3795 INDICADORES DE DESEMPENHO, QUALIDADE(S) E
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Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 INDICADORES DE DESEMPENHO, QUALIDADE(S) E MELHORIA Virgínio Sá- Universidade do Minho/IEP [email protected] Resumo A definição de sistemas de indicadores de desempenho que reconheçam e captem as diferentes faces d ae s c o l ae nq u a n t o“ o r g a ni z a ç ã oe du c a t i vac ompl e x a ” ,i s t oé ,q u ec a pt e mn ã oa p e na sas uaqu a l i d a de científica e pedagógica, mas também a sua qualidade democrática (Afonso, 2002), constitui hoje um dos principais desafios na agenda do Estado Avaliador. A construção de tais sistemas de indicadores deve ancorar-se, entre outros suportes, nos dados da investigação disponível. Contudo, e ao contrário do que subentendem as perspectivas mais gerencialistas e tecnocráticas, em educação não existe um “ mo de l oe xp l i c a t i v o ”s uf i c i e n t e me n t ec on s e n s u a l i z a do a partir do qual se possam derivar sistemas de indicadores capazes de reconhecer as distintas qualidades que compõem a escola. Nesta comunicação pretende-se confrontar diferentes lógicas de regulação inerentes aos distintos processos avaliativos e articula-las com os factores que, com base na literatura específica, devem ser considerados na criação de um sistema de indicadores. Pretende-se, nomeadamente, explorar as considerações políticas, técnico-científicas e práticas, relevando as suas tensões e contradições internas. 1. As pressões performativas e a centralidade da agenda avaliativa Ao longo das duas últimas décadas, em geografias sócio-políticas muito diversas, a agenda avaliativa e as pressões performativas, nas suas diferentes configurações e domínios de incidência, têm vindo a configurar-se como um dos vectores estruturantes dos discursos, das propostas e das medidas de política educativa.1 As razões deste aparente consenso em torno da urgência da avaliação educacional em geral, e da avaliação das escolas em particular, inscrevem-se num quadro de racionalidades plurais 2 que evidenciam lógicas em tensão, umas 1 De resto, Dias Sobrinho (2000: 184) considera mes moq ue“ adé c a daden ov e nt af oic h a ma d aadé c a d a d aa va l i a ç ã o” . 2 Num esforço de inventariação dos factores subjacente sà“ pr e s s ã op a r aaa va l i a ç ã od a se s c o l a s ” ,Az e ve do ( 2 00 7)di s c r i mi nad oz e“ q u e s t õe s ”qu earruma em três grandes categorias: i )“ p ol í t i c a s ” ;i i )“ s o c i a i s ” ;i i i )e “ e c o nó mi c a s ” .Ne s t al i s t a g e mi n c l ue ms ead e s c e nt r a lização e a autonomia e a correlativa prestação de contas; a reivindicação de informação por parte do consumidor como condição para práticas de escolha informadas; a assunção da escola c o mo “ un i d a d ec r í t i c a ”a s s o c i a da a o se s t u do ss o br eo “ e f e i t oe s t a be l e c i me n t o ” ;a spr e o c up a ç õ e sc oma( ba i x a )“ p r od ut i v i d a d e ”d a se s c ol a se mc on t r a s t ec o mos( s up os t os ) e l e va do si nv e s t i me nt o sp úb l i c o s ;o“ i n s uc e s s o”d ae s cola em assegurar o sucesso de todos; a avaliação e nt e n di dac o mo“ e s t r a t é g i ad emarketing” ;o( s up os t o )de s f a s a me n t oe nt r ea se x i g ê n c i a sd o“ mu n dod o t r a b a l ho ”eao f e r t ae d uc a tiva das escolas; a crise de confiança na escola decorrente, nomeadamente, da sua “ ma s s i f i c a ç ã o” ;aa va l i a ç ã o( s é r i a )c omoum c on t r a p on t oà sf o r ma s“ p r e gu i ç os a s ”dea va l i a ç ã o( e x .o s rankings); as pressões internacionais e aa v a l i a ç ã oc o moa l t e r n a t i v aà“ ve r i f i c a ç ã od ac o nf o r mi d a d e ” ;a avaliação como factor de melhoria e como condição para o desenvolvimen t ode“ c omu ni da de sp r o f i s s i on a i s ” (p. 21-22). 3795 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 mais referenciáveis às preocupações com a vigilância e o controlo, outras filiadas em agendas emancipatórias e orientadas para a melhoria e desenvolvimento organizacional. Oc o nt e xt o ma c r oe s t r u t ur a le m q ue o “ s ur t o de avaliacionite” ( Es t ê vã o ,2 00 1)e a “ e s qu i z o f r e n i ad ap e r f o r ma t i vi da d e ”( Si mõe s ,2007) se vêm desenvolvendo constitui um dos topos e ma n c i p a t ó r i o ” ,q ue r f a c t or e sf o r t e me n t ec o n di c i o na n t e sd as u as ub or di n a ç ã oq ue raum “ 3 aum “ topos r e g ul a t ó r i o” . Ora, como refere Ball (2002: 4), reportando-se sobretudo ao contexto i ng l ê s ,“ o se l e me nt osc ha v ed o‘ p a c o t e ’d ar e f orma da educação- e isto aplica-se com igual vigor e importância a escolas, colégios e universidades- são o mercado, a capacidade de gestão e 4 ap e r f o r ma t i vi da d e . ”Pa r ae s t ea u t o r ,a“ pe r f or ma t i v i d a deéumat e c no l o gi ap ol í t i c a , uma cultura e um modo de regulação que se serve de críticas, comparações e exposições como meios d ec o nt r o l o,a t r i t o e mu da n ç a ”( i b i de m) .Ac r e s c e n t ad e po i s Ba l lq ue o s“ t e r r o r e s da p e r f o r ma t i v i d a de ”p od e mi mp l i c a rv á r i o sr i s c o spa r aa“ n a t u r e z adaa l mad op r o f e s s o r ”ep od e m 5 i nd uz i r“ f a b r i c a ç õ e s ” d i v e r s a s .Ne s t ec o nt e xt o,a“ ge s t ã od ai mp r e s s ã o”p od es ob r e p or s eà s relações baseadas na autenticidade. De resto Ball (2002: 12) afirma mesmo que “ O qu eép r o du z i d oéu me s pe c t á c u l o ,o uoq ue p od e r í a mosc on s i d e r a ruma‘ f a n t a s i ae nc e n a d a ’( But ler, 1990), que está lá apenas para ser vista ej u l ga d a . ” Co nt ud o ,a“ ge s t ã od ai mp r e s s ã o ”p od ei mpl i c a rd i s p e n d i o s a s“ op e r a ç õe sd e c os mé t i c a ”( Es t ê vã o ,20 01 ) ,c o m ac o ns e q ue n t ed e s l ocação de recursos para fins outros que não aqueles que, presumidamente, estão no cerne das organizações educativas. A própria aquisição e o r ga n i z a ç ã ode“ i nf or ma ç ã op e r f o r ma t i va ”p od ee nvolver custos tão elevados que exaure os recursos necessários à promoção de uma oferta educativa de qualidade. Como afirma Elliot (1996: 15), citado por Ball (2002: 12), a obtenção d a q ue l ai n f o r ma ç ã o“ c o ns o met a n t ae n e r gi a , que reduz drasticamente a energiad i s po ní v e lpa r as ef a z e r e m me l ho r a me n t o spa r as ee v ol ui r ” . Daqui podem resultar, como advertimos noutros momentos (Sá, 2004; 2008; 2009), alguns “ e f e i t o sp e r ve r s os ”e“ da n osc ol a t e r a i s ”q ue ,entre outras consequências, podem redundar numa qualidade desqualificada. Nav e r d a de ,a“ di s p e r s ã os e mâ nt i c a ”d oc on c e i t oqualidade (Manilla, 1989), associada à sua despolitização, têm facilitado a sua instrumentalização ao serviço de agendas e de agentes muito diversos. Por exemplo, a imposição de uma versão hegemónica (e parcial) da qualidade- a sua versão mercadorizada importada do mundo empresarial- tem conduzido ao privilegiar de 3 Expressões que tomamos aqui de Estêvão (2001: 159). 4 Ba l l( 20 02 :6 )e s c l a r e c equ e“ Ast e c n ol og i a spo l í t i c a senvolvem a distribuição calculada de técnicas e a r t e f a c t o spa r aor g a ni z a rf o r ç a sec a pa c i d a d e sh u ma n a se mr e d e so pe r a c i on a i sef u nc i o na i sd ep od e r . ” 5 Es c l a r e c eBa l l( 20 02 :15 )q uea s“ As fabricações são versões de uma organização (ou pessoa) que não e xi s t e -n ã oe s t ã o‘ f o r adav e r d a de ’ma st a mb é mn ã o transmitem simplesmente explicações directas e verdadeiras- elas são produzidas prop os i t a d a me n t ep a r a‘ s e r e me x p l i c á v e i s ’ . 3796 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 indicadores de desempenho que valorizam sobretudo o que é mensurável, gerando sombra e opacidade sobre outras faces do poliedro educativo. Assim, por exemplo, como referimos noutro texto (Sá, 2008), quando a qualidade é medida em termos de resultados escolares, e estes são aferidos a partir dos desempenhos nos exames nacionais, as escolas serão induzidas a concentrarem-se na preparação dos alunos para que estes sejam bem sucedidos nesses mo me nt o sd e( i n) ve r da de .Es t e“ t e a c ht ot h et e s t ”( Ba l l ,1 99 3:1 07 ) ,i nd uz i r á ,e nt r eo ut r a s consequências, a secundarização das aprendizagens mais dificilmente mensuráveis como, por exemplo, a educação para a democracia e para a participação, o desenvolvimento do espírito crítico, desenvolvimento global da personalidade.6 Na verdade, os exames, além de efectuarem u ma“ us u r p a ç ã od oc u r r í c u l o ” ,c o moa f i r maSo br i n ho( 2 00 0:9 7) ,“ a c a ba ml a nç a nd oumavi s ã o embaçada sobre o ensino e a aprendizagem e empobrecem os objectivos curriculares a fim de p od e r e m me d i l o s ” ,de s t af or ma c on t r i bu i n do para mais uma das muitas formas de desqualificação da qualidade que supostamente perseguem. Como nos ensina Gentilli (1997, p. 1 72 ) ,“ O s i gn i f i c a d o da q ua l i d a de e ,c o n s e q ue ntemente, a definição dos instrumentos apropriados para avaliá-la, são espaços de poderedec o nf l i t oqu enã od e ve ms e ra b a nd on a do s . ” Reconhecer a natureza política e pluridimensional da qualidade tem, portanto, implicações diversas, desde logo, como se realça na citação, p a r aa“ de f i n i ç ã odo si n s t r ume n t o sa p r o pr i a d os p a r aa va l i á l a ” . 2. Indicadores de desempenho e qualidades plurais Ap e s a rde p a r e c e rc o ns e n s ua la f i r ma rqu e“ u m mo de l od ed e s e mpe n ho nã op o de s e r estabelecido sem se ancorar fortemente na invest i g a ç ã oe x i s t e nt e ”( Cl í ma c o ,1 99 1 b:7 )equ ea s “ performances escolares só têm sentido no quadro de um modelo incontestável de eficácia e s c ol a r ”( Fi ga r i ,1 99 9:14 5) ,av e r da d eéqu e ,c o mo afirma de seguida o mesmo autor, tal mo de l o“ a i nd anã oe s t ác o ns t r u í d o ”( i de m,i bi de m) . Na literatura que explora os processos de organização de sistemas de indicadores confere-se habitualmente um espaço à discussão dos conceitos de referente e de referencial e ao processo de referencialização (Figari, 1996; 1999). Contemplam-se também algumas das “ c on s i de r a ç õe s ”qu edevem presidir à escolha dos sistemas de indicadores. Nutall (1994: 22), p ore xe mp l o, de f e n deq u ehát r ê s“ c o ns i de r a ç ã o ”bá s i c a sar e s pe i t a rn ac r i a ç ã odeu ms i s t e made i nd i c a d or e s :i )“ c on s i de r a ç õ e sp ol í t i c a s ” ;i i )“ c o ns i de r a ç õ e st é c ni c o/ c i e n t í f i c a s ” ;i i i )e 6 Michael Apple (2001), numa entrevista concedida a Michael Shaughnessy, Kathy Peca e Janna Siegel, a s s u mi n do u maf r o n t a lde n ún c i ad oq uev e m de no mi n a n d od e“ i nd i v i du a l i s mo po s s e s s i v o” ,a f i r mo u: “ Ac t ua l me nt e ,d e ba i x o da i nf l uê nc i a do n e o l i b e r a l i s mo,o v e r da d e i r os i gn i f i c a do d ac i da d a ni af o i radicalmente transformado. Nos dias de hoje o cidadão é um simples consumidor. O mundo é visto como um v a s t os up e r me r c a do . ”( p . 17 ) 3797 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 “ c on s i de r a ç õe spr á t i c a s ” .Nop r i me i r oc a s ooa ut or inclui a necessidade e legitimidade do poder político em obter informação sobre o funcionamento do sistema de modo a perceber em que medida os objectivos previamente definidos estão a ser alcançados. As considerações técnicocientíficas centram-se sobretudo na definiç ã o d o “ mod e l o e x pl i c a t i v o” e n as ua operacionalização. As considerações práticas incluem a sua exequibilidade com custos razoáveis e a produção de informação de fácil leitura e em tempo oportuno. Considera Nuttall (1994) que, se responder aos req ui s i t o sd ec a d au mad a s“ c on s i de r a ç õ e s ”de modo independente já levanta uma série de questões, satisfazer em simultâneo as três “ c on s i de r a ç õe s ”r e v e l a s eu mami s s ã oq ua s ei mpo s s í vel, dada a sua natureza potencialmente conflitual. Efectivamente, quando um sistema de i nd i c a do r e sp r o c ur ap r o du z i ra“ i n f o r ma ç ã o” desejada pelos decisores políticos corre o risco de s ede i xa re n l e a rpe l a s“ q u e s t õe sn amo da ”e m prejuízo de dimensões mais substantivas. Quando as questões mais pragmáticas dos custos e da simplificação para efeitos de consumo ganham a dianteira, compromete-se o rigor e a validade da análise e aumentam-se os riscos da corrupção dos indicadores. Responder aos requisitos da validade, aumentado o número de indicadores e diversificando os campos de recolha de informação, pode reforçar a sua consistência científica, mas conflitua com a exigência de rapidez, baixo custo e simplicidade da informação requerida. Por isso, conclui Nuttall (1994: 3 8) ,“ I nt h ef i n a la n a l y s i s ,t h e n ,t h eq ua l i t yo ft h esystem is likely to be crucially determined by those who hold the purse-string, almost always the policy-makers on behalf of their c on s t i t ue n t s . ” Subjacente a um sistema de indicadores, de forma explícita ou implícita, encontra-se sempre não apenas uma concepção de escola (Lima: 2002)7, mas também uma concepção de educação. Contudo, como esclarece Nutall (1994), apesar dos significativos contributos da investigação para o estabelecimento de relações de associação (embora dificilmente de causalidade) entre diversas variáveis potencialmente associadas ao d e s e mpe n hod a sor ga n i z a ç õe se d uc a t i v a s ,“ no g e n e r a lmo de loft hee d uc a t i onp r o c e s s… c ur r e nt l ye x i s t s ”( p. 25 ) . Pori s s o, a nc or a ru ms i s t e ma de indicadores numa mera racionalidade técnico-científica amputa a compreensão da complexidade do processo de criação de um sistema de indicadores. Importa por isso reconhecer, na linha de Sobrinho (2000: 89) que a avaliação, “ Ai nd aq uet a mbé ms e j au ma questão técnica, muito mais importantes são a sua acção e seu significad op ol í t i c o s . ”Con t u do ,a h e g e mo ni ada“ e pi s t e mol og i ap os i t i v i s t a ”s ub j a c e nt ea o“ pa r a d i g mado mi na nt edea v a l i a ç ã o c on t á b i leg e r e nc i a l ”( Li ma ,Az e ve d o& Ca t a ni, 2008: 20), não apenas tecnocratiza o processo, 7 Como afirma Lima (2002: 17), “ aa va l i a ç ã oe d u c a c i o na ldea l u no s ,e s c olas, ou departamentos, entre outros elementos, realiza-se necessariamente por referência, implícita ou explícita, a concepções, imagens ou r e pr e s e nt a ç õ e sd eo r g a n i z a ç ã oe s c ol a r ” . 3798 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 como o impede de reflectir a pluralidade de qualidades que habitam em cada escola. Na verdade, com expressivamente defende Afonso (2003: 51): “ Sec on s i d e r a r mosqu eaq ua l i d a dedae d uc a ç ã oescolar não se consubstancia apenas na sua qualidade científica e pedagógica, mas também, e em simultâneo, na sua qualidade democrática, não podemos deixar de exigir que a avaliação das escolas públicas se estruture através de procedimentos mais complexos, diversificados e muito distintos daqueles em que se têm baseado os exames externos e s t a n da r di z a d o soup a dr on i z a do s . ” O reconhecimento da pluralidade de qualidades da escola é, portanto, incompatível com as f o r ma spo br e se“ p r e gu i ç os a s ”d ea va l i a ç ã o( Az e v e do ,2 00 7) ,c o md e s t a q uepa r ao s“ r a nk i n gs d a se s c ol a s ”c o ns t r u í do sap a r t i rd osr e s u l t a d osdos exames do 12º ano de escolaridade, tão do agrado de certos segmentos da nossa comunicação s o c i a l .Es t af o r mad e“ pu bl i c i d a d ee ng a no s a ” ( Sá& An t u ne s ,2 0 07 ) ,a l é md oss e u s“ e f e i t o sdi s c i pl i n a do r e sn a se s c o l a s ”( Sa nt i a g oet al., 2004), pode ainda resultar no que Miller (1990), cit a dop orWa l s h( 1 99 4 ) ,de s i gn ap or“ I c a r u s 8 p a r a do x” . As s u mi rae s c o l ac o mo“ o r g a ni z a ç ã oe d uc a t i v ac ompl e x a ”( Af o n s o,2 00 2;20 03 ) ,o u c omo“ l ug a rd evá r i o smu nd os ”( Es t ê vã o,20 0 4) ,o ua i n da ,n a sp a l a vr a sd ome s moa u t or ,c omo “ or ga n i z a ç ã of r a c t a l i z a d aemu l t i di s c ur s i v a ”( Es t ê v ã o ,19 98 ) ,c o m todas as implicações que tais concepções de escola acarretam para a pluralização da qualidade e dos princípios de justiça e de bem comum que aquela deve corporizar, obriga seguramente a reequacionar uma certa engenharia da avaliação, assente numa racionalidade tecnocrática, que absolutiza modelos e nega, ou oculta, a sua natureza mais profunda, isto é, que constituem opções entre muitos outros futuros possíveis. O reconhecimento da pluralidade de mandatos da escola, constituindo um requisito prévio à pluralização da(s) qualidade(s), não se converte automaticamente em dispositivos de avaliação capazes de registar o largo espectro de excelências que aquela pode abrigar. Como admite Natércio Afonso (2002: 54), “ Ép r o vá v e lqu eod e s e mpe n hoo r g a ni z a c i on a lea‘ q ua l i d a de ’deumae s c o l aon depr e d o mi na m preocupações com a equidade e a coesão social não sejam adequadamente reconhecidos por um programa de avaliação que privilegia, ao nível da definição dos padrões de referência, a l i b e r d a d ed ee s c o l ha ,ae f i c i ê nc i aeapr od ut i vi da d e . ” 8 Walsh (1994), inspirando-se em Miller (1990), utiliza a e xp r e s s ã o“ p a r a d ox od eÍ c a r o ”pa r as er e f e r i ra o risco que uma excessiva focalização numa visão reducionista do sucesso pode ter para a sobrevivência das organizações anteriormente bem sucedidas. A este propós i t o ,Wa l s h( 1 99 4:5 9)a f i r ma :“ Cor p or a t ef a i l u r e s c a nf r e qu e nt l yb es e e nt oh a ver e s u l t e df r oms uc hon e s i de dd e ve l o pme nt s . ” 3799 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 Não sendo possível iluminar, em simultâneo, o largo espectro de excelências, a selecção da face ai l u mi na rde pe n de ,e m úl t i mai n s t â n c i a ,d equ e mc o nt r o l ao“ ho l of ot e ” .Ad mi t i nd oc om Segiovanni et al. (1987), citados por Afonso (2002: 53), que equidade, excelência, eficiência e liberdade constituem valores que constituem o cerne do debate sobre política educativa, resta saber como se arquitecta o edifício educativo com uma adequada distribuição do peso pelos quatro pilares, isto é, sem que nenhum deles soçobre. Ora, como admitem os autores referidos, a p e r ma ne n t e“ t e ns ã o ”e n t r eosvá r i o sp i l a r e storna a realização de tal empreendimento num projecto de difícil consecução. Por seu lado Levin (2002), igualmente citado por Afonso (2002: 54), depois de considerar que os critérios da liberdade de escolha, eficiência, equidade e coesão social podem constituir uma grelha de análise na prestação do serviço educativo, afirma também q ue“ Nã oe xi s t en e nh um s i s t e maó pt i moq uega ranta os máximos de resultados nos quatro critérios. Em última análise, a escolha depende das preferências específicas e dos valores transmitidos por intermédio das instituições democ r á t i c a s . ”Re c up e r a s ea qu i ,ma i sumav e z ,a natureza eminentemente ético-política, quer do edifício educativo, quer dos dispositivos susceptíveis de serem mobilizados para o avaliar. 3. Dispositivos avaliativos e aprendizagem de duplo circuito A repolitização do processo avaliativo densifica a sua complexidade, obrigando à consideração de distintos planos de análise. Já não se trata apenas de pensar a escola como organização aprendente, na linha da single-loop learning, mas de a pensar como organização que aprende a aprender, pressupondo esta uma double-loop learning (Morgan, 1997). Se, no primeiro caso, a organização revela capacidade de monitorar o seu desempenho por referência aos padrões préestabelecidos e de iniciar acções correctivas em relação a eventuais desvios (ênfase nos meiosface técnica), no segundo caso, acrescenta-se a capacidade de auto-questionamento sobre a adequação das próprias normas e objectivos (ênfase nos fins- face política). À tradicional operação de determinação da congruência entre o desempenho e os objectivos, há agora que adicionar uma avaliação que questione os próprios objectivos. Boa parte da discussão em torno das questões da avaliação das escolas (e não só) tende a circunscrever o debate à esfera dos problemas técnicos, onde incluímos o espaço de definição do dispositivo, com especificação do referente e do referido, e de todo o arsenal metodológico com os seus diferentes graus de sofisticação. Neste debate, as questões da validade dos indicadores e da objectividade dos avaliadores tendem a ocupar o núcleo da agenda. Contudo, e não obstante a relevância destas questões, o essencial parece ser remetido para as margens, ou ficar mesmo fora de cena, isto é, a intensidade da luz que se projecta sobre o modelo e o modo de avaliar, acaba por invisibilizar (e naturalizar) o avaliado. Na verdade, um dispositivo de 3800 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 avaliação, sendo uma forma de ver, constitui simultaneamente uma forma de não ver. No caso da avaliação das escolas, por exemplo, discute-se com frequência a adequação dos indicadores em relação às dimensões, mas problematiza-se muito pouco as próprias dimensões, e menos ainda a hierarquia das metas e dos objectivos educativos.9 A preocupação em seguir o caminho certo para se alcançar uma meta não dispensa a necessidade de, a todo o momento, nos interrogarmos sobre a bondade d ap r ó pr i ame t a .Pori s s o ,c o mod e f e nd eNu t a l l( 1 99 4:1 9) ,“ we s h ou l dd r o pp r e c o nc e pt i on sa bo utwha t‘ i nd i c a t or s ’a r ea n dr e c o gn i z et h a ti ti st h e i ruse that 10 ma k e st h e m‘ i n di c a t o r s ’ . ” A avaliação educacional em geral, e a institucional em particular, pode servir diferentes agentes e agendas, realçando-se, num extremo, a avaliação orien t a d ap a r aoc o nt r o l oa s s e nt enu m“ j u í z o a ut o r i t á r i o”( Wa l s h ,1 99 4)e ,n oo ut r oe x t r e mo ,umaa v a l i a ç ã os ub or di na d aàmelhoria (Costa & Ventura, 2005) e impulsionadora da emancipação (Afonso, 2005a; 2005b) e do d e s e n vo l vi me nt oh uma n odo s“ a t or e s s u j e i t o s ”( Ga s paretto, s/d) implicados no processo. Não está na sua natureza servir uns ou outros. Usá-la para fin sd e“ p r e mi a ç ã o”e“ p un i ç ã o ” ,p o r exemplo, constitui um dos (ab)usos que pode gerar o seu desvirtuamento pois, nesse caso, c omod e nu nc i aGa s p a r e t t o( s / d ) , “ I s s or e s u l t anaampliação da resistência ao processo avaliativo eas u aa go n i z a ç ã oemo r t e . ”( p.2 ) ,oue nt ã o,aa v a l i a ç ã ot o r n a s en um j o god o“ ga t oed or a t o” (Ventura, 2006), podendo mesmo gerar alguns efeitos colaterais (Sá, 2009). No caso português, como escrevemos recentemente (Sá, 2009: 101),“ ai n t e r c o ne x ã odeum conjunto diversificado d er e c e n t e sme d i d a sdepo l í t i c ae d uc a t i v a[ …] ,p od es e ri n du t o r a ,n ã oa pe n a sd e“ r i va l i d a d e i nt e r i ns t i t u c i o na l ”( Li maet al., 2008), mas militar também no sentido de gerar excluídos. ” 4. À laia de conclusão Comode f e n d eAz e v e do( 2 00 7:16 ) ,“ Asc r i a ç õ e ssociais são sempre muito mais complexas do que os instrumentos de que dispomos para a sa va l i a r . ”Ne s t ac i r c un s t â nc i a ,ea pe s a rda impressionante proliferação verificada na produção de sistemas de indicadores de 11 desempenho , a vigilância crítica deve constituir a postura que orienta a avaliação dos 9 Um exemplo paradigmático do efeito de ofuscação da face técnica sobre a face política da avaliação pode s e re n c on t r a d on os“ c o n t r a di t ór i os ”pr o du z i d osp e l a se s c olas a propósito das avaliações externas realizadas p e l aI GE.Com f r e qu ê n c i aa se s c o l a s“ q ue i x a ms e ”d eq uenã os e“ me di u”b e me s t eoua q ue l ea s p e c t o,ma s r a r a me n t es e“ i nt r ome t e m”n ap r ob l e ma t i z a ç ã od oq ues ea v a l i aedopa r aqu es ea va l i a . 10 Importa referir que Nutall (1994: 19), ao desenvolver este raciocínio, reconhece que se inspira em Selden (1991), autor que considera ter tido o mérito de t e r“ de s a t a d oon óg ór d i o ”dad i s c us s ã oe mt o r no desta questão. 11 Walsh (1994: 51), baseando-se em estudos de outros autores, informa-nos que na década de 80 se assistiu a um rápido crescimento do número de indicadores de desempenho em diversos serviços públicos. Por exemplo, no caso do Serviço Nacional de Saúde inglês, passou-se de 70 indicadores em 1980 para 450 em 1988 e no livro banco da despesa pública passou-se de 500 em 1985 para 1800 em 1987, data a partir da qual, acrescenta oa u t o r ,“ n oo newa sc ou nt i n ga nymo r e ” . 3801 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 processos e dos produtos educativos, bem assim como os usos (e abusos) que se fazem dos seus resultados. Como esclarece Walsh (1994: 56), “ Pr o d uc t i o np r o c e s s e si nt h epu bl i cs e c t ora r e f r e qu e n t l yc o mp l e xa n du n c l e a r ” .Con s i d e r apo risso o mesmo autor que “ i ti si n a pp r o pr i a t e and, perhaps, unfair to relate reward to performance if we are unable to develop very clear u nd e r s t a n di n gso ft h ec a u s e so fe f f e c t i v e ne s s . ”Con t u d o,or e c o n he c i me nt od e s t aparcialidade e subjectividade não significa excluir a possibilidade e necessidade de avaliação das escolas e, me n osa i n da ,c e de rà “ e s p i t e mo l o gi ap os i t i v i s t a ”( Li ma ,Az e ve d o & Ca t a ni ,20 08 :2 0) s u bj a c e n t eà sde r i v a sge r e n c i a l i s t a s ,à sob s e s s õe smé t r i c a s( “ q ua n t o f r e n i a ” )eà sp r e s s õe s performativas que impregnam a pandemia das reformas educativas. O debate em torno da avaliabilidade da escola, além do reconhecimento da sua natureza “ or ga n i z a ç ã oc omp l e x a ” ,t e mi gu a l me n t edei nc orporar uma reflexão em torno dos limites à me d i ç ã oe me du c a ç ã o ,b e mc omo a s“ e x t e r na l i d a de s ”i n e r e nt e sà p r e s t a ç ã o des e r vi ç os p úb l i c os .Co moe s c l a r e c eWa l s h( 19 94 :5 4) ,“ Thedi fficulty in defining the public realm is not technical, but based in the nature of the public r e a l ma st h es i t eo fc on f l i c t i ngva l ue s . ”Poro ut r o lado, mesmo que tecnicamente fosse possível medir a eficácia da prestação do serviço educativo, ainda havia que considerar as implicações éticas de fazer experiências com as pessoas. Po rou t r ol a d o,“ a‘ n a t u r a l i z a ç ã o’s oc i a leé t i c ad apr ob l e má t i c adaq ua l i d a de ”( Co r r e i a ,19 99 : 1 6)i mpõ eum “ c o n s e n s oc og ni t i vo ”qu eob nu b i l aap e r c e p ç ã od asua função de legitimação e impede a visão da sua natureza políptica. Contudo, considerando q uea“ q ua l i d a de ”po d en ã o p a s s a rde“ u man ov ar e t ó r i c ac on s e r v a d or a ”( Ge n t i l l i ,1 9 97 ) ,i mp õe s eas u aadjectivação, até p or q u eama l haa va l i a t i vaqu ea p a nh aa“ q ua l i d a deme r c a nt i l ”po den ã od a rc o n t ada“ qu a l i d a d e d e moc r á t i c a ” . Referências bibliográficas AFONSO, A. J. (2002). Políticas Educativas e Avaliação de Escolas: por uma Prática Avaliativa menos Regulatória. In J. A. Costa, A. N. Mendes & A. Ventura. Avaliação de Organizações Educativas. Aveiro: Universidade de Aveiro. AFONSO, A. J. (2003). Avaliar a Escola e a Gestão Escolar: Elementos para uma Reflexão Crítica. In M. T. Esteban. 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