renúncia de subsídios. necessidade de lei específica

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renúncia de subsídios. necessidade de lei específica
TRIBUNAL DE CONTAS DOS MUNICÍPIOS DO ESTADO DA BAHIA
AJU: ASSESSORIA JURÍDICA
ORIGEM: GABINETE DO CONSELHEIRO PAOLO MARCONI
PROCESSO Nº 08500-15
PARECER Nº 02034-15 (AP Nº 065/15)
EMENTA:
RENÚNCIA DE SUBSÍDIOS.
NECESSIDADE
DE
LEI
ESPECÍFICA.
INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO ART. 37,
INCISO X C/C ART. 39, § 4º DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL.
JURISPRUDÊNCIA
DO
STF.
CONCRETIZAÇÃO
DO PRINCÍPIO DA
SEGURANÇA JURÍDICA E DO “SISTEMA DE
FREIOS E CONTRAPESOS” (CHECKS AND
BALANCES). A importância de lei específica para
fixação, alteração e até mesmo redução de
subsídios além de se enquadrar na moldura
constitucional do art. 37, X c/c art. 39, §4º, e
acompanhar a jurisprudência do STF, visa
oferecer, através da perspectiva do Checks and
Balances, uma solução essencial para que a
convivência entre os poderes se revista de um
mínimo de segurança, indispensável para que se
tenha ordem social , quando na ocorrência de
contrapostos interesses políticos ou até mesmo
diante de divergência entre os produtores do
direito, seja o legislador, seja o administrador,
seja o magistrado, ou quantos possam dizer
autoritativamente o direito, que integram um
sistema de poder político.
Trata-se de TERMO DE OCORRÊNCIA em tramitação nesta Corte de Contas, sob o
protocolo de n.º 08500-15 lavrado em 17.06.2015 pela 2ª DIRETORIA DE CONTROLE
EXTERNO – DCE/3ª DIVISÃO DE CONTROLE EXTERNO - DCOE, em razão da
“determinação contida no Parecer Prévio do Pedido de Reconsideração referente ao
processo de Prestação de Contas TCM nº 08811-13” (fls. 03/08), que sinalizara a “não
apresentação dos processos de pagamento do Vice-Prefeito e secretários” quando da
análise das contas anuais da Prefeitura Municipal de SANTANA, de responsabilidade do
gestor, o Sr. MARCO AURELIO DOS SANTOS CARDOSO.
I – DA TEMPESTIVIDADE DAS RAZÕES DE DEFESA
Regularmente notificado em 24.07.2015, através do Edital nº 220/2015 (fls. 15), ofereceu
o Responsável as suas razões de defesa (fls. 20), acompanhada de
documentação
suplementar (fls. 21/33), ingressando-as no Protocolo Geral deste Órgão sob o nº 1096315, em 10.08.2015, o que revela a sua TEMPESTIVIDADE, atendendo ao permissivo
legal contidos no art. 99 da Resolução TCM n.º 627/02 – Regimento Interno do TCM e
art. 6º da Resolução TCM nº 1225/06.
Por fim, o presente processo fora submetido em 08 de setembro de 2015 para análise
desta Unidade Jurídica, em atendimento à promoção de fls. 48, de lavra do Conselheiro
Paolo Marconi; sendo, por fim, encaminhado o processo a este assessor jurídico pela
Chefia da AJU para a emissão de opinativo jurídico na mesma data supracitada.
Posto o relatório, passemos ao mérito.
II – DAS RAZÕES DE MÉRITO
O relator do processo, em seu despacho ás fls. 48, define os limites jurídicos deste
opinativo, nos seguintes termos:
[…] Para exame da regularidade da renúncia dos subsídios (dezembro/2012) por
parte dos Secretários Municipais, motivada no cumprimento das metas da Lei de
Responsabilidade Fiscal, tendo em vista que não foi apresentado embasamento
legal para o ato, apesar da expressa manifestação dos agentes políticos.
Conforme documentação acostada pela defesa (fls. 25/33), os secretários municipais
renunciaram integralmente, no mês de dezembro/2012, a percepção dos seus subsídios
tendo em vista, conforme supracitado, o atendimento às metas estabelecidas pela Lei de
Responsabilidade Fiscal. Todavia, esta renúncia fora apenas comprovada pela
administração municipal através de “Declaração” subscrita pelos secretários, sem porém
nenhum ato legal que precedesse tal procedimento.
O presente opinativo, portanto, trilhará para a análise do caso em tela à luz das
premissas estatuídas na CARTA DE OUTUBRO.
Ab initio, cabe asseverar o que dispõe a Instrução TCM n° 001/04 (alterada pelas
Instruções TCM n° 001/06, 01/2011 e 01/2012), na direção do mandamento
constitucional previsto no art. 37, X da CARTA DE DIREITOS e do art. 34, § 4° da
Constituição do Estado da Bahia:
I – DA FIXAÇÃO DOS SUBSÍDIOS
2. Os subsídios dos Prefeitos, Vice-Prefeitos, Vereadores e Secretários Municipais
serão obrigatoriamente fixados, em valores absolutos, por Lei de iniciativa da
Câmara Municipal. (grifos nossos)
De plano, portanto, insta acentuar que a legalidade na definição/alteração na
remuneração dos subsídios dos agentes públicos supracitados terá como vetor de
orientação a edição de LEI ESPECÍFICA, instrumento normativo adequado para o fim
acima citado. Assim, portanto, dispõe a CARTA MAGNA:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios
de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art.
39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a
iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na
mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998) (grifo nosso)
Em que pese a renúncia de subsídios não se amolde precisamente nas expressões
constitucionais de “fixação” ou “alteração”, em pese se possa sustentar que a renúncia
seja uma espécie de alteração do modus de definição do subsídio ou até mesmo
alteração deste, a Segurança Jurídica, como corolário legal de sedimentação da
harmonia e equilíbrio das instituições, remete à necessidade de edição de LEI
ESPECÍFICA, e esta tem sido a linha de intelecção do Supremo Tribunal Federal - STF
em inúmeras ocasiões, que se pronunciara acerca do fato, na seguinte direção:
As resoluções da Câmara Distrital não constituem lei em sentido formal, de
modo que vão de encontro ao disposto no texto constitucional, padecendo,
pois, de patente inconstitucionalidade, por violação aos arts. 37, X; 51, IV; e 52,
XIII, da CF.” (ADI 3.306, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 17-3-2011,
Plenário, DJE de 7-6-2011.)
"Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição
o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores
públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X; art.
51, IV; art. 52, XIII. Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto 1, de 5-11-2004,
das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Cautelar deferida."
(ADI 3.369-MC, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 16-12-2004, Plenário, DJ
de 1º-2-2005.) No mesmo sentido: AO 1.420, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento
em 2-8-2011, Primeira Turma, DJE de 22-8-2011; ADI 3.306, Rel. Min. Gilmar
Mendes, julgamento em 17-3-2011, Plenário, DJE de 7-6-2011. (Grifos nossos)
Desta forma, a Corte Constitucional é categórica ao afirmar que “em tema de
remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, mais
notadamente através de lei específica”.
Quanto ao posicionamento da doutrina, esta é majoritária acerca do indispensável
respeito ao PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL; e neste caso releva notar as sempre
precisas lições do PROF. UADI LAMMÊGO BULOS 1:
Agora, tanto a remuneração como o subsídio só podem ser fixados ou alterados
por lei ordinária determinada para esse fim. Excluem-se, pois a possibilidade do
uso de medidas provisórias bem como a adoção de resoluções administrativas.
(grifo nosso)
Retornando, mais uma vez, ao âmbito jurisprudencial, em decisão do Supremo Tribunal
Federal, através da Ministra CARMEN LÚCIA, remetendo à jurisprudência consolidada na
referida Corte, em face de uma possível colisão entre os arts. 29, inciso VI e 37, X,
firmara o seguinte entendimento:
O exame da presente causa evidencia que o acórdão ora impugnado diverge da
diretriz jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na análise da matéria em
referência. Sendo assim, pelas razões expostas, conheço e dou provimento ao
presente recurso extraordinário (CPC, art. 557, § 1º-A), em ordem a julgar
procedente a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio
Grande do Sul (DJ 22.6.2011, grifos nossos). E: RE 440.429/MG, Relator o
1 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 6. ed rev. e atual. - São Paulo:Saraiva, 2011,
p. 1034.
Ministro Ayres Britto, decisão monocrática, DJ 8.2.2010. 7. Na mesma linha foi o
parecer da Procuradoria Geral da República: 2. A questão de fundo está em
saber se é possível a fixação de subsídios dos vereadores mediante
resolução da própria Câmara Municipal, como sustenta a recorrente, ou se há
necessidade de aprovação de lei em sentido estrito. E, bem examinada a
questão, tem-se que a pretensão recursal não merece ser acolhida, pois a
Corte local, ao decidir como decidiu, adotou entendimento que se harmoniza
com a jurisprudência da Suprema Corte a respeito da remuneração de
agentes públicos. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal possui firme
orientação no sentido de submeter à reserva absoluta de lei a matéria relativa
à fixação de remuneração de agentes públicos. A esse respeito, confira-se o
aresto proferido no RE-AgR nº 494.253/SP (Rel. Exma. Sra.Min. Ellen Gracie,
DJe 15.03.2011), assim ementado: 3. Como se vê, a fixação da remuneração
dos vereadores - agentes políticos municipais - deve observar as prescrições
contidas na Carta Magna. E a interpretação sistemática que se faz da
Constituição Federal, a partir da leitura do art. 37, inciso X ,c/c art. 39, § 4º,
leva à conclusão de que é imprescindível lei em sentido estrito para fixar o
subsídio de vereadores.(...) 4. Assim, a despeito de o art. 29, inciso VI, da
CF/88 nada dispor expressamente a respeito da necessidade de lei para o fim
de fixar o subsídio de vereadores, a interpretação conjunta dos arts. 37,
inciso X, e 39, § 4º, da Lei Maior, não permite outra conclusão a não ser a que
reputa indispensável lei em sentido estrito para regular a matéria. Nada há a
prover quanto às alegações da Recorrente. 8. Pelo exposto, nego seguimento a
este recurso extraordinário (art. 557, caput, do Código de Processo Civil e art. 21, §
1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Publique-se. Brasília, 1º
de agosto de 2013. Ministra CÁRMEN LÚCIA. Relatora (grifos nossos)
Logo, a INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA que se faz da Constituição Federal, a partir da
leitura do art. 37, inciso X c/c art. 39, § 4º, esta inclusive utilizada pelo STF, leva à
conclusão de que é imprescindível lei em sentido estrito para fixação, alteração e
até mesmo renúncia de subsídio por parte dos agentes políticos, e no caso
específico da renúncia, a LEI apresenta o cóndão de disciplinar o período/mês da adoção
do procedimento de contenção de despesa, evitando, desta forma, inclusive, demandas
judiciais futuras propostas por tais agentes que poderiam alegar um possível
enriquecimento ilícito da administração, gerando, de outro giro, prejuízo aos cofres
públicos.
Outro aspecto importante é que o Poder Legislativo apreciaria as razões de tal proposta
de renúncia de subsídios, realizada pelo Executivo através de Projeto de Lei,
consolidando, portanto, o “sistema de freio e contrapesos” - Checks and Balances (que se
originara do princípio dos poderes harmônicos e independentes), o qual os atos gerais,
praticados exclusivamente pelo Poder Legislativo, consistentes na emissão de regras
gerais e abstratas, limita o Poder Executivo, que só pode agir mediantes atos especiais,
decorrentes da norma geral; não se podendo olvidar que com o fito de coibir a
exorbitância de qualquer dos poderes de seus limites e competências, ainda dar-se-á a
ação fiscalizadora do Poder Judiciário.
Recorrendo mais uma vez a doutrina, quanto ao supracitado "remédio supremo" 2 aos
desmandos de um determinado Poder, urge ressaltar as lições do Prof. AUGUSTO
ZIMMERMANN:
[…] a separação de poderes e o Checks and Balances seriam perfeitamente
compatível com o Estado democrático, limitando-se o poder, mas garantido-se a
plena liberdade política dos indivíduos e do direito das minorias. Possibilita, de
igual forma, a formação do Estado de Direito, na medida em que ele previne o
abuso governamental submetendo-se governantes e governados ao rule of law,
donde ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de prévia determinação legal...3
A necessidade de LEI ESPECÍFICA, conforme alhures enfrentado, tendo guarida em
sólida jurisprudência do STF, visa a concretização da Democracia, do Princípio da
República, e sobretudo, do Estado Constitucional, que consoante lições de KARL
LOEWENSTEIN4, se distingue da autocracia, e se consubstancia no princípio da
distribuição do poder, que apenas se aperfeiçoa na medida em que vários e
independentes detentores de poder participam da formação da vontade estatal,
submetidos todos a controles; ou seja, para o referido autor, a existência de uma
sociedade estatal baseada na liberdade e na igualdade, consequentemente pluralista, é
correlata do constitucionalismo.
Por fim, cabe asseverar que a importância de LEI ESPECÍFICA para fixação, alteração e
até mesmo redução de subsídios além de se enquadrar à moldura constitucional dos
dispositivos retromencionados, e acompanhar a jurisprudência no seio da Corte
Constitucional - STF, visa, indubitavelmente, oferecer, através da perspectiva do Checks
2 HAMILTON, Alexander; JAY, John e MADISON, James. O Federalista. 2ª Edição. Campinas: Russell
Editores, 2005, p. 72.
3 ZIMMERMANN, Augusto. Teoria Geral do Federalismo Democrático. 2ª Edição. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005.
4 LOEWENSTEIN, Karl. Teoria da la Constitución. Trad: Alfredo Gallego Analbitarte. Barcelona: Editorial
Ariel, 1976.
and Balances, uma solução essencial para que a convivência entre os poderes se revista
de um mínimo de segurança, indispensável para que se faça "ordem social", quando na
ocorrência de contrapostos interesses políticos ou até mesmo diante de divergência entre
os produtores do direito, seja o legislador, seja o administrador, seja o magistrado, ou
quantos possam dizer autoritativamente o direito, que integram um sistema de poder
político.
CONCLUSÃO – a síntese possível e necessária
Em consonância com os fatos e fundamentos jurídicos acima expendidos, e em atenção
à solicitação do ilustre Relator do processo, manifestamo-nos pela necessidade de LEI
ESPECÍFICA para fixação, alteração e renúncia de subsídios de Prefeitos, VicePrefeitos, Vereadores e Secretários Municipais.
Remeto às considerações superiores.
É o parecer.
Em, 29 de setembro de 2015.
ALESSANDRO MACEDO
Assessor Jurídico
AJU/TCM