revista n3
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Revista da Fapese, v.3, n. 2, p. 81-86, jul./dez. 2007 81 Feijão Guandu: Uma Planta Multiuso Ruberval Leone Azevedo Genésio Tâmara Ribeiro * ** R e s u m o Cláudio Luiz Leone Azevedo F *** eijão guandu é uma leguminosa que possui diversas utilidades. Sua cultura tem muita importância para diversos países, principalmente os asiáticos e africanos. Encontrada com freqüên- cia em todo o Brasil, esta leguminosa pode ser observada principal- mente nos quintais domésticos de muitas cidades do interior. Com utilização bastante diversificada, a cultura do feijão guandu pode ser usada para os mais diversos fins: como planta melhoradora de solos, na recuperação de áreas degradadas, como planta fitorremediadora, renovação de pastagens, na alimentação de ani- mais domésticos e da pecuária e também na alimentação humana. Por estes aspectos, possui um enorme potencial para exercer múltiplas funções nos sistemas de produção agrícola, além de gerar pro- dutos de elevado valor biológico para melhoria do meio ambiente em geral. Por seu valor nutritivo pode ser amplamente usado na alimentação humana, como também para uso na alimentação animal, mas necessita ser melhor explorada em locais onde seu uso ainda é limitado. PALAVRAS-CHAVE: Leguminosa; Cajanus cajan; recuperação de solos. * Engenheiro Agrônomo, Mestre em Ciências Agrárias. Professor Substituto da Universidade Federal de Sergipe, Departamento de Engenharia Agronômica, Av. Marechal Rondon, s/n, Jardim Rosa Elze – São Cristóvão/ SE, 49.100.000. E-Mail: [email protected]. ** Engenheiro Florestal, Doutor em Entomologia. Professor Adjunto da Universidade Federal de Sergipe, Núcleo de Engenharia Florestal, Av. Marechal Rondon, s/n, Jardim Rosa Elze – São Cristóvão/SE, 49.100.000. EMail: [email protected]. *** Engenheiro Agrônomo, Mestre em Fitotecnia. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Centro Nacional de Pesquisa de Mandioca e Fruticultura Tropical, Embrapa/cnpmf. Rua Embrapa, S/N.º Centro, 44380000 - Cruz das Almas/BA - Caixa-Postal: 007. E-mail: [email protected] 82 Ruberval Leone Azevedo; Genésio Tâmara Ribeiro; Cláudio Luiz Leone Azevedo 1. Introdução O feijão guandu [Cajanus cajan (L.) Millspaugh] pertence à família Fabaceae, subfamília Faboideae. Leguminosa arbustiva anual ou semiperene é uma cultura importante para diversos países dos trópicos e subtrópicos, principalmente os países asiáticos e africanos. A sua origem ainda é motivo de controvérsia, divergindo entre o Continente Africano e a Índia (Nene e Sheila, 1990; Van Der Maesen, 1990). Esta leguminosa foi introduzida no Brasil provavelmente pela rota dos escravos, nos navios negreiros procedentes da África, tornando-se largamente distribuída e seminaturalizada na região tropical (Seiffert e Thiago, 1983). O Cajanus cajan possui os seguintes nomes comuns nos mais variados lugares do globo: Guandul, paraguayo, sachacafé, falso café, arveja (Argentina), Feijão guandu, guandu (Brasil), quinchoncho (Venezuela), frijol de árbol (México), Cumandái (Paraguai), red gram, tur, arhar, dahl (Índia), pigeon pea (Austrália), pois d’angole (países de língua francesa), Puerto Rican bean, pigeon pea (Havaí). A área cultivada com feijão guandu no mundo em 2005 girou em torno de quatro milhões de hectares, proporcionando uma produção de três milhões de toneladas. O maior produtor mundial é a Índia, que tem essa cultura como base de sua alimentação, com 90% da produção mundial (Faostat, 2006). Encontrada com freqüência em todo o Brasil, esta leguminosa pode ser observada principalmente nos quintais domésticos de muitas cidades do interior. Esta popularidade está relacionada com a palatabilidade de seus grãos verdes, podendo substituir ervilhas enlatadas. Seus grãos secos podem ser empregados da mesma forma que o feijão comum para o consumo humano, além de serem avidamente consumidos por aves domésticas (Seiffert e Thiago, 1983). Com utilização bastante diversificada, a cultura do feijão guandu pode ser usada para os mais diversos fins: como planta melhoradora de solos, na recuperação de áreas degradadas, como planta fitorremediadora, na renovação de pastagens, na alimentação de animais domésticos e da pecuária, também largamente utilizada na alimentação humana. 2. Uso como planta melhoradora de solos A adubação verde é uma prática que recupera a fertilidade do solo, enriquecendo-o com matéria orgânica e nutrientes, melhorando suas condições físicas e biológicas, além de ser eficaz no controle de erosão, enxurradas etc. As plantas ditas leguminosas são as preferidas como adubos verdes devido à fixação biológica do nitrogênio atmosférico e à produção de grande quantidade de massa rica em elementos minerais, mobilizados nas de diferentes camadas do solo através de um sistema radicular profundo e ramificado (Paulo et al., 2006). O feijão guandu constitui-se em uma das plantas de maior uso como adubação verde, por que além de possuir um sistema radicular profundo e ramificado que, torna-o capaz de resistir ao estresse hídrico, possibilita-o romper camadas adensadas de solos, como “pé de arado”. Devido a isso, o guandu é chamado de arado biológico, e tem se destacado com relação às melhorias na fertilidade do solo (Alcântara et al., 2000; Rodrigues Filho et al., 1996; Santos et al., 1999; Seiffert e Thiago, 1983). 3. Recuperação de áreas degradadas A utilização de leguminosas para recuperar áreas degradadas apresenta várias vantagens, devido à existência de um grande número de espécies que ocorrem em várias regiões do Brasil e à relativa facilidade na obtenção de sementes. Mas a principal preferência pelo uso das espécies leguminosas, se deve à característica especial que elas possuem em relação as outras plantas, que é a capacidade de se associarem com microrganismos do solo, como bactérias fixadoras de nitrogênio, que transforma o nitrogênio do ar em compostos nitrogenados assimiláveis pelos vegetais, podendo tornar a planta parcial ou totalmente independente Revista da Fapese, v.3, n.2, p. 81-86 jul./dez. 2007 Feijão guandu do aporte externo desse nutriente. O feijão guandu tem sido uma opção promissora utilizada em diversos trabalhos, com resultados significativos (Beltrame e Rodrigues, 2007; Faria e Campello, 2000; IBAMA, 1990; Nascimento e Silva, 2004). 4. Planta fitorremediadora A fitoextração é uma tecnologia para despoluição de solos e recursos hídricos contaminados por metais pesados e poluentes orgânicos e inorgânicos, como, por exemplo, herbicida. Desponta como uma técnica promissora tanto economicamente como ambientalmente. Esta técnica usa plantas tolerantes para transferir metais do solo ou água para a parte aérea, a qual pode ser removida da área poluída. O feijão guandu se mostra com opção que pode ser usada como planta fitorremediadora (Pires, et al., 2003, 2006; Pelegrini et al., 2003). 5. Renovação de pastagens degradadas A degradação das pastagens é um dos maiores problemas para pecuária do Brasil. Estima-se que 80% do total das áreas de pastagens cultivadas do Brasil, encontram-se em algum estádio de degradação. É um processo evolutivo de perda de vigor e produtividade forrageira, com o mínimo de recuperação natural, que afeta a produção e o desempenho animal e culmina com a degradação do solo e dos recursos naturais em função de manejos inadequados, por isso a degradação precisa ser revertida para garantir a produtividade e a viabilidade econômica da pecuária (Macedo et al., 2000). Dentre as maneiras de se reformar uma pastagem degradada está a adição de leguminosas nas áreas exclusivas de gramíneas, que tem contribuído para recuperação destas e aumentado a produtividade. O feijão guandu, quando utilizado em pastagens consorciadas, determina um aumento no crescimento e na palatabilidade das gramíneas, devido, principalmente, ao fornecimento contínuo e efetivo de nitrogênio 83 para estas, o que têm demonstrado um aumento no seu teor de proteína (Bonamigo, 1999). 6. Manejo de nematóides em cultivos anuais. Na atualidade estratégias para um manejo eficiente de fitonematóides são aquelas que diminuem custos, aumentam a produção e não agridem o ambiente. Os nematóides podem ser influenciados de duas formas pela diversidade de espécies vegetais, ou seja, podem ser capturados ou mortos por certas plantas ou podem ser atraídos por uma cultura-armadilha, nesse último caso, a cultura-armadilha deve ser colhidas ou destruídas antes da eclosão dos nematóides. O feijão guandu pode ser utilizado tanto como planta antagonista, quanto como planta armadilha para a redução e controle de fitonematóides em áreas cultivadas. Indicado para áreas com infestação do nematóide Pratylenchus brachyurus (Inomoto et al., 2006; Ritzinger e Fancelli, 2006; Valle et al., 1997). 7. Uso na alimentação animal A produtividade da forragem do feijão guandu é considerada elevada, pode chegar a 12 toneladas por hectare ano. Possui alto valor nutritivo para o gado de leite e/ou corte, sendo sua farinha excelente para a suplementação de suínos e aves. As folhas e ramos finos apresentam teores de proteína bruta entre 16 e 20%, enquanto que a digestibilidade da matéria seca pode variar de 50 a 65%. Os ganhos de peso estão em torno de 500 a 800 g/animal/dia e entre 400 a 700 kg/ ha/ano, respectivamente para os períodos chuvoso e seco (Costa et al., 2001). Também é um excelente volumoso como componente de ração de confinamento, quando se quer manter, no período de seca, ganhos de peso dos bovinos iguais ou superiores aos obtidos na estação chuvosa, deve-se fornecer uma alimentação mais equilibrada do que aquela que o animal obtém em pastejo (Lourenço e Delistoianov, 1993; Thiago e Costa, 1983). Revista da Fapese, v.3, n.2, p. 81-86 jul./dez. 2007 84 Ruberval Leone Azevedo; Genésio Tâmara Ribeiro; Cláudio Luiz Leone Azevedo Na alimentação de frangos de corte o feijão guandu tem sido utilizado na forma de farelo, principalmente como alternativa para diminuir os custos e produção. Embora precise passar por algum processo térmico para inibição de alguns fatores antinutricionais que podem diminuir a digestibilidade dos nutrientes, na dieta animal (Mizubuti et al., 1995; Oliveira et al., 2000). Uso do farelo de sementes de feijão guandu em dietas de suínos em crescimento, terminação e fêmeas em gestação, pode substituir entre 50 a 75% da proteína oriunda do farelo de soja. Também os variados fatores antinutricionais devem ser adequadamente inativados (Bellaver, 2004). 8. Na alimentação humana O feijão guandu apresenta na sua composição um elevado teor protéico, semelhante a outras leguminosas. A sua composição em aminoácidos é semelhante ao feijão comum (Phaseolus vulgaris L.).Apresenta também teores expressivos de cálcio, ferro, magnésio e fósforo. O consumo do feijão guandu na América Central ocorre, sobretudo enlatado, ainda verde ou “de vez” (no ponto entre verde e maduro), mostrando que o enlatamento pode ser uma forma eficaz de preservação da coloração do grão, principalmente na entressafra. Na Índia ele é consumido principalmente descascado, separando-se os cotilédones, sendo então denominado de “dhal” (Barcelos et al., 1999; Canniatti-Brazaca, et al., 1996). No Brasil, o feijão guandu é uma boa opção para a produção de grãos em sistemas agrícolas de base familiar especialmente no semi-árido brasileiro. Esta leguminosa é encontrada principalmente nos quintais domésticos de muitas cidades do interior do Nordeste, onde também serve como complemento da renda familiar, pois estes grãos ainda verdes são vendidos nas feiras livres. As propriedades funcionais de concentrado protéico de feijão guandu, tais como solubilidade da proteína em função do pH, capacidade de absorção de água e óleo, capacidade de formação de gel e capacidade de formação e estabilidade da emulsão, indicam que há possibilidades de utilização deste na formulação de produtos cárneos, substitutos da carne, molhos e sopas, como também, a boa capacidade de formação e estabilidade da espuma indica uma possível utilização deste em produtos de padaria e confeitaria (Mizubuti, et al., 2000). 9. Considerações finais A cultura do feijão guandu possui um enorme potencial para exercer múltiplas funções nos sistemas de produção agrícola, além de gerar produtos de elevado valor biológico para melhoria do meio ambiente em geral. Por seu valor nutritivo pode ser amplamente usado na alimentação humana, como também na alimentação animal. Necessita ser melhor explorada em locais onde seu uso ainda é limitado. Revista da Fapese, v.3, n.2, p. 81-86 jul./dez. 2007 Feijão guandu 85 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALCÂNTARA, F.A.; FURTINI NETO, A.E.; PAULA, M.B.; MESQUITA, H.A.; MUNIZ, J.A. . Adubação verde na recuperação da fertilidade de um Latossolo vermelho-escuro degradado. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 35, p. 277-288, 2000. BARCELOS, M. F.P.; TAVARES,D.Q.; GERMER, S. P. M.; SADAHIRA, M. S.; FERREIRA, V. L. P.; CAMPO. S, S. D. Aspectos tecnológicos e sensoriais do guandu [Cajanus cajan (L.) Millsp.] enlatado em diferentes estádios de maturação. Ciência Tecnologia de Alimentos, Campinas, v. 19, n. 1, p.73-83. 1999. BELLAVER, C. Considerações sobre os alimentos alternativos para dietas de suínos.. In: Encontro Internacional dos Negócios da Pecuaria., 2004, Cuiabá. Encontro internacional dos negócios da pecuaria, Cuiabá, MS. [Anais...] Cuiabá: ENIPEC, 2004, 2004. Disponível em : < www.cnpsa.embrapa.br/ down.php?tipo=palestras&cod_arquivo=12>. FAOSTAT. 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