globalização produtiva e comercial e desafios do
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GLOBALIZAÇÃO PRODUTIVA E COMERCIAL E DESAFIOS DO SLP DE CALÇADOS DO VALE DOS SINOS RIO GRANDE DO SUL/BRASIL Dra. Maria Lucrécia Calandro, Dra. Clarisse Chiappini Castilhos Mag. Silvia Horst Campos Fundação de Economia e Estatística - Brasil 1. Introdução As intensas transformações, produtivas, comerciais, tecnológicas e financeiras, ocorridas nas últimas décadas do Século XX, e suas conseqüências sobre o ambiente competitivo internacional, trouxeram novos desafios à sobrevivência de empresas e setores produtivos. Um dos grandes traços desse movimento, denominado genericamente de globalização ou mundialização, é a definição de uma nova divisão internacional do trabalho (DIT). Nessa nova DIT, o processo de produção de um bem é dividido em várias fases de trabalho, as quais podem ser separadas geograficamente. Tal dispersão global das cadeias produtivas permite que etapas intensivas em mão-de-obra sejam deslocadas para regiões e países com custos de produção inferiores aos praticados na atual localização. Esse movimento explica o crescimento acentuado da produção de bens semiduráveis, produtos nos quais os preços desempenham papel fundamental na concorrência internacional, como é o caso de calçados e têxteis, em países asiáticos. Com a mudança no ambiente competitivo e o resultante acirramento da concorrência, empresas de diversos setores produtivos, buscando manter e/ou ampliar a participação no mercado, empreenderam um esforço de desenvolver capacitações que lhes viabilizassem agregar valor ao produto para assim se reposicionarem na cadeia global de valor. No caso da indústria calçadista, segmento tradicionalmente nômade, os anos 90 presenciaram um novo deslocamento de plantas e de empresas fabricantes de calçados para países e regiões que apresentam vantagens locacionais ligadas ao baixo custo de produção, cujo principal exemplo é a China. O deslocamento de plantas engaja-se dentro de um movimento geral de constituição de uma nova distribuição espacial da indústria, tanto de países desenvolvidos como de países em desenvolvimento. Esses deslocamentos, que se prolongam pelos anos 2000, configuram a seguinte divisão de mercado entre os principais fabricantes: calçados de menor valor agregado ficaram a cargo dos países asiáticos enquanto os países antigos e tradicionais fabricantes de calçados, como é o caso da Itália, ocupam nichos de mercado, com produtos de marca e design sofisticado. Nessa divisão, o Brasil ocupa uma posição intermediária no mercado – os calçados não são baratos como os fabricados pelos asiáticos, nem possuem os atributos (sofisticação, design e marca) dos produtos italianos. Convivem no Brasil dois tipos de aglomerações: o primeiro, mais tradicional, organizado em redes locais de produção, é especializado na produção de calçados femininos (Vale dos Sinos/RS); calçados masculinos (Franca/SP e Jaú); calçados infantis (Birigui/SP). O segundo tipo de aglomeração está sediado no Nordeste do Pais e destaca-se pela produção de calçados de baixo custo e menores preços. Em um cenário de intensificação da concorrência internacional, as empresas estão deslocando plantas para regiões de menores custos e investindo na aquisição de novas capacitações que lhes possibilitem um reposicionamento na cadeia global de valor. Essas mudanças resultam da implementação de estratégias de agregação de valor, diversificação de mercados, deslocamento de plantas e abertura de novos canais de comercialização, as quais viabilizam a manutenção e a conquista de mercados em um ambiente de acirramento da concorrência e de política de valorização da moeda nacional. Por isso, a compreensão das transformações que atravessa a forma de organização das empresas em arranjos produtivos não pode se limitar a seus elementos endógenos, é necessário considerar os novos padrões de concorrência dominantes em escala mundial. Tendo presente esse panorama internacional, o objetivo deste artigo é identificar as alterações ocorridas no SLP calçadista do Vale dos Sinos (RS/Brasil), especialmente nos anos 2000, decorrentes das transformações produtivas e comerciais verificadas nos últimos 20 anos em escala mundial. O presente artigo está organizado em duas seções, além da introdução e das considerações finais. A seção 2 apresenta o panorama internacional que se construiu nos últimos 20 anos onde se desenrolaram as mudanças que constituem o pano de fundo para a análise que segue. Na seção 3 serão examinadas as novas estratégias produtivas, comerciais e tecnológicas adotadas pelas principais empresas do setor calçadista, bem como as mudanças verificadas nas formas de inserção dessas empresas no mercado internacional. Nessa análise buscar-se-á avaliar se as formas de adequação das empresas pertencentes ao SLP Vale dos Sinos ao novo ambiente competitivo em termos de produtos, processos e canais de comercialização. Também serão examinadas as conseqüências desse movimento sobre a participação da indústria calçadista do RS na composição do PIB estadual, nas exportações industriais do Estado, sobre o número de empresas calçadistas e empregos gerados no SLP do Vale dos Sinos (RS). Para finalizar serão tecidos alguns comentários sobre as prováveis transformações verificadas no SLP de calçados do RS em termos de governança, formas de produção e difusão de inovação e cooperação interfirmas e interinstitucional, tendo em vista as transformações do ambiente internacional. 2. Panorama internacional A análise das transformações por que tem passado a atividade produtiva no capitalismo contemporâneo determinou uma nova lógica de expansão internacional dos capitais que norteia esta investigação. A partir de meados da década de 80, os grandes grupos industriais intensificaram suas estratégias de fusões, aquisições e acordos de cooperação comercial, organizacional e tecnológica, resultando numa centralização do capital sem precedentes. Os investimentos diretos do exterior (IDE) passaram a visar principalmente o mercado internacional, e suas decisões estão submetidas à unidade financeira da qual fazem parte, pouco interagindo com o ambiente produtivo onde se introduzem. A estruturação de um grupo industrial “em torno de um centro financeiro e através de uma rede de conexões (...) constitui o modo dominante de segmentação do capital no estágio atual do capitalismo” (Beau, apud Serfati, C.,1998). Nesse mesmo movimento, emerge em escala mundial, um novo paradigma tecnológico e organizacional (Perez, 1989, Freeman, 1982) que, segundo uma perspectiva neoschumpeteriana, abriu novas janelas de oportunidades, introduziu novos players na concorrência internacional e impeliu a mudanças institucionais que permitiram sua dominância em escala mundial. O novo paradigma, consagrado na literatura por Piore e Sabel (1984) como modelo de especialização flexível tem como um dos traços mais importantes o da desverticalização produtiva o que gerou muitas novas atividades e estimulou ainda mais a criação de novas empresas dentro de Arranjos Produtivos Locais (APLs) ou Sistemas Locais de Produção (SLPs). Esse paradigma vem a substituir o taylorista-fordista, caracterizado pela concentração técnica, que integrava numa mesma empresa diferentes etapas da produção (integração vertical). Até o final dos 70, os investimentos diretos do exterior- IDE adotavam uma estratégia de expansão internacional através da implantação de unidades produtivas completas, denominadas filiais, em diferentes países, também verticalmente integradas, cujo objetivo era a conquista de mercados nacionais. Esses IDEs, nesses casos, apresentavam importantes efeitos sobre a geração de novas atividades produtivas dentro dessas regiões onde se implantavam, uma vez que em geral se utilizavam de fornecedores locais. Nessa fase a organização de SLPs apareceu como uma importante forma de organização das empresas, no âmbito regional, estabelecendo um contraponto à concentração técnica do capital, inserindo competitivamente PMEs e regiões mais pobres, como é o caso típico da III Itália, bem como promovendo um certo equilíbrio na distribuição da renda regional e pessoal e ampliação do emprego nesses ambientes. A proximidade entre as diversas instituições que compõem um SLP (empresas, sindicatos, centros de ensino e pesquisa, unidades de comercialização, etc) apoiou a mais rápida difusão de inovações nos tecidos produtivos locais, permitindo a organização de novos nichos de concorrência. No SPL, as diferentes etapas da produção, embora não pertençam a uma mesma empresa, estão próximas e interagem a partir de varias formas de acordos de cooperação, por exemplo, na compra de matérias-primas, ou na comercialização dos bens. Entretanto, o aprofundamento da concentração financeira e da globalização das cadeias produtivas, criou condições para que muitas empresas que surgiram dentro desses espaços a se tornarem grandes capitais internacionais, caso típico da Parmalat. Essa tendência aprofundou um tipo de hierarquização dentro dos SLPs, já apontadas por Rabelotti (1998) engendrando nesses espaços, empresas com acesso diferenciado às chamadas economias externas, um dos traços mais atraentes de aglomerações produtivas. Em escala mundial, a ascensão da globalização financeiro-produtiva tornou-se a forma dominante na dinâmica concorrencial, favorecida pelas regras impostas através do chamado Consenso de Washington (1989), que impõem uma nova DIT que aprofunda as diferenças entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. De maneira geral, adotam-se políticas favoráveis à abertura dos mercados de trabalho, de bens e serviços e monetário. Coerentemente com essas determinações, o Brasil, a partir do governo Collor de Mello, adota políticas macroeconômicas liberais, de abertura do mercado e privatização das estatais. O Brasil, e em particular o Rio Grande do Sul, já nessa fase contava com importantes SLPs que foram desenvolvendo redes de cooperação entre as instituições na medida em que a idéia de SLP se difunde enquanto instrumento de política pública. Também no RS, essas aglomerações passaram a apresentar fortes limites competitivos, principalmente na última década, que estão relacionadas à nova ordem concorrencial, que se impôs a partir dos anos 90, e cujos principais elementos são a financeirização globalizada (Chesnais, 2004); a globalização das cadeias produtivas e a nova DIT do qual a China é o player mais representativo. Esses grandes transformações internacionais repercutiram sobre a organização e a capacidade competitiva dos SLPs. As grandes empresas que no período anterior haviam internalizado quase todas as etapas do processo produtivo passaram a direcionar suas atividades para alguns elos estratégicos das cadeias produtivas. Esse processo origina novas empresas produtoras de bens, que, anteriormente, eram produzidos de forma integrada por uma única empresa. Esse mesmo movimento de desverticalização da produção, ao mesmo tempo em que multiplica os elos das cadeias produtivas, favorece a internacionalização dessas cadeias, reduzindo a capacidade das grandes empresas de difundirem inovações no âmbito regional e mesmo no nacional. No período anterior, a entrada de IDE poderia reforçar as redes locais de fornecedores, com repercussões positivas sobre a difusão de inovações. Na presente fase (a partir dos anos 90) observa-se a tendência inversa, ou seja, os fornecedores de primeira linha — e mesmo os de segunda — das grandes empresas são também fornecedores internacionais, enfraquecendo os vínculos entre as empresas locais e as usuárias, com influência sobre o funcionamento dos SLPs. Incorporando essa ótica da mundialização e financeirização do capital, os estudos mais recentes sobre cadeias produtivas aportam diversas contribuições. Para Prochnik (2002), a configuração das cadeias produtivas foi alterada em função do processo de desverticalização característico das novas formas de organização da produção. Os elos das cadeias se multiplicaram e se diversificaram originando novas empresas e novas atividades. A discussão do conceito de cadeia produtiva vis-à-vis a nova dinâmica internacional de acumulação de capital permite melhor compreender os efeitos da globalização produtiva no estudo das relações interfirmas e da dinâmica do desenvolvimento territorial. Com esse procedimento é possível visualizar de maneira bastante nítida o papel que exerce uma empresa multinacional quando está à frente de uma cadeia produtiva, seja como produtor final, seja como distribuidor internacional. No caso da liderança da cadeia ser exercida pelo distribuidor, como é o caso do setor de calçados, sua dinâmica depende dos compradores internacionais (grandes redes de varejo, tradings ou grandes marcas), que assumem o papel de coordenação visto que são responsáveis pela distribuição das encomendas entre produtores localizados em países diferentes.” (Gereffi, Memodovic, 2003 apud Cruz-Moreira, 2003: 151). Essa nova forma de organização da produção, que se tornou dominante em escala mundial, absorvendo e controlando as formas de organização do paradigma anterior, constituiu-se no esforço do capital para superar sua crise de valorização. Assim, afirmou-se uma nova divisão internacional do trabalho que apresenta componentes que influenciam significativamente a atuação do comércio mundial. “Encontra-se em curso um fenômeno de segmentação da produção, também chamado “especialização vertical” (ver Hummels, Rapoport e Yi, 1998), que permite às empresas transnacionais separarem sua produção em busca de vantagens de localização. Tal tendência de internacionalização da produção é acompanhada não apenas por aumento no comércio internacional – através do comércio intra-firma -, mas obviamente, por um incremento do fluxo de investimentos diretos entre países, que teve um enorme crescimento desde o início da década, sendo boa parte deles destinada para a China” (Castilhos, Carneiro, 2008). No que se refere especificamente à produção de calçados é preciso considerar que é uma atividade intensiva em mão-de-obra realizada com tecnologias difundidas, o que lhe confere baixas barreiras à entrada onde o preço assume um papel estratégico na disputa por mercados. Como o processo produtivo é realizado em etapas; modelagem, corte, costura, montagem e acabamento, é prática comum nessa indústria a descentralização de etapas da produção para diversas empresas. Até os anos 90, a maioria das empresas integrantes da cadeia de fornecimento das empresas calçadistas encontrava-se em um mesmo espaço geográfico, formando aglomerações produtivas especializadas. A entrada de novos produtores, com menores custos de produção, alterou a distribuição geográfica da produção de calçados. Paralelamente a entrada dos novos produtores asiáticos e do crescimento exponencial da produção chinesa, houve um deslocamento de plantas de produtores tradicionais para região regiões com menores custos, aprofundando a divisão já existente entre fabricantes, integrantes das primeiras etapas da cadeia de valor, e os integrantes da ponta final da cadeia, que são os responsáveis pelo desenvolvimento e comercialização da produção. Durante esse período os estudos das aglomerações produtivas buscavam identificar as aglomerações produtivas e a partir daí examinar os diferentes elementos responsáveis pelo sucesso competitivo do arranjo, sobretudo o relacionamento entre os diversos atores presentes nessas aglomerações. Com base nesse diagnóstico, elaboravam-se políticas públicas com o objetivo de consolidar o SLP e desenvolver a região. O processo de globalização, sobretudo, produtiva e comercial, aumentou a dispersão da produção; novos locais de fornecimento de insumos e de matérias-primas apareceram e novas formas de hierarquização produção foram se desenvolvendo. Para coordenar a cadeia produtiva dispersa em diversos locais e países, e cujos produtos também são comercializados em mercados dispersos, são requeridas competências relacionadas não somente com o processo produtivo mas sobretudo com o mercado (conhecer a demanda, divulgar e comercializar a produção). São essas as atividades que geram mais valor na cadeia produtiva. A idéia de cadeia global de valor passa a ter sentido com a globalização do processo, ou seja, quando as diferentes etapas de uma produção estão distribuídas em diversos países, ou regiões: (...) “Em outras palavras, design, produção e marketing envolvem uma cadeia de atividades distribuídas em diferentes partes do mundo” (Schmitz, McCormick, 2002: 41). A intensificação da concorrência exigiu o ”aprimoramento produtivo” das empresas e do próprio aglomerado, tanto através de melhoria de processo e de produtos, promovendo um avanço funcional, ou seja, avançar na cadeia de Valor. “Algumas melhorias auxiliam no reposicionamento do aglomerado produtivo na cadeia global, outras apenas reforçam a posição existente”. Por exemplo, enquanto a melhoria funcional busca o avanço vertical das empresas, as melhorias em produtos podem apenas abrir novos nichos de mercado, melhorando o posicionamento horizontal. A cadeia de valor compreende a seguinte seqüência de atividades: concepção do produto; fontes de matérias-primas, de insumos intermediários e de serviços industriais; diferentes etapas produtivas, marketing, distribuição, serviços de pós-venda. Essas atividades constituem uma cadeia interconectada de produção, distribuição e consumo de produtos e serviços. (Raikes, Jensen, Ponte, 2000; Kaplinsky, 1998 apud Cruz-Moreira, 2000). No caso da indústria calçadista, intensiva em mão-de-obra e com produção dispersa pelo mundo, cada vez mais o comando da cadeia fica concentrado na ponta da cadeia: produtores de marcas tradicionais, grandes varejistas e cadeias de desconto, por designers e por comercializadores de marcas famosas. Dessa forma, o esforço de países e empresas vem sendo feito no sentido de gerar competências que viabilizem a progressão na cadeia de valor. Para manter a posição ou mesmo ampliar a participação no mercado internacional, as empresas devem buscar melhorar o posicionamento “Para alcançar estágios superiores, as empresas precisam desenvolver processos de aprendizagem que lhes permitam promover inovações e fortalecer suas competências.” (Guidolin, Costa, Rocha, 2009: 155). O posicionamento de países e empresas calçadistas dentro da cadeia global de valor depende do conjunto de funções desempenhadas pelas empresas. A tipologia de modernização industrial (progressão industrial), construída a partir de conceitos utilizados por Hobday (1995), Gereffi (1991), Gereffi (1999) e Humphey (2004, apud Guidolin, Costa, Rocha (2009: 154) consta no Quadro 1. Quadro 1 – Atividades características das empresas nas diferentes posições da tipologia de modernização industrial OEA Original equipament assembly Faccionistas ou maquiladoras OEM Original equipament manufacturer Fornecedores de pacotes completos Recebem especificações sobre produtos e processos produtivos; Recebem insumos e componentes semiacabados ; Realizam atividades simples de montagem; Retornam o produto ao cliente para outras operações; Recebem especificações sobre o produto; Desenvolvem especificações sobre o processo de produção; Gerenciam compras e logística; Entregam o produto acabado com a marca do cliente. ODM Original design manufacturer Fornecedores de pacotes completos com design próprio Realizam atividades de design e de especificações de produtos; Produzem ou terceirizam a produção; Gerenciam a cadeia de fornecedores; Eventualmente decidem sobre a comercialização. OBM Original brand manufactures Fornecedores de pacotes completos com marca própria Realizam atividades de criação e gestão de marcas; Realizam atividades de design e de especificação de produtos; Produzem ou terceirizam a produção; Gerenciam a cadeia de fornecedores; Decidem sobre o processo de comercialização. GB Global byers Compradores globais Não produzem; Realizam atividades de criação e gestão de marcas próprias; Realizam atividades de design e de especificação de produtos; Terceirizam a produção; Gerenciam a cadeia de fornecedores; Decidem sobre o processo de comercialização. Fonte: Guidolin, Costa e Rocha (2009: 154) A partir desse enfoque, o upgrading na cadeia, segundo Cruz-Moreira e Fleury (2003) é viabilizado através da melhoria em processos e em produtos (upgrading funcional), ou ainda mediante o avanço setorial (mudança para um outro setor). Os fabricantes de calçados de menores custos e menores preços, que concorrem no mercado internacional, possuem plantas do tipo OEA (caso do Paquistão, do Vietnã e da Tailândia). “Os países que desenvolvem competências, principalmente a capacidade de gestão da cadeia de fornecedores, inserem-se como parceiros globais no modelo OEM e ODM, como ocorrem em Taiwan. Já os países que investem em design, qualidade, desenvolvimento de produto e marketing conseguem atual no mercado global com OBM, no qual se destacam os países europeus.” (Godolin, Costa, Rocha, 2009: 155). 3. Transformações recentes do SLP de calçados do Vale dos Sinos A indústria calçadista do Rio Grande do Sul, situada no extremo sul do Brasil, iniciou sua fase de expansão na década de 70 fabricando grandes volumes de calçados de baixo custo a partir de especificações de grandes compradores: varejistas e exportadores (tradings). Paralelamente à expansão do número de empresas fabricantes de calçados foram se constituindo em seu entorno uma rede de fornecedores de insumos e de componentes, fabricantes de máquinas e prestadores de serviço configurando um aglomerado de empresas especializado na produção de calçados. Destaca-se nesse sentido a existência de importantes centros tecnológicos do calçado, instituições de ensino e entidades de classe patronais e sindicais vinculadas ao setor. Surgida, inicialmente, no Vale do Rio dos Sinos, essa indústria encontra-se hoje presente em diversos municípios próximos à região original. A área ampliada, que constitui o SLP calçadista no Rio Grande do Sul, inclui o Vale do Paranhana, o Vale do Taquari, o Vale do Caí e parte da região serrana do Estado (cerca de 50 municípios). Mas o SLP do Vale dos Sinos ainda é o maior e o mais importante e pode ser tomado como parâmetro para a caracterização e desempenho dessa indústria no Rio Grande do Sul. Considerado um das maiores (ou o maior, para alguns autores) clusters de calçados no mundo, favorecendo a geração de importantes economias de aglomeração que contribuem para a maior competitividade das empresas, esse SLP agrega estabelecimentos industriais de diferentes portes produzindo calçados, couros, componentes e máquinas, com níveis variados de capacitação tecnológica. As mudanças que vem se fazendo presentes na indústria calçadista do Vale dos Sinos já iniciaram no final dos anos 80, quando o desempenho dessa indústria começou a refletir, por um lado, as transformações havidas no mercado internacional e, pelo outro lado, os efeitos da rápida abertura comercial brasileira. Essencialmente aconteceram ajustes da esfera produtiva às novas condições de produção (novas práticas produtivas e novo paradigma tecnológico) e alteração nas formas de comercialização (globalização produtiva e comercial) e ajustes aos efeitos da política econômica baseada em taxas de juros elevadas e câmbio apreciado (Costa, 2007). Apesar do crescimento expressivo da produção e das exportações, viabilizados pelo aglomerado de empresas e pela presença significativa de entidades empresariais e de pesquisa e ensino, a indústria calçadista gaúcha pouco avançou na cadeia global de valor, acomodando-se à posição de subcontratado de grandes compradores internacionais. Ou seja, os investimentos em capacitação para o desenvolvimento de produto e criação de marcas e para a criação de canais próprios de comercialização e distribuição mantiveram-se em patamares reduzidos até a década de 90. A crescente participação dos calçados asiáticos no mercado internacional contudo passou a exigir dos calçadistas gaúchos um reposicionamento na cadeia global de valor, ou seja, esses fabricantes devem buscar uma melhoria de processos e de produtos que garantam maior valor agregado ao produto final e, ao mesmo tempo, desenvolver capacitações na área de design, marcas e comercialização. As informações e análises sobre o desempenho recente dessa indústria no Brasil e no Rio Grande do Sul mostram alguns avanços nessa direção. 3.1. Produção, exportação, emprego e número de empresas na indústria de calçados do Rio Grande do Sul no período 1996-2009 A indústria calçadista do Rio Grande do Sul é formada por cerca de 3.700 empresas que empregaram em torno de 114 mil trabalhadores formais em 2008, o que representou 37,23% da mão-de-obra ocupada nessa indústria no Brasil. Nesse mesmo ano, essas empresas geraram exportações da ordem de US$ 1.115,56 milhões 08 (59,30% do valor das exportações brasileiras de calçados) com o embarque de 51,48 milhões de pares, o que se traduziu em 31,05% do volume total exportado pelo Brasil (MDIC/SECEX/Aliceweb). Contudo, embora expressiva, a importância relativa do Vale dos Sinos vem diminuindo nos últimos anos. A participação da atividade fabricação de calçados em termos do Valor da Transformação Industrial (VTI) calculado pelo IBGE é um indicador importante na avaliação da perda de representatividade dessa indústria nos últimos 15 anos. Em 1996 o VTI da indústria de calçados no Rio Grande do Sul respondia por aproximadamente 60% do valor dessa atividade no Brasil refletindo a concentração da produção de calçados em solo gaúcho. Em 2007, no entanto, esse percentual já havia declinado para pouco mais que 37%, por conta da perda de competitividade no mercado internacional referida anteriormente nesse artigo. A comparação entre o VTI da fabricação de calçados e o VTI total da indústria de transformação no Rio Grande do Sul também aponta uma perda expressiva de representatividade: 14,17% em 1996 e apenas 6,58% em 2007. A evolução do emprego formal no SLP calçadista do Rio Grande do Sul soma-se a esse quadro desfavorável. Apesar da intensa produção de calçados e artigos de couro, aliada à oferta de componentes, máquinas e instituições de ensino e desenvolvimento, conforme dados do Ministério do Trabalho e Emprego do Brasil é possível visualizar no Gráfico 1 que o emprego formal no SLP calçadista do Rio Grande do Sul vem perdendo importância no cenário nacional, embora isoladamente ainda seja a principal atividade industrial empregadora no país. Ainda que o volume de emprego tenha se mantido relativamente estável ao longo do período (uma diferença de apenas 2.500 vínculos empregatícios), sua representatividade passou de 58% em 1996 para apenas 37% em 2008. Também é importante destacar a perda de participação do SLP no total do emprego formal na indústria de transformação no Rio Grande do Sul equivalente a 6,5 pontos percentuais, refletindo o encolhimento dessa atividade produtiva no Estado. 350.000 300.000 250.000 200.000 150.000 100.000 50.000 0 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 20 08 nº empregados Gráfico 1 - Emprego formal na indústria de calçados no Brasil e no Rio Grande do Sul - 1996 e 2008 Total RS Total BR Fonte: MTE – RAIS (1996 e 2008) O deslocamento de plantas industriais desse Estado para outras regiões do país a partir de meados da década de 90, explica em grande parte essa perda de representatividade na indústria calçadista nacional. Motivado pela busca de mão-de-obra mais barata e existência de incentivos fiscais mais atraentes, pela valorização do dólar frente ao real e pelo crescimento da concorrência do calçado chinês tanto no mercado internacional quanto no mercado interno brasileiro, esse deslocamento estimulou o surgimento e a consolidação de novos pólos produtores da cadeia produtiva do calçado no Brasil. A especialização da indústria calçadista gaúcha na fabricação de calçados de couro transparece na composição da mão-de-obra empregada segundo o tipo de atividade. Cerca de 77% encontrava-se alocada nesta atividade em 2008 (no Brasil foi 66%), embora com uma participação menor do que a observada em 1996 (83%), refletindo a especialização na fabricação de calçados de couro, femininos. O contraponto ocorre na atividade de fabricação de calçados sintéticos que vem conquistando espaços crescentes ao longo da década de 2000. Uma questão importante refere-se à formalização do emprego no setor calçadista, que é intensivo em mão-de-obra e onde o fluxo de produção é descontínuo. As empresas tendem a terceirizar diversas etapas do processo produtivo visando a redução dos custos salariais e tributários, embora também o façam para amenizar os efeitos da flutuação da demanda e da sazonalidade inerente à produção de calçados. É bastante freqüente o uso de bancas de costura, também conhecidas como ateliês, que realizam as atividades de costura, corte, montagem, aplicação de componentes e acabamento. A informalidade desponta como um elemento preponderante nesta relação de subcontratação. Este tipo de vínculo possibilita operar com custos menores e redução de problemas associados à rotatividade da mão-de-obra muito comum nos produtos largamente afetados pelas flutuações de demanda. É importante observar, entretanto, que essa alternativa não garante um controle adequado e suficiente da qualidade dos serviços prestados, ocorrendo muitas vezes um resultado inferior aos padrões recomendados (Costa, 2002). Já no referente à evolução do número de estabelecimentos não é possível observar a mesma perda de importância do SLP calçadista do Rio Grande do Sul (Gráfico 2). 12.000 10.000 8.000 6.000 4.000 2.000 0 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 20 08 nº estabelecimentos Gráfico 2 - Estabelecimentos na indústria de calçados no Brasil e no Rio Grande do Sul - 1996 e 2008 Total RS Total BR Fonte: MTE – RAIS (1996 e 2008) Ao longo de todo o período em análise, a sua participação nessa indústria em nível nacional se manteve em torno de um terço (30% em 1996; 38% em 2001 e 37% em 2008). A explicação para essa evolução remete para o porte médio das empresas, que é menor no Rio Grande do Sul do que no Brasil, especialmente nos locais/estados onde se desenvolveram os novos pólos produtivos que concentram um maior número de médias e grandes empresas. Trata-se de unidades modernas, relativamente verticalizadas, que empregam um elevado número de pessoas, ou então são grandes produtoras de calçados injetados cujo processo de fabricação demanda menos mão-de-obra. No Rio Grande do Sul, existe um número crescente de micro e pequenas unidades produtivas no SLP calçadista, em grande parte decorrente do forte processo de desverticalização das empresas que aqui se verifica. As empresas tendem a terceirizar diversas etapas do processo produtivo com vista a reduzir custos de salários e de pagamento de impostos, mas também o fazem para minimizar os problemas decorrentes da flutuação da demanda e da sazonalidade inerente à produção de calçados. As mudanças que vêm ocorrendo em termos espaciais no país, também parecem estar ocorrendo no âmbito do SLP calçadista no Rio Grande do Sul. Com base nos dados de emprego e estabelecimentos da RAIS foi possível constatar uma dispersão geográfica da produção, emprego industrial e número de empresas do ale dos Sinos para outros estados brasileiros, bem como um extravasamento dessas atividades para as regiões vizinhas ao mesmo. É notório o crescimento das regiões do Vale do Paranhana e Encosta da Serra e do Vale do Taquari em contraposição à queda de participação do SLP Vale dos Sinos. Nesse permanecem principalmente as empresas fabricantes de máquinas e de peças e componentes para a indústria coureiro-calçadista. Também concentram-se ali várias instituições que buscam transferir conhecimentos técnicos e intermediar os atores envolvidos na atividade econômica. Destacam-se dentre essas instituições aquelas prestadoras de serviços técnicos e tecnológicos que, “atuando como um tipo de infraestrutura do arranjo produtivo, contribuem para o aumento de sua eficiência e competitividade” (Costa, 2009: 264). A Tabela 1 mostra a evolução do emprego formal e do número de estabelecimentos entre 1996 e 2008 nas regiões vizinhas ao SLP Vale dos Sinos. Esse deslocamento tem sido de certa forma apoiado pela atuação das instituições já existentes, principalmente no que se refere ao apoio àquelas unidades. Tabela 1 - Emprego formal e número de estabelecimentos no SLP calçadista no Rio Grande do Sul - 1996 e 2008 Discriminação 1996 Vale dos Sinos Vale do Taquari Vale do Caí Paranhana - Encosta da Serra Serra SLP 51.242 9.469 5.342 28.517 7.832 102.402 Emprego 2008 %2008/1996 -16,86 42.605 18,53 11.224 5.879 10,05 33.301 5.961 98.970 16,78 -23,89 -3,35 Estabelecimentos 2008 %2008/1996 134,93 690 1.621 135,80 81 191 51 123 141,18 1996 354 105 1.281 1.182 122 3.239 233,90 16,19 152,85 Fonte: MTE – RAIS (1996 e 2008. A preocupação das instituições do SLP Vale dos Sinos com o estilo e o design dos produtos, com vistas à agregação de valor ao produto final, tem motivado ações de apoio efetivo às empresas desse SLP e também das regiões vizinhas. Nos calçados, são os investimentos em qualidade e desenvolvimento de produto, estilo e design, aliados à contínua busca de redução de custos, que têm permitido criar um diferencial competitivo para a indústria nacional. No processo de ajuste que se seguiu à maior exposição da economia brasileira à concorrência externa no início dos anos 90, as empresas também passaram a investir em processos e produtos buscando reduzir custos e racionalizar a produção, trazendo uma breve fase de recuperação da produção. No entanto, a exportação de calçados continuou concentrada nas regiões produtoras originais por mais uma década, alternando momentos de expansão com os de desaceleração, acusando os efeitos da valorização e desvalorização do real e de uma conjuntura internacional em que mercados tradicionais viam-se tomados pelos produtores asiáticos, especialmente, os chineses, comercializando calçados a preços muito baixos. A valorização do real iniciada em 2004 e o avanço dos calçados chineses impulsionaram a utilização de estratégias que trouxessem uma nova inserção internacional da indústria gaúcha de calçados. Destacam-se dentre elas a diversificação de mercados e ampliação do mercado externo; a fabricação de produtos diferenciados de maior valor agregado destinado a nichos de mercado, através de investimentos em design e produtos de moda; e a comercialização com marca própria em substituição ao regime de subcontratação antes majoritariamente utilizado. O resultado dessas estratégias pode ser melhor compreendido na análise do desempenho exportador das aglomerações de empresas do setor calçadista em âmbito nacional e regional. Praticamente todos os segmentos produtivos da cadeia coureiro-calçadista têm apostado na inovação. Nos últimos anos, as empresas do segmento de componentes para couro, calçados e artefatos intensificaram suas ações voltadas à inovação, ao design e à sustentabilidade, buscando soluções criativas como forma de se diferenciar no mercado, agregando valor (qualidade e tecnologia) aos seus produtos. A importância da inovação tecnológica nesse segmento tem sido ressaltada na literatura, com destaque para as empresas da indústria química, da produção de polímeros, plásticos e borrachas e metalúrgicas. Cabe ressaltar-se aqui o duplo papel desempenhado por essa indústria nos últimos anos: ao mesmo tempo em que abastece os fabricantes de calçados com os acessórios e componentes necessários para a produção dos vários modelos e linhas de produtos desenvolvidos pelos designers, a indústria de componentes também investe em desenvolvimento de produto e de processo, transferindo inovação para a indústria calçadista. Na atualidade, ganha espaço a exploração de novos materiais para o desenvolvimento de produtos que tenham apelo ecológico e de conforto. Nesse sentido, uma gama enorme de produtos naturais (sementes, fibras naturais, etc.) vem sendo incorporada ao produto final, construindo a imagem de um produto original, vinculado ao local. O acirramento da concorrência internacional no ramo calçadista, assim como a ocorrência de crises econômicas e/ou financeiras nos mercados compradores do produto nacional, trouxeram conseqüências negativas para as exportações do SLP Vale dos Sinos e para o total da indústria de calçados gaúcha. Isso principalmente pelo fato dessa indústria ser significativamente voltada para o mercado externo e estar menos preparada para vender sua produção no mercado doméstico. Ao perder espaço principalmente no segmento de calçados de preços mais baixos, diminuíram as quantidades exportadas e os atores dos SLPs agiram no sentido de buscar alternativas que pudessem recompor a sua rentabilidade. A elevação do preço médio de exportação assim como a busca de novos mercados despontou como uma boa estratégia a ser seguida. Ou seja, diversificação de mercados, especialmente nichos de mercado, e esforços de fabricação de maior valor agregado tem sustentado o desempenho das exportações gaúchas de calçados 1 . A Tabela 2 apresenta a evolução das exportações gaúchas e brasileiras de calçados de 1996 a 2009. A série inicia com desempenhos semelhantes, tanto em termos de valor quanto de pares exportados, com um diferencial relativamente estável até 2002, para então enfrentar um breve recuo entre 2002 e 2003, por conta da crise argentina e da desaceleração da economia norte-americana, principais compradores dos calçados gaúchos. Em 2004, já se faz presente uma reversão desse quadro, aliado à difusão de uma estratégia de diversificação e ampliação do mercado externo, em um contexto de encolhimento da demanda interna. A partir de então, adquire nitidez o comportamento diferenciado das vendas externas de calçados pelo Rio Grande do Sul e pelo Brasil. Os mercados gaúchos foram mais atingidos pelo acirramento da concorrência internacional e pelo processo de valorização da moeda nacional o que provocou uma seqüência de 1 Para fugir da concorrência asiática, os fabricantes brasileiros e, especialmente os gaúchos, intensificaram a busca de novos mercados e o aumento das vendas para mercados já explorados e, mais importante, passaram a agregar valor ao calçado nacional e a buscar novos canais de comercialização, que permitissem firmar a marca da empresa. Em conseqüência foram reduzidas as vendas para os EUA e para a Argentina e aumentadas substancialmente as vendas para outros países latinoamericanos e, sobretudo, para países europeus. retrocessos nos volumes exportados. Nem mesmo a elevação do preço médio de exportação foi suficiente para compensar os impactos da redução dos pares embarcados. Essa situação foi amenizada no caso brasileiro, contudo, por conta do crescimento da produção para exportação dos novos pólos produtores na região nordeste do país. Atualmente o SLP calçadista do Rio Grande do Sul perdeu a liderança dos estados exportadores em termos de volume embarcado. Mas ainda permanece liderando as exportações em valor por conta dos fortes investimentos em inovação e canais de comercialização com vistas à agregação de valor ao produto exportado. Tabela 2 - Exportações de calçados no Brasil e no Rio Grande do Sul – 1996-2009 Rio Grande do Sul Ano Valor (US$ milhões) Brasil N° de pares Preço Médio Valor (US$ N° de pares Preço Médio (milhões) (US$) milhões) (milhões) (US$) 1996 1388,92 121,96 11,39 1.567,23 142,68 10,98 1997 1341,58 115,66 11,60 1.522,94 142,48 10,69 1998 1144,04 99,67 11,48 1.330,48 131,02 10,16 1999 1084,66 103,05 10,53 1.277,77 137,17 9,32 2000 1292,77 121,38 10,65 1.547,30 162,59 9,52 2001 2002 1318,31 1166,62 121,21 114,74 10,88 10,17 1.617,20 1.450,97 171,33 164,14 9,44 8,84 2003 1149,41 116,87 9,83 1.552,07 188,95 8,21 2004 1274,48 119,89 10,63 1.814,01 212,46 8,54 2005 1310,34 98,89 13,25 1.891,56 189,67 9,97 2006 1256,91 81,84 15,36 1.863,12 180,44 10,33 2007 1215,22 69,81 17,41 1.911,75 177,05 10,80 2008 2009 1115,56 765,80 51,48 35,55 21,70 21,54 1.881,31 1.360,02 165,79 126,58 11,35 10,74 Fonte: MDCI / SECEX / Sistema Alice A adoção da estratégia de diversificação e ampliação do mercado externo por uma parcela mais ampla de produtores exportadores locais, em um contexto de encolhimento da demanda interna, explicam em grande parte o retorno do crescimento das exportações a partir de 2004, compensando, em parte, a queda nos volumes exportados (perdas acumuladas de 50 milhões de pares). No caso brasileiro, 2004, desponta como um ano marcado por um pico produtivo e também de volume embarcado. Nesse ano foram exportados 212,5 milhões de pares de calçados, 85,9 milhões a mais do que em 2009. O qüinqüênio 2005-2009 trouxe perdas expressivas para o setor, seja pela concorrência do calçado chinês, seja pelo movimento de valorização do real ou ainda pela crise que abalou o mundo a partir do terceiro trimestre de 2008. As perdas em termos de pares embarcados foram maiores na indústria calçadista gaúcha, especializada na produção de calçados femininos de couro, de maior preço unitário e com uma parcela expressiva da produção direcionada para o mercado externo. Às conseqüências negativas sobre a competitividade l do setor calçadista decorrentes das mudanças na taxa de câmbio, somou-se a expressiva queda no volume comercializado em nível internacional por conta do encolhimento d demanda nos principais países importadores de calçados. A evolução das exportações de calçados, em termos de valor, mostra um comportamento diferente, principalmente a partir de 2002. Pode-se constatar que as vendas externas em 2007 geraram divisas apenas um pouco menores do que o de 2004 na indústria calçadista gaúcha, mas os dois anos seguintes acentuaram sobremaneira a diminuição dos montantes exportados. Em ambos os casos, é visível o desempenho mais favorável das exportações da indústria calçadista nacional, refletindo a existência de um diferencial com relação à performance do setor no Estado. O exame dessa evolução mostra alguns resultados positivos dos esforços realizados pelos fabricantes em anos recentes, sem os quais as vendas externas certamente teriam registrado um desempenho bem mais desfavorável. O movimento na direção de segmentos de produtos de moda, cujos calçados possuem maior qualidade e preço, e nos quais têm se concentrado os investimentos em estilo, design e consolidação de marca própria, abriu novos nichos de mercado para o calçado gaúcho, compensando as perdas de participação em mercados compradores de calçados de menor preço, ocupados pelos fabricantes chineses. Em resumo, a elevação paulatina do preço médio incorpora os resultados dos esforços de agregação de valor ao produto, com investimentos em diferenciação do produto, estilo e design, possibilitando a sua comercialização em nichos de mercado de preços mais elevados. O Gráfico 3 demonstra o comportamento do preço médio de exportação do calçado gaúcho e nacional. A partir de 2004 eleva-se sobremaneira o preço médio de exportação do calçado gaúcho em decorrência de estratégias adotadas pelos fabricantes locais. Já nos demais estados brasileiros continua-se produzindo e exportando produtos de menor valor agregado e de menor preço médio. Gráfico 3 - Preço médio de exportação de calçados no Brasil e no Rio Grande do Sul - 1996-2009 25 US$/par 20 15 10 5 Brasil 2009 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 0 Rio Grande do Sul Fonte: MDCI/SECEX/Aliceweb Concentradas em poucos mercados consumidores, as exportações de calçados gaúchos tem nos Estados Unidos seu cliente externo mais forte, embora tenha havido uma expressiva perda de importância desse mercado nos últimos anos. A participação de outros países como Reino Unido, Itália, Espanha e Holanda, na Europa, e Canadá, Argentina e Venezuela, nas Américas, tem se expandido bastante nos anos 2000, particularmente após 2004. Os resultados das ações dos fabricantes em termos de diversificação e ampliação de mercados podem ser melhor percebidos na análise das exportações gaúchas de calçados, por destino (Tabela 3). Tabela 3 – Principais países de destino das exportações de calçados do Rio Grande do Sul – 1996 e 2009 Pares 1996 Ranking países 1 EUA 2 Reino Unido 3 Argentina 4 Canadá 5 Alemanha 6 Paraguai 7 Holanda 8 Bolívia 9 Chile 10 França % 73,12 5,26 2,88 2,50 1,80 1,79 1,34 1,27 1,15 0,88 2009 Ranking países 1 EUA 2 Reino Unido 3 Argentina 4 Itália 5 França 6 Espanha 7 Alemanha 8 Bolívia 9 Venezuela 10 Holanda Valor % 29,86 11,50 8,58 8,13 4,96 3,72 2,71 2,21 2,15 2,05 1996 Ranking países 1 EUA 2 Reino Unido 3 Argentina 4 Itália 5 França 6 Espanha 7 Alemanha 8 Bolívia 9 Venezuela 10 Holanda % 75,13 5,95 2,48 1,77 1,63 1,32 1,21 1,14 1,05 0,92 2009 Ranking países 1 EUA 2 Reino Unido 3 Itália 4 França 5 Argentina 6 Espanha 7 Alemanha 8 Holanda 9 Portugal 10 Canadá % 28,97 14,76 10,83 5,82 5,38 4,08 3,31 2,48 1,64 1,60 Em 2009, as compras dos Estados Unidos de sapatos fabricados no Rio Grande do Sul absorveram 29% do valor exportado e 30% do volume embarcado, seguido pelo Reino Unido. Esses dois países também foram os principais destinos em 1996, mas a alteração nas participações em 15 anos foi extraordinária, havendo uma desconcentração progressiva dos países de destino das exportações do Rio Grande do Sul. Para manter o preço médio dos pares de sapatos exportados em alta, as indústrias gaúchas estão aumentando sua participação em nichos de maior valor agregado e em mercados com potencial de crescimento. A busca de uma comercialização pautada na inserção de produtos com design e identidade própria (marca) em contraposição ao regime de subcontratação onde o importador trazia a marca e inseria no sapato produzido sob encomenda está deixando de ser a prática dominante adotada no SLP calçadista Vale dos Sinos. 3.2. Ações/estratégias produtivas, tecnológicas e comerciais e adequação ao novo ambiente competitivo Os deslocamentos da produção para países e regiões com menores custos de produção, realizados a partir dos anos 90, renovaram os desafios competitivos para os produtores localizados em países em desenvolvimento. No caso da indústria calçadista gaúcha, que exporta um percentual expressivo de sua produção, os impactos estão sendo severos. Os produtores têm empreendido esforços de adequação e atualização de sua linha de produtos e de seus processos produtivos bem como buscado intensificar seus canais de comercialização. Apesar da intensificação da concorrência ao longo da década de 90, os calçados gaúchos somente perderam competitividade a partir de 2005, em decorrência da política econômica de valorização do real. As exportações reduziram-se em termos de quantidade de pares vendidos, porém, em termos de valor, registraram acréscimos moderados, alcançados pela elevação do preço médio do calçado exportado. Para contrabalançar a perda no mercado externo, as empresas exportadoras adotaram dois tipos de estratégias: redirecionar suas vendas para o mercado interno e/ou investir em marcas próprias, e em canais de comercialização, fabricando um produto de maior valor agregado, de forma a posicionar seu produto fora do quesito preço. A implementação dessa estratégia, focada em lotes de calçados diferenciados, contudo, resultou em uma redução expressiva no número de empregos no setor. Informações obtidas junto a representantes de entidades de classe dessa indústria indicam que a fabricação em menores lotes levará a uma redução no número de empresas e de emprego na indústria. A estratégia de vender calçados com marca própria ganhou destaque nas decisões das empresas nos anos 2000 e, junto com ela veio a necessidade da criação e/ou ampliação do próprio canal de comercialização, as lojas próprias. Antes disso um grande número de empresas calçadistas gaúchas fabricavam calçados sob encomenda de grandes distribuidores que repassavam desenho e especificações técnicas, contratando assim, serviços industriais. Foi possibilitada, assim, a aquisição de conhecimentos industriais – corte, costura e acabamento, etc. - pelas empresas do setor, porém foi responsável por um processo de acomodamento por parte dos proprietários que não se preocuparam com o processo de criação e modelagem dos produtos. Esse tipo de inserção externa já vinha mostrando-se inadequado em um cenário de crescente participação chinesa no mercado mundial. Porém, acostumadas a apenas realizar o processo de fabricação, estas empresas possuem pouca prática na atividade de “vender o produto”. Na mudança da forma de inserção na cadeia de global de valor pelos grandes compradores, o apoio institucional fornecido pelo Serviço Brasileiro de Apoio à Pequena e Média Empresa (SEBRAE), a Agência Brasileira de Promoção de Exportação e Investimentos (Apex-Brasil) e a Brazilian Footwear tem se mostrado fundamental. Esses eventos do setor ainda se constituem no principal canal de vendas das empresas do setor. Observa-se, porém uma preocupação com a necessidade de acumular conhecimentos que permitam progredir na cadeia de valor: as empresas possuem capacidade produtiva, acumulada durante anos de trabalho no setor calçadista, e agora voltam seus investimentos para a área tecnologia (design e modelagem) e área comercial. Em termos de mercado interno, a divisão do mercado é feita por segmento de produtos. Os calçados de cabedal de couro são vendidos preferencialmente na região sul e sudeste do país, enquanto os elaborados com material sintético, pelas suas especificações e pelo preço, são vendidos também pelas regiões norte e nordeste. A maioria das empresas, localizadas no Vale dos Sinos, possui um departamento de criação, que reúne designer e o pessoal da modelagem técnica, tendo em vista a necessidade de adaptar os modelos encomendados pelos representantes comerciais. O processo produtivo, porém, ainda é bastante artesanal, utilizando poucas máquinas de comando numérico computadorizado. As empresas de maior porte utilizam máquinas de costura e balancins computadorizados. A etapa mais automatizada é a da costura, visto que são atividades mais trabalhosas e que demandam mais trabalho manual. “A subcontratação da etapa de costura é prática comum entre as empresas calçadistas. As empresas contratam serviços de ateliês como forma de reduzir custos (encargos sociais) e os problemas decorrentes da flutuação da demanda e da sazonalidade inerente à produção de calçados.”(Calandro, Campos, 2008: 18). As empresas voltadas para o segmento de moda adotam a estratégia de lançamentos de coleções mais freqüentes, acompanhando os lançamentos do segmento de vestuário, fabricando duas coleções básicas e mais duas ditas complementares. Pode-se observar que os empresários calçadistas da região do Vale dos Sinos, estão se tornando conscientes de que as vantagens competitivas desse tipo de indústria está cada vez menos associadas ao processo de produção, que vem sendo repassado para terceiros e mais a habilidades em outras áreas da empresa, como a comercial e tecnológica. Segundo Klein e Garcia (2007), o processo de concorrência intercapitalista e a construção de capacidade inovativas estão atrelados à posse de ativo intangíveis, especialmente nas esferas comercial e tecnológica. Uma tendência, observada nos últimos anos, vem sendo o trabalho em conjunto de fornecedores de componentes e fabricantes de calçados, desde a etapa de desenvolvimento de novos materiais. Na busca por um novo perfil de produtos, ou de realizar melhorias no calçados já fabricados, ou simplesmente, conseguir manter-se inovativas no segmento de moda que requer, em média, cinco lançamentos por ano, as empresas selecionadas nesta pesquisa realizaram melhorias pontuais no processo produtivo e ampliam seus esforços nas áreas tecnológicas e comercial da empresa. 4. Considerações finais A organização de empresas em aglomerações produtivas conta com inúmeras vantagens ligadas à proximidade entre as instituições que a compõem (fornecedores, comercializadores, produtores finais, instituições de ensino e pesquisa, agentes financeiros, sindicatos). Essas instituições, mesmo sendo concorrentes entre si, podem cooperar para melhorar a competitividade coletiva, favorecendo a inserção competitiva das empresas de diferentes portes e característica produtivas. A utilização das externalidades existentes da forma mais equitativa possível vai depender da ação das governanças locais, representadas pelas instituições que representam esse SLP. A competitividade desse SLP, por sua vez, além de sua dinâmica endógena requer articulação dessa governança com o entorno, onde se destaca o poder público na elaboração de políticas adequadas, da relação com o mercado mundial (investimentos, relações comerciais). O estudo das mudanças de estratégia do SLP de calçados do Vale dos Sinos requereu portanto uma avaliação dos prováveis efeitos das novas condições internacionais de concorrência sobre a dinâmica de crescimento desse arranjo produtivo. A partir dos anos 90, a nova divisão internacional da produção de calçados consolidou a China na posição de líder isolada da produção e das exportações mundiais de calçados. Além da China, novos países asiáticos estão ganhando participação no mercado internacional, impondo perdas expressivas para os fabricantes tradicionais, como é o caso do Brasil, e em particular dos fabricantes gaúchos. Neste cenário adverso, as empresas calçadistas brasileira adotaram ações de adaptação e reação, seja buscando menores custos de produção, seja investindo em design e em tecnologia. Na década de 90, as grandes empresas calçadistas deslocaram plantas para regiões com menores custos (mão-de-obra e matéria-prima baratas e incentivos fiscais). Nos anos 2000, estão buscando o reposicionamento do produto: sair do segmento de calçados padronizados e de preços baixos (commodity) para a produção especializada em calçados de maior valor agregado, vendidos em nichos de mercado, e em volumes menores. Para tanto, as empresas estão trabalhando para criar uma identidade, agregar valor, enfim criar um diferencial competitivo. Esses esforços envolvem a contratação de estilistas, o investimento em modelagem e estudos de tendências, a abertura de lojas em shoppings e no exterior, de modo a tornar a marca conhecida. Essa é uma situação que pode ser nitidamente observada nas empresas do SLP Vale dos Sinos e regiões vizinhas O resultado dessa estratégia pode ser constatado pela análise dos dados de produção e de exportação que mostram uma elevação continuada no preço médio dos calçados exportados, ao mesmo tempo em que se observa uma retração na quantidade de pares vendidos. Esse desempenho é explicado pelo preço médio do calçado: os fabricantes estão vendendo calçados de maior valor agregado e, portanto, maior preço médio. Foi possível constatar-se igualmente uma dispersão geográfica da produção, emprego industrial e número empresas do Vale dos Sinos para outros estados brasileiros, bem como um extravasamento dessas atividades para as regiões vizinhas ao mesmo dentro do estado do Rio Grande do Sul. Outros aspectos importantes sobre os quais pode-se conjeturar referem-se às relações de poder no interior de uma cadeia - as relações de “governança” – estruturadas para coordenar e controlar atividades econômicas geograficamente dispersas. Para isso pode-se a literatura sobre cadeias globais (Gereffi, 1996) traz importantes contribuições. Através dessa abordagem é possível identificar quem exerce o papel estratégico de coordenar e definir os rumos da cadeia, o que atualmente está concentrado nas grandes empresas. Nesse sentido, observa-se, conforme aponta a literatura recente sobre o tema, que quando a "governança" das cadeias globais de valor é exercida por empresas multinacionais, sua interação com o meio sócio-econômico local mostra-se superficial, transitória e, em alguns casos, torna-se até mesmo um enclave que pode prejudicar um equilíbrio pré-existente. Constata-se igualmente que, numa cadeia global, a difusão de inovações entre seus elos revela-se ainda menos fluída do que numa situação em que a cadeia se encontra circunscrita a um espaço determinado. Quando a liderança dessa cadeia global é exercida por uma empresa pertencente a um grande grupo internacional, seja ela uma produtora de bens finais (montadora de automóveis, por exemplo) ou uma grande distribuidora internacional (atacadistas como Carrefour e Wallmart), seus efeitos multiplicadores ou de difusão de inovações sobre o núcleo local da cadeia produtiva tendem a ser cada vez menos significativos. Como já foi referido, a estratégia dos grandes grupos é definida em escala mundial e, por isso, possui uma grande autonomia vis-à-vis a economia local. A tendência à internacionalização das cadeias produtivas altera também sua lógica de governança e, portanto, de interação com o local onde essa atividade possui sua base produtiva. O papel da governança em uma cadeia produtiva é exercido por uma “firma líder que especifica o que deve ser produzido e monitora a performance das outras firmas” (Schmitz, McCormick, 2002: 42). No caso dessa liderança ser exercida por uma empresa pertencente a grandes grupos internacionais, o poder local fica visivelmente enfraquecido. As decisões quanto a fornecedores, mercados, preços, utilização de insumos, entre outras, estão submetidas aos interesses do grupo internacional cabendo pouca margem de manobra para as demais. No caso específico de um SLP de calçados, cuja liderança é exercida pelo distribuidor, diversos aspectos devem ser considerados para serem constatados por uma investigação que só poderá ser confirmada dentro de um período mais longo. Se o SLP em questão fundamenta sua competitividade nos baixos custos de produção sua submissão à ponta final da cadeia será mais forte. Nesse caso diversos elementos como modelos, material utilizado, design, mercados, preços e quantidades serão definidos fora da governança local. Da mesma maneira não haverá inovação visto que a produção dependerá de especificações predeterminadas. Nesse caso haverá uma provável dispersão das empresas em busca de ampliar suas condições de baixo custo, como parte das empresas do Vale dos Sinos vem fazendo, conforme se constata pelas informações demonstradas a respeito do deslocamento de empresas para outros países e regiões brasileiras. Essa dispersão provavelmente levará ao enfraquecimento ou desagregação dos fornecedores locais e à perda de efeitos multiplicadores sobre outras atividades como comércio local e regional, geração de emprego e renda, entre outras. Por outro lado, a efetivação de upgrades que criem nichos de especialização e especificidades que induzam à produção de bens de maior valor agregado, capazes de conquistar fatias de mercado de maior preço e com mais exigências de qualidade e design devem garantir um melhor desempenho a essas empresas. Nesse caso, essas empresas poderão contar com o apoio de instituições de ensino e pesquisa o que indica que diversas vantagens de proximidade serão mantidas. Porém, nesse caso, as diferenças entre as empresas, expressas pela desigualdade no acesso às externalidades, deverão se aprofundar, com efeitos negativos sobre as relações entre o conjunto das instituições locais. 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