DE EUCLIDES E OS ELEMENTOS AOS NOSSOS DIAS MARIA

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DE EUCLIDES E OS ELEMENTOS AOS NOSSOS DIAS MARIA
DE EUCLIDES E OS ELEMENTOS AOS NOSSOS DIAS
MARIA DOLORES COSTA LHAMAS CARDOSO
Email: [email protected]
ORIENTADORA: Drª Giselle Costa De Sousa ([email protected])
RESUMO
A proposta principal deste trabalho é apresentar Euclides e sua obra Os
Elementos de uma forma ampla, porém com seu foco voltado para a aplicação da
Geometria plana no universo atual da docência. Os Elementos é a obra matemática
grega onde foram compilados, por Euclides de Alexandria, todos os conhecimentos
matemáticos da época, sendo utilizado durante séculos como única fonte de estudos
geométricos. Este trabalho permeia a época pré-Euclidiana − citando os
antecessores de Euclides, os quais tiveram seus estudos e tratados demonstrados
organizadamente nos Elementos − tratando ainda de alguns detalhes a respeito do
período no qual a atividade foi desenvolvida, bem como, discorre sobre a época pósEuclidiana - quando é evidenciada a influência dos conceitos axiomáticos nas obras
que surgiram posteriormente, principalmente no que concerne ao surgimento de
novas Geometrias, chamadas de não-Euclidianas, que ocorreu enquanto os
matemáticos, tentavam comprovar a inconsistência do quinto postulado. Para tanto,
mediante uma pesquisa bibliográfica, descreve-se sumariamente o conteúdo dos
treze livros da obra citando ainda outros trabalhos atribuídos a Euclides, alguns
existentes e outros perdidos no tempo, além dos que são descritos como de
Euclides, apesar de existirem inquirições a respeito do assunto. Discorre-se também
sobre a metodologia utilizada para formular os Elementos aliada a uma explanação
sobre as dificuldades encontradas pelos docentes atuais na utilização e abordagem
da Geometria Euclidiana na sala de aula, seus principais motivos e algumas
sugestões sobre conceitos pedagógicos que podem facilitar e dinamizar a
Geometria. Para tanto, é proposta a utilização de um princípio lúdico, dinâmico e
atual, mediante o uso do software livre GeoGebra como mecanismo de
interatividade e entretenimento, auferindo uma maior leveza e dinamização as aulas
de Geometria Plana, podendo ser usado em qualquer escola sem impingir ônus.
Palavras-chave: Euclides. Elementos. Matemática. Axiomas. Didática. GeoGebra.
1 INTRODUÇÃO
Com exceção de um texto de Autólico (360 a.C / 290 a.C) a respeito da esfera
móvel, os livros de Euclides são os mais antigos tratados de matemática grega de
que dispomos.
Conforme consta no site Galeria ..., (1991, p.20-21)
Talvez nenhum outro livro, além da Bíblia, se possa gabar de tantas
edições em diversas línguas e certamente nenhuma outra obra
matemática teve tanta influência como a exercida pelos Elementos:
durante mais de dois mil anos, eles serviram como modelo de
raciocínio lógico para todo o mundo, e pode afirmar-se que, durante
todo esse tempo, todos os estudantes que aprenderam geometria,
aprenderam-na de Euclides.
Este trabalho tem como objetivo um maior conhecimento desta obra e de seu
autor, além da exploração de seu conteúdo através dos recursos atualmente
disponíveis para educação.
2 EUCLIDES DE ALEXANDRIA
2.1 Fontes históricas. Matemática grega pré-euclidiana
Os problemas para o estudo da matemática grega principiam pelas fontes
históricas disponíveis, pois os mais antigos manuscritos matemáticos gregos datam
do século X d.C. Isto é, são cópias, mais próximas da nossa época do que da época
de Euclides. A J.L. Heiberg, estudioso dinamarquês da antiguidade clássica,
devemos as edições definitivas da maior parte dos textos matemáticos gregos.
Seguindo a cronologia do período grego da Matemática (600 a.C. – 450 d.C.)
indicada por H. Eves (2007), em sua Introdução à História da Matemática
2
apresentamos quatro contribuições da matemática pré-euclidiana e seus principais
colaboradores:
(i) Introdução e depois desenvolvimento significativos da geometria dedutiva
(Tales de Mileto, 600 a.C.; Pitágoras de Samos, 540 a.C.);
(ii) Início da teoria dos números (Escola Pitagórica, 540 a.C.);
(iii) Descoberta das grandezas incomensuráveis (Escola Pitagórica, pré 340
a.C.);
(iv) Sistematização da lógica dedutiva (Aristóteles, 340 a.C.).
A essas contribuições, acrescentamos as lúnulas de Hipócrates, os
paradoxos de Zenão e os trabalhos de Eudoxo. Mais informações são
encontradas no livro Episódios da História Antiga da Matemática, de Asger Aaboe
(1984).
2.1 A época helenística. Alexandria. O Museu
A cidade de Alexandria, fundada por Alexandre em 332 a.C., no Egito, se
tornou o centro mais suntuoso e cosmopolita do mundo. Com sua morte o império foi
dividido em três partes independentes. Em 306 a.C., o controle da parte egípcia
passou às mãos de Ptolomeu I, entre seus primeiros atos está à criação em
Alexandria de uma escola ou instituto conhecido como Museu, chamado também de
escola de Universidade de Alexandria. Neste sentido, Eves (2007, p.166) comenta:
“Trata-se da primeira instituição do gênero e sua organização e objetivos logo
vieram a se assemelhar aos das universidades atuais”. O Museu era um centro de
ensino e investigação fundado e sustentado, principalmente, pelo estado e dispunha
de salas de aula e de trabalho, de uma extraordinária biblioteca que incluía cerca de
400 000 papiros, de um observatório astronômico e de jardins botânicos e
zoológicos. Para multiplicar os livros, numerosos copistas eram utilizados.
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2.2 Euclides de Alexandria
Euclides, o autor do texto de matemática mais bem sucedido e influente de
todos os tempos – Os Elementos (em grego, Stoichia), não contou com a mesma
fama de seu best seller, pois pouco sabemos sobre sua vida. Algumas edições de
Os Elementos identificam erroneamente o autor como Euclides de Megara que era
um discípulo de Sócrates. Nosso Euclides é conhecido como Euclides de
Alexandria, porque lá foi chamado para ensinar matemática. Da natureza de seu
trabalho podemos presumir que tivesse estudado com discípulos de Platão, ou na
própria Academia. Proclo (410-485 d.C.), que escreveu comentários sobre Os
Elementos, foi obrigado a apresentar raciocínios de plausibilidade para afirmar que
Euclides viveu durante o reinado de Ptolomeu I Sóter do Egito (304-285 a.C.). Ele
diz ainda que Euclides precedeu Arquimedes (287-212 a.C.), pois Arquimedes cita
Os Elementos, que foi posterior a Eudoxo e Taeteto, pois os trabalhos destes foram
incorporados ao livro Os Elementos. Existe uma história, citada por Carl Boyer
(1996) em sua História da Matemática ligando Euclides a um rei Ptolomeu.
Segundo Aaboe (1984) Proclo conclui que esse soberano deve ser Ptolomeu I.
A matemática grega pré-euclidiana apresenta um desenvolvimento rápido,
inspirado e acrítico (depois de Tales de Mileto); em seguida, um estágio de crítica e
de dúvidas e, finalmente, uma disposição e polimento cuidadosos das várias partes.
A Euclides competiu essa última parte, na obra Os Elementos, apresentou de
maneira lógica e racional, podemos até dizer didática, todo o conhecimento
matemático acumulado por seus antecessores. Depois de Euclides e ainda dentro
do período grego da matemática, destacamos as seguintes contribuições:
(i) germes do Cálculo integral (Arquimedes, 300 a.C.);
(ii) Geometria das secções cônicas (Apolônio, 225 a.C.);
(iii) Geometria prática (Herão, 75 d.C.);
(iv) Trigonometria (Hiparco, 140 a.C.; Menelau, 100 d.C.; Ptolomeu, 150 d.C.);
(v) Teoria dos números, sincopação da Álgebra (Diofanto, 250 d.C.).
Percebemos nitidamente a influência do trabalho de Euclides. Não só devemos
considerar o Euclides de Os Elementos como um excelente sistematizador de
questões já conhecidas, pois a ele se deve, também, uma grande quantidade de
resultados próprios de investigação (WUSSING, 1998).
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3 OBRAS DE EUCLIDES
Além da obra os Elementos, muitos foram os trabalhos e tratados atribuídos
a Euclides de Alexandria, segundo Lancon Jr (1995), mas poucas alcançaram os
dias de hoje, relataremos a seguir os trabalhos que sobreviveram ao tempo e os que
são tratados como perdidos.
3.1 Trabalhos existentes de Euclides
Lancon Jr (1995) em seu texto cita como trabalhos sobreviventes de Euclides:
Data, On Divisions of Figures, Phaenomena, e Optics. Todos são encontrados
preservados, como da forma original, em Grego exceto On Divisions, que foi
parcialmente preservado em árabe. Todos seguiram a mesma estrutura de os
Elementos, tendo sido rigorosamente definidas e provadas todas as proposições
matemáticas existentes.
•
Data – Obra intimamente relacionada com os quatro primeiros livros dos
Elementos. É um conjunto de diversas definições seguidas por 94. Data
também é considerada importante no desenvolvimento da álgebra geométrica
dos gregos é abordado na discussão do Livro II dos Elementos.
•
On Divisions of Figures – obra que sobreviveu numa tradução árabe, que
consiste de 36 proposições relativas à divisão de diferentes figuras. Este
trabalho é semelhante às Divisions of Figures feito por Heron de Alexandria,
por escrito de, talvez, o século III dC, exceto pela parte relativa a discussão
sobre cálculos numéricos feita por Heron.
•
Phaenomena - é um tratado sobre sphaeric, ou seja, um estudo da geometria
esférica, a fim de explicar movimentos planetários, bastante semelhante On
the Moving Sphere, de Autolycus de Pitane, que floresceu em torno de 310
aC No entanto, as proposições de Autolycus são mais abstratas do que as de
Euclides, que utiliza os termos convenientes: astronômico, horizonte e círculo
do Zodíaco, na sua apresentação. É no Phaenomena que Euclides faz a
5
primeira observação de que uma elipse pode ser obtida a partir do corte de
um cilindro
•
Optics – é o mais antigo tratado sobre Ótica escrito em grego. Nas suas
definições Euclides segue a tradição platônica, onde a visão é causada por
raios discretos que emanam do olho. São 36 proposições onde Euclides
relaciona o tamanho aparente de um objeto para a sua distância a partir do
olho, e investiga a aparência das formas de cilindros e cones quando olhadas
de diferentes ângulos.
3.2 Trabalhos perdidos de Euclides
Dos
tratados
perdidos
atribuídos
a
Euclides,
quatro
foram
inquestionavelmente suas obras: Conics, Porisms, Pseudaria, and Surface Loci. (
Lancon Jr, 1995).
•
Conics – é uma compilação feita por Euclides, a qual segundo Pappus,
foi dado o crédito para Aristaeus, um contemporâneo, pelas
descobertas sobre cônicas.
•
Porisms - Tratado que continha 171 teoremas e 38 lemmas. Tem sido
sugerido que todo o trabalho foi um subproduto das investigações de
Euclides quando estudava as cônicas. Acredita-se que este trabalho
poderia conter aproximações à Geometria Analítica.
•
Pseudaria – também conhecido como o livro de falácias, no qual ele
mostrou como evitar erros no raciocínio usando uma contradição para
chegar a uma verdade.
•
Surface Loci - A última das obras de Euclides a serem incluídas no
Treasury of Analysis foi Surface Loci. Não se sabe se este título referiase à loucos por superfícies ou superfícies para loucos. Em qualquer
caso, as provas parecem favorecer a interpretação de que os loucos
eram as próprias superfícies. Alguns acreditam que Loci podem se
referir as quadricas complexas (paraboloids, hyperboloids, prolate
spheroids), porém, nenhum texto sobreviveu para confirmar qualquer
hipótese.
6
3.3 Outros trabalhos
De acordo com a pesquisa de Lancon Jr (1991) algumas obras perdidas como
Catoptrica e algumas outras sobre música e mecânica são atribuídas a Euclides,
porém deixam dúvidas quanto a veracidade da autoria.
•
Catoptrica - sobre a teoria dos espelhos é atribuída a Euclides por
Proclus. É geralmente aceito, no entanto, que Proclus errou, pois é mais
provável que este trabalho seja de autoria de Théon de Alexandria (IV
século dC), que editou algumas obras de Euclides. (Bulmer-Thomas, p.
430; Heath, Greek, II, p. 526-8 apud LANCON JR, 1995).
•
Proclus também atribui a Euclides um trabalho chamado Elementos
da Música. Os dois tratados existentes, identificados com este trabalho
foram: Introduction to Harmony e Sectio Canonis (Division of the Scale). O
primeiro é baseado em uma teoria musical da Aristoxenus, considerado
como sendo o trabalho do seu aluno Cleonides. Este último trabalho é
baseado na teoria Pitagórica da razão matemática entre notas musicais.
Não é um tratado muito importante e acredita-se que tenha sido escrito
baseado em originais de Euclides. (Bulmer-Thomas, p. 430-1 apud
LANCON JR, 1995).
•
Vários trabalhos sobre mecânica são atribuídas a Euclides quando
baseados em fontes Árabes. On the Heavy and the Light, que contem nove
definições e cinco proposições Noções aristotélicas sobre corpos em
movimento e o conceito específico de gravidade. Book on the Balance trata
a teoria da alavanca, escrito de uma forma semelhante ao formato usado
por Euclides, contendo uma definição, dois axiomas, e quatro proposições.
Um terceiro fragmento, sobre os círculos descritos pelo final do movimento
de
alavanca,
contém
quatro
proposições.
Estas
três
obras
são
complementares entre si, de tal forma que tem sido sugerido que são
remanescentes de um único tratado sobre mecânica, possivelmente escrito
por Euclides. (Bulmer-Thomas, p. 431; Heath, Greek, I, p. 445-6 apud
LANCON JR, 1995).
Mas, de todas as obras de Euclides os Elementos foi a que melhor
sobreviveu ao tempo, principalmente pelas diversas cópias que foram feitas e das
diversas traduções a que foi submetida. É concernente mencionar que, também,
devido a esses fatos alguns pequenos fragmentos de idéias podem ter se perdido no
7
decorrer de todo processo, porém ainda é a mais completa e mais bem estruturada
obra da época conhecida por nós. Faremos, a seguir, uma breve explanação sobre
ela.
3.2 Os Elementos
Os textos de maior parte dos matemáticos gregos não chegaram aos nossos
dias na sua versão original, uma vez que eram escritos em papiro e os rolos de
papiro eram muito frágeis e com o constante manuseio deterioravam-se. Apenas os
trabalhos considerados importantes, como os Elementos de Euclides, e que foram
copiados freqüentemente é que resistiram até aos nossos dias. (Friberg, 2005 apud
LAGARTO, 2002).
Os treze livros da obra podem ser comparados atualmente a capítulos de um
livro, que de acordo com Souza (2004) e possuem o seguinte conteúdo:
• Livro I: Definições, axiomas e postulados; os três casos de congruência
de
triângulo;
teoria
das
paralelas;
relações
entre
áreas
de
paralelogramos, triângulos e quadrados. A proposição quarenta e sete
(penúltima) é o conhecidíssimo Teorema de Pitágoras.
• Livro II: Trata o que usualmente se designa por álgebra geométrica ou
geometria das áreas. Num total de 14 proposições.
• Livro III: Consiste em trinta e nove proposições contendo muitos dos
teoremas conhecidos sobre ângulos, círculos, cordas, secantes e
tangentes.
• Livro IV: Construção de alguns polígonos regulares, bem como a sua
inscrição e circunscrição num círculo.
• Livro V: Teoria das Proporções de Eudoxo.
• Livro VI: Aplicação dos resultados do Livro V à geometria plana.
• Livros VII, VIII e IX: Livros consagrados à Teoria de Números.
• Livro X: Versa sobre as grandezas irracionais. É o Livro mais extenso
deste conjunto.
• Livros XI, XII e XIII: Sobre geometria tridimensional.
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Ressaltemos que em toda obra estão contidas, proposições e teoremas com
demonstrações irrefutáveis daquilo que os seus antecessores tinham mostrado de
uma forma descuidada, porém Euclides não deve ser considerado apenas como um
compilador, mesmo que tenha sido esta sua principal função no decorrer da obra e
sua colaboração para a História, mas deve ser visto como um inovador na forma de
pensar matemática. Conforme consta a seguir.
Os Elementos de Geometria de Euclides, reunião sistemática das
proposições sobre esta ciência que no seu tempo se conheciam e de
outras que ele próprio inventou; obra admirada pelos matemáticos e
filósofos de todos os países e de todos os tempos pela pureza do
estilo geométrico e pela concisão luminosa da forma; modelo lógico
para todas as ciências físicas pelo rigor das demonstrações e pela
maneira como são postas as bases da Geometria em conceitos
fundamentais, apresentados sob o nome de definições, axiomas e
postulados. Nesta mesma obra aparece, sob forma geométrica, a
origem da Álgebra, com a resolução das equações do segundo grau.
É bem sabido que os antigos matemáticos gregos, tendo a noção de
grandeza incomensurável, mas não tendo a noção correspondente
de número irracional, constituíram a Matemática sob forma
geométrica, considerando em vez de números, segmentos de recta,
para assim abrangerem nas suas teorias as grandezas
comensuráveis, e portanto os números racionais e as grandezas
incomensuráveis.
As últimas páginas do livro segundo dos Elementos do grande
lógico de Alexandria contêm, com efeito, os teoremas necessários
para a construção das raízes das equações do segundo grau
definidas geomètricamente. Foram estes os primeiros vagidos da
Álgebra, que depois, tomando forma algarítmica e crescendo mais e
mais, levou nas suas asas às alturas, em vôos soberbos, a
Geometria, a mãe que a criara.
(TEIXEIRA, 1934, p.1)
Comentaremos, a seguir, a maior inovação introduzida por Euclides na época,
sua metodologia.
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4 A METODOLOGIA DE EUCLIDES
As noções de verdade de Platão e Aristóteles (384-322 AC) estiveram
presentes em Os Elementos. Para Platão a realidade era o que pensamos. Para
Aristóteles era também o que percebemos. Definições, postulados, axiomas e
proposições (teoremas e problemas) e processo logico-dedutivo para chegar a
novos conhecimentos com base nos anteriores e seus pressupostos, consistem num
reflexo desses discursos, uma forma fazer ciência: a razão e a visão, ou seja,
axiomática e diagramas explicativo-demonstrativos. (MOURA, 2003)
Os antigos matemáticos faziam distinção entre postulado e axioma. Axioma
é um conceito em todos os ramos do saber, ou seja, uma afirmação assumida como
auto-evidente. Postulado é uma hipótese relativa a um saber peculiar a uma ciência
em particular. (Heath, Elements, I, p.117-9. apud LANCON JR, 1991). Não se tem
precisão sobre quais afirmações Euclides assumiu como seus postulados e
axiomas, pois variam conforme as traduções utilizadas como base de informações.
(AMARAL, 2003).
O quinto postulado de Euclides é o mais polêmico de todos. Muitos
matemáticos apresentaram preocupação devido ao fato da propriedade axiomática
da independência, não estar tão evidente uma vez que o ponto de interseção
poderia ocorrer a milhares de quilômetros foi a tentativa de confrontar esse
postulado que originou o princípio da geometria não Euclidiana. O padre jesuíta G.
Saccheri (1667 - 1733) provavelmente foi o primeiro a ensaiar uma abordagem
inteiramente nova. No seu último livro Euclides ab omni naevo vindicatus tentou
utilizar a técnica de redução ao absurdo, admitindo a negação do postulado do
paralelismo de Euclides com vista a obter algum absurdo ou contradição. Sem o
saber Saccheri tinha descoberto a geometria não-euclidiana. O trabalho de Saccheri
permaneceu ignorado durante século e meio. Outros grandes matemáticos, como
Karl Gauss (1777 - 1855), o príncipe dos matemáticos, redescobriu e desenvolveu a
geometria em bases semelhantes às de Saccheri (negando o quinto postulado), sem
nunca chegarem a uma contradição (POMBO, 2000).
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5 APRENDENDO E ENSINANDO GEOMETRIA ATRAVÉS DO LÚDICO
Pesquisas feitas nos últimos 10 anos com professores atuantes, mostraram
que muitos têm dificuldades para solucionar problemas e explicar conteúdos
relacionados à geometria e a trigonometria, dificuldades decorrentes da deficiência
no ensino desses assuntos nas décadas de 70 e 80, devido a lacuna deixada na
década de 60 quando a axiomática Euclidiana foi substituída pela Boubarkiana,
eliminando o ensino da geometria e trigonometria dos livros didáticos, voltando a
vigorar apenas na década de 80, momento em que se reconhece, novamente, a
importância relevante da geometria Euclidiana na formação do aluno.
Desde o início do século XX as aulas de Matemática têm sido na maioria das
vezes limitadas ao estudo dos conteúdos trazidos nos livros didáticos, onde os
métodos de ensino são mais centrados na memória, fazendo assim vigorar no aluno
um comportamento de passividade e conformismo. Acreditamos que na realidade a
melhor opção seria dosar a memória, lógica e criatividade, colocando em prática
atividades que suscitam a curiosidade e desencadeiam um comportamento de
pesquisa, tornando o aprendizado muito mais eficaz, já que o ensino lúdico e
desafiador prolongam a aprendizagem para fora do ambiente escolar, estendendo-a
pelo cotidiano do aluno.
Se faz mister, portanto, um bom planejamento por parte do docente para que
não seja imposto um único objetivo didático, voltado apenas para o conteúdo, mas
também objetivos comportamentais, desenvolvendo métodos que exijam mais
habilidades motoras, lógicas e de raciocínio, estimulando assim a inteligência, a
criatividade, a mobilidade e a maturidade.
Em relação à Geometria, em particular, é de suma importância que os alunos
vejam sua geometria aplicada ao seu cotidiano. Há inúmeras formas de trabalhar a
Geometria de forma criativa e interessante, afinal aspectos geométricos podem ser
vislumbrados em vários ambientes e situações cotidiana, basta que para tal o
professor planeje sua aula, incluindo atividades práticas e inovadoras conforme
indicam os Parâmetros Curriculares Nacionais (...), entre elas, jogos, aulas de
campo, textos históricos sobre a matemática, além do uso de softwares livres como
GeoGebra, cuja potencialidade abordaremos posteriormente, dando ao aluno uma
origem plausível e palpável daquilo que ele está aprendendo.
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Desta forma a matemática deixará de ser algo rígido, chato e sem finalidade,
e tanto o professor quanto o aluno terão o prazer da descoberta.
Assim, para os professores que declaram não terem aprendido muito bem
geometria e sentem dificuldade para explorar o conteúdo em sala de aula, o melhor
é expor suas dúvidas, realizar atividades de maneira autônoma, refletir e socializar
seus saberes construídos, tanto nos momentos da formação acadêmica, quanto na
sua prática docente. Torno a enfatizar que os usos de softwares livres podem
auxiliar muito no desenvolvimento pessoal, no que tange a geometria. Explanaremos
a seguir sobre o uso de softwares livres, em particular o GeoGebra.
6 EXPLORANDO O GEOGEBRA
O GeoGebra é um software disponibilizado gratuitamente, onde aplicamos o
conhecimento da geometria e a álgebra dinâmica e didaticamente incluindo a
possibilidade do lúdico que se apresenta como mais atraente.
Existe um esforço do Ministério da Educação com a finalidade de fazer com
que todas as escolas públicas possuam um laboratório de informática. Inicialmente
era dispendioso mantê-lo em funcionamento, pois os sistemas operacionais
oferecidos no mercado tinham que ser registrados e esses registros eram caros,
hoje, porém esse problema foi resolvido com a utilização do Linux, o qual existe,
inclusive, numa versão especial chamada Linux Educacional que possibilita a
utilização de vários softwares livres voltados para educação, especificamente, entre
eles encontra-se o GeoGebra, que é de fácil instalação e devido ao nível de
interatividade com o usuário torna-se de fácil manuseio e entendimento, podendo
ser usado desde a mais tenra infância, como ferramenta para fazer desenhos, assim
como o paint brush, ou pelos discentes mais avançados para cálculos e
demonstrações dos mais diversos níveis, proporcionando um entendimento visual
que é praticamente impossível quando se usa apenas quadro e giz ou papel e as
ferramentas de desenho comuns.
A criança provavelmente terá mais facilidade no manuseio da ferramenta, pois
é mais curiosA e não tem medo de explorar o novo. Com uma pequena orientação
ela será capaz de visualizar a Geometria de uma forma natural. Através de
12
pequenas tarefas como unir os pontos determinados ela será levada a criar figuras
geométricas que poderão ser exploradas pelo professor da forma que melhor lhe
aprouver.
Aos professores que possuam deficiência no trato com a Geometria também
poderão ser beneficiados pelo uso da ferramenta para explorar e intensificar seus
estudos, incluindo elaboração de aulas, figuras para provas e material didático.
Os alunos mais graduados poderão visualizar demonstrações matemáticas,
as quais serão assimiladas mais facilmente, além da exploração de uma variedade
de casos e exemplos que apenas com lápis e papel seriam demasiadamente
cansativos.
Atualmente ferramentas como o GeoGebra são utilizadas em trabalhos sobre
Geometria, como por exemplo, as ilustrações existentes no site Euclid’s Elements
(JOYCE, 1998), as quais foram feitas com Geometry Applet um software similar, que
permite ao usuário uma intervenção direta na figura, o que propicia melhor
compreensão e fixação do conteúdo. Apontamos ainda o próprio site do do
GeoGebra onde existem vários exemplos de trabalhos direcionados para
aprendizagem de matemática e estatística. Devido a essa dinamização do estudo da
Matemática podemos concluir que a matéria dita de menor interesse para a maioria
dos alunos e professores pode tornar-se a mais prazerosa e interessante das aulas.
7 CONCLUSÃO
A partir do percurso histórico de Euclides e os Elementos aos nossos dias
enveredamos num conhecimento da época pré-euclidiana e da influência que
Euclides exerceu sobre seus sucessores passando por elucidações de sua biografia
e obras literárias a fim de discorremos sobre a importância da própria Geometria e
seu ensino. Neste sentido, podemos evidenciar também que Euclides compilou todo
conhecimento matemático existente em sua época de uma forma axiomática, lógica
e até didática. Utilizou-se de conhecimentos pré-existentes já demonstrados
adequando-os a uma linha lógica de pensamentos matemáticos, mas também
demonstrou vários teoremas visando uma maior consistência lógica.
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De fato, o trabalho executado por Euclides nos apresenta uma visão Platônica
e Aristotélica. Ele era mais Platônico quando formulava proposições cujos
encadeamentos mentais eram suficientes para evidenciar a verdade e era mais
Aristotélico quando, por necessidade ou por sistema, construía diagramas que
tornavam a verdade (mais) acessível.
Frente a força e importância dos Elementos e do próprio Euclides discutimos
a postura do professor de matemática, perante a Geometria, em sala de aula, as
dificuldades encontradas e então sugerimos algumas alternativas para dinamizar o
processo da busca de conhecimento, como o uso de softwares livres voltados ao
ensino de Geometria, que poderão tornar auxiliar a vida do discente e do docente,
fazendo com que seja despertado o interesse pessoal de cada um pela Geometria,
proporcionando maior fixação e entendimento do conteúdo apresentado.
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