A doença periodontal como mecanismo de indução ao parto
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A doença periodontal como mecanismo de indução ao parto prematuro de crianças com baixo peso Carlos Marcelo da S. Figueredo ( [email protected] ) - PhD em Periodontia e Química Clínica pelo Karolinska Institute - Suécia; - Professor Adjunto da UERJ e UNIGRANRIO; - Coordenador da Especialização em Periodontia da PUC-RJ Janaína Nunes Sampaio - Instituto de Odontologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (IOPUC-RJ) Ricardo Guimarães Fischer - Prof. Disciplina Periodontia da UERJ - Doutor em Periodontia pela Univ. Lünd, Suécia - Diretor Cultural da SOBRAPE - Direor da Revista PERIODONTIA, da SOBRAPE O objetivo do presente estudo foi avaliar os mecanismos de indução que levam ao parto prematuro de crianças de baixo peso, buscando uma correlação com a doença periodontal. Estudos recentes mostram apenas uma associação entre as duas condições e possíveis linhas patogênicas em comum não tem sido convicentemente demonstradas. Mediadores inflamatórios que ocorrem nas doenças periodontais, como a interleuquina 1, o fator de necrose tumoral e a prostaglandina, também possuem uma participação importante na iniciação do trabalho de parto, sendo considerados mecanismos biologicamente plausíveis que podem ligar as duas condições. A revisão da literatura possibilitou a conclusão de que a infecção, por si só, é um fator de risco importante, podendo a doença periodontal ser incluída como um fator de risco de extremo valor para o mecanismo de indução do parto prematuro de crianças de baixo peso. A presença de células inflamatórias durante a inflamação periodontal elevando as concentrações de prostaglandina, enzimas proteolíticas, e citoquinas próinflamatórias podem funcionar como um importante fator de risco para o parto prematuro de crianças com baixo peso. 1. Introdução A reação inflamatória causada pela doença periodontal vem sendo associada ao aumento do risco de se desenvolver outras doenças inflamatórias crônicas, como artrite reumatóide, gromerulonefrite, aterosclerose e doenças obstrutivas pulmonares crônicas (Scannapienco et al. (1998). A doença periodontal também tem sido associada ao nascimento prematuro de crianças de baixo peso (Offenbacher et al. 1995). A definição internacional para nascimento de crianças com baixo peso, adotada pela 29ª Assembléia Mundial de Saúde em 1976, é um peso de nascimento menor do que 2500g (Andrews et al. 1995). O nascimento abaixo do peso pode ser o resultado tanto de um curto período gestacional, quanto de um retardo no crescimento intrauterino. A gestação normal para humanos é de 40 semanas. São considerados prematuros, períodos gestacionais abaixo de 37 semanas (World Health Organization 1975). Geralmente, a maioria dos nascimentos prematuros são também recém-natos de baixo peso. Didaticamente, é importante a distinção entre prematuros de baixo peso e retardamento no crescimento intrauterino, porém uma definição padrão para retardo intrauterino é difícil de se achar (Willians & Offenbacher 2000). A definição atualmente utilizada para considerar um infanto de baixo peso, mas não prematuro, seria um peso de nascimento menor do que 2500g com um período gestacional igual ou maior do que 37 semanas. O nascimento prematuro é usualmente o resultado de uma das 4 abrangentes áreas do diagnóstico em obstetrícia: 1) trabalho de parto prematuro, 2) ruptura prematura da membrana, 3) complicações maternas e 4) complicações fetais (Main 1988). Entre estes 4 fatores, o trabalho de parto prematuro e a ruptura prematura da membrana podem ser causados pela reação inflamatória proveniente de infecções. Supostamente entre elas a doença periodontal pode ser considerada. Sendo assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar os mecanismos de indução que levam ao parto prematuro de crianças de baixo peso, buscando uma correlação com a doença periodontal . 2. Revisão da literatura 2.1 Distribuição Mundial da Prevalência de Crianças de Baixo Peso A Ásia apresenta a maior prevalência de crianças de baixo peso no mundo, atingindo 15% dos infantos. A média de peso do recém-nato é de 2900g. Em 2º lugar, encontram-se a África e América do Sul, onde a média de baixo peso é aproximadamente 11% (média de peso em torno de 3000g). A Austrália e América do Norte apresentam prevalências baixas, entre 6 e 7%, com uma média de peso do infanto de 3200g. A Europa apresenta uma grande variação para o nascimento de crianças de baixo peso (4 - 12%, com média de peso de 3200g). Os custos mundiais para o tratamento deste problema são enormes e o entendimento dos fatores prédisponentes e das causas do nascimento prematuro de crianças de baixo peso são importantes alvos nos programas de controle de saúde (para revisão, ler Willians et al. 2001). 2.2 Fatores de Risco na Indução de Parto Prematuro O prematuro de baixo peso é o resultado final de alterações num sistema contínuo e estável. A determinação dos fatores envolvidos no nascimento de crianças de baixo peso é de difícil entendimento pela complexidade da natureza sistêmica de desenvolvimento fetal e das repentinas iniciações do trabalho de parto. São considerados como de risco os seguintes fatores: genético, demográfico e psicossocial, obstétricos, nutrição, infecção, exposição tóxica, e cuidado pré-natal (Willians et al. 2001). No presente estudo foi analisado apenas o efeito da infecção como fator de risco. 2.3 Mecanismos Envolvidos no Trabalho de Parto 2.3.1 Fisiologia do Trabalho de Parto O parto é caracterizado por contrações uterinas coordenadas, que levam a uma dilatação do colo do útero e finalmente, a expulsão do feto. Alguns dos mecanismos envolvidos no trabalho de parto estão resumidos na Figura 1. Em termos de parto normal, a rotura da membrana ocorrerá depois da iniciação das contrações. Os mecanismos envolvidos na iniciação do trabalho de parto em mulheres não são totalmente conhecidos (Schellenberg & Liggins 1994). No entanto, prostaglandinas parecem exercer um papel inicial neste processo, sendo que a prostaglandina E2 pode ser usada para induzir o parto em humanos. Os eventos iniciais identificados no trabalho de parto são o aumento da biodisponibilidade da prostaglandina F2 a, e um aumento na concentração de receptores para o hormônio ocitocina (Chard 1991). O último parece ser estimulado pelo aumento dos níveis de prostanoídes, possivelmente de prostaglandina E2. O precursor obrigatório para a síntese de prostanoíde é o ácido araquidônico livre (Schellenberg & Liggins, 1994). A concentração deste ácido aumenta no fluído amniótico durante o trabalho de parto espontâneo. Ele também induz o aborto ou o trabalho de parto, quando injetado no fluído amniótico. As membranas fetais contém fosfolipase A2, que podem separar o ácido araquidônico dos fosfolipídios. Tem sido sugerido que, fontes bacterianas de fosfolipase A2 podem ser importantes na indução do parto prematuro (Bejar et al. 1981). A ocitocina é um dos agentes mais potentes para a estimulação da contração uterina (Mitchell & Chibbar 1995). Tanto o aumento de receptores para ocitocina durante o parto quanto o alargamento da cérvix e do miométrio, parecem ser iniciados por um refluxo neurogênico direcionado para a neurohipófise da glândula pituitária agindo como um feedback positivo para a produção de ocitocina (Chard 1994). Tem sido postulado que a taxa de estrogênio - progesterona, que aumenta gradativamenteaté o final da gravidez, é o resultado de uma atividade do miométrio, demonstrando uma grande contratilidade; porém a progesterona é inibida durante o curso da gravidez, inibindo o processo de contração uterina (Romero & Mazor, 1988). 2.3.2 Mecanismos Envolvidos no Parto Prematuro Cinco pontos tem sido mais utilizados para ajudar na discussão sobre os possíveis mecanismos envolvidos com o parto pretermo. Eles são: (1) os processos fisiológicos normais que acontecem cedo demais; (2) infecção, (3) inflamação; (4) hemorragia; (5) isquemia placentária e stress (Lockwood 1995). Os últimos quatro são usados para ilustrar o crescimento de evidências da existência de métodos alternativos de ativação deste mecanismo, que levam para caminhos comuns na iniciação do parto (Romero & Mazor 1988). Como o objetivo desta revisão foi de avaliar a relação patogênica da periodontite com o nascimento de prematuros com baixo peso, apenas os mecanismos envolvidos na infecção e na inflamação foram analisados. Figura 1- Esquema simplificado dos possíveis mecanismos envolvidos no trabalho de parto prematuro e ruptura prematura de membrana 2.3.2.1 Inflamação e Infecção Existem evidências ligando a infecção maternal com o parto prematuro (Romero & Mazor 1988, Andrews et al. 1995). A colonização vaginal por espécies de bacteroides tem sido associada com um aumento de 60% do risco de parto prematuro (Minkoff et al. 1984). Infecções no trato genito-urinário tem sido associadas com complicações na gravidez durante muitos anos. Infecções subclínicas também tem sido demonstradas estarem ligadas ao nascimento precoce (Gibbs et al. 1992). O uso de metronidazol e eritromicina para tratar de mulheres com vaginite bacteriana tem demonstrado reduzir as taxas de nascimento prematuro (John et al. 1995). Por outro lado, McDonald et al. (1997) não demonstraram uma redução na taxa de nascimento prematuro após o uso de antibióticos, exceto em mulheres com história prévia de parto prematuro. Pesquisas envolvendo uma desordem específica da gravidez chamada pré-eclâmpsia, têm demonstrado que a gravidez normal, por si só, está associada a alterações inflamatórias bastante similares às encontradas em septicemia, onde um aumento dos níveis de TNFa e interleuquina-6 pode ser observado (Sacks et al. 1998). O conhecimento atual dos eventos que envolvem o trabalho de parto normal e dos mecanismos que ligam fatores de risco conhecidos para nascimento precoce de crianças de baixo peso, sugerem fortemente que as prostaglandinas e as citoquinas pró-inflamatórias possuem um papel importante na iniciação do processo (Williams et al. 2000). Devido a relação próxima entre inflamação e infecção, parece que alterações nos níveis de mediadores inflamatórios como resultado de uma resposta do hospedeiro contra agentes infecciosos, pode representar o mecanismo-chave através do qual a infecção é associada ao parto prematuro de crianças de baixo peso. Assim, um aumento dos níveis de citoquinas derivadas da mãe ou do feto, como por exemplo, TNF-a, pode levar a um aumento da expressão da IL-6, resultando na produção de prostanoídes. Como via alternativa, tanto os neutrófilos, quanto vários organismos gram negativos produzem a enzima fosfolipase A2, que hidroliza o ácido araquidônico, que por sua vez, regula a síntese de prostanoídes (para revisão, ler Willians et al. 2001). O TNF-a e a IL-6 têm sido demonstrados, in vitro, terem a capacidade de atravessar a membrana fetal humana (Kent et al. 1994). Apesar de ser difícil extrapolar estes resultados para situações in vivo, é plausível que, infecções do trato genito-urinário possam influenciar a imunidade feto placentária. Um mecanismo alternativo poderia envolver um desafio mais direto da bactéria periodontal e/ou de seus produtos. Uma disseminação pelo líquido amniótico pode ser causada tanto pelo sistema sangüíneo, através de bacteremias transitórias ou pelo fato da bactéria ser introduzida na vagina pela prática do sexo orogenital, e então, entrar no fluído genital. Algumas evidências para este mecanismo mais direto são provenientes do estudo de Hill (1993), no qual bactérias foram cultivadas do líquido amniótico de mulheres com membranas intactas. Uma alta proporção de fluídos eram positivos para Fusobacterium nucleatum, que é uma bactéria anaeróbia gram negativa, freqüentemente encontrada em infeção periodontal, porém, normalmente ausente na microflora vaginal (Hill 1993). 3. Doença Periodontal A possibilidade de que a doença periodontal possa ser importante com relação ao nascimento precoce tem origem nos estudos de Offeenbacher et al. (1995). A condição de aumento da inflamação gengival durante a gravidez é conhecido há muitos anos (Williams et al. 2000). Existem sugestões de que este fato esteja relacionado a uma imunossupressão no segundo trimestre de gravidez (Lopatin et al. 1980). O periodonto infiltrado também pode ser considerado como reservatório tanto para produtos microbianos quanto para mediadores inflamatórios. Níveis locais de prostaglandinas E2 e níveis locais e sistêmicos de TNFa, tem sido demonstrados estarem aumentados na periodontite (Moss et al. 1995). Experimentos em animais nos quais hamsters grávidas foram infectadas com Porphyromonas gengivalis, uma bactéria gram negativa freqüentemente associada a periodontite, tem demonstrado uma associação significante entre o aumento dos níveis de prostaglandinas E2 e TNFa com o retardo de crescimento fetal. Tais resultados sugerem que a infecção por Porphyromonas gingivalis pode afetar a gravidez em humanos (Collins et al. 1994). Offenbacher et al. (1995) analisaram a possibilidade da infecção periodontal funcionar como fator de risco para o nascimento prematuro de criança de baixo peso. 124 mães grávidas, ou no período pós parto, foram avaliadas quanto à prevalência de infecção periodontal. Casos de crianças prematuras de baixo peso foram definidos como crianças com menos de 2500g e período gestacional abaixo de 37 semanas. As crianças foram subdivididas em trabalho de parto prematuro ou ruptura prematura da membrana. Os dados indicaram que a doença periodontal representa um fator de risco previamente não reconhecido e clinicamente significante para nascimento de crianças prematuras de baixo peso como conseqüência tanto do trabalho de parto prematuro quanto de uma ruptura prematura da membrana. Dasanayake (1998) analisou a relação de saúde periodontal em mulheres grávidas como um possível fator de risco para crianças de baixo peso. Cinqüenta e cinco mulheres grávidas foram comparadas com 55 mulheres não grávidas. Foi avaliada a hipótese de que uma higiene oral deficiente em mulheres grávidas poderia ser um fator de risco para o nascimento prematuro de criança de baixo peso. O estudo concluiu que uma saúde periodontal deficiente da mãe é um fator de risco potencial e independente para o nascimento prematuro de criança de baixo peso. 4. Discussão A hipótese de que a doença periodontal poderia funcionar como um possível indutor ao parto prematuro de crianças de baixo peso foi apresentada nesta revisão. Entre as possíveis vias de indução, o processo de infecção parece ter uma estreita ligação com as alterações causadas pela doença periodontal (Brocklehurst 1999). A presença de vários fatores de risco, interagindo no desencadeamento no processo de indução de parto, é um fato preponderante. A placa bacteriana e a deficiência na higiene oral funcionam como agentes diretos para a instalação e propagação dos problemas periodontais, sendo a infecção o fator de risco que mais justifica a inter-relação entre trabalho de parto prematuro e a periodontite (Willians et al. 2000). No mecanismo de trabalho prematuro, existe uma infecção previamente instalada, que por ação de endotoxinas, bactérias orais ou outros fatores microbiológicos desencadeiam um processo inflamatório, processo este também presente na periodontite. Uma vez instalada, a inflamação promoverá o aumento de citoquinas pró-inflamatórias, assim como a ativação de células como macrófagos e neutrófilos (Lopatin et al. 1980). Estes elementos citados são também caracterizados nos processos das periodontopatias. Durante o desenvolvimento desta inflamação podem ocorrer interferências de fenômenos como os da hemorragia ou isquemia placentária. Logo, a ativação destas células irá desencadear a produção de enzimas também presentes na periodontite, que juntamente com a ação do TNFa, levará a produção de prostanóide (Kent et al. 1994). Em níveis elevados, os prostanóides podem desenvolver uma contração uterina, caracterizando um trabalho de parto prematuro; ou sob a ação de proteases poderá levar a uma ruptura prematura da membrana (Bejar et al. 1981). Já foi demonstrado que o aumento nos níveis de prostaglandina, principalmente a prostaglandina E2, está descrito na evolução da periodontite, onde a mesma eleva o processo de reabsorção óssea. Assim, a semelhança entre os processos da periodontite e infecção são interessantes e a presença da prostaglandina para tais processos é extremamente importante (Williams & Offembacher 2000). Sendo assim, podemos concluir que a infecção é um fator de risco importante. Dessa forma, a doença periodontal pode ser incluída como um fator de risco de extremo valor para o mecanismo de indução do parto prematuro em crianças de baixo peso. A presença de células inflamatórias durante a inflamação periodontal, elevando a concentração de prostaglandina, e enzimas proteolíticas são fundamentais para o início do trabalho de parto prematuro. 5. Bibliografia Andrews WW, Goldenberg RL, Hauth JC. Preterm labor: emerging role of genital tract infections. Infect Agents Dis 1995: 4:196-211. Andrews WW, Hauth JC, Goldberg RL, Gomez R, Romero R, Cassell GH. 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