Anais do Evento

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Anais do Evento
AO276 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - História do Pensamento
Geográfico
[1188] ABORD AGEN S D O CON CEI TO D E TERRI TÓRI O N A H I STÓRI A RECEN TE D A GEOGRAFI A
MODERNA.
MARCOS AURELIO SAQUET.
UNIOESTE, FRANCISCO BELTRÃO, PR, BRASIL.
Resumo:
Em alguns países, como a Itália, por exemplo, a renovação da geografia, ocorrida a partir dos anos 1960-70,
dá-se centrada no conceito de território. Há diferentes perspectivas epistemológicas, mas predomina a
pautada no materialismo histórico e dialético. Já em outros países, como o Reino Unido, esse movimento
acontece se revisitando e revendo conceitos como os de região e lugar. Na França, há uma centralidade para
os conceitos de espaço e território. No Brasil, principalmente nos anos 1970-80, a renovação da geografia
ocorre, sobretudo, destacando-se o conceito de espaço geográfico, numa perspectiva materialista. De
maneira geral, evidenciam-se processos até então mascarados, como a atuação do Estado e dos agentes do
capital em diferentes situações, na organização e diferenciação espacial. Tenta-se pensar e elaborar
elementos teóricos que possam subsidiar a transformação social e a geografia, dessa maneira, assume um
caráter político e ideológico importante, dito de ‘esquerda’.
Nesse sentido, nos propomos a estudar as diferentes abordagens e concepções do conceito de território, em
virtude de sua larga difusão nos últimos anos no Brasil. Para isso, fizemos o estágio de pós-doutorado, na
Itália, onde encontramos uma gama bem diversificada de estudos territoriais, tanto na geografia como na
sociologia e na economia. Nosso objetivo principal foi compreender as diferentes abordagens e concepções
do conceito de território a partir dos anos de 1950-70, subsidiando a elaboração de uma abordagem
territorial que reconheça as articulações existentes entre as dimensões sociais do território (economiapolítica-cultura), entre estas e a natureza exterior ao homem, e o processo histórico e multiescalar de
processos territoriais. Dito de outra maneira estamos tentando contribuir para a elaboração de uma
argumentação que reconheça as dimensões sociais e naturais da constituição do território no real, o processo
histórico e a multiescalaridade, ou seja, uma abordagem (i)material do(s) território(s) e da(s)
territorialidade(s). Para tanto, fizemos pesquisa bibliográfica, participamos de colóquios, seminários e outros
eventos científicos. Também, efetivamos atividades conjuntas com outros pesquisadores do Brasil e do
exterior, de atualização, cooperação e diálogos e, escrevemos diferentes textos sobre os resultados obtidos
para socialização, debates e publicações. O principal resultado atingido se traduz numa abordagem de traços
da história recente da geografia, destacando as abordagens e concepções de território, especialmente, na
Itália e no Brasil. Ao mesmo tempo, contemplamos autores e obras da literatura francesa e de países de
língua
inglesa.
Uma de nossas principais referências para realizar a pesquisa, foi o geógrafo italiano Massimo Quaini, que
nos oferece alguns procedimentos basilares para uma pesquisa desta natureza. São eles: selecionar e utilizar
as obras produzidas com bastante tempo e dedicação; narrar com reflexão (a história da geografia), mais
como uma problemática do que como uma solução; apreender a complexidade de relações sociais existentes
entre pesquisadores, grupos de estudos e universidades; identificar as categorias utilizadas, reconstruindo
caminhos percorridos e entrevistar autores sobre sua história de vida e produção intelectual. Não se trata de
compreender e narrar indivíduos singulares, mas suas obras, relações, grupos de pesquisas, enfim, os
contextos, os lugares em distintas escalas (estadual, regional, nacional, internacional), nos quais se inserem
e vivem, reconstruindo detalhes e sutilezas que, muitas vezes, as obras escritas e publicadas não deixam
transparecer.
As principais questões que orientaram nossa pesquisa e foram desenvolvidas são as seguintes: Como nascem
as discussões e as abordagens renovadas do conceito de território nos anos 1950-70? Quais as principais
implicações desse processo no pensamento geográfico? Quais os principais componentes da constituição do
território no real? É possível pensar e substantivar uma abordagem (i)material do território que considere, ao
mesmo tempo, as dimensões sociais e naturais do processo de territorialização? Como?
Com a reelaboração da ciência geográfica a partir dos anos 1950-60 e, principalmente, durante os anos
1970, foi possível identificar e caracterizar, envolvendo outras ciências sociais e a filosofia, quatro tendências
principais, que condensam estudos sobre o(s) método(s) de abordagem e sobre o conceito de território: a)
uma centrada na discussão teórico-metodológica, a partir de obras de G. Dematteis, G. Deleuze, F. Guattari,
M. Quaini, A. Bagnasco e C. Raffestin; b) outra, pautada na compreensão da dimensão geopolítica do espaço,
como fazem J. Gottmann e E. Soja; c) outra, ainda, voltada à explicação do desenvolvimento territorial, da
reestruturação do capital e de movimentos sociais, a partir dos estudos de C. Muscarà, A. Bagnasco, A.
Magnaghi, G. Becattini, G. Dematteis e F. Indovina e, uma quarta, semiológica, como faz U. Eco, na década
de 1970.
No Brasil, as perspectivas efetivadas a partir do início dos anos 1980, vinculam-se, sobretudo, aos estudos
de autores como Jean Gottmann, Gilles Deleuze, Félix Guattari, Claude Raffestin e Robert Sack. Apenas mais
recentemente efetivam-se algumas elaborações centradas em autores italianos, como Giuseppe Dematteis,
Arnaldo Bagnasco e Giacomo Becattini, interligando a discussão do território à do desenvolvimento local. De
maneira geral, há concepções distintas, que se excluem e se encontram em alguns aspectos e revelam,
dessa maneira, uma problemática interdisciplinar (relacional), histórica e bem diversificada, no Brasil e
noutros países.
AO277 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - História do Pensamento
Geográfico
[1575] PAISAGEM: DO MATERIAL AO IMATERIAL.
ULISSES DA SILVA FERNANDES.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O presente trabalho é fruto de uma discussão acerca do conceito de paisagem empreendida ao longo da
elaboração da dissertação de mestrado “A Natureza Monumental do Copacabana Palace Hotel: a Antevisão de
uma Paisagem”, apresentada no ano de 2006 ao Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade
Estadual
do
Rio
de
Janeiro,
para
a
obtenção
do
título
de
mestre
em
Geografia.
O recorte espacial elegido, naquele momento, abarcava não apenas a edificação do hotel em si, mas todo o
seu entorno, o que mobilizava uma discussão teórica acerca do conceito de paisagem. O estudo objetivava
uma análise sobre toda uma gama de transformações de caráter material e imaterial concernente a uma das
porções mais conhecidas da urbe carioca nos dias atuais, a praia e o próprio bairro de Copacabana. Neste
ponto, as transformações da paisagem trespassavam a barreira do sensível, pois muitas das novas
concepções em respeito à incorporação urbana de Copacabana à cidade do Rio de Janeiro estavam ligadas a
uma resignificação simbólica de múltiplos elementos pertinentes à paisagem já ali presentes desde muito
tempo.
Isto posto, aponta-se para o fundamento do trabalho ora aqui pretendido, pois objetiva empreender um
diálogo entre duas diferentes leituras inerentes a este conceito-chave da Geografia: a leitura enquanto elo
sensível, pertinente ao desenvolvimento de um referencial teórico da Geografia respaldado pela análise
espacial; a leitura do simbólico, onde abarca o imaterial, motivando novas concepções de interação entre o
homem
e
o
meio
que
o
circunda.
A paisagem surge enquanto um sensível objetivado e, assim, ao longo da história do pensamento geográfico
acaba por ser atrelada à expressão concreta da interação espacial do homem enquanto ser social. Entretanto,
a retomada da chamada Geografia Cultural reacende a importância do conceito, buscando nele a
possibilidade de leitura de formas espaciais simbólicas, muitas delas mobilizadoras da ação dinâmica do
homem
na
construção
do
espaço.
O conceito de paisagem tem importância vital na identificação da Geografia enquanto ciência moderna. Sua
compreensão advém de postulados anteriores ao seu próprio reconhecimento enquanto ciência
individualizada, como nos estudos de Humboldt, onde desde pronto não se pode negar a influência do
romantismo
alemão.
Em consonância com a escola determinista alemã e, fundamentalmente, com a escola possibilista francesa o
conceito de paisagem permeia a construção de um discurso de leitura geográfica, onde na proposta dos
gêneros de vida, na obra de Vidal de La Blache, adquire consistência para uma abordagem regional calcada
na objetivação do sensível enquanto paisagem e transforma-se, conforme Horacio Capel, em “objeto
essencial
da
investigação
geográfica”.
A partir do estabelecimento de uma Geografia Cultural – mormente aquela relacionada à Escola de Berkeley,
nos Estados Unidos da América, com Carl Sawer – observa-se uma diminuição da tensão entre as diferenças
de abordagem entre o humano e o físico, que antagonicamente, até então, se preconizavam enquanto
Geografia. Neste ponto, o conceito acaba por também permitir condições objetivadas da análise para as duas
linhas,
sem,
entretanto,
por
fim
à
postura
dualista
entre
ambas.
O conceito não subsiste à aceleração das transformações na relação entre o homem e a natureza e, por
decorrência, da exacerbação dos vínculos entre o homem e o urbano. O esgotamento da análise dos gêneros
de vida, prioritariamente associada a um modo de vida rural, leva a Geografia a buscar novos referenciais
teóricos, onde a leitura da dinâmica espacial progressivamente transborda enquanto uma análise de
compreensão
geográfica.
Paralelamente, o conceito de paisagem, acoplado à compreensão da dinâmica espacial, restringe-se, em
acordo com Milton Santos, à possibilidade de identificação “de formas que, num dado momento, exprimem as
heranças que representam sucessivas relações localizadas entre o homem e natureza”. Entre a perda do
referencial teórico centrado na leitura das paisagens e a incorporação de uma Geografia chamada de crítica
ou radical, onde há ênfase em uma análise espacial, também ressurge um movimento culturalista,
fundamentalmente a partir da década de sessenta, do século XX. Esta escola recompõe a abordagem
geográfica a partir da leitura da paisagem, mas incidindo sobre ela uma conectividade abstrata, ou seja, uma
percepção do simbólico inerente à própria interação entre o homem e o meio no qual se impõe.
Uma revisão bibliográfica pertinente ao tema sustenta a discussão empreendida, ora suscitando confronto
entre as duas concepções apresentadas, ora interagindo as duas possibilidades de leitura. Deste modo, se
estabelece o questionamento norteador do trabalho, atrelado à pertinência – ou não – da interconectividade
do conceito a partir de linhas de pensamento, por princípio, antagônicas. Este estudo vem sendo
empreendido junto ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro,
enquanto um dos pilares de sustentação de anteprojeto de pesquisa apresentado no processo de seleção ao
programa
no
final
do
ano
de
2006.
O estudo, motivado, como demonstrado, em questões norteadoras de trabalho anterior, encontra-se em
processo de discussão crítica, de enfrentamento de novas bibliografias e de construção de um referencial
teórico-metodológico capaz de sustentar a possível interação do conceito a partir das distintas concepções
indicadas. Impõe-se como um estudo pertinente à História do Pensamento Geográfico, na medida em que
busca respaldo na própria produção das idéias abarcadas pelo conceito ao longo do desenvolvimento da
Geografia
enquanto
ciência.
Por fim, sua apresentação junto ao VII Encontro Nacional da ANPEGE incide na possibilidade da contribuição
crítica que a sua exposição, ao menos parcial, possa receber de seus pares em congresso, visto se pressupor
ser este um norte motivador do encontro.
AO278 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - História do Pensamento
Geográfico
[1945] HISTÓRIA DO PENSAMENTO GEOGRÁFICO: NARRATIVA DE UMA PESQUISA.
DANTE FLÁVIO DA COSTA REIS JÚNIOR.
UNICAMP, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
Somando já um bom número de produtos acadêmicos, a linha de pesquisa denominada “História do
Pensamento Geográfico” se ressente, contudo, de textos que registrem, com exclusivo interesse, o problema
metodológico. Isto é, Monografias, Dissertações e Teses, ainda que fatalmente apresentem – em geral, numa
seção introdutória – o percurso da pesquisa, este mesmo “passo a passo” não é replicado em publicações
outras, nas quais (seria positivo) ele posasse assunto-cardeal. Esta comunicação deseja figurar como relato
útil àqueles pesquisadores cujos estudos raiem direta ou indiretamente o aspecto (combinado)
epistemológico/histórico do pensamento geográfico. Portanto, em tom admitidamente propedêutico,
narraremos o procedimento que adotamos em nossa pesquisa no Doutorado. Pois, desde que fosse dado
suficiente relevo, sobretudo ao encadeamento processual das etapas, nos pareceu que esta publicidade teria
algo a dizer a quem, ansiando “melhor” decurso, vacila na hora de optar por alternativos itinerários. A
sondagem, iniciada no segundo semestre de 2003, terminou por compreender soma de exames que se
complementaram. Isto é, muito do resultado final – espectro amplo de assuntos, arregimentados a fim de
elucidar tema central – teve de ser “pressentido”. E é bastante natural: na ausência de planos-protótipos já
razoavelmente legitimados pela prática, convém ao menos intuir a amarração de elementos auxiliares na
investigação (quer dizer, o ar tecidual que ela provavelmente terá de requerer). No nosso caso particular
(inclinação temática manifesta desde o Mestrado), arquitetamos uma Tese norteada pelos espíritos
contextual e teórico da chamada Geografia Teorética. Assim sendo, antevimos que os pré-requisitos teriam
de substanciar um exame simultaneamente atento à historiografia (à cena dos episódios condicionantes) e à
epistemologia (ao substrato filosófico, bem como às propensões que em virtude dele se seguem). Mas de que
forma alinhavar duas espécies distintas de análise, contando que caminhem paralelas e – a despeito de certa
independência nos tratamentos – que ainda aportem num mesmo ponto crucial? Quisemos coordenar dois
estudos. Um de cunho epistemológico, especificamente interessado na questão das “explanações
analógicas”; outro, de natureza historiográfica, previsivelmente preocupado com o fato de haver
condicionamento contextual das idéias. Porque quando tais explanações suscitam com naturalidade o debate
de fronteira e a causalidade histórica aponta o papel decisivo de autores e/ou instituições, fica mais que
evidente o ensejo: aproximá-los num mote de explanação mútua pode se dar! Restaria apenas conceber esta
mutualidade num programa de pesquisa “geográfico”. Manifestou-se aí (uma vez mais) aquela inclinação: o
analogismo é facilmente detectado no discurso dos “novos geógrafos”; então, optar pela historiografia da
Escola Teorética calharia ... e, quem sabe, mais bem acabada se conduzida pela seleção de um autor
brasileiro seu partidário. Elegemos Antonio Christofoletti. A escola significou retorno à modelagem teórica; o
que significou, em grande medida, reverência ao acervo conceitual das ciências naturais. Porém, um segundo
motivo acrescenta-lhe justificativa: a incontestável insuficiência de obras que, em língua portuguesa, tratam
de História do Pensamento Geográfico rendem – malgrado possível boa-intenção de seus pouco abundantes
autores – abordagens reduzidas e reducionistas. Mas e o que validaria, por sua vez, a eleição de
Christofoletti? Condição de tremendo receptor/difusor do supramencionado acervo e articulação teórica que
pretendeu patrocinar – via resenhas, principalmente – entre os conceitos de “geossistema” e “sistema sócioeconômico” (ilustradores da assimilação de teoria naturalista pelo pensamento geográfico). Dado que o
estudo seria dúplice, demarcamos dois objetivos atinentes. O objetivo epistemológico seria o de examinar a
aproximação metodológica das disciplinas científicas e também a insinuação de que os fenômenos sobre os
quais se debruçam poderiam apresentar similaridade funcional. Neste caso, coordenadamente, teríamos de
detectar uma virtual admissão desta similaridade, no discurso do geógrafo brasileiro. Já o objetivo
historiográfico seria o de expor como aparecem, ao longo da história da ciência, as alegações de afinidade
inter-fenomênica, coligando o fato à comprovação de que toda a prédica de Christofoletti denotaria, na
verdade, a causa de promover a dispersão, no tempo, dos valores caros à Nova Geografia (notadamente, a
cláusula de uma linguagem lógica). A pesquisa, eminentemente bibliográfica, pressupôs a leitura de centenas
de referências textuais; exercício que, de hábito, exige acurado critério seletivo. Sabíamos que teríamos de
inspecionar a história do pensamento científico ocidental (ali identificando iniciativas de “parentesco” entre as
fenomenologias física e humana) e, com eqüitativo esmero, vistoriar a produção intelectual do geógrafo (ali
identificando, por sua vez, acordo com a idéia de monismo metodológico). Porém, à medida que a pesquisa
adiantava-se, “implicações” deram de se mostrar. A convergência dos estudos só se sustentaria pela atenção
a um vasto elenco de temas (da cautela hermenêutica ... ao caráter promissivo – mantido candente – da
interdisciplinaridade). Nesta comunicação, iremos esmiuçar o processo da pesquisa (inclusive este transcurso
inopinado), esquadrinhando, ao final, as conclusões que puderam ser feitas – tanto no que concerne à
ocorrência mais contemporânea de uma comunhão teórico-conceitual entre as disciplinas, quanto no que diz
respeito ao diagnóstico que Christofoletti faz desta mesma comunhão, mas no particular condado da
Geografia. Pois que haveria claros sinais de que um empreendimento teórico em especial as poria em
sintonia lingüística (modelagem neo-sistêmica); além do que, o geógrafo brasileiro parece realmente ter
conseguido rastrear iniciativas recentes de explanar, com menor impasse, a interface físico|humano.
AO039 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1170] GEOGRAFIA E LITERATURA: VISÕES DO ESPAÇO EM BANGÜÊ.
MARCOS ANTÔNIO ALVES DE ARAÚJO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, NATAL, RN, BRASIL.
Resumo:
Nos espaços da literatura, especificamente dos romances, o escritor, utilizando as cores de sua vivência,
pinta suas obras de arte literárias, brinca com a textura de suas metáforas, eufemismos e hipérboles, tece,
com dor e alegria, suas histórias, constrói, através das artes de dizer, suas representações e urde, com os
fios
da
memória
e
da
vida
cotidiana,
suas
tramas
romanescas.
Nas linhas e entrelinhas do discurso literário, é possível descortinar, sentir e ler narrativas, que permeadas
por conteúdos da existência do autor, expressam histórias de amor e de ódio, de vida e de morte, de sucesso
e de fracasso, enfim, de sonhos, de fábulas e de fantasias. Essas histórias, protagonizadas por sujeitos
criados
pelo
próprio
autor,
são
tecidas
sob
um
substrato
espacial.
Percorrer as trilhas literárias é adentrar nos espaços subjetivos do autor, reconhecer seus lugares de
memória, incursionar em seus territórios afetivos, revisitar suas regiões vividas e descortinar suas paisagens
culturais. Nesse sentido, o espaço, assim como o foco narrativo, o enredo, a estética, o narrador, o tempo, e
o personagem, se constitui em um elemento relevante na formação da estrutura narrativa, tornando-se um
dos vários dispositivos a serviço do romancista na composição de seu universo literário.
O espaço na literatura é atinado como uma das categorias evocadas pelo escritor na construção de sua
narrativa, sendo visibilizado como o cenário principal onde os personagens tecem seus pensamentos, suas
vivências, seus sonhos, seus desejos, seus sentimentos, seu cotidiano, suas práticas corporais, enfim, suas
múltiplas
experiências
com
o
ambiente.
Nesse contexto, o espaço é uma construção social, uma produção cultural, uma representação da condição
humana, imaginada e simbolizada, outrossim, no âmbito literário. Diante disso, as tramas romanescas são
imbuídas de representações, imagens e percepções de espaços praticados, vivenciados e subjetivados pelo
autor em suas experiências culturais, transformados em ficção literária. Portanto, as obras literárias ao
aglutinarem elementos da existência do autor, refletem expressões, embora fragmentadas de uma
determinada
realidade
social.
Dessa forma, utilizando retalhos e partículas de seu cotidiano, de suas experiências, de conteúdos de sua
existência e de suas práticas vivenciais, o escritor constrói sua narrativa literária, criando personagens,
cenários e histórias, matizando seu enredo com os diversos símbolos auferidos de seu espaço vivido.
Nessa perspectiva, partindo do pressuposto de que o espaço se caracteriza como um recurso preponderante
no desenrolar da ação narrativa, estabeleceu-se como objetivo desse trabalho, atinar, ancorado nos
baluartes teórico-metodológicos da Geografia Cultural, como o espaço é representado e percebido na trama
romanesca
de
Bangüê,
de
autoria
do
escritor
paraibano
José
Lins
do
Rego.
Para a composição desse estudo, empregou-se como procedimento metodológico, a leitura, a releitura, a
problematização e a análise do discurso literário de Bangüê, inspirado e respaldado por reflexões teóricas
advindas de autores como: Gaston Bachelard, Antônio Dimas, Yu-Fu Tuan, Vernaide Wanderley e Carlos
Augusto
Figueiredo
de
Monteiro.
Assim, diante da perspectiva de que o conhecimento cientifico se constrói através de inquietações, lançou-se
o seguinte questionamento, norteador desse trabalho: como o espaço é representado e percebido na
tessitura romanesca de José Lins do Rego, mais precisamente em sua obra Bangüê?
A escusa de se perquirir as representações e as percepções do espaço na literatura, sobretudo no romance
Bangüê, assim como o interesse em buscar possíveis respostas para essa pergunta, decorreu do fato de que
é perceptível no contexto da produção do conhecimento cientifico geográfico, mormente brasileiro, uma
visceral
lacuna
de
investigações
que
abordem
tais
temáticas.
Na literatura de Bangüê, o engenho Santa Rosa, incrustado nas terras férteis e úmidas da região do Agreste
paraibano, compreende o espaço principal da trama romanesca, lugar de onde José Lins do Rego fala e
protagoniza as histórias de angústias, de indecisão, de amores irrealizáveis, de sonhos e de fracassos do
personagem-narrador Carlos de Melo. Através da análise do discurso narrativo presente em Bangüê, atinouse que o espaço é visibilizado por diversos ângulos e dizibilizado por uma única fala, ou seja, a do narrador.
Em Bangüê, o escritor apresenta, através de uma linguagem forte, metafórica, poética e porosa, um espaço
rural e regional perpassado pelo desenvolvimento do ciclo da cana-de-açúcar, diante do fim do patriarcado
rural e do desmoronamento do mundo dos engenhos de açúcar da plaga nordestina, destacando os hábitos,
costumes e comportamentos, principalmente, da sociedade açucareira do brejo paraibano, cenário utilizado
pelo
escritor
para
tecer
sua
ficção
literária.
Envolvido por uma força poética espacial de índole regional, por uma nostalgia da natureza, por um
sentimento bucólico e por um senso de observação dos costumes campestres, José Lins do Rego, em sua
narrativa Bangüê, trama uma obra urdida por fios de tensões que refletem os desajustes dos paradoxos, das
discrepâncias
e
dos
problemas
sócio-espaciais
da
região
Nordeste.
Nesse aspecto, as obras de José Lins do Rego, em especial o romance Bangüê, são influenciadas pelos
ditames da segunda fase do Modernismo e marcadas por uma escritura contestadora e crítica. Esse escritor,
assim como outros que fizeram parte do elenco da segunda fase desse movimento, especialmente os
oriundos do Nordeste brasileiro, voltou-se para as desigualdades sociais de sua plaga, para a situação da
população e para os conflitos germinados, denunciando, através de uma linguagem coloquial, popular e
espontânea, a seca, a fome, a miséria e a opressão social que circundavam a cartografia regional. Esse
caráter é uma peculiaridade dos escritores da tão falada geração de 1930, fustigados por formas mais
complexas de ler e narrar o cotidiano e por terem uma visão crítica das relações sociais.
No romance do qual se fala, José Lins do Rego ainda tematiza a passagem do engenho para a usina de
açúcar e a conseqüente mecanização do beneficiamento e do processamento da cana. Nessa obra, em que as
experiências de vida do escritor circulam e pulsam nas “artérias textuais”, o espaço é percebido de uma
maneira complexa e plural, em que ora são apresentados dispositivos de apreciação estética, ora destacados
elementos
de
medo,
de
insegurança
e
de
repulsa.
Desse modo, o discurso literário, mais do que os cansativos levantamentos científicos, com seus métodos,
tabelas, teorias, gráficos e fórmulas, pode revelar meticulosas informações acerca da percepção dos seres
humanos sobre determinados recortes espaciais. Atinente ao romance Bangüê, este expressa idéias e visões
para um espaço amalgamado de subjetividades, de angústias, de topofílias, de sonhos, de crises, de
memórias, de loucuras, de paixões, de decadências, de conflitos, de misérias, enfim, de planos e projetos
inexeqüíveis.
AO040 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Espaço e Cultura
[1549] CUNHA: ESPAÇOS E SOCIALIZAÇÕES PRETÉRITAS E PRESENTES.
ÉRIKA MESQUITA.
UNICAMP, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
Pretendemos neste trabalho analisar os espaços e sua relação com novas e velhas territorialidades expressas
no lugar. Primeiramente analisaremos o espaço das casas e a sociabilidade criada em seu interior. Tomamos
como base em nossa análise a paisagem, partindo da premissa de que os aspectos imateriais da cultura e
também as experiências vividas e as percepções das pessoas do lugar estão em partes materializados no
meio físico. Em cidades como Cunha verificamos que os elementos construídos estão ainda em grande
interação com a sociedade, e a afetividade se verifica como traço cultural ligado à paisagem, e muitas vezes
elementos da paisagem, quer natural ou edificada, são considerados patrimônio do lugar, selecionados pela
memória de seus moradores. Logo, sem memória, o presente de uma cultura perde as referências
ideológicas, econômicas e culturais que a originaram. O exercício da memória é, pois, o exercício da
lembrança, que por sua vez, é o exercício do pensamento simbólico – característica fundamental do homem.
São, portanto, distintos processos e práticas culturais. A memória individual ou coletiva é, pois, um sistema
onde se cruzam estruturas culturais, políticas e econômicas enquanto códigos de representação. As
representações do passado, do presente e as idealizações do futuro também convivem na memória coletiva
do lugar, conferindo ao indivíduo identidade cultural. Buscaremos elencar as materialidades e aspectos
culturais de Cunha e fazer uma análise de quais fatores contribuíram para preservar melhor a cultura local,
denominada de tradicional caipira, e assim sendo conservando o patrimônio de pedra e cal e cultural e
privilegiando as socializações e memórias ligadas ao lugar. Concomitante com a análise as novas
territorialidades
do
lugar.
A vastidão de seu território e as características geo-ecológicas contribuíram, em seu processo histórico, para
que houvesse certo isolamento com relação aos centros metropolitanos do Vale do Paraíba. Essa
peculiaridade faz com que os habitantes da cidade e principalmente da área rural vivam numa temporalidade
bastante diversa dos centros industrializados. É mister lembrar que Cunha se caracteriza por uma localidade
produtora de gêneros de subsistência que atende as diferentes localidades que se especializavam em café,
silvicultura, e produtos industrializados. A tão aventada impressão de retorno no tempo não se reduz as
sensações subjetivas e idílicas, pelo contrário, tal processo lento de inserção nas representações constitutivas
das
sociedades
modernas
é
o
que
averiguamos
no
lugar.
Para compreendermos a dinâmica sócio-espacial de Cunha, temos que entender o lugar. Para Milton Santos o
lugar é o objeto ou o conjunto de objetos e de ações. Em algumas localidades podemos encontrar um feixe
de forças sociais em atuação que as transformam em lugares. De modo a distinguir os conceitos, podemos
conceber
a
localização
como
mais
estática
e
o
lugar
como
sendo
mais
dinâmico.
O fenômeno que vem ocorrendo em Cunha é a desterritorialização das populações locais, e em contrapartida
vem se erigindo novas territorialidades para o lugar. O problema é que essas novas territorialidades possuem
características excludentes se contrapondo com a territorialidade vernácula do lugar, questão que
abordaremos
a
posteriori.
A mudança incide sobre os modos de ocupação e apropriação do espaço, sobre o universo de práticas
econômicas e sociais, os valores e representações vinculados ao ecossistema local e conhecimento
acumulado sobre os usos materiais e simbólicos da natureza. Um dos fenômenos decorrentes da apropriação
do lugar por novas territorialidades é a dificuldade do restabelecimento das atividades produtivas daqueles
que saíram em outro ambiente, que na maioria das vezes não é o natural, isso leva, conseqüentemente, à
total
transformação
do
modo
de
vida
tradicional
destes
grupos.
Notamos algo interessante na Cunha rural com relação ao espaço, para muitos dos caipiras que
encontramos, percebemos que a distância e a noção de espaço entre as casas no ambiente rural é tomado na
base do grito. Podemos notar que variados tipos de distâncias eram medidos e entendidos pelos caipiras de
acordo com uma comunicação oral gritada ou assoviada, assim faziam cálculos da hora que chegariam, da
“lonjura” entre a roça e a casa e entre uma casa e outra. Não compreendemos como esse grito ou assovio é
transformado em horas (mais freqüentemente) e léguas, mas existe essa operação, que muitos caipiras mais
antigos
ainda
utilizam.
A sociabilidade na atual sociedade complexa é outra, apoiada no individualismo como um dos ícones da
modernidade, as relações entre os vizinhos em Cunha se dão mais por parentesco ou amizade e menos por
conta de um laço de compadrio. Verificamos atualmente uma menor importância na existência,
principalmente nas áreas rurais, de relações de solidariedade entre as famílias vizinhas. As novas
materialidades do mundo rural de Cunha implicam em construções de alto padrão, implicando em conforto e
isolamento. Muitas casas, particulares ou tornadas pousadas primam para além da venda de um meio natural
exuberante, em remeter o visitante aos “tempos de antigamente”, incorporando alguns aspectos residuais da
cultura caipira ao período atual, como o fogão à lenha, colchas de retalhos, móveis rústicos, e uma culinária
denominada tradicional, sempre aberta a incorporar o novo, como os pratos com pinhão, trutas, shitake, etc.
Portanto, pretendemos expor as transformações sócio-espaciais de Cunha através deste nosso estudo,
apresentando, de certa forma, as espacializações pretéritas e as novas espacializações e territorialidades.
AO041 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Espaço e Cultura
[1709] M ARGI N AI S N AS M ARGEN S: I N TERPRETAÇÕES GEOGRÁFI CAS
CONTRABANDO.
ADRIANA DORFMAN.
PPGG- UFSC, FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL.
Resumo:
DE
LI TERATURAS
DE
Aspectos da sociedade e do imaginário dos habitantes da fronteira Brasil-Uruguai, especialmente aqueles
relacionados às práticas de contrabando, são investigados através da análise de cinco contos e uma novela
escritos, ao longo do século XX, por autores da “comarca do Pampa” (regionalização literária proposta por
Angel Rama em 1982). São construídas comparações com a literatura de contrabando escrita por autores
franceses, ambientada nas fronteiras com a Espanha e com a Bélgica, a fim de investigar a relação entre os
contextos geográficos e as representações literárias das práticas de contrabando. A elaboração de mapas
auxilia na análise do objeto fronteira e das metáforas que a ele se aplicam em ambos casos.
Os textos trabalhados dão testemunho da importância do contrabando para o imaginário local e regional, dos
processos de transmutação do sentimento de marginalidade geográfica e social em particularidade cultural
manifestos, por vezes, numa postura dissidente em relação ao interesses do centro político-cultural dos
estados-nação.
No caso gaúcho, desenha-se uma “linhagem” de contrabandistas: essa tradição constitui um tipo regional,
subvertendo o heroísmo do gaúcho e valorizando traços como astúcia, honra e solidariedade. O
(personagem) contrabandista pode ser, portanto, interpretado como um depositário de “verdades locais”,
destacando a importância das passagens (vau, ponte, trem, atalho, paso) e dos pasadores como sujeitos dos
“atos
perpendiculares”
ao
objeto
fronteira
cotidiano.
As tensões entre a legalidade estatal e as práticas consideradas como legítimas no cotidiano fronteiriço
materializam-se também no (personagem do) guarda aduaneiro, fortemente tensionado entre lógicas
pertencentes ao trabalho e à comunidade.
AO042 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1720] SOBRE MUROS E GRAFFITI: AÇÃO E RESISTÊNCIA SOCIAL NA CIDADE.
MARCELO MATHEUS MEDEIROS.
IPPUR- UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O presente trabalho busca analisar a apropriação do espaço público, notadamente os muros da cidade, pelo
grafite. Nesse sentido, pretende-se verificar se essa forma de expressão corresponde a um novo tipo de
discurso político emergindo na cidade. Contudo, o que estamos chamando de grafite é, especificamente, a
forma de expressão plástica da cultura Hip-hop e não tudo que está inscrito nos muros, como é tido por
alguns
autores.
A busca pelo grafite como objeto de estudo se explica pela grande disseminação do grafite pelos muros da
cidade e, também, pelo seu forte impacto visual. É significativo ressaltar que essa forma de expressão – um
dos elementos do HIP-HOP – entrou no Brasil com incrível força. O fato de ser uma “cultura importada” não
invalida o processo, pelo contrário, já que possivelmente ocorrera um processo antropofágico. Ou seja, esse
elemento externo é absorvido e (re)trabalhado para ser (re)inserido num contexto próprio. A mistura do hiphop com a cultura brasileira – sobretudo afro-brasileira como o samba, embolada e a capoeira – garante
autenticidade
ao
movimento
no
Brasil.
Outro fator, segundo o qual o trabalho se justifica, inscreve-se no fato de que a cultura HIP-HOP é uma
expressão essencialmente urbana gestada nos guetos negros norte-americanos, que nos aparece como o
mais recente movimento de irradiação da cultura negra norte-americana, reverberando, e não mais ficando
pressa em círculos de uma elite mais “esclarecida”: esta chega ligando diferentes realidades por intermédio
de algo que se constitui de diferentes formas de expressão. Contudo, essas diferentes realidades guardam
dentro de si imensas similaridades. Em meio a outros fatores, passa a ter ressonância e a incorporar-se às
diferentes culturas no mundo. Tem-se em vista, ainda, a significativa visibilidade social que esse meio de
expressão
detém,
tanto
positiva
quanto
negativamente.
O trabalho está alicerçado, metodologicamente, a partir dos seguintes procedimentos. Primeiramente,
procedemos a um levantamento bibliográfico, na tentativa de buscar um embasamento teórico que abarcasse
e desse fundamento aos objetivos do estudo, tanto no que concerne aos conceitos quanto no que diz respeito
a trabalhos, acadêmicos ou não, sobre o grafite. A seguir, realizamos tomadas de fotos, tentando relacionar
ou captar os trabalhos (grafites) inscritos nos espaços públicos à dinâmica da cidade, seus discursos e a
percepção que os transeuntes, entre outros, têm desses trabalhos – esta por meio de entrevistas informais.
Para efeito de exemplificação, nos utilizaremos de dois eventos relacionados ao universo graffiti no Rio de
Janeiro: o encontro internacional de graffiti, que ocorreu na Cruzada São Sebastião localizada na Zona Sul do
Rio de Janeiro e o evento Circulando: Dialógo e comunicação na favela, que teve lugar no Morro do Alemão,
Zona Norte do Rio de Janeiro. Além desses eventos, que tiveram lugar em espaços tidos como não-cidade, o
oposto da “cidade formal”, abordaremos os colocados nos espaços formais da cidade, seus discursos, ações,
táticas.
Como nossa preocupação está na visibilidade dos atores no espaço público, a disputa pelos espaços de
visibilidade seria uma das formas, no nosso entender, de resistir a um discurso prenhe de preconceitos.
Dessa forma, os muros da cidade transformam-se no lócus privilegiado para essa ação, já que podem, a todo
momento, serem apropriados por outros discursos, por outros atores com propostas opostas àquelas
dominantes.
Dentro dessa perspectiva é que gira nosso quadro teórico e conceitual. É ter um olhar para a re(l)ação do
social e o território. Assim, na leitura do território praticado, bucamos considerar, neste trabalho, as ações e
re-ações sociais que historicamente vão sendo alisadas pelo discurso dominante, mostrando-se, contudo,
resistentes. Atentar pra essas ações-re-ações empreendidas pelos “homens lentos” em seus “espaços
opacos” e, bem como a construção de “espaços opacos” nos “espaços luminosos”, nos leva ao entendimento
da dimensão do acontecer social: o cotidiano. Um cotidiano revelador da dialeticidade do território.
Revelador, também, da existência de outros projetos portadores de outros discursos. Nesse sentido,
admitimos que ações-re-ações que se dão no cotidiano garantem, de serta forma, a sobrevivência dos
homens lentos no território: estas práticas e usos no/do território traduzen-se em contextos e possibilidades
de ação. “Existem, portanto,” como nos fala Ribeiro (2000a: p.240), “atos a serem reconhecidos e
valorizados e, ainda, vozes a serem ouvidas e inscritas na formulação dos fururos possíveis”.
De alguma forma, esses movimentos questionam as formas de organização dominantes, suas formas de
legitimação e os seus mecanismos de dominação cultural. Constituem um ato de transgressão à
normatividade social e aos constrangimentos impostos pelo espaço, inserindo-se num movimento de
redefinição
do
público
e
do
privado.
Novos movimentos e suas formas de expressão trazem algo novo ao cenário da cidade: o grafite, expressão
plástica do Hip-Hop, apropria-se dos muros para transmitir um novo discurso, com uma nova forma de ação
política que foge dos meios convencionais. É a arte na transformação da vida. É a resposta de um grupo
excluído sócio-espacialmente de sua condição de cidadão. Os espaços desses grupos, seus territórios,
condições sócio-econômicas, culturais, ideológicas e identitárias, guardam íntima relação com o teor de seus
discursos.
Daí, o que resulta saber é como identificar as ações e os discursos que têm repercussões políticas no espaço
urbano hoje. Para tanto, busca-se entender o percurso desse discurso e dessas ações, os grupos ou os
agentes da ação, onde são gestados, onde são colocados e de que forma se dão. Esse processo pode - e é no
nosso entender - ser visto como uma forma de politizar o território, ocupando-o: é uma forma, por fim, de
trazer a alteridade, a pluralidade do social à cena pública.
AO043 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1770] GEOGRAFIA E LITERATURA: UNEM PASSADO E PRESENTE NO PELOURINHO.
MARIA AUXILIADORA DA SILVA; HELOISA ARAÚJO ARAUJO.
UFBA, SALVADOR, BA, BRASIL.
Resumo:
Objetivos:
O Pelourinho, localizado na cidade do Salvador, Bahia, guarda em cada rua, ladeira e beco...segredos,
encantos, desencantos, magias... Inspiração e fascínio de vários poetas, pesquisadores, pintores, escritores...
dentre eles, o escritor Jorge Amado, é também o cenário de vários de seus romances.
No século XX, em 1985, o Pelourinho foi tombado pela UNESCO - Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura - como Patrimônio da Humanidade, em função da sua história, beleza
arquitetônica e características culturais. Para Miranda e Santos (2002, p.37), “um espaço só chega à situação
de centro histórico quando o tempo e a cultura do local deixam nele os seus vestígios através das mudanças
que
se
sucedem
na
sociedade,
refletindo
na
sua
morada”.
A pesquisa busca analisar o espaço do Pelourinho, como lugar de memória, na obra Suor do escritor baiano
Jorge Amado e hoje, durante a 7ª etapa do processo de requalificação do Centro Histórico de Salvador
(C.H.S).
Jorge Amado criou seus textos através da apropriação do espaço vivido, percebido e sentido por ele... tudo
isto adquirido através da experiência. Desta forma, o escritor mantém um diálogo íntimo com a cidade e seu
cotidiano, aponta a compreensão da cidade, dando-lhe sentido. Ferrara (1993, p.202), em seu livro Olhar
Periférico,
salienta:
As transformações econômico-sociais deixam na cidade marcas e sinais que contam uma história não verbal
pontilhada de imagens, de máscaras, que tem como significado o conjunto de valores, usos e hábitos,
desejos
e
crenças
que
misturam,
através
do
tempo,
o
cotidiano
dos
homens.
E como este patrimônio é sentido, vivido e percebido pelos moradores que vivenciaram, e vivenciam, a 7ª
etapa da requalificação do Centro Histórico de Salvador? A 7ª etapa da requalificação do Centro Histórico de
Salvador
coincide
com
o
cenário
da
obra
Suor?
Referencial
Teórico
e
Conceitual
Abordar-se-á o espaço do Pelourinho, sob o enfoque da Geografia Humanística, enfatizando a categoria lugar,
como foco da afetividade e da relação com o meio ambiente. Uitlizar-se-á, como aporte teórico-metodológico,
a Fenomenologia para a abordagem do lugar que visa a descrever qual o significado do Pelourinho como
lugar de vivência. Neste viés, far-se-á a discussão acerca da importância das obras de Jorge Amado e do
processo de requalificação do Pelourinho e de sua relevância, pois estes “carregam” o sentimento de
pertencimento
ao
lugar.
Ao se abordar o espaço, redirecionando-o ao conceito de espaço vivido, recorre-se a Tuan (1983), que
ressalta que o espaço é mais abstrato do que o lugar. Pretende-se discutir o conceito de lugar à luz dos
conceitos de Tuan, como norteadores do entendimento de como se dá esse sentimento dos moradores e
turistas em relação ao Pelourinho, além de construir-se um diálogo com outros teóricos da Geografia e da
Filosofia.
Outros conceitos que se somam a esse debate são o de “memória” e “patrimônio” e referem-se ao
pensamento de Le Goff e Carlos com suas considerações acerca do pensar e do conhecer, tendo como eixobase a preocupação com a memória, impedindo que os acontecimentos se percam no fluir do próprio tempo.
Metodologia
Diante do objetivo proposto, optou-se por uma metodologia de caráter qualitativo, mais apropriado à
realização desse estudo, pois parte-se do pressuposto que o lugar de memória é aquele vivenciado e
experienciado,
dando
àquele
lugar
sentimentos
e
significados.
Esta pesquisa exploratória, segundo os meios citados por Vergara (1998, p. 44), será bibliográfica,
documental e de campo. Os levantamentos bibliográficos dão base teórica para questões observadas, como
as diferentes formas de ocupação e mudanças na funcionalidade das moradias do Pelourinho.
A construção de mapas permitirá verificar quais os limites desse Pelourinho no romance Suor. E se coincidem
com
os
limites
da
sua
“requalificação”.
As
principais
PELOURINHO:
_
–
–
–
–
LUGAR
DE
Ocupação
Jorge
inicial
Amado:
Construção
do
Programa de requalificação
O
questões:
Pelourinho
do
e
valor
da
Pelourinho
como
CHS: planejamento e
sob
HISTÓRIA:
o
as
expansão.
memória
cenário
diversas fases
olhar
da
vivida.
em
Suor.
de implantação.
cultura.
Resultados
Essa representação espacial e social, elaborada por Jorge Amado, poderá contribuir para se pensar e
repensar esse Pelourinho, que ainda vive o processo de requalificação do CHS. Sua área central foi
praticamente transformada. Mas, no aspecto social, sua realidade se confunde com ficção... Os despejos
forçados das famílias até a 6ª Etapa implicaram violação do Direito à Moradia e desrespeito à história de vida
desses moradores. Os pobres foram expulsos da “cidade histórica” para que uma nova imagem da cidade
atenda
o
principal
foco
dado,
que
é
o
turista.
Hoje, acontece a 7ª Etapa da requalificação do Centro Histórico, na qual a Associação dos Moradores e
Amigos do Centro Histórico de Salvador (AMACH) conquistou a efetiva participação de seus moradores nas
suas
importantes
decisões.
Através do TAC, Termo de Ajustamento de Conduta, assinado pelo Ministério Público e a CONDER,
Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia, foi garantida a permanência de 103 famílias em
imóveis
recuperados
para
uso
habitacional.
Le Goff, ao discutir o papel das cidades, contempla, de forma clara, a importância da memória:
A memória é um elemento essencial do que se costuma chamar identidade, individual ou coletiva... A
memória, onde cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura salvar o passado para servir o presente
e o futuro. Devemos trabalhar de forma a que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a
servidão
dos
homens
(Le
Goff,
1996,
p.
476-477).
A gestão participativa reflete novos paradigmas no planejamento das cidades. Desta forma, acredita-se que o
método fenomenológico complementa e subsidia as práticas de planejamento urbano numa visão mais
humanizada, baseadas nas experiências e vivências do homem no lugar. Que a requalificação dos centros
históricos seja sinônimo de vida, e não de exclusão social, a fim de que o Centro Histórico de Salvador seja
um
lugar
cheio
de
memória,
de
respeito
e
de
vida.
Palavras Chave: Geografia, Literatura, Lugar, Memória, Identidade
AO235 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Turismo
[1303] CARN AVALI ZAÇÃO E COM PLEXI D AD E TURÍ STI CA: UM A GEOGRAFI A D AS PAI SAGEN S
RITUAIS NOS EVENTOS DA GRANDE FORTALEZA- CE.
CHRISTIAN DENNYS MONTEIRO DE OLIVEIRA.
UFC, FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
O presente artigo corresponde aos resultados preliminares de uma investigação sistemática das interfaces de
dois fenômenos contemporâneos em franca expansão metropolitana: A religiosidade e a turistificação.
Estudos anteriores a respeito dos processos de modernização de espaços simbólicos (sagrados e profanos)
permitiram a reorganização dessa pesquisa exploratória, na qual tem sido possível refletir e compreender o
seguinte fenômeno. De que maneira a cultura metropolitana de Fortaleza consegue “carnavalizar” suas
manifestações religiosas mais expressivas mesmo sem a projeção regional ou nacional de suas festividades
carnavalescas? E por que razões os fatores que condicionam esse santuário metropolitano permanecem à
margem
da
visibilidade
turística?
Partindo desses questionamentos, o trabalho discute, a formação das paisagens rituais em Fortaleza, por
intermédio de uma hermenêutica das imagens híbridas (jornalísticas e empíricas), a fim de retratar a
dinamismo das festas religiosas (São José, N. S. de Fátima, Iemanjá, Assunção, etc) e a diluição dos eventos
profanos (o carnaval, o forró, a festa junina). Tudo em favor de uma hibridação cultural – simbólica e
materialmente espacilizada – na construção de difusa de mega santuários. O grande problema é tentar
percebê-los e registrá-los pelos apenas pelos fixos; quando constatamos que está na fluidez sua maior
identidade. Os meios utilizados para desencadear essa hermenêutica – cartográficos, fotográficos e
iconográficos – precisam suceder a uma breve reflexão metodológica a respeito do processo científico em
diálogo
permanente
com
o
imaginário
mítico-religioso.
A pesquisa acadêmica lança um permanente desafio ao pesquisador contemporâneo: como tornar as
investigações científicas um veículo de leitura do cotidiano? Pode parecer arriscado e ambivalente iniciar uma
reflexão sobre formas simbólicas, no âmbito da geografia do turismo, destacando as necessidades
consumistas da comunicação escrita. Mas um pensamento complexo na geografia (Silva; Galeano, 2004)
com diretriz educacional, não pode furtar-se ao reconhecimento de que lidar com a ambivalência é tão
científico quanto explorar a objetividade. O que recruta a interlocução dois tipos de leitores, em geral
insensíveis às mutações do imaginário religioso na geografia da sociedade brasileira. Tanto os estudiosos de
ciências humanas quanto a militância das organizações ambientalistas, teimam em reduzir o peso cultura
religiosa na interpretação dos problemas sociais e ambientais de um território. Entretanto, por fatos ou
metáforas, esse mesmo cotidiano cria e recria novos equipamentos especiais de ritualização, aqui
reconhecidos
pelo
codinome
de
Santuário.
O conhecimento das formas simbólicas – atualizadas pelo desafio da modernização do carnaval brasileiro –
pode e deve pleno intercâmbio com os dilemas espaciais contemporâneos, dentro do contexto metropolitano.
Os santuários carnavalescos trazem a reverência e a retórica das tradições; mas exploram o que há de mais
acessível
e
tecnológico
na
dinâmica
dos
espetáculos.
A espacialização dos fenômenos e processos culturais, na Grande Fortaleza-CE, continua apresentando
situações diversas e aparentemente desconexas. Eventos lúdicos, cívicos, esportivos, são transformados em
shows populares de forte apelo simbólico. Especialmente aqueles que se enquadram como “eventos
religiosos” – sejam nos ginásios, estádios, praças públicas ou parques – adquirem uma substantiva
expressão cultural, embora à margem do planejamento turístico setorial. As festas de N. S. da Assunção e de
Iemanjá, realizadas no mesmo 15 de agosto, aparecem como um dos mais completos exemplos de
contrastes criativo na construção de um santuário carnavalesco na metrópole. E sobre esse evento
detalharemos como a pesquisa da complexidade do turismo, deixa escapar e faz incorporar
(simultaneamente)
estratégias
de
fomento
à
cultura
turística
em
Fortaleza.
Daí ser tão pertinente estabelecer indagações que vinculem a pesquisa com o cotidiano e abrir linhas de
intercâmbio, no território cultural, entre religiosidade, festividade e práticas comunicacionais de
entretenimento e turismo. No Brasil – e em boa parte da América Latina – são essas três forças que
dinamizam a ambiência cultural do Carnaval. Muito se explorou o seu significado temporal. Contudo, sua
densidade
espacial
contém
muitas
lacunas.
Como fundamentação teórica, as análises antropológicas de Rita Amaral (2000) e político – comunicacional
de Nazareth Ferreira (2001) estabelecem um ponto de partida para leitura estratégica da festa. Outras
reflexões sobre a evolução histórica do carnaval brasileiro , no decorrer dos séculos XIX e XX, aparecem
como demonstração de sua marca modelar e organizativa (Queiroz, 1992; Tramonte, 2001; Araújo, 2003) e
produto de exportação da imagem nacional (Bignami, 2002), Mas é em sua reconstrução contemporânea
como espetáculo de mídia (e turístico), para toda e qualquer época do ano, que se evidencia sua remete a
sua “profanação” essencial. Embora, o geógrafo Felipe Ferreira, a instauração do Carnaval esteja
intrinsecamente ligada à instauração da tensão por sua hegemonia e pela disputa do lugar carnavalesco.
(Ferreira 2005, p.322), como pensar a valorização estratégica do modelo carnavalesco na religiosidade sem a
contrapartida
do
cristianismo
secular?
Investigar o processo de carnavalização dos santuários e a densidade de suas manifestações como sínteses
da contemporaneidade metropolitana, constitui o principal objetivo deste trabalho. Em termos específicos, os
objetivos permitiram o desenvolvimento das três partes apresentadas nos parágrafos seguintes. Cumpre,
porém, lembrar que os procedimentos metodológicos da pesquisa – até o presente – demarcaram as
seguintes atividades: a) Revisão bibliográfica a respeito da modernização das festas e do carnaval; b)
indicação das manifestações populares de interface religiosa, na área em estudo; c) registro dos depoimentos
sobre a organização desses eventos; d) caracterização paisagística dos elementos (quantitativos e
qualitativos) do processo de carnavalização; e) reflexão sobre a (des) articulação desses eventos em relação
ao
planejamento
do
turismo
na
metrópole.
Inicialmente, é feita exposição conceitual sobre o campo religioso que dá origem às polaridades: sagrado X
profano, e concebe veículos de mediação. Discute-se “lugares santos” diante da hegemonia secular, na
construção pública e recente das paisagens metropolitanas. Fortaleza e região fornecem um palco
privilegiado para verificação do fa festa religiosa como a exceção da festa profana, não o contrário como se
espera.
Na seqüência, são trabalhados exemplos, aparentemente desconexos, porém cumulativos, da concepção de
santuário como espaço-ritual (simbólico) para a festa carnavalesca no Brasil. Expõe-se a necessidade de
fixação e controle, da religiosidade manifesta pelo próprio Carnaval. Se em outras paisagens metropolitanas
(Rio de Janeiro e São Paulo) isto demandou um equipamento simbólico (sambódromo e templos diversos), na
metrópole
cearense a
demarcação
é mais
temporal:
o
calendário
cíclico
dos
eventos.
Por último, já estabelecendo um tratamento operatório que torna os Santuários carnavalescos espaços
dialógicos (para visitação educativa) – utilizando a vertente da desconstrução educacional de Antoni Colom
(2004) – o texto propõe múltiplas formas de inclusão dos novos espaços carnavalescos no circuito dos
lugares turísticos. A significativa multiplicação de práticas locais e regionais dos processos carnavalescos
ganha relevo na valorização do evento e projeção (paisagística) de sua efervescência. A observação da
dinâmica metropolitana do carnaval em Fortaleza, comparativamente a outros centros, tem seu contraponto,
não só na carnavalização, mas na construção “anárquica” de uma cultura turística. A gestão do Turismo que
reconheça a produção desses novos santuários, pode articular-se de forma emancipadora mediante o
estímulo à visitação, ao artesanato do intercâmbio permanente de grupos sociais mobilizados educação mais
significativa.
Em termos conclusivos o estudo explorou um sentido radicalmente geoeducativo. É possível enxergar no
contato das paisagens rituais com a complexidade do turismo, os novos propulsores de um ordenamento
cultural para a metrópole cearense. O Carnaval agora ultrapassa o estágio de festa religiosa da raça, como
falava Oswald de Andrade, e se transmuta em estratégia simbólica das praças (ícones paisagísticos da
democracia direta); um espaço-tempo de inclusão social, com sentido ritual. Algo que as políticas públicas
mal conseguem entender. Que dirá administrar. Algo que precisa ser promovido com outras vertentes de
interpretação; aquelas mais comprometidas com a construção de realidade do que com sua mera retratação.
Estudos onde o futuro não seja apenas a repetição do passado, um museu de grandes novidades, nas
palavras
Palavras-chave:
Bibliografia
de
Santuário,
outro
Carnaval,
poeta
Turismo,
Religiosidade,
contemporâneo.
Complexidade
Básica
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Carnaval:
Seis
milênios
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AO236 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia do Turismo
[1428] A NATUREZA E O MODO DE VIDA EM GUARAMIRANGA- CE.
VILMA TEREZINHA ARAÚJO.
UNESP, RIO CLARO, SP, BRASIL.
Resumo:
Um desafio histórico tem se colocado para as sociedades contemporâneas: como combinar as formas atuais
de desenvolvimento com uma utilização racional e não predatória do meio-ambiente? E mais: como conciliar
a conservação da natureza com o modo de vida de populações que dependem diretamente dos recursos
naturais
para
sua
sobrevivência
física
e
social?
(Cunha,
2004).
A criação de Unidades de Conservação tem sido uma das principais formas de conservação da natureza no
Brasil. No Ceará a discussão sobre a presença de populações humanas em áreas protegidas e no seu entorno
ainda é incipiente. Apesar da Lei 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação
da Natureza (SNUC), abordar essa problemática em vários de seus artigos, em raras ocasiões os impactos da
criação de unidades de conservação (UCs) sobre o modo de vida das populações afetadas diretamente são
avaliados. Dessa situação decorre que algumas UCs representam um considerável aumento nas restrições de
uso
dos
recursos
naturais.
O Município de Guramiranga é um dos componentes da APA de Baturité, decretada pelo Governador do
Estado do Ceará em 18 de setembro de 1990. Localiza-se na Microrregião de Baturité, a 4015’48” de latitude
sul e 38055’59” longitude oeste de Greenwich. Possui uma extensão territorial de 107,6 Km2. A população,
conforme censo do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2000 era de 5.712 habitantes,
sendo
2.331
habitantes
residentes
na
área
urbana
e
3.381
na
área
rural.
A pesquisa tem como sujeitos as lideranças políticas e comunitárias, autoridades locais, moradores da zona
rural, organizações não-governamentais, igrejas, órgãos públicos etc. A investigação está baseada na
pesquisa qualitativa, tendo como procedimentos entrevistas semi-estruturadas e gravadas, observações
diretas da ação cotidiana e pública, depoimentos registrados em diários de campo e análise de documentos.
Desta forma, tem como objetivos: investigar as mudanças econômicas e demográficas que vêm ocorrendo no
município de Guaramiranga após a criação da APA; investigar as transformações no modo de vida da
população rural a partir do incremento do turismo; conhecer as condições socioeconômicas dos sitiantes e
suas lógicas; detectar os efeitos para o meio ambiente dos novos modelos de ocupação e explorações do
lugar.
Brandão (1999) lembra que em um passado não muito distante, os homens podiam vivenciar a natureza
como o lugar do exercício legítimo de seu domínio... o mundo natural era, então, duplamente próximo dos
humanos: ele os envolvia diretamente e ele lhes pertencia. De uns 20 anos para cá, o mundo de natureza
tornou-se uma espécie de “lugar retirado”. Foi deslocado para mais longe, desde que se o considere como a
porção conhecida ou imaginada do ambiente ainda não incorporada à sociedade. Ele foi retirado, tomado dos
homens do lugar como um cenário de direitos, e tornou-se um espaço dado ao dever de preservação por
responsáveis
agora
não
mais
usuários.
Para Tuan (1980), existe uma diferença no modo como o visitante e o nativo percebem o meio ambiente.
O visitante e o nativo focalizam aspectos bem diferentes do meio ambiente.... Em geral, podemos dizer que
somente o visitante (e especialmente o turista) tem um ponto de vista; sua percepção frequentemente se
reduz a usar os seus olhos para compor quadros. Ao contrário, o nativo tem uma atitude complexa derivada
da sua imersão na totalidade de seu meio ambiente. O ponto de vista do visitante, por ser simples, é
facilmente enunciado. A confrontação com a novidade, também pode levá-lo a manifestar-se. Por outro lado,
a atitude complexa do nativo somente pode ser expressa com dificuldade e indiretamente através do
comportamento,
da
tradição
local,
conhecimento
e
mito.
Coriolano e Marinho (2002) dizem que até a década de 70, o Ceará desenvolvia uma economia quase
exclusivamente agrícola, sustentada fundamentalmente pela agropecuária, predominando a agricultura de
subsistência. A partir da década de 80, o Estado experimentou uma transformação estrutural de sua
economia, incluindo o turismo, com a instalação de equipamentos modernos com a intenção de atrair maior
fluxo de visitantes. A área em estudo por está apenas 72 km de Fortaleza, com temperaturas amenas e
paisagens serranas é uma área de lazer para a classe média e alta de Fortaleza, caracterizando o turismo de
segunda
ou
terceira
residência,
com
multiplicação
de
chácaras
e
sítios.
Segundo Luchiari, (1997) a justificativa primeira da expansão do turismo é a preservação do recurso natural
para ser usufruído pelo turista, ao passo que os empreendimentos imobiliários que vêm atrás dele vão
destruindo os recursos naturais, privatizando-os e criando um ambiente artificial. Esse processo de destruição
do meio ambiente destrói também a lógica do funcionamento e da expansão do turismo.
Guaramiranga tem se destacado nos últimos anos pelo aumento da especulação imobiliária em função das
suas potencialidades naturais e um calendário pleno de eventos culturais como festival de jazz e blues,
festival de gastronomia, festival de flores, festival de teatro e até mesmo festival de vinho.
Através de visitas a área percebe-se a pequena participação da população rural nesses eventos, identificando
sua presença principalmente na prestação de serviços informais como caseiros/diaristas das casas de
turistas/veranistas, garçons, trabalhadores da construção civil, etc. Também é fácil perceber as mudanças
nas paisagens, onde os velhos sítios agora mais modernos e com portões sempre fechados, casas de morada
que se transformam em casas de fim de semana. Os novos donos das terras, vindos de fora, procuram na
área
um
local
para
descanso
e
lazer.
Uma
paisagem
mercadoria.
Palavras Chaves: turismo, unidade de conservação, população, APA de Baturité.
AO237 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Turismo
[1522] URBANIZAÇÃO TURÍSTICA E INCLUSÃO SOCIAL PRECÁRIA.
GILMAR MASCARENHAS DE JESUS.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
URBANIZAÇÃO
E
INCLUSÃO
SOCIAL
TURÍSTICA
PRECÁRIA
Palavras-chave:
inclusão
social
–
urbanização
turística
–
segregação
socioespacial
O turismo, notoriamente, tem se configurado como um poderoso agente de transformações territoriais e de
estruturas sociais locais. No discurso oficial e empresarial, surge esta atividade como promissora fonte de
renda e emprego para milhares de agentes espalhados pelos diversos destinos turísticos. Todavia, embora
existam diversas experiências no Brasil a partir de projetos de inclusão social a partir do turismo, este
continua sendo, majoritariamente, uma via de acumulação de capital. E como tal, uma engrenagem
produtora
de
desigualdades
e
segregação
socioespacial.
Nosso estudo se dirige ao fenômeno da urbanização turística, isto é, à produção de espaços e urbanidades
pelo turismo, à natureza da transformação de aglomerações urbanas quando turistificadas (Patrick MULLINS,
1991). Em particular, pretendemos refletir sobre os limites e possibilidades de inclusão social no âmbito da
urbanização
turística.
Dirigimos nossa atenção ao território fluminense. Após um longo período de constante crescimento
demográfico, a área metropolitana do Rio de Janeiro apresentou uma relativa redução na última década
(1990-2000). Ao mesmo tempo, e devido ao turismo, a economia do interior fluminense começou a reverter
seu processo de estagnação. Para além da reestruturação produtiva e das novas tendências de localização
industrial, o que observa é que a urbanização turística vem cumprindo um importante papel neste processo.
Não apenas no Rio de Janeiro, a urbanização turística vem se constituindo em todo o Brasil uma importante
via
de
acumulação
capitalista
e
de
produção
do
espaço.
Pretendemos analisar esta nova e impressionante forma de urbanização, identificando sua morfologia e
funções, tomando a pequena aglomeração de Penedo, situada na Região Sul Fluminense, como estudo de
caso. Pretendemos reconhecer a natureza segregacionista da urbanização turística e verificar suas reais
possibilidades
de
oferecer
condições
de
inclusão
social.
Beneficiando-se da proximidade dos grandes centros emissores de turistas (as duas metrópoles nacionais) e
trabalhando a herança cultural finlandesa, Penedo converteu-se nas últimas três décadas em um dos mais
importantes destinos turísticos fluminenses. Seu crescimento econômico e demográfico vertiginoso
produziram uma paisagem repleta de contrastes sociais, que tenta tornar invisível a extrema pobreza, e prol
do
êxito
do
produto
turístico.
O texto se divide em dois segmentos: no primeiro, apresentamos o processo histórico de produção do lugar,
de sua turistificação, e no segundo avaliamos o quanto a urbanização turística, por sua natureza intrínseca,
condiciona
a
inclusão
social
local.
Considerando-se que o processo de turistificação em Penedo foi acionado de forma intensa e em uma área
ainda praticamente rural, a forma urbana resultante é basicamente produto do turismo, consistindo assim
num dos mais acabados processos de urbanização turística em território fluminense. Tentaremos demonstrar
não apenas a visibilidade de tal processo, mas sugerir o mesmo como eixo estruturante na produção do
espaço em Penedo, conferindo ao núcleo em questão fisionomia, funções e inserção regional bastante
singulares,
com
acentuado
grau
de
exclusão.
Para analisar a aglomeração urbana de Penedo, nos deteremos primeiramente nas atividades econômicas e
sua espacialidade, para a seguir examinar a problemática social, que encontra na questão habitacional sua
expressão mais dramática e ilustrativa da natureza por vezes perversa da urbanização turística.
Em suma, a organização do espaço urbano em Penedo configura a existência de dois circuitos da economia
local, cada um com sua espacialidade própria, claramente demarcada. Um setor destinado a turistas e
indivíduos de médio/alto poder aquisitivo residentes nas proximidades (bairro Martinelli, Resende etc.),
composto por bens e serviços mais sofisticados, destinados sobretudo ao prazer, e com preços praticamente
inacessíveis aos segmentos populares da região. Um outro circuito, destinado aos pobres do lugar,
caracteriza-se por baixos preços, organização informal ou rudimentar, abrangendo amiúde serviços de
primeira necessidade. O primeiro circuito, sendo para clientes motorizados, se estende espaçosamente pela
via principal até as zonas de baixa densidade populacional da Fazendinha e Alto Penedo, espaço alvo de
intensa especulação imobiliária. O segundo se concentra no relativamente desvalorizado bairro Formigueiro.
O fluxo migratório em direção a Penedo originou novas ocupações precárias, geralmente em áreas de
encosta. Uma delas recebeu a denominação de África II, sugerindo certa continuidade em relação à antiga
aglomeração de negros e pobres, supracitada. São também posseiros os migrantes que formaram Jambeiro e
Vale do Ermitão, áreas de similar feição. O mais interessante é a localização destes espaços. Todos se
encontram muito próximos ao eixo turístico de Penedo, mas a topografia permite que se mantenham
\"escondidos\", preservando assim a paisagem romantizada, da alegria, do consumo, da atmosfera
finlandesa...Trata-se de um arranjo altamente segregacionista, que exclui o pobre da paisagem turística,
tornando-o
adequadamente
invisível.
Recusamos a massificada e repetida noção de “exclusão social”, em favor da inclusão social precária.
Concordamos com José de Souza Martins (1997:30-32): nos marcos da sociedade capitalista a inclusão
existe, mas ela é marginal, precária, instável; ao passo que a categoria de exclusão social se apresenta
“extremamente vaga (...) imprecisa e vazia”. Nossa pesquisa indicou que, enquanto processo de acumulação
capitalista, o turismo cria uma sociedade paralela que é includente do ponto de vista econômico e excludente
do ponto de vista social, moral e até político (Martins, 1997, pp. 33 e 34).
AO238 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia do Turismo
[1591] O TURISMO DE VERANEIO E AS TENSÕES ESPACIAIS EM MOSQUEIRO- PA.
INDIRA CAVALCANTE DA ROCHA MARQUES.
UFRJ, BELÉM, PA, BRASIL.
Resumo:
Objetivo: Analisar o veraneio e as transformações no espaço da ilha de Mosqueiro a partir de uma
abordagem mais complexa da ciência e da crise ambiental atual, buscando colocar a geografia em diálogo
com
outros
campos
científicos.
Referencial teórico-conceitual: A proposta da pesquisa nos colocou diante de uma nova forma interpretativa
da problemática ambiental e da ciência. Fez-se necessário questionar o arcabouço teórico da ciência moderna
e buscar novos caminhos metodológicos. Diferentemente da concepção dualista (homem versus natureza)
Bensaid (1999) enfatiza a indissociabilidade das relações (complexas) entre sociedade e natureza, apoiandose na categoria trabalho de Marx. A exploração exacerbada da natureza passa pela relação social de
produção capitalista. Defende ainda o diálogo entre economia política e ecologia política. Para Altvater (1995)
a problemática ecológica é também social. Coelho (2000) questiona a concepção comum de impacto
ambiental como uma relação de causa-efeito, apoiada em Milton Santos ela define o espaço como uma
dimensão das relações entre sociedade e natureza. Os impactos são, então, as relações dinâmicas entre
sociedade e natureza que reestruturam as classes sociais e o próprio espaço. Fratucci (2001), Rodrigues
(2001) e Sánchez (1991) evidenciam esta interdependência, tomando o turismo como motivador da
redefinição do espaço. Este é remodelado tornando-se um novo espaço, agora turístico, transformando além
da
feição
biofísica
a
social.
Medotodologia: Derrida (Alvim: 2000), Alexander (1987), Leopoldi (1998), Marcus (1998) empreenderam um
movimento que questionou as “verdades absolutas”, relativizando e refletindo a relação entre sujeito e objeto
de estudo. Essa nova postura permitiu não apenas buscar novas angularidades teórico-conceituais como
possibilitou um melhor diálogo com o objeto, refletindo uma nova apreensão do mesmo. O trabalho de
campo ganhou nova dimensão, os atores envolvidos passaram de meros informantes a elementos ativos na
própria definição da pesquisa e de seus resultados. Os levantamentos de fotografias aéreas e dados sobre
degradação do meio ambiente, sobre população e infraestrutura foram cruzados com um levantamento
histórico-documental, buscando reconstituir a visão dos diversos atores sobre a ilha e sobre o veraneio,
evidenciando subliminarmente uma visão sobre si e sobre os demais atores e as relações entre estes
desenvolvidas
(identidades).
Para
tal
recorremos
também
a
entrevistas
diretas.
Principais questões desenvolvidas: Analisamos as transformações do espaço na ilha e sua relação com o
veraneio a partir de três recortes temporais: o primeiro, virada do século XIX para o XX, quando estrangeiros
e elite da capital paraense passaram a freqüentar Mosqueiro e a organizar o espaço litorâneo da praia do
Chapéu Virado de modo a usufruí-lo como espaço de lazer e veraneio, produzindo uma nova configuração
espacial; as grandes mudanças estruturais (décadas de 1960 e 1970) decorrentes da prática de veraneio,
marcam o segundo momento. É quando são construídas a rodovia e a ponte ligando por via terrestre
definitivamente a ilha à Belém. Este momento caracterizou-se por uma forma de turismo de classe média,
mudando não apenas a relação com o espaço, mas com o próprio veraneio. No terceiro período (a partir dos
anos 1990) o veraneio popular representou não apenas uma nova prática de veraneio, mas também uma
nova forma de se relacionar com a ilha, assim como novas visões e relações entre os diversos atores.
Contribuíram para isso a redução da tarifa do ônibus e a expansão urbana de Belém.
Resultados: A imagem de bucólica associada à Mosqueiro está restrita à orla do Chapéu Virado. Foi uma
visão construída inicialmente pelos estrangeiros e, depois, incorporada pela elite belenense. A visão foi
construída junto à prática social do veraneio. O espaço construído do Veraneio no Chapéu Virado contrasta
com o ritmo e modo de vida da população nativa. A evidência de espaços diferenciados demonstra também a
segregação espacial, onde o Chapéu Virado fica, de modo geral, reservado aos de fora, concentrando a
disponibilidade de serviços. Identidades distintas (veranista e nativo) foram sendo construídas e remodeladas
de acordo com as mudanças na prática do veraneio. Se no primeiro momento os de fora eram sinônimos de
superioridade sócio-econômica, com o veraneio popular os “antigos de fora” passaram a falar como os de
“dentro” e os de fora, agora os turistas de baixo poder aquisitivo, são vistos depreciativamente. O espaço
turístico em Mosqueiro necessitou de características urbanas. É na conformação destas características, que
encontramos a construção da rodovia e da ponte, entre outras, possibilitando a intensificação do fluxo
veranista, impulsionando novos processos na ilha e no próprio veraneio, como a incorporação de uma parcela
considerável da classe média de Belém e, por conseguinte, expansão da área destinada ao veraneio, com
implicações sobre a apropriação do espaço e a sua degradação. A intensificação do veraneio nos anos 1990
levou a uma intensificação do uso do espaço da ilha a incorporação de novas áreas à prática turística. Por
outro lado o que antes era visto como bucólica (a orla do Chapéu Virado) passou a ser compreendido como
sinônimo de caos, transferindo às áreas mais distantes a visão de bucolismo. A apropriação do espaço e o
impacto ambiental são intensificados havendo redução da vegetação nativa, exploração mineral (para
construção civil) e ocupação urbana desordenada, além do aumento da violência e da poluição em suas
diversas manifestações. O veraneio não é o único elemento de redefinição espacial em Mosqueiro, mas
participa destacadamente desestruturando e reestruturando o espaço. Assim, o espaço é totalidade, é
resultado e condição para os processos sociais, inclusive as identidades.
AO239 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia do Turismo
[1647] SI TUAÇÃO SOBRE ASPECTOS D A GEOGRAFI A E M EI O AM BI EN TE N A VI LA D E EN CAN TAD AS,
ILHA DO MEL - PR.
DANIEL HAUER QUEIROZ TELLES; JOSÉ MANOEL GANDARA.
UFPR, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
Este estudo resulta da pesquisa realizada no Programa de Mestrado em Geografia pela Universidade Federal
do Paraná. Traz a análise sobre a área de ocupação Vila de Encantadas, situada na Ilha do Mel, litoral
paranaense. O espaço de suporte aonde ocorre as relações sociais e econômicas para esta localidade vem
sofrendo pressão acima do suporte ambiental e de gerenciamento em infra-estrutura existentes. Tais
relações estão diretamente relacionadas aos modos de vida da população local e são proporcionalmente
resultantes da atividade turística. A forma de exploração turística no local não apresenta conformidades
ambientais coerentes com o aspecto territorial. Trata-se de uma área de amortecimento de importantes
Unidades de Preservação, marcada por um ambiente relativamente frágil, pelos aspectos físicos e culturais
relacionados ao processo de formação da sociedade. Além das implicações ambientais existem fatores
culturais importantes, que marcam a ocupação do local, e juntamente a este fator, o aspecto histórico que
ilustra a renovação técnica como um dos principais impactos sociais e consequentemente ambientais. A
comunidade habitante sofreu mudanças marcadas pela procura do local e de toda a ilha pelas belezas
naturais e cênicas, sobretudo. Desta maneira o turismo passou a interferir cada vez mais no espaço local.
Empreendimentos turísticos têm na prática de exploração econômica impulsionada pela importância da Ilha
do Mel no contexto do turismo e da natureza, preocupações ligadas basicamente ao lucro imediatista e não
sustentável. A partir de resultados de entrevistas com representatividades dos grupos sociais desta
comunidade, bem como dos órgãos governamentais relacionados, foram analisadas questões que ilustrem
tais afirmações. Foi utilizado para a pesquisa o método qualitativo, com aplicação de entrevistas baseadas
em um roteiro pré-estabelecido e geração de uma matriz relacionando os temas abordados e os
entrevistados. Na interpretação dos dados obtidos, observaram-se os discursos individual e coletivo para
então descrever os resultados. A partir da análise sobre as colocações, e da relação com conceitos teóricos a
respeito de temas correlatos, este trabalho pretende apresentar uma melhor compreensão da realidade
territorial específica desta unidade geográfica de análise. A caracterização da opinião da sociedade mostrouse voltada para insatisfação e inconformidades no processo de gestão ambiental na área de ocupação, fato
coerente com os problemas existentes em grau e origem. São considerados para sustentação dos resultados,
aspectos teóricos de sustentação às discussões, tendo como suporte os estudos relacionados à geografia e as
questões ambientais. Os resultados pretendem contribuir na evidência das problemáticas ambientais
atualmente existentes no local. A forma como a exploração turística vem se procedendo nesta localidade
levam a considerar que são necessárias medidas mitigatórias e preventivas no âmbito social, econômico e
ambiental
para
a
recuperação.
Palavras chave: Meio ambiente, exploração turística, infra-estrutura, Encantadas.
AO240 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Turismo
[1698] A AM AZÔN I A RI BEI RI N H A E AS POLÍ TI CAS D E D ESEN VOLVI M EN TO D O TURI SM O N O
MUNICÍPIO DE CAMETÁ- PA.
JOSÉ CARLOS DA SILVA CORDOVIL.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ, BELÉM, PA, BRASIL.
Resumo:
A AMAZÔNIA RIBEIRINHA E AS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE
CAMETÁ-PA.
A prática do turismo se transformou numa atividade econômica capitalista organizada em meados do séc.
XIX (CRUZ, 2000). Com o desenvolvimento dos transportes, a atividade se expandiu principalmente após a
Segunda Guerra Mundial. Hoje se apresenta como importante fator de atração de divisas para os países,
estados ou municípios, atribuindo-lhes maior dinamismo econômico. Assim, de um ponto de vista econômico,
o fenômeno turístico é responsável por um grande fluxo de capital, verificado pelo crescimento do setor no
conjunto
da
economia
mundial.
Entretanto, analisando-o sob uma perspectiva geográfica, como prática social, o turismo provoca, pelas
relações que são engendradas, repercussões no espaço promovendo a produção de diversas formas espaciais
e a modificação de paisagens. Além disso, esse fenômeno também é político, porque ultrapassa o poder das
instituições sobre o território repercutido, em novas formas de gestão como estratégias governamentais.
Desse modo, a partir das práticas sociais que caracterizam a gestão do território, as ações de poder do
Estado passam a ser exercidas para implementação e desenvolvimento do turismo. Surgem novas normas
sociais e espaciais, estabelecendo-se novas regras de domínio e apropriação do território, tornando a
atividade
mais
um
agente
condicionador
de
seu
(re)ordenamento
(CRUZ,
2001).
Sendo assim, insere-se em nossa discussão o conceito de gestão do território que diz respeito à dimensão
espacial do processo de gestão vinculado ao território, o controle exercido pelo Estado (CORRÊA, 1996). São
essas ações, formas de gestão e controle do espaço, que se constituem em políticas públicas, que passam a
ser
desempenhadas
para
promover
a
instalação
e
desenvolvimento
do
turismo.
As
políticas
públicas
de
turismo
são
entendidas
por
Cruz
(2000,
p.
40)
como:
[...] conjunto de intenções e estratégias estabelecidas e/ou ações deliberadas, no âmbito do poder publico,
em virtude do objetivo geral de alcançar e/ou dar continuidade ao pleno desenvolvimento das atividades
turísticas
em
um
dado
território.
Essas políticas vêm sendo realizadas em diversos municípios incentivando-se o turismo como estratégia para
o desenvolvimento. Deste modo, através de mecanismos de gestão do território, criados pelos governos do
Estadual e Municipal, políticas têm sido pensadas e implementadas com vistas ao incentivo e
desenvolvimento
da
atividade
em
Cametá
.
Assim, devido à crescente importância do turismo como estratégia de gestão para o desenvolvimento e pelas
repercussões espaciais que o mesmo provoca, pretendemos realizar um estudo sobre as políticas de
desenvolvimento do turismo em Cametá, como exemplo de um município que expressa uma das realidades
da Amazônia, a ribeirinha, onde a dinâmica de relações se dá mediada pelos rios, pelos portos e trapiches
(SILVA e MALHEIRO, 2006), produzindo uma das particularidades que definem a região, utilizada, em
especial,
como
um
dos
elementos
de
atração
turística
(TRINDADE
JR.,
2002).
Nesse sentido, este trabalho tem como objetivos analisar a partir da gestão do território as políticas
pensadas e implementadas pelos governos do Estado e do Município para o Desenvolvimento do turismo em
Cametá, através da identificação das políticas que vêm sendo planejadas e o modelo de turismo estimulado
pelas mesmas, analisando do mesmo modo, as intervenções espaciais implementadas no Município em
função das políticas voltadas para a atividade turística. Além disso, procura-se avaliar se o modelo de turismo
estimulado pelas políticas adequa-se ao perfil de turista que tem procurado Cametá e ao potencial sóciogeográfico
local.
Como em Cametá, o desenvolvimento do turismo está também inserido nas políticas dos governos Municipal
e Estadual, sendo desencadeado um conjunto de medidas de fomento à atividade como estratégia econômica
para o desenvolvimento faz-se necessário, portanto, um estudo científico sob a perspectiva geográfica sobre
essas políticas públicas que vêm sendo planejadas e implementadas pelo governo nas suas diferentes esferas
de poder, especialmente em nível estadual e municipal. Assim, é preciso saber: que modelo de turismo está
sendo estimulado para ser implementado no Município de Cametá através das políticas públicas pensadas
pelos governos estadual e municipal? Que intervenções no espaço estão sendo implementadas em função
dessas políticas públicas? O modelo de turismo estimulado pelas políticas adequa-se ao perfil do turista que
tem
procurado
Cametá
e
ao
potencial
sócio-geográfico
do
Município?
A partir da análise bibliográfica, e documental foram encontrados dados que permitiram identificar e analisar
as políticas para o desenvolvimento do turismo em Cametá, como o Plano de Desenvolvimento do Turismo do
Estado do Pará (PDT), onde se verificou que este expressa uma tendência atual, a emergência do paradigma
do desenvolvimento sustentável, onde o turismo surge como uma alternativa possível, especialmente, o
turismo ecológico. É nesse contexto que se insere as políticas concebidas para o desenvolvimento do turismo
em Cametá, sendo incentivado, principalmente o modelo de turismo ecológico, por este ser um dos mais
viáveis
do
paradigma
do
desenvolvimento
sustentável,
tão
em
voga
na
Amazônia.
Tendo em vista as incidências espaciais do turismo, a partir do tratamento geográfico do fenômeno para
compreender seu papel na organização dos espaços (RODRIGUES, 1997), através de políticas os governos
estadual e municipal têm promovido o desenvolvimento do setor turístico, por meio de intervenções
espaciais, que estão direta ou indiretamente ligadas à atividade. Assim, como expressão das políticas
destaca-se a construção da orla da cidade, a pavimentação de vias de circulação (rodovias de acesso ao
Município), revitalização de praças, a construção do novo aeroporto e do terminal hidroviário, assim como a
construção
de
hotéis.
O modelo de turismo estimulado pelas políticas concebidas pelo governo do Estado e do Município não
adequa-se ao perfil de turista que visita o Município e principalmente ao seu potencial sócio-geográfico, pois
não é considerada a totalidade dos dados sobre a demanda e a oferta turística existentes, ou seja,
informações sobre o perfil dos turistas que freqüentam o município, e nem a caracterização e a
potencialidade
local
para
aquele
fim.
Portanto, as políticas pensadas e implementadas podem não levar aos resultados almejados, gerando como
conseqüência seu lado perverso, como impactos ambientais, e descaracterização da cultura local, já que, não
são consideradas as particularidades existentes, o potencial de atrativos naturais e culturais, ou seja, a
realidade
sócio-geográfica
local,
como
expressão
de
uma
Amazônia
ribeirinha.
Palavras-chave: Políticas de turismo, Amazônia ribeirinha e Cametá.
AO241 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia do Turismo
[1821] TURI SM O E D ESEN VOLVI M EN TO SUSTEN TÁVEL: ESTUD O D E CASO D AS AREAS D E
PROTEÇÃO AMBIENTAL NO MUNICÍPIO DE CAMPO MAGRO - PARANÁ.
MARGARETE ARAUJO TELES.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
Os municípios que se localizam em áreas de proteção, buscaram no turismo uma alternativa econômica,
tentando aproveitar os seus próprios recursos naturais e culturais para o desenvolvimento. Situa-se neste
caso, o município de Campo Magro, localizado na Região Metropolitana de Curitiba, no Estado do Paraná, a
cerca de 10 km da capital. Possui características socioeconômicas e ambientais complexas. Conta com
aproximadamente 20.409 habitantes, cuja maioria mora na zona urbana, na área de Proteção Ambiental da
Bacia do Passaúna(APA) e Unidade Territorial de Planejamento(UTP). A APA é a mais problemática, pois sofre
grande pressão das indústrias. A UTP foi criada com objetivo de restringir o uso e a ocupação de solos em
áreas de mananciais de abastecimento de águas, superficiais e subterrâneos.Por iniciativa de órgãos da
administração estadual e municipal, foram propostos alguns projetos para Campo Magro, envolvendo o
turismo como uma das alternativas econômicas viáveis ao seu porte. Foram sugeridos; turismo rural, o
ecoturismo, o agroturismo e o turismo ecológico.Neste sentido, o objetivo principal desta pesquisa centrou-se
numa análise crítica do potencial turístico do município de Campo Magro, apontando medidas para o
desenvolvimento de atividades turísticas ambientalmente corretas. Os objetivos específicos consistiram em
analisar os atrativos naturais e culturais, equipamentos a sua infra-estrutura básica, considerando as suas
potencialidades para o desenvolvimento do turismo; além de verificar projetos e propostas de exploração
turística no território e nas áreas de proteção ambiental do município; e em verificar o envolvimento da
comunidade do município de Campo Magro, tendo em vista o desenvolvimento sustentável do turismo. São
indicadas ainda, medidas para o aproveitamento dos recursos naturais e culturais, conciliando atividades
turísticas com a conservação e preservação da Área de Proteção Ambiental do Passaúna, a Unidade Territorial
de Planejamento e a zona rural do município de Campo Magro.No final, foram feitas as considerações e
algumas recomendações, indicando medidas para o desenvolvimento turístico do município. Além da
proposta por RUSCHMANN (1997, p.185), roteiro para diagnóstico turístico de localidades receptoras e o seu
referencial teórico – metodológico, foram também utilizados referenciais teóricos metodológicos de autores
que tratam da temática turística, Goodey(2002), Beni(2001), Swabrooke(2000), Rodrigues(2001),
Petrocchi(2001), Boullón(2002), Silva(2001), Cooper Et Al(2001), Vera(1997), Lage E Milone(2000),
Bahl(2000), Barreto(1996) e outros que embasaram a discussão dos resultados. Sabendo-se que o método
para verificar o potencial do turismo inicia-se a partir do inventário procurou-se verificar por meio da coleta
de dados na Prefeitura Municipal de Campo Magro, órgãos de planejamento e pesquisa do estado (COMEC,
IPARDES, IBGE, EMATER) e da pesquisa de campo, dados gerias sobre o município e suas áreas de proteção,
infra-estrutura, projetos , atrativos naturais e culturais e a participação da comunidade. De acordo com
PETROCCHI (2001, p. 192), o processo de inserção da comunidade deve se iniciar com o planejamento
participativo. Logo, ao planejar o desenvolvimento do turismo no município de Campo Magro, deve-se
identificar as características sócioeconômicas da comunidade.Quanto os funcionários públicos, muitos não
visitaram os atrativos mas acreditam na sua potencialidade, comentaram que basta criar infra-estrutura
adequada. De acordo com BARRETO (1996, p. 52), ‘”a infra-estrutura turística de um núcleo turístico é a
soma de todas as infra-estruturas: urbana, acesso, equipamentos e serviços turísticos, equipamentos e
serviços de apoio e recursos turísticos”.Verificou-se que não houve um diagnóstico turístico da UTP e da APA
do Passaúna. Consultaram-se os órgãos governamentais e identificou-se que estas recomendações, são
baseadas em avaliações superficiais, sem rigor sistêmico. Ao finalizar a pesquisa, é possível tecer algumas
recomendações, as quais ficam à disposição dos gestores públicos e privados do turismo: verificar se a
atividade é prioritária, frente aos problemas sociais, econômicos e ambientais do município; verificar o modo
como os proprietários de áreas potenciais envolveriam-se na atividade e se absorveriam as populações mais
carentes;avaliar como o turismo se adequará às áreas de proteção ambiental, com o mínimo de impacto para
o meio ambiente natural;avaliar os recursos financeiros disponíveis para pôr em prática as propostas em
relação ao turismo;elaborar um plano de administração contínua do setor quando houver mudança dos
gestores municipais;estabelecer diretrizes e padrões para planos detalhados de áreas com potencial turístico,
tanto na área urbana quanto na área rural, e principalmente as áreas de proteção ambiental;incluir nos
planos, a participação da comunidade, que deve ser envolvida por meio de um programa de sensibilização e
conscientização através do enfoque participativo;integrar os departamentos da prefeitura direta ou
indiretamente.Considerando que o município está inserido em áreas de mananciais sob a proteção de Lei
Federal e Estadual, deve-se estabelecer com os órgãos de planejamento e controle destas áreas maior
integração, para participar na elaboração dos diagnósticos e prognósticos, tendo em vista identificar os tipos
de turismo que possa se adequar à área. Finalmente, deve-se pensar que o município de Campo Magro
precisa desenvolver atividades econômicas para melhorar a qualidade de vida das pessoas que lá residem,
para preservar e conservar o meio ambiente. Precisa-se de planejamento bem elaborado com previsão de
longo prazo, que possa ser implantado aos poucos, sem causar impactos danosos ao meio ambiente natural,
social
e
cultural.
Palavras-chave: Turismo, Turismo Sustentável, Desenvolvimento, Município.
AO298 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Ordenamento Urbano e Gestão Territorial
[1557] LI M A BARRETO E UM A OUTRA GEOGRAFI A SOCI AL D O RI O D E JAN EI RO:REVEN D O O
PROCESSO DE SEGREGAÇÃO DA CIDADE.
ELIZABETH DEZOUZART CARDOSO; NELSON NÓBREGA FERNANDES.
UFF, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
Lima Barreto e uma outra geografia social do Rio de Janeiro: revendo o processo de segregação na cidade.
O objetivo deste trabalho é a revisão do processo de segregação residencial no Rio de Janeiro, a partir das
abordagens que Lima Barreto fez sobre as diferentes partes da cidade em suas crônicas, nas duas primeiras
décadas
do
século
XX.
Nossos pressupostos teóricos encontram-se especialmente em Villaça (1998;2000), considerando-se as
observações que apresenta sobre a maioria dos modelos explicativos da segregação nas cidades brasileiras,
particularmente o Rio de Janeiro. Na perspectiva deste autor, ao contrário do previsto pelos citados modelos,
a separação entre as classes sociais não acontece necessariamente em áreas homogêneas e exclusivas.
Assim, a segregação muitas vezes surge e se desenvolve apenas pela concentração em uma área da maior
parte das classes altas e médias da cidade, na qual convivem com outros grupos e classes sociais, isto é, não
requerendo
um
grau
absoluto
de
exclusividade
e
homogeneidade
social.
Como em muitos outros casos, é de suma importância que a análise dos fenômenos considere a intensidade
com que se manifestam no mundo real. No exame da segregação, Villaça nos ajuda, por exemplo, a superar
o beco sem saída da idéia de que a presença das grandes favelas nos bairros da “zona sul” do Rio de Janeiro
anula a possibilidade da existência da própria segregação; ou ainda, que o tema da segregação nas
metrópoles brasileiras se deva apenas à importação a-crítica de temas e problemas da literatura estrangeira,
notadamente norte-americana, onde em suas cidades a presença de guetos étnicos e raciais, isto é, de áreas
com homogeneidade e exclusividade social, justificariam os estudos de segregação. De qualquer modo, o fato
da área de segregação das classes mais altas não ser exclusiva e destas classes não ocuparem todo o espaço
não impede que as mesmas exerçam grande influência sobre seus lugares de reprodução, se autosegreguem, se ocupem em produzir representações espaciais associadas ao seu domínio e modo de vida,
bem como se dediquem a exercer pressões sobre o poder público pela melhoria deste setor da cidade e de
sua
acessibilidade
ao
centro.
A metodologia adotada pelo trabalho consiste na releitura da obra em crônica de Lima Barreto, à luz dos
pressupostos teóricos apontados. Partiu-se de uma seleção de crônicas sobre temas como, por exemplo, “o
cotidiano da cidade”, “reforma urbana/modernização da cidade” e “subúrbios”, conforme encontrados em
Rezende
e
Valença
(2004).
A escolha desta parte da obra de Lima Barreto se deve às seguintes razões: em primeiro lugar, parte das
crônicas reunidas por Rezende e Valença não conheciam publicação ainda em nenhuma coletânea das obras
do autor já editadas; segundo, por se tratar de escritor crítico, arguto e engajado nos assuntos mais
palpitantes da cidade (Cf Sevcenko: 1985), de seus bairros, de sua gente, das transformações urbanas em
curso; terceiro, por ter sido um intelectual que enfrentou as mais diversas polêmicas em um considerável
número de periódicos, oferecendo assim, possibilidades de visões distintas das representações dominantes
sobre
o
uso,
a
ocupação
e
a
divisão
da
geografia
social
do
Rio
de
Janeiro.
As principais questões desenvolvidas dizem respeito ao exame das análises consagradas na literatura urbana
carioca face à geografia social do Rio de Janeiro inferida a partir de Lima Barreto. Na literatura urbana
carioca foram levantados três pontos fundamentais: a) o início da mudança no padrão de segregação definida
a partir da Reforma Passos; b) a consagração de um padrão rígido e dicotômico de segregação
correspondente a “zona sul” X “subúrbios”/”zona norte”.; c) o pressuposto de áreas segregadas de grande
homogeneidade
interna
no
Rio
de
Janeiro.
A partir da obra de Lima Barreto pode-se rever aquelas teses até então consagradas sobre a segregação
espacial carioca naquele período, podendo-se concluir que a Reforma Passos, ao contrário do que geralmente
é reconhecido, contribuiu em muito para a consolidação do processo de auto-segregação das classes altas em
direção à área que ficaria conhecida como “zona sul”, não sendo, entretanto, seu ponto de partida. Assim, a
abertura da Avenida Central e a construção da Avenida Beira Mar vieram aproximar o centro dos bairros
praianos, onde já se concentrava uma expressiva parte das classes altas, , melhorando sua acessibilidade,
como bem explicita Villaça (op. cit.). Por outro lado, a “zona sul” não era de exclusividade da classe
abastada, embora estivesse ali mais bem representada, enquanto os chamados “subúrbios” também não
eram de exclusiva moradia dos desfavorecidos. Barreto, em suas crônicas, localiza membros das classes de
status mais alto tanto na área da cidade que viria a ser conhecida como “zona norte” como nos próprios
“subúrbios”, o que leva à conclusão da não existência de um padrão de segregação dicotômico e em áreas
homogêneas. Pela obra de Lima Barreto, infere-se um “mapa social” bem mais complexo do que aquele que
seria descrito por décadas. A obra de Lima Barreto permite não apenas extrair este complexo “mapa social”
do Rio de Janeiro em princípios da República, mas também conhecer a geografia social em processo, que
envolve não apenas o desejo de auto-segregação das classes mais altas como também sua capacidade de
influência sobre o poder público, ao contrário da maior parte da população da cidade.
Referências
Rezende,
B.
e
Sevcenko,
N.
Valença,
R.
Literatura
Lima
Barreto
como
–
Toda
Missão.
Crônica.
SP,
RJ.
Agir,
Bibliográficas
2004.
2vol.
Brasiliense,
1985.
Villaça, Flávio. Espaço Intra-Urbano no Brasil. Studio Nobel Editora/Fapesp/Lincoln Institute, 1998.
____________ Segregation in the Brazilian Metropolis. Trabalho apresentado no International Seminar on
Segregation in the City. Lincoln Institute of Labour Policy. Cambridge. Mass. 2000. Disponível em:
www.flaviovillaça.arq.br.
Palavras-chave: Geografia Urbana; Segregação sócio-espacial; Rio de Janeiro.
AO299 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1758] A CENTRALIDADE URBANA: UMA ANÁLISE A PARTIR DA CIDADE PEQUENA.
ALEXANDRE BERGAMIN VIEIRA; CLAUDIA MARQUES ROMA.
UNESP, PRESIDENTE PRUDENTE, SP, BRASIL.
Resumo:
A existência de um centro articula a concentração de atividades destinadas a favorecer a comunicação, a
acessibilidade com referência ao conjunto da cidade, e que, por essa aglutinação de fixos, há um movimento
dos
fluxos
que
gera
uma
centralidade
urbana.
No entanto, o centro urbano, histórico ou tradicional, não significa necessariamente a expressão de
centralidade, pois a centralidade é definida não apenas pelas localizações, mas pelo movimento dos fluxos,
portanto, fixos e fluxos são indissociáveis, permitindo a “extrapolação” do centro, ou seja, a possibilidade de
centralidades
outras.
A centralidade, que contém atributos econômicos, políticos, sociais, culturais e ideológicos, resultantes do
conflito da luta de classes presente na sociedade capitalista, é essencial na compreensão do fenômeno
urbano (LEFÈBVRE, 1999), pois, as cidades do capital existem sob a lógica de uma sociedade desigual, na
qual cada vez mais se acirram as divisões sociais, técnicas e territoriais do trabalho.
Isso gera a necessidade das cidades concentrarem, espacialmente, equipamentos, atividades e serviços para
que
as
relações
econômicas
e
sociais
sejam
maximizadas
na
reprodução
do
capital.
Assim, compreendemos que a estruturação urbana e da cidade é um processo contínuo, múltiplo e
contraditório que molda e é moldado pela segregação socioespacial, pela exclusão social, por diferentes
agentes sociais, por processos de (re)descentralização, gerando elementos que constituem e redefinem os
centros
e
as
centralidades
urbanas.
Dessa forma, o tema proposto exige uma compreensão das relações capitalistas na produção das dinâmicas
que envolvem o processo da urbanização, para que possamos compreender os arranjos espaciais da
centralidade na estruturação urbana e da cidade. Urbana e da cidade devido à necessidade de articulação das
escalas, ou seja, a relação entre urbanização e cidade, espaços intra e interurbanos e meso, macro e micro
escalas
(SPOSITO,
2004).
Dentre esses apontamentos suscitamos algumas indagações que nos instiga investigar e analisar a realidade
específica da centralidade intraurbana e interurbana de uma cidade pequena, pois, será que em uma cidade
pequena podemos caracterizar centralidades multi(poli)nucleadas? Será que a centralidade de uma cidade
pequena se dá apenas na escala da cidade ou à extrapola, irradiando-se para além das cidades?
E
como
definir
uma
cidade
pequena?
Santos (1978) aponta-nos o que poderíamos considerar como uma cidade pequena ou local. Primeiro, as
cidades regionais seriam aquelas “possuidoras de uma função de relação, desempenhando um papel
regional”, em que uma boa parte do comércio de alimentos é oriunda da própria região, enquanto uma outra
parte dos alimentos podem ser importados e são aquelas cidades onde se encontra um comércio tradicional,
entre outras características. O autor classifica como cidade local, a “pequena cidade”, o aglomerado urbano
que atende às necessidades básicas de sua população, ainda que esta recorra ou receba de outras cidades
mão-de-obra,
serviços
e
equipamentos
mais
especializados.
Assim, Inúbia Paulista pode ser classificada como cidade local, pois é um aglomerado urbano que atende
somente as necessidades básicas de sua população e que depende de outras localidades para suprir
necessidades relativas a serviços mais especializados de educação, saúde além de demandar mão-de-obra
especializada
de
outros
municípios.
No entanto, a cidade possui um hipermercado que exerce influência na rede urbana regional, abrangendo 49
municípios do seu entorno, gerando novos conteúdos ao centro urbano, originando múltiplas e diferentes
centralidades, a partir das especializações produtivas e de novos padrões de consumo, propiciadas pela
existência
do
hipermercado.
Dessa forma, a centralidade exercida pela “cooperativa” na escala da cidade, não se restringe ao espaço
intraurbano, ela está “para além da cidade”, pois representa um ponto de atração na rede urbana,
enquadrando-se, portanto, no novo papel da rede urbana pautada na sociedade urbana do consumo.
O papel de Inúbia Paulista, devido a centralidade exercida na rede urbana, caracteriza o processo de
globalização e da intensificação da urbanização. Esse enfoque é importante para compreendermos os
processos atuais que (re)configuram e redefinem as redes urbanas, principalmente no que se refere à
(des)articulação/integração
espacial.
Ou seja, as novas formas de assentamento, a concentração com descentralização, as localizações com fluxos
e a velocidade e flexibilidade das informações, transforma a cidade, antes monocêntrica, em uma cidade
poli(multi)centrica
(RIBEIRO,
2006).
Este processo de descentralização e recentralização, que gera esta cidade contemporânea multi e
policêntrica, ultrapassa a escala da cidade, combinando uma articulação entre o inter e o intraurbano,
permitindo uma articulação de situações urbanas diferenciadas e uma combinação de localizações e situações
que implicam em transformações nos fixos e fluxos de pessoas, capitais, mercadorias e informações.
A poli(multi)centralidade se intensifica, cada vez mais, nas cidades devido à expansão urbana que
descentraliza os assentamentos humanos rumo a periferias cada vez mais distantes das áreas centrais
dotadas de serviços e equipamentos urbanos, essa descentralização gera concentração em outros pontos que
necessidade de outras centralidades, modificando cada vez mais o par centro-periferia (SPOSITO, 2001).
Essas dinâmicas, na maioria das vezes, vêm acompanhadas de novas centralidades como um reforço para o
produto imobiliário da definição centro-periferia, caracterizando, assim, um novo espaço urbano.
Entendemos, portanto, que a questão da polinucleação pode ser observada com maior intensidade nas
metrópoles
como
também
nas
médias
e
pequenas
cidades.
Assim, apesar da aparente inexpressividade econômica, Inúbia apresenta não apenas uma monocentralidade,
mas policentralidade na estruturação da cidade e “para além das cidades”.
AO300 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1437] TRAN SFORM AÇÕES EM CURSO N O PERFI L ECON ÔM I CO E SÓCI O- ESPACI AL D E CI D AD ES D E
PEQUENO PORTE: O EXEMPLO DE BOM JESUS DO ITABAPOANA NO NOROESTE FLUMINENSE.
MARIA ALICE ALKMIM ANDRADE.
UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
OBJETIVOS
DO
TRABALHO
O presente trabalho se propõe a um esforço de compreensão e análise do atual perfil econômico e espacial
das cidades de pequeno porte. Para tal, procura-se focalizar a atuação dos agentes e processos que
redefinem o perfil atual de uma pequena cidade do Estado do Rio de Janeiro: Bom Jesus de Itabapoana.
A escolha desta cidade justifica-se pela mudança de sua fisionomia urbana, através do incremento
quantitativo e qualitativo das residências e da diversificação da atividade comercial, industrial e de serviços,
fenômeno observado em visitas a esta cidade, desde 1990, ao ensejo de trabalhos de campo aí realizados.
REFERENCIAL
TEÓRICO
E
CONCEITUAL
Na era da revolução da informática, os fatos, eventos e ações ganham imediata ressonância na sociedade e
no espaço de alcance planetário. A urbanização assume importância global e a cidade é o locus onde estas
transformações eclodem com maior rapidez. No Brasil, o momento atual, “meio técnico-científicoinformacional” (Santos, 1993), remodela o espaço que se torna mais fluido e assume novas feições.
Neste contexto, a urbanização brasileira vem apresentando mudanças em sua dinâmica, ditadas
principalmente pelo novo modelo de acumulação técnico científico-informacional, entendido como o momento
histórico no qual a construção ou reconstrução do espaço se dá com um crescente conteúdo de ciência, de
técnicas e de informação (Santos, 1993). O território passa a receber maciços investimentos em infraestrutura, acelerando os progressos nos transportes, nas comunicações, com o uso cada vez mais freqüente
da informática, gerando o que Santos (1993) denominou “aumento exponencial da fluidez do território”.
Nesse sentido, a organização do espaço brasileiro vem apresentando inflexões em sua dinâmica dentre as
quais destaca-se a valorização do papel das cidades de pequeno porte no desenvolvimento local, durante a
última década. As mudanças no perfil econômico das cidades, particularmente, de pequeno porte, possuem
uma acentuada importância no contexto da organizaçãoO quadro de mudanças que vem dinamizando as
cidades de pequeno porte delineia-se a partir de algumas tendências sócio-econômicas engendradas pela
amplificação da infra-estrutura de transporte, de comunicação, do desenvolvimento de novas tecnologias que
permitem realocar recursos econômicos e humanos favorecendo a desconcentração espacial da atividade
produtiva e da população. Além disso, do ponto de vista institucional, observa-se um processo de
descentralização administrativa, fortalecido pela Constituição de 1988, que favorece as administrações
públicas locais, ampliando-lhes as competências e a sua participação na distribuição dos recursos públicos.
Cabe destacar, a importância que os agentes locais vem assumindo na promoção do desenvolvimento
econômico. espacial do Estado do Rio de Janeiro, por ser este um estado que registra um relativo
esvaziamento econômico e populacional do interior em função da pouca expressividade da atividade agrícola
e industrial, em contraste com o processo histórico de concentração urbana na metrópole.
METODOLOGIA
O trabalho será dividido em três. Na primeira será feita uma breve discussão teórica sobre as mudanças da
urbanização brasileira e sobre o papel da pequena cidade atualmente. Depois serão apresentadas as
mudanças que estão ocorrendo no perfil da cidade de Bom Jesus do Itabapoana percebidas através das
inúmeras saídas de campo feitas nesta região. Na conclusão serão discutidas as principais mudanças no perfil
das
cidades
pequenas
além
do
levantamento
de
novas
questões.
PRINCIPAIS
QUESTÕES
Dentre o quadro de mudanças responsáveis pela valorização do papel das cidades de pequeno porte no
desenvolvimento dos lugares serão abordados as seguintes questões: a descentralização administrativa, o
processo de desconcentração industrial e a deterioração da qualidade de vida nas metrópoles. Além disso,
será desenvolvida uma breve discussão a respeito da refuncionalização destes núcleos urbanos.
RESULTADOS
ALCANÇADOS
Foi possível constatar que o Estado do Rio de Janeiro, atualmente, está passando por um processo de
revitalização econômica atingindo diversos setores da economia, tendo como uma de suas bases de
sustentação a articulação entre o Governo Federal e instrumentos de coordenação, aplicação e pesquisa dos
diversos agentes estaduais. Esta revitalização produtiva refletiu-se na cidade de pequeno porte através de
transformações
na
organização
espacial
e
na
estrutura
econômica.
Cabe ressaltar que as cidades visitadas no decorrer da pesquisa ilustraram a importância de uma eficaz
administração pública para o crescimento econômico municipal. Uma gestão pública em que as pessoas estão
comprometidas com a melhoria econômica do município, através de uma parceria cada vez mais forte entre o
público e o privado. É essencial um projeto de desenvolvimento local que seja gerado a partir de uma intensa
mobilização dos segmentos organizados da sociedade civil em regime de pacto com as autoridades locais.
Nesse sentido, a etapa de desenho e de execução de um projeto de mudanças econômicas e sociais em um
município depende da qualidade de suas lideranças políticas e comunitárias: o seu nível de consciência social,
de capacidade de gestão administrativa, de negociação em situação de conflitos, a sua capacidade de atrair
recursos de instituições diversos, etc.
AO301 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1281] ARRAN JOS PROD UTI VOS LOCAI S, APREN D I ZAGEM , I N OVAÇÃO E D ESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL: UMA ANÁLISE CRÍTICA DOS DEBATES RECENTES.
EMÍLIO RAFAEL POLETTO.
UNI VERSI DADE ESTADUAL PAULI STA - I NSTI TUTO DE GEOCI ÊNCI AS E CI ÊNCI AS EXATAS, I TAPI RA, SP,
BRASIL.
Resumo:
O processo de racionalização do território, neste começo do século XXI, coloca-se acima da economia, da
cultura e da política. A literatura especializada vem apontando para o fato de que o território, em certos
lugares, acaba por tornar-se mais racional e mais produtivo, o que torna possível diferentes participações no
processo de globalização. Nesta nova economia da informação, do conhecimento e do aprendizado, o
território passar a ser visto como um campo de forças, um lugar que exercita a dialética entre a escala local
e a escala global, entre o estado, o mercado e a sociedade. O território torna-se o quadro da vida de todos
nós, na sua dimensão global, na sua dimensão nacional, nas suas dimensões intermediárias e na sua
dimensão local, que constitui o traço de união entre o passado e o futuro imediatos. As características
particulares de um determinado território devem ser utilizadas no processo produtivo, criando vantagens
competitivas
específicas,
a
serem
utilizadas
pelas
empresas
locais.
Assim, termos como inovação tecnológica, aprendizagem, cooperação e competitividade tornaram-se
recorrentes nos diversos trabalhos sobre desenvolvimento local e regional surgidos na última década. Os
arranjos produtivos locais (APLs) passam a ser vistos como uma estratégia de desenvolvimento local a ser
implementada em regiões que apresentam uma aglomeração produtiva que apresente potenciais de
crescimento
econômico.
Os APLs podem ser designados como aglomerações de agentes econômicos, políticos e sociais, localizados
em um mesmo território, com foco em um conjunto específico de atividades do setor produtivo e que
apresentam vínculos expressivos de interação, cooperação e aprendizagem. Os APLs geralmente incluem
empresas, que são aquelas que produzem os bens e serviços finais, fornecedoras de equipamentos e outros
insumos, prestadoras de serviços, vendedoras, clientes, cooperativas, associações e representações. Além de
diversas outras organização e instituições voltadas à formação e treinamento de recursos humanos,
informação, design, P&D, promoção e financiamento. A formação de APLs está associada às trajetórias
históricas de construção de identidades e de formação de vínculos sociais, culturais, políticos e econômicos,
dentro de uma base territorial local ou regional. São mais propícios a desenvolverem-se em ambientes
favoráveis à interação, à cooperação e à confiança entre os atores. Assim, o território local compreende um
determinado espaço institucional, social e cognitivo (pode ser um bairro, um município, uma rede de
municípios, uma bacia hidrográfica, um vale, etc.), desde que possua sinais de identidade coletiva (sociais,
culturais, econômicos e políticos) e a capacidade de promover uma convergência em termos de expectativas
de desenvolvimento. A organização do território que objetiva o desenvolvimento local deve ter como ponto
de partida um pacto territorial que viabilize a associação de interesses promovida entre os diversos atores
regionais, que se conservam independentes, com vista a obtenção de determinados objetivos.
Os objetivos deste trabalho são: fazer uma análise crítica sobre o debate recente em torno dos APLs e sobre
as
diferentes
teorias
do
desenvolvimento
local.
Para a realização desta pesquisa selecionamos diversos trabalhos sobre os APLs e o desenvolvimento local
(tanto da literatura nacional quanto internacional), aos quais pretendemos dar uma leitura crítica. Sempre
focando na questão do território como suporte para as relações de produção, buscamos analisar a
importância de elementos como cooperação, aprendizagem, conhecimento tácito e difusão de inovações.
O que pretendemos abordar nas leituras dos trabalhos selecionados foram: a questão da validez do conceito
de desenvolvimento local, o valor de incentivar os APLs e sua real eficiência para promover o
desenvolvimento econômico e social e como ocorrem a cooperação, a aprendizagem e a difusão de inovações
em
aglomerações
produtivas
territoriais.
Desse modo, a pesquisa chegou à conclusão de que a articulação da esfera local frente ao global, que há
dentro do território, ocorre de forma dialética. Quando os investimentos são destinados a criar um entorno
favorável aos negócios, se está subsidiando o capital e, portanto, contribuindo para o processo de
restabelecimento do poder e dos privilégios de classe. Desse modo, há nestas estratégias de
desenvolvimento certas contradições que devem ser analisadas minuciosamente a partir de seus aspectos
histórico-geográficos. Fazer uma cidade única, especial e “autêntica” pode resultar em algo muito atrativo
aos investimentos e por isso muitas planejadores estão começando a prestar atenção a suas heranças
culturais ou a considerações culturais em geral, com o objetivo de realizar sua natureza comercial. Se o
objetivo dos investimentos é atrair o turismo ou certos tipos de atividade empresarial, a construção de um
entorno urbano tranqüilo, criativo, interessante, pode passar a formar parte do processo neoliberal. Por um
lado, estas estratégias utilizam-se de um discurso voltado para o bem-estar da comunidade local e pretende
que o desenvolvimento seja alcançado através de um esforço coletivo sinérgico entre os agentes locais, na
esperança de que a utilização de certos recursos específicos a seus territórios torne-os mais competitivos no
mercado. Por outro lado, é difícil enxergar que uma estratégia como esta obtenha sucesso, quando na
verdade os recursos territoriais não estão sendo utilizados para a comunidade local, mas apenas para o
capital.
AO302 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1761] DINÂM I CA D A I N OVAÇÃO N A AGLOM ERAÇÃO D E OPTOELETRÔN I CA D O RECI FE:
D I AGN ÓSTI CO/ CARACTERI ZAÇÃO D AS CON D I ÇÕES LOCAI S PARA O D ESEN VOLVI M EN TO D O
SISTEMA LOCAL DE INOVAÇÃO.
PRISCILA BATISTA VASCONCELOS; ANA CRISTINA DE ALMEIDA FERNANDES.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO, RECIFE, PE, BRASIL.
Resumo:
O presente artigo resulta de pesquisa desenvolvida com o objetivo de identificar em que medida as condições
sócio-econômicas e culturais do meio local facilitam ou dificultam a construção do sistema local de inovação
em que se desenvolve o setor de optoeletrônica do Recife. Situa-se no campo temático dos sistemas de
inovação, que surge na Europa na década de 80 com os estudos de Chris Freeman (1988) e Bengt-Ake
Lundvall (1988; 1992). Esses primeiros estudos focaram a escala territorial nacional, reconhecida como a
porta de entrada dos estudos sobre o fenômeno sistêmico e geograficamente distinto do processo de
produção de novas tecnologias. Freeman concebe o sistema nacional de inovação (SNI) como uma rede de
organizações e instituições nos setores público e privado, cujas atividades e interações iniciam, importam,
modificam
e
difundem
novas
tecnologias.
Posteriormente percebe-se que o sistema de inovação (ou partes dele) acontece e apresenta peculiaridades
em outras escalas, como a escala local, foco desta pesquisa. Observa-se que existem diferentes tipos de
sistemas, e que tais diferenças derivam de condicionantes que operam muitas vezes na escala sub-nacional.
São condicionantes de natureza histórico-cultural, sistema de valores e comportamentos que organizam a
socioeconomia e orientam as relações entre os diversos agentes e entre estes e o espaço, mediadas por uma
estrutura de poder específica aos diferentes lugares (RAFFESTIN, 1993). Como o território expressa um
“sistema de relações existenciais e/ou produtivistas”, pode-se afirmar que o processo de formação do
sistema de inovação varia de acordo com a própria história de formação do território, o que valida a
compreensão
de
suas
escalas
sub-nacionais.
Dentre as condições constituintes do SLI pode-se distinguir dois tipos: os agentes que são por natureza
desempenhadores de funções no sistema (fundamentalmente as firmas e demais produtores de
conhecimento, informação, políticas, regras), e os elementos que são por natureza estruturantes do sistema
como a presença e natureza de instituições científicas e tecnológicas, a especialização regional da atividade
econômica presente na localidade, a oferta de mão-de-obra profissional qualificada, a qualidade do sistema
educacional, a cooperação entre os diversos agentes (Edquist, 1999; Hendry, 1999 e 2002; Howells, 1999;
Morgan,
1997;
e
Fernandes
e
Lima,
2006).
Com base nestas idéias, a pesquisa foi formulada metodologicamente em quatro etapas: as fases 1 e 2
centraram-se, especificamente, na pesquisa bibliográfica conceitual e naquela direcionada para a
compreensão do objeto empírico do estudo; a fase 3 focou a identificação dos agentes do sistema, com base
em cinco categorias: a dimensão urbana e econômica da cidade do Recife, a base de C&T ali presente, a
indústria de optoeletrônica, a mão-de-obra especializada, e o sistema educacional. Resultou desse
procedimento a identificação dos agentes e de características territoriais que interferem sobre a sua atuação.
Entre estes agentes, destacam-se: Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco,
Universidade Federal de Pernambuco, Universidade de Pernambuco, Universidade Católica de Pernambuco,
Centro Federal de Ensino Tecnológico, Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, Instituto de Tecnologia
de Pernambuco, e sete empresas; na fase 4, a pesquisa concentrou-se na análise dos elementos que
compõem
o
sistema
de
inovação
local.
Chegou-se à evidência que existe em Recife uma incipiente concentração de empresas que utilizam a
tecnologia da optoeletrônica. Estas empresas atuam em diferentes mercados, o que dificulta aproximação
espontânea para desenvolvimento de projetos em cooperação. Percebe-se que o agente comum a todas é a
UFPE. Estas empresas estão inseridas em um contexto de acentuada desigualdade social, expressa pela
coexistência de vários grupos de pesquisa em optoeletrônica no Recife, acesso restrito à educação superior,
baixa qualidade da educação formal e da formação profissional, elevada taxa de desemprego associada à
histórica ocorrência de trabalho informal, assim como a baixa remuneração e participação do trabalho no
produto regional. Forte polarização educacional e socioeconômica bloqueiam o desenvolvimento de um
sistema produtivo inovativo. Este é, no entanto, imaturo e reduzido, em parte porque as interações que
realiza entre seus agentes são limitadas, devido às acentuadas assimetrias existentes e ao desperdício do
potencial criativo da população sem acesso à educação e formação profissional. Ademais, o sistema
econômico historicamente consolidado, baseado em atividades tradicionais ou rentistas, não favorece o
desenvolvimento de novas tecnologias. Com este padrão econômico-social, o que poderia ser uma
oportunidade de desenvolvimento para o Recife, termina por favorecer a reprodução do atraso, assim como
de uma elite conservadora, que bloqueiam a reconversão de sua economia para segmentos mais dinâmicos e
inclusivos.
Um outro aspecto observado se refere à falta de políticas governamentais que favoreçam o setor, como
percebido nas entrevistas, o que se deve em parte à mencionada valorização de setores tradicionais e
rentistas que vêm se reproduzindo na hegemonia da base produtiva local. Enfim, o sistema de inovação
presente no Recife situa-se num contexto sócio-econômico em que o desenvolvimento de uma indústria de
alta tecnologia encontra dificuldades particulares, além dos elementos da dinâmica macroeconômica e outros
aspectos próprios da escala nacional, resultantes das características históricas da formação de seu território,
em que pese a presença local de importantes instituições de C&T. O principal desafio do território consiste na
superação desta desigualdade, de modo que os benefícios decorrentes da competência científica e
tecnológica ali presentes sejam revertidos para seu desenvolvimento e apreendidos por uma crescente e
ampla parcela da população.
AO044 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1216] CONSTRUÇÕES CULTURAIS: REPRESENTAÇÕES FÍLMICAS DO ESPAÇO E DA IDENTIDADE.
MARIA HELENA BRAGA E VAZ DA COSTA.
UFRN, NATAL, RN, BRASIL.
Resumo:
Esse trabalho tem como objetivo tecer alguns comentários sobre o cinema enquanto meio de representação
cultural e sua inserção no contexto de algumas teorias que elaboram sobre os conceitos de intertextualidade,
construção das percepções do espaço, e identidade cultural. A idéia de uma constante e permanente troca
entre textos e representações; a eterna correlação entre as construções reais e subjetivas no que toca tanto
a visão quanto à construção de um imaginário coletivo regido pela percepção e pela construção do espaço; e
a sensação de perda do controle do tempo e da história, a dificuldade de se manter um estilo individual e o
entendimento de que existe hoje no contexto contemporâneo uma ‘crise de identidade’, são as diretrizes para
a
discussão
e
análise
que
pretendo
apresentar
nesse
trabalho.
Pensando: (1) no conceito de intertextualidade discutido por Barnes e Duncan (1992) que situa as
representações de uma maneira geral como conjunções de uma variedade de textos, relações e referências;
(2) no processo de construção (real ou fílmica) de visão e percepção do espaço discutida por autores como
Stephen Heath (1993), Degli-Esposti (1998), Crang (1998) e Lury e Massey (1999); e (3) na pósmodernidade e no “aparecimento” de um novo formato para a identidade cultural (Stuart Hall, 2001; Fredric
Jameson, 2004), esse trabalho mostrará, através da análise do filme brasileiro O Homem que Copiava (Jorge
Furtado, 2002), como os conceitos elencados acima vêm sendo elaborados dentro da representação fílmica
ajudando na construção de uma visão subjetiva e coletiva sobre a prática da percepção do espaço e a
construção da identidade na pós-modernidade. Existe, obviamente, uma diversidade enorme de filmes, e na
mesma medida, maneiras de “construir” e representar o espaço e as identidades culturais. A preocupação
principal aqui será com a questão teórico-metodológica relacionada à análise de um texto fílmico sob uma
perspectiva geográfica cultural dando ênfase às possíveis relações existentes entre o texto e a representação
dos
conceitos
descritos
acima
como
de
interesse
para
a
discussão
proposta.
As representações de uma maneira geral são construídas pela conjunção de uma variedade de textos e
relações, isto é, fazem parte de um processo denominado intertextualidade que induz à compreensão de que
o significado não é simplesmente produzido no contexto da relação entre um texto e o objeto que esse
representa (“o mundo lá fora”), mas no resultado produzido no e pelo processo de conjunção das variadas
referências (Barnes e Duncan, 1992). Dessa forma, levar a sério o processo da intertextualidade significa
descartar o uso puro e simples de um texto fílmico como “objeto de verificação” através do qual se pode
“checar”
se
a
imagem
fílmica
do
objeto
“confere”
com
a
dada
em
realidade.
De acordo com o conceito do espaço narrativo, desenvolvido por Heath (1993), a construção do espaço pelo
cinema advém de um discurso espacial projetado pela e através da visão e que está impregnado de formas
simbólicas. A noção do espaço narrativo, do espaço fílmico no caso do cinema, se refere ao espaço
imaginado. Se a experiência (do espaço como uma prática social e material) é percebida e representada por
uma forma de representação visual e cultural, como é o caso do cinema, o resultado final desta
representação espacial, o espaço fílmico, constituirá um espaço da representação que por sua vez produzirá
novas formas de percepção do espaço. Isto é, a interação entre a “prática espacial”, a “representação do
espaço” (que acontece com a percepção da realidade) e o “espaço da representação”, que é essencialmente
o espaço “construído” pela imaginação, é responsável pela produção de novas formas de perceber, construir,
entender
e
modificar
o
espaço.
Existe uma forte relação entre a narrativa fílmica - enfatizando o enquadramento, o espaço, a arquitetura, a
mise-en-scène e colocando os personagens dentro de locações geográficas específicas - e o mundo real das
relações sociais (Crang, 1998; Lury e Massey, 1999). As construções fílmicas servem não somente como
objeto de crítica, mas como re-ordenamento das “imaginações geográficas” que adquirimos do mundo. Como
Crang (1998) explica: “o conhecimento da maioria das pessoas sobre a maioria dos lugares se adquire
através da mídia de vários tipos, de maneira que, para a maioria das pessoas, a representação vem antes da
‘realidade’”(p.44, tradução minha). O cinema pode, portanto, ser considerado como um meio que assume um
papel central na construção das imaginações geográficas dos indivíduos na medida em que ajuda a “inventar”
esses
lugares.
Meu argumento central é que, através da relação com o espaço – e sua representação –,os discursos fílmicos
podem ser interpretados e compreendidos. As representações fílmicas de nossas imaginações geográficas,
por exemplo, aparecem dentro de uma “projeção” das paisagens, regiões, e lugares, relacionados ao
contexto do espaço do real. As raízes dessas imaginações se deitam na história estrutural de um sistema
formado pelo diálogo do espaço real com as imagens que construímos de nós mesmos através de meios de
representação como o cinema, e nas visões proporcionadas pelo espaço concreto (arquitetônico) e o espaço
de representação (fílmico) que – cada um ao seu tempo e a sua maneira –, nos coloca em posição “elevada”
para ver e perceber o espaço “como um todo”, incorporando-o a nossas mentes como uma totalidade e
permitindo
que
a
experiência
da
vida
urbana
“adquira
novos
sentidos”(Costa,
2006).
Pensando na construção da “identidade cultural na pós-modernidade” e na discussão promovida por Stuart
Hall, esse trabalho procura discutir e demonstrar como o filme O Homem que Copiava (Jorge Furtado, 2002),
através da representação de uma visão da prática do consumo, elabora sobre temas caros à pósmodernidade, mais especificamente sobre as questões de identidade. Nesse filme Jorge Furtado dá prioridade
à noção de “identidade” como um “prêmio” a ser adquirido, e não uma necessidade intrínseca ao sujeito, e
que vem atrelado a uma necessidade relacionada ao que Degli-Esposti (1998) designa de “consumo criativo”.
A noção de “identidade pelo consumo”, no entanto, não é um tópico de interesse particularmente recente
para a produção cinematográfica de uma maneira geral ou da brasileira de maneira particular. Mas nos filmes
contemporâneos, naqueles considerados por alguns como “pós-modernos”, a representação da identidade e
do consumo difere da construída por seus antecessores dramaticamente na sua representação da
subjetividade. Então, essa re-configuração da subjetividade demanda necessariamente uma re-estruturação
no que toca não apenas as estratégias narrativas mas a escolha de novas temáticas e estéticas.
Da mesma forma que Blade Runner (Ridley Scott, 1982) se tornou um ícone para o estudo do pós-
modernismo, penso que O Homem que Copiava, de maneira similar, deva ser entendido, dentro do contexto
da produção cinematográfica brasileira contemporânea, emblematicamente no contexto do pós-modernismo
apesar, é claro, de os dois filmes terem sido produzidos em contextos cinematográficos distintos e terem
marcadamente visões e construções narrativas e estéticas completamente diferentes. A mise-en-scène no
filme de Scott é indubitavelmente o exemplo supremo de uma visão fílmica pós-moderna saturada de
“successive layers of urban history” (Collins, 1989, p.133), conseguida através de justaposições, bricolagens
referentes a diferentes espaços e tempos. Dessa forma, a prática de análise intertextual aparece como
primordial para a compreensão do processo de formação do pós-modernismo e a representação da produção
cultural
pós-moderna.
O filme O Homem que Copiava, se envolve no jogo de narrar (e representar) uma cultura pós-moderna que
acontece por meio da produção, construção, de uma “bricolagem de identidades”. O que encontramos no
filme de Furtado é precisamente uma completa aplicação do termo “bricolagem” relacionada, produzida e
construída a partir da produção cultural. Há um reconhecimento de que “os materiais” (elementos) com os
quais os indivíduos constroem sua identidade nunca são aqueles de uma cultura homogênea, mas, ao
contrário, são produtos de culturas díspares, compostos em si de fragmentos culturais. É nessa perspectiva,
portanto, que irei examinar O Homem que Copiava e o processo de construção da identidade cultural na pósmodernidade.
AO045 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1264] GRAN D TH EFT AUTO:REPRESEN TAÇÃO, ESPACI ALI D AD E E D I SCURSO ESPACI AL EM UM
VIDEOGAME.
ANDRÉ LIMA DE ALVARENGA.
UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
a)
Obj e t ivo
Est e t r a ba lho
in cor por a ndo
tem
com o
pa r a
b)
obj e t ivo
su a
a m plia r
área
o
e scopo
de
Re fe r e n cia l
e x pe r im e nt a l
pe squ isa
da ge ogr a fia cu lt u r a l,
os
vide oga m e s.
t e ór ico
con ce it ua l
O referencial teórico conceitual utilizado se divide em três partes. A primeira se enquadra na linha
e pist e m ológica const r u t ivist a do e st udo da s r e pr e se n t a çõe s, de n t r o da qua l de st a ca m os: a
se m iologia , a pa r t ir dos a u t or e s F. Sa u ssu r e , C. Pe ir ce e R. Ba r t he s; a psicologia cogn it iva ,
r e pr e se n t a da por J. Pia ge t , e a a n á lise discu r siva de M . Fou ca u lt . Em se gu ida , discu t im os a s
possibilida de s da s nova s t e cnologia s infor m á t ica s, com P. Le vy, M . Silva , S. Joh n son , e dos
vide oga m e s, com J. Ju u l, H . Je n k in s e B. Su it s. Por ú lt im o a na lisa m os dois con ce it os t e ór icos da
ge ogr a fia r e conh e cidos n o j ogo, com o t e r r it ór io e t e r r it or ia lida de s, com ba se e m C. Ra ffe st in , M .
Souza e R. Sa ck , e se gr e ga çã o u r ba na , a poia do e m D . H a r ve y, E. Soj a , G. Br idge , S. Sa sse n e P.
Marcuse.
c)
M e t odologia
D ividim os
a
m e t odologia
em
três
e t a pa s:
1 – Apr e se n t a çã o da ba se t e ór ica u t iliza da . 2 – D e scr içã o de t a lha da do vide oga m e Gr a n d Th e ft
Au t o, com ê n fa se nos a spe ct os e spa cia is a pr e se n t a dos: pa r a r e a liza r t a l de scr içã o pe n e t r ou - se o
espaço virtual do jogo fazendo o reconhecimento das representações socioespaciais presentes. Os
e le m e n t os a na lisa dos se divide m e m t r ê s se gm e n t os: a ) a r qu it e t u r a do e spa ço con st r u ído, b)
dist r ibu içã o da popu la çã o de pe r sona ge n s figu r a t ivos, e c) r ot e ir o ficciona l. 3 – Por fim ,
a na lisa m os t a l e spa cia lida de com ê nfa se n o discu r so a pr e se n t a do pe lo j ogo sobr e a fr a gm e nt a çã o
u r ba na da s cida de s a m e r ica n a s e a for m a çã o de t e r r it ór ios e t e r r it or ia lida de s n o t e cido socia l
u r ba n o com o r e spost a a e ssa fr a gm e n t a çã o. Ut iliza m os, pa r a t a l, a s fe r r a m e n t a s t e ór icocon ce it ua is
a pr e se n t a da s.
d)
1
2
3
Pr in cipa is
–
–
Qu e st õe s
/
Pon t os
Com o é const r u ída e r e pr e se nt a da a e spa cia lida de no j ogo Gr a n d
Que con ce it os ge ogr á ficos e st ã o pr e se n t e s no j ogo e com o se
–
Qua l
é
o
discur so
e spa cia l
a pr e se n t a do
por
D e se n volvidos
Th e ft Au t o?
m a n ife st a m ?
tal
j ogo?
A pa r t ir da se m iologia pode m os le r o vide oga m e com o um t e x t o. A in t e r pr e t a çã o de t a l t e x t o,
apesar de variar com a experiência de cada indivíduo, tende a ser bastante semelhante na medida
e m qu e a s pe ssoa s com pa r t ilha m va lor e s cu lt u r a is, fa t o fa cilit a do pe la indú st r ia de com u n ica çã o
de
m a ssa .
A e spa cia lida de do vide oga m e Gr a n d Th e ft Au t o é con st r uída a ssim : há u m gr a n de ce n á r io vir t u a l
pr oj e t a do e m t r ê s dim e n sõe s de for m a a pe r m it ir a im e r sã o do pe r sona ge m pr in cipa l, C.J.,
con t r ola do pe lo j oga dor . Ta l e spa ço, r e pr e se n t a do com o pa lco, é a lt a m e n t e com ple x o: con t a com
t r ê s cida de s de por t e m e t r opolit a no, um in t e r ior ba st a n t e a m plo e é um a r e pr e se nt a çã o ca r ica t a e
r e duzida dos e st a dos a m e r ica nos Ca lifór n ia e N e va da , be m com o da s cida de s de Sã o Fr a ncisco,
Los Ange le s e La s Ve ga s. A r e fe r ê n cia a e st e s e st a dos e cida de s se de du z pe la t opon ím ia , que
pa r odia os n om e s dos lu ga r e s a qu e se r e fe r e m , be m com o pe los e le m e n t os visua is a pr e se nt a dos
n a pa isa ge m cr ia da . O ce n á r io se a pr e se n t a com o m a qu e t e e com o h ipe r t e x t o: a s con st r u çõe s
r e pr e se n t a da s sã o com o ca ix a s e st a nqu e s, im pe n e t r á ve is, só a ce ssíve is a t r a vé s de lin k s
pr e se n t e s n a pa isa ge m qu e t r a n sfe r e m o pe r sona ge m pa r a out r o ce ná r io r e pr e se nt a n do o int e r ior
dos
pr é dios.
A dist r ibu içã o da popu la çã o e dos ve ículos no ce ná r io ocor r e pe lo m é t odo que Ch or le y e H a gge t t
ch a m a m de M a t r iz Ge ogr á fica de D a dos: o ce ná r io é dividido e m á r e a s, e pa r a ca da á r e a sã o
in dica dos t ipos de pe ssoa s e ve ícu los qu e pode m se r e n con t r a dos, a lé m da s pr oba bilida de s de
a pa r içã o. D e t a l for m a , n os ba ir r os pe r ifé r icos e ncon t r a m os pe ssoa s e ve ícu los de e st e r e ót ipo
m a is pobr e , e nqu a nt o nos ba ir r os r icos pr e dom ina m os t ipos de a pa r ê n cia r ica . H á ba ir r os de
m a ior ia n e gr a , ou t r os sã o gu e t os la t inos, ou lu ga r e s on de e ncon t r a m os t ipos a lt e r n a t ivos com o
h ippie s ou ca sa is ga ys. Assim , pode m os visu a liza r cla r a m e n t e o m ode lo a m e r ica no da
fr a gm e n t a çã o u r ba na a pont a do por Pe t e r M a r cu se a o indica r qu a t r o pa dr õe s qu e de scr e ve m e ssa
divisão:
cla sse ,
r a ça
e
cor ,
e t n icida de
e
e st ilo
de
vida .
Pode m os e n con t r a r n a s m e t r ópole s a pr e se n ça de ga ngue s de r u a , qu e cont r ola m dive r sos
t e r r it ór ios u r ba nos. Com o CJ, o h e r ói da t r a m a , pe r t e n ce a um a ga ngue , t oda a ve z e m que se
a pr ox im a de u m a ou t r a r iva l, e st a a va n ça pa r a a gr e di- lo. É possíve l r e a liza r u m a gu e r r a de
ga ngu e s e t e n t a r t om a r um t e r r it ór io r iva l. H á , t a m bé m , á r e a s m ilit a r e s e de le ga cia s e n volvida s
por ce r ca s e com dive r sa s pla qu e t a s a visa n do que in va sor e s se r ã o a ba t idos. N o ca so de inva sã o o
FBI a pa r e ce im e dia t a m e n t e e a t ir a . Aqu i h á vá r ia s gr a da çõe s e for m a s de t e r r it or ia lida de com o
in dica do
por
R.
Sa ck .
e)
Re su lt a dos
a lca n ça dos
e
con clu sões
Con clu ím os qu e a pe sa r da n ovida de na for m a de r e pr e se n t a r o e spa ço e da u t iliza çã o de r e cu r sos
bastan t e com ple x os pa r a se con st it u ir t a l e spa ço com a r e s de r e a lida de , possibilida de de
in t e r a t ivida de e ca pa cida de de “livr e cir cu la çã o” do u su á r io pe r m it ida s pe lo vide oga m e , in clu in do
a possibilidade de representação de uma série de conceitos e noções geográficas, o conteúdo final
a pr e se n t a do t r a z um discu r so sobr e t a is e spa ços qu e pode se r e n con t r a do e m m u it a s ou t r a s
for m a s de r e pr e se n t a çã o. Ta l discu r so é e st e r e ot ipa do e e st á pr e se n t e n a m a ior ia dos film e s
policia is, pr in cipa lm e n t e os da in dú st r ia n or t e - amer ica na , m a s t a m bé m n a m a ior ia dos ca de r n os
policia is
dos
j or na is
e
r e vist a s.
N ã o pode m os dize r qu e o j ogo cr ia um fa lso olh a r sobr e a s cida de s, ou qu e t e n t a iludir se u s
u su á r ios de for m a a in cu t ir qu a lqu e r t ipo de pr e con ce it o sobr e a e spa cia lida de ur ba n a
a pr e se n t a da de for m a pr oposit a da . M a s pode m os dize r qu e o j ogo é m a is u m m e io de
r e pr e se n t a çã o, que a t r a vé s de sign os ba st a n t e com ple x os, dinâ m icos e pe r sua sivos r e pr oduz u m a
ce r t a visã o e st e r e ot ipa da da s cida de s, cola bor a n do n a n a t u r a liza çã o de t a l for m a de le r o e spa ço
urbano.
AO046 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1548] A FAVELA N A CI D AD E M ARAVI LH OSA: ELEM EN TOS PARA UM A H I STORI A AM BI EN TAL
CONTADA PELO CINEMA NACIONAL.
INÊS AGUIAR DE FREITAS; RACHEL DE ALMEIDA MOURA.
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Tendo a arte cinematográfica como suporte para a realização de uma história ambiental da favela carioca,
sob a luz da Geografia, este trabalho tem o objetivo de identificar alguns elementos do imaginário social que
constituem
o
“mito”
da
beleza
da
cidade
do
Rio
de
Janeiro.
A História Ambiental, disciplina que considera a natureza, tanto como o homem, atores protagonistas na
organização do espaço, apresenta-se como um conhecimento interdisciplinar que tem na natureza seu objeto
de estudo, possuindo muitas características em comum com a geografia. De acordo com Worster (1991), a
história
ambiental
apresenta-se
em
três
níveis
de
análise:
• O 1º nível compreende as questões referentes ao estudo das paisagens do passado e seus fatores bióticos
e
abióticos;
• O 2º nível busca analisar as questões socioeconômicas e suas interações com o ambiente;
• O 3º nível trata da ação da cultura sobre o meio físico-material, descobrindo na paisagem os usos e
significados
e
vendo-os
como
elementos
formadores
da
“memória”
de
um
povo.
Desta forma, utilizando-se da base metodológica correspondente ao 3º nível de questões, este trabalho
busca o entendimento dos mitos, idéias, representações sobre a natureza carioca nas paisagens dos filmes
Assalto
ao
Trem
Pagador,
Orfeu
Negro
e
sua
refilmagem
Orfeu.
Nesse sentido, a partir da leitura do conceito de paisagem alemã – Landschaft - que compreende a paisagem
como um complexo natural total, representado, de forma integrada, pela natureza e pelas ações humanas
(FREITAS, PERES e RAHY, 1999), e com uma visão de paisagem apresentada por Shama (1996, p.17).
“Antes de poder ser um repouso para os sentidos, a paisagem é obra da mente. Compõe-se tanto de
camadas de lembranças quanto de estratos de rochas”, estamos aqui retomando o conceito de paisagem
alemão a partir da ótica paisagem X memória proposta por Shama, ou seja, pensando a paisagem antes de
tudo
como
resultante
da
memória.
Assim, a paisagem da cidade é o elemento essencial na identidade carioca e, por conseguinte, na construção
do discurso mítico da Cidade Maravilhosa, pautado na sua beleza natural. Essas idéias vêm sendo
fundamentadas desde o período dos viajantes naturalistas que se encantavam com a paisagem, passando
pelo Império Brasileiro, influenciado pelo romantismo alemão, no qual se exaltava a beleza dos trópicos, e,
finalmente, chegando à primeira república, onde, como sede do Governo Federal surge a necessidade de
adequar sua forma urbana à concentração e acumulação do capital. Ou seja, o Brasil precisava de uma
cidade cosmopolita; o que será realizado na reforma urbanística da administração do prefeito Pereira Passos
(ABREU,
1997).
A idéia de uma “cidade maravilhosa”, consolidada com a música, de mesmo nome, de André Filho, de 1934,
ainda hoje “hino” oficial da cidade, continua sendo alimentada pela mídia e pelas artes, através da música e,
sobretudo, pelo cinema. Assim, todo trabalho realizado pela mídia e expressões artísticas influencia na
representação da natureza, ajudando a formar a identidade do carioca, que tem por sua cidade um
sentimento de pertencimento, baseado na sua relação com a natureza, reforçando a idéia de uma beleza
singular.
Embora saibamos que a história ambiental, no que concerne ao seu primeiro e segundo nível de análise,
corresponda a uma história de degradação ambiental, o terceiro nível de uma História Ambiental do Rio de
Janeiro, nos informa de um “mito” da beleza capaz de sustentar muitas práticas sócio-espaciais. Sendo
assim, vejamos como este mito da beleza se apresenta nos filmes nacionais citados a partir das imagens da
natureza carioca. Faremos está análise através de um dos cenários mais polêmicos do nosso espaço urbano –
a favela que vista como um problema moral, político e social a favela é o lócus da marginalidade, do pobre,
do trabalhador honesto, do samba, e, acima da tudo, a favela é vista como não-cidade. Mas, e a natureza na
favela?
Sob
a
ótica
paisagem
x
memória
há
alguma
representação?
Com efeito, a favela surge em “espaços naturais”, até então, não ocupados. Portanto, conservava boa parte
de sua paisagem natural. Nos filmes mais antigos, como Assalto ao Trem Pagador (1962) e Orfeu Negro
(1959), várias paisagens demonstram a relação próxima do morador da favela com a natureza, revelando-a
como
um
espaço
que
lembra
o
bucólico.
No que concerne ao 3º nível da História Ambiental, a favela é representada no cinema ainda como parte da
“cidade maravilhosa”; é ainda parte da cidade porque é “natural”. O carioca, sobretudo a elite, se identifica
com o aspecto bucólico, com as belas paisagens que se descortinam do alto do morro como no filme Orfeu.
No entanto, à medida que a cidade cresce, aumentam as diferenças sócio-espaciais, tornando a favela, em
termos habitacionais a possibilidade viável para as camadas de baixa renda. Por essa razão, na refilmagem
de Orfeu (1999), a natureza encontra-se cada vez mais longe. Se antes, os barracões distantes um dos
outros apareciam na paisagem ainda repleta de vegetação, agora, onde está a natureza? O chão é
cimentado, as casas estão “amontoadas”. Com tanta gente morando neste espaço, é preciso retirar a
natureza. Temos então a morte da bela natureza, significando a desvalorização de tais espaços da cidade
também no ponto de vista do imaginário. Estas porções da população carioca perdem direito ao mito da
beleza
urbana
e,
com
ele,
perdem
parte
da
sua
condição
de
“carioca”.
Assim, este trabalho conclui que a favela, a praia, o pão-de-açúçar, são imagens que pertencem ao espírito
carioca enquanto referência e marcam as relações do habitante com a natureza desta cidade, estando as
mesmas imagens presentes nos filmes sobre o Rio de Janeiro. À medida que a natureza da favela se afasta
desta relação, ao longo de um intenso processo de urbanização, há uma mudança na identificação do carioca
com o morro habitado que nos permite entender como algumas práticas sócio-espaciais e discursos
estigmatizados sobre a favela se constituíram no tempo.
AO047 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1753] A REPRESEN TAÇÃO D OS ESPAÇOS D E FRON TEI RA N OS JORN AI S BRASI LEI ROS: UM A
PROPOSTA METODOLÓGICA PARA O ESTUDO DA CARTOGRAFIA JORNALÍSTICA.
ANDRÉ REYES NOVAES.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
A cartografia jornalística é uma das formas de representação dos espaços e fenômenos geográficos com
maior difusão na sociedade contemporânea. Desde o início do século XX os avanços nas tecnologias de
produção e reprodução vêm permitindo que os jornais utilizem sistematicamente os mapas para localizar os
eventos e complementar as notícias com informações geográficas. De fato, através da cartografia jornalística,
“a mídia impressa apresenta uma quantia significativa de informações geográfica para o público” (Kent e
Sanders, 1993:95). No entanto, a geografia não tem dado uma atenção muito freqüente a esta forma de
representação
do
espaço.
Dois motivos principais podem justificar a ausência de um campo consolidado de pesquisas sobre a
cartografia jornalística. Primeiramente deve-se reconhecer que este é um objeto de estudo relativamente
novo, pois os mapas só intensificaram sua participação nos jornais na segunda guerra mundial, iniciando um
processo que encontrou seu auge apenas nos anos 1980, quando a introdução dos computadores e novas
tecnologias de impressão tornaram os mapas mais freqüentes do que nunca na imprensa. Por outro lado, a
cartografia jornalística sempre foi considerada, na ótica de cartógrafos e geógrafos, como uma forma
“inferior” de representação do espaço, já que esta não respeitava os cânones da cartografia tradicional. Nesta
perspectiva, a cartografia jornalística só poderia ser estudada a partir de suas deformações, gerando estudos
que enumeravam os erros cometidos que comprometeriam uma representação “correta” do espaço.
De fato, ainda são raros os trabalhos que buscam considerar a cartografia jornalística como uma fonte de
informação, um objeto de estudo privilegiado para compreender como a sociedade contemporânea percebe e
representa espaços específicos. Considerando os mapas jornalísticos como “inovadores, únicos e
esteticamente atraentes” (Green, 1999:141) podemos ir além de uma mera critica calcada nos cânones da
cartografia tradicional, reconhece-os como um objeto de estudo que pode fornecer informações específicas
sobre
as
construções
sociais
que
atribuem
significados
aos
espaços
geográficos.
O objetivo específico do presente trabalho de pesquisa é fazer da cartografia jornalística uma fonte de
informação sobre como os jornais brasileiros percebem e representam os espaços de fronteira. De fato, como
evidenciou Monmonier (1989), os espaços de fronteira foram muito freqüentemente representados nos
mapas da imprensa, já que a maioria dos leitores não tem conhecimento geográfico suficiente para localizar
um acontecimento noticiado fora do eixo central de circulação dos jornais. No Brasil, assim como em outros
países, além de serem pouco conhecidos pelos leitores, estes espaços ainda são profundamente
estigmatizados, sendo freqüentemente associados à ausência do estado, processos migratórios e atividades
ilegais.
A partir do caso específico da representação dos espaços de fronteira, buscou-se aqui desenvolver as bases
para uma analise qualitativa da cartografia jornalística. De fato, a maioria dos trabalhos sobre estes mapas
ou condena sua falta de cientificidade (Speier, 1941, Gilmartin, 1985, Porter, 1985), ou tem uma perspectiva
mais histórica, tratando da evolução de sua freqüência a partir da introdução de diferentes tecnologias de
produção e reprodução (Monmonier, 1989, Kent e Sanders, 1999). Ainda não são muito freqüentes os
trabalhos que buscam estudar os significados das práticas cartográficas selecionadas para construir os mapas
na
imprensa,
dialogando
com
as
teorias
sobre
imagem
e
representação.
A discussão sobre a problemática do presente artigo estará organizada em momentos diferenciados.
Primeiramente buscarei fazer uma breve reconstituição da história da cartografia jornalística e seus principais
estudos. Posteriormente pretende-se construir uma análise mais ampla sobre como a geografia tem
introduzido teorias de outras áreas do conhecimento para trabalhar com a relação entre imagem e
significado. A partir dos estudos desenvolvidos em minha dissertação de mestrado (Novaes, 2005), pude
identificar duas matrizes que vem sendo mais freqüentemente utilizadas e podem ser definidas como as
bases
conceituais
desta
pesquisa.
A História da Arte e a Semiologia são campos do conhecimento que tem geralmente fornecido um arcabouço
conceitual muito utilizado pelos geógrafos quando estes estão preocupados em introduzir a questão do
significado em seus trabalhos. O objetivo geral deste trabalho foi fazer uma avaliação das formas como estas
matrizes têm sido utilizadas na geografia e na cartografia, para posteriormente encontrar bases sólidas para
desenvolver uma análise qualitativa da representação dos espaços de fronteira na imprensa brasileira.
O frutífero diálogo com a Semiologia e a História da Arte permitiu a consolidação de uma base conceitual
para um estudo do significado das práticas cartográficas aplicadas nos mapas da imprensa. De forma geral,
constatou-se que os mapas jornalísticos tendem a reproduzir as concepções sociais que têm alimentado as
políticas públicas predominantes nos espaços de fronteira, apresentando uma visão pejorativa que estimula
uma atitude jurídico-militar. A concepções de que os espaços de fronteiras são locais de perigo e de
abandono, que devem ser, sobretudo, militarizados, tem estimulado muitos mapas jornalísticos, que utilizam
setas, símbolos, cores, e uma infinidade de outras práticas cartográficas para comunicar informações sobre
um espaço pouco conhecido pelo público leitor.
AO048 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1915] GEOGRAFIA E CINEMA: DUAS LINGUAGENS E SUAS IMAGENS DE MUNDO.
DENNIS ZAGHA BLUWOL.
PUC- SP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
Objetivos
O objetivo da presente pesquisa (que se encontra em andamento) é sistematizar os elementos da linguagem
cinematográfica que formam a geograficidade das imagens fílmicas. A partir deste conhecimento, pretendese analisar diferentes obras traçando paralelos entre a geograficidade destas representações, principalmente
no que se refere à representação de ambientes urbanos, e a geograficidade urbana onde tais representações
foram
criadas.
Referencial
teórico
e
Conceitual
A base da pesquisa, em sua primeira parte, é a teoria sobre linguagem cinematográfica. Para a aplicação da
leitura geográfica dos filmes na discussão sobre a questão urbana, além dos textos de teoria de Geografia
urbana,
é
dado
muito
valor
às
análises
do
sociólogo
Zygmunt
Bauman.
Metodologia
A pesquisa parte da análise da bibliografia sobre cinema, tentando perceber qual a dimensão geográfica dos
elementos da linguagem cinematográfica. Após esta fase, as análises partem de análises fílmicas,
identificando nas obras os elementos já estudados e associando-os à leitura da bibliografia sobre Geografia
urbana e outros textos que auxiliem na compreensão do que é o mundo urbano na modernidade.
Principais
Questões
As relações entre os filmes e a Geografia podem ir muito além do tradicional uso dos mesmos como simples
ilustrações de questões, uso este muito praticado, principalmente no campo do ensino.
Esta pesquisa parte do pressuposto que a imagem fílmica possui uma geograficidade e que tal geograficidade
existe
em
relação
dialética
com
a
geograficidade
vivida
pelos
feitores
destas
obras.
Faz-se, então, necessário, como sistematização inicial da pesquisa, rastrear os elementos que formam a
linguagem cinematográfica e apontar de que maneira cada um deles pode contribuir para a construção da
geograficidade
fílmica.
São
estes
resultados
que
estão
apresentados
abaixo.
Após esta fase inicial, já concluída, o prosseguimento desta pesquisa será a tentativa de revelar a relação
dialética entre representações e mundos representados, no que se refere à vivência de ambientes urbanos
em dois momentos muito diferentes: A U.R.S.S. de 1929 no filme Um Homem com uma Câmera, de Dziga
Vertov
e
os
E.U.A.
de
2001
no
filme
Cidade
dos
Sonhos
de
David
Lynch.
Resultados
alcançados
A linguagem cinematográfica consiste em uma série de elementos que permitem criar imagens (e sons)
portadores de significados. O meio principal de transmissão de informações no cinema é a imagem gráfica.
Esta imagem possui uma organização espacial. Tal organização pode revelar uma geograficidade, na medida
em que há motivos para que sua espacialidade se organize de certa maneira. Esta maneira, intencionalmente
escolhida pelos feitores das obras, permite leituras e interpretações. A interpretação e significação da
espacialidade
fílmica
é
o
que
chamamos
da
busca
da
geograficidade
fílmica.
Um primeiro debate é sobre os limites do que se pode perceber em um filme, com as idéias de “quadro”,
“campo” e “plano”. O quadro de um filme é o limite geométrico da imagem, limitando o campo, ou seja,
aquilo que será percebido. Este limite não é apenas geométrico, na medida em que limita a percepção e,
portanto, contribui para a significação que se pode fazer de tal imagem. Assim sendo, é também um limite
geográfico. Uma certa porção do lugar filmado é escolhido para aparecer, enquanto o resto não. Aí entra
também a discussão sobre o tipo de plano utilizado: dentro destes limites do quadro pode-se mostrar uma
cidade inteira ou um detalhe de uma unha. Pode-se mostrar alguém de corpo inteiro, só acima do busto, só o
rosto ou só o olhar. Cada uma destas escolhas pode ser considerada como um tipo de plano. Consideramos
este
procedimento
como
a
escolha
da
escala
que
cada
cena
possuirá.
Além disso, um plano pode possuir diferentes profundidades. Pode ser visto elementos apenas em um plano,
ou, ao mesmo tempo, elementos que se distanciam em profundidade do primeiro plano. Esse procedimento
amplia a espacialidade percebida, sem necessitar cortá-la para mostrar separadamente elementos que se
localizam
na
frente
e
depois
os
que
estão
atrás.
O modo como a câmera captura a imagem é também de suma importância para a criação da espacialidade
fílmica. O ângulo que ela faz com os objetos filmados é a primeira questão. Ele pode ser, além de reto,
inclinado para baixo (plongée) ou para cima (contre-plongée). O contre-plongée realça o objeto filmado, o
engrandece. O plongée o diminui. Assim, a espacialidade de um objeto cria significados de grandeza, de
poder,
mas
também
de
aflição,
opressão.
A câmera pode, ainda, se movimentar. Pode fazer um percurso (travelling) ou se mover em torno do próprio
eixo (panorâmica), assim como misturar os dois movimentos. O modo como os lugares serão capturados pela
câmera, ou seja, como a espacialidade desses lugares serão apresentadas no filme, depende, portanto,
também dos movimentos, assim como, logicamente, os significados destas espacialidades (suas
geograficidades).
A iluminação é outro aspecto de importância central. A luz foca o olhar do espectador em certas porções dos
lugares filmados. Realça umas e esconde outras; ajuda a dar forma aos objetos filmados. Vários são os
exemplos clássicos de usos diferenciados da iluminação. O “Expressionismo Alemão”, por exemplo, usava-a
para centrar a atenção em uma pequena parte da tela, não permitindo que o espectador se perdesse no
resto, que, em total escuridão, era o caos completo, assim como a verdadeira Alemanha da época, logo após
o fim da Primeira Guerra Mundial. A iluminação, ainda, ajuda a criar a atmosfera emocional, ajudando assim
no
modo
como
o
espectador
interpretará
o
significado
dos
lugares
mostrados.
A montagem é a espinha dorsal da linguagem cinematográfica. Ela junta diferentes pedaços de imagem,
além de imagens com sons. Juntar diferentes imagens é juntar diferentes lugares, formando um novo lugar
fílmico. Kuleshov, famoso diretor e teórico de cinema soviético, chamou este procedimento de “Geografia
Criadora”.
A
montagem
cria
unidades
espaciais.
A espacialidade fílmica é, portanto, resultado de junções de fragmentos criando unidades. Para que esta
espacialidade possua sentido é necessário que haja uma organização espacial na ligação entre os diversos
planos, entre as diversas cenas. É a isto que se chama de raccord espacial. Direções de movimentos, olhares
e objetos, por exemplo, devem possuir um sentido entre os diversos planos, para que se compreenda a
geograficidade da trama. A ausência intencional deste sentido pode ser também um discurso sobre a
ausência
de
sentido
do
lugar
apresentado.
Estes são os elementos básicos da linguagem cinematográfica que criam a espacialidade de um filme e,
portanto,
sua
geograficidade.
Os pressupostos teóricos para se ler geograficamente um filme estão aí dados, portanto. Cabe agora aplicálos de acordo com o interesse do leitor. A pesquisa de mestrado que está em andamento os aplicará para
tentar compreender os sentidos da geograficidade dos ambientes urbanos criados nas duas obras
supracitadas.
AO049 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1936] A FAVELA NA PAISAGEM CARIOCA E A FAVELA CARIOCA REPRESENTADA NO CINEMA.
JOSÉ NAZARENO DA SILVA.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
INTRODUÇÃO
Na história do pensamento geográfico, o interesse pela cultura sempre se fez presente na intenção de os
geógrafos compreenderem a ação do homem sobre a superfície terrestre. Durante muito tempo, porém, fatos
da cultura não foram analisados “sob o ângulo da atividade mental dos portadores da cultura nem das
relações que se desenvolveram entre si em tal ou qual lugar”. (CLAVAL, 2001, p.35.) Tal perspectiva
contribuiu para plasmar, na primeira metade do século XX, uma geografia cultural preocupada com a
diversidade das paisagens, mas ainda incapaz de esclarecer plenamente a dinâmica dos comportamentos
humanos.
A originalidade de cada cultura, expressa nas paisagens, está no centro dessa nova geografia cultural que
considera cultura não como categoria residual, mas como “meio pelo qual a mudança social é experenciada,
contestada
e
constituída”.
(COSGROVE;
JACKSON,
2000,
p.15.)
A cidade e suas paisagens híbridas passam a ser um objeto privilegiado pelo interesse dos geógrafos movidos
pela ótica da nova geografia cultural. Eles constroem representações e procuram significados nas diversas
espacialidades existentes no território urbano, afinal estudar e “planejar a cidade é, ao mesmo tempo, pensar
a própria pluralidade do real e dar efetividade a este pensamento do plural”. (DE CERTAU, 1978, p.172).
O cinema, gerado na Segunda Revolução Industrial e alimentado pelas técnicas da Revolução Informacional,
constitui um dos veículos mais expressivos para representar e compreender as nuanças culturais do espaço
geográfico contemporâneo, particularmente “o cinema dos valores sociais, isto é, o cinema que liga os
homens uns aos outros, o cinema que é de testemunho“. (ESCUDERO, s.d., p. 15).
Há uma outra aproximação existente entre cinema e geografia: o cenário — fundamental no universo fílmico,
ambiência em que as personagens se movimentam e movimentam seu destino — guarda certa semelhança
com a categoria paisagem. ratificada pelos geógrafos Barbosa e Corrêa em A paisagem e o trágico em O
amuleto
de
Ogum.
A imbricação cultural entre favela e cinema no Rio de Janeiro não é acidental. A história da cidade teve a
paisagem favela representada muitas vezes na tela: de Favela dos meus amores (1935), de Humberto Mauro
até Quase dois irmãos (2005), de Lúcia Murat. Favela e cinema refletem cruzamentos culturais possíveis e
presentes no tecido urbano do Rio de Janeiro. Possuem histórias desenvolvidas de forma quase simultânea à
própria história da cidade que lhe serviu de berço, nos últimos anos do século XIX. A favela, em 1897, no
morro da Providência, onde se instalaram “com a devida autorização dos chefes militares, os egressos da
campanha de Canudos, no lugar que passou a ser chamado morro da Favela” (CHALHOUB, 2001, p.17); e o
cinema, em 19 junho de 1898, “ao retornar da Europa (...) Afonso Segreto roda o primeiro plano em terras
brasileiras, flagrando a entrada da Baia da Guanabara, a bordo do Brésil”.(MOURA, 1987, p.18)
A favela tornou-se um dos signos mais conhecidos da cidade: um dos pólos da dualidade entre exclusão e
inclusão, padrão informal de construção e formal, identidade afinada com um sentimento de pertencimento à
comunidade
ou
com
o
outro,
habitante
do
asfalto.
Os filmes escolhidos para ilustrar as representações da paisagem da favela carioca: os dois Orfeus: O Orfeu
negro (1959), de Marcel Camus, e o Orfeu (1999) de Cacá Diegues, partem do mesmo texto referência —
Orfeu da Conceição, de Vinícius de Moraes, cuja trama transpõe o mito grego para uma favela carioca
OBJETIVOS
E
METODOLOGIA
A geografia cultural, apoiada em olhares interdisciplinares, fornece instrumental teórico para empreender o
estudo do tema A favela na paisagem carioca e a favela carioca representada no cinema.
Dessa
forma,
esse
trabalho
tem
como
objetivos:
— compreender por que a favela real e a representada no cinema são categorias, cada vez mais presentes,
na
paisagem
da
cidade
do
Rio
de
Janeiro
e
no
discurso
fílmico;
— compreender as diferenças das representações da favela carioca no cinema, em intervalo de quarenta
anos,
construídas
pelos
olhares
estrangeiro
e
de
pertencimento;
— pesquisar e analisar as matrizes ideológicas que permeiam e possibilitam o cruzamento cultural existente
entre habitantes da favela e do asfalto no território da cidade dual do Rio de Janeiro.
A favela não está apenas presente fisicamente na paisagem urbana do Rio de Janeiro: ela produz fatos
econômicos, políticos e culturais que influenciam diretamente o comportamento dos cidadãos e interferem no
funcionamento da cidade. A favela é uma instituição ativa e criadora da qual emana grande apelo midiático.
REFERÊNCIAS
BARBOSA, Jorge Luiz; CORRÊA, Aureanice de Mello. A paisagem e o trágico em O amuleto de Ogum. In:
CORRÊA, R. L.; ROSENDAHL Z. (org.) Paisagem, imaginário e espaço. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p.71102.
CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiço e epidemias na corte imperial. São Paulo: Companhia das Letras,
2001.
250p.
CLAVAL,
Paul.
A
geografia
cultural.
2.
ed.
Florianópolis:UFSC,
2001.
455p.
COSGROVE, Denis; JACKSON, Peter. Novos rumos da geografia cultural. In: CORRÊA, R. L.; ROSENDAHL Z.
(org.) Geografia cultural: um século (2). Rio de Janeiro: EdUERJ, 2000. p. 15- 32.
DE CERTAU, Michel. A invenção do cotidiano.:1. Artes de fazer. 3. ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 1998. 352p.
ESCUDERO,
José
Maria
García.
O
cinema
social.
Lisboa:
Áster,
s.d.
393p.
MOURA, Roberto. A bela Época (primórdios- 1912). Cinema carioca (1912-1930)In: RAMOS, Fernão (org.)
História do cinema brasileiro. São Paulo: Círculo do Livro, 1987. p. 9-72.
AO050 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1953] CIDADE, CULTURA E PLANEJAMENTO EM TEMPO DE ESPETÁCULO.
AMÉLIA CRISTINA ALVES BEZERRA.
UERN, MOSSORÓ, RN, BRASIL.
Resumo:
Cidade,
cultura
e
planejamento
em
tempo
de
espetáculo:
Pensar a cidade na contemporaneidade nos coloca diante de uma nova questão, qual seja, a tendência do
uso da cultura como um dos elementos norteadores do planejamento urbano. Uma das expressões dessa
dinâmica tem sido os investimentos nas políticas de revitalização de centros históricos, na construção de
equipamentos culturais e ainda na (re)invenção de festas -que têm assumido a característica de grandes
espetáculos - reafirmando, desse modo, particularidades/singularidades regionais e locais, o que implica uma
(re)elaboração das identidades que, não raramente, são vendidas no mercado de cidades.
Essa “nova” dinâmica urbana que vem se materializando na cidade opera mediante a incorporação de novos
valores culturais e de novos padrões de vida, ou a afirmação daqueles já existentes, pois no mundo global, a
diferenciação buscada através da identidade local, se torna uma importante estratégia. E a identidade está
fortemente ancorada na imagem da cultura local, que nessa fase histórica do capital, passa a ser utilizada
como recurso como bem destaca Yúdice (2004), e, nesse processo, vem sendo apropriada como uma das
formas
de
delimitação
das
particularidades
locais
frente
ao
mercado
global.
Ao falar sobre esse processo de mercantilização da cultura, Arantes (2002) argumenta que o “tudo é
cultura”, inaugurado nos idos de 1960, teria, pois, se transformado de vez naquilo que a autora denomina de
“culturalismo de mercado”. Esse processo ocorreu com tamanha intensidade que a cultura que havia se
cristalizado
como
esfera
autônoma
dos
valores
antimercado
torna-se
imagem.
Ao situar a questão urbana nesse processo, Vainer (2002) argumenta que se durante um longo período o
debate sobre essa temática remetia a temas como crescimento desordenado, reprodução da força de
trabalho, equipamentos de consumo coletivo, movimentos sociais urbanos, racionalização do uso do solo etc,
a “nova” questão urbana (grifo nosso) teria, agora, como nexo central a problemática da competitividade
urbana,
em
que
a
imagem
e
o
marketing
são
acionados
de
forma
agressiva.
Essa centralidade que a imagem tem assumido na dinâmica das cidades é uma das expressões do processo
de espetacularização que a sociedade tem vivenciado nas ultimas décadas. Esse processo que é percebido
por Seabra (2002) como o excesso midiático contido nas relações nos produtos e nas coisas foi originalmente
discutido por Debord (1997), onde afirma que toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas
condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos e tudo que era vivido
diretamente
tornou-se
uma
representação.
Em se tratando da cidade, essas representações são expressas através dos rituais, dos eventos, das imagens
que sintetizam a identidade local, que adquire sentido por meio da linguagem e dos sistemas simbólicos
pelos
quais
são
representadas.
Assim, as imagens construídas constituem um discurso sobre a cidade, são sínteses de representações
ordenadas em linguagem visual e verbal. Já as intervenções espaciais são discursos em ação, expressões
materiais de uma concepção de cidade. Pela midiatização que as cerca, são tornadas partes da imagem da
cidade. .Assim, é possível dizer, baseado em Sanchez (2003) que há um complexo intercâmbio entre a
transformação material e o simbolismo cultural, entre a reestruturação de lugares e a construção das
identidades, na medida em que as representações que os sujeitos têm do real influem na construção da
realidade, ao mesmo tempo em que as práticas materiais são as bases para novas representações do real.
As formas de demarcação da identidade têm assumido características particulares nas cidades. Em Mossoró,
cidade localizada no oeste do Rio Grande do Norte, esse processo tem se expressado tanto através da
dinâmica urbana, como é o caso da recuperação de ambientes históricos e a construção de equipamentos
culturais, a exemplo dos teatros, dos espaços destinados à realização de eventos, quanto da festa, como é o
caso dos festejos juninos e da festa cívica denominada Auto da Liberdade. Ambas as festas têm se tornado
grandes
espetáculos
e
para
estes
têm
sido
destinados
grandes
investimentos.
Nesse processo de (re)invenção da festa, os festejos juninos, que inicialmente possuíam um caráter quase
espontâneo dos valores e das tradições populares, vêm sendo apropriados pelos administradores públicos e
empresariais, transformando-se em megaeventos, cujo caráter de empreendimento econômico e comercial
tornou-se
muito
acentuado.
Essa (re)invenção das festas simultaneamente a (re)estruturação de áreas estratégicas da cidade, sobretudo
a área central, faz parte de um mesmo processo, que, na nossa compreensão, converge para produção de
uma imagem da cidade. Através dessa imagem aqueles que pensam Mossoró tentam projetá-la no cenário
turístico estadual e regional. Para tanto, a cultura, projetada especialmente através da festa, representa uma
das formas de diferenciá-la no mercado de cidades. Isso tem se traduzido inclusive no material publicitário
que tem sido veiculado sobre a cidade, onde Mossoró é denominada a capital cultural do oeste potiguar.
É neste quadro que se entrelaçam cidade, cultural e planejamento urbano, sendo este o tema do presente
artigo, cujo objetivo específico é discutir a dinâmica sócio-espacial da cidade de Mossoró nos últimos dez
anos, tentando entender como a cultura vem sendo apropriada pelo planejamento urbano e quais os
impactos
desse
processo
na
dinâmica
social
local.
Esse objetivo se insere dentro de uma pesquisa mais ampla desenvolvida ao longo do doutorado realizado na
Universidade Federal Fluminense, através da qual realizamos observações, fizemos entrevistas com gestores
e administradores da cidade, acompanhamos as festas que vêm sendo implementadas pelo poder público e
ainda analisamos o material publicitário que vem sendo veiculado sobre a cidade. Essa pesquisa nos colocou
diante da necessidade de discutir e analisar a relação do planejamento que vem sendo proposto para
Mossoró, com esse momento histórico no qual a afirmação de uma singularidade local assume uma
centralidade no mercado global de cidades. E essa singularidade está relacionada diretamente com a
afirmação de uma cultura local que tem sido retomada no sentido de afirmar a identidade da cidade.
Palavras chaves: Cidade, cultura, identidade e planejamento.
AO285 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Mudanças no Sistema de
Paisagens
[1487] I M PACTOS AM BI EN TAI S EM PAI SAGEN S D E EXCEÇÃO: O BREJO D E ALTI TUD E D A SERRA D E
BATURITÉ - CEARÁ.
LUCIANA MARTINS FREIRE; MARCOS JOSÉ NOGUEIRA SOUZA.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ - UECE, FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
As paisagens de exceção representam configurações diferenciadas em relação ao seu entorno. Resultam de
uma dinâmica isolada, oriunda de fatores naturais, sobretudo biogeográficas, ao longo do tempo geológico.
Suas formas podem oferecer a resposta para estudos sobre a formação de ambientes existentes tanto no
passado quanto no presente.
Na Região Nordeste do Brasil, e mais especificamente no Estado do Ceará, as paisagens de exceção, segundo
Ab’Sáber (2003), verificam-se ao longo de seu território, exemplificadas pelos: agrupamentos de inselbergs,
sob a forma de “montes ou ilhas” rochosas que pontilham domínios das caatingas; e maciços elevados,
voltados para ventos úmidos vindos do oceano Atlântico, resultando na constituição de florestas tropicais de
cimeira, também denominados como “enclaves”, “ilhas úmidas”, ou mesmo “brejos de altitude”, que se
apresentam dispostos em pleno sertões secos.
A presente pesquisa desenvolve-se analisando o ambiente de uma das mais expressivas paisagens de
exceção do nordeste brasileiro: os brejos de altitude, exemplificados aqui pela serra de Baturité. Segundo
Ab’Sáber (1990), a expressão ‘brejos’, aplicada a ilhas de umidade no interior dos sertões secos, teve sua
origem explicada através do entendimento na própria serra cearense. “Quem subia dos sertões secos
dominantes nas terras baixas onduladas regionais, encontrava nos altos da serra úmida e florestada algumas
planícies de formato alveolar, logo reconhecidas pela velha expressão portuguesa ‘brejo’”.
A exuberância paisagística da serra de Baturité justifica-se pelo comportamento de um ambiente
diferenciado, onde a altitude do relevo possibilita a existência de condições climáticas que potencializam
favoravelmente a ocorrência de um enclave de mata úmida, no domínio semi-árido das caatingas, com
formação influenciada pelos ventos que sopram do oceano Atlântico. As potencialidades dos recursos naturais
favorecem a criação de condições propícias ao desempenho das atividades agrícolas e da fixação de
populações. Assim, desde que começou a ser ocupada, por volta do século XVIII, iniciaram-se intensos
processos de exploração, sob os quais a mata ali existente ia sendo continuamente retirada para dar lugar a
espaços urbanos e áreas agrícolas, sem qualquer limite. Para deter o uso desordenado dos recursos naturais,
criou-se uma Unidade de Conservação: a Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra de Baturité,
abrangendo parte do território de oito municípios cearenses, totalizando uma área de 32.690 ha.
Mesmo com a existência do Código Florestal (Lei Nº 4.771, 1965) e com a criação da APA na Serra (Lei nº
6.902, 1991), a área delimitada pela Unidade de Conservação continua enfrentando problemas ambientais no
que diz respeito às condições de uso e ocupação da terra.
Esta pesquisa tem como objetivo precípuo avaliar o estado atual de conservação dos recursos naturais
inseridos na serra de Baturité. O estudo requer não somente o conhecimento da área na sua integralidade,
mas também a analise ecológica das compatibilidades de uso e ocupação a longo prazo, buscando-se
conhecer as condições atuais de ocupação in loco e analisar os efeitos dessas transformações. A pesquisa
desenvolveu-se a partir da análise integrativa da natureza, com base na concepção geossistêmica.
Inicialmente, realizou-se um estudo do referencial teórico sobre o assunto em foco, o levantamento histórico
da ocupação na serra de Baturité, exame de material cartográfico, bibliográfico e documental produzido por
instituições oficiais. Na pesquisa de campo, fez-se a aplicação de entrevistas à população local, visita a
órgãos e instituições públicas, reconhecimento da verdade terrestre e análise das condições físicas do meio.
O conceito de paisagem é o elemento geográfico fundamental da pesquisa. Entre os principais geógrafos que
abordaram o termo destaca-se o geógrafo norte-americano Carl Sauer (1925), trazendo a idéia de paisagem
relacionada ao tempo e suas relações vinculadas ao espaço, estando sempre em constante desenvolvimento.
Sauer foi um dos primeiros geógrafos a tratar a Geografia de maneira integrada, inserindo a visão
fenomenológica no seu contexto e através de uma leitura crítica. Outro geógrafo a ser destacado é o francês
Georges Bertrand (1972), trabalhando a paisagem em sua totalidade de modo homogêneo, porquanto a
sociedade e a natureza estão relacionadas entre si, representadas em um mesmo espaço geográfico.
Juntamente com as contribuições de Bertrand, outros autores consagraram-se pelo fato de operacionalizarem
a paisagem por intermédio do desenvolvimento do conceito de geossistema. Para Sotchava, a identificação
do geossistema ocorre mediante a homogeneidade e a diferenciação, por meio de classes hierarquizadas do
ambiente natural. Pode-se, enfim, dizer que paisagem é o conjunto da relação entre elementos físicos,
biológicos e humanos, que resultam em determinada configuração visual, estando sempre condicionada a
transformações, sejam de origem local e/ou global.
Dentre os impactos ambientais observados, assinala-se, como principal responsável, a devastação da
cobertura vegetal, praticada indiscriminadamente em vertentes e nascentes fluviais, ocasionando a
aceleração dos processos erosivos, ressecamento de fontes d’água naturais, ablação dos solos, assoreamento
do fundo dos vales, empobrecimento da biodiversidade e descaracterização da paisagem serrana.
Acrescenta-se a prática de técnicas agrícolas rudimentares, além do uso incorreto de agrotóxicos, o que vem
comprometendo a qualidade das águas superficiais, dos solos e da saúde humana e ambiental. A infraestrutura de saneamento básico dos municípios da Serra é deficiente, causando a poluição de recursos
naturais. A especulação imobiliária, resultado da elevação do valor da terra na serra de Baturité, consolidada
como região de segunda residência e propícia a atividades turísticas, também caracteriza-se como fator de
degradação da paisagem natural.
AO286 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Mudanças no Sistema de
Paisagens
[1579] AS COM UN I D AD ES RURAI S TRAD I CI ON AI S E O USO D OS RECURSOS N ATURAI S N A SERRA
DA PRATA – LITORAL DO PARANÁ.
ADRIANO CÉSAR BUZZATO.
UFPR, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
O objetivo da pesquisa foi analisar, no contexto de implantação do Parque Nacional Saint-Hilaire/Lange, os
impactos das populações humanas locais sobre os recursos naturais da UC. Os objetivos específicos foram:
caracterizar as comunidades que podem ser afetadas pela legislação restritiva da UC e possíveis conflitos que
possam ser gerados; definir o impacto das comunidades tradicionais sobre os recursos naturais presentes na
área. O método mais apropriado para fundamentar os objetivos propostos neste trabalho é o enfoque
sistêmico. A visão sistêmica permite analisar e entender o agroecossistema como um todo, de forma
dinâmica, onde estão presentes e se relacionam componentes físicos, químicos e biológicos. Para se construir
uma análise espacial que contemple de um lado, restrições ambientais e, de outro, comunidades que
dependem dos recursos, é preciso conhecer o conceito de desenvolvimento sustentável em seus diferentes
aspectos. Para RAYNAUT, ZANONI e LANA (2000; 2002), esse conceito permanece até hoje muito ambíguo,
pois pode se referir a domínios bem diferentes da realidade e aplicado em níveis de análise tanto globais,
quanto locais. Pode ainda contemplar diferentes escalas de tempo, desde as das gerações presentes até as
das
gerações
futuras
(RAYNAUT;
ZANONI;
LANA,
2002).
No Relatório Bruntdland (1987) citado por OLIVEIRA (2002), desenvolvimento sustentável é definido como
“aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras
atenderem às suas próprias necessidades”. O conceito não se atém às reais necessidades do ser humano,
nem à desigualdade social e não contempla, ainda, a definição de um nível equilibrado de consumo que não
comprometa o futuro. Dessa forma, para OLIVEIRA (2002), “a noção de sustentabilidade só se torna real
quando construída sobre uma verdadeira mudança de paradigma” que reconheça sua complexidade e seu
enfoque
pluridimensional.
Para LEFF (2000, p.123), o desenvolvimento sustentável está ligado a uma cultura ecológica, definida como
“um sistema de valores ambientais que reorienta os comportamentos individuais e coletivos, relativamente
às práticas de uso dos recursos naturais e energéticos”. Para esse autor o desenvolvimento sustentável está
ligado diretamente às práticas cotidianas das comunidades. Ele continua: “... os valores que mobilizam os
processos sociais a uma gestão ambiental do desenvolvimento, definem-se através de racionalidades
culturais que advém das formas de organização produtiva e estilos étnicos das sociedades tradicionais, povos
indígenas e comunidades camponesas” (LEFF, 2000). Com isso o autor afirma que as comunidades que
dependem dos recursos naturais são capazes de organizar suas formas de produção de maneira equilibrada e
respeitando os ciclos naturais. A condição para implantar projetos de gestão ambiental e de manejo dos
recursos naturais em escala local depende da preservação das identidades étnicas, dos valores culturais e
das práticas tradicionais de uso dos recursos (LEFF, 2000). Assim, vislumbra-se no conceito de
desenvolvimento sustentável um meio para se chegar a uma melhor eqüidade social e a um uso responsável
dos
recursos
naturais.
Partindo-se da idéia de que possa haver no futuro próximo uma mudança de paradigmas com relação à
conservação ambiental, fez-se necessário complementar a pesquisa com a discussão do uso comunal dos
territórios. Para MIRANDA (2003), “Diversas dessas comunidades que dependem diretamente dos recursos,
mantém determinadas ações conservativas dos recursos explorados, ações essas moduladas por relações
sócioculturais e econômicas, vinculadas inclusive aos saberes ecológicos comunais, indicando que as
biodiversidades e as sociodiversidades co-evoluem e co-adaptam-se.” A autora utiliza, dessa forma, os
conceitos de evolução e adaptação, consagrados na biologia, para defender a possibilidade da relação entre a
população tradicional e uso dos recursos naturais, de maneira responsável e sem perdas, fato que, em geral,
já
acontece
na
prática,
mas
que
não
é
considerado
pela
legislação
ambiental.
“O projeto de restaurar o equilíbrio perdido de um ecossistema e de assegurar a sustentabilidade futura do
seu uso, graças a medidas coercitivas de controle, não condiz com o melhor conhecimento ecológico atual ou
com o que se sabe do funcionamento dos sistemas sociais.” (RAYNAUT; ZANONI; LANA, 2002) Com base
nesses autores é possível vislumbrar a possibilidade de adaptação entre comunidades humanas e
ecossistemas, sem que haja perdas ambientais. Elas seriam, ao invés de expulsas de seus locais de origem,
as responsáveis diretas pela conservação dos recursos naturais, mantendo assim a estreita relação que têm
com
o
ambiente.
Basicamente, dois tipos de comunidades rurais vivem na região de domínio da Serra da Prata: comunidades
tradicionais com pouca ou nenhuma inserção no mercado e forte dependência dos recursos naturais como
meio de subsistência e; comunidades rurais inseridas no mercado, que utilizam os recursos naturais como
complementação alimentar. O primeiro oferece pressão sobre recursos naturais através do extrativismo e da
caça. Serão mais afetados pela legislação restritiva. O segundo, inserido de alguma forma no mercado,
oferece mais pressão sobre os recursos abióticos, como o solo e água, já que para atender o mercado é
preciso uma área considerável de cultivos. Levando-se em conta que os cultivos nos sopés da Serra da Prata
são em geral de banana e mandioca, pode-se considerar esse tipo de ocupação como de maior potencial de
riscos ao ambiente, visto que essas culturas são degradantes do solo e contaminadoras da água.
Palavras-chave: Recursos Naturais, Unidades de Conservação, Comunidades Tradicionais.
AO287 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Mudanças no Sistema de
Paisagens
[1718] SUSTEN TABI LI D AD E AM BI EN TAL: UM ESTUD O D E PERCEPÇÃO N O EN TORN O D A RPPN D O
CARAÇA/MG.
MARGARETH ALVES CARVALHO; JOSÉ FLÁVIO MORAIS CASTRO.
PUC MINAS, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
O tratamento das questões socioambientais na perspectiva da construção das sociedades sustentáveis coloca
a participação comunitária como condição para assegurar legitimidade, representatividade e sucesso nos
objetivos das ações e o estabelecimento de parcerias, sempre que necessário, como instrumento para
viabilizá-las.
No estado de Minas Gerais ente os municípios de Santa Bárbara e Catas Altas existe uma Reserva Particular
do Patrimônio Natural (RPPN) que pretende coincidir a conservação com a sustentabilidade ambiental. Tratase da RPPN do Caraça. Uma área de proteção ambiental, pólo religioso, econômico, educacional e cultural
local.
O Santuário do Caraça, atual Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN do Caraça) foi fundado em
1774. A RPPN do Caraça está localizada nos municípios de Catas Altas/Santa Bárbara, Minas Gerais, distando
120 km de Belo Horizonte. O relevo, com altitudes variando de 800 a 2.050 metros, abriga nascentes com
cachoeiras de enorme valor cênico. A RPPN do Caraça/MG Localiza-se nas coordenadas de 20°05’S e
43°28’W, Possui cerca de 11.233 hectares, onde 10.187,89 ha são área de preservação. Os restantes
1.045,11 ha são área de manejo (Plano de Ação da PBCN para o Caraça – 2003/2006)
No entorno da RPPN do Caraça existem duas comunidades: Santana do Morro e Sumidouro. Nestas
comunidades, foram observados fortes traços coloniais, de subserviência, de baixa auto-estima e uma
ausência de planejamento e autoliderança que aliados a uma cultura de desenvolvimento social excludente e
degradador, se tornam fortes entraves à participação e às parcerias. Este é o quadro cultural observado
neste trabalho. A motivação científica é marcada pela idéia de defesa da diversidade cultural como elemento
intrínseco
em
processos
de
conservação
ambiental.
Objetivos
do
trabalho
O objetivo foi o de identificar a realidade socioeconômica e cultural e as percepções ambientais das
comunidades do entorno da RPPN do Caraça, por meio da geração de um banco de dados digital, oferecendo
subsídios metodológicos para a gestão participativa no processo de conservação da região.
Para
atingi-lo
procedemos
as
seguintes
etapas:
1 Identificação do perfil econômico, social e cultural dos moradores das comunidades do entorno;
2 Caracterização das condições de infra-estrutura e dos equipamentos coletivos existentes nas comunidades,
bem
como
a
avaliação
que
os
moradores
fazem
destes
equipamentos;
3 Levantamento dos principais problemas e demandas locais que os moradores apresentavam;
4 Identificação e análise das percepções que os moradores apresentavam em relação à RPPN do Caraça;
5 Identificação e análise dos principais problemas ambientais percebidos pelos moradores do entorno.
Referencial
teórico
e
conceitual
O conceito de desenvolvimento sustentável surgiu da Estratégia Mundial para a Conservação (World
Conservation Strategy) lançada pela União Mundial para a Conservação (IUCN, 1991) e pelo Fundo Mundial
para a Conservação (WWF, 1991), Apoiados pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(PNUMA, 1991). A Estratégia Mundial propunha uma harmonização entre o desenvolvimento socioeconômico
com a conservação do meio ambiente, com ênfase na preservação dos ecossistemas naturais e na
diversidade genética, para a utilização dos recursos naturais. Sendo assim, o conceito foi definido como “um
processo que permite satisfazer as necessidades da população atual sem comprometer a capacidade de
atender as gerações futuras” (CMMAD, 1988 - Relatório Nosso Futuro Comum, também conhecido como
Informe
Bruntland).
Os novos rumos para a conservação são marcados por uma mudança de postura diante do conhecimento e
práticas das comunidades locais. A valorização dos saberes de caiçaras, camponeses, índios, passa por uma
revisão da própria comunidade científica em relação à imagem da ciência como a única que detém o poder de
indicar os caminhos da conservação. Além disso, os cientistas de diversas áreas do conhecimento, como
mostra os trabalhos de Diegues e Arruda (2001), estão buscando construir um novo cenário teórico e
metodológico que possa compreender as comunidades locais o mais próximo possível da lógica delas. Para
essas comunidades a natureza é o lugar onde vivem, herdado dos antepassados e sujeito a transformações
decorrentes de ações humanas e sobrenaturais. Esta visão não carrega a dualidade cultura-natureza que
influenciou
várias
linhas
de
pensamento
conservacionistas.
Metodologia
utilizada
Foi realizada uma coleta de dados através de uma pesquisa descritiva que gerou um banco de dados
georreferenciados. Esta coleta foi realizada por domicílio, por meio de entrevistas. Ao todo foram
entrevistados vinte e nove (29) dos trinta e um (31) domicílios de Santana do Morro. Em Sumidouro um total
de setenta (70) domicílios de moradores e oito (8) de moradores de fins de semana.
De posse dos dados foi aplicado um estudo de percepção ambiental e a geração de mapas temáticos. Os
mapas temáticos foram construídos com base na semiologia gráfica (Bertin, 1967). A cartografia temática,
seguindo o método da representação qualitativa, foi escolhida para registrar e tratar os dados obtidos no
trabalho
de
campo.
Principais
questões/pontos
desenvolvidos
Elaboração de um estudo de percepção ambiental e de mapas temáticos em duas comunidades do entorno da
RPPN
do
Caraça/MG.
Conclusões
As pesquisas sobre percepção ambiental são fundamentais para identificar o uso do espaço, questões sociais
e aspectos ambientais, subsidiando assim os programas de educação ambiental, o planejamento e a
implementação de unidades de conservação, gestão governamental de áreas protegidas e de seu entorno.
Nesta pesquisa, constatou-se que entre os moradores do entorno da RPPN do Caraça, 72% dos entrevistados
em Santana do Morro e 64% em Sumidouro, associam os danos ambientais às atividades econômicas
existentes na região. Assim a mineração e as indústrias são responsabilizadas pela poluição dos rios, do ar,
desmatamento
e
plantas
doentes.
Também a atividade dos turistas que procuram a região para visitar o Caraça é considerada por alguns dos
entrevistados como fonte de poluição, pois os resíduos produzidos são deixados nas matas, rios e estradas.
Embora ainda incipiente, o turismo no município tende a aumentar bastante devido à proximidade com a
Estrada
Real.
No estudo das comunidades de Santana do Morro e Sumidouro a cartografia temática aliou recursos de
computação com Semiologia Gráfica. Nestas comunidades a falta de informações é uma realidade e a
expansão do turismo e de atividades mineradoras exige uma metodologia ágil e eficaz, que realize o
diagnóstico correto da área, fornecendo bases para elaboração de propostas de intervenção conjuntas entre
poder público, privado e a comunidade.
AO288 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Mudanças no Sistema de
Paisagens
[1840] EXPLORAÇÃO DAS AREIAS FLUVIAIS VERSUS PRODUÇÃO DE AREIAS DE BRITAGEM.
ELIZA BELÉM TRATZ.
UFSC, FLORIANOPOLIS, SC, BRASIL.
Resumo:
A exploração de areias fluviais traz conseqüências sérias ao meio ambiente, como a erosão das margens do
canal, intensa movimentação de solo em virtude da lavra, emissão de ruídos pelas dragas, além do que,
rejeitos são lançados à margem do canal, o que faz com que a vegetação natural das margens seja soterrada
desestabilizando assim, a flora e a fauna e, favorecimento o aparecimento de processos erosivos (ARAÚJO E
MACIEL, 1999).Por esse motivo, autoridades como o Instituto brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA), e
Instituto Ambiental do Paraná (IAP) vem coibindo cada vez mais, e de maneira mais severa a atividade em
todo o Estado do Paraná, em vista, dos problemas ambientais que a atividade gera e risco de esgotamento
do
recurso.
Neste panorama de conflitos, entre mineradores de areia fluvial e órgãos de proteção ambiental surgem as
areias de britagem, conhecidas também, como areias artificiais, devido ao processo do beneficiamento da
rocha quais, são produzidas em pedreiras, em muitos casos, confeccionadas a partir de rejeitos sólidos como
alguns tipos de brita que não possuem valor comercial, o que faz com que haja a redução de certos impactos
ambientais
no
local
de
produção.
Entretanto, as areias provenientes do processo de britagem diferem-se das areias naturais, tanto nos
aspectos granulométricos quanto morfoscópicos. Tais diferenças devem-se ao fato das areias fluviais serem
resultantes da destruição erosiva de qualquer tipo de rocha (LEINZ e AMARAL, 2001 p.55). Enquanto que, as
areias de britagem, têm sua origem no processo de trituração do basalto em um britador que, por meio da
abrasão reduz as partículas de rocha até 3,8mm o que pela Associação Brasileira de Normas Técnicas já é
considerado
areia
de
britagem
(TRATZ,
2006).
Pautado nessa discussão, o presente trabalho consiste no estudo comparativo das propriedades físicas das
areias de britagem e fluviais comercializadas no município de Guarapuava-PR, bem como na análise dos
impactos ambientais e econômicos provocados pela atividade. Deste modo, o trabalho objetivou:
1)caracterizar o processo de britagem a partir dos litotipos encontrados na região; 2) efetuar levantamento
de custo e destinação das areias de britagem no município de Guarapuava-PR; 3) Reconhecer as
propriedades morfoscópicas e granulométricas das areias fluviais e de britagem comercializadas no
município; 4) Avaliar sobre esses aspectos e outros referentes aos impactos ambientais a viabilidade da
produção dessas areias em Guarapuava-PR. Para tanto, adotaram-se os seguintes procedimentos
metodológicos:
METODOLOGIA.
Consistiu em levantamento bibliográfico, seguido de trabalhos de campo no local de produção das areias de
britagem e, estabelecimentos comerciais de Guarapuava. Após a coleta de dados, foram efetuadas as
análises granulométricas e morfoscópicas Sendo que, para as análises morfoscópicas adotou-se a
metodologia de Krumbein (1941 apud SUGUIO, 1973) e, para as análises granulométricas a metodologia
proposta
pela
EMBRAPA
(1979).
Granulometria: foram realizads 11 análises, sendo seis de areias fluviais e cinco de areias de britagem.
Seguindo
o
seguinte
procedimento:
Secagem: as amostras foram levadas à estufa por 24 hora para secagem a 65º C. Após a secagem do
material, foi realizada a moagem em gral de porcelana, com a ajuda de um pistilo.
Peneiramento: Depois de secas as amostras foram pesadas e dispostas sobre peneiras com a seguinte escala
granulométrica, de <0,175 a >4mm. A separação da areia muito fina das demais classes granulométrica foi
obtida
através
de
via
úmida,
obedecendo
a
Lei
de
Stocks.
Pipetagem: a amostra resultante foi acondicionada em uma proveta de 1000ml, para a coleta da fração silte
e argila. O material contido na pipeta foi agitado por cerca de um minuto e depois coletado em tempos prédeterminados e com controle de temperatura a 21º C. O material coletado com a pipetagem foi colocado em
um Beckers de 50ml, e levados para a estufa, onde permaneceu sob uma temperatura de 20ºC até que se
completasse
a
secagem.
Morfoscopia: consistiu, na comparação visual dos constituintes granulométricos, com base na tabela de
arredondamento
de
esfericidade
de
grãos
em
Microscópio
petrográfico.
RESULTADOS
As análises granulométricas e morfológicas dos materiais revelaram que existe uma diferenciação entre as
areias fluviais e de britagem. As areias de britagem caracterizam-se por serem mais angulosas que as areias
fluviais, distribuídos estes nos graus 4 e 5 de arredondamento da tabela visual de Krumbein apud SUGUIO
(1973), enquanto que as areias fluviais têm seu grau de arredondamento nos graus 5, 6 e, 7 não sendo raros
grãos
nos
graus
8
e
9,
o
que
não
ocorre
com
as
areias
de
britagem.
Em relação a granulometria, as areias de britagem diferem-se das areias fluviais da seguinte forma: os grãos
são menos selecionados que as areias fluviais e não contém seixos, enquanto que, as areias de britagem são
constituídas predominantemente por grânulos, areias muito grossas e areias grossas, sendo estas melhores
selecionadas
e
constituídas
predominantemente
por
areias
médias.
Sob a perspectiva ambiental, as areias de britagem quando comparadas às areias fluviais geram menos
impactos ao meio físico, em vista, destas serem subprodutos das britas e produzidas em uma empresa que
apresenta Licenciamento Ambiental, diferente da maioria das empresas de extração de areia fluvial que
atuam no Paraná e praticam a exploração predatória. Mas, em contrapartida, durante o processo de
produção, as areias saem do britador contendo uma quantidade de 20% de filler, bem a mais os limites
impostos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que é de 7% em média. Por isso, as areias
precisam passar por um processo de decantação para a separação do material fino da areia de britagem. A
sobra desse material quando molhado torna-se rejeito.
AO289 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Mudanças no Sistema de
Paisagens
[1899] CARTOGRAFIA DA DESERTIFICAÇÃO NO CARIRI PARAIBANO.
BARTOLOMEU ISRAEL SOUZA; EDUARDO RODRIGUES VIANA LIMA.
UFPB, RIO TINTO, PB, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho teve como objetivo efetuar o mapeamento da desertificação no Cariri paraibano. Conforme a
CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DESERTIFICAÇÃO (1995), esse tipo de degradação da terra nas
zonas secas resulta de fatores diversos que vão das variações climáticas às atividades humanas, atingindo os
solos, os recursos hídricos, a biodiversidade e a qualidade de vida da população.
Quanto ao Cariri paraibano, essa região encontra-se localizada no centro-sul do Estado da Paraíba, a uma
distância que varia de 180 a pouco mais de 300km de João Pessoa (capital), perfazendo um vasto território
composto por 29 municípios distribuídos numa área de 11.689km² (20% do Estado em questão). Os
elementos comuns de sua paisagem são os baixos índices pluviométricos, a caatinga hiperxerófila, as
limitações edáficas (solos rasos e, em muitos casos, com altos teores de salinidade), cidades pequenas e
baixa densidade demográfica.
Em relação a existência da desertificação nessa região, esta é condicionada pelo clima semi-árido que, em
determinados setores, conforme observações de Ab’Sáber (1974), poderia mesmo ser classificado como árido
moderado, dada a severidade com que este se manifesta. Se esse processo tem o clima como agente
condicionador, séculos de intervenções antrópicas que, em geral, não levaram em conta as especificidades
naturais do Cariri, foram os responsáveis pelo estabelecimento da desertificação em seu território.
Os procedimentos metodológicos realizados para efetuar o mapeamento das áreas desertificadas no Cariri
foram fundamentados na identificação dos tipos de caatingas encontrados na região e os níveis de
antropismo existentes, tomando por base a análise de imagens de satélite. Para isso, foram utilizadas
técnicas de Contraste (Logaritmo e Raiz Quadrada), com o objetivo de melhorar a qualidade visual e separar
melhor os alvos observados nas imagens, e o método de classificação Não Supervisionado, onde cada pixel
encontrado é automaticamente organizado em grupos previamente definidos, adotando o algoritmo de
processamento de imagens K-médias (Venturieri & Santos, 1998).
As imagens de satélite (em número de quatro) analisadas foram as do CBERS, do período de 13/08/2005 e
20/07/2006. As bandas utilizadas foram as de número 2, 3 e 4, enquanto o tratamento do conjunto de
informações espaciais foi realizado através do software Spring 4.2.
Paralela a essa fase, foram efetuados diversos trabalhos de campo que nos auxiliaram na identificação das
informações obtidas em laboratório e também na definição de cinco classes temáticas: Água, Áreas Não
Desertificadas, Áreas com Baixo Nível de Desertificação, Áreas com Médio Nível de Desertificação e Áreas
com Alto Nível de Desertificação.
Das áreas consideradas Não Desertificadas para aquelas classificadas com Alto Nível de Desertificação, ocorre
uma diminuição progressiva da cobertura do solo, dos estratos em que a vegetação se apresenta (arbóreo,
arbustivo e herbáceo) e da variedade de espécies da caatinga. Ao mesmo tempo, a pecuária, o
desmatamento, as manchas de solo exposto e os processos erosivos caracterizaram-se pelo constante
aumento.
Em termos quantitativos, os resultados obtidos podem ser vistos na tabela abaixo:
Tabela 01- Área ocupada
pelos corpos d\'água e pelos
níveis de desertificação no
Cariri.
CLASSES
TEMÁTICAS
ÁREA
OCUPADA
(km/%)
Água
105,31/0,9
Área
Não
2.450,43/21,9
Desertificada
Área
com
Baixo
Nível
3.126,43/27,9
de
Desertificação
Área
com
Médio
Nível
2.767,94/24,7
de
Desertificação
Área
com 2.741,90/24,5
Alto Nível de
Desertificação
Pelos números expostos, observa-se que em somente 21,9 da região estudada a desertificação estaria
ausente. Essas áreas ocupam algumas serras de mais difícil acesso, manchas esparsas nos vales de rios e
trechos de solos mais profundos pouco afetados por atividades econômicas, onde a vegetação está melhor
preservada. Fazendo parte dessa classificação, também incluímos as áreas onde se pratica a agricultura de
vazante, dominada por culturas de subsistência onde, apesar do seu uso secular, os solos ainda permanecem
produtivos.
Em relação as áreas desertificadas, estas representam 77,1% do Cariri, sendo que destes, 24,5% referem-se
ao nível mais alto desse tipo de degradação. Quanto a localização dessas áreas percebe-se que, como regra,
as mesmas se concentram no entorno dos maiores rios da região (Paraíba e Taperoá) e dos seus afluentes
mais importantes onde, desde o início da colonização, houve um processo de ocupação mais intenso, o que
acarretou um consumo maior da vegetação nativa.
Estabelecendo-se uma diferenciação de padrões de uso da vegetação nessas áreas e a sua conseqüente
degradação, levando-se em conta a maior e menor proximidade das habitações, temos, no primeiro caso, o
seu consumo direta e indiretamente intensificado pela população através da coleta de lenha, produção de
carvão vegetal e limpeza dos terrenos para evitar a presença de animais peçonhentos.
No segundo caso, particularmente nas propriedades rurais, apesar de ocorrerem as mesmas situações
anteriores, a degradação da vegetação está mais relacionada ao seu extrativismo para a construção de
cercas (renovadas, em média, de 6 a 8 anos) e principalmente à pecuária extensiva, onde ocorreu ou ocorre
superpastejo, em áreas anteriormente desmatadas e ocupadas por lavouras de algodão, e naquelas em que a
estrutura geo-ecológica é naturalmente mais frágil (Ab’Sáber, 1977).
Questões relacionadas a estrutura fundiária dominante também tem contribuído fortemente para o
surgimento de novas áreas degradadas, além da manutenção e intensificação daquelas que existem a mais
tempo, uma vez que o grande número de pequenas propriedades, associadas ao baixo nível de informação,
capital e tecnologia utilizada nas atividades produtivas da região, tornam difícil a adoção de medidas que
evitem a ocorrência e a expansão da desertificação.
AO290 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Mudanças no Sistema de
Paisagens
[1457] PAI SAGEM E I D EN TI D AD E URBAN A: CON STRUÇÃO E D ESCON STRUÇÃO. UM A POSSÍ VEL
RECONSTRUÇÃO?
VANESSA MOURA DE LACERDA TEIXEIRA.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
O primeiro objetivo deste trabalho será traçar um panorama geral dos resultados da dissertação de mestrado
defendida no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense. O projeto
realizado na dissertação de mestrado teve como tema central a lagoa Araruama e a memória e a identidade
urbana da cidade de Araruama, situada na Região dos Lagos do Estado do Rio de Janeiro. Essa crise
ambiental provocada pelos incentivos econômicos no que tange à implementação de infra-estruturas
urbanas, desencadeou na poluição da lagoa e, em conseqüência disto, houve uma ruptura com a história da
cidade
de
Araruama
e
a
desconstrução
identitária
deste
passado.
O segundo objetivo será escolher uma representação espacial mais expressiva, dentre aquelas trabalhadas,
por sua condição intrínseca na construção e desconstrução da paisagem, para se propor linhas de
planejamento urbano e ambiental para a região. A representação escolhida são as salinas de Praia Seca, 3°
Distrito do município de Araruama. Ela se apresenta como contraponto do desenvolvimento urbano na
medida em que é polarizadora e desagregadora dos aspectos sociais, ambientais, culturais e econômicos da
região. Partícipe da paisagem urbana, hoje bastante alterada em função das novas práticas espaciais, as
salinas vêm alcançando um grau de degradação que põe em evidência o futuro que está sendo construído.
Por este motivo, esta representação foi dentre as demais já estudadas, escolhida para compor este trabalho,
numa lógica que compreende não só ela própria, como também aquela a qual está vinculada, a lagoa.
O referencial teórico e conceitual estabelecido segue as linhas de Lefebvre (1994) em seu livro “A Produção
do Espaço”, onde ele considera a história das práticas espaciais um artifício para a concepção das
transformações sociais no espaço e no tempo. O autor aborda três dimensões: as práticas espaciais, as
representações de espaço e os espaços de representação. É em torno da dialética entre elas que se tem uma
apreensão mais apurada das mudanças que se refletem no espaço ao longo da história. Aqui essas três
dimensões serão estruturadas a fim de se estabelecerem as relações entre elas e a cidade ao longo do
tempo,
no
que
tange
às
áreas
salineiras
de
Araruama.
Todo esse aparato teórico e conceitual em torno de um objeto empírico auxiliou na visão acerca dos
problemas existentes na cidade, principalmente nas mudanças desencadeadas no decorrer de três períodos
importantes do processo de produção urbana. E assim, deste processo, urge a necessidade de construção de
uma nova racionalidade em cima de um elemento de vital importância na cidade: a lagoa. Neste contexto,
será tratada a questão ambiental dentro desse quadro urbano o qual a cidade de Araruama esteve
condicionada, de maneira que sejam analisadas algumas idéias de Enrique Leff (2004) e Antonio Carlos
Robert Moraes (2005). São autores que trabalham com a temática ambiental e revelam sobremaneira a visão
interdisciplinar
do
meio
ambiente.
A metodologia utilizada se estruturará em cima de fotos, mapas de três períodos característicos da história
da cidade e entrevistas com os moradores e visitantes de diferentes faixas etárias para se visualizar as
mudanças então ocorridas. Estarão presentes os resultados do trabalho de campo com a descrição dos
pontos observados durante as entrevistas e a interpretação dos questionários. Neste trabalho a idéia será
apresentar os principais eixos norteadores da metodologia utilizada na dissertação e propor uma metodologia
acerca das áreas de salinas na região a fim de se sugerir uma linha de planejamento urbano e ambiental.
A lagoa Araruama permeou o desenvolvimento da cidade em vários momentos de seu crescimento, tendo
estado, portanto, vinculada à dinâmica urbana e sua relação com a identidade e às representações espaciais
por ela construídas e desconstruídas. E, por isto, a escolha das áreas de salinas para a elaboração de um
planejamento urbano e ambiental da região, pois essas áreas foram o tempo todo partícipes das
transformações então processadas. Assim, será realizado um pequeno mapeamento das áreas salineiras a
fim de serem identificadas as zonas mais propensas à expansão da cidade. Este mapeamento subsidiará uma
futura possibilidade de planejamento urbano e ambiental a fim de se preservar as salinas que ainda se
encontram
em
funcionamento
e
recuperar
aquelas
desativadas.
As principais questões colocadas se imbuem de um caráter extremamente estruturador desse trabalho:
haveria uma possibilidade de reconstrução da paisagem e da identidade urbana nesse intenso processo de
construção e desconstrução? Essa questão nos remete à exigência de se criar novas condutas de
planejamento em cima desse elemento dito natural e que influencia na constituição de toda a paisagem e
outros elementos os quais ele vincula. A lagoa é influenciada também pelos intensos processos de ocupação
da região e, da mesma forma em que altera a paisagem, também é alterada por ela.
Dentro dessa racionalidade ambiental em que os antigos hábitos da região se desmaterializam no espaço
para dar lugar a construções sociais imediatas, sem a proposta de um plano racional idealizado com base nas
relações culturais entre os homens e o meio ambiente, entre o meio ambiente e a cidade, há que se repensar
as práticas de planejamento e manejo da paisagem em ambientes urbanos. Neste contexto, se inserem as
possibilidades de reconstrução da paisagem a partir de um elemento natural, visto aqui como o grande
impulsionador das potencialidades da região. A lagoa gerou outras representações a ela vinculadas, as quais
se
alteraram
ao
longo
do
tempo,
no
espaço
e
na
paisagem.
Deste modo, as salinas da região serão tratadas não como objeto principal do trabalho e, sim, como um
resultado das discussões levantadas no projeto de dissertação. Além de estarem diretamente associadas à
lagoa Araruama, se revestem de um caráter social, ambiental, cultural e econômico na região extremamente
importante
para
o
seu
desenvolvimento.
Os resultados adquiridos neste projeto de pesquisa concluem que a paisagem e a identidade urbana estão
intrinsecamente relacionadas e, no caso do objeto de estudo em pauta, tem-se a presença de um elemento
natural que delineia o processo de construção e desconstrução dessa identidade. Visto que a cidade não é
estática e está em constante mudança, é dinâmica e, portanto, instável, há o tempo todo que se pensar na
dialética entre construção, desconstrução e principalmente, reconstrução. Reconstrução sim, para que a
memória da cidade se restabeleça, seja materializada no espaço, seja materializada nos livros, documentos,
etc. Reconstrução para fortalecer os elos com o passado, presente e futuro, num respeito à identidade, à
paisagem, à memória e ao meio ambiente.
AO303 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1173] EXPAN SÃO URBAN A EM CI D AD ES M ÉD I AS: UM A REFLEXÃO A PARTI R D O N ÚCLEO E D A
ÁREA CENTRAL DE MONTES CLAROS NO NORTE DE MINAS GERAIS.
IARA SOARES DE FRANÇA1; BEATRIZ RIBEIRO SOARES2.
1.UNIMONTES, MONTES CLAROS, MG, BRASIL; 2.UFU, UBERLÂNDIA, MG, BRASIL.
Resumo:
O presente trabalho busca compreender a importância econômica desses espaços no interior da cidade e sua
relação com a expansão urbana. Para isso, discute-se a posição de Montes Claros enquanto cidade média
dialogando com as definições de núcleo central, área central e suas inter-relações. Analisou-se a expansão
urbana dessa cidade mediante os processos de centralização e descentralização econômica, bem como, a
funcionalidade do núcleo central. A expansão urbana de Montes Claros teve como palco seu núcleo central.
Esse espaço desempenha uma forte função comercial aqui demonstrada por meio de levantamentos de
atividades econômicas e confecção de mapas de uso e ocupação de solo, tabelas e gráficos. O material
fotográfico produzido ilustrou o núcleo e área central de Montes Claros, a partir de sua função comercial,
notadamente. Realizou-se, também, revisão e análise da literatura existente referente às temáticas: cidades
médias, núcleo central, áreas centrais, expansão urbana e descentralização econômica com o objetivo de
delinear caminhos ou aportes teóricos para elucidações e diálogos no processo de construção do trabalho. No
âmbito do núcleo central realizou-se uma breve análise de um dos projetos da prefeitura municipal;
intitulado Vivo Centro; que visa sua revitalização, bem como as Leis do Plano Diretor e Uso e Ocupação do
Solo de Montes Claros. Do ponto de vista do nível hierárquico das cidades, uma cidade média é aquela que se
localiza entre a grande cidade e as pequenas cidades, tendo dessa forma, uma posição intermediária.
Amorim (2001) alerta que a posição que as cidades médias ocupam no interior de um país não é fechada ou
está pronta e inacabada, visto que uma cidade média não é média, ela está média em uma determinada
situação de um contexto específico. Há que se considerar, também, a localização espacial da cidade média,
pois, se ela está isolada em uma determinada região, esse fato pode indicar dificuldade de autonomia e de
manutenção de sua posição de cidade média. Além disso, esta cidade também pode estar sob a influência
direta ou indireta de uma metrópole nacional, metrópole regional, de uma capital estadual ou se posicionar
próxima a uma importante cidade, o que, provavelmente, confere-lhe maiores possibilidades de
desenvolvimento e crescimento. Todos esses fatores tornam cada cidade média singular no espaço e no
tempo
em
que
se
localizam.
(SOARES,
2001).
Para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE –, a cidade média é aquela que possui população
entre 100.000 e 500.000 habitantes. Quando se considera como critério de classificação o tamanho
demográfico, ou seja, cidade com população entre 100.000 e 500.00 habitantes, Montes Claros é uma cidade
média, haja vista o fato de possuir 342.586 mil habitantes (IBGE, 2000). Isso já havia sido mostrado por
Andrade e Lodder em seus estudos na década de 1970. Nessa mesma década, a cidade foi incluída no
Programa Cidades de Porte Médio, parte integrante da política pública definida pelo II Plano Nacional de
Desenvolvimento (PND). Ao estudar as cidades mineiras com mais de 100 mil habitantes, Amorim Filho,
Bueno e Abreu (1982) consideraram Montes Claros como uma cidade média de nível superior, uma
verdadeira “capital regional”. O estudo do IPEA/IBGE/UNICAMP (1999) classificou a cidade de Montes Claros
como um centro regional 2. Estudos mais recentes, como o de Pereira e Lemos (2004), também identificam
essa cidade como média, tendo por base a sua capacidade de polarização intra-regional. Montes Claros/MG
constitui uma realidade singular no tocante a essa discussão, sobretudo, em função de como se deu seu
processo de desenvolvimento e expansão urbana, de modo que passou a assumir uma posição de
centralidade intra e inter-urbana, consolidando-se como o núcleo urbano mais expressivo da região em que
se insere, o norte de Minas Gerais. Sendo assim, analisar sua função de centralidade intra-urbana frente ao
período técnico científico informacional e sua potencialidade econômica torna-se fundamental. Em relação à
economia o setor terciário é o que mais gera emprego no município. Dentre as atividades que movimentam
esse setor, destacam-se o comércio, a educação, as telecomunicações, a informática e o transporte. Esse
setor apresenta-se bastante complexo, dinâmico e diversificado correspondendo a aproximadamente 53% do
PIB
total
de
Montes
Claros.
(Fundação
João
Pinheiro,
2006).
A área central é um importante espaço das cidades que concentra atividades econômicas, serviços e fluxo
diversos – pedestres, veículos, consumidores, além de ser uma área de grande acessibilidade e infraestrutura urbana. Spósito (2001, p.235) utiliza a expressão “área central” para designar os diferentes setores
urbanos nos quais se observa a concentração de atividades comerciais e de serviços, tais como o núcleo
principal, os eixos de desdobramento das atividades nele desenvolvidas, os subcentros de comércio, os
shoppings centers, as vias especializadas, entre outras. As cidades médias crescem e se expandem
obedecendo a uma dinâmica intensa de trocas e fluxos de mercadorias, capitais, usos. Nesse sentido,
transformam-se espaços, deslocam ou expandem atividades e acarretam novas centralidades. Em Montes
Claros, o crescimento da cidade, resultante do aumento demográfico e da expansão do tecido urbano, tem
ocasionado seu alargamento com a abertura de novos bairros e loteamentos para áreas periféricas. Nessas
circunstâncias, a área central da cidade vai perdendo seu caráter residencial e passa a assumir
demasiadamente diversos tipos funções relacionadas à prestação de serviços e comércio. Todavia, a
emergência de novas formas comerciais ou centralidades urbanas como os subcentros de comércio e
serviços, shopping-centers e vias especializadas, paralelamente à pujança e à representatividade comercial
do núcleo e área central têm marcado a dimensão econômica de Montes Claros no Norte de Minas Gerais.
AO304 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ordenamento Urbano e Gestão Territorial
[1181] O PROCESSO D E REPROD UÇÃO D O ESPAÇO URBAN O D A ZON A SUL D E N ATAL/ RN A PARTI S
DA INFLUÊNCIA DOS SHOPPING- CENTERS.
GERSON GOMES NASCIMENTO.
UFRN, NATAL, RN, BRASIL.
Resumo:
Eixo
Temático
Apresentação
III
oral
–
Brasil:
em
espaço,
identidades
grupos
de
e
projetos
trabalhos
de
nação
(Gts)
RESUMO
Título: O processo de reprodução do espaço urbano na Zona Sul de Natal/RN a partir da influência dos
shopping-centers
Este trabalho objetivou analisar o processo de reprodução do espaço urbano na Zona Sul de Natal-RN a partir
da influência dos shopping-centers. Nesse contexto, a importância desse estudo se deve pela primazia
estudada no que se refere à dinâmica socioespacial e comercial que esses empreendimentos deram e dão à
cidade, notadamente na Zona Sul a partir dos anos de 1990, período em que surgem com mais intensidade,
ainda que outros de menor porte já se fizessem presentes na sua paisagem urbana desde os anos 80. Com
os problemas atuais constatados nas áreas de comércio mais tradicional da cidade (os bairros da Ribeira e
Cidade Alta) tais como: deseconomias de aglomeração, insegurança, desconforto, trânsito caótico entre
outros, esses empreendimentos representam um elemento importante na reprodução urbana, principalmente
na área em questão, bem como na concentração de atividades comerciais e de serviços num único local, na
qual as possibilidades de compras, lazer e entretenimento se dão de forma “aparentemente” tranqüilas,
seguras e cômodas quando comparada a outros comércios, pois foram minuciosamente planejados para esse
fim. Contudo, longe de promoverem uma sociabilidade na sociedade, tais empreendimentos são sinônimos de
segregação socioespacial, pois, à medida que provocaram uma valorização nas áreas próximas onde se
instalaram, a maneira como se inseriram no espaço urbano natalense não ultrapassou a contradição do modo
de produção capitalista, ao contrário, reforçou-as na medida em que produziram novas formas de espaços
que nem todos na sociedade pode freqüentar, representando de forma clara um espaço de segregação
socioespacial. Na consolidação dessa pesquisa, aprofundamos nosso conhecimento sobre os conceitos
teóricos de produção e reprodução do espaço baseado em diversos autores referentes à temática abordada,
bem como análises de leituras e fichamentos de trabalhos teóricos sobre shopping-centers. No que se refere
à metodologia que deu suporte a pesquisa teórica, utilizamos dados secundários em órgãos públicos e
privados como: Semurb, Caern, Cosern, Urbana, IBGE entre outros, representantes da sociedade civil como
forma de levantamento de dados e informações importantes na nossa análise, foram utilizados, ainda, dados
primários com entrevistas formais e estruturadas gravadas com membros de diversos seguimentos da
sociedade como: profissionais vinculados a órgãos públicos e privados, agentes sociais produtores e
consumidores de espaço, profissionais autônomos e a própria sociedade civil. Complementando a pesquisa,
realizamos entrevistas formais que constavam de um questionário semi-aberto, dividido em duas partes e
composta com questões abertas e fechadas. Como resultado, observamos que está ocorrendo um processo
de descentralização comercial e de serviços para áreas mais atrativas da cidade, notadamente para a Zona
Sul, principalmente após a implementação dos shoppings; as áreas circunvizinhas a esses empreendimentos
sofreram uma valorização imediata no que se refere à valorização do solo urbano; esses espaços já fazem
parte da rotina do natalense e se consolidaram como centros de entretenimento para as pessoas de melhor
poder aquisitivo se constituindo numa opção a mais; houve uma mudança de hábitos e costumes no que se
refere às compras e lazer na cidade; esses empreendimentos não são os únicos elementos responsáveis pela
crescente valorização e reprodução urbana nessa área, mas constituem um dos principais influenciadores
desse processo; o número de estabelecimentos comerciais e de serviços próximos a estes estabelecimentos
cresceu velozmente; estes, constituem elementos de segregação socioespacial na medida em que nem todos
podem
freqüentá-los.
Palavras-chaves: Reprodução do Espaço – Shopping- centers - Descentralização Comercial - Zona Sul –
Segregação Socioespacial
AO305 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1203] SHOPPING CENTER: ENTRE O LUGAR E O NÃO- LUGAR.
FLAVIO SAMPAIO BARTOLY.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
A tentativa de padronizar determinados setores da vida em sociedade nas mais diferentes áreas do planeta
advém da necessidade de otimizar a circulação dos fluxos de capital, os quais são facilitados quando há uma
rede conectada e “formatada” por determinados parâmetros gerais. Assim, a cultura, os gostos, a relação
com o outro e a representatividade de estar em certos espaços são moldados a partir de uma mesma lógica,
a qual deve ser “injetada” de modo eficiente em diversos países. Mais especificamente, a própria arrumação
do espaço passa a ser modificada dramaticamente a fim de atender às necessidades e imposições globais.
Verifica-se assim, que a organização do capitalismo em uma rede global, tem a cidade como um de seus
principais
nós
que
amplia
e
ordena
a
relação
entre
a
produção
e
o
consumo.
Um bom exemplo dessa atuação de planificação da cidade em prol de eficiência para a rotação do capital
pode ser ilustrado pelo comércio que movimenta a cidade. Dentre as diversas maneiras de se apresentar e
vender mercadorias, pode-se afirmar que a maior expressão em termos de adequação aos “parâmetros” é o
shopping center. Este equipamento urbano tornou-se uma solução para vários “problemas”, sendo aclamado
pela
grande
maioria
dos
personagens
do
varejo,
inclusive
pelos
consumidores.
Seja para atender aos moradores motorizados e abastados dos subúrbios americanos, em sua origem em fins
da década de 1940, ou para satisfazer aos anseios da elite paulistana na década de 1960, ou até para servir
de refúgio à violência urbana do Rio ou ao frio de Edmonton, o shopping reúne diversos tipos de mercadorias
que estavam dispersas pela cidade, com o “conforto” do descolamento, ainda que parcial com a distância do
centro
(“original”),
com
os
efeitos
do
clima
ou
com
a
própria
realidade
social.
Na década de 40, nos EUA e nos anos 60, no Brasil, a afirmativa de que os shoppings eram pouco
representativos para o cotidiano e que a relação que o público mantinha com esses espaços era muito
distante, provavelmente, não seria contestada. Havia muito pouco para se fazer em um shopping, até porque
as administrações ainda não compreendiam o potencial do shopping em ser mais do que um centro de
compras e com isso atrair mais (as) pessoas. A ida ao shopping era esporádica, rápida e motivada
unicamente
pela
compra.
Esta primeira inserção do shopping na cidade, caracterizando-se como um local de passagem para compras,
homogêneo e pouco comunicativo, credenciou este equipamento urbano como um possível exemplo daquilo
que alguns autores chamam de “não-lugar”; uma paisagem estandardizada, projetada sem levar em conta
fatores particulares que pudessem promover uma identificação com as pessoas que ali se encontram. Um
espaço desprovido de peculiaridades, uma paisagem amorfa, interesseira, “sem alma”, que reduz a
comunicação a placas. De acordo com nossas principais referências à cerca do não-lugar, Marc Auge e
Edward Relph, assim se estabelece um local que por sua própria inautenticidade não pode ser caracterizado
como
um
lugar.
No bojo destas questões está a revolução da mobilidade e das comunicações, a qual promoveria, por
exemplo, o fim das distâncias e das especificidades locais, culminando com o fim dos lugares, ou com a
proliferação de lugares desprovidos de identidade, está o conceito de não-lugar. Talvez possamos afirmar
que no centro desta discussão encontra-se a própria geografia, ciência na qual o lugar possui o status de
conceito-chave, e para a qual esses “novos tempos” trazem o desafio do encontro com a fluidez e a
efemeridade levadas ao extremo pelo processo de globalização. Experimentamos e observamos novos
arranjos espaciais, os quais são ao mesmo tempo causa e conseqüência das novas relações sociais que se
estabelecem.
Ainda que conservem a forma “homogeneizada” e o objetivo primordial do comércio, diversos fatores
concorreram para que, há vários anos, a inserção dos shoppings na cidade tenha se modificado
expressivamente. O shopping tornou-se, também, um espaço de sociabilidade, em que as pessoas
cotidianamente se encontram, se divertem e passeiam. Na ampla discussão sobre o conceito de
sociabilidade,
tomamos
como
principais
referências,
Norbert
Elias
e
Georg
Simmel.
As administrações dos shoppings perceberam que a incorporação de outras atividades e a criação (e/ou
expansão) de espaços de sociabilidade seria vital para a ampliação dos lucros. Assim, se agregam aos
shoppings partes importantes do cotidiano de milhões de freqüentadores, o que evidentemente traz
implicações
práticas
e
simbólicas
para
a
vida
no
espaço
urbano.
Neste sentido, o objetivo principal deste trabalho é contribuir para o entendimento do shopping center na
cidade contemporânea. Especificamente, objetivamos chegar este propósito nos lançando ao desafio de
discutir a validade de rotularmos os shoppings de hoje como não-lugares, especialmente diante do
aprofundamento da relação do shopping com os freqüentadores e com a própria cidade. Através de sua
organização espacial, a busca por uma dimensão “lugarizada” do shopping pode lançar contribuições
importantes
para
a
compreensão
de
aspectos
da
realidade
urbana
contemporânea.
Na tentativa de alcançar os objetivos propostos, foi realizado um levantamento bibliográfico sobre os
shoppings e sobre os conceitos de lugar e de não-lugar. Como campo mais próximo de estudo, no Barra
Shopping pudemos observar como a inserção da sociabilidade no empreendimento ganhou enorme
importância nos últimos 10 anos. Por outro lado, o Iguatemi, construído 15 anos depois do “Barra”, já nasceu
com a idéia de que a sociabilidade seria fundamental para o sucesso. Realizamos observações participativas,
entrevistas com freqüentadores e com as administrações dos dois shoppings. Esses procedimentos geraram
novos questionamentos e lançaram luz sobre como os shoppings são vividos e analisados sob diversos pontos
de
vista.
Com isso, entendemos que mais do que determinar a condição de “inautenticidade” de um local apenas por
sua forma, o não-lugar pode nos ajudar a compreender aspectos importantes de determinados espaços, que
por apresentarem uma clara padronização de sua forma, acabam limitando ao mínimo a diversidade de
experiências. Todavia, o não-lugar não abrange todas as perspectivas que esses espaços pretensamente
padronizados apresentam para a experiência. É imprescindível lembrar que dependendo do “papel” que
exercemos nesses espaços, podemos reconhecer distinções naquilo que a princípio seria indiferenciado, e
manter afetividade com um shopping específico. Assim, há que se ter cuidado na aplicação do conceito de
não-lugar, para que possamos ampliar a análise de ambientes planejados (que proliferam em ritmo
acelerado), e não aprisionar a reflexão em um rótulo que promove uma análise superficial.
Concluímos que a possibilidade de se pensar o shopping como um lugar traduz em grande medida processos
e vivências cada vez mais comuns em diversas sociedades urbanas mundo afora.
AO306 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1442] EN TRE O PASSAD O E O PRESEN TE: O D ESARRAN JO ESPACI AL N O CEN TRO D A CI D AD E D E
RIO CLARO- SP (PESQUISA FINANCIADA PELA FAPESP).
PRISCILA MARIA NATIVIO; SILVIA APARECIDA GUARNIERI ORTIGOZA.
UNESP/IGCE, RIO CLARO, SP, BRASIL.
Resumo:
A partir dos anos 1970, a Geografia passa por transformações, deixando de considerar somente a observação
e a descrição, voltando-se para transformações que ocorrem na realidade social. Desse modo, o espaço é
visto como base da vida social e sua organização, um reflexo da atividade econômica. De acordo com
inúmeros estudiosos do pensamento geográfico, somente os grandes detentores do poder possuem uma
visão integrada desse espaço, e em contrapartida, alienam socialmente o cidadão comum, que possui uma
visão fracionada do espaço, isto é, só tem noção do lugar onde vive sem ter uma visão abrangente do todo e
seus
problemas.
Esta pesquisa é um trabalho da área de geografia urbana, que nos últimos anos vem apresentando
diversificação teórica e metodológica para o entendimento da realidade urbana. Abarca amplas investigações,
fundamentalmente pesquisas voltadas ao consumo do e no espaço, onde o urbano é entendido como um
processo dinâmico que articula as relações sociais de produção e a reprodução do espaço.
A urbanização capitalista guarda em si um processo de concentração de homens, de produtos e de coisas nas
cidades, articulando sistemas hierarquizados, em uma verdadeira luta por territórios. É a cidade, como lugar
das transformações do cotidiano e dos dramas, que nos permite entender as relações espaço-tempo nos dias
atuais.
Assim, essa pesquisa procura avaliar a produção do espaço urbano através da valorização capitalista, ou
seja, formas distintas de consumo e valorização do espaço. Para isso, tomamos como universo de análise o
município de Rio Claro-SP, por este apresentar peculiaridades quanto ao tema em questão: com o consumo
do espaço, o espaço deixa de ser o espaço do vivido, transformando-se em mercadoria, que privatiza cada
vez mais os lugares. Focalizamos como estudo os estacionamentos (são cinco, no total) localizados no
entorno do Jardim Público, no centro da cidade de Rio Claro-SP, que é uma área de grande circulação diária
de pessoas, mercadorias e, principalmente, fluxo intenso de automóveis. Anteriormente esses
estacionamentos davam lugar a amplos casarões e palacetes, pertencentes a famílias renomadas. Um desses
exemplos é o caso de uma famosa casa noturna e restaurante, “A Toca”, relembrada até os dias de hoje por
muitos moradores da cidade, onde atualmente se encontra o estacionamento do Banco Bradesco.
Ao abordar estudos que envolvam a produção do espaço urbano, faz-se necessário valorizar o papel dos
agentes construtores desse espaço, como o poder público (que atua como agente de regulação do uso do
solo, implementando serviços e elaborando leis e normas de uso para o espaço urbano, o que foi analisado
por CÔRREA, 1989; SOUZA, 1994; LEITE, 1989), os grandes detentores de capital (com destaque para o
setor imobiliário, que colocam no mercado um produto com formas específicas de produção e consumo, onde
a localização torna-se estratégica, como muito bem argumentado por CÔRREA, 1989; CARVALHO, 1993) e a
sociedade civil (que tem o sentido do lugar, que é criado por relações e referências entre habitante-lugar).
Com isso, o que se evidencia é que em Rio Claro-SP não tem havido, ao longo de sua evolução urbana, um
respeito ao patrimônio histórico e cultural, o que pode ser observado pelo desmantelamento de suas formas
espaciais, como a substituição de cinco casarões por estacionamentos, ao redor do Jardim Público, no centro
da
cidade.
Nesse sentido, Carlos (1992) argumenta que a paisagem urbana guarda dois elementos fundamentais: o
espaço construído, imobilizado nas construções, e o movimento da vida, em um choque dos contrastes e das
diferenças, visíveis nos usos do solo urbano, onde este é determinado pelo valor, que define a dinâmica do
acesso ao solo urbano. E essa dinâmica leva a uma redistribuição do uso de áreas já ocupadas ou a
incorporação
de
novas,
dando
novas
formas
de
valorização
para
esse
espaço.
Dentro desse contexto, essa pesquisa objetivou analisar a produção do espaço urbano sob a ótica da
valorização capitalista, isto é, formas diferenciadas de consumo e valorização do espaço.
Para tanto, fizemos uso do método lefebvriano através de procedimentos metodológicos que buscam
identificar e recuperar temporalidades desencontradas e coexistentes, o que nos permitiu uma análise crítica
do tema, que possui três momentos de investigação: o primeiro momento é o descritivo, que consistiu na
observação do objeto de estudo, no nosso caso os estacionamentos no entorno do Jardim Público de Rio
Claro-SP, através de técnicas de observação sistemáticas e entrevistas – busca, a partir do que vê
reconstituir
a
diversidade
das
relações
sociais.
O segundo momento é o analítico-regressivo, onde se procurou datar as relações sociais, remanescentes de
época específica, ou seja, é a análise da realidade descrita, ponderando-se as contradições e as
possibilidades. E o terceiro e último momento é o histórico-genético, que foi a busca da gênese do processo,
indicando um marco de transformação sem abandonar-se a noção de conjunto – é reconhecer o antigo, o
novo
e
o
diferente.
Procuramos, em nosso objeto de estudo, dar destaque a memória dos moradores, o que nos permitiu
entender a história do centro da cidade e também, da cidade como um todo. A memória atua enquanto
conservação do passado na lembrança, isto é, é na lembrança que o passado pode sobreviver, através da
resistência de imagens e fatos, enquanto interpretação do silêncio, o que foi salientado por autores como
Bosi (1994); Claval (2001); Adams (2002); Moreira (2004); Hummel (2005) e Halbwachs (2006).
Em nossa pesquisa, a aplicação de entrevistas aos antigos proprietários dos casarões, e de questionários à
população, possibilitou uma reconstrução da história do centro da cidade que não é a oficial, mas sim, aquela
vivida por seus moradores, através de uma desmistificação histórica, trazendo à tona os silêncios da
memória, buscando compreender o não-dito, salientando que não se busca uma verdade histórica absoluta,
mas,
sim,
uma
versão
dos
fatos.
Na história de Rio Claro-SP, transformar antigos casarões em estacionamentos significa estar em dia com a
modernidade. As ruas têm suas formas, funções e estruturas suprimidas, tornando-se espaço de fluxo dos
automóveis, os grandes líderes do espaço urbano. Lideres que locam o espaço enquanto simples mercadoria:
os estacionamentos trazem a imagem de segurança frente à violência que persiste em assolar os tempos
modernos.
Realizar esse resgate histórico não foi tarefa das mais simples, mas o que nos impulsionou foi saber que
descobrimos uma história sobre o entorno do Jardim Público de Rio Claro-SP por um novo viés, diferente do
pronunciado pela história dita oficial: aquele dos moradores, que sentem e vivenciam o lugar.
AO307 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ordenamento Urbano e Gestão Territorial
[1466] A OCUPAÇÃO E OS VAZIOS URBANOS NA CIDADE DE PALMAS.
ELISEU PEREIRA DE BRITO; LISANDRA PEREIRA LAMOSO.
UFGD, PALMAS, TO, BRASIL.
Resumo:
Os vazios urbanos vêm se projetando de forma cada vez mais acentuada e complexa no processo de
urbanização brasileira. O sistema capitalista transformou o lote urbano em mercadoria, isto é, em bem
econômico de especulação, fato que motivou a atuação articulada de diferentes agentes sociais em relação
ao lucro produzido pelo mercado de terras na cidade, resultando em áreas não ocupadas. Para Milton Santos
(1990), o fenômeno é antigo, embora sem as expressões atuais, marcadas, sobretudo, por intensas disputas
pelo poder de posse das terras e interesses distintos de obtenção de lucro sobre o solo produzido.
Segundo Lúcio Kowarick (1999), os vazios urbanos são, em sua maioria, resultado do baixo preço do solo nas
zonas periféricas devido à carência de infra-estrutura, acarretando a formação de grandes aglomerados
humanos que, por sua vez, necessitam do prolongamento dos serviços públicos até aquelas áreas. À luz
deste contexto, observamos a valorização dos solos retidos para fins especulativos em porções do espaço
urbano que se encontram estrategicamente sem ocupação, beneficiando-se, assim, da construção das redes
de
infra-estrutura.
Conforme Elizeu Ribeiro Lira (1995), o processo de vazios urbanos na cidade foi gerado pelo não
cumprimento dos princípios do Plano Diretor da cidade, o qual corromperam, desvirtuaram e até mesmo
desconheceram o que se havia planejado para a ocupação do solo da capital. Para Eliseu Pereira de Brito
(2005), este processo teve origem no primeiro ano de ocupação da cidade, quando o Estado, por meio da
Companhia de Desenvolvimento do Tocantins (CODETINS), desprezou o princípio quinto do planejamento
urbanístico da cidade que buscava, acima de tudo, a flexibilização na transformação do solo, garantindo a
expansão
ordenada
do
solo
urbano
da
capital.
Considerando os vazios urbanos na cidade de Palmas, Tocantins, Eliseu Pereira de Brito (2005) evidencia a
responsabilidade da formação destes ao poder público estadual, detentor das terras da capital. Esta reserva
de espaços segregados para os ricos e pobres na cidade criou áreas vazias e uma alta especulação imobiliária
sobre as terras da capital, que não foi loteada de forma progressiva, mas sim, de forma “ilhada”, gerando
focos de população isolada, que beneficiaria as áreas vizinhas. A localização dos centros administrativo,
financeiro e comercial, próximo das quadras das elites, fez com que parte da população usufruísse a infraestrutura e, em contrapartida, a 16 quilômetros de distância, ficou a população pobre, desprovida dos
principais
serviços
de
infra-estrutura.
No que tange à interpretação da problemática dos vazios urbanos, as contribuições de autores como Milton
Santos, em seu livro Metrópole Corporativa Fragmentada (1990), focaliza os vazios urbanos da cidade de São
Paulo; a importante obra de Lúcio Kowarick (Escritos Urbanos, 1999) na qual o autor explora, dentre as
muitas questões sobre a cidade, a problemática da especulação imobiliária sobre o solo urbano, provocando o
que define como os vazios urbanos planejados; e a discussão de Andrea Borde (2003), que faz uma leitura
dos vazios urbanos em suas múltiplas faces no seu artigo intitulado: Percorrendo os vazios urbanos.
Como forma de interpretar a problemática na cidade de Palmas, buscamos subsídios nas pesquisas realizadas
por Elizeu R. Lira (1995), em sua dissertação de mestrado (A Gênese de Palmas, 1995), que analisa o
processo de criação, planejamento e condução da ocupação nos primeiros anos da construção da capital, e
também a pesquisa realizada por Eliseu P. Brito (2005), na obra intitulada: (Produção e Reprodução do
Espaço Urbano de Palmas, 2005), na qual o autor buscou interpretar as principais questões referentes à
ocupação e planejamento do uso do solo urbano na capital do Estado do Tocantins.
Os objetivos principais desta pesquisa foram: Analisar a dinâmica da ocupação do solo na cidade de Palmas –
TO, no período de 1990-2006 e analisar a peculiaridade destes vazios urbanos de Palmas – TO.
Os procedimentos adotados foram: em um primeiro momento, um recorte temporal das etapas do complexo
processo de ocupação do espaço urbano de Palmas. O segundo procedimento foi o recorte espacial. Este
recorte possibilitou uma análise da dinâmica de ocupação do solo, como também uma identificação mais
precisa dos diversos processos de exclusão, segregação e espoliação urbanas que o Estado, em atuação
conjunta com as incorporadoras imobiliárias, utilizou para alimentar a especulação imobiliária na cidade,
resultando assim, nos vazios urbanos e em uma fragmentação da cidade de Palmas.
Nesta ótica, podemos dizer que esta pesquisa partiu de uma metodologia qualitativa e procurou analisar o
processo dos vazios urbanos da cidade de Palmas, visando o aprofundamento teórico conceitual da temática
em
questão.
Na cidade de Palmas, fundada em 1990, esta problemática adquire contornos singulares, pois se trata de um
espaço urbano planejado, segundo as concepções do urbanismo modernista, tendo como um dos principais
agentes fundiários o Estado. A capital tocantinense apresenta hoje um dos maiores índices de vazios urbanos
dentre as capitais brasileiras, sobretudo em sua área central. De um lado, observamos uma capacidade
efetiva para a cidade abrigar mais de um milhão de habitantes, e em contrapartida, segundo projeção do
IBGE (2005), Palmas possui 200 mil residentes. Buscar soluções que envolvam questões sociais e
econômicas neste momento de ocupação do solo urbano de Palmas, a fim de trazer uma resposta à altura
dos princípios do Estatuto da Cidade, pode ser uma das alternativas, visando minimizar os efeitos negativos
da significativa presença de vazios urbanos em Palmas e neste norte é que direcionamos nossa pesquisa.
AO308 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1985] RELAÇÕES EN TRE TEORI A E PRÁTI CA N A AN ÁLI SE URBAN A E SUAS CON TRI BUI ÇÕES PARA
O AVANÇO DO CONHECIMENTO.
GERALDO MAGELA COSTA.
PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA - UFMG, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
Pelo menos desde os anos 1970 a análise de práticas urbanas, como parte dos processos socioespaciais, tem
sido uma questão relevante na produção do conhecimento sobre o urbano. A partir daquele momento as
contradições urbanas tornaram-se mais explícitas, agravadas pelas prioridades dadas à produção e
reprodução ampliada do capital industrial em detrimento das necessidades de reprodução social. A partir das
últimas duas décadas do século XX foi se tornando comum falar-se em processos de exclusão socioespacial.
Tais processos têm sido analisados de diferentes formas, de acordo com o momento histórico e as diferentes
abordagens teóricas usadas para a interpretação do desenvolvimento capitalista e a chamada questão urbana
no Brasil em particular e na América Latina em geral. Assim, nos anos 1970, uma boa parte de tal
interpretação se dava com base na análise que se fazia do caráter do modo de produção capitalista na
América Latina pela abordagem da teoria da dependência e, no contexto urbano, da teoria da marginalidade.
Tratava-se essencialmente da marginalidade ocupacional, teorizada tanto pela vertente dualista quanto pela
não dualista de interpretação das características do modo de produção na América Latina, especialmente no
Brasil (Oliveira, 1981). Na sua dimensão urbana e metropolitana, a “marginalidade” ocupacional se traduzia
na superexploração da força de trabalho, agravada pelo o que Kowarick (1979) denominou ‘espoliação
urbana’. Praxis, na forma de movimentos sociais e de ações da chamada “sociedade civil organizada”, visava
essencialmente reformas, especialmente por meio de mudanças do Estado identificado como o principal
responsável por políticas urbanas excludentes. Durante os anos 1980, a extensão territorial da urbanização
se acentua, tornando-se generalizada, especialmente a partir das grandes metrópoles, aumentando a
preocupação com a inexistência e/ou precariedade dos meios de consumo coletivo e as formas socialmente
perversas de ocupação e apropriação da terra urbana por parte do segmento imobiliário do capital. Com isto,
ganha força as análises de inspiração marxista, a chamada economia política urbana, que apesar de ter
trazido avanços importantes para o entendimento da lógica da acumulação e sua relação com o espaço
urbano, pouco ou quase nada avançou em termos da análise histórica, política, das práticas e do poder em
geral. O fim do regime militar, no entanto, possibilitou o resurgimento de movimentos sociais, reacendendo
as discussões sobre as possibilidades de políticas realmente públicas e de reformas, a exemplo das iniciativas
voltadas para a busca da função social da terra urbana e da cidade. Pode-se dizer que foi especialmente a
partir dos anos 1990 que o termo exclusão ou exclusão socioespacial (urbana) tenha se tornado de uso mais
corrente na análise urbana. A reestruturação da atividade produtiva e o processo de globalização da
economia estariam introduzindo maior complexidade no espaço urbano, ao mesmo tempo em que são
observadas novas formas de gestão urbana a partir da Constituição de 1988, supostamente progressistas,
mas que introduziram mudanças nas possibilidades da práxis socioespacial. Isto porque, boa parte dos atores
de movimentos sociais que lutavam por mudanças nos anos 1980, passam a parceiros do Estado na
formulação e implementação de políticas urbanas, o que vem merecendo análises sobre suas reais
possibilidades de autonomia política (Souza, 2003). Meu objetivo neste artigo é, após uma revisão das
análises urbanas desde os anos 1970, dar ênfase ao momento atual por meio de uma reflexão sobre algumas
propostas teóricas que considero ter potencial explicativo para as formas de urbanização e as possibilidades
da práxis socioespacial transformadora. Metodologicamente, portanto, a análise se pauta tanto pela
interpretação de textos que em diferentes momentos trataram do tema proposto, quanto pela tentativa de
reflexão crítica que transcenda tais interpretações. Não se trata de um artigo baseado em uma única
pesquisa, mas sim em um conjunto de análises já realizadas pelo autor, baseadas na teoria e na pesquisa.
Se, por um lado, as contribuições de autores como Henri Lefebvre, Doreen Massey, Edward Soja, Milton
Santos, Amélia Damiani, Roberto Luís de Melo Monte-Mór, entre outros, têm contribuído de forma
significativa para o avanço do conhecimento teórico sobre a urbanização, por outro lado, minha hipótese é
que as reflexões sobre as possibilidades das práxis transformadora ficam muitas vezes no nível da crença ou
do discurso sobre a necessidade da justiça social e/ou da necessidade de buscar formas de unir as forças de
movimentos sociais ainda fragmentados em seus objetivos. A reflexão proposta procura transcender estas
abordagens. Neste sentido, serão explorados especialmente as reflexões de Henri Lefebvre (1993, entre
outros), sobre as possibilidades da práxis socioespacial, de Milton Santos (1996, entre outros) em sua
discussão sobre o território usado e o potencial da luta transformadora dos imigrantes urbanos diante de
uma nova realidade socioespacial perversa e de Doreen Massey (1994), em sua abordagem inovadora sobre
os lugares e as relações sociais. Como resultado, sugere-se que a reflexão proposta contribui para o diálogo
com outros pesquisadores sobre o mesmo tema e, com isto, avança no processo de produção do
conhecimento sobre o espaço socialmente produzido nos países do capitalismo periférico.
KOWARICK,
L.
1979.
A
espoliação
urbana.
Rio
de
Janeiro:
Paz
e
Terra.
LEFEBVRE,
H.
1993.
The
production
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space.
Oxford:
Blackwell.
MASSEY, D. 1994. Space, place and gender. Minneapolis: University of Minneapolis Press.
OLIVEIRA, F. 1981. A economia brasileira: crítica à razão dualista. 4.ed. São Paulo: CEBRAP.
SANTOS, M. 1996. A natureza do espaço — técnica e tempo — razão e emoção. São Paulo: HUCITEC.
SOUZA, M.L. 2003. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbanos. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil.
AO022 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Epistemologia da
Geografia
[1179] A REINVENÇÃO DA CORPOREIDADE: POR UMA TEORIA DO SUJEITO EM GEOGRAFIA.
ELIAS LOPES LIMA.
UFF, NITEROI, RJ, BRASIL.
Resumo:
Quando nos estendemos sobre o espaço, seja por movimento de um gesto, seja para localizar um objeto e
mesmo para nos enveredarmos em toda sorte de relações que ele nos suscita, o fazemos com a nítida
impressão de que este espaço passa a nos pertencer, que este espaço se torna tão familiar quanto nosso
próprio corpo, passando a perfilar seus horizontes como registro de nossas experiências.
Essa pesquisa objetiva precisar como a noção de corpo contribui para uma concepção de espaço, explicitando
a intrínseca relação entre essas duas categorias do entendimento humano, de modo que contribuamos para a
reflexão do anacronismo que tomou conta do pensamento moderno. Destacam-se assim como objetivos de
um estudo geográfico a propósito do corpo: 1) refletir sobre as antinomias da tradição cartesiana e suas
implicações para uma concepção de espaço, reavaliando sua dupla legalidade segundo uma corporeidade
física e uma corporeidade humana, para enfim apontar para uma presumível multi-corporeidade; 2) destacar
o papel do sujeito no discurso geográfico, posto a notoriedade com que o objeto vem sendo tratado por essa
ciência, sem que incorramos para tanto numa inconciliável bipolarização; 3) tratar um meio relacional
marcado por uma pluralidade de perspectivas, dotando a diferença de uma relevância fundamental na
produção do espaço, de onde se deduz que a experiência corporal indígena compõe um formidável referencial
de análise. 4) e, por fim, evidenciados os fundamentos do corpo e sua realidade espacial, o retomaremos em
meio a um conjunto de determinações histórico-geográficas, representações simbólicas e relações de poder,
sem
que,
todavia,
percamos
de
vista
o
seu
caráter
emancipatório.
Em muitos trabalhos geográficos o espaço assume equivocadamente o papel de agente, restringindo as
pessoas a meros espectadores, como se vivessem enclausuradas e estáticas nos lugares e territórios, inertes
na paisagem tal como em uma fotografia – tais recortes espaciais assumindo a protagonização das ações.
Dizemos que o espaço se reproduz, assim como os anos passam, quando são mais propriamente os seres
humanos que agem no espaço e no tempo dando-lhes significados que se revertem àqueles como relações.
No afã de nos desvincularmos de um espaço inerte e inanimado dotamos de vida própria os objetos perdendo
assim de vista o sujeito, como se o espaço prescindisse de sua intervenção. Reproduzimos assim o preceito
cartesiano de um sujeito isolado do extenso e o princípio kantiano de um espaço a priori independente da
sensibilidade e do entendimento. Curioso como mesmo o corpo parece destacado do sujeito ou mesmo
daquilo que designamos por homem (o ser humano em geral). Há que se destacar o papel do sujeito nas
análises geográficas, e não deixá-lo subentendido entre objetos e ações; porquanto que se tome o devido
cuidado de não restringir corpo e espaço como puras representações de nossas relações, ou, por outro lado,
limitar o espaço a um palco onde se desenrola a atividade do homem, sem refletir que o mesmo palco tem
vida, como recorrentemente fazem muitos sociólogos, historiadores, antropólogos, filósofos... À necessidade
em se ater ao objeto da ciência geográfica deve aliar-se à necessidade de integrar de modo interdependente
o sujeito no mesmo processo constitutivo, sem que reiteremos, pois, uma inconciliável bipolarização.
Esse imbróglio nos impulsiona a lançar mão de uma noção que nem tanto se encerra por um horizonte
empírico e sensível de mundo e tampouco subjaz a uma dimensão reflexiva e contemplativa, assim como
também não os anulam ao (con)fundi-los como advogam os postulados pós-modernos: a corporeidade dos
corpos consiste num espaço que compreende corpos os mais variados se inter-relacionando numa
promiscuidade que impossibilita a síntese de recortamentos espaciais compartimentados e precisos, mas que,
todavia, permite-nos contemplar imbricações entre o orgânico e o inorgânico, a idéia e a coisa, o significado
e o sentido, abrindo-se assim para socialidades mais horizontalizadas e solidárias. A alteridade, nesse
sentido, é um dado patente do espaço, é o alimento sem o qual não poderia se sustentar. Tais premissas vão
subsidiar o redimensionamento de relações que recaem sobre os corpos, incapacitando-os e atenuando suas
propriedades instrumentais, temporais, espaciais de maneira a arrefecer o poder (e, portanto, a resistência)
que
lhe
é
patente
no
ato
de
sua
constituição
perceptiva.
Situamos o pensamento de Foucault em sua notável alusão à constituição das subjetividades à luz das
relações de poder no âmbito de uma racionalidade tipicamente moderna, tendo Merleau-Ponty como ponto
de partida e principal referência teórica por anteceder-se ao sistema de representações sociais e, portanto,
às próprias relações de poder, para confrontá-los, posteriormente, com os saberes indígenas, conhecimentos
que sempre foram considerados como residuais pelo cientificismo moderno mas que sempre lhe foi
constitutivo, e por fim evidenciar o que Walter Mignolo chamou de pensamento liminar, Enrique Leff de
diálogo de saberes e Boaventura de Souza Santos de hermenêutica diatópica, o que preferimos designar,
para
melhor
situar
dentro
de
nossa
proposta,
de
transcorporeidade.
Esse trabalho consiste num exercício de constante confrontação. Cotejamos métodos os mais diversificados
entre si, comparamos o corpo segundo áreas de conhecimento igualmente diferenciadas e confrontamos
racionalidades e sobretudo concepções de corpo distintas e conflitantes. Não para anulá-las perante o
reconhecimento da outra, mas principalmente para enriquecê-las mediante um reconhecimento mútuo e,
mais importante, considerá-las como possibilidades de resignificação de nossa relação com o outro, eis aqui,
por fim, nosso objetivo primeiro. Nesse sentido, a metodologia adotada consiste em interrogar as diferenças,
compará-las não para extrair-lhes sínteses reducionistas, mas para alçá-las a campos de possibilidades que
se abrem ao mundo e que só o devenir histórico poderá confirmá-las. Assim temas tão diferenciados como
epistemologia, ontologia, poder, técnica, linguagem, música, dentre outros, convergem para o entendimento
do corpo como um ser simultaneamente espacial e temporal. Daí podermos contrastá-los a fim de extrair
uma síntese sempre provisória para reafirmar o corpo como ponto de inflexão do estado de adestramento e
letargia
promovido
pelos
circuitos
de
poder
hegemônico.
É através de uma investigação geográfica acerca do corpo que, redundâncias à parte, é propriamente uma
investigação geográfica espacial (ênfase necessária a fim de marcar essa inerência mútua), pode-se, se não
definir e deliberar, ao menos introduzir elementos necessários para o que se poderia chamar de uma teoria
do sujeito em geografia. É nesse sentido que falamos numa reinvenção da corporeidade.
AO023 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Epistemologia da
Geografia
[1259] A D I FUSÃO D O POSI TI VI SM O LÓGI CO N A GEOGRAFI A: N OTAS D E UM ESTUD O A RESPEI TO
DA GEOGRAFIA DO CONHECIMENTO E DO PAPEL DA CULTURA NA PRODUÇÃO DA CIÊNCIA.
MARIANA ARAUJO LAMEGO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
\"Rubricas abrangentes como \"Ciência Natural\", \"Ciência Biológica\", \"Ciência Social\" e \"As
Humanidades\" têm lá sua utilidade para organizar currículos, ou para separar doutos em grupos exclusivos
ou comunidades profissionais, e para distinguir amplas tradições de estilo intelectual. (...) Quando essas
rubricas, no entanto, passam a ser consideradas mapas da vida intelectual moderna, com limites e
territórios, ou, pior ainda, algo assim como um catálogo Linnaean, no qual são classificadas as espécies
escolásticas, acabam escondendo o que realmente acontece lá fora, onde homens e mulheres têm suas idéias
e escreveram o que pensaram.\" Clifford Geertz (O Saber Local. Novos ensaios em antropologia
interpretativa.
Petrópolis:
Vozes,
2004.
p.
15)
\"Science is not above culture; it is part of culture. Science is not a disembodied entity; it is incarnated in
humam beings (...). Science is not some eternal essence slowly taking form in history; rather, it is a social
practice grounded in concrete historical and geographical cirscunstances\" David Livingstone (Put t ing Science
in I t s Place: geographies of scientific knowledge. Chicago: The University of Chicago Press, 2003. p.180)
As citações acima não introduzem o presente trabalho por acaso. Precedem meu texto porque são
norteadoras de minha argumentação. Este trabalho é desenvolvido em acordo às seguintes idéias: não se
produz conhecimento no vácuo do tempo e do espaço e, principalmente, por seres extraterrestres. O
conhecimento é socialmente e historicamente produzido, estimulado por e em contingências sócio-espaciais.
O conhecimento é, portanto, historicamente específico e, o que mais nos interessa, é geograficamente
específico. Homens e mulheres que vivem (ou viveram) em algum tempo e principalmente em algum lugar
produzem (ou produziram) suas reflexões, criam (ou criaram) teorias, que respondem, ou ao menos
tentaram responder, a demandas e anseios que enraizam este conhecimento ao seu local de produção,
explicitando, neste processo, o indispensável papel – ainda que muitas vezes obscurecido em diversos
estudos sobre a produção do conhecimento geográfico – que o local desempenha. Qualquer tentativa de
classificar o conhecimento produzido é, portanto, meramente utilitária, certamente a posteriori e não encobre
uma
constatação:
o
conhecimento
científico
é
constitutivo
da
cultura.
Esta argumentação é empregada na análise da difusão do positivismo lógico na geografia quantitativa – que
foi o tema de minha dissertação de mestrado, defendida em fevereiro de 2006. É neste sentido que me refiro
a este trabalho como um exercício, um esforço em compreender o modo pelo qual idéias elaboradas num
determinado local, num determinado tempo, por um determinado grupo social – Áustria; anos 20 do século
XX; filósofos, físico e matemáticos – se difundem por e através de fronteiras disciplinares e geográficas
encontrando ampla aceitação e instaurando novos modos de se fazer ciência em outro local, outro tempo e
outro grupo social – Estados Unidos e Inglaterra; anos 50 do século XX; geógrafos. Quais traços carregam
estas teorias que as conectam ao seu local de produção? Quais são aqueles que se perdem no caminho?
Quais novos traços ganham estas idéias em seu novo habitat? A proposta é mesmo a de explorar os
caminhos percorridos em um processo migratório peculiar, no qual estão envolvidos não apenas homens e
mulheres, mas suas idéias, seus planos e suas visões de mundo.
AO024 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Epistemologia da Geografia
[1359] NATUREZA E CULTURA NA GEOGRAFIA DO BRASIL DE JOSUÉ DE CASTRO.
INÊS AGUIAR DE FREITAS.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Na história do pensamento ocidental, uma grande importância sempre foi concedida à dinâmica existente
entre o homem e seu ambiente natural. Da mesma maneira, um dos temas fundadores da geografia é aquele
que trata as relações entre natureza e cultura (GLACKEN, 1990). A história da relação natureza x cultura é
muito rica e interessante e nos informa mesmo sobre a nossa condição humana, nossa consciência, nossos
atos políticos, nossas decisões econômicas, enfim, nossa atitude como agentes geográficos. Tais
preocupações têm origem na Antigüidade, passando por todos os momentos da história do Ocidente desde
então.
Devemos lembrar que alguns autores brasileiros do passado contribuíram, de maneira especial, para a
discussão de tais temas. Este é, sem dúvida, o caso de Josué de Castro (1908-1973).
Assim, nosso objetivo geral será engendrar uma releitura de suas obras, contextualizando-as dentro do
pensamento geográfico e identificando como tratou a relação natureza x cultura. Realizaremos uma nova
leitura da obra “geográfica” de Josué de Castro - Geografia Humana (1939), Geografia da Fome (1946),
Geopolítica da Fome (1951), Ensaios de Geografia Humana (1957), - lançando sobre elas um novo olhar e
novas
interpretações.
Pensamos poder contribuir com novos elementos para a análise de suas obras e para o reconhecimento de
sua contribuição para a geografia, partindo da tese de que Josué de Castro é, na verdade, resultado de uma
mistura de diversas influências da geografia clássica (especialmente a de origem francesa) e que teve uma
visão das relações entre natureza e cultura na geografia que realizou, a partir da influência, principalmente,
de autores como Vidal de la Blache e Elisée Réclus, e outros geógrafos clássicos mais recentes, como Eric
Dardel. E isto transparece na escolha de seus temas, em suas preocupações metodológicas e mesmo na
forma como apresentou e analisou as relações do homem com o meio no território brasileiro - criando não só
uma regionalização que lhe permitiu organizar espacialmente toda a informação sobre a fome no Brasil, mas
também um projeto de erradicação da mesma, apontando suas causas naturais e sociais.
Josué Apolônio de Castro nasceu no dia 05 de setembro de 1908, em Recife, Pernambuco. Do seu
nascimento, em meio a uma família de classe média de origem sertaneja, à sua morte no exílio em Paris,
França, em 1973, como um grande estadista, Josué de Castro influenciou várias gerações e ditou, há mais de
50 anos, o que seria uma das discussões centrais da atualidade - a fome no mundo.
Se a Geografia da Fome causou impacto, sobretudo para os grupos conservadores que procuravam esconder
os problemas da fome e da miséria no país, maior impacto seria provocado em 1951, com o lançamento dos
dois volumes da obra Geopolítica da Fome, no qual o autor mudou sua escala de trabalho, passando a
analisar o problema no mundo inteiro. Se a mudança de escala do regional para o nacional foi observada na
Geografia da Fome, no qual desceu à escala regional brasileira, analisando as características alimentares e as
carências delas decorrentes em cada uma das cinco regiões em que dividiu o país, na ampliação de sua
análise para a escala do mundo, procurou dividir a superfície da terra em áreas ricas e pobres, evidenciando,
já,
o
contraste
Norte/Sul.
Em seu Ensaios de Geografia Humana (1957) são claras suas preocupações com os métodos da geografia,
com o estabelecimento de conceitos, exatamente as mesmas preocupações presentes em Vidal de La Blache.
Podemos reconhecer aqui fortes traços da Escola Francesa de Geografia, pois, valendo-se de sua rica (e
eclética) formação acadêmica e atividade profissional, Josué acabou por valorizar a história e a cultura como
elementos
essenciais
da
relação
que
os
homens
estabelecem
com
o
meio.
Assim como os geógrafos da Escola Francesa, ao fazer geografia, Josué de Castro preocupou-se em definir o
objeto da Geografia, em criar conceitos, em estabelecer uma metodologia de pesquisa. De onde se pode
concluir que suas preocupações em dar continuidade ao pensamento geográfico incluíam fazer da Geografia
uma ciência positiva. Josué, ao tratar da “distribuição do efetivo humano” sobre a superfície da Terra,
pergunta: “Que causas influem na distribuição desigual do contingente humano pela superfície da Terra?”
(CASTRO, 1957, p. 33) E a resposta a tal questão não poderia ser mais influenciada pelo possibilismo de
origem
lablachiana,
como
veremos.
Queremos investigar e tornar clara a geografia clássica / tradicional que tornou possível seu trabalho e que
mostra a riqueza de seu embasamento teórico-metodológico. Gostaríamos de estudar o Josué de Castro
preocupado em fazer uma... “Geografia da paisagem cultural, da paisagem humanizada, pela presença dos
traços de cultura, das marcas que o elemento humano vem incrustando através do tempo na superfície da
terra”. (CASTRO, 1957, p.7) Recuperando a influência de uma geografia cultural vidalina, Josué de Castro
não deixa de relacionar as condições dadas pelo meio com os “aspectos positivos da condição humana” (a
capacidade
transformadora)
do
homem
nordestino
/
brasileiro.
Por todos os motivos colocados acima é que este estudo deseja recuperar sua importante contribuição para a
discussão de idéias que, ainda hoje, permeiam não só o imaginário brasileiro, mas que influenciam mesmo
nossas ações no que tange os problemas envolvendo cultura, sociedade, regionalismo, meio ambiente,
pobreza, fome... Nesse sentido, poderíamos mesmo considerar Josué de Castro como um dos pioneiros na
discussão
de
tais
temas,
no
âmbito
da
geografia
brasileira.
Nosso trabalho, dados seus objetivos e características - um trabalho conceitual, que se fundamenta numa
grande discussão teórico-metodológica - apoia-se em uma grande análise bibliográfica, tornando-se,
essencialmente, um trabalho de gabinete.
AO025 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Epistemologia da
Geografia
[1389] INFLUÊNCIAS DA ESTÉTICA KANTIANA NA GÊNESE DA GEOGRAFIA FÍSICA.
ANTONIO CARLOS VITTE.
UNICAMP, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
O objetivo deste trabalho é apresentar uma discussão sobre o papel e a importância da estética kantiana e o
seu desdobramento na naturphilosophie para a gênese da geografia moderna e, em particular, para o
surgimento da geografia física. Sabe-se que Kant refundou a estética ocidental a partir da Crítica do Juízo
(Kant, 1985) de 1791, onde a noção de forma foi a intrumentalizadora para a representação da natureza.
Nascida sob forte impacto da biologia e das duras críticas sobre a não consideração da naturez na Crítica da
Razão Pura (Kant, 1981), a Crítica do Juízo ao romper não apenas com as duras regras da Crítica da Razão
Pura, avançou na medida em que Kant explicitou o papel da imaginação, do belo e do sublime na
constituição da modernidade do mundo. O resultado imediato foi um forte impacto no conceito de natureza e
na sua representação. É neste momento, com os trabalhos de Goethe, Schelling e Alexander von Humdoldt
que ser organiza a geografia física moderna a partir de uma requalificação da noção de espaço e que dentro
do contexto da metafísica da natureza pemitirá o surgimento da morfologia goethiana, com forte impacto na
organização da geomorfologia e, no surgimento dos conceitos de geoesfera e paisagem, estruturadores da
moderna geografia física, com fortes impactos nos estudos territoriais e ambientais.
AO026 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Epistemologia da
Geografia
[1822] OS CAM I N H OS QUE SE BI FURCAM : AUGUSTI N BERQUE E M ARTI N H EI D EGGER N A
CONFIGURAÇÃO DE UMA ESPACIALIDADE.
LENICE DA SILVA LIRA.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Os camimhos que se bifurcam: Augustin Berque e Martin Heidegger na configuração de uma nova
espacialidade
Partindo dos textos de Augustin Berque – geógrafo francês cujos estudos são dedicados à médiance (o
sentido da relação de uma sociedade com o espaço e com a natureza) – , e dos escritos do filósofo alemão,
Martin Heidegger, pretende-se refletir sobre a influencia deste filósofo no pensamento de Augustin Berque, e,
conseqüentemente,
na
configuração
de
uma
abordagem
ontológica
do
espaço.
Destarte,
coloca-se
as
seguintes
indagações:
a) De que modo a filosofia de Heidegger contribuiu para as formulações de Berque sobre o espaço?
b) Que construções conceituais e abordagem geográficas surgiram a partir da transposição do esquema
conceitual
heideggeriano?
Nesse sentido, foi delimitado dois percursos. Aquele feito por Heidegger e aquele traçado por Berque, que se
bifurcam em um terceiro: o da relação / “trajeção”, que permanecendo nela implica na simultaneidade de
pares
“opostos”,
e
não
na
exclusão
de
um
ou
de
outro.
Tanto Heidegger quanto Berque partem da crítica ao paradigma moderno, que condena a realidade a um
único ponto de visto – ou do sujeito ou do objeto – , e que, segundo Heidegger, teria afastado o Ser de sua
origem.
E,
de
acordo
com
Berque,
teria
empobrecido
a
experiência
do
mundo.
A questão latente na obra de Heidegger aproximava-se daquela tratada por Berque, a saber, a superação da
relação
sujeito/objeto,
de
uma
relação
instrumental
do
mundo,
do
ser
humano.
Quando nos colocamos diante do mundo, quando olhamos o mundo com todos os seus objetos e sujeitos,
não atentamos para o fato de que as coisas, que o sentido do mundo, se constituem numa dada relação, que
é
o
resultado
da
cultura
de
uma
época
e
de
um
lugar.
A obra de Augustin Berque abre novas possibilidades de abordagem dos temas tratados em geografia. Daí a
sua
relevância
na
constituição
das
espacialidades
contemporâneas.
A metodologia do trabalho baseia-se na análise das obras desses dois autores, especificamente, Ser e tempo
e A origem da obra de arte, de Martin Heidegger, e Médiance. De milieux em paysage e Écouméne.
Intoduction
à
l’étude
dês
milieux
humains,
de
Augustin
Berque.
O trabalho insere-se no eixo temático “Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e
empíricos”, vinculado ao grupo de trabalho (GT) “ Epistemologia da geografia” (apresentação oral).
Palavras-chave:
Referências
Augustin
Berque,
Martin
Heidegger,
espaço,
“trajeção”.
bibliográficas:
BERQUE,
Augustin.
Médiance.
De
milieux
en
paysage.
Paris:
Reclus,
1990.
________________. Écoumène. Introduction à l’étude des milieux humains. Paris: Belin, 2000.
CARVALHO,
Bernardo.
Mongólia.
São
Paulo:
Cia
das
Letras,
2004.
DARDEL, Éric. L’homme et la terre. Nature de la réalité géographique. Paris: CTHS, 1990 (1925, 1ª edição).
DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. São Paulo: Ed. 34, 1998.
ERBER, Pedro Rabelo. Política e verdade no pensamento de Martin Heidegger. Rio de Janeiro: PUC-Rio; São
Paulo:
Loyola,
2003.
HEIDEGGER,
Martin.
A
origem
da
obra
de
arte.
Lisboa:
Edições
70,
1977.
____________.
Ser
e
tempo.7.
ed.
Petrópolis:
Vozes,
2000.
2
v.
SADZIK,
Joseph.
Esthétique
de
Martin
Heidegger.
Paris:
Éditions
Universitaires,
1963.
AO222 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia do Trabalho
[1198] TERRI TÓRI O E TRABALH O: O PAPEL E A AÇÃO D O ESTAD O N O ESTABELECI M EN TO D E
POLÍTICAS PÚBLICAS DE GERAÇÃO DE RENDA.
TATIANE MARINA PINTO DE GODOY.
UNESP, RIO CLARO, SP, BRASIL.
Resumo:
O acesso ao trabalho em condições dignas não tem sido tarefa fácil no atual momento. O Estado que antes
era apenas responsável pela regulamentação e fiscalização das questões trabalhistas adquire também o
papel de facilitador na geração de trabalho e renda ao exercer a função de intermediador de mão-de-obra, de
qualificação e requalificação profissional, orientação trabalhista e atendimento ao trabalhador pelo Sistema
Público
de
Emprego.
Tais políticas não têm se mostrado suficientes para a inserção no mercado de trabalho de todo o contingente
de desempregados. Novas respostas são buscadas e dentre elas emerge o apoio ao empreendedorismo
através de práticas autogestionárias no âmbito da Economia Solidária. Esta forma de organização do trabalho
tem sido objeto de políticas públicas, especialmente no Brasil, e apoiada por organizações governamentais e
não governamentais. Assim, temos como objetivo discutir a natureza do trabalho na sociedade
contemporânea e o papel do Estado na geração de trabalho e renda, tendo como categoria de análise o
território
como
expressão
geográfica
da
regulação
política.
Nossa orientação teórica é de uma geografia crítica que vai além das análises locacionais. Nosso esforço vai
em direção à uma análise que dê conta do desvendamento das relações sociais produtoras do espaço
geográfico e de suas implicações na reprodução da humanidade. Afirmamos que é através do trabalho que se
produz o espaço geográfico, ou seja, o espaço das relações sociais. Mas, à medida que as relações sociais de
produção estejam em crise o que observamos é uma crise generalizada que se materializa na desigualdade
sócio-espacial. Contamos com o aporte teórico de Boaventura de Sousa Santos na avaliação do potencial
emancipatório da Economia Solidária, juntamente com as contribuições de Ricardo Antunes e Paul Singer
para o desvendamento do sentido do trabalho no atual momento e, de Henri Lefèbvre para o debate da
autogestão
e
da
emancipação
humana.
Para essa pesquisa nós nos utilizamos da análise de dados do Atlas da Economia Solidária no Brasil
(SENAES/MTE), do Anuário dos Trabalhadores (DIEESE 2006), bem como da análise de dados obtidos em
trabalho de campo e de revisão bibliográfica. A forma de análise dos resultados está embasada no método
Progressivo-Regressivo,
proposto
por
Lefèbvre
(1978).
As principais questões levantadas por esta pesquisa foram: a crise que vivemos hoje é de trabalho ou de
emprego? Qual a sua relação direta com a crise da cidade? A autogestão é uma possibilidade de emancipação
para os trabalhadores? Para tanto foi necessário o estudo histórico do trabalho com o objetivo entender qual
a sua importância hoje na sociedade bem como no que consiste a crise do trabalho debatida por alguns
autores.
O trabalho tem hoje o seu maior nível histórico de produtividade, de uso das faculdades da inteligência e de
desafios no plano da complexidade tecnológica e organizativa. Por outro lado, o seu acesso na forma
contratual nunca esteve tão segmentado. Surge a necessidade de reflexão sobre o real problema que afeta a
sociedade atualmente. A crise que vivemos é do trabalho ou do emprego? Para Singer (1999) melhor que
desemprego, o que de fato descreve o que está ocorrendo é o entendimento do termo precarização do
trabalho. Os novos postos de trabalho, surgidos em função das transformações das tecnologias e da divisão
internacional do trabalho, não oferecem, em sua maioria, ao ocupante as compensações usuais que as leis e
contratos
coletivos
garantiam
anteriormente.
A falta de meios de reprodução da vida está visivelmente manifestada no espaço urbano, onde pode-se
verificar as mais diversas atividades informais e até mesmo ilícitas praticadas pela população posta às
margens das formas contratuais de trabalho. O trabalho possibilita ao homem a ascensão à qualidade de
cidadão. Sem trabalho o homem tem restringidas as suas possibilidades de desenvolvimento humano e
social, ampliando as suas vulnerabilidades. Dentre as possibilidades de inserção no mercado de trabalho
daqueles que estão alijados dos meios de reprodução da vida emerge a Economia Solidária, compreendendo
um conjunto de empreendimentos de produção e serviços geridos de forma autogestionária. Iniciada nas
administrações municipais, as políticas públicas para desenvolvimento deste setor ganharam importância
federal. Desde 2003 o Brasil possui uma Secretária Nacional de Economia Solidária implantada dentro do
Ministério
do
Trabalho
e
Emprego.
Os empreendimentos autogeridos representam atualmente um campo potencial de geração de trabalho e
renda, pois, além de proporcionar trabalho aos seus associados também empregam pessoas em melhores
condições. Há uma dialética que envolve os empreendimentos econômicos solidários. Eles ao mesmo tempo
em que apresentam um caminho para a inclusão social também são subordinados ao mercado que prima
pela acumulação. Outra questão que deve ser considerada é o do aporte do poder público, sem o qual não há
condições de fundação e manutenção dos empreendimentos autogeridos no tempo e no espaço.
Santos (2003) nos mostra que a história do capitalismo também é a história das lutas de resistência e da
crítica contra valores e práticas. A viabilidade das alternativas, pelo menos a curto e médio prazo, depende
da sua capacidade de sobreviver no contexto do domínio do capitalismo. Tal viabilidade, entretanto, não
significa a aceitação do que existe porque a realidade, segundo o pensamento crítico, não se reduz ao que
existe. O fato de iniciativas alternativas não representarem novos modos de produção não lhes retira sua
relevância nem seu potencial emancipador. Contata-se que, ao Estado cabe incentivar a formação e
promover a sustentabilidade de empreendimentos solidários. São necessárias políticas públicas com
continuidade no tempo e no espaço político.
AO223 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia do Trabalho
[1319] FAZENDO GÊNERO NO MERCADO DE TRABALHO FEMININO DE FORTALEZA.
ALINE PARENTE OLIVEIRA1; IVAINE MARIA TONINI2.
1.UNI VERSI DADE FEDERAL DO CEARÁ, FORTALEZA, CE, BRASI L; 2.UNI VERSI DADE FEDERAL DO RI O
GRANDE DO SUL,FACULDADE DE EDUCAÇÃO, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL.
Resumo:
Este estudo refere-se a uma investigação sobre as relações entre mercado de trabalho e gênero em
Fortaleza/CE focalizando, especificamente, os setores ocupacionais com a finalidade de compreender as
maneiras que estão posicionadas nele. Sua pertinência está pautada na contribuição de mostrar que os
lugares de posicionamento e circulação endereçadas as mulheres ainda estão muito pautados pela
perspectiva
da
divisão
sexual.
Tem como campo teórico a Geografia Cultural por auxiliar a compreender que essas relações são construídas
nas práticas culturais para posicionar mulheres e homens em diferentes setores ocupacionais.
Esta pesquisa insere-se no campo da Geografia Cultural, mais especificamente, em uma vertente que tem
discutido problematizado e se valido da fecundidade de uma articulação teórica com as perspectivas pósestruturalistas. Nesse sentido, a Geografia Cultural tem contribuído para os encaminhamentos teóricos desta
pesquisa, por contemplar uma virada nas formas tradicionais de se entender os conhecimentos e saberes
sedimentados no enquadramento Iluminista, corporificado na crença no progresso constante, e no alcance
irrestrito da razão e da ciência. Dessa forma a perspectiva da Geografia Cultural tem como questionamento
os sujeitos posicionados em múltiplas identidades, transitórias e até mesmo contraditórias, de acordo com os
diferentes grupos em que se desdobram. Através deste entendimento, as identidades não são fixas nem
permanentes, mas são transformadas continuamente pelas práticas culturais. Assim, o sujeito assume
identidades diversas em diferentes momentos. Neste sentido, esta perspectiva contribui para examinar as
formas tradicionais da construção de significados para o gênero. Ancorada nesta perspectiva teórica,
pretendo compreender a identificação e a localização dos cânones que sustentam e consagram a
sexualização dos setores ocupacionais do mercado de trabalho de Fortaleza/CE, possibilitando questioná-lo.
As relações de gênero podem ser entendidas como aquelas que põem em jogo representações e símbolos de
masculino e feminino, e dependem das práticas sociais para se manterem vivas no conjunto de valores da
sociedade. A reflexão sobre gênero mostra que a realidade é atravessada por múltiplas linhas e, portanto,
toda e qualquer informação sobre as mulheres implica, necessariamente, pensar a, multiplicidade do/a(s),
o/a(s) e Outro/a(s). As representações de masculino e as de feminino, por exemplo, não são as únicas. Logo,
a utilidade do gênero está em desconstruir, deslocar significados que foram culturalmente construídos e
mostrar que, quando construídos em torno da diferença sexual, podem e devem ser tencionados,
questionados, problematizados. O uso do gênero como um foco central é pertinente para as análises ao
auxiliar a entender as construções culturais que dizem respeito o posicionamento de homens e mulheres por
diferentes
setores
ocupacionais
do
mercado
de
trabalho.
Fortaleza tem vivenciado nas últimas décadas um crescimento de novos postos de trabalho, resultante tanto
do processo de globalização do mercado, na modernização das atividades econômicas como do aumento
populacional. Diante disso, associam-se numa nova reestruturação organizacional dos postos de trabalhos,
alguns são eliminados, outros são inovados. Tal fato vem proporcionar um desequilíbrio entre as
necessidades de absorção da força de trabalho e as possibilidades de oferta de emprego em relação ao
gênero. Essas políticas têm produzido injunções que incidem desigualmente sobre as identidades de gênero,
possibilitando uma cartografia territorial elaborada a partir de subordinações, discriminações e privilégios
entre eles. As desigualdades entre gênero no mercado de trabalho vão além da diferença marcada pelo sexo,
à idade e à cor, variáveis preponderantes na ocupação setorial do mercado de trabalho, elas acentuam o
diferencial de opções de inserção ocupacional entre os grupos, constituindo uma segregação no mercado de
trabalho, que faz com que eles se concentrem em tipos diferentes e desiguais de ocupações. Tais
posicionamentos produzem conseqüências perversas entre homens e mulheres, pois separá-los e atribuirlhes diferentes funções possibilitam tratá-los desigualmente nas oportunidades. Isso provoca menores
remunerações
e
menos
condições
sociais
para
as
mulheres.
Para entender estas questões foram buscadas os dados para a pesquisa nos Censos do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), no Anuário Estatístico do Sistema Nacional de Empregos (SINE/CE) e o
Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT) no período de 2001 e 2005, por apresentarem maiores
acessibilidades e atualizações. A partir de sua coleta foram observados os comportamentos de algumas
variáveis que permitem compreender a problemática estudada: setor ocupacional, faixa etária, grau de
instrução e salário da população ocupada de Fortaleza. A primeira possibilitará examinar a divisão do
mercado de trabalho por setores (primário, secundário e terciário), com a finalidade de verificar a existência
de uma concentração específica do trabalho feminino. Através da faixa-etária permite observar a composição
e distribuição da população pelo mercado de trabalho, para investigar a constatação de
alterações/diminuições dos percentuais nas faixas de idade mais propensas ao trabalho. Por meio do nível de
escolaridade é possível verificar a qualificação da mão-de-obra entre homens e mulheres e por fim se fará
uma análise da distribuição de renda entre o gênero. O que tem gerado a discriminação, pois mesmo com a
crescente participação feminina no mercado de trabalho, contudo não foi acompanhada de uma elevação
linear
na
sua
remuneração
quando
comparada
com
a
do
homem.
As análises iniciais dos dados apontam que as mulheres fortalezenses, no período em estudo, representam o
maior contingente populacional da mão-de-obra ativa. No entanto, não dominam o quadro da população
ocupada, onde suas atividades principais estão no ramo do setor terciário. Neste setor desempenham as
atividades de professoras, enfermeiras e recepcionistas. No tocante a faixa etária as mulheres tem sua
melhor distribuição de ocupação na fase adulta entre os 20-49 anos, fato este interligado também com o
nível educacional, que mostra as mulheres mais preparadas devido seu grau de instrução mais elevado que
os homens, favorecendo assim para enfrentar as exigências do mercado de trabalho. No entanto, esta
qualificação não aparece em condições de melhores rendimentos, pois suas rendas estão concentradas entre
meio salário até dois salários míninos. Após as análises isoladas das variáveis serão efetuados seus
cruzamentos, os quais permitirão construir os eixos temáticos da pesquisas. Isto é permitirão estabelecer
reflexões mais pontuais para atender os objetivos propostos do estudo.
AO224 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Trabalho
[1751] O D ESAFI O D A UN I CI D AD E ORGÂN I CA D O TRABALH O: OS POVOS CERRAD EI ROS N A LUTA
POR UM TERRITÓRIO LIVRE.
MARCELO RODRIGUES MENDONÇA1; ANTONIO THOMAZ JÚNIOR2.
1.UFG - CAMPUS CATALAO, CATALAO, GO, BRASIL; 2.UNESP, PRESIDENTE PRUDENTE, SP, BRASIL.
Resumo:
A conformação espacial do campesinato brasileiro, historicamente, se verificou junto às áreas de produção
capitalista. O campesinato nasceu e recriou-se a partir da histórica expropriação, da mobilidade espacial e
das migrações. A desterritorialização vivenciada pelos camponeses e trabalhadores da terra se intensificou
com a crescente tecnificação da agricultura moderna, na medida em que o sentido do trabalho rural se
modificou. Assim, ainda hoje, aparece como algo crescente o fenômeno das migrações, ou seja, daqueles
trabalhadores que não conseguem se reterritorializar e buscam nos movimentos sociais que lutam pela terra
e
pela
reforma
agrária
a
alternativa
para
a
sobrevivência.
À medida em que as terras são incorporadas ao circuito produtivo para a produção de mercadorias, parcela
desses expropriados são forçados a migrar para áreas mais distantes, que se consubstanciam na recente
fronteira agrícola das áreas de Cerrado e das bordas da Amazônia, constituindo uma agricultura da
abundância. Desterritorializados e reterritorializados nas áreas de fronteira, constituem identidades na terra,
sem vínculos diretos com o mercado, tendo como principal objetivo a reprodução social da família. No
território brasileiro, desde a organização espacial na colônia, os camponeses e trabalhadores livres viviam
nos arredores da economia açucareira produzindo alimentos, inclusive para os engenhos. Aos poucos, se
configuraram em territorialidades imbricadas, constituindo a agricultura camponesa e a agricultura
capitalista,
na
gênese
do
processo
de
constituição
da
sociedade
brasileira.
Ao pensar a classe trabalhadora na contemporaneidade e, concretamente, esmiuçada a partir da
territorialização das empresas rurais nas áreas de Cerrado, algumas indagações são pertinentes: primeiro é
necessário compreender os camponeses como classe trabalhadora, mesmo porque na área pesquisada –
Goiás – são protagonistas da mais expressiva e importante ação política contra o capital. Todavia, sabe-se
que essa ação está eivada de paradoxos, uma vez que lutam pela permanência da propriedade individual da
terra, mas, ameaçados pelo agronegócio e pelas barragens, se mobilizam na defesa de seus interesses e
acabam por expressar possibilidades emancipatórias. Não apenas por isso, mas também pelo conteúdo das
relações estabelecidas, diante do surgimento de diversas categorias de trabalhadores que desejam a terra e,
assim, iniciam um gradativo movimento de diálogo em torno de reivindicações comuns – a terra.
Diversos elementos são (re)construídos e (re)inventados como forma de assegurar a permanência da
produção camponesa. Atualmente, é possível perceber a tentativa de uniformizar as formas de uso e
exploração da terra, hegemonizadas pelas empresas rurais. Contudo, a ação política construída pelos
trabalhadores da terra e camponeses na defesa da terra de trabalho implica no fortalecimento da reforma
agrária, demonstrando a re-Existência desses sujeitos sociais que buscam nas áreas urbanas o apoio
necessário para publicizar e manter a ação política na luta pela terra e na defesa da reforma agrária. Tudo
isso nos estimula a pensar que há um tensionamento favorável ao rompimento das fronteiras (intelectual e
politicamente) que nos mantêm distantes da compreensão das mutações que atingem frontalmente a classe
trabalhadora,
particularmente,
no
Brasil.
Pensar o novo conteúdo na relação cidade-campo parece algo estranho, uma vez que as idéias estão
consolidadas e expressam uma correlação de forças entre os diversos segmentos acadêmicos. Muitos dos
quais se enclausuram nos gabinetes e formatam realidades sem considerar que elas estão em constante
processo de transformação, agarrando-se às tábuas de salvação, “alumiando” o caminho para os menos
afortunados cientificamente. O debate sobre a relação cidade-campo é uma das mais importantes formas de
adquirirmos consciência das vivências e das experiências, e das ações, decorrentes da crise da sociedade
contemporânea. Para tanto, a cautela é uma necessidade, na medida em que não se pode discutir as
transformações espaciais sem considerar os processos intrínsecos à pesquisa, pois se corre o risco de tentar
compreender
as
permanências,
mas
sem
considerar
o
movimento
da
história.
A possibilidade de superação está na capacidade de determinação do futuro e na tentativa de dar novo
sentido às ações/decisões políticas. Para tanto, há que se apropriar de uma nova consciência, na medida em
que o presente não é alvissareiro, mas apresenta as potencialidades criadoras, enquanto condições objetivas
e subjetivas para animar uma ação política transformadora, agregando diferentes atores políticos, mas, com
o cuidado de que a diferença não seja apenas mais um discurso para manter a “normalidade” do
metabolismo social do capital. Esse é o desafio proposto: fazer essa reflexão no seio da Ciência Geográfica,
considerando as discussões postas pela Geografia do Trabalho.
AO225 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia do Trabalho
[1805] UM A CON TRI BUI ÇÃO AO EN TEN D I M EN TO D O CON FLI TO CAPI TAL X TRABALH O N O BRASI L
FREN TE AO AVAN ÇO D O CAPI TAL AGROI N D USTRI AL CAN AVI EI RO: ESTRATÉGI AS, TEN D ÊN CI AS E
NOVAS TERRITORIALIDADES.
ANA MARIA SOARES DE OLIVEIRA; ANTONIO THOMAZ JÚNIOR.
FCT/UNESP, PRESIDENTE PRUDENTE, SP, BRASIL.
Resumo:
Esta pesquisa pauta-se na investigação, apreensão e discussão dos rearranjos e redefinições técnicoprodutivas e organizacionais desencadeadas no âmbito do agronegócio canavieiro no Brasil, tendo como eixo
principal da reflexão a relação capital x trabalho. Nossa pretensão tem sido, portanto, apreender as novas
territorialidades e estratégias apresentadas pelo capital agroindustrial canavieiro frente ao processo de
expansão, e os mecanismos de exploração e controle do trabalho nesse contexto.
AO226 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia do Trabalho
[1889] CON FLI TOS E CON TRAD I ÇÕES EN TRE CAPI TAL VERSUS TRABALH O N OS LARAN JAI S
BAIANOS E SERGIPANOS.
JÂNIO ROBERTO DINIZ DOS SANTOS.
USP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
As transformações no mundo do trabalho frente o processo de reestruturação produtiva do capital, enquanto
resposta a crise do capital, pode ser compreendida também como a crise do trabalho e seus diversos
processos de territorialização, conforme acontece nos laranjais baianos e sergipanos, escolhidos como objeto
de nossa pesquisa. Assim, busca-se entender as transformações no mundo do trabalho, frente às demandas
do modo de produção capitalista, o processo de territorialização do capital, as diversas alianças estabelecidas
entre grupos capitalistas e latifundiários, a luta pela garantia do trabalho, por parte da classe trabalhadora
(cada vez mais explorada), mas também outras experiências desenvolvidas por estes como os sindicatos, as
associações, as cooperativas ou mesmo a luta pela terra via organização em Movimentos Sociais. Por outro
lado, é preciso que se considere a forma contraditória por meio da qual o capital penetra no campo brasileiro
e, neste caso, nos laranjais baianos e sergipanos, a partir tanto da expansão das relações de trabalho
tipicamente capitalistas como também reproduzindo e se apropriando (muitas vezes) sob formas das relações
não-capitalistas, garantida pelos processos de subsunção do trabalho e sujeição da renda da terra ao capital,
fundamentais a sua reprodução social. No entanto, é preciso que se considere que, ao mesmo tempo em que
o capital se apropria da produção camponesa, pode-se pensar que esta possa vir a ser uma possibilidade de
uma outra relação, que não seja necessariamente a da relação capital-trabalho que está sendo gestada no
campo brasileiro, e que precisa ser melhor compreendida, inclusive na região em estudo.
Desta forma, pretende-se analisar o movimento contraditório do desenvolvimento do capitalismo no Brasil, a
partir da hipótese de como as contradições entre capital versus trabalho na região citrícola baiana e
sergipana vêem promovendo profundas modificações territoriais frente às novas formas de gestão e controle
do trabalho e, ao mesmo tempo, o desenvolvimento de estratégias por parte dos trabalhadores e
camponeses para continuar participando do processo produtivo; com repercussões nas condições de vida
destes últimos que buscam participar, ainda que parcialmente, da construção neste território citrícola.
Marx (1983, p. 149) pressupõe que o processo de trabalho deve ser considerado de início
independentemente de qualquer forma social determinada. Enquanto o trabalho é um processo entre o
homem e a natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu
metabolismo
com
a
natureza.
Mészáros (2002) em sua obra Para Além do Capital esboça a contradição entre forças produtivas e relações
de produção. Segundo este autor a formação social capitalista é marcada por uma contradição imanente, ao
mesmo tempo em que aumenta sua capacidade produtiva, dispensa a força de trabalho, proporcionando um
descompasso entre a capacidade produtiva e a possibilidade de consumo, que está imbricado na relação no
aumento
do
desemprego.
Antunes (2002) discute várias dimensões que são centrais ao pensar o mundo do trabalho hoje em suas
formas contemporâneas. Dimensões da vigência da centralidade do trabalho ou nos seus múltiplos sentidos
que o trabalho adquire. Discorda de Gorz (2003) e até mesmo de Kurz (S.D), que advogam o fim do trabalho
embora admita a complexidade das relações laborativas. Complexidade de relações que envolvem as
relações entre trabalho produtivo e trabalho improdutivo, trabalho material e imaterial, trabalho manual e
intelectual, e o teletrabalho. Segundo Antunes (2002, p.104) essas relações que foram apresentadas como
nova conformação da classe-que-vive-do-trabalho, ao invés de negar a centralidade do trabalho é uma base
concreta para reafirmar a centralidade do trabalho no capitalismo contemporâneo. Assim, sustenta a tese de
que houve uma heterogeneização, complexificação e fragmentação da classe-que-vive-do-trabalho.
Apresenta esta como tendência influenciada pela redução do proletariado industrial, fabril, tradicional,
especializado, herdeiro da indústria verticalizada (modelo Taylorista/Fordista) e expansão ocidental do
Toyotismo.
Enquanto para Kurz (em sua obra A Honra perdida pelo trabalho) a crise do sistema mundial produtor tem de
ser buscada para além da sociedade industrial, do mercado e do Estado, ou seja, na dissolução da sociedade
do trabalho. Kurz também recorre à dimensão marxiana entre o trabalho concreto e trabalho abstrato,
esclarece a importância da distinção, que é imprescindível, pois permite qualificar a dimensão do trabalho no
qual ele está se referindo. Na sua obra Kurz destaca que o que está em crise é o trabalho abstrato, aquele
que produz valor de troca. A sociedade em que o ócio involuntário (desemprego) se opõe ao tempo livre,
enquanto representação moral socialmente reconhecida e válida. O destaque aqui dessa interpretação é que
corre-se o risco de virar uma finalidade natural as contradições que são sociais e historicamente
estabelecidas. Acreditamos que a defesa da sociedade de tempo livre, na qual o trabalho concreto é
subsumido pelo capital é ambíguo, pelo menos para todos os membros, pois, com isso se mantendo as bases
de produção e reprodução social, já que, esta se apresenta de forma diferente a partir da possibilidade de
distinção e condição da classe social no capitalismo. Somente a partir da superação do sistema de produção
para o socialismo e o comunismo, coisa que o autor não acredita ou demonstra muito ceticismo ou
pessimismo em conseguir e relata as experiências e fracassos do socialismo real que foi analisado pelo
mesmo como socialismo dos produtores como impossibilidade lógica. Kurz (S.D.) ainda em sua obra A Honra
perdida pelo trabalho enfatiza a categoria real do trabalho que há de ser concebida como trabalho abstrato
no sentido de uma indiferença destrutiva no que se refere ao conteúdo material dos agentes opostos em
movimento. Indiferença que segundo este autor se manifesta não apenas no plano subjetivo e psicológico da
“insatisfação com o trabalho”, mas com a crescente “objetividade da catástrofe” como processo objetivo do
mundo.
Conclui-se que o território, enquanto dimensão política encontra-se representado enquanto campo de forças
de interesses divergentes, por meio do qual é possível a análise geográfica dos conflitos no território e das
contradições existentes na relação capital versus trabalho. Neste contexto, destaca-se a importância da luta
de parcelas menos favorecidas da sociedade, na busca de participar, ainda que parcialmente, da produção do
território, imprimindo, também, a sua territorialidade.
AO227 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Trabalho
[1969] ESPACI ALI D AD ES E EXPAN SÃO D A ED UCAÇÃO SUPERI OR PRI VAD A N O ESPAÇO
METROPOLITANO E A IDEOLOGIA DA QUALIFICAÇÃO DO TRABALHO.
LEONARDO CHAGAS DE BRITO.
PPFH/LPP/UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O objetivo geral desse trabalho é estabelecer relações entre a expansão da educação superior no espaço
metropolitano
e
o
componente
ideológico
capitalista
da
qualificação
do
trabalho.
No que se refere às questões teórico-conceituais, o espaço é formado e transformado historicamente a partir
do trabalho que permite o advento das técnicas (sistema de objetos) incorporada de novos saberes (sistema
de ações) que ao mesmo tempo se transforma em técnica (racionalidade das ações) (Santos, 1994), além
das múltiplas especificidades produtivas, econômicas, políticas e administrativas na/da construção espacial
capitalista. A relação trabalho-saber-técnica constitui a própria essência na/da construção espacial.
O espaço metropolitano seria o grande palco desse processo como o local que sofre constantes
transformações em decorrência da concentração dos principais sistemas produtivos e de serviços
ocasionando maiores fluxos de mercadorias, capitais, pessoas e informações, sendo ainda a materialização,
reflexo
do
sistema
capitalista
e
a
condição
da
existência
do
mesmo.
A ideologia que gira em torno da técnica, saber, educação superior e trabalho, no atual período técnicocientífico-informacional são gerados pelos principais agentes do trabalho no sistema capitalista e adquiridos
quase que instantaneamente pela sociedade sem que se perceba ou questione as relações inseridas na
questão
como
tentativa
de
superação
ou
de
construção
de
outras
possibilidades.
A educação tem um papel fundamental aos interesses do capital na formação de trabalhadores para os
setores produtivos. A “idéia de capital humano” perdura ao longo do século XX e o atual, mas a subordinação
das práticas educativas aos interesses do capital fazem parte da sua construção histórica (Frigotto,2003).
Para o capital COM requintes ideológicos, torna-se necessário um trabalhador mais “qualificado” para estar
de acordo com as necessidades produtivas e comerciais, para melhor gerenciá-los, tirando maior
aproveitamento possível para que a acumulação se torne cada vez mais rápida e maior.
Este item é fundamental para que possamos dar maior dimensão de uma das conseqüências materiais da
relação trabalho-saber-técnica e educação superior inseridos na ideologia da qualificação num dos espaços
onde
o
capitalismo
mais
se
reproduz:
O
espaço
metropolitano
E é a partir desses componentes ideológicos que em geral a sociedade vê a importância da educação superior
na medida em que ela possa oferecer melhores condições para uma possível inserção no “competitivo
mercado de trabalho”. No caso, se inserir no mercado formal de trabalho com maior estabilidade e
rentabilidade, coisas que se encontram nas empresas de grande porte como multinacionais e empresas
estatais que, de certa forma, ainda oferecem certas garantias e melhores salários, considerando que a
precarização das relações e dos contratos de trabalho e o desemprego foram avassaladores na última década
neoliberal.
Apesar do espaço metropolitano concentrar grande diversidade de atividades de trabalho, não significa que
haja emprego para todos, e na versão do empresariado, isto é explicado em vários momentos, pelo baixo
nível de qualificação. O espaço metropolitano por ser um constante local de disputa existe busca incessante
do trabalhador por cursos variados e educação superior, visando melhor formação profissional e maior
possibilidade
de
emprego.
Assim, desencadeia-se uma busca constante por lucros do “mercado da educação superior” pouco explorado,
aumentando o número de instituições de educação superior privadas e suas espacialidades na metrópole. Em
números absolutos, o setor privado passou de 392.041 ingressos em 1997, para 995.873 ingressos em 2003.
O ensino superior, como um todo (público + privado), passou de 573 mil para 1,26 milhão de ingressos no
mesmo
período.
(Braga
&
Monteiro,
2005)
Já que o Estado não cria vagas suficientes no ensino superior público, a possibilidade de se aumentar o
número de vagas é muito pequena, com isso há uma falta do atendimento da demanda promovendo assim o
crescimento de instituições de ensino superior privadas. Ou seja, “quanto menos crescer o atendimento da
demanda do ensino superior público, tanto mais poderá crescer o mercado atendido pelo setor privado”
(Menezes,
2002).
Consideramos que a partir de fatores relacionados como leis e autorizações do Estado, a ideologia do capital
humano e qualificação profissional, a falta de atendimento da demanda pelo setor educacional público, os
baixos preços das mensalidades (na grande maioria das instituições e em determinados cursos) e a sedução
publicitária ocasionam no aumento quantitativo das instituições privadas de educação superior. Tais
condições são fundamentais para a compreensão da expansão de tais instituições, mas o fator ideológico é,
ao nosso ver, significativo para mercantilização e instrumentalização do saber e do trabalho ampliando as
espacialidades dos interesses privados educacionais que se reproduzem no espaço metropolitano.
AO228 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Trabalho
[2018] D A TEORI A À PRÁXI S: OS COLETI VOS ESPAN H ÓI S E A PROD UÇÃO COLETI VA N A ÓTI CA
ANARQUISTA.
VALERIA DE MARCOS.
DEPTO. DE GEOGRAFIA FFLCH USP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
É de longa data que uma parte da humanidade tem se empenhado na busca de formas de organização da
produção capazes de possibilitar uma vida em bases mais equas e no respeito do ambiente. O mesmo
momento histórico que gera uma forma de capitalismo aparentemente hegemônico gera, contraditoriamente,
os germes da sua superação através de grupos sociais e de intelectuais que buscam alternativas e buscam, o
quanto possível, colocá-las em prática. É neste quadro que se inserem as discussões realizadas há mais de
um século no interior do movimento anarquista, sobre a organização da sociedade em bases coletivistas e
comunistas/comunitárias.
O que animou a discussão no interior do movimento anarquista foi a necessidade de apresentar propostas
concretas a serem colocadas em prática imediatamente após a realização da revolução social. As raízes
destas propostas podem ser encontradas na Revolução Francesa e nos ideais de liberdade, igualdade e
fraternidade por ela apresentados e divulgados pelo mundo todo. A consciência da força da classe
trabalhadora, assim como de sua capacidade de organização nos sindicatos, serviu de estímulo ao debate
sobre as formas de organização possíveis da sociedade futura. A sede privilegiada desses debates foi a
Associação Internacional dos Trabalhadores, sobretudo a Primeira Internacional, onde os socialistas
discípulos de MARX e os anarquistas discípulos de BAKUNIN apresentaram e defenderam as suas propostas
para a sociedade revolucionária.
De acordo com os anarquistas – nos centraremos nas suas propostas para a produção coletiva e comunitária
– a primeira tarefa da revolução deveria ser a realização da expropriação, de forma radical e integral, de
todos os bens que pudessem permitir a quem quer que fosse de explorar o trabalho de outrem. Tal
expropriação – que deveria realizar-se em todos os setores da economia para não permitir retrocessos – teria
garantido a todos o livre acesso a todos os meios necessários a desenvolver as suas faculdades de acordo
com as suas possibilidades.
Superada esta fase, a sociedade seria organizada em comunas auto-geridas que teriam buscado, dentro dos
limites impostos, alcançar a auto-suficiência através da diversificação da produção e de uma prática agrícola
no respeito do ambiente, privilegiando as técnicas e os métodos de cultivo resultantes mais eficazes no
decorrer do tempo, recuperando assim os saberes locais e considerando a terra como um patrimônio comum,
do qual dispôr em benefício de cada um e de todos. KROPOTKIN aconselhava também a integração entre as
atividades agrícola e industrial, e o estabelecimento do primado do mercado interno sobre o externo. A estes
princípios podem ser reconduzidas as propostas atuais de fechamento dos ciclos ecológicos e das fileiras
econômicas apresentadas pelas teorias de desenvolvimento local auto-sustentável.
Todas estas propostas eram compartilhadas pelas duas correntes da escola socialista, a coletivista e a
comunista. A polêmica existente referia-se à forma de acesso ao fruto do trabalho desenvolvido
coletivamente, e é aqui que reside a diferença entre a produção coletiva e a produção comunitária,
comumente utilizadas como sinônimos. Ponto de partida de ambas as correntes era a necessidade de se
alcançar o verdadeiro objetivo da revolução social na ótica anarquista: o estabelecimento da completa
liberdade e igualdade entre os homens, ou seja, igualdade não apenas política, mas também econômica e
social. O caminho a ser trilhado para alcançar tal objetivo é que irá caracterizar estas duas formas de
produção na agricultura.
De acordo com BAKUNIN, cujas idéias deram origem à escola coletivista, o objetivo da revolução na ótica
anarquista seria alcançado “por meio da organização espontânea do trabalho e da propriedade coletiva das
associações produtoras livremente organizadas e federadas nas comunas e por meio da federação, esta
também espontânea, destas comunas” (BAKUNIN, 1977a:75).
O outro pilar das idéias anarquistas, base de sustentação da sociedade do devir e de todas as propostas de
sua organização econômica e social, era a justiça, não aquela dos códigos, mas aquela baseada na
consciência dos homens. A sociedade organizada sobre estas bases deveria fazer com que todos os homens
pudessem ter “os meios materiais e morais para desenvolver plenamente a sua própria humanidade; tal
princípio se traduziria (…) da seguinte forma: organizar a sociedade em tal modo que qualquer indivíduo,
homem ou mulher, vindo à luz, encontre oportunidades iguais para o desenvolvimento das próprias
faculdades e para a utilização das mesmas com o próprio trabalho; organizar uma sociedade que, tornando
impossível a quem quer que seja a exploração do trabalho de outrem, permita a cada um participar do
resultado das riquezas sociais (na realidade produzidas somente através do trabalho), somente na proporção
em que terá contribuído a produzí-las com o próprio trabalho” (BAKUNIN, 1922:55/56). Estas eram as bases
da organização coletiva da produção, que mais tarde se traduziram no moto «de cada um, de acordo com as
suas possibilidades e a cada um, de acordo com o seu trabalho».
É neste quadro que iremos analisar a experiência dos coletivos durante a Guerra Civil Espanhola onde, uma
vez realizada a expropriação, foi estabelecida a propriedade comum das terras e dos instrumentos de
produção e foram criados os coletivos com base na estrutura das comunas autogeridas propostas por
BAKUNIN e KROPOTKIN. O presente trabalho apresenta parte dos resultados alcançados em nossa tese de
doutorado já concluída, tendo sido realizado a partir da leitura de autores como PRESTON, PEIRATS,
BRENAN, BROUÉ e TÉRMINE, DELLACASA, RANZATO, RICHARDS, LEVAL, entre outros, além das obras dos
anarquistas BAKUNIN e KROPOTKIN. Nele trataremos dos passos dados para a organização dos coletivos, sua
forma de organização e funcionamento, dos resultados alcançados, dos espaços e territórios que dele se
originaram.
AO309 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1222] A AUTO - SEGREGAÇÃO SÓCI O- ESPACI AL EM PALHOÇA- SC: O CASO D O LOTEAM EN TO
PEDRA BRANCA.
FERNANDO PINTO RIBEIRO.
UFSC, FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL.
Resumo:
Neste trabalho propõe-se analisar um processo de estruturação urbana que resulta em formas urbanas
distintas e díspares, um fenômeno denominado Segregação Sócio-Espacial, a manifestação das classes
sociais no espaço. Baseando-se na dinâmica e no arranjo espacial da região Metropolitana de Florianópolis,
fora enfocado o loteamento Pedra Branca em Palhoça, um vasto empreendimento imobiliário voltado para
populações de maior renda. Palhoça, assim como outros municípios do litoral central do Estado, apresenta
um traço marcante da colonização açoriana, com atividades econômicas voltadas para o turismo, pesca e
indústria de pequeno e médio porte. O forte crescimento populacional ocorrente a partir dos anos 70 e, ainda
mais em 80 e 90, aliado a políticas públicas incapazes de ordenar a nova configuração territorial municipal,
evidenciou graves problemas ligados a infra-estrutura e a pobreza, sérios obstáculos enfrentados pelos
habitantes do município. Neste ínterim, a atração de grandes grupos do setor imobiliário, tendo como
principal os empreendedores do loteamento Pedra Branca, viabiliza bons subsídios para se analisar a
segregação. Com isto, buscou-se estudar os agentes e processos formadores deste espaço, caracterizando o
processo de segregação sócio-espacial ocorrentes na área do loteamento e prevendo os impactos e
transformações espaciais nos próximos anos. Isto acarretou numa pesquisa sobre os processos espaciais que
levaram o Pedra Branca a se constituir, bem como sobre a evolução da urbanização e das desigualdades do
município. A fim de se levantar dados, foram pesquisados outros estudos relevantes ao tema tratado,
realizados campos a área de estudo e produzido trabalhos gráficos, com o intuito de gerar hipóteses e
resultados que pudessem situar a produção e reprodução espacial na Região Metropolitana de Florianópolis.
Muito se produziu sobre o tema segregação sócio-espacial, seja no Brasil ou no Exterior. Dentre alguns
estudos de relevante interesse, é válido ressaltar alguns autores da Escola de Chicago, tais como Mackenzie
e Park, e outros da escola de Sociologia Urbana Francesa, com destaque para Manuel Castells. O embate
teórico das duas escolas se baseia, a priori, no entendimento da formação de espaços segregados, no qual o
viés marxista da segunda corrente procura desmistificar a naturalização da formação da segregação,
proposto pela primeira. No Brasil, Flavio Villaça, Maria Encarnação Beltrão Sposito, Roberto Lobato Correa,
dentre outros, desenvolvem uma reflexão para o entendimento da Segregação e da Auto-Segregação em
âmbito Latino-Americano. Villaça, por exemplo, baseia-se em estudos de caso de algumas das principais
metrópoles brasileiras, expondo que o padrão mais conhecido de segregação nestes casos é a oposição
centro-periferia. Em Palhoça, valemos dos estudos de Vilson Farias e Claudir Silveira, contribuições
interessantes para clarificar os parâmetros sócio-econômicos do município. Assim, verificaram-se que os
problemas sociais e urbanos de Palhoça, unem-se a formação de um lugar de usos mistos, com arborização e
com completo acesso aos serviços públicos, dotado de zonas industriais, comerciais e residenciais, ao qual
vêm atraindo moradores de diversas localidades externas. Seu surgimento fomentou uma forte disparidade
com relação aos níveis de renda e a acessibilidade aos serviços urbanos, alterando os valores da terra. A
segregação sócio-espacial aflora com esta valorização, podendo ser aprofundada com as determinantes do
novo modelo urbanístico adotado, o Novo Urbanismo. Com o referencial teórico e o estudo empírico, notou-se
que a existência do loteamento, enquanto produto oferecido e procurado pelo mercado imobiliário, manifesta
um processo de isolamento voluntário de determinados grupos, que, como foi analisado através de
questionário realizados no empreendimento, provém, em sua maioria, de Florianópolis e fora de Santa
Catarina. Esse típico processo de dinâmica sócio-espacial ilustra fortemente uma cidade (neste caso a RMF)
em constante transformação. Vemos que o domínio e monopolização espacial evidenciados na ação de
grandes empresas privadas demonstram o verdadeiro conflito que emerge na reprodução espacial. A
colaboração do Estado (prefeitura de Palhoça), na incorporação e da implantação do loteamento reforça
ainda mais o papel dos grandes modificadores do espaço. Com relação às conseqüências aos bairros de
entorno e a Palhoça como um todo, podemos levantar a hipótese que, a crescente valorização da terra,
ocasionada pelas melhorias trazidas com o empreendimento, induz a conseqüências de ordem dinamizadora
e de mobilidade. Ou seja, é tendencioso avaliar que vêm ocorrendo um típico caso de reprodução espacial,
onde os bairros de entorno passam a se valorizar e adquirir maior importância no conjunto da cidade.
Conforme já citado, o mercado imobiliário tende a focar nestes locais como novas áreas para investimentos,
o que pode engendrar a mobilidade das populações que ali residem para outros um pouco mais afastados. Os
habitantes com renda média a baixa tendem a ser substituídos por outros com um poder aquisitivo um pouco
maior, caracterizando uma dinâmica segregacional gerada por novos bairros habitados por grupos sociais de
alto
status.
Por fim, a promoção de integração social pode e tende a ser viabilizada através de espaços culturais,
comerciais e de lazer, ao mesmo tempo em que se investe gradativamente numa urbanização condizente e
consciente com o bem-estar do cidadão. São políticas que podem trazer uma realidade melhor, por mais
paliativo que seja. Além disso, nos vemos diante de novas práticas atreladas ao planejamento e a gestão da
cidade, responsáveis por influir nos parâmetros de segregação sócio-espacial, como o orçamento
participativo.
AO310 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1475] A UTILIZAÇÃO DOS INDICADORES SOCIAIS PELA GEOGRAFIA : UMA ANÁLISE CRÍTICA.
JOSÉ CARLOS MILLÉO.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, SAO GONCALO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O presente resumo pretende sintetizar os principais aspectos da tese de doutoramento defendida pelo autor
ao final do ano de 2005 na Universidade Federal Fluminense no Programa de Pós-Graduação em Geografia
desta
instituição.
O objetivo deste trabalho é elaborar uma crítica ao processo de adoção e utilização dos indicadores sociais
pela Geografia. Esta proposta baseou-se no argumento de que este encontro, Geografia/indicadores, não tem
sido devidamente explorado em função de uma atmosfera povoada de deficiências e lacunas teóricas. Para
que a superação desta atmosfera se dê defendemos que alguns caminhos deverão ser trilhados
inapelavelmente. Neste sentido, cada capítulo deste trabalho representa uma tentativa de colaborar para a
criação desta atmosfera, buscando desvelar não só a forma como a Geografia passou a se utilizar dos
indicadores sociais, mas também, e mais recentemente, como estão se dando algumas tentativas de analisar
os indicadores sociais a partir também de uma perspectiva que, ao menos, pretende ser menos “descolada”
do
componente
espacial.
Em primeiro lugar, julgamos necessário que as idéias que regeram a criação do conceito de indicador social
sejam examinadas mais detidamente e, desta vez, tentando esquadrinhá-las como circunstâncias que
reverberam fortemente no encontro da Geografia com este instrumental. Em função disto, é que foram
alinhadas aquelas que, ao nosso entendimento, são as duas principais fontes teóricas que justificaram a
possibilidade de existência dos indicadores sociais e que lhes forneceram suas funções dentro do
planejamento estatal e privado. De um lado, abordamos a corrente utilitarista dentro da Economia, tanto em
sua versão (que Amartya Sen denomina de) Ética quanto a “corrente da Engenharia”, dentro da qual figuram
alguns economistas neoclássicos de grande expressão. Do outro lado, procuramos demonstrar como algumas
idéias advindas da chamada Escola de Chicago também desempenharam um papel decisivo na constituição
das primeiras idéias que indelevelmente marcaram os indicadores sociais, tendo em vista, principalmente, o
interesse desta escola por formas de compreensão da mudança social e dos impactos que inovações
tecnológicas
poderiam
provocar
na
sociedade.
Tendo em vista o destaque dado a estas duas fontes de influência, são apontadas possibilidades e
deficiências dos indicadores sociais. Caracteriza-se o encontro da Geografia com os indicadores sociais como
tendo sido marcado pela desconsideração das circunstâncias anteriormente citadas. Isto se reflete em um
olhar negligente para com o indicador social e seu papel como objeto técnico auxiliar na produção de um
espaço racional. Deste modo, o trabalho lembra que os conceitos próprios da Geografia podem ser
redirecionados à construção dos indicadores sociais. Foi apontada também uma reduzida reflexão sobre a
reconstrução e representação estatística, o que colabora para que se mistifique sua utilização e prejudique a
análise dos processos que compõem a substituição de um conceito social por dados estatísticos.
Este trabalho infere que, de forma crescente, incursões em torno da relação entre o espaço e os indicadores
sociais deverão se dar, como uma repercussão mais imediata das novas demandas de informação, tanto para
o controle quanto para a exploração de novas frentes ao processo de acumulação. Para isto, demonstrou-se
como os estudos interessados na mudança social fomentaram as primeiras discussões em torno da idéia de
se criarem indicadores sociais que mais recentemente vêm sofrendo questionamentos através da
reconsideração de alguns de seus pilares como a modernização, o progresso ou mesmo o desenvolvimento.
Este processo de procura por novas bases de informações, assim como os questionamentos dos formatos
tradicionais de obtê-las, vem provocando a reemergência de debates mais afeitos ao campo da Ética e da
Filosofia Política que, de maneira geral, haviam se afastado das discussões sobre os indicadores sociais. Estes
debates são aqui explorados não só como uma recomposição de aspectos anteriormente relevados, mas
também como um chamamento à reconsideração do componente espacial que transpassa o tema indicadores
sociais. Foram examinadas, em especial, propostas liberais como as do filósofo político John Rawls e do
economista Amartya Sen, tentando levantar as possibilidades destes dois autores funcionarem como alvo de
ponderações
provindas
da
Geografia.
Por fim, são feitas algumas reflexões com base em pesquisas mais recentes. Os apontamentos feitos a tais
trabalhos já procuram evidenciar novas tendências que podem ser assumidas na “métrica” do social.
Também se analisam as perspectivas que exploram o conceito de pobreza, demarcando-o de maneira mais
rígida e tradicional, com base ao acesso sobre bens e rendas e que, com esta linha, procuram mapear a
pobreza, até pesquisas que procuram utilizar o conceito de território para abordar a exclusão social.
Palavras-chave: indicadores sociais, Geografia, objeto técnico, racionalização, mudança social.
AO311 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1691] AN ALI SAR A SEGREGAÇÃO URBAN A: PAD RÕES ESPACI AI S D E ESTRUTURAÇÃO D O ESPAÇO
URBANO.
LILIAN HAHN MARIANO DA ROCHA.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA, SANTA MARIA, RS, BRASIL.
Resumo:
ANALISAR A SEGREGAÇÃO URBANA: PADRÕES ESPACIAIS DE ESTRUTURAÇÃO DO ESPAÇO URBANO
Embora se reconheça que nos últimos anos (especialmente a partir da década de 70, na França e Estados
Unidos, e na de 80, no Brasil) tem-se produzido razoável acervo de informações espaciais intra-urbanas, os
estudos sobre processos espaciais e sua atuação na organização da estrutura espacial urbana – dentre eles o
de segregação residencial – não apresentam larga tradição nas pesquisas. È somente no inicio do século XX
que os pesquisadores passam a trabalhar mais ou menos sistematicamente estes processos; os quais
tiveram enorme influência da Escola de Sociologia Urbana (Escola de Chicago), especialmente através do
padrão de círculos concêntricos de localização da população dispostos ao redor de uma área central,
conforme descrito por Burgess, com base nos estudos realizados na década de 20, na cidade de Chicago,
onde a população de alto status residia na periferia. Outro exemplo é o modelo setorial de distribuição dos
estratos sociais elaborado por Hoyt, em 1939, a partir de um estudo incluindo 25 cidades americanas, onde a
população de alto status ocupava um setor da cidade diametralmente oposto a localização da população de
baixo status econômico. A partir destes estudos, as discussões sobre onde se localizam os diversos estratos
sociais na cidade ganha força, e inúmeros estudos são realizados. Estes dois padrões são identificados para
sociedades industrializadas, que se caracterizam por apresentar um elevado grau de desenvolvimento
tecnológico e populacional, bem como de diversidade econômica, traços característicos das metrópoles e
grandes
cidades
industrializadas.
Entretanto o padrão mais antigo e mais abrangente tanto espacial quanto temporalmente, e ainda
largamente encontrado até hoje, é aquele estudado por Kohl, em 1841, para distribuição dos grupos sociais
da Europa Continental, em uma época em que os efeitos do capitalismo ainda não se faziam sentir
completamente – sociedade pré-industrializada, tendo a população de alto status residindo no centro e a de
baixo status na periferia. Este padrão revela-se contrário ao modelo de Burgess, embora mantenha o mesmo
modo
de
distribuição
na
forma
de
anéis
concêntricos
(Corrêa,1995).
Em 1960, Guideon Sjoberg publicou o livro The Preindustrial city, em que estuda os padrões espaciais das
cidades européias da idade média comparando-os aos das cidades atuais. Concluiu, assim como Kohl, que
nas cidades atuais a elite reside no centro; entretanto, a partir do momento que se industrializam, esta
organização adquire nova configuração: as elites passam a ocupar círculos ou setores de círculos da periferia
urbana.
Para Sjoberg, as sociedades evoluem de um estagio pré-industrial para um industrial, passando por uma fase
intermediária em que apresenta tanto características da sociedade industrial como da pré-industrial. A cidade
pré-industrial, com a elite no centro e os pobres na periferia, ao se industrializar, modernizar, muda sua
configuração espacial, havendo o abandono, em maior ou menor grau, do centro e ocupação da periferia, ou
de setores da periferia pela população de alta renda. Sjoberg aponta em seus estudos sobre organização
espacial
das
cidades,
para
a
tese
da
mudança
técnica,
econômica
e
espacial.
Leo Schnore (1975), revisando as pesquisas de outros estudiosos sobre cidades latino americanas, confirma
para estas cidades a mesma tendência observada por Sjoberg (1960): a mudança da população de alto
status
em
função
da
industrialização
e
do
crescimento
urbano.
Essas mesmas mudanças foram observadas por Yujnovsky (1971), Mértins/Bähr (1983), para metrópoles
latino-americanas. No Brasil, Villaça (1978;1998), por meio de seus estudos para seis metrópoles brasileiras,
também
evidencia
esta
mudança
para
todas
as
capitais
por
ele
analisadas.
Pode-se, assim, observar que, na literatura, tem-se discutido o processo de mudança do padrão espacial da
cidade sob o ponto de vista da mudança técnica/econômica, qual seja, as cidades mudam sua organização
interna, a partir de sua industrialização e conseqüente crescimento econômico e populacional.
Partindo dessas observações sobre evolução da estrutura espacial interna das cidades de um estágio préindustrial para um industrial, muitas questões ainda persistem, dentre elas: que padrão apresentam as
cidades atuais que modernizaram suas estruturas, apresentam novos atores sociais atuando em seu espaço,
porém
não
passaram
por
um
processo
de
industrialização?
Até que ponto as cidades não industrializadas apresentam um padrão locacional de cidades préindustrializadas? Teriam elas a população de alto status residindo em áreas distantes do centro? O padrão
espacial dessas cidades sempre foi o mesmo? Se mudou, desde quando? Como era no passado e por que
mudou? Que agentes sociais foram responsáveis pela organização atual? Quais os impactos espaciais e as
transformações sociais nesse tipo de espaço? Qual a origem dos grupos sociais existentes no espaço urbano
da cidades? Qual o arranjo das áreas e suas mudanças? E as outras atividades: comércio, serviços, que local
ocupam no espaço urbano dessas cidades? Que relação apresentam os sistemas viários – local e regional,
com
as
localizações
entre
os
diversos
elementos
da
estrutura
urbana?
Neste sentido, este trabalho, busca contribuir para retomada de um tema de estudo decisivo
para a compreensão da problemática urbana atual, qual seja: os estudos que envolvem a temática da análise
de
padrões
espaciais
de
distribuição
da
população
urbana.
Além disso, também vem a contribuir para a retomada do tema, a existência de posições divergentes
baseadas em teorias lançadas por diferentes autores, bem como o entendimento de que esses modelos, de
forma isolada, parecem não mais responder à realidade atual, especialmente por observar-se que todos
apresentam certa eficácia quando dentro de uma limitada área de abrangência. Na realidade, tais modelos
não são exatamente divergentes, mas podemos dizer que se complementam, uma vez que uma cidade pode
apresentar todos estes modelos em diferentes momentos de sua história, ou, também, resquícios de todos
eles juntos num dado momento de evolução espacial. Sendo assim, o objetivo dessa pesquisa é abordar a
evolução do estudo de padrões locacionais, no que tange a estruturação do espaço urbano, apresentando os
padrões
espaciais
existentes
e
o
padrão
latino-americano
de
organização
espacial.
Conclui-se que o processo de segregação residencial está presente no espaço urbano de diferentes tipos de
cidade, desde o seu nascedouro. Através da segregação residencial, ou mais precisamente através de uma de
suas frações – a elite - , que os outros grupos e atividades passam a se localizar no espaço, traduzindo-se
em padrões de organização espaciais. Tais padrões ou modelos espaciais representam possibilidades teóricas
e não modelos universais únicos, caracterizados cada um deles pela exclusividade descritiva da realidade
urbana
local.
Assim, os discursos sobre a temática da organização da estrutura social suscitam divergências, dentre elas a
discussão sobre até que ponto é possível formular leis de urbanização que subsistam em mais de uma
cultura. Cada cidade reveste-se de características próprias, seja no que se refere à dinâmica de sua inserção
na divisão territorial do trabalho, seja em relação ao conteúdo, à funcionalidade e às implicações sociais e
espaciais da racionalidade técnica presente no território, como também no que diz respeito ao processo de
(re)produção
do
espaço
urbano.
Há, entretanto, um certo consenso no que tange a mudança, a evolução dos padrões locacionais da estrutura
social, que encontram-se vinculadas às mudanças tecnológicas, ou seja, ao nível tecnológico e econômico
que
as
cidades
atingem.
Neste sentido, a literatura tem apontado que as cidades mudam suas configurações espaciais ao se
industrializarem, modernizarem, passando de um padrão pré-industrial, em que a elite reside no indo os ricos
residir na periferia. Há, portanto, o abandono pelas elites, em maior ou menor grau, do centro e ocupação da
periferia
ou
de
setores
da
periferia.
Os
estudos
de
Gideon
Sjoberg
(1960;
1975)
Leo Schnore (1975) apontam para essa tese de mudança técnica, econômica e espacial que ocorrem centro e
os pobres na periferia, para um padrão industrial, onde há uma inversão do padrão anterior, e nas grandes
cidades e metrópoles ao se industrializarem. Contudo, tanto os estudos de Sjoberg e Schnore, assim como os
de outros estudiosos sobre os padrões locacionais da estrutura social, que evidenciam esta “evolução” de um
padrão pré-industrial para um industrial, não apresentam propostas para cidades que modernizaram mas não
desenvolveram em seu espaço um parque industrial significativo a ponto de “transformar” seu espaço social.
AO312 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ordenamento Urbano e
Gestão Territorial
[1782] TERRITÓRIO DAS FAVELAS: LIMITES REAIS E IMAGINÁRIOS.
HELENA MIDORI KASHIWAGI1; ANA HELENA C. FREITAS GIL2.
1.UFPR A- CAMPUS LITORAL, CURITIBA, PR, BRASIL; 2.UFPR - ESCOLA TÉCNICA, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho busca apresentar algumas conclusões acerca da pesquisa realizada em comunidades marginais
urbanas, na qual tivemos como estudo de caso a Favela do Parolin em Curitba - PR. Trata-se de uma favela
extremamente emblemática para o poder público, pois as intervenções urbanas realizadas nos últimos 50
anos demonstraram que a problemática extende-se além dos aspectos físicos, territoriais e ambientais. O
cenário de pobreza assola a população dessa favela que aponta aproximadamente 4.779 habitantes, segundo
o último censo do IBGE em 2000. Sua proximidade com o centro de Curitiba, cerca de 4 km, tem sido uma
das principais preocupações dos planejadores urbanos, desafiando as políticas públicas de planejamento
urbano. Foram diversas as intervenções mal sucedidas nesta favela, constatando-se que a visão racional e
tecnicista sobre áreas irregulares não atende as necessidades reais destas populações marginais. Neste
sentido, o objetivo geral deste trabalho foi investigar de que forma os valores sociais, culturais e afetivos dos
moradores sobre o lugar, sobre o espaço vivido por eles, torna-se relevante para subsidiar as ações dos
planejadores urbanos e à implementação dos instrumentos de intervenção urbana. Diante do exposto,
recorremos aos aportes teóricos e metodológicos da Geografia Humanística em sua vertente fenomenológica
para se compreender o processo de percepção e apropriação dos espaços pelos moradores da favela. Assim,
buscou-se a interface da Geografia com o Planejamento Urbano, adentrando-se numa visão mais humanizada
do planejamento, e, dessa forma, contribuindo na interpretação da linguagem particular dessses moradores
sobre a definição e delimitação do território através de suas representações sígnicas sobre o meio vivido.
Para fundamentar essa discussão contextualizamos a fenomenologia percorrendo as suas origens e
observando a sua contribuição no diálogo com o Urbanismo e as Teorias Sígnicas. Neste sentido, para a
releitura do espaço enquanto espaço vivido e constituído a partir de experiências e vivências, recorremos a
diversos autores representantes da corrente fenomenológica, tais como os geógrafos Yi-Fu Tuan, Edward
Relph e Leonar Guelke, cujas obras sobre a importância dos lugares, do mundo vivido, dos significados e das
representações possibilitam uma nova leitura sobre o urbano. Incorporando a esse diálogo abordou-se o
olhar fenomenológico sobre as imagens sígnicas, fundamentando-se na Semiótica de Charles Pierce, por
meio do modelo sígnico triádico para interpretar o objeto, o interpretante e o signo. Os estudos sobre mapas
mentais utilizados pelo arquiteto Kevin Lynch para investigar a cidade nos embasaram na questão do
entendimento destas representações gráficas da Geografia. Para auxiliar tal compreensão, a pesquisa de
doutoramento de Salete Kozel tornou-se referencial, principalmente, por meio da metodologia por ela
desenvolvida para interpretação de mapas mentais. Recorremos a diversos autores brasileiros para contribuir
nesta reflexão, dentre os principais, destacamos Oswaldo Amorim Filho, Lívia de Oliveira e Elaine Kohlsdorf.
A discussão fenomenológica de Merleau-Ponty contribuiu para o aprofundamento das questões do mundo
vivido, enquanto lugar encarnado de experiências e aspirações de seus ocupantes, no qual o homem,
enquanto corpo coloca-se em relação direta e harmônica com o mundo. A metodologia utilizada para a
investigação foi o levantamento de dados a partir da pesquisa empírica que consistiu de entrevistas e
aplicação de mapas mentais. Esse trabalho de campo durou 2 meses, nos quais enfrentamos diversos
desafios para a concretização da pesquisa, principalmente, por causa dos tiroteios entre a polícia e os
bandidos da favela. O universo de amostragem entrevistado foi definido em três grupos: moradores da
favela, moradores do entorno da favela e planejadores urbanos. Nos mapas mentais solicitamos que
representassem por meio de desenho por meio de desenho como eles percebiam a favela. Nesta atividade
percebemos que a representação mental dos moradores e não moradores se distinguiam de seus relatos.
Tais contradiçoes nos levaram a alguns questionamentos: Os mapas mentais poderiam revelar a afetividade
sobre o lugar? Por que esses moradores omitiam a violência na linguagem oral, mas na linguagem desenhada
ela era representada? E mais: Os dados subjetivos e imaginários poderiam ter relevância na condução das
políticas públicas de intervençào urbana? Estas questões tornaram-se no cerne desta pesquisa, na qual
tentamos compreender as imagens sígnicas dos moradores, as quais desvendaram um mundo paralelo ao
mundo de violência constituído de valores e afetividade, o qual não é percebido pelos olhos dos planejadores
urbanos. A interpretaçào das construções sígnicas correlacionadas com elementos urbanos, numa relação
triádica, cujos moradores e não moradores da favela assumem papel de interpretante e o objeto no ambiente
experienciado, composto por elementos espaciais como a rua, a casa, o rio, por exemplo, permitiram que
esses elementos adquirissem significados topofílicos ou de topofobia, importantes para a construção dos
limites territoriais reais e imaginários. Neste sentido, os resultados desta pesquisa foram muito instigantes,
pois revelaram que por meio das representações cognitivas do mundo real é possível se compreender, por
meio de técnicas de interpretação, as percepçoes imaginárias do mundo vivido de cada indivíduo, permitindo
atravessar as barreiras do real ao imaginário. Assim, conclui-se que a fenomenologia nos possibilita
restabelecer o contato entre o mundo e as significações, onde o conceito de lugar é valorizado, permitindo
redefinir o território das favelas, onde os limites reais e imaginários, próprios de cada indivíduo, constituem
uma linguagem sígnica particularizada, cujos signos precisam ser levados em consideração nos processos de
ordenamento e gestão territorial.
AO313 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ordenamento Urbano e Gestão Territorial
[1838] A PRODUÇÃO DA SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL E OS MOVIMENTOS SOCIAIS URBANOS.
REGINA CÉLIA BEGA DOS SANTOS.
UNICAMP, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
1.
Objetivos:
A segregação sócioespacial relaciona-se à escassez social da terra urbanizada. Há possibilidade, nos limites
do capitalismo, para a elaboração e implementação de uma política urbana eficiente em relação a objetivos
sociais?
Como
alterar
os
mecanismos
da
dinâmica
especulativa
responsável
por
essa
escasses?
O poder público pode dispor de vários instrumentos com a reforma urbana, pode disciplinar o regime de
propriedade, pode intervir para que o exercício desse direito esteja voltado para beneficiar a coletividade,
com base no princípio da função social da propriedade. Com o Estatuto da Cidade as possibilidades estão
apontadas e aprovadas! No papel, entretanto, como avançar para que o mesmo se efetive? Para a construção
de condições dignas de vida, garantindo os direitos fundamentais do morador da cidade? A reforma urbana
pode contribuir para a efetivação da cidadania? Como viabilizar uma política urbana comprometida em
assegurar a todo o cidadão condições de vida digna e justiça social?
2.
Referencial
teórico
e
conceitual
Através da produção elitizada, o capital imobiliário produz e vende a escassez. A segregação socioespacial é,
assim,
gerada
pela
disputa
por
espaços
da
cidade.
A política da escassez social da terra produzida pela lógica fundiária e relacionada à venda da diferenciação
material e simbólica do espaço urbano, aprofunda a desigualdade social, pois leva ao encarecimento da terra
e
da
moradia.
A manutenção destas desigualdades assinala para possibilidades de algumas frentes de luta relacionadas ao
direito ao espaço geográfico ou à cidade, tendo em vista que as intervenções do poder público acabam
sempre beneficiando os grupos hegemônicos. O poder público tende a reproduzir um modelo de gestão
centralizador e tecnocrático, que privilegia o atendimento a setores detentores de poder econômico,
especialmente
o
capital
imobiliário.
(SAULE
JR,
1993)
O espaço urbano produzido por este modelo concentrador, guarda as marcas da desigualdade econômica
(socioespacial),
e
da
não
fixação
de
uma
efetiva
política
social.
.
3.
Metodologia
Utilizada
Para a realização deste estudo foi feito um levantamento bibliográfico relacionado a artigos e livros
publicados à respeito dos Movimentos Sociais Urbanos desde a década de 1970. Foi realizado ainda um
levantamento na imprensa alternativa existente neste período de Ditadura Militar na busca de matérias a
respeito dos movimentos sociais organizados e espontâneos (os chamados quebra-quebras), que eclodiram
no
período.
Os artigos de jornais e a literatura acadêmica específica foram relacionados a textos (livros e artigos) que
tratam da ordem mundial contemporânea. O objetivo foi o de inserir as especificidades de nossa Formação
sócioespacial no processo mais geral de desenvolvimento do capitalismo nesta contemporaneidade.
4.
Principais
questões
/
pontos
desenvolvidos
Uma das tendências marcantes desta fase contemporânea é a redução progressiva da parcela da economia
controlada de dentro do país. O comando externo é cada vez maior em virtude da ampliação do campo de
ação das transnacionais, e o Estado precisaria desenvolver pesados esforços para contrariar essa influência
desagregadora.(SANTOS,
M.,
1996)
O que está em questão, portanto, é se e como o Estado pode reverter estas tendências; se o poder público
quer ou não, é outra questão. Sem dúvida, vontade política é importante, mas não é o suficiente. É
necessário o envolvimento da sociedade civil em um projeto de modificação radical da realidade social.
.Será que podemos ainda falar nos dias de hoje em reforma urbana ou é mais um anacronismo? Como dizem
ser
a
reforma
agrária.
A reforma urbana não é um projeto recente em nosso país. Fez parte do programa de reformas de base da
década de 50. Nesta época, já se discutia que a solução para o problema da moradia vinculava-se à
necessidade de se colocar em prática um planejamento territorial. Entretanto, é na década de 80, com a
entrada em cena dos movimentos sociais, que se avança na tomada de consciência de que a
responsabilidade pelas políticas públicas não é apenas competência do Estado. Além disso, com a
democratização do país, abriu-se a possibilidade de controle da ação estatal por parte da sociedade civil. O
processo é de rompimento com a visão instrumental do Estado, a partir de seu entendimento enquanto
articulação
de
relações
de
forças
sociais
e
territoriais.
5.
Resultados
alcançados
e
conclusões
A intensificação das ocupações e posses de terras vazias e ociosas sem nenhuma utilização social, quer
sejam públicas ou privadas, pela população de baixa renda tem contestado a ordem natural não legítima
sobre
o
direito
de
propriedade.
A articulação entre Estado e sociedade civil – isto é, o Estado ampliado, \"locus\" privilegiado da luta entre
diferentes concepções de mundo e interesses sociais - abre novos desafios para os movimentos sociais, que
passaram
a
atuar
e
influir
para
a
formulação
de
políticas
globais.
Em nosso entendimento a execução desta política urbana dependerá de como evoluirão as relações entre
poder público e sociedade-civil.
Bibliografia
LEFEBVRE,
Henri
O
Direito
à
Cidade.
Editora
Documentos,
1969,
São
Paulo
SAULE JR..Direito e Reforma Urbana. In: Anais do Terceiro Simpósio Nacional de Geografia Urbana, RJ, 1993.
SANTOS, Milton., Do espaço sem nação ao espaço transnacionalizado. In: Brasil 1990: caminhos alternativos
do
desenvolvimento.
RATTNER,
H.
(org.),
São
Paulo:
Brasiliense.
1979
SANTOS, Milton - A Natureza do Espaço - técnica e tempo razão e emoção, São Paulo, Hucitec, 1996 .
SANTOS, Regina Célia Bega – Rochdale e Alphaville: formas diferenciadas de apropriação e produção da terra
na metrópole paulistana. Tese de doutoramento. São Paulo. FFLCH-USP, 1994.
palavras chaves: segregação sócioespacial, participação política, sociedade civil
AO314 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Ordenamento Urbano e Gestão Territorial
[2061] D A CASA Á RUA: AS TERRI TORI ALI D AD ES D E CRI AN ÇAS E AD OLESCEN TES N O RI O D E
JANEIRO.
MARIA DA PENHA C. FIGUEIREDO GILL.
UFF, NITEROI, RJ, BRASIL.
Resumo:
A partir de meados do século XX, a questão da infância e da adolescência tornou-se tema relevante para o
mundo acadêmico, despertando o interesse de pesquisadores e cientistas sociais das mais diversas áreas do
conhecimento. No limiar desse novo milênio, continua a ser colocada como um dos desafios a ser enfrentados
pelos Estados e Organizações Governamentais e Não Governamentais, principalmente, quando os problemas
que envolvem crianças e adolescentes tem aumentado de grau e número (trabalho infantil, prostituição
infantil, pedofilia, abuso sexual, violência, reclusão, droga, tráfico, prisão, exclusão) e em escalas diversas
(casa, rua, cidade, Estado, país, global). O presente texto tem como objetivo central analisar a casa e a rua
como territórios de crianças e adolescentes; nesse sentido, buscou-se entender o espaço da casa como um
território abandonado e o espaço da rua como um território adotado. Iniciamos essa discussão a partir do
conceito de infância e adolescência em Ariès, (1978 [1960]); Leite (1997); Postman (1999); Rizzini, 2002;
Figueiredo (2004); Del Priore (2004). No entendimento do conceito de casa e rua, dialogamos com os não
geógrafos que têm um debate nesse campo conceitual, sobretudo, com antropólogos e sociólogos (Freyre,
1999, Da Matta, 1991; Graham, 1992). Quanto ao conceito de território, territorialidade e territorialização, o
debate deu-se no campo específico da Geografia, tomando como base Sack (1986); Raffestin (1993); Soja
(1993); Santos (1999, 2002); Haesbaert (1997, 2004); Souza, (1995); Machado, (1992); Ribeiro e Mattos
(2002); Silva, (2002). O nosso trabalho ocorreu em três momentos distintos: em um primeiro momento,
observamos a rua enquanto territórios das crianças e dos adolescentes no período compreendido aos meses
fevereiro, março e abril de 2005; no segundo momento, saímos da condição de mera observadora, partimos
para uma ação mais concreta (abordagem) e através da observação participante penetramos na
cotidianidade das crianças e dos adolescentes no território/rua, mais precisamente nos meses de maio, julho
e agosto. Já entre os meses de setembro, outubro e novembro, nos empenhamos em ouvir as falas e as
histórias de vida das crianças e dos adolescentes, utilizamos a técnica da entrevista aberta e semiestruturada. No terceiro momento, nos dedicamos à sistematização da tese, extraímos algumas conclusões,
tais como: a maioria dos estudos que se debruçaram sobre a infância e a adolescência das ruas tem ignorado
a análise da casa, elegendo quase sempre uma abordagem da família, normalmente, analisando a partir de
uma ótica de “família desorganizada e desestruturada”. Até que ponto, pode-se entender a casa e a rua em
contraste e oposição? Considerando que a casa e a rua são “irmãs gêmeas” vemos que uma está
intrinsecamente ligada à outra. Nesse sentido, compreendemos que não é possível entender a situação das
crianças e dos adolescentes na rua sem, no entanto, iniciar essa discussão pela casa. O binômio casa – rua
ainda permanece, de certa forma, entre alguns cientistas sociais como uma questão a ser resolvida: a casa é
tida como um local de “controle e autoritarismo”; a rua como o “descontrole e a massificação”. (Da Matta,
1983; Graham, 1992). Ao longo desse trabalho, tentamos desfazer dois mitos: o primeiro é que justifica toda
e qualquer violência pela pobreza; o segundo, é que a casa é um ambiente harmônico e tranqüilo enquanto a
rua representa um espaço perigoso e violento. Defendemos que a casa longe de ser um lugar permeado por
relações harmoniosas, demarcadas por gestos de carinhos, amizade, respeito e consideração, ao contrário, o
que tem sido cada vez mais evidenciado, não apenas na casa do pobre como também na casa do rico, são
relações marcadas por rivalidades e conflitos. Na nossa pesquisa, constatamos que a maioria das crianças e
dos adolescentes que já romperam os laços com suas famílias vinham de relações conflituosas em casa.
Defendemos, portanto, que tanto a casa quanto à rua são palcos privilegiados de disputas e conflitos,
podemos dizer que são arenas de lutas sociais. Assim, ao analisarmos geograficamente e historicamente os
espaços da casa, no contexto da história de vida das crianças e dos adolescentes, não podemos atribuir
apenas a pobreza como sendo a única responsável pelo abandono da casa pelas crianças e pelos
adolescentes, não podemos menosprezar os aspectos culturais e sociais (maus-tratos e violência) a que,
historicamente,
as
crianças
foram
sempre
submetidas.
AO315 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ordenamento Urbano e Gestão Territorial
[1863] EFEI TOS SÓCI O- ESPACI AI S D A ESTI GM ATI ZAÇÃO D AS FAVELAS N O RI O D E JAN EI RO:
ALGUMAS REFLEXÕES PRELIMINARES.
FERNANDO LANNES FERNANDES.
UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O trabalho proposto visa apresentar reflexões preliminares da pesquisa de doutoramento em Geografia
intitulada “Violência e Estigma: efeitos sócio-espaciais da ‘atualização’ do ‘mito da marginalidade’ no Rio de
Janeiro”. Esta pesquisa tem como objetivo analisar os efeitos do discurso sobre a violência para o
agravamento
da
segregação
na
cidade
do
Rio
de
Janeiro.
O trabalho tem por hipótese que o aumento da violência urbana no Rio de Janeiro vem contribuindo para o
agravamento das disparidades sociais e da segregação e estigmatização sócio-espacial dos moradores de
favelas. Tais efeitos se expressam não apenas em termos materiais, como habitação, local de moradia,
acesso à infra-estrutura, como também, e especialmente, em termos simbólico-práticos, atingindo
diretamente o modo de vida do morador de favela, impedindo a ampliação de seu espaço-tempo social e,
com isso, impossibilitando-lhe a aquisição de condições necessárias à sua emancipação enquanto sujeito
ativo na sociedade. Em outros termos, a criminalização da pobreza, bem como a formação de “espaços
criminalizados” (CAMPOS, 2005), vem funcionando como um mecanismo perverso de reprodução e
perpetuação da pobreza, em todos os seus níveis (material, cultural, intelectual etc.).
O pressuposto fundamental é que o discurso sobre a violência tem desdobramentos práticos quanto à
segregação sócio-espacial na cidade, tornando-a fragmentada e possuidora de grupos sociais com
oportunidades, condições ao exercício da cidadania e experiências de espaço-tempo totalmente distintas. Ao
nosso entender, a estigmatização é um componente central na análise do agravamento da segregação sócioespacial. Em linhas gerais, esse cenário caracteriza o que SOUZA (2006; 2000; 1994a; 1994b) denominou
“atualização” do “mito da marginalidade”, expressão essa por nós aproveitada, que tem seu fundamento nos
discursos criminalizantes que vêm incidindo, nos últimos anos, sobre as favelas, (re)orientando as
intervenções do Poder Público e o comportamento dos setores dominantes na cidade.
De acordo com PERLMAN (2002), o “mito da marginalidade” constitui uma ideologia, apoiada em um
conjunto de estereótipos construídos em torno das favelas que têm por função justificar e legitimar ações dos
setores
dominantes.
As considerações de Perlman, apesar de estarem distantes quase 30 anos, evidenciam um cenário que pouco
mudou do ponto de vista da visão construída sobre as favelas e seus moradores, cujas bases interpretativas
se mantém. A permanência de determinados traços, tais como a idéia de desordem e bandidagem, vêm
ganhando força atualmente, podendo-se dizer, portanto, que essa visão se renovou, agora com novas
variáveis, das quais a que possui maior peso é a presença do tráfico de drogas nas favelas e seus
desdobramentos
na
cidade
como
um
todo.
A territorialização do tráfico de drogas no varejo nas favelas, que se intensifica nos anos 80 e 90, vem
pautando a representação social das favelas e, ao memso tempo, sustentando a ação do Estado e da maior
parte das iniciativas da sociedade civil organizada. Mas a violência do tráfico e seus efeitos não se restringem
apenas às favelas. Ela vem se manifestando a cada dia com maior intensidade na cidade como um todo,
passando a influenciar o ordenamento urbano e colocando as favelas como alvos principais no combate aos
problemas
da
violência
urbana.
Com base nisso, acompanhando SOUZA (2006; 2000; 1994a; 1994b), defendemos o argumento de que a
violência urbana tem provocado efeitos negativos no que se refere à visão da população carioca, em
particular as classes média e alta, sobre os moradores de favelas, havendo, com isso, uma intensificação dos
mecanismos
de
segregação
e
estigmatização
sócio-espacial
destes
no
cenário
urbano.
Some-se a isso, um contexto socioeconômico marcado pela emergência da “nova pobreza urbana”
(MINGIONE, 1993), ou ainda o “novo lumpemproletariado” (SOUZA, 2000), observa-se que a relativa
diminuição do papel do Estado do bem-estar social vem sendo gradativamente substituída por um estado
repressor, um “estado penitência” (WACQUANT, 2001), que faz uso da polícia como principal instrumento de
contenção dos efeitos da “reconfiguração da pobreza” (RIBEIRO, 2005). No bojo dessas mudanças, destacase a dinâmica espacial da marginalização, marcada pela concentração e estigmatização.
O principal desdobramento dessas intervenções calcadas na criminalização da pobreza é o agravamento da
condição de vida do morador de favela, que se vê impedido de realizar-se como cidadão. Essa sua potencial
capacidade de realização é obstaculizada, tornando o morador de favela um “cidadão partido” – visto que
cidadão pela via constitucional, mas sem condições de exercício dessa cidadania pela via prática, estreitamse, cada vez mais, as possibilidades de exercício da cidadania. Nas favelas, onde, por um lado, a dimensão
física do espaço público é marcada pela irregularidade das formas de ocupação e uso e, por outro, a
dimensão simbólica do espaço público é marcada pelo medo decorrente da territorialização do tráfico de
drogas, observa-se que as condições ao exercício da cidadania são ainda mais restritas que no restante da
cidade e constituem um obstáculo ainda maior ao desenvolvimento sócio-espacial dessas áreas.
Dois aspectos vêm sendo analisados no momento atual da pesquisa. O primeiro deles diz respeito ao
aprofundamento da “presentificação” e “particularização” da vivência dos moradores de favelas (SILVA,
2002) e a conseqüente dificuldade de exercício da cidadania, que inclui, dentre outros aspectos, a
apropriação dos espaços da cidade e a aquisição capital cultural, educacional, social e financeiro. O outro
aspecto diz respeito à fragmentação do tecido sociopolítico-espacial (SOUZA, 2000), que tem por base a
territorialização das favelas pelo tráfico de drogas, o processo de auto-segregação dos setores dominantes, a
gradativa conformação de um espaço urbano marcado pela diminuição dos espaços de convívio e participação
e
pela
segmentação
social
cada
vez
maior.
Nossa abordagem empírica vem buscando identificar os efeitos práticos da “atualização” do “mito da
marginalidade” a partir das práticas sócio-espaciais de jovens negros, do sexo masculino, moradores das
favelas da Maré e Rocinha. Eles foram escolhidos por representarem o grupo social mais estigmatizado e que
sofre de maneira mais severa os efeitos da violência física, especialmente a letal, e simbólica. O
levantamento em curso vem demonstrando que os efeitos mais evidentes são a restrição da mobilidade
espacial mediante mecanismos de constrangimento, e a invisibilidade social, decorrente da radicalização da
estigmatização das favelas e de seus moradores. A análise aponta para uma correlação entre esses efeitos e
o processo de reconfiguração do espaço público na cidade.
AO193 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Política
[1236] A ZONA FRONTEIRIÇA E A INTEGRAÇÃO DOS TERRITÓRIOS DOS ESTADOS- NAÇÃO.
BEATRIZ MARIA SOARES PONTES.
UFRN, NATAL, RN, BRASIL.
Resumo:
A área do projeto Calha Norte, alvo do nosso estudo, abrange, atualmente, 194 municípios, dos quais 95
localizam-se ao longo dos 10.938km da fronteira do nosso país com as Guianas, Venezuela, Colômbia, Peru e
Bolívia. A nossa pesquisa envolve os municípios fronteiriços que integram a zona de fronteira estabelecida
pelo Brasil. Os aludidos municípios fazem parte dos seguintes estados: Amapá, Pará, Roraima, Amazonas,
Acre
e
Rondônia.
O nosso objetivo principal, portanto, repousa sobre a discussão da chamada zona fronteiriça, sob a ótica
territorial. Assim sendo, se, em virtude da delimitação, o território dos estados termina obrigatoriamente na
linha de fronteira, o mesmo já não ocorre com a vida econômica no espaço contíguo denominado zona
fronteiriça. Mesmo que existam obstáculos naturais, as regiões limítrofes de um lado e de outro de uma
fronteira formam, frequentemente, uma única unidade socioeconômica. Esta unidade não pode ser
artificialmente negada pelos recortes territoriais. Portanto, são inevitáveis os contatos entre os habitantes
das
fronteiras.
A contigüidade dos territórios estatais impõe o respeito por alguns princípios de boa vizinhança, favorecendo
processos
de
cooperação
mais
densos
do
que
nas
relações
interestatais
habituais.
No que concerne aos municípios integrantes da zona de fronteira abrangida pelo projeto Calha Norte
observamos, por parte do estado brasileiro, algumas iniciativas de cooperação relativas à integração terrestre
ou fluvial, projetos energéticos e de telecomunicações, bem como intercâmbios econômicos com as nações
vizinhas. Todavia, atestamos, através da pesquisa, que o projeto Calha Norte tem se preocupado
relevantemente com iniciativas, de natureza variada, nos territórios dos municípios brasileiros que integram a
zona de fronteira, de forma muito mais acentuada do que providências que possam representar um
intercâmbio
mais
dinâmico
com
os
territórios
extra-nacionais.
Atestamos que o Ministério da Defesa tem dado ênfase à visão de zona fronteiriça sob a ótica preconizada
pela jurisprudência brasileira, a qual inclui a chamada faixa interna de 150km de largura, paralela à linha
divisória do território nacional, cabendo à União a demarcação da mesma. Nos municípios integrantes desta
faixa interna, abrangida pela zona fronteiriça, a União deverá aplicar anualmente recursos. De sua
arrecadação nos municípios situados na faixa precedentemente referida, o governo federal deverá aplicar nos
mesmos, anualmente, no mínimo 60% da referida, especialmente em viação e obras públicas, ensino,
educação e saúde, e no desenvolvimento da lavoura e pecuária. Para a construção de obras públicas da
competência dos municípios abrangidos pela zona de fronteira, a União concorrerá com 50% do custo. A
União também deverá priorizar, em tais municípios, construções de prédios para escolas, hospitais e
maternidades, redes de água e esgotos, usinas elétricas e rodovias. À União também compete a criação de
colônias e núcleos rurais de recuperação do elemento humano nacional, bem como colônias militares, com o
mesmo
objetivo.
Nesse sentido, o projeto Calha Norte tem contemplado tais municípios com diversas obras, a saber:
construção de estradas vicinais, infra-estrutura urbana física e social (malha viária interna, pavimentação
asfáltica, saneamento básico, construção de escolas, postos de saúde, praças de esporte e lazer, habitação,
centros comunitários, quadras poliesportivas, obras de drenagem, iluminação pública e construção de
terminais rodoviários), apicultura em áreas indígenas, pavimentação de rodovias estaduais, construção de
centro de zoonose (Acre), urbanização de pistas de pouso, construção de pontes fluviais, implantação de
unidades de corpo de bombeiros, implantação de unidades da Polícia Militar, projetos para a defesa do meio
ambiente e povos indígenas, aquisição de equipamentos agrícolas, integração de sistema troncal de
transportes (Acre-Rio Branco), obras de infra-estrutura turística da orla (em vários municípios do Amazonas),
construção
de
marcenaria
comunitária
e
de
centro
de
artesanato
(Rondônia).
No que concerne às obras militares, as referidas remetem-se à construção de quartéis, postos avançados de
fronteira, aquisição de equipamentos necessários ao adequado desempenho das forças armadas em áreas
fronteiriças, manutenção de aeródromos, aeronaves e embarcações, manutenção de estradas e apoio às
comunidades.
Pelo exposto, fica claro que as intervenções levadas a termo, nos municípios integrantes da zona fronteiriça
do projeto Calha Norte, resultam, preferencialmente, em realizações que sugerem melhorias no território
interno dos aludidos municípios, principalmente em suas áreas urbanas. Quanto às obras militares, estas,
também, são localizadas nas cidades-sede dos municípios em apreço ou nas áreas das fronteiras
setentrionais próximas às nações vizinhas. Pelo visto, estamos diante de dois problemas fundamentais, se
atentarmos para o objetivo maior da integração latino-americana, porquanto o estado brasileiro, bem como
as outras forças vivas sociais da Amazônia, deverá, ainda, intensificar os processos e projetos internos de
articulação do território nacional, naquelas paragens, e destas com os territórios das nações vizinhas, de
acordo com a visão moderna de fronteira, que defende a integração dos territórios.
AO194 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Geografia Política
[1250] TERRI TORI ALI D AD ES
TRAN SFRON TEI RI ÇAS
NA
ZON A
DA
INTERNACIONAL BRASIL- ARGENTINA.
LEILA CHRISTINA DIAS; MARISTELA FERRARI.
UFSC, FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL.
Resumo:
FRON TEI RA
SECA
As zonas de fronteira internacional podem ser definidas como espaços geográficos próximos à linha-limite
internacional que apresentam interações sociais, culturais e econômicas. No documento “Proposta de
Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira”, a zona de fronteira é caracterizada
“[...] por interações que, embora internacionais, criam um meio geográfico próprio de fronteira, só
perceptível na escala local/regional das interações transfronteiriças” (BRASIL, 2005, p.152). O documento
considera que, nesta escala, o meio geográfico formado por cidades gêmeas – adensamentos populacionais
cortados pela linha-limite internacional seca ou fluvial – é o que melhor caracteriza a zona de fronteira,
reconhece que ao longo dos 15.719 quilômetros de fronteira do Brasil com países vizinhos localizam-se
apenas 35 cidades gêmeas, e aponta a heterogeneidade dessa vasta zona de fronteira. Chama a atenção
para a presença de lógicas espaciais diferenciadas, e variadas formas de organização territorial
transfronteiriças. A zona de fronteira seca brasileira argentina, constituída pelas cidades de Dionísio
Cerqueira (SC), Barracão (PR) e Bernardo de Irigoyen (Misiones-Argentina), configura uma dessas cidades
gêmeas. O povoamento deste segmento fronteiriço começou a consolidar-se no final do século XIX e mais
efetivamente a partir do início do século XX, com o desenvolvimento do ciclo econômico da erva-mate nativa
do Brasil. Antes de 1903 nenhum marco delimitava o limite internacional nos 22 quilômetros de fronteira
seca, e a população que lá ia se estabelecendo interagia sem conceber o limite político que já era visualizado
nos mapas desde 1895. A chegada de organismos de controle dos Estados Nacionais, em meados de 1940,
impõe mudanças às práticas sociais que até então regulavam o uso daquele espaço territorial. Este trabalho
objetiva compreender o processo de construção dessas territorialidades transfronteiriças, neste segmento da
fronteira Brasil-Argentina, entre o fim do século XIX e a primeira metade do século XX. A territorialidade
humana é aqui entendida como “[...] a tentativa de um indivíduo ou grupo para afetar, influenciar ou
controlar pessoas, fenômenos e relações, delimitando e assegurando controle sobre uma área geográfica”
(SACK, 1986, p. 19). Mas como analisar a territorialidade? C. Raffestin (1993) introduz uma idéia que auxilia
a construção do instrumental metodológico: “[...] a análise da territorialidade só é possível pela apreensão
das relações reais recolocadas no seu contexto sócio-histórico e espaço-temporal” (p. 34). Ele chama
atenção, portanto, para a necessidade de apreender a territorialidade considerando “aquilo que a construiu”
em suas partes constitutivas – interna e externa. Os principais procedimentos operacionais desta pesquisa
consistiram em revisão bibliográfica e entrevistas com antigos moradores em universo social diversificado. O
contexto histórico de construção das primeiras redes de interação neste segmento da fronteira é marcado
pelas disputas territoriais entre Argentina e Brasil, e entre os estados de Paraná e Santa Catarina. Por esse
espaço fronteiriço circulava, no início do século XX, não somente a erva-mate do Brasil para a Argentina, mas
também mercadorias e mão-de-obra, criando inter-relações independentemente dos limites políticos
territoriais dos países e estados. As companhias organizadas em torno da atividade econômica da compra e
da distribuição do mate atraíram fluxos de migrantes trabalhadores brasileiros, paraguaios e argentinos e
estimularam o aparecimento de pequenos armazéns de secos e molhados gerando constantes fluxos de
ambos os lados do limite. Outro fator era o isolamento físico e econômico daqueles pequenos e incipientes
aglomerados populacionais ali estabelecidos. Após a demarcação dos limites territoriais nenhuma ação que
representasse oferta de serviços e equipamentos à população local foi empreendida pelos seus respectivos
Estados Nacionais, e, em situação de isolamento, as relações transfronteiriças tornaram-se mais fortes. Na
visão dos poucos moradores que ali permanecem desde aquela época, esta zona de fronteira era um
subespaço esquecido, verdadeiro hiato, não apenas para o Brasil, mas também para a Argentina. A
territorialidade transfronteiriça se constitui neste período pelo conjunto dos elementos de suas vidas
cotidianas: relações de trabalho, de parentesco e outras relações que se projetavam num espaço comum no
qual o limite internacional não representava qualquer obstáculo à circulação de pessoas, mercadorias e
matérias primas. A ausência dos Estados Nacionais como reguladores das interações que ali se desenvolviam
contribuiu para que as populações das três cidades construíssem um senso territorial comum. A chegada
progressiva de organismos de controle dos Estados nacionais, a partir de meados da década de 1940, altera
este quadro: ao desenvolvimento das redes de interações sociais, culturais e econômicas que se estendiam
além das fronteiras nacionais –a partir das quais a população imprimiu ao espaço que ocupava uma lógica
territorial particular – acrescem restrições à circulação, na lógica dos Estados territoriais. A população
fronteiriça reorganiza-se nas formas de interagir, na prática do contrabando descaminho, desafiando o
conceito de lei territorial dos Estados nacionais. A territorialidade transfronteiriça se redefine nos termos de
Raffestin, em sua parte constitutiva externa, aquela imposta pelos atores não fronteiriços.
Referências
bibliográficas:
BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Secretaria de Programas Regionais. Programa de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira. Proposta de Reestruturação do Programa de Desenvolvimento da
Faixa
de
Fronteira.
Brasília:
Ministério
da
Integração
Nacional,
2005.
RAFFESTIN,
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Por
uma
Geografia
do
Poder.
São
Paulo:
Ática,
1993.
SACK, R. D. Human Territoriality: its theory and history. Cambridge University Press, 1986.
AO195 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Política
[1301] A CRI SE BRASI L- BOLÍ VI A E AS CON TRAD I ÇÕES D O N ACI ON ALI SM O LATI NO- AMERICANO
NUMA ERA DE CRISE DAS ESQUERDAS.
LUIS LOPES DINIZ FILHO.
UFPR, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
OBJETIVOS
1. Analisar os discursos sobre a identidade latino-americana para demonstrar o modo como tais discursos
reproduzem paradigmas de pensamento afins às ideologias nacionalistas e populistas, em suas vertentes
hegeliana
e
romântica.
2. Demonstrar, por meio de um breve histórico da atual crise diplomática entre Brasil e Bolívia, que os
conteúdos dessas ideologias e seus paradigmas de pensamento conduzem a uma contradição entre os
discursos nacionalistas de esquerda e as propostas de integração continental, expressa na forma como o
governo
boliviano
caracteriza
o
Brasil
como
uma
potência
subimperialista.
METODOLOGIA
A análise dos discursos que versam sobre as identidades coletivas, nacionais e latino-americanas, segue a
proposta elaborada por Antonio Carlos Robert de Moraes em seu livro “Ideologias geográficas: espaço,
cultura e política no Brasil”, a qual foi desenvolvida nos últimos anos pelos pesquisadores ligados à revista
Terra Brasilis. Em tal proposta, parte-se de uma leitura da obra marxiana que passa pelas formulações de
autores como Georg Lukács e Antonio Gramsci, leitura essa que valoriza a historicidade dos processos sociais
e a autonomia relativa da política e da cultura na análise dos discursos ideológicos. Trabalha-se portanto com
o conceito de “ideologia geográfica”, vinculado à concepção gramsciana de ideologia como “visão de mundo”,
QUESTÕES
ABORDADAS
Com base no referencial teórico-metodológico mencionado, rastreiam-se as origens dos discursos
nacionalistas e latinoamericanistas e os parâmetros de pensamento sob os quais procuram estabelecer a
existência, como realidade presente e/ou como projeto de futuro, das identidades coletivas às quais se
referem. No final, a análise da crise diplomática envolvendo os governos brasileiro e boliviano, bem como dos
discursos usados por esses governos para justificar suas decisões, é inserida no contexto histórico da crise
intelectual
e
política
das
esquerdas,
iniciada
por
volta
de
1970.
CONCLUSÕES
1. Os discursos que procuram provar a existência de uma identidade latino-americana e que discutem
políticas de integração continental com base nesse pressuposto cometem os mesmos equívocos históricos e
lógicos das ideologias que tentam estabelecer a existência atual ou futura de identidades nacionais fundadas
em
laços
pré-políticos
(territoriais,
históricos
e
étnico-culturais).
2. São justamente esses equívocos que colocam as ideologias nacionalistas e esquerdistas latino-americanas
em rota de colisão com as propostas de integração continental originadas do pensamento político e
econômico de esquerda, propostas que datam das primeiras formulações da CEPAL sobre a questão do
subdesenvolvimento.
3. As ambigüidades e contradições que marcam o conflito entre os governos Morales e Lula em relação aos
direitos de exploração de gás em solo boliviano são reflexos claros da crise intelectual e política das
esquerdas, pois ambos precisam satisfazer a expectativas de reformas políticas e econômicas inexeqüíveis
que foram alimentadas por eles mesmos em suas respectivas campanhas eleitorais.
AO196 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Geografia Política
[1304] OS N OVOS TERRI TÓRI OS FI N AN CEI ROS RESULTAN TES D A
BANCÁRIA DOS ANOS 90 NO BRASIL.
IVAN JAIRO JUNCKES.
FACULDADE UNIÃO, PONTA GROSSA, PR, BRASIL.
Resumo:
D ESN ACI ON ALI ZAÇÃO
Este artigo analisa o processo de redefinição das territorialidades do capital bancário durante a
reestruturação financeira ocorrida nos anos noventa no Brasil e sua relativa estabilização no início da
primeira
década
do
Século
XXI.
As alterações ocorridas no sistema financeiro brasileiro neste período evidenciam um intenso rearranjo de
forças entre os estratos capitalistas que tencionaram a inserção subordinada do país ao recente ciclo de
liberalização mercantil, ampliando especialmente aqueles segmentos subsumidos no capital financeiro
transnacionalizado. A crescente influência dos bancos no conjunto social instaura um novo regime de gestão
cujas normas e instrumentos se estabelecem sobre os conflitos sociais e sobre a ordem pública, reduzindo ou
neutralizando as resistências históricas dos seus setores assalariados. Desta forma, os conglomerados
financeiros passaram a coordenar territorialidades específicas que suplantaram os referenciais nacionais e
consagraram a ordem fluida dos fluxos financeiros mundializados, gerando-se novos parâmetros para a
pesquisa
e
análise
geográfica
de
suas
relações.
Os financistas têm assumido a centralidade global das relações de produção e subordinado governos e
mercados à dinâmica da riqueza fictícia e à corrupção generalizada dos contratos sociais tal qual detalhado
nas pesquisas de Chesnais (1996 e 1998). A análise da trajetória dessa fração de classe está detalhada na
produção de Harvey (1990) sobre as funções do crédito e as transformações do seu papel no capitalismo
contemporâneo, em que se destaca a instável centralidade dos financistas no sistema produtivo e político. A
abordagem da organização de classe dos banqueiros no Brasil está realizada nas pesquisas de Minella (1988,
1995, 1998 e 2005) que trata da intensa articulação político-ideológica das organizações de interesses dos
financistas e suas ações para promover as bases do pensamento neoliberal e influenciar na composição e nas
políticas
das
agências
estatais.
Especialmente importante para compreender as discussões sobre a dinâmica do sistema financeiro são os
conceitos de fluxos, espaços de fluxos e, o seu complementar, os espaços de lugares baseados em Harvey
(1993), Santos (1994 e 2001a) e Castells (1999). Utiliza-se a definição de fluxo como sendo “seqüências
intencionais, repetitivas e programáveis de intercâmbio e interação entre posições fisicamente
desarticuladas, mantidas por atores sociais nas estruturas econômica, política e simbólica da sociedade”
(Castells, 1999, p.436). Os espaços de fluxos são descritos por Castells (1999) em três camadas articuladas
entre os circuitos de impulsos eletrônicos, os centros ou nós das redes de comunicação e as redes pessoais e
funcionais que organizam as elites dominantes conferindo-lhes capacidade de ação e realização de seus
objetivos estratégicos. Conforme Santos (2001), os espaços de fluxos comprimem, reorganizam e
tendencialmente absorvem o tempo real e os lugares vividos, como uma função dos deslocamentos
instantâneos, ordenando e subordinando os demais espaços da vida na sociedade, exatamente o que pode
ser
observado
no
contexto
do
trabalho
no
sistema
financeiro.
A metamorfose nas relações de poder suportadas pelos financistas é, então, analisada pelo conceito de
territorialidade e suas escalas utilizadas para abranger a complexidade da apropriação desigual de recursos
utilizados para alcançar determinados objetivos estratégicos em determinados limites espaço-temporais.
O conceito de territorialidade é assumido como corresponde ao espaço territorializado, ou seja, da
apropriação, concreta ou simbólica, do espaço por um agente que lhe projeta um trabalho, na forma de
energia e informação, marcado por relações de poder, conforme Sack: \"territórios são formas socialmente
construídas de relações espaciais e seus efeitos dependem das relações de controle e seus propósitos\"
(Sack, 1986, p. 216). A territorialidade foi considerada, assim, como a composição das relações mantidas em
um meio e sujeitas a variações em diferentes escalas de tempo para diferentes agentes, tal qual definido por
Raffestin
(1993).
Através desses referenciais, identifica-se como os agentes da reestruturação do sistema financeiro ocorrida
nos anos noventa no Brasil desenvolveram novas territorialidades resultantes de cálculos intencionais usados
para influenciar, afetar ou controlar o comportamento de grupos envolvidos na disputa de recursos.
No desenvolvimento das investigações pesquisou-se a implantação dos programas estatais de estímulo a
reestruturação financeira e seus principais impactos sobre os bancos envolvidos e sobre as finanças públicas,
elaborou-se um quadro histórico da participação das instituições estrangeiras no ranking bancário no Brasil,
construiu-se mapas da espacialidade das redes de agências dos principais bancos participantes do processo
em estudo, realizou-se diversos comparativos físico-financeiros entre estes bancos antes e após a
desnacionalização, assim como quadros históricos da participação qualitativa dos principais bancos ativos no
mercado brasileiro, investigou-se também o comportamento da elite bancária nacional ante o mercado
financeiro global, através de suas organizações de classe e principais instituições financeiras envolvidas, e
conclui-se os estudos detalhando os novos parâmetros da organização territorial do capital bancário no
Brasil.
Verifica-se desta forma que as combinações das políticas liberalizantes para produzir taxas e cifras de lucro
financeiro têm desregulamentado mercados, intensificado exponencialmente a especulação e instaurado
urgências políticas que mobilizam recursos em escala global para preservar as condições de acumulação de
um
reduzido
grupo
de
gestores
financistas.
A partir da desnacionalização conservadora ocorrida nos anos noventa no Brasil os financistas promoveram a
realocação de referenciais territoriais para o âmbito corporativo globalizado e sua sujeição aos ditames
verticalizados da mundialização financeira. Configurou-se desta forma uma nova territorialidade bancária
para o início do século XXI sustentada por complexos mecanismos de hegemonia incorporados à esfera
produtiva, por permissivas coalizões de interesses instauradas junto ao poder político e, ainda, por múltiplas
redes
de
comércio
ilegais
pulverizadas
pelo
planeta.
Assim o dinheiro e as finanças desconstituem os referenciais territoriais e as materialidades aos quais
serviam de representação, tornam-se globais e cibernéticos e resignificam o poder da corrupção constante
das regras, tornando-se a própria regra da efemeridade dos contratos e do dilaceramento das forças
dispostas
nas
lutas
sociais.
Palavras-chave: 1. território; 2. capital bancário; 3. bancos; 4. elite financeira; 5. poder.
AO197 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Geografia Política
[1748] TRAN SFORM AÇÕES N A FRON TEI RA BRASI L- ARGEN TI N A: O PAPEL D ESEM PEN H AD O PELAS
PON TES I N TERN ACI ON AI S EN TRE AS CI D AD ES- GÊM EAS D E URUGUAI AN A- PASO D E LOS LI BRES E
SÃO BORJA- SÃO TOMÉ.
CIRCE INÊS DIETZ; ALDOMAR ARNALDO RÜCKERT.
UFRGS, UFRGS, RS, BRASIL.
Resumo:
Objetivos
(a) Identificar a importância assumida pelas pontes internacionais no processo de alteração da função de
fronteira, isto é, passagem da fronteira-separação para fronteira-comutadora; (b) Analisar os diferentes
cenários em que foram construídas as duas pontes internacionais existentes no Rio Grande do Sul que ligam
este estado à República Argentina (Uruguaiana-Paso de Los Libres e São Borja-São Tomé); (c) Identificar os
diferentes atores que estiveram envolvidos no processo de construção dessas infra-estruturas estratégicas.
Referencial
Teórico
Rückert (2004) ao tratar das mudanças nas noções de fronteira destaca um abandono do entendimento de
fronteiras de contenção e fronteiras-separação da geopolítica, para áreas de transição, interface e/ ou de
trocas entre os países. Segundo o autor “perdem-se os antigos significados nacionalistas e militaristas de
fronteira, verificando-se um tipo de atualização das velhas idéias ratzelianas de fronteiras móveis ou
flutuantes, ainda que num marco no qual as áreas de fronteiras deixam de ser zonas de tensão para se
converterem em zonas de contato e articulação” (Rückert, 2004, p. 12). Os exemplos mais sensíveis dessa
mudança funcional da fronteira estão no continente europeu, em virtude do percurso histórico trilhado na
consolidação
da
União
Européia.
Também Valenciano aponta para o fato de que a integração na América Latina produz uma revalorização das
fronteiras. Assim, “o cambio de la función de la frontera discriminante a la permeable y articulante entre
economías vecinas permite hablar de una distinta función de la frontera en los procesos de integración”
(Valenciano,
1996,
p.
187).
Esta mudança do papel das regiões fronteiriças acaba por ter repercussões em todo o território pelo fato de
que obras públicas de infra-estrutura são construídas e atividades produtivas sofrem uma relocalização.
Assim, a fim de atender um novo modelo de acumulação, há uma tendência de modificação da conformação
dos territórios em seu uso, ocupação e apropriação, variando em termos temporais a sua concretização.
(Rückert,
2004).
Schäfer (2000, p. 60) aponta que no processo de mudança das funções de fronteira as questões “(...)
relativas à circulação rodoviária [encontram] condições absolutamente diferentes daquelas que compunham a
antiga funcionalidade fronteiriça”. Enquanto que no período geopolítico centrado na contenção das fronteiras
a preocupação com infra-estruturas que ligassem os países era praticamente nula, tal situação se inverte e
passa a se tornar central no cenário contemporâneo que tende a integração regional.
Principais
questões
Integração e desenvolvimento de infra-estrutura técnicas estratégicas são questões profundamente interrelacionadas. As dificuldades de acesso de um país para o outro interferem tanto em termos de intercâmbios
de idéias quanto de mercadorias e traduzem-se em dificuldades em termos de cooperação.
A transformação do sentido de fronteira passa, por exemplo, na mudança de orientação da estrutura dos
transportes. Ao invés do sistema de transportes voltar-se ao território nacional, para os principais mercados
consumidores ou então aos nós das redes por onde escoa a produção (portos marítimos), a infra-estrutura
busca
conectar
o
Brasil
com
os
países
vizinhos.
É fundamental destacar que a implantação de infra-estruturas estratégicas reflete um conjunto de interesses
de diferentes atores. Se não há interesses não há mobilização em torno da realização do empreendimento.
Em outras palavras, os interesses e as ações dos atores materializam-se na construção das infra-estruturas,
no caso em estudo, as pontes internacionais.
Metodologia
A metodologia que será utilizada nessa pesquisa baseia-se no procedimento das escalas geográficas de poder
e gestão. A opção por esta metodologia deve-se ao fato de que esta permite compreender como os
diferentes atores atuam em prol do atendimento de seus interesses, nesse caso, a integração dos territórios
dos dois lados da fronteira. Rückert (2001) aponta que em cada escala de investigação acontecem
fenômenos distintos. Desta forma, compete a identificação dos atores – Estado, mercado e sociedade civil –
em cada escala, bem como a análise de como se dá a interação entre eles. Entre os procedimentos
metodológicos utilizados estão a consulta a fontes de dados secundários, assim como também o trabalho de
campo nas cidades em que estão localizadas as ponte internacionais.
Resultados
alcançados
e
conclusões
Atualmente existem duas pontes internacionais ligando o Rio grande do Sul (Brasil) e Argentina. A ponte
internacional entre as cidades de Uruguaiana e Passo de los Libres constitui-se na primeira ponte
internacional unindo Brasil e Argentina e teve sua inauguração em 1947. A ponte internacional unindo São
Borja - São Tomé, inaugurada em dezembro de 1997, logo após a assinatura do Tratado de Assunción, e tem
um significado muito importante no contexto da discussão e implementação do bloco econômico.
Assim, pode-se afirmar que os cenários em que foram construídas essas pontes são expressivamente
distintos. Enquanto que a primeira foi construída na década de 40, em momento ainda de maior preocupação
com a defesa militar da fronteira, a segunda foi edificada no início do processo de integração promovido pela
instalação
do
Mercosul,
na
década
de
90.
As diferentes infra-estruturas estratégicas têm importante papel na aproximação dos países. Estas se
constituem em elementos que contribuem na conformação das novas funções desempenhadas pelas
fronteiras, tornando-as mais porosas e permitindo uma maior agilidade no fluxo de pessoas e mercadorias.
Contudo, estes empreendimentos não garantem que a região da fronteira Brasil (Rio Grande do Sul) e
Argentina (Corrientes) seja considerada desenvolvida.
AO198 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Política
[2010] OS AGEN TES D O I M PERI ALI SM O N A AM AZÔN I A OCI D EN TAL: UM ESTUD O D A I N TERVEN ÇÃO
DAS ONGS NO ESTADO DO ACRE.
NAZIRA CORREIA CAMELY.
UFF, NITEROI, RJ, BRASIL.
Resumo:
a)
Objetivos
específicos
- Identificar se as ações e estratégias desenvolvidas para desmobilizar os movimentos de trabalhadores
radicalizados do final dos anos 70 e 80, no Acre, são efetuadas por intermédio das ONGs .
- Identificar, analisar e sistematizar quais as estratégias para apropriação e mercantilização do patrimônio
sócio-ambiental
da
Amazônia,
pelas
propostas
de
cooperações
internacionais.
- Avaliar criticamente como se constrói as redes de relações (nacionais e internacionais) para o
fortalecimento técnico e financeiro, tendo em vista as políticas para o desenvolvimento socioambiental da
Amazônia.
b)
Referencial
teórico
e
conceitual:
Trabalhamos com a economia política marxista, o conceito de Lênin sobre imperialismo, por nos
contrapormos fortemente ao conceito de ‘Império’ e outros atualmente desenvolvidos. No campo das ONgs
tem vasta bibliografia sobre sua atuação no mundo. No trabalho utilizaremos como referência importante o
conceito de ‘onguismo’ desenvolvido pelo sociólogo espanhol Andrés Piqueras. Também procuraremos
desenvolver este conceito para averiguar se o ‘onguismo’ configura-se como uma nova geopolítica para
Amazônia, utilizando conceitos da geopolítica e da geoestratégia, trabalhando com RAFESTTIN e outros
autores. Como a delimitação de áreas protegidas na Amazônia é o campo principal de atuação das Ongs
ambientalistas, buscaremos em Milton Santos subsídios para compreender e desvendar a economia política
do
espaço
das
áreas
protegidas
na
Amazônia.
c) Metodologia utilizada: Revisão bibliográfica,Fontes Oficiais, Fontes Não-Governamentais, entrevistas e
Observação
Direta
.
d)
Principais
questões
/
pontos
desenvolvidos
Nossa principal questão é averiguar o processo de hegemonia das ONgs e de que forma ocorre (se for o
caso)
a
intervenção
imperialista
na
Amazônia,
via
a
ação
das
ONgs.
e)
Resultados
alcançados
e
conclusões
O Estado do Acre viveu um vigoroso processo de luta dos trabalhadores pela posse da terra e pela
preservação dos recursos naturais necessários à reprodução da população residente na floresta. Esse
processo teve eco nos movimentos ambientalistas, principalmente internacionais. Surge no Acre uma gama
de organizações, associações e cooperativas, que, a princípio, pareciam romper com a secular cadeia de
exploração a que estavam submetidos os trabalhadores, principalmente os seringueiros. Dentre essas
organizações, têm atuação destacada as Organizações não Governamentais (ONGS), especialmente aquelas
ligadas
à
preservação
do
meio
ambiente.
No desenvolvimento do projeto de pesquisa já podemos averiguar a estreita relação das ONGs com os
poderes executivo e legislativo do Estado do Acre, a partir de 1999, como também nas instâncias do poder
federal. Averiguamos a vinculação dessas organizações, via operações de financiamento e outras, de
agências internacionais, reconhecidamente vinculadas aos interesses do imperialismo estadunidense, como
Banco
Mundial,
USAID,
Fundação
Ford,
TNC,
Fundação
Moore.
A atuação das ONGS, também ocasionou um processo de cooptação de importantes movimentos sociais,
anteriormente vigorosos, especialmente via capitulação de suas lideranças. Ocorrem também uma gama de
atuação das ONGs junto às populações rurais, ribeirinhos, colonos e seringueiros, alcançando as
comunidades mais distantes e ofertando recursos e até bens sociais (como saúde e educação), onde também
desenvolvem projetos nas áreas da produção, educação e pesquisas. Projetos estes financiados,
especialmente
com
recursos
externos.
Esses objetivos estão vinculados às verdadeiras ações dessas organizações que demonstram o caráter de
corporativização das ONGs, que vão assumindo cada vez mais funções e responsabilidades do Estado, como
vimos especificados em seus próprios objetivos que se confundem com objetivos e ações de responsabilidade
do
Estado.
Junto às questões colocadas acima, pensamos que ao contrário dos que muitos alardeiam colocando as ONgs
como uma nova vanguarda, verificamos em pesquisa realizada na primeira e mais importante cooperativa
dos trabalhadores rurais do Acre, a CAEX, formas de atuação das ONgs que concebem e financiam
estratégias de flexibilização e precarização de relações de trabalho, que representaram para as mulheres
trabalhadoras locais, as quebradoras de castanha, o restabelecimento de relações da antiga cadeia de
aviamento,
que
pagava
em
produtos
ao
trabalho
realizado
pelas
mulheres.
A intervenção imperialista na Amazônia, e especialmente no Estado do Acre, parece ser desenvolvida
principalmente via atuação das ONGS na região, por serem essas organizações que passam a gerir recursos e
executar ações que, a nosso ver, estão estreitamente vinculadas aos interesses imperialistas de preservação
da Amazônia, para suprir os recursos estratégicos de matérias primas da fase atual da indústria capitalista
baseada
na
biotecnologia
Dentro do quadro acima exposto apresentamos abaixo algumas organizações não governamentais, que
atuam no Acre e na Amazônia, e que no nosso entendimento parecem desenvolver atividades estreitamente
vinculadas
aos
interesses
imperialistas
na
região
amazônica:
-PESACRE: Criada a partir de um projeto de cooperação da Universidade da Flórida com a Universidade
Federal do Acre, atua com índios, seringueiros e colonos (agricultores) buscando formas mais racionais de
aumentar a produção e a produtividade, de ampliar a comercialização de produtos florestais não-madeireiros
(açaí, cupuaçu etc.) e, muitos dos pesquisadores visitantes, oriundos dos EUA, atuam em outros países
dominados pelo imperialismo. Um dos seus principais financiadores é a USAID (órgão do governo norteamericano).
- Centro de Trabalhadores da Amazônia – CTA: Nasceu do “Projeto Seringueiro” sendo hoje a principal ONG
do Estado do Acre no trabalho com as comunidades da floresta para o controverso manejo madeireiro. Dessa
instituição saíram vários dos que hoje estão no poder executivo e legislativo local, e também no legislativo
nacional.
- SOS Amazônia - Entregou boa parte das terras do Acre, na fronteira com o Peru, para a TNC, The Nature
Conservancy, bastante conhecida por tentar comprar terras no Brasil e na Bolívia em troca de dívida externa.
Essa organização tem tentado, nessa região do Acre, expulsar antigos moradores, (cerca de 500 famílias) do
Parque Nacional da Serra do Divisor, na fronteira do Acre com o Peru, comprovadamente a região de maior
biodiversidade do planeta. Essa região é “administrada” pela SOS Amazônia, cuja área é de responsabilidade
do
IBAMA.
- WHRC- Woods Hole Research Center : ONG norte-americana que tem presença na região amazônica
através de pesquisadores em várias áreas; parte de sua atuação dá-se através de universidades e de outras
ONGs, algumas das quais essa mesma entidade é fundadora ou participante. Sua importância está no papel
que tem cumprido seus pesquisadores no projeto – Large Biosphere Atmosphere - LBA .
- WWF – World Wildlife Fund – Fundo Mundial da Vida Silvestre: Trata-se de uma das maiores ONGs atuando
na região e tem presença em quase todos os Estados amazônicos financiando projetos na área ambiental.
Atualmente,
a
sede
da
WWF
na
Amazônia
é
na
cidade
de
Rio
Branco.
- Fundação Ford - FF: Vem atuando há bastante tempo, financiando universidades, ONGs e pessoas. Ela tem
cumprido um importante papel na formação de recursos humanos que atuam na região ou fora dela; muitos
de seus quadros fizeram ou fazem parte de universidade e institutos de pesquisa na Amazônia, além de
trabalharem
também
no
Banco
Mundial
e
outras
organizações
desse
tipo.
- The Nature Conservancy – TNC: Entidade envolvida na compra de áreas na Amazônia em troca da dívida
externa e tentativa de comprar terras no pantanal no Brasil e na Bolívia. Vem atuando no Acre através de
uma ONG, SOS Amazônia, financiando um imenso parque (Parque Nacional da Serra do Divisor) na fronteira
do Acre com o Peru, onde foram realizados vários estudos de fauna e flora e de onde se pretende retirar a
população
de
quinhentas
famílias
que
moram
naquele
parque.
Palavras-chave: Amazônia, Imperialismo, ONG’S, Geopolítica, Biodiversidade
AO199 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia Política
[2107] M UROS, FRON TEI RAS E CAM POS: BARREI RAS À M OBI LI D AD E, POLÍ TI CA M I GRATÓRI A E
NOVAS TERRITORIALIDADES.
HELION PÓVOA NETO.
IPPUR- UFRJ, NIEM, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
a)
Objetivos
do
Trabalho:
Analisa-se o atual contexto internacional de imposição de barreiras à mobilidade espacial de migrantes,
solicitantes de asilo e refugiados, com o erguimento de muros e cercas, a permanência e reforço de
fronteiras militarizadas, e a instituicao de campos e centros de acolhida para esses sujeitos.
A análise diagnostica um marco político de discursos e práticas de culpabilização de migrantes e refugiados
por diversos males sociais. O objetivo é apresentar e analisar modalidades de atuação estatal contra os
migrantes
baseadas
em
restrições
forçadas
à
sua
mobilidade
espacial.
b)
Referencial
Teórico
e
Conceitual:
Políticas migratórias são entendidas como formas de intervenção sobre os territórios nacionais, e sobre suas
escalas infra e supra nacionais, associadas à reelaboração de novos recortes espaciais e territorialidades
voltadas
ao
exercício
do
controle
da
mobilidade
espacial
das
populações.
Assim, a literatura sobre processos de reformulação territorial e de emergência de novos recortes, utilizados
quando da intervenção sobre movimentos populacionais, é referencial básico para este trabalho.
Também as análises de novas tendências internacionais de regionalização são relevantes, já que os
processos analisados sugerem a reformulação de noções tradicionais de países de emigração, de imigração e
de passagem. Processos de transição entre tais “posições”, bem como diversificações, inversões e
multiplicações
de
fluxos
migratórios
são
verificados.
As barreiras à mobilidade espacial são analisadas como medidas concretas de cerceamento ao movimento,
mas também como discursos eloqüentes sobre populações tidas como “indesejáveis” ou “perniciosas” para as
sociedades
de
destino.
c)
Metodologia
Utilizada:
A metodologia é em primeiro lugar histórica, enfocando a constituição de barreiras à mobilidade e as políticas
de incentivo e cerceamento à imigração durante a Guerra Fria. Analisam-se iniciativas de promoção e seleção
de imigrantes regiões carentes de mão-de-obra, ao longo de um período no qual caminha-se no sentido de
maior
seletividade
e
restrição
na
política
imigratória.
O período histórico mais recente, balizado em princípio pela queda ou reformulação dos regimes socialistas
do Leste Europeu e da Ásia e, em seguida, pelo 11 de setembro de 2001, utiliza-se metodologia comparativa
no acompanhamento e cotejo das políticas de controle da mobilidade adotadas, perseguidas e sugeridas.
d)
Principais
Questões:
É intenso o debate internacional sobre políticas migratórias. As sociedades desenvolvidas mostram-se
crescentemente hostis à imigração tanto voltada para o mercado de trabalho quanto composta por refugiados
e solicitantes de asilo em deslocamentos ligados à violência da guerra e das perseguições.
O imigrante é diagnosticado como excedente inassimilável pela economia e socialmente oneroso,
radicalizando-se a partir daí a sua percepção na qualidade de ameaçador para a manutenção da ordem e
para a restrição de gastos sociais, rejeição que se estende também ao refugiado e ao solicitante de asilo.
e)
Resultados
Alcançados
e
Conclusões.
Políticas de estado para migrantes e refugiados, na forma de barreiras físicas e campos para reunião e
confinamento, superaram formas tradicionais de intervenção. Meios de comunicação de massa e forças
políticas reforçam a hostilidade quanto imigrantes, com imagens ameaçadoras sobre a imigração, tida como
invasiva e descontrolada. Sendo as migrações fortemente condicionadas por fluxos de informação em redes
sociais internacionalizadas, as barreiras visam também a desestimular migrantes em potencial.
Barreiras e campos são dispositivos práticos de política migratória e também discursos de sinalização para
candidatos à migração ilegal. São também erguidas fora dos limites territoriais das sociedades de imigração,
vendo-se como exemplos os muros erguidos nos enclaves espanhóis do Marrocos e as propostas de campos
para migrantes em pontos de passagem rumo à Europa, assim como as pressões dos EUA por maior controle
da
fronteira
México-Guatemala.
Dispositivos anti-mobilidade podem ser mapeados, com uma tipologia que busca de similaridades e objetivos
comuns. Sinteticamente, é possível identificar, em primeiro lugar, o erguimento de barreiras em fronteiras
terrestres ou marítimas entre sociedades com desníveis de desenvolvimento e bem-estar social, como nos
casos conhecidos do México e de Ceuta e Melilla. Mas também entre países periféricos com disparidade de
condições econômicas, dispositivos semelhantes são erguidos, do que é exemplo a cerca eletrificada erguida
pelo governo de Botswana na tentativa de frear a migração proveniente do Zimbabwe.
Em todos esses casos, a sinalização anti-imigração coexiste com fortes demandas por mão-de-obra pelos
mercados de trabalho das áreas de ingresso de imigrantes. Isto sugere que as barreiras à migração, ao
bloquearem a passagem de muitos, atuam também no sentido da possibilidade de uma maior exploração do
trabalho
daqueles
que
têm
sucesso
em
atravessar.
Em seguida, reconhecem-se barreiras que visam dificultam ou impedem a mobilidade e o ingresso de grupos
étnicos ou nacionais tidos como indesejáveis ou ameaçadores. A barreira israelense frente aos territórios
palestinos é um exemplo evidente, bem como as faixas militarizadas entre as duas Coréias e entre as áreas
grega
e
turca
de
Chipre.
O muro, a cerca, o campo de refugiados, a fronteira fortificada contra migrantes, são todos dispositivos de
controle sobre a mobilidade dos homens associada à imposição de medidas quanto aos fluxos migratórios.
Migrantes e refugiados são objeto de políticas que parecem estar em expansão, impondo limites à liberdade
de movimento e produzindo novas formas de fechamento dos territórios.
AO361 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Regionalização e
Globalização
[2074] A M OBI LI D AD E D E JOGAD ORES: OS EFEI TOS D A GLOBALI ZAÇÃO E D O CAPI TALI SM O N O
FUTEBOL.
PAULO MIRANDA FAVERO.
USP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
O objetivo deste artigo é pensar a entrada da globalização e do capital no futebol através da mobilidade de
jogadores. A partir da Geografia, pretende-se analisar o futebol em seus aspectos políticos e econômicos, em
diversas escalas. O foco central está na tentativa de entender a saída de jogadores dos países da periferia do
mundo para as áreas centrais do globo, utilizando principalmente os casos da América Latina, incluindo o
Brasil. Além desta migração em massa, que também pode ser considerada uma “exportação” de jogadores,
outros aspectos chamam a atenção, como as medidas políticas adotadas para que essa transferência de
atletas ocorra com mais facilidade e o papel da globalização diante desse processo.
No futebol ocorre uma espécie de “Divisão Internacional do Trabalho”, onde cada associação ou região
desempenha um papel diferente e que pode ser comparada com a disputa de blocos econômicos. O Mercado
Comum Europeu está para o Mercosul da mesma forma que a Uefa está para a Conmebol. A intenção deste
artigo é apresentar os fluxos do futebol no território e expor o futebol como fenômeno mundial e elemento do
poder mundial. O esporte se espacializa, só que o poder é volátil e tenta abarcar o mundo, sem definir as
fronteiras de sua atuação. No caso brasileiro, é o Clube dos 13 que faz o papel de protagonista (junto com a
CBF), representando os interesses do capital estrangeiro – neste caso, formado pelos clubes pertencentes ao
G-14.
Outro ponto a se destacar dentro desse artigo é o futebol enquanto negócio. As ações políticas são voltadas
para transformá-lo em capital e, dessa forma, a globalização interfere em muitos aspectos: ela aniquila as
escolas nacionais, por causa da grande circulação de atletas de diferentes nacionalidades, esvazia as
periferias de jogadores e os concentra em clubes transnacionais. A exportação de jogadores faz o futebol
crescer como negócio na Europa, porém esvazia o futebol como sociabilidade no Brasil – em grande parte
pelo aumento da quantidade de transmissões de jogos por canais de televisão. É só ver o número cada vez
menor de torcedores nos estádios de futebol, fato que preocupa as entidades que regem o esporte no País.
A lógica do capital agrada aos dirigentes brasileiros, que buscam mais dinheiro a qualquer preço. O Clube dos
13 aceita a missão de colaborar para fornecer jogador para a Europa. É desse negócio que vem o dinheiro
para investir nas categorias de base, formar mais jogadores e mandar para o exterior. Nesta lógica, o Brasil
não passa de um exportador de jogadores. Fato que é festejado todos os anos pela Confederação Brasileira
de Futebol (CBF), sempre que o número de atletas que saem do país supera os números do ano anterior. E a
entidade comemora mesmo que só consiga vender o produto futebol através da Seleção e nunca através dos
campeonatos
brasileiros,
sejam
eles
nacionais,
regionais
ou
locais.
O grande número de atletas exportados, neste caso não apenas do Brasil, mas de todos os países periféricos
do mundo da bola, aliado ao fato de o atleta ser uma mercadoria global, faz com que os jogadores também
exerçam um papel de commodities. As commodities possuem grande importância internacional,
principalmente no sistema financeiro, e são negociadas em profusão. Assim, os jogadores de futebol também
seriam uma espécie de commodity, mas ao contrário de serem negociados nas bolsas de valores (por
enquanto), são comprados e vendidos pelos clubes com o consentimento das Confederações nacionais e da
Fifa.
A Seleção Brasileira também funciona como uma bolsa de commodity dos jogadores brasileiros. A cada
convocação para a equipe nacional, os atletas ficam mais valorizados. É muito comum, logo após um jogador
ser chamado duas ou três vezes para a Seleção, que algum clube da Europa compre seu passe. Isso ocorreu
com muitos jogadores e, curiosamente, a Inglaterra só permite que seus clubes contratem jogadores
estrangeiros que já vestiram algumas vezes a camisa da seleção. Assim, atuar com a camisa amarela do
Brasil
é
um
bom
trampolim
para
um
ótimo
contrato
no
exterior.
O artigo faz parte de uma pesquisa iniciada há alguns anos, que busca na Geografia Econômica e Política
elementos para se discutir o esporte mais popular do mundo. As raras e excelentes discussões sobre o
futebol dentro da Geografia serviram de base para o trabalho, e a bibliografia consultada partiu desde textos
jornalísticos até pesquisas de campo, passando por livros de História, Antropologia, Literatura, Educação
Física etc. Um outro tipo de bibliografia, mais ligada às teorias marxistas, também foi fundamental para
elaboração do artigo, principalmente para tentar entender a dinâmica do capital e a influência disso no
próprio futebol. A teoria de Guy Debord, sobre o espetáculo, também traz elementos importantes para esta
discussão. Muitos documentos também foram consultados para ajudar a esclarecer as lacunas da pesquisa.
Palavras-chave: Globalização, futebol, migração de jogadores, Geografia.
AO362 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Regionalização e
Globalização
[1736] “A I N TERN ACI ON ALI ZAÇÃO ATUAL D O EN SI N O SUPERI OR: M OBI LI D AD E D OS ESTUD AN TES
E GEOPOLÍTICA DO CONHECIMENTO”.
FABIO BETIOLI CONTEL.
ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING (ESPM), SAO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
Objetivos
do
Trabalho
O texto procura analisar o atual processo de internacionalização da educação superior, focando a atenção
sobre a mobilidade internacional dos estudantes de terceiro grau, assim como para as novas formas de
prestação de serviços educacionais “à distância”, permitidas pelas novas técnicas da informação.
Referencial
Teórico
Para a análise dos fluxos mundiais de estudantes, os trabalhos pioneiros de Pierre George (1957; 1977) e
Jacqueline Beaujeu-Garnier (1980) foram sobremaneira importantes. De Pierre George (1957:249 e ss.) foi
fundamental para o estudo sua diferenciação entre a emigração dada nos “países industrializados” e aquela
que ocorre a partir do que chamara de “países coloniais”. De Beaujeu-Garnier (1980: 193 e ss.) foi bastante
profícua a distinção de “migrações permanentes” e “emigrações temporárias”, já que esta distinção está na
base
da
geografia
atual
da
mobilidade
internacional
de
estudantes.
Em relação à questão das novas tecnologias da informação, aplicadas à prestação de serviços educacionais,
foi essencial a utilização da teorização proposta pelo geógrafo Milton Santos (1994; 1996), para quem as
técnicas da informação interferem de duas principais maneiras no uso do espaço geográfico: a) elas
permitem a chamada “tele-ação”, isto é, que uma nova divisão territorial do trabalho se instale, sem que os
atores “decididores” estejam fisicamente presentes nas regiões produtivas; b) estas técnicas permitem
também, destarte, uma maior centralização do comando das decisões, implicando numa maior
hierarquização da atual divisão internacional do trabalho. O uso das técnicas do ensino a distância, portanto,
podem tanto servir para uma democratização da difusão do saber universitário, quanto para um aumento da
centralização de sua produção, principalmente nas Universidades de renome internacional dos países do
centro
do
sistema-mundo.
Metodologia
A
pesquisa
se
valeu
de
dois
principais
recursos
metodológicos:
a) revisão bibliográfica: o recurso à revisão bibliográfica permitiu que fosse traçado um panorama da
evolução das migrações internacionais, sendo elas de três principais tipos: migração de estudantes, migração
de mão-de-obra não-qualificada e migração de mão-de-obra qualificada (AZEVEDO, 1967; PEIXOTO, 2001;
ÖZDEN, 2005). Permitiu ainda que pudéssemos interpretar os dados estatísticos da mobilidade internacional
de estudantes, identificando quais as principais conseqüências desta mobilidade para a organização dos
territórios
e
de
seus
sistemas
de
ensino
superior;
b) análise e interpretação de dados estatísticos: foram três as principais fontes de estatísticas para a
consecução da pesquisa: dados da UNESCO (2006), do Institute for International Education (IIE) e da
Organization
for
Economic
Co-Operation
and
Development
(OECD).
Principais
questões
O contexto atual da liberalização das trocas comerciais entre os países começa a afetar de forma mais direta
também os chamados “serviços educacionais”. Alguns países têm pressionado a Organização Mundial do
Comércio (OMC) para que haja uma maior liberalização do fluxo de investimentos diretos, assim como para a
liberalização das formas de prestação de serviços educacionais “transfronteiriços” (“cross-border educational
goods
and
services”)
(LIMA,
2006;
2007).
Este movimento de liberalização é pleiteado principalmente pelos Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia e
Japão, que têm interesses em aumentar sua influência na polarização dos fluxos de estudantes
internacionais, assim como em incrementar a exportação de “produtos educacionais”, como forma de
melhorar
a
posição
de
suas
respectivas
balanças
comerciais
na
economia-mundo.
O grande problema diz respeito ao caráter eminentemente comercial que este movimento adquire. As
estratégias dos países que querem esta maior liberalização se chocam frontalmente com as vicissitudes dos
países em desenvolvimento. Para estes últimos, a atual “sociedade do conhecimento” (DRUCKER, 1970;
GORZ, 2004) indica a necessidade de criação de uma infra-estrutura de ensino de terceiro grau voltada a
finalidades republicanas, para a difusão do ensino, pesquisa e extensão universitária para toda a população
de seus territórios. Este caráter público e estratégico das vicissitudes dos países em desenvolvimento tem
encontrado dificuldades ainda maiores para se consolidar, dada esta pressão de caráter mercadológico,
competitivo, que o comércio internacional dos bens educacionais adquire na atualidade.
Considerações
finais
A análise estatística e bibliográfica permitiu que chegássemos a alguns resultados provisórios sobre o
problema:
a) os países interessados na maior liberalização dos fluxos de estudantes, investimentos e prestação de
serviços ligados a educação superior são os que mais recebem estudantes internacionais em seus territórios;
b) a bibliografia analisada (CARNOY, 2002; CZINKOTA, 2005; KRITZ, 2006; KNIGHT, 2001; 2005; ADLUNG,
2005) não dá a relevância necessária aos impactos regionais dos gastos dos alunos estrangeiros nos
territórios hospedeiros. Somente nos Estados Unidos, em 2006, os 565.039 alunos forâneos naquele país
instalados despenderam nada menos que US$ 19.953.958.276,00, para suas despesas com taxas
universitárias
e
“gastos
correntes”
(alimentação,
habitação,
lazer
etc.);
c) a importância estratégica que adquirem esta mobilidade internacional dos fluxos de estudantes, os
investimentos externos e a prestação de serviços educacionais (assim como o esforço de certos Estadosnação para aumentar sua influência sobre eles), nos permite falar na formação de uma “geopolítica do
conhecimento” no atual período histórico.
AO363 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Regionalização e
Globalização
[1706] REDES: APONTAMENTOS PARA PENSAR SOBRE O CONCEITO.
ANA EMÍLIA DE QUADROS FERRAZ.
UESB/UFS, VITORIA DA CONQUISTA, BA, BRASIL.
Resumo:
Objetivos
do
trabalho:
As análises das articulações entre espaços urbanos e regionais se estabelecem nos temas geográficos de
diferentes maneiras, dentre as quais, figuram trabalhos realizados tendo como base o estudo das redes.
Esses esforços analíticos, suscitam debates e argumentações por vezes antagônicos e outras
complementares, o que torna o uso do conceito de redes complexo e instigante. Várias questões afloram com
a inserção do conceito de rede ao arcabouço teórico da geografia. Então buscamos compreender: O que são
redes? Que características elas apresentam na contemporaneidade? Como a discussão a respeito de redes
aparece na geografia? Como considerar as redes num contexto contemporâneo na ciência geográfica? Como
a
sua
manifestação
contribui
no
estabelecimento
da
cidade
e
da
região?
Pelo exposto, tratamos neste trabalho, de algumas contribuições teóricas que auxiliam a discussão do
conceito
de
rede
e
sua
relação
com
a
cidade
e
a
região.
Referencial
teórico
conceitual:
Além da variedade dos significados e sinônimos o termo rede tem uma história que o torna ainda mais
complexo. “O termo rede não é recente, tampouco a preocupação em compreender seus efeitos sobre a
organização
do
território
(DIAS,
1995,
p.143).”
Na geografia, o termo rede passa a ser utilizado com o intuito de compreender a organização dos territórios,
levando em consideração a sua origem, que designa um conjunto de fios entrelaçados, linhas e nós. De
acordo com Parrochia (1993, p. 5) “Por analogia com a imagem de origem, chamamos «nós» de rede toda
intersecção
dessas
linhas.”
Já a partir da segunda metade do século XVIII, o conceito ganha novas dimensões de entendimento com sua
a utilização por engenheiros cartógrafos que usam representações geométricas do território e passam a
empregar “[...] o termo no sentido moderno de rede de comunicação e representam o território como um
plano de linhas imaginárias ordenadas em rede, para matematizá-lo e construir o mapa”. (DIAS, 2005, p.
15).
Nos últimos anos, novos significados e possibilidades de aplicação teórica surgem para o uso do conceito e
vários autores têm se dedicado à sua análise e contribuído para o seu aprofundamento teórico.
Para empreender o propósito de analisar o conceito de rede além da ambigüidade, uma pista nos é oferecida
por Moreira (2006), quando afirma que um estudo pautado nas redes possibilita à geografia, o olhar sobre o
espaço móvel e integrado. Este intento também está presente nos escritos de Santos (2004), os quais
reforçam a importância do conceito de rede para o estudo contemporâneo da geografia. Este autor, ressalta
que existe uma matriz que considera apenas o aspecto material das redes e se fundamenta nas análises das
redes técnicas, e uma outra que também leva em conta o dado social, as chamadas redes sociais.
Apesar de compreender a importância dos estudos que privilegiam o estudo de redes técnicas
compartilhamos com a preocupação esboçada por Dias (2005), quando questiona como é possível avançar na
construção de um conceito de rede, contextualizado no campo do conhecimento geográfico, que não esteja
associado ao determinismo tecnológico? O estudo das redes, na relação entre os aspectos técnicos e os
aspectos sociais, não devem ser considerados separadamente, mas de modo conjunto, consubstanciado,
assim possibilitando o entendimento da complexidade do espaço móvel e integrado. O técnico é um aspecto
do social. Reforçando esta tese, Dias (2005, p. 23) conclui que, “A rede, como qualquer outra invenção
humana,
é
uma
construção
social”.
Além desses aspectos, também outros merecem destaque para que a idéia de ambigüidade do conceito de
rede possa ser dissipada. Como concebe Santos (2004): as redes são ao mesmo tempo virtuais e reais,
estáveis e dinâmicas, globais e locais, unas e múltiplas, concentradoras e dispersoras, condutoras de forças
centrípetas e de forças centrífugas. As redes são isso tudo ao mesmo tempo. Essas características
consubstanciadas, dão conteúdo às redes. O estudo da rede se compõe de um processo dialético, visto que,
como observa Lefèbvre (1995, p. 240), “[...] leis dialéticas constituem, pura e simplesmente, uma análise do
movimento. O movimento real, implica essas diversas determinações: continuidade e descontinuidade;
aparecimento e choque de contradições; saltos qualitativos; superação.” Como aponta Lefèbvre (1995, p.
170) “[...], o real se apresenta como: móvel, múltiplo, diverso, contraditório.” Assim, é possível afirmar que
as ambigüidades das redes se revelam falácias e se dissipam pois fazem parte de um mesmo processo.
Metodologia
Com o desenvolvimento dos trabalhos pretendemos elaborar reflexões que contribuam para o debate
geográfico sobre as relações que se estabelecem entre a cidade, a região, com base no estudo de redes.
Quando propomos analisar essas relações os vários elementos das redes estão presentes. Para viabilizar
essas análises pautamos a pesquisa nas redes que estabelecem com base na política pública de saúde, nos
serviços de educação de nível superior e na atividade comercial de atacado em Vitória da Conquista, pois
entendemos que essas abordagens permitirão o exame multifário das redes e possibilitarão abordar os seus
vários elementos. Entendemos que esta estratégia metodológica assegura uma investigação dialética das
redes, visto que estas dimensões de análise permitem diferentes exercícios com a utilização da idéia de rede.
Inicialmente, privilegiamos a revisão bibliográfica objetivando um aprofundamento teórico, como forma de
definir conceitos referenciais básicos. Às formulações teóricas serão acrescidas informações dos trabalhos de
campo, com o objetivo de confrontar teoria e prática e se avançar com as análises referentes a redes.
Principais
questões
desenvolvidas
Quando o termo rede é empregado em análises geográficas ele está imbricado de propriedades que,
consubstanciadas, dão suporte ao próprio conceito. De propriedade multifária, perpassam o conceito de redes
termos como: conexidade, fixos, fluxos, fluidez, horizontalidade, verticalidade, dentre outros. A complexidade
do estudo das redes nos impõe desafios: Como analisar os elementos da rede? É possível elaborar esse
estudo tendo como base empírica de estudo a política de saúde, o serviço de educação e a atividade
comercial de Vitória da Conquista? Objetivando responder estes questionamentos, cabe, aproximar o
conceito de redes às escalas geográficas, sobretudo, a região e a cidade. Torna-se imperativo observar, por
um lado, como o conceito de rede se manifesta ou se comporta nestes planos escalares e por outro, como
convivem
e
interagem
cidades,
regiões
e
redes.
Resultados
alcançados
e
conclusões
Como destacado não se pode fazer uma separação absoluta entre os vários aspectos das redes, visto que
estão imbuídos de uma relação de interdependência e, portanto, não se pode considerá-los como se fossem
isolados.
Palavras-chave: Redes, geografia, cidade, região.
AO358 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Regionalização e
Globalização
[1777] O REGIONALISMO TRANSNACIONAL NA ÁSIA.
ELOI MARTINS SENHORAS1; PATRICIA NASSER CARVALHO2.
1.UNICAMP, CAMPINAS, SP, BRASIL; 2.UFF, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
O presente artigo busca fazer uma breve leitura sobre o regionalismo transnacional da Ásia por meio de uma
discussão teórica de uma nova categoria analítica na geografia que é reflexiva à espacialidade geoeconômica
do
sistema
internacional.
Com essa discussão pretende-se fornecer os subsídios adequados para a garantia de pluralidade e o
aprofundamento do debate sobre os processos de integração regional no mundo e, em especial, destacar o
caso da cooperação e interdependência dos países asiáticos por meio do paradigma dos gansos voadores,
que deu origem à formação de um complexo espaço internacional denominado spaghetti noodle asiático que
é
multicortado
por
múltiplos
esquemas
de
um
regionalismo
transnacional.
Estruturação
do
Artigo
O regionalismo transnacional têm sido um dos maiores movimentos nas relações internacionais, pois
praticamente todos os países do globo são membros de um bloco e muitos pertencem a mais de um, de
forma que quase dois terços do comércio mundial se dá por meio desses “mercados comuns” (Hilaire e Yang,
2003).
A proposta de estudo do artigo está dividida em duas seções que se complementam ao amalgamarem a
teoria do regionalismo transnacional a um caso prático de exemplificação dessa categoria espacial
geoeconômica.
Na primeira seção, o texto irá fazer uma releitura do conceito de região, que é extremamente importante na
geografia, por meio de uma ótica internacional ou propriamente transnacional, conforme sugerido por
Senhoras
e
Vitte
(2007).
Na segunda seção será introduzida uma discussão sobre o paradigma dos gansos voadores na Ásia, e como
ele estimula a formação de uma espacialidade de comercio intra-asiatico denominado pelos especialistas de
“Spaghetti Noodle Asiático”, que é multirecortado por uma série de acordos regionais que serão identificados
caso
a
caso.
Procedimento
Metodológico
O estudo será realizado por uma pesquisa de revisão bibliográfica sobre a temática do regionalismo
transnacional e do paradigma dos gansos voadores na Ásia e por um levantamento e um conseqüente
tabulamento dos esquemas transregionais de comércio na Ásia em fontes primárias e secundárias de
informação, a fim de plotar em um mapa a configuração do spaghetti noodle dos esquemas transregionais.
Regionalismo
Trasnacional:
Introdução
a
uma
Discussão
Escalar
As escalas geográficas per se não são boas ou ruins ou únicas, são apenas instâncias transversais e
simultâneas onde acontece a dialética da acumulação. Portanto, nenhum recorte espacial é natural ou dada à
priori, pois as escalas são construções históricas, econômicas, culturais, políticas e sociais cujas forças
capitalistas têm inerente capacidade de manejar bem simultaneamente e muitas vezes de forma articulada
(Brandão,
2001).
As escalas são produzidas e não dadas ontologicamente à priori, pois são conteúdos e relações fluidas,
contestadas e perpetuamente transgredidas, como observa Swyngedouw (1997) ao analisar vários eventos
que ocorrem em uma escala e têm implicações e conseqüências em outras, uma vez que muitas vezes,
independentemente de qual é o sítio em que ocorre um evento, seus efeitos são sentidos em diferentes
níveis
escalares.
Apesar de fluidas e interpostas entre si, toda escala é central e decisiva, material e politicamente, para
estruturar os processos dialéticos da acumulação, por isso o artigo pretende mostrar a importância de uma
escala
relevante,
mas
com
insuficientes
estudos,
que
é
o
regionalismo
transnacional.
Com o crescente processo de globalização, os tradicionais estudos regionais baseados, nas particularidades,
têm cedido espaço para outras “regiões”, articuladas a escalas mais abrangentes de caráter internacional.
Dentro desse contexto e devido aos controversos significados e instrumentalizações do conceito região na
geografia, o presente artigo pretende fazer uma releitura teórica do termo região por meio do referencial da
geografia das relações internacionais, através dos conceitos de regionalismo, regionalização aberta ou
integração regional transnacional, que são processos multifacetados de formação de blocos de países que
compartilham os mesmos valores ou objetivos, a partir de ações engendradas pela lógica econômica do
mercado e/ou dos Estados-Nações soberanos, ao estabelecerem voluntariamente instituições para
governança.coletiva.
Regionalismo
Trasnacional
Asiático
e
o
Paradigma
dos
Gansos
Voadores
As profundas transformações nas temporalidades e espacialidades do sistema capitalista apresentam uma
série de desafios para a análise da expressão geográfica das densas e rápidas mudanças em curso, que
impõem uma ampla e complexa agenda de análise trans-escalar a respeito das metamorfoses do movimento
da
acumulação
de
capital
em
sua
dimensão
espacial.
Dentro desse quadro, a teoria conhecida como paradigma dos gansos voadores é uma explicação para um
padrão transregional de espacialidade industrial e comercial que envolve uma divisão regional do trabalho
baseada
numa
hierarquia
industrial
e
locacional
na
Ásia.
A relação do paradigma dos gansos voadores com a formação de um espaço complexo e multicortado por
vários esquemas transnacionais de regionalismo é direta, uma vez que pela analogia, os gansos ao voarem
juntos
em
“V”,
mostram
uma
forte
cooperação
regional
que
é
hierarquizada.
Ela fornece uma descrição da realocação de indústrias de um país para outro através do comércio e do IDE
(Investimento Direto Estrangeiro), em resposta a mudanças nas condicões de competitividade. Mais do que
isso, analisa as ligações entre os diferentes países numa hierarquia regional, identificando os mecanismos de
transmissão
do
desenvolvimento
e
da
cooperação
interestatal.
O artigo pretende demonstrar como principais conclusões que a peculiaridade do crescimento dos esquemas
regionais transnacionais na Ásia está assentada na dinâmica de cooperação e hierarquia dos fluxos de
comércio e IDE do paradigma dos gansos voadores, que ao se estruturar por meio de Redes Regionais de
Produção de firmas que estão além das fronteiras nacionais por meio de mecanismos de coordenação e
colaboração de longo prazo, acabam por delinear o multicortado espaço internacional de acordos regionais
transnacionais
denominado
spaghetti
noodle
asiático
(Peng,
2000).
Bibliografia
BRANDÃO, C. A. “A Espacialidade da Riqueza: notas teóricas sobre as principais determinações da dimensão
espacial do processo de desenvolvimento”. Cadernos IPPUR, ano 15, nº 1. Rio de Janeiro: IPPUR, 2001.
HILAIRE, A. & YANG, Y. The United States and the New Regionalism/Bilateralism. Washington: MMF, 2003.
PENG,
D.,
“The
Changing
Nature
of
East
Asia”,
Pacific
Affairs,
Summer,
2000.
SENHORAS, E. M.; VITTE, C. C. S. . “A Escala do Regionalismo Transnacional sob Construção”. Anales del XI
Encuentro
de
Geógrafos
de
América
Latina.
Bogotá:
UNAL,
2007.
SWYNGEDOUW, E. “Neither global nor local: ‘globalization’ and the politics of scale. In: COX, K. Spaces of
globalization. New York: Guilford Press, 1997.
AO359 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Regionalização e
Globalização
[2020] INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA GEOGRAFIA DO COMÉRCIO VAREJISTA DA CHINA.
JOSÉ MESSIAS BASTOS.
UFSC, FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL.
Resumo:
O presente trabalho tem como objetivo central analisar as transformações recentes na estrutura econômicoterritorial do comércio varejista da China. Utilizando-se da categoria marxista de formação sócio-espacial
investiga-se como se implementou os agentes responsáveis pelas rápidas mudanças que estão em
andamento no varejo chinês. Do ponto de vista metodológico utilizou-se relatórios publicados pela redes de
lojas que operam na China e pelo Ministério do Comércio e por inúmeros artigos e livros editados
recentemente. Assim, a partir da análise do material recolhido foi possível construir um panorama global das
razões mais relevantes que explicam as modernizações recentes que estão ocorrendo na sociedade chinesa e
no
comércio
varejista,
em
particular.
O comércio varejista na China encontra-se fortemente fragmentado, pois as 100 maiores empresas do setor
detém apenas 10,5% do seu faturamento, que alcançou, em 2005, o montante de 755 bilhões de dólares. A
partir do acordo firmado em 2001, para admissão na Organização Mundial Comércio (OMC), o mercado
consumidor chinês foi sendo cobiçado mais e mais pelas maiores redes comerciais do mundo.
A principal rede varejista da China o Grupo Estatal Shanghai Bailian formou-se da fusão das redes estatais
Shanghai Yibai, Co. Hulian, Shanghai Friendship Group e da Materiais Shanghai Co., em 2003, essa rede
apresentou faturamento de 72,1 bilhões de Remembi (RMB) (8,9 bilhões de dólares) em 2006. Operando,
atualmente, com uma rede de mais de 6.000 lojas, distribuídas pelo território nacional chinês, o Grupo
Bailian atua com os seguintes formatos de lojas: Supermercados, hipermercados, conveniência, lojas de
departamento e de material de construção. Tal contexto marca o novo momento vivido pela estrutura
comercial da China, pois as redes locais são forçadas a se confrontarem com as grandes e modernas cadeias
mundiais, como a francesa Carrefour, a americana Wal-Mart e outras iniciativas varejistas dos países vizinhos
do
Sudeste
asiático.
Um exemplo, que demonstra também a magnitude dos dados apresentados anteriormente, é o caso da
Lianhua supermercados Holdinhg Co., Ltda que tem participação direta do poder público e de empresas
estatais e privadas nacionais e estrangeiras, como japonesa Mitshubishi. A rede de lojas Lianhua multiplicou
por 3,8 vezes o número de lojas entre 2000 e 2005 (de 943 para 3609). Embora não operasse no segmento
de hipermercado no início desta década, em junho de 2006 já controlava 101 dessas filiais. Quanto ao
faturamento o resultado foi mais significativo, pois, entre os anos 2000 e 2005, suas vendas brutas saltaram
de cerca de RMB 1.784,5 milhões para RMB 14.313,0 milhões. Isto significou que nesse período suas vendas
cresceram
em
mais
800%,
conforme
os
Relatórios
Anuais
da
Holding
Lianhua.
Com relação aos investimentos privados no setor varejista cabe ressaltar que apesar da agressividade das
redes estrangeiras no mercado chinês são as redes domésticas que apresentam maior agressividade.
Segundo Don Lee jornalista do Los Angeles Time em sua reportagem “os discretos bilionários da China”,
publicada no jornal O Estado de São Paulo p. 20 de 07/06/2006, a Gome Electrical Appliance nasceu da
iniciativa de um camponês pobre nascido nas proximidades da cidade de Shantou que se localiza na Província
de Guangdong. Dez anos depois, Guangyu, havia construído uma rede com 120 lojas de eletro-eletrônico e
tornou-se o empresário mais rico da China, administrando uma rede com mais de 550 lojas que ocupam área
de 2,52 milhões de m², distribuídas por 178 cidades e empregando mais de 100 mil trabalhadores até o
primeiro
semestre
de
2006.
A rede de lojas varejista Suguo é outro caso de dinamismo de cadeias de lojas na China, pois no período de 9
anos saltou de 13 lojas de supermercados e conveniência, em 1997, para 1583 lojas em 2005. Desde sua
origem, em 1996, uma de suas grandes estratégias foi a de estabelecer filial no meio rural, aproveitando a
gigantesca população de mais 900 milhões de habitantes que vivem no campo e a ampliação da renda per
capita dos proprietários e trabalhadores do meio rural, que aliás cresceu muito nas últimas décadas. Este
exemplo, despertou o interesse do Ministério da Agricultura da China que realizou um esforço para, através
de um Projeto de Lei, criar um sistema moderno de distribuição na área rural. Beneficiando cerca de 100
milhões de pessoas, o projeto já conta com 1150 lojas em 770 condados e municipalidades que empregam
cerca de 350 mil pessoas, investindo o montante de RMB 7 bilhões até maio de 2006. Nas lojas localizadas
em pequenas cidades o Estado chinês oferece um subsídio de 3.000 Yuan e para as vilas 4.000 Yuan, mas
aquelas que estão localizadas nas regiões centrais ou ocidentais podem ter mais um acréscimo de 1.000
Yuan. Todo esse esforço empreendido pelo poder público visa: 1) satisfazer com segurança a crescente
demanda do meio rural, 2) empurrar para frente a industrialização da agricultura, 3) capacitar os
pretendentes ao negócio e 4) monitorar, inspecionar e revisar as iniciativas eleitas e o projeto como um todo.
Assim, a partir destes resultados empíricos das cadeias de lojas e da economia chinesa em geral, evidenciase o caráter modernizador de extremo dinamismo das redes de lojas chinesas. Tal dinamismo é importante
ressaltar foi coordenado, incentivado e, em grande parte, subsidiado financeiramente e gerencialmente pelas
políticas públicas implementadas pelas diversas esferas do governo chinês. Contudo, cabe assinalar que tais
apoios governamentais não obscurecem a capacidade empresarial dos novos empreendedores do comércio
varejista da China. Pelo contrário, o que o governo chinês esta interessado explorar ao máximo é a
capacidade empreendedora do novo empresário chinês oferecendo a possibilidade de enfrentar as grandes
redes mundiais no mercado doméstico e ao mesmo tempo preparando-as para no futuro concorrer em outros
mercados.
AO360 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Regionalização e
Globalização
[1856] JAPÃO: REVOLUÇÃO PASSIVA E RIVALIDADE IMPERIALISTA.
MARCOS AURELIO DA SILVA.
UFSC, FLORIANOPOLIS, SC, BRASIL.
Resumo:
Antes que a Ásia Oriental se tornasse a região do planeta com as maiores taxas de crescimento econômico, o
Japão já despontava no cenário mundial com prodigioso dinamismo. No início do século passado, Lenin o
associava aos “países capitalistas jovens, que progrediram com enorme rapidez” (1977:636), dinamismo que
se manteve por todo o século, como o demonstram as estatísticas da ONU, apontando-o como o país que
apresentou a mais elevada taxa de crescimento da produção industrial do capitalismo desenvolvido entre
1938-1988, com 6,1% ao ano
perdendo apenas para o Brasil, com 6,7% ao ano, se incluirmos os
capitalismos do Terceiro Mundo, e ficando no terceiro posto se se abarca o mundo socialista, com os 7,5% ao
ano
da
ex
URSS
(RANGEL,
1990).
Não deve haver dúvida que, envolvendo uma atualização tecnológica, pelo uso do mais avançado progresso
técnico existente na economia mundial, estamos diante de um aspecto do desenvolvimento desigual a escala
internacional, portador de enormes ganhos para diversas industrializações tardias, inclusive periféricas
(LENIN, 1977, ROWTHORN, 1979, MAMIGONIAN, 1982). E, se a portentosa re-divisão geográfica do trabalho
de diversos ramos da produção industrial planetária é sua expressão mais acabada, não seria demais dizer
que o Japão figura, aqui, como um dos principais beneficiários. Com efeito, se na “altura de 1960, os EUA
ainda detinham mais de um quatro da produção mundial de aço, mais da metade da montagem de
automóveis e (alguns anos depois) quase 90% da produção de televisores a cores”, em 1980, contudo “a
parte do Japão... saltara de 6,5% (1960) para 15,5% no aço; de 5% para 30% nos automóveis; e de
virtualmente
zero
para
mais
de
50%
nas
televisões
a
cores”(OLIVEIRA,
2006:13-14).
Aliás, vale notar que o fenômeno não se restringe às tecnologias já maduras. Ele alcança também, e de
forma extremamente veloz, os produtos saídos da revolução da microeletrônica. Assim, se nos “anos 80,
firmas americanas atendiam, no país e em implantações no exterior, 98% da produção mundial” de
semicondutores, logo em seguida “o Japão inverteria a situação...”, alcançando em “fins de 1986... 90% das
256K
D-RAM
vendidas
no
mundo”(OLIVEIRA,
2006:16).
Todavia, na década de 1990, o quadro que acima traçamos perde algo da sua nitidez. O outrora dinâmico
crescimento econômico japonês, abalado pela reação norte-americana, que logrou impor uma determinada
macroeconomia planetária a partir de meados dos anos 1980, conhece uma persistente estagnação. E, a
economia dos Estados Unidos, após sofrer seguidamente com os desdobramentos da crise de longa duração
aberta nos anos no início da década de 1970, conhece mesmo, na década dos 1990, uma importante
retomada.
Posto o novo quadro, é possível dizer que o processo da re-divisão internacional do trabalho que o
desenvolvimento desigual em curso na economia mundial do século XX forjava, perdeu, pois, o ímpeto e a
orientação e geográfica que o marcara? Outrossim, que as categorias que permitiam a compreensão deste
processo
deixaram
de
ter
sentido?
Para Teixeira (2000), se o contexto anterior poderia ser interpretado a partir da noção de rivalidade
imperialista esposada por Lenin (1977), ou quiçá da categoria gramsciana de hegemonia (1987), hoje
qualquer dos dois aportes teria perdido sua força explicativa. Os Estados Unidos se nos apresentaria, pois,
como o único império, “capaz de adotar as estratégias que bem entender”, dada a “centralidade dólar no
sistema monetário internacional e a autoridade do Federal Reserve sobre os investimentos de capital”,
fatores que permitiriam à economia americana escapar das “restrições de balanço de pagamentos... importar
livremente
e,...
reestruturar
seu
parque
industrial...”
(TEIXEIRA:
2000:9).
Não obstante a efetiva reação norte-americana caberia indagar: esta leitura não esta se prendendo
exageradamente nos fatores sistêmicos que marcam o capitalismo atual? Não seria este viés impeditivo de
uma análise que, ao lado das formas gerais assumidas pelo modo de produção dominante, atentasse para as
formações sociais que o compõe? Não decorre do mesmo viés a incapacidade de perceber, mutatis mutandis,
o
que
há
de
válido
nas
categorias
marxistas
acima
assinaladas?
O artigo que aqui se segue irá, pois, articular estas duas escalas de análise para tentar entender a posição
japonesa no cenário econômico mundial atual, a saber, a do modo de produção em seus aspectos
dominantes e a da formação social japonesa. Ele está dividido, além da introdução e das conclusões, em três
seções. Na primeira seção, irá tratar da construção da formação social capitalista nipônica, das características
específicas que lhe marcaram em razão da via de transição ao capitalismo que ali se processou, bem como
das relações internacionais que esta via forjou, de enormes repercussões geopolíticas na Ásia da primeira
metade do século XX. Na segunda seção, o foco será as transformações que, no pós II Grande Guerra
Mundial, lhe permitiram crescente capacidade de emulação. Na terceira seção, o artigo se volta para as
características da reação norte-americana, notadamente pautada pela tentativa de imposição de uma
macroeconomia calcada na valorização cambial e na liberalização financeira, bem como para os efeitos
econômicos e geográficos que ela causou no tipo de rivalidade imperialista que caracterizava a emulação
japonesa.
AO364 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Regionalização e
Globalização
[1224] BRASI LI A OU W ASH I N GTON ? D ESAFI OS POLÍ TI COS E OS RUM OS D A I N TEGRAÇÃO SUL
AMERICANA.
RONALDO DA SILVA1; VÂNIA RUBIA FARIAS VLACH2.
1.UNI VERSI DADE FEDERAL DE UBERLÂNDI A UFU, UBERLÂNDI A, MG, BRASI L; 2.UNI VERSI DADE FEDERAL DE
UBERLÂNDIA - UFU, UBERLÂNDIA, MG, BRASIL.
Resumo:
A área de Livre Comércio das Américas - ALCA, lançada pelos Estados Unidos da América – EUA para unir em
uma única Zona Comercial, países entre o Alasca e a Terra do Fogo, fracassou, ou está congelada por tempo
indeterminado.
As políticas neoliberais resultaram em aumento do endividamento, maior concentração de renda, alienação
do patrimônio nacional, ataque a direitos sociais, dolarização de algumas economias e abertura
indiscriminada de mercados com pesados déficits nas balanças comercial e de pagamentos. Isso levou a
Argentina à bancarrota e o Brasil ao FMI. O resultado foi a eleição de vários governos identificados com a
esquerda e uma postura crítica aos EUA na Venezuela (Hugo Chaves), no Brasil (Lula), na Argentina
(Kirchener),
na
Bolívia
(Evo
Morales)
e
no
Equador
(Rafael
Correia).
Estes governos se opuseram ao México, Canadá e Chile, que desejavam, com os EUA, a formação da zona de
integração das Américas. O Brasil jogou papel especial nesse processo: Buenos Aires, Brasília e Caracas, por
exemplo, consideram fundamental consolidar e ampliar o MERCOSUL - Mercado Comum do Cone Sul, rumo a
uma
integração
mais
ampla
da
América
do
Sul
como
um
todo.
Os EUA também contribuíram para o fracasso das negociações. O governo americano não procurou defender
no Congresso o fim ou redução de barreiras tarifárias, não-tarifárias para as commodities agrícolas dos
países Sul-Americanos. Os subsídios do governo americano ao seus agricultores também provocam enorme
distorção
comercial
na
relação
com
o
Brasil.
Após o fracasso da ALCA e o avanço das negociações para a ampliação do Mercosul, os EUA buscam fechar
acordos bilaterais de comércio, conhecidos como TLC- tratados de livre comércio (México, Chile e Peru). A
Colômbia está próxima de obter o mesmo, enquanto Paraguai e Uruguai têm sido insistentemente abordados
com igual fim. É claro que os acordos bilaterais podem solapar o Mercosul, e impedir a consolidação da
integração
Sul
Americana.
Os tratados de livre comércio entre países Sul-Americanos e os EUA põem Brasília em uma rota de
divergência com Washington. Pode o Brasil continuar a se desenvolver e convencer seus vizinhos das reais
vantagens econômicas e políticas da integração Sul-Americana, além da retórica da solidariedade?
Objetivos: O objetivo do trabalho é problematizar os caminhos da integração Sul Americana e os conflitos,
reais e potenciais, em geral, cifrados e camuflados pela linguagem diplomática, entre a política externa de
Brasília
e
Washington.
Referencial Teórico e Conceitual: O tema da Integração geoeconômica e política da América do Sul é
relativamente recente. A produção na Geografia Brasileira é escassa. Esse estudo tem recorrido à literatura
da economia, sociologia do desenvolvimento e ciência política. Relações Internacionais comparadas, fluxo de
comércio, Produto Interno Bruto (PIB), infra-estrutura e macro-indicadores econômicos são fundamentais
para a análise e a construção de cenários geopolíticos. As ações políticas contemporâneas dos governos de
países Sul Americanos, em especial do Brasil, além dos EUA, bem como declarações oficiais, acordos,
tratados e declarações sobre a integração física, energética e comercial têm sido usados como recursos.
Metodologia: A diplomacia elabora uma linguagem cifrada, muito polida com vocação para esconder os
conflitos de fundo entre os Estados. É necessário analisar os acordos entre os países e confrontá-los com
dados objetivos e ações concretas. As declarações de chancelaria e dos chefes de Estados precisam ser
escrutinadas. A comparação da força econômica dos países e a capacidade das lideranças de proporem e
liderarem
projetos
como
a
integração
deve
ser
sondada.
Principais
questões
ou
problemas:
a) Quais as ações empreendidas por Washington que dificultam ou impedem a criação e consolidação de uma
zona
de
integração
econômica
Sul-Americana?
b) Como a política externa Brasileira (2002-2007) têm se articulado e quais as principais iniciativas e
propostas
rumo
à
integração
Sul-Americana?
c) Como Brasília reage às medidas de Washington que ameaçam a integração Sul-Americana no futuro
próximo
e,
no
plano
imediato,
a
constituição
do
Mercosul?
d) Como os demais países Sul-Americanos agem diante das ofertas e projetos de Brasília e Washington?
Resultados
Alcançados
e
Conclusões
A pesquisa ainda não foi concluída. Diplomatas, empresários, políticos, representantes da indústria e do
comércio precisam ser entrevistados no Brasil e nos EUA. Centros de pesquisa, dados econômicos, acordos e
tratados
precisam
ser
analisados.
Projeções
e
especulações
devem
ser
alinhavadas.
Há várias tendências, forças e ações em movimento entre Brasília e Washington, bem como, em especial,
Buenos Aires, Caracas, La Paz e Bogotá. Washington e Brasília têm emitido sinais de realização de forte
parceria em torno do álcool no futuro próximo para criar um mercado mundial de energia e combustível
alternativo. Ao mesmo tempo, Washington busca fechar acordos com o Paraguai e Uruguai em desfavor do
Brasil e da Argentina. Em contrapartida, o Presidente Lula lhes acena com mais vantagens para
contrabalancear a proposta estadunidense. Caracas tem atacado as projeções de parceria entre Brasil/EUA
em torno do álcool e auxiliado Bogotá em sua luta para a retomada do controle de refinarias da Petrobrás.
Bogotá
está
ansiosa
por
um
especial
acordo
de
comércio
com
Washington.
Dentre as iniciativas que favorecem e acenam para a integração Sul-Americana, destaca-se o Banco do Sul,
uma espécie de agência de financiamento multilateral para financiar grandes obras de integração e
desenvolvimento. Por outro lado, o FMI perdeu importância na região nos últimos anos e enfrenta uma crise
de credibilidade dado o fracasso de suas recomendações, especialmente na Argentina. A Organização dos
Estados Americanos – OEA, sempre liderada pelos EUA, perdeu voz e força na América do Sul.
Todas essas novidades dos anos 2000 - rejeição da ALCA, integração física, e energética, novas prioridades e
agências de investimento na América do Sul - apontam uma reunião de esforços que fazem avançar a
integração continental. No entanto, essas condições não são suficientes para uma área de livre comércio
solidária, cujo paradigma é a União Européia. Essas tendências contraditórias colocam Brasília e Washington
em posições divergentes, mesmo que a retórica diplomática seja sempre cortês e procure negá-la. Ao Brasil
é vital buscar desenvolvimento e estabilidade econômica e política na América do Sul sob a sua liderança.
Washington se interessa por manter sua hegemonia econômica e sua influência política intactas na América
do Sul. O fracasso do ajuste neoliberal nos anos 1990 levou à derrota nas urnas e à deposição de governos
mais entusiasmados com tal influência. Os governos Chaves e Kirchener expressam reservas a Washington
com certa estridência. Este cenário é desafiador para a pesquisa que estamos empreendendo
AO365 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Regionalização e Globalização
[1695] ZONA D A FRON TEI RA I N TERN ACI ON AL BRASI L- BOLÍ VI A E SUAS I M PLI CAÇÕES
PROCESSO DE INTEGRAÇÃO REGIONAL.
MARIA APARECIDA NUNES.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE - UFS, ARACAJU, SE, BRASIL.
Resumo:
NO
Na contemporaneidade, os espaços fronteiriços, passa a exigir maior atenção, em virtude das mudanças de
paradigmas dos Estados nacionais. Os limites que na antiguidade configuravam-se, em elementos físicos e
culturais, atualmente, no processo global da economia mundial, as redes, tecnológicas, econômicas ou
sociais é que, determinam onde e quando terminam os territórios. Assim, no Estado moderno, os variados
atores,
através
dos
fluxos,
é
que
dinamizam
os
espaços.
A fronteira Brasil - Bolívia é um espaço que apresenta situações particulares, propiciado pela influência dos
respectivos países, com sua prática social, cultural e econômica, totalmente regulada, conforme a intenção
de cada território nacional, o que se constitui em dinâmica própria nas áreas de fronteira. Essa dinamicidade
dicotomiza com seus limites físicos diante da presença da porosidade ali estabelecida.
Assim, este trabalho busca analisar através de dados socioeconômicos levantados de parte dos municípios da
zona de fronteira internacional Brasil - Bolívia, o papel dos agentes sociais ou institucionais nessa área, bem
como, relacionar a atuação dos diferentes atores no mesmo espaço, a zona de fronteira, com temporalidades
diferenciadas. A partir dos dados identificar os elementos que reduz e dificulta a possibilidade de integração
entre os países estudados, bem como, identificar os elementos que condicionam e solidificam a integração
territórios.
Para fins de análise dos municípios da faixa de fronteira, do Brasil e Bolívia, apresentados na área de
trabalho foi metodologicamente, determinada uma área que envolve 150 quilômetros, a partir da linha
demarcatória nos respectivos territórios nacionais, compreendendo em um polígono de 300 quilômetros.
Ressalta-se, que, juridicamente, o tamanho da faixa de fronteira é variável dentro do território sulamericano.
Os municípios envolvidos na pesquisa são: Cáceres, Porto Esperidião, Pontes e Lacerda e Vila Bela da
Santíssima Trindade, na parte brasileira e, San Matias, San Ignácio de Velasco, San Rafael e San Miguel no
Departamento de Santa Cruz na Bolívia. Assim, o estudo foi desenvolvido a partir de informações
bibliográficas diversas, referentes ao tema proposto, dando ênfase às obras e dados oficiais dos países
pesquisados, IBGE no Brasil e INE na Bolívia e em publicações diversas, além do apoio de observações de
campo, na coleta de dados primários e na confirmação dos dados secundários. Ressalta-se, que, o
embasamento
teórico
acompanhou
todas
as
etapas
do
trabalho.
Na atualidade os limites são determinados pelos fluxos realizados entre as instancias supranacionais que,
definem e alteram as relações no campo econômico, político, social e cultural. Machado (1998), coloca que, o
conceito de limite, como está asseverado na atualidade, foi reforçado pelo moderno conceito de Estado.
Assim, os questionamentos são postos para estabelecer e caracterizar quais os tipos de intercâmbio são
mediados pelos limites internacionais. Nesse sentido, o cientista político Friedrich Kratochwil (1986),
propõem uma abordagem sistêmica da questão, partindo da premissa que os Estados modernos constituem
um sistema, assim, como a outros sistemas, o de organização social, caracterizando-se por pertencer a uma
ordem
de
tipo
territorial.
No espaço de fronteira, a zona de fronteira se compõe de atores, que, ao mesmo tempo são, produtos e
processos das interações econômicas, culturais e políticas, tanto, espontâneas como promovidas. Machado
(1988 p. 46), coloca que, \"[...] é o espaço-teste de políticas públicas de integração e cooperação, espaçoexemplo das diferenças de expectativas e transações do local e do internacional, e espaço-limite do desejo de
homogeneizar a geografia dos Estados nacionais\". Nesse sentido, [...] a área de fronteira apresenta algumas
condições associada à ambientes complexos. (MACHADO, 1988 p. 46). A complexidade do espaço fronteiriço
é particularmente, aferido as identidades presentes nesse espaço, como Moura (1997, p. 99), em sua análise
a respeito de fronteiras, envolve outras variáveis como parâmetros de análise, assim, a autora enfoca que as
territorialidades são propostas a partir da transitoriedade dos territórios e, concomitante a esses
movimentos, as indicações do local, são atribuídas pela identidade, que, ressalta os limites territoriais.
A extensa fronteira seca, cerca 750 quilômetros, que mais une que separa o Brasil da Bolívia, pela falta de
uma barreira física é, também, sustentada pela dinâmica socioeconômica local. A fronteira de Mato Grosso,
no Brasil, com o departamento de Santa Cruz, na porção oriental boliviana, apesar de ser cortada por poucas
estradas, oficialmente, reconhecidas, é permeada por inúmeros caminhos, que interligam fazendas e
pequenas comunidades e, mantêm entre si, uma substancial conexão de sociabilidade. É por esses caminhos,
onde são realizadas diversas atividades, como a realização das festas e do estabelecimento de uma base
econômica local. O estabelecimento das relações de sociabilidade entre os caminhos, denominados de
“cabriteiras” presentes nessa área, atendem, também, a proliferação de um poder paralelo as instituições de
segurança. A prática do contrabando, tanto de drogas oriundo da Bolívia, quanto, em sentido contrário a
passagem de produtos roubados brasileiros, são comumentemente realizados por esses caminhos.
Essa situação justifica o aparato de segurança nesse espaço dispondo de dados de inteligência, que se
conforma em unidade de trabalho fronteiriço, entre as unidades policiais envolvidas no acordo, nessa
perspectiva o marco institucional deixa de existir e passa a conformar-se em uma região de atuação.
Esses aspectos e, outras situações presentes e, inerentes da faixa de fronteira mato-grossense e boliviana,
atribui a esse espaço a composição de territorialidades diferenciadas, considerado nesse contexto, as
relações heterogêneas que são estabelecidas nos respectivos territórios nacionais.
AO366 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Regionalização e Globalização
[1344] TERRI TÓRI O E COM ÉRCI O N A FRON TEI RA: AS RELAÇÕES EN TRE M ATO GROSSO D O SUL E
MERCOSUL.
LISANDRA PEREIRA LAMOSO1; ELIANA LAMBERTI2.
1.UNIVERSI DADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS, DOURADOS, MS, BRASI L; 2.UNI VERSI DADE ESTADUAL
DE MATO GROSSO DO SUL, DOURADOS, MS, BRASIL.
Resumo:
Mato Grosso do Sul está dividido político-administrativamente em 78 municípios, com 44 deles na faixa de
fronteira internacional. Desses, três são áreas urbanas que fazem contato fronteiriço contíguo, como
conurbações internacionais. Neste contexto, o presente trabalho tem o objetivo de compreender a dinâmica
das relações comerciais entre Mato Grosso do Sul e os países vizinhos; analisar os fatores que determinam a
baixa integração comercial na faixa de fronteira e os determinantes das principais empresas exportadoras do
estado.
A atividade comercial é tema pouco recorrente na literatura geográfica recente. As contribuições partem,
predominantemente, do campo da Economia, através de uma análise geométrica do espaço, como um
sistema de distâncias e localizações. Para compreender a baixa integração comercial entre Mato Grosso do
Sul e os países fronteiriços é necessário analisar as multidimensões do espaço geográfico como constituição
histórica e como resultado de relações entre atores sociais, “a maneira pelas quais as estratégias dos agentes
marcam o espaço em termos de produção e distribuição de riquezas, dando assim origem à formas e
especificidades que caracterizam os territórios” (PECQUEUR e ZIMMERMANN, 2005, p. 78).
As condições históricas definiram a divisão territorial do trabalho e a inserção do Centro-Oeste no capitalismo
industrial, principalmente a partir dos anos setenta, com o avanço da cultura da soja para o abastecimento
do mercado consumidor do Sudeste e para atender às necessidades da geração de divisas com as
exportações. Tal análise, quando adotada para a compreensão das economias de aglomeração no interior de
uma
mesma
nação
é
passível
de
comprovação
empírica.
No caso do comércio exterior, além do tamanho do mercado e dos custos de transporte, razões históricas
determinaram as relações de comércio, entre eles os efeitos da política macroeconômica, notadamente os
incentivos às exportações e a variação cambial. A integração entre os territórios, na economia globalizada, é
cada vez mais dependente da modernização das infra-estruturas e essa modernização reflete, também, a
capacidade dos atores regionais mobilizarem recursos e competências disponíveis nos territórios (MONIÉ,
2001). Condições satisfatórias de infra-estrutura provocam fluidez e o aumento da produtividade da cadeia
logística e segundo Monié (2001), estão em estreita dependência das relações entre o segmento transporte e
os
serviços
de
apoio
ao
comércio
e
à
produção,
que
agregam
valor
ao
fluxo.
Para a realização dessa pesquisa adotou-se o método deductivo, partindo da teoria para a observação da
realidade. De acordo com Popper (apud MENDEZ, p. 20) “las teorias son redes que lanzamos para expresar
aquello que llamamos el mundo: para racionalizarlo, explicarlo y domilarlo. Y tratamos de que la malla sea
cada vez más fina”. Além da pesquisa de dados com base nos relatórios disponibilizados pelos órgãos oficiais,
como Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Os referenciais teóricos são
complementados pelas informações recolhidas sobre os principais produtos que fazem parte da pauta de
exportação e importação tanto especificamente do Mato Grosso do Sul como dos demais integrantes do
Mercosul; a análise da participação do comércio intra-regional na perspectiva do comércio mundial e o
detalhamento
das
características
das
principais
empresas
exportadoras.
A baixa integração comercial de Mato Grosso do Sul com os países fronteiriços a partir da consideração do
espaço não como um fator físico, restrito à proximidade geográfica e sim como um elemento constituído
historicamente, destacam-se as simetrias para explicar o baixo intercâmbio. Bolívia, Paraguai e Mato Grosso
do Sul tem uma matriz produtiva semelhante, como exportadores de produtos primários e importadores de
manufaturados,
o
que
dificulta
a
integração
de
suas
balanças
comerciais.
A condição de “estar na fronteira” representa pouco para as relações comerciais internacionais do estado, na
medida em que esta “localização” é reduzida à proximidade física, reduzida à noção de distância entre o Mato
Grosso do Sul e os países fronteiriços. Os principais parceiros comerciais do estado são países europeus e
asiáticos. As importações, que pelo volume poderiam representar uma aproximação com a vizinha Bolívia,
estão pautadas exclusivamente na importação do gás natural. Portanto, o comércio exterior do Estado de
Mato Grosso do Sul é predominantemente voltado para os países europeus e asiáticos, mesmo com sua
condição geográfica de localização afastada dos principais portos do Oceano Atlântico e próximo a países
latino-americanos
com
Bolívia,
Paraguai,
Argentina
e
Uruguai.
Em 2005, Mato Grosso do Sul exportou cerca de 1% do total das exportações brasileiras com predomínio dos
produtos básicos. Quanto às importações, a proporção inverte-se em favor dos produtos industrializados.
Nesse intercâmbio, predomina a exportação de soja e carne bovina e a importação de gás natural. A soja é
tradicional produto voltado à exportação, para complementação protéica do rebanho europeu e a carne
bovina é bem aceita tanto nos mercados asiático quanto europeu em função do predomínio das pastagens
naturais na nutrição animal (“boi verde”) e as condições naturais no estado favorecem as vantagens
comparativas
para
essa
produção.
Tanto a soja quanto a carne bovina também são produzidos nos países vizinhos, o que gera pouca margem
de comercialização no mercado platino, onde Uruguai e Argentina inclusive são tradicionais exportadores
desses produtos. As principais empresas exportadoras do Mato Grosso do Sul – os frigoríficos e as empresas
que comercializam grãos – têm suas unidades organizadas para atender a um mercado maior que o mercado
local ou regional e priorizam os ganhos de escala possíveis nos mercados mais tradicionais, como América do
Norte, União Européia e mais recentemente os países asiáticos. Até mesmo a produção de aves e suínos, que
tem crescido no Estado desde a década de oitenta, está organizada em função dos mercados europeus e
asiáticos, não havendo relações de comércio dessa produção com os países fronteiriços do Mercosul.
A matriz produtiva do estado não está construída para integrar-se com as cidades estrangeiras vizinhas ou
mesmo com a demanda importadora dos países do Mercosul, pois o território constituiu-se enquanto rede,
em função da demanda européia e asiática pela sua escala de consumo. As simetrias produtivas tendem a
incompatibilizar as trocas entre Mato Grosso do Sul e países fronteiriços, ambos elaborados e determinados
pela ação dos grandes grupos da cadeia produtiva de grãos e carnes.
AO367 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Regionalização e Globalização
[1474] EN TRE O VI RTUAL E O REAL: O QUE EFETI VAM EN TE SE CON CRETI ZOU EM 1 0 AN OS D E
APROXIMAÇÃO BRASIL / FRANÇA COM INCIDÊNCIA PARA A FRONTEIRA (1996- 2006)?
GUTEMBERG DE VILHENA SILVA.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL.
Resumo:
Objetivo do trabalho
Verificar como ficou a dimensão pensada e a efetivamente concretizada de cooperação transfronteiriça nos
10 anos (1996-2006) em que se projetaram políticas territoriais para a fronteira franco-brasileira.
Referencial
teórico
A questão debatida sobre fronteiras políticas na atualidade tem ganhado força. Reconhece-se, conforme
Rückert (2005, p. 02), a necessidade de se analisar diferenciações territoriais emergentes, novos significados
que adquirem os usos políticos do território, e as novas formas e conteúdos territoriais que configuram-se
plenos
de
rupturas
de
paradigmas.
Para as fronteiras, Valenciano (1996, p. 187) coloca que somente num passado recente alguns Estadosnacionais “seletivamente” formaram cooperações transfronteiriças. A metamorfose da fronteira, de
discriminante à permeável e articulante, entre economias vizinhas, permite constituir-se sua redefinição de
sentido/função em processos de integração, apontado também por Courlet (1996) e que vai ao encontro do
que
foi
colocado
anteriormente
a
partir
de
Ruckert.
Brasil e França por quase todo o século XX mantiveram uma fronteira-opaca, discriminante, em que políticas
territoriais para aquele lócus não foram criadas. Alguns trabalhos recentes têm mostrado um quadro analítico
de metamorfoses para aquela fronteira. Num desses, Silva & Ruckert (2006) buscaram entender como está
se organizando o Brasil, através do estado do Amapá, no que diz respeito a algumas formas espaciais de
ligação com o Caribe e Europa, via rodovia transguianense, a qual engloba todos os territórios pertencentes
ao platô das Guianas, e que tem na Rodovia Federal brasileira BR 156 e na construção de uma ponte
binacional Brasil / França, ligando o Estado do Amapá à Guiana Francesa, alguns pontos conectores.
Mais recentemente, este autores (2007), fizeram um ensaio em que tratam da organização de um mundo em
redes geográficas formadoras de territórios em redes, as quais fornecem elementos bastante interessantes
para temas de pesquisas, tais como essa relação transfronteiriça Brasil / França, utilizando escalas
geográficas como método de procedimento. Importa destacar que projetos como esses transfronteiriços são
essencialmente questões políticas em suas concepções, pois dependem não somente da decisão interna, mas
também
de
uma
vontade
concordante
do
(s)
país(es)
vizinho(s).
O que se verifica, no avanço ou não da cooperação transfronteiriça,é que está relacionada em diversos casos,
como o aqui tratado, com competência de diversas jurisdições; às assimetrias entre as unidades
participantes; à incompatibilidade de procedimentos sobre um mesmo assunto; e a dificuldade de diálogo
entre instâncias envolvidas.
Principais questões
Em 1996 é promulgado, Acordo-Quadro reconhecendo a especificidade da fronteira comum entre o Brasil e a
França. O acordo, como instrumento jurídico, tornou-se o mecanismo que forneceu uma moldura institucional
ampla, estreitando os vínculos entre aquelas nações e mercados regionais. Nos 10 anos aqui contemplados,
vários foram os eixos pensados para a cooperação transfronteiriça, os quais são elencados a seguir
sumariamente: .Educação principalmente na capacitação de professores; Agricultura: objetivando a
erradicação, ou pelo menos, o controle e/ou monitoramento da mosca da carambola (Bactrocera
carambolae); Segurança: buscando o fortalecimento de intercâmbios entre os dois serviços aduaneiros, bem
como criar condições especiais que permitam o tráfego Macapá-Cayenne. Meio Ambiente; A proposta em
geral é de proteção; projetos de cartografia temática de ecossistemas tropicais; desenvolvimento de
intercâmbios técnicos para tratamento de água e lixo nas maiores áreas urbanas; Saúde: girando em torno
de medicina de emergência, telemedicina e nas ações em torno de doenças tropicais comuns na fronteira
(Dengue e Malária); Energética: com projeto de construção de uma Pequena Central Hidrelétrica (PCH) no rio
Oiapoque, assim como intercâmbios de técnicos na área de energia renovável, solar e Biomassa; Turismo: A
ligação aérea permanente com a Guiana Francesa incluindo o Amapá nas rotas de turistas provenientes da
Europa que visitem a Guiana Francesa; Transportes, cuja cooperação caminha mais rapidamente, já que
envolve multiplos interesse diretamante. A pavimentação total da BR 156, ligando Macapá (Capital) ao
Oiapoque (extremo Norte), é um fator de integração do Brasil com os países do Platô das Guianas( França /
Guiana Francesa, Suriname, República da Guiana e Venezuela) após a construção de ponte binacional entre
Amapá e Guiana Francesa.
Metodologia
Fez-se uma pesquisa bibliográfica sobre exemplos de enlaces internacionais relacionados a Estados lindeiros;
buscou-se em órgãos oficiais, principalmente na Agência de Desenvolvimento do Amapá, sessão de Relações
internacionais, e no Ministério das Relações Exteriores, todos os documentos relacionados à cooperação
transfronteiriça Brasil e França; e, por fim, foram visitadas as cidades-gêmeas de Saint Georges / Guiana
Francesa e Oiapoque / Amapá para se verificar in loco um pouco da dimensão de cooperação. A partir da
relação dos elementos acima mencionados, foi montada a análise do que se pensou desde o início da
cooperação (1996) até o ano de 2006 quando se completou uma década de proposta de integração
transfronteiriça.
Conclusão
Muitas das propostas de cooperação entre Brasil e França nas diversas áreas mencionadas para a fronteira
não saíram do papel. A complexidade das relações ali construídas, envolvendo diversas esferas nacionais e
internacionais; a falta de diálogo entre jurisdições envolvidas, pelo menos do lado brasileiro;
incompatibilidade de procedimentos sobre um mesmo assunto; uma forte burocracia política, e também a
falta ou o descaso de interesses de algumas autoridades, caracterizou, e ainda tem se caracterizado, como
uns dos principais entraves para efetuar um enlace mais eficaz das ações transfronteiriças.
AO368 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Regionalização e Globalização
[1192] GEOECONOMIA E INSTITUIÇÕES: O CASO DA PETROBRAS E DA PDVSA.
MARGARIDA MARIA CARNEIRO LEÃO MATTOS.
UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
GEOECONOMIA
E
INSTITUIÇÕES:
O
CASO
DA
PETROBRAS
E
DA
PDVSA
Pelo que determinaram em matéria de grandes transformações e pelos conflitos e problemas a que estiveram
relacionados, sem dúvida o século XX e o petróleo são indissociáveis. Foi na última centúria que progresso
técnico nas formas de utilização do petróleo alcançou todos os aspectos da vida dos povos, passando a
desempenhar papel determinante na economia e nas relações entre países, provocando guerras e
consolidando alianças. Assim, a prospecção, produção, refino e distribuição do petróleo passaram a ser
atividades importantes para os países e, em conseqüência, a sua regulamentação uma questão estratégica.
Na América do Sul, ainda no século XIX, empresas inglesas e norte-americanas exploravam as jazidas
mediante concessões e a nacionalização das reservas coincidiu com o desenvolvimento da economia do
petróleo, a partir da constatação da sua importância para o desenvolvimento dos países. A criação de
empresas estatais para gerir o recurso em todas as suas etapas de produção, foi a forma encontrada pelos
Estados para manter sob seu comando a atividade petrolífera. Na verdade, a condição estratégica do petróleo
o fez situar-se no núcleo das transformações que, ao longo do século XX, determinaram a reestruturação
produtiva, a abertura dos mercados, a mudança da função do Estado e de sua capacidade regulatória.
O objetivo do trabalho é analisar, sob o ponto de vista institucional, a relação entre o Estado e a empresa
estatal petrolífera mediante o cotejo das trajetórias da Petróleo Brasileiro S. A. – PETROBRAS e da Petróleos
de Venezuela S. A. – PDVSA, bem como comentar as dinâmicas territoriais decorrentes daquela relação.
Levantam-se ainda, algumas considerações sobre as conseqüências da atuação daquelas empresas para a
integração
energética
do
continente
sul-americano.
O contexto teórico no qual se pretende desenvolver a análise remete à geoeconomia, aqui entendida como a
análise das relações entre espaço e poder, o qual se manifesta por meio de estratégias de ordem econômica
conduzidas pelos Estados, para proteger e promover sua economia nacional (LOROT, 1999). Essa abordagem
se afigura adequada para dar conta das dinâmicas territoriais conformadas a partir, principalmente, da II
Guerra Mundial e das mudanças das relações entre países e nos seus modos de produção. Data dessa época
a abertura dos mercados, o intenso progresso tecnológico e das comunicações com a conseqüente
deslocalização da produção e a constituição de empresas transnacionais, com capacidade de alavancagem e
circulação de capitais. Até então, somente os Estados-Nação detinham o poder de decidir sobre a economia
de seus países, mas a influência crescente das empresas mundiais as credenciou para alinharem-se entre os
principais atores do contexto mundial. Nesse ponto, a perspectiva das fronteiras e limites do Estado como
espaços de sua produção sofre uma transformação importante modificando o conceito de mercado nacional
(EGLER, 2001), e fazendo com que os interesses das nações penetrem os territórios de outros países onde
quer que suas empresas desenvolvam atividades. Nesse cenário, a empresa petrolífera, multinacional e/ou
estatal, ganha uma condição ao mesmo tempo estratégica e complexa para o seu Estado de origem. A rigor,
os territórios de atuação da empresa fora do seu país são mercados domésticos (EGLER, op. cit.) e,
consequentemente,
dividem
o
interesse
e
o
poder
entre
as
nações
envolvidas.
Neste ponto, fica clara a necessidade de se aportar à análise as referências da escola neo-institucionalista,
para melhor compreender a importância e o papel das instituições no desempenho das economias, e do
Estado como detentor da capacidade de regulação (NORTH, 1991). Normas e regulamentos configuram
instituições que, ao longo do tempo e em diferentes espaços determinam o desempenho mais ou menos
eficiente da economia. Assim, organizações são criadas para aproveitar oportunidades surgidas a partir de
instituições, formais e informais, desenvolvidas no seio da sociedade. Sob essas referências teóricas analisase o desenvolvimento da Petrobras e da PDVSA, os pontos comuns e divergentes nas suas trajetórias e as
condições
atuais
de
atuação
conjunta.
A Petrobras nasceu em 1953, embora as preocupações com a regulamentação da atividade petrolífera já
estivessem presentes desde 1939, com a promulgação da chamada “lei do petróleo” e a criação do Conselho
Nacional do Petróleo. A consciência da importância da disponibilidade de petróleo para sustentar a indústria
nascente, juntava-se à percepção da limitação das reservas onshore de petróleo e gás, acessíveis à
tecnologia dominada pela empresa (ALVEAL, 1999). Tais limitações ficaram ainda mais evidentes por ocasião
do choque do petróleo no início dos anos 1970, reforçando, no âmbito do Estado, a preocupação de dotar a
empresa de investimentos e normas adequadas para o maior desenvolvimento dos recursos humanos e das
pesquisas de prospecção offshore. Quando em 1988, a nova Constituição foi promulgada, foram abertos os
caminhos para a mudança no marco regulatório que conduziu à quebra do monopólio da exploração em
1997. Detendo a maior parte do capital da empresa o Estado ainda tem influência nas decisões mais críticas,
embora a gerência e a estratégia aproximem-se mais das de uma empresa privada.
A par das referências mais antigas e mesmo algumas lendas, a exploração do petróleo na Venezuela já se
fazia desde 1914 e em quantidade tal que, em 1930, cerca de 100 empresas estrangeiras se registraram
para exploração dos abundantes recursos petrolíferos. A exploração sob concessão prosseguiu, tendo a
intervenção do Estado limitada quase que exclusivamente à taxação de 50% dos lucros das empresas
exploradoras. A Venezuela foi uma das signatárias originais da criação da Organização dos Países Produtores
de Petróleo – OPEP, em 1960, mas, somente em 1976, constituiu a PDVSA. Consolidada na década de 1980,
a empresa participa de empreendimentos de refino na Europa, nos Estados Unidos e no Caribe. Mercê da
extrema dependência do país ao petróleo, a PDVSA tem sua regulação e estratégias muito ligadas às
necessidades do país. Assim é que, particularmente a partir de 2002, a empresa vem sendo cada vez mais
vinculada às ações e estratégias políticas e de desenvolvimento do governo, uma simbiose sintetizada no fato
de
o
presidente
da
empresa
ser
também
o
Ministro
das
Minas
e
Energia.
Nos últimos anos e mais recentemente com a entrada da Venezuela no Mercosul, abrem-se possibilidades de
trabalhos conjuntos entre as duas empresas, no território venezuelano e também no Brasil. As questões de
regulação envolvidas em tais projetos refletem exatamente a relação que cada uma das empresas mantém
com seu Estado e, por vezes, a inconformidade entre os objetivos dos governos e as necessárias estratégias
de
longo
prazo
das
empresas.
Referências
ALVEAL, C. Estatais Petrolíferas Latinoamericanas no Século XX: um complexo heterogêneo de trajetórias de
um
capitalismo
de
intervenção
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1990,
15°
ed.,
2002,
152
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AO369 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Regionalização e Globalização
[1403] ENERGIA E CONFLITOS TERRITORIAIS NA AMÉRICA DO SUL: UMA VISÃO GEOECONÔMICA.
CLAUDIO ANTONIO EGLER.
UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Apresentação
A Declaração de Margarita, firmada pelos chefes de estado sul-americanos em abril de 2007, embora aponte
para a busca da integração energética continental, não esconde os conflitos de interesses econômicos e
diversidade de orientações políticas sobre os rumos que tomará esse processo nos próximos anos. Esse
trabalho procura mostrar que os conflitos e ajustes em torno dos recursos energéticos revelam um novo
estágio das relações sul-americanas e que devem ser analisados considerando os seus aspectos
geoeconômicos, já que novos agentes sociais estão presentes, cuja atuação é pautada principalmente por
vínculos econômicos estabelecidos pelas novas redes continentais construídas no final do século XX.
Contextualização
O processo de integração energética na América do Sul pode ser, grosso modo, dividido em três períodos
distintos: o primeiro deles se estende desde os primórdios do século XX até a Segunda Grande Guerra, e se
manifesta através de acordos isolados, com efeitos geográficos pontuais, como aquele firmado entre a
Argentina e o Paraguai (1926), visando o aproveitamento energético e a garantia de navegação da Bacia do
Alto Paraná, com especial atenção à ilha de Apipé, cujo potencial hidroelétrico era reconhecido. Inclui-se
também nesta fase o Acordo de Roboré (1938) entre Brasil e Bolívia, no qual o governo brasileiro se
comprometia a construir a ferrovia Corumbá - Santa Cruz de la Sierra, em troca de concessões nos campos
petrolíferos na faixa sub-andina boliviana e de pagamentos em petróleo cru. Embora os resultados efetivos
destes acordos tenha sido praticamente nulo, do ponto de vista da integração energética, os conflitos por
recursos foram marcantes, como foi o caso da Guerra do Chaco (1932 a 1935), ente a Bolívia e o Paraguai
para disputar uma área que seria rica em petróleo. A Guerra do Chaco provocou quase 100 mil mortos entre
bolivianos e paraguaios, e fez o país perder 200 000 quilômetros quadrados para o Paraguai. Na Bolívia, é
conhecida
como
\"Guerra
do
Petróleo\".
O segundo período estende-se desde o imediato pós Segunda Guerra Mundial até o final da década de 1970 e
é marcado pelos chamados \"trinta anos gloriosos\" da economia mundial e pelo processo de industrialização
nacional substitutiva de importações nas duas principais economias da América do Sul: Brasil e Argentina.
Neste período, a crescente demanda de energia resultante da industrialização pesada e da acelerada
urbanização coloca na ordem do dia a busca de fontes de energia para além dos limites nacionais.
Neste contexto, em 1958 a Argentina e o Paraguai iniciam os entendimentos para o aproveitamento
energético das quedas de Yacyretá e Apipé, no trecho do Rio Paraná entre os dois países, da mesma maneira
que em 1966, o Brasil e o Paraguai iniciam as conversações para o aproveitamento dos recursos hidráulicos
compartilhados, firmando a Ata de Iguaçu, uma declaração conjunta que manifestava a disposição para
estudar o aproveitamento dos recursos hidráulicos \"desde e inclusive o Salto de Sete Quedas até a foz do
Rio
Iguaçu\".
A disputa entre Brasil e Argentina em torno da utilização do potencial hidráulico da Bacia do Prata (Yahn
Filho, A. G., 2006) vai conferir ao Paraguai papel decisivo no abastecimento de energia elétrica para o Cone
Sul e perdura até o final da década de 1970, quando foi assinado o Acordo Tripartite entre Brasil, Paraguai e
Argentina (1979), para aproveitamento dos recursos hidráulicos no trecho do Rio Paraná desde as Sete
Quedas até a foz do Rio da Prata, seguido do Acordo para Uso Pacífico da Energia Nuclear Brasil-Argentina
em 1980, que conferiu ao Rio Paraná papel decisivo na integração energética regional, através da construção
de grandes barragens binacionais, como a de Itaipu e de Yacyretá e, como resultado dos ajustes alcançados
no setor nuclear, conferiu o status de zona militarmente desnuclearizada à América e ao Atlântico ao sul do
Equador.
De 1980 até os dias atuais, período marcado pela crise e reestruturação da economia mundial e pela
emergência dos países asiáticos como China, Coréia do Sul e Índia no cenário global, a integração energética
sul-americana apresentou movimentos contraditórios. Do ponto de vista da América do Sul, este período
pode ser divido em duas fases distintas: a primeira, que se estende até os primórdios do século XXI é
caracterizada pelo ajuste passivo à globalização, com a liberalização dos mercados nacionais, a
desregulamentação estatal e a privatização das empresas estatais. Nesta fase, apesar dos problemas
resultantes do ajuste passivo, a dinâmica das grandes empresas do setor energético, privatizadas ou não,
acompanharam as iniciativas de integração regional e estendem suas redes para alem das fronteiras
nacionais, em especial as duas principais economias do Cone Sul, Brasil e Argentina, que passam a buscar
novas fontes de energia – principalmente gás natural, incorporando a Bolívia como uma peça chave no
contexto energético regional. Nesse contexto, pode-se compreender da formação do Mercado Comum do Sul
(Mercosul) através do Tratado de Assunção, descrito por Moniz Bandeira (2003: 484) como um \"esforço de
construção
do
espaço
econômico
comum
da
Bacia
do
Prata\".
A segunda fase, que de certa maneira representa uma conseqüência dos resultados desastrosos das décadas
de liberalização, corresponde a emergência de governos nacionais de cunho popular, que buscam enfrentar o
passivo social através das receitas obtidas pela produção e comercialização de recursos energéticos. É o caso
da Venezuela, da Bolívia, e, mais recentemente, do Equador. O Paraguai, embora governado por
conservadores, também poderia ser incluído entre os países que buscam aumentar suas receitas através da
renegociação
dos
valores
obtidos
pela
comercialização
de
energia.
Neste contexto, observa-se um movimento contraditório, pois de um lado a integração energética sulamericana é decisiva – inclusive para manter e ampliar as receitas de economias como a Bolívia e o Paraguai,
de outro a ausência de um marco regulatório continental está criando zonas de tensão que se propagam pelo
interior dos próprios territórios nacionais, como é o caso paradigmático da Bolívia, onde os conflitos
territoriais estão se agudizando entre os departamentos do Altiplano e os das zonas baixas do Chaco e da
Amazônia.
Referencial
teórico
Geopolítica e geoeconomia não são campos excludentes. Se de um lado, a geopolítica se fundamenta no
controle estratégico dos lugares, a geoeconomia atua preferencialmente sobre a logística das redes. É essa
articulação que define as relações espaciais de poder entre domínios e fronteiras, que redesenham
constantemente
os
contornos
do
mapa
do
mundo
atual.
Neste cenário, a principal noção que serviu de base à geografia econômica, isto é, o mercado nacional, tem
hoje reduzido poder de explicação sobre o comportamento dinâmico da produção e distribuição de bens, em
grande parte devido às condições de integração multilocacional das cadeias produtivas.
Da mesma maneira, a noção de limites, como uma linha divisória entre os territórios e mercados nacionais,
devido a fluidez dos circuitos internacionais de bens e capitais, perdeu boa parte de seu poder explicativo, na
medida em que os instrumentos clássicos de atuação do Estado-nação perdem seu poder de estabelecer
fronteiras, em função do poder que dispõem as firmas transnacionais para delimitar, através de mecanismos
econômicos,
suas
respectivas
áreas
de
influência.
A busca por recursos energéticos revela um novo estágio dos conflitos globais (Klare, M. T., 2002) e a
configuração atual das estruturas produtivas ampliaram o papel da logística como instrumento de
manutenção do domínio sobre os mercados domésticos e de abertura de novas fronteiras através da
extensão de novas redes, cujo controle é compartilhado com empresas, cujas sedes – na maioria das vezes,
estão situadas fora dos territórios nacionais. Neste contexto, a integração sul-americana está marcada por
conflitos que se originam, tanto no passado remoto, como também na aplicação do receituário do “consenso
de
Washington”
para
enfrentar
os
desafios
da
globalização
(Silveira,
M.
L.,
2005)
Desde meados da década de 1990, é possível observar um crescimento da abordagem institucionalista nos
trabalhos de Geografia Econômica (Scott, 1995; Storper,1997; Jessop, 1995; Peck, 2000; Cumbers, A,
Mackinnon, D e Mcmaster, R, 2003) que analisam a mudança do papel do Estado como agente econômico
para o fortalecimento das funções de regulação, que em uma perspectiva dinâmica que não priorizam uma
escala específica, mas ao contrário, consideram as regiões produzidas e reproduzidas pela ação de
organizações e instituições. A aplicação desta concepção ao setor energético sul-americano já resultaram em
diversos trabalhos, dos quais se destacam Egler, C. A. G. (1995 e 2006) e Egler, C. A. G. e Pires do Rio, G. A.
(2003), onde procurou-se mostrar a relevância dos marcos regulatórios, em um contexto institucional e
geoeconômico.
Considerações
finais
O trabalho aponta para a importância da aplicação da geoeconomia, apoiando-se firmemente em sua leitura
do papel das instituições e organizações na configuração do espaço econômico, para desvendar a origem dos
conflitos e ajustes que se manifestam no processo de integração energética sul-americano, discutindo suas
possibilidades futuras, que cada vez mais dependem do estabelecimento de um marco regulatório
continental, capaz de ajustar a operação das empresas energéticas nacionais, como a PDVSA ou a Petrobrás,
aos
objetivos
maiores
de
desenvolvimento
regional.
Referências
bibliográficas
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AO215 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia da Saúde
[1265] GRI PE EM CURI TI BA/ PR: A I N FLUÊN CI A D E ALGUN S FATORES SÓCI OAM BI EN TAI S N A
INCIDÊNCIA DE 2004 E 2005.
LEANDRO RAFAEL PINTO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
A cada dia os estudos das relações entre ambiente e sociedade possibilitam novas descobertas. Atualmente
sabe-se que para estudar todo o complexo que envolve uma doença que afeta a um grupo social, faz-se
necessário um aprofundamento em toda a cadeia que envolve esta relação, ou seja, no âmbito dos fatores
ambientais, biológicos, sociais, econômicos, dentre outros, da enfermidade envolvida. A gripe tem sempre
sido de destaque na história da humanidade, principalmente nos últimos anos pela possível ameaça de uma
pandemia mundial após os casos de gripe aviária ocorridos na Ásia e Europa. Em Curitiba, tem-se por
premissa que as condições climáticas típicas de subtropicalidade favorecem no aparecimento contínuo de
novos casos de gripe na população, esquecendo assim dos outros fatores que podem vir a influenciar na
doença como os ligados as questões das relações sociais. O presente estudo, desenvolvido no campo da
Geografia da Saúde, traz algumas contribuições no entendimento da influência das variáveis geográficas na
distribuição temporal (sazonal) e na distribuição espacial dos casos de gripe em Curitiba nos anos de 2004 e
2005. Com este período de apenas dois anos não é possível chegar a nenhum padrão da incidência apenas
uma análise típica, porém mesmo assim objetiva-se: mostrar quais os períodos de maior ou menor incidência
da doença nos anos analisados, de que forma as variáveis metereológicas influenciam nesta sazonalidade e
como a distribuição das variáveis sociais nos bairros de Curitiba interfere na própria distribuição da doença.
Na abordagem utilizada no presente trabalho optou-se por desenvolver a concepção de multicausalidade
(abordagem sistêmica), em que preconiza que a doença não é conseqüência exclusiva da ação de um único
agente, mas que fatores interagem para que ela se manifeste. Qualquer ruptura do sistema composto pelo
agente (o vírus influenza), o homem (e suas relações sócio-econômicas) e o ambiente (neste caso optou-se
pelo clima) ou sua desestabilização, geraria um estado de doença. Para tanto, optou-se por desenvolver este
estudo num referencial teórico da Geografia da Saúde que tem como base os estudos referentes à influência
dos fatores geográficos nas doenças atuais (novas ou reincidentes), ou na administração dos recursos de
saúde, ou seja, a Geografia da Saúde ocupa uma posição nodal, é um espaço onde convergem ou se cruzam
fenômenos naturais e sociais. Para este estudo, os dados dos casos de gripe foram coletados junto ao
Boletim Eletrônico de Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba por semana epidemiológica. Os
dados sociais utilizados foram fornecidos pelo IPPUC. Os dados metereológicos (temperatura do ar, umidade
relativa e precipitação) foram coletados pela estação de Curitiba do INMET. Os dados supramencionados
foram tratados estatisticamente e depois organizados em um banco de dados único e seqüencialmente foram
espacializados bairro a bairro para uma melhor visualização da distribuição espacial, além da confecção de
gráficos e tabelas para a visualização da distribuição têmporo-sazonal. Depois de feita as devida correlações
e análises os principais resultados encontrados foram: A) Os dois anos apresentaram-se de maneiras
diferentes na distribuição mensal dos casos de gripe, juntos totalizaram mais de 688000 casos na cidade,
sendo que para o ano de 2004 a manifestação maior foi nos meses de abril, maio e junho, ou seja, meses
com características de outono, tendo um declínio nos meses de inverno, um leve aumento nos meses de
setembro, outubro e novembro (típicos de primavera) e um forte declínio no final do ano em dezembro e
mantendo-se nos meses de janeiro e fevereiro do ano seguinte, ou seja, meses com características de verão,
para o ano de 2005 observa-se também uma manifestação maior nos meses de outono, com destaque para
os meses de maio e junho, e o inverno, ao contrário de 2004, manteve os índices altos sendo que o mês de
agosto foi o mais expressivo do ano totalizando mais de 44000 casos, no restante dos meses os índices
diminuíram. B) A ocorrência de forma cíclica dos casos pode estar relacionada com a grande variação dos
tipos de tempo encontrados em Curitiba para os dois anos, pois as variações de temperatura aliadas a
precipitação influenciam na ocorrência dos casos e ambas as variáveis não se apresentaram iguais em sua
distribuição para os anos de 2004 e 2005. C) Em geral, a síndrome gripal mostrou uma distribuição nãouniforme pelo território curitibano, concentrando-se com maior destaque no bairro do CIC (aproximadamente
54000 por ano), e com concentrações significativas na porção do semi-anel ao sul da área central curitibana.
Os bairros periféricos ao centro de Curitiba, excluso o mesmo, apresentaram os menores números de casos
para os anos analisados. D) Pode-se também demonstrar a relação direta existente entre as variáveis sociais
e o número absoluto de casos da doença por bairro. Nos bairros mais populosos, de maior quantidade de
habitantes por domicílio, aliado ao fato da baixa renda e condição de pobreza crítica, houve um
favorecimento para o elevado número total de casos. A região central de Curitiba, caracterizada por ser uma
região onde se tem as melhores condições de vida e renda, apresentou os menores números absolutos de
casos, exceto o bairro do Centro, que por suas características de alta circulação populacional diária, grande
número de estabelecimentos comerciais, financeiros e administrativos (que remete a noção de
“confinamento”) fazem com que o número total de casos seja mais elevado. Entender as mais diversas
relações existentes entre doença – ambiente – sociedade é de suma importância para todos e a Geografia da
Saúde vêm por trazer sua contribuição, ampliando seus conhecimentos, suas áreas de trabalho e seu caráter
transdisciplinar para se tornar uma ciência de cunho prático e útil.
AO216 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia da Saúde
[1469] “N OVAS TERRI TORI ALI D AD ES”, “N OVOS LUGARES” E A SAÚD E AM BI EN TAL EM PORTO
ALEGRE.
ROSA MARIS ROSADO1; MARLA FERNANDA KUHN2.
1.CGVS- PMPA, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL; 2.CVGS, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL.
Resumo:
Na década de 80 no Brasil foram promovidas iniciativas para se instituir, no âmbito do setor saúde ações de
Vigilância do Meio Ambiente, de acordo com a constituição de 1988 e a Lei orgânica de Saúde de 1990. Mas é
a partir do ano 2000 que o Ministério da Saúde formula a denominada Vigilância Ambiental, hoje Vigilância
em Saúde Ambiental que no caso da cidade de Porto Alegre é gerenciada pela Secretaria Municipal de Saúde
de
Porto
Alegre
na
Coordenadoria
Geral
de
Vigilância
em
Saúde
CGVS.
A Vigilância em Saúde Ambiental pode ser entendida como um conjunto de ações que proporcionam o
conhecimento e a detecção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes do meio
ambiente que interferem na saúde humana, com a finalidade de recomendar e adotar medidas de prevenção
e controle dos fatores de riscos e das doenças ou agravos relacionados à variáveis ambientais. Propor e
recomendar políticas públicas de Saúde sem um conhecimento da cidade é desastroso, por isso acreditamos
ser o olhar geográfico para a forma urbana uma significativa contribuição para o conhecimento dessa
dinâmica
.
Nos parece importante delimitar dentro do campo da Saúde Ambiental que a questão local, seus territórios
dinâmicos configuram-se na escala a ser pensada nas reflexões relacionadas a este campo. Para alguns
autores, a questão local não é de permanência num mundo que muda, uma das dificuldades está nas
formulações de pesquisadores que preferem se ater na estabilidade, ao passo que as realidades de que eles
falam
são
apreendidas
muito
melhor
a
partir
da
mudança.
Em Porto Alegre, o reconhecimento do papel do território para a gestão da saúde ambiental, é um passo
básico para a caracterização da população e seus problemas de saúde.Além disso, permite o
desenvolvimento de um maior vínculo entre os serviços de saúde e a população. É necessário compreender a
racionalidade do espaço, entendida historicamente e fruto das redes, expressa por meio do conteúdo
geográfico do cotidiano, conceito que ajuda a desvendar a (re) produção da forma urbana.
Partimos do entendimento, sugerido por Milton Santos, de perceber que a característica mais importante do
lugar é de sua própria existência, a escala é a do cotidiano e seus parâmetros são a co-presença, a
vizinhança, a intimidade, a emoção, a cooperação, e a socialização com base na contigüidade, reunindo na
mesma lógica interna todos os seus elementos: pessoas, empresas, instituições, formas sociais e jurídicas e
geográficas.
Identificamos nos lugares, contextos de usos dos territórios diferenciados compreendidos como vulneráveis
para a saúde humana. Na maioria das vezes o planejamento da política pública de saúde, no caso de
Vigilância em Saúde Ambiental, não teoriza sobre as bases de um urbanismo que tem dificuldade de pensar
como apresentam alguns autores o “fluxo como modo de morar”, sua apresentação da “cidade território” e
da “cidade natureza” não apreende a extensão territorial das cidades como um mal.
Nas considerações teóricas à cerca da descentralização populacional nas cidades, cada vez mais extensiva
das novas áreas industriais, verificamos um espaço urbano fragmentado e disperso, em que se podem
distinguir os diferentes usos com diferentes conteúdos sociais, desde zonas de pobreza absoluta aos mais
excludentes
conjuntos
residenciais
.
Podemos identificar Porto Alegre como uma cidade difusa, contendo um número elevado de condomínios indo
para áreas de periferia, produzindo novas centralidades. Esse fenômeno produz um efeito no campo da
Saúde Coletiva e Vigilância em Saúde Ambiental constituindo-se objeto constante de busca de conhecimento.
Mas, quais os efeitos a Saúde humana decorrente do impacto ambiental dessas novas centralidades?
Devemos inicialmente considerar que o modelo de desenvolvimento no Brasil, com característica
desordenada e sem planejamento, favoreceu a ocorrência de níveis crescentes degradação ambiental. A
contaminação do solo por substâncias químicas representa riscos à saúde pública e a mobilidade ou
transporte dessas substâncias pode influenciar na qualidade da água, do ar e do solo, portanto, interferindo
na
saúde
ambiental.
O conhecimento desses novos lugares e novas territorialidades nas cidades é fundamental para a detecção de
qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes do meio ambiente que interferem na saúde
humana, podendo com isso atingir sua finalidade de recomendar e adotar medidas de prevenção e controle
dos
fatores
de
riscos
e
das
doenças
ou
agravos
relacionados
à
variável
ambiental.
Podemos pensar a Gestão em Saúde Ambiental na cidade levando em conta dois planos de territorialidade, o
primeiro opera sobre as normas e regramento do uso de recursos disponíveis,e o segundo, diz respeito à
ciência e técnica das políticas territoriais, processos interativos e políticas em rede, atuando sobre as
interações.
Podemos verificar que a construção de um sistema de vigilância em saúde ambiental requer que o contexto
seja devidamente valorizado. A dimensão territorial passa a ser uma estratégia interessante para a saúde
ambiental, parte de um sistema complexo, portanto vai necessita do estabelecimento de um diálogo entre
saberes, envolvendo as diferentes areas do conheceimento e os saberes populares sobre a cidade.
A exclusão urbanística, representada pela gigantesca ocupação do solo urbano, é ignorada na representação
da “cidade oficial”. Ela não cabe nas categorias do planejamento modernista/funcionalista, pois mostra
semelhança com as formas urbanas pré-modernas. A importação dos padrões do primeiro mundo, aplicados
a uma parte da cidade, contribuiu para que fosse marcada pela modernização incompleta ou excludente.
Assim, buscamos a compreensão de que a intervenção em Saúde Ambiental exige uma articulação
intersetorial, pois o arcabouço institucional responsável pelas políticas públicas e privadas está organizado
por setores mais ou menos especializados, que têm objetivos distintos, mas complementares entre si.
Consideramos que efetivamente um trabalho local pode conduzir a uma gestão territorial integrada ao
ambiente se as ações forem ao encontro das necessidades da população. Os processos históricos podem não
ser percebidos nos lugares, e é justamente por isso que, ao se trabalhar com as relações espaciais devemos
articular local/global. É muito importante analisar o lugar para além de sua concepção locacional, com
enfoques
interligados
com
o
mundo
vivido
dos
indivíduos
e
das
comunidades.
Os fatores que contribuíram para a crise nas cidades são múltiplos e complexos, mas os principais são a falta
de gerenciamento ambiental coordenado e a falta de redes comunitárias e intersetoriais, que se aplicam até
mesmo aos países desenvolvidos com habitação adequada e serviços a ela relacionados.
A Gestão da Saúde Ambiental necessita urgente da introdução de um olhar geográfico para os fenômenos de
saúde/doença na cidade de Porto Alegre, pois é na cidade, dinâmica, dispersa, periurbana, industrial, que
tudo acontece!
AO217 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia da Saúde
[1511] INTERAÇÕES ESPACIAIS E CENTRALIDADES NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO COM BASE EM
DADOS DA SAÚDE.
RENATO GUEDES VIEITES; MARTA FOEPPEL RIBEIRO.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O mapeamento da infra-estrutura médico-hospitalar é de fundamental importância na área de saúde pública,
podendo contribuir para o desenvolvimento de ações de prevenção e controle de epidemias e para uma
alocação mais racional dos fixos hospitalares, bem como fornecer subsídios à tomada de decisão quanto à
alocação de recursos/investimentos nos equipamentos e serviços. Neste sentido, nos últimos dez anos vem
sendo observado um aumento expressivo dos estudos na área da Geografia Médica, que buscam realizar
descrição e análise da distribuição regional das doenças, utilizando amplamente recursos cartográficos e
sistemas
de
informação
geográfica
(SIGs).
A relevância da abordagem geográfica dos temas relacionados à saúde possui como objetivo tornar mais
precisa a análise dos fatores que norteiam e condicionam a definição das políticas públicas na área de saúde.
O objetivo do estudo buscou, por meio do geoprocessamento, observar as prováveis interações espaciais
entre os municípios do Estado do Rio de Janeiro, considerando-se as seguintes variáveis relacionadas à saúde
pública: número de hospitais credenciados, leitos contratados em hospitais credenciados, unidades
ambulatoriais e internações em hospitais credenciados. Com base nos valores dessas variáveis e nos
resultados das interações espaciais, procurou-se definir as áreas de influência dos municípios fluminenses e,
a
partir
disso,
reconhecer
as
suas
centralidades.
Este estudo justificou-se, em parte, pela carência ainda existente de estudos sobre os dados referentes à
infra-estrutura hospitalar observada no Estado do Rio de Janeiro e procurou demonstrar, por meio de
procedimentos de análises espaciais utilizando o Geoprocessamento, as desigualdades na infra-estrutura em
relação
à
saúde
no
espaço
fluminense.
A incorporação de Geotecnologias em análises espaciais relacionadas à Saúde ressalta que os Sistemas de
Informação Geográfica constituem-se em um poderoso instrumento para o planejamento, monitoramento e
avaliação
das
ações
em
determinada
área.
Os
procedimentos
metodológicos
adotados
neste
estudo
foram:
a) levantamentos bibliográficos sobre: as relações entre Geografia e Saúde; aplicações do Geoprocessamento
em análises espaciais da infra-estrutura em saúde pública; Teoria das Localidades Centrais;
b) visitas a bibliotecas setoriais da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e do Instituto de Medicina Social da
UERJ;
c) atividades realizadas por meio do parque tecnológico do Laboratório de Geoprocessamento (LAGEPRO),
tais como: levantamento e tabulação dos dados referentes as variáveis supracitadas; pesquisas na internet;
utilização de arquivos executáveis aplicados às análises espaciais - PI.exe (calcula o Potencial de Interação) e
PV.exe
(calcula
o
Polígono
de
Voronoi).
Após a definição dos potenciais de interação (PIs), com base nas distâncias e nos valores dos parâmetros
relacionados à infra-estrutura médico hospitalar dos municípios, foram: destacados aqueles com os maiores e
com os menores valores de potencial de interação com base nos dados no Anuário Estatístico 2004, da
Fundação CIDE, DATASUS e da SES/RJ; delimitados os polígonos de voronoi (áreas de influência) dos
municípios a partir dos PIs; elaborados mapeamentos temáticos que evidenciam espacialmente a forte
influência/relação de dependência exercida pela metrópole fluminense sobre os demais municípios da estado,
como
também
as
centralidades
sub-regionais.
O PI.exe refere-se ao cálculo da distância relativa e da “massa” dos pontos marcados no mapa no formato
digital raster (matricial). Já o PV.exe permite representar, no espaço geográfico, possíveis tendências
relacionadas
à
sua
organização,
a
partir
da
ocorrência
de
centros
de
influência.
A Teoria das Localidades Centrais aplicada à Saúde no Estado do Rio de Janeiro realiza um apanhado
histórico acerca da criação desta teoria que foi desenvolvida em 1933 por Walter Christaller. Esta teoria foi
repensada por vários autores (incluindo Roberto Lobato Corrêa) à luz da Geografia Crítica que representou
um importante alicerce para um planejamento mais racional da distribuição das infra-estruturas médicohospitalares.
Finalmente, este estudo ressalta em seus resultados a importância de se reiterar a necessidade da
espacialização dos dados referentes à infra-estrutura da saúde no Estado do Rio de Janeiro e à necessidade
de uma aproximação maior entre a Geografia e as temáticas relativas à saúde, para que assim ocorra um
planejamento eficiente, com uma distribuição de recursos mais equilibrada.
AO218 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia da Saúde
[1545] LEI SH M AN I OSE VI SCERAL EM ÁREAS D E LAZER N A REPRESA D A UH E D E M I RAN D A, EM
UBERLÂNDIA (MG).
MÁRCIA BEATRIZ CARDOSO DE PAULA; SAMUEL CARMO LIMA.
UFU, UBERLÂNDIA, MG, BRASIL.
Resumo:
Os objetivos deste trabalho foram investigar a fauna flebotomínica existente em localidades situadas às
margens da Represa da UHE de Miranda, localizada no Rio Araguari, em Uberlândia, uma das maiores
atrações turísticas do município, em áreas onde espécimes de L. longipalpis já foram capturadas, em
investigações entomológicas preliminares para avaliar o potencial de risco de transmissão de leishmaniose
visceral no município. Atualmente existem áreas loteadas no entorno do lago de Miranda, que abrigam
instalações voltadas para o turismo e o lazer. Nos últimos dois anos, a Represa de Miranda recebeu cerca de
três mil visitantes, com o objetivo de lazer e estudos. Nesta área existem ambientes propícios a presença de
vetores
transmissores
de
leishmanioses.
A leishmaniose visceral (LV), devido a sua alta incidência e alta letalidade, principalmente em indivíduos não
tratados e crianças desnutridas, tornou-se uma das doenças mais importantes da atualidade. É também
conhecida como Calazar, Esplenomegalia Tropical, Febre Dundun. No Brasil, a transmissão de Leishmania
chagasi, principal agente etiológico da LV, se dá pela picada de fêmeas de insetos dípteros pertencentes à
família Psychodidae, tendo como principal vetor o Lutzomyia longipalpis (BRASIL 2006)..
A transmissão da doença vem sendo descrita em vários municípios, de todas as regiões do Brasil, exceto na
região Sul. Desde a década de 70, devido às transformações ambientais, a urbanização crescente e ao êxodo
rural a LV, que inicialmente era descrita como característica de ambientes rurais, vem passando por um
processo
de
urbanização
e
provocando
o
aparecimento
de
novos
focos
da
doença.
As estratégias de controle da LV até então utilizadas, estavam dirigidas verticalmente para o controle do
reservatório canino - inquérito sorológico canino e eutanásia em cães sororeagentes - bem como para a
aplicação de inseticidas, diagnóstico e tratamento adequado de casos registrados. Entretanto, estas medidas,
muitas vezes realizadas de forma isolada, não apresentaram efetividade para a redução da incidência da
doença, determinando a necessidade de reavaliação das ações propostas pelo Programa de Controle da
Leishmaniose
Visceral
(PCLV).
Metodologia
Para a realização das capturas dos flebotomíneos foram utilizadas armadilhas luminosas do tipo CDC. As
capturas foram realizadas no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2006, em localidades situadas ao
redor da Represa de Miranda, durante 2-3 dias consecutivos. As armadilhas foram expostas no peridomicílio
de residências que apresentassem condições propícias ao desenvolvimento de flebotomíneos como: abrigo de
animais domésticos, principalmente aves e suínos, presença de pomar, matéria orgânica em decomposição,
mata e sombra. Foram colocadas 1-2 armadilhas por domicílio, expostas às 18:00 horas e recolhidas até as
9:00
horas
do
dia
seguinte.
A montagem dos flebotomíneos foi realizada pelo método de Berlese e a identificação dos exemplares foi
feita
de
acordo
com
a
classificação
proposta
por
Young
&
Duncan
(1994).
Para o diagnóstico da leishmaniose visceral canina (LVC) foi realizado um inquérito canino censitário, onde
foram analisadas amostras de sangue de todos os cães residentes em áreas onde foram capturados
espécimes de L. longipalpis. Após a colheita do material descrito, o mesmo foi embalado em saco plástico e
armazenado a 4°C até o momento em que foi submetido à Reação de Imunofluorescência Indireta.
A técnica utilizada para o diagnóstico da LVC foi a Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI). Os testes de
RIFI foram realizados de acordo com protocolo fornecido pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos
Bio-Manguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Rio de Janeiro-RJ, Brasil, entidade fornecedora do
antígeno utilizado nas reações para a detecção de anticorpos anti-Leishmania em soro de cães. Foram
considerados reagentes todos os soros que apresentaram reatividade a partir da diluição 1:40.
Resultados
No período de janeiro de 2005 a dezembro de 2006 foram realizadas 337 capturas na área estudada, 75
capturas realizadas em 2005 e 262 capturas realizadas em 2006. Este acréscimo no número de capturas
ocorrido em 2006 foi devido a que uma equipe de agentes de controle de zoonoses foi exclusivamente
montada para realizar capturas nas localidades onde foram capturados os L. longipalpis. A partir de 2006 as
capturas passaram a ser sistemáticas, sendo realizadas mensalmente. No período estudado foram capturados
444 flebotomíneos, 85 (19,1%) em 2006 (tabela 1) e 359 (80,9%) em 2006. Dos capturados, 50 espécimes
foram de L. longipalpis (11,3%), sendo que dois espécimes foram capturados em 2005 (4%) e 48 espécimes
(96%)
foram
capturados
em
2006.
Foram testadas 302 amostras de sangue de cães residentes na área estudada sendo 150 (49,7%) em 2005
(tabela 3) e 152 (50,3%) em 2006 (tabela 4). Do total de amostras testadas 300 (99,3%) foram não
reagentes, duas amostras (0,7%) foram indeterminadas e nenhuma amostra apresentou resultado reagente.
Conclusões
O Brasil enfrenta atualmente a expansão e urbanização da LV em casos humanos. O ciclo de transmissão que
anteriormente ocorria no ambiente silvestre e rural, hoje também se desenvolve em centros urbanos. Belo
Horizonte, capital do estado de Minas Gerais, ilustra claramente o processo de urbanização da LV nas cidades
brasileiras. Por outro lado, pelo fato da urbanização ser um fenômeno relativamente novo, pouco se conhece
sobre
a
epidemiologia
da
LV
nos
focos
urbanos.
Em Uberlândia, existem alguns ambientes característicos e propícios à ocorrência da LV na zona rural. Neste
estudo verificou-se que, alem da presença de outros flebotomíneos, existe uma densidade crescente do vetor
incriminado como transmissor da LV na área estudada, que é um dado de bastante relevância
epidemiológica.
Na maior parte dos estudos sobre epidemias urbanas foi possível observar que a LV canina precedeu o
aparecimento da doença humana. Neste estudo, verificou-se, por meio de exames sorológicos, que ainda não
se tem a presença de cães doentes na região e, portanto, não está havendo, ainda a transmissão ativa da
doença. Levando-se em consideração que um importante aspecto de doenças ligadas a vetores é a existência
de uma população de hospedeiros efetivamente responsáveis pela manutenção e dispersão da doença, os
resultados obtidos ressaltam a necessidade da continuação das medidas de controle da LV adotadas para
esta região, que irão permitia a detecção precoce dos animais infectados uma vez que estes constituem na
principal
fonte
de
infecção
para
os
flebotomíneos.
Palavras Chaves: Leishmaniose Visceral, Flebotomíneos, L.longipalpis.
AO219 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia da Saúde
[1627] CARTOGRAFI A E REPRESEN TAÇÕES CON CRETAS D O URBAN O: A PERCEPÇÃO ESPACI AL D OS
AGENTES DE SAÚDE DE OURO PRETO - MG.
ELIVELTON SILVA FONSECA; DEBORA VERIDIANA BRIER.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
A coleta de dados está presente nos trabalhos acadêmicos de cunho quantitativo por meio de equipes
organizadas. No caso da Geografia da saúde, este material pode ser coletado pelos agentes de saúde ou
pelos agentes de endemias onde eles se dividem de acordo com suas unidades de trabalho, como PAC’s e
PSF’s , para atingir a todo município, caso o mesmo tenha cobertura total e o estudo privilegie o universo. O
município de Ouro Preto possui seis PAC’s e cobertura total das famílias pelo SUS, e conta com 55 agentes de
saúde. Segundo o IBGE (2000) possui uma população urbana de 55.953 e 14.302 domicílios particulares
permanentes
na
área
urbana,
com
densidade
demográfica
de
52,6
por
km².
A hipótese do trabalho é que os agentes de saúde teriam dificuldade de apresentar algum material
cartográfico em representação vertical ou em perspectiva da superfície em croquis de cadastro, a serem
elaborados pelos mesmos para corrigir dados cadastrais da base cartográfica . Consideramos os objetivos:
verificar os diversos tipos de percepção que os agentes possuem da sua realidade em representações feitas
para a correção dos dados cadastrais de infra-estrutura de Ouro Preto; além de observar qual foi à ordem
hierárquica
de
elementos
espaciais
estabelecida
na
percepção
dos
agentes.
Trata-se do universo dos domicílios da área urbana do município e a cobertura total nos privilegiou neste
momento. Foram agrupados os agentes da seguinte maneira: definiram-se os grupos pelo tamanho da área
de abrangência dos PAC’s e deu-se uma simples representação cartográfica da área a ser coletada pelo
grupo, fruto de ampliação da escala da base maior que é a área urbana do município. Tendo em mãos esta
representação e a informação para coletar os números cívicos de todas as ruas, os agentes elaboraram sua
representação.
Ao estudarmos a espacialização dos pontos da base de dados em aproximação com a base cartográfica do
município observamos que os domicílios onde os pontos de GPS foram coletados não estavam em
congruência com as suas representações na base. O momento da espacialização da base de dados na base
cartográfica nos mostrou uma precisão insuficiente para a coleta de dados em domicílio (erro médio de 16
metros,
o
que
desloca
os
pontos
de
uma
casa
para
a
do
seu
lado).
Não foi recomendado nenhum tipo de representação quanto à forma, tendo em vista que o intuito da coleta
era saber apenas sobre a localização dos números cívicos das casas de Ouro Preto na ordem em que se
apresentavam nas ruas da cidade, em um cadastro o mais atual possível. Recomendou-se a importância da
ordenação da coleta (partindo da esquerda para a direita), para correção e complementação, que são de
suma importância para facilitar os trabalhos tanto da secretaria de saúde, como de qualquer unidade que
necessite
de
material
cadastral.
Enfocando os estudos de Kevin Lynch (1997), deu-se destaque a percepção da cidade, que nos remete aos
sentidos do ser humano e seu senso de orientação. Perceber o ambiente em que vive torna-se primordial
para a sobrevivência e para o conhecimento da cidade onde habitamos. Neste contexto, a imagem mental
construída pelo indivíduo busca informações e associações com objetos ou outras informações já contidas na
memória. Caso as informações não existam o objeto não é imediatamente identificado e nenhuma relação é
criada, até a associação ser possível pela atribuição de significação. A partir desta percepção iniciou-se o
trabalho, considerando os referenciais objetivos (físicos) de percepção do meio realizado pelos agentes de
saúde
de
Ouro
Preto.
Correia (2003) acrescenta que temos diferentes maneiras de perceber o espaço urbano, de modo que o
contexto em que vivemos, bem como nossa história de vida, influenciam em nossa percepção espacial.
Simultaneamente a organização social estabelece padrões espaciais enquanto a percepção os (des) constrói
de acordo com nossos referenciais. Os agentes de saúde ao representarem as suas unidades de análises
estabeleceram a relação direta entre sua vivência e sua percepção, de modo que mesmo elementos como
propriedades
privadas
tiveram
destaque.
Almeida e Passini consideram que a iniciação ao entendimento e confecção de material cartográfico passa
pelo processo vivido-concebido-percebido, de modo que quanto maior a vivência do indivíduo com o
cotidiano, melhor seria sua representação e entendimento das relações espaciais que ditam todo o
desenvolvimento de estruturas cognitivas espaciais. Assim, ao longo do processo de cognição, a noção de
distâncias, localização relativa e absoluta, referências, seria construída, no aprendizado escolar. Estas
construções são chamadas por HALL (1978), de internalizações, que cada indivíduo é submetido desde a
infância.
Nota-se que o trabalho de alguns agentes demonstrou a dificuldade do tratamento dos dados com escala
adequada, mas basearam-se no formato que percebiam ao longo de seu caminho, e não em copiar o material
que foi dado, havendo algumas confusões com relação às escalas, ao traçado das vias, à continuidade das
mesmas. Em contraponto, alguns trabalhos seguiram à risca a estrutura das vias, não representando as
residências, mas colocando apenas seu número. Outros ainda não demonstraram habilidade ou capacidade
de representar sua percepção, colocando apenas uma representação textual (tabela) dos dados da rua com o
respectivo lado das casas. Cabe ressaltar que para o objetivo do cadastro todas as representações foram
muito
bem
sucedidas.
As construções dos agentes nos mostraram a diversidade de informações que podem ser construídas do
ponto de vista da percepção e a queixa da dificuldade do trabalho levantou a problemática da percepção
espacial urbana, da estruturação sinuosa, fruto de um conjunto de relevo acidentado, da cidade de Ouro
Preto, ambiente nem sempre agradável aos que experimentam seu contexto urbano citadinamente.
Cabe-nos questionar: Porque um mesmo objetivo inicial de correção nos cadastros nos trouxe percepções
diferentes e valores representativos diferentes? A abordagem dos temas acima relacionados foram
desenvolvidas e serão apresentadas no trabalho completo.
AO220 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia da Saúde
[1912] REFLEXOS D AS CON D I ÇÕES SAN I TÁRI AS E AM BI EN TAI S N A SAÚD E D AS CRI AN ÇAS E
PERSPECTIVAS DE AÇÃO: DIAGNÓSTICO DO BAIRRO PETROVALE- BETIM/MG.
PAULA GONÇALVES VILELA; VILMA LÚCIA MACAGNAN CARVALHO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
Objetivo
O objetivo desse trabalho é avaliar a situação da saúde das crianças de até 5 anos de idade que se
encontram em situação de risco em uma área extremamente vulnerável ambientalmente: bairro Petrovale
localizado em Betim/MG principalmente, por sua precária cobertura no que refere ao saneamento ambiental.
A partir desses dados pretende-se fornecer informações e estabelecer prioridades de intervenção para
melhoria da saúde das crianças que habitam essa área e que venham a servir de subsídios para ações
preventivas e reparadoras por parte do poder público e ou demais partes interessadas.
Referencial
Teórico
e
Conceitual
Esse trabalho partiu dos estudos realizados por Heller (1995), em sua tese de Doutorado, que sugeriu uma
série de ações a serem implantadas no município de Betim-MG com o intuito de diminuir os índices de
diarréia infantil em crianças menores de 5 anos. O trabalho de Heller alertou para a fragilidade dos estudos
estatísticos que tendem a uma padronização de resultados. Assim essa pesquisa adotou como um dos
referenciais teóricos a Geografia Humanística, debatida por Amorim (1999), que valoriza a incorporação das
percepções e dos valores do homem nos estudos ligados ao meio ambiente e na explicação dos fenômenos
espaciais.
Leão (2005) destaca a importância de se considerar a realidade espacial e social sobre a ótica do indivíduo
para se estabelecer as relações entre o meio ambiente e o perfil de saúde das crianças. Segundo Najar
(1998) a associação entre medicina e Geografia não é um fato recente. Há mais de um século
epidemiologistas e outros cientistas da área médica exploram o potencial das informações de cunho
geográfico
na
busca
do
entendimento
do
dinamismo
espacial
das
doenças.
Metodologia
Utilizada
A metodologia adotada teve como instrumentos de abordagem a pesquisa quantitativa e qualitativa não se
atendo apenas aos fatos por si só mas, também aos fenômenos procurando mais confiança no uso do relato
da experiência dos participantes e menor preocupação com os valores de abrangência da pesquisa conforme
destacado
por
Martins
&
Bicudo
(1994).
As
técnicas
adotadas
valeram-se
de:
- Teste estatístico. Análise de regressão simples e coeficiente de Karl Pearson entre as variáveis: mortalidade
infantil e oferta de esgotamento sanitário, nos municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte.
- Entrevistas com os responsáveis pelos setores de saúde e meio ambiente do município de Betim para
selecionar
a
área
mais
vulnerável.
- Entrevistas junto a UBS – Unidade Básica de Saúde do bairro Petrovale envolvendo a equipe de saúde e
representantes
da
comunidade.
- Diagnóstico socioambiental do bairro Petrovale junto aos líderes comunitários. Trabalho de campo nas 7
áreas mais críticas selecionadas por eles com o auxílio de imagem de satélite e planta cadastral do bairro em
escala
1
:
2
000.
- Pesquisa documental envolvendo o setor de bioestatística do município, fichas mensais do PACS – Programa
de Agentes Comunitárias de Saúde e as fichas diárias de consulta dos pediatras da UBS do bairro Petrovale.
- Pesquisa qualitativa envolvendo o uso de questionários semi-estruturados e relatos espontâneos em 30
domicílios, com pelo menos 1 criança menor de 5 anos, selecionados de forma aleatória em Vila Esperança.
Pontos
desenvolvidos
O teste estatístico realizado demonstrou não haver correlação expressiva entre as duas variáveis analisadas.
Mas, em virtude desse tema incorporar inúmeros aspectos (sociais, econômicos, políticos) optou-se por
prosseguir
a
pesquisa
incorporando
técnicas
qualitativas.
A princípio foi feito um diagnóstico do bairro Petrovale, o mais crítico do município, onde foram apontadas 7
áreas vulneráveis do ponto de vista socioambiental. As doenças diarréicas e as doenças respiratórias
apareceram como as principais causas de adoecimento das crianças em função da precariedade do
saneamento básico e da presença da REGAP – Refinaria Gabriel Passos, respectivamente.
O 2º passo foi examinar os dados fornecidos pela secretaria municipal de saúde de Betim onde se percebeu
uma grande incompatibilidade entre os números fornecidos e a realidade local. Assim, fez-se necessário
analisar as fichas mensais do PACS dos anos de 2003 e 2004 (288 fichas) e as fichas de consulta da pediatria
da UBS no ano de 2004 (504 fichas). No 1º caso observou-se um expressivo número de casos de diarréia nas
microáreas mais críticas, somados à incidência de IRA em todas as microáreas no período avaliado.
Em relação às consultas pediátricas houve uma grande incidência de doenças infecto-parasitárias em crianças
menores de 4 anos, cerca de 13% do atendimento, além do previsto. Os atendimentos por IRA, cerca de
20%, permaneceram dentro do previsto na literatura médica. Cabe destacar que os documentos analisados
apresentaram fragilidades, ora pela falta de cobertura em algumas áreas do PACS, ora pelo preenchimento
inadequado
por
parte
da
pediatria.
A Vila Esperança, uma área de ocupação irregular, foi apontada como a mais crítica do bairro em todas as
etapas
acima.
Resultados
alcançados
e
conclusões
No bairro Petrovale foi detectado o quanto a precariedade em saneamento básico reflete na saúde das
crianças. Apesar da instalação de uma ETE (embargada judicialmente) e de redes coletoras de esgoto a
comunidade sofre com questões de aspectos estruturais: muitos domicílios não estão ligados na rede;
entupimento da rede em várias ruas; fossas negras perfuradas a menos de 1 metro e que transbordam.
Por isso, é importante a avaliação e adequação do sistema de esgotamento sanitário implantado. É
necessário, também, um trabalho educativo para alertar a população sobre o perigo do contato direto das
crianças
com
o
esgoto
in
natura.
Na pesquisa qualitativa em Vila Esperança os moradores elegeram como principais problemas: presença de
esgoto in natura nas ruas; o cheiro e particulados lançados na atmosfera pela REGAP e o grande número de
ratos. Esses últimos estão diretamente relacionados ao lixo e dejetos humanos que são lançados em valas e
lotes
abandonados.
Em Vila Esperança as crianças são afetadas substancialmente por questões ligadas ao saneamento. Apesar
do grande número de crianças infectadas por parasitoses intestinais e com vários episódios de diarréia os
entrevistados, em sua maioria, consideraram isso “coisa de criança” e só procuram assistência médica
quando o quadro se agrava. O esgoto incomoda pelo fator estético, imaginam que se tivessem redes de
esgoto
teriam
asfalto,
como
aconteceu
na
parte
baixa
do
bairro.
A maioria considerou como causa do adoecimento das crianças a poluição do ar provocada pela REGAP. Não
foi possível, nesse trabalho, relacionar a ocorrência de doenças respiratórias com a presença da refinaria.
Em relação ao saneamento básico é preciso tornar a área “habitável”. De modo geral devem ser promovidas
ações educativas e de resgate da cidadania para que os moradores desenvolvam sua auto-estima de forma
positiva, passando a adotar hábitos de cuidado e higiene com suas famílias e com os espaço em que
habitam. De forma a promover a topo-reabilitação da área.
AO221 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia da Saúde
[2000] AS D OEN ÇAS RESPI RATÓRI AS E A COLETA D E D AD OS EM SAÚD E: ABORD AGEM
QUALITATIVA NA CIDADE DE SANTA GERTRUDES/SP.
NÁDIA HELENA BUENO; SANDRA ELISA PITTON.
UNESP, RIO CLARO, SP, BRASIL.
Resumo:
A poluição vem ganhando atenção cada vez maior da sociedade civil, sendo considerada atualmente como
uma questão de saúde pública, devido ao efeito deletério que pode ocasionar na qualidade de vida da
população. Diante disso, a presente pesquisa teve como objetivo mapear os casos de doenças respiratórias
na cidade de Santa Gertrudes – SP, pela razão desta concentrar um grande número de indústrias cerâmicas
em seu espaço intra e peri-urbano, fonte de material particulado e gases tóxicos que poluem o ar, sendo
estes
os
agentes
de
doenças
respiratórias.
A poluição atmosférica, em particular, se apresenta como uma das mais graves fontes de problemas de
saúde na cidade, sobretudo para o agravamento de tais doenças, pois como afirma Lopes (1998), os efeitos
do ar poluído influenciam principalmente no sistema respiratório, devido à deposição de partículas no interior
do
organismo.
A poluição do ar associada à atividade cerâmica é provocada, segundo Domingos (2004) e Franchini (2004)
por material particulado lançado no ar em todas as etapas da produção dos pisos, desde a extração até o
produto final. Como principal poluente atmosférico, o material particulado age diretamente como indutor de
problemas respiratórios, pois, como afirma Branco (2002, p.33): “o material particulado, isto é, o conjunto
de partículas sólidas e líquidas em suspensão no ar, na forma de poeiras e aerossóis, também pode exercer
efeito
irritante
sobre
as
mucosas
que
revestem
as
vias
respiratórias”.
Particularmente em Santa Gertrudes, Bonacin (2001) atesta a existência do material particulado: “Análises
em água da chuva indicaram que há expressiva atuação de material particulado, provavelmente associado às
emissões
de
chaminés
das
indústrias
[...]”
(p.
183).
Além da evidente poluição atmosférica que assola a cidade, a falta de planejamento urbano para a saúde é
evidenciado desde o reduzido número de centros de saúde bem equipados, à ausência de um hospital local
até a falta de estrutura nos órgãos de saúde em fornecer dados que auxiliem pesquisadores nas mais
diversas áreas do conhecimento, fazendo com que a pesquisa por queixa seja utilizada para suprir essa
ausência
de
material
documentado.
Partindo-se dessa problemática o mapeamento das doenças foi realizado tendo como base os relatos e
queixas da população obtidos com a aplicação de questionários, através do método de amostragem
estratificada proporcional, consideraram-se como estratos os setores censitários da cidade de Santa
Gertrudes, e como os elementos os questionários aplicados. Assim, o número de questionários aplicados é
proporcional ao número de domicílios de cada setor censitário. Pelo questionário foi possível descrever o
perfil sócio-econômico e caracterização da saúde respiratória dos moradores e no âmbito da abordagem
qualitativa, analisou-se os padrões de multicausalidade das doenças, levando-se em consideração os fatores
ambientais e características sócio-econômicas de cada área da cidade que se destacou, como o relevo,
proximidade
às
fontes
poluidoras,
funções
urbanas,
renda,
idade
dos
moradores,
etc.
No caso da presente pesquisa, os questionários foram aplicados proporcionalmente nos 19 setores censitários
de Santa Gertrudes, conforme a divisão censitária determinada pelo IBGE. Segundo dados do Censo 2000 do
IBGE, a cidade contém 4376 domicílios particulares, que repercutiu na aplicação de 235 questionários.
Após a aplicação dos questionários os dados obtidos foram tabulados com o auxílio do software Excel,
através do qual notou-se que o universo pesquisado foi de 949 indivíduos, resultando em uma média de
quatro pessoas por domicílio. Levando-se em consideração que a população de Santa Gertrudes era de
18.687, segundo dados do IBGE (2004), a presente pesquisa atingiu 5% dos moradores.
Depois de terem sido aplicados todos os questionários e feita a tabulação dos dados, analisou-se os
resultados obtidos por questão, traçando assim uma caracterização geral da cidade através da especialização
dos dados, permitindo a comparação entre os 19 setores, ressaltando aqueles que mais se destacam no que
diz
respeito
a
maior
incidência
de
doença
respiratória.
Nestas análises foram caracterizados os setores da cidade como um todo através dos dados pessoais dos
moradores como: idade, sexo, escolaridade, profissão e renda; e também a partir da caracterização da saúde
dos moradores observando a porcentagem de doenças respiratórias, o nome destas e sua freqüência,
salientando a necessidade de passagem por hospitais ou centros de saúde e se há um período do ano
específico que tais doenças, atreladas ao sistema respiratório, se apresentem com maior incidência.
Chegou-se à conclusão que a cidade como um todo apresentou um alto índice de pessoas portadoras de
problemas respiratórios, correspondendo a 36% do universo analisado, verificando-se que houve relação
entre os setores de maior incidência de doentes e certas particularidades físicas do meio atreladas às
condições sociais dos moradores, evidenciando assim que a abordagem qualitativa é fundamental para a
coleta
de
dados
em
saúde.
Os resultados desta pesquisa poderão subsidiar o planejamento de ações na área da saúde que viabilizem
novas propostas para a melhoria do bem estar e saúde da população da cidade de Santa Gertrudes,
ajudando a aprimorar a efetividade e equidade de ações na área da saúde, cuja metodologia pode espelhar
novas
análises
em
outras
localidades.
Palavras-chave:
Ambientais.
Poluição
Atmosférica;
Abordagem
Qualitativa;
Amostragem
Estratificada;
Fatores
AO051 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1161] O QUARTEI RÃO D O SOUL: A BLACK M USI C CRI A UM ESPAÇO D E SOCI ABI LI D AD E E
CIDADANIA EM BELO HORIZONTE.
RITA APARECIDA DA CONCEIÇÃO RIBEIRO.
UFMG, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
Objetivos
A cidade se revela ao observador em suas múltiplas facetas. Sua unidade se fragmenta em milhares de
aspectos que fazem dela um corpo social vivo, com características próprias. Tomando o espaço geográfico
como uma relação social, ele sofre a influência de fatores sócio-históricos específicos. Assim como Carlos
(2005) entendemos que o espaço deve ser percebido em sua totalidade, enquanto “condição, meio e produto
da reprodução da sociedade”. Esse processo tem o homem como principal agente, portanto “pensar o urbano
significa pensar a dimensão do humano”. Tal dimensão revela-se pelas construções simbólicas que são por
ele estabelecidas. Desde a definição aos sentidos e usos do espaço, passando pelas regras e convenções
sociais, todas as relações que se estabelecem na cidade são produtos de relação sociais contraditórias e
mutáveis, que influenciam na constituição da identidade da cidade. Nosso trabalho tem como objetivo
analisar um movimento cultural que acontece na região central de Belo Horizonte - o Quarteirão do Soul. Tal
movimento, ligado a um produto midiático, a black music, congrega nas tardes de sábado homens e
mulheres na faixa dos 40/50 anos, vindos dos mais diversos pontos da cidade e que se reúnem no meio da
rua, em volta de um toca-discos de vinil, vestidos com trajes que remetem às vestimentas de seu ídolo
James Brown, para dançar e conversar. Antes um espaço praticamente sem circulação de pessoas aos
sábados, a presença dos integrantes do Quarteirão do Soul constituiu um ponto de encontro e até atração
turística. Nosso objetivo, portanto é investigar como as formas simbólicas produzidas pela mídia podem
fomentar movimentos culturais, a apropriação e transformação do espaço urbano, a partir do gosto comum
de seus fãs. Em seguida pretendemos entender como, pela influência do ideário da soul music, este pode se
transformar em um movimento que cria identidades de resistência, levando a novas formas de mobilização
social.
Referencial
Teórico
O estudo das cidades tendo como ponto de partida suas manifestações culturais deve considerar não apenas
as manifestações em si, mas o contexto sócio-histórico de sua produção, as regras e convenções sociais, os
modos de disseminação de seus produtos e a forma como são produzidos e recebidos. Milton Santos (2002)
nos lembra que “o enfoque do espaço geográfico, como resultado da conjugação entre sistemas de objetos e
sistemas de ações, permite transitar do passado ao futuro, mediante a consideração do presente”. (SANTOS,
2002, p.100). Autores como ELIAS (1990), GOMES (2001) e THOMPSON (2002), entre outros discutem o
conceito de cultura. Tal conceito, desde seu surgimento atrela-se à idéia de desenvolvimento, confundindose, por vezes, com aquele de civilização. Portanto, ao analisar uma determinada cultura estamos
descrevendo e talvez reescrevendo ações que já são significativas para outros indivíduos, que as produzem,
recebem e interpretam tais ações no seu cotidiano. Como afirma Milton Santos (2002) “se o espaço é como
pretendemos, um resultado da inseparabilidade entres sistemas de objetos e sistemas de ações, devemos
causticar (...) o equívoco epistemológico, herdado da modernidade de pretender trabalhar a partir de
conceitos puros.” (SANTOS, 2002, p.101). A análise de um fenômeno cultural, portanto, pressupõe uma
investigação
que
se
debruce
para
além
do
objeto
pura
e
simplesmente.
Metodologia
Procuramos estabelecer um referencial metodológico que possibilite a compreensão de um fenômeno cultural
que tem suas raízes na chamada Indústria Cultural, produzido, interpretado e reinterpretado por um grupo
de pessoas localizado espaço-temporalmente. As relações de interpretação, de recepção, as disputas de
poder e pelo espaço urbano estão inseridas em nossas indagações. Para a realização de tal processo
investigativo, optamos por trabalhar com uma metodologia de pesquisa denominada por Thompson (2002)
Hermenêutica de Profundidade. O seu referencial metodológico orienta-se pela interpretação, ou
reinterpretação, dos fenômenos significativos levando em consideração as características estruturais das
formas simbólicas, assim como as condições sócio-históricas de ação e interação, visto que estas acontecem
em contextos estruturados espaço-temporalmente. Analisar a cidade tendo como objeto empírico um
fenômeno social como o Quarteirão do Soul em Belo Horizonte leva em consideração o que Santos (2002)
denomina “forma-conteúdo”, para quem essa idéia “une o processo e o resultado, a função e a forma, o
passado e o futuro, o objeto e o sujeito, o natural e o social. Essa idéia também supõe o tratamento analítico
do espaço como um conjunto inseparável de sistemas de objetos e sistemas de ações. “(SANTOS, 2002,
p.103).
Questões
desenvolvidas
Assim dentro da premissa da análise sócio-histórica, num primeiro momento, analisaremos o processo de
mudanças no cotidiano urbano a partir das transformações do meio técnico informacional. Na seqüência
discutimos a influência dos produtos midiáticos na constituição das identidades na cidade e como estas
disputam o espaço urbano. Num segundo momento investigamos a trajetória do movimento soul, desde suas
raízes nos Estados Unidos, sua disseminação como produto da comunicação de massa, e a incorporação do
movimento no Brasil e mais especificamente em Belo Horizonte, até o surgimento do Quarteirão do Soul, em
2004. Na análise formal ou discursiva, abordamos a estrutura de significados subjacentes à forma simbólica,
como no caso do Movimento Soul, o vestuário, as expressões típicas, a ordem da dança, o papel do homem e
da mulher, o mito James Brown, considerando também, além do aspecto simbólico, formal, uma análise
discursiva
que
considera
as
falas
dos
produtores
e
freqüentadores
do
movimento.
Conclusões
O processo de interpretação/reinterpretação possibilita ao pesquisador ir além do aspecto histórico,
geográfico e formal, permitindo que se analisem as formas simbólicas à luz de uma nova perspectiva que
considere os diversos aspectos. Dessa forma buscamos traçar em nosso trabalho possíveis explicações para
um fenômeno cultural que teve suas bases lançadas nos Estados Unidos nos anos 60 do século passado,
transformou-se em produto de consumo de determinado segmento social e hoje toma forma na cidade de
Belo Horizonte pela ocupação de um espaço na cidade, o quarteirão da Rua Goitacazes entre São Paulo e
Padre Belchior. Buscamos entender as relações que se estabelecem entre um peculiar grupo de
freqüentadores e um local no centro da cidade, que teve sua função primária como via de acesso e
estacionamento transformada aos sábados em espaço de encontro e sociabilidade. Visamos compreender
como as ações de apropriação e uso desse espaço aos sábados sem consulta a nenhuma instância de poder
pode ser considerada como uma manifestação de resistência de uma determinada parcela da população,
levando a novas formas de identidade e mobilização social.
AO052 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1254] TRAD I ÇÃO E PATROCÍ N I O N O M UN D O D O SAM BA: “VEM VER D E PERTO UM A CI D AD E A
CANTAR”.
CARLOS EDUARDO SANTOS MAIA.
UFG, GOIÂNIA, GO, BRASIL.
Resumo:
O enfoque das relações políticas no contexto da atual, onde os lugares e as tradições interagem com o
mundo globalizado, realiza-se, neste trabalho, interpretando-se a dinâmica impressa no mundo do samba
pelo caráter espetacular consagrado nos desfiles das Super Escolas de Samba S.A. do Rio de Janeiro, em que
os cobres dos patrocinadores são imputados como condição sine qua non para um bom desfile. Entretanto,
ao lado de uma moderníssima estrutura empresarial que conta com o patrocínio de bicheiros, empresas
multinacionais, prefeituras, governos de estado, ONGs, etc., amiúde ressalta-se a tradição da festa e das
agremiações. Estes pilares que firmam as Escolas no passado e no presente com vistas ao futuro
materializam-se em formas espaciais construídas e “reformadas”, entre as quais destacaremos as quadras, o
sambódromo e a cidade do samba, palcos daquelas relações igualmente impregnadas de práticas
tradicionais. Metodologicamente, no trabalho analisam-se fontes bibliográficas e documentais que versam
sobre
o
assunto,
como
livros,
revistas,
jornais,
sites,
etc.
Para o cumprimento desta empreitada resgata-se, inicialmente, a historicidade das escolas de samba,
ressaltando-se o contexto urbano em que surgiram no final da década de 20, as contradições culturais deste
mesmo período e a seu firmamento nas periferias. A seguir, discutem-se os incentivos aos desfiles pelo
Estado e os primórdios dos patrocínios de contraventores zoológicos. Posteriormente, enfocam-se a inserção
dos carnavalescos e da classe média nos desfiles, a consolidação dos bicheiros como patronos e as
implicações disto na dinâmica espacial do mundo do samba. Finalizando esta primeira parte, apresentam-se
algumas
reflexões
sobre
a
atual
estrutura
empresarial
das
agremiações.
Na segunda parte do trabalho, analisa-se a influência dos bicheiros na manutenção de certa tradição e,
simultaneamente, na promoção de rupturas no mundo do samba, o que se traduziu na incorporação de
formas
espaciais,
relações
políticas
e
assistencialismo,
entre
outros
aspectos.
A terceira parte do trabalho aprofunda as relações de patronagem entre os bicheiros e os clientes
(agremiações) e seu poder de influência na organização dos desfiles. Destarte, a “moderna engenharia
empresarial” do mundo do samba, que une a LIESA e a Cidade do Samba, os patrocinadores de enredo e as
comunidades, os bicheiros e o poder público será tratada nesta etapa. Evidentemente, as recentes denúncias
envolvendo as atividades ilícitas dos bicheiros, sua prisão por formação de quadrilha, tráfico de influência e
corrupção e os possíveis impactos disto no mundo do samba também serão questionados.
AO053 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1269] ESPAÇO E CULTURA N O ESTAD O D O RI O D E JAN EI RO. A QUESTÃO RELI GI OSA: EXPAN SÃO
DE IGREJAS E SEITAS (NEO)PENTECOSTAIS.
HELIO ARAUJO EVANGELISTA; MARCUS VINICIUS CASTRO FARIA.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
- Objetivos: Analisar a atual expansão do fenômeno neopentecostal no Rio de Janeiro.Verificar a difusão e
área de abrangência – nicho de atuação-, a importância de como e quando se deu a difusão espacial desta
religião, quais foram os agentes desta difusão e que barreiras impedem uma maior difusão.
- Fundamentação Teórica: Diante da avalanche evangélica que vem varrendo o país nos últimos anos,
buscamos analisar, baseando-se no tripé Fé-Espaço-Tempo, a situação do Rio de Janeiro, que representa a
capital político-cultural nacional, historicamente reconhecida por seus intelectuais, suas universidades, enfim
como uma população altamente politizada e esclarecida . Ainda assim vem sendo inundada e extremamente
influenciada pelo pensamento das igrejas evangélicas de linhagem neopentecostal. Reflexo deste quadro são
os políticos eleitos, os piores do Brasil, grande parte evangélicos que juntam política e religião, e o Rio já tem
um evangélico como governador do Estado a dois mandatos consecutivos, reflexo do brutal aumento da
“clientela” evangélica no Rio de Janeiro.”Os sucessivos arranjos ocorreram por diferentes motivos, como
eventos sociais e econômicos, situações demográficas e fatos históricos relevantes”(ROSENDHAL,1999
).Quais seriam as implicações territoriais deste crescimento, dada as novas apropriações de determinados
segmentos do espaço? O que essa expansão significa para o futuro do Rio de Janeiro diante desta alienação
da
população?
Para examinar a religião no contexto geográfico a apropriação de determinados segmentos do espaço. “Os
espaços apropriados efetiva ou afetivamente são denominados territórios. Territorialidade por sua vez,
significa o conjunto de praticas desenvolvidas por instituições, no sentido de controlar um dado
território”.(ROSENDAHL, 1996). É nesta poderosa estratégia geográfica de controle de pessoas e coisas,
ampliando muitas vezes o controle sobre espaços, que a religião se estrutura enquanto instituição, criando
territórios seus. Nos apropriaremos do conceito de território “culturalista”, onde se prioriza a dimensão
“simbólico-cultural, mais subjetiva na qual o território e visto sobretudo como o produto da apropriação/
valorização
simbólica
de
um
grupo
sobre
seu
espaço”(HAESBAERT,2001).
- Metodologia: Consiste em efetuar um levantamento bibliográfico junto à bibliotecas, acervos, etc, visando
uma coleta de informações a respeito do tema. Tarefa que será concluída em três meses.Num segundo
momento pretendemos dedicar dois a três meses à leitura do material recolhido (livros, documentos, artigos)
para depois prosseguir com as posteriores etapas do projeto. Nos dois meses seguintes, pretendemos
realizar trabalhos de campo, com visitas às atividades desenvolvidas nos templos, acompanhadas de
relatórios, análises socioeconômicas dos fiéis, questionários e entrevistas. Para efeitos comparativos, traçar
paralelos
com
as
práticas
historicamente
desenvolvidas
pela
igreja
católica.
- Principais questões/pontos desenvolvidos: A falência do modernismo, a crise econômica, o desconforto
social, provocam uma espécie de desencantamento do mundo e favorecem um fascínio pelo irracional que
vem sendo capitalizado pelas religiões neopentecostais do tipo “teologia da prosperidade” e/ou “fé de
resultados”, que prometem um paraíso mundano, rompendo com a idéia do ascetismo protestante centrado
no trabalho, ressaltada por Weber. O que interessa é o aqui e o agora. Atribui-se a culpa de todos os males
ao Diabo e os homens não são responsáveis pelos atos de maldade que cometem, pois o Diabo os levam a
pecar. Torna-se escancarada a ambição materialista e imediata na relação com Deus.”Somente o dinheiro
traz felicidade e enriquecer tornou-se o único objetivo digno de uma vida” (RAMONET).
- Resultados alcançados e conclusões: Nestes últimos anos temos assistido a uma verdadeira avalanche
evangélica pentecostal que vem inundando o país. Esta tendência tem a visibilidade aumentada pela
natureza do proselitismo religioso dos pentecostais e pelo tipo de publicidade feita por essas igrejas. O
numero de pessoas que declaram pertencer a uma das religiões do grupo pentecostal encontra-se em
constante aumento no Brasil: 3,9 milhões em 1980, 8,8 milhões em 1991 e 18 milhões em 2000. Como se
vê, a população pentecostal mais do que dobra a cada década. A taxa de variação media anual dos
pentecostais observada em 1991 a 2000 cresce 8,3%, enquanto a população total aumenta apenas 2%,
durante
este
mesmo
período.
O perfil demográfico e socioeconômico dos pentecostais apresenta grandes desvios em relação à media
brasileira. Do ponto de vista demográfico, os pentecostais habitam mais as zonas urbanas do que as rurais
congregam mais mulheres do que homens, mais crianças e adolescentes do que adultos, e mais negros,
pardos
e
indígenas
do
que
brancos;
de
acordo
com
o
Censo
de
2000.
Em relação aos aspectos sociais, em matéria de educação, se caracterizam por um nível muito elementar,
uma vez que os seus fieis possuem, sobretudo, cursos de alfabetização de adultos, antigo primário e primeiro
grau. No que diz respeito ás atividades econômicas, os pentecostais apresentam um nível de remuneração
muito
baixo,
uma
vez
que
eles
recebem
basicamente
ate
três
salários
mínimos.
Todos esses desvios do perfil demográfico e socioeconômico, em relação a media brasileira, revelam que o
pentecostalismo se mostra particularmente bem implantado nas camadas mais populares que vivem nas
cidades.
A exemplo da região metropolitana do Rio de Janeiro, os pentecostais permeiam o município por todos os
lados. Assim, eles representam mais de 21% da população em municípios como Belford Roxo, Duque de
Caxias, Nova Iguaçu e Itaboraí. Observa-se ainda a presença de pentecostais na própria cidade do Rio de
Janeiro, nos distritos da Zona Oeste, sobretudo em Santa Cruz, Campo Grande e Bangu.
- Três palavras-chave: Geografia, Cultura fluminense, Religião.
AO054 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1569] O CI RCUI TO H I P H OP N A REGI ÃO M ETROPOLI TAN A D E
COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO.
CRISTIANO NUNES ALVES.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
CAM PI N AS:
TERRI TÓRI O,
Essencialmente contestador, o movimento hip hop se mostra como um destacado meio de expressão da
população urbana de diversos cantos do mundo que utilizam a cultura em sua forma política para questionar
a
exclusão
a
que
são
submetidos.
No Brasil, na última década, a cultura hip hop, formada pelos elementos break, grafite e rap, se tornou
componente integrante do espaço geográfico (M. Santos. A natureza do espaço. SP: Hucitec, 1996):
conforma e se apropria de um sistema de objetos para desenvolver suas atividades, tais como casas de
shows, rádios comunitárias, equipamento de suporte artístico, lojas especializadas, entre outros, além de
utilizar fixos e lugares públicos, tais como ruas, escolas, parques e praças. Suas ações configuram
igualmente um sistema, indissociado do sistema material, movido por seus agentes e manifesto, entre outros
elementos, pelo fluxo de comunicações e informações do circuito hip-hop: a rede em torno das
apresentações de seus elementos político-artísticos, envolvimento com projetos comunitários, ligações com
poderes municipais, circuitos de radiodifusão (livre e de mercado), estúdios sonoros ou visuais; entre outros.
Malgrado as ações de esvaziamento e cooptação, o hip hop continua como uma importante “voz das
periferias” urbanas. Nos anos 1990 a Região de Campinas, normatizada como região metropolitana (RMC) se
torna um dos destaques do circuito hip hop nacional. No intuito de contribuir para o entendimento do uso do
território no período atual, buscamos analisar a espessura do circuito hip hop que se constituiu na Região,
bem como a relação deste circuito com a desigualdade sócio-territorial em curso na metrópole campineira.
Nas cidades inventariadas destacamos a ação de aproximadamente 200 breakers, (militantes que dançam o
break) e 150 grafiteiros (militantes que praticam a arte visual do hip hop). Destacamos ainda a ligação do
movimento com cerca de 30 rádios comunitárias e a presença de 280 grupos de rap, o que significa dizer que
são cerca de mil pessoas cantando o gênero musical do hip hop. A produção fonográfica do rap na Região
ocorre
de
modo
caseiro
e
conta
com
quatro
estúdios
especializados.
Nessa pesquisa foi possível constatar que o hip hop resiste à cooptação pelos poderes hegemônicos, entre
outros fatores devido à sua intensa ligação com o lugar, condição essencial para viver a cultura hip hop e que
possibilita uma constante e conflituosa adaptação do movimento frente às imposições da indústria cultural.
Não por acaso a tática utilizada pelos militantes do movimento é a de concentrar suas manifestações em
espaços públicos desde o centro até as periferias da cidade, acessíveis à maioria excluída; trata-se de um
circuito baseado em critérios de acessibilidade e que compreende uma mídia alternativa.
Contra a cooptação, cresce entre militantes do hip hop a preocupação com os que tomam o primeiro contato
com o movimento. A preocupação em muito se explica pela superexposição do hip hop na grande mídia, sob
uma roupagem que esvazia o seu conteúdo político, vertendo-o num simples produto para as massas.
É no contato pessoal e na dinâmica da própria periferia que as distorções causadas pela tentativa de
cooptação se esvaecem. Os hip hoppers afirmam a importância da proximidade, do contato na rua, no bar,
na escola, na praça para se difundir os valores da cultura hip hop, num processo pautado na própria
trajetória do indivíduo durante o seu dia e sob o discurso do hip hop, que se mostra em consonância com a
dinâmica do entorno, dizendo respeito à vida do indivíduo da periferia e substantivando a densidade
comunicacional. Aqui reside um dos pontos fortes no embate com a indústria cultural.
Para o arranjo do hip hop metropolitano há a formação de um micro circuito espacial de horizontalidades,
amarrado por círculos espaciais de cooperação da resistência (círculos ascendentes de informação),
envolvendo o intercâmbio entre as organizações do movimento e destas com outros agentes da sociedade,
algo que ocorre da escala local até a escala regional com o calendário tático de eventos.
A cidade de Campinas aparece, juntamente com as cidades de Hortolândia e Sumaré, como lugar de grande
influência para o hip hop da RMC. Acreditamos que as relações de contigüidade, assim como o grau de
articulação dado pelos órgãos hip hop podem ajudar ainda no entendimento dessas cidades, que em têm
comum, o fato de abrigarem grandes periferias, constituídas por bairros operários cuja configuração
territorial facilita a aglomeração. Chamou-nos atenção o fato de que essa espécie de mancha hip hop
corresponde ao chamado eixo da pobreza da RMC. Outro dado importante é que essa espécie de mancha hip
hop se sobrepõe aos maiores corredores de trânsito intermunicipal de passageiros do estado de São Paulo,
que
envolve,
entre
outras,
as
linhas
que
ligam
Campinas
à
Hortolândia
e
Sumaré.
Aventamos que a aglomeração pode favorecer a revolta e o questionamento. Consideramos ainda a hipótese
de que a força do movimento nessas cidades pode estar ligada à proximidade entre os homens que habitam
seus espaços opacos sob um cotidiano potencialmente criador de consciência crítica.
AO055 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1904] ESPAÇO, I GREJA E PRÁTI CAS RELI GI OSAS: UM A AN ÁLI SE A PARTI R D AS ROM ARI AS N O
RECÔNCAVO SUL DA BAHIA.
WEDMO TEIXEIRA ROSA.
UFBA, SALVADOR, BA, BRASIL.
Resumo:
A Igreja católica e a religiosidade popular tiveram papel fundamental na origem e expansão de grande parte
das cidades brasileiras, sendo que muitas dessas cidades surgiram e/ou cresceram em função da atuação
desta instituição e, em alguns casos, de práticas e valores da religiosidade local. Esse fato é, especialmente,
percebido na Região Econômica do Recôncavo Sul da Bahia, onde se encontra um complexo urbano secular
que
tem
uma
diversidade
natural,
econômica
e
cultural
muito
grande.
Porém, quando se discute o espaço urbano e/ou a história das cidades no Brasil, destaca-se muito mais o
papel do Estado, da política, da economia na formação e produção dos espaços urbanos e dos municípios
brasileiros, diminuindo ou ausentando a importância da Igreja, da religião, dos valores e crenças da
população na construção da paisagem urbana ou formação política e territorial dos municípios em nosso país.
A Igreja norteava o desenho urbano e os estágios hierárquicos das aglomerações que surgiam ao longo do
tempo até o momento da criação oficial do município, como escreve Murillo Marx (1991, p. 12): “Uma
concentração de moradas e uma capela, depois capela-curada ou visitada por um padre, quem sabe uma
paróquia mais tarde. Um povoado de determinado porte aspiraria constituir uma paróquia ou, denominação
que prevaleceu entre nós, uma freguesia. Depois tal freguesia vai almejar a autonomia municipal [...]”.
Essa seqüência foi bastante comum até o final do século XIX – momento da separação oficial do Estado e da
Igreja, quando advém à República e se acentua a secularização. No entanto, esta separação não fez com que
os estabelecimentos eclesiásticos perdessem de vez sua influência sobre a configuração territorial dos
municípios brasileiros e até, pelo menos, meados do século XX, se fazia o caminho descrito acima para um
pequeno arraial ou vila conseguir alcançar o status de município. Na Bahia, em especial no Recôncavo Sul, a
seqüência citada acima aconteceu com muita freqüência no decorrer do século XIX em muitos municípios,
com destaque para Cachoeira, Nazaré, Santa Terezinha, Santo Antonio de Jesus, São Felipe, etc., e ainda no
século
XX
com
os
municípios
de
Laje,
Milagres,
Varzedo,
entre
outros.
A separação do Estado e da Igreja aconteceu há mais de um século, mas, sem dúvida, essa relação ainda
confunde estudiosos, políticos, bispos e a população em geral, ainda mais quando a religiosidade popular se
manifesta com tanta força em cidades como Milagres, que tem função religiosa e atrai milhares de devotos e
romeiros, pessoas em sua grande maioria humildes e que estão distantes de centros econômicos e culturais,
onde as práticas religiosas como festas religiosas e as romarias/peregrinações têm uma dimensão cultural
forte
e
está
diretamente
relacionada
ao
surgimento
e
expansão
do
núcleo
urbano.
Na Bahia, muitas cidades têm relação com as festas religiosas e populares, especialmente na Região do
Recôncavo Sul, onde se pode citar como exemplo a festa de Santo Antônio, em Santo Antonio de Jesus, a
festa de São Roque em Nazaré, a festa da Irmandade da Boa Morte em Cachoeira, inúmeras festas dedicadas
aos Santos padroeiros como o de Santo Amaro, Laje, Jiquiriçá, São Felipe, São Miguel das Matas, entre
tantas outras cidades, sem falar nas festas dos santos juninos, que em alguns lugares como Amargosa e
Cruz
das
Almas
são
grandes
espetáculos
festivos.
Algumas dessas práticas e festas religiosas atraem muita gente de outras cidades e de diferentes regiões da
Bahia e até do Brasil, tornando o lugar um centro convergente de crentes, principalmente quando esse lugar
tem histórias de milagres e aparições de Santos ou da Virgem Maria. Esse é o caso de Milagres, situado no
extremo oeste da Região do Recôncavo Sul e na Região Natural do Semi-Árido baiano, entre as cidades de
Feira de Santana e Jequié, às margens da BR-116. Assim, Milagres é considerado um centro de convergência
de romeiros, com dimensão local e regional no Estado da Bahia, com um fluxo periódico de devotos que
buscam
lugares
sagrados
para
manifestarem
sua
fé.
Este ensaio tem como objetivo principal analisar as manifestações espaciais das práticas religiosas a partir
das romarias na cidade de Milagres – BA, discutindo a influência dessa prática devocional na dinâmica urbana
e regional e na organização espacial da cidade em questão e a importância da Igreja nesse contexto,
enquanto instituição. Este trabalho é parte de uma pesquisa realizada no Mestrado em Geografia e os
procedimentos metodológicos utilizados aqui foram o levantamento bibliográfico e documental, trabalho
direto no campo, a fim de vivenciar e conhecer melhor o fenômeno estudado, entrevistas e análise dos dados
coletados.
As festas e práticas religiosas como as romarias são manifestações culturais que ocorrem na área urbana
e/ou rural num tempo sagrado, num tempo que para o homem religioso é qualitativamente diferente do
tempo cotidiano, que tem valor significativo e consegue aproximar o homem comum de um campo de força
divino, extraordinário, principalmente quando esse tempo ocorre num espaço sagrado, imprimindo ao lugar
das festas uma dinâmica diferente da dos dias comuns, tornando-o simbolicamente importante para os
visitantes.
“Para o homem religioso, o espaço não é homogêneo: o espaço apresenta roturas, quebras; há porções de
espaço qualitativamente diferentes das outras” (ELIADE, 1992, p. 25). Dessa forma, há um espaço de valor
significativo, que se diferencia qualitativamente de outros espaços, sendo, portanto, o espaço sagrado. “Tal
como o espaço, o tempo também não é para o homem religioso, nem homogêneo nem contínuo. Há, por um
lado, os intervalos de Tempo sagrado, o tempo das festas (na sua grande maioria, festas periódicas); por
outro lado, há o Tempo profano...” (ELIADE, 1992, p. 63). O espaço sagrado é considerado pelos fiéis
católicos o lugar onde Deus, Jesus Cristo ou os Santos manifestam seu poder, onde acontecem milagres ou
aparições, sendo que nesses locais, são constituídos símbolos do sagrado como uma pedra, uma fonte, uma
gruta, ganhando esse lugar, principalmente no Tempo sagrado, um campo de forças divinas que tem o poder
de transportar o homem religioso acima de si mesmo, possibilitando seu encontro com uma divindade.
A discussão do sagrado envolve consequentemente o profano e mesmo que estas duas dimensões pareçam
opostas, estão fortemente correlacionados pois “[...] a idéia do profano só tem sentido numa perspectiva
religiosa, ou seja, no domínio fenomenológico em que se opõe à noção do sagrado. Essa oposição liga as
duas referidas categorias de forma necessária, numa estreita correlação” (SERRA, 2000, p. 53).
Como explica Rosendahl (1996, pp. 27-32), o espaço sagrado é qualitativamente diferente do espaço profano
para o fiel, porém existe uma relação entre ambos. Nesse sentido a prática religiosa da peregrinação/romaria
envolve uma organização do espaço sagrado e, conseqüentemente, do espaço profano: no espaço sagrado se
realiza o contato com Deus, ou com os Santos, sendo que esse espaço é definido simbolicamente em
Milagres pela Igreja, a gruta ou a fonte; no entorno desse espaço, principalmente ao redor da igreja – que é
onde se concentra o maior número de fiéis – é possível reconhecer atividades e serviços destinados a atender
às necessidades do romeiro, como alojamento, áreas de comércio, de estacionamento, de show, que definem
o
espaço
profano.
O sagrado e o profano coexistem no mesmo espaço, sendo que no tempo sagrado, no tempo das festas, não
dá para definir com clareza onde termina um e começa outro, não dá para definir as fronteiras de um e de
outro, porém quanto mais se afasta dos símbolos considerados sagrados, como a igreja, o profano se
materializa cada vez mais no espaço. O espaço profano é montado ao redor do espaço sagrado, havendo
assim,
uma
inter-relação
entre
eles.
A visita de um devoto ao lugar sagrado, em um tempo sagrado, e a realização de suas práticas devocionais o
aproxima de Deus. Elas se constituem como uma visita afetiva, como um ato de amor e de demonstração de
fé no seu santo protetor. Esta ida do romeiro a uma cidade-santuário, num tempo de festas, para
cumprimento do seu ato devocional, que envolve sentimentos e paixões, alteram o cotidiano daquele local,
imprime no espaço uma configuração diferente da habitual, (re)modelando-o de acordo com suas crenças,
atitudes
e
valores.
É totalmente evidente que no período de romarias, Milagres se transforma, expandindo as possibilidades de
emprego e renda para a sua população, mesmo que de maneira informal, criando um movimento de pessoas,
serviços e capital, diversificando a economia local. No segundo semestre do ano a cidade “pára”, sendo que
grande parte da população espera ansiosa pelas festas religiosas, pois muitos só sobrevivem daquilo que
conseguem arrecadar no período festivo. A dinâmica urbana de Milagres é marcada por dois momentos
distintos: Um período de romarias, com intenso fluxo de romeiros e visitantes, que se estende durante todo o
primeiro semestre de cada ano, e tem grande força nas festas religiosas, onde se (re)organiza o espaço e se
altera o cotidiano urbano, (re)criando formas e (re)funcionalizando-as para atender o visitante. Outro
período, sem romarias, notadamente no segundo semestre do ano, o cotidiano da cidade é muito parecido
com de outros pequenos núcleos urbanos da Bahia, voltando-se então para o tempo comum.
As festas religiosas e as peregrinações/romarias indicam experiências humanas repletas de significados,
(re)organizam o espaço e modificam a paisagem e a dinâmica urbana. O estudo da espacialidade do sagrado,
das festas religiosas, da vivência e práticas religiosas dos romeiros, trata do estudo de práticas sociais, da
importância dos lugares e símbolos sagrados e da experiência das pessoas com o espaço.
AO056 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[2050] CAM I N H O D OS D EUSES, CAM I N H O D OS H OM EN S: A CON TRUÇÃO D O ESPAÇO SAGRAD O N A
IGREJA MESSIÂNICA MUNDIAL DO BRASIL.
ALEXANDRE LEITE SOUZA FARIAS.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
CAMINHO DOS DEUSES, CAMINHO DOS HOMENS: A CONTRUÇÃO DO ESPAÇO SAGRADO NA IGREJA
MESSIÂNICA
MUNDIAL
DO
BRASIL
Objetivo
Este trabalho tem como objetivo a análise do modo como se processa a construção do espaço sagrado no
seio de novas formas de expressão religiosa derivadas do xintoísmo. Nossa pesquisa ficou circunscrita ao
universo religioso da Sekai Kyussei Kyo, denominada em nosso país de Igreja Messiânica Mundial (IMMB),
mais especificamente ao escopo da cidade-santuário dessa instituição religiosa em terras brasileiras, o
chamado Solo Sagrado do Brasil, localizado na cidade de São Paulo, às margens da represa de Guarapiranga.
A Igreja Messiânica Mundial, entidade que pertence ao rol das religiões que recebem a designação de novas
religiões japonesas, e será analisada aqui no que tange ao papel do sagrado na transformação do espaço
geográfico, o qual adquire significado particular para os que compartilham dessa crença no sagrado. Esse
centro de peregrinação religiosa inscreve no espaço a carga de significados que o sagrado possui na vida dos
fiéis desta religião, influenciando na visão de mundo que decorre de tal influência. Sua paisagem é marcada
pela relação de simbiose entre natureza e cultura, característica que constitui o sistema de pensamento
religioso xintoísta e suas variantes contemporâneas. Nesta pesquisa procuraremos conhecer as funções
religiosas desse espaço sagrado, sua estrutura espacial e organização, a natureza simbólica do seu espaço
geográfico e o significado que ela fornece para os fiéis na apreensão dos valores religiosos da religião
messiânica, profundamente influenciados por esta relação entre o homem e a natureza.
Referencial
teórico
e
conceitual
Entre as inúmeras possibilidades analíticas disponíveis para uma abordagem do fenômeno religioso,
procuramos analisá-lo pela perspectiva da geografia cultural, considerando a religião como um fenômeno
cultural e a geografia como campo do conhecimento capaz de analisar tais fenômenos em sua materialização
na
dimensão
espacial.
Trabalhamos nessa pesquisa com o conceito de espaço sagrado e de espaço profano, proposto por Mircea
Eliade, bem como com a sua noção de hierópolis, ou de cidades-santuários, aprofundado no campo da
geografia da religião por Zeny Rosendahl. Tais conceitos possibilitam a abordagem dos aspectos simbólicos
da cultura. Para a análise específica do campo religioso, utilizamos o referencial conceitual desenvolvido pelo
sociólogo
francês
Pierre
Bourdieu,
em
especial
a
sua
noção
de
campo
simbólico.
Como o nosso estudo trata de um sistema de pensamento religioso diferente dos elaborados no ocidente,
procuramos trazer as contribuições conceituais propagadas por Colin Campbell, em sua perspectiva sobre a
presença
de
crenças
religiosas
orientais
em
sociedades
ocidentais.
Metodologia
Utilizamos a metodologia de Pesquisa de campo em dois níveis: i) levantamento de dados e informações
sobre a atuação da IMMB e a concepção e construção do Solo Sagrado de Guarapiranga (SSG) – projeto,
planta, números em geral (fontes secundárias); ii) entrevistas com responsáveis, líderes religiosos, fiéis e
outros sobre o processo de construção, funcionamento, organização e manutenção do SSG (fontes
primárias).
Fizemos uso também do método da observação participante, com o intuito de desenvolvermos a nossa
pesquisa sobre o papel que essa cidade-santuário desempenha na vida religiosa dos devotos dessa religião,
bem como na construção de sua identidade como grupo religioso. Essa observação participante foi realizada
em uma dessas peregrinações rumo ao solo sagrado, em especial a que ocorreu no dia dois de novembro,
data que marca o calendário religioso de tal grupo para a comemoração do sufrágio as almas dos ancestrais
e antepassados. Procuramos interagir com um grupo de pessoas oriundas da cidade do Rio de Janeiro, desde
a sua partida para a cidade-santuário, seu momento de chegada e permanência no local, bem como a volta
para
a
sua
cidade
de
origem.
Principais
questões
Estudamos a cidade-santuário denominada pela religião Messiânica de Solo Sagrado, procurando identificar e
levantar os aspectos que corroboram as características dessa cidade como centro de peregrinação e
confluência religiosa para os devotos e simpatizantes dessa religião de diferentes partes do Brasil, a
importância do espaço sagrado para o sistema de crenças messiânico, bem como a relevância que essa
cidade e a peregrinação realizada até ela possuem para os seus adeptos. Além disso, procuramos aprofundar
a relação existente entre natureza e cultura para a construção de uma identidade ecológica e profundamente
relacionada com os aspectos ambientais e de preservação da natureza, procuramos identificar também como
se processou a absorção dessa visão de mundo gestada em um ambiente cultural distinto das tradições
culturais
e
religiosas
da
maioria
dos
membros
desse
grupo.
Resultados
alcançados
e
conclusões
Devido ao intenso fluxo de peregrinos que se deslocam em direção ao Solo Sagrado de Guarapiranga, bem
como o sentido simbólico que estas peregrinações possuem nos dias de comemoração religiosa para seus
membros, bem como por toda a carga sagrada atribuída ao espaço, esse local pode ser considerado como
uma hierópolis. Foi possível identificar a relevância das peregrinações para a construção de um sentido de
proximidade com o sagrado, de busca pelo transcendente que se encontra materializado no espaço, o qual
acaba por fornecer sentido para as atribulações do mundo contemporâneo. O espaço adquire contornos e
modificações segundo as bases conceituais dessa religião, carregando de sentido os vários locais, atribuindo
sacralidade
a
distintos
espaços
e
em
diferentes
gradações.
Além disso, foi possível notar a importância dos aspectos ecológicos para este grupo, embora os aspectos
conceituais relacionados a interação entre natureza e cultura simbólica presente no discurso dos líderes
religiosos e membros dessa instituição sofram uma adaptação aos aspectos interpretativos de nossa cultura.
Palavras-chave: Espaço sagrado; Igreja Messiânica Mundial do Brasil, geografia da religião; novas religiões
japonesas; hierópolis;
AO057 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[2055] N O RI TM O D AS I N TERVEN ÇÕES URBAN Í STI CAS N A CI D AD E M ARAVI LH OSA D E SÃO
SEBASTIÃO DO RIO DE JANEIRO.
JOÃO BAPTISTA MELLO.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
NO
DE
RITMO
DAS
SÃO
INTERVENÇÕES
SEBASTIÃO
URBANÍSTICAS
DO
NA
RIO
CIDADE
DE
MARAVILHOSA
JANEIRO
No ritmo das intervenções urbanísticas e nos versos e compassos dos compositores da música popular
brasileira, a comunicação aborda as reformas urbanas, planos diretores e políticas públicas que
reconfiguraram a antiga capital da Colônia e do Império em uma majestosa cidade seguindo as intenções da
ordem e do progresso republicanas nas formas espaciais no ex centro político do país. Eis, em meio a
britadeiras, tratores, monta-e-desmonta, poeira, lama, instrumentos, vozes e a expulsão da população do
seu universo vivido, a apreciação de um segmento social que capta, com sensibilidade, o sentimento, a
rejeição, o entendimento e a aderência dos indivíduos e grupos sociais a todo um conjunto de metamorfoses
ocorridas na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. A urbe carioca, privilegiada pela natureza
exuberante e dadivosa, plena de baías, oceano e domínios florestais, foi edificada sobre aterros colossais e,
mais tarde, o homem teve que construir túneis perfurando montanhas que contribuíram para o seu
espraiamento. As cirurgias urbanas, no entanto, ocorreram somente no século vinte e não apenas
transformaram a cidade fétida, plena de doenças, de becos, travessas e ruas estreitas, que não condiziam
com os preceitos da República, como no bojo da organização do espaço contribuíram para alçar a antiga
capital brasileira em uma cidade admiravelmente bela. Harmonias e dissonâncias no cruzamento dos temposlugares de um fabuloso Rio musical ressonaram canções de porte anunciando a Cidade Maravilhosa e as
flechas venenosas indicando momentos torturantes que, de acordo com o discurso oficial, mereciam ser
vencidos para que a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro exibisse esplendor, graça e glamour como
outras capitais mundiais. Tais acordes, mapeados pelos compositores da música popular brasileira, ganharam
permanência e expressão ao longo do século vinte. Neste embalo, de um lado pulsa uma urbe com seus
encantos, sinuosidade das montanhas, natureza dadivosa e sua gente entendida, no início deste terceiro
milênio, como o povo mais cordial e amigável do mundo em pesquisas científica e turística. Mas, as
dissonâncias pulularam nas margens do Rio, para que assomassem as delícias envoltas e tão propagadas em
cartões postais e símbolos exuberantes, bem como em lugares paradisíacos, afora fantasias escapistas e
inebriantes. No âmbito de tais posturas, a pesquisa afinada com os princípios da geografia humanítica,
focaliza um elenco de canções evidenciando os martírios impostos pelas reformas urbanas, lamentos de toda
ordem, por parte dos desalojados de seus mundos vividos e a euforia das autoridades em oferecer a
esperança sempre renovada de melhores dias para serem vividos em uma cidade de “... cheia de encantos
mil ...”, em meio a geografias sedutoras como afirma um dos versos da marchinha-hino da Cidade
Maravilhosa. No eco dos clarins e de vozes uníssonas, convém lembrar, há um repertório extraordinário.
Trata-se, na realidade, de um documento valioso a ser apreciado. As canções, em sua grande maioria,
permanecem como verdadeiros emblemas e referências, introjetadas no âmago das pessoas e eternizadas na
boca do povo e na memória. Comungando com uma cidade dadivosa no convívio social, ostentatória em suas
formas naturais, imponente nas edificações humanas e plena de funções e/ou simbologias, compositores,
intérpretes, maestros e instrumentistas uniram seus talentos e apuro musical e destacaram momentos
significativos e os meandros do Rio, cujo traço comum aglutina beleza, hospitalidade, acolhida, bem estar,
conflitos, ações e a lida do dia-a-dia. Na confluência de idéias, apego, fôlego e sonhos, o Rio de Janeiro,
estuário de manifestações artísticas e culturais, detém uma brilhante constelação de músicas dedicadas à sua
geografia. Um pequeno elenco desse cancioneiro figura a seguir sendo o repertório interpretado à luz dos
versos das canções alinhadas em ordem cronológica e analisadas na íntegra, quando necessário, ou apenas,
parcialmente. Diante do exposto, convém ressaltar, música popular, compositor, lugar e Rio de Janeiro
comparecem como palavras-chave seguindo os preceitos da geografia humanistica, uma perspectiva
interessada em entender a alma dos lugares a partir das experiências vividas pelos indivíduos e grupos
sociais. Apoiada nos princípios da fenomenologia e da hermenêutica, esta perspectiva entende ser o lugar
parte integrante do ser e, por conseguinte, cada indivíduo um geógrafo informal capacitado para discorrer
sobre a alma dos lugares, por ser o homem quem produz, aprende, vive e transmite geografia, como no caso
dos compositores da música popular brasileira. O lugar (ou lar), nas mais diversas escalas, integra um
mundo filosófico e vivido, existencial e coletivo, de enraizamentos, fé e congraçamento tecido por meio da
permanência, o estoque de conhecimento, a herança cultural e envolvimentos que conduzem à posse e a
afeição denotando pertencimento, aconchego e intimidade, mas também lutas e glórias, enfim, uma
\"morada familiar\" ou lar, por excelência, seja ao nível individual, seja público, compartilhado e forjado por
intermédio de edificantes significados. Nestas condições, o lugar ou lar -- íntimo, fechado, humanizado -- no
conjunto da criação, trocas e identidade, pode assumir igualmente a condição de intermundo (ou
intersubjetividade) referente ao universo comum a um grupo social, por ser cenário, campo de forças e das
interações dos seres humanos. Isto posto, a cidade do Rio de Janeiro apresenta-se tal qual um livro aberto à
interpretação através da assinatura dos compositores da música popular brasileira e o esforço em se atingir
tal meta tem como apoio as filosofias fenomenológica e hermenêutica. Como pôde ser evidenciado o discurso
dos compositores esteve muito focado nas reformas urbanas quando estas ocorreram. Cessadas as tiranias
das intervenções no espaço urbano, alguns autores ainda voltaram seus sentimentos e genialidade para o
passado (colaborando) ou mesmo eternizando os lugares devastados do passado e de grande expressão para
determinados indivíduos ou grupos sociais. Isto posto, convém lembrar, a música popular constitui um
elemento relevante para a compreensão da cidade e sua análise. Trata-se de um instrumento a ser
considerado, em sala de aula, como material didático de envolvente e fácil compreensão. No mesmo
compasso, não pode ser negligenciado pela academia sob pena de ser perder a busca de íntimas, coletivas,
pretéritas, hodiernas, sofridas, pulsantes, vitoriosas mas, sobretudo, sedutoras, vívidas e arrebatadoras
geografias.
Palavras-chave: música popular, compositor, lugar, Rio de Janeiro, reformas urbanas, geografia humanística
AO124 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Agrária
[1187] A REFORM A AGRÁRI A N A CAM PAN H A GAÚCH A: O PROCESSO D E D ESCON CEN TRAÇÃO
FUNDIÁRIA E TERRITORIALIZAÇÃO CAMPONESA.
FLAMARION DUTRA ALVES1; VICENTE CELESTINO PIRES SILVEIRA2.
1.UNESP, RIO CLARO, SP, BRASIL; 2.UFSM, SANTA MARIA, SP, BRASIL.
Resumo:
INTRODUÇÃO
A análise do processo de reforma agrária ocorrido na Campanha Gaúcha vem contribuir para o debate do
desenvolvimento regional no Rio Grande do Sul. O estudo do processo de ocupação e colonização da
Campanha Gaúcha revela a estrutura fundiária dessa região, marcada pelas grandes propriedades, vazios
demográficos e atividades econômicas pouco dinâmicas. No fim da década de 1980, começa-se a implantação
de assentamentos rurais nos municípios da Campanha havendo uma territorialização camponesa e
redistribuição fundiária, em 2006 há 85 assentamentos rurais territorializado em 79.177 hectares, em 9
municípios.
OBJETIVOS
O trabalho tem como objetivo verificar as alterações na estrutura fundiária dos municípios da Campanha
Gaúcha que apresentam assentamentos rurais, além de analisar os impactos da territorialização camponesa
no território da pecuária e das grandes propriedades rurais, no âmbito socioeconômico e territorial.
METODOLOGIA
O emprego de uma metodologia que resgatasse as raízes da ocupação territorial, juntamente com os
diversos aspectos das alterações dos assentamentos rurais no âmbito regional, foi conseguido através da
metodologia sistêmica fundamentada em Morin (1977) que ressalta a importância das relações entre os
elementos que conjugam o todo, e a análise dos antagonismos é fundamental nesse tipo método,
considerando
a
complexidade
dos
elementos
na
busca
da
totalidade.
Procedimentos
metodológicos
Primeiramente, fez-se uma revisão bibliográfica sobre os diversos temas estudados, em seguida, a coleta de
dados secundários em órgãos públicos (IBGE, EMATER, INCRA, etc) para posteriormente realizar saídas de
campo, a fim de coletar informações junto aos assentamentos rurais, e setores dos municípios de Candiota e
Hulha Negra, com o intuito de analisar as alterações socioeconômicas da reforma agrária.
Foram empregadas entrevistas semi-estruturadas, de ordem qualitativa, promovendo uma riqueza de
informações e detalhes. Obtendo respostas diversas, que muitas vezes um questionário fechado, estruturado
não
proporciona
ao
pesquisador.
FUNDAMENTAÇÃO
TEÓRICA
A base teórica-conceitual da pesquisa está dividida em partes de acordo com as temáticas estudas.
Resgate
histórico
da
região
da
Campanha
Gaúcha
Primeiramente, um estudo da colonização e ocupação territorial da região da Campanha Gaúcha, para
delinear a formação socioeconômica desses municípios, através das obras de Brum (1987), Pesavento (1997)
e Costa (1988) constatou-se a formação do latifúndio pastoril e de uma sociedade desigual. Conforme esses
autores, a Campanha Gaúcha se caracteriza pela grande propriedade rural, baixa densidade demográfica e
baixo dinamismo econômico pela carência de atividades. A concentração fundiária iniciada no século XVIII
dura até hoje, porém, com o processo de reforma agrária esse cenário começa a se alterar de forma lenta,
mas dinamizando o espaço agrário dos municípios que apresentam assentamentos rurais em seus territórios.
Transformações capitalistas e a questão agrária: organização do espaço agrário e campesinato
Ao estudar a questão agrária fez-se uma leitura dos clássicos rurais de Kautsky (1972), Lênin (1985) e
Chayanov (1974), para em seguida discutir a questão agrária brasileira em Oliveira (1999) e Graziano da
Silva (1999) e, principalmente as conseqüências da modernização da agricultura no espaço agrário gaúcho.
As obras de Tambara (1985) e Brum (1987) mostram os resultados sociais, econômicos e territoriais desse
processo modernizante na agricultura gaúcha, o forte êxodo rural, concentração das terras na metade norte
do Rio Grande do Sul, expansão das lavouras de soja e trigo, ou seja, esse processo de territorialização do
capital na agricultura gaúcha contrastou com a falência de milhares de camponeses, concentração da renda e
poder
e
o
surgimento
de
movimentos
sociais
do
campo,
entre
eles
o
MST.
Territorialização
dos
camponeses
na
Campanha
Gaúcha
Baseado no conceito de território de Raffestin (1993) e Haesbaert (2004) no qual esse é uma fração do
espaço conquistada por um grupo ou indivíduo, sendo um trunfo conquistado. Em Fernandes (1999) o
conceito de territorialização está vinculado ao processo que o MST transforma no espaço, a conquista da
terra através da luta. Essa territorialização está presente na Campanha Gaúcha, através dos 85
assentamentos
rurais
em
9
municípios
ocupando
79.177
hectares.
RESULTADOS
E
CONCLUSÕES
Observou-se uma pequena redução na concentração fundiária na Campanha Gaúcha, dos 20 municípios da
Campanha, 9 apresentam assentamentos rurais, e nesses os assentamentos ocupam 2,66% do total da área.
Porém, em Candiota 16,3% da área é territorializada pelos camponeses, em Hulha Negra 26,7% da área está
conquistada pelos camponeses. Nos estudos realizados nesses municípios constatou-se a ampliação da
participação camponesa na economia local, a força gerada pelos camponeses trouxe para o espaço rural a
melhoria de infra-estrutura (escolas, postos de saúde, estradas, eletrificação, crédito rural, assistência
técnica, etc) e criação de uma cooperativa para assentados e não-assentados para fortalecer as relações
familiares
no
espaço
rural.
A presença das grandes propriedades e das relações capitalistas não fez com que o camponês desaparecesse
conforme os estudos marxistas de Kautsky (1972) e Lênin (1985), havendo sim, uma ampliação das
atividades camponesas, onde o cooperativismo é a alternativa mais viável para o desenvolvimento local
nessa
região.
Palavras-chaves: Reforma Agrária, Territorialização, Campanha Gaúcha, Estrutura Fundiária, Assentamentos
Rurais.
AO125 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Agrária
[1210] D ESI GUALD AD E E POBREZA N O BRASI L CON TEM PORÂN EO: D ESAFI OS H I STÓRI COS E
ATUAIS.
PATRÍCIO AURELIANO CARNEIRO.
UFMG, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho discute alguns dos fatores responsáveis pela construção e pela sustentação de uma nova
geografia das desigualdades no Brasil. O estudo fundamental aqui empreendido versa sobre a desigualdade
moral ou política que, segundo Rousseau, é estabelecida por um consentimento dos homens, numa espécie
de convenção. No referencial teórico foram adotadas publicações no âmbito da geografia agrária e da
população, da economia e da história. Como evidências concretas, a fim de demonstrar, por meio da
confecção de mapas temáticos das 558 microrregiões do país, a dimensão espacial e material da situação das
desigualdades, coletaram-se dados demográficos e agropecuários de diversas instituições de pesquisa.
O fenômeno das desigualdades e a pobreza, sua representação material e espacial, se aprofundaram nas
últimas décadas. Dentre os principais fatores responsáveis pelo citado processo no Brasil, quatro merecem
destaque pela forma que alimentam a reprodução paralela da abundância e da escassez.
O primeiro fator se refere à modernização seletiva da agricultura que atingiu, excepcionalmente, regiões com
possibilidades de expansão em escala empresarial. Os créditos agrícolas e os subsídios fiscais foram
direcionados apenas para a expansão de culturas de exportação, contemplando, tão somente, os poucos e
grandes latifundiários. A transformação na base técnica da agricultura possibilitou uma revolução na
produção e na produtividade agrícola, mas acentuou a dependência do território brasileiro aos interesses das
grandes corporações multinacionais: produtoras de sementes, insumos, agrotóxicos e máquinas. O resultado
foi o comprometimento da produção de gêneros alimentícios básicos da sociedade brasileira em detrimento
das culturas que interessam ao mercado internacional, revelando um uso alienado do território no que tange
às necessidades de sua população e que produz desigualdades extremas no âmbito da geração e da
apropriação
da
renda
agrícola.
O segundo fator, histórico e também decorrente da modernização seletiva da agricultura, é a concentração
da terra, notável na rigidez das velhas estruturas das oligarquias tradicionais. O modelo político que privilegia
os grandes latifúndios com a monocultura exclusivista e a pecuária extensiva tem corroborado para que os
agricultores familiares, vinculados à exploração extensiva da terra, busquem outras estratégias de
sobrevivência, seja como posseiros, parceiros, arrendatários, assalariados nas grandes fazendas ou, ainda,
como migrantes nos centros urbanos. O que torna urgente a discussão acerca da necessária revisão do
sistema fundiário brasileiro, que deve se basear numa releitura das relações políticas no campo e na
compreensão da terra como instrumento de trabalho daqueles que dependem, exclusivamente, dela para
retirar
o
seu
sustento.
O terceiro fator, decorrente dos dois primeiros e do processo de urbanização e industrialização, consiste no
êxodo rural que teve como decorrência principal a ampliação da pobreza no entorno das áreas
metropolitanas, em função, principalmente, da especulação imobiliária. Se nas décadas passadas a pobreza e
a fome estavam concentradas, em sua maior parte, no campo e nas pequenas cidades, como conseqüência
do crescimento urbano descontínuo, grandes bolsões de mendicância se configuraram nas metrópoles,
trazendo à tona uma nova geografia da centralidade e da marginalidade. O enfraquecimento do papel do
Estado, devido ao receituário neoliberal, o contexto de flexibilidade dos salários e do desemprego e a
necessidade, cada vez maior, de mão de obra especializada contribuem para a intensificação do caráter
marginal e periférico da população pobre metropolitana, seja na vida social ou na morfologia espacial da
dimensão
urbana.
O quarto fator consiste no privilégio das políticas governamentais à agricultura de exportação, incentivando,
a pretexto da necessidade de uma balança comercial superavitária, o crescimento da produção e da
produtividade de um setor agropecuário que supre a nutrição animal em mercados externos. Dados
divulgados pela FGV, em 2001, apontaram que o mapa da fome abarcava, aproximadamente, 1/3 da
população, ou seja, enquanto os portos brasileiros exportam milhões de toneladas de grãos,
aproximadamente 60 milhões de pessoas carecem das condições mais elementares para a sua reprodução
social. É inadmissível que num país, dotado de uma das maiores áreas agricultáveis do mundo, se encontrem
elevadas taxas de população faminta. A extensão do problema exige provisão imediata das necessidades
básicas e uma avaliação séria e crítica acerca das políticas de incentivo à agricultura familiar.
Esses quatro fatores relatados contribuem para que se mantenha elevada a concentração da renda. O Censo
Demográfico de 2000 apontou que enquanto a parcela dos 50% mais pobres detinha 14% da renda total,
esta mesma fatia era apropriada por somente 1% dos mais ricos. Tal monopolização da renda determina que
não somente lugares tradicionalmente antigos, mas também novos ou modernos sejam atingidos pela
pobreza, como apontou, no mesmo ano, o At las do Desenvolvim ent o Hum ano do Brasil, ao relatar
55.609.228 pessoas ou 33% da população total com renda mensal per capit a abaixo de R$ 75,50.
A origem da pobreza brasileira não está, portanto, na escassez, absoluta ou relativa, de recursos, mas na
magnitude e na permanência da desigualdade de renda, forjada, entre outros, pelos fatores anteriormente
elencados. E, apesar do papel central e primordial das políticas redistributivas, a experiência brasileira no
combate à pobreza, infelizmente, até pouco tempo, reforçou unicamente a alternativa do crescimento
econômico. O que nos permite compreender o por quê de na primeira década do século XXI, o Brasil não ser
um país pobre, mas de muitos pobres.
AO126 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia Agrária
[1302] A APROPRIAÇÃO DA CATEGORIA TERRITÓRIO NAS ATUAIS POLÍTICAS DE ACESSO A TERRA
DO MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO – MDA.
PAULO VALDENOR SILVA DE QUEIROZ1; FLÁVIO RODRIGUES NASCIMENTO2.
1.UNI VERSI DADE ESTADUAL DO CEARá, FORTALEZA, CE, BRASI L; 2.UNI VERSI DADE ESTADUAL DO CEARÁ,
FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
A pretensão inicial desta pesquisa é a de analisar as políticas de acesso à terra desenvolvida pelo Ministério
do Desenvolvimento Agrário –MDA- (utilizado o caso do território dos Sertões de Canindé - Ceará), partindo
das categorias território e desenvolvimento sustentável, destacando as implicações de tais políticas no
ambiente
sociocultural
dos
indivíduos
envolvidos.
Buscamos analisar, a partir das condições sócio-históricas atuais do acesso a terra, o processo de formação
territorial brasileira e como a apropriação das categorias Território e Desenvolvimento Sustentável, realizada
pelo MDA, têm implicado em um novo conjunto de políticas públicas no âmbito nacional, com reflexos no
território
retromencionado.
Ao se pensar numa analise conceitual da categoria território, faz-se necessário a compreensão, segundo
Raffestin (1993), de que o espaço é anterior ao território. O território se forma a partir do espaço, e é
resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático, que se apropria de um espaço, concreto ou
abstratamente,
tornando-o
um
território.
O território, nessa perspectiva, seria o espaço no qual se projetou um trabalho, e que, por conseqüência,
revela uma complexa teia de relações sociais marcadas por conflituosas relações de poder. Dessa forma, o
espaço seria a (...) “prisão original, o território é a prisão que os homens constroem para si”.(...).
“Evidentemente, o território se apoia no espaço, mas não é o espaço. É uma produção, a partir do
espaço”(RAFFESTIN,
1993:144).
Para Santos (1992), as várias formas espaciais são sempre, de certo modo, uma expressão dos vários
momentos históricos e de sua dialética relacional. É a partir dessa concepção que podemos diz que, o espaço
nada mais é do que um processo de acumulação de tempos desiguais, sugerindo que o espaço seja
considerado como um fator de evolução social, não apenas como uma condição. “O espaço deve ser
considerado como uma totalidade, a exemplo da própria sociedade que lhe dá vida” (SANTOS, 1992: 05).
Assim, nota-se que não é possível estudar o território sem compreender o espaço e seu processo de
fragmentação, criadores de territórios. Desse modo, é possível afirmar que essa dimensão espacial nos
coloca diante da articulação sociedade – espaço, na medida em que a produção da vida, no cotidiano do
indivíduo, não representa apenas a produção de bens para a satisfação das necessidades materiais, mas
também a produção da humanidade do homem, colocando-nos diante da produção social do mundo
(CARLOS,
1997:306).
Ademais, acredita-se que hoje virou “moda” utilizar o conceito de território para explicar tudo, o que indica
se tratar da já antiga confusão que resulta principalmente da não explicitação do conceito de território que se
está utilizando, considerando-se muitas vezes o território como sinônimo de espaço ou de espacialidade. Ou
numa visão ainda mais problemática, como a simples e genérica dimensão material da realidade social.
Como já apontado, um debate central sobre o território envolve seu caráter absoluto ou relacional. O
território construído a partir de uma perspectiva relacional do espaço é visto completamente inserido dentro
de relações social-históricas, ou, para muitos autores (FERNANDES, 1999; RAFFESTIN, 1993; SOUZA, 2005),
de
relações
de
poder.
Em se tratando do discurso do desenvolvimento sustentabilidade, podemos dizer que este vem sendo cada
vez mais difundido e ampliado. Segundo Leff (2001: 16) hoje esse discurso da sustentabilidade “chegou a
afirmar o propósito e a possibilidade de conseguir um crescimento econômico sustentável através dos
mecanismos
de
mercado”.
É possível, ainda, concordar com o mesmo autor para afirmar que o princípio de sustentabilidade (território e
desenvolvimento) “surgem no contexto da globalização como a marca de um limite e o sinal que reorienta o
processo
civilizatório
da
humanidade”
(LEFF,
2001:
15).
Um segundo momento da pesquisa, consiste na investigação dos documentos produzidos pelo MDA e SDT,
verificando o modo como as categorias têm sido utilizadas e quais as possíveis matrizes teóricas teriam sido
utilizadas
para
sua
elaboração.
Feitas a revisão bibliográfica e a análise conceitual dos documentos oficiais do MDA, busca-se apreender
como a partir dessa nova leitura do espaço geográfico, têm sido: as implementações de políticas relacionadas
a distribuição de terras; o apoio à pequena produção familiar; a sustentabilidade ambiental e acessória
técnica,
tendo
como
caso
a
ser
analisado
os
Sertões
de
Canindé.
Dentro dessa problemática, uma questão que urge como central para toda essa nossa discussão se daria por
intermédio das seguintes hipóteses: por que o Ministério do Desenvolvimento Agrário utiliza a categoria
território, relacionando-a com a lógica do Desenvolvimento Sustentável, em seus documentos e não outras
categorias? Porque a opção pela categoria território para a elaboração de tais políticas? Que objetivos sociais
e políticos circundam tais políticas? Outros pontos, como os critérios (políticos, sociais, econômicos e
ambientais) que foram utilizados para criação destes territórios sustentáveis, também nos parecem de
fundamental importância para compreensão e análise da implementação de tal política.
Assim, o grande interesse da pesquisa consiste, também, em responder algumas outras inquietações como:
Que elementos foram utilizados para formar estes territórios? Que tipos de estudos teriam sido feitos nas
diversas
localidades?
Que
finalidade
tem
tal
política?
O anseio em realizar a pesquisa, explicou-se facilmente pelo fato de que todas estas indagações encontramse até sem uma resposta lógica e satisfatória. É importante ainda ressaltar que se almeja aqui tratar da
importância e amplitude do conceito território na atual conjuntural política mundial, que tem ampliado e
muito o campo de debate do referido conceito, chegando inclusive a falar-se em processos de des-reterritorialização (HAESBAERT, 2004).
AO127 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia Agrária
[1352] PREVI D ÊN CI A RURAL N O BRASI L E ÊXOD O D OS AGRI CULTORES I D OSOS: ESTUD O D E CASO
EM SÃO JOSÉ DO NORTE - RS.
JEFFERSON RODRIGUES DOS SANTOS.
UFSC, SAO JOSE DO NORTE, RS, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho resulta de uma dissertação de mestrado e analisa a relação entre a previdência rural brasileira
e os processos migratórios da população idosa do meio rural, tomando como estudo de caso o município de
São José do Norte, no estado do Rio Grande do Sul. O trabalho parte de uma revisão dos estudos realizados
sobre previdência nas regiões Nordeste e Sul do Brasil, dos quais tem-se a estatística de que 27% dos
beneficiários da previdência em ambas regiões realizaram pelo menos uma migração desde a aposentadoria.
Tais migrações ocorrem geralmente no sentido rural-urbano, especialmente em direção a municípios de
tamanho igual ou menor do que aquele de origem. Partindo desta constatação levantamos a seguinte
pergunta: porque este percentual significativo de aposentados migra justamente após acessar um
mecanismo
de
segurança
de
renda?
Na busca de respostas à questão estabelecida foi adotado um referencial teórico-metodológico que
possibilitasse a reconstituição dos fatores que interagem com a renda previdenciária no caso em estudo,
especialmente a discussão sobre totalidade e situação geográfica presentes nas obras de Milton Santos e
Pierre George. Também foi considerada a literatura pertinente à agricultura camponesa, no intuito de
constituir uma base para o entendimento dos processos decisórios que mesclam caracteres econômicos,
sociais e culturais. Foram abordados os determinantes tanto históricos quanto atuais, sociais, espaciais e
econômicos em suas distintas escalas, com o propósito de reconstituir, buscando a totalidade, a realidade
local na qual incide a previdência rural. Partiu-se do pressuposto de que condições pré-existentes gerarão
resultados diferentes apesar da política de caráter universal. Considerando este quadro pré-existente,
concluiu-se que do ponto de vista espacial, ocorreram dois períodos diferenciados de impactos. No primeiro,
antes da instalação das infra-estruturas (pavimentação e eletrificação rural), parte dos beneficiários migrou
para a cidade em busca de melhores condições de conforto e proximidade dos serviços de saúde. No segundo
período que se estende até o presente, em função da existência destas, a população tende a permanecer no
campo, considerando a melhoria das condições de conforto através da eletrificação rural e melhor acesso à
área urbana proporcionado pela rodovia pavimentada. Ainda assim, as condições rarefeitas no acesso aos
serviços de saúde no meio rural, a desvinculação entre trabalho e vida no meio rural ocorridas em contexto
de especialização produtiva e profissionalização, bem como a desagregação das famílias por motivos
econômicos permanecem como elementos influentes na decisão de migrar dos idosos.
AO128 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Agrária
[1764] “ERA SÓLI D O E SE RECOM PÔS N O AR”: O LUGAR H I STÓRI CO D O CAM PON ÊS N O M UN D O
MODERNO.
BRUNO PEREIRA BEDIM.
IGC- UFMG, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
O artigo problematiza as distintas concepções teóricas sobre o campesinato no mundo moderno e os
diferentes pressupostos político-ideológicos que permeiam as perspectivas de sua análise, tendo em vista os
traços distintivos da modernidade, que vão desde as intervenções na esfera da produção, passando por
mudanças
políticas
estruturais,
e
ainda,
por
revoluções
culturais
e
sociais.
Uma vez sujeito no processo histórico moderno, o camponês se insere entre os inúmeros fenômenos sociais
engendrados pela modernidade e suas tendências econômicas, políticas e culturais a transformar o mundo.
Traz consigo uma temporalidade imersa na desigualdade do desenvolvimento funcional à reprodução do
capitalismo; a projeção e a contestação, no âmbito acadêmico, do indivíduo em movimento.
Preocupação teórica e empírica entre as ciências humanas e sociais, a desmistificação da definição de
camponês enquanto ‘entidade conceitual’ suscita o debate em torno de teorias que concebem a organização
da
economia
camponesa
como
contraponto
à
empresa
capitalista
convencional.
Em certo sentido, os modos de resistência camponesa podem ser entendidos como metáfora dessa ‘entidade
conceitual’ em se adaptar às transformações assistidas nos ‘tempos modernos’. Shanin (1980), por exemplo,
ressalta que as tarefas não-agrícolas praticadas pelo camponês num período anterior à modernidade foram
assumidas pela produção industrial em massa – muito embora os camponeses tenham suas especificidades
no modo de reagir às mudanças estruturais das esferas mais amplas da sociedade, nelas se refletindo e se
diferenciando – seja pela ‘recamponesação’ de determinados territórios, seja pela sua tenacidade em resistir
aos
tempos
e
ainda
possuir
um
lugar
histórico
na
contemporaneidade.
O artigo retrata ainda a submissão do campesinato às estruturas tradicionais de dominação e exploração,
incluindo a venda sazonal e barata da sua força de trabalho e as trocas desiguais no mercado – a compra de
produtos complementares e a venda de sua produção, geralmente desfavoráveis aos camponeses.
No que concerne à transformação capitalista da agricultura camponesa, tem-se as contribuições clássicas de
Lênin (1982) e Karl Kautsky (1980) – este último enfocando os processos de diferenciação na maneira pela
qual
o
capital
penetra
na
agricultura.
Aos olhos de um observador desatento, o desenvolvimento do capitalismo no campo – atrelado à tecnificação
cada vez mais presente na vida desses atores rurais – remeteria à extinção dos camponeses enquanto classe
e sujeitos. No contexto das intensas transformações estruturais vislumbradas na modernidade, muitos
autores fadaram essa ‘entidade social’ (campesinato) ao desaparecimento, sendo que, para eles, o século
XIX seria o veredito de seu desfacelamento e o século XX o limiar de seu próprio fim face a expansão
capitalista
no
campo.
Por conseguinte, não faltaram ‘profecias’ que condenassem o camponês à ‘extinção’. Conforme lembra
Umbelino de Oliveira (2004), muitos teóricos acreditaram que, uma vez que o campo se desenvolvia do
ponto de vista do capital, seria necessário, pois, remover do caminho do ‘progresso’ capitalista esse ‘resíduo
social’ chamado camponês. E não faltaram arautos acadêmicos que anunciassem a proletarização
camponesa, os quais anteviram o endividamento, a falência, a perda de terras e, finalmente, a sepultura do
campesinato
de
suas
épocas.
Contudo, teóricos como Martins (1990), Oliveira (1989; 2004) e Shanin (1980) contrapõe que há uma
distorção teórica entre os autores que insistem em reproduzir a idéia de que a expropriação, a tecnificação e
o subseqüente “desenraizamento” do campesinato seriam os pressupostos fundamentais para o
desenvolvimento capitalista no campo. Para Martins e Oliveira, é possível que o campesinato seja entendido
como classe social inserida no modo capitalista de produção, se reproduzindo dentro do capitalismo como
expoente
de
suas
próprias
contradições.
A ausência do regime de trabalho assalariado na organização do trabalho camponês, por sua vez, insurge
não apenas como contradição histórica do processo de valorização e expansão do capital no campo, mas
também, contraditoriamente, cria condições para a subordinação de sua pequena produção agrícola
excedente e a subseqüente subordinação do trabalho camponês como processo funcional à reprodução do
próprio capital. Ou seja: tem-se a exploração da unidade familiar de produção camponesa como uma
necessidade de expansão capitalista, verificando-se, nesse tipo de exploração do trabalho familiar, o máximo
de
sobre-trabalho.
O que se verifica, sazonalmente, no âmbito estrutural das unidades camponesas, é a compra esporádica e
parcial de sua força de trabalho, o que não necessariamente constitui trabalho assalariado. Se o salário é o
elemento que constitui os custos da reprodução do trabalhador no sistema capitalista, a ausência de trabalho
assalariado na unidade de produção familiar camponesa pode ser entendida ainda como um artifício do
capitalismo mundial – criado a partir da relação desigual entre campo e cidade? – o qual se apropria das
desigualdades
do
desenvolvimento
para
se
reproduzir.
Ao final do artigo, é apontada a necessidade de se pensar o camponês como um ator social integrado às
formas de produção capitalista e aos processos sociais que permeiam a vida moderna. Ademais, deve-se ter
em mente que o aparente “atraso” da agricultura camponesa pode ser entendido como algo interessante ao
capitalismo, pois resguarda territórios para onde ele poderá se expandir no futuro e se valorizar.
O não-desaparecimento camponês e seus enigmas têm suscitado inúmeros debates e controvérsias no
âmbito acadêmico. Sua aparente ‘marginalização’, contudo, pode significar sua funcionalidade ao sistema de
reprodução do capital, (re)atualizando-se numa espécie de “acumulação primitiva permanente”(SHANIN,
p.58), realimentando o sistema com mercadorias, gêneros alimentícios e mão-de-obra baratos. Ao invés de
se “desmanchar no ar”, o campesinato, contraditoriamente, se recompõe em novos termos.
Em cada sociedade, assim, o camponês terá uma forma elementar de inserção no sistema de produção
capitalista; uma classe social a se reproduzir inserida num processo contraditório de reprodução do capital;
uma forma específica de reprodução da riqueza capitalista; um sujeito histórico a desafiar a própria história.
AO129 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia Agrária
[1982] MUDANÇAS NO MERCADO DE TRABALHO RURAL:UMA ABORDAGEM TEÓRICA.
ANA VIRGINIA MENEZES; CORÁLIA MARIA SANTOS.
UFS, ARACAJU, SE, BRASIL.
Resumo:
Mudanças
no
Mercado
de
Trabalho
Rural:
Uma
Abordagem
Teórica
O capitalismo em seu desenvolvimento integrou o capital industrial à agricultura, subordinando ou
extinguindo os camponeses de acordo com os seus interesses.A espacialização do capital reduziu as
oportunidades de trabalho agrícola e proporcionou a criação de novas funções no campo.Diante dessa
realidade, interessa-nos fazer uma revisão bibliográfica mostrando a visão de teóricos clássicos sobre a
intensificação das relações capitalistas durante o século XIX na Europa e as transformações já apresentadas
no mercado de trabalho rural. A partir da Divisão Internacional do Trabalho com base nas fases do
taylorismo, fordismo e toyotismo , busca-se compreender a desigualdade de desenvolvimento econômico
entre os países e a atual morfologia do trabalho. Em Kautsky , encontramos uma análise minuciosa sobre o
desenvolvimento do capitalismo na europa e a relação entre a agricultura e a indústria no processo de
proletarizaçâo do camponês. A indústria capitalista e o avanço dos meios de comunicação seriam
responsáveis pela destruição da indústria caseira de subsistência e a conseqüente perda de auto-suficiência
do camponês . A produção para o mercado incentivou a concorrência e a divisão do trabalho, levando ao
aperfeiçoamento do trabalhador e dos equipamentos e técnicas de trabalho. O camponês tornou-se
dependente do comércio intermediário porque já não produzia tudo que necessitava. Ele precisava agora
adquirir ferramentas e alguns alimentos para consumir porque se especializou em determinado tipo de cultivo
comercial - a mercadoria, e passou a comprar os alimentos básicos, a exemplo dos cereais e da farinha, para
o consumo familiar.
Para kautsky, o camponês ao substituir a produção simples de mercadoria pelo modo de produção capitalista
, fragilizou-se diante do proprietário do grande estabelecimento agrícola por não possuir infra-estrutura para
transportar seus produtos até o mercado e daí ficar na dependência do intermediário para o intercâmbio
comercial;além de não dispor de conhecimentos sobre transações comercias passando desse modo a contrair
empréstimos com capitalistas, dos quais dificilmente consegueria se livrar, portanto, Kautsky , não
acreditava na racionalidade econômica do pequeno estabelecimento.Para ele, o latifundiário seria privilegiado
em relação ao camponês por existir em menor número, ter melhores relações comerciais e financeiras,
sobretudo para obtenção de empréstimos bancários. Enquanto isso, refere-se ao despreparo dos camponeses
para organização em cooperativas pela falta de visão política e de tempo para se dedicarem a
autogestão.Afirmava ainda que no sistema capitalista, o grande estabelecimento agrícola teria a tendência de
progredir, mas não superaria o pequeno. \"Onde se faz regredir demais o pequeno estabelecimento , tornase cada vez menor o rendimento do grande estabelecimento e este começa a regredir
também\"(kAUSTSKY,1986, p.145) As famílias camponesas com prole numerosa e ociosa seriam
fundamentais ao funcionamento do capitalismo: \"O modo de produção capitalista não nos promete nenhum
fim do grande estabelecimento agrícola, nem nos promete o fim do pequeno\"(IBIDEM, p.145). Ele , muito
embora já evidenciasse os avanços tecnológicos, ainda apostava na importância fundamental da força de
trabalho no processo produtivo. Contudo, as rupturas nas formas tradicionais de produção e no padrão de
concorrência capitalista fundamentada no modelo técnico-científico trouxeram uma nova realidade para o
mercado de trabalho. A integração do capital industrial e financeiro à agricultura com a aplicação dos avanços
científicos diminuiu os postos de trabalho essencialmente agrícolas.
Em Lenin, encontramos uma análise sobre o campesinato da Rússia, mostrando que o desenvolvimento do
capitalismo levaria à decomposição dos pequenos produtores em patrões e operários agrícolas.Os
camponeses ricos com acesso a lotes comunitários possuíam ainda terras compradas e arrendadas,
tornando-se pequenos proprietários e fazendeiros através do mecanismo em que a terra torna-se
mercadoria, \"máquina de fazer dinheiro\" (LENIN, 1982, p.38). Apesar da política populista da Rússia,
interessada em negar o processo de capitalização da agricultura, os camponeses ricos, segundo Lênin,
desenvolviam a agricultura mercantil juntamente com a pecuária comercial, bem como concentravam os
equipamentos e técnicas agrícolas mais eficazes. Enquanto isso, o grupo inferior do campesinato era formado
por camponeses que pouco ou nada cultivavam , vendiam a força de trabalho porque não possuíam
equipamentos para trabalhar a terra e por isso arrendavam seus lotes comunitários e tornavam-se ,
normalmente , diaristas agrícolas, formando o proletariado rural.O grupo médio, também apresentava uma
situação instável e para explorar a terra precisava se associar a outros. Os dados revelavam que o grupo de
camponeses médios fornecia mais operários do que empregava. Portanto, \"é instável e transitória a sua
situação , intermediária entre a burguesia e o proletariado agrícola\". (IBIDEM, p.42). Desse modo , a
desintegração do campesinato russo ocorria através da sua subordinação à economia mercantil no que se
refere ao seu próprio consumo ou não desempenho de suas atividades. As relações estabelecidas
apresentavam todas as contradições do sistema capitalista.
Referências:
ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaios sobre a afirmação e a negação do trabalho.São Paulo,
Boitempo,1999.
HARVEY,D.
Condição
pós-moderna.São
Paulo:Loyola,1992.
KAUTSKY,
Karl.
A
questão
agrária.São
Paulo:
Nova
Cultural,1986.
LENIN, Vladimir. O desenvolvimento do capitalismo na Rússia . São Paulo: Abril Cultural 1982. p.5-212.
AO130 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Agrária
[1383] EN TRE A CON QUI STA E A PERM AN ÊN CI A N A TERRA: FORM AS D E LUTA D O ASSEN TAM EN TO
MOSQUITO NO MUNICÍPIO DE GOIÁS- GO, 1986/2006.
JOSÉ BRAGA COELHO; CELENE CUNHA MONTEIRO ANTUNES BARREIRA.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS, GOIANIA, GO, BRASIL.
Resumo:
OBJETIVOS
O objetivo principal desse trabalho de pesquisa foi conhecer as diferentes etapas do processo de luta pela
conquista e permanência na terra no Assentamento Mosquito, identificando fatores históricos que
influenciaram na ocupação coletiva da terra, caracterizando os problemas sócio-culturais e econômicos dos
assentados, bem como investigando a participação de entidades religiosas e classistas na constituição do
assentamento.
REFERENCIAL
TEÓRICO
E
CONCEITUAL
As referências conceituais utilizadas nesse trabalho foram aquelas que dedicaram a discussão sobre
“fronteira” enquanto movimento dinâmico na ocupação territorial, que provocou grandes transformações no
espaço geográfico, sendo de caráter econômico, demográfico ou cultural. Os principais autores referenciados
no conceito de fronteira foram: BARREIRA (1997 e 2002), BECKER (1988), BORGES (1990 e 2000),
FERREIRA (1988), LENHARO (1986), MARTINS (1995 e 1997) e WEGNER (2000). Já os referenciais teóricos
foram pautados nos autores que discutem e apresentam resultados de pesquisa sobre a modernização no
campo brasileiro e sobre as lutas camponesas no Brasil. Nesse sentido, os principais autores referenciados
foram: DUARTE (1998), FERNANDES (1998), GONÇALVES NETO (1997), GRAZIANO DA SILVA (1982),
GRAZIANO NETO (1985), GRZYBOWSK (1991), KAGEYAMA (1990), LINHARES & TEIXEIRA DA SILVA (1999),
MORISSAUA (2001), MÜLLER (1989), OLIVEIRA (1989, 2005 e 2006), SORJ (1980) e VELHO (1979).
METODOLOGIA
A tarefa de pesquisar sobre as diferentes formas de lutas existentes no assentamento Mosquito, que decorre
de contatos com uma diversidade de fontes de informações, resulta numa metodologia plural. Ao mesmo
tempo em que se pesquisavam as contradições sociais e históricas que envolveram os personagens do objeto
pesquisado, havia também a necessidade de analisar a história de vida, para facilitar o entendimento do
comportamento e de decisões tomadas pelo grupo. Todavia, as estratégias utilizadas para a realização desse
trabalho, se pautaram em: pesquisas de fontes bibliográficas e documentais; entrevistas estruturadas com
formulários; dados colhidos através de conversas informais; e o registro sistemático de informações e
observações, como se fosse um diário de campo. Foi realizada pesquisa utilizando entrevistas semiestruturadas com 30 assentados, também entrevista com Dom Tomaz Balduíno (ex-bispo da Diocese de
Goiás), com o presidente do STR dos municípios de Goiás e Faina e conversas informais com assentados que
participaram diretamente da ocupação da fazenda que originou o Assentamento Mosquito. Foi realizada
pesquisa também através de várias visitas, como ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(INCRA) de Goiás, às sedes da CPT nacional e regional, à Procuradoria Geral do Estado de Goiás, ao Cartório
de Registro de Imóveis da Comarca de Goiás-GO, ao Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), ao
Escritório da Agência Rural em Goiás-GO, ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Goiás-GO e Faina, da
mesma forma em que aconteceram diversos contatos diretos no Assentamento Mosquito, realizando pesquisa
com os assentados, seja através de questões em formulário, de entrevista aberta, de observação, ou mesmo
de
conversa
informal.
PRINCIPAIS
QUESTÕES
As principais questões pesquisadas basearam-se na apresentação e forma de ocupação da posse da terra no
Brasil, buscando assim o entendimento sobre a origem das grandes propriedades. Foram apresentadas
diversas formas de luta que aconteceram no Brasil, em decorrência da forma de ocupação capitalista do
território brasileiro e da resistência dos posseiros diante do processo de sua expulsão do campo, quando
foram implantadas políticas públicas de ocupação do sertão, principalmente aquelas direcionadas para o
cerrado brasileiro. Foi dada ênfase para o movimento de fronteira agrícola iniciado após a década de 1960,
denominada também de “Modernização da Agricultura”, dando destaque para a conseqüente migração rural
urbana, resultante da mecanização no campo, aumentando a concentração de terra e o desaparecimento de
pequenas propriedades; tudo isso influenciou na decisão dos camponeses de se organizarem na prática de
ocupação coletiva de latifúndios, como forma de forçar a realização da reforma agrária, para isso contando
com apoio de mediadores, como Sindicatos de Trabalhadores Rurais e a igreja católica. Também foi
pesquisada e apresentada a ocupação econômica do município de Goiás, bem como a sua estrutura fundiária
responsável pela ocorrência de lutas camponesas no município. O estudo de caso do Assentamento Mosquito
expõe o aspecto histórico, porém, com enfoque principal para a realidade atual do assentamento, com o
intuito de apresentar as diversas formas de lutas ali enfrentadas em seus 20 anos de existência. A
constituição do Assentamento Mosquito, no ano de 1986, marcou o início de uma série de 22 assentamentos
rurais no município de Goiás, que o credencia como o município de maior número de assentamento rurais do
Estado de Goiás e do Brasil. No entanto, passado 20 anos e a euforia da conquista iniciou a constante luta
pela sobrevivência e permanência na terra, alguns assentados desistiram, outros pensam em desistir, mas,
existem ainda aqueles que sonham com projetos de participação coletiva para garantirem a propriedade.
CONCLUSÃO
Conclui-se, também, que a formação de grandes propriedades no Brasil aconteceu historicamente mediante
políticas públicas de ocupação de terras devolutas. Assim, os diversos tipos de fronteiras, em tempo e
espaços diferenciados, provocaram o surgimento de situações sociais e ambientalmente conflitivas. No
Assentamento Mosquito percebe-se que a luta principal é com relação à reprodução social, devido a falta de
condições para os filhos dos assentados permanecerem no campo, onde a grande maioria dos filhos que
saíram para estudar e trabalhar abandonaram os estudos dedicando apenas ao trabalho nos grandes centros
urbanos. Por ser o primeiro assentamento do município de Goiás é também o recordista em comercialização
de parcelas, o que dificulta também no trabalho cooperativo, uma vez que quem adquire não possui a
consciência de luta coletiva. Destaca-se no assentamento a valorização dada a manifestação da religiosidade
popular, através da folia de reis reúnem-se anualmente, mesmo aqueles que por diversos motivos deixaram
ali suas famílias. Assim, com toda dificuldades enfrentadas pelas famílias que ali residem, ainda consideram
que a reforma agrária vale a pena e tem esperança de melhorias para a vida do homem do campo. No
entanto, mediante a situação vivida por aquelas famílias, que consideram suas aposentadorias como fonte de
renda para sobrevierem, fica clara a necessidade de repensar o modelo de reforma agrária praticado no
Brasil, uma vez que seus problemas não são de exclusividade apenas daquele assentamento.
PALAVRAS-CHAVE: Fronteira – Latifúndio – Assentamento Rural – Reforma Agrária.
AO131 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Geografia Agrária
[1503] O AVANÇO DO CAPITALISMO NO CAMPO E A APROPRIAÇÃO DO TERRITÓRIO: ABORDAGENS
SOBRE O NOROESTE PARANAENSE.
JOSIANE FERNANDES DE CARVALHO.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGA, MARINGA, PR, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho, que compreende uma pesquisa maior que está sendo desenvolvida para a dissertação de
mestrado em Geografia, tem por finalidade apresentar a reordenação territorial no campo a partir da
modernização da agricultura na região Noroeste do Paraná. Dessa forma, objetiva-se realizar um resgate
histórico do processo de ocupação da região abordada, destacando as peculiaridades relacionadas ao espaço
rural, e contrapor com os novos arranjos territoriais acirrados com a mundialização do capital e a apropriação
capitalista do território. Para tanto, acredita-se que uma abordagem conceitual das categorias geográficas
seja de fundamental importância para análise dos dados empíricos levantados. Embora saiba que a
diversidade de linhas de pensamento traga diferentes conclusões a respeito de tais conceitos, preocupa-se,
nesse artigo, pontuar como se entende os conceitos de território, espaço e região, dentro da linha teórica da
pesquisa. Entendendo, desse modo, que essa leitura é apenas uma das possibilidades para o entendimento
da organização do espaço agrário. Compreende o espaço como palco das relações do homem e da natureza.
Nesta perspectiva, a ocupação do espaço social se materializa por meio das relações sociais. Segundo Moraes
(1981) o espaço produzido resulta da ação humana sobre a superfície terrestre, portanto, se faz necessário
compreender o espaço a partir da dialética entre matéria e idéia, ou seja, numa lógica onde o espaço é causa
e fim das relações do homem. Por sua vez, o conceito de região está vinculado a um subespaço dentro da
totalidade espacial, como uma das estruturas da sociedade. Seu sentido remete a uma unidade
administrativa, mas que também carrega configurações especiais. Nesse sentido, a região é tomada como
um recorte espacial de reprodução da totalidade, não estando dissociada do todo e do processo global. Podese dizer que o conceito de território, historicamente, foi pensado, definido e delimitado a partir de relações de
poder. No entanto, outra noção é essencial para o entendimento do território, a idéia de apropriação, o que
permite que em uma sociedade desigual, a luta organizada da classe explorada também aproprie e construa
novos territórios. Contudo, é impossível desprezar a desmedida apropriação capitalista do território,
Haesbaert (2004), chamou atenção para o fato de que a partir da interpretação de Marx pode-se visualizar
que o modo de produção capitalista “desterritorializa” os modos de produção preexistente para
reterritorializar segundo sua própria dinâmica. Associa-se assim, o processo de internacionalização e as
novas formas de territorialidades que vão passar a ser regida, em grande parte, pelo movimento das grandes
empresas multinacionais. Como procedimento metodológico utiliza-se, a priori, de pesquisa bibliográfica
sobre a produção do espaço e especificamente a ocupação do Norte do Paraná, e também da análise de
dados sobre o meio rural que demonstram a concentração do uso da terra e mudanças na estrutura agrária
pós-modernização da agricultura. O processo de ocupação da grande região Norte do Paraná se configura
historicamente como o espaço de colonização planejada. As terras que eram de propriedade de uma empresa
(Companhia Melhoramentos Norte do Paraná), foram vendidas numa perspectiva de obtenção de altos lucros.
As regiões Norte Novo, e Norte Novíssimo, hoje Norte Central e Noroeste, respectivamente, foram áreas em
que o planejamento antecedeu a colonização, a maioria dos lotes que foram vendidos estavam divididos em
pequenas e médias propriedades e como os pagamentos podiam ser parcelados, antigos colonos e lavradores
tiveram a possibilidade de se transformarem proprietários das terras (CANCIAN, 1981). Dessa forma, é
possível observar uma mudança estrutural, não só na ocupação do espaço, mas também no modo de
exploração da terra. O método de comercialização de terras praticada pela companhia estrangeira,
fracionando-as em pequenos lotes, e a facilidade no pagamento permitiram a maximização dos lucros para a
empresa, mas possibilitou que milhares de pessoas migrassem para região no sonho da terra própria e de
melhores condições de vida. No entanto, com o desenvolvimento do capitalismo no campo a estrutura do
espaço agrário foi alterada, não só pela concentração do uso da terra, mas também pelas relações sociais. A
tecnificação, a proletarização do homem do campo, a concentração da renda da terra, e até mesmo a
integração da unidade de produção familiar à produção industrial foram conseqüências de um processo
intenso e gradativo. Sem dúvida, esse movimento do capital não é único de uma região, nem mesmo
homogêneo no cenário brasileiro, mas, em certa medida, o recorte realizado para o trabalho, o noroeste
paranaense, expressa, em grande parte, as mudanças que se desenrolaram principalmente a partir da
década de 1980 no meio rural. Diante disso, pode-se analisar a partir de dados do IBGE sobre a região e a
observação empírica somada a revisão bibliográfica que a medida que o capitalismo avança sobre o campo
não traz apenas mudanças para as relações que permeavam a estrutura agrária, mas o processo de
industrialização e concentração do uso da terra redefine a ótica do território, uma vez que apropriado pelo
capital passa a determinar a organização do campo. A padronização da mercadoria e do consumo estabelece
novas relações sociais, até mesmo nos lugares mais longínquos. Esse novo modelo de organização social faz
com que os lugares sejam mesclados de experiências locais e mundiais, e é a partir disso que novas
territorialidades
podem
ser
construídas,
como
síntese
das
novas
experiências.
REFERÊNCIAS
CANCIAN,
Nadir
Aparecida.
Cafeicultura
paranaense:
1900-1970.
Curitiba:
Grafipar,
1981.
HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. Rio de
Janeiro:
Bertrand,
2004.
MORAES, Antonio Carlos Robert. Geografia; pequena história crítica. São Paulo: Hucitec, 1981.
AO132 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Agrária
[1602] A PROD UÇÃO AGROPECUÁRI A EM ASSEN TAM EN TOS N A ÁREA D E I N FLUÊN CI A D E GRAN D ES
MINERADORAS.
SHEILA DO SOCORRO TEIXEIRA GEMAQUE; MAURÍLIO DE ABREU MONTEIRO.
UFPA, BELÉM, PA, BRASIL.
Resumo:
O artigo analisou a produção agrícola e a pecuária em quatro assentamentos do município de Parauapebas,
no Estado do Pará, que se localizam próximas à minas da CVRD. Buscou-se inferir em que medida a presença
da
empresa
mineradora
contribuiu
na
estabilidade
da
produção
camponesa
analisada.
A estabilidade camponesa é determinada pela junção de fatores que propiciam a permanência, bem como a
estruturação dos assentados na área. A discussão teórica acerca da existência de tendências da produção
camponesa, podem ser, a grosso modo, agrupadas em três vertentes teóricas. Há os que defendem a
existência de uma tendência a instabilidade da produção camponesa, no caso da Amazônia teria papel
relevante as culturas anuais baseadas no sistema de derruba e queima, além de que fatores de ordem
jurídica e social contribuiriam para ampliar o grau de instabilidade, assim se tornaria altamente insustentável
tanto do nível econômico como no ecológico. Outros advogam a existência de tendência a estabilidade, que
ocorreria em níveis sócio-econômicos, quando limitassem o sistema de pousio, e a ele viabilizasse integração
sucessiva de culturas perenes e de gado, propiciando o processo de estabilização relativa da agricultura
familiar. Outra vertente argumenta que não se pode apresentar uma generalização em torno da estabilidade
ou instabilidade da produção camponesa na Amazônia e, que para explicá-las as políticas agrárias deveriam
ter por base condicionantes agroecológicos, sócio-econômicos, sócio-culturais, idade de colonização e,
fundamentalmente
o
fator
político-institucional.
Para se inferir os impactos em relação a estabilidade de assentamentos rurais, foi realizada pesquisa de
campo nos PA’s Palmares I e II, Onalício Barros e Carlos Fonseca. Intervalo e Nível de confiança formam as
definições que nortearam a dimensão da amostra da pesquisa realizada nos assentamentos. O nível de
confiança adotado foi de 99%, incorrendo de 1% de chance de se errar nos dados a serem obtidos. Em
função do universo de famílias que há nos quatro assentamentos, e levando-se em consideração o período da
pesquisa,
optou-se
por
um
intervalo
de
confiança
de
10%.
Estabelecido o plano amostral e elaborado o questionário, foram aplicados 296 questionários, estruturados
em 71 questões. No PA Carlos Fonseca, que atualmente conta com 110 famílias, foram aplicados 45
questionários. No PA Palmares I com o universo total de 210 famílias foram aplicados 83 questionários, no
Palmares II que possui 517 famílias foram aplicados 126 questionários e, no Onalício Barros que possui 68
famílias, foram aplicados 42 questionários. As informações obtidas em campo foram armazenadas em forma
de
um
Banco
de
dados.
No questionário foram abordados temas, tais como os dados gerais da família, da associação e forma de
organização interna de cada PA. Obtive relevância dados relativos à produção e comercialização, bem como a
própria relação camponesa e mineral. Foi realizado tratamento dos dados no sentido de se estabelecer
relações entre a instalação de empreendimento mineral e as dinâmicas presentes nestes PA’s.
Foi verificado a relação da prática das atividades econômicas nos PA’s. Na Palmares I 78,35% praticam a
pecuária, 83,13% a temporária e 85,54% a permanente. Na Palmares II 66,66% a pecuária, 81,74% a
temporária e 77,77% a permanente. No Carlos Fonseca 84,44% a pecuária, 73,33% a temporária e 91,11%
a permanente e, no Onalício Barros 69,04% a pecuária, 50% a temporária e 26,19% a permanente. Tais PA’s
possuem a média de lotes de 5,37%. Sendo que 46,62% dos assentados contratam mão-de-obra, em
especial
na
época
da
colheita.
Quanto ao local de venda da produção agrícola, respectivamente na Feira do Produtor e no Comércio Local, a
Palmares I obteve 48,19% e 20,48%, na Palmares II 36,5% e 15,07%, no Carlos Fonseca 35,55% e 37,77%
e, no Onalício Barros 40,47% e 16,66%. E a principal espécie bovina comercializada é a vaca com 73,64%
em todos os PA’s, seguido do bezerro com 39,18% e, por último o boi com 6,08%.
Entre as principais fontes de renda destacados pelos assentados, respectivamente foram agricultura e
pecuária, a Palmares I obteve 61,44% e 8,44%, a Palmares II 67,46% e 13,5%, o Carlos Fonseca 51,11% e
11,12% e, o Onalício Barros 47,61% e 11,92%. Acrescenta-se o extrativismo onde a castanha obteve
21,95%,
a
madeira
com
13,17%
e
por
último
a
lenha
com
10,13%.
A pesquisa constatou que a estruturação das unidades camponesas na região de Carajás, possui não mais de
200 ha de terra e tem a reprodução da unidade produtiva baseada no trabalho familiar. Constatou-se
também que, para aproximadamente 2/3 dos assentados, a agricultura é a fonte principal da renda, havendo
presença tanto de culturas permanentes quanto de temporárias e, que a atividade pecuária representa
aproximadamente 1/3 dos rendimentos camponeses. Evidenciando-se assim a existência de dinâmicas que
expressam um indicador de estabilidade da estrutura produtiva. Neste caso é provável que a presença da
grande mineração e, juntamente com ela, o crescimento demográfico ampliou a diversidade da demanda por
produtos agrícolas. Procura que pode estar sendo suprida pelos assentados e contribuindo para
complexificação
das
unidades
camponesas.
Evidenciou-se, fundamentalmente, que há influência da mineração nas trajetórias camponesas no sudeste
paraense, trata-se de uma influência dicotômica e contraditória, uma vez que muito provavelmente amplia o
volume e a diversidade da demanda de produtos de origem camponesa, favorecendo a complexificação da
sua estrutura produtiva. Entrementes, os maiores impactos da mineração nas trajetórias camponesas
reforçam sua instabilidade, pois colaboram na atração da força de trabalho para outras atividades alterando a
disponibilidade na unidade familiar para realização de trabalho no lote, o que, sabidamente, é um dos pilares
da reprodução e estabilidade da produção camponesa.
AO133 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Agrária
[1631] AS AÇÕES COLON I ZAD ORAS E A OCUPAÇÃO D A TERRA N A REGI ÃO D AS M I SSÕES – RS –
BRASIL.
FABIANA FUNK.
UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL, SANTA CRUZ DO SUL, RS, BRASIL.
Resumo:
OBJETIVOS
Este trabalho tem como principal objetivo analisar a ocupação da terra na região das Missões, região está
localizada na parte noroeste do Rio Grande do Sul. Para isso, parte-se da regionalização proposta pelos
COREDEs (Conselhos Regionais de Desenvolvimento), perpassando anteriormente pela discussão acerca dos
conceitos de região e regionalização. Com um embasamento teórico formado a respeito do tema, segue-se
para a caracterização da região das Missões, no que diz respeito a conhecer a apropriação histórica de seu
território, os interesses implícitos e explícitos nas ações colonizadoras – por parte do governo e das
colonizadoras particulares (migração interna) -, procurando relacionar esta história às atuais configurações
de uso e ocupação da terra, retratados por meio de dois sistemas agrários: o sistema agrário do planalto e o
das
colônias
novas.
METODOLOGIA
Este estudo foi desenvolvido baseado em pesquisas bibliográficas, assim como em dados coletados no Senso
Agropecuário feito pelo Instituto de Geografia e Estatística no ano de 2000 (IBGE), e em informações do
Ministério do Desenvolvimento Agrário referentes ao ano de 2005 (MDA). As conclusões, foram
demonstradas
em
mapas
ilustrativos.
Região
e
regionalização
A ocupação/apropriação do território sempre esteve, direta ou indiretamente, ligada ao estabelecimento de
áreas homogêneas. Porém, este estabelecimento de áreas, e a forma pelo qual é feito, implicam em alguns
conceitos como região e regionalização, para os quais ainda não há um consenso absoluto.
No artigo, tenta-se chegar a um conceito de região e regionalização, onde ele é debatido nas diferentes
escolas geográficas, sob o enfoque de autores como Corrêa (1987), Moraes (1981), Santos (1997), Bezzi
(2002), Duarte (1980), Lacoste (1929) e Benko (1999). Atualmente, poderão existir tantas regiões quantos
forem os critérios adotados para as suas classificações. Assim, toma-se região como sendo um lugar no
espaço, composto por características semelhantes relativas aos mais diversos aspectos – ambientais,
econômicos, sociais, culturais, entre outros -, que a distingue das outras regiões adjacentes e a integram ao
mundo
globalizado
através
de
suas
peculiaridades.
Região
das
Missões
e
os
Sistemas
Agrários
Para efeitos de estudo da região das Missões, optou-se pela regionalização proposta pelos Coredes. Os
Coredes foram criados em 1994, pelo governo estadual, e tem como objetivo principal promover o
desenvolvimento
regional
harmônico
e
sustentável.
(PEREIRA,
2000).
Esta região, localiza-se na parte noroeste do planalto sul-riograndense, é formada por vinte e cinco
municípios. Para relembrar a história da constituição da Região, o artigo retrata a saga dos Índios Guaranis e
dos padres Jesuítas que nesta parte do território gaúcho construíram uma grande comunidade, tanto cultural
e econômica, quanto bélicamente. Porém, o mesma fonte que provinha o seu sustento dos Sete Povos das
Missões, também foi parte de sua ruína. As grandes criações de gado constituíram o principio necessário para
a recaída do olhar da Coroa Portuguesa por aquelas paragens. (PESAVENTO, 1997; BERNARDES, 1997). De
todo o esplendor desenvolvido pelos índios Guaranis nos Sete Povos, o que restou são as ruínas de algumas
reduções e o sítio histórico de São Miguel Arcanjo, o mais importante acervo da obra missioneira no Brasil, e
declarado
pela
UNESCO,
em
1993,
Patrimônio
Histórico
Mundial.
A colonização da província do Rio Grande do Sul para o oeste do Estado se deu devido ao medo de que o
Estado perdesse o seu território para os países vizinhos. Desta forma, foram fundadas diversas colônias ao
longo da encosta, com o objetivo de expandir o povoamento e também ligar o oeste do Estado com o
Planalto
e
a
Depressão
Central.
Em 2005, Neto e Basso caracterizaram os nove sistemas agrários existentes no Rio Grande do Sul, sendo que
dois deles compõem a região das Missões: o sistema agrário do planalto e o sistema agrário das colônias
novas. Da mesma forma, esta região teve tipos distintos de povoamento. Ao sul, da região das Missões, que
faz parte do sistema agrário de campos, a ocupação foi feita, basicamente, por estancieiros. Já na parte
norte, ocorreu à colonização, que inciou-se no Estado por volta de 1748, mas que na região das Missões
somente
começou
a
acontecer
em
1849.
(BERNARDES,
1997)
Para isso, houve duas frentes colonizadoras: as oficiais e as particulares. O Objetivo da colonização
promovida de forma oficial era vender os lotes indistintamente a quem procurasse a região, imigrantes ou
agricultores que se deslocavam das áreas coloniais mais antigas do Rio Grande do Sul, estabelecendo na
região das Missões povoamento de etnias mistas. Já a missão da colonização promovida pelas colonizadoras
particulares foi originar áreas homogêneas, de uma só, ou que predominasse uma etnia.
CONCLUSÃO
As formas de colonização influenciaram diretamente a organização e configuração territorial da região das
Missões. Onde a colonização foi feita de forma particular, desenvolveu-se a agricultura familiar,
caracterizando o sistema agrário das colônias novas. Já onde a colonização foi feita de forma oficial,
desenvolveu-se o latifúndio, com a monocultura da soja e o criatório extensivo de animais, caracterizando o
sistema agrário do planalto.
AO134 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Agrária
[1873] OS CONFLITOS DOS SUJEITOS SOCIAIS NA ESTRUTURA AGRÁRIA GOIANA.
SANDRA APARECIDA ALVES.
USP, SÃO PAULO, GO, BRASIL.
Resumo:
As desigualdades sociais no Brasil são profundas, uma das maiores do planeta. Esse quadro foi construído
principalmente a partir da chamada Revolução Verde, que principalmente a partir dos anos 60, a agricultura
brasileira inicia o processo de modernização. Emergem nessa década, com o processo de modernização da
agricultura, novos objetivos e formas de exploração agrícola originando transformações tanto na pecuária,
quanto na agricultura. Como conseqüências do processo são apontadas, além da acirrada concorrência no
que dizem respeito à produção, os efeitos sociais e econômicos sofridos pela população envolvida com
atividades rurais.
A forma de organização desde os movimentos messiânicos até os grupos de cangaceiros demarcavam os
espaços políticos da revolta camponesa. Eram conseqüências do cerco a terra e à vida. Embora fossem lutas
localizadas, aconteciam em quase todo o território brasileiro e representaram uma importante força política
que desafiava e contestava incessantemente a ordem instituída. São partes da marcha camponesa que
percorre a estrutura do espaço agrário brasileiro. Mas a luta pela terra, contra a expropriação, contra a
grilagem não teve fim, continua muito forte até os dias atuais e só chegará ao fim quando houver uma
profunda transformação social.
Em outros termos, a luta pela reforma agrária, embora se constitua, hoje, em produto indireto das
experiências construídas a partir de mobilizações do passado - sobretudo as ocorridas nos anos 1950-60,
vinculadas à atuação das Ligas Camponesas - apresenta nuanças peculiares, resultantes de uma conjuntura
específica, marcada por novos modelos de exploração agrícola, por sua vez responsáveis por padrões de
acumulação diferenciados daqueles prevalecentes em décadas anteriores.
O que não é possível na visão de Martins (1990) é discutir a reforma agrária do ponto de vista da
racionalidade de uma empresa capitalista. Mas esse não é o raciocínio camponês. Ele valoriza outras coisas
como um lugar seguro para ficar e manter sua família junta. “Ele não quer ver o mundo desagregando. E não
há nenhum motivo para que o mundo dele se desagregue”, diz Martins. Sua crítica é radical em relação às
teorias de transição para a cidade, que começam a ganhar força em estudos antropológicos dos anos 40.
Segundo Martins, uma ficção que acabou não se concretizando em lugar nenhum do mundo, a não ser em
algumas áreas dos Estados Unidos. Não há nenhum motivo, na sua visão, para se acelerar a transição para a
cidade já que ela não vai levar as pessoas do campo a lugar nenhum.
Mas a intenção não é apenas a análise estrutural, mas essa simultaneidade entre os diversos sujeitos sociais
e a estrutura agrária, ou seja, ao mesmo tempo como alguns desses sujeitos procuram dominar e outros
experimentam a dominação e se organizam para resistir. Muitas vezes quando lançamos nosso olhar a esse
campo nos é apresentada uma hegemonia da burguesia agrária, mas isso podemos melhor analisar durante a
apresentação das entidades, movimentos e organizações.
As mudanças ocorridas nas últimas décadas na área econômico-produtiva não vieram acompanhadas das
necessárias mudanças na estrutura fundiária. No aparato legal foram introduzidos novidades importantes
como a exigência do cumprimento da função social da propriedade e o instituto da desapropriação para fins
de reforma agrária. Porém, os poderes públicos não aplicaram estes preceitos. O poder do latifúndio e do
atraso sempre se impôs pelas alianças políticas ou pela violência.
Por outro lado, as contradições e conflitos do modelo de desenvolvimento adotado pela elite nacional fizeram
surgir, no decorrer da história brasileira, inúmeras lutas de resistência e de direitos, lutas pelos meios de
trabalho e produção. Das lutas dos índios contra a expropriação até a luta dos negros pela terra livre dos
quilombos, da luta de Canudos e do Contestado até as Ligas Camponesas, a resistência indígena, negra e
camponesa sempre aconteceu e assumiu diversas formas. Nas últimas décadas, emergiram novos sujeitos e
formas de organização e de luta. As lutas dos seringueiros, ribeirinhos, índios, atingidos por barragens, dos
remanescentes quilombolas, dos sem terra e dos camponeses ganharam dimensão nacional com novos
atores sociais em movimento. Eles se constituem principalmente a partir dos anos 80.
Nesse sentido, há uma simultaneidade da ação dos sujeitos sociais na estrutura agrária, o que define a
configuração territorial do estado de Goiás, bem como define as relações entre os diferentes sujeitos
presentes nesse espaço. Esses diferentes sujeitos sociais presentes no campo goiano, como os movimentos
sociais, sindicatos, entidades patronais, estabelecem relações sociais dominantes que são de luta, às vezes
uma luta pacífica ou regulada, outras vezes uma luta descontrolada e que tende a um enfrentamento direto.
Nesse sentido, percebe-se muitas vezes a inorganicidade dos atores, pois há uma grande quantidade de
grupos e organizações que desejam controlar a situação impondo suas particularidades e visões, o resultado
é uma crise permanente, pois não haverá consenso, o que poderá haver é uma hegemonia de algum
grupo/organização sobre outra, ou não. Nesse sentido se estabelece uma forte disputa no campo, ou seja, os
camponeses, latifundiários, e todas as demais categorias são disputados pelos diferentes movimentos,
entidades e organizações no sentido de garantir a hegemonia, aí entram os atores sociais do campo:
movimentos sociais (Movimento Sem Terra – MST, Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB,
Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA, entre outros), sindicatos (Sindicatos Rurais, Sindicato dos
Trabalhadores Rurais – STR...), entidades (União Democrática Ruralista). Quando voltamos nosso olhar para
dentro da estrutura agrária goiana, percebemos uma grande estratificação dos sujeitos sociais presentes.
AO001 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ensino da Geografia
[1206] A CRI SE D A ACUM ULAÇÃO CAPI TALI STA E AS POLÍ TI CAS N EOLI BERAI S: REFLEXOS N O
ENSINO DE GEOGRAFIA E NA FORMAÇÃO DE DOCENTES.
ALOYSIO MARTHINS DE ARAÚJO JUNIOR.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, PALHOCA, SC, BRASIL.
Resumo:
No Brasil, a partir do início da década de 1990, o discurso e a prática de governos, instituições internacionais
e de Organizações Não-Governamentais em relação às Universidades foi o de transferir sua função de
produtoras de conhecimento científico, para se voltarem ao mercado de trabalho. Nos campos social e
educacional, isto torna o Ensino uma mercadoria, reprodutora das necessidades de grandes grupos
empresariais. O discurso neoliberal da escolarização inclusiva condiciona a resolução dos problemas sociais a
partir da lógica do mercado. Isto tem induzido o docente a ser um reprodutor de conhecimentos originados
fora do seu contexto educacional e além do ambiente de sua comunidade. Atualmente discute-se que um dos
grandes entraves ao crescimento e desenvolvimento econômico e social brasileiro é sua deficiente
capacitação de mão-de-obra. Algumas correntes teóricas utilizam o argumento de que os países que mais
investiram na qualificação do trabalhador, apresentaram maiores taxas de crescimento e renda per capita.
Entretanto, não se considera a distribuição da renda gerada pelo aumento da produtividade do trabalho. No
contexto nacional, a maior produtividade da força de trabalho está muito ligada aos interesses de empresas
multinacionais, que têm técnicas mais avançadas e necessitam colocar tais tecnologias em uso no país. Sem
a conseqüente qualificação da mão-de-obra isto se torna desinteressante para tais empresas. De longa data
o sistema de ensino no Brasil tem passado por transformações estruturais devido às necessidades de
diferentes demandas, de acordo com cada período histórico e de sua etapa de desenvolvimento econômico e
social. Isto tem levado a um questionamento inquietante: como o ensino de geografia e de que forma esta
ciência se (inter)relaciona com os processos políticos, sociais, econômicos e tecnológicos no processo de
conhecer, explicar e analisar seu objeto? Nesse sentido, o objetivo geral desta pesquisa foi investigar a crise
da acumulação capitalista, as políticas neoliberais implementadas a partir dos anos 90 no Brasil e os reflexos
no ensino de geografia, bem como na formação de docentes desta disciplina. Esta periodização se faz
necessária, pois, é a partir de então, que o Brasil e especificamente seu sistema de ensino e demandas
profissionais, passam a ser chamados a ter novas inserções dentro de uma política denominada neoliberal no
sentido de oferecer às empresas um profissional capacitado a enfrentar os desafios cotidianos das
organizações. Para alcançá-lo, discutiu-se e analisou-se como a geografia e o ensino desta disciplina se
inserem num ambiente de transformações econômicas, tecnológicas e sociais, notadamente nas duas últimas
décadas. A relevância desta pesquisa reside no fato de que o Brasil, ao praticar uma política neoliberal,
perdeu a capacidade de gerenciar as melhores estratégias para o seu processo de desenvolvimento
econômico e social. As exigências que o capital nacional e internacional têm feito ao Brasil, em particular,
principalmente desde a última década, têm transformado o ensino superior em um simples reprodutor das
necessidades de empresas multinacionais, que, para a redução de custos de produção, inserem no setor
produtivo novíssimas tecnologias. Entretanto, a Universidade não pode submeter-se aos ditames do
mercado, pois este é instável e dinâmico, do ponto de vista empresarial. Tais considerações levam a
reflexões que se inserem no ensino de geografia, enquanto ciência próxima à sociedade e suas demandas
pelo reconhecimento e conhecimento da realidade na qual está inserida. A metodologia de um trabalho de
pesquisa inclui as diferentes interpretações teóricas acerca de um determinado problema, sendo o conjunto
de técnicas seus instrumentos de compreensão da realidade. Esta pesquisa teve um caráter documental,
exploratória e indutiva, com abordagem interpretativa dialética da realidade. Este conceito foi desenvolvido
por Marx e Engels, a partir das concepções de Hegel. Entendiam o movimento como tensão entre opostos, e
com isto, anteviam possibilidades de transformações sociais. Para a dialética marxista, a atividade humana é
um processo de totalização, ainda que nunca se chegue a uma etapa final. Há totalidades mais ou menos
gerais e o nível de totalização necessário depende das questões que se pretende analisar. Para Marx o ser
humano é a expressão de toda sua vida material e social, ou seja, produtor e produto das relações sociais. A
análise sobre a realidade, na ótica marxista, pressupõe iniciar-se do mais complexo, mesmo sendo abstrato,
para o mais simples e concreto, voltando ao complexo, que pode ser apreendido de maneira concreta. Assim,
tem-se uma situação que avalia o todo e as partes, mas que não é possível pensar o primeiro (o todo) sem
as últimas (as partes) e vice-versa. Deve-se, então, verificar tanto o que une as partes entre si com o todo,
bem como as contradições entre esses. A realidade deve ser pensada descobrindo, construindo e
reconstruindo as realidades, por meio de sínteses e análises. Outro instrumental de análise, bastante
utilizado por diferentes ciências, além da própria geografia, é denominado Materialismo Histórico. Marx
buscou estudar a sociedade capitalista dentro de uma abordagem histórica. Para focar sua atenção sobre as
relações que determinam os rumos da história, simplificou as complexas relações de causa e efeito que
interligavam as várias faces dos sistemas sociais, ou seja, as idéias, religião, costumes, moral, instituições
econômicas e sociais existentes em todos os sistemas sociais. A marcha dos acontecimentos, nesta
perspectiva, se daria em diferentes estágios de desenvolvimento das forças produtivas materiais de uma
determinada sociedade. Assim, o trabalho emerge como principal veículo de transformações, onde o homem
domina a natureza, humanizando-a e transformando a si próprio. Dessa forma, o trabalho resulta da divisão
social na apropriação dos meios de produção por parte de uma classe social, decorrente da diferenciação
social de uma sociedade, principalmente sob o capitalismo. Com este trabalho, espera-se lançar luzes numa
reflexão e compreensão mais aprofundada e crítica do papel da educação escolarizada no contexto social e,
especificamente na área de geografia. Visou ainda aprofundar os debates em torno das concepções teóricometodológicas da linha de pesquisa \"Geografia em Processos Educativos\", ligada ao Programa de PósGraduação em Geografia do Departamento de Geociências da Universidade Federal de Santa Catarina.
AO002 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ensino da Geografia
[1385] ED UCAÇÃO SUPERI OR A D I STÂN CI A: A LÓGI CA D A POLÍ TI CA PÚBLI CA PARA A FORM AÇÃO
DE PROFESSORES NO BRASIL.
MARCIO COSTA BERBAT.
UERJ, NITEROI, RJ, BRASIL.
Resumo:
O presente estudo teve por objetivo investigar a formação de professores a partir do incentivo de políticas
públicas oficiais implantadas e/ou fomentadas no Brasil com apoio do Ministério da Educação (2002 – 2006),
através da educação superior a distância, especificamente, na área de conhecimento da Geografia, ou seja,
com os cursos de licenciatura de Geografia na modalidade de educação a distância.
A política educacional brasileira desde a década de 90 do século XX, vem passando por profundas mudanças
às quais se inserem em um cenário dominado por novas configurações políticas, econômicas e culturais,
norteadas por orientações de valores de ideário neoliberal, dentro do processo de reestruturação produtiva
do capitalismo global, que impõe uma nova realidade para o século XXI, no qual tem o conhecimento como
base
elementar
da
produção
e
de
um
cenário
capitalista
de
competição
globalizada.
A educação a distância vem-se configurando, no início deste novo século, como uma das principais políticas
dos organismos internacionais, especialmente Banco Mundial (BM), Organizações das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e, mais recentemente, Organização Mundial do Comércio (OMC),
sob
a
aparência
do
acesso
à
educação
nos
países
periféricos.
Na área educacional brasileira, várias mudanças vão se efetivando no que concerne ao papel social das
instâncias educativas de ensino superior, como seu financiamento, abrangência de atuação, abertura de
novas
vagas,
contratação
de
funcionários
e
professores,
entre
outros.
Para tanto, buscou-se em dois momentos: 1) analisar o processo de discussão e criação de programas que
incluem ou são especificamente para a formação de professores através da educação superior a distância
(UAB e Pró-Licenciatura); 2) analisar a legislação educacional brasileira para regulamentação definitiva da
educação a distância, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN - nº 9.394/96), o
Decreto nº 5.622, de 19/12/2005(oficializando a educação a distância no país até a pós-graduação), que
regulamentou o art. 80 e 87 da Lei nº 9.394, de 20/12/1996 e o Decreto nº 5.800, de oito de junho de 2006,
que
dispõe
sobre
a
criação
do
Sistema
Universidade
Aberta
do
Brasil
(UAB).
Como fundamentos teóricos do estudo estão idéias de Fernandes (1975), Lima (2006), Catani (2003) e Leher
(2005), no que se refere aos aspectos de reforma da educação superior conduzida no país, desde o governo
Fernando Henrique Cardoso, se mantendo no governo Lula da Silva, aonde sob a aparência de expansão do
acesso e democratização desse nível de ensino, vêm se realizando a privatização interna das universidades
públicas, o empresariamento da educação superior que se configura pela ampliação do numero de cursos
privados
e
pela
imposição
de
uma
lógica
empresarial
à
formação
profissional.
Apresenta-se como principal contribuição deste trabalho a investigação sobre como está acontecendo à
reforma educacional no ensino superior brasileiro, que vem cada vez mais forte, através do próprio Governo
Federal, ampliando a participação das instituições de ensino superior privadas, com a evidente manobra de
recursos públicos que estão sendo direcionados para os empresários da educação brasileira, entregues dentro
de programas de atuação mista entre o setor público e o privado, como o Pró-Licenciatura.
Tanto o Pró-Licenciatura como a UAB, que segundo o Governo Federal através da Educação Superior a
Distância devem resolver o problema de falta de professores no Brasil, são programas recheados de abusos
aos direitos conquistados pelos trabalhadores ao longo de décadas, como o de ter um contrato de trabalho,
respeitando a legislação trabalhista, pois a maioria não tem vínculo empregatício, trabalham através de
bolsas ou mesmo recebendo como cooperativado, ligado as fundações existentes em muitas instituições
públicas
no
Brasil.
Os Cursos de Licenciatura em Geografia estão dentro desse universo empobrecido de política pública, que
segundo as perspectivas devem ter seus primeiros cursos iniciados ainda em 2007. Através de Pólos
Municipais, o número de alunos matriculados pode variar de acordo com a estrutura existente tanto por parte
da
Universidade
envolvida
como
a
que
será
necessária
nos
Pólos
Presenciais.
Priorizando a formação de professores através da educação superior a distância, o governo não faz apenas
uma opção de modalidade, mostra principalmente sua submissão as diretrizes dos organismos internacionais.
Em oposição a esse caminho, existe um conjunto de movimentos sociais, sindicais e estudantis que lutam
diariamente pela defesa da educação pública e gratuita como direito de todos e dever do Estado e que
reafirmam o princípio defendido arduamente por Florestan Fernandes ao longo de sua vida: verba pública
exclusivamente
para
a
educação
pública.
A educação a distância pode ser usada na construção de um projeto de educação ampla para a sociedade,
com qualidade, gratuita e com a participação democrática de todos os brasileiros. Dentro desses princípios, a
educação a distância pode ajudar a corrigir injustiças seculares na educação brasileira, para isso, precisamos
acreditar na possibilidade de integração das tecnologias com a educação, não deixando que os envolvidos
sejam apenas conduzidos no processo de formação, mas façam parte da construção do futuro que todos
desejamos.
AO003 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ensino da Geografia
[1404] O CURSO D E LI CEN CI ATURA EM GEOGRAFI A A D I STÂN CI A N O ÂM BI TO
LICENCIATURA E A MUDANÇA DE PARADIGMA NA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES.
ANA BEATRIZ GOMES CARVALHO.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA, CABEDELO, PB, BRASIL.
Resumo:
DO
PRÓ-
Introduç
Este trabalho é resultado de uma pesquisa mais ampla, desenvolvida na Universidade Estadual da Paraíba no
período de agosto de 2006 a fevereiro de 2007, com o objetivo de analisar o impacto das políticas públicas
em Educação a Distância na formação de professores da rede pública do Estado, especificamente em
municípios distantes dos principais eixos econômicos com maior acessibilidade ao Ensino Superior. A criação
e implementação de um curso de Licenciatura em Geografia, na modalidade a distância, provocam mudanças
na estrutura da formação do professor que vivencia em seu processo de formação o impacto de conceitos
como globalização, flexibilidade tempo/espaço, construção de rede de informações, entre outros processos. A
alternativa que nos parece válida para o nosso objeto de estudo é uma perspectiva sócio-histórica para a
prática de nossa pesquisa que foi desenvolvida em dois eixos: a análise do material documental que
precedeu e fundamentou a concepção político pedagógica dos programas de formação de professores na
modalidade a distância, observando a contextualização da conjuntura local/global, e a análise da construção
e implementação do projeto político-pedagógico do Curso de Geografia na modalidade a distância
desenvolvido pela Universidade Estadual da Paraíba e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte no
âmbito do Pró-Licenciatura. O outro eixo está centrado na prática do professor, entendido agora como sujeito
e principal agente com a possibilidade de uma reflexão que parte do que o professor faz, para uma
reconstrução do que pode ser feito, confrontando-o com o seu contexto social e político.
Polítcas Públicas em Educação a Distância
As inovações tecnológicas provocaram um impacto sem precedentes em nossa sociedade na segunda metade
do século XX. Chamamos a sociedade em que vivemos hoje de sociedade de informação, conceito que define
bem a existência de fluxos tão complexos de idéias, produtos, dinheiro, pessoas, que estabeleceu uma nova
forma de organização social. O fato é que verificamos claramente as transformações na organização do
trabalho, na produção, nos mecanismos de relacionamento social, no acesso à informação.
O Brasil assumiu o compromisso com outros nove países em 1990 para garantir a melhoria e universalização
da educação básica, e para tanto, uma série de medidas foram tomadas neste período. Dentro desta
perspectiva, o Governo Federal implementou uma ação que pretendia articular vários setores da esfera
federal, os diferentes níveis de esfera pública (Estados e Municípios), e as universidades públicas na criação e
implementação de um programa de formação de docentes na modalidade a distância. O programa PróLicenciatura tem como objetivo a criação de cursos de Graduação (Licenciaturas) na modalidade a distância
para formação e qualificação do professor que atua em sala de aula na rede pública, sem nível superior (ou
quando apresenta nível superior em uma área diversa da que efetivamente atua). Esta distorção existente
nos quadros da Educação Básica pública ocorre principalmente em localidades distantes dos grandes centros.
Segundo documento do MEC, “trata-se de um Programa de formação inicial voltado para professores que
atuam nos sistemas públicos de ensino, nos anos/séries finais do Ensino Fundamental e/ou no Ensino Médio e
não têm habilitação legal para o exercício da função (licenciatura). O Pró-Licenciatura - Programa de
Formação Inicial para Professores dos Ensinos Fundamental e Médio se insere no esforço pela melhoria da
qualidade do ensino na Educação Básica realizado pelo Governo Federal por meio do Ministério da Educação
(MEC), com a coordenação das Secretarias de Educação Básica (SEB) e de Educação a Distância (SEED) e
com o apoio e participação das Secretarias de Educação Especial (SEESP) e Educação Superior (SESu)”.
A busca pela melhoria da educação básica é, sem dúvida, o princípio norteador das ações de qualificação dos
professores. A avaliação realizada pelo Sistema de Avaliação Básica apontou a deficiência de qualidade da
escolarização, servindo de base para uma série de ações do Governo Federal. A implementação de
programas de formação de professores na modalidade a distância é uma delas e caracteriza-se por uma ação
que reuniu elementos diversos em sua concepção, formando uma verdadeira rede de colaboração entre
diversas instituições, dos mais diferentes níveis, enriquecendo a construção de um programa de formação de
professores da rede pública. Os indicadores educacionais relativos à formação de professores, que se
encontram nas salas de aula das escolas públicas no Brasil, sinalizam para as disparidades de formação em
nível regional dos professores em exercício na rede pública nas séries finais do Ensino Fundamental e Médio;
como também para a necessidade de se desenvolver projetos de formação acadêmica para esse educador, de
modo que haja mudanças na qualidade da educação básica ofertada na rede pública de ensino.
Conclusão
A formação do professor em uma modalidade com inserção tecnológica embutida na própria metodologia do
curso será capaz de fazer uma diferença significativa em sua atuação na Educação Básica. Ao fazer o curso
de Licenciatura na disciplina em que efetivamente atua, o professor que já exerce essa atividade, acumulará
não apenas o conteúdo específico que leciona, mas também inúmeras possibilidades pedagógicas que
permitam uma atuação mais efetiva, inserida realmente em uma sociedade de informação e conhecimento..
O que se discute aqui é ainda mais profundo, a escola não precisa modificar-se para acompanhar o novo
modo de produção, mas sim porque as formas de aprendizagem se modificaram, e todos os paradigmas
anteriores não funcionam mais e quando aplicados dificultam a ação fim da escola: possibilitar a
aprendizagem.
AO004 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ensino da Geografia
[1803] O CURRICULO ESCOLAR NO ENSINO DE GEOGRAFIA: ALGUMAS REFLEXÕES.
KALINA SALAIB SPRINGER; MERCEDES SOLÁ PÉREZ.
UFPR, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
Ensinar Geografia requer a formulação de questões como: para que ensinar Geografia? Por que ensinar
Geografia? Por que aprender Geografia? Assim, é importante ter uma definição clara a cerca do papel da
disciplina no ensino e sua materialização pedagógica adequada às diferentes faixas etárias. A identidade da
disciplina não está no conteúdo e sim no seu papel na formação do aluno. Desta maneira, tem-se com
objetivo principal estimular a reflexão e o debate a respeito da adequabilidade dos conteúdos propostos para
ensino básico, tendo como referência a prática docente realizada no 5º ano do ensino básico na escola
Estadual
Tiradentes
em
Curitiba
/
Paraná.
Depresbiteris (2000) coloca que no dia-a-dia a escola se fixa nos conteúdos, esquecendo-se das capacidades
e das atitudes que se deseja desenvolver. Nesta perceptiva errônea torna-se difícil a definição e construção
dessas capacidades (cognitivas, intelectuais, afetivas, motoras), que permeiam todo o ensino, sem estarem
vinculadas
aos
conteúdos.
Segundo Castro & Spazziani (2000) a escola deve capacitar o indivíduo à formação de processos que
promovam e desenvolvam a conscientização, através de uma postura crítica, dialética e com conteúdos que
se
relacionam
diretamente
à
sua
realidade.
Carneiro (1993) descreve que a importância da educação geográfica decorre fundamentalmente da
concepção de cidadão que uma sociedade se propõe como referencial de orientação ao seu processo
educativo e que a geografia escolar não se reduz a uma programação curricular meramente informativa, mas
deve ter uma afetividade formativa dentro da escola sobre o desenvolvimento intelectual e atitudinal do
aluno. Dentro deste contexto a prática docente promoveu algumas reflexões: Qual a real importância destes
conteúdos para estas crianças de 11 / 12 anos de idade? Qual o real aprendizado deste aluno? Ou ainda que
tipo de aprendizado esta sendo efetuado? Não serão estes conteúdos muitos extensos e desconexos da vida
do
aluno?
Estas inquietações permearam nossas discussões a respeito de qual o papel da disciplina de Geografia no
ensino básico. E se, a maneira como está sendo conduzido este ensino fará realmente diferença na vida do
aluno. Assim, no decorrer da pesquisa identificaram-se as seguintes problemáticas: 1) incompatibilidade
entre a quantidade de conteúdos, os objetivos por estes propostos e a carga horária destinada à disciplina de
Geografia. 2) Dentro deste problema incluiu-se um segundo: a extensão destes conteúdos. Este fato pode
também ser claramente evidenciado dentro das escolas, quando lançamos a expressão: ‘tenho que vencer o
conteúdo’. Quando a gama de conteúdos é muita como aconteceu neste estágio, vários problemas são
identificados. 3) A dificuldade dos alunos para com o desenvolvimento dos conteúdos, pois estes ainda (em
sua maioria) não possuem o nível de abstração exigido para as tarefas a eles designadas. Isto pode
claramente ser evidenciado durante as aulas, quando os alunos tinham que através de um conceito, tentar
imaginar algo. Por exemplo, ao ser trabalhado o relevo, os alunos não conseguiam abstrair as formas, e ao
solicitado para diferenciar planície, montanha e planalto, não conseguiam fazê-lo senão pela cópia do
contorno que estas estruturas apresentavam nos mapas. 4) A difícil aproximação dos conteúdos trabalhados
em aula, com a vida cotidiana do aluno. Um exemplo claro, deste problema evidenciou-se quando se
trabalhou com o conceito de vegetação, mais especificamente vegetação litorânea. Aqueles alunos que,
recentemente estiveram no litoral paranaense facilmente associaram a vegetação vista naqueles locais com
as fotos do livro didático. Para estes alunos o aprendizado e a associação das imagens por eles conhecidas
com os conceitos trabalhados em aula ocorreu tranqüilamente. Entretanto, aqueles alunos que não possuíam
esta experiência de vida além de não conseguirem fazer as devidas relações, sentiram-se pormenorizados
por não terem a mesma vivência e conseqüentemente mesma facilidade de aprendizado. Estas situações por
vezes geraram momentos de desconforto dentro da sala de aula. 5)Outro aspecto, evidenciado foi a
utilização dos conteúdos como instrumento disciplinar para seus alunos, evidenciando assim, a falta de
autonomia do professor dentro da sala de aula. Não é raro escutar a expressão ‘se vocês não ficarem quietos
vou passar mais conteúdos’. Isto nada mais é que uma apropriação indevida da utilização deste termo, e faz
com que o aluno, associe conteúdos e alguma forma de castigo ou repreensão por algo errado que eles
fizeram. Bem como maior tempo para o professor, mas também para o aluno desenvolver as atividades de
maneira mais satisfatória o possível. Considerando-se todos estes aspectos não podemos simplificar a
Geografia escolar a conteúdos curriculares. Muitos destes conteúdos podem aparecer também em outras
disciplinas. Assim, quando a Geografia ocorre do conteúdo pelo conteúdo, tem-se nas aulas ao invés de
construção de conhecimento, um repasse de informações. Informações estas que, muitas vezes em excesso,
podem tornar-se repetitivas dentro da própria Geografia. Com esta atitude, a formação de cidadãos, um dos
objetivos também da disciplina de Geografia, é por vezes esquecido. Partindo-se do pressuposto que a
cidadania é um processo de conscientização e aprendizado de valores e atitudes, torna-se importante um
repensar sobre como a disciplina de Geografia esta contribuindo para a formação destes cidadãos. Estes
cidadãos conscientes de seus valores e seu modo de vida traduzidos em atitudes para com o próximo e/ou
para com o lugar onde vive é que definirá a organização do lugar. Isto é bem definido nas palavras de
Carneiro (1993) onde a Geografia escolar deve ser um pretexto para se fazer a educação geográfica,
sobretudo na perspectiva da finalidade de formar cidadãos conscientemente responsáveis e participantes. Ou
seja, antes de ensinar conteúdos soltos e desconexos é necessário conscientizar o aluno de que ele é
organizador / desorganizador dentro de um espaço em constante transformação. É necessário conscientizá-lo
de que ele, junto aos colegas, amigos e familiares é responsável por aquele espaço. Isso é, inserir-se no
espaço e através desse ‘inserir-se no espaço’ cuidar do mesmo. Com base em afirmativas como a de Callai
(1998), de que a realidade, ou o lugar em que se vive é o ponto de partida para se chegar à explicação dos
fenômenos e que, a Geografia não deve ser memorativa, descritiva ou enciclopédica, e sim deve trabalhar a
realidade do aluno, ou seja, todas as dimensões que compõem a forma de viver e o espaço que o cerca, a
Geografia assume papel primordial na educação. Contudo não essa Geografia, como se encontra hoje, mas
sim uma Geografia cidadã, que ensine o respeito para com o próximo e para com o lugar, o cooperativismo
ao invés da competição, a harmonia entre os seres humanos e entre estes e a natureza. Uma Geografia que
ensine que é através de nossas atitudes e ações que poderemos melhorar o espaço em que vivemos.
AO005 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ensino da Geografia
[1807] LIÇÕES DE GÊNERO NA INTERNET: OS BLOGS.
GUSTAVO SIQUEIRA DA SILVA.
UFSM, SANTA MARIA, RS, BRASIL.
Resumo:
Introdução
Com a ajuda do referencial teórico consegui direcionar um foco analítico, escolhendo a Internet como local de
produção do conhecimento sobre gênero inscritos nos blogs. Apesar de em uma primeira impressão de que
Internet, geografia e educação parecem temáticas desconexas, sem vinculações, percebi com este estudo
que elas poderiam se articular. Após visualizar esta articulação, várias questões colocaram-se entre minhas
antigas convicções. A utilização da Internet como corpus empírico não me parecia viável. Agora, além de
buscar examiná-la com outros olhos, ela na prática moldaria definitivamente minhas concepções.
Objetivos
Esta pesquisa pretende contribuir para estudos de Geografia de gênero tentando responder as seguintes
indagações: como a escola utiliza a Internet em sua prática pedagógica? como ocorre o processo de
construção identitária pelos blogs? quais são os referentes identitários em deslocamento?
Referencial
Teórico
Para entender a óptica com que pretendo focalizar a temática, se faz necessária a apreensão de conceptos
chaves, na análise do papel atribuído ao gênero nos diversos setores da sociedade, no caso discurso e
identidade. Antes de deter-me nestes conceptos, gostaria de argumentar que esses estão articulados na
perspectiva teórica pós-estruturalista, por esta abalar as estruturas solidificadas na razão, na ciência e na
busca do progresso constante do pensamento iluminista. Calcada na verdade científica da razão a
modernidade iluminista estabeleceu relações binárias de poder – homem/mulher, branco/não branco,
razão/sentimento, bem/mal – onde os pólos estabelecem disputas, e o elemento primeiro aparece como
dominante, através da legitimação de um discurso considerado verdadeiro ou mais válido do que outro.
Passei a entender identidade a partir das leituras de Stuart Hall. Este autor afirma que foi o projeto da
modernidade que produziu um sujeito unificado, localizado solidamente como indivíduo social. Busco
identificar a ruptura proporcionada pelo feminismo no sujeito moderno, na Internet, que durante algum
tempo foi considerada uma temática alienígena. Meu trabalho está situado dentro da corrente geográfica que
ganhou maior destaque a partir dos anos 80. Conforme McDowell apud MAIA (2001, p.90), existem duas
principais linhas teóricas dentro da Geografia Cultural que emerge na década de 80: “[...] uma desenvolvida
no Reino Unido e outra nos Estados Unidos: a primeira tornou como foco principal as relações sociais e o
significado simbólico, reveladas em ações sociais em um determinado lugar ou localidade, enquanto a
segunda enfocava mais especificamente sobre paisagens em si”. Minha pesquisa está inscrita na primeira
linha teórica que tem como referência as teorias de Raymond Williams e Stuart Hall. “Nessa perspectiva, a
principal preocupação é a análise das maneiras como os artefatos materiais são apropriados, e os seus
significados transformados através dos hábitos sociais oposicionistas” (idem). Por fim, concordo com a leitura
realizada por MAIA (2001) de Linda McDowell que aponta como “a principal característica da nova Geografia
Cultural é o reconhecimento de significados contestáveis e divergentes, bem como do caráter temporal e
contestável
do
conhecimento”
(idem).
Metodologia
Para localizar os blogs no ciberespaço utilizei os sites de busca da Internet, dentre os mais conhecidos o
Altavista, levou-me até o site BLOGS.COM.BR, intitulado O Portal de Encontro de Blogueiros do Brasil. Este
site oferece várias formas de busca de blogs, por tema, por idade, por estado e cidade, e também
aleatoriamente. Foi a última que adotei para localizar os blogs, aleatoriamente fui analisando-os e
selecionando os que enquadravam na faixa etária que estabeleci para investigação que foi de 12 a 20 anos,
por esta representar a possibilidade dos/as jovens estarem em escolas do ensino básico. Dos 24 blogs
utilizados para a investigação, 20 eram assinados por meninas e 4 por meninos. Os dados e informações
sobre a tecnologia e o processo de informatização nas escolas estaduais de ensino básico, foram buscados na
Internet também. Enfim, a grande teia dos computadores, precisa ser analisada, ser problematizada, ser
encarada não como a única, mas como mais uma possibilidade de investigação, que interage e condiciona a
vida
digital
e
social
na
pós-modernidade.
Pontos
Desenvolvidos
O trabalho aborda a inserção das tecnologias digitais e da Internet na paisagem pós-moderna, sua função no
processo evolutivo do pensamento e do conhecimento, com a passagem da escrita linear para a utilização da
hipertextualidade. Comento sobre o caráter desterritorializado da vida digital e de suas relações
comunitárias, tentando localizar geograficamente os blogs no ciberespaço, através de sua caracterização.
Articula-se a expansão dos microcomputadores e da Internet com o aprendizado e com as políticas públicas
brasileiras. Procuro caracterizar a categoria gênero buscando situar em recortes temporais a postura
feminina em relação a sua situação de subjugada, de entendida como o outro do homem. Tento direcionar
esta concepção em torno da identidade de gênero para a educação, para poder ancorar a análise das
identidades de gênero dos/as adolescentes nos blogs. O foco analítico da pesquisa é enfatizado através dos
discursos textuais e gráficos inscritos nos blogs, procuro caracterizar as identidades de gênero produzidas
e/ou
reproduzidas
pelos
adolescentes.
Resultados
A articulação proposta por mim, entre as temáticas da Internet, educação e gênero, apresentou-se como
uma tarefa bastante árdua para corporificar-se neste estudo. Mas, o que pude perceber é que as identidades
de gêneros produzidas pela escola são fortes, pois são legitimadas sem discussão por uma sociedade
patriarcal. Essas identidades de gênero encontram-se nos blogs, mas já não mais tão inflexíveis, pois as
meninas começam a avançar as fronteiras que demarcavam o espaço a elas atribuído pela modernidade.
Internet e escola se contradizem, e como percebi pelas leitura realizadas, se a escola tem cumprido uma
função conservadora, que não tem contribuído no avanço da formação de meninos/as livres de valores que
desprezam as diferenças culturais, a web tem se apresentado como um espaço alternativo para que os/as
adolescentes possam expressar, construir, negociar e fixar suas identidades de gênero. Seja através de listas
de discussão de e-mails, chats, ou mesmo nos blogs, não há mais como ocultar a necessidade de
compreendermos a Geografia do ciberespaço, e como ele e a as relações humanas nele estabelecidas estão
constituindo o sujeito e a sociedade pós-modernos.
AO006 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Ensino da Geografia
[1917] I N CLUSÃO D I GI TAL E I N CLUSÃO SOCI AL: A EXPERI ÊN CI A D OS ROTEI ROS D I D ÁTI COS
DIGITAIS.
REJANE CRISTINA DE ARAUJO RODRIGUES1; CLAUDIA ANDRÉA LAFAYETTE PINTO2.
1.UNI VERSI DADE DO ESTADO DO RI O DE JANEI RO, RI O DE JANEI RO, RJ, BRASI L; 2.SECRETARI A
MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Neste artigo analisamos uma importante experiência metodológica desenvolvida para a Secretaria de Estado
de Educação do Estado do Rio de Janeiro, a elaboração dos Roteiros Didáticos Digitais. Inseridos em uma
proposta mais abrangente de ampliação das possibilidades de aprendizagem dos alunos do segundo
segmento do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, este novo recurso didático pode representar do ponto
de vista do ensino da Geografia uma importante alternativa metodológica voltada a inserção consciente do
cidadão
brasileiro
nas
transformações
das
relaidades
espaciais
e
sociais.
A informática aparece aqui como um improtante recurso para a inclusão digital e cidadã daqueles segmentos
que têm ficado ao longo das últimas décadas privados de novas possibilidades de um ensino de qualidade. O
uso do computador, como recurso de aprendizagem aparece como instrumento de inclusão social, ampliando
ainda
as
possibilidades
de
aprendizagem.
Os Roteiros Didáticos Digitais se constituem em uma proposta que objetiva a complementação dos conteúdos
trabalhados em sala de aula, incluindo a orientação de atividades que tenham no uso da computação e de
suas técnicas a ampliação das possibilidades de aprendizagem. A metodologia proposta considera: a
apropriação de conceitos e teorias na análise dos processos geográficos; a identificação dos resultados das
diferentes ações humanas sobre o meio natural; o desenvolvimento de habilidades ligadas à compreensão de
textos literários, jornalísticos, análise de gráficos e tabelas, interpretação de imagens etc; e o
desenvolvimento de habilidades para pesquisa e seleção de conteúdos disponíveis na Internet.
Foi proposta a uma equipe formada por professores com elevada qualificação e larga experiência no ensino
fundamental e médio o desenvolvimento de 480 roteiros didáticos digitais construídos como atividades
multimídia mediadas por computador, com o objetivo de desenvolver competências e melhorar a
aprendizagem do aluno nas áreas de Português, História, Geografia, e Línguas Estrangeiras (Inglês e
Espanhol). Os roteiros deverão ser implantados nos laboratórios de Informática das escolas públicas,
aplicados na 5ª à 8ª séries do Ensino Fundamental e na 1ª à 3ª séries do Ensino Médio.
Na base do projeto está uma proposta mais geral de Reorientação Curricular proposta pela SEE/RJ. De
acordo com o projeto os alunos continuarão participando das aulas convencionais de suas escolas. As
atividades realizadas no laboratório de Informática terão como base os roteiros didáticos digitais, sendo o
aluno assistido por um monitor local, um orientador tecnológico ou por um professor.
Os roteiros didáticos digitais se constituem como uma atividade com o objetivo principal de desenvolver uma
competência específica. Estes roteiros têm como característica a possibilidade de estudo autônomo pelo
aluno, tendo sido construídos com orientações claras e objetivas embora apresenta, além da indicação de
uma ferramenta simples, outra avançada. Cada roteiro não ultrapassa um tempo de atividade de 30 minutos,
apresentando animações, ilustrações, clips de videos, sites etc, que podem estabelecer a interface com
outras disciplinas. Os roteiros são ainda estruturados para ter continuidade em outro roteiro (conjunto de 2
ou
3,
conforme
o
pré-roteiro).
Desta forma, os roteiros são estruturados nas seguintes seções: pré-produção (orientação para que o
professor na sala convencional possa preparar os alunos para consumo do roteiro no laboratório e/ou prérequisitos); produção (atividade no laboratório dos alunos); e pós-produção (orientação para que o professor
na sala convencional possa contextualizar a tarefa realizada com a realidade do aluno e /ou avaliar a
produção
do
aluno).
Chamamos a atenção nesta analise para o fato de que a experiência de elaboração de material didático
oportuniza a ampliação do debate sobre a necessária distinção entre método e técnica. A técnica, no
processo de ensino-aprendizagem, só tem sentido, quando associado ao uso de conceitos e teorias e a
escolha de um método base do processo de ensino. Assim, considerados método e técnica, podemos destacar
a importância e as possibilidades desta experiência didática para o ensino da Geografia escolar.
Assim, destacamos que o objetivo do trabalho é apresentar a experiência de construção de roteiros didáticos
digitais e analisar a importância desta metodologia para o ensino da Geografia no ensino fundamental. Serão
apresentados alguns roteiros elaborados para como complemento às aulas desta disciplina, apresentadas as
estratégias propostas para sua elaboração e analisadas possibilidades criadas por esta proposta
metodológica.
AO007 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Ensino da Geografia
[2121] DESAFIOS DO ENSINO DE GEOGRAFIA NO CURSO PEDAGOGIA DA TERRA.
MARIA DE FÁTIMA ALMEIDA MARTINS.
UFMG, BELO ORIENTE, MG, BRASIL.
Resumo:
Diretrizes e Bases - LDB - e ganha sentido na medida em que fortalece os sujeitos nos lugares em que
realizam
a
sua
prática.
Nesse sentido, o texto será pautado pelas discussões das quais temos participado em torno da construção do
currículo, organizado por áreas de conhecimento, que para este curso foram assim denominadas: Área de
Ciências da Vida e da Natureza; Área de Ciências Sociais e Humanidades; Línguas, Artes e Literatura e
Matemática. Assim constituído, com o formato e estruturação curricular acima indicado, o curso nos instiga a
pensar em uma prática pedagógica que vá para muito além dos campos disciplinares, bem como nos coloca
novos e desafiantes elementos para o trabalho por área que, no nosso modo de pensar, não se resume tão
somente
à
questão
da
interdisciplinaridade.
Com esta proposta curricular, o curso tem nos mobilizado e requerido um envolvimento para além das
práticas parcelizadas, comuns nas práticas cotidianas na universidade, porque o movimento que o sedimenta
e o fortalece é o do trabalho coletivo. Com esse sentido, o encaminhamento que vem sendo dado na
consolidação da área no curso é o de aglutinar esforços para encontrar uma proposição que possa explorar as
possibilidades do diálogo entre os campos disciplinares que, no caso da área de Ciências Sociais e
Humanidades (que tem como base estruturadora a Geografia, a História, a Sociologia e a Filosofia) possam
articular questões que dialogem para além das fronteiras de seus campos disciplinares. Entendemos que,
como ação propositiva, esse diálogo seria um dos primeiros desafios que o curso nos coloca como
educadoras.
É preciso destacar que, na sua particularidade, enquanto lugar de formação do professor do campo, o curso
ganha centralidade na reflexão sobre a educação para além das fronteiras hegemônicas do saber instituído,
porque (re)significa e qualifica a ação dos sujeitos que estão envolvidos na ação educadora do e para o
campo.
Esse movimento em direção à reflexão sobre a formação do professor, necessariamente nos remete aos
conteúdos e aos recortes da ciência geográfica e, mais especificamente, ao seu ensino, bem como à sua
construção na estrutura curricular. Articular esse conjunto de questões referidas à prática escolar significa
pensar
como
e
sob
que
condições
são
organizadas.
Neste sentido é que cabe aqui uma pequena referência às discussões sobre currículo empreendidas por
Gimeno Sacristán e A. I. Pérez Gómez. Para estes autores, existe uma relação extremamente importante e
próxima entre o ensino e o movimento que culmina na organização e na elaboração de atividades do
currículo.
Ou
seja,
“... é preciso ver o ensino não na perspectiva de ser atividade instrumento para fins e conteúdos préespecificados antes de empreender a ação, mas como prática, na qual esses componentes do currículo são
transformados e o seu significado real torna-se concreto para o aluno/a.” (SACRISTÁN, PÉREZ GOMÉZ;
2000:123).
Ao refletir sobre a construção deste curso nos diferentes contextos de sua elaboração, outras questões
também ganham sentido, como as relativas à sociedade, bem como os sentidos da educação, ou seja, sobre
como esta deve alcançar o desejável, ir além e chegar às diferentes espacialidades, como objetivo e sentido,
de forma emancipatória. Assim, ao realizar este movimento de reflexão sobre os sentidos do curso e sua
relação com e na formação social, o que passa a ser “essencial é pensar a sociedade e a educação em seu
devir” (MAAR, 2003:12). Esta perspectiva de análise apresenta elementos que consideramos importantes
para a prática e a formação do professor do campo, na medida em que esta reconhece ser essencial a
educação como processo e, mais, na medida em que a vida e a experiência passam a ser fundamentais como
elementos formadores dos sujeitos na educação. Em outras palavras, “só assim seria possível fixar
alternativas históricas tendo como base a emancipação de todos no sentido de se tornarem sujeitos refletidos
da história, aptos a interromper a barbárie e realizar o conteúdo positívo, emancipatório, do movimento de
ilustração
da
razão.”
(MAAR,
2003:12)
Enfim, o desafio dado neste curso é o de desenvolver uma proposta de ensino e aprendizagem da Geografia
na área de Ciências Socias e Humanidades que possa convergir numa experiência formativa, nos termos
formulados por Adorno, de que “é preciso romper com a educação enquanto mera apropriação de
instrumental técnico e receituário para a eficiência, insistindo no aprendizado aberto à elaboração da história
e
ao
contato
com
o
outro
não-idêntico,
o
diferenciado.”
(MAAR,
2003:27)
Algumas perguntas povoam o tempo todo a prática, o sentido e o significado da Geografia neste curso. Como
efetivamente pode-se construir alternativas que venham propiciar a aprendizagem significativa não
reiterativa da prática formal? Ou ainda, como avançar na reflexão sobre a formação do professor do campo a
partir da formação por áreas, sem perder a especificidade dos conhecimentos disciplinares que compõem a
área?
Para fazer a reflexão sobre esta prática, no movimento em que ela se realiza as reflexões de autores como:
NÓVOA (1997), GÓMEZ (1997), ADORNO (2003) e LEFEBVRE (1983) são fundamentais. Do mesmo modo,
para a discussão mais específica do ensino da Geografia, autores como Douglas SANTOS (1995), Lana
CAVALCANTE (2002), Rui MOREIRA (2006), Ariovaldo Ubelino de OLIVEIRA (2003) e Odette SEABRA(1999),
também
estão
sendo
importantes
para
a
análise
sobre
o
ensino
da
geografia.
A experiência que estamos vivenciando, na elaboração da estrutura curricular do curso, é do diálogo com os
diferentes campos do conhecimento – Geografia, História, Filosofia e Sociologia – que compõem a Área de
Ciências Sociais e Humanidades, com o sentido de definir e circunscrever o eixo norteador das questões a
serem postas pela área, vem ocorrendo a partir do olhar ou dos olhares dos conhecimentos de cada
disciplina, mas numa perspectiva interdisciplinar.
AO161 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Costeira e Marinha
[1261] ASPECTOS FI SI OGRÁFI COS COSTEI ROS D AS PRAI AS AREN OSAS D A FAI XA OCEÂN I CA DAS
I LH AS D E SAN TA CATARI N A E SÃO FRAN CI SCO D O SUL, LI TORAL D O ESTAD O D E SAN TA
CATARINA, BRASIL.
NORBERTO OLMIRO HORN FILHO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL.
Resumo:
O presente trabalho tem por objetivo caracterizar do ponto de vista fisiográfico costeiro as praias arenosas da
faixa oceânica das duas maiores ilhas do litoral do Estado de Santa Catarina (ilha de Santa Catarina - ISC e
ilha de São Francisco do Sul - ISFS), de modo a correlacionar os aspectos geológicos, geomorfológicos,
texturais
e
ambientais.
A ilha de Santa Catarina localiza-se no litoral Central do Estado nas coordenadas geográficas de 27°22\'45\"
e 27°50\'10\"S e 48°21\'37\" e 48°34\'49\"W, na microrregião geográfica de Florianópolis, município de
Florianópolis. A ilha apresenta forma alongada na direção NE-SW sob regime de micro maré e uma
hidrodinâmica imposta pelo oceano Atlântico e baía de Florianópolis (baías Norte e Sul). A área é de 399
km²; perímetro de 174,3 km; comprimento máximo de 52,5 km; larguras mínima, média e máxima de 1,3
km,
7,6
km
e
18,8
km,
respectivamente
e
altitude
máxima
de
532
m.
A ilha de São Francisco do Sul localiza-se no litoral Setentrional do Estado nas coordenadas geográficas de
26°09\'42\" e 26°27\'05\"S e 48°29\'38\" e 48°42\'59\"W, na microrregião geográfica de Joinville, município
de São Francisco do Sul. A ilha apresenta forma triangular na direção NE-SW sob regime de micro maré e
uma hidrodinâmica imposta pelo oceano Atlântico, baía da Babitonga e canal do Linguado. A área é de 540
km²; perímetro de 94 km; comprimento máximo de 35 km; larguras mínima, média e máxima de 2,2 km,
9,2
km
e
16
km,
respectivamente
e
altitude
máxima
de
318
m.
O referencial teórico e conceitual do trabalho toma como base as definições geomorfológicas de ilha costeira
e praias arenosas. Do ponto de vista geológico, uma ilha costeira apresenta os tipos litológicos de seu
substrato muito similares àqueles encontrados na região continental, com os quais se mantiveram unidos
durante o tempo em que o nível médio do mar esteve em posição abaixo do atual (SUGUIO, 1992). Dentre
as diversas feições geomorfológicas de ilhas continentais se destacam as praias arenosas, constituídas de
depósitos inconsolidados dominados pela hidrodinâmica imposta pelas ondas, correntes, marés e ventos
associados atuantes sobre as condições geológicas e geomorfológicas antecedentes (SHORT, 1999).
A metodologia utilizada neste trabalho compreendeu uma revisão bibliográfica a par dos aspectos
fisiográficos das praias das ilhas mencionadas, baseado principalmente nos resultados apresentados por Horn
Filho (1997) para a ilha de São Francisco do Sul e Horn Filho (2006) e Horn Filho et al. (2007) para a ilha de
Santa
Catarina.
As principais questões e pontos a serem abordados no trabalho têm como pergunta essencial “As praias
arenosas da faixa oceânica das ilhas de Santa Catarina e São Francisco do Sul apresentam características
distintivas
do
ponto
de
vista
fisiográfico
costeiro”?
No que concerne a geologia do embasamento, na ilha de São Francisco do Sul predominam gnaisses,
migmatitos e granitos do Complexo Granulítico de Santa Catarina, enquanto que na ilha de Santa Catarina
predominam granitos, riolitos e diabásios. Em linhas gerais, as ilhas de São Francisco do Sul e Santa Catarina
apresentam histórias evolutivas semelhantes por estarem condicionadas aos mesmos eventos transgressivos
e regressivos do Atlântico sul durante o Quaternário (HORN FILHO et al., 1994). Na planície costeira de
ambas as ilhas predominam sedimentos dos sistemas deposicionais continental e litorâneo, compreendendo
os depósitos coluvial, lagunar, marinho praial, eólico, estuarino e paludial, de idades do Quaternário
indiferenciado,
Pleistoceno
superior
e
Holoceno.
A costa Leste das ilhas apresenta um total de 19 praias arenosas, sendo 13 praias na ilha de Santa Catarina
(Santinho, Moçambique, Barra da Lagoa, Prainha da Barra da Lagoa, Galheta, Mole, Gravatá, Joaquina,
Campeche, Morro das Pedras, Armação, Matadeiro e Lagoinha do Leste) e 6 praias na ilha de São Francisco
do Sul (Itaguaçu, Ubatuba, Enseada, Cais, Prainha, Grande). As praias apresentam formas em planta
diferenciadas, se destacando as praias alongadas (ex. praia Grande, ISFS); hiperbólicas (ex. praia da
Armação, ISC); artificial (praia do Cais, ISFS) e de bolso (ex. praia do Santinho, ISC).
Do ponto de vista textural, ocorrem entre os sedimentos praiais, areias grossas, médias e finas. Exemplo de
praias com sedimentos grossos são as praias do Morro das Pedras e Armação (ISC). Nas praias da ilha de
Santa Catarina (Gravatá, Joaquina, Campeche e Lagoinha do Leste) e nas praias Grande, Itaguaçu, Ubatuba
e Enseada (ISFS) predominam sedimentos médios e nas praias do Santinho, Galheta, Matadeiro (ISC) e
Prainha ou praia da Saudade (ISFS) predominam sedimentos finos, típicos de praias de bolso ou enseada.
Quanto ao desenvolvimento costeiro das praias da costa Leste das duas ilhas, observa-se que a faixa praial
da ilha de Santa Catarina tem sido mais ocupada quando comparada com a ilha de São Francisco do Sul. Os
balneários do Santinho, Barra da Lagoa, Mole, Joaquina, Campeche, Morro das Pedras e Armação são muito
procurados por turistas e residentes da ilha de Santa Catarina, o que torna a ocupação mais homogênea de
norte a sul. Na ilha de São Francisco do Sul, a ocupação se restringe ao extremo norte da faixa praial, onde
se destaca o crescimento urbano nas praias da Enseada, Ubatuba, Itaguaçu e Prainha. A praia Grande,
apesar de ser a mais extensa de todas as praias consideradas (22.250 m) foi identificada a menor ocupação
urbana,
típica
ainda
de
um
estágio
inicial
de
desenvolvimento
costeiro.
Conclui-se então que de um modo geral, as praias das ilhas de Santa Catarina e São Francisco do Sul
apresentam características geológicas, geomorfológicas e texturais similares, principalmente quando se
considera as praias do extremo norte da ilha de São Francisco do Sul e as praias da ilha de Santa Catarina.
Do ponto de vista oceanográfico-ambiental, a alta declividade do setor de ante praia da praia Grande (ISFS)
e dos setores central e norte das praias do Moçambique e Armação (ISC), provavelmente acarreta no baixo
percentual de ocupação urbana quando comparado com as demais praias das duas ilhas. Alia-se também o
fato de que o setor centro-sul da ilha de São Francisco do Sul não apresenta promontórios rochosos, o que
torna
a
praia
mais
monótona
e
sujeita
a
uma
maior
instabilidade
ambiental.
BIBLIOGRAFIA
HORN FILHO, N.O. O Quaternário costeiro da ilha de São Francisco do Sul e arredores, nordeste do Estado de
Santa Catarina - aspectos geológicos, evolutivos e ambientais. 1997. 312p. Tese (Doutorado em Geociências)
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Universidade
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Rio
Grande
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Sul,
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HORN FILHO, N.O.; LEAL, P.C.; OLIVEIRA, J.S. de. Atlas fisiográfico e sedimentológico das praias arenosas
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HORN FILHO, N.O.; GRÉ J.C.R; ABREU DE CASTILHOS, J.; DIEHL, F.L. Estudo geológico correlativo entre o
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Chichester,
1999,
379p.
SUGUIO, K. (Ed.). Dicionário de Geologia marinha: com termos correspondentes em inglês, francês e
espanhol. São Paulo: Biblioteca de Ciências Naturais/USP, 1992.
AO162 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Costeira e
Marinha
[1330] ALTERAÇÕES N O PERFI L N ATURAL D A ZON A COSTEI RA D A CI D AD E D E FORTALEZA, CEARÁ,
AO LONGO DO SÉCULO XX.
JOSÉ ALEGNOBERTO LEITE FECHINE.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ, FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
O objetivo deste trabalho é apresentar os processos morfodinâmicos, relacionados com as mudanças do perfil
natural da área costeira de Fortaleza, Nordeste do Brasil a partir do século XX. O estudo está individualizado
em duas faixas: SE/NO e L/O e possui uma extensão de aproximadamente 23 quilômetros, banhada pelo
oceano Atlântico a SE/NO e L/O. Situa-se entre as bacias hidrográficas dos rios Cocó e Ceará. O litoral de
Fortaleza é segmentado em dois setores pela presença da ponta natural, rochosa, do Mucuripe, de forma tal
que a área pode ser dividida em duas faixas: faixa SE/NO (Rio Cocó à Ponta do Mucuripe), com uma
extensão de aproximadamente 8km e faixa L/O (Ponta do Mucuripe até a foz do Rio Ceará), com uma
extensão aproximada de 15km de costa. Ecossistemas naturais e estruturas artificiais encontram-se
distribuídos ao longo das duas faixas. Na faixa SE/NO situa-se a foz do rio Cocó com manguezal e cordões de
beach-rocks, além de praias, das dunas da Praia do Futuro, o espigão do Titãzinho e o porto do Mucuripe; já
na faixa L/O, ocorrem praias com cordões de beach-rocks, a foz do riacho Maceió, as dunas do Mucuripe, o
calçadão da Beira-Mar, o calçadão da Praia de Iracema e respectivo aterro, a ponte Metálica, o Hotel Marina
Park, a Estação de tratamento de esgotos da CAGECE, a Avenida Leste Oeste, o pólo de lazer da barra e a
foz do rio Ceará, tomados por obras costeiras, ou seja, espigões e muralhas de proteção. A orla marítima foi
compartimentada levando em conta a extensão e a complexidade das paisagens, repletas de ambientes em
diferentes estados de degradação ambiental e envolvendo atividades sócio-econômicas e culturais das mais
variadas. Seguimos o princípio metodológico indicado pela análise geoambiental, que têm como diretriz
principal à análise integrada da paisagem, de forma a permitir uma concepção globalizante e funcional do
espaço, através do estudo das inter-relações entre os diversos elementos que a compõem – na pesquisa em
particular, ocupação da faixa litorânea, assoreamento, erosão e degradação dos atributos naturais do espaço
são os principais elementos abordados. A compartimentação da área de estudo em duas faixas
geoambientais foi realizada com base os elementos naturais, tomando-se como referência as
desembocaduras dos rios Cocó e Ceará, respectivamente situados à leste e a oeste da área de estudo. Tendo
o afloramento, na área central, a ponta rochosa do Mucuripe. Havendo Sistemas ambientais como campos de
dunas, foz dos rios com seus manguezais e faixa de praia, impactados por usos e ocupações diversas, foram
detalhados. Setores relacionados a obras de engenharia costeira e projetos de uso e ocupação da orla
marítima também foram analisados. As faixas analisadas são feições dinâmicas que vem sofrendo com o
avanço e recuo da linha de costa. Sua posição no espaço muda constantemente em várias escalas temporais
(diárias, sazonais, decadais, seculares e milenares). Desta forma, a faixa de praia de Fortaleza é afetada por
um número muito grande de fatores, alguns de origens naturais e intrinsecamente relacionadas à dinâmica
costeira (erosão costeira, variação relativa do nível do mar, dispersão de sedimentos), outros relacionados
com as intervenções humanas na zona costeira (obras de engenharia, drenagens, aterramento de praias,
construção de espigões, muros de contenção etc.). O impacto ambiental e as mudanças, naturais e
antrópicas, nestas áreas, são bastante consideráveis. Um exemplo prático é o intenso avanço da linha de
costa na faixa sudeste – noroeste (Praia do Futuro, Caça e Pesca e Serviluz.), com engorda do perfil praial.
Na faixa leste – oeste, ocorre um intenso recuo da linha de costa em direção ao continente (Praia do
Meireles, Praia de Iracema, Pirambu, Leste-Oeste e Barra do Ceará) vem ocorrendo. Estes processos se
deram anteriormente e posteriormente à construção da grande obra o Porto do Mucuripe, que veio alterar
drasticamente toda a dinâmica costeira da cidade de Fortaleza. Em toda a extensão dos 23km de zona
costeira e litorânea analisadas, foram encontradas os mais diversos tipos de construções e equipamentos,
desde zona portuárias, espigões, muros de contenção, hotéis, restaurantes, calçadões, barracas de praia,
edifícios para habitação da alta e média classe, emissário submarino e favelas. Diante de tal contexto,
verifica-se claramente o fato de não haver em Fortaleza faixa litorânea natural. Em seu lugar, ocorre um
ambiente marítimo extremamente antropogenizado. Os principais problemas ambientais detectados ao longo
do front marítimo da cidade são resultantes da ocupação da faixa praial, da construção sobre o campo de
dunas e da realização de obras costeiras que determinaram alterações na dinâmica local com conseqüências
ambientais desastrosas. Com efeito, em Fortaleza toda a zona de berma e o campo de dunas adjacente
foram ocupados pela população. Foram realizadas mais de 20 obras importantes nos 23 km de litoral ao
longo do século XX. Estas obras contribuem para modificar o perfil praial e equilíbrio dinâmico existente,
além de expulsar a população mais pobre para outros ambientes, com áreas extremamente urbanizada e
exposta a alterações drásticas no traçado e na dinâmica natural. Do ponto de vista natural, é inevitável
pensar no agravamento das condições ambientais para o futuro próximo, em função da pressão sobre os
recursos naturais ainda existentes, e da descaracterização dos atributos naturais litorâneos, sempre em
crescente processo. Do ponto de vista social e econômico, parece haver tendência nas próximas décadas
para que todo da orla marítima se transforme em área de elevado valor imobiliário, ocupada por hotéis e
edifícios de luxo, a fim de atender a demanda turística e habitacional de alta renda. Elitização e degradação
ambiental parecem ser esses os retratos básicos das alterações históricas na orla marítima de Fortaleza ao
longo do último século.
AO163 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Costeira e
Marinha
[1513] EVOLUÇÃO GEOM ORFOLÓGI CA E TI POLOGI A D O CAM PO D E D UN AS M ÓVEI S EN TRE AS
PRAIAS DE MORRO BRANCO E BARRA NOVA, BEBERIBE, CE.
MÔNICA VIRNA DE AGUIAR PINHEIRO; VANDA CLAUDINO-SALES.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ, FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
Esse trabalho tem como objetivo discutir a gênese e a evolução geomorfológica de campos de dunas, com
ênfase na tipologia, entre as praias de Morro Branco e Barra Nova, no Município de Beberibe, litoral leste do
Estado
do
Ceará.
As dunas são definidas como depósitos de areia quartzosa acumulados a partir do trabalho da dinâmica eólica
de erosão, transporte e deposição de grãos de areias. As dunas costeiras têm sua evolução associada
diretamente à dinâmica litorânea e têm como fonte predominante de sedimentos a faixa de praia (Silva e
Cavalcante,
2004).
Uma grande parte dos campos de dunas atuais encontram-se livres de vegetação, ou seja, são móveis e se
deslocam livremente na zona costeira. Contudo, ao encontrarem algum tipo de obstáculo poderão ter seu
deslocamento interrompido e serem fixadas pela vegetação e então, passarem para formas estabilizadas ou
fixas. Todas as dunas costeiras estabilizadas atualmente indicam terem tido alguma mobilidade no passado,
provavelmente
sob
regime
climático
diferente
do
atual
(Tsoar,
2003).
A metodologia utilizada para se alcançar os objetivos propostos apóia-se na perspectiva do Princípio do
Atualismo, que apóia-se na interpretação dinâmica dos processos atuais e na consideração de que estes,
submetidos às mesmas leis físicas, atuaram de maneira semelhante, todavia com intensidades variadas, ao
longo da história natural da Terra (Claudino-Sales, 2004). Associadas a esse princípio norteador, foram
utilizadas técnicas diversas, tais como: bibliográfica detalhada e específica do tema e do setor de estudos,
nos âmbitos da literatura científica nacional e internacional, análises de fotografias aéreas, imagens de
satélites, mapas temáticos em escalas variadas, associados a trabalhos de campo, com auxilio de
equipamento
técnico.
As dunas podem ser classificadas quanto a sua tipologia como móveis, semi-fixas, fixas, formas de deflação e
cimentadas (Claudino-Sales, 2002). Assim, identificamos e classificamos a morfologia das dunas presentes
na
área
em
tela
em:
dunas
móveis,
semi-fixas,
fixas
e
formas
de
deflação.
As formas móveis foram caracterizadas como longitudinais e lençóis de Areia ou Sandsheets. As dunas semifixas presentes são as dunas frontais e as nebkas. Também fazem parte do campo em tela, as dunas fixas
que nos aparece sem uma forma definida e as formas de deflação apresentando sua morfologia típica como
os
blowouts
e
os
rebdous.
As dunas longitudinais são formas móveis presentes na área de estudo em setores da planície de deflação,
localizadas na vanguarda dos lençóis de areia. Esse tipo de duna tem sua gênese associada a rastros de
migração, isto é, ao se deslocarem encontram obstáculos como, por exemplo, lagoas interdunares e vão
modificando suas formas deixando pra trás as marcas de sua pretérita passagem. Nesse caso, os tipos mais
comuns a deixarem rastros de migração são as dunas parabólicas ou barcanas através de suas pontas
alongadas.
Os lençóis de areia ou sandsheets, perfazem a maior parte da área e caracterizam-se por uma grande
quantidade de sedimentos, definidos na literatura científica como sem forma definida. Numa escala maior, os
lençóis de areia, são reconhecidos pela indefinição tipológica de suas dunas. Na área de estudo isso se deve à
quantidade de sedimentos acumulados em uma área restrita, cerca de 7 Km, pois, para a configuração de
uma tipologia de dunas uniforme, é necessária uma área extensa, o que não ocorre no setor estudado,
devido ao barramento efetuado pelo leito do rio Choró, situado no extremo oeste do campo de dunas.
As dunas semi-fixas caracterizam-se por apresentar-se parcialmente cobertas pela vegetação, possuindo
ainda uma certa mobilidade, daí sua denominação. As dunas frontais, localizadas próximas a foz do rio
Choró, apresentam-se como um alinhamento de dunas parcialmente vegetalizado paralelo à faixa de praia e
sua origem está associada a um acúmulo de sedimentos após a área de berma. Ocorre a colonização pela
vegetação,
condicionada
em
razão
da
maior
umidade
nessa
área
próximo
ao
mar.
A morfologia das dunas nebkas que pontilham quase todo campo de dunas sobre diferentes tamanhos,
representam montículos de areia cobertos pela vegetação de porte arbustivo. Seu tamanho pode variar,
aumentando tanto ao agregar mais grãos de areia a essa cobertura como pela contínua colonização da
vegetação.
As dunas fixas aparecem à retaguarda do campo móvel total ou parcialmente vegetalizadas, mas sem
nenhum tipo de mobilidade. As espécies de plantas pioneiras que as recobrem, são capazes de resistir à
aridez, altas temperaturas da superfície, ventos com considerável teor de salinidade, rajadas de areia e baixa
disponibilidade
de
nutrientes.
As formas de deflação são identificadas através dos blowouts. Eles correspondem a superfícies de dunas
erodidas pelo vento, com formas topográficas depressivo-côncava, em forma de concha, formada pela erosão
de uma duna ou substrato de areia pré-existente. Os blowouts são encontrados em ambiente de dunas
frontais, mas também, como apresentam-se na área de estudo, em ambientes de alta energia do vento como
as planícies de deflação. De acordo com sua dinâmica, podem evoluir para dunas do tipo parabólicas.
Os rebdous assim como os blowouts têm sua origem associada ao trabalho de deflação. Os morros de areia
semi-vegetalizados são esculpidos pelo trabalho contínuo dos ventos na zona costeira. No setor estudado
encontramos esse tipo de duna próximo a planície de deflação, onde os ventos atuam de forma mais
eficiente.
A partir dos procedimentos utilizados, pode-se, portanto, identificar e classificar os diferentes tipos de dunas
presentes no campo de dunas em estudo. A sequência da pesquisa indicará o contexto evolutivogeomorfológico da área, visando assim determinar a provável gênese desses principais tipos de dunas do
setor estudado.
AO164 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Costeira e
Marinha
[1535] BALAN ÇO H Í D RI CO: UM PARÂM ETRO CLI M ÁTI CO PARA O ESTUD O D A M OBI LI D AD E D E
DUNAS COSTEIRAS NO CEARÁ.
MÔNICA VIRNA DE AGUIAR PINHEIRO; MARTA CELINA LINHARES SALES.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ, FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
As dunas, como elemento geomorfológico de intensa dinâmica na zona costeira e litorânea do Estado do
Ceará,
apresentam
uma
relação
estreita
com
as
condições
climatológicas
presentes.
O objetivo desse trabalho é através da determinação do balanço hídrico subsidiar o estudo da dinâmica
costeira associado ao calculo do Índice de Aridez (IA) e relacioná-lo à mobilidade dos campos de dunas do
Ceará. Para o desenvolvimento da pesquisa, foram utilizadas técnicas básicas, que possibilitaram a
compreensão
do
balanço
hídrico
associado
à
dinâmica
costeira
na
área
de
estudos.
Foi realizada uma ampla revisão bibliográfica visando agregar os dados produzidos sobre a dinâmica litorânea
e costeira do setor de estudos, além de análises de imagens de satélite, catalogação, análise e
homogeneização dos dados meteorológicos adquiridos. O preenchimento de falhas dos dados de precipitação
fornecidos pela Sudene (1990), foi efetuado através do método elaborado por Tucci (1993). O balanço hídrico
e a evapotranspiração potencial e real foram calculados de acordo com o método de Thornthwaite e Mather
(1955),
através
do
software
livre
VAREJÃO
(1990).
As temperaturas médias mensais para os 24 postos localizados ao longo da costa cearense foram estimadas
com base em equações de regressões múltiplas, nas quais são consideradas as latitudes, altitudes e distância
para
o
mar.
A partir desse método do balanço hídrico foi elaborado um perfil climatológico do litoral cearense, levando em
consideração principalmente a precipitação, temperatura, evapotranspiração real e potencial. E
conjuntamente, a partir desses dados inferimos e analisamos o índice de aridez (IA) para o litoral do Ceará.
Durante o ano, a precipitação mantém um comportamento padrão que se inicia timidamente no mês de
dezembro, chovendo pouco mais de 50 mm. Essa chuva aumenta gradativamente até o efetivo inicio da
quadra chuvosa, mais precisamente em fevereiro e se estendendo até abril, onde pudemos perceber uma
visível
queda
dos
níveis
de
precipitação.
A partir desse período, no mês de junho começa o período de estiagem tendo como características os baixos
índices pluviométricos e um déficit hídrico considerável, observado através da expressiva diferença entre a
evapotranspiração
potencial
(EP)
e
a
evapotranspiração
real
(ER).
O déficit hídrico pode estar relacionado à mobilidade das dunas e sua escassa colonização pela vegetação,
pois o período com baixas precipitações se estende por vários meses, mais precisamente cerca de 6 meses, e
as altas temperaturas também vão influenciar essa baixa umidade na área, colaborando assim, para a
permanência
de
areias
mais
secas
durante
parte
do
ano
nos
campos
de
dunas.
O Índice de Aridez para o litoral cearense nos apresentou características de climas úmidos, pois esse índice,
calculado através de P/PET (quociente da média anual de precipitação (P) sobre o potencial anual de
evapotranspiração - PET), que representa o fator de umidade do solo disponível para a vegetação, < 0.65
define terras secas, definido pelo Programa Ambiental das Nações Unidas (UNEP) (Tsoar, 2003).
O Índice de Aridez para o litoral cearense indicou características de climas úmidos, ou seja, > 0.65. Somente
9 (nove) dos 24 postos apresentaram índice inferior a 0.65, dos quais somente 2 (dois) se encontram
efetivamente na zona litorânea. São eles os municípios de Guriú, localizado no extremo oeste do litoral
cearense,
e
Aracati
mais
a
leste.
Esses dados mostram que a umidade presente no litoral cearense, comprovada através desse índice, não irá
influenciar na composição da dinâmica sedimentar da área, pois mesmo com uma alta taxa de umidade, ao
nosso ver uma das principais causas dessa expressiva mobilização atual de dunas, está relacionada ao curto
período de chuvas e a um longo período de estiagem, associado à atuação dos ventos alísios de SE mais
intensos
e
efetivos
durante
todo
o
período
mais
seco
do
ano.
Podemos concluir então que, de acordo com o Balanço Hídrico e o Índice de Aridez inferidos para o litoral do
Ceará, é possível observar em primeiro lugar que, com o balanço hídrico pode-se analisar a relação entre a
precipitação e a evapotranspiração e assim identificar um expressivo déficit hídrico durante o período de
estiagem colaborando desta forma com a mobilidade de dunas durante esse período.
Em segundo lugar, a partir do Índice de Aridez obter informações a respeito da umidade do litoral cearense
associando a mobilidade de dunas, ou seja, esse parâmetro por si só, não é suficiente pra compreensão da
dinâmica costeira, devendo ser portanto, associado à distribuição sazonal das precipitações.
AO165 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Costeira e
Marinha
[1640] CARACTERIZAÇÃO D OS ASPECTOS FÍ SI COS E D A D I N ÂM I CA COSTEI RA D O TRECH O PRAI AL
ENTRE AS PRAIAS DO SEIXAS E CABO BRANCO, JOÃO PESSOA/PB.
SEVERINO DOS RAMOS ALVES DA SILVA; MARCELO DOS SANTOS CHAVES.
UFPB, JOÃO PESSOA, PB, BRASIL.
Resumo:
A zona costeira brasileira tem como aspectos distintivos a sua extensão, com mais de 7400 km, não
observando as enseadas, baías, cabos, ilhas ou outras formações praiais, mais a sua grande variedade de
espécies e de ecossistemas, que podem ser encontrados ao longo de sua costa. Neste contexto a linha de
costa é uma das feições mais dinâmicas do planeta, podendo variar a sua forma de acordo com a
interferência humana e também sua própria dinâmica natural extremamente ativa, a sua geologia mais a
variação do nível relativo do mar que determinam o desenho da linha de costa dependendo ainda, da
disponibilidade local do material sedimentar do ambiente praial. O Estado da Paraíba localizado na região
Nordeste do Brasil possui um litoral com aproximadamente 150 km de extensão. João Pessoa, sua capital,
ocupa a parte centro-sul deste litoral, com uma extensão que se aproxima de 25 km, com a divisa do seu
litoral, norte e sul, entre as praias de Bessa (norte) e Barra de Gramame (sul). Nestes litorais são
perceptíveis as diferenças físicas, sendo o norte uma extensa faixa de planície litorânea holocênica entre o rio
Paraíba e o oceano Atlântico, e o sul com extensas áreas de falésias vivas e mortas, com diferenças na
morfologia, ora apresentando áreas de deposição, ora apresentando áreas de erosão na linha de costa em
ambos os sentidos geográficos. Assim, este trabalho é o resultado de uma análise inicial, cujo interesse
partiu da necessidade de estudar um ambiente praial, para contemplar uma área onde foi desenvolvido um
projeto de pesquisa que foi apresentado, à Comissão Julgadora da Coordenação do Mestrado em Geografia
da Universidade Federal da Paraíba, e aprovado. Teve como objetivo, verificar no litoral do município de João
Pessoa – PB, a dinâmica costeira, enfocando o uso e ocupação do ambiente praial, no trecho compreendido
entre a praias do Seixas, na latitude 07° 09’ 19’’S e longitude 34° 47’ 35’’W, e a praia de Cabo Branco,
latitude 07° 08’ 696’’S e longitude 34° 48’ 742’’W, perfazendo aproximadamente 2,0 km, analisando os
aspectos físicos, os processos de uso e ocupação e as relações sócio-culturais e sócio-econômicas nela
desenvolvidas, conferindo a vulnerabilidade e degradação já existentes, uma vez que é sabido que João
Pessoa teve uma dinâmica de ocupação que a difere das demais capitais litorâneas do Nordeste, pois a
mesma foi fundada no interior, as margens do rio Sanhauá, em 1585, e cresceu lentamente para o litoral, e a
partir da segunda metade do século XX teve o processo de ocupação em seu litoral intensificado. Para tanto
foi verificado nas praias do Seixas e Cabo Branco a relação homem-ambiente e a interação com a
Geomorfologia, utilizando autores da Geografia e de áreas afins. Nesta perspectiva, utilizamos (ALMEIDA,
1989); (CHAVES, 2005); (MABESOONE & CASTRO, 1975); (MABESSONE & SILVA, 1991); (MENESES et al;
2006); (MUEHER in CUNHA & GUERRA, 2002; GUERRA & CUNHA, 2003; CUNHA & GUERRA, 2003);
(PALMIERE & LARACH in GUERRA & CUNHA, 2004); (TRAVASSOS, 1980). A metodologia utilizada consistiu
além de um levantamento bibliográfico, cartográfico e documental, utilizando autores da Geografia e de
áreas afins, consultas a sítios oficiais na internete, na busca de interpretar as informações que foram obtidas
com as coletas de dados básicos nos trabalhos de campo, como também procedimentos para a determinação
de parâmetros de ondas (monitoramento hidrodinâmico), criados por Muehe in Cunha & Guerra (2003). A
área escolhida tem como principal característica a forte presença humana ocupando a linha de costa, sendo
que ao norte da falésia onde o processo de ocupação é mais antigo, possui construções de alvenaria e menos
terrenos desocupados, e ao sul há uma forte presença de pequenos comerciantes (barraqueiros) que se
encontram em dificuldades com a progressiva erosão da linha de costa, onde é sentida a força das ondas nas
marés altas, quando estas atingem os barracos que servem, além de ponto comercial, moradia para alguns
comerciantes. A hidrologia é marcada por uma forte presença de pequenas bacias, fazendo com que o
tabuleiro da ponta do Cabo Branco funcione como interflúvio, e tendo as suas vertentes a oeste uma
suavemente inclinação, sendo assim, o percurso natural das águas fluviais que abastecem esses rios. O clima
que predomina na área como em todo o litoral da Paraíba é o tropical úmido. A geologia é caracterizada
como bacia sedimentar marginal, e apresenta depósitos sedimentares das formações: Beberibe (sobre o
embasamento cristalino), Gramame e Maria Farinha (calcário), e se sobrepondo a estas, encontramos a
formação Barreiras. As feições geomorfológicas encontradas são modeladas nas rochas sedimentares da
Formação Barreiras e são: as falésias vivas e mortas, uma estreita planície costeira predominantemente
quartzosa, e um largo terraço de abrasão, mais beach rocks que aparecem nas marés baixas, como formas
visíveis predominantes. Com base no cruzamento das informações, pôde-se constatar no decorrer deste
estudo que: a área estudada passa por um processo de reajuste morfológico, onde aparentemente o mar
está buscando de maneira progressiva, construir um novo perfil, redesenhando a linha de costa, que sem a
intervenção antrópica, retroagirá em relação ao nível de base. A situação atual dos moradores das
construções regulares sobre a pós-praia é de tentativa de contenção do “avanço do mar” e os barraqueiros
na maioria vindos do interior não possuem outro local para fixação, caso o poder público não se manifeste no
sentido de buscar uma ré-colocação. Assim, o resultado significativo que podemos apresentar com este
trabalho, é o de contribuir com informações a partir desta análise inicial dos processos naturais, que atuam
neste ambiente praial onde está inserida a falésia da Ponta do Cabo Branco, e através do monitoramento
sistemático que será realizado, dando seguimento a esta pesquisa.
AO166 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Costeira e
Marinha
[2004] AN ÁLI SE D AS I N FLUÊN CI AS AN TRÓPI CAS E N ATURAI S N A QUALI D AD E AM BI EN TAL D O
ESTUÁRIO DO RIO PIRAGI- CE, BRASIL.
DAVIS PEREIRA DE PAULA; LIDRIANA SOUZA PINHEIRO.
UECE, FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
As zonas litorâneas com presença de estuários são ambientes nos quais os impactos antrópicos tem causado
uma grande multiplicidade de alterações. Eles são considerados como locais ideais para o desenvolvimento
industrial, portuário e agrário devido à quantidade abundante de água que dispõem por serem regiões que
sofrem influências marinhas e fluviais. O estuário do Rio Pirangi, área em apreço nesse estudo, localiza-se na
Região Nordeste do Brasil, vem nos últimos anos, sendo bastante procurado para implantação de
empreendimentos de carcinicultura e barramentos ao longo do canal estuarino. O objetivo precípuo deste
trabalho foi avaliar a qualidade ambiental e uso potencial do estuário através da integração de dados obtidos
in situ de hidrodinâmica, morfodinâmica, sedimentológia, uso e ocupação e parâmetros físicos do estuário,
constribuindo com o desenvolvimento de uma metodologia de gerenciamento e manejo sustentável aplicado
ao desenvolvimentode regiões estuarinas. Estuários são corpos de água costeira, semifechados e que
apresentam uma conexão livre com o oceano e no qual a água do mar ou a salinidade é diluída pela água
doce oriunda da drenagem do continental (PRITCHARD, 1955, CAMERON & PRITCHARD, 1963 apud MIRANDA
et. al., 2002). Neste caso, o balanço de água é resultante da soma das cargas que chegam ao estuário
através das precipitações (P) e descargas fluviais (Qf) e subtraídas do volume de água que é transferido para
atmosfera por evaporação (E). Estuários são ambientes costeiros de vida efêmera no tempo geológico,
presentes durante épocas de elevação relativa do nível do mar, quando atuam como depósitos efetivos dos
sedimentos fluviais, não permitindo que estes sedimentos cheguem à região da plataforma continental
(MILLIMAN E EMERY, 1958). Portanto, os estuários atuam como verdadeiros filtros retendo os sedimentos em
sua área de deposição. Além dos sedimentos continentais trazidos pelos rios, estuários também recebem
sedimentos da região da plataforma interna e de áreas costeiras adjacentes, trazidos pela deriva litorânea e
caracterizam-se por apresentarem no interior dos sistemas zonas de mistura (PATCHINEELAM, 2000). Os
estuários podem ser classificados em quatro grupos principais de acordo com sua geomorfologia: estuários
de planícies costeiras, estuários constituídos por barra, Fiordes e estuários causados tectonicamente
(PRITCHARD 1925b; DYER 1973). Considerando que o comportamento climático é praticamente homogêneo
e com variação temporal bem marcada no Estado do Ceará, optou-se por trabalhar com as condições
extremas do ponto de vista da hidrodinâmica, salinidade, amplitude de marés, ondas, temperatura, ventos e
contribuição fluvial permitindo avaliar com mais precisão o grau de permanência sazonal do sistema
estuarino. As medições foram efetuadas em 6 estações de monitoramento de modo a torná-las
representativas. Essas estações foram definidas de acordo com os padrões de circulação estuarina, o uso e
ocupação e a geometria do estuário. Nas medições de velocidade e direção das correntes utilizou-se um
correntômetro MOD.SD-30 Sensor Data. Para caracterizar as marés foi instalado um marégrafo mecânico no
interior do estuário. Os dados referentes à salinidade, temperatura, condutividade e oxigênio dissolvido
foram obtidos por um perfilador CTD (Sensor Data). As coletas foram realizadas desde a superfície até o
fundo com intervalo de 5 cm de profundidade. Os estuários localizados no Estado do Ceará apresentam como
grande peculiaridade a presença de barramentos ao longo dos canais fluviais e estuarinos que controlam o
desperdício de água doce para o interior do sistema, porém as construções dessas barragens sem a devida
consonância com o grau de suporte destes ambientes provocam uma série de alterações físicas, químicas e
biológicas que resultam em inúmeros impactos a jusante dessas construções. Outra questão crucial que
atinge os estuários cearense é o desenvolvimento da carciniculta de forma não sustentável que ocasiona
diversos impactos, tais como: desmatamento do manguezal, da mata ciliar e do carnaubal, extinção dos
trechos de apicum, soterramento de gamboas e canais de maré, e contaminação da água por efluentes dos
viveiros. A morfologia do sistema estuarino do Rio Pirangi é bastante complexa, principalmente na região da
desembocadura, onde existem extensos bancos de sedimentação e canais de navegação com baixas
profundidades. Na região da foz o canal estuarino apresentou uma largura média de 219,6 m e profundidade
média de -1,6 m. O Estuário do Rio Pirangi apresenta as características sedimentológicas clássicas de um
sistema estuarino tropical. No período chuvoso observou-se que a foz estuarina encontrava-se recoberta por
sedimentos arenosos, ocupando uma faixa que se estendia, a partir do mar, por cerca de 5,0 km de
extensão. A estrutura halina do estuário do Rio Pirangi obedece à sazonalidade climática inerente a região,
onde no período no período de estiagem a salinidade média no estuário foi de 21,3 e no período de chuva 6,4
ocorrendo uma redução na intrusão salina de 69,9%. Essa redução é conseqüência do maior aporte de água
doce circulando no interior do sistema e promovendo a diluição da maré salina pela drenagem continental. A
partir dos dados descritos acima foi constatado que durante o período de estiagem o estuário do Rio Pirangi
foi classificado como verticalmente bem misturado ou homogêneo. Outra característica peculiar e relevante
deste estuário é sua morfologia formada por canais estreitos e uma descarga fluvial pequena. A partir das
geoinformações discorridas podemos afirma que as barragens presentes no estuário do Rio Pirangi estão
afetando diretamente os padrões de circulação e sedimentação ao longo do canal estuarino. Além dessas, as
formas de uso e ocupação como a carcinicultura presentes ao longo das margens vêm contribuindo
significativamente para diminuição do grau de suporte a erosão.
AO167 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Costeira e
Marinha
[2103] ASPECTOS TERMOPLUVIOMÉTRICOS DO LITORAL DO ESTADO DO PARANÁ.
FELIPE VANHONI JORGE.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANA, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
O estudo do tempo atmosférico e do clima é há muitos anos objeto de curiosidade e de pesquisas em
diferentes regiões do planeta, pois exercem grande influência nas atividades humanas, desde o modo de vida
até o ar que respiramos. O Brasil devido a sua grande extensão territorial possui diferentes regimes
climáticos e apresenta condições bastante diversificadas e influenciadas pela sua configuração geográfica,
sua significativa extensão costeira, seu relevo e pela dinâmica das massas de ar que atuam sobre seu
território. A área costeira brasileira compreende uma faixa de cerca de 8,5 mil km de extensão e largura
variável. O Litoral do Estado do Paraná está localizado na Região Sul do Brasil entre as latitudes 24º30`S e
26º00`S e longitudes 48º00`W e 49º00`W, correspondendo a Planície litorânea e parte da Serra do Mar. O
clima da planície litorânea paranaense, segundo a classificação de Koeppen, é do tipo Cfa, subtropical úmido
mesotérmico com verão quente. O mesmo tipo climático ocorre na Serra do Mar até 700 m de altitude, a
partir da qual passa para tipo Cfb, subtropical úmido mesotérmico com verão fresco. Este trabalho tem como
objetivos analisar as características climáticas do Litoral levando em consideração a influência dos fatores
estáticos e dinâmicos a partir das seguintes etapas. A primeira caracterizou-se pela fundamentação teórica
do objeto do estudo. A segunda etapa caracterizou-se pela coleta dos dados, sendo que as variáveis
utilizadas foram a temperatura do ar (mínima, média e máxima) e pluviosidade. Os dados foram tratados
estatisticamente e depois organizados em um banco de dados, sendo que os mesmos correspondem em sua
maioria a um período de 30 (trinta anos) numa escala temporal estabelecida entre 1975-2004. Foram
coletados dados mensais e diários de temperatura e pluviosidade junto ao INMET (Instituto Nacional de
Meteorologia) e IAPAR (Instituto Agronômico do Paraná), e dados mensais e diários de pluviosidade junto à
SUDERHSA (Superintendência de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental),
totalizando 21 (vinte e uma estações). Do total das estações, 04 (quatro) apresentam dados de temperatura
e todas as 21 (vinte e um) apresentam dados pluviométricos. A espacialização dos dados representou a
terceira etapa da pesquisa. A última baseou-se na análise dos resultados chegando a partir dos objetivos na
caracterização climática do Litoral do Paraná. Em relação aos resultados pode-se considerar que as médias
da temperatura média anual ficam entre 19º e 21ºC na planície litorânea diminuindo nas regiões mais altas.
Nas Serras e Morros, a média anual fica entre 15º e 17ºC, chegando a menos nas altitudes elevadas. O
período mais quente é representado pelos meses de dezembro, janeiro e fevereiro sendo que este último se
destaca como o mais quente entre os três. O período de menores temperaturas é representado pelos meses
de junho, julho e agosto sendo que o mês de julho é o que apresenta a menor média de temperatura. No
inverno é que se identificam as menores médias, devido aos fatores climáticos dinâmicos que afetam a região
neste período como a Frente Polar Atlântica (FPa). Nota-se a grande influência do relevo na determinação
das médias (anual e sazonal) das temperaturas para o litoral, além de outros fatores como a diferença de
pressão e a maritimidade. A média pluviométrica anual no litoral do Paraná é de 2435,8mm, sendo que o
máximo é registrado na estação Véu de Noiva (2548002) na Serra do mar com média de 3465,4mm, e o
menor valor é registrado na estação de Morretes (2548038) com média de 1958,7mm. Os dados
excepcionalmente altos do Véu de Noiva, situada a 680 m de altitude, são explicados pela sua localização
num vale profundo, com orientação favorável para a penetração das massas de ar provenientes do oceano.
Na faixa litorânea se verifica um máximo acentuado de pluviosidade no verão, recebendo nesta época do ano
a atuação predominante da Massa Tropical Atlântica, o aquecimento basal e acentuação de instabilidade da
massa de ar fomentada pelo efeito orográfico do sistema atlântico. Em relação às médias pluviométricas
sazonalmente estabelecidas, nota-se que a maior média concentra-se no verão, sendo que a média no litoral
fica em torno de 1000 mm nas áreas mais altas e parte da Planície de Guaraqueçaba, e cerca de 800 mm nas
demais áreas. No outono a média varia entre 500 e 800 mm/ano, sendo que na Serra do Mar é que se nota
uma média maior entre 700 e 800 mm. O inverno representa o período das menores médias para a região,
sendo que varia de 300 a 400 mm/ano. Na primavera a chuva se distribui com maior homogeneidade sendo
que a média fica entre 500 e 600 mm, variando nas áreas mais altas chegando a 1031,5 na estação Véu de
Noiva. O período com maior intensidade pluviométrica está compreendido nos meses de verão principalmente
nos meses de janeiro e fevereiro, tendo como média aproximadamente 350mm/ano somente no mês de
janeiro. O período com menor média pluviométrica é o inverno, principalmente no mês de agosto onde a
média fica em torno de 80 a 150 mm. O mês com maior número médio de dias com chuva no mês é janeiro
com uma média de 20 (vinte) dias com chuva, sendo este mês também o mais chuvoso. Além de janeiro, os
meses de dezembro, fevereiro e março também apresentam médias superiores a 18 (dezoito) dias com
chuva. O mês com menor número de dias de chuva é o de Junho com média de 11 (onze) dias de chuva.
Outros meses como julho e agosto também apresentam baixos índices de dias com chuva. A maior
quantidade de chuvas no trimestre mais quente (dezembro, janeiro e fevereiro), é atribuída à conjugação de
dois fatores dinâmicos: maior freqüência de frente polar motivada pela maior freqüência de semiestacionamentos sobre o Paraná, nesta época, e pelas ocorrências de chuvas de convergência trazidas pelas
correntes perturbadas de oeste. O litoral não apresenta um período seco e em relação às variáveis que
possam de um modo geral interferir no comportamento pluviométrico, reconhece-se que estas são o
resultado da circulação atmosférica, em conjunto com outros elementos dinâmicos e estáticos, como a
influência do oceano e da Serra do Mar. Com referencia às relações causais dos atributos climáticos,
observou-se a estreita e importante relação entre: a altitude e a temperatura, a influência oceânica no
controle climático imprimindo na região uma pequena amplitude térmica, a influência dos fluxos e das frentes
polares na ocorrência de chuvas. . Pode-se dizer que o principal elemento regionalizador do clima do litoral e
da
Serra
do
Mar
no
Paraná
é
a
temperatura.
Palavras-chave: clima, litoral, dinâmica
AO099 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Espaço e Movimentos
Sociais
[1628] RED ES REGI ON AI S D E I N TERVEN ÇÃO SOCI OAM BI EN TAL N O BRASI L: ARTI CULAÇÕES
TRANSTERRITORIAIS.
SONIA AGUIAR LOPES1; CIDOVAL MORAIS DE SOUSA2.
1.UFF, NITERÓI, RJ, BRASIL; 2.UEPB, CAMPINA GRANDE, PB, BRASIL.
Resumo:
1.
Objetivo
Discutir uma proposta de agenda de pesquisa interdisciplinar e interinstitucional para um campo empírico
ainda pouco investigado pelas ciências humanas e sociais no Brasil: as redes sociais de ONGs e movimentos
sociais que promovem intervenção socioambiental em âmbito regional, indicando os aspectos em comum que
possam
nortear
os
estudos
a
serem
desenvolvidos.
2.
Referencial
teórico
e
conceitual
A proposta parte da análise de recentes revisões de literatura sobre “a questão regional” e de abordagens
sobre as noções de “territorialidade”, “supraterritorialidade” e “transterritorialidade” para discutir a atuação
de redes sociais brasileiras com foco socioambiental em espaços geográficos e/ou geopolíticos
estrategicamente
delimitados.
A atuação dessas redes é observada como experiências de “reapropriação social da natureza” (Leff) e de
intervenção socioambiental, que pressupõem um padrão específico de produção compartilhada de
conhecimento e saberes, e de ação comunicativa (Habermas). Levam-se em conta, também, atributos de
interação
e
de
construção
de
vínculos
da
análise
de
redes
sociais.
Pelo seu escopo, uma agenda de pesquisa nesse campo passa, necessariamente, pela articulação de
conceitos e teorias que vêm sendo produzidos no âmbito de diferentes disciplinas (Geografia, Economia,
Ciência Política, Sociologia do Conhecimento, Ciência da Informação, Comunicação) e por debates científicos
transdisciplinares, como os da “epistemologia ambiental” e da “racionalidade ambiental” propostos por
Enrique Leff, e o da complexidade, nas concepções de Edgar Morin, Alberto Melucci e Tomas Villasante.
3.
Metodologia
utilizada
Além da análise teórico-conceitual, o trabalho utiliza documentos institucionais para fazer uma abordagem
exploratória de quatro redes sociais brasileiras, selecionadas a partir dos seguintes critérios: a) serem
articuladas e “operadas” pela participação colaborativa entre organizações sem fins lucrativos e movimentos
sociais com inserção local e/ou regional; b) delimitarem a sua atuação em territórios claramente explicitados;
c) terem propósito de intervir nas condições socioambientais dos territórios em que atuam; d) apoiarem suas
ações em conhecimento gerado por seus participantes e/ou colaboradores; e) utilizarem meios de
comunicação próprios e/ou de parceiros para divulgar suas ações e intervir no discurso público sobre temas
socioambientais
pertinentes
à
sua
territorialidade.
GTA – Grupo de Trabalho Amazônico: articulação iniciada em 1992 e atualmente organizada em 18 coletivos
regionais distribuídos pelos nove estados da Amazônia Legal. Reúne cerca de 600 ONGs e movimentos sociais
de agricultores, seringueiros, indígenas, quilombolas, quebradeiras de coco babaçu, pescadores, ribeirinhos,
além de entidades ambientalistas, de assessoria técnica, de comunicação comunitária e de direitos humanos.
A localização dos coletivos não obedece a um critério territorial homogêneo mas a “percepções”
socioespaciais
estratégicas
para
a
rede.
Rede Pantanal de Ongs e Movimentos Sociais: nasceu em 1994, a partir da mobilização de cerca de 100
entidades contra o mega projeto da Hidrovia Paraná-Paraguai (cancelado em 1998), que colocaria em risco
várias áreas úmidas, inclusive o Pantanal. Hoje se apresenta como uma coalizão de mais de 300
organizações, entre comunidades indígenas, populações tradicionais, ONGs, sindicatos e pesquisadores. Sua
coordenação geral é formada por 13 entidades da Argentina, Brasil, Bolívia, Paraguai, Uruguai, Holanda e
Estados Unidos, que identificam prioridades, definem atividades, negociam estratégias comuns e
compartilham
informações.
ASA – Articulação no Semi-Árido Brasileiro: atua desde 1999 na região que se estende dos estados do
Nordeste ao norte de Minas Gerais e do Espírito Santo, e congrega cerca de 750 entidades, entre ONGs de
desenvolvimento e ambientalistas, associações de trabalhadores rurais e urbanos, associações comunitárias,
sindicatos e federações de trabalhadores rurais, movimentos sociais e organismos de cooperação
internacional. Sua meta de construir um milhão de cisternas na região funciona como um “mote” para o
debate e busca de alternativas sobre recursos hídricos, desertificação e produção do biodiesel através do
cultivo
de
oleaginosas.
Fórum Permanente de Defesa do Rio São Francisco: criado em 2000, como parte do processo de mobilização
para implantação do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, congrega cerca de 60 entidades. O
Fórum constrói propostas coletivas para revitalização e preservação das condições socioambientais da Bacia
(que corta Bahia, Minas Gerais, Alagoas, Sergipe, Pernambuco e Goiás). Para isso conta com a assessoria de
engenheiros e advogados de instituições públicas, que analisam os aspectos técnicos e jurídicos dos projetos
governamentais
relacionados
à
revitalização
e
transposição
da
Bacia.
5.
Principais
questões
/
pontos
desenvolvidos
O trabalho identifica os aspectos em comum dessas redes, em termos das relações socioespaciais
construídas, dos atores e disputas envolvidos, e dos saberes socioambientais que orientam e dão suporte às
suas ações. Procura problematizar, ainda, as relações com o poder público nos processos de monitoramento
dos conflitos ambientais, e de participação e/ou intervenção nas instâncias decisórias sobre meio ambiente.
6.
Resultados
alcançados
e
conclusões
O trabalho constata uma lacuna de investigação científica no Brasil que articule conceitos e noções
importantes da Geografia (como região, regional, território e socioespacialidade) com uma visão crítica da
Sociologia do Conhecimento sobre a produção de saberes e sua aplicação nas práticas de ação coletiva de
redes de ONGs e movimentos sociais. Em função disso, procura evidenciar o potencial de estudos
interdisciplinares que envolvam pesquisadores e estudantes de instituições acadêmicas inseridas na mesma
territorialidade dessas redes.
AO100 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Espaço e Movimentos
Sociais
[1726] REFLEXÕES SOBRE OS CON FLI TOS TERRI TORI AI S N A SOBREPOSI ÇÃO D E UN I D AD ES D E
CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS.
LELIO POLESSA MAÇAIRA; LUIZ JARDIM WANDERLEY.
UFRJ, RIODE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
De acordo com a legislação brasileira, o Estado tem o dever de desapropriar os moradores existentes nas
Unidades de Conservação de Proteção Integral (UPI), como os Parques Nacionais e Reservas Biológicas,
procurando recriar nestes espaços uma primeira natureza, a natureza intocada (DIEGUES, 2000). A primeira
natureza não está presente em parte alguma da superfície terrestre, o que existe atualmente é uma segunda
natureza, resultado das ações humanas no espaço geográfico (SANTOS, 1996). As áreas naturais protegidas
de uso restrito refletem uma forma emblemática de relação entre seres humanos e a natureza, na qual o
Estado impõe sobre o território das populações tradicionais, outra lógica espacial tida como sustentável,
moderna e pública. A institucionalização de UPIs envolve uma série de conflitos de interesses entorno dos
direitos das populações tradicionais, ao conceber uma natureza separada da sociedade, ou seja, a ação
humana é entendida como algo negativo ao ecossistema a ser preservado. Sendo assim, torna se de
fundamental importância discutir os conflitos provocados pela sobreposição entre Unidades de Proteção
Integral e territórios de populações tradicionais e o conseqüente rompimento da interação destes grupos com
a natureza. Devido à enorme gama de populações tradicionais e seus direitos reconhecidos, nos ateremos à
problematica
específica
das
populações
remanescente
de
quilombos
em
UPIs.
As populações tradicionais, em geral, utilizam a terra e os recursos naturais coletivamente por gerações, com
técnica de baixa agressão ao ambiente e voltada para subsistência. No entanto, com a sobreposição de UPIs
a territórios tradicionais, as populações que permanecem em suas terras acabam criminalizadas ao explorar
os recursos naturais dos quais dependem para promoveram seu “modo de vida”. Assim, os territórios sobre
os quais detinham domínio passam a ser geridos e controlados por outros atores, representados pelos órgãos
estatais ambientais, como o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
Este processo nos permite promover um paralelo com o cercamento dos campos na Europa entre os séculos
XVI e XIX, os chamados enclosures, quando por meio da apropriação privada dos feudos e das terras comuns
o capitalismo se originou, proletarizando o camponês, privando-os de produzirem seu próprio meio de
subsistência e destruindo sua economia natural (SILVA, 1996). Do mesmo modo, a sobreposição entre
Unidades de Conservação e territórios quilombolas, quebra os laços construídos nesta economia natural,
alterando drásticamente a relação entre as comunidades negras e o uso comum da terra.
Para discutirmos esta sobreposição propusemos resgatar o artigo de Marx (1842) sobre a Lei do Roubo de
Madeira na Prússia, que provocou a criminalização dos camponeses que dependiam da coleta da madeira
caída no chão para sua sobrevivência. Segundo Foster (2005) - sociólogo que discutiu a existência de uma
raiz ecológica na concepção marxiana - Marx foi buscar munição para tratar a questão da criminalização do
roubo de madeira na economia política, que se apresenta como um referencial pertinente para abordamos
também a sobreposição entre as UPIs e os territórios quilombolas. Na Europa, os camponeses tinham,
tradicionalmente, o direito de recolher a madeira para uso cotidiano e foram impedidos em função da
instituição do sistema de propriedade privada e o desenvolvimento do capitalismo. De forma semelhante, no
Brasil a reprodução quilombola se vê impossibilitada na medida em que lhe são amputadas suas terras
comuns.
Este trabalho está organizado em três seções. Na primeira, desenvolvemos em termos conceituais e teóricos
a problemática da sobreposição de UPIs a territórios tradicionais. Na segunda, aplicamos a abordagem
proposta na análise da sobreposição das UPI aos territórios quilombolas, utilizando como fonte principal a
pesquisa bibliográfica sobre o tema e a análise documental dos diferentes instrumentos políticos e legais
instituídos no Brasil, tanto sobre legislação de áreas protegidas, quanto sobre direitos territoriais
quilombolas. Finalmente, na terceira seção, à guisa de conclusão, apresentamos uma reflexão geral sobre as
conseqüências dessa sobreposição na relação das populações quilombolas com a natureza.
O impasse entre UPIs e territórios quilombolas não é só no uso, mas sobre o que se deve preservar: o
patrimônio cultural e um pretenso patrimônio natural. Apontando para o fato de que ao mesmo tempo em
que a legislação ambiental não permite a existência de nenhum tipo de ocupação no interior das UPIs, os
quilombolas por lei detém o direito a permanência e titulação das áreas que ocupam. Esta é um peculiaridade
da discussão entorno da sobreposição entre UPI e comunidades quilombolas. Os quilombolas são grupos que
tem uma característica jurídica própria dentro da classificação populações tradicionais (SANTILLI, 2004).
Desde a constituição brasileira de 1988, por meio do artigo 68, é reconhecido o direito de titulação aos
remanescentes de comunidades de quilombos. Não é raro que as terras e até mesmo os quilombolas sejam
vistos como remanescentes sócio-territoriais, que remetem ao passado do Brasil e de um grupo que fora
oprimido e tivera uma organização social própria como resistência ao sistema colonial escravista. Por isso,
com a lei que dá direito a terra aos quilombolas, esse grupo esteve vinculado a Instituição Palmares do
Ministério
da
Cultura
e
não
ao
órgão
regularizador
fundiário.
A conseqüência da sobreposição é a criminalização do uso do território e a exclusão social pela ausência de
políticas públicas, de direitos e necessidades básicas, que finalmente leva ao abandono do seu espaço vivido,
deste modo, tem-se como resultado sua inexorável desterritorialização. Os negros não perdem somente seus
territórios vitais, no melhor sentindo ratzeriano (que lhe permite a sobrevivência), mas perdem também seus
espaços de significado, de história e de identidade.
AO101 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Movimentos Sociais
[1862] CURSI N H OS ALTERN ATI VOS E POPULARES: M OVI M EN TOS TERRI TORI AI S D E LUTA PELO
ACESSO AO ENSINO PÚBLICO SUPERIOR NO BRASIL.
CLOVES ALEXANDRE CASTRO.
UNICAMP, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
Os Cursinhos alternativos e populares por meio dos processos que os constituíram, contados por seus atores
é o enfoque desse trabalho. Educadores populares, estudantes, agentes de pastorais, movimento negro e um
terreno bastante fértil oriundo dos movimentos populares das décadas passadas contribuíram para dar
expressão aos Cursinhos pré-vestibulares alternativos e populares disseminados, hoje, em todo país.
Apresentam-se assim como alternativa econômica aos “fast food” da educação e como alternativa política a
projetos educacionais que têm como centralidade a reprodução de valores da sociedade competitiva do
capital e suas avaliações pautadas em análises “meritocráticas”, as quais não revelam com fidelidade as
potencialidades dos candidatos em quaisquer exames de concursos. As duas frentes nas qual nosso objeto se
projeta como alternativa, têm suas raízes na forma que tem assumido o aparelho de Estado na sociedade
brasileira. Desde os seus primórdios, a sociedade brasileira se organizou, com relação as suas instituições, a
exemplo dos colonizadores portugueses, de uma forma confusa envolvendo a coisa pública e privada e seus
respectivos interesses. Ao fazermos o resgate do processo de constituição do aparelho de Estado português,
expressão daquela sociedade nos tempos em que foi analisado, foi possível compreender a sociedade
brasileira e o aparelho de Estado que ela gerou, pois o Estado é a expressão da hegemonia política e cultural
da sociedade em uma determinada época. No Brasil, essa hegemonia transformou, por meio do comando da
máquina pública, uma rede de serviços essenciais em grandes negócios particulares com investimentos
públicos. Esse quadro traçado anteriormente, explica a hegemonia dos agentes do ensino pago na disputa
com os movimentos sociais por uma outra agenda para a educação, e é nesse cenário que nós construímos
uma compreensão de escala geográfica ligada às acumulações de poderes que podem projetar atores locais
para espaços de decisões e disputas globais. Os milhares de Cursinhos pré-vestibulares alternativos e
populares territorializados no Brasil, caracterizam-se, para nós, como movimentos territoriais, por conta de
suas lutas pelo acesso dos mais pauperizados ao ensino público superior. Tais lutas se realizam por meio de
ações políticas, que contribuem para a ultrapassagem da “cerca” do exame vestibular, e de ações políticas
por meio de protestos e conseqüentes projeção de seus atores sociais no espaço de poder, ou seja, no
território da disputa e decisão política: o aparelho de Estado. Assim, o trabalho de dissertação de mestrado
ora apresentado significa um período na trajetória do autor. Este período tem seu início em datas que
antecedem sua aprovação no vestibular para o curso de graduação em Geografia no ano de 1998. Remonta
ao início dos anos de 1990, quando, militante no setor de juventude do Partido dos Trabalhadores, atuava no
movimento secundarista na cidade de São Paulo e pôde participar de dezenas de eventos político-sociais,
vivenciando diversas “lutas” da sociedade brasileira. Entre elas, inserem-se o “Fora Collor”, os “Anões do
Orçamento”, o movimento contra as privatizações. Em junho de 1995, em meio às articulações para o
Congresso da União Nacional dos Estudantes, durante uma reunião no Diretório Central dos Estudantes
(DCE) da UNICAMP, ocorreu o primeiro contato com um projeto de curso Pré-Vestibular não comercial,
voltado a alunos oriundos das classes mais pauperizadas e vindos obrigatoriamente da escola pública.
Tratava-se do Cursinho do DCE-UNICAMP fundado na gestão “IDENTIDADE” no ano de 1995. Após o
Congresso da UNE, na capital federal, o grupo político que se organizou em torno da chapa “Ousar Lutar
Ousar Vencer” partiu para reflexões que contribuíssem para repensar o papel da mais importante entidade de
representação dos estudantes. Constituiu-se, então, um fórum de discussões que agrupou atores da Bahia,
Distrito Federal, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Em meio a vários
debates, concluiu-se que era preciso mudar a forma de atuação dos militantes do movimento estudantil e, ao
mesmo tempo, levar um outro ator para universidade: aqueles que têm o acesso à universidade pública
obstruído por suas condições sociais e formação precária. A inserção desses novos personagens permitiria
não só modificar o perfil do movimento estudantil e do meio universitário como também disputar espaço
nestes ambientes e na própria sociedade. Para isso era necessário o fortalecimento da prática de se criar PréVestibulares semelhantes ao do DCE-UNICAMP nos campi universitários espalhados pelo país. Em 1998,
quando calouro do curso de Geografia, houve uma assembléia geral de estudantes, na qual o então vicediretor da unidade, professor Néri Alves, foi questionado sobre qual deveria ser o papel da única universidade
pública do extremo oeste paulista frente à realidade da região divulgada pelo o IBGE naquela semana de
agosto de 1998. Os indicadores divulgados por aquele órgão mostravam que, segundo dados colhidos no ano
de 1997, a região de Presidente Prudente havia superado a do Vale do Ribeira no quesito pobreza. Depois de
algumas discussões, foi proposta a criação de um Curso Pré-Vestibular voltado para estudantes de baixa
renda, originários da escola pública, e foi constituído um grupo de trabalho para viabilizar a idéia. Esse grupo
foi composto por três estudantes e o vice-diretor, que propôs transformar a idéia em um projeto de extensão
universitária. No final do mesmo ano, foram selecionados alunos dos cursos de graduação da FCT-UNESP
para ministrarem aulas no projeto social de extensão “Cursinho Ideal”. Aprovado para ministrar o curso de
História do Brasil, foi possível aprender bastante sobre a realidade brasileira e suas causas, durante os
quatro anos de prática pedagógica no cursinho. Por conta desse aprendizado, a experiência no Cursinho Ideal
foi transformada num registro, materializado na Monografia de Bacharelado, sob orientação do professor
Everaldo Melazzo, intitulada “Cursinho Ideal da Unesp: por uma política pública de combate à exclusão
social”. Já era possível notar, porém, em práticas de cursinhos vistas em algumas unidades da federação ou
no Encontro Nacional de Cursinhos Populares, ocorrido no ano de 2000, em Florianópolis, um perfil ou
postura de movimento social popular. Esse incômodo levou ao desafio desta pesquisa de mestrado, que
pretende apresentar um breve histórico dos Cursinhos Alternativos e Populares por meio do olhar de um
geógrafo e analisar as origens do aparelho de Estado brasileiro e das suas políticas para a educação, as
quais, certamente, influíram no surgimento do movimento social que é objeto deste trabalho. Por último,
tentamos trazer para o campo da Geografia o debate sobre movimentos sociais, compartilhando com alguns
geógrafos a necessidade de se criar categorias geográficas para a análise dos movimentos sociais, o que nos
levou
a
fazer
uma
reflexão
sobre
o
de
conceito
de
movimentos
territoriais.
Palavras-chave: Cursinhos alternativos e populares; Estado; hegemonia; escala geográfica; movimento
territorial.
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Quando
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AO102 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Espaço e Movimentos Sociais
[2035] MOVIMENTOS SOCIAIS: IDENTIDADE E TERRITÓRIO NA BOLÍVIA.
MARCELO ARGENTA CÂMARA.
UFRGS, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho tem como objetivo central analisar a importância das identidades, e especificamente aquelas
baseadas em aspectos relacionados ao território, enquanto bases para a formação, o discurso e a ação dos
movimentos sociais na Bolívia. Partindo de uma abordagem multidisciplinar, que procura compreender os
aspectos relacionados à formação de identidades e as teorias sobre os movimentos sociais, relacionamo-los
tomando como fio de articulação o território e os aspectos a ele relacionados. Essa articulação mostra-se
essencial para a compreensão do crescente protagonismo exercido pelos movimentos sociais bolivianos nos
últimos anos. Estes movimentos, a partir de um discurso calcado naquilo que denominamos identidades
sócio-territoriais, puderam romper com as estruturas excludentes herdadas de anos de exploração colonial, o
que, até certo ponto, não havia sido possível até então, pese a importância de todas as formas anteriores de
mobilização
social
havidas
anteriormente
no
país.
O trabalho perpassa a interpretação dos conceitos chave para a construção de nosso marco interpretativo,
que são as Identidades Sócio-Territoriais. Para isso, percorremos uma trajetória que se inicia no resgate dos
conceitos de território e territorialidade, onde se buscou uma compreensão do território em uma concepção
ampla, que pudesse abranger suas dimensões material e simbólica. A aproximação aos aspectos simbólicos
se fez a partir do conceito de territorialidade, buscando aí inserir a dimensão relacional como fundamental
para a construção da relação de apropriação que é faz a “transformação” do espaço em território. E, dentro
dessa interpretação que privilegia os aspectos relacionais, consideramos os caminhos pelos quais esta
relação
com
o
território
se
faz
identidade
e,
assim,
se
faz
discurso
e
ação.
A metodologia utilizada buscou atuar em duas frentes: a pesquisa de campo e a pesquisa bibliográfica. A
pesquisa de campo, baseada em abordagem qualitativa e entrevistas não-diretivas, buscou compreender as
formas pelas quais o território é compreendido e vivido pelos membros dos movimentos sociais bolivianos. A
partir de entrevistas realizadas num universo selecionado entre aqueles movimentos nos quais a dimensão
étnico-cultural projeta-se como a mais proeminente, buscou-se uma aproximação ao universo vivido
daqueles personagens. Houve aí uma intenção clara de resgate da dimensão humanista da Geografia, numa
abordagem metodológica influenciada pelas perspectivas crítica e fenomenológica, que ressaltam a
importância da vivência do cotidiano na construção das diferentes geografias. O segundo momento do
trabalho consistiu na análise do discurso à luz das referências bibliográficas, buscando compreender a
vinculação
do
contexto
analisado
às
estruturas
de
seu
contexto
histórico-político.
A questão que se destaca dentro do trabalho é a do conflito de territorialidades vivido em países como a
Bolívia, herança nítida de seu passado colonial (ainda vigente nas estruturas estatais e da elite do país). As
formas distintas com que setores da população boliviana vivem sua territorialidade, tanto no sentido material
quanto na compreensão que fazem do território em si, é a base dos antagonismos que se explicitam na
exclusão
social.
Assim, é exatamente por propor uma nova visão de organização sócio-territorial, uma outra visão e vivência
do território, através de um discurso que se ancora em formas de vivência originárias das populações
andinas, e que ainda são vigentes entre as populações excluídas, que se possibilita a construção de uma
inédita coesão social entre setores dispersos, unidos na construção de uma identidade comum.
A importância da introdução de um ferramental próprio da Geografia na análise das mobilizações sociais na
América Latina do século XXI é importante por propor uma alternativa frente ao esgotamento de certas
ferramentas de interpretação para a mobilização social no continente. As ferramentas de análise baseadas
exclusivamente em conceitos economicistas se esgotam diante da complexidade dos contextos enfrentados
no continente latino americano após a (des)estruturação do Estado baseada nos preceitos do Consenso de
Washington.
Neste trabalho vemos que movimentos que baseiam seus discursos em aspectos da identidade, da
etnicidade, da multiculturalidade, são propositores de uma nova configuração social. O território e a
territorialidade, vistos aqui como agentes formadores de identidades, podem ser chaves importantes não só
para a compreensão da ação de movimentos sociais de comprovada força e êxito de ação, como os
analisados neste trabalho, mas também para a possibilidade de construção de alternativas de contrahegemonia frente às estruturas de exclusão vividas nas diferentes sociedades.
AO103 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Espaço e Movimentos Sociais
[2101] A OCUPAÇÃO QUI LOM BO D AS GUERREI RAS: FORM AS E SEN TI D OS D A RESI STÊN CI A N A
ÁREA CENTRAL DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO.
LEONARDO BRASIL BUENO.
IPPUR, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
A formação da Ocupação Quilombo das Guerreiras, situada na área central da cidade do Rio de Janeiro, se
insere nas últimas três décadas de crise urbana(sua versão periférica) e surgimento de novos atores e
movimentos sociais nas metrópoles latino-americanas. Partindo das margens espaciais decorrentes da crise
do modelo fordista de desenvolvimento e resistindo a lógica indiscriminada de disseminação das políticas
neoliberais, esses novos atores e movimentos já produzem sentidos e formas de apropriação do espaço
urbano que precisam ser entendidos nas suas particularidades e semelhanças(Ribeiro,2000; Gonçalves,2001;
Zibechi,2003).
Formado por cem famílias que anteriormente moravam em condições sub-humanas, em locais onde estavam
na iminência do despejo ou em condições de morador de rua, o movimento que culminou na Ocupação
Quilombo das Guerreiras apresenta uma forma de organização descentralizada, pautada por discussões e
decisões coletivas, assim como acontece em muitos movimentos por moradia espalhados pelas periferias das
grandes cidades da América Latina. Ainda que não tenha a amplitude e organização dos movimentos de
bairro situados em Buenos Aires e Caracas, por exemplo, o movimento em questão também apresenta
característica similar quando analisamos a sua territorialização, via recuperação de espaços físicos
degradados
e
coletivização
do
trabalho.
O objetivo deste trabalho reside na identificação e análise das formas e dos sentidos presentes nas ações
coletivas de um movimento urbano situado na área central da cidade do Rio de Janeiro. Para tanto, achamos
necessário uma análise que contextualize este movimento em um cenário de conflitos sociais e resistência
protagonizado por movimentos sociais a partir de seus processos de territorialização , entendidos na luta pela
apropriação
e
resignificação
do
tempo/espaço
dominante.
Aos processos globais e regionais de produção do espaço urbano cabe uma necessária diferenciação social
das práticas estabelecidas no lugar, entendido como resistência. Advertimos, porém, que o uso do “lugar”
como categoria não nos remeterá a uma dimensão fechada, como sinônimo de “comunidade”, nem
estritamente a uma condição de simples confirmação de uma lógica externa mais ampla, como normalmente
indica a noção de “local”.Partindo de reflexões formuladas por geógrafos formados na teoria crítica do
espaço, entendemos que o lugar compreende, dialeticamente, o global e o local, contemplando a
historicidade
do
processo.
A trajetória do movimento estudado, marcada por tentativas de ocupação de prédios situados em diferentes
locais da cidade, acaba desembocando em sua afirmação na área central da cidade. Mais precisamente em
prédio localizado na Rua Francisco Bicalho, próximo a Rodoviária Novo Rio e a Zona Portuária da cidade. O
prédio, abandonado há mais de 15 anos, pertence juridicamente a Companhia Docas do Rio de Janeiro que
aceitou um acordo, mediado pelo ITERJ, de manutenção temporária dessas famílias, durante o período de 12
meses no prédio. A empresa, que optou por uma drástica redução de sua força de trabalho nos últimos anos
e é possuidora de uma série de dívidas com a prefeitura, afirma que ao término do prazo pretenderá exigir,
judicialmente, a ordem de despejo. A posição do movimento também é bastante clara e pautada da posição
irredutível de permanência no prédio, pois entendem serem fundamentais os benefícios trazidos pela
localização.
Além da disputa judicial com a empresa Docas, também analisamos outras dimensões do conflito territorial,
presentes na trajetória do movimento. Aqui, mostrou-se necessária para nossa pesquisa uma análise que
enfocasse as relações sociais de poder inscritas no espaço da cidade do Rio de Janeiro. Durante a trajetória,
identificamos no movimento uma posição consensual clara de distanciamento e reprovação às ações da
polícia, do tráfico de drogas e das “milícias”. Entretanto, a identificação destes atores como inimigos políticos,
reiterada em reuniões do movimento e entrevistas individuais, não impede que o movimento também
visualize e combata (de maneira pacífica e é importante que ressaltemos) outras formas assumidas pelo
poder, como órgãos de decisão jurídica, empresas e meios de comunicação. Estes últimos, responsáveis por
uma representação ideológica e pejorativa em relação à Ocupação Quilombo das Guerreiras.
Nossas análises nos permitiram interpretar que o movimento que culminou na Ocupação Quilombo das
Guerreiras não deve ser entendido somente como uma luta por moradia, mas sim de um reivindicação pelo
direito à cidade e à vida urbana, ao acesso e uso, material e simbólico, dos espaços centrais da cidade.
Trata-se, desta maneira, de um movimento que reivindica seu direito à moradia, à proximidade aos locais de
trabalho, mas também “aos locais de encontro, aos ritmos de vida e empregos do tempo que permitem o uso
pleno
e
inteiro
desses
momento
e
locais”
(Lefebvre,2001,
p.
143)
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Autônoma d e Puebla.
AO104 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Movimentos Sociais
[2076] A LUTA PELA TERRA N O PAÍ S D O LATI FÚN D I O: QUAN D O UM CON FLI TO POR TERRA SE
TORNA UM MASSACRE CONTRA TRABALHADORES.
HELENA ANGÉLICA DE MESQUITA.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS, CATALÃO, GO, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho é parte da tese de doutorado intitulada “Corumbiara: o massacre dos camponeses. Rondônia,
1995”, que aborda a questão da luta pela terra no Brasil com foco sobre o conflito por terra que aconteceu na
fazenda Santa Elina, município de Corumbiara. Ao eleger como objeto de estudo o massacre de
CORUMBIARA não se pretendeu estudar o conflito por ele mesmo e nem como algo restrito a um lugar ou a
um momento histórico mas buscar entender o processo da luta pela terra no Brasil, considerando o modelo
de desenvolvimento adotado que é concentrador e excludente. No Brasil, em todos os tempos, a ocupação
capitalista da terra tem sido violenta, principalmente contra os posseiros, quilombolas, indígenas e sem terra.
A expropriação e a marginalização são expressões de violência. Rondônia é a expressão clara de como se dá
a
correlação
de
forças
nesse
processo
de
apropriação
do
território.
Cada conjuntura que o Brasil atravessa tem servido para reforçar a estrutura fundiária cada vez mais
concentrada e que a cada vez, exclui maiores parcelas de trabalhadores do acesso à terra. A história tem
mostrado que os desterrados e desterritorializados têm se organizado e têm enfrentado esta estrutura
secular de dominação e espoliação, isso tem gerado muitos conflitos que se tornam massacres quando o
Estado/latifundiarista interfere. Assim foi Canudos, Contestado, Guerrilha do Araguaia, Trombas e Formoso,
Luta do Arrendo, Corumbiara, Eldorado do Carajás. O conflito da fazenda Santa Elina tem a mesma gênese
histórica de muitos outros que ocorreram em períodos diferentes e lugares diferentes, sob conjunturas
diversas.
No dia 14 de julho cerca de 600 famílias ocupam um latifúndio de 20000 h e aí começa um conflito que
acabou em um dos maiores massacres de camponeses ocorridos na Brasil. No dia 09 de agosto, 194 policiais
inclusive o Comando de Operações Especiais, COE e outros tantos de jagunços e guachebas fortemente
armados cercaram o acampamento por todos os lados e atacaram com bombas de gás que a todos sufocava.
Quando o dia amanheceu o massacre já era evidente. Onze pessoas foram mortas, inclusive a pequena
Vanessa de apenas 6 anos. Centenas de trabalhadores foram torturados por mais de 24 horas seguidas,
viúvas e órfãos ficaram desamparados, tem gente desaparecida até hoje. Dezenas de trabalhadores estão
impossibilitados de trabalhar por causa das lesões sofridas e não receberam nenhum tratamento adequado.
Foi uma ação criminosa praticada pelo Estado com a conivência, ou no mínimo a omissão de todas as
instâncias do poder. No entanto ninguém foi responsabilizado e os camponeses foram condenados pelo Júri
Popular
no
qual
as
testemunhas
foram
os
próprios
policiais.
Corumbiara continuou fazendo vítimas, muitas pessoas morreram depois, inclusive o vereador Manoel
Ribeiro, o Nelinho, que apoiou os camponeses da Santa Elina e foi assassinado em dezembro do mesmo ano
emboscado
por
jagunços
de
latifundiários.
A metodologia básica foi consulta á fontes primárias e entrevistas que permitiram criar e recriar a história
dos homens, dos lugares onde vivem os homens, mais ainda, das relações dos homens com a natureza e dos
homens entre si. Dentre as fontes oficiais de consulta está o processo judicial intitulado Caso Corumbiara.
Outros dois processos judiciais também foram consultados, o que trata da morte do vereador Manoel Ribeiro,
e outro que trata de outro conflito ocorrido em 1982, na fazenda Cibixi, onde morreram 3 pessoas Os
processos foram importantes fontes de consulta, pois ali estão as versões oficiais dos episódios.
Muito importante também foi buscar compreender o papel do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e do Movimento Camponês Corumbiara (MCC) sendo esse último criado logo após os
acontecimentos
da
Fazenda
Santa
Elina.
O mais importante instrumento foi a pesquisa memorial. Foram entrevistadas duzentos e doze pessoas entre
advogados, juizes, sindicalistas, assentados, professores, soldados, oficiais e até o comandante da operação.
O mais importante foi entrevistar mais de cem camponeses que estiveram na Santa Elina. Eles relataram
suas
experiências
e
assim
pude
reconstruir
os
acontecimentos
daqueles
dias.
Com este trabalho fez-se a análise de uma situação a partir dela mesma. O primeiro passo foi localizar e
delimitar tal situação no tempo e no espaço, procurando compreender o massacre como uma totalidade em
si mesmo que se insere em algo mais complexo, evidenciando ou não, as suas correlações, interações,
especificidades e contradições no contexto do modo de produção vigente. É uma tentativa de compreender
uma realidade infinitamente rica, complexa e contraditória cuja universalidade é concreta e não foi diluída ao
optar pelo estudo de caso. Pelo contrário, o estudo de caso possibilitou o aprofundamento na compreensão
de muitas questões, dentre elas se pôde ver as contradições e divergências entre o que está registrado
oficialmente nos processos e inquéritos judiciais e os testemunhos dos sobreviventes do massacre.
O objetivo do massacre para os latifundiários era atingir a todos os que se levantam, se organizam e lutam
contra o latifúndio. A investigação oficial no IPM e IPL e depois no júri provou que o objetivo foi alcançado,
mas dialeticamente provocou também reações contra o próprio latifúndio ou pelo menos contra a violência no
campo e as suas conseqüências. Melhor seria se se cuidasse também das causas dessa violência e se
identificassem
e
punissem
os
responsáveis.
Esta
é
a
proposta
deste
texto.
AO105 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Movimentos Sociais
[1246] TI PI FI CAÇÃO SOCI AL E TRAN SI TORI ED AD E TERRI TORI AL N A LUTA PELA TERRA: O CASO
DOS CAMPONESES/PESCADORES DE TAMBAÚZINHO, MUNICÍPIO DE SANTA RITA – PB*.
MARCO ANTONIO MITIDIERO JUNIOR.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
Objetivo
do
Trabalho
Partindo da idéia de que a lógica dos conflitos agrários entre grandes proprietários de terra versus
camponeses (pequenos proprietários, parceiros, arrendatários, posseiros, sem terra, etc.) no Brasil segue a
regra da expulsão e expropriação desses últimos sujeitos sociais, o presente trabalho tem como objetivo
narrar a trajetória de um grupo de camponeses/pescadores paraibanos que ao resistirem a expulsão
permeiam uma variedade de tipificações sociais da comunidade em luta e exemplificam uma perversa
instabilidade territorial que envolve a luta pela terra. Com isso, esse estudo pretende aprofundar reflexões já
realizadas no relatório de qualificação para a tese de doutorado intitulada “Ação territorial de uma Igreja
radical: teologia da libertação, luta pela terra e a atuação da Comissão Pastoral da Terra paraibana”.
Referencial
Teórico
e
Conceitual
Como a luta de resistência dessa comunidade camponesa é acompanhada integralmente pela Comissão
Pastoral da Terra paraibana (CPT), toda a organização da resistência esta baseada num discurso políticoreligioso, portanto fez-se necessário à discussão de alguns referencias teóricos e teológicos advindos da
Teologia da Libertação, como por exemplo: a noção de “opção preferencial pelos pobres” e a idéia de que os
oprimidos
são
“portadores
da
sua
própria
história”.
No campo da Geografia optou-se por usar o referencial teórico da Geografia da Ação proposta pelo geógrafo
alemão Benno Werlen. Nessa reflexão, a ação social ganha ênfase frente aos conceitos meramente espaciais,
reforçando as concepções de que é a sociedade que constrói o território. Para o atual estudo, propus a noção
teórica de ação territorial da Igreja, isto é, os religiosos próximos aos movimentos sociais e imbuídos pelos
ensinamentos da Teologia da Libertação ajudam a produzir manifestações sociais que vão para além do
discurso teológico e espiritualista da Igreja Tradicional. Ocorre uma espécie de materialização do discurso
religioso.
Nesse bojo, procurei trabalhar com os conceitos de territorialização da luta pela terra e de territorialidade
camponesa, bem como com a definição de tipificações sociais próprias do campo brasileiro: moradores de
condição,
posseiros,
acampados,
sem
terra
e
assentados.
Metodologia
Utilizada
Para a proposição de tipificação social e a constatação de uma transitoriedade territorial durante a luta pela
terra, foi necessário fazer uma etnografia do conflito, lançando mão do resgate de histórias de vida por meio
de entrevistas diretas e do acompanhamento do conflito na própria área e por meio das ações judiciais
decorrentes.
Principais
questões
e
pontos
desenvolvidos
Os
principais
pontos
desenvolvidos
foram:
- a tipificação social dos camponeses/pescadores envolvidos na luta pela terra. A trajetória histórica desse
grupo remonta a terceira década do século XX , portanto estão há aproximadamente 80 anos vivendo nessas
terras. Num primeiro momento eram tidos como moradores de condição; num segundo momento, quando na
década de 1990 se instaura o conflito, são vistos como invasores pelo proprietário da terra e passam a se
autodenominarem de posseiros que lutam pela posse da sua terra; num terceiro momento do conflito passam
a ser vistos pela sociedade local e pelo judiciário como sem terra-invasores, e depois do despejo efetuado
pela Polícia Militar, com a destruição das casas, passam a ser acampados ao retornarem a área; e logo mais
adiante
passam
a
ser
assentados
após
a
desapropriação
da
área.
- a transitoriedade territorial dos camponeses/pescadores da fazenda Tambaúzinho. Nos mesmos moldes que
a variedade de tipificações sociais que assumiram no decorrer da luta, a qualificação da terra em disputa
também assume um caráter transitório e instável. Da terra do “patrão” que permitia os camponeses
morarem e a ele pagarem um dia de trabalho gratuito por ter-lhes cedido terra para plantar, para a
propriedade privada inabalável do novo proprietário da terra. Nesse processo, os camponeses assumem
aquela terra como de direito deles, com isso ela passa a ser pensada como área de posse. Por outro lado, o
judiciário passa a reconhecer aquela área como propriedade privada vitima de turbação e esbulho. Após a
desapropriação (que ainda esta em curso), aquela terra começa a ser denominada de assentamento rural.
Resultados
Alcançados
No que diz respeito a um aspecto geral do estudo, etnografar esse conflito possibilitou explicitar os tortuosos
e trágicos caminhos percorridos pelos camponeses brasileiros que se organizam e lutam contra a expulsão e
possível migração para as áreas urbanas. No âmbito mais específico, foi possível entender claramente a
opção tomada pelo judiciário paraibano em defesa do proprietário de terra, mesmo se tratando de uma área
onde os camponeses residem a aproximadamente 80 anos. A posição do proprietário privado da terra e do
judiciário paraibano convergiram para a identificação de que as 29 famílias que ali residiam são invasores,
essa posição fez com que a comunidade junto a CPT se organizassem e resistissem ao processo de expulsão.
Com isso, os 12 anos de conflito (1995 a 2007) mostram uma constante mutação nas identidades sociais
desses camponeses e uma tortuosa transitoriedade da relação desses com a sua área de posse, com o seu
território.
Palavras Chave: Tipificação Social, Transitoriedade Territorial, morador de condição, posseiro, sem terra
* Trabalho proposto para apresentação oral em Grupo de Trabalho (Espaço e Movimentos Sociais), no eixo
temático “Brasil: espaço, identidades e projeto de nação”.
AO106 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Movimentos
Sociais
[1262] M OVI M EN TOS SOCI OTERRI TORI AI S: TERRI TORI ALI D AD E E POLI TI ZAÇÃO D O ESPAÇO N O
BRASIL.
NELSON RODRIGO PEDON.
FCT/UNESP, PRES. PRUDENTE, SP, BRASIL.
Resumo:
O proncipal objetivo desse trabalho de doutorado, é buscar compreender o conjunto de questões que emerge
da complexa relação entre a participação política da classe trabalhadora com o território. Para tanto
realizamos um exame da forma pela qual a Geografia Brasileira passou a incorporar os Movimentos Sociais
em seu temário de investigações ao longo dos últimos 25 anos, assim como esses estudos se
fundamentaram ao longo desse período. Nossa finalidade é a de propor o conceito de Movimentos
Socioterritorial como uma modalidade no conjunto dos Movimentos Sociais.
Nossa pesquisa se fundamenta na leitura de trabalhos em geografia a respeito da participação política e dos
Movimentos Sociais, em trabalhos dessa temática na Sociologia e em estudos de casos. Apoiamos nossas
hipóteses num farto material estatístico que têm como fonte o DATALUTA (banco de dados de luta pela terra
do NERA- Nucleo de Estudos,Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária da UNESP de Pres. Prudente/SP), a
Comissão Pastroral da Terra, o Observatório Social da América Latina _OSAL, e o Conselho Latino Americano
de Ciências Sociais - CLACSO.
O emprego da denominação Movimentos Socioterritoriais se justifica na medida em que ela valoriza,
enquanto conceito analítico, uma especificidade importante para os estudos desse fenomeno na Geografia, a
politização do espaço e a territorialidade contida nestas expressões de luta política.
Numa primeira fase, por meio de pesquisas, leituras, sistematização e interpretação das pesquisas em
Geografia sobre Movimentos Sociais em teses, dissertações livros e artigos de revistas, constatamos que na
história do Pensamento Geográfico no Brasil muito já foi dito a respeito do território e de sua
problematização realizada pelos Movimentos Sociais, assim como de sua natureza e as implicações de seu
uso na sociedade moderna.
Nosso referencial teórico é consituído pelos autores clássicos do Pensamento Geográfico brasileiro e
internacional, e pelos trabalhos especificos da temática dos Movimentos Sociais realizados pela Sociologia e
pela Geografia, sobretudo a brasileira. Essa duscussão revela o quão é importante para os geógrafos
entender a complexa problemática que envolve as diferentes formas coma as quais a sociedade modela,
organiza e se identifica com o espaço no qual se reproduz.
Nessa pesquisa o território é considerado com a mediação entre dois grupos sociais. É uma relação
triangular, pois a relação entre sujeitos é mediada pelo espaço que, nesse processa toma status de território.
Nestes termos o território tem uma dimensão política intrínsecam pois tem a dimensão do poder no centro de
sua constituição.
Seja no campo ou na cidade, acreditamos que o fator que dá unidade aos Movimentos Sociais aqui
denominados de Movimentos Socioterritoriais, não está associado aos recursos ou às caracterísitcas
peculiares da população rural ou urbana, daí não concordarmos com a formulação que vê o território como
recurso, ou como trunfo a ser conquistado. O que dá identidade a estes movimentos é o fato de na sua
constituição o espaço apresenta-se como mediador da ação.
Nem todos os Movimentos Sociais podem ser denominados socioterritoriais. Independente da abordagem, se
geográfica ou se sociológica, acreditamos que nem todo Movimento Social tem o espaço como mediação da
ação mobilizadora, e, portanto, política.
Por fim, nossa tese busca mostrar que lutas especificas como a lut a pela t erra ou pela moradia só existe
porque o espaço não representa somente a base material onde se fixam objetos, ou uma área a ser
delimitada, ficando a partir de então sobre a tutela de um grupo. A mobilização política dos Movimentos
Socioterritoriais, seja dos Movimentos Sem terra, seja dos Movimentos por Moradia, só existe porque há
uma identidade do grupo com o espaço,isto é, uma territorialidade que permite ao grupo sobreviver e atuar
em espaço alheio, quando este ainda não se consttui como território de outrem.
AO107 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Movimentos Sociais
[1320] N OVO M OVI M EN TO SOCI AL? UM A AN ÁLI SE D AS ESTRATÉGI AS TERRI TORI AI S
ASSOCIAÇÕES DE MORADORES DO BAIRRO DE COPACABANA.
JULIA BEREZOVOYA ASSIS.
UFF, NITEROI, RJ, BRASIL.
Resumo:
D AS
A cidade é um recorte especial para a análise dos processos sociais e suas relação com a materialidade. É
condição, meio e produto das relações sociais como também espaço de disputas, conflitos políticos e
resistências e é assim que a cidade se realiza enquanto potencialidade de um espaço coletivo. Há uma crise
nas cidades como decorrência do atual modo de produção e acumulação assim como há uma crise no modo
de pensar a cidade. É sob o prisma da corporatização (SANTOS, 2003) das cidades que se torna fundamental
compreender as relações políticas locais e suas estratégias territoriais, numa tentativa de analisar como os
lugares reagem frente às novas questões colocadas pelas mudanças globais de produção, consumo e
distribuição. Nosso objetivo é verificar as práticas territoriais dos diferentes grupos sociais, tendo como pano
de fundo as mobilizações da sociedade civil e suas relações com o Estado. Tal objetivo nos conduz a
compreensão do surgimento de novas territorialidades e suas diversas lutas. Este trabalho pretende oferecer
dados para a análise do papel do Estado frente às transformações políticas, econômicas e culturais do
momento assim como para o entendimento das associações de moradores como parte de um movimento
social urbano que compõem a sociedade civil em busca de um Estado mais democrático. Buscamos também
avaliar a perspectiva da formação de uma rede política, vinculada às estratégias das diferentes associações
de
moradores
do
bairro.
Neste trabalho busca-se a construção de uma forma de análise sobre movimentos associativos de bairro a
partir de conceitos-chave da geografia tais como território além de outros como sociedade civil, Estado,
movimentos sociais urbanos e redes políticas. Buscaremos utilizar um conceito de território que tenha força
para nos auxiliar na análise da questão aqui posta. Para isso, as noções de limite, controle e autonomia
devem estar presentes já que temos como objeto de estudo associações de moradores em um bairro
heterogêneo e complexo como o de Copacabana, onde a constatação das diferentes associações já nos traz
uma idéia de delimitações territoriais. Ao delimitar um espaço estamos lidando com noções de controle e
poder. A noção de autonomia também é fundamental para nossa conceituação, uma vez que é um elemento
necessário ao se tratar de um sistema político que se quer democrático. A relação entre espaço e poder será
analisada nas diferentes associações de moradores e suas estratégias para garantir o poder/controle de um
determinado
território.
As formas de organização da sociedade civil como os movimentos sociais urbanos e a potencial formação de
redes políticas serão destacados para permitir uma análise mais acurada das associações políticas locais. É
grande o número de estudos sobre a problemática dos movimentos sociais, porém as interpretações sobre o
que é um movimento social urbano são inúmeras e dependem do paradigma teórico-metodológico adotado
por cada autor (GOHN, 2004). Ao considerar as associações de moradores enquanto espaços públicos que
possibilitam a elaboração de alternativas pela melhoria nas condições de vida de um coletivo que agem na
correlação de forças, qualificaremos as associações de moradores enquanto movimentos sociais urbanos. O
bairro por ser referencial territorial das lutas locais aglutina diferentes sujeitos e classes sociais em nome de
causas comuns, e cria espaços públicos de participação local, que podem contribuir para uma democratização
da gestão da cidade e para o fortalecimento da sociedade civil. O que não significa que não haja conflito
entre os moradores que são heterogêneos e apresentam demandas, estratégias e lutas diferenciadas.
Nessa pesquisa tem-se como área de estudo o bairro de Copacabana. Partimos do princípio que o bairro, ao
invés de um recorte submisso, é uma instituição constituída de um potencial capaz de gerar decisões e ações
que resultem em transformações significativas para a sociedade local. Inicialmente partimos de uma revisão
bibliográfica sobre os conceitos selecionados para embasar a questão proposta. Seguimos então para a etapa
das entrevistas com atores chave no processo de construção das mobilizações políticas locais. As entrevistas
estão sendo aplicadas a cinco associações de moradores, três delas sendo das áreas de classe média, e duas
das favelas existentes. O terceiro momento será dedicado a análise do material recolhido nas saídas de
campo.
O tema deste trabalho articula a relação sociedade civil organizada, Estado e espaço. A delimitação temática
aqui proposta focaliza o associacionismo de bairro, tendo em vista os seguintes aspectos: suas estratégias
territoriais tanto materiais quanto as simbólicas. Visa relacionar as formas de organização territorial dos
moradores frente às transformações que vem ocorrendo no bairro e no Estado de uma maneira geral
identificando as questões abordadas pelas diferentes organizações de bairro e como essas estratégias
influenciam na formação de novas territorialidades. Em síntese, tais limites evidenciam o papel das
associações de moradores e sua relação com o espaço numa perspectiva que nos permita pensar em novas
formas de resistência no que diz respeito as formas de gestão da cidade. Ou seja, pensar a sociedade através
da geografia na perspectiva de inserir o espaço na teoria social crítica tal como nos propõe SOJA (1993, pp.
18
a
21)
e compreendendo
a
profunda
relação
entre espaço,
tempo
e ser
social.
Refletindo sobre em que medida a formação de redes políticas poderia levar a uma maior democratização da
gestão da cidade, e consequentemente a uma maior participação da sociedade civil na política local,
postulamos a seguinte questão para esta pesquisa: como se configura a tensão entre a possibilidade de
formação de redes políticas locais e o processo de fragmentação socioespacial do bairro de Copacabana, a
partir da atuação de suas associações de moradores. A questão é se essas associações estão em um
processo de formação de redes políticas ou se a atual forma de movimentos de bairro na área em estudo
está
levando
a
uma
fragmentação
socioespacial.
Podemos vislumbrar algumas considerações em relação à formação de redes políticas e ao papel das
associações de moradores na atualidade a partir de resultados obtidos com entrevistas realizadas com alguns
dos atores selecionados. A perspectiva da rede política encontra-se enquanto um projeto de algumas
associações, mas que atualmente as ações caminham de forma individualizada. Resultado este que pode ser
revertido com novas entrevistas que estão em andamento. O papel e a presença das associações de
moradores continua marcante pela quantidade de associações, porém o alcance de suas medidas parece
delimitado a questões locais desconsiderando o cenário mais geral.
AO108 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Espaço e Movimentos Sociais
[1499] A TERRITORIALIDADE ÉTNICA DOS POTIGUARA.
AMANDA CHRISTINNE NASCIMENTO MARQUES; MARIA DE FÁTIMA FERREIRA RODRIGUES.
UFPB, JOÃO PESSOA, PB, BRASIL.
Resumo:
Pesquisas realizadas no âmbito das Ciências Humanas e Sociais indicam que os índios territorializados no
Nordeste brasileiro assimilaram valores da sociedade envolvente a partir do contato com os europeus e foram
ao longo da formação sócio-territorial do Brasil perdendo traços de sua identidade étnica e cultural em
conseqüência da violência de ordem material e simbólica de que foram vítimas através dos genocídios,
dizimação ocorrida em situações de enfrentamentos seja através dos etnocídios imposição de outra língua,
religião e forma de organização social. Em decorrência desses enfrentamentos frequentemente foram
caracterizados pelo estado e pela sociedade como homens pobres livres tanto no Brasil colônia quanto na
República
Velha.
A partir da década de 1970, sobretudo após a Constituição de 1988, esses povos atingiram um patamar de
organização política, principalmente em relação à reorganização e retomada de seus territórios e de
afirmação de sua cultura. Esta postura dos índios, especialmente os do Nordeste brasileiro, somou-se ao
conjunto dos movimentos sociais e suscitou acaloradas discussões entre os estudiosos, ocupando lugar na
mídia e em diversas instâncias da sociedade passando a organização desses povos a ser denominada de
emergência
étnica,
por
diversos
autores
das
ciências
sociais.
Partindo desses pressupostos, buscamos analisar o processo de construção do território e da territorialidade
étnica dos índios Potiguara da Aldeia Três Rios, localizada no município de Marcação, Paraíba. Esta pesquisa
vem sendo desenvolvida desde 2004, e é parte integrante da linha de pesquisa movimentos sociais no
campo,
do
grupo
de
pesquisa
do
CNPq,
Território,
Trabalho
e
Cidadania
(GESTAR).
É considerando a emergência étnica, movimento que se configura na busca de reafirmação da identidade e
memória coletiva do grupo social em pauta, que sentimos a necessidade de estudar a Aldeia Três Rios, visto
que esse território foi retomado recentemente, em 04 de agosto de 2003. Nesse ensejo, consideramos que
somente uma investigação dirigida especificamente à problemática em pauta, seja no que diz respeito ao
processo de resistência, seja no que diz respeito à ação do Estado, possibilitará ampliação dos conhecimentos
geográficos, principalmente porque os temas abordados vêem enfocar conceitos e temas de relevância social
capazes de contribuir para a reelaboração de políticas públicas que apontem para a melhoria da qualidade de
vida
desses
grupos
sociais.
Em busca do significado da terra para esse grupo social verificamos que o Território Potiguara está presente
na memória coletiva como catalisador das demandas sócio-culturais, sendo essas reatualizadas no processo
de reprodução material e simbólica, ao mesmo tempo em que congrega os parentes em sua pauta de lutas;
ampliando
seus
limites
e
possibilidades
de
fortalecimento
interno.
A pesquisa foi construída a partir de levantamento bibliográfico utilizando instrumentos de sistematização por
nós elaborados, em Bibliotecas de Instituições de Ensino Superior (IES) dentre outras. a) recorremos a
buscas em cd´s de eventos técnico-científicos e nos portais especializados em divulgação científica, a
exemplo do Scielo e portal da Capes, com a finalidade de localizar artigos relacionados às questões dos
territórios indígenas no Brasil. Com relação aos documentos, priorizamos o levantamento de informações no
Jornal Correio da Paraíba, nos períodos de janeiro de 1980 a dezembro de 1989, que se encontram no
Arquivo Histórico do Estado da Paraíba, da Fundação Espaço Cultural – FUNESC; b) pesquisa via web e em
órgãos públicos, como a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), Fundação Nacional do Índio (FUNAI),
Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e Instituto Sócio-Ambiental (ISA) e no Museu Nacional em busca de
dados referentes às aldeias indígenas do Nordeste brasileiro e especificamente dos Potiguara; c) trabalhos de
Campo ocasião em que construímos uma etnografia sobre os processos de resistência e construção da
territorialidade Potiguara na aldeia Três Rios, através do acompanhamento de reuniões e protestos dos índios
na
cidade
de
João
Pessoa,
concomitantemente
à
sistematização
das
informações.
Do ponto de vista teórico - metodológico, sentimos a necessidade de abrir um diálogo interdisciplinar entre a
geografia e a antropologia visto que este diálogo, na abordagem do tema proposto, é importante para o
entendimento do território como uma porção do espaço que se revela etnicamente diferenciado. Nesse
sentido, fazer uma relação entre a Geografia e a Antropologia significa buscar interfaces, e conhecimentos
consolidados no diálogo interdisciplinar que conforme assinalam Morin (1999) e Santos (2001), criam a
possibilidade de abrir um leque de discussões, conexões, encontros e interpretações em direções
convergentes
e
complementares.
Propomos-nos a fazer uma reflexão teórica, aludindo às análises de autores da Geografia, no que se refere
ao entendimento sobre o Território e a Territorialidade. Para tanto, nos fundamentamos em autores como
Raffestin (1993), Souza (2003), Santos (1994) e Haesbaert (2004). Além desses autores incorporamos em
nossa pesquisa o conceito de emergência étnica, de Arruti (1993) e Oliveira (1993), a partir da antropologia,
com vistas a uma melhor compreensão dos processos organizativos relativos a esse grupo.
Nessa pesquisa, utilizamos o conceito de território visando dar realce a um aspecto significativo dessa luta
como representação de uma territorialidade étnica. Consideramos, por conseguinte, dimensões simbólicas
que compõem o universo da cultura e se revelam através das relações interpessoais e nos conflitos
interétnicos. Consideramos que o território não é apenas o espaço concreto ou absoluto criado a partir de
componentes naturais e sociais; ele é, sobretudo, gerador de raízes e identidade que se expressam na
conjugação de forças políticas e manifestações que denotam pertencimento ao grupo e que permeiam as
relações de parentesco, de vizinhança, de gênero presentes nos diversos momentos da vida social.
Considerando as pesquisas realizadas até o presente momento, entendemos que compreender a questão
indígena em sua complexidade e diversidade implica percorrer caminhos extensos. Corroborando com os
autores anteriormente mencionados, ao se reportarem aos seus estudos específicos e, considerando a
confluência dos temas reafirmamos o que em outros momentos já escrevemos, que o processo organizativo,
a luta pela conquista do território e as práticas de resistência em Três Rios, Marcação-PB configuram traços
relevantes da reafirmação da identidade étnica Potiguara, verdadeiro vetor para a conquista do território.
AO109 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Movimentos Sociais
[1555] N OVAS VOZES N O ARAGUAI A: N OTÍ CI AS D O PLAN EJAM EN TO TERI TORI AL PARTI CI PATI VO
E DA NEO- COLONIZAÇÃO DEMOCRÁTICA.
WILSON MADEIRA FILHO.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, NITEROI, RJ, BRASIL.
Resumo:
a) os objetivos do trabalho – Instauração dos trabalhos preparatórios para a elaboração do Plano Diretor
Participativo do município de São Domingos do Araguaia PA, a partir de uma visão crítica do Projeto Rondon.
b) o referencial teórico e conceitual - Cerca de 145 anos após a expedição pioneira de Couto de Magalhães
(cfe. MAGALHÃES, José Vieira Couto de. Viagem ao Araguaia. São Paulo: Editora Três, 1974), cerca de 35
anos após os gritos do Araguaia e a perseguição e morte dos guerrilheiros ligados ao PC do B (cfe. MORAIS,
Taís; SILVA, Eumano. Operação Araguaia: os arquivos secretos da guerrilha. 2ª edição. São Paulo: geração
Editorial, 2005), 10 anos após o massacre de Eldorado dos Carajás e um ano após a morte da missionária
Dorothy Mae Stang, a Amazônia Ocidental permanece como a região com maior índice de conflitos agrários
no Brasil e, consequentemente, como uma das regiões de maior tensão democrática no mundo. Problemas
relativos à regularização fundiária, à disputas de terras, ao soterramento de culturas e valores tradicionais,
ao trabalho escravo (cfe. FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por
dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004) e a danos ambientais em larga
escala, são algumas das tristes marcas que caracterizam essa região, em especial o entorno do Bico do
Papagaio.
c) a metodología utilizada - A retomada do Projeto Rondon teve como um dos seus focos centrais de atuação
em 2006 uma inserção de caráter político-social em várias regiões no Brasil, em especial a Amazônia, com
trabalhos realizados em 87 municípios. O conjunto de ações foi subdividido em dois blocos, um a propor
iniciativas nos campos da Saúde e da Cidadania e outro a trabalhar com os temas da formação de
Cooperativas de Trabalhadores Rurais e a elaboração de debates preparatórios para um Plano Diretor
Participativo. De forma bastante distinta a um perfil mais propriamente assistencialista, que caracterizou o
Projeto Rondon no passado, a nova configuração indicava, na maioria dos seus itens, uma atuação indutora
por
parte
das
equipes
universitárias
a
auto-organização
local.
d) as principais questões / pontos desenvolvidos - O presente trabalho relata a experiência do grupo da
Universidade Federal Fluminense na região do Araguaia, em fevereiro de 2006, em especial no município de
São Domingos do Araguaia, e o desafio de propor uma tecnologia democrática complexa em uma região
marcada
pela
oligarquia
rural
e
pelo
mandonismo
local.
O foco da análise concentra-se nos debates preparatórios para o Plano Diretor Participativo, a partir da
proposta de inserção dos demais subtemas do Projeto Rondon em seu conjunto (Saúde, Cidadania e
formação de Cooperativas) e ainda em desdobramentos intrínsecos à metodologia do Rondon enquanto
Projeto governamental gerido pelas Forças Armadas. De um lado, apostou-se em um contexto de reforma
urbana que engloba o planejamento rural e o toma o Desenvolvimento Humano como um critério chave. De
outro lado, a convivência das equipes com os militares, em especial nos assentamentos rurais e comunidades
indígenas e tradicionais, numa região ainda com fortes traços simbólicos de combate a ideologias
revolucionárias, não raro apontou para novas dicotomias que passaram a polarizar a atuação extensionista
da universidade ao binômio obediência-hierarquia do Exército Brasileiro, trazendo críticas de parte a parte.
Foram eixos centrais da atuação da UFF, portanto, os temas do Desenvolvimento local sustentável e da
Gestão Pública. Quanto ao primeiro eixo, centrado no fortalecimento de cooperativas rurais, foram realizadas
reuniões no Sindicato dos Trabalhadores rurais de São Domingos do Araguaia trabalhando os seguintes
temas: Diagnósticos dos conflitos no campo; Legislação agrária, histórico e financiamento; Direito ambiental
e
desenvolvimento
sustentável;
Tecnologias
sociais.
Tivemos, como resultado, cerca de 50 lideranças rurais presentes, “capacitadas” quanto à criação e
fortalecimento de cooperativas e sindicatos rurais. Em diagnósticos prévios que realizáramos, conhecíamos a
forte organização local, todavia permeada pelas disputas intestinas para a presidência do Sindicato, o qual
por sua vez, era visto como trampolim para a candidatura política. Entre as dificuldades encontradas,
sobressaia a distância de alguns assentamentos, atuando como fator impeditivo para um público maior.
Na segunda semana, concentramo-nos na ampliação desse contato, realizando visitas às vilas, comunidades
tradicionais e assentamentos, chegando aos seguintes locais: Vila São José, comunidade de quebradeiras de
coco; Reserva Indígena Suruí Sororó; Vila Nazaré; Projeto de Assentamento Veneza; Comunidade São
Benedito;
Projeto
de
Assentamento
Almescão
1.
Como resultados dessa fase, foram realizadas palestras e debates com as comunidades, apresentando os
principais aspectos trabalhados nas oficinas na semana anterior com as lideranças, chamando atenção à
conscientização quanto à importância de participarem também do processo de discussão do Plano Diretor
Participativo, em vista de a maior parte da população de São Domingos do Araguaia residir no meio rural.
Quanto ao segundo eixo, do desenvolvimento local sustentável, realizamos, na primeira semana, o Curso
Plano Diretor Participativo, com a seguinte estrutura: Plano Diretor Participativo: o que é?; Plano Diretor
Participativo:
principais
diretrizes;
Legislação;
Projetos,
como
fazer;
Cidades
sustentáveis.
Como resultado, tivemos cerca de 70 inscritos, em especial servidores municipais e lideranças da sociedade
civil organizada. Entre as dificuldades encontradas, avultava a ausência dos gestores públicos,
destacadamente
os
secretários
municipais
e
o
prefeito.
Na segunda semana, realizamos a Conferência preparatória do Plano Diretor Participativo de São Domingos
do Araguaia, com o seguinte cronograma: 13/02/2006 – Financiamento e Geração de emprego e renda;
14/02/2006 – Desenvolvimento urbano e rural; 15/02/2006 – Gestão democrática; 16/02/2006 – Aprovação
dos
textos,
do
regimento
interno,
do
regulamento
e
do
calendário
e) resultados alcançados e conclusões - Se os resultados aferidos podem permitir que se leia uma ampliação
quantitativa dos participantes no processo de deliberação sobre o planejamento territorial e mesmo uma
melhora qualitativa no arsenal crítico dos cidadãos locais, sobretudo daqueles que já vinham se empenhando
em práticas reivindicatórias, também é possível se observar, na guinada no modelo assistencialista do
Projeto Rondon, instrumentos de projetos governamentais de neo-colonização democrática, em especial na
Amazônia.
A parte final deste trabalho traz para o debate alguns momentos do estado da arte do Plano Diretor
Participativo no município de São Domingos do Araguaia, relatando como foi realizado e que propostas foram
ou não efetivadas, assim como alguns dos resultados do Fórum dos Pró-reitores de Extensão em relação ao
Projeto Rondon.
AO110 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Espaço e Movimentos Sociais
[1570] M OVI M EN TOS
SOCI AI S,
( RE)
CON FI GURAÇÕES
I D EN TI TÁRI AS
E
RECONHECIMENTO DE DIREITOS TERRITORIAIS NA AMAZÔNIA.
VALTER DO CARMO CRUZ.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE- UFF, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
LUTAS
POR
O modelo que orientou o processo de ocupação e apropriação da Amazônia nas últimas décadas esteve
pautado num projeto de modernização conservadora materializado nos planos e planejamentos do Estado
autoritário e na implantação de “grandes projetos”. A premissa organizadora desse modelo era a crença no
papel da modernização como a única força capaz de destruir as superstições e relações arcaicas, não
importando o seu custo social, cultural e político. A industrialização e a urbanização eram vistas como
inevitáveis, e, necessariamente, progressivos caminhos em direção à modernização (Escobar, 1998).
Esse projeto de modernização conservadora produziu um novo ordenamento territorial onde não havia
espaço para as “comunidades tradicionais” (índios, ribeirinhos, pequenos agricultores, seringueiros,
varzeiros, castanheiros, populações quilombolas, mulheres quebradeiras de coco, etc.), suas formas coletiva
e familiar de apropriação da terra e dos recursos naturais baseados na pequena agricultura e no extrativismo
e seus modos de vidas eram vistos como um obstáculo ao “desenvolvimento” e ao “progresso”.
Assim, o avanço da fronteira econômica e demográfica na Amazônia significou uma radical mudança nos
padrões fundiários e na forma de apropriação da terra e dos recursos naturais na região, visto que a terra
deixa de ter somente um valor de uso e passa a ter um valor de troca, transforma-se em mercadoria,
institui-se o mercado de terras, assim como a legitimidade da posse que, até então, estava fundada nos
direitos consuetudinários ou “direitos costumeiros” é substituída pela legitimidade assentada no ordenamento
jurídico estatal, fundado no direito liberal-individual, expresso nos títulos de propriedade da terra.
Essas mudanças implicaram em profundos processos de des-territorialização e subalternização das
“comunidades tradicionais” na Amazônia, mas essa história de violência e subalternização que a
modernização/colonial trouxe para a região, sobretudo pelo avanço da fronteira demográfica e econômica,
passa a ser questionada a partir do final dos anos de 1980. A partir desse período ocorre um crescimento e
fortalecimento da sociedade civil, em especial, a emergência de um conjunto de movimentos sociais que
canalizam as forças políticas das chamadas “comunidades tradicionais” que, no movimento de r-existência
aos processos de exploração econômica, dominação política e estigmatização cultural, começam a se
organizar constituindo-se como novos protagonistas que ganham visibilidade a partir dos inúmeros
antagonismos
sociais
e
das
lutas
por
seus
direitos
sociais
e
culturais.
Nesse contexto, vem ocorrendo à constituição de novos sujeitos políticos e a emergência de “novas”
identidades territoriais construídas pelas “comunidades tradicionais” nas lutas sociais pela a afirmação
material e simbólica dos seus modos de vida. Para Gonçalves (2001), esse novo contexto aponta para a
construção de “novas” identidades coletivas surgidas de velhas condições sociais e étnicas, como é o caso
das populações indígenas e negras, ou remetendo-se a uma determinada relação com a natureza
(seringueiro, castanheiro, pescador, mulher quebradeira de coco) ou, ainda, expressando uma condição
derivada da própria ação dos chamados “grande projetos” implantados na região, como estradas,
hidrelétricas, projetos de mineração, entre outros (“atingido”, ”assentado”, “deslocado”). Trata-se de um
processo de re-significação político e cultural que esses grupos sociais vêm fazendo da sua experiência
cultural
e
da
sua
forma
de
organização
política.
Esses movimentos se diferenciam dos movimentos antecedentes por suas estratégias discursivas e
identitárias, ao designar os sujeitos da ação; não aparecem atrelados à conotação política que, conforme
Almeida (2004), em décadas passadas estava associada principalmente ao termo camponês e trabalhador
rural.. No momento histórico atual, esses atores políticos apresentam-se através de múltiplas denominações
e apontam para a construção de novas e múltiplas identidades. A emergência das “novas” denominações que
designam desses “novos” movimentos sociais espelha um conjunto de práticas organizativas que traduzem
transformações políticas mais profundas na capacidade de mobilização desses grupos, em face do poder do
Estado
e
em
defesa
de
seus
territórios
(Almeida,
2004).
Mas essas emergências identitárias não são gratuitas, são novas estratégias na luta por direitos. Dentro
dessas novas estratégias discursivas e das novas táticas políticas os “velhos” agentes vêm se constituindo
em “novos” sujeitos políticos ou novas posições-de-sujeito (Hall, 2004) como forma de garantias a direitos
sociais e também a direitos culturais, notadamente, do chamado “direito étnico a terra”, e os direitos que
asseguram
a
posse
coletiva
ou
familiar
das
terras
e
dos
recursos
naturais.
Essas (re) configurações identitárias, a constituição de novos sujeitos políticos, novos sujeitos de direito
significam uma redefinição das táticas e estratégias pela luta da terra na Amazônia, sobretudo pelo impacto
da emergência da “questão ambiental” e da “questão étnica” na Região. Esses dois processos se
materializam na atual realidade da Amazônia, pois há uma crescente visibilidade das questões ambientais por
conta do “desenvolvimento sustentável” e da biodiversidade; ao mesmo tempo há uma crescente
organização e mobilização das chamadas “comunidades tradicionais” na luta pelo reconhecimento dos seus
“direitos étnicos”, como vem ocorrendo com as populações indígenas, quilombolas e as populações
extrativistas como a dos seringueiros, entre outras. Isso implica numa espécie de “ambientalização” e
“etnização” das lutas sociais, complexificando a questão agrária, foco irradiador dos principais conflitos na
região.
Nessa busca de afirmação de suas identidades coletivas e de suas territorialidades que esses movimentos
vêm reivindicando ou mesmo inventando novos direitos . Os movimentos sociais lutam pelo reconhecimento
por parte do Estado de uma outra ordem jurídica, uma matriz de normatividade alternativa, que possa
garantir as diversas modalidades de territorialização que não se enquadram inteiramente dentro do modelo
da propriedade capitalista e do direito liberal individual. Neste sentido, busca-se o reconhecimento de um
quadro normativo capaz de reconhecer direitos pautados no uso, na tradição, nos chamados direitos
consuetudinários ou “direitos costumeiros”, direitos esses ignorados ou invisibilizados no estatuto jurídico
estabelecido.
O objetivo desse trabalho é analisar a relação entre esses processos de (re) configurações identitárias, e as
lutas pela afirmação das territorialidades e pelo reconhecimento dos chamados direitos territoriais das
chamadas “comunidades tradicionais”, em especial, as comunidades quilombolas, bem como a criação de
reservas extrativistas na Amazônia.
AO393 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[2066] PLAN O D I RETORES E PARTI CI PAÇÃO POPULAR: UM A ESTRATÉGI A D E GESTÃO
DEMOCRÁTICA.
SARAH LÚCIA FRANÇA.
UNIFACS, SALVADOR, BA, BRASIL.
Resumo:
Este estudo tem como principal objetivo apresentar algumas considerações acerca da importância da
participação popular na gestão urbana e, em especial, na elaboração de planos diretores, a fim de propor um
desenvolvimento ordenado das cidades brasileiras. Assim, para elaboração deste trabalho foi feita uma
intensa revisão bibliográfica através de livros, revistas, jornais e documentos legais. Além disso, a
participação em equipes técnicas para a elaboração de Planos Diretores permitiu vivenciar o processo,
facilitando o entendimento das dificuldades enfrentadas pelos diversos segmentos envolvidos.
A complexidade dos centros urbanos passa a exigir novas estratégias de gestão, que obriga planejadores e
urbanistas a refletir sobre as questões e a busca de novas alternativas e leis de controle urbanístico, a fim de
proporcionar melhor qualidade de vida da população. O Planejamento urbano é uma dessas estratégias que,
a partir da dinâmica da sociedade também ganha novas roupagens, cada dia mais fortalecido pelas
conquistas
democráticas.
A partir dessas necessidades, ocorreu uma intensa mobilização dos grupos socais desfavorecidos, na luta
pelos seus direitos, surgindo assim, os movimentos sociais. Dessa forma, a população auxilia na tomada de
decisões a cerca dos problemas urbanos, contribuindo para a descentralização do poder do Estado sobre o
rumo
da
cidade
e
lutando,
por
uma
distribuição
mais
igualitária
de
oportunidades.
A participação popular nas ações de planejamento urbano tem apresentado avanços em função da
diversidade de momentos políticos que o país tem atravessado, como a conquista pela democracia com a
Constituição de 1988, e logo após, o Impeachment do Presidente Fernando Collor. É preciso reconhecer, que
a sociedade civil e suas formas de organização e manifestação vieram se modificando ao longo do tempo.
Uma das grandes conquistas da população, em outubro de 2001, foi a aprovação do Estatuto da Cidade, que
regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal. A lei define alguns instrumentos para auxiliar no
desenvolvimento urbano, e o Plano Diretor Participativo é um deles. Assim, nesses últimos cinco anos, a
democracia adquire outra dimensão. A sociedade passa a participar da elaboração, do acompanhamento e da
execução não só dos planos diretores, mas, também, dos programas a que se referem às políticas públicas.
Inicia-se então, um novo ciclo, a democracia urbana, com a valorização da participação dos movimentos
sociais na definição das políticas públicas, mudanças no modelo de gestão das cidades, a partir da aliança
entre governo e sociedade civil. Tudo isso possibilitou legitimidade no processo, além de facilitar as condições
de
governabilidade.
Inúmeros foram os problemas decorrentes deste novo ciclo, pois não tem uma metodologia ou fórmula
pronta, para inclusão dos cidadãos nas decisões urbanas. O que existem são instrumentos capazes de dar
legitimidade a esse processo. Para haver a efetiva participação cidadã é necessário que ocorra a articulação
de instâncias, de atores, de interesses (particulares e coletivos) e entre a participação da população e
representação política. Nesse sentido, a tarefa de promover tais articulações, cabe a todos os atores sociais e
requer algumas condições básicas, das quais se destacam a qualidade da informação, a existência de
recursos
econômicos
e
a
motivação
destes
atores.
Mesmo cidades como Recife, Porto Alegre e Santos que buscaram a implementação de uma gestão
democrática e serviram como “modelos de planejamento urbano” às demais capitais, ainda estão distantes
dos ideais da democracia e da justiça social, sendo que os seus esforços não foram suficientes para a
construção
de
um
plano
diretor
com
a
efetiva
participação
da
população.
De fato, as formas de participação popular são bem amplas e indicam as possibilidades de descentralização e
de gestão democrática. De acordo com a questão a ser discutida, várias estratégias poderão ser utilizadas
simultaneamente. O poder público deve conduzir o processo de forma plenamente transparente, e seus
propósitos e ações devem ser explícitos. A clareza de objetivos torna as decisões mais viáveis.
Um dos graves empecilhos da participação popular é a estrutura pública que não permite certa sociabilidade
e a repartição dos poderes. Ainda é muito forte a centralização, sendo que muitos políticos não conseguem
repartir o poder com outros segmentos sociais. É preciso reverter esse quadro, no sentido de ampliar a
participação social nas intervenções públicas e isso requer uma ação transparente, descentralizada e
participativa.
Esse
é
o
tripé
da
luta
pela
gestão
democrática.
A nova concepção de planejamento participativo deve ser praticada, cuja cidade, produzida por vários
agentes, deve ser planejada através de uma ação coordenada, em torno de um pacto social que reflita os
anseios da sociedade e corresponda aos interesses públicos. Na medida em que se tornam públicas, as
diretrizes e prioridades de desenvolvimento e expansão urbana, a sociedade pode intervir e participar da
gestão
pública.
Contudo, a democratização do plano diretor é fundamental para romper esse vício de projetos e planos
prontos em escritórios e compartilhar o processo com todos os cidadãos, assumido por todos os atores. A
participação popular nas decisões urbanas não é um convite, e sim, um dever de todos os cidadãos. Com
isso, o planejamento deixa de ser uma solução apenas técnica e passa a ser transformado em resultado de
articulação
política
entre
os
diversos
atores
sociais
que
pactuam
a
vida
da
cidade.
Assim, hoje o panorama se transforma. A participação da população no processo de planejamento da cidade
é de fundamental importância, mas ainda falta percorrer um caminho muito longo de conquistas, para que
tenhamos no futuro, a cidade ideal, desejada por todos, sem desigualdades e problemas urbanos.
AO394 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Urbanização da Sociedade
[1334] O D I LEM A D A ESCOLH A: RAÇA, FAVELAS, I D EN TI D AD ES E TEORI A D AS REPRESEN TAÇÕES
SOCI AI S EM I N TERFACE COM A GEOGRAFI A URBAN A — A CON STI TUI ÇÃO D OS TERRI TÓRI OS
FAVELADOS NA METRÓPOLE DO RIO DE JANEIRO E PRÁTICAS CORRELATAS.
BRENO DO NASCIMENTO GONÇALVES MENDES.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O presente texto estuda fenômenos sociais e espaciais associados às favelas na cidade do Rio de Janeiro.
Resulta de pesquisa da Geografia Urbana que buscou a possível contribuição metodológica da Teoria das
Representações Sociais (TRS) — desenvolvida por Serge Moscovici — à investigação da compreensão do
modo pelo qual se deu a construção, ao nível do imaginário, das favelas e dos negros. Partimos da hipótese
de que na cidade ocorre a formulação de redes simbólicas de representações sociais discriminatórias e de
caráter racial acerca de indivíduos negros e residentes de favelas, o que contribuiria com a segregação
espacial e social existentes, alterando as identidades existentes. Há a hipótese de que algumas
representações justificam e reificam as diferentes possibilidades de apropriação do espaço urbano, de acordo
com a raça dos indivíduos ou sua residência em favelas, e tendem a cristalizar as diferenças entre brancos e
negros, dos habitantes da “cidade asfáltica” e da “cidade favela”. Estabelecemos assim dois objetivos
primordiais, que nos balizaram: 1- investigar relações entre a construção social da raça negra na cidade, o
universo simbólico e as práticas sócio-espaciais desenvolvidas pelo Estado desde o período colonial, com os
espaços quilombolas; 2- buscar na TRS contribuições à compreensão da constituição das diferentes
representações de negros e favelados e suas implicações espaciais na urbanização da metrópole, associando
a TRS ao conceito de identidade (em M. Castells), assim como ao estudo dos processos históricos, simbólicos
e de constituição do espaço criminalizado, associados à análise do discurso hegemônico.
O presente estudo se torna interdisciplinar, graças à combinação da análise da urbanização da metrópole à
teoria da Psicologia Social. Na Geografia, analisamos os conceitos de território, lugar, espaço favelado e
analisamos a transmutação de quilombos periurbanos em favelas e esgarçamento do tecido sócio-espacial
(nos termos de Andrelino Campos e Marcelo Lopes). Na Sociologia, buscamos os estudos acerca da
identidade, desenvolvidos por Castells, e poder. Na TRS, o conceito de representações sociais e os processos
que permitem compreender a emergência das significações e a análise do sentido.
Para desenvolver as pesquisas, associamos bibliografias da Geografia Urbana, Ciências Sociais, Psicologia
Social, e Lingüística. Inicialmente analisamos a validade do conceito de “raça” no contexto brasileiro. Tais
considerações são enriquecidas com dados do Censo 2000. Iniciamos então o debate quanto às identidades
(auto representações) negras na cidade, dialogando com a TRS. Analisamos a constituição de representações
sociais, hetero representações simbólicas construídas nos diferentes processos sociais desenvolvidos no
espaço e no tempo. Iniciamos a análise dos discursos hegemônicos, e culminamos com a Geografia e seus
estudos urbanos que estabelecem relações entre antigos quilombos periurbanos e as favelas cariocas
contemporâneas.
Articulam-se aos objetivos, a pesquisa do papel da construção das identidades negras e suas representações
sociais para a constituição das diferentes noções de favelas. Para além, cabe investigar as tentativas de
associação de negros e favelados, empreendidas via discurso hegemônico, e os fatores que contribuem para
a inculcação de representações diferenciadoras das pessoas em um viés racial e locacional.
Propomos alternativas contra-hegemônicas para uma pedagogia cotidiana que permitam modificações das
representações de grupos sociais e de espaços, não mais construídas via dominação pelo discurso e uso de
pedagogias conservadoras e antidemocráticas, com a denúncia de seu caráter discriminatório e
segregacionista, idealizadas hegemonicamente desde tempos coloniais (hoje utilizando a mídia de massa
para propagar seus ideários), e contribuir para re-fundar a escola como espaço privilegiado do conhecimento,
onde a possibilidade de questionamento se torne realidade, construindo representações pautadas no
conhecimento dos processos históricos, culturais, espaciais e simbólicos de construção da cidade do Rio de
Janeiro.
Concluímos que as noções de raça e identidade afetam em muito a vida dos residentes ou não em favelas. As
bibliografias nos indicam serem os indivíduos negros e favelados aqueles que sofrem influências mais
nefastas em seu modo de vida e no modo de identificar-se perante os demais grupos societários. Tais
considerações emergem a partir de nossa proposta metodológica do par conceitual “identidade –
representação social” como o que permite maior aproximação teórica com os fenômenos sociais e espaciais
ocorrentes cotidianamente na metrópole carioca. As noções de identidade e representação social contribuem
para fundamentar as práticas sócio-espaciais, e estas são intimamente relacionadas ao universo simbólico e
de signos — assim como o sistema de objetos e de ações — existente e constituinte do espaço, a todo o
histórico de lutas e resistências ético-políticas existente no território, e a significação, sentimento e a
experiência adquirida no processo singular da vivência apreendida no lugar. A construção das identidades
negras passa por questões pretéritas de ação do Estado. Práticas policiais e preventivas aplicadas aos
quilombos periurbanos são constantemente reproduzidas com as atuais favelas, além de formas de
representações sociais que, assim como no período colonial e imperial, associam o negro ao espaço das
favelas (ocupando papel simbólico semelhante ao dos quilombos para a ordem do Estado); o espaço favelado
e seus habitantes estariam associados aos negros. As representações sociais se formam a partir do sujeito
coletivo; neste sentido, a subjetividade do indivíduo foi construída em profunda relação com a sociedade, da
qual aprendeu códigos lingüísticos, simbólicos e respectivas normas. Neste processo, estará continuamente
construindo e alterando suas identidades, graças aos imponderáveis da vida, permanentemente mutável.
AO395 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[1336] ABORDAGENS BRASILEIRAS ACERCA DAS PERIFERIAS.
ROSELAINE OLIVEIRA DOS SANTOS.
UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Neste trabalho objetiva-se discutir a trajetória do conceito de periferia na formação social brasileira. Busca-se
compreender, desde os caminhos teóricos que consolidaram, a partir da década de 1970, certo paradigma
interpretativo responsável por uma visão “majoritária” da periferia, até as abordagens mais recentes, as
quais lançam diferentes olhares para as transformações em curso nestes espaços, formulando diferenciadas
interpretações.
Em linhas gerais, é feito um esforço de síntese cujo resultado expõe cinco grandes correntes interpretativas
das periferias urbanas no Brasil, as quais mostram-se ora complementares, ora excludentes, refletindo
diferentes momentos da organização desses espaços e/ou de um contexto teórico filosófico mais amplo.
De forma geral, na primeira e mais antiga corrente interpretativa, a periferia é entendida como espaço de
extensão ou continuidade do crescimento urbano, sendo uma área de transição entre o urbano e o rural, na
qual o uso urbano vai progressivamente tomando espaço e se sobrepondo ao rural, podendo haver a
predominância de um ou outro uso. Nessa visão, a periferia não está atrelada a nenhum conteúdo de classe e
a distância em relação ao centro urbano é conseqüência da capacidade de dinamismo e crescimento espacial
do
mesmo.
Em uma segunda visão, consolidada na década de 1970, sob influência do debate acerca das teorias do
desenvolvimento, a periferia no Brasil passou a ser entendida como um resultado espacial da segregação
imposta por um capitalismo dependente; espaço, ao mesmo tempo, física e socioeconomicamente distante
de um centro urbano, locus da reprodução social da classe trabalhadora pauperizada. Assim, seria funcional
ao sistema por permitir o desadensamento do núcleo e a diminuição das pressões populares sobre o Estado e
os empregadores, sendo atrelada a um conteúdo social específico (de baixo status), ao loteamento popular
baseado na autoconstrução e às mais elementares carências urbanas (tanto maiores quanto maior a
distância
em
relação
ao
centro
urbano).
Para uma terceira corrente, engendrada no mesmo contexto teórico que a segunda, independentemente da
localização próxima ou distante ao centro urbano, o que marca a periferia é a condição de pobreza de seus
habitantes e a baixa renda diferencial, sendo representada por espaços tão diversos como favelas, cortiços
ou
loteamentos
populares,
por
exemplo.
Marcando uma quarta corrente interpretativa que veio complementar a segunda (ressaltando o dinamismo
populacional e econômico da periferia), está a idéia de que esses espaços tendem a um processo de
heterogeneização sócio-espacial, deslanchado a partir do incremento das atividades de comércio e serviços
(por vezes também industriais) a reboque do crescimento populacional que gera demanda crescente aos
comerciantes e prestadores de serviços locais, com diferentes níveis de capitalização. A idéia de uma
periferia homogeneamente pobre e carente das infra-estruturas mais básicas é descartada em prol de uma
visão mais complexa que destaca espaços residenciais e de consumo cada vez mais sofisticados a compor um
cenário
sócio-espacial
crescentemente
heterogêneo.
Finalmente, em uma quinta visão, bem recente, a periferia passa a ser entendida não só como locus da
segregação imposta às classes pobres, como também da auto-segregação de classes abastadas oriundas do
núcleo metropolitano. De acordo com essa última visão, as periferias brasileiras estariam cada vez menos
vinculadas a um conteúdo específico de classe, existindo uma “periferia pobre” e, cada vez mais, uma nova
“periferia rica”, constituída por condomínios fechados, que estaria transformando e dualizando a periferia
tradicional. Ao considerar uma “periferia rica”, esta visão trata a periferia, sobretudo, em termos da distância
física em relação ao centro metropolitano, deixando de lado uma unidade conceitual atrelada aos processos
de
segregação
e
exploração
em
relação
a
um
centro.
Dentre as cinco interpretações acima, as duas últimas tratam de transformações recentes nas periferias, e à
primeira vista estariam tratando de uma mesma coisa: a complexificação dos conteúdos sociais na periferia.
Entretanto, defende-se que a heterogeneização sócio-espacial da periferia e a formação de espaços autosegregados em meio à periferia para usufruto de uma elite oriunda do centro metropolitano constituem
processos completamente distintos que elaboram formas, paisagens, lugares e funções igualmente diversos
na estrutura metropolitana e apresentam diferentes inter-relações com a periferia e com o processo de
periferização. Assim, enquanto a heterogeneização sócio-espacial da periferia é entendida enquanto um
desdobramento do processo de periferização (ou seja, como decorrente, em última instância, do crescimento
de uma população pobre e segregada em relação ao núcleo metropolitano, que passa a constituir-se em
demanda capaz de gerar oportunidades de negócios para agentes locais minimamente capitalizados,
contribuindo à geração de empregos e de uma classe média na periferia), a formação de espaços autosegregados em meio à periferia para usufruto de uma elite oriunda do núcleo metropolitano seria decorrente
de um processo outro, o de “suburbanização” dessas elites (no sentido norte-americano de suburbs), que
passam a fugir dos fatores de deseconomias de aglomeração do núcleo e a buscar espaços vazios (que
podem ou não ser em meio à periferia) onde seja possível a constituição de “edge-cities”.
AO396 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Urbanização da Sociedade
[1566] O CIRCUITO DE RÁDIO FM E A PRODUÇÃO FONOGRÁFICA EM CAMPINAS- SP.
CRISTIANO NUNES ALVES.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
A pesquisa propõe analisar as dinâmicas sócioterritoriais na metrópole de Campinas. Queremos
especialmente contribuir para o entendimento da conformação e da espessura do circuito de rádio FM na
cidade, produto e condição do circuito de produção fonográfica, inserido no contexto da industria cultural
como
meio
de
divulgação
de
massa.
Em torno das variáveis “radiodifusão” e “produção musical”, temos a situação de “experiência sonora no
lugar” que tomamos como componente do espaço geográfico contemporâneo. O circuito de rádio FM faz uso
de um sistema de objetos para desenvolver suas atividades, tais como estações de rádios comerciais e
comunitárias, torres de transmissão, carros de propaganda, estúdios de produção musical, lojas de discos,
entre outros. Suas ações configuram igualmente um sistema, indissociado do sistema material, movido por
seus agentes e manifesto, entre outros elementos, pelo fluxo de informação de programação das rádios
(notícias e entretenimento), produção fonográfica em si, eventos musicais, entre outros. Trata-se de objetos
e ações que dão forma ao que Milton Santos denomina meio-técnico-informacional (Técnica, espaço e tempo.
SP:
Hucitec,
1994).
Surgido no final do século XIX na Inglaterra, o rádio rapidamente se difunde para vários lugares do mundo e
chega ao Brasil em 1923, instalando-se como um meio de informação de elite. Em 1937 se iniciam os
trabalhos da Rádio Cultura, primeira em Campinas, já na época uma cidade de significância na rede urbana
do
Estado
de
São
Paulo.
As rádios se tornaram elemento vital para a introdução da indústria cultural no país. A partir de década de
1940 entram na era da publicidade e os dados desse período, chamado de “época de ouro do rádio”, já
indicavam estratégias verticais de uso do território ligadas ao veículo. O rádio passa a ser utilizado para
difundir ideologias em favor da integração territorial sob o comando de uma racionalidade capitalista
homogeneizante.
No pós-guerra, em face de concorrência com a TV, o rádio se transformou em um meio de informação de
“segunda classe” para as elites, e passa a ser direcionado sobretudo às camadas populares urbanas. Na
década de 1960 no contexto de um vigoroso momento de industrialização e urbanização, surge o
instrumento que regula a radiodifusão no país: o Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT), amparado
pela Lei 4.117 de 27 de agosto de 1962, que demonstra a importância assumida pela radiodifusão no
processo
de
modernização
do
território
nacional.
Na década seguinte o Ministério das Comunicações lança o plano de distribuição de canais FM (Freqüência
Modulada). Trata-se de uma freqüência que, em relação à AM (Amplitude Modulada) - predominante até
então - tem menor alcance e maior fidelidade sonora. Adequada para a radiodifusão musical, a FM se torna o
meio preponderante na divulgação do circuito de produção fonográfica de massa no país.
Impulsionadas por ações estratégicas do governo militar as concessões se tornam ao mesmo tempo moeda
de troca de grupos políticos e um meio de interiorização para a radiodifusão, estendida a um maior número
de lugares. O período de expansão da FM coincide com uma época de urbanização crescente em que se
delineia o meio-técnico-científico-informacional no Brasil. Na medida em que crescem as aglomerações
urbanas e ganha complexidade a mediação técnica que dá conteúdo ao fenômeno urbano, torna-se urgente
todo
um
sistema
instrumental
para
a
difusão
da
cultura
de
massas.
No território brasileiro, o rádio envolve um complexo conteúdo de objetos e ações: Trata-se do veículo de
massa que abrange o maior número de lugares. De acordo com o Ministério das Comunicações em 2004, dos
4.974 municípios da federação, 1573 abrigam emissoras de rádio e quase a totalidade do território é
envolvido
pela
radiodifusão.
Mas, na contramão e em constante atrito - confluência com as estratégias verticais de uso do território pelo
circuito FM, eclodem nos lugares circuitos ascendentes associando rádios livres, movimentos culturais e a
produção
musical
independente,
entre
outros.
Tal conflito entre ordens verticais (descendentes) e a dimensão horizontalizada (ascendente) da vida dos
lugares pode ser reconhecido, entre outros, no circuito de produção de rap, música que compõe a cultura hip
hop. Malgrado o monopólio da informação difundido pelo circuito FM - que em geral corresponde a um
conteúdo informacional alheio ao lugar – se organiza, portanto, um circuito de produção musical pautado na
proximidade, possível por meio de uma comunicação ascendente. Esse circuito envolve uma mídia
denominada alternativa, apontando para formas de fazer igualmente alternativas, que incluem a apropriação
das novas tecnologias de informação. Nesse sentido podemos pensar nos caminhos que conferem à arte uma
expressão
política.
Para problematizar esta questão, tomamos como situação a cidade Campinas, no período que se inicia em
1969 a partir da chegada da FM, com a fundação da Rádio Andorinha, primeira a operar no município, até os
dias atuais. A região de Campinas a partir da década de 1970 experimenta o processo de metropolização.
Desde o início da expansão da FM, a Região dispõe de um conteúdo técnico e informacional adequado para a
difusão
do
novo
circuito.
Nos interessa entender a força de agregação que contém o saber e a comunicação entre os homens no lugar.
Da comunicação entre os indivíduos acreditamos emergir formas de pensar e agir no território a partir de
uma
racionalidade
alternativa
à
racionalidade
hegemônica.
Trata-se do estudo de Campinas enquanto um lugar, a partir das densidades técnica, informacional e
comunicacional. Buscamos, pois, compreender as condições geográficas de vida nesta metrópole por meio do
refinamento do conceito de densidade comunicacional, colaborando assim para o debate sobre os usos
possíveis e correntes do território atual.
AO397 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Urbanização da
Sociedade
[1704] A INTEGRAÇÃO PRECÁRIA DOS GUARANI- MBYA AO \ "UNIVERSO URBANO\ ".
CAMILA SALLES DE FARIA.
USP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
Uma leitura geográfica da metrópole de São Paulo revela um processo que envolve relações de espaços e
tempos diferenciadas. Podemos destacar relações espaços/tempos integrados ao sistema mundial, nos quais
aparecem espaços homogeneizados — produzidos pelo Estado, através do planejamento —, fragmentados e
hierarquizados — pelo capital através da propriedade privada, no que se refere aos tempos, não há muita
diferença, visto que estes também são ditados pelo modo capitalista de produção. Assim, a paisagem da
metrópole revelaria uma produção constante de novos espaços, assim como predomínio das vias de
circulação, para maior fluxo e movimentação das mercadorias e um menor tempo para se realizar o processo
de
reprodução
do
capital.
Mas a metrópole não é só isso. Ela apresenta também espaços de apropriação/uso e tempos que não são
ditados pelo “relógio do capital”. Com este intuito esta pesquisa busca desvendar, o que hipoteticamente,
acredita-se como um espaço de resistência na metrópole paulistana: a Terra Indígena Jaraguá. Porém, tornase necessário pensa-la através de um processo de mudanças lidas através da contradição
integração/desintegração deste povo no que se pode chamar de “universo urbano”. Evidentemente trata-se
de um processo contraditório que não se realiza de forma linear e integral no tempo e nem homogeneamente
no
espaço.
A Terra Indígena Jaraguá — localizada na zona oeste da cidade de São Paulo — é ocupada pela população
Guarani Mbya e formada por duas glebas que compõem o Tekoa Ytu (Aldeia na frente da Pedra), dividida
pela Estrada Turística do Jaraguá, área demarcada e homologada desde 1987 , pelo então Presidente da
República José Sarney, e outra gleba, Tekoa Pyau (Aldeia Nova, que renasce). Esta última área não está
demarcada
por
isso
se
encontra
em
conflito
e
foi
reocupada
a
partir
de
1995.
Este processo de mudança lido como um momento de incorporação do índio ao “universo urbano” revela a
passagem da relação de imediaticidade entre a comunidade indígena Guarani Mbya e a natureza para uma
relação de mediaticidade, através inicialmente da introdução do dinheiro nas relações sociais da aldeia como
meio de troca, e que vai produzir uma alteração profunda no processo de trabalho, tanto no que se refere às
relações de trabalho quanto ao hábito de consumo dos produtos. Esta transformação resulta na expansão da
metrópole sob a lógica capitalista, por meio do processo de periferização, e com isso consequentemente da
proximidade com a cidade onde as relações passam a ser mediadas pela mercadoria e pelo mercado.
Em um primeiro momento a relação com a natureza para os Guarani bastava para garantir parte das
necessidades vitais como a alimentação e a produção de sua cultura material. Isto porque os Guarani além
de caçadores, coletores são também agricultores de pequenos roçados. Hoje, porém, este processo de
imediticidade com a natureza se transformou radicalmente. Isto porque esta relação direta com a natureza
como sustento da vida e da cultura, não garante mais a sobrevivência da comunidade que passa a depender
das relações com o universo urbano, e desta forma há uma inserção do índio ao modo urbano que pode ser
percebido nas aldeias. Deste modo invertem-se as relações, agora a existência dos índios é garantida pela
troca
na
cidade
em
busca
de
produtos
para
complementar
sua
alimentação.
Essa nova relação é patrocinada pelo Estado, através de políticas indigenistas integracionistas, como a
criação de uma série de “cargos” para os membros da comunidade dentro das aldeias e como a garantia suas
“aposentadorias”.
A análise que desvenda esse processo se apóia na articulação possível de três momentos produzindo espaços
diferenciados
englobando:
transformação,
deterioração,
e
resistência.
Uma transformação aparece como decorrência do processo apontado como produto da demarcação das
Terras
Indígenas,
resultando
em
um
“cercamento”
da
aldeia.
Uma deterioração é percebida no modo de vida da comunidade através da mudança nas relações com a
natureza juntamente com o processo de “cercamento” das terras indígenas, o que revela uma constante
diminuição da fronteira, tornando-se apenas um limite com o urbano. Tal momento é ressaltado ainda pelo
fato de que a comunidade indígena está proibida de coletar e caçar dentro do Parque Estadual do Jaraguá,
localizado nesta zona fronteiriça. Mostrando que se trata de uma outra lógica tanto do entorno, como
também do Parque, que não é similar à lógica da população Guarani. Para os Mbya a natureza faz parte de
seu mundo, de seu cosmos e por isso o homem a ela pertence. Diferentemente dos não-índios que a vêem
como algo exterior, para dominá-la ou até mesmo negá-la. Acrescida da lógica do capitalismo deixa de ser
natureza e passa a ser recursos naturais, e nesta dimensão, passíveis de serem comercializados.
Uma resistência é notada através da cultura Guarani ao processo de integração ao “mundo urbano”, seja
através dos rituais e mitos, ou seja na sua relação com a terra, a tradição e a língua, e tem um sentido outro
aquele da propriedade privada que se estabelece em seu limite. Aqui se potencializa a possibilidade da
realização do modo de vida indígena.
AO398 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[1783] VIOLÊNCIA CRIMINAL NO ESPAÇO URBANO DE SANTA MARIA- RS.
ELIANE MELARA; VANDA UEDA.
UFRGS, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL.
Resumo:
OBJETIVO
Esta pesquisa tem como objetivo demonstrar a importância da temática da violência bem como a
espacialização dos crimes no espaço urbano de Santa Maria-RS, através da identificação de áreas onde a
criminalidade
está
mais
acentuada,
analisando
geograficamente
este
processo.
REFERENCIAL
TEÓRICO
A violência é ao mesmo tempo geral e específica, sua análise é uma questão de escala. Problemas como a
pobreza e o desemprego, falência ou corrupção das/nas instituições de repressão e punição (polícias,
instituições prisionais, sistema judiciário), a alegada crise de valores do mundo contemporâneo e a sempre
lembrada crise das instituições sociais como a família, têm uma abrangência nacional e internacional. Tais
fatores emergem e operam em escala supralocal, e tem a ver com decisões ou processos que vão desde a
dinâmica do sistema mundial capitalista até políticas macroeconômicas nacionais e especificidades sócioespaciais
na
cidade.
Souza
(2005).
A violência já é companheira constante da maior parte da população urbana, onde o medo e a ansiedade,
incorporados ao seu cotidiano, não somente tem modificado os seus hábitos como tem produzido políticos
oportunistas com plataformas eleitorais que incluem promessas mirabolantes de contenção da criminalidade
(Félix, 1996). De acordo com a autora, a Geografia só recentemente vem dando maior atenção ao tema,
especialmente a partir da conscientização da necessidade de se dar maior relevância aos processos sociais,
com novas abordagens das desigualdades e de como estas constroem e geram espaços diferenciados.
De acordo com Caldeira (2000) a violência e o medo combinam-se a processos de mudança social-espacial
nas cidades contemporâneas, gerando novas formas de segregação social no espaço urbano. No entanto, sua
investigação é especialmente importante porque fomenta o desenvolvimento de dois novos modos de
descriminalização: a privatização da segurança e a reclusão de alguns grupos em enclaves fortificados.
Segundo a autora os enclaves fortificados – prédios de apartamentos, condomínios fechados, conjunto de
escritórios ou shopping centers – constituem o cerne de uma nova maneira de organizar a segregação e a
reestruturação
econômica.
METODOLOGIA
Utilizou-se como procedimentos metodológicos para a realização da pesquisa: a efetuação de coleta de dados
criminais na Brigada Militar, relacionados às ocorrências criminais; construção de gráficos e mapas, a fim de
quantificar, cruzar e espacializar as informações obtidas e realização da análise das questões abordadas,
correlacionando a bibliografia pesquisa com as informações obtidas, a fim de construir algumas
considerações
sobre
a
temática
estudada.
Inicialmente a proposta vinculava-se numa espacialização da violência criminal nos bairros de Santa Maria.
Entretanto, no ano de 2006, com a implantação do Novo Plano Diretor, de acordo com a Lei Complementar
nº 042, de 29 de dezembro de 2006 o espaço urbano da cidade foi dividido em 8 Regiões Administrativas e
41 bairros (antes eram 24). Dessa forma, optou-se por efetuar este estudo considerando as Regiões
Administrativas da cidade - Centro Urbano, Norte, Nordeste, Oeste, Centro Oeste, Centro Leste, Sul e Leste.
Foram analisados dados referentes às ocorrências criminais, fornecidos pela Brigada Militar, comparando as
informações entre os anos de 1998 e 2003. De acordo como o Código Penal, delimitou-se para o trabalho os
crimes Contra Pessoa (homicídios e lesões corporais), Contra o Patrimônio (roubos e furtos), assim como
Tráfico
e
Consumo
de
Entorpecentes.
PRINCIPAIS
QUESTÕES
A violência é um fenômeno que afeta a sociedade numa escala global. As grandes metrópoles do Brasil
sofrem enormemente com essa problemática, entretanto, as cidades médias também vêm apresentando
significativos
níveis
de
criminalidade.
Considera-se, desse modo, que a dinâmica criminal pode ser um dos fatores de transformação do espaço e
reorganização
espacial
(o
crime
transforma
o
espaço
e
seus
significados).
Nesse sentido, estudar a violência a partir da Geografia torna-se um grande desafio, já que a esta é vista
como uma prática sócio-espacial, como um elemento do espaço geográfico e como parte do espaço urbano.
RESULTADOS
E
ALGUMAS
CONSIDERAÇÕES
Pode-se diagnosticar um expressivo aumento da taxa de criminalidade no ano de 2003 em relação ao ano de
1998 no espaço urbano de Santa Maria. Conforme a espacialização das informações obtidas, em quase todas
as modalidades criminais selecionadas para este trabalho, as regiões administrativas Centro Urbano, Oeste,
Norte e Nordeste se destacaram com os maiores números de incidência criminal. As regiões Leste, Centro
Leste, Sul e Centro Oeste apresentaram um número reduzido de crimes se comparado as outras regiões.
Uma das causas da incidência de crimes estar focalizada na região central e noroeste da cidade vincula-se a
maior concentração populacional nestas áreas. Sabe-se que existem outras causas que explicam a
espacialização criminal na cidade de Santa Maria, já que a violência é um assunto complexo e envolve uma
multiplicidade de questões. Embora este estudo esteja assentado num modelo estatístico de comportamento,
considera-se necessária a análise conjunta com fatores sociais, econômicos, políticos, culturais, a fim de se
chegar a possíveis explicações sobre as causas da violência, e as repercussões deste fenômeno no espaço
urbano.
AO399 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[1592] A FOM E E A M I SÉRI A N A ALI M EN TAÇÃO: UM A ABORD AGEM CRÍ TI CA A PARTI R D A
METRÓPOLE DE SÃO PAULO.
JOSÉ RAIMUNDO SOUSA RIBEIRO JUNIOR.
DG / FFLCH / USP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
A
Ge ogr a fia
da
Fom e
Pode-se dizer que Josué de Castro foi o primeiro intelectual brasileiro a chamar a atenção para o drama da
fome. Através de uma vasta obra, escrita entre as décadas de 30 e 60, esse médico e geógrafo recifense,
rompeu com o que ele mesmo denominava o “tabu da fome” – tabu que, apoiado em preconceitos morais e
interesses
políticos,
tornava
a
fome
um
tema
proibido.
Sua primeira grande contribuição foi a conceituação da fome. Para ele a fome se manifestaria de diversas
maneiras: coletiva ou individual; endêmica (constante) ou epidêmica (surtos); parcial/oculta ou total
(inanição). Definições importantes que trazem profundidade ao conceito sem restringi-lo a casos esporádicos
e
extremos.
Através de seus dois livros mais conhecidos, Geografia e Geopolítica da Fome, Josué de Castro descreveu os
horrores da fome no Brasil e no mundo e delimitou o que seriam as áreas de fome endêmica e epidêmica.
Nesse caminho combateu as teses que explicavam a fome através de um determinismo climático, chamando
atenção para a importância do “passado histórico” para o entendimento da realidade.
Porém, se a obra de Josué de Castro permanece importante para o entendimento da fome, ela não é
suficiente. Apesar de ter escolhido a fome como temática (uma escolha ousada para a época) ele não rompeu
com a análise regional tradicional de forte caráter descritivo e empirista. Além disso, o fato de ter vivido a
transição do Brasil de um país predominantemente rural para um país predominantemente urbano, fez com
que ele se debruçasse principalmente sobre a população do campo.
A
Ur ba n iza çã o
Cr ít ica
A realidade que vivemos hoje nos coloca a necessidade de uma nova interpretação da fome. O século XX foi
marcado por um imenso movimento migratório do campo para as cidades. No Brasil a população urbana já
representa
cerca
de
80%
da
população
total.
Essa enorme mobilização da população respondeu às necessidades de reprodução do capital, que precisava
de uma vasta mão-de-obra nas cidades para realizar o processo de industrialização. Assim nasceram as
metrópoles brasileiras, que sintetizam, de algum modo, o desenvolvimento contraditório da economia
capitalista.
O processo de industrialização, que em um primeiro momento mobilizou a população para as cidades, agora
caminha no sentido de expelir cada vez mais os trabalhadores do processo produtivo através do
desenvolvimento das forças produtivas. As enormes cidades, que cresceram atendendo às necessidades do
capital, chegam ao limite da crise, pois o desemprego generalizado leva à miséria aqueles que têm como
única
forma
de
sobreviver
a
venda
de
sua
força
de
trabalho.
Simultaneamente, a cidade torna-se ela mesma um negócio. A propriedade privada da terra sustenta um
amplo campo de negócios urbanos que tornam a vida cotidiana dos trabalhadores ainda mais miserável. Uma
enorme massa de trabalhadores e desempregados (ou subempregados) enfrentam cotidianamente a
radicalidade
da
situação:
não
há
moradia
nem
emprego
para
a
maioria.
Além dos conflitos e das diferenças sociais podem ser identificadas as diferenças espaciais de acesso à
urbanização. A metrópole – enquanto negação da cidade, cidade fragmentada – revela o império da
economia
sobre
a
vida
cotidiana
e
sintetiza
o
momento
crítico
que
vivemos.
Trata-se da urbanização crítica (DAMIANI), que é a impossibilidade do urbano para todos. É o urbano
revelando as contradições que vivemos através de uma população gigantesca que apenas sobrevive.
A
fom e
e
a
m isé r ia
na
a lim e n t a çã o:
o
ca so
da
m e t r ópole
de
Sã o
Pa u lo
A miséria da vida cotidiana, fruto de sua intensa fragmentação e programação, revela-se nos mais diversos
âmbitos: na alimentação, na habitação, no transporte, no trabalho, no lazer, na educação etc.
Considero que a alimentação seja um âmbito privilegiado que possibilita um estudo mais particular e vertical.
Ela ocupa um papel central na vida cotidiana sendo simultaneamente uma necessidade biológica e social. Sua
deterioração, tanto nos aspectos nutricionais, como nas relações sociais que cercam esse ato, revela a
profundidade
da
miséria
da
vida
cotidiana.
Essa deterioração da alimentação, diferente do que se possa imaginar, atinge uma enorme parcela da
população brasileira. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada em 2004 pelo IBGE,
indica que no Brasil haveriam 72.163.896 de pessoas em situação de insegurança alimentar, o que
representa aproximadamente 40% de toda população brasileira. Segundo essa mesma pesquisa,
aproximadamente 79% da população em situação de insegurança alimentar (cerca de 56.736.950) vive nas
cidades.
Deve-se ressaltar que essa deterioração da alimentação não é uniforme, não se manifesta da mesma forma
em toda a população. De maneira geral ela atinge com mais intensidade as camadas mais pobres da
população, sendo uma expressão das diferenças sociais que são simultaneamente diferenças espaciais.
Portanto, é impossível entender essa deterioração da alimentação sem considerar o processo de urbanização
crítica, sem considerá-la inserida em um processo mais amplo e que portanto a inclui.
É necessário considerar também, que uma pesquisa que tenha como objetivo entender critica e
profundamente a fome, não pode ficar restrita à consulta da bibliografia existente e dos dados estatísticos.
Neste sentido colocamos acento na realização de trabalhos de campo, em determinados recortes espaciais,
que podem de alguma maneira revelar através de suas particularidades a universalidade do processo.
Por fim, gostaria de ressaltar que o sentido desse trabalho não é a busca por uma saída possível através do
planejamento, nem a tentativa explicar a miséria como uma face do capitalismo dependente. Seu sentido é o
de explicitar que a possibilidade do urbano para todos passa necessariamente por uma transformação radical
das bases da produção e reprodução sociais.
AO400 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Urbanização da Sociedade
[1664] PEQUEN AS CI D AD ES D A M I CRORREGI ÃO GEOGRÁFI CA D E CATALÃO ( GO) : PERSPECTI VAS
DE ENVELHECIMENTO POPULACIONAL.
NÁGELA APARECIDA DE MELO1; BEATRIZ RIBEIRO SOARES2.
1.UNI VERSI DADE FEDERAL DE UBERLÂNDI A/ FACULDADE DE CI ÊNCI AS I NTEGRADAS DO PONTAL,
I TUI UTABA, MG, BRASI L; 2.UNI VERSI DADE FEDERAL DE UBERLÂNDI A/ I NSTI TUTO DE GEOGRAFI A,
UBERLÂNDIA, MG, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho faz parte de um projeto de pesquisa em desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação do
Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia, sobre a temática pequena cidade.
O presente artigo tem como objetivo analisar alguns elementos da dinâmica populacional das pequenas
cidades da microrregião geográfica de Catalão (GO), especificamente, a ocorrência de perspectivas de
envelhecimento
da
população
local.
O recorte espacial da pesquisa é formado pelos municípios e cidades de pequeno porte da microrregião
geográfica de Catalão que, apresentaram, no censo demográfico do IBGE, ano de 2000, até 20 mil habitantes
urbanos. Essa microrregião faz parte da mesorregião Sul Goiano e é formada por onze municípios, tendo
Catalão como sede; esta é a única cidade entre os municípios que excede o total de 20 mil habitantes.
Para o desenvolvimento do presente estudo foram realizados revisão bibliográfica sobre a temática pequena
cidade, a formação sócio-econômica e espacial de Goiás e da porção sudeste deste estado; levantamento e
análise de dados demográficos sobre a evolução do número de residentes e estrutura etária; entrevistas com
441 pessoas residentes na área em estudo e com representantes das administrações municipais; e,
observação
empírica,
nas
dez
pequenas
cidades,
com
roteiro
pré-estabelecido.
A temática central da pesquisa é a questão da pequena cidade. Esse assunto se relaciona diretamente com o
conceito de cidade e urbano e com o limite inferior do sistema de cidades. Nesse sentido, por um lado, faz
interface com as definições político-administrativas adotadas pelos países e, por outro, com a construção
conceitual dos estudos acadêmicos, envolvendo várias áreas do saber científico e, especificamente a
Geografia,
enquanto
ciência
que
estudo
questões
de
conteúdo
espacial.
Os estudos sobre pequena cidade ainda apresentam incipiente desenvolvimento. Sendo essa afirmação
válida, no caso brasileiro, tanto em relação a elaboração conceitual, como no que diz respeito a compreensão
das
múltiplas
realidades
existentes.
Santos (1979, 1993 e 2004) desenvolveu o conceito de “cidade local” como uma tentativa de tratar a
questão da pequena cidade, pelo ponto de vista funcional. Segundo este estudioso, cidade local é
efetivamente: o nível urbano mais baixo, o limiar que permite a uma aglomeração satisfazer as demandas
gerais mínimas de uma população; tem influências estritamente locais e níveis urbanos elementares, mas,
fundamentais para o seu entorno imediato; deve apresentar um limite inferior de complexidade das
atividades urbanas capazes de garantir um crescimento auto-sustentado e um domínio territorial; surge ou
passa a funcionar com intermediária entre o campo modernizado e outros núcleos maiores e complexos; e,
tem possibilidades limitadas de criar atividades modernas por causa do tamanho reduzido de seu mercado e
do caráter monopolístico de algumas atividades regionais (SANTOS, 1979, 1993 e 2004).
Nazareth (2004), tendo, também, em vista a apreensão das pequenas cidades pela perspectiva de suas
funcionalidades urbanas, sugeriu duas categorias de análise para o desenvolvimento de estudos. Um delas é
a trama social e espacial que tem cinco dimensões: 1) o exercício das funções propriamente ditas; 2) a
intensidade do processo de urbanização; 3) a presença do mundo rural, 4) o modo de vida cotidiano; 5) a
dinâmica da sociabilidade local. A outra categoria indicada foram as trajetórias de desenvolvimento.
Em geral, os estudos desenvolvidos, até então, constituem-se trabalhos analíticos sobre realidades espaciais
de pequenas cidades, sem, contudo centrar-se na proposição conceitual. Esses têm, também, apresentado
importantes contribuições pela ampliação os conhecimentos sobre as pequenas cidades brasileiras e suas
particularidades e ainda por proporem reflexões que podem servir ao avanço conceitual do tema.
Um dos processos notados nas pequenas cidades é a ocorrência de baixo crescimento populacional, mesmo
em situações de esvaziamento de seus entornos rurais, o que afeta consideravelmente, os seus dinamismos
e
papéis
(FERREIRA,
1987;
ENDLICH,
2006;
MELO
e
SOARES,
2006).
A área em estudo, nesse trabalho, composta por Anhanguera, Campo Alegre de Goiás, Corumbaíba, Cumari,
Davinópolis, Goiandira, Ipameri, Nova Aurora, Ouvidor e Três Ranchos apresentou, na segunda metade do
século XX, um processo de expressiva de perda populacional; os decréscimos populacionais foram mais
intensos no período entre 1970 e 1980; a diminuição do contingente populacional teve maior expressividade
no meio rural. Nas cidades, a dinâmica demográfica apresentou-se mais diversificada, ocorrendo tanto
diminuição do contingente urbano, como também aumento, entretanto, em baixos percentuais.
Identificou-se, ainda, na dinâmica populacional dessa área, perspectivas de envelhecimento. Analisando a
composição da estrutura demográfica, segundo grupos de idade, verifica-se a tendência de ampliação da
participação dos grupos etários com idade mais elevada (60 anos e mais) e diminuição da participação do
número
de
crianças
e
jovens.
Os dados demonstram que, nesses municípios, a participação das pessoas com idade de 60 anos ou mais, no
conjunto total da população, no ano de 2000, foi, conforme dados do IBGE (2006), superior a média do país
(7,3 %), da região Centro-Oeste (5,2 %) e do estado de Goiás (5,7 %). Com exceção de Campo Alegre de
Goiás e Três Ranchos, os demais apresentaram percentual de população idosa, superior a 10 %, no conjunto
da
população
total.
Entre os anos de 1996 e 2000, ocorreu ampliação da participação de pessoas com faixa etária mais elevada,
o que, acompanhado de queda na taxa de fecundidade, diminuição percentual de crianças e jovens no total
de residentes e melhoria nos indicadores de longevidade, sugere a ocorrência de envelhecimento da
população
local
(IBGE,
2003).
O processo de envelhecimento, no caso em estudo, deve ser visto, por um lado, como integrante das
mudanças que vem ocorrendo na própria estrutura demográfica do país; resultante, principalmente, da
ampliação da esperança de vida ao nascer, da diminuição do número de filhos por mulher e da queda da
mortalidade (BERQUÓ, 2001). Por outro, nas pequenas cidades e municípios, onde o crescimento
populacional tem sido incipiente, este se demonstra mais acelerado, como no caso das localizadas na
microrregião de Catalão (GO), e, portanto, se refere a fatos específicos desses lugares.
O campo do entorno dessas cidades, por sua vez, não consegue fixar a população pela sua baixa absorção de
mão-de-obra, sobretudo, onde há o predomínio da atividade pecuarista e/ou da agricultura moderna, as
quais ocupam pouca força de trabalho e impõem a sazonalidade do emprego, especificamente no caso da
segunda.
Ao mesmo tempo, ocorre, comumente que, as pequenas cidades também não conseguem reter a população
expulsa do campo, assim como os próprios moradores urbanos, devido a ausência de um setor econômico
dinâmico que gere empregos, bem como de serviços educacionais que possibilitem formação técnica e
superior. Além de outros aspectos como a falta de estruturas para lazer, diversão e acesso as diversas
culturas e práticas esportivas. Ressalta-se que questões como essas, foram apontadas por Ferreira (1987) e,
nessa
pesquisa,
são
re-afirmados.
Visto por esse ângulo, verificou-se nessa pesquisa, que o envelhecimento, nas pequenas cidades se relaciona
também, com um outro aspecto comum nesses lugares, que, especificamente, na área em estudo, é
identificado pela migração de população, sobretudo de jovens, para centros maiores, e, também, conforme
alguns casos, pela ocorrência de um “movimento de retorno” de pessoas idosas, em geral, aposentadas e
naturais das pequenas cidades que, migraram para centros maiores em momentos anteriores.
AO401 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Urbanização da Sociedade
[1839] OS LI M I TES D A VI D A N AS M ARGEN S D A CI D AD E: O “PORTO D O SAL”, ESPAÇO D E
(SOBRE)VIVÊNCIA NA ORLA FLUVIAL DE BELÉM - PA.
BRUNO CEZAR MALHEIRO.
NAEA- UFPA, BELEM, PA, BRASIL.
Resumo:
A cidade de Belém sintetiza em sua orla fluvial tempos-espaços diferenciados e contraditoriamente
articulados, dentre os quais estão uma temporalidade metropolitana reproduzida em uma lógica da
mercadoria e tempos ribeirinhos, que ainda subsistem em feiras, portos e trapiches nas margens da cidade.
Parece, então, que a orla fluvial de Belém se transfigura em um território da reunião, expressão espacial do
encontro de experiências, da convergência de temporalidades distintas: nela a metrópole se estende em
direção ao rio e o rio se estende em direção à metrópole. Na união dessas correntezas está posta sua
dinâmica. Essa faixa da cidade é, assim, uma das principais expressões geográficas da relação entre vida
urbana
e
a
vida
ribeirinha
no
contexto
amazônico.
O espaço ao qual direcionamos nossa análise neste trabalho, o Porto do Sal, localizado na orla central de
Belém, também se produz no encontro dessas lógicas distintas, mostrando-se como lugar historicamente
produzido a partir de uma inserção precária em uma economia metropolitana, como espaço que registra
práticas de (sobre)vivência diretamente ligadas a uma relação com o rio, práticas estas colocadas à margem
a partir da proliferação de um tempo metropolitano na orla de Belém, tempo este que se liga ao processo de
metropolização do espaço de Belém que, nesse contexto, compreende perdas em relação ao próprio urbano.
Diante desta problemática o presente trabalho procura analisar as práticas cotidianas de (sobre)vivência do
Porto do Sal, buscando mostrar o processo de produção de uma cidade à margem expressa em um espaço à
margem. Nesse sentido, analisamos a geografia histórica deste espaço, as temporalidades que se expressam
nas espacialidades e nas práticas cotidianas do Porto, bem como os elementos de uma condição social
degradada
presentes
nas
experiências
dos
agentes
produtores
deste
lugar.
A metodologia utilizada para a concretização destes objetivos foi dividida em cinco momentos, sendo que em
um primeiro momento foram realizados levantamento e análise bibliográfica; um segundo momento foi
reservado para o levantamento e análise de documentos em arquivo público; em um terceiro momento
iniciaram as observações diretas, situando e relacionando fatos cotidianos, construindo cadeias de
significação; em um quarto momento realizou-se entrevistas gravadas semi-estruturadas com os agentes
produtores do espaço; e em um quinto momento registrou-se depoimentos que mostrem as histórias de vida
de alguns sujeitos, no sentido de se aproximar da condição social destes e da realidade espacial configurada.
No tocante ao referencial teórico podemos situar este trabalho, primeiramente, no campo da Geografia a
partir da utilização da teoria da produção social do espaço (LEFEBVRE, 1974; SANTOS, 2004a). Tendo como
campo privilegiado de análise a cidade, nossas reflexões também se alimentam das teorizações sobre cidade,
urbano e vida urbana de Lefebvre (1971, 2001, 2002) para situarmos o espaço que analisamos a partir da
coexistência e simultaneidade de modos de viver o urbano. Para uma maior compreensão da dinâmica
econômica e social processada neste espaço foi importante a utilização da teorização de Martins (2002) sobre
o processo de inclusão precária, bem como a teorização de Milton Santos (1979) acerca da dinâmica dos dois
circuitos da economia urbana. Outra contribuição fundamental é a teorização de Haesbaert (2004) acerca da
dinâmica de territorialização precária relacionada a uma grande instabilidade e insegurança sócio-espacial.
Articulando este referencial teórico com a dinâmica empírica observada no Porto do Sal a partir dos
procedimentos
metodológicos
indicados
anteriormente,
chegamos
a
algumas
conclusões.
Remontando, de maneira breve, contextos locais/regionais, percebemos que o Porto do Sal, no período da
cabanagem assumiu a função de ponto de defesa e ordenamento territorial, servindo, ainda, para articular o
movimento cabano a partir do rio. O Porto também viveu períodos de grande comércio, nos quais esse
espaço, além de ponto de troca era lugar do encontro entre sujeitos vindo do “além rio” e sujeitos da cidade,
sendo um ponto importante para o abastecimento e para o desenvolvimento do comercio e até mesmo para
o lazer.Nesse sentido, parece que o Porto possuía uma dinâmica interessante, pois ao passo que aos seus
arredores proliferavam-se atividades do circuito superior, como escritórios e empresas, ou até mesmo
fábricas; no trapiche o movimento era comandado por sujeitos que acessavam aquele espaço em busca de
sobrevivência, através de barcos de pequeno e médio porte que ali aportavam sem pagar taxas, enfim, por
trocas mais amplas que pressupunham o encontro, o reconhecimento mútuo, inter-relações entre tempos
sociais distintos, mas que ali se apresentavam complementares. Quando chegamos à realidade atual, o que
se observa é uma total decadência econômica, quando a estrada passa a ser o meio de transporte de muitos
dos que acessavam o porto, quando a concorrência com outros portos privados dificulta a sobrevivência dos
sujeitos e quando o porto desmorona, o que torna impossível qualquer movimentação de embarcações. Essas
considerações nos guiaram a reconhecer esse lugar como aglomerado de exclusão, onde os sujeitos se
territorializam precariamente em um cotidiano ligado à desigualdade social. Aproximamo-nos, dessa forma,
de um espaço cuja dinâmica econômica é processada para atender a uma demanda pouco capitalizada da
população (espaço de sobrevivência) e onde se desenvolvem sociabilidades próximas preenchidas por um
cotidiano
degradado
(espaço
de
vivências).
Visualizamos, assim, um espaço de (sobre)vivência cujos sujeitos produtores incluem-se precariamente na
economia política da cidade, a partir de práticas econômicas ligadas ao circuito inferior da economia urbana,
as quais refletem uma coexistência de tempos sociais contraditórios ajustados de forma degradada. O porto
vira “favela”, um aglomerado de casas dispostas em um terreno inconsolidado, ou mesmo sobre o rio, isso
sem nenhuma condição digna de vida. Percebemos, dessa forma, que, por os sujeitos desse aglomerado de
exclusão possuírem origens distintas e perspectivas também diferenciadas acaba ocorrendo um ajustamento
social precarizado no espaço em que os sujeitos se relacionam quase sempre por falta de opções, sendo que,
apesar disso, ainda observamos práticas de comunicação e sociabilidades demonstrando que as relações
processadas neste lugar ultrapassam a determinação de trocas de mercadorias chegando a uma dimensão do
vivido.
Nos limites do humano, os sujeitos enfrentam as necessidades inscritas no plano do presente. Nesse sentido,
submergindo ao abismo social deste espaço a partir de histórias de vida expressivas, percebemos a
reinvenção da vida a cada dia, o enfrentamento do presente desenhando devires, uma nova cidade que
emerge nas experiências liminares, na convivência com a escassez, como uma forma de invenção, de
criação, de indeterminação, de insurgência.
AO402 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[1858] O MIGRANTE NA METRÓPOLE: UMA MOBILIDADE PERMANENTE ENTRE TERRITÓRIOS.
ANA MARIA MATOS ARAUJO1; JOSÉ BORZACCHIELLO DA SILVA2.
1.UNI VERSI DADE FEDERAL DE SERGI PE, FORTALEZA, CE, BRASI L; 2.UNI VERSI DADE FEDERAL DO CEARÁ,
FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
Objetivo
Analisar a inserção do migrante na periferia metropolitana, observando as condições do habitar e da
mobilidade
do
trabalho
entre
municípios,
bairros
e
favelas.
Re fe r e n cia l
t e ór ico
Utiliza-se o conceito de mobilidade do trabalho desenvolvido por Gaudemar (1977, p.192), como “uma
característica do trabalhador submetido ao capital e por essa razão ao modo de produção capitalista”. Além
de a mobilidade ocorrer espacialmente, ela aumenta na razão direta do desenvolvimento de um país, de uma
região
e
lugar.
Na acumulação primitiva foram deslocados trabalhadores de outros modos de produção para o capitalismo,
dos espaços rurais para urbanos. A mobilidade do trabalho continuou sendo instrumento da ampliação
capitalista, sendo incrementada nas reestruturações, nas revoluções tecnológicas, em condições específicas
de trabalho (de organização e controle). Há mobilidade quando se mudam jornadas, turnos, ramos
industriais, setores (agricultura, indústria e serviços), ou quando desaparecem e surgem novas atividades,
atingindo
diferentes
lugares,
tudo
pela
e
para
a
valorização.
A migração é uma das formas de ampliar a acumulação mediante a mudança do lugar de residência dos
trabalhadores, para uso da força de trabalho ou para ampliar exército de reserva, mesmo que, boa parte
desses trabalhadores jamais seja empregada. Afinal, essa reserva vai ser utilizada menos como oferta e mais
como controle da resistência dos trabalhadores e de exploração capitalista, pelo rebaixamento de salários
(MENELEU
NETO,
1996).
Em Luxemburgo (1988), Harvey (2004) e Robira (2005), observa-se a relação entre a mobilidade do trabalho
com a expropriação de terras, durante a acumulação primitiva, mas, sobretudo, presente na acumulação
ampliada. Tal expropriação faz subsumir as relações e os espaços não-capitalistas, que estariam como
reserva para ampliar essa acumulação, reestruturando a produção e o mercado, valorizando o espaço.
Metodologia
Concebe-se o território não como reflexo ou apenas como palco das relações sociais, mas sendo portador de
uma materialidade dessas relações sociais, que permite a reprodução da sociedade. Tal espacialidade dando
qualidade aos processos sociais e naturais permitindo se materializarem sobre a superfície terrestre, tal como
fundamentado
em
Lipietz
(1987)
e
em
Moraes
e
Costa
(1999)
A distribuição de pessoas e objetos no espaço não é resultado exclusivo do modo de produção capitalista. Há
uma relativa autonomia das relações não-capitalistas, cujas espacialidades resistem às mudanças e abrem
novas possibilidades, mesmo articuladas a produção capitalista (MARTINS, 2000, p. 122). Igualmente,
Massey e Keynes (2004) defendem a tese de que o espaço está em processo e, portanto é inacabado e abrese
para
o
inesperado
e
o
imprevisível.
Realizou-se estudo de caso na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), sobre a mobilidade do trabalho,
mediante pesquisa direta com 801 famílias, entre residentes em Fortaleza (317) e em seis municípios
metropolitanos periféricos de um total de 12 (pesquisando 484 familias), abordando aspectos quantitativos e
qualitativos,
do
trabalho,
da
habitação
e
da
ocupação
dos
territórios.
Questões
Como explicar que a imigração continue mesmo com a metrópole se mostrando contraditória, ou um misto
de opulência e miséria, com inúmeros problemas urbanos e com enormes dificuldades de inserção nesse
contexto
de
desemprego,
precariedade
e
violência?
Pon t os
de se n volvidos
A mobilidade do trabalho é vista pelo Desemprego e precarização das relações de produção; na Migração
urbana e urbano-metropolitana, e, na Ocupação (invasão) e habitação do espaço periférico do imigrante e
dos
trabalhadores
metropolitanos
residentes
em
favelas.
Resultados
É alto o índice dos desempregados: 18,0%, em Fortaleza e 14,3% nos municípios periféricos. O trabalho por
conta-própria é mais freqüente na metrópole (54,8%) que diversifica oportunidades para o trabalhador. Tal
relação mantém a renda em torno do mínimo: com mais de meio a um salário mínimo são 36,3% em
Fortaleza; na faixa de um a dois salários são pouco mais de 10%. É comum para os residentes na periferia
saírem em busca de trabalho em Fortaleza, sobretudo saindo de Caucaia (34,0% dos chefes de famílias
ocupados), além de Eusébio (22,2%). Mais da metade da população pesquisada residente em favelas nasceu
fora de Fortaleza (55,8%), embora boa parte deles resida na Capital há mais de dez anos (85,5%). São
praticamente estabelecidas, pelo tempo de residência, muitas famílias vivem constantes deslocamentos, uma
mobilidade habitual entre áreas não-capitalistas (bairros, municípios e favelas). Na favela Riacho Maceió, por
exemplo, 40% dos entrevistados invadiram outras áreas e temem serem forçados a repetir tal “opção”. Com
características de “território-reserva”, essa favela está em transição e a um passo de tornar-se espaço
capitalista, por força da pressão imobiliária e da valorização do espaço. A omissão dos governos, em
urbanizar, sanear, colocar infra-estrutura na Favela, de certo modo, ajuda nessa expropriação urbana.
Conclusões
Confirma-se na RMF, o que Martins (2003) verificou sobre os nordestinos que habitam as periferias das
periferias metropolitanas nacionais. São lugares sem infra-estrutura, sem condições de habitação, mas
viáveis a sobrevivência, como uma alternativa ao aluguel, uma solução popular para o déficit habitacional.
Uma “expansão das fronteiras urbanas” em conflito e em confronto pela habitação, dada a carência ampliada
e insatisfeita pelos constantes fluxos migratórios (SILVA, 2005, p.103). Os lugares mais inapropriados para o
habitar: as encostas de morros, de dunas e margens de rios e lagoas, dentre outros. Mas os trabalhadores
não utilizam a moradia apenas como peça do habitar (pelo valor de uso), transformam-na em mercadoria
popular, encaminhada para o mercado imobiliário capitalista, pelo seu valor de troca.
AO403 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[1865] APROPRI AÇÃO, SEGREGAÇÃO E CON FLI TO N O PROCESSO D E REVALORI ZAÇÃO D O CEN TRO
HISTÓRICO DA CIDADE DE SÃO PAULO.
GLÓRIA DA ANUNCIAÇÃO ALVES.
FFLCH- USP, SAO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
Seguindo uma tendência mundial, a cidade de São Paulo e nela, mais especificamente, seu centro histórico
tradicional passa, com maior ênfase desde a década de 90 do século XX, por um processo de revalorização
da área o que vem implicando em mudanças sócio-espaciais que revalorizam a área em questão. Essa área
foi uma centralidade única até os anos 50 do século XX; era a referência simbólica da cidade, o que fazia com
que centro e cidade fossem, no imaginário popular, sinônimos. Na reprodução do capital fez-se necessária a
expansão da centralidade e com ela novos centros, alguns especializados, surgem na cidade que passa a ser
marcada pela policentralidade. Esse desdobramento da centralidade implicou em um deslocamento de sede
de empresas, instituições bancárias e investimentos para outras centralidades e com isso houve um certo
abandono da preservação do patrimônio imobiliário existente o que produziu na paisagem ares de decadência
física e, segundo alguns, decadência moral. A partir do estudo do processo de revalorização desse centro,
que visa recuperar sua capacidade de atração de investimentos bem como o papel de gerenciamento e
comando de atividades, verifica-se que vem ocorrendo um embezamento da paisagem e, junto a ele, um
processo de higienização social. Mas o processo é contraditório, gerando resistências e luta pela apropriação,
pelo
uso
desse
espaço,
como
procuraremos
demonstrar.
A paisagem do centro tradicional da cidade de São Paulo vem passando por uma série de transformações que
trazem mais modernização a esse espaço (é o caso das obras na avenida Ipiranga para a ampliação da linha
de metrô) e ao mesmo tempo procura, em uma estratégia pública-privada, conservar parte do patrimônio aí
edificado. As transformações desse espaço, em geral, se justificam a partir da conjugação do binômio –
modernização/conservação
-,
que
em
outras
épocas
eram
colocados
como
antagônicas.
Em nome da modernidade, desde o início do século XX boa parte das antigas edificações da área central deu
lugar aos edifícios com muitos andares. Essa era outra característica do centro: a verticalidade. Ainda que
após os anos 50 a verticalização dos edifícios não fosse exclusividade do centro, este continuava a concentrar
a maior parte dos grandes edifícios. Na paisagem, segundo MÜLLER (1958), São Paulo cada vez mais se
parecia com uma cidade americana, sendo seu centro e a concentração da verticalidade nessa área sua maior
expressão.
A partir da década de 70 (séc. XX), temos novas áreas da cidade que passam a receber investimentos
públicos e privados, o que possibilita o surgimento de novas centralidades, mais especializadas e seletivas.
Esse processo de expansão da centralidade é resultado do crescimento da então centralidade única e da sua
impossibilidade, ao menos momentânea, de responder espacialmente e em tempo real às novas
necessidades
apresentadas.
Essa é a grande contradição existente da dimensão tempo-espaço: ao mesmo tempo em que o espaço tem
que ser equipado para responder satisfatoriamente a um determinado processo produtivo, isso lhe confere
uma determinada rigidez das formas que dão conta das necessidades postas em determinado momento
temporal, mas pode tornar-se um empecilho ao desenvolvimento do novo processo produtivo onde a
velocidade tem papel diferencial. Espacialmente, as transformações dão respostas parciais aos problemas
postos, mas rapidamente deixam de responder de forma adequada às questões postas. O próprio Plano de
avenidas é um exemplo disso. Sua construção implicou na fixação no espaço do traçado das avenidas e ruas.
Ao seu redor novas construções foram executadas e na época se considerava o que há de mais moderno.
Hoje, esse traçado é considerado obsoleto, não permitindo a velocidade necessária à rápida fluidez das
mercadorias. O mesmo pode ser dito dos prédios: muitos deles não possibilitam a instalação dos cabos de
fibras óticas fundamentais à velocidade da informação tão necessária hoje ao processo produtivo.
Resolver o problema técnico-espacial (o da rigidez) aliado ao processo de especulação imobiliária posto em
curso pelos agentes imobiliários, implicou na aplicação de recursos em outras áreas da cidade pelo poder
público
o
que
permite
ao
surgimento
de
novas
centralidades.
Ainda que os centros se pareçam, concentrando atividades, pessoas e serviços, ou seja, atributos da
centralidade, eles não são iguais. Existe uma hierarquia: há os que possuem a concentração de atividades
mais especializadas e seletivas, reunindo mais recursos e capital e há os que são mais multifuncionais e
menos especializados. Essa hierarquia não é só econômica e funcional: ela incorpora atributos simbólicos
também. Desta forma, o centro tradicional tem, do ponto de vista espacial, a saída de parte de sedes de
empresas privadas e públicas, o que promove um certo “esvaziamento” e a conseqüente não conservação
física de parte de seus imóveis. Parte delas se desloca para as novas centralidades que por estratégias de
valorização acabam por ganhar status de os novos lugares a serem freqüentados por parcelas da população
de
melhor
poder
aquisitivo,
em
detrimento
da
antiga
centralidade.
Se o centro é visto como “perigoso” e pretende-se, no desenvolvimento das estratégias de valorização dos
espaços, revalorizar essa área central, é fundamental criar uma imagem positiva do centro, afastar o “ar” de
degradação passa a fazer parte da estratégia de revalorização desses espaços. Deste modo, mudar a imagem
dos centros é importante para o processo de desenvolvimento das cidades, em especial, das aspirantes ou
que já fazem parte da seleta rede de cidades globais, ou seja, aquelas que podem ser peças chave no
desenvolvimento do sistema de reprodução capitalista, com funções de decisão e de comando das ações
financeiras,
de
produção
e
de
consumo,
inclusive
dos
espaços.
Mas como fica a população de menor poder aquisitivo que na área central vive (com ou sem renda), trabalha
e/ou consome? Para esses, de acordo com as propostas estudadas, não há espaço. Eles são vistos como
“problemas” e , invariavelmente, as saídas passam pela higienização social desse lugar, com uma série de
ações em que se destacam as de associação público-privado, que ocorrem e geram conflitos espaciais.
Como parte de um espaço de reprodução capitalista, a cidade de São Paulo, que se projeta na rede de
cidades mundiais, possui contradições e movimentos internos que articulam diferentes escalas geográficas e
que se manifestam com intensidade nesse espaço que um dia foi uma centralidade única, confundido centro
e cidade, e que hoje, ainda que tenha perdido essa especificidade, continua sendo uma centralidade
fundamental nesse projeto de manutenção de São Paulo enquanto uma cidade mundial.
Palavras
chave:
revalorização,
conflitos
espaciais,
globalização.
AO404 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[1876] O ESPAÇO D O CAPI TAL: PROVI SÃO H ABI TACI ON AL E SEGREGAÇÃO SÓCI O- ESPACI AL N O
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO.
ADRIANO BOTELHO.
MIN. RELAÇÕES EXTERIORES, BRASÍLIA, DF, BRASIL.
Resumo:
a.
Objetivos
do
trabalho:
O trabalho tem como objetivo analisar como as diferentes formas de acesso ao financiamento imobiliário para
a provisão habitacional se relacionam com a produção do espaço urbano, contribuindo, através dos processos
de fragmentação, homogeneização e hierarquização espaciais (tríade proposta por Henri Lefebvre), para uma
crescente
segregação
sócio-espacial.
b.
Referencial
teórico
e
conceitual:
O espaço, ao longo da história do modo de produção capitalista, passou a fazer parte dos circuitos de
valorização do capital, seja pela mercantilização da terra, seja pelo seu parcelamento (pelo loteamento ou
pela verticalização), ou, como vem ocorrendo mais recentemente, pela sua crescente inclusão nos circuitos
de circulação do capital financeiro. A produção do espaço passa a ser um elemento estratégico para a
acumulação do capital. Para Henri Lefebvre (A revolução urbana, 1999), ocorreria uma crescente
dependência por parte do capitalismo da produção e consumo do espaço nas últimas décadas. A relação
entre o espaço (sua produção, vivência, percepção, concepção e conceituação) e o modo capitalista de
produção deve ser vista, porém, como uma via de mão-dupla, como fazendo parte de uma relação dialética e
complexa. De forma mais abrangente, a produção e o consumo do espaço, assim como a urbanização, estão
inseridos no amplo processo de reprodução das relações de produção capitalistas, na medida em que são
guiados pelos ditames da propriedade privada e são regulados pelas necessidades do capital de gerar valor
excedente.
Partindo da idéia lefebvriana de que as contradições do espaço são contradições da sociedade (Lefebvre, H.,
La production de l’espace, 2000), a cidade capitalista se estruturaria através dos mecanismos de mercado, e
se caracterizaria por uma crescente fragmentação, homogeneização e hierarquização de seus espaços. Um
instrumento que garantiria essa hierarquização é a renda fundiária urbana, categoria pré-capitalista, mas que
é incorporada aos mecanismos de reprodução do capital. Para Lefebvre, por homogeneização entende-se a
repetição monótona de elementos no espaço e que conformam tal espaço: aeroportos, vias expressas,
rodovias, cidades verticais de concreto, cidades horizontais de casas unifamiliares etc., criando um consumo
repetitivo de coisas no espaço e do espaço que engendra um tédio indelével. Esse espaço homogeneizado
seria o lócus de ligação das relações capitalistas mundializadas, com seus pontos fortes (os centros) e as
bases mais frágeis e dominadas (as periferias). Segundo o mesmo autor, a fragmentação relaciona-se com o
espaço partido em espaços separados, ocupados pelas funções que se exercem nesses espaços distintos:
trabalho, moradia, lazeres, transportes, produção, consumo. Rigidamente quantificado, medido em metros
quadrados, como em dinheiro, esse espaço “fatiado” é entregue ao mercado em parcelas, quase sempre
mínimas. E por fim, os espaços dissociados no homogêneo se hierarquizam: espaços nobres e vulgares,
espaços residenciais, espaços funcionais, guetos diversos, conjuntos de alto padrão, áreas para os migrantes
e para os autóctones, espaços das classes médias. Em resumo, ocorre a segregação. A hierarquização toma
formas gerais e específicas: a distinção entre os “pontos fortes” do espaço e os centros (de poder, de
riqueza, de trocas materiais ou espirituais, de lazeres, de informação) e as periferias (elas também
hierarquizadas, mais ou menos afastadas de um centro principal ou secundário, até tomar a forma de um
lugar
deserto,
abandonado).
Dessa forma, a análise das relações entre os mecanismos de geração e distribuição da renda fundiária entre
distintos setores da economia pode revelar como se estrutura a cidade capitalista através da tríade
lefebvriana
acima
exposta.
c.
Metodologia
utilizada.
O artigo é resultado da pesquisa realizada para Tese de Doutorado, defendida no âmbito do Programa de
Geografia Humana da Universidade de São Paulo em 2005. Foram realizadas extensa consulta bibliográfica e
a fontes primárias (Companhias Habitacionais, Comissão de Valores Imobiliários, EMBRAESP, Associação de
Consórcios e Cooperativas), bem como entrevistas com agentes imobiliários urbanos, representantes de
movimentos por moradia, agentes financeiros, estudiosos da dinâmica urbana, funcionários de Companhias
Habitacionais atuantes no Município de São Paulo, e moradores dos empreendimentos estudados. Como
forma de analisar as informações obtidas, foram feitos mapas sobre a localização dos empreendimentos e
cruzamento com os valores do solo urbano. Ou seja, foi realizada tanto uma análise qualitativa, por meio da
literatura,
fontes
primárias
e
entrevistas,
quanto
quantitativa.
d.
Principais
pontos
desenvolvidos
O artigo discute três casos de produção imobiliária residencial no município de São Paulo, cujo financiamento
é bastante distinto entre si, com reflexos em sua localização no espaço urbano. Um dos casos refere-se aos
novos instrumentos de captação de recursos financeiros por parte do setor imobiliário, os chamados Fundos
de Investimento Imobiliários (FII’s) e os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI’s). Trata-se de um nível
superior de integração do capital financeiro com o setor imobiliário, surgido no Brasil em meados da década
de 1990. O segundo caso é ligado às chamadas cooperativas habitacionais, uma forma de autofinanciamento
da produção da moradia utilizada, sobretudo pela classe média urbana a partir da relativa estabilização do
regime de preços proporcionada pelo Plano Real nos anos 90. O terceiro caso refere-se ao financiamento
estatal à moradia para a população mais pobre através de novas formas de captação de recursos,
principalmente após o colapso do Banco Nacional da Habitação (BNH) em meados da década de 1980 e da
paralisação
do
Sistema
de
Financiamento
Habitacional
(SFH).
Foi feito um mapeamento dos três tipos de empreendimento e foi realizado um cruzamento das localizações
dos
empreendimentos
com
os
valores
do
solo
urbano.
A partir da análise desses casos, foi possível chegar a importantes considerações sobre a produção do espaço
urbano
que
é
crescentemente
dominada
pelas
estratégias
de
reprodução
do
capital.
e.
Resultados
alcançados
e
conclusões
Através do estudo realizado, pode-se afirmar que ocorre, através da maior inserção da produção do espaço
nas estratégias de reprodução do capital, o fortalecimento dos mecanismos de segregação sócio-espacial,
baseados na tríade fragmentação, homogeneização e hierarquização do espaço. Esse processo apontaria para
o surgimento da não-cidade, na medida em que são crescentemente criados obstáculos para o encontro e a
reunião de pessoas, objetos de consumo coletivo, idéias etc. Ou seja, na medida em que o valor de uso
subordina-se ao valor de troca e a mercadoria generaliza-se no urbano, a cidade e a realidade urbana
tendem a ser destruídas, pois esta deixa de ser vivida em sua totalidade, e sim fragmentariamente e através
de crescentes constrangimentos aos seus habitantes.
AO405 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Urbanização da Sociedade
[1952] AUTO- SEGREGAÇÃO E FRAGM EN TAÇÃO SÓCI O- ESPACI AL: OS CAM I N H OS D E UM PROCESSO
DE EXPANSÃO URBANA.
PATRICIA CHAME DIAS.
SUPERINTENDÊNCIA DE ESTUDOS ECONÔMICOS E SOCIAIS DA BAHIA, LAURO DE FREITAS, BA, BRASIL.
Resumo:
Auto-segregação
e
fragmentação
sócio-espacial:
os
caminhos
de
um
processo
de
expansão
urbana
Objetivos
e
Referencial
Teórico
A auto-segregação das elites é algo evidente nas cidades brasileiras. Condomínios fechados voltados aos
segmentos mais abastados proliferam, com a promessa de proporcionar aos seus moradores maior
“qualidade de vida” (PRÉTECEILLE, 2004; SOUZA, 2000, 2003), o que se associa à possibilidade de
afastamento dos problemas urbanos, de criação de um estilo de vida mais harmônico e homogêneo — que só
inclui os iguais (CALDEIRA, 2003; MARCUSE, 2004; GOMES, 2002; RIBEIRO, 2004). Essas “ilhas da
felicidade”, dada a densidade e o custo da terra dos grandes centros, só podem ser instaladas em locais mais
afastados, desde que relativamente próximos e sempre acessíveis àqueles. Destacam-se, com essas
condições, os municípios periféricos das metrópoles (VILLAÇA, 2001). Com isso, locais onde antes
prevaleciam funções rurais vão sendo adaptados a seus novos moradores, e, com isso, urbanizados. Neste
texto analisam-se os processos que fizeram com que o município de Lauro de Freitas, integrante da Região
Metropolitana de Salvador (RMS), se convertesse de área periférica, local de moradia de pequenos
agricultores e sitiantes, em área privilegiada para a implantação de condomínios fechados, amplamente
urbanizada. Discutem-se, sobretudo, as conseqüências desse processo na divisão sócio-espacial do
município.
Metodologia
Procedeu-se a um levantamento bibliográfico, com ênfase nos conceitos de segregação e auto-segregação,
nas análises das implicações de tais processos e nas tendências recentes de desconcentração espacial da
população das regiões metropolitanas. Realizou-se pesquisa documental e cartográfica, levantando-se as
modificações sócio-espaciais ocorridas entre 1960 e 2005, e informações referentes à implantação de
loteamentos e condomínios em Lauro de Freitas (número de empreendimentos, ano de implantação, área
ocupada e localização). Para compreender os processos em curso na atualidade, realizaram-se observações
estruturadas
e
120
entrevistas
domiciliares.
Principais
pontos
desenvolvidos
Discutiu-se os principais aspectos que fizeram com que Lauro de Freitas fosse privilegiado, na RMS, pelos
agentes do mercado imobiliário para a implantação de loteamentos e condomínios voltados aos grupos
sociais de renda média e alta, o que atraiu em particular pessoas de Salvador e parcela dos migrantes mais
escolarizados que chegaram a essa região na década dos 90. Para tanto, tratou-se da importância das
intervenções
públicas
(de
âmbito
estadual
e
municipal)
que
viabilizaram
tal
processo.
Estudaram-se os processos que contribuíram para as alterações da estrutura e da função do município, o que
resultou
na
ampliação
da
sua
área
urbana
e
na
conurbação
com
a
capital.
Desenvolveu-se uma análise sobre a relação entre a implantação dos inúmeros empreendimentos
residenciais e a fragmentação social e espacial de Lauro de Freitas, e de como os antigos moradores e os
mais
pobres
se
“adaptaram”
à
nova
estrutura.
Conclusões
A ampliação da população, da urbanização e a alteração do perfil socioeconômico dos moradores de Lauro de
Freitas foi favorecida pela tendência de periferização da população da RMS. Uma parte dos moradores da
capital com maior poder aquisitivo passou a residir nas localidades situadas na sua orla norte, que faz limite
com Lauro de Freitas. Desse modo, esse município foi incorporado ao processo de expansão imobiliária que
ocorria em Salvador, sobretudo por apresentar, até os 80, as terras mais baratas da metrópole e ter uma
estrutura
fundiária
eminentemente
rural.
Os empreendimentos residenciais voltados aos segmentos sociais mais abastados ampliaram-se
aceleradamente a partir da década dos 90, em especial na porção litorânea do município — de ocupação
antiga, onde ainda residiam pessoas que há muito lá chegaram. Chamada de Atlântico Norte, nos 60, em tal
área havia fazendas, sítios e porções de terras abandonadas e desvalorizadas, que gradativamente foram
sendo compradas ou invadidas por pessoas de baixa renda. Atualmente, com os inúmeros condomínios
fechados, restam relativamente poucos desses moradores ou seus descendentes; os que “resistem” relatam
a alteração nos modos de vida, a perda da terra e a falta de efetivo contato com os novos moradores.
Ademais, o poder público vem privilegiando, na instalação de infra-estrutura e prestação de serviços, os
locais onde estão os habitantes mais novos, ou seja, os de maior renda. Para os outros moradores, os mais
pobres,
a
urbanização
é
mais
lenta...
A auto-segregação das elites metropolitanas contribuiu para que Lauro de Freitas se constituísse como uma
cidade fragmentada, onde pessoas de diferentes níveis de renda são vizinhas, mas não se relacionam, sequer
se encontram. A articulação entre esses dois mundos, contíguos e, simultaneamente, tão distantes, se dá por
um
estar
sempre
(como
mão-de-obra)
à
disposição
do
outro.
Referências
CALDEIRA, Tereza. Cidade de muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo. 2. ed. São Paulo: Ed. 34;
EDUSP,
2003.
GOMES, Paulo César Costa. A condição urbana: ensaios sobre a geopolítica da cidade. Rio de Janeiro:
Bertrand
Brasil,
2002.
MARCUSE, Peter. Enclaves, sim; guetos, não: a segregação e o Estado. Espaço & Debates, São Paulo, v. 24,
n.
45,
p.
24-33,
jan./jul.
2004.
PRÉTECEILLE, Edmond. A construção social da segregação urbana: convergências e divergências. Espaço &
Debates,
São
Paulo,
v.
24,
n.
45,
p.
11-23,
jan./jul.
2004.
RIBEIRO, Luiz César de Queiroz. A metrópole: entre a coesão e a fragmentação, a cooperação e o conflito.
In: ______ (Org.). Metrópoles: entre a coesão e a fragmentação, a cooperação e o conflito. São Paulo: Ed.
Fundação
Perseu
Abramo;
Rio
de
Janeiro:
FASE,
2004.
p.
17-40.
SOUZA, Marcelo Lopes de. ABC do desenvolvimento urbano. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
______. O desafio metropolitano: um estudo sobre a problemática sócio-espacial nas metrópoles brasileiras.
Rio
de
Janeiro:
Bertrand
Brasil,
2000.
VILLAÇA, Flávio José Magalhães. Espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Nobel, 2001.
Palavras chaves: segregação, urbanização, desigualdade sócio-espacial
AO174 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Geografia Histórica
[1158] CON FI GURAÇÃO URBAN A D O RECÔN CAVO BAI AN O COLON I AL: UM A CON TRI BUI ÇÃO PARA
A PESQUISA NA GEOGRAFIA HISTÓRICA.
ADRIANO BITTENCOURT ANDRADE.
UFBA / CMS, SALVADOR, BA, BRASIL.
Resumo:
A história urbana acontece de forma não linear, como um conjunto de temporalidades múltiplas e
assimétricas que coexistem e se sobrepõe. Temporalidades que tem a sua existência real no acontecimento
de eventos que ganham expressão concreta a partir da sua realização no espaço geográfico/social (SANTOS,
1997 e 2005). Desta forma, rompe-se então com a pretensão de conhecer a cidade a partir de uma lógica
cronológica progressiva que toma como verdade vivida apenas uma temporalidade técnica que se apresenta
como
evento
principal
do
discurso
dominante.
Aceitando este pressuposto, esse trabalho objetiva revisitar a história do Brasil colonial, especialmente na
consolidação (século XVIII) da sua rede urbana no entorno da Capital da Colônia. Pretende-se
especificamente compreender a dinâmica espacial de pequenas formações urbanas do Recôncavo baiano,
formações essas que tiveram papel fundamental na centralidade de Salvador e que estabeleceram laços
comerciais em escala global como produtoras de fumo e cana-de-açúcar e compradoras de negros
escravizados.
Além de tratar da dinâmica regional da rede urbana que se implantava, pretende-se observar a
espacialização dos processos na escala local, analisando as principais ocupações urbanas do período de maior
representatividade econômica do Recôncavo baiano. Especialmente no XVIII, Cachoeira, Santo Amaro e
Nazaré se constituíram por motivos similares, nas mais importantes nucleações administrativa/portuárias
junto a áreas produtoras, onde o conjunto liderado pelo uso da força de escravos africanos nas lavouras
canavieira e fumageira se consolidou concretamente no espaço. Estas formações urbanas possuíam
importância, preponderantemente, como articuladoras de uma rede urbana que era presidida pela capital
colonial na outra margem da baía. Não se tem explícito, entretanto quais os agentes que produziam aquele
espaço (rural-urbano) e qual o resultado decorrente. É uma história não dita, não escrita e, talvez, não
pesquisada, formando uma lacuna para o entendimento das cidades e do urbano brasileiros.
Objetiva-se enfim, de forma mais ampla considerando o encaminhamento dos estudos de doutoramento,
apresentar uma contribuição à construção de uma história do urbano e das cidades, mas especialmente,
entender as formações urbanas brasileiras a partir da análise de eventos e espaços que são oprimidos ou
“esquecidos”
no
conjunto
de
um
pretenso
saber
histórico
geral.
O texto aqui apresentado resulta da análise de um trabalho de recuperação histórica e digitalização dos
córdices, especialmente para o caso brasileiro, do meado do século XVII até o final do período colonial
quando o controle da documentação esteve sob a égide do Conselho Ultramarino, isso possibilita na nossa
contemporaneidade amplo acesso ao Arquivo Histórico Ultramarino Português. É um material recentemente
disponibilizado ao público no Brasil através da concentração das informações nos Arquivos Públicos dos
Estados da União e, nesse sentido, ainda carece de ser transformado de documentação em análise e texto
histórico.
A consulta deste Arquivo se constituiu na primeira análise de fonte primária e já revelou uma imensa gama
de
possibilidades
de
pesquisa
sobre
as
ocupações
urbanas
do
Brasil
Colonial.
Há nos referidos arquivos, notadamente para o caso da Bahia (3.310 páginas com cerca de 20.000 resumos
de documentos) uma grande concentração das informações no século XVIII, possivelmente por conta do
maior alcance do fenômeno urbano em rede interna e externa, do maior número de vilas, pela densificação
da ocupação humana nas áreas exploradas e, fundamentalmente, pela ampliação riqueza produzida pela
Colônia
neste
século.
O material consultado apresenta resumos de requerimentos, cartas, pedidos, representações, consultas,
despachos, ofícios, cartas patentes, decretos, alvarás, provisões, cartas régias, mapas, etc. Contatos formais
entre os variados níveis hierárquicos da Colônia (do escravo e morador ao Governo-Geral e Juiz de Fora) e
entre a Colônia e a Coroa, o Tombo e o Conselho Ultramarino. São resumos que apresentam a data, o local e
o pleito ou ordem; eles indicam preciosas pistas sobre o “funcionamento” do Brasil Colonial, entretanto não
há aprofundamento das informações, para isso sendo necessário recorrer ao documento na sua íntegra. Essa
possibilidade
por
si
só
já
alimenta
uma
imensa
perspectiva
de
pesquisa
histórica.
Os documentos do Arquivo Histórico Ultramarino apresentam uma riqueza de dados que revelam o cotidiano
da Colônia, confirmando algumas “verdades” historicamente concebidas e questionando outras, ou ao menos,
apresentando indícios a serem pesquisados. De forma abrangente a leitura dos resumos e, num próximo
passo, a íntegra dos documentos selecionados, revelam a dinâmica do Recôncavo colonial na sua dimensão
espacial, tanto física (mapeamentos, registros de posse, pedidos de sesmarias, solicitação de construção de
engenhos, sobrados e capelas) quanto social (litígios passionais, por posse de bens e herança, por facilitação
na produção, ocupação e migração de cargos, formação de irmandades).
AO175 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Geografia Histórica
[1278] SESM ARI AS N O AN TI GO SI STEM A COLON I AL: CON CESSÕES, PRI VI LÉGI OS, CORRUPÇÕES E
LITÍGIOS NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1709- 1822).
PATRÍCIO AURELIANO CARNEIRO.
UFMG, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho apresenta uma revisão acerca do processo de concessão de sesmarias no Brasil colônia,
enfocando o funcionamento de tal instituto e enfatizando os instrumentos normativos, a forma das doações,
os
fatores
estimuladores
dos
litígios
e
as
corrupções.
A metodologia utilizada consistiu da consulta de obras da história e da geografia e do levantamento de fontes
primárias, entre as quais destaco: alguns documentos históricos da Seção Colonial do Arquivo Público
Mineiro, relatórios de Presidente de Província e relatos de viajantes. O objeto de análise foi a economia
colonial mineira, entre os anos de 1709 e 1822: a primeira data marca a criação da Capitania de São Paulo e
das Minas do Ouro e a segunda a extinção das concessões de terras pela Coroa.
O Instituto de Sesmarias remonta à idade média ibérica e surgiu como instrumento para garantir a
consolidação territorial de Portugal, conter o abandono dos campos, inclusive os já lavrados, assegurar a
produtividade da agricultura decadente e regular a mão-de-obra rural. O Estado possuía domínio eminente
sobre todo o território, com poderes, inclusive, de expropriação do sesmeiro, caso este não cumprisse a
obrigatoriedade
do
cultivo
no
tempo
predeterminado.
Na transposição do sistema sesmarial para o Brasil, a metrópole se deparou com diferenças marcantes do
espaço geográfico da colônia, como a sua vasta dimensão territorial e a aparente rarefação demográfica,
adotando modificações na forma de concessão. Ignoraram-se as possibilidades da grande margem de
ilegalidades e corrupções. O caráter vitalício das sesmarias portuguesas foi aqui substituído pelo perpétuo.
Lá, procurou-se combater a incultura, aqui, havia a necessidade de viabilizar a formação de mão-de-obra
necessária para garantir a lucratividade do empreendimento colonial, uma concepção que mais tarde tomou
forma
teórica
na
doutrina
de
Wakefield.
A ausência de restrições quanto ao tamanho das glebas nas doações passou a ser regra, pelos menos
anteriormente aos instrumentos normativos das Cartas Régias: tudo para atender aos objetivos do sistema
de produção colonial monocultor e escravista. Daí resultou que se distribuíram faixas de terras em dimensões
muito superiores àquelas em que uma pessoa poderia razoavelmente torná-la produtiva. No vale do Paraíba
mineiro, Mar de Espanha, Francisco Leite Ribeiro recebeu dezessete sesmarias entre 1817 e 1818, pedidas
em nome de seus filhos. Em Leopoldina, o comendador Manuel José Monteiro de Barros obteve a concessão
de quatorze sesmarias no princípio do século XIX. Requereu-as para todos os seus filhos que existiam e até
mesmo
para
uma
filha
que
não
estava
nascida.
Um atributo essencial na doação de cartas de sesmarias se manteve no Brasil: a concessão de t ít ulos de
posse, não de propriedade. Ao sesmeiro era cedido o direito de usufruto da terra, podendo a Coroa, da
mesma forma que em Portugal, se apropriar da gleba caso não se implantasse o cultivo. Para tanto,
regimentos norteadores, visando combater a improdutividade, foram instituídos. Estes procuraram combater
os abusos criados pelos senhores mais poderosos que causavam prejuízo da marcha da colonização e à
arrecadação da Fazenda Real, fixando prazos máximos para cultivo, povoação e demarcação das terras. A
despeito da formação de latifúndios, o essencial era o povoamento e a disseminação de culturas, principais
finalidades
para
as
quais
as
sesmarias
foram
criadas.
A legislação agrária colonial, não obstante os regimentos impostos, foi um estímulo à formação de grandes
extensões, pois além da flexibilidade nas medições, raramente efetuada pelos sesmeiros, não vedava a
incorporação de outras terras. Ademais, estas eram concedidas tão somente a “homens bons”, de
“qualidades” ou, preferencialmente, de “posses”, e a quem o Rei imaginasse dever favores. O relatório do
Presidente de Província Francisco Pereira de Vasconcellos, de 1855, apontou o quanto eram desiguais as
concessões, pois chegou-se a distribuir sesmarias desde a dimensão de 50 braças até 48 léguas quadradas,
sem
contar
aquelas
cujo
registro
não
mencionou
o
tamanho.
A utilização de marcos referenciais muito gerais e, às vezes, sem perenidade, agravou os problemas de
conflitos de terras. Instrumentos legais foram criados para combater os litígios. Mas, a garantia da
estabilidade da posse residia na violência e artimanhas dos grandes sesmeiros ou na falta de proibição de
outrem. Os conflitos de posse foram agravados pela abundância de terras devolutas, pela sua importância
em áreas de fronteira, pela grilagem, pela mercantilização precoce do espaço rural mineiro e pela posse
lançada
anteriormente
à
concessão,
o
que
não
foi
raro
na
região
mineradora.
O sistema de sesmarias vigorou até 1822 quando a Coroa reconheceu uma situação insuportável, cujo
desdobramento, qual seja, a ocupação, em escala cada vez maior, das terras não cultivadas ou devolutas por
grandes contingentes da população rural, posseiros ou “intrusos”, como eram denominados, começou a
ameaçar a propriedade latifundiária. A partir de então, a posse passou a predominar livremente no país, até
a promulgação da Lei n.º 601, de 18 de setembro de 1850 (Lei de Terras). Esta revalidou as sesmarias
antigas e as posses encampadas no período acima, além de ter instaurado a aquisição da terra por meio da
compra,
ou
seja,
transformando-a
em
uma
mercadoria.
A inevitável emancipação dos escravos e a abundância de terras devolutas no Brasil colocavam como
necessária para a reprodução da classe senhorial a formação de um mercado livre de força de trabalho. Com
o instrumento jurídico de 1850, não somente se efetivou este desejo como também se concretizou a
propriedade capitalista da terra. O Estado e a referida classe, portanto, ao negarem o meio de produção
básico aos homens pobres livres e aos futuros emancipados, fundaram um dos principais fatores da questão
agrária brasileira.
AO176 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia Histórica
[1279] A FORM AÇÃO SÓCI O- ESPACI AL D ERI VAD A D A REGI ÃO CACAUEI RA D A BAH I A: D A ORI GEM
A CONSOLIDAÇÃO, DA DECADÊNCIA ÀS POSSIBILIDADES DE PLANEJAMENTO TERRITORIAL.
PAULO FERNANDO MELIANI.
UFPE, RECIFE, PE, BRASIL.
Resumo:
Este estudo apresenta os resultados parciais de uma pesquisa que, partindo dos conceitos de formação sócioespacial e de espaço derivado, procura compreender o espaço da atual microrregião de Ilhéus-Itabuna, mais
conhecida como região “cacaueira” da Bahia. A atual organização do espaço de Ilhéus-Itabuna é produto
histórico de sua formação regional, que enraizou formas geográficas oriundas da função espacial dominante,
a produção de cacau. Decadente há décadas, a lavoura regional não possui mais a importância regional de
outrora, mas sua cultura domina o imaginário das pessoas do lugar, muitas ainda na expectativa de uma
redenção
da
economia
cacaueira.
O conceito de espaço derivado, apresentado por Milton Santos, sustenta a idéia de uma formação sócioespacial derivada (estranha, estrangeira), já que a organização do espaço se deu em função de necessidades
longínquas, sendo criado ou transformado por demandas externas. Segundo o autor, é a Maximilien Sorre
que se deve a denominação “paisagens derivadas”, desde que a adotou para mostrar a relação histórica
entre países industriais e subdesenvolvidos. A decadente região cacaueira do sul da Bahia é um exemplo de
espaço derivado, já que sua formação sócio-espacial se deu fundamentalmente em função da demanda
estrangeira
por
amêndoas
de
cacau
ao
longo
dos
séculos
19
e
20.
Nessa perspectiva, este estudo busca reconhecer o processo de formação sócio-espacial da região, bem como
apresentar possibilidades de planejamento territorial, considerando formulações geográficas de natureza
regional
e
urbana
que
subsidiem
políticas
de
desenvolvimento.
O referencial conceitual, metodológico e teórico está organizado em três eixos de fundamentação: (1) o dos
conceitos de formação sócio-espacial e de espaço derivado, definidos por Milton Santos; (2) o dos dados
quantitativos e informações qualitativas de natureza histórica, econômica, demográfica e geográfica
referentes ao processo de formação regional, notadamente presentes nos trabalhos de Eduardo Bueno sobre
a colonização brasileira, de Milton Santos sobre a zona do cacau, de Silva Bandeira de Mello e outros sobre o
subsistema urbano de Ilhéus-Itabuna, de Angelina Garcez e Antonio Freitas, bem como o de José Carlos
Vinháes sobre a história regional, entre outros; (3) o das considerações a respeito das possibilidades de
planejamento e desenvolvimento regional, fundamentalmente as propostas de Edgard Porto sobre
desenvolvimento
e
território
na
Bahia.
Na formação sócio-espacial buscou-se a identificação da origem e o reconhecimento da evolução regional por
meio de uma periodização que considera as funções do espaço ao longo do tempo como critérios balizadores
de períodos. Assim, foi possível levantar algumas questões principais e desenvolver alguns pontos relativos a
estas questões: (1) qual a função espacial antecedente a formação regional, considerando que essa só se
deu com a implantação e consolidação da economia cacaueira nos séculos 18 e 19; (2) que fatos e
fenômenos sócio-econômicos e geográficos estão relacionados á formação regional cacaueira; (3) que fatores
instabilizaram e instabilizam a economia cacaueira e que trazem consigo a decadência regional; (4) que
possibilidades têm os geógrafos de analisar e propor políticas de planejamento territorial que permitam o
desenvolvimento
da
região.
A periodização proposta para a compreensão da formação sócio-espacial da região compreende três
períodos: (1) os antecedentes da formação regional, quando o espaço tinha uma função de “fronteira de
recursos”; (2) o período pleno da formação regional, quando o espaço assume sua função cacaueira e (3) o
período de decadência regional que perdura até os dias atuais. Além da periodização, que trás consigo a
identificação e o reconhecimento dos fatos e fenômenos fundamentais de cada período, este estudo
apresenta considerações sobre as possibilidades de análise regional e planejamento territorial.
No primeiro período, o dos antecedentes da formação regional, refere-se fundamentalmente ao período de
colonização portuguesa, quando o espaço tinha uma função de fronteiras de recursos. A cidade de Ilhéus,
fundada em 1534, permaneceu isolada do povoamento europeu durante o período de Capitania por diversos
fatores: má administração, presença de uma floresta inóspita, oocorrência de doenças desconhecidas dos
europeus, resistência de povos indígenas, estratégias da Coroa Portuguesa de centralização política e
econômica
na
Capitania
da
Bahia
(Salvador),
entre
outros.
Com a introdução do cacau no século 18, é que o povoamento se intensifica decisivamente, dando origem a
região. Os antigos núcleos litorâneos, como os das atuais cidades de Ilhéus, Belmonte, Canavieiras e Itacaré
concentravam a população regional e comandaram a conquista de suas hinterlândias ao exercerem a função
de portos cacaueiros. Com a exportação regular de amêndoas de cacau, a partir de 1834, a produção se
ruraliza e o povoamento se intensifica no interior da região. Os volumes de exportação crescem
significativamente ao longo do século 19 do mesmo modo que os contingentes de migrantes que chegam à
região,
notadamente
do
Estado
de
Sergipe.
Apesar da consolidação da economia cacaueira, a atividade monoprodutora regional desde sempre mostrou
seu caráter de instabilidade, sujeitando a região a recorrentes períodos de estagnação econômica. Incertezas
climáticas, incidência de pragas e doenças, variações de preços, flutuações de câmbio, concorrência de
produtores africanos, entre outros fatores, sempre foram (e ainda são) agentes de risco na economia
cacaueira. A economia cacaueira atravessa uma séria crise desde os anos 1980, desencadeada pela
tendência declinante dos preços no mercado internacional e pela ocorrência de doenças nos cacaueiros
causadas
pelos
fungos
“vassoura-de-bruxa”
e
“podridão-parda”,
entre
outros
fatores.
O conhecimento da formação sócio-espacial, responsável pelas formas e organização espacial da região,
permite um melhor embasamento na busca de possibilidades de análise e planejamento territorial que
permitam o desenvolvimento regional. Cabe destacar as possibilidades de proposição de políticas públicas de
integração produtiva regional e de serviços, de competitividade internacional, de emprego e formação
profissional, de infra-estrutura e equipamentos, bem como de uma articulação espacial para a região.
Palavras-chave
região cacaueira da Bahia; formação sócio-espacial; espaço derivado; análise regional; planejamento
territorial
AO177 - América Latina: temporalidades e territorialidades - Geografia Histórica
[1379] A TERRI TORI ALI D AD E FRAN CI SCAN A: ELEM EN TOS FUN D AN TES E AM BI GÜI D AD ES N A
AMÉRICA PORTUGUESA.
MOYSÉS VINICIUS ALVES DA SILVA.
FERLAGOS, CABO FRIO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O presente trabalho teve por objetivo principal delinear a inserção espacial na América colonial portuguesa da
Ordem franciscana, os seus pressupostos históricos, sociais e religiosos, bem como a sua individualização no
cenário eclesial enquanto suposta portadora de um carisma particular, sob a hipótese de que existiria um
modelo próprio de uso do território, o que configuraria assim uma territorialidade genuinamente franciscana
dentro
do
quadro
colonial
luso-brasileiro.
Para tanto, o conceito-chave adotado foi o de territorialidade, dentro de uma perspectiva de estratégia de
uso do espaço com a finalidade de atingir pessoas e objetos, tornando o próprio espaço, através de uma
apropriação
efetiva
e
simbólica,
um
meio
para
tal
fim.
Além dele, um segundo conceito adotado acessoriamente para o desenvolvimento do trabalho foi o conceito
sociológico de capital simbólico de Pierre Bourdieu, o qual poderia ser resumido como o modo que se forma
uma identidade social, a sua apropriação e reprodução simbólica por gerações vindouras, sob novas
condições de tempo e de espaço, podendo assim, em nossa análise, ser auferido pela forma como um
determinado grupo utiliza estrategicamente do território, a ele tornado espaço de reprodução vivencial e
ideal.
A metodologia de análise historiográfica tomou por base os textos produzidos sobre o franciscanismo ou
sobre a Igreja Católica de modo mais amplo, sob três vertentes, a saber: a história contada pelos membros
da própria Ordem; aquela analisada criticamente dentro do próprio ambiente eclesial, principalmente no que
se refere às missões católicas na América colonial portuguesa; e, finalmente, aquela história imprescindível
da formação do Brasil contada pelos clássicos da Geografia, História, Sociologia, Filosofia e Antropologia de
nossa literatura. Assim procedendo, investigamos pontos de vista diferenciados, mas não antagônicos de um
mesmo
assunto
complexo
em
sua
gênese
e
em
sua
análise.
Um dos pontos principais desenvolvidos pela pesquisa teve por meta inventariar aqueles que foram um dos
principais marcos espaciais da presença franciscana na América portuguesa: os conventos construídos entre
os séculos XVI e início do século XVIII entre os atuais estados da Paraíba e São Paulo, onde, ao menos de
modo informal, uma visita foi realizada, perfazendo um número total de treze conventos conhecidos de um
total de vinte e seis construídos no período acima, dentro das atuais Províncias de Santo Antonio e Imaculada
Conceição, lembrando que a denominação província equivale dentro do objeto estudado a uma divisão
regional
e
hierárquica
existente
dentro
da
própria
Ordem
Franciscana.
Assim, como conclusão, vimos que a funcionalidade e localização privilegiada dentro das antigas vilas e
cidade coloniais dos conventos franciscanos construídos no período português da América são a expressão de
um jogo de territorialidades em que uma tensão estrutural se fez presente dentro deste grupo social marcado
pelo paradoxo existencial de ser ele mesmo ou de ser uma resposta às exigências estruturais de um
momento específico que vivia a Igreja Católica no qual ele está inserido, ou seja, o padroado ibérico e um
modelo de missão atrelado a um modus operandi essencialmente militar e comercial, sob a justificativa e a
legitimidade
da
religião.
Através da análise historiográfica, observamos que o franciscanismo como movimento, cresceu à sombra de
uma igreja profundamente tradicional e o seu dilema-mor nesta condição parece ter sido o de estar dentro
ou fora deste domínio eclesial, ser movimento ou se transformar em ordem religiosa. Esta tensão identitária
se fez presente na maneira como Francisco de Assis e os seus seguidores se inseriram nas sociedades em
que
viveram.
Mesmo sem um discurso legitimador filosófico ou mesmo doutrinário, as práticas religiosas refletidas no uso
de espaço medieval demonstraram uma práxis territorial nova, itinerante, revitalizando espaços leigos e
praças públicas, corrompendo um modelo de cristandade baseado na fixidez segura dos espaços sagrados de
igrejas e mosteiros, a estabilitas loci. Foi o que denominamos de territorialidade flutuante. Uma estratégia
territorial que nunca foi assumida enquanto tal. Ela foi simplesmente vivida, uma práxis existencialista sem a
ideologia
do
discurso
que
dela
se
fez
posteriormente.
Se a territorialidade flutuante franciscana foi foco de uma tensão estrutural interna, isto foi possível
primeiramente pela própria contradição existencial em se fazer ordem. Somado a uma distância temporal de
três séculos, a questão colonial impunha a necessidade de se expandir dentro da esfera de possibilidades do
estado monárquico português, associando a isto a questão paradoxal de se tornar um poder constituído pelas
bênçãos da empresa mercantil, representada pelo modelo de apropriação colonial do Novo Mundo.
Assim, a construção, mudanças de status de funções religiosas para atividades militares ou mesmo as
posteriores ampliações de alguns conventos franciscanos conforme observado pela pesquisa de campo,
fizeram deles um marco espacial do modelo de inserção territorial baseada em pressupostos antagônicos
para o carisma da Ordem. Eles são a materialização de um modelo de igreja pactuada com o poder do
Estado, se tornando a evidência concreta de uma espacialização que difere de uma estratégia de ser/estarno-mundo de forma itinerante em um caminho, de extensão ou raio a partir de pólos de uma grande e única
rede, regionalizada em forma de Províncias e Custódias. Aqui, os conventos estabelecidos denotam uma
Ordem localizada em forma de pólo de dispersão, onde núcleos privilegiados de ação são eleitos para a
prática da “desobrigação” típica da assistência religiosa aos colonos europeus, servindo ainda como ponto de
partida para o caminho de ida e volta das missões, o que denota a deferência dos núcleos centrais sob a
forma de cidades e vilas, em detrimento de outras áreas, expressando em uma diferenciação de lugares, a
típica dicotomia colonial lusa litoral-sertão.
AO178 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia Histórica
[1668] A IMPORTÂNCIA DOS TERRENOS DE MARINHA NO BRASIL COLONIAL E IMPERIAL.
MARCO TÚLIO MENDONÇA DINIZ; FÁBIO PERDIGÃO VASCONCELOS.
UECE, FORTALEZA, CE, BRASIL.
Resumo:
INTRODUÇÃO/JUSTIFICATIVA
Os terrenos de marinha são uma estreita faixa de terra 33 metros que avança para o continente a partir do
preamar médio de 1831 (daí o interesse nesse período histórico), tem esse nome por estarem próximos ao
mar
e
não
por
pertencerem
à
Marinha
do
Brasil.
O objetivo deste trabalho foi o de trazer ao conhecimento de uma maior quantidade de geógrafos, qual as
origens e o regime dos terrenos de marinha em nosso país, abortando especificamente os períodos colonial e
imperial
(este
último
dividido
em
Primeiro
Império,
Regência
e
Segundo
Império).
REFERENCIAL
TEÓRICO
É demasiado carente o interesse de cientistas sobre tais terrenos, mais ainda em reconstituir a história de
sua instituição. Consideráveis contribuições foram dadas por juristas como Menezes (2007) e Nieburh (2004),
Lima & Pereira de Lima (2007), também entre na discussão porém todos de forma muito introdutória no
período em destaque. Não foi encontrado geógrafo tratando da matéria por isso aumentou nosso desafio em
pesquisar
o
tema.
MÉTODO
O método utilizado na pesquisa foi um só: descrição e analise de textos científicos e da legislação do Brasil
Imperial e Colonial. Esses últimos encontrados após demorada pesquisa nos arquivos da Câmara dos
Deputados, disponibilizados na internet. A descrição das leis foi quantitativa e qualitativa, assim como dos
trabalhos
acadêmicos
à
que
tivemos
acesso.
PRINCIPAIS
QUESTÕES
Uma Ordem-Régia de 21 de outubro de 1710 vedava que as terras dadas em sesmarias compreendessem as
marinhas “as quais deveriam estar desimpedidas para qualquer serviço da coroa e de defesa da terra”
(MENEZES, op. cit.). Era área nobre de domínio público, sendo a Coroa sua proprietária e não permitindo seu
uso
para
fins
privados.
Niebuhr (2004) faz referência à mesma Ordem Régia e afirma ter tido acesso à uma outra de 04 de
dezembro de 1678 onde os terrenos de marinha são , também, considerados bens de domínio público.
Sendo essas as primeiras referências históricas ao tema, havendo ainda no período regencial a primeira
demarcação com lei de 1811, citada por Lima & Pereira de Lima (2007, on-line).
No período Imperial temos: Brasil (1826) no primeiro Império; Brasil (1831a & 1831b) na Regência, as
últimas
com
a
primeira
demarcação
das
marinhas
no
governo
brasileiro.
Iniciasse no período regencial o regime de aforamentos das marinhas e em 1868 (BRASIL, 1868) Dom Pedro
Segundo normatiza definitivamente o que são e como deve proceder quanto ao uso e demarcação dos
terrenos de marinha. Nesse texto o Imperador constam as principais diretrizes do aforamento dos terrenos
de
marinha,
em
sua
maioria
utilizadas
até
os
dias
atuais.
Pedro Segundo é o principal representante desta idéia de aforar o vender terras públicas em benefício do
Tesouro
e
ajuste
das
contas
públicas.
CONCLUSÕES
Em nossa pesquisa pudemos perceber que a zona costeira, desde os primórdios de nossa nação foram áreas
prioritárias de interesse por parte de particulares e do estado, note-se que apenas um aspecto que são os
terrenos
de
marinha
foi
motivo
de
grande
atenção
da
coroa.
As marinhas inicialmente foram tratadas como terrenos estratégicos para a construção de portos de diversos
tamanhos e usos, e de fortalezas para a proteção dos territórios contra ataques estrangeiros.
Posteriormente se percebeu que também eram áreas passiveis de ocupação e utilização econômica diversa,
gerando recursos para a o Tesouro e sendo áreas comerciais e residenciais interessantes para o povo
brasileiro.
O regime de demarcação do ponto onde está localizada no espaço a linha imaginária que prevê a legislação
do país é trabalho complicado mesmo para geógrafos bem treinados na Geografia Aplicada. Esses além das
técnicas apuradas têm de conhecer assuntos como o aqui tratado para entender o contexto de sua pesquisa.
É demasiado complicado falar sobre essas áreas que são motivo de interesses diversos, porém pensamos ter
contribuído com este ensaio que pretende ser um subsídio para a contextualização histórica dos problemas e
dilemas que estão no entorno dos litorais, e de forma mais particular nos terrenos de marinha em nosso país.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decisão Imperial nº. 29 – Justiça – Provisão do Desembargo do Paço de 21 de fevereiro de 1826. Dá
providências sobre os destroços feitos na povoação de Itabapuanna a requerimento do proprietário da
fazenda Moribeca. Coleção das leis do Império do Brasil – Portal da Câmara dos Deputados, [on-line]. [S. l.]
Disponível em:
AO179 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Histórica
[1806] A TOPONÍMIA COMO ELEMENTO DA APROPRIAÇÃO SIMBÓLICA.
RAFAEL LUIZ LEITE LESSA CHAVES.
PPGG - UFRJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Nomear lugares é muito mais do que uma simples atribuição de nomes; é “materializar” o sentimento que
um lugar é uma entidade que possui uma individualidade que a distingue de outros lugares, e isso ocorre
baseado
na
sensação
de
que
um
lugar
é
útil
e
vale
a
pena
ser
nomeado.
Ao se nomear uma área, esta deixa de ser um simples ponto no mapa ou apenas um pedaço da superfície
terrestre; transforma-se em um espaço com significado. Um topônimo também é a expressão da
intencionalidade de um grupo, em demonstrar a territorialização de determinada área. Podemos dizer que os
topônimos têm função semelhante à dos pelourinhos, de símbolo demarcador da propriedade territorial.
No período inicial de consolidação do território colonial português na América, era necessário que se fizesse o
registro das novas terras. Uma das formas utilizadas foi a produção mapas, que além de representarem
graficamente as características espaciais dos novos domínios, eram um importante veículo de comunicação.
Num período de intensa disputa entre coroas européias pelo domínio das terras americanas, o ato de grafar,
em idioma português, os nomes das áreas conquistadas nos mapas, era uma clara comunicação da
propriedade
do
território.
Entre 1500 e 1530, os portugueses, batizaram a costa do que é hoje o território brasileiro seguindo o
calendário hagiológico, ou seja, baseando-se exclusivamente nas suas referências culturais. A partir de 1530,
com o início da colonização, que necessariamente implicava em maior convivência – hostil ou não – com os
indígenas, os portugueses começaram, então, a utilizar bastante a toponímia autóctone. Ao longo do
processo de apropriação de fato do território costeiro, decorrido principalmente nos dois primeiros séculos do
período colonial, entretanto, essas toponímias foram, em parte, desaparecendo, dando lugar a toponímias
européias
ou
híbridas.
Esta artigo pretende compreender o processo, historicamente variante, de nomeação das novas áreas
conquistadas, uma das feições espaço-político-culturais presentes na conquista e apropriação colonial
brasileira. Este processo ocorreu, por vezes atribuindo-se um topônimo europeu, outras vezes utilizando-se
um topônimo indígena, houve casos em que fundiu-se um topônimo europeu com um indígena. A
identificação destas três formas de nominação de lugares é esclarecedora para a explicação da apreensão,
em
diferentes
períodos,
da
colônia
pelo
colonizador.
Analisaremos a imposição de topônimos na capitania do Rio de Janeiro no período de 1565 até 1600,
observando a matriz cultural utilizada para a denominação, para assim demonstrar que a troca de matrizes
ocorre em decorrência da história dos lugares, ou seja, com o estabelecimento efetivo dos lusitanos na terra;
ou a importância estratégica de determinados lugares. Para a operacionalização deste projeto, serão
observados,
para
o
período
estudado,
os
nomes
utilizados
nas
cartas
de
sesmaria.
A justificativa desta pesquisa é procurar oferecer uma contribuição para o preenchimento de uma lacuna na
história da formação territorial do Brasil, tratando da apropriação simbólica do território colonial português na
América. Pretende-se também demonstrar que o processo de imposição da toponímia ao território colonizado
foi bastante complexo, e revela importantes relações de poder e interações culturais entre dominadores e
dominados. Analisaremos essas relações e interações através do processo de apropriação simbólica da
capitania
do
Rio
de
Janeiro
pelos
portugueses
nos
século
XVI.
Ambicionamos explicitar que a evolução do nome dos lugares acompanha de perto a história dos lugares,
pois como já demonstrado em trabalho anterior, especificamente para o caso da Capitania do Rio de Janeiro
no século XVI (CHAVES, 2003), as áreas estrategicamente posicionadas são batizadas pelos descobridores ou
pelos ocupantes de altos postos da burocracia portuguesa, ou seja, aqueles que não têm (ou têm muito
pouco) contato com o meio local. Como exemplo, podemos citar os acidentes geográficos, que recebiam os
nomes atribuídos pelos capitães das naus e as vilas fundadas (e batizadas) pelos governadores gerais; ao
passo que as áreas posteriormente ocupadas, possuem em grande parte os topônimos indígenas, pois em
muitos casos, é destes a logística utilizada para tal conquista, como é o caso dos arraiais fundados por
bandeirantes (WEHLING, 1994). Procura-se então observar, até que ponto prevaleceu a cultura européia, e
até que ponto, a cultura indígena sobreviveu; e de que forma a cultura indígena foi utilizada pelo colonizador.
Se segundo Zelinsky, “The study of names is a many-sided enterprise with great and exciting intellectual
potentialities” (ZELINSKY, 1997), como podemos fazer uma abordagem geográfica da toponímia sem cair no
campo da etimologia ou da antropologia? Propomos que para esta tarefa, nenhuma outra área do
conhecimento geográfico faria de forma mais eficaz do que a Geografia Histórica, pois não se trata aqui de
fazer uma análise do significado dos topônimos, e menos ainda de uma simples observação de sua
distribuição espacial. Pretendemos através do recorte sincrônico, utilizar as categorias de análise geográfica,
que são atemporais, para compreender um objeto não material que compõe o espaço geográfico de um
“presente
de
então”
(ABREU,
2000),
e
as
ações
relacionadas
à
sua
produção.
Visamos com este trabalho observar a imposição da toponímia portuguesa em um primeiro momento, sobre
amplas áreas costeiras, nas quais não há trocas culturais entre colonizador e colonizado, e em um segundo
momento o surgimento da toponímia européia na Capitania do Rio de Janeiro, percebendo assim, a
progressiva apropriação simbólica em escala local, ou seja, imposição de seu poder, pela supressão de um
elemento cultural, porém absorvendo parte da cultura autóctone pelo início do contato direto dos diferentes
povos.
AO180 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia Histórica
[2047] A DIFERENCIÇÃO SOCIAL NA FORMAÇÃO SÓCIO- ESPACIAL EM CRICIÚMA - SC.
KEITY KRISTINY VIEIRA ISOPPO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, SAO JOSE, SC, BRASIL.
Resumo:
Existem três abordagens teóricas para explicar a industrialização em Santa Catarina: o desenvolvimentista
conservador, o schumpteriano e o de formação socioespacial. Os dois primeiros, “baseiam-se na tese da
gênese industrial como obra da consolidação do capital comercial (import-export) ou na capacidade
empreendedora do capitalista de origem européia, o que teria gerado um ‘modelo econômico catarinense’ de
desenvolvimento industrial” (SILVA apud BELTRÃO, 2001). O terceiro, dentre estes referenciais teóricos que
explicam o surgimento das indústrias em Santa Catarina, é o de formação socioespacial, elaborado por Milton
Santos,
o
qual
é
utilizado
neste
trabalho.
Pensando nas especificidades de cada formação, Armem Mamigonian reforça a perspectiva de formação
socioespacial elaborada por Milton Santos, acrescentando a importância da pequena produção mercantil,
atrelada a um determinado tipo de imigração que agrega um processo de acumulação diferenciado de outros
tipos de ocupação existente em outras regiões brasileiras e até mesmo catarinenses. O êxito industrial da
pequena produção mercantil transplantada da Europa através do processo de colonização em Santa Catarina
pode ser confirmado através da obra “Estudos Geográficos das indústrias de Blumenau” de Armem
Mamigonian (1965). Este estudo afirma que as iniciativas locais e a origem modesta caracterizam a
existência da pequena produção mercantil, “capitalistas sem capital” que exemplifica a origem das indústrias
de Blumenau. Assim, pode-se diferenciar dois tipos de gênese industrial, uma de acordo com a profissão
anterior de seu proprietário (artesão, mestre de ofício e engenheiro) e outra de acordo com a origem do
capital.
Esta abordagem “considera a industrialização de algumas regiões catarinenses como decorrentes da
acumulação gerada pela pequena produção mercantil, aliada a uma representativa divisão social do trabalho
entre agricultores independentes, artesãos, operários e pequenos comerciantes” (BELTRÃO, 2001). É o que
se pretende verificar neste trabalho, isto é, analisar-se-á a diferenciação social na formação socioespacial de
Criciúma a partir da idéia de ruína dos pequenos produtores de Lênin utilizando como base o primeiro
capitulo do seu livro “O Desenvolvimento do Capitalismo na Rússia”. Os pensamentos deste autor nos dão
subsídios para entender como ocorreu o processo de diferenciação dos pequenos produtores, considerando o
aumento
do
mercado
interno
local.
A partir do século XIX Santa Catarina foi colonizada por imigrantes, “pequenos agricultores alemães, italianos
e poloneses (séculos XIX e XX), que coexistem com povoamentos luso-brasileiros, de origem mais antiga
(XVII e XVIII) e consagrados à criação, no planalto, e à pequena lavoura, no litoral” (MAMIGONIAN, 1966). O
processo de imigração apoiado pelo governo imperial, assim como em toda região sul, possuía o objetivo de
povoar as terras que ainda fossem desabitadas com elementos provenientes da Europa. Em Santa Catarina,
assim como no Rio Grande do Sul, foram os alemães e italianos os principais colonos. Visando as terras de
matas, encontraram pelas condições de relevo e drenagem uma faixa bastante larga entre o litoral e o
planalto.
(SANTA
CATARINA,
1986)
A região Sul Catarinense foi povoada em grande parte por imigrantes provenientes do norte da Itália. “Muitos
foram favorecidos por leis que lhes davam o direito de comprar as chamadas Terras Devolutas, podendo ser
pagas em espécie, dinheiro ou serviços prestados ao governo, como abertura de estradas, construções de
pontes ou prédios públicos” (GOULARTI FILHO, 1995).Criciúma foi fundada em 05 de janeiro de 1880,
povoada em grande parte por italianos e pouco tempo depois (1891), por poloneses e em 1912 por alemães
(SANTOS, 1997). Goularti Filho (1995) explica que a colonização de Criciúma se assemelha com a do Vale do
Rio Itajaí, onde pequenos proprietários produziam além da subsistência, comercializando seus excedentes
manufaturados, como farinha de mandioca, açúcar, pó de café, vinagre e vinho, farinha de milho, arroz
descascado, salame, banha, toucinho, torresmo, leite, nata, charque e outros. Muitos destes pequenos
proprietários tiveram destinos diferentes, uns tiveram suas produções falidas, outros viveram entre altos e
baixos durante os períodos de crise, possibilitando uma base bastante pulverizada, garantindo que outros
proprietários tivessem facilidade de acumulação, longe de latifúndios (GOULARTI FILHO, 1995).
“A divisão social do trabalho constitui a base da economia mercantil” (LENIN, 1982), permitindo o
nascimento de uma nova população rural, “a burguesia rural e o proletariado rural - classe dos produtores de
mercadorias na agricultura e classe dos operários agrícolas assalariados”. (LENIN, 1982) Sendo assim, a
maioria dos produtores acabam sendo expropriados dos meios de produção, tornando-se mercadoria nas
mãos de outros, tendo que vender a única coisa que lhes sobrou, sua força de trabalho. “A transformação do
pequeno produtor em operário assalariado pressupõe a perda dos seus meios de produção (terra,
instrumentos de trabalho, oficina etc.) – ou seja, pressupõe o ‘empobrecimento’, a sua ‘ruína’” (LENIN,
1982). ‘Lênin contraria a idéia de que o empobrecimento dos pequenos produtores reduz o mercado interno,
para ele os novos proprietários desses meios de produção “produzirão sob a forma de mercadorias os
produtos que, anteriormente, eram consumidos pelo próprio produtor – vale dizer: ampliam o mercado
interno” (LENIN, 1982). Antes da divisão social do trabalho o pequeno produtor produzia para sua
subsistência, não tendo a necessidade de comprar mercadorias de outro produtor, o mercado interno então
era pequeno ou inexistente. Após a divisão social do trabalho, houve uma especialização da produção,
permitindo o aparecimento de unidades econômicas heterogêneas diminuindo a quantidade de produtores
com o mesmo produto. Dada esta economia pulverizada, tem-se a necessidade de comercialização dos
produtos já que os produtores não produzem mais para sua subsistência, ou seja, há um aumento do
mercado interno. “É, portanto, a divisão social do trabalho a base de todo o processo de desenvolvimentos da
economia
mercantil
e
do
capitalismo”.
(LENIN,
1982)
Goularti (1995) menciona que na Região Sul de Santa Catarina existiram alguns pequenos agricultores que
ascenderam e acabaram tornando-se comerciantes e industriais, é o caso segundo ele de: Mário Burigo, Elói
Burigo e Otávio Burigo que em 1950 tornaram-se comerciantes de produtos da mineração; Mecril, Elmar
donos de uma metalúrgica; Maximiliano Gaidzinski, que em 1936 adquiriu um lavador de moinha,
associando-se posteriormente a um comércio e a uma cerâmica. Pode-se pensar então que “o
desenvolvimento da economia mercantil provoca um crescimento do número de ramos industriais distintos e
independentes” (LENIN, 1982). O processo de imigração juntamente com o surgimento da pequena produção
mercantil foram fatores que contribuíram para a acumulação.
AO058 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1167] CARTOGRAFIA FILATÉLICA BRASILEIRA.
JOSÉ FLÁVIO MORAIS CASTRO; ALEXANDRE ALVES DINIZ.
PUC MINAS - PPGG- TIE, BELO HORIZONTE, MG, BRASIL.
Resumo:
INTRODUÇÃO
A Filatelia é o “estudo dos selos do correio usados nas diferentes nações, metodicamente colecionados”
(BUENO, 1976). Os selos postais de uma nação podem trazer na estampa distintos aspectos sociais,
ambientais, culturais, históricos e geopolíticos, constituindo-se importante meio de comunicação dos valores
de uma sociedade.
A filatelia brasileira notabiliza-se pelo uso de diversos recursos técnicos de representação dos valores de
nossa sociedade. Dentre esses recursos, merece destaque a Cartografia. As interseções entre Filatelia e
Cartografia no Brasil geraram mais de 350 selos ao longo da história (CORREIOS, 2002), constituindo-se no
primeiro lançamento o selo em comemoração ao 3º Congresso Panamericano em 1907. Desde então, a
Cartografia tem municiado a Filatelia com mapas s e temáticos, subsidiando, assim, a comunicação de
diversas idéias, valores e conceitos.
OBJETIVOS
Este trabalho tem por objetivo analisar a cartografia filatélica brasileira e as interseções geográficas que
ocorrem na representação gráfica adotada nos selos postais brasileiros, interseções estas intimamente
relacionadas à Geografia Cultural.
REFERENCIAL TEÓRICO E CONCEITUAL
As interseções geográficas, do ponto de vista da representação simbólica nos selos postais, podem estar
intimamente associadas à cultura e suas relações com o espaço, sendo, portanto, passíveis de serem
investigadas no âmbito da Geografia Cultural. Vale lembrar que os seres humanos vivenciam e transformam
o mundo natural em humano. Nesse processo de transformação ganha destaque a cultura. A produção e
reprodução da vida material, resultante da intercessão entre cultura e natureza, é subordinada aos sistemas
de comunicação, uma vez que sem eles a construção e transmissão de comportamentos, saberes, técnicas,
conhecimentos e valores não seria possível.
A semiótica ou semiologia é uma disciplina recente nas ciências humanas, criada no início do Séc. XX.
Etimologicamente, ambos os epítetos são derivações de semeion, vocábulo grego que designa “signo”. No
entanto, a semiótica é de origem americana, significando termo canônico que designa a semiótica como
filosofia das linguagens. Por outro lado, a semiologia é um termo de origem européia compreendido como o
estudo de linguagens particulares (imagens, gestos, teatro, etc.). Essa intrigante ciência dos signos tem
como grandes precursores o lingüista suíço Ferdinand de Saussure, e o cientista norte-americano Charles
Sanders Peirce (JOLY, 2002; SANTAELLA e NOTH, 2001).
METODOLOGIA
Os selos postais representam uma mídia que vem ganhando força nas últimas décadas no Brasil, e que, até o
presente momento, tem sido pouco explorada em análises geográficas. A prática filatélica no Brasil vem
sendo cada vez mais valorizada, fato corroborado pelo expressivo número de emissões de selos postais ,
contabilizando mais de 4.000 estampas desde 1843, quando se emitiu o primeiro selo (CORREIOS, 2002).
Desses, aproximadamente 10% trazem reproduções, documentos ou referências cartográficas que serão
objeto da análise.
Considerando que a abrangência e a quantidade dos temas abordados são amplas, procedeu-se a seleção e
agrupamento do conjunto de selos postais que apresentam elementos cartográficos nos seguintes eixos
temáticos: cartografia/mapas antigos; expedições; meio ambiente; redes de transportes e de
telecomunicações; e, migrações e etnia.
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O eixo temático cartografia/mapas antigos é representado pelos selos postais contendo mapas dos séculos
XVII e XVIII, em estilo portulano e que documentaram as grandes navegações. O eixo temático expedições,
caracteriza mapas temáticos com representações de rotas ligadas ao Descobrimento do Brasil e as
expedições científicas dos séculos XIX e XX.
Os selos postais do eixo temático meio ambiente representam o Brasil por meio de mapas temáticos ligados
à cobertura vegetal e à geologia, e, um mapa de localização e distribuição espacial ligado à caatinga no
nordeste brasileiro.
Os selos postais do eixo temático redes de transportes e de telecomunicações utilizam o mapa como
elemento de localização, com escalas variadas de representação de rotas e fluxos de informações, pessoas,
mercadorias e capitalção. Da mesma forma, os selos postais do eixo temático migrações e etnia também têm
no mapa um elemento de localização, abordando a ocupação do espaço brasileiro por meio de mapas que
representam a formação da etnia brasileira e as correntes migratórias.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho consistiu numa tentativa de contribuir com um campo relativamente inexplorado da literatura
geográfica: as interseções entre cartografia e os selos postais. A partir das estampilhas brasileiras, buscou-se
resgatar uma importante função da cartografia, que é a comunicação de informações espaciais, empregada
na codificação de signos carregados de significados culturais.
A partir do exame dos eixos temáticos ficou claro que os mapas e projeções são evocados nos diversos selos
com objetivos distintos. Em muitos casos, os mapas ganham a dimensão de ícones, na conotação
pearsoniana, comunicando relações topológicas, de distância e indicando a localização de feições e
elementos, além de representar trajetórias diversas.
Assim como a cultura é elemento central, mediador das relações entre sociedade e natureza, os processos de
comunicação são fundamentais à produção e reprodução cultural. Dentre as diversas mídias disponíveis, os
selos postais representam, indubitavelmente, um poderoso veículo de comunicação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BUENO, Francisco da Silveira. D icion á r io Escola r da Lín gu a Por t u gue sa . 11ª. ed. Rio de Janeiro:
FENAME, 1976.
CORREIOS. Informe Publicitário: Filatelia. São Paulo: Contadino. 2002.
JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. São Paulo: Papirus, 2002.
SANTAELLA, Lucia e NOTH, Winfried. Imagem: cognição, semiótica, mídia. São Paulo: Iluminuras, 2001.
AO059 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1328] POR UM A CARTOGRAFI A D O LI XO SECO D E PORTO ALEGRE: TERRI TÓRI O E AM BI EN TE N O
COTIDIANO DAS CATADORAS DE MATERIAIS RECICLÁVEIS.
ROSA MARIS ROSADO; ÁLVARO LUIZ HEIDRICH.
UFRGS, PORTO ALEGRE, RS, BRASIL.
Resumo:
Como a comunidade da reciclagem do lixo de Porto Alegre (isto é, das catadoras de materiais recicláveis)
estabelece seu território e quais as redes de relações com os agentes externos (assessores(as) da prefeitura,
representantes de entidades religiosas, pesquisadores(as), educadores(as) e com cidadãs e cidadãos)? Que
representações sociais de ambiente se expressam neste cotidiano? Que significados fornecem a seu espaço
cotidiano de trabalho com o lixo? Estas entre outras questões surgiram na elaboração do projeto de pesquisa
de doutorado desenvolvido no PPGEO/UFRGS e nos impulsionaram na direção do objetivo principal de
estudar as características que configuram o espaço cotidiano das comunidades da reciclagem enquanto
território, analisando as complexas redes de relações presentes em um galpão (forma como a comunidade
refere-se ao seu espaço de trabalho), bem como, as representações e os significados acerca do ambiente que
nele se expressam. Os objetivos específicos deste trabalho são: 1) analisar os papéis e as relações e interrelações que a comunidade da reciclagem, estabelece no seu espaço cotidiano e externamente a ele, na
legitimação e fortalecimento deste território, bem como, das suas fronteiras; 2) procurar desvelar as
estruturas de poder e controle deste território, observando a dimensão subjetiva e cultural na apropriação
deste espaço, como criadores de uma referência simbólica que reforça o território; 3)buscar identificar as
representações sociais de ambiente que a comunidade apresenta, captando como elas são expressas no seu
cotidiano de trabalho com o lixo e 4)observar se o espaço cotidiano do trabalho com o lixo (elemento
estigmatizador) reforça a identidade de catadora ou motiva a busca de outras alternativas de trabalho e
geração de renda (ser ou estar catadora?) e a relação com as representações sociais de ambiente nele
identificadas.
Entre as associações de catadores de Porto Alegre, que gerenciam as 13 Unidades de Triagem de Resíduos
Sólidos (os galpões) situadas nas diversas regiões da cidade, temos a Associação dos Recicladores do
Loteamento Cavalhada que se constituiu em agosto de 1996, foco desta pesquisa. A escolha da Associação
da Cavalhada levou em conta à acessibilidade da pesquisadora, visto já ter atuado nesta comunidade
enquanto assessora da prefeitura, bem como, as singularidades que este grupo apresenta: (1) trata-se de
uma unidade vinculada ao Movimento Nacional de Catadores; (2) localizada em um reassentamento urbano
com diversas intervenções do poder público municipal; (3) onde se desenvolveu um Projeto de Educação de
Adultos
(Projeto
Galpão)
durante
cerca
de
1
ano.
As informações obtidas das observações no galpão e nas conversas informais (cotidianas) com as catadoras
no seu espaço cotidiano foram consideradas como base para a elaboração de narrativas. Por meio das
narrativas elaboradas, refletiremos sobre as práticas cotidianas desta comunidade, procurando atentar para
fato de que a análise deste espaço cotidiano, devido à complexidade, não pode se resumir a uma técnica
linear, fruto de interferências múltiplas (divisão do trabalho, do tempo, do saber, do poder...), mas, sim, ter
como ponto de partida o sujeito enquanto ser humano, condicionado, concreto e suas relações simbólicas,
próximas,
fixas
e
mutáveis.
O espaço do galpão se define pela adequação à atividade da catação de lixo e pela diferença dada a ele na
prática cotidiana das catadoras que dele se apropriaram, humanizando-o. Assim, devem ser considerados
também os aspectos relativos à identidade e, ainda, as relações de poder que emanam deste território,
sendo necessário procurar compreender as concepções de mundo das catadoras e como são expressas deste
espaço. Se as representações sociais são construídas a partir das práticas sociais no espaço vivido pelos
sujeitos, o espaço vem a ser objeto desta representação. Desvelando a teia de significados que sustenta o
cotidiano no galpão enquanto território, buscamos as representações sociais de ambiente se expressam nas
“práticas discursivas” das catadoras. Afinal, há uma experiência particular destas trizes sociais em relação ao
ambiente, pois este é um elemento presente no discurso sobre a reciclagem que as envolve cotidianamente.
Percebemos que a abordagem pertinente para a leitura deste território vai ao encontro de uma das propostas
apontadas por Haesbaert (2004), que inclui uma concepção multidimensional e não exclusivista de território
(territórios múltiplos e multiterritorialidades). Propomos, assim, uma leitura mais ampla deste território, isto
é, para além da geração de renda (dimensão econômica), das relações de poder internas e externas a ele
(dimensão política), da identidade e dos laços afetivos entre os catadores (dimensão cultural/simbólica).
Neste território expressam suas representações sociais de ambiente, de lixo, do galpão, de gênero entre
outras,
na
sua
cartografia
cotidiana
de
relações.
O principal desafio está relacionado, portanto, às profundas mudanças mundiais e seus reflexos no espaço
político, econômico e social local, no qual começam a desenhar novos imaginários, novas cartografias
simbólicas que nos trazem para uma historia não oficial não linear e, portanto, para uma nova geografia
(Reigota, 2002) cartografada por “sujeitos anônimos” no “contrafogo” para impedir ou na adoção de táticas
para resistir a “precariedade” que nos afeta cotidianamente.
Nesta análise preliminar já é possível perceber a necessidade de re-adequação das ações sociais na esfera
pública e governamental, atentando aos critérios da comunidade e aos seus territórios, redefinidos
cotidianamente, levando em conta a complexidade ambiental presente neste contexto. Enquanto isto, no
espaço do galpão, as catadoras buscam reinventar no cotidiano suas formas de ser e estar no mundo,
traçando a sua própria cartografia do lixo, em uma geografia alternativa que precisa ser reconhecida e
considerada.
AO060 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1619] O LUGAR DA FEIRA LIVRE NA CIDADE DO SALVADOR.
SIMONE MARIA COSTA.
UFBA, SALVADOR, BA, BRASIL.
Resumo:
Este projeto consiste em analisar o processo de composição do tecido urbano, econômico e sócio-cultural da
cidade de Salvador, a partir do surgimento das feiras-livres na borda da Bahia de Todos os Santos,
evidenciando a construção do lugar da feira-livre de São Joaquim, através de uma superposição de extratos
físicos
e
simbólicos
e
sua
influência
no
cotidiano
do
povo
baiano.
A feira livre, produzida e reproduzida constantemente pelo povo, é um meio de sociabilização, onde são
tecidas complexas relações políticas, econômicas, sociais e culturais, onde melhor pode se conhecer a cidade,
o
povo,
seus
costumes,
sua
cultura.
A feira de São Joaquim, tatuada na malha urbana da cidade, assim como as outras que a antecederam,
imprime na cidade e no imaginário coletivo, sua existência enquanto lugar: lugar de compra, venda, troca,
sabores, saberes, vida, cor, som, de povo, de identidade baiana, portador de um riquíssimo patrimônio,
guardado em suas vias, histórias escritas pelas criações coletivas e que retratam a sua essência.
Entender essas marcas e percepções do lugar das feiras-livres na cidade nos permite compreender os
processos e transformações dos espaços urbanos, numa decodificação de signos e símbolos, revelando as
tradições e características que ficaram marcados em seus aspectos sócio-culturais, econômicos e políticos.
Assim, objetiva-se especificamente, analisar como a (re)construção destes espaços influenciaram na
permanência da feira, mesmo com o rápido crescimento urbano da cidade, identificar qual o lugar da feiralivre na sociedade e na cidade e avaliar como a Feira de São Joaquim, configurando-se oficialmente como um
destino turístico, após seu reconhecimento enquanto patrimônio imaterial cultural brasileiro, se comportará
frente
a
essa
nova
perspectiva.
Para tanto, o estudo ancora-se, dentre outros, em Calvino (1990, p. 14), para quem, as cidades, construídas
por diferentes grupos, com valores e signos distintos, não comportam apenas o seu passado, elas “... contém
o passado como as linhas da mão, que é escrito nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos edifícios
[...]
em
cada
segmento
riscado,
por
arranhões,
serraduras,
entalhes,...”.
Seguindo esta análise, não podemos desconsiderar que o homem é um ser temporal e que as diversas
sociedades apresentam diferentes maneiras de produzir e preservar a cultura, e assim, variadas formas de
construir e se relacionar com a cidade, aqui entendida, como a materialização dessa cultura em determinado
espaço
e
tempo.
Segundo Santos (2006, p. 61), o espaço “é formado por um conjunto indissociável, solidário e também
contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o
quadro único no qual a história se dá.” Deste modo, deve ser visto como um fator da evolução social,
portanto, produzido e reproduzido constantemente” (CASTROGIOVANNI, 2000, p. 23), podendo ser
transformado em lugar à medida que adquire personalidade, torna-se vivido, o lugar, mais do que o espaço,
relaciona-se com a existência real e a experiência vivida, pois “o lugar transcende sua realidade objetiva e é
interpretado
como
um
conjunto
de
significados”.
(LENCIONI,
1999,
p.
154).
Santos (2006, p. 61), nos coloca que “os elementos fixos e fixados em cada lugar, permitem ações que
modificam o próprio lugar, fluxos novos ou renovados que recriam as condições ambientais e as condições
sociais, e redefinem cada lugar.” Segundo o autor, p 270, “O lugar é [...] onde fragmentos de uma rede
ganham uma dimensão única e socialmente concreta, graças à ocorrência, na contigüidade, de fenômenos
sociais agregados, baseados num acontecer solidário, que é fruto da diversidade e num acontecer repetitivo,
que
não
exclui
a
surpresa.”
Tuan (1979), refere-se ao lugar como possuidor de ““um espírito”, “uma personalidade”, havendo um
“sentido de lugar” que se manifesta pela apreciação visual ou estética e pelos sentidos a partir de uma longa
vivência.” Nesse sentido, a cidade , conjunto de significados, “(...) deve ser vista como uma escritura, uma
fala a ser interpretada [...]. Trata-se de um enigma a ser desvendado pela exploração. (...) É uma obra de
arte viva, e seus atores são os seus habitantes. Há cores e odores. Hábitos e costumes.” (WAINBERG, 2000,
p.
13)
Como diz Antonio Castrogiovanni (2000, p. 24), “As cidades são representantes fiéis dos macromovimentos
sociais e devem ser vistas como uma representação da condição humana, sendo que essa representação se
manifesta por meio da arquitetura em si e da ordenação dos seus elementos. A cidade é um mundo de
representações, ela pulsa, vive, seduz, agride, transforma-se e transforma aqueles que nela interagem.”
Sob essa ótica, pode-se afirmar que a cidade é sempre reflexo da história do próprio homem e suas
características atuais refletem na sua imagem e no modo de vida das pessoas, que precisam reconhecer-se
naquilo que vêem. Assim, há de se entender a cidade como o meio em que se vive, a integração das esferas
natural,
social,
cultural,
política
e
econômica,
onde
a
cultura
se
processa.
Santos (2006, p. 106), nos revela que “os movimentos da sociedade, atribuindo novas funções às formas
geográficas, transformam a organização do espaço, criam novas situações de equilíbrio e ao mesmo tempo
novos pontos de partida para um novo movimento.”. Podemos tomar como exemplo as feiras livres, que
desde a Idade Média, se constituem como grandes formadoras e transformadoras do espaço, atribuindo
novas
situações
e
movimentos
a
cidade.
Etimologicamente, segundo Aurélio, (1988) feira é um “lugar público, muitas vezes descoberto, onde se
expõem e vendem mercadorias”. Entretanto, a feira, em sua plenitude, tem um conceito muito mais amplo,
que não uma percepção meramente comercial. Segundo Fittipaldi apud Guglielmo, (2005, p. 11), na feira
“toda transação vem carregada de significados. São trocados bens simbólicos, já que são estimados por
valores determinados no âmago de suas culturas produtoras. São portanto portadoras de identidades e
subjetividades”.
Percebe-se então, que, estudar o lugar da Feira na cidade de Salvador, além de um entendimento do
processo de evolução e transformação do espaço urbano é também um reconhecimento e valorização de um
patrimônio, que entre suas funções, tem o papel de promover “a continuidade cultural”, ser o elo entre o
passado
e
o
presente.
Faz-se então indispensável (re)apreendermos a olhar para a feira como um bem que representa identidade e
que exterioriza o valor de uma cultura, de algo que pode ser a expressão de uma conjuntura histórica, a
leitura
de
uma
concepção
social
ou
a
manifestação
de
uma
tradição.
Como metodologia para o referido trabalho, adota-se pesquisas qualitativas, de caráter exploratório,
utilizando-se do Estudo de Caso e o método dialético, pautando-se na 1ª Lei da Dialética. Como métodos de
procedimentos, o histórico, cartográfico, estatístico, funcionalista e de análise. As técnicas complementares
utilizadas são pesquisas de campo, documental e bibliográfica, adotando a amostragem não-probabilistica
intencional (amostragem por cotas), onde os participantes são considerados os agentes sociais.
As principais questões são: Como se deu composição do tecido urbano, econômico e sócio-cultural da cidade
do Salvador, com os surgimentos das feiras-livres na borda da Baía de Todos os Santos?; Com rápido
crescimento urbano da cidade de Salvador, como a (re)construção destes espaços influenciaram na
permanência destas feiras?; Qual o lugar da feira-livre na sociedade e na cidade do Salvador?; A feira de São
Joaquim se configurando como um destino turístico, após seu reconhecimento enquanto patrimônio cultural,
como se comportará frente a essa nova perspectiva?
AO061 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1855] IDENTIDADES TERRITORIAIS QUILOMBOLAS FRENTE AO ESTADO- NAÇÃO BRASILEIRO.
ISABEL ARAUJO ISOLDI.
IGE/UNICAMP, CAMPINAS, SP, BRASIL.
Resumo:
A partir da Constituição Federal de 1988, cem anos após a abolição da escravatura, as territorialidades
próprias das terras de quilombo começaram a ser discutidas pelo Estado brasileiro a partir da promulgação
do artigo 68 que garante a posse da terra aos remanescentes de quilombo que comprovarem a veracidade de
sua ancestralidade. O processo escravagista no Brasil relegou um grande contingente populacional à situação
de marginalidade sócio-espacial, pois ainda que libertos da escravidão em 1888, os negros ex-escravos não
adentraram a condição de cidadania proposta pela República. De fora do sistema econômico vigente,
estiveram também condenados à exclusão do acesso legal a terra, fato que não impediu as ocupações
informais, que deram origem às milhares de comunidades negras rurais existentes hoje em território
brasileiro.
A abordagem geográfica é de extrema relevância uma vez que a temática remete a uma herança ligada à
própria formação da nação e ao acesso ao território como recurso e como abrigo; em situação de exclusão,
os negros ocuparam terras ‘distantes’, formando territorialidades próprias, de forma que se desenvolveram
identidades ligadas diretamente ao uso e ocupação do território. O objetivo do trabalho consiste da análise
das identidades territoriais das comunidades de quilombo frente à implementação do artigo 68 pelo Estadonação, como uma tentativa de inclusão sócio-espacial dos remanescentes do processo escravagista.
O uso e ocupação de determinados lugares são fundamentais na formação de identidades culturais e
territoriais. Além da importância do processo histórico, é importante considerar também as práticas que
consolidam o cotidiano, pois “o território identitário não é apenas ritual e simbólico; é também o local de
práticas ativas e atuais, por intermédio das quais se afirmam e vivem as identidades”.(BOSSÉ, 2004, p.169).
Sendo as práticas sociais partes integrantes de uma territorialidade simbólica, pelas quais os grupos afirmam
e
reivindicam
sua
identidade
cultural
e
política
em
relação
ao
seu
lugar.
A metodologia de análise compreende o espaço como sistema indissociável de objetos e ações; uma
totalidade dinâmica que abriga diversas relações espaciais. (SANTOS, 1997). O valor do espaço é
determinado a partir do uso que dele é feito. Através da apropriação demarcam-se territórios que, enquanto
porções do espaço são socialmente construídas e ocupadas, através da energia e do trabalho. O espaço,
enquanto algo abstrato, é formalizado nos territórios, politicamente demarcados de modo que seria espaço a
‘prisão original’ enquanto que o território seria ‘a prisão que os homens constroem para si’. (RAFFESTIN,
1993,
p.144).
O uso e ocupação do território permite a territorialização do poder. É assim que o espaço, amplo e abstrato,
se torna real, pois é no lugar que ordens externas se materializam, já que o lugar é a categoria do espaço
geográfico onde o mundo se concretiza por meio de sistemas de objetos e ações, deixando de ser uma
abstração. Dessa forma, o lugar não é somente uma parte do mundo, mas o próprio mundo localizado.
(LUCHIARI,
1999).
Assim, cada lugar é por si só individual. O lugar contém o mundo em si, mas ao materializar a abstração, o
faz de maneira única, de modo que cada lugar é um, diferente dos demais. As singularidades dos lugares
podem ser expressas pelas diferentes territorialidades que denotam formas de apropriação do espaço
exclusivas a cada localidade. Trata-se de “um fenômeno de comportamento associado à organização do
espaço em esferas de influências ou em territórios nitidamente diferenciados, considerados distintos e
exclusivos, ao menos parcialmente, por seus ocupantes ou pelos que os definem”. (SOJA, apud RAFFESTIN,
1993,
p.
159).
É importante considerar que o Estado nacional busca ser unificado ainda que a nação estatal não se
identifique com uma realidade objetiva e as populações não compartilhem de um livre consentimento com
relação ao seu destino nacional. As comunidades minoritárias, em situação de vulnerabilidade, dependem do
papel das instâncias institucionais para a construção ou negação do pertencimento nacional já que apenas
como cidadão, o indivíduo terá garantido pelo Estado seus direitos e liberdades. Desse modo se propõe um
projeto assimilacionista, como uma alternativa a possíveis processos de ruptura do território nacional. O
modelo político e jurídico do Estado-nação aspira à unidade, sendo todos cidadãos iguais perante a lei. O que
se dá então é a constituição de um Estado pautado no princípio da igualdade, mas que se impõe soberano
sobre
as
diferenças
culturais.
As terras de quilombo se formaram a princípio, à parte do Estado brasileiro, em uma condição de resistência
à opressão ditada pela escravidão e após, pela exclusão social imposta aos negros quando da implementação
da República. A condição de Estado-nação impõe a necessidade de uma identidade cultural para a criação de
uma unidade nacional que garanta a coesão do país, tarefa difícil diante da diversidade de formas de uso do
território
por
grupos
sociais
distintos.
Neste contexto, é possível dizer que o artigo 68 acaba por normatizar a identidade quilombola, uma vez que
para a obtenção da titulação da terra é necessário que a comunidade requerente prove a veracidade de sua
identidade e se enquadre no conceito de quilombo adotado pela legislação. Ainda que a maioria das
reivindicações por titulações de terras de quilombos seja precedido de conflitos fundiários e não de
inquietações em relação à identidade, as comunidades muitas vezes retomam símbolos e valores já
esquecidos, que confirmem seu passado e seu pertencimento àquela terra. A identidade quilombola é
assumida, em primeira instância, enquanto uma possibilidade de inserção na sociedade.
Palavras-chave: identidade territorial; comunidades quilombolas; Estado-nação, uso e ocupação do território;
territorialidades.
AO062 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1933] A ESTRADA DE FERRO E O COTIDIANO SOCIAL DA CIDADE DE TRÊS LAGOAS – MS.
ARLINDA MONTALVÃO OLIVEIRA; EDIMA ARANHA SILVA.
UFMS, TRÊS LAGOAS, MS, BRASIL.
Resumo:
Percebe-se que é no espaço geográfico que se dão às circulações de mercadorias, de pessoas, de serviços e
informações que geram as modificações sócio-espaciais cada vez mais complexas e em escalas locais e
globais. As contribuições da Geografia inserem e evidenciam os processos sociais ocorridos no contexto da
dinâmica sócio-espacial. O estudo de fatos da realidade torna possível o entendimento dos pressupostos
dessa ciência. Em que o fazer geográfico faz mais sentido, pois nos permite compreender em que
circunstâncias e onde as transformações sociais ocorrem. Nessa perspectiva considera-se que não basta
explicar o mundo, é preciso compreender as transformações do espaço geográfico vivido ao longo do tempo.
Essas transformações do meio geográfico envolvem a inter-relação entre o homem e o meio.
Neste contexto pretende-se refletir, por meio do objeto desse estudo, o cotidiano social dos moradores do
Município de Três Lagoas – MS, no período do seu povoamento e construção da Estrada de Ferro Noroeste do
Brasil. Ressalta-se ainda a necessidade de abordar as relações entre homem, tempo e território, associado às
atividades econômicas, às condições habitacionais dos moradores e toda a infra-estrutura local, vislumbrando
a
dinâmica
sócio-espacial
ocorrida
ao
longo
do
tempo.
A expansão urbana vem provocando mudanças radicais no cotidiano das pessoas e nas dinâmicas econômica,
social e cultural dos diferentes municípios sul-mato-grossenses. De modo geral essas mudanças
proporcionaram o êxodo rural e a urbanização. O surgimento de novos núcleos urbanos acelerou o
crescimento
populacional
e
aumentou
os
problemas
sócio-ambientais.
Na busca do entendimento desse novo saber geográfico, onde o cotidiano social da população três-lagoense
contribuiu na construção e organização do território da cidade propôs-se estudar os diferentes momentos
históricos do povoamento e desenvolvimento das atividades produtivas analisou-se ainda as mudanças
ocorridas nas relações políticas, econômicas e sociais. Além de identificar e compreender as características do
cotidiano rural conferida ao cotidiano urbano, decorrente da construção da Estrada de Ferro Noroeste do
Brasil.
Sabe-se que a Estrada de Ferro transformou substancialmente o cotidiano das pessoas, tanto no campo
quanto na cidade, mudando-se também as relações produtivas, econômicas, políticas e sociais. Dentre essas
mudanças destacam-se as contribuições dos trabalhos realizados pelos primeiros engenheiros da Rede
Ferroviária. Assim, a paisagem foi sendo rapidamente remodelada, novas moradias, novas ruas e estradas
foram traçadas no antigo rural, constituindo o novo urbano; estabeleceu uma nova ordem produtiva,
comercial e social. Criaram-se novas possibilidades de alimento, de vestuário, de meios de locomoção de
pessoas
e
mercadorias.
Nesse sentido a linha férrea foi também responsável pela produção e segregação territorial de duas classes
sociais da época: os fazendeiros, os comerciantes, os burocratas e senhores de posses instalaram-se na
parte norte da cidade. A frente da Estação Ferroviária e a rua principal da cidade foram construídas ligando
dois centros de poder: a Estação e a Igreja. Foram construídos ainda deste lado: a praça central, igrejas,
hotéis, cinemas, armazéns, padarias, bares, botequins e clubes; mais distantes do centro foram construídos
os bordéis. Na porção sul de seu território instalaram-se a classe operária, a massa de trabalhadores e
assalariados, ao fundo da Estação foram construídas as edificações de moradias dos operários, o pernoite
para atender aos maquinistas, os barracões e oficinas que garantiam o suporte, o funcionamento e
locomoção do trem de carga ou de passageiros, de início circulava precariamente. Surgem deste lado, as
primeiras vilas e bairros destinados aos pobres e assalariados, separados pela linha férrea e ligados pelo
túnel, há muitos anos servindo de acesso ao território da classe dominante. Tomando como referência o que
Moraes (1987, p.123) argumenta sobre o pensamento de Santos: “É necessário discutir o espaço social e ver
a produção do espaço como o objeto. Este espaço social ou humano é histórico, obra do trabalho, morada do
homem.
É
assim
uma
realidade
e
uma
categoria
de
compreensão
da
realidade”.
Este artigo foi produzido junto ao programa de Pós-graduação nível mestrado em Geografia da UFMS. As
discussões até aqui apresentadas apóiam-se em embasamentos teóricos metodológicos já discutidos
anteriormente por Lefebvre (1991-2001) e Santos (1988-1998); também utilizou-se das pesquisas realizadas
por pesquisadoras locais: Mercante (1986), Mendonça (1991), Cattanio (1976) e Aranha Silva (1992); além
dos referenciais sobre a ferrovia e cotidiano, escritos por Azevedo (1953) e Oliveira Neto (2005).
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
As mudanças sócio-econômicas impostas pelo sistema capitalista ao longo dos séculos estão nitidamente
presentes na área de estudo, ou seja, no território que compreende a Estação, as oficinas e os núcleos
residenciais ferroviários em Três Lagoas-MS. Evidencia-se bem o controle do Estado e da classe dominante
sobre os demais grupos. Sabe-se também, da participação e contribuição da ferrovia nas transformações
desse território, nas relações produtivas e de trabalho. Assim, a partir da percepção do resgate do cotidiano
dessas pessoas foi possível identificar os principais fatos e notoriedades daquela época do início do século XX
(1909-1915). Destaca-se nitidamente que o transporte ferroviário foi considerado o meio de transporte mais
utilizado pelas massas populares, a estação ferroviária da cidade de Três lagoas era o ponto de encontro e
atrações, principalmente nos finais de semanas fazia parte do cotidiano das pessoas. Por muito tempo, foi o
apito do trem foi o som que despertava as pessoas e anunciava que era hora do trabalho. A população mais
carente saía de seu refúgio, atravessava o túnel e usufruía dos encontros, da estação e do social burguês.
Percepções como estas, permitem refletir sobre a importância desse estudo pela análise dos fatos históricos e
do espaço vivido pelos moradores do território três-lagoense. Por fim, apoiou-se na concepção de Oliveira
Neto (2005, p. 33) que apresenta a cotidianidade como formas e desejos da realização pessoal para aprender
essa realidade delineada e materializada nas formas, nos objetos, nos fluxos e fixos, enfim, na vida, seja ela
sofrida ou prazerosa revelada na cotidianidade dos indivíduos, nos seus desejos, na sua história e no seu
tempo; materializado por um ideário de progresso e produção capitalista, até alcançar o seu fim, ou quem
sabe um novo recomeço.
AO063 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[2097] GEOGRAFI A E TERRAS I N D Í GEN AS: I D EN TI FI CAÇÃO D E TERRI TÓRI OS AN CESTRAI S N AS
FRONTEIRAS DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU – MT.
EMERSON FERREIRA GUERRA.
CENTRO DE EDUCAÇÃO INTEGRADA DO VALE DO SÃO FRANCISCO, JANUÁRIA, MG, BRASIL.
Resumo:
O Parque Indígena do Xingu foi criado na região dos formadores deste rio, no Estado do Mato Grosso na
Amazônia brasileira, onde já habitavam vários povos indígenas ligados por um complexo sócio-cultural
estabelecido há séculos. Locais extremamente importantes para sua identidade e cultura ficaram fora do
traçado do Parque e hoje são ocupados por extensas fazendas de criação de gado e cultivo de soja.
Embora tenha sido criado oficialmente em 1961, o Parque Indígena do Xingu (PIX) tem como marco inicial a
Expedição Roncador – Xingu que se iniciou em 1946 na cidade de Leopoldina – GO. O objetivo desta
expedição consistia em uma estratégia geopolítica do governo federal em estabelecer uma via de
comunicação com o norte do país desbravando a região oeste instalando pistas de pouso no percurso para
garantir a segurança dos vôos. Mas o que estava realmente incutido nestas ações era uma necessidade
emergente de ocupar os vazios demográficos no interior do território nacional e levar a presença do estado
nesses locais mais isolados e ainda desconhecidos. Vale lembrar o contexto da segunda guerra mundial onde
a disputa de territórios e a hegemonia das nações sobre eles gerava uma condição tensa no cenário mundial.
Começava então a marcha para o oeste que deu origem à Fundação Brasil Central. Nas frentes
expedicionárias se destacou as figuras dos irmãos Cláudio, Leonardo e Orlando Villas-Bôas. Estes
demonstraram grande habilidade em contatar os povos indígenas que encontravam nos locais recém
chegados e conseguiam converter algo que poderia vir a ser hostilidade por parte dos indígenas em
cooperação para as metas que deveriam cumprir. Os Villas-bôas percebem então, que a ocupação da
sociedade envolvente e o progresso vindouro colocavam em risco a sobrevivência de uma grande diversidade
de povos com culturas e hábitos distintos. Por esse motivo, foram movidos por um ideal paralelo de tentar
proteger
esses
povos.
Tem-se início uma longa jornada para a criação do PIX. Por mais que fossem nobres os objetivos dos irmãos
Villas-bôas, havia outros interesses envolvidos na questão. Para o estado era estratégico assegurar a
delimitação do que chamavam centro geográfico do Brasil e que acreditavam ficar na região do rio Xingu e,
assim, resguardar uma estratégica porção territorial. Sob essa ótica os índios e os ambientes associados não
chegavam configurar uma prioridade como era para os Villas-Bôas. Entretanto, havia forte oposição do poder
local na criação de uma área extensa de reserva o que acabava por significar um atravancamento do
progresso
dessas
áreas
como
era
o
lema
da
marcha
para
o
Oeste.
Apesar de interesses divergentes e muita disputa houve a criação do parque a partir dos rios formadores do
Xingu onde já habitavam vários povos indígenas ligados por um complexo sócio-cultural estabelecido há
séculos naquele lugar. Não obstante a esse fato, a jornada dos Villas-Bôas prosseguiu no intuído de proteger
outros povos ameaçados e transferi-los também para o parque. Isso representou uma considerável
reconfiguração espacial dos territórios desses povos indígenas. Afinal, os que já estavam lá tiveram suas
terras reduzidas e delimitadas pela ocupação não indígena e os que foram transferidos deixaram suas terras
originais para habitarem um local completamente alheio, além de serem forçados a coabitarem o parque com
outros
povos,
muitas
vezes
inimigos.
Um dos reflexos observados hoje, após 40 anos da criação do PIX, e sob a ótica dos indígenas é o fato de
que locais extremamente importantes para sua identidade e cultura ficaram fora do traçado do PIX. Por esse
motivo são movidos, atualmente, a reconquistarem essas áreas não contempladas pelo parque ou até
mesmo seus territórios originais. Para isso recorrem a vários órgãos governamentais e não governamentais
com os quais mantém ligação para concretizarem seus objetivos. Dessa forma, vários atores estão hoje
envolvidos na identificação e apoio à demarcação dessas áreas como FUNAI, IPHAN, IBAMA, associações
indígenas
e
ONG’S.
O objetivo deste trabalho consistiu na identificação de territórios de uso ancestral de povos indígenas
xinguanos. Realizamos três expedições para a identificação das áreas. Cada expedição contou com uma
equipe composta por um técnico de campo, um consultor e o grupo de indígenas, contemplado a presença de
pessoas mais idosas das comunidades e conhecedores dos locais e histórias associados, bem como, alguns
jovens. O método consistiu, basicamente, em coletar e registrar dados e informações de relevância para a
identificação das áreas. Em campo buscávamos sempre, orientados pelos indígenas, indícios, evidências, e
testemunhos do assunto tratado que confirmassem o fato da ocupação ancestral dos lugares em
identificação. O fio condutor do trabalho foi a busca da conexão entre as narrativas indígenas e o espaço
geográfico. Após a identificação e georeferênciamento dos territórios foram produzidos mapas dos mesmos.
Foram, portanto, identificados o abrigo rochoso Kamukuaká do povo Waurá, O antigo pequizal denominado
Naruvutu pelos Kalapalo e a lagoa sagrada Tarik Yegun do povo Ikpeng. Os resultados destas atividades
visam colaborar com o processo de ordenamento territorial das terras indígenas no Brasil que vem se
caracterizando nos últimos anos por iniciativas de expansão de suas fronteiras pela retomada de áreas
ancestralmente
ocupadas.
AO279 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - História do Pensamento Geográfico
[1681] SOM BRA D O POD ER, TRAM AS D O SABER: N OTAS SOBRE O I X CON GRESSO BRASI LEI RO D E
GEOGRAFIA (1940).
SERGIO NUNES PEREIRA.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
Os Congressos Brasileiros de Geografia, realizados em onze ocasiões entre 1909 e 1954, despertaram uma
atenção discreta da historiografia do pensamento geográfico. Por se aproximarem dos modelos de
organização acadêmica e profissional da geografia-disciplina, estabelecida no Brasil na década de 1930,
costumam ser apontados como a iniciativa mais importante levada a cabo pela entidade que os organizava, a
Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro (SGRJ), fundada no final do século XIX. Na concepção original, tais
eventos foram imaginados de modo a ocorrerem anualmente, coincidindo com a semana de comemoração da
Independência do Brasil. Em 1908 a SGRJ iniciou a preparação do I Congresso Brasileiro de Geografia,
realizado
no
ano
seguinte
com
apoio
substantivo
do
Governo
Federal.
Entre 1909 e 1926 foram realizados oito Congressos Brasileiros de Geografia, nem sempre com o mesmo
sucesso alcançado na edição inaugural. Esta, pelo fato de ter se realizado na capital do país e contado com a
participação de figuras proeminentes da República, constituiu realmente um acontecimento político de
importância nacional. Os certames seguintes, com exceção talvez do V Congresso, realizado em Salvador no
ano de 1916, tiveram menor repercussão. É plausível supor que tais eventos, por não terem se beneficiado
de apoio decisivo do governo central, apresentaram maiores dificuldades em sua realização, o que teria
resultado no número reduzido de adesões e na precária publicação de seus resultados, na forma de anais.
Em geral, os congressos sediados fora da Capital da República foram realizados sob os auspícios dos
governos e dos institutos histórico-geográficos estaduais, com reduzida participação da SGRJ. Há indicações
de que problemas de entrosamento entre os organizadores locais e a agremiação sediada na Capital teriam
se verificado em alguns casos, provocando dificuldades adicionais para a realização dos eventos.
O IX Congresso Brasileiro de Geografia, no entanto, inscreveu-se num contexto bastante diferente. Este se
realizaria em 1940, na cidade de Florianópolis, no momento em que se consolidavam novos espaços
institucionais para o conhecimento geográfico no país – de um lado, cursos universitários em São Paulo e no
Rio de Janeiro, de outro, órgãos técnico-administrativos ligados diretamente ao poder central. Vale destacar
que nesta época, em pleno Estado Novo, a geografia ganhava ares de saber oficial, muitas vezes considerado
de ‘utilidade pública’. Disso beneficiou-se o IX Congresso, realizado com substancial apoio da máquina
estatal. Prova irrefutável de tal condição seriam os anais do evento, publicados em cinco volumes entre 1941
e 1944. Ao todo são mais de 3.500 páginas, contendo no primeiro volume a parte preparatória
(documentação oficial, regulamento, teses recomendadas, discursos e programação) e nos demais os
trabalhos
apresentados
nas
oito
seções
temáticas,
seguidos
dos
respectivos
pareceres.
Tais seções, denominadas ‘comissões técnicas’, eram constituídas por nomes da recém-formada comunidade
científica dos geógrafos e os que a ela haviam concorrido. Cada qual contava com um presidente, dois
secretários e dois ou três relatores. A título de exemplo, vale mencionar alguns de seus participantes: Pierre
Monbeig Raimundo Lopes, Alberto Lamego, Luiz de Castro Faria, Alice Canabrava, Fernando de Azevedo,
Delgado de Carvalho, Jorge Zarur, Renato Teixeira Mendes, Orlando Valverde, José Setzer e Odilon Nogueira
Matos, entre outros. Sem que tivessem assumido cargos de coordenação ou secretariado nas comissões, até
por sua elevada posição, participaram também das discussões personalidades como Rondon, Gilberto Freire e
Roger
Bastide.
Afora a participação individual de profissionais já consagrados e outros que fariam seu nome na geografia e
outras áreas do conhecimento, o IX Congresso deixou sua marca também pela colaboração científica de
algumas instituições, seja na forma de apresentação conjunta de trabalhos ou no envio de contribuições.
Neste sentido, podem ser mencionadas as participações do Ministério das Relações Exteriores e do Serviço de
Proteção aos Índios (comissões de cartografia e geografia humana, respectivamente); os estudos sobre
portos, viação e fontes de energia apresentados pelo Clube de Engenharia do Rio de Janeiro (comissão de
geografia econômica); e, finalmente, um conjunto de comunicações reunidas sob o título Contribuição para o
estudo dos centros urbanos brasileiros, apresentadas à comissão de geografia humana pela Faculdade de
Filosofia,
Letras
e
Ciências
Humanas
da
Universidade
de
São
Paulo.
Embora a SGRJ figure, ao lado do IBGE, como uma das instituições promotoras do IX Congresso Brasileiro de
Geografia, em termos estatutários e organizacionais, parece evidente que o tom do evento foi ditado pelos
portadores do novo conhecimento geográfico propagado na Academia, cujo carro-chefe era a geografia
humana. Nada sugere, no entanto, a existência de uma tensão entre tal orientação e os interesses cultivados
na SGRJ, empenhada sobretudo na difusão da geografia e em seu exercício como saber de ‘utilidade pública’.
Daí que o IX Congresso representasse um fator de convergência entre a velha entidade e o novo aparato
institucional criado oficialmente para o desenvolvimento da pesquisa geográfica no Brasil, encarnado no
IBGE. As duas instituições estavam irmanadas no nacionalismo que permeava o evento, perfeitamente
afinado com o regime centralizador e autoritário enraizado então no Estado brasileiro.
No contexto apresentado, a sombra do poder unificava propostas de organização do conhecimento geográfico
aparentemente desencontradas. Valendo-se da pesquisa e de reflexões suscitadas por uma tese de
doutoramento já defendida, o presente trabalho pretende lançar alguma luz sobre o papel do IX Congresso
Brasileiro de Geografia na conformação da disciplina no Brasil, logo após o momento de sua
institucionalização. Há motivos plausíveis para se enxergar o espaço institucional em vias de organização na
geografia brasileira como um campo de interação entre grupos distintos que, ao menos a princípio,
compartilharam os mesmos fóruns de discussão. De um lado, a “Veneranda” SGRJ; de outro, a nova
comunidade profissional, por sinal consideravelmente híbrida. A chamada “institucionalização” transcorreu
em caminhos mais tortuosos e complexos que o geralmente admitido pela história oficial da geografia. E os
congressos científicos apresentam-se como fontes privilegiadas para se investigar as tramas urdidas em
nome da disciplina, pois era neles que “todos se encontravam”. Busca-se aqui uma imersão no tema, com
base na leitura dos anais do IX Congresso, no levantamento de notícias sobre o evento e na reconstituição
das filiações institucionais e rede de relações dos principais personagens envolvidos.
AO280 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - História do Pensamento Geográfico
[1877] GEOGRAFI A, PLAN EJAM EN TO E A SUPERAÇÃO D O SUBD ESEN VOLVI M EN TO: O SEM I N ÁRI O
DE BORDEAUX.
PAULO ROBERTO DE ALBUQUERQUE BOMFIM.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
A comunicação em questão pretende apontar as discussões geradas durante o seminário dedicado ao estudo
dos fatores de regionalização do espaço brasileiro, do papel das cidades na regionalização país e dos tipos de
região brasileiras. A regionalização do espaço no Brasil, foi debatida, em novembro de 1968, pelo Centro de
Estudos de Geografia Tropical, do Centro Nacional de Pesquisa Científica, em Bordeaux, reunindo geógrafos e
cientistas sociais brasileiros e franceses (principalmente), como Pierre Monbeig, Pierre Deffontaines, Etienne
Juilliard, Pierre George, Pierre Gourou, Bernard Kayser, Michel Rochefort, Michel Foucher e Horacio Capel. A
partir dos debates em tela, discutiram-se os pontos de vista sobre métodos de regionalização no Brasil. De
imediato, o Seminário atacou os conceitos (muito caros à Economia Espacial) de região homogênea, região
heterogênea e região-programa, a partir dos quais seriam discutidos os limites acima referidos, quais sejam,
as problemáticas metodológicas das definições e delimitações regionais (noutras palavras, a questão da
regionalização)
para
o
aménagement
du
territoire.
Dentre várias comunicações objetivando precisar certos conceitos da geografia, especificamente o de região,
muitas vezes entendida – num recorte bastante descritivo – enquanto área de extensão de uma paisagem
(Jean Labasse e A. Demangeot, apud CNRS, 1971, p.17/37) ou zona de ação de serviços (Etienne Juilliard,
apud CNRS, 1971, p.19-20), as observações de Bernard Kayser, enfatizando a necessidade de os trabalhos
geográficos ligados ao planejamento abandonarem o caráter descritivo e se fixarem “na ação”, questionariam
o “valor operacional” das micro-regiões traçadas pelo IBGE, sendo problemática a valorização da hierarquia
urbana pelo critério de equipamentos terciários, haja vista a grande concentração – quando não
exclusividade – desses serviços tão-somente nas metrópoles nacionais brasileiras (KAYSER, 1971, p.77-78).
Em trabalho anterior, Kayser (Les divisions de l’espace géographique dans les pays sous-développés [1966])
constatara a falta de capacidade de polarização inerente à grande parte dos países subdesenvolvidos.
Tomando por base sua tipologia (espaços indiferenciados, regiões de especulação, regiões de intervenção,
bacias urbanas e regiões organizadas), B. Kayser advogaria a tese de um caráter superficial dos fluxos no
Brasil, país onde a “estrutura econômica dualista” – com regiões voltadas para fora convivendo com outras
de mera subsistência – só daria margem a uma fraca integração, resultando num “espaço atomizado”, e
mais, provocando na verdade, dadas essas relações espaciais frouxas, num pretenso processo de indução de
pólos, o enfraquecimento econômico regional em favor da (re) concentração dos fluxos econômicos na
metrópole nacional (KAYSER, 1971, p.81-82); o que o autor consideraria como uma ambigüidade das zonas
de
influência
no
Brasil.
Mas a questão mais complexa a ser resolvida na regionalização do espaço no Brasil seria quanto à definição
de seus limites, circunscrita, como se disse, às superfícies jurídicas, conforme os três níveis existentes na
federação brasileira (algo “mal adaptado à planificação moderna”, segundo Kayser [1971, p.83]). Em
contraposição, para Lysia Bernardes (CNRS, 1971, p.85), esses contornos seriam justificáveis, tendo em
vista a não prejudicar, numa regionalização em favor do planejamento, os interesses dos estados da
federação, “mesmo em um plano de governo federal” Para a geógrafa do IBGE (Lysia Bernardes, apud CNRS,
1971,
p.85),
A subdivisão [regional] dos estados [da federação], mesmo dos menores, se justifica inclusive por uma
necessidade de se criar unidades do território, maiores que os municípios e menores que os estados, para
uso
de
estatísticas,
tendo
por
base
unidades
homogêneas.
Outra justificativa acerca do trabalho do IBGE (CNG, 1967) dizia respeito ao método usado, a respeito do
qual o próprio Michel Rochefort considerava como uma “necessidade” tentar projetar sobre o espaço
brasileiro “o esquema de ordenamento usado nos países desenvolvidos” visando a pesquisar, no Brasil, a
eventual existência de “regiões orgânicas”, ou seja, de “espaços compreendidos nos limites do poder de
polarização de um grande centro, cada qual organizado por toda uma rede de centros urbanos, formando o
entorno da influência do grande centro” (ROCHEFORT, 1971, p.127). Entretanto, se o método aplicado
sistematicamente pelo CNG não era voltado para a definição de um “poder real de polarização”, mas sim, a
potencialidades, não deixaria de ter também para seu propositor sua fraqueza – ao menos como utilizado no
Brasil –, ao não demonstrar de fato os fluxos realmente provocados pelas atividades econômicas, por não
apontar, também, a real movimentação de pessoas, de mercadorias, de finanças, não fornecendo, pois (e
nisso estava sua grande vicissitude), indicações quantificáveis (ROCHEFORT, 1971, p.128-129). Como
explicitado em seu trabalho realizado no EPEA em 1967, a aplicação do método (Rochefort/Hautreux) no
Brasil não levou em consideração que a simples presença de equipamentos terciários não significa
polarização, só possível quando as atividades econômicas “tenham atingido um certo nível de
desenvolvimento” e as populações locais também “tenham atingido um certo poder aquisitivo” (ROCHEFORT,
1967, p.11). Com sua falta de mensuração quantificável, o trabalho do Conselho Nacional de Geografia daria
“somente uma indicação sobre os limites aproximados das regiões polarizadas pelos centros principais, sem
nenhuma precisão sobre a importância e o conteúdo dos fenômenos de polarização no interior da região
limitada”
(ROCHEFORT,
1967,
p.12).
Estavam demarcados no final da década de 1960, seja no Seminário do CNRS, seja na produção do IBGE os
entraves metodológicos que os estudos sobre regionalização teriam de enfrentar caso sua finalidade fosse (e
era) a de suprir, fornecendo dados quantificáveis, os escopos do planejamento estatal: à guisa de conclusão
do Seminário do Centro de Estudos de Geografia Tropical, Olivier Dolfus (apud, CNRS, 1971, p.188)
sintetizaria os debates ocorridos, reafirmando o conceito de regionalização enquanto “ato político visando a
melhorar o desenvolvimento econômico [e acompanhado] necessariamente da criação de limites [e] de
fronteiras
[em
seu]
interior”.
Em suma, evidenciava-se um encontro entre a geografia regional francesa e os desígnios de um Estado
autoritário, no Brasil, em que tanto transparece a o enfraquecimento da questão política em favor da
“temática regional”; a persistência da questão metodológica, ligada à geografia ativa, sobretudo,
testemunhando o quanto sua recepção, no Brasil, como “geografia marxista” não impediu seu uso pelo IBGE,
IPEA e outros órgãos governamentais, em plena ditadura. O que não não deixa de assinalar a fragilidade
teórica
dessa
corrente
(ESCOLAR;
MORAES,
1989).
BIBLIOGRAFIA:
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Centre
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Informações,
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Colin,
1966,
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ROCHEFORT, M. O problema da regionalização no Brasil. Rio de Janeiro: IPEA, 1967, 24 p.
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Scientifique). La régionalisation de l’espace au Brésil. Bordeaux: Centre d’Études de Géographie Tropicale du
CNRS, 1971, p.127-135.
AO281 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - História do Pensamento
Geográfico
[2041] GEOGRAFIA FÍSICA: BALANÇO DA SUA PRODUÇÃO EM EVENTOS CIENTÍFICOS NO BRASIL.
MARCOS BARROS DE SOUZA.
FFLCH/USP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
Objetivos: Esta pesquisa teve os seguintes objetivos: efetuar balanço de como vem sendo abordada a
Geografia Física, em eventos científicos, utilizando-se como fonte de informações os Anais e/ou Cadernos de
Resumos e Contribuições Científicas de eventos científicos realizados ao longo do período de 1954 a 2004;
refletir sobre os direcionamentos da pesquisa em Geografia Física, contribuindo com uma visão crítica dos
trabalhos analisados; identificar as tendências teórico-metodológicas e temáticas dos trabalhos publicados
nos Anais e/ou Caderno de Resumos e Contribuições Científicas de eventos científicos; discutir e levantar
hipóteses dos motivos por que muitos geógrafos físicos participam de eventos ligados à outras áreas de
conhecimento fora do âmbito da Geografia; discutir possíveis motivos para que alguns eventos ligados à área
de Geografia Física pararam de ocorrer; refletir e analisar o atual momento da Geografia Física.Referencial
teórico e conceitual: A decisão de pesquisar este tema ocorreu pela ausência de trabalhos de pesquisa que
evidenciem como a Geografia Física vem sendo trabalhada no Brasil, seus caminhos, seus desafios teóricos e
sua contribuição ao país, expressos em eventos de divulgação científica. A delimitação do período desta
análise de 1954 a 2004 ocorreu pelo fato de 1954 ter sido o ano em que se iniciaram os Congressos
Nacionais de Geógrafos. O recorte foi definido em 2004 por ter sido o ano da realização do 6º Congresso,
englobando, ainda, eventos específicos da Geografia Física. Neste período as idéias, conceitos e concepções
teórico-metodológicas se transformaram significativamente no âmbito da Geografia. As transformações se
deram tanto no volume de trabalhos e participações como também nos enfoques e temáticas abrangidas pela
Geografia Física. O tema desta pesquisa tem importância significativa na Geografia e, principalmente, no
âmbito da Geografia Física por realizar um balanço dos trabalhos produzidos, ligados a esta subdivisão do
estudo da natureza na Geografia e publicados nos Anais e/ou Cadernos de Resumos e Contribuições
Científicas dos seguintes eventos científicos, ocorridos no período de 1954 a 2004: Congresso Brasileiro de
Geógrafos, Encontro Nacional de Geógrafos, Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada, Encontro
Nacional de Estudos Sobre o Meio Ambiente, Simpósio Brasileiro de Climatologia Geográfica e Simpósio
Nacional de Geomorfologia. A importância desta análise remete a necessidade de socializar o significado
histórico das abordagens e direcionamentos da pesquisa em Geografia Física no Brasil. A escolha dos
referidos eventos ocorreu pelo fato de serem em nível nacional, abrangendo, então, os pesquisadores que
divulgaram suas pesquisas, no período delimitado. Além disto, os registros em Anais e/ou Cadernos de
Resumos e Contribuições Científicas dos eventos refletem, com relativa fidelidade, os avanços deste campo
específico da Geografia e os rumos da Geografia brasileira como um todo. Essa relativa fidelidade afirmada se
deve, sobretudo, pelo predomínio das pesquisas em Geografia Humana e da dicotomia em relação à
Geografia Física. Pode-se, também, constatar um “recolhimento”, voluntário ou não, de pesquisadores
ligados à corrente considerada, talvez por muitos geógrafos, como “fora de moda”, durante um certo
período.Metodologia utilizada: Para a realização da presente pesquisa foram utilizados os seguintes
materiais: Referências bibliográficas relacionadas à evolução do pensamento geográfico, bem como a História
da Geografia, com a finalidade de traçar o percurso histórico da Geografia no mundo e no Brasil, destacando
a Geografia Física; Anais e/ou Cadernos de Resumos e Contribuições Científicas dos seguintes eventos
científicos: Congresso Brasileiro de Geógrafos; Encontro Nacional de Geógrafos; Simpósio Brasileiro de
Geografia Física Aplicada; Encontro Nacional de Estudos Sobre o Meio Ambiente; Simpósio Brasileiro de
Climatologia Geográfica; Simpósio Nacional de Geomorfologia; Entrevistas com pesquisadores, através de
roteiros e questionários, com membros de Comissões Organizadoras de eventos científicos ligados à área de
Geografia Física. Foram, também, incluídos geógrafos considerados expoentes da pesquisa e da atuação
técnica que trabalham com temas voltados para o campo da Geografia Física. Conclusões: Através das
leituras de trabalhos produzidos sobre o pensamento geográfico e, alguns, sobre a Geografia Física, relatados
nesta pesquisa, além da análise dos Anais e/ou Cadernos de Resumos e Contribuições Científicas, pode-se
constatar
que:
- houve uma grande influência francesa na Geografia brasileira nas décadas de trinta, quarenta, cinqüenta e
sessenta do século XX, sendo que nas décadas de trinta e quarenta predominou os trabalhos de geógrafos
franceses e nas décadas de cinqüenta e sessenta, além dos geógrafos franceses, encontram-se trabalhos
produzidos por geógrafos brasileiros com notável influência francesa, tendo em vista que os cursos de
Geografia,
no
Brasil,
eram
ministrados,
inicialmente,
por
docentes
franceses.
A Geografia produzida até a década de sessenta do século XX poderia ser chamada de descritivo-explicativa,
pelo fato que os trabalhos eram produzidos com uma preocupação muito local, mediante análises de
pequenas áreas e descrição de paisagens, quase sempre sem uma preocupação de generalidades, de
correlação de causa e efeito, situando os problemas nacionais em um plano internacional, dando à Geografia
um
valor
meramente
cultural,
conforme
relata
Andrade
(1977).
- a década de setenta do século XX foi marcada pela realização de trabalhos concentrados nas áreas de
Geomorfologia e de Climatologia, demonstrando predomínio da Análise Geossistêmica neste período, com
forte
influência
das
Geografias
Russa,
Francesa
e
Alemã.
- A Geografia, nas décadas de oitenta e noventa do século XX poderia ser chamada de “Ambientalista”, tendo
em vista a crescente conscientização da população com a preservação do meio ambiente e a preocupação
dos
pesquisadores
em
produzir
trabalhos
voltados
para
a
problemática
ambiental.
A década de oitenta do século XX foi marcada, também, pelo início de eventos dedicados à Geografia Física,
como os Simpósios Brasileiros de Geografia Física Aplicada e os Encontros Nacionais de Estudos Sobre o Meio
Ambiente, dentre outros, que criaram oportunidade para que a comunidade de pesquisadores brasileiros
dedicada aos estudos da Geografia Física pudesse se reunir e debater os assuntos específicos da área.
Cada evento reflete a Geografia brasileira como esta ocorreu no momento da realização do mesmo e que fica
registrado nos Anais e/ou Cadernos de Resumos e Contribuições Científicas, que são publicados e distribuídos
aos
participantes.
É de fundamental importância que sejam registrados os relatos e depoimentos dos geógrafos e
pesquisadores que contribuíram e ainda contribuem para a evolução da Geografia no Brasil, pois as
memórias constituem elementos para a análise e compreensão futura da produção geográfica.
Baseado nos depoimentos dos geógrafos físicos é possível notar que os eventos científicos são fundamentais
para que os profissionais e demais interessados possam se reunir formalmente e discutir os trabalhos
produzidos,
além
de
ser
um
espaço
para
a
troca
de
informações.
O desenvolvimento de novas técnicas e a interdisciplinaridade parece ter influenciado para que os geógrafos
físicos participem de eventos ligados à outras áreas, deixando de participar dos eventos organizados pela
Associação dos Geógrafos Brasileiros. Além destes fatos muitos geógrafos físicos se sentiram excluídos dos
eventos promovidos pela Associação dos Geógrafos Brasileiros, principalmente no final da década de setenta
e início da década de oitenta do século XX, devido ao surgimento da Geografia Crítica, conforme discutido
neste trabalho, o que influenciou, também, o aparecimento de eventos científicos destinados aos geógrafos
físicos.
AO064 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1322] ASPECTOS GEOGRÁFICOS EM SÍMBOLOS ESTADUAIS BRASILEIROS.
TIAGO JOSÉ BERG.
UNESP RIO CLARO, CORDEIROPOLIS, SP, BRASIL.
Resumo:
Com o advento da Constituição Republicana de 1891, as províncias brasileiras se tornaram automaticamente
Estados federados e poderiam ter armas, brasões e hinos próprios desde que não omitissem os símbolos
nacionais.
Os símbolos portam-se como claras declarações de identidade nacional (estadual ou regional). Em essência,
eles servem como “totens modernos” (no sentido Durkheimiano) – são signos que trazem uma relação
especial para as nações que representam, distinguindo-as de outras e reafirmando suas fronteiras de
identidade. Projetam uma mensagem que é propositalmente e meticulosamente construída quando foram
adotados ou escolhidos para se tornarem símbolos oficiais, remetendo esses significados como um traço
distintivo de um grupo ou comunidade sob a forma de unidade política e criando uma identidade associativa
em que se pode experimentar a consonância e \"a realização física repercutida da comunidade imaginada\"
através
do
processo
ritual
(ANDERSON,
2005,
p.197).*
Para criar essas identidades de associação, os símbolos agregam e sintetizam as referências culturais
(sociais) e naturais vinculadas com o território em diferentes graus e, ao se tornarem signos sensoriais,
projetam neste contexto os valores ideológicos que referenciam e circunscrevem um espaço (político ou
simbólico)
determinado
num
plano
de
sobreposição
temporal
e
limitada.
Ao cantar o hino, hastear a bandeira e ostentar o brasão, renovam-se os compromissos morais que os
patriotas possuem com sua terra, com os elementos culturais, regionais, históricos, com a própria natureza e
a identidade (elementos de referência e percepção do espaço geográfico), gerando um forte sentido de copertencimento,
de
comunhão,
no
processo
ritual
inculcado
tacitamente
pelos
símbolos.
Quando se examinam os símbolos estaduais presentes, encontra-se uma grande variedade de significações
que envolvem a história, a cultura, a natureza, o pensamento, o território e o regionalismo como referências
simbólicas particulares de cada unidade federativa, servindo potencialmente como testemunhos em
diferentes escalas do espaço-tempo do processo de ocupação e formação do território nacional.
Essas etapas de formação da federação brasileira a constituição de nossas unidades federativas revelam
tendências políticas favoráveis ao “federalismo” e em outros períodos do tempo histórico seu poder de ação e
participação fora reduzido pelas tendências ao “centralismo” (caso da Constituição de 1937). Como reflexo
desse contexto territorial e político, a utilização e adoção dos símbolos estaduais ocorreram em períodos de
“florescência” do federalismo (principalmente com o advento da República [1889] e a Constituição de 1988),
evidenciando características distintivas no que tange à descrição do espaço geográfico, dos discursos
regionalistas em prol da autonomia federativa e das superposições de temporalidades ao longo do passado
histórico.
Argumenta-se que as referências espaciais que envolvem cultura e a natureza estão presentes em símbolos
estaduais localizados no interior brasileiro, cuja história enquanto entidade administrativa é recente, como
nos casos de Rondônia e Roraima, enquanto os Estados mais próximos do litoral e das vertentes dinâmicas
do processo colonial, como São Paulo e Mato Grosso, apresentam exaltações histórico-descritivas em face de
sua ocupação mais antiga. Os Estados situados nas zonas de fronteira, como no caso do Acre e Rio Grande
do Sul, refletem em seus símbolos a condição “belicista” e “regionalista” que envolveram a disputa por seus
territórios
no
passado.
Assim, os hinos, bandeiras e brasões de armas dos Estados brasileiros (enquanto tema de pesquisa)
demonstram possibilidades de interpretação e análise dentro do campo científico, demandando maiores
estudos para que se possa estreitar as relações entre “a geografia e as representações simbólicas” como uma
nova perspectiva da análise e decodificação das formas culturais de representação espacial.
*ANDERSON, B. Comunidades imaginadas. Porto: Edições 70, LDA, 2005.
AO065 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1339] AUSÊN CI AS E PRESEN ÇAS D AS CRI AN ÇAS N A PAI SAGEM BRASI LEI RA:ESTUD OS
GEOGRAFIA DA INFÂNCIA.
JADER JANER MOREIRA LOPES.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
DE
No meio acadêmico a materialidade das crianças têm tido diferentes representações, essas têm sido
“objetos”, “sujeitos” de estudo de diversas ciências (Sociologia, Pedagogia, Psicologia, são só alguns
exemplos) que as têm percebido ora como portadoras do discurso do outro, ora como portadoras de seu
próprio
discurso,
ora
como
objetos
mudos.
Um traço que tem acompanhado as crianças é a compreensão de suas infâncias na perspectiva da
negatividade, inscrita desde a palavra latina, é o in-fans, o que não fala e perpetuando-se em outros
momentos históricos: é a idade da não razão, é a idade do não trabalho e mais recentemente, frente às
mudanças contemporâneas, que tem alardeado para alguns o desaparecimento da infância é a idade nãoinfância. Poderíamos agregar, ainda, às reflexões mais uma negatividade: a do espaço e do tempo, a noção
de uma infância percebida como sujeitos “a-topos”, ou seja, de lugar nenhum, como sujeitos a-temporais, de
tempo
nenhum.
Essa perspectiva de ver a criança e de conceber a infância, nega seu papel de sujeito social, nega a
existência de suas historicidades e geograficidades, nega suas possibilidades de construção, de ação e de
diálogo na produção dos espaços e tempos em que se inserem e as colocam na condição de sujeitos
passivos, e portanto passíveis de receberem ações que vem dos “outros” que compõem seus cotidianos.
A infância, portanto, tem sido percebida muito mais pela sua ausência, pela sua incompletude, do que pela
sua presença, concepção que se espraia em várias dimensões sociais e materializam ações em diversos
campos
da
sociedade
e
do
conhecimento.
Essa leitura está presente também nas suas relações espaciais que, em nome de um suposto caminho que
todas as crianças deveriam percorrer na sistematização da construção de sua inserção espacial, de forma
universal, as mantiveram deslocadas de seus contextos culturais e de pares, e também afastadas dos
momentos de organização e produção dos espaços em que vivem e historicamente, negligenciaram suas
linguagens
espaciais.
Essa pesquisa parte desse pressuposto e tem sua origem nessas inquietações, buscou-se compreender a
presença
das
crianças
no
espaço
brasileiro,
na
sua
produção
e
organização.
Como a primeira etapa desse projeto objetivou localizar as crianças em diferentes paisagens urbanas,
optamos por ter como referência central a observação direta dos pesquisadores em campos previamente
escolhidos, ou seja, o contato estreito entre os pesquisadores e o campo onde ocorreriam os trabalhos, sem
a presença de intermediários; nessa perspectiva assumimos um postura etnográfica. Não ocorreu a
preocupação de diferenciar as suas idades. Foram consideradas crianças sozinhas ou acompanhadas de
adultos.
Foram feitas uma série de descrições, acompanhadas de desenhos e mapas, que pudessem marcar a
presença da criança no espaço, diálogos também foram registrados, desvelando os movimentos rotineiros
que
marcam
seus
cotidianos
e
configuram
suas
infâncias.
Essa perspectiva de observação teve como principal objetivo reconhecer a presença e os processos de
apropriação espacial por crianças a partir das relações entre elas e com o mundo edificado pelos adultos e
nos chamados artefatos de infância. Reconhecemos, assim, que as culturas da infância se estabelecem no
interstício entre as crianças, seus pares, o mundo adulto e todas os diferentes agentes que fazem parte
desse
processo,
que
temos
nomeado
de
territórios
de
infância.
Para isso, foram definidas previamente três cidades, utilizou-se como critério de escolha as seguintes
características: duas cidades de porte médio, sendo uma localizada do interior outra em uma zona
metropolitana e uma cidade considerada pequena. Dessa forma foram escolhidas as cidades de Juiz de Fora,
Minas
Gerais;
Niterói
e
Santo
Antônio
de
Pádua,
Rio
de
Janeiro.
Em duas cidades optou-se por fazer a observação sem a interferência do pesquisador nos movimentos das
crianças, mas a preocupação maior era registrar seus movimentos, atuações e presenças no espaço. Em uma
das cidades, escolheu-se travar uma observação mais próxima com as crianças e tentar compreender suas
vivências
espaciais,
inclusive
tentando
vivenciar
suas
rotinas
no
espaço.
O trabalho de campo revelou que na produção de seu espaço as sociedades constroem formas (configurações
materiais), cujas funções seriam destinadas para suas crianças. Há, portanto, na configuração das paisagens,
na estrutura ou organização espacial, não só locais destinados para as crianças, mas como também artefatos
(objetos) gestados por diferentes agentes produtores do espaço e que só podem ser compreendidos a partir
das
representações
de
infâncias
que
pré-existem
nessas
sociedades.
Apesar das diferenças espaciais entre as três cidades, suas singulares histórico-geográficas, podemos
perceber é que é muito similar a configuração não só nos objetos, que se repetem em todas, mas também
das
formas,
o
que
denotam
uma
perspectiva
homogeneizada
de
infância.
Algumas dessas formas estão presentes nos documentos oficiais, como os planos diretores das cidades, pois
ao fazermos uma análise desses documentos, podemos perceber que eles pouco ou nada trazem de
propostas na organização das cidades relativo à presença da criança, salvo em seu aspecto de uma educação
institucionalizada,
ou
no
trato
à
crianças
consideradas
“problemas”.
Constatamos, assim, numa primeira observação a ausência da criança não só nos documentos oficiais, mas
na materialidade de formas e objetos que configuram a paisagem, negando e negligenciando registros de
suas passagens, de suas existências no espaço e no tempo, desvelando uma concepção de infância que vê a
criança como alguém incapaz de escrever sua história e geografia, incapaz de produzir artefatos sociais, de
produzir
espaços,
e,
portanto,
cultura.
Mas essa ausência não nega suas presenças nas paisagens das cidades, basta um olhar com maior acuidade
veremos
suas
ações
e
atuações
em
diversos
locais.
Foi, assim, que pode se perceber determinadas parcelas do espaço urbano existente nas cidades
pesquisadas, tornarem-se lugares de crianças, locais cujas funções originais não foram gestadas para elas,
mas
que
sofreram
apropriações
e
tornarem
espaços
de
suas
presentificações.
Percebeu-se a constante capacidade de transformação da lógica espacial, bem como o estabelecimento de
lugares e territórios. Os liames entre essas duas categorias geográficas foram muito estreitos, o que nos
obriga a utilizá-las a partir da sua fusão, ou seja, para as crianças a prática espacial é uma prática de lugarterritório, já que apreendem o espaço em suas escalas vivenciais, a partir de seus pares, do mundo adulto,
da
sociedade
em
que
se
inserem.
Pode-se observar, portanto, que há momentos em que as crianças subvertem, há momentos em que
interpretam, reproduzem o espaço e seus objetos, e há momentos de criação, de invenção, transformandoos, reorganizando os princípios da forma, função, localização, organização, representação e outros, a partir
de suas ações.
AO066 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Espaço e Cultura
[1791] LUGARES D A SAUD AD E E D O RESSEN TI M EN TO: A M I GRAÇÃO GAÚCH A PARA M ATO GROSSO
A PARTIR DOS OLHARES DE QUEM MIGROU E DE QUEM FICOU.
JONES DARI GOETTERT.
UFGD, DOURADOS, MS, BRASIL.
Resumo:
Introdução
A migração geralmente é apreendida a partir das mulheres e homens que migram, detendo-se nelas e neles
as representações sobre os lugares – de saída e de chegada –, as condicionantes na origem e as relações no
destino. Este trabalho procurou abarcar, além dos olhares de gaúchas e gaúchos para o Mato Grosso,
também os olhares sobre a migração de familiares que permaneceram no Rio Grande do Sul. Nesta mesma
direção, também objetivou apreender como a migração, as representações e as relações, de quem migrou
como quem ficou, atravessam – ou são atravessadas por – relações estruturais (em seu sentido econômico),
conjunturais (políticas e sociais, sobretudo) e subjetivas (pessoais e familiares, em especial).
Aspectos
metodológicos
A produção da fonte oral com trabalhos de campo realizados em Rondonópolis (Mato Grosso) e no noroeste
gaúcho, balizou o instrumental metodológico do trabalho. Da fala de gaúchas e gaúchos que migraram e de
familiares que ficaram, foram sendo apreendidas as representações, saudades e ressentimentos entre
sujeitos que, mesmo com o passar do tempo e distantes espacialmente, ainda manifestaram relações do
passado que participam das relações do presente, e também do devir. Das falas, entrelaçaram-se tempos e
também lugares, em uma dialética que foi envolvendo alegrias, mas também tensões, de mudanças – a
migração – que nem sempre apagam marcas de relações nos lugares saídos e nos lugares chegados. O
diálogo constante sobre a produção da fonte oral deu-se, especialmente, com Alessandro Portelli e Pierre
Bourdieu. O primeiro, ao salientar que toda fala é também expressão de uma leitura do mundo, sua
interpretação e filosofia; o segundo, por salientar que os sujeitos envolvidos na pesquisa – referia-se à
pesquisa sociológica – não podem ser apreendidos a partir de uma relação “entomológica”, mas sim no
encontro entre a objetividade necessária e a subjetividade possível, para nem transformar os sujeitos em
“objetos”
e
nem
fazer
de
deles
o
conteúdo
sem
crítica.
Aspectos
teóricos
A análise da migração gaúcha para o Mato Grosso a partir dos olhares de quem migrou e de quem ficou,
percorreu um conjunto de referenciais teóricos sobre o tema, desde análises da migração com viés mais
economicista ao mais fenomenológico. Com isso, não se pretendeu uma “mistura” gratuita das várias
concepções, mas a possibilidade de, a partir de entrecruzamentos, construir uma leitura dos sujeitos
envolvidos na migração, que atentasse para os elementos estruturais que condicionam as migrações no
capitalismo, para os aspectos conjunturais e, sobretudo, subjetivos. Com isso, procurou-se a construção de
um “equilíbrio” teórico na análise, mas que não perdesse de vista o papel preponderante que os sujeitos
desenvolvem tanto na decisão de migrar – ou ficar – como no ato efetivo da migração – ou no ato efetivo da
permanência.
Efetivamente, dentro outros, percorreu-se as análises propostas por Jean Paul de Gaudemar que, em uma
perspectiva marxista, salientou as determinações dadas pelo Capital na “mobilidade do trabalho” (em
especial, porque no estudo buscou-se a compreensão da migração de trabalhadoras e trabalhadores gaúchos,
moradores em bairros periféricos de Rondonópolis). Na mesma direção, estabeleceu-se um diálogo fecundo
com Paul Singer, em especial sobre os “fatores de expulsão” e “atração de população”, e como ambos
tiveram papel diferenciado sobre sujeitos em condições de classe muito semelhantes, fazendo com que parte
da família migrasse e outra não. Mas, em especial, o principal diálogo teórico, sobre migração e lugares, foi
estabelecido com Ana Fani Alessandri Carlos e Abdelmaleck Sayad. Com a primeira, a contribuição se pautou
sobre a produção do lugar como relação parte da tríade “lugar-indivíduo-identidade”, que, para o trabalho, se
desdobrou nas relações entre migrante e lugar deixado e lugar chegado, em especial nas relações que foram
se processando no segundo e se constituindo, também, como suporte para as relações com o primeiro. Em
relação a Abdelmaleck Sayad, o diálogo se concentrou, especialmente, na situação do migrante como sujeito
em trânsito, constituindo-se a migração como um “ato social completo”. Também a partir do autor,
construímos a noção de “transitoriedade migratória”: o tempo que se inicia no ato da decisão de migrar à
compreensão por quem migra de que não mais pertence ao lugar de origem (porque suas relações são
outras), e sim ao lugar de destino. Esta “transitoriedade” não é definida por componentes estruturais ou
conjunturais, mas, sobretudo, a partir da percepção da mulher ou homem migrante, de seu novo lugar no
conjunto das relações no lugar de origem, ou seja, o seu não mais pertencimento; da mesma forma, a
percepção de que participa das relações no lugar chegado, como parte inseparável delas.
Algumas
conclusões
Em síntese, pode-se apontar que: (1) a migração gaúcha de trabalhadoras e trabalhadores para
Rondonópolis, no Mato Grosso, condicionada estrutural e conjunturalmente por questões econômicas e
políticas, também teve a participação de elementos subjetivos, importantes para que muitas e muitos
migrassem e outras e outros ficassem; (2) nas falas, tanto de quem migrou como de quem ficou, foram
sendo reconstruídas relações de antes, durante e depois da migração, envolvendo os lugares deixados e os
lugares chegados; relações que repuseram, além de sentimentos de saudade, também ressentimentos
advindos de questões tanto postas no sul, no passado, como repostas nas relações que continuaram se
estabelecendo depois da migração; e (3), que a migração estudada, a partir do cruzamento de
condicionantes estruturais, conjunturais e subjetivos, relativiza a proeminência de um fator sobre outro,
sendo imprescindível, especialmente, ouvir quem migra e quem fica como possibilidade de se ler o
movimento em sua complexidade.
AO067 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[1882] SI GN I FI CAD OS ESPACI AI S E D I SCURSO POLÍ TI CO: UM A PROPOSTA D E D I ÁLOGO EN TRE A
GEOGRAFIA CULTURAL E A GEOGRAFIA POLÍTICA.
THIAGO ROCHA FERREIRA DA SILVA.
UERJ - PROF. SUBSTITUTO, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
O objetivo deste trabalho é promover uma reflexão sobre o papel da paisagem para a construção do discurso
em manifestações políticas. Mais especificamente, o que buscamos aqui é tentar compreender as relações
entre o discurso da manifestação política e os significados socialmente compartilhados a respeito do lugar
onde se realiza esta manifestação. Para tanto, partimos da construção de uma perspectiva metafórica da
paisagem
vista
como
um
cenário.
A idéia da paisagem como cenário se apóia na possibilidade de concebermos o cenário como um sistema
espacial de significação, construído a partir da apropriação, pelo encenador, dos significados das formas
eleitas para constituir esse cenário. Esse conjunto de formas simbólicas se conjugaria com os outros sistemas
de significação do espetáculo, tais como o texto, a fala, o figurino ou a iluminação, por exemplo, dando corpo
ao
discurso
deste
espetáculo.
A paisagem por sua vez, também pode ser compreendida como um conjunto de formas simbólicas, um
sistema espacial de significação, como vem sendo feito por diversos trabalhos no campo da Geografia
Cultural renovada. O que se pretende ao pensar a paisagem como um cenário é incorporar a possibilidade da
apropriação de alguns significados desta paisagem para a construção de discursos. No caso deste nosso
trabalho,
os
discursos
políticos.
Propomos com esta dissertação promover à luz da perspectiva da paisagem como cenário a interpretação de
duas manifestações políticas ocorridas em Março de 1964, um momento crucial da história do nosso país. A
primeira delas foi o Comício da Central, ocorrido em 13 de Março, na cidade do Rio de Janeiro, enquanto a
segunda foi a Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade, ocorrida seis dias depois, em 19 de Março, na
cidade de São Paulo em resposta ao Comício. Além da possibilidade de diálogo entre essas duas
manifestações, pretendemos enfatizar o papel fundamental da paisagem na construção de seus discursos,
buscando
uma
abordagem
original
para
os
eventos
pela
ótica
da
Geografia.
Este trabalho, assim, pretende oferecer uma contribuição teórica no sentido de valorização da abordagem
geográfica na análise de discursos políticos. As novas perspectivas, ligadas a aspectos de simbolismo e
significação, que a Geografia Cultural vêm trazendo à luz podem representar uma ampliação do escopo de
análise das relações entre espaço e poder, às quais a Geografia Política sempre se debruçou com reconhecida
competência na esfera institucional e em escalas geográficas amplas, mas que, contudo, parecem pouco
visitadas
em
outras
escalas
e
esferas
da
vida
pública.
É com esse propósito que dedicamos nossa atenção às manifestações políticas, mais especificamente à
relação que pode ser estabelecida entre o discurso que estas manifestações levam aos espaços públicos e o
local onde elas se realizam. Por esta perspectiva, pensar as paisagens urbanas como cenários para estas
manifestações consiste em um esforço de rompimento com a visão do senso comum que concebe o cenário
como um fundo passivo diante do qual se desenrola o espetáculo. Ao contrário, o que desejamos propor é o
papel ativo do cenário, indissociável deste discurso. Da mesma maneira, não podemos perceber a paisagem
como um simples receptáculo da manifestação política. A paisagem, ao ser objeto de apropriação simbólica,
se
torna
parte
do
próprio
discurso.
O embate discursivo que opôs em Março de 1964 a evocação do discurso do trabalhismo getulista, por parte
do então presidente João Goulart, ao discurso anticomunista de seus adversários não pode ser descolado,
assim, de seus cenários, a Central do Brasil, no Rio de Janeiro, e o percurso entre a Praça de República e a
Praça
da
Sé
em
São
Paulo.
Não pretendemos restringir este trabalho a uma interpretação pontual de dois eventos políticos ocorridos há
mais de quarenta anos. Em primeiro lugar porque a apropriação de significados atribuídos às paisagens
permanece como uma prática recorrente na construção de discursos políticos. Um caso eloqüente ao qual
podemos nos referir é a campanha presidencial de 2002, quando, na tentativa de construir um novo discurso,
o então candidato Luis Inácio Lula da Silva abandona, em seu último comício na cidade do Rio de Janeiro, o
tradicional cenário da Candelária, local de diversos eventos políticos históricos, preferindo encerrar sua
campanha na Praia de Botafogo, zona sul da cidade. Em segundo lugar, porque pretendemos ainda com esse
trabalho valorizar o papel da dimensão simbólica da paisagem urbana para a construção do discurso político.
Se conseguirmos atingir este objetivo, constitui-se então, nosso trabalho em um esforço de valorização
também da abordagem cultural da Geografia, oferecendo uma possibilidade de diálogo com a Geografia
Política no campo das relações entre significações espaciais e poder.
AO068 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[2120] PAISAGEM VERNACULAR: ALDEAMENTOS SALINEIROS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
WERTHER HOLZER; JOÃO PAULO DA SILVA BASTOS.
UFF, NITERÓI, RJ, BRASIL.
Resumo:
Este texto pretende fazer uma breve reflexão sobre assentamentos tradicionais e a sua relação com a
paisagem
onde
se
inserem.
Para encaminhar esta questão elegemos um recorte do território do Estado do Rio de Janeiro onde fazemos
nosso estudo de caso. Entre as muitas paisagens, e arquiteturas, vernaculares deste território uma nos
chamou a atenção: a paisagem das salinas que se implantam ao redor da Lagoa de Araruama. Estas salinas e
seus
respectivos
aldeamentos
salineiros
são,
portanto,
nosso
tema.
Trata-se de um universo de pesquisa bastante abrangente, são muitas as salinas, boa parte delas com
aldeamentos implantados, muitas ainda produzindo sal, outras tantas abandonadas, sendo aos poucos
reconvertidas
para
loteamentos
e
condomínios
de
veraneio.
Escolhemos alguns exemplos que foram submetidos a dois parâmetros iniciais de análise. O primeiro baseado
na proposta de Peirce Lewis para o que chamou de “axioma histórico”; O segundo o da utilização do método
fenomenológico, quando ele se refere à espacialidade ou, se preferirmos, geograficidade humana (como
proposta
por
Eric
Dardel,
1990).
Segundo Lewis “ ...nós fazemos o que fazemos, e produzimos o que produzimos, porque nossos fazeres e
produtos são heranças de nosso passado..., uma grande parte da paisagem comum foi construída por
pessoas no passado, cujos gostos, hábitos, tecnologias, opulência e ambições foram diferentes das nossas
hoje. ... Para compreender estes objetos é necessário entender as pessoas que os construíram — nossos
ancestrais
culturais
—
no
seu
contexto
cultural,
não
no
nosso.”
(1979,
23).
Esta Paisagem — vernacular — certamente não é aquela voltada para as grandes estruturas temporais ou
cronológicas, para os fatos tratados, digamos, no atacado; mas também, e principalmente, de ocorrências
menores, do cotidiano, dos fatos guardados na memória, das versões, dos vestígios, que vão permitir uma
aproximação com a paisagem onde palpita o mundo vivido dos que lá estão, e dos que lá estiveram. Ele fala
de um movimento de renovação da Geografia Cultural, a chamada Geografia Cultural-Humanista, que
ansiava por um aprofundamento conceitual nas questões relativas ao espaço e ao tempo, a partir do “lugar”
e da “paisagem”, remetendo-se à memória e ao “mundo vivido”, a partir principalmente do que as
humanidades — literatura e artes plásticas — podem nos informar sobre esses temas.
A Fenomenologia também busca as facticidades que envolvem a memória dos fatos que se diluem no tempo,
que por sua vez nos remetem à História que tenha um fundamento fenomenológico. Uma História que pode
estar voltada para o estudo do tempo e da memória na construção de novas epistemologias e ontologias.
O passado, então, é determinante para a constituição de nossa visão de mundo. “O conhecimento pessoal,
assim como o geográfico, é uma forma de ocupação seqüencial. Assim como uma paisagem ou um ser vivo,
cada mundo pessoal teve um curso no tempo, uma história própria.” (Lowenthal, 1961, 258).
Segundo Lowenthal apesar das relações humanas com o passado variarem de cultura para cultura e, até de
pessoa para pessoa, existem algumas vias que o tornam apreensível pela consciência. Estas rotas, que serão
seguidas
neste
trabalho,
são
as
da
memória,
da
história
e
das
relíquias.
Retomamos, portanto, a proposta de Lowenthal de que a Geografia estuda sempre um país estrangeiro. De
que a Geografia Cultural-Humanista, a História, as Humanidades e as Artes caminham juntas nos estudo
deste país. Um país estrangeiro que tem muito a nos ensinar. Observar os artefatos humanos como Arte, ou
seja como modos de expressão da capacidade humana de sonhar e de construir novos mundos, pode nos
ajudar
a
compreender
esse
país
estrangeiro.
O entorno da Lagoa de Araruama será nosso “pais estrangeiro”. Ele foi ocupado comprovadamente há pelo
menos 4.500 anos antes do presente, como indicam os artefatos pré-cerâmicos dos indígenas que extraiam
seu sustento do rico habitat proporcionado pela interação entre a Mata Atlântica e a Restinga, e
principalmente,
pela
presença
do
sal.
Testemunhos desta ocupação ainda podem ser encontrados em toda a região, assim como de outras
atividades econômicas subsequentes, que garantiram o sustento e a ocupação do território pelo ocupante
europeu. Das áreas mais produtivas da Mata Atlântica extraiu-se o pau-brasil, plantou-se a cana-de-açúcar,
depois o café e, já no século XX, a laranja. Na restinga, menos produtiva, vivia-se da pesca e da criação de
gado. Em ambos os casos estas atividades tradicionais deram lugar depois à terra nua, reservada às
atividades
de
especulação
imobiliária
voltada
para
o
turismo
e
ao
veraneio.
Na Lagoa de Araruama, desde o início da ocupação humana se extraiu o sal. Os índios extraíam o sal
utilizando-se da abertura de cacimbas junto à linha d’água. Durante o período colonial português sua
extração foi proibida, pois o sal era monopólio da Coroa. O processo de produção só foi modificado em 1822
quando as salinas foram construídas segundo as técnicas mais avançadas, que deram ao entorno da Lagoa
de Araruama as feições paisagísticas que hoje podemos observar. Nos anos 1940 mudam as técnicas de
exploração com a instalação da Companhia Nacional de Álcalis introduzindo-se na região os padrões urbanos
dos
centros
industriais
brasileiros.
Também as salinas foram atingidas pela voragem da especulação imobiliária, grandes extensões da restinga
foram parceladas e vendidas em lotes para a construção de residências de final de semana.
Este é o principal motivo que enseja este texto: procurar manter viva uma paisagem, e uma arquitetura,
vernacular que consideramos como uma forma de expressão artística. Tanto a paisagem quanto as
edificações, consideradas aqui como os prédios e as próprias salinas, são relíquias que expressam mais do
que o modo de vida dos que ali habitavam.
AO069 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Espaço e Cultura
[2122] O LUGAR NO SHOPPING CENTER.
ANDRÉ LUIZ SOARES PEREIRA.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, SAO GONCALO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Observamos atualmente uma intensa série de transformações no espaço urbano, transformações essas de
cunho estrutural, político e cultural. Na atualidade, essas transformações têm no \"shopping center\" um de
seus principais representantes, já que essa modalidade do capitalismo tem modificado intensamente as
cidades. Porém estas modificações não se referem apenas nas questões de centralidade, de fluxos de
mercadorias e serviços, mas também – e principalmente – nos comportamentos e costumes dos habitantes
da
cidade
capitalista.
As práticas cotidianas dos habitantes podem ser compreendidas através dos sentimentos de afetividade e
identidade que ambos têm a partir de suas experiências locais, e essas experiências muitas vezes denotam
práticas que são características em determinados lugares. Assim, observamos que a discussão sobre o lugar
se remete ao bairro como espaço imediato da vida das relações cotidianas mais finas, o que nos suscita a
desenvolver neste artigo um estudo mais detalhado sobre esses aspectos da realidade dos lugares.
É importante ressaltarmos e relembrarmos que o \"shopping center\", além de permitir o surgimento e
manutenção de uma centralidade, também se insere numa perspectiva social, ditando regras e
comportamentos nos seus usuários e freqüentadores. O \"shopping center\" sendo fenômeno de cunho
essencialmente capitalista, não é projetado, construído, inaugurado e oferecido às classes desprovidas
economicamente, mas é um objeto de uso e consumo preferencialmente para os setores mais privilegiados
da sociedade, aqueles que detêm estratos de renda média a alta. Esse verdadeiro “templo da mercadoria”,
segundo ilustra Silvana Maria Pintaudi em trabalho de mesmo título, é preferencialmente utilizado pelos
setores mais favorecidos. O comportamento dos menos favorecidos também é instituído, e nos \"shopping
centers\" fica nítida essa situação, pois evitam freqüentar estes lugares ao saberem que terão de confrontar
com uma realidade que para eles, além de ser um sonho, é quase que impossível, caracterizando uma
situação
de
exclusão.
Uma questão a ser levantada neste momento e que nos auxiliará a trilhar o caminho para elaborarmos este
projeto é a situação de constrangimento que os menos favorecidos experimentam. É importante destacar que
esses não são proibidos de usarem os serviços oferecidos pelo “shopping center”, mas permanece junto a
eles um sentimento, uma questão de identidade com aquele lugar, na qual simplesmente percebem que para
usufruírem deste espaço, é primordial possuírem condições financeiras adequadas para tal evento e, que
todo aquele glamour que é apresentado através das vitrines e decoração não é oferecido para eles, mas sim
para atraírem mais consumidores que estejam dispostos a “adorar o consumo” neste templo.
Essas situações comportamentais que os habitantes da cidade capitalista exercem é oriundo da segregação
espacial que inicialmente é imposta, para depois com essas condições possa se executar uma segregação
sócioespacial, oriunda da seletividade moderna que o capital exerce sobre algumas localidades.
E quando um \"shopping center\" é instalado numa localidade considerada carente? Uma localidade que
anteriormente era negada pelo poder público municipal e estava desprovida dos bens necessários para o
atendimento de necessidades básicas, como sistemas de esgoto e saneamento básico? Qual será o
significado desse empreendimento para essa população local, ou seja, será que irão aceitar uma novidade
urbana como, por exemplo, uma família de classe média aceitaria, sabendo que podem usufruir deste
espaço? Ou então o \"shopping center\" terá um novo significado para estes moradores locais?
Muitos são os questionamentos a serem levantados neste momento, porém pretendemos focalizar no
seguinte, que passará a ser o leme que conduzirá este trabalho: qual o significado do SC no lugar na qual
fora implementado, para os moradores locais? Este questionamento encontra coro graças a uma série de
trabalhos levantados e na qual estes mesmo trarão o sustento e o subsídio necessários à elaboração deste
artigo.
Nossa intenção é investigar tais modificações ocorridas no espaço urbano de São Gonçalo, com ênfase nas
mudanças sócioespaciais principalmente no que tange às situações comportamentais variadas que são
expressas pela população, sendo o recorte temporal que pretendemos aplicar neste trabalho o primeiro
semestre de 2007, avaliando os comportamentos dos moradores ao redor do São Gonçalo Shopping Rio, ou
seja,
uma
perspectiva
local.
A primeira etapa deste documento pretende elucidar o conceito de lugar na vertente de alguns autores, na
intenção de compreendermos como que o lugar como sendo primordialmente o local onde atribuímos os mais
respectivos sentimentos de afetividade e identidade, e como que estas relações são construídas e
preservadas.
No segundo momento, pretendemos apresentar de forma empírica como que estas questões são explanadas
por esses moradores locais, de forma a compreender a construção de um espaço urbano completamente
desigual e segregador, mas também a formação do que podemos chamar de espaços de resistência.
AO242 - Alterações nas relações entre natureza e sociedade no mundo e no Brasil - Geografia do Turismo
[1174] A I M PORTÂN CI A D O FEN ÔM EN O D A SEGUN D A H ABI TAÇÃO E SUAS I M PLI CAÇÕES COM A
ATIVIDADE DO LAZER- VERANEIO: O EXEMPLO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
MIGUEL ANGELO RIBEIRO.
UERJ, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL.
Resumo:
Esta pesquisa tem por objetivo contribuir para compreensão da importância do fenômeno da segunda
habitação e suas implicações com a atividade do lazer-veraneio, na expansão urbana da metrópole do Rio de
Janeiro.
A dimensão espacial do processo da segunda habitação nos levou a optar pela escala de análise macro, nos
permitindo
observar
os
seus
traços
gerais
no
contexto
do
território
fluminense.
Para dar conta da temática em tela, alguns ângulos de análise foram selecionados, possibilitando uma visão
integrada deste fenômeno, a saber: as relações da metrópole com a sua área de influência imediata; a
segunda habitação como estratégia de expansão da demanda para o setor imobiliário e as transformações
que a partir da metrópole do Rio de Janeiro criaram as precondições para expansão do fenômeno do lazerveraneio.
Para atingir o objetivo proposto, a metodologia de pesquisa utilizada teve como referência as informações do
Censo Demográfico do IBGE para o ano 2000, estabelecendo uma relação entre o número total de domicílios
particulares
não
ocupados
sobre
os
domicílios
particulares
total.
Isto posto, o processo de metropolização envolvendo a produção de espaços residenciais e com outras
funções, verifica-se tanto no próprio município do Rio de Janeiro como em municípios integrantes da sua
região metropolitana, gerando um padrão de uso da terra em que cada uso apresenta continuidade espacial.
Este processo extravasa o âmbito da Região Metropolitana, abarcando áreas que, apesar de não
apresentarem contigüidade física com o Rio de Janeiro, estão sob sua influência direta no que concerne a
diversos aspectos sócio-econômicos. Cabe ressaltar que a posição hegemônica do Rio de Janeiro é
proveniente sobretudo, da sua condição de capital, mais tarde perdida quando da transferência da sede do
governo federal para Brasília, mas não influenciando internamente no contexto do território fluminense, no
qual percebe-se um processo de concentração de população, bens e recursos, nos limites metropolitanos,
principalmente, em seu núcleo – o município do Rio de Janeiro, e que a partir do final dos anos 1970 começa
a
exercer
influência
sobre
áreas
do
interior.
Uma dessas influências, partindo do núcleo metropolitano, diz respeito ao processo de ocupação temporária
das habitações, na qual atualmente vem apresentando um papel bastante significativo por um número
considerável de residentes da metrópole do Rio de Janeiro, atendendo aos objetivos de lazer e veraneio,
fenômeno
este
conhecido
da
segunda
habitação.
Este fenômeno, iniciado, com certa intensidade, na primeira metade do século XX em território fluminense,
abrange áreas serranas e litorâneas, na qual esta intensidade estava cada vez mais relacionada em função
da menor distância e/ou maior acessibilidade à metrópole, representada pela construção da ponte Presidente
Costa e Silva (Rio-Niterói), inaugurada em 1974, ao asfaltamento e duplicação de estradas de rodagem,
como
a
BR-101,
e
da
Rio-Teresópolis.
Tal fato conduziu a intensa movimentação de recursos e a especulação em torno deste fenômeno,
constatados nas proximidades das vias de acesso que articulam a metrópole a estes municípios,
representados por cartazes com anúncios de vendas de terrenos, sítios, chácaras, lançamentos de
condomínios, a cargo de um grande e diversificado número de agentes e empresas imobiliárias, além de
influenciar nas atividades de comércio e serviços, provocando um processo de urbanização turística
fantástico,
ainda
em
estágio
de
consolidação,
em
pleno
início
do
século
XXI.
Neste contexto, podemos afirmar que o processo da segunda habitação decorreu da acelerada urbanização
associado à emergência de uma sociedade urbano-industrial. O novo modelo de desenvolvimento do País
passa a vincular-se historicamente à expansão de grandes aglomerações metropolitanas que refletem no
espaço a concentração de população e recursos. A modernização capitalista nesses espaços está associada as
transformações significativas que permitiram a expansão do processo de segunda habitação, e no qual, a
metrópole
do
Rio
de
Janeiro
constituiu-se
em
exemplo
significativo.
O surgimento das novas formas de morar dirigidas pelo capital imobiliário às classes de maior poder
aquisitivo, pela sua amplitude no meio urbano, tem contribuído para a reestruturação espacial e expansão
das metrópoles. Como exemplos materializados espacialmente podemos citar os condomínios abertos,
fechados,
horizontais,
verticais;
os
apart-hotéis,
e
os
conjuntos
habitacionais.
Esta outra forma de utilização da habitação tem sua maior relevância em cinco áreas localizadas além dos
limites de construção continua da Área Metropolitana do Rio de Janeiro, destacando-se: o eixo que se dirige
ao norte do estado, cortado pelas rodovias BR-101 e RJ-106, estendendo-se do município de Maricá até o de
Rio das Ostras, correspondendo aqueles localizados na Região de Governo denominada Baixadas Litorâneas;
o eixo que se dirige ao sul do estado, cortado pela BR-101, partindo de Mangaratiba até Parati, envolvendo
municípios da Região de Governo denominada Costa Verde, antiga Baía da Ilha Grande; a área situada ao
norte da metrópole, na região serrana, com municípios integrantes da Região de Governo Centro-Sul
Fluminense, tais como Vassouras, Paty do Alferes, Miguel Pereira e Engenheiro Paulo Frontin; o eixo ocupado
por Guapimirim, município localizado nos limites da periferia metropolitana do Rio de Janeiro, e Teresópolis,
na Região Serrana, e os municípios de São João da Barra e São Francisco de Itabapoana, localizados na
Região Norte Fluminense, que atendem os veranistas procedentes de Campos dos Goytacazes e imediações,
e
do
estado
Capixaba.
Tais resultados ratificam o processo de ocupação temporária de residências, com grande freqüência, por um
número considerável de habitantes provenientes, sobretudo, da metrópole do Rio de Janeiro, com objetivos
de lazer e veraneio.
AO243 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Turismo
[1208] TURISMO. IDENTIFICAÇÃO DE ESPACIALIDADES COM BASE NA ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO
DA REDE HOTELEIRA E TRANSPORTE AÉREO NO ESPAÇO BRASILEIRO.
MARCOS AURÉLIO TARLOMBANI DA SILVEIRA.
UFPR, CURITIBA, PR, BRASIL.
Resumo:
Nas últimas décadas, o fenômeno turístico concebido, tanto como uma atividade econômica quanto uma
prática social, tem levado muitos lugares a se transformarem em verdadeiros “territórios turísticos”, isto é,
territórios estruturados a partir e para o turismo. É uma transformação que pode ser interpretada como uma
tradução espacial da civilização do lazer muito bem explorada pelos agentes econômicos do chamado
“negócio do ócio”. O aumento dos fluxos turísticos internacionais, impulsionado pelas lógicas da globalização
econômica e mundialização da cultura, vem sendo acompanhado da difusão dos modelos de espacialização
do turismo, com enormes impactos territoriais - econômicos, sociais, culturais e ambientais nos lugares de
destino. Fundamentado em pressupostos teóricos-conceituais, este trabalho aborda as espacialidades do
turismo no Brasil a partir da análise da distribuição da rede hoteleira e do transporte aéreo no território
brasileiro. Discute-se o processo de produção/consumo do território pelo turismo, destacando-se alguns
impactos territoriais decorrentes de sua expansão no país. O trabalho está estruturado em três partes. Na
primeira parte, expõe-se os fundamentos teóricos-conceituais discutindo-se a produção/apropriação do
território pelo turismo. A segunda parte é o exercício de identificação da distribuição geográfica da rede
hoteleira e do transporte aéreo no território brasileiro utilizando-se dados estatísticos publicados em revistas
de circulação nacional e em dados georreferenciados construídos pelo IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística, na obra intitulada Atlas Nacional, editado em formato digital. E, na terceira parte, apresentamse as considerações finais com a análise e discussão dos resultados e conclusões do trabalho. Entendido
como prática social, pode-se afirmar que o turismo ocorre em um dado contexto territorial a qual, constitui
em si mesma, uma forma de territorialidade. Definido o território como um campo de forças coletivas,
resultante de uma teia ou rede de relações sociais que nele se estabelecem, o mesmo deve ser visto na sua
natureza dual – dimensão ontológica – e como produto – das relações sociais. O território turístico resulta da
prática turística, ao mesmo tempo em que a concretiza é transformado por ela através de um processo
dialético de desterritorialização e reterritorialização, abrigando, de forma inquestionável, novas
territorialidades. A construção territorial se concretiza como um campo de forças resultante de um processo
de apropriação. É essa apropriação que qualifica o território turístico, que se expressa por meio da
(re)criação e ou (re)definição de espaços, cuja finalidade é atrair/recepcionar turistas, ofertando a estes
infra-estruturas, equipamentos e serviços diversos, caracterizando uma forma de venda e consumo do
espaço. No atual contexto da economia globalizada tem se atribuído ao turismo um papel relevante na busca
do desenvolvimento territorial. Governos nacionais, regionais e locais, administradores e gestores públicos,
enfim, todos aqueles que formulam as chamadas políticas de desenvolvimento econômico, tanto nos países
desenvolvidos, quanto nos países em desenvolvimento, como no caso do Brasil, o turismo é visto como uma
poderosa ferramenta para alavancar o desenvolvimento regional e local. Nesse sentido é que pode identificar
no espaço brasileiro novas territorialidades produzidas pelos atores econômicos hegemônicos que dominam a
atividade turística, notadamente aqueles ligados a dois setores chaves como os representados pela hotelaria
e pelo transporte aéreo. Esses atores impõem lógicas que desenham novas funcionalidades no uso do
território, desestruturando a organização socioespacial local existente e remodelando paisagens, imprimindo,
assim, novas configurações territoriais e inserindo novos valores socioculturais e ambientais. Esses novos
arranjos espaciais compõem as novas territorialidades turísticas. No que se refere ao setor governamental,
este tem tido seu papel e sua função na configuração territorial do turismo no país. Inicialmente a partir de
1996, com a proposição da denominada “Política Nacional de Turismo”, cuja meta era fomentar a expansão
da atividade por meio de programas como o PRODETUR – Programa de Desenvolvimento Turístico em escala
regional e, com o PNMT – Programa de Municipalização do Turismo em escala local. Depois a partir de 2002,
com o lançamento e implantação do chamado “Plano Nacional de Turismo”. O referido plano demonstra uma
forte confiança do governo federal no turismo enquanto atividade econômica que possa contribuir para o
progresso econômico e social do país. O incentivo ao crescimento, tanto do turismo internacional como
doméstico, é um dos pilares do Plano. Um dos objetivos é atrair um número crescente de turistas
estrangeiros, outro é aumentar o fluxo doméstico de turistas. No que concerne ao setor privado,
particularmente no setor hoteleiro, são vários os investimentos turísticos feitos no Brasil nos últimos 10 anos.
Em todas as regiões, com destaque para a zona costeira do nordeste, com potencial ainda pouco explorado
para o turismo de sol e praia, pipoca por todos os cantos a construção de novos meios de hospedagem como
hotéis, resorts e pousadas. Mas não é somente no nordeste, por todo o país, além de diversos
empreendimentos voltados ao lazer urbano - shoppings-centers, centros de convenções e eventos-,
multiplicam-se as atividades relacionadas ao turismo no espaço rural e em áreas de proteção ambiental,
como parques e reservas ecológicas. Essa nova dinâmica territorial pode ser a vida ou a morte de territórios
em escala regional e/ou local, pois o turismo pode provocar impactos positivos ou negativos nos espaços dos
quais se apropria, ficando uma ou outra situação na dependência da adoção de estratégias de planejamento
territorial adequadas e do modelo de desenvolvimento escolhido.
AO244 - Brasil: espaço, identidades e projetos de nação - Geografia do Turismo
[1283] TURISMO EM ESPAÇO RURAL: EMBATE ENTRE RESIDENTES E TURISTAS.
TELMA MARA BITTENCOURT BASSETTI SANTOS.
USP, CAMPO MOURAO, PR, BRASIL.
Resumo:
Este trabalho tem como objetivo principal relacionar a atividade turística nos espaços rurais de alguns
municípios turísticos do Espírito Santo com as condições de vida oferecidas pelos municípios aos seus
residentes. O turismo é caracterizado como um fenômeno econômico, político, social e cultural, dos mais
expressivos das sociedades ditas pós-industriais. Movimenta, em nível mundial, um volume enorme de
pessoas e de capital, e, cada vez mais significativamente, cria e recria espaços diversificados. Para Remy
Knafou (1999), o turismo é uma atividade cada vez mais difícil de ser avaliada, oscilando entre uma sub e
supervalorização que varia conforme a origem da avaliação e o interesse dos avaliadores. Milton Santos
(1985) propõe entender o espaço como um conjunto imbricado de objetos geográficos, naturais e artificiais,
cujo conjunto é dado pela natureza e às funções atribuídas a esses objetos pela sociedade. Para Santos, a
essência do espaço é social. Assim, segundo o olhar de Santos, “temos paralelamente, de um lado, um
conjunto de objetos geográficos distribuídos sobre um território, sua configuração geográfica ou sua
configuração espacial e a maneira como esses objetos se dão aos nossos olhos, na sua continuidade visível,
isto é, a paisagem; de outro lado, o que dá vida a esses objetos (...) são todos os processos sociais
representativos de uma sociedade em um dado momento” (1985, p. 2). É preciso considerar que o turismo
praticado no espaço seja ele rural ou urbano, obedece a critérios especificamente capitalistas tendo em vista
que a atividade está submetida ao universo do consumo do e no espaço. Nesta direção o turismo em sua
enorme complexidade exerce incidências territoriais específicas nos espaços em que, direta ou indiretamente,
estão relacionados a essa atividade. Arlete Moysés Rodrigues (1999) considera que o turismo produz espaços
delimitados e espacialmente destinados a consumos específicos através do conjunto de serviços que passam
a fluir neste mesmo espaço, agora mundializado e globalizado. Em função da globalização e dos
desdobramentos da construção da nova ordem mundial, as cidades passam por uma redefinição de seus
papéis. Segundo David Harvey (1996), em todo o mundo capitalista avançado as cidades passaram a ser
vistas como grandes empresas e como tal, a competição entre elas deveria refletir a competição das
empresas, que, na busca por incrementos de produtividade, procurariam se situar nas localidades que mais
oferecessem condições materiais, sociais e institucionais para seu desenvolvimento. Para Harvey, trata-se de
um novo empresariamento que tem como característica central a parceria público-privado e esta parceria é
empresarial porque, tanto o planejamento quanto a execução desta parceria tem cunhos especulativos e,
portanto, sujeitas aos riscos inerentes aos empreendimentos imobiliários sem planejamento. Neste caso, é
como se o público assumisse os riscos e o privado os benefícios. Compans afirma que “invariavelmente, a
imagem que se tenta construir é a de uma cidade empreendedora, socialmente integrada, que oferece
qualidade de vida e um ‘clima’ favorável aos negócios” (1999, p. 109). Entretanto, na tentativa de tornar-se
competitiva, a cidade que seria por direito para todos os cidadãos volta-se para o consumo de poucos e
poucos se beneficiam dela. As melhorias nas cidades, quando acontecem, também são localizadas e
comumente norteiam os símbolos destinados ao consumo da elite, seja ela local ou turística. A efemeridade
dos signos e a necessidade de construir outros são justificadas pela própria característica do consumo que é
insaciável e fugaz. É o efeito da maquiagem que esconde o que não é para ser visto; voltado para o olhar do
turista, para o que o agrada. Daí as fachadas, os canteiros, as pinturas, enfim, melhorias aparentes que não
geram benefícios iguais para todos, mas que produzem recortes da cidade e tentam representá-la como um
todo. Segundo John Urry (1996), essas imagens construídas são intencionalmente direcionadas para o olhar
do turismo e para aspectos da paisagem que separam o turista de suas experiências cotidianas. O
direcionamento da paisagem, de alguns espaços, para o olhar do turista, leva-nos a pensar sobre o que pode
ou não ser visto na cidade turística. O que nos é permitido ver e o que nos é proibido observar. Afastar do
olhar turístico os problemas da cidade e escondê-los pode, de imediato, favorecer o desenvolvimento da
atividade turística. Entretanto, concomitantemente, esta segregação do espaço pode comprometer
seriamente a vida dos residentes, uma vez que os investimentos locais priorizam a construção de signos em
detrimento das melhorias de infra-estruturas e acessos a serviços públicos. As melhorias, quando acontecem,
também são localizadas e comumente norteiam os símbolos destinados ao consumo da elite, seja ela local ou
turística. Essa é uma visão equivocada, pois quando as infra-estruturas e a sociedade como um todo
(empregos, segurança, saúde etc) estão resolvidos, isso também se torna um fator de atratividade turística.
Para realizar esta pesquisa utilizamos os dados sobre a oferta de alguns serviços públicos (abastecimento de
água, esgotamento sanitário e coleta e destino do lixo), sobre o crescimento populacional, o fluxo turístico e
alguns índices que nos serviram de parâmetro para hierarquizar os municípios (Índice de Desenvolvimento
Humano Municipal – IDH-M e Índice de Desenvolvimento dos Municípios do Estado do Espírito Santo – IDMES) e comparar a evolução da melhora das condições de vida da população nestes aspectos entre os anos de
1991 e 2000. Concluímos que o aumento do fluxo turístico implica em maior quantidade de pessoas
utilizando-se dos serviços e da infra-estrutura dos municípios, o que pode acarretar uma disputa entre turista
e
residente
pela
manutenção
de
suas
condições
de
vida.
AO245 - Espacialidades no mundo contemporâneo: desafios teóricos e empíricos - Geografia do Turismo
[1388] UM A ABERTURA AO D EBATE SOBRE A ( RE) PROD UÇÃO D O ESPAÇO D A CI D AD E D E SÃO
PAULO E O TURISMO.
FABIO CEZAR BRAZ.
USP, SÃO PAULO, SP, BRASIL.
Resumo:
A idéia de turismo sempre esteve associada a lazer ou descanso; uma prática social na qual o indivíduo busca
experiênciar lugares diferentes, relacionar-se com outras pessoas, enfim, deixar a repetição do seu dia-a-dia.
Mas ao tomar o turismo de eventos e negócios, também denominado corporativo, faz-se a ressalva que
mesmo o objetivo deste viajante ser assunto de trabalho, todos são potencialmente turistas, visto que
segundo os organismos oficiais de turismo, hoje, todo mundo que viaja, independente da motivação do
deslocamento, é um turista. E o conceito se torna mais complexo ao se discutir uma cidade como São Paulo,
nacionalmente conhecida como a “capital do trabalho”, onde os fluxos emissivos e receptivos são muito
expressivos, em especial a atratividade da metrópole para o mundo dos negócios, do qual se abstrai, por
conseguinte,
um
de
seus
mais
importantes
segmentos
turísticos.
Perante a trama de relações que se fazem presentes na produção do espaço urbano da metrópole de São
Paulo “tomamos o turismo de eventos/feiras de negócios” como objeto de estudo nesta pesquisa.
A preocupação intelectual por nós levantada parte de reflexões acerca da geografia na sua relação com o
turismo, objetivando analisar criticamente essa relação, desfazendo discursos, contestando verdades insólitas
e abstraindo lógicas que se impõem sobre o espaço da metrópole. Ao debruçarmo-nos sobre a
produção/reprodução do espaço de São Paulo partimos da premissa de que mediante o mundo da mercadoria
o pensamento economicista circunscreve a tudo e a todos, legitimando ações dos agentes de mercado e do
Estado,
discussão
esta
que
permeará
todo
o
nosso
trabalho.
As metamorfoses do espaço seguem a lógica do capital, e pelos investimentos serem seletivos o espaço vai
se estruturando em pedaços hierarquizados, formando áreas de centralidade econômica. Observar e analisar
a criação de novas áreas de centralidade e o reforço das centralidades pré-existentes pelo turismo de
eventos/feiras de negócios na metrópole paulista é o aspecto principal no qual reside nosso estudo.
Comumente, trabalhos com abordagem sobre o turismo centram-se nos aspectos econômicos. Este caráter
está expresso na conceituação apresentada por Shattenhofen (na década de 1910), citada por Barreto (2000,
p.9): “Turismo é o conceito que compreende todos os processos, especialmente os econômicos, que se
manifestam na chegada, na permanência e na saída do turista de um determinado município, país ou
estado”.
Não se buscará aqui demonstrar por meio de dados estatísticos ou experiências anteriores quanto o turismo
é benéfico/maléfico para uma cidade, ou a região na qual ela está inserida ou integrada/articulada por
“redes” diversas. O turismo não pode ser tido apenas como a solução para os municípios sedentos por
aumentar divisas e/ou fluxo de capitais. Não se pretende, também, desbancar os que pensam desta forma,
muito menos, condenar tal prática, todavia, a ciência tem dois caminhos, um é servir à ordem estabelecida,
prestando-se de base teórica, técnica/instrumental ou, como crítica, visando questionar os modismos, as
ideologias, as conjunturas políticas etc. Neste sentido, pareceu pertinente iniciar a reflexão proposta com
uma frase de Lozato-Giotart (1993), que transmite a mensagem que permeará o texto. Segundo o autor