inadequada, baixa escolaridade); 3) O Processo Saúde Doença – concepção; 4) Perfil Epidemiológico do país; 5) Promoção da Saúde e Prevenção de Agravos. Os alunos terão 30 minutos para discutir nos grupos. 4- Posteriormente os alunos serão novamente divididos, porém, em grupos mistos (1-6). Os alunos terão 40 minutos para passarem o seu tema para o restante do grupo. ANÁLISE E DISCUSSÃO Os conteúdos enfatizados na Unidade 1 – Processo Saúde-Doença foram trabalhados de modo essencialmente teórico e reflexivo, utilizando para isso as diretrizes pedagógicas da educação crítica transformadora. O intuito da reestruturação das disciplinas e do uso da metodologia da problematização foi o de formar alunos com capacidade crítica. Tratase de estratégias utilizadas para desenvolver nos estudantes: o raciocínio investigativo, a capacidade de resolver problemas de forma contextualizada e o potencial de mudança da realidade. As disciplinas de Microbiologia e Parasitologia, Vigilância Epidemiológica e Sanitária e Doenças Transmissíveis compõem a matriz Curricular do Curso Técnico de Enfermagem do CEFORH de Pariquera-Açu, por isso tornou-se possível integrá-las na Unidade 1 – no Processo SaúdeDoença (SÃO PAULO, 2009). Em síntese, o objetivo primordial desta unidade foi tornar os estudantes capazes de compreender os determinantes socioeconômicos e culturais envolvidos no Processo Saúde-Doença, sem deixar de considerar aspectos 388 biológicos e subjetivos do indivíduo. Assim, os modos de viver e as formas de organização da vida cotidiana em sociedade passaram a ser fundamentais para a compreensão da Unidade. Quanto aos aspectos gerais da integração de conteúdos foi possível relacionar pontos positivos. Ressalta-se: • A utilização da proposta metodológica problematizadora; • O processo de integração de conhecimentos, visando à formação crítica e a capacidade de atuação profissional futura; • A correlação dos conteúdos de ensino com o panorama epidemiológico local, favorecendo a formação condizente com a realidade; • A contextualização socioeconômica e cultural envolvida na resolução de problemas no Sistema Único de Saúde (SUS); • A oferta de espaço durante o aprendizado para tornar presentes as experiências dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde; • A valorização dada às ações complexas relacionadas ao cuidado em Saúde com seres humanos. A partir dos pontos descritos, observou-se um rompimento importante com o formato dos planos curriculares tradicionais na formação Técnica em Saúde, entretanto, ainda evidenciam-se alguns problemas. Nesta nova estruturação disciplinar integrada observam-se deficiências quanto ao uso da metodologia da problematização. O plano de aula em análise não apresenta a fase final da problematização, que se refere à aplicação do conhecimento construído na realidade prática. Essa deficiência mantém a problemática da dissociação entre teoria e prática. Bomfim et al (2009) ressaltam que os planos curriculares na área da Saúde frequentemente dissociam teoria e prática, dificultando o aprendizado efetivo por parte dos estudantes. No plano de aula analisado, os aspectos burocráticos envolvidos na liberação Institucional para Estágios e Visitas Técnicas inviabilizaram a aplicação da correlação teoria e prática imediata. O desenvolvimento da teoria e da prática de maneira sequencial possibilita um aprendizado mais significativo, portanto, é necessária a realização de estágios supervisionados, imediatamente após a teoria, de forma correlacionada. Além disso, seria pertinente introduzir momentos de “dispersão” no decorrer do aprendizado teórico-prático, por meio de visitas às diversas áreas e setores envolvidos com a Saúde. Com relação ao conteúdo geral proposto no Plano de aula, acredita-se 389 que a inclusão de conceitos essenciais das Ciências Sociais e Humanas, como: Sociedade; Família; Ética; Moral; Política e outros favoreceriam a construção do conhecimento temático. De acordo com Saviani (2005), a educação em Saúde deve ater-se ao desafio de transformar a realidade social. A educação em Saúde deve produzir saberes voltados aos interesses da população, relacionados à assistência à Saúde. Outra problemática que se mantém refere-se à avaliação. Embora o processo avaliativo seja baseado em competências, ainda apresentamos um modelo quantitativo de avaliar. Os alunos foram avaliados nas unidades teóricas por meio de conceitos obtidos através de percentuais: 80%-100% – ótimo; 65%-80% – bom; 50%-65% – suficiente; menor que 50% – insuficiente (SÃO PAULO, 2009). Visando uma modalidade avaliativa processual, baseada na competência, acredita-se que, se bem estruturados os instrumentos e critérios para o alcance da aptidão do aluno, a avaliação poderia ter sido bidimensional nas Unidades teóricas e práticas, baseada no alcance total dos desempenhos essenciais, necessários para que os alunos atinjam a competência solicitada. O sistema de avaliação bidimensional (A - Atingiu o desempenho e NA - Não atingiu o desempenho) enfatiza o feedback (entre aluno e professor) e elimina efeitos classificatórios; permite maior amplitude quanto à aprendizagem; evita posturas competitivas e comparativas; estimula a autonomia e torna o aluno parâmetro para si mesmo, no empenho para o estudo; impossibilita a compensação de um desempenho pelo outro; e desencoraja o aluno a estudar por notas (PERRENOUD, 1999; KIKUCHI et al., 2005). A avaliação na concepção transformadora da educação apresenta função diagnóstica, em que o aluno é parâmetro para si mesmo, na análise de seu aprendizado, sendo capaz de reconhecer suas fortalezas e fraquezas no decorrer do ensino. Além disso, a avaliação transformadora apresenta função formativa, visando um acompanhamento contínuo, correção e reorientação do estudante. Nesta perspectiva, os desempenhos são ressaltados e os alunos participam continuamente da aprendizagem (PROVENZANO; MOULIN, 2003). As notas e conceitos, embora sejam precisos, são superficiais em relação à qualidade da aprendizagem. Não permitem o entendimento individualizado do aprendizado, porque generalizam e padronizam sujeitos diferentes, impossibilitando a identificação das dificuldades e avanços de cada aluno (HOFFMAN, 2001). Através da descrição e da discussão sistemática desenvolvida foi possível compreender os pressupostos do processo de Integração de Disciplinas e o 390 referencial teórico proposto para o Curso Técnico – CEFORH de PariqueraAçu, da Classe de Juquiá, referente à Unidade 1 – Processo Saúde-Doença. Acredita-se que essa nova proposta apresentada represente o início das mudanças necessárias para a adoção plena do Currículo Integrado, na perspectiva da Educação Crítica transformadora. CONSIDERAÇÕES FINAIS A estruturação da Integração de Disciplinas e do Currículo Integrado requer conhecimento, atitude e empenho por parte dos docentes e das instituições de ensino. Requer flexibilidade, uma vez que as reformulações devem ser realizadas constantemente, conforme as necessidades provenientes dos alunos, do curso, da Instituição e da própria organização da área da Saúde. A partir da análise deste trabalho sugerem-se o fortalecimento das parcerias com as Instituições Locais de Saúde, visando à integração curricular contínua entre Ensino, Serviço e Comunidade, pertinentes ao processo de formação crítica, condizentes com a realidade. Ressalta-se ainda a importância de utilizar as diretrizes e a organização do Sistema Único de Saúde como base para a estruturação das unidades de aprendizagem e da revisão permanente dos planos de aula, que devem ter como objetivo maior a formação de Técnicos em Enfermagem competentes para a atuação no Sistema Único de Saúde. REFERÊNCIAS BOMFIM, M. I. R. M. et al. A organização pedagógica do trabalho docente em saúde. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz; Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, 2009. 164p. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 168 p. BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, 23 dez. 1996. CARVALHO, B. G.; MARTIN, G. B.; CORDONI, L. A organização dos serviços de saúde. In: ANDRADE, S. M.; SOARES, D. A.; CORDONI, L. (Org.). Bases da saúde coletiva. Londrina: UEL, 2001. p. 27-59. FERRAZ, C. A. et. al. CEFORH completa 39 anos. Revista da Rede de Escolas Técnicas do SUS, Rio de Janeiro, n. 38, 2010. FORTES, J. I.; OLIVEIRA, S. C.; FERREIRA, V. C. Unidade 1: processo saúde: doença. In: PROGRAMA DE FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DE NÍVEL TÉCNICO (São Paulo). Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem, área 1: módulo de habilitação. São Paulo, 2009. 391 GIL, C. R. R. et. al. Reformulações no ensino da enfermagem: análise e reflexões de uma experiência em construção. Divulgação em Saúde para Debate, Londrina, n. 15, p. 11-14, nov. 1996. Hoffman, J. Avaliar para promover: as setas do caminho. Porto Alegre: Medicação, 2001. Kikuchi, E. M. et al. Avaliação do processo de ensino e aprendizagem. In: DELLAROZA, M. S. G.; VANNUCH, M. T. O. (Org.). O currículo integrado do curso de enfermagem da Universidade Estadual de Londrina: do sonho a realidade. São Paulo: Hucitec, 2005. p. 59-82. Perrenoud, P. Avaliação: da excelência à regulação da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. Provenzano, M. E.; Moulin, N. M. Proposta pedagógica: avaliando a ação. Brasília: Ministério da Saúde, 2003. Núcleo Estrutural, Módulo 8. Sakay, m. h. et al. Recursos humanos em saúde. ANDRADE, S. M.; SOARES, D. A.; CORDONI, L. (Org.). Bases da saúde coletiva. 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A ação pedagógica fundamentada em uma abordagem interdisciplinar possibilita a compreensão de aspectos cognitivos, afetivos, sócio-econômicos, políticos e culturais, constituindo uma prática pedagógica socialmente contextualizada. Objetivo: Apresentar uma proposta de plano de ensino sobre o SUS direcionado ao Aluno trabalhador no Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem – Módulo Habilitação, no Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde no Estado de São Paulo - TecSaúde. Metodologia: Trata-se de uma pesquisa de caráter não experimental, de natureza qualitativa, com abordagem descritiva. Atuando como enfermeiras docentes na formação profissional do técnico de enfermagem, durante o período de fevereiro a setembro de 2010 constatamos em nossa vivência profissional que a grande maioria dos alunos enfrenta algum tipo de dificuldade na aprendizagem, teórica e prática, sobre assuntos relacionados ao SUS. No curso vivenciado, esse tema é ensinado em um momento específico, em Saúde Coletiva e, posteriormente, pouca correlação é estabelecida entre os demais componentes curriculares e o SUS. Consideramos que esse tipo de abordagem fragmenta a compreeensão sobre o sistema de saúde e a participação do sujeito, como elemento transformador no espaço de trabalho e no cenário da saúde. Essa inquietação motivou-nos na delimitação desses aspectos na educação profissional, norteando a proposta para a (re)elaboração de um plano de ensino em Saúde Coletiva, à luz do Currículo Integrado. Nessa construção, propomos a (re)distribuição, ao longo do curso, sobre os temas relacionados ao SUS, mantendo a carga horária originalmente destinada, de maneira que a nova abordagem seja contextualizada em diversos momentos, com a utilização de estratégias metodológicas ativas. Considerações 393 finais: As constatações obtidas no desenvolvimento deste estudo possibilitam a implantação de um plano de ensino inovador, centrado no aluno trabalhador inserido no SUS, sem impacto na carga horária total do curso. Quando a escola, enquanto instituição formadora reconhece e assume o papel social que lhe é atribuído, mobiliza os docentes nesse posicionamento. Essa mediação é favorecida com a diversificação das estratégias metodológicas que permite aproveitar a vivência do aluno trabalhador, na busca da aproximação entre a realidade e a prática profissional, promovendo uma reflexão interdisciplinar, multiprofissional e crítica sobre a saúde no Brasil, instrumentalizando-o na participação nas lutas sociais pela transformação da realidade vivida. Descritores: Educação em Enfermagem. Educação Profissionalizante. Educação Técnica em Enfermagem. Sistema Único de Saúde. Saúde Pública. Introdução O interesse em realizar este estudo originou-se de uma experiência em educação profissional na área de enfermagem e da convivência com alunos-trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS), pois conhecêlos é uma necessidade de todo professor empenhado e comprometido em propor atividades pedagógicas efetivas, colaborando para que sejam futuros profissionais de excelência, no que diz respeito à capacitação e às competências profissionais. Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2009), desde a década de 1970 o sistema de saúde vem se transformando, com a redemocratização do Estado brasileiro, onde o eixo básico para discussão da gestão de serviços de saúde perpassa a formulação e a implantação do SUS. Nessa trajetória, a atenção para a saúde coletiva nunca esteve tão presente quanto nos dias atuais. Durante décadas, o foco dos investimentos em saúde era predominantemente voltado para a assistência individual, na concepção hospitalocêntrica. Contudo, a partir da reforma sanitária e da criação do SUS, houve um fortalecimento da saúde coletiva, sobretudo ao se perceber que a melhor alternativa para elevar o nível da saúde da população reside na intensificação das ações de atenção básica por meio da prevenção e da promoção à saúde. Considerando a importância de apresentar e compartilhar essa concepção durante a formação profissional na área da saúde e que os indivíduos vivenciam diferentes contextos sociais, o processo educativo interativo favorece 394 o intercâmbio de saberes e oferece os subsídios necessários para o crescimento de todos os participantes envolvidos e, desse modo, apresenta-se como um importante instrumento de transformação social. Portanto, o fazer pedagógico precisa estar fundamentado em uma abordagem interdisciplinar que possibilite a compreensão de aspectos cognitivos, afetivos, socioeconômicos, políticos e culturais, constituindo uma prática pedagógica socialmente contextualizada (SCHAURICH; CABRAL; ALMEIDA, 2007). Segundo Oliveira et al. (2002), a formação de recursos humanos para a saúde em nosso país consiste em um dos maiores desafios para a organização do setor. Há um déficit crônico de profissionais qualificados, em nível técnico; essa situação coloca em risco a assistência à saúde da maior parte da população. Dentre as causas dessa problemática podem-se destacar as distorções do mercado de trabalho, restringindo a oferta de empregos para técnicos de enfermagem. É uma profissão existente desde 1966, quando foi criado o primeiro curso na Escola Ana Néri, embora a regulamentação para o exercício profissional ocorresse efetivamente em 1986, com a Lei nº 7.498/86, regulamentada pelo Decreto-Lei nº 94.406/87. Desde então, a luta é contínua para esses profissionais, cuja força de trabalho era pouco qualificada e a formação específica carecia de propostas educativas estruturadas. Atualmente, já observamos algumas mudanças nesse sentido, começando pelo governo do Estado de São Paulo, que, pensando na formação desta área, contribui significativamente para essa melhora, por meio do Programa TecSaúde. O Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde no Estado de São Paulo foi instituído pelo Decreto Estadual nº 53.848, de 19/12/2008, com o objetivo de ampliar a escolaridade dos trabalhadores da saúde por meio da formação de profissionais de nível técnico com habilitações para o ingresso no mercado de trabalho e melhorar a qualidade dos serviços de saúde prestados à população no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado. O TecSaúde foi implementado pela fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) em parceria com a Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo e com o Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (Ceeteps). Os cursos, em suas diferentes etapas, são executados pelas Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde (ETSUS, Ceforh), pelas Escolas Técnicas do Ceeteps, mediante convênio com a Fundap e pelas entidades públicas, privadas credenciadas e contratadas, destinados aos que já possuem a qualificação de auxiliar de enfermagem (FORTES, 2009). Nesse contexto, é relevante a realização de um curso que contribua para desenvolver um olhar crítico e de integralidade sobre os problemas e as 395 necessidades de saúde da população brasileira, ressaltando a importância do fortalecimento e desenvolvimento do SUS, qualificando profissionais para atuar de maneira consciente a partir dos princípios do SUS, entre eles, os princípios norteadores, definidos na Lei Orgânica da Saúde 8.080/90, estabelecendo a conformação de um modelo de atenção pautado na integralidade da atenção, pressupondo que as necessidades precisam ser desvendadas em suas múltiplas dimensões, considerando a diversidade e a complexidade das mesmas. Tal processo imprime outras possibilidades, como também outras exigências para os trabalhadores dos serviços de saúde e novos perfis profissionais (SHIMIZU; LIMA; SANTANA, 2007). Atualmente, muitas são as tendências e metodologias educacionais estudadas, pesquisadas, experimentadas e aplicadas no ensino no Brasil, não muito diferente do que tem ocorrido em âmbito internacional. Contudo, percebe-se um avanço nas tecnologias educativas, principalmente se for considerado que, simultaneamente, alternativas mais tradicionais de educação têm sido questionadas e outras têm surgido, as quais possibilitam e demonstram maior atenção e interesse pelo dinamismo existente nos campos e nas ciências social, política, educacional, religiosa, entre outras (SCHAURICH; CABRAL; ALMEIDA, 2007). A proposta do Programa TecSaúde é proporcionar aos alunos informações e conhecimentos relativos à saúde, tendo como diretriz a constituição de uma relação entre a teoria e a prática; portanto, o processo de ensino-aprendizagem é voltado para a valorização do pensamento crítico e criativo do aluno-trabalhador de nível médio técnico de enfermagem. Como enfermeiras e educadoras buscamos utilizar, além do conhecimento técnico científico, concepções e estratégias pedagógicas que proporcionam aos alunos-trabalhadores os subsídios necessários para a reflexão, como elemento participante e atuante no sistema de saúde, colaborando na transformação da realidade e construindo uma parte diferente na história da humanidade. Objetivo Apresentar uma proposta de plano de ensino sobre o Sistema Único de Saúde direcionado ao aluno-trabalhador no Curso Técnico de Nível Médio em Enfermagem – Módulo Habilitação, no Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área da Saúde no Estado de São Paulo - TecSaúde. 396 Metodologia Esta pesquisa foi desenvolvida de acordo com os pressupostos preconizados pelos estudos de natureza qualitativa com uma abordagem descritiva. A pesquisa qualitativa possui uma maior preocupação com o aprofundamento e a abrangência da compreensão, seja de um grupo social, de uma organização, instituição ou de uma representação. A metodologia qualitativa é utilizada para a abordagem social como meio para abordagem da realidade. Qualquer pesquisa social que pretenda um aprofundamento maior da realidade não pode ficar restrita apenas ao referencial quantitativo; seu critério, portanto, não é numérico (MINAYO, 2004). Atuando como enfermeiras educadoras em instituições de ensino de curso técnico de enfermagem na Grande São Paulo, pelo Programa TecSaúde, durante o período de fevereiro a setembro de 2010, constatamos em nossa vivência que a grande maioria dos alunos enfrenta algum tipo de dificuldade na aprendizagem, teórica e prática, sobre assuntos relacionados ao SUS. Percebemos a carência de um olhar crítico e de compreensão da integralidade do cuidado e das ações educativas em saúde para a população, pois a percepção dos alunos sobre a necessidade de qualificar a atenção em saúde não compartilhava da noção de perceberem-se como atores nesse cenário. Essa inquietação motivou-nos na delimitação desses aspectos deficitários na educação profissional, norteando a elaboração de um plano de ensino, à luz do Currículo Integrado, com um formato diferenciado em relação ao que nos foi apresentado originalmente no curso, na unidade de ensino onde atuamos. O Currículo Integrado segue a criação de módulos integrados que viabilizam a interdisciplinaridade e a relação teoria-prática, adotando a metodologia da problematização, com o objetivo de formar alunos críticos, criativos e ativos, que constroem seus conhecimentos a partir da realidade, e são protagonistas conscientes na construção das transformações desejadas, estando a pesquisa inserida nesse processo. Essa proposta pedagógica fundamenta-se na certeza de que o aluno é sujeito ativo no processo de construção do seu conhecimento, cumprindo ao professor a condução dos processos de ensino e aprendizagem pelo permanente desafio do raciocínio do aluno e pela progressiva integração de novos conhecimentos às experiências prévias. O conteúdo passa a ser organizado por meio de sucessivas aproximações e em níveis crescentes de complexidade (GODOY, 2002). O Curso Técnico é estruturado em três grandes áreas, denominadas 397 Área I – Promovendo a saúde; Área II – Cuidando do cliente em estado crítico; Área III – Participando da gestão em saúde. A carga horária proposta totaliza 900 horas, divididas em 200, 500 e 140 horas, respectivamente, em cada área. Na Área I, ao início do curso, dentre os vários assuntos abordados, é apresentado ao aluno-trabalhador o SUS no estado de São Paulo. Em geral, após essa abordagem inicial, os temas seguintes das outras áreas assumem a devida importância na formação, mas com o risco do tema SUS não receber a atenção necessária, conforme a habilidade do enfermeiro docente, dentre outros aspectos, em estabelecer a interdisciplinaridade entre os assuntos. Tencionando assegurar a transversalidade do tema, nas diversas etapas do curso, elaboramos um modelo de plano de ensino, de maneira que a abordagem sobre o SUS seja viabilizada ao longo do curso, inserida concomitantemente com outros assuntos, de forma contextualizada para suprir as necessidades e as dificuldades enfrentadas pelos alunos-trabalhadores, favorecer o fortalecimento e desenvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS), buscando qualificar os alunos para atuarem, a partir dos princípios do SUS, desenvolvendo competências e serem capazes de planejar, organizar e avaliar programas, serviços e sistemas de saúde e, assim, estimulando o desenvolvimento do pensamento crítico sobre os temas relacionados à saúde. Ao estabelecer a relação entre o SUS e as etapas de estudo, possibilitamos que o aluno-trabalhador compreenda melhor o seu papel como ator profissional e social, no sistema de saúde. Resultados O modelo de plano de ensino proposto não altera a carga horária proposta atualmente, no curso técnico. O diferencial reside na distribuição dos temas, ao longo do curso e nas metodologias propostas, suscitando a reflexão sobre a realidade atual, as mudanças nas práticas, no trabalho, a formação de novas competências, reconhecendo-se como elemento atuante e transformador. 398 Plano de ensino – o SUS e o aluno-trabalhador Aula 1 4 horas/aula Assunto O processo de construção do SUS. Conteúdo Reforma Sanitária no Brasil, histórico do SUS. Momento da aplicação Primeira aula do curso - Área I - Promovendo a saúde. Justificativa Iniciar o curso com discussões sobre o Sistema Único de Saúde, mostrando ao aluno-trabalhador a importância do conteúdo e o que o SUS representa na formação profissional. Objetivo Conteúdo Metodologia Apresentar o cronograma das aulas. Orientar sobre a distribuição dos temas nos diferentes momentos do curso. Introdução ao componente: objetivos, finalidades da distribuição temporal proposta, apresentação da avaliação por portfólio. Cronograma das aulas. Exposição dialogada. Favorecer a compreensão sobre a trajetória histórica das políticas públicas de saúde no Brasil. Apresentação do SUS. Discussão: O que você entende por SUS? Reforma Sanitária no Brasil. Histórico do SUS. Roteiro norteador Pré-projeção do filme. Filme: Políticas de Saúde no Brasil Realizar a síntese do tema proposto. Organizar o portfólio. Divisão dos alunos em duplas: síntese escrita da análise do filme. 399 Plano de ensino – o SUS e o aluno-trabalhador Aula 2 4 horas/aula Assunto O Sistema Único de Saúde – Princípios do SUS. Conteúdo Os princípios do SUS, leis e artigos: Código de Ética de Enfermagem. Resolução COFEN 311/07 – Código de Ética de Enfermagem, Lei 8.080/90 – SUS, especial artigo 7º - Princípios do SUS. Momento da aplicação Área I – Promovendo a saúde: aplicar antes de iniciar os temas relacionados à saúde mental. Justificativa Inserir o conteúdo seguido pela aula de reforma psiquiátrica no Brasil e no mundo, para relacionar os princípios do SUS com a reforma psiquiátrica e o contexto histórico de “loucura”. Objetivo Conteúdo Metodologia Revisar a aula anterior. Apresentação do SUS, Reforma Sanitária no Brasil, Histórico do SUS. Exposição dialogada. Apresentar a legislação. Código de Ética de Enfermagem. Resolução COFEN 311/07 Código de Ética de Enfermagem. Lei 8.080/90 – SUS. Ênfase no artigo 7º Princípios do SUS. Exposição dialogada. Data show. Análise e interpretação de textos propostos. Analisar os princípios do SUS. Refletir sobre o respeito desses princípios, na prática do trabalho. Princípios do SUS. Relação dos princípios do SUS com a reforma psiquiátrica e o contexto histórico de “loucura”. Divisão em três grupos: elaboração da dramatização - cada grupo representará um princípio do SUS. Realizar a síntese do tema proposto. Incluir registros no portfólio sobre a dramatização, como atividade avaliada. 400 Dramatização. Discussão com o grupo. Plano de ensino – o SUS e o aluno-trabalhador Aula 3 4 horas/aula. Assunto O Sistema Único de Saúde – Os princípios do SUS. Conteúdo Princípios do SUS – O SUS e o estado de São Paulo. Momento da aplicação Primeira aula da Área II – Cuidando do cliente em estado crítico. Justificativa Integrar a Área I e a Área II, relembrar a Reforma Sanitária e introduzir o conteúdo de atendimento ao paciente crítico, explicar o sistema de referência e contrarreferência, no sistema de saúde. Objetivo Conteúdo Metodologia Relembrar o conteúdo anterior e relacionar com o conteúdo apresentado na 1ª e 2ª aulas (Área I). Elencar as ações na prática do trabalho. Refletir sobre a nova atuação como elemento participante do SUS e colaborador na concretização dos princípios do SUS. Apresentação do SUS, Reforma Sanitária no Brasil, Histórico do SUS. Código de Ética de Enfermagem, Resolução COFEN 311/07 – Código de Ética de Enfermagem, Lei 8.080/90 – SUS, princípios do SUS. O atendimento em saúde ao paciente crítico. Sistema de referência e contrarreferência. Exposição dialogada. Contextualizar o SUS nas esferas governamentais. Identificar os fatores determinantes e condicionantes do êxito desse sistema de saúde. Elaborar propostas possíveis, como se fossem os gestores, expressando as mudanças na realidade atual. Guia curricular do aluno - Área I: O SUS e o estado de São Paulo. Leitura em grupos. Realizar a síntese do tema proposto. Incluir os registros no portfólio sobre a apresentação e propostas, como atividade avaliada. Discussão: “A vivência do alunotrabalhador: cliente e profissional.” Divisão em 3 grupos: cada grupo representa uma esfera governamental: nível federal, estadual e municipal – abordagem sobre as ações e os limites das ações nas diferentes esferas. Apresentação em forma de telejornal. Discussão com o grupo. 401 Plano de ensino – o SUS e o aluno-trabalhador Aula 4 4 horas/aula. Assunto O aluno-trabalhador e o SUS. Conteúdo O auxiliar de enfermagem, o técnico de enfermagem, o aluno-trabalhador e o SUS. Lei 7.498/1986, Decreto 94406/1987. Momento do curso a aplicar o conteúdo Área II – Cuidando do cliente em estado crítico; antes do conteúdo “O cuidado à gestante em estado crítico”. Justificativa Relembrar os princípios do SUS ao final da Área II, no sentido de favorecer uma discussão com o aluno mais “amadurecido”, para que ele possa efetivamente fazer uma reflexão mais consistente por ter vivenciado o curso por um período maior. Objetivo Conteúdo Metodologia Apresentar a legislação profissional Coren, Cifen. O auxiliar de enfermagem. Aula expositiva dialogada. Data show. Discussão em grupo: O auxiliar e o técnico de enfermagem: identidade e atribuições. O técnico de enfermagem. O aluno trabalhador e o SUS. Lei 7.498/1986. Refletir sobre o papel do aluno-trabalhador como elemento transformador do SUS. 402 Decreto 94406/1987. Roda de conversa: Quem é o aluno-trabalhador? a) perfil do aluno-trabalhador; b) perfil do profissional na área da enfermagem x outros profissionais; c) o papel do aluno-trabalhador como elemento transformador do SUS. Plano de ensino – o SUS e o aluno-trabalhador Aula 5 4 horas/aula. Assunto O aluno-trabalhador e o SUS. Conteúdo Revisão e avaliação. Momento da aplicação Área III – Participando da Gestão em Saúde: após a unidade “Relações humanas no trabalho em saúde.” Justificativa Finalizar o conteúdo fazendo uma interligação com as relações humanas. Objetivo Conteúdo Metodologia Revisar o conteúdo apresentado nas aulas anteriores. Conceitos gerais sobre o SUS: princípios, legislação. Realizar um feedback do portfólio ao aluno. Conteúdos construídos. Discussão com o grupo. Autoavaliação do aluno, a partir do portfólio construído. Refletir sobre o papel (re) assumido como trabalhador inserido no sistema. Propostas para reafirmação do (novo) papel no SUS. Encerramento. Considerações finais As constatações obtidas no desenvolvimento deste estudo nos possibilitam a expectativa de implantar um plano de ensino inovador, voltado para o Sistema Único de Saúde e o aluno-trabalhador, ambos interligados e direcionados à saúde da população brasileira. É importante contextualizar o aluno-trabalhador dentro desse conteúdo, mostrando que ele está inserido no nosso Sistema Único de Saúde e, consequentemente, faz parte de seu próprio estudo. Trazer a vivência desse aluno-trabalhador para dentro da sala de aula, utilizando suas experiências como exemplos, discutindo os casos vividos são formas de evidenciar a proximidade da realidade na prática profissional e instrumentalizá-lo nas lutas sociais pela transformação dessa realidade. Muitos profissionais da saúde não conhecem o sistema em que estão inseridos, desconhecem os princípios do SUS e/ou não os seguem. Verificamos que nossos alunos-trabalhadores são profissionais que atuam há muitos anos no Sistema Único de Saúde, mas não se veem incluídos nele. Compete à escola 403 e aos docentes mostrar ao aluno como e por que ele faz parte do Sistema, promovendo uma reflexão interdisciplinar, multiprofissional e crítica sobre o processo saúde-doença, de acordo com a evolução das políticas de saúde no Brasil. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde. O SUS de A a Z: garantindo saúde nos municípios. 3. ed. Brasília, 2009. 480 p. (Série F. Comunicação e educação em saúde). FORTES, Julia Ikeda et al. Curso técnico de nível médio em enfermagem: módulo de habilitação: guia metodológico de apoio ao docente. São Paulo: FUNDAP, 2009. GODOY, Christine Baccarat de. O curso de enfermagem da Universidade Estadual de Londrina na construção de uma nova proposta pedagógica. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 10, n. 4, jul. 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0104-11692002000400018&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 20 out. 2010. MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 8. ed. São Paulo: Hucitec, 2004. OLIVEIRA, Lavínia Santos de Souza et al. Profissionalização de atendentes de enfermagem no Estado de São Paulo: um estudo sobre a oferta e demanda de formação. Revista LatinoAmericana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 10, n. 5, out. 2002. Disponível em: <http://www. scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-11692002000500003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 24 out. 2010. SCHAURICH, Diego; CABRAL, Fernanda Beheregaray; ALMEIDA, Miriam de Abreu. Metodologia da problematização no ensino em enfermagem: uma reflexão do vivido no PROFAE/ RS. Escola Anna Nery, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, jun. 2007. Disponível em: <http://www.scielo. br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-81452007000200021&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 19 set. 2010. SHIMIZU, Helena Eri; LIMA, Maria da Glória; SANTANA, Maria Natividade Gomes da Silva Teixeira. O modelo de competências na formação de trabalhadores de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v. 26, n. 2, p. 161-166, abr. 2007. Disponível em: <http:// www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672007000200007&lng=en>. Acesso em: 26 out. 2010. 404 O RESGATE DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS POR MEIO DA PARTILHA DE HISTÓRIAS DE VIDA DE ALUNOS-TRABALHADORES DA ENFERMAGEM: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA Ana Carolina Acorinte Rosimeire Soares Silva Sandra Maria Pilotto Rosely Moralez de Figueiredo Resumo Trata-se de um relato de experiência que se iniciou com uma atividade realizada pelos docentes de um curso técnico em enfermagem ao longo da disciplina de Metodologia de Pesquisa. O resultado obtido foi tão significativo que se transformou neste relato. Os docentes decidiram adotar uma estratégia diferente para a disciplina, identificando as necessidades no processo ensinoaprendizagem, no sentido de produzir profissionais com um perfil dinâmico e criativo. Essa experiência buscou levar à reflexão sobre os valores de vida de cada um e suas expectativas futuras. A proposta foi que cada um, após ter assistido a um filme, colocasse no papel suas frustrações, medos, alegrias e conquistas, ou seja, um pouco de sua história e compartilhasse isso com os colegas. Os alunos imediatamente abraçaram a ideia, e, assim, seguindo as etapas propostas pela atividade, foram elaborando esses pequenos textos, socializando-os e muitas vezes se identificando com os colegas e os compreendendo. A atividade foi finalizada com a organização de uma cartilha com todas estas histórias de luta e superação. Os resultados extrapolaram o objetivo inicial da atividade proposta. No depoimento final dos participantes, os mesmos relataram que a atividade propiciou maior reflexão e identificação com o comportamento do colega, suas ações e reações. Apontam que essa experiência foi fundamental para que olhassem para os colegas de trabalho e para os usuários do serviço de saúde sob uma perspectiva muito diversa, com mais paciência, tolerância e compreensão. Descritores: Pesquisa científica, metodologia de ensino, formação docente. 405 Introdução Como docentes de um curso técnico de enfermagem do Cefor, classe descentralizada de São Carlos, propusemo-nos a relatar nossa experiência vivida junto aos alunos. Na disciplina de Metodologia da Pesquisa referente ao Módulo I desse curso, as atividades se transformaram num trabalho que percebemos ser uma ferramenta a qual poderia contribuir para a aprendizagem significativa e participativa dos alunos. Vamos relatá-la neste trabalho de conclusão de curso como experiência da atividade docente. Tal proposta emergiu da necessidade de se olhar os alunos de uma forma mais integral, principalmente ao nos depararmos com os temas do Curso de Formação Docente em Educação Profissional na Área da Saúde, onde pudemos refletir sobre a nossa prática docente. Ao realizarmos as atividades do CT1 (alunos-trabalhadores do SUS), destacando a atividade de articulação 2: “Conhecendo melhor os próprios alunos”, tivemos o grande impulso. Percebemos ali a riqueza de informações que poderíamos utilizar para iniciarmos nosso trabalho. O novo modelo de saúde exige profissionais capacitados para atender a uma demanda de serviço especializado e humanizado. A necessidade de formar profissionais com esse perfil nos faz refletir sobre a relação entre trabalho, saúde e educação. Tal relação deve ser entendida a partir da concepção à qual que estão condicionados os aspectos socioeconômico-culturais da sociedade em que ocorre. Hoje o trabalhador deve ter um perfil dinâmico, deve ser criativo e ter uma formação acadêmica que permita um olhar mais amplo do mundo e consiga trabalhar em equipe com eficiência. O trabalho é um processo dinâmico, que muda de acordo com as necessidades e interesses da sociedade. O trabalhador da área da saúde tem as suas especificidades, porém não foge a esse processo histórico. É fundamental hoje que o profissional de saúde entenda as tecnologias (duras e leves), que participe juntamente com a sua equipe do plano de cuidado individual e coletivo, entendendo as diversas dimensões que isto implica. Neste panorama, o processo-ensino aprendizagem torna-se desafiador, no sentido de produzir profissionais com o novo perfil, conectando definitivamente teoria e prática, levando o ensino ao campo de trabalho, explorando as experiências do aluno. Em se tratando de aluno-trabalhador, temos hoje a experiência tradicional juntamente com a nova. Em alguns casos temos alunos que foram aprendizes e hoje atuam em campos onde a tecnologia evoluiu de uma 406 forma que o trabalhador, educado nos moldes tradicionais, não consegue acompanhar. Sabemos que a implantação do Sistema Único de Saúde vem ao encontro desta evolução. Percebemos o incentivo a uma melhora na qualificação profissional, pois com a implantação plena do SUS, há a necessidade de profissionais diferentes dos que temos no momento; necessitamos de profissionais que entendam os princípios do SUS e os coloquem em prática. Segundo Thofehrn (2005), dessa forma, vivemos hoje uma situação de transição, onde há um grupo de profissionais que vivem no modelo antigo de trabalho e outro que está sendo preparado para o novo. Na área de saúde percebe-se este conflito no sentido de que, como o SUS é um sistema em implantação, muitas falhas existem, o que faz com que os profissionais não acreditem plenamente nele. Outro ponto a ressaltar é a visão que tanto a população como o profissional têm do Sistema: um plano para a classe menos favorecida economicamente. Assim, é importante para o educador conhecer o aluno no sentido de saber quais são seus valores de vida, suas competências e suas expectativas. É fundamental também conhecer seu perfil, saber de onde veio e qual é sua visão e atuação profissional. Colocar no papel os pensamentos, as lembranças e os sonhos é um verdadeiro exercício da vida. Nessa perspectiva entendemos que, ao aplicarmos a disciplina a nós proposta de Metodologia da Pesquisa, era possível ir mais além do que somente falar em etapas de pesquisa. Escrever é uma arte. Pode nos trazer prazer, pode nos fazer repensar, refletir, elaborar e organizar, ações estas indispensáveis para trabalhadores da enfermagem. Assim, sonhamos juntamente com a coordenadora do curso uma estratégia diferente para a disciplina. O primeiro passo foi assistir ao filme Colcha de retalhos juntamente com a classe, para disparar a ideia do quanto seria significativo escrever. Mas, escrever o quê? Para quê? E a proposta foi valorizar as histórias de vida de cada aluno e transformá-las em uma arte. Histórias de vida devem ser valorizadas e quando partilhadas nos fazem crescer ainda mais. Trazem contribuições na área profissional e pessoal. Após assistir o filme, ainda com receio de dispararmos a proposta para a turma, fomos tecendo nossa colcha de retalhos. Ao contarmos as nossas histórias de vida começamos a tecer retalhos que se tornaram um trabalho de união e partilha. Cada aluno tecia seu retalho, na medida em que ia partilhando a própria história de vida profissional e pessoal, e aos poucos uníamos um retalho ao outro, formando um pedaço de 407 uma colcha, que simbolizava uma rede, e, assim, percebíamos que as nossas histórias possuíam coisas parecidas. Reconhecíamos cada aluno ao ler e reler sua história, conseguíamos enxergá-los além daquela aula que vivenciamos. Muitos não sabem, mas ao lermos nos emocionávamos e sabíamos que muitas pessoas se emocionariam com as diferentes histórias de luta e superação. Ao propormos a atividade pensamos ainda na possibilidade única de permitir que cada aluno se interasse com o outro, favorecendo assim as relações interpessoais, não só em sala de aula, mas que levassem como exemplo ao ambiente de trabalho. Nessa perspectiva de formar alunos-trabalhadores é impossível não falar de relações interpessoais no trabalho. A instituição formadora deve de alguma forma permitir que os alunos possam durante a formação experimentar novas formas de relacionamento, e é atribuição do docente criar novos olhares e estratégias para trabalhar essas questões. As questões que envolvem as relações interpessoais na equipe de enfermagem estão em evidência. É fundamental para a resolução dos conflitos e ambiguidades geradas a partir do processo de trabalho em saúde o estabelecimento de princípios éticos, na perspectiva de uma assistência digna, igualitária, universalizada, buscando o atendimento integral ao indivíduo – assim descrevem Pinho e Santos (2007). Já Amestoy, Schwartz e Thofehrn (2006) afirmam que, nesse sentido, a comunicação é a principal ferramenta que possibilita o relacionamento, pois pressupõe uma interação entre as pessoas, troca ou partilha de opiniões, informações, bem como a expressão de sentimentos e emoções. Assim, o diálogo contribui para o surgimento da empatia e dos laços de confiança entre a equipe de enfermagem e clientes, o que fortalece o vínculo. O profissional de enfermagem tem ao seu dispor a comunicação e o bom humor como instrumentos essenciais, a fim de proporcionar maior interação entre equipe e usuário dos serviços de saúde, sendo este, paciente e família, o objeto de trabalho da enfermagem, ao qual será prestado o cuidado, isto é, a tarefa profissional. O estabelecimento de vínculos saudáveis no ambiente de trabalho favorece a execução das ações de enfermagem e melhora em muito o relacionamento na equipe. Dessa forma, busca-se beneficiar o paciente por meio da qualidade dos cuidados prestados ao mesmo e à família. Assim, justifica este estudo a necessidade de descrever uma ação que consideramos inovadora no âmbito da formação de trabalhadores da saúde e que nos remeterá a tratar os efeitos, impactos e produtos no âmbito das relações interpessoais do trabalho e da educação. 408 Objetivo Relatar uma experiência de prática docente do curso de complementação para técnicos de enfermagem, demonstrando o impacto desta nas relações interpessoais e a influência no processo ensino-aprendizagem. Metodologia Trata-se de um relato de experiência sobre uma estratégia utilizada em sala de aula, em uma disciplina do Curso de Complementação para Técnicos de Enfermagem. Para este trabalho seguimos alguns passos: • Apresentação do filme Colcha de retalhos. (Título no Brasil: Colcha de retalhos / Título original: How to Make an American Quilt / País de origem: EUA / Gênero: Drama / Tempo de duração: 116 minutos / Ano de lançamento: 1995 / Direção: Jocelyn Moorhouse). O filme foi escolhido para ser utilizado como disparador. Dinâmica em roda: transformar um pedaço de retalho na sua história de vida. Após o filme os alunos fizeram uma roda e colocaram suas percepções sobre o filme, fazendo um link com o cotidiano. • União dos retalhos: neste momento cada aluno unia seu retalho a outro com o qual se identificasse por ter uma história de vida parecida com a sua. • Construção de uma narrativa sobre a vivência desta atividade. As narrativas foram construídas com a ajuda dos docentes. • Construção de uma cartilha com as narrativas dos alunos. Foram consolidadas as narrativas e construiu-se a cartilha. • Apresentação da cartilha no momento da conclusão do curso. Na realização da atividade adotou-se a metodologia participativa, que facilita a integração entre educador e educando, permitindo a participação de todos, com melhor aproveitamento do aprendizado. Com essa estratégia os alunos não só recebem as informações que necessitam como também sentemse seguros para serem construtores do aprendizado, o qual propicia a livre comunicação e o questionamento do assunto em discussão. Foi utilizada a técnica de dinâmica de grupo, e como disparador da discussão o filme Colcha de retalhos. Outra estratégia utilizada foi a de brincar com um pedaço de retalho, pois ao brincar a pessoa expressa sentimentos, 409 fantasias, medos e conflitos para superá-los. O produto deste trabalho é um consolidado de todas as narrativas dos alunos, que será apresentada no final do curso. Resultados e discussão Durante a exibição do filme observou-se que muitos alunos se emocionaram e se identificaram com as situações apresentadas. O filme contribuiu para a integração do grupo e proporcionou a aproximação dos docentes com os alunos. Durante a roda os alunos se conheceram mais e os docentes puderam enxergar as particularidades de cada um. As histórias pipocavam de todos os lados, entusiasticamente cada um queria falar, contar um pouco de sua vida. E aí surgiram histórias que emocionavam a todos, alunos e docentes. Na união dos retalhos houve uma procura por afinidades com a história do outro. Percebemos identificação, solidariedade, empatia. Surgiram diversos sentimentos; os alunos se emocionaram, riram e choraram. A colcha de retalhos foi construída e valorizada por apresentar a história de vida de cada um. E foi este o momento de colocar no papel as histórias que todos ouviram. As narrativas foram construídas e desse consolidado nasceu uma cartilha. Para finalizar, solicitamos aos alunos que fizessem uma avaliação da atividade desenvolvida, por meio da questão norteadora: “O que significou para você participar dessa atividade?” Abaixo uma síntese da proposta, onde obtivemos os seguintes resultados: “... aprender a ouvir, compreender, ver o outro como semelhante me fascinou. Poder falar sem ser julgado, ouvir sem julgar, foi uma grande ‘lição de vida’”. “... Aprendi a dividir meus problemas, que guardava só prá mim.” “... um momento de parar, nessa loucura que é o nosso cotidiano, e realmente enxergar pessoas ao nosso lado. Foi importante ouvir cada um, participar da atividade, construir pensamentos e traçar metas”. “... Tive uma experiência muito rica, pois passei por momentos de, além de muita sabedoria, muito aprendizado, já que cada um de nós tem finalidades em comum, que o ‘cuidar’, mesmo não trabalhando no mesmo lugar, mas com um ao mesmo objetivo.” “... Percebi que cada um tem uma maneira diferente, mas com um mesmo ideal, fazendo de sua profissão o bem-estar do outro. Espero conseguir ser 410 multiplicadora de tantas experiências de vida e amor ao próximo, mesmo sabendo que possa não haver retorno desejado.” As percepções dos alunos acerca da atividade mostraram que a solidariedade se desdobra em um conjunto de habilidades que se forma na identificação com o outro, como parte da vida e na compreensão das eventualidades às quais cada pessoa está sujeita e na disposição permanente de ajuda ao outro. A presença da amizade entre os alunos-trabalhadores também integra os aspectos que influenciam a relação interpessoal, como observamos nas seguintes falas: “... cumplicidade, autoconhecimento, conhecer meus limites e onde começam os dos outros; companheirismo, participação e envolvimento nas questões dos meus colegas”. “... houve interação de todos, com muita união e descontração; conheci meus colegas como jamais os vi no dia a dia”. Muitos dos relatos coletados traziam à tona a importância de se comunicar, falar sobre seus sentimentos e pensamentos. A comunicação, quando feita de forma adequada e com respeito mútuo, age de forma positiva na formação e na recuperação dos vínculos. Acreditamos que a comunicação pode ser mais facilmente estabelecida nos pequenos grupos, já que o contato entre as pessoas é frequente. Nesse sentido, segundo estudos de Leopardi (2006), a comunicação é a principal ferramenta que possibilita o relacionamento, pois pressupõe uma interação entre as pessoas, troca ou partilha de opiniões, informações, bem como a expressão de sentimentos e emoções. Assim, o diálogo contribui para o surgimento da empatia e dos laços de confiança entre os alunos, o que fortalece o vínculo e, posteriormente, o aprendizado. “... O que vi e aprendi foi o bastante para me transformar no que sou hoje, e a comunicação é muito importante para conseguirmos nossos objetivos.” O bom humor foi outro aspecto emergido na situação apresentada, utilizado no ambiente da sala de aula, envolvendo alunos-trabalhadores com o intuito de estreitar os vínculos interpessoais por meio do desenvolvimento do processo comunicativo. A autora Kretly (2007) afirma que, perante o exposto, a comunicação associada ao bom humor proporciona uma satisfação mútua, bem como o alívio da ansiedade por diminuir a tensão emocional entre os alunos-trabalhadores. 411 As pessoas se relacionam com outras para construir uma rede de comunicação visando harmonizar as relações na busca por uma convivência saudável, a qual traz benefícios para todos. Por intermédio do estabelecimento de uma boa comunicação pode-se obter, conforme os vínculos criados, uma relação de ajuda entre os indivíduos. Conclusão Identificamos que o desenvolvimento dessa estratégia favorece uma postura crítica e proativa dos futuros técnicos de enfermagem. A possibilidade de contar suas histórias gerou mudanças na forma da interação com os colegas e os docentes. Dessa forma pôde-se aliar o conhecimento técnico-científico à questão pessoal e humana de cada um deles. Os alunos-trabalhadores apontaram que a experiência foi fundamental para que olhassem para os colegas de trabalho e para os usuários do serviço de saúde sob uma perspectiva muito diferente, com mais tolerância, compreensão e paciência. Constatamos que, por meio da experiência, pudemos observar um grande avanço na abordagem da disciplina de Metodologia da Pesquisa em enfermagem, e com isso contribuímos para a formação de profissionais comprometidos e muito mais sensibilizados em consonância às novas diretrizes ministeriais sobre a política de humanização em saúde. REFERÊNCIAS AMESTOY, S. C.; SCHWARTZ, E.; THOFEHRN, M. A humanização do trabalho para os profissionais de enfermagem. Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, v. 19, n. 4, p. 444-449, out./dez. 2006. BONFIM, M. I. R. M. (Coord.). Formação docente em educação profissional técnica na área de saúde: trabalho, saúde e educação. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz; Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca; 2009. KRETLY, P. Modelo Goethe de liderar corporações. In: CANDELORO, R. (Org.). Gigantes da liderança. São Paulo: Resultado, 2007. LEOPARDI, M. T. Teoria e método em assistência de enfermagem. 2. ed. Florianópolis: Soldasoft, 2006. PINHO, L. B.; SANTOS, S. M. A. O relacionamento interpessoal como instrumento de cuidado no hospital geral. Cogitare Enfermagem, Curitiba, v. 12, n. 3, p. 377-385, jul./set. 2007. THOFEHRN, M. B. Vínculos profissionais: uma proposta para o trabalho em equipe na enfermagem. Tese - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2005. 412 PERFIL E COMPETÊNCIA DOCENTE NA EDUCAÇÃO PROFISSIONALIZANTE EM ENFERMAGEM Polyana de Castro Limeira1 Rika M. Kobayashi2 Resumo O perfil profissional é definido como sendo resultante do processo de debate, que inclui atribuições profissionais legitimadas pela prática da profissão e atribuições desejáveis, objetivando que sejam incorporadas e aceitas. Este estudo objetivou à revisão de literatura sobre o perfil e competência do docente da educação profissional de nível médio em Enfermagem. Os critérios adotados para a busca dos artigos foram publicações em português, nas bases de dados do Lilacs, Medline, Scielo, Dedalus, no período de 2005 a 2011, utilizando os termos “educação profissionalizante”, “enfermagem”, “docente”, “competências”, “ensino” e “Sistema Único de Saúde” (SUS), isolados ou intercruzados entre si, que reportou 18 produções de um total de 221 encontradas. Os temas convergiram para a competência docente para a formação de Recursos Humanos (61%), Didática, Avaliação e Pesquisa, com 11% cada, e para a condução do estágio supervisionado (6%). Descritores: Educação Profissional; Perfil do Docente; Formação Técnica em Enfermagem. 1. Enfermeira, graduada pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP). Pós-graduada em Docência em Educação Profissional Técnica de Nível Médio na área da Saúde pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em Nefrologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP) e em Urgência e Emergência pelo Centro Universitário São Camilo. Docente em Enfermagem do TecSaúde. Enfermeira da Triagem do Pronto Socorro do Hospital das Clínicas da FMUSP. 2. Enfermeira, pedagoga, doutora em Enfermagem pela Escola de Enfermagem da USP. Diretora Técnica do Serviço de Educação Continuada do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. Tutora da Turma 2 do Núcleo Interdisciplinar de Apoio Docente (NIAD–EEUSP) do Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TecSaúde). 413 Introdução A educação profissional técnica (EPT) em nível médio na área de Saúde vem alcançando inúmeras conquistas, no Brasil. Os primeiros cursos técnicos em Enfermagem datam da década de 60 do século XX. Ainda na mesma década, a IV Conferência Nacional de Saúde possuía como intento a implementação de uma política permanente de recursos humanos em saúde (FIOCRUZ, 2009). A evolução histórica da educação profissionalizante (EP) em saúde, especificamente em Enfermagem, foi impulsionada por meio do advento de projetos como o Larga Escala, implantado em 1985 (OLIVEIRA, 1996). Posteriormente, o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae), uma iniciativa do Ministério da Saúde (MS) em conjunto com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), formou aproximadamente 225 mil técnicos aptos para o trabalho nos diversos serviços de Saúde integrantes do Sistema Único de Saúde (SUS) e investiu na formação pedagógica dos docentes envolvidos no projeto (MARQUES, 2007). No que tange aos avanços legais implicados na formação dos auxiliares de Enfermagem, (AE) bem como dos Técnicos de Enfermagem (TE), conforme consta no Ministério da Educação, houve a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei número 9.394/96), sendo atualmente complementada pelos Decretos números 5.154/04, 5.840/06 e número 6.301/07, além do Parecer CNE/CEB número 39/04 e da Resolução CNE/CEB número 4/99 (Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico). As bases legais citadas mostram dentre outros aspectos as competências a serem desenvolvidas pelos alunos dos cursos profissionalizantes; no entanto, as competências legais do profissional docente não são claramente abordadas. Para Perrenoud (1998), uma competência é a capacidade de mobilizar recursos e conhecimentos, visando ao enfrentamento eficaz de situações complexas ou inéditas. Para isso, para que se elevem as competências do profissional, não basta haver uma profusão de recursos, mas sim que ele saiba aplicá-los às situações, quando necessário. Depresbiteris (2005) cita a acepção do termo competência como faculdade legal concedida a um profissional para execução de determinados procedimentos. No campo específico da pedagogia destinada à educação em Enfermagem, questiona-se se a formação e a atuação dos docentes coadunam 414 com as demandas do século XXI, que requer pensamento científico e reflexivo, visando ao desenvolvimento dos saberes e das competências imprescindíveis à docência (FARIA; CASAGRANDE, 2004). Em convergência com as competências, o perfil profissional é definido como sendo resultante do processo de debate, que inclui atribuições profissionais legitimadas pela prática da profissão e atribuições desejáveis, objetivando que sejam incorporadas e aceitas (DAVINI, 1994). Assim sendo, no presente trabalho optou-se por empregar as expressões “competências” e “perfil profissional” como similares. O despertar para a importância do tema em questão advém das inquietações da pesquisadora, com base em sua vivência cotidiana na docência em educação profissional técnica do programa TecSaúde. Nesse sentido, buscou-se verificar os reais objetivos que motivaram os docentes a exercerem tal função, bem como identificar as competências necessárias para a docência. Ademais, verifica-se no cotidiano do trabalho a existência de enfermeiros que exercem a docência devido à oportunidade de inserção no mercado de trabalho, nas situações em que não obtiveram êxito em postos de trabalho presentes nos estabelecimentos de assistência à saúde (EAS). Com base nas constatações anteriormente explicitadas surge a inquietação e o questionamento acerca de qual seria o perfil preponderante entre os profissionais enfermeiros-docentes. Assim, torna-se imprescindível compreender se a docência no ensino médio, na maioria das vezes, é exercida por prazer e vocação e, por conseguinte, com a devida motivação requerida para prática educacional transformadora da realidade, em decorrência da formação de profissionais providos do necessário conhecimento técnicocientífico; ou se, na maioria das vezes, a docência representa apenas um meio de complementação de renda e, portanto, pouco imbuída do empenho típico de profissionais que apreciam o que fazem (PADOVANI, 2007). Além disso, observa-se que algumas instituições de ensino não exigem como pré-requisito para a composição do quadro de docentes profissionais com formação específica para lecionar, seja em caráter de licenciatura, seja em caráter de pós-graduação em docência; ou, ainda, há escolas que mantêm professores incumbidos de disciplinas de diversas áreas, decrescendo a especificidade e, portanto, o preparo dos profissionais para lecionarem conteúdos sobre os quais, porventura, não possuem domínio (SAMPAIO; MARIN, 2004). Para Madeira e Lima (2010), a prática pedagógica necessita de formação específica em docência, além da experiência prática do professor nos EAS, que 415 viabiliza a construção de exemplos que facilitam aos alunos a apreensão do conteúdo ministrado. Ademais, para Paquay et al. (2001 apud Padovani, 2007), quando o professor é iniciante não consegue distinguir com clareza o que é sua dificuldade do que é dificuldade dos discentes. Desse modo, caso não haja uma predisposição em reconhecer tal dificuldade, com o intuito de tentar dirimi-la, pode haver uma lacuna no processo de aprendizagem. Outro possível fator contribuinte para o déficit na EPT é a dupla jornada de trabalho dos docentes, que frequentemente assumem funções na instituição de ensino concomitantemente a incumbências em EAS ou até mesmo em outra instituição de ensino. Isso decorre do atual contexto político, com decréscimo da remuneração, bem como da oferta de emprego, acarretando o acúmulo de empregos (STACCIARINI; TRÓCCOLI, 2001). Isso pode se constituir em um intenso agravante ao declínio da qualidade do conteúdo ministrado, devido à sobrecarga do professor. Não bastando isso, há também professores cuja prática de transmissão do conhecimento baseia-se no empirismo, prejudicando a qualidade do conteúdo lecionado (BATISTA; BATISTA, 2004). Diante da situação exposta, o contínuo progresso da EPT está diretamente atrelado às constantes reformulações de conceitos e à adoção de novos paradigmas nas práticas educacionais. Assim sendo, é de suma importância que os enfermeiros reformulem sua visão acerca do ensino e aprendizagem em Enfermagem (LIMA; CASSIANI, 2000). Por conseguinte, é premente a constatação dos perfis e competências preponderantes entre os docentes, confrontando com os perfis e competências requeridos para o profícuo exercício da docência, de maneira que sirva de subsídio para providências de capacitação de tais profissionais, acarretando o incremento da qualidade do ensino prestado aos seus discentes. Objetivo Identificar a produção científica acerca do perfil e da competência docente na educação profissionalizante em Enfermagem. Metodologia O presente trabalho consistiu na revisão da literatura que realiza uma análise das publicações concernentes ao tema proposto. 416 O levantamento das produções científicas foi realizado nas bases de dados Lilacs, Medline, Scielo e Dedalus, relacionadas à educação profissional, publicadas entre os anos de 2005 a 2011; no idioma português, em revistas indexadas pelas bases de dados científicas, em teses ou dissertações, seja na íntegra ou em resumo. Os descritores utilizados foram: “educação profissionalizante”, “enfermagem”, “docente”, “competências”, “ensino” e “Sistema Único de Saúde (SUS)”, isolados ou cruzados entre si. Obteve-se um total de 221 produções e foram excluídas as que não atenderam aos critérios de inclusão e as que não se referiram à educação profissional de nível médio em Enfermagem, restando 18 produções científicas. Os artigos encontrados foram lidos na íntegra, classificados e, de acordo com os temas abordados, foram categorizados conforme o eixo temático em que se enquadraram. Apresentação e discussão dos resultados O total de publicações encontradas foi de 18 produções, mostrando a necessidade de mais investimentos de pesquisa nessa área. As produções foram realizadas de forma homogênea ao longo de 2005 a 2010, variando de duas a quatro produções ao ano. No que tange ao tipo de publicação, 14 (77,7%) consistiram em artigos científicos e publicados principalmente na Revista da Escola de Enfermagem da USP e na revista Trabalho, educação e saúde, com três exemplares (21,4%). Mediante a leitura dos artigos, foram realizadas as classificações das temáticas contidas nas produções, originando as categorias a seguir relacionadas. Formação de recursos humanos (11 artigos – 61,1%) Nessa categoria incluíram-se os artigos referentes aos diversos aspectos implicados na formação de recursos humanos, tais como políticas e legislações das áreas de Educação e de Saúde. Um estudo realizado com um grupo de enfermeiros do Curso de Formação Pedagógica em Educação Profissional na Área de Saúde: Enfermagem, em Campo Grande, identificou o conhecimento desses alunos, antes e depois da realização do curso. Relataram que é necessário que os professores possuam conhecimentos técnico-científicos prévios de sua área de atuação, que respeitem a dignidade e a autonomia de seus discentes e que suscitem neles a capacidade transformadora da realidade, reconhecendo que 417 educar não se restringe ao mero treino para que os aprendizes desempenhem destrezas (SILVA; SILVA; SANTOS, 2005). De acordo com Bagnato et al. (2007), faz-se necessário que os profissionais educadores em EPT tomem conhecimento das políticas de formação profissional vigentes em nosso país, sabendo problematizar os aspectos das mudanças educacionais no Brasil e reconhecendo que as legislações podem, muitas vezes, manifestar os interesses das políticas neoliberais e da redução da participação do Estado nas políticas sociais. Cabe também a compreensão de que o país se articula ao processo de globalização mundial no papel mais de consumidor do que como produtor de conhecimentos, no âmbito da educação profissional. Não bastando isso, o docente deve lutar por um ensino profissionalizante em Enfermagem integrado à educação geral. A flexibilização e a precarização dos vínculos empregatícios intensificam as necessidades de polivalência e de ampliação das competências por parte dos profissionais, tornando imprescindível que os docentes sejam imbuídos do compromisso de formarem profissionais, levando em conta as necessidades destes e não somente as políticas neoliberais vigentes em nosso país, viabilizando o devido engajamento que vise às transformações necessárias à construção de cidadãos omnilaterais, cujos conhecimentos adquiridos abarquem os aspectos técnico-científicos, éticos, políticos, sociais e culturais e atendam às demandas de saúde da população (BAGNATO et al., 2007). Sant’Anna et al. (2008) ratificam os princípios de autonomia, espírito crítico e transformador da realidade que devem ser incutidos pelos educadores em seus educandos, conferindo destaque ao princípio da flexibilidade, em detrimento dos currículos por disciplina, centralizadores e descontextualizados. No que tange ao processo ensino-aprendizagem do curso de técnicos de Enfermagem no contexto do cuidado aos pacientes críticos no âmbito do SUS, reitera-se a importância de que o ensino aborde as questões existenciais, subjetivas e sociais desses pacientes e de que se transponha o treinamento meramente técnico (APPOLINÁRIO; CORRÊA, 2009) Wermelinger, Machado e Amâncio Filho (2010), em estudo objetivando à revisão do processo histórico de construção da identidade profissional dos técnicos em Saúde no Brasil, apontaram a relevância do fortalecimento do conceito de equipe multiprofissional em Saúde como alternativa para a valorização das profissões não médicas, em especial aquelas de nível médio em Saúde. Essa demanda suscita a necessidade de que os educadores estejam aptos a fomentar em seus alunos a prática de tal preceito, o que, por sua vez, requere 418 que semeadores de ideias possuam os conceitos intrínsecos à sua formação e prática profissional. Os resultados da prática profissional das egressas do Projeto de Formação em Larga Escala de Pessoal de Nível Médio e Elementar para os Serviços de Saúde (PLE) foram estudados por Bittar (2009), que elucida que o PLE incluiu, além da formação de profissionais de nível médio em Enfermagem, a capacitação dos futuros docentes/instrutores, incutindo-lhes a integração entre saúde e educação, a valorização das potencialidades dos alunos, o respeito ao ritmo de aprendizagem destes, bem como à possibilidade de influência dos conhecimentos prévios dos aprendizes sobre o processo educativo. O PLE viabilizou aos docentes a consideração dos aspectos políticos concernentes ao processo de trabalho em Enfermagem, de maneira que, politizado, por conseguinte, o docente consiga politizar seus discentes. Assim sendo, compete ao educador a tarefa de não restringir a prática educacional à mera transmissão de conteúdos, e que ele possua, além do preparo técnicocientífico-político, atributos adicionais como o engajamento social e ético, a humildade, o ímpeto de aprender e ensinar. Destaca-se, ainda, a valorização à compreensão pelo professor do que é ser único perante a pluralidade e o que é ser plural na unidade (BITTAR, 2009). Além do PLE, Bersusa et al. (2007) citam o Classe Descentralizada e o Projeto de Formação dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae) como iniciativas que ao longo da história intensificaram a qualificação de profissionais da Enfermagem, viabilizando a fortificação do SUS. Carvalho (2006) investigou a aplicação do conceito de interdisciplinaridade (articulação dos conteúdos) pelos enfermeiros-docentes em sua prática pedagógica, preconizando que a formação do enfermeiro-docente deve prover o desenvolvimento das competências necessárias à adoção de um currículo integrado, que transponha os limites das disciplinas, para que o aluno entenda como os conteúdos se integram, com o intuito de desenvolver as competências necessárias à prática profissional. Além disso, faz-se necessário, ao docente do século XXI, que seus alunos consigam estabelecer o nexo entre os conteúdos elucidados e sua prática profissional. Enfatizou ainda a necessidade da comunicação entre os docentes ministrantes de diferentes disciplinas (trabalho em equipe), viabilizando a interdisciplinaridade; de reuniões nas quais se discutam as dificuldades dos alunos. É imprescindível que haja consonância entre os enfoques abordados por cada professor, com o intuito de desenvolvimentos das competências dos alunos, definidas previamente no projeto político-pedagógico da instituição (CARVALHO, 2006). 419 Um importante estudo foi realizado com o intuito de identificar os aspectos envolvidos no desenvolvimento de competências na formação do enfermeiro para educação profissional (EP) em Enfermagem. A autora afirma que, em consonância com as alterações advindas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (número 9.394/96), que preconiza um modelo de formação profissional baseado em competências, até mesmo os docentes passam a perceber a importância de expansão de suas próprias competências técnicas e científicas, dirimindo a dicotomia entre teoria e prática, e implementando novas ações cotidianas em sala de aula, que devem ser analisadas posteriormente em conjunto com os demais professores. Dentre as competências sociopolíticas faz-se imprescindível que os educadores envolvam-se no coletivo da instituição de ensino, engajando-se na elaboração de sua proposta pedagógica, enquanto corresponsáveis pelo bom andamento da proposta, que, por sua vez, não deve ser estanque, sendo passível de constantes mudanças e construção contínua (VALENTE, 2005). Preconiza ainda que os enfermeiros-docentes adotem a educação permanente em sua atuação profissional, cabendo a eles que baseiem seu exercício de construção/produção do saber em suas próprias realidades, sendo necessário ainda que explicitem, em sala de aula, exemplos ocorridos em sua vivência na prática assistencial de Enfermagem para contextualizar esse ensino – o que, de maneira alguma, prescinde dos conhecimentos e da formação didática desses docentes. Nesse contexto, a autora utiliza-se da paráfrase para o movimento de problematização do Arco de Maguerez, no qual a formação: 1) baseia-se na realidade; 2) propõe a problematização; 3) realiza a explicitação (teorização); 4) formula hipóteses de solução que possam realizar a transformação da realidade (VALENTE, 2005). A autora explicita ainda uma profusão de outras competências requeridas para o exercício da docência em EP, tais como: a competência técnica de saber mobilizar e disponibilizar tecnologias importantes na educação em Saúde; flexibilidade para mudanças; possuir o prazer de também aprender; adotar uma relação horizontal com os discentes, partindo da própria realidade desses e realizando uma troca de conhecimentos mútua; lecionar de maneira estimulante e prazerosa (estímulo ao gostar de aprender), incutindo o pensamento crítico-reflexivo nos educandos; realizar a avaliação formativa da aprendizagem, por meio da observação criteriosa e contínua do aluno, tanto no contexto teórico quanto prático; adotar a interdisciplinaridade; considerar que cada turma é singular, sabendo adequar os recursos didáticos disponíveis 420 às especificidades desse grupo; conhecer o desenvolvimento cognitivo dos estudantes, com o intuito de que as dificuldades perante os desafios propostos não os desestimulem; contar com as aulas expositivas como uma das inúmeras outras estratégias didáticas; assumir que as estratégias de ensino não se alicerçam em fórmulas prontas; planejar, dirigir, controlar e definir os rumos da ação pedagógica (exercício da autoridade) (VALENTE, 2005). O exercício da autoridade, no entanto, não pode ser confundido com o autoritarismo, o que acarretaria a deturpação de todos os enriquecedores preceitos aqui discutidos. Em uma pesquisa cujo intuito era evidenciar o sentido do trabalho de supervisão do Profae, verificaram como principais atributos/competências requeridos para o exercício da supervisão em docência: a capacidade de ouvir/compreender as necessidades dos outros; a consideração ao contexto da instituição onde ocorre a supervisão, pois o critério que cada escola adota como problema de intervenção advém de suas metas, objetivos e valores; a compreensão de que não se pode assumir postura punitiva, mas sim de acompanhamento de um processo de desenvolvimento contínuo, sendo imprescindível conhecer a proposta, os alunos, a cidade e o mercado de trabalho. Evidenciou-se no entanto que, na prática, o material de supervisão preparado pelas coordenadoras possuía caráter mecânico, requerendo, por isso, a elaboração de novos instrumentos para supervisão que possibilitassem acompanhar os aspectos gerenciais e pedagógicos. Além disso, o processo de supervisão realizado pelas enfermeiras supervisoras demonstrou ser fragmentado e prioritariamente atrelado ao controle, com a hipervalorização à conferência sistemática de inúmeros itens; e ênfase aos relatórios e baixa interação com os principais atores envolvidos no processo (BARALDI; CAR, 2006). Assim, a superação de tais déficits detectados compõe a gama de competências, ajustes e atributos a serem desenvolvidos pelos enfermeirosdocentes-supervisores para a melhoria do processo ensino-aprendizagem, já que supervisões adequadamente realizadas podem instrumentalizar a melhoria dos docentes diretamente ativos no processo educativo em sala de aula e a resolução das demais necessidades detectadas. Vale ressaltar ainda que, em uma pesquisa que objetivou traçar o perfil e as necessidades de qualificação de auxiliares e técnicos de Enfermagem da Estratégia Saúde da Família (ESF), no Ceará, detectou-se que a maior parte das demandas referia-se a técnicas/procedimentos, enfatizando-se a relevância de uma política de educação permanente que promova a melhoria na capacitação e na atuação desses profissionais (XIMENES NETO et al., 2008). A ênfase 421 foi nos procedimentos e técnicas, o que nos remete à necessidade de pensar na formação do docente com competências científicas especifidade em Enfermagem, bem como experiência e habilidade para a prática profissional. Assim, para a formação de recursos humanos há necessidade de serem contemplados os seguintes aspectos: a importância do conhecimentos técnico-científicos específicos da área de atuação, das políticas de formação, de qualificação profissional, do ensino profissionalizante integrado à educação geral, da integração entre saúde e educação, da construção de cidadãos atendendo às demandas, à fortificação de saúde da população no âmbito do SUS. Didática/estratégias no processo ensino-aprendizagem (dois artigos – 11,1%) As principais estratégias de ensino encontradas na literatura foram a realização do planejamento de ensino e de aula; a seleção e a aplicação da estratégia de ensino que coadune com os objetivos da aula; possuir conhecimento científico específico de Enfermagem; a interação dialógica com o aluno, observando as expressões verbais e não verbais, reconhecendo dificuldades e sentimentos; o desenvolvimento de temas de interesse do aluno; o estímulo ao prazer no estudo; o incentivo à participação ativa do aluno como sujeito de seu aprendizado; a realização de contínua avaliação para norteamento das estratégias de ensino (OKANE; TAKAHASHI, 2006). As autoras defendem estratégias nas quais os alunos atuem em projetos concretos e experimentais, que estimulem que os discentes leiam e ouçam fontes disponíveis fora do âmbito escolar, que assistam a seminários e palestras ministrados por profissionais atuantes e que participem de visitas culturais e técnicas. Ressalta-se a importância de que o professor busque a coerência entre o que aprendeu e o que deverá escolher para transmitir aos alunos. Nos dias de hoje, o ambiente virtual de aprendizagem (AVA) é usado como eficaz estratégia didática, que pode ser incorporada e utilizada pelos docentes da EPT, conforme estudo realizado por Aguiar e Cassiani (2007) em um curso profissionalizante de Enfermagem, cuja avaliação do AVA demonstrou consonância com os objetivos educacionais com alunos, obtendo 85% de acertos nas questões. O docente engajado no progresso da EPT e na capacitação dos profissionais deve considerar as tecnologias disponíveis como facilitadores do processo educativo (AGUIAR; CASSIANI, 2007). Nessa categoria, as estratégias foram apontadas como recurso para a realização do planejamento, e realizadas de diferentes formas, culminando com a apropriação da tecnologia necessária nos dias atuais. 422 Avaliação do processo ensino-aprendizagem (dois artigos – 11,1%) No campo da EP, Zocche (2007) critica a primazia da avaliação da aprendizagem centrada nos resultados individuais da aquisição de habilidades e atitudes específicas, e os docentes, em lugar de avaliarem, julgam e emitem veredictos, conferindo ao cuidar certezas e verdades imutáveis. Assim, a utilização da avaliação por competências consiste na possibilidade de superação desses entraves, bem como da fragmentação do conhecimento. Ademais, avaliação cognitiva e laboral na EPT em Enfermagem precisa integrar o processo de ensino-aprendizagem, como ferramenta do aprender a aprender. É abordada também a pertinência da utilização de estudos de caso e de situações-problema como estratégias de ensino e de avaliação da aprendizagem, enquanto elementos atrelados um ao outro (ZOCCHE, 2007). Uma pesquisa analisou os processos de avaliação da aprendizagem e evidenciou a importância de o professor tomar conhecimento do projeto pedagógico do curso no qual lecionará, visando contribuir ao alcance dos objetivos postulados pela escola. Defende que a avaliação deve considerar o educando de forma integral e que o docente mantenha um diálogo com os alunos, principalmente sobre o processo de avaliação da aprendizagem (MORAES, 2009). É de suma importância que os docentes desenvolvam competência para práticas que suscitem uma avaliação formativa, o que requer a compreensão de como o aluno aprende, da dinâmica do conhecimento para detectar as dificuldades demonstradas pelos aprendizes e, por conseguinte, intervir sobre elas, ao longo do percurso. Desse modo, a avaliação formativa configura-se como um meio para estimular os que já estão caminhando a caminhar cada vez mais com autonomia sobre seu processo de aprendizado (MORAES, 2009). O tema do processo avaliativo tem despertado sempre interesse, inclusive nesse estudo relacionado à EP, quer no âmbito cognitivo, processual, de formação, que permita um direcionamento futuro visando ao desenvolvimento da autonomia no processo educativo. Pesquisa (dois artigos – 11,1%); Na revisão de literatura realizada por Mata & Madeira (2010), os autores ressaltam a necessidade de fomento às pesquisas que abordem o contexto da educação profissionalizante em Enfermagem, por serem fundamentais para que o docente desenvolva uma visão crítico-reflexiva do ensino profissional, incrementando a qualidade da educação. Em outra revisão integrativa, que visou à síntese e à análise dos 423 conhecimentos gerados em artigos publicados em revistas nacionais de Enfermagem sobre a temática da educação profissional, no período de 1999 a 2003, os temas abordados foram: a evolução histórica da educação profissional em Enfermagem no Brasil; as vivências dos alunos; perfil e conhecimentos prévios dos alunos e caracterização da escola (SILVEIRA; CORRÊA, 2005). Nessa área da EP de nível médio há ainda um vasto campo a ser explorado, principalmente no que tange à formação docente para a consolidação do SUS, dos processos de trabalho desenvolvidos no SUS. Estágio supervisionado (um artigo – 5,5%) Em estudo realizado por Stutz & Jansen (2006) com alunos de um curso técnico em Enfermagem, no contexto do estágio curricular, identificaram-se como demandas requeridas a utilização de recursos didáticos que viabilizassem a troca de experiências e a participação dos aprendizes em seu processo de aprendizagem. O conturbado relacionamento interpessoal discente com a equipe de funcionários do campo de estágio foi citado, o que pode tornar necessária a intervenção do docente, com o intuito de identificar as possíveis causas dos conflitos e sua solução. Além disso, o saber-fazer no aprendizado prático representava para os aprendizes uma fonte de insegurança, o que piora quando conjugado às poucas oportunidades para realização de procedimentos mais complexos e às divergências entre as técnicas aprendidas na instituição de ensino e as técnicas adotadas no local de estágio (STUTZ; JANSEN, 2006). Por isso, é imprescindível o acompanhamento do aluno pelo professor, dirimindo ou amenizando a ansiedade e potencializando a autoconfiança necessária às atividades práticas de Enfermagem. Assim sendo, cabe ao docente a detecção das limitações de seus discentes, a orientação adequada acerca de seus erros e o provimento de um ambiente que acalente suas dúvidas. É de extrema relevância, ainda, que esses professores encorajem a interação dos alunos à equipe de trabalho presente no campo de estágio, já que esses funcionários desempenham importante papel no processo ensinoaprendizagem dos estagiários. Não bastando isso, faz-se pertinente que o educador possibilite ao educando a realização de atividades diversificadas, que superem a dicotomia entre o saber e o fazer (STUTZ; JANSEN, 2006). Enfim, no que se refere ao estágio supervisionado, o relacionamento interpessoal no campo de trabalho, o saber-fazer prático necessário para desenvolvimento de habilidade e de segurança, a mediação docente, e a diminuição da dicotomia entre o saber e o fazer foram evidenciados. 424 Conclusões O presente trabalho permitiu constatar que a produção científica em educação profissional em Enfermagem, especificamente no âmbito do ensino profissionalizante, apresenta-se em quantidade aquém da necessária para a detecção das lacunas presentes na formação dos auxiliares e técnicos de Enfermagem. A maioria das produções científicas concerniu à formação de recursos humanos, abordando as políticas de formação, de qualificação profissional, do ensino profissionalizante integrado à educação geral, da integração entre saúde e educação, da construção de cidadãos atendendo às demandas, à fortificação de saúde da população no âmbito do SUS, sobre didática e estratégias no processo ensino-aprendizagem, a avaliação do processo ensino-aprendizagem, que permitam o direcionamento futuro visando ao desenvolvimento da autonomia no processo educativo, Pesquisa ainda com um vasto campo a ser explorado, principalmente no que tange à formação docente para a consolidação do SUS, dos processos de trabalho desenvolvidos no SUS e sobre o estágio supervisionado , tentando diminuir distancias entre o saber e o fazer. Considerações finais A constatação das principais competências requeridas para o exercício da docência na EP em Enfermagem, presentes na literatura pesquisada, permitiu constatar que pode haver um descompasso entre tais necessidades e os reais perfis/competências profissionais encontrados entre grande parte dos enfermeiros-docentes atuantes em nosso contexto educacional, o que requer que se investiguem os possíveis entraves e facilitadores à viabilidade da aplicação prática das imprescindíveis competências dos docentes. Por tudo isso, torna-se indubitável a necessidade de estudos posteriores que subsidiem a melhoria da atuação dos professores, especificamente em EP, do que decorrerá o progresso dos processos de construção do saber e da realidade pedagógica e, por conseguinte, de profissionais de Saúde habilitados para o incremento da qualidade da assistência de Saúde, no contexto do SUS, caminhando rumo à fortificação de seus notáveis preceitos. REFERÊNCIAS AGUIAR, R. V.; CASSIANI, S. 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Revista da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v. 41, n. 2, p. 279-286, jun. 2007. O sentido do trabalho em um projeto de formação de profissionais de Enfermagem. BARALDI, S.; CAR, M.R. Revista da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v. 40, n. 4, p. 555-562, dez. 2006. O estudo dirigido como estratégia de ensino na educação profissional em Enfermagem. OKANE, E. S. H.; TAKAHASHI, R. T. Revista da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v. 40, n. 2, p. 160-169, jun. 2006. 427 Desenvolvimento e avaliação de ambiente virtual de aprendizagem em curso profissionalizante de Enfermagem. AGUIAR, R. V.; CASSIANI, S. H. B. Revista LatinoAmericana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 15, n. 6, p. 1086-1091, nov./dez. 2007. Proposta pedagógica do Profae na perspectiva dos enfermeiros instrutores. SILVA, V. R.; SILVA, M. G.; SANTOS, L. B. O. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v. 58, n. 3, p. 284289, maio/jun. 2005. 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A construção das políticas de formação profissional de nível técnico de Enfermagem para o SUS: visitando experiências da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. BERSUSA, A. A. S.; OLIVEIRA, L. S. S.; MARTINS, C. L.; BÓGUS, C. M.; ESCUDER, M. M. L. Revista Paulista de Enfermagem, São Paulo, v. 26, n. 2, p.103-112, abr./jun. 2007. Análise integrativa da literatura 1999-2003): ensino em educação profissional em Enfermagem. SILVEIRA, R.; CORRÊA, A. K. Revista de Enfermagem da UERJ, Rio de Janeiro, v.13, n. 1, p. 91-96, jan./abr. 2005. A formação do enfermeiro docente do ensino médio profissionalizante na relação com o princípio da interdisciplinaridade. CARVALHO, R. S. A. 84 f. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006 1 A formação do enfermeiro para o ensino de nivel médio em Enfermagem: uma questão de competências. VALENTE, G. S. C. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005. 428 POLÍTICAS PÚBLICAS E A RELAÇÃO COM A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA NA ÁREA DA SAÚDE Autora: Carlota de Sousa Scarelli Orientador: Prof. Mário do Carmo Martini Bernardo Resumo O objetivo do trabalho é descrever as políticas públicas na área da saúde no Brasil e a relação com a educação profissional técnica na referida área e o desenvolvimento desta até os dias atuais. A metodologia utilizada foi de estudo descritivo, do subtipo pesquisa bibliográfica, cuja trajetória apoiouse nas leituras exploratórias e em seletivo material de pesquisa, bem como em sua revisão integrativa, contribuindo para o processo de síntese e análise dos resultados de vários estudos. O trabalho descreve de forma contextualizada as origens das primeiras medidas de saúde institucionais até a criação do Ministério da Saúde e as primeiras políticas de saúde do setor. Focaliza especialmente a 8ª Conferência de Saúde, a Constituição Federal de 1988, a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), nas quais o papel do Estado na formação profissional técnica é definido como compromisso. A partir desses marcos são apresentados os principais pontos das Conferências Nacionais de Saúde e a legislação, que contribuíram para a implantação do SUS, para as políticas de saúde e de recursos humanos para o setor, em especial para a educação profissional técnica. O trabalho tem a perspectiva de contribuir para que os profissionais-docentes dos cursos técnicos compreendam melhor seu papel político na educação e, consequentemente, participem na luta contra as dificuldades para concretizar as políticas de educação profissional técnica na saúde. Descritores: Políticas Públicas. Sistema Único de Saúde. Profissionais Técnicos. 429 INTRODUÇÃO Entende-se por políticas o poder e a capacidade ou a possibilidade de agir, de produzir efeitos desejados sobre indivíduos ou grupos humanos. Sendo assim, as políticas públicas são “um conjunto de ações coletivas voltadas para a garantia dos direitos sociais, configurando um compromisso público que visa dar conta de determinada demanda, em diversas áreas. Expressa a transformação daquilo que é do âmbito privado em ações coletivas no espaço público” (GUARESCHI et al., 2004, p. 180). A partir dessas afirmações, nosso entendimento é que as políticas públicas em educação profissional na área da saúde compreendem o conjunto de ações coletivas voltadas para a capacitação e a qualificação de profissionais para o trabalho na área da saúde, com o objetivo de proporcionar um atendimento de qualidade aos cidadãos. Contudo, cumpre salientar que nem sempre a promoção da saúde e mesmo da educação foram encaradas como um dever para o poder público e um direito para os cidadãos. Assim, o desenvolvimento das políticas públicas em educação na saúde sucede o desenvolvimento das políticas públicas em saúde, figurando como uma evolução destas. Sendo assim, para a compreensão histórico-evolutiva do objeto de nosso estudo, analisaremos as políticas públicas em saúde e como estas evoluíram para as de educação profissional. Para tanto, convém realizarmos uma breve retrospectiva histórica para conhecermos e compreendermos os determinantes históricos que impulsionaram o processo de construção destas políticas. Durante todo o período colonial, e até mesmo durante o período monárquico, não havia interesse do governo em promover a saúde no Brasil e, portanto, as políticas públicas em saúde inexistiam. A promoção da saúde ficava a cargo da própria população e a assistência às pessoas carentes ficava sob cuidados das iniciativas de instituições beneficentes e filantrópicas ligadas à Igreja Católica, como a Santa Casa de Misericórdia. O restante da população buscava auxílio em curandeiros, barbeiros, farmacêuticos, parteiras, médicos, etc. (COSTA, 1985). Não havia portanto iniciativas governamentais voltadas para a promoção da saúde e a prevenção das doenças. Ocorre, nessa época, a proliferação de doenças pestilentas, como a febre amarela, a varíola e a malária (MACHADO; LOURENO; MURICY, 1978). Tal cenário começa a se transformar durante a República Velha – primeira fase da República no Brasil –, período no qual a sociedade brasileira 430 inicia a constituição de um Estado moderno, marcado pela ascensão social de grupos ligados à atividade cafeeira, nascendo aí a saúde pública no país, marcada pela revisão das práticas adotadas até aquele momento e a adoção de saberes fundamentados na bacteriologia e na microbiologia. O processo foi mais visível onde esses grupos possuíam maior influência, como nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, onde se destacaram os médicos Emilio Ribas e Oswaldo Cruz, respectivamente (MERHY, 1992). A primeira entidade criada no país com o objetivo de coordenar as políticas públicas na saúde foi a Diretoria Geral de Saúde Pública, em 1897, que ficou subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores – o Ministério da Saúde só seria criado em 1953. Em 1904, esse órgão seria reformulado sob a coordenação de Oswaldo Cruz, introduzindo a produção de soros e vacinas, desenvolvendo as campanhas sanitárias (LUZ, 1979). São essas as primeiras medidas que se constituem de fato políticas públicas em saúde adotadas no Brasil. Destaca-se, nesse contexto, a campanha de imunização contra a varíola, realizada no Rio de Janeiro sob coordenação do sanitarista Oswaldo Cruz, e que desencadeou a revolta da população. Nesse período também ocorrem algumas realizações importantes que marcaram a sociedade da época, tais como: reforma urbana no Rio de Janeiro e em Santos; criação dos institutos Vital Brasil, Oswaldo Cruz e Butantã; implantação de leis e códigos que davam vida às políticas públicas em saúde (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 1989). Saliente-se que essa mudança de postura por parte do governo, o qual passa a comandar a saúde e, principalmente, as políticas públicas em saúde, está ligada à necessidade de garantir que os produtos exportados, especialmente o café (que representava 60% da economia do país), chegassem ao destino (Europa e EUA) mantendo o nível de qualidade exigido por esses mercados. Para tanto, eram necessárias as políticas de saneamento dos espaços de circulação das mercadorias exportáveis e controle de doenças que prejudicassem o prestígio do produto (LUZ, 1979). A industrialização, por sua vez, também contribuiu para a evolução das políticas de saúde. O processo de industrialização deslocou uma imensa massa populacional para os centros urbanos, criando-se uma massa operária que precisava ser atendida pelos serviços de saúde, surgindo o modelo médicoassistencial privatista (LUZ, 1979; MENDES, 1994). Tal modelo desenvolveu-se como componente do sistema previdenciário, sendo inicialmente criados os Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs). Posteriormente são criados o Instituto Nacional de 431 Previdência Social (INPS) e Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social (Inamps), estendendo a cobertura da atenção à saúde e a seguridade social apenas aos trabalhadores inseridos no mercado de trabalho e aos seus familiares (SÃO PAULO, 2009). Revela-se, assim, o interesse do Estado com a manutenção da saúde dos trabalhadores que poderiam representar prejuízo para a industrialização, e não da sociedade em geral. Esse modelo médico-assistencial privatista foi marcado pelo privilegiamento da prática médica curativa, especializada e individualizada, em detrimento de medidas de saúde pública, de caráter preventivo e coletivo; pela criação de um complexo médico-industrial, com inserção dos grandes monopólios internacionais do setor farmacêutico e de equipamentos hospitalares; e pela prestação de serviços de saúde predominantemente pelo setor privado. (SÃO PAULO, 2009). Segundo Braga e Paula (1981), o cenário se transforma quando tem início o processo de abertura política, após o período de crescimento econômico conhecido como “milagre econômico”, com o surgimento de movimentos sindicais e intelectuais que passam a questionar as políticas públicas do governo e o modelo assistencialista de então, os quais provocaram a criação do Plano de Pronta Ação (PPA) e do Fundo de Apoio Social (FAS), que, por sua vez, contribuíram para o avanço dos investimentos privados na área da saúde. Na década de 1960/1970, nasceu e se desenvolveu o movimento sanitário, o qual se consolidaria em 1970, politizando a questão da saúde, defendendo que esta é um direito de todos e um dever do Estado, tendo por base os princípios da integralidade, universalidade, equidade e descentralização, com efetiva participação do Estado. A partir desse movimento, teve início a Reforma Sanitária (AROUCA, 1991; HEIMANN et al., 1992; ALMEIDA, 1995). Coroando os esforços pela institucionalização da saúde como direito de todos e dever do Estado, é implantado o Sistema Único de Saúde (SUS) conforme o artigo 198 da Constituição Federal de 1988. Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede organizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo para os serviços assistenciais; III – participação da comunidade (BRASIL, 1988). 432 Assim, no artigo 198 da Constituição Federal de 1988, nasce o Sistema Único de Saúde no Brasil, definido pela participação social, descentralização e atendimento integral. No artigo 199, abre-se a assistência à saúde à iniciativa privada e, no artigo 200, definem-se as competências do SUS em relação ao Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e Epidemiológica, ao ordenamento de formação de recursos humanos, de saneamento básico, ao apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico, bem como às ações intersetoriais na área do meio ambiente, incluindo os ambientes de trabalho (ANDRADE, 2007, p. 43). Para Pugin (1996), os participantes desse movimento chegaram a um consenso de que a saúde brasileira naquele momento não necessitava apenas de uma reforma meramente administrativa e financeira, e sim de uma mudança em todo o arcabouço jurídico institucional vigente, ampliando o conceito de saúde segundo os preceitos da reforma sanitária. Em março de 1990, é criado o Departamento do SUS, subordinado a uma secretaria Nacional de Assistência à Saúde. Após grandes embates entre o Movimento Sanitário e o governo, foram criadas as Leis 8.080, de 19 de setembro de 1990, e 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que regulamentam a área da saúde da Constituição. Estas duas leis foram chamadas Lei Orgânica da Saúde (LOS). São consideradas leis infraconstitucionais, que disciplinam legalmente o cumprimento do mandamento constitucional da proteção e da defesa da saúde (ANDRADE, 2007, p. 45). JUSTIFICATIVA A criação e a consolidação do SUS nos municipios brasileiros pressupõe a existência de equipes multiprofissionais preparadas para atender aos objetivos do novo sistema. Para que isso ocorra há necessidade de uma política de saúde que tenha entre suas prioridades a contínua formação dos profissionais, incluindo-se o profissional técnico. Atualmente constatam-se diversas iniciativas do Estado nesse sentido, porém isso nem sempre ocorreu assim. O compromisso do Estado com a formação do profissional técnico teve uma história construída com lutas ao longo das mudanças políticas e institucionais, que redundou em uma legislação que hoje lhe dá suporte. Consideramos fundamental o conhecimento da trajetória contextualizada dessas políticas públicas e a legislação referente à educação na saúde, por parte dos profissioanis de enfermagem, principalmente os 433 profissionais-docentes dos cursos técnicos, pois tal conhecimento propiciaria compreender melhor nosso papel histórico e político na construção do Sistema Único de Saúde. OBJETIVO Descrever de forma contextualizada as origens das políticas públicas na área da saúde no Brasil, a relação com a educação profissional técnica na referida área e o desenvolvimento desta até os dias atuais. METODOLOGIA Optou-se por um estudo descritivo, do subtipo pesquisa bibliográfica, cuja trajetória apoiou-se nas leituras exploratórias e em seletivo material de pesquisa, bem como em sua revisão integrativa, contribuindo para o processo de síntese e análise dos resultados de vários estudos, criando um corpo de literatura compreensível. O levantamento bibliográfico propriamente dito foi realizado por meio da base de dados do Scielo, Lilacs e Ministério da Saúde, utilizando palavraschave como “políticas públicas”. Foi também efetuado um levantamento manual de alguns periódicos e livros, após consulta ao acervo da Biblioteca da Universidade do Oeste Paulista. Após o levantamento bibliográfico, realizou-se a leitura exploratória do material encontrado. Com essa leitura, pôde-se obter uma visão global do material, considerando-o de interesse ou não à pesquisa. Desse modo foram selecionados 38 trabalhos e/ou documentos para serem referências. RESULTADOS Relato da política de educação do SUS O primeiro projeto de caráter público que vinculou o Estado à produção de mão de obra técnica qualificada para o serviço em saúde foi o Projeto Larga Escala, adotado em fins do regime militar, instituído pela Portaria de 11 de março de 1980, alterada pela Portaria Ministerial de 27 de abril de 1984 e ratificado pela Resolução Ciplan n° 15 de 11/11/85 (BRASIL, 1985). Contudo, esse programa não se configurou como política pública, e sim com estratégia de formação, experiência pedagógica, movimento ou ideia, visando qualificar uma força de trabalho empregada no setor saúde, 434 em consonância com os ideais da Reforma Sanitária Brasileira, que propunha a democratização do sistema de saúde, bem como mudanças na prática profissional dos trabalhadores deste setor (BASSINELLO; BAGNATO, 2009b). Em 1986, ocorreu a 8ª Conferência Nacional de Saúde, primeira após a redemocratização do país. A Conferência serviria de base para a Constituição Federal de 1988, que institucionalizou o dever do Estado com a educação técnica na saúde, formalizando esse compromisso. Assim, a partir desse evento, tem início a maior parte dos projetos de políticas públicas para o setor. A partir de 1988, alguns fatos ocorreram no sentido de consolidar os compromissos atribuídos ao SUS na Constituição, em especial a Lei Orgânica 8.080/90 e a Lei 8.142/90, que regulamentaram as diretrizes do sistema e as conferências nacionais de Saúde seguintes, que mantêm o papel de canal entre gestores e a sociedade, reafirmado na Lei 8.142. Se traçarmos, portanto, uma linha cronológica em relação às políticas públicas em educação em saúde, temos a 8ª Conferência ocorrida em 1986, a Constituição de 1988, que institucionaliza o SUS e o vincula ao compromisso de executar essas políticas, e as Leis Orgânicas, de 1990, que regulamentam as políticas em questão, e as Conferências seguintes. Assim, discorremos sobre esses acontecimentos, obedecendo à sequência de sucessão. Conferências nacionais de Saúde As conferências nacionais de Saúde são momentos de ouvir a sociedade pronunciar-se sobre os problemas de saúde que mais a aflingem e oferecer propostas de soluções para esses problemas. A partir das conferências e suas deliberações, os gestores do sistema de saúde elaboram a política de saúde mais adequada para a consecução dos objetivos, metas e estratégias do SUS (CARVALHO; SANTOS, 2006). De acordo com o Ministério da Saúde, as conferências existem desde a década de 1940 e começaram discutindo, justamente, assuntos relacionados à saúde e aos serviços básicos de saneamento. A 1ª Conferência Nacional de Saúde ocorreu em 1941, durante o governo de Getúlio Vargas. Suas concepções privilegiavam aspectos curativos da saúde e não preventivos, com defesa sanitária da população, assistência social aos indivíduos e às famílias, proteção da maternidade, da infância e da adolescência. Durante a 1ª Conferência Nacional de Saúde, definiu-se que as conferências ocorreriam anualmente ou, pelo menos, 435 de dois em dois anos. A 2ª Conferência se deu em 1950, seguindo o mesmo estilo da primeira (CONFERÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO..., 1941). Em 1963, a 3ª Conferência teve um diferencial ao contar com a participação de movimentos democráticos na área da saúde, ampliando o espaço de discussão. Os problemas sanitários brasileiros apareceram pela primeira vez, sendo apontados e discutidos. As propostas apontaram a necessidade de um plano nacional que atingisse as três esferas de governo (BRASIL, 1963). As conferências de 1966, 1975, 1977 e 1980 ocorreram na ditadura militar e tiveram uma participação tímida, devido à situação política da época. Mesmo assim as conferências aconteceram sob a forte repressão do Estado. Na década de 1980, com a abertura democrática e a luta de movimentos sociais, em especial o movimento de Reforma Sanitária, acontece a 8ª Conferência Nacional de Saúde, marco de uma nova era para a saúde no Brasil. 8ª Conferência Nacional de Saúde Dentro das Conferências Nacionais que ocorreram, a 8ª Conferência Nacional de Saúde merece especial destaque no âmbito de formação do SUS. Ainda que a instituição formal do SUS tenha se dado na Constituição de 1988, suas origens remontam desde a 8ª Conferência Nacional de Saúde, ocorrida em março de 1986, em Brasília, promovida pelo Ministério da Saúde. Considerada um marco histórico fundamental para a evolução dos estudos que resultaram no SUS, teve como participantes diversos setores organizados da sociedade, com destaque para valiosa participação de usuários, e pela quantidade de pré-conferências estaduais e municipais já realizadas. Os principais temas debatidos nesta conferência foram: saúde como direito de cidadania, reformulação do sistema nacional de saúde e o financiamento do setor (AROUCA, 1988; FLEURY, 1988). A importância dessa Conferência reside ainda no fato de que o relatório por ela gerado serviu de referência para os constituintes dedicados à elaboração da Carta de 1988, bem como para os militantes do Movimento Sanitário Brasileiro, ao lançar conceitos como o da universalidade, redefinir o conceito de saúde pública no país, caracterizando-o como direito do cidadão e dever do Estado, e propor uma rede assistencial descentralizada e organizada (AROUCA,1991; ANDRADE, 2007). Um dos temas discutidos nessa Conferência foi quanto à formação dos recursos humanos para a área da saúde, prevendo que o Estado deveria proporcionar a capacitação e a reciclagem dos seus recursos humanos, o 436 que foi formalizado no artigo 200 da Constituição de 1988 e no artigo 15 da Lei Orgânica 8.080/90. A 8ª Conferência previa ainda a instituição de uma educação permanente para a formação dos recursos para a saúde. Denominada como “Reformulação do Sistema Nacional de Saúde”, tema central da conferência, nela foram sugeridos os seguintes princípios relacionados com a política de recursos humanos: 1. O novo Sistema deverá reger-se pelo princípio da capacitação e reciclagem permanentes de seus Recursos Humanos; 2. A formação dos profissionais de saúde deve estar integrada ao sistema regionalizado e hierarquizado de atenção à saúde; 3. Os currículos da área da saúde deverão ser integrados por conhecimentos das práticas terapêuticas alternativas. (BRASIL, 2004) Aparecem, a partir da demarcação da reforma sanitária (reformulação do Sistema Nacional de Saúde), a educação permanente e a formação dos profissionais de saúde, destacando-se a adequação da educação dos profissionais à regionalização e à hierarquização do sistema de saúde. Constituição Nacional de 1988 Artigo 200: Ao Sistema Único de Saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da Lei: III - ordenar formação de Recursos Humanos na área da saúde; V - incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico. Note-se que aparece tanto a ordenação da formação de recursos humanos quanto o desenvolvimento científico e tecnológico; por conseguinte, tanto uma responsabilidade para com a formação de pessoal de saúde de modo geral, quanto com a produção específica de conhecimento e tecnologia no âmbito do próprio Sistema (BRASIL, 1988). Na Constituição Federal de 1988, criou-se o Sistema Único de Saúde e definiu-se que a ele competiria o papel de formação de seus próprios recursos humanos. Tal competência foi definida no artigo 200. Portanto, foi esse artigo da Constituição que estabeleceu legalmente as políticas públicas de educação em saúde no Brasil, abrindo possibilidade de formar trabalhadores com perfil pertinente às necessidades técnicas e sociais emergentes, além de contribuir para a consolidação do novo sistema. 437 A Lei Orgânica da Saúde de 1990 (BRASIL, 1990) Atribui-se à Lei Orgânica de 1990 a regulamentação do SUS, estabelecendo suas diretrizes e princípios. É composta por duas leis: Lei 8.080/90 e Lei 8.142/90. A Lei 8.080 define a estrutura geral do sistema de saúde brasileiro, definindo os objetivos e as áreas de atuação do SUS, que incluem a promoção de saúde, a prevenção de doenças e a recuperação da saúde (PINTO et al., 2009). Em relação aos recursos humanos, destacamos os seguintes artigos da Lei 8.080: Art. 6º- define os campos de atuação do SUS. Art.15 - formaliza o compromisso do Estado, em todas as suas instâncias de poder, com a formação de recursos humanos para a área da saúde. Artigo 6º: Estão incluídas no campo de atuação do SUS: III - a ordenação da formação de recursos humanos na área da saúde; X - o incremento, em sua área de atuação, do desenvolvimento científico e tecnológico. Artigo 15: A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições: IX - participação na formulação e na execução da política de formação e desenvolvimento humanos para a saúde; XIX - realizar pesquisas e estudos na área da saúde. (BRASIL, 1990) Logo, o artigo 15 da Lei Orgânica 8.080/90 deu início às políticas públicas de educação em saúde, pois obrigou o poder público (em todas as suas esferas) a participar da formação e do desenvolvimento dos profissionais da saúde. Ainda em 1990 foi aprovada a Lei nº. 8142, que regulamentou o financiamento do sistema e a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde por meio das conferências de saúde e dos conselhos de saúde (PINTO et al., 2009). 9ª Conferência Nacional de Saúde Primeira conferência após a formação do SUS e a Lei Orgânica 8.080/90, que regularizou os conselhos de saúde e as conferências. Foi chamada “Municipalização é o caminho”. Ocorrida em 1992, entendeu como necessário para a implementação do SUS como relação à área de recursos humanos: 438 1. Assegurar uma Política de Formação e Capacitação de Recursos Humanos que se articule com os órgãos formadores; 2. Promover a imediata regulamentação do Art. 200, Inciso III, da Constituição Nacional que atribui ao SUS a tarefa de ordenar a formação de recursos humanos; 3. Garantir escolas de formação de trabalhadores de saúde nas Secretarias de Saúde ou através de articulação com Secretarias de Educação, Universidades e outras instituições públicas de ensino superior; 4. Assegurar que as Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde destinem recursos orçamentários para a capacitação e treinamento dos seus quadros de pessoal e criação de núcleos de recursos humanos, com atividades de administração e desenvolvimento. (BRASIL, 2004) Lançado na 8ª Conferência, confirmado na Constituição Federal e regulamentado na Lei Orgânica, o compromisso do Estado na formação de recursos humanos é reafirmado, desta vez, sob a instituição de escolas de formação de trabalhadores do SUS. Com efeito, decide-se pela regulamentação imediata do artigo 200 da Constituição. Assim, as decisões dessa conferência alavancaram os trabalhos relacionados à instituição de um sistema formador de profissionais. 10ª Conferência Nacional de Saúde Sua chamada foi “Onde dá SUS, dá certo!”, essa conferência ocorreu em 1996. Quanto aos recursos humanos em saúde, no que se refere à administração dos trabalhadores de saúde, aparece à qualificação dos trabalhadores em saúde, assim proposta: 1. O Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde devem promover programas permanentes de capacitação, formação, educação continuada, reciclagem e motivação das Equipes de Trabalhadores em Saúde; 2. As Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde das Capitais devem implantar e manter técnica e financeiramente Centros Formadores de Trabalhadores em Saúde, autônomos, com atuação integrada 439 com os Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde e com as Secretarias de Educação e Universidades; 3. O Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais de Saúde devem manter assessoria permanente aos Municípios para a realização de programas permanentes de capacitação, formação, educação continuada, reciclagem e motivação de trabalhadores em saúde. (BRASIL, 2004) Quanto à formação e desenvolvimento de Recursos Humanos em Saúde foi deliberado que: 1. O Ministério da Saúde deve apresentar, após ampla discussão com as entidades representativas da área, um Plano de Ordenamento da Capacitação, Formação, Educação Continuada e Reciclagem de Recursos Humanos em Saúde, para deliberação do Conselho Nacional de Saúde, que seja articulado nacionalmente, inclusive com previsão de repasses financeiros específicos para essas atividades, baseado nos seguintes princípios: • • • • criação de Comissões Permanentes para integração entre os Conselhos de Saúde, os serviços de saúde e as Instituições de Ensino Fundamental e Superior, para deliberar sobre a capacitação, formação, educação continuada e reciclagem dos Recursos Humanos em Saúde, a partir da ótica do SUS; estímulo à criação de Escolas de Saúde Pública em todos os Estados da União; criação de novos cursos de nível médio e superior para a área da saúde de acordo com as necessidades do SUS, identificadas a partir de critérios epidemiológicos e da manifestação dos Conselhos de Saúde; qualificação dos cursos profissionalizantes de nível médio para a área da saúde, com fiscalização rigorosa e fechamento dos que não têm condições de funcionamento. Nessa conferência foi proposta a criação de novos cursos de nível médio e superior para a área da saúde, de acordo com as necessidades do SUS, a serem identificadas. Destacaram-se, na conferência, a qualificação dos cursos profissionalizantes de nível médio e a criação de escolas de saúde pública em todos os estados. Dando sequência aos trabalhos da anterior, essa conferência procurou, 440 quanto à qualificação dos profissionais, prosseguir com a regulamentação do artigo 200, de modo a cada vez mais reafirmar o papel do Estado. Nesse sentido, atribui-se à 10ª Conferência Nacional de Saúde a determinação de que o Estado, em todos os níveis, deve promover programas permanentes de capacitação, educação continuada, reciclagem e motivação das equipes de trabalho; devem-se criar centros formadores orientados exclusivamente para o ensino técnico (escolaridade fundamental, ensino de qualificação básica, ensino de habilitação profissional e ensino técnico especializado), integrando a Rede de Escolas Técnicas do SUS (RET-SUS). Nota-se que a cada conferência reafirma-se o papel dos gestores e acrescenta-se alguma atribuição, de forma a ampliar e aperfeiçoar os trabalhos realizados. Em 15 de outubro de 1999, foi criado o Programa de Profissionalização dos Trabalhadores da Área da Enfermagem (Profae), um projeto do Ministério da Saúde, coordenado pela Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Este projeto teve como principal meta a profissionalização em grande escala dos trabalhadores da área da saúde de nível médio e elementar, especificamente os auxiliares e técnicos de enfermagem (BOMFIM, 2009, p. 43). 11ª Conferência Nacional de Saúde Sua chamada foi “Efetivando o SUS: qualidade e humanização na atenção à saúde, com controle social”, e ocorreu em 2000. Foram aprovadas as seguintes proposições quanto ao Controle Social (BRASIL, 2004): Quanto ao fortalecimento dos princípios do SUS, ao seu caráter público, à integralidade, à equidade e à humanização, sugeriu-se que: 1. Os novos trabalhadores do setor público de saúde deverão ter formação adequada para o novo modelo de atenção à saúde preconizada e aos antigos em atuação na rede deve ser assegurado um programa de educação continuada através de Escolas Técnicas e de Escolas de Saúde Pública dos estados. Quanto à Política Nacional de Recursos Humanos para SUS, o desenvolvimento de trabalhadores em saúde foi afirmado com sugestões à capacitação: 1. Canalizar recursos financeiros para a formação dos recursos humanos para o SUS, definindo o perfil profissional apropriado a partir de necessidades concretas locais; 441 2. Assegurar a disponibilidade de recursos financeiros para a viabilização de programas de capacitação e qualificação permanente dos Recursos Humanos nos municípios, no estado e na união; 3. Assegurar recursos financeiros de no mínimo 1% do orçamento da saúde para qualificar a capacitação de recursos humanos em cada esfera de governo, com prioridades e programa aprovados pelo respectivo Conselho de Saúde; 4. A União, estados e municípios devem ampliar a sua atuação na realização de cursos de especialização e aperfeiçoamento em saúde pública, descentralizados por regionais de saúde. Quanto à formação de pessoal para a saúde: 1. Regulamentar o Art. 200 da Constituição Nacional; 2. Incentivar técnica, financeira e politicamente a expansão da pósgraduação em saúde no Brasil; 3. Estabelecer regras nacionais de articulação entre o MEC, as Sociedades de Especialistas e o CNS e passar ao SUS a decisão sobre especialidades a serem criadas ou extintas, bem como a regulamentação da diversificação dos papéis das profissões de saúde e das oportunidades formativas nos ambientes de trabalho da saúde; 4. Redimensionamento do papel dos aparelhos formadores em saúde (universidades e escolas técnicas) no fortalecimento do SUS revisão das estruturas curriculares para que se enriqueçam pelo debate da política, legislação e trabalho no SUS; 5. Articulação dos aparelhos formadores com os segmentos de controle social do SUS; 6. Efetivar a abertura de novos cursos de formação de recursos humanos para a saúde; 7. Ampliar o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área da Enfermagem – PROFAE – para outros cidadãos. Quanto à educação continuada, foi deliberado: 1. Garantir aos recursos humanos em saúde processos permanentes de educação continuada, nas três esferas de governo, inclusive sobre os princípios e diretrizes do SUS e conceitos básicos em saúde pública. Que todo profissional de saúde tenha treinamento de ingresso nos serviços e que o Governo Federal, Estadual e 442 Municipal assumam a sua parcela de responsabilidade com o financiamento do SUS, de forma a facilitar o encaminhamento da necessária qualificação dos recursos humanos para o sistema; 2. Descentralizar e regionalizar as ações das Escolas de Saúde Pública para uma melhor qualificação e educação continuada dos trabalhadores da saúde. Coube a essa conferência, além de reafirmar e ampliar tudo o que já havia sido decidido, estabelecer no processo de profissionalização a divulgação dos princípios fundamentais do SUS, universalidade, integralidade, equidade, a fim de reafirmá-los e fortalecê-los de maneira que isso os oriente em seu trabalho e contribua assim para a consolidação do sistema. Baseando-se nos princípios organizacionais regionalização e descentralização, determinou-se que a instituição das escolas formadoras de profissionais técnicos em saúde seja de forma a priorizar a proximidade dos usuários e gestores; e concentrar em núcleos determinados a gestão de sua região próxima. Nessa conferência definiu-se também a efetivação da abertura de novos cursos de formação para a saúde e foi proposta a necessidade de ampliação do Programa de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae) para outras categorias de trabalhadores do ensino médio, tais como: em odontologia, com os técnicos de higiene dental; em vigilância à saúde, com os técnicos em saúde; em administração e informação, com os técnicos em registros de saúde; entre outros, além do Técnico em Enfermagem (BRASIL,1988). 12ª Conferência Nacional de Saúde Chamada de Conferência Sergio Arouca, teve como eixo principal o lema “Saúde: um direito de todos e dever do Estado – a saúde que temos, o SUS que queremos” (CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE, 2004). A 12ª Conferência foi antecipada por decisão do Plenário do Conselho Nacional de Saúde, realizado em Brasília de 7 a 11 de dezembro de 2003, quando mais de quatro mil cidadãos discutiram e deliberaram sobre os rumos do Sistema Único de Saúde. Aproximou gestores dos governos federal, estadual e municipal, usuários do SUS, profissionais de saúde, prestadores de serviços, representantes do Ministério Público, parlamentares, técnicos e especialistas. Juntos, não só 443 celebraram o controle social em saúde, mas também formularam estratégias e diretrizes, discutidas e aprovadas pela maioria dos delegados presentes que, ao serem implantadas, tiveram repercussão na melhoria das condições de vida e saúde da população brasileira. São destaques dessa conferência: 1. Garantir a efetivação de programas de profissionalização do auxiliar de enfermagem que trabalha na rede do SUS para técnico de enfermagem, utilizando recursos das três esferas de governo. 2. Criar cursos de formação para técnico de higiene dental (THD), auxiliar de consultório dentário (ACD), técnico de prótese dentária (TPD) e auxiliar de prótese dentária (APD), obedecendo à legislação vigente, incluindo as escolas técnicas e as universidades públicas no processo de capacitação dos trabalhadores do SUS. 3. Estabelecer como política do SUS a profissionalização técnica, na qual as Escolas Técnicas de Saúde cumpram o papel fundamental de escolarização, qualificação, habilitação profissional e educação permanente para agentes, auxiliares e técnicos das várias áreas do setor saúde. (CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE, 2004) São criados aqui diversos cursos técnicos, além do de enfermagem, com o objetivo de auxiliar os trabalhos do SUS. Para auxiliar o serviço odontólogico, os cursos técnicos de higiene dental, prótese dentária e auxiliar de consultório dentário. Entre as atribuições dessa conferência, destaca-se a garantia do estabelecimento de políticas de profissionalização dos auxiliares de enfermagem atuantes no SUS em técnicos de enfermagem, sob o financiamento das três esferas de governo. 13ª Conferência Nacional de Saúde A 13ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em dezembro de 2007, teve como tema central “Saúde e qualidade de vida: políticas de Estado e desenvolvimento”, com os seguintes eixos temáticos: I - Desafios para a efetivação do direito humano à saúde no século XXI: Estado, sociedade e padrões de desenvolvimento; II - Políticas públicas para a saúde e qualidade de vida: o SUS na seguridade social e o pacto pela saúde; III - A participação da sociedade na efetivação do direito humano à saúde (BRASIL, 2007). 444 Foram discutidas dentro do eixo temático II, as seguintes propostas: 131. O Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais devem fortalecer e garantir recursos financeiros para Política de Educação Permanente, estabelecendo parcerias com as instituições Federais, Estaduais e Municipais, Hospitais Universitários e ENSP / FIOCRUZ, ETSUS para a realização de capacitação e treinamento dos Conselheiros, Gestores, Agentes Comunitários de Saúde, Atendente de Consultório Dentário, Agentes de Endemias, e demais Trabalhadores de saúde, para este fim. Realizando e fortalecendo as ações. 133. Oportunizar e criar através de políticas públicas o acesso à qualificação e conhecimento, através de cursos profissionalizantes e ou de qualificação profissional para todos os servidores e profissionais da rede SUS, estabelecendo uma política de capacitação de recursos humanos, fortalecendo as Escolas Técnicas da Saúde transformandoas em verdadeiros centros de referência regional/estadual, favorecendo unificação de informações estratégicas para atuação profissional (BRASIL, 2007). Destaque para a adoção de parcerias entre governos e universidades e outras instituições a fim de contribuir para a formação de novos trabalhadores para a saúde e o fortalecimento da política permanente de educação em saúde. A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde foi uma proposta de ação estratégica que visou contribuir para transformar e qualificar: a atenção à saúde, a organização das ações e dos serviços, os processos formativos, as práticas de saúde e as práticas pedagógicas. A implantação dessa política implica trabalho articulado entre o sistema de saúde (em suas várias esferas de gestão) e as instituições de ensino, colocando em evidência a formação e o desenvolvimento para o SUS (ELLERY, 2007, p. 885). De acordo com a autora, a educação permanente é aprendizagem no trabalho, em que o aprender e o ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e do trabalho. Propõe-se que os processos de capacitação dos trabalhadores da saúde tomem como referência as necessidades de saúde das pessoas e das populações, da gestão setorial e do controle social de saúde, tenham como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho e sejam estruturados a partir da problematização de trabalho. 445 As propostas de educação profissional técnica para a área da saúde De uma maneira geral, os atuais projetos existentes no país surgiram de atuações do Ministério da Saúde e debates nas conferências nacionais de Saúde. Nesse contexto, a cada nova conferência, reafirmava-se o que fora estabelecido na(s) anterior(es) e se ampliavam as definições. A 12ª Conferência Nacional de Saúde tem papel importante, pois por ela define-se: “Garantir a efetivação de programas de profissionalização do auxiliar de enfermagem que trabalha na rede do SUS para técnico de enfermagem, utilizando recursos das três esferas de governo.” A 13ª Conferência, por sua vez, estabelece as parcerias entre governo (Secretarias de Saúde, Ministério) e universidades e demais instituições federais e estaduais, como ETSUS e Fiocruz, para a promoção de tais projetos. Para compreender as tendências (ou propostas) em voga na educação técnica em enfermagem, precisamos avançar um pouco mais, considerando as especificidades contidas na organização da educação profissional. Dois projetos de formação de trabalhadores da área da enfermagem marcaram as políticas públicas para o setor a partir desse período: o Larga Escala e o Profae (BOMFIM, 2009, p. 43). O Projeto de Formação de Trabalhadores para a Área de Saúde em Larga Escala, também conhecido como Projeto Larga Escala (PLE), surgiu em 1981, fruto do processo de reformulação dos serviços de saúde, que visava ao aumento de cobertura e implantação de uma rede básica, priorizando populações rurais de pequenos centros e periferias das grandes cidades (BASSINELLO; BAGNATO, 2009a). O PLE teve por base vários processos que buscavam operar transformações no sistema de saúde, dentre eles o processo de elaboração da Reforma Sanitária (BASSINELLO; BAGNATO, 2009b). O Projeto Larga Escala surgiu de um acordo interministerial, entre o Ministério da Saúde, o Ministério da Previdência e Assistência Social e o Ministério da Educação, instituído pela Portaria de 11 de março de 1980, alterada pela Portaria Ministerial de 27 de abril de 1984, ratificado pela Resolução Ciplan n° 15 de 11/11/85 (BRASIL, 1985). Esta resolução vem provar o Projeto de Formação em Larga Escala de Pessoal de Nível Médio como sendo a estratégia prioritária para a preparação de recursos humanos no âmbito das Ações Integradas de Saúde, que buscavam a integração de serviços, rumo ao Sistema Único de Saúde, definido na 8ª Conferência Nacional de Saúde realizada em 1986, além de ratificar a participação interministerial, das Secretarias Estaduais de Saúde, de Educação e da Organização Panamericana da Saúde (BRASIL, 1985). Portanto, surgiu antes mesmo da 8ª Conferência e da 446 Constituição Federal de 1988, devido à necessidade de promoção e melhoria da formação profissional de trabalhadores de nível médio e fundamental da saúde, revelando a existência dessa preocupação antes da Constituição, que, entretanto, institucionalizou tal responsabilidade do Estado. Tratou-se de um projeto de cooperação interinstitucional, oriundo do acordo de recursos humanos firmado entre o Ministério da Saúde, o Ministério da Educação, o Ministério da Previdência e Assistência Social e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). Estabeleceu-se como uma experiência pedagógica amparada pela Lei Federal n° 5.692/71, das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e o artigo 33 da Resolução do Conselho Estadual de Educação – C.E.E. 23/83 (GRYSCHEK et al., 2000). O PLE teve como objetivo principal a qualificação profissional do pessoal de nível médio e elementar com atuação em serviços públicos de saúde e que não tivera oportunidade de escolarização anterior (GRYSCHEK et al., 2000). Porém, mesmo funcionando, o PLE até 1996 não se mostrava suficiente para atender à demanda de profissionalização do atendente (SILVA; SILVA; SANTOS, 2005). No estado de São Paulo, paralelamente ao projeto Larga Escala, a Secretaria da Saúde Estadual criou, em 1988, o Projeto Classe Descentralizada, objetivando investir na formação e no desenvolvimento de seus profissionais da área de enfermagem. A iniciativa foi uma parceria do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (Suds) e do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (Ceetpes), tendo recebido financiamento do Banco Mundial até 1994, quando houve um declínio do projeto (BERSUSA et al., 2007). Em 15 de outubro de 1999, foi publicada pela portaria 1262/GM, do Ministério da Saúde, o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área da Enfermagem (Profae). Em 2003, este já estava vigorando em todo o Brasil, coordenado pela Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. O projeto teve como principal meta a profissionalização em grande escala dos trabalhadores da área da saúde de nível médio, especificamente os auxiliares e técnicos de enfermagem, formando cerca de 225 mil auxiliares de enfermagem e 90 mil técnicos em enfermagem para atuar nos múltiplos espaços e ações de saúde (BOMFIM, 2009, p. 43). Esse projeto foi fruto da atuação do Ministério na Saúde, mas na 11ª Conferência Nacional de Saúde, em 2000, discutiu-se a ampliação do mesmo. O Profae, além da linha de atuação voltada para a qualificação profissional de nível médio, tinha um outro componente, cujo objetivo era a formação pedagógica para docentes de Educação Profissional de Nível Técnico na Área de Enfermagem, com vistas a atender às mudanças na 447 educação profissional (SILVA; SILVA; SANTOS, 2005). Uma das características do Profae é a proposta de parcerias para sua execução. No estado de São Paulo várias instituições se compuseram com o Ministério da Saúde para ofertar os cursos, destacando-se os Centros Formadores de Recursos Humanos (Cefor), com várias turmas descentralizadas por todo o estado (BERSUSA et al., 2007). Como é descrito em muitas das conferências e na própria Constituição Federal de 1988, o compromisso com a formação de profissionais técnicos na área da saúde é pertinente às três esferas de poder (municipal, estadual e federal). Nesse sentido, o estado de São Paulo vem assumindo sua parcela de responsabilidade por meio da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), órgão do governo do Estado. Recentemente, projeto desenvolvido pela Fundap, por meio do Decreto Estadual nº. 53.848, de 19/12/2008, com a participação das secretarias da Saúde, Desenvolvimento, Gestão Pública e Educação, vem dando continuidade a esse trabalho de formação técnica para a área da saúde. Trata-se do TecSaúde – Programa de Formação de Profissionais de Nível Técnico para a Área de Saúde no Estado de São Paulo (TECSAUDE, 2010). Com esse projeto, destinado aos profissionais atuantes na área da saúde que buscam complementar sua formação com qualificação profissional, o governo estadual tem como objetivo ampliar o nível de formação dos trabalhadores por meio da formação de profissionais de nível técnico com habilitações para o ingresso no mercado de trabalho, e melhorar a qualidade dos serviços de saúde prestados à população no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) no estado (TECSAUDE, 2010). O TecSaúde tem também, a partir de 2010, a proposta de oferecer cursos de especialização profissional de nível técnico em enfermagem aos profissionais da área que trabalham em hospitais estaduais ou municipais. Os técnicos poderão escolher entre as áreas de Urgência e Emergência, Oncologia, Terapia Renal Substitutiva e Neonatologia de Risco. Esse projeto pretende contribuir para a elevação da qualidade do atendimento de saúde em todo o estado (TECSAUDE, 2010). CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante muitos anos, a saúde não foi considerada uma obrigação do Estado em nosso país. As políticas a esse respeito vão se limitar a campanhas para evitar a disseminação de doenças, e não por um interesse social, mas sim 448 para preservar a qualidade das exportações. Posteriormente, o papel da saúde pública vinculou-se ao objetivo de evitar o adoecimento dos trabalhadores industriais, o que representaria perda de produtividade. A essa política arbitrária e desastrosa de saúde assistiu a sociedade civil, muitas vezes violentamente, como na Revolta da Vacina. O primeiro documento que vincula ao Estado a obrigação de promover a saúde para a população será a Constituição de 1988, que determinará a criação de políticas públicas em educação na área da saúde, a fim de que o próprio sistema de saúde criasse seus recursos humanos de acordo com suas necessidades. O Projeto Larga Escala, embora anterior à 8ª Conferência e tendo abordado a temática da capacitação de profissionais para saúde, não institucionalizou esse compromisso do Estado, muito embora fosse um projeto cujo objetivo era promover tal capacitação, por intermédio da qualificação de nível médio e elementar de pessoal já atuante nos serviços públicos de saúde e que não tiveram oportunidade de profissionalização anterior. Porém, era necessária a regulamentação dessas políticas, que é afirmada e reafirmada nas conferências de saúde. Assim, são políticas bastante recentes e configuram-se um marco dentro do processo histórico evolutivo da saúde pública no Brasil, pelo qual o Estado não é apenas responsável pela saúde, mas também por garantir a qualidade do profissional de saúde. São criados assim projetos como o Programa de Profissionalização dos Trabalhadores da Área da Enfermagem (Profae), em 1999, cujo objetivo era profissionalização dos trabalhadores da área da saúde de nível médio, especificamente os auxiliares e técnicos de enfermagem, e o TecSaúde, em 2008, com o objetivo de ampliar o nível de formação dos trabalhadores e melhorar a qualidade dos serviços de saúde prestados no SUS no Estado. A criação dessas políticas, portanto, é a nível federal, já que estão associadas à Constituição Federal, que impera sobre toda a nação. Entretanto, de acordo com uns dos princípios do próprio SUS, ou seja, a regionalização e descentralização, deve-se privilegiar a municipalização das ações, uma vez que é a esfera mais próxima do usuário. Dessa forma, os recursos devem passar por todas as esferas até atingir o local específico onde será aplicado. As três esferas de poder, portanto, têm papéis definidos nesse processo. A esfera federal capta os recursos a serem repassados para as esferas estaduais, que, por sua vez, agregam mais recursos e orientam sua distribuição para as esferas municipais dentro de suas fronteiras. E essas, por fim, aplicam os recursos diretamente. Assim, é fundamental que as três esferas estejam em harmônica interação, de modo que haja recursos suficientes para a saúde, os 449 mesmos cheguem ao seu destino e, chegando, sejam devidamente aplicados. Mas isso ocorre realmente de maneira justa e adequada? A sociedade brasileira é bem heterogênea e em muitos municípios falta ao gestor público a responsabilidade pela saúde da comunidade, ao mesmo tempo em que a população desconhece certos direitos ou não luta por eles. Assim, quando os recursos chegam aos municípios, onde deverão ser aplicados, ficam à mercê da capacidade local de geri-los com competência e bem direcioná-los. É bem divulgada na mídia e conhecida dos brasileiros a tradição de se transferir recursos de áreas sociais e da saúde para outros setores, atendendo a interesses eleitorais. Muitas vezes, é visível que os gestores municipais não criam condições para a instalação e a aplicação das políticas públicas de capacitação e qualificação na área da saúde, que possibilitem ao profissional de saúde delas participar, seja pela má divulgação desses projetos entre os profissionais da área, que muitas vezes os desconhecem, seja pela má vontade em, por exemplo, fornecer um veículo para transportar alunos de locais mais afastados, por não considerar que seja isso uma obrigação. Perante essas questões emerge a participação popular como direito e como estratégia de reivindicação de recursos para a formação de profissionais e a fiscalização da aplicação dos mesmos, exercendo assim o controle social previsto na criação do SUS. Os dados apresentados por nós, porém, mostram que o envolvimento dos municípios com a formação de pessoal técnico na área da saúde é muito reduzido, concentrando-se os esforços nas esferas estaduais e federais. Agora, depois da Constituição, das leis orgânicas e conferências de saúde, que regulamentaram a criação de um sistema que formasse os próprios profissionais, a maior dificuldade é garantir que os recursos sejam aplicados e que a formação dos profissionais seja mantida. É por essa consolidação que os profissionais da área e os usuários devem lutar hoje. O docente de curso técnico tem a responsabilidade de mostrar essa realidade aos seus alunos, evidenciando os pontos que permanecem críticos na saúde do país e as lutas que já foram conduzidas para se atingir às conquistas asseguradas na Constituição Federal de 1988, para que, além de dimensionarem todos os direitos e garantias adquiridas, possam valorizá-las. 450 REFERÊNCIAS ALMEIDA, E. S. 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Acesso em: 5 ago. 2010. 453 454 PRAZER E SOFRIMENTO NO TRABALHO: VIVÊNCIAS E PERCEPÇÕES DE ALUNOSTRABALHADORES DO SUS Márcia Heloisa Correa Zuin Ferreira1 Antonio Carlos Caetano1 Lúcia Marinilza Beccaria2 Nádia Antonia A. Poletti2 Claudia Bernardi Cesarino2 Vânia Zaqueu Brandão2 RESUMO O estudo teve como objetivo analisar a percepção dos alunostrabalhadores matriculados no TecSaúde – PROFESP (2009-2010), da Classe Descentralizada de Mirandópolis-SP, buscando compreender o sentido conferido ao trabalho no Sistema Único de Saúde, melhores e piores vivências em relação às condições gerais de trabalho e ao relacionamento com a equipe e usuários. A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário estruturado composto de questões fechadas de múltipla escolha e descritivas. Participaram 22 alunos-trabalhadores da Classe Descentralizada de Mirandópolis, ligada ao CEFOR (Centro de Formação) de Assis, dentro do Programa TecSaúde, no período de fevereiro e março de 2010. Foi adotada a análise de conteúdo de Bardin (1979), a fim de buscar elementos para a compreensão das falas originadas da vida prática, com o propósito de resgatar as melhores e piores vivências dos alunos-trabalhadores no âmbito do Sistema Único de Saúde. Os resultados mostraram que os alunos encontram-se inseridos na realidade social de sua comunidade e receptivos às novas propostas de ensino-aprendizagem, colocando em pauta a vivência de sua prática social cotidiana. Houve congruências com as perspectivas e anseios de mudanças do Sistema Único de Saúde, apontando lacunas existentes no sistema e no atendimento humanizado, como o princípio da equidade e da integralidade. Conclui-se que os alunos-trabalhadores vivenciam prazer e sofrimento no 1. Enfermeiros - alunos do I Curso de Formação Docente em Educação Profissional Técnica em Saúde – Niad de São José do Rio Preto. 2. Professoras Adjuntas da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto – FAMERP e Tutoras do Niad de São José do Rio Preto. 455 desempenho de suas atribuições. Assim, o presente estudo contribuiu para uma reflexão sobre as percepções e vivências relacionadas às atividades dos alunos na área de Enfermagem e no Sistema Único de Saúde. Descritores: Prazer. Sofrimento. Alunos. Trabalhadores. Enfermagem. INTRODUÇÃO No Brasil, a produção de Saúde Pública vem exigindo reflexão e ações permanentes, desde a VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, vista como um marco político e histórico na construção de outros modos de fazer Saúde no Brasil. Para Guazina (2008), a construção de um Sistema Único de Saúde (SUS), nasceu pela desacomodação de diversos atores sociais, que se organizaram em múltiplos espaços para problematizar os modos de cuidado da Saúde no Brasil, como uma forma de inquietação diante da visão da saúde como mercadoria, inserida numa lógica do regime ditatorial que priorizava em suas ações uma Saúde privatizada, deslocando o olhar das questões coletivas para os modos de cuidar privado. Desde que o Sistema Único de Saúde foi institucionalizado em 1988, o mesmo vem passando por transformações radicais que modificaram substancialmente o pensar e o fazer em Saúde. Segundo Taíra et al. (2007), quatro questões têm sido colocadas como fundamentais para a sua implementação: a descentralização, o financiamento, o controle social e os recursos humanos. A mais complexa destas questões é, sem dúvida, a de recursos humanos, que vem apresentando maior resistência à mudança, dentro da política de reforma do estado no País. Assim, depois de quase duas décadas da criação do Sistema Único de Saúde, ainda convém perguntar se os alunos-trabalhadores da área da Saúde sabem o que ele significa, se conhecem a forma como se apresenta a questão dos recursos humanos, frente aqueles que cotidianamente fazem do SUS o seu lugar de prática. A formação profissional dos trabalhadores de nível técnico em Enfermagem tem sido objeto de iniciativas assumidas pelo Estado. Dentre as várias experiências implantadas em nível nacional, vamos nos ater à trajetória do PROFAE (2000), ao TecSaúde – Profesp (2009). Em 15 de outubro de 1999 publica-se a portaria 1262/GM, do Ministério da Saúde, instituindo o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE, 2000 - 2007), buscando qualidade na atenção à saúde, na formação dos 456 recursos humanos do Sistema Único de Saúde, em sintonia com os princípios e as diretrizes assegurados constitucionalmente (BRASIL, 2008). O trabalho em Saúde é complexo e exige reflexão, ou seja, que as decisões sejam tomadas de modo articulado pelos vários saberes profissionais, pautados em diferentes conhecimentos, que devem ser mediados pela dimensão ética, humanitária e política (BOMFIM et al., 2009). Segundo Dejours (2001), trabalhar não é apenas exercer atividades produtivas, mas também conviver. Medeiros et al. (2006) complementam que na organização do trabalho deve haver preocupação com a eficácia técnica, mas também incorporar argumentos relativos à convivência, ao viver em comum, às regras de sociabilidade, ou seja, ao mundo social do trabalho, bem como argumentos relativos à proteção do ego e à realização do ego, ou seja, à saúde e ao mundo subjetivo. Glanzner (2008) enfatiza que a atividade profissional é muito importante para o ser humano, pois culturalmente é uma forma de inserção social, de status, de interação entre indivíduo, cultura e sociedade. Pode-se levar ao prazer, ao crescimento profissional e à satisfação do trabalhador, como também pode gerar sofrimento e levar o indivíduo ao adoecimento psíquico. Corroborando com essa idéia, Dejours (2001) destaca que o trabalho desempenha papel central na vida humana. Segundo Ferreira e Mendes (2001) o prazer é uma vivência individual ou compartilhada por uma equipe de profissionais, porém, com experiências gratificantes advindas da satisfação dos desejos e das necessidades do trabalhador. O prazer é realmente o oposto ao sofrimento e tem sua origem no bem que o trabalho faz ao corpo, à mente e às relações entre as pessoas. Sendo assim, suas principais causas encontram-se nas dimensões da organização, constituindo-se um dos antecedentes de bem-estar no trabalho sob a forma de uma avaliação consciente de que algo vai bem e também um indicador de saúde. O prazer se manifesta por meio da gratificação, da realização, da liberdade e da valorização do trabalho (COUTO, 2008). Dejours, Abdoucheli e Jaye (2007) relatam que o trabalho nunca é neutro, sempre proporciona uma experiência com o real, na qual o sujeito se depara com o inesperado, o que o coloca diante de uma experiência afetiva, inicialmente de sofrimento. Pode ser transformado em prazer através da mobilização dos recursos subjetivos, quando o sujeito consegue negociar as regras da organização de trabalho, ultrapassar os obstáculos e realizar a sua tarefa, conquistando o prazer. Por outro lado, se o sujeito não consegue resolver os problemas, permanece a experiência de sofrimento (MORAES; CAVALCANTE, 2009). 457 Alguns estudos demonstraram que o trabalho de enfermagem, devido a sua dinamicidade e complexidade, gera duplos sentimentos: satisfação (prazer) e insatisfação (sofrimento). Essa dicotomia faz com que os alunostrabalhadores vivenciem uma dualidade constante entre o prazer e sofrimento (FERREIRA; MENDES, 2001; MEDEIROS et al., 2006; COUTO, 2008; LOPES, 2009). Ao discorrer sobre as condições materiais no trabalho, nas tarefas ditas de execução, o trabalhador se vê de algum modo impedido de fazer corretamente o seu trabalho, constrangido por métodos e regulamentos incompatíveis entre si (DEJOURS, 1992). Essa precariedade das condições de trabalho, somadas à dificuldade de convivência com os colegas de profissão, acarretam prejuízos na vida cotidiana privada desse trabalhador (MEDEIROS et al., 2006). Couto (2008), ao discorrer sobre o profissional técnico de Enfermagem, reconhece o seu trabalho como árduo, devido aos cuidados realizados no paciente; invariavelmente, esse trabalho consiste no cumprimento de escalas rotineiras sobre a supervisão do enfermeiro, o que tolhe a criatividade e a capacidade laborativa frente às situações, levando ao sofrimento. Os trabalhadores dos serviços públicos, inseridos em um contexto socioeconômico neoliberal, vêm paulatinamente sofrendo as consequências da redução do seu poder aquisitivo (MEDEIROS et al., 2006). Embora se constate a existência de multiemprego é importante ressaltar os efeitos da acumulação de escalas de serviço e o consequente aumento da jornada de trabalho. Esse enfoque corresponde a um olhar sobre o sofrimento no mundo do trabalho atual (MEDEIROS et al., 2006). Essa dupla oportunidade de vivências oportuniza aos trabalhadores a construção de estratégias defensivas, que são mecanismos, muitas vezes inconscientes, individuais ou coletivos, de negação ou de racionalização do sofrimento, causados por contradições e conflitos vivenciados no ambiente de trabalho (COUTO, 2008). Para Oliveira e Ciampone (2006) a fragmentação presente nos processos de trabalho esgarça as relações entre os diferentes profissionais da Saúde e entre esses e os usuários; influenciados também pelo trabalho em equipe, bem como pelo preparo e a disposição pessoal dos profissionais para lidarem com a dimensão subjetiva, presente nas práticas de atenção em saúde, reafirmando ainda que tem deixado a desejar. A subjetividade é mobilizada no ambiente de trabalho, sendo que o processo de trabalho é o canal em que os trabalhadores expressam e buscam concretizar seus desejos, vontades e possibilidades, dando sentido e significado, não só para o labor, mas também para a vida do sujeito. Nessa perspectiva, é impossível separar o trabalho 458 da produção de subjetividades e o modo de trabalhar dos modos de sentir (MANCEBO, 2007). Diante do exposto, este estudo objetivou conhecer as vivências e percepções dos alunos-trabalhadores, com enfoque na satisfação e/ou insatisfação, levando ao prazer e/ou sofrimento no trabalho, contextualizando assim, seus nexos, para compreender o pensar, o sentir e o agir que norteiam estes discentes na construção cotidiana da sua prática no Sistema Único de Saúde. OBJETIVO GERAL Analisar a percepção dos alunos-trabalhadores matriculados no TecSaúde – PROFESP (2009-2010), na Classe Descentralizada de MirandópolisSP, buscando compreender o sentido conferido ao trabalho no Sistema Único de Saúde, considerando as melhores e piores vivências em relação às condições gerais de trabalho e ao relacionamento com a equipe e usuários. Objetivos Específicos Verificar a percepção dos alunos-trabalhadores do TecSaúde – PROFESP (2009-2010), da Classe Descentralizada de Mirandópolis-SP, sobre a sua atuação como profissional de Saúde. Identificar o prazer e o sofrimento dos alunos-trabalhadores do TecSaúde – PROFESP (2009-2010), da Classe Descentralizada de MirandópolisSP, em relação às condições gerais do trabalho. Analisar as vivências dos alunos-trabalhadores em relação à equipe de Saúde e aos usuários do Sistema Único de Saúde. METODOLOGIA A base metodológica que fundamentou este estudo sobre o prazer e o sofrimento na formação dos futuros técnicos de enfermagem foi a pesquisa qualitativa, pois a mesma permite o acesso à intersubjetividade, presente no propósito de revelar a percepção que o aluno tem em relação ao que é trabalhar no SUS. Para Minayo (2006) “o objeto das Ciências Sociais é essencialmente qualitativo”. O objeto desta pesquisa considera a natureza qualitativa da experiência humana, expressa aqui pela fala dos entrevistados, por meio dos produtos das interpretações que fazem a respeito de como vivem, constroem 459 seus artefatos e a si mesmos, sentem e pensam. Isso significa “considerar o sujeito de estudo (como) gente, em determinada condição social, pertencente a determinado grupo social ou classe, com suas percepções, opiniões, valores, crenças e significados. Vale também considerar que o objeto das ciências sociais é complexo, contraditório, inacabado e em permanente transformação”. Este estudo foi realizado com alunos-trabalhadores do Curso de Complementação da Qualificação Profissional Auxiliar de Enfermagem para Técnico de Enfermagem, da Classe Descentralizada de Mirandópolis, ligada ao CEFOR (Centro de Formação) de Assis, dentro do Programa TecSaúde, oriundos das cidades de Andradina, Castilho, Guaraçaí, Mirandópolis, Murutinga do Sul e Pereira Barreto. Dele participaram vinte e dois alunostrabalhadores, que exercem a profissão de auxiliar, considerando a seguinte situação: dezenove atuam diretamente na área de Enfermagem e três indiretamente (asilo, consultório particular e APAE), a análise se deu durante os meses de fevereiro e março de 2010. Primeiramente foram explicados os objetivos da pesquisa, sobre a sua participação voluntária, a preservação da identidade e como preencher o questionário. O instrumento de coleta de dados foi elaborado em parceria com os docentes da Classe Descentralizada de Mirandópolis (CEFOR-Assis) e da Classe Descentralizada de Bebedouro, ligada ao Centro de Formação de Araraquara. Vale ressaltar que algumas das principais vantagens de um questionário é o fato de que ele consegue atingir várias pessoas ao mesmo tempo, obtendo um grande número de dados, também se percebe uma maior liberdade das respostas, em razão do anonimato, evitando vieses potenciais do entrevistador (BONI; QUARESMA, 2005). O instrumento de coleta de dados foi um questionário estruturado, composto de nove questões descritivas, que tiveram seu preenchimento individual pelos alunos-trabalhadores, com o intuito de favorecer ao entrevistado a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto, sem direcionar repostas ou condições pré-fixadas pelo docente-pesquisador, como um meio de alcançar, tanto conteúdos voltados ao posicionamento próprio quanto às percepções e vivências, como alunos trabalhadores no âmbito do Sistema Único de Saúde. Nesse estudo foi utilizada a parte descritiva do questionário, referente às questões sobre o “Prazer e o sofrimento no trabalho: vivências e percepções de alunos-trabalhadores do SUS”, com questionamentos sobre a percepção da sua atuação como profissional do SUS; o nível de satisfação e afinidades que tem com a profissão escolhida; o prazer e sofrimento como trabalhador da rede e o 460 prazer e sofrimento, com relação ao serviço prestado no seu local de trabalho. Foi adotada a análise de conteúdo, especificamente a temática, a fim de buscar elementos para a compreensão das falas originadas da vida prática (BARDIN, 1979), de acordo com os seguintes procedimentos: • Leitura e releitura dos questionários para o processo de tabulação; • Mapeamento das falas dos alunos trabalhadores, realizada com a exploração do material até atingir um “senso comum”, recortando os dados definidos, a partir da leitura dos questionários respondidos por escrito pelos alunos-trabalhadores e dos objetivos da pesquisa (destacando-se as palavras e frases significativas); • Análise da dinâmica das falas (síntese das falas, baseada nas palavras e/ou frases significativas interpretadas pelo pesquisador), compondo o quadro de análise das categorias e subcategorias. Essa estratégia (mais do que um simples recurso de ilustração) foi empregada com o propósito de resgatar as melhores e piores vivências dos alunos-trabalhadores, no âmbito do SUS. RESULTADOS E DISCUSSÃO As falas apresentadas a seguir revelam a realidade sofrida e/ou prazerosa, conflituosa e contraditória, comumente encontrada no mundo do trabalho na área da Saúde. Procurou-se confrontar os dados com a literatura e detectar suas congruências e/ou convergências, isto é, uma aproximação dos conhecimentos do universo de senso comum, ou possíveis realidades diferentes. A análise dos dados permitiu a definição de quatro categorias: percepção do aluno-trabalhador na sua atuação como profissional do SUS; nível de satisfação e afinidades que você tem com a profissão escolhida; o prazer do aluno-trabalhador e o sofrimento do aluno-trabalhador. do SUS Percepção do aluno-trabalhador na sua atuação como profissional Nesta categoria, encontraram-se duas subcategorias): Satisfazer usuário SUS e melhorar atuação profissional. Do total de vinte e dois alunos, doze responderam a essa categoria, levando em conta que seis não atuam no SUS e quatro não responderam. Acredita-se que não compreenderam o enunciado. Uma das desvantagens 461 do questionário é o fato de que algumas perguntas ficam sem respostas, pela dificuldade de compreensão por parte do aluno-trabalhador (BONI; QUARESMA, 2005). Satisfazer usuário SUS O trabalho, como atividade humana, não pode ser reduzido a um processo alienante, onde o trabalhador se limita a cumprir normas e prescrições, ele compreende a subjetividade de cada sujeito e pode ser fonte de sofrimento para uns e de prazer para outros (ALMEIDA; PIRES, 2007). Entende-se o trabalho como um valor social que dignifica as pessoas, sendo necessário e fundamental para o ser humano e, como tal, deve ser prioritariamente, causa de satisfação (MARTINS, ROBAZZI; PLATH, 2007). No que diz respeito ao item ”satisfazer usuário”, a maioria está consciente de que apesar das dificuldades cotidianas (“regras e normas”): da forte divisão do trabalho, dos problemas de gestão, da falta de interesse de alguns profissionais envolvidos e da divisão de tarefas com profissionais desprovidos de formação com base social; ainda assim, mesmo com todas essas situações apontadas, os alunos-trabalhadores sinalizaram positivamente que estão eticamente comprometidos com a vida humana, apontando para uma outra forma de atender o usuário com direito ao SUS, mas também notase que há certa tendência à frustração, misturada a uma tentativa de “fazer o possível para caminhar no rumo certo”, sentimento observado nas falas a seguir: “Atuo como profissional, dando o melhor de mim para satisfazer o cliente; [...] É difícil agradar todo mundo, apesar de não ter tido nenhum problema com paciente; [...] Dentro do próprio sistema que é imposto, regras e normas não é possível agradar totalmente o usuário; [...] Não tenho dificuldades com os pacientes da rede SUS, a maioria está satisfeita.” No trabalho de Enfermagem, apesar de ser considerado desgastante, há um gosto especial, que reside na execução das atividades assistenciais. O trabalho se apresenta como mediador de realização pessoal e profissional, em decorrência da possibilidade de serem executados procedimentos e cuidados diretos ao paciente, ou seja, o fato de poder realizar o trabalho e poder contemplar seus resultados, tal como se percebe pelas falas. Em que o alunotrabalhador denota dar o melhor de si, na tentativa de satisfazer o usuário do Sistema Único de Saúde (DAL BEM et al., 2004). Lunardi Filho (1997) relata que relações de trabalho percebidas como 462 relações de poder, e não somente como relações de produção, produzem e constroem, põem em prática uma anatomia política: a disciplina. Sendo assim, processa-se um trabalho sobre o corpo e a alma do trabalhador, para que ele não apenas realize e execute o que se quer, mas para que o faça “como” se quer, conforme as normas, técnicas e as determinações, emanadas da organização do trabalho, estabelecendo-se com isso, congruência entre o autor e a fala sobre as regras e normas impostas pelo sistema. Esse estudo demonstrou congruência com os autores citados acima. Apesar da maioria dos alunos-trabalhadores estarem satisfeitos, há que se destacar ainda a necessidade de um repensar junto a essa equipe, uma vez que há sujeitos que sentem que é difícil agradar a todo mundo e que pelas regras e normas não é possível agradar totalmente o usuário. Isto denota que há certo grau de insatisfação entre os trabalhadores e/ou usuários, fator que deve receber uma atenção especial a fim de evitar o desencadeamento maior da insatisfação. Melhorar atuação profissional Percebe-se através dos relatos que o valor atribuído à atuação profissional está ligado ao cuidado prestado, resultando em melhorias aos usuários (pacientes ou comunidade), pois os alunos-trabalhadores denotam expectativas em melhorar a qualidade do serviço prestado no Sistema Único de Saúde; também se mostram receptivos às mudanças com o ensinoaprendizagem do curso técnico de Enfermagem, direcionando-se assim para os docentes pesquisadores. De outra feita, esta população alvo busca estratégias, coletivamente, que contribuam para a realização das mudanças, dentro do tão complexo contexto de implementação do SUS, de modo que ele se mostre eficaz em toda a sua dimensão política, social, econômica e humanística. Em relação a esse contexto, os alunos destacaram algumas justificativas: “Boa e espero melhorar mais; [...] Melhor atendimento à população; [...] Satisfatória, apesar de que pode melhorar.” Pode-se depreender dessas falas o fato de que o aluno-trabalhador vê: de um lado, a presença do educador, como representante de saber reconhecido e valorizado pela sociedade e, de outro, o usuário, uma vez que se coloca no lugar daqueles que não têm esse saber e que vivem a história secular de não achar lugar para o saber que lhe é próprio, tal atitude é posta em xeque por uma relação contraditória, que estabelece uma intersubjetividade desigual a 463 priori. O fato de o educador ser o elo que decifra o mundo com os educandos, implica a necessidade de se trabalhar a importância da troca de saberes, visando à modificação neste pensamento da assimetria do saber, por parte do aluno trabalhador (COSTA, 2005). “Sei que não posso esperar muito devido ao meu estudo, mas espero melhorar, e muito, com o curso.” Percebe-se também um anseio em melhorar a atuação profissional, uma vez que, para a área de Saúde, no que se refere à tecnologia do processo de trabalho, o saber e a técnica dos trabalhadores são tão ou mais indispensáveis do que os materiais e equipamentos. Assim, de um lado, é possível perceber que as alterações tecnológicas ocorridas no trabalho em Saúde implicam um processo mais coletivo, na medida em que as tarefas de um grupo profissional dependem de outro, no entanto, por outro lado, percebe-se como consequência uma concentração das atividades reflexivas e de maior autonomia em apenas alguns grupos profissionais, permanecendo uma proporção cada vez maior de trabalhadores com atividades meramente rotineiras e padronizadas (PITTA, 1990 apud SIQUEIRA; WATANABE; VENTOLA, 1995). É necessário o estabelecimento de uma política nacional de formação e desenvolvimento em educação profissional, adequando o perfil dos profissionais ao contexto do Sistema Único de Saúde, através de uma educação permanente voltada para a saúde coletiva. Este tema é bem mais que um debate sobre questões profissionais (carreira, cargos, salários, função, jornada de trabalho, formação técnica, etc.), é um debate que está intimamente associado ao desejo de efetivação concreta dos princípios do SUS, como também da regulamentação trabalhista desta nova categoria profissional (THEISEN, 2004). Nível de satisfação e afinidades que você tem com a profissão escolhida. Foi dividida em duas subcategorias: Satisfação com o trabalho não material (“de cuidar”) e insatisfação no trabalho material (capitalista). Do total de vinte e dois alunos-trabalhadores: dezenove exercem a profissão na área de Enfermagem. Sendo que três não foram considerados (dois por não exercerem a profissão de Auxiliar de Enfermagem e um por não responder à questão). Não houve insatisfação declarada, apesar de um discente não responder esta questão. 464 Satisfação com o trabalho não material (“de cuidar”) As relações humanas constituem a base do trabalho do profissional de saúde, uma vez que não há possibilidade de dissociar o fisiológico do psicológico (SOUZA; SILVA; SALEH, 2005). Para lidar com tanto sofrimento, o trabalhador de Enfermagem tem que aprender a utilizar estratégias defensivas, controlando e negando seus sentimentos, distanciando-se do paciente. No entanto, muitos deles não conseguem e acabam se colocando no lugar do outro, sofrendo junto com ele. O prazer que o trabalho poderia proporcionar ao Auxiliar de Enfermagem seria a sensação de poder ajudar a salvar vidas (já que o poder de salvar é do médico), ajudar a curar pessoas, oferecendo saúde e bem-estar. Se por um lado este “poder” acarreta uma enorme responsabilidade para o trabalhador, já que qualquer erro pode ser fatal, por outro lado ele lhe confere a sensação de ser alguém especial, dotado de um dom divino (SIQUEIRA; WATANABE; VENTOLA, 1995). Percebe-se através dos relatos que a satisfação com o trabalho não material (“de cuidar”) está associada às propostas e práticas de humanização. Dentre os sentidos destacados, encontraram-se aqueles que designam humanização, tais como: o de tratar com respeito e carinho, amor, empatia, a capacidade de colocar-se no lugar do outro, o acolhimento, a aceitação do outro, o diálogo, a tolerância, a prática de tratar do outro com respeito e educação, aceitar as diferenças, resgatar a dimensão humana nas práticas de Saúde. Outros sentidos também aparecem, tais como: o acolhimento, a inclusão, a não-discriminação e valorização do trabalhador. Faz-se presente aqui à humanização, como atitude ética e humanitária. Entendem-se também as relações interpessoais associadas à qualidade do cuidado, incluindo a valorização dos trabalhadores. “Meu nível de satisfação é bom, tenho muita afinidade com a profissão que escolhi, gosto de cuidar das pessoas, fazer o melhor que posso, sou atenciosa, dedicada no que faço; [...] ótima gosto de trabalhar na área da saúde e com a sociedade; [...] bom relacionar com pessoas e poder ajudá-las; [...] afinidade é que gosto mesmo de estar entre eles de uma maneira ou de outra, sou feliz graças a Deus; [...] ótima, pois me identifico com o que faço me realizo podendo ajudar o próximo; [...] satisfação boa, facilidade de comunicação, facilidade em sempre me colocar no lugar do outro, principalmente em caso de doença; [...] ótimo, adoro conversar com as pessoas, dar atenção às pessoas idosas, porque eles são muito carentes, e a maioria das pessoas não tem paciência com os idosos; [...] ótimo, quando consigo realizar meu trabalho, 465 dentro do possível, fazer com que o paciente sinta-se satisfeito com o meu atendimento profissional.” Insatisfação no trabalho material (capitalista) A força de trabalho em Saúde no sistema capitalista percebeu que a mulher exerce atividades múltiplas no campo doméstico e passou a apoderarse deste, utilizando e explorando intensamente a polivalência e multiatividade do trabalho feminino, valendo-se também da experiência que as mulheres trazem das suas atividades realizadas no reduto doméstico para o mercado de trabalho (THEISEN, 2004). Importante ressaltar que a população alvo estudada é predominantemente formada pelo sexo feminino (95,45%). Fazse presença marcante nesta subcategoria, considerar o dualismo entre a vida pessoal / profissional e a força do trabalho capital do mundo contemporâneo. (MEDEIROS et al., 2006; MARTINS; ROBAZZI; PLATH, 2007; THEISEN, 2004; LOPES, 2009). “Estou muito satisfeita, a única coisa que me incomoda é a carga horária (acho muita).” Pode-se deduzir com a referência: “acho muita“, a contextualização de uma abordagem indireta do “pensar e sentir” das mulheres no mercado de trabalho. As mulheres convivem com conflitos pelo sentimento de culpa em relação à família, pela falta de tempo de dedicar-se, de acompanhar o desenvolvimento e estudos dos filhos; pelo sentimento de vazio e fragilização dos laços afetivos com familiares; pela dúvida quanto ao certo e errado do ponto de vista dos seus próprios valores, na relação entre ser e ter, na sociedade atual (MARTINS; ROBAZZI; PLATH, 2007; MEDEIROS et al., 2006; OLIVEIRA; CIAMPONE, 2006; COUTO, 2008; LOPES, 2009). O trabalho abarca um significado maior do que o ato de trabalhar ou de vender a sua força de trabalho em busca de remuneração. Fica aqui explícito o fato de que a remuneração social pelo trabalho (ato de cuidar), em favor dos usuários/comunidade, com certos direitos sociais, aliados ao reconhecimento e a realização profissional garante a satisfação, porém, nunca colocando em segundo plano a força de trabalho capital (MEDEIROS et al., 2006). “Mas sabemos que nosso salário está defasado, caminham lado a lado; [...] satisfação é boa, mas sabemos que nosso salário está defasado.” 466 O prazer do aluno-trabalhador Nesta categoria emergiram duas subcategorias: atendimento humanizado e Autorrealização profissional e valorização do emprego. Do total de vinte e dois alunos-trabalhadores, todos responderam à categoria: o prazer do aluno-trabalhador. Apesar de seis não trabalharem direta ou indiretamente no SUS, desse total, cinco atuam na área da Saúde e somente um não é da área (funcionário público), mas todos exercem um trabalho. Atendimento humanizado De acordo com as respostas, constatou-se que o tema “atendimento humanizado” mostrou-se presente, fazendo emergir os vários sentidos da palavra humanização, são eles: o Ético – “dentro da minha responsabilidade”; o Humanitário – “trabalho com amor e dedicação aos usuários”; o Social – “servir a minha comunidade”; o Político – “se estiver ao meu alcance.” No tocante à humanização do SUS, está implícito o trabalho ético e humanitário vivenciado pelo aluno-trabalhador e a sua preocupação/ envolvimento com o sujeito/coletivo, com as suas expectativas aqui demonstradas na busca pela melhoria da qualidade no atendimento, sem com isto adotar uma postura inocente, de que somente “ser bonzinho” com o usuário pode resolver a luta, que sempre se faz contínua para um atendimento eficaz. Nas falas é subjetivamente evidenciado o comprometimento com a Política de Humanização da Assistência à Saúde (PHAS). Identificou-se a presença dos princípios da universalidade do acesso, da integralidade na assistência às demandas e necessidades de saúde da população, além da equidade da atenção à saúde, embasando o desafio de possibilitar uma prática de Saúde, em que o aluno-trabalhador enxergue o usuário na sua totalidade, e não apenas como um corpo ou uma fragmentação, mas como um indivíduo, que participe ativamente no seu processo de saúdedoença (SOUZA; SILVA; SALEH, 2005). Percebeu-se também a tentativa de integração entre profissionais, usuários e gestores no Sistema Único de Saúde: “Prazer em poder aliviar o sofrimento das pessoas; [...] atender o usuário no máximo em que puder e estiver ao meu alcance; [...] realizar meu trabalho com amor; [...] bom, realizo meu trabalho com amor e dedicação aos usuários; [...] servir a minha comunidade; [...] atender a população carente; [...] prazer quando o paciente é bem atendido; [...] estar em contato com a sociedade, e fazer algo por eles, dentro da minha responsabilidade mesmo que seja o mínimo; [...] prazer em praticar o bem, dar o máximo; [...] gratidão 467 de fazer tudo pelo paciente, ver a melhora do paciente; [...] prazer em ajudar o próximo; [...] ver os casos dos pacientes solucionados; [...] poder prestar melhor atendimento possível aos pacientes; [...] prazer em poder aliviar o sofrimento das pessoas; [...] atender o usuário no máximo em que puder e estiver ao meu alcance.” Autorrealização profissional e valorização do emprego A valorização do trabalho de Enfermagem é reconhecida pelas demonstrações de gratidão, pelos comentários positivos, acerca do trabalho realizado e pelo reconhecimento geral, gerando sentimentos de profundo prazer (satisfação). O sentimento do dever cumprido, após a realização do plantão exaustivo, apesar de um dia de excessivo trabalho, também se constitui em fonte de prazer no trabalho (LUNARDI FILHO, 1997). O que aparece no relato: “prazer por ser gratificante, gosto muito do que faço.” Os resultados comentados a seguir pelo aluno-trabalhador podem ser creditados ao dualismo conflitante (prazer/sofrimento), das especificidades do trabalho na área da Saúde, aqui presente subjetivamente pelo prazer (lado positivo) da valorização do “ser humano”: “Sinto-me bem com o trabalho que faço, da valorização vivida como ‘‘ser social’’; [...] prazer por ser gratificante, da autorrealização profissional; [...] prazer em estar atuando e da valorização por ter um emprego; [...] prazer em estar trabalhando; [...] prazer em estar atuando, mesmo que ainda não como Auxiliar de Enfermagem.” O sofrimento do aluno-trabalhador Nesta categoria surgiram três subcategorias: morosidade e descrença na qualidade do atendimento SUS; impotência diante da fragilidade da vida humana e precarização das condições de trabalho. Morosidade e descrença na qualidade do atendimento SUS A descrença em relação ao SUS aparece aqui, representada pela fala: “em ver alguns pacientes que não conseguem resolver seus problemas, mas por força de vontade de quem eles dependem”; ou ainda, “SUS é SUS e particular é particular”; o que denota uma extrema insatisfação e desconfiança com a qualidade do serviço produzido. Além disso, fortalece mitos preconceituosos como a ineficiência no sistema de Saúde e a opção para quem não pode pagar tratamento particular, isto certamente contribui para desqualificação do sistema (PAIM, 2007; AROUCA, 2003). 468 Segundo Arouca (2003) “o modelo assistencial é anti-SUS”, esta lógica transformou o governo num grande comprador e todas as outras instituições em produtores. A Saúde virou um mercado com produtores, compradores e planilhas de custos. O modelo assistencialista acabou universalizando a privatização e o aluno-trabalhador tem a visão do serviço privatizado como a solução, encampando o descrédito em relação ao SUS. Apesar de os alunostrabalhadores reconhecerem a saúde como direito do cidadão e afirmarem, em sua maioria, que estão satisfeitos, quando os usuários conseguem resolutividade no atendimento, os mesmos alegam não confiar na qualidade do atendimento do sistema SUS. Percebe-se uma dissonância entre o ideal da teoria e a sua aplicabilidade na prática. No cenário real, os alunos-trabalhadores percebem as necessidades de saúde das pessoas, famílias e comunidade, além de sua participação e falhas no processo de trabalho da equipe e da rede SUS. Neste contexto, problematizam as necessidades de saúde da pessoa/família, detectam o problema de saúde, apresentam uma visão crítica-reflexiva, pela presença do modelo de sistema médico hegemônico (hospitalar e medicalizante); percebe-se também um anseio, mesmo que subjetivamente, pela necessidade em se avançar na efetivação da integralidade e equidade para diminuir esta falta de efetividade dos serviços de Saúde, estas possibilidades implicam em desafios na práxis docente (AROUCA, 2003; PAIM, 2007; MARIN et al., 2009). Apreende-se das falas a seguir, que talvez a visão pessimista em relação ao funcionamento, seja motivada pelo conhecimento e pela prática inseridos no contexto do trabalho. Ou seja, os alunos-trabalhadores têm uma visão mais crítica em relação ao desempenho do Sistema Único de Saúde, provavelmente, por conhecerem as reais condições e as dificuldades para realizarem seu trabalho (PAIM, 2007). “Mas em parte, pelo atendimento das especialidades a serem atendidas, quanto a demora para o paciente ser avaliado pelas especialidades; [...] não pode haver demora: a demora “morre” [...] sofrimento pela demora em agendamentos de consultas e exames que deixa o usuário irritado e mais doente [...] sofrimento devido à demora ou agendamentos (através de UBS ou lista de espera) [...] às vezes ver que a fila de espera do SUS para atendimento é longa [...] em ver alguns pacientes que não conseguem resolver seus problemas, mas por força de vontade de quem eles dependem. SUS é SUS e particular é particular [...] sofrimento em não poder fazer algo que poderia ser feito, mas não está em meu alcance [...] sofrimento, quando o paciente sai insatisfeito, não podendo fazer todos os exames necessários [...] sofrimento de ver o paciente ser mal atendido.” 469 Impotência diante da fragilidade da vida humana O tipo de atividade desenvolvida pelos alunos-trabalhadores de Enfermagem, por si só, já traz um componente de sobrecarga, pois os mesmos lidam com a vida e a morte (MARTINS; ROBAZZI; PLATH, 2007). As situações e relações vivenciadas no cotidiano geram tanto prazer e satisfação, quanto sofrimento e desgaste. O prazer está presente sempre que o tratamento do paciente é bem-sucedido. Durante a assistência ao paciente em processo de morrer, o profissional de enfermagem sofre muito, pois se sente impotente, inconformado com a presença da morte, e também despreparado, emocional e psicologicamente (LIMA JUNIOR; ESTHER, 2001; GUTIERREZ; CIAMPONE, 2006). Nesse sentido, a fala de dois dos participantes é expressiva: “O sofrimento é quando não posso fazer mais nada para salvar a vida do próximo, sofrimento em não poder ajudar mais; [...] quando não tem mais solução para a vida dele.” A vivência pessoal e a maneira como o aluno-trabalhador interpreta o seu trabalho diário são fatores que estão ligados ao sofrimento, refletidos em seus modos de ser e viver. Revelam ainda, que as situações de tensão e conflito inerentes ao modo como lidar com o descaso da equipe médica, com o descaso do familiar em relação ao paciente e à morte, geram sentimentos de impotência e de solidão nos alunos-trabalhadores e constituem aspectos que geram sofrimento. Percebe-se claramente, pela fala dos alunos-trabalhadores, a carga emocional desencadeada ao lidar com o sofrimento do paciente. É visível o sofrimento profissional ao defrontar-se com a angústia de cuidar de pacientes em processo de morrer e com as respectivas famílias envolvidas nesse processo. Identificam-se falas que remetem à integralidade, como compreensão das necessidades físicas, biológicas, sociais, espirituais e emocionais do ser cuidado, além da exigência de se reorganizar um modelo de atenção à saúde para responder a essas necessidades (GUTIERREZ; CIAMPONE, 2006; SILVA; SENA, 2008). “E sofro quando o paciente tem uma patologia grave; [...] em ver a necessidade da sociedade carente, e quase nada poder resolver.” Precarização das condições de trabalho Os alunos relataram o desgaste no trabalho em relação à remuneração; as jornadas de trabalho extensivas, árduas, também emergem salientar o ritmo e a carga de trabalho, o grau de autoritarismo das chefias, as fracas 470 probabilidades de carreira e ascensão profissional, a inexistência de formas de participação (SENTONE; GONÇALVES, 2002; MEDEIROS et al., 2006). Percebe-se o sofrimento do trabalhador, principalmente quando se fala de sua remuneração: “Carga horária puxada e sou pouco remunerado [...] o meu sofrimento é quando pego o meu pagamento (salário).” Outro aspecto identificado como sofrimento: “até mesmo não reconhecida pelo que faço”, fala que pode demonstrar o não reconhecimento dos superiores na hierarquia e/ou equipe de trabalho e/ou usuários; ou ainda um sentimento de resignação embutido, que expressa um desabafo, em função do quanto os profissionais de Enfermagem estão expostos a ambientes de trabalho insalubres, tanto no sentido material quanto subjetivo, e submetidos às condições de trabalho precárias, colocando em risco a manutenção de sua saúde. As atividades dos profissionais de Saúde são tensas, devido às prolongadas e duplas jornadas de trabalho, ao número limitado de profissionais e ao desgaste psicoemocional nas tarefas realizadas (SENTONE; GONÇALVES, 2002; ELIAS; NAVARRO, 2006; FERREIRA; MENDES, 2001; MEDEIROS et al., 2006; DALMOLIN; GONÇALVES, 2009; COUTO, 2008). “Pouco remunerada e até mesmo não reconhecida pelo que faço.”. CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS Percebeu-se que há ainda um predomínio das tendências neoliberais, particularmente, de uma tradicional, como a relação professor/aluno verticalizada, tecnicista, centralizada no modelo biomédico; porém, outras tendências também aparecem mescladas nas falas de outros alunostrabalhadores, que anseiam por mudanças na maneira como o professor (facilitador do aprendizado) conduz a prática docente, mediante a adoção de condutas mais abertas e democráticas, em direção à horizontalidade, na interação educador-educando. Identificou-se certa tendência em abandonar a concepção bancária (pedagogia da transmissão e por condicionamento), em prol de uma concepção contemporânea, onde os sujeitos evidenciam a pedagogia da problematização, preparando o aluno (agente central) para a busca de soluções críticas, a fim de enfrentar os problemas no cotidiano, visando à transformação da realidade (BUENO; EBISUI; CINTRÃO, 2004; FREIRE, 2001; AARESTRUP; TAVARES, 2008). 471 As concepções pedagógicas que mais se enquadram no que foi discutido direcionam a busca para uma educação/ensino de Enfermagem que privilegie a conquista da autonomia profissional; na elaboração de uma proposta de formação que enfatize/ valorize características de análise, de reflexão, de crítica e de superação de paradigmas. Concepções que sustentam uma formação profissional comprometida com um projeto pedagógico-históricopolítico-filosófico e social que subsidie ações e práticas de Saúde voltadas para a maioria da população, atendida por estes profissionais (AARESTRUP; TAVARES, 2008). A prática educativa proposta na pedagogia problematizadora de Paulo Freire parece ser a mais apropriada, por agir na Saúde coletiva, com o propósito de estabelecer um cuidado humanizado, de promover a valorização do saber do educando, preparando-o para a transformação da realidade e de si mesmo, e ainda por possibilitar a efetivação do direito do usuário às informações, de forma a exercer autonomia ativa nas ações de saúde, assim como para manter a capacitação contínua nas técnicas necessárias para o trabalhador de Enfermagem, a fim de que este execute um trabalho criativo, centrado em habilidades humanas. Também sedimentam os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde em busca de uma sociedade mais democrática, com a formação de um profissional voltado para a sociedade ou interesse público (AARESTRUP; TAVARES, 2008; CASTANHO, 2002). Para Saviani (2000) é na prática social que o professor encontrará os grandes temas para o exercício do magistério, detectando, analisando e propondo soluções para os principais problemas postos pela sociedade. É a inserção da prática social que possibilitaria a transformação dos conteúdos formais, fixos e abstratos, em conteúdos reais, dinâmicos e concretos, permitindo que a escola transforme-se cada vez mais num espaço democrático de discussão e análise, com temáticas conectadas a questões e problemas da realidade social. CONSIDERAÇÕES FINAIS Identificou-se que os alunos-trabalhadores encontram-se inseridos na realidade social de sua comunidade e receptivos a novas propostas de ensino-aprendizagem, colocando em pauta a vivência de sua prática social cotidiana. Essa disposição dos alunos-trabalhadores encontrou congruências com a perspectiva e os anseios de mudanças do Sistema Único de Saúde, apontando lacunas existentes no sistema e no atendimento humanizado, 472 com equidade e integralidade. Os alunos-trabalhadores vivenciam prazer e sofrimento no desempenho de suas atribuições, pois prazer e sofrimento não são propriedade de nenhuma categoria profissional. A intenção deste estudo não foi o de demonstrar que os alunos-trabalhadores sofrem (o que de fato ocorre, em algumas situações), mas o de compreender a visão sobre o próprio sofrimento. Assim, contribuiu para uma reflexão sobre as percepções e vivências relacionadas às suas atividades na área de Enfermagem e no Sistema Único de Saúde. 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