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Revista Científica
ISSN 2179 6513
A
AMAZÔNIC
Faculdades Integradas do Tapajós
Revista Científica
ISSN 2179 6513
A
AMAZÔNIC
Faculdades Integradas do Tapajós
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Biblioteca Ubaldo Corrêa – Santarém/Pa
PERSPECTIVA AMAZÔNICA-Revista de Publicação Acadêmica da FIT. Santarém Pará: FIT,v.7, n.4, 2014. 118p.
Semestral
ISSN 2179-6513
1. Estudos multidisciplinares. 2. Amazônia. 3. Faculdades Integradas do TapajósFIT.
CDD 050
“Contribuir para o entendimento aprofundado das questões amazônicas nos
diversos campos do conhecimento mediante a divulgação de produção
científica local que possa subsidiar as atividades acadêmicas e práticas tendo
em vista o estudo da Amazônia para o progresso da humanidade e o aumento
da qualidade de vida da população Amazônica”.
Escopo e Foco
A revista Perspectiva Amazônica publica trabalhos teóricos e teórico-empíricos
nas seguintes modalidades: artigo original, artigo de revisão, resenha, relato de
caso e ensaio, em qualquer área do conhecimento e preferencialmente que
tenham relação com a região Amazônica.
Público alvo
O público-alvo é constituído principalmente de profissionais e estudantes da
academia amazônica e brasileira, e, paralelamente, de todas as pessoas
interessadas nas questões da Amazônia nos diversos campos do
conhecimento.
Requisitos
Os artigos originais, artigos de revisão, resenhas, relatos de caso e ensaios
submetidos à apreciação da revista “Perspectiva Amazônica” devem ser
inéditos, nacional e internacionalmente, não estando sob consideração para
publicação em nenhum outro veículo de divulgação. Trabalhos publicados ou
em consideração para publicação em anais de congressos podem ser
considerados pelo Conselho Editorial e pelos Avaliadores, desde que estejam
em forma final de artigo. Os artigos e documentos podem ser redigidos em
língua portuguesa, inglesa ou espanhola. Para serem publicados, os trabalhos
deverão adequar-se às normas para publicação da revista e serem aprovados
pelos Avaliadores.
PERSPECTIVA AMAZÔNICA
Missão
Conselho Mantenedor
Paulo Roberto Carvalho Batista
Presidente
Antônio de Carvalho Vaz Pereira
Vice-Presidente
Ana Paula Salomão Mufarrej
Edson Raymundo Pinheiro de Sousa Franco
Etiane Maria Borges Arruda
Marlene Coeli Vianna
Direção Geral da FIT
Helvio Moreira Arruda
Direção Financeira
William José Pereira Coelho
Direção do Centro de Estudos Sociais Aplicados
Ana Campos da Silva Calderaro
Direção do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde
José Almir Moraes da Rocha
Editor Responsável (Coordenação de TCC e Pesquisa)
Gabriel Geller
Conselho Editorial
Ana Campos da Silva Calderaro
Gabriel Geller
Helvio Moreira Arruda
José Almir Moraes da Rocha
Concepção gráfica e Coordenação Gráfica
Publicittá Agência de Comunicação da FIT
Thais Helena Medeiros
Capa
Lígia Augusta
Aluna Curso de Publicidade e Propaganda da FIT
Foto da capa
Arquivo HMA
Por do Sol no Rio Tapajós visto da orla de Santarém
Diagramação
Karen Juliana P. de Azevedo
Impressão: Gráfica Global
Nesta sétima edição, temos a satisfação de contar com 80% de artigos
diretamente relacionados ao contexto regional Amazônico, comprovando o
compromisso da FIT com a pesquisa para o desenvolvimento sustentável.
Acreditamos que este periódico tem estimulado e contribuído de forma
relevante para o debate científico de alto nível na região, e esperamos ver os
artigos aqui publicados cada vez mais reconhecidos e citados nas suas áreas de
conhecimento, tornando a Perspectiva Amazônica uma referência em produção
científica na Região Norte do Brasil.
Gabriel Geller
Editor Geral
Revista Perspectiva Amazônica
EDITORIAL
Em 2014 a Revista Perspectiva Amazônica continua a crescer e inovar,
aprimorando sua identidade visual, reforçando seu corpo de avaliadores e
contando agora com classificação Qualis C em uma área do conhecimento
(Sociologia), e classificações Qualis B em duas outras áreas
(Antropologia/Arqueologia e Medicina Veterinária), que esperamos que em
breve seja estendida a outras áreas.
AVALIADORES
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Alexandre Rodrigo Batista de Oliveira FIT/UEPA Mestre 20000006.
Ciências Biológicas; 40000001. Ciências da Saúde; 90000005.
Multidisciplinar (Ensino de Ciências)
Ana Karine Albuquerque de Alves Brito, 00005. Ciências Sociais Aplicadas
FIT, Mestre, 60000007. Multidisciplinar (Ensino de Ciências)
Edivaldo da Silva Bernardo, FIT, Doutor, 80000002. Linguística, Letras e Artes
Francisco Edson Sousa de Oliveira, FIT, Doutor, 60000007. Ciências
Sociais Aplicadas; 70000000. Ciências Humanas; 80000002. Linguística,
Letras e Artes; 90000005. Multidisciplinar (Sociais e Humanidades)
Gabriel Geller, FIT, Mestre, 60000007 Ciências Sociais Aplicadas.
90000005. Multidisciplinar (Sociais e Humanidades)
Hipócrates Menezes Chalkidis, FIT, Mestre, 20000006. Ciências
Biológicas; 40000001. Ciências da Saúde; 90000005. Multidisciplinar
(Ensino de Ciências)
José Almir Moraes da Rocha FIT/UEPA/UFOPA,Doutor, 20000006.
Ciências Biológicas; 40000001. Ciências da Saúde; 90000005.
Multidisciplinar (Ensino de Ciências)
José de Lima Pereira, FIT, Mestre, 60000007. Ciências Sociais Aplicadas
Lidiane Nascimento Leão, UFOPA, Mestre, 60000007. Ciências Sociais
Aplicadas; 70000000. Ciências Humanas; 90000005. Multidisciplinar
(Sociais e Humanidades)
Mara Rejane Miranda de Almeida,FIT, Mestre, 80000002. Linguística,
Letras e Artes
Maria Irene Escher Boger, FIT, Doutora, 60000007. Ciências Sociais
Aplicadas; 70000000. Ciências Humanas; 80000002. Linguística, Letras e
Artes; 90000005. Multidisciplinar (Sociais e Humanidades)
Marla T. Barbosa Geller, CEULS/ULBRA , Mestre, 10000003. Ciências
Exatas e da Terra (Computação); 30000009. Engenharias
Martinho Leite, FIT, Mestre, 10000003. Ciências Exatas e da Terra
(Computação); 30000009. Engenharia
Maura Cristiane e Silva Figueira, FIT, Mestre, 40400000. Enfermagem
Raimunda Nonata Monteiro, UFOPA, Doutor, 50000004. Ciências
Agrárias; 60000007. Ciências Sociais Aplicadas
Robinson Severo, UFOPA, Doutor, 50000004. Ciências Agrárias
Rodrigo Tenório Padilha, FIT, Mestre, 50500007. Medicina Veterinária
Rubens de Oliveira Martins, Ministério da Ciência e Tecnologia, Doutor,
7000000. Ciências Humanas
Síria Lissandra de Barcelos Ribeiro, FIT, Doutora, 20000006. Ciências
Biológicas; 40000001. Ciências da Saúde; 90000005. Multidisciplinar
(Ensino de Ciências)
Roberto Cesar Lavor dos Santos, FIT, Mestre, 60000007. Ciências
Sociais Aplicadas
Thais Helena Medeiros, FIT, Mestre, 60000007. Ciências Sociais
Aplicadas 7000000. Ciências Humanas.
Exortismo e Exotismo da Amazônia
Francisco Edson Sousa de Oliveira
Redes de Sociabilidade e Comércio na Floresta Artesanías em Palha
deTucumã Entrançam Grupos e Vidas nas Enseadas do
Rio/Arapiuns em Santarém/PA.
Thaís Helena Medeiros; Kátia Helena S. C. Schweickard
Ethos Amazônida e Dialética da Nova Colonização
Ivair da Silva Costa
O Negro nas Lendas e Mitos de Monte Alegre
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Sales Martins da Silva
Incidência e Distribuição Espacial de Acidentes de Trânsito nos
Bairros do Município de Santarém-Pará, no Período de 2007 a 2009
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Rafael Gibson O. da Silva; Tayná Matos do Vale; Rodrigo Luis Ferreira da Silva
Políticas Públicas para o Turismo no Município de Santarém: Uma
Análise do Trade Turístico sobre o Pólo Tapajós
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Áurea Siqueira de Castro Azevêdo
As Mídias Digitais como Facilitadoras no Contexto Educacional
Rosane Tlentino Gusmão Maia
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ciências biológicas e da saúde
Fauna Parasitária de Micrurus Hempricii (Jan,1958) ( Serpente
Elapidae) da Floresta Nacional do Tapajós, Belterra, Pará
Pedro Henrique Salomão Ganança; Tisla Carol Marialva Camargo; Hipócrates de Menezes Chalkidis;
Lincoln Lima Corrêa
O Stress Como Fator Agravante em Portadores de Psoríase
Kaio Vinícius Paiva Albarado; Parado Spinola da Rocha
Potencialidades e Fragilidades na Aplicação Prática da
Sistematização da Assistência de Enfermagem
Jonata Ribeiro de Soua; Luiz Antônio Bergamim Hespanhol; Isabela Vanessa Sampaio dos Reis; Natália
Miranda Monteiro; Pablison Cardim Coelho; Paula Simone Barbosa Cardoso; Kaio Vinícius Paiva Albarado;
Sheyla Mara de Oliveira
Normas para Publicação
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SUMÁRIO
ciências humanas e sociais aplicadas
Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.10-19
EXORTISMO E EXOTISMO DA AMAZÔNIA
Francisco Edson Sousa de Oliveira*
RESUMO
A invenção exótica e exortada da Amazônia são construtos o para refletir sobre os mitos e lendas que
fertilizaram diários de viajantes por grande parte do ocidente durante o período das Grandes
navegações, principalmente pelas Américas. O referido estudo pretende trazer reflexões que ajudem
sobre a compreensão dessa espacialidade e também mostrar os desdobramentos que isso pode ter
causado na formação social e cultural da paisagem amazônica ao longo da história. Fazer
considerações pertinentes em relação ao enigmático, ao fantasioso, e ao frenético como sendo
procedimentos causadores de um caráter superficial descaracterizado de propósitos já arraigado na
paisagem primitiva da Floresta.
Palavras-chave: Exortação e Exotismo, Amazônia, Invenção.
ABSTRACT
The invention urged da Amazonia is a construct to reflect about the myths and legends that have
enriched daily travelers in much of the West during the period of the great navigations, mainly
through the Americas. This study aims to bring reflections to help on the understanding of this
spatiality and also show the consequences that this may have caused on social and cultural
formation of the Amazonian landscape throughout history. Make relevant considerations in
relation to the enigmatic, fanciful, and frantic as a superficial character causing procedures
mischaracterized of purpose already ingrained in primitive forest landscape.
Key words: advocacy, Amazon, Invention.
*Possui graduação em Letras pelo Instituto Luterano de Ensino Superior de Santarém (1994), mestrado em Gestão do Desenvolvimento e Cooperação Internacion
pela Universidade Moderna (1999) e Doutorado em Literatura Geral e Comparada – Universite de Limoges (2006). Atualmente professor – Faculdades Integradas
do Tapajós. Tem experiência na área de Administração, com ênfase em Administração Escolar, escola rural e comunidades.
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Introdução
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Contrariamente ao que se possa pensar, a Amazônia não foi descoberta, não
com a mesma ideia do descobrimento do Brasil, sequer foi construída; na realidade
sua idealização se dá a partir da construção da Índia, construída pela história grecoromana, pelo relato de missionários e viajantes comerciantes.
Nesse bojo inclui-se, também a mitologia Indiana que, a partir de uma
natureza variada, delicia e apavora os homens medievais. A tal conjunto de
maravilhas anexam-se as monstruosidades animais e corporais, incluídas tãosomente enquanto a posição ao homem considerado adamita normal e habitante de
um mundo delimitado por fronteiras orientais por tradições religiosas (GONDIN,
1994).
O referido artigo apresenta contornos que influenciaram arquétipos,
principalmente, aqueles que fertilizaram os sonhos do Eldorado amazônico
delineados nos mapas econômicos dos arrivistas de forma exortizada e exótica. A
primeira viagem ao novo mundo fez-se a acompanhar por esse imaginário e
influenciou a visão Europeia sobre aquelas terras jamais vistas. A descoberta de terras
que completavam as secularmente conhecidas, originou tensões que acarretam
especulações, as quais, as poucas vão sendo aglutinadas em temas que se cristalizam
em torno de uma expressão: a raça humana. Motivo de enormes controvérsias, essa
expressão acompanha os séculos, oriundos dela constroem-se ciências, especula-se a
natureza para atingi-la, aceitá-la ou refutá-la a partir de prisma da sociedade que
conheciam, ou seja, e dos próprios questionadores, atitude que origina nova visão
desfocada (BACHELARD, 1989).
Pressionados por adversidades comuns à época, os homens sonham encontrar
o paraíso e a fonte de eterna juventude. A tradição religiosa que um grande rio nascia
naquele local aprazível, cujas águas encobriam riquezas, e não muito longe, uma
fonte considerada para a total supressão dos males sociais, onde a fome, as doenças e
as pestes continuamente dizimavam respeitáveis contingentes humanos. Esse local
foi encontrado pelos expedicionários de Orellana e se localizava na região
Amazônica. Sucessivamente visitada, principalmente depois de liberada a
navegabilidade do Rio Amazonas pelo governo português, para aquela região
composta de enormes rios e florestas compactas, dirigem-se às atenções e erigem-se
verdades; confrontam-se teorias e refutam-se ou confiam-se hipóteses. Como
justificar a presença de animais gigantescos até tinham seu habitat? Possivelmente
havia gigantes entre o intricado vegetal, não havia, outrossim, homens com rabo? E
as mulheres brancas, altas e guerreiras, não guardavam a prodigiosa cidade de ouro,
próxima a um lago dourado, onde banhava um rei muito rico? Certamente, o clima,
deveria ser o responsável pelos atos bestiais, endurecimento do caráter e
envelhecimento precoce do autóctone. Essas perguntas geralmente acompanham os
viajantes e as respostas não se encaixavam na vertente infernista, ora na edênica, ou
ainda justificavam a catequese. (GONDIN, 1994)
Essa contextualização histórica reporta-nos para uma reflexão atual sobre o
grande luxo de narrativas romanescas que transportam as mazelas sociais,
econômicas e políticas para as asas do condor e os lábios de mel do Condoreirísmo e
de "Iracema". Com a visão de enaltecer a terra, foram lançadas muitas estratégias de
manobras, com a preocupação de não dividir o "cobiçado" muitas figuras mitológicas
passaram pelo processo da transformação animalesca do monstro promiscuído
vivente dessa terra.
A ideia de exótico exortizado apresenta-se arbitrariamente no pensamento e na
imaginação poética, como nas paisagens imaginárias da Antiguidade e Idade Média,
11
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proporcionando um delimitamento nas estrofes e nos limites geográficos, porém
alargando sempre mais, o mito herói anti-herói escondido no sonho compadecido dos
românticos. A geografia do exótico exortizado se fixou de uma maneira incisiva com o
processo de ocidentalização do mundo, com a demarcação e a acentuação da fronteira
ocidente-oriente que ocorreu nos últimos quatro séculos, mas que se concentrou no
século XX. (IDEM, 1994).
A Construção da Exortização Amazônica
Nas comunidades da Amazônia convive-se com realidade nativa e por outro,
mantidas pelo assistencialismo político trazido pelas ONG's e intervindo
ideologicamente com objetivo de justificar interesses externos sobre as reservas
naturais da humanidade existente no mundo ocidental. (GONDIN, 1994).
Para atender as dinâmicas em curso nesses processos, podemos nos limitar a
observar a tradicional equação que projeta o ocidente como modernidade e pósmodernidade, e o oriente e outros espaços e nações correspondentes ao distante e
diferente, como os outros, portanto exóticos. Estamos nos referindo aos fatos recentes
da emergência na nova ordem econômica também, como monstros exóticos morando
e contribuindo com a formação de caricaturas mitológicas provenientes dos lados do
ocidente.
Nessa linha de compreensão, um dado importante em relação à EXÓTICO
EXORTIZADO é que esta tem sido com muita frequência um dos vetores do processo
de incorporação e diferenciação cultural, mas certamente não o único. Na verdade, o
exótico exortizado se relaciona e se combina com outros processos como o da
transculturação que é um dos meios de adaptação de culturas vistas como distantes,
indígenas, primitivas, rústicas aos valores naturais e culturais de outras latitudes.
(IDEM, 1994).
A exortação a que determinadas sociedades, países, regiões e grupos humanos
recorrem para tratar seus próprios constituintes culturais tem sido na verdade um
recurso usual ocasionado para processar, ao mesmo tempo, suas relações com os
padrões envolventes da civilização ocidental moderna, a partir da qual afinal se
disseminam ideias como a de exótica, primitivo e selvagem, sem que tal recurso
venha a representar uma ameaça aos seus modos de ser, suas raízes profundas, seus
mitos e valores livres. O que significa admitir que a exortização exótica é via de mão
dupla e que em determinadas situações funciona como o principal elemento de
reconfiguração da identidade cultural.
Tantos "Eus Poéticos" historicamente construídos e naturalizados em temáticas
exuberantes, felicitadas em canto e prosa nas redondezas do encanto da Floresta Verde
Oliva. Os séculos podem variar e os cronistas serem originários das mais diferentes
nacionalidades, no entanto, diante do rio e da mata amazônicas, quase genericamente,
nenhum se isentou de externalizar sentimentos que variavam do primitivismo préedênico ao infernismo primordial. Ainda que familiarizados com a região ou mantendo o
tom frio e distanciado do pesquisador, esse objetivo móvel, essa natureza grandiosamente
avassaladora, em algum momento fez com que esses homens parassem e a escutassem, e
a sentissem, muitas vezes deixando para trás olhares já estruturados, visões já vividas,
para pensarem nas selvas renascidas, na contemplação extasiada da grandiloquência
natural. São momentos que destacam quase unicamente a natureza, muitas vezes
explicitando seu ordeirísmo, outras somente aludindo à sua primordialidade, mas cada
um registrando imagens particulares ou quase arguetípicas, extraídas da Idade de Ouro ou
mesmo das maravilhas e monstruosidades indicas (RANGEL, 2001).
O intrigante para a antropologia é o poder de magia que paira sobre a climatologia
que cobre os contrastes, formadores do cenário marcante que simboliza o enigmático.
12
Mesmo quando se observa a razão no realismo narrado em prosa, prescreve-se o
envolvimento irracional, emotivo na descrição precisa do ambiente observado, com
essas controvérsias a imagem magnética vai comboiando rio abaixo enturvando a
ideia do objeto. Dificilmente se encontrará um relato de um viajante sobre a
Amazônia que não mostre o paraíso transformado em inferno pela ação dos
mosquitos. A diversidade e a grande quantidade de drogas medicinais, conservada
pelos naturais. A madeira: jacarandá, cumaru, pequiá, angelim, ipê, castanheira e
maracatiara, maravilhas gratuitamente oferecidas pela natureza, aqui na Amazônia e
extinta na Europa há séculos (DIAS, 1999).
São tantas as narrativas que analiticamente ou racionalmente tentam mostrar
esse fenômeno planetário, entre as sugestões incrivelmente atuais de aproveitamento
das riquezas naturais insinuam-se as histórias fantásticas, impregnando o arcabouço
narrativo, alargando suas possibilidades, fugindo tempos imemoriais com o estupor
da sucessão de coisas novas, pontuadas, sempre, pelas causas e efeitos, pela reflexão
linearizantemente concludente (PADURA, 1989).
"Além do que, se o Lago Dourado tem o ouro que a opinião lhe atribui; se as
Amazonas habitam, conforme o testemunho de muitos, entre as maiores riquezas do
Orbe; se os Tocantins em pedras preciosas e abundância de ouro são tão afamados do
Francês; se os Omáguas com os seus haveres alvorotam o Peru, e um Vice-rei logo
mandou o Pedro de Orsua com grosso exército à procura deles; neste grande Rio tudo
se encontra: aqui o Lago Dourado, aqui as Amazonas, aqui os Tocantins e aqui os
ricos Omáguas (...). E aqui finalmente está depositado o imenso Tesouro que a
Majestade de Deus tem guardado para enriquecer com ele a do nosso grande Rei e
Senhor Felipe Quarto. O lago dourado estava localizado - segundo Acuña - a vinte
léguas abaixo do Rio Tapi, no Catuá, que deságua no Amazonas, as margens
densamente povoadas por diferentes nações, e:
"Entre estas nações, que todas são de diferentes línguas, segundo as notícias que se
têm pelo novo Reino de Granada, está o desejado Lago Dourado, que tão inquieto traz
o espírito de toda a gente do Peru. Não o afirmo com certeza, mas um dia permitirá
Deus que saiamos desta perplexidade”. 1(GONDIN, 1994).
As Índias gigantes eram as curiguerês, habitantes do rio cachinguarará, as quais:
"Segundo as informações dos que os tenham visto, e que se ofereciam para levar-nos
a suas terras, são gigantes de dez e seis palmos de altura, muito valentes, que andam
nus, trazem grandes argolas de ouro nas orelhas e nariz, e para chegar às suas aldeias
2
são necessários dois meses contínuos de viagem desde a boca do Cuchiguará”.
As coordenadas geográficas são os artifícios de que o autor lança mão para
tornar verossímeis as notícias fantásticas.
Notícias fantasmas chegadas para o mundo dão conta de que o inusitado
continua a acontecer aqui em terras Amazônicas: Existe um sujeito chamado Carlos
Medeiros, em nome de quem estão registradas 120.000 quilômetros quadrados de
terras espalhadas por este pedação de planeta chamado Amazônia. Isso dá 1,5% do
território nacional. Para compreender a grandiosidade dessa extensão de terra, vale
dizer que equivale à soma dos territórios de Portugal e Bélgica. É verdade que as
terras ficam no fim do mundo, no meio do matão amazônico. Mas o conjunto das
áreas de Carlos Medeiros é tão gigantesco. Podendo-se supor que por lá exista riqueza
mineral significativa, que o acaso ganha um destaque obrigatório. Pois bem: o mais
incrível nessa história nem é o tamanho das clebas do Senhor Medeiros. Mais do que
isso, espanta o fato de que ele Carlos Medeiros, não existe. É um fantasma criado por
aquele que o Ministério Público Federal, e a Polícia Civil acreditam ser a maior
quadrilha de grilagem de terra em atividade no país. omo se pode justificar como uma
quadrilha tão ativa permanece intocada durante tanto tempo, mata virgem adentro?
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1
Gondin, Neide. A
invenção da Amazônia.
São Paulo, Marco Zero
1994; p.101.
2
Entrada de um Rio.
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3
Falta de juízo.
14
Esses fatos canalizam ideias que proporcionam criações em série, de narrativas
míticas inimagináveis sobre o que de fato ser esse Pedaço de Planeta (TOCANTIS,
2000).
A Amazônia brasileira sempre exerceu um grande fascínio sobre o alienígena.
A exuberância de suas florestas, os grandes rios sempre proporcionam um universo de
mitos em que os relatos dos primeiros navegantes vislumbrados com impressões
apressadas, desprovidas de fundamento, como é o caso da visão Romanesca das
lendas Amazônicas (IDEM, 2000).
Para muitos narradores de prosa poética, aquela era uma região misteriosa e
sem dano, aspecto esse de nome prejuízo, porque atesta a postura preconceituosa em
relação ao nativo e que veio a influenciar no desenvolvimento nacional da literatura.
Outra situação é a negação do elemento índio, registrado em narrativas pelos
viajantes, como um problema dentro de um processo considerado normal na
conquista territorial. A comercialização dos bens nativos feita pela Europa fez com
que países mais novos, como é o caso dos Estados Unidos da América do Norte,
vissem a região como um legado geográfico naturalmente seu. A cobiça que a região
despertou no Espírito do Estrangeiro distanciou cada vez mais o silvícola e o contato
entre as duas civilizações resultou na transformação cultural e consequente mudança
comportamental do autóctone.
Os índios jamais foram vistos como elementos que impulsionaram a
decadente economia portuguesa do século XVIII, através da coleta gratuita das
"drogas do sertão”. Escravos dentro de suas terras, presenciaram a desmistificação de
seus mitos seculares executada pelos missionários a serviço da coroa portuguesa.
Com o branco tornaram-se alcoólatras e passaram a exercitar a rapinagem.
O primeiro documento que se conhece sobre a penetração do europeu no maior
rio da Amazônia, data de 1541-2 e foi redigido pelo dominicano Frei Gaspar de
Carvajal, expedicionário às ordens de Francisco Orellana, governador da cidade de
Santiago de Guayaquil. Seguindo a tradição dos cronistas viajantes, Carvajal inicia
seu Descobrimento do Rio de Orellana assegurando que “tudo que eu vou contar
daqui por diante será como testemunha de vistas e homem a quem Deus quis dar parte
de um tão novo e nunca visto descobrimento, como é esse que adiante direi”
(CARVAJAI, 1991).
Era governador das províncias de Quito, o espanhol Gonçalo Pizarro,
pretendendo conquistar as terras do Eldorado e da canela, depois de setenta dias de
marcha, somente encontrou poucas e dispersas árvores dessa especiaria. Em Quema,
povoado de pequeno número de cabanas, distando cento e trinta léguas de Quito, no
Peru, Francisco de Orellana encontra-se com a expedição malograda de Pizarro
(IDEM, 1994).
Em vez de retroceder, Pizarro resolve explorar um grande rio no qual as informações
diziam existir índios vestidos. Navegam umas vinte léguas e encontram novas povoações.
Nesse local, a mando de Pizarro, constroem um barco e com ele percorrem mais cinquenta
léguas totalmente despovoadas. Sem comida, Orellana propõe seguir em frente à procura de
alimentos, mas antes, combina que se demorasse, Pizarro deveria retroceder. Com cinquenta
e sete homens, algumas canoas tomadas de índios e o barco recém-construído, parte Orellana
rio abaixo. Andam duzentas léguas sem que alimentos conhecidos fossem vistos.
Impossibilitados de retroceder devido às correntezas e ir por terra ser tarefa impraticável,
seguem em frente, cada vez mais famintos, alimentando-se de couros, cintas e solas de
sapatos cozidos com algumas ervas, de maneira que era tal a nossa fraqueza, que não
podíamos ter em pé. Um dos gatinhos, outros arrimados a bordões, meteram-se pelas
montanhas em busca de raízes comestíveis, e houve alguns que comeram algumas ervas
desconhecidas, ficando às portas da morte, pois estavam com loucos e não tinham miolo .3
Revista Perspectiva Amazônica
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(...) disseram que eram vassalos de um grande senhor, e que por seu mandado vinham
ver que éramos ou que queríamos e para onde íamos. Recebeu-os muito bem o Capitão
e, antes que lhes falasse, lhes mandou dar muitas joias, que eles apreciaram
muitíssimo. 7
O cronista não detalha o tipo de joia, minúcia que deveria ser explicitada, uma
vez que os nativos se apresentaram enfeitados e vestidos, fato esse que justificaria o
término da viagem, objetivo de Francisco Pizarro. A expedição de Orellana não
retrocede; pelo contrário, no bergantim novo vai enfrentar o desconhecido. O
encontro com esses índios ataviados com joias de ouro, o modo humilde em nativos
tão altos que, espontaneamente, colocam-se como servos daqueles estrangeiros,
contradiz as informações repassadas no reino de Apária sobre a belicosidade que os
nautas enfrentariam se adentrassem ainda mais aquela região dominada pelas
Amazonas. A informação sobre a cor e o tamanho desses índios que se foram e nunca
mais soubemos de onde eram nem de que terra tinham vindo8, aproxima-se da
primeira carta de Vespucci, que registrou a presença de Antes no Novo Mundo
(GONDIN, 1994).
À medida que as "províncias" vão sendo deixadas para trás, mais dificuldades
se apresentam para a expedição de Orellana. O relato é enriquecido com descrições
que, aos poucos, adquirem o tom fantástico nos reinos onde tudo pode acontecer,
apesar dos ataques ininterruptos de mais de dez mil índios por água e por terra (... e não
davam um só momento de descanso)9. Tentam cozinhar em uma ilha aparentemente
deserta, mas são observados por milhares de olhos e atacados outra vez por:
Mais de 130 canoas, nas quais havia mais de 8.000 índios e por terra era
incontável a gente que aparecia.
Entre esta gente e Canoas de guerra andavam quatro ou cinco feiticeiros, todos
pintados e com as bocas cheias de cinza que atiravam para o ar, tendo nas mãos uns
10
bissopes com os quais atiravam água no rio, à maneira de feitiços.
Extenuados e famintos, entram no rio da Trindade (Purus), terra dos Omágua,
e encontram em uma aldeia que resistiu por uma hora.
Numa casa de diversões, dentro da qual encontrávamos muita louça dos mais
variados feitios: havia telhas e cântaros enormes, de mais de vinte e cinco arrobas, e
outras vasilhas pequenas, como pratos, escudelas, candieiros, tudo da melhor louça
que já se viu no mundo, porque a ela nem a de Málaga se iguala. É toda vidrada e
esmaltada de todas as cores, tão vivas que espantam, apresentando, além disso,
desenhos e figuras tão compassadas, que naturalmente eles trabalham e desenham
como o romano.
Disseram-nos ali os índios que tudo o que havia naquela casa, feito de barro, se
encontrava terra adentro, feito de ouro e prata, e que eles nos levariam lá, pois era
perto. Encontramos nessa casa dois ídolos, tecidos de palha de diversos modos: eram
de estatura de gigantes e tinham metidas no moledo dos braços uma roda, a modo de
braceletes e outras panturrilhas, perto dos joelhos; as orelhas eram perfuradas e muito
grandes, parecendo as dos índios de Cuzco, porém maiores.11
Nesse território de guerra, aportam em terras dos pacíficos servos de Paguana, ricas em
prata. A terra é muito alegre e aprazível e abundante em todas as comidas e frutas, tais como
pinhas e peras, que na língua da Nova Espanha se chamam abacates, e ameixas, guanas e muitas
outras frutas excelentes. Penetram em um rio tão preto como tinta, batizado por eles de Rio Negro.
Corria ele tanto e com tal ferocidade que em mais de vinte léguas fazia uma faixa na outra água,
sem misturar-se com o mesmo.12 A proximidade do reino dos Amazonas é antecipada por mais
indícios. O cronista deixa a impressão de que era um território diferente o daquelas mancebas,
comprovado pelas descrições e dos costumes dos vassalos das Pentasiléias. A miniatura de uma
cidade é a amostra que se completa com a descrição de um reino diferente dos demais.
7
Espécie de presentes que ajudaria
na aproximação aos nativos sem
que estes expressem alguma reação.
8
Assim eram as notícias do
desaparecimento de nativos
sem nenhuma repercussão,
pois os mesmos não
representavam interesses de
maior significação.
9
Reação insignificante dos índios
em relação ao poderio ideológico
de manobras sobre as caravanas
de navegadores durante a
colonização.
10
Feiticeiros, figuras
antropofágicas que se
contrapunham aos atos humanos.
11
Comparação estabelecido entre
povos de polos distintos mas que
simbolicamente deveriam valer
como referência de informações.
12
Rio Negro conhecido em
decorrência de suas águas escuras
e seus volumes de água e que
desemboca no Amazonas e banha
a grande capital da Amazônia o
"Amazonas".
15
Revista Perspectiva Amazônica
Ano4 N° 7 p.10-19
4
Comidas típicas.
5
Pena aos que detivessem
conhecimentos sobre as raízes
das Amazonas.
6
Espécie de autoridade, voz de
comando nas obrigações dos
senhores e que detinham os
planos de manobras sobre as
províncias a serem procuradas.
16
No início do ano de 1542 ouvem tambores e dias depois vêem uma povoação e a
atacam. A fome aumentava a coragem. Os conhecimentos rudimentares daquela
língua permitem a comunicação de Orellana com os nativos, que os suprem com
tartarugas, perus, manatis, perdizes, gatos, pescados e monos assados.4 Diante de treze
caciques, presença exigida pelo capitão, Orellana toma posse das terras em nome da
Coroa Espanhola. Nesse local permanece o tempo suficiente para a fabricação de
cravos de ferro que seriam utilizados, posteriormente, na construção de um bergantim
(IDEM, 1991).
Durante esse tempo, não deixavam os índios de acudir, trazer comida farta e
com tanta ordem como se toda a sua vida tivessem servido. Vinham com suas joias e
arrecadas de ouro, e nunca o Capitão consentiu que se tornasse coisa alguma, nem
mesmo que mirássemos, para que os índios não entendessem que lhe dávamos apreço.
E quanto mais nisto nos descuidávamos, mais ouro punham em cima de si.
Aqui nos deram notícias das Amazonas e das riquezas que há mais abaixo, e
quem o fez foi um índio chamado Apária, velho que dizia ter estado naquela terra, e
também nos deu notícia de outro que estava apartado do rio, metido terra adentro e que
ele dizia possuir enorme riqueza do outro. Este senhor se chama Ica; nunca o vimos
porque, conforme disse, ficou desviado do rio (IDEM, 1991)
Os expedicionários reencontram e esqueciam o imaginário dos antigos
viajantes, cujas histórias sobre fortunas incríveis - lá Preste João, Grão Khan ou as
áreas contíguas ao Éden, aqui o Eldorado, lugar fabuloso e a cidade Mamoa das
lendárias mulheres guerreiras - estão sempre presentes na invenção da Amazônia. Ao
longo da narrativa, o cronista vai utilizar as mesmas expressões de Marco Polo sobre
os reinos que pagavam vassalagem a Gengis Khan. Divide a extensão do rio em vários
reinos, dominados por um número pequeno de senhores, sobressaindo um principal
entre os demais, técnica que, de certa forma, facilita a compreensão de uma área
inexplorada, desconhecida e imensa. Quando não compara, iguala ou privilegia os
frutos, os animais e as terras aos da Espanha. A maneira de conseguir comida seguia o
mesmo ritmo, o ataque e a pilhagem das casas dos nativos ou, como sucedeu a
alimentação era garantida pelos nativos, prática que foi alterada por Orellana - após
um jejum forçado durante a Semana Santa - ao designar oficialmente um dos
expedicionários como provedor da despensa de bordo. Apesar da fartura das doações
ou da pilhagem, os viajantes estão sempre famintos. A fome, aliás, e as batalhas são os
temas mais recorrentes na viagem inaugural. Talvez o cronista quisesse encaminhar o
relato para o tema principal, ou seja, a presença das Amazonas na América espanhola.
Um dos indícios é o fato de a existência dessas mulheres já ser conhecidas em Quito
(IDEM, 1991).
No reino de Apária, o primeiro que encontram, possivelmente depois de
perguntarem pelas Amazonas, Ouvindo o que o Capitão lhes dizia e lhes
recomendavam que, se fossemos ver as Amazonas, que chamam na sua língua
coniupuiara, que quer dizer grandes senhoras, que víssemos o que fazíamos, porque
éramos poucos e elas muitas, e que nos matariam. Que não parássemos em sua terra,
porque eles nos dariam tudo de que tivéssemos mister. 5
Nesse local constroem um bergantim mais resistente e Orellana outra vez toma
posse das terras, agora diante de Apária6 e mais vinte e seis "senhores”. À posse seguese o fincamento de enorme cruz, prática comum entre os conquistadores. O bem-estar
dos expedicionários não se completa devido à praga de mosquitos. Enquanto
construíam o bergantim, quatro índios foram conhecer Orellana.
Tendo de altura um palmo a mais que o mais alto cristão. Eram muito
brancos, de cabelos bastos que lhes chegavam até a cintura, com roupa e joias
de ouro, e trazendo muita comida. Chegaram com tanta humildade, que todos
ficamos pasmos de suas disposições e boa educação.
Revista Perspectiva Amazônica
Em uma:
Aldeia de medíocre tamanho (...) havia uma praça muito grande e no meio da
praça um grande pranchão de dez pés em quadro, pintado e esculpido em relevo,
figurando uma cidade murada, com a sua cerca e uma porta. Nessa porta, haviam
duas altíssimas torres com as suas janelas, as torres com portas que se defrontavam,
cada porta com duas colunas. Toda esta obra era sustentada sobre dois ferocíssimos
leões que sustinham nos braços e nas garras. Havia no meio desta praça um buraco
por onde deitavam, como oferenda ao sol, a chicha, que é o vinho que eles bebem,
sendo o sol que eles adoram e têm como seu Deus.
Era esse edifício coisa digna de ser vista, admirando-se o Capitão e nós todos
de tão admirável coisa. Perguntou o Capitão a um índio o que era aquilo e que
significava aquela praça, e o índio respondeu que eles são súditos e tributários das
Amazonas, e que não as forneciam senão de penas de papagaios e guacamaios para
forrarem os tetos dos seus adoratórios. Que as povoações que eles tinham eram
daquela maneira, conservando-o ali como lembrança e o adoravam como emblema
13
de sua senhora, que é quem governa toda a terra das ditas mulheres.
A sucessão de embates com índios mais belicosos indicia a proximidade com
o reino das temidas mulheres. Redobram os cuidados a fim de evitarem emboscadas,
enforcam alguns prisioneiros de guerra, penetram em um rio "poderoso”, batizado de
rio Grande (madeira), saqueiam os alimentos, encontram muito milho (e também
muita aveia), de que os índios fazem pão, e vinho muito bom, parecendo cerveja.14 Na
província de São João, no dia 24 de junho, entram "de chofre" na boa terra e senhorio
das Amazonas. O cronista adianta que os índios já estavam de sobreavisos; tentam
estabelecer contato com os nativos, mas são recebidos com escárnio pelos vassalos assim interpreta Orellana que os aguardavam mais abaixo. Diante de tamanho
desrespeito, o Capitão manda abrir fogo. Nessa batalha, cinco espanhóis morrem e
abatidos a pauladas os que abandonavam a guerra, por dez ou doze delas, que
guerreavam à frente, como capitães. Afinal, diz o cronista, as Amazonas estavam ali
atendendo ao pedido de socorro de seus súditos e tributários. As Amazonas são as
guardiãs desse Édem tropical (CARVAJAI, 1991).
Por intermédio do índio que aprisionaram, conhecem em detalhes a vida das
mulheres varonis. Questionado pelo Capitão com um vocabulário que havia feito,
disse o índio que eram umas mulheres que residiam no interior, a umas sete jornadas
da costa, e por ser este senhor Couynco seu súdito, tinha vindo guardar a
15
costa. Explicou que as mulheres não eram casadas, viviam no interior e que lá ele já
estivera muitas vezes pagando vassalagem. Ao todo havia setenta aldeias,
construídas em pedra e com portas. Os caminhos que as ligavam eram guardados por
sentinelas que cobravam a entrada. As celibatas só coabitavam quando sentiam
desejo e com homens de um povo vizinho com os quais guerreavam, levando-os à
força. Ficavam com eles o tempo que quisessem até engravidar. Depois deixavam-no
morto o pai, mas, se fosse filha, era bem criada e educada na arte guerreira. A
principal delas chamava-se Conhori.
Os homens guerreiros, escolhidos para o ato sexual, eram altos de corpo e
muito brancos, e muito numerosos. Conhecidos desde Quito, muitos andavam 1.400
léguas para vê-las. A terra é fria (...) há pouca lenha, sendo muito abundante em todas
16
as comidas.
A cidade das Amazonas é a utopia de Carvajal, diferente da utópica cidade de
Tomás Morus, erigida provavelmente na aprazível e desértica Ilha de Fernando de
Noronha, inspirada na Mundus Novus de Vespucci. 17
Na construção da cidade das Amazonas não há lugar para bons e pacíficos
selvagens. Nela o cronista projeta a sociedade que conhece, rigidamente
Ano4 N° 7 p.10-19
13
Informações sobre a força das
mulheres guerreiras em relação ao
seu poderio de comando, por isso,
as conquistas de espacialidades
como a Amazônia.
14
Grande rio que também
desemboca no rio "Amazonas"
rico pelos minérios e pela
estratégia comercial, que serviu
para o surgimento da cidade
mineradora de Porto Velho.
15
Regiào de fronteira na
Amazônia que limita o Brasil a
outros países.
16
Função reprodutora de força
referente nos homens por isso, as
atividades de força destinadas a eles.
17
Função reprodutora de força
referente nos homens por isso, as
atividades de força destinadas a
eles.
17
Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.10-19
18
Período útil de vida deveria ser
destinado exclusivamente ao
trabalho em prol da defesa da
terra.
hierarquizada, medieval, dividida entre plebeias e nobres, dominada por uma
matriarca, cercada por uma corte feminina, e obviamente possuindo um corpo de
guerreiras e sentinelas.É um castelo medieval ao qual se adicionou o culto inca de
adoração ao sol. Os camponeses e os vassalos, com seus tributos, mantêm a corte em
troca de proteção. O império, composto por mulheres brancas que só mantinham
contato sexual com homens igualmente brancos, os mais valentes da região,
pressupõe a criação de uma outra raça forte, guerreira. Ainda que cercada por
pequenos edens ou feudos circunvizinhos, a população é produtiva, queima os
campos para o plantio ou trabalha as terras mais centrais, prática que facilitou, muitas
vezes, a incursão dos espanhóis para a rapinagem de alimentos nas aldeias
ribeirinhas. É uma terra primaveril, edênica, rica em caça, pesca e frutos, esconde
tesouros indescritíveis muito bem guardados pela sociedade de cestas dominada por
Conhori, a matriarca das mulheres lendárias. As Amazonas escolheram um local frio
para construir em pedra um reino mais duradouro e mais civilizado. As casas tinham
portas e eram assoalhadas. As "vergonhas" não ficam expostas nem seus corpos são
mutilados - mantêm os seios intactos - demonstrativo de que são as responsáveis pelo
processo civilizatório da região com o alargamento de seus domínios.
Mas são mulheres e temidas pelos autóctones, e fortes o suficiente para abatêlos a pauladas e enfiarem a um palmo de profundidade suas flechas na madeira
resistente do bergantim. Carvajal mapeia e descreve a estratégia guerreira feminina,
seus usos e costumes, incluindo os povos limítrofes. Por outro lado, pontua a cada
investida do nativo, a superioridade bélica e coragem heroica do europeu, faminto,
penetrando o desconhecido e abatendo a quase totalidade dessas Amazonas na pior e
mais feroz batalha já realizada na imensidão de um território aprazível, fértil, rico em
minérios, habitado por índios extremamente belicosos, mas não impossível de ser
conquistado. O trabalho consistira somente em descobrir a sede de onde provinha o
comando, localizado a umas sete jornadas da costa, tão distante, tão inacessível, que
os índios da parte superior do rio já asseguravam que quem tivesse de descer à terra
destas mulheres tinha de ir rapaz e voltar velho.18
Conclusão
Diante dessa contextualização, visualiza-se mundos e mitos imaginários e
imaginários, convivendo naturalmente no mesmo habitat, expondo particularidades e
encantos. O mito religioso justifica-se pela interpretação apresentada nos relatos
missionários e viajantes e contada sintetizadamente pelas nativas, o herói, resultado
das cantigas épicas das Guerreiras Amazônicas, lendárias afamados habitantes do
grande rio.
O mito existe na realidade, estruturado para a verdade dos fatos e para
invenção destes, daí as controvérsias narrativas extraídas de um ambiente que pode se
tornar ao mesmo tempo, o paraíso edêmico e o infernismo do rio negro
A amplificação do mito tem sido conduzida geralmente pelos interesses
econômicos, são utilizados artifícios, manobras através do jogo de palavras e dos
recursos linguísticos, assim como as lendas que propiciaram uma possibilidade fértil,
embora, ilusória para conduzir o imaginário e fazer dele um trunfo para explorar a
Amazônia, os personagens sustentar a ilusão do Fausto no contexto dessas narrativas,
transportam-se para uma possibilidade real e que são recheados de ironias e crônicas
com o intuito de iludir e induzir para uma literatura que esteja à serviço dos interesses
dos arrivistas.
A história da Amazônia nesta fase, praticamente foi construída por elementos
externos, ao contrário do que se pensa hoje sobre o grande interesse e cobiças
internacionais ter sido construída sobre a égide do neoliberalismo atual, a Amazônia
18
Revista Perspectiva Amazônica
do passado teve sua história escrita e narrada pelos arrivistas, que traziam consigo os
mapas de uma região nativa e próspera. Verifica-se, no desenvolvimento da região
uma delimitação de tempo e de espaço, em primeiro lugar os assentamentos
localizados no seio da mata e dos grandes rios de difícil acesso. Em segundo lugar os
períodos, que nomeadamente, determinaram a história econômica em um cenário de
desenvolvimento em ciclos. E em cima disso, seguiram-se outros aspectos da vida na
Amazônia.
Alguns pesquisadores chamam isso de dominação, outros preferem chamar
de exploração, pois, consideram esta fase, como sendo negra para os nativos, que
tiveram suas culturas praticamente sucumbidas pelo poder econômico internacional
e pelo cinismo político do momento nacional. Assim, mensura-se que o exótico
aumentado estruturadamente, construiu contornos inimagináveis na paisagem
amazônica identificados no tempo moderno.
Ano 4 N° 7 p.10-19
Referências
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Editora Valer/ Edições Governo do Estado, 2000.
WILLIAM, Edwards
A Voyage up the River Amazon, including a residence at. Pará. John Murray. London.
1855.
19
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Redes de Sociabilidade e Comércio na Floresta
Artesanías em Palha de Tucumã Entrançam Grupos e Vidas
nas Enseadas do Rio Arapiuns em Santarém/PA
Thais Helena Medeiros*
Kátia Helena S. C. Schweickard**
RESUMO
O artigo apresentado aqui, é uma síntese da dissertação de mestrado em sociologia, defendida na
UFAM, em 2013. O trabalho imbuiu-se do compromisso em olhar as relações socioculturais das redes
de sociabilidade e comércio das artesanías em palha de tucumã. As mesmas que apoiam, definem e
constroem a paisagem cultural que hoje se espraia no território. A metodologia está amparada nos
referenciais sociológicos e etnográficos, tendo como método principal a memória coletiva.
Palavras-chave: Artesãs(ãos) de palha de tucumã – objetos culturais – Rio Arapiuns –
redes de sociabilidade
ABSTRACT
The article presented here is a summary of the dissertation in sociology, defended at UFAM in
2013. The work is imbued commitment to looking at sociocultural relations of sociability and
commerce of Artesanías straw tucuma. The same support that, define and build the cultural
landscape that today spreads in the territory. The methodology is supported by the sociological
and ethnographic references, having as main method to collective memory.
Key words: Artisans of palm straw - cultural objects - Arapiuns rivers – Sociability network
*Mestre em Sociologia (PPGS/UFAM), especialista em ecoturismo pela UFLA/MG e jornalista (FACHA/RJ). Atualmente, é professora e coordenadora do
curso de jornalismo das Faculdades Integradas do Tapajós (FIT).
**Doutora em sociologia e antropologia pela UFRJ, mestre pela UFAM, graduada em agronomia/UFRRJ e ciências sociais/UFAM. É professora adjunta do
Departamento de Ciências Sociais/UFAM.
20
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Introdução
As argumentações que seguem aqui conformam a síntese da pesquisa do
mestrado em sociologia que defendi na Universidade Federal do Amazonas
(UFAM), em abril de 2013. O trabalho imbuiu-se do compromisso em olhar as
1
relações socioculturais das redes de sociabilidade e comércio das artesanías em
palha de tucumã. As mesmas que apoiam, definem e constroem a paisagem cultural
que hoje se espraia no território. Nesse sentido, investiguei os processos de
ressignificação em torno da intensificação e transformação das elaborações dos
objetos resultantes do labor e trabalho que exige a habilidade das mãos de uma
tecedeira(o). Em uma teia intrincada de relações parentais, o conjunto cesteiro está
presente apoiando processos de significação e de tessitura2 de lugares de convivência
social como São Miguel, Vila Gorete, Vila Brasil, Vila Coroca, Arimum, Urucureá e
3
sítios.
Afora São Miguel, que está situado na Reserva Extrativista (RESEX) Tapajós
Figura 1 –Um Rio, vários Lugares Culturais. Mapa produzido em 15 de março de 2012, pelo técnico em georeferenciamento do
PSA, Ney Rafael Gomes Monteiro, para este trabalho
1
Inspirei-me na noção de artesanía
ao tecer as análises em torno das
relações socioculturais
empreendidas pelas artesãs(ãos)
de objetos em palha de tucumã,
por entender que a definição de
artesanato da língua portuguesa
não daria conta do objetivo. Vem
da língua espanhola e refere-se
tanto a trabalhos manuais como
intelectual resultante das
elaborações humanas. Está
delineado por Octávio Paz (2011)
em O uso e a contemplação,
quando diz que a peça de
artesanato “(...) preserva as
impressões digitais – reais ou
metafóricas – do artesão que a
criou. Essas impressões não são a
assinatura do artista; elas não são
um nome. Nem são uma marca
registrada. Antes, são um signo: a
cicatriz quase invisível que denota
a irmandade original dos homens,
e sua separação. Além de ser feito
por mãos humanas, o artesanato
também é feito para mãos
humanas: não apenas podemos
vê-lo, mas tocá-lo com nossos
dedos (p.01).”
2
Arapiuns, margem direita do curso de águas pretas e bem menor que o Rio
Tapajós e Amazonas, as demais localidades estão fundeadas na grande extensão de
terra que compreende o Projeto de Assentamento Agroextrativista Lago Grande
(PAE Lago Grande) (Figura 1). Nesse sentido, os sujeitos atuantes se mostram na
arena de conflitos tendo em sua base dois elementos históricos cruciais para a
humanidade: a posse e o uso da terra e seus recursos naturais. Arena expressa na
paisagem social onde estão edificados os lugares, configurando em espaços sociais
de ruralidade.
Mais do que diferenças, esses lugares demonstraram ser base da
existência e do modo da vida possível. Nesse sentido, antes conectados aos
mercados modernizados através dos regatões e da ida das pessoas pela via fluvial
aos centros mais próximos, como Santarém, hoje veem esses mesmos mercados
se fixarem em seus domínios espaciais e temporais. O mundo global chega pela
conectividade da telefonia móvel e pela diversidade de mobilidade por
intermédio da Rodovia Translago (PA 257). Mas, também e principalmente, pelo
conduto da energia que chega pouco a pouco vinda dos motores de combustível
4
fóssil do município de Juruti, onde está instalada a mineradora Alcoa Inc. , e
5
trazida pelo Programa Luz Para Todos, a qual é gerenciada pela Celpa.
Considero, aqui, tessitura como a
“organização, contextura”
(Ferreira, 2004, p.1942). Utilizo
esta terminologia no sentido
figurativo para referir-me à
organização, ao arranjo físico do
lugar empreendido pelas relações
socioculturais em torno das
artesanías em seu contexto
territorial material, simbólico e
artístico. Faço esta relevância,
pois ao abordar tecedura, reportome ao significado em si, ato de
tecer os fios que atravessam ou
cruzam a urdidura (Ferreira,
2004).
3
Os sítios abarca o lugar que está
fora do círculo que define a
localidade –igreja e barracão
comunitário; escola, quando
possui; o posto de saúde; as
tabernas e as casas que circundam
essas edificações. São
considerados localmente como o
agrupamento de uma parentagem
(categoria local). Tem
denominações próprias como o
sítio Santíssima Trindade e
Aratapi, respectivamente
pertencentes às localidades de
Vila Gorete e Vila Brasil
21
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4
Mineração de bauxita:
alcoa.com/brasil/pt/info_page/Ju
ruti.asp
5
celpa.com.br
O mundo está impresso pelos veículos e gêneros comunicacionais como a
televisão, os DVDs e o velho já conhecido rádio. A diferença de hoje é que estão
ligados desde que o dia amanhece ao recolherem-se a noite. Interpretei que é nessa
confluência de processos sociais e econômicos interligando culturas, que permaneceu
naqueles lugares a técnica de elaborar objetos de palha. Paisagens culturais em que o
mundo global e o local transformam e agenciam a existência dos grupos sociais e suas
artesãs(ãos). Mesmo assim, a principal mercadoria de troca ainda é a farinha. No total,
as outras modalidades sazonais, bem como o conjunto cesteiro complementam a
receita familiar, ao lado dos programas de transferência de renda dos governos. SE
antes o dinheiro dos objetos compravam alimentação, roupas e material escolar, hoje
em dia, também consomem bens que substituem os trabalhos diários. São os
eletrodomésticos como o tanque de lavar roupas, liquidificados e fogão a gás. Na lista
do consumo estão inscritos os mobiliários como sofás e cama [apesar de não
desconsiderarem a tradicional ini (Cascudo, 1983) ou a rede de dormir].
Assim, na seção que segue, relato o aparato metodológico com ênfase na
interpretação etnográfica da cultura. Posteriormente, faço uma síntese das
argumentações concebidas na dissertação, em torno do teçume em palha de tucumã
como elemento de autorepresentação, confrontando traços culturais que persistem no
entrelaçamento das inovações na contemporaneidade. No prosseguimento, parto para
as considerações finais.
O Percurso Sociológico e Etnográfico
No entendimento de que a ciência, sob a égide do encontro entre saberes, pode
apoiar a transformação da realidade na busca de bem estar e viver, o conhecimento
científico pode e deve se aproximar dos conhecimentos produzidos no mundo vivido.
Garcia Canclini (2006) alerta que precisamos de ciências sociais dinâmicas, com
transversalidade, nômades e capazes de percorrer pavimentos múltiplos do saber num
redesenho desses planos no sentido horizontal.
Sem arrogâncias, sem universalismos como bem demonstra Santos (2000,
2006) por meio de seus textos e dos profícuos debates no âmbito da academia,
prossegui oportunizando voz a outras epistemologias locais. Por isso, insisto como
técnica do desenvolvimento local, que todo o conhecimento gerado a partir das alças
desta ciência ocidental (muitas vezes antropocêntrica) pode ser utilizado para atender
às demandas sociais, culturais e ambientais dos povos na contemporaneidade.
Aproximo-me de Tuan (1983) para entender o lugar como sendo “uma classe
especial de objeto [material]. É uma concreção de valor, embora não seja uma coisa
valiosa, que possa ser facilmente manipulada ou levada de um lado para o outro; é um
objeto no qual se pode morar” (p.14). Na visão do lugar determinado pela presença
das relações socioculturais e simbólicas ancoro-me em Ribeiro (1992-93), ao
discorrer que
(...) o lugar está intimamente ligado ao estar no mundo. No caso da
espécie humana, dado o nosso caráter gregário, o estar no mundo tem
uma implicação social. Quem está no mundo só o é em algum lugar. O
reconhecimento de estar e/ou ser no mundo por um outro ser cria a
medida da definição do lugar de um ser perante o outro. Assim, o lugar
define-se a partir de relações sociais entre seres que estão interagindo,
que podem ganhar qualquer qualitativo, como relações culturais, de
trabalho, políticas, amorosas, entre tantas outras. (...) Desse modo, o
lugar deixa de ser um mero reflexo do local, pois os seres que o definem
podem estar distantes. Ou seja, os seres não se relacionam apenas com
quem está no local, diante de si, mas sim com quem possui um
instrumento técnico para manipular e transmitir códigos de informações
que possibilite a interação (p.238).
22
Revista Perspectiva Amazônica
A experiência de estudar, pesquisar e dissertar com outras lentes a
compreensão do modo de vida das artesãs(ãos), se deu num esforço contínuo e
sistemático de reflexão sobre a complexificação da vida e das relações sociais e
culturais, a partir dos fluxos que interligam os lugares às pessoas e as pessoas a seus
objetos, que por sua vez se conectam as pessoas. Essas que selecionam e elaboram
objetos materiais na mediação da vida imantando-os de significados materiais e
simbólicos. Afinal, “tudo são misturas”, “misturam-se as almas nas coisas,
misturam-se as coisas na alma”, profetizou Marcel Mauss em seu Ensaio sobre a
dádiva (2003, p.212).
Assim entendido, os objetos materiais ou as artesanías em palha de tucumã
objetivados em culturais daquela territorialidade no Arapiuns agenciam-se no
interior das expressões subjetivas. Os mesmos que influem sobre o modo de
existência, defrontam-se com a memória coletiva e remodelam grupos sociais;
envolvem-se de contrato e troca transmutando-se em mercadorias da vida social e
cultural.
No prolongamento da ideia de Vaz (2011, p.3), no artigo que trata sobre o
movimento cabano ressignificado, aqui estendendo-se ao Rio Arapiuns, habilito-me
a apontar que aqueles povos respondem às pressões externas, buscando mais
intensamente “pelas suas origens e pela sua história enquanto fazendo parte de um
território ou uma região muito particular”.6 O mesmo que, como descreve o autor em
suas reflexões, “funciona como o mito de origem dos quilombolas, indígenas,
ribeirinhos e até setores das classes médias urbanas” (p.3). Belezas naturais,
esconderijo, resistência e uma avantajada biodiversidade podem ter contribuído para
os processos migratórios na formação social e cultural daquelas paragens no tempo
presente (Benchimol, 2009).
Voltando às delimitações e conceituações dos termos aqui empregados e
apropriados, ressalto que teçume, com ç, é uma adequação da linguagem local e que
representa e apreende o resultado do ato de tecer (verbo transitivo que também
origina tecedura definida na página 14) a palha de tucumã, originando o tecido que
formará o objeto escolhido: um uru, porta panela ou um cestão. Ao contrário de
Carvalho (2011, 2004) que o escreve com ss, preferi traduzi-lo graficamente com ç,
pois entendi que além de ser uma transcrição linguística é tão mais fonética,
originária do discurso oral. Principalmente se retratado, e como é retratado aqui, a
partir da fonética indígena onde o som de çu é muito comum; vide cupuaçu, babaçu,
jacaré açu, carauaçu. Ao utilizar, aqui, o termo tessitura com dois ss refiro-me à
organização, à contextura social e cultural empreendida pelas artesãs(ãos).
Filio a cartografia sociocultural a um espaço contraditório no qual o poder
desenha caminhos sutis. Emergindo os sujeitos sociais, sobressaem desejos e
vontades ao definirem territórios legítimos na contraposição à violência simbólica
(Bourdieu, 1997; Schweikardt, 2012). É representativo como uma prática de
concepção local, fixa redes de sociabilidade abarcando sujeitos sociais diversos.
Impondo, dessa forma, racionalidades residuais que dantes escondidas, agora,
expõem-se ao turbilhão social.
A pesquisa está organizada no enfoque interativo nas ciências sociais, a
partir do referencial teórico interpretativo. Nesse empenho em compreender as
relações socioculturais que regem a ressignificação do teçume em palha de
tucumã, me ancorei em Geertz (1989) quando ensina que a etnografia é uma
atividade interpretativa numa descrição densa. A ênfase recai não simplesmente na
comunicação simbólica e suas significações, estruturas e produção de sentidos dos
objetos. Mas, concomitantemente na “agência, intenção, causação, resultado e
transformação” que estão impressas nas relações socioculturais da arte de trançar a
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Destaque do autor.
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palha ou no “sistema de ação cujo fim é mudar o mundo”, e não somente “codificar
proposições simbólicas a respeito do mundo”, acordando com a posição de Alfred
Gell (2009, p.251).
Antes de realizá-la, Cardoso de Oliveira (2006) convidou-me a olhar, ouvir e
escrever o mundo do outro. James Clifford (1998) propõe a escrita etnográfica
enquanto construção de empreendimentos textuais nessa historicidade e cultura
própria. Assim, além de interpretar, a etnografia é a escrita que persegui neste
trabalho, buscando o conhecimento na convergência da ciência e dos saberes locais
(Geertz, 1997), onde o familiar e exótico tem caráter relativo (Da Mata, 1978).
Nesse contexto, a simultaneidade e instantaneidade da comunicação
colaboram para a familiarização de sociedades e culturas distantes (McCraken,
2003), dinamizando e acarretando transformações sociais, dramáticas ou suaves que,
nos diferentes grupos, permitem um remapeamento societário. Procurei exercitar o
olhar antropológico voltado em perceber a mudança social não apenas ao nível das
grandes transformações históricas, mas como resultado acumulado e progressivo de
decisões e interações cotidianas. Interagindo com as análises sociológicas da
realidade que permitem a compreensão da rede de sociabilidade, percorri o caminho
dos sistemas relacionais, entendido por Michel Maffesoli (2006) como a
“multiplicidade de situações, de experiências, de ações lógicas e não lógicas que
constituem a socialidade” (p.32).
Campus, locus, mergulho, emersão... Locais onde se encontram as diferenças
antropológicas. Modos de viver e conviver muito diferentes daquele que está gravado
em minha bagagem social, cultural e ambiental. Nesse sentido, posicionei-me
vigilante, enquanto uma técnica do desenvolvimento, na tarefa intelectual dolorosa
de cunhar o conhecimento. Não foi fácil, como já assinalado anteriormente, ir ao
encalço das lições dos sentidos de olhar e ouvir tão necessários à condição da
pesquisadora.
No processo de construção, empreguei a oralidade no recurso da transmissão
dos saberes que advêm das experiências sociais. Nessa aventura, sobressai o método
da memória coletiva, como resultante das mudanças que ocorrem nas relações entre
os grupos, onde apreciei as ideias de Halbwachs (2006), quando insere que a memória
pressupõe a reconstrução dos dados no presente da vida social projetando-os no
passado reinventado. Para o autor, a memória coletiva “magicamente recompõe o
passado” (p.13), sendo que entre uma e outra é onde se desenvolvem as diversas
formas de memória. Estando a rememoração pessoal situada na encruzilhada das
redes de solidariedades múltiplas em que estamos envolvidos no agora, podem
emergir as lembranças que a externamos na linguagem (Halbwachs, 2006). O método
apoiou as lembranças e recordações, pois compartilham de um mesmo núcleo social.
Dirá o autor que
para que nossa memória se aproveite da memória dos outros, não basta
que estes nos apresentem seus testemunhos: também é preciso que ela
não tenha deixado de concordar com as memórias deles e que existam
muitos pontos de contato entre uma e outras para que a lembrança que nos
fazem recordar venha a ser reconstruída sobre uma base comum
(Halbwachs, 2006,p.39).
Introduzo, ainda, a harmonia que faço com as análises da memória pela lente da
hermenêutica da condição histórica em Paul Ricouer (2007) no decorrer das análises
de campo. Nessa linha de reflexão, relevo que as pessoas esquecem o sentimento, mas
não o fato histórico, quando este deseja também ser esquecido, mas não o fazemos
porque temos a garantia de que os recursos da amnésia são postos em reserva.
A partir dessas noções previamente estudadas e analisadas, inicialmente,
realizei uma revisão e análise bibliográfica do estado da arte então produzida,
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seguida de entrevistas com alguns representantes das organizações não
governamentais de apoio as iniciativas do teçume da palha do tucumãzeiro junto aos
grupos de artesãs(ãos) e lideranças do movimento social. Na visita ao ICMBIO,
foram-me repassados alguns documentos sobre diagnóstico socioeconômico da
RESEX Tapajós Arapiuns, dos quais utilizo como dados secundários na distinção
daquela unidade de conservação. Apesar de afeita com a realidade pesquisada,
executei um estudo exploratório com o grupo de artesãs(ãos) na localidade de
Urucureá, em setembro de 2011, e duas entradas em campo para a pesquisa.
Portanto, o trabalho foi recortado nas tecedeiras Josefa Cardoso, Lenir
Cardoso, Zilda França, Ana Sousa Castro –São Miguel; Nair Santos Lopes, Rosalina
(Rosa) de Sousa Castro, Antonia Castro (Dondon), –Vila Gorete; Maria Emília
Mota, Alzira Lopes, Izolina da Cruz –Vila Brasil; Maria Nei Viana da Silva, Neide
Viana, Elenira Viana da Silva, Maria Lucinete Viana da Silva –Arimum; Doralice
Silva, Rosangela Tapajós, Maria Zeneide de Sousa Tapajós, Amélia Rodrigues,
Maria Elsa Rodrigues, Anadir de Oliveira, Maria Eunice de Oliveira, Alvina Ferreira
Rodrigues –Urucureá. Bem como, nas(os) narradoras Józima Nunes (dona Miloca)
–São Miguel; Januário Cardoso e Carmem Santos–Vila Gorete; Jonas Dias –Vila
Brasil; Júlio Ferreira da Silva, Elias dos Santos Lopes e Zenaide Viana –Arimum.
Com Ana Sousa Castro, Jonas Dias e Alzira Lopes utilizei do caderno de
campo para guardar as conversas. Em Arimum observei, vivenciei e conversei
casualmente nos dias que passei em campanhia da vida ativa das artesãs, o que vale
para o período que fiquei na casa de Maria Emília Mota. Com as(os) demais
entrevistados realizei conversas formalizadas com o uso do gravador. Ressalto que,
as transcrições foram feitas somente das falas que foram enxertadas neste trabalho.
Realizei conversas com observação direta que me foram expressivas ao
interpretar e traduzir o modo de vida e as significações do mundo material dada pelas
artesãs(ãos). Valeram-me também as companhias e os diálogos com as minhas
condutoras, guias locais, e companheiras na composição do conhecimento sobre as
relações socioculturais entre as artesãs(ãos) e suas artesanías: Dilair Santos Lopes
–Vila Gorete; Maria Luzia dos Anjos –São Miguel; Ana Maria Dias Cardoso, Juliana
Pereira Oliveira e Dinaiara Nogueira Dias –Vila Brasil; Luziete da Silva Correa –Vila
Coroca; Odenilda Gama Silva (Deca) –Urucureá.
Mas, foi ao encontrar com Josefa Cardoso que erigi a arquitetura da pesquisa.
Tecia uma cesta, sem o uso de óculos que me surpreendeu para sua idade. Ao ser
apresentada para ela, perguntei, em voz alta por estar levemente surda, como tinha
aprendido a tecer. Sem olhar para mim, ouviu a pergunta e em silêncio ficou até
responder dirigindo-me o olhar na pergunta: “Japiim não tem cabeça?”, voltou-se
para o entrançamento, teceu um ponto e retornou a olhar para mim, perguntando e
afirmando: Japiim tem cabeça!”. Repete o movimento e afirma de novo: Japiim tem
cabeça!”. Japiim ou o xexéu de peito amarelo (Cacicus cela) é habilidoso na
construção de seu ninho. Tramando fios, concebe um saco longo pendurado nas
árvores, com uma pequena entrada redonda na parte mais fina e onde logo acima está
preso ao tronco do galho. Geralmente, na época de porem os ovos, o fazem em
coletivo numa mesma árvore.
Nas pesquisas in situ, investiguei as interações e as relações sociais das e entre
as pessoas que fazem com que as artesanías sejam elaboradas. E a lente utilizada para
essas análises foi a cultura, o modo e os códigos internalizados que regem e ordenam
o mundo e a rede social em que estão incluídas(os) as artesãs(ãos) naquele recorte do
Rio Arapiuns, agenciando e mobilizando as pessoas.
É uma interpretação dos aspectos dos grupos de parentagens de cada
localidade personificado pelas artesãs(ãos). Um trabalho contínuo e exaustivo de
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observação do mundo em que estão envoltas as artesãs(ãos) e suas artesanías,
registrando fatos aparentes, mas, também buscando aqueles que estão representados
nas profundezas da realidade social, nas combinações não-previstas de elementos
(Mills, 2009). Esses foram exaustivamente inscritos no caderno de campo,
desconstruindo representações superficiais, buscando a realidade tal como ela é e não
como se ela fosse.
A observação, aqui, assumiu o sentido de complementar as entrevistas que
partiram de uma lista dos temas geradores, que tinha em mente e na mão. Apesar de
manter a preferência por entrevistas espontâneas ou despadronizadas, houve
momentos em que senti necessidade de um formulário de orientação com perguntas
abertas. Assim, tive que recorrer a alguns telefonemas, emails e a ajuda de barqueiros
levando e trazendo cartas para suprir essas lacunas que por ventura ficaram abertas.
Identifiquei as entrevistas espontâneas e visitas como conversas causais que
aconteciam nas cozinhas ou varandas, e que são geralmente fora das casas. Com as
artesãs que me hospedaram, tivemos um período de convivência seguido, sempre que
possível, de longas conversas e observação do dia a dia em lugares distintos.
No encontro com as artesãs(ãos), que compõem a memória coletiva, utilizei
de gravação para não perder o diálogo na construção do discurso oral inserido no
corpo da dissertação, ajudando a minha memória e os escritos –apressados e mal
rascunhados– nos cadernos de campo. Usei o gravador MP3, de alta definição,
somente com as artesãs(ão) que considerei foco do trabalho.
Fundamentação Teórica
O desenvolvimento teórico perpassa pelas narrativas entre a empiria do
campo realizado em contraste com as teorias da sociedade, das diversidades físicas e
culturais. O primeiro capítulo abre com uma contextualização da opção teórica em
torno dos grupos sociais domésticos (Fortes, 2011), e “como unidades de análise
enquanto sistema social (unidade demográfica), unidade econômica e unidade de
manejo” (Almeida, 2007, p.164), distinguindo a construção categórica das
artesãs(ãos). Entendi que podem estar agrupadas em torno do campesinato histórico
de acordo com as noções de Chayanov (1924) e Shanin (2005), o que compreendi.
Mas, principalmente, priorizando as diferenças do sistema adaptativo dos povos das
águas amazônicas, a partir de trabalhos como o de Lima (1999) e Wagley (1988). Em
seguida, traço uma morfologia social (Mauss, 2012) das localidades e redes de
sociabilidade das artesãs(ãos) entremeadas por seus objetos materiais e culturais,
abalizando os aspectos ambientais, econômicos e culturais e de significações
simbólicas.
Em síntese, o estudo está recortado em torno dos laços familiares da
parentagem de Josefa Cardoso, uma artesão de 94 anos, ligando tecedeiras(ores) de
outras parentelas que na mobilidade edificaram lugares culturais, moradia da técnica
manual e da arte de trançar a palha de tucumã. Ao empreender as reflexões respaldada
pelas relações de parentesco, Josefa Cardoso foi o fio condutor para o desvelar da
pergunta que orienta esta pesquisa. Ao me sentir desolada em campo com tantas
informações que a priori pareciam desconexas, ainda em Vila Gorete, subitamente
revelou-se diante das minhas ansiedades Januário Cardoso, sogro da artesã Rosalina
(Rosa) de Sousa Castro. Artesã e narrador que abriram o caminho da pesquisa com
suas memórias e histórias, e mais uma vez distinguindo Josefa Cardoso, que é sua tia.
Assim, descrevo algumas particularidades e semelhanças das localidades.
No segundo capítulo, a narrativa depreende que a memória coletiva reconstrói
a mobilidade entre as margens do Arapiuns moldando novos agrupamentos
societários, ou territórios culturais. A mobilidade, que tem como característica a
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fronteira [(re)territorialização (Litlle, 2012; Hannerz, 1997), erige espaços de
ruralidade (Hébette & Moreira, 2004), na construção de um espaço rural. Na
ampliação dos núcleos principais, entre outros motivos, está associada à satisfação
das necessidades individuais de se alimentar, vestir e abrigar; reprodução social e
econômica. Nesse sentido, descrevo a ressignificação desse padrão de teçume,
conformando o conjunto cesteiro local, mediando e mesclando desejos e
sentimentos às coisas, traduzindo a interpretação dos enunciadores aos significados
que os objetos carregam de vida social. Desse contexto, abrem-se duas seções: na
primeira onde discuto sobre o trabalho manual na elaboração de objetos únicos
(Mills, 2009). Como observa Paz (2012), as artesanías estão intrinsicamente ligadas
a pessoas, a alma, aos saberes, a criação e habilidade. As mãos que tecem em
“movimentos similares” indicam um trabalho intenso elaborado pela “dupla
gestualidade” (Velthen, 1998, p.126); edificam objetos culturais e reconstroem
dinâmicas sociais nem tão coerentes, nem tão intencionais (Gonçalves, 2007;
Douglas, 2009). Nesse entorno, relações de reciprocidade e solidariedade são
erigidas a partir dos laços parentais.
Em seguida, discorro sobre alguns objetos que marcam a memória das
artesã(ãos), que são o uru, o cestão e o chapéu (Fotografia 1). Explorando esse
universo simbólico cristalizado no uru, na suposição de objeto primordial, de forma
primeira, chego à difusão que hora se realiza na diversidade criativa de outros
objetos e pigmentação da palha, traços culturais que permaneceram enquanto outros
foram se modificando, tornando-se mais complexos. Ao deslindar aquele universo
objetal, cheguei às taxonomias realizadas por Ribeiro (1985) identificando as
semelhanças do entrançamento com povos indígenas. Bem como, autenticando a
transculturalidade (Hannerz (1997) e Sahlins (1997a, 1997b)) histórica no aporte
dos europeus e nordestinos com ênfase nas periodicidades. Nessas análises, percebi
que a ampliação das elaborações das artesanías em palha de tucumã expõe
revalorização do patrimônio cultural material e simbólico na pluriatividade da
plataforma de desenvolvimento ecoturística, reorientando atividades de cunho
florestais manejados, e que não advém somente da produção agrícola. A
interpretação deixa transparecer os objetos como resultado da interação contínua de
um sistema de práticas sobre um sistema de técnicas vivenciadas no cotidiano
(Baudrillard, 2008). Nesse sentido, objetos, pessoas e lugares empreendem suas
histórias entrecruzando-se ou interagindo-se umas com e nas outras (Douglas,
2009).
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Figura 1 –a primeira imagem mostra o tradicional uru. Em seguida, pequenos porta sabonetes. As três
fotos posteriores, demonstram tipos de chapéus. E por último, jovens artesãs tecem nas sombras dos
tucumãzeiros no terreiro
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Para chegar à compreensão desses objetos na vida das pessoas, inspirei-me nas
representações sociais de literatos amazônicos como Galvão (1976), Jurandir (1995),
Veríssimo (1970), Inglês de Sousa, (1968), Tocantins (1968). Além dos relatos de
naturalistas como Bates (1979); Daniel (2004) e Agassiz & Agassiz (1975).
O terceiro capítulo, apoderando-me de uma escrita conjugada entre o campo
da pesquisa e o conjunto teórico eleito, considero as oposições dialéticas entre o novo
e o velho, o moderno e o tradicional diante de uma realidade social em transição;
colocando os objetos culturais difundidos no Arapiuns rolando na vida como
mercadorias (Douglas, 2006). Principalmente ancorada nas análises da modernidade
em Williams (2011, 2005) e Paz (1984). As barreiras que dantes dividiam
bruscamente urbanicidade e ruralidade, são agora transpostas, revirando as categorias
capitais econômicas e as relações de trocas entre o (pós)moderno (ou pós-industrial?)
mundo contemporâneo e agrupamentos societários que ainda mantêm outras formas
de relações econômicas e socioculturais (Bourdieu, 1979; Almeida, 2008a,
Barth,1998).
As análises centraram-se na contradição entre a realidade do mundo da vida
das(os) artesãos de palha de tucumã e a condição global, a mercantilização e os
objetos. Os pontos de contato e as disparidades sociais e políticas, econômicas e
ambientais. Concluindo que esse conjunto das artesanías demarca vida, mas também
demarca território sociocultural e geopolítico.
Na primeira seção deste capítulo, seguem argumentações em torno das teorias
antropológicas do consumo, e como se dá na prática social das artesanías. Em seguida,
contextualizo a realidade social das artesãs(ãos) dialogando com as questões da
modernização e modernidade do mundo ocidental capitalista. E, fechando o tópico,
algumas considerações sobre o comércio de artesanato local e global.
Considerações Finais
Pondero, primeiramente, que a força motivadora da proposta e
desenvolvimento deste trabalho foi o belo, a trama colorida que imanta os objetos
elaborados em palha de tucumã. Resultado da criação de artesãs(ãos) que apreendem
as técnicas de colheita da palha, dos pigmentos e do entrançamento do saber local,
sobressaindo-se como elementos que não permitem cingirem-se na
transculturalidade dos povos.
Considerei que esta produção, além de ser um estudo com bases etnográficas
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Constatei na pesquisa que o aprendizado da prática do teçume é
desenvolvido no seio do grupo familiar, e tido como uma elaboração feminina
aprendendo com as avós e mães. O que percebi ser um traço distintivo do
entrançamento da palha, pois além de receberem como herança, a interação
cultural aponta que as novas artesãs apreendem a técnica ao olharem as tecedeiras
amigas, ao serem motivadas pelas vizinhas e amigas que conformam a rede de
sociabilidade em torno das artesanías em palha de tucumã. Interpreto que marca
um traço cultural que persiste, interagindo com a heterogeneidade do mundo.
Dos urus, cestas e cestões, chapéu e o ponto “furadinho” ou “de olho”
abrem-se às possibilidades de inovação, aprimoramento e melhoria da qualidade
dos objetos, teçume e pigmentação; as artesãs(ãos) e seus grupos mostram que
desejam expandir os mercados de oferta para a comercialização e, principalmente
desejam alcançar melhores preços para os objetos culturais. Ao proporem-se uma
organização que foge aos modos da organização da vida diária, percebem que no
conjunto podem alcançar meios de expansão do teçume em valores para troca.
Ao analisar os objetos, a pesquisa deparou-se com a influência dos traços
indígenas marcados nos objetos atuais de interação cultural. A forma e teçume do
uru e do cestão da trama do folíolo largo foram encontradas nos objetos dos povos
que habitam o norte do Pará, Parque do Tumucumaque e Xingu. Assim como ficou
demonstrado que o entrançamento “de olho”, ou de “buraco” é influência direta
dos trançados em palha do nordeste, até mesmo a matéria prima pode ser a mesma.
A diferença marcante das artesanías em palha de tucumã do Arapiuns é o
entrançamento que as tecedeiras chamam “de miúdo”, “escaminha” ou
“miudinho”. O estudo não identificou esse teçume nas artesanías dos povos
amazônicos e no artesanato do nordeste. Outro traço marcante são os pigmentos
“do mato”. Da pesquisa, é interessante notar que os povos indígenas pigmentam as
talas de arumã pintando-as antes de entrançar, tal como a palha. Porém, as
artesãs(ãos) do Arapiuns cozinham a palha. Não detectei na bibliografia
consultada sobre os povos indígenas tingindo palha no cozimento, tampouco
tingiam a palha. Entendi que talvez seja um traço cultural português ou europeu.
Observei que nessa rede de organizações em que se colocam, possibilita
acessarem o mundo do consumo. Ao comercializarem os objetos de palha de
tucumã agregam valores adicionais à renda familiar. E nesse sentido, a dinâmica
da economia doméstica privilegiou a artesanía substituindo os ganhos que o
extrativismo da borracha havia eliminado em meados do século XX. A principal
mercadoria de troca ainda é a farinha, outras modalidades sazonais e os objetos de
palha de tucumã complementam a receita familiar ao lado dos programas de
transferência direta de renda do governo brasileiro. Na aquisição de bens via o
consumo de mercadorias na substituição de alguns trabalhos manuais diários, os
eletrodomésticos como o tanque ou máquina de lavar, liquidificador e fogão a gás;
bem como, os mobiliários são os principais exemplos que a facilidade de acessos e
a energia proporcionaram à esses grupos sociais.
A escolha dos trançados em palha de tucumã reflete uma associação entre a
disponibilidade dos recursos naturais pelo manejo sem complexidade da palheira e a
carga simbólica com que os povos na floresta tropical manipulam as fibras, talas e
palhas. Condição artesanal exibida pela habilidade e criatividade das mãos que tecem
a palha, deixaram-se notar através da memória dos contemporâneos.
Este estudo projeta a possibilidade real da salvaguarda e gestão do patrimônio
cultural, calcado na continuidade da prática como resguardo de bens materiais e
imateriais, enquanto marca coletiva e indicação geográfica. Sobressaindo nas
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sociológicas, é, em sua origem, um ensaio. Coloquei-me nele, mostrei-me ao buscar
compreender as bases teóricas mescladas à empiria que regem as relações
socioculturais das artesanías em palha de tucumã. Não foi uma viagem fácil, tampouco
sem dor.
O estudo que desenvolvi é um debate interno das ideias que fundamentam a
compreensão das relações socioculturais nos processos de ressignificação do conjunto
cesteiro em palha de tucumã. Discorri que objetos carregam e comunicam símbolos
(magia e encantamento, experimentação e prática), compondo uma rede de
sociabilidade e comércio da floresta, na tessitura da vida e da trama desta história. Ao
interpretar as relações socioculturais em torno da comercialização desses objetos, na
atualidade, insiro que na descentralização das tomadas de decisões previstas da
Constituição de 88 pelos conselhos paritários, o Estado Brasileiro expande as relações
com a sociedade representada pelos movimentos sociais e organizações privadas. Com
isso, a base da organização regulariza-se em organizações coletivas, na proteção dos
conhecimentos e direitos aos territórios dos povos indígenas, quilombolas e das
múltiplas formas autoidentitárias.
Assim, a pesquisa possibilitou as análises teóricas e narrativas que permeiam a
vida humana e biodiversa numa nova paisagem amparada na emergente discussão em
torno do desenvolvimento local, a qual se afinam no debate. O foco centrou olhar sob os
significados, mecanismos ou modos de organização do mundo ao redor das artesanías,
que concorrem para dar sentido ao lugar do artesanato em palha de tucumã e suas
relações nesta realidade globalizante contemporânea.
Dentre os caminhos apontados pela investigação, a mobilidade ao remodelar
territórios possibilitou que a prática do teçume estabelecesse os lugares culturais que foi
o recorte do trabalho. Nesse processo, a compreensão dos laços parentais e de
compadrio definindo as relações sociais e geográficas configurou o que a pesquisa
identificou como o ponto difusor, compreendido por essas localidades e seus sítios,
personificado na presença da artesã Josefa Cardoso. Tendo como característica focal a
intensificação das elaborações do entrançamento e o comércio local, regional e
nacional, principalmente.
O translado da várzea do Amazonas para o interior, pode ter sido motivada pela
ocupação secular desenhada na calha daquele rio. O deslocamento para o Rio Arapiuns
tem motivos nas relações sociais, festas e matrimônio; e nas atividades econômicas. Ao
contraírem o casamento, que não tinha regras rígidas, era do fica, escolhiam uma ponta
de areia e fundeavam a parentela, tendo como labor primordial a farinha e o
extrativismo vegetal. Ou ganhavam em troca um pedaço de terra na parentagem
nominando seu sítio. Como as ilhargas daquele rio também já comportavam ocupações
ancestrais e de fluxos migratórios, os homens muitas vezes encontravam trabalho nas
atividades de capina e derruba de capoeira, como também no trato com o gado. Ao
mesmo tempo, em que foi transformando-se na arena dos conflitos sociais que abarcam
as questões cruciais para a humanidade: acesso à terra e aos recursos naturais.
Os conflitos sociais não cessaram, permanecem, pois as características de
fronteira estão marcadas nos acessos terrestres à essas localidades, adentrando os
territórios de reprodução material e simbólica. Nos interstícios desses acessos, o mundo
se instala: é o mercado que intercala bens, mercadorias, pessoas e grupos. É onde estão
correlatos a comercialização dos objetos florestais de palha de tucumã, e onde
misturam-se as pessoas e estas nas coisas. Na busca da diversidade de estratégias
econômicas, as artesanías seguem aquele mundo marcando uma maneira de ser,
interagindo culturas e intensificando a mobilidade, deslocando imaginários, seus
símbolos e geografando territórios.
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dinâmicas e práticas, suas organizações e movimentos sociais estão entremeados no
sistema capitalista. Objetos que ao serem retirados, retiram-se também os
elaboradores. Entendo que as reflexões desenvolvidas neste trabalho, perfizeram as
premissas que envolverão estudos mais amplos sobre as relações socioculturais
percorridas pelo conjunto cesteiro e suas artesãs(ãos). Por outro lado, a geopolítica
deverá dar conta de negociar um novo modelo de desenvolvimento local
(econômico, social e ambiental) que transcendam as linhas tradicionais de comando e
controle, e que possam induzir aos setores produtivos, comportamentos ambientais,
potencializando as ações participativas de governança entre os vários setores da
sociedade.
Investigações futuras que envolvem aprofundamento sobre a intersecção do
conjunto cesteiro cultural do Arapiuns em palha de tucumã e o conjunto cesteiro dos
povos que estão territorializados ao norte do Estado do Pará e a sudeste, no Parque
Nacional do Xingu, são propositivas focando as formas e usos de cestos e objetos de
barro naquele contexto cultural. Aponto também que investigações onde a biologia
intersecciona sociologia e antropologia serão bem vindas no desenvolvimentos de
fixadores e impermeabilizantes dos corantes naturais. Bem como, pesquisas
vindouras em torno do consumo entendido como cultura material na atualidade em
seus diferentes usos, pressupondo-se formas de autonomia frente a realidade dada.
Este estudo fortalece questões a serem investigadas em torno do encadeamento
sociológico dos objetos e suas relações mediando dimensões culturais e produção de
subjetividades em diferentes contextos sociais. A cultura olhada não como algo a ser
perdido ou adquirido, mas sim como um mecanismo em que os povos buscam
significar o mundo e suas instituições. Estados que investiguem a interação de um
mundo expresso em grandes transformações onde o produtor, produto e consumo
estão intrinsecamente correlacionados. Entendo, também, que análises onde a
possibilidade da interconexão entre consumo e gênero são de importância relevante,
bem como consumo e parentesco.
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Ano4 N° 7 p.36-48
Ethos Amazônida e Dialética da Nova colonização
Ivair da Silva Costa*
RESUMO
O presente texto procura perceber que a realidade de degradação ambiental, vista em várias partes
do mundo, também está presente na Amazônia. De diversas formas, não somente os ecossistemas
estão sendo destruídos, mas igualmente a visão de mundo dos habitantes, condicionando a região a
uma realidade de paradigma e vítima cruel da exploração pós-moderna, tornando-se campo fértil
para a instalação do capital e da globalização. Do mesmo modo, a reflexão faz uma crítica à
globalização e seus processos que impõe um tipo de desenvolvimento que influencia na qualidade e
na quantidade do potencial biótico amazônico e na relação homem-meio ambiente, encerrado na
racionalidade tecnológica e com consequências trágicas para a natureza e para o homem. Por outro
lado, a análise constata a construção de um novo ethos insurgente no homem regional formado por
novos elementos reflexivos e novas atitudes em cuja concepção de mundo subsiste a visão do
homem como sujeito histórico, social e ético capaz de questionar os rumos do desenvolvimento
adotado e transformar a realidade na qual está inserido
Palavras-chave: globalização, degradação ambiental, ethos amazônida
ABSTRACT
The present text tries to realize that fact of environmental degradation seen several parts of the
world also is present in the Amazon region. In several forms, not only the ecosystems are being
destroyed, but equally the world vision of the inhabitants, when modern-powders are stipulating
the region to a reality of paradigm and cruel victim of the exploration, becoming a fertile field for
the installation of the capital and of the globalization. In the same way the reflection does a
criticism to the globalization and his processes that there imposes a type of development that
influences the quality and the quantity of the biotic potential Amazonian and in the relation manenvironment shut in the technological rationality and with tragic consequences for the nature and
for the man. On the other side, the analysis notes the construction again ethos insurgent in the
regional man formed by new reflexive elements and new attitudes in which world conception there
exists the vision of the man as historical, social and ethical subject able to question the courses of
the adopted development and to transform fact which is inserted.
Key words: globalization, environmental degradation, ethos Amazonian
*Doutor pela PUC/SP, professor de filosofia, ética, ciência política nas Faculdades Integradas do Tapajós.
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Introdução
Depois da Segunda Guerra Mundial, poluição e degradação ambiental se
tornaram preocupação da humanidade por adquirirem dimensões planetárias. Os
processos tecnológicos e industriais, em conjunto com a globalização, motivaram
debates mundiais em torno dos problemas ambientais e propostas foram idealizadas
em vista da unificação ecológica do mundo. Os efeitos destrutivos provocaram
questionamentos como: qual o critério de desenvolvimento adotado pela
humanidade no seu processo de crescimento econômico? Que concepção de
desenvolvimento adotar para a modificação do quadro atual, em vista de uma
harmonia entre os povos e na oferta das mesmas oportunidades para todos?
Movida pela ideia de desenvolvimento ilimitado e pela expansão técnicoindustrial a humanidade tem feito um caminho histórico de degradação dos
ecossistemas planetários que se agrava a cada ano. Na Amazônia a história não é
diferente. As ameaças aos ecossistemas aqui são frutos dos impactos ambientais
impostos pela globalização. Esses impactos têm se apresentado de diversos modos o
que tem provocado na rica variedade ambiental e cultural faces diferentes da
exploração. A globalização, aliada à ideia de desenvolvimento ilimitado e necessário
e a “qualquer custo”, se caracterizam como os principais fatores da degradação
socioambiental, do desperdício e principal ameaça à vida na Amazônia.
Globalização e Desenvolvimento Ilimitado
Globalização é um tema convergente que está intrinsecamente ligado às
questões socioambientais e é apontado como um dos responsáveis pela situação
degradante vivida pela humanidade. O termo oferece uma variedade de
interpretações, por estar envolvido em um debate onde são contrapostas duas visões
diferentes: de um lado, um fenômeno real; de outro, por parte dos céticos, tudo não
passa de ilusão (VEIGA, 2006). Sem entrar no mérito dessas questões, a análise do
termo aqui recai sobre o significado para as relações da humanidade com a natureza,
na tentativa de perceber o entendimento e o alcance dos efeitos desse processo da
pós-modernidade, também na região amazônica.
Segundo Robertson (ROBERTSON, 1999), globalização repousa sobre duas
ideias principais: uma basicamente econômica, e se refere à emergência da economia
capitalista global dominada por um pequeno número de empresas multinacionais e
pelos estados-nação; outra entende globalização como uma ameaça não apenas ao
futuro econômico de muitas nações, mas também às suas tradições culturais e
identidades. Nesse contexto, ela não se refere aos processos de ocidentalização,
americanização, modernização ou “imperialismo cultural”, mas “à compressão,
temporal e espacial, do mundo como um todo.” (ibidem, p. 12).
Para Wanderley (WANDERLEY, 2003, p. 213), globalização é “um processo
de aumento gradativo de relações, contatos e fluxos que se estabeleceram entre povos
os mais variados, ocupando regiões dispersas pelo mundo, no campo econômico,
político, cultural e religioso.” Dessa concepção, constata-se a quase certeza que a
globalização, enquanto processo transmundializado, já penetrou quase todos os
cantos do mundo ou está em vias de penetração, alcançando os recantos mais
distantes. Além desse alcance mundial, ela abarca todas as dimensões da vida
humana, desde o micro até ao macro da sociedade.
A tomada de consciência dos efeitos do processo globalizatório e sua
influência em todas as camadas sociais têm favorecido o despertar mundial para as
situações de destruição dos recursos naturais globais e da Amazônia em particular.
37
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1
O relatório foi resultado de um
encontro em Estocolmo,
patrocinado pela Conferência
das Nações Unidas sobre o
Desenvolvimento e o Meio
Ambiente (PNUMA).
Sabendo que o culpado por esses processos é o modelo de desenvolvimento adotado
pelas nações pós-modernas, negociações são feitas, acordos são assinados, tratados
são assumidos e ações são implementadas no intuito de solucionar as crises
provocadas pelos efeitos universais da denominada “crise ecológica” global.
No nível mundial, o relatório intitulado Los Limites del crecimiento1, de
1972, marca o início de um pensamento mundial em relação à crise ambiental e à
necessidade de conservação dos diversos ecossistemas (COSTA, 2006). A
humanidade se conscientiza, por exemplo, que a crise ecológica não se restringe
somente a alguns ecossistemas, mas ao conjunto da biosfera e da humanidade toda.
Com isso, temas capitais para a humanidade são reincorporados nas discussões
políticas, além de reintegrar temas socioambientais na consciência antropológica e
social. Afirma Morin (MORIN, 1997). “A ciência da ecologia diz-nos, com efeito,
que, além de um certo limite, a degradação da natureza é também a degradação da
vida humana...”
Descobriu-se, ainda mais, que as disparidades do desenvolvimento
mostradas na crescente diferença entre o número daqueles que são abastados e
aqueles que vivem na extrema miséria, colocam em cheque a pós-modernidade e
tudo o que ela representa de novidade pela tecnologia avançada e pelos projetos de
desenvolvimento.
Para Peña-Veja (PEÑA-VEJA, 1997), esses projetos desenvolvimentistas
são frutos do “mito do crescimento”, cujo princípio fundamental se baseia na
exploração máxima dos recursos naturais para a promoção do desenvolvimento
humano. No pensamento político, a ideia de um desenvolvimento simplificador e
mutilador dominante determina as relações de dependência dos países ricos com os
países pobres e a submeter uns em relação aos outros, transformando-se em uma
ideia-força. Afirma Peña-Veja (ibidem, p. 204):
Sabemos que a noção de desenvolvimento […] desta metade de século, é
uma palavra mestra na qual se depositaram todas as vulgatas ideológicopolíticas dos anos 50 e 60. Basta ver a abundante literatura publicada
durante este período para perceber como o trono comum da ideologia
técnico-industrial e econômica é uma ideia-força
2
Apesar do mito do progresso e
seus princípios não terem ainda
sido abandonados, ficaram claras
as carências e os limites da
noção de desenvolvimento
implantado nas sociedades
ocidentais.
38
Por outro lado, a mentalidade implantada no ocidente procurou racionalizar o
ser humano para desenvolver a técnica, e não desenvolver a técnica para a promoção
do homem. Com isso, o desenvolvimento entrou em crise, juntamente com a crise do
grande mito moderno do homem ocidental de conquistar a natureza, tornando-se o
soberano do mundo2. Caiu-se na ilusão de que a ciência/técnica/indústria cumpriria o
papel histórico de realização do homem (PEÑA-VEJA, 1997).
O Desenvolvimento Ilimitado na Amazônia
No caso brasileiro e especialmente na região amazônica, aspectos diferentes
da mentalidade desenvolvimentista devem ser levados em conta. Primeiramente é
preciso fazer uma reavaliação do contexto no qual o Brasil se inseriu para entrar no
chamado processo de desenvolvimento e perceber quais as estratégias que teve que
criar para ser introduzido no rol dos países em desenvolvimento e quais as
consequências que sofreu e está sofrendo para se manter em tal colocação.
As respostas podem ser buscadas na história dos vários ciclos econômicos e
da implantação dos vários projetos impostos na região ao longo do período pósguerra (SAUER, 2005). Acompanhando a definição dos caminhos da política e da
economia mundial, a nova relação surgida entre a sociedade brasileira e a natureza foi
regida por uma questão mais ampla que a territorial, configurada a partir de um novo
padrão de inserção dos países nas relações mundiais (BECKER & GOMES, 1993).
Revista Perspectiva Amazônica
Pretendendo alcançar estágios que o equiparasse aos países desenvolvidos, o
Brasil seguiu uma trajetória semelhante à dos demais países em desenvolvimento
(MAY, 2001), conquistando etapas de crescimento científico e tecnológico que
superaram outros do mesmo nível. Com isso, novos elementos se configuraram no
cenário nacional, em que o ambiente foi sendo alterado na perspectiva de
desenvolvimento e a ciência apareceu como capaz de oferecer fundamento para essa
perspectiva.
As primeiras tentativas de exploração da Amazônia foram realizadas pelos
colonizadores que vieram atraídos pelas lendas das riquezas minerais, pela busca de
conhecimento de interesse científico e pelo patriótico ideal de defesa contra os
invasores (BRANCO, 1995). A colonização que marcou o início da depredação do
ecossistema amazônico demonstrou, em seu processo, diversos períodos cuja
pressão exploratória ora ia se acirrando, ora diminuindo, mas, de modo progressivo e
permanente, afirmou-se com projetos desenvolvimentistas para a região
inexplorada.
Assim, a inserção da Amazônia no mundo se deu através de “ondas
históricas”, todas justificadas também por invocações ideológicas (MENDES &
SACHS, 1997). Desde as sesmarias, passando pela coleta das “drogas do sertão”,
extração mineral, extração de madeiras, pelo estímulo para o plantio e cultivo de
monoculturas, caso da soja atualmente, a Amazônia vem sofrendo investidas do
capital exterior que nunca respeitou e nem levou em conta a biodiversidade e a
constituição geofísica da região. Aspectos da colonização antiga, realizada com a
cruz e a espada, são mostrados atualmente numa nova fase de modernização
agregando o dinheiro e a escravidão como móveis da colonização (GONÇALVES,
2005).
Paralelamente aos fatores estratégicos, a coleta dos produtos da floresta foi
um dos principais elementos do processo de ocupação das terras e da formação da
economia da região. Atualmente, a racionalidade tecnológica e o poder do capital,
juntamente com o processo de globalização, subordinando o poder político ao
econômico, garantem a exclusividade da exploração dos recursos locais de acordo
com modelos e relações socioeconômicas que perpetuam os processos de declínio
ecológico e de pobreza humana.
A exploração sistemática que caracteriza a fase moderna foi implantada no
final do século XIX e início do século XX, ao surgir uma economia baseada na
atividade extrativista e mercantilista, cujo produto principal deu nome ao período:
ciclo da borracha. Ao lado da castanha, da juta e de outros produtos de grande valor
comercial, a extração do látex foi o responsável pelo notável surto econômico da
época, registrado no desenvolvimento urbano, político e cultural não só das capitais
Belém e Manaus, mas de outras cidades e vilas da região (ASSAYAG HANAM &
BATALHA, 1999). 3
Esta fase áurea da economia regional denominada Belle Époque teve sua
decadência quando os países desenvolvidos começaram a incrementar a plantação de
seringueiras e produção do látex em lugares considerados mais favoráveis aos seus
interesses. Além disso, a fabricação da borracha sintética impôs um período de
estagnação da economia gomífera na região.
No entanto, passando essa fase de euforia, na metade do século passado
outros fatores comerciais são inseridos na Amazônia, com destaque para a retomada
dos projetos de integração no todo nacional pelo Governo Federal, cujo principal
interesse era tirar a região do abandono e promover o desenvolvimento (ASSAYAG
HANAM & BATALHA, 1999).4 Fruto desse projeto começou-se a construção da
rodovia Belém-Brasília que conduziria à expansão da fronteira agrícola e industrial
Ano 4 N° 7 p .36-48
3
“Este foi um período de utilização
racional dos bens naturais
renováveis, cujo aproveitamento
econômico gerou investimentos de
infra-estrutura adequados ao
crescimento demográfico da
região. O Estado do Amazonas
chegou a arrecadar, em um ano,
40% da receita tributária nacional
e contava com serviços de
comunicação telegráfica,
navegação fluvial, porto, águas e
esgotos. Manaus, classificada
então como a segunda cidade do
Brasil, possuía uma usina
elétrica”. (ASSAYAG HANAN &
BATALHA, 1999. p. 63).
4
“Pode-se balizar a década de 50
como a da retomada da integração
física da Amazônia ao restante do
território brasileiro [...] naquela
época, os poderosos da
comunidade internacional
incentivavam o crescimento
material de um pós-guerra,
envolviam-se em conflitos
localizados e desdenhavam
qualquer preocupação ambiental”.
(ibidem, p. 64ss).
39
Revista Perspectiva Amazônica
Ano4 N° 7 p.36-48
p.36-49
para o coração da Amazônia, projeto amplamente apoiado pela comunidade
internacional do pós-guerra que aparece como uma das principais incentivadoras.
Afirmam os autores (ibidem, p. 64):
Esse comportamento desenvolvimentista refletiu-se e ainda se reflete no
território nacional, em particular naquilo que se convencionou tratar
como Amazônia Legal [...] A expansão da fronteira econômica do Brasil
na Amazônia estende-se ao longo dos principais eixos rodoviários que
cortam a região: as estradas Belém-Brasília, Cuiabá-Porto Velho (BR364); Cuiabá-Santarém e Transamazônica.
5
“Os governos [...] pós-64
definiram como estratégia a
integração nacional, que foi
iniciada pela “operação
Amazônia”, cuja ideologia
serviu de lema ao chamado
Projeto Rondon: “integrar para
não entregar”. (SAUER, 2005, p.
51-66) Ver, sobretudo, o capítulo
II: “As políticas governamentais
para a Amazônia e o Pará.”
6
“As políticas governamentais
para a Amazônia mesclaram a
visão de que era necessário
explorar o imenso potencial
natural da região com a idéia de
'domesticar o ambiente',
transplantando o modelo de
desenvolvimento do sul do país,
calcado principalmente na
necessidade de urbanização.”
(ibidem, p. 51ss).
40
Estes fatores de desenvolvimento repercutiram no todo nacional,
aumentando ainda mais a situação de agressão à natureza e a escassez de seus
recursos.
No período subsequente, o processo da globalização marca a penetração do
capital na região amazônica de modo mais concreto e amplia sua ação quando a
racionalidade do mercado se impôs por intermédio das novas fronteiras econômicas
voltadas, sobretudo, para grandes projetos regionais (SAUER, 2005).5 Esta situação
também favoreceu a descaracterização da cultura regional que, em alguns aspectos,
se enfraqueceu ou sofreu dispersão, e, em outros, influenciou na criação de novas
posturas do amazônida frente à natureza. Grandes projetos como hidrelétricas,
fábrica de celulose, exploração de bauxita, ferro, alumínio, exploração do ouro,
extração da madeira, incentivados pelos investimentos nacionais e estrangeiros
colocaram a Amazônia no giro do capital financeiro internacional, a partir de
parâmetros mundiais de desenvolvimento.
Com o slogan “desenvolvimento com segurança” teve início um
intencionado e amplo projeto de inserção da Amazônia no âmbito nacional e
internacional, criando um corolário de realidades adversas e desafios insuperáveis
relacionados à fauna, flora e água, fontes naturais de vida, que passaram a exigir
atenção e cuidado para serem preservados. A ameaça permanente de extinção da rica
biodiversidade, os desequilíbrios ambientais e sociais em conjunto com a
biopirataria de material genético e o extravio do conhecimento ancestral das
populações nativas para as mãos dos laboratórios estrangeiros colaboraram para o
arrefecimento do processo da globalização presente na Amazônia.
O capital atuante encontrou campo fértil na região por causa de sua riqueza
em recursos naturais e pela facilidade de sua exploração, o que trouxe profundas
alterações para a natureza e para as populações. Com isso, surge como resultado, nos
aglomerados urbanos, violência urbana e rural com cifras assustadoras, além de
grande quantidade de pessoas sujeitas à fome e às carências materiais e espirituais, e
a proliferação de novas formas de exploração motivadas pelo fácil acúmulo de
6
riquezas (SAUER, 2005).
Para Hogan (HOGAN, 1993), o crescimento demográfico é identificado
como o principal vilão provocador de todo esse impacto. Este não se restringe
somente às pressões da população sobre os recursos naturais em busca de sustento e
desenvolvimento, embora tenha sido considerado o maior culpado pelo esgotamento
dos recursos e pela degradação ambiental. Esta versão de entendimento e de
conhecimento do causador do impacto, no entanto, tornou-se agravante, deslocando
o foco de atenção da tríade população/meio ambiente/desenvolvimento para os
processos que advém de um histórico caracterizado fortemente pela migração
(HOGAN, 1993).
Paralelamente a isso, foi adotado um caminho do “desenvolvimento a
qualquer custo” onde o Brasil, querendo sair do atraso e, sem clareza dos objetivos
que seriam alcançados com as ações tomadas e sem modelos sobre os quais se pautar,
Revista Perspectiva Amazônica
acelerou um processo de exploração da natureza sem respeitar o limite de capacidade
de recarga dos ecossistemas. Dessa forma, a Amazônia, detentora das maiores
reservas de recursos naturais do planeta, representada, sobretudo, pela grande
riqueza florestal e pela biodiversidade, foi sendo ocupada sem planejamento e sem
estudo da vocação natural do solo.
Atividades de grande impacto como a extração de madeira, produção de
carvão vegetal para a indústria de ferro-gusa, instalação de empresas de mineração,
exploração de petróleo e as hidroelétricas, em conjunto com a ganância e a busca do
lucro fácil, levaram também para a região a garimpagem, a pesca e a caça predatórias,
contribuindo para os processos de degradação.
Pela imposição de proibições para a exploração dos recursos naturais para
não depredá-los, ou pela não obtenção de recursos para viabilizar a sustentabilidade
dos projetos, o que acaba ocorrendo na região “é a exploração clandestina dos
recursos naturais, gerada pela pressão antrópica descontrolada” (ASSAYAG
HANAN & BATALHA, 1999, p. 66).
O histórico dos megaprojetos mostra que alguns fatores devem ser levados
em conta quando se trata de discutir os movimentos de industrialização de algumas
áreas da Amazônia, como aquelas favorecidas pelo estabelecimento de grandes
empresas de extração de minérios, em que os impactos provocados por essas
atividades se manifestam com uma proporção tal que é impossível serem
imaginados.
Caso recente é o relatório apresentado na audiência pública realizada no mês
de maio de 2007, no município de Juruti/PA, onde foi instalada uma grande empresa
exploradora de bauxita (FRENTE DE DEFESA DA AMAZÔNIA, CEAPAC, 2007).
A Procuradoria de Justiça da região constatou e lamentou o fato de a empresa, na fase
do licenciamento, haver abandonado o diálogo com o Ministério Público, por causa
do cumprimento do cronograma de instalação. Isso levou a empresa a omitir, nos
mapas oficiais que se encontravam na internet, várias comunidades da região do lago
de Juruti Velho. Cerca de nove mil pessoas se encontravam apagadas nos planos de
instalação da obra.
Além disso, outros agravantes como o aumento populacional da cidade de
Juruti e um grande impacto nas contas públicas, a necessidade da construção de
estradas e hospital para acolher a população que acorreu para a região, juntamente
com o aumento da violência, provocou alterações nas relações sociais da população.
Porém, a principal violência, conforme relatório da Procuradoria foi a
destruição da base de sobrevivência pela invasão de terrenos e plantações e pelo
aproveitamento, por parte da empresa, da água, da terra e da biodiversidade da
região, em detrimento da população que ficou à margem do projeto.
Por ocasião da audiência pública foi denunciado também o assoreamento dos
igarapés do Jará e do Fifi que foram, por um grande período, os destinatários finais
dos dejetos oriundos da higiene pessoal dos funcionários da empresa em seus
alojamentos. Além disso, as nascentes do igarapé do Prudêncio, em Juruti Velho,
sofreram erosão e tiveram suas águas poluídas em razão das obras realizadas pela
mineradora.
Do mesmo modo, têm acontecido em outros municípios da região Oeste do
Estado do Pará grilagens de terra e extração desordenada de madeira para preparar o
terreno para o plantio de soja motivado, sobretudo, pela instalação na cidade de
Santarém, de um porto graneleiro. Aliadas a esse fator, as políticas públicas do
Governo Federal para assentamentos na região têm provocado desentendimentos
quanto às responsabilidades de cada órgão pelos conflitos que deles decorrem. Há um
permanente “jogo de empurra-empurra” entre os órgãos federais e estaduais, o que
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Revista Perspectiva Amazônica
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acaba beneficiando os grileiros de terras públicas (SAUER, 2005).
O desenvolvimento aplicado na Amazônia vem acompanhado de uma carga
preconceituosa, o que favorece a instalação de projetos empresariais e leva à
exploração da mão de obra local, além da degradação dos ecossistemas. Grandes
empreendimentos de capital nacional e internacional, quase sempre apoiados pelo
Governo brasileiro, favorecem ações degradantes à natureza e colaboram para a
penetração de novos mecanismos de exploração como o capital especulativo e a
monocultura de exportação.
Embora a globalização com suas características tenham contribuído para o
desenvolvimento regional, pois acalentam diversos segmentos sociais e aumentam
as expectativas de rápida industrialização regional, contribuem e muito para os
processos destrutivos. Afirma Monteiro (MONTEIRO, 2005, p. 157): “...as
dinâmicas derivadas das atividades voltadas à extração e à transformação industrial
de minerais incluem-se, seguramente, entre os mais expressivos elementos que
contribuíram e contribuem para a efetivação de significativas mudanças na
Amazônia oriental brasileira”.
Para piorar ainda mais a situação o desenvolvimento descontrolado, além de
desestabilizar os ecossistemas, cria uma nova realidade caracterizada pelo abandono das
populações que se tornam joguetes nos projetos das grandes incorporadoras financeiras,
produzindo situações de desumanização e colaborando para o aceleramento das
condições de miséria das populações e de destruição dos ecossistemas.
Ethos Amazônida e Crítica ao “Desenvolvimento Ilimitado”
A análise da realidade amazônica faz ver que o ethos regional está passando
por grandes transformações, não somente pelas provocadas pela globalização, mas
por outras que mostram o despertar crítico diante da história e uma maior organização
e participação na reivindicação de seus direitos sociais. Isso se dá, por exemplo,
quando o homem regional totalmente integrado ao mundo natural tem receio de sua
destruição total. Para Oliveira (OLIVEIRA, 2000), esta realidade demonstra ser um
espaço contraditório, pois nesse “universo simbólico”, entrecruzam-se elementos de
caráter crítico em relação à vida, motivados pela mentalidade técnico-científica
globalizada que se universaliza, com elementos mais tradicionais, de caráter prémoderno, mais ético e religioso.
De fato, no relacionamento com o mundo, com o outro e com a realidade que o
cerca, o ser humano gera valores segundo os quais organiza a sua vida econômica,
política e cultural. Ao realizar essa organização não prescinde daquilo que vai
adquirindo ao longo da construção de sua história, e, na reação aos estímulos e
conteúdos, dá também a sua contribuição. Desse modo, ele pode fundamentar seu
agir dentro de valores que garantam os direitos da pessoa, a construção de uma
sociedade justa e solidária, a verdade e a paz.
Antes de analisar alguns conteúdos que determinam o novo ethos do homem
amazônida revelador do compromisso com a história e uma visão crítica diante da
situação desumana vivida, é necessário apresentar os elementos formadores da
cosmovisão amazônica e que são aproveitados pela ideologia da globalização, em sua
dinâmica de manutenção da população cada vez mais aprisionada e alienada por um
discurso de falsas promessas. Os pontos que merecem destaque são os seguintes:
1. Uma forte referência do amazônida à natureza, à terra-mãe, que mantém e envolve
sua vida ao próprio lugar onde mora. Dessa concepção, advém como atitudes submissão aos
ciclos e passividade diante das leis que fazem funcionar a sociedade, consideradas imutáveis;
2. O entendimento de si mesmo como uma peça do mundo, submetido a suas
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Revista Perspectiva Amazônica
leis imutáveis e a seu destino. Daí a crença de que sua ação já está estabelecida pela
própria ordem cósmica, de modo que ele se sente mais objeto do que sujeito do
mundo;
3. A concepção do trabalho como uma espécie de necessidade ou mesmo de
servidão, dentro de uma vida experimentada originalmente como passiva e
submetida ao que é fora do homem. Assim, com esse pensamento, interpreta a sua
vida e a história coletiva como o cumprimento de um destino, de um plano
estabelecido por Deus desde toda a eternidade;
4. Sentindo-se parte da natureza como um todo, ele se sente também parte da
sociedade humana, também ela entendida como totalidade orgânica, hierárquica e
imutável, que tem uma estrutura semelhante à ordem natural. A atitude diante disso é a
resignação, a obediência diante das autoridades constituídas e das instituições vigentes;
Grandes grupos econômicos e parte do Governo se aproveitam desse
conhecimento para implantar uma ideologia de fortalecimento desta visão em função
de seus interesses. Através de parcerias com o poder público, com grupos
empresariais e com alguns meios de comunicação, realizam e divulgam ações sociais
em favor de pequenos grupos de riscos, como formas de mascarar e até mesmo
ocultar os processos destrutivos com suas intervenções na região, que são bem mais
amplas que aquelas.
Porém, outra realidade está surgindo, graças às intervenções de vários atores,
fazendo despertar na região uma nova visão de mundo cujo resultado é a construção de
um ethos que assume papel diferente. Inverso daquele primeiro, o novo que se insurge
passa a criticar as atitudes de inércia diante da situação de degradação e a fortalecer
aquelas que cooperam para a manutenção do equilíbrio na relação homem-natureza.
Trata-se de uma nova consciência social e política, embasada na dimensão
ético-religiosa, que ajuda a confrontar projetos do homem que vão de encontro às
situações degradantes que proliferam na região. Para Leonardo Boff, constitui-se da
inauguração de uma nova aliança para com a terra, residindo no resgate da dimensão
do sagrado. De fato: “sem o sagrado, a afirmação da dignidade da Terra e do limite a
ser imposto ao nosso desejo de exploração de suas potencialidades permanece uma
retórica sem efeito” (BOFF, 2004, p. 160).
Além disso, acredita-se ser um despertar da sociedade amazônica que ao
longo de sua história foi sempre envolvida por interesses externos e viveu
subordinada aos projetos econômicos de fora que buscam, de modo permanente em
seu território, as riquezas para continuar a dinâmica do capital internacional
A análise de um documento intitulado “Carta de Santarém”, fruto de uma
audiência pública promovida pela Ordem dos Advogados do Brasil - OAB Subseção
Santarém e com a participação de mais de vinte entidades representativas da
sociedade do Baixo Amazonas, ilustra a tomada de consciência e o novo ethos que
está surgindo.
A audiência pública ocorreu no dia 30 de agosto no auditório da Universidade
Federal do Oeste do Pará, UFOPA, que tratou das hidrelétricas no rio Tapajós, com o
t e m a “ H i d r e l é t r i c a s n o Ta p a j ó s , p e r s p e c t i v a s e i m p a c t o s . ”
(www.ihu.unisinos.br/noticias/523271 - hidreletricas-no-tapajos-audiencia-publica
Acessado dia 15 de setembro de 2013).
Foram enviadas cópias da “Carta de Santarém” às Comissões de Direitos
Humanos da OEA, ONU, MPF, Presidente Dilma e seus associados. A carta é um
grito de resistência, resultado do aprofundamento das organizações sociais
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e no envolvimento das mesmas, nos debates acerca da degradação da dignidade
humana que se concentra na região. A carta deixa claro que cresce entre as
populações da região a conscientização da falta de sensibilidade e respeito por parte
do Governo Federal e de outros setores da sociedade, em relação aos povos e
ecossistemas da Amazônia.
Após a leitura da íntegra do documento, será feita a análise pertinente ao tema
proposto.
CARTA DE SANTARÉM
“Nós da sociedade civil organizada de Santarém e região, povos e
comunidades tradicionais, reunidos em Audiência Pública, realizada em
Santarém - PA, no dia 30 de agosto de 2013, convocada pela OAB Ordem dos Advogados do Brasil - Subseção Santarém e pelos
Movimentos Sociais da região, com o tema: HIDRELÉTRICAS NO
TAPAJÓS: PERSPECTIVAS E IMPACTOS, por meio desta carta,
manifestaram que NÃO CONCORDAMOS COM A CONSTRUÇÃO
DAS HIDRELÉTRICAS NO RIO TAPAJÓS!
Na Audiência Pública representantes da Eletrobrás/Eletronorte e de
empresas contratadas para a realização do empreendimento, tentaram
convencer que as hidrelétricas na Bacia do Rio Tapajós são uma
necessidade para o Brasil. Cerca de 180 participantes, vindos de terras
indígenas, comunidades rurais e cidades da região, aprenderam detalhes
da perversidade do plano do Governo Federal para barramento do Rio
Tapajós e seus afluentes. Os argumentos dos representantes do governo
revelaram que as hidrelétricas seriam construídas em sacrifício dos
povos e comunidades tradicionais e em beneficio de uma pequena elite
de grandes empreiteiras e mineradoras.
Questionados sobre a invasão do governo nos territórios Munduruku e
nos territórios tradicionalmente ocupados, com aparato militar em
operação de guerra, os representantes do governo e seus técnicos
contratados responderam que é “apenas” uma questão de “discreta e
democrática” proteção ao trabalho de pesquisa para o EIA/RIMA
esperado pelo IBAMA. No entanto, para os representantes dos povos e
comunidades tradicionais presentes isso é uma agressão arbitrária e
intimidatória. Em resposta, manifestaram-se representações dos povos e
comunidades Tradicionais:
“Vocês são um bando de covardes, pois entram em nossa casa. Vocês têm
medo de nós. Nós não somos ameaça. Vocês são ameaça, pois só estamos
defendendo o que é nosso.” (liderança Munduruku).
“Estamos representando mais de 20 mil pessoas da RESEX TapajósArapiuns. Viemos aqui dizer que não queremos as hidrelétricas, não
precisamos dessas hidrelétricas.” (liderança ribeirinha).
“Queremos o direito de viver, de criar nossos filhos, de trabalhar. Não
queremos morrer afogados. O recado está dado: Nós vamos resistir até o
fim. A luta continua!”(liderança indígena).
“Vamos lutar até a morte para não acontecer essas hidrelétricas.
Ninguém é bandido, nós ficamos espantados com tanta polícia.”
(liderança beiradeira).
As falas aqui transcritas manifestam a indignação da população do
Tapajós, agredida, porém resistente frente à ofensiva que está
acontecendo de maneira violenta e autoritária.
Denunciamos o claro descumprimento da Constituição Federal e da
Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da
qual o Brasil é signatário. O Brasil assumiu o compromisso de realizar
consultas prévias em qualquer projeto ou decisão de governo que
venha a afetar, modificar, de forma permanente e irreversível, a vida de
povos indígenas, tribais e tradicionais. Trata-se, portanto, de um
direito constituído que tem sido violado pelo governo por meio de
decisões autoritárias de membros do judiciário.
Em vergonhosa e covarde afronta à dignidade dos indígenas e à
seriedade do Estado brasileiro, os mais de 140 índios presentes em uma
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Revista Perspectiva Amazônica
reunião em Brasília, em junho de 2013, ouviram do ministrochefe da Secretaria Geral da Presidência da República que:
“mesmo após consulta pública, os índios não terão poder de veto à
construção das hidrelétricas”.
A autoritária e equivocada política energética do governo
brasileiro oprime os povos indígenas e as organizações da
sociedade que estão cientes de seus direitos e das obrigações do
Estado. As ações do governo brasileiro tem sido típicas de regimes
totalitários e ditatoriais que, recentemente, levaram à morte dois
indígenas (Munduruku e Terena) e instalaram um clima de terror
em seus territórios.
Ao mesmo tempo em que denunciamos as arbitrariedades do
Governo Federal, que impõe seu projeto de crescimento
econômico a qualquer custo e sem respeito aos direitos humanos
dos povos do Tapajós, manifestamos completa rejeição à
implantação de hidrelétricas, as quais trarão impactos
irreversíveis aos povos e à natureza na região do Tapajós.
Requeremos do Supremo Tribunal Federal que exija da
presidência da república o respeito aos direitos humanos como
manda a Constituição Federal, como a consulta prévia antes de
iniciar obras de tão grandes impactos como as hidroelétricas na
bacia do Tapajós que ameaçam de forma irreversível os ciclos
naturais das áreas de maior biodiversidade do planeta. Solicitamos
também aos órgãos de direitos humanos da Organização dos
Estados Americanos - OEA e da Organização das Nações Unidas ONU que intervenham junto ao Governo Federal brasileiro por
desrespeitar tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Santarém, Pará, 30 de agosto de 2013.
1.
Associação Comunitária de Montanha e Mangabal
2.
FAMCOS
3.
International Rivers
4.
Movimento Tapajós Vivo – MTV
5.
Centro de Estudo, Pesquisa e Formação dos Trabalhadores
do Baixo Amazonas – CEFTBAM
6.
Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP/Santarém
7.
Projeto Saúde e Alegria – PSA
8.
Colônia de Pescadores Z- 20
9.
Comunidade Indígena de Pinhel – Rio Tapajós IAPAPI
10. Movimento de Trabalhadores por Luta e Moradia – MTLM
11. Associação indígena Pahyhyp – ITAITUBA
12. GCI/CITA
13. Grupo de Defesa da Amazônia-GDA
14. Movimento Salve o Juá
15. Associação Maira – Resex Tapajós
16. Ecotore
17. FAOR
18. OAB subseção Santarém
19. CEAPAC
20. Movimento Roda de Curimbó
21. Associação da Comunidade de Nuquini – Tapajós
22. Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Santarém
23. ASBAMA
24. SINSOP
25. Associação Irmã Dulce
26. UES
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Revista Perspectiva Amazônica
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A carta é fruto do despertar das consciências das pessoas acerca das formas de
destruição que se desenvolveram na Amazônia nas últimas décadas, cujo resultado é
a mobilização dos grupos sociais reivindicando direitos. Encontros como esses
acontecem em toda a região, tendo como motivação principal o engajamento dos
movimentos de defesa dos direitos humanos, pastorais sociais, minorias étnicas,
Ministério Público, OAB, sindicatos, associações e etc.
Os elementos a serem destacados dizem respeito a uma pedagogia que provoca
novos comportamentos, alimenta novos sonhos e reforça uma nova benevolência para
com a criação (BOFF, 2004). Ao mesmo tempo em que provoca atitudes de veneração,
respeito para com a natureza, por isso, fundamentalmente ética, incute na pessoa a
consciência de ser sujeito responsável por sua vida e pela criação e que a realidade
social é uma produção histórica que pode ser transformada (OLIVEIRA, 2000).
A análise deixa explícito um eixo central revelado pelo ethos amazônida que
exprime, antes de tudo, uma intelecção do mundo enriquecido com os conteúdos
éticos revelados pelo imaginário simbólico e pelas práticas decorrentes da situação
vivida. Percebe-se assim, que as novas posturas e novos modos de ser e de reagir
diante da realidade são assumidos, deixando transparecer frutos como resultados de
uma luta contra as forças destrutivas na região. E, a partir daí, “o ser humano se
autocompreende a si, suas relações com seus outros irmãos na vida humana, com a
natureza e todo o universo das coisas” (LIBANIO & MURAD, 1996, p. 289).
O ethos regional bastante caracterizado se encontra no modo de se relacionar com a
natureza, onde o sagrado e o profano, o mito e a religião, embora com linguagens diferentes,
constroem as relações sociais e decodificam os signos inserindo-os no cotidiano. Imbuídos
dessa realidade rica e sugestiva, os povos da Amazônia percebem o conflito permanente
entre as situações de destruição e negação do humano e as lutas em defesa da vida e do
ambiente natural nela presente. Por isso, hoje, mais do que em outros tempos, é urgente
juntar os esforços em vista do resgate do verdadeiro sentido que o imaginário amazônico
exprime, para garantir a fonte de valores defensivos da natureza presentes nele.
Considerações Finais
Entre os elementos destacados na “Carta de Santarém” que mostram valores
autóctones reveladores da nova postura das populações amazônicas que se juntam
organizadamente em defesa da vida em todos os seus aspectos, projetam-se os seguintes:
1. Na denúncia dos interesses do Estado voltados para a aprovação de grandes
projetos em vista do favorecimento de grupos econômicos, percebe-se a gestação de
um novo ambiente cultural entre impactados, começando a situar-se diferentemente
no mundo social. As populações não se consideram mais simplesmente como peças de
uma máquina, mas tomam consciência da organização da sociedade e seu
funcionamento. Passam a ter uma visão histórica da vida. “Queremos o direito de
viver, de criar nossos filhos, de trabalhar. Não queremos morrer afogados. O recado
está dado: Nós vamos resistir até o fim. A luta continua!” (liderança indígena).
2. A consciência de que são povos que lutam contra aqueles que destroem a
vida e os recursos naturais faz surgir nas pequenas comunidades uma nova tarefa a ser
executada: defender os direitos conquistados na esfera nacional e internacional, em
vista da construção de uma sociedade organizada a partir da solidariedade universal,
em que haja a participação e não a exploração e a dominação.
O Brasil assumiu o compromisso de realizar consultas prévias em
qualquer projeto ou decisão de governo que venha a afetar, modificar,
de forma permanente e irreversível, a vida de povos indígenas, tribais e
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Revista Perspectiva Amazônica
tradicionais. Trata-se, portanto, de um direito constituído que tem sido violado
pelo governo por meio de decisões autoritárias de membros do judiciário.
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3. A luta pela defesa e igualdade dos direitos humanos, como valor-eixo,
exclui qualquer tipo de discriminação de qualquer povo provocada por qualquer tipo
de projeto. Vínculos de solidariedade e comunhão com a criação hoje e no futuro
aparecem como constitutivos da vida do dia a dia, que contrariam os projetos que
trazem impactos irreversíveis à natureza e às pessoas.
Ao mesmo tempo em que denunciamos as arbitrariedades do Governo
Federal, que impõe seu projeto de crescimento econômico a qualquer
custo e sem respeito aos direitos humanos dos povos do Tapajós,
manifestamos completa rejeição à implantação de hidrelétricas, as quais
trarão impactos irreversíveis aos povos e à natureza na região do Tapajós.
4. As atitudes tomadas resultam em organizações de resistência, com ênfase
na participação, na espontaneidade, e na valorização da diversidade. Aumenta-se a
sensibilidade diante dos problemas socioambientais e a necessidade do diálogo com
as diversas tradições culturais, salvaguardando sua autonomia e a maior
biodiversidade do planeta.
A autoritária e equivocada política energética do governo brasileiro
oprime os povos indígenas e as organizações da sociedade que estão
cientes de seus direitos e das obrigações do Estado. As ações do governo
brasileiro tem sido típicas de regimes totalitários e ditatoriais que,
recentemente, levaram à morte dois indígenas (Munduruku e Terena) e
instalaram um clima de terror em seus territórios.
5. O surgimento de uma nova imagem de Deus, não mais como o Senhor todopoderoso que garante a ordem cósmica e social, mas como aquele que intervém na
história coletiva para libertar os grupos humanos oprimidos e fazer deles um povo de
homens livres e solidários, isto é, um povo de irmãos e irmãs. Com isso, crescem os
apelos em favor da justiça, redescobre-se o sentido da festa, valorizam-se os
símbolos e a gratuidade nas relações humanas.
As atitudes ressaltadas no documento contrariam a visão de mundo envolvida
pela globalização e seu sistema propagado, ao mesmo tempo em que a combatem. Ao
criticar o sistema propagado pela globalização e seus efeitos, o novo ethos pode ser
condensado nas seguintes proposições: a) o ser humano não está sozinho no mundo.
Ele é filho da terra e com ela mantém uma relação mediatizada pela subjetividade; b)
o caráter de religação que cada ser humano tem com a imensa cadeia viva da terra, o
que faz nascer o sentimento de auto-estima e de descoberta do próprio sagrado que
produz intimidade.
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Acessado dia 15 de set. de 2013.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.49-56
O Negro Nas Lendas e Mitos de Monte Alegre
Sales Martins da Silva*
RESUMO
O objetivo deste artigo é interpretar como a imagem do negro está inserida nas narrativas
montealegrenses possuidoras de personagens com características afro-brasileiras. Uma vez que a
sociedade brasileira vive um novo contexto em relação à história e cultura afro-brasileira é
pertinente analisar as personagens e averiguar existência de discriminação, simultaneamente a
investigação contribuirá para a utilização das lendas e mitos como ferramentas pedagógicas que
auxiliarão o ensino de história, levando os alunos da parte para o todo e do todo para a parte, ou seja,
o estudo aprendizagem se dará do simples para o complexo e do complexo para o simples. As fontes
de pesquisa, analisadas e contextualizadas por meio da historiográfica. O município de Monte
Alegre, no Oeste do Pará, assim como em todo o Brasil, possui um conjunto de lendas e mitos, que
fazem parte da sua manifestação cultural pela qual expõe a sua identidade, revelando assim a sua
posição referente aos afro-brasileiros no passado, especificamente na antes e depois da abolição da
escravatura no século XIX. As narrativas locais refletem a mentalidade da sociedade hierárquica
brasileira, portanto retratam o preconceito, ou seja, as relações sociais entre brancos e negros, mas
também é possível encontrar aspectos da cultura afro-brasileira.
Palavras-chave: Lendas. Mitos. Monte Alegre. Afro-brasileiro. Ensino.
ABSTRACT
The purpose of this article is to interpret how the image of blacks is placed in the narratives from
Monte Alegre that feature characters with African-Brazilian characteristics. Once the Brazilian
society lives a new context in relation to the African-Brazilian history and culture it will be
pertinent to analyze the characters and ascertain whether discrimination, simultaneous to an
investigation will contribute to the use of the legends and myths as pedagogical tools that will aid
in the teaching of history, taking the students from a piece to the whole and from the whole to a
piece, in other words, the study learning will take one from the simple to the complex and from the
complex to the simple. The research sources, analyzed and contextualized by historiography. The
municipality of Monte Alegre, in the West of Pará, just like in all of Brazil, has a set of legends and
myths, that are a part of its cultural manifestation which exposes its identity, revealing the city's
position in reference to the African-Brazilians in the past, specifically in before and after the
abolition of slavery in the nineteenth century. The local narratives reflect the mentality of the
hierarchical Brazilian society, and therefore portray prejudice, in other words, the social
relations between whites and blacks, but it is also possible to find aspects of African-Brazilian
culture.
Key words: Legends. Myths. Monte Alegre. African-Brazilian. Teaching.
*Graduado em Licenciatura Plena em História pela Universidade Estadual Vale do Acaraú, aluno do curso de pós graduação Lato sensu em História e Cultura Afrobrasileira da FINON, atua como professor da rede estadual nas turmas de ensino médio da Escola Francisco Nobre de Almeida e Pretextato da Costa Alvarenga.
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Revista Perspectiva Amazônica
Introdução
Ano 4 N° 7 p.49-56
Neste trabalho o enfoque são as personagens negras, encontradas nas lendas e
mitos do município de Monte Alegre, Oeste do Pará, que se passam durante o século
XIX. Pela possibilidade das narrativas serem utilizadas nas aulas de história e cultura
afro-brasileira, elas podem expor uma figura estereotipada do negro, diminuindo a
autoestima de alunos do ensino fundamental, já que as histórias possuem
características de um período histórico onde a cultura negra foi menosprezada por
uma minoritária elite de brancos.
A condição do negro, no passado, pode ser analisada através dos mitos e
lendas, que permite compreender como as personagens afro-brasileiras estão
inseridas nas histórias de uma sociedade hierárquica. Verificar a existência ou não do
descaso com o negro, na sociedade montealegrense, manifestada nas lendas
mitológicas, devido expressarem a identidade social de um grupo sempre aceito pelo
seu todo e perceber a cultura afro-brasileira.
Além disso, o contexto educacional no ensino da história e cultura afrobrasileira nas escolas torna pertinente averiguar a existência do preconceito racial
com o negro nas lendas e mitos locais, pois são ferramentas que devem ser
trabalhadas de maneira que não venham ofender os discentes afro-brasileiros.
A discriminação racial e social com o negro e as tentativas coletivas ou
individuais desse grupo para fugir do preconceito são realidades encontradas nas
narrativas populares, manifestações culturais, acarretadas de significados que
demonstram essa dinâmica. Então analisá-las e captar as personagens, neste caso os
afro-brasileiros das histórias de Monte Alegre, é entender qual o olhar dos
montealegrenses sobre eles, no decorrer da sua história.
Desde quando o negro chegou ao Brasil, para suprir a necessidade da mão de
obra, a sua força de trabalho predominou em nossa sociedade, não só no setor
econômico, mas no social e cultural também. “As relações entre brancos e negros, ou
seja, senhor e escravo levaram a sociedade escravista brasileira a ter preconceito
próprio contra os negros.” (ALGRANTI, 1997, p.143).
Neste sentido, a posição que era imposta aos afro-brasileiros, no meio social,
revela o perfil de uma sociedade preconceituosa, sendo esta uma das suas marcas,
expressadas nas manifestações culturais, entre elas, as narrativas populares.
“As lendas e mitos fazem parte das culturas e só possuem entendimento
quando relacionadas à realidade de um grupo da qual faz parte da sua história.”
(SANTOS, 1994, p. 143). Por está razão as lendas analisadas neste trabalho serão
contextualizadas com o período histórico em que elas ocorrem, para acompanhar
a situação dos negros e como eram vistos na sociedade controlada pelos brancos.
Monte Alegre, assim como em todo o Brasil, possui na sua formação a
mescla das três culturas, branca, indígena e negra, fazendo parte da sua
identidade à diversidade cultural, entretanto, sendo mais predominante a cultura
indígena.
No seu conjunto de lendas e mitos são perceptíveis os traços dos três
grupos étnicos, onde é possível observar a condição social das pessoas de cor
negra, idealizada e materializada pela classe dominante.
Diante disto, existe a possibilidade das personagens que remetem a
figura do negro estarem inseridas de forma preconceituosa, demonstrando o
racismo e por isso aparecem de forma inferior. Por outro lado, as narrativas
podem estar apenas reproduzindo contemporaneidade da época. E por último
podem, por ventura, estar nas histórias, com a finalidade de serem valorizados e
repassar esse ideal a sociedade local.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.49-56
Cultura
O entendimento do termo cultura é fundamental para realização desta
pesquisa, pois elementos culturais, mitos e lendas, serão utilizados como objeto de
estudo.
Santos (1994, p. 47) ressalta que:
Lendas ou crenças, festas ou jogos, costumes ou tradições
esses fenômenos não dizem nada por si mesmos, eles apenas
o dizem enquanto parte de uma cultura, a qual não pode ser
entendida sem referencia a realidade social de que faz parte, à
história de sua sociedade.
Compreende-se então, que tudo que está relacionado à cultura deve estar
ligado ao passado e ao presente de um povo. “Pois a cultura é antes de tudo uma obra
coletiva” (MELLO, 1982, p. 60).
Burke (1989, p. 25) “hoje contudo seguindo o exemplo dos antropólogos, os
historiadores e outros usam o termo "cultura" muito mais amplamente, para referir-se
a quase tudo que pode ser apreendido em uma dada sociedade, como comer, beber,
andar, falar, silenciar e assim por diante.”
Assim, pode-se definir cultura como o modo de ser de um povo, envolvendo
tudo o que produzem; leis, comidas, religião, ideologia, natureza e outros fatores,
representados nas manifestações culturais, que contribuem para que um grupo social
seja único.
Folclore
Muito se discutiu sobre o significado da palavra folclore, mas foi no o VIII
Congresso de Folclore Brasileiro em 1995, que surgiu o conceito que será utilizado
neste trabalho. O folclore então foi definido como:
o conjunto das criações culturais de uma comunidade,
baseado nas suas tradições expressas individualmente ou
coletivamente, representativo de sua identidade social.
Constituem-se fatores de identificação da manifestação
folclórica : aceitação coletiva, tradicionalidade,
diminamicidade e funcionalidade. Ressaltamos que
entendemos folclore e cultura popular como equivalentes,
em sintonia como preconiza a Unesco. A expressão cultura
popular manter-se-a no singular, embora entendendo-se que
existem tantas outras culturas quantos sejam os grupos que as
produzem em contextos naturais e econômicos específicos.
(CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO, 1995)
Delbem (2007), define folclore como um produto do meio social, que é
acolhido pelo todo e manifestado no dia a dia. Neste mesmo sentido, Trindade (2010,
p. 08) descreve folclore como “a ciência humana e social que estuda os fatos e as
relações, os processos e as realizações de um grupo social [...] resultantes da difusão
no tempo e no espaço”.
Diante disso, folclore, neste artigo, é definido como um conjunto de representações
de elementos culturais que identifica um grupo social.
Lendas e Mitos: Representação do Real
Compreendendo que o modo de ser de um povo, entendido neste trabalho
como cultura, é representado por meio do folclore, torna-se pertinente utilizar
como fonte de pesquisa as narrativas populares, com personagens negros,
encontradas na biblioteca municipal da cidade de Monte Alegre, onde estão
registradas as lendas e mitos locais. Mas antes de fazer a revisão literária é
preciso compreender o conceito de lenda e mito e a sua importância neste artigo.
51
Revista Perspectiva Amazônica
Cascudo (1979, p. 439 - 440) afirma que
Ano 4 N° 7 p.49-56
Lenda é a mistura do real com a imaginação humana que
repassam episódio heróico ou sentimental com elemento
maravilhoso ou sobre humano, que são transmitidos e
conservado pela oralidade de geração em geração e o mito
um sistema de lendas, que não possui fixação, ou seja,
ocorrem antes dos fatos históricos.
O autor confirma que as lendas e mitos possuem o mesmo sentido, entretanto
ocorrem em tempos diferentes, onde as lendas acompanham o decorrer da história e
os mitos ocorrem antes dos acontecimentos históricos. Embora o autor confirme o
elemento fantasioso existente nas narrativas, ele também afirma que a realidade está
presente nelas. Com isso, as estórias, possuem um fundo de verdade, pois antes de
receberem as características fictícias eram fatos reais e não duvidosos.
Já Pereira (2008, p. 18) em seu trabalho do Painel de Lendas e Mitos da
Amazônia entende que “lendas e mitos são símbolos diferentes para identificar a
mesma coisa, mas são sinônimos, sendo que a lenda possui um termo poético”. As
narrativas são distintas, entretanto caminham para o mesmo lugar, mas o que deve ser
dado ênfase na fala deste autor é a sua afirmação quanto as narrativas serem símbolos
que identificam algo.
Assim, as conclusões dos dois autores dão suporte para que as lendas e mitos,
tomadas como fonte de pesquisa, sejam analisadas não como verdades, mas pela sua
representação do real, transmitida por meio de elementos que auxiliam a identificar
algo, neste caso a forma que o negro está inserido nas narrativas montealegrenses.
Lendas e Mitos de Monte Alegre
“As lendas e mitos de Monte Alegre são contadas de geração para geração e
são tidas como fato real por muitos montealegrenses. Antigos moradores locais
confirmam a veracidade de todas elas”. (BAIA, 1997, p.100)
As lendas e mitos montealegrenses mais conhecidas pela população local são:
A cidade Encantada do Gurupatuba, A Cobra Grande Rainha da Serra do Paytuna, A
Fortuna do Pote, A Infeliz Perpetua, A lenda do Paytunaré, A Lenda da Serra Azul, A
Lenda da Tapiira – iauara, A Sereia do Gurupatuba e O Coronel e a Cobra Grande.
Dentre as narrativas citadas acima, foram diagnosticadas duas lendas com
personagens negros, entre elas: Fortuna do Pote e A Lenda da Serra Azul.
Imagem do Negro nas Lendas de Monte Alegre
As lendas, A Fortuna do Pote e a Lenda da Serra Azul, mostram duas
personagens de cor negra, onde uma está na condição de escravo e outra personagem de
homem livre. Neste sentido, é possível dizer que na primeira lenda a imagem do negro
está inserida de forma discriminatória, pois, além de ser um prisioneiro, a narrativa não
cita o seu nome, sendo mencionado na lenda apenas como o escravo, indicando ser uma
figura sem importância. Já a segunda personagem, por não ser um cativo e possuir
nome, “Bandeira”, e até apelido, “Preto Velho”, aparenta estar em uma posição melhor
ou mais valorizada, em relação à personagem da Fortuna do Pote. Entretanto, em um
segundo olhar, verifica-se que o escravo possui uma forte relação de amizade com o seu
patrão. A afinidade é descrita quando a lenda expõe os motivos pelo qual o cativo
revelou a localização do tesouro ao seu senhor. Enquanto que Bandeira, apesar de ser
um homem livre, encontra-se desempregado, situação identificada pelo fato de nenhum
outro indivíduo da estória, aceitar realizar a tarefa de solucionar o mistério da fazenda.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.49-56
Deste modo, o “trabalho” rejeitado pelos outros foi à oportunidade para obter
reconhecimento. Diante destas observações, verifica-se uma inversão, na qual o
escravo encontra-se em situação mais vantajosa comparada a de “Bandeira”. No
entanto, vale ressaltar, que o patrão da Lenda da Serra Azul, mandou buscar o “Preto
Velho”, que estava perdido nas matas, indicando uma valorização desta personagem
dentro da estória.
No término das narrativas averigua-se que o cativo morre, enquanto que o
“Preto Velho” consegue o seu objetivo, tornando-se um curandeiro famoso. Assim os
finais das personagens seguem caminhos diferentes, mas ambos ligados ao
sobrenatural.
O destino final não é a chave para indicar a valorização de um e o desprezo de
outro, aliás, nenhuma das situações descritas, das personagens, revelam
discriminação. Entretanto, a contextualização histórica das narrativas, abre caminho
para compreender de que forma as figuras afro-brasileiras estão inseridas.
As duas lendas se passam durante o século XIX, em anos distintos. A Fortuna
do Pote ocorre na primeira metade do século, período em que o Brasil é uma
sociedade escravocrata, onde nela o preconceito é expresso pela discriminação racial,
nesse contexto a cultura negra é olhada como insignificante.
Para Gilberto Freyre, autor do livro, Casa-Grande & Senzala, a relação na
sociedade escravista, entre senhor e escravo, é harmoniosa. “O escravo negro no
Brasil parece-nos ter sido, com todas as deficiências do seu regime alimentar, o
elemento melhor nutrido em nossa sociedade patriarcal” (FREYRE, 2006, p. 107).
Neste trecho o autor exemplifica a suposta harmonização, através da alimentação,
colocando que o escravo alimentava-se melhor que o seu senhor.
A primeira lenda apresenta elementos, que promovem a existência do
paternalismo ou uma relação amigável entre o branco e o negro na sociedade
montealegrense, como a descrita por Freyre (2006), o que justificaria o “amor” e o
“carinho” do escravo pelo seu senhor, citado na lenda.
O paternalismo não é visto de um ângulo cordial e harmonioso por todos. “Na
obra de Freyre o paternalismo é, sem dúvida alguma, um termo descritivo e
impreciso, que oferece uma perspectiva de análise da sociedade 'a partir de cima'”
(LARA, 1995, p. 48). “Entenda-se por paternalismo, não concessão fácil, mas uma
forma de controle mais eficaz do que o chicote do feitor” (REIS e SILVA, 1989,102).
Nessa perspectiva, o paternalismo é entendido como o método de dominação do
negro, pelo qual o escravo se deixa dominar e não laços fraternais.
Essa relação, entre senhor e escravo, também é entendida como forma de
resistência, por onde muitos negros buscavam melhorias ou até mesmo a sua alforria.
“Os escravos, no entanto, traduziam o paternalismo numa doutrina diferente da
imaginada pelos senhores” (LARA, 1995, p. 47). Para Reis e Silva (1989.p. 102) esse
tipo de escravo não estava satisfeito com a vida, mas estavam familiarizados com o
que tinham e procuravam não arriscar a sorte.
O cenário feliz caracterizado anteriormente, da narrativa a Fortuna do Pote, torna-se
o inverso, onde a dominação camuflada, do branco sobre o negro, mais eficaz que o chicote
está presente, assim como, a busca do criolo para obter melhorias, vantagens ou até mesmo
a sua liberdade.
Já a Lenda da Serra Azul se passa no final do século XIX e início do XX, período
histórico, em que a libertação dos escravos está recente, assim como discriminação com o
homem negro livre. Azevedo (2004, p. 217), explica o porquê dessa desvalorização
a esta incômoda herança dos tempos de trabalho escravo devia-se a
marginalização do negro, bem como a simultânea ascensão social do imigrante
europeu, portador das virtudes do trabalho disciplinado, responsável, regular.
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Revista Perspectiva Amazônica
A marginalização do homem negro parece ser a razão, que colocava a
personagem “Bandeira”, na condição de desempregado, transmitindo estar
conformado, com a posição que a sociedade montealegrense, reflexo da nacional,
tinha lhe imposto.
No entanto, existe outra justificativa para o negro não estar
trabalhando na fazenda descrita na narrativa. Embora esteja relacionado com o
branco, não é por imposição dele, mas simplesmente pelo fato de não querer, uma
questão de orgulho, “é duvidoso que, após anos de servidão, os escravos estivessem
dispostos a ficar em situação não muito diversa que tinham” (FAUSTO, 1994. p.
113). A busca por um estilo de vida distinto da escravidão era o seu objetivo, se
deparar com a realidade ou qualquer semelhança com o passado não estava no seu
novo modo de vida. Assim, o que caracteriza esta personagem não é a passividade,
diante do desprezo da sociedade, mas sim o seu direito de escolher o que fazer, a
liberdade de ir e vir.
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As Lendas no Ensino de História
Seguindo a nova tendência no ensino de história nas salas de aula, o que
consiste nas abordagens temáticas, pesquisadores educacionais afirmam que a
aprendizagem ocorre através de uma dinâmica pedagógica, “se faz num movimento
constante que vai tanto das partes para o todo como do todo para as partes, ao longo de
todo o seu processo” (DUPAS, 1994. P. 44).
Neste contexto, as lendas tornam-se ferramentas pedagógicas que facilitam o
entendimento da história local, a parte, além disso, proporciona a contextualização
do período histórico, o todo. Uma vez que a história local é imagem da história
nacional, as lendas se encaixam perfeitamente para ser a ponte entre as
peculiaridades da identidade do educando e os acontecimentos de proporções
maiores, historicamente falando, que também influenciam na compreensão da
identidade e na cidadania do mesmo.
Entretanto, para que as aulas sejam bem sucedidas devem ser planejadas, pois
as lendas locais não devem ser apenas expostas para os alunos. É necessário enfocar
um tema, escolher as narrativas adequadas e é claro transportar o aluno das partes
para o todo e do todo para as partes.
Conclusão
Diante dessas abordagens é considerado que o município de Monte Alegre espelhavase na ideologia da sociedade brasileira do século XIX, onde o preconceito com os africanos e
afro-brasileiros, representados nas lendas, estava presente. Então, não existe a possibilidade da
inexistência de preconceito nas lendas locais, pois as duas personagens, analisadas,
simbolizam o olhar preconceituoso da sociedade antes e depois da abolição dos escravos.
Entretanto, não é só o discriminação que é representado. É possível perceber também
as estratégias utilizadas pelos negros como forma de resistência, contra a dominação do
branco e a tentativa de sufocar a cultura afro, como por exemplo, a escolha pelo ócio após a
libertação, vista não como uma imposição e sim por opção. Insígnias da determinação e
autoestima afro-brasileira nas narrativas locais.
Portanto, a resistência do negro contra a dominação, de uma sociedade branca
minoritária e a situação de ócio por escolha e não por imposição são produtos criados pelos
negros, entendidos como elementos da cultura afro-brasileira, podendo ser trabalhado na
disciplina de história e cultura afro-brasileira na escolas do ensino fundamental, não só da
cidade de Monte Alegre, mas de qualquer município, através de temas, hora trabalhando o
próximo dos discentes, lendas locais e hora o distante, entendido como a contextualização dos
fatos da história nacional e mundial.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.49-56
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.57-65
Incidência e distribuição espacial de acidentes de trânsito nos bairros
do município de Santarém-Pará, no período de 2007 a 2009
Rafael Gibson O. DA SILVA*
Tayná Matos DO VALE**
Rodrigo Luis FERREIRA DA SILVA***
RESUMO
O Ministério da Saúde do Brasil publicou, em junho de 2009, que os acidentes de transporte terrestre
matam anualmente mais de um milhão de pessoas em todo o mundo, resultando um grande número
de feridos e sequelados. O objetivo deste estudo foi identificar a incidência e distribuição espacial
dos acidentes de trânsito nos bairros do município de Santarém-PA, em uma série histórica
abrangendo o período de 2007 a 2009. A pesquisa desenvolvida teve o caráter quantitativo e de
levantamento retrospectivo, sobre os dados secundários do Sistema Integrado de Segurança Pública
do Departamento de Trânsito do Estado do Pará, localizado na cidade de Belém-PA. Em seguida, os
dados encontrados foram dispostos em forma de tabela para sua melhor interpretação. Foi possível
constatar durante este estudo, que os principais bairros acometidos foram Aparecida, Caranazal e
Aldeia, tendo o município de Santarém um expressivo número de acidentes de trânsito, ressaltando
que esse número teve um crescimento no período de 2007 a 2008 e um declínio entre os anos de 2008
a 2009. Os resultados demonstram a necessidade de ações e campanhas educativas junto aos órgãos
públicos voltados para o trânsito no sentido de minimizar essa expressiva incidência dos acidentes
de trânsito na cidade de Santarém.
Palavras-chave: Acidentes de trânsito, epidemiologia, incidência.
ABSTRACT
The Brazilian Health Department published in june of 2009, that traffic accidents kill annually
more than one million of people in whole world, resulting a great number of wounded and sequel
persons. The objective of this study was to identify the incidence and space distribution of the
traffic accidents in the quarters of the Santarém-Pará city, in the period from 2007 to 2009. The
research was quantitative type and retrospective survey, about secondary data of the Integrated
System of Public Security of the Transit Department of the Pará State, located in Belém city. After
that, the joined data had been organized in table for better interpretation. During this study it was
possible to evidence an expressive number of traffic accidents in Santarém city, with a rise in the
period from 2007 to 2008 and decline between 2009 and 2008. The main reached quarters had
been Aparecida, Caranazal and Aldeia, in this period. The results demonstrate that more
educative actions and campaigns about transit are necessary, with objective to minimize this
expressive incidence of the traffic accidents in Santarém city.
Key words: advocacy, Amazon, Invention.
*Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade do Estado do Pará.
**Acadêmica do Curso de Medicina da Universidade do Estado do Pará.
***Fisioterapeuta; Professor da Universidade do Estado do Pará e das Faculdades Integradas do Tapajós; Mestre em Ciências da Motricidade Humana pela
Universidade Castelo Branco/RJ; Doutorando em Doenças Tropicais do Núcleo de Medicina Tropical da Universidade Federal do Pará.
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Revista Perspectiva Amazônica
Introdução
Até o ano de 2009, Santarém possuía uma frota de aproximadamente 45 mil
veículos, distribuídos entre automóveis, caminhões, caminhonetes, micro-ônibus,
motocicletas, motonetas e ônibus (GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ, 2010a).
Para seu tráfego estes veículos dispunham de apenas pouco mais de 200Km de vias
pavimentadas que não correspondiam nem a 30% dos 670,41Km de vias públicas
existentes na cidade, que em sua grande maioria eram, e ainda são, de piçarra
(PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTARÉM, 2010). Contudo, seguramente o
dado mais preocupante sobre o trânsito de Santarém, diz respeito ao elevado índice
de Acidentes de Trânsito (AT) que diariamente são assistidos nas ruas da cidade.
Segundo dados oficiais os acidentes envolvendo transporte terrestre matam
anualmente mais de um milhão de pessoas em todo o mundo, resultando um grande
número de feridos e sequelados (BRASIL, 2009). Em outra estimativa a Organização
Mundial de Saúde calcula que em 2020 os AT serão a 2ª causa de morte prematura no
mundo (DAVANTEL et al., 2009; SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE,
2004).
Dentro desta realidade, o trânsito brasileiro é considerado um dos piores e
mais perigosos do mundo, com um índice de 1 AT para cada 410 veículos em
circulação. Para fins de comparação, exemplifica-se a incidência de AT na Suécia,
aonde a relação é de 1 AT para cada 21.400 veículos em circulação
(DEPARTAMENTO NACIONAL DE TRÂNSITO, 1997).
No Brasil, a cada ano, os AT aumentam a sua importância enquanto problema
social e econômico, sobretudo em decorrência de seu grande impacto enquanto causa
de morte, representando mais de um quarto das mortes violentas no país (WORLD
HEALTH ORGANIZATION, 2004).
As condições estruturais e econômicas da grande maioria das cidades
brasileiras agravaram ainda mais os problemas gerados pelos AT. Na maioria estas
cidades foram construídas acompanhando o crescimento de sua frota de veículos e
construindo grandes redes viárias, muitas vezes sem o planejamento adequado ou o
investimento suficiente para a manutenção dessas vias que deterioram rapidamente e
criam condições inseguras para o trânsito de veículos e pessoas (GOVERNO DO
ESTADO DO PARÁ, 2010b).
Vale ressaltar a grande preocupação que os AT têm causado no Brasil e no
mundo devido ao elevado número de vítimas jovens que atingem e pelos impactos
sociais, econômicos e pessoais que provocam. Nas duas últimas décadas, os AT
foram a principal razão das mortes por causa externa, somente sendo superado pelos
homicídios (BRITO et al., 2009; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2004;
BRASIL, 2004; SCALASSARA et al., 1998; SÖDERLUND; ZWI, 1995).
Além de representar um grave problema de saúde pública, os AT implicam em
um custo anual de 1% a 2% do Produto Interno Bruto (PIB) para os países menos
desenvolvidos (SODERLUND; ZWI, 1995). Em relação ao Brasil, o Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), numa estimativa conservadora, calcula que o
custo social e material dos AT é de R$25,7 bilhões por ano, que representa 1,39% do
PIB nacional (IPEA, 2006).
Nos EUA, uma análise da Administração da Segurança no Tráfego nas
Estradas Nacionais concluiu que os principais custos em decorrência de AT
correspondem a: dano de propriedade (33%); perda de produtividade no trabalho
(29%); despesas médicas (10%) e perdas de produtividade no lar (8%) (CENTER
FOR DESEASE CONTROL AND PREVENTION, 1992).
As estimativas da Organização Pan-Americana de Saúde apontam
ainda que 6% das deficiências físicas, no mundo, são causadas por AT.
Ano 4 N° 7 p.57-65
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.57-65
No Brasil, esses números ainda não são totalmente conhecidos, contudo do total de
portadores de deficiências atendidos pelo Hospital das Clínicas de São Paulo, 5,5%
são casos de vítimas de AT (GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO, 1993).
Cerca de dois terços dos leitos hospitalares brasileiros dos setores de
ortopedia e traumatologia são ocupados por vítimas de AT, com média de internação
de vinte dias, gerando um custo médio de vinte mil dólares por ferido grave (PIRES et
al., 1997). O Departamento Nacional de Trânsito registrou, em 1994, mais de 22 mil
mortes no trânsito no país e mais de 330 mil feridos. O custo anual estimado
ultrapassa três bilhões de dólares (DENATRAN, 1997).
Para uma boa parte de especialistas os AT não são uma fatalidade, como a
maioria da população insiste em acreditar, mas ocorrem pela deficiência na
conservação de veículos e estradas ou ainda são provocadas pelos pedestres e
condutores, aonde as falhas humanas se sobrepõem aos demais determinantes dos
acidentes (SCALASSARA et al., 1998; SCIESLESKI, 1982a; SCIESLESKI,
1982b).
Buscando reduzir este alarmante cenário, medidas educativas sobre o
comportamento da população no trânsito são cada vez mais incentivadas nas
diferentes regiões do planeta e em todas as esferas de governo, para criar uma nova
cultura no trânsito (MARÍN; QUEIROZ, 2000). Contudo, para que estas ações
educativas sejam verdadeiramente efetivas e auxiliem a reduzir o número de AT, o
conhecimento sobre os dados epidemiológicos desta condição de risco se faz
extremamente necessária.
Diante disto, idealizou-se esta proposta da pesquisa que buscou conhecer a
incidência e a distribuição espacial dos acidentes de trânsito (automobilístico,
motociclístico e atropelamento) no município de Santarém-PA, no período
compreendido entre 2007 a 2009.
Metodologia
Para alcançar este objetivo foi desenvolvida uma pesquisa de levantamento,
quantitativa, de caráter retrospectivo, tipo série histórica, abrangendo o período de
2007 a 2009.
A coleta de dados foi realizada no Sistema Integrado de Segurança Pública do
Departamento de Trânsito do Pará (DETRAN) da cidade de Belém-PA, tendo como
alvo o número de acidentes notificados, por bairro, no município de Santarém. Após a
coleta dos dados, foi utilizado o programa Microsoft Excel® 2007 para tabulação e
organização dos mesmos, que posteriormente foram dispostos em forma de tabela
para sua melhor interpretação.
Resultados e Discussão
T a b e la 1 . A c id e n te s d e trâ n s ito p o r b a irro n o m u n ic íp io d e S a n ta ré m .
A n o 2007
B a ir r o
Q td (% )
A e ro p o rto
...
A e ro p o rto v e lh o
3 7 ( 6 ,0 8 )
A ld e ia
4 1 ( 6 ,7 3 )
A p a re c id a
5 7 ( 9 ,3 6 )
C a m b u q u ira
...
C a ra n a z a l
5 6 ( 9 ,2 0 )
C e n tra l
...
C e n tro
...
D ia m a n tin o
2 8 ( 4 ,6 0 )
E sp e ra n ç a
2 2 ( 3 ,6 1 )
F á tim a
...
In te rv e n to ria
2 5 ( 4 ,1 1 )
L ib e rd a d e
1 7 ( 2 ,7 9 )
L iv ra m e n to
1 2 ( 1 ,9 7 )
N o v a re p ú b lic a
1 7 ( 2 ,7 9 )
M a ra c a n ã
1 3 ( 2 ,1 3 )
M a ra rú
...
M a tin h a
1 1 ( 1 ,8 1 )
P ra in h a
2 5 ( 4 ,1 1 )
S a n ta c la ra
3 1 ( 5 ,0 9 )
S a n ta n a
...
S a n ta re n z in h o
1 4 ( 2 ,3 0 )
S a n tís s im o
2 1 ( 3 ,4 5 )
U ru m a ri
...
O u tro s b a irro s *
9 8 ( 1 6 ,0 9 )
N ã o in fo rm a d o
8 4 ( 1 3 ,7 9 )
T o ta l
6 0 9 (1 0 0 )
... : N ã o fo ra m c o n ta b iliz a d o s
b a irro s ” o u e m “ N ã o in fo rm a d o
* : B a irro s q u e a p re s e n ta ra m m e
59
A n o 2008
A n o 2009
B a ir r o
Q td (% )
B a ir r o
Q td (% )
A e ro p o rto
1 0 ( 1 ,4 5 )
A e ro p o rto
2 8 ( 4 ,2 2 )
A e ro p o rto v e lh o
4 1 ( 5 ,9 3 )
A e ro p o rto v e lh o
3 5 ( 5 ,2 7 )
A ld e ia
5 1 ( 7 ,3 8 )
A ld e ia
3 6 ( 5 ,4 2 )
A p a re c id a
6 5 ( 9 ,4 1 )
A p a re c id a
5 2 ( 7 ,8 3 )
C a m b u q u ira
1 3 ( 1 ,8 8 )
C a m b u q u ira
...
C a ra n a z a l
4 7 ( 6 ,8 0 )
C a ra n a z a l
4 3 ( 6 ,4 8 )
C e n tra l
C e n tra l
1 0 ( 1 ,5 1 )
...
C e n tro
3 4 ( 4 ,9 2 )
C e n tro
8 5 ( 1 2 ,8 0 )
D ia m a n tin o
1 8 ( 2 ,6 0 )
D ia m a n tin o
4 0 ( 6 ,0 2 )
E sp e ra n ç a
1 6 ( 2 ,3 2 )
E sp e ra n ç a
...
F á tim a
1 6 ( 2 ,3 2 )
F á tim a
1 9 ( 2 ,8 6 )
In te rv e n to ria
1 6 ( 2 ,3 2 )
In te rv e n to ria
1 2 ( 1 ,8 1 )
L ib e rd a d e
1 4 ( 2 ,0 3 )
L ib e rd a d e
...
L iv ra m e n to
1 3 ( 1 ,8 8 )
L iv ra m e n to
1 0 ( 1 ,5 1 )
N o v a re p u b lic a
1 7 ( 2 ,4 6 )
N o v a re p ú b lic a
1 6 ( 2 ,4 1 )
M a ra c a n ã
1 2 ( 1 ,7 4 )
M a ra c a n ã
...
M a ra rú
1 1 ( 1 ,5 9 )
M a ra rú
...
M a tin h a
M a tin h a
...
...
P ra in h a
4 1 ( 5 ,9 3 )
P ra in h a
2 2 ( 3 ,3 1 )
S a n ta c la ra
4 7 ( 6 ,8 0 )
S a n ta c la ra
4 1 ( 6 ,1 7 )
S a n ta n a
S a n ta n a
1 0 ( 1 ,5 1 )
...
S a n ta re n z in h o
2 1 ( 3 ,0 4 )
S a n ta re n z in h o
2 6 ( 3 ,9 2 )
S a n tís s im o
2 9 ( 4 ,2 0 )
S a n tís s im o
2 2 ( 3 ,3 1 )
U ru m a ri
U ru m a ri
1 0 ( 1 ,5 1 )
...
O u tro s b a irro s *
9 5 ( 1 3 ,7 4 )
O u tro s b a irro s *
1 0 7 ( 1 6 ,1 1 )
N ã o in fo rm a d o
6 4 ( 9 ,2 6 )
N ã o in fo rm a d o
3 9 ( 5 ,8 7 )
T o ta l
6 9 1 (1 0 0 )
T o ta l
6 6 4 (1 0 0 )
A T n e s te a n o o u o s s e u s v a lo re s e s tã o in c lu íd o s e m “ O u tro s
”.
n o s d e 1 0 a c id e n te s p o r a n o .
Revista Perspectiva Amazônica
A tabela anterior demonstra que no triênio investigado, observou-se um
número bastante expressivo de AT em Santarém, contabilizando um total de 1964
eventos, sendo que em todos os 3 anos investigados o número de ocorrências foi
sempre superior a 600, o que resultou em uma média de quase 1,8 acidentes a cada
dia.
Sobre este comportamento é interessante constatar que os resultados deste
estudo coincidem com os dados regionais referentes à primeira década após a
incorporação do novo código de trânsito brasileiro, que foi instituído em setembro de
1997 pela Lei no 9.503 (BRASIL, 1997), que apontam altos índices de AT no Norte
do Brasil (BRASIL, 2004). Segundo a Secretaria de Vigilância em Saúde do
Ministério da Saúde do Brasil as regiões Norte e Nordeste foram às únicas regiões do
Brasil que não demonstraram redução significativa do número de AT após o novo
Código de Trânsito (BRASIL, 2004).
Este cenário coincide com a afirmativa de Marín e Queiroz (2000), ao
concluírem que somente as grandes cidades do Brasil têm encontrado condições
satisfatórias para implantar programas educativos a fim de criarem uma nova cultura
de trânsito para suas populações.
Santarém, infelizmente não se encontra dentro deste seleto grupo de cidades.
Localizada na região oeste do Pará, a cidade de Santarém possui um PIB de R$
1.654.644,55 (PIB per capita de R$ 6.004,42), sendo apenas o 7o de todo o Pará
(3,22%) (BRASIL, 2008) e apresenta um índice de desenvolvimento humano de
0,746 que é considerado médio (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O
DESENVOLVIMENTO, 2000).
Ainda analisando o comportamento geral dos números da tabela 1, observouse que no intervalo entre os anos de 2007 e 2008 houve aumento do número de AT,
enquanto que entre os anos de 2008 a 2009, houve um decréscimo neste número.
Esta oscilação entre aumento e redução do número de AT entre anos
consecutivos, também já foi observada em outros levantamentos como o de Santos e
Júnior (2012) ao estudar o comportamento dos AT na cidade de Belém. Tal
comportamento pode estar demonstrando uma tendência de manutenção dos
elevados números de AT nestas duas cidades.
No ano de 2009 um achado que se destaca entre os números da tabela 1, diz
respeito à diminuição do número de bairros não informados, o que pode representar
uma maior eficiência dos serviços de informação e consequentemente uma
sinalização de um maior controle do Estado sobre o acompanhamento dos AT que
acontecem no município de Santarém.
Em relação ao aumento da incidência nos outros bairros de Santarém, que se
refletiu pelo maior número de bairros que tiveram menos de 10 acidentes, é possível
que este fato esteja relacionado ao surgimento de novos bairros da zona urbana de
Santarém ou a maior urbanização de bairros considerados periféricos, fragmentando
ainda mais as taxas de incidência de AT.
Ainda quanto ao cenário dos bairros de Santarém, de acordo com a tabela
ilustrada, pode-se perceber que no ano de 2007, o número de AT predominou sobre os
bairros Aldeia, Caranazal e Aparecida apresentando mais de 40 acidentes cada um.
Os dois últimos bairros tiveram cerca de 10% dos acidentes notificados neste ano e o
primeiro demonstrou aproximadamente 7% do total de notificações daquele ano.
No ano de 2008 foi possível perceber que estes bairros mantiveram-se entre
os mais acometidos por AT. Contudo, percebeu-se ainda que neste ano de 2008,
houve a inclusão dos bairros Santa Clara (6,8%), Aeroporto Velho (5,93%) e Prainha
(5,93%) como os que mais registraram AT.
No ano de 2009 a realidade permaneceu a mesma sobre os bairros prevalentes,
Ano 4 N° 7 p.57-65
60
Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.57-65
com exceção do bairro Aldeia que, neste ano, apresentou diminuição de sua incidência
(5,42%). Esse fato ocorreu também nos bairros Aeroporto Velho, e Prainha. Por outro
lado o bairro Centro destacou-se neste ano por ter apresentado o maior índice de
acidentes desde o ano de 2007, totalizando 85 casos das 664 notificações realizadas.
Ao longo da série histórica, os bairros Aparecida e Caranazal apresentaram,
portanto, importante relevância no contexto dos AT ocorridos no município de
Santarém. Além deste fato, uma observação que teve grande destaque neste estudo foi o
aumento expressivo do número de AT no bairro Centro, no ano de 2009 como já foi
destacado anteriormente.
Apesar de ser difícil estabelecer uma precisa relação entre os AT em Santarém e
suas causas, sobretudo de forma específica para cada bairro, existem vários fatores que
seguramente podem ser listados como influenciadores de seu surgimento.
A elevação do número de AT em alguns bairros de Santarém pode estar
relacionada ao crescente número de veículos transitando nestes bairros, sobretudo
motociclistas. Segundo o Relatório Estatístico de Trânsito no Estado do Pará para estes 3
anos de estudo a elevação do índice de motorização em Santarém foi de 25,93%, sendo
12,34% para motocicletas e 13,59% para carros (GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ,
2010a).
Um achado preocupante sobre este cenário revela que embora as motocicletas
representem menor frota em relação aos automóveis elas contribuem com o maior
número de vítimas (56%), devido a sua maior vulnerabilidade e mortalidade nos AT
(SOARES et al., 2010; BRASIL, 2005; BRASIL, 2003).
Especificamente em relação aos bairros mais populosos de Santarém (Centro e
Aparecida, por exemplo), destaca-se o crescimento do fluxo de serviços e mercadorias
em suas ruas. Scalassara et al. (1998) e Minayo (2004), já destacaram que a elevação da
ocorrência de AT, sobretudo os que envolvem vítimas fatais, está frequentemente
associada ao crescimento urbano e consequente aumento do fluxo de veículos como foi
observado em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro.
Vale destacar que o município de Santarém tem apresentado um dos maiores crescimentos
de frota de veículos de todo o Estado do Pará com um incremento de 16% ao ano. Em uma
estimativa do Núcleo de Acompanhamento e Monitoramento Estatístico de Trânsito do Estado do
Pará (GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ, 2010a), para o aumento da frota de Santarém esperase um salto de 44714 veículos em 2009 para 146975 em 2017, o que chama atenção para um
cenário futuro de aumento dos AT, caso medidas de prevenção não sejam implementadas agora.
Outra possibilidade que também não pode deixar de ser mencionada, como possível
motivação para o crescimento do número de AT em alguns bairros de Santarém, diz respeito à falta
de infraestrutura e manutenção adequada das vias públicas. Segundo dados da própria Prefeitura
Municipal de Santarém menos de 30% das ruas de Santarém são pavimentadas (PREFEITURA
MUNICIPAL DE SANTARÉM, 2010) e além disso, muitas das ruas pavimentadas encontram-se
em péssimas condições de conservação.
Apesar de não se ter levantado quais bairros de Santarém apresentam o maior número de
vias não pavimentadas ou em precárias condições de dirigibilidade, é notório pelo frequente
noticiamento nos principais jornais impressos que circulam na cidade, que suas vias públicas, em
geral, não contribuem para um tráfego seguro nas ruas de Santarém.
Este conjunto de condições desfavoráveis já foi mencionado por Santos e Júnior (2012) ao
afirmar que as condições de pista possuem grande influência sobre a ocorrência de AT, por criarem
condições inseguras para dirigibilidade.
Fatores relacionados ao mau comportamento de motoristas e pedestres que transitam pelas
ruas de Santarém, certamente também possuem expressiva colaboração sobre os resultados
apresentados na tabela. Contudo, talvez este possa ser o fator mais democraticamente envolvido
para a ocorrência dos AT nos diferentes bairros de Santarém.
Revista Perspectiva Amazônica
Ano4 N° 7 p.50-57
60
61
Revista Perspectiva Amazônica
Assim sendo, a ascensão do número de acidentes ocorridos entre o ano de
2007 e 2008 pode ter sido fortemente influenciada por políticas educacionais
insuficientes relacionadas ao trânsito, sobretudo aquelas que deveriam ensinar
medidas preventivas, assim como aquelas destinadas a simples informação em
relação as suas consequências para o condutor e os passageiros.
Segundo o Relatório Estatístico de Trânsito no Estado do Pará para estes 3
anos de estudo, houve no Pará um significativo número de AT que tiveram como
causa: desrespeito a preferencial, manobra irregular, perda de controle do veículo,
falta de atenção, avanço de sinal, embriaguez alcoólica, sonolência, dentre muitas
outras causas relacionadas a imprudência, ao desrespeito das leis e regras de trânsito e
ao comportamento de risco no trânsito (GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ,
2010b).
Neste contexto, Juncal (2009) salienta que o repasse de conhecimentos
e do processo educativo relativo ao comportamento no trânsito não deve ser
responsabilidade apenas das instituições diretamente ligadas ao trânsito, e
sim de todas as instâncias da sociedade, incluindo instituições de ensino
fundamental, médio e superior.
Logicamente que além de suas causas, outro aspecto de grande
relevância no que tange ao debate dos AT em uma cidade ou país, diz respeito as
suas desastrosas consequências. Analisando este prisma, talvez uma das mais
imediatas consequências negativas que os AT determinam, diga respeito à
sobrecarga dos serviços de saúde, desde os voltados para o atendimento de
urgência e emergência, assim como os grandes hospitais de referência em
traumatologia e neurologia, e os centros de reabilitação, em todo o país
(MELLO JORGE, 1997).
Diante deste contexto e partindo-se do princípio de que os AT são, em sua
grande maioria, fruto de falhas humanas e que, portanto, são em maior ou menor
grau, previsíveis e preveníveis (SCALASSARA et al., 1998; SCIESLESKI,
1982a; SCIESLESKI, 1982b), a sua ocorrência revela falhas na estruturação
geral do trânsito local, refletindo a necessidade urgente de medidas de
organização do trânsito e consequentemente de controle sobre os AT.
A definição destas medidas inicia-se pela determinação do quadro
epidemiológico local, pelos serviços de saúde, reconhecendo os pontos
críticos que envolvem esta problemática. Em seguida faz-se o levantamento de
todos os setores que podem estar envolvidos, de alguma maneira, em sua
gênese ou em sua resolução. Por fim, se estabelecem metas pontuais de curto,
médio e longo prazo que possam modificar os principais fatores causais. Entre
os principais e mais viáveis mecanismos para evitar a morbi-mortalidade
destes eventos destacam-se as ações educativas para o trânsito (MELLO
JORGE, 1997).
Vale ressaltar que estas medidas educativas não devem dirigir-se apenas à
prevenção do acidente propriamente dito, mas devem envolver também ações
mais amplas, como a maior regulação e fiscalização sobre a liberação de veículos
e carteiras de trânsito, assim como a melhor manutenção das vias públicas e o
adequado cumprimento da legislação vigente.
Sobre este conjunto de ações argumenta-se, portanto, que somente a
implementação de campanhas de prevenção de AT, certamente não alcançará o
resultado desejado no que diz respeito à redução do número destes eventos. A
atuação do poder público, ou seja, uma vontade política para a ação é
imprescindível para o fechamento deste ciclo de morbi-mortalidade que hoje se
constitui o trânsito brasileiro.
Ano 4 N° 7 p.57-65
62
Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.57-65
Conclusão
De acordo com a proposta da pesquisa, pôde-se concluir que é alarmante a
prevalência de AT nos bairros da área urbana da cidade e que apesar de se observar
uma diminuição da incidência no ano de 2009, o número de AT no município de
Santarém ainda é bastante significativo, devendo ser uma das principais preocupações
do poder público e da população.
Além disso estes resultados revelam a necessidade da implantação de novas e
mais efetivas ações e campanhas educativas por parte dos órgãos reguladores do
trânsito municipal, enfatizando-se, porém, que não há necessidade de novas leis, mas
de cumprimento efetivo das já existentes.
Percebe-se, então, que há necessidade de um trabalho que envolva desde a
conscientização e orientação da população por parte das autoridades de trânsito, professores
de escolas a partir da mais tenra idade da criança, continuando em todos os níveis e
profissionais de saúde, assim como a participação mais efetiva do poder público em relação
à gestão do trânsito municipal sobre o risco de um número maior de vidas perdidas.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.66-78
Políticas Públicas Para o Turismo no Município de Santarém: Uma
Análise do Trade Turístico Sobre o Polo Tapajós
Áurea Siqueira de Castro Azevêdo*
RESUMO
A pesquisa intitulada “Políticas Públicas para o turismo no município de Santarém: uma análise do
trade turístico sobre o Polo Tapajós” teve como objetivo analisar o conhecimento do trade turístico
sobre o Polo Tapajós, uma vez que este encontra-se inserido no programa de desenvolvimento
turístico: Programa de Regionalização do Turismo- “Roteiros do Brasil”. Desta forma, a pesquisa
enquadra-se na categoria exploratória, sendo que foram realizadas pesquisas bibliográfica e
documental, que embasaram o conteúdo teórico do trabalho, além de uma pesquisa de campo. A
partir dos dados coletados, mediante a aplicação de 24 questionários, constatou-se que apenas 50%
dos informantes da pesquisa são conhecedores sobre o que se constitui o Polo Tapajós e sua
importância para o desenvolvimento turístico. Outro resultado relevante é o fato de que somente
8,3% dos pesquisados conhecem o Programa de Regionalização do Turismo e, consequentemente,
os benefícios advindos deste. Com isso, conclui-se que os agentes do trade pouco estão cientes da
realidade nacional no âmbito do turismo e que o Polo Tapajós está inserido neste contexto.
Palavras-chave: mercado turístico, programa, desenvolvimento.
ABSTRACT
The research entitled “Public Policies for tourism in the city of Santarém: an analysis of the
tourist trade about the Tapajós Pole” had as objective to analyse the knowledge of the tourist
trade about the Tapajós Pole, once it is included in the current tourist development program:
Tourism Regionalization Program- “ Brazil Itineraries”. This way, the research fits in the
explanatory category, where bibliographic and documentary researches were developed, which
supported the theoretical content, besides a field research. Therefore, 24 questionnaires were
applied and, from the data collected, it was verified that only 50% of the informers are aware of
what constitutes the Tapajós Pole and its importance for the tourist development. Other relevant
result is the fact that just 8,3% of the informers know the Regionalization Program and,
consequently, the benefits that come from it. So, it is concluded that the agents on the tourist
market are not so conscious of the national reality in the tourist scenario and that the Tapajós Pole
is included in this context.
Key words: tourist market, program, development.
*Especialista em Educação e Gestão Ambiental. Turismóloga. Acadêmica de Engenharia Florestal da Universidade Federal do Oeste do Pará-UFOPA.
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Revista Perspectiva Amazônica
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Introdução
O Brasil é possuidor de uma grande variedade de riquezas naturais,
gastronômicas e histórico-culturais, recursos suficientes para desenvolver o turismo
e, por conseguinte, segmentar a atividade. Na Região Amazônica, que integra nove
estados brasileiros, incluindo o Pará, foram desenvolvidas diretrizes para a
exploração do ecoturismo sustentável realizadas pelo Programa de Desenvolvimento
do Ecoturismo na Amazônia Legal- PROECOTUR. Na ocasião, o referido programa
dividiu o Estado do Pará em polos turísticos, entre eles o Polo Tapajós, cuja sede é
Santarém.
Em 2003, um programa a nível nacional foi proposto que concerne ao
ordenamento da atividade turística do país. Assim, considerando que cada Estado tem
a sua peculiaridade em relação à atratividade turística e, por conseguinte, seus
municípios também, foi lançado o Programa de Regionalização do Turismo “Roteiros do Brasil”, visando explorar o desenvolvimento sustentável do turismo nas
regiões, valorizando a vocação que cada uma possui. Através deste programa, a oferta
turística tanto no Brasil quanto nos Estados vem sendo diversificada com ênfase ao
desenvolvimento regionalizado, no qual o Estado do Pará está inserido através dos
polos turísticos que outrora foram definidos pelo PROECOTUR.
Desta forma, diante da possibilidade de explorar turisticamente as regiões,
levando em consideração a sua geografia e seu potencial turístico, torna-se vantajoso
para o agente do trade turístico desenvolver ideias e ações que possibilitem a
formatação de serviços compatíveis com o que o turista procura na região visitada. E a
isto, some-se o fato de valiosa contribuição para a motivação de todos os agentes
envolvidos direta ou indiretamente no universo do turismo para a construção coletiva
do desenvolvimento sustentável.
Assim, é relevante a necessidade de realizar um estudo e investigação sobre
“Políticas Públicas para o turismo no município de Santarém: uma análise do trade turístico
sobre o Polo Tapajós” porque muitas das ações promovidas pelo Governo Federal em
relação ao turismo servem como um subsídio para a comercialização do produto turístico
que uma região possui, cabendo aos envolvidos que comungam destas ações o seu
conhecimento e a posterior interpretação para o benéfico aproveitamento tanto para a
empresa em que atuam, quanto à região em que ela se encontra, a fim de favorecer o
desenvolvimento turístico da região. Desta forma, torna-se importante saber se os agentes
envolvidos no trade turístico de Santarém detêm conhecimento acerca da inclusão do Polo
Tapajós no Programa de Regionalização, este sendo um resultado de políticas públicas
aplicadas para o crescimento da atividade turística no país.
Com isso, uma das propostas do Programa é a integração da sociedade, do Poder
Público, das instituições de ensino e agentes inclusos no trade turístico para que, juntos,
promovam o desenvolvimento nos estados brasileiros aos quais pertencem. A nível local,
tomando por base este raciocínio, sendo o município de Santarém a sede do Polo Tapajós, os
agentes que atuam no trade turístico detêm conhecimento em relação às políticas públicas
para o turismo local representadas pelo Programa de Regionalização?
Neste sentido, a presente pesquisa teve como objetivo geral investigar o
conhecimento dos agentes que atuam no trade turístico da sede do Polo Tapajós,
Santarém, sobre as políticas públicas desenvolvidas para o turismo. Ademais, como
objetivos específicos, buscou-se investigar qual o entendimento do trade turístico
sobre o Polo Tapajós e sua importância para o turismo no mesmo e em Santarém,
identificar a visão dos envolvidos no trade turístico quanto à importância do Programa
de Regionalização- “Roteiros do Brasil” como uma política pública de turismo para o
Polo Tapajós e verificar se os envolvidos no trade turístico se reconhecem como
sujeitos contribuintes para o desenvolvimento do turismo local e do Polo Tapajós.
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Fundamentação Teórica
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Políticas Públicas e o Turismo
Dias (2003) define políticas públicas como as atividades que,
exclusivamente, o Estado executa a fim de realizar objetivos que se verificam na
sociedade como um todo. Ou seja, os elementos que as constituem são o fim da ação
governamental, as suas metas que norteiam o desdobramento para a finalização, os
meios estabelecidos para a realização de metas e os processos de sua realização. A
necessidade de políticas públicas surge então, quando se buscam formas para a
concretização da vontade de uma coletividade, ao passo que esta entende o que lhe é
necessário no presente, atuando as políticas como um trabalho operacional, através
de ações, em busca de um bem comum.
De acordo com Cruz (2002), a história do turismo organizado no país é
bastante recente e inexperiente em relação a outros países por ter começado na
década de 1950. Nesta época, organizavam-se e cresciam de maneira significativa as
classes sociais notadamente nos centros urbanos e, aos poucos, começariam a
incorporar entre os seus valores socioculturais a ideologia do lazer e do turismo, fato
esse já existente no Primeiro Mundo. A partir de então, a preocupação com as
políticas públicas do turismo no Brasil começou a ganhar projeção perante os
governantes.
Para Dantas (2005), o turismo pode gerar efeitos positivos como o
crescimento econômico, melhoria da qualidade de vida da população, a geração de
emprego e renda e até mesmo a conservação dos valores naturais e socioculturais,
desde que haja uma sensibilidade do governo na formulação de políticas públicas de
turismo, fornecendo subsídios para seu planejamento e execução e esclarecendo a
área de atuação do Poder Público sobre a atividade. Com isso, o governo deve atuar
com mais intensidade principalmente em lugares em que não há capital e mão de obra
especializada, por intermédio das políticas públicas.
Porém, somente atuar sobre o turismo não é o suficiente para o fortalecimento
da atividade, visto que o turismo não se evidencia de forma isolada, necessitando, por
isso, de outras políticas. Nesse aspecto, uma ligação entre os diversos setores da
política nacional é necessária para que a própria política pública de turismo seja
articulada e reconhecida como tal. Desta forma, o turismo requer uma política que,
efetivamente, realize as ações que lhe são inerentes, já que, “ao assumir papéis que
não lhe cabem, as políticas nacionais de turismo deixam de cumprir funções que lhes
são inerentes, como, por exemplo, aquelas relativas à democratização do turismo
interno” (CRUZ, 2002, p.37).
As políticas públicas de turismo têm por objetivo primordial modificar
positivamente a realidade do local onde são implementadas. Entretanto, precisam ser
de fato concretizadas em muitos outros lugares dentro do território nacional, de
pluralidade cultural imensa e uma vasta alternativa de potencialidades turísticas a
serem trabalhadas, a fim de que a atividade se consolide uma atividade importante
economicamente (BARROS, 2005).
Neste sentido, Dias (2003) afirma que as políticas direcionadas ao
desenvolvimento do turismo devem, primeiramente, passar por um processo de
planejamento, pois, uma vez elaboradas e traçadas as estratégias para a
implementação de ações, haverá um contínuo processo de tomadas de decisões que
possibilitem a orientação da atividade presente para atingir um determinado futuro.
Ao contrário, a simples adaptação a presente realidade de planos elaborados sem um
devido planejamento são considerados uma improvisação, correndo o risco, ainda,
de não serem totalmente concretizados ou acontecerem de maneira errônea.
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O turismo, então, pode ser considerado positivo quando ele é capaz de, não só
criar lucros para as empresas envolvidas, mas também elevar a satisfação da
população local. Para que isso possa ocorrer tem que haver políticas públicas tais
como: uso da infraestrutura e do equipamento pela população local (hotel,
restaurante, espaço de esporte, lazer e cultura), o seu acesso aos recursos naturais e a
cargos de chefia, criação de emprego para a mão de obra local, utilização de forma
responsável dos recursos naturais, respeito e ajuda na preservar da cultura local e
contribuição para melhoria das redes de educação, saúde, saneamento e transporte da
localidade.
O Polo Tapajós
De acordo com Faria (2005), devido ao fato de a Amazônia brasileira
apresentar variados recursos naturais houve a necessidade de implantação de
políticas públicas que melhor gerenciassem estes recursos, minimizando os impactos
negativos sobre eles, ao passo que também favoreceriam o incentivo à implantação
do ecoturismo na região. Uma das ações de grande amplitude realizadas na região foi
o desenvolvimento do Programa de Desenvolvimento do Ecoturismo da Amazônia
Legal - PROECOTUR. Como um de seus resultados, houve a criação de polos
turísticos nos estados de sua atuação. Neste sentido, para o Ministério do Meio
Ambiente (2006), a criação dos polos possibilitaria a competitividade da região como
um destino de ecoturismo, além de que a concorrência entre os Estados seria
minimizada, já que cada um adotaria a exploração de um nicho de mercado que fosse
mais conveniente aos seus objetivos.
Desta forma, segundo a Companhia Paraense de Turismo- PARATUR (2006),
há seis polos que possibilitam explorar o destino Pará turisticamente, agregando
maior valor ao produto e contemplando as características que o Estado possui, não
ficando, assim, restritos às atividades de ecoturismo. São eles: Polo Belém, Polo
Amazônia-Atlântica, Polo Marajó, Polo Araguaia-Tocantins, Polo Xingu e Polo
Tapajós.
O Polo Tapajós, cuja sede é Santarém, apresenta rica variedade em atrativos
naturais e histórico-culturais. Um dos grandes espetáculos encontrados no Pólo é o
encontro dos rios Amazonas e Tapajós, provocado pela diferença de densidade,
velocidade e temperatura dos rios, correndo juntos por quilômetros sem se misturar,
em frente à cidade de Santarém, conhecida como “Pérola do Tapajós”.
Segundo Leite (2001), Santarém é a cidade mais importante do Oeste do Pará
e é uma das fortes potências para o turismo paraense. E, em Santarém, as opções de
turismo se apresentam principalmente em suas praias de areias brancas, expostas ao
longo de 1.992 Km, como Alter do Chão, situada na vila de mesmo nome. Localizada
a 33 km da cidade, a vila de Alter do Chão, antiga aldeia dos índios Boraris, é palco da
maior festa folclórica do oeste paraense, a festa do Sairé, que mescla o religioso e o
profano, marcando a disputa dos botos Tucuxi e Cor de Rosa.
No Polo Tapajós, de acordo com a PARATUR (2006), também se encontram
atrativos históricos notadamente representados pelo Quartel de Óbidos, cuja
arquitetura revela os traços portugueses e a exuberância de uma grande obra do século
XIX, e pelo Forte Pauxis no mesmo município, que remonta a época em que a Coroa
Portuguesa viu seu poderio ameaçado com a presença de ingleses, holandeses e
franceses, dentre outros, na região amazônica. Conforme a mesma Companhia, os
portugueses deixaram muito mais que o patrimônio histórico: trata-se do
Carnapauxis, uma atração festiva que ocorre anualmente no período carnavalesco,
reunindo milhares de pessoas.
Já no município de Monte Alegre, segundo Leite (2001), encontram-se serras
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com inscrições rupestres, como as serras do Ererê e da Lua, porém, como as visitas,
por vezes, são feitas sem nenhum tipo de controle para minimizar os impactos,
algumas inscrições estão danificadas. Isso implica em uma melhor administração do
local e utilização do espaço pelos visitantes, para que estes atrativos não venham a ser
degradados.
As atrações de Alenquer remetem à natureza da Amazônia. As cachoeiras
Preciosa, de 45 metros e Véu de Noiva, de 25 metros, possuem em seu entorno trilhas
compostas por bromélias e orquídeas, que embelezam e tornam mais agradáveis as
caminhadas ali feitas. Todavia, foi da ação dos ventos que resultou o atrativo mais
impressionante de Alenquer: a Cidade dos Deuses, um conjunto de formações
rochosas onde povos primitivos fizeram pinturas e inscrições, servindo de
curiosidade aos que visitam a região (PARATUR, 2006).
De acordo com Busman (2006), em Oriximiná ocorre, às margens do rio
Trombetas, o Círio Fluvial de Santo Antônio, Padroeiro da cidade, uma manifestação
de fé que ocorre há mais de 50 anos. A imagem de Santo Antônio é transportada pelo
rio em uma balsa motorizada, formando a “berlinda do Santo”, ornamentada
conforme o tema do Círio e que ganha mais brilho com luzes coloridas ao seu redor.
As “barquinhas”, ornamentadas e iluminadas com diversas cores, acompanham a
balsa, proporcionando uma visão ímpar.
Conforme a Resolução 001/2009 da Paratur, que dispõe sobre a adequação
dos polos turísticos, considerando o objetivo geral do Programa de Regionalização
do Turismo, o Polo Tapajós detém uma área de influência, além das cidades já
citadas, sobre os municípios que compõem a Região Baixo Amazonas (Almerim,
Belterra, Juruti, Curuá, Faro, Porto de Moz, Prainha e Terra Santa) e Região Tapajós
(Aveiro, Itaituba, Jacareacanga, Novo Progresso, Rurópolis e Trairão).
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Programa Regionalização do Turismo - “Roteiros do Brasil”
O Turismo brasileiro contempla as diversidades regionais, fator capaz de
proporcionar, com boa administração, a geração de emprego e redução de
desigualdades sociais. De acordo com o Ministério do Turismo (2004), com a criação
do Ministério do Turismo no início de 2003, houve também a elaboração do Plano
Nacional de Turismo, que dentre seus objetivos estão: interiorização e segmentação
da atividade turística, diversificação dos mercados, produtos e destinos,
desconcentração de renda por meio da regionalização, incremento do turismo
interno.
Com o Plano Nacional de Turismo criado, buscou-se pela criação de uma
proposta que fosse capaz de unir a sociedade como um todo para, então, promover
uma ação produtiva que remetesse ao desenvolvimento sustentável de forma
coletiva. E, de acordo com o Beni (2003), considerando que o turismo é o mercado
que mais tende a crescer no Brasil, devido aos recursos que apresenta, o Ministério do
Turismo observou a necessidade de analisar com cautela o modelo de
desenvolvimento do turismo no país e averiguar os meios possíveis de combater os
principais impasses que retardavam o crescimento do turismo.
Diante disso, em 2004, conforme o mesmo autor, o Ministério do Turismo
lança o Programa de Regionalização do Turismo- “Roteiros do Brasil”, levando em
consideração as orientações presentes no Plano Nacional de Turismo, a fim de
contribuir com a visão dos que participam do processo de formulação e
comercialização do produto turístico, promovendo o desenvolvimento da atividade
turística de forma regionalizada, unindo os municípios em roteiros integrados.
Desta forma, atuando no âmbito turístico, o Programa de Regionalização do
Turismo se constitui em “um modelo de gestão descentralizada, coordenada e
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integrada, baseada nos princípios de flexibilidade, articulação, mobilização,
cooperação intersetorial e interinstitucional e na sinergia de decisões”
(MINISTÉRIO DO TURISMO, 2004, p.11). É um modelo em que todos que atuam
com o turismo estão envolvidos, abrangendo também, outros agentes sociais,
pertencentes à destinação onde o turismo efetivamente acontece.
Como exigências para a adoção do novo modelo, conforme o mesmo
Ministério, estão as mudanças de relação entre o poder público e a sociedade civil, a
mobilização e organização social e, acima de tudo, o entendimento da macrodivisão
administrativa adotada no País (Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste). Além
disso, o Programa assimila a noção de território e espaço, no qual o homem se
relaciona com a cultura e com os recursos que a natureza dispõe, ou seja, o indivíduo
está em interação constante com o meio, podendo fazer uso dele para promover o bem
estar social.
Segundo o Ministério do Turismo (2004), a estruturação do Programa
observou as seguintes estratégias:
•Gestão coordenada, em que foi necessária formação de parceria para atuar
nas ações de concretização do programa, compreendendo os governos federal,
estadual e municipal, unido a comunidade nas etapas de planejamento,
implementação e avaliação.
•Planejamento integrado e participativo, pois a ação pública, seja ela estatal
ou privada, detém espaços necessários para a participação política no processo de
organização e gestão do território. Logo, a elaboração, de forma participativa, de
planos que assegurem o desenvolvimento do turismo regional representa tornar os
espaços e mecanismos de representação política da sociedade civil em aspectos
democráticos, permitindo, assim, as mudanças estruturais almejadas.
•Promoção e apoio à comercialização, pois o programa defende a
participação e o reconhecimento de que o País possui inúmeras particularidades que
servem para o incremento da oferta turística e em seu modo de comercializar,
alcançando resultados no mercado.
Conforme Beni (2003), o objetivo do Programa de Regionalização“Roteiros do Brasil” é estruturar, ampliar, diversificar e dar maior qualidade a
oferta turística do Brasil, promovendo a inserção competitiva do produto
turístico no mercado internacional e, ao mesmo tempo, aumentando o consumo
do mesmo no mercado nacional. Tal objetivo baseia-se no incentivo dado aos
municípios, para que os mesmos organizem-se em consórcios para formar
roteiros integrados, a fim de compor o conjunto nacional de produtos turísticos.
Com base nisso, o Pará formatou onze roteiros integrados,
envolvendo seus polos turísticos. Destes onze roteiros, foram escolhidos
três para serem trabalhados para o mercado internacional, a saber:
•Roteiro Amazônia Quilombola - envolve os municípios de Belém,
Acará e Ponta de Pedras, ou seja, tal roteiro passa pelos Polos Belém,
Araguaia-Tocantins e Marajó, respectivamente;
•Roteiro Amazônia do Marajó- envolve os municípios de Belém, do
Polo Belém, Salvaterra e Soure, do Polo Marajó, e
•Roteiro Tapajós: Amazônia, Selva e História - abrangendo os
municípios de Santarém e Belterra, ambos do Polo Tapajós.
Desta forma, o Polo Tapajós fora contemplado com a formatação de
um roteiro turístico integrado, a fim de que tal destino seja conhecido
nacionalmente e internacionalmente em paralelo com as ações que serão
realizadas, devendo, inclusive, contar com a colaboração de todos os
agentes envolvidos, especialmente do trade turístico.
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Metodologia
No que se concerne aos objetivos, a referida pesquisa situa-se na categoria
exploratória, pois, de acordo com Lakatos e Marconi (2006), buscou-se investigar um
fenômeno desconhecido para torná-lo mais explícito, não excluindo a possibilidade
de uma modificação futura na pesquisa. Ademais, foi realizada uma investigação
acerca do tema proposto através de uma pesquisa bibliográfica e pesquisa documental
e, por fim, foi feita uma pesquisa de campo com a aplicação de questionários.
De pronto, o estudo realizou-se na cidade de Santarém, localizado no Estado do
Pará, sendo que o espaço utilizado para tal foi o centro comercial, compreendendo a
pesquisa em 30% de cada segmento de empresas que compõem o trade turístico: hotéis,
restaurantes e agências de viagem.
Neste sentido, de acordo com a Secretaria Municipal de Turismo - SEMTUR
(2006), o município possui dentro da área urbana 35 restaurantes, 21 agências e 22 hotéis.
Com a porcentagem de 30% sobre cada segmento, os informantes da pesquisa foram
empresários e funcionários de 11 (onze) restaurantes, 06 (seis) agências de viagens e 07
(sete) hotéis localizados no centro da cidade, escolhidos pela fácil localização e por serem
de bastante representatividade quanto ao fluxo de demanda para Santarém, perfazendo
um total de 24 participantes.
Outrossim, em função da abordagem, a pesquisa possuiu caráter qualitativo,
pois, segundo Dencker (2002), neste estudo se procurou o aprofundamento da
compreensão de um fenômeno, além de interpretá-los em termos do significado
dado pelos participantes da pesquisa. Também possuiu caráter quantitativo, pois
permitiu mensurar opiniões e quantificar valores sobre o tema em questão através de
uma amostra representativa dos agentes que atuam no trade turístico.
Resultados
Conhecimento sobre o Polo Tapajós
Quando interrogados sobre em que consistia o Polo Tapajós, dos participantes
entrevistados, 58,3% (n= 14) nunca ouviram falar no mesmo, ao passo que 41,7% (n= 10)
afirmaram saber do que se trata o Polo. Assim, 30% (n= 3) destes últimos afirmaram que
o Polo remete ao desenvolvimento turístico através de divulgação, apoio e implantação de
projetos que fortifiquem o destino. Já 70% (n= 7) acreditam ser a região de turismo em
que Santarém está inclusa, juntamente com as cidades cercanas (Gráfico 1).
As duas colocações expostas têm relação com o que se trata o Polo, visto que,
conforme o Ministério do Meio Ambiente (2006), este objetiva a promoção e
desenvolvimento do turismo nas cidades nele inseridas, formando uma destinação
turística de alta potencialidade e competitividade na região. Assim, Santarém, unida às
cidades adjacentes, forma o Polo Tapajós, destino com alta capacidade de atratividade
turística e que requer, como qualquer outra destinação, incentivos para o seu
desenvolvimento.
Porém, há que se pôr atenção no fato de que o número dos que conhecem o Polo Tapajós
é menor quando comparado com o número dos que dizem não saber nada a respeito do assunto.
Gráfico 1- Conhecimento sobre o Polo Tapajós
Fonte: Dados do estudo
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O Polo Tapajós e o desenvolvimento turístico nas cidades
Interrogados se o Polo Tapajós é capaz de proporcionar o desenvolvimento do
turismo nas cidades que o compõem, 50% (n= 12) dos informantes não opinaram,
enquanto que 50% (n= 12) acreditam que através do Polo Tapajós o turismo será mais
desenvolvido em tais cidades. Porém, 50% (n= 6) dos que responderam “sim” não
souberam justificar a resposta (Gráfico 2).
Os 50% (n= 6) que justificaram, afirmaram que o Polo Tapajós é relevante
para turismo nas cidades que o integram porque:
•
Incentiva e organiza melhor as cidades;
•
Promove o destino, através do planejamento da atividade, englobando
governo e município e
•
Torna as cidades mais conhecidas, atraindo turistas.
Certamente, segundo o Ministério do Meio Ambiente (2006), foi com o
propósito de desenvolver o turismo mediante um planejamento da atividade,
organização das cidades e atração de investimentos em empreendimentos turísticos
que os pólos turísticos foram criados. Logo, percebe-se que as respostas dos
informantes estão interligadas, já que são consequências do planejamento da
atividade. Se o turismo é desenvolvido em parceria com o governo e com as cidades, a
tendência é que estas se organizem, divulguem e desenvolvam turisticamente o
destino, o que, por conseguinte, atrairá mais turistas para região.
Gráfico 2- O Polo Tapajós e o desenvolvimento turístico nas cidades
Fonte: Dados do estudo
Conhecimento sobre o Programa de Regionalização
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Segundo os dados coletados, 91,7% (n= 22) dos informantes não sabem o que é o
Programa de Regionalização do Turismo- “Roteiros do Brasil”, enquanto que 8,3% (n= 2)
dos participantes souberam dizer em que este se constitui (Gráfico 3). Segundo estes, o
Programa de Regionalização é um programa criado pelo Ministério do Turismo com o intuito
de viabilizar, desenvolver e divulgar um destino, através da criação de roteiros integrados.
Certamente, de acordo com o Ministério do Turismo (2004), ao se criar o
Programa de Regionalização do Turismo- “Roteiros do Brasil” o objetivo se constitui
em estruturar melhor a oferta turística brasileira, dando maior qualidade do produto
turístico, à medida que este produto é diversificado mediante a integração das cidades
que compõem as regiões turísticas, formando roteiros integrados.
Desta forma, é um programa que está sendo desenvolvido atualmente em
todas as Unidades Federativas do Brasil, requerendo a participação e interação de
todos os agentes que estão inseridos no mercado turístico juntamente com a
comunidade de cada local, mas que a maioria dos agentes do trade turístico santareno
demonstra não conhecer. Isso demonstra a fragilidade e falta de atenção dos atores
que trabalham com o turismo na cidade pesquisada em relação às alternativas
propostas para o desenvolvimento do destino.
Gráfico 3- Conhecimento sobre o Programa de Regionalização
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Fonte: Dados do estudo
Programa de Regionalização e desenvolvimento do
Polo Tapajós
Quando perguntados se Programa de Regionalização tende a desenvolver o
Polo Tapajós turisticamente, naturalmente por desconhecerem do que se trata, 91,7%
(n= 22) dos entrevistados preferiram não opinar, ao passo que 8,3% (n= 2) disseram
que o destino será mais desenvolvido mediante a inclusão no referido Programa
(Gráfico 4). Desta forma, estes justificaram a resposta afirmando que, com o suporte
do governo federal através dos investimentos no âmbito do turismo, a atividade no
destino passará a ser mais estruturada e organizada, além de ser uma forma do Polo
Tapajós ser conhecido e divulgado nacionalmente.
Sem dúvida, as justificativas procedem com as finalidades do Programa de
Regionalização. Uma vez unidas, as cidades integrantes das diversas regiões
turísticas, de acordo o Ministério do Turismo (2004), terão apoio do Governo Federal
que dará suporte para a atividade, desde que estas estejam cientes das reais
necessidades e entraves enfrentados para o desenvolvimento do turismo, uma vez
que se objetiva obter a qualidade do produto turístico nacional. Desta forma, o
programa tende a fortalecer o Polo internamente, desenvolvendo seu potencial e
externamente, perante divulgação nos limites nacionais.
Porém, ao mesmo tempo, frente ao desconhecimento do trade, é
questionador até quando o governo passará a criar mais programas se os agentes que
estão inseridos neste meio os desconhecerem, uma vez que estes atores são
fundamentais para o processo de promoção turística nos destinos. Assim, é
necessário que um trabalho mais ordenado seja executado, para que as políticas de
turismo sejam, de fato, consideradas pelos agentes que atuam diretamente no setor.
Gráfico 4- Programa e o desenvolvimento do Polo Tapajós
Fonte: Dados do estudo
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Competitividade com a Formatação do Roteiro Turístico
Interrogados se a formatação do Roteiro “Tapajós: Amazônia, selva e
história” torna Santarém e Belterra mais competitivos, 83,33% (n= 20) dos
informantes não responderam e 4,2% (n= 1) afirmaram que não, visto que acreditam
que a criação de um roteiro não é o primeiro passo para desenvolver o turismo. Os
informantes que responderam “sim” perfazem um total de 12,5% (n= 3), pois
acreditam que é o único roteiro no referido Polo e tem prioridade para ser trabalhado
com a ajuda federal. Ademais, Santarém possui vários atrativos e a sua união com
Belterra, só fortifica o roteiro (Gráfico 5).
É evidente que as cidades escolhidas para serem trabalhadas pelo governo
federal através dos roteiros integrados têm maior capacidade para serem fortificadas
e, consequentemente, mais competitivas no mercado estadual e nacional. Isso
porque, segundo o Ministério do Turismo (2004), as cidades que compõem os roteiros
escolhidos para a obtenção do padrão internacional de qualidade, receberão
investimentos que visem a este fim. Ademais, Santarém possui recursos que a tornam
atrativa e, juntamente com Belterra, o roteiro fica mais diversificado, tornando-o
mais competitivo. Novamente, a falta de opinião acerca da realidade turística local é o
que chama a atenção nos resultados da pesquisa.
Gráfico 5- Competitividade com a formatação do roteiro turístico
Fonte: Dados do estudo
Contribuição Para o Turismo Local
Quando perguntados se se consideram agentes contribuintes para o
desenvolvimento do turismo local, 12,5% (n= 3) dos entrevistados não responderam
à questão, enquanto que 87,5% (n= 21) afirmaram contribuir para o turismo. Destes
últimos, 38,1% (n= 8) responderam que são contribuintes para o turismo através da
divulgação da cidade e das do entorno aos clientes, 23,8% (n= 5) através da
terceirização de serviços turísticos, 23,8% (n= 5), oferecendo boa estrutura física na
empresa para que o cliente goste e decida voltar e 14,3% (n= 3), através da montagem
de pacotes turísticos (Gráfico 6).
Percebe-se que a maioria dos informantes se considera contribuinte para a
atividade turística da cidade, inclusive pela divulgação “boca a boca” aos clientes de
suas empresas. Conforme Dias (2002), a comunicação via oral (boca a boca) é a
principal forma de promoção do turismo junto aos amigos, parentes e colegas de
trabalho, ou seja, hoje em dia é um método muito eficaz de divulgar.
No entanto, não compete apenas aos empresários e funcionários do mercado
turístico a função de desenvolver o turismo, uma vez que cada cidadão contribui com
pequenas ações, como por exemplo, não jogando lixo no chão e zelando pelos locais
públicos e privados. O importante é que todos se sintam responsáveis pela promoção
do turismo na região, cuja contribuição é relevante para a atividade. Logo, o
desenvolvimento de uma destinação turística “ocorre não só devido à participação
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governamental, mas também com a colaboração da iniciativa privada e da
comunidade local” (DIAS e AGUIAR, 2002). Assim, é um erro pensar que o turismo
depende só do Poder Público.
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Gráfico 6- Contribuição para o turismo local e do Polo Tapajós
Fonte: Dados do estudo
Realização de Outras Ações Pela Empresa para o Turismo
Quando questionados se a empresa realiza outros tipos de ações em benefício
do turismo local e do Polo Tapajós, apenas 29,2% (n= 7) dos pesquisados buscam
realizar ações novas para desenvolver o turismo na região, sendo que 28,6% (n= 2)
destes terceirizam serviços turísticos para outras empresas e 71,4% (n= 5)
beneficiam o turismo através da capacitação profissional. Já 70,8% (n= 17) não
realizam outros tipos de ações, cujas justificativas foram: 58,8% (n= 10) afirmaram
faltar capital e incentivos para tal, 23,6% (n= 4) disseram que não compensa investir
sem saber se haverá retorno e 17,6% (n= 3) não realizam outras ações porque tem
interesse (Gráfico 7).
Certamente a falta de capital é um fator que inibe a mobilização de qualquer
ação (MONTEJANO, 2001). Porém, a maioria das empresas, pelo exposto, trabalha
apenas para si e não para a região como um todo. Havendo qualquer tipo de reação
para a captação ou até mesmo para o aumento de visitantes na região, não somente um
empreendimento turístico será beneficiado. O que falta é um pensamento positivo e
esclarecimento maior acerca do turismo e o estímulo para promover benefícios à
região e a sua empresa.
Gráfico 7- Realização de outras ações para o turismo
Fonte: Dados do estudo
Conclusão
Dentro da promoção da atividade turística tanto a nível nacional quanto
municipal, o Poder Público assume um papel de suma importância. Porém, também
cabe ao trade turístico a discussão e elaboração de propostas inerentes ao setor, já que
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os vários segmentos que o compõem compreendem melhor a realidade do local em
que atuam. Contudo, em Santarém, a participação do trade turístico em sua totalidade
não é efetiva no âmbito do turismo o que, sem dúvida, dificulta e retarda o
desenvolvimento da atividade turística.
Acreditando que a região tem potencial para o crescimento do turismo, o
imprescindível seria que todos os que estão envolvidos neste processo tenham
conhecimento sobre o cenário atual, fato que não ocorre no mercado santareno. O
Polo Tapajós ainda é de desconhecimento da maioria dos agentes do mercado
turístico, refletindo a ideia de que tais agentes não estão no processo turístico e que,
por conseguinte, desconhecem a importância do Polo para impulsionar o turismo
regional. E, ainda que alguns, de maneira coerente, o considerem oportuno para a
captação de investimentos turísticos na região, o turismo está comprometido pela
falta de união participativa que o setor exige.
De forma mais intensa, o Programa de Regionalização- “Roteiros do Brasil”,
instrumento viável para fortificar os incentivos turísticos no Polo Tapajós, é de
desconhecimento da maior parte do trade turístico. Nada pode justificar tal
desconhecimento, pois, uma vez inseridos no mercado turístico, os empresários e
funcionários têm por obrigação assumir o compromisso de desenvolver o meio em
qual estão inseridos, conhecendo o ambiente regional e nacional, para enfim,
reivindicar e propor soluções compatíveis com o que é almejado por todos. Mas, se
não há esta integração, como saber o que é almejado por todos? Claro que se espera o
desenvolvimento do turismo. Porém o que ocorre, é que, enquanto se espera, não há
nenhuma mobilização para que o tal desenvolvimento se concretize. Isso justifica a
falta de conhecimento sobre os projetos para a promoção do turismo.
Assim, é de suma importância sensibilizar os empresários turísticos para que
atuem de maneira crítica e significativa para a promoção do crescimento do turismo
na região, favorecendo a realização da atividade com base no cumprimento das
responsabilidades a que a atividade se destina e não somente para satisfazer um
contrato de comércio. Desta forma, o maior investimento não se resume somente na
concretização de grandes empreendimentos para a promoção de oferta e captação de
demanda. É necessário, pois, um investimento que abarque os envolvidos no trade
turístico para uma atuação conjunta, como parte da comunidade onde está instalado,
identificando os problemas existentes e reivindicando-os a fim de que se convertam
em reais possibilidades de exploração turística. Todavia, antes de tudo, é preciso que
cada agente tenha em mente a importância de sua atuação, bem como a vontade de
querer contribuir mais com a atividade turística.
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78
Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.79-85
AS MÍDIAS DIGITAIS COMO FACILITADORAS NO CONTEXTO
EDUCACIONAL
Rosane Tolentino Gusmão Maia*
RESUMO
Hoje as salas de aula deixaram de ser um local em cujo espaço o professor é o único responsável pelo
processo de ensino e aprendizagem. Os alunos passam de receptores de informação, para
construtores do conhecimento, tendo como principais aliadas, as novas tecnologias. O professor
passa de ator para mediador desse processo e busca alicerçar a eficiência da sua atuação na interação
constante. Dentro desse novo contexto, torna-se necessária uma readaptação às novas formas de
aprendizado. Este trabalho objetiva avaliar as vantagens da utilização das mídias digitais nas salas
de aula. Através de uma pesquisa descritiva e um método de abordagem qualitativo foram avaliadas
as funcionalidades destas ferramentas no contexto educacional. Foram enumeradas e descritas as
principais características das mídias existentes atualmente, cuja utilização pode ser direcionada para
o processo de ensino e aprendizagem. Relacionou-se a utilização dessas mídias ao impacto causado
na motivação, na criatividade e no senso argumentativo dos discentes nas salas de aula.
Palavras-chave: Ensino. Aprendizagem. Mídias digitais.
ABSTRACT
Today's classrooms are no longer a local area in which the teacher is solely responsible for
teaching-learning process. Students go from receivers of information to builders of knowledge,
and its main allies, the new technologies. The teacher is acting as mediator in this process and
seeks to underpin the efficiency of its operations in constant interaction. Within this new context,
becomes a necessary readjustment to new ways of learning. This study evaluates the advantages
of using digital media in classrooms. Through a descriptive approach and a method of qualitative
features were evaluated these tools within the educational context. Were listed and described the
main characteristics of media available today, whose use can be directed to the teaching-learning
process. Related to the use of such media to the impact on motivation, creativity and sense of
argumentative students in classrooms
Key words: Knowledge. Learning. Digital Midias.
*Mestranda em Recursos Naturais da Amazônia; Especialista em Docência Superior; Tecnóloga em Processamento de Dados; Coordenadora e docente
dos cursos de Tecnologia em Redes de Computadores e Tecnologia em Gestão da Tecnologia da Informação das Faculdades Integradas do Tapajós.
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Revista Perspectiva Amazônica
Introdução
Ano 4 N° 7 p.79-85
A revolução tecnológica dos últimos anos não deu início apenas a mais um
ciclo, mas a uma nova era chamada digital. Vive-se hoje, por conta disso, uma razão
de máxima mudança, com uma avalanche de informações e inovações surgindo em
curtos espaços de tempo, gerando a necessidade de uma readaptação continuada a
essa nova “sociedade da informação”.
Desde muito cedo percebeu-se que as novas tecnologias iriam provocar
grandes alterações socioeconômicas [...] (RIBEIRO, 2009). Um dessas mudanças
deu-se no contexto educacional. Novos conceitos como mídias sociais, aprendizado
colaborativo, e-learning, m-learning, educação a distância, ambientes virtuais de
aprendizagem, tornaram necessária uma adaptação das diretrizes metodológicas de
ensino. Em pouco tempo, o domínio da tecnologia certamente deixará de ser apenas
um “diferencial” e passará a ser uma “exigência” nos currículos dos educadores.
Não se pode, entretanto, pensar em tecnologia como solução, mas como um
meio produtivo de alcançar a excelência em qualquer ação desempenhada. Segundo
Souza (2009), não são as tecnologias que mudam a sociedade e sim os modos com
que as pessoas se apropriam delas e as utilizam.
Esta é a proposta apresentada nesta pesquisa, que traz como tema central as
mídias digitais e a sua utilização como ferramentas auxiliares no processo ensinoaprendizagem. O objetivo principal é avaliar a maneira que essas mídias podem atuar
como “facilitadoras” desse processo. Através de uma pesquisa descritiva e um
método de abordagem qualitativo foram avaliadas as funcionalidades dessas
ferramentas no contexto educacional.
Mudanças nos Paradigmas Educacionais
A “era da informação” exige dos docentes uma nova postura. Hoje surge uma
nova geração denominada “Geração C”1, a geração da comunicação, da conectividade,
da colaboração, da cocriação, da vida em comunidade, disposta a participar ativamente
dos processos de transformação do mundo que os cerca.
Não se pode fechar os olhos para as transformações na educação, que
vislumbram os alunos, não mais como meros “receptores”, mas como “produtores” de
informação no mundo acadêmico. Para Freire (2010, p.35-50),
1
Conceito criado por Dan
Pankraz, diretor de
planejamento e estratégias
para o público jovem da
agência de marketing
digital DDB Sydney.
ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer
forma de discriminação [...] como professor crítico, sou um
“aventureiro” responsável, predisposto à mudança, à aceitação
do diferente. Nada do que experimentei em minha atividade
docente deve necessariamente repetir-se.
Surge, então, a necessidade de se trabalhar com novas competências no novo
contexto educacional. Perrenoud (2000) destaca algumas competências como o trabalho
em equipe, a utilização de novas tecnologias e a capacidade de envolver os alunos em
suas aprendizagens e no trabalho.
As Mídias Digitais no Processo Ensino-Aprendizagem
O que são Mídias Digitais
Considera-se mídia digital todos os meios de comunicação baseados em tecnologia
digital como computador, telefone celular, cd, vídeo digital, blue ray, internet, world wide
web, televisão digital , data show, lousas eletrônicas e outras mídias interativas.
80
Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.79-85
Postura do Educador Frente às Mídias Digitais
Existem dois tipos de educadores: os modernos e os tradicionais. O grande
problema não é lidar com as diferenças no âmbito pedagógico, mas com a forma
preconceituosa de “enxergarem” uns aos outros. Diante disso, cria-se uma barreira
gerando dois lados distintos que ganhariam muito mais se compartilhassem os seus
conhecimentos e experiências.
Ainda existe uma resistência grande por parte de alguns educadores sobre a
utilização das novas tecnologias na sua vida profissional. Basta visitar os sites de
algumas instituições de nível superior e verificar o espaço destinado aos docentes. É
muito frequente encontrar espaços que nem sequer foram visitados e muito menos
utilizados para promover uma interação com os alunos.
Diante desse quadro, é extremamente necessário que as instituições
educacionais incentivem os seus professores a fazer da tecnologia uma aliada nas suas
atividades docentes. As semanas pedagógicas e cursos de extensão seriam uma
oportunidade de promover ações dentro das instituições com o objetivo de estimular os
professores a incluírem a utilização das mídias digitais em seus planejamentos didáticos.
Principais Mídias Digitais Utilizadas no Contexto
Educacional
No contexto educacional pode-se utilizar uma variedade de mídias como
mediadoras e facilitadoras do processo ensino-aprendizagem.
Internet - A Web 2.0
2
Plano do Governo Federal
que pretende levar, até
2014, banda larga a todos
os municípios brasileiros
por preços acessíveis pelas
populações de baixa renda.
De todas, talvez possa ser considerada como a mídia mais acessível, uma vez
que a inclusão digital passou a ser um item integrante das propostas governamentais
de inclusão social. Com o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL)2, instituído em
2010, espera-se uma redução dos preços e um aumento expressivo de usuários na web.
Nos anos 90, surgiu a “primeira geração” da internet que disponibilizava
uma gama imensa de informações que poderiam ser acessadas, atendendo à
solicitação dos usuários. Com o passar dos anos e o desenvolvimento de novos
conceitos, visando a construção coletiva do conhecimento, percebeu-se que haveria
a necessidade de transformar o atual ambiente web em um ambiente mais dinâmico.
Surgiu então, o conceito de Web 2.0.
Considerada como a segunda geração da World Wide Web, veio com a proposta de
criação e uso de ferramentas colaborativas. Seu conceito baseia-se no “CoLearn”, ou
aprendizado colaborativo, que objetiva dinamizar o ambiente on-line, através da socialização
e troca de informações, possibilitando aos internautas a sua participação direta na atualização
e organização do conteúdo. Dentre as ferramentas mais utilizadas na web 2.0 destacam-se:
Wikis
81
Wiki, que significa “extremamente rápido” no idioma havaiano, é o nome
dado aos sistemas cujos programas são baseados em ferramentas que permitem a
criação coletiva de documentos. Funcionam como uma enciclopédia, por permitir o
armazenamento de um grande número de informações sobre as mais variadas áreas.
Como são programas abertos, as suas ferramentas são aperfeiçoadas continuamente
pelos programadores, a fim de impedir o surgimento de problemas como a postagem
proposital de informações inadequadas feitas por usuários mal intencionados.
Nos ambientes wiki, os textos postados podem ser alterados de forma
simples, permitindo a sua otimização a cada alteração feita.
Revista Perspectiva Amazônica
Dessa forma, as informações tornam-se cada vez mais completas e apresentam um
conteúdo com maior qualidade. Atualmente a Wikipédia3 é o ambiente wiki de maior
destaque na web 2.0 e já chegou a quase 300 mil artigos publicados em Português e a
mais de 4 milhões de artigos em outros idiomas.
No mundo acadêmico cada vez mais essas ferramentas ganham adeptos. Ao
se implantar um ambiente wiki em uma instituição de ensino, trabalha-se com a
habilidade de síntese de textos e o hábito pela leitura dos alunos na busca de
informações, que tornam a pesquisa elemento prazeroso da sua rotina, o que irá
contribuir para torná-los mais críticos, argumentativos e reflexivos.
Ano 4 N° 7 p.79-85
Computação em Nuvens (Cloud Computing)
No contexto educacional, a computação em nuvens chega como uma grande
aliada para os estudantes. Os trabalhos acadêmicos podem ser produzidos,
armazenados e acessados diretamente da rede, o que dispensa o seu armazenamento
em dispositivos de memória, como pen drives, por exemplo. Além disso, poderão ser
compartilhados com os demais usuários da rede, criando uma “rede social de
conhecimento”.
A computação em nuvem é mais ou menos o que sua mãe faz com as
roupas sujas que você deixou espalhadas no chão do quarto e, dias
depois, como que por encanto, encontra no armário limpas, passadas,
cheirosas e cuidadosamente dobradas nas gavetas certas, sem que você
tenha ideia de como isso aconteceu. A computação em nuvem faz isso
com seus arquivos de internet – ela os armazena – e com suas
necessidades de processamento – ela roda seus programas sem que você
precise sequer estar com seu PC ligado. Isso significa que uma porção
crescente das informações digitais produzidas por pessoas e empresas
está sendo processada e guardada em descomunais centros de
computação espalhados pelo mundo, mas conectados entre si.
(RYDLEWSKI. 2009)
Esse novo conceito transforma a rede em um tipo de computador comunitário
gigante que pode ser acessado a qualquer momento, de qualquer lugar, bastando para
isso ter uma conexão com a internet.
4
Existem vários aplicativos gratuitos disponíveis como o Google Docs , o
5
6
Skydrive , o Ubuntuone , entre outros, que permitem a criação, a edição e o
armazenamento de documentos na web e oferecem suporte aos formatos mais
utilizados de arquivos. Vários usuários podem compartilhar um mesmo documento
em um dado momento. O usuário não precisa ter necessariamente um computador
com um editor de texto ou uma planilha eletrônica instalados, ele poderá ter acesso
aos documentos de qualquer máquina, bastando para isso ter criado uma conta e
gerado uma senha de acesso.
Estes aplicativos permitem uma interação maior entre alunos e professores
dentro da comunidade acadêmica e também fora dela, pois os documentos
armazenados on-line são de livre acesso e suas alterações podem ser feitas
simultaneamente. Poderão ser feitos uploads e downloads de arquivos a qualquer
momento e trabalhadas atividades como: enquetes, criação de projetos em grupo,
fóruns de discussão, socialização de arquivos, entre outros. A maior vantagem é que
esse feedback permitirá ao professor avaliar o grau de participação dos alunos e, caso
essa participação seja aquém do esperado, implementar as mudanças necessárias no
planejamento de suas atividades para incentivá-los.
4
https://docs.google.com
5
https://skydrive.live.com
6
https://one.ubuntu.com/
Blogs
Os blogs são cada vez mais utilizados no meio acadêmico para divulgação de
notícias, propor debates, socializar material, entre outras atividades.
82
Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.79-85
A vantagem dos blogs é o teor eclético dos conteúdos que são veiculados através
deles. Professores e alunos das mais variadas culturas podem socializar as suas experiências
através de uma linguagem mais dinâmica e estimulante, porém não desprovida de coesão e
coerência, pois quando se escreve sabendo que muitas outras pessoas terão acesso ao
conteúdo, o cuidado com a forma certamente será levado em conta por quem está
escrevendo, trazendo como consequência um aprimoramento da escrita e da argumentação.
Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA)
7
8
moodle.org.br
Código aberto.
O avanço tecnológico trouxe com ele uma nova realidade educacional, o
ensino mediado por computador. A Educação a Distância (EaD), segundo
RomiszowskI (2005), teve seus tempos áureos na segunda metade do século 20
período em que ganhou um certo grau de respeito e reconhecimento na educação
pública. Algum tempo depois, foi marcada pela síndrome da descontinuidade.
Na era do e-learning a EaD ressurge com força total. Os Ambientes Virtuais de
Aprendizagem (AVA) ganham uma nova roupagem e passam a ser ferramentas complementares
poderosas de apoio para o desenvolvimento de habilidades como a criatividade e o pensamento
crítico no processo ensino-aprendizagem presencial tradicional. Através da integração de diversas
mídias, linguagens e recursos, professores e alunos interagem em ambientes individuais e
coletivos que diferem das salas de aula pela dinâmica de estudo proposta. Dentre as vantagens
trazidas nesse tipo de atividade, destaca-se a possibilidade de se obter um feedback imediato por
parte dos professores, que avaliam as atividades postadas, e dos alunos, que passam a sentir-se
mais estimulados e seguros a produzir, uma vez que terão acesso às eventuais críticas e sugestões
atribuídas ás suas produções antes de socializá-las.
Nesses ambientes as informações são de acesso fácil, atuais, confiáveis e estão todo o
tempo disponíveis, distribuídas em arquivos para downloads, wikis, salas de aula virtuais, chats,
blogs, entre outros recursos.
Um ambiente muito utilizado atualmente é o Moodle7 por ser um aplicativo gratuito,
contemplar inúmeros recursos de fácil utilização e permitir a adequação das necessidades das
instituições e dos usuários (open source).8
Segundo Guidi (2010) um AVA de qualidade é fundamental para uma universidade, na
medida em que o ambiente representa a própria instituição no mundo virtual, uma vez que acabam
agregando valor ao processo de ensino-aprendizagem, fortalecendo a imagem das instituições.
Mídias Sociais
Existe atualmente uma gama de mídias sociais como Orkut, Facebook, LinkedIn,
My Space, Twitter, YouTube, Flickr, entre outras, que podem ser utilizadas no contexto
educacional com resultados muito positivos. O LinkedIn é uma rede social profissional
com mais de 120 milhões de pessoas cadastradas. Através dessa rede são feitos contatos,
surgem oportunidade de trabalho e respostas para dúvidas em todos os setores, pela
diversidade de profissionais que fazem uso dela. As demais mídias, além de espaços para
interagir, promover debates e socializar ideias, são poderosas ferramentas para divulgação
de eventos institucionais como jornadas acadêmicas, seminários e palestras, de forma
gratuita e com possibilidade de um alcance de um número expressivo de pessoas.
Mídias na Sala de Aula
83
O retroprojetor, as leituras de textos apostilados e a cópia de longos textos no
quadro tendem, cada vez mais, a cair em desuso nas salas de aula. O aluno da “Geração
C” está cada vez mais interessado em “ser” parte atuante do processo educacional do que
simplesmente “fazer” parte dele. Ele precisa ser estimulado a participar ativamente e é
nesse momento que as mídias digitais assumem o seu papel de parceiras nessa conquista.
Não se pode pensar, em qualquer que seja a mídia, como o elemento central do
processo ensino-aprendizagem, mas sim como “auxiliar” desse processo.
Revista Perspectiva Amazônica
Existe hoje disponível uma variedade de mídias de manuseio simples, cuja utilização
promove um interesse maior e aumenta a produtividade dos alunos nas salas de aula.
Ano 4 N° 7 p.79-85
Data Show
O uso pedagógico do data show nas salas de aula ainda provoca muitas
discussões dentro da comunidade docente.
O que ocorre com o data show, muitas vezes, é a subutilização dos seus
recursos. Ele não deve ser utilizado somente para projetar textos e fazer a leitura
destes na tela. Os editores gráficos atuais permitem a criação de slides com textos,
imagens, vídeos e hiperlinks, melhorando a dinâmica das apresentações, que poderá
ser aprimorada utilizando-se um apontador a laser, pois dessa forma o apresentador
poderá circular mais livremente pelos espaços na sala de aula.
Dependendo do conteúdo trabalhado, poderão ser utilizados filmes, imagens,
músicas e até mesmo a internet, se houver uma rede wireless (sem fio) ou um modem
para a conexão, aumentando o dinamismo, o interesse e a participação dos alunos nas
aulas.
Lousa Digital
As lousas digitais chegam às salas de aula como mais uma alternativa de
promover a motivação e a interação dentro delas.
O professor ao utilizar esse recurso tem ao alcance, em um mesmo instante,
arquivos de áudio e vídeo, a internet para acesso imediato e vários outros tipos de
conteúdo que no final da aula poderão ser gravados e enviados instantaneamente, via
e-mail, para o aluno.
O contato com as novas tecnologias e a possibilidade de interagir com elas
certamente desperta nos alunos um interesse maior pelas aulas, aumentando o seu
rendimento.
Podcasts
Os podcasts são programas que envolvem produção, transmissão e
distribuição na Internet de arquivos de áudio ou vídeo que podem ser ouvidos ou
vistos em aparelhos móveis, como MP3, telefones celulares (iPhone, iPods, por
exemplo) ou computadores pessoais. (MORÁN, 2009). Existem hoje no mercado
softwares gratuitos e de fácil manuseio para o desenvolvimento desse tipo de mídia.
Os professores poderão produzir podcasts para gravar e disponibilizar as suas
aulas para os alunos acessarem quando acharem necessário e estes poderão produzir e
divulgar os seus trabalhos acadêmicos exercitando a capacidade de trabalho em
equipe, a organização e a criatividade.
Screencasts
São aplicações que permitem a gravação digital das ações feitas na tela do
computador. Pode-se adicionar áudio às gravações dando origem a tutoriais que
poderão ser disponibilizados como uma vídeo-aula.
Existem aplicativos gratuitos e de uso muito simples disponíveis para
download. Esse tipo de arquivo certamente chamará mais a atenção e promoverá um
interesse maior do aluno do que as tradicionais apostilas.
Tecnologia Móvel
Nesse grupo de mídias estão incluídos o notebook, o celular, o iPod, os tablets, o MP3
player, o Iphone, entre outros. Eles são os elementos base do móbile learning (aprendizado móvel),
um novo conceito no contexto educacional, que tem como principal característica a ubiquidade, ou
seja, a possibilidade de estar disponível em qualquer lugar a qualquer momento.
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Revista Perspectiva Amazônica
Professores e alunos cada vez mais vêm fazendo uso dessas ferramentas,
aumentando, dessa forma, as possibilidades de acesso e socialização de conteúdos, de
estreitamento dos laços entre a comunidade acadêmica e de otimização do tempo pela
abrangência do número de pessoas que recebe a informação em um único momento.
Ano 4 N° 7 p.79-85
Conclusão
As transformações sociais, ao longo do tempo, determinaram as mudanças
nos paradigmas educacionais. Atualmente vive-se uma dessas mudanças provocada
pela revolução tecnológica.
Um novo perfil de educador está sendo exigido diante desse novo panorama
educacional. O professor, nesse novo contexto, deve buscar uma adequação dos seus
métodos pedagógicos ao perfil dessa nova geração de discentes que utilizam as mídias
digitais como ferramentas de suporte para a promoção da interação e do aprendizado.
Existe uma variedade de mídias digitais que, se utilizadas de forma apropriada,
podem trazer resultados muito positivos no contexto da educação. A utilização de
recursos tecnológicos como os de multimídia em sala de aula e a internet em atividades
extraclasse que explorem a coerência e a objetividade, aumentam o interesse dos
alunos e incentivam a criatividade e o senso de argumentação dos mesmos.
O sucesso do processo ensino-aprendizagem, porém, não pode se restringir
ao manuseio dessas ferramentas, muito menos o seu insucesso ser atribuído à sua não
utilização. Deve existir, por parte dos educadores, o cuidado e o bom senso na hora
da escolha da mídia adequada ao contexto de suas aulas. A finalidade deverá ser
sempre a de compartilhar o conhecimento de forma dinâmica, interativa e reflexiva.
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Ano4 N° 7 p.XX-XX
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.86-96
Fauna Parasitária de Micrurus hemprichii (Jan, 1958) (Serpente:
Elapidae) da Floresta Nacional do Tapajós, Belterra, Pará
Pedro Henrique Salomão Ganança*
Isla Carol Marialva Camargo**
Hipócrates de Menezes Chalkidis***
Lincoln Lima Corrêa****
RESUMO
A infestação por helmintos em serpentes ocorre através da ingestão de presas contaminadas e tipo
de hábitat. O objetivo do estudo foi analisar a fauna parasitária de Micrurus hemprichii coletados na
Floresta Nacional do Tapajós, Belterra, Pará. Foram analisados (n=48) espécimes, foram coletados
os dados morfométricos, sexo e sítios de infecção. Os parasitas foram separados por Filos e
analisados conforme a intensidade de infecção (I), abundância (A) e prevalência (P). Para a análise
dos dados, foi usado os testes de Coeficiente de Correlação de Pearson, rs (intensidade de infecção) e
teste de U Mann-Whitney ( diferenças de intensidade de infecção entre sexos) do programa BioEstat
5.0. A biometria de M. hemprichii apresentou comprimento médio de x=481,67±10,29 mm e peso
médio de =24,94±73,42 g. O Filo Nematoda foi predominante com (I=4; A=0,17; P=4,17%) e
Plathyhelminthes foi representado pela Classe Cestoda com (I=10; A=0,21; P=2.08%). A
intensidade de infecção não influenciou no comprimento (n(A+B)=48; rs=0.1080; p=0.0225) e no
peso (n(A+B)=48; rs=0,07; p=0.0622) da serpente. Houve diferenças significativas das
intensidades dos Nematodas (Z(U)=7.8625; p<0.0001) e Cestoda (Z(U)=8.0897; p<0.0001)
quando comparadas aos sexos do hospedeiro. O hábito fossorial e a dieta específica podem ter
favorecido para a baixa intensidade parasitária encontrada em M. hemprichii.
Palavras-chave: Flona do Tapajós, endoparasitas, hábito alimentar
ABSTRACT
Endoparasite infestation occurs in snakes through ingestion of contaminated prey and habitat
type. The aim of the study was to analyze the parasitic fauna of Micrurus hemprichii collected in
the Floresta Nacional do Tapajós, Belterra, Pará. Were analyzed (n=48) specimens were
collected morphometric data, sex and infection sites. The parasites were separated and analyzed
by Phylum according to the intensity of infection (I) abundantly (A) and prevalence (P). For data
analysis, we used tests of Pearson Correlation Coefficient rs (infection intensity) and test of
Mann-Whitney U (differences in intensity of infection between sexes) of BioEstat 5.0. Biometrics
M. hemprichii showed average length x=481,67±10,29 mm and average weight =24,94±73,42 g.
The Phylum Nematoda was predominant (I=4; A=0, 17; P=4, 17%) and Plathyhelminthes was
represented with the class Cestoda (I=10; A=0, 21; P=2.08%). The intensity of infection did not
affect the length (n (A+B) =48; rs=0.1080; p=0.0225) and weight (n (A+B) =48; rs=0, 07;
p=0.0622) from serpent. There were significant differences of the intensities of nematodes (Z (U)
=7.8625; p<0.0001) and Cestoda (Z (U) =8.0897; p<0.0001) when compared to the sexes of the
host. The fossorial and specific diet may have favored for low parasitic intensity found in M.
hemprichii.
Key words: Flona Tapajos , endoparasite , feeding habits
*-**Acadêmicos do Curso de Licenciatura Plena em Ciências Biológicas. Faculdades Integradas do Tapajós (FIT). Email: [email protected] & [email protected]
*** Mestre em Biociências (Zoologia) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Professor titular das Faculdades Integradas do Tapajós..
**** Mestre em Parasitologia-UNICAMP, Mestrado em Gestão e Cooperação Internacional-Universidade Moderna de Lisboa, reconhecido pela Universidade do
Vale do Itajai-UNIVALI. Atualmente é Professor Titular II das Faculdades Integradas do Tapajós.
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Introdução
Ano 4 N° 7 p.86-96
Serpentes da espécie Micrurus hemprichii são encontradas na Bolívia, leste da
Colômbia, Equador, Peru, Sul da Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. No
Brasil é registrada para os Estados do Amazonas, Rondônia, Pará, Maranhão e
provavelmente Roraima e Amapá (ABUYS, 1987; PEREZ-SANTOS & MORENO,
1988; CAMPBELL & LAMAR, 1989; HARVEY et al. 2003). Essa serpente é conhecida
popularmente como coral-verdadeira. É fossorial, criptozóica e ocasionalmente terrícola,
sendo encontrada tanto em ambientes florestados como em áreas antropizadas. Possui
hábitos diurno e noturno e sua alimentação é considerada especialista, sendo a única
espécie do gênero Micrurus que se alimenta quase que exclusivamente de onicóforos na
natureza (CUNHA et al., 1978; ROZE, 1982), predando também lagartos (Leposoma),
anfisbênios e serpentes (MARTINS & OLIVEIRA, 1998; BERNARDE, 2004).
A região amazônica abriga uma ofídiofauna muito rica e diversificada, com
aproximadamente 149 espécies descritas (ÁVILA et al., 2007). Devido aos
diferentes modos de vida, forrageamento, morfologia, reprodução e interações
tróficas esses animais são mais vulneráveis a infestações por parasitas (AHO, 1990).
Parasitas podem afetar o crescimento do hospedeiro e podem reduzir sua
capacidade de sobrevivência (RAWSON, 1977; KABATA, 1981), afetando sua
morfologia, aparência externa, bem como reduzindo a fecundidade e a dieta do
hospedeiro, comprometendo a dinâmica parasito-hospedeiro e podendo ocasionar a
mortalidade dos hospedeiros (MARCOGLIESE, 2004), além de facilitar o
aparecimento de infecções secundárias por fungos e bactérias (THATCHER, 2006).
Os parasitos compõem uma diversidade de organismos que são
especificamente adaptados para viver em outro organismo vivo (GOATER &
GOATER, 2001). Eles são divididos em endoparasitas e ectoparasitas, dependendo
da sua localização na superfície ou dentro dos seus hospedeiros (POULIM &
MORAND, 2004), eles possuem adaptações que lhes permitem otimizar a vida
parasitária (THATCHER, 2006).
A composição da comunidade parasitária depende da interação de alguns
fatores como: o ambiente (temperatura, pluviosidade e umidade); o hospedeiro
(tamanho corporal, sexo, dieta, hábitat) e o número de parasitas (HAMANN et al.,
2006; TAKEMOTO et al., 2004). E através dessa composição é possível conhecer
melhor a ecologia, história natural, ciclo de vida e evolução tanto do parasita quanto
do hospedeiro (MELLO, 2013).
O impacto do parasitismo em seus hospedeiros e suas populações é
significante. Parasitos podem afetar a vida dos seus hospedeiros de diversas formas,
por exemplo, agindo sobre o comportamento, a fisiologia, a morfologia ou
reprodução (MARCOGLIESE, 2004). A ação do parasitismo vai além de agir
individualmente em seu hospedeiro ou em suas populações, indica também um
importante papel na estrutura ecológica das comunidades (MARCOGLIESE, 2004).
George-Nascimento (1987) propôs que os parasitas são bons indicadores de
interações ecológicas persistentes, pois seu ciclo de vida envolve a relação presa predador e é adaptado aos relevantes padrões de sazonalidade.
No entanto, apesar da elevada diversidade de helmintos nos vertebrados, pouco se
conhece em relação à riqueza de espécies (HUGOT et al., 2001 apud MELLO, 2013),
biogeografia e patologias originadas pelos parasitos.
Considerando que o parasitismo constitui um dos fatores que podem interferir na
estrutura de comunidades e também fornecer informações relevantes sobre o hospedeiro e o
ecossistema, este estudo tem como objetivo descrever a composição de helmintos da serpente
Micrurus hemprichii e determinar sua prevalência, abundância e intensidade de infecção.
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Referencial Teórico
O parasitismo é uma associação estreita de dois organismos co-evoluindo, em
que um (o parasita) retira do outro (o hospedeiro) algum benefício (PLATT, 1992). De
acordo com Poulim e Morand (2004), os parasitos podem ser classificados como
endoparasita e ectoparasita, e passam um período significante de suas vidas
associados a um hospedeiro, com os quais mantém dependência metabólica e que por
serem muitas vezes ocultos, diminuem a estimativa de biodiversidade.
Em répteis, a infecção por endoparasitos esta muito relacionado à dieta, tipo
de hábitat e modo de forrageamento do hospedeiro (ANDERSON, 2000). Nesses
animais, o trato gastrointestinal é o sistema mais comumente afetado pelo
parasitismo, e os endoparasitas mais relatados, pertencem aos Filos Platelminthes,
Nematelminthes e Acantocéfalas (BENSON, 1999; WILSON & CARPENTER,
1996).
No Filo Platyhelminthes, destacam-se as classes Trematoda e Cestoda, como
as que mais acometem serpentes. Dentre os trematódeos, os pertencentes à Classe
Digenea são os mais importantes. Os digenéticos apresentam ciclo de vida complexo
(heteroxênico), caracterizados por uma série de estágios, envolvendo hospedeiros
invertebrados (hospedeiros intermediários) e vertebrados (hospedeiros definitivos)
(TAKEMOTO et al., 2004; PAVANELLI et al., 2008).
Os endoparasitas da Classe Cestoda na sua maioria apresentam ciclo de vida
heteroxeno (TAKEMOTO et al., 2004; PAVANELLI et al., 2008). O modo de
infecção é através da relação predador – presa, sendo os répteis hospedeiros
intermediários ou paratênicos (GOATER & GOATER, 2001).
Da mesma maneira, os indivíduos adultos do Filo Nematelminthes, podem
viver em uma variedade de tecidos no hospedeiro definitivo, embora o intestino
delgado seja o hábitat mais comum para esses parasitas. Ao contrário dos
trematódeos, muitos nematoides evoluem de ciclos de vida diretos, apesar de várias
ordens de nematóides terem vida complexa com ciclos com hospedeiros
intermediários (GOATER & GOATER, 2001).
Em geral, a ação patogênica da maioria dos parasitas varia muito de uma
espécie para outra e depende de diferentes fatores como intensidade do parasitismo,
órgãos afetados, grau de especificidade de hospedeiro, presença de infecções
concomitantes, fatores genéticos e condições ambientais (GARCIA et al., 1993;
SANTOS et al., 2002). No entanto, os principais efeitos relatados do parasitismo em
serpentes são anorexia, alteração na morfologia e no comportamento, redução da
sobrevivência e competitividade e nas fêmeas, redução de fecundidade (VITT &
CALDWELL, 2009; MARGOGLIESE, 2004).
Trabalhos relacionando o parasitismo e serpentes de ambiente natural são
escassos. Há estudos enfatizando a descrição de novas espécies e novos hospedeiros,
que hoje são a base de estudos recentes, como o de Yamaguti (1971); Travassos et al.,
(1969); Correa (1980); Thatcher (1993) são as principais revisões sobre trematódeos;
Yamaguti (1961) e Vicente et al. (1993) são importantes trabalhos sobre nematódeos;
e Yamaguti (1959) e Schmidt (1986), sobre cestódeos.
Os principais estudos recentes sobre a composição da parasitofauna de serpentes
brasileiras foram o de Rossellini (2007), que caracterizou a helmintofauna de Helicops
leopardinus do Pantanal Sul - Matogrossense, além de proporcionar uma visão geral sobre a
parasitofauna das serpentes brasileiras. Melo (2013), que caracterizou endo e ectoparasitas de
Crotalus durissus (Linnaeus, 1785) de localidades de Minas Gerais e Siqueira et al., (2005)
descreveu uma nova espécie de ascarídeo parasito de Bothrops jararaca.
Não existem estudos acerca da helmintofauna da serpente Micrurus hemprichii e
estudos envolvendo endoparasitas do gênero Micrurus são poucos.
Revista Perspectiva Amazônica
Destacam-se Silva e Barrella (2002), que descreveram a espécie Micrurus frontalis
como novo hospedeiro de Haplometroides buccicola; Rossellini (2007), que citou a
ocorrência de Ophiotaenia macrobothria e Almeida et al., (2007) que descreveu a
ocorrência de pentastomídeos em Micrurus ibiboboca.
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Materiais e Métodos
Descrição da Área de Coleta
A Floresta Nacional do Tapajós tem uma área estimada de 600.000 hectares,
abrangendo quatro municípios: Aveiro, Belterra, Rurópolis e Placas no oeste do
estado do Pará (COHENCA, 2007).
Segundo a classificação de Köppen o clima é do tipo AmW (clima tropical
com temperatura média do dia mais frio do ano superior a 18 °C). Tem dois períodos
sazonais bem definidos, um período sazonal seco (Janeiro–Junho) e outro chuvoso
(Julho–Dezembro) (ESPIRITO SANTO, 2005).
Foram abertas quatro trilhas em ambientes distintos, localizadas no km 83 da
BR 163 (Santarém-Cuiabá). Sendo duas áreas de baixio e duas de platô. As trilhas
localizavam-se nas seguintes coordenadas: AAP: Área Alterada Platô (S=03°02';
W=054°56'); APP: Área Platô Preservado (S=03°04';W=054°58'); e duas áreas de
baixios: AAB: Área Alterada Baixio (S=03°01';W=054°59'), APB: Área Preservada
Baixio (S=03°03'; W=054°57') (Figura 1). A coleta ocorreu no período de dois anos
de Dezembro de 2009 a Dezembro de 2011.
Método de Coleta
Armadilha de interceptação e queda (pitfall) (CECHIN & MARTINS,
2000)
Foram instaladas nas áreas de coleta, armadilhas de interceptação e
queda (pitfall). Essas armadilhas consistem em recipientes como baldes
plásticos (100 L), enterrados no chão, dispostos em intervalos de 10 m ao
longo de uma linha e interligados por uma cerca guia constituída de uma lona
plástica de 1,60 metros de altura (HEYER et al., 1994; CECHIN &
MARTINS, 2000).
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Ano 4 N° 7 p.86-96
Análise das Serpentes
As serpentes capturadas foram mortas através de punção cardíaca com 01 ml
de anestésico (Cloridrato de Lidocaína e Epinerfrina), de acordo com a resolução nº.
301 de 08 de dezembro de 2012. Os dados biométricos como CRC (comprimento
rostro-cloacal), CC (comprimento da cauda) e peso, eram anotados. Em seguida, os
espécimes eram fixados com formol a 10 % e conservados em álcool a 70%. A licença
para a captura dos exemplares foi expedida pelo Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), SISBIO nº 14018-6. As
serpentes foram depositadas na Coleção Herpetológica das Faculdades Integradas do
Tapajós - FIT.
Coleta de Parasitas
Foi analisado o trato gastrointestinal de espécimes de Micrurus hemprichii
(n=48). O trato digestivo foi seccionado da região oral ao intestino grosso, os parasitas
foram coletados com auxilio de estereomicroscópio (Zeizz SV11). Os parasitas foram
coletados e acondicionados em microtubos com álcool à 70%, devidamente
identificados. Os parasitas foram identificados e separados por Filo Plathelmintes
(Classes Cestoda e Trematoda) e Nemathelmintes. E de acordo com Bush et al., (1997),
foi determinada a prevalência, intensidade média e abundância média parasitária.
Análise Estatística
Usou-se Análise de Variância com o teste estatístico ANOVA um critério para
avaliar a intensidade de infecção dos grupos de parasitas com o peso e o tamanho do
hospedeiro. O teste de Correlação de Pearson rs, foi utilizado para medir as diferenças de
intensidade de infecção em relação ao comprimento e peso. Para medir as diferenças de
intensidade de infecção com sexos dos hospedeiros usou-se o teste U Mann-Whitney.
Os resultados foram tabulados por meio do Microsoft Office Excel 2007 e os
cálculos estatísticos foram realizados através do Programa Bioestat 5.0 (AYRES et al., 2007).
Para as estimativas de diversidade de parasitas foi calculado o índice de
Simpson com o auxílio do software PAST. O índice de Simpson indica a dominância,
e está voltado para a abundância da espécie mais comum do que para medir a riqueza
(diversidade) das espécies. (MAGURRAN 1988). O índice de Simpson (1-D) varia
de 0 (baixa diversidade) a quase 1 (alta diversidade) (KREBS,1989).
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Resultados e Discussão
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No presente trabalho, foram analisados 48 espécimes de Micrurus
hemprichii, sendo 14 machos e 34 fêmeas. Em relação ao tamanho dos espécimes, os
mesmos apresentaram comprimento médio de (x= 481,67; ±10,29 mm) e peso
médio de (= 24,94; ±73,42g).
De todos os indivíduos analisados, apenas 3 apresentavam parasitas em seu
trato-gastrointestinal, representando 6,2% da amostras. Dos espécimes parasitados,
dois estavam infectados por helmintos do Filo Nemathelmintes e um indivíduo
encontrava-se parasitado pelo Filo Plathelminthes (Figura 3).
Figura 3: 1 Visualização de Nemátodas (20X esterioscópio). 2 Exemplar de Nemátoda. 3 Exemplar de Cestoda (20X esterioscópio). 4 Exemplar de Cestoda (40X esterioscópio).
A distribuição dos parasitas encontrados de acordo com seus respectivos
hospedeiros, estão descritos no Gráfico 1.
No total, foram identificados 18 espécimes de helmintos, sendo 55,6%
espécimes de Cestodas e 44,4% espécimes de Nematodas, com uma média
parasitária de 0,37 parasitos/serpentes. Todos os helmintos encontrados estavam no
intestino dos hospedeiros (Tabela 1).
Tabela 1: Prevalência, intensidade média de infecção, abundância média e
parasitária e órgãos associados à infecção dos helmintos parasitas de Micrurus
hemprichii procedentes da Floresta Nacional do Tapajós, Belterra, Pará.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.86-96
Metazoários
SI
P (%)
IM
A
Cestodas
Intestino
2.08
10
0.21
Nematodas
Intestino
4.16
4
0.17
Sítio de Infecção; P: Prevalência; IM: Intensidade Média; A: Abundância e AP: Abundância parasitária
A intensidade de infecção não influenciou no comprimento (n(A+B) = 48; rs=
0.1080; p= 0.0225) e no peso da serpente (n(A+B) = 48; rs= 0,07; p=0.0622). A maior
prevalência foi de Nematodas (P= 4.16 %), devido à maioria dos indivíduos desse
grupo possuir ciclo de vida direto com transmissão pela ingestão de ovos larvados ou
penetração ativa pela pele ou orifícios (ANDERSON, 2000). A alta prevalência desse
grupo de parasitos não interferiu no metabolismo do animal, não havendo assim uma
ação expoliativa por parte da fauna parasitária.
Em relação ao sexo, os machos foram mais infectados por Nematodas
(Z(U)=7.8625; n(A+B)=48; p<0.0001) e as fêmeas por Cestoda (Z(U)=8.0897;
n(A+B)=48; p<0.0001). Mesmo tendo baixa intensidade de parasitismo nessas
serpentes analisadas, pode-se verificar uma prevalência para os tipos de parasitos
distribuídos pelo sexo. Em Prado (2003), foi constatado que a intensidade de infecção
por Nematodas diminuiu a fecundidade das fêmeas da espécie de Erytrolamprus
miliaris (=Liophis miliaris) no Domínio Atlântico do interior do Paraná, o que afirma
que o parasitismo afeta a fecundidade do hospedeiro (MARCOGLIESE, 2004).
O presente trabalho apresentou uma baixa diversidade, conforme o Índice de
Simpson S (1-D) = 0,21/ Nematodas e S (1-D) = 0,18/ Cestodas. De acordo com Aho
(1990), os répteis apresentam uma helmintofauna empobrecida quando comparados
a outras classes de vertebrados.
Segundo Rocca (1999) e Rocca & Hornero (1991) répteis herbívoros
apresentam uma fauna parasitária maior e mais diversa que répteis carnívoros. A
baixa diversidade de parasitas deve-se ao hábito alimentar de Micrurus hemprichii, a
qual possui dieta específica, alimentando-se de vertebrados (ofiófogas), sendo a
única espécie do gênero Micrurus a alimentar-se de invertebrados (Onicóforos)
(CUNHA et al. 1978; ROZE, 1982; MARTINS & OLIVEIRA, 1998, BERNARDE,
2004).
Almeida et al. (2007), em um estudo sobre prevalência e intensidade de
infecção por pentastomídeos em duas espécies de serpentes do nordeste brasileiro,
observou uma alta prevalência desses parasitas em Philodryas nattereri e uma taxa
relativamente leve de infecção para Micrurus ibiboboca, com uma prevalência de
25%. O que se percebe é que nas espécies analisadas de Micrurus hemprichii a
prevalência foi bem menor quando comparadas à Micrurus ibiboboca, isso
provavelmente está relacionado ao fato de habitarem em diferentes áreas. Ainda
segundo o autor a baixa infecção em M. ibiboboca é atribuída ao hábito fossorial e ao
tipo de alimentação (vertebrados serpentiformes) (VANZOLINI et al., 1980).
Conforme Aho (1990), além da alimentação, a abundância de parasitos é uma
variável que pode estar relacionada ao tipo de hábitat do hospedeiro (fossorial,
arbóreo, terrestre, semi-aquático e aquático) e também pela possibilidade do
hospedeiro em adquirir parasitos, que por sua vez é influenciada pelas exigências
fisiológicas e ecológicas de cada espécie hospedeira, especialmente à disponibilidade
de hábitats com adequadas condições hídricas e de temperatura.
Conclusão
Os resultados do presente estudo demonstram uma taxa relativamente baixa
de parasitos quando comparada com outros estudos de endoparasitas de Micrurus
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Revista Perspectiva Amazônica
ibiboboca quando comparadas com a intensidade de infecção em M. hemprichii, o
que provavelmente pode ser atribuída a fatores como hábito fossorial e
principalmente a dieta especializada dessa serpente. Pode-se verificar que a
prevalência de Nematoda foi o dobro quando comparada com os Cestodeos.
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Agradecimentos
O autor principal agradece o apoio das Faculdades Integradas do Tapajós
(FIT) na cessão da Bolsa de Iniciação Científica. Os autores agradecem o apoio do
Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Toxinas (INCTTox) pelo
financiamento; à Embrapa e LBA pelo apoio nas atividades de campo. Aos revisores
pelas sugestões. Ao ICMBio pelas autorizações de coleta e permanência na Flona do
Tapajós.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.97-104
O Stress Como Fator Agravante em Portadores de Psoríase
Kaio Vinícius Paiva Albarado*
Patrícia Spinola da Rocha**
RESUMO
Uma das dermatoses mais importantes e discutidas dentro dos aspectos clínicos dermatológicos é a
psoríase. Essa doença atinge a pele devido às várias inflamações que são caracterizadas pela
proliferação desordenada dos queratinócitos. Assim, este artigo teve como objetivo analisar a
influência que o stress tem no agravamento em pacientes portadores de psoríase, observando através
de pesquisa científica, o seu mecanismo fisiológico, tentando entender o funcionamento desse
desencadeamento. Referindo-se ao stress, pode-se afirmar que é um estado de tensão do organismo
que pode ser patogênico, o que causa um desequilíbrio interno no mesmo, causando desconforto em
pacientes. Já no que tange ao desencadeamento para o agravamento dessa doença, que parte do
princípio da troca de informação do meio externo com o meio interno através da pele, pelos sensores
neurais, na qual estímulos são enviados para o sistema neuro-endócrino, deixando em alerta o
sistema imune que manda leucócitos para os lugares onde, possivelmente, seria o lugar da lesão.
Portanto, através dos achados bibliográficos, constatou-se que a pele é o principal órgão transmissor
de sinais do meio exterior para o sistema nervoso central, que em um estado de stress, pode
influenciar na piora do paciente psoriático.
Palavras-chave: Psoríase, stress, dermatose.
ABSTRACT
One of the most important dermatoses and discussed in the clinical dermatological is psoriasis.
This disease is due to various skin inflammations which are characterized by disordered
proliferation of keratinocytes. Thus , this review article aims to analyze the influence that stress is
worsening in patients with psoriasis, watching through a literature search , its physiological
mechanism , trying to understand the operation of the trigger . Referring to stress, it can be said
that it is a state of tension that can be pathogenic organism , which causes an internal imbalance
therein, causing discomfort for these patients. Now regarding the trigger for the worsening of the
disease, which assumes the exchange of information from the external to the internal environment
through the skin, by neural sensors, in which stimuli are sent to the neuro-endocrine system ,
leaving on alert the immune system sends white blood cells to the places where they possibly
would be the place of injury. Therefore, through the bibliographic findings, it was found that the
skin is the main body of the transmitter signals from the outside to the central nervous system,
which in a state of stress can influence the deterioration of the psoriatic patient.
Key words: Psoriasis, Stress, Dermatosis
*Acadêmico do Curso de Bacharel em Enfermagem da Universidade do Estado do Pará-UEPA- Campus XII Santarém. [email protected].
**Mestra em Genética e Biologia Molecular pela Universidade Federal do Pará-UFPA- Especialista em Genética e Biologia Molecular pelo Instituto Esperança de
Ensino Superior-IESPES- e Bióloga pela UFPA.
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Introdução
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A psoríase caracteriza-se por ser uma doença de pele inflamatória crônica,
aparecendo placas eritematoescamosas com prevalência na região dos joelhos e
cotovelos e no couro cabeludo. Ela pode aparecer nos homens e nas mulheres, sendo
mais comum na faixa etária dos 30 anos (SILVIA; CASTRO, 2010; PORTH;
MATFIN, 2010).
Vários fatores são de extrema relevância para o agravamento dessa patologia.
Uma delas é o stress emocional que está intrinsicamente ligadas pela alteração na
relação com as outras pessoas, que devido ao aparecimento dessas placas, elas podem
sentir-se rejeitadas ou abandonadas (SILVA; SILVA 2007; AZULAY, 2008).
Diante desse exposto, o stress pode prejudicar o estado de equilíbrio do
organismo de maneira que este funciona em total harmonia. Quando ocorre essa
“reação de alarme” o corpo em resposta, desencadeia interferências fisiológicas para
tentar diminuir os sinais físicos dessas ações externas (LIPP, 2000; ZUARDI, 2009).
Assim, pessoas que são acometidas com psoríase têm um agravamento mais
frequente ao aparecimento dos sinais dessa doença, pois, acontece o desequilíbrio no
organismo, sendo que o stress tem influência no sistema imune humano,
desencadeando reações em nível de sensores neurais (SOUZA et al.2005;
OLYMPIO; AMORIM; LIMA, 2012).
Desse modo, a pele é um elo que comunica o meio interno com o externo e no
momento em que se dá o stress, durante esse período ocorre uma transmissão nos
sensores de nervos localizados na região periférica do sistema nervoso central
(SNC), acometendo a aproximação do psicológico com o meio exterior (AZULAY,
1997 apud SOUZA et al. 2005;).
Perante todos os acometimentos mostrados acima, este artigo teve como
objetivo analisar a influência que o stress tem no agravamento em pacientes
portadores de psoríase, observando através de outros estudos, o seu mecanismo
fisiológico, tentando entender o funcionamento desse desencadeamento.
Metodologia
Este artigo de revisão é de cunho qualitativo que segundo Rodrigues (2006), se
dá quando o pesquisador faz uma análise mais subjetiva sobre o seu estudo, sendo que
este não pode ser quantificado, o que pode envolver questões psicológicas,
comportamentos e até opiniões, ou seja, tudo o que for inerente ao ser humano.
Desse modo, o presente estudo foi realizado através de uma pesquisa
bibliográfica, na qual são feitos a partir de outras fontes de dados como livros, artigos
publicados em periódicos, dissertações, teses, dentre outras, para que o pesquisador
possa ter um embasamento teórico reforçando, assim, a sua ideia do assunto estudado
(MARCONI; LAKATOS, 2011). Com isso, foi feito uma procura no banco de dados da
Scientific Eletronic Library Online (Scielo) e na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) para
se adquirir artigos com as palavras–chave: stress e psoríase.
Realizada a busca dos dados secundários, foram verificados os estudos mais
recentes e relevantes do tema proposto. Feito isso, começou a análise profunda das
pesquisas científicas com leituras minuciosas, visando verificar os pontos importantes
para compreensão dos mecanismos fisiológicos da patologia, com autores que abordam
sobre o agravamento que o stress causa em portadores de psoríase.
Concomitante a leitura desses documentos científicos, efetivou-se os
fichamentos dessas obras, que constitui em destacar trechos de importância para este
estudo, facilitando o entendimento do leitor para colocar em ordem as análises efetuadas,
possibilitando uma melhor organização neste trabalho (MARCONI; LAKATOS, 2011).
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Resultados e Discussão - Características Gerais da
Psoríase
Uma das dermatoses mais importantes e discutidas dentro dos aspectos
clínicos é a psoríase. Esta é uma doença que atinge a pele devido às várias
inflamações que são caracterizadas pela proliferação desordenada dos queratinócitos
(WOLTERS, 2005 apud HOBOLD, 2012). Essas lesões eritematoescamosas
aparecem devido a alguns fatores internos e externos como a influência do sistema
imunológico, alterações bioquímicas e vasculares (TORRES et al. 2011 apud
HOBOLD, 2012).
Desse modo, estudos feitos por Arruda et al.,(2011) afirmam que essa doença
não é contagiosa, mas crônica atingindo cerca de 1 a 3% de toda a população mundial,
podendo atingir pessoas de todas as idades dentre eles homens e mulheres, afetando
os dois sexos em uma proporção igual, de modo que a população da cor branca são
mais susceptíveis a desenvolver esta patologia (ROBBINS; COTRAN, 2010).
Entretanto, Araújo, Burgos e Moura (2009) apud Hobold (2012), mostram
que não existe um estudo no Brasil de sua prevalência, porém a nível mundial, a
psoríase pode afetar 2% da população o que pode variar entre 0,6% a 4,8% dessa
população.
Esta dermatose tem características peculiares, fazendo com que seja
detectada ao exame clínico, sendo caracterizadas pelo aparecimento de lesões róseas
ou de cor avermelhada, das quais são cobertas por escamas secas com a aparência
branca que se alternam nos períodos da fase aguda quando esta melhora ou piora. As
principais regiões do corpo, em que aparecem esses sintomas com mais frequência,
são os joelhos, cotovelos, couro cabeludo, palmas das mãos e sola dos pés. Portanto,
pelo fato dessa doença ser crônica, ela não tem cura, mas pode ser tratada (ARRUDA
et al. 2011).
No que tange a imunopatogênese da psoríase, Lowes (2007) apud Sanchez
(2010), mostra que essa doença é complexa, envolvendo afecções do sistema imune
inato que envolve os queratinócitos, as células dendríticas, os macrófagos,
neutrófilos, mastócitos e células endoteliais e o sistema imunológico adquirido,
abrangendo também, os linfócitos T. Desse modo, pode-se observar que as células do
sistema imune inato, quando são ativadas, produzem fatores de crescimento que são
as quimiocinas e as citocinas, das quais agem em cima das células do sistema imune
adquirido mantendo esse sistema de reciprocidade (GUTTMAN-YASSKY;
KRUEGER, 2007 apud SANCHEZ, 2010).
Estudos feitos por Moreira e Souza (2008) existem vários tipos de psoríase,
mas podemos destacar a vulgar, a guttata, a eritrodérmica e a pustulosa. A do tipo
vulgar que de acordo com Silva e Da Silva (2007) apud Moreira e Souza (2008) é a
mais comum, com lesões delimitadas que podem variar de tamanho, apresentando
colorações avermelhadas, com as escamas aderentes e secas, com cor prateada ou
acinzentada, tendo a sua localização na região dos joelhos, cotovelos e couro
cabeludo.
Já a psoríase do tipo guttata é a que atinge mais as crianças da qual, podem
aparecer algumas pápulas e placas de tamanho pequeno, podendo surgir após
uma infecção nasal causado por algum tipo de bactéria. No entanto, a psoríase do
tipo eritrodérmica é a forma mais grave, pelo fato desta abranger praticamente
todo o corpo (cerca de 90%) que caracteriza-se por possuir eritema e descamação.
Nesse contexto, a psoríase do tipo pustulosa também pode ser generalizada ou
localizada atacando as palmas das mãos e plantas dos pés (CUCÉ; FESTA NETO,
2001, FITZPATRICK et al.2005 apud CARVALHO et al. 2010).
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Revista Perspectiva Amazônica
Ao falar sobre o tratamento da psoríase, Carneiro (2007) relata que existem
medicações tópicas, no caso dos emolientes, que agem como hidratantes para aliviar
os sintomas, onde estes são empregados nos pacientes em que a doença está de forma
mais leve. Nesse contexto, o autor ainda afirma que a fototerapia também pode ser
utilizada como forma de tratamento, na qual é feito através da utilização de luz
ultravioleta que irá causar alterações de imediato inibindo a mitose, de modo que este
é feito apenas em pacientes com a forma disseminada ou grave da doença. Estes tipos
de tratamentos corroboram com estudos feitos por Barros e Lopes (2002) apud
Moreira e Souza (2008), no qual utilizam-se de medicações tópicas, hidratações de
pele e exposições moderadas a luz solar.
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Características Extrínsecas do Stress
Existem fatores intrínsecos e extrínsecos que podem comprometer o estado
de um paciente psoriático. Um desses fatores extrínsecos é o stress. De acordo com
Lipp (2000) a palavra, stress, é de origem latina que já foi usada há muitos séculos
atrás, mas que somente no ano de 1926, foi descrita pelo dr. Hans Selye como um
estado de tensão do organismo que pode ser patogênico, o que causa um
desequilíbrio interno no mesmo.
Lipp (2003) apud Silva e Silva (2007, p. 260), também afirmam que o
stress[...]é uma reação com componentes físicos, químicos, mentais e emocionais do
organismo, causada pelas alterações psicofísiológicas que ocorrem quando a pessoa
se confronta com uma situação que possa irritá-la, amedrontá-la, confundi-la ou
fazê-la feliz.
Já para Jesus (2010), o estado de stress também pode ser entendido como
algo subjetivo de cada ser humano. O autor mostra que um simples ruído pode ser
agradável para um, mas incômodo para outra pessoa, dependendo da situação.
O corpo humano vive em constante homeostase e cada órgão interno tem o
seu próprio ritmo de entrosamento, mas quando ocorre um episódio de stress, este
fica em total desarmonia, fazendo com que cada um deles trabalhe mais do que o
outro, suprindo a necessidade dos que pouco trabalham (LIPP, 2000).
O meio social do qual o indivíduo está inserido, também pode interferir na
sua vida particular, afetando o seu bem-estar e colocando em risco a sua saúde.
Assim, Batista (2011, p. 30) em seus estudos afirma que “[...] o stress tem uma
relação dinâmica e recíproca entre o indivíduo e o ambiente”.
Corroborando com o autor citado anteriormente, Bianchi (1990), apud
Batista (2011, p. 31) o stress é considerado “[...] como uma alteração no ambiente
interno ou externo de tal magnitude, qualitativa ou quantitativa, que requer do
organismo uma maior adaptação, promovendo a reação de defesa para manter a vida
em homeostase”.
Desse modo, o stress pode causar certo desconforto para as pessoas que são
acometidas de psoríase, pois como relata Torrezan (1997) apud Silva e Silva (2007),
quando o stress torna-se exagerado, pode comprometer as funções do sistema imune
do ser humano, evidenciando ainda mais o aparecimento da doença.
Com isso, pode-se perceber que o stress age como um catalisador,
cooperando na baixa qualidade de vida do ser humano, fazendo com que este esteja
inserido em programas de prevenção para a saúde no combate a este “mal do século”.
(SILVA; MULLER, 2007).
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Desencadeamentos Fisiológicos do Stress na Psoríase
Partindo do princípio que a psoríase é uma doença crônica dermatológica,
percebe-se que o principal órgão afetado é a pele, pois ela tem um maior contato com
o meio externo, sendo uma de suas funções fazer o revestimento de todo o corpo, que
facilitará a proteção do organismo, podendo também ser um componente que regula a
temperatura corpórea, realizando um equilíbrio do meio interno com o externo
(SOUZA et al. 2005).
Nesse contexto, Azulay (1997) apud Souza et al.,(2005.p. 168), afirma que a:
[...] “inter-relação pele-psiquismo é estreita desde a sua origem embrionária, pois
tanto a epiderme quanto o sistema nervoso têm a sua origem no mesmo folheto
embrionário, o ectoderma”. Sendo assim, existe na pele uma transmissão sensorial
com seus nervos situados na região periférica do sistema nervoso central (SNC),
fazendo com que haja uma aproximação do psicológico com o meio exterior.
Silva e Silva (2007) corroboram com o autor citado acima, garantindo que as
células que dão origem a pele, tem uma relação muito próxima com as células
nervosas. Estes também afirmam que existe uma aproximação nas alterações
emocionais do indivíduo que está acometido com alguma doença da derme, no qual o
emocional do sujeito pode interferir no quadro clínico de algumas patologias a nível
tegumentar.
Essas alterações se dão por consequência do estado de atenção que o stress
causa, pois este afeta todo o equilíbrio das funções do organismo devido às reações
fisiológicas ocasionadas por ele, tendo em vista restabelecer os níveis de normalidade
que o corpo encontrara outrora (ZUARDI, 2009).
Compreende-se que a psique humana pode afetar na homeostasia corpórea, pelo
fato de que os pacientes portadores de psoríase, ao perceberem a presença dessa
dermatose pelo corpo, poderão sentir-se constrangidos por conta dos sinais desta doença,
de maneira que eles podem adquirir um nível de stress elevado, colocando em risco a
piora dessa enfermidade (STEINER; PERFEITO, 2003 apud SILVA; SILVA, 2007).
Esse desequilíbrio no organismo, por causa do stress, pode ter influência no
sistema imune humano, pois ela irá desencadear reações em nível de sensores neurais,
o que pode acarretar o agravamento de algumas doenças da pele. Assim, a patologia
se desenvolverá quando o organismo não se adapta a situação de stress (SOUZA et al.
2005; OLYMPIO; AMORIM; LIMA, 2012).
Dessa forma, o autor acima ainda afirma que o desencadeamento do stress se dá,
quando um estímulo do agente estressor é ativado, no qual essas informações possam ser
transcritas para o sistema límbico-hitpotalâmico. Essas partículas serão repassadas para
todo o organismo em forma de transmissões sensoriais, onde acontecerão vários eventos.
As glândulas supra-renais e a hipófise são acionadas liberando os
hormônios adrenalina e cortisol, respectivamente. Estes irão ativar órgãos como o
coração e o pulmão, de maneira que as células do sistema imune receberão
informações por meio de receptores e só funcionarão conforme a mensagem
recebida. Essas células transmitirão dados para o sistema neuroendócrino, pelos
neurotransmissores, que serão captados pelo encéfalo e produzirão mensageiros
de tensão para os órgãos alvos, onde estes poderão ser mantidas ou inibidas
(AZAMBUJA, 2000 apud SOUZA et al. 2005).
Condizendo com o autor citado, Dias (2007), afirma que esse entendimento
do stress a nível fisiológico, é de suma relevância para a compreensão de alguma
mudança no tegumento humano, no que se refere a patologias da pele. Sendo
assim, Jesus (2010. p. 17) mostra que “O stress psicológico afeta a patofisiologia
de doenças infecciosas, inflamatórias e auto-imunes”.
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No entanto, Jesus (2010) ainda afirma que existem stress do tipo agudo e
crônico, na qual a primeira dura num curto período de tempo e o segundo num tempo
mais prolongado, podendo ultrapassar anos. Ainda de acordo com Jesus (2010), o
desencadeamento da sua resposta patofisiológica pode fazer alterações na
imunobiologia da pele, na qual o stress agudo pode dar um estímulo na função
imunecutânea, já o tipo crônico atua como imunossupressivo.
Nesse contexto, Wiswanathan e Dhabhar (2005) apud Jesus (2010), relataram
em seus estudos o quanto o sistema nervoso humano pode ter um domínio sobre todo
o organismo numa situação de stress. Eles descrevem que o cérebro transmite dados
de perigo por todo o organismo e através de estímulos enviados para o sistema neuroendócrino, faz deixar em alerta o sistema imune que manda leucócitos para os lugares
onde, possivelmente, seria o lugar da lesão.
Assim, ao realizarem seus estudos experimentais e após testarem as suas
hipóteses, eles chegaram a uma conclusão, onde
Ano 4 N° 7 p.97-104
[..] o stress agudo inicialmente aumenta o tráfico de todas as
subpopulações de leucócitos até ao local de uma cirurgia ou ativação
imune, mas apesar de não alterar a sequência de entrada (neutrófilos e
macrófagos precedem os linfócitos), aumenta significativamente a
magnitude de infiltração de cada subpopulação. A segunda conclusão diznos que este aumento de leucócitos induzido pelo stress é um mecanismo
de resolução (o número de leucócitos decresce 72h após o implante). E
finalmente os quimio-atratores derivados dos antigénios ou patogênios
resultantes de lesão tecidular, seletivamente mobilizam subpopulações
específicas. Estes achados revelam-nos um importante mecanismo
através do qual stressores agudos alteram o curso das diferentes respostas
imunes (inata vsadaptativa; precoce vstardia; aguda vscrónica)
(WISWANATHAN; DHABHAR, 2005 apud JESUS, p. 18, 2010).
Este achado científico foi de grande valia, pois durante as cirurgias ele pode ajudar
como imunoprotetor, protegendo o organismo de alguns patógenos, mas este poderá
provocar o agravamento de reações inflamatórias como a gengivite e as autoimunes, no
caso a psoríase (WISWANATHAN; DHABHAR, 2005 apud JESUS, 2010).
Desse modo, Jafferany (2007) apud Jesus (2010) confirma que a psoríase tem
o seu agravamento ocasionado pelo stress, pelo fato deste interferir na
permeabilidade da barreira da epiderme. Jesus (2010) ainda ressalta que existem
estudos comprovando que substâncias interferem na deterioração do desequilíbrio
dessa barreira na altura do tecido cutâneo, mas esse mecanismo ainda continua uma
incógnita para os pesquisadores da área.
Considerações Finais
Ao analisar os estudos referentes ao agravamento da psoríase por conta do
stress, primeiramente, observou-se que ela é uma doença sem distinção de sexo, cor e
não se tem uma expressiva proporção em escala global, levando em consideração
outras dermatoses. Outra observação feita foi sobre a psoríase vulgar como a mais
comum nesses pacientes, sendo que em crianças, a mais frequente é a guttata. Pelo
fato de ser crônica, ela não tem cura, mas existem tratamentos para aliviar os seus
sinais e sintomas.
Em relação ao stress, as pesquisas mostraram-se relevantes no que diz
respeito à influência do meio externo para o desequilíbrio da homeostase no
organismo humano, de maneira que cada um tem uma reação diferente em uma
determinada situação estressante. Desse modo, a situação de “alarme” passa
a ser um catalisador no agravamento dessas pessoas que são acometidas de
psoríase. Assim, os sinais da doença passam a ser vistos com mais frequência.
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Revista Perspectiva Amazônica
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Ao observar esse desencadeamento para o agravamento da psoríase, constatouse que a pele é o principal órgão transmissor de sinais para o sistema nervoso central,
sendo que este, em resposta ao stress, irá ativar o sistema imune e as suas principais
células de defesa irão atingir os locais em que está se instalando uma possível
inflamação, acarretando na piora do estado de saúde do paciente psoriático.
Levando em consideração todos os estudos aqui analisados, é importante
ressaltar que ainda há poucos trabalhos abordando o tema da psoríase sendo agravada
pelo stress. Outro ponto de suma relevância nesse artigo foi à interessante relação do
psíquico com o meio externo, ocasionando o agravamento dessa patologia.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.105-113
Potencialidades e Fragilidades na Aplicação Prática da
Sistematização da Assistência de Enfermagem:
Um Olhar Acadêmico
Jonata Ribeiro de Sousa*
Luiz Antônio Bergamim Hespanhol**
Isabela Vanessa Sampaio dos Reis**
Natália Miranda Monteiro**
Pablison Cardim Coelho**
Paula Simone Barbosa Cardoso**
Kaio Vinícius Paiva Albarado**
Sheyla Mara de Oliveira***
RESUMO
A sistematização da assistência de enfermagem (SAE) é regulamentada por lei e é uma incumbência
privativa do enfermeiro, responsabilizando-o pela implantação, planejamento, organização, execução e
avaliação nos serviços de saúde. O estudo teve por objetivo conhecer a percepção dos acadêmicos do 5° ano
do curso de Bacharelado em enfermagem sobre as potencialidades e fragilidades do método (SAE), através de
pesquisa qualitativa, descritiva de abordagem crítico-interpretativo, utilizando-se um questionário
semiestruturado para coleta de dados. Os resultados revelaram que as potencialidades estão relacionadas ao
conhecimento proporcionado ao enfermeiro para identificar as situações de saúde/doença de seu cliente;
contribui para promoção, prevenção, recuperação e reabilitação na saúde do indivíduo; baseia-se em um
método científico, voltado à assistência com o público e possui etapas para melhorar os serviços de
enfermagem e a qualidade da vida dos pacientes. As fragilidades implicam diretamente em ausência de
conhecimentos; excessos de atribuições dadas ao enfermeiro (assistência e administração); método recémintroduzido; debilidade da estrutura hospitalar e recursos humanos insuficientes, contribuindo para o fracasso
de sua implantação. Conclui-se que a SAE, consiste em um método científico organizado, que capacita o
enfermeiro a atuar de forma significativa, melhorando os cuidados de enfermagem e contribuindo para a
qualidade na vida da população.
Palavras-chave: Enfermagem, Sistematização da assistência de enfermagem e Qualidade de vida.
ABSTRACT
The systematization of nursing care (NCS) is regulated by law and is a private assignment
nursing, taking responsibility for the implementation, planning, organizing, implementing and
evaluating health services. The study aims to identify the perceptions of academics the 5th year of
the Bachelor of Nursing about the strengths and weaknesses of the method (NCS) through
qualitative, descriptive of critical-interpretive approach, using a semi-structured data collection.
The results revealed that the potentials are related to the knowledge provided to nurses to identify
situations of health / illness of his client; contributes to promotion, prevention, recovery and
rehabilitation in the health of the individual, based on a scientific method, targeted assistance
with the public and has steps to improve nursing services and quality of life of patients.
Weaknesses involve directly in the absence of knowledge; excesses of assignments given to nurses
(servicing and administration); newly introduced method; weakness of hospital infrastructure
and insufficient human resources, contributing to the failure of its implementation. We conclude
that the NCS is organized on a scientific method, which enables the nurse to act significantly
improving nursing care and contributing to the quality of life of the population.
Key words: Nursing, Systematization of nursing care and quality of life.
*Acadêmico de Medicina da Universidade do Estado do Pará-Campus XII-Santarém-Pará.
**Acadêmicos do curso de Bacharel em Enfermagem da Universidade do Estado do Pará-Campus XII-Santarém-Pará.
***Bióloga, Enfermeira, Especialista em Saúde da Família pela Universidade do Estado do Pará. Especialista em Enfermagem em Nefrologia pelo Centro
Universitário Geraldo Di Biase e Mestra em Doenças Tropicais pela Universidade Federal do Pará.5
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Revista Perspectiva Amazônica
Introdução
Ano 4 N° 7 p.105-113
A Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) em ambientes
hospitalares, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de
enfermagem, é regulamentada pela Resolução COFEN-272/2002. Tal resolução
determina que a SAE seja uma incumbência privativa do enfermeiro, cabendo-lhe a
implantação, planejamento, organização, execução e avaliação de tal processo.
Sendo assim, a SAE deve ser desenvolvida em todas as áreas de atuação da
enfermagem para garantir a qualidade e efetividade do cuidado ao paciente/cliente.
A SAE é uma forma organizada de estabelecer a atuação de enfermagem,
tendo o completo domínio do campo teórico e das habilidades práticas, sendo
fundamentada pelo processo de enfermagem, no qual, o enfermeiro tem a
oportunidade de prestar seus cuidados de forma holística contemplando as
necessidades humanas básicas de cada indivíduo. Além do mais, a elaboração da
sistematização da assistência de enfermagem é um dos meios que o enfermeiro dispõe
para aplicar seus conhecimentos técnico-científicos e humanos na assistência ao
paciente/cliente e caracterizar sua prática profissional, colaborando na definição do
seu papel, de profissão independente, frente à sociedade (TANNURE;
GONÇALVES, 2008).
Nunes (2009) aprofunda a discussão quando enuncia que a SAE deve ser
aplicada pelo profissional da enfermagem de maneira organizada, para que este possa
garantir um atendimento holístico ao paciente/cliente, de modo a identificar as suas
necessidades básicas.
Através da SAE é assegurada uma prática assistencial adequada e
individualizada ao paciente (AMARANTE; ROSSETO; SCHNEIDER, 2009).
Nesse sentido, quando refletimos sobre a qualidade da assistência à saúde, no que
tange ao cuidado de enfermagem, percebemos que a SAE não se comporta apenas
como um método/modelo de cuidado, mas, sobretudo como um elo entre o
desenvolvimento científico e profissional de enfermagem e a qualificação do serviço
de saúde.
Segundo Felix, Rodrigues e Oliveira (2009), a implementação da SAE é
imprescindível para diferenciação e valorização dos profissionais da enfermagem,
sendo que essa sistematização, embasada cientificamente, proporciona assistência
individualizada e de excelência para o paciente/cliente.
Não obstante estar assegurada pela Resolução COFEN-272/2002, existem
percalços que atrapalham e até inviabilizam a efetivação da SAE. Vários fatores têm
dificultado a elaboração e avaliação da SAE, como sobrecarga de trabalho, pessoal
insuficiente e despreparo profissional além dos fatores inerentes ao processo
gerencial. O que reflete frequentemente na forma adotada pelos enfermeiros em
realizar a assistência não planejada, mecanizada, repetitiva não respeitando a
individualidade do paciente. Atualmente, há uma tendência mundial em se
estabelecer a sistematização da assistência de enfermagem na prática profissional: o
diagnóstico, as prescrições e os resultados das intervenções, proporcionando um
atendimento com excelência em qualidade ao cliente submetido à assistência de
enfermagem (FELIX; RODRIGUES; OLIVEIRA, 2009).
Ao se refletir sobre as desvantagens da prática de enfermagem não
sistematizada, percebe-se o quanto se deixa de valorizar a própria profissão colaborando
para a sua estagnação. Portanto, diante de todo o contexto que envolve a SAE, tais
como: teoria, importância, e as dificuldades de aplicação na prática profissional, o
presente estudo tem como objetivo conhecer a percepção dos acadêmicos do 5° ano do
curso de Bacharelado em enfermagem sobre as potencialidades e fragilidades da SAE.
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Ano 4 N° 7 p.105-113
Fundamentação Teórica
A eficácia do atendimento ao paciente vem se aprimorando com o passar dos
anos, principalmente, no que se refere aos cuidados da enfermagem. Nesse sentido, o
cuidar dos clientes de maneira holística é indispensável, pois “a necessidade de
capacitar os profissionais da Enfermagem para uma assistência sistematizada, de
qualidade, tem sido objeto de preocupação, tanto de instituições formadoras quanto
das entidades de classe (MALUCELLI et al. 2010, p. 230).
Por isso, a SAE, se consolida como um instrumento metodológico capaz de
gerar novos conhecimentos, visando à melhora do paciente/cliente. Desse modo, a
SAE está composta por cinco etapas: a investigação, diagnósticos de enfermagem,
planejamento dos resultados esperados, prescrição de enfermagem e a avaliação da
assistência de enfermagem, tendo como “líder”, nesse processo, o enfermeiro
( S I LVA , 2 0 0 4 a p u d Z A N A R D O , Z A N A R D O ; K A E F E R , 2 0 1 1 ;
TANURE;PINHEIRO, 2011).
Conforme Tanure e Pinheiro (2011), o primeiro passo para a realização do
processo de enfermagem é a investigação, que consiste em fazer a anamnese e exame
físico do paciente, afim de que as informações, sobre o estado de saúde deste, possam
ser verdadeiras para tornar o atendimento eficaz e preciso.
O segundo passo são os diagnósticos de enfermagem, de maneira que a coleta
dos dados feita durante a investigação possa ser analisado minunciosamente. Estes se
baseiam em problemas que estão ocorrendo no momento para que possa ser
prevenida uma possível piora futuramente, porém, este profissional deve ter um
embasamento teórico no seu diagnóstico, visão crítica e decisiva, além de uma boa
observação possibilitando-o uma ágil interpretação nos seus dados. Cabe ressaltar,
que uma informação errada, nessa fase, poderá ocasionar falhas nas fases seguintes
(TANURE;PINHEIRO, 2011; SILVA;OLIVEIRA, 2007).
No que se refere ao segundo passo da SAE, o profissional da enfermagem que
identificou os problemas, deve fazer uma listagem dos acometimentos que vão dos
mais graves até os mais brandos, para que possam ser dadas prioridades aos casos de
maior urgência de tratamento (TANURE;PINHEIRO, 2011).
No que diz respeito à terceira fase do processo de enfermagem, isto é, o planejamento
dos resultados esperados, consiste em um “[...] estabelecimento de prioridades para os
problemas diagnósticos; fixação de resultados com o paciente, se possível a fim de minimizar
ou evitar problemas” (ALFARO-LEFEVRE, 2005;IYER;TAPTICH;BERNOCCHILOSEY,1993 apud TANURE;PINHEIRO, 2011.p. 83). Isso se deve a sequência lógica de
um tratamento sistematizado para o que o paciente/cliente, tenha uma melhora rápida e
significativa da sua saúde, de maneira mais humanizada.
Já a prescrição de enfermagem, que é a quarta etapa desse processo, é por em
prática as ações de enfermagem para que o paciente obtenha a sua recuperação, ou
seja, são intervenções necessárias para que ele chegue aos resultados esperados da
sua prescrição (TANURE;PINHEIRO, 2011).
A quinta e última etapa desse processo é a avaliação da assistência de
enfermagem, que visa à obtenção de respostas positivas, dadas pelo paciente, sobre o
tratamento do qual foi submetido, chegando ao resultado esperado pelo enfermeiro,
que foram feitas através de anotações no próprio prontuário ou por uma boa
observação do profissional (TANURE;PINHEIRO, 2011).
Assim, é possível se ter um atendimento organizado para suprir as necessidades desse paciente,
a fim de que sejam amenizadas, com rapidez, os seus problemas, tanto físico quanto psicológico. Com
isso, o profissional da enfermagem deve ter um fundamento teórico para saber o que fazer e o por que
fazer tal procedimento, visando o bem-estar de seus pacientes (MALUCELLI et al. 2010).
107
Revista Perspectiva Amazônica
Além disso, “a prática da assistência de enfermagem vai além do modelo
médico, ela é baseada e instrumentalizada por um referencial próprio, criado e
construído pelos profissionais de enfermagem, o qual possibilita a união da teoria à
prática” (REPPTTO;SOUZA, 2005, p. 326).
Nesse contexto, esse modelo de assistência não deve ser somente o
biomédico, de modo que os profissionais da enfermagem possam ter a oportunidade
para colocar em pauta, novos conhecimentos para uma assistência mais humana e de
qualidade.
Esses conhecimentos são empregados de acordo com uma teoria de
enfermagem, e dependendo da realidade, poderá ser aplicada os mecanismos
profissionais necessários para um atendimento mais humanizado em seus pacientes,
utilizando-se de um planejamento e de uma organização para garantir uma
recuperação rápida e de qualidade (KRAUZER,2009; CUNHA;BARROS, 2005).
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Metodologia
A metodologia empregada foi pesquisa qualitativa, descritiva de abordagem
crítico-interpretativo. Para Marconi e Lakatos (2008), a pesquisa descritiva é aquela
que delineia o tema, e busca abordar também quatro aspectos: descrição, registro,
análise e interpretações de fenômenos atuais, objetivando seu funcionamento no
presente. Tais elementos contemplam o tipo de abordagem explícita na pesquisa, bem
como sustenta seus objetivos.
Amostra
O universo ou população da presente pesquisa foram discentes da
Universidade do Estado do Pará, Campus XII, situada na Avenida Plácido de Castro,
N° 1399, bairro de Aparecida, Santarém-PA, Brasil. A amostra ou subgrupo da
população estudada foram 10 alunos, na faixa etária de 20 (vinte) a 28 (vinte e oito)
anos, que estivessem matriculados no quinto ano do curso de Bacharelado em
Enfermagem, de qualquer gênero. Os critérios de exclusão da pesquisa foram:
acadêmicos desistentes do curso ou que estivessem em estágio rural (estágio
curricular em parceria com outros municípios).
Protocolos utilizados
Foram tomadas todas as providências necessárias, para realização da
pesquisa, previstas na lei 196/96, que regulamenta a pesquisa com seres humanos,
como a adoção do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), procurando
preservar a dignidade do público da pesquisa, respeitá-los em sua autonomia e
defendê-los em sua vulnerabilidade. Além disso, ocorreu ponderação entre riscos e
benefícios, tanto atuais como potenciais, individuais ou coletivos (beneficência),
comprometendo-se com o máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos;
garantir que danos previsíveis serão evitados (não meleficência) e cuidar da
relevância social da pesquisa com vantagens significativas para os sujeitos da
pesquisa e minimização do ônus para os sujeitos vulneráveis, o que garante a igual
consideração dos interesses envolvidos, não perdendo o sentido de sua destinação
sócio humanitária (justiça e equidade).
A coleta das informações foi feita por meio da aplicação de um questionário
semi-estruturado, que segundo Marconi e Lakatos (2008) é constituído por uma série
ordenada de perguntas, que devem ser respondidas por escrito e sem a presença do
entrevistador. O local da aplicação do instrumento foi acessível ao sujeito da pesquisa
com disponibilidade de dia e horário combinado com o pesquisado.
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Revista Perspectiva Amazônica
Ano 4 N° 7 p.105-113
Análise de dados
Para a análise dos dados foi utilizado o método de análise de conteúdo, que
segundo as proposições de Bardin (2002) apud Goldemberg e Otutumi (2008), tratase do desvendamento de significações de diferentes tipos de discursos, dentre eles o
questionário, baseando-se na inferência ou dedução, mas que, simultaneamente,
respeita critérios específicos propiciadores de dados em frequência, em estruturas
temáticas, entre outros. O exame das informações foi sequenciado em três polos
cronológicos: pré análise: leitura flutuante do material constituinte do corpus;
exploração do material: codificação e recorte dos elementos constitutivos do objeto
de estudo; tratamento e interpretação: processo analítico de significação e validação
dos resultados.
O presente estudo se processou em três fases principais: pesquisa
bibliográfica, coleta de dados e análise das informações obtidas. O levantamento
bibliográfico ou pesquisa bibliográfica de acordo com Marconi e Lakatos (2011)
consistiu na análise de documentos expressos em livros, teses, artigos científicos e
outros; a coleta de dados foi evidenciada pela realização da aplicação do questionário
e a análise de dados se processou mediante a aplicação do método científico análise
de conteúdo, para a interpretação dos dados coletados. Os resultados da pesquisa são
descritos, aqui, principalmente na forma de construções textuais, destacando a
percepção dos acadêmicos sobre a SAE, evidenciando suas potencialidades e
fragilidades.
Resultados e Discussão
Potencialidades
As potencialidades são um conjunto de possibilidades que aguardam
realizações, ou seja, o vir a ser (LOUZADA;NETO, 2010). No contexto da
sistematização da assistência de enfermagem (SAE) as potencialidades dizem
respeito, principalmente, aos benefícios que a sua aplicação trará para a prática
assistencial.
A SAE é um método científico que traz uma abordagem diferenciada, onde
existe uma evolução crescente e contínua em direção a uma assistência integral ao
paciente/cliente (CUNHA;BARROS, 2005). Além do mais, na tentativa de
conceituar o cuidado, devemos considerar, entre outras coisas, como afirma Silva,
Porto e Figueiredo (2008), que ele é parte integrante da vida humana, e que nenhuma
vida pode subsistir sem ele, reforçando a importância do cuidado diferenciado
inerente a SAE.
Quanto à análise das potencialidades, os depoimentos revelaram que a SAE
“Permite, ao enfermeiro, identificar as situações de saúde/doença de seu cliente;
contribui para a promoção, prevenção, recuperação e reabilitação na saúde do
indivíduo, consistindo em um modo organizado de trabalho, voltado à assistência
com o público e possuindo etapas para melhorar os serviços de enfermagem e a
qualidade da vida dos pacientes”. Tais enunciados se complementam nos estudos de
Bitta, Pereira e Lemos (2006) que a caracterizam como modelo metodológico ideal
para o enfermeiro aplicar seus conhecimentos técnico-científicos na prática
assistencial, favorecendo o cuidado e a organização das condições necessárias para
que ele seja realizado.
Por esse prisma, a SAE pode ser interpretada como determinante no processo
saúde doença, dando suporte, tanto ao profissional de enfermagem no exercício do
cuidado, quanto para o paciente, que recebe um atendimento diferenciado. “A SAE
contribui para a qualidade da assistência prestada ao paciente, porque permite uma
visão completa (holística) da situação do paciente, não apenas a patologia, mas todo
109
aspecto emocional e social, capacitando os enfermeiros e humanizando a
assistência”.
A SAE é regulamentada através da Resolução COFEN-272/2002 sendo
responsabilidade do enfermeiro aplicá-la em todos os níveis da assistência à saúde e,
segundo os acadêmicos “é importante a sua aplicação em todos os setores
hospitalares e ambulatoriais, sendo um caminho ao progresso da assistência de
enfermagem e a finalidade da formação do enfermeiro, que é cuidar de quem precisa
de cuidado especializado a SAE é um processo investigativo e científico”.
Para os acadêmicos, outra potencialidade que a aplicação da SAE traria para a
prática profissional é a que ela “estimula o enfermeiro a conhecer uma diversidade de
patologias e a planejar os possíveis cuidados, permite resolver problemas
relacionados à assistência, contribui para planejamento da assistência, permite ao
enfermeiro conhecer seu tino de observação, investigar necessidades humanas
básicas afetadas, não só a doença e planejar cuidados que reduzirão o tempo de
internação, pois evitam problemas relacionados à falta de assistência”. Para Bitta,
Pereira e Lemos (2006) trata-se de uma abordagem deliberativa de solução de
problemas, que exige habilidades cognitivas, técnicas e interpessoais, e estando
direcionada para a satisfação das necessidades do cliente e da família.
Além disso, foi destacado que a SAE aumenta a criticidade do profissional,
permite que o profissional ou o acadêmico tenha uma compreensão mais clara dos
problemas apresentados pelo cliente, demonstra que a enfermagem é uma peça
fundamental na equipe multiprofissional e permite o fortalecimento da classe de
enfermeiros. Estes relatos reforçam mais uma vez, a importância da aplicação da
SAE e seus benefícios, tanto para o paciente que terá um atendimento diferenciado,
quanto para o profissional enfermeiro que se fortalecerá tanto na teoria, quanto na
prática, permitindo realizar um atendimento de qualidade nos serviços de saúde,
culminando com a melhora de vida da população.
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Fragilidades
As fragilidades são entendidas como um conjunto de fatores que impedem ou
retardam a realização de algo. Ao se refletir sobre as desvantagens da prática de
enfermagem não sistematizada, percebe-se o quanto se deixa de valorizar a própria
profissão colaborando para sua estagnação, comprometendo o desenvolvimento da
ciência do cuidar, a enfermagem, como ressalta Felix, Rodrigues e Oliveira (2009).
Atualmente muitos são os profissionais de enfermagem que não sistematizam sua
assistência, deixando assim de oferecer um plano de cuidados individualizados e
integral que vise o bem estar do cliente e que atenda suas necessidades básicas
(VASCONCELOS et al., 2009). Nesse sentido, relatos como: “a ausência de
conhecimentos, excesso de atribuições dadas ao enfermeiro (assistência e
administração), modo de assistência recente para os profissionais, debilidade da
estrutura hospitalar, falta de apoio dos demais enfermeiros, poucos enfermeiros para
muitos pacientes”, foram percebidos como fragilidade que se correlacionam,
impedindo ou dificultando a aplicação na prática profissional da sistematização da
assistência (SAE).
Outras fragilidades na aplicação da SAE, na visão dos acadêmicos, envolvem o
ambiente de trabalho que dificulta a aplicação da SAE pela grande demanda de pacientes
a serem atendidos, os enfermeiros se prendem mais à administração do hospital, a falta
na grade curricular de disciplinas que ensinem o desenvolvimento da SAE , professores
qualificados e falta de apoio das instituições hospitalares para a aplicação da SAE.
Tais evidências, encontradas nos relatos, corroboram com o estudo de
Boaventura (2006) no qual ele afirma que a SAE tem encontrado obstáculos para a
110
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sua efetiva operacionalização na prática diária do profissional alegando as mais
diversas razões, dentre elas a falta de conhecimento e prática na realização da SAE
exigindo do profissional mais tempo para desenvolvê-la, tempo esse consumido pela
sobrecarga de trabalho e número insuficiente de profissionais na unidade de trabalho.
Hermida e Araújo (2006) fazem uma revisão sistemática dos fatores
contribuintes para a implementação da SAE e elencam diversos itens como:
reconhecimento da realidade institucional; sensibilizar toda a equipe de enfermagem
para a implantação da SAE; definir a missão, filosofia e objetivos do Serviço de
Enfermagem da instituição; preparo intelectual (teórico) da equipe de enfermagem;
elaboração dos instrumentos do Processo de Enfermagem e preparo prático para a
implementação da SAE. Se tais fatores, considerados imprescindíveis, não se
fizerem presentes dentro de uma instituição de saúde em que se almeje a SAE, todo o
arcabouço discutido e evidenciado nas potencialidades fica inutilizado na prática do
cuidado de enfermagem.
Conclusão
Verificar as potencialidades e fragilidades da sistematização da assistência de
enfermagem (SAE) permeou as análises dos questionários, com objetivo de conhecer a
percepção dos acadêmicos concluintes do curso de enfermagem quanto ao tema proposto.
Portanto, concluímos que a SAE consiste em um método organizado para
melhorar os serviços de enfermagem, contribuindo para a qualidade na vida dos
pacientes, já que permite investigar necessidades humanas básicas afetadas com uma
visão holística da situação de saúde/doença do mesmo. Com isso, a SAE mostra-se como
finalidade da formação do enfermeiro, demonstrando que a enfermagem é uma peça
fundamental na equipe multiprofissional, representando assim, as potencialidades para
que a SAE seja aplicada nos diversos serviços de saúde.
São colocados pelos acadêmicos como fragilidades para a implementação da SAE,
a falta de preparo e corporativismo dos profissionais, somado ao excesso de atribuições
dadas aos enfermeiros e o pequeno número destes para o atendimento de muitos pacientes,
além da ausência de apoio por parte das instituições que prestam serviços de saúde.
Os resultados esperados foram alcançados, confirmando que a SAE (na
percepção dos acadêmicos) possibilita melhor atendimento ao paciente, melhorando a
qualidade da assistência de enfermagem e que certas dificuldades de entendimento,
conhecimento e confiança sobre a SAE, contribuem para a não aplicação desta.
Por fim, para que ocorra sistematização da assistência de enfermagem é
fundamental a capacitação dos enfermeiros, tanto na grade curricular, quanto na prática
profissional, o que proporciona conhecimentos científicos e metodológicos para a
aplicação da SAE. É necessário também o dimensionamento e engajamento da equipe
profissional de enfermagem, para dinamizar os serviços de saúde e, apoio das instituições
de saúde, que, passam a evitar gastos adicionais com materiais e tempo de internação em
consequência do déficit da assistência de enfermagem. Pesquisas, no sentido de
investigar os problemas e potencialidades da SAE, contribuem para fortalecer seu
embasamento teórico e possibilitam discussões e reflexões que podem contribuir para a
melhoria da qualidade da assistência prestada.
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1. A revista “Perspectiva Amazônica” publicará artigos originais, artigos de revisão, resenhas, relatos de caso e
ensaios, desenvolvidos por pesquisadores de diferentes instituições de ensino e pesquisa, que tenham caráter
científico, sejam inéditos e versem sobre qualquer área do conhecimento e preferencialmente que
possuam alguma relação com a realidade Amazônica.
Artigo científico “é parte de uma publicação com autoria declarada, que apresenta e discute ideias, métodos,
técnicas, processos e resultados nas diversas áreas do conhecimento” (ABNT. NBR 6022, 2003, p. 2). Os artigos
originais apresentam temas ou abordagens inéditas, ao passo que os artigos de revisão analisam e discutem
trabalhos já publicados sobre um determinado tema.
Resenhas são revisões críticas de livros e de publicações científicas ou de interesse científico, nacionais ou
estrangeiros. Uma resenha deve resumir, analisar, comparar e opinar sobre a obra em questão, constituindo
portanto contribuição teórica ou científica ao campo.
Relatos de caso são relatos de experiências vivenciadas adaptadas ao uso didático. Os relatos devem analisar a
situação em exame e propor questões para reflexão, contextualizando o caso dentro da área do conhecimento e
suas implicações nesta área.
Ensaios são opiniões aprofundadas obtidas através da análise de um assunto. São exposições objetivas, lógicas,
críticas e originais sobre determinado tema, pelo qual o autor pode transmitir informações e ideias.
2. Os trabalhos serão submetidos ao Conselho Editorial da revista que os encaminhará a dois Avaliadores
conforme área de conhecimento e disponibilidade, para que emitam o parecer favorável ou desfavorável à
publicação do artigo. O(s) avaliador(es), ao apreciar(em) o trabalho, não terá(ão) conhecimento de sua autoria.
3. O encaminhamento do manuscrito deverá ser acompanhado de carta assinada por todos os autores,
reafirmando que o material não foi publicado e nem está sendo submetido a outro periódico.
4. Ao enviar o trabalho para análise o(s) autor(es) concorda(m) com todos os termos das normas de publicação e
abre(m) mão de qualquer ação com relação a estes. As Faculdades Integradas do Tapajós, o Conselho Editorial
e os Avaliadores da Revista “PERSPECTIVA AMAZÔNICA” não se responsabilizam, nem de forma
individual nem de forma solidária, pelas opiniões, ideias e conceitos emitidos nos textos, que são de inteira
responsabilidade de seu(s) autor(es).
5. As pesquisas que envolvam seres humanos ou animais devem apresentar na metodologia que os
experimentos foram realizados em conformidade com a legislação vigente sobre o assunto adotada no país, de
preferência com prévia aprovação do Comitê de Ética correspondente.
6. Os Avaliadores podem aceitar ou não os trabalhos submetidos e, eventualmente, sugerir modificações ao(s)
autor(es), a fim de adequar os textos à publicação. Nesse sentido, só serão publicados os trabalhos que recebam
parecer favorável, e que tenham sido ajustados conforme indicação dos avaliadores.
7. Os trabalhos não aceitos para publicação ficarão à disposição do autor até três meses após a comunicação do
resultado.
8.
Os autores terão direito a dois exemplares da revista na qual seu trabalho foi publicado.
9.
Os trabalhos serão aceitos em fluxo contínuo e caso aprovados publicados conforme a edição semestral.
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO
GERAIS
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NORMAS PARA PUBLICAÇÃO
115
ESPECÍFICAS
Na primeira página do arquivo deverá constar: a) título e subtítulo (se houver); b) autoria: nome completo
do(s) autor(es) na forma direta, acompanhados de um breve currículo que o(s) qualifique na área do artigo; c)
órgão financiador (se houver); d) resumo e abstract (máximo de 200 palavras); e) palavras-chave (no mínimo
três);
2. O corpo do texto dos artigos originais deve apresentar, sempre que possível, a seguinte estrutura: a)
introdução; b) fundamentação teórica; c) metodologia ou material e métodos; d) resultados; e) discussão; f)
conclusões; h) referências.
3. Nos artigos de revisão, resenhas, relatos de caso e ensaios não será exigida a estrutura comum aos artigos
originais.
4. As referências devem ser apresentadas conforme norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT), em ordem alfabética, com entrada pelo último sobrenome do (s) autor (es). Quando houver mais de
um trabalho do mesmo autor citado, deve-se seguir a ordem cronológica das publicações.
5. As figuras e tabelas devem ser sempre em preto e branco, apresentadas em folha separada do texto e com
numeração específica para cada categoria, acompanhadas das legendas, créditos e fonte. As tabelas e figuras
devem ser executadas no mesmo programa usado na elaboração do texto.
6.
As características técnicas dos trabalhos devem ser as seguintes:
a.
Editor de texto: Word 97 ou superior
b.
Fonte: Times New Roman, 12
c.
Espaçamento: 1,5 linhas
d.
Papel: A4
e.
Alinhamento: Justificado
f.
Margens: Superior: 3cm, Inferior: 3cm, Esquerda: 2cm, Direita: 2cm
g.
Extensão: De 08 a 20 páginas, incluindo a primeira página (título, autor, abstract,
conforme item 1.)
7. Os trabalhos deverão ser enviados em arquivo MS WORD para os e-mails [email protected] e
[email protected] , acompanhados dos demais documentos exigidos, que deverão ser encaminhados em arquivo
“PDF”.
Revista “PERSPECTIVA AMAZÔNICA”
Faculdades Integradas do Tapajós
Coordenação de Pesquisa e TCC
Rua Rosa Vermelha, 335 – Aeroporto Velho
68010-200
Santarém – Pará – Brasil
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