Aquisição de Poder por Via da Lei
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Aquisição de Poder por Via da Lei
‘Acabar com a pobreza extrema é essencial não só por uma questão de compaixão. A economia mundial beneficiará enormemente com as contribuições daqueles que conseguem evoluir de situações de dependência para a participação total. (…) O mandato da Comissão é intimidante mas também é essencial, pois a aquisição do poder com base legal pode acrescentar muito em relação aos meios mundiais existentes na luta constante para salvar e enriquecer vidas humanas.’ Comissão para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres Pôr a Lei a Trabalhar para Todos Madeleine Albright ‘A lei não é uma coisa que se inventa numa universidade; a lei é algo que se descobre. As populações pobres já têm acordos entre si, contratos sociais, e o que é necessário fazer é normalizar profissionalmente estes contratos para criar um sistema jurídico reconhecido e respeitado por todos.’ Hernando de Soto ‘A nossa determinação e as aspirações de todos quantos lutam para transformar os bens que possuem em propriedades valiosas, não pode deixar dúvidas.’ Benjamin Mkapa Comissão para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres ‘Longe de ser um luxo sem o qual os pobres podem viver, direitos jurídicos eficazes são uma necessidade para todos. A exclusão jurídica dos pobres nega-lhes uma oportunidade de melhorarem as suas vidas – e impede o desenvolvimento dos países pobres.’ Clotilde Medegan A Comissão para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres foi a primeira iniciativa global com enfoque na ligação entre exclusão, pobreza e a legislação. Lançada por um grupo de países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento incluindo o Canadá, Dinamarca, Egipto, Finlândia, Guatemala, Noruega, Suécia, África do Sul, Tanzânia, e Reino Unido, foi acolhida pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (UNDP) em Nova Iorque. Co-presidida pela ex-secretária de Estado, Madeleine Albright, e o economista Peruano Hernando de Soto, juntou governantes eminentes e médicos de todo o mundo. A aquisição de poder por via da lei não se trata de ajuda, mas de ajudar as pessoas pobres a saírem da pobreza, trabalhando nas reformas políticas e institucionais que aumentam as respectivas oportunidades e protecções jurídicas. Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres http://www.undp.org/legalempowerment concepção: cynthiaspence.com Comissão para a Pôr a Lei ao Serviço de Todos VOLUME I Relatório da Comissão sobre a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres Copyright © 2008 da Comissão sobre a Aquisição de Poder pelos Pobres por Via da Lei e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento 1 UN Plaza, Nova Iorque, Nova Iorque, 10017 As opiniões expressas nesta publicação são as dos respectivos autores e não representam necessariamente as opiniões das Nações Unidas ou do PNUD. PISBN: 978-92-1-126219-3 Impresso nos EUA pela Consolidated Graphics, empresa certificada pelo Forest Stewardship Council (FSC). O papel utilizado é basicamente isento de cloro e de ácidos e está certificado pelo Forest Stewardship Council. Todas as tintas apresentam um baixo teor de COV e são de base vegetal. Prólogo No último mês de Julho em Nova Iorque, o Secretário-geral das Nações Unidas Ban Ki-moon e eu falámos da necessidade de encorajar a comunidade internacional a acelerar o progresso dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. A Chamada para a Acção foca-se na mobilização não só de governos mas também do sector privado, ONGs, sociedade civil e comunidades religiosas a fazerem mais para se atingirem os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. O governo do Reino Unido continua a pressionar com a necessidade de uma acção acelerada em todas as oportunidades possíveis em 2008, incluindo através das intervenções ao nível do G8 e da União Europeia. Pôr a Lei ao Serviço de Todos examina as questões que terão uma influência profunda no potencial humano e no progresso a caminho dos Objectivos de Desenvolvimentos do Milénio. Há três anos, um distinto grupo de sábios, ex chefes de governo, governantes e pensadores juntaram-se para analisarem a questão da aquisição de poder por via da lei pelos pobres. Quero aplaudir o produto resultante do trabalho dos meus ex colegas. Concordo com a conclusão global que expandindo e aprofundando a protecção jurídica universal, as pessoas pobres terão mais possibilidades de se libertarem da pobreza. Como o Relatório evidencia, as fontes para uma exclusão jurídica são numerosas e muitas vezes específicas ao nível de cada país. Contudo, evidenciam-se quatro linhas de força. Em primeiro lugar, a aquisição de poder por via da lei é impossível quando às pessoas pobres lhes é negado o acesso a um sistema de justiça que funciona bem. Em segundo lugar, a maioria dos pobres a nível mundial têm falta de direitos de propriedade e o poder económico intrínseco dos respectivos bens mantém-se por explorar. Em terceiro lugar, a pessoas pobres em particular mulheres e crianças, sofrem de condições de trabalho pouco seguras porque os seus empregadores muitas vezes operam fora do formalismo da legalidade. Em quarto lugar, às pessoas pobres são-lhes negadas oportunidades económicas porque os seus patrimónios e negócios não são reconhecidos legalmente. Não conseguem aceder ao crédito, ao investimento nem aos mercados internos e externos. O governo do Reino Unido está empenhado em trabalhar para reduzir a pobreza e a vulnerabilidade entre os pobres deste mundo providenciando ajuda às nações em desenvolvimento e defendendo questões tais como a redução da dívida. Colaboramos com parceiros para providenciar aconselhamento a governos e organizações de doadores em políticas que facilitam a participação dos pobres no crescimento económico e que têm impacte na redução da pobreza. Este Relatório, um produto da investigação, análise e consultas feitas em mais de 20 países em desenvolvimento, foi elaborado por peritos internacionais e por um corpo administrativo, estimulará debates e diálogos que têm profunda importância no progresso em direcção ao atingimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Em concreto já estamos a mais de meio entre o ano 2000 e o ano 2015. Mas, na realidade ainda estamos a um milhão de milhas do sucesso. No início deste ano, o Secretário-geral das NU Ban Ki-moon apelidou 2008 como o ano do “os milhões que ficaram para trás” – um ano para uma acção crítica sobre os ODMs. Pôr a Lei ao Serviços de Todos providencia uma opinião necessária e válida para mudanças estruturais que darão aos pobres que trabalham uma ferramenta válida para se eximirem das garras da pobreza. Gordon Brown Primeiro-ministro do Reino Unido Ex Membro da Comissão Prefácio Em Novembro de 2006, uma delegação da Comissão para a Aquisição de Poder pelos Pobres por Via da Lei visitou um exuberante mercado ao ar livre (conhecido por ‘Toi market’) num bairro pobre e degradado de Nairobi no Quénia. Para visualizar o mercado, imaginem um centro comercial sem paredes – ou melhor ainda, sem um tecto ou pavimento – onde cada negócio é representado por uma pequena mesa ou por um cobertor estendido no chão. Imaginem também, uma zona circundante que é notória pela falta de saneamento, pela poluição e pelo crime. As inundações são frequentes. Cerca de uma pessoa em cinco tem VIH-SIDA. A maior parte dos residentes têm falta de um registo predial da barraca a que chamam casa ou do registo comercial do pequeno negócio do qual dependem para viver. Estes são homens e mulheres que são vulneráveis e despojados em todos os sentidos – excepto numa coisa – estão determinados a não serem vítimas. Há cerca de uma década, os vendedores no mercado criaram um programa comum de poupança para o qual cada um contribuiu com quinze cêntimos por dia. O dinheiro foi usado para pequenos empréstimos aos negócios e para promover melhoramentos cívicos, tais um balneário público. Quinze cêntimos por dia parece uma soma irrisória, mas nesse lugar e para aquelas pessoas o pagamento significou muitas vezes a renúncia à compra de roupas novas para uma criança, alimentos para a família, ou uma bicicleta usada para transporte. Isto foi a democracia na sua forma mais pura – a vontade da comunidade como um todo, de trocar um benefício privado em prol da construção de uma escapatória para fugir à pobreza. As propostas para empréstimos e projectos eram aprovados aberta e colectivamente, com o consentimento expresso pelo ondular dos dedos e o bater de palmas. Com o tempo, o fundo cresceu em pequenos incrementos até um valor superior a $200,000. Isto ainda não era muito num mercado com mais de 5000 bancas em aglomeração compacta, vendendo tudo desde brinquedos e hortaliças a velas de ignição e jogos. Mas o plano de poupança era uma fonte de esperança e de orgulho para as pessoas que acreditaram na acção cooperativa, tendo percebido a importância do cumprimento de regras partilhadas e que fizeram tudo para se ajudarem uns aos outros. A coragem deles deu ênfase à nossa convicção que aqueles que consideram a pobreza como uma outra face da condição humana são ignorantes, pois os pobres não a aceitam e quando têm uma oportunidade agarram-na para transformarem as suas vidas. Pelo que vimos e pelas pessoas que encontrámos, a Comissão partiu de Nairobi encorajada. Então, em Dezembro de 2007, o Quénia realizou uma eleição presidencial. A votação foi viciada e desencadearam-se lutas. Centenas de pessoas morreram e o mercado que visitámos foi completamente destruído. Não existe praticamente nada. i Em resposta à expressão dos sentimentos de tristeza e de preocupação, a Comissão recebeu uma carta de Joseph Muturi, um dos lideres do mercado. Ele contou que o tecido social construído durante décadas foi rasgado e que as pessoas foram forçadas ao exílio no seu próprio país, simplesmente por razões étnicas. “Andámos para trás no tempo”, escreveu ele, e que “demorará muitos anos a voltar ao nível onde estávamos tanto social como economicamente”. Ele observou que foram os Quenianos que construíram o Quénia; agora foram os Quenianos que destruíram o Quénia; mas que – tinha a certeza – recuperá-lo-iam novamente com dispêndio de tempo e recursos que nunca podem ser recuperados na totalidade. A lição é clara. Quando as regras democráticas são ignoradas e não existe lei capaz de providenciar um abrigo, as pessoas que sofrem mais são aquelas que não se podem dar ao luxo de perder. A criação de uma infra-estrutura de legislação, direitos, imposição de cumprimento e de decisão não é um projecto académico, com interesse apenas para cientistas políticos e sociólogos. A fundação de tais instituições pode fazer a diferença entre a vulnerabilidade e a segurança, o desespero e a dignidade para centenas de milhões de seres humanos. Na sua carta escrita a partir das ruínas do Toi market, Joseph Muturi disse que “a maior tarefa que me ocupou mais foi tentar juntar as pessoas de modo a podermos salvar o nosso sentido de comunidade.” A criação de um sentido de responsabilidade mútua e de comunidade numa base global é a chave da luta contra a pobreza e um desafio para todos nós. Temos esperança que este relatório da Comissão, com as suas recomendações, possa ajudar a mostrar o caminho para esse objectivo e para um futuro melhor e mais equitativo para nós todos. Respeitosamente, Co-Presidentes Comissão para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres ii Agradecimentos Uma tarefa desta magnitude e complexidade só pode ser levada a cabo com sucesso através das inestimáveis contribuições de pessoas com um enorme leque de competências e aptidões. Este relatório é o resultado de muito debate entre os membros da Comissão. Enquanto tinham muitas e variadas opiniões, algumas das quais ainda se mantêm, gostaríamos de expressar o nosso contentamento pela convergência de opinião que aconteceu durante a nossa reunião de encerramento, e que levou ao consenso agora apresentado. O relatório beneficiou enormemente da orientação e do apoio intelectual que foi dado pelos membros do Comité de Aconselhamento da Comissão a quem agradecemos as suas contribuições. Agradecemos aos presidentes, relatores e membros dos grupos de trabalho que forneceram uma base analítica e de conhecimento. O seu trabalho, na forma de relatórios de cinco grupos de trabalho, é apresentado no Volume II do relatório da Comissão. Os colaboradores individuais dos relatórios dos grupos de trabalho são reconhecidos no Volume II. Estamos agradecidos às autoridades nacionais e locais, que são inúmeras para poderem ser todas mencionadas, as quais foram responsáveis pela condução com sucesso das consultas nacionais em 22 países à volta do mundo. Gostaríamos de estender os nossos agradecimentos aos doadores que fizeram generosas contribuições para o trabalho da Comissão: Canadá, Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega, Suécia, Suíça, Irlanda, Espanha, Reino Unido, o Banco Africano de Desenvolvimento e a Comissão Europeia. Reconhecemos a instituição anfitriã, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e especialmente Olav Kjørven pelo seu papel de liderança, bem como a Maaike de Langen e Hugh Roberts que incansavelmente contribuíram para o esboço do relatório. Mais ainda, queremos estender os nossos agradecimentos todos aos Serviços da PNUD em cada País que apoiaram as consultas nacionais. Mona Brøther, em representação do Governo da Noruega teve um papel especial na coordenação dos doadores e em fazer contribuições substantivas ao nosso trabalho. Joseph Muturi merece uma menção especial pelo seu trabalho que inspirou esta Comissão. Estamos agradecidos ao Membro da Comissão Allan Larsson pela sua contribuição dos primeiros esboços do relatório, e a Philip Legrain, Tim Mahoney e Francis Cheneval pelas contribuições nas várias etapas do processo de redacção do texto. iii Agradecimentos especiais vão também para a equipa de apoio à Comissão a qual é composta pelo Secretariado em que os seus membros tanto actuais como passados incluem Cate Ambrose, Martha Barrientos, Ove Bjerregaard, Timothy Dolan, Jill Hannon, Sid Kane, Shara Kaplan, Paulina Kubiak, Mala Mathur, Parastoo Mesri, Adriana Ruiz-Restrepo, Shomwa Shamapande, Harsh Singh, Veronique Verbruggen, e Nu Nu Win, bem como os membros de apoio às co-presidências, especialmente Kristin Cullison e Gabriel Daly. Todos deram incansável apoio aos desafios operacionais multifacetados lançados pela Comissão, bem como à redacção e edição do relatório. Uma longa lista de pessoal interno e de voluntários apoiou a Comissão, incluindo Sabiha Ahmed, Shailly Barnes, Camilo Alejandro Barrera, Wanning Chu, Francesco Di Stefano, Fabio Gonzalez Florez, Patricia de Haan, Mario Daniel Gómez, Ruth Guevara, Alena Herklotz, Brian Honermann, Emily Key, Rajju Malla-Dhakal, Diego Felipe Otero,Farzana Ramzan, Alec Schierenbeck, Erica Salerno, Asrat Tesfayesus, Sebastián Torres Luis Villanueva, e Tara Zapp. Por último mas não menos importante, agradecemos a Jean-Luc Fiévet por contribuir generosamente com várias fotografias a serem incluídas no relatório e a Cynthia Spence pela concepção e arranjo gráfico desta publicação. iv Madeleine K. Albright Co-Presidente Naresh C. Singh Director Executivo Hernando de Soto Co-Presidente A Comissão Co-Presidentes Madeleine K. Albright ex Secretária de Estado do Governo dos Estados Unidos e ex Representante Permanente dos Estados Unidos junto das Nações Unidas. É actualmente a Administradora-Delegada do The Albright Group LLC e Presidente e Administradora-Delegada da Albright Capital Management LLC, uma empresa de consultoria financeira de investimentos em mercados emergentes. Hernando de Soto é Presidente do Instituto para a Liberdade e Democracia e autor de obras fundamentais tais como The Mystery of Capital e The Other Path. Director Executivo Naresh C. Singh é Director Geral de Governação e Desenvolvimento Social na Agência para o Desenvolvimento Internacional do Canadá (em licença sabática) e ex Conselheiro Principal sobre Pobreza e Meios de Subsistência Sustentáveis no PNUD. Membros da Comissão Fazle Hasan Abed fundador e presidente da BRAC, uma das maiores organizações mundiais de Desenvolvimento com base no Bangladesh. Lloyd Axworthy é actualmente o Presidente e Vice-Reitor da Universidade de Winnipeg. É ex Ministro dos Negócios Estrangeiros do Canadá (entre 1996 e 2000) e actualmente pertence aos conselhos de administração da MacArthur Foundation, Human Rights Watch, Pacific Council, e outras. El Hassan bin Talal está empenhado na criação de sociedades nas quais as pessoas possam viver e trabalhar em liberdade e com dignidade. É o Presidente do Arab Thought Forum e actualmente trabalha na construção de uma carta de princípios tanto de cidadania como social que incorpore um código de ética e promova odesenvolvimento societário na região da Ásia Ocidental e Norte Africana. Fernando Henrique Cardoso ex Presidente do Brasil (de 1995 a 2002) e ex presidente do Clube de Madrid (de 2003 a 2006). Shirin Ebadi é um advogado iraniano e um activista dos direitos humanos, que recebeu o Prémio Nobel em 2003. Ashraf Ghani é o Presidente do Instituto para Eficácia Governamental e é ex Ministro das Finanças do Afeganistão. Medhat Hassanein é Professor de Finanças e Banca no Departamento de Gestão da Escola de Negócios, Economia e Comunicação da Universidade Americana do Cairo e é ex Ministro das Finanças do Egipto. Hilde Frafjord Johnson é ex Ministra de Desenvolvimento Internacional da Noruega e Membro do Parlamento, tendo servido em dois mandatos governamentais, sendo o primeiro também como Ministra dos Direitos Humanos. Numa outra qualidade, Ms. Johnson é actualmente a Directora Adjunta Executiva da UNICEF. Anthony McLeod Kennedy é um Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça dos Estados Unidos da América. Durante a sua carreira como jurista foi professor de Direito e deu aulas na Europa versando o tema dos direitos fundamentais. Allan Larsson é ex Ministro das Finanças da Suécia e ex Membro do Parlamento Sueco. Foi Director Geral do Conselho para o Mercado Nacional do Trabalho na Suécia e como Director Geral na Comissão Europeia. É actualmente presidente da Universidade de Lund e conselheiro do Presidente da Comissão Europeia sobre energia e alterações climáticas. Clotilde Aniouvi Médégan Nougbodé é Presidente do Supremo Tribunal de Justiça do Benin. Foi anteriormente Chefe de gabinete do Ministro da Justiça do Benin e membro fundadora da Associação de Mulheres Juristas do Benin (AFJB), uma organização sem fins lucrativos. Benjamin Mkapa é ex Presidente da Tanzânia. É actualmente o Presidente do South Centre, e Co-Presidente do Investment Climate Facility para a África e um membro activo nas negociações de paz na Região do Grandes Lagos de África. Mike Moore é ex Primeiro-ministro da Nova Zelândia e ex Director Geral da Organização Mundial do Comércio (de 1999 a 2002). É um membro activo dos conselhos sobre assuntos de comércio e foi também membro da Comissão das Nações Unidas sobre Migrações Internacionais. Milinda Moragoda é ex Ministro das Reformas Económicas, Ciência e Tecnologia e ex Secretário de Estado do Ministério do Plano e Desenvolvimento do Sri Lanka. Actualmente é Ministro do Turismo. v S. Tanwir H. Naqvi é General Tenente na reforma do Exército Paquistanês desde 1995, e serviu como Ministro Federal na capacidade de Presidente da Agência para a Reconstrução Nacional, uma organização que fundou e liderou durante três anos (de 1999 a 2002) para restruturação das instituições de governo do Paquistão no sentido de as tornar mas eficazes na resposta aos desafios do séc. XXI. Mary Robinson é ex Presidente da Irlanda e ex Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos. É actualmente a Presidente da Realizing Rights: The Ethical Globalization Initiative (EGI). Arjun Sengupta é ex Professor da escola de Estudos Internacionais da Universidade Jawaharlal Nehru e um Professor Auxiliar na Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard. É actualmente Presidente do Centro para o Desenvolvimento dos Direitos Humanos em Nova Deli e preside, em Genebra, ao Grupo de Trabalho Intergovernamental das Nações Unidas sobre o Direito ao Desenvolvimento. É também membro do Parlamento Indiano. Lindiwe Sisulu é actualmente Ministro da Habitação e membro do Parlamento da República da África do Sul. Lawrence H. Summers é ex Presidente da Universidade de Harvard e ex Secretário de Estado do Tesouro dos Estados Unidos. Actualmente é director executivo da D.E. Shaw, uma firma de investimentos alternativos. Erna Witoelar é ex Ministra do Povoamento e Desenvolvimento Regional e membro da Assembleia Nacional da Indonésia. Foi Embaixadora especial das Nações Unidas do ODM na Ásia e Pacífico até ao fim de 2007 e é membro em vários Conselhos Executivos de Comités de Altos Funcionários (CSO’s) que trabalham em projectos de desenvolvimento sustentável e nas reformas de governação. Ernesto Zedillo é ex presidente do México e actualmente é Director do Centro para o Estudo da Globalização, é Professor de Economia e Política Internacionais e Professor Associado de Estudos Florestais e Ambientais da Universidade de Yale. vi Membros do Comité de Aconselhamento Robert Annibale, Director Mundial de Microcrédito, Citigroup Marek Belka, Secretário Executivo, Comissão de Economia para a Europa das Nações Unidas (UNECE) Diego Hidalgo, Fundador, Clube de Madrid Donald Kaberuka, Presidente, Grupo do Banco Africano de Desenvolvimento Jean Lemierre, Presidente, Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento Louis Michel, Comissário para o Desenvolvimento e Ajuda Humanitária, Comissão Europeia Luis Alberto Moreno, Presidente, Banco de Desenvolvimento Interamericano Kumi Naidoo, Secretário-geral e CEO, CIVICUS Sheela Patel, Director Fundador, Sociedade para a Promoção de Recursos Locais (SPARC) Jan Peterson, Fundador e Presidente, Comissão Huairou Juan Somavia, Director Geral, Organização Internacional do Trabalho (ILO) Anna Tibaijuka, Director Executivo, NU-HABITAT Victoria Tauli-Corpuz, Presidente, Fórum Permanente das Nações Unidas para Assuntos Indígenas John Watson, Ex Presidente, CARE do Canadá Francisco Garza Zambrano, Presidente, Cemex América do Norte Robert Zoellick, Presidente, Banco Mundial Índice Prefácio i Agradecimentos iii Sumário Executivo 1 Capítulo 1: Pôr a Lei ao Serviço de Todos 13 A Importância da Lei 15 Progresso e Frustração 16 Dirigir-se aos Quatro Mil Milhões de Pobres e Excluídos 19 Consciencialização de Direitos pela Mudança Política 20 A Aquisição de Poder por Via da Lei é o Caminho 21 Fazer a Pobreza passar à História 29 Capítulo 2: Os Quatro Pilares da Aquisição de Poder por Via da Lei 25 O Conceito de Aquisição de Poder por Via da Lei 26 Direitos Humanos 29 Os Quatro Pilares da Aquisição de Poder por Via da Lei e a Dimensão do Problema 31 Capítulo 3: A Aquisição de Poder por Via da Lei é Politicamente Inteligente e faz Bom Sentido Económico 43 A Aquisição de Poder equaciona com Políticas Inteligentes 43 Um Desafio Político com Recompensas 44 Um Papel Essencial para a Democracia 46 A Aquisição de Poder por Via da Lei faz Bom Sentido Económico 47 Capítulo 4: Agenda para a Mudança 59 Uma Agenda Para Acesso à Justiça 59 Uma Agenda sobre os Direitos de Propriedade 65 Uma Agenda sobre os Direitos do Trabalho 68 Uma Agenda sobre os Direitos de Comerciar 71 Capítulo 5: Estratégias de Implementação 75 Fazer Bem à Primeira Vez 76 Gestão das Partes Interessadas e Mobilização de Aliados 79 Acção ao Nível Internacional 81 Notas Finais 90 Bibliografia 93 Este é o primeiro de dois volumes do trabalho da Comissão. O segundo volume é publicado separadamente (disponível em www.undp.org/legalempowerment) e consiste nos resultados de cinco grupos de trabalho formados para informar sobre as deliberações da Comissão. Poderá haver casos em que as afirmações neste relatório ultrapassam as dos grupos de trabalho no volume II. vii No séc. XXI, a aquisição pelos quatro mil milhões para desbloquear as acabar com a pobreza e mais estável e pacífico. Sumário Executivo de poder por via da lei de excluídos é a chave energias necessárias para construir um mundo O espectro da pobreza e o sofrimento resultante da necessidade e do medo são realidades há muito existentes, de tal maneira que a pobreza é muitas vezes tida como sendo uma coisa natural e parte inevitável da condição humana. No início, quando apenas a luta pela sobrevivência era o principal para a maioria das pessoas, esta conclusão parecia tolerável, talvez até inevitável. No entanto, na nossa era temos todas as possibilidades de disponibilizar amplamente as oportunidades económicas. Nos últimos sessenta anos, foi criada mais riqueza do que jamais fora criada. Já não se pode argumentar que a pobreza é natural ou inevitável. Embora muitos tenham partilhado esta prosperidade, uma fatia demasiado grande da população humana foi deixada para trás, continuando a viver em privação, desperdiçando os seus talentos com a morte. A África subsaariana não está na via para atingir qualquer dos Objectivos de Desenvol- vimento do Milénio e a pobreza extrema persiste em todos os continentes. Abundam as estatísticas acerca do número de indivíduos que vivem com um rendimento de pobreza extrema, independentemente de trabalharem muito ou pouco. E a falta de rendimento é apenas uma das dimensões da pobreza. Esta Comissão argumenta que a quatro milhões de pessoas em todo o mundo é-lhes sonegada a possibilidade de melhorarem as suas condições de vida e saíram da pobreza, porque são excluídas dos enquadramentos legais.1 Quer vivam abaixo ou ligeiramente acima da linha de pobreza, estes homens, mulheres e crianças não gozam das protecções e direitos atribuídos pela lei. Podem ser cidadãos do país onde vivem, mas os seus recursos, já de si modestos, não podem ser adequadamente protegidos nem alavancados. Assim, não é a ausência de bens ou falta de trabalho que os deixa para trás, mas o facto de esses bens e trabalho serem inseguros, desprotegidos e muito 1 menos produtivos do que poderiam ser. Existem também vulnerabilidades adicionais. As comunidades indígenas podem ser privadas de se fazerem ouvir politicamente e podem ver os respectivos direitos humanos violados. Além da exclusão baseada na pobreza e sexo, às mulheres pobres também lhes pode ser negado o direito a herdarem bens. Assim, na nossa era, a pobreza alargada tem de ser compreendida como sendo criada pela própria sociedade. Em demasiados países, a legislação, instituições e política que governam os assuntos económicos, sociais e estratégicos, negam a grande parte da sociedade a possibilidade de participarem em condições de igualdade. As regras do jogo são injustas. Isto, não é só moralmente inaceitável; impede o desenvolvimento económico e pode minar rapidamente a estabilidade e a segurança. Os resultados da governação – isto é, o efeito cumulativo das estratégias e instituições sobre a vida das pessoas – só mudarão se os processos de governação forem profundamente alterados. A Comissão … A Comissão para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres foi criada para tratar este desafio. É constituída por 21 Comissários, incluindo ex-chefes de estado e governantes, ministros em funções, juristas, investigadores económicos e outros decisores políticos do Norte, Sul, Este e Oeste. Temos pontos de vista diferentes relativamente aos pontos positivos e negativos da globalização mas estamos de acordo quanto aos imperativos de encontrarmos maneiras melhores de lutar contra a pobreza e a exclusão. Ao longo dos três últimos anos, levámos a cabo 22 processos de consulta nacional junto de representantes de governos locais, académicos, sociedade civil e movimentos de base. Lançámos cinco grupos de trabalho técnico, que apresentaram relatórios especializados. Utilizámos a nossa própria experiência, analisámos publicações relevantes, falámos com pessoas de todas as áreas e debatemos o assunto com decisores políticos nacionais e internacionais bem como entre nós 2 próprios. Vimos e ouvimos histórias de sucesso, e acreditamos que há provas convincentes de que quando os pobres recebem protecção conforme o estado de direito, eles podem prosperar. … e a respectiva Avaliação: Quatro Mil Milhões de Vidas Excluídas A comissão acredita que a pobreza é provocada pelo homem, pela acção e inacção e o insucesso das políticas públicas e dos mercados. A Comissão vê que nos países ricos as pessoas têm mais possibilidade de terem acesso à justiça e a outros direitos – como trabalhadores, pessoas de negócios e detentores de propriedades. A recente e vasta criação de riqueza tem origem em várias protecções legais, normas e instrumentos que governam coisas tais como organizações de negócios, grupos empresariais, bens comerciáveis, contratos laborais, associações de trabalhadores, capital de risco e propriedade intelectual. Embora as mesmas protecções e instrumentos existam em muitos países em vias de desenvolvimento, a grande maioria não tem maneira de lhes ter acesso. Não obstante esta realidade, os suportes legais do empreendedorismo, emprego e interacção de mercados são muitas vezes tidos como certos pelas abordagens tradicionais ao desenvolvimento e pela teoria económica clássica. Os contratos e os direitos de propriedade são tidos como estando implementados e o que resulta da economia informal raramente é tido em conta. Na verdade, a maioria das iniciativas de desenvolvimento tem tendência para concentrar-se na economia oficial, no sistema jurídico formal e nas instituições a nível nacional em detrimento do nível local. No entanto, a maioria das pessoas pobres não vive ao abrigo da lei, mas bem afastados da protecção jurídica e das oportunidades que esta lhes proporciona. As instituições e normas informais locais governam as suas vidas e meios de subsistência, e nos casos em que não são excluídos do sistema jurídico, são muitas vezes oprimidos por ele. Porque os pobres não têm os seus Cambodja © Jean-Luc Fievet 2007 direitos reconhecidos, são vulneráveis a abusos por parte das autoridades que descriminam, procuram subornos ou ficam do lado de interesses poderosos que podem pretender impedir que os pobres compitam economicamente ou procurem desapossá-los das suas próprias terras. Este tipo de discriminação tem consequências massivas. A Comissão conclui que pelo menos quarto mil milhões de pessoas estão excluídas do estado de direito. É a minoria da população mundial que pode tirar partido das normas e regulamentações legais. A maioria da humanidade está de fora a olhar para dentro, incapaz de contar com a protecção da lei e incapaz de entrar nos mercados nacionais e muito menos nos globais. A Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres como Estratégia de Desenvolvimento Quando o ordenamento jurídico funciona para todos, define e impõe os direitos e obrigações a todos. Isto permite que as pessoas interajam entre si numa atmosfera certa e previsível. Assim, o estado de direito não é um mero enfeite para o desenvolvimento; é uma fonte essencial de progresso. Cria um ambiente onde todo o espectro da criatividade humana pode florescer e a prosperidade pode ser criada. A Comissão compreende que a aquisição de poder por via da lei é um processo de mudança orgânica através da qual os pobres e excluídos passam a poder usar a lei, o sistema e serviços jurídicos para proteger e fazer avançar os seus direitos e interesses como cidadãos e actores económicos. O ordenamento jurídico é a plataforma na qual assentam as instituições vitais da sociedade. Nenhuma economia de mercado moderna pode funcionar sem leis, e para ser legítimo, o próprio poder tem de se submeter ao ordenamento jurídico. Um mercado florescente e inclusivo pode proporcionar o espaço fiscal que permite aos governos nacionais um melhor desempenho das respectivas responsabilidades. O relacionamento entre a sociedade, o estado e o mercado é simbiótico. Por exemplo, o Mercado não só reflecte as liberdades fundamentais tais como as liberdades de associação e movimento, como também gera recursos para providenciar, manter e impor todo o conjunto de direitos humanos. São este tipo de processos, em que os pobres concretizam os seus direitos e colhem os benefícios de novas oportunidades, que permitem o gozo da cidadania – resumindo, a aquisição de poder por via da lei. Se a lei é uma barreira para os pobres que desejam melhorar a sua situação, se é vista como um obstáculo à dignidade e segurança, então a 3 ideia de lei como instituição legítima, em breve será abandonada. Se a lei é aceite e compreendida como oferecendo protecção e igualdade de oportunidades e garantindo o acesso a um processo justo e neutro, então a lei será consagrada como a base da justiça. O desenvolvimento não tem soluções técnicas. Para que os Estados garantam o direito à protecção dos cidadãos, os sistemas podem e têm de ser alterados e de forma sistémica. A aquisição de poder por via da lei é uma força central neste tipo de processos de reforma. Isto implica que os Estados cumpram os seus deveres para com o respeito, protecção e cumprimento dos direitos humanos e que os pobres estejam cada vez mais conscientes dos seus direitos, e colham as oportunidades que lhes escapam, através dos seus próprios esforços, assim como através dos esforços daqueles que os apoiam, redes mais alargadas e governos. Os elementos da aquisição de poder por via legal têm os seus fundamentos no espírito e redacção da legislação internacional dos direitos humanos e especialmente no Artigo 1 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que declara, ‘Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos.’ Democracia: Meios Indispensáveis, Fim Justo As justas palavras da Declaração, escritas há 60 anos, são universalmente aceites mas raramente cumpridas. Se os pobres fizerem por via da lei a aquisição de poder, têm de ter direitos eficazes e legalmente protegidos. Estes incluem o direito ao voto, o direito à liberdade de expressão e o direito à segurança jurídica. É um objectivo essencial das sociedades democráticas dar estes direitos, e um desafio constante fazê-lo consistente e equitativamente. As organizações internacionais, tanto regionais como globais, podem ajudar a apoiar a construção de instituições democráticas através de uma variedade de meios. 4 Algumas avisaram contra a democratização enquanto o estado de direito se mantém imperfeito. A Comissão não concorda. Democracia e aquisição de poder por via da lei são almas gémeas e resultam melhor se forem síncronas do que em sequência. Na ausência da aquisição de poder por via da lei, as sociedades perdem os benefícios resultantes da livre circulação de informação, do debate aberto e das novas ideias. Entretanto, os governos não são responsabilizados pelas políticas imprudentes. Há uma razão pela qual nenhuma democracia conheceu a fome, e isso é visível ao longo de várias décadas sugerindo que as democracias são menos propensas a desencadear conflitos. Naturalmente que não há um único modelo de democracia, mas as necessidades dos pobres podem fazer-se ouvir melhor quando a tomada de decisões é descentralizada para o nível local. O princípio essencial subjacente à democracia, em todos os seus modelos, é que o poder legítimo tem a sua origem na vontade do povo livremente expressa. Reforçar a democracia é essencial para a aquisição de poder por via da lei. Para os Reformadores: Resistência e Recompensa Transformar uma sociedade para incluir os pobres exige reformas exaustivas a nível económico, social, político e jurídico. A curto prazo, a reforma não parece ser uma opção fácil. No entanto, há uma recolha de resultados por parte da liderança. Quando os pobres conseguem encontrar protecção e oportunidades no sistema jurídico, os benefícios práticos tornam-se visíveis. Conforme a economia informal passa a estar documentada, a base fiscal é alargada aumentando os rendimentos para o desenvolvimento nacional. Os ganhos económicos expandem os mercados locais e aumentam a actividade financeira a todos os níveis. Conforme o estado de direito se expande, as redes predatórias que exploram participantes vulneráveis na economia informal começam a desaparecer, e cada vez mais pessoas desenvolvem o interesse na redução do crime e na manutenção de uma ordem social pacífica. Conforme esta transformação se desenvolve, as reformas ganham terreno e os governos que aderiram a ideias reformistas ganham credibilidade, especialmente entre o eleitorado político cujas vozes anteriormente não eram ouvidas. Deste modo, a aquisição de poder por via da lei pode dar corpo e viver de acordo com uma descrição apelativa para o progresso. A aquisição de poder por via da lei não substitui outras iniciativas importantes de desenvolvimento, tais como investir mais na educação, serviços públicos, e infra-estruturas, reforçar a participação no comércio e atenuação e adaptação às alterações climáticas: em vez disso, complementa essas iniciativas, multiplicando o respectivo impacto criando as condições para o sucesso. As pessoas que vivem em pobreza extrema necessitam de assistência imediata e especialmente intervenções direccionadas. O providenciar de educação de qualidade, especialmente para as raparigas, não podia ser mais urgente. A Comissão está convencida que os quatro mil milhões de excluídos a nível mundial possuem capacidades significativas. Se os Estados e a legislação forem reformados de modo a reconhecerem adequadamente os pobres, se a legislação for implementada para todos, os que estão excluídos rapidamente começarão a ultrapassar a situação actual e a contribuir para a solução dos problemas sociais e económicos crónicos. Os Quatro Pilares da Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres Durante as deliberações e com base no trabalho dos respectivos grupos de trabalho temático, a Comissão desenvolveu uma lista completa de prioridades para a aquisição de poder por via da lei abarcando quatro pilares cruciais que têm de estar no centro dos esforços nacionais e internacionais para dar aos pobres protecção e oportunidades. A aquisição de poder por via da lei só pode ser conseguida através de uma mudança sistémica dirigida ao desbloqueio do potencial cívico e económico dos pobres. A lista de prioridades da Comissão inclui: acesso à justiça e estado de direito, direitos de propriedade, direitos de trabalho e ‘direitos de negócios’.* Estes quatro pilares reforçam-se e apoiam-se uns aos outros. Na respectiva convergência e através da respectiva sinergia, a aquisição de poder por via da lei pode ser conseguida. Primeiro Pilar: Acesso à Justiça e ao Estado de Direito Em primeiro lugar entre os direitos encontra-se aquele que garante todos os outros: acesso à justiça e ao estado de direito. A aquisição de poder por via da lei é impossível quando, de jure ou de facto, é negado aos pobres o acesso a um sistema jurídico que funcione bem. Onde leis justas salvaguardam e fazem cumprir os direitos e obrigações da sociedade, os benefícios para todos, especialmente os pobres, são imensuráveis. Garantir igual acesso à justiça, embora fundamental para o progresso, é difícil de conseguir. Mesmo se o sistema jurídico é tecnicamente inclusivo e justo, o igual acesso à justiça só pode ser conseguido com o empenho do estado e das instituições públicas. As medidas da aquisição de poder por via da lei nesta área têm de: • Garantir que todos têm o direito fundamental à personalidade jurídica, e a serem registados ao nascer; • Revogar ou alterar leis e regulamentações parciais contra os direitos, interesses, e modo de vida dos pobres; • Facilitar a criação de organizações e coligações da sociedade civil e do estado, incluindo paralegais que trabalhem em defesa dos excluídos; • Estabelecer um monopólio estatal legítimo sobre os meios de coacção através por exemplo, policiamento eficaz e imparcial; • Tornar o sistema judicial formal, os sistemas de administração territorial, e instituições públicas relevantes mais acessíveis através do reconhecimento e integração de procedimentos jurídicos informais e tradicionais com os quais os pobres já estão familiarizados; * ‘Direitos de Comerciar’ não necessita de ser um novo termo jurídico, mas antes é resultante de direitos existentes relacionados com a prossecução de negócio a nível individual, agora agregado a este termo na base da instrumentalidade vital desse processo na subsistência dos pobres. 5 Colômbia © Jean-Luc Fievet 2007 • Encorajar os tribunais a prestar a devida consideração aos interesses dos pobres; • Apoiar mecanismos para a resolução alternativa de conflitos; • Encorajar e institucionalizar o acesso a serviços jurídicos de modo a que os pobres conheçam a legislação e possam tirar proveito dela; • Apoiar medidas concretas para a aquisição de poder por via da lei pelas mulheres, minorias, refugiados e pessoas internamente deslocadas e povos indígenas. Segundo Pilar: Direitos de Propriedade A detenção da propriedade, individualmente ou em associação com outros, é um direito humano. Um regime de propriedade totalmente implementado é composto por quatro blocos: um sistema de regras que define o conjunto de direitos e obrigações entre pessoas e bens que reflectem a multiplicidade e diversidade dos sistemas de regime de propriedade em todo o mundo; um sistema de governação; um mercado em funcionamento para a troca de bens; e um instrumento de política social. Cada um destes componentes pode ser disfuncional e funcionar contra os pobres. Quando o sistema funciona no seu todo, passa a ser um veículo para a inclusão 6 dos pobres na economia formal e um mecanismo para a sua ascensão social. Quando todo o sistema ou um único componente é disfuncional, os pobres são privados da oportunidade ou descriminados. Uma vez que as reformas dos direitos de propriedade são inerentemente arriscadas, deve ser prestada toda a atenção para garantir os direitos dos pobres. As mulheres, que constituem metade da população mundial, só detêm 10 por cento dos bens a nível mundial. As populações indígenas e outras conhecem a descriminação activa. Para garantir os direitos dos grupos, é necessário um pensamento jurídico imaginativo. Dar aos totalmente desprovidos o direito e acesso a bens significa intervenções sociais directas. Para serem totalmente produtivos, os bens têm de ser formalmente reconhecidos por um sistema que abarque tanto os direitos de propriedade individuais como os colectivos. Isto inclui o reconhecimento dos direitos tradicionais. Incorporá-los nos registos normais, títulos e contratos, em conformidade com a lei, protege os agregados familiares e os negócios. As expulsões só deveriam ser uma opção em circunstâncias onde a segurança física da vida e propriedade estivessem ameaçadas, ou nos casos em que os contratos tenham sido quebrados ou perante processos de expropriação justos. Devem ser efectuadas através do respectivo processo jurídico, equitativamente aplicável, contestável e independente, e sempre que o custo da expulsão seja totalmente compensado. Os direitos de propriedade, incluindo título de posse, não só devem ser protegidos por lei, mas também através da associação da propriedade dos pobres a interesses mais amplos da sociedade (aumentando o alcance da validação do respectivo título de posse). A possibilidade está aberta para os pobres utilizarem o bem como garantia para a obtenção de crédito, tal como um empréstimo para negócio ou uma hipoteca. Isso encoraja à conformidade, ligando os proprietários aos bens, os bens a endereços fixos e endereços fixos ao cumprimento, isto é, à responsabilização das pessoas. Assim, a reforma da propriedade pode reforçar o acesso à personalidade jurídica e à justiça. Os registos de propriedade unificam disposições dispersas num sistema único, juridicamente compatível. Isto integra os mercados locais fragmentados, permitindo que os negócios procurem novas oportunidades fora das imediações mais próximas e colocando-os no contexto jurídico onde estarão mais bem protegidos pela segurança jurídica e associação de causa. As medidas da aquisição de poder por via da lei nesta área têm de: •Promover uma governação eficiente da propriedade individual e colectiva para integrar a economia subterrânea na economia formal e garantir que se mantém facilmente acessível a todos os cidadãos; •Garantir que em todas as nações é legalmente obrigatório por lei o reconhecimento das propriedades e que todos os proprietários têm acesso aos mesmos direitos e normas; •Criar um mercado funcional para a troca de bens, que seja acessível, transparente, e responsável; •Alargar a disponibilidade dos direitos de propriedade, incluindo o título de posse, através de políticas sociais e outras políticas públicas, tais como o acesso ao alojamento, empréstimos a juros bonificados e à distribuição de terras do estado; •Promover um sistema de direitos de propriedade inclusivo que reconheça automaticamente a propriedade de bens imóveis adquirida pelos homens em co-propriedade com as respectivas esposas ou parceiras de união de facto. Terceiro Pilar: Direitos do Trabalho Os pobres podem chegar a gastar a maioria das horas que estão acordados no local de trabalho, mal conseguindo sobreviver com o que ganham. Mas o trabalho não é um bem essencial. Do mesmo modo que a propriedade e os bens físicos dos pobres são reconhecidos, também o seu maior bem – o seu trabalho e capital humano – deve ser eficazmente reconhecido. A legitimidade, mesmo a aceitabilidade, da economia depende de direitos básicos de trabalho, assim como o desenvolvimento do capital humano necessário para o crescimento sustentado. Por outro lado, o melhoramento contínuo dos direitos de trabalho e sociais depende de uma economia de mercado funcional e bem-sucedida. O padrão típico e gasto da baixa produtividade, salários baixos, e riscos altos tem de ser substituído pelo cumprimento da Agenda dos Princípios Fundamentais e Direitos no Trabalho e doTrabalho Digno, e a estratégia para dar protecção e oportunidade aos trabalhadores na economia informal, uma coligação descrita como um contrato social global emergente. Como: •Respeitar, promover e implementar a liberdade de associação para que a identidade, voz e representação dos pobres que trabalham possa ser reforçada no diálogo social e político acerca da reforma e respectiva concepção; •Melhorar a qualidade da regulamentação laboral e o funcionamento das instituições do mercado do trabalho, criando assim sinergia entre a protecção e a produtividade dos pobres; •Garantir o cumprimento efectivo de um pacote mínimo de direitos no trabalho para trabalhadores e empresas na economia informal que apoia e vai mais além da Declaração dos Princípios Fundamentais e Direitos no Trabalho; 7 •Aumentar o acesso às oportunidades de emprego na economia de mercado crescente e mais inclusiva; •Expandir a protecção social para os trabalhadores pobres no caso de choques económicos e alterações estruturais; •Promover medidas que garantam o acesso a cuidados médicos, seguros de saúde e pensões; •Garantir que a aquisição de poder por via da lei dinamiza a igualdade de sexos, indo assim ao encontro dos compromissos segundo as normas da ILO (OIT) que promovem activamente a eliminação da discriminação e igualdade de oportunidade para, e o tratamento de, mulheres que surgiram como uma força importante na redução da pobreza nas comunidades pobres. Quarto Pilar: Direitos nos Negócios2 A Comissão tem como evidente que os pobres 8 têm direito aos direitos, não só quando trabalham por conta de outrem, mas também no desenvolvimento dos seus próprios negócios. O acesso a serviços financeiros básicos é indispensável para homens de negócios em potencial ou emergentes. Igualmente importante é o acesso à protecção e oportunidade tal como a possibilidade de contratar, fazer negócios, obter capital para investimento através de acções, obrigações ou outros meios, para conter o risco financeiro pessoal através da protecção dos bens e responsabilidade limitada, e passar a posse de bens de geração em geração. Estes direitos poderão não Indonésia UNICEF/HQ07-0690/Josh Estey ser igualmente importantes para cada empresário mas são essenciais na erradicação da pobreza e no desenvolvimento económico. Têm de estar acessíveis a todas as inúmeras micro, pequenas e médias empresas no mundo em vias de desenvolvimento – muitas dirigidas por mulheres – que empregam uma grande parte da força laboral. Muitas vezes o sucesso ou fracasso deste sector económico marcará a diferença entre o progresso económico contra a estagnação, o aumento do emprego contra o desemprego generalizado, e a criação de uma sociedade de partes interessadas mais alargada contra uma maior desigualdade que leva a um contrato social mais fraco. As medidas da aquisição de poder por via da lei nesta área têm de: •Garantir direitos de negócio básicos; incluindo o direito à venda ambulante, a ter um local de trabalho, e ter acesso às infra-estruturas e serviços necessários (abrigo, electricidade, água e instalações sanitárias); • Reforçar a governação económica eficaz que facilita e torna acessível a montagem e funcionamento de um negócio, o acesso aos mercados e abandonar um negócio se necessário; •Expandir a definição de ‘pessoa jurídica’ para incluir as empresas de responsabilidade jurídica que permitem que os detentores separem os seus bens pessoais dos empresariais, permitindo assim assumirem riscos de forma prudente; •Promover serviços financeiros inclusivos que disponibilizam aos empresários no mundo em vias de desenvolvimento aquilo que muitos dos seus pares noutros locais têm garantido – poupanças, crédito, seguros, pensões, e outras ferramentas de gestão de risco; •Expandir o acesso a novas oportunidades de negócio através de programas especializados para familiarizar os empresários com os novos mercados e ajudá-los a cumprir as regulamentações e requisitos, e esse apoio com ligações a jusante e a montante entre empresas maiores e mais pequenas. Impulso Institucional e Implementação Para ser bem-sucedido, a aquisição de poder por via da lei tem de conduzir a uma mudança sistémica, incluindo a reforma institucional. Numa agenda completa, em vez de uma abordagem faseada, os quatro pilares da aquisição de poder por via da lei reforçam-se uns aos outros. Instituições e leis efectivas que explicam claramente os direitos e obrigações, dão aos indivíduos a confiança para cooperarem com outros no tempo e à distância, criando assim riqueza com segurança. Os ganhos da produtividade distribuídos através de reformas numa área, conduzem a outros. Os mecanismos para a protecção social e os direitos no trabalho estão ligados de perto ao desenvolvimento de um ambiente empresarial produtivo e competitivo. Na aquisição de poder por via da lei, as coisas boas andam de mãos dadas. A liderança política impõe-se. Uma agenda completa será mais bem gerida não por ministérios individuais, em competição para ganhar apoios e atenção, mas por presidentes e primeiros-ministros em cooperação com os ministros das finanças, da justiça e do trabalho. Através da sua autoridade política, presidentes e primeiros-ministros podem fazer avançar a agenda e criar impulso político essencial. Mas os Altos Representantes não são uma pré-condição para uma liderança eficaz. As organizações de cidadãos e populares podem criar iniciativas valiosas para a mudança através da educação do público e reuniões sobre o tema da aquisição de poder por via da lei. Muitas melhorias nas vidas dos pobres foram conseguidas através da inovação social. A Aquisição de Poder por Via da Lei também tem de ser feita das bases para as cúpulas. A abordagem da aquisição de poder por via da lei recomendada pela Comissão é diferente das abordagens tradicionais às reformas jurídicas e institucionais e não envolve planos estereotipados para implementação. Os contextos nacionais e locais diferem, criando uma grande variedade de barreiras e oportunidades para reforma que têm de ser tidas em conta. No entanto, é muito provável que o sucesso partilhe características comuns. Coligações políticas alargadas, trazendo líderes de outras áreas da sociedade e empenhados em defender políticas, aplanarão o caminho para a aquisição de poder por via da lei e ajudarão a ultrapassar resistências, diversidades e atrasos. É essencial o conhecimento e a sintonia com, o contexto político e as reformas baseadas numa compreensão profunda e partilhada das condições locais tanto na economia formal como na informal. O aspecto do sexo requer enorme atenção nas quatro áreas, assim como os direitos das populações indígenas e a lei tradicional. Os pobres não são os objectos em si da aquisição de poder por via da lei, mas sim os co-criadores e facilitadores. Têm de participar e dar informação em todas as fases da reforma, incluindo a monitorização apertada dos resultados. A reforma tem de crescer a partir das realidades e necessidades dos pobres. A Comissão está convencida que o sucesso tem mais possibilidades onde a vontade 9 de atingir a democracia é maior. Como Avançar no Mundo Multilateral Enquanto o governo é o actor chave e responsável, o ‘portador das responsabilidades’ em termos de direitos humanos, num processo de Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres, as Nações Unidas e o sistema multilateral alargado podem ajudar dando-lhes o seu apoio total. A comunidade internacional não-governamental pode fazer o mesmo Mais especificamente: •A agenda da aquisição de poder por via da lei tem de estar integrada como uma preocupação fulcral das agências multilaterais globais tais como o Banco Mundial, o PNUD, o IOT, a FAO e a NU-HABITAT. Nos seus aspectos distintos, estas agências influenciam o modo como os governos estabelecem e implementam as regras que definem as protecções e oportunidades económicas e sociais. As respectivas estratégias e abordagens operacionais têm de mudar para que possam disponibilizar um apoio forte, sustentado e coordenado à Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres. O PNUD deve tomar a liderança e trabalhar com outras agências das NU para desenvolverem uma agenda multilateral e coerente para a aquisição de poder por via da lei; •A Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres também tem de passar a ser uma missão fulcral para as organizações políticas regionais, bancos regionais e instituições regionais das NU. Estas organizações podem trabalhar de perto com os líderes nacionais tanto para ajudarem os governos empenhados na reforma e exercerem uma influência normativa nos governos menos dispostos a abraçarem a reforma; •A sociedade civil e as organizações com base nas comunidades podem contribuir fazendo a ligação entre os pobres e as instituições políticas a todos os níveis, advogando uma melhor representação para os pobres, organizando apoio para as agendas das reformas e trabalhando como auditores independentes para o 10 sistema político; •A comunidade empresarial pode aplainar o caminho para a aquisição de poder por via da lei através do Compacto Global das NU, e apoiando e participando em esforços de reforma numa base local e nacional; •As comunidades religiosas e as tradições espirituais indígenas podem ter um papel único e essencial em transpor os imperativos morais da aquisição de poder por via da lei em acções concretas; •Várias associações profissionais, incluindo juristas, advogados, entidades administrativas territoriais, supervisores e urbanistas, também podem ter um papel na reunião e disseminação da informação nas respectivas comunidades e redes de trabalho. Podem disponibilizar apoio político para a aquisição de poder por via da lei e acesso à reforma da justiça, assim como aumentando o financiamento para o apoio jurídico e outros serviços necessários. Juntas, estas iniciativas devem dar: •Apoio coerente para os esforços de aquisição de poder por via da lei em cada país; •Apoiar um consenso político para a aquisição de poder por via da lei a nível global e regional; •Criar novos instrumentos para apoio da aquisição de poder por via da lei, tais como: oUm ‘Pacto Global para Aquisição de Poder por Via da Lei” como primeiro passo na codificação dos direitos essenciais e esclarecimento de uma estrutura para a respectiva execução; oMecanismos para acompanhamento do progresso a todos os níveis; oUm centro de informação para registo, armazenagem e disseminação de experiências e lições aprendidas relativamente à aquisição de poder por via legal; oParcerias público privadas; oUma iniciativa global para promover conhecimento e inovação das bases. Em resumo, a vasta maioria da população mundial vive à margem da lei. Esta é uma receita para a estagnação nacional e global. Um estado cego consigo próprio está destinado a fracassar. Quando tantas pessoas à margem do estado de direito, as sociedades não são capazes de atingir o seu potencial; todos os elementos do sistema económico – da produtividade e poupanças ao investimento e mercados ao planeamento e inovação – são privados de energia e de bens. Esta exclusão faz com que seja mais difícil para os governos irem ao encontro das suas necessidades nacionais, e cria problemas sociais que podem gerar agitação civil e desintegração social. A solução para a exclusão está na inclusão através da Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres. Isto é económica, política, social e moralmente importante. Um país com leis e instituições que não calam os pobres, beneficiará das contribuições de toda a população e de uma ordem jurídica, social e económica em que todos os segmentos da sociedade têm voz e empenho. Esses países terão maior facilidade em construir uma coesão nacional, e mais probabilidade de encontrar um nicho positivo no mercado competitivo mundial. O mundo como um todo beneficiará conforme cada vez mais estados implementam as reformas necessárias para promover a aquisição de poder pelos pobres. Essas iniciativas ajudarão a reduzir as pressões criadas pelas migrações de refugiados, subdesenvolvimento, fome, negligência ambiental, urgências de saúde e conflitos. Num mundo interdependente, todos estaremos melhor se os nossos vizinhos puderem contar com a protecção jurídica e puderem viver conforme as suas responsabilidades segundo essa mesma lei. Afinal, a nossa época é uma época de mudanças sísmicas, não só na área económica mas também na criação de um domínio público global. Uma miríade de interacções desgovernadas flui entre estados, desde o óbvio ao quase invisível, do maligno ao benfazejo. Algumas têm de ser restringidas, outras controladas e outras ainda facilitadas e encorajadas. No entanto, como acontece a nível nacional, as nossas instituições globais permanecem cegas à maioria da realidade, mais equipadas para o passado do que para o presente, prejudicando as nossas tentativas de lidar com cada problema novo que enfrentamos. Quem é que pode negar que todos partilhamos uma responsabilidade para proteger: uma que estamos longe de atingir? Quer relativamente às alterações climáticas, comércio, migração, ou segurança, o mundo esperará regras justas para o séc. 21, regras que ofereçam protecção e oportunidades para todos de acordo com as obrigações dos direitos humanos. Tempo para uma Agenda Renovada Contra a Pobreza É tempo para uma agenda renovada contra a pobreza com enfoque na inclusão da grande maioria da população mundial nos sistemas de direitos e obrigações que já deram provas da sua capacidade de encorajar a prosperidade durante os últimos 60 anos. É da responsabilidade dos líderes nacionais e globais, e de todos nós, alargar esse círculo de oportunidade e aumentar o alcance da protecção – não replicando a trajectória dos países ricos mas encontrando meios que permitem que cada país encontre o seu próprio percurso. Embora os métodos possam variar, o objectivo é o mesmo – capacitar e promover a aquisição de poder pelos pobres para serem bemsucedidos tanto como indivíduos como contribuidores para o bem-estar económico e social das respectivas comunidades. Mais inacção e atraso deixarão que os talentos humanos morram mais cedo e por usar, e manchará as vidas que restam. Fazer a pobreza passar à história não pode ser conseguido apenas através da aquisição de poder por via da lei, mas é difícil ver como se poderá fazer sem ela. A Aquisição de Poder por Via da Lei reconhece a complexidade da sociedade e o rico potencial dos pobres. Dando livre curso à sua criatividade, temos nas nossas mãos a possibilidade de forjar um mundo mais humano, mais igual, mais próspero e melhor. Chegou o momento de nos unirmos em apoio dessa tarefa essencial e transformadora. 11 A Comissão constata que de pessoas, a maioria da estão excluídas do estado 1 Pôr a Lei ao Serviço de Todos cerca de 4 mil milhões população mundial, de direito. A té a violência começar, Margaret Atieno Okoth vendia couves seis dias por semana numa banca exígua no Mercado Toi de Nairobi, juntamente com outros vendedores que apregoavam de tudo desde sapatos em segunda mão a peças para bicicletas. Os seus parcos rendimentos permitiam-lhe mandar apenas três dos seus 12 filhos para a escola, enquanto o marido, John, procurava trabalhos ocasionais nos bairros da classe média onde pudesse ir a pé a partir de casa. Mas por muito que Margaret trabalhasse, a família tinha de subsistir numa barraca de lata de uma divisão, sem electricidade, água ou instalações sanitárias. Estavam aprisionados em Quibera, um bairro de lata miserável onde um milhão de Quenianos se debate para sobreviver e a pobreza é passada de geração em geração. Em milhares de povoações como esta em todo o mundo, pessoas pobres como a Margaret não possuem personalidade jurídica – sem certidão de nascimento, sem endereço jurídico, sem direitos à respectiva barraca ou banca de mercado. Sem documentos legais, a capacidade em tirar o maior partido dos seus esforços e bens é limitada, e vivem no medo permanente de serem despejados pelas entidades oficiais ou senhorios. Os criminosos estão sempre à espreita; entidades oficiais corruptas invadem-nos. E conforme testemunhado na recente violência no Quénia, a segurança não existe. Mesmo antes de a violência rebentar, Joseph Muturi, que dirigia um pequeno negócio de vestuário no Mercado Toi, disse a amigos e colegas: ‘Sei que em poucas horas tudo isto pode desaparecer.’ Estava especialmente preocupado com a ameaça das escavadoras mecânicas arrasarem o mercado para dar lugar a interesses económicos mais poderosos. Afinal, a violência era política, despoletada por uma eleição aguerrida. Para milhares de pessoas no mercado Toi, o acontecimento apenas provou a verdade fundamental das palavras de Joseph. Efectivamente tudo desapareceu. Não havia segurança ou protecção quando era mais necessária. 13 Estes problemas podem parecer difíceis. Mas a mudança é possível. Basta visitar o mercado Sewa Nagar de Deli. ‘Nunca esquecerei como a vida era difícil anteriormente,’ diz Mehboob, que vende plásticos em Sewa Nagar. ‘Era uma luta para sobreviver com um trabalho duro e honesto, mas era praticamente impossível. A polícia e as entidades oficiais locais exigiam subornos, ameaçando despejar-me ou confiscar-me a mercadoria. Eu tinha de pagar, mas mesmo assim era ameaçado e batiam-me. O meu produto foi confiscado e já perdi a conta de quantas vezes fui despejado. Nunca imaginei que alguma coisa pudesse mudar.’ U m visitante de Sewa Nagar mal poderia agora reconhecer as condições horríveis que Mehboob tão dolorosamente recorda. O mercado está repleto de compradores à procura de pechinchas nas bancas limpas e bem mantidas que rivalizam pela atenção dos compradores. Madan Sal vende frutos secos, Santosh tenta a clientela feminina com pulseiras e cosméticos, Raju faz um comércio rápido barbeando homens – e já nenhum tem medo. A origem desta notável transformação é simples, mas no entanto profunda. Enquanto anteriormente Santosh e os outros comerciantes legalmente não tinham direito a exercerem a sua actividade comercial, agora obtiveram licenças oficiais para o fazerem. No papel, isso poderá não parecer revolucionário, mas na prática dá aos comerciantes pobres do mercado a aquisição de poder que faz com que o seu trabalho árduo valha a pena. Em troca, mediante uma renda mensal razoável, agora os comerciantes têm direitos garantidos para as suas bancas. ‘Já não temos de pagar subornos,’ explica Mehboob. ‘Sinto-me bem porque ganho dinheiro de maneira honesta e pago os meus impostos.’ A maioria dos vendedores ambulantes da Índia não tem tanta sorte. A legislação municipal do país proíbe a venda ambulante sem licença. No 14 entanto, Deli com uma população de mais de 15 milhões de pessoas, passou menos de 4.000 licenças. Estima-se que 99 por cento dos 10 milhões de vendedores ambulantes do país sejam obrigados a trabalhar na ilegalidade. Em vez de serem protegidos pela lei, são excluídos dela. Parte do problema reside no facto de a voz dos pobres não ser ouvida. A transformação de Sewa Nagar deu-se porque um grupo de acção baseado em Deli denominado Manushi dirigiu uma campanha de base para influenciar entidades governamentais para a mudança. Esta campanha conseguiu o apoio das autoridades locais e membros do parlamento, pelo menos publicamente. ‘Nos últimos meses, temos vindo a enfrentar uma grande violência e ameaças,’ diz Madhu Kishwar da Manushi. ‘Mas as boas notícias são que a Manushi recebe um forte apoio para este trabalho aos mais altos níveis, indo contra as linhas partidárias.’ ‘O gabinete do Primeiro Ministro interveio acerca do assunto e deu instruções para que este projecto não fosse perturbado. O GovernadorTenente também dá o seu apoio, assim como o Comissário Adjunto do Governo da área. Mas os políticos locais perseguem-nos e a polícia local tem um papel duvidoso por razões óbvias. Esta é uma zona que estava livre de subornos – algo que a polícia dos níveis mais baixos não consegue tolerar. Também estão a ser fortemente pressionados por parte dos políticos que estão desesperados por manter os pontos de venda ambulante sob controlo, não só porque lhes dá um forte rendimento, mas também porque assim podem obrigar estas pessoas a irem às reuniões políticas, fazer o trabalho eleitoral deles e estarem disponíveis sempre que queiram fazer uma demonstração de força.’ Para Madhu, a batalha ainda só começou. ‘Este projecto-piloto faz parte de uma campanha muito mais alargada que pretende libertar as vidas dos pobres que trabalham por conta própria na Índia, de controlos burocráticos desnecessários e das máfias extorcionistas,’ afirma. ‘Reconhece que as iniciativas dos pobres têm um papel essencial na economia do país e que têm o direito de ganhar a vida livre de perseguições, extorsões, espancamentos e outras violações dos direitos humanos.’ A transformação de Sewa Nagar prova uma verdade básica, mas muitas vezes ignorada: a exclusão e a pobreza provocadas pela legislação andam de mãos dadas, e no entanto nenhuma é inevitável. Se Sewa Nagar pode mudar, também Quibera pode. Margaret também podia usufruir de uma vida melhor. Mesmo depois da catástrofe, os reinícios são possíveis. A Importância da Lei Longe de ser um luxo sem o qual os pobres podem viver, direitos jurídicos eficazes são uma necessidade para todos. A exclusão dos pobres pela lei, não é apenas desesperadamente injusta, como lhes nega uma oportunidade de melhorar as suas vidas e impede o desenvolvimento dos países pobres. Cerca de metade da população de áreas urbanas em todo o mundo vive em povoamentos ilegais e trabalha em economias paralelas. Um número absoluto ainda maior de pobres encontra-se em áreas rurais isoladas com o acesso seguro e limitado à terra e a outros recursos. Eles não vivem dentro da lei, mas fora dela: iniciam contratos de trabalho irregulares, gerem negócios não registados, e muitas vezes ocupam terras às quais não têm legalmente direito. Nas Filipinas, 65 por cento das habitações e negócios não estão registadas, na Tanzânia 90 por cento. Em muitos outros países, os números são superiores a 80 por cento. Em termos de PIB, a economia informal é responsável por mais de um terço – e a aumentar – da economia do mundo em desenvolvimento.3 Quando os potenciais empresários se dispõem a registar legalmente um negócio, as burocracias e custos frustram os seus planos. Um estudo recente do Banco para o Desenvolvimento Inter- Americano de 12 países Latino-Americanos, concluíram que apenas oito por cento de todas as empresas estão legalmente registadas, e que cerca de 23 milhões de negócios operam na ilegalidade. Os proprietários destes negócios não conseguem obter empréstimos bancários legais,4 nem conseguem implementar contratos ou expandir para além de uma rede pessoal de clientes e parceiros conhecidos. Uns estimados dois mil milhões de pessoas não têm acesso a serviços financeiros básicos.5 Assim, os pobres não têm outra escolha senão aceitar a insegurança e a instabilidade como modo de vida. A exclusão dos pobres da legislação é um problema crucial, mas no entanto tem recebido pouca atenção prática – até ao presente. Este relatório da Comissão de Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres é a primeira a destacar o modo como, dando às mulheres e homens pobres do mundo acesso à justiça, e apoiando e accionando os direitos à propriedade, trabalho e negócio6 – os direitos jurídicos que a maioria das pessoas nos países ricos têm garantidos – pode dar-lhes a aquisição de poder para mudarem as suas vidas para melhor. A Comissão junta mulheres e homens ilustres de diferentes origens, de diversas convicções políticas e uma grande variedade de especialização. Passámos os três últimos anos a analisar uma grande quantidade de provas, observando directamente a luta dos pobres e a procurar os pontos de vista de uma variedade de pessoas em todo o mundo – decisores políticos e cidadãos comuns, ricos e pobres, homens e mulheres de negócios, sociedade civil e organizações baseadas nas comunidades, especialistas no desenvolvimento internacional e representantes dos habitantes de bairros de lata. Escutámos e aprendemos. Este relatório reflecte muitas vozes, mas acima de tudo as dos pobres. A mensagem que sobressai claramente é que o mundo não compreendeu a importância de fazer com que a lei trabalhe para todos, para dar protecção e oportunidade. E a 15 COMISSÃO SOBRE A AQUISIÇÃO DE PODER POR VIA DA LEI PELOS POBRES A Comissão para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres foi a primeira iniciativa global com enfoque na ligação entre a exclusão, a pobreza e a legislação. Lançada por um grupo de países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento incluindo o Canadá, Dinamarca, Egipto, Finlândia, Guatemala, Noruega, Suécia, África do Sul, Tanzânia, e o Reino Unido, foi acolhida pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (UNDP) em Nova Iorque. Co-presidida pela ex Secretária de Estado, Madeleine Albright, e o economista Peruano Hernando de Soto, juntou governantes eminentes e práticos do terreno de todo o mundo. A lista completa dos membros da Comissão encontra-se no início deste relatório. Este progresso notável tem avançado de mão dada com uma evolução no pensamento e prática da política de desenvolvimento. Aprendemos lições importantes acerca do que resulta e o que não resulta. O que teve início nos anos 50, como uma diminuta agenda de investimento na infra-estrutura para incentivar o crescimento económico, é agora muito mais amplo. Abarca medidas para reforçar o desenvolvimento social e ir ao encontro das necessidades dos pobres. Abrange a reforma macroeconómica e o encorajamento do crescimento liderado pelo sector privado. Tem em conta problemas tais como o comércio, dívidas, meio-ambiente e sexo. E desde o início dos anos 90, propõe uma governação democrática e uma sociedade civil activa. A aquisição de poder por via da lei não se trata de ajuda a fundo perdido, mas de ajudar as pessoas pobres a se erguerem e saírem da pobreza, trabalhando nas reformas políticas e institucionais que aumentam as respectivas oportunidades e protecções jurídicas. consequência disto reflecte a verdade contida nas palavras de Rousseau: ‘O homem nasceu livre e em toda a parte vive acorrentado.’ Progresso e Frustração A economia mundial torna-se ainda mais dicotómica. As décadas recentes são testemunho de avanços inigualáveis no crescimento económico e no desenvolvimento humano. Na maior parte do mundo, os níveis de vida melhoraram, assim como a expectativa de vida, a sobrevivência infantil, o acesso a água limpa, as taxas de escolaridade e o tratamento das mulheres. Cerca de 500 milhões de pessoas sairam da pobreza extrema nos últimos 25 anos.7 16 Na passagem para o séc. XXI a cimeira do Milénio das Nações Unidas adoptou a Declaração do Milénio e estabeleceu oito ambiciosos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (MDGs). Estes objectivos marcam um compromisso global sem precedentes para reduzir a pobreza e promover o desenvolvimento humano: melhor segurança alimentar e cuidados de saúde, acesso à instrução melhorado, menos discriminação e maior sustentabilidade ambiental. A pobreza extrema diminuiu. E no entanto, a erradicação da pobreza global permanece um objectivo difícil de manter. A África subsaariana não se encontra entre os objectivos num único dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.8 Em todo o mundo, a desigualdade está a aumentar. As soluções de mercado e o rigor macroeconómico não cumpriram tudo o que prometeram. E embora os esforços para um desenvolvimento mais sustentado e governação democrática sejam sem dúvida importantes, não cumpriram os progressos que muitos esperavam. F alhas no sistema internacional continuam a minar os esforços de desenvolvimento. A imperfeição do estado da legislação internacional e respectiva aplicação, deixa a segurança internacional, já sem mencionar a justiça, numa quimera. Embora o comércio internacional seja essencial para o desenvolvimento dos países, as negociações da Agenda para o Desenvolvimento em Doha na Organização Mundial do Comércio estão paradas. Houve algum progresso acerca do aligeiramento da dívida, mas ainda fica muito por fazer. A maioria dos países doadores continua longe dos seus compromissos internacionais, de dar em ajuda 0,7 por cento do respectivo rendimento nacional bruto. A ajuda externa nem sempre é dirigida para o alívio da pobreza, e muitas vezes é feita com fraca coordenação e de maneira ineficaz.9 Os efeitos traiçoeiros das falhas da legislação sobre as vidas dos pobres, desde há muito que tem vindo a ser um assunto preferido dos grandes comentadores – Charles Dickens, por exemplo, em quase todas as suas novelas. Entre os economistas, Douglass North foi um dos primeiros a fazer notar que as receitas da política associadas à teoria económica tradicional não conseguiram captar as nuances e complexidades da actividade económica informal. North e outros economistas mais recentes como Nicholas Stern mudaram Zimbabué © UNICEF/HQ02-0344/Giacomo Pirozzi o seu enfoque das teorias normalizadas sobre o modo de funcionamento dos mercados, para a importância das instituições do mercado tais como os sistemas de propriedade, o ambiente empresarial e o trabalho.10 Estas instituições diziam, modelam a actividade económica das pessoas normais e são altamente resistentes à mudança devido a interesses entrincheirados. Desta nova compreensão dos desafios, associados ao desenvolvimento económico, surgiu um enfoque na melhor governação destas instituições de mercado críticas. Foi dado uma ênfase especial ao clima de investimento e às regras e normas que afectam a propriedade e o trabalho. Stern e outros também advogaram a criação de mecanismos que permitissem que os homens e mulheres pobres participassem nas tomadas de decisão que afectam as respectivas vidas. 17 Pediram maior investimento nas pessoas, através da instrução, melhor acesso à informação e capacidade de desenvolvimento em instituições públicas-chave.11 ‘Os pobres’ são o que sinteticamente apelidamos de um conjunto enorme de pessoas que têm rendimentos baixos e que lutam com problemas tais como a fome, a doença e a habitação indigna. Vivem em zonas rurais remotas, bem como em bairros degradados dos subúrbios citadinos. Trabalham como fornecedores de serviços domésticos, agricultores de subsistência, trabalhadores indiferenciados temporários, vendedores ambulantes e recicladores de lixo. Muitos pertencem a minorias étnicas sub-representadas – muitas vezes são migrantes internos ou migrantes internacionais que se deslocaram para uma zona geográfica onde lhes falta de um estatuto legal definido. Muitos foram deslocados pela guerra ou por conflitos civis. Outros são populações indígenas que foram excluídas da sociedade dominante. Os pobres são na sua grande maioria mulheres. O enfoque de Stern nos bens e capacidades dos pobres e das instituições funcionantes necessárias para libertar o seu potencial, reflecte a ênfase de Amartya Sen na liberdade dos pobres em modelarem as suas próprias vidas. Sen identifica a governação política e económica – e a qualidade de instituições de nota – como sendo intrínsecas e instrumentais para a expansão do desenvolvimento humano como liberdade. Isto envolve o acesso a, e a qualidade de, educação e saúde, assim como a participação política e de mercado. A agenda de desenvolvimento como liberdade é virtualmente sinónimo da aquisição de poder político, social e económico das pessoas com base nos direitos humanos. O desenvolvimento assim compreendido é simultaneamente um imperativo moral e, Segundo Sen, o caminho para a prosperidade e redução da pobreza. Com base nas lições dos últimos 50 anos, o Directorado para a Cooperação e desenvolvimento da OCDE estabeleceu directivas para aumentar a eficácia da ajuda e cooperação no desenvolvimento que são semelhantemente abrangentes: garantir a propriedade local e nacional do processo de desenvolvimento; promover governação de qualidade, incluindo a democracia, direitos humanos e o estado de direito; abandonar os projectos de desenvolvimento tradicionais para abordagens mais baseadas na política e apoio orçamental directo; e encorajar a participação activa da sociedade civil.12 Mas se isto aborda um sentido lato do que é necessário, o desafio de como o atingir, é uma viagem que acaba de ser iniciada. O apoio do 18 estado de direito é um exemplo: teve o seu próprio declínio e circulação nos últimos 50 anos, mas um corpo crescente de literatura torna a sua prática incipiente.13 As abordagens antiquadas à Lei e Desenvolvimento têm de ser revistas. Muitos factores são simplesmente esquecidos. A maioria das iniciativas de desenvolvimento continua a ter tendência para enfoque na economia oficial, o sistema jurídico formal, e outras instituições estabelecidas e são completadas sobretudo a nível nacional em vez de local. Por exemplo, os programas que promovem o acesso à justiça e o estado de direito, geralmente destacam as instituições formais tais como os parlamentos, o sistema eleitoral, as delegações judiciais e executivas do governo. A assistência económica tem tendência a fazer o enfoque na melhoria do clima de investimento para as empresas registadas ou estrangeiros. No entanto, a maioria das pessoas nos países em vias de desenvolvimento, especialmente os pobres, pouco interagem com as instituições nacionais e o sistema jurídico formal. As suas vidas são sobretudo moldadas pelas normas e instituições informais, tais como as condições do bairro de lata em que vivem ou o grau de corrupção das entidades locais. As grandes reformas nacionais passam-lhes ao lado. Dirigir-se aos Quatro Mil Milhões de Pobres e Excluídos que ficaram para trás é uma resposta com falhas e insuficiente para a pobreza global. Collier argumenta que devemos ‘estreitar o objectivo e alargar os instrumentos.’ Este relatório é uma parte essencial do alargamento, mas nenhum estreitamento deverá acompanhar a sua aplicação. Sabemos da existência de números deprimentes quanto ao número de pessoas que vivem com menos de um dólar por dia (os que vivem em pobreza extrema)14 e os que vivem com menos de dois dólares por dia (os que vivem em pobreza moderada).15 Mas a Comissão vê que cerca de quarto mil milhões de pessoas, a maioria da população mundial, vivem excluídos do estado de direito.16 Na melhor das hipóteses, vivem com bens muito modestos e desprotegidos, que não podem ser alavancados no mercado devido a mecanismos cumulativos de ‘Acabar com a pobreza extrema é essencial não ó por exclusão. A agenda da aquisição de uma questão de compaixão. A economia mundial poder por via da lei dirige-se à totabeneficiará enormemente com as contribuições lidade destes quatro mil milhões de daqueles que conseguem evoluir de situações de pessoas. A sua pobreza em termos dependência para a participação total. (…) O de rendimento pode variar, mas o mandato da Comissão é intimidante mas também seu direito à protecção e oportunidade iguais, segundo o estado de é essencial, pois a aquisição do poder por via da direito não pode. lei pode acrescentar muito em relação aos meios Em Os Milhões que Ficaram Para Trás, Paul Collier afirma que a comunidade internacional deve concentrar os seus esforços de ajuda nos países muito pobres do mundo, que possuem uma população combinada de cerca de mil milhões de pessoas, e que muitas vezes se encontram ou acabam de sair de situações de conflito. Collier afirma que a ajuda é especialmente necessária e pode potencialmente ter resultados melhores mundiais existentes na luta constante para salvar e enriquecer vidas humanas.’ Madeleine Albright nesses países. Mas, Collier acredita que a ajuda terá relativamente poucos resultados no fortalecimento do desenvolvimento e redução da pobreza noutros países em vias de desenvolvimento, que têm outros recursos para utilizar, tais como comércio, investimento directo estrangeiro e impostos. A assistência internacional ao desenvolvimento é efectivamente essencial para os países mais pobres e para sociedades em recuperação após um conflito. Os dadores devem dar prioridade a estes países e dar enfoque ao financiamento da redução efectiva da pobreza e recuperação económica. Mas o enfoque apenas nos milhões Q uatro mil milhões de pessoas não estão adequadamente protegidos pela lei e por instituições abertas e funcionantes, e por uma variedade de razões, são incapazes de utilizar a lei eficazmente para melhorar o seu modo de vida. No entanto, estes quatro mil milhões não são um grupo rígido. Os que vivem em pobreza extrema são tipicamente pobres de bens e não serão capazes de sair da pobreza apenas com reformas jurídicas. A sua situação só pode ser melhorada com uma variedade de medidas, desde a protecção do seu modo de vida ao acesso aos recursos e serviços tradicionais, e as reformas sistémicas para tornar as instituições públicas acessíveis e justas. Os que vivem em pobreza moderada possuem alguns bens e rendimento, o que lhes pode permitir tirar partido 19 da mudança institucional. Para todas estas pessoas, a protecção dos seus bens é fundamental. Mas a protecção do que possuem não é o suficiente, pois são pobres e as suas posses são mínimas. Merecem uma oportunidade de tornar os seus negócios, independentemente do seu tamanho pequeno ou micro, mais produtivos e têm o direito a condições de trabalho dignas. As reformas das instituições com que lidam são essenciais para a sua aquisição de poder. Apenas através deste tipo de alteração sistémica, é que os mais pobres serão capazes de tirar partido das novas oportunidades e serão atraídos a juntarem-se à economia formal. Mas também temos de nos dirigir aos que, embora não vivam em pobreza extrema ou moderada, no entanto não conseguem utilizar a lei para seu proveito e encontram-se em perigo constante de passarem a engrossar as fileiras dos muito pobres. A agenda da aquisição de poder por via da lei procura evitar esta derrapagem e fortalecer os pobres com mais capacidade e recursos. A aquisição de poder deste grupo também pode ter um impacto adicional positivo no desenvolvimento, tanto por razões económicas como políticas. A razão económica é que os pobres neste estrato social que adquiriram poder, estimulam as interacções do mercado. Em muitos países, reforçará a cadeia de aumento de valor entre a classe dos pobres e da classe média baixa, e finalmente no estrato social mais alto. Politicamente, reforçar os interesses destes pobres pode ganhar mais voz e capacidade para auto-organização e finalmente para a autoaquisição de poder. Enquanto – felizmente – a aquisição de poder por via legal desta maior variedade de pobres poderá não consumir uma grande parte dos parcos recursos de ajuda, é um componente essencial para a redução eficaz da pobreza e para o desenvolvimento socioeconómico. A aquisição de poder por via da lei é uma agenda versátil para os quatro mil milhões de excluídos. 20 Consciencialização de Direitos pela Mudança Política A aquisição de poder por via da lei está ancorada nos princípios básicos dos direitos humanos articulados na Declaração Universal dos Direitos Humanos – e nas subsequentes convenções internacionais e regionais dos direitos humanos – começando pelo Artigo 1: ‘Todo o ser humano nasce livre e igual em dignidade e direitos.’ As implicações desta simples afirmação não podiam ser mais profundas. Na verdade, de princípios familiares e estabelecidos, emerge uma agenda radical de aquisição de poder por via da lei, não uma solução técnica, mas uma agenda para uma reforma fundamental. Todos os cidadãos devem poder gozar de protecção eficaz dos seus direitos básicos, bens e modo de vida, suportados pela lei. Devem ser protegidos da injustiça, quer causada pelos seus concidadãos ou entidades governamentais, todos os quais – seja qual for o posto que ocupem – devem estar sujeitos à lei. A comunidade internacional tem o dever de apoiar a aquisição de poder por via da lei tanto como expressão destes princípios, como estratégia principal para atingir os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Isto está intimamente relacionado com a democracia, o mais recente processo das bases para as cúpulas; simultaneamente os meios indispensáveis para a expressão de numerosos direitos humanos e a maneira menos má que os homens encontraram para organizar os seus negócios. A aquisição de poder por via da lei pode criar as bases para uma democratização bem-sucedida, no entanto não deve atrasá-la – as duas têm de trabalhar em conjunto. Na maior parte do mundo, incluindo as velhas democracias, o desenvolvimento da democracia está parado e a procura de inovação e renovação tem de ser redobrada. Onde a prática democrática pode florescer, também a aquisição de poder por via da lei, os indivíduos e respectivas comunidades podem. É uma vantagem na prática e em princípio que a aquisição de poder por via da lei seja menos normativa para o desenvolvimento do que outras abordagens, tendo como objectivo a maior capacidade dos pobres, incluindo na área pública, de modo que as decisões sobre o tipo de desenvolvimento sejam deles, em vez de serem determinadas por relatórios como este. A Aquisição de Poder por Via da Lei é o Caminho A Comissão acredita que a pobreza pode ser eliminada, mas apenas mediante uma mudança radical no modo de pensar e abordagem por parte dos governos e instituições internacionais. Alguns argumentam que acabar com a pobreza depende amplamente de libertar as forças de mercado enquanto outros são mais favoráveis a uma maior confiança na mão condutora do governo. Mas estes dois pontos de vista tradicionais não estão a ter em conta uma parte essencial da situação. O desenvolvimento depende de mais mercados e política económica; também depende do modo como as leis e instituições funcionam e se relacionam com os cidadãos. Por sua vez, isso reflecte o modo como o poder e a influência estão distribuídos na sociedade. O problema para o mercado de Sewa Nagar não era a ausência de empreendedorismo ou falta jurídica e instituições que dêem protecção e oportunidades genuínas para todos. As ferramentas necessárias para agir estão disponíveis e deviam ter ampla consternação política. A Comissão acredita que a pobreza é fabricada pelo homem, uma consequência das nossas acções e da nossa inacção. Por concepção ou por defeito, mercados, leis, instituições e políticas, muitas vezes fracassam no seu serviço ao bem comum, excluindo ou descriminando contra as mulheres e homens pobres. A democracia é muitas vezes mais um mantra do que realidade; na prática, o estado de direito é muitas vezes governar segundo a lei, aplicada arbitrariamente e em desigualdade. Embora as pessoas nos países pobres possam ter direitos no papel, a maior parte das vezes não passam daí. Frequentemente, as únicas leis que as populações conhecem são regras informais, algumas tradicionais, outras mais recentes. Na maioria dos países ricos, em contrate, a maioria das pessoas tem direitos e obrigações efectivos, quer como trabalhadores, homens e mulheres de negócios, rendeiros, ou proprietários. Se os seus direitos forem violados, podem recorrer à lei; se não cumprirem as ‘Os funcionários do estado muitas vezes pensam que suas obrigações, pode ser posta uma a sua ajuda aos pobres é um favor que lhes prestam. acção nos tribunais contra eles. O Sentem-se totalmente distantes dos pobres e muitas facto de se saber que, se necessário vezes não se querem envolver com eles.’ os direitos e obrigações legais podem Referendo Nacional no Uganda ser impostos, guia as acções diárias das pessoas, e sem dúvida que isso lhes permite não abandonar as oportunidades de regulamentação governamental; era a falta económicas e outras. Na verdade, a prosperidade de uma base protectora legal, politicamente dos países ricos é criada através de uma variedade acordada e apoiada. de instrumentos e normas sofisticadas tais como as empresas de responsabilidade limitada, parcerias Acreditamos que chegou o momento de ultrapassar e cooperativas, bens negociáveis, contratos de as linhas de batalha ultrapassadas de outrora; trabalho, capital de risco, seguros e propriedade a esquerda contra a direita, o estado contra o intelectual – todos eles baseados numa estrutura mercado, local contra global. A nossa agenda jurídica eficaz e instituições funcionantes. No não se baseia em teorias abstractas ou compaientanto, mesmo os países mais desenvolvidos estão xões utópicas; reflecte as realidades da pobreza longe de erradicar a exclusão e a não aquisição de e exclusão que os pobres conhecem. Tem um poder por via da lei. Pode haver grandes problemas enfoque na abolição das barreiras que impedem proporcionando representação, ou sem estrutura os pobres de avançar, e construir uma estrutura 21 Uganda Cate Ambrose, Aquisição de Poder por Via da Lei jurídica para criar um banco de micro-crédito,17 e os migrantes podem arrastar-se fora da sociedade, envoltos por um mundo ao qual não podem aceder. A Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres não é uma prioridade que qualquer parte do mundo possa ver com complacência. Proporcionar a aquisição de poder por via de lei aos pobres para realizarem o seu potencial enorme, permitir-lhes-ia agarrar o seu próprio destino tanto como cidadãos, como pioneiros do desenvolvimento. Por sua vez, isso permitiria aos países estarem mais bem equipados para enfrentarem alguns dos desafios da globalização – entre eles a competitividade comercial, sem desemprego, sustentabilidade ambiental, e acesso a tecnologias. Tudo isto não é um substituto para outras iniciativas importantes, tais como investir mais em serviços sociais e infra-estruturas, melhorar a participação no comércio mundial, e fazer esforços para mitigar e adaptar à alteração climática; complementa-os. A aquisição de poder por via de lei disponibiliza soluções para o séc. XXI para o velho problema da pobreza e é um componente crucial na abordagem dos novos desafios do nosso tempo. Fazer a Pobreza passar à História Fazer a pobreza passar à história será difícil. Exige pressão popular, liderança política a todos 22 os níveis, tempo e esforços enormes por parte das próprias mulheres e homens pobres. No entanto, os pobres só conseguirão escapar à pobreza se tiverem o poder de se ajudarem a si próprios. A aposta não poderia ser mais alta. O nosso mundo em constante retracção, dilacerado entre ricos e pobres, não é desesperadamente injusto; é perigosamente instável. As nossas vidas estão incontornavelmente interligadas; podemos prejudicar-nos ou ajudar-nos uns aos outros. Assim, a globalização não só coloca um desafio; também oferece uma escolha. Agir agora e construir um mundo melhor para todos; ou não fazer nada e colocar em risco tudo quando estimamos. É por isso que devemos transformar a segurança e oportunidade do privilégio de uns para a realidade de todos. A justiça assim o exige, assim como o desenvolvimento. A nossa mensagem fulcral é simples: fazer com que a lei trabalhe para todos oferece protecção e oportunidade para todos. Este relatório apresenta em pormenor o modo como, definindo os pilares da aquisição de poder por via da lei, as suas vantagens políticas e económicas, uma agenda para reforma, medidas políticas, fases e tácticas e a acção necessária a nível internacional. As melhores práticas de constituir os melhores economia formal atraente jurídica inclusiva. 2 Os Quatro Pilares da Aquisição de Poder por Via da Lei informalidade podem alicerces para uma e legitimar uma ordem C omo Margaret e John em Quibera, a maioria dos pobres do mundo vivem fora do âmbito da lei, a sua penúria é tanto uma causa como uma consequência da sua falta de direitos jurídicos eficazes. Lutam por sobreviver, quanto mais para melhorarem a sua vida, vivendo no medo e na insegurança, vendo os seus esforços travados a cada momento. Porque o sistema funciona contra eles, os pobres têm de correr apenas para não saírem do mesmo sítio. Sobrevivem inventando as suas próprias soluções. Surgem com maneiras ‘informais’ de fazer as coisas que misturam as práticas tradicionais com a ingenuidade moderna (como os ricos fazem, mas por vantagem e não por necessidade). Estas estruturas informais e por vezes muito sofisticadas guiam o modo de viver dos pobres, de trabalhar, fazer comércio, obter serviços essenciais tais como instrução, água e energia e proteger e policiar as respectivas comunidades. Por exemplo, os pobres criam meios informais de adjudicarem as propriedades, documentar transacções, garantir e obter crédito, criar associações comerciais, dividir o trabalho e verificar a identidade. Enquanto muitas vezes os pobres recorrem a meios informais porque na verdade estão excluídos da economia formal, por vezes eles escolhem operar informalmente porque as instituições formais são disfuncionais ou corruptas. Muitas vezes a formalidade e a informalidade sobrepõem-se e interagem – muitos trabalhadores e empresas decidem o volume que querem comprometer com as instituições estatais, pesando as vantagens de o fazerem, contra os custos potenciais de não o fazerem.18 Na verdade, a distinção entre economias formais e informais é muitas vezes pouco clara: existe um vasto espectro de disposições de vários graus de formalidade e informalidade. 25 “As vidas de todas as pessoas que vivem numa cidade formalmente organizada são servidas directa ou indirectamente por milhares de trabalhadores que labutam durante horas a fio, muitas vezes sob condições degradadas, por salários que dificilmente cobrem os respectivos custos de alimentação. Também vivem sob a constante ameaça de despejo dos seus locais informais de habitação.” Sheela Patel M as as instituições informais podem deixar os pobres vulneráveis à corrupção, exploração, interferência burocrática, ao braço forte da lei, e aos criminosos. A ordem de execução de punição da justiça pode ser exemplar (os países desenvolvidos podiam aprender muito com alguns costumes antigos de restauração da justiça), mas do mesmo modo é muitas vezes brutal e discriminatória, e não menos contra as mulheres. As transacções económicas permanecem imprevisíveis, inseguras e limitadas. O alcance limitado das redes locais circunscreve a oportunidade – sendo praticamente impossível a utilização dos mercados nacionais ou internacionais. É portanto improvável que a informalidade seja uma rampa de lançamento para o desenvolvimento. Dá poucas oportunidades para o crescimento económico e rendimentos limitados para o investimento público em serviços essenciais – tais como a saúde, instrução, infra-estrutura e justiça – que beneficiariam os pobres. No entanto, o objectivo da aquisição de poder por via de lei não é ‘firmar’ a economia informal. Isso equivaleria a tratar os sintomas em vez das causas, e punir os esforços de lidar com o assunto em vez de os apoiar. A causa principal da informalidade generalizada é o fracasso das leis formais, instituições e governação. Assim, muitas pessoas afastam-se das instituições do estado e públicas e permanecem na economia tradicional e informal. Miríades de práticas informais locais e soluções ajudam a suster estas comunidades. Mas se as melhores práticas da informalidade pudessem providenciar os elementos para cons- 26 truir uma economia formal atraente, e uma ordem jurídica legítima e inclusiva, os horizontes dos pobres seriam amplamente expandidos. O núcleo da agenda da aquisição de poder por via de lei não é só incorporar estes elementos de construção no sistema jurídico, mas também reformar as instituições formais existentes tornando-as abertas, acessíveis e legítimas. O Conceito de Aquisição de Poder por Via da Lei A aquisição de poder por via da lei é o processo através do qual os pobres passam a estar protegidos e obtêm a capacidade de utilizar a lei para promover os respectivos direitos e interesses, em relação ao estado e no mercado. Implica que os pobres tomem plena consciência de todos os seus direitos, e colham as oportunidades que daí lhes advêm, através do apoio público e dos seus próprios esforços, assim como os esforços daqueles que os apoiam e de redes mais alargadas. A aquisição de poder por via da lei é a abordagem de um país baseada no respectivo contexto que ocorre tanto a nível nacional como local. A abordagem da Comissão ao conceito de aquisição de poder por via da lei está descrita no diagrama acima. Duas condições chave para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres são a identidade e a expressão. Os pobres necessitam de (prova de) uma identidade reconhecida que corresponde à sua actividade cívica e económica como cidadãos, detentores de bens, trabalhadores, e homens/mulheres de negócios. Sem uma voz pelas populações pobres, um processo de aquisição de poder por via da lei não pode existir. Por um lado esta voz necessita crucialmente de se basear na informação e instrução e por outro na organização e representação. Começando pelo modo de vida dos pobres, composto pelos seus bens e actividades, são O Conceito de Aquisição de Poder por Via da Lei Condições para a Aquisição de Poder por Via da Lei Identidade e Estatuto Jurídico como Cidadão Identidade e Estatuto Jurídico como detentores de Bens Identidade Informação e Instrução Opinião Identidade e Estatuto Jurídico Organização comoTrabalhador e Identidade e Estatuto Representação Jurídico como homem/mulher detentora de Negócio Pilares da Aquisição de Poder por Via da Lei O Estado de Direito e o Acesso à Justiça Direitos de Propriedade Direitos Direitos do Trabalho Direitos de Comerciar M U D A N Ç A S I S T É M I C A Objectivos da Aquisição de Poder por Via da Lei Acesso à Justiça Acesso aos Bens Protecção Acesso Acesso a Trabalho Digno Oportunidade Acesso a Mercados detentores de bens, trabalhadores e homens de três as áreas de aquisição de poder consideradas negócios. A aquisição de Poder por Via da Lei como essenciais: direitos de propriedade, direitos pelos Pobres exige uma mudança sistémica, mas de trabalho e ‘direitos de comerciar.’19 Acesso à se os pobres adquirirem verdadeiramente poder, justiça e ao estado de direito devem ser consiisto melhora fundamentalmente o relacionamento derados como fundamentais que permitem a entre o estado e todos os cidadãos. Com idenestrutura que suporta a consciencialização destes tidade nas suas diferentes funções, uma voz no direitos. O conjunto nuclear destes direitos não pode ser totalmente eficaz excepto se houver uma opção realista de os ‘Para os pobres a face mais visível do estado são os impor. Assim, a aquisição de poder por via de lei é uma estrutura abranmembros da polícia que nas favelas se comportam gente de quarto pilares, o acesso à de tal forma que violam os seus direitos fundamentais.’ justiça e ao estado de direito, direitos Referendo Nacional no Brasil de propriedade, direitos do trabalho e direitos de comerciar. Como processo de reforma, a aquisição de poder por via de lei exige intervenções paralelas e coordenadas. Todo o processo deve ser compreendido como sendo iterativo e o relacionamento entre o processo de aquisição de poder por via da lei e a mudança sistémica é mutuamente consolidante. Os pobres que adquirem poder por via da lei terão mais voz e identidade; terão mais influência nas reformas institucionais e jurídicas e políticas sociais, que por sua vez melhorarão a consciencialização dos respectivos direitos como cidadãos, processo de mudança e direitos melhorados nas três áreas de aquisição de poder, os pobres terão efectivamente mais acesso à justiça e ao estado de direito, o acesso a bens melhorado, mais acesso a um trabalho digno e melhor acesso aos mercados. As mulheres, os povos indígenas, e grupos vulneráveis devem ser total e justamente incluídos em todas as fases do processo de aquisição de poder por via da lei. For them ‘equal’ access 27 may not be enough; active promotion and facilitation of these groups’ meaningful participation may also be necessary to ensure just outcomes and their full participation in the process. Os objectivos finais da aquisição de poder por via de lei são o aumento da protecção e oportunidade para todos: proteger os pobres da injustiça – tal como despejos injustos, expropriação, extorsão e exploração – e oferecer-lhes igualdade de oportunidade de acesso ao mercado local, nacional e internacional. Identidade e direito de opinião como condições-chave da aquisição de poder por via de lei ‘Todos têm o direito a serem reconhecidos perante a lei’, é um dos principais direitos humanos. Assim, o estado tem a obrigação de reconhecer formal e legalmente que uma pessoa existe. A aquisição de poder por via da lei exige um documento acessível com o qual o/a portador/a possa provar a sua identidade. Sem este tipo de prova da respectiva identidade jurídica, especialmente os pobres são muitas Afeganistão © UNICEF/HQ07-1168/Shehzad Noorani vezes excluídos das protecções formais do sistema jurídico do estado e como beneficiários dos bens e serviços públicos. As pessoas também necessitam de informação acerca dos respectivos direitos e do modo como podem ajudar a moldar a tomada de decisões. Necessitam de ter voz sobre o modo como a respectiva sociedade e economia são organizadas. A opinião exige a existência de instrução, que tal como a informação ‘A Aquisição de Poder por Via da Lei tem também a e identidade, está amiúde assimever com oportunidade: os pobres podem e conseguem tricamente disponível para ricos e receitas próprias e são extremamente engenhosos pobres. E os pobres precisam de em desenvencilharem a sua própria subsistência. Em organizações que representem as cidades e aldeias à volta do mundo desenvolvido, suas próprias escolhas. Os números vendem bens e serviços nas ruas e organizam mercados têm força e protecção. As orgade rua que as entidades governamentais se recusam a nizações podem exigir e negociar Kumi Naidoo reconhecer.’ reformas e tratar com o estado mais 28 seus bens excepto mediante pagamento de justa amplamente. Quase todos os pobres têm acesso compensação, por razões de utilidade pública a grupos ou associações de algum tipo – cooou interesse social, e nos casos e de acordo com perativas de pequenos trabalhadores agrícolas, as formas estabelecidas por lei.’22 A mesma sindicatos, associações de pequenas empresas, organizações comunitárias, associações de mulheres, ou comunidades religiosas – que podem disponibi‘Um debate sobre direitos humanos rapidamente lizar plataformas mais eficazes a trás à ideia as atrocidades de Darfur ou os senhores partir das quais podem promover os da Guerra no Congo que arrastam crianças para as respectivos direitos. Direitos Humanos A aquisição de poder por via da lei tem a sua base normativa em normas globalmente aceites dos direitos humanos e devem ir sempre ao encontro ou ultrapassar estas normas globais. Os direitos humanos devem guiar o processo de aquisição de poder por via da lei, especialmente as reformas institucionais e jurídicas, assim como as políticas sociais que têm como objectivo reconfigurar a relação entre o estado e os cidadãos a nível nacional e local. suas fileiras, ou mulheres e crianças migrantes vendidas para escravatura sexual. (...) Mas enquanto estas crises chamam a atenção do mundo para alguns dos exemplos mais dramáticos e visíveis de injustiça humana, a falta de direitos humanos básicos suportados por milhões que vivem em pobreza absoluta, tem origem nas estruturas subjacentes de sociedades que sistematicamente separam os ricos dos pobres, os poderosos dos desprovidos. Na verdade, mais de metade da população mundial vive fora da legislação imposta ou reconhecida, sem meios jurídicos eficazes para proteger as famílias, lares ou posses.’ Mary Robinson Direitos de propriedade e direitos humanos A Declaração Universal dos Direitos Humanos estipula que ‘todos têm o direito a deter bens individualmente, assim como em associação com outros’ e que ‘ninguém será arbitrariamente privado dos seus bens.”20 Segundo Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais, ‘todas as pessoas naturais e jurídicas têm direito ao gozo pacífico dos seus bens. Ninguém será privado das suas posses, excepto se for no interesse público e sujeito às condições providenciadas pela lei e pelos princípios gerais da lei internacional.’21 A Convenção Americana dos Direitos Humanos afirma que ‘todos têm o direito a utilizar e gozar os seus bens. A lei pode subordinar essa utilização e gozo ao interesse da sociedade.’ Além disso, estipula que ‘ninguém será privado dos Tradução Inglesa do editorial do jornal madrileno El Pais de 1 de Junho de 2007 intenção jurídica é expressa na Carta [Banjul] Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, que afirma que ‘o direito à propriedade será garantido. Só podem ser prejudicados no interesse da necessidade pública ou por interesse geral da comunidade e de acordo com as provisões da legislação adequada.’23 No contexto da construção da paz e lidando com a situação complexa de refugiados e pessoas deslocadas internamente (IDPs), a restituição da propriedade é considerada como uma questão importante dos direitos humanos. Segundo textos representativos da comunidade internacional, não há paz justa sem a instituição da propriedade privada e sem a restituição de propriedade expropriada arbitrariamente ou uma compensação equiva- 29 Turquia © UNICEF/HQ05-1217/Roger LeMoyne lente dos bens expropriados.24 A Convenção acerca da Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, afirma no Artigo 16: ‘Os Partidos Estatais implementarão todas as medidas apropriadas para eliminar a descriminação contra as mulheres em todos os assuntos relativos ao casamento e relações familiares, garantirá especialmente uma base de igualdade entre homens e mulheres: (h) Os mesmos direitos para ambos os esposos relativamente à detenção, aquisição, gestão, administração e gozo e disposição dos bens, tanto a título gratuito como a título oneroso.’ Direitos de trabalho e direitos humanos Uma parte importante da lei internacional dos direitos humanos abarca direitos de trabalho fundamentais tais como a liberdade de associação e protecção do direito de forma de aderir a sindicatos; eliminação de trabalho forçado ou obrigatório em todas as suas formas; condições de trabalho justas e favoráveis; eliminação da descriminação no acesso ao emprego, formação e condições de trabalho; pagamento igual para homens e mulheres para trabalho do mesmo valor; e 30 abolição do trabalho infantil, estipulando uma idade mínima para admissão ao emprego. Os direitos de comerciar como uma nova era dos direitos humanos? O s direitos de comerciar ainda não necessitam de ser vistos como uma nova expressão da lei. Mas sim com um conjunto de direitos existentes de indivíduos e grupos de pessoas para iniciarem uma actividade económica e transacções comerciais. A Comissão juntou estes direitos com base na respectiva instrumentalidade essencial no modo de vida e perspectivas económicas dos pobres. Os direitos de comerciar incluem o direito das pessoas iniciarem um negócio legalmente reconhecido sem regulamentações arbitrariamente aplicadas ou descriminação na aplicação de normas e procedimentos. Concentra-se em eliminar barreiras desnecessárias que limitam as oportunidades económicas e em proteger os investimentos que as pessoas fazem nas suas empresas, por muito pequenos que sejam. Os direitos de comerciar têm origem nos direitos políticos e civis, assim como nos económicos e sociais. O direito a organizar e a liberdade de associação, por exemplo, suportam o direito a formar cooperativas de negócio, outras empresas e associações de entidades patronais e de trabalhadores. As actividades empresariais são a expressão de toda uma classe de liberdades, nomeadamente a liberdade de associação, liberdade de movimento, liberdade de desenvolver os talentos de cada um e a liberdade de troca de bens legitimamente adquiridos e serviços. A lógica para a promoção dos direitos de comerciar é a sua ligação às liberdades fundamentais do indivíduo, assim como a enorme importância das pequenas e médias empresas para ultrapassarem a pobreza. Uma grande parte dos pobres trabalha nesses negócios (e mesmo mais se incluirmos a agricultura). Conforme essas empresas crescem, dão mais trabalho e mais salários. Memo um crescimento modesto dos salários a este nível, faz uma grande diferença para a segurança e qualidade de vida. Quanto mais inclusivo o mercado formal se tornar, melhores são as oportunidades para expandir a abrangência e qualidade dos direitos de trabalho, que por sua vez constrói o capital humano. Uma agenda de direitos humanos Propomos uma agenda ambiciosa para mudança e uma estratégia eficaz para a implementar, em que tudo terá de ser negociado e acordado a nível local e nacional. Ao mesmo tempo, insistimos veementemente que a comunidade internacional expanda a base de aquisição de poder por via da lei, na legislação internacional dos direitos humanos. Os direitos essenciais da aquisição de poder por via da lei merecem ser mais desenvolvidos em pactos de aquisição de poder por via da lei regionais ou globais e eventualmente em tratados internacionais de direitos humanos. Tal estrutura pode reforçar a reforma nacional, mas para que as reformas beneficiem os pobres, têm de ser construídas a partir das bases e não das cúpulas para as base ou de fora para dentro. A participação e detenção de bens pelos próprios pobres são essenciais para qualquer sucesso. A campanha liderada pelos Anciãos, Todos os Homens Têm Direitos, é um bom exemplo do modo como a agenda dos direitos humanos pode ser inserida na cultura e sociedade civil, um passo para a aquisição de poder por via da lei.25 As reformas que são impostas, independentemente de serem muito bem-intencionadas, raramente ganham raízes nas sociedades. Para serem reconhecidas como pertinentes e legítimas por uma grande maioria de pessoas, as leis têm de ser ancoradas em valores existentes, tradições e estruturas, assim como têm de ser consistentes com as obrigações internacionais dos direitos humanos. Isto é especialmente verdade para a aquisição de poder por via da lei, que trata de dar voz aos pobres e tenacidade aos seus direitos. É uma vantagem na prática e em princípio que a aquisição de poder por via da lei é menos normativa para o desenvolvimento do que outras abordagens, tendo como objectivo a maior capacidade dos pobres, incluindo na área pública, de modo que as decisões sobre o tipo de desenvolvimento sejam deles, em vez de serem determinadas por relatórios como este. Os Quatro Pilares da Aquisição de Poder por Via da Lei e a Dimensão do Problema O acesso à justiça e o estado de direito como estrutura fundamental e que dá habilitação legal, é o primeiro pilar da aquisição de poder por via da lei. Os três outros pilares são áreas da aquisição de poder resultantes dos modos de vida dos pobres: direitos de propriedade, direitos de trabalho e direitos de comerciar. Em cada pilar, a escala do problema que a Comissão está a tentar abordar é estudada, antes de abordar as soluções nos próximos capítulos. Primeiro Pilar: Acesso à justiça e ao Estado de Direito O acesso à justiça e ao estado de direito são essenciais para a aquisição de poder por via da lei. Reformar a lei no papel não é suficiente para mudar o modo como os pobres a vivem no dia-a-dia. Mesmo as melhores leis são meras ilusões se os pobres não puderem usar o sistema 31 jurídico para lhes dar força. Mesmo as melhores regulamentações não ajudam os pobres se as instituições que as impõem são ineficazes, corruptas, ou são controladas pelas elites. Por isso, é absolutamente importante reformar as instituições públicas e abolir as barreiras jurídicas e administrativas que impedem os pobres de garantir os seus direitos e interesses. mais de 20 milhões de casos pendentes, e alguns casos civis demoram mais de 20 anos a chegarem aos tribunais.28 No Quénia, estão pendentes cerca de um milhão de casos, mais de 300.000 perante o Supremo Tribunal de Justiça só em Nairobi.29 Um juiz médio nas Filipinas tem um atraso de pelo menos 1.479 casos em atraso.30 As leis que são essenciais para os pobres são muitas vezes A personalidade jurídica é a pedra ‘O sistema de justiça é caracterizado por atrasos no angular para o acesso à justiça. exercício da justiça, falta de capacidade institucional Apesar da provisão inequívoca na Declaração Universal dos Direitos e sistemas ineficientes de imposição da lei e dos Homens, dezenas de milhões de congestionamento. Estes problemas existem devido pessoas não possuem personalidade à falta de pessoal com formação adequada e falta jurídica formalmente documende equipamento essencial e instalações tanto a nível tada. Estima-se que mais de sete federal como regional.’ em cada dez crianças nos países Referendo Nacional na Etiópia menos desenvolvidos do mundo não possuem certidão de nascimento ou outro documento de registo.26 Isto impede muitas pouco claras, contraditórias, desactualizadas ou discriminatórias no respectivo impacto. Nas delas de acederem à instrução e cuidados de Filipinas, por exemplo, os colonos têm de provar saúde. Dá-lhes mais vulnerabilidade à exploração, que viviam naquela terra antes de 1992, para tal como o trabalho infantil e tráfego humano. E obterem direitos formais; os colonos informais sem provas documentais da sua existência, os raramente conseguem fazer prova disso, enquanto respectivos pais terão dificuldade em interagir os colonos posteriores a 1992 são simplesmente política, económica e mesmo socialmente fora excluídos por lei. das respectivas comunidades locais. A ausência de documentação legal pode ser utilizada para os bloquear de tirarem partido de programas antiA existência de direitos processuais eficazes – pobreza que lhes são especificamente destinados. mecanismos funcionantes para implementar direitos – também são importantes. Um estudo recente de cinco países na América Central Mesmo quando em posse de personalidade mostra que legislação mal concebida ou legisjurídica, a maioria dos pobres continuam a lação processual inexistente são uma razão deparar-se com falta de acesso à justiça. As insimportante da legislação substantiva ineficaz. Isto tituições estatais têm tendência a servir as redes poderá explicar parcialmente a razão pela qual os estabelecidas das elites políticas e económicas direitos constitucionais permanecem apenas no em vez dos pobres. Estatísticas globais compapapel, os impostos não são cobrados e o invesrativas acerca do acesso à justiça são difíceis timento público em serviços sociais permanece de obter; mesmo uma medição exacta é compli27 abaixo dos níveis ‘garantidos’. cada. Um país que está repleto de advogados, por exemplo, poderá não ter necessariamente um sistema jurídico justo. Mas os números ainda s pobres podem ser incapazes de podem ser indicativos da dimensão do problema. aceder ao sistema jurídico porque não o Na Índia, por exemplo, onde se sabe que existem compreendem, ou porque não o conhecem. apenas 11 juízes para cada milhão de pessoas, há Podem ser iletrados, o que prejudica gravemente O 32 nos estudos das suas necessidades jurídicas encontram-se em redor das mudanças nas principais relações que governam as suas vidas e bens. Por exemplo, uma vez que os pobres normalmente vivem em casas da família que nunca foram formalmente documentadas e registadas, o falecimento do chefe de família coloca a questão de quem é o proprietário da casa e de quem tem o direito de lá viver. Além disso, a terra é muitas vezes preparada para o cultivo e depois utilizada sem que os direitos formais alguma vez tenham sido estabelecidos. A ausência de direitos formais deixa os pobres vulneráveis ao despejo se o proprietário legal mudar, e faz com que a segurança jurídica e compensação total sejam pouco prováveis nas tentativas de despejo pelas autoridades públicas. Do mesmo modo, se os direitos da mulher não tiverem sido formalizados, uma mulher que ajude ‘Além do facto de a justiça não utilizar uma a construir um negócio juntamente linguagem facilmente compreensível, especialmente com o seu marido, poderá perder por parte dos pobres, a iliteracia da grande maioria tudo em caso de divórcio. Quando dos naturais do Benim constitui um obstáculo sério as comunidades detêm pastos em ao respectivo acesso à justiça. É amiúde uma fonte conjunto, partilham água e usam as de incompreensão e desconfiança: os pobres podem mesmas áreas de pesca, é praticamente impossível para as pessoas sentir que a justiça é distorcida a favor dos ricos, que dali saem realizarem os seus muitas decisões estão armadilhadas e que os juízes bens, o que efectivamente limita a são corruptíveis. O desconhecimento da justiça sua liberdade de mudar de modo reflecte-se em sentimentos de incompreensão, de vida. Simultaneamente os que frustração e desafeição.’ chegam de novo, podem ver-lhes Referendo Nacional no Benim negado o acesso aos recursos colectivos. a sua capacidade de interagir com o sistema jurídico. Em muitos países, a lei é redigida e administrada apenas na língua oficial, que muitos dos pobres poderão não falar ou ler. Em quase todos os países Africanos, por exemplo, o sistema jurídico funciona apenas em Inglês, Francês ou Português, excluindo assim a maioria da população que apenas fala os idiomas locais. Os tribunais podem ser muito distantes, sub-financiados, e demorarem anos a decidir os casos. Levar um caso a tribunal com rapidez poderá exigir subornos. Os processos judiciais podem ser inacessíveis a todos quantos não têm representação jurídica, que em geral é demasiado dispendiosa para os pobres. As restrições sobre quem pode exercer a lei e disponibilizar serviços jurídicos são outras barreiras que podem bloquear formas mais acessíveis de serviços jurídicos tais como clínicas jurídicas e para-jurídicas. As dificuldades na obtenção de acesso à justiça reforçam a pobreza e a exclusão. Conforme os estudos das necessidades jurídicas, crime e vítimas demonstram, os pobres necessitam de melhor protecção jurídica. A sua segurança pessoal é muitas vezes ameaçada. Muitos vivem no medo constante de serem despejados e da expropriação. Os problemas mais graves que os pobres reportam A dependência negativa é um risco grande. Os parceiros estão ligados entre si por investimentos específicos, que se arriscam a perder se abandonam o relacionamento. A pessoa mais pobre na relação é em geral quem tem mais a perder – rendeiros e empregados tendem a ter investido mais num determinado lote de terra ou negócio do que o senhorio ou a entidade empregadora investiu neles. Muitas vezes, a mulher dedica mais tempo e esforço à família e os seus bens do que os maridos, o que torna difícil para elas escaparem a um casamento infeliz e a vulne- 33 rabilidade à exploração. Apesar da sua necessidade de um sistema jurídico, muitos pobres mantêm-se longe dele e das instituições do estado em geral. Acreditam, a maioria das vezes correctamente, que estas instituições não ajudarão a resolver os seus problemas. Mesmo se o sistema pudesse eventualmente disponibilizar reparação adequada, poderá demorar demasiado tempo, custar demasiado e necessitar da especialização que não têm. O princípio da igualdade perante a lei é fundamentalmente importante, no entanto incrivelmente difícil de conseguir. Mesmo as democracias com maturidade e instituições do estado a funcionarem bem, debatem-se para o conseguirem. Em países onde a democracia é fraca, as instituições têm mais probabilidades de serem controladas pelas elites. Demasiadas vezes, a lei é uma ferramenta do estado para as elites dirigentes usarem a seu belo prazer – uma opção para alguns, e não uma obrigação que se aplica igualmente para todos. Segundo pilar: Direitos de propriedade A importância dos direitos de propriedade vai muito para além do seu papel como bens económicos. Direitos de propriedade seguros e acessíveis dão uma sensação de identidade, dignidade e pertença. Criam laços fiáveis de direitos e obrigações no seio de uma comunidade, e um sistema de reconhecimento mútuo de direitos e responsabilidades para além dele. Para muitos indivíduos e comunidades pobres, a terra é mais do que apenas um agregado de lotes utilizados e 34 Haiti UNICEF/HQ94-0806/ NICOLE TOUTOUNJI ocupados. É a expressão de um modo de vida, a qual devem ter a oportunidade de melhorar através dos seus próprios esforços. Começando pela propriedade de baldios, as disposições da propriedade evoluíram enormemente abrangendo a terra, outros bens concretos e conceitos em expansão constante tais como as quotas de poluição, produtos financeiros, invenções e ideias. Uma prova esmagadora a nível mundial, prova que as relações da propriedade funcional estão associadas ao crescimento estável e a contratos sociais, ao passo que as relações de propriedade disfuncionais estão associadas a sociedades pobres, desiguais e instáveis. Quando os direitos de propriedade estão fora do alcance das pessoas, ou os direitos estão sujeitos a pretensões concorrentes, os respectivos bens muitas vezes não estão garantidos e o potencial económico permanece severamente inibido. No entanto, a maioria dos pobres do mundo não tem direitos de propriedade eficazes – não tem uma posse garantida, não tem consciência dos seus direitos jurídicos, ou não os consegue exercer. Isto é verdade nos estados mais pobres, mas também noutros mais prósperos tais como o Brasil, China, e Rússia. Este poder económico intrínseco da respectiva propriedade permanece por explorar, e os pobres incapazes, por exemplo, de dar um colateral para um empréstimo para aumentar os rendimentos ou melhorar os negócios. Insegurança atinge fortemente os pobres. Podem estar sujeitos a despejos arbitrários, forçados a abandonar as suas terras a qualquer momento sem indemnização, e não têm qualquer poder em disputas acerca de bens perante actores poderosos. Os seus modos de vida estão constantemente ameaçados, e há pouco que os encoraje a fazer futuros investimentos nas suas terras ou negócios de pequena escala. Em muitos países, as instituições estatais não dão a protecção que os pobres necessitam e a que têm direito. apenas cinco dos 76 países em vias de desenvolvimento estudados em 2005 tinham direitos de propriedade e governação baseada em regras, tiveram uma classificação de 4 ou superior – e todos os cinco são estados em pequenas ilhas.31 Isto significa que os direitos de propriedade da maioria das pessoas nos países em vias de desenvolvimento não estão protegidos, que os contratos não são obrigatórios, e que os registos e outras instituições necessárias para proteger a propriedade, funcionam mal ou não funcionam de todo.32 O sbens dos pobres podem ser documentados através de disposições informais locais que dão alguma protecção e liquidez. Mas estes raramente são reconhecidos pelas instituições nacionais e não permitem que o capital seja alavancado mais amplamente. Quaisquer que sejam os seus bens económicos, as pessoas têm o direito a permanecerem em subemprego. Os proprietários utilizam os seus bens para obterem empréstimos, impor contratos ou expandirem-se para além de uma rede de trabalho pessoal de clientes familiares A análise do Banco Mundial sobre o Desempenho ou parceiros. A sua propriedade está muitas vezes dos Países e Avaliações Institucionais (CPIA) vulnerável a ser confiscada através da força ou mostra a extensão do problema. Com base numa da lei. Além disso, o capital informal é invisível e classificação de 1 (mais baixo) a 6 (mais alto), improdutivo para a economia nacional. E uma vez que os pobres não podem participar na economia para lá das suas As mulheres são metade da população mundial, proximidades imediatas, as possibiliproduzem 60 a 80 por cento dos alimentos nos países dades comerciais são reduzidas. em vias de desenvolvimento, e são cada vez mais responsáveis pelos agregados familiares rurais, mas no entanto detêm menos de 10 por cento dos bens a nível mundial. Grande parte da miséria no mundo em vias de desenvolvimento deve-se a sistemas de propriedade tradicionais e estatutários que privam as mulheres dos direitos civis. Muitas vezes as mulheres enfrentam barreiras para poderem deter bens, usálos e transferi-los ou herdá-los. Amiúde, as mulheres enfrentam despejos forçados das suas casas e terras (terras sobre as quais tinham direitos tradicionais ou outros) por membros da família, autoridades tradicionais e/ou vizinhos. Fontes: ONU 1980; FAO 1999 Direito das Mulheres à Terra e Recursos Naturais: algumas implicações para uma abordagem baseada nos direitos humanos. Isto é uma enorme perda de oportunidade. No Perú, por exemplo, o capital informal está estimado em 74 mil milhões de USD. Os números para o Haiti são superiores a 5.4 mil milhões de USD; nas Honduras, perto de 13 mil milhões de USD; na Albânia, perto de 16 mil milhões de USD; na Tanzânia, mais de 29 mil milhões de USD; nas Filipinas, mais de 32 mil milhões de USD; no Egipto, mais de 248 mil milhões de USD; e no México, mais de 310 mil milhões de USD.33 O facto de este capital 35 informal não poder ser colocado em utilização na sua totalidade é especialmente humilhante porque já se encontra onde é mais necessário – nas mãos dos pobres e respectivas comunidades. As fontes externas de capital, tais como a ajuda oficial e o investimento estrangeiro, são menos abundantes e nem sempre chegam aos pobres. A posse de propriedades, na verdade o seu controlo das terras poder ser muito vago, uma vez que são os homens quem negoceiam o acesso. Terceiro pilar: Direitos do trabalho Um sistema de direitos de trabalho bem concebido deverá providenciar protecção e oportunidade. A Declaração Universal dos Direitos dos Homens estabelece uma série de direitos de trabalho, assim como uma longa tradição de normas de trabalho internacionalmente acordadas. As leis devem proteger os trabalhadores vulneráveis da exploração, sem diminuírem as suas oportunidades de emprego formal (regulamentações excessivas ou ineficazes podem ser incerteza acerca da propriedade jurídica de florestas, terras de pasto, terras pantanosas e fontes de água doce – de cujo acesso a maior parte dos pobres de zonas agrícolas depende para o seu modo de vida – é outro problema enorme. Mesmo agora, quase um terço da população mundial sofre de escassez moderada a grande falta de água. A Comissão Mundial da Água estima que o aumento das populações e o crescimento económico aumentará as necessidades Depois de ter sido dada como tendo erradicado de água em cinquenta por cento nos a mosca tsé-tsé e criado terra de cultivo e área próximos 30 anos, e que cerca de quatro para a sua população em crescimento, a região de mil milhões de pessoas sofrerão de grave Shinyanga passou a ser o Deserto da Tanzânia. escassez de água até 2025.34 O valor Em 1986, uma iniciativa governamental conhecida da terra e do imobiliário muitas vezes como projecto de Hashi, deu poder ao povo Sukuma depende directamente da existência de de tradição agrícola e pastorícia, que utilizaram os direitos sobre a água adequados. Nesta seus conhecimentos ecológicos e fortes instituições situação, os direitos de propriedade terão tradicionais para repor a produtividade da sua um papel-chave na definição de quem terra. Restabeleceram as áreas cercadas protegidas, tem acesso à água. Os grupos vulneráveis sofrem sobretudo de ausência de direitos de propriedade. As populações indígenas são frequentemente vítimas de descriminação de propriedade; as terras indígenas detidas colectivamente muitas vezes já foram declaradas como bens fundiários públicos ou baldios (e colectivamente podem ser retidos na formalização de direitos de propriedade). As mulheres, que constituem metade da população mundial, detêm muito pouco das propriedades mundiais – em alguns países, tão pouco quanto dois por cento. Raramente detêm mais de 15 por cento das propriedades.35 Mesmo quando as mulheres têm direitos jurídicos de 36 conhecidas como ‘ngitili’. Não demorou muito para a natureza responder. Com as acácias e as miombos novamente a desenvolverem-se, vegetação rasteira e variedades de erva, os pássaros e espécies de mamíferos voltaram e claro, o gado – um bem comerciável no seio desta comunidade rural. Outras terras passaram a ser propriedade de famílias individuais. Trabalho árduo e um investimento modesto restauraram a fertilidade do solo e aumentaram a produtividade agrícola. Os rendimentos dos agregados familiares, a dieta e a segurança melhoraram significativamente. Ao mesmo tempo, o rendimento das áreas cercadas ajudou cada vez mais as comunidades a pagarem os serviços públicos tais como melhor instrução, serviços de saúde e acesso a mercados para os seus produtos. Hashi é a prova que a atribuição de poder, a redução da pobreza e a sustentabilidade ambiental andam de Fonte: A Riqueza dos Recursos do Mundo Pobre 2005 mãos dadas. Federal of) da) © © UNICEF/HQ98-0446/Roger UNICEF/HQ98-0446/Roger LeMoyne LeMoyne FormerJugoslávia Yugoslavia(República (Federal Republic mais prejudiciais do que vantajosas). O nosso ponto de vista tem de mudar de ver o trabalho como um recurso natural a ser extraído, para ver o trabalho como resultante de seres humanos que têm de passar a ser o assunto de investimento se pretendemos construir a prosperidade. A maioria dos pobres do mundo arrasta-se na insegurança de trabalhos mal pagos na economia informal. São vendedores ambulantes, varredores de lixo, trabalhadores da construção, pequenos fabricantes de mobílias, trabalhadores têxteis que trabalham a partir de casa, pescadores, pequenos agricultores e cantoneiros florestais. Praticamente todos os 500 milhões de trabalhadores pobres que ganham menos de um dólar por dia, trabalham na economia paralela. O trabalho informal é responsável por mais de metade do total dos postos de trabalho nos países em vias de desenvolvimento, e chega a 90 por cento em alguns países Sul Asiáticos e Sul-africanos.36 Mais ou menos metade de todos os trabalhadores informais trabalha por conta própria, muitas vezes em relações salariais disfarçadas; as empresas informais ou agregados familiares empregam outro quarto; e o outro quarto é empregue informalmente por empresas formais. P or muito duramente que trabalhem, estes trabalhadores por conta própria, jornaleiros casuais e trabalhadores no domicílio não conseguem fugir à pobreza. Em teoria, têm direitos básicos e protecções, mas na prática isso não acontece. Não têm benefícios da legislação laboral e disposições de negociação colectiva, porque a sua relação de emprego não está definida. Suportam condições de trabalho inferiores e insegurança laboral. Normalmente é-lhes negado o acesso aos benefícios do estado ou da entidade patronal e da segurança social.37 O reconhecimento e cumprimento dos direitos dos trabalhadores individuais e das respectivas organizações são essenciais para quebrar o ciclo da pobreza.38 O emprego informal muitas vezes expande-se tanto positiva como negativamente. Enquanto a recessão atira as pessoas para o trabalho informal para sobreviverem, a recuperação pode também dar incremento ao emprego informal em pequenas empresas empreendedoras e actividades subcontratadas e contratadas externamente no sistema de produção global.39 37 As mulheres têm mais probabilidade de trabalharem na economia informal. Nos países em vias de desenvolvimento, excluindo o Norte de África, mais de três em cada cinco mulheres no trabalho não-agrícola, têm empregos informais. Nos países em que podem trabalhar, as mulheres perfazem entre 30 a 90 por cento dos vendedores ambulantes e 35 a 80 por cento dos trabalhadores no domicílio.40 Mais de quatro quintos dos trabalhadores industriais no domicílio no mundo em vias de desenvolvimento são mulheres. Além disso, as mulheres predominam nas categorias mais baixas do trabalho informal e tipicamente ganham menos do que os homens. As duas últimas décadas viram um aumento notório na participação das mulheres na força laboral. A segmentação global dos mercados de trabalho pelo género, sugere que o trabalho das mulheres não veio simplesmente substituir o dos homens. Em vez disso, um processo paralelo criou oportunidades de emprego informal pobre e mal pago, principalmente para as mulheres.41 A maioria dos cidadãos mexicanos não tem acesso a serviços bancários e apenas 13 por cento tem uma hipoteca a pagar. Na ausência de instituições financeiras, os pobres e as classes médias baixas apoiam-se em casas de penhores. A taxa de juros anual cobradas vai de 48 por cento em casas de penhor não lucrativas a 160 por cento nas lucrativas. As populações indígenas também foram amiúde forçadas ao trabalho informal devido à perda das suas terras tradicionais, relocalização sem compensação e serviços de apoio básicos, sub-investimento na instrução e saúde, e sistemas e materiais educacionais mal adaptados. Mais amplamente, o aumento da competição global, regulamentações laborais ineficazes, desactualizadas ou mal concebidas, e a informalidade crescente, quando em conjunto, alargam as distâncias entre a legislação laboral e a realidade do local de trabalho. Quarto pilar: Direitos de comerciar A maioria dos empresários pobres do mundo opera informalmente, e como consequência uma parte impressionante da economia nos países em vias de desenvolvimento é informal.42 Garantir 38 os respectivos direitos de comerciar e a ter um local de trabalho e a infra-estrutura respectiva e serviços (abrigo, electricidade, água, instalações sanitárias), facilitando assim o sucesso das pequenas e médias empresas, seria um passo inestimável no caminho para a redução da pobreza. Os pobres ocupam terra da qual não possuem um título de propriedade, trabalham em pequenos negócios que não estão registados e apoiam-se na família e amigos para empréstimos ou para partilharem o risco. São especialmente vulneráveis a vicissitudes, corrupção e violência de criminosos e entidades oficiais. Possuem poucos meios de resolução de disputas, excepto através de subornos ou violência. Fonte: La Crónica de Hoy, 9 de Outubro de 2006. As oportunidades económicas dos pobres são limitadas. Têm dificuldade em ter acesso a financiamento e a mercados e raramente obtêm benefícios fiscais e outros incentivos empresariais. Têm de trabalhar contornando as regulamentações das zonas urbanas que os proíbem de exercer a actividade comercial. Muitas vezes é-lhes negado o direito à utilização dos recursos públicos e comuns. E podem ser obrigados a regras onerosas de saúde pública e sanitária, nomeadamente na produção de comida nas ruas. Conforme as coisas se apresentam, os quatro mil milhões de excluídos não têm prospectos de obter as ferramentas legais que os países desenvolvidos utilizaram para criarem riqueza. Provavelmente, eles não conseguirão criar uma personalidade jurídica, obter responsabilidade limitada, associarem-se com outros empresários para ‘As ligações aos serviços públicos (água, electricidade e telefone) exigem um título de posse de propriedade juridicamente reconhecido ou contrato como forma de garantia. Assim, muitas vezes os comerciantes informais são privados destes serviços.’ Referendo Nacional no Sri Lanka integrar capital, aceder a mecanismos financeiros para obter liquidez, extensão de crédito, contratar empregados, fornecedores e clientes, aceder a oportunidades de exportação e muito mais. Quando a legislação que regula os pequenos negócios é redigida, implementada ou imposta injustamente, ou simplesmente é demasiado fraca e ineficiente, deixa os pobres com poucas opções senão fazer negócio na economia informal. Obter uma licença, o primeiro passo para registar um negócio, é muitas vezes proibitivamente dispendioso e difícil. No Quénia, por exemplo, mais de 1.000 licenças governam as novas empresas; mais de 130 leis separadas regulam só a agri- cultura. Regulamentações onerosas e pesadas impedem os pobres de melhorarem as suas vidas através de iniciativas, e asfixiam o desenvolvimento da economia. A dimensão do problema O problema que a Comissão aborda é de proporções enormes. Em cada um dos quarto pilares os problemas são profundos e afectam os pobres em todo o globo. Quatro mil milhões de pessoas estão excluídas do estado de direito. Repetimos: Quatro mil milhões de pessoas estão excluídas do estado de direito. Esta Comissão tem uma agenda para mudar esta situação e acreditamos que abordar o problema da aquisição de poder por via da lei é uma política inteligente e também economia de qualidade. Promover a Sustentabilidade Ambiental e Abordar a Mudança Climática G arantir a terra e direitos aos recursos para os pobres, pode combater a pobreza, assim como a degradação ambiental. Os pobres dependem mais directamente do respectivo meio-ambiente local para a sobrevivência do dia-a-dia do que os ricos. Eles suportam o impacto imediato quando os recursos ecológicos e serviços colapsam. No entanto, provas em todo o mundo mostram que a inversão dos danos ambientais tais como a sobrepesca, poluição aquática, degradação da terra e desflorestação está intimamente associada com o garantir que as populações locais e comunidades detêm a propriedade ou manutenção dos recursos ambientais de que dependem.43 Vejamos a Namíbia. As reformas jurídicas de 1996 criaram uma estrutura para a gestão dos recursos naturais com base na comunidade, dando aos Namibianos que formam áreas de conservação, direitos jurídicos para gerir reservas de vida selvagem. Estes direitos garantidos permitiram aos Namibianos rurais reduzirem a caça furtiva e fizeram com que os números de animais selvagens e os ecossistemas recuperassem. Os Namibianos pobres também ganharam novas oportunidades empresariais baseadas no ecoturismo e actividades relacionadas. Estes negócios dão uma nova fonte de rendimento e trabalho, assim como uma noção mais ampla de objectivo e dignidade. A experiência da Namíbia prova que desenvolver direitos jurídicos garantidos para as populações locais pode promover a conservação e o desenvolvimento económico.44 As alterações climáticas são um desafio ainda maior – e os pobres estão mais vulneráveis. Conforme o Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas esclarece, é necessário um corte enérgico nas emissões de gases que provocam o efeito de estufa para afastar consequências globais desastrosas. Mas o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) 2007 do PNUD prova como os pobres já estão afectados. As mulheres e homens pobres são os mais vulneráveis porque vivem em ambientes marginais: as áreas com tendência para seca e desertificação, áreas em risco de inundações, países e comunidades com pouca possibilidade para evitar ou gerir desastres ou adaptar-se às alterações ambientais. Quando os desastres acontecem, as disputas acerca da terra e outros direitos de propriedade são especialmente conten- (cont.) 39 Promover a Sustentabilidade Ambiental e Abordar a Mudança Climática cont. ciosos e difíceis, sobretudo quando as populações estão deslocadas. A destruição ou falta de um sistema válido reconhecido de títulos de posse pode dar lugar a conflitos e à paragem da recuperação e reconstrução. Durante o ciclone no Bangladesh em 2006, muitas terras de agricultores simplesmente desapareceram debaixo das águas, obrigando-os a mudarem-se. As alterações climáticas poderão no futuro despoletar novas crises de refugiados, uma vez que determinadas áreas ficam inabitáveis. ‘‘Agora há mais inundações e as margens dos rios são levadas pelas águas mais rapidamente. Não há para onde ir. A minha terra está no rio. Agora, não tenho nada.’ Intsar Husain, Antar Para, noroeste do Bangladesh, 2007 (in HDR 2007/2008) Negociações conducentes à Convenção sobre as Alterações Climáticas globais disponibilizam oportunidades de abordar a vulnerabilidade crescente dos pobres através da cooperação internacional crescente na adaptação à alteração climática, assim como os esforços para a limitar. Um acordo global teria de incluir compromissos para implementar o financiamento para ajudar as pessoas dos países pobres a adaptarem-se. A aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres deve fazer parte do debate, uma vez que sem acesso a ferramentas jurídicas e protecções, as populações pobres continuarão vulneráveis. Infra-estruturas à prova de clima e melhoria da preparação para catástrofes não são suficientes. Insistimos junto da ONU para incluir a agenda de aquisição de poder por via da lei como elemento central nas estratégias para adaptação nas negociações sobre as alterações climáticas pós-2012. A Convenção de Estruturas sobre Alterações Climáticas da ONU reconhece o direito dos países pobres em receberem apoio na adaptação à alteração climática. Desde 2006 existe um acordo sobre um Programa de Trabalho de Nairobi sobre Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação à Alteração Climática. A Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres deverá ser incluída nestas negociações como elemento base de estratégias de adaptação e políticas. Num mundo em que as emissões de carbono têm urgentemente de ser reduzidas, os limites e mercados das licenças de emissões de carbono darão incentivos importantes para as reduções de emissão e a transição para tecnologias mais limpas e mais sustentáveis. Estes incentivos também deviam gerar uma muito maior procura de projectos de redução de carbono, incluindo de países em vias de desenvolvimento. Mas o potencial para os pobres acederem e beneficiarem deste financiamento através da venda dos direitos das emissões 40 de carbono, nomeadamente para projectos que abordam a gestão sustentável de terras, sem dúvida que dependerá de maneira muito importante da respectiva aquisição de poder por via da lei. G raças ao Protocolo de Kyoto, foram gerados milhares de milhões de dólares para investimentos em soluções mais sustentáveis em países em vias de desenvolvimento, tais como energias renováveis. Esses mecanismos têm de ser expandidos para que possam financiar investimentos mais alargados na redução da pobreza de maneira amiga do ambiente. Associar inovações nas finanças ambientais e reformas jurídicas favoráveis aos pobres, podia apresentar um modelo novo de finanças de desenvolvimento capaz de chegar às comunidades pobres mais directamente do que o apoio convencional. A reabilitação das florestas degradadas, pastagens e terras agrícolas é uma parte importante da minimização da alteração climática. Essas terras, que têm o potencial de reter quantidades significativas de carbono da atmosfera, encontram-se em grande parte na África subsaariana e em muitas outras regiões em vias de desenvolvimento. Através de esforços para aumentar a produtividade do solo, a retenção de água e cobertura de vegetação, estas terras degradadas podem contribuir para ir ao encontro dos objectivos climatéricos globais, ao mesmo tempo que ajudam os pobres e as comunidades vulneráveis. Esses investimentos deverão portanto qualificar-se para financiamento do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo ou outros instrumentos associados ao crescimento dos mercados de venda dos direitos de emissões do carbono. O Protocolo de Kyoto ofereceu muito poucas oportunidades para o financiamento através da venda dos direitos de emissão de carbono relacionado com as terras. A nova ronda de negociações, despoletada pela conferência climática de Bali em Dezembro de 2007, dá a nova oportunidade para abordar esta insuficiência. No entanto, igualmente importantes são os principais assuntos relacionados com uma falta de direitos transparentes quanto à posse e utilização da terra e outros recursos naturais. A falta de direitos de garantia sobre a terra das comunidades agrícolas pobres nega-lhes o acesso ao mercado de venda dos direitos de emissão de carbono, assim como a outras formas de financiamento e serviços. O financiamento através da venda dos direitos de emissão de carbono podia ajudar a abordar tanto as alterações climáticas como a pobreza rural. É uma grande oportunidade para trazer investimento desesperadamente necessário para áreas rurais fortemente afectadas pela pobreza. Mas sem direitos de posse de terras eficazes, isso não acontecerá.46 A aquisição de poder por uma questão de emancipar grande prosperidade sociedade como um todo. 3 A Aquisição de Poder por Via da Lei é Politicamente Inteligente e faz Bom Sentido Económico via da lei não é apenas os pobres; também oferece e segurança para a N a maioria dos países, as elites ricas e poderosas dominam a política e a esfera económica. A política pública e os respectivos resultados estão moldados pelos respectivos interesses, em vez dos interesses da maioria pobre que luta para sobreviver. Estas desigualdades económicas e políticas têm tendência a serem reforçadas por leis e instituições injustas e disfuncionais, e a incapacidade dos pobres em acederem à justiça. Isto não é apenas injusto; é falta de visão. Por agora poderá permitir aos ricos manterem-se no topo da pirâmide, mas a um custo enorme. Desgasta os poderes do estado, impede o crescimento económico e alimenta a instabilidade. A corrupção e a procura de rendas47 são especialmente onerosas. Nos casos piores, os estados fracassados vão até ao conflito. Mas mesmo nos países onde os problemas não se deterioraram tanto, os sistemas injustos que minam e restringem as oportunidades, em último caso prejudicam não só os pobres, mas a sociedade no seu todo, e mesmo as elites. Aquisição de Poder por Via da Lei nas Políticas Inteligentes Nos casos onde a legislação e instituições formais não servem as necessidades dos pobres, a política gravita para os canais informais. Quando os governos não conseguem ou não querem dar protecção e oportunidades a todos, a legitimidade e relevância do sistema formal são desgastados. Desenvolve-se um ciclo vicioso, com a decadência das instituições jurídicas e o crescimento das disposições informais improvisadas, alimentando-se uma na outra. O estado esvazia-se. A sociedade fragmenta-se. Nos casos piores, a economia estagna. A agitação prepara-se. A legitimidade e autoridade dos líderes políticos estão minadas. Na melhor das situações, isto resulta num estado precário de desenvolvimento bloqueado e nas piores no colapso. A governação é importante, e mais amiúde do que o contrário, os países pobres têm uma governação menos eficaz. A respectiva população 43 contribuirão para mercados de bens funcionantes, que melhorarão a produtividade da terra e outros bens, colhendo assim dividendos económicos para os pobres. Os direitos de propriedade são ferramentas jurídicas cruciais para os pobres e como tais podem ser um instrumento para melhor inclusão e igualdade, em vez de aumentarem a marginalização. ‘Muitas pessoas não sabem quais são os seus direitos humanos e não estão cientes do que significa ter um direito.’ Referendo Nacional em Moçambique obtém menos justiça por parte dos tribunais e está mais sujeita aos crimes, à corrupção e interferência governamental nas suas vidas. Uma boa governação – sob a forma de instituições que estabelecem um conjunto de regras previsíveis, imparciais e consistentemente impostas – é crucial para atingir uma sociedade mais justa, mais próspera e mais sustentável. A aquisição de poder por via da lei não é apenas uma questão de emancipar os pobres; também oferece grande prosperidade e segurança para a sociedade como um todo. A aquisição de poder por via da lei reforça a eficácia e legitimidade do A Aquisição de Poder por Via da Lei Pelos Pobres estado, e assim a das suas entidades oficiais e não tem de ser um jogo de tudo ou nada onde representantes a todos os níveis. Líderes corajosos que defendem a ‘Combater a corrupção exige a consciencialização Aquisição de Poder por Vias da Lei pelos Pobres, ganharão apoio a todos acerca das consequências destrutivas da corrupção, os níveis. destacando o papel de instituições de monitorização governamentais e não-governamentais, fazendo valer o papel dos media e criando um poder judiciário independente e imparcial.’ Referendo Nacional na Jordânia uns ganharão e outros perderão. Conforme se frisou, a aquisição de poder por via da lei começa com a identidade e a expressão. Uma estratégia bem-sucedida para dar a todas as pessoas essa identidade torna mais difícil explorar os pobres, mas não reduz a identidade de mais ninguém. Expressão e representação para os pobres não nega o mesmo a outros. No entanto, nas reformas de aquisição de poder por via da lei, é essencial que as vozes dos pobres não sejam diluídas. Quando a reforma institucional dá realce ao acesso à justiça pelos pobres, a sociedade como um todo fica melhor. Direitos de propriedade funcionantes Um Desafio Político com Recompensa No entanto, sem dúvida que as reformas são difíceis. Qualquer líder – quer seja um presidente, um líder parlamentar de um partido político, o líder de uma organização com base na sociedade ou comunidade civil, um chefe de aldeia ou um chefe de um bairro de lata – que queira enfrentar este desafio enfrenta várias dificuldades concretas. Para começar, em geral os pobres desconfiam das instituições governamentais e o sistema jurídico, e com boas razões. São estas instituições que têm o poder de estabelecer e manter as regras que governam a actividade económica, que muitas vezes perpetuam a desigualdade económica. Têm de ser reformadas para trabalharem no interesse de ‘Os pobres continuam a ver a lei como sendo sobretudo todos. Num estudo da era soviética para os ricos, reconhecendo a realidade pouco num país do leste europeu, 82 por democrática que a lei é a expressão da ideologia da cento dos proprietários de comércios elite dominante.’ Referendo Nacional nas Filipinas informais afirmou que era neces- 44 Albânia © UNICEF/HQ97-0695/Roger LeMoyne sário subornar as entidades oficiais para que os seus negócios pudessem continuar a operar.48 A experiência ensinou aos pobres a serem prudentes relativamente aos políticos que prometem reformas. Eles necessitam de ver resultados tangíveis para que se deixem convencer. Os políticos têm de provar que o sistema formal está a mudar para prepararem as suas necessidades. O mercado de Sewa Nagar prova que isso é possível. T ambém existe uma ampla percepção que promover os direitos de propriedade aumentará os interesses da elite. Isto não é necessariamente verdade. Tudo depende do modo como essas reformas são implementadas e se os interesses dos pobres são consistentemente salvaguardados desde o início. Eficazmente implementado, um sistema de direitos de propriedade inclusivo e que funcione bem é tão importante, se não o mais importante para os pobres. Muitíssimos especialistas convencionais em assuntos jurídicos e de desenvolvimento que perdem tempo com ninharias de soluções técnicas para cada problema possível também têm de ser evitados. As soluções técnicas rápidas podem parecer atraentes, mas excepto se as reformas forem baseadas nas necessidades e condições locais forem negociadas e implementadas colocando os pobres na boa posição, eles não conseguirão criar raízes e marcar realmente a diferença. Talvez mais importante, uma maioria da sociedade tem de ser convencida que a construção de uma ordem jurídica eficaz e mais inclusiva é exequível e em última instância preferível para todos. Propostas utópicas desencadeiam o cinismo, e as revolucionárias desencadeiam o medo e a resistência. Os pobres necessitam de ter expressão, uma organização e informação; os ricos e os poderosos necessitam de serem persuadidos e terem confiança. Não é possível fingir que a política não existe. Actores poderosos têm de co-optar, e serem conquistados. A liderança nacional e as coligações alargadas para a mudança são essenciais. No entanto, a aquisição de poder por via da lei, não exige que os respectivos defensores políticos sejam santos (embora isso pudesse ajudar) mas apenas que reconheçam um auto-interesse esclarecido. Um capital político significativo será um benefício para o reformador. Conforme a actividade económica informal vê oportunidades no sistema formal, a base fiscal é alargada. Activi- 45 dade económica extra resultante da aquisição de poder por via da lei aumenta ainda mais as receitas públicas. Conforme cada vez mais pessoas desenvolvem um interesse na redução da criminalidade e na manutenção da paz, a base política daqueles que advogam a reforma é alargada. Além disso, a liderança exige uma visão credível do futuro. A aquisição de poder por via da lei tem por base noções fortes de liberdade, justeza e solidariedade e pode por isso moldar uma visão convincente. As pessoas compreendem a linguagem da inclusão, especialmente se no dia-a-dia forem alvo de exclusão. E que melhor legado político do que ter feito uma contribuição duradoura para o desenvolvimento do seu país, ter dado às pessoas uma oportunidade real para melhorarem as suas vidas? Institucionalizado em leis e práticas, a aquisição de poder por via da lei é um legado que permanece. Um Papel Essencial para a Democracia A luta dos pobres tem muitas vezes as suas raízes em sistemas políticos em que os cidadãos se vêem negado o direito à expressão; as instituições governamentais não têm obrigação de responder às pessoas, e interesses especiais exploram os recursos sem medo de serem escrutinados. A democracia ‘Os sistemas jurídicos e judiciais 46 Brasil © Moisés Moraes pode encorajar o desenvolvimento de políticas e prestação de programas que abordam as exigências das pessoas. Disponibiliza incentivos e salvaguardas que permitem que todos os cidadãos, mesmo os mais pobres, recompensem entidades oficiais que agem no interesse público e responsabilizem quem não trata das suas necessidades. Como é sabido, nunca uma democracia conheceu a fome. Enquanto os governos não democráticos podem conseguir providenciar segurança e serviços básicos, os democráticos têm mais possibilidade de dar resposta às necessidades das pessoas conforme é tido como legítimo. Existem provas empíricas que sugerem que as democracias têm um melhor desempenho do que as autocracias relativamente ao crescinão são responsáveis.’ mento per capita do PIB e outros Referendo Nacional na Tanzânia indicadores de bem-estar social.49 Existe também uma forte associação junto dos países em vias de desenvolvimento entre democracia e bem-estar (conforme concluído no Índice de Desenvolvimento Humano). O smecanismos de autocorrecção da democracia, resultantes de mecanismos de controlo impostos pelas agências governamentais, também apoiam a responsabilização, reduz o abuso de poder e promove a receptividade aos problemas da maioria do eleitorado. Não existe substituto para um processo verdadeiramente inclusivo, participativo e deliberativo, onde pontos de vista alternativos são considerados e os interesses dos cidadãos pobres e marginalizados são tidos em conta. Ninguém é tão sensato como todos. Quase invariavelmente, os pobres sofrem mais de falta de expressão, representação e influência – mesmo em sistemas de governação aberta e competitiva. A exclusão política duradoura endurece na resignação e fatalismo vis-à-vis das instituições formais e processos de tomada de decisões do estado. São necessários esforços vigorosos para ajudar os cidadãos a organizarem-se e participarem eficazmente na influência de decisões que afectam as suas vidas, assim como para permitir que os partidos políticos e parlamentos representem melhor as necessidades dos eleitores. O poder demasiado centralizado é frequentemente um impedimento para a participação significativa dos cidadãos. A descentralização e a aquisição de poder por via da lei podem reforçar-se mutuamente, porque um governo que está próximo da população tem mais probabilidade de ser um governo pelo e para o povo. Mas mesmo nos sistemas mais descentralizados, a exclusão pode existir, pelo que é necessário que estejam implementados mecanismos de responsabilização que funcionem bem. Muitas democracias são frágeis. Herdaram problemas endémicos tais como dívidas, doenças, divisões étnicas, pobreza e corrupção. Em muitos países, mecanismos de controlo do próprio poder permanecem fracos. Mas enquanto a controvérsia envolve se a democratização facilita o estado de direito, não há desacordo em que o progresso feito no estabelecimento do estado de direito facilita a democratização.50 Seria mais exacto dizer que a democratização e a aquisição de poder por via da lei têm de estar sincronizados em vez de sequenciados: pois são espíritos irmãos que não devem poder dispersar-se. A democracia também pode ajudar a accionar a aquisição de poder por via da lei, e ambos são intrínsecos e instrumentais para o desenvolvimento. A Aquisição de Poder por Via da Lei é sinónimo de Economia de Qualidade Durante anos, Venâncio Andrade sobreviveu com dificuldade vendendo tachos e panelas nas ruas poeirentas de Lima, a capital do Perú e cidades vizinhas. Acabou por aprender sozinho como fabricar utensílios de cozinha em alumínio, e em 1985 juntou dinheiro suficiente para comprar um lote de terreno num parque industrial vazio nas redondezas de Lima. O facto de deter uma propriedade qualificou Andrade para empréstimos bancários que ajudaram a que a sua empresa de utensílios de cozinha se desenvolvesse, e agora dirige a associação empresarial da Villa El Salvador, um bairro de lata em crescimento com 400.000 habitantes que surgiu nas imediações do parque industrial. Andrade, de 62 anos de idade tem cinco funcionários a tempo inteiro na sua folha de salários, e nos períodos de picos de produção, emprega até 30 pessoas. Ele próprio reconhece que foi o facto de ter adquirido formalmente uma propriedade que os tornou a ele e outros pequenos empresários na Villa El Salvador clientes viáveis aos olhos de possíveis emprestadores. ‘O crédito permitiu-me dar resposta ao aumento de procura dos meus produtos quando preciso de produzir mais,’ explica Andrade.51 Muitas investigações confirmam que boas instituições são essenciais para o sucesso a longo prazo das economias. Na verdade, alguns pretendem que a segurança dos direitos de propriedade tem sido historicamente o mais importante 47 determinante da razão pela qual alguns países enriquecem e outros permanecem pobres.52 Isto não quer dizer que os direitos de propriedade sejam o ovo de ouro. Pelo contrário é um ingrediente-chave muitas vezes ignorado de uma aquisição de poder por via da lei mais ampla e uma agenda de desenvolvimento que permitirá aos países desenvolverem economias modernas. Fazer com que as instituições e as regras funcionem para o bem do público mais alargado está no cerne desta agenda. Após uma greve nos serviços públicos de gestão e limpeza urbana de Bogotá em meados dos anos 90, o governo local pediu a ajuda dos trapeiros. Respondendo à chamada da cidade, eles eliminaram mais de 700 toneladas de lixo por dia. Detectando uma oportunidade de negócio, organizaram-se na Associação de Recicladores de Bogotá (ARB), uma associação de 25 cooperativas de apanhadores de lixo. Mas quando o contrato para fornecer serviços sólidos de gestão de lixos foi posteriormente apresentada a concurso, a legislação governamental e as condições do concurso impediram-nos de participar. Ajudados por advogados pro bono, a ARB exigiu uma revisão constitucional desta provisão injusta e uma citação de protecção dos direitos humanos. O Tribunal Constitucional da Colômbia aceitou os argumentos e concedeu-lhes uma acção de declaração para a respectiva inclusão em processos de concursos públicos ligados à gestão de lixos. Legislação efectiva e inclusiva, imposta através de instituições que funcionam bem, dá lugar a uma quantidade de benefícios económicos que são tão fundamentais que por vezes são esquecidos. Facilitam as transacções e fazem com que sejam mais baratas. Apoiam a predictabilidade, segurança e confiança. Possibilitam a imposição de contratos a longo prazo entre estranhos. Por sua vez, isso permite uma maior especialização e divisão do trabalho, economias de escala, comércio à distância, e funções financeiras essenciais tais como crédito e seguros. Este tipo de características marcam a diferença entre uma economia rudimentar com um modelo simples de produção e troca e uma economia desenvolvida muito mais complexa e produtiva. Legislação bem concebida e razoavelmente implementada também pode promover competitividade, investimento e inovação. O que realmente é importante não é tanto a regulamentação ou desregulamentação per se, mas a qualidade da legislação, regulamentação e instituições. Equidade – pela qual queremos dizer igualdade de protecção e oportunidade – exige que os pobres tenham segurança e uma hipótese razoável de participar na economia formal. Mas o mesmo acontece com a eficiência: Se os pobres não conseguirem fazer render os seus talentos, o 48 Fonte: Ruiz-Restrepo 2007 crescimento recente-se. Ideias brilhantes e investimentos rentáveis não são utilizados, a pobreza entrincheira-se, o potencial das populações é desperdiçado, e o crescimento da economia abranda.53 A aquisição de poder por via da lei pode marcar uma diferença no desenvolvimento. Mas não é uma panaceia. Condições macroeconómicas fortes também são importantes, assim como a abertura ao comércio e investimento estrangeiro. Investimento na instrução, formação, infraestruturas e serviços essenciais é vital. Suportado pela aquisição de poder por via da lei, tudo isto promoverá um crescimento com uma base ampla e a redução da pobreza. As vantagens do acesso à justiça e o estado de direito Para colher os benefícios da atribuição dos direitos de propriedade na sua totalidade, defi- nindo relacionamentos de emprego e o registo legal de empresas, os direitos têm de poder ser impostos e as instituições funcionantes têm de os implementar. Enquanto a medição do valor económico do acesso à justiça é notoriamente difícil, a maioria dos estudos concluem que o estado de direito tem uma contribuição significativa para o crescimento e para a redução da pobreza. No entanto, estudos que se centram sobretudo no impacto do estado de direito na segurança do investimento estrangeiro, reduzem os seus verdadeiros benefícios económicos. Esses estudos negligenciam o valor para os pobres de puderem obter reparação legal devido a injustiças.54 Omitem os benefícios mais amplos de fazer com que todas as transacções e relações económicas sejam previsíveis, transparentes, e justas. O acesso à justiça e ao estado de direito também facilita a resolução de disputas. A determinação da propriedade de bens, tais como terras, direitos de mineração e água é muitas vezes difícil. A obrigação de desempenhar serviços e bens intangíveis tais como relações com clientes podem ser difíceis de definir. As relações nas quais estes bens se acumulam são muitas vezes difíceis de regular num contrato, e especialmente para os pobres. É inevitável que surjam disputas, especialmente quando as relações se alteram. Um tribunal ou árbitro imparcial podem ajudar a resolver conflitos, reduzir abusos e permitir aos pobres a obtenção de reparação legal. Embora seja extremamente valioso o facto de impor contratos justos, o legalismo não verificado pode provocar defensiva e incerteza. Os arguidos têm de ser protegidos contra a ameaça de reivindicações pouco sólidas, que representam custos enormes e que na verdade são uma forma de extorsão. É necessário obter um equilíbrio. As vantagens dos direitos de propriedade Os direitos de propriedade devem ser compreendidos como um conjunto de direitos e obrigações entre pessoas e bens, reflectindo a multiplicidade e diversidade dos sistemas de propriedade em todo o mundo. Em todos os sistemas de propriedade, criar segurança e previsibilidade é fundamental. Os sistemas de propriedade são uma faceta central da funcionalidade do estado e são indicadores importantes da respectiva eficácia. Os direitos das populações indígenas dependem de e interagem com uma grande variedade de medidas e políticas tais como as que abrangem o título de posse fundiária; a protecção das espécies em vias de extinção; saúde, alimentos e agricultura; água de qualidade; acesso a, e a exploração dos recursos naturais; gestão ambiental; conservação dos solos; e a protecção do património cultural. Neste amplo horizonte, os direitos de propriedade intelectual podem ajudar a criar ou a proteger os direitos indígenas. Um exemplo que ilustra a utilização dos direitos de propriedade intelectual está relacionado com as medicinas tradicionais na República Popular da China, relativamente às quais vários milhares de patentes foram atribuídos nos últimos anos. Fonte: OMPI 2005 Em termos económicos, para ser totalmente produtivo, os bens têm de ser formalmente reconhecidos por um sistema jurídico de direitos de propriedade. Dar-lhes corpo em registos padrão, títulos e contratos em conformidade com a lei, dá aos agregados familiares e negócios um título de posse seguro que os protege de supressão involuntária. Os despejos só deviam ser possíveis em circunstâncias excepcionais, através de processos legais, os quais têm de ser aplicados em termos de igualdade, contestáveis e independentes, e nos casos em que os custos de despejo sejam totalmente compensados, apenas em circunstâncias onde a segurança física da vida e propriedade estejam 49 ameaçadas, em que os acordos de contratos não tenham sido cumpridos, e nos casos de processos de expropriação justos. Os direitos de propriedade, incluindo a segurança de título de posse, não só devem ser protegidos por lei, mas também associando a propriedade dos pobres a interesses societários mais amplos (aumentando o leque de validação da segurança do título de posse) tal como abrindo a possibilidade de os utilizar como colateral para obtenção de crédito, tal como um empréstimo para negócio ou uma hipoteca. Esses sistemas encorajam o cumprimento ligando os proprietários e detentores de bens aos bens, os bens aos endereços e os endereços ao cumprimento. Assim, a reforma da propriedade, se implementada correctamente, pode fortalecer o acesso à personalidade jurídica e à justiça. Os registos de propriedade unificam disposições dispersas num sistema único, juridicamente compatível. Isto pode integrar os mercados locais fragmentados, permitindo que os negócios procurem novas oportunidades fora das respectivas proximidades imediatas. Sem direitos de propriedade eficazes, geridos por instituições funcionantes, as economias avançadas deveriam retroceder. Reciprocamente, a respectiva introdução podia permitir que as economias em vias de desenvolvimento dessem um enorme passo em frente. Vejam a China. Mantém-se um desafio colossal de pobreza e desigualdade, assim como um grande debate histórico acerca do tipo e vastidão da reforma da propriedade, mas a experiência da China demonstra sem sombra de dúvida a instrumentalização dos direitos de propriedade na criação da riqueza. A securização da propriedade de facto, após a economia ter começado a ser liberalizada nos anos 80, gerou 7,4 triliões de USD em capital para a expansão económica do país. Isto impede o crescimento do investimento directo estrangeiro de 611 mil milhões de USD e quase 46 mil milhões de ajuda estrangeira que recebeu.55 Abundam as provas que os direitos de proprie- 50 dade garantidos desenvolvem o investimento. Estudos levados a cabo na Polónia, Roménia, Rússia, Eslováquia, e Ucrânia revelam que os homens de negócios que acreditam que os seus direitos de propriedade estão garantidos, reinvestem até 40 por cento mais dos seus rendimentos do que os que não acreditam. A gricultores também investem mais nas suas terras. No Gana e na Nicarágua, concluiu-se que os agricultores que possuem títulos de posse investem mais nas respectivas terras.56 As terras rurais no Brasil, Indonésia, Filipinas e Tailândia dispararam de valor entre 43 e 81 por cento depois de lhes ter sido atribuído o título de posse. O aumento do valor das terras reflecte um aumento de investimento e alimenta uma maior produtividade, produção e rendimentos. Na China, o efeito combinado da atribuição de títulos de posse e a liberalização de preços aumentou a produção das quintas em 42 por cento entre 1978 e 1984.57 Os agricultores da Tailândia que receberam título de posse das suas terras produzem um quarto mais do que os que não o possuem. O valor da terra urbana aumentou dramaticamente depois de lhe ter sido atribuído o título de posse – 14 por cento em Manila, em 25 por cento em Guayaquil e Lima, e em 58 por cento em Davao.58 Também encoraja as populações a refazerem as suas casas. Um estudo de um bairro de lata na Argentina concluiu que quando os ocupantes ilegais de terrenos públicos receberam o título de posse das suas casas, o número de casas com paredes de boa qualidade aumentou em 40 por cento, enquanto as que tinham telhados bons aumentaram em 47 por cento.59 A provisão dos direitos de garantia sobre a terra em Lima aumentou as despesas na renovação das habitações em 68 por cento.60 Quando os direitos das populações sobre as suas terras não estão garantidos, têm de dedicar recursos valiosos na protecção física da mesma e muitas vezes acabam envolvidos em conflitos escola. Uma vez que têm um rendimento superior devido ao trabalho de longas horas fora de suas casas, recorrem menos ao trabalho infantil.62 A aquisição de poder por via da lei por parte das mulheres, com direitos de propriedade faz uma grande diferença na pobreza e malnutrição. Como as mulheres ganham mais, têm tendência a gastar uma parte maior dos seus rendimentos em manter os filhos saudáveis e bem alimentados. Garantir que as mulheres tinham direitos de propriedade eficazes apoiaria assim famílias e negócios mais fortes. Proteger quaisquer que fossem os bens existentes, é a primeira preocupação dos pobres. Medidas para conseguir essa protecção em si mesma, dar poder por via da lei aos pobres, garantir os seus modos de vida e fazer investimentos para o futuro mais atraentes. Os direitos de propriedade são fundamentais para a vida e funcionamento da sociedade assim como a respectiva reforma não pode ser negligenciada. Por esta mesma razão, a reforma acarreta riscos, pelo que é necessário ter um cuidado especial em aprender com os erros anteriores em que os benefícios foram abarcados pelas elites locais em vez de pelos pobres. Garantir que as reformas de propriedades não enfraquecem os direitos das mulheres e direitos comunitários das populações indígenas ou de pastoreio é especialmente difícil. Os beneficiários têm de ser consultados, pelo que a aquisição de poder por via da lei garante que os pobres participam voluntariamente nos sistemas República Centro-Africana / Foto ONU acerca dos limites dos lotes. Um estudo no Perú concluiu que perto de metade (47%) de quem não possuía um título de posse tinha de pagar a sentinelas para vigiarem os seus lotes. As famílias com título de posse mais garantido podiam dedicar mais tempo a procurar melhores oportunidades de trabalho. No total, os membros dos agregados familiares despendiam mais 45 horas por semana em emprego produtivo – o equivalente a juntar o salário de mais uma pessoa ao agregado familiar. As mulheres, que de outro modo ficariam em casa para a proteger, são quem mais beneficiou.61 A s crianças também ganharam com isso. As famílias no programa Peruano, por exemplo, têm menos probabilidade de mandar os filhos pequenos trabalhar e mais de os mandar à 51 de direitos de propriedade conforme compreendem que as vantagens ultrapassam os custos. É um programa que baseia as reformas nas realidades locais e nas necessidades e interesses dos vulneráveis. funções económicas essenciais de um sistema formal de direitos de propriedade. No entanto, é extremamente importante garantir que os direitos das mulheres são salvaguardados. Os sistemas tradicionais têm de passar o teste das obrigações dos direitos humanos fundamentais. Sempre que os bens possam ser representados em forma normalizada, os horizontes da actividade económica dos pobres serão alargados em conformidade. Quando o sistema de propriedade local passa a estar documentado e protegido por lei, pode ser integrado na economia de mercado nacional e internacional, quaisquer que sejam as suas características. Muitas terras indígenas foram e ainda são, declaradas públicas ou baldios, porque são detidas colectivamente conforme a concepção de propriedade e acesso que não se encaixam adequadamente em sistemas de propriedade importados. Esta falta de estatuto, reconhecimento e registo de direitos de utilização colectiva ou propriedade detida por grupos, tem consequências enormes para os proprietários de bens indígenas e sociedade em geral. É um Para retirar crianças do trabalho, é necessário problema crítico para a reforma dos direitos de propriedade, na sua gloultrapassar preconceitos sociais, construir boas escolas balidade. Ao abordar estes assuntos em número suficiente e compensar as famílias pobres em regiões onde a definição e pela perda do salário de uma criança. Enquanto identificação dos povos indígenas estes custos não são de desprezar, as vantagens é difícil e contestada, é melhor económicas da eliminação do trabalho infantil – a concentrar-se em garantir que os maior produtividade e rendimentos gerados por uma sistemas de terras indígenas são maior escolaridade e melhor saúde – ultrapassava-as reconhecidos, normalizados e documentados em conformidade com a em muito. Fonte: PDNU CPI In Focus; Crianças na Pobreza; Março de 2004 lei. Isto contorna a perturbada definição de quem é ou não ‘indígena,’ e tem a vantagem acrescida de partir do zero nos Quer através de posse tradicional, direitos colecassuntos sistémicos dos regimes indígenas ou de tivos, ou atribuição de títulos de posse individuais, posse tradicional. os pobres necessitam de poder utilizar os respectivos bens eficazmente. Se o venderem para fazer face a uma crise, poderão acabar por ficar em s sistemas de posse tradicionais, pensasituação mais difícil do que anteriormente. As áreas va-se que não davam segurança suficiente, resultantes de trabalho e de direitos de comerciar mas estudos mostram que podem ser flexíveis para os pobres são críticas para os pobres para e receptivos às circunstâncias económicas ganharem um rendimento suficiente através de em mudança.63 Em muitos países em vias de trabalho digno e empreendedorismo para serem desenvolvimento, especialmente na África capazes de alavancar os bens de sua propriedade. subsaariana, os sistemas de posse tradicional representam uma maneira adequada e pouco As vantagens dos direitos de trabalho custosa para os rurais pobres garantirem o acesso à terra. Um agregado familiar, aldeia, ou É amplamente aceite que o trabalho não é grupo com laços familiares muitas vezes é uma um bem essencial.64 O mercado de trabalho é garantia contra riscos, assim como o acesso a diferente de outros mercados porque não só cria crédito informal e segurança. Os sistemas tradivalor, mas também molda a distribuição dos cionais podem assim disponibilizar algumas das rendimentos e prosperidade. Enquanto o pro- O 52 gresso necessita que a competitividade elimine os negócios fracassados, as pessoas não podem ser atiradas para o lixo. Questões ideológicas acerca de regulamentação ou desregulamentação têm vindo a ser debatidas exaustivamente. No entanto, mais importante é a questão do modo como a regulamentação pode ser utilizada para promover o trabalho digno para os trabalhadores pobres. O enfoque deverá estar em encontrar o equilíbrio correcto entre segurança, estruturas de apoio e flexibilidade para empresas, tanto na economia formal como na informal, enquanto se trabalha em reformas que farão baixar os custos de entrar na economia formal para os negócios pequenos para que os direitos de trabalho possam ser impostos mais eficazmente. Trabalho digno e produtivo pode tirar os indivíduos da pobreza.65 P ara promover o trabalho digno, é necessário eliminar os aspectos negativos da informalidade enquanto que simultaneamente se Em geral, trabalhadores seguros estão mais motivados. Têm mais probabilidade de investir no seu futuro e no dos filhos. Se sentirem que têm expressão na sociedade, contribuirão mais para ela. Assim, direitos de trabalho eficazes não tratam apenas de proteger os trabalhadores; também reforçam a economia e a sociedade. Enquanto regulamentações de trabalho inadequadas puderem travar a produtividade e o acesso ao trabalho digno, a desregulamentação pode ser contra produtiva e deixar os trabalhadores vulneráveis e sem segurança. A quadratura do círculo não é impossível – as regulamentações laborais deviam promover emprego digno sem desencorajar as empresas a contratar trabalhadores legalmente. A aquisição de poder por via da lei pode assim melhorar a produtividade, assim como condições de trabalho dignas. As vantagens dos direitos de comerciar O registo jurídico pode melhorar dramaticamente a produtividade e rentabilidade dos negócios informais. O registo ‘Ugandeses receiam a bancarrota e a perda da permite-lhes criar hierarquias que propriedade pessoal daí resultante.’ permitem a divisão e especialização Referendo Nacional no Uganda laboral. Ajuda-os a obter capital fresco e acumular o capital que geram. Permite-lhes tomar riscos garante que as oportunidades do modo de vida maiores, e assim tirar vantagem de oportunie empreendedorismo não são destruídas, e dades novas e potencialmente rentáveis. Assim, se promove a protecção dos trabalhadores e enquanto os negócios tradicionais e informais unidades económicas na economia informal e sem dúvida que têm as suas vantagens, os pobres respectiva incorporação no fluxo principal da devem ter a oportunidade de registar juridicaeconomia.66 mente os seus negócios se assim o quiserem. Dar aos trabalhadores direitos de trabalho Empresas de responsabilidade limitada encongarantidos encoraja-os (e à respectiva entidade tram-se entre as instituições jurídicas de melhor patronal) a investir em novas aptidões que produtividade. Permitem que um negócio consmelhoram a produtividade. Dar-lhes-ia mais poder titua uma personalidade jurídica diferente da dos negocial e consequentemente salários mais altos proprietários. Isto separa as finanças pessoais em proporção com o aumento de produtividade. dos empresários das do respectivo negócio. Se Também lhes permitiria obter uma parte mais o negócio fracassar, a família do empresário não justa dos lucros num negócio, protegê-los-ia perderá tudo; se o empresário passar tempos da exploração e garantir-lhes-ia condições de difíceis, o negócio ainda pode sobreviver, ou ser trabalho dignas. 53 Cambodja © Jean-Luc Fievet 2007 vendido. Isto encoraja os homens e mulheres de negócios a arriscarem mais, e assim ganharem mais proveitos. A maioria dos negócios informais tem de operar apenas com um montante limitado do capital da família. Os empresários podem por vezes fazer empréstimos de pequenos montantes de prestamistas informais, mas apenas por curtos períodos de tempo e a taxas de juros punitivamente altas. Estes constrangimentos de créditos impedem que os negócios informais se expandam e expõem-nos a riscos operacionais e financeiros maiores. As empresas juridicamente registadas têm muito mais facilidade em obter capital. Em vez de se apoiarem financeiramente em amigos e família, podem emitir acções a um grupo mais amplo de investidores e fazer empréstimos junto de instituições de micro- 54 As políticas de investimento público que promovem a utilização de tecnologias de trabalho intensivo melhoraram o acesso a contratos de aprovisionamentos públicos para pequenos empreiteiros locais em países Andinos. As actividades vão desde microempresas para manutenção de rotina das estradas em áreas rurais ao envolvimento de microempresas na recolha de lixos e limpeza de ruas em áreas urbanas. No entanto, um estudo da OIT mostra que o acesso ao aprovisionamento público para pequenos empreiteiros locais ainda é muito limitado devido a barreiras jurídicas e institucionais. Por exemplo, alguns países podem restringir os contratos a empresas registadas no registo nacional de empreiteiros ou com engenheiros civis ou arquitectos certificados. Por isso, algumas regiões introduziram um ’cartão de pequeno empreiteiro’ e um registo para empreiteiros locais, permitindo que pequenos empreiteiros executem obras de pequeno a médio âmbito na área local, sujeitos a determinados requisitos mínimos. Fonte: Yeng e Cartier van Dissel 2004. OIT Tornar o Comércio Justo e Inclusivo O comércio a nível mundial aumentou nas últimas décadas, beneficiando grandemente uma grande parte da população mundial. Mas é possível fazer muito mais para reduzir a pobreza e melhorar as oportunidades para todos. Os mercados abertos governados por regras previsíveis permitem um negócio mais justo aos novos aderentes e aos que se iniciam, disponibilizando assim mais oportunidades, incluindo para todos quantos vivem na pobreza mas que anteriormente foram deixados de fora. Um sistema comercial interna e internacionalmente baseado em regras é portanto uma ferramenta niveladora útil de desenvolvimento. Infelizmente, a Ronda para o Desenvolvimento da OMC em Doha, chegou a um impasse. Os assuntos mais prementes para um melhor acesso ao mercado para os países em vias de desenvolvimento e melhores oportunidades para os países mais pobres, não conheceram qualquer progresso apesar dos louváveis esforços para construírem capacidade relativa ao comércio. Em muitos países, as políticas económicas internas não conseguiram estimular a criação de postos de trabalho e crescimento em termos de igualdade. Por exemplo, muitos países apoiam-se na extracção intensiva dos recursos naturais para conseguirem divisas, mas não a associaram a políticas para criarem novos negócios e postos de trabalho com ela relacionados. A abertura de mercados deve ser complementada pela gestão de mudança adequada. Da abertura dos mercados resultam ganhadores e perdedores, embora as medidas que os acompanham que expandem as aptidões, as infra-estruturas e redes de segurança podem ajudar a mitigar os efeitos negativos. Assim, as políticas relativas ao comércio são estimuladores importantes na promoção da mudança e da produtividade. crédito, bancos, e eventualmente, mercados de capital. O custo do capital é muito inferior, porque podem usar uma variedade maior de produtos financeiros, os prestamistas têm maior certeza de serem pagos e os investidores podem comercializar as suas acções mais facilmente. Quando as restrições de capital são menos duras, subitamente os novos investimentos passam a ser possíveis. Os empresários podem diversificar os seus riscos, e oportunidades que não seriam aproveitadas podem agora sê-lo. As empresas formais também têm maior possibilidade de empenhar-se em contratos e fazer A aquisição de poder por via da lei podia desempenhar um papel. A exclusão da propriedade, de negócios e dos direitos de trabalho restringem severamente as oportunidades para as pessoas e negócios de beneficiarem do comércio internacional. No México, por exemplo, apenas sete por cento dos negócios possuem estatuto jurídico e os documentos necessários para fazer negócios com os Estados Unidos e o Canadá segundo a NAFTA (Acordo Norte Americano para o Livre Comércio). Para o Perú, apenas dois por cento podem comerciar internacionalmente. Expandir o acesso aos direitos jurídicos permitiria que muitos mais negócios locais tivessem a oportunidade de beneficiarem do comércio. O snegócios registados têm maior sucesso, não só para outros mercados mas também nos recursos necessários para crescerem e receberem economias de escala e assim tornarem-se mais competitivos. O acesso ao financiamento é importante, mas o acesso à partilha de riscos também o é, assim como à informação e formação. A maioria dos pequenos agricultores e produtores industriais tem dificuldade em exportar. A sua incapacidade em penetrar nos mercados estrangeiros, muitas vezes reforça as desigualdades entre sexos, uma vez que as mulheres estão desproporcionadamente representadas nestas categorias. Necessitam de reformas de trabalho, empresariais e de propriedade para terem uma oportunidade para comerciar. Necessitam de produtos financeiros inovativos, assim como de serviços e medidas que protejam os trabalhadores informais no trabalho juridicamente garantido e regulamentado, assim como esquemas de seguros de saúde. com que outros entrem neles. Não necessitam de dedicar tanto tempo e recursos à monitorização dos respectivos agentes e parceiros. Acham mais barato e fácil fazer negócios com estranhos, mesmo distantes e não precisam de se apoiar em familiares, amigos chegados e contactos locais. Abrem-se-lhes novos mercados. As empresas formais também são mais fortes e adaptáveis. Uma vez que o capital de uma empresa consiste em bens tangíveis e intangíveis, tais como um bom relacionamento com os clientes, o seu valor é maior do que a soma das partes. Se o proprietário de um negócio formal- 55 mente registado decidir sair vendendo as suas acções, o valor destas pode ser imediatamente transferido. Num negócio informal, isto é impossível. Os bens da empresa são propriedade pessoal do proprietário, assim como as suas relações comerciais. Em resultado disso, empresas informais viáveis são amiúde dissolvidas e o capital acumulado é perdido. Por exemplo, quando o proprietário de uma empresa legalmente registada falece, os herdeiros herdam as acções na empresa. No caso de um negócio informal, os herdeiros herdam os bens físicos do negócio. Surpreendentemente, os negócios informais, quase sempre têm uma vida muito curta, e a maior parte do respectivo capital acumulado perde-se. Outro ponto fraco dos negócios informais é que normalmente não possuem uma hierarquia clara e funções especializadas. Porque contratar trabalhadores é oneroso e os contratos são impossíveis de impor, a maioria das tarefas tem tendência a ser concentrada nas mãos da família ou amigos próximos. A hierarquia familiar muitas vezes suplanta a do negócio e a eficiência tende a sofrer. Porque as empresas jurídicas podem impor contratos, podem contratar estranhos. Isto dá-lhes acesso a um leque muito maior de talentos. O registo jurídico também permite que as empresas dividam as responsabilidades entre trabalhadores especializados organizados através de hierarquias empresariais que tiram o maior partido dos talentos dos seus funcionários. Isto 56 México © Maaike de Langen aumenta substancialmente a produtividade. Os funcionários especializam-se no que sabem fazer melhor, enquanto os custos de processamento de informação, comunicação, coordenação de actividades de produção e aquisição e distribuição de conhecimentos são reduzidos. Vantagens da Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres As vantagens da aquisição de poder por via da lei são amplas e profundas, deixando florescer o potencial humano em resultantes espantosos. Esta é uma correspondência à escala do problema. E mais ainda, em troca a Comissão tem uma agenda abrangente. O desenvolvimento não Uma vez que os contextos é essencial que o programa a partir das condições e necessidades dos pobres. 4 Agenda para a Mudança tem soluções técnicas. nacionais e locais diferem, de reformas cresça realidade locais e das O estado tem o dever de proteger e os cidadãos o direito à protecção. Portanto, os ordenamentos jurídicos devem ser modificados, e esta modificação deve ser sistémica de modo a estabelecer um novo equilíbrio entre a autoridade dos governos e os direitos dos cidadãos. As condições das estruturas básicas das sociedades – ordenamento jurídico, o poder legislativo e o poder executivo – têm de ser reformadas. Este capítulo define um programa para a mudança, com uma série de medidas reformadoras para os quatro pilares da aquisição do poder por via da lei. Tem por base o trabalho de grupos de trabalho temáticos da Comissão, cujos relatórios são publicados separadamente. Apresenta alternativas viáveis para agências governamentais, para o sector privado, a sociedade civil (incluindo o mundo académico), e as organizações comunitárias de base. Uma agenda de reforma extensiva terá o maior impacte nas vidas das pessoas pobres. Contudo, como a situação difere de país para país, tanto no que diz respeito ao contexto nacional como aos desafios que são enfrentados pelas pessoas pobres, é crítico que a agenda reformadora cresça a partir das condições locais. Não existe uma única forma correcta de percorrer este caminho. Em alguns países, algumas políticas são mais urgente do que outras, e a calendarização e sequência das reformas irá variar. Cada país e as comunidades precisam de encontrar o respectivo caminho no processo da aquisição de poder por via da lei. Os pobres precisam de melhorar as suas vidas de forma incremental; a cada passo, uma combinação de reformas de aquisição de poder por via da lei deve estar disponível para eles. Uma Agenda Para Acesso à Justiça De modo a que o ordenamento jurídico tenha um papel significativo na aquisição de poder pelos pobres de modo a poderem escapar à pobreza, leis que conferem um misto de direitos, poderes, 59 Opções de Reforma Justiça • Sistemas de registo de identidade melhorados, gratuitos. • Sistemas alternativos acessíveis, financeiramente possíveis e eficazes de resolução de disputas. • Simplificação jurídica e normalização e campanhas de informação jurídica direccionadas para os pobres. • Sistemas de apoio jurídico mais fortes e quadros jurídicos alargados com para-jurídicos e estudantes de direito. • Reforma estrutural que permita que os grupos baseados nas comunidades repartam os riscos jurídicos entre si. Propriedade • Institucionalizar um sistema de governação de direitos de propriedade eficiente, que sistemática e massivamente conduza a economia fora do contexto jurídico para a economia formal e que garanta que permanece facilmente acessível a todos os cidadãos. • Promover um sistema de direitos de propriedade inclusivo, que reconheça automaticamente a propriedade de bens imóveis adquirida pelos homens em co-propriedade com as respectivas esposas ou parceiras de união de facto, assim como regras de herança transparentes. • Criar um mercado funcional para a troca de bens, que seja acessível, transparente e responsável. • Garantir que em todas as nações é legalmente obrigatório por lei o reconhecimento das propriedades e que todos os proprietários têm acesso aos mesmos direitos e normas. • Reforçar os direitos de propriedade, incluindo o título de posse, através de políticas sociais e outras políticas públicas, tais como o acesso ao alojamento, empréstimos a juros bonificados e à distribuição de bens fundiários do estado. • Directivas jurídicas para relocalização forçada, incluindo compensação justa. • Reconhecimento de uma variedade de títulos de posse fundiária, incluindo direitos tradicionais, direitos das populações indígenas, direitos de grupos, certidões, etc., incluindo a respectiva normalização e integração destas práticas no sistema jurídico. • Auditorias sobre propriedade fundiária pública com publicação das respectivas conclusões para desencorajar a tomada de posse ilegal de bens fundiários públicos. • Procedimentos simplificados para registo e transferência de propriedades fundiárias e bens. Labour • Direitos fundamentais no trabalho, especialmente liberdade de associação, negociação colectiva e não descriminação. • Melhoria da qualidade da regulação laboral e respectiva aplicação. • Abordagens inclusivas à protecção social, independentes da relação laboral. Direitos do trabalho (saúde e segurança, horas de trabalho, salário mínimo) abrangendo os trabalhadores na economia informal. • Mais oportunidades para instrução, formação e reciclagem. Empresas • Estruturas reguladoras e jurídicas adequadas, incluindo contratos comerciais obrigatórios, direitos sobre propriedade privada, utilização dos espaços públicos. • Transacções comerciais justas entre empresas informais e formais. Desenvolvimento financeiro e empresarial e serviços de marketing para as empresas informais. • Incentivos às microempresas, incluindo aprovisionamento governamental, redução fiscal e subsídios. Protecção social para os empresários informais. 60 remoto e se necessário a conjugação dos serviços de registo com outros serviços sociais ou práticas tradicionais. Requer também a criação de incentivos para o registo pessoal de identidade com o estado providenciando informação, trabalhando com intermediários locais de confiança e minimizando quaisquer condições adversas ao registo formal. O objectivo último não é aumentar o volume de registos mas sim melhorar o acesso a protecções e oportunidades. Apesar de, por si só, a distribuição de certidões de nascimento não conduzir a estes Ex-Jugoslávia (República Federal da) © UNICEF/HQ95-0848/Roger LeMoyne objectivos, é claramente um elemento de um programa reformador alargado de aquisição de privilégios, e imunidades são necessárias – tanto poder por via da lei. assim como as reformas das instituições públicas e um sistema jurídico e judicial que possam fazer com Melhorar o acesso à justiça através que essas atribuições legais tenham sentido prático. dos meandros da burocracia Tal como parte do acesso ao esforço da justiça é governamental necessário auditar todas as leis, regulamentos, e configurações institucionais. Leis que descriminam Muitas pessoas apoiam-se no sistema burocrático, contra os direitos, interesses e as vidas dos pobres seja ele relacionada com a administração territoprecisam de avaliação e de revisão. rial ou com o planeamento urbanístico, ou com o registo de bens e negócios, ou esquemas de Garantir que todos têm uma acesso a créditos púbicos, etc. Estes sistemas identificação legal A identificação legal é a pedra angular do acesso à justiça Uma identidade legal para todos requer que um determinado número de problemas seja endereçado. Estes incluem a falta de capacidade dos sistemas de registo de identificação dos países, a eliminação de taxas associadas ao sistema, apoio ‘A lei não é uma coisa que se inventa numa universidade; a lei é algo que se descobre. As populações pobres já têm acordos entre si, contratos sociais, e o que é necessário fazer é normalizar profissionalmente estes contratos para criar um sistema jurídico reconhecido e respeitado por todos.’ Hernando de Soto 61 Levando em consideração o papel das Ordens de podem parecer abertos a abuso por aqueles que Advogados tanto a nível nacional como internaestão no poder, servindo os interesses de poucos, cional, encorajar uma relação de trabalho eficaz através da corrupção e falta de transparência, com a Ordem é importante no desenvolvimento em vez de actuarem, para muitos, como uma de programas de apoio judiciário direccionados e estrutura de aquisição de poder. Portanto, a que funcionem. As Ordens de Advogados podem reforma tem de incluir tanto o melhoramento ajudar a agregar e disseminar informação pela do acesso aos sistemas de justiça bem como ao comunidade forense sobre os problemas do tratamento justo dentro da burocracia governaacesso à justiça, podem ser úteis na vigilância mental. Endereçar os problemas do sistema buroe na promoção do apoio político à reforma do crático pode levar a reformas na administração acesso à justiça e ao aumento de financiamento pública tais como a melhoria nas adjudicações para os serviços de apoio judiciário necessários. públicas e nos casos de reclamação de direitos, Podem também ajudar a identificar os candicom a prossecução da reforma do funcionalismo datos mais adequados para o apoio judiciário e público de modo a expandir as oportunidades para incentivos de desempenho na administração pública, e o aumento No Bangladesh, por exemplo, o divórcio oral da descentralização e da duplicação é proibido pela constituição, mas continua na prestação de serviços. A reforma predominante nas comunidades rurais pobres. do enquadramento jurídico-administrativo, incluindo as extensões bem Uma ONG do Bangladesh concluiu que a simples enquadradas das leis da liberdade informação dos membros dos tribunais tradicionais de informação, têm incidência locais que o divórcio oral não era permitido, reduziu sobre os relatórios de impacte e a substancialmente esta prática. Também foi possível protecção de informadores, bem introduzir normas da legislação nacional nas como a revisão jurídica cirúrgica deliberações da comunidade, práticas de mediação e do processo administrativo, podem normas tradicionais. Fonte: Golub 2000 também ser factores importantes no acesso à justiça administrativa. eventualmente patrocinar programas de formação Alargamento do âmbito dos serviços judiciária com o objectivo de ir ao encontro das de apoio judiciário para os pobres necessidades dos pobres. O acesso à justiça baseia-se em grande medida As reformas relacionadas incluem o aumento da num acesso, dentro de critérios de razoabilidade, capacidade dos pobres de assegurar financiaaos serviços de apoio judiciário. Isto pode ser mento para acções judiciais com decisão favoconseguido de várias maneiras. Uma delas é, de rável positiva e mais oportunidades para acções forma gradual, a liberalização do mercado dos judiciais em representação ou conjuntas tais como serviços de apoio judiciário reduzindo barreiras acções populares. A última requer a liberalização regulamentares de acesso – tais como “práticas adequada do mercado para tal financiamento, o de serviços de apoio judiciário não autorizadas” – qual pode incluir mais oportunidades para acordos para prestadores de serviços, incluindo os que não de honorários condicionados, investimento de tersendo advogados, estão interessados em oferecer ceiras partes em acções judiciais e sub-rogação de apoio judiciário aos pobres. Uma outra é conceber acções judiciais. Porquanto que as acções popusistemas de apoio judiciário, os quais podem lares têm as suas limitações, as situações em que dar mais ênfase à prestação de para-jurídicos67 um grande número de vítimas do mesmo caso ou e estudantes de direito, e a agregação do apoio de casos semelhantes (muitas vezes de pequena judiciário com outros serviços. 62 monta) poderem dar seguimento a essas acções de forma colectiva, têm vantagens em termos de acessibilidade para as vítimas e consequentemente o respectivo acesso à justiça. Gestão dos tribunais fiabilidade dos serviços judiciais. Incentivar os tribunais a prestar a devida consideração aos interesses dos pobres Os tribunais em países com ordenamentos jurídicos consuetudinários (comum) e civis encontraram novas formas abordar a injustiça. Os juízes são capazes de fazer com que todos os direitos humanos – tanto do campo civil como político, bem como do económico, social e cultural – sejam sujeitos à lei. Acções de litígio social e de interesse público no Sul da Ásia e na África do Sul mostraram como os tribunais adquiriam o poder de se transformarem na voz institucional dos pobres. Estas inovações devem ser reconhecidas e incorporadas em políticas de melhoramento do acesso à justiça em todos os países.68 Permitir às organizações judiciárias a aplicação de preceitos e normas de direitos humanos internacionalmente consagrados no julgamento de litígios sob o enquadramento legal nacional será muito importante para fazerem com que o sistema jurídico seja mais Em 2004, o Governo da Sérvia começou a introdução capaz na aquisição de poder pelos de um sistema de gestão automatizado no sistema dos pobres. T odas as pessoas, principalmente os pobres, devem ter um acesso significativo aos tribunais para resolver acções litigiosas e garantir os seus direitos contra abusos pelo estado ou por interesses privados. Em primeiro lugar isto requer um número suficiente e geograficamente disperso de tribunais para a população os poder aceder e condições para que todos os cidadãos compreendam o andamento processual. Melhoramentos na gestão e na organização dos tribunais podem ir longe no que toca à facilitação da utilização dos próprios tribunais, incluindo centros de apoio e quiosques de informação que permitam aos cidadãos o acesso à informação sobre os seus casos e sobre o andamento processual dos mesmos. O trabalho necessário tribunais comerciais, que há muito era um bastião de corrupção. O novo sistema selecciona os juízes aleatoriamente, cobra aos litigantes honorários normalizados, e permite aos cidadãos acompanhar em linha o desenvolvimento dos respectivos casos. O respectivo aumento em transparência, eficiência e justeza teve como resultado uma diminuição de 24 por cento no inventário de casos pendentes durante o ano de 2006, e entre 2004 e 2006 uma redução de 38 por cento no tempo necessário para fazer cumprir um contrato. para criar ou melhorar a rede de tribunais a nível nacional é difícil e longo, e muitos projectos anteriores não tiveram resultados favoráveis para os pobres. Contudo, um número de projectos de sucesso foi levado a cabo, especialmente em países de rendimentos médios, os quais serviram para incrementar a imparcialidade, rapidez e Melhorar a resolução informal e consuetudinária de litígios Embora muito do enfoque da agenda da aquisição de poder por via da lei estar centrada em como atingir essa capacitação através das instituições formais do estado, a grande maioria dos pobres no mundo apoia-se em sistemas de justiça fora do âmbito do estado ou seja em sistemas informais. Portanto, é vital considerar os processos de justiça fora do âmbito do estado. Estruturar de forma apropriada a relação entre o sistema estatal e o não estatal é crucial. As reformas em sistemas jurídicos pluralistas podem incluir a combinação formal ou o reconhecimento tácito do sistema de justiça fora do âmbito do estado com campanhas 63 Iraque © UNICEF/HQ03-0488/Shehzad Noorani de consciencialização e instrução que promovam a evolução do sistema informal de justiça. Condicionantes objectivas no sistema não estatal são também importantes, em particular no que concerne aos limites de práticas que perpetuam a subordinação das mulheres. Estes sistemas podem também ser reforçados com o apoio da sociedade civil e de organizações comunitárias de base. Em muitos contextos, os Tribunais Arbitrais (TAs) podem ser considerados um sucesso. Estes mecanismos oferecem protecção eficaz dos direitos e/ou resolução eficaz das contestações de litígios resultantes de disposições sobre atribuição de propriedades, especialmente para mulheres privadas de direitos civis. Em geral, o sucesso de métodos alternativos de resolução de conflitos depende de certas práticas e normas, tais como o direito de pessoas pobres nomearem um juiz árbitro da sua escolha para a resolução do conflito. Mas é igualmente imperativo que os mecanismos alternativos de resolução de conflitos sejam reconhecidos com legítimos e ligados ao cumprimento formal da lei e que não funcionem completamente fora do âmbito do sistema judicial formal.69 64 Promover a auto-ajuda com informação e organização das comunidades Enquanto existe uma certa tendência para equacionar o acesso ao sistema de justiça como o acesso aos serviços de apoio judiciário, na premissa que o único caminho para a justiça é através de causídicos e dos tribunais, muitas vezes a primeira (e algumas vezes a única) opção que resta a uma pessoa pobre é ver o que consegue fazer por ela própria. A aquisição de poder pelos pobres através da disseminação de informação jurídica e da formação de grupos de pares (auto-ajuda) são as primeiras estratégias em direcção à justiça. Os pobres podem não receber a protecção ou ter as oportunidades às quais têm legalmente direito porque não conhecem a lei ou porque não sabem como fazer para assegurar o apoio de alguém que lhes possa dar a ajuda necessária. As tecnologias de comunicação e informação estão particularmente bem posicionadas para apoiar intervenções orientadas para o fortalecimento de grupo de partilha de informação, ensinando os pobres acerca dos respectivos direitos, e incentivando a formação jurídica não formal. Uma Agenda sobre os Direitos de Propriedade Promoção de um sistema inclusivo de direitos de propriedade Um sistema inclusivo de direitos de propriedade em prol dos pobres requer regras que definam claramente o conjunto de direitos e obrigações entre as pessoas e os bens. O direito de propriedade deve oferecer opções claras e simples de personalidade jurídica e de propriedade societária para pequenos negócios e para as associações tradicionais de pobres. A protecção jurídica de limitação de responsabilidade tem de ser ampliada aos micro empresários e os direitos de protecção contra posse indevida devem ser reconhecidos tanto apara os bens tangíveis como para os intangíveis. Os enquadramentos jurídicos que permitem a associação de habitação própria e de posse fundiária devem ser promovidos, permitindo que a propriedade individual e co-propriedade sejam combinadas por pessoas com recursos limitados. Registos de propriedade oficialmente reconhecidos devem ter a forma de certificados simples que conferem reconhecimento formal a práticas sociais e posse tradicional. O estado deve valorizar a base de bens dos pobres permitindo co-propriedade comunitária. Em alguns ordenamentos jurídicos a co-propriedade comunitária de recursos naturais tais como pastos, terras, florestas, recursos hídricos, recursos piscícolas e minérios de superfície são meios tradicionais eficazes de garantirem controlo e direitos de propriedade a pessoas que têm poucos ou mesmo nenhuns bens. Estes sistemas devem ser ambos reconhecidos e totalmente protegidos contra apreensão arbitrária. Ao mesmo tempo, às comunidades deve ser-lhes dada a opção de reconhecerem direitos de propriedade individual dentro da comunidade e alargando-os a pessoas alheias. Mas dependendo do contexto, se operadores privados quiserem explorar estes recursos, e/ ou colocá-los fora do controlo comunitário, com a comunidade afectada a depender para as suas vidas e destino desses recursos, o estado pode ter interesse em intervir, a pedido ou em representação desta comunidade. Em geral a utilização de recursos naturais deve ser regulamentada por regras e normas claras e previsíveis, que são aplicáveis não só à comunidade como também aos proprietários privados. Devem ser feitos esforços para garantir os direitos de propriedade a moradores em habitação urbana degradada e a ocupantes ilegais de terrenos públicos rurais usando um conjunto de medidas que incluem mecanismos de financiamento, providenciando-lhes documentação adequada relativa às propriedades já ocupadas, ou dandolhes alternativas adequadas. Os mercados do arrendamento muitas vezes dão o primeiro passo em colmatar a falta, pelos pobres, de bens fundiários. Garantias mais fortes e transparentes devem reforçar a posição dos pobres nas zonas rurais e urbanas em termos de arrendamento. Por meio do casamento ou da união de facto, a propriedade imobiliária e a propriedade pessoal detida pelo parceiro masculino deve ser automaticamente considerada como co-propriedade da mulher. As regras sucessórias devem abranger tanto os herdeiros masculinos como os femininos recebendo equitativamente as disposições testamentárias de modo a evitar que os elementos femininos sejam deserdados. As leis do divórcio devem tratar equitativamente tanto homens como mulheres. A promoção de um sistema de direitos de propriedade inclusivo que incorpore medidas para fortalecimento da posse requer aprendizagem através de experiências múltiplas com base em programas individuais de registo de propriedade. Para garantir protecção e a inclusão dos mais pobres, um conjunto alargado de políticas deve ser considerado. Estas incluem o reconhecimento formal, a representação oficiosa e a integração de um conjunto de formas de posse fundiária tais como direitos consuetudinários, direitos de populações indígenas, direitos de grupos e certificados. O sucesso depende em grande medida de reforma extensiva do sistema de governo que regula os 65 direitos de propriedade, como é analisado a seguir. Estes sistemas têm de ser de fácil acesso, baratos, transparentes e libertos de complexidades. Acima de tudo, os pobres têm de estar protegidos de despejos arbitrários por devido processo legal e ter direito a compensação integral. As reformas devem ser acompanhadas por mecanismos inovadores de política social, incluindo disposições para dar financiamento acessível para habitação própria, meios de subsistência, infra-estruturas e serviços básicos. A condução de auditorias sobre propriedade fundiária pública e a publicação dos resultados pode reduzir o número de apropriações indevidas de bens fundiários públicos. Nas terras baixas da Bolívia oriental, os direitos de posse de terras estão no centro de um acordo pioneiro para preservar tanto o modo de vida de populações indígenas como uma extensão única de floresta tropical seca. Negociações entre o Governo e os Guarani-Izoceno tiveram como resultado duas decisões marcantes. A primeira preservou 3,4 milhões de hectares de floresta desabitada do Gran Chaco como parque nacional. A segunda atribuiu o título de posse de Guarani-Izoceno a 1,5 milhões de hectares como território indígena comunitariamente detido. Para os Guarani-Izoceno, o resultado foi um compromisso pragmático, segundo o qual desistem de qualquer pretensão de posse da floresta do Gran Chaco mas adquiriram os direitos únicos de explorarem a terra e florestas do território de que têm posse. Fonte: A Riqueza dos Pobres 2005 A institucionalização de um sistema de governação eficaz dos direitos de propriedade O funcionamento das agências de administração de propriedades e da administração fundiária é crucial para os pobres. As regras são recursos que podem ser facilmente subvertidos para servirem interesses de minorias, por exemplo através da corrupção e da falta de transparência. Portanto, a estrutura de governação e o desempenho de tais sistemas deve ser analisado e se necessário reformado. A separação dos poderes do registo de propriedade fundiária e da gestão fundiária é uma reforma que reduzirá o risco de práticas abusivas. Adicionalmente, as agências de administração devem ter repartições de fácil acesso para os pobres e em geral descentralizadas, os sistemas responsáveis de governação e de gestão fundiária devem ser desenvolvidos, especialmente onde possam acrescentar valor aos mecanismos tradicionais tais como os da resolução de conflitos. O tempo e o custo do registo de propriedade formal deve ser diminuído. Para garantir que as propriedades de uma nação são reconhecidas e legalmente garantidas pelo ordenamento jurídico, todos 66 os proprietários devem ter acesso aos mesmos direitos e normas. Isto permite que a economia paralela possa ser deslocada de forma massiva e sistemática no sentido da economia formal. Os números de passos que os compradores e os vendedores devem seguir para formalmente executarem a transferência propriedade devem ser mínimos. As responsabilidades dos vários escalões do governo na gestão de bens fundiários públicos devem ser claramente definidas. Limites estritos devem ser impostos na capacidade do estado poder expropriar terra. A estrutura jurídica deve ser imposta de forma adequada e ser suficientemente coerente para que não entre em conflito com outras leis relacionadas com a propriedade as quais possam privar grupos vulneráveis dos respectivos direitos civis. Entre as leis e códigos que devem ser revistos, quanto à respectiva consistência, são as leis da propriedade, leis de garantias adicionais, leis do código civil, leis de família, leis sucessórias e legislação relativa ao casamento. Os sistemas manuais de registo de propriedade fundiária requerem um aturado trabalho manual e induzem erros e duplicações. Os custos do registo de propriedade podem ser consideravelmente reduzidos e a respectiva transparência aumentada, através de sistemas informáticos e de GPS, especialmente onde registos completos ainda não existem. Contudo há três advertências a fazer. A corrupção pode facilmente aumentar a fase inicial da digitalização, embora possa ser drasticamente reduzida uma vez que os sistemas estejam implementados e a funcionar. Um passo crucial é a validação dos dados, ao nível local, com as pessoas a quem lhes dizem respeito. Em segundo lugar existe o perigo de sobre dotação tecnológica. As soluções técnicas só são sustentáveis se estiverem alinhadas com as infra-estruturas, os recursos e as capacidades disponíveis localmente. A administração fundiária só será independente das pressões das partes socialmente poderosas se puderem manter o seu funcionamento permanente de forma financeiramente independente. Em terceiro lugar, a informatização e as correcções de base tecnológica não farão qualquer diferença se o sistema de governação da propriedade no seu sentido lato continuar sem reformas e inacessível aos pobres. As soluções tecnológicas na falta de reformas institucionais e jurídicas a favor dos pobres podem perturbar mais do que serem benéficas. O registo de propriedade tem de ser complementado com a definição de zonas e com planeamento. A formação de guetos pode ser evitada impondo a utilização da terra de modo misto. Nos casos onde zonas degradadas ocorreram, é essencial criar um ambiente protector e capacitante de residência e actividade laboral para os pobres, através de zonas especiais de interesse social. A elevação do nível de bairros degradados deve incluir os registos de propriedade para as parcelas, com um mínimo de desenvolvimento do serviços e condições para a melhoria incremental da infra-estrutura. Isto ajuda a dar aos pobres a posse sustentada e a participação no valor incremental da propriedade. Desenvolver mercados de propriedade e de crédito acessíveis aos pobres Um sistema de propriedades e de negócios integral e funcional permite que bens fundiários, imobiliários, pessoais, mobiliários e ideias sejam transformados em bens que sendo alavancados podem ser comprados e vendidos, a valores determinados pelas forças do mercado, de modo transparente e explicável. Deve permitir o desenvolvimento de mecanismos financeiros – incluindo o crédito e seguros – para facilitar transacções e melhorar os resultados económicos. O mercado deve ser estruturado para permitir aos pobres tirar o máximo partido dos seus bens. Deve ser dada orientação para a elaboração dos contratos, com a minimização de pré-requisitos para compra de bens fundiários que excluam os pobres – tais como o requisito de formação escolar agrícola formal – e a elaboração de contratos de compra e venda em que os pobres possam confiar. Regras de Leasing devem ser simples e claras, serviços notariais e emolumentos para pequenas transacções devem ser eliminados e os pequenos ou novos proprietários isentos de impostos e emolumentos de registo. Os direitos de preferência dados a co-proprietários, vizinhos, ou rendeiros devem ser considerados desde que não resultem daí apropriações arbitrárias. Adicionalmente, tectos na aquisição de propriedade ou prazos alargados de pagamento das vendas são consideradas práticas protectoras com sucesso, desde que sejam limitadas no tempo e que esse tempo seja utilizado para formação jurídica e financeira. Considerar os bens pessoais como garantia financeira Existe um crescendo de prova que aumentando o número de itens que podem ser utilizados legalmente como garantia financeira reduz o custo do crédito. Mais pessoas podem aceder ao crédito se mais tipos de propriedade puderem ser utilizados como garantia e se os mercados do crédito se tornarem mais concorrenciais. Um maior número de pobres teria acesso a criar historiais de crédito sem por em risco as suas terras e as suas casas. O sistema de crédito não se transforma automa- 67 ticamente a partir da formalização dos registos dos bens. Uma acção catalisada e consertada do estado e das instituições financeiras é necessária de modo a promover o acesso ao crédito para famílias pobres e para pequenos produtores urbanos e rurais. Um meio complementar de apoio aos mercados de crédito direccionados aos pobres deve ser feito através da criação de registos de bens pessoais. Reforçar direitos de propriedade através de políticas sociais e outras O estado pode fazer muito para dotar os seus cidadãos com bens imóveis – por exemplo, dando acesso aos pobres à posse de habitação, oferecendo crédito imobiliário de baixa taxa de juro e distribuindo bens fundiários do estado. A reforma de redistribuição agrária necessita de ser complementada, para os novos proprietários, com o acesso a serviços básicos, tecnologia, crédito e mercados. Como alternativa a relocalizações forçadas de terras, o projecto de reforma de bens fundiários com base na comunidade providenciam aos grupos de beneficiários fundos para a compra desses bens. O suprimento de fundos é disponibilizado sob a condição de terem um fim produtivo e quando os mercados de bens fundiários estiverem suficientemente desenvolvidos. O procedimento é juridicamente menos complicado e menos sensível do ponto de vista político do que os programas de aquisição compulsiva. Condicionantes legais relativos aos beneficiários permitem a busca de outros fins sociais, tais como a distribuição de bens fundiários comprados em nome de mulheres. A dimensão da consciencialização da posse de habitação própria e da informação sobre direitos tem um impacte significativo nos investimentos em bens fundiários e na produtividade. Somente uma minoria de trabalhadores agrícolas está ciente das disposições legais relevantes. Isto implica que a maior fatia dos ganhos de produtividade associados com o registo de bens fundiários terá de ser objectivada através da formação e da informação. Consultas múltiplas e o envolvimento de organi- 68 zações sociais contribuem para uma mudança na equação do poder e no aumento da satisfação e eficiência da reforma da propriedade. Em particular a comunicação e participação activas da sociedade civil, são factores importantes para garantir a qualidade de mudança sistémica no regime de direitos de propriedade. Num âmbito mais alargado, tais medidas contribuem para alimentar tanto a coesão social como a cidadania. A indústria da construção emprega mão-de-obra local, faz recircular os rendimentos pela economia local e contribui para o desenvolvimento de trabalho especializado. O governo pode ter um papel catalisador na promoção da habitação proporcionando crédito e juntando o sector privado e outras organizações de pobres da sociedade civil para criar condições favoráveis ao desenvolvimento de esquemas de habitação social e em última análise de posse pelos pobres. P or último, o governo pode também ter um papel de intermediário nas negociações entre o proprietário do bem fundiário e os seus ocupantes de baixos recursos em situações em que os legítimos proprietários têm pouca esperança de recuperar a propriedade ocupada sem contencioso prolongado e onde recuperar parcialmente o bem tem muitas vantagens. Uma Agenda sobre os Direitos do Trabalho Em última análise, o objectivo dos direitos laborais é garantir a livre escolha de trabalho produtivo, realizado em condições de liberdade, dignidade e igualdade – em suma uma ‘uma agenda de trabalho digno’. O conteúdo específico de um programa de trabalho digno, que foi reconhecido como um objectivo global,70 é mais bem definido ao nível de cada país através do diálogo social. O objectivo é tornar o emprego como um objectivo central das políticas económicas, e dar melhorias graduais na qualidade do trabalho e proveitos para os trabalhadores, incluindo a imposição dos direitos do trabalho como sendo a via principal para sair da pobreza. Índia © OIT / M. Crozet Muitos códigos de conduta de voluntariado bebem dos princípios fundamentais e direitos do trabalho, tais como a proibição de trabalho forçado, trabalho infantil, e discriminação laboral, e têm por base os normativos da OIT. São ferramentas importantes para motivarem as corporações multinacionais a melhorarem o respectivo desempenho e estão actualmente a ter um papel importante no fortalecimento dos direitos do trabalho, no momento em que as empresas estão mais sensíveis às reacções éticas dos consumidores. Esforços para No Quénia, tanto as transferências de dinheiro como fortalecerem os direitos do trabalho os programas de emprego ajudam a melhorar as devem ter enfoque no seguinte: As instituições que ajudam a criar emprego, melhores regulamentações laborais e impõem princípios fundamentais e direitos no trabalho, precisam de ser fortalecidas de modo a criarem sinergias entre a protecção dos trabalhadores pobres, a sua produtividade e a dos seus bens. Instituições e regulamentos devem ser revistos examinando os respectivos impactes na criação de riqueza e na protecção laboral. capacidades das pessoas, especialmente das crianças. As transferências de dinheiro que aumentam o rendimento dos agregados familiares pobres podem ser suficientes para melhorar a instrução e saúde das crianças se houver um fornecimento adequado desses mesmos serviços. Mas é possível que um programa de emprego tenha um impacto de multiplicação mais forte do que as prestações familiares se ajudar a desenvolver a infra-estrutura económica e social. Se esse tipo de programa incluir a construção de clínicas e escolas por exemplo, pode dar um impulso ao fornecimento dos serviços sociais. Fonte: Centro Internacional para a Pobreza 2007 Fortalecimento da identidade, da voz, da representação e do diálogo O processo de aquisição de poder por via da lei inicia-se com a identidade. Do mesmo modo que a propriedade e os bens físicos dos pobres são reconhecidos, também o seu maior bem, o seu trabalho e capital humano, deve ser eficazmente reconhecido. Existe uma necessidade específica de garantir que os trabalhadores e os empresários na economia informal 69 têm o direito de liberdade de associação através de organizações da sua livre escolha e direito à negociação colectiva, em particular as mulheres e os jovens que estão sobre representados na economia informal. Deve ser dada ênfase ao crescimento de organizações de representação dos trabalhadores pobres, em particular de trabalhadores assalariados e por conta própria que operam na economia informal, para terem voz, representação e diálogo com os operadores da economia formal e com as autoridades públicas, de modo a poderem defender os seus direitos. O fortalecimento da qualidade dos regulamentos do trabalho a imposição eficaz dos princípios fundamentais e direitos do trabalho O objectivo é criar sinergia entre a protecção e a produtividade dos trabalhadores pobres e os respectivos bens. A análise da qualidade das instituições e das regulamentações deve envolver uma revisão crítica e autocrítica dos instrumentos legais do ponto de vista dos impactes sobre a produtividade e a protecção do trabalho. Apoiar, na economia informal, um pacote mínimo de direitos do trabalho Um pacote mínimo de direitos do trabalho deve ser estabelecido e imposto para os trabalhadores pobres na economia informal com uma convergência gradual e progressiva para os direitos do trabalho da lei geral. Isto deve sustentar e ultrapassar a Declaração de Princípios Fundamentais e Direitos do Trabalho com três aspectos adicionais relacionados com as condições do trabalho: higiene e segurança no trabalho, horários de trabalho e salário mínimo. Tal plataforma mínima para a aquisição de poder deve ser realista e de imposição exequível. O progresso no sentido de um conjunto mais completo de direitos do trabalho deve ser esperado. Fortalecimento do acesso às oportunidades Políticas para criação e promoção de acesso melhorado dos pobres a melhores oportunidades 70 de emprego a tempo inteiro produtivo e de livre escolha, como promovido pela Convenção 122 da OIT, podem fornecer um mecanismo chave para a aquisição de poder pelos pobres na economia informal e facilitar a sua transição para o mundo formal. As oportunidades para instrução e para a aquisição de competências, bem como as medidas para combater a discriminação, ajudam a aumentar o reconhecimento legal dos pobres e também a conduzi-los para mais próximo das novas oportunidades económicas. Apoiar protecção social inclusiva O reconhecimento do direito à segurança social foi desenvolvido através de instrumentos universalmente aceites, tais como A Declaração Universal dos Direitos do Homem e o Convénio Internacional sobre Direitos Económicos Sociais e Culturais, os quais proclamam que a segurança social é um direito fundamental da sociedade a que todos os seres humanos têm direito. Isto deve ser garantido em todos os países através de legislação, instituições, e mecanismos que dêem resposta, os quais podem proteger os pobres de abalos e contingências que os podem fazer empobrecer e de medidas que garantam o acesso a cuidados médicos, seguros de saúde, pensões de velhice e serviços sociais. Estes mecanismos não devem apenas estar dependentes da prova do status do emprego mas devem estar abertos a todos os tipos de trabalhadores. De uma perspectiva sistémica os direitos a pensões e à protecção na doença devem ser dados às pessoas como cidadãos e não como trabalhadores e conferidos com base nos princípios universais. Promover a igualdade dos sexos A pobreza tem uma dimensão de género e a aquisição de poder por via da lei pode ajudar a promover a igualdade dos sexos. Um desafio chave é garantir que os padrões laborais da OIT, os quais promovem a igualdade de oportunidades e tratamento, são eficazmente ampliados aos trabalhadores do sector informal.71 O ponto de partida para este processo está situado na igualdade de género dos padrões essenciais do trabalho. Uma Mais de 90 por cento dos trabalhadores na Índia, encontram-se na economia informal (incluindo os trabalhadores agrícolas), com pouca – se alguma – segurança social estatutária. A maioria são trabalhadores ocasionais, trabalhadores a contrato e à peça e trabalhadores independentes por conta própria. Recentemente, o Governo Indiano lançou o Esquema de Segurança Social dos Trabalhadores do Sector Não Organizado em 50 distritos, numa base piloto. O esquema disponibiliza três protecções básicas: pensão de velhice, seguro de acidentes pessoais e seguro médico. É obrigatório para os empregados registados e é voluntário para os trabalhadores por conta própria. Os trabalhadores contribuem para o esquema, assim como a entidade empregadora. Nos casos dos trabalhadores por conta própria que pretendem aderir ao esquema, estes pagam a contribuição do trabalhador e da entidade empregadora. O governo também contribui. Centros de Apoio aos Trabalhadores estão a ser instalados para apoiar os trabalhadores (ver acima em Direitos de Segurança dos Trabalhadores Informais). O esquema será implementado através dos gabinetes da Organização da Previdência dos Trabalhadores, já Fonte: Governo da Índia, 2004 existentes em todo o país. orientação útil pode ser encontrada na Convenção do Trabalho em Casa da OIT do ano de 1966,72 a qual confere a extensão da protecção legal e da aquisição de poder por via da lei a trabalhadores que trabalham a partir de casa (subcontratados da indústria que trabalham a partir das respectivas casas), que são predominantemente mulheres. Uma Agenda sobre os Direitos de Comerciar Muitos países desenvolvidos emergem de uma história carregada de regulamentações muito rigorosas, com aprovações necessárias memos para as actividades menores e com uma sobre centralização e inflexibilidade das autoridades. Com uma produção legislativa de fraca qualidade durante muitos anos foi criada uma teia complexa e inconsistente de legislação que impõe uma barreira regulatória assustadora para a criação formal de futuras empresas. Assim, tais sistemas regulatórios nesses países não estão desenvolvidos para apoiar uma economia de mercado florescente que criará crescimento e empregos na economia formal. Sob este enquadramento, os pequenos negócios informais devem muitas vezes assumir maiores riscos do que as empresas normalmente maiores e formais e gastam mais tempo e recursos em controlar agentes e sócios, o que explica a razão de normalmente empregarem parentes e amigos próximos. Escolhem com frequência negócios de baixo risco que muitas vezes lhes dão retornos baixos. Operam com um montante limitado de capital e como resultado disso, são forçados a fazerem negócios numa pequena escala. Uma vez que dificilmente conseguem a acumulação de capital, é muitas vezes muito difícil para estes empresários vender os respectivos negócios e lucrar dos activos tanto tangíveis como intangíveis que acumularam.73 A política económica e o código comercial e das sociedades comerciais, os quais estão vocacionados, na maioria dos países pobres, para as grandes empresas, têm se ser alterados para incluírem o número vastíssimo de detentores de negócios que se situam na base da pirâmide económica. A reforma destas políticas e das estruturas jurídicas devem focar-se em ajudar os negócios informais a utilizarem todos os seus activos de modo a que funcionem como empresas produtivas e rentáveis. Os elementos chave relativos aos esforços em atingir tais objectivos incluem: Um conjunto de direitos de comerciar sustentados em políticas e institucionalizados e impostos através de organismos reguladores. 71 São Tomé e Príncipe © UNICEF/HQ97-1186/Giacomo Pirozzi Independentemente da respectiva dimensão ou potencial de crescimento, os direitos de todos esses negócios informais devem ser reconhecidos. Estes incluem o direito ao trabalho e à criação e registo de sociedades comerciais, os quais necessitam de competências comerciais, de ocupar um espaço físico e acesso a infra-estruturas básicas tais como um tecto, electricidade, água e saneamento. Com o crescimento dos negócios informais, estes irão precisar de protecções e direitos jurídicos adicionais, tais como a capacidade para obterem benefícios fiscais, licenças de exportação e acesso a serviços logísticos e de comunicações. Esforços para fortalecer os direitos básicos de comerciar devem ser baseados num conhecimento profundo das práticas locais, e onde for possível, devem ser incorporados na estrutura legal. É também importante a criação de mecanismos e de financiamento que providenciem protecção social a empresários informais, tal como existem mecanismos jurídicos que ajudam as pessoas a operarem e a expandirem os respectivos negócios uma vez que entrem no mercado. A ausência de direitos das sociedades comerciais, incluindo regras relativas a blindagem de entidades, responsabilidade limitada e blindagem do 72 capital e sucessão perpétua da firma bem como direitos de responsabilização de gestores e funcionários e a protecção dos pequenos accionistas, aumenta a probabilidade dos negócios evoluírem para a informalidade. Procedimentos administrativos mais optimizados As barreiras administrativas são os requisitos burocráticos que emanam dos regulamentos, da respectiva implementação e imposição. Um regulamento pode estar bem concebido, ser equilibrado e eficiente, mas o seu verdadeiro efeito nas empresas advém do modo como é implementado. As barreiras administrativas são um incómodo que dissuade as empresas informais de interagirem com as autoridades governamentais74. As regulamentações impostas às empresas incidem sobre várias categorias. Alguns regulamentos que governam os negócios na sua infância aumentam os custos de entrada na economia formal. Outros regulamentos governam a actividade das empresas em fase de cruzeiro e outras ainda estão afectas ao fecho das empresas. As autoridades centrais ditam alguns destes regulamentos enquanto as autoridades autárquicas e regionais ditam outras. Mais ainda, as pequenas empresas enfrentam os custos impostos pelo governo nas áreas laborais, custos salariais, normas de higiene e segurança, impostos e custos com a exportação. Os recursos financeiros e de tempo gastos no cumprimento das regulamentações governamentais impõem sobre as empresas custos por transacção onerosos. Adicionalmente o custo directo de pagamentos, tais como o de licenciamentos, representa também um custo significativo de fazer negócio. Inversamente, os pagamentos feitos para evitar a detecção de não conformidades ou os subornos a representantes governamentais, são os custos de operação no sector informal. O formalismo administrativo e os custos envolvidos no registo ou na obtenção de licenças para uma empresa precisam de ser reduzidos e que a todos os empresários lhes seja dado o acesso facilitado. Um acesso mais abrangente aos serviços financeiros e apoio à inovação em produtos financeiros O acesso ao financiamento é crucial para as empresas. Contudo, as empresas na economia informal têm falta de acesso aos mercados financeiros e falta de capacidade para competir em mercados de produtos. O acesso melhorado aos serviços financeiros básicos consistindo em poupança, crédito, seguros, pensões e ferramentas para gestão do risco, são um dado crítico para empresários emergentes ou potenciais alavancarem oportunidades económicas e melhorarem a respectiva qualidade de vida. Mercados financeiros mais inclusivos necessitam que haja sensibilização dos sistemas de crédito formal e informal quanto ao modo como os trabalhadores pobres usam o crédito e as barreiras e regras desajustadas dos procedimentos dos empréstimos formais. Precisam também de terem instalado processos legais e administrativos que tornem o processamento das garantias – incluindo bens pessoais bem como garantias sociais – mais baratas, transparentes e rápidas. È também necessário dar apoio à inovação nos produtos e serviços financeiros, com o objectivo de aprofundar o seu âmbito. Consulta, participação e definição de regras inclusivas Os negócios informais e os respectivos representantes precisam de ser consultados bem como participarem na elaboração de políticas relevantes bem como em organismos que definem as regras de funcionamento. Precisam de ser mantidos informados dos seus direitos legais de modo a que possam negociar com eficácia, fazer cumprir contratos e buscar reparação. O programa da aquisição de poder por via da lei relativa aos direitos de comerciar enfatiza as reformas que providenciam um ordenamento jurídico e institucional bem como o estado de direito, o qual permitirá aos proprietários pobres de negócios o desenvolvimento das respectivas capacidades e de utilizar o talento, energia e iniciativa para fazerem crescer os seus bens e gerar empresas que sejam eficientes e produtivas. As reformas dos negócios combinadas com as reformas da propriedade podem trazer segurança, recursos e aumento de competitividade a todas as empresas mas particularmente às empresas micro, pequenas e médias. O crescimento destas empresas aumenta significativamente as possibilidades de fortalecimento dos direitos laborais. Quando mais inclusivo e mais atraente o mercado formal se torna, maior é a probabilidade de regulação dos direitos laborais, os quais por sua vez constroem o capital humano para a nova geração. Tal como a Irlanda ou a Espanha mostraram no passado recente, existe um potencial enorme ao juntar os governantes e os empresários das PME para desenvolverem estratégias que sigam estas linhas de força. 73 Dar corpo à aquisição de estratégia astuciosa e com base no conhecimento… abordagem construída nos direitos humanos para lhes vidas dos pobres. 5 Estratégias de Implementação poder por via da lei exige uma politicamente importante, É o momento para uma nova fundamentos jurídicos e dar um significado real nas A Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres é uma visão arrojada e a sua implementação desafiante. Este capítulo elabora sobre o modo como pode ser feito. São indicadas linhas de orientação para a implementação, fases, políticas e tácticas para acção a nível nacional. Isto é seguido de um programa para a comunidade internacional. Quatro mil milhões de pessoas vivem arredadas do estado de direito. Instituições políticas, administrativas e judiciais não estão orientadas para a protecção dos direitos dos pobres. Grande parte da comunidade humanitária está em crise ao chegar à conclusão que as abordagens passadas não são suficientes. Agora é tempo de avaliar com realismo, e de lutar por novas soluções. Tal como Albert Einstein comentou, “Não podemos resolver os problemas utilizando o mesmo tipo de raciocínios que usámos quando os criámos.”. As soluções do séc. XXI são chamadas a complementar ou mesmo substituir as estratégias desenvolvidas no século passado, para a redução da pobreza e a criação de riqueza. A Comissão acredita que são necessárias mudanças significativas nas relações entre o estado e os pobres bem como entre o poder público e o privado. A tomada de consciência do potencial integral da aquisição de poder por via da lei, em última análise, requer o estabelecimento de instituições mais abertas, inclusivas e responsáveis por todo o espectro político e económico. Mas tudo não precisa de acontecer ao mesmo tempo. A aquisição de poder por via da lei pode iniciar-se com mudanças de políticas específicas para determinadas áreas. Com o aumento de proveitos, bens e poder, os pobres encontrarse-ão numa posição mais forte para exigirem reformas institucionais adicionais. As estruturas envolventes da Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres, tais como a Declaração Universal dos Direitos do Homem e outros 75 convénios jurídicos internacionais, já existem.75 Os governos do mundo estão empenhados neles. O que falta são a miríade de regulamentos nacionais e locais deste jogo e estão em falta as políticas que dão substância, na vida do dia-a-dia dos pobres, a essas grandes declarações. Colocar em prática as reformas necessárias requer uma análise discreta do que é possível fazer, mas também precisa de uma prontidão para arriscar quando o tempo for o adequado. Governantes pragmáticos procuram janelas de oportunidade para as políticas usando-as para criarem espaço para avançarem, de modo a resolverem problemas particulares que os pobres enfrentam. É importante reconhecer que enquanto muitas vezes faz sentido ligar o programa da aquisição de poder por via da lei a processos de desenvolvimento existentes, tais como as Estratégia para a Redução da Pobreza, a aquisição de poder por via da lei não deve ser manietada por processos que possam estar bloqueados ou não sejam funcionais. São necessárias coligações políticas alargadas favoráveis a mudanças em prol dos pobres que envolvam líderes de todos os quadrantes da sociedade para galvanizarem e manterem as reformas e para evitarem que essas reformas sejam desviadas, diluídas ou atrasadas. Os contextos nacionais são peculiares portanto não existe um único modelo para atingir este objectivo. Mas determinadas condições e regras chave devem orientar a implementação da aquisição de poder por via da lei. Como o Capítulo 2 indica, as quatro condições chave para a aquisição de poder por via da lei são identidade, informação, opinião e organização. As cinco regras de orientação indicam que o processo deve seguir de baixo para cima, ser financeiramente exequível, realista, libertador e atento ao risco. Existem experiências comparativas entre países que levaram a cabo reformas jurídicas e de regulamentação em prol dos pobres que são ilustrativas. Os grupos de trabalho da Comissão angariaram a muito custo provas com origem em muitas partes do mundo acerca do que na rea- 76 lidade funciona e do que não funciona. Os seus relatórios analisam o porquê e o como, e apontam abordagens que envolvem governos, parcerias publico privados, organizações da sociedade civil e movimentos sociais inovadores, os quais podem ser modificados e aplicados a uma ampla gama de condições.76 Os erros mais frequentes são subestimar os impedimentos à implementação e não prever consequências indesejadas para os pobres. O sucesso, por outro lado, envolve invariavelmente a compreensão das barreiras e como ultrapassá-las, escutando os pobres e aprendendo com essa actuação. Porque este processo não funciona da mesma forma quando é aplicado transversalmente nas sociedades, os governantes têm de estar atentos e com apetência para experimentarem. Independentemente do tipo de reforma escolhida esta deve ser faseada para se mesclar com o passado único da sociedade e a prontidão desta para aceitar a mudança. Para arrancar com uma mudança tão controversa e profunda como é a aquisição de poder por via da lei – uma abordagem que ameaça muitos interesses instalados – o papel positivo da liderança política nacional não pode deixar de ser sublinhado. A prossecução de uma determinada política, tal como o alargamento do acesso à justiça, requer um conjunto lato de líderes cuja opinião concorre no que diz respeito à natureza do problema e como o resolver. Alguns destes indivíduos podem emergir como “defensores da política” os quais levam para a frente a reforma por meio da angariação de coligações amplas para a mudança no seio do governo, e por ultrapassarem objectivos e obstáculos. Fazer Bem à Primeira Vez Antes de se prosseguir muito profundamente com actividades de aquisição de poder por via da lei, uma análise de contexto deve ser feita para se estabelecerem quais as reformas que são mais necessárias e aquelas que terão a maior probabilidade de sucesso. Tal análise também dá orientação quanto ao processo de implementação e indica aos reformadores os riscos que precisam Implementação da Aquisição de Poder por Via da Lei O modo como a aquisição de poder por via da lei está concebida, é implementada e monitorizada, é distinto. Trata-se de uma abordagem das bases para as cúpulas no sentido que está baseada nas realidades da pobreza e exclusão conforme vivido pelos pobres, e exige a respectiva participação activa e aceitação. Simultaneamente, a aquisição de poder por via da lei exige liderança política e empenho das cúpulas e alianças com os interessados-chave. É uma abordagem política baseada em coligações alargadas para a mudança, em vez de uma abordagem técnica ou burocrática que implica apenas funcionários públicos internacionais, líderes governamentais e elites. Acima de tudo, ao mesmo tempo que a aquisição de poder por via da lei é suportada pelos princípios internacionais dos direitos humanos, as respectivas prioridades são estabelecidas pelos pobres e baseadas nas necessidades e condições locais. Serão necessários novos indicadores, índices e protocolos de monitorização e avaliação para ir ao encontro da natureza distinta da Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres. A Comissão identificou cinco características, que em conjunto distinguem a aquisição de poder por via da lei das abordagens tradicionais às reformas jurídicas e institucionais: Das bases para as cúpulas e favoráveis aos pobres O processo da aquisição de poder por via da lei deve basear-se nas necessidades dos pobres, conforme eles próprios as vivem e exprimem. As reformas têm de ser concebidas e implementadas de modo inclusivo e participativo e accionadas para ajudar os pobres a organizarem-se a sair da pobreza. de ser mitigados e quais os desafios que devem ser atendidos. Isto aumenta a probabilidade de sucesso. O foco deve ser nos factores sociais e culturais que potencialmente afectam a implementação dentro do contexto económico – os quais tanto podem ajudar como inibir – bem como na abertura e capacidade do estado. A juntar ao inventário destas preocupações deve ser acrescentada uma análise cuidada do alcance e apoio que estas instituições informais têm sobre os pobres. A análise contextual integral é a base para um estudo de exequibilidade dos vários cenários de aquisição de poder por via da lei. Os elementos mais importantes dessa análise são: Financeiramente exequível As medidas propostas, os procedimentos acordados e requisitos impostos, tudo tem de estar ao alcance dos pobres que pretendem beneficiar. Realista As reformas devem basear-se numa compreensão realista dos mecanismos formais e informais, normas, e instituições e o modo como se inter-relacionam e interagem. Os governos necessitam de se envolver com os pobres para conhecerem o modo como as instituições das bases trabalham, assim como os respectivos pontos fortes e fracos. Poderão ser necessários mecanismos menos convencionais para recolha de informação. Libertadora A aquisição de poder por via da lei deve concentrar-se na eliminação das barreiras jurídicas que atrasam as actividades económicas dos pobres. Uma vez que isto está inextrincavelmente associado a uma estrutura institucional e regulamentadora funcionante, o ónus da prova para tais requisitos está com o estado. Consciencialização do risco É necessário que sejam tomadas todas as providências na concepção, implementação e monitorização das reformas locais. No entanto, inevitavelmente as reformas ambiciosas podem sem intenção prejudicar algumas populações pobres e vulneráveis. Estes riscos devem ser escrupulosamente monitorizados durante o processo. •A estrutura social doméstica, em especial o respectivo género, classe e agregação étnica e ainda as atitudes culturais em prol da participação e da igualdade; •O contexto económico – incluindo a distribuição da riqueza e do rendimento e o nível e ritmo de crescimento económico; •As características do estado – tanto do sistema político como do administrativo; •A amplitude da informalidade política e económica e das tensões com os sistemas formais e oficialmente reconhecidos. 77 A análise contextual e o conhecimento do ambiente da política são essenciais para prever se as condições estão no ponto para reformas mais ou menos extensas de aquisição de poder por via da lei, quais as opções de implementação que parecem ser as mais prováveis, que sequenciação e quais os melhores marcos temporais, o como da concepção das reformas, que alternativas necessitam de ser consideradas, que mecanismos de limitação de riscos valerá a pena experimentar e que variáveis precisam de ser monitorizadas durante a implementação. M A indústria de minibus e táxis na África do Sul é prova de como as instituições informais que surgem na ausência de regulamentação governamental eficaz podem acabar por ser prejudiciais. Na África do Sul, os minibuses e os táxis são o principal meio de transporte dos pobres. Uma lacuna na lei do trânsito permitiu este sector amplamente não regulamentado, que surgisse no fim da era do apartheid. Com o tempo, os operadores de microempresas independentes acabaram por dominar o sector. Na ausência de regulamentação governamental, taxistas proprietários individuais caíram sobre as associações industriais privadas em início de vida para a atribuição de percursos e praças de táxis e resolver disputas entre a concorrência. Estas associações rapidamente se tornaram muito poderosas por direito próprio e iniciaram disputas de território. Em meados dos anos 90, uma guerra de táxis virtual custavam anualmente a vida a centenas de taxistas e passageiros. Fonte: Barrett 2003 uitas sociedades e culturas têm estruturas hierárquicas e patriarcais que dificultam a prossecução da aquisição de poder por via da lei. O envolvimento dos pobres no processo de tomada de decisão dando direitos iguais ás mulheres pode ser particularmente desafiante. Em alguns contextos, o uso e costume pode ser contrário à visão dos direitos humanos consagrada na constituição nacional, particularmente no que concerne ao tratamento das mulheres e das minorias. Um dilema semelhante emerge quando se tentam garantir níveis mínimos de responsabilização e de transparência no interior das estruturas tradicionais. Felizmente, os usos e costumes não são rígidos nem imutáveis. É pois possível objectivar um processo em que as práticas tradicionais evoluem em resposta ao desenvolvimento social e aos princípios dos direitos humanos. 77 Estes mecanismos informais evolutivos existem em parte porque são muitas vezes mais acessíveis e prestam mais auxílio às pessoas pobres que muitas das vezes as instituições oficiais. Eles promovem a flexibilidade e o compromisso dentro das normas comunitárias. Em outros casos, o sistema informal nem é eficiente nem justo. O contexto é crítico. 78 Importa também a distribuição do poder e da riqueza para a aquisição de poder por via da lei. Se a posse da terra, capital e outros activos produtivos estão altamente concentrados, os reformadores têm de ter cuidado com a regularização do sistema de direitos económicos. A manutenção de desigualdades existentes no que toca à posse negará o valor da reforma para os pobres e pode mesmo levar a maior marginalização. Por outro lado, perpetuar a exclusão da posse formal devido a desigualdade de distribuição de bens fundiários e outros activos pode ser uma pior opção. O discernimento deve ser unido ao contexto. A eficácia das instituições do estado é um outro factor contextual. Quão capaz é a administração pública? Isto está relacionado com a corrupção, a capacidade para realizar e a aptidão para proteger os cidadãos e os seus bens. Em muitos países existem leis favoráveis de apoio aos pobres, mas não estão implementadas. Onde o estado não é eficaz, os seus residentes devem proteger eles próprios os respectivos bens, juntando-se por Cambodja © Jean-Luc Fievet 2007 exemplo a um patrono político. Muitas vezes, isto dificulta a aquisição de poder por via da lei. Em estados frágeis a capacidade ainda é mais fraca. O ordenamento jurídico em particular é ineficaz em tais sociedades. As boas novas são que uma vez que haja a compreensão das reformas jurídicas e das funções da governação para a aquisição de poder por via da lei, o investimento necessário para fortalecer essas funções pode ser muitas vezes mobilizado. A intensidade necessária pode ser a do esforço mais do que a do dinheiro. Gestão das Partes Interessadas e Mobilização de Aliados Juntamente com o conhecimento do contexto, uma tarefa inicial e importante na implementação é o estudo das partes interessadas. As partes interessadas são os participantes que têm a capacidade para fazer avançar uma política de mudança. A respectiva posição é determinada pelos interesses percepcionados que podem ou não estar formalmente ou deliberadamente organizados.78 É crucial dife- renciar entre grupos, para melhor compreender as divisões, alianças e necessidades particulares. As partes interessadas que se opõem ou dão assistência à aquisição de poder por via da lei precisam de ser escrutinadas para se estabelecer com é que se podem transformar em apoiantes do processo. O objectivo é obter maior solidez quanto à probabilidade de sucesso das reformas da aquisição de poder por via da lei, gerindo as partes interessadas e estabelecendo o que é necessário para construir uma coligação ganhadora mínima para a aquisição de poder por via da lei no país. Em Pequim, as entidades executivas e autoridades locais fecham os olhos quando empresários migrantes urbano-rurais que não cumprem totalmente os requisitos de licenciamento, obtêm licenças ilegalmente junto de residentes locais. Este comércio ilícito sobrevive porque os burocratas obtêm proveitos com isso. Optimizar o registo de empresas, em linha com os objectivos da aquisição de poder por via da lei, ameaçaria o rendimento rotineiro mas ilegal na capital chinesa. Fonte: He 2005 79 Os pobres são os beneficiários a quem se destinam as políticas da aquisição de poder por via da lei. Uma alteração organizacional ou jurídica que do ponto de vista externo parece em si benéfica aos olhos dos peritos pode ser vista como demasiado arriscada ou de pouco valor da perspectiva de alguém que está dentro da comunidade pobre. É por isso mesmo que os pobres também têm de ter algo a dizer sobre a implementação. As estratégias de aquisição de poder por via da lei dependem das partes interessadas beneficiárias querem participar. Se os pobres resistirem à mudança, as políticas mais bem-intencionadas de nada valem. Os aliados principais dos pobres são as associações comunitárias e os activistas da sociedade civil que trabalham em prol dos pobres. Podem ser mobilizados para a reforma e transformarem-se em aliados fortes. Alguns podem ser grupos de acção social local ou de apoio judicial a causas, tais como a Fundação para Ajuda Judiciária da Indonésia (Indonesian Legal Aid Foundation), cuja missão é defender em tribunal as pessoas pobres e ampliar os respectivos direitos. Outros incluem as associações profissionais apoiantes da causa dos excluídos. Por exemplo, a Associação dos Presidentes dos Conselhos Directivos das Faculdades de Direito (Association of Law School Deans) do Equador promove o apoio judiciário para a população indigente desse país. A aquisição de poder por via da lei será uma política desfavorável para alguns. Um exemplo é a redistribuição de um direito ou benefício na posse de uma parte interessada para outra e que reclamam a posse, que é mutuamente exclusiva, de um mesmo recurso escasso tal como terra fértil ou minérios. Os senhorios, lojistas, prestamistas e outras elites locais podem ver uma ameaça no exercício de novos direitos ou de direitos latentes por pessoas que se encontram privadas dos direitos civis. Os profissionais liberais podem ter interesse em manter o status quo da não aquisição de poder por via da lei, tais como os causídicos que ficam a perder se as leis forem traduzidas numa linguagem corrente ou se 80 meios menos onerosos de resolução de conflito forem mais prevalentes. Os governantes podem esforçar-se por minimizar os conflitos redistributivos expandindo as oportunidades económicas de modo a que diferentes interesses possam ser negociados para ir ao encontro das necessidades de todas as partes, mas existe um amplo potencial de confrontação desde que partes interessadas mais importantes considerem que os ganhos dos outros são obtidos às suas custas. Isto pode estar ligado ao facto de que o retorno da aquisição de poder por via da lei é futuro e não imediato. A resistência pode advir de funcionários públicos, funcionários judiciais, e de outros que interpretam e administram as leis, regimentos e regulamentos. Passes, licenciamentos comerciais, cálculo de impostos, e similares são origens de poder e potencialmente de rendimentos ilegais através de subornos, “luvas” e outros comportamentos de saque ilegal. Funcionários públicos que obtêm ganhos a partir desses instrumentos legais podem sabotar a reforma. Onde for possível, devem ser-lhes dados incentivos positivos para apoiarem as políticas de aquisição de poder por via da lei em vez de resistirem a elas – por exemplo a promoção dos funcionários públicos, responsabilidades novas e interessantes, oportunidades de formação ou outras regalias se ajudarem na implementação da reforma. Em vez de tentarem à partida o bloqueio das reformas, as partes economicamente fortes podem subtilmente manipulá-las para as bloquear segundo a sua conveniência – um fenómeno conhecido como “captura pelas elites”.79 Em muitos países, por exemplo, especuladores imobiliários antecipam os programas de registo fundiário comprando terras aos ocupantes ilegais a preços mais elevados que os existentes no mercado informal. Os ocupantes ilegais beneficiam no curto prazo, mas perdem os benefícios dos programas de registo fundiário, os quais se vão acumular nas pessoas com os bolsos mais fundos.80 A libertação parcelar e condicional de fundos é uma estratégia para contrariar a problema persistente da captura pelas elites. É difícil a oposição colectiva pelos pobres, para garantirem os seus direitos face a esse tipo de resistências. Mesmo se os potenciais perdedores da política representarem uma minoria, tais como os grandes proprietários ou burocratas governamentais, tendem a organizar-se eficazmente para defenderem os seus interesses instalados. Os potenciais ganhadores poderão não estar cientes do que podem auferir e podem correctamente ter medo das perdas se a mudança não ocorrer rapidamente. É portanto fundamental, a mobilização de aliados e das partes interessadas apoiantes e o encontrar de caminhos para gerir os passos foram apoiados no aumento das respectivas capacidades para providenciarem mais bens e serviços públicos, incluindo serviços de saúde e instrução, segurança e estabilidade e um ambiente macroeconómico que estimule o crescimento e o investimento. Isto continua a ser necessário, mas não é suficiente. Uma distribuição mais equitativa de oportunidades para a participação dos pobres no crescimento é uma aspiração, mas mantém-se em larga medida por cumprir. Isto é o resultado de configurações estruturais e institucionais que não funcionaram para a grande maioria das pessoas, a maior parte das quais teve que se refugiar no sector informal para sobreviver com dificuldades. Enquanto esforços meritórios foram feitos e estão em marcha para melhorar a eficácia da ajuda ao desenvolvimento, tais como a Declaração de Paris, são lentos a materialiO Pacto Global da ONU zarem-se no terreno. Uma acção mais forte de harmonização e alinhamento Algumas empresas de maiores dimensões e de objectivos é necessária. A Aid corporações multinacionais fazem menos oposição Effectiveness e a Aquisição de Poder acerca da aquisição de poder por via da lei e por por Via da Lei pelos Pobres devem-se vezes poderão mesmo ser aliados desta política. Mais complementar. Portanto, o programa de 3.000 empresas em mais de 100 países aderiram da Aquisição de Poder por Via da Lei deve ser prosseguido nos fóruns de ao Pacto Global da ONU, que faz com que se cooperação para o desenvolvimento empenhem no apoio de padrões exigentes em áreas tais como a OCDE-CAD, o Fórum da tais como os direitos humanos e o trabalho. Amiúde, Cooperação para o Desenvolvimento estas empresas dizem que gostariam de lançar da ONU e nas reuniões anuais das parcerias com comunidades pobres no mundo em instituições subscritoras do acordo de vias de desenvolvimento a fim de criarem modelos Bretton Woods. O rápido crescimento de negócios sustentáveis, equitativos e inseridos na na cooperação Sul-Sul apresenta oportunidades promissoras e novas cultura local. Fontes: ONU 2007 e Hart 2005 arenas para a aquisição de poder por via da lei. críticos. O sucesso é ganho com mais segurança É agora inegável o crescente alcance dos parquando os benefícios que se produzem são menticipantes privados transnacionais, tais como suráveis e com significado para os beneficiários. as grandes corporações e a sociedade civil e as Acção ao Nível Internacional organizações com base comunitária. Durante muito tempo, a comunidade internacional falhou Tanto as estratégias mais recentes como as mais em reconhecer a verdadeira extensão da sua antigas de redução da pobreza foram concebidas influência, particularmente no tocante a normas e na base do crescimento e desdobramento econópadrões. Cativar os participantes do sector privado micos ou por via da redistribuição. Os governos 81 Fases no Processo de Aquisição de Poder por Via da Lei O ambiente da política num país devia informar a estratégia e concepção da implementação da reforma. A fim de poder tornar a aquisição de poder por via da lei uma realidade para os pobres, são necessárias reformas compreensivas. Essas reformas podem ter início na mudança em algumas áreas políticas e serem sequenciadas e implementadas por fases. As lições aprendidas com a implementação de outras reformas complexas mostram que as fases genéricas listadas nas caixas de texto que se seguem, são ferramentas especialmente úteis. A aquisição de poder por via da lei envolve uma combinação complexa de alterações técnicas, institucionais e políticas. Os conjuntos de tarefas que se seguem são importantes – o sequenciamento específico variará conforme o país e contexto, mas a concepção de cada componente devia basear-se nos princípios de adaptação às necessidades do utilizador e disponibilidade de recursos, participação do utilizador, parcimónia (a menor quantidade de informação e custos necessário para concluir a tarefa), e simplicidade. Definição da Agenda: Apoiar a mudança, desenvolver os assuntos da política e tomar decisões que lançam as reformas políticas. Os políticos e os grupos de interesse têm tendência a tomar a liderança nestas actividades, mas raramente serão bem-sucedidos sem a mobilização dos pobres. Devia ser incluída uma avaliação detalhada dos assuntos a serem abordados. A análise identificará os problemas de política, jurídicos e institucionais, assim como falhas nos recursos, capacidade e ferramentas. Formulação e legitimação de políticas: Abordar o conteúdo técnico das medidas das reformas. No entanto, independentemente do conteúdo técnico, as medidas das reformas necessitam serem aceites e vistas como necessárias e importantes. Através dos seus representantes, os pobres deviam ser parte do processo de concepção da reforma. Os problemas críticos incluem sequenciamento e temporização, é crucial dado que têm a capacidade para actuar a um ritmo e escala que nem os governos nem as agências internacionais podem igualar.81 Mas tais vantagens têm também riscos associados; por exemplo o respeito pelos direitos humanos, económicos e sociais não deve ficar a saque de ponderações resultantes da obtenção de lucros a curto prazo. 82 condicionalismos de recursos, estabelecimento de uma estrutura de monitorização e avaliação, e garantir um equilíbrio entre o processo e os produtos para manter a iniciativa. Construir a circunscrição: Convencer os beneficiários das vantagens das reformas e provar que as vantagens a longo prazo valem os custos a curto prazo. Os problemas-chave incluem mecanismos de coordenação, adopção de um protocolo ou acordo, esclarecimento das funções e responsabilidades, e acordo num amplo processo para a reforma. Mobilização de recursos: Garantir o fluxo de recursos adequados, abordando os incentivos e exercendo liderança na galvanização das circunscrições. É necessário o comprometimento de recursos financeiros, técnicos e humanos. Concepção de implementação e desenvolvimento da capacidade organizacional: Os reformadores necessitam de criar e alimentar redes de trabalho e parcerias para cooperação e coordenação, e acompanhar o desenvolvimento de nossas aptidões organizacionais e capacidade nos sectores público, privado e não governamental. Velhos procedimentos, rotinas de funcionamento e padrões de comunicação são difíceis de fazer desaparecer; a mudança poderá enfrentar muita resistência de várias sectores. Planear acção e monitorizar o progresso: Estabelecer sistemas e procedimentos para obter informação de modo a que a implementação esteja relacionada com a aprendizagem e adaptação, a fim de produzir resultados e ter impacto. Comprometer as partes interessadas na implementação e os respectivos beneficiários no estabelecimento de sistemas de monitorização e metodologias, e obter informação. Assim, simplificar-se-á o processo de acompanhar indicadores previamente identificados. Concentrar debates de grupo, workshops, e métodos semelhantes pode ser utilizado para garantir a participação. Do mesmo modo, a esfera de influência da sociedade civil e das organizações de base comunitária está a crescer. Uma aproximação ao problema digna do séc. XXI deve reconhecer as larguíssimas contribuições para a mudança que tais organizações trouxeram. É pouco sensato pensar-se que a mudança necessária pode ser conseguida sem estes participantes. em dignidade e direitos” soa a vazio para alguém como Margaret no bairro degradado de Kibera. A aquisição de poder por via da lei pode fazê-la ressoar mais alto e mais límpida. É tempo para uma nova abordagem que assenta nas bases das leis existentes e no amplo apoio aos direitos humanos dando-lhes significado na vida quotiA Declaração tem sido extraordinariamente bemdiana dos pobres. Com o seu enfoque no trabalho sucedida. Poucas ideias são agora tão potentes a partir da base e construindo uma ampla como as dos direitos humanos. Milhares juntam-se coligação para a mudança política formatada às para os exigir, milhões correspondem-se em apoio, necessidades locais, a aquisição de poder por alguns arriscam a própria vida por elas e mesmo via da lei dá um complemento essencial à abordagem tradicional Embora não defenda uma ‘Abordagem Maquiavélica’ aos direitos humanos da cúpula à aquisição de poder por via da lei, os antigos ainda para a base. Este ano marca o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem. É uma ocasião importante e uma oportunidade excepcional para explorar o potencial do momento para fazer uma diferença duradoura. nos podem dar importantes pontos de vista para este desafio: ‘É necessário ter em conta que não há nada mais difícil de executar, nem mais duvidoso de ter sucesso, nem mais perigoso de tratar, do que iniciar uma ordem nova das coisas. Pois o reformador tem inimigos em todos aqueles que beneficiam da velha ordem e apenas defensores pouco empenhados em todos os que beneficiariam com a nova ordem, este empenho pouco comprometido que surge em parte do medo dos respectivos adversários que têm a lei a favor deles; e em parte da incredulidade da raça humana que não acredita verdadeiramente em nada até o ter efectivamente experimentado. Assim, acontece que em todas as oportunidades para atacar o reformador, os respectivos oponentes fazem-no com o zelo dos patriotas, os outros apenas o defendem com pouco empenho, pelo que entre uns e outros o reformador corre grande perigo.’ Niccolo Machiavelli déspotas adulam-nas. Virtualmente todos os estados sobrescreveram a Declaração, os dois Convénios e a Convenção de Genebra e a maior parte faz um esforço significativo para as cumprir. Porém, em muitos aspectos, a promessa dos direitos humanos não está cumprida. As elegantes palavras do Artigo 1 da Declaração Universal, “Todos os seres humanos nascem livres e iguais A Comissão pede às Nações Unidas e ao sistema multilateral alargado ao nível global, regional e de país, para considerar a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres uma missão central na próxima década. Longe de substituir a agenda para os direitos humanos, pode dar-lhe mais força e promover avanços que de outro modo não estariam ao seu alcance. Nem é um substituto para o programa dos ODMs e da demanda para erradicar a pobreza; bem ao contrário, enriquece esses esforços com ferramentas e abordagens que atacam fundo as causas estruturais da pobreza e da exclusão. Um esforço internacional concertado para atingir os ODMs juntamente com um programa dinâmico para um assalto acelerado contra a pobreza mundial, entre hoje e 2015, bem como para além dessa data. A Comissão chegou a consenso num conjunto de recomendações e princípios em que acredita serem capazes de guiar e inspirar os esforços globais, regionais e nacionais para o avanço da Aquisição de Poder por Via da Lei, com um foco importante na acção localizada, principalmente a nível local e 83 nacional. Pretendemos alcançar o despertar para a sua importância e mobilizar para a acção governos, instituições intergovernamentais, o sector privado e a sociedade civil, mas não podemos – nem queremos – ditar o que deve ser feito. O sucesso em políticas públicas passa pela posse plena por quem as tem em custódia, principalmente governantes e líderes políticos. A aquisição de poder por via da lei requer uma base alargada, uma abordagem das bases para as cúpulas. O programa global que a Comissão propõe foca a construção da posse política e apoio nacional e local aos processos de reforma, com base em conhecimento sólido tanto analítico como empírico. Fazer da aquisição de poder por via da lei uma prioridade política necessita de uma estratégia politicamente relevante e inteligente. Uma coligação de países do Norte e do Sul deve oferecer-se para defender empenhadamente a agenda da aquisição de poder por via da lei na ONU conduzindo depois para o debate e resolução na 63ª sessão da Assembleia Geral da ONU que se inicia em Setembro de 2008. Estabelecer uma arena de “acesso aberto” sobre a aquisição de poder por via da lei A Comissão pede às agências multilaterais, fundações, movimentos de base e outras organizações da sociedade civil, empresas de informação e de comunicação e outras entidades do sector privado, para conjuntamente estabelecerem um fórum global e uma arena virtual para a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres. Tal fórum, modelado nas redes web sociais e profissionais e nas comunidades virtuais, procuraria ser verdadeiramente acessível e inclusiva, permitindo a interacção a nível global dos interessados. Deveria ser estabelecida uma reunião global, a intervalos definidos, combinando com um grande encontro num local físico em simultâneo com participação virtual global, para elevar a consciencialização e fazer um ponto de situação do progresso atingido a nível mundial. 84 Desenvolver consensos políticos a nível regional – Um Pacto Regional sobre a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres A Comissão acredita que as entidades políticas regionais e sub-regionais (tais como a União Africana, CEDEAO/ECOWAS, ANSA/ASEAN, ALCSA/SAFTA; OEA/OAS e o Mercosul) são nucleares para o processo da aquisição de poder por via da lei. Pedimos a estes vários organismos para iniciarem um diálogo entre os respectivos membros, utilizando os princípios e recomendações emitidas pela Comissão como um enquadramento de referência. Apoio pode ser dado por agências relevantes da ONU e membros da Comissão com localização regional numa base de necessidade e a pedido. A Politica de Proximidade da União Europeia, que oferece aos vizinhos da UE uma relação privilegiada, com base num compromisso mútuo em valores comuns, pode servir como uma inspiração para tal pacto regional. Os organismos regionais devem ser incentivados a desenvolverem os seus próprios resultados: •Documentos de orientação e de melhorespráticas para os seus membros; •Documentos mandatórios da política com padrões e critérios para implementação ao nível nacional; •Programas de cooperação regional; •Padrões estatísticos comuns, conjuntos de indicadores e objectivos. Estes possivelmente variam de região para região, mas seriam baseados num consenso alargado dentro de cada região, construindo a partir dos direitos universais económicos e sociais. As regiões poderiam buscar a formulação de um Pacto Regional para a Aquisição de Poder por Via da Lei que envolva as principais partes interessadas da região, comprometendo alguns ou mesmo todos para os quatro elementos acima indicados. Dar apoio coerente aos esforços de aquisição de poder por via da lei ao nível de país Alguns países já estão a ensaiar um ordenamento jurídico mais inclusivo que providencia oportunidades para os pobres e os excluídos. A Comissão insiste com as agências multilaterais relevantes e com outros participantes a providenciarem um política mais célere e apoio técnico a tais iniciativas quando lhes for solicitado. Como um primeiro passo, as agências multilaterais devem pôr à discussão os princípios e recomendações deste relatório com o fim de gerar uma agenda global partilhada da política (permitindo opiniões diferentes e abordagens dentro de tal contexto). Uma agenda global coerente da política pode levar ao estabelecimento de programas de investimento conjugados com assistência técnica, baseado num clara atribuição de funções e responsabilidades. Um processo semelhante pode ser concebido entre países doadores interessados e organizações internacionais não governamentais. O processo deve beber das complementaridades dos programas da Aid Effectiveness, Financing for Development e da Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres. As políticas devem evoluir com o tempo, com base nas experiências decorrentes da implementação e com as lições aprendidas. A Comissão recomenda que mecanismos de financiamento sejam estabelecidos para apoio à política regional e específica de países e para trabalho de desenvolvimento de competências. Adicionalmente, critérios claros de aquisição de poder por via da lei devem ser introduzidos nos mecanismos apropriados existentes. Dados os mandatos abrangentes relativos às políticas de apoio ao desenvolvimento, a Comissão pede ao PNUD e ao Banco Mundial para desenvolverem propostas concretas relativas as estes temas, em consulta com outros departamentos relevantes da ONU – tais como a ONU-HABITAT, FAO, e OIT – com organismos da sociedade civil e com doadores bilaterais. Actividades da Aquisição de Poder por Via da Lei I mplementar reformas legais através da aquisição de poder por via da lei utilizando tal abordagem faseada, requer uma variedade de acções diferentes e medidas políticas. As actividades concretas que se seguem estão entre elas: Mobilizar as partes interessadas: Assim que as principais partes interessadas tenham sido identificadas, as mais importantes necessitam de serem juntas para acordarem um processo e um conjunto de princípios-guia para a agenda de aquisição de poder por via da lei. Os problemas-chave incluem o estabelecimento de mecanismos de coordenação, adopção de um protocolo ou acordo, esclarecimento das funções e responsabilidades, e acordo num amplo processo para a reforma. Diagnóstico da aquisição de poder por via da lei: Com base na análise inicial do ambiente e na análise contextual, deverá ser efectuada uma avaliação pormenorizada. Este diagnóstico deve centrar-se tanto nas instituições formais como informais, na maneira como trabalham e nas respectivas interacções. A análise identificará os assuntos de política, jurídicos e institucionais, assim como falhas nos recursos, capacidade e ferramentas. Planear a acção: Exige o desenvolvimento de um marco, objectivos, estratégias e intervenções específicas que contribuirão para os objectivos da aquisição de poder por via da lei. Os problemas críticos incluem sequenciamento e temporização, condicionalismos de recursos, estabelecimento de uma estrutura de monitorização e avaliação, e garantir um equilíbrio entre o processo e os produtos para manter a iniciativa. Actividades piloto: Devem ser construídas em volta da ideia de ‘ganhos rápidos’ em áreas onde sejam exequíveis. Desta maneira é possível provar algum sucesso inicial e construir a credibilidade da agenda da aquisição de poder por via da lei. Concertação: Expandir o leque de actividades e aceitar desafios mais complicados, será suportado pelo aumento da consciencialização de sucessos anteriores, sensibilização adicional, e reforço do processo de consulta. Institucionalizar a mudança e o processo de mudança: Avançar algumas das reformas fundamentais, construindo sobre as experiências na fase piloto e fase de concertação para reformar as organizações e regras que moldam o contexto institucional. 85 O PNUD e o Banco Mundial desenvolverão propostas nas quais incentivarão, através de um processo de auto candidatura, um conjunto de países piloto. A Comissão pede ao PNUD para estabelecer e liderar uma comissão de direcção ou um “grupo de apoiantes” para garantir a mais ampla tomada de responsabilidade e seguimento da agenda da aquisição de poder por via da lei. Os participantes internacionais também precisam de apoiar a acumulação de saber e aquisição de conhecimentos ao nível global, com base nas experiências decorrentes da implementação e das avaliações de resultados e impactes. Um componente importante são os programas de troca entre pares, que devem ocorrer transversalmente ao conjunto de países que buscam a aquisição de poder por via da lei. De modo a construir um portfólio de características partilhadas e de oportunidades para comparação e troca, tais iniciativas têm de cumprir determinados critérios de elegibilidade. A Comissão incentiva a criação de pequenos núcleos de secretariado para a coordenação e a gestão do conhecimento, as serem acolhidos pelo PNUD. A inclusão de um vasto conjunto de participantes será facilitada através da criação de uma rede de conhecimento ou de uma comunidade de práticos. A política global e a agenda do programa de implementação para a aquisição de poder por via da lei devem ser cada vez mais inspirados e guiados pelos processos políticos regionais como os acima descritos, bem como por iniciativas e avanços ao nível dos países. Providenciar uma reflexão sustentada sobre a aquisição de poder por via da lei Nuclear ao progresso humano, e embebido nas mais duradouras preocupações da humanidade, a aquisição de poder por via da lei precisa não só de pessoas que exerçam essa reflexão mas também do conhecimento institucionalizado. Nos níveis escolares mais básicos, os programas escolares que iniciam as crianças nos rudimentos 86 de vida cívica e dos direitos humanos, sustentarão a sensibilidade infantil relativa a elas próprias e a cidadania futura. Ao nível internacional e universitário, os programas, ensino e redes de investigação sobre desenvolvimento precisam de manter a vivência intelectual da aquisição de poder por via da lei e abrir a mentes dos futuros governantes. Mas isto não é uma actividade corrente, mas sim uma outra especialização. A academia profissionalizada é propensa à dispersão e um conceito misto tal como é o da aquisição de poder por via da lei, deve ser uma pequena componente do processo de união das partes e para as universidades, o recapturar das suas opiniões no domínio público. Para isto, tanto fundos como mentes serão necessárias. Criação de mecanismos inovadores para apoio à aquisição de poder por via da lei U m conjunto de instrumentos globais deve ser criado, partindo das iniciativas normativas até à colaboração operacional e partilha de conhecimento. Tais iniciativas precisam de reflectir a natureza política das iniciativas da aquisição de poder por via da lei a alimentar a posse genuína. Em vez da criação de novas instituições ou estruturas, estes instrumentos devem ser acolhidos pelas organizações existentes. As iniciativas normativas globais devem ser sequenciadas relativamente aos processos políticos regionais e aos esforços reformadores levados a cabo pelos países e serem directamente inspiradas por esses resultados, de modo a que qualquer envolvente normativa deva estar firmemente ancorada em experiências e políticas regionais correntes. a) D efinição de Normas através do Pacto de Aquisição de Poder por Via da Lei. Enquanto os direitos do trabalho foram, de certa forma, claramente consagrados nos acordos e convenções internacionais através da OIT, os direitos de propriedade, os direitos de negociar e o acesso à justiça nunca foram enunciados em pormenor para além de meras referências ou princípios. A Comissão recomenda que seja dado início a um diálogo alargado sobre a envolvente dos direitos humanos na aquisição de poder por via da lei. Um resultado final poderia ser um Pacto de Aquisição de Poder por Via da Lei, idealmente baseado em pactos regionais como é acima descrito. Tal pacto deveria ter uma compreensão ampla, tornando claro para o leitor médio que os direitos centrais da aquisição de poder por via da lei são direitos humanos tão importantes como a liberdade de expressão, o direito ao voto e outros direitos básicos. Tal pacto definiria os princípios centrais que os países subscreveriam e daria linhas de orientação sobre a maneira como deveriam ser postos em prática. Adicionalmente a um Pacto ou como alternativa, uma Declaração de Aquisição de Poder por Via da Lei poderia ser preparada para análise pela Assembleia Geral da ONU. Contudo, a Comissão recomenda que tal declaração seja posposta tendo por base as experiências decorrentes da implementação das iniciativas ao nível nacional, regional e global como indicado neste capítulo de modo a garantir apoio e adesão políticas. b) Defensores dos Pobres A nomeação de “Defensores dos Pobres” pode lançar sinais fortes às pessoas pobres em todo o mundo sinalizando que as suas preocupações sobre a aquisição de poder por via da lei podem ser ouvidas. Podia ajudar a ligar os níveis globais aos locais num modo de acção direccionado. Ao nível local ou nacional, os “Defensores do Pobres” poderiam ter um papel importante em dar voz às pessoas pobres e apoiarem a respectiva aquisição de poder por via da lei. A comunidade internacional poderia tomar a decisão de que tais Defensores dos Pobres estariam incluídos sob o conceito de defensores dos direitos humanos, como pormenorizado na Declaração sobre Direitos e Responsabilidades Individuais, Grupos e Organismos da Sociedade para a Promoção e Protecção de Direitos Humanos Universalmente Reconhecidos e Liberdades Fundamentais.82 Isto mostraria um compromisso muito forte da comunidade internacional em apoio dos Defen- sores do Pobres e por outro lado protegê-los-ia das violações dos direitos humanos. Mas também, ao nível Global, poderiam existir Defensores dos Pobres. Seriam funções honoríficas sem autoridade formal e sem outras tarefas que não as de chamar a atenção para a causa dos pobres e a perspectiva que oferece a aquisição de poder por via da lei para o melhoramento das suas vidas. Os Defensores Globais dos Pobres poderiam trabalhar a pedido de organizações de pessoas pobres para a inserção de questões pertinentes nas agendas políticas nacionais ou internacionais, e apoiarem e publicitarem as soluções para problemas e obstáculos que as pessoas pobres encontram nas áreas do direito à propriedade, trabalho e direito de negociar. O processo teria como objectivo identificar e construir sobre as iniciativas locais e encontrar soluções inovadoras. Inicialmente, alguns membros da Comissão poder-lhes-ia ser pedido para servirem como defensores globais dos pobres. c) C entro coordenador de conhecimento sobre a aquisição de poder por via da lei A uma instituição poder-se-ia conferir o mandato de estabelecer um centro coordenador para o conhecimento e experiências adquiridas, com total disponibilidade para todas as partes interessadas. Este centro coordenador obteria conteúdos a partir da investigação sobre políticas, relatórios de projecto e outras peças relevantes. Ligações com redes académicas existentes ou a criar sobre a aquisição de poder por via da lei deveriam promover a investigação académica e planear em conjunto os programas de investigação. d) Parcerias público privadas para a aquisição de poder por via da lei Reconhecendo as complexidades da reforma e o amplo leque de funções e serviços que estariam envolvidos, a Comissão recomenda que parcerias imaginativas público privadas sejam estabelecidas tanto ao nível global como regional. Estas congregariam entidades com recursos importantes e competências para apoio a governos e outros participantes nos esforços destes em promoverem 87 Tácticas para Defensores e Agentes de Mudança P ara ser bem sucedido na implementação de reformas de aquisição de poder por via da lei, os agentes de mudança têm de ser mobilizados e capazes de ter ideias criativas sobre o modo como disponibilizar as políticas, torná-las financeiramente possíveis e aceitáveis no contexto específico em que trabalham. As opções estratégicas e considerações tácticas que se seguem poderão ajudar a atingir esse marco: Encontrar o seu próprio percurso: Existe uma base rica de experiência internacional comparativa, mas não há fórmulas feitas para conseguir a aquisição de poder por via da lei. Soluções correctas para um determinado contexto podem ser completamente erradas para outro. Pensar sistemicamente, agir de forma incremental: A aquisição de poder por via da lei exige mudanças sistémicas – abordagens tipo big bang são raras e amiúde perdem a força quando implementadas. Pensar a longo prazo, avançar aos poucos: Justiça, trabalho e problemas fundiários são complicados e não se prestam facilmente a uma abordagem tradicional de projectos a três anos. No entanto, as reformas têm de disponibilizar melhorias tangíveis com bastante celeridade para manter a iniciativa para a aquisição de poder por via da lei. Apoiar associações de pobres, mas não comprometer a respectiva independência: O perigo está em que, ajudar estes grupos, pode fazer com que fiquem mais responsáveis perante a agência de financiamento externa do que perante a sua participação na associação. Dedicar recursos para apoiar processos de participação e coordenação: Enquanto muitas vezes as soluções técnicas atraem interesse suficiente por parte de dadores e governos, a aquisição de poder por via da lei. Tais parcerias poderiam englobar agências multilaterais, instituições financeiras, entidades envolvidas em sistemas de cadastro geográfico, prestadores de serviços jurídicos, organizações comunitárias e da sociedade civil, fundações e outros. e) Empresas a promoverem programas de aquisição de poder por via da lei Cada vez mais as empresas influenciam as normas e os padrões adoptados e consequentemente têm um importante papel na promoção dos 88 a capacidade de desenvolvimento para mecanismos de participação e coordenação é muitas vezes subavaliada e por isso sub-financiada. Dar suporte remoto eficaz: Sem uma campanha de promoção dedicada, os beneficiários não podem tirar partido das reformas. Dar acesso à informação: O acesso à informação ajuda as pessoas a compreenderem melhor e a avançarem para os seus direitos, por exemplo na garantia de títulos de posse ou na abordagem da descriminação no trabalho. Utilizar linguagem simples e local: Um dos elementos-chave para o controlo nacional da reforma é a linguagem: diálogo, debate, e partilha de informação têm de ser conduzidos nos idiomas locais, e os documentos legais desmistificados reproduzindo-os em termos correntes. Trabalhar com para-profissionais: Há muitas oportunidades para criar uma nova geração de para-profissionais com formação e possivelmente certificados para darem resposta aos requisitos do serviço diário dos pobres. Os para-profissionais não necessitam de ter os estudos avançados dos actuais profissionais, que amiúde são inadequadamente organizados, dispendiosos e incluem assuntos de interesse limitado para o possível cliente base. Prestação de serviço em grupo: Esta é uma estratégia pouco custosa para prestação de benefícios tangíveis aos pobres. Um exemplo é o fornecimento de bilhetes de identidade com programas de vacinação. Ser flexível. Aproveitar as vantagens tácticas das oportunidades conforme estas surgem e não ficar constrangido por um calendário programado de serviços. programas da aquisição de poder por via da lei. O Pacto Global da ONU, sendo a maior iniciativa do mundo em congregar as empresas transnacionais e a sociedade civil, pode ter um papel nuclear na construção do apoio a partir do mundo dos negócios, para se obter uma mudança sistémica na aquisição de poder por via da lei. f) Iniciativa para promover o conhecimento das bases e a inovação social A Comissão recomenda que uma iniciativa a nível global seja lançada para apoiar a promoção de conhecimento das bases e a expansão da informação sobre inovações na área da aquisição de poder por via da lei. Tal iniciativa deve ter um alcance alargado a um amplo conjunto de organizações e redes nas quais as pessoas pobres tomem parte, desde instituições religiosas a associações de agricultores a redes de apoio feminino. O reconhecimento poderia vir sob várias formas, tais como prémios, publicações, fundos e apoio técnico. Isto pode estar ligado à iniciativa proposta da Global Open Access Arena para a Aquisição de Poder por Via da Lei. g) Observar um Dia Internacional sobre a Aquisição de Poder por Via da Lei pelos Pobres Um dia especial sobre a Aquisição de Poder por Via da Lei podia ser introduzido no Calendário anual da ONU dos dias especiais a comemorar. Serviria para promover a Aquisição de Poder por Via da Lei, a nível mundial, enfatizando, em cada ano, os direitos essenciais da aquisição de poder por via da lei. Adicionalmente, poderia sublinhar em particular um tema que fosse próximo da aquisição de poder por via da lei. Os que buscam a aquisição de poder por via da lei pelos pobres e pelas comunidades terão a sempre presente admiração e apoio desta Comissão e a de um número diariamente crescente de pessoas e instituições que, após escutarem as opiniões emitidas neste relatório, passam a partilhar delas. Mas muito mais importante, é o facto de ganharem a admiração daqueles cujas vidas são tocadas por eles e terem a satisfação de ajudar a garantir, no meio de um sem número de alternativas desesperadas, um futuro humano mais sorridente. 89 Notas Finais 5 DFID Press Release, 18 de Junho de 2007 (http://www.dfid. gov.uk/News/files/pressreleases/bank-billion-benefit.asp). Em estudos conduzidos no terreno desde 1998 em 20 países a pedido dos governos da Guatemala, Bolívia, Panamá, Honduras, Argentina, México, Haiti, República Dominicana, El Salvador, Equador, Colômbia, Peru, Tanzânia, Egipto, Albânia, Filipinas, Etiópia, Geórgia, Gana e Paquistão, o Instituto para a Liberdade e Democracia (ILD) estimou em baixa que entre 70 a 90 por cento das populações rurais e urbanas vivem fora do enquadramento legal dos respectivos países. Aplicando estes resultados às 179 nações em desenvolvimento e às repúblicas da ex União Soviética, de acordo com o grau de envolvimento da respectiva estrutura institucional, foi calculado que 85 por cento da população vivia em zonas à margem do enquadramento legal. Estimando uma população de 4,9 mil milhões de pessoas nesses 179 países, conclui-se que 4,1 mil milhões vivem em zonas à margem do enquadramento legal. 6 “Direitos de Comerciar” ainda não necessita de ser um novo termo jurídico, mas antes é resultante de direitos individuais que bebem do direito consuetudinário escrito, agora agregados a este termo na base da instrumentalidade vital desse processo na subsistência dos pobres. 7 WDI 2007 Estudos feitos por um conjunto de outras organizações confirmam este número. A Organização Mundial do Trabalho, na edição de 2002 dos Key Indicators of the Labour Market estimou que “mais de 70 por cento da população activa nos países em desenvolvimento opera na economia informal.”. Levando em conta os dependentes destes trabalhadores, significa que pelo menos 4,3 mil milhões de pessoas nesses países se apoiam em actividades informais para a sua subsistência diária. O Instituto do Banco Mundial (WBI), utilizando definições convencionais de subemprego e pobreza, encontrou estimativas semelhantes. O WBI organizou o programa “Inclusive and Sustainable Business: Opening Markets to the Poor”, com o objectivo de apoiar estratégias concebidas por executivos do sector privado e líderes do sector público para criarem oportunidades “para os quatro mil milhões de pobres do mundo.”. 11 Stern, Dethier, e Rogers: Growth and Empowerment Making Development Happen, MIT Press, 2005 A estimativa do ILD tornou-se num padrão internacional, como é exemplo, um estudo apoiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, a Sociedade Financeira Internacional (IFC), o Grupo Banco Mundial, a Microsoft e a Fundação Shell bem como o livro que se seguiu The Next 4 Billion: Market Size and Business Strategy at the Base of the Pyramid (Março de 2007) por A. Hammond. 90 8 The Millennium Development Goals Report 2007, ONU, 2007. 9 Banco Mundial: Economic Growth in the 1990s: Learning from a Decade of Reform, 2005. 10 North, D.C., Institutions, Institutional Change and Economic Performance. Cambridge: Cambridge University Press, 1990. 12 Harmonising Donor Practices for Effective Aid Delivery Volume 2; DAC Guidelines and Reference Series; OECD-DAC 2006 (http://www.oecd.org/dataoecd/53/7/34583142.pdf). 13 Thomas Carothers, Promoting the Rule of Law Abroad: The Problem of Knowledge, Carnegie Endowment Working Paper No. 34, Rule of Law Series, Democracy and Rule of Law Project, 3. Washington, D.C.: Carnegie Endowment for International Peace, Janeiro de 2003. 14 De acordo com os WDI 2007, existiam 985 milhões de pessoas a viver em extrema pobreza, i.e. a viver com menos de um USD por dia em 2004. Cerca de 500 milhões dos quais sobreviviam com menos de um USD por dia mas que apesar das longas horas de trabalho árduo, em condições muitas vezes inimagináveis, não podem escapar à pobreza. OIT, World Employment Report 2004-05; ILO, Working out of Poverty, 2003. 15 De acordo com os WDI 2007, uma estimativa de 2,6 mil milhões de pessoas, quase metade de toda a população do mundo em desenvolvimento, continuavam a viver abaixo do nível de pobreza de dois USD por dia. 2 “Direitos de Comerciar” ainda não necessita de ser um novo termo jurídico, mas antes é resultante de direitos existentes relacionados com a prossecução de negócio a nível individual, agora agregado a este termo na base da instrumentalidade vital desse processo na subsistência dos pobres. 3 Schneider, Friedrich. “Shadow Economies and Corruption all over the World: New Estimates for 145 Countries”, Julho de 2007, publicado em: Economics, The Open-Access, Open-Assessment E-Journal, No. 2007-9. Disponível em http://www.econ.jku. at/Schneider/publik.html 16 4 As populações rurais e de baixos recursos têm muitas vezes dificuldades em aceder aos bancos comerciais. Podem ser analfabetos, a agência local do banco pode ser muito distante e os custos dos serviços bancários e a imposição de saldos em conta podem ser excessivos. Uma estimativa indica que dois mil milhões de pessoas não têm acesso a serviços financeiros básicos. Números baseados no DFID Press Release, 18 de Junho de 2007 (http://www.dfid.gov. uk/News/files/pressreleases/bank-billion-benefit.asp). 20 Artigo 17, The Universal Declaration of Human Rights, UN Doc. G.A. res. 217A (III), U.N. Doc A/810 em 71 (1948). Consultar nota de rodapé 1. 17 Muhammad Yunus: “Yunus takes microfinance to New York”, Financial Times, 15 de Fevereiro de 2008 18 World Bank (2007) Informality: Exit and Exclusion. 19 “Direitos de Comerciar” não necessita de ser um novo termo jurídico, mas antes resultante de direitos existentesrelacionados com a prossecução de negócio a nível individual, agora agregado a este termo na base da da instrumentalidade vital desse processo na subsistência dos pobres. 21 A Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais, (ETS No. 5), 213 U.N.T.S. 222, entrou em vigor a 3 de Setembro de 1953, Protocolo I sobre a imposição de alguns direitos e liberdades não incluídos no Capítulo I da Convenção, 20 de Março de 1952. 22 Artigo 21, American Convention on Human Rights, O.A.S. Treaty Series No. 36, 1144 U.N.T.S. 123 entrou em vigor em 18 de Julho de 1978, em: Basic Documents Pertaining to Human Rights in the Inter-American System, OEA/Ser.L.V/II.82 doc.6 rev.1 at 25 (1992). 36 OIT, Women and Men in the Informal Economy: A Statistical Picture, 2002 23 Artigo 14, African [Banjul] Charter on Human and Peoples’ Rights, adoptado a 27 de Junho de 1981, OAU Doc. CAB/LEG/67/3 rev. 5, 21 I.L.M. 58 (1982), entrou em vigor a 21 de Outubro de 1986. 24 Economic and Social Council, Commission on Human Rights, Sub-Commission on the Promotion and Protection of Human Rights, 56th session, Economic, Social and Cultural Rights. “Housing and property restitution in the context of the return of refugees and internally displaced persons”. Relatório final do Relator Especial, Paulo Sérgio Pinheiro. E/CN.4/Sub.2/2005/1 28 de Junho de 2005. Consultar Artºs. 7; 15. 25 Disponível em http://www.everyhumanhasrights.org/ read_it/ (25 de Janeiro de 2008). Consultar em especial os Artºs. 2, 6, 7, 8, 17, 20, 23. 26 UNICEF. 2005. The “Rights” Start to Life: A Statistical Analysis of Birth Registration, disponível em http://www.childinfo. org/areas/birthregistration/docs/Full%20text%20English.pdf. (23 de Janeiro de 2008) 27 Barendrecht, Maurits, Mulder, José and Giesen, Ivo, “How to Measure the Price and Quality of Access to Justice?” (Novembro de 2006). http://ssrn.com/abstract=949209 28 Disponível em http://www.hrdc.net/sahrdc/hrfeatures/HRF154.htm and http://www.icj.org/news.php3?id_ article=2684&lang=en 29 Disponível em http://allafrica.com/stories/200710021003. html and http://allafrica.com/stories/200708071187.html 30 American Bar Association, “Judicial Reform Index for the Philippines”, Março de 2006. Disponível em http://www.abanet. org/rol/publications/philippines_jri_2006.pdf 31 Os cinco países foram a Domínica, Granada, Samoa, Santa Lúcia e São Vicente e as Granadinas, todas ilhas muito pequenas. Dos 76 países analisados pela CPIA, apenas Samoa pontuou um agregado de 4 pontos no máximo de 6 do total dos 16 indicadores de governação. 2005 IDA Resource Allocation Index, disponível em www.worldbank.org 32 Banco Mundial, CPIA 2005 Assessment Questionnaire: 33, disponível em www.worldbank.org 33 Disponível em http://www.ild.org.pe/en/whatwedo/diagnostics 34 As condições são especialmente graves em África, no Médio Oriente e no Sul da Ásia. Consultar Banco Mundial, Water Resources Sector Strategy: Strategic Directions for World Bank Engagement. Banco Mundial, Washington D.C. (2003) p. 1 35 Disponível em at http://www.icrw.org/. Também consultar FAO 1999. “Women’s right to land and natural resources: some implications for a human rights based approach”. SD Dimensions. Disponível em: FAO: http://www.fao.org/sd/LTdirect/LTan0025.htm (23 de Janeiro de 2008). 37 OIT, Resolução da 90ª Sessão da Conferência Geral, 2002 38 OIT: Working out of Poverty, 2003 39 Chen et al. 2005. 40 OIT, Women and Men in the Informal Economy: A Statistical Picture, 2002 41 ibid. 42 A economia informal de 96 países em desenvolvimento é responsável por 37 por cento da economia ou do PIB oficial. (Schneider, Friedrich. “Shadow Economies and Corruption all over the World: New Estimates for 145 Countries”, Julho de 2007, publicado em: Economics, The Open-Access, Open-Assessment E-Journal, No. 2007-9. Disponível em http://www.econ.jku.at/ Schneider/publik.html A economia informal produz 27 por cento da produção não agrícola no Norte de África, 29 por cento na América Latina e 31 por cento na África sub Saariana e na Ásia. Na Tailândia e na Nigéria excede 70 por cento da economia. (OIT, Women and Men in the Informal Economy: A Statistical Picture, 2002). 43 WRI Report 2005. 44 Boudreaux 2007. 45 HDR 2007/2008. 46 HDR 2007/2008. P Gutman “From Goodwill to Payments for Environmental Services: A Survey of Financing Options for Sustainable Natural Resource Management in Developing Countries 2004.” 47 “Renda económica” é uma mais-valia que não existiria numa economia de mercado competitiva. O comportamento de “Busca de renda” refere-se aos esforços para que o governo gere rendas económicas, as quais poderiam ser absorvidas pelo sector privado a expensas da sociedade para obtenção de maisvalias como resultado das ineficiências que criam. 48 De Soto, Hernando. 1989. The Other Path (New York: Basic Books). 49 Morton H. Halperin, Joseph T. Siegle, Michael M. Weinstein, “The Democracy Advantage: How Democracies Promote Prosperity and Peace”. Routledge, 2005. 50 Journal of Democracy, Julho de 2007, Volume 18, Número 3 (o qual é dedicado a este debate e oferece um resumo incluindo Snyder, Carothers, e Fukuyama). 51 Latin America: The Search for Good Jobs, Newsweek, 23 de Outubro de 2007. 52 Dani Rodrik in Goodbye, Washington Consensus, Hello, Washington Confusion, Harvard, 2006 com referência a Acemoglu, Johnson, and Robinson, “The Colonial Origins of Comparative Development”, American Economic Review, 2001. 53 2006 World Development Report: Equity and Development, Setembro de 2005. 91 54 Danielle Resnick and Regina Birner, Does Good Governance Contribute to Pro-poor Growth? A Conceptual Framework and Empirical Evidence from Cross-Country Studies, 2005. 55 World Development Indicators 2007. 56 Banco Mundial: World Development Report 2005. A Better Investment Climate for Everyone. p.79. 57 Op. Cit. pp. 80-81. 58 Op. Cit. p. 80. 59 Galiani, Sebastián y Ernesto Schargrodsky. Property Rights for the Poor: Effects of Land Titling. En: Disponível em http://economics.uchicago.edu/pdf/Galiani_022706.pdf. 60 Field, Erica. Property Rights and Investment in Urban Slums. Disponível em http://www.economics.harvard.edu/ faculty/field/papers/FieldinvestJEEA.pdf. 61 Field, Erica. “Entitled to Work: Urban Property Rights and Labour Supply in Peru”, pág. 24. 62 Ibid. 63 Place and Hazell 1993; Bruce and Migot-Adholla 1994; Harrison 1990; Mighot-Adholla et al. 1994a; Collier and Gunning 1999. 64 Article I of the Declaration of Philadelphia, 1944, Annex to the Constitution, Convention of the International Labour Organisation. 65 Consultar Report of Working Group 3 no Capítulo 3 do Volume II. 66 Resolução sobre trabalho digno na economia informal, OIT, 2002. 67 O termo “para-jurídico” pode ser de algum modo enganador dado que sugere um assistente que executa tarefas de natureza jurídico-legal. Os para-jurídicos enquadrados em programas existentes em muitos países em desenvolvimento podem ser vistos como activistas comunitários que para além de terem uma sólida formação jurídica, estão também familiarizados com as normas e práticas das comunidades locais e têm competência para dar conselho em apoio judicial e irem mais além do que apenas o conselho jurídico no sentido estrito do termo. 68 Casos provados em Angola, Brasil, Colômbia e outros países da América Latina, Hungria, Índia e África do Sul que mostram como pode ser feito estão documentados em Courts and Social Transformation in New Democracies: An Institutional Voice for the Poor? Eds. Roberto Gargella, Pilar Domingo, e Theunis Roux, Ashgate: Reino Unido, 2007. 69 Brustinow 2006. 70 Documento Final, parágrafo 47. Cimeira Mundial da ONU, Nova Iorque, Setembro de 2005; ECOSOC Documento Ministerial sobre a Criação de um ambiente que conduza a emprego produtivo e trabalho digno, Genebra, Julho de 2006; 71 Consultar também Convention 156, Workers with Family Responsibilities. 72 92 Nº. 177, 1966. 73 ILD artigo sobre Legal Tools to Empower Informal Businesses, apresentado ao WG4. 2006. 74 USAID, Removing Barriers to Formalization: The Case for Reform and Emerging Best Practice, 2005. 75 Estes acordos internacionais incluem a Declaração Universal dos Direitos do Homem (UDHR), o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (ICCPR) e o Pacto Internacional dos Direitos Económicos e Sociais (ICESR), Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos Fundamentais no trabalho incluindo convenções essenciais sobre liberdade de associação e de negociação colectiva bem como a proibição de trabalho forçado, a eliminação do trabalho infantil e a não discriminação na promoção da igualdade de oportunidades e tratamento bem como a Convenção dos Povo Indígenas e Tribais, 1989 (Convenção OIT Nº. 169). Adicionalmente, existe um direito que é reconhecido internacionalmente “Direito a Habitação Digna”, o qual inclui a segurança da posse como uma das suas seis componentes. 76 A lista completa dos grupos de trabalho está disponível no Volume II deste relatório. 77 Cotula 2007. 78 Duas abordagens úteis para analisar os interesses das partes interessadas no desenvolvimento sãos os impulsionadores da mudança DFIDs, disponíveis em http://www.gsdrc.org/go/ topic-guides/drivers-of-change, e a análise sobre o poder feita pela Agência Sueca de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (SIDA) disponível em http://www.sida.se/sida/jsp/sida. jsp?d=118&a=24300&language=en_US. 79 Decker 2005. 80 Platteau 2004. 81 Relatório interino do Enviado Especial do Secretário-geral sobre o problema dos direitos humanos e as corporações transnacionais e outras grandes empresas, E/CN.4/2006/97. 82 Resolução da Assembleia Geral; A/RES/53/144. 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