A raça Aberdeen Angus - Aberdeen Angus
Transcrição
A raça Aberdeen Angus - Aberdeen Angus
magazine 01.2010 A raça Aberdeen Angus Um testemunho sobre a excelência da sua qualidade José Estevam Matos Departamento de Ciências Agrárias, Centro de Biotecnologia Universidade dos Açores Introdução Contactei, pela primeira vez, com a raça Aberdeen Angus, na República da África do Sul. Por lá, emigrado, à força, trabalhei então, como “farming manager”, para um grupo de fazendas de produção de carne, de 2.000 vacas de ventre, cujo objectivo principal era o de produzir bezerros desmamados para abate; cerca de 1.000 por ano. A maior parte das vacas eram das raças Africânder e Brahaman, animais muito bem adaptados ao clima quente e árido, como era o caso, no Calaári, junto às cidades de Kuruman e Vryburg. Estas vacas eram cruzadas com toiros de raça europeia, das raças Aberdeen Angus, Shorthorn (de carne), Hereford e Simentaler. Dessa minha experiência resultou a convicção da excelência do Angus, da sua excelente adaptação a condições difíceis, dando origem a animais que manifestavam grande vigor híbrido; muito boa conformação, sendo muito procurados pelo mercado do “baby beef” pela excelência da sua carne. Já nos Açores, e mais recentemente, sugeri que se realizassem alguns cruzamentos AngusxHolstein, na Granja da Universidade dos Açores, com o principal objectivo de se obterem vacas de amamentação, com a finalidade comprovar a sua mais valia em cruzamentos com uma terceira raça terminal. Infelizmente, porque nem sempre conseguimos os financiamentos necessários para realizar este tipo de trabalhos, não foi possível prosseguir com o trabalho. Pudemos no entanto comprovar a mais valia da raça Angus na cobrição das novilhas de leite, no que toca à facilidade partos. São muitos os aspectos, factores, ou caracteres, que po- dem contribuir para o sucesso de uma raça na exploração de carne: No Período de Cria • Fertilidade • Longevidade • Tamanho da Vaca • Peso do Vitelo ao Nascimento • Facilidade de Parto • Habilidade materna • Requerimento total de nutrientes/ingestão/eficiência No Período de Recria e Engorda • Índice de Crescimento • Eficiência conversão alimentar • Capacidade de ingestão • Peso da carcaça • Idade ao acabamento • Classificação final da carcaça No Retalhista/Consumidor • Rendimento em peças nobres (de 1ª) • Tenrura • Sucosidade • Marmoreado • Textura • Flavour (Gosto, sabor, cheiro) • Cor da carne e da Gordura Segundo Schiefelbein (1998), é maior o peso económico das características relacionadas com a 1ª fase, a de cria 15 magazine Gráfico 1. Importância relativa dos caracteres relevantes para a produção de carne bovina, por fases (Schiefelbein,1998) (vaca/vitelo). Obviamente, este maior peso económico, têm muito a haver com os custos de manutenção, especialmente das vacas, incluindo a sua cria até ao primeiro parto, período seco e de lactação. (Gráfico 1) Em alguns destes aspectos a raça Aberdeen-Angus destaca-se em relação a outras, nomeadamente relativamente à eficiência biológica/económica, à longevidade, habilidade materna, eficiência, precocidade no acabamento, qualidade da carne (marmoreado, tenrura), aspectos corroborados pelos trabalhos de diversos investigadores. Convicto de tudo disto, mas também do facto de que não existe no Mundo uma única raça que seja superior em todos os caracteres considerados importantes na produção de carne, tentarei aqui apresentar argumentos a favor da vantagem de utilizar o Angus para a obtenção de uma carne de excelência, quer em raça pura, quer em cruzamento, em sistemas de pastoreio, em particular no caso 01.2010 dos Açores, mas não só! Eficiência Biológica/Económica A investigação tem demonstrado que a eficiência biológica, embora muito importante, nem sempre é sinónimo de eficiência económica (lucro). Taylor (1994) refere que o máximo de lucro é quase sempre obtido antes de se atingir o máximo de eficiência biológica. Van Oijen et al. (1993) num estudo de eficiência económica (valor de output por $100 de impute) comparou 3 grupos de vacas, do mesmo tamanho e tipo, com três níveis de produção leiteira diferentes, baixo, médio e alto, alimentadas de acordo com o seu nível de produção e chegaram à conclusão que as mais rentáveis eram as de baixa, ou média, produção leiteira; apesar de, obviamente, os vitelos filhos de vacas de maior produção crescerem a ritmo superior. Notter (1984) chegou também à conclusão que um nível de produção de 5,5 kg de leite/dia poderia ser considerado suficiente para que o vitelo tivesse um nível aceitável de crescimento. A eficiência biológica nas explorações de carne é principalmente reflectida pelo número de vitelos desmamados por vaca exposta ao toiro. O peso dos vitelos desmamados é geralmente de importância secundária na definição da eficiência biológica de sistemas integrados, mas desempenha um papel importante na definição da eficiência económica para o produtor de vitelo em sistema de amamentação natural. Várias medidas de eficiência de um rebanho, ou de animais tomados individualmente, têm sido descritas na literatura. Estas medidas, apesar de serem avaliadas por diferentes metodologias de cálculo, procuram levar em consideração as diferenças em peso (ou tamanho) e ou requerimentos nutricionais dos animais. São utilizadas, por exemplo, as relações entre os pesos dos bezerros ao desmame, ou ao abate, com o peso vivo das vacas na altura do parto, no início da época de reprodução, ou no mo- 17 mento de desmame dos bezerros, bem como com o consumo total, ou relativo, de energia, capacidade de ingestão, eficiência alimentar (Kress et al., 1990; Maddock e Lamb S/data). Medidas de eficiência biológica As medidas de eficiência biológica da produção de gado bovino de carne até ao desmame, comummente utilizadas em diversos estudos são: • Kgs de vitelo desmamado por cada vaca em reprodução; • Kg de vitelo desmamado por kg de vaca em reprodução; • Kg de vitelo desmamado/(ou abatido) por cada vaca em reprodução/por unidade de energia consumida; • Kg de carcaça de vitelo, por cada vaca em reprodução/por unidade de energia consumida; • Kg de carne limpa, por cada vaca em reprodução/por unidade de energia consumida. São importantes os indicadores de eficiência alimentar tais como, como a Eficiência de Conversão Alimentar (Feed Conversion Efficiency - FCE) e a Ingestão Alimentar Residual (Residual Feed Intake - RFI). Este último indicador, o RFI, definido como sendo a diferença entre a ingestão alimentar verificada e a predita com base nas necessidades de produção e de manutenção, tem vindo a tornar-se a medida de eleição para avaliar a eficiência alimentar do gado bovino de carne, uma vez que é independente do crescimento e do peso corporal. Este carácter é moderamente herdável e é um bom candidato à selecção genética com base em marcadores, dada a variabilidade da sua expressão nas diferentes raças e entre indivíduos da mesma raça (Crews, 2005; Moore et al. 2009). O consumo de energia pelo conjunto vaca/vitelo na 18 fase de ciclo produtivo de cria representa 72% do consumo energético total nos sistemas de amamentação natural e 70-75% da energia consumida pelo rebanho das vacas é usado para a sua própria manutenção (Ferrell e Jenkins, 1982), sendo que as vacas de raças de elevada estatura/ peso, elevado nível de produção leiteira e massa corporal mais magra, têm requisitos energéticos mais elevados por unidade de peso corporal, do que as vacas de estatura média, níveis mais baixos de produção leiteira e com maior quantidade de massa gorda corporal. Os níveis de ingestão, e as necessidades de energia e proteína são influenciados pelo tamanho corporal das vacas. Quando o tamanho aumenta de 454 para 635 kgs de peso vivo, a ingestão, de energia, e as necessidades proteicas aumentam 23%, 19% e 13%, respectivamente. Vacas maiores implicam maiores imputes, em parte porque têm um maior massa corporal para ser mantida. De forma semelhante vacas com maior produção leiteira têm custos adicionais, associados com as necessidades proteicas e energéticas, que poderão não ser totalmente compensados por maiores níveis de crescimento dos vitelos. Para além disso o status energético das vacas tem um grande impacto a nível reprodutivo (Short e Adams, 1988) e, nos sistemas de produção de carne, o sucesso reprodutivo é da maior importância. O tamanho óptimo do gado carne é um assunto muito debatido entre os especialistas na matéria. As raças de gado de carne variam muito no seu tamanho e o tamanho óptimo depende do sistema de produção, nomeadamente dos níveis de ingestão de matéria seca que estes proporcionam, períodos de carência alimentar e de stress ambiental. Uma explicação para os levados níveis de ineficiência energética dos sistemas de produção de carne é os elevados custos de manutenção dos rebanhos: 71% do dispêndio de energia na produção de carne é usada para a manutenção magazine 01.2010 QUADRO 1. Energia metabolizável (EM) requeridas para a manutenção de vacas prenhes, não lactantes, de quatro tipos biológicos Raça da vaca Requisitos de manutenção (quilo calorias de EM, por kg de peso metabólico, por dia) Angus x Hereford 130 Charolês x Raça Inglesa 129 Jersey x Raça Inglesa 145 Simentaller x Raça Inglesa 160 Farrel e Jenkins, 1984 . J. Anim. Sci. 58:234. dos animais, e 50% da energia dispendida na produção de carne é usada para manter a vaca. No entanto a investigação tem comprovado haver diferenças genéticas entre as raças (Farrell e Jenkins, 1984;1985). (Quadro 1) Sendo que as vacas de maior nível de produção leiteira, têm maiores exigências de manutenção quando em lactação, mas também quando secas e que, também, as raças com maior potencial genético para maior produtividade, estão em desvantagem num ambiente mais restritivo do ponto de vista alimentar. Além disso o aumento de massa corporal em raças de elevado índice muscular resultaria em elevado dispêndio energético, o que é demonstrado pelos maiores níveis de dispêndio energético de manutenção de um determinado peso de massa muscular quando comparado com igual peso de gordura (Pullar e Webster, 1977; Thompson et al., 1983; DiConstanzo et al., 1990;1991). Baseados nestes estudos podemos concluir que, vacas com elevados níveis de exigências de manutenção se caracterizam por terem elevados níveis de produção leiteira, elevado peso visceral, elevado peso corporal magro, baixo nível de gordura, elevado nível de output mas elevados níveis de imputes. Pelo contrário as vacas com baixos níveis de exigências de manutenção têm, baixos níveis de produção leiteira, baixo peso de vísceras, níveis baixos de massa corporal magra e elevados níveis de gordura, baixos outputs e baixos imputes. É conhecido que num ambiente de abundância alimentar, em ambiente de conforto, não há diferenças consistentes em eficiência entre os vários tipos biológicos/raças, mas há uma tendência para os tipos biológicos/raças de maior tamanho/peso, com maiores produções leiteiras serem mais eficientes do que os tipos biológicos/raças mais pequenas. Mas que em condições de restrição alimentar e/ ou em ambiente stressante, os tipos biológicos/raças de tamanho moderado e produção de leite moderada tendem a estar melhor adaptadas e ultrapassam em eficiência as raças/tipos de maior peso/tamanho e de maior produção leiteira. Estas conclusões são confirmadas por um estudo extensivo, levado a cabo durante 5 anos, abrangendo 9 raças puras, feito por Jenkins e Farrell (1994), em que estes autores compararam a eficiência biológica, determinada a 4 níveis de ingestão alimentar. O Quadro 2 mostra que, se a ingestão de matéria seca aumentar de 3.500 para 7.000 Kg, por vaca/ano, há uma mudança dramática na eficiência das raças. A 3.500 Kg de ingestão de matéria seca as raças mais eficientes foram a Red Poll e a Angus, mas a 7.000 Kg de ingestão de matéria seca foram as raças de maior porte, Charolês, Simmental, Gelbvieh, Braunvieh e a Limousin, QUADRO 2. Eficiência biológica de nove raças de carne a dois níveis de ingestão de matéria seca Raça Ingestão de matéria seca, Kg/vaca/ano 3.500 7.000 Gramas de vitelo desmamado/Kg MS/ vaca exposta Angus 39 17 Hereford 30 13 Red Poll 47 24 Charolês 27 45 Limousine 33 42 Simentaller 26 42 Gelbvieh 29 36 Braunvieh 33 42 Braunvieh 33 42 Adaptado de Jenkins e Farrell, 1994. J. Anim. Sci. 72:2787 QUADRO 3. Diferenças relativas de apetite entre 9 raças de gado (Regressão da ingestão da matéria seca sob o peso corporal, assumindo-se que os níveis de ingestão são proporcionais ao peso adulto elevado a 0.73) Angus 0.493 Charolês 0.480 Red Poll 0.465 Hereford 0.454 Gelbvieh 0.425 Braunvieh 0.423 Pinzgauer 0.412 Simmental 0.409 Limousine 0.367 lb MS/peso 0.73; Taylor et al., 1981 19 QUADRO 4. Efeito da longevidade das vacas na eficiência económica do rebanho Medida de eficiência Idade máxima (anos) de reforma das vacas Biológica (lb TDN/lb de peso abatido) Económica (custo $/cwt de peso abatido) 7 10.09 74.83 9 9.78 72.12 11 9.55 69.39 13 9.30 68.03 15 9.10 67.57 Adaptado de Kress et al., 1988. J. Anim. Sci. 66 (Suppl.1):175 QUADRO 5. Eficiência pós-desmame em relação a vários pontos de acabamento a) Ponto de Acabamento Grupo/Raça Tempo 207 d Peso de carcaça 333 Kg Produto retalho 210 Kg Pontuação de marmoreado Gramas de ganho de peso vivo/Mcal de EM Red Poll 49 48 47 51 Hereford 54 51 46 57 Angus 50 49 46 54 Limousin 54 54 57 47 Braunvieh 50 51 51 49 Pinzgauer 50 50 50 51 Gelbvieh 48 49 50 45 Simmental 51 52 54 49 52 53 55 49 1,9 2.0 2.4 1.9 Charolês Diff (P<.05) a) b) b Adaptado de Gregory et al. 1994. JAS. 72:1138 A diferença (P<.05) é a diferença aproximada entre médias das raças para haver significância estatística as mais eficientes. Outro dos factores, nem sempre levado em consideração e que muito contribui para a eficiência alimentar das vacas de carne, particularmente quando exploradas em regime de pastoreio, é a sua capacidade de ingestão. Assumindo que os níveis de ingestão são proporcionais ao peso adulto elevado a 0.73, Taylor et al. (1981) avaliou variação de apetite entre 9 raças, em animais em equilíbrio de peso, alimentados ad libitum. Como se pode constatar pelo Quadro 3 a raça Angus destaca-se pela positiva, com uma constante de regressão de 0,493. Também se constatou que com níveis de restrição de ingestão da matéria seca havia uma tendência das raças com maior apetite 20 quando alimentadas ad libitum exibirem um maior sucesso reprodutivo. Longevidade e Fertilidade Uma das características que muito influencia a eficiência económica de um rebanho de carne é a longevidade das vacas de cria e a longevidade está, obviamente, relacionada com o sucesso reprodutivo, pois é conhecido que a principal causa de reforma prematura das vacas é a falha reprodutiva. A raça Angus é conhecida pela longevidade das suas vacas, fazendo mesmo parte da história da fundação da raça o facto da vaca com o nome de “Old Grannie,” a vaca mais magazine famosa nos registos da Aberdeen Angus Society, ter vivido 36 anos e ter produzido 29 vitelos. O Quadro 4 demonstra o efeito da longevidade das vacas na eficiência do rebanho (Kress et al., 1988). A medida da eficiência económica neste estudo foi o custo $ por 100 lb de peso ao abate da descendência. Este estudo ilustra a valia económica da longevidade das vacas, diminuindo o custo de produção à medida que as vacas de cria ficam 01.2010 Idade/Ponto de Acabamento (Market End Point) Gregory et al. (1994) avaliaram a eficiência de crescimento pós-desmame em novilhos castrados, de 9 raças puras, quando alimentados para atingirem vários pontos de acabamento para o mercado: idade = 207 dias; peso de carcaça = 333 Kg; produto de retalho (peças comestíveis) = 210 lb; ou grau de marmoreado (Quadro 5). A eficiência 48,4 47,1 46,9 Shorthom Charolês 49,1 Santa Gertrudis 47,3 Limousin 47,4 Belmont Red 52,7 Brahman 38,1 Angus 60 50 40 30 20 10 0 Hereford Gráfico 2. Efeitos da raça na classificação mp4 Adaptado de : “Producing and Processing Quality Beef from Australian Cattle Herds” ed. P Dundon, B Sundstrom e R Gaden (2000) QUADRO 6. Características da carcaça - médias de acordo com as raças1 1 2 Raça Peso de carcaça, lb. Espessura gordura in Área do long. dorsi in2 Percentagem de Peças de talho % Pontuação Marmoreado2 % CLASSE USDA CHOICE Shorthorn 707 .49 11.1 67.0 566 74.7 HerefordAngus 707 .63 11.2 67.2 543 70.7 Simmental 695 .37 11.9 70.1 510 63.4 Charolês 747 .36 12.6 70.2 523 58.9 Maine Anjou 705 .38 12.3 70.1 501 49.5 Gelbvieh 686 .39 12.0 70.2 507 45.2 Salers 707 .41 12.0 70.0 515 44.5 Limousine 667 .39 12.3 71.5 477 43.8 Chianina 692 .32 12.4 71.9 448 27.5 Adaptado de Cundiff et al., 1993. 400 = Pouco marmoreado = Classificação Select; 500 = pouco marmoreado = Classificação Choice mais anos no rebanho. A eficiência produtiva em bovinos de corte, na fase de cria, está directamente relacionada com o desempenho reprodutivo das fêmeas, com a sua habilidade materna e com o potencial de ganho de peso dos bezerros. biológica foi expressa em gramas de peso vivo por megacaloria (Mcal) de energia metabolizável (EM) da dieta consumida. Quando os animais foram alimentados para serem abatidos num determinado “timing” (207 dias) não houve uma tendência consistente mas no geral animais 21 22 de raças mais pequenas, com menos peso corporal para ser mantido tenderam a ser mais eficientes; quando alimentados para atingirem um determinado peso de carcaça (333 kg), ou quando alimentadas para atingirem um peso constante de produto de venda a retalho, produto comestível (210 kg), as raças de maior tamanho, raças ditas continentais, com maiores índices de ganho de peso corporal foram mais eficientes; mas quando alimentadas para atingirem um mesmo índice de marmoreado (grau de acabamento) as raças inglesas, de menor porte e menores índices de crescimento, mais precoces na deposição de gordura/acabamento, foram as mais eficientes. Qualidade da Carne O termo qualidade, no contexto da carne, engloba uma série de propriedades que a tornam, uma vez cozinhada, num produto não só comestível, mas apelativo e apetecível, para além das propriedades nutricionais, mas também funcionais, que são exigidas no processamento de produtos alimentares dela derivados (Klettner, 1995). A capacidade dos tecidos para satisfazer todas estas propriedades depende da idade do animal, da sua alimentação, da genética e do seu estado de desenvolvimento, da prepração dos animais pré-abate, bem como das transformações ocorridas post mortem (maturação da carne) (Ingr, 1989). O grau de tenrura é a característica organoléptica que mais influencia a opinião do consumidor de carne de bovino. Esta é influenciada directamente pela quantidade de tecido conjuntivo, particularmente o colagéneo presente na carne, que aumenta com a idade do animal. Mas a tenrura também está relacionada com o método de confecção culinária, com a peça de talho, com o grau de maturação da carne, sexo e idade do animal, mas também com a sua genética (raça e genótipo individual) (Heinze e Bruggemann., 1994; Shortose e Harris, 1990; Smith et al. 1987; 2007; Savell et al. 1989; Miller et al. 1995; Choat et al. 2006; Maher et al. 2004). Considerando os efeitos da raça na classificação da qualidade organoléptica da carne (Classificação compósita, MQ4 = tenrura x 0.4 + flavour x 0.2 + sucosidade x 0.1 + aceitação geralx 0.3.) Dundon et al. (2000) colocam a raça Angus em primeiro lugar relativamente a esta classificação (Gráfico 2). Para além da tenrura, a sucosidade - que está relacionada com o marmoreado - a textura, o flavour, a própria cor e brilho da carne, são características susceptíveis de influenciar a preferência do consumidor. Bureš et al. (2006) compararam a composição química, as características sensoriais e o perfil de ácidos gordos de novilhos toiros das raças Aberdeen Angus, Charolês, Simmental, e Hereford. Os novilhos da raça Angus receberam a maior pontuação para as diferentes características sensoriais (cheiro, flavour, textura, e sucosidade) e a concentração em ácido linolénico (C18:3-n3), um ácido gordo poli-insaturado, foi também mais elevada na carne dos novilhos desta raça, bem como o teor em lípidos intra-musculares. Nos Estados Unidos da América, Cundiff et al., (1993), 22 compararam as médias de diferentes raças de carne relativamente às características de carcaça e colocaram as raças inglesas Shorthorn, Angus e Hereford nos primeiros lugares, no que diz respeito ao marmoreado (566 e 543 pontos respectivamente), atingindo estas raças uma maior percentagem (74,7% e 70,7 %) na classificação de CHOICE (Quadro 6) (a classificação da carne de vaca nos EUA inclui - baseada nos critérios do marmoreado da carne e idade estimada - as categorias: Prime; Choice; Select; Standard; Commercial; Utility; Cutter; e Canner) (Menos de 4% por cento da carne de bovino classificada nos Estados Unidos atinge a qualidade de excelência “Prime”). Considerando estes atributos, não será por acaso que a carne Angus tem vindo a ser comercializada, a nível mundial, com recurso a marcas registadas que envolvem o nome da própria raça, como são os exemplos da Certified Angus Beef®; a AngusPride®; Premium Gold Angus®, Certified Australian Angus Beef®, New Zealand AngusPure®, Angus Burger®, etc. o que faz dela uma caso único, a nível Mundial, nesta relação entre raça e certificação de qualidade, um aspecto cada vez mais importante na fidelização do consumidor. Conclusões A opção pela raça Aberdeen Angus é uma opção que se justifica, no caso dos Açores e não só, principalmente para a produção de carne a partir da erva, em raça pura ou em cruzamentos, com acabamento precoce, vitelão (baby-beef), ou novilhos castrados, ou inteiros, acabados aos 16-18 meses na erva, ou com alguma suplementação de concentrados, ou, preferencialmente, silagem de milho. As vacas cruzadas HolsteinxAngus, dada a sua boa produtividade leiteira, poderiam mesmo ser utilizadas, nos Açores, em sistemas de dupla amamentação, com o desmame de 4 bezerros por vaca. Uma vez que se confirma uma vantagem competitiva da raça Aberden Angus, em relação aos parâmetros de qualidade organoléptica da carne, seria conveniente que a sua comercialização se fizesse mais dirigida à restauração de qualidade, nomeadamente aos restaurantes que se dedicam à confecção de rodízios; bifes; espetadas, etc; procurando-se junto destas instituições e dos seus clientes, um melhor reconhecimento desta qualidade reconhecidamente superior. Bibliografia Bureš D., L. Bartoň, R. Zahrádková, V. Teslík, e M. Krejčová (2006). Chemical composition, sensory characteristics, and fatty acid profile of muscle from Aberdeen Angus, Charolais, Simmental, and Hereford bulls. Czech J. Anim. Sci., 51, 2006 (7): 279–284. Choat, W.T., J.A. Paterson, R.M. Rainey, M.C.King, G.C. Smith, K.E. Belk, e R.J. Lipsey.2006. The effects of cattle sex on carcass characteristicsand longissimus muscle characteristics.J. Anim. Sci. 84:1820-1826. Crews D.H.D. Jr . 2005. Genetics of efficient feed utilization and national cattle evaluation: a review. Genet. Mol. Res. 4 (2): 152-165. Cundiff, L. V., F. Szabo, R. M. Koch, M. E. Dikeman, e J. D. Crouse. 1993. Breed comparisons in the germplasm evaluation program at MARC. Proceedings Beef Improvement Federation. Asheville, NC. magazine DiConstanzo, A., J.C. Meiske, S.D. Plegge, T.M. Peters, e R.D. Goodrich, 1990. Within-herd variation in energy utilization for maintenance and gain in beef cows. J. Anim. Sci. 68:2156. DiCostanzo A., J. C. Meiske e S. D. Plegge. 1991. Characterization of energetically efficient and inefficient beef cows. J Anim Sci. 69:13371348. Dundon P, B Sundstrom e R Gaden ed (2000) Producing and Processing Quality Beef from Australian Cattle Herds. Ferrell, C. L., e T. G. Jenkins. 1982. Efficiency of cows of different size and milk production potential. Pages 12–24 in USDA, ARS, Germplasm Evaluation Program Progress Report No. 10.MARC. Clay Center, NE. Ferrell, C.L. e T.G. Jenkins, 1984. Energy utilization by mature, nonpregnant, non-lactating cows of different types. J. Anim. Sci. 58:234 Ferrell, C.L. e T.G. Jenkins, 1985. Cow type and the nutritional environment: Nutritional aspects. J. Anim. Sci. 61:725. Gregory, K.E., L.V. Cundiff, e R.M. Koch. 1994. Breed effects, dietary energy density effects, and retained heterosis on different measures of gain efficiency in beef cattle. J. Anim. Sci. 72:1138. Heinze P. H. e D. Bruggemann. 1994. Ageing of beef: influence of two ageing methods on sensory properties and myofibrillar proteins. Sciences des Aliments 14, pp. 387–399. Jenkins, T.G. e C.L. Ferrell. 1994. Productivity through weaning of nine breeds of cattle under varying feed availabilities. I. Initial evaluation. J. Anim. Sci. 72:2787. Klettner, P.G. (1995) Cooling, freezing and thawing processes for meat. Die Fleischerei 7-8. Kress, D.D., D.E. Doornbos, e D.C. Anderson. 1990. Performance of crosses among Hereford, Angus, and Simmental cattle with different levels of Simmental breeding: V. Calf production, milk production, and reproduction of three- to eight-year-old dams. J. Anim. Sci. 68:1910. Kress, D.D., M.D. MacNeil, e G.E. Dickerson. 1988. Effect of mating system, cow culling strategy, and maximum cow age on beef cattle biological and economic efficiency. J. Anim. Sci. 66(Suppl. 1):175. Abstract. Maddock T. D e Lamb G. C. The Economic Impact of Feed Efficiency in Beef Cattle. University of Florida IFAS Extension:: http://edis.ifas.ufl. edu/pdffiles/AN/AN21700.pdf. Acessado em 2/8/2010. Maher, S.C., A.M. Mullen, A.P. Moloney, D.J.Buckley, e J.P. Kerry. 2004. Quantifying the extent of variation in the eating quality traits of the M. longissimus dorsi of conventionally processed Irish beef. Meat Sci. 66:351-360. 01.2010 Miller M.F., L.C. Hoover, A.L. Cook, A.L. Guerra, K.L. Huffman e K.S. Tinney et al. 1995. Consumer acceptability of beef steak tenderness in home and restaurant, Journal of Food Science 60, pp. 963–965. Moore S. S., F. D. Mujibi e E. L. Sherman. 2009. Molecular basis for residual feed intake in beef cattle. J. Anim Sci.. 87: 1418. Notter, D.R. 1984. Incorporating beef cow efficiency into total management systems. IN: Proc. Beef Cow Efficiency Forum. Michigan State Univ., East Lansing, MI and Colorado State Univ., Fort Collins, CO. p. 125. Pullar, J.J. e A.J.F. Webster. 1977. The energy cost of fat and protein deposition in the rat. Brit. J. Nutr. 37:355. Savell J.W. ,H. R. Cross , J. J. Francis, j. W. Wise, D. S. Hale , d. L. Wilkes, G. C. Smith, 1989. J.W. Savell, H.R. Cross, J.J. Francis, J.W. Wise, D.S. Hale, D.L. Wilkes and G.C. Smith J. Food Qual. 12, p. 251. Schiefelbein, D. 1998. Back to the basics: A real-world strategy for improving the quality and consistency of beef. Minnesota Cattle Feeder Rep. B-458. Short, R.E., e Adams, D.C. 1988. Nutritional and hormonal interrelashionships in beef cattle reproduction. Canadian Journal Animal Science, v. 68, p. 29-39. Shorthose W.R. e P.V. Harris.1990. Effect of animal age on the tenderness of selected beef muscles. Journal of Food Science 55 (1990), pp. 1–8. Smith G. C., Savell J.W., Cross H.R., Carpenter Z. L., Murphey C.E., Davis G.W., Abraham H.C., Parrish F.C. e Berry B.W. 1987. Relationship of USDA quality grades to palatability of cooked beef. Journal of Food Quality 10: 269-286. Smith, G. C., Carpenter, R Z. L., Cross, H. R., Murphy, C. E. ,Abraham, H. C., Savell, J. W. ,Davis, G. W., Berry, B. W. e Parrish Jr., F. C. 2007. Relationship of USDA marbling groups to palatability of cooked beef, Journal of Food Quality, 7, 289–309. Taylor, R.E. 1994. Beef Production and Management Decisions, 2nd edition. Macmillan Publ. Co., New York, NY. Taylor, St. C. S., H. G. Turner, e G. B. Young. 1981. Genetic control of equilibrium maintenance efficiency in cattle. Anim. Prod. 33:179. Thompson, W.R., J.C. Meiske, R.D. Goodrich, J.R. Rust, e F.M. Byers, 1983. Influence of body composition on energy requirements of beef cows during winter. J. Anim. Sci. 56:1241. Van Oijen, M., M. Montano-Bermudez, e M.K. Nielsen. 1993. Economical and biological efficiencies of beef cattle differing in milk production. J. Anim. Sci 71:44. 23