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2 MATO GROSSO DO SUL: APONTAMENTOS HISTÓRICOS. Neimar Machado de Sousa (org.) 3 MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCO INSTITUIÇÃO SALESIANA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR Chanceler: Pe. Dr. Afonso de Castro Reitor: Pe. José Marinoni Pró-Reitor Acadêmico: Pe. Jair Marques de Araújo Ficha Catalográfica 4 © 2005 Editora UCDB Impresso no Brasil Printed in Brazil 1ª Edição 2006 Coordenação de Editoração Ereni dos Santos Benvenuti Editoração Eletrônica Neimar Machado de Sousa Capa José Francisco Sarmento É proibida a reprodução total ou parcial desta publicação, para qualquer finalidade, sem autorização por escrito dos editores. O conteúdo publicado é de inteira responsabilidade do autor e não representa o posicionamento da Editora UCDB. Feito depósito legal na Fundação Biblioteca Nacional (Decreto n. 1825 de 20/12/1907). Os direitos desta edição são reservados à Editora UCDB, cadastrada no Sistema ISBN sob o n. ?????. Membro da Associação Brasileira das Editoras Universitárias - ABEU Av. Tamandaré, 6000 - Jardim Seminário CEP 79117-900 - Campo Grande-MS Fone/fax: (67) 3312-3373 e-mail: [email protected] http://www.ucdb.br/editora 5 A história só se repete como farsa ou como tragédia. K. Marx 6 Dedico este livro: Aos professores e colegas do Curso de História/UCDB, aos meus alunos no Curso de História pelo esforço, apoio e paciência que tiveram comigo. 7 SUMÁRIO A CRIAÇÃO DO TERRITÓRIO FEDERAL DE PONTA PORÃ......................................9 A HISTÓRIA DO POVO TERENA...................................................................... 11 ARNALDO ESTEVÃO DE FIGUEIREDO ............................................................. 14 BARÃO DE ANTONINA E AS TERRAS DE MATO GROSSO ................................... 17 DIVISÃO DO ESTADO DE MATO GROSSO ....................................................... 23 VIDA E OBRA DE DOM AQUINO CORRÊA (1885 – 1956) ................................... 28 FILINTO MÜLLER ......................................................................................... 44 MADAME LYNCH .......................................................................................... 48 MOVIMENTO DIVISIONISTA NO MATO GROSSO DO SUL................................... 52 A VIDA E OBRA DE PAULO COELHO MACHADO................................................ 55 A TRILHA DO PEABIRU ................................................................................. 63 A GÊNESE DE CORUMBÁ............................................................................... 69 ARLINDO DE ANDRADE GOMES..................................................................... 76 CORONELISMO EM MATO GROSSO (1889-1943) ............................................. 80 HISTÓRIA E FRONTEIRA: O SUL DE MATO GROSSO 1870-1920. ....................... 85 PEDRO PEDROSSIAN.................................................................................... 92 RIO PARAGUAI NO MATO GROSSO DO SUL..................................................... 96 RONDON E OS ÍNDIOS DO CENTRO-OESTE BRASILEIRO ................................ 101 SILVINO JACQUES O ÚLTIMO DOS BANDOLEIROS ......................................... 109 UM POUCO DA VIDA DE VESPASIANO BARBOSA MARTINS.............................. 113 VIRGÍLIO CORRÊA FILHO............................................................................ 117 ENTREVISTAS ........................................................................................... 134 PEDRO PEDROSSIAN.................................................................................. 135 PAULO COELHO MACHADO ......................................................................... 145 8 APRESENTAÇÃO A grande parte dos acadêmicos ao ingressarem na universidade conhecem mais a história de Roma que a própria. O mesmo pode-se dizer com relação à Bolívia, aos índios, ou mesmo dos processos históricos regionais ou locais e sua conexão com a história do país. Embora o raciocínio parece simplicista, encerra uma provocação relevante que remete ao currículo de história de nossas escolas na educação básica e até mesmo no ensino superior de onde provém nascem os professores que administrarão este currículo nas salas de aula e preparação os futuros acadêmicos. Ressalta-se aqui o fato deste texto nascer no bojo de uma graduação em história e atinge assim futuros professores que produzem material didático-pedagógico ao mesmo tempo em que treinam a própria pena. O texto também visa suprir uma lacuna de textos reamente mais afinados com a produção acadêmica para uso posterior em sala de aula devido ao uso público e gratuito desta obra, por isso a opção pelo formato eletrônico. Prof. Neimar Machado de Sousa 9 A CRIAÇÃO DO TERRITÓRIO FEDERAL DE PONTA PORÃ Josué Antonio Teodoro1 RESUMO: Esse texto foi elaborado de acordo com as exigências da disciplina de História do Mato grosso do Sul, ministrado pelo Profª Neimar Machado no 5º semestre do curso de história desta instituição. Tem por objetivo analisar o processo de criação do território federal de Ponta Porá, apontando suas principais características. Para tanto os procedimentos metodológicos utilizados, foi a leitura e analise de textos, cujas os resultados estão serão apresentes no referente artigo. PALAVRAS-CHAVE: Território Federal, Mato Grosso, Povoamento. A CRIAÇÃO DO TERRITÓRIO FEDERAL DE PONTA PORÃ Na década de 40 Getúlio Vargas, decide ocupar os “vazios” do Brasil. Pois a zona Central do país era totalmente dezabitadas, em pleno século vinte, uma enorme parte do território nacional ainda era desconhecida, a naõ ser pelas lendas de indios assacinos que corriam pela imaginação das pessoas e os relatos dos banderantes nada se sabia ao certo dessas região. Essa iniciatica do governo de povoar os territórios brasileiros ficou conhecido como “A Marcha para o Oeste” um moimento que organizou varias espedições, uma delas ficou conhecida com marcha do Roncador Xingu lideradas pelos três irmão Orlando Villas Bôas, o mais velho, Cláudio e Leonardo.Pois na época o governo precisava de homens para a difícil empreitada e estava convocando voluntários. Assim tem inicio a Marcha para o Oeste. Em setembro de 1943, são criados no país cinco novos territórios federais: Amapá, Rio Branco, Iguaçu, Ponta Porá, Nioaque, e Dourados. Dentre esses Ponta Porã: Em 1943, por decreto-lei de 13 de setembro, foi criado o Território Federal de Ponta Porã, entre outros, ao longo das fronteiras do país diante da necessidade de povoar essas distantes regiões.[...] era constituído pelos municípios de Porto Murtinho, Miranda, Nioaque, Belas Vista, Ponta Porã, Maracaju e Bonito. Ponta Porã era a capital e seu primeiro governador foi Ramiro Noronha (1945-45). (CAMPESTRINI, GUIMARÃES, 1995, p.129). Além disso, mais tarde como o objetivo de ocupar a região de fronteira com o Paraguai e reduzir o poder da Companhia Mate Laranjeira, o governo federal implantou a colônia agrícola de Dourado. Essas áreas foram divididas e cedidas a 1 Aluno do 5º semestre do curso de História da Universidade Católica Dom Bosco 10 colonos, a concessão desses lotes deu origem a vários municípios favorecendo assim o povoamento. Ouro fator importante a ser lembrado e que a criação do território de Ponta Porá, representou uma grande contribuição para a tão sonhada criação do Estado de Mato Grosso do Sul. No entanto, este território teve vida curta, pois em 1946, com a promulgação da Nova Constituição Federal, ele foi extinto. Contudo pode-se concluir que essa necessidade de povoar o país, através da Marcha para Oeste, foi responsável pela criação de novos municípios o que vai favorecer o povoamento da região. Vimos que Mato Grosso também passou por esse processo, através da criação do território federal de Ponta Porã, e da colônia agrária de Dourados. É que essa divisão dentro de Mato Grosso, ai fortalecer os idéias para uma divisão desse Estado, a criação do novo Estado de Mato Grosso do Sul. BIBLIOGRAFIA CAMPESTRINI, Hildebrando, GUIMARÃES, Acyr, Vaz. História de Mato Grosso do sul. 4 ed.Campo Grande: Brasília. 1995 GRESSLER, Lori, VASCONCELOS, Luiza, SOUZA, Zélia. História e Geografia do Mato Grosso do Sul. Site: http://www2.uol.com.br/caminhosdaterra/reportagens/140_roncador: Matéria publicada na edição #140 da revista Os Caminhos da Terra. 11 A HISTÓRIA DO POVO TERENA Ramão da Silva Fermino 2 RESUMO: Este artigo foi desenvolvido com o objetivo de analisar e estudar a história do povo terena no Estado de Mato Grosso do sul, seus principais momentos na história, suas contribuições para o desenvolvimento da região, bem como também como seu passado de exploração, e quais as conseqüências que o passado trouxe para a vida desse povo, que já sofreu com muitas explorações, nos dia atuais. Para se conhecer a história dos terenas é preciso recorrer a várias fontes de informações. Podemos conhecer o passado dos terenas pelos produtos da sua cultura material como objetos de cerâmica; tecelagem, instrumentos musicais, que revelam muito dos hábitos e costumes antigos e que atualmente nem sempre existe. Mais Também ouvir os relatos orais dos mais velhos. PALAVRAS-CHAVE: Terenas, História, Origem, Território. A LÍNGUA DOS TERENA A língua falada pelos terenas é a mais importante fonte que se tem para se conhecer parte da história mais recente é também do passado. Saber a origem do povo é muito difícil. Em geral, cada povo cria mitos e lendas para explicar sua origem. O mito sobre como os terenas forram criados, pode ser contado de várias maneiras, as diferenças entre as versões narradas estão ligadas ao momento e a situação vivida pelo povo, quando contam essa parte de sua história. (BITENCOURT, 2000, p. 22) A região do Exiva (Chaco) ficava próxima das minas de metais preciosos onde os colonizadores europeus disputavam esse território. As várias tribos da região foram envolvidas por essas lutas, com isso houve o deslocamento. Os terenas construíram suas aldeias perto do forte Coimbra e das vilas das serras de Albuquerque entre os rios Paraguai e Miranda. Na época em que os terenas deixaram o Exiva, a região de Miranda era desabitada. MOMENTOS HISTÓRICOS DO POVO TERENA Para os terenas, têm relembrado três grandes momentos em sua história. 2 Acadêmico de História/UCDB. Indígena da etnia Terena. 12 O primeiro foi à saída do Exiva, foi um período em que os Terenas ocupavam um território vasto, dedicando-se a agricultura, e estabelecendo alianças importantes com os guaicuru e com os portugueses. O segundo momento foi à guerra do Paraguai (1864-1870) os terenas e guaicuru aliaram-se aos brasileiros e lutaram para preservar seus territórios. O terceiro foi os tempos de servidão, quando os terenas serviam aos brancos, hoje os terena têm sido obrigados a se submeter a trabalhar para os proprietários de terra particulares. Este momento ainda está sendo vivido por eles, que estão fazendo sua história buscando maior autonomia enquanto povo, e mais direitos como cidadãos brasileiros. OS TERENA NA GUERRA DO PARAGUAI O governo brasileiro também chamou índios de Mato grosso para combaterem os paraguaios. Os Guaicurus lutaram ao lado do exercito brasileiro enquanto os terenas, que sempre foram grandes agricultores, além de enfrentar o exército, também participavam da guerra fornecendo alimentos para os combatentes. (BITENCOURT, 2000, p. 56). Taunay conta que no caminho para Nioque a coluna de soldados foi atacada pela epidemia de cólera que matou muitos soldados. Um dos primeiros a morrer pela doença foi um terena, após a guerra dois fatos marcaram a história dos terenas, a criação dos serviços de proteção aos índios o SPI e a construção da estrada de ferro e a criação das áreas dos terenas. A CRIAÇÃO DAS ÁREAS DOS TERENAS Os terenas aproveitaram o trabalho junto a Rondon, quando da instalação da linha telegráficas para solicitar-lhe que o governo lhes garantisse a posse de suas terras por meio de decretos reservas aos índios. Algumas comunidades, como Cachoerinha, Bananal e Ipeque, tiveram suas terras demarcadas em 1905 e mais tarde, em 1911, foram reconhecidas pelo SPI. Quando os terenas solicitaram a demarcação de territórios, não estava pedindo um presente para o governo ou de Rondom. O Povo terena havia enfrentado o exército paraguaio para proteger suas terras. A demarcação das áreas terenas foi à confirmação de um direito muitas vezes conquistado no decorrer de sua história. E sobre esse direito que falam os mais velhos (BITENCOURT, 2000, p. 100). O tamanho das áreas demarcadas pela antiga SPI era muito menor do que o território ocupado pelos terenas antes da guerra do Paraguai. Algum tempo depois os terenas começaram a ir para as cidades a partir do final dos anos 50. A saída dos terenas de suas aldeias para as cidades, acontecia 13 porque havia um crescimento da população nas reservas e a falta de “fulturo” nelas. Em 1960, foi constatado que havia cerca de 480 terenas na época morando em Campo Grande. Embora existam muitas explicações que podem justificar a saída dos terenas de suas reservas, é importante reconhecer que a falta de uma área suficiente para a população, que cada vez vem aumentando. OS TERENA HOJE Atualmente os terenas aldeados vivem espalhados em municípios sul matogrossense como Miranda, Aquidalana, Anastácio, Sidrolândia, Dois Irmão do Buriti e Nioaque. Hoje a FUNAI não resolveu os problemas mais importantes da vida dos terenas, o direito à terra para que toda da autonomia as autoridades terenas tem consciência da necessidade de buscar novas alternativas no relacionamento com a sociedade nacional e no usufruto pleno de seus territórios. BIBLIOGRAFIA BITENCOURT, Circe Maria, LACERDA Maria Elisa. A história do povo terena. Brasília: MEC. 2000. 14 ARNALDO ESTEVÃO DE FIGUEIREDO Leandra Alves ∗ O presente artigo analisa a trajetória de um dos personagens da história política de Mata Grosso do Sul, Arnaldo Estevão de Figueiredo. Nasceu em 1892, na fazenda Paulo Lopes, de seus pais Antônio Estevão de Figueiredo e Antônia Maria Pinheiro de Almeida, no município de Rosário Oeste, próximo a cidade de Cuiabá no atual Estado de Mato Grosso. Estudou no Liceu Cuiabano e quando se formou, ganhou uma bolsa de estudos do Cel. Pedro Celestino Corrêa da Costa para fazer o curso de Engenharia Agrônoma no Rio Grande do Sul. Convocado para o campo político , por se tratar de um jovem de família abastada , cuja formação em Engenharia Agrônoma , favoreceria aos interesses do Coronel Pedro Celestino em relação a demarcação de terras da região sul do Estado de Mato Grosso. Por isso , Arnaldo Estevão de Figueiredo ao adentrar para a carreira política filiou –se imediatamente ao Partido Republicano Mato-grossense chefiado por aquele subsidiou os seus estudos. Arnaldo iniciou sua carreira política por volta dos vinte e cinco anos, quando chega a cidade de Campo Grande: Desde quando cheguei a Campo Grande, em 1917, fui convocado para a política, pelos amigos da cidade. Havia na época dois partidos: o Partido Republicano Mato-grossense – PRMG, chefiado pelo Cel. Pedro Celestino Corrêa da Costa, e o Partido Republicano Nacional – PRN, conservador, comandado pelo Senador Azeredo: ingressei no Republicano Mato-grossense. (RIBEIRO, p. 293). Em 1920, Arnaldo E. de Figueiredo foi convocado a assumir o cargo de ViceIntendente do município de Campo Grande. Devido aos reclames da população campograndense ao abastecimento de água, uma das medidas importantes realizadas por Arnaldo como Intendente foi a criação do primeiro serviço de abastecimento de água em Campo Grande. Já em 1924, Arnaldo foi responsável pelo assentamento de famílias imigrantes em Terenos. Em 1946, Arnaldo E. realiza sua campanha política ao cargo do governo do Estado do Mato Grosso, com um discurso dirigido aos trabalhadores: Dirijo-me aos trabalhadores de Mato Grosso, homens de todas as classes [...] e para cuja grandeza e prosperidade, todos, sem exceção, individual com coletivamente trabalham nos campos ou na cidade, quer amanhando a terra para a produção benfazeja ou arrancando do seu ∗ Graduanda do 5º semestre em História pela Universidade Católica Dom Bosco/UCDB. 15 seio generoso as gemas preciosas, quer servindo na indústria, no comércio, ou nas múltiplas formas de suas atividades em busca do seu sustento e da sua família (RIBEIRO, p.340-341). Arnaldo vence as eleições para o cargo de governador do Estado de Mato Grosso, a respeito da posse de Arnaldo, “O Tribunal Regional Eleitoral, por ata de 21 de março de 1947 declarou eleito Governador do Estado de Mato Grosso para o primeiro período do vigente regime constitucional, o cidadão Doutor Arnaldo Estevão de Figueiredo (RIBEIRO, p.342)”. A respeito do governo de Arnaldo, Rubens Mendonça ressalta, o início de uma nova era na política de desenvolvimento do Estado, dando ênfase a política de colonização do Estado do Mato Grosso: Ao governo de Arnaldo Estevão de Figueiredo devemos o início da era de desenvolvimento do norte do Estado [...] o Dr. Arnaldo Estevão de Figueiredo pode realizar no seu govêrno, a política de colonização do Mato Grosso. E graças a sua ação, foi feita a colonização do Vale do São Lourenço, Dourados, Bodoquena, Barra do Bugre e as terras férteis começaram a ser desbravadas (MENDONÇA, 1970, p.124). No exercício do cargo de Governador do Estado, Arnaldo ressalta a importância que deu ao problema da terra, e no processo de colonização do Estado, a atenção dada as correntes migratórias: Como Governador e no desempenho de atividades executivas, encarei o problema da terra como da maior prioridade para Mato Grosso [...] convivi de perto com todas as correntes migratórias que se dirigiam para o Mato Grosso, principalmente o elemento gaúcho que foi o principal contingente a povoar as terras da fronteira com o Paraguai , desde Ponta Porã, Dourados, Amambaí e Bela Vista [...]“Criei a Delegacia Especial de Terras e Colonização, em Campo Grande (RIBEIRO, p.345-346). Uma das políticas adotadas no governo de Arnaldo a respeito da terra foi a política agrária, onde os pequenos produtores recebiam incentivos do governo para a produção agrícola, “Os pequenos produtores rurais receberam incentivos através da distribuição de sementes selecionadas e ferramentas agrícolas. (RIBEIRO, p. 360)” A Política Viária era uma das propostas do Governo de Arnaldo, nesse sentido essa política foi de extrema importância para a ligação do Sul do Mato Grosso com o Norte: Em meu governo, disse o Dr. Arnaldo, mister, foi, portanto, traçar um plano de ação, no qual figurou em prioridade a ligação Norte/Sul, com a criação da Comissão de Estradas de Rodagem – CER [...] Foi assim que a CER ligou Rondonópolis a Campo Grande rumo sul e para oeste conseguiu implantar até Alto-Araguaia. (RIBEIRO, p. 360). Com o objetivo de expandir sua política educacional para regiões inóspitas do sul e norte do Estado de Mato Grosso, Arnaldo Estevão de Figueiredo encontrou 16 soluções no ensino primário para as colonizações definitivas de áreas pouco povoadas. Em sua profissão de Engenheiro Agrônomo , Arnaldo Figueiredo pode analisar de perto a realidade dos moradores que habitavam o interior do Estado e executou medidas como a construção de Escolas Rurais em todo o Estado de Mato Grosso: Foram construídas mais de 200 (duzentas) Escolas Rurais, tanto ao norte quanto ao sul do Estado, que funcionavam a princípio, em casas improvisadas, afirma J.M. de Figueiredo . As Escolas Rurais tinham por fim ministrar a instrução primária rudimentar. Eram localizadas a mais de 3 quilômetros da sede Municipal, constando de seu programa: o ensino de leitura, escrita, as quatro operações sobre números inteiros, noções de História pátria, Geografia do Brasil, e especialmente do Estado de Mato Grosso, e noções de higiene. (RIBEIRO, p.361). Como um personagem da vida política, Arnaldo participou do movimento divisionista na criação do Estado de Mato Grosso do Sul: Arnaldo Estevão de Figueiredo participou ativamente a favor da criação do Estado de Mato Grosso do Sul, desmembramento este, que almejou com harmonia, pois era vantajoso para ambos os quadrantes, tanto ao norte como ao sul seriam beneficiadas as pessoas e o progresso (RIBEIRO, p.471). Arnaldo Estevão de Figueiredo, faleceu no dia 15 de dezembro de 1991, conforme narra Lélia Ribeiro, “O atestado médico acusou um enfarte do miocárdio, porém, a causa mais profunda permaneceu ignorada, conjecturando-se, em especial o rompimento de um aneurisma intestinal que o incomodava já há uns 3 anos (RIBEIRO, p. 543)”. BIBLIOGRAFIA MENDONÇA, Rubens. História de Mato Grosso. 2ª ed.Instituto Histórico de Mato Grosso,Cuiabá/MT,1970. RIBEIRO, Lélia Rita E. de Figueiredo. O homem e a terra. Editora do Senado Federal, Campo Grande/MS, sem referência de data. 17 BARÃO DE ANTONINA E AS TERRAS DE MATO GROSSO Ana Cláudia da Silva Simone Ferreira Ovilda de Souza RESUMO: Barão de Antonina; João da Silva Machado, tenente-coronel, nascido a 17 de junho de 1782 na vila de Taquari, província do Rio Grande do Sul, grande criador do hoje estado do Paraná. Foi também oficial da ordem do cruzeiro e grande dignatário da ordem de Rosa, irmão do Barão de Ibicuí. João da Silva Machado iniciou a luta pela vida como negociante de gado; comprava tropas no Rio Grande do Sul e repúblicas vizinhas para revender na feira de Santana, da Bahia, chegando mesmo até Caxias do Maranhão. Em 1821 foi escolhido pela Comarca de Curitiba para servir de eleitor de deputado a constituinte portuguesa. Em 1820 foi incumbido pelo governo de São Paulo de explorar minérios de prata no morro do Itaiyó, já exercia o posto de sargento-mor de milícias. Irrompe o movimento revolucionário de 1835 no Rio Grande do Sul; toma parte ativa na defesa da legalidade e recebe as honras de Coronel honorário do exército. Deflaga a revolução de 1842 em Sorocaba; Monte Alegre, então presidente da província de São Paulo, encontra nele a única pessoa para reprimir o alastramento da onda sediosa na região do Paraná. Em recompensa, pela defesa da lei recebe por decreto imperial de 11 de setembro de 1843, o título de Barão de Antonina elevado a Barão com grandeza, por decreto de 13 de agosto de 1860. Em 1854 atinge o ponto culminante de sua carreira política: separa a comarca de Curitiba, formando nova província a do Paraná, que o elege senador. Abandona a política militante da província de São Paulo, ocupando-se unicamente com a do Paraná. Por ordem do governo imperial estabelece núcleos de catequese auxiliados por missionários, em Tibagi, Paranapanema, Ivaí Ribera; organiza e instala aldeamentos de índios em Tibagi e em São João Batista do Rio Verde, em São Paulo; funda povoações como São Jerônimo, Jataí e outras. As estradas de rodagem foram objetos de sua atenção entre outras citamos a de Ribeira e Curitiba, a da Graciosa, abriu uma estrada através de incultos sertões entre Paraná e o Mato Grosso. Ilustre escritor, agregado a família pelo casamento. O Barão de Antonina faleceu em São Paulo a 18 de março de 1875 de tifo e morreu com 92 anos. PALAVRAS-CHAVE: biografia: Barão de Antonina, Paraná, Tibagi. INTRODUÇÃO 18 O Barão de Antonina (João da Silva Machado) iniciou a luta pela vida como negociante de gado, comprava tropa no Rio Grande do Sul e repúblicas vizinhas pra revender nas feiras de Sorocaba, província de Minas Gerais, feira de Santana, da Bahia, chegando até Caxias do Maranhão. Em 1854 separa a comarca de Curitiba, formando nova província a do Paraná, por ordem do Governo imperial estabelece núcleos catequese auxiliados por missionários, em Tibagi, Paranapanema, Ivaí Ribera, organiza e instala aldeamentos de índios em Tibagi e em São João Batista do Rio Verde, em São Paulo funda povoações como Jerônimo, Jataí e outras. A partir dos anos 1840, as iniciativas de ocupação das terras da bacia do Tibagi foram levadas adiante pelo Barão de Antonina, este encarregou José Francisco Lopes e John Henrique Elliot de várias expedições de reconhecimento da região. A segunda expedição tinha num total de 9 pessoas, saíram da Fazenda Monte Alegre, pertencente ao Srº Manoel Inácio do Canto e Silva, atravessaram o Tibagi e seguiram rumo norte-noroeste em direção a serra da Apucarana. No dia 15/09/1846, chegaram ao Rio Apucarana nas fraldas da serra Elliot afirma que desse local avistou os campos do Inhonhô distante oito e nove léguas a nordeste na margem ocidental do Tibagi. Desse local eles concluíram que o Tibagi deveria ser navegável logo abaixo desses campos, e se eram grandes o suficiente para o estabelecimento de um depósito e acomodação de gado, bem como o fornecimento de pastagens para as tropas que seguissem com mercadorias para o embarque no Tibagi rumo ao Mato Grosso. De volta, chegaram dia 08/10/1846 na fazenda Monte Alegre, e dia 13/10/1846 na Fazenda Pirituba, então o Barão determinou que eles deveriam prosseguir as explorações seguindo o caminho de Curitiba ao Mato Grosso. Um semana após terem chegado da Serra de Apucarana, Lopes e Elliot, partiram para os campos do Inhoó. Eram uma expedição de trinta pessoas com dois índios como guias. Chegando a esses campos no dia 20/11/1846. Demoram na exploração dessas Campinas durante dez dias, eram várias Campinas entremeadas de matos. No dia 04/12/1846 eles se encontravam nos campos do Inhoó que denominaram de São Jerônimo. Em 16/12/1846, Lopes e Elliot e mais doze pessoas, por determinação do Barão rumaram dos campos do Inhoó para norte acompanhado Tibagi de uma a duas léguas de distância, depois acompanharam o Rio Congonhas. Em 15/13/1847 a quinta entrada de Lopes e Elliot, partiu dos campos de Inhoó em direção aos fogos dos índios que eles tinham visto na exploração de novembro de 1846. após atravessarem o Rio Congonhas, a seis léguas dos campos do Inhoó. Em 14/06/1847, Elliot e Lopes e três camaradas embarcam no Tibagi, uma légua abaixo dos campos do Inhoó. Dia 20/09 iniciaram a viagem de retorno de 19 Albuquerque no Mato Grosso para Pirituba em São Paulo, onde chegaram a 27/12/1847. A partir dessa data os territórios do cacique Inhoó nos planaltos a leste do Rio Tibagi seriam transformados em entreposto comercial, caminho para o Mato Grosso e fazenda de criação do Barão de Antonina. Podemos constatar que após seis anos da chegada de Lopes e Elliot aos territórios Kaingang fazenda esta que alguns anos depois ele vai repassar ao Governo do Império para a criação do aldeamento indígena de São Jerônimo. Em 31/08/1856, o Barão de Antonina ordenou a demissão de todos os empregados de São Jerônimo, e retirou todo o pessoal da fazenda, inclusive escravos e animais. No final de 1858 (14/12/1858) o Kaingang atacaram a fazenda São Jerônimo levando ferramentas e materiais do trem bélico que ali estava estacionada. O administrador refugiou-se na fazenda Fortaleza, a pretexto de ir buscar presentes. O governo provincial enviou um contingente de quarenta e seis praças sob o comando do Capitão Camilo Xavier de Souza, para a Fazenda de São Jerônimo, acabou não encontrando os índios. Os Kaingang atacaram a fazenda que o Barão de Antonina tinha cravado nos campos do Cacique Inhoó, no centro dos seus territórios no Vale do Tibagi. No ano seguinte em 17/06/1859, possivelmente devido ao levante dos Kaingang na região, foi criado, pelo aviso da Secretaria de Estado dos negócios do Império o aldeamento indígena de São Jerônimo da serra. No antigo território Kaingang possiado pelo Barão de Antonina. Esse aldeamento teve como primeiro religioso o Frei Mathias de Gênova, e em seguida assumiu Frei Luiz de Cemitille. Alguns dias depois de criado o aldeamento de São Jerônimo (21/06/1859), o Barão de Antonina passou para o domínio do Governo Imperial a fazenda São Jerônimo, da qual era dono a quatorze anos, desde a posse feita em 1846. A extensão dessas terras era de 33.800ha. Os primeiros Kaingang deslocados para esse aldeamento foi o grupo do Cacique Arapquembé, num total de 78 índios. E no início de 1860, Joaquim F. Lopes foi para Curitiba com mais de 32 índios Kaingang para receberem presentes. O ano de 1875 é marcado por um fato importante que sinaliza o início da ocupação das terras do aldeamento indígena de São Jerônimo por populações não indígenas. Em 04/09/1875, o Governo Imperial, pelo aviso da Fazenda, nº 150, autorizou o Governo da Província a conceder títulos de arrendamento ás famílias brancas residentes no aldeamento, conforma a solicitação de Frei Luiz de Cemitille.(CAVALCANTI, 1924) A comunicação do Diretor Geral dos índios, e uma decisão que já tinha sido tomada pelo Presidente da Província, com a autorização do Governo Imperial, de 20 ceder as terras do aldeamento de São Jerônimo para os brancos que estavam na região. Em 1878, Cemitille comunicou que iria colocar todos os seus empregados e índios para abrir um novo caminho. Esse novo caminho procurou evitar os ribeirões, o novo traçado seguiu pelos espigões divisores das águas do Tibagi e cinzas, passando por Ventania até a Fazenda Fortaleza, o que seria a estrada do cerne joje (BR 090). O relatório anual do Frei Cemitille de 01/01/1979, informou que no aldeamento de São Jerônimo estava em construção oito casas para moradia dos índios que residiam no aldeamento, um engenho de moer cana, um monjolo, além da existência das residências do pessoal administrativo, cadeia e igreja. A população de indos aldeados era 405 indivíduos assim distribuídos; 132 do sexo masculino de 10 anos, 111 do sexo feminino maiores de 10 anos, 90 menores do sexo masculino e 72 do sexo feminino. (ofícios, 01/01/1789. APEP). Mas em 22/11/1881 por aviso do Ministério da Agricultura o Frei Luiz Cemitille foi transferido para o aldeamento de Guarapuava. Ele é enviado pelo Ministro da Agricultura a tratar de serviço de catequese no sul, nos sertões de Guarapuava. (ORLEANS, 1957) As tentativas de ocupação das terras indígenas dos campos do Inhoó, pelos brancos continuou agora nas terras “doadas aos Kaingang pelo Barão de Antonina”. O objetivo de Telêmaco Borba e de seus seguidores era tentar apoderar-se das terras indígenas do aldeamento de São Jerônimo. (WACHOWICZ, 1987). Com a saída do Frei Luiz de Cemitille, o Frei Timóteo de Castelnuovo assumiu as funções religiosas em São Jerônimo. Em 30/09/1883, Frei Timóteo crismou duzentas e cinqüenta pessoas, essa crisma rendeu para a paróquia 14$600, ele teve a ajuda do Padre José Julhiani, cinco anos depois, em 1888, morreu e foi sepultado em São Jerônimo, um dos braços direito do Barão de Antonina no reconhecimento de amplos territórios a oeste dos campos gerais, John Henrique Elliot e sua mulher Reginalda Rocha Elliot, eles deixaram quatro filhos. As tensões entres os Kaingang e as populações brancas da região eram constantes, e em 07/04/1891, os Kaigang atacaram viajantes no caminhos de São Jerônimo, nesse ataque morreu o Kaigang Gaspar. Os Kaigang de São Jerônimo revidaram incendiando o acampamento dos brancos nas margens do Rio Congonha. Dessa forma chegamos ao fim do século XIX, os Kaigang defendendo seus territórios ancestrais da invasão branca, e este utilizando todas as formas possíveis para expandir suas conquistas nos territórios Kaigang do Tibagi. A morte de Frei Timóteo de Castelnuovo, e 1895, resultou no desmantelamento do aldeamento indígena de São Pedro de Alcântara em frente a vila de Jataí. De qualquer forma, na virada deste século, dado o quadro de abandono, 21 podemos deduzir que os Kaigang retornaram para as florestas principalmente para a região de serras entre os rios Tibagi e Cinzas. (TOMMASINO, 1995) Nessa região das serras e ao longo do Tibagi foram criadas as Reservas indígenas onde foram “acomodados” os Kaingang. A Reserva Apucarana no Município de Londrina, a Tibagi e Queimadas no Município de Ortigueira, e os territórios Kaingang do cacique Inhoó foram ocupados e transformados na cidade de São Jerônimo da Serra, restando aos Kaingang nesse município duas áreas; a de São Jerônimo, junto a cidade e a área denominada Barão de Antonina também no Município de São Jerônimo da Serra. No século XX o esbulho das terras dos Kaingang em São Jerônimo continuou e no Governo de Getúlio Vargas foi legitimado a expropriação dos territórios indígenas no Tibagi. Em 30/06/1945, através do Decreto Lei 7692, o Governo Federal cedeu ao Governo do Paraná a antiga fazenda São Jerônimo para a instalação do município, de uma área original de 33.800ha os índios ficaram apenas com 4.840ha em duas áreas separadas. O mesmo ocorreu em 1949 com a área indígena do Apucarana, os 54.000ha originais foram reduzidos a 6.399ha, também dividida em áreas separadas. CONCLUSÃO No século XIX, tivemos a ocupação da bacia oriental do Tibagi pelos grandes fazendeiros dos campos gerais paranaense que procuravam expandir seus domínios. A partir dos anos 1840, as iniciativas de ocupação das terras da bacia do Tibagi foram levadas adiante pelo Barão de Antonina (João da Silva Machado), um homem que começa sua vida com a compra e venda de tropas e mais tarde isso lhe proporciona um grande destaque no meio político e econômico. Passa de Sargento-mor a categoria de Barão de Antonina e sua ascensão econômica é explicada através da posse do território Kaingang. O que percebemos é que o Barão de Antonina como tantos outros fazendeiros daquele estado possuíam grandes extensões de terras que pertenciam aos territórios indígenas, como afirma a citação abaixo: Alguns dias depois de criado o aldeamento de São Jerônimo, (21/06/1859), o Barão de Antonina passou para o domínio do Governo Imperial a fazenda São Jerônimo, da qual era dono há 14 anos, desde a posse feita em 1846. a extensão dessas terras era de 33.800ha. (MOTA, 1997) Daí pode se ter uma idéia de onde vem os grandes latifúndios brasileiros. No século XIX, teve a conquista dos territórios, que usurparam os territórios indígenas que foram justificada em torno da questão nacional. Já no século XX, temos a destruição dos territórios Kaingang do Tibagi; por causa do progresso muitas áreas foram invadidas e desmatadas, fora criadas nessas áreas, grandes campos agrícolas, 22 também agora no final do século a companhia elétrica do Paraná, em nome do Progresso vai construir várias barragens no Rio Tibagi, onde vai inundar a única floresta que restou aos Kaingang, então destroem a natureza em nome do progresso. BIBLIOGRAFIA MOTA, Lúcio Tadeu. As guerras dos índios Kaingang: a históira épica dos índios Kaingang no Paraná. Maringá: Editora da UEM, 1994 CAMPESTRINI, Hildebrando e GUIMARÃES, Acyr Vaz. História de Mato Grosso do Sul. Campo Grande: Tribunal de Justiça de Mato Grosso do sul, 1991. MERCER, Edmundo A. & MERCER, Luiz Leopoldo. História do Tibagi. Curitiba: Cenicom, 1977 BROTERO, Frederico de Barros. João da Silva Machado. Disponível em: www.jbcultura.com.br/gde_fam/pafn07.htm. 23 DIVISÃO DO ESTADO DE MATO GROSSO Gesiany da Costa Souza 3 Nilva Maria Assis Rosa 4 RESUMO: Este trabalho tem o objetivo de compreender o processo divisório do Estado de Mato Grosso, considerando o seu aspecto econômico, político, social e cultural. A decisão de dividir o Estado de Mato Grosso em dois estados foi tomada em 1977 e efetivada em 1979. As dissensões políticas e os interesses econômicos das oligarquias formadas entre ambas as regiões foram proeminentes nas idéias separatistas. Um líder de grande importância no movimento separatista do Sul de Mato Grosso foi Vespasiano Martins. A primeira nota oficial da divisão do Estado de Mato Grosso foi dada pelo então Ministro Rangel Reis na cidade de Pelotas (RS) em março de 1977. Enquanto o Sul de Mato Grosso recebia a notícia com euforia, no Norte mais precisamente em Cuiabá, a população amargava a derrota. O movimento em prol da divisão aconteceu sem a participação popular, enquanto uma batalha travada entre os líderes em busca do poder. Este trabalho foi realizado por meio de pesquisas bibliográficas. PALAVRAS-CHAVE: Divisão, Estado, Política e Desenvolvimento. DIVISÃO DO ESTADO DE MATO GROSSO Este trabalho tem como objetivo compreender o processo divisório do Estado do Mato Grosso, mostrando os passos e encaminhamentos políticos, econômicos, sociais e culturais bem como seus principais líderes. A decisão de dividir Mato Grosso em dois estados foi tomada em 1977 e efetivada em 1979 com a criação de Mato Grosso do Sul. Na época afirmava ser essa a melhor forma de administrar e desenvolver uma região tão extensa, diferenciada e estratégica. Além disso, a região centro sul de Mato Grosso, com a agricultura mais intensiva, distribuída por um número maior de propriedades, tem crescimento diferenciado da região norte, onde predomina a pecuária extensiva e o latifúndio. Para a região sul chegam muitos emigrantes desde o final do século XIX, vindo do sul e do sudeste. Esse movimento se fortalece neste século e cria uma sociedade mais complexa e aberta, além de laços políticos sólidos com os Estados vizinhos, especialmente São Paulo. (Almanaque Abril 2000 p.187) 3 4 Graduando em História na Universidade Católica Dom Bosco. E-mail: [email protected] Graduando em História na Universidade Católica Dom Bosco. E-mail: [email protected] 24 Um líder de grande importância no movimento separatista do Sul de Mato grosso foi Vespasiano Martins As dissensões políticas e os interesses econômicos das oligarquias formadas distintamente entre ambas as regiões, foram proeminentes nas idéias separatistas. Enquanto a liga sul-mato-grossense trabalhava no sentido de obter a divisão do Estado, o centro Cuiabá procurava abafar os mecanismos arquitetados pela mesma para acabar com o movimento. Visto que as autoridades centristas começam a taxar de subversivas as aspirações sulistas. Como reforço as delegacias de polícia passaram a receber de Cuiabá ordens para reprimir os movimentos separatistas. Taxar de subversivas as idéias separatistas, foi indubitável forma encontrada pelas autoridades do centro para acalmar os ânimos separatistas. Segundo Rodrigues com a Revolução de 31 de março de 1964, os separatistas novamente se recolheram, mas sentem as esperanças renascerem com a chegada em Cuiabá dos coronéis Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva. A ideologia de apego a terra e o culto à tradição procuram demonstrar que os cuiabanos se sentem integrados à vida mato-grossense em todos os momentos de sua história e em qualquer ponto do território, integrando-o à nação e defendendo-o a qualquer preço. (Rodrigues, 1985 p. 165) As grandes diferenças na formação da estrutura econômica e cultural das duas regiões sempre foi mola propulsora para os movimentos políticos separatistas dentro do Estado nas duas regiões. Desde a Independência do Brasil, houve em 1823 a preocupação da Assembléia Constituinte com os vazios demográficos do Império, principalmente nas regiões do Pará, Amazonas e Mato Grosso. ( Rodrigues 1985). Em 1932 através do prefeito de Campo Grande, Vespasiano Martins surge mais concretamente um movimento separatista criando o Estado de Mato Grosso do Sul ou de Maracajú (SILVA, 1996). A década de 70 foi sem dúvida decisiva dentro do processo divisório de Mato Grosso. Se na área federal os representantes do Governo se manifestavam, o mesmo aconteceria com os políticos mato-grossenses, que não escondiam sua euforia a favor ou contra o processo divisório em andamento. Em 1972, os políticos Sul-mato-grossenses já opinavam quanto à designação nominal do Novo Estado, sendo mais citado o de Maracajú. Para o governador José Fragelli, o Estado dividido deveria ocorrer em federações: Campo Grande e Mato Grosso, assim como a criação de três territórios federais: Aripuanã, Xingu e Araguaia. 25 As afirmações desses parlamentares vêm confirmar, as rivalidades existentes entre duas partes do Estado. O centralismo político e administrativo imposto pelo centro durante tanto tempo criou as arestas que os incompatibilizaram durante um século. O rápido crescimento do sul, em desarmonia com o marasmo do centro em todos os aspectos, veio consolidar de fato uma situação de direito. Podemos observar que os períodos de governos do Estado de Mato Grosso nas pessoas de Pedro Pedrossian e José Fragelli, este último, inclusive, com raízes separatistas adquiridas do pai Nicolau Fragelli, que foi deputado, e de estreitas relações com Vespasiano Martins, tiveram papel decisivo no desenvolvimento político administrativo e econômico do sul do Estado. Em março de 1977 em Pelotas (RS), o Ministro Rangel Reis, anunciava que o “pacote” da divisão territorial de Mato Grosso estava pronto. Entretanto, a Presidência da República só divulga a primeira nota oficial a respeito da divisão territorial no dia 03 de maio de 1977. Na ocasião o Estado criado recebe provisoriamente o nome de Campo Grande. A 15 de novembro do mesmo ano, a Presidência da República assinou a mensagem que encaminhou ao congresso Nacional o projeto de lei complementar propondo o desmembramento da região Sul de Mato Grosso. A mudança do nome de Campo Grande, anunciada em 03 de maio, para Mato Grosso do Sul, ocorreu em função dos protestos de todo o Sul de Mato Grosso. No dia 11 de outubro de 1977, às 11h30min horas, em Brasília, consolidavase a luta dos sul-mato-grossenses pela divisão territorial pretendida. Se a divisão de Mato Grosso trouxe alegrias e tristezas, as dúvidas também fizeram parte do cotidiano do Mato-Grossense antes da solenidade oficial de 11 de outubro de 1977. As dúvidas se resumiram em saber com certeza o nome do Novo Estado. E as dívidas do novo Estado com que ficavam? Quanto seria necessário a União para criar dois Estados viáveis? O Governador Garcia Neto dizia que os gastos estariam em torno de 20 milhões de Cruzeiros, mas já se sabe que a União não dispõe de meios para oferecer tanto dinheiro. (Rodrigues 1985). Ainda Rodrigues, de acordo com a exposição de motivos número 37, de 24 de agosto de 1977, o nome do Estado criado foi Mato Grosso do Sul. Houve apenas o desmembramento do Sul do Estado a partir dos rios: Correntes, Piquiri, Itiquira, Cuiabá e Paraguai, procurando evitar a divisão de municípios. A dívida do Estado foi “perdoada” pela União assim como carreados recursos na ordem de CR$ 1.400,000. 000,00 (Um bilhão e quatrocentos milhões de Cruzeiros) uma vez retirados de seus cofres 75% da receita enviada pelo Sul. A tranqüilidade dos 40 mil funcionários do estado se fez através de artigos, 23, 24, 25, 26 e 27do cap. IV da Lei Complementar n° 31 que previu múltiplos aspectos do problema. 26 O movimento divisionista chegou ao seu fim. Importava saber se realmente devia trazer aquilo que os sul-mato-grossenses esperavam, pois a população acreditava ingenuamente que os chamados divisionista seriam convocados para orientar os trabalhos de instalação do Novo Estado e se para os centristas serviu de exemplo para o extremado centralismo político, historicamente comprovado que durante tanto tempo impuseram ao resto do estado. A Lei Complementar estabelecera, no seu artigo 48, que “O Poder Executivo Federal criará Comissão Especial, vinculada ao Ministério da Justiça, da Secretaria do Planejamento da Presidência da República e do Departamento Administrativo do Serviço Público- (DASP.)”. Indiscutivelmente era uma comissão de nível, à qual cabia a responsabilidade de Construir dois futuros grandes Estados do Brasil. Esperava-se que Mato Grosso do Sul se tornasse em “O Estado Modelo”, para futuras divisões territoriais”. O Estado Modelo ao invés de começar pequeno com pé no chão, dava os seus primeiros passos de forma nababesca. Enquanto os membros da Comissão Especial tomavam as suas decisões, nem sempre calcadas nas necessidades da região por serem elementos de pouca ou quase nenhuma vivência com a terra a que vinham servir, o povo se contentava apenas em esperar o dia 1 de janeiro de 1979, quando seria instalado o Estado recém criado. Ao mesmo tempo em que a Comissão se reunia em Campo Grande, em Brasília ocorria uma “luta terrível de foice no escuro” eram velhos políticos procurando levar vantagens junto ao governo federal. De um lado, o senador Dr. Pedro Pedrossian e seus companheiros políticos, de outro lado os seus adversários, representados por senadores e deputados federais. Por não haver consenso entre as facções políticas, o Governo Federal procurou um nome que pouca ligação tinha com a nascente unidade federativa. O nome escolhido foi de Harry Amorim. A instalação oficial do governo aconteceu, às 17 horas do dia 1 de janeiro de 1979, no Teatro Glauce Rocha, na cidade universitária em Campo Grande, presidida pelo ministro da Justiça Armando Falcão. As diferenças regionais entre os dois Estados, se não foram relevantes para criar os antagonismos políticos, econômicos, sociais e culturais, pelo menos serviram como justificativa. Segundo o autor em sua obra dá ênfase às palavras do então Presidente da República, quanto aos motivos da criação do Novo Estado (RODRIGUES, 1985, p 159). A criação do Estado de Mato Grosso do Sul deve ser entendida como reconhecimento político uma realidade econômico-social. Como uma decisão que vem atender a vontade de um povo; que ao mesmo 27 tempo, objetiva melhor integração nacional e a consolidação da ocupação da região Centro Oeste; que beneficia também o próprio Estado de Mato Grosso, visto como poderá este dedicar-se, doravante, com o apoio da União, ao melhor aproveitamento de seu imenso território e exploração de suas grandes potencialidades de desenvolvimento. Antevejo para o novo Estado promissor futuro. De deu povo e de seu governo, estou certo, muito esperam os brasileiros. (Ernesto Geisel). A Liga Sul-mato-grossense não mediu esforços em perpetuar a luta pela divisão territorial criando comitês em diversas cidades do sul, tentando conscientizar a população de suas vantagens. A mesma não escondeu sua satisfação e se fez presente ao ato de assinatura de lei complementar de n° 31, como se nota na leitura da “Ata n° 09 da Liga Sul-mato-grossense”, onde se descreve a viagem e a solenidade realizada no Palácio do Planalto, até sua volta a Campo Grande. Se a euforia fazia parte dos sul-mato-grossenses, no norte, Cuiabá amargava a derrota sofrida. Mas o que motivou a divisão territorial de Mato Grosso, segundo a divisão oficial foi a necessidade de ocupação dos vazios demográficos da Amazônia Legal. Os movimentos divisionista aconteceram pelas lideranças sem a participação popular. Nos processo de desmembramento territorial, os aspectos econômicos, sociais e políticos tem muita relevância nas decisões. Quanto à análise ao seu resultado se foi bom ou ruim não se tem conhecimento, porém cada vez que acontece uma divisão territorial na federação, surge junto novas esperanças de trabalhadores e aventureiros em busca de melhores oportunidades e condições de vida. Para os líderes o que se observa é uma batalha travada em busca de poder entre as facções políticas. BIBLIOGRAFIA ALMAQUE ABRIL. 26° ed. São Paulo: Abril, 2000. SILVA, Jovam Vilela. A Divisão do Estado de Mato Grosso ( uma visão histórica 18921977). Cuiabá: Ed UFMT, 1996. RODRIGUES, J. Barbosa. História de Mato Grosso do Sul. Ed. do Escritor: São Paulo 1985. 28 VIDA E OBRA DE DOM AQUINO CORRÊA (1885 – 1956) Andréa dos santos chagas1 Jorge Mendonça Júnior2 Daniela Araújo Magalhães3 RESUMO: Este artigo analisa a trajetória social e política de Dom Aquino Corrêa através de referências bibliográficas. Grande personagem da história de Mato Grosso, enquanto Bispo de Cuiabá foi nomeado Presidente do Estado de Mato Grosso e posteriormente fundou o Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso e ainda ocupou uma cadeira na Academia Brasileira de Letras. PALAVRAS-CHAVE: Cuiabá, Bispo, Presidente de Estado. O DESPERTAR DA SUA VOCAÇÃO Cuiabá não era o ambiente mais propício para o desabrochar de uma vocação sacerdotal e religiosa, era um lugar deserto que durante longos quarenta anos de episcopado, Dom Carlos não ordenara sequer um sacerdote diocesano. FIGURA 01 – D. AQUINO CORRÊA Fonte: Curia Metropolitana de Cuiabá. O adolescente Francisco, alegre e barulhento, sentiu dentro do teu coração à vontade de ser padre e disse: “já resolvi”. Então procurou o Padre Rafael Traversa que no confessionário ouviu-o atentamente, e compreendendo suas dúvidas, deu-lhe conselhos que naquela noite, resolveu-se em definitivo o problema de sua vocação. Graduando do 5º semestre do curso de História da Universidade Católica Dom Bosco - UCDB Graduando do 5º semestre do curso de História da Universidade Católica Dom Bosco- UCDB 3 Graduando do 5º semestre do curso de História da Universidade Católica Dom Bosco - UCDB 1 2 29 Ele decidiu: seria um sacerdote salesiano, lembrando das palavras de seu patrono São Luís de Gonzaga: “O que não é eterno, nada vale”. Foi então que em 4 de Novembro de 1902, despediu-se de seu pai e seguiu para o noviciado dos padres de Dom Bosco, às margens de Coxipó-Mirim, sobre sábia direção do mestre, Padre Filipe Pappalardo. Em 19 de março de 1903, recebeu junto com outros companheiros sua batina das mãos do Inspetor dos Salesianos, Padre Antônio Malan. Dom Aquino foi um eterno noviço, ele definira em noviço: florindo sempre sem deixar fenecer o frescor e noviço dos inícios de sua vida religiosa. Quando acabou o seu período de noviço, seguiu para Roma em 2 de julho de 1904, com passagens pagas pelo Presidente do Estado, que a 1º de outubro de 1904, pronunciou os votos consagrando-se a Deus na Congregação Salesiana, Francisco quando chegou em Turim, teve a grata oportunidade de conversar com o Padre Rua, sucessor de Dom Bosco. Apesar de sua saúde fraca, por cinco anos, dedicou-se aos estudos em Roma vindo a doutorar-se em Filosofia e Teologia. Foi eleito Bispo em dezembro de 1919. Em 17 em janeiro de 1909, aos 23 anos de idade, como Presbítero em Roma, dia seguinte celebra sua primeira Missa na Basílica de São Pedro. Havia uma cerimônia na antiga disciplina eclesiástica, chamava-se o dia da “Tonsura”, que o Bispo cortava simbolicamente os cabelos do jovem, marcando o 1º passo para o ingresso do candidato ao estado clerical, indicando assim que não mais o mundo e sim unicamente Deus seria a herança de sua vida. Dom Aquino tinha problemas sérios de saúde, seus superiores da Congregação, o mandam de volta para Roma, para um tratamento severo e repouso absoluto, mas a necessidade de sua presença trouxe-lhe de volta a pátria, e antes mesmo de matar as saudades do querido pai e de sua família, sua obrigação já era representar os Salesianos de Mato Grosso no Primeiro Congresso Interamericano de Ex-alunos Salesiano, em Buenos Aires, o jovem sacerdote impressionou sendo o orador oficial da Representação do Brasil. Enquanto estava em Roma mandou uma carta ao pai relatando a sua alegria de poder estar celebrando as missas em lugares tão especiais e sempre colocando as suas intenções como por exemplo: seu saudoso pai, sua falecida mãe e seus avós, e descreve ainda sua fortuna em ver o Santo Padre a falar-lhe duas vezes, de receber a Benção Papal que na sua audiência, Pio X, pousou-lhe a mão sobre a cabeça. 30 Como diretor do Liceu Salesiano, sua liderança era incontestável, jovem, simpático e orador são meios estes de que se vale Dom Aquino, no espírito do Dom Bosco que se apóia todo na razão, na religião e no amor, instruiu a formar a juventude de sua terra. Marco de sua rápida passagem na direção do Liceu Salesiano foi o lançamento da primeira pedra e o início da construção do Santuário de Nossa Senhora Auxiliadora, em 24 de maio de 1912. Quatro anos apenas de atividade religiosa, apontavam-no como digno de ser escolhido para os ônus do episcopado, pois seria assim o primeiro bispo salesiano brasileiro. Esta nomeação pontifícia aconteceu em 2 de abril de 1914, no dia em que completava 29 anos de idade, sendo o Bispo mais jovem do mundo. Foi um triunfo, muitas homenagens foram feitas entre praças e teatros. No Natal recebeu de presente de Dom Carlos uma cruz de ouro, tendo no centro e nas quatro extremidades esmeraldas, que usava somente em solenidades, pois no dia-a-dia, preferia usar uma cruz mais leve, que ganhou de seu velho pai, mas o presente de Dom Carlos foi roubado em 13 de agosto de 1986, num assalto à mão armada a Residência dos Arcebispos. Dom Aquino, nas férias, visitava as colônias indígenas dos Borôro, com sua simplicidade e constante jovialidade, agradava muito, conseguindo até se expressar no seu idioma. Dom Aquino já se preocupava com a situação política de Mato Grosso. Diante da situação em que passava o Estado, o presidente da República, Dr. Wenceslau Brás, decretou a intervenção federal no Estado de Mato Grosso enviando um representante para encontrar alguém que reunisse autoridade moral, inteligência, simpatia, honestidade, cujo nome fosse aceito por todos. Em 12 de julho de 1917, Dom Aquino toma posse da Diocese de Corumbá e neste mesmo período alguns partidos concordam na pessoa do Bispo para Presidente do Estado, ele ciente das dificuldades que o aguardam, aceita a indicação de seu nome para candidato, e então começa a preparar a plataforma de seu governo. Dois partidos firmam acordo em outubro de 1917: o Partido Liberal e o Partido Republicano, com o apoio dos dois, Dom Aquino foi aceito e proclamado candidato de Conciliação para Presidente do Estado de Mato Grosso. Então em 1º de novembro Dom Aquino foi proclamado Presidente do Estado, onde sua maior preocupação era o sul do Estado que de Corumbá a Três Lagoas, que abrangia imensa área povoada e rica. Após haver tomado posse, ele inaugura nova modalidade de governo: o governo itinerante, pois seria a melhor maneira de conhecer o Estado, visitando 31 cidades, entrando contato direto com as autoridades e com o povo, sentindo assim de perto suas necessidades e anseios. Umas das realizações do Bispo Presidente do Estado, que perdura até hoje, foi à criação de uma instituição literária fundada em setembro de 1921 como Centro Mato-grossense de Letras, mas em agosto de 1932, denominou-se Academia Matogrossense de Letras. Fundou também, para preservar a memória do seu Estado em 1919, o Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso. As coisas não corriam bem no Estado, e ambos os partidos que apoiavam o Presidente, queriam em troca, a máquina administrativa. E aconteceu o imprevisto: os dois Partidos se coligaram e irredutíveis, uniram-se contra o Bispo Presidente, e formaram a “Fusão Mato-grossense”. Dom Aquino continuou a governar, a sofrer ataques de ambos os Partidos, até que as duras penas entregou o Estado ao seu sucessor Pedro Celestino Corrêa da Costa, ele saiu vaiado, humilhado e desprezado. Oferecem a Dom Aquino a Diocese de Belo Horizonte. Ele excita pois os dois Partidos estão contra ele, é um período de sofrimento pois mal tem onde morar e volta temporariamente para Liceu Salesiano. Só após oito meses, toma posse de sua Arquidiocese em 16 de abril de 1922, não mas com grande projetos, mas com prioridade e preocupação de trabalhos voltada para a pregação da palavra de Deus. Em 8 de outubro, no Santuário do Coração de Jesus, em São Paulo, recebe a insígnia própria dos Arcebispos Metropolitanos – O Pálio. Durante o seu episcopado, Dom Aquino passava longas horas em oração e meditação na Igreja do Bom Despacho, que celebrou ali até mesmo de madrugada a Santa Missa e as suas Bodas de Prata Sacerdotais. Por 34 anos, Dom Aquino levava à Padroeira de Cuiabá os anseios, as súplicas, as lágrimas de seu povo, e a este trazia conforto e bênçãos. E EXALTOU O HUMILDE Valeu-se um acontecimento mundano para projetar no mundo social e literário o Arcebispo de Cuiabá. Fala-se da inauguração do Jóquei Clube do Rio de Janeiro, que Dom Aquino estava hospedado no Palácio São Joaquim, por indicação do Arcebispo do Rio de Janeiro e seu amigo Dom Sebastião Leme que era incumbido de fazer a benção inaugural do Jóquei para a alta classe da sociedade do Rio de Janeiro, por motivo de uma faringite aguda indicou de última hora para substituí-lo Dom Aquino em junho de 1926. 32 Essa substituição do eminente Arcebispo Dom Sebastião Leme, figura exponencial do clero e de todos conhecidos, pelo obscuro e inexpressivo Arcebispo de Cuiabá, não deixou muito satisfeitos os membros da Comissão organizadora. No dia da solenidade, após o discurso do presidente do Jóquei Clube, quando Dom Aquino deveria, em nome do chefe da província eclesiástica, dizer algumas palavras de parabéns e a seguir, proceder à benção, alteou a voz e começou fazer um breve discurso improvisado, que logo chamou a atenção geral. Depois do discurso, ele era a pessoa mais aplaudida e aclamada pela multidão que estava presente, e foi a nota principal do jornal O Globo na manhã seguinte. Os discursos da inauguração do Jóquei Clube e de posse no Instituto Histórico e Geográfico brasileiro propiciaram o lançamento da candidatura de Dom Aquino a uma vaga na Academia brasileira de letras, com total incentivo de Dom Sebastião Leme. A insistência de Dom Sebastião Leme em que aceitasse a difícil candidatura e se sujeitasse aos azares da eleição, tinha uma sábia e apostólica finalidade: a mensagem de Cristo devia ecoar, reproduzir nas salas da Academia, e impunha a presença e a palavra e um Sacerdote e de um Bispo como Dom Aquino. Preparando a candidatura, tratou de republicar o livro de versos, Terra Natal, o qual com os dois volumes de Odes, deveria ser apresentado a cada um dos acadêmicos. Dom Aquino disputava a vaga que era do Senador Lauro Muller com seu único opositor o Sr. Lindolfo Collor, que era Deputado pelo Rio Grande do Sul, homem de grande projeção política cultor do vernáculo o distinto orador. Todos já confiavam na vitória de Dom Aquino, inclusive o Jornal O Globo, que venceu e a notícia despertou em Mato Grosso e na Arquidiocese uma alegria incontida, vendo o primeiro filho do longínquo e esquecido Mato Grosso eleito para Academia dos Imortais (1926). Encerrava-se triunfantemente o Ano Centenário de Cuiabá. O Bispo fora recebido no mirante da história, o Instituto Histórico e Geográfico e ingressava vitorioso para a Academia Brasileira de Letras. Trata-se da segunda mitra a penetrar os umbrais solenes da Academia, pois a primeira fora a do Santo e sábio Dom Silvério Gomes Pimenta o imortal Arcebispo de Mariana. Assentar-se entre os “imortais” conferia lustre e prestígio, não só a pessoa mas a agremiação à qual pertencesse , neste caso a Igreja Católica. Fora esta a razão da insistência de Dom Sebastião Leme em que, apesar da eventual derrota Dom Aquino se candidatasse a Academia: com ele era a Igreja, o Episcopado que entrava para a imortalidade acadêmica. Na solenidade de posse da cadeira nº 34 no dia 3011-1927 estava o Presidente Washington Luis todo o Ministério e a grande 33 participação de toda sociedade da Capital da República na posse do Arcebispo de Cuiabá. VISITA A ROMA 1929 Há sete anos havia assumido o Governo da Arquidiocese e, atendendo a determinação do Código de Direito Canônico, deveria ir visitar e venerar os túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, e apresentar a Santa Sé o relatório sobre o estado da Arquidiocese. Pela primeira vez encontraria com o Santo Padre o Papa Pio XI e participaria da homenagem a Dom Bosco, o qual seria declarado Bem-aventurado a dois de junho de 1929 em Roma. Sua personalidade, sua simpatia, atraíram atenção de todos, e foi convidado a celebrar a Missa Dominical no salão do transatlântico. A devoção do celebrante o sermão em perfeito italiano, empolgaram o numeroso auditório que fez questão de custear a edição do folheto contendo a homilia. Criação da prelazia do Diamantino era devido a vastidão da Arquidiocese e a falta de clero, a impossibilidade de prover ao bem espiritual das provações de índios e de civilizados dispersos. Entre várias paróquias, a mais preocupante era a de Nossa Senhora da Conceição do alto Paraguai no Diamantino. As visitas pastorais foram umas das atividades menos conhecidas, mais edificante e trabalhosa da vida apostólica do Arcebispo e no entanto, das mais preciosas ante o Divino Pastor, foi as visitas pastorais, mas isso não fez sozinho precisou da ajuda de irmãs e abnegados franciscanos e toda despesa era paga com suas próprias economias. Encontrando jovens de famílias pobres com inclinações para arte e ofícios, levava-os para o Liceu Salesiano São Gonçalo, onde gratuitamente durante anos eram eles instruídos e formados em algum ofício. Em 1925, Dom Aquino vai visitar as pastorais do velho Bispo Dom Silvério Gomes Pimenta, que era querido por todos onde celebrou muitas crismas, comunhões e confissões, pois, devida a precariedade e dificuldade dos meios de transporte e comunicação e o custo da visita era por sua conta. OS FRANCISCANOS NA ARQUIDIOCESE. A CRIAÇÃO DA PRELAZIA DA CHAPADA. Assim noticiava uma publicação sobre missões religiosas: “No fim de janeiro de 1937, encontrando-se em São Paulo, Dom Aquino Corrêa ouviu de um frade a possibilidade da ida de missionários franciscanos para 34 Mato Grosso. O Arcebispo muito se alegrou com essa notícia e logo ofereceu três paróquias de sua Arquidiocese e se prontificou a entregar uma região para Prelazia. De fato, o governo da Província Franciscana da Imaculada Conceição de São Paulo, em reunião definitorial de 15 de janeiro daquele ano, tinha resolvido ceder à Província Franciscana de Santa Isabel da Turíngia, na Alemanha, todo o território do então Estado de Mato Grosso. Na reunião definitorial Provincial de 2 de março de 1937, o governo da Turíngia aceitou a oferta e decidiu a fundação da nova missão em Mato Grosso.” A notícia foi logo comunicada ao Arcebispo com o agradecimento pela oferta das três paróquias e, ao mesmo tempo, foi-lhe exposta a seguinte dificuldade: as leis em vigor na Alemanha proibiam levar dinheiro para fora do País, nem permitiam enviar auxílios de qualquer espécies era necessário, pois, ter a certeza de que os padres enviados a Mato Grosso teriam garantido o sustento. A 16 de março de 1937, Dom Aquino respondeu expressando a alegria em receber os filhos de São Francisco, oferecendo-lhes duas paróquias: a de Nossa Senhora do Rosário, em Rosário Oeste, e a de Santo Antônio do Leverger. A seguir, escreve: “A verdadeira messe, grande e digna dos filhos do Patriarca Seráfico, será a paróquia desta Arquidiocese denominada “Sant’Ana da Chapada” a ser em breve erigida, como é lícito esperar, em sede de Prelazia nullius, de acordo com o pedido que eu mesmo encaminhei, faz pouco tempo, à Nunciatura Apostólica”. No fim da carta, acrescenta que já oferecera a projetada Prelazia aos Padres da Congregação dos Sagrados Corações de Picpus, na Holanda, cuja resposta estava esperando para breve. Caso, porém, não aceitassem a Prelazia, como previa o Arcebispo, ficaria à disposição da Província Franciscana da Turíngia. Finalmente, após tantos anos de desolação, a Providência consolava o Pastor com a vinda de novos operários para vinha do Senhor! A perseguição que o Nazismo intensificava mais e mais contra a Igreja Católica na Alemanha viria beneficiar Mato Grosso e, de maneira particular, a Arquidiocese de Cuiabá. No dia 23 de fevereiro de 1938, os primeiros Franciscanos Alemães chegaram de barco a Cuiabá, e foram cordialmente recebidos e hospedados pelo Arcebispo. No dia 17 de março, foi-lhes oferecido um banquete de despedida e, no dia 20 do mesmo mês, realizava-se a posse do primeiro vigário, Frei José Passmans, e despontava uma nova era de vida espiritual para aquela imensa e desolada região que, desde o ano de 1904, não contava com pároco residente. Haveria mais uma paróquia a oferecer aos franciscanos, a de Santo Antônio do Leverger, mas Dom Aquino ia protelando, aconselhando calma e devagar. Qual era a razão de adiar a entrega de uma paróquia há tantos anos abandonada e necessitada 35 urgentemente de pastor? O secretário de Dom Aquino revelou o segredo: o Arcebispo não tinha dinheiro para adquirir uma casa para os padres, tampouco para prover ao seu sustento... Os poucos recursos da Arquidiocese eram absorvidos e consumidos na ampliação e na reforma do velho prédio do Asilo Santa Rita. O sonho do Arcebispo era a criação da Prelazia da Chapada e entrega-la ao zelo dos Franciscanos. Há anos vinha mantendo correspondência com a Nunciatura Apostólica, e, em sua viagem à Europa, em 1938, estivera em Roma para tratar, com os organismos competentes, da criação da Prelazia. A 22 de janeiro de 1939, o Padre Frei Pedro Holz foi empossado como primeiro pároco da Paróquia de Sant’Ana da Chapada. Bom é que tenhamos uma idéia do que era aquela Paróquia para aquilatar as preocupações e trabalhos do nosso Arcebispo. Na proposta da criação de Prelazia, a população foi calculada em cerca de 15.000 habitantes. Estes se dividiam em três classes, distintas entre si, pelas condições de vida e pela atitude religiosa, a saber: índios pagãos, garimpeiros e sertanejos: índios pagãos: naquele tempo, viviam ainda na região três tribos diferentes: a tribo dos Guatós, que morava na parte central e cujo número era bem pequeno. Mais longe, os Caiapós habitavam nas grandes matas do norte e ainda eram verdadeiros selvagens. Eram nômades e não mantinham relações nem com civilizados nem com outras tribos indígenas. No centro da Prelazia, no rio São Lourenço, existiam seis aldeias de índios meio civilizados, da tribo dos Borôro. Estes, segundo as estimativas, eram perto de 1.000 indígenas; Garimpeiros: dentro do território da Prelazia se localizavam umas 20 minas de diamantes e de ouro. Os garimpeiros, cujo número era, ora maior, ora menor, não tinham moradia fixa. Na sua maioria, eram aventureiros que vinham de todos os Estados do Brasil, e mesmo do estrangeiro, para, em pouco tempo, fazer fortuna. Mas, em geral, vegetavam na maior miséria econômica e moral, porque a sorte não sorria para todos; Sertanejos: eram os antigos habitantes da região. Em geral, eram pequenos camponeses com pobre choupanas de palha e barro. Cultivavam o que precisavam para viver e mais nada. Como estavam desligados de todo comércio, não tinham possibilidade de nenhuma venda ou troca, e assim não pensavam em melhorar suas condições de vida. Contudo, viviam felizes e contentes. Quase todos eram analfabetos. Em todo o território da Prelazia, então, havia poucas escolas, nenhum médico, nenhum dentista, nenhuma farmácia, nenhum hospital, nenhum cuidado social. Segundo Dom Vunibaldo, primeiro Prelado, o povo que morava na Prelazia era 36 “um povo bom e simples, mas um pouco sofredor, trabalhando continuamente, sem muitas esperanças. Alimentando-se mal, sobrevive aquela gente por um milagre quase inconcebível de nutrição. Sem roupa suficiente, vai resistindo às intempéries como pode. Em moradia, mais ruína que casa, vive a rigor de iminente desabrigo. Sem medico nem remédios de farmácia, livra-se lutando contra os males e as doenças.” As condições religiosas eram deveras lastimáveis, pois, durante anos a fio, não aparecia um sacerdote para catequisar aquelas povoações e, quando chegara um vindo, de Minas Gerais, fora preciso suspendê-lo do uso de ordens pela sua vida pouco edificante. Dom Vunibaldo, mais uma vez, nos descreve a situação: “Um povo, na realidade, católico. Mas a ignorância em matéria de fé era tal que dava pena. A prática da vida religiosa quase se reduzia a meras formas ocas, cujo significado não compreendiam. Acompanhar a folia com bandeira do santo, para muitos era o maior ato de religião. Usavam o nome de Deus em suas expressões: parece que pouco o invocavam em suas preces. E o que dizer do respeito a Deus em seus mandamentos mais importantes?” Nada mais compreensível, perante tão desolada realidade, que o Arcebispo se empenhasse a mais não poder para entregar esta porção enorme da Arquidiocese aos Franciscanos, pois os Padres da Congregação dos Sagrados Corações de Picpus haviam recusado a oferta. Como demorava a criação da nova Prelazia, Dom Aquino, em 1938, foi tratar do assunto junto à Congregação Consistorial, em Roma. Agosto é mês de férias e o Cardeal preposto à Congregação não estava. E Roma achava que uma população de 15.000 almas não necessitava de ser elevada a Prelazia... Não tinham, porém, a mais longínqua idéia do que são 140.000 km²! Afinal, Dom Aquino desabafou entristecido e decepcionado que em Roma houvesse tão pouca compreensão sobre a situação do Brasil! Finalmente, a 13 de julho de 1940, foi publicada a Constituição Apostólica “Quo Christi Fidelibus”, com a qual era criada a Prelazia nullius da Chapada e, um ano depois, no dia 19 de julho de 1941, foi nomeado o Padre Frei Vunibaldo Talleur, membro do Comissariado dos Franciscanos de Mato Grosso, para Administrador Apostólico. A 16 de maio de 1910, em Cuiabá, aparecia o Semanário da Arquidiocese, A Cruz, nascido do ardor apostólico e da aguerrida pena de Frei Ambrósio Daydée, Franciscano da Terceira Ordem de Alby, com as bênçãos do belicoso e autoritário Arcebispo Dom Carlos Luiz D’Amour, ambos varões de excepcional envergadura moral, 37 os quais, naquele tempo e naquelas circunstâncias, exerceram, com destemor e zelo ardente, o seu apostolado. Um clima de hostilidade e desprezo, desde a queda do Império, envolvia a Igreja de Cuiabá, seu Arcebispo e o Clero. Calúnias hediondas, veiculadas pela revista A Reação, estavam a exigir uma tomada de posição, e esta veio com ingentes sacrifícios, no Seminário da Conceição, nasceu o jornal Católico A Cruz, ao qual melhor caberia o nome de Espada, tais os golpes e contragolpes que brandia. Tanto o jornal A Cruz quanto os “sabatinos” deixaram de existir com a morte do Arcebispo. Em geral, era ele quem corrigia as provas tipográficas, com a meticulosidade que lhe era peculiar. Redigia crônicas religiosas, e, durante muitos anos, enriqueceu o jornal com o “artigo de fundo” sob o título geral de “Pétalas do Evangelho”, artigos religiosos e, ao mesmo tempo, literários de alto valor, enfeixados mais tarde, por ocasião de 25º aniversário de sua morte, em volume com o mesmo expressivo título Pétalas do Evangelho. Tantas eram as dificuldades do jornal que as catequistas e algumas dedicadas Filhas de Maria, mais próximas, sob a sorridente e santa liderança da Professora Aureolina Ribeiro, a queria e conhecida Professora Oló, dobravam-lhe as páginas, escreviam os endereços e o remetiam aos assinantes! Mas, enquanto viveu, nem pobreza, nem cansaço, nem falta de colaboradores e dificuldades de obter o papel necessário conseguiram faze-lo desistir de, através da boa imprensa, pregar a verdade nos lares e localidades mais distantes de sua Arquidiocese. Mantinha-se, desse modo, fiel, sobranceiro às dificuldades, ao lema que escolhera como ideal do seu episcopado: “Sanctifica in Veritate” – Santificar através da Verdade. No ano de 1938, o Governo brasileiro foi convidado e aceitou a participar da VII Conferência da Instrução Pública em Genebra. Para representar o Governo foi convidado o Arcebispo de Cuiabá que aceitou a honrosa incumbência. Quarenta e duas nações fizeram-se representar e, no dia 18 de julho, o primeiro ato foi a eleição dos dois vice-presidentes, pois era praxe, nas assembléias internacionais, que o Presidente da Conferência anterior propusesse o novo presidente a ser eleito. Eleito por aclamação o delegado da França, Paulo Barrier, este propôs, para primeiro vice-Presidente, o nome de Dom Aquino que foi entusiasticamente aclamado. Mais um prestigio e orgulho para o episcopado e a longínqua Cuiabá. 38 Com o Arcebispo do Rio de Janeiro, inicia Dom Sebastião leme uma grande campanha para recuperar o prestígio social do Catolicismo no Brasil, reivindicando para a Igreja o lugar que – como dizia - lhe cabe por direito na vida social. Por ocasião do Centenário da Independência do Brasil, em 1922, promove um grande Congresso Eucarístico, objetivando mostrar, às autoridades do País e ao povo em geral, a força viva do catolicismo. Dom Aquino, recém-saído do Governo do Estado de Mato Grosso, fora convidado para proferir, na Igreja de São Francisco de Paula, o sermão de abertura oficial do Congresso Eucarístico, em que se sagrou, desde logo, no mais empolgante orador sacro. A própria candidatura de Dom Aquino à Academia Brasileira de Letras, que ele não desejara nem favorecera, parecia fazer parte do plano de Dom Sebastião Leme, que, como líder do Episcopado e da intelectualidade católica, estava empenhado em que a Igreja continuasse a ter partipação efetiva no mais alto silogeu da intelectualidade brasileira, ausente que estava desde o falecimento de Dom Silvério Gomes Pimenta, o primeiro representante do clero a ter assento naquele sodalício. As diretrizes do Pontificado de Pio XI eram a revitalização do Catolicismo dentro de uma óptica de reivindicação e conquista dos direitos de Cristo Rei. A tradicional concepção da Igreja “sociedade perfeita” deveria estar ao lado e em sintonia com o poder civil. É neste contexto histórico, que se inicia e desenvolve, a contar de 1922, o serviço episcopal de Dom Aquino, cuja personalidade, em contínua e luminosa ascensão no cenário nacional, é aproveitada especialmente por Dom Sebastião Leme para o necessário diálogo entre Igreja e Governo Federal. A amizade e a admiração do Presidente Getúlio Vargas, a chancela acadêmica que conferia a seu nome extraordinário prestígio, fizeram de Dom Aquino o orador das grandes solenidades promovidas pelo Governo Federal. Justo é observar, no entanto, que a maioria dos discursos foi pronunciadas em Missas ou Te Deum em ação de graças em dias festivos da nacionalidade. Assim em 1933, no Rio de Janeiro. Era a primeira vez que um Presidente da Argentina visitava oficialmente o Brasil. Fora o Arcebispo de Cuiabá convidado para a oração gratulatória, sendo o oficiante Dom Sebastião Leme, então Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro. Deixou empolgado o auditório, e o Presidente Getúlio Vargas, agradecendo, perguntou ao Arcebispo o que lhe poderia oferecer em retribuição a tão relevante serviço. 39 Tratava-se de reabrir o Seminário da Conceição, que, desde os primeiros anos do episcopado de Dom Carlos, cerrara suas portas para os candidatos ao sacerdócio e, finalmente, voltaria a ser casa de formação como Noviciado da Inspetoria Salesiana de Mato Grosso. Viriam da Itália os primeiros noviços, e Dom Aquino queria oferecer-lhes uma viagem igual à dos primeiros missionários vindos, em 1895, a Cuiabá. Pediu ao Presidente custeasse a viagem dos jovens que viriam da Europa para se prepararem à entrega, de corpo e alma, à promoção religiosa e humana do nosso povo. Em 1941, mais uma vez o Presidente Getúlio Vargas desejou que a voz de Dom Aquino ecoasse no Rio de Janeiro perante imensa multidão, ao serem inumados os restos mortais dos heróis de Laguna e Dourados, no monumento a eles erigido na Praia Vermelha. Não era simplesmente vínculos de amizade, simpatia ou gratidão, mas o reconhecimento de um bispo católico ao Presidente, o qual, após anos de tenebroso laicismo, dera à Igreja e às suas instituições o respeito e prestígio merecidos. A 7 de agosto de 1941, o Presidente Getúlio Vargas era recebido festivamente em Cuiabá: era a primeira visita de um Presidente da República a Mato Grosso. Dom Aquino, como uma das figuras representativa do Estado, promoveu um solene Te Deum de ação de graças na velha Catedral. 1948- ANO DE SOFRIMENTO E DE TRABALHO. O ano de 1948 apresenta-nos, dia após dia, a múltipla e verdadeira faceta do Arcebispo, madrugava as três e meia todos os dias para orar, meditar e estudar. Neste mesmo ano a 19 de fevereiro falece vigário geral, Padre Luís Sutera, o qual, durante vinte anos fora seu auxiliar dedicado. Reduzido a inatividade por um derrame cerebral, passou os últimos meses da sua vida na Santa Casa de Misericórdia, onde todos os dias o Arcebispo ia visitá-lo. Presidiu as cerimônias fúnebres e também ele rendeu-se à doença que há muito o fazia sofrer, tinha ele um rim deslocado que estava a exigir pronta intervenção cirúrgica. O tempo de Quaresma não permitia que ele se ausenta-se, entretanto em 14 de abril as condições de saúde se agravaram e ele foi levado ao Rio de Janeiro, em avião especial da Presidência da República, para ser submetido a exames e à operação, apesar de muito a contragosto pois, a 2 de maio haveria a inauguração da matriz de Santo Antonio do Leveger e no dia 18 seria a posse do novo Bispo da Chapada Dom Vienebaldo Talleur. No final do mês, dia 30 de maio pelo médico Drº Joaquim Moreira da Fonseca deixando a Casa de Saúde somente em agosto. 40 A 28 de outubro em Porto Alegre pronunciou a oração inaugural no Pontifical de abertura do V Congresso Eucarístico Nacional. Ao voltar ao Rio de Janeiro, antes de retornar a Cuiabá, brinda o Episcopado com um pequeno livro em latim: Florelegium Axceticum pro Episcopis. Florégio Ascético para os Bispos. Em 26 de novembro retorna a cidade natal e é recebido por todas as autoridades encabeçadas pelo Governador do Estado, pelo Clero, pelos religiosos e pelo povo fiel. SEU PRECÁRIO ESTADO DE SAÚDE. A DESIGNAÇÃO DE SEU BISPO AUXILIAR. Antes da ordenação ao presbiterado, em Roma sofreu um profundo esgotamento nervoso, que exigiu meses de tratamento e lhe impediu de obter outros títulos acadêmicos, além dos que já possuía: doutor em Filosofia e em Teologia. Durante uma de suas internações, de São Paulo em 1943 ele escreveu uma linda Carta Pastoral sob o título “O dever da oração”, e nos dá a conhecer seu estado de saúde. Em 1947 devido a uma longa e grave doença escreve outra notável Carta Pastoral: O Testamento do Vosso Arcebispo. Em 1952 teve uma gravíssima e dolorosa infecção, agravado por problemas cardíaco e diabético, e durante o tempo que ficou internado escreveu a Carta Pastoral sobre O Congresso Eucarístico de Cuiabá e os frutos que dele esperamos. Enfraquecido por tantas enfermidades, e ao sentir declinarem-lhes as forças, solicitou por intermédio da Nunciatura Apostólica, ao Santo Padre, um Bispo auxiliar e mais tarde querendo preparar-se ao grande passo na oração e no recolhimento, um Arcebispo coadjutor com direito à sucessão. Ao longo de vários anos enviou insistentes pedidos para superiores maiores da Congregação Salesiana, quanto a Nunciatura Apostólica, mas os nomes por ele apresentado já estavam sendo cogitados para outras dioceses. Os dois nomes sugeridos pelo Arcebispo foram os de Pe. João Rezende Costa e Pe. Orlando Chaves, ambos ligados a Dom Aquino, honraram sobremaneira a Congregação e o Episcopado Nacional. Em 20 de junho de 1950, recebe o telegrama da Nunciatura Apostólica em que lhe comunicava que o Papa Pio XII nomeava o Pe. Antônio Campelo de Aragão, Bispo titular de Sesta e auxiliar do Arcebispo de Cuiabá. Os poucos anos que o Bispo auxiliar passou em Cuiabá foram de muitas iniciativas, organizador do 1º Congresso Eucarístico de Cuiabá, fez vibrar a cidade e a Arquidiocese. 41 Com a morte, em março de 1956, do Arcebispo de Cuiabá, governou Dom Campelo, como vigário capitular, vindo a tomar posse a 11 de fevereiro de 1957 da Diocese de Petrolina, no Estado de Pernambuco. NA SEMANA SANTA – 1950 O aniversário natalício de Dom Aquino leva-nos a relembrar e reviver a Semana Santa, pois que ele nascera no dia 2 de abril de 1885, numa quinta- feira Santa. O acontecimento de maior relevo nessa semana que ele invariavelmente celebrava e presidia em sua sede com muitos trabalhos e extraordinária devoção, era o Sermão do Encontro. Nada melhor do que a Epístola a Dom Aquino, escrita e publicada pelo acadêmico Corsíndio Monteiro da Silva, dirigida a Dom Aquino por ocasião do Centenário de seu nascimento. DOIS JUBILEUS E O CONGRESSO EUCARÍSTICO O ano de 1952 marcava, na sua vida duas datas jubilares: uma de ouro e de prata a outra, ambas ricas de alto significado para a sua vida de religioso salesiano e de literato. Completava-se meio século de vida religiosa salesiana e, há 25 anos recebera os lauréis da imortalidade literária com a eleição à Academia Brasileira de Letras. O Bispo auxiliar para “comemorar, santificar e perpetuar as duas efemérides jubilares”, lançara a idéia de um Congresso Eucarístico, o 1º de Mato Grosso, um Congresso em Cuiabá era tarefa tão nobre quanto ousada: a distância que muito e tudo dificultava, porém em se tratando de Dom Aquino, todos se uniam, todos vibravam e cooperavam felizes. Era dado a Dom Aquino presidir ao 1º Congresso Eucarístico do Estado que governava como Presidente de Conciliação. Concorrera e vencera dois concursos para o hino dos Congressos Eucarísticos Nacionais - da Bahia em 1933, e de Pernambuco em 1939. O trabalho inteligente e ingente do Bispo Dom Campelo, auxiliado por uma plêiade de católicos, conseguiu tornar Cuiabá digna de um Congresso Eucarístico. A 12 de junho de 1952, no primeiro dia do Congresso, o Colégio Salesiano São Gonçalo, do qual ele fora aluno, professor e diretor, inaugurava o salão de atos com a sessão solene em homenagem ao acadêmico jubilar. Outra expressiva homenagem partira da iniciativa do afilhado Drº Luis Phelipe Pereira Leite na praça principal da capital, entre o Palácio do Governo e a Catedral Metropolitana, uma escultura em bronze feita por Leonardo Viana da Cunha Lima. 42 ANO DE 1954 A pouco e pouco, vamos chegando aos últimos anos de vida do Arcebispo tendo ele, agora o Bispo Auxiliar a dinamizar a vida religiosa da Arquidiocese, ausenta-se com mais freqüência demorando no Rio de Janeiro e em São Paulo. A 19 de novembro, no Rio de Janeiro recebe as insígnias de Comendador da Ordem do Mérito Militar, havendo sido já por ocasião do Congresso Eucarístico agraciado com as insígnias de Grande Oficial da Ordem do Mérito Naval. Desde a aurora até ao crepúsculo de sua existência de literato e pastor de almas, sua vida foi suavemente iluminada pelo amor à Santíssima Virgem. ÚLTIMA MENSAGEM O ano de 1955 girou, todo ele em torno do 36º Congresso Eucarístico Interno, sua preparação e realização. Foi em janeiro de 1956 que Padre Pedro Cometti acompanhou Dom Aquino até a Catedral, pois ele desejava escolher e definir o local onde deveria ser enterrado. O Presbitério da Velha Sé Catedral, de estilo colonial achava-se bem elevada acima da nave central a ele ascendia por seis degraus, em baixo estava a mesa de comunhão entre esta e os degraus de acesso ao presbitério, havia um espaço de metro e meio de largura, pelo comprimento da nave central, por onde o Sacerdote passava distribuindo a Comunhão. Ele escolheu este espaço, entre os degraus e a mesa de Comunhão, e pediu que uma lápide de mármore branca cobrisse seus restos e tivesse gravado, em letras grandes, a frase: “A Eucaristia é tudo”. Desde os primórdios de seu Episcopado, Dom Aquino escrevia semanalmente um artigo para o Semanário A CRUZ, a partir de 1951, após muita insistência ele concordou que os artigos fossem enfeixados em volume e em 1955 ele levou os originais a Imprensa Nacional. Com o falecimento do Arcebispo e com o passar dos dias nenhuma informação era passada a respeito do edição do livro, a não ser que os originais haviam sumido, após um não o sucesso do Arcebispo teve conhecimento de que “um amigo” retirara da imprensa os originais e os levara para sua residência, guardando com muito cuidado, porém, certo dia sua empregada, num assomo de vontade de limpar e ordenar, jogou tudo no fogo, e lá se foram as pétalas do Evangelho. Entretanto um paciente trabalho do Padre Raimundo Pombo conseguiu coligir grande parte dos artigos esparsos em jornais e revistas, havendo a Arquidiocese de Cuiabá, com o patrocínio da Prefeitura Municipal de Cuiabá, mandado publicar, no 25º ano de seu falecimento. No ano de 1952 no mês de julho Padre Pedro Cometti acompanhou Dom Aquino a residência do Drº Marcelo Moreira para um almoço, antes de entrar na 43 residência como era do seu feitio Pe. Cometti olhou se o Arcebispo estava “em ordem”, quando notou uma gota de pus na narina direita, foi então que Dom Aquino lhe disse que era um tumor, mas já estava tratando e pediu para que não dissesse a ninguém. Na máxima reserva, tomava aplicações de radioterapia e a intercessão do Padre Rinaldi, alcançou-lhe que o tumor estacionasse. Faleceu sem que ninguém mais soubesse. O mês de janeiro de 1955 praticamente o passou no quarto sem incômodos específicos, porém com um mal-estar generalizado e grande fraqueza. Dois meses após Dom Aquino ter ido visitar as construções do aeroporto em Várzea Grande, o avião que traria seus restos mortais seria o primeiro a pousar naquele “mar de asfalto” como ele havia se referido. MORRE DOM AQUINO Dom Aquino passa por alguns exames médicos realizados em São Paulo, entretanto, aconselhavam uma operação que não apresentava alto risco, pois se tratava de um cálculo encontrado na parede da bexiga, causava certa preocupação pelo físico extremamente debilitado do paciente e pelos problemas cardíacos que tinha. Fora operado com êxito no dia 18 de março, mas o pós-operatório não apresentou indícios favoráveis a uma pronta recuperação, pois os rins não funcionavam bem e receava-se uma uremia fatal, o que, infelizmente acabou acontecendo no dia 22 do mesmo mês. Na tarde tristíssima do dia 23 de março de 1956, pela primeira vez, um avião de carreira chegava ao novo aeroporto, ainda não inaugurado trazendo os restos mortais de Dom Aquino, o qual ele havia visitado dois meses antes. BIBLIOGRAFIA COMETTI, Pe. Pedro. Dom Aquino Corrêa: vida e obra. Cuiabá, 1993. 44 FILINTO MÜLLER ADENILTON BERNARDES FELICIANO5 RESUMO: Este artigo visa apresentar a contradição existente sob à imagem de Filinto Müller. Um homem aparentemente admirado por companheiros políticos e amigos, isto é, se existir amizade na política, mas execrado pela maioria da sociedade, pela sua participação e atuação com requintes de violência contra opositores ao governo Vargas, no período da ditadura no Brasil , no qual ele ocupara o cargo de chefe de policia e responsável direto pela ordem e segurança do governo de 1933 à 1941. Mas como é sabido por muitos, pela manipulação e por não ser de interesse das lideranças políticas do país, que cheguem ao conhecimento da massa, determinados fatos ou períodos da história recente, são quase que inexistentes bibliografias e outras matérias, para que se possam ser feitas analises minuciosas sobre os fatos ou personagens que fazem parte dessa história, e poder tirar da mesma a própria conclusão sobre os acontecimentos. E por maior dificuldade que exista, este texto busca trazer o leitor à uma reflexão sobre a possibilidade de uma personagem poder sair como herói ou somente como vitima das circunstâncias de determinadas situações da qual tenha participado diretamente, trazendo dor e sofrimento à muitas pessoas, através apenas de fontes apresentadas por ex-companheiros de labuta, ou que por maiores que sejam, por mais desculpas que se possa pedir, nunca se apagará da memória de um povo, os males por ele sofridos, nem mesmo se esses males tenham sido realizados por alguém que estivesse achando que na realização de suas funções estivesse fazendo o correto, em busca apenas da ordem da nação, sem se aperceber que estaria deixando marcas profundas de dor e sofrimento para a posteridade. PALAVRAS-CHAVE: Chefe de policia, Ex-companheiros, Ditadura, Herói, Sistema. A VIDA DE FILINTO MÜLLER Filinto Muller , nasceu no dia 11 de julho de 1900, em Cuiabá – MT. Pertencente a uma família de tradição na política matogrossense, onde seu pai, Júlio Frederico Müller, foi prefeito de Cuiabá por várias vezes durante a República Velha e seus irmãos Fenelon e Júlio Müller foram interventores federais no estado durante o primeiro governo de Getúlio Vargas. Fez os estudos secundários em Cuiabá, e os de grau superior na Escola Militar do Realengo, onde se especializou em Artilharia, e na Faculdade de direito de Niterói, onde bacharelou-se em ciências Jurídicas e Sociais (MELLO, 1970). 5 Acadêmico do curso de História/UCDB.E-mail: [email protected] 45 Foi senador por quatro mandatos, nas legislaturas de 1947, 1955, 1962 e 1970, com destacadas atuações. Exerceu a liderança do PSD e, posteriormente, do governo JK. No mandato de 70 ocupou a liderança da ARENA e do governo, e a presidência nacional do partido, além de ter sido Chefe de Polícia durante a ditadura do Governo de Getúlio Vargas, entre 1933 e 1941, período que o colocou na história do Brasil como sendo uma figura monstruosa que fechava sindicatos, prendia operários e mandava torturar e matar comunistas. Em 1973 assumiu a presidência do senado. Neste mesmo ano, no dia do seu aniversário (11 de Julho), vitima de acidente aéreo, morreu, junto à mulher o neto e mais 119 pessoas (www.diariodaserra.com.br) Político preocupado com o desenvolvimento intelectual, cientifico e econômico do seu estado natal, muitos mato-grossenses tiveram formação acadêmica no Rio de Janeiro, com o apadrinhamento de Filinto Müller, sob uma única condição, de que após formados deveriam retornar para o Mato Grosso, de forma a contribuirem para o desenvolvimento do Estado. Foi Ele também um dos principais responsáveis pela fundação da Universidade Federal de Mato Grosso. È difícil acreditar que na política do Brasil, onde sempre um esta querendo puxar o tapete do outro, existam amigos ou admiradores dos feitos realizados pelos seus concorrentes. Porém segundo políticos como Saldanha Derzi e Plínio de Mello, excompanheiros de Filinto Müller, ele fora um homem admirável, de muitas qualidades, responsabilidades e de integridade moral, principalmente por não se colocar em discussões quando o acusavam de alguma arbitrariedade que desabonasse sua figura, ou até mesmo por saber reconhecer seus erros cometidos. Plínio de Mello, em seu livreto “ DE ALCESTE A FILINTO: O Perfil de Um Homem”, deixa bem explicita a descrição desses fatos: Um homem que durante anos e anos a fio , viu sua personalidade arrastada na lama dos insultos, recebendo serenamente os raios da calúnia que ribombavam sobre ele, mas sem lhe abater a estatura de homem. Calúnias, infâmias, ódio; ódio por amor do ódio, se assim me posso expressar, servindo de pára-raios de toda uma situação, uma época política, às vezes como único culpado de ações que não foram suas nem delas tivera conhecimento e que quase sempre nem a elas se poderia opor, pois não lhe sobrava poder para tanto!(pág. 2) Filinto Müller tem a grandeza de reconhecer perante a Nação o seu erro, pensando que na ditadura se encontrariam os meios para criar uma situação que eliminasse a corrupção e a imoralidade que ele, quando moço, via em torno de si. Hoje, reconhece, sinceramente, que errou e prega a sua fé na democracia, “porque a democracia é o único regime que realmente respeita a integridade do homem e lhe possibilita elevar-se e dignificar-se” , isto é, atingir os mais altos padrões de dignidade humana, aproximando-o mais Daquele que, em sendo Deus, se deixou crucificar, por amor dos homens e desse ideal de maior perfeição humana.(pág.3) 46 CUMPRIMENTO DO DEVER OU ABUSO DO PODER? Como já foi descrito, sua principal presença na história do Brasil não está relacionada à sua participação de liderança dentro da política nacional e nem tão pouco, na sua visão progressista para o MT, e muito menos ainda pelo seu caráter, honestidade, carisma, entre outras qualidades. Sua presença é marcante durante o governo Vargas, onde por quase uma década (1933 – 1941) fora Chefe de policia do governo, sendo responsável direto pela manutenção da ordem e segurança do país, fato que o tornara, o maior alvo das acusações e perseguições sofridas pelo governo, por parte dos esquerdistas contrários ao Getulianismo que eram perseguidos pelo mesmo, de forma que alguém deveria executar o trabalho de proteger o governo contra os revolucionários da época, se é que se pode falar em revolução para aquele período de nossa história, e esta função era de responsabilidade de Müller, que usava de todas as formas para conseguir realizar bem seu trabalho, não importando a forma como conseguiria realiza-lo. Enfim, fora Ele o pára-raios de Vargas, segundo alguns desses seus “amigos” – “Sobre seus ombros recaiu o peso da ditadura, da repressão ao comunistas e integralistas, das torturas, das prisões injustificadas e dos desaparecimentos” (www.tce.mt.gov.br), pois como culpar por mortes e torturas um homem tido como “o pai do povo”, que assegurou os direitos trabalhistas, entre outras inúmeras conquistas? (www.diariodaserra.com.br). De todas a acusações, a mais conhecida e polêmica, é a da prisão e deportação da judia alemã, Olga Benário, militante comunista e mulher de Luís Carlos Prestes, que era orientador da Aliança Nacional Libertadora, um órgão do partido comunista e um dos principais opositores ao governo. Em entrevista consedida por Filinto Müller ao JORNAL DO BRASIL do dia 16 e 17-11-69, ele se isenta da culpa de deportação e conseqüentemente a morte em um campo de concentração alemão, da militante comunista, e diz que somente cumpria ordens. Toda gente sabe no Brasil que um ato de expulsão de estrangeiro não depende de um chefe de Policia, mas sim de decisão do Presidente da República, referendada pelo Ministro da Justiça. Fui convocado para uma reunião ministerial e notificado de que deveria levar esclarecimentos sobre a situação das mulheres estrangeiras presas[...]. Levei a documentação à reunião ministerial. Houve longo debate. Fiquei contra a expulsão. Ao final decidiu-se que as estrangeiras seriam expulsas. A polícia fez o que lhe competia[...]. A minha atuação foi a de coligir dados do processo e de cumprir o decreto de expulsão (JORNAL DO BRASIL). Não se pode dizer portando que Filinto Müller fora um homem sem escrúpulos, por toda sua participação e influência durante o período que ocupou o cargo de Chefe de Policia do Governo Vargas, mas também, ele não pode ser isentado 47 de todas as atrocidades ocorridas. Mas a questão que fica em relação à Filinto Müller enquanto Chefe de Policia e responsável direto pela ordem e segurança do País, já que praticamente todas as fontes que se encontram à respeito dele são descritas pelos excompanheiros ou por aqueles influenciados a faze-lo de forma à transforma-lo em herói, ou somente vitima do sistema, é! Ele, somente executava as ordens da maneira que lhes eram passadas, ou pelo poder a ele outorgado, agia de forma mais viril do que deveria ser ? E mesmo sendo apontado por muitos como um personagem mal de um período da história, por outros fora, ou é apontado como um personagem que teve que se adequar aos períodos, onde,quando teve que usar a força, usou, e posteriormente quando virou político, e teve que usar sua inteligência e visão progressista, também usou. Enfim, Filinto Müller entrou na História do Brasil, pela porta dos fundos, fazendo o serviço sujo, mas o sistema insiste em coloca-lo como sendo um homem bom, que apenas pelo seu patriotismo, buscava manter a ordem a qualquer custo. BIBLIOGRAFIA DERZI, Saldanha. Filinto Müller. Brasília, 1973. MELLO, Plínio de. De Alceste a Filinto, O Perfil de Um Homem. 1970. http//www.diariodaserra.inf.br http//www.tce.mt.gov.br http//www.senado.gov.br 48 MADAME LYNCH Tais Sebastiana.Leite da Silva Pereira1 RESUMO: Ao longo dos séculos XIX, XX e XXI, biográficos, memorialistas e historiadores traçaram, com propósito diferentes perfis de Elisa Lynch, dando a ela um lugar de destaque no confronto conhecido como Guerra do Paraguai. O que interessa, quando se escreve sobre a história de Madame Lynch, e, sobretudo, a tarefa de fazer meditações entre duas culturas, entre o passado e o presente, e de resgatar a trajetória de sua vida. Este artigo e de levantar esses perfis, o que permite uma conclusão mais precisa para este estudo. PALAVRAS-CHAVE: Mulher; Guerra do Paraguai. MADAME LYNCH Em 1835, nasce na Irlanda Eliza Alicia Lynch, com apenas 12 anos foi estudar em Londres, junto com o irmão, freqüentando as melhores escolas e o conservatório de música, onde aprendeu piano. Sua beleza física, acentuada por educação refinada, era de tal ordem que aos 15 anos foi pedida em casamento pelo médico militar francês Xavier de Quatrefages, que se aperfeiçoava em um hospital britânico. Apesar de ainda estar na adolescência, sua família aceitou o pedido do pretendente, que tinha mais do dobro de sua idade. Reclusa em seu quarto de hotel, não restava a Elisa senão a leitura, preferencialmente a de literatura romântica, seu marido ficava no quartel. Entediada, ela conseguiu convencê-lo a permitir que o acompanhasse como enfermeira-auxiliar, em missão militar no deserto. Mal sabia que tal experiência teria grande utilidade, anos mais tarde, quando acompanhou Solano López na guerra. Após ser acusada de ser amante de um jovem russo, seu esposo a mandou de volta a França. O Ministério das Colônias lhe informou que não tinha direito a qualquer pensão, já que seu casamento não era reconhecido pelas autoridades francesas.Quatrefages havia casado com uma estrangeira, segundo as leis inglesas, e não havia solicitado a indispensável autorização prévia de seus superiores. Elisa escreveu então ao marido, liberando-o de qualquer compromisso, e recebeu como resposta de Quatrefages que ele também a liberava, pois já não a considerava sua esposa desde o duelo. Tais Sebastiana Leite da Silva Pereira Graduando em História na Universidade Católica Dom Bosco(UCDB) [email protected] 1 49 Juntamente com uma amiga ex-esposa do comandante do Regimento de Argel, que havia voltado a Paris depois de também separar-se do marido. As amigas trocaram confidências e Elisa recebeu, surpresa, convite para ir morar na casa de uma certa "Madame", que era freqüentada pela ex-esposa do militar e também por personalidades da alta sociedade, que ali mantinham encontros íntimos. Em 1854, Francisco Solano Lopez, filho mais velho do Presidente do Paraguai Carlos Antonio Lopez, foi enviado a Europa como ministro plenipotenciário para comprar armamento e estabelecer contatos comerciais. Em Paris conheceu a irlandesa Elisa Alicia Lynch, foi o capitão Brizuela, ajudante-de-ordem de Solano Lopez, que o levou a Lynch. Passaram a encontrar-se diariamente e a viajar juntos em todas as ocasiões que Solano tinha compromissos diplomáticos. Os rumares do romance chegaram aos ouvidos do pai de Solano, que determinou a sua volta ao Paraguai, alegando razões de Estado, para separá-lo da amante. Também a família de Elisa não aprovava a possibilidade de vê-la partir para a distante América do Sul, continente atrasado onde havia indígenas e escravos, além de febres tropicais e animais selvagens. Foi combinado que Elisa viajaria antes e aguardaria Solano em Buenos Aires, enquanto ele voltaria primeiro ao Paraguai para convencer o pai a aceitar que vivessem juntos. Finalmente Solano foi buscá-la, revelando que seu pai aceitara que vivessem juntos, de maneira discreta, isolados da sociedade e residindo em uma casa localizada nos arredares de Assunção. Desde sua chegada ao Paraguai, Elisa enfrentou a hostilidade da Igreja Católica e da sociedade local, que não aceitavam seu concubinato com o filho do presidente. Sua casa, ampla e decorada por ela própria, possuía inclusive sala de música, sendo freqüentada apenas por uns poucos casais amigos de seu companheiro e por diplomatas europeus que eram recepcionados em jantares e saraus musicais. Era, enfim, um verdadeiro centro cultural na provinciana capital paraguaia.A sociedade, escandalizada, fazia comentários maldosos. As mulheres diziam que "a casa de madame Lynch" era uma cópia do "prostíbulo de luxo de Paris, de onde Solano a tirara". Outras, invejosas de sua beleza e mais ferinas, afirmavam que a casa da "gringa aventureira" era o lugar ideal para quem gostava de beber, pois sua adega guardava os melhores vinhas e licores importados. Indiferente aos comentários, Elisa cuidava pessoalmente da educação das quatro filhos dois casais de sua união com Solano e evitava expor-se em público. Quando, em outubro de 1862, Solano López tornou-se presidente pouca coisa mudou na rotina do casal. Elisa recusou-se a morar no palácio, a fim de não estimular 50 novas críticas. Durante a guerra, a irlandesa comprou terras e imóveis, área que correspondia exatamente à extensão territorial da colônia de Dourados delimitados pelo decreto do governo imperial de 26 de abril de 1856. Também se tornou proprietária, graças ao beneplácito de Solano Lopez, de uns 4375 quilômetros quadrados entre os rios Bermejo e Pilcomayo, território reconhecido como argentino no pós-guerra, e, ainda, outros 135 mil quilômetros quadrados na região oriental do Paraguai. Para manter a aparência de lisura desses negócios, em lugar do próprio Presidente como era de praxe, as vendas possuíam a autorização do vice-presidente Sánchez. Em suas solicitações de compra, Elisa Lynch invocou a condição de cidadã britânica com filhos paraguaios, pretextando o desejo de contribuir, com dinheiro que oferecia pelas terras, em favos do esforço de guerra do Paraguai, Como bem ressaltou Centurion, quando as vendas se deram, em fins de 1869, já não havia tempo para usar o dinheiro arrecadado na defesa Nacional, e, ademais, não havia nenhuma lei que autorizasse a alienação das terras publicas. O enriquecimento imobiliário de madame Lynch foi possível porque o Estado paraguaio era praticamente um feudo da família Lopez. Na descrição de Ricard Francis Burton, escritor, aventureiro e diplomata inglês.”O país e, de fato uma grande estância da qual o supremo magistrado atua como proprietário”. Em 23 de dezembro de 1868, quando estava cercado pelo inimigo em Lomas Valentinas, Solano Lopez deixou seu testamento aos cuidados do representante diplomático norte-americano, general MacMahon. Nele, mostrava-se “agradecido pelos serviços [sic!] da senhora dona Elisa e a declarava sua herdeira universal”. A transferência de terras publicas para Elisa Lynch se explica pela preocupação de Solano Lopez com a sorte da família. Outra explicação hipotética não excluente, e a de que, consciente da derrota final que se aproximava Lopez estava convencido de que o Paraguai seria dividido entre a Argentina e Brasil, deixando de existir como Estado independente. Após sepultar seu companheiro, Elisa Lynch e seus filhos foram levados para Assunção sob a proteção do general Câmara, nessa capital, as mulheres de antigos exilados paraguaios publicaram uma carta no jornal La Regeneración, na qual exigiam que se tomassem medidas enérgicas contra a companheira do falecido ditador. Lynch foi acolhida, para a sua segurança, a bordo do navio de guerra brasileiro, e, pouco depois, partiu para a Europa. Empobrecida Elisa Lynch chegou a Buenos Aires em 1885, aí estivera dez anos antes, a caminho de Assunção, onde não pode permanecer devido à hostilidade das mulheres da elite local com o objetivo de obter a posse das terras que o governo 51 de Solano Lopez transferira para seu nome. Ao tomar consciência da dificuldade de conseguir seu objetivo, Elisa transferiu seis supostos direitos de posse para o filho mais velho, Enrique Venâncio Solano Lopez. De volta a Europa, Elisa Lynch morreu em Paris, em 1886, na miséria, a ponto do enterro ter sido pago pela prefeitura. Em 1961, nas comemorações do sesquicentenário da independência paraguaia, as cinzas de Elisa Lynch voltaram solenemente a Assunção, a bordo de um navio de guerra que trouxe sua urna funerária da França. Contudo, sua última vontade de ser sepultada ao lado do companheiro e do filho não foi cumprida. A alegação foi a de que a mausoléu de Solano López estava no Phanteón, que é também uma igreja. Assim, as autoridades religiosas vetaram que as cinzas da concubina repousassem eternamente ao lado das de seu amante. O mausoléu de Elisa Lynch, a irlandesa que desafiou preconceitos e os horrores das batalhas, foi erguida na entrada principal do Museu Militar do Paraguai. BIBLIOGRAFIA Doratioto, Francisco..Maldita Guerra: Nova História da Guerra do Paraguai.São Paulo: Companhia de Letras, 2002 Dourado, Maria Tereza Garritano. Mulheres comuns, Senhoras Respeitáveis. Campo Grande: Editora UFMS, 2005 www.uff.br 52 MOVIMENTO DIVISIONISTA NO MATO GROSSO DO SUL Marco Aurélio de Sousa Manvailler Vendas Poucos estudos se propõem em apresentar uma hipótese sobre o surgimento do movimento que culminou com a divisão do estado de Mato Grosso em 1977, sobretudo a uma análise do papel dos agentes envolvidos em tal movimento. A real importância da pesquisa realizada pela historiadora Alisolete Weingartner, que resultou na publicação de seu livro Movimento Divisionista em Mato Grosso do Sul, está em acrescentar à historiografia regional um estudo sobre a política coronelista de Mato Grosso do final do século XIX e a efetiva participação de determinados grupos no processo de manutenção da unidade estadual. A proposta inicial de identificar o aparecimento do ideário divisionista, perde espaço em certo ponto do livro para a ilustração da movimentação política em torno do governo estadual, pois segundo a autora, foi justamente a luta pelo controle político da região que determinou a forma de atuação do movimento divisionista. Após a guerra contra o Paraguai a região sul de Mato Grosso experimentou um acentuado aumento da atividade econômica e a emergência de um grande número de cidades, isso foi estimulado sobretudo pelo crescimento da atividade pastoril e pela migração de populações oriundas de diversas regiões, mas principalmente de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, São Paulo além da região do Norte de Mato Grosso. O crescimento econômico do sul de Mato Grosso fomenta o surgimento das oligarquias sulinas independentes do controle da capital do estado. Esses grupos sociais detentores de grande poder econômico exercem consequentemente o controle político da região através dos coronéis que em sua absoluta maioria são grandes latifundiários capazes de arregimentar numerosos contingentes para as lutas armadas nas quais asseguravam a sua supremacia. A ascensão econômica do sul, proporcionada pela atividade pastoril contrasta com a decadência da exploração aurífera no norte, sobretudo em Cuiabá capital do estado, causando uma instabilidade entre as forças políticas (oligarquias) do norte e do sul, por um lado o norte interessado em expandir seu controle para o sul e por outro os latifundiários sulistas juntamente com os pequenos posseiros (sua maioria migrantes gaúchos e mineiros) reivindicando a legalização das posses de terras. Neste contexto, surge na região sul do estado a “Companhia Matte Larangeira” que logo se torna a principal exportadora de todo o Mato Grosso sendo responsável pela maior parte da arrecadação estadual, a atividade desta empresa é 53 baseada na exploração dos ervais em uma área arrendada pelo estado, porém a peculiaridade observada em relação a esta empresa é que ela obtém o monopólio desses arrendamentos, proporcionando-a um gigantesco acúmulo de poder econômico e político, além do controle sobre a propriedade das terras da maior parte do sul de Mato Grosso, visto que o contrato de arrendamento previa o controle da ocupação territorial como obrigação da arrendatária. O governo estadual atraído pelo crescente fortalecimento econômico do sul e receoso pela independência política das oligarquias sulinas alinha-se à Matte Larangeira a fim de estender sua influência na região, isto impulsiona as crises entre os coronéis do sul de Mato Grosso e a Companhia Matte Larangeira em relação à posse de terras, assim, apesar do caráter privado da empresa, o poder econômico da Matte proporcionava ao estado através de acordos e subsídios, o controle da grande área dos arrendamentos. Portanto a luta pela posse das terras juntamente com a tentativa de enfraquecer a influência da Companhia Matte Larangeira na região, são fatores que, segundo Alisolete, agem como a gênese do Movimento Divisionista no Mato Grosso do Sul. Contudo esta luta pela divisão confunde-se com as disputas entre os grupos oligárquicos pelo controle do poder estadual, e isto acentua ainda mais as divergências entre os proprietários sul-mato-grossenses e a Matte, uma vez que esta empresa sempre interferia nas disputas a fim de garantir seus privilégios. Tais disputas pelo governo estadual desencadeiam uma crise política que leva alguns militares do sul de Mato Grosso a instituírem em 31 de março de 1892 o “Estado Livre de Mato Grosso” ou “República Transatlântica de Mato Grosso”, este ato apesar de seu fracasso, não determina o fim da idéia de divisionista. Apesar do grau de desenvolvimento do sul de Mato Grosso e do crescente número de cidades no início do século XX, o movimento divisionista estava ligado essencialmente às lutas pela posse de terras o que lhe empregava um caráter rural. Contudo com o gradativo aumento da importância das cidades, sobretudo daquelas ligadas ao comércio de gado e fora das áreas sob controle da Companhia Matte Larangeira, o ideal divisionista passa a ganhar um aspecto mais urbano com a crescente participação de profissionais liberais e comerciantes. Concomitantemente a este fenômeno de “urbanização” o movimento recebe um grande fator incentivador principalmente por causa da instalação da estrada de ferro em Campo Grande, o que promove o surgimento de novas forças políticas ligadas ao comércio, pois a partir daí esta cidade passa a configurar como pólo econômico do estado. 54 Outro resultado da implementação da estrada de ferro em Campo Grande é a intensificação do intercâmbio desta cidade com os grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro, assim a região atendida pela ferrovia passa a sofrer um processo de intensa urbanização e interação cultural e ideológica com São Paulo, isto vai fortalecer a idéia divisionista com fontes teóricas trazidas por grupos politizados de outras regiões. Não obstante, a ferrovia promoveu sem dúvida, o desenvolvimento urbano e o crescimento populacional das regiões por onde passava isso se verificou pela insurgência de novas cidades onde haviam estações de parada, diferentemente do que ocorria nos territórios controlados pela Companhia Matte Larangeira que praticava o monopólio da terra e somente permitia instalação de novos moradores se estes estivessem subordinados a ela. Outro ponto de extrema relevância para o movimento divisionista é a “Revolta Tenentista” de 1922 por causa da adesão de alguns setores da sociedade, sobretudo dos profissionais liberais ao movimento revolucionário que prometeu criar o estado de Brasilândia, porém as derrotas das colunas revolucionárias de Izidoro Dias Gomes e Luis Carlos Prestes, arrefecem e demonstram desorganização do movimento divisionista, além disto deixa clara a hegemonia econômica e política da Companhia Matte Larangeira. Em suma, a política do estado de Mato Grosso no fim do século XIX e início do XX é marcada e movimentada por disputas oligárquicas pelo poder, onde a supremacia econômica da empresa Companhia Matte Larangeira trabalhando como agende de unidade estadual fez com que esta estivesse sempre exercendo influência política no estado, seja qual fosse o resultado das disputas entre as oligarquias. As disputas pelo governo do estado juntamente com a luta pela legalização da posse das terras estimulam o surgimento de um movimento que visava à divisão da região sul do restante do estado. 55 A VIDA E OBRA DE PAULO COELHO MACHADO Alfredo F. Montier Rubia Mara A. Garcia A Vida e Obra de Paulo Coelho Machado, é uma pesquisa elaborada através da análise de trabalhos já concluídos sobre suas obras e trajetória de sua vida no Estado do Mato Grosso do Sul. Todo esse contexto histórico se passa num momento em que a sociedade brasileira vive plena ditadura militar, e dentro desse cenário a região Sul Mato Grossense, luta em busca de ter uma identidade e melhorias de vida. Objetivo desse artigo é demonstrar, como foi importante a colaboração de Paulo Coelho Machado, para história da cidade de Campo Grande e a sua formação, e sem esquecer a importância da visão de sua filha Marisa Machado, além disso tudo lembrar da importante colaboração de Hidelbrando Campestrini para entendermos quem foi o Paulo C. Machado. O artigo vai expor para os interessados no assunto como foi que se deu a divisão do Estado de Mato Grosso, e o envolvimento de Paulo C. Machado dentro desse processo. A forma de pesquisa desenvolvida, foi através de leitura de obras trabalhos já existentes sobre o grande memorialista Paulo Coelho Machado. No final dessa pesquisa ficara bem claro, que o artigo teve como meta trazer a tona, a realidade de uma época em que toda população brasileira estava sofrendo os terríveis momentos da política dos militares no Brasil. Palavras-Chave: Mato Grosso; Mato Grosso do Sul; Campo Grande; Paulo Coelho Machado. RESUMO: Inicialmente, para esclarecimento iremos abordar como foi a vida desse homem brilhante e importante para história de nosso Estado. A história de Paulo Coelho Machado começa, em São Paulo no dia 16/12/1917, data de seu nascimento, logo depois com dois anos sua família decide mudar para Campo Grande, aqui ele vai estudar em várias escolas como o colégio Spencer do professor Bartolomeu que localizava-se na rua 13 de Maio. Depois de terminado os primeiros anos de estudo, ele retorna a São Paulo para concluir o ginásio, no semi-interno do colégio São Bento onde termina o ginásio. Alguns anos depois a convite de sua irmã Inah muda-se para o Rio de Janeiro capital do país nesse período. No Rio de Janeiro, ele se forma em direito na Faculdade Nacional, voltando para a cidade de Campo Grande no ano de 1940, aqui Paulo Coelho Machado, vem para trabalhar como professor e advogado. 56 Em Campo Grande ele inicia sua vida profissional lecionando em várias instituições de ensino como: Colégio Nossa Senhora Auxiliadora; Colégio Oswaldo Cruz e a Escola Normal Joaquim Murtinho. Com dona Zilá Guimarães Corrêa, casa-se e tem quatro filhos. Foi um excelente advogado, sempre trabalhando dentro dos padrões da ética por mais de 30 anos. Homem de extrema importância para esclarecer as duvidas da municipalidade de Campo Grande através de excelentes obras, além de ter participado ativamente da política no Estado do Mato Grosso do Sul, é um dos idealizadores que reativou a liga Sul Mato Grossense, entidade que teve relevante importância na divisão do Estado, fundada inicialmente por estudantes em 1934. As suas obras além de refletir o momento que Paulo C. Machado vivia, é importante para entendermos como foi sua vida e a sociedade de sua época, principalmente a população de Campo Grande. Paulo C. Machado, foi um dos personagens, mais importantes que participaram ativamente do movimento da criação do Estado do Mato Grosso do Sul. Ele por duas vezes foi vereador, mais nunca-se deixou seduzir pela política. A divisão do Estado, para Paulo C. Machado estabeleceu-se como uma peça fundamental. Ele e outras pessoas importantes como: Dr Kerman Machado, Dr José Fragelli e Cândido de Castro Rondon, receberam uma missão do então Ministro do Interior Rangel Reis, que formasse uma comissão que deveria fornecer as necessárias informações sobre o Estado do Mato Grosso. Devidas as dificuldades de ocorrer de imediato, a divisão do Estado Paulo C. Machado reativa a liga Sul Mato Grossense, entidade fundada em 1934. Através da Constituição Federal, eles sabiam que teriam êxito apesar da forte oposição dos cuiabanos. Depois de várias dificuldades Paulo C. Machado, enviou para o Ministro do Interior Rangel Reis, as informações necessárias do Estado do Mato Grosso, conseguindo o aval do presidente Ernesto Geisel autorizando a divisão. O presidente Geisel nomeia o nome do novo Estado de Campo Grande. Os municípios vizinhos não aceitaram que o Estado chamasse Campo Grande. Para acabar com a polêmica, Paulo C. Machado presidiu uma reunião em que a maioria votou pelo nome de Mato Grosso do Sul, aprovado pela assembléia Legislativa, só que todos imaginavam que Mato Grosso chamaria “Mato Grosso do Norte”. Paulo C. Machado sugeriu dois nomes para o novo Estado, Amambai e Maracaju, só que não teve jeito ficou como Mato Grosso do Sul. Paulo C. Machado, admitiu que foi com muita dificuldade, que concretizou o sonho da divisão tão esperada por toda sociedade do Sul de Mato Grosso. A sua participação na política foi fundamental nesse momento para realização desse projeto, da formação do Estado do Mato Grosso do Sul. 57 As principais obras escritas por Paulo C. Machado são ricas em detalhes, nos conteúdos trazem os aspectos dos primórdios do município ao longo do tempo. A origem da cidade de Campo Grande e a história de seus habitantes estão na coleção de livros com o título: Pelas Ruas de Campo Grande. As grandes colaboradoras que beneficiaram no entendimento das peculiaridades que permitiram a idéia de como formou-se o município, são as obras: A Rua Velha ( 26 de agosto ); A Rua Principal ( 14 de Julho ); A Rua Barão ( A Barão do Rio Branco ); A Rua Alegre ( Rua 7 de Setembro ) e a Grande Avenida ( Afonso Pena ). Na obra Rua Velha, o autor conta como foi o surgimento da rua hoje denominada hoje 26 de Agosto, descrevendo a história de todos os moradores que viviam no local e a formação do comércio, onde viviam classes opostas, uma era de trabalhadores humildes e a outra privilegiada da época. Na obra sobre a Rua Principal, o autor descreve o surgimento de uma maneira sintética o desenvolvimento do local e a origem da Rua 14 de Julho, lugar hoje centralizador de instalações comercias, atividades artísticas e outros acontecimentos de grande relevância, que colaboraram para o desenvolvimento de Campo Grande, além dessa obra possuir detalhes que enriquecem a história, os costumes e os personagens do período. Na brilhante obra sobre a Rua Barão, o autor analisa o perfil de seus moradores e tem como principal objetivo demonstrar o crescimento do comércio e também relata que naquela rua moravam cidadãos de grande importância da cidade como: políticos, comerciantes entre outros que tanto colaboraram no sentido de dar a cidade um desenvolvimento gigantesco para a caminhada da história de Mato Grosso do Sul de uma forma simples. Além dessas magníficas analises, que já citamos acima temos a visão da filha de Paulo C. Machado, que faz um esboço sobre sua visão pessoal que tem de seu pai. A entrevista feita com Marisa Machado pelo acadêmico Marcos Caetano da Silva será colocada abaixo na íntegra onde buscaremos entender um pouco quem foi Paulo C. Machado através de suas analises pessoais. ANEXO Segundo Marisa Machado, o seu pai sempre foi um homem íntegro, um bom pai, intelectual, um exemplo de homem. Estes são alguns adjetivos em que Marisa Machado, filha de Paulo C. Machado citou em entrevista concedida ao pesquisador Marcos Caetano da Silva, a qual segue na íntegra: 58 “Paulo C. Machado veio para Campo Grande muito pequeno. Quando o Dr. Arlindo de Andrade ( Juiz de Direito ) veio da Bahia para cá, trouxe meu avô o Sr. Eduardo Olímpio Machado, que também era advogado, e então começaram a trabalhar nessa área jurídica. Quando meu avô veio para esta região, tornou-se prefeito de Campo Grande, aliás, foi um dos primeiros prefeitos do município. Entre suas atividades aqui exercida, fundou a associação Comercial. Assim, ele tinha um forte círculo de amizades, e meu pai, já desde pequeno lembrava muito da época do Jockey Clube, das pessoas maiores e mais velhas, por este motivo estava sempre enfronhado com as coisas de Campo Grande. Na sua mocidade, meu pai estudou Direito e também possuiu um jornal. O Campograndense. Acontece que tudo isso foi envolvendo-o na paixão por Campo Grande. Tanto é, que pouco tempo antes de sua morte, é que aceitou ganhar o título de cidadão campograndense, pois ele não admitia este título porque tinha o receio que descobrissem que ele era paulista e não campograndense. Há mais de 40 anos foi que ele começou este trabalho de pesquisa. Ele tinha um pequeno gravador, colhia as informações com todas aquelas pessoas mais antigas, das quais muitas já se foram, então ele copiava todo o material e ia juntando as histórias e organizando-as de maneira subseqüente. Ele dizia que não era um historiador, e sim um contador de história, isso porque ele pesquisava, mas quem contava eram as pessoas que davam seus depoimentos. Dessa forma ele recolhia fotos, e com recursos próprios mandava reproduzilas e em seguida as devolvia às famílias. E com isso começou a montar um acervo, e a idéia de escrever sobre Campo Grande era porque ele sempre teve essa paixão, esse fascínio pela história; primeiro por ser advogado, e depois por ter trabalhado como professor em alguns colégios da cidade, isso porque quando ele veio muito pequeno, Campo Grande ainda era uma Vila; então ele presenciou o crescimento da cidade. Papai não era uma pessoa festeira, mas gostava de uma boa prosa, assim ele tinha a facilidade de captar o assunto e repassar de uma maneira muito gostosa, principalmente por ser professor e utilizar a didática para esclarecer o assunto. E foi, também didaticamente que passou a história para os seus livros, o que os tornaram de fácil entendimento. A obra que eu mais gosto é a Rua Principal, porque eu tenho também um certo fascínio pela história, e a rua 14 de Julho porque realmente foi o início do comércio, o início do desenvolvimento da cidade; onde os mascates, os imigrantes 59 começaram a chegar; os libaneses etc...; esses comerciantes foram formando as primeiras lojas, com o Gaburas; Palace Royal; a Primorosa; e então a vida passou a ter um outro ritmo. Isso não quer dizer as outra obras não sejam também importantes, mas a Rua Principal, eu acho bárbaro, já que eu sempre gostei de ver o início das pessoas; como começou determinada atividade etc... Como político o meu pai era super honesto, uma honestidade que nos dias atuais não se encontra facilmente por aí. Digo isto, não por ser meu pai, mas porque ele realmente transmitia essa característica. Por duas vezes ele foi o vereador mais votado, numa época em que vereador não tinha salário; ele tinha sua profissão e colaborava com cidade. Em seguida, foi secretário de Agricultura acumulando a pasta de Indústria e Comércio no Governo de José Fragelli, um dos últimos governadores do Estado ainda uno. Por esse desempenho, envolvimento, ele foi um divisionista; foi um dos líderes na divisão do Estado de Mato Grosso. Politicamente, ele sempre trabalhou na questão da divisão. E quando foi Secretário, o Governador em Cuiabá sempre o recebeu de braços abertos, já que ele fez muito pelo Estado; fez grandes projetos que até hoje a gente deve pelo trabalho que ele realizou. Por exemplo: O terreno onde está instalada a indústria da Coca Cola foi um incentivo dele. Também as localidades onde estão os laboratórios próximo ao Lago do Amor foram doações do Governo do Estado através de sua gestão. Incentivou a produção do soro antiofídico; organizou um movimento denominado guerra da madeira, o qual tinha como objetivo ações contra a saída indiscriminada de madeira do Estado. Quando findou o Governo de José Fragelli, meu pai foi convidado pelo presidente Geisel a formar uma equipe de estudos econômicos, demográficos e uma série de detalhes; já que havia necessidades de apresentar um projeto com argumentos para convencer o Presidente da República de que era inevitável a divisão do Estado. Uma luta em que já havia muito tempo, inclusive com meu avô. Entretanto com a reativação da Liga Sul Mato Grossense pró divisão, o papai tornou-se presidente da mesma, onde desencadeou-se o processo de divisão até o Presidente Ernesto Geisel assinar a Lei. Quando a divisão foi concretizada, que era um sonho acalentado pelo sul de Mato Grosso e o norte do Estado não queria, passou a haver então discussões em torno do nome a ser dado ao novo Estado. 60 Inicialmente foram sugeridos três nomes: Estado de Maracaju; Estado de Campo Grande e Estado de Amambaí, o que acabou finalmente ficando como Mato Grosso do Sul, nome escolhido pelo Presidente Geisel. Depois da divisão, o Presidente Ernesto Geisel foi hábil no sentido de trazer uma pessoa técnica para montar de forma administrativa o Estado, para depois entrar os políticos locais. Porém na época, os políticos não entenderam a estratégia, e juntaram forças no sentido de derrubar o Governo de Harry Amorim Costa. Assim, ficamos parados no tempo, enquanto Mato Grosso crescia porque já tinha uma estrutura política formado, aqui aconteciam os desentendimentos políticos e deixando de crescer na velocidade que merecíamos. Todo divisionista que entendia a divisão como uma coisa inevitável, também possuía a idéia que papai tinha. Ele dizia que Mato Grosso do Sul era privilegiado pelas fronteiras, principalmente pela proximidade de São Paulo, isso nas distâncias entre Cuiabá e São Paulo e que o norte que já possuía uma parte quase amazônica, passaria a ter uma ajuda muito maior do Governo Federal. Assim sendo, verificamos que os divisionistas possuíam uma visão bastante futurista do que estava acontecendo; pensavam nas melhorias de 10, 20 ou 50 anos adiante; isto demostrava o amor que papai, Demóstenes Martins e outros possuíam pelas terras, que não eram deles também. Terras que adotaram, vislumbraram o desenvolvimento, o que com o Estado uno tornaria muito difícil a administração com grandes distâncias, e dividindo criava-se duas identidades. O que não houve de início, exatamente por causa da pressão política contra o Harry, foi um amadurecimento de se criar uma identidade do Estado. O que ocasionou uma indefinição cultural, seja ela na música, na culinária. Tudo ainda era ligado ao Mato Grosso, o nome confundido, enfim um cordão umbilical difícil de ser rompido mantinha raízes fortes, mas era inevitável a divisão. O meu pai como político era um raro de honestidade, de visão, de capacidade e como técnico. Ele não era um político de palanque, o feitio dele era de produzir, de ação. Ele foi um verdadeiro exemplo como filho dessa terra, até por não ter nascido aqui, deixou um exemplo de amor pela preservação da história, dos bons costumes e da família que deixou. Papai teve dois sonhos que ele pode concretizar. O primeiro deles foi conhecer a família de seu avô em Portugal ( o que o deixou muito emocionado ), o segundo foi a conquista maior, ele conseguiu ganhar o maior prêmio de expositores de gado Nelore. Enfim, sentiu-se muito contente. 61 Papai, apesar de ter sido uma excelente pessoa, era muito fechado. Não demonstrava muito diálogo, era sempre reservado, mas pronto a responder a tudo o que lhe fosse perguntado. Bastante intelectual, estava sempre pronto a discutir os mais variados assuntos, como por exemplo: a respeito de todos os sistemas religiosos no mundo, no campo político, artístico etc... Homem bondoso de coração inigualável, ele procurou dar o melhor de si, assim pôde construir este grande trabalho que foi contar a história de Campo Grande”. Outra pessoa importante, e amigo fiel Hidelbrando Campestrini esteve sempre ao lado de Paulo C. Machado, oportunamente teceu o seguinte comentário a respeito do escritor. “No historiador Paulo Coelho Machado devem ser destacadas duas características: a seriedade na pesquisa e a simplicidade da linguagem. Ele tinha o faro da verdade histórica: perseguia os indícios, recolhia as informações, estudava-as e ordenava-as com uma seriedade e responsabilidade tais que o que ele registrava tinha crédito. Não omitia circunstâncias, nomes ou datas; não camuflava, não mudava a cor. Não lhe interessava a versão do fato, interessava-lhe o fato, exposto de forma serena, completa, com a imparcialidade peculiar dos sábios, sem qualquer formalismo acadêmico. A segunda característica é a linguagem fluente, leve, de um guia que narra e descreve, para o transeunte atento, os fatos e pessoas que habitaram estas vias e povoaram esta região. O leitor sente-se perambulando pelas ruas, pelas estradas, pelos anos e pelas décadas, parando aqui, observando acolá, magnetizando sempre pela narrativa envolvente e observações sutis do historiador, empolgado por tão rico conteúdo histórico. Este seu modo de contar, solto, coloquial, está presente nos fatos mais surpreendentes. Foi um homem de coisas simples. Nunca se deixou dominar pelos bens materiais, pelo patrimônio que construiu. Paulo C. Machado foi o historiador de Campo Grande. Por mais de 40 anos, recolheu, principalmente da tradição oral, informações e dados, e conseguiu reunir um invejável patrimônio histórico sobre esta terra, tornando-se o depositário e fiel testemunho do mais rico material sobre Campo Grande. Vale lembrar que Paulo C. Machado foi eterno estudioso. Sempre rodeado de livros e fontes. Ele, que era a fonte da história da cidade, tão procurado por tantos estudiosos e pesquisadores, que a todos atendia com bons préstimos. 62 É absolutamente desnecessário recomendar ao leitor a de Paulo C. Machado. O público o conhece e o admitira de longa data. Faço-o, todavia, por dever de gratidão por ter sido principalmente ele a motivar-me a estudar história desta terra que me acolheu tão hospitaleiramente, berço hoje de meus filhos e netos; de respeito por ter sido, ao longo destes anos, o orientador compreensivo e desinteressado; de orgulho do discípulo que se envaidece do mestre. BIBLIOGRAFIA SILVA, Marcos Caetano da . Vida e Obras de Paulo Coelho Machado. UCDB, Campo Grande, 2001. CAMPESTRINI, Hidelbrando. “O Cronista da cidade”. In: Revista de divulgação do Arquivo Histórico de Campo Grande-MS nº 6. Campo Grande: UFMS, 1998. p. 6-10. MACHADO, Paulo Coelho. “14 de Julho”. In: Revista de divulgação do Arquivo Histórico de Campo Grande-MS nº 5. Campo Grande: UFMS, 1995. P. 14-26. MACHADO, Paulo Coelho. “Pelas Ruas de Campo Grande”. In: A Rua Barão. Vol. III. MACHADO, Paulo Coelho. “Pelas Ruas de Campo Grande”. In: A Rua Principal. Vol. II. MACHADO, Paulo Coelho. “Pelas Ruas de Campo Grande”. In: A Rua Velha. Campo Grande: Imprensa da UFMS, 1990. 63 A TRILHA DO PEABIRU Valquiria Allis Nantes6 RESUMO: Esta pesquisa é referente à trilha indígena pré-colombiana que ligava o Brasil, Paraguai, Bolívia e Peru. Por se tratar do estudo de um período anterior à chegada dos europeus na América – Latina, a pesquisa foi baseada em uma entrevista com a pesquisadora Rosana Bond, e em outras bibliografias. A trilha do Peabiru foi de grande importância para os índios Guaranis para buscar caça, ligar diversas aldeias, serviu para andanças e migrações de povos indígenas além de ter servido como elo de comunicação entre os índios sul-americanos. PALAVRAS-CHAVE: História da América; Peabiru; Trilha Indígena. A TRILHA MAIS ANTIGA DA AMÉRICA Uma das grandes características humanas que os fazem diferirem dos animais é a capacidade de transformar o meio de acordo com suas necessidades. A trilha do Peabiru foi um grande feito, provavelmente de uma civilização muito avançada, transformando o meio para atender as necessidades de uma época. Os estudos sobre a trilha do Peabiru ainda são limitados. Essas pesquisas são de caráter arqueológico e por meio de literaturas antigas, tendo em vista que houveram muitas transformações nas áreas onde se encontrava a trilha, essas transformações aconteceram por meio da urbanização, agricultura, pecuária e entre outros fatores que acabam por dificultar pesquisas da história pré-colombiana e a memória indígena. Mesmo com poucas certezas sobre ela, pode-se dizer que foi a mais importante via transcontinental na América do Sul pré-colombiana. A pesquisadora Rosana Bond que estuda esta trilha indígena descreve: “A linha tronco tinha cerca de três mil quilômetros, ligando o Atlântico ao Pacífico, ou seja, ia do Brasil ao Peru ou vice-versa. Unia o litoral de Santa Catarina e São Paulo ao litoral peruano. No trajeto, o Brasil (Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul), Paraguai, Bolívia e Peru”7 Graduanda do curso de História, 5º semestre, na Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. Pesquisadora Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Políticas de Educação superior – GEPPES. E-mail: [email protected]. 7 Entrevista com a pesquisadora Rosana Bond. Disponível em: http://www.anovademocracia.com.br Acesso em: 15/05/2006 6 64 A rota exata da trilha do Peabiru ainda não é possível saber mas segundo Bond, apoiando-se em pesquisas literárias e em descobertas arqueológicas pode-se traçar uma rota entre o Brasil e Peru: “Partindo talvez do atual município de Palhoça (Massiambu) e Florianópolis, a trilha ia até Barra Velha, penetrando continente adentro no rumo do rio Itapocu. Cruzava o nordeste catarinense, passando possivelmente por Guaramirim e São Bento, e chegava ao Paraná. Já dentro daquele estado, passava em Castro e seguia pelas cabeceiras dos rios Ivaí e Cantu. Chegava ao médio Piquiri, indo pela margem esquerda deste até cruzar o rio Paraná, acima de Guaíra. Havia outra passagem por Foz do Iguaçu, mas esta não era a original da linha tronco, segundo afirmaram Reinhard Maack e Jaime Cortesão. Atravessando o rio Paraná, estava-se no Paraguai. A entrada do Peabiru na terra paraguaia se fazia por dois ramais. O primeiro era rio Mondaí-Assunção/rio Paraguai-Chaco. O segundo era rio Iguatemi-Alto Chaco-Porto Casado. Os dois ramais se juntavam no Chaco. O Peabiru, então, seguia o rio Paraguai ao norte até a serra de Santa Luzia. Em Corumbá e Puerto Suarez, guinando a oeste, penetrava na Bolívia, passando por Cochabamba-Sucre-Potosí. Nesses locais existiam caminhos incas e era provavelmente ali que o Peabiru já se confundia com eles. A partir de Potosí, a estrada inca seguia pelo rio Desaguadero, ou por uma linha paralela mais ao norte. Alcançava depois o lago Titicaca, entrando no Peru. Contornava o lago pelo norte e sul. A bifurcação se unia em Cacha, voltando a ser uma via única”8 Com grande extensão, a trilha possuía características diferentes dependendo do tipo de terreno. O Padre Lozano descreveu: “oito palmos de largura e forrado com grama miúda; Moisés Bertoni (...) disse que esses índios semeavam suas trilhas com gramináceas de sementes glutinosas que grudavam nos pés e pernas dos viajantes. Assim, ao caminhar, ia-se multiplicando o plantio. Há relatos de que certos trechos eram pavimentados com pedras, do mesmo modo que as vias incaicas. Donato menciona dois prováveis achados: um perto da aldeia de Meruri (MT); e outro a 50 km do rio Miranda (MS)”9 ORIGEM DA PALAVRA “PEABIRU” A palavra Peabiru é de origem Tupi-Guarani e há várias traduções: “caminho forrado, entulhado”, “por aqui passa o caminho antigo de ida e volta”, “caminho pisado, pegada do caminho, marca do caminho”, “caminho ralo, caminho sem ervas”, “caminho brando, suave”, “caminho cujo percurso se iniciou”, “caminho tortuoso, cheio de voltas”, “caminho que leva ao céu, ou às alturas”. AS HIPÓTESES DA CONSTRUÇÃO DO CAMINHO E A SUA IMPORTÂNCIA 8 9 Idem, Ibidem Idem, Ibidem 65 Sobre a construção desta impressionante “estrada” não há teses conclusivas, porém existem três suposições notáveis que Rosana Bond esclarece em uma entrevista publicada em junho de 200310: Caminho da Terra Sem Mal: “Os guaranis, saídos do Paraguai, teriam se deslocado para o litoral catarinense entre os anos 1000 e 1300. O Peabiru teria sido aberto nessa migração, cujo objetivo seria a procura de um paraíso, a chamada Terra Sem Mal, Yvy marã ey. ‘Crêem que (a Terra Sem Mal) está situada na direção leste, onde nasce o sol, e as migrações dos povos guaranis os levavam à sua busca naquele lado. Muitos chegaram à costa atlântica...’, afirma o estudioso paraguaio Dionísio Gonzalez. A motivação religiosa teria transformado o Peabiru em algo sagrado para os guaranis.” Caminho dos incas: “A rede viária incaica no Peru, Equador, Argentina Bolívia, com 16 mil quilômetros, era impressionante. Vários autores levantam a hipótese de que os incas teriam aberto o Peabiru. Romário Martins, Augusto Pinto, o Barão de Capanema e Caldas Tibiriçá supunham que os andinos desejassem ligar Cuzco ao Atlântico, dentro de uma concepção expansionista do império. Luiz Galdino (...) e Hernâni Donato dizem que os incas podem ter estado em praias sul-brasileiras. Florianópolis (SC), Guaratuba (PR) e litoral santista incluídos. Sugerem que através do Peabiru, funcionários do soberano inca podem ter visitado S. Catarina, Paraná e S. Paulo, até com uma certa assiduidade, para avaliar a possibilidade de contatos comerciais. ‘Mera prospecção’, diz Donato. Galdino acredita que as viagens dos batedores incas ocorreram em época recente, pouco antes da vinda dos europeus, e eram realmente uma tentativa daquele império de colocar um pé no Atlântico. ‘Só que aqui a imensa confederação Carió (Guarani), no sul, e Tupinambá, de Cananéia para cima, botaram-nos para correr’ afirma ele, bem-humorado. Mesmo sem relações duradouras, as idas e vindas de guaranis e incas pelo Peabiru deixaram vestígios de uma certa influência cultural. Por exemplo: - Na astronomia: os meses do ano são relacionados à lua (jassy, em tupiguarani e killa, no idioma quíchua, praticado pelos incas). - Na estatística: o ainhé (cordão de cipó guarani) é semelhante ao quipu (cordão com nós, dos incas, usado para contagem). - Na música: grupos guaranis adotaram a flauta de pã dos Andes. - Nas armas: a macaná guarani (clava, borduna) é muito parecida com a maqana dos incas. Na denominação de fauna, flora: sara (espiga, em guarani; milho 10 Idem, Ibidem 66 em quíchua); cui (animal roedor, nos dois idiomas); jaguar, jaguara (felino, nos dois idiomas); mandioca (guarani) e ioca ou iuca (quíchua), suri (ema, nos dois idiomas).” Caminho de São Tomé: “Segundo essa versão, o caminho teria sido aberto por São Tomé, apóstolo de Cristo. A passagem de Tomé pela América foi bastante mencionada a partir do século XVI. Entre os depoimentos estão os dos padres Montoya, Lozano, Manoel da Nóbrega e da Newe Zeitung Ausz Persill landt (Nova Gazeta da Terra do Brasil, 1508). A versão corrente é a que um homem branco, barbudo, trajando um camisolão - identificado como o apóstolo - teria chegado ao Brasil "andando sobre as águas". Chamado de Zumé, Sumé ou Pay Sumé pelos índios, esse personagem teria falado de um deus único e transmitido aos nativos uma série de conhecimentos. Em sua peregrinação, teria percorrido trechos do Brasil e ido rumo ao Paraguai e ao Peru, abrindo então o Caminho de S. Tomé (Peabiru). Em terras paraguaias foi chamado de Sumé. Saindo dali, a figura teria continuado a abertura do Caminho até os Andes, onde foi chamado de Kon Illa Tijsi Viracocha - também conhecido por Kon Tiki e Viracocha.” O Peabiru foi muito usado pelos índios Guaranis para buscar e transportar caça, ligar diversas aldeias, serviu para andanças e migrações de povos indígenas, além de ter servido de elo de comunicação entre os índios sul-americanos. Há hipóteses de que essa extensa rota pode ter sido utilizado pelos Itararés, no interior paranaense já nos anos 400 ou 500 d. C., mil anos antes da conquista européia. Mais tarde foi utilizada pelos bandeirantes paulistas para proceder “uma expansão em direção à fronteira oeste”11, serviu também para a “descoberta de riquezas, criação de missões religiosas, comércio, fundação de povoados e cidades”12. Atualmente no Brasil praticamente não há trechos do Peabiru, sabe-se que existem poucos vestígios em Pitanga (PR). “Nos anos 70, o Profº Igor Chmyz localizou um pequeno trecho de um ramal em Campina da Lagoa (PR), mas este, segundo ele, foi destruído pela atividade agrícola pouco tempo depois”13. O mesmo acontece nos demais países da América Latina, em que a grande parte do acervo pré-colombiano foi e está sendo destruído. A ODISSÉIA DE ALEIXO GARCIA E O PEABIRU Os náufragos europeus que ficavam perdidos no Brasil formavam famílias, aprendiam costumes indígenas, lendas, histórias e tornavam-se também A autora Elizabeth Siqueira cita a trilha do Peabiru na sua obra: A História de Mato Grosso, 2002, p. 21 Entrevista com a pesquisadora Rosana Bond. Disponível em: http://www.anovademocracia.com.br/10/25.htm Acesso em: 15/05/2006 13 Idem, Ibidem 11 12 67 conhecedores da língua dos nativos que estabeleciam contato. Assim aconteceu com Aleixo Garcia, um português do qual não se sabe sua cidade de origem ou data de nascimento, mas sabe-se que viveu entre os índios patos. Ao tomar conhecimento da história referente à serra da Prata e ao poderoso “Rei Branco”. Convencido da veracidade da história o Aventureiro português parte no verão de 1524 para uma jornada em direção ao Peru e às fabulosas riquezas do império Inca juntamente com um “exército” formado por dois mil índios flexeiros (Carijós, em sua maioria). “[...]Do porto dos Patos, a tropa de Garcia se dirigiu até a foz do rio Itapocu, considerado ‘a porta de entrada do sertão. (...) Seguindo pela margem esquerda do Itapocu, o grupo penetrou no continente e deu início à caça ao tesouro’”14. Sendo Guiado pelos indígenas, Aleixo Garcia chegou a uma trilha indígena bem demarcada, o Peabiru. Durante a jornada os viajantes alimentaram-se de mel silvestre, palmito, milho e farinha de pinhão. No sudeste da Bolívia, o Português e seus índios Guarani “[...] atacaram os postos fronteiriços do Império Inca (...). Garcia deve ter estado a menos de 150 km de Potosi, a fabulosa montanha de mais de 600 m., quase inteiramente de prata pura, e local que dera origem à legenda da ‘serra da prata’. O ‘Rei Branco’ também existia: era o Inca Huayna Capac, que vivia em Cuzco, a capital imperial localizada 600 km ao norte de Sucre”15. O exército de flexeiros saquearam os vilarejos nos arredores de Sucre e Potosi. Na retirada do grupo para o regresso à Santa Catarina, foram atacados pelos Payaguá às margens do rio Paraguai. Centenas de índios morreram e entre eles estava Aleixo Garcia. Os sobreviventes ao ataque dos Payaguá chagaram ao porto dos Patos, por volta de 1525, e entre eles estava o mulato “Francisco Pacheco, um dos náufragos de Solis”. Pacheco fez um relato da experiência e mostrou algumas peças que restaram do saqueamento, o que criou uma “febre” de procura de riquezas em Melchior Ramires, Henrrique Montes, indígenas e em outros viajantes europeus. Segundo Eduardo Bueno (2001, p.146), por intermédio deles, as notícias sobre a “serra da Prata” e o “rei branco” também iriam chegar aos ouvidos dos reis de Portugal e Espanha – e se tornariam a força motriz que impulsionou a exploração do rio da Prata e a ocupação do litoral sul do Brasil. BIBLIOGRAFIA BUENO, Eduardo. Náufragos, Traficantes e Degredados: as primeiras expedições no Brasil, 1500- 1531. Rio de Janeiro: objetivo, 1998, 143 – 146. BUENO, Eduardo. Náufragos, Traficantes e Degredados: as primeiras expedições no Brasil, 1500- 1531. Rio de Janeiro: objetivo, 1998, 143. 15 Idem, p. 145. 14 68 ENTREVISTA com a pesquisadora Rosana Bond. Disponível em: http://www.anovademocracia.com.br Acesso em: 15/05/2006 SIQUEIRA, Elizabeth Madureira. História de Mato Grosso: da ancestralidade aos dias atuais. Cuiabá: Entrelinhas, 2002, p. 21. 69 A GÊNESE DE CORUMBÁ Fabiana Pereira V. Navarro16 Ricardo Fernandes Silva17 Vanessa Moreno Soncela18 RESUMO: Este trabalho procura resgatar o Processo de Colonização de Mato Grosso desde o início da sua ocupação pelos espanhóis do Século XVI, até as últimas décadas do Século XVIII, momento em que os portugueses consolidaram a posse sobre esse território. Ajuda a entender um pouco mais a história desta região. De modo especial os conflitos entre os dois povos ibéricos que, a princípio confrontaram-se para manter o controle da mão-de-obra nativa e, posteriormente, para garantir a posse dos territórios mato-grossenses, ricos em metais preciosos. PALAVRAS–CHAVE: História da Gênese, Biografia, Confluência, Espanha, Portugal. O PROCESSO DE OCUPAÇÃO Este artigo apresenta o processo de colonização de Mato Grosso em especial da região do Pantanal Sul, e também da expansão mercantilista européia nos séc. XVI, XVII e XVIII dando importância tanto na fase espanhola como na portuguesa. Esta pesquisa teve o propósito de resgatar o processo de colonização de Mato Grosso, mais especificadamente da região do Pantanal sul, dentro dos quadros da expansão mercantil européia nos séculos XVI, XVII e XVIII, co0nsiderando para tanto duas fases: a espanhola e a portuguesa. (ESSELIN, 2000, p-9). A primeira vista procura mostrar o que atraiu os espanhóis para a bacia platina no início do séc. XVI, como foi a ocupação por parte dos mesmos, da ocupação a implantação de núcleos populacionais nas terras mato-grossenses e sua evolução colonial. Segundamente destaca o atrativo dos portugueses na região mato-grossense, na metade do séc. XVI, em razão principalmente da mão-de-obra indígena . Desde então inicia-se a competição pelo monopólio da mão-de-obra indígena e logo após com a descoberta de ouro do Cuiabá pela posse das regiões auríferas. O foco do livro A Gênese de Corumbá é mostrar que por falta de conhecimento e de acesso a documentações cabíveis o processo de colonização do Mato Grosso era exclusivo somente aos portugueses sendo que os espanhóis tiveram uma importância de peso nesta ocupação. Os espanhóis fundaram o primeiro núcleo Acadêmica – Universidade Católica Dom Bosco; Graduanda em História; E-mail: [email protected] Acadêmico – Universidade Católica Dom Bosco; Graduando em História; E-mail [email protected] 18 Acadêmica – Universidade Católica Dom Bosco; Graduanda em História; E-mail [email protected] 16 17 70 populacional de MT a cidade de Santiago de Xerez, só este fato faz desmentir a primazia a Cuiabá no ciclo do ouro. A GÊNESE Além disso, antes da fundação de Cuiabá, a Companhia de Jesus apoiada pela coroa Espanhola, fundaram a redução do Itatim, que era importante estrategicamente, o estuário do Prata aos contrafortes andinos e servia de escudo contra á penetração portuguesa na região argentífera do Peru. O processo de ocupação do Paraguai pelos espanhóis em direção ao Mato Grosso foi iniciado no séc. XVI, porque os mesmos estavam empenhados em encontrar o caminho marítimo que os levassem as Índias que para tanto era rica em especiarias, este foi o principal fator que os trouxe ao estuário do Rio da Prata. No começo do século XVI, os espanhóis estavam empenhados na busca de um caminho marítimo que os conduzisse às Índias, rica em especiarias. Foi essa busca que os trouxe ao estuário do rio do Prata. (ESSELIN, 2000, p-21). A princípio o continente americano só servia como um obstáculo para o encontro de tal rota marítima. Posteriormente foi firmado um contrato com o rei espanhol Fernando V, com a finalidade de achar um estreito que ajudasse na penetração do Rio da Prata. Assim foi feito e essas expedições encontraram várias ilhas. Logo adiante em costa Uruguaias alguns outros tripulantes ao desembarcarem nessas ilhas foram mortos por índios charruas. O restante da tripulação européia teve no seu retorno barco naufragado próximo à ilha de Santa Catarina tendo alguns de seus tripulantes salvos um que mais se destacou foi Aleixo Garcia. Acolhidos pelos indígenas formaram famílias, aprenderam costumes e até conheceram melhor sobre a existência de metais como a prata. Estas histórias e firmamento de espanhóis em novas terras fez com que os portugueses ficassem atentados a adentrara a Serra do Prata. Com isso enviaram uma expedição comandada por Martin Afonso de Souza, que teve um insucesso na mesma, pois forma morta pelos naturais daquelas regiões quando tentaram carregar riquezas peruanas. Mesmo com tamanho insucesso, Martin fundou São Vicente e Piratininga, principalmente porque essas vilas davam acesso primoroso ao Paraguai e ás minas do Peru. Com todo esse acontecimento os espanhóis só tinham uma idéia fixa e uma expedição afim da ocupação da Serra do Prata e por toda região do rio da Prata. O propósito era apenas de explorar os metais e tudo que os indígenas produziam, e não 71 trazer nenhum cultivo ou benefício a essas terras. Os índios inicialmente foram amigáveis dividindo até sua alimentação com a expedição, mais depois que se negaram a dar alimento foram atacados pelos expedicionários que agora queriam escravizá-los até que cultivassem alimentos para os mesmos. Isso não deu certo, pois alguns índios querandins se deslocaram para o interior fugindo da escravidão e os que ficaram lá se revoltaram e atacavam constantemente os espanhóis. Por essa razão os espanhóis tiveram que cultivar a sua própria comida, fundaram posteriormente o forte de Corpus Christi com o intuito de isolarem de ataques. Deve-se deixar claro que os únicos índios que ajudaram os espanhóis depois de serem vencidos foram os guaranis que tinham suam importância para os espanhóis, pois eram agricultores, caçavam e coletavam de ótima forma, e os espanhóis ficaram incumbidos de proteger os índios de ataques nômades. Essa junção de nativos e expedicionários fez com que fosse formada a sociedade paraguaia, tendo uma grande miscigenação entre os mesmos. Com toda essa disputa luso espanhola o que fica bem claro com todas essa fundações de vilarejos e fortes estratégicos é que os indígenas sofreram muito com isto pois foi a mão de obra deles que mais causou conflitos e sofrimentos naquela época. A fundação da cidade de Santiago de Xerez foi estratégica, pois servia de reservatório de mão - de – obra indígena com muita catequização religiosa. No começo o contato com colonizadores foi amistoso, mais depois com tanta opressão e abuso sofrido pelos indígenas eles começaram a fugir quando pegos eram açoitados e colocados em grilhões para evitar nova fuga, uma barbárie. A chegada dos Jesuítas e o seu trabalho missionário em Mato Grosso marcaram também a colonização espanhola em nosso continente, e com sua cartilha religiosa oprimia os indígenas a praticarem seus cultos religiosos de costumes. Essas reservas e até a redução do Itatim receberam invasões portuguesas que dizimaram vários nativos e assim alguns indígenas que conseguiram fugir dessa execução em massa se refugiaram para as matas onde voltaram aos seus cultos e adorações a seus deuses. “As vitórias portuguesas sobre os núcleos de povoação castelhana se revestiram de importante significado”. (ESSELIN, 2000, p-93). Os portugueses conseguiram uma vitória significativa em cima dos espanhóis nas suas reduções: à medida em que Xerez foi invadida e Itatim abandonada, deixaram de ser um empecilho nas investidas portuguesas pela regiao do prata e no vice-reino do Peru. 72 O campos de Xerez passaram a ser usadas pelo portugueses como ponto de pousada, albergue, colheita de sementeiras e infalivelmente passagem privilegiada ao Extremo Oeste. antes de atingir o Extremo-Oeste, as bandeiras voltaram suas atenções para a região do Paraguai e do vice-reino do Peru, onde seus ataques foram mais constantes. Promoviam inavasões, roubos de gado e cavalos e destruíam áreas cultivadas, apossando-se de colheitas e capturandoos naturai, o que obrigava os grupos indégenas a procurarem abrigo nas imediações dos núcleo depovoamento espanhol. Os Portugueses chegaram a invadir em 1652, a província do Paraguai com quatro poderosas colunas, mas foram supreendidos pelas forçasespanhola que uniram-se indígenas e jesuítas,que,a mando do governador destríram os exércitos invasores. A derrota que os portugueses sofreram no Paraguai, nao foi motivo para eles desistirem das suas investidas em direção da preaindígena. Em fevereiro de1676,invadiram Vila Rica do Espírito Santo, ao poente do rio Paraná, em torno da qual existia grande população índigena que prestava serviços aos seus moradores. Nao ofereceram qualquer resistência e se renderm à superioridade bélica dos invasores, os quais levaram quatro povoados de índios, com aproximadamente quatro mil peças, além de terem despovoado completamente a Vila,uma vez que seus habitantes procuraram refúgio em Assunção. A invasão de Vila Rica trouxe como consequencia a completa desestabilização da economia paraguaia, que foi privada da maior parte da mão-de-obra de sua principal atividade econômica – a erva-mate. A descoberta das primeiras minas em Cuiabá ocasionou a imediata afluência de portugueses, principalmente os de São Paulo, ao local das jazidas,tidas, na época, como as mais ricas da colônia. Foram formadas várias comitivas para irem em busca do cobiçado metal. (ESSELIN, 2000, p-103). Os primeiros aventureiros tiveram muitos obstáculos: percorriam por volta de 500 léguas de navegação fluvial, num período de quatro a seis meses, enfrentando as mais variadas dificuldades; a falta de alimento, a falta de pilotos com experiência para comandar as embarcações, os naúfragios eram constantes; os pioneiros enfrentavam ainda o ataque de mosquitos e o forte calor. A busca pelo ouro, traziam aos montes, que eram vitimados pela fome ou pelas epidemias. O ouro mato-matogrossense era de aluvião, ou seja, as minas só eram opulentas na superfície, que, apesar de extensa, possuía ouro em pequena 73 concentração. Após descobertas a coroa portuguesa em Cuiabá, determinou a contribuição anual, de duas oitevas e meia para cada pessoa que trabalhasse em qualquer ofício,sendo arrecadadas, quatro arrrobas de ouro, que, rapidament,foram levadas à provedoria de São Paulo, pelo padre André dos Santos Queiros, provocando entusiasmo geral na população. A corrida ao ouro de Cuiabá provocou novo afluxo para a região das minas. Precavidos com o que ocorreu em Minas Gerais a Coroa portuguesa procurou assegurar a prioridade da posse do metal para os paulistas, evitando assim novos conflitos como o que aconteceu com a guerra dos Emboabas. O povoado de Cuiabá sofreu com a ocupação rápida populacional e a alta especialização da atividade mineiradora trouxe graves problemas, tais como o completo desinteresse por outras atividades econômicas fundamentais,o que provocou crises de fome e miséria. Os negros, ocupados nas lavras, não dispunham de tempo para se dedicar ao cultivo. Cabia quase que exclusivamente aos comerciantes paulistas fornecer aos garimpeiros todos os produtos necessários, desde os deconsumo até equipamentos mais sofisticados. As monções que antes se dedicavam exclusivamente a caça aos índios, passaram a fazer o comércio,altamente lucrativo. Foram elas que asseguraram a comunicação entre São Paulo e Mato Grosso e introduziram este novo terrítorio nas hostes da política mercantilista portuguesa. O ouro mato-grossense, geralmente encontrado no leito e nas margens dos cursos d`´agua, obrigava os negros a trabalharem com seus corpos mergulhados,o que causava danos irrecuperáveis à saúde, diminuindo sua produção e o seu tempo de vida. A morte ou invalidez prematura dos escravos exigia constante reposição da mão-de-obra. Como a exploração aurífera na região alternou período de grande produção com outros de marcante decadência,o negro tornou-se mercadoria muito cara, incompatível como os rendimentos dessas lavras, o que obrigou o minerador a utilizar o indígena no processo de produção. Os indios mais utilizados na procura ao ouro foram os bororos e os parecis, os quais ofereciam menor resistência e eram de fácil trato. No ano de 1726, chegara em Cuiabá o Governador da Capitania de São Paulo, Rodrigo Cesar de Menezes, a quem estava submetido aquele territorio. Cumprindo ordens reais, vinha com objetivo deregularizar a cobrança de impostos e organizar a, administração pública. ”As prioridades portuguesas eram delimitar a área, fixar o povoamento e garantir a posse, o que justifica a ação do governador em estimular a agricultura e a pecuária”.(ESSELIN,2000,p.129). 74 Em defesa do comércio, do povoamento e da navegação nos rios Guaporé e Madeira, Rolim de Moura, em carta a Diogo de Mendonça Corte Real, pediu que fosse franqueada a comunicação de Mato Grosso com o Pará, e isso por diversas razões: A primeira que do Pará hão de concorrer naturalmente muitas pessoas para aquelas minas. A segunda que as fazendas e mantimentos do reino vindos por ali hão de ser mais baratos, o que facilitará a subsistência dos seus moradores. A terceira que por aquela parte fica muito mais breve a comunicação com o corte donde pode ser socorrida esta capitania, com grande brevidade. E quarta fazerem - nos senhores daquela navegação. Essa abertura contribuiria ainda para introdução de negros na região, mãode-obra essencial para as minas e cultivo de terra facilitaria a imigração dos açoreanos, acelerando a fixação do povoamento. Após a descoberta da rota fluvial que ligava Mato Grosso ao Pará, os Jesuítas, visando iniciar a ocupação e bloquear a navegação portuguesa, fundaram a aldeia de Santa Rosa, no lado Oriental. Com a demarcação do Tratado de Madri, essa aldeia foi, em comum acordo, restituída aos portugueses. Em 1759, a construção de um forte no local, que recebeu o nome de Presídio de Nossa Senhora da Conceição, mais tarde presídio de Bragança. O contrabando, não obstante, era intenso e contava com a conivência de muitas autoridades. Assim sendo, o forte construído para deter o avanço espanhol e garantir o uso privado da navegação do rio, na verdade não cumpriu bem seu papel, pois, em boa parte do ano, com as cheias do pantanal, toda área ficava alagada, permitindo que as embarcações o contornassem, deixando de ser alvo fácil de seus canhões. (ESSELIN, 2000 p.141). Em 21 de setembro de 1778, Marcelino Roiz Camponês fundou o novo povoado também com o nome de Albuquerque, por ser uma vila sobre altos barrancos do rio, hoje denominada Corumbá. Os primeiros colonizadores do povoado vieram na companhia de seus fundadores, à custa da Fazenda Real, e enfrentaram grandes dificuldades. A situação começou a melhorar após as colheitas e também em função das atividades de comércio que os moradores mantinham com Cuiabá. Desenvolveram uma economia de subsistência: produziam milho, feijão, algodão e mandioca, praticavam a caça e a pesca e exportavam couros e peles de animais silvestres e o algodão, que, pós fiado e tecido, era trocado por equipamentos agrícolas ou por outros produtos que não tinham condições de plantar. Em Abril de 1791, havia em Corumbá 141 pessoas, sendo um oficial, 12 soldados de guarnição, com seis crianças brancas e 50 índios e nove pretos escravos, 75 todos do sexo masculino; 11 mulheres e crianças brancas, sessenta e duas índias e três negras escravas. Em 1850, o Governador de Mato Grosso, João José da Costa Pimentel, determinou a ocupação de Fecho dos Morros por um destacamento militar. Ao tomar conhecimento do ocorrido, o Presidente do Paraguai imediatamente enviou uma tropa ao local e desalojou os brasileiros do sítio onde se haviam instalado. A partir desse incidente, as autoridades brasileiras se convenceram da necessidade de utilizar economicamente a região. Para movimentar a economia local e para dar início á atividade mercantil em larga escala, era necessário utilizar a navegação regular do rio Paraguai. No ano de 1856, Brasil e Paraguai assinavam o Tratado de Amizade, comercio e navegação. Através dele, o império conseguiu liberar a navegação do rio Paraguai, permitindo á cidade portuária de Corumbá desenvolver-se e manter com regularidade contatos comerciais com navios brasileiros e também com aqueles de bandeira de outros países, o que concorreu para acelerar o seu desenvolvimento econômico, tornando-a o principal entreposto comercial do estado de Mato Grosso. A prioritária necessidade de defender a região de ataques de inimigos (índios ou espanhóis) baseou-se na fundação de pequenos núcleos isolados, disseminados em mais de quinhentas léguas de fronteira e assentados em locais estratégicos, facilmente fortificáveis, que pudessem rechaçar eventuais ataques inimigos. Corumbá, que antes de tudo era uma guarnição de fronteira, reflete essa estratégia de ocupação. Foi no governo de Luis Albuquerque que ocorreu a consolidação do poder luso nesse território. Ao construir o forte Príncipe da beira, no Guaporé, assegurou a navegação a navegação com Belém do Pará. No momento período, com a construção de Coimbra e de Corumbá, garantiu acesso da Capitania ao litoral. Em ambos os casos, conseguiram manter os espanhóis em seus territórios, impedindo sua expansão. Além de ocupar a terra e conter os inimigos, esses novos núcleos propiciaram o avanço da colonização, pois os fazendeiros, que até então assentavam suas propriedades apenas nas proximidades de Cuiabá, passaram a se estabelecer nas terras adjacente às fortalezas, dedicando-se então à agricultura, pecuária e exploração dos recursos locais. BIBLIOGRAFIA ESSELIN, Paulo Marcos. A GÊNESE DE CORUMBÁ: Confluência das Frentes Espanhola e Portuguesa em Mato Grosso 1536-1778. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2000. 76 ARLINDO DE ANDRADE GOMES Tânia Mara Redivo19 RESUMO: Este trabalho tem por objetivo pesquisar a vida e obra de Arlindo de Andrade, tendo como metodologia para sua elaboração, pesquisa bibliográfica em obras que tratam deste homem público da história sul-mato-grossense. Filho de senhores de engenho em Pernambuco, formado em direito na faculdade de Recife como muitos outros filhos da elite de seu tempo. Através de amigos dos pais, no Rio de Janeiro, conseguiu ser nomeado para emprego público no Mato Grosso. Juiz em Nioaque, pediu transferência para Campo Grande, onde estranha as atitudes hostis e a maneira violenta de se resolver os problemas na cidade. Depois de ter exercido a magistratura por pouco mais de um mês e meio, dedicou-se à advocacia, ao jornalismo e à política. Foi também editor do primeiro jornal de Campo Grande, O ESTADO DE MATO GROSSO. Assumiu a intendência de Campo Grande e trabalhou, segundo os cronistas, no saneamento e urbanismo da cidade. PALAVRAS-CHAVE: História regional, Campo Grande, Arlindo de Andrade Gomes. A HERANÇA DE ARLINDO Nasceu em Timbaúba-Pe, em 16/04/1884, num velho engenho de açúcar, onde passou a infância. Filho de Manoel da Cunha Andrade Gomes e Maria Cavalcante de Andrade. No Recife fez a faculdade de direito. Trabalhou no Diário de Pernambuco. Gostava muito de ler e estudar. Colou grau em direito no dia 05/12/1907. Descontente com a orientação política abandonou o Diário e foi para o estado de Mato Grosso, chegando lá no mês de abril de1908, com pouco dinheiro no bolso, foi em busca de trabalho. Iniciou como professor de botânica no tradicional “Lyceu Cuyabano”, onde teve alunos como Arnaldo Estevão de Figueiredo – que veio a ser governador de Mato Grosso em 1946, e Ulisses Cuiabano – um dos maiores poetas mato-grossenses. Em 10 de julho, Arlindo foi nomeado inspetor escolar da capital e a seguir, procurador fiscal da delegacia do tesouro federal do estado de Mato Grosso, assinada pelo presidente Nilo Peçanha, tomando posse no dia 14 de outubro. Porém, não era o que Arlindo esperava, no ano seguinte, aceitou o lugar de juiz de direito da Comarca de Nioaque e posteriormente, em decorrência da criação da comarca de Campo Grande, através da lei número 549, publicada no dia 20/07/1910, foi removido para nossa Comarca, sendo então, o primeiro juiz de direito de Campo 19 Acadêmica de Historia/UCDB. E-mail: [email protected] 77 Grande. O juiz tinha 27 anos. Era um homem simples, tolerante, afável, modesto. Uma pessoa com atributos para distribuir a justiça. Nos 50 primeiros dias depois da sua posse, Campo Grande foi invadida por cerca de 300 homens armados, comandados pelo caudilho Bento Xavier. Amando de Oliveira, presidente da Câmara improvisa a reação fazendo fugir o invasor. O primeiro tenente Constantino de Souza acusou Amando de Oliveira de ter abusado do poder e mandou prende-lo por isso. Arlindo de Andrade, imediatamente concede uma ordem de habeas-corpus em favor de Amando de Oliveira. A autoridade militar não só descumpre a ordem como determina a prisão do próprio juiz. Revoltado com atitudes arbitrárias do presidente da câmara que baixava decretos absurdos de estado de sítio e ameaças de guerra contra quem afrontasse suas decisões, Arlindo de Andrade decide demitir-se do cargo. E assim Campo Grande perde seu primeiro juiz. Deixando o cargo de juiz, dedicou-se à advocacia, ao jornalismo e à política. Arlindo seguiu os passos de seu colega e amigo Eduardo Olímpio Machado que abria caminho novo na advocacia: as divisões de terras. Até o início deste século, as fazendas não possuíam cercas divisórias, o gado era querenciado em determinados lugares e os entreveros evitados por meio da identificação pela marca a fogo e os bezerros pela divisa, consistente em um picote na orelha. O arame farpado foi descoberto no final do século passado, possibilitando extremar as lindes das propriedades rurais, bem como construir divisões internas das pastagens. Ao estabelecer a prática de cercar os imóveis rurais, logo surgiu a necessidade de se fixarem limites e confrontações das propriedades e de extinguir os condomínios existentes, por meio das ações de divisão e demarcação de terras. Arlindo e Olímpio Machado se especializaram nesse tipo de serviço forense. Com os honorários da advocacia, pôde adquirir uma pequena chácara, esta se transformou em pouco tempo num verdadeiro parque da cidade, que os amigos e curiosos inevitavelmente visitavam. Frutas, flores, árvores ornamentais, fruteiras tropicais de sua terra, pássaros em grandes viveiros ou em pequenas gaiolas, outros soltos a procurar o alimento que todos os dias lhes eram distribuído. Tudo classificado por Arlindo com o nome popular e o correspondente científico. Com a experiência adquirida no jornal de Pernambuco, no dia 22 de junho de 1913, Arlindo de Andrade publica o primeiro número de seu jornal intitulado O ESTADO DE MATO GROSSO, dessa forma nasce o primeiro jornal de Campo Grande. 78 Em 1918, casa-se com dona Julieta, com a qual teve 7 filhos, além de Sílvio que se tornou médico de renome em Campo Grande, e falecido aos 37 anos de idade. Ainda por essa época Arlindo se empenhou dia-a-dia na campanha presidencial de Rui Barbosa, pois Arlindo se empolgava com as idéias liberais, com a veemência de suas afirmações, a eloqüência de seus discursos eruditos, o conhecimento profundo, tantas vezes confirmado, dos problemas brasileiros, enfim, Rui Barbosa era para Arlindo a grande esperança para os problemas brasileiros. Todavia Arlindo não contava com a dada derrota de seu candidato, o que o deixou Arlindo muito contrariado, mas também o impulsionou para a sua futura atuação política. Arlindo estava intimamente ligado aos eventos e trabalhos mais significativos da cidade na época. Portanto em 1921, Arlindo assume a intendência de Campo Grande e realiza trabalho importante no progresso da cidade. Valério de Almeida (2003) escreveu Campo Grande de outrora, onde ele afirma: Foi o Dr. Arlindo, sem sombra de dúvida, o passos largos desta terra, pois com ele desapareceram velhos pardieiros e surgiram as obras mais notáveis em prol do saneamento da cidade e quiçá do seu urbanismo, daí a fisionomia dos novos prédios bem como passeios e muros em todas as vias públicas. E relaciona outras tantas obras e transformações transcendentais: nivelamento de todas as ruas; arborização das vias, embelezamento da Av. Afonso Pena; padrão para calçadas e passeios; implantação do horto municipal; locação e planta do bairro Amambaí; construção de pontes e estradas na cidade e no interior do município. E, por fim, a transferência da sede da Circunscrição Militar, de Corumbá para Campo Grande, cujos quartéis foram construídos em área doada pela prefeitura. (Campo Grande de Outrora, p. 21 e 22). Entre tantas realizações, vale destacar que Arlindo foi como afirmou Ulisses Serra (1971, p.72 a 78), o decorador da cidade: Realmente, com sua paixão pelas plantas, foi ele quem arborizou as ruas e cuidou das praças e jardins e também de seu arruamento. De sua própria chácara, na Marechal Rondon, saíram, gratuitamente, mudas das árvores que hoje ornamentam nossa cidade, amainam os dias de verão, formando essa magnífica e deslumbrante arborização que tanto envaidece o campo-grandense. O personagem retratado nas linhas acima é um daqueles poucos, que, com muito esforço, dom e dedicação construíram e reproduziram tradição política da República Velha o clientelismo e a política feita pelos “doutores”. A biografia de Arlindo de Andrade Gomes não difere muito, com base nos cronistas, dos relatos tradicionais, ou seja, o político é apresentado como homem regido pela ética, em um mundo onde os valores se invertem; enfim, de tudo que se 79 expôs, fica o personagem como paradigma das atuais e futuras gerações. Uma característica dos relatos das crônicas é não desagradar a ninguém, especialmente se o biografado for influente. BIBLIOGRAFIA ANDRADE GOMES, Arlindo de. O Município de Campo Grande em 1922. Instituto Histórico e Geográfico de MS. D’ALMEIDA,Valério. Campo Grande de Outrora. Editora letra livre, 2003. MACHADO, Paulo Coelho. Arlindo de Andrade, primeiro juiz de direito de Campo Grande.Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, 1988. Campo Grande-MS. SERRA, Ulisses. Camalotes e Guavirais. Editora Clássico-científica, 1971. 80 CORONELISMO EM MATO GROSSO (1889-1943) Claudemir Rosalvo Seron20 Ivanio A. Nogueira21 Marco Aurélio Olarte22 RESUMO: Este trabalho analisa ao período determinado entre os anos de 1889 a 1943 sobre os coronéis, abordando especificamente as estruturas econômicas e sociais neste período, com ênfase especial à política republicana regional e suas características. Sendo assim o artigo “o coronelismo em Mato Grosso ” tem por objetivo compeender os fatos políticos e sociais na região, o grande interesse da pesquisa enfoca os fatos políticos que marcaram a história mato-grossense. PALAVRAS-CHAVE: coronelismo, banditismo republicano. BANDITISMO O estudo do coronelismo mato-grossense faz nos compeender o fanomeno político que caracteriza em um dado momento a história brasileira da região, entretanto no período colonial se deram as primeiras viagens, e aqui instalou-se um centro mineiro marcando assim o ciclo do ouro em Mato Grosso. A violência sempre esteve presente desde o primeiro contato com o homem branco. Uma característica marcante do coronelismo mato-grossense aconteceu em função da delimitação no tempo e no espaço a nível regional, assim com o regime republicano aparecem no Mato Grosso coronéis que pegam em armas pelo poder. Outro aspecto do coronelismo em Mato Grosso foi o envolvimento com o banditismo que existia nessa região em fins do séc. XIX, a relação do coronel com o bandido no período republicano teve características bem definidas, no início com o auge do coronelismo coincide lutas políticas no estado quando os bandidos são protegidos pelos coronéis que tendo poder domina homens armados e vinculam bandidos a polícia local. Num segundo momento o banditismo em Mato Grosso marca o aparecimento de grandes bandos e ganham fama alem das fronteiras. O poder dos coronéis começa entrar em decadência somente com a intervenção federal no estado a partir de 1917, o que abalou a estrutura do coronelismo em Mato Grosso foi a mudança em suas bases econômicas e sociais ocorridas nos anos 20, essas mudanças fizeram surgir um relativo e importante Claudemir Rosalvo Seron, graduando do curso de História pela Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. [email protected] 21 Ivânio A. Nogueira, graduando do curso de História pela Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. 22 Marco Aurélio Olarte, graduando do curso de História pela Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. marcoauré[email protected] 20 81 processo de urbanização no sul do estado e a transferência do eixo econômico de Mato Grosso com o comércio que concentrava nos centros como Corumbá-rio-Paranácuiabá agora com a estrada de ferro deslocou-se para Campo Grande, ainda em 20 o sul de Mato Grosso recebe influências de São Paulo através da ferrovia e é sacudido por políticas revolucionárias dos sindicatos e dos movimentos tenentistas. A revolução de 30 sacode ainda mais o poder coronelista por uma ação opressora com intervensões federais golpeando grandes proprietários de terra e usineiros do norte e mais tarde com o desarmamento da população do sul mudando a feição da política regional. Para entender a violência política em Mato Grosso no período republicano ao qual atingiu seu ponto máximo é preciso analisar a ocupação da fronteira oeste, um ponto se refere a guerra com o Paraguai e a repercussão da invasão no território mato-grossense. A história sempre reduziu e justificou a ação dos bandos como excepcional e não como algo real que atuava na formação econômica e social e política da sociedade rural brasileira, expressando de uma forma de repressão ao banditismo. Depois da independência, a violência tomou formas declaradas a nível político, assim foi palco de muitas agitações gerando a rebeliões em 1834, expressando o grau de violência que ali existiu. No início do século XIX a região enfrentou muitas dificuldades para sua sobrevivência e dependia quase que totalmente de verbas do governo federal. A utilização da navegação pelo rio Paraguai tinha o interesse de assegurar o controle da fronteira oeste do império, mas com a guerra do Brasil com o Paraguai significou para o mato grosso um período de crise, além de sofrer a invasão e ocupação de grande parte de suas terras passou a um isolamento quase completo pelo fato de haver proibição da navegação por parte do Paraguai, no entanto a guerra foi para Mato Grosso um período de fome e doenças sofrendo assim uma estagnação em sua economia, e mesmo após a guerra a região viveu um clima de estabilidade e violência esta que ali existiu era tão rotineira e acontecia com tanta naturalidade que impressionava até aqueles que passavam por aquela região. AS DISPUTAS As disputas dos coronéis na região fizeram desenvolver ainda mais o banditismo envolvendo-os em lutas políticas e partidárias locais tornando comum em todos os movimentos revolucionários a partir de 1891 e chega a um ponto que o banditismo e o coronelismo não podem mais serem compreendidos separadamente. O poder dos coronéis nesse contexto político facilitava arrebanhar homens armados sustentando assim o poder na região, entretanto o envolvimento dos bandidos no 82 processo político escapou ao controle dos coronéis que passaram a saquear fazendas de inimigos políticos e inclusive deles próprios. No entanto o que caracterizava Mato Grosso, na república velha, e início do estado novo foi a impunidade, nesse período quando alguém era submetido a julgamento era quase sempre absolvido pois os acusados apresentavam-se com seus inofensivos revólveres à cinta. Outra forma de violência ocorrida anterior a 1931 foi o trabalho escravo nos ervais e fazendas de açúcar com troncos para o castigo, só através do coronel Antônio Mena Gonçalves em 1931 com a ajuda da força militar invadem usinas prendendo seus proprietários. Em 1939, inicia o desarmamento dos coronéis e bandidos e da população em geral quando o General João Pessoa intensifica a lei do desarmamento. A crise política que marcou o período republicano, teve seus reflexos em Mato Grosso, onde em 1892 uma revolta na cidade de Corumbá daría continuidade a um processo de disputas políticas e econômicas em todo o estado. Esta revolta baseou-se em questões econômicas, nas quais a burguesia local se via prejudicada pelos desmandos do governo de Manuel J. Murtinho, sob as influências do governo de Deodoro e que desfavoreceu a região sul de Mato Grosso na questão dos benefícios recebidos. Os movimentos contestatórios também fizeram presentes em Cuiabá, onde o governo central era alvo do descontentamento político. Em meio a este quadro de convulsões sociais a figura dos coronéis teve papel relevante nas decisões políticas do estado. O processo histórico de Mato Grosso caracterizou-se pela atuação dos coronéis suas disputas que se fizeram ao longo do período republicano. Esses movimentos entremeados pela violência que protagonizou a história local fez com idéias separatistas que proliferassem na região sul do estado. A razão maior em relação a essas intenções se baseava nos desequilíbrios econômicos e administrativos da região. MATE LARANGEIRA Os inúmeros episódios políticos que ocorreram no período republicano e marcados pela intransigência dos personagens históricos, realçou a figura dos coronéis como elemento aglutinador de revoltas e contra-revoltas, pois havia entre estes, os simpatizantes das causas governistas. Ainda como fator alimentador das causas separatistas, a migração de um contingente gaúcho fomentou o movimento separatista dos coronéis locais. Este apoio dos sulistas oriundos das regiões gaúchas teve episódio relevantes nas reviravoltas das disputas políticas no estado. Figuras como Bento Xavier e outros incrementaram a violência na região. Segundo Corrêa (1995, p.19) companhias como a erva mate laranjeira predominavam o setor de 83 exportador tendo ainda a pecuária aliada a este aspecto, com a conseqüente criação de vários saladeiros pelo estado. Apesar de todos os entreveiros porque passou a história de Mato Grosso, a decadência dos coronéis teve seu período esgotado, o qual, em função do progresso que se apresentava, paulatinamente este quadro conturbado na vida social do estado foi se extinguindo com a predominância cada vez maior pela presença do estado legalizado. Este período de convulsões ficou conhecido como a terra da “lei do 44”. Em 1930, as questões separatistas ganharam mais força, onde Campo Grande passa a irradiar esse movimento pois as desigualdades econômicas e os favorecimentos políticos punham a região norte em nítida vantagem social. Ainda que este fato tenha prejudicado o aspecto social e econômico da região, a introdução da estrada de ferro alterou sobremaneira o desenvolvimento e povoação da região sul do estado. E ao mesmo tempo auxiliou no controle da atuação dos revoltosos em vários pontos do estado, com o transporte e ocupação dos militares nesses locais. Paralelamente em meio a essas inúmeras questões sociais políticas e econômicas que envolveram o estado onde a figura ímpar dos coronéis se destacou, outro elemento contestador é “sui generis” irá se destacar e que será o surgimento de grupos ou bandos armados atuando em meio as revoltas e contestações sociais, sendo considerados pelo poder constituido como bandidos e criminosos da sociedade. Esses grupos sempre atuaram em meio às reivindicações sociais e de forma rebelde às políticas exercidas pelo estado. O banditismo exerceu aliado ao coronelismo movimentos revolucionários e sangrentos nos quadros políticos do estado, chegando mesmo a ter seus líderes reconhecidos em âmbito nacional. A grande contribuição para o desenvolvimentos desses grupos foi a leva de gaúchos que migraram para o sul do estado, trazendo de sua terra as experiências revolucionárias e os costumes tipicos em sua maneira de lutar, tais com a famosa “degola”. Nos anos de 30 e 40, a fama desses grupos ultrapassou as fronteiras do estado pondo o governo central e local em situação delicada, ainda que esta situação predominasse no meio rural. Dentre esses bandidos, o mais conhecido na história de Mato Grosso é Silvino Jacques que se transformou em mito devido ao seu destemor e perícia como atirador. Oriundo do Rio Grande do Sul este personagem marcou o período de banditismo no Mato Grosso de maneira relevante, porém em 1939, o governo inicia a operação da captura de Silvino Jacques onde após uma perseguisão árdua ao grupo consegue êxito eliminando o famoso bandido que tanto perturbava a burguesia de então. Além desse período, ainda em 1941 a existência de grupos armados como os famosos baianinhos fez com que o governo organizasse outra captura para por fim às ações desse grupo de bandoleiros que assaltavam fazendas e faziam extorsões. Após 84 vários embates, o grupo foi se dizimando aos poucos com os últimos elementos se refugiando no Paraguai. Portanto, a história de Mato Grosso se formou na trajetória desses elementos contraditórios em seu meio social, propiciados em seu surgimento por uma herança da administração colonial onde os mandos e a precária estrutura política e econômica sempre favoreceu a um pequeno grupo da elite em detrimento da grande massa de trabalhadores oprimidos e explorados. Invariavelmente este fenômeno universal ocorrerá toda vez que se fizer presente a incoerência e a displicência do estado no trato das questões econômicas e sociais, impostas às classes mais humildes da população. BIBLIOGRAFIA CORRÊA, Valmir Batista. Coronéis e Bandidos em Mato Grosso. Campo Grande: UFMS, 1995. 85 HISTÓRIA E FRONTEIRA: O SUL DE MATO GROSSO 1870-1920. 23 Lucélia Gonçalves Cavalcante 24 Viviane Luiza da Silva RESUMO: Este artigo tem como questão fundamental a análise da consolidação da fronteira Oeste do Brasil, no período de 1870 a 1920, ou seja, no pós-guerra do Paraguai, enfocando o espaço correspondente ao Sul de Mato Grosso, o atual Estado de Mato Grosso do Sul para a compreensão da História regional e sua influência na História do Brasil. Pelo posicionamento a fronteira Sul de Mato Grosso incorporou culturas e costumes de diferentes localidades internas: gaúcho, nordestino, paulista, mineiros e externas: bolivianos e principalmente paraguaios, surgindo um Estado com combinação variadas na sua base social, política e cultural que ao estudar o processo de demarcação de fronteira compreendemos a identidade regional da população sul mato-grossense. PALAVRAS-CHAVE: História Regional, Sul de Mato Grosso e fronteira. INTRODUÇÃO Este artigo foi elaborado em base de pesquisa bibliográfica de Lúcia Salsa Corrêa, cujo título é História e Fronteira: O Sul de Mato Grosso 1870-1920. Sobre a autora é importante ressaltar que graduou-se na faculdade de Filosofia, Ciência e Letras São Bento da PUC-SP, onde obteve os títulos de licenciatura e bacharel em História, no ano de 1973. Durante toda sua carreira de docente e pesquisadora dedicou-se à História Regional, o que resultou em diversas publicações. Foi professora titular da UFMS, hoje aposentada. Nos primórdios de 1999 assumiu a direção do Centro de Pesquisa, Pós-graduação e Extensão da UCDB. Atualmente faz parte da PróReitoria da UNIDERP. O livro História e Fronteira, foi resultado da tese de Doutorado e relata O processo da fronteira do atual estado de Mato Grosso do Sul. O sul do então estado de Mato Grosso passou por conflitos indígenas no século XVI. Até a consolidação da fronteira do atual Estado de Mato Grosso do Sul ocorreu dificuldades que retardaram sua demarcação, como no século XVI conflitos indígenas Graduando em História na Universidade Católica Dom Bosco. E-mail: [email protected] Graduando em História na Universidade Católica Dom Bosco. E-mail: [email protected] 23 2 86 com aventureiros conquistadores, dificuldades de adentrar a região, pois o ambiente era desconhecido e com vasta extensão de terras alagada (pântanos). SUL DE MATO GROSSO: A FRONTEIRA, O ESPAÇO E A MIGRAÇÃO A partir de fins do século XVII até começos do XIX houve conflito de interesses expansionistas entre castelhanos e portugueses. A pecuária é atribuída como uma das principais atividades econômicas do Sul de Mato Grosso no século XIX, porém com a Guerra do Paraguai há invasões de terras na região Sul, sendo somente após a guerra que a fronteira será definitivamente demarcada. Aconteceu em meados do século XIX a Guerra do Paraguai, do qual a fronteira entre o sul de Mato Grosso e Paraguai foi definido no pós-guerra. O espaço que corresponde à fronteira do atual Estado de Mato Grosso do Sul foi influenciado em sua demarcação pelo meio ambiente e atividades econômicas que predominava como a pecuária, erva-mate e o término do recurso mineral-aurífero no atual estado de Mato Grosso. A definição de fronteira em Mato Grosso do Sul tem muita variedades de causas e efeitos no processo de ocupação e conquista do território, por ser uma região fronteirísticas com outros países: Paraguai e Bolívia, além dos estados brasileiros como Minas Gerais e São Paulo. Para compreender o início da conquista da fronteira Sul de Mato Grosso é necessário entender período colonial. O ponto de partida para a [...]fronteira Sul é a compreensão da expansão colonizadora e o desenvolvimento comercial europeu em nível mundial, a partir do século XVI. Dessa forma, as colônias ibéricas tiveram o seu processo de expansão territorial como prolongamento da política mercantilista, do predomínio do Capital mercantil e da luta pela hegemonia nos novos continentes25. No século XVI até o século XVIII, o Sul de Mato Grosso serviu como rota alternativa para escoamento de mercadorias (metais preciosos) consolidando o mercado de contrabando26, como era praticado em toda colônia. Além, de permitir a entrada de portugueses e mamelucos (paulistas) em áreas espanholas. De acordo com Corrêa (1999), a Metrópole não conseguia controlar todo o território colonial. Assim, permitiu o contato dos fronteirísticos com os núcleos do planalto andino e das Missões Jesuíticas na Planície do Paraguai, reforçando um comércio clandestino de abastecimento de mercadorias essenciais (sal, escravos, erva-mate, couro...) e também o contrabando de metais preciosos (prata e ouro). CORRÊA, 1999, p. 59. Segundo o Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa contrabando significa comércio proibido; introdução clandestina de mercadorias estrangeiras sem pagar os direitos devidos. 25 26 87 O ambiente complexo com regiões alagadiças, até então, inexplorável, desconhecido e com mudança de clima constante (muita chuva ou pouca) e os índios foram uns dos fatores para retardar a conquista da região. No primeiro momento de contato entre os conquistadores Em um segundo momento (meados do século XVI) existiu uma fronteira indígena – uma terra mbaiânica27- representado uma forte barreira para ocupação de espanhóis ou portugueses até meados do século XIX. No terceiro momento foi de integração entre colonos e índios Mbya-Guaikuru com contatos comerciais, de aliança, catequese e casamento. A contribuição indígena foi significativa para ocupação da região Sul, como Corrêa afirma: “De um modo ou de outro, os Guaikurú exerceram expressiva influência no processo de ocupação da fronteira Sul de Mato Grosso até às vésperas da guerra com o Paraguai, ocasião em que sofreram pesados reveses”. (1999, p. 77). A falta de recursos portugueses para assegurar suas fronteiras e a concentração de todos os esforços nos núcleos auríferos do Norte de Mato Grosso, acabaram por adiar a conquista definitiva da região Sul. Quando ocorre a decadência mineira e do Norte de Mato Grosso, a população busca novas alternativas para sobreviver, sendo um dos fatores que contribuiu para ocupar e redefinir a fronteira do Sul de Mato Grosso. O processo migratório anterior a Guerra do Paraguai deu-se por duas vertentes, uma por razão da crise política de Cuiabá (capital de Mato Grosso) e a outra dos migrantes conquistadores-aventureiros (mineiros e paulistas) encontram-se com os cuiabanos: Uma delas foi procedente do Norte de Mato Grosso, de Cuiabá e de seus entornos, decorrendo da crise política de 1834, deslocando-se no sentido Norte-Sul, à procura de campos para a criação nos Pantanais, nos vales dos rios tributários do Baixo-Paraguai e em parte dos campos firmes da Vacaria. [...] A outra onda de migrantes desbravadores/conquistadores procede em grande parte de Minas Gerais e de São Paulo, em direção Leste-Oeste até encontrar-se com os cuiabanos no vale do rio Miranda. Daí, espalhara-se até as margens dos rios Ivinhema, Iguatemi e Apa, atingindo o extremo Sul de Mato Grosso e a fronteira com os paraguaios,28motivada pelo entusiasmo com os extensos e formosos campos de criar . Na primeira metade do século XIX ocorre uma expansão interna no Sul de Mato Grosso, por meio de expropriação de terras indígenas, disputa dos pioneiros por terras imensas e sem limites definidos. A pecuária foi a atividade mais importante dessa região Sul e fronteiriça. Com a criação extensiva de gado e a exploração da erva-mate, em um futuro breve iria Para a autora, terra mbaiânica imperou a hegemonia Mbayá sobre as demais etnias chaquenhas e das planícies do Médio e Baixo- Paraguai, surgindo uma fronteira indígena, uma terra mbaiânica. 28 CORRÊA, 1999, p.94. 27 88 definir a abertura da via fluvial, vinculando Mato Grosso a Bacia do Prata e pelo estreitamento dos contatos comerciais com à Bolívia e com o Paraguai pela fronteira seca. Segundo Corrêa (1999) a Guerra do Paraguai, ocasionou invasão de terras (1864-1870) em: Coimbra, Corumbá, Miranda, Aquidauana, Nioaque, Dourados, Coxim e boa parte dos Pantanais ocasionando uma desorganização das vilas e fazendas de gado bovino, sendo algumas das poucas cidades que tinham organização administrativas (exemplo Corumbá) arrasadas com a invasão paraguaia. Com o fim da guerra, aos poucos, as cidades foram recuperando seus habitantes e atividades urbanas e rurais. Tendo dificuldades para comprovar suas posses muitos tiveram que recorrer a Cuiabá para tentar recuperar documentos que provassem a propriedade de sua terra, mesmo assim, era complicado. Infelizmente, as comunidades indígenas foram os mais afetados, pois perderam muitos índios em moléstias, na guerra e principalmente a perda de suas terras, sendo obrigados a trabalharem em fazendas ou nas vilas, porém as relações de resistência entre índios e “civilizados” não foram eliminadas. Em meados do século XIX, Mato Grosso já havia definido sua produtividade, a criação de gado (pecuária) era a principal atividade tendo campos em abundância e exigindo menos trabalhadores do que a agricultura. De acordo com Corrêa (1999) na Segunda metade do século XIX, com a livre navegação do rio Paraguai a fronteira Sul de Mato Grosso foi rapidamente modificada. Permitindo o contado da província mato-grossense com a Bolívia, Paraguai e o acesso ao Atlântico tendo uma alternativa de abastecimento e escoamento de matériasprimas na região. Somente após a Guerra do Paraguai, o Brasil conseguiu o caráter definitivo da livre navegação até o Porto de Corumbá, criando as condições para uma ocupação mais efetiva da fronteira Sul, com base em suas regiões ribeirinhas. Esse livre-trânsito fluvial tinha interesse capitalista das potências européias e norteamericana, pois facilitaria a entrada de produtos e capitais estrangeiros e o Brasil exportaria produtos primários. O livre-trânsito fluvial dos rios platinos, incluindo o rio Paraguai, foi, portanto, uma reivindicação impulsionada pela expansão do livrecomércio e defendia pelas potências capitalistas desde princípios do século XIX, (...) eram ideais a um trânsito mercantil de mão-dupla: uma via de entrada de mercadorias e capitais europeus e norteamericanos pelo interior do continente sul-americano, e uma via de escoamento 29de produtos primários baratos, destinados aos mercados de além-mar . 29 CORRÊA, 1999, p.126. 89 Mato Grosso ressentiu-se com os reflexos tardios das transformações do período pós-guerra de 1914-1918, que inviabilizaram a manutenção da sua principal via de abastecimento e comércio internacionais, através de Corumbá e da navegação pela Bacia do Prata. O Estado continuava dependente de produtos básicos e desenvolvia uma agricultura rudimentar. A posse de terras no Sul de Mato Grosso no período pós-guerra com os Paraguaios não foi tão diferente do modelo clássico de ocupação e instalação de fazendas de criar pelos sertões de todo o Brasil. As mesmas variáveis que caracterizaram as mesmas frentes de ocupação em especial a pecuária na região de fronteira Sul-mato-grossense aconteceu de forma diferenciada por motivo de suas determinações ambientais e o seu processo histórico de conquista e expropriação de terras. Segundo Lucia Salsa Correa (1999) em nenhuma outra parte do país ocorreu a posse mansa e pacífica conforme determinavam as leis e os documentos oficiais a esse respeito. O que marcou a expansão das unidades territoriais para a criação de gado ou extração da erva-mate foi avaliado pelo alto grau de violência, dada a situação de risco de posseiros, pioneiros, configurada pela insegurança e instabilidade da fronteira paraguaia e indígena. E sem contar com difícil e sofrida adaptação ao meio ambiente e pelo isolamento nos confins dos sertões. Além, o problema dos transportes precários e a ineficiência fiscalizadora do estado, responsáveis pelo aparato de segurança das fronteiras. Por volta de 1880 a 1890, formaram-se fazendas de gado na fronteira Sul de Mato Grosso pela apropriação de vastas extensões de terras sem limites definidos, e pela impraticabilidade dos cercamentos. Ainda a respeito dos limites de posse e da sua legalização em Mato Grosso, Virgilio Correa Filho afirmava que: ...Os limites mencionados vagamente abrangiam, não raro, a área muitas vezes maior que a devida, quando não se processa a mediação de acordo com as exigências legais 30. Um outro fator agravante das tensões e da violência desse processo foi a disputa por terras entre os próprios posseiros que lutavam, entre si e contra a entrada de imigrantes pelas terras sem dono no sul-mato-grossense. Nem mesmos as leis na segunda metade do século XIX conseguiram classificar esse processo de lutas, ou, evitar posses irregulares que caracterizaram a região por longo tempo. A legalização das propriedades esbarrava em diversos fatores, um deles foi à desorganização provocada pela invasão paraguaia em Mato Grosso e pela 30 CORRÊA FILHO, VIRGILIO. Fazendas 1955. p. 20 – 21. 90 movimentação das tropas do exército brasileiro em campanha contra o Paraguai, conseqüentemente ocasionando a demora reordenação das atividades rotineiras da fronteira. A fase heróica da fronteira sul-mato-grossense no período entre 1870 e 1920 correspondeu, às especificidades e singularidades que a caracterizavam, como por exemplo, a consolidação dos latifúndios pecuaristas e a formação e crescimento de matérias-primas em regime de cria extensiva do gado bovino. De forma paralela ocorreu uma valorização gradativa das terras na região Sul de Mato Grosso. E, finalmente, a fronteira se desenvolveu em condições adversas que delimitaram o desenvolvimento capitalista da imensidão de seus sertões. Outro ponto visível da fronteira foi o fluxo migratório nas três últimas décadas do século XIX. O movimento de imigração recebeu suporte oficial através das políticas de colonização do Brasil, para solucionar o problema de falta de braços para a lavoura e a substituição da mão de obra escrava livre e assalariada, com o concurso de colonos estrangeiros. Acompanhando essa tendência, o Governo da Província empenhou seus parcos recursos, a despeito de suas persistentes limitações orçamentárias, para incentivar o povoamento mais intensivo de seus sertões vazios, oferecendo vantagens e procurando atrair investidores e trabalhadores para o solo mato-grossense. Todavia é preciso salientar que, comparado à movimentação migratória dos grandes portos atlânticos sul-americanos nesse final do século, como Buenos Aires, Rio de Janeiro e Santos, o fluxo de gente que se dirigiu a Mato grosso foi pequeno, mas contribuiu de modo muito significativo no bojo das transformações econômicas ocorridas em sua região Sul. Assim, paulistas, mineiros, goianos e nordestinos em geral dirigiram-se para a fronteira Sul mato-grossense, em pequenos grupos e em escala gradativa. O imigrante paraguaio incorporou-se na comunidade da fronteira sul-mato-grossense, sobre tudo como elemento predominante de trabalho nos ervais e, em menor proporção, nas fazendas de criação de gado bovino.31 Após a Guerra do Paraguai, Mato Grosso recebeu um significativo numero de estrangeiro e de brasileiros de outras regiões, que demandavam a sua fronteira Sul. Os paraguaios, que representavam a maior parte de pessoas que migraram para Mato Grosso. Autora explica que o paraguaio veio atenuar a grande carência de mão-de-obra em atividades e técnicas que lhes eram familiares no Paraguai, tradicional país de pecuária extensiva e exploração primitiva de yerbales nativos. p. 222. 31 91 No que se diz respeito das migrações internas, a oferta ilusória de terras disponíveis da fronteira mato-grossense e seus abundantes recursos naturais, trouxe também uma corrente gaúcha em demanda das matas de ervais nativos do extremo Sul. No processo de povoamento da fronteira Sul de Mato grosso adquiriu marcas da contravenção e da violência. E para compreender melhor esse traço na História mato-grossense, não se pode excluir o peso da herança colonial no seu contexto fronteiriço, principalmente as características de um território imenso e sem controle administrativo estatal, sem polícia, sem barreiras fiscais adequadas. Como explica Lucia Salsa Correa: A fronteira aberta e imensa, vigiada de forma sempre insuficiente, oferecia a perspectiva concreta de fuga e a certeza da impunidade. As autoridades dos núcleos populacionais fronteiriços acusavam a gravidade do problema, cientes de sua impotência para coibir e punir desordens e crimes diversos e sem poder garantir as mínimas condições de ordem e tranqüilidade pública em suas comunidades32. Outro fator singular da violência da fronteira de Mato Grosso foi a participação de soldados e oficiais nas questões políticas regionais, e movimentos rebeldes tanto no lado brasileiro como nas republicas limítrofes. A fronteira Sul de Mato Grosso por circunstâncias históricas, resultou, num espaço determinado pela violência, construído no processo de lutas persistentes pela posse de terras e domínio político regional. Por outro lado, constitui-se num espaço de trocas culturais, em especial a Paraguaia, que deixou marcas profundas nas comunidades Sul Mato-Grossenses. BIBLIOGRAFIA CORRÊA, Lucia Salsa.Historia e Fronteira: o Sul de Mato Grosso 1870-1920. Campo Grande:UCDB,1999. CORRÊA, Virgilio Filho.Fazendas de gado no Pantanal Mato-Grossense. Rio de Janeiro:Ministério da Agricultura-Serviço de Informação Agrícola,1955. LISA.Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa.Supervisão Alpheu Tersariol. Vol.1.São Paulo:LISA,1972. 32 Historia e Fronteira, p. 208. 92 PEDRO PEDROSSIAN Eliza Castagnetti* RESUMO: Este trabalho apresenta parte da vida e participação de Pedro Pedrossian, um político que teve intensa participação na vida e construção da historia do lugar onde vivemos. Como governador de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul realizou importantes obras e concretizou sonhos. Com uma larga experiência política expõe idéias e opiniões, principalmente sobre política, suas experiências e conquistas. Acha que já cumpriu seu papel e missão como governador. Em um entrevista fala de sua trajetória na política, também da situação e construção de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. PALAVRAS-CHAVE: Biografia, Profissão, Carreira, Política, Governador, Contribuições, Social. PEDRO PEDROSSIAN PARTICIPANDO DE NOSSA HISTORIA Pedro Pedrossian nasceu no dia 13 de agosto de 1928 em Miranda, Mato Grosso do Sul. Filho de João Pedro Pedrossian e Rosa Pedrossian, estudou o secundário no Liceu Nossa Senhora Auxiliadora e cursou Engenharia Civil na Universidade Mackenzie. Engenheiro e proprietário rural, nos anos de 1966 a 1971 elege-se governador de Mato Grosso ainda não desmembrado; e senador de 1979 a 1980.Chegou a receber homenagens como Medalha do Pacificador (Ministério do Exército); e Ordem do Mérito Aeronáutico (Ministério da Aeronáutica). Em Mato Grosso,1965, um jovem engenheiro do sul do estado ousou encarar eleitoralmente de frente poderosas forças oligárquicas que se eternizavam no poder, tradicionalmente. Então assume o cargo de Governador do estado de Mato Grosso em 31 de janeiro de 1966. O engenheiro civil Pedro Pedrossian, em 1967, promove o planejamento econômico e financeiro do Estado, enfatizando o orçamento, estabelecendo prioridades e distribuição de recursos em todos os municípios. Com uma grande identificação com as massas populares e as camadas empresariais. Nesta linha de ação, é criada a Secretaria de Segurança Pública, no Estado substituindo a antiga chefatura de Polícia. Na ocasião,1971 ocorreu uma reforma de base nos setores de justiça e segurança pública. O delegado deixou de ser nomeado em função dos interesses da política partidária, só podendo ser designado para o posto quem tivesse diploma de bacharel ou fosse oficial de carreira. Foram criadas as Delegacias Regionais, com serviços de rádio patrulha nas principais cidades do Estado, e a Penitenciária Estadual de Cuiabá, resolvendo problemas de ordem social. 93 Suas principais obras, ele próprio considera como símbolos concretos de compromisso, são as universidades e centros educacionais. Também criou a PROMOSUL (Promoção Social Mato Grosso do Sul) em 1991, com variados e amplos projetos beneficiando toda a população. Em 1966 em Cuiabá, instala a UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso).Em Campo Grande instala em 1993 a UEMT (Universidade Estadual de Mato Grosso), mais tarde federalizada, tornando-se UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Promovendo grande desenvolvimento e oportunidades a todos os estratos sócio-econômicos. “Certamente nenhum outro instrumento pode ser mais efetivo, permanente e prodigioso para fixar as balizas da rota para o futuro que uma Universidade”.(Pedro Pedrossian,1994). Também obra do governador, o Palácio Popular da Cultura/Centro de Convenções, dispondo de um espaço turístico, cultural e empresarial, consagrado ao desenvolvimento integral humano e econômico, localizado no coração do Parque dos Poderes (1983) também obra de sua idealização. Pedro Pedrossian percebia uma grave crise espacial, criando o centro político administrativo do Estado no Parque dos Poderes, juntamente com a Reserva Ecológica do Parque dos Poderes. Outra importante obra entre muitas, foi o Parque das Nações Indígenas, assim como o Parque Ayrton Senna, o Hospital Rosa Pedrossian e importantes programas de Conjuntos Habitacionais. Não menos importantes obras e projetos foram os Ambientais, promovendo a preservação, e os projetos econômicos. O ex-governador de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul acha que já cumpriu seu papel, que o sonho petista acabou porque o Brasil começa a entender e a gostar da democracia. Em um dos seus discursos, em setembro de 1969, ao receber o título de “Cidadão Corumbaense”, Pedro Pedrossian demonstra todo seu patriotismo, reconhecendo responsabilidades e metas. Onde o novo Mato Grosso e fruto de lutas e trabalho de todos, sendo uma grande parte do Brasil e com grandes potenciais futuros. Finaliza com uma mensagem de otimismo e agradecimento a Corumbá, também enfocado no estadual e nacional. A história de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul tem um antes e um depois. Esse divisor de águas dizem, ser os três governos do engenheiro Pedro Pedrossian, que se elegeu governador do velho Mato Grosso ainda jovem para seu cargo, em plena efervescência do regime ditatorial e que se tornaria, ao longo do tempo, na mais importante liderança política do Mato Grosso e, depois, do Mato Grosso do Sul, sua opção de domicílio eleitoral, com a divisão do Estado, em 1977. De acordo com o próprio ex-governador, se tivesse optado por Mato Grosso, não seria diferente, pois basta que se pronuncie este nome em qualquer roda de cafezinho, numa praça ao 94 lado do velho Palácio Alencastro, no centro de Cuiabá, ou numa roda de cerveja com peixe frito num barzinho da ponte do rio Coxipó, é unanimemente reconhecido por certas pessoas como líder inconteste de todos os mato-grossenses, com ou sem divisão. Governador em três ocasiões e Senador da República, Pedro Pedrossian, aos 71anos, mata saudade dos tempos de poder contemplando grandes painéis com fotografias das principais obras que edificou, no último andar de um prédio que nem é dos mais sofisticados, na área nobre de Campo Grande, onde vive com a esposa, dona Maria Aparecida, sempre rodeado por filhos e netos e, de vez em quando, recebendo visitas de um restrito número de amigos. Mesmo quando estava no auge do poder, Pedrossian sempre foi de poucos amigos e avesso a conversas que não fossem lá muito interessantes. É conhecida a história de um deputado que teve que voltar do portão da famosa fazenda Petrópolis, em Miranda, onde o governador descansava num final de semana, pois não admitia ser importunado com conversas sobre política ou de governo quando estava no aconchego familiar. Mas é comum encontrarmos biografias com vidas cheias de glamour com belas histórias e reconhecimentos; onde a outra parte nunca encontramos. É um problema da população brasileira que fecha os olhos quando deve abrir. Mas há quem garanta que ele aproveitava muito pouco esses momentos com a família, pois sempre que retornava desse aconchego trazia um grande projeto debaixo de braço. Mesmo quando governava, jamais abandonou a prancheta de engenheiro à qual ainda recorre mesmo nestes tempos de potentes computadores com telas de plasma ou cristal líquido, como se tivesse ainda algum grande projeto em mente. Pescador de sonhos? Folclore político. Verdade? Não sei. Por esses e por outros, em 1994, a Folha de São Paulo publica pesquisa que avalia o desempenho dos governadores em seus estados. Pedro Pedrossian é o primeiro no ranking dos governadores brasileiros, com aprovação moral, administrativa e política no comando do Executivo sul-mato-grossense. Pedro Pedrossian dizem ser um desbravador, o tocador das grandes obras, mas não gosta de ser reconhecido desta forma. Ele diz que realizou programas e implantou projetos. Foi ele quem criou as primeiras Universidades, os linhões de energia elétrica, os primeiros conjuntos habitacionais, as rodovias que interligaram as regiões produtoras dos dois estados, os estádios de futebol, mas foi também e, muito provavelmente, o mais polêmico de todos. Dizia-se um forjador de lideranças, mas não conseguiu deixar um sucessor na política estadual e reclamava sempre que seus aliados não entendiam sua política de administrar de divergências. 95 Quando o Estado foi dividido, comprou o terno para tomar posse como primeiro governador, achando que seria nomeado pelo presidente Geisel. Mendes Canale, primeiro secretário do Senado à época, barrou essa pretensão. Veio Harry Amorim. Foi derrubado por Pedrossian, que nomeou Marcelo Miranda, que também foi derrubado pelo próprio Pedro, que acabou assumindo o governo. O ex-governador admite a soberba que o levou a perder duas eleições, mas diz que não perdeu, que apenas não as ganhou, o que é mais grave, segundo ele, admitindo que não soube ler o sentimento popular. E, pela primeira vez, fala da grande obra que faltou construir em seus três governos.Não concorda com a premissa de que o motivo da criação do Estado de Mato Grosso do Sul se embase na “razão da argumentação histórica de que o Sul sustentava o Norte”. Este não é um bom argumento, e muito menos é histórico. Considera esse um conceito reducionista e, permite, preconceituoso, também ao se referir à indolência do mato-grossense. Acredita, sim que ambos tem vocações e aptidões próprias e diversas. Mato Grosso do Sul por razões geoestratégicas e mais voltado a adaptação e evolução dos seus setores secundário e terciário da economia; enquanto Mato Grosso e possuidor de fortes tendências a sustentabilidade econômica baseadas nas atividades primaria e secundária. Mas acredita que Mato Grosso do Sul tem maiores possibilidades e está mais apto de verticalizar a sua produção. Ha de se ler esse momento com uma aguda visão de futuro. O que vê e a formação de uma classe empresarial atualizada, informada; antevê um amanha brilhante. Sempre acreditou que tudo tem o seu tempo. Confessa que não consegue observar um político que deu certo sem que busque, imediatamente, as lições que fizeram dele um ator permanente por mais que variem os cenários. Sempre que fez esse exercício resultou em grandes contribuições ao seu entendimento do que seja, realmente, a Política. Mas, acima dos interesses de grupos ou de corporações, sempre colocou os interesses do Estado ou do País. Mais ainda: os interesses da maioria. BIBLIOGRAFIA PEDROSSIAN, Pedro. Três governos, dois estados, uma trajetória. Curitiba: Ed. Serena LTDA,1995. PEDROSSIAN, Pedro. O Novo Mato Grosso. 1969. 96 RIO PARAGUAI NO MATO GROSSO DO SUL Elizabet A. D. Khodr RESUMO: Este trabalho apresenta a história do Rio Paraguai e a sua importância para o Mato Grosso do Sul. Sendo que na introdução serão apresentadas algumas informações, um breve histórico e o valo do Rio Paraguai para o Estado. Consta também a história do envolvimento de Mato Grosso e o uso e controle do Rio Paraguai na Guerra da Tríplice Aliança. As informações apresentadas neste trabalho baseiam-se em dois livros que estão citados na referência bibliográfica. PALAVRAS-CHAVE: Rio Paraguai, Tríplice Aliança. RIO PARAGUAI O Rio Paraguai nasce na Chapada dos Parecis, perto da cidade de Diamantina no Estado de Mato Grosso, numa área de grande importância da hidrografia sul americana, pois reúne as nascentes do Paraguai e tributários do Amazonas. Seus primeiros 50 KM. Na direção Sul o nome de Paraguaisinhos. Corta o Pantanal, a República do Paraguai e deságua no Paraná perto da cidade de Corrientes na Argentina; banha a cidade de Cáceres, Corumbá, Porto Murtinho, Concepción e Assunção. Sua extensão de 2621 Km é de indiscutível importância política, militar, econômica e estratégica. “A grande profundidade, a corrente e velocidade constantes e o imenso volume de água” transformam o rio Paraguai numa das mais importantes vias de penetração, de colonização e desenvolvimento da região oeste do Brasil. O rio Paraguai e, sem qualquer dúvida, o rio de mais valor para o Mato Grosso do Sul. Por ser navegável (o rio Paraguai) desempenhou um importante papel na formação histórica da região, juntamente com os seus afluentes. Por ele chegaram os habitantes pré-históricos, os ancestrais dos índios, que foram se adaptando ao longo das suas margens. Cruzaram os espanhóis em busca das minas do Peru, no século XVI. Por ele também navegaram as Monções (bandeiras fluviais), que no século XVII e XVIII vieram procurar índios e acabaram encontrando ouro Às margens do rio Coxipó, fundando a cidade de Cuiabá em 08 de abril de 1719. Foi palco de muitas batalhas de portugueses, espanhóis e índios pela conquista e posse da terra, às suas margens foram fundados fortes, povoados, presídios, quando então governava a capitania de Mato Grosso e Cuiabá o quarto governador, Capitão-General Luiz Albuquerque de Mello Pereira e Cáceres (1739-1797), consolidando a coroa portuguesa às terras alcançadas pelos bandeirantes, pelo Tratado de Tordesilhas deveriam pertencer a 97 Espanha. Na guerra do Paraguai (1865-1870) testemunhou e se tingiu de sangue, servido de cemitério a muitos cadáveres. Por ele recebemos influência da República do Prata. Influência nos hábitos, na linguagem, na cultura do povo mato-grossense tendo em vista que, até século XIX, a então imensa Província só se ligava com a corte do Rio de Janeiro por via fluvial e marítima, desprezando a extenuante viagem por terra que se fazia a lombo de burro e demorava vários meses. CONTROLE DO RIO PARAGUAI E O ENVOLVIMENTO DE MATO GROSSO NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA O controle de uso das vias navegáveis constituíram sempre uma das preocupações das nações expansionistas e colonialistas. Para recompor os interesses dos europeus após o expansionismo napoleônico, ficou estabelecido que era inteiramente livre a navegação dos rios e que nada poderia impedir neles o comércio. A posição atendia aos interesses do Capitalismo industrial inglês. A utilização de vias navegáveis, como era o caso do Paraguai, tornava-se imprescindível para a expansão dos interesses econômico-políticos. A política isolacionista e contrária a esses interesses internacionais, praticadas pelo ditador Francia continuou a ser seguida pelos López. Carlos López, ao assumir o governo paraguaio, reforçou o poder estatal na economia, inclusive na formação do setor industrial. Esta política dos governantes guaranis tornou-se um obstáculo a livre navegação do rio Paraguai. O desenvolvimento singular do Paraguai aos demais países da América do Sul, se não foi um entrave aos demais interesses de expansão do capital europeu, representou pelo menos uma ameaça potencial que foi superestimada por seus vizinhos com os quais discutia questões de fronteiras pendentes desde o processo de emancipação política. A questão da livre navegação somente seria solucionada com a posterior delimitação da região de fronteira com o território paraguaio. Em 1845, Carlos López declarou o país aberto ao comércio e à imigração, porém com restrições. Em 1857, pela intervenção do ministro das relações exteriores do governo brasileiro, e independente da posição do governo paraguaio, estabeleceram-se entre os países de fronteiras do rio, tratados permitindo a navegação dos rios Paraguai, Paraná e Uruguai por parte de navios de qualquer nação. A navegação fluvial através do Prata tornou o rio Paraguai um veículo de penetração de investimentos estrangeiros que, a despeito de seu pequeno volume em relação às inversões de capital em outras regiões do país, foi em Mato Grosso um poderoso fator de transformação. O Brasil iniciaria as hostilidades com o Paraguai, dependendo da navegabilidade do rio Paraná. Por outro lado recebia também garantias do próprio 98 império brasileiro de franquear a navegação do Paraguai até o Porto de Corumbá aos navios mercantes de todos os países. A falta de uma ligação em condições favoráveis entre a sede do império e a região fronteiriça transformava o sistema fluvial do Paraguai, Paraná e Prata. O fato de o Paraguai estar em pleno desenvolvimento possibilitava a distante província de Mato Grosso crescer economicamente nos círculos econômicos paraguaios e até desintegrar-se do império brasileiro. Em 1857, foi assinado um protocolo reservado entre Paranhos e a confederação Argentina, estabelecendo vários aspectos: se o Paraguai não chegasse a um acordo amigável, o império brasileiro estaria disposto a lançar mão de medidas coercitivas e também recorrer a guerra. Estabeleceu que a confederação Argentina deveria aliar-se ao império brasileiro se a guerra tivesse por objetivo pôr um fim não só na questão fluvial, mas também à fronteira. Foi nessa pressão diplomática e política que Paranhos conseguiu com Solano López (com autorização do pai Carlos López) a liberação da navegação do rio Paraguai até o porto de Corumbá. A guerra parecia ser inevitável. Encurralado por todos os lados, López justificava a invasão paraguaia na província de Mato Grosso no fato da região tomarse uma retaguarda importante ao garantir fornecimento de gado para seus exércitos. A razão de López em enviar um oficial de seu exército, disfarçado de comprador de gado e terras, para fazer um levantamento da extensão do rebanho bovino da região de fronteira, chegando até Corumbá. Antes de terminar o ano, as forças paraguaias atacaram o forte de Coimbra. Com a queda do forte os paraguaios continuaram avançando até Corumbá. Navios paraguaios subiram o rio no encalço de fugitivos de Corumbá, alcançando-os na região do rio São Lourenço onde se deram combates. As tropas paraguaias não chegaram até Cuiabá impedidos pelas águas rasas do rio. Em 1867, forças brasileiras retomaram a praça de Corumbá. Todos os habitantes da vila há meses estavam enfrentando um inimigo mais poderoso: uma epidemia de varíola. Devido à epidemia, os soldados e sobreviventes retomaram a Cuiabá, levando a doença. No mesmo ano, os paraguaios retomaram a Corumbá permanecendo até o ano seguinte, quando retiraram para o Paraguai. Retomando a questão das causas e efeitos da guerra do Paraguai constata-se o choque de interesses do imperialismo liberal. As transformações econômicas que se processaram em todo cone sul-americano, após o conflito com os paraguaios, tomaram inequívoca a atuação inglesa nos bastidores político-diplomáticos da guerra. A guerra com o Paraguai, até então explicada como interesses imediatos, de conflitos de fronteiras, da luta pelo controle e internacionalização das águas do rio 99 paraguai, foi também uma conseqüência do jogo de interesses da burguesia portenha e da burguesia mercantil brasileira. O contexto econômico e político ao nível internacional caracterizaram esse período da guerra como a etapa do predomínio do liberalismo. A região do Prata era então palco de uma disputa hegemônica entre interesses nacionalistas dos governantes argentino e brasileiro. No tocante a Mato Grosso, a invasão paraguaia foi um divisor de águas no processo de ocupação da fronteira oeste. A guerra com o Paraguai imprimiu marcas no desenvolvimento mato-grossense. As conseqüências da guerra acabaram por promover mudanças significativas em seu processo histórico, sobretudo no setor econômico, que passou a receber uma influência da região do Prata. A internacionalização das águas do rio Paraguai até Corumbá tomou este porto o mais importante entreposto comercial de Mato Grosso. Foi através deste porto que se estabeleceram contatos mais assíduos e uma influência de grande significado econômico de praças comerciais e financeiras estrangeiras sobre a região de Mato Grosso. A guerra abriu a porta necessária aos investimentos de capital na região de Mato Grosso, tanto na produção agropecuária, como no comércio importadorexportador. A navegação fluvial uma vez aberto o rio Paraguai às embarcações, possibilitou a exploração mais acentuada dos recursos da região sob formas diversas: Compras de grandes glebas de terra por grupos estrangeiros, aberturas de casas comerciais filiais em Corumbá, surgiram as primeiras casas bancárias em Mato Grosso. O núcleo de Corumbá tomou-se porto obrigatório de embarque e desembarque de mercadorias e passageiros nacionais e estrangeiros. Com a internacionalização das águas do Paraguai até o porto corumbaense, concentrou um considerável número de estabelecimentos comerciais estrangeiros e de comerciantes locais ligados ao comércio platino, dando uma força econômica e política à cidade capaz de sustentar movimentos contra a centralização política e administrativa de Cuiabá. O período que se inaugurou em Mato Grosso após a guerra foi marcado por transformações de ordem econômica, com a participação de capitais estrangeiros, como também a formação de novos grupos sociais. Na região de fronteira sul, por exemplo através de concessão, Thomaz Laranjeira deu início à exploração de áreas de ervais nativos, entre a região de 100 Dourados e Ponta Porã. Antes apenas alguns criadores de gado haviam ocupado o planalto de Maracajú. No plano político, o período teve o poder de renovar as lideranças provinciais com o aparecimento de novos grupos de pressão que passarão a atuar no cenário republicano. Estabeleceu uma fronteira móvel, sem uma clara definição, permeada de brasileiros de várias partes do país e de estrangeiros, em especial os paraguaios, para brigarem pela posse de terra. Nessa luta surgiram coronéis fazendeiros e seus peões, pequenos agricultores, lavradores e comerciantes, bandidos e ervateiros. Estes coronéis da frente de ocupação do espaço mato-grossense lutaram durante a Primeira República entre si, pela posse de terra, e contra os grupos oligárquicos do norte, pelo controle político do estado. BIBLIOGRAFIA CORREA, Lúcia Salsa. Fronteira oeste. Campo Grande: UFMS, 2002. CAMPESTRINI, Hildebrando e GUIMARÃES, Acyr Vaz. História de Mato Grosso do Sul. Campo Grande: Tribunal de Justiça de Mato Grosso do sul, 1991. 101 RONDON E OS ÍNDIOS DO CENTRO-OESTE BRASILEIRO Devane M.S. Gonçalves. RESUMO: Este trabalho retrata a trajetória do grande sertanista, Marechal Rondon, o desbravador do interior do país. Teve contato direto com diversos povos índigenas (algumas hostis, outras “pacificadas” ou escravisadas por fazendeiros) quando construía as linhas telegráficas que ligaram Goiás a Mato Grosso. Obteve a demarcação de terras de várias etnias. Recebeu do Congresso Nacional, através de lei especial, o posto de marechal do Exército sendo nacionalnente conhecido como defensor das causas indígenas. PALAVRAS-CHAVE: Rondon; Exército; Índios. VIDA E OBRA DO MARECHAL RONDON NO INTERIOR DO BRASIL Marechal Candido Mariano da Silva Rondon o desbravador do sertão brasileiro, também conhecido como O Pacificador, entre outras homenagens a ele prestadas. Homem simples, de natureza humilde, viveu sua vida em beneficio da Pátria e dos índios da qual aprendeu a respeitar da maneira mais intima e sincera que se possa imaginar, a ponto de dar a sua própria vida em sua defesa. Seu lema era “Morrer se for preciso, matar jamais”. Candido mariano da Silva nasceu em Mimoso no Mato Grosso em 05 de maio de 1965, em meio à guerra entre Brasil e Paraguai. Herdou o nome do pai, que não conhecerá devido a sua morte, mas que deixou o seu destino traçado nas mãos do tio Manuel Rodrigues da Silva Rondon E sua mãe Claudina de Freitas Evangelista que também morrerá após dois anos e meio de seu nascimento. Candido era o único filho do casal de descendentes de bandeirantes com aborígines, tendo seu pai origem luso portuguesa, espanhola e guaná e sua mãe sangue bororo por parte da avó, e terena por parte da mãe, portugueses por parte do avô e do pai. Candido cresceu na fazenda do avô Materno onde teve seu primeiro contato com a escola. Ainda menino, foi levado pelo tio Manuel para Cuiabá para o cumprimento da promessa que fizera a seu irmão no seu leito de morte. Em 1873 para não perder o ano foi estudar no Mestre Cruz, escola particular. No ano seguinte matriculou na 102 escola João Batista de Albuquerque, da escola de Mestre João Candido passou para a escola do professor Francisco Ribeiro da costa onde terminou seu curso primário em 1878. Em 1879 passou a estudar na escola normal que logo depois passou a chamar-se Liceu Cuiabano. Aos dezesseis anos terminava o curso normal, sendo nomeado professor primário. Com o sonho de estudar no Rio de janeiro decidiu que como soldado o faria, e assim poderia estudar na escola militar, poucos dias antes de terminar o curso no Liceu Candido já era praça do 3.º Regimento de Artilharia a Cavalo. Iniciou a sua carreira a 26 de novembro de 1881, no quartel do antigo acampamento Couto Magalhães em Cuiabá. Seu destino era a Escola Militar da Praia Vermelha, aonde chegou em 31 de dezembro do mesmo ano. Sobre a tutela do 2.º Regimento de Artilharia a Cavalo, incluído na 4.º Bateria do Regimento, sob o comando do então capitão Hermes da Fonseca. Como tinha boa letra foi designado amanuense da secretaria do Regimento, e, logo depois, amanuense do Quartel-Mestre-General. Não pode matricular-se em 1882 porque os exames do Liceu Cuiabano não eram validos no Rio. Escreveu-se no Dom Pedro II, para enxames na Instrução Publica sendo examinado em Português e Geografia. Devido a uma campanha que assentaria 200 aprovado nos exames de admissão para 1883, e para não iniciar seu curso superior apenas em 86, resolveu cortar caminho, cursou o 1.º ano e requereu exames vagos para o 2.º e o 3.º anos, tentou e venceu, ficou famoso pela façanha. Em 1884 iniciava o curso superior, seu rendimento escolar era muito bom, sua meta se definia em alcançar o posto de alfares-aluno. Essa promoção foi concebida em 4 de julho de 1888, neste mesmo ano o governo criou a Escola Superior de Guerra, nesse novo órgão Candido concluiu seus estudos de matemática superior. Cinqüenta e cinco dias após a proclamação da republica, recebendo o titulo de Engenheiro militar e o diploma de Bacharel em Matemática e Ciências Físicas e Naturais, Candido era desligado da Escola Superior de Guerra. Em janeiro de 1890. Foi promovido ao posto de temente para o Corpo de Estado Maior de 1.ºclasse, neste mesmo ano, pela portaria de 28, do Ministério da Guerra, foi autorizado a acrescentar ao seu nome o sobrenome de Rondon e passou a chamar-se Candido Mariano da Silva Rondon. Nome que ficou consagrado história. Seu regresso a Cuiabá aconteceu em março de 1890, foi rever a terra natal e visitar parentes e amigos. Pouco tempo depois o major Antonio Ernesto Gomes Carneiro recebia um telegrama do Quartel-General. Rondon tinha sido indicado pelo General Benjamim 103 Constant, para lente substituto da 1.º seção da Escola Militar, cargo vitalício. Gomes Carneiro não aceitou o ajudante com cargo vitalício e telegrafou para Q-G explicando o motivo. A resposta veio do general Floriano Peixoto que não tardou em dá-la. “De acordo consultei o ministro da guerra” major Gomes Carneiro, que Rondon o traria como abaixo de Benjamim Constant, era um grande conhecedor dos problemas indígenas e defensor de suas causas, donos das terras que as linhas precisavam atravessar. Gomes Carneiro foi influência decisiva para que Rondon abraçasse a missão que o tornaria famoso. Proibiu que se atirasse nos índios ainda que fosse para assustá-lo “quem dora em diante tentar matar ou afugentar os índios de suas legitimas terras, terá de responder, por este ato, perante a chefia desta comissão”. Na sua primeira experiência colaborou com a implantação de 583 quilômetros de linha telegráfica sobre a estrada anhanguera, a primeira estação que Rondon viu inaugurar, a do Capim Branco. Os índios bororos habitavam 400 quilômetros dessa estrada, os do baixo São Lourenço ou Bororo Ocidentais já estavam pacificados os do leste ou bororo orientais ainda não pacificados. De Capim Branco com muares escolhido iniciaram os trabalhos de reconhecimento no sertão leste de Mato grosso para o traçado definitivo das linhas que viam de minas, foi nesta viagem que chefe e ajudante se ligaram pro resto da vida, o Major foi um verdadeiro professor para Rondon, sempre tendo referencias das paradas de pouso, todavia, sempre perto de riachos e bom pasto. Seu destino era alcançar o Registro do Araguaia. E dali para sangradouro. Passando por terras indígenas. Rondon fez os trabalhos de levantamento topográficos de linha construída e determinou as coordenadas geográficas dos pontos mais importantes ate ali, onde ate então não havia entrado em contato com nenhum grupo indígena daquela região. Após esse trabalho Rondon fora chamado a Capital Federal onde assumiu o cargo de professor e se casou com Francisca Xavier, filha de seu ex-professor, com quem teve sete filhos. Entre ser professor e sertanista, Rondon fez a opção, o serrado e a selva, do posto de major, foi rebaixado a seu posto real de capitão de engenheiro e nomeado chefe do 16.º Distrito Telegráfico, subordinado ao Ministério da aviação e inspetor geral do Destacamentos do Sertão cargo ligado ao ministério da guerra. 104 De volta a Cuiabá no Mato Grosso Rondon recebe a missão de levar 1.746 quilômetros de linhas telegráficas fazendo ligações com a fronteira, alcançaria Corumbá, Porto Murtinho, Bela Vista e Cáceres, divisa com a Bolívia e Paraguai. A linha vinha de Cuiabá passando por Coxim, Nioque, Miranda e o Forte Coimbra. Estes eram os únicos aglomerados urbanos do rumo sudeste naquela época. No oeste Poconé e Livramento. Integrando toda essa região ao resto do país. Nessa época Rondon estabeleceu contato com os índios Bororo. Se encontrando no rio São Lourenço, partiu para visitar a aldeia Kajare (buraco do morcego) o chamejera (cacique, chefe) pediu a Rondon que ficasse dois dias na aldeia, porque os índios queriam homenageá-lo. Os índios organizaram então um bacoro. Dois dias depois Rondon partiu se despedindo em língua bororo, e agradecendo a homenagem prestada. Em 1901 Rondon teve uma visita inesperada, o chemejera Oraine Ecureu e o pajé Baru acompanhados de suas gentes e logo seguiram para Itiquira. As doenças, as inevitáveis deserções reduziram em pouco tempo a sua tropa de oitenta homens para trinta homens. Rondon estava quase sem homens para o trabalho, quando na inauguração de uma das estações chegou a gente de Baru, depois um emissário de Oriane Ecureu, pedindo remédio para um índio que se ferira numa luta contra uma onça negra. O remédio seguiu, e poucos dias depois, o chemejera chegava trazendo 150 homens. Rondon lhe pediu ajuda e ofereceu-lhes trabalho, os índios aceitaram, sobre a condição de que fossem comandados por pagmejera (titulo dado a Rondon). Os soldados eram intimados a respeitar os aldeamentos dos índios, ficavam separados do acampamento, os índios havia trazido suas famílias consigo. Quando chegaram perto de Itaquira, um incidente matou muitos índios. Havia sarampo na cidade, a epidemia se alastrou na tribo vitimando principalmente os homens. Esses se atiravam na água para diminuir a febre, o que era fatal, ate que Rondon conseguir convencê-los a seguir os conselhos médicos. Sendo inaugurada e estação Itaquira Rondon seguiu para Coxim, era o mês de maio e o pantanal começava a secar, épocas em que o trabalho iria entrar em terras de outras nações indígenas. Os bororos se despediram de Rondon a margem do rio Taquari, pois, dali para frente era terra de caiamo, denominados por eles assim os 105 terena, guaiacuru e uachiri. Levaram consigo os presentes que ganhara, seus pertence, e os baquites, contendo restos mortais dos que faleceram na epidemia. De Coxim a Corumbá, o terreno era pantanoso. Rondon fez inúmeras viagens de reconhecimento percorrendo rios da região, levava sempre seus cães que ele o denominava onceiros (caçadores e onça). Ao inaugurar a estação de Coxim, viajou para Mimoso e depois para o Rio de Janeiro junto com o chefe bororo Adriano (Coguricaxoreu - Galina preta) para tratamento medico, retornando em 17 de janeiro de 1903 para Cuiabá, com sua família. De volta a Coxim a linha seguiu então para Aquidauana, o terreno era de difícil acesso entre as baixas o tenente Horta Barbosa que fora devorado pelas piranhas. O trecho de Aquidauana a Corumbá era mais difícil ainda, os serviços foram iniciados com o pantanal na sua época de cheia. No dia 1.º de janeiro de 1904 o então Major de engenharia Rondon inaugura a linha telegráfica Cuiabá-Corumbá Rondon tinha como companheiros dois índios bororo Cogurica-choreu e tóri, que o seguiam por toda parte como se fosse sua sombra, antes mesmo da solenidade acabar pegaram os cavalos e foram para Aquidauana, pois era preciso levar a linha telegráfica ate a fronteira do Paraguai e Bolívia. Iniciaram os levantamentos percorrendo os trajetos Aquidauana, Miranda e Porto Murtinho, Margarida, Nioque e Aquidauana. Depois partiu para explorar o rio negro, nesta viagem encontrou um grupo de índios uachiri, com quem manteve contato, um desses índios o ajudou muito na exploração de um brejo no rio Corrente, onde o rio sumia estava ele procurando passagem para as linhas, bom caçador observou a abundancia de caça na região, principalmente de onças. De volta ao Rio Negro achou o caninho que precisava. Portos Murtinho e Margarida não demoraram a ficar ligados. Seguindo a linha de fronteira, passou pela aldeia terena do Ipegue onde comandava o capitão Jose Caetano Tavares, índio terena apesar do nome aportuguesado, como havia muitas fraudes nos limites das terras indígenas, Rondon tratou de demarcá-las. Depois desse trabalho regressou a Cuiabá, e foi á aldeia Kejare visitar Ocureu e levar alguns presentes que havia caçado: couro de onças, entre outros. No período de 1.900 a 1.906. Rondon foi responsável pela construção de 1.746 quilômetros de linha telegráficas e 17 estações de comunicação. Nessa época salvou Ipegue e cachoeirinhas, os únicos pedaços de terras dos terena e quiniquinauas, que em outrora, tiveram extensos territórios. Ele ainda conseguiu do governo o reconhecimento dessas terras e dos direitos dos índios. Conseguiu ainda 106 salvar os remanescentes da tribo dos ofaiés pertencentes a cabeceira do rio Taboco e Negro que estavam sendo caçados e exterminados por se alimentarem das reses pertencentes um coronel-fazendeiro. Nestes anos Rondon colocou sob sua proteção as tribos Bororo, Terena, Ofaié e Kadiwéu. E procurou ajuda-los de todas as formas possíveis. Rondon terminará seu serviço no sul de Mato Grosso integrando através das estações telegráficas esta parte do país, agora seu trabalho seria integrar o norte do país. Em 1907 Rondon parte de Diamantino para descobrir o rio Juruema. Com as linhas traçadas ao norte e Mato Grosso com destino a mata amazônica, Rondon organiza essa expedição e parte com destino a serra dos Parecis, chegando a um local denominado Cágados no dia 07 de setembro. Um índio pareci ajudou a estear a bandeira brasileira, seria esse o começo de uma longa amizade. Na aldeia Queimada um grupo de índios já esperava com ansiedade por Rondon, chefiados por Toloiri que já tinha ouvido falar de Rondon. Saindo da aldeia Queimada, tomaram a excursão a pé, apos vários dias de caminhadas começaram a aparecer os primeiros sinais dos nhambiquaras, índios considerados não civilizados pelos exploradores. Certa manhã Rondon viu um índio próximo do acampamento às margens do rio Sauê-uiná. Ao saíram dali em direção ao rio Juruema, e quando a alcançaram comemoraram com tiros para o auto, descalçaram dois dias na sua margem e então, bateram então em retirada. Rondon preparava para visitar uma aldeia quando, no meio da mata, ocorreu um ataque dos nhambiquaras, Rondon só escapou porque uma das flechas arremessada contra ele parou no couro de sua bandoleira. Seus homens se vingar do audacioso ataque, Rondon então os impediu e os lembrou de que ele só estava defendendo suas terras dos invasores. Voltando no local do ataque deixou presentes e partiu. Sua tropa vinha doente, cansados com receio de um ataque dos nhambiquaras que os perseguia dia e noite. Alcançaram o rio Sauê-uiná limites dos domínios dos nhambiquara com os parecis. Rondon não perdeu um homem se quer nesta arriscada exploração. De volta a terra dos nhambiquaras dois índios parecis iria acompanhar Rondon, Zoôlô conhecedor da língua nhambiquara e seu irmão Toloiri já conhecido de Rondon, esse a morte não deixou ir nesta expedição. Explorando campos e matas, Rondon encontrou um grupo de índios nhambiquaras viajando com seus objetos, mulheres e crianças. Os cachorros os atacaram e eles fugiram, uma criança ficou para traz, Rondon cuidou dela, deu-lhe 107 presentes e deixou no lugar do acontecimento. Horas depois, voltou lá, a criança havia sumido e os presentes deixados no local, uma prova de resistência para Rondon. Em 1910 Rondon foi para o Rio de Janeiro, nessa época foi convidado a organizar o Serviço de Proteção aos Índios e Trabalhadores Nacionais. Antes de seguir para o norte o então tenente-coronel Rondon esteve no interior de São Paulo para p trabalho de pacificação dos índios Caingangues, o que conseguiu em seis meses. Em julho de 1911 estava em Mato Grosso, pronto para explorar o sertão, coordenando as atividades da comissão. Dedicava a maior parte do tempo com os índios, visitou varias nações e verificava os seus problemas, evitou sempre que os tratassem com dureza. Ao inspecionar o a linha da seção norte de Santo Antonio do Madeira ate o Jamari descendo o Jiparana sempre visitando as aldeias, sua fama já se estendia por todos os lados, os índios já sabiam que podia contar com aquele que agora era Coronel. Na expedição Roosevelt-Rondon, estiveram acampados na aldeia Queimada dos parecis. Seu objetivo era chegar ao Rio das Duvidas. Tiveram vários contatos com os nhambiquaras, todos amistosos. Porem dias depois em uma exploração acompanhada por lobo, seu cão preferido, entrou na mata atrás de uma caça e foi morto a flechadas por índios, Rondon ficou triste e ainda assim deixou presentes ao lado do cão morto, para mostrar que eram amigos. Rondon fez o levantamento geográfico de diversas regiões de Mato grosso, organizou o Serviço de Proteção aos Índios, serviu também vários museus nacionais e do mundo, foi elogiado por inúmeras celebridades e Chefes de Estados. Em 1939 Rondon e nomeado presidente do Conselho Nacional de Proteção ao Índio, podendo novamente dedicar-se a sua obra que começou com a presidência do Serviço de Proteção aos Índio, fundado em 1.910. No dia 5 de maio de 1.955, dia do seu aniversário, foi homenageado no congresso nacional com as platinas de Marechal do Exercito, graduação máxima do exercito brasileiro. Faleceu em 19 de fevereiro de 1958, o país entrou em luto oficial por três dias. No seu velório autoridades, índios, admiradores entre outros davam adeus ao bravo herói, sendo sepultado no cemitério São João Batista no Rio de Janeiro. Foi no sertão do Brasil que passou maior parte da sua vida desbravando, explorando e fazendo contato com etnias por onde passava, entre suas conquistas 108 estão: a criação da S.P.I. (Serviço de Proteção ao Índio); Parque Indígena do Xingu; foi colaborador do Museu Nacional coletando peças para varias coleções, junto de outros trabalhos de relevância para a unidade nacional. Em todo centro-oeste não havia nenhuma etnia indígena que não o conhecesse. BIBLIOGRAFIAS. MARTINS. Demósthenes. Marechal Rondon. Conferencia proferida na Academia Matogrossense de Letras (Cuiabá-MT). ed. Arte e diagramação; Art&Traço. Em 05 de maio de 1963. FREITAS. Sebastião Costa Teixeira. A vida dos grandes brasileiros. Marechal Rondon, ed. três São Paulo, SP. Brasil 1974. RONDON, o último dos bandeirantes. Produção: Leão Film. Direção: Joel W Leão. 2000. 109 SILVINO JACQUES O ÚLTIMO DOS BANDOLEIROS Karolyni Moti Lucimara Corrêa Rosangela Braga33 RESUMO: Esse trabalho foi elaborado de acordo com as exigências da disciplina História do Mato Grosso do Sul, ministrada pelo Profº Neimar Machado no 5º semestre do curso de História da Universidade Católica Dom Bosco. Tem por objetivo analisar a vida de Silvino Jacque contada no livro Silvino Jacques o ultimo dos Bandoleiros, de Brigino Inhames. Apontando assim seu papel na história de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. PALAVRAS-CHAVE: Silvino Jacques, Mato Grosso do Sul, Bandoleiro SILVINO JACQUES O ÚLTIMO DOS BANDOLEIROS Silvino Elmiro Jacques, seu nome verdadeiro, nasceu em 17 de fevereiro de 1906, no distrito de Camapuã, município de São Borja Rio Grande do Sul, seu pai era Leão Pedro Jacques, e sua mãe Santa Ana Jacques, afilhado de Getúlio Vargas. Era uma pessoa de personalidade forte, e que ficou bastante conhecido, seu nome sempre vinha acompanhado de medo e confusão. Silvino moldou sua personalidade ao exemplo do padrinho, de homem afável que não desperdiçava palavras e que tinha uma maneira profundamente realista para enfrentar situações de grande perigo [...] moço alto, pele suavemente amorenada, [...] olhos gaúcho e rasgados, exibindo no sorriso dois dentes de ouro, prosa simpática, ele atraia a atenção das pessoas. (IBAHES, 1997, p.19) Passou sua infância na cidade natal lá estudou até os 15 anos, chegando à idade, serviu a Brigada Milita, chegou até terceiro sargento, quando saio da brigada, foi trabalhar como fiscal de linha entre Santo Ângelo e Santa Rosa. Silvino andava de um lado para outro atrás de trabalho foi numa dessas andanças que em uma noite começou, a sua vida de fugitivo. [...] chegando em são Ângela de passagem, resolveu divertir-se no Cabaré da Bolinha [...] lá pelas tantas, [...] achando-se um tanto desapercebido das atenções femininas, resolveu fazer, notaram sua presença perguntando ‘essa casa tem goteira !?’ – alguém respondeu, ‘não’. Ele ‘então agora tem!’[...] a patrulha da polícia municipal que estava por ali e mais alguns civis que se ofenderam, resolveram 33 Acadêmicas do 5º semestre do curso de história da Universidade Católica Dom Bosco 110 assediá-lo à bala [...] tendo Silvino matado três e arrancado o bigode do Deoclécio. (IBAHES, 1997, p.24). Depois desse acontecimento a vida de Silvino Jacques não seria mais a mesma naquela noite ele saiu fugido de Santa Ângela passando por vários municípios, sempre perseguido pela polícia, chegando então a fronteira com a Argentina, lá também não permaneceu por muito tempo, pois as autoridades argentinas negociaram sua captura com seus perseguidores, Silvino segue então para São Borja, chegando ficou por algum tempo, tendo que sair novamente fugitivo, pois o delegado já estava alertado de sua situação. Silvino resolve então partir para Mato Grosso. Silvino como tantos outros gaúchos envolvidos em mortes e malvistos no seu Estado, resolvera emigrar para o distante Mato Grosso, que na época era a terra prometida onde a justiça se cumpria pela lei do quarenta-e-quatro. (IBAHES, 1997, p.29). Em Mato Grosso Silvino marcaria sua historia como herói e assassino. Chegando em Bela Vista, Silvino adota um nome falso Sr. Valdemar Pereira, por lá ficou por um longo tempo, onde ganho a confiança das pessoas do lugar, com seu jeito boêmio e alegre(IBAHES, 1997) mais um Certo dia e descoberto por um visitante gaúcho que estava de passagem, sendo obrigado a fugir novamente, seu destino agora seria uma pequena vila chamada Porteira, lá permaneceu e fixou moradia ainda como seu Valdemar, trabalhando nas fazenda Quando chegou a revolução de 1932, Silvino se juntaria as tropas constitucionalista, lutando do lado de se padrinho, onde ficaria bastante conhecido, pois seu bando lutou em nome do Estado de Mato Grosso contra os Paulistas. Esse grupo de aproximadamente 150 homens teria destaque de suma importância no bom êxito na campanha a favor de Getúlio Vargas, graças à temperança e coragem de seu afilhado, que na época tinha 26 anos, e ganharia o titulo representativo de capitão, Comandante do 2º esquadrão. (IBAHES, 1997, p.64) Terminada a revolução de 32, Silvino traz sua mulher para morar com ele na fazenda Paraíso. Mais não demoraria para se meter em confusão novamente. Quando a Revolução de 1935, começo Silvino vil um importante chance de um poder político legal na região. Mas infelizmente a revolta fracassou e Silvino levou grandes prejuízos, pois fornecia alimento às tropas revolucionárias. Para recuperar-se começo a fazer pequenos serviços, matando um ou outro, não demorando muito para ele passar de herói a bandido, nessa época em vivia em bonito e foi por lar que, começaria a disputa que marcaria para sempre a história da região. Silvino e seu bando, encabeçado por Adão Jacques e Antonio Nio Paim, se empenhava em ferrenha perseguição aos Dos Santos. Estes possuíam varias fazendas, entre elas a São Manoel a Descavado, as Brite-Kuê, a Loma Porá, Morro Bonito, e outras. A quadrilha atacava os peões, e quando não os matavam castravam-os para humilhar seus 111 inimigos. Roubavam o gado e nada lhes acontecia. O exercito parecia impotente para persegui-los, tal a mobilidade exibida pelos bandidos. (IBANHES, 1997, p164). A desculpa do bandoleiro quanto a suas jornadas de assaltos, perseguição e assassinatos no Brasil eram de que, ele estava protegendo a entrada de Paraguaios na região, e que eles estariam protegendo as fronteiras. Muitos delegados o apoiavam como por exemplo, o Delegado Otávio Sanchez, e o Felisberto. A região dos Três Morros perto de Bonito era de Trânsito livre para Silvino e seu bando ali o que eles fizessem estava feita e ninguém os incomodaria, o seu bando era formado por: Adão Jacques seu primo e melhor amigo, Antônio Paim, Codô e o Guedes ambos irmão de Raída ultima mulher do Silvinio, Tertuliano, Ramão, Maneco e o Nico, outros não ficavam por muito tempo. No ano de 1938 as patrulhas dos quartéis saíam principalmente da cidade do sul de Mato Grosso (Campo Grande), num certo dia um Tenente do exército lhe entregou um pacote lacrado e dentro havia uma arma automática enviado pelo próprio Getulio Vargas, o sanguinário ditador do Brasil desta época. Neste momento os dos Santos com seu bando já conduzira homens para capturar o silvinio, mas todos suas tentativas não tiveram resultados, mas estes perseguidores dos bandoleiros nunca desistiria, afinal Silvinio era um excelente atirador e muito habilidoso, e não seria fácil capturá-lo. Esse grupo dos santos não era legalizado pelo governo, não tinham permissão legal para formar um grupo armado para recrutar gente para perseguição, eles agiam por conta própria, pondo-se em risco, podendo até serem presos . O prefeito de bela vista e demais autoridades civis fizeram um abaixo assinado e enviaram ao governador do Estado de Cuiabá pedindo que Orcírio do Santos viesse a Ter Carta Banca para chefiar a captura do bandoleiro. Como resposta veio não só a liberação como também, eliminá-lo. Sendo assim com armas de guerra patrulhavam todas as fazendas á procura dos bandidos, mas quem acabou encontrando foi Rodrigues Peixoto perto de Guia Lopes da Laguna. Em 15 de Maio 1939 em Miranda, Silvino desistiu da briga, pois não tinha nenhuma chance de superar o inimigo, alem do mais, seus companheiros estavam feridos e cansados. Em meio à batalha, nenhum dos bandos desistia, Silvino sentiu uma forte pancada acima do rim, com o golpe da bala do fuzil escorregou e bateu o rosto no mourão dois dos seus cangaços arrastaram-no para perto da cerca a fim de protegê-lo de outro tiro, mais nada adiantou seu fim tinha chegado, ela dentro da mata morreu. Como o torvelinho que passa a galope e voa para longe, o seu espírito arrancou-se daquele corpo e galopou nas patas de um povoeiro resplandecente para junto do seu criador, que é esse o destino de todo 112 ser vivente. Falecia assim aos 33 anos de idade, o cidadão Silvinio Ermínio Jacques, e nascia o mito grandioso, invencível e assustador do capitão Silvinio Jacques, um gaúcho predestinado a sofrer a perseguição dos homens, gerada pela sua própria violência, um inimigo implacável e esperto que pensara um dia vencer a sua guerra [...] O silvinio quase sempre dormia na mata, e agora repousava na rede o seu sono eterno. IBANHES, 1997,p.259-260. Assim termina a história de Silvino Jacques, para uns heróis para outro assassino de sangue frio. Que deixou sua história registrada, mesmo que na maioria das vezes marcada com sangue, foi de fundamental importância, em uma época que a lei era feita pelos mais fortes, e a base do quarenta-e-quatro. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICA INHAMES, Brígido. Silvino Jacques o último dos Bandoleiros: o no mito gaúcho sul-mato-grossense. 3° ed. Campo Grande: Universidade Federal de Mato Grosso do sul. 1997 113 UM POUCO DA VIDA DE VESPASIANO BARBOSA MARTINS Joseane da Silva Lima34 RESUMO: Vespasiano Barbosa Martins, foi um grande lutador, que sempre defendeu seus ideais juntamente com o povo sul-matogrossense. Como político planejou é um país em prática tudo aquilo que a classe de elite almejava. PALAVRAS-CHAVE: Médico; Político O MÉDICO E POLÍTICO VESPASIANO BARBOSA MARTINS No dia 3 de agosto último, a Academia sul-mato-grossense de Letras promoveu uma sessão solene em homenagem a Vespasiano Barbosa Martins, primeiro governador do sonhado Estado de Maracaju, instalado em 11 de julho de 1932, que teve efêmera existência, pois não durou mais que 82 dias. Vespasiano, o governador emposado, conclama todos os mato-grossenses a lutar “pela unidade da nossa pátria. Pela unidade do Brasil, pela guarda do nosso patrimônio moral. Pela segurança dos destinos da nossa nacionalidade”. Governou oito e dois dias. Vencidos os divisionistas, sobrou-lhes a trilha do exílio. Não, morreu, todavia o idealista; não fineceu, contudo, o ideal; retraíram-se os indomáveis sonhadores, para adensar as forças e retornar com mais vigor à luta. E venceram. No dia 11 de outubro de 1977, o Presidente Ernesto Geisel, gaúcho, admirador desta região, ocultando-lhes os recônditos onseiros e reconhecendo-lhe a missão histórica – mais do que os próprios mato-grossenses – Cria o Estado de Mato Grosso do Sul. Vespasiano Barbosa Martins, historicamente considerado o principal líder do Sul de Mato Grosso. Vespasiano, ao que consta, foi o primeiro mato-grossense do sul a obter diploma universitário. Vespasiano Barbosa Martins nasceu na fazenda Campeiro, Município do Rio Brilhante, em 4 de agosto de 1889, de onde saiu, na culatra de uma boiada, em direção a Uberaba para se matricular com Colégio Diocesano Marista, em fevereiro de 1903. No final do ano seguinte, Vespasiano volta para Mato Grosso e, em 1905 viaja para Cuiabá, para cursar o colégio, onde termina o ginásio em 1909. 34 Graduanda do Curso de História, 5º semestre, na Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. 114 Segue para o Rio de Janeiro e, em 1910 entra na Faculdade Nacional de Medicina, da Praia Vermelha, onde se forma em medicina em 1915 tendo sido aluno brilhante. Como médico, começa sua vida profissional na cidade de São Luiz de Cáceres; depois vem para Campo Grande, onde monta seu consultório e reinicia sua clínica. Em 1917 casa-se, em São Paulo, com Alina Baís, filha de Bernardo Baís, primeiro prefeito eleito de Campo Grande e primeiro Juiz de Paz. Cerimônia discreta, bem ao gosto do Drº Vespasiano; casados ficam morando com os pais na Av. Afonso Pena enquanto passa a construir sua residência na rua 15 de Novembro, um dos palacetes mais bonitos de Campo Grande. Na Clínica Geral, o Drº Vespasiano sente-se seguro, como fora o seu mestre Miguel Couto; mas realizar uma cirurgia era um desafio que exigia superação;diante dessa realidade, começa a estudar, disseca as ilustrações anatômicas e diante de um paciente com hérnia estrangulada, o Dr. Vespasiano tem seu primeiro teste. Improvisa “A sala de cirurgia” no seu consultório; o anestesista, o dono da farmácia; e o auxiliar, outro clínico recém-chegado , o Drº César Galvão. Ou operário ou deixaria o paciente sucumbir ao abdômen agudo que se instalava. Ao terminar o ato cirúrgico, com ediceção do improvisado anestesista, que dormia o paciente estava salvo e nova vida começava para um cirurgião autodidata. No dizer do Drº Fernando Correa da Costa, o Drº Vespasiano “aprendeu e começou a exercer a cirurgia, por absoluta premência, no su próprio consultório” ali ao lado da farmácia Royal, na esquina da 14 de julho com a A. Afonso Pena. Ao identificar os pontos nos quais deveria se aprofundar no estudo da cirurgia, depois de acumular experiência e algumas economias, resolveu vender os bens e viajar para Europa; partiu em 25 de fevereiro de 1925, em busca de centros médicos de maior nomeada; em Berlim, estuda cirurgia com o Profº Strasmami; depois vai para Paris e recicla as tácnicas cirúrgicas com o Profº Leguet, dando-lhe o embasamento de que tanto necessitava para ser o cirurgião que influenciaria os médicos da época, que tinham tido formação cirúrgica com Brandão Filho e Fernando Magalhães, na Santa Casa do Rio de Janeiro. É ainda do Drº Fernando a afirmação seguinte: “não vi ninguém oprar tão pessoalmente como Vespasiano. Em cirurgia ele era ele mesmo”. Em 1926, de volta ao Brasil, foi ser o diretor de cururgia do hospital Otemã, em São Paulo, onde permanece até 1929, quando retorna a Campo Grande e reinicia suas atividades médicas, ao mesmo tempo em que se candidata o prefeito de Campo Grande, pelo recém-fundado Centro Cívico, sendo derrotado por Ontero Paes de Barros, numa das mais fraudulentas eleições, segundo os historiadores. 115 Ao participar da política, o Drº Vespasiano não abandonava a medicina, a qual exercia com personalidade e grande tirocínio clínico. E é deste médico que a diretoria da associação médica de Mato Grosso do Sul incubiu-me de falar. Como especialista, anestesiei na Santa Casa, em 1954, um sen paciente, que fora submetido à prostectomia por via supropúbica auxiliado pelo Drº Fernando Correia da Costa, formavam a dupla mais qualificada de médicos do estado. Iniciando o ato cirúrgico, na hora do descolamento da glêndula, que é feito com os dedos indicador e médio, com toda a habilidade que possuía, o Drº Vespasiano não conseguiu sua retirada. Um tanto cansado pelo esforço, apelou para o auxiliar, carinhosamente: “Fernando, arranca essa danada...” Naquela época, o Drº Vespasiano Barbosa Martins ainda cumpria o mandato de Senador da República e a Santa Casa continuaria sem sua presença tão marcante pelos conhecimentos e pela cultura que a todos enrriquecia. Segundo o escritor Ulisses Serra, saudoso fundador da Academia sul-mato-grossense de Letras, Vespasiano era de “extrema bravura pessoal e de um mundo de ternura”. Mas foi no final de 1964 e início de 1965, na sua casa, na rua 15 de Novembro, um sobrado com escadaria de acesso ao primeiro piso, que tivemos a oportunidade de conviver com o líder político e o grande expoente da medicina em Mato Grosso, ao prestar assistência médica a sua mulher, dona Celina, portadora de uma doença (dermatomiosite) que exigia perfusões e transfusões semanais, durante as quais conversávamos sobre causas políticas e casos clínicos que havia tratado, descrevendo-os de maneira singular. Dona Celina, paciente colaboradora para receber sangue ou soro introvenoso associado as vezes a outros medicamentos, tinhas veias pequenas e escondidas, o que obrigava ao uso de pequenas agulhas, pois na época não havia scalpes ou cateteres para o uso indovenoso. Preparado a equipe para tranfusão, dirigia-me para borda do leito de dona Celina acompanhado pelo Drº Vespasiano, que torcia para que eu acertasse a veia e, feito ista, exclamava entusiasticamente: “desgraçado para pegar uma veia...” Horas a fio, enquanto assistíamos ao gotejar das soluções, o Drº Vespasiano contava os casos de medicina que fizera nas idas à Campo Grande e depois pedia para a empregada um refresco. Deliciávamos uma limonada, que ele degustava com prazer, e dizia: “como tem gente que troca limonada ou uma laranjada por um desses refrigerantes engarrafados?! Não posso acreditar...” Certo dia, falando sobre o valor do trabalho médico, confidenciou-nos que a profissão não dava para enriquecer, mas sentia-se um homem realizado 116 profissionalmente e, para suas aspirações, estava economicamente bem, mesmo não tendo jamais enviado uma cobrança de seus honorários aos seus clientes e nunca lhe faltava o dinheiro que precisava. Homem simples, sisudo, franco enérgico e defensor intransigente da “coisa pública” e da ética médica, o Drº Vespasiano foi um homem carismático, capaz, leal, honesto e íntegro cujo nome a Associação Médica deu a sua biblioteca, reverenciando uma das “figuraras mais perfeitas da vida pública nacional”, segundo palavras do Deputado Ruy Santos. No dia 14 de janeiro de 1965, as duas horas da manhã, o Drº Vespasiano, que já sofrera um enfarte em 1952, tem um novo ataque, cai fulminado, nem um gemido, nem um grito nem nada, nem sofrimento como era o seu desejo. Ao ser sepultado, o orador oficial da associação médica de Campo Grande, Drº Hugo Pereira do Vale, numa adoração emocionada disse: “Vespasiano Barbosa Martins, meu colega e amigo. Que dolorosa coincidência para você que me trouxe a vida; eu venho hoje com profunda emoção, trazer cadeira da morte, para iluminar os caminhos da eternidade”. Drº Vespasiano Barbosa Marins, que as gerações atuais e vindouras, de políticos e de médicos, o tenhamcomo exemplo, quer no trato dos negócios públicos quer na medicina, que o Drº Vespasiano exerceu com tanto zelo e o melhor de sua capacidade profissional, em benefício do próximo. BIBLIOGRAFIA CAMPESTRINI, Hidelbrando; ROSA, João Pereira. O Médico Vespasiano Barbosa Martins. CAMPESTRINI, Hidelbrando. Vespasiano e a Saga da Divisão. MARTINS, Nelly. Vespasiano Meu Pai. SILVA, Jovam Vilela. A Divisão do Estado do Mato Grosso do Sul 117 VIRGÍLIO CORRÊA FILHO João Paulo Pereira Zanela35 Virgílio Corrêa Filho (Cuiabá – MT, 1887/ Rio de Janeiro – RJ, 1973) pertenceu a tradicional elite mato-grossense sendo um intelectual engajado no movimento pela construção e propagação de uma identidade de Mato Grosso, visando assim a propaganda e integração da região ao cenário nacional, como na política estatal vigente no período da era Vargas. O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB-RJ), o Conselho Nacional de Geografia (CNG-RJ), bem como o Jornal do Comércio (RJ), desempenharam um papel decisivo na trajetória de Virgílio Corrêa Filho projetando-o ao cenário nacional e internacional. As instituições oficiais como o IHGB e o CNG, entre outras, desempenharam um papel relevante neste período ao colaborar, sob diversos aspectos, para o consenso em torno do programa de construção de uma identidade do estado nacional, mantendo intelectuais oficiais em seus órgãos para atender aos objetivos do grupo social dominante, no caso, colaborar com a propaganda doutrinária em voga, tendo em vista o discurso que vigorava em suas publicações. Virgílio Corrêa Filho fazia parte da intelectualidade que, na década de 20, defendia o ideário nacionalista e que foi cooptada por Getúlio Vargas para desenvolver o seu projeto de “reconstrução nacional” sob os auspícios de um “novo conceito de democracia” em que o governo e o povo se diziam “uma só e mesma poderosa realidade”, representados pelo Estado Novo. RESUMO: INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO A institucionalização da pesquisa histórica no Brasil deu-se a partir da fundação do IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasil), pelo então imperador Dom Pedro II, no ano de 1883. Seus idealizadores o justificavam pela necessidade de investigação, organização e publicação dos documentos tidos como históricos que estavam dispersos nas províncias do Império. Virgílio Corrêa Filho ficou reconhecido e prestigiado no IHGB como autor dos trabalhos: Mato Grosso, destinado a compor o Dicionário do IHGB, Estrada da Chapada, Questões de Terras, Notas à Margem, As Raias de Mato Grosso, Os Tratados com a Bolívia, As estradas de Mato grosso, Os Predecessores de Rondon e Monografias Cuiabanas. Também por meio de suas obras fez questão de divulgar as iniciativas do IHGB para efetivar pesquisas nos arquivos da Europa. Além de substancial conteúdo, relacionou os arquivos consultados em vários países, trazendo assim, uma extensa relação de documentos. 35 Acadêmico de História na Universidade Católica Dom Bosco. 118 Com a política integracionista vigente na época, a atenção em torno da construção de uma história através de ideais patrióticos e da segurança pelo futuro do país, sempre foram umas das principais preocupações de Virgílio Corrêa Filho. Para ele o estudo sobre o passado deveria ser sempre o principal objetivo dos pesquisadores, cuja finalidade seria aproveitar suas lições, para fortalecer o sentimento de unidade nacional e garantir o desenvolvimento do país, referendando, aqui, uma concepção de história nitidamente pragmática. Para sustentar os seus empolgantes argumentos sobre a política personalista de Getúlio Vargas, Virgílio Corrêa Filho relatou algumas das obras realizadas neste período, destacando os fatores positivos dos empreendimentos, tais como: a eletrificação da E. F. Central do Brasil, o seu prolongamento até o Paraguai e Bolívia; o saneamento da Baixada Fluminense; as indústrias bélicas; a pesquisa do petróleo; a siderurgia em ampla escala; a legislação trabalhista e a organização da previdência social por meio de instituições. Neste mesmo intento, comentou que “os exemplos de fora estimulavam as tendências inovadoras”, colocando Franklin Roosevelt, presidente dos Estados Unidos, na série dos grandes presidentes, comparando sua política de grandes obras à de Getúlio Vargas, no sentido de ter tomado medidas eficazes contra “agentes agressivos”, internos ou externos do Estado, podendo-se assim notar o caráter nitidamente cultualista vigente em sua obra. O papel destinado ao IHGB, como foi possível verificar, pode ser mesmo considerado como o de “guardião das tradições nacionais”, na medida em que se esmerava para reunir, conservar e divulgar documentos tidos como fundamentais para a história do país, cultivando e legitimando, através das suas publicações, conferências e cursos, realizados sob sua égide, uma memória histórica destinada a preservar valores que, sem dúvida, foram socialmente produzidos, a partir de um trabalho coletivo de construção da realidade social, neste caso, pelos intelectuais oficiais do Estado Novo, para cultuar a imagem pública de Getúlio Vargas. CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA O Conselho Nacional de Geografia, organismo oficial de coordenação e supervisão das atividades geográficas brasileiras, foi outro órgão que exerceu profunda influência na trajetória de Virgílio Corrêa Filho. A sua colaboração constante prestada aos interventores de Mato Grosso, naturalmente homens de confiança do presidente, garantiu-lhe as credenciais necessárias que o levaram a pertencer à alta burocracia do CNG. Tendo participado, neste mesmo período, como delegado do governo de Mato Grosso e representante do IHMT, e em 1937, da sessão inaugural do 119 CNG. De fato, a sua inserção no âmbito político e cultural, após este acontecimento, ampliou-se significativamente. Para Virgílio Corrêa Filho, a fundação do Conselho Nacional de Geografia, tendo o seu aparelhamento e planificação sistemática dos estudos sobre o território do país, serviria para garantir o desenvolvimento e a segurança, além de estabelecer propostas sugerindo uma diretriz para a política nacional. Para o governo era fundamental promover a realização da campanha pela sistematização e divisão territorial do Brasil, sendo assim, orientar os órgãos controladores da economia nacional, espalhando a idéia da importância da pesquisa geográfica e da estatística censitária para a segurança do país. O interesse do Virgílio Corrêa Filho pelo perfeito conhecimento e organização territorial do Brasil ficou registrado nos artigos publicados na imprensa na época, como por exemplo, no Jornal do Comércio, bem como, na Revista Brasileira de Geografia, destinada à divulgação trimestral de assuntos relativos ao território brasileiro, além de estimular a produção geográfica. Virgílio Corrêa Filho fazia parte dos geopolíticos que debatiam questões relativas às fronteiras nacionais, em que se criavam o “ideal pela defesa” do território nacional, tema por excelência na geopolítica da época, no campo das relações internacionais. É possível perceber seu interesse em colaborar para a definição da propriedade dos latifúndios, legitimando a organização para o povoamento do interior do país, bem como, as faixas de fronteira, a implementação dos meios de transportes e os limites mato-grossenses. Sendo atuante propagandista da política Varguista e “intelectual orgânico” do regime, não poderia deixar de contribuir para cultuar um dos maiores empreendimentos do Estado Novo, como foi a Marcha para Oeste, fator de integração nacional, defesa das fronteiras, exploração e povoamento, especialmente da região Centro-Oeste, efetivando-se a partir dos postulados da geopolítica, desenvolvidos nos anos 30 e 40, com a contribuição do desenvolvimento das pesquisas e estudos realizados no CNG. Para reforçar suas impressões, publicou o artigo “Divagações”, a 18 de junho de 1939, em que discorreu sobre o passado das três cidades matogrossenses já atingidas pela “marcha progressista”, quais sejam Campo Grande, Corumbá e Cuiabá, enfatizando a última, com o objetivo de reivindicar a ligação de sua cidade natal, com as regiões litorâneas por meio da estrada de ferro. Aqui também, concluiu o texto asseverando que, ninguém “para tal missão construtora se emparceirará com o Presidente Getúlio Vargas (...) feito bandeirante da brasilidade”, notando-se novamente o caráter cultuador do escritor. 120 Um forte condicionamento geopolítico levou-o a desenvolver temas nesta perspectiva, não os restringindo, porém, à região de origem. Desta forma, é necessário enfatizar que quando escreveu sobre Mato Grosso, não foi somente por mero sentimentalismo pelo torrão natal. Seus trabalhos têm um sentido mais complexo e só podem ser melhor dimensionados, à luz de um universo maior. Tratava-se de uma região com posição geográfica estratégica, para o desenvolvimento dos projetos de interiorização do país, de ligação com o litoral e com os países da América Latina. Outro fator geopolítico importante que contribuiu significadamente na época, e que fazia parte do projeto nacionalista centralizador, é a extensão do território, além dos rios, vias que, quando bem aproveitadas, podem contribuir para a defesa e integração nacional. Muitos desses estudos desenvolvidos durante o Estado Novo foram precursores dos debates realizados nas décadas posteriores, em cujo clima foi fundado a Escola Superior de Guerra. Era uma exigência das Forças Armadas, especialmente, após a entrada do Brasil na Guerra Européia na década de 40, como providência indispensável à segurança nacional. A prestação de informações, que segundo Virgílio Corrêa Filho eram “oportunas, precisas e circunstanciadas”, discorriam sobre os mais diversos aspectos das condições brasileiras, como, por exemplo, a organização da estatística e de mapas precisos sobre o território nacional. Neste sentido, o IBGE, integrado ao CNG, cujas seções de Estatística Militar funcionavam como órgãos colaboradores do Conselho de Segurança Nacional e dos Estados Maiores da Forças Armadas durante o período do conflito, prestavam serviços à planificação do esforço de guerra do país, fornecendo às autoridades o resultado de suas pesquisas e executando inquéritos especiais, de caráter eventual ou permanente, inclusive o levantamento dos estoques e outros índices econômicos, que as Forças Armadas considerassem úteis aos seus serviços técnicos e estatísticos. Para Virgílio Corrêa Filho, o decreto-lei N.311, de 02/03/1938, responsável pela divisão territorial do país, denominado Lei Geográfica do Estado Novo, contribuiu para o perfeito conhecimento do país, além de ter colaborado para reforçar a unidade nacional a partir da utilização de critérios comuns, elaborados por todo o território nacional, para a distribuição do país por circunscrições. Pela primeira vez, comentou, que os municípios tiveram “os seus limites definidos com precisão, em toda amplitude do território nacional”, o que teria evidenciado “a capacidade organizadora dos dirigentes” guiados pelo “idealismo patriótico”. A racionalidade administrativa para a 121 organização do território seria, portanto, o resultado da aplicação dos estudos geográficos. POLÊMICA E PRODUÇÃO DO DISCURSO HISTÓRICO Como muitos intelectuais, Virgílio Corrêa Filho também enveredou pela polêmica, em especial nas primeiras décadas do século atual, período em que viveu em Cuiabá. Roberto Ventura, um estudioso das polêmicas literárias no Brasil, afirma que este estilo pode revelar o “caráter personalista” da intelectualidade brasileira, “desde o século XIX até nossos dias”. Segundo este autor, embora os polemistas procurassem enfatizar oposições, predominavam os “caracteres comuns devido à relativa ausência de diferenciação teórica e ideológica até as primeiras décadas do século XX”. Assim, geralmente, predominavam os ataques pessoais. Roberto Ventura ainda comenta que, prevalecia uma “orientação autoritária” ao invés do debate de idéias, levando a uma “série infindável de monólogos”, em que os autores pretendiam reafirmar suas próprias “crenças”. A polêmica, para ele, portanto, constitui um “modo específico de prática intelectual” que se aproxima em sua estrutura, “da política partidária e parlamentar” e das “lutas entre oligarquias”. Nas lutas entre “parentelas”, seriam, nada mais que, “lutas pelo poder” marcadas por divergências pessoais. Assim, Roberto Ventura concluiu que, comuns no século XIX, as polêmicas personalistas persistiram no século XX integradas aos padrões culturais ainda vigentes, porém, incorporando, além de campanhas em prol da modernização, projetos contraditórios de reformulação do Estado, da sociedade e da cultura, que se acentuou na década de 30. Tal efervescência político-cultural teria influenciado os projetos dos intelectuais inserindo-os em uma “conjuntura de recriação institucional”. Como expressão que marcaram a trajetória de Virgílio Corrêa Filho, homem público e intelectual atento aos acontecimentos do seu tempo, é muito significativa a série Polêmica. Para completá-la, publicou ainda uma coletânea de discursos, proferidos, em maio e junho de 1928, pelo então Senador Pedro Celestino Corrêa da Costa, sob o título: Política de Mato Grosso – Como se desmascaram e se esmagam as perfídias de um paranóico imbecil, antecedidos de uma nota explicativa de sua autoria. A série Polêmica, além de refletir as preocupações pessoais e políticas que lhe deram origem, representa, na verdade, uma parte da história vivida por Virgílio Corrêa Filho. Porém, mais do que isto, constituem, com muita propriedade, a memória que 122 ele desejou deixar registrada sobre os acontecimentos em questão, ou seja, ele construiu a representação dos acontecimentos de acordo com sua experiência de historiador. Assim, escrevendo a história do seu próprio tempo, procurou precaver-se de futuras interpretações, ou mesmo intenções políticas que pudessem deturpar o fato nos quais esteve envolvido. Autor, narrador e personagem confundem-se de tal forma no decorrer de sua obra, como será possível observar, que acabei por concluir estar analisando, neste caso, uma autobiografia, hoje também conhecida como ego-história. Da mesma forma, poderíamos, pois, afirmar que na ego-história de Virgílio Corrêa Filho aparece, apenas, uma parte de sua vida, aquela que lhe parecia conveniente preservar e divulgar, ou seja, ele selecionou algumas lembranças de sua vida pública, tentando mostrar, especialmente, como desempenhou o papel de secretário geral no governo de Mato Grosso. Enfim, como se desenrolou a sua carreira, naquele quatriênio da história, defendendo-se sempre das acusações que lhe foram imputadas, revelando a contragosto, segundo declarou, sua vida “modesta, mas digna como as que mais o forem”. Virgílio Corrêa Filho já desenvolvia em 1919, seus dotes de jornalista, na cidade de Cuiabá, publicando semanalmente os editoriais do jornal O Mato Grosso, órgão do Partido Republicano estadual. O estopim que deu início à polêmica derivouse justamente de alguns destes artigos, em especial o que foi publicado em 22 de agosto de 1926. Neste ele criticou tópicos da mensagem presidencial publicada na Gazeta Oficial, a 10 de junho do mesmo ano, que, de acordo com ele, estava “recheada de falsas acusações da administração passada” como, por exemplo, o legado de uma situação financeira “penosa e difícil”. Para ele, a mensagem presidencial constituía um “veemente libelo contra todas as administrações republicanas de Mato Grosso e, em particular, contra sua antecessora”. O presidente, após a leitura do artigo de Virgílio Corrêa Filho denominado “O detrator oficial”, fez publicar na Gazeta Oficial um telegrama endereçado ao Coronel Pedro Celestino Corrêa da Costa, seu antecessor no governo, repudiando o citado artigo do dia 22 de agosto, no qual, segundo ele, Virgílio Corrêa filho reeditara, “torpes infâmias e vis calúnias” contra Antônio Corrêa da Costa, ex-governador e seu pai, publicadas doze anos antes. Dirigindo-se a Mário Corrêa da Costa com ironia peculiar, Virgílio Corrêa Filho escreveu: “Presumo que tenha havido troca de endereço”, pois que o telegrama, escrito “a propósito de um artigo publicado no jornal O Mato Grosso”, e contra o seu autor, deveria, segundo ele, ter-lhe sido encaminhado, aproveitando para criticar o presidente pelo mau costume de não responder as correspondências que lhe eram enviadas. 123 Virgílio Corrêa Filho, mostrando que, inicialmente, tentou manter uma correspondência, na medida do possível, amigável com os agressores, identificados através dos artigos lidos especialmente na Gazeta Oficial, justificou a elaboração e a publicação da série denominada Polêmica. Transcreveu, também, nesta série, sua correspondência ativa e passiva, referente à questão, principalmente entre e ele e Mario Corrêa da Costa. Sua intenção era demonstrar o relacionamento amistoso mantido com os ilustres políticos cuiabanos antes das injunções políticas causadoras dos desentendimentos e, inclusive, a sua disposição para colaborar com o governo. A “série de provocações e injúrias” contra o governo passado e contra ele, através da Gazeta Oficial, em especial, as publicadas a 15 e 16 de março de 1926, com o aval de Mário Corrêa da Costa, intensificavam-se. Ao referir-se a Antonio Corrêa da Costa, escreveu ele, tentou estabelecer uma comparação entre duas épocas em que ocorreram difamações e calúnias pelos jornais. Para ele, Mário Corrêa da Costa não entendeu as suas intenções. Aliás, acusando o presidente de desconhecimento dos fatos, lembrou que a 05 de agosto de 1914, já participava de polêmicas, quando publicou no Jornal do Comércio, o artigo “Política de Mato Grosso – A Verdade dos Fatos”, no qual fez a defesa do eminente político matogrosssense. Para ele, o erro do presidente foi causado por “paixões” que, certamente, perturbaram o seu julgamento, ou mesmo, pelo desconhecimento da história do seu Estado. Virgílio Corrêa Filho acusou Mário Corrêa da Costa de inventar um artigo que teria publicado contra Antônio Corrêa da Costa. Demonstrando indignação, declarou que tal artigo “imaginário sob a epígrafe abissínia”, jamais fora escrito por ele e nem jornal algum publicou. Em algumas colaborações na Imprensa, realmente, afirmou, não achava necessário assinar os artigos, fossem de interesse geral, de “defesa do partido”, e de vários assuntos “que surgiam simplesmente como da redação”, da qual não constava que fizesse parte. Frente a tantos ataques sofridos, procurou demonstrar a disparidade de forças em luta: “O gigante”, Mário Corrêa da Costa, que o desafiava, trazia as “insígnias do mando e da força bruta” e surgia “encouraçado de baionetas e metralhadoras”, enquanto ele, o “microscópico lutador”, apoiava-se somente “na verdade e na justiça da sua causa”. Uma manifestação de desagravo à memória de Antônio Corrêa da Costa, foi publicada no editorial nº 8 do Democrata, a 26/8/26. Mas na verdade, o artigo visava destruir a imagem pública de Virgílio Corrêa Filho, conforme sua interpretação, tratando-o como “individualidade raquítica e incolor”, responsável pela reedição de inomináveis perfídias capazes de macular o passado de tão eminente político, 124 atingindo, então, de forma vingativa o “coração vilmente alanceado do filho extremoso”. Assim, Virgílio Corrêa Filho registrou que, além dos insultos de baixo calão subscritos oficialmente pelo Dr. Mário Corrêa da Costa, sofreu, também, os ataques do Democrata, ou “Demo”, apelido vulgar do bi-semanário fundado em Cuiabá, “para servir o governo atual”. Porém, não respondeu às agressões publicadas no periódico, porque, além de não dispor de tempo para ocupar-se de todas as “verrinas”, este, “é jornal que vive fora da lei”, pois, não apresenta um diretor ou redator principal, afirmou. Somente o “secretário particular do Presidente”, aparecia como gerente e, ainda, com vencimentos ilegais. Além destes dois personagens envolvidos na Polêmica, qual seja, o “detrator oficial”, Mário Corrêa da Costa, presidente do Estado, e a “gralha empavonada”, Manoel Paes de Oliveira, Secretário do Interior, havia ainda um terceiro: “o siamês”, Carlos Gomes Borralho, Secretário da Agricultura. Com este último, Virgílio Corrêa Filho, também, trocou várias cartas alertando-o para o fato de que responderia às acusações publicadas na Gazeta Oficial, numa “série difamatória da administração passada”, que, segundo ele, careciam de provas documentais. Para uma melhor compreensão dos episódios políticos ocorridos em Mato Grosso, naquela época, é muito importante considerar o histórico denominado como “Contestação ao libelo de borra”, 4º capítulo do “Siamês da Gralha Empavonada”. Neste, aliás, como em toda série Polêmica, Virgílio Corrêa Filho deixou evidente a existência de uma forte tradição localista que existia em Cuiabá, em que poderosos grupos do poder estavam sempre à frente das questões políticas. Fato daí decorrente, teria ocorrido em janeiro de 1921, ou seja, a fusão do “celestinismo” (grupo do Senador Pedro Celestino Corrêa da Costa) com o “azeredismo” (grupo do Senador Antônio de Azaredo). Daí resultara, portanto, o acordo em torno da candidatura do senador Pedro Celestino Corrêa da Costa à Presidência e do Dr. Estevão Corrêa a vice, em substituição a D. Aquino Corrêa. Carlos Gomes Borrado, então deputado estadual, permaneceria na Assembléia Legislativa. Porém, a incerteza da posse de Pedro Celestino da Costa, devido às atividades no Senado, cogitou-se que deveria assumir o vice, Estevão Corrêa. Carlos G. Borrado, segundo Virgílio Corrêa Filho “Borra-alho”, interessado em ocupar tal cargo, conspirou contra Estevão Corrêa, através de uma série de abaixo-assinados, para obter apoio dos chefes locais, “em prol da sua inqualificável maquinação”. Porém, Pedro Celestino Corrêa da Costa resolveu assumir o exercício do cargo a 22 de janeiro de 1922, em nome da coesão do partido. Em reunião com a Comissão Executiva do partido, para acalmar os ânimos, o presidente 125 eleito teria apresentado o projeto para nomear Carlos G. Borrado, Secretário Geral do Estado. No entanto, Estevão Corrêa, “hostilizado (...) pelos embustes borralhescos”, acusou-o de traição em benefício próprio. Houve unanimidade às argumentações de Estevão Corrêa. O “Borra-alho”, enfim, “não era persona grata à Comissão Executiva do partido situacionista, que lhe embargou a nomeação”. Enfim, para Virgílio Corrêa Filho, o Dr. Mário Corrêa da Costa revelara-se “habilíssimo teatrólogo”, tão rápidas eram as mudanças das suas orientações, “como nas revistas opulentas de números variados”. Ao prometer manter-se afastado das agitações partidárias, promoveu a fundação do Partido Democrata, assumindo a sua chefia política. Assim, acabou por misturar a administração com a política, conforme os documentos publicados nesta série. Assim, Virgílio Corrêa Filho concluiu que, realmente, alguém deveria redigir as mensagens que o presidente, por certo, apenas assinava, caso contrário, a subida ao poder teria lhe causado uma “lastimável amnésia”, responsável pelos erros e incoerências do “desabusado presidente”, ao redigir as mensagens publicadas. Em Política de Mato Grosso – Como se desmascaram e se esmagam as perfídias de um paranóico imbecil, obra já citada, Virgílio Corrêa Filho, completando os argumentos e as provas para legitimar a memória que construiu sobre os fatos relatados, numa nota explicativa, ainda não satisfeito, fez questão de registrar os ilustres representantes da “estirpe” Corrêa da Costa. O verdadeiro objetivo para esta publicação, segundo Virgílio Corrêa Filho, era, além de completar a série intitulada Polêmica, divulgar, para além das fronteiras de Mato Grosso, onde Mário Corrêa da Costa se via protegido pela imunidade do cargo, os desatinos que vinha praticando, através de suas mensagens na Assembléia Legislativa do Estado. A CONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA Tendo suas obras valorizadas pelos membros do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT) e mais tarde, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), entre outros já citados, Virgílio Corrêa Filho foi também recomendado como modelo de historiador, pois, a partir de uma nova concepção de história, fundamentada na “razão social” em que “se concentram as nacionalidades”, usaria uma “linguagem que fala muito para o futuro”, conforme avaliação de Feijó Bittencourt, seu contemporâneo. Assim, tendo sempre ocupado cargos de destaque como funcionário público, além de jornalista e Engenheiro Civil, Virgílio Corrêa Filho dedicou mais de cinqüenta anos de sua vida à elaboração de trabalhos destinados, segundo ele, ao 126 “conhecimento exato do ‘Brasil bem fadado’”. Sem dúvida, foi um representante do ideário nacionalista que predeterminou na década de 20, que como já me referi, impunha aos intelectuais a necessidade de conhecer os problemas e a história do país. Na obra Capítulos de História Colonial (1500-1800), espelhava-se em Capistrano de Abreu, num Auto-Retrato Capistraneano, palo saber do “historiador madurecido, que fora às fontes abeberar-se de informações utilizadas com perspicácia incomparável”. Surpreendia-se de que em meio à “desordem de sua mesa de trabalho”, como registrou em algumas das suas correspondências, pudesse Capistrano desenvolver trabalhos que lhe “imortalizaram o nome de historiador arguto e desvendaram novos rumos aos seus continuadores”. Além disso, admirava-o por estimular a colaboração de escritores contemporâneos, alguns esquecidos, como por exemplo, Vale Cabral e Silveira Caldeira. No artigo “Dois Excitadores de Dedicações”, lembrando o esquema teórico de Plutarco, ao comparar figuras exemplares colocando-as em paralelo, Virgílio Corrêa Filho homenageou dois escritores, Capistrano de Abreu e Alberto Torres, que, segundo ele, foram glorificados na década de 30, embora “diversos em tudo mais, tiveram gloriosa recompensa, que os irmanou perante a Posterioridade veneradora de seus espíritos devassadores de novos rumos”. O grande problema nacional seria o contraste representado pelas duas civilizações, “que se avizinham sem se penetrarem, mutuamente, a litorânea e a sertaneja”, era para Virgílio Corrêa Filho, inegável. E, ainda, não se encontrara o meio eficaz de articulá-las intimamente, em benefício geral. Partindo da constatação de que, nem a educação dos jovens que migram para a cidade, bem como dos citadinos para o meio rural, conseguiam modificar, “de forma sensível a divergência que separa as duas atividades”. O “descendente do roceiro”, mandado a realizar estudos superiores, movido pelo anseio dos pais por uma vida melhor, adquire, segundo ele, “aspirações incompatíveis com a sua origem modesta, e transforma-se em incurável candidato à burocracia, nas suas várias modalidades”. Já o profissional urbano, muitas vezes, não se adapta ao sertão. Para Virgílio Corrêa Filho, as “forças vivas do país”, encontravam-se em “reserva”, a que faltava a “competente mobilização com finalidade produtiva”. Para que o homem possa revelar-se um “agente do progresso”, seria necessário o “adestramento nas operações impostas pela intensa vida moderna”. Seguindo a doutrinação de Alberto Torres, afirmou ainda que sobram qualidades ao brasileiro que, “devidamente exercitadas” o habilitará a trabalhar em setores diferentes, qualificandoo para desenvolver “os mesmos feitos que o imortalizaram no devassamento dos sertões, nas campanhas defensivas do território, na fusão de capitanias desarticuladas 127 em um só organismo político, de enormes proporções, e nas várias atividades industriais e científicas, quando superiormente orientadas”. Seria preciso, portanto, investir na educação profissional que lhe desenvolva os “pendões naturais”, e lhe aumente a “valia espontânea”, como a que permitiu a “arrancada heróica dos bandeirantes”, para dilatação da área ocupada, através de obstáculos de toda ordem e a improvisação de “artífices e inventores”, em alguns dos quais a humanidade festejou o “admirável gênio benfazejo”. Várias vezes considerado como “profundo admirador e cultuador” do “estilo exuberante” de Euclides da Cunha, Virgílio Corrêa Filho dedicou-lhe, nada menos do que treze artigos, publicados no Jornal do Comércio, que mereceram citação na Obra Completa de Euclides da Cunha. No artigo “Euclides da Cunha”, Virgílio Corrêa Filho sintetizou o que representou para ele “o escritor que interpretara os mais complexos aspectos e aspirações da nacionalidade” brasileira, e que “insculpira em páginas imortais o poema incomparável” de “Os Sertões”. Para Virgílio Corrêa Filho, Os Sertões “maravilhou” desde os seus primeiros leitores e críticos literários, tendo agitado “violentamente a pacatez costumeira do ambiente das letras”. Jamais, afirmou, tratara alguém sobre a “magma questão nacional”, com tanta “segurança de raciocínio”, ao ensinar-lhe os diferentes aspectos, de maneira tão original, distinguindo-se de escritores de longa “trajetória luminosa”, como Machado de Assis, José Veríssimo, Joaquim Nabuco, entre outros. Finalmente, para completar o rol dos notáveis nacionalistas, Virgílio Corrêa Filho referiu-se a Vicente Licínio Cardoso, copiando o estilo de Plutarco, ao compará-lo a Euclides da Cunha, no artigo denominado “O Ensaísta Modelar”, já citado. Vicente Licínio Cardoso e Euclides da Cunha teriam em comum a formação em engenharia, o que teria contribuído para “irmaná-los na glória”, sendo Vicente Licínio Cardoso, o “continuador da sua campanha superiormente nacionalizadora”, afirmou. Vicente Licínio Cardoso reconhecia, portanto, de acordo com Virgílio Corrêa Filho, a dificuldade para implementar a “missão renovadora, a míngua de preparo prévio do meio social, em que pretendia agir” Euclides da Cunha. Interessado em completar-lhe a “transformação mental”, não se contentou em elaborar ensaios “comprobatórios da opulência dos seus cabedais intelectuais”. Empenhou-se arduamente na campanha, que declarou indispensável à solução dos “magnos problemas nacionais”. Como um apologista da educação integral, em que via o mais eficiente fator de engrandecimento nacional, contribuiu como professor na Escola Politécnica, mediante concurso, tornando-se “sub-diretor técnico da Instrução, ao tempo da implantação da reforma, que deu novos rumos ao ensino municipal no Distrito Federal”. 128 A importância destes textos publicados por Virgílio Corrêa Filho, é permitir o resgate de sua visão da história e os elementos que compunham sua preocupação de historiador, ou seja, suas impressões pessoais sobre as questões predominantes entre os intelectuais, seus contemporâneos. É possível constatar que privilegiou alguns valores em comuns entre os escritores selecionados, que alimentaram, com certeza, sua concepção de história e orientaram sua metodologia para a produção do seu próprio discurso. A argumentação de Virgílio Corrêa Filho reflete, portanto, suas intenções básicas, ou seja, selecionou seus temas sempre os relacionando ao momento histórico vivido. Neste caso, ao exaltar os grandes ideólogos do nacionalismo, colaborou para perpetuar valores caros à política de integração nacional. BIOGRAFIA E INTELIGÊNCIA HISTÓRICA Para a elaboração deste exercício historiográfico, escolhi as biografias de três personagens que viveram em épocas diferentes, dignos exemplos de “dedicação apostolar” e merecedores da “benemerência da posterioridade”, na expressão de Virgílio Corrêa Filho. São eles: Alexandre Rodrigues Ferreira, brasileiro que se projetou na Europa como naturalista dedicado ao estudo das riquezas da Pátria; Augusto Leverger, militar e estadista, “bretão cuiabanizado”, que a partir das suas grandes obras adquiriu prestígio nacional, e Joaquim Murtinho, mato-grossense ilustre que se projetou na política nacional. Significam, com certeza, figuras modelares, expressão dos valores mais caros a Virgílio Corrêa Filho, perfeitos defensores de “sadia brasilidade”. Alexandre Rodrigues Ferreira. Vida e Obra do Grande Naturalista Brasileiro, integrante da clássica coleção Brasiliana, cuja finalidade era “definir as peculariedades da terra brasileira e sua gente”. Ainda estudante, serviu de “demonstrador de história natural”. Apenas formado como doutor em Filosofia, a 10 de janeiro de 1779, fora incumbido pelo ministro Martinho de Mello e Castro para integrar a chamada “Viagem Filosófica” nas terras coloniais portuguesas, indicado por sugestão da Congregação de Coimbra, como seu “mais qualificado discípulo para tamanha entrepreza” , cabendolhe “aquilatar” as riquezas naturais do Brasil. Virgílio Corrêa Filho registrou com entusiasmo as belezas e as riquezas naturais brasileiras, investigadas por Alexandre Rodrigues Ferreira, referindo-se ao “encanto das paisagens” e à “utilidade inigualável do solo dadivoso”, propício às plantações. Além de cumprir pontualmente com os encargos recebidos durante os nove anos em que permaneceram no Brasil, na Amazônia e Mato Grosso, seu biografado ainda contribuía com críticas e sugestões, que visariam antes de tudo, a “utilidade da Pátria” ou o “crédito da Nação”, como ao denunciar as fraudes cometidas 129 por exportadores inescrupulosos de produtos como algodão, bem como, pela má organização da agricultura e da pecuária. Para ele, Alexandre Rodrigues Alves possuía um “incoercível sentimento patriótico”, além de um “amor entranhado às pesquisas”. Além de contribuir para o conhecimento dos lugares visitados nos tempos coloniais, esta biografia traz, sem dúvida, o oculto de um personagem modelar Outra biografia que lhe garantiu reconhecimento foi Augusto Leverger - O Bretão Cuiabanizado, escrita em 1941. É interessante mencionar que Virgílio Corrêa Filho mantinha correspondência com familiares do biografado, residentes em Paris, mesmo sem conhecê-los pessoalmente. Numa destas cartas, declarou que o epíteto “Bretão Cuiabanizado”, fora criado por ele, tendo recebido aceitação geral. Este representaria, portanto, o “forasteiro”, que através, especialmente da “parentela”, agregou-se ao projeto de construção de uma identidade mato-grossense de “arrojada bravura”. O espírito que perpassa as biografias de Virgílio Corrêa Filho, de um modo geral, é, portanto, de imortalização dos “homens notáveis”, os “vultos cérebres do passado”, que não se intimidam diante de qualquer adversidade, capazes de realizar “Sacrifício Inigualável” e “Ato de Bravura” para o perfeito cumprimento dos deveres, como teria feito Leverger. Nesta biografia, relatou os principais acontecimentos que marcaram a permanência de Leverger em Mato Grosso, de 1830 até sua morte, em 1880, período em que “portou-se com a mesma habilidade de marujo afeito a navegar pelos mares revoltosos”, reportando-se às experiências, herdadas do pai, de “aventureiro do mar”. Quando leverger chegou a Mato Grosso a Bacia do Prata já seria, então, “o palco movimentado” em que ocorriam as lutas movidas pelas questões de fronteira entre o Brasil e as províncias platinas, tema sempre caro a Virgílio Corrêa Filho. Além da contextualização histórica que desenvolveu neste trabalho biográfico. Virgílio Corrêa Filho, apoiou-se em fontes documentais que constituem indicações importantes para os pesquisadores, como, por exemplo, vários ofícios presidenciais, correspondências, memórias e obras de Augusto Leverger, como: Apontamentos Cronológicos da Província de Mato Grosso; Diário de Reconhecimento do Rio Paraguai, desde a cidade de Assunção, até o rio Paraná; Roteiro da Navegação do Rio Paraguai, desde a foz do São Lourenço até o Paraná; Roteiro da navegação do rio Paraguai, desde a foz do Sepotuba até à do São Lourenço, entre outras, publicadas pelo Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso/IHGMT e pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro/IHGB. Joaquim Murtinho, outra biografia em que exaltou mais um personagem ilustre. Joaquim Murtinho (Cuiabá/ 1848 – Rio de Janeiro/ 1911) projetou-se na 130 política nacional como Ministro das Finanças no governo de Campos Sales, Virgílio Corrêa Filho elaborou esta biografia para comemorar o centenário do seu nascimento. Traço marcante do conjunto de sua obra é o fato de tê-la elaborado sempre buscando no passado os acontecimentos que pudessem colaborar para a montagem do quadro onde deveriam se desenrolar os fatos e a trama dos personagens na história que se propunha a construir. Joaquim Duarte Murtinho teria recebido este nome em homenagem ao avô materno, o sargendo-mór português Joaquim Duarte Pinheiro, vítima das violências da Rusga em 1834. Tendo estudado até os treze anos no Seminário Episcopal de Cuiabá, seguiu para o Rio de Janeiro com os irmãos, em 1861, para prosseguir os estudos, como era comum, naquela época, entre as famílias locais de maior poder econômico. Outra atividade de Joaquim Murtinho, comentada por Virgílio Corrêa Filho, estaria ligada à Companhia Mate Laranjeira, empresa que desenvolvia a indústria ervateira em Mato Grosso. Informou que esta empresa, “nada mais seria que simples ramo das atividades comerciais do estabelecimento de crédito”, que Joaquim Murtinho dirigia, ou seja, o Banco Rio e Mato Grosso. O Dr. Antônio Corrêa da Costa, secretário do governo em Mato Grosso na gestão de Antônio Maria Coelho, teria iniciado a empresa, por orientação de Joaquim Murtinho, na fazenda Três Barras, “à margem esquerda do Rio Paraguai, onde abriu o porto, a que em homenagem ao seu mestre e amigo, deu o nome de Porto Murtinho”. Neste local fora estabelecida a sede da Empresa Mate Laranjeira, que antes ficava em Concepción, vila do Paraguai. Era representante de Joaquim Murtinho, o seu irmão Francisco, que através de contratos com o governo de Mato Grosso, para a “expansão da área e do prazo” para os investimentos, desenvolveu a empresa até torná-la um “verdadeiro Estado no Estado”. Tomaz Laranjeira adquiriu ao seu acervo, posteriormente. Algumas cidades foram fundadas a partir da Mate Laranjeira, tais como: Porto Murtinho, Campanário, além do implemento da população de Bela Vista e Ponta Porá. Fora construída, também, a primeira via férrea de Mato Grosso, ligando Porto Murtinho a São Roque, para facilitar o transporte do mate. Como médico do Marechal Deodoro, Joaquim Murtinho teria exercido significativa influência para a nomeação do primeiro governador de Mato Grosso, Antonio Maria Coelho, e do seu secretário, Antonio Corrêa da Costa, seu ex-aluno na Escola Politécnica. Os partidos políticos mato-grossenses encontravam-se ainda “desmantelados”, segundo Virgílio Corrêa Filho, pois, teriam recebido de surpresa a notícia da mudança do regime federal. 131 Em 1891, Manuel José Murtinho assumiu a presidência do Estado, enquanto Joaquim Murtinho desempenhava o seu papel de senador da República, continuando a residir, portanto, no Rio de Janeiro. Joaquim Murtinho fora nomeado, então, para o Ministério da Indústria Viação e Obras Públicas, em 1896, durante o governo interino de Manuel Vitorino, “de exaltação patriótica”, vice de prudente de Morais. Na presidência de Campos Sales, este mesmo iniciou o seu governo nomeando para Ministro da Fazenda Joaquim Murtinho. Como uma das primeiras medidas no ministério, “elevou o imposto de consumo à categoria de eficiente fator de aumento da receita da União”. Sua missão seria “reabilitar o Brasil em suas finanças”, daí a organização de um esquema fiscal mediante decretos especiais. As práticas financeiras de Joaquim Murtinho como a criação e aumento de impostos, a deflação, entre outras, exigiam sacrifícios da população, fato este muito explorado pela imprensa de oposição, segundo Virgílio Corrêa Filho. Assim, Joaquim Murtinho teria visto “crescer contra o seu nome a transbordante maré de injúrias e calúnias”. Novamente servindo-se, com certeza, da metodologia de Plutarco, Virgílio Corrêa Filho comparou Joaquim Murtinho a Floriano Peixoto. Este, “consolidou a República, dominando insurreições freqüentes”. A tendência pragmática em evidência no trabalho de Virgílio Corrêa Filho, no sentido de ressaltar em cada personagem biografado qualidades exemplares, não desmerece a hipótese de que são as suas biografias destinadas à “inteligência histórica”. Com certeza, elas trazem um acervo de informações diversas que, embora mereçam ser devidamente dimensionadas, são importantes para o conhecimento de uma época determinada da história do Brasil. Seu êxito como escritor e historiador teve início com a obra Mato Grosso. Expressão do momento histórico de sua produção, é representativa do sentimento patriótico que envolvia os mato-grossenses no seu bicentenário, sentimento este aguçado pela proximidade da comemoração do centenário da Independência do Brasil. Representativa dos seus anseios geopolíticos, a obra As Raias de mato Grosso, já citada, constituiu-se de quatro volumes consagrados ao estudo da “fixação” dos limites do estado, além de registrar a memória de seus “homens ilustres”, como Antônio Corrêa da Costa, que teria esboçado o plano inicial do primeiro volume, tendo-lhe dado, portanto, origem, sendo, depois, completada por Virgílio Corrêa Filho. As mesmas hipóteses evidenciadas nas obras de Virgílio Corrêa Filho até aqui analisadas, também podem ser observados em História de Mato Grosso, escrita em 1959 e publicada em 1969, atualizada e ampliada, contendo 741 páginas. 132 Nessa publicação é possível perceber que Virgílio Corrêa Filho manteve a mesma perspectiva histórica da identidade mato-grossense preconizada por ele, já observada em obras anteriores, insistindo, por exemplo, na origem bandeirante de Cuiabá, então capital de Mato Grosso. O orgulho da descendência bandeirante se percebe em muitos trechos, de forma bastante explícita. É possível, também, observar nesta obra, a proposição da idéia de isolamento em que se encontra localizado seu estado natal, especialmente a capital, “a mais de quinhentas léguas do litoral atlântico”, o que, certamente, viria reforçar sua tese sobre a necessidade, da implementação de vias de comunicação, como as ferrovias, visando a ligação do chamado “sertão” com as regiões mais desenvolvidas do país, ou seja, com o sudeste. Na defesa dos seus ideais geopolíticos, acabou por colaborar com esta perspectiva que se tornou, durante muito tempo, recorrente na historiografia matogrossense, isto é, a máxima do isolamento que teria marcado o estado de Mato Grosso. Enfatizou a recomendação sobre a importância da “imitação” do currículo das escolas dos países mais adiantados para possibilitar o “progresso” do Brasil. Interessante ressaltar o fato de que Virgílio Corrêa Filho construiu um painel com os programas escolares para exemplificar a diferença do conteúdo do ensino de “história do Brasil” desenvolvido em alguns estados brasileiros. É importante observar que sua intenção, acompanhando o momento histórico vivido, tido como populista, era demonstrar que havia liberdade para a elaboração dos programas, porém, desde que se observassem uma diretriz que enfocasse sempre os “imperativos da unidade nacional”. CONSIDERAÇÕES FINAIS Entendo que a contribuição de Virgílio Corrêa Filho para a história deve ser melhor dimensionada, considerando-se o pioneirismo de autores que, como ele, sensibilizaram-se e providenciaram a proteção, a conservação e a organização de documentos valiosos, acervos imprescindíveis para a construção do conhecimento. É tarefa do historiador aproveitar esse legado cultural atendo-se para as questões contemporâneas, fazendo avançar o conhecimento histórico a partir das novas necessidades que se apresentam a fim de compreender melhor o passado e, portanto, dar condições para que novos paradigmas venham propiciar meios mais eficazes para a investigação científica. BIBLIOGRAFIA 133 TRINDADE, Vilma E. Política, História e Memória em Mato Grosso: Virgílio Corrêa Filho. Campo Grande: Editora UFMS. 134 ENTREVISTAS 135 PEDRO PEDROSSIAN 36 A história de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul tem um antes e um depois. Os três governos do engenheiro Pedro Pedrossian, que se elegeu governador do velho Mato Grosso aos 3l anos de idade, em plena efervescência do regime ditatorial e que se tornaria, ao longo do tempo, na mais importante liderança política do Mato Grosso e, depois, do Mato Grosso do Sul, sua opção de domicílio eleitoral, com a divisão Estado, em 1977. Se tivesse optado por Mato Grosso, não seria diferente, pois basta que se pronuncie este nome em qualquer roda de cafezinho, numa praça ao lado do velho Palácio Alencastro, no centro de Cuiabá, ou numa roda de cerveja com peixe frito num barzinho da ponte do rio Coxipó, que ele é unanimemente reconhecido como líder inconteste de todos os mato-grossenses, com ou sem divisão. Governador em três ocasiões e Senador da República, Pedro Pedrossian, hoje, aos 71anos, mata saudade dos tempos de poder contemplando grandes painéis com fotografias das principais obras que edificou, no último andar de um prédio que nem é dos mais sofisticados, na área nobre de Campo Grande, onde vive com a esposa, dona Maria Aparecida, sempre rodeado por filhos e netos e, de vez em quando, recebendo visitas de um restrito número de amigos. Mesmo quando estava no auge do poder, Pedrossian sempre foi de poucos amigos e avesso a conversas que não fossem lá muito interessantes. É conhecida a história de um deputado que teve que voltar do portão da famosa fazenda Petrópolis, em Miranda, onde o governador descansava num final de semana, pois não admitia ser importunado com conversas sobre política ou de governo quando estava no aconchego familiar. Mas há quem garanta que ele aproveitava muito pouco esses momentos com a família, pois sempre que retornava desse aconchego trazia um grande projeto debaixo de braço. Mesmo quando governava, jamais abandonou a prancheta de engenheiro à qual ainda recorre mesmo nestes tempos de potentes computadores com telas de plasma ou cristal líquido, como se tivesse ainda algum grande projeto em mente. Pedro Pedrossian foi um desbravador, o tocador das grandes obras, mas não gosta de ser reconhecido desta forma. Ele diz que realizou programas e implantou projetos. Foi ele quem criou as primeiras Universidades, os linhões de energia elétrica, os primeiros conjuntos habitacionais, as rodovias que interligaram as regiões produtoras dos dois estados, os estádios de futebol, mas foi também e, muito provavelmente, o mais polêmico de todos. Dizia-se um forjador de lideranças, mas não conseguiu deixar um sucessor na política estadual e reclamava sempre que seus * Entrevista publicada 11 de Outubro de 2005 e disponível em: http://www.douradosnews.com.br Acesso em 20/05/2006. Agradecimentos à acadêmica Eliza Castagnetti pela garimpagem da entrevista. 136 aliados não entendiam sua política de administrar de divergências, como aconteceu nas eleições de 1982, em Dourados, quando lançou José Elias como candidato a governador, mas apoiou, na base, a candidatura de Braz Melo, que concorria com Luiz Antonio Gonçalves, o candidato apoiado por José Elias. Quando o Estado foi dividido, Pedro Pedrossian comprou o terno para tomar posse como primeiro governador, achando que seria nomeado pelo presidente Geisel. Mendes Canale, primeiro secretário do Senado à época, barrou essa pretensão. Veio Harry Amorim. Foi derrubado por Pedrossian, que nomeou Marcelo Miranda, que também foi derrubado pelo próprio Pedro, que acabou assumindo o governo. Nesta entrevista ao jornal folha de dourados - e republicada hoje pelo Dourados News em homenagem ao aniversário da criação do novo Estado - o exgovernador admite a soberba que o levou a perder duas eleições, mas diz que não perdeu, que apenas não as ganhou, o que é mais grave, segundo ele, admitindo que não soube ler o sentimento popular, mas critica também a arrogância e a soberba do PT, afirmando que acabou o sonho petista de implantar uma ditadura partidária como qualquer outro regime de exceção. E, pela primeira vez, fala da grande obra que faltou construir em seus três governos. O movimento divisionista, que culminou com a criação do Mato Grosso do Sul, deu-se em razão da argumentação histórica de que o Sul sustentava o Norte, que os cuiabanos eram indolentes, que não produziam, essas coisas. Veio a divisão e parece que o tiro saiu pela culatra, o Mato Grosso explodiu em desenvolvimento e as coisas por aqui não se alteraram tanto. Qual sua avaliação desses 28 anos? Em primeiro lugar, não concordo com a premissa do jornalista de que o motivo da criação do Estado de Mato Grosso do Sul se embase na “razão da argumentação histórica de que o Sul sustentava o Norte” (sic). Este não é um bom argumento, e muito menos é histórico. Considero esse um conceito reducionista e, permita-me, preconceituoso, também ao se referir à indolência do mato-grossense. A secessão mato-grossense dá-se por razões estratégicas geopolíticas, administrativas, econômicas e culturais. Sequer o ato justifica-se por fatos meramente históricos ou geográficos, isoladamente. Foi produto de muita prospecção, avaliação e de estudos, depois ajustados aos interesses do sistema que detinha o poder e medidas todas as conseqüências do ato e do momento. A rigor, a secção dá-se pela culminância de diversos fatores embricados. Em um determinado instante histórico, eles se ajustam numa acomodação das partes, 137 para a formação de uma só corpo, ou razão, ou justificativa, ou motivo homogêneo que favoreceu a culminância de um processo secular. É conseqüência, portanto, da soma de várias partes de um mesmo conjunto, de uma mesma unidade. Apenas considero que o governo militar acreditou que todos esses fatores estavam realmente coesos e prontos, como os átomos de uma mesma molécula, e que realmente era aquele o melhor momento para se executar essa medida. Tentar explicar a criação de MS tomando-se por base apenas uma das complexas razões inter-relacionadas é comprometer o todo, tentando se valorizar uma parte. Essa atitude provoca sistematicamente uma visão quando não cega, míope ou estrábica do cenário mais amplo que é necessário se ver e se conhecer para uma interpretação mais clara e menos nebulosa do fenômeno desse histórico como um todo. Permita-me discordar – pelas mesmas razões de reducionismo ou de simplismo preconceituoso e perigoso – da segunda parte da pergunta. Não creio que Mato Grosso tenha explodido e Mato Grosso do Sul tenha se reduzido a uma lenta caminhada. Para a História, 28 anos significam tanto quanto um grão de areia para, apenas, um pedacinho do leito do rio Dourado, como exemplo. MS e MT são estados díspares; têm suas idiossincrasias, suas peculiaridades e particularidades – tanto que foram separados – e, portanto, pertencem a processos diferentes de desenvolvimento. Medir e comparar esses processos é misturar ou tentar fazer com que o óleo e a água deixem de ser imiscíveis e se combinem. Acredito, sim, que ambos têm vocações e aptidões próprias e diversas. Mato Grosso do Sul por razões geoestratégicas é mais voltado à adaptação e evolução dos seus setores secundário e terciário da economia; enquanto Mato Grosso é possuidor de fortes tendências a sustentabilidade econômica baseada nas atividades primária e secundária – nas ordens de valores aqui colocadas. À medida que agreguem valor às commodities produzidas, como exige a moderna economia, ambos explodirão, para usar um termo do jornalista. Mas acredito que MS tem maiores possibilidades e está mais apto, até por razão geoestratégica, de verticalizar a sua produção primária. Importante que se perceba que os processos de adaptação aos seus potenciais não são os mesmos. Como resultado, os tempos de resultados também são diferentes. Mas ambos cumprem com extraordinária capacidade de futuro os seus papéis nos cenários de desenvolvimento nacional e mundial. Serão dois notáveis estados, muito eficientes e competitivos, independente dos governos que possam ter. Disso, não duvido. 138 Há de se ler esse momento com uma aguda visão de futuro. O que vejo é a formação de uma classe empresarial atualizada, informada, com domínio da ciência e de tecnologias específicas, nas duas unidades. Antevejo um amanhã brilhante. Avizinha-se o tempo de colher, porque sempre acreditei que tudo tem o seu tempo. O Mato Grosso produziu também novas lideranças políticas, aqui o deputado Londres Machado ainda reina absoluto. Sente-se culpado por isso? Em razão de tudo o que afirmei, reitero meu desejo que olhemos a realidade de acordo com as características, o momento e as destinações de cada Estado. Nada acontece gratuitamente na História. Tudo é resultado de uma combinação de fatores. Se, em algum momento, em algum lugar do mundo, desponta alguma liderança realmente autêntica – reforço o autêntica – razões existem para esse destaque. Isso nada tem de profecia, mas de determinismo histórico. Quanto a sua permanência é outra questão da qual cuidará a própria História. Não vejo razões, de quaisquer naturezas, para que Mato Grosso produza lideranças que Mato Grosso do Sul não possa também produzir. Não há impeditivos explícitos para esse fenômeno. É só questão de tempo e de oportunidade. Mato Grosso do Sul tem belos quadros políticos a serem ainda revelados. Sinto e vejo claramente esse potencial em nossa juventude. Quanto ao deputado Londres Machado, o considero um político de seu tempo. Conciliador e com extrema capacidade de liderar interesses dispersos. É craque na solução de contraditórios e de superar situações conflitantes. É um talento que a História, certamente, irá destacar. Devo confessar que não consigo observar um político que deu certo sem que busque, imediatamente, as lições que fizeram dele um ator permanente por mais que variem os cenários. Sempre que fiz esse exercício resultou em grandes contribuições ao meu entendimento do que seja, realmente, a Política. Londres é um exemplo. Dispo-me de todos os ranços e me limpo de todas as teias de aranha, dos preconceitos, dos pruridos ou da intolerância para avaliar um político, especialmente, da estatura e importância do Londres. Olho dessa maneira, acima dos muros partidaristas ou das cores ideológicas. Sempre procuro conhecer, com realismo e dessa maneira pragmática, tanto os meus companheiros como os adversários de momento. Ao meu ver, esse metido sempre deu certo para mim. Sua convivência com a classe política nunca foi das mais tranqüilas... O Sr. acha que os políticos se intimidavam diante de sua liderança ou não tinham ritmo para lhe acompanhar? 139 Interessante como a pergunta do jornalista já vem acompanhada de uma resposta insinuada. Não vejo o porquê de meu relacionamento com a classe política tenha sido intranqüila. Evidentemente, a política executada na prática de seu dia-a-dia envolve interesses de setores da sociedade aos quais determinado partido está ligado ou é dissonante, o que comumente causa entrechoques. Mas, acima dos interesses de grupos ou de corporações, sempre coloquei os interesses do Estado ou do País. Mais ainda: os interesses da maioria. Fui intransigente nesse princípio. Trouxe sempre comigo esse conceito com irritante coerência. Jamais abri mão dele. Nunca levei à sério muitos políticos bissextos, que faziam uma política de campanário, de conchavos e de barganhas. Todos os que me conheceram sempre souberam dessa minha disposição. Jamais negociei com mercadores. Os que se incluíram nessa conceituação, evidentemente se afastaram de mim, quando não, me detrataram. Portanto é possível que vários deles tenham chorado por me conhecer. Como o choro é livre, jamais os chamei para consolá-los. Talvez muitos tenham jogado pedra em mim. Mas acima de tudo, respeitei os retos e honrados. Levei em consideração os sérios, com autoridade moral, os políticos com princípios e coerentes aos seus princípios – fossem divergentes ou convergentes dos meus. Desses, com certeza, recebi o mesmo respeito que a eles dediquei. Com o governador Zeca do PT já em fim de mandato, quem o Sr. projeta como liderança em ascensão? O surgimento de novas lideranças independe de mandatos. Por seu lado, o José Orcírio termina sua gestão, mas creio que irá prosseguir sua biografia política com outro mandato eletivo, provavelmente majoritário, imagino eu. Portanto, não é ele quem abre espaço para novo nome, ele simplesmente vai ocupar outro. As précandidaturas postas para ocupar o lugar dele são nomes já conhecidos e sedimentados. Todos em busca de uma consolidação, o que uma eventual derrota nas urnas não os impedirá, entretanto, de buscar novas oportunidades. São novos em idade e futurosos. O Sr. acha que o ex-prefeito André Puccinelli já pode ir guardando o dinheiro para comprar o terno de posse? 140 Antigamente se dizia que barriga de mulher grávida, cabeça de juiz e urnas só se pode contar quando são abertas. Ou como gostam de dizer os locutores de rádio, em delicioso óbvio: o jogo só acaba quando termina. A extraordinária dinâmica da política pode caminhar por diversas trilhas, muitas imprevisíveis. Hoje, o cenário coloca o André como bastante bem cotado para ocupar o lugar do Zeca. Amanhã, não saberia dizer qual formato de bichinho a nuvem da política tomará. No discurso quando lhe concedeu o título de cidadão douradense o então vereador Raufi Marques disse que para onde se olhe, em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, se vê uma obra sua. O Sr. se considera mesmo o maior governador de todos os tempos? Não posso me considerar o melhor Governador de todos os tempos. Primeiro, não sei exatamente a qual dos estados o Sr. se refere. Entretanto, tenho certeza que fui o governador, em ambos os estados, como a maior visão de futuro. Fui o que sinalizou com maior clareza para os caminhos do porvir. Esse é o nó górdio de meus três Governos: a falta de entendimento claro dos marcos de futuro que finquei nos solos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Alguns se referem a mim como um fazedor, um tocador de obras, um realizador. Ledo engano. Jamais construí o que não fosse um sinal, uma marca para que dali se projetasse para o grande salto no tempo. Essa é a grande diferença que gostaria que todos entendessem, não fui um construtor na acepção comum da palavra. As realizações promovidas em meus governos eram apenas plataformas alavancadoras de futuro. Não fiz obras, realizei programas e projetos. Para um entendimento aprofundado desse conceito, tomemos, por exemplo, as universidades. Instalei pólos de saber e de conhecimento para a formação de massa crítica e de consciências capazes de romper com o atraso, o marasmo, o imobilismo e, ao mesmo tempo, em que eu edificava um centro formador de quadros capazes de atender, a um só tempo, à necessidade regional de profissionais qualificados e de não permitir que nossos talentos, nossas inteligências ou nosso próprio futuro fossem embora para, quem sabe, numa mais voltarem. Realmente, exportar esses valores era lamentável, imperdoável, mesmo. Esse, portanto é o papel da universidade. Não a vejo em sua concretude, mas em seu conceito e proposta de futuro que contém. O Sr. construiu universidades, preparou os dois estados para o futuro e depois perdeu duas eleições importantes. Considera-se traído, a população 141 não soube fazer a leitura de seu tempo ou admite que houve equívocos em seus projetos? Jamais. A população é sábia. Ela compreende a realidade e muitas vezes tem uma melhor leitura dela que nós, governantes enclausurados em redomas de carpetes e refrescados pelo ar condicionado. Não perdi eleições, apenas não as ganhei, o que é bastante diferente e, talvez, mais grave. Explico. Não soube, naquelas oportunidades, ler o sentimento popular. Não soube responder às perguntas do povo e atender às suas demandas mais imediatas. Achei que já as tinha dado. No entanto estava enganado. Talvez tenha sido por presunção que não soube compreender que novas realidades exigem novas mentalidades e novas perguntas e, portanto, novas respostas. Exatamente eu, que sempre preguei e apliquei esse princípio em meus governos e na minha própria vida. O bom político jamais deve achar que tem todas as respostas. Porque, como dizem, quando considera que as tem, vem o povo e muda as perguntas. Neste caso, quem trai quem? Aprendi que são os políticos que traem o povo, exatamente por falta de cotidianizar as suas respostas. E o que é isso, senão alienação política? Tudo bem que o Sr. disse que não fez obras e sim projetos, mas de todas qual a que considera mais importante? futuro. Pelo já dito, as universidades são a síntese de uma filosofia de gestão de Qual a obra que gostaria de fazer e não conseguiu? Antes de terminar o meu terceiro mandato de governador, em Mato Grosso do Sul, tinha a firme decisão de lançar as bases do Centro de Ciência e Tecnologia de Campo Grande. Uma obra voltada para a contemporaneidade. Hoje, não mais se pode entender o desenvolvimento holístico, integrado e sustentável sem a pesquisa, a ciência e a tecnologia. São ferramentas indispensáveis e insubstituíveis da modernidade, da qual sempre fui um enamorado. Estas são os novos instrumentos da prosperidade social, coletiva e individual. Não pude realizar esta obra extraordinária por várias razões, inclusive por não dispor de uma área urbana favorável, como eu desejava naquele momento. O tempo, que é um conceito abstrato, e com o qual me relaciono bem, nessa ocasião foi meu adversário, muito mais que a falta de visão de setores da sociedade, como dos recursos governamentais que não dispunha na oportunidade. 142 Devo assinalar que pela primeira vez, depois que deixei o Governo, estou voltando a esse assunto, que de certa forma dá a mim uma certa sensação de incompletitude – esse é um neologismo criado para descrever o meu sentimento – em minhas administrações. Seus governos sempre foram muito arrojados e de muitas realizações, como o senhor se veria governando sob a égide da lei de responsabilidade fiscal? Sempre mantive a ética como parâmetro de gestão. A lei de Responsabilidade Fiscal por certo me ajudaria muito a governar. Por diversas vezes, o Estado deixou de receber recursos por capricho de meus adversários. E não foram poucas as vezes. Hoje, com a LRF não aconteceria esse viés. Muitos confundem determinação, coragem e ousadia com irresponsabilidade. Somente cabeças que não precisam necessariamente ser muito privilegiadas podem discernir uma coisa de outra coisa. Lamento que esse privilégio tenha, às vezes, se transformado em raridade ou em cinismo. Como co-responsável pela eleição do governo do PT no Estado, como avalia o momento político, diante de tantas denúncias? Creio, numa avaliação mais cautelosa e distante, mesmo porque jamais fui membro do Partido dos Trabalhadores, que essa crise foi muito saudável à vida partidária nacional. Primeiramente, o país decretou a queda do muro de Berlim ideológico brasileiro. A hegemonia intelectual da esquerda do Brasil ruiu, foi abaixo. Mostrou que o PT errou e que não era detentor exclusivo, como quis fazer entender, da moral, da boa fé, dos bons costumes, da ética em termos absolutos. A arrogância e a soberba petista fez o muro ideológico da hegemonia intelectual desabar. No meu caso, como milhões e milhões de brasileiros acreditei na conveniência das propostas programáticas e ideológicas do Partido dos Trabalhadores. Claro que fazendo as devidas e necessárias reservas. Sou um cidadão, uma pessoa comum, portanto não possuo a capacidade onipotente de avaliar sem erros, de concluir sem equívocos. Entretanto, devemos reconhecer que feita a depuração política nacional, os valores pragmáticos petistas terão vicejados e florescidos em uma árvore que precisa de podas, de realimentação, de ser aguada e adubada com os valores do povo brasileiro para poder se refazer e novamente dar bons frutos. 143 Distanciar-se da população e encasterlar-se no poder como em uma redoma, sempre foi um erro político estratégico fatal. E o PT cometeu esse erro que vem culminando em um canibalismo capaz de cortar a própria carne. As razões ainda são nebulosas. A versão do desejo de mexicanizar o país, através da ditadura partidária hegemônica, é bastante aceitável. O sonho petista mergulhou em um romantismo infantil ou em uma infantilidade romântica, que foi rapidamente despertada pela sineta democrática da nacionalidade. O sonho petista acabou. Digo o sonho da ditadura partidária, como qualquer outro regime de exceção, porque o Brasil começa entender e a gostar da democracia. Com tudo isso o Estado está no rumo certo? Tanto Mato Grosso do Sul como Mato Grosso são estados com potenciais extraordinários de desenvolvimento equilibrado. E é importante se assinalar que independe de eventuais governos para que venham adquirir a velocidade ideal de progresso. E entender que essa velocidade é progressiva e não mais constante como há 20 ou dez anos atrás quando a exclusividade da prosperidade estava em mãos governamentais e congressuais. A mundialização está ensinando às forças sociais e empresariais que elas podem ser o dínamo que toca à frente os projetos das comunidades. Agora, o governo é que começa correr atrás dos segmentos produtivos e produtores, a nova energia e força do desenvolvimento político e social, sem enfatizar, claro, o econômico. Aos poucos se inverte a direção da mão do desenvolvimento. O Estado se reduz, se torna o sonhado Estado mínimo dos neoliberais. Transforma-se apenas em regulador, normatizador e fiscalizador. Você pode ou não concordar com esse processo. No entanto, ele é irreversível e inquestionável. Descobrir quais são os impactos físicos, políticos e sociais que possam causar menor dano ao conjunto das pessoas é a tarefa dos democratas e republicanos verdadeiros, universo no qual julgo estar inserido. E o Brasil de Lula? Como nossos MT e MS, o Brasil é um país de um futuro esplendoroso. A hegemonia imperialista e intervencionista americana e européia debilita-se a olhos vistos. A China, a Índia, o Brasil, para falar apenas dos geograficamente maiores, são países que em curto espaço de tempo irão emergir como forças de equilíbrio com as potências dominadoras e exploradoras. A Europa parece ter compreendido isso antes e melhor que os Estados Unidos. A formação de blocos econômicos homogêneos – às vezes nem tanto – é sinal 144 de que a comunidade financeira internacional começa a sentir o impacto do crescimento dos grandes países com uma geografia física e humana fantástica. O Brasil, antes quintal, começa a se mobilizar para ocupar a sala-de-estar. É preciso que se amplie a sala ou que se aceite o aperto que virá pela frente. Pedro Pedrossian. Alguma chance de o eleitor vir apertar esta tecla nas urnas eletrônicas em futuras eleições? Acho que já cumpri com honra e orgulho a minha missão como governante. Sou um soldado suíço, vou para a guerra e, ao terminar, volto para casa, não para o quartel. Como cidadão, é meu dever acompanhar de boa fé as coisas da política e os acontecimentos que dizem respeito à minha vida, à vida da minha família e da minha comunidade. Faço isso como dever de casa e com precisão cirúrgica, diariamente, porque entendo que todo homem e toda mulher somos seres políticos por excelência. Alguma mágoa da política? Nenhuma. A política não erra; muito menos o povo. Somos nós que erramos. 145 PAULO COELHO MACHADO Hidelbrando – Pelas informações disponíveis, sabe-se que Campo Grande é uma das poucas cidades brasileiras que possui a história de seus habitantes e de suas ruas principais. Diante desse seu trabalho agrada-lhe ser chamado de cronista-mor de Campo Grande? Paulo C. Machado – De certa forma, sim. Afinal, são mais de 40 anos de pesquisa da história da cidade de Campo Grande. A história do povo simples, trabalhador, dedicado, que construiu esta cidade e esta Capital. Hidelbrando – Como está concretizada sua pesquisa? Paulo C. Machado- Na série Pelas Ruas de Campo Grande, com cinco livros: A Rua Velha, a atual Rua 26 de Agosto; A Rua Principal, A Rua 14 de Julho; A Rua Barão; A Rua Alegre, A Rua 7 de Setembro e um pouco a Rua Maracaju e as Avenidas, principalmente a Av. Afonso Pena. Hidelbrando – Que tal a aceitação do público? Paulo C. Machado – O povo sempre se entusiasma com sua história, principalmente quando enfoca seus familiares, conhecidos e vizinhos. Foi o que aconteceu. A Rua Velha, o primeiro deles, está esgotado há tempo. Hidelbrando – A Rua Velha tem mais valor que as outras? Paulo C. Machado – Em tese, não. Na prática, acredito que sim pois é o ponto de partida da história de Campo Grande. Tudo necessariamente começa por ela. Hidelbrando – Analisando o início de Campo Grande, seus valores e anseios, é possível concluir sobre os princípios que nortearam a identidade do povoado? Paulo C. Machado – Muito trabalho e muito amor à terra são os segredos do desenvolvimento dessa cidade. Hidelbrando – Sendo um grande advogado, de onde veio o gosto pela história? Paulo C. Machado – Nasceu de uma missão do Rotary Club, que pretendia dar à cidade, num de seus aniversários na década de 40, uma publicação que revelasse a sua história. Fui encarregado da pesquisa por ser o mais novo da comissão. Os outros eram o Dr. Nicolau Fragelli e o tabelião Ulisses Serra, escritores já consagrados. 146 Entreguei-me ao trabalho de localizar e entrevistar as pessoas mais antigas da cidade, que me revelaram fatos que anotei em cadernos pois não existiam ainda os gravadores. Hidelbrando – Aí nasceu a paixão pesquisa? Paulo C. Machado – De fato. Apaixonei-me pela investigação que me revela coisas importantes. Pude perceber que pessoas comuns eram tão importantes na formação da cidade, quanto os poderosos. Por isso refiro-me com freqüência a eles em meu trabalho de reconstrução dos fatos que formam a vida de Campo Grande. Hidelbrando – O trabalho da comissão foi publicado? Paulo C. Machado – Não. Sem alternativa, resolvi divulgar o material. Primeiro, no Jornal da Cidade e, depois, no Correio do Estado. E fui relatando os fatos, as ruas, seus moradores. Com isso, senti-me obrigado a ampliar a pesquisa. Hidelbrando – É normal enfrentar dificuldades na pesquisa? Paulo C. Machado – O pesquisador deve ser teimoso, pois encontra sempre dificuldades em seu trabalho. Tenho que recorrer à tradições oral e, por isso, estou constantemente preocupado com a confirmação de outras pessoas, muitas vezes com versões diferentes. Encontrar as pessoas aptas a fornecer as informações é outro obstáculo sério. Hidelbrando – É verdade que certas vez um informante foi interceptado no momento de embarcar no ônibus? Paulo C. Machado – É verdade. Encontrei-o dentro de um ônibus, que partia para Bela Vista, onde morava. Por sorte, houve um atraso na partida, que me proporcionou o tempo necessário à entrevista. Hidelbrando – E sobre sustos e pesquisas? Paulo C. Machado – Sempre há. Os piores sustos ocorrem quando o pesquisador tem uma informação errada e descobre isso depois de publicada, comprometendo sua credibilidade. Quando a surpresas, ás vezes fatos que se tem como certos, pacíficos, de repente a pesquisa demonstra serem falsos. Hidelbrando – Um exemplo. Paulo C. Machado – Aconteceu ao pesquisar a presença dos pioneiros no sítio de Campo Grande. Historiadores conceituados afirmam que o poconeano João 147 Nepomuceno foi a primeira pessoa a fixar-se aqui. No meu livro a Rua Velha mostro o resultado da minha pesquisa que revelou. Ter ele surgido depois de José Antônio Pereira, demonstrando a versão consagrada por Peri Alves Campos e outros que lhe seguiram as pegadas. Hidelbrando – Como agir com os fatos que podem melindrar? Paulo C. Machado – Há pessoas que se melindram quando encontram algumas informações desaírosa a um antepassado. Por isso evito as mais pesadas. Tive alguns casos que me aborreceram. Uma antiga cliente, que até me devia favores e honorários, me procurou para dizer que achou de mau gosto fatos narrados sobre o comportamento do pai dela que, afinal, nada tinha de desabonador, mas davam apenas um tom de humor ao trabalho. Reclamou e saiu de cara fechada. Outros me atacaram, com publicações em jornal pelas referência ao avô, mas não reclamou do epíteto que lhe dei e até pareceu-me satisfeita por me haver lembrado dele. Hidelbrando – Na pesquisa, alguns vultos acabam impressionando o historiador. Cite alguns. Paulo C. Machado – Vários personagens acabaram por impressionar-me. Cito Arlindo de Andrade Gomes, pernambucano, primeiro juiz de direito de Campo Grande, que instalou a comarca em 1911. Em 1922 era prefeito e construiu o Jardim Público, Praça Ari Coelho. Era pessoa de bem, caráter irreprochável.Intelectual, lia muito, boa cultura. Pai de família exemplar. Conversa agradável, amava Campo Grande e a natureza. Sobre ele escrevi uma breve biografia. Outro, Amando de Oliveira, paulista, também amigo de Campo Grande. Foi vereador e presidente da Câmara. Deu muitos exemplos de bravura e bom senso. Repeliu invasão da cidade por forças revoltosas e defendeu o juiz de direito quando o comandante da polícia decretou estado de sítio e quis prender o juiz. Hidelbrando – É verdade que foi o primeiro a ser enterrado no cemitério Santo Antônio? Paulo C. Machado – Veja o que é destino. Amando de Oliveira doou á municipalidade o terreno do cemitério Santo Antônio e foi primeiro a ser sepultado ali, assassinado em 1914. Hidelbrando – Mais algum personagem? 148 Paulo C. Machado – Joaquim Viera de Almeida, cuiabano, o escriba do povoado no final do século passado. Era o mais letrado dos habitantes da época. Escrevia atas de reuniões, oficios, reivindicatórios para o governo e até cartas particulares. Prestou muitos serviços a Campo Grande. Primeiro comerciante e curandeiro. Hidelbrando – Que locais históricos, em Campo Grande, não podiam ter desaparecido e quais devem ser preservados? Paulo C. Machado – Não podiam ter desaparecido o Coreto da Praça Ari Coelho e o relógio da Av. Afonso Pena. Devem ser preservados o Museu da Cidade, sede da fazenda Bálsamo, que pertenceu a Antônio Luís Pereira, filho do fundador, o complexo das construções da Noroeste do Brasil; o obelisco da Av. Afonso Pena; a capela da tia Eva e algumas casas mais antigas do miolo da cidade. Hidelbrando – Há espírito para esta conservação? Paulo C. Machado – Há. Hoje a população foi tomada pela mentalidade conservacionista. Toda gente esá preocupada com a nossa história. Recebo constantemente alunos e professores á procura de informações de fatos históricos. Já perdemos muita coisa que pertencia às nossas tradições. Ainda há o que conservar e reconstruir, o que compete aos agentes políticos. Hidelbrando – Seu pai deixou, no então Mato Grosso, uma história de dignidade, austeridade e retidão de caráter muito bem retratada por Antônio Lopes Lins no trabalho Eduardo Olímpio Machado – o Homem, o Meio, seu Tempo. Como foi Eduardo Machado para o filho Paulo? Paulo C. Machado – Meu pai foi um homem extremamente bondoso. Em casa procurava dar educação correta aos filhos, sem repressões. Apenas conselhos e alguns pitos, sem qualquer castigos físico ou gritos desnecessários. Tratava bem os empregados, protegia-os, não gostava de serviços manuais. Foi juiz de direito e advogado. O pai dele também fora juiz. Essa, talvez, a causa de sua austeridade e espírito de justiça. Não sabia negar favores a quem recorria a ele. Foi, por isso, explorado por muita gente. No fim da vida ( morreu com 93 anos ), ficava na porta da casa distribuindo moedas aos meninos que passavam. Possuía bons amigos, a quem procurava agradar. Tinha muita presença de espírito, bom humor e alegria. 149 Hidelbrando – Sobre seu lado profissional. Como foi trabalhar como advogado? Paulo C. Machado – Meu trabalho de advogado, por mais de 30 anos, sempre foi gratificante. Exerci minha profissão com garra, entusiasmo e dentro dos padrões éticos, sem me preocupar com a remuneração de meus serviços. Estudava cada causa, por banal que fosse. Minha preocupação maior era não errar e produzir trabalhos corretos e estéticos. Não havia lugar para especializações quando iniciei a profissão. Hidelbrando – Reconhecidamente tímido, como administra sua timidez, principalmente no júri? Paulo C. Machado – Sem ser orador, vencendo minha timidez produzi trabalhos no júri, com elevado número de bons resultados, que me proporcionaram fama na advocacia criminal. Estudava bem os processos, pesquisava, procurava informar-me sobre a vida do réu, das testemunhas, da vítima e de tudo que se relacionasse ao caso. Estudava lógica e a doutrina dos doutores, além da jurisprudência. Tinha bom arquivo e um fichário atualizado. Hidelbrando – E como juiz auditor militar? Paulo C. Machado – Fui nomeado para exercer o cargo de juiz auditor da Nona Região Militar, que exerci por mais de 5 anos. Uma grande experiência que me trouxe novos conhecimentos do comportamento humano. Eram inúmeros os processos e minhas decisões foram sempre aceitas pelo Superior Tribunal Militar. Hidelbrando – O senhor foi vereador e secretário de Estado. Gosta da política? Paulo C. Machado – Na política faltava-me entusiasmo para exercer cargos eletivos. Fui eleito vereador duas vezes, pela UDN, e gostava dos debates. O Dr. Fernando Corrêa da Costa era preito e depois governador. Iniciou-me para que continuasse a carreira política, prometendo incluir meu nome na chapa de deputado federal. Recusei terminantemente. Entusiasmei-me sempre pelos movimentos políticos, mas não me seduzia a profissão. Hidelbrando – O senhor fez história? Paulo C. Machado – Não tenho qualquer pretensão. O meu modesto está aí, com o único intuito de ser útil, de registrar a caminhada de nosso povo. Nada mais. 150 Hidelbrando – E sua participação na luta pela criação do Estado de Mato Grosso do Sul? Paulo C. Machado – Devo reconhecer que, desde a década de 40, empenheime na criação do Estado de Mato Grosso do Sul. Quando o presidente Ernesto Geisel acenou com a viabilidade de criar o novo Estado, apressei-me em reativar a Liga Sul Mato Grossense e, com ele, preparar os dados necessários para a Lei Complementar nº 31. Hidelbrando – Por que, na ei, está cria o Estado e não divide o Estado? Paulo C. Machado – É que Mato Grosso do Sul sempre se considerou autônomo. Não poderia aceitar que Mato Grosso fosse dividido. E sim, que ele fosse criado com desmembramento do do território mato grossense. Hidelbrando – E nosso Estado vai melhorar? Paulo C. Machado – Certamente. O Estado está encontrando seu caminho, o seu destino. O povo é trabalhador, decidido. O momento nacional não ajuda muito. Mas vai melhorar. Aí nosso Estado estará entre os maiores e melhores do país. Pode acreditar. Hidelbrando – Qual sua preocupação básica na pesquisa? Paulo C. Machado – A preocupação básica e sempre intensa é evitar que se esfumassem nos desvãos do tempo os sucessos mais caros e importantes deste torrão, adotado como terra natal por todos aqui aportaram. Este trabalho teve como objetivo, resumir em poucas palavras como-se passou a vida de Paulo C. Machado. Passamos por um breve resumo de como ele teve sua vida acadêmica no Rio de Janeiro e sua participação na política do Estado de Mato Grosso do Sul, principalmente referente a criação do novo Estado O trabalho abordou o sonho e as dificuldades que a sociedade Sul Mato Grossense passava para ter uma identidade ou seja a busca de melhores condições de vida, pois era uma parte de do Estado do Mato Grosso esquecida pelas autoridades. A pesquisa abordou na íntegra a visão de Marisa Machado e uma entrevista feita por Hidelbrando Campestrini a Paulo Coelho Machado. O cronista-mor da cidade de Campo Grande foi de extrema importância pois suas obras levou a todos nós a entender-mos como foi a surgimento do comércio e a vinda dos imigrantes para cidade através de uma série de obras com o título “Pelas Ruas de Campo Grande”. 151 O mais importante além da história de Paulo C. Machado, foi verificar que toda sociedade brasileira vivia um período político ditatorial no Brasil.