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Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico RELATÓRIO FINAL DO PROJETO PÓS DOUTORADO CNPQ Modalidade Bolsa: Pós-Doutorado Júnior – PDJ Bolsista: Rita de Cácia Oenning da Silva Endereço: Servidão do Cravo Branco, 259, Campeche, Florianópolis/SC, 88063-522 Endereço eletrônico: [email protected] CPF: 632.460.239-72 Processo: 162725/2011-6 Período inicial: 01/2012 a 11/2012 Prorrogação: 12/2012 a 11/2013 Instituição: Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) Supervisor: Prof. Dr. Rafael José de Menezes Bastos (PPGAS/UFSC) Projeto: Duplos e múltiplos: Crianças e Performances Musicais dos Ameríndios do Vale do Javari nas cidades. Janeiro de 2014 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico RITA DE CÁCIA OENNING DA SILVA SOBRE JABUTIS, JAGUARES E AVATARES: Performances, narrativas e produção fílmica de e sobre crianças ameríndias nas cidades. Relatório de Estágio Pós Doutoral, modalidade Recém Doutor submetido ao Programa de Pós Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina para obtenção do grau de Pós Doutora. Sob a supervisão do Prof. Dr. Rafael José de Menezes Bastos. Florianópolis, Janeiro de 2014. ii Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Oenning da Silva, Rita de Cácia. Sobre Jabutis, Jaguares, e Avatares: Performance e narrativas de e sobre crianças ameríndias nas cidades. Relatório Final de Estágio Pós-Doutoral. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina: Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, 2014. Resumo O presente Relatório Sobre Jabutis, Jaguares e Avatares: Performances e narrativas de e sobre crianças ameríndias nas cidades, apresenta os resultados do desenvolvimento do projeto Duplos e múltiplos: Crianças e Performances Musicais dos Ameríndios do Vale do Javari nas Cidades com bolsa concedida pelo CNPq para Projeto Pós-Doutorado Júnior – PDJ, Processo número 162725/2011-6, vigência de 11/01/2012 a 30/11/2013. O projeto foi realizado na UFSC, junto ao grupo do Núcleo de Pesquisa “Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe” – MUSA – com uma parte na Universidade da Califórnia Los Angeles – UCLA com o professor Antony Seeger– sob a supervisão geral do Professor Doutor Rafael José de Menezes Bastos. O relatório contém Apresentação, Resumo e objetivos do Projeto de pesquisa, Descrição das atividades realizadas e Resultados da Pesquisa nos dois anos do pós doutoramento. Palavras chave: etnologia indígena, antropologia da arte, narrativas e performances, crianças indígenas, noroeste amazônico, produção da pessoa. Florianópolis, Janeiro de 2014. iii Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico SUMÁRIO APRESENTAÇÃO 01 Apresentação do projeto, com Resumo e Objetivos da pesquisa 02 1. INTRODUÇÃO 03 2. ATIVIDADES REALIZADAS E RESULTADOS DA PESQUISA 10 2.1. Realização de pesquisa teórica, sonoro-vídeo-bibliográfica 10 2.1.1 Introdução à pesquisa teórica 10 2.1.2 O lugar e a presença da criança na literatura do Noroeste Amazônico 11 2.1.3 Pesquisa áudio-videográfica 28 2.2. Realização de pesquisa etnográfica e videográfica de performances de ameríndio 35 2.3. Produzir material audiovisual dessas performances 45 2.3.1. Filmes gravados em Itacoatiara Mirim – SGC 47 2.3.2. Filmes gravados no Bairro Tiago Montavo – SGC 48 2.3.3.Filmes gravados em Tabocal de Uneiuxi – Santa Isabel do Rio Negro 48 2.4. Escrever artigo etnográfico relacionado ao tópico específico do projeto de pesquisa e publicações 49 2.4.1.Artigos escritos encaminhados para publicação e DVDs produzidos 50 2.4.2. Artigos, livros e DVDs sendo produzidos 53 2.5. Cooperar e participar do Núcleo MUSA 2.5.1. Participação de apresentações de projetos de pesquisa e palestras dos membros do MUSA 2.5.2. Apresentação do Projeto Duplos e Multiplos e dos resultados da pesquisa de Pós-Doc no MUSA 54 55 56 2.6. Participar de seminários ministrados pelo Professor Anthony Seeger na UCLA entre os meses de janeiro e março de 2012 2.6.1. Aulas de Archiving ministrada por Anthony Seeger 2.6.2. Colóquios na UCLA 2.6.3. Participação da 46th Annual Meeting of SEMSCHC 2.6.4. Pesquisa na Biblioteca da UCLA 57 57 57 58 58 2.7. Realizar entrevistas com pesquisadores reconhecidos na área de etnomusicologia e etnologia 2.7.1 Entrevista com Anthony Seeger 2.7.2 Entrevista com Steven Feld 58 59 59 Florianópolis, Janeiro de 2014. iv Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 2.7.3 Entrevista com Suzanne Oakdale 2.7.4 Entrevista com Amanda Minks 2.7.5 Entrevista com Deise Lucy Montardo 2.7.6 Entrevista com Acácio Tadeu Piedade 2.7.7 Entrevista com Júlia Mello Piedade 2.7.8 Entrevista com Judith Seeger e filhas 2.7.9 Entrevista com Rafael José de Menezes Bastos 60 61 62 62 62 63 63 2.8. Fazer contatos e estabelecer diálogos com pesquisadores da antropologia da música e da performance 63 2.9. Participar de seminários, conferências, congressos da área temática 2.9.1. Como ouvinte 2.9.2. Apresentando trabalhos 66 66 69 2.10. Atividade docente 71 2.11 Atividades Realizadas não previstas no projeto 2.11.1. Manter o site do MUSA 2.11.2. Participação da Banca de defesa 2.11.3. Participação de aulas no PPGAS UFSC 2.11.4. Coordenação do projeto A saúde de crianças em áreas rurais no Estado do Amazonas 73 73 73 73 2.12 Dificuldades Encontradas 79 3. AVALIAÇÃO 70 4. BIBLIOGRAFIA 81 74 ANEXOS OBS: Todos os anexos estão com link para acesso online. Em anexo: 1- Artigo: Performance Narrativa, literatura oral e subjetivação entre crianças pequenas. 2- Artigo: Cuidando de crianças: Uma introdução para a pesquisa das práticas amazonenses 3 – Artigo: A produção de Pessoas e os sistemas de saúde no Amazonas. 4 – Artigo: Quem conta um conto aumenta muito mais que um ponto 5 - Capa Encarte do DVD Crianças Amazônicas. Narrativas e performances de (e sobre) crianças indígenas e caboclas do Amazonas. 6 - Entrevista: Revisitando o Brasil e o campo entre os Kisêdjê (Suyás): Conversa com Anthony Seeger. 7 - Entrevista: Sons e Sentidos: Entrevista com Steven Feld 8- Entrevista: Tornando-se outro: Entrevista com Suzanne Oakdale 9 - Cartaz da mostra de filmes feita no Instituto Socioambiental (ISA Rio Negro) Florianópolis, Janeiro de 2014. v Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico APRESENTAÇÃO O presente relatório Sobre Jabutis, Jaguares e Avatares: Performance e narrativas de e sobre crianças ameríndias nas cidades, apresenta os resultados do desenvolvimento do projeto Duplos e múltiplos: Crianças e Performances Musicais dos Ameríndios do Vale do Javari nas Cidades com bolsa concedida pelo CNPq Projeto Pós-Doutorado Júnior. O projeto foi realizado na UFSC, junto ao grupo do Núcleo de Pesquisa “Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe” – MUSA – com uma parte na Universidade da Califórnia Los Angeles – UCLA com o professor Antony Seeger– sob a supervisão geral do Professor Doutor Rafael José de Menezes Bastos. O projeto Duplos e múltiplos visou contribuir para o debate da área Arte, Cosmologia e Filosofia nas Terras Baixas da América do Sul, com ênfase na Amazônia. O objetivo desse projeto foi colocar a pesquisadora em contato com uma nova área de pesquisa, a etnologia brasileira, realizando pesquisa de campo para produzir material etnográfico e videográfico sobre essa pesquisa. Para tanto, o projeto de pesquisa propôs o estudo de performances entre crianças indígenas que vivem na cidade, onde se pretendeu observar como essas performances refletem e produzem a socialidade ameríndia nas cidades, buscando o entendimento de aspectos sóciocosmológicos e políticos manifestos nessas. A pesquisa propôs como viés analítico cruzamentos entre as teorias antropológicas da pessoa, do ritual, do corpo e da performance, onde os eixos complementares são centrais: 1) a antropologia da arte para uma reflexão sobre a artisticidade dos povos indígenas; 2) os estudos de performance, que tem possibilitado uma análise intertextual do rito e das manifestações estéticas com seus enquadres variados; 3) a antropologia audiovisual compartilhada, onde o uso da mídia digital serve não apenas para o registro dos eventos, mas especialmente como meio de salientar a reflexividade das performances, acessando assim as performances em si, mas também o ponto de vista dos performers sobre essas. Tendo crianças indígenas como foco da pesquisa, pretendeu-se pensar o lugar da criança e o modo como essas Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico se posicionam no contexto das performances encontradas no campo, contribuindo para uma etnologia de indígenas nas cidades e seus processos de transformação. Objetivamente a pesquisa propôs: 1) Produzir artigo com os dados etnográficos encontradas nas cidades. 2) Produzir material videográfico que abordem e incluam as performances encontradas em campo. 3) Produzir uma série de entrevistas e filmes dessas, quando possível, que enriqueçam o conhecimento e o debate/pesquisa sobre etnomusicologia e performance, entrevistando importantes referências da área. Os entrevistados foram Anthony Seeger, Steven Feld, Suzanne Oakdale, Amanda Minks, Acácio Piedade, Júlia Mello Piedade, Deise Lucy Montardo, Rafael José de Menezes Bastos. 4) Contribuir para uma abordagem da artisticidade, procurando entender como as performances e seus enquadres (ou gêneros) constroem relações. 5) Pensar o lugar da criança e o modo como essas se posicionam no contexto das performances encontradas no campo. (ver projeto). Florianópolis, Janeiro de 2014. 2 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico INTRODUÇÃO A formação antropológica oferece múltiplos caminhos, podendo um antropólogo se especializar em diversas áreas ou escolher uma área específica para perseguir durante sua formação e atuação. Os caminhos que tracei durante minha formação tanto no mestrado quanto no doutorado estiveram bastante relacionados com uma antropologia na cidade, pensando os agrupamentos urbanos e as relações e subjetividades estabelecidas nesse ambiente. Trabalhando com classes populares com pouco acesso aos recursos do estado (populações que se autodenominam “da periferia”) foquei nos modos de organização social, parentesco, mobilidade social, modos de expressão locais e especialmente na subjetividade que brota naquele meio. As pesquisas buscavam entender como crianças se situam e são situadas nesses contextos e como estão relacionando-se com os múltiplos universos culturais e sociais aos quais têm acesso. Realizando uma antropologia que ouve e observa crianças em diferentes contextos e universos culturais (que hoje vem sendo chamada de antropologia da criança), primeiro em Florianópolis (mestrado em Antropologia Social no PPGAS/UFSC – 1996-1998) estudei crianças consideradas “de rua” e minha observação permitiu entender os fortes laços que essas mantem com suas famílias extensas. Entre a casa e a rua, um universo específico de parentesco e de redes sociais permite que essas crianças circulem entre mundos distintos, de modo pouco observado em contextos com mais recurso financeiro. A rua é um lócus importante na formação da subjetividade do grupo (e não apenas das crianças) e nela as relações se desenrolam tanto quando na casa. A marginalização da rua pela sociedade nacional, por outro lado, cria a falsa ideia de poucos laços familiares. A circulação de crianças, como sugere o trabalho de Cláudia Fonseca (1995) sobre as classes populares de Porto Alegre, uma estratégia usada pelas famílias para a sobrevivência e continuidade do grupo, apresentou-se como uma importante dinâmica entre os grupos estudados em Florianópolis. A dissertação “A porta entreaberta” (Silva 1998) mostrou então os caminhos e as estratégias dessas famílias e dessas crianças para poder viver num universo urbano, com baixíssimos recursos financeiros – recursos sociais que Florianópolis, Janeiro de 2014. 3 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico possibilitam essa circulação das crianças são fundamentais para a continuidade do grupo e representam uma ampliação de laços de parentesco, e não o contrário, uma quebra deles. Para realizar a pesquisa de campo no doutorado (PPGAS/UFSC - 2003-2008) escolhi um grupo de crianças também de classes populares em Recife (PE) que tinham em comum o gosto e um contato com diferentes tipos de manifestações artísticas populares. Nesse meio foi possível perceber que a conexão das crianças com a arte permite a essas uma série de ferramentas para a expressão, mas mais que tudo para a constituição de si enquanto sujeitos sociais. Em Superar no Movimento (2008) mostro como essas crianças, criativas e capazes de inventar cultura, abriam aos seus pais e familiares outras perspectivas sobre trabalho e sobre a vida cotidiana, colocando-os em rituais não comuns nas suas próprias infâncias. Os estudos de performances foram nesse sentido fundamentais para essa análise. No entanto, minha aproximação das populações urbanas me tornaram ciente que a divisão entre urbano e rural não são tão claramente definidas pelos grupos. A antropologia urbana me oferecia ferramentas para entender essas subjetividades, mas embora vivendo nas cidades, uma gama impressionante de aspectos remetiam à vida e à experiência rural, mediada por parentes, especialmente tios e avós, por amigos, e mesmo pelo acesso a bens provenientes dessa área. Portanto, essa foi uma divisão que aprendi a relativizar no trabalho de campo com essas crianças. Chamei de “socialidade estética da periferia” o modo como essas crianças e seus pares se organizavam em relação à cultura Recifense. Corpos e mentes são construídos pela dança, pelas narrativas, pelo andar nas ruas; uma estética que está intimamente conectada com uma ética e com a construção desse sujeito social. Atuando como antropóloga e como professora universitária fiz uma aproximação tímida com a etnologia indígena trabalhando com crianças indígenas em dois contextos: 1) Em 2007 na Colômbia, numa comunidade Saliba, grupo falante da língua Saliba que tem sido pouco estudado. Eles fizeram contato com um ONG que eu prestava assessoria e fizemos diversos filmes curtas na língua sáliba. 2) Em 2009 trabalhei com crianças guaranis no Paraguai, promovendo um curso de produção Florianópolis, Janeiro de 2014. 4 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico audiovisual. Em ambos os casos realizamos filmes sobre o contexto onde viviam, captando narrativas das mesmas, e promovendo uma antropologia visual compartilhada, onde a câmera e o ponto de vista do filme são negociados/compartilhados com as crianças e os seus cuidadores. Esses dois contatos despertaram em mim interesse enorme em poder aprofundar meus estudos nessa área antropológica: a antropologia sobre e com os povos indígenas. A aproximação com a etnologia, uma área importante na antropologia mundial e uma das referências na antropologia brasileira, foi inevitável. O desenvolvimento do projeto de Pós doutoramento Duplos e múltiplos: Crianças e Performances Musicais dos Ameríndios do Vale do Javari nas Cidades, o qual de agora em diante chamarei simplesmente Duplos e Múltiplos, foi uma oportunidade única de me aproximar de crianças indígenas brasileiras. Foi também uma oportunidade de ir a campo em família, envolvendo meu marido e minha filha de pouco mais de 2 anos no processo da pesquisa, o que certamente criou uma dinâmica diferenciada com a população alvo. A presença de ambos em campo trouxe facilidades para criar vínculos com as pessoas, especialmente com as crianças, ao mesmo tempo em que dificultou minha permanência por muito tempo em campo. Foi necessário estabelecer horários específicos para realizar a pesquisa, negociando entre os horários das crianças pesquisadas e os horários que uma criança de dois anos exige, como descanso nas tardes, etc. Embora no projeto do pós-doutorado tenha proposto estudar crianças no Vale do Javari, a pesquisa de campo foi realizada no noroeste amazônico, abrangendo especialmente crianças e cuidadores dos grupos étnicos Baniwa, Curipaco, Nadëb, Tariano, Tucano. O contato com crianças num contexto mais urbanizado no Noroeste Amazônico (São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel do Rio Negro) foi bastante produtivo, colocando a pesquisadora em contato com uma diversidade de modos de vida onde as crianças estão inseridas, ampliando o conhecimento sobre a etnologia amazônica. Pesquisa de campo e a revisão bibliográfica sobre o tema foram dois eixos desse aprofundamento na área etnológica brasileira. A mudança do lócus da pesquisa de campo, abandonando a ideia de ir para o Florianópolis, Janeiro de 2014. 5 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Vale do Javari, se deu por orientação de pesquisadores da área, especialmente por Pedro Cesarino, conhecedor da situação sanitária da região. A região do Vale do Javari vem sendo assolada nos últimos anos por uma grande epidemia de malária, hepatite e tuberculose. Como a proposta da pesquisa era ir a campo com a família, conforme descrito no projeto, fui orientada a proceder a pesquisa noutra área do país, preservando a saúde de minha filha de apenas dois anos de idade. Hepatite, Malária, tuberculose e outras doenças tropicais têm levado rapidamente à óbito crianças e adultos pela escassez de recursos médicos que o Vale do Javari sofre há anos. Essas orientações, de cunho bastante prático, levaram a pesquisar crianças do Noroeste Amazônico, mais especificamente na região de São Gabriel da Cachoeira e em Santa Isabel do Rio Negro. O Noroeste amazônico constitui-se num campo extremamente rico para uma pesquisa de indígenas na cidades, pois São Gabriel da Cachoeira é a cidade mais indígena do Brasil e oferece um universo multilíngue muito complexo. São Gabriel da Cachoeira, município situado no extremo noroeste do Estado do Amazonas, na microrregião da Bacia do Rio Negro, tem limítrofes ao norte com a Colômbia e a Venezuela, ao sul e ao leste com o município de Santa Isabel do Rio Negro e ao sul com Japurá. Boa parte do seu território é abrangido pelo Parque Nacional do Pico da Neblina, além das terras indígenas Alto Rio Negro; Médio Rio Negro I, II e III e Rio Téa. Além de ser considerado ponto estratégico pelo país por causa da sua localização, com uma forte presença militar na cidade, são reconhecidas na região como línguas oficiais além do português, três idiomas indígenas tradicionais falados pela maioria dos habitantes, a saber Nheengatu, Tucano e Baniwa1. Segundo Cristiane Lasmar, pesquisadora da cidade de São Gabriel da Cachoeira, esse é o núcleo populacional mais expressivo do alto Rio Negro, com 15 mil habitantes2, sendo 80% indígenas. Portanto, a pesquisa sonoro-vídeo-bibliográfica se focou em particular na produção sobre a região, sem no entanto fechar-se nela. 1 Lei Municipal 145, de 22 de novembro de 2002. Toda região do município de SGC corresponde a área de 109.184,896 km2, com população de 39.097 habitantes (Dados do IBGE, 2012). 2 Florianópolis, Janeiro de 2014. 6 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico O Município de São Gabriel da Cachoeira é habitado tradicionalmente por 27 etnias (22 presentes no Brasil) que falam idiomas pertencentes a três famílias linguísticas, o Aruak, Macu e Tucano e que se articulam numa complexa rede de trocas. Embora essas etnias têm características particulares, compartilham ou tem como eixo de ligação mitos, aspectos da cultura material, da cosmovisão e da organização social. Partilham por exemplo, o mito da origem e trajetória comum da Cobra Ancestral, que segundo eles concebeu todos estes povos; Também partilham os rituais de oferecimento (dabucuri) e cerimônias com os “cantos dos velhos”, cantos que são semelhantes em toda a área. Por esse mito as hierarquias entre esses grupos são explicados e estabelecidos, inclusive a relação desses com o homem branco. Esse mito estabelece também o vínculo com os lugares onde cada um desses povos foi gerado dentro da área. Os rituais são espaços de troca e de interação entre diferentes grupos e são também um momento de reconexão da vida cotidiana com a ancestralidade. Estudar crianças indígenas nas cidades não teve como proposta separar os campos do conhecimento: a antropologia urbana e a antropologia dos povos indígenas. Ao contrário, buscou entender como estas duas área antropológicas estão se comunicando e como as crianças e seus familiares estão fazendo conexões entre diferentes universos culturais. Muitos grupos indígenas vivem nas cidades e nessa caso essa divisão é artificial. Uma etnologia que descreve comunidades como blocos isolados parecem desprezar os fluxos que existem entre diferentes mundos e seus processos de transformação. Trabalhos sobre indígenas na cidade (Lasmar, 2005; Andrello, 2006; Cesarino, 2008; Santos, 2008, Albuquerque, 2011) apontam a importância de entender os processos de transformação e as permanências que envolvem esse vínculo com o modo de vida dos brancos. Alguns desses trabalhos destacam as mudanças evidentes nos modos de vida, mas vários deles apontam para uma reinvindicação da identidade indígena com mais ênfase. A ida para as cidades tem sido motivada pelo acesso aos sistemas de saúde e o escolar, e essas são estratégias para manter o próprio grupo. No noroeste amazônico essa relação entre comunidades e vilas nas cidades vem sendo feita há séculos. (Andrello, 2006; Wright,1981). Lá estão também seus parentes. Florianópolis, Janeiro de 2014. 7 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Estudar crianças indígenas nas cidades é reconhecer que na cidade ou nas pequenas comunidades, a antropologia se faz na dobra, no confronto, no encontro, no desgaste, no embate – mas também reconhecer capacidades de adaptação, de planejamento do grupo e de transformação, sem deixar de pertencer a um grupo (Lasmar, 2008). Durante o desenvolvimento do projeto Duplos e Múltiplos, nesses quase dois anos de pesquisa e de contatos com a etnologia brasileira, busquei entender a dinâmica da vida de crianças provenientes de agrupamentos indígenas do noroeste amazônico3 ouvindo e vendo suas performances e narrativas, e através delas perceber como essas revelam um imaginário sobre o mundo que lhes cerca. Observar, ouvir crianças, conversar com elas sobre temas variados tem sido um exercício interessante no fazer antropológico. Dois aspectos pareceram importantes de pesquisar: 1) tentar entender que lugar as crianças ocupam na sociedade em que vivem – como a infância e a criança são vistas pelo seu grupo. 2) tentar entender como essas crianças se posicionam dentro da sociedade em que vivem – como argumentam, narram e se constroem como sujeitos nessas comunidades. Como essas performances e narrativas são usadas na produção do sujeitos e da suas subjetividades, não somente revelando aspectos da vida das crianças e de suas sociedade, mas constituindo essas dentro do grupo em que vivem foi um dos eixos da pesquisa. Durante a pesquisa, o encontro com uma diversidade de crianças e seus familiares foi possível, já que a pesquisa se deu em várias comunidades. No primeiro ano estive em contato com crianças de dois no município de São Gabriel da Cachoeira, um deles no Bairro Tiago Montavo, e o outro na comunidade indígena de Itacoatiara Mirim. No segundo ano a pesquisa se estendeu a Santa Isabel do Rio Negro, município vizinho de São Gabriel da Cachoeira. No bairro Tiago Montavo, São Gabriel da Cachoeira, estive com crianças e com uma família Tariano/tucano provenientes da região Bacia do Rio Uaupés, da 3 Mas não necessariamente vivendo aldeados – embora o que é uma aldeia é também algo bastante variável, especialmente no Rio Negro. Florianópolis, Janeiro de 2014. 8 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico cidade de Iauareté. As crianças já tinham nascido na cidade de São Gabriel e eram todas parentes próximas entre si – primos e irmãos da família Araújo. Já em Itacoatiara Mirim estive com um número maior de crianças, mas o predominante do grupo era Baniwa/Curipaco, de famílias provenientes do rio Aiari, da Bacia do Rio Içana. Algumas das crianças tinham nascido nesse local, mas muitas delas tinham migrado junto com a família. A comunidade tem sua própria escola, já que situa-se numa região mais isolada da parte urbana do município. Trabalhei com as crianças da escola, o que incluía uma diversidade de etnias – Curipaco, tucano, Baniwa, tapuia. No segundo ano esse contato na pesquisa de campo se estendeu para um agrupamento um pouco mais isolado, mas ainda em constante contato com a vida nas pequena cidade de Santa Isabel do Rio Negro. Estive especialmente na comunidade Tabocal de Uneiuxi, situada no Rio Uneiuxi, num grupo predominantemente Nadëb, do tronco-linguístico Macu. Esse contato se deu por intermédio de uma pesquisa que fui convidada a participar, que visava entender os modos de cuidados de crianças pequenas nas comunidades de Santa Isabel do Rio Negro. Através desse projeto de pesquisa “A saúde de crianças rurais no Estado de Amazonas”, descrito no item “Atividades não Previstas” desse relatório, tive acesso também à saberes locais sobre cuidados de crianças de Lábrea (Rio Purus) e Atalaia do Norte (Vale do Javari). Embora a pesquisa não tenha sido feita no Vale do Javari como tinha sido proposto no projeto de pesquisa devido as péssimas condições sanitárias do Vale para levar uma criança pequena a campo (nesse caso minha filha, como tinha sido minha proposta), coordenar a pesquisa sobre saúde e cuidados de crianças ribeirinhas do Estado do Amazonas permitiu conhecer um pouco da realidade de crianças naquele Vale. Descrevo a seguir com mais detalhes as Atividades realizadas e os Dados obtidos na pesquisa. Florianópolis, Janeiro de 2014. 9 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 2. ATIVIDADES REALIZADAS E RESULTADOS DA PESQUISA Para cumprir os objetivos do projeto, foram realizadas diversas ações e atividades, que serão descritas a seguir, todas previstas conforme se apresentam enumeradas e em negrito. Com essas atividades os resultados da pesquisa foram se delineando, os quais vou relatar no decorrer desse relatório. 2.1. Realização de pesquisa teórica, sonoro-vídeo-bibliográfica da produção recente em antropologia da arte e da etnologia indígena da região estudada; também aquela que pensa o lugar da crianças em diferentes sociedades. 2.1.1 Introdução à pesquisa Teórica A pesquisa teórica, sonoro-vídeo-bibliográfica da produção em etnologia indígena levou em conta trabalhos antropológicos que enfocam a presença das crianças em temas que envolvam arte, narrativas, produção da pessoa, performances, ritos, produções fílmicas sobre a região amazônica, especialmente do noroeste. Procurei vislumbrar como crianças indígenas vêm sendo abordadas em trabalhos etnográficos sobre povos indígenas, ainda que essas não sejam o foco central dessas produções; também pesquisar como o tema arte e artisticidade vem sendo desenvolvido nos últimos anos naquela região e se há um investimento para entender e registrar os modos de vida das crianças indígenas nas cidades. Uma crescente produção vêm dando atenção ao ponto de vista das crianças, e a arte é dos caminhos para essa abordagem juntamente com temas como educação, jogos, história, noção de pessoa, religião, mitos e ritos, entre outros. Grande parte da pesquisa teórica foi feita no Brasil, em bibliotecas como a da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), mas também na biblioteca da UCLA, Los Angeles, Califórnia (USA), onde a pesquisadora realizou parte do projeto, e na biblioteca da Universidade do Novo México, NM, onde desde 2005 tenho estabelecido vínculos com pesquisadores daquela instituição. O acesso online à artigos trabalhos acadêmicos e Florianópolis, Janeiro de 2014. 10 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico de produções audiovisuais possibilitou investigar o tema em revistas e bancos de dados de filmes e de teses bibliotecas nacionais e internacionais. O acesso online de acervos fílmicos, como o do Núcleo de Antropologia Visual da UFAM (http://www.navi.ufam.edu.br/index.php/acervo) facilitaram a pesquisa de filmes sobre a região do noroeste amazônico. O banco de teses do Centro de Estudos Ameríndios (CESTA/Unicamp) que tem link na Biblioteca Digital da UNICAMP, do Museu Nacional e outros mais, facilitaram a pesquisa de teses e dissertações mais recentes. Do mesmo modo contatos com pesquisadores que estudam etnologia na Amazônia foi fundamental para ampliar a possibilidade dessa revisão. Além dessa revisão que seguirá aqui, textos produzidos durante o desenvolvimento do projeto de pesquisa e anexados nesse relatório, mostram esse contato com bibliografia pesquisada, especialmente aquele que envolve a produção da pessoa e aquele que envolve narrativas e performances. Os textos introdutórios das entrevistas, também em anexo expõem outra parte da revisão no campo da etnomusicologia e da etnologia. Citarei aqui mais que tudo alguns pontos considerados importantes para a pesquisa etnográfica feita nesses dois anos. Embora tenha buscado também a produção sonoro-áudio-bibliográfica sobre crianças e arte no Brasil, um olhar mais minucioso foi dado à produção que ajuda a entender as dinâmicas dos povos onde a pesquisa etnográfica foi realizada, ou seja, o noroeste amazônico. 2.1.2 O lugar e a presença da criança na literatura do Noroeste Amazônico A presença das crianças na literatura referente ao noroeste brasileiro, embora não diretamente enfocando o ponto de vista dessas como tem sugerido a antropologia da criança, se apresenta especialmente em temas como guerra, nascimento, vida cotidiana, redes de troca, rituais (especialmente os de nascimento, nominação e de passagem ao mundo adulto), brincadeiras e educação. Elas, as crianças, estão presentes nem sempre de modo direto, mas são citadas com certa frequência nos trabalhos de alguns pesquisadores, como o de Robin Wright e de Flora Cabalzar. Florianópolis, Janeiro de 2014. 11 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Já num dos primeiros registros sobre os grupos indígenas do noroeste, o livro “Dois anos entre os indígenas”, que se refere à longa viagem pelo Rio Negro e seus afluentes feita pelo etnologista e explorador alemão Theodor Koch-Grunberg, aparecem relatos sobre as crianças e o modo como essas são vistas e cuidadas em algumas das comunidades, entre as várias populações visitadas. Koch-Grunberg já escreve sobre ritos e técnicas corporais que referem-se à produção da pessoa naquele contexto, muito embora não use esse termo. Em vários pontos da sua obra podemos ver fotos e ler a descrição que o viajante faz de situações que envolvem ritos, evitações ou aparatos indígenas próprios para as crianças. Normalmente carregadas junto às mães, as crianças pequenas são amamentadas até aproximadamente 2 anos. O autor descreve objetos fabricados especialmente para bebês, como um pequeno suporte feito de palha que oferece segurança aos que ainda não caminham enquanto seus pais trabalham. Segundo Koch-Grunberg, o nascimento de uma criança é tratado de modo especial, e envolve vários atores, especialmente os pais e parentes de ambas as partes, mas também pajés e rezadores. Benzimentos, prescrições e evitações mostram como a chegada de uma criança na vida de um casal muda a condição do sujeito no grupo. Viajando por um dos afluentes do Rio Negro ele cita: Dois dos meus Umaua, casados mas não tendo filhos, não queriam comer do veado assado, mostrando explicitamente sua forte repugnância, enquanto o terceiro, que já tinha um filhinho, comia com bom apetite. (Koch-Grunberg, 2005: 312) Koch-Grunberg descreve o parto, que nos mostra como era rodeado de cuidados. As observações feitas em campo por Theodor Koch-Grunberg vão ser depois consideradas por inúmeros pesquisas naquele contexto e vão servir de base para uma antropologia da região. O parto realiza-se na maloca ou numa barraca afastada, ou mesmo na mata, com auxilio e presença de todas as mulheres casadas que tem o rosto pintado solenemente de vermelho. Quem corta o cordão umbilical e a mãe do esposo. Ela usa tiririca, um capim cortante. O cordão umbilical e as páreas enterram-se logo, imediatamente. Se há gêmeos, o segundo-nato é morto e enterrado ali mesmo, imediatamente depois do nascimento. Se os gêmeos são de sexos diferentes, matam a menina. Poucas horas depois de um nascimento Florianópolis, Janeiro de 2014. 12 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Namocolfba, o pajé foi para perto da parturiente, que tinha sido isolada numa repartição feita de lascas de paxiúba e folhas de bananeira, e levou consigo todos os apetrechos da pajelança, chocalho, cristais de quartzo etc., colocados num balaio. Lá ele realizou as recitações de defesa, num monótono murmúrio, estando presentes somente a parturiente, seu marido, e os pais dele. A conclusão do resguardo, que sempre se realiza na repartição onde reside o jovem casal, e que durara cinco dias, era acompanhada por usos iguais aos do rio Tiquié. Antes de levarem o recém nascido para o primeiro banho, esvaziaram a casa inteira. Também nós tínhamos que levar toda a nossa bagagem para fora. Somente no dia seguinte foi que um parente próximo - pelo costume, e o irmão do marido - trouxe peixinhos cozidos para a refeição, e com isto estava terminado o tempo de jejum. Oito dias depois do nascimento, os pais preparam uma festa de bebida, em honra do seu recémnascido, e nela se reúne toda a parentela. Nesta ocasião, o avô (o pai do pai) dá o nome à criança. Os meninos quase sempre recebem dois nomes, e as meninas somente um. (Koch-Grunberg, 2005: 312,313) São esses rituais de nascimento e nominação que foram observados ainda por outros pesquisadores do noroeste que servirão de base para uma reflexão sobre os sistemas de organização, parentesco e sobre o xamanismo local. Os Tucanos (ver Jean Jackson, Hugh-Jones) são os que mais foram estudados nesse sentido, mas também existem muitas pesquisas sobre os Baniwa. No artigo “Nomes Secretos e Riqueza Visível: nominação no noroeste Amazônico,” Hugh-Jones (2002) fala que o processo de nominação acompanha os processos de desenvolvimento, de modo que uma pessoa adquire nomes no início da vida e deve despir-se deles no fim. O autor descreve o nascimento de um Makuna (tucano) e sobre esses dados desenvolve inúmeras reflexões importantes. Uma mulher, normalmente, dá à luz nas roças de mandioca em torno da casa; ela é, em geral, assistida por sua sogra ou outra mulher experiente que se torna a “madrinha” (masolio) da criança. Não há homens presentes. O bebê é pintado com tinta preta (wee) e banhado no rio; a mãe, então, retorna à casa onde o rosto e o corpo do recémnascido são ungidos com pintura vermelha (günanya). Antes de sua entrada, os homens removem de dentro dela todos os bens domésticos — itens rituais, armas, bancos, potes e outros aparatos de cozinha etc. — e eles mesmos saem da casa. Um xamã faz então a fumigação desta com cera de abelha incandescente, um ato que marca a separação entre os vivos e o mundo dos espíritos (ver S. Hugh-Jones 1979:186-189). Os pais e a criança ficam então de três a dez dias reclusos juntos, em um compartimento no interior da casa. Durante esse período, as atividades e a dieta de ambos ficam restritas Florianópolis, Janeiro de 2014. 13 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para evitar males à criança; em particular, o pai deve abster-se do trabalho. O fim da reclusão, com seus alimentos e outras restrições, é marcado pelo banho no rio dos pais e da criança, tendo a água sido antes tornada segura através da fumaça (de lenha, tabaco ou cera de abelha) soprada por um xamã, ou um homem ou uma mulher mais velhos. Antes do banho, a mãe e o bebê têm a pele pintada com uma tintura preta (wee), todos os bens domésticos são mais uma vez removidos, os moradores saem e a casa é novamente fumigada com cera incandescente. Uma vez de volta a esta, o bebê é novamente ungido com pintura vermelha. Agora é considerado completamente humano e seus pais podem retomar gradualmente sua dieta e as atividades normais.” (Hugh-Jones, 2002: 52) Segundo o autor (Hugh-Jones, 2002), os grupos tucano mais centrais e ao norte, como os Desana, Cubeo e Tucano, adiam a nominação até que os ossos da criança estejam duros e ela comece a andar e falar, considerando que os nomes são muito “pesados” e potentes para serem portados por bebês pequenos. Ainda segundo o autor, os que vivem na região do Pirá-Paraná e nas redondezas conferem nomes às suas crianças logo após o nascimento; neste caso, a justificativa é que a nominação “transforma e modifica a alma” (üsü wasoase) da criança, dando-lhe força e vitalidade e aumentando suas chances de sobrevivência. E o autor segue sua reflexão sobre o tema da chegada de um novo membro e o significado que tem isso em termos da relação com espíritos de ancestrais. Segundo suas observações: Como a mãe dá à luz na roça, o xamã (kumu), idealmente o parente agnático do pai da criança, submete-se a um processo paralelo, sentando-se em um banco durante horas a fio enquanto sopra encantamentos sobre a pintura vermelha e/ou a cera de abelha (basere, wanore). Em seus pensamentos, ele viaja para a casa de origem do grupo ou casa de transformação (masa yuhiri wii), onde ele localiza a criança em forma de espírito. Consultando os ancestrais (hee büküra), ele também escolhe um nome e um papel ritual para a criança e adivinha seu destino e os perigos que lhe podem ocorrer na vida. Ele, então, acompanha e protege a criança-espírito (üsü) e o nome, enquanto juntos eles se movem gradualmente do mundo espiritual imaterial dos ancestrais para assumir forma material aqui e agora, o bebê como carne e sangue, o nome como pintura vermelha (para meninas) ou cera de abelha (para meninos) aplicadas em seu corpo. O nome é o hee üsü ma, “o caminho da alma ou elo com os ancestrais” e enquanto o xamã sopra, o seu sopro confere vida, um processo de transformação que começa durante o trabalho de parto, mas que só é concluído no final do período de reclusão. A partir deste breve relato, emerge um padrão de nascimento duplo, que é ao mesmo tempo material e espiritual, que acontece tanto na roça como no rio, que vem tanto da mãe quanto do xamã, e que é reduplicado nas sequências paralelas do banho, que estruturam o período de reclusão. (Hugh-Jones, Florianópolis, Janeiro de 2014. 14 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 2002:53) É notório no trabalho de Hugh-Jones que temáticas do corpo, pessoa e substância compõem linhas fundamentais da análise do autor quando fala dos tucanos. O corpo do bebê é formado por substâncias fornecidas por ambos os pais: o sêmen paterno se torna osso e o sangue materno se converte em carne e sangue. Como uma entidade viva, o bebê também tem um coração, pulmões e respiração — todos eles üsü. A linha de sêmen que passa do pai para a criança e a relativa durabilidade dos ossos em relação à carne são importantes idiomas de patrilinearidade tucano. Os instrumentos sagra- dos mostrados aos rapazes na iniciação são, simultaneamente, os ancestrais do clã e os ossos do único ancestral do grupo que adota os iniciandos como filhos (ver S. Hugh-Jones 1977). Sob forma simbólica, esses ritos também envolvem a transmissão de sêmen dos mais velhos para os mais novos (ver S. Hugh-Jones 2001). A vitalidade da criança, üsü, contrapõe-se ao seu nome e espírito — üsü aqui como “alma-nome”, que está sob os cuidados do xamã e não provém do pai, mas da coletividade de ancestrais e, em particular, de um “avô” recentemente falecido. A contribuição de ossos do pai é relativamente durável, o nome do ancestral indiscutivelmente também. Comparando os nomes às flautas sagradas, aos ornamentos plumários e a outros bens, um xamã makuna afirma: “eles são como o sol — não apodrecem” (ver, também, C. Hugh-Jones 1979:134-135). É apenas no final da reclusão, quando o corpo e o espírito da criança, alma-corpo e almanome, estão completamente unidos que ela é considerada completamente humana, um momento marcado tanto pelo banho conjunto dos pais com a criança, como pela queima de mais cera de abelha e por uma nova remoção dos bens domésticos. (Hugh-Jones, 2002:53) Tomando como referência a classificação de E. Viveiros de Castro dos sistemas de nominação ameríndios enquanto continuum do pólo “exonímico” ao pólo “endonímico”, Hugh-Jones (2002) faz uma comparação entre os sistemas de nominação Tucano, Jê e Bororo (2002:46). O autor diz que o sistema tucano combina endonímia e elementos de exonímia a partir de grupos patrilineares que dependem de seus afins para a reprodução, o que o distingue desses outros sistemas (2002:63). Hugh Jones cita uma seção de um mito que forma a base de grande parte do xamanismo envolvendo o parto tucano e que segundo ele, esclarece o padrão de duplo nascimento. Sugere que se a origem material dos bebês está nas mulheres, Florianópolis, Janeiro de 2014. 15 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico sua origem espiritual está no rio, assim como todos os Tucano afirmam uma origem aquática única a partir dos ancestrais saídos da Cobra d’Água. Diz o mito Depois que a mãe de Warimi foi morta pelas onças, ele escapa para o rio, sob a forma de espírito. Ali ele brinca com um grupo de crianças que tramam agarrá-lo. Enterram uma menina na margem arenosa do rio, urinam sobre sua pélvis e se afastam. Enquanto Warimi brinca com as borboletas atraídas pela urina, ela bate suas pernas e lhe dá à luz, encarnado em uma criança (ver S. Hugh-Jones 1979:277). Numa das passagens da tese de Geraldo Andrello ele diz que quando uma pessoa morre, o corpo se desfaz na terra, volta para a terra, ye’pâ. E o autor segue Mas a alma se decompõe, pois uma parte dela, que já nasceu junto com o corpo se dirige para dia-wapîra wi’i, e outra parte, aquela associada ao nome pessoal volta para a casa de transformação à qual o nome da pessoa que morreu está associado. E assim, é como uma essência que retorna à sua fonte de origem, podendo ser realocada em outras crianças que venham a receber o mesmo nome. A reciclagem dos nomes é feita em geral em gerações alternadas, de maneira que há uma tendência de que um filho primogênito receba o nome do avô paterno. (Andrello, 2006:242,243) Um texto fundamental para a temática da produção da pessoa entre os ameríndios é o artigo de 1979, “A construção da pessoa nas sociedades indígenas” de Anthony Seeger, Roberto da Matta e Eduardo Viveiros de Castro. O artigo já citado no projeto de pesquisa, e valeu ser reconsiderado aqui pela sua importância. Esse foi um dos tópicos tratados na entrevista que fiz com Anthony Seeger, um dos autores, descrito nesse relatório. Segundo o próprio autor, imbuídos de levar adiante um movimento que se fazia na antropologia brasileira no final dos anos 70, o artigo tornou-se uma referência. Espelhando-se em Mauss, Dumont e em etnografias dos povos da América do Sul, inclusive várias do Noroeste, o artigo mostra como a noção da pessoa e de corporalidade são bases para entender as dinâmicas sociais e a organização social dos povos indígenas nas Terras Baixas da América do Sul. O tema é um marco importante para a antropologia brasileira. Aponta para a preocupação dos povos aqui residentes privilegiarem uma reflexão sobre a Florianópolis, Janeiro de 2014. 16 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico corporalidade na elaboração de suas cosmologias. “Este privilégio da corporalidade se encontra dentro de uma preocupação mais ampla: a definição e produção da pessoa pela sociedade” (1979:03). Diversas etnografias da Amazônia mostram como as práticas corporais são fundamentais e são diversas para construir uma pessoa – são os cuidados que se deve ter para produzir e criar gente, na relação com os demais membros de uma sociedade. Tais práticas corporais envolvem teorias de concepção, teoria de doenças, papel dos fluidos corporais no simbolismo geral da sociedade, proibições alimentares, ornamentação corporal, entre outras. Para Seeger, Da Matta e Viveiros de Castro, (1979:03) a fabricação, decoração, transformação e destruição dos corpos são temas em torno dos quais giram as mitologias, a vida cerimonial e a organização social. “Uma fisiologia dos fluidos corporais – sangue, sêmen – e dos processos de comunicação do corpo com o mundo (alimentação, sexualidade, fala e demais sentidos) parece subjazer às variações consideráveis que existem entre as sociedades sul-americanas, sob outros aspectos”. (1979:11). Os autores citam pesquisas etnográficas sobre essa população A produção física de indivíduos se insere num contexto voltado a produção social de pessoas, isto é, membros de uma sociedade específica. O corpo, tal como nós ocidentais o definimos, não é o único objeto (e instrumento) de incidência da sociedade sobre os indivíduos: os complexos de nominação, os grupos e identidades cerimoniais, as teorias sobre a alma, associam-se na construção do ser humano tal como entendido pelos diferentes grupos tribais. Ele, o corpo afirmado ou negado, pintado e perfurado, resguardado ou devorado, tende sempre a ocupar uma posição central na visão que as sociedades indígenas têm da natureza do ser humano. (Seeger, Da Matta, Viveiros de Castro, 1979:03, 04). Em grande parte das populações que tive acesso durante a pesquisa neste projeto as crianças são tidas como um iniciante que precisa (assim como qualquer membro do grupo que se inicia em algo) de um controle ainda maior e um investimento constante para se situar e se educar para esse mundo prático e sobrenatural (ver Pereira, 2013; Souza, Deslandes e Garnelo, 2011). Florianópolis, Janeiro de 2014. “Fechar o 17 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico corpo”, um termo que surgiu nas conversas com os familiares das crianças em pesquisa de campo, envolve rituais diversos – é uma das principais práticas no cuidado das crianças quando doentes ou para a prevenção da doença. Mostra como essas devem ser, desde o nascimento, alvo de técnicas preventivas e de cura. Viveiros de Castro (1986) lembra que entre os Araweté, quando uma criança nasce ela está aberta às ações e substâncias paternas, especialmente as da mãe, penetram em seu corpo. "Ainda bem pequenas (de "cabelo novo", como dizem), as crianças são frequentemente submetidas a uma operação xamanística, a pedido dos pais: o "fechamento do corpo" ou "tapagem". Seu objetivo é permitir que os pais retomem paulatinamente suas atividades, e evitar que a criança tenha "dor na carne". A simbólica e evidente: “a criança está aberta, as ações e substâncias paternas penetram em seu corpo."(1986:447). A dissertação "Criando Gente no Alto Rio Negro: um olhar Waikhana” de Rosilene Fonseca Pereira (2013), recentemente defendida no PPGAS da UFAM, trata de modo particular do tema entre seus familiares residentes no Rio Negro. A autora, uma antropóloga descendente do grupo que aborda na sua dissertação, mostra como entre seus familiares um bebê é cuidado da gestação ao nascimento. Diz a autora que o nascimento "é entendido como a passagem de um mundo bom para um mundo sujo e cheio de doenças. Por isso prepara-se o local com o bharceyé (conjunto de benzimentos, narrativas sagradas) para protegê-las. Durante todo o ciclo da gestação vão sendo compartilhados conhecimentos tanto do pai quanto da mãe e dos avós”. (Pereira, 2013: 49). O bhaeceyê é considerado uma ação de proteção extremamente importante, que acompanha os waikhana desde a criação (narrativas de criação dos waikhana), o nascimento, o processo de formação de nirhinonrriré (pessoa desde o nascimento até 14 anos) para adulto, alianças matrimoniais, deslocamento na mata, nos novos rios, igarapés e para outros lugares distantes de nossos contextos, abertura de novos sítios, construção de moradia, meios de transporte, confecção de utensílios domésticos (...).(Pereira, 2013:49) A ausência desses cuidados pode gerar a perda da criança, já que “Se não houver bharceyé logo que o bebê nasce, os hiorkiê-marsawirirhê ficam bravos, fazem Florianópolis, Janeiro de 2014. 18 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico barulho, a terra treme, e os whaimarsãwirriré, os seres da água aparecem e querem levar o bebê”. (Pereira, 2013:55). O trabalho de Rosilene Fonseca é o único da região que toma o tema infância como foco, muito embora ela não trabalhe diretamente com as crianças e seus pontos de vista e sim com a memória dos seus pais e parentes sobre suas infâncias. No entanto, o trabalho da autora mostra como o tema é rico e cheio de possibilidades de descobertas. Trata-se de uma excelente etnografia sobre a vida das crianças na região do Rio Negro. Na dinâmica cotidiana dos grupos do Rio Negro há um indicação que toda criança fala pelo menos duas línguas, a do pai e a da mãe. Segundo Flora Cabalzar, falando dos tuyuca, a criança terá mais intimidade com a língua da mãe no início de sua socialização, fato que garante, justamente, a persistência do multilinguíssimo característico desta região. Na socialização da criança, entretanto, deve-se levá-la a, progressivamente, abandonar a língua da mãe pela do pai (Gómez-Imbert, 1996: 443), uma vez que compreenda que há mais de uma subcomunidade linguística no seu campo social. Mahecha (2004: 235-6) enfatiza a importância da competência cultural tanto na língua do pai como na da mãe, mais valorizadas respectivamente pelos parentes agnáticos e afins. O domínio da língua seria um indicador concreto dos conhecimentos que a pessoa tem de sua Gente. O emprego correto das diversas formas retóricas valorizadas em diversos contextos seria a condição básica para poder afirmar que se tem um pensamento completo. Também seria igualmente importante dominar um vocabulário básico em outras línguas faladas nas regiões por onde a pessoa circula (idem: 235-6).(Cabalzar, 2012: 14) Estudando os hupd’äh da região do Rio Negro, Renato Athias diz os modos de passagem do conhecimento entre esses não se difere dos demais grupos da região, salvo detalhes específicos. O autor refere-se aos clãs (famílias) como fundamentais na transmissão do conhecimento. A importância da família se mostra nos cuidados que os pais e as mães têm com as crianças Hupd'äh. “Após o nascimento os recém nascidos permanecem sempre com a mãe, e conforme vão crescendo começam a aprender a falar a língua corrente, por volta dos quatro a cinco anos de idade.”(Athias, 2010:08). O autor diz ainda que é na vida prática, na atividade diária que os Florianópolis, Janeiro de 2014. 19 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ensinamentos são passados, mas também pelos mitos narrados especialmente pela noite na casa comunal, quando o silencio é maior. Mas ainda se ensina pelos rituais, como o do dabucuri. “Entre os Hupd'äh, as festas, os rituais de iniciação são os momentos centrais para falar nos saberes tradicionais, no entanto, todos os momentos podem ser aproveitados para a transmissão, como no banhos matinais, caçadas, pescarias, na selva e nos locais de trabalho”(Athias, 2010:05). A oralidade parece ser uma maneira especial para repassar seus conhecimentos. Entre os Hupd'äh são transmitidos e assimilados, os mitos, as histórias, as tecnologias de caça, as fórmulas terapêuticas e de proteção - a hierarquia dos clãs –, todos estes conhecimentos são repassados pela oralidade tanto pelos pais aos filhos, avôs aos netos. As narrativas mitológicas e as histórias, as fórmulas terapêuticas e de proteção e a hierarquia dos clãs acontecem durante as festas de Dabucuri, ou também os conhecimentos podem ser repassados durante a noite, segundo os Hupd'äh é o momento em que todos estão acomodados, sem barulhos que lhes incomode e principalmente pela mente estar descansada, facilitando a memorização dos extensos conteúdos relativos à trajetória percorrida pelos seus ancestrais.(Athias, 2010: 06). O autor diz ainda que quando questionados sobre como adquiriram conhecimento sobre suas atividades econômicas, os Hupd'äh, recorrem sempre as narrativas da passagem de K'eg-teh neste mundo. “São episódios incríveis e de transmissão de conteúdos metereológicos para realizar alguma iniciativa. E faz parte daquele repertório das histórias dos Hipãh-teh, de um conjunto de exemplos que se encaixam no saber-fazer hup. Por exemplo, sobre os locais de caça e as técnicas de caça, a armação das armadilhas de caça, que conhecem, afirmam que foi K'eg-teh que deixou para a humanidade (incluindo todos nós).” (Athias, 2010:08). Segundo o autor as histórias míticas são fontes de conhecimentos dos Hupd'äh, e as ações de personagens míticos são justificativas dos seus comportamentos. “É nesse sentido que fazem questão de transmitir essas histórias aos filhos, pela importância que tem no contexto vivido por eles. São essas histórias que norteiam as suas atividades”. (Athias, 2010:08) Os Hupd'äh, (assim como os demais povos da região do Rio Uaupés e Tiquié) são compreendidos por outros povos da região através das histórias mitológicas que Florianópolis, Janeiro de 2014. 20 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico os enquadram dentro de uma categorização própria dessa região. “Nos mitos podem se apreender as principais referências geográficas, históricas e cosmológica é daí que surge todo o conjunto de conhecimento (hipãh) desse povo. (Athias, 2010:05) Robin Wrigth fala algo similar sobre o mito entre os Baniwas. O mito Kunai, segundo Wright (1981) um dos grandes ciclos na história do cosmos na concepção Baniwa, conta a vida do filho de Iaperikuli e Amaru, a primeira mulher. Infinitamente rico em simbolismo, de uma importância central na cultura Baniwa, explicando pelo menos quatro grandes questões sobre a natureza do mundo: como a ordem e os modos de vida dos antepassados são reproduzidos para todas as gerações futuras; como as crianças devem ser instruídas sobre a natureza do mundo; como as doenças e o infortúnio entraram no mundo; e qual a natureza da relação entre seres humanos, espíritos e animais, que é a herança do mundo primordial.”(1981:75) A tese de Flora Cabalzar “Até Manaus, até Bogotá. Os Tuyuka vestem seus nomes como ornamentos: geração e transformação de conhecimentos a partir do alto rio Tiquié (noroeste Amazônico)” descreve as práticas e modos de conhecimento altorionegrinos, a partir do alto rio Tiquié (afluente do rio Uaupés na Terra Indígena Alto Rio Negro, município de São Gabriel da Cachoeira, Amazonas), analisando percepções acerca dos processos de geração e transformação dos saberes considerados de maior valor (niromakañe). O objetivo d tese consiste em descrever como conhecedores (masirã) são percebidos a partir de atualizações de aspectos da agnação ou das vitalidades transmitidas por linhas paternas. Agnação que se realiza sob novas formas nos movimentos de abertura ao exterior - nos abrandamentos nas práticas de proteção, na nominação, na circulação de sabres e sua eficácia na composição de almas, corpos, pensamentos. A autora está entrando no debate importante sobre a organização social da região iniciada por Hugh-Jones em relação ao trabalho de Viveiros de Castro, já citado acima. Não vou me ater com mais detalhes a esse debate aqui por não ser o foco central dessa revisão. No entanto, afirmo ser um importante embate da etnologia do noroeste. Flora Cabalzar sugere que com a mudança do modo de vida dos tuyucas, eles Florianópolis, Janeiro de 2014. 21 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico tem ajustado seus rituais de nominação, para evitar determinados problemas que essa mudança trouxe a eles. Dentre tantas mudanças que os índios citam ao falar destes seus saberes ou cultura (entre “saberes maiores que ainda temos e aquilo que já perdemos”), uma segunda motivação deste capítulo é a ideia corrente entre alguns conhecedores, de que os benzedores de hoje, em comum acordo com as famílias, pais das crianças, têm preferido não mais fazer o benzimento da alma-nome da criança recém-nascida impregnando-a com intenção-pensamento de ser e tornar-se grande conhecedor (como baya ou dançador, baseg¡ ou benzedor, yuam¡ ou entoador cerimonial (também wederige hig¡); báseg¡ ou protetor de doenças da Casa em Festa). Desse modo, dizem evitar os grandes riscos que se corre quando se possui saberes maiores sem, entretanto, dar seguimento ao conjunto de restrições associadas à sua produção, manutenção e incrementação. Agências nesse sentido, de reajustes na composição das almas, pensamentos, nomes, corpos, são aqui entendidas como reajustes cosmopolíticos no âmbito da hierarquia e fabricação do corpo (Cabalzar, 2012:91). Outro autor que escreveu longamente sobre a história da região focando especialmente os Baniwa do Rio Ayari e sua história de contato foi Robin Wright. Escreveu Cosmos, self and history in Baniwa religion: for those unborn (University of Texas Press, 1998); organizador, com Neil L. Whitehead, In darkness and secrecy. The anthropology of assault sorcery in Amazonia (Duke University Press, 2004) e organizador da obra: Transformando os deuses (vol. I, 1999 e vol. II, 2004, Editora Unicamp). Talvez sua obra mais conhecida é História indígena e do indigenismo no alto Rio Negro (Campinas: Mercado de Letras / S. Paulo: Instituto Socioambiental – ISA, 2005, 319 pp), mas também publicou vários artigos sobre religiões e histórias indígena. Na obra “Aos que Vão Nascer: uma Etnografia Religiosa dos Índios Baniwa” (2005) Wright diz que os pajés são hekwapinai, as “crianças do universo” que “brincam” no universo. O autor diz ainda que são as crianças que começam mais cedo na sua formação de pajés aquelas que adquirem mais conhecimento sobre a arte da cura. Poucos pajés atingem este nível; os que conseguem, “frequentemente, começaram sua aprendizagem quando pequenos Florianópolis, Janeiro de 2014. 22 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (crianças de cinco ou seis anos), porque demonstraram ter qualidades que os predispunham a começar a aprender. Grande parte das suas vidas, então, é dedicada a uma aprendizagem relativamente contínua de tal modo que, quando chegam à faixa etária adulta, o seu conhecimento ultrapassa muito o de seus companheiros que começaram a sua instrução mais tarde.(Wright, 2005: 123) Outro tema frequente onde as crianças aparecem na bibliografia do noroeste amazônico é nas guerras. Robin Wright trata do rapto das crianças e diz que as crianças e as mulheres eram pegas como troféus. Os macus eram grupos capturados pelos Baniwas. O ato de comer um inimigo morto era na verdade parte de uma lógica mais inclusiva de “retribuição” ou “trocar” (koada) relações sócio-políticas definidas entre grupos distantes e potencialmente hostis. As práticas de rapto de crianças (mairowa), pegar ossos como troféus, o contrato de chefes guerreiros de fazer guerra com sibs não guerreiros, bem como a ingestão da carne de um inimigo morto, estão relacionadas à noção de guerra como uma forma de simbolicamente estruturar a hostilidade, a qual serve de motor para a reprodução social. Os povos “Maku”, caçadores e coletores, que viviam nas fronteiras do território Aruaque, estavam justamente entre aqueles que os Baniwa e Curipaco aprisionaram, mas que poderiam eventualmente ser incorporados na estrutura hierárquica dos sibs dessas sociedades (isto é, eles não seriam necessariamente comidos a não ser por motivos de vingança).”(Wright, 1981: 52) Conta Wright da natureza dos padrões da guerra Baniwa, onde a captura das crianças seguia a lógica da predação familiarizante. As narrativas recolhidas por Journet (1994) e por mim (1991) indicam que a guerra (uwi) tinha dois objetivos principais: (1) vingarse da morte de um parente com a morte de um inimigo, de acordo com uma lógica de troca ou 'retorno' (koada), em que o fim do conflito se dava com o extermínio total, ou quase-total, do inimigo (ipuunda) mesmo se corresse o risco de ser exterminado no processo; e (2) substituir os mortos com a captura de crianças e/ou mulheres, permitindo não só a recuperação das perdas mas também a futura reprodução do grupo - de novo, mesmo que isso levasse à perpetuação de relações hostis. A guerra Baniwa constitui então um sistema de relações, e não um 'acidente' da sociedade, no qual os inimigos representavam uma fonte de progênie. A busca de vingança, ou 'retorno', era um meio de os grupos inimigos se trocarem, substituírem seus mortos e se perpetuarem no tempo. Nesse sistema, Florianópolis, Janeiro de 2014. 23 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico a importância das relações de aliança por casamento era totalmente secundária.(2005:181) A criança aparece como protagonista em várias situações: elas caçam, pescam e realizam tarefas domésticas por conta própria. Vivem dinâmicas cotidianas onde estão entre pares, o que lhes reserva bastante espaço para o protagonismo. Quando capturadas, ou ainda quando levadas por missionários para serem catequisadas, elas procuravam fugir e voltar para seus grupos de origem, indo mato adentro. Mas foi nos mitos, mas que tudo, que vi que crianças tem grande poder protagônico. Os ancestrais criadores das gentes do Rio Negro são crianças que vieram com poderes especiais. Entre os Baniwas, por exemplo: Kuwai é um ser extraordinário cujo corpo consiste de todos os elementos do mundo e cujos zumbidos e cantos produziram todas as espécies animais. O seu nascimento coloca em movimento um processo rápido de crescimento em que o mundo em miniatura e caótico de Iaperikuli se abre até o tamanho do mundo na vida real com as florestas e rios habitados por seres humanos e as várias espécies de animais da floresta, pássaros e peixes. Kuwai ensina à humanidade os primeiros ritos de iniciação; mas, no fim desses rituais, Iaperikuli mata Kuwai, empurrando-o dentro de um enorme fogaréu, um "inferno" que queima a terra, e o mundo se reduz de novo ao seu tamanho em miniatura. Das cinzas de Kuwai nascem os materiais vegetais com os quais Iaperikuli fez as primeiras flautas e trombetas sagradas que seriam tocadas nos ritos de iniciação e cerimônias sagradas de hoje. Amaru e as mulheres, então, roubaram estes instrumentos do Iaperikuli, provocando uma longa caçada em que o mundo se abre pela segunda vez enquanto as mulheres, fugindo do Iaperikuli, tocam os instrumentos pelo mundo inteiro. Eventualmente, os homens recuperam os instrumentos e com eles, Iaperikuli procura os primeiros antepassados da humanidade.(Wright,2005:75) Falando sobre a mitagem4 Baniwa, Robin Wright (sd:10) diz que “a base dos cânticos kalidzamai cantados nos ritos de iniciação masculinos e femininos (denominados Kuwaipan, Casa de Kuwai) é o mito de Kuwai, o filho de Nhiaperikuli 4 Segundo o autor o termo “mitagem” (“mythscape”) “refere-se à paisagem (“landscape”) regional com uma coleção de sítios/lugares que estão todos relacionados com as tradições de criação. Uma noção similar a esta “mitagem” seria o “Tempo de Sonho” (“Dreamtime”) dos aborígenes australianos, já que, por exemplo, os baniwa mantêm uma relação viva com seus sítios sagrados pedindo a proteção de suas deidades que, segundo acreditam, habitam todos estes lugares”.(Wright, sd:01). Florianópolis, Janeiro de 2014. 24 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e Amaru (para versões completas, ver Wright, 2011; para uma versão Dzauinai, ver Hill, 2009)”. Segundo o autor “Como um todo, os cânticos consistem de dezesseis conjuntos, cantados com interlúdios em que os cantadores sopram fumaça de tabaco em vasilhas de pimenta. Em essência, os cânticos recontam uma série de cinco viagens feitas pelos homens para recuperar as flautas e instrumentos sagrados de Kuwai, os quais as mulheres haviam roubado de Nhiaperikuli. As mulheres, Amarunai (ou Inamanai), levam os instrumentos mundo afora, parando em inúmeros lugares onde tocam a música de Kuwai. Quando fizeram isso, o mundo “se abriu” ganhando seu tamanho atual, com corredeiras, montes, rios, cidades e fins de mundo (ou “pontas do céu”). Nhiaperikuli e os homens perseguem (“napiinetaka”) as mulheres e Kuwai, seguindo-os até o fim do mundo, onde abandonam as mulheres e a música de Kuwai e trazem de volta (“nadietawa”) os cânticos para o centro do mundo no Hipana, um córrego no Alto Aiary, lugar da criação de Kuwai e sítio da emergência dos ancestrais da humanidade. Como um ancião afirma de forma concisa: “Kuwai deu início ao mundo, isto é, o mundo de hoje e todos os lugares nele começaram com as viagens e a música de Kuwai”. (Wright, sd: 11) O mito se assemelha ao do Jurupari, presente em diversas etnias do noroeste amazônico, e revela o poder dessa criança na ordem do mundo dos homens e sua relação com a flauta e seu canto. Altamente abordados na literatura, Jurupari, por exemplo, torna-se um líder indígena ainda criança. Jurupari, através do sopro e da música, organiza e ordena os povos da região – ele é pessoa e flauta. Por outro lado, no ritual de iniciação dos meninos (não somente deles mas também de adultos não iniciados) onde se usam as flautas sagradas, são as crianças (meninos e meninas) e as mulheres que são proibidas de verem as flautas. Se por um lado há interdição visual das flautas, devem ouvir essas sendo tocadas, participando do ritual. São somente neófitos do sexo masculino os iniciados no ritual onde essas flautas são tocadas, e ver pela primeira vez a flauta no ritual de iniciação implica num castigo corporal aos meninos5. A passagem por esse ritual é o modo como se faz um menino tornar-se adulto. Outro mito interessante que cita as crianças e o seu protagonismo foi coletado por Acácio Piedade (1998). Trata-se do “Wãti - sobre como os antigos mataram os espíritos do mato” 5 Em relação às mulheres a literatura aponta o estupro coletivo e/ou morte social como castigo. Florianópolis, Janeiro de 2014. 25 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Antigamente havia espíritos do mato que faziam muito mal, os Wãti. Eles roubavam crianças e mulheres das malocas. Faziam isto quando os homens e mulheres saiam para trabalhar, e na maloca ficavam só velhos e crianças. Ou então à noite, quando eles entravam sorrateiramente e levavam bebês, crianças ou mulheres, colocando-os num aturá. Todo mundo sabia que eles existiam, e que faziam muito mal. Às vezes acontecia, quando uma criança ia brincar sozinha no mato, Wãti pegava e levava. Certo dia, homens e mulheres de uma maloca saíram para trabalhar, e ficaram na maloca apenas uma velha e as crianças. Foram todos tomar banho no porto e já voltaram para a maloca. A velha disse: “tomem cuidado, não saiam, fechem bem as portas”. Mas já havia um Wãti lá dentro. “Já estou aqui”, disse, e cantou e dançou, e avançou na velha. As crianças, muito assustadas, se esconderam num girau bem no alto da maloca. De lá elas viram o espírito do mato fazendo muito mal à velha, machucando-a muito. Por fim, a velha morreu. O espírito do mato pegou um ralador de mandioca e dançou com ele. Os meninos maiores, mais valentes, desceram e jogaram maniqüera fervendo no Wãti. Mas o espírito sorriu e disse: “hum... assim está quentinho, gostoso, joguem mais!” As crianças correram para o girau, apavoradas. O Wãti pegou a velha morta e a colocou no aturá para levar embora. Pôs o aturá nas costas, virou-se e foi andando. Mas os meninos corajosos, puxavam o aturá com um pau com gancho na ponta. O Wãti estranhou que não conseguia sair do lugar, então baixou o aturá e virou-se. Nada. Pôs o aturá de novo nas costas e foi andando. Mas novamente não conseguia andar, pois os meninos puxavam o aturá com o pau. Wãti baixou o aturá e virou-se e olhou muito bravo. Nada. Pela terceira vez, colocou o aturá nas costas e foi andando. Desta vez ele foi embora, porque os meninos deixaram ele ir. Tiveram a ideia de segui-lo e descobrir o esconderijo dos Wãti. (Piedade, 1997: 181) Na questão da arte, as narrativas de mitos e as conexões com o uso de flautas sagradas despertaram especial atenção tanto a literatura aponta, quanto no trabalho de campo. Um complexo ritual envolvendo o uso de flautas sagradas conectado a mitologia -- que incluem a iniciação, os ancestrais, a guerra e os ciclos sazonais é característico da região -- envolvem diversas etnias. Uma vasta produção acadêmica tem sido feita sobre a região, e atualmente os indígenas tem registrado sua cultura e pensamentos sobre ela na forma escrita. Os trabalhos de Acácio Tadeu Piedade (1997), Jonathan Hill (vários), Robin Wright e Deise Lucy Montardo (2010, 2012) tratam a questão da música entre as etnias da região do noroeste, abordando o tema das flautas sagradas. Burst of Breath: Indigenous Ritual Wind Instruments in Lowland South America, editado por Jonathan Hill e Jean-Pierre Chaumeil e publicado recentemente (2011), reúne pesquisas importantes sobre o tema. Os artigos dos organizadores, de Acácio Tadeu Piedade, Rafael José de Menezes Bastos, Maria Ignez Mello, Robin Wright, entre outros, Florianópolis, Janeiro de 2014. 26 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico discutem aspectos do uso das flautas sagradas nas Terras Baixas das Américas do Sul (TBAS). Na maioria dos trabalhos que abordam as flautas sagradas foram estudados especialmente sob o ponto de vista dos que as executam, os homens. O trabalho de Maria Ignez Mello (1999, 2005) aborda o modo como as mulheres Waujá se relacionam com essas flautas. A autora busca compreender a ligação entre a música vocal do iamurikuma (ritual feminino) e a instrumental das flautas kawoká (ritual masculino), já que as mulheres afirmavam que “música de iamurikuma é música de flauta”. À partir dessa investigação, defende que a questão colocada por esses rituais musicais não diz respeito nem à dominação masculina, nem à inversão de papéis sexuais, e nem à hierarquia sexual. Os rituais e a vida cotidiana são esferas inseparáveis para os Waujá; há um entrelaçamento dos poderes criativos masculinos e femininos, não havendo antagonismo ou dominação. Essa questão é muito pouco esclarecida em muitos contextos – inclusive no noroeste. O debate de gênero se aproxima daquele campo com o trabalho de Cristiane Lasmar (2005), estudando as relações de casamento na cidade de São Gabriel do Rio Negro. Deise Lucy Montardo recentemente discutiu o processo de retorno dos Baniwa de Itacoatiara Mirim, São Gabriel da Cachoeira, (o mesmo grupo que pesquisei) a Camarão, local de onde migraram há mais de 30 anos com o objetivo de desenterrar flautas e trompetes kowai. A autora também destaca que a proibição da mulheres verem as flautas não impede, necessariamente, que essas tenham acesso à parte importante do universo das flautas sagradas. Poderíamos dizer o mesmo para as crianças, e parece interessante conhecer o ponto de vista dessas sobre essa temática. Um aspectos que pareceu interessante nos trabalhos da região amazônica é como os rituais são centrais. Nesse sentido a musica, especialmente aquela que produzida pelos aerofones, constituem um eixo importante para esses povos, e está intrinsicamente conectada nos mitos e na vida ritual da região. Nesse sentido podemos dizer, como sugere Rafael de Menezes Bastos, que “é possível falar de uma generalidade do papel da música na cadeia intersemiótica do ritual nas terras baixas da América do Sul apontando para um lugar semântico que encompassa os nexos de integração, intermediação, desencadeamento e similares, sintetizáveis pelo nexo geral de tradução”(Bastos, 2007:296). Bastos aponta ainda outra característica da musica das Florianópolis, Janeiro de 2014. 27 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico terras baixas da América do Sul, que é a sequencialidade, nesse caso citando vários trabalhos, inclusive o de Acácio Piedade sobre um grupo no noroeste amazônico. “Tudo leva a crer, então, que peças isoladas de música não parecem fazer muito sentido na região. Essa seqüencialidade no plano intercancional — cujo tipo de organização evoca a da suíte ocidental (Fuller 2007) — foi primeiramente descrita por mim, de forma sistemática, entre os Tupi-gua- rani kamayurá do Alto Xingu (Menezes Bastos 1990, 1994, 1996a, 2004a, 2004b; Menezes Bastos e Piedade 1999). Posteriormente, ela foi estudada entre os Aruaque kulina do Acre (Silva 1997), os Tucano yepamasa (Piedade 1997), os Aruaque xinguano wauja (Piedade 2004; Mello 1999, 2005), os Tupiguaraniguaranisdosuledocentro-oestebrasileiros (Montardo2002), os Caribe arara do Pará (Coelho 2003) e — sim, exatamente, sim — entre os “índios misturados” Kalankó de Alagoas (Herbetta 2006)”(Bastos, 2007:298). As mudanças no modo de vida dos moradores do noroeste amazônico, considerando seus processos de transformação dos modos de vida nos centros mais urbanizados, são tratados em dois trabalhos importantes sobre a presença indígena nas cidades. Cidade do Índio (2006), de Geraldo Andrello, trata das transformações e cotidianos de Iaueretê, uma vila do município de SGC. De volta ao Lago do Leite (2005), de Cristiane Lasmar, estuda as relações de gênero na cidade de São Gabriel da Cachoeira e aponta para as continuidades e descontinuidades da vida dos índios morando na cidade. Ambos livro serviram de referência para a pesquisa etnográfica feita entre crianças em São Gabriel da Cachoeira. A ideia de transformação é fundamental na cosmologia e nos mitos dos povos do noroeste e as mudanças nos modos de vida nas cidades seguem essa mesma lógica apresentada nos mitos. O trabalho de Rosilene Waikhon (2013), estudante do PPGAS da Universidade Federal do Amazonas e também indígena do Povo Pira-Tapuia da região, tomou como foco central da pesquisa esse grupo, fazendo uma reflexão sobre a experiência da infância e os significados dela para seus pais e parentes mais velhos. A autora entrevista os próprios pais, observando mudanças e permanências apontadas por esses nas suas infâncias e pretende ainda fazer um comparativo com narrativas e modo de viver das crianças da sua etnia. O tema infância aparece também Florianópolis, Janeiro de 2014. 28 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico de modo bastante complexo no debate sobre infanticídio. Os trabalhos antropológicos tratam de não criminalizar nem de afirmar existir na atualidade essa prática entre os grupos da região na atualidade, evitando o preconceito com que o tema vem sendo tratado pela mídia e por setores religiosos atuantes. 2.1.3. Pesquisa Audio-videográfica A temática dos mitos e a busca de práticas que envolvem, entre outras coisas, a presença dos rituais de iniciação no noroeste amazônico foi abordado em dois trabalhos videográficos. Esses mostram duas comunidades indígenas, uma em São Gabriel da Cachoeira, da etnia Baniwa e a outra em Iauaretê, da etnia Tariana, tem reagido ao processo histórico de evangelização/catequização e proibição de rituais tradicionais. Os filmes, descritos à seguir, registram a busca de bens materiais e simbólicos perdidos e ou roubados pela sistemática catequização que sofreram aqueles povos. Iauaretê, Cachoeira das onças6 trata do processo de reconhecimento da região de Iauaretê como “bem cultural de caráter imaterial”. Os índios Tariano, após décadas de catequese missionária, mostram seus conhecimentos, abordando o relato mítico ilustrado nas pedras de uma cachoeira, a reconstrução de uma grande maloca, e a tentativa de reaver objetos há anos guardados em um museu de Manaus. O filme, feito em parceria com Vídeo nas Aldeias e com o IPHAN7, reúne narrativas de lideranças indígenas do alto Rio Negro sobre os significados e ensinamentos contidos na região, revelando seu esforço e luta para fortalecer e legitimar as tradições indígenas. Esse movimento do povo tariana de Iuauretê foi abordado por diversas vezes nas narrativas de uma das família com quem estive em contato na pesquisa de campo. Descobrindo a importância de sua própria cultura dentro do mundo 6 O documentário Iauaretê, Cachoeira das Onças, dirigido por Vincent Carelli, foi feito em parceira com o IPHAN, orgão responsável por registrar o local como patrimônio cultural imaterial. 7 Publicação de livros de autoria indígena e registro de patrimônio cultural imaterial (Cachoeira de Iauaretê, no livro dos lugares sagrados do IPHAN / MinC e Sistema Agrícola do Rio Negro, no livro dos saberes e fazeres do IPHAN / MinC). Florianópolis, Janeiro de 2014. 29 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico contemporâneo, os próprios indígenas estão gravando suas músicas e realizando seus filmes. O filme Podaali foi produzido por lideranças da etnia Baniwa da comunidade de Itacoatiara Mirim, São Gabriel da Cachoeira, migrantes há aproximadamente 30 anos do Rio Içana/Ayari. O filme foi apoiado pelo ISA (Instituto Sócio Ambiental – Projeto Rio Negro) e pela Universidade Federal do Amazonas. O filme trata do esforço feito pela comunidade em revitalizar práticas culturais Baniwa para viver como “índio” em maloca e fazendo rituais tradicionais. O documentário mostra a construção da maloca tradicional em São Gabriel da Cachoeira e a expedição a Camarão, comunidade de origem dos Baniwa, onde ouvem as flautas sagradas depois de trinta anos. O filme mostra os projetos de revitalização cultural, e um dos objetivos que ainda mantém a comunidade é o desenterro das flautas e trompetes kowai, trazendo essas para a cidade. Segundo a pesquisadora Deise Lucy Montardo, estes instrumentos são os canais de trocas nos planos vertical entre estes e os ancestrais e no horizontal, entre estes e seus os parentes, e o mundo dos brancos. O objetivo desse filme se assemelha ao Ritual das flautas, de Delvair Montagner e Regina Müller (34min./1996 - Brasil/DF), que registra os Asurini, do rio Xingu, Pará, que quase dizimados nos anos 70 do século passado, aos poucos se recuperam demograficamente e mantêm sua vida ritual e artística, manifestando, assim, o desejo de se afirmar como grupo étnico. O filme Saltos amazônicos, feito por Liana Amin e Igor Amin (7min. 30seg). Brasil/MG 2011), mostra como as crianças se divertem dando saltos de um barco à margem do rio Negro, uma brincadeira lúdica da Amazônia. Aproveita da brincadeira das crianças para realizar um filme poético, cuja mensagem é essa: a imagem de crianças divertindo-se no Rio Negro. O filme feito por Renato Athias Fragmentos de um diário de campo (07min/2005 - Brasil/PE) mostra Messias, um velho homem Hupd’äh do Igarapé Pombo (do rio Umari), na região do médio Rio Tiquié, fazendo pu´úk, um pó derivado da planta coca, comum ao uso daquele povo. Embora o roteiro do filme se centre nesse feitio, inicia falando que o velho Messias dedica seus cuidadso às crianças enquanto os demais membros da aldeia vão em busca de alimentos na Florianópolis, Janeiro de 2014. 30 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico floresta. Os Hupd’äh fazem parte da família linguística macu no Brasil, juntamente com outros povos como os dâw, macu-hupd’äh e macu-iuhupdes. Na literatura etnográfica, linguística e pelos regionais, são chamados por vários nomes como macu, Nadëb, nadöbö, anodöub, makunadöbö, guariba, guariua-tapuio, cabori, cabari, xiriwai, xuriwai, kuyawi, camã e nadëp. Assim como grande parte dos falantes do tronco Macu são conhecidos por um certo isolamento (Possobon, 1993; SilverwoodCope, 1990) e sua história é marcada por relações complexas com os demais povos do Rio Negro, considerados como escravos em relatos etnográficos. Caçadores exemplares, estabeleceram tradicionalmente relações de trabalho especialmente com os Baniwa e os tucanos, tratando de trabalhar somente quando precisavam. Silverwood-Cope (1972), aponta os Maku Orientais como “índios da floresta” e são classificados como coletores-caçadores. O centésimo Dâw (doc., 15,01 min, Brasil/Goiás, 2011) dirigido por Orlando Lemos também trata do povo de um povo Maku. Com roteiro premiado pelo Edital de Curtas da AGEPEL, faz uma importante recuperação da música, dos contos e da história desse povo da floresta, os Dâw, que em contato com o mundo branco e com o sedentarismo se vê quase em extinção. Estudado preferencialmente por missionários, os Dâw são pouco conhecidos na literatura. Os estudos de Peter SILVERWOOD-COPE (1980, 1990), de Jorge Pozzobon (1993, 1999), a tese de Renato Athias (1995) e o que Theodor Koch-Grunberg descreveu na sua passagem pela região entre 1903-1905, constituem a produção mais consistente sobre esse grupo denominado macu no noroeste amazônico. O grupo autodenominado Dâw se diz descendente dos Nadëb. O filme inicia com uma senhora, Dona Maria Dâw, dizendo que já pode cantar. Depois vem a voz de um homem que conta a história da dramática redução dos Dâw. Conta esse senhor que os Curupiras comeram os Dâw no Igarapé Weni. Uma canoa cheia de Dâw fora atacada e somente dois voltaram. Segundo esse senhor os Dâw eram comidos por onças e por Curupiras. Aparece na tela uma mensagem que conta um pouco da história do povo e dá o título ao filme. “Em 1984 o pastor Valteir Martins reúne 64 Dâw no sitio Waruá, situado na margem direita do Rio Negro. 20 anos depois os Dâw aguardam a chegada do 100o um habitante simbólico da recuperação do grupo”. Nasce na roça a menina Sandra, que ao nascer cai dos braços Florianópolis, Janeiro de 2014. 31 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico da mãe e sofre traumatismo craniano e fica tetraplégica. Em meio a imagens da comunidade, a voz de Dona Maria ecoa cantando um canto que fala da preguiça dos homens – canta ela que esses não caçam mais, não pescam, e vivem comendo frango, alimento dos brancos. A música revela a tensão de gênero. O filme mostra na sequência a volta de alguns Dâw a sua terra, próxima ao Rio Marié. Na terra dos seus avós, narram a trajetória do seu povo. Agora é a voz de Dona Deulinda quem canta. Um homem conta que os Dâw vieram lá do Wiç. “Devoradores dos Dâw eram perigosos, brigavam muito. Os Dâw pensavam que eram Ianomâmis, mas eu acho que eram Nadëb”. Embora não trate das crianças e do modo como são cuidadas, o que é visível no filme é a preocupação com a extinção daquele grupo, o que implica nos cuidados para nascerem novos membros. Hoje os Dâw são mais de 120 e na visita que fiz ao grupo, as crianças são alegres e muito interessadas em filmes. Assistimos com elas vários filmes e tivemos momentos bem interessantes de contação de histórias que elas iniciaram. Essas não farão parte da descrição da pesquisa que fiz na área por decisão tomada entre nós e as lideranças do povoado. O CD Cantos das Mulheres Hupd´äh e Dâw apresenta músicas cantadas pelas mulheres do tronco linguístico macu. O CD foi gravado pela pesquisadora Geórgia Silva, que trabalhou com os Hupd´äh e seus sistemas de saúde. Silva (2011) escreve um relatório sobre o seu trabalho “Gêneros musicais entre as mulheres indígenas da família linguística Maku, Alto Rio Negro, Amazonas, Brasil. Embora tive acesso a uma das músicas pelas mãos da própria pesquisadora, este CD foi distribuído unicamente entre os grupos indígenas8. Vale ainda destacar que um dos primeiros filmes produzidos no Amazonas, foi feita em 1921 por Silvino Santos, um fotógrafo que acompanhou a expedição de Theodor Koch-Grunberg. Trata-se do filme No país das Amazonas, o primeiro documentário de longa-metragem sobre a região, que leva à Europa o retrato da grande floresta Amazônia. Mostra os trabalhos e atividades desenvolvidas na selva e no rio, e é considerado um épico ou filme de aventuras de uma rara beleza e interesse histórico e documental. O filme serviu para representar os estados do Norte do Brasil 8 Ver SILVA, 2011. Florianópolis, Janeiro de 2014. 32 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico na exposição que teve lugar no Rio de Janeiro, comemorativa do Centenário da Independência, tendo posteriormente sido exibido em Paris Cinema Pathé do Boulevard des Italiens, em Paris e noutras capitais europeias. 1921 filmou No Paiz das Amazonas é considerado um filme de rara beleza fotográfica. O lançamento comercial no Rio de Janeiro foi em 2 de abril de 1923 no cinema Palais. O cineasta havia feito dois outros filmes que sumiram. Em 1924/25 realizou No Rasto do EIDorado, outro documentário cinematográfica mas agora da Expedição Alexander Hamilton Rice, explorador, geógrafo norte americano, graduado pela Harvard University. O filme apresenta aspectos do Rio Negro e do Rio Branco, as grandes cachoeiras do Rio Branco, tribos de índios e mostra ainda diversos costumes das tribos Macus - Chirianes - Maiongons - e Xirixanes e dos índios brancos que habitam as serras do Parimá" (Folha do Norte, Belém do Pará, 12.09.1926 in Cinemateca Brasileira – ficha catalográfica do filme). Nesta mesma linha de documentações antiga, podemos citar a importante obra do Theodor Koch-Grunberg (1872-1924) gravados entre 1911-1913. O CD Walzenaufnahmen aus Brasilien 1911-1913 (Gravações em cilindros do Brasil) torna acessível, pela primeira vez de forma mais abrangente, as gravações feitas por KochGrunberg durante sua terceira viagem à América do Sul, empreendida de 1911 a 1913, indo do norte do Brasil ao sul da Venezuela. Trata-se de um importante projeto do Arquivo Fonográfico de Berlim e esse é o terceiro CD da série “Documentos sonoros históricos”. Nessa viagem, Koch-Grunberg utilizou o então recém-lançado fonógrafo de Edison, para registrar em cilindro músicas de povos indígenas por ele visitados, e gravou, em 1911, 49 cilindros com músicas cantadas e tocadas por membros das etnias Makuxi, Taurepang e Yekuana-Maiongong (da família linguística Karib) e Wapixana (família Aruak). Outros 36 cilindros foram gravados em 1913, contendo cantos e peças de música com flauta dos Baniwa (família Aruak) e dos Tucano e Desana (família Tucano), além de cantos venezuelanos. (2009). O autor, na sua pioneira gravação de peças ameríndias divide as mesmas pelas categorias: cantos de dança, cantos de trabalho, cantos de cura e peças instrumentais. Sabe-se que KochGrunberg usou em suas expedições tecnologias inovadoras para a época, Florianópolis, Janeiro de 2014. 33 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico fotografando, gravando sons e filmando, o que constitui um importante registro sobre a região9. Inspirados no trabalho que Theodor Koch-Grunberg (1872-1924) realizou nas comunidades do Alto Rio Negro e na região do Monte Roraima o projeto A música das Cachoeiras, coordenado por Agenor Vasconcelos (Cauxi Produtora Cultural) faz um registro etnográfico audiovisual onde a música é central nas gravações. São quase quatro horas de 80 faixas musicais de grupos indígenas das etnias Baniwa, Wapixana, Makuxi e Taurepang, O nome é uma referência às correntezas da bacia do Alto rio Negro. A diversidade musical das comunidades indígenas do norte do Amazonas e do Estado de Roraima foi reunida nessa coletânea. Um importante filme feito sobre a região é WAR OF THE GODS (66 minutes Colour), dirigido por Brian Moser com o auxilio direto dos antropólogos Peter Silverwood-Cope, Stephen and Christine HughJones. O filme retrata a guerra entre Protestantes e Católicos para impor sua religião aos índios tradicionais Maku and Barasana, povos residentes da Região do Valpés, na Floresta da Colômbia. O filme contem uma série de informações e detalhes sobre a cosmologia, a vida social e a divisão sexual do trabalho entre os dos índios da Amazônia. Mostra os dois grupos que vivem nas florestas: 1) os Maku, que vivem especialmente da caça e coleta, e os sedentários Barasana, que vivem especialmente da agricultura. O filme contrasta esses dois modos de vida e dois sistemas de crença, apresentados pelos antropólogos que viveram e trabalharam com os dois grupos com o de missionários e católicos da região. Está incluído ainda no filme em voz over a fala de um xamã Maku, e cenas da maloca Barasana, da casa comunal, o centro da vida social e doméstica do grupo. No filme Filhos da Terra, da Série “Índios no Brasil, Vídeo nas Aldeias, 2000 / 18min, Fernando Baniwa, uma liderança da região do Rio Negro mostra como os índios se relacionam com os seus territórios ancestrais. Tanto ele quanto os demais entrevistados do filme mostram que o uso sustentável dos recursos da natureza é um 9 A análise das músicas e instrumentos musicais coletadas por Theodor Koch-Grunberg foram feitas pelo musicólogo Erich Moritz von Hornbostel (1977-1935). Esse publicou publicado estudos detalhados do material recolhido no Rio Orinoco no volume 3 de Vom Roroima zum Orinoco. Florianópolis, Janeiro de 2014. 34 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico conceito milenar das populações indígenas. Agora, ingressando na economia de mercado, muitos povos desenvolvem experiências de desenvolvimento sustentável com a exploração não predatória dos recursos da floresta, inspirada na filosofia dos seus antepassados. A cestaria Baniwa é um importante saber desse grupo e suas grafias tem significados muito importantes para o grupo. A série de dez programas educativos “Índios no Brasil” produzida pelo Vídeo nas Aldeias, propôs renovar o curriculum escolar sobre a temática. É apresentada pelo líder indígena Ailton Krenak, e mostra como vivem e o que pensam os índios de nove povos do território nacional. Finalmente, a produção sonoro-vídeo-bibliográfica sobre o noroeste amazônico, especialmente a bibliográfica é bastante vasta, e oferece um material riquíssimo para a etnologia brasileira. Nessa revisão, fiz apenas uma passagem rápida pelos trabalhos, mas a oportunidade de acessar parte desse material já produziu em mim ainda mais curiosidade e desejo de prosseguir pesquisando a área. Abaixo vou descrever o material que pude produzir enquanto em contato com povos daquela região. 2.2. Realização de pesquisa etnográfica e videográfico de performances de ameríndios Como foi apontado no item anterior, a pesquisa etnográfica e videográfica foi realizada em São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel do Rio Negro– Amazonas, e de modo específico se deu em três lócus distintos, com diferentes grupos étnicos. Foram eles: a) Com crianças da comunidade indígena Itacoatiara-Mirim, localizada a 30 minutos do centrinho urbano do município de São Gabriel da Cachoeira (22 km desde a sede do Município) onde vivem 22 famílias indígenas, predominantemente da etnia Baniwa. Embora a maioria das crianças são da etnia Baniwa, do tronco linguístico Aruak e falantes da língua Baniwa do Rio Içana, residem ainda naquela comunidade crianças da etnia tucano, tapuia, Wanano, Cubeo, tuyuca, Barasana, Siriano e Curipaco. Durante a estada com as crianças de Itacoatiara-Mirim, através do Florianópolis, Janeiro de 2014. 35 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico intermédio de Moisés da Silva, estive em constante contato com o Sr. Luiz Laureno Baniwa, Mestre da Maloca “Casa do Conhecimento” e com seus familiares (sua esposa Dona Luzia Inácia da Silva (Piratapuia), seus filhos e netos). Ainda contei com o apoio e a presença da família de Mário Felício Joaquim (pajé da comunidade e cunhado do Sr. Luiz) e sua família. Jesuína Galdêncio Batista, professora da comunidade no ano letivo 2012, também Baniwa mas falante da língua nheengatu, auxiliou com o trabalho com as crianças. Todas as pessoas daquela comunidade falavam português como língua geral, e era nessa língua que a escola funcionava, conectando assim os diferentes grupos linguísticos lá residentes. A comunidade de Itacoatiara-Mirim tem se tornado conhecida pelo projeto “Casa do Conhecimento”, feito em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA – Rio Negro) e a busca de recursos de alguns membros para a recuperação de rituais que são considerados fundamentais na cosmovisão das etnias que lá vivem, especialmente dos Baniwa. O Podaali (que significa troca de oferendas em Baniwa, também amplamente conhecido naquela região como dabucuri) é um ritual de compartilhamento e sociabilização do Povo Baniwa da região do Alto Rio Negro que vem sendo reativado na comunidade. O ritual, além de ser um momento de troca de alimento, é importante pois nele dança e música tanto expressam quanto criam a vida comunitária. A pesquisa em Itacoatiara me colocou em contato com aspectos cotidianos da comunidade, permitiu interagir com as crianças tocando pequenas flautas e dançando no ritual que fizeram naquele período. Na maior parte do tempo em que estive com as crianças, produzimos juntas filmes sobre histórias que elas inventaram e interpretaram para as câmeras. Três histórias foram inventadas pelas crianças e filmadas, e estão descritas abaixo. Todas elas continham animais como agentes. As crianças também fizeram uma filmagem mostrando a comunidade para a câmera. Elas sugeriram tal filmagem e elas mesmas filmaram com uma das câmeras levadas à campo todo o tmepo, tornando a própria produção videográfica um material a ser analisado. A “videografia partilhada”, possibilitou a coprodução entre a pesquisadora e as crianças. O convívio de minha própria família, que esteve em campo comigo, também deve ser levado em conta na pesquisa, uma vez que essa presença altera, evidentemente, a relação com as pessoas da comunidade e a pesquisadora. Florianópolis, Janeiro de 2014. 36 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Ao final da pesquisa, na despedida do primeiro estágio em campo um dabucuri foi organizado pelos moradores da Maloca Casa do Conhecimento. Nessa ocasião agradeceram e ofertaram comida para mim, minha família e para as crianças e professores da escola. Nesse dabucuri, Sr. Luiz, Dona Luzia, Sr. Mário e a irmã mais nova do Sr. Luiz realizaram diversas performances, cantando e dançando para os visitantes. Dona Luzia distribuía o caxiri enquanto descansava da dança. As crianças prepararam e apresentaram uma dança, tocando flautas transversais muito curtas feitas de bambu. O aerofone continha apenas um furo numa das extremidades e eram tocadas horizontalmente, seguradas com a mão direita,. Elas mesmas prepararam todos os ornamentos e a flauta, auxiliadas pelos pais e professores, o que foi uma surpresa para nós, inclusive a apresentação, fato que impossibilitou acompanhar tal produção. Na performance os meninos tocavam as flautas e as meninas os acompanhavam na dança, formando pares. Alguns deles estavam pintados e usavam na cabeça uma coroa, estilo tiara, feita de fibra natural trançada. As meninas usavam biquínis e uma saia também feita de fibra. Os meninos usavam a bermudas e estavam sem camisa. A coreografia consistia num movimento constante em forma ziguezague, marcando dois passos cada um. Ao mesmo tempo faziam uma coreogria oval ao redor das oferendas deitadas em cestos tradicionais Baniwas e Macus (ofertavam pupunha e banana coletada nas roças ao redor da maloca). Os meninos iniciaram a dança sozinhos e depois de duas voltas as meninas entraram e engajaram-se aos meninos, formando pares de mais ou menos mesma idade. A dança prosseguiu ainda por vários minutos, com os professores (Gesuína Galdêncio Batista, Marinéia Lizardo e professor Euclides) que haviam preparado a turma torcendo para que a performance fosse boa. Depois que acabaram, foram aplaudidos de pé e mostraram-se muito contentes de terem participado. No inicio vários deles mostravam-se envergonhados de participar de modo tão ativo no evento. Mas essa vergonha parece ter sido superada quando a performance deles iniciou e ainda mais quando terminou. Depois deles, foi o momento em que os adultosda Maloca ofertaram sua performance. O homens tocavam grandes flautas verticais (sopradas pela extremidade superior) b) O segundo grupo foi com crianças e familiares da etnia Tariana/tukano, residente Florianópolis, Janeiro de 2014. 37 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Tiago Montavo, um dos bairros novos da Cidade de SGC que recebe muitos migrantes indígenas. Os tariana, embora originários da Bacia de Uaupés tradicionalmente habitados pelos Tucano, são de família linguística Aruak, como os Baniwas e os Barés. O grupo que trabalhei migrou de Iauaretê e vive na cidade de São Gabriel há aproximadamente 14 anos em busca de melhores condições de estudo. Essa é uma das razões mais comuns da mobilidade de indígenas para a cidade, e não é recente. Embora as crianças com quem trabalhei já tenham nascido em São Gabriel da Cachoeira, mantém uma conexão constante com a região de Iaueretê, marcada pela presença de Sr. Fernando e Dona Bernadete (avós maternos das crianças) e com o universo mítico familiar muito presente nas narrativas desses. Andrey, (08 anos), Andréia (07) e Adriene (05) (filhos de Izonéia Araújo) e Máyra (04 anos) (filha de Hildete Araújo e prima dos demais), foram as crianças do grupo tariana com quem convivi em Tiago Montavo. Interessante que embora os pais das crianças fossem baré e um militar nordestino, todas família se apresentava como tariana. Entre esse grupo observei o modo como narrativas das gerações anteriores são utilizadas e transformadas pelas crianças. Foi possível perceber um intenso convivio das crianças com os pais e os avós, especialmente na roça. Esse mantem o hábito de contar histórias pela noite, o que foi comprovado no repertório das narrativas das crianças. Ouvi ainda muitas narrativas dos avós sobre como era a vida dos tariana e dos tucanos em Iauaretê, como eram os rituais de iniciação (do Sr. Fernando), como Sr. Fernando tornou-se um respeitado benzedor em São Gabriel da Cachoeira. Das crianças, ouvi narrativas sobre seu dia-a-dia, suas idas nas roças, suas dinâmicas escolares, e histórias. Elas contaram ainda mitos para a câmera e inventaram suas próprias histórias, mesclando saberes do mato e da cidade. Curupiras, Jabutis, Bichos preguiças, onças, cobras eram focos das suas histórias, mas também Avarates, Belas e feras, personagens televisivos e da literatura compunham seu arsenal de personagens. Pude também gravar algumas histórias criadas pelas crianças, histórias essas que envolviam seres mitológicos dos tariana mesclados com seres do mundo virtual moderno, como os avatares. Com essas crianças, fui várias vezes para a roça e elas nos mostraram suas técnicas de pesca, os frutos que coletam, os diversos manejos de alimentos, o fazer farinha, etc. Florianópolis, Janeiro de 2014. 38 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico No convívio com essa família, pude filmar algumas histórias contadas pelos avós sobre os tariana de modo geral, seus mitos e ritos, sobre a prática de benzimento no grupo e a importância dessa para o nascimento de uma criança tariana, sobre a dimensão cosmológica e prática de ser e nascer tariana. A família em questão, embora não fale mais tariana e tenham adotado a língua tucano há muito tempo (como grande parte dessa etnia), se reconhecem como tariana e tem parentesco direto e forte conexão com o grupo de Iauaretê que fiz o filme Iauaretê, Cachoeira das Onças, onde registram o processo de reconhecimento da região como “bem cultural de caráter imaterial”. A pesquisa de campo gerou um material para reflexão sobre aspectos sóciocosmológicos, mitológicos e rituais da região, bem como sobre o modo como crianças e seus familiares vem elaborando suas vidas na cidade de SGC. Ambos os grupos tem uma relação com rituais onde a música e a dança são fundamentais meios de expressar e de recriar a vida comunitária. 3) A oportunidade de pesquisa num terceiro grupo surgiu enquanto estive em São Gabriel da Cachoeira no inicio do ano 2013 para mostrar os filmes feitos em 2012. O contato e a oportunidade de trabalhar com o grupo multiétnico, majoritariamente Nadëb (grupo de fala macu) da Comunidade de Tabocal de Uneiuxi do Município de Santa Isabel do Rio Negro se deu por causa do desenvolvimento de um projeto maior, que visava pesquisar sobre cuidado de crianças pequenas em três municípios do estado do Amazonas, o qual vou descrever com mais detalhes minha participação posteriormente neste relatório. Durante minha estada na comunidade foi possível perceber a forte conexão que esse grupo tem com a roça, com a mata, e com os rios. Duas mulheres da comunidade e várias crianças e adolescentes falaram da sua prática diária de plantio e colheita, dos jogos, das brincadeiras, do cotidiano. As crianças mostraram desde como alimentam-se no cotidiano, na produção da roça e na coleta dos frutos comuns da sua dieta (ingá, açaí, etc.), da coleta no mato e do manejo de animais para o alimento. Falaram sobre esses alimentos e apresentaram técnicas de preparação dos mesmos. Também mostraram a importância do Dabucuri, dança com o mesmo nome do ritual Florianópolis, Janeiro de 2014. 39 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico de oferenda tradicional entre os povos do noroeste amazônico. Num longo diálogo com essas, foram mostrando como aprendem a dançar e cantar e como alguns entre eles se tornam especialistas no canto, por exemplo. Notei que naquela região o puxador da dança e do canto sempre é um personagem importante, com mais conhecimento. As crianças dançaram o dabucuri e permitiram que filmássemos. Esse momento foi muito especial pois foi onde pude perceber como um especialista vai se destacando no grupo – quem canta, quem dança, etc. Também mostraram suas brincadeiras no rio e o perfeito manejo que tem desde pequenas das canoas. O banho no rio não é só um momento de higienização pessoal; trata-se de um momento de jogos, brincadeiras, e de intenso convívio entre eles. A comunidade de Tabocal tem uma mulher como governadora, aspecto bastante incomum naquela região. Essa no entanto, era da etnia tucano, grupo tradicionalmente conhecido por estabelecer com os macu uma relação hierárquica. Essa governadora fora designada pelo próprio grupo como governadora. Dona Lurdes, a governadora, e Dona Marlene, Nadëb, nos receberam e nos acompanharam durante parte do dia da filmagem com as crianças, mostrando especialmente a roça e o manejo de alguns alimentos. A presença de minha família em campo foi bastante interessante, já que as crianças gostavam de interagir com minha filha e achavam engraçado o seu jeito de falar, de andar, de querer aprender suas técnicas. Embora tenha sido um passagem bastante rápida na comunidade, ficando apenas dois dias, esse contato foi intenso e muito produtivo. As crianças gostaram muito de contar histórias, e de aparecer frente à câmera. Dois filmes foram possíveis desse contato com o grupo – um deles de uma narrativa mítica contada por uma menina de 10 anos de idade e o outro das crianças e das duas mulheres mostrando a vida comunitária. Esse último filme contem ainda as crianças dançando o dabucuri e cantando. Peixes, jabutis, antas, jaguares, bichos preguiça, sucuris, Curupiras, peixes são personagens que aparecem com muita frequência nas narrativas das crianças dos três locais onde pesquisei, revelando a presença desses nos seus imaginários e em diversos casos, essas diferentes espécies estão ainda presentes nos seus cotidianos. Florianópolis, Janeiro de 2014. 40 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Participando da vida comunitária e familiar, crianças ouvem e contam histórias míticas. Segundo Robin Wright (1981) a narração de mitos é “uma forma de performance artística e um diálogo entre contador e ouvinte; a arte é drama e através dela, os tempos sagrados são criados e recriados.” (1981: 459). Pela informação fornecida por alguns adultos em campo, essas histórias míticas contadas pelas crianças podem ser pedaços de mitos mais longos que somente especialistas ou velhos contam na sua totalidade, ou partes que elas puderam gravar rapidamente, mas isso não quer dizer que não consideram crianças capazes de contar os mitos. Narrar o mundo mítico também é narrar o mundo vivido. Como vimos na revisão bibliográfica sobre o noroeste amazônico, essa é uma forma muito usual de transmissão de saberes sobre comportamento, relação com lugares, modos de plantio, passagem de fórmulas morais, etc. Esse dado se apresentou muito fortemente em campo também. A narrativa mítica tem seu próprio estilo em diferentes contextos e no noroeste, constituindo-se num importante modo de transmissão de conhecimento, tem lugar no cotidiano do grupo. As crianças aprendem esse gênero desde muito cedo, mas também aprendem a inventar suas próprias narrativas em diferentes gêneros. Em quase todos os contextos em que estive, eram as crianças pequenas (3, 4, 5 anos) as mais ousadas nas suas invenções narrativas. Misturavam seres e coisas de diferentes mundos, fazendo-os se comunicarem, conviverem, entrarem em conflito, resolverem esses conflitos. As crianças com aproximadamente 10 anos já estavam sempre mais aptas a contarem os contos clássicos da sua comunidade. Nesses contos, mitos, e historias contadas por ambos os grupos animais assumem funções bastante humanas, revelando o perspectivismo amazônico. Embora algumas crianças vivam em bairros bastante urbanizados, uma das questões fundamentais no contexto de todas as crianças que estive em contato foi a forte relação mantida com as roças. Todas elas, sem exceção, frequentavam roças com pais e com os avós. As únicas crianças que conheci que não frequentavam as roças eram aquelas que o sistema PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) proibia e culpabilizava a prática de levar crianças para as roças. Essas não foram crianças que estive em contato permanente. Como a produção obtida no manejo das roças segue sendo um dos principais recursos alimentares dessas famílias, os pais Florianópolis, Janeiro de 2014. 41 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico achavam fundamental elas aprenderem a plantar e colher e mesmo a entender o universo cultural-mítico que envolve essa relação com as plantas e os animais, e especialmente com a terra. Junto com a roça estão ainda a caça, a pesca e a coleta de frutos nas matas próximas. Embora algumas famílias também dependam de bolsa família (um importante recurso para famílias mais urbanizadas para adquirir suplementos como sal, açúcar, roupas, sapatos), a relação com diversos alimentos, animais e artefatos próprios do uso na roça estão muito presentes no seu dia a dia e as crianças aprendem desde muito cedo a lidar com esses saberes. São gradativamente introduzidas nessas tarefas e uma criança de 5, 6 anos pode perfeitamente pescar, conseguir na mata próxima recursos para sua própria alimentação. As crianças participam com frequência de atividades de plantio, colheita, pesca artesanal, e muitas delas reconhecem de modo bastante apurado uma diversidade de bichos, árvores e outros seres viventes naquele meio, alguns desse nem sempre visíveis para mim, como espíritos, protetores das matas, etc. Assim, a relação com os animais e com uma diversidade impressionante de frutos fazem parte da vida cotidiana dessas crianças e de seus familiares. Uma das criticas que se ouve sobre as crianças que vivem próximas das cidades é que essas perdem a cultura familiar por estarem em contato com a televisão, com escolas, com novos modos de vida. Embora isso possa ser em parte verdade porque o convívio com esses aparatos modernos podem mudar a vida das crianças, o que parece também verdadeiro é que a implantação das escolas dentro das comunidades com ensino em português e com professores que não conhecem a língua e a cultura da região, tem levado um saber bancário para a vida dessas crianças, mesmo nas comunidades mais afastadas. Alguns profissionais desprezam por completo os saberes locais, os conhecimentos dos velhos, negando as dinâmicas de passagem de conhecimento criados pela própria comunidade. Mas de qualquer modo, o que percebi nas comunidades em que fui, foi uma constante comunicação entre os saberes familiares e os introduzidos pela escola. Também a forte presença das famílias na vida das crianças garantia esse diálogo. É preciso sempre perceber as resistências que contextos como esses geram, como eles são agregados nas dinâmicas locais e como a própria comunidade elabora esses aspectos. Florianópolis, Janeiro de 2014. 42 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico As crianças, convivendo com diferentes realidades, precisavam dominar um arsenal bastante grande de aspectos que são vistos como do mundo urbano, frequentando aulas, assistindo tv, participando das narrativas locais, vivendo relações entre pares mais descontinuadas que aquelas crianças que vivem em ambientes menos urbanos. As crianças mesclam esses universos e muitos outros, e isso se faz expressão nas suas falas, nas narrativas, no modo de moverem-se. No segundo ano da pesquisa, um retorno a campo possibilitou revisitar dados obtidos no primeiro ano. As visitas aos grupos se deu em março de 2013, sendo importante momento para fazer também um retorno às comunidades das filmagens obtidas no ano anterior. Duas mostras dos filmes foram feitas: uma na Maloca do Conhecimento e a outra no Clube do Instituto Sociambiental (ISA) Rio Negro. A primeira mostra, na Maloca do Conhecimento, Itacoatiara Mirim, contou com a presença das crianças que participaram das filmagens no ano anterior, mas também de outros membros da comunidade, especialmente os professores e os membros da família do Sr. Luiz, Mestre da Maloca e do Sr. Mário, um dos protagonistas de um dos filmes. Improvisamos um lençol como tela e usamos um projetor que a comunidade tem. Os filmes foram aplaudidos com alegria pelos participantes e depois da mostra fizemos um debate para ouvir sugestões de mudanças dos mesmos. Esse foi ainda um momento importante da pesquisa, revelando o gosto das crianças e dos adultos em verem-se na tela improvisada que montamos na Maloca. Os filmes foram aprovados e a sua publicação na internet e a posterior produção de um DVD profissional autorizada. Cópias provisórias do DVDs foram deixadas na comunidade para que pudessem assistir novamente em outros momentos. A Casa do Conhecimento tem sua própria câmera filmadora e eles também estão produzindo filmes, e aproximando-se desse tecnologia. Depois da mostra dos filmes na Maloca, dois jovens Baniwa que no ano anterior não tinham filmado a história contada por eles, fizeram questão de fazê-lo, para que sua narrativa sobre como os Baniwa conseguiram o fogo fizesse parte do DVD finalizado. Esse é o filme “Fogo” e trata-se de uma história contada pelos mais velhos e presente nos livros de narrativas indígenas da região. Florianópolis, Janeiro de 2014. 43 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico A mostra naquela comunidade revelou o gosto das crianças pela imagem, ao mesmo tempo revelou a possibilidade da reflexividade dessas pelos seus corealizadores. Senhor Mário, o pajé da comunidade estava muito feliz por se ver como um dos personagens principais do documentário “Gente Grava pelo Coração”. Depois de assistir o filme disse que ficou ainda mais entusiasmado para aprender sobre como curar as pessoas. Disse querer se tornar um pajé ainda mais eficiente, para poder contribuir com a sua comunidade e com o crescimento da cultura Baniwa. Embora o filme revelasse uma questão importante para os Baniwa, que gravam sua cultura e seu modo de vida pelo coração, a filmadora, contraditoriamente pode levar um saber e uma presença da sua cultura em outros meios, gravando o que eles falam sobre gravar no coração. Disse que agora mesmo que a cultura Baniwa não morre mais – está também gravada na forma de filme. A segunda mostra de filmes se deu na Sede do Instituto Socioambiental (ISA), no dia 09 de abril de 2013, e foi promovida numa parceira do ISA Rio Negro, Foirn, MUSA/PPGAS/UFSC e Shine a Light. Embora não tenham aparecido muitas pessoas, foi um momento onde a família Tariano pode assistir os filmes produzidos pelas crianças daquela família. Foi um momento de grande emoção para Andrey (07) , um dos narradores do filme “Curupira”. Ele esteve todo o tempo empenhado em aprender como filmar, mas especialmente gostou de se ver como narrador. Seus familiares aplaudiram sua performance, o que o fez muito feliz. A menina Mayra, de 4 anos, também ficou entusiasmada em ver-se como narradora de uma longa história e como haviam poucas pessoas presentes, eles pediram para repetir os filmes e assistimos duas vezes cada um deles. Segue abaixo a descrição da produção audiovisual dessas etapas em campo. 2.3. Produzir material audiovisual dessas performances Florianópolis, Janeiro de 2014. 44 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Durante o período da pesquisa etnográfica, diversas narrativas e performances foram filmadas, assim como cenas cotidianas que revelam o saber-fazer, onde crianças estão engajadas ativamente. Tanto no primeiro, quanto no segundo ano, o uso da mídia digital foi importantíssimo para captar um ponto de vista das crianças, suas falas sobre o mundo onde vivem, e especialmente para captar suas performances e narrativas, seja de mitos que fazem parte da cosmologia local quanto de histórias que essa criaram à partir do acesso a narrativas orais da comunidades ou da vida televisiva e da literatura presente em suas vidas cotidianas. Embora vivam ainda a vida comunitária bastante intensa, as crianças acessam de modo bastante frequente a mídia televisiva, o que certamente lhes dá material para produzirem imaginários outros sobre o mundo que não somente aqueles narrados nas suas casas pelos mais velhos. Na etnia tariana filmei as crianças pescando, indo para a roça, ajudando no fabrico da farinha de mandioca, interagindo com seus familiares, com minha família (que esteve em campo comigo). Filmei ainda elas ouvindo as narrativas dos avós, bem como elas mesmas contando histórias que inventaram ou que a elas foram contadas. Com essa família Tariana, além das histórias criadas pelas crianças, foi filmado uma narrativa feita por Dona Bernadete (A Preguiça, avó do mundo) e também uma longa reflexão da família sobre o que significa ser tariana na cidade de SGC e a prática do benzimento no nascimento de um tariana. Em Itacoatiara Mirim as crianças inventaram histórias que embora tenham sido criadas coletivamente naquele momento da pesquisa, remetem ao universo mítico da região e enfatizam a ideia de transformação – animais são gente e tem relações entre si de afetos e inimizade. Entre as histórias que as crianças inventaram, duas destaco aqui por ajudarem a pensar a mitologia e a criação do mundo. Foi filmado um ritual Podaali (Dabucuri) na “Casa do Conhecimento” onde as crianças de Itacoatiara, devidamente pintadas e vestidas para o evento, estão dançando e tocando pequenas flautas. Essa dança, juntamente com filmagem da reflexão de alguns membros da comunidade sobre o evento, compõem um documentário sobre a importância do ritual da música e da dança para os Baniwa do noroeste amazônico. Florianópolis, Janeiro de 2014. 45 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico No segundo ano do projeto, foram realizados filmes com crianças e moradores de Tabocal de Uneiuxi, Santa Isabel do Rio Negro. Os filmes foram feitos por mim feito em colaboração com Shine a Light, Bernard Van Leer Foundation, e pesquisadores do PPGAS/UFAM, e fizeram parte da pesquisa "A saúde de crianças em áreas rurais do Estado de Amazonas". Esse projeto foi possível graças ao primeiro ano de atividades com as crianças indígenas em São Gabriel da Cachoeira. Foi um desafio entender como crianças pequenas — indígenas, caboclas, ou ribeirinhas — são cuidadas e se cuidam naqueles municípios, e como acessam sistemas formais de saúde no Estado de Amazonas. O objetivo do projeto foi entender e documentar os modos tradicionais de cuidado de crianças pequenas no Estado, e pensar os desafios e as fortalezas de sistemas de saúde no Estado para propor políticas públicas. Embora tivesse também preocupação com o cuidado de crianças, performances, narrativas e a agência de crianças vivendo entre o mundo tradicional de rios e matos, e a vida nas pequenas cidades do Amazonas foram alvo dos registros. Como nos demais filmes, trabalhei em parceira com Kurt Shaw. Sem o esforço em conjunto esses filmes não seriam possíveis. Rosilene Fonseca, moradora de Santa Isabel e antropóloga formada pela UFAM participou do dia das filmagens. As crianças participaram ativamente da filmagem, mostrando suas brincadeiras, seus conhecimentos sobre comida, higiene, dança, música, sobre cuidados de si e as estratégias da comunidade para formar e cuidar dos seus filhos. As narrativas e performances apresentadas nesses filmes revelam e produzem um saber único sobre o universo natural e cultural onde vivem. Os filmes que resultaram da pesquisa estão citados abaixo e estão sendo divulgados no Blog http://inventar-se.blogspot.com/. A edição foi feita por mim e por Kurt Shaw, que também foi o animador dos filmes em vários casos com desenhos produzidos pelas crianças durante o período em que estive em campo. 2.3.1. Filmes gravados em Itacoatiara Mirim - SGC 1) Como o jabuti comeu a onça: Trata-se de uma história inventada por Florianópolis, Janeiro de 2014. 46 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico crianças de aproximadamente 8 anos da comunidade de Itacoatiara Mirim. Além da história ter sido narrada por um dos garotos, foi representada pelo grupo e desenhos foram feitos para criar um filme ficção animado. Animação, 3’02, Itacoatiara Mirim, AM, 2012. http://www.youtube.com/watch?v=WoLQv-yHzhA 2) O Peixe, a Anta, e os Jabutis: História inventada pelas crianças de 04 a 08 anos de Itacoatiara Mirim, que remete ao universo relacional entre diferentes animais-gente do ambiente natural da comunidade. Como o primeiro filme, esse foi narrado por uma das crianças, interpretado para a câmera e desenhos dos personagens ajudam a construir o filme de animação. Narrativa animada, 5’53, Itacoatiara, AM, 2012. http://www.youtube.com/watch?v=O3Z4AXd14XE 3) Fogo: Um mito sobre o modo como os Baniwa conseguiram o fogo, narrado pelos netos do Seu Luiz Laureano da Silva, articulador da Casa do Conhecimento da comunidade de Itacoatiara Mirim. Narrativa animada, 2’17, Itacoatiara Mirin, SGC, AM, 2013. http://www.youtube.com/watch?v=5dHMQ_6-8RE 4) Gente grava pelo coração – Um ritual dos Baniwa com a participação das crianças dançando e tocando flautas. Doc, 15 min, Iatacoatiara, AM, 2012. Online http://www.youtube.com/watch?v=_7NO3p89dxc 2.3.2. Filmes gravados no Bairro Tiago Montavo - SGC 5) Os Zelos da Preguiça: filme onde Dona Bernadete Araújo conta aos seus netos uma história que ouvia de seu pai em Iaueretê. Parte do universo mítico regional, descreve a relação entre pessoas e animais da floresta amazônica. A narrativa de Dona Bernadete foi editada e animada com Florianópolis, Janeiro de 2014. 47 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico desenhos feitos por seus netos. Narrativa animada, 3’30, São Gabriel da Cachoeira, AM, 2012. http://www.youtube.com/watch?v=zKg5kvjTILs 6) O fantástico encontro da Bela com o lobisomem e o Avatar: Trata-se de uma história que Mayra, uma menina da etnia tariana de 4 anos de idade inventa à partir da junção de histórias ouvidas ou assistidas na teve. Editada e animada aproveitando desenhos produzidos pela narradora e por seus primos. Narrativa animada, 7’06, São Gabriel da Cachoeira, AM, 2012. http://www.youtube.com/watch?v=YH-Q3ms-N_8 7) Curupira: Justiceiro do Amazonas: narrativa de Andrey, tariana de 07 anos, sobre o Curupira, protetor da Floresta, e o ataque que esse faz a caçadores que matam mais que podem comer. A história foi animada por Kurt Shaw. Animação, 2’59, SGC, AM, 2012. http://www.youtube.com/watch?v=r898J_Dl3P0 2.3.3. Filmes gravados em Tabocal de Uneiuxi – Santa Isabel do Rio Negro 8) Escrito na Areia: Leidiana dos Santos Miranda, uma menina de 10 anos da comunidade indígena Tabocal do Uneiuxi, Santa Isabel do Rio Negro, narra a saga de um Jabuti enterrado na lama por uma anta. Em busca do inimigo, persegue a única pista deixada por esse: sua merda. Passados nove anos, o Jabuti vinga-se da Anta. Animação das fotos dos desenhos das crianças da comunidade. Narrativa animada, 4 min, Tabocal de Uniuexi, Santa Isabel, AM, 2013. http://www.youtube.com/watch?v=qPcCKVfvRbk 9) Cuidando da Gente: Feito em Tabocal do Uneiuxi, Médio Rio Negro, Amazonas, o filme apresenta crianças da comunidade falando sobre comida, saúde, banho e cuidados de si. Mostra ainda os cuidados com a roça e a dança típica da região dançada no Dabucuri. Em grande parte Nadëb, mas Florianópolis, Janeiro de 2014. 48 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico também Tucano, Tariano, e Ianomâmi mostram a relação entre alimentos, saúde, e sazonalidade, e nos oferecem pistas para pensar como no quotidiano das crianças oposições fáceis entre trabalhar e brincar, estudar e jogar não são percebidos do mesmo modo naquela comunidade. No interior de Amazonas --- como em muitas sociedades tradicionais -- esta divisão não existe. O filme mostra como o cuidado de crianças é uma atividade integrada na vida familiar e comunitária e que o aprendizado infantil em Tabocal vai muito além daquele oferecido nos bancos escolares. Documentário, 14 minutos, Tabocal de Uniuexi, SIRN, AM, 2013. Online http://www.youtube.com/watch?v=szONJY-4zuo 2.4. Escrever artigo etnográfico relacionado ao tópico específico do projeto de pesquisa e publicações Durante esses dois anos, alguns textos foram produzidos, com o intuito de fazer uma reflexão sobre performances, narrativas e produção de sujeitos, especialmente aqueles que se referem a produção e (auto produção) das crianças. As entrevistas feitas com pesquisadores da área de etnologia/etnomusicologia exigiu leitura e aprofundamento nos tópicos de cada pesquisador entrevistado. Portanto, alguns textos introdutórios das entrevistas também fazem parte dessa produção. 2.4.1. Artigos escritos encaminhados para publicação e DVDs produzidos 1) Performance Narrativa, literatura oral e subjetivação entre crianças pequenas: O caso do lobo mau (que casou) com a vovozinha. Personagens da literatura infantil clássica tem suas trajetórias e ações delineadas e conhecidas. Quando se fala de um personagem normalmente se sabe qual sua ação e sua destinação. Nas narrativas de crianças pequenas, no entanto, tais personagens são subjetivados de tal modo que passam a conviver num mundo de possibilidades outras que dão desfechos inusitados Florianópolis, Janeiro de 2014. 49 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico à suas vidas, sendo absolvidos ou absolvendo-se de um fim único. Narrativas feitas por crianças pequenas de um bairro de periferia do Rio de Janeiro da história clássica “Chapeuzinho Vermelho” feita frente à câmera videográfica, trazem interessantes reflexões sobre: 1) como eventos narrados e eventos narrativos se relacionam para essas; 2) como o evento narrativo expressa a própria subjetivação do narrador e sua capacidade de fazer interagir mundos em diferentes níveis, contextualizando e recontextualizando histórias, incluindo a sua própria; e 3) finalmente, como a experiência narrativa é um aspecto fundamental para a expressão e constituição de sujeitos em qualquer fase da vida. Artigo aceito para publicação na ILHA – Revista de Antropologia – Programa de Pós Graduação em Antropologia Social – Universidade Federal de Santa Catarina – Campus Universitário – 88040-900 Florianópolis, SC, Brasil, 2014. Edição Especial Arte e Socialidades. Anexo no link http://www.shinealight.org/Portuguese/anexoscnpq2013/Lobomauevovozinha.pdf 2) Cuidando de crianças: Uma introdução para a pesquisa das práticas amazonenses: O artigo introduz o livro Cuidados de Crianças Ribeirinhas, destacando a importância da pesquisa com crianças indígenas. Está publicado online in: Cuidados de Crianças Ribeirinhas. Florianópolis e Manaus: Shine a Light e UFAM, 2013. Anexo no Link http://linhadebaseamazonas.wordpress.com/2013/10/03/cuidadosde-criancas-ribeirinhas/ 3) A produção de Pessoas e os sistemas de saúde no Amazonas. Capítulo 1 do livro Cuidados de Crianças Ribeirinhas, o artigo mostra como a produção da pessoa é um tema fundamental quando se estuda cuidado de crianças no Amazonas. Faz uma revisão bibliográfica sobre a etnologia amazônica e o tema da produção da pessoa naquele contexto, mostrando como o descaso total da sociedade nacional sobre os modos de produção de gente e pode gerar conflitos intransponíveis. Também aponta a importância de um diálogo entre agentes de saúde pública e os ribeirinhos para poder criar dinâmicas apropriadas que auxiliem as comunidades afastadas no cuidado da saúde das crianças pequenas. In: Cuidado de Crianças Ribeirinhas. Florianópolis e Manaus: Shine a Light e UFAM, 2013. Anexo no link http://www.adrmarketplace.com/Cidade/criancasamazonas.pdf Florianópolis, Janeiro de 2014. 50 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 4) Quem conta um conto aumenta muito mais que um ponto. O artigo analisa narrativas de crianças pequenas e os saberes que essas expressam sobre o meio cultural do qual fazem parte. Suas performances revelam como entendem e dinamizam as relações com seus pares, incluindo as relações de gênero, bem como com outros seres, imaginários ou não. Através dessas narrativas estão testando possibilidades (de seres, de interação, de linguagens) abrindo um leque para uma estética de si. Apoiada na experiência da produção fílmica com crianças, chamo atenção para a capacidade transformativa e criativa presente nas performances narrativas de crianças pequenas e pontuo aspectos filosóficos do seu pensamento. Essas, narrando frente à câmera e à platéia, fazem-se sujeitos: produzem a si mesmas e o mundo. O artigo foi aceito para publicação na Perspectiva: Revista do Centro de Educação da UFSC, 2014. Edição Especial "Mídia, gênero e infância" sobre ISSN print 0102-5473, ISSN 2175-795X Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. Anexo no link http://www.shinealight.org/Portuguese/anexoscnpq2013/generoecriancasdois.pdf 5) Revisitando o Brasil e o campo entre os Kisêdjê (Suyás): Conversa com Anthony Seeger. Entrevistar Anthony Seeger foi um grande desafio. Muito se sabe dele no Brasil e sua importância para a enologia brasileira é grande. Escrever sobre o autor introduzindo a entrevista foi apontar essa profundidade com que o autor lidou e lida com a pesquisa e com as relações que estabeleceu nesses anos de contato com o Brasil. Em análise para publicação pela Revista MANA: Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social - PPGAS-Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Anexo no link http://www.shinealight.org/Portuguese/anexoscnpq2013/manaSeeger.pdf 6) Sons e Sentidos: Entrevista com Steven Feld. O texto introdutório sobre Feld destaca sua capacidade de pensar e inovar na antropologia dos sentidos, dando especial atenção ao som. O autor critica o uso da expressão musica quando se faz pesquisa com povos indígenas. Em análise para publicação na Revista de Florianópolis, Janeiro de 2014. 51 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Antropologia da USP. USP, São Paulo. Anexo no link http://www.shinealight.org/Portuguese/anexoscnpq2013/StevenFeldentrevista-usp.pdf 7) Tornando-se Outro: Entrevista com Suzanne Oakdale. A introdução à entrevista feita com Suzanne Oakdale foi mais um texto elaborado na série entrevistas. Suzanne é uma autora pouco conhecida no Brasil, mas seu trabalho tem um destaque importante na formação do self e nas narrativas, dois tópicos fundamentais para a pesquisa que fiz no noroeste amazônico. A entrevista foi aceita para publicação na Revista Horizontes Antropológicos, Revista de Antropologia do PPGAS UFGRS, Porto Alegre, 2014. edição ainda a definir. Anexo no link http://www.shinealight.org/Portuguese/anexoscnpq2013/Suzanneentrevista.pdf 9) Crianças Amazônicas. Narrativas e performances de (e sobre) crianças indígenas e caboclas do Amazonas. DVD com a produção audiovisual das performances e narrativas das crianças feita em pesquisa de campo. O material está em formato de DVD e foi encaminhando para reprodução em série para distribuição. Possui um encarte explicativo do projeto. Ver em anexo o encarte do DVD com descrição dos filmes no link http://www.shinealight.org/Portuguese/anexoscnpq2013/DVDBooklet.pdf 2.4.2 Artigos, livros e DVDs sendo produzidos O primeiro ano do projeto foi dedicado especialmente à realização das entrevistas, revisão bibliográfica, pesquisa de campo e trabalho com material audiovisual. Foi um período de intenso trabalho, sem no entanto ter sido tempo suficiente para efetivar as devidas publicações que uma pesquisa assim gera. No segundo ano foi possível a finalização de alguns artigos e o envio dos mesmos para publicação, como indicado anteriormente. No entanto, a produção desses dois anos de entrevistas e pesquisa em campo geraram material que ainda será finalizado e possivelmente encaminhando Florianópolis, Janeiro de 2014. 52 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para publicação. A seguir refiro-me a artigos e entrevistas que estão sendo editados para serem enviados para publicação. Cito ainda o material audiovisual produzido nas entrevistas com os pesquisadores, que permitirá uma produção audiovisual em formato dvd e que será, com as devidas permissões, publicada on-line. 01) Sobre Jabutis, Avatares e flautas: Performances e narrativas de crianças indígenas do Noroeste Amazônico - o artigo apresenta uma reflexão sobre performances (narrativa, dança e canto) de crianças indígenas e familiares que vivem na cidade de São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel do Rio Negro/Noroeste Amazônico. As crianças indígenas, de etnias variadas mas especialmente Baniwa, Nadëb e tariana apresentam em suas narrativas e performances um interessante caminho para pensar o mito e a tradição e o ato de criação dos mesmos. Com criatividade, elas tanto se apoiam nas narrativas e conhecimentos míticas apresentados por seus familiares para suas performances, quanto recriam esse mundo no seu imaginário, mesclando com o cotidiano na cidade e na roça. O artigo foi apresentado em dois eventos, e por isso deve sofrer modificações para que seja finalizado. A apresentação do mesmo no evento Jornadas Antropológicas gerou novas reflexões que devem ser incluídas na versão final. 02) Ouvir/Ver/Sentir: Entrevista com Deise Lucy Montardo” – em formato de vídeo e artigo – em português. 03)Sons que ensinam: Entrevista com Amanda Minks” - em formato de artigo – em inglês. 04)A Festa da Jaguatirica: Entrevista com Rafael de Menezes Bastos - em formato de vídeo e artigo – em português. 05) Um musicologia indígena: Entrevista com Acácio Tadeu Piedade – em formato de vídeo e artigo – em português. Florianópolis, Janeiro de 2014. 53 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 06) Uma menina em campo: Entrevista com Julia Mello Piedade - em formato de vídeo e artigo – em português. 07) A família antropológica: Segunda parte da entrevista com Anthony Seeger, junto com as entrevistas de suas duas filhas e sua esposa, a pesquisadora Judith Seeger. em formato de artigo – em português. O8)Os sons dos desafios do campo: Livro da coletânea das entrevistas – por orientação do supervisor desse pós-doutoramento, as entrevistas feitas com os pesquisadores comporão um livro, a ser encaminhado para publicação. 09)Cuidados de Crianças Ribeirinhas: publicação do livro já escrito e publicado apenas online descrito nesse relatório. Será reeditado e encaminhado para publicação. 2.5. Cooperar e participar do MUSA com temas relacionados à pesquisa e apresentar seminários sobre o projeto em desenvolvimento Durante esses dois anos estive presente em várias reuniões e encontros promovidos pelo MUSA, participando ativamente dos debates. Cito alguns desses encontros: 2.5.1. Participação de apresentações de projetos de pesquisa e palestras dos membros do MUSA Samanta Fioravante Oliveira (Graduanda em Antropologia - UFSC)- apresentação do Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso - A farra sem boi em Ganchos/SC América Larrain (doutoranda UFSC) - apresentação do Projeto de Tese: “Formas e Cores” do Artesanato Indígena na Colômbia - O Sombrero Vueltiao Zenú. Florianópolis, Janeiro de 2014. 54 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Izomar Lacerda – (doutorando PPGAS/UFSC) – apresentação do Projeto de Tese Guerra, Sopro e Musicalidades Ashaninka: uma etnografia na Terra Indígena Kampa do Rio Amônia, na Amazônia do Alto Juruá. Letícia Grala Dias (mestranda do PPGAS/UFSC) - apresentação do Projeto de Mestrado: Benzeduras e Benzedeiras da Barra da Lagoa – Florianópolis, SC. Janaina Moscal – (doutoranda do PPGAS/UFSC) - Apresentação do projeto de Pesquisa de doutorado: Música e Movimento Social. Em 30/10/2012. Izomar Lacerda - (doutorando PPGAS/UFSC) - Apresentação preliminar dos dados de Campo de Guerra, Sopro e Musicalidades Ashaninka. Eduardo Ferraro (mestrando PPGAS/UFSC) - Apresentação do projeto de pesquisa de mestrado "Transformações no gauchismo através da música". Em 20/09/2013. Blanca Cecilia Gómez Lozano (Mestranda em antropologia) - apresentação do projeto de pesquisa da aluno do mestrado “Do Hato ao Palco: A música popular llanera na construção de identidades e territorialidades nos Llanos Orientales colombianos” de. 04/10/2013. Primeiro encontro em MUSA E MUSICS (UDESC), visando criar espaços de debate e interação dos dois núcloes de pesquisa. Nov. 2013. Palestras assistidas no MUSA: Sonia Lourenço: Palestra Patrimônio cultural e saberes tradicionais quilombolas de Chapada dos Guimarães. Maio de 2013. Allan de Paula Oliveira – Palestra Um lugar chamado Brasil. Capital: Asunção. Em 14/06/2013. Florianópolis, Janeiro de 2014. 55 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Lançamento oficial do Livro: A Festa da Jaguatirica: uma interpretação Críticointerpretativa no COMPASSO ABERTO - Escola Livre de Música, na Av. Rio Branco, 223, Centro de Florianópolis/SC. Editado pela EDUFSC, o livro inaugura a Série Brasil Plural do Instituto Brasil Plural, tendo como base a tese de doutorado do Professor Rafael José de Menezes Bastos defendida em 1990 na USP sob a orientação da professora Lux Vidal. Esta é uma obra pioneira e fundamental da etnomusicologia, apresentando de forma inovadora uma extensa e intensa descrição analítica – tendo como ponto central a música - do ritual do Yawari dos índios Kamayurá do Alto Xingu. 19/10/2013. 2.5.2. Apresentação do Projeto Duplos e Multiplos e dos resultados da pesquisa de Pós-Doc no MUSA a) Apresentação do Projeto de Pesquisa deste pós-doutoramento ao grupo do MUSA no dia 18/05/2012, onde pude partilhar e ouvir comentários e sugestões para o mesmo. b) Um segundo momento de reflexão sobre este projeto junto aos integrantes do MUSA contando ainda com a participação de alunos e professores do PPGAS UFSC, foi no 1o. Ciclo de Palestras do PPGAS/UFSC. Neste evento proferi a palestra “Entre Jaguares e Avatares: performances de crianças indígenas na cidade de São Gabriel – Rio Negro” no dia 17 de outubro de 2012, apresentando uma reflexão preliminar dos dados obtidos em campo. c) Mostra dos filmes da pesquisa de campo em São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel/ Rio Negro/AM. Sala do MUSA/PPGAS/UFSC. Foi um importante momento de partilhamento de parte do resultado da pesquisa com os membros do MUSA. Dia 06/09/2013. 2.6. Participar de seminários ministrados pelo Professor Anthony Seeger na Florianópolis, Janeiro de 2014. 56 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico UCLA entre os meses de janeiro e março de 2012 Na Universidade da Califórnia de Los Angeles (UCLA), sob a orientação do professor Anthony Seeger, participei das seguintes atividades: 2.6.1. Aulas de Archiving ministrada por Anthony Seeger – embora essa disciplina não fosse proposta no projeto, foi um meio de interagir e conhecer melhor o professor Anthony Seeger e seus alunos na UCLA. Durante as aulas, ministradas sempre com muito bom humor e organização, pude conhecer mais de perto os esforços de Anthony Seeger para revitalizar arquivos de mídia (som, imagem especialmente), formando uma verdadeira rede de arquivamento sobre música e imagem no mundo. Faz um importante trabalho na UCLA e no Smithsonian Institute, renovando o interesse de muitas pessoas para o tema. Empenhado no tema há alguns anos, o autor tem um proposta interessante de pensar o arquivamento. Sua perspectiva é de que os arquivos não são importantes por causa do passado, como se propõe comumente, mas por causa do presente e do futuro. Trabalhando com arquivos, Seeger percebeu o quanto as pessoas mudavam suas vidas quando podiam acessar determinados filmes ou músicas (familiares ou não), e passou a defender a importância de arquivos se tornarem mais acessíveis e valorizados. 2.6.2. Colóquios na UCLA: participei da série de Colóquios organizados pelo departamento de Etnomusicologia da UCLA, onde Seeger foi o conferencista. A “Série de Colóquios Nazir Ali Jairazbhoy” apresenta uma variedade de leituras focando em pesquisas e temas importantes no campo da etnomusicologia. a) "'Are you related to...?' Growing up in the Seeger Family -- Music, Politics, and Repression 1900-1958" no dia - 25 janeiro de 2012. b) "Why Study the Súya Indians of Brazil?: Anthropology, Music, and Ethnomusicology" em Feb.22.2012 - 01:00 p.m. - 03:00 p.m. Florianópolis, Janeiro de 2014. 57 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico c) "What is it all for? Applying Scholarship Outside the Classroom: Indigenous Rights, Archiving, Folkways Records, and Professional Organizations" Wed. Mar. 7.2012 01:00 p.m. - 03:00 p.m. 2.6.3. Participação da 46th Annual Meeting of SEMSCHC - Society for Ethnomusicology, Southern Califórnia and Hawaii Chapter, realizado no 25 de fevereiro de 2012, na Loyola Marymount University, Los Angeles, CA a convite de Anthony Seeger. 2.6.4. Pesquisa na Biblioteca da UCLA – durante minha estada em Los Angeles, aproveitei para realizar pesquisa no arquivo público online JStor. Além de obter textos importantes sobre os pesquisadores que entrevistei, tive acesso a artigos de interesse do meu projeto em especial. 2.7. Realizar entrevistas com pesquisadores reconhecidos na área de etnomusicologia, produzindo, se possível, material audiovisual destas. Um dos objetivos do projeto de Pós-Doutorado foi entrevistar alguns antropólogos que trabalham com música e/ou com indígenas das terras baixas da América do Sul. Os entrevistados até o momento são Steven Feld, Anthony Seeger, Amanda Minks, Suzanne Oakdale, Deise Lucy Montardo. Os pesquisadores Rafael José de Manezes Bastos e Acácio Piedade, ambos integrantes do MUSA, ainda serão entrevistados. Detalho abaixo aspectos das entrevistas feitas: 2.7.1. Entrevista com Anthony Seeger – Como a pesquisa de Seeger e seus escritos são bem conhecidos no Brasil, a entrevista focou em alguns aspectos teóricos, mas também pessoais da sua pesquisa com os Kisêdjê (Suyás). Como minha pesquisa envolve crianças, algumas das perguntas se voltaram para o fato que sua obra tem uma grande sensibilidade para temas como que envolvam a vida e a socialização das Florianópolis, Janeiro de 2014. 58 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico crianças, como os rituais de iniciação, a construção da pessoa, relações entre gerações, entre outros. Estive muito interessada também no fato que Seeger fez seu campo com a família (mulher e filhas) e em como esse aspecto modificou ou influenciou sua pesquisa, tema que foi bem produtivo. Seeger, embora tenha ido a campo com a família, não romantiza essa presença em campo, mas assume como elas abriram portas para determinados temas, ao mesmo tempo em que complicaram sua própria pesquisa, exigindo dividir seu tempo entre ser pesquisador e ser pai. Também abordei temas que Seeger desenvolve mais recentemente no prefácio da segunda edição do seu livro Why Suyás Sing, 200410, como a distinção entre Antropologia da Música e Antropologia Musical, ou o fato que Seeger diz que no livro Nature and Society está discutindo mais aspectos da estrutura e mudanças da sociedade suyá, e no livro Why Suyás Sing está apontando muito mais para as performances e os rituais, enfatizando o processo. Também o tema sobre arquivos e sua relação com John Blaking (que como eu estudou crianças) aparecem na entrevista. A entrevista com Seeger foi editada, gerando material audiovisual (online no Blog) e foi transcrita, editada e enviada para editores da Revista Mana, MN, Rio de Janeiro, em processo de avaliação pelos editores da Revista. 2.7.2. Entrevista com Steven Feld (UNM - fevereiro de 2012): Tive dois encontros com o pesquisador Steven Feld que foram muito produtivos. Nesses encontros o tema central foi a antropologia do som e da imagem e os desdobramentos teóricos que o autor desenvolveu nos últimos anos. Sua pesquisa entre os kaluli, um povo que vive em Bosavi (New Guinea), relaciona diferentes tipos de som a expressões dos sentimentos no cotidiano e em rituais. No livro Som e Sentimento, precocemente o autor trabalha com a antropologia do som, radicalizando uma crítica à etnomusicologia. O autor fala também sobre a presença das crianças na sua pesquisa e como isso o influenciou. Explica como a coletânea Bosovi: Rainforest Music from Papua New Guinea (3-CD anthology and booklet), released on Smithsonian Folkways Recording, registra sons entre os kaluli em diferentes momentos da vida: Disco a) 10 Revised paperback edition of Why Suyá Sing: A Musical Anthropology of an Amazonian People. A paperback with a CD published by the University of Illinois Press, 2004. Florianópolis, Janeiro de 2014. 59 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Guitar Bands of the 1990s. Disco b) Sounds and songs of Everyday life; Disc c) Sounds and Songs of Ritual and Ceremony) e expressa a vida e a cosmologia Kaluli. Mais recentemente Feld vem analisando o world music e desenvolvendo pesquisas que envolvem multimídia variadas (som, fotografia, vídeo) e texto. Feld concebe (e realiza) CDs e DVDs, - traduzidos por sons e imagens – que diz serem importantes argumentos numa pesquisa. Defende que é preciso também ouvir e ver e não somente escrever sobre o que se pesquisa. Alguns dos seus trabalhos mais atuais seguem essa perspectiva: focam nesse argumento estético e se relacionam com o que Feld chama de uma “acoustics epistemology” ou “Acoustemology”. A entrevista com Feld foi transcrita, traduzida, editada e enviada para publicação na Revista de Antropologia da USP – aguarda-se parecer dos editores da Revista. Feld não sentiu-se confortável com a filmagem da entrevista; assim, não haverá edição de material audiovisual. 2.7.3. Entrevista com Suzanne Oakdale – março de 2012 – Albuquerque/NM Suzanne Oakdale é uma antropóloga formada pela Universidade de Chicago, que foi orientada por Terence Turner. Suzanne estuda os kayabi, povo tupi guarani residente no Xingu, e sua relação com a sociedade nacional. Escreveu a tese “The Power of Experience: Agency and Identity in Kayabi Healing and Political Process in the Xingu Indigenous Park”. Suzanne falou sobre como chegou até os kayabi, dos contatos e negociações anteriores mediadas por Eduardo Viveiros de Castro, das dificuldades e facilidades do campo. Embora Suzanne assuma que não tem formação para estudar a música entre os caiabis, os cânticos guerreiros são dados importantes na sua análise sobre a constituição de pessoa e a autobiografia entre os líderes ou xamãs caiabis, tema central da sua pesquisa. Entre os temas da entrevista estava o fato que a antropologia brasileira é considerada uma das mais produtivas nas últimas décadas e como os kayabi trazem perspectivas importantes para pensar a produção antropológica atual e a relação com sociedade nacional. Falou ainda do modo como em campo esteve relacionada com crianças e como essas auxiliaram sua pesquisa. Por último Suzanne contou da sua participação no Editorial Board da Tipití: Journal of the Society for the Anthropology of Lowland South America, da importância da Florianópolis, Janeiro de 2014. 60 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Revista e especialmente da “Society for the Anthropology of Lowland South America” - SALSA - para as pesquisas na área de etnologia. Como a entrevista de Feld, a entrevista de Suzanne foi transcrita, traduzida e editada e foi aceita para publicação em 2014 pela Revista Horizontes Antropológicos, PPGAS, Porto Alegre. Suzanne também não sentiu-se confortável com a filmagem da entrevista, logo não há material audiovisual. 2.7.4. Entrevista com Amanda Minks – Oklahoma – 28 março de 2012: Amanda Minks é formada na Columbia University em Etnomusicologia (2006), especializando-se na relação entre música e linguagem, socialização e política nas Américas. É professora no Honors College (University of Oklahoma), afiliada com os Departamento de Antropologia, Native American Studies, Gender e Women’s Studies, e Musicologia. Música e antropóloga, Minks pesquisou práticas expressivas das crianças Miskitu (Corn Island, Costa Caribenha de Nicaragua), abordando estética e política das brincadeiras e canções Miskitu. Como Amanda Minks é uma autora pouco conhecida no Brasil, a entrevista se centrou na formação da autora, nos autores que mais a influenciaram, no seu principal trabalho (pesquisa entre crianças Miskitu), e no modo como entende as pesquisas de antropologia que envolvam música. A entrevista com Amanda Minks sofreu pequenos edições no conteúdo e está transcrita em inglês. Será enviada para revista internacional a ser indicada pela professora Minks. 2.7.5. Entrevista com Deise Lucy Montardo: realizada em agosto de 2012 em Manaus. Deise Lucy Montardo é pesquisadora associada ao MUSA e vem contribuindo para a pesquisa na área de antropologia da música. Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Catarina (1989), mestrado em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1995) e doutorado em Ciência Social (Antropologia Social) pela Universidade de São Paulo (2002). Atualmente é professora da Universidade Federal do Amazonas e membro da comissão editorial das revistas Antropologia em Primeira Mão, Espaço ameríndio e Tellus. Trabalha com música indígena, etnomusicologia, música, etnologia guarani e Florianópolis, Janeiro de 2014. 61 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico xamanismo. Na entrevista, Deise descreveu sua trajetória como pesquisadora, sua relação com os guaranis na pesquisa de doutorado, sua presença no MUSA e aspectos importantes da produção desse Núcleo, sua ida para a Amazônia e como isso modificou sua pesquisa. Sua entrevista revela aspectos importantes da vida, da arte da luta do povo guarani. O material audiovisual da entrevista precisa ser editada. Foi também transcrita mas ainda precisa ser editada para envio para publicação em forma de artigo. 2.7.6. Entrevista com Acácio Piedade – realizada em junho de 2013, na casa do pesquisador, em Florianópolis. Acácio é professor da UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina. Sua pesquisa estende-se desde o noroeste amazônico, lócus onde faço pesquisa de campo nesse projeto, e depois ao Xingu, onde pesquisa os Waujá. A entrevista foi filmada e está sendo editado o material audiovisual. Foi também transcrita mas ainda precisa ser editada para envio para publicação em forma de artigo. 2.7.7. Entrevista com Júlia Mello Piedade – realizada em julho de 2013 em Florianópolis, a entrevista aborda a participação da entrevista aos nove anos de idade na pesquisa de campo de seus pais, Acácio Piedade e Maria Ignez Mello entre os Waujá, no Xingu. A entrevista foi transcrita e precisa ser editada e feito uma introdução. 2.7.8. Entrevista com a família de Anthony Seeger, Judith Seeger , Margareth e Léia Seeger– realizada via internet, a entrevista com a esposa de Anthony Seeger, Judith Seeger, e com suas filhas, Margareth e Iléia pretendem complementar a primeira parte da entrevista feita com o autor sobre a presença de sua família em trabalho de Campo. 2.7.9. Entrevista com Rafael José de Menezes Bastos – A entrevista com o professor Rafael foi feita no em outubro de 2013. Foi uma longa entrevista, importante não somente para a etnologia indígena preocupada com a música, mas Florianópolis, Janeiro de 2014. 62 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para entender a história da arte no Brasil. O autor fala de inúmeros temas, partindo da sua formação em família, na universidade, da sua aproximação precoce com a música e com a arte, da ditadura no Brasil, dos seus mais influentes professores, da sua estada em campo, da sua relação com os Kamayurá, no Xingu, sobre a antropologia da música no Brasil, entre outros. A entrevista está sendo transcrita e a parte audiovisual editada para constar no site do MUSA. 2.8. Fazer contatos e estabelecer diálogos com pesquisadores da antropologia da música e da performance, buscando uma reflexão sobre o lugar das crianças nas pesquisas A ampliação da minha atuação como antropóloga na área de etnologia, um dos objetivos desse projeto de pós-doutoramento, permitiu uma série de novos contatos e vínculos com diferentes pesquisadores. Dos Estados Unidos cito especialmente os professores entrevistados (Suzanne Oakdale, Steven Feld, Amanda Minks, Anthony Seeger) mas também Jonathan Hill e Robin Wright, pesquisadores com quem venho mantendo contato para debate sobre a área da etnologia no noroeste amazônico. No Brasil, cito os pesquisadores associados do Musa, especialmente Rafael de Menezes Bastos, Kaio Domingues Hoffman, Izomar Lacerda, Maria Eugênia Dominguez, Acácio Piedade, Deise Lucy Montardo, Alexandre Herbetta, Sonia Regina Lourenço, autores que tem contribuído para uma antropologia da arte e da artisticidade das terras baixas da américa do sul. Reativei contato com os pesquisadores Aristóteles Barcelos Neto, Ângela Sacchi, Nádia Heusi, entre outros, todos colegas do PPGAS/UFSC que trabalham com povos indígenas no Brasil. Em Manaus, estive com pesquisadores do NEAI – Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena (PPGAS/ UFAM). Durante o primeiro ano do projeto estabeleci contato com pesquisadores ligados a região do Vale do Javari (Elena Welper, Pedro Cesarino, Barbara Arisi) e do Noroeste Amazônico (Jonathan Hill, Robin Wright, Acácio Piedade, Deise Lucy Montardo, Renato Athias, Geórgia Silva) e também com pesquisadores do Instituto Socioambiental (ISA - Rio Negro). Conversas com Geórgia Silva, Geraldo Andrello, Florianópolis, Janeiro de 2014. 63 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Pedro Cesarino, Flora Cabalzar e Aloisio Cabalzar foram fundamentais para realizar a pesquisa em São Gabriel da Cachoeira. Em São Gabriel encontrei com diversos pesquisadores e visitantes como Nicanor Rebolledo (professor visitante Nepi/UFSC), Pillar Miguez (Pós Doutoranda do PPGAS/UFSC), Clarice Cohn (professora da Universidade Federal de São Carlos/SP), Pieter van der Veld (agrônomo, assessor do programa ISA Rio Negro), Renato Martinelli, que estavam de passagem pela região na mesma época. Também mantive diálogo com o pessoal da FUNAI atuante na Região do Rio Negro, especialmente Fernanda Nunes. O encontro e a troca de ideias com pesquisadores indígenas, como Hildete Araújo, Gilmara Andrade, Rosilene Waikhon, Moisés da Silva, e as pesquisadoras e agentes indígenas do Setor de Mulheres da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) e da Casa de Artesanato Warirô, permitiram uma inserção nos grupos para a pesquisa de campo. Em SP, por ocasião da Reunião da ABA, estive com Danilo Paiva, que trabalha com o Hupd’äh, grupo Maku da região e conheci uma das referencias nos estudos de performance: Richard Schechner um dos grandes pensadores e realizadores de performance Studies dos Estados Unidos, professor da New York University. Durante minha estada na Ucla, fiz contatos com pesquisadores daquela instituição, mas especialmente entrei em contato com uma gama de apresentações e produções na 46th Annual Meeting of SEMSCHC - Society for Ethnomusicology, Southern Califórnia and Hawaii Chapter, realizado no 25 de fevereiro de 2012, na Loyola Marymount University, Los Angeles, CA. Anthony Seeger me apresentou a vários pesquisadores e professores de etnomusicologia nesse evento. Durante o ano de 2013 a troca com pesquisadores da região amazônica foi intensa. O contato com pesquisadores do ISA, como Renato Martilnelli, se estendeu enquanto estive em campo em março/abril de 2013. Tambem do ISA conheci o trabalho do pesquisador Adeilson Lopez, que trabalha com os Baniwas no Rio Içana e Laise Diniz, do setor de educação daquela instituição. Na Foirn – Federação das Organizações Indigenas do Rio Negro - foi possível Florianópolis, Janeiro de 2014. 64 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico um diálogo com inúmeros dos seus membros: Rosane Cruz, do setor de mulheres, Almerinda Ramos de Lima, Diretora Presidente da Foirn, André Fernando Baniwa, um importante atuante na região do Rio Negro, Braulina Aurora Baniwa. Em abril de 2013 participei do Encontro das Mulheres na FOIRN, onde conversei com várias mulheres e famílias. Foi possível entender o enorme esforço dessas mulheres para participarem do evento, vindo de muito longe. O evento foi muito interessante e entrevistei algumas famílias sobre a vinda dessas ao evento. No projeto “Saúde de crianças das áreas ruais do Estado do Amazonas”, um leque de relações se estabeleceram tanto com pesquisadores da etnologia no amazonas, quanto com pesquisadores e lideranças comunitárias locais. Coordenando o projeto de pesquisa sobre saúde no amazonas estive em intenso contato com os seguintes pesquisadores:Deise Lucy Montardo – professora da UFAM, Presidente da ABET, que coordenou parte do projeto; Inara Nascimento – professora da UFAM, campus Benjamim Constant; Rosilene Fonseca – antropóloga, mestre pela UFAM e participante da Foirn; Georgia Silva – trabalhou com os Hupda do Rio Negro. Estive ainda em constante diálogo sobre cuidado de crienças com: Marcos Pelegrini: professor da UFRR, um importante referencia na antropologia da saúde dos povos indígenas no Brasil. Tem extenso trabalho com os ianomâmis de Roraima. Luiza Garnello – pesquisadora da Fio Cruz – AM, uma das mais conceituadas pesquisadoras e médica que atua no Rio Negro. Maximiliano Ponte - pesquisador da Fio Cruz – AM, também médico que atua na área do Rio Negro. Renato Athias – professor da UFPE, que tem trabalhado há anos com os povos macu do Rio Negro– AM. Tereza Menezes – professora da UFAM, trabalha com populações da região do Rio Purus, Lábrea. pesquisadora do projeto Nova Cartografia. Maria Helena Ortolon – diretora do Museo de Antropologia da UFAM. Andrey Moreira Cardoso – médico, especialista em Saúde da Família pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2003) e Doutor Saúde Pública (2010), Florianópolis, Janeiro de 2014. 65 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ambos pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz. Integra o Grupo de Pesquisa Saúde, Epidemiologia e Antropologia dos Povos Indígenas FIOCRUZ, atuando na linha de pesquisa Epidemiologia e Saúde de Populações Indígenas. Esses contatos, e outros que por ventura não citei aqui, certamente auxiliaram a entender as dinâmicas de organizaçãoo social e política no noroeste amazônico e região, bem como a acessar saberes e produções sobre ela. 2.9. Participar de seminários, conferências, congressos da área temática 2.9.1. Como ouvinte: Participação de Colóquios de Etnomusicologia da UCLA “Série de Colóquios Nazir Ali Jairazbhoy” focando em pesquisas e temas importantes no campo da etnomusicologia. Nessa caso, como descrito anteriormente, todos foram proferidos por Anthony Seeger. a) "'Are you related to...?' Growing up in the Seeger Family -- Music, Politics, and Repression 1900-1958" no dia - 25 janeiro de 2012. b) "Why Study the Súya Indians of Brazil?: Anthropology, Music, and Ethnomusicology" em Feb.22.2012 - 01:00 p.m. - 03:00 p.m. c) "What is it all for? Applying Scholarship Outside the Classroom: Indigenous Rights, Archiving, Folkways Records, and Professional Organizations" Wed. Mar. 7.2012 01:00 p.m. - 03:00 pm. Participação da 46th Annual Meeting of SEMSCHC - Society for Ethnomusicology, Southern Califórnia and Hawaii Chapter, 25 de fevereiro de 2012, na Loyola Florianópolis, Janeiro de 2014. 66 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Marymount University, Los Angeles, CA. II Encontro de Performance da UFSC – organizado pelo Instituto Nacional de Pesquisa Brasil Plural – 11, 12, 13 de abril de 2012. 28a. Reunião da ABA – realizada de 02 a 05 de julho de 2012, na PUC-SP, SP. Seminário Universidade e Educação Indígena: Desafios para a Inclusão de qualidade e construção de um espaço intercultural de produção e troca de saberes Organização: ProfªAntonella M. I. Tassinari, Profª Edviges M. Ioris, Prof. José Nilton de AlmeidaApoio: MEC/PROEXT: Programa de extensão: Promoção da Igualdade Étnico Racial no Ensino Superior, PROCAD-Casadinho(UFGO-UFSC- UFRGS),Participação Conjunta: INCT Inclusão/SC/ Hotel Bica dÁgua. 10 e 11 de dezembro de 2012. O seminário abordou iniciativas de inclusão indígena no Ensino Superior (ações afirmativas, licenciaturas indígenas e pós-graduação), a partir de depoimentos de várias universidades brasileiras e do caso do México, buscando soluções institucionais. Colóquio Arte e Sociabilidade: pesquisa, colaborações e fronteiras. Organizado pelo IBP Instituto Nacional de Pesquisa - Brasil Plural – Manaus/ AM entre 21 e 22 de agosto de 2012. O encontro é uma atividade promovida pelo INCT Instituto Brasil Plural que prevê a pesquisa antropológica e a comparação de distintos universos no Sul e no Norte do Brasil e suas fronteiras. Cito duas conferencias que assisti- Jonathan Hill (Illinois University) dia 21 /08 - 9:30 horas- Musicalizing the Other: Ethnomusicology in the Age of Globalization - Rafael J. de Menezes Bastos (UFSC) 22/08 - 19:00 horas -Música nas Sociedades Indígenas das Terras Baixas da América do Sul: Reflexões sobre Deslocamentos e Mudanças de Rumo na Etnomusicologia. Florianópolis, Janeiro de 2014. 67 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 1o. Ciclo de Palestras do PPGAS/UFSC – outubro/novembro de 2012, Florianópolis, SC. Colóquio Reflexões sobre Pesquisa Antropológica e Políticas Públicas no INCT Brasil Plural. Pesquisadores do Instituto Brasil Plural reuniram-se em Florianópolis, de 18 a 20 de novembro, e realizaram apresentações e debates sobre os trabalhos realizados nas redes do IBP. A maioria deles tem mostrado uma constante tensão entre as práticas culturais e as políticas públicas em diversos segmentos sociais, como a questão indígena, saúde, migrações, direitos humanos e o reconhecimento de saberes locais, que foram tema de quatro mesas redondas. A finalidade do colóquio foi realizar um balanço das pesquisas realizadas pelo IBP que tenham contribuído para subsidiar as políticas públicas, debater as controvérsias e estimular novas ideias. Embora não tenha apresentado trabalho no evento, os resultados da pesquisa “Cuidados de Crianças Ribeirinhas” foi apresentado por Deise Lucy Montardo, contribuindo para o debate. O evento foi intenso e de grande proveito para pensar a atuação das redes do IBP e seus vínculos com as políticas públicas, um tema fundamental para a atuação dos pesquisadores desse instituto. Foi um importante momento de troca e de aprendizado. Também de abertura para trabalhos coletivos sobre o tema da etnologia indígena. Nesse evento estive em diálogo com o pessoal do NEPI - Núcleo de Estudos de Populações Indígenas, da UFSC, especialmente com Antonella Maria Imperatriz Tassinari. 2.9.2. Apresentando trabalhos: 28a. Reunião da ABA – realizada de 02 a 05 de julho de 2012, na PUC-SP, SP. Artigo apresentado: “O caso do lobo mau (que casou) com a vovozinha: Narrativas, literatura oral e subjetivação entre crianças pequenas” no Grupo de Trabalho "Narrativas em performance: experiência, subjetivação e etnografia". Participação como palestrante do Colóquio Arte e Sociabilidade: pesquisa, Florianópolis, Janeiro de 2014. 68 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico colaborações e fronteiras. Organizado pelo IBP Instituto Nacional de Pesquisa - Brasil Plural – Manaus/ AM entre 21 e 22 de agosto de 2012. Artigo apresentado: “Socialidade Estética e subjetivação entre crianças de periferia a arte de inventar (-se)”. 1o. Ciclo de Palestras do PPGAS/UFSC – 17 de outubro de 2012, Florianópolis, SC, proferindo a palestra “Entre jaguares e Avatares: performances de crianças indígenas na Cidade de São Gabriel da Cachoeira- Rio Negro – Amazonas”. Mostra dos Filmes do projeto em São Gabriel da Cachoeira, Abril de 2013. 1) Maloca Casa do Conhecimento, São Gabriel da Cachoeira, AM. 2) ISA Rio Negro. Sede do ISA, São Gabriel da Cachoeira, AM. Ver cartaz em anexo no link http://www.shinealight.org/Portuguese/anexoscnpq2013/cartazmostraisa.pdf Organização do Evento: Primeiro e Segundo Encontro de pesquisadores do Projeto Saúde de Criança de áreas rurais do Amazonas”, Manaus, AM. Março e agosto de 2013. Apresentação do trabalho “Narrativas, produção de si e gênero na produção midiática/fílmica com crianças” no Evento Fazendo Gênero 10 – Desafios Atuais e Feminismo, – 16 a 20 de Setembro de 2013, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. GT Questões de Gênero e Infância nas Produções Midiáticas de, para e com Crianças), organizado por Gilka Girardello (Universidade Federal de Santa Catarina) e Juliane di Paula Q. Odinino (UDESC e Faculdade Municipal de Palhoça). Participação das Jornadas Antropológicas do Discentes do PPGAS-UFSC 2013 “Antropologias em Trânsito: formações entre o campo e a escrita” de 8 a 11 de outubro de 2013, Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Participei ativamente das Jornadas Antropológicas 2013 com as seguintes atividades: Florianópolis, Janeiro de 2014. 69 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 1) Coordenando o Ateliê de Pesquisa (2) - Arte, Imagens, Música e Performance, que aconteceu nos dias 09, 10 e 11 de outubro de 2013 2) Apresentando resultados da pesquisa relatada nesse projeto com o texto Entre Jaguares e Avatares: Divagações sobre Performances e narrativas de crianças indígenas na cidade. dia 09/10/2013 na Sessão 1 – Produção inventiva e Performances. 3) Debatendo os textos apresentados no terceiro dia do evento na Sessão 3: Produção inventiva e Performances. Dia: 11/10/2013. Os textos debatidos foram os seguintes: Onadekom: uma etnografia da produção musical na conjuntura social e política da Palestina / Rafael Gustavo de Oliveira (PPGAS/UFPR) O rufar do tambor: dançando no ritmo das toadas e no “dois pra lá e dois pra cá” com o Boi Garantido / Socorro de Souza Batalha (PPGAS/UFAM) “Pelas cordas da viola”: pensando a relação viola e violeiro no fandango caiçara / Patrícia Martins (PPGAS/UFSC) Beber ou degustar: eis a questão / Kamila Guimarães Schneider (Ciências Sociais / Unioeste). 4) Participando da Sessão Áudio Visual do evento como curadora da mostra A vida como Obra de Arte, em Homenagem a Maria Ignez Mello (in Memoriam). Música, compositora, pesquisadora associada do Núcleo de Estudos Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe (MUSA/PPGAS/UFSC) e professora do Departamento de Música da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) Maria Ignez Mello faleceu em 2008, deixando uma obra importante para a antropologia da música e do gênero estudando os Waujá no Xingu. Estudando a música Waujá Maria Ignez Mello (Mig) aborda o ritual de iamurikuma relacionando-o com o tema das flautas proibidas às mulheres, e trás o debate das relações de gênero para a etnologia. Discute assim os vários nexos deste ritual com a cosmologia, as relações de gênero, a ética, o poder, a estética, a musicalidade e a Florianópolis, Janeiro de 2014. 70 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico política, destacando questões como a necessidade de controle do desejo, a quebra da reciprocidade e o papel fundamental dos sentimentos de ciúme e inveja na socialidade Waujá. Sua tese Recebeu em 2006 Menção Honrosa no Concurso Brasileiro ANPOCS de Obras Científicas e Teses Universitárias em Ciências Sociais, Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais - ANPOCS. Duas obra de importantes pesquisadores são dedicas a ela: Burst of Breath, organizado por Jonathan D. Hill e Jean-Pierre Chaumeil (Nebraska, 2011) e A Festa da Jaguatirica, de Rafael de Menezes Bastos (UFSC, 2013). 2.10. Atividade docente Na Universidade de Oklahoma (USA), à convite de Amanda Minks, professora do Honors College afiliada com aos Departamentos de Antropologia, Native American Studies, Gênero e Women’s Studies e Musicologia, ministrei em parceria com Kurt Shaw duas aulas sobre pesquisa com crianças e uso de mídia digital. Contribuindo com as atividades docentes do PPGAS/UFSC, ministrei no mês de novembro de 2012 duas aulas da disciplina “Antropologia da Arte” (2012/02 e 04 créditos) e mais uma em dezembro de 2012. Todas as aulas que ministrei foram sobre temáticas trabalhadas por pesquisadores que entrevistei durante o primeiro ano de pós-doutoramento. A disciplina foi oferecida e coordenada pelos professores Maria Eugênia Dominguez e Rafael José de Menezes Bastos, ambos integrantes do MUSA, aos alunos de Mestrado e Doutorado do programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFSC. A disciplina tem como ementa temática importante à pesquisa proposta nesse projeto: A construção da arte como objeto de estudo antropológico: etnoestética, etnomusicologia e outros subcampos da área. Arte como código sociocultural: principais tendências teórico-metodológicas. Arte e artisticidade. Artes populares, eruditas, folclóricas e indígenas. Etnografias clássicas, modernas e recentes sobre a arte. Florianópolis, Janeiro de 2014. 71 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico As aulas ministradas por mim estão relacionadas abaixo: Dia 21/11/2012 – 13 a. aula do curso Seeger, A. 2004. Why Suyás Sing: A Musical Anthropology of an Amazonian People, 2nd ed. Cambridge: Cambridge University Press. Menezes Bastos, Rafael José de. 2007. “Música nas Sociedades Indígenas das Terras Baixas da América do Sul: Estado da Arte.” Mana, v.13, p. 293 - 316, 2007. Dia 28/11/2012, 14a. aula do curso Menezes Bastos, Rafael José de. 1999. A Musicológica Kamayurá: Para Uma Antropologia da Comunicação no Alto Xingu, 2ª. ed. Florianópolis: Editora da UFSC (trechos). Feld, Steven. 1982. Sound and Sentiment: Birds, Weeping, Poetics, and Song in Kaluli Expression, 2nd ed. Philadelphia: Pennsylvania University Press (trechos). Dia 05/12/2012 – 15a. aula do curso Montardo, Deise L. Oliveira. 2009. Através do Mbaraka: Música, Dança e Xamanismo Guarani. São Paulo: Edusp, pp. 189-203. Hill, Jonathan & Chaumeil, Jean-Pierre. Burst of Breath. Indigenous Ritual Wind Instruments in Lowland South America. Lincoln: University of Nebraska Press, 2011. “Overture”, pp. 1-46. 2.11. Atividades Realizadas não previstas no projeto 2.11.1.Durante o ano de 2012, tendo em vista a ida a campo de um dos integrantes do MUSA, fiquei com a responsabilidade de manter o site do Núcleo, cujo link é http://www.musa.ufsc.br/index.php. Até o presente momento auxilio na alimentação Florianópolis, Janeiro de 2014. 72 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do site. 2.11.2. Participação da Banca de defesa da mestranda Rosilene Fonseca Pereira, PPGAS/ UFAM/ Manaus. Título da Dissertação: Criando gente no Alto Rio Negro: um olhar Waikhana. Data da defesa: 20/03/2013. 2.11.3. Participação de aulas no PPGAS UFSC: A participação como ouvinte de algumas aulas de duas disciplinas do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social-UFSC que abordavam etnologia indígena foram importantes para ampliar a compreensão do vasto e complexo debate bibliográfico desenvolvido por pesquisadores das terras baixas da américa do sul. 1) Tópicos Especiais em Antropologia: Antropologia da mistura e transformação. ANT 510025 (D) (2 créd.) ministrada pelo Prof.: José Antônio Kelly Luciani.Ementa: Uma das dificuldades mais persistentes da antropologia tem sido desenvolver teorias satisfatórias respeito à chamada mudança social ou cultural. Esta disciplina se debruça sobre a temática da transformação e da mistura, sendo esta última inevitavelmente ligada à questão da mudança. Abordaremos então a questão da mistura e transformação desde duas perspectivas: a primeira corresponde a teorias ou formas nativas de mistura e transformação. Aqui leremos etnografias de diversas regiões do mundo (Amazônia, Melanésia, Andes, Meso-América). A segunda parte visa explorar algumas teorias antropológicas da transformação social ou cultural. Assim serão analisadas e contrastadas abordagens teóricas de autores como Lévi-Strauss, Sahlins, Wagner, Clastres, Deleuze, refletindo sobre seu encaixe com as etnografias a serem lidas. Mesmo que as leituras etnográfcas correspondam a várias regiões etnográficas e que as leituras teóricas são de caráter geral, a preocupação principal é a temática da mudança cultural nas Terras Baixas Sul Americanas – o curso terá uma ênfase nesta região etnográfica. Florianópolis, Janeiro de 2014. 73 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 3)Etnologia Indígena ANT3161, ministrada pelo professor Rafael José de Menezes Bastos.Ementa: A etnologia das Terras Baixas da América do Sul, suas principais temáticas e posturas teórico-metodológicas. Esboço histórico e situação atual. A constituição da cosmologia como seu domínio globalizador. Etnografias Gê, Alto Xingu, Alto Rio Negro, Tupi, Guiana, Pano e outras. Perspectivas comparativas. Os índios, o Brasil e o sistema mundial. Dessa disciplina, por motivos particulares, pude participar apenas de alguns poucos encontros. 2.11.4. Coordenação do projeto “A saúde de crianças em áreas rurais no Estado do Amazonas. Embora não tenha sido planejado, esse projeto foi de grande aprendizado e auxilio para o objetivo desse empreendimento de pósdoutoramento: colocou a pesquisadora em contato com um enorme leque de conhecimento sobre a vida de crianças amazônicas e com inúmeros pesquisadores da área. Por esse motive, me atenho a descrever com mais detalhe essa atividade e como ela se colocou como uma possibilidade. Com o primeiro ano de pesquisa junto a crianças indígenas e seus familiares em São Gabriel da Cachoeira, recebi um convite que foi bastante proveitoso para seguir dando prosseguimento ao aprofundamento na etnologia indígena: o de montar uma equipe de pesquisa para realizar o projeto de pesquisa sobre saúde e cuidados de crianças ribeirinhas. Constatei colegas Deise Lucy Montardo, Antropóloga professora da UFAM, Kurt Shaw, pesquisador da ONG Shine a Light, e Geórgia Silva, pesquisadora do Saúde Sem Fronteiras, para saber de seus interesses em auxiliar na formação da equipe e participação na pesquisa. Montamos uma equipe de 3 pesquisadores de área para três diferentes municípios, uma pesquisadora de Arquivos, 5 assessores, dois realizadores de vídeos e mais auxiliares de pesquisa em cada região, que foram selecionados pelos pesquisadores de área. O convite veio do diretor da Fundação Bernard Van Leer, Leonardo Yanez, que vem investindo em projetos que auxiliem crianças ribeirinhas no acesso à saúde no Estado do Amazonas. O foco da pesquisa foi a observação de como crianças são Florianópolis, Janeiro de 2014. 74 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico cuidadas e como elas mesmas se cuidam em três municípios do estado – Santa Isabel do Rio Negro (Rio Negro), Atalaia do Norte (Vale do Javari) e Lábrea (Rio Purus). A pesquisa objetivou conhecer a realidade para pensar dinâmicas de acesso de crianças do interior de amazonas ao sistema de saúde pública. A oportunidade pareceu interessante por possibilitar uma ampliação da pesquisa iniciada no primeiro ano. Como era uma pesquisa multifocal, contatei pesquisadores do Programa de Pósgraduação da Universidade Federal do Amazonas e formamos uma equipe onde grande parte dos pesquisadores já realizavam pesquisa em áreas importantes em três municípios do Estado do Amazonas. Além de coordenar a pesquisa, organizando o grupo, contatando assessores de pesquisa com conhecimento avançado nas áreas da pesquisa, participei de parte da pesquisa em campo, filmando e conversando com as famílias e com as crianças de Santa Isabel do Rio Negro. A escolha dos municípios foi feita seguindo os desafios apresentados naquelas comunidades como: distância geográfica, lócus de doenças endêmicas, conflitos culturais evidentes, dificuldades que tais grupos sofrem para o acesso ao sistema de saúde e extrema pobreza. Esses locais para a realização da pesquisa foram selecionados com o objetivo de mostrar alguns dos desafios na atenção à saúde em Amazonas, e não como um meio representativo de todas as áreas rurais no estado. Portanto, uma série de dados foram possíveis de serem captados pelos pesquisadores e pelos coordenadores. Como mencionei acima, minha presença em campo foi na comunidade indígena Tabocal de Uneiuxi, do município de Santa Isabel do Rio Negro, ainda no noroeste amazônico, ampliando ainda mais esse contato com narrativas e performances de crianças. Também pude entender como cuidam diariamente das crianças. Foram as crianças mesmas quem mostraram onde e como estão produzindo saúde: na dança, nas atividades cotidianas, na caça, na coleta de frutos, na agricultura, nos banhos nos rios, nas festas e ritos que o grupo ainda preserva, e não apenas no atendimento médico ou xamânico. O projeto foi inscrito na Plataforma Brasil (Sistema Nacional de Ética em Pesquisa – SISNEP) do Ministério da Saúde, e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). O projeto recebeu parecer positivo, destacando a importância da pesquisa para a região. Florianópolis, Janeiro de 2014. 75 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico O pesquisador de área em Santa Isabel do Rio Negro foi Rosilene Fonseca Pereira, mestre em antropologia pela UFAM e indígena do povo Waikhana, moradora de Santa Isabel. Rosilene defendeu dissertação sobre cuidado de crianças em 2013, pesquisando a história da sua própria etnia, discutindo noções êmicas. Em Lábrea, o pesquisador foi Willas Costa Dias, doutorando da UFAM e integrante do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia. Em Atalaia do Norte, a pesquisadora foi Inara Nascimento Tavares, mestre em antropologia social, pesquisadora da região e, no período da pesquisa, professora da UFAM no campus Benjamin Constant. Cada um desses pesquisadores tinha um assessor que o auxiliou na produção do texto final, lendo e sugerindo mudanças. O Pesquisador de Lábrea contou com o auxílio constante de Thereza Menezes, professora da UFAM que coordena pesquisas na região. A pesquisadora de Atalaia do Norte contou com o auxilio de Maria Helena Ortolon, professora da UFAM, pesquisadora de etnologia do Vale do Javari; já a pesquisadora de Santa Isabel do Rio Negro contou com a leitura do texto por Renato Athias, professor da Universidade Federal de Pernambuco que trabalha na região do Rio Negro com antropologia da saúde há várias décadas. Além disso, cada pesquisador de área contratou um auxiliar de pesquisa local (um agente de saúde, líder local ou pesquisador local) para auxiliar no processo. A escolha desses auxiliares de pesquisa foi feita pelo próprio pesquisador e variou muito de local para local, mas grande parte dos auxiliares também foram pessoas que ou vivem nas comunidades, ou tem vínculo longo com as mesmas. Compor a equipe de trabalho de campo utilizando recursos humanos locais, inclusive indígenas, caboclos, foi uma opção ética e tecnicamente oportuna da pesquisa. Atores locais facilitam o acesso aos universos e aos saberes locais, e são eles mesmos fontes de informação importantes. Viabilizam melhores resultados em menos tempo, investindo localmente. Por outro lado, participar de um empreendimento como esse, pensamos, oportuniza aos mesmos uma reflexão sobre suas práticas e a de terceiros, fazendo da própria pesquisa uma oportunidade de valorização e de transformação dos seus saberes. Florianópolis, Janeiro de 2014. 76 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico O projeto foi coordenado por mim, antropóloga e Pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina em conjunto com Kurt Shaw, filósofo, mentor e diretor executivo de Shine a Light e Deise Lucy Oliveira Montardo, antropóloga, professora do Programa de Pós Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Amazonas e Pesquisadora do INCT Instituto Brasil Plural. Esta equipe formou o grupo de pesquisadores e coordenou as atividades de pesquisa, realizou encontros e debates e submeteu o projeto para análise pelo comitê de ética da UFAM. O gerenciamento financeiro do projeto foi feito pelos membros da Shine a Light, já que coube a esta a responsabilidade formal do projeto. Durante a realização da pesquisa, foram feitos dois encontros da equipe em Manaus: um preparatório, realizado em março de 2013 e outro de apresentação e debate dos dados coletados, em julho de 2013. Sediados no Programa de Pós Graduação da Universidade Federal do Amazonas, esses encontros foram essenciais para preparar o grupo para a pesquisa e depois para compartilhar os resultados e estabelecer a linha de base. O projeto teve dois assessores gerais, que acompanharam a pesquisa e sugeriram modificações, debateram os dados e fizeram a leitura do relatório final “Cuidados de Crianças Ribeirinhas”, auxiliando na definição da linha de base. Ambos assessores têm extensa experiência” em pesquisa e implantação de projetos em saúde em área amazônica. Maximiliano Loiola Ponte de Souza, médico, psiquiatra, doutor em Ciências pela FioCruz e atualmente pesquisador do Instituto Leônidas e Maria Deane, da Fiocruz, que tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Ciências Sociais em Saúde, atuando principalmente nos temas saúde indígena, antropologia da saúde e saúde mental. Maximiliano participou do debate do projeto no primeiro encontro organizativo feito pela equipe em Manaus (em março de 2013) e sugeriu modificações importantes para a pesquisa. O assessor Geral Marcos Antônio Pellegrini, também médico formado pela Universidade Federal de São Paulo (1986), mestrado (1998) e doutorado (2008) em Antropologia Social pela Universidade Federal de Santa Catarina, tem vasta experiência profissional na área de planejamento e organização de serviços de saúde Florianópolis, Janeiro de 2014. 77 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico entre povos indígenas. É professor do Instituto de Antropologia, do Programa de PósGraduação em Ciências da Saúde e do Programa de Pós-Graduação Sociedade e Fronteiras da Universidade Federal de Roraima. Tem pesquisa na área de Antropologia da Saúde, Etnologia e Saúde Indígena, o que auxiliou enormemente no debate dos relatórios finais dos pesquisadores e cruzamento dos dados coletados pelos pesquisadores (segundo encontro feito em Manaus em julho de 2013). A pesquisa foi registrada num longo relatório: “Cuidado de Crianças Ribeirinhas”, disposto em forma de livro, e que está disponível online no link http://www.adrmarketplace.com/Cidade/criancasamazonas.pdf. Além de escrever a introdução do documento e o primeiro capítulo, em parceria com Kurt Shaw organizamos o livro, fizemos o cruzamento dos dados e escrevemos as propostas da linha de base. Também produzimos em conjunto os filmes que fizeram parte do trabalho, sendo que me envolvi muito mais com os produzidos em Santa Isabel do Rio Negro, onde pude também realizar a captação das imagens e acessar as performances das crianças da comunidade de Tabocal de Uneiuxi. d) Uma outra atividade não programada pelo projeto de pesquisa foi a participação do Evento “Encontro das Mulheres da FOIRN”. Nesse evento pude acompanhar a atuação de lideres indígenas mulheres e o debate que elas vem fazendo sobre gênero naquele meio. Durante o evento entrevistei mulheres e homens participantes, para tentar entender como as crianças participam da organização política daquela área e como homens e mulheres pensam a política de gênero da região. O material audiovisual desse evento ainda está por ser editado. 2.12 Dificuldades Encontradas A maior dificuldade encontrada durante o desenvolvimento do projeto foi a necessidade da mudança do lócus da pesquisa de campo. Tal dificuldade, no entanto, embora tenha alterado certos aspectos esperados na pesquisa, não impossibilitou bons resultados. Florianópolis, Janeiro de 2014. 78 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 3. AVALIAÇÃO Um dos objetivos desse projeto foi colocar a pesquisadora em contato com uma nova área de pesquisa, a saber, a etnologia indígena brasileira, estudando crianças indígenas e suas performances nas cidades. Também objetivava produzir conhecimento e material sobre o tema. O esforço empreendido nesses meses de atividades abriram um leque espantoso de conhecimento na área referida. Isso se deu por diversos motivos: 1) por participar das atividades do Núcleo MUSA, sob a coordenação do Professor Rafael de Meneses Bastos e Maria Eugênia Dominguez. Os integrantes do Núcleo ofereceram durante esse período, ampla acolhida e sólido debate na área referida; 2) por ter entrado em contato com uma bibliografia sobre etnologia no Brasil, especialmente a produzida sobre a área do Vale do Javari (onde iria realizar a pesquisa de campo) e com aquela que se refere ao Noroeste Amazônico, onde a pesquisa foi realizada. 3) Por poder contatar tantos novos pesquisadores e especialistas na área da etnologia indígena. 4) Em São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel do Rio Negro, realizando pesquisa bibliográfica, etnográfica e videográfica sobre e naquela região, pude entender e interagir com a produção sobre etnologia brasileira de modo bastante intenso, e ainda fazer contato com pesquisadores e com diferentes etnias. 5) As entrevistas realizadas, igualmente, permitiram a valorização e o acesso a informações importantes sobre o tema de cada um dos entrevistados, todos etnólogos ligados ao tema performances/narrativas e/ou a antropologia da música. 6) Por ter me desafiado a algo inédito para mim: ir a campo levando minha própria família, o que me acrescentou reflexões sobre a infância que ainda Florianópolis, Janeiro de 2014. 79 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico estou elaborando e que em algum momento deve merecer atenção em forma de um artigo. 7) O contato com as crianças e seus familiares, que me permitiram acessar seus saberes, suas formas de estar junto, sua criatividade e que me forneceram dados muito interessantes para pensar a arte e a artisticidade nas comunidades indígenas nas Terras baixas da América do Sul. Deste modo, a oportunidade de realizar esse estágio de pós-doutoramento foi fundamental para complementar minha formação como pesquisadora, abrindo o acesso a esse impressionante leque de saberes que a etnologia vem construindo desde sua constituição como área do conhecimento. Graças a esse estágio, sinto que minha formação antropológica está muito mais completa. Espero que o saber produzido nesses dois anos seja de valor também para os povos indígenas da região do Rio Negro e que o material produzido seja útil a outros pesquisadores. Espero que sirva ainda de estimulo a outros pesquisadores que queiram trabalhar com crianças. Elas nos ensinam muito, e a pesquisa de campo com elas é desafiadora, mas mais que tudo, prazerosa, cheia de risos e encantamentos. A criatividade com que elas vivem seus dia a dia e contam suas histórias é impressionante. Merece darmos olhos e ouvidos a elas, para vermos e ouvirmos como produzem cultura e pesquisarmos para que serve essa produção. O sentido da existência e da capacidade humana parece estar ai. 3. BIBLIOGRAFIA ARHEM, Kaj. Ecosofia Makuna. In: CORREA, François (org.) La Selva Humanizada: ecologia alternativa en el trópico húmedo colombiano. Bogotá: Instituto Colombia- no de Antropologia, p. 109-126, 1993. ALBUQUERQUE, Marcos Alexandre. O Regime imagético Pancaruru: Tradução Intercultural na Cidade de São Paulo. Tese de doutorado. Florianópolis, PPGAS/UFSC, 2011. ANDRELLO, Geraldo. Cidade do Índio (Transformações e cotidiano em Iauaretê, São Paulo, Editora da Unesp/ ISA/ NuTI, 2006. ANDRELLO, Geraldo. 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Tradução para português por Maria Sílvia Cintra Martins (DL/UFSCar), Sd. Filmografia do noroeste não descrita no relatório: A onça e o jaguar, de Herbert Bröld (37 min./1993 - Suiça).Sobre Theodor KochGrünberg. É uma viagem pelo Rio Negro que refaz os caminhos de Theodor Koch-Grünberg pela Amazônia. Florianópolis, Janeiro de 2014. 89 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Bahsariwii-Panti-Maloca, de Andrea Bitencourt Prado (31 min./2005 Brasil/AM).O vídeo trata da documentação da montagem de uma maquete de maloca tradicional dos povos do alto rio negro, adicionada de entrevista que entremeiam a montagem com informações sobre a metodologia da construção de malocas reais, além do contexto mitológico que envolve toda a construção e a própria existência destas edificações. O vídeo faz referencia também ao processo de proteção do Patrimônio cultural imaterial brasileiro após a criação do decreto 3551/2000. Conta com a presença especial do Kumu Gabriel gentil Tukano. Baniwa – uma história de plantas e curas, de Stella Oswaldo Cruz Penido (72 min./2005 - Brasil/RJ). As práticas tradicionais de cura estão no cerne da cultura Baniwa, povo indígena do Alto Rio Negro, Amazonas. O documentário busca o sentido de permanência dessas práticas no atual contexto do contato. Casimiro, de Erlan Souza e Fernanda Bizarria (30 min./2009 Brasil/AM).Documentário sobre as missões salesianas do Alto Rio Negro, no Amazonas, e sua relação com o processo de colonização dos indígenas brasileiros. Em meio ao cenário, desponta a figura do padre Casimiro, uma vida dedicada a cultura indígena.Cenas do cotidiano na vida dos Hupd’äh, protagonizadas por Messias, chefe do clã Pinoahtenre, da aldeia do IgarapéPombo, rio Umari. Os Hupd’äh vivem na região interfluvial dos rios Uaupés, Tiquié e Papuri no Alto Rio Negro, Amazonas. Hianhekhetti movimento indígena Baniwa, de Stella Oswaldo Cruz Penido (21min./2011 – Brasil). Em Tunui Cachoeira, rio Içana, lideranças avaliam 20 anos de luta dos povos Baniwa e Coripaco. O que conquistaram e o que a reflexão sobre estas conquistas traz de positivo para suas vidas. O momento atual exige uma nova reflexão para a retomada do movimento indígena rionegrino. Em março de 2011 a Assembçéia Geral Baniwa e Couipaco debate as políticas públicas para a saúde e a educação e projetam uma nova estratégia política para o futuro do movimento. Mosaico de São Gabriel da Cachoeira, de Cristian Pio Ávila e Eddie Jr. (28min./2007 - Brasil/AM). O filme retrata através do prisma do patrimônio imaterial. As diversas tensões e discursos relacionados ao tema em São Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro, no Amazonas. Meninos nus, de Delvair Montagner (08min./1996 - Brasil/DF). Um dia na vida das crianças Marubo do rio Ituí, Amazonas, última esperança de um povo em perigo, narrado poeticamente por Helena Barcelos. Nadëb: voz de um povo Maku, de Ricardo Romcy Pereira (10min./2004 Brasil/AM) O encontro dos sabores no Rio Negro, de Aurélio Michiles e Elaine Cesar (24min./2008 - Brasil/SP). Documentário sobre a expedição gastronômica realizada neste importante rio amazônico, aonde o estudioso da alimentação Toni Massarés reflete sobre as iguarias que saboreia nesta reveladora viagem culinária. Florianópolis, Janeiro de 2014. 90 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Núcleo de Pesquisa Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - MUSA Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Remições do Rio Negro, de Fernanda Bizarria e Erlan Souza(90min./2009 Brasil/AM). Documentário sobre as missões salesianas do Alto Rio Negro, no Amazonas, e sua relação com o processo de colonização dos indígenas brasileiros. Florianópolis, 21 de janeiro de 2014. Rita de Cácia Oenning da Silva. Pesquisadora MUSA/PPGAS/UFSC Florianópolis, Janeiro de 2014. 91