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metrópole por Juliana Calderari per to do son h o lon ge do m ar, A LEVADOS PELO ROMANTISMO, PAULISTANOS EMBARCAM NA PRODUÇÃO ARTESANAL DE VELEIROS 24 [ REVISTA DA FOLHA ] 28 DE SETEMBRO DE 2008 cada mês, após 15 dias corridos de trabalho, o piloto de helicóptero Alexandre Dangas, 38, dirigese a um galpão no bairro do Jaraguá, na zona norte da capital, onde passa o restante do tempo. Tira folga dos ares e, em terra firme, constrói o sonho que vai levá-lo a mares distantes. Lá, a 780 metros acima do nível do mar e com o auxílio da enteada Juliana Siqueira, 21, ele corta e lixa placas de madeira e faz experimentos com fibra de vidro para a construção de um veleiro de 33 pés (10 m). “Pesquisamos esse projeto na internet”, conta o piloto, que pretende melhorar o desempenho em regatas com o barco. No início, a opção foi construir um modelo menor, de 28 pés (8,60 m). Só que, quando ele e Juliana foram à Argentina ver um pronto, desistiram: “A gente subiu, olhou o do lado e falou: ‘Ah, quero o maior!’” “Construir um barco é um romance e uma tragédia”, define o engenheiro naval Jorge Nasseh, autor de “Manual de Construção de Barcos”, o livro de cabeceira dos que sonham em colocar na água sua própria engenhoca. Estima-se que cerca de 3.000 barcos são construídos todos os anos, para uso próprio, no Brasil (leia quadro à pág. 27). Segundo Jorge, que lança seu terceiro livro hoje, às 16h, na São Paulo Boat Show, 99% das embarcações são a vela. Apesar de ser novato na construção, Alexandre, que veleja há dez anos, já comprou e reformou um barco abandonado na represa de Guarapiranga. “Foram oito meses de trabalho até colocá-lo na água”, conta Juliana. Recuperar barcos sucateados é muitas vezes um primeiro passo para se aventurar na construção. Após a reforma de um pequeno veleiro, o empresário Riccardo Guardalben, 42, comprou um projeto para construir o seu próprio modelo. O antigo “day sailer”, como são chamadas as embarcações para passeios curtos, foi vendido para engordar a poupança do futuro veleiro de 36 pés (11 m). “Apareceu uma boa oportunidade e acabei transformando o velho em matéria-prima.” Os R$ 8.500 apurados viraram alumínio, empregado na construção do novo brinquedo. Para abrigar sua criação, Riccardo construiu um galpão nos fundos da empresa de embalagens que dirige, em Mauá, na Grande São Paulo. A exigência de tanto espaço leva os construtores a optar por regiões mais afastadas, onde o valor do aluguel é mais baixo. “O tamanho mínimo é de duas vezes o tamanho do barco”, recomenda Jorge. Nesse ponto, o gerente administrativo Claudinê Franco, 50, deu sorte. Ao som do rock inglês do Queen, alternado com jazz e blues, ele divide o galpão com Riccardo. Com muito zelo, Claudinê manuseia o cedro e a fibra de vidro com que constrói sua versão de 28 pés de um modelo similar ao do amigo. navegar é preciso Para evitar desistências no meio do caminho >> É necessária muita persistência. Saiba se você quer mesmo fazer seu próprio barco >> Veja se vale a pena comprar ou construir >> Estabeleça seu objetivo: regatas, passeios curtos ou longos >> Pesquise em sites e livros e visite estaleiros >> Descubra com que tipo de material você tem mais afinidade >> Faça um planejamento de custo de longo prazo Onde saber mais: Associação Brasileira de Veleiros de Oceano (www.abvo.org.br/) e Federação de Vela do Estado de São Paulo (www.fevesp.org.br) Beatriz Toledo/Folha Imagem Alexandre Dangas, 38, e Juliana Siqueira, 21, sobre seu futuro veleiro 28 DE SETEMBRO DE 2008 [ REVISTA DA FOLHA ] 25 metrópole Riccardo Guadalben, 42, na estrutura de seu barco de alumínio “Eu mesmo cortei toda a madeira em cima de uma bancada, usando um tico-tico”, conta orgulhoso.” O tempo de produção varia muito de construtor para construtor. Claudinê já está no terceiro ano, instalando a marcenaria. “A idéia é não comprometer o orçamento familiar, levar como hobby e, ao final, terminar com uma embarcação.” O motivo de tanta dedicação é o sonho de fazer uma travessia oceânica até a Itália. A jornada solitária de 40 dias foi outro motivo para Claudinê optar pelo processo. “Tenho que ter um barco em que eu possa confiar. Não daria para comprar um casco e ir para o mar sem saber como foi concebido.” Ter intimidade com a embarcação e fazer modificações no projeto fazem diferença. Outras vantagens, apontadas por Riccardo, são personalizar o interior do barco e mexer em sua ergonomia. Seu veleiro, por exemplo, será preparado para a viagem que fará com sua família para a Antártida. Um dos grandes desafios dos construtores “caseiros” é o custo do sonho. “Geralmente, um projeto fica em torno de R$ 100 mil a R$ 300 mil”, aponta Jorge. “Muita gente acredita que sai mais barato, mas não sai.” Na hora de decidir entre comprar ou construir, muitos preferem a segunda opção por ser mais flexível. “Para eu comprar um barco pronto, vou ter que bancar de uma vez só”, explica Alexandre. Como construtor, ele pode economizar o valor da mão-de-obra e fazer no tempo de seu caixa. 26 [ REVISTA DA FOLHA ] 28 DE SETEMBRO DE 2008 Divulgação Barco ruim não afunda Trocar informações é fundamental. Riccardo freqüentemente recebe amigos no galpão para trocar idéias sobre lixas e soldas. “O bacana da construção amadora é ouvir quem está construindo e, principalmente, quem já construiu”, afirma. Para isso, os construtores contam com um grande número de blogs e fóruns. Pesquisar em livros e visitar estaleiros também são outras fontes para saber, ao menos, o que não fazer. “Tem coisas que a gente vê e não acredita: plantas e vasos dentro do barco, por exemplo”, diverte-se Claudinê. Enquanto muitos aprendem com os erros alheios e acabam até abrindo estaleiro de produção artesanal, outros casos têm finais dramáticos. O professor de navegação Fabio Reis, que não acredita muito no talento amador, já viu vários barcos tortos. “Um amigo meu levou quatro anos para montar uma lacraia”, brinca. Mesmo assim, segundo Jorge, há salvação. “Qualquer coisa bóia. Barco fica ruim, mas não afunda.” Fotos Karime Xavier/Folha Imagem luxo na marginal Segundo dados da Associação Brasileira dos Construtores de Barcos e Seus Emplementos, a Acobar, as atividades que envolvem a construção, compra e venda de barcos movimentaram US$ 470 milhões em 2007 no país. Só na São Paulo Boat Show daquele ano, maior feira náutica da América Latina, foram R$ 158 milhões em seus seis dias de funcionamento. Neste ano, a feira conta com 150 expositores que trazem preciosidades como a lancha Phantom 500 HT, avaliada pelo mercado por cerca de US$ 2 milhões. Palestras gratuitas sobre mergulho e orientação na compra de veleiros e lanchas estão na programação. Para os interessados em tirar a habilitação de arrais amador -que permite a condução de embarcações de esporte e recreio- a Marinha do Brasil aplicará o exame, que tem taxa de R$ 80 e deverá ser paga em espécie no momento da inscrição. Claudinê, 52, e o veleiro que o conduzirá em viagem solitária o onde Transamérica Expo Center. Rua dr. Mário Villas Boas Rodrigues, 387, Santo Amaro, tel. 2186-1062. quando Até 1º/10. Hoje: 12h às 22h. Seg. a qua.: 14h às 22h. ingresso adultos e estudantes R$ 30, acima de 65 anos R$15, portadores de necessidades especiais R$ 1 e crianças de até um metro grátis. Informações no site www.boatshow.com.br servi ç Para não passar muito aperto, Riccardo começou a economizar cinco anos antes. “Abri uma conta à parte e, quando deu 50% do valor do barco, comecei a construção.” Planejamento é importantíssimo. “É igual à obra em casa. Você acha que vai gastar ‘x’ e gasta sempre mais.” Claudinê, por outro lado, não quer mais saber de conta. “Parei de registrar, quero me enganar.” Sua estratégia para não se esgotar financeira e mentalmente é programar pausas. Em um dos anos, chegou a ficar cinco meses de férias de seu barco. Acostumado a receber emails de construtores amadores, Jorge confirma que a quantidade de desistências é elevada. “É muita energia. Tem gente que perdeu a mulher, que quer largar o trabalho”, afirma. “A grande sacada é você comprometer as mulheres para ajudar na decoração e no layout interno”, aconselha Riccardo. 28 DE SETEMBRO DE 2008 [ REVISTA DA FOLHA ] 27