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veio carregado de esperança, o sentimento que contagiou 85% dos brasileiros e todos os setores da vida do país. Todos esperamos que venham – rápidas, efetivas, transformadoras – as tão necessárias mudanças, mote principal das campanha dos candidatos à Presidência. As mudanças começam a chegar e passam pela direção da ACERP: sai Fernando Barbosa Lima, entra Beth Carmona na presidência da entidade. “Mudar” tem como significado mais expressivo “dispor de outro modo”. E é precisamente isto que todos esperamos da nova presidente da ACERP, que nos chega ungida pela aura das mudanças incorporadas pelo novo governo – como bem o atesta a fala do Secretário de Comunicação Social, na cerimônia de posse (veja na página 4). Presente à posse, a SOARMEC pôs-se à inteira disposição da nova direção da ACERP para contribuir no planejamento desse “outro modo” de que tão agudamente necessitam as Rádios MEC, neste momento. Nesta edição do “Amigo Ouvinte”, voltamos a expor e analisar as graves questões técnicooperacionais e administrativas que vêm cerceando cada vez mais o desempenho das duas emissoras. Confira na página 4. Ao mesmo tempo, reiteramos aqui nossa disposição em contribuir, junto à nova direção da ACERP, para que o atual estado-de-coisas seja “disposto de outro modo”. O documento entregue ao presidente Lula – veja a íntegra na página 5 – explicita claramente nossas propostas de mudança, e seu sentido é o de “revitalização e retomada”. Confiamos em que, mais do que um debate retroativo e desgastante, teremos a “correção de rota” na direção das propostas de uma rádio educativa e cultural, moderna e eficiente – como queriam Roquette-Pinto e Henrique Morize, ao colocar no ar, em 23 de abril de 1923, a 1ª emissora de rádio brasileira. É auspicioso que as comemorações destes 80 anos coincidam com o clima de mudança trazido pelo atual governo, e, assim, inspirem os planos de ação da nova diretoria da ACERP. Oportunas e inadiáveis, tais mudanças serão, sem dúvida, o melhor presente de aniversário que as Rádios MEC, seus funcionários, colaboradores e ouvintes, poderiam receber. 2003 1923 Amigo Ouvinte Ano XI • Nº 34 • MARÇO DE 2003 I N F O R M AT I V O D A S O C I E D A D E D O S A M I G O S O U V I N T E S D A R Á D I O M E C ACERP tem novo presidente Acervo TVE M u da n ça s no a r IMPRESSO Editorial Elizabeth Carmona – na foto, entre o Secretário de Comunicação da Presidência, Luiz Gushiken e a diretora de TV Rosa Maria Crescente – é, desde o dia 21 de fevereiro, a nova diretora-presidente da ACERP, a associação que administra a TVE e a Rádio MEC – páginas 3 e 4 SOARMEC recebe Prêmio Estácio de Sá 2002 SOARMEC foi eleita pelo Conselho Estadual de Cultura, por unanimidade, para receber o prêmio Estácio de Sá, 2002, na Categoria Comunicação. Instituído em 1977, para contemplar pessoas e instituições que se sobressaem, anualmente, nos diversos setores culturais, o Estácio de Sá é um dos mais importantes prêmios culturais do Estado do Rio de Janeiro. Indicada ao Conselho pela Academia Brasileira de Música – a quem mais uma vez agradece –, a SOARMEC obteve, assim, mais um incontestável reconhecimento dos serviços prestados à cultura brasileira e ao rádio educativo-cultural. Veja fac-simile da notificação, ao lado. A Também neste número Alto-falante Cartas Uma carta para Lula Quatro perdas 2 2 5 7 Adorno em Nova York 9 A Rádio do meu tempo, entrevista com Allan Lima e Ieda de Oliveira 11 O ouvinte permanente Números da CAO Coluna do Conselheiro Programações OITENTA ANOS DE RÁDIO NO BRASIL 15 15 15 16 2003 Alto-Falante SONIA VIRGÍNIA MOREIRA também doou e autografou trës ediçóes recentes de seus livros para nossa biblioteca. O VETERANO Paulo Cezar Bourget, do Setor de Planejamento e Orçamento, já não trabalha mais na rádio. Foi substituído pelo seu homônimo Paulo Cezar Pestana. Marlene Aparecida Mattos, do mesmo setor, pediu transferência para o Ministério da Fazenda. A LIVRARIA Só Letrando batizou o seu café literário com o nome do poeta Geir Campos, que foi importante produtor da PRA-2. O café fica em Niterói, na rua José Clemente, 27. O SELO RÁDIO MEC, que muitos confundem com o Selo SOARMEC, foi contemplado com polpudo financiamento pela Petrobrás Distribuidora. Veja anúncio na página 8. PESQUISA realizada em São Paulo mostra que as vendas de CDs, lá, caíram quase 50 %. Não deve ser muito diferente o percentual de queda das vendas no Rio e em outras cidades. YATA ANDERSON , veterano do jornalismo esportivo, aposentou-se no início do mês. ESTUDO DA UNESCO apurou que a maioria dos 70 países que firmaram o compromisso de “Educação para todos” – no Forum Mundial de Educação, em 2000 – não irão cumprir as metas acertadas de reduzir a exclusão educacional até 2015. JOSÉ LUIZ SOARES do Nascimento é o novo locutor contratado pela MEC FM, para o lugar do saudoso Paulo Márcio (veja necrológio na página 7). PAULO SANTOS, o lendário introdutor do jazz no Rádio Brasileiro e o mais famoso locutor da antiga PRA-2, está recolhido, desde novembro, na Casa São Luiz, no Caju. O ANALFABETISTMO adulto chega a 868 milhões, em todo o mundo. No Brasil, 13,63% dos adultos são analfabetos, o que dá cerca de 20 milhões de pessoas. Veja trecho do discurso do novo Ministro da Educação, nesta página. EDINO KRIEGER, ex-presidente da SOARMEC, é o novo presidente do Museu da Imagem e do Som. PESQUISA DO ISER concluiu que um terço dos moradores de favelas ouvem rádios comunitárias. Para mostrar a todos o que é esse tipo de rádio, está no ar, no prefixo AM 1180, a Rádio Viva Rio – parceria do Viva Rio com o Sistema Globo de Rádio. NOSSA PEQUENA coleção de rádios antigos cresceu bastante com a doação feita por Zé Zuca (foto). Foto JC M ello A BIBLIOTECA Tude de Souza recebeu duas sensacionais doações de Allan Lima: quatro volumes de scripts raros, assinados por Pascoal Longo e Otto Maria Carpeaux, e o raríssimo livro “Como falar e escrever certo”, de Otacílio Rainho, professor de Português do programa “Colégio do ar”. O MINISTÉRIO da Cultura tirou do ar o canal TV Cultura e Arte, que era distribuído por operadoras de TV- paga e acessível por meio de parabólicas. O Cultura e Arte foi criado em 2001 e encontrou resistências no próprio governo (a Radiobrás era contra). Seu custo operacional era de R$150 mil, mensais. ONDAS CURTAS é o nome da nova publicação da SOARMEC, cujo 1º número saiu em janeiro. Seu objetivo é manter nossos sócios informados durante os intervalos entre os números do AMIGO OUVINTE, que, por questões econômicas, está saindo muito espaçadamente. MOANA Mayal, nossa ex-colaboradora, está fazendo, por sua produtora MOTIM, um diagnóstico de nosso site, no intuito de atualizá-lo jornalisticamente e capacitá-lo para que preste os serviços que é potencialmente capaz de prestar ao usuário. Cartas Tenho sido ouvinte (e amigo) dos 800 kHz da nossa MEC AM, mas infelizmente está se tornando cada vez mais difícil manter o hábito. (...)ªInconformado com a súbita piora do sinal (...) quase sempre no meio de um programa, liguei muitas vezes para vários departamentos da rádio, e o que sabem dizer é: “está normal”. “de nada sabemos”, “ninguém reclama”, “aqui estamos ouvindo bem”, “o problema deve ser na recepção”... E tinha que continuar ouvindo apitos e zunidos(...) Bom, problemas de recepção (de qualquer emissora) sempre existem, é claro. Geralmente ocorrem em zonas limítrofes do alcance do sinal de rádio-frequência, ou devido a obstáculos locais (que pode ser o meu caso, morador da Ilha do Governador) – mas também dependem da potência de transmissão! Bom, num dia de sorte, alguém do setor técnico me atendeu bem e soube informar o seguinte: a AM possui dois transmissores, um principal de 100kW de potência (o que é muito bom!), e outro, reserva, de 10 kW. Mas disse também que o principal não costumava usar toda a sua potência, e que às vezes era o reserva que transmitia 2 a programação (...) Portanto, fico pensando: a MEC AM, um dia investiu em um equipamento de ótimo potencial, capaz de ombrear seu sinal com os das maiores emissoras comerciais (...) Mas hoje ela fica apenas espremidinha entre o potente sinal da CBN (que durante o dia é efetivamente de 100kW) e o da Manchete (não tão forte, mas suficiente para abafar o da MEC). (...) A quem interessa isso? Quem se sentiria prejudicado com uma melhores programações do Brasil transmitindo com um sinal potente, audível, emfim, disputando honestamente a audiência? Aluisio Lemos Gostaria saber o porque das deficiências técnicas. Falta pessoal técnico? O operador dorme ou sai para lanchar? Tenho um pouco a impressão que isso realmente acontece porque observo muitas vezes uma pausa muito grande (não somente de segundos mas sim de minutos) entre o fim de uma musica e a volta do apresentador. Gerhard Hackstein Ami go Ouvinte é uma publicação da SOARMEC Sociedade dos Amigos Ouvintes da Rádio MEC. De Utilidade Pública Municipal (Lei nº 2464) e Estadual (Lei nº 3048) CGC 40405847/0001-70 Praça da República l4l-A Sala 201 CEP 20211-350 Tel: 2221-7447 R: 2207 e 2210 [email protected] EDITOR-RESPONSÁVEL: Renato Rocha JORNALISTA-RESPONSÁVEL: Francisco Teixeira PRESIDENTE DE HONRA: Beatriz Roquette-Pinto DIRETORIA: PRESIDENTE: Luis Carlos Saroldi VICE-PRESIDENTE: Regina Salles TESOUREIRA: Leonete Marback ATIVID. CULTURAIS: Francisco Teixeira COMUNICAÇÃO: José Renato Monteiro PATRIMÔNIO: Reinaldo Ramalho SECRETÁRIO: Renato Rocha CONSELHO FISCAL: Sérgio Cabral, Norma Tapajós e Otto A. de Castro COLABORADORES: Paulo Garcia, Renata Mello CONSULTOR JURÍDICO: Letácio Jansen CONTADOR: Manoel Mescouto COORDENAÇÃO GRÁFICA: J. C. Mello Trechos do discurso de posse do Ministro da Educação Cristovão Buarque (...) Tenho muitas razões para estar aqui, feliz, contente e agradecendo ao presidente Lula. Mas a mais importante é a luta contra o analfabetismo. Cheguei onde eu gostaria na minha vida. Por isso hoje, eu não penso, em absoluto, em ter uma disputa eleitoral no futuro. A minha disputa agora é com a história. E com a história para cumprir esse compromisso de termos, nesse país, abolido o analfabetismo. (...) Não é possível que um país que tem a mesma língua, fabrica aviões, tem hidrelétricas, tem tanta riqueza, não consiga fazer com que todos os adultos leiam a língua, que quase todos falam, salvo alguns grupos indígenas. Não é possível. É uma vergonha que nós não temos o direito de viver com ela e muito menos de deixá-la para gerações que venham depois de nós. Nós herdamos um Brasil com analfabetismo. Mas, por favor, não repassemos para os nossos filhos e netos, para gerações futuras, um Brasil com a chaga do analfabetismo. (...) Quero fazer uma referência depois a outro grupo, ao qual eu vou me dedicar: as crianças brasileiras. (...) Quando alguns anos atrás, o Ministério da Educação deixou de ter a Cultura, mantiveram o “C” do MEC. Naquela época eu disse: como podemos falar em Educação, se escrevemos errado a sigla do Ministério da Educação? Hoje, quero dizer que a sigla não está errada: aquele C na sigla é de “Criança”. A partir de hoje, esse é o Ministério da Educação e das Crianças brasileiras. (muitos aplausos). ACERP tem nova presidente Empossada em 21 de feverereiro, pelo Conselho de Administração, em cerimônia na TVE, que contou com a presença do atual secretário de Comunicação, Luiz Gushiken, e várias personalidades da política e da mídia eletrônica, Elizabeth Carmona traz para trabalhar em sua equipe, como Diretora de TV, Rosa Maria Crescente; como Diretor Financeiro, Orlando Guillon; e mantém o experiente Silvio ReNa cerimõnia de posse, Luiz Gushiken, nan Ulisséa na Direção Executiva. Elizabeth Carmona e Fernando Barbosa Lima Acervo TVE quarto Diretor-presidente da ACERP é uma pessoa preocupada com a qualidade da programação da mídia eletrônica e responsável por programas premiados, aqui e no exterior. Em seu discurso de posse (veja box à direita), Elizabeth Carmona fêz referências ao rádio e à Rádio MEC, o que é muito auspicioso, pois contraria uma tendência cultivada por quase todos os responsáveis máximos pela TVE e Rádios MEC – desde a antiga FUNTEVÊ, até a atual ACERP. O Acervo TVE Perfil profissional Beth Carmona foi diretora de programação da TV Cultura, de São Paulo, onde trabalhou de 1987 a 1998, sendo eleita membro da Diretoria Executiva da emissora por duas gestões consecutivas, durante as quais a emissora chegou a ocupar, em São Paulo, o segundo lugar em audiência. Responsável por uma programação dirigida ao público infan to-juvenil, reconhecida no Brasil e no exterior, Beth Carmona também supervisionou projetos para o público adulto, com destaque para programas históricos, sociais e culturais. A longa lista de realizações inclui as séries Mundo da Lua, Castelo Ra-Tim-Bum, Cocoricó e X-Tudo, e os programas Turma da Cultura, Matéria Prima, Leituras do Brasil, Olhando para o Céu, e Nossa Língua Portuguesa; além de co-produções nacionais e internacionais. Em junho de 1999, assumiu a Direção de Programação e Produção dos canais Discovery Kids e Animal Planet, do grupo Discovery, para a América Latina e Ibéria. Nesse cargo, foi responsável por supervisionar as coproduções internacionais e os projetos realizados em parceria com produtoras brasileiras e latino-americanas, em um trabalho que gerou programas como Cyberkids, Eco Aventura Amazônia, Acesso Total, Missão Astronauta, Amigo Zôo, Os Brasileiros, Expedição Langsdorf, e Novos Heróis-Animais em Extinção, entre outros. Em janeiro de 2002, Elizabeth Carmona assumiu a supervisão dos seis canais do grupo Discovery no Brasil – Discovery Channel, Animal Planet, Discovery Kids, Discovery Health, People & Arts e Travel & Adventure –, passando a se dedicar mais intensamente aos conteúdos brasileiros dos canais, para garantir a adequação e participação local na programação. Apoio Cultural Em outubro de 2002, foi convidada para a Direção de Programação e Produção dos canais Disney e Fox Kids Brasil, com a responsabilidade de orientar a produção local e de identificar talentos e projetos criados especialmente para o público brasileiro. Além da grande experiência prática no desenvolvimento de programações de qualidade, Beth Carmona também é uma estudiosa do veículo Televisão, com participação em eventos promovidos por organizações como o UNICEF e a Fundação Internacional Prix Jeunesse. Em Londres, em 2001, coordenou o painel da América Latina, no II World Summit for Children and Television, e, em março de 2002, integrou o Comitê de Organização do III World Summit, realizado na Grécia. Atualmente, participa ativamente da organização da IV Cúpula Mundial de Mídia para Crianças e Adolescentes, que se realizará no Rio de Janeiro, em abril de 2004. Elizabeth Carmona preside, ainda, a ONG Centro Brasileiro da Mídia e da Criança – MIDIATIVA, que se dedica ao debate do tema da qualidade na Mídia. T r e c h o d o d i s c ur s o d e p o s s e “O mestre Roquette-Pinto, ao iniciar as atividades do Rádio no Brasil, disse que o Rádio seria “o livro e o jornal daqueles que não sabiam ler”. Interpretar este ideal e evoluir nesta linha de pensamento é valorizar a missão da Rede Educativa de Rádio e TV, é contribuir para a formação ampla do nosso povo, é pensar no cidadão e na construção da cidadania. Trabalharemos no sentido de recuperar o caráter nacional de nossas emissoras, com profissionais que sintam orgulho de participar em mais uma fase deste projeto. Temos muito trabalho pela frente, mas acreditamos numa missão possível . Televisão se faz em equipe . Radio também. Só conseguiremos atingir a qualidade quando as várias áreas envolvidas no processo estiverem afinadas – a área técnica de transmissão, equipamentos e estrutura deve acompanhar e dar todo suporte aos conceitos, conteúdos, formatos e filosofia. Produção original e própria, produção de terceiros, independentes, parcerias e co-produções. Temos que fazer parte do projeto que vai impulsionar a produção áudio-visual neste país . Nessa linha, nossa programação deve ser diferenciada, alternativa no sentido mais amplo do conceito. Temos o compromisso de oferecer um serviço cultural, educativo e informativo para toda a sociedade, para todo o Brasil. Um serviço publico necessário, uma programação saudável. Temos que garantir a presença e a expressão nacional em toda sua variedade e ajudar no processo de formação de telespectadores mais exigentes, sendo mais exigentes com nós mesmos. Temos que ajudar na criação de referências áudio-visuais de qualidade.” Reflexão, e informação sobre a música A Revista da Academia Brasileira de Música Faça sua assinatura anual (R$20,00) Telefax (21) 2205 3879 • www.abmusica.org.br • [email protected] 3 Pronunciamento quase perfeito Acervo TVE O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem a dimensão exata do significado da palavra público e da palavra educação. São duas áreas no País que sempre careceram, entre outras coisas, de atenção e até de respeito por parte dos governantes. (...) E não é a minha presença aqui que dá o testemunho desse respeito e dessa atenção. O que dá o testemunho do respeito e da atenção que o novo governo brasileiro tem pelo público e pelo caráter educativo da TVE e das rádios MEC é a presença da Beth Carmona como a nova presidente desta casa.(...)A história de vida de Beth Carmona é uma prova incontestável de quanto representa, para nós do governo, a Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto. Trazer Beth Carmona para esta Casa não foi uma tarefa fácil. Ela tinha outros compromissos, outros projetos.(...) Luiz Gushiken, Secretário de Comunicação da Presidencia da República “quase” do título desta matéria deve-se ao fato de que há uma frase – no pronunciamento feito pelo novo Secretário de Comunicação da Presidência, na posse da nova Diretora-presidente da ACERP ( box acima) – que, tirada do contexto, transforma-se em um dos maiores elogios já feitos à ACERP. No contexto do discurso, no entanto, fica claro que, ao afirmar que "a história de vida de Beth Carmona é uma prova incontestável de quanto representa, para nós do governo, a Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto", Luiz Gushiken pretendeu dizer que "a história de vida de Beth Carmona é uma prova incontestável de quanto representa, para nós do governo, o bom funcionamento da ACERP e a idéia das Organizações Sociais". Assim como está, fica difícil aceitar a frase, pois, enquanto a premiada folha de serviços da pessoa física Elizabeth Carmona merece todos os elogios, a folha de serviços da pessoa jurídica ACERP ainda deixa muito a O desejar. Isso talvez explique porque o Secretário acrescenta, na sequência, que “trazer Beth Carmona para esta Casa não foi uma tarefa fácil.” Produto endogâmico do governo anterior, que há mais de quatro anos mistura terceirização com burocracia, a gestão da ACERP, pelo menos na Rádio MEC, provocou um esvaziamento sem precedentes – esvaziamento que vinha de antes, é verdade, mas que adquiriu mais velocidade e tornou-se inexorável. Não é função do Amigo Ouvinte avaliar o que foi feito ou desfeito na TVE, mas, preocupados com a situação da mais importante rádio educativa-cultural do país, e esperando contribuir para uma futura e desejada mudança, não podemos deixar de apresentar alguns dados que, acreditamos, são do interêsse do Secretário e da Diretorapresidente – já que ambos citaram as Rádios MEC em seus pronunciamentos –, nesta hora de troca de comando e recomeço de jornada. (RR) Duas ou três coisas sobre a ACERP-Rádio G Nesses anos de experimentação administrativa, gerindo uma rádio pública voltada para a Educação e Cultura, podemos afirmar que a ACERP – que carecia de experiência anterior em teleducação – não conseguiu resolver os muitos problemas herdados da extinta Fundação Roquette-Pinto, e ainda acrescentou outros à lista. Temos hoje uma FM tautológica – que só não é mais repetitiva graças a seus produtores, que adquirem e trazem novos CDs para alimentar a programação –, e uma AM que nem de repetitiva pode ser rotulada, pois não "fala". Sua abafada chiadeira é produto de um transmissor velho numa antena da Radiobrás, em Itaóca, na qual pegamos "carona", e que também não está se sentindo muito bem. G O espaço físico da emissora, na Praça de República, carece cada vez mais de reforma e manutenção. O prédio continua sem a sonhada escada externa de incêndio, com elevadores caducos e escadaria em péssimo estado. G O equipamento radiofônico propriamente dito também carece de reposição e manutenção. O nível de canibalização dos aparelhos, chegou ao máximo. Há grave carência de tocadores de minidisks e CDs. G A discoteca continua dependendo de doações:não existe um programa de aquisições de discos. G O setor Educativo, que não ia bem das pernas, acabou de acabar, há dois anos, sem choro nem vela. G Em termos de programação, se, por um lado, foram acrescentados à grade programas como o de Altamiro Carrilho, e de Pedro Luiz e a Parede cortou, por outro, muitos programas, e dissolveu o Conselho de Programação. Saíram da grade: os programas infanto-juvenis do Zé-Zuca, que faziam link com as escolas e estimulava a reflexão dos estudantes; o "Nosso Tempo", que debatia as necessidades dos deficientes físicos; as crônicas de Mário Negreiros e Alcione Araújo; o programa semanal de "Defesa do Consumidor"; e os programas de entrevistas, pesquisas e de serviços na AM. 4 G Como se depreende, todos os programas opinativos foram sistematicamente extintos. Esta orientação, aplicada ao jornalismo, amputou o setor, que ficou sem as tradicionais edições matutinas (quatro) e noturnas (três). Ficou também sem as análises de economia; sem a reportagem factual; sem as entrevistas sobre temas inéditos com populares; sem a cobertura de eventos educativos e científicos; sem os semanais "Painel do Esporte", "Documento Vivo" (de reportagens sobre um assunto especial), "Memória Brasil" ( que entrevistava personalidades) , e "Além da Notícia" (que debatia temas momentosos). G O Setor de Pesquisa, que já teve 10 funcionários, hoje tem apenas um – que dá conta do serviço, pois a rádio está quase sem produção. Vale lembrar que a Pesquisa ainda não foi informatizada, o mesmo acontecendo com o Acervo de Programação, que possui quase 40 mil gravações e continua sendo catalogado manualmente. G Para se ter uma idéia do conjunto, falta acrescentar , ainda, a extinção do cargo tradicional de “Diretor da Rádio”, a extinção dos concursos “Talento Rádio MEC” e FESCAN – para concertistas e estudantes, respectivamente –, e a redução drástica do pessoal da produção, locutores, técnicos e operadores, com a conseqüente queda na qualidade da programação e sobrecarga dos que permanecem trabalhando. Se alguém adoece ou entra em férias, o bicho pega, porque não há contratações – nem mesmo as temporárias para substituição em caso de férias, doença ou licença. (RR) OBSERVAÇÃO NECESSÁRIA. Na listagem acima, não nos detivemos na criação do Selo Rádio MEC, que tem vários méritos – cria opotunidade profissional para os 16 artistastítulo e seus acompanhantes, enriquece nossa discografia com cerca de duzentas canções e peças inéditas, e também dá visibilidade midiática à emissora. Mas, convenhamos, a rádio precisa mais de audiência do que de visibilidade e, na verdade, um selo discográfico é, em si, uma atividade de natureza extra-radiofònica. Veja anúncio na página 8 Fernando Barbosa Lima A aplaudida gestão de Fernando Barbosa Lima na ACERP – aplaudida por pessoas do padrão de Fernanda Montenegro – faz pensar que, caso ele tivesse sido não o terceiro mas o primeiro presidente da Associação, o saldo, hoje, seria muito mais animador. Não podemos esquecer que ele assumiu em janeiro de 2002, quando, depois Foto Fabio Pimentel de dois anos de desempenho abaixo da crítica, a ACERP – sigla que ele pedia aos jornalistas para omitir e substituir por REDE BRASIL, em suas matérias – perdia fôlego, audiência e credibilidade. O escândalo da censura na TVE ainda estava fresco, e a amputação de programas jornalisticos e opinativos, na rádio, ainda sangrava. Como não era um homem de rádio e como praticamente restava tudo por fazer na TVE, Fernando praticamente dedicou-se a esta última. Não cabe falar, aqui, dos problemas herdados e resolvidos, ou não, na TVE, nem do que deixou de ser feito nas Rádios MEC (veja balanço nesta página). Mas não podemos deixar de registrar o apoio que Fernando Barbosa Lima e sua equipe, deram aos Amigos Ouvintes. Ainda mais quando se lembra que, em relação à nossa sociedade, Fernando herdou um embaraço que, certamente, não teria assumido a proporção que assumiu, se ele, com sua elegância e sentido ético, estivesse no cargo desde o início. Como se sabe, Fernando substituiu um diretor-presidente que combatia a SOARMEC e evitava o diálogo chegando a desmarcar 8 reuniões consecutivas com nosso diretor-presidente, na época Edino Krieger. Em sua gestão, Fernando Barbosa Lima reatou o diálogo da ACERP com a SOARMEC, autorizou a realização de novos discos da série repertório – o que permitiu a feitura do CD de Mário Tavares enquanto o maestro estava vivo –, veiculou chamadas na TVE e permitiu o retorno das chamadas da SOARMEC pela Rádio MEC, além de fornecer a contrapartida para a estruturação do futuro estúdio de remasterização da Rádio MEC, em parceria com os Amigos Ouvintes. Seria uma ingratidão não registrar este agradecimento a ele e aos componentes de sua eguipe, com destaque para o diretor Silvio Renam e o advogado Carlos Adalberto Torres. “uma volta ao passado dos grandes filmes, das velhas matinês!!!” Cine Clube "FILME ANTIGO" Tex./Fax: (021) 2711-0601 C. Postal: 10.5039 Icaraí - Niterói - RJ CEP. 24.230-970 Carta ao Lula Pronunciamento do senador Roberto Saturnino no Senado Federal Foto JC Mello “Gostaria de dar notícia à Casa de uma carta da Sociedade dos Amigos Ouvintes da Rádio MEC ao Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. Na verdade, os funcionários e ouvintes da Rádio MEC, especialmente os mais antigos e ainda vinculados ao ideal da radiodifusão educativa, nunca se conformaram ou aceitaram o desligamento da emissora do Ministério da Educação para a sua vinculação à Secretaria de Comunicação da Presidência, juntamente com a Radiobrás. Na verdade, a emissora Rádio MEC tem uma função eminentemente educativa, que vem desde a sua criação por Roquette- Pinto, que fez a doação ao Governo Federal com o compromisso de mantê-la como emissora educativa e cultural. A Secretaria de Comunicação, onde está a Radiobrás, tem outra missão, a da informação do Governo, que nós consideramos também importante. Tive inclusive a oportunidade de me manifestar contrariamente, estranhando essa vinculação. A Sociedade dos Amigos Ouvintes da Rádio MEC fez esta carta, que peço seja transcrita na íntegra nos Anais desta Casa. A carta historia desde a origem da emissora, a sua doação à Fundação por Edgar Roquette-Pinto, depois o Ato do Presidente Getúlio Vargas, de 1943, criando o serviço de radiodifusão educativa, exatamente em respeito ao compromisso assumido com o doador Roquette-Pinto. Enfim, toda a história, até finalmente esta vinculação estranha à Secretaria de Comunicação da Presidência da República. Sr. Presidente, a carta termina pedindo ao novo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva que considere sugestões de diretrizes estratégicas relativas à Rádio MEC, que rapidamente leio.(...)” O senador encerra seu pronunciamento lendo as proposições contidas na carta que vai transcrita na íntegra, a seguir, nesta página. Íntegra da Carta ao Presidente Rio de Janeiro, 12 de novembro de 2002 Senhor Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva A Sociedade dos Amigos Ouvintes da Rádio MEC – SOARMEC é a primeira e, até o momento, a única entidade de amigos voltada para uma emissora de rádio, em todo o Brasil. Criada em 1992, para apoiar as atividades educativas e culturais da Rádio MEC, a SOARMEC reúne entre seus colaboradores um representativo grupo de artistas, jornalistas, radialistas, educadores e profissionais liberais preocupados com os rumos da radiodifusão educativa-cultural em nosso país. Edgard Roquette-Pinto, o pioneiro da radiodifusão brasileira, foi também o primeiro a perceber a importância do rádio como veículo de difusão da educação e da cultura. Ele sabia que o rádio poderia se tornar "a escola dos que não têm escola" e, assim, um poderoso instrumento de transformação do homem. Em 1923, fundou a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro e, em 1936, doou-a ao então Ministério da Educação e Saúde – com a condição de que mantivesse sua programação educativa e cultural. Honrando o compromisso, o Presidente Getúlio Vargas assinou, em 1943, o Decreto 11491, que criava o Serviço de Radiodifusão Educativa – SRE, implementando o rádio como instrumento de política pública, ligado ao Ministério da Educação e Saúde. O SRE tinha como missão "orientar a radiodifusão como meio auxiliar de educação e ensino, promover, permanentemente, a irradiação de programas científicos, literários e artísticos de caráter educativo e informar e esclarecer quanto à política de educação no país". Mas, não obstante os bons serviços prestados à educação e à cultura, o SRE foi sendo progressivamente descaracterizado, a partir de 1964. Posteriormente, no final do governo Itamar Franco, houve uma tentativa de se transformar as emissoras educativas do governo (entre elas a Rádio MEC e a TVERJ) em emissoras públicas, voltadas para a educação no sentido mais amplo, revendo sua constituição e estabelecendo alianças com outros setores da sociedade. Sentia-se a necessidade de valorizar ainda mais o produto cultural do país, inclusive abrindo espaço para as manifestações artísticas regionais. Em janeiro de 1995, entretanto, o governo Fernando Henrique Cardoso transferiu, por decreto, as emissoras educativas do Ministério da Educação para a Secretaria de Comunicação da Presidência da República. Extinguiu os departamentos de educação da TVE e da Rádio MEC, e criou uma estrutura paralela chamada "TV Escola" – que não correspondeu à demanda do ensino a distância no país. Em seguida, promoveu a extinção da Fundação Roquette-Pinto e a criação da Associação de Comunicação Educativa Roquette-Pinto – Acerp. Era o início do processo de "publicização" que dura até hoje, com repasse do patrimônio público de radiodifusão a um grupo privado, através de um contrato de gestão, sem autorização do Congresso Nacional, sem visibilidade social e sem um processo licitatório. Diante deste quadro, não é mais possível protelar claras e urgentes definições de uma política democrática e plural para a radiodifusão educativa e cultural no Brasil. Entendemos que, num governo realmente preocupado com a identidade do país, tal política deverá contemplar diretrizes e estratégias, como: 1) recuperar o papel e a função das emissoras públicas de radiodifusão como meio de educação a distância, promovendo sua utilização como recurso efetivo na democratização do processo educativo; 2) realizar um criterioso levantamento da realidade da radiodifusão no país e, em especial, das emissoras educativas-culturais; 3) criar condições para que se restabeleça uma rede pública de emissoras, distinta da missão institucional da Radiobrás. Esta rede deve estar empenhada no resgate, atualização e aperfeiçoamento do sistema nacional de radiodifusão educativa e cultural, agrupando Rádios e TVs educativas estaduais, universitárias, comunitárias e de entidades não governamentais; 4) enfatizar a cidadania em toda a programação, contribuindo para o processo de desenvolvimento intelectual e moral do indivíduo, visando sua integração e promoção social; 5) revitalizar o jornalismo, priorizando ações de acompanhamento e discussão das políticas públicas, além da divulgação, promoção de debates e transmissão de eventos educativos, científicos, artísticos e culturais; 6) incentivar os diversos gêneros radiofônicos como documentários, crônicas, literatura, dramaturgia radiofônica, etc., considerando todos os públicos e faixas etárias; 7) estimular e capacitar os profissionais da radiodifusão educativa, além de complementar a qualificação de estudantes e novos profissionais para o setor; 8) promover o conhecimento das particularidades regionais da língua portuguesa no Brasil, incentivando o intercâmbio permanente com a comunidade dos países lusófonos; 9) abrir espaço para as manifestações artísticas culturais das diferentes regiões do país e estimular o intercâmbio de grupos regionais; 10) formular projetos de assistência às emissoras da rede pública quanto à sua modernização. Há muito por fazer, não resta dúvida, mas é possível transformar este cenário adverso. Em consonância com o lema de Roquette-Pinto – "Pela cultura dos que vivem em nossa terra, pelo progresso do Brasil" – , a SOARMEC manifesta a Vossa Excelência estar pronta para ajudar, com sua experiência de 11 anos, na reconstrução do sistema de radiodifusão educativo-cultural brasileiro. Foto Ailton de Freitas A diretoria da SOARMEC elaborou, no final de 2002, um documento endereçado ao presidente eleito, com um curto diagnóstico da situação das emissoras educativas no Brasil e algumas propostas de ações importantes para o setor. Com o objetivo de fazer o documento chegar às mãos do presidente, enviamos cópia ao senador Roberto Saturnino – que tão bem conhece a problemática da Rádio e que tem sido incansável na defesa da emissora. Assim, no dia 14 de dezembro, o senador fêz mais um pronunciamento no Senado Federal – o quarto, em menos de dois anos, a ter a Rádio MEC como tema –, quando, após discorrer sobre a imprópria vinculação da emissora à SECON, leu a parte propositiva do documento e determinou que o texto fosse transcrito na íntegra para os anais daquela Casa. Veja, abaixo o trecho inicial do pronunciamento do Senador e. em seguida, a ìntegra da Carta Aberta ao Presidente, “A historia do homem torna-se mais e mais uma competição entre educação e catástrofe.” H.G.Wells 5 Enriqueça seu repertório com as Séries Repertório Rádio MEC Instrumental Brasileiro Inédito Gibran Helayel - composições e solos 1- Brejeira Varanda das Serestas: 2- Afinando o violão 3- Silêncio 4- Inquieto 5- Parati 6- Valsa na Madrugada 7- Volto já (p/ 2 violões) 8- Ventos Suíte Caladas Estrelas: 9- Tangueando 10- Choro Lento 11- Valsa Rápida Trio Botelho Freitas Fagerlande 12- Camafeu 13- Dança 14- Cantorias (p/ 3 violões) Tardes Brasileiras 15- A Tarde 16- O baile nas águas 17- Suspiros 18- Carrossel 19- Bianco 20- Sonhos 21- Elfo Conselheiro Cinco Prelúdios MÚSICA A3 SUÍTE QUADRADA AMOROSO SOPROS E INVENÇÕES ARLEQUIM CARINHOSO GAIOLA ABERTA PEQUENO DIVERTIMENTO TRIO Nº 2 1.2.3 VENDAS: (021)2221-7447 ramais 2207 ou 2210. E também no CCBB, Loja Funarte, Arlequim, Paço Imperial, Estação Botafogo, Estação Unibanco, Livraria da Travessa, Livraria Berinjela, Macabrú, Prefácio Livraria, Livraria Ponte de Tábuas, Modern Sound, Toca do Vinícius, Lamúsica, Saraiva (RJ e SP), MicroStore (SP), Musical Box (SP), FNAC Brasil (SP), Iluminações (Campinas), Scriptum Livraria e Papelaria, CD Plus, Disco Mania (BH), Opus (Recife) e Oliver Discos (PB). Quatro perdas O compositor e maestro Mário Tavares nasceu em Natal, no Rio Grande do Norte, em 1928. Em 1944, transferiu-se para o Recife, acompanhando seu mestre Tommaso Babini. Em1947,estabeleceu-se definitivamente no Rio de Janeiro, onde concluiu o curso na Escola Nacional de Música e, logo depois, foi contratado como celista, pela Orquestra do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Em 1960, chegou à direção da Orquestra Sinfônica Brasileira e, a partir daí, construiu um currículo impressionante dentro do cenário nacional, regendo centenas de óperas e balés, até 1998, e sendo responsável por dezenas de primeiras audições de obras de autores brasileiros. Além de suas atividades regulares à frente da OSB, o maestro também se sobressaiu como regente internacional – foi o reorga- dial brasileiro e para a qual, a simples presença de Paulo, nos corredores da rádio, chamava a atenção. Afirmava não existir fronteiras entre música popular e clássica, e deu substancial contribuição aos dois gêneros. A partir dos anos 60, ganhou fama na tela da TV como principal maestro dos saudosos festivais da Canção Popular transmitidos pela Globo, de 1967 a 1975. O maestro trabalhou na Rádio MEC na década de 50, quando esteve à frente da Orquestra de Câmara da Emissora. Embora mais conhecido como regente, Mario Tavares deixa obra significativa também como compositor. O volume 16 da série Repertório Radio MEC – o primeiro CD inteiramente dedicado à obra de Mario – contém quatro peças da primeira fase do autor, incluindo a gravação da primeira audição mundial de sua premiada “Rio, a epopéia do morro”. Faleceu em fevereiro. Foto J.C. Mello Seu olfato e humor eram apuradíssimos. Dizia que “As mulheres cheiram mais doce, quando estão naqueles dias.” Dizia também coisas como “O braile é um saco: o negócio é o rádio e o gravador.” Paulo via com mais clareza o papel e a situação do rádio educativo do que muitos videntes.Sua maior felicidade, confessava, era “fazer rádio na Rádio MEC”, coisa com que sonhava desde a década de 70, quando participou de um programa de variedades na antiga Rádio Continental. Era imensamente grato a Adelson Alves, que teve a idéia de trazer o programa para a Rádio MEC; e ao diretor Paulo Henrique Cardoso, que deu o sinal verde. Absolutamente pontual, o Paulo quase nunca faltava e era sempre um dos últimos a sair, quando, só então, apagava as luzes de sua sala. Sem ele, o 2º andar ficou ainda mais vazio. nizador da Orquestra Sinfônica de Lima, no Peru e dirigiu vários concertos em Washington.e no Chile (recebeu a medalha Gabriela Mistral pelo trabalho realizado naquele país). O então reitor da UFRJ, Carlos Lessa; Mário Tavares e Edino Krieger, durante a cerimônia de entrega do título de doutor honoris causa, em novembro, passado. Fábio Prado O caipira mais elegante da Rádio MEC, uma das vozes mais bonitas do rádio brasileiro, nos deixou, no último dia 15 de dezembro. Amigo e companheiro, mineiro de Cataguases, Paulo Márcio tinha 53 anos. O bom humor fazia parte da sua vida e a mineirice percebia-se de longe. O mais bonito era seu coração: puro, humilde, amigo, sempre disposto a estender a mão e a compreender o próximo. O jovem Paulo Márcio deixou a casa dos pais, na roça, aventurando-se na cidade grande. Sabia que o interior não lhe daria muito retorno. Veio parar no Rio de Janeiro e acabaram percebendo que tinha talento para o rádio. No ar, nem de longe lembrava aquele caipira do roçado, que “ajudava no engenho e ganhava garapa e melado”, como ele mesmo escreveu em versos.Trabalhou nas mais importantes rádios cariocas: Roquette-Pinto, Tupi, Manchete, Rádio Jornal do Brasil, Rádio Globo e Rádio Opus 90, terminando sua missão aqui na Rádio MEC. Tinha uma incrível versatilidade quando usava o seu instrumento de trabalho. Uma voz aveludada, firme e elegante que alcançava ótima performance, tanto em um texto jornalístico como na interpretação de uma poesia. Mas os méritos deste locutor vão para sua característica mais eminente: era um autodidata. Sabe-se que Paulo Márcio não completara o primeiro grau, mas sua biblioteca não dispensava Kafka, Simone de Beauvoir e Thomas Mann, para citar apenas alguns. Isso sem falar em obras que ele fazia questão de ler no idioma de origem. Certe vez, em conversa formal, ele traduziu algums linha do livro que estava lendo, todo escrito em francês. Ficou uma lacuna em cada coração que conviveu com Paulo Márcio. Resta-nos sua poesia, que ele começou a escrever pouco antes de deixar este plano material. São reminiscências, lembranças de uma infância na roça, que ele descreveu em tom bem humorado, com uma ponta de saudosismo. Uma volta ao passado, parecendo prever a aproximação do fim. Deixa saudades nosso companheiro. Mas vamos lembrar sempre da sua alegria, do seu “jeitim mineiro de ser”. Os Amigos Ouvintes estão de luto. Foi-se o nosso Sancho Pança. Foi-se o fiel escudeiro de nossa quixotesca sociedade. Com o seu desaparecimento, a Rádio MEC – beneficiária de toda a sua curta e produtiva vida profissional – perde um dos seus mais desinteressados defensores. E perde um seu futuro historiador, pois ele era profundo conhecedor da história da emissora – história que estava ajudando a recuperar e, a seu modo, preparava-se para escrever, um dia. Fábio veio para a Rádio, há 9 anos, como estágiário do Curso de Comunicação da UFRJ. Enquanto seus colegas estagiários colocaram-se, depois, em grandes empresas da mídia, ele escolheu trabalhar onde pudesse melhor expressar os valores da cultura e da cidadania – mesmo à custa de submeter-se a um salário absolutamente desproporcional às suas habilidades. Católico de formação – um de seus melhores amigos era o padre Li, um jovem sacerdote chinês –, Fábio era uma pessoa sem malandragens ou segundas intenções. Uma pessoa que calava sobre os defeitos dos outros e nunca levantava a voz. Mesmo assim, escolheu trabalhar na desconfortável trincheira da sociedade civil. Sem nunca ter feito parte do quadro profissional da Emissora, ele fêz muito mais por ela do que a maioria de nós, funcionários, que nela trabalhamos, mas pouco trabalhamos por ela , ou seja, pouco fazemos pela preservação de suas características educativas, culturais e tudo o mais que Fábio tão bem conhecia – como o prova sua monografia de formatura em comunicação pela UFRJ que recebeu grau máximo e focaliza, justamente, o Rádio Educativo no Brasil, uma de suas bandeiras. A outra bandeira era a do Flamengo, com a qual foi enterrado no choroso sábado do dia 13 setembro, sob coroas de flores e palavras de papel dizendo: "Para tanto amor, tão curta vida". Acervo Allan Lima Não usava bengala, e era quase saltitante que ele descia as escadas, sem usar as mãos. Tinha voz poderosa e presença leve. Sempre arrumado, sempre sorridente, deu uma lição diária de vida a todos nós., durante os anos em que trabalhou como apresentador da Rádio MEC AM, onde estreou em 1993, no programa “Nosso Tempo”, produzido por Ritamaria Aguiar e coordenado por José Almeida. Um programa inteiramente voltado para o público portador de deficiência e suas necessidades – coisa que faz falta no Paulo Márcio Foto Clara Zúñiga Mário Tavares Acervo Allan Lima Paulo Fernando Daniela Lapidus Em tempo. Com a colaboração extraordinária de Livia Rosa, que já participou de nossa equipe de colaboradores e hoje está na Editora Record, os Amigos Ouvintes estamos preparando a edição em livro da citada monografia. (mais sobre Fabio na página seguinte) 7 O futuro estúdio de remasterização Foto J.C. Mello Foto Clara Zúñiga Um talento interrompido Fábio ao teclado sob o olhar da sempre-musa da SOARMEC, Ana Paula s Amigos Ouvintes já sofreram grandes perdas. O professor Jorge Luiz de Souza e Silva, nosso insubstituível primeiro presidente; e os inesquecíveis e operosos sóciosfundadores Célio Alves Lima, o Padre Almeida e Beatriz Guimarães. Mas o desaparecimento deles aconteceu dentro da ordem natural das coisas – os três eram idosos. Fábio tinha só 27 anos. Felizmente, ainda existem muitas pessoas que abraçam a causa do rádio educativocultural. Conheço dezenas, e todas já têm uma certa idade – o que parece também estar dentro da ordem natural das coisas. Mas não conheço ninguém com menos de trinta anos, tão interessado na questão quanto meu infortunado amigo e braço-direito. Para os que o conhecíamos, diretores, ex-diretores, colaboradores e ouvintes, Fábio era o futuro da SOARMEC. Era quem não iria deixar a bandeira cair, levando-a a um tempo mais longe e, talvez, mais proveitoso. Nem todos sabem, mas – na foto acima, ao teclado do piano Bösendorfer que ele ajudou a trazer da Áustria e a carregar para a Rádio –, Fábio não está simplesmente posando de pianista. Músico, de fato – ganhava uns trocados tocando em casamentos e festas – ele colocou todo seu talento musical a serviço dos discos e programas da SOARMEC. Os frutos de seu trabalho estão nos 18 primorosos CDs que produziu e fazem parte das melhores coleções do país; na série sobre música popular; nos livros da Biblioteca Tude Souza, que ele ajudou a organizar, a encadernar e resenhar; em dezenas de programas da primeira fase do Ao vivo entre amigos, que ele ajudou a produzir e montar; na nova aparelhagem do estúdio de remasterização (veja matéria ao lado); no site da SOARMEC, que fica órfão; e no "Amigo Ouvinte", jornal cujos últimos números foram praticamente paginados por ele, e do qual ele seria, em breve, o editor-responsável. É a perda irreparável, propriamente dita. O fato de estar fazendo o seu necrológio, quando, na ordem natural, ele é que um dia faria o meu, fecha definitivamente um cíclo da existência da SOARMEC, cujo significado, para este redator, é, simbolicamente, mais forte do que o fato de termos ultrapassado a barreira dos 10 anos de serviços prestados, ou termos sido distinguidos pelo Conselho Estadual de Cultura com o maior prêmio cultural do estado. Um prêmio que ele não viveu para ver, como não viveu para ver a vitória de Lula, a quem tanto admirava. (RR) O Na foto , um dos mais experientes técnicos da Emissora, Cosme Ubiracy, familiarizando-se com os novíssimos aparelhos do estúdio de remasterização de áudio, adquirido com verba do Senado Federal e repassada pelo MinC. Orçada em trinta mil dólares, a espinha dorsal da aparelhagem adquirida pela SOARMEC consiste em um computador Macintosh G-4 e os softwares da Sonic Solutions contendo os mais sofisticados programas de limpeza de ruídos e beneficiamento de gravações. Entre outros serviços, o estúdio permitirá a transposição do acervo da Rádio, cujo suporte é quase todo analógico, para o suporte digital - que conserva a informação gravada por mais tempo. Em parceria com a ACERP - uma parceria que muito demorou a dar frutos. Além do equipamento de ponta, a SOARMEC adquiriu o sistema de garantia SONIC, por um ano, possibilitou apoio técnico para montagem do estúdio e se responsabilizará pelo treinamento de dois técnicos da Rádio. O veterano Cosme será um deles, assim que o estúdio for deveras inaugurado. Nova aquisição da Biblioteca Tude de Souza Novos CDs do selo Rádio MEC Com patrocínio da Petrobras Distribuídora, os discos de João de Aquino e Paulo Feital, já lançados, e o de Hermeto Paschoal, cujo lançamento se dará no próximo dia 24 de março,às 19,30 h, no Rio Scenarium (Rua do Lavradio, 20) 8 Gravura de Belmonte extraída do livro de EliasThomé Saliba, Raíses do Riso, que contém um ótimo capítulo de 27 páginas sobre o humorismo nos primeiros tempos do Rádio. Visite a Biblioteca Tude de Souza. Adorno em Nova York Logo após chegar aos EUA, em 1938, Adorno sofreu o primeiro choque com a industria cultural ao tentar aplicar, sem sucesso, sua teoria da regressão da audição a uma pesquisa sobre a música no rádio. vida de Adorno em Nova York, de 1938 até 1941, embora seja uma passagem pouco lembrada pelos seus estudiosos, é um pedaço importante de seu longo exílio nos Estados Unidos que não apenas mostra as dificuldades de contato com a cultura norte-americana, mas também o confronto direto com a indústria cultural. Na verdade, Adorno foi a Nova York para trabalhar num projeto financiado pela Fundação Rockefeller, conhecido como “The Princeton Radio Research Project”, sob a direção de um outro emigrado europeu, Paul Lazarsfeld. O contrato de Adorno foi obtido pela mediação de Lazarsfeld na Fundação, com uma grande verba para pesquisas sobre a música (clássica, semiclássica e popular) no rádio, que ocupava uns 60% da programação das emissoras. Deixou a Europa, acompanhado de sua mulher, em 16 de fevereiro de 1938, a bordo do Champlain. Em março de 1938, já estava morando num apartamento situado na rua Cristopher, nº 45, lado oeste de Greenwich Village, alimentando a esperança de trazer Walter Benjamin para os EUA. Para animá-lo a dar esse grande passo, comparava sedutoramente a Sétima Avenida ao bulevar Montparnasse. Ao contrário de suas expectativas, diz, numa carta do mesmo mês, que não foi tão difícil se acomodar à nova situação, pois “ela é, sérieusement, muito mais européia aqui do que em Londres”. A Ilustração: Carwall - Folha SP Cervejaria Abandonada Nas suas memórias, Lazarsfeld relatou que tinha conhecido os trabalhos de Adorno publicados na Alemanha a respeito do papel “contraditório” da música na sociedade. Considerava ser um grande desafio tentar unir as análises teóricas de Adorno com a pesquisa empírica, ou seja, combinar a sociologia crítica da música com os métodos positivistas da sociologia norte-americana. Ao que tudo indica, pensava que a dialética deixaria de ser hegeliano-especulativa e se tornaria materialista se fosse articulada com a pesquisa empírica “sociográfica”. Desde 1934, por meio de inúmeras negociações com o reitor Nicholas Murray Butler, o instituto de Pesquisa Social da Escola de Frankfurt conseguira se estabelecer na Universidade Columbia, num belo prédio situado na rua 117, conhecido como “Morningside Heights”. Sob a direção de Max Horkheimer, o instituto havia dado suporte financeiro a Lazarsfeld quando ele começara a de- senvolver um centro de pesquisas metodológicas na Universidade de Newark, Nova Jersey. Com um contrato de tempo parcial, Adorno começou a trabalhar no Office of Radio Research (Departamento de Pesquisa em Rádio), sob a direção de Lazarsfeld, em Nova Jersey. A outra metade do tempo foi reservada para as atividades do Instituto de Pesquisa Social, na Columbia. As impressões iniciais de Adorno, no contato com o centro de pesquisas de Lazarsfeld, não foram lá muito boas, como ele próprio conta em “Experiências Científicas nos Estados Unidos”: “O ‘Princeton Radio Research Project’ não tinha seu centro nem em Princeton nem em Nova York, mas sim em Newark, Nova Jersey; provisoriamente, funcionava em uma cervejaria abandonada. Quando viajei para lá, através do túnel do Hudson, senti-me um pouco como no ‘Naturtheater’ Kafkiano de Oklahoma”. Ele bem poderia ter aqui acrescentado que a atmosfera parisiense, referida nas cartas a Benjamin, tinha desaparecido por completo durante a travessia do rio Hudson. Mas os problemas mal tinham começado a aparecer: rebentou uma guerra de nervos, uma série ininterrupta de choques com a equipe de pesquisa, com Lazarsfeld, com a financiadora do projeto, com os donos de emissoras, com os professores de música, etc. Resíduos desses combates diários estão nos próprios textos arquivados da Columbia. No memorando “Music in Radio”, de 26 de junho de 1938, Adorno tentou explicar nas suas 161 páginas por que não se deveria iniciar uma pesquisa sobre a música no rádio pela coleta de dados da audiência, com os “likes and dislikes” do ouvinte, mas sim com aquilo que, em última análise, poderia estar condicionando o seu modo de ouvir. Trechos melódicos A proposta original do projeto de Princeton consistia em ouvir o ouvinte (“listening to the listener”). Adorno objetava que , em se tratando de um ouvinte de audição desconcentrada, desatenta e atomística, além de ser acrítico, como o próprio correio de fãs das emissoras atestava, era preciso considerar, em primeiro lugar, como se produzira essa redução da capacidade de experiência musical das audiências, o “non listening listening” do rádio. A sua hipótese da regressão da audição, considerada inverificável e teoricamente viesada pelos positivistas de plantão, estabelecia a relação entre a perda da capacidade auditiva e a história da fetichização da música pela formamercadoria, desde o fim do século XIX. Capturada pela indústria do entretenimento e pelos monopólios que pas- saram a explora-la como “big business”, a música foi perdendo a sua autonomia em relação ao mundo alienado pelo capital, ou seja, sendo integrada ao processo de produção de mercadorias, conduzindo de quebra o ouvinte para o estado de regressão auditiva. Será que hoje em dia ele é capaz, pergunta Adorno, de experimentar a absorção sinfônica ao ouvir a catedral de sons de um Beethoven quando reproduzida em miniatura pelas ondas do rádio na sua casa? Será que não se limita a ouvir apenas alguns trechos melódicos (nem sempre importantes, musicalmente falando) desses “clássicos tão populares”? Ou será que não está mais condicionado a responder aos estímulos meramente sensoriais dos ritmos frenéticos de músicas destituídas de qualidade composicional? Durante quantos minutos o ouvinte médio consegue manter a concentração durante a execução de uma composição séria? Por que ele embarca tão facilmente nas músicas pré-fabricadas da máquina de Hollywood, contribuindo para o seu sucesso, independentemente do valor musical? Será que uma canção dos “hit parades” é, de fato, uma canção que se sobressai pelas qualidades musicais ou resulta apenas do sucesso da manipulação do rádio que a repete durante várias semanas, pelo menos nove vezes ao dia, até levá-la ao topo da lista das mais vendidas, segundo a técnica de alta pressão do “plugging”? Essas perguntas foram o eixo de sua pesquisa e dos seis artigos escritos (nem sempre publicados) sobre a música popular, a sinfonia do rádio, um programa de educação musical na NBC, o “plugging” do rádio etc. Final da história: em 26 de outubro de 1939, num seminário do qual participaram os donos de emissoras de rádio, o representante da Fundação Rockefeller, John Marshall, e especialistas de comunicação, Adorno tentou, mais uma vez, tornar aceitáveis suas teses sobre a música no rádio. Segundo as memórias de Lazarsfeld, John Marshall achou que o esforço de levar a teoria crítica para o terreno da comunicação tinha sido um fracasso. A fundação não renovou o contrato na seção de música, pois pretendia captar recursos financeiros dos “broadcasters” a fim de ampliar e estender o estudo por mais dois anos, mas as criticas de Adorno ameaçavam arruinar um negócio que gozava de aceitação das audiências e sobretudo da clientela de anunciantes. Afinal de contas, a audiência era e continua sendo a principal mercadoria produzida e vendida pelo rádio aos anunciantes comerciais. por Iray Carone,ex-professora aposentada do Instituto de psicologia da USP. Ilustração de Carvall. Extraído da Folha de SP. 9 O Ministério da Cultura em dois tempos 1 Weffort, o intelectual Antes que seja tarde, renda-se o tributo. Ainda é tempo. Quem acessa a página do Ministério da Cultura na internet (www.cultura.gov.br.) encontra uma fabulosa oferta de livros. Com o devido atalho para comprá-los. Foram pagos com o dinheiro público. Pelo menos dois com o copatrocínio da Associação de Amigos da Funarte. Consagram o pensador nacional Francisco C. Weffort, como ele assina os volumes. É autor (“A cultura e as Revoluções da Modernização”, 2000), co-autor (“Cinema Brasileiro”, 2001), organizador (“Um olhar sobre a Cultura Brasileira”, 1998), prefaciador (“Fascínio e Repulsa”, 2000), e apresentador (“Cultura e Desenvolvimento”, 2000). Por coincidência, trata-se do ministro da Cultura da era Fernando Henrique Cardoso. O ministério editou os livros. O intelectual oni-presente é também o “diretoreditorial” da série pela qual os outros títulos saíram. Escreve, financia, auto-publica-se. Só uma mente maldosa especularia não se tratar de mera casualidade tamanha convergência. O sítio mantido pela repartição chefiada por Weffort anuncia sete livros. Cinco contêm textos do ministro. O repórter ainda não leu os dois mais recentes. A inteligência do país sai enriquecida da leitura de “A Cultura e as Revoluções da Modernização”. No prefácio, Márcio Souza assinala a “precisão de raciocínio”, a “linguagem clara” e os “textos brilhantes que prescindem de apresentação”. Puro acaso, o escritor Souza preside a Fundação Nacional de Arte, a Funarte. Logo, subordina-se a Weffort. Em “Fascínio e Repulsa”, lançado pela Funarte, o autor é o presidente da Fundação. O prefaciador Weffort incensa o “texto luminoso, instigante” de Souza. Retribui o adjetivo “brilhante” duas vezes. Num livro, o ministro diagnostica, conforme introdução do subordinado, “a síndrome derrotista paranóica da esquerda”. Derradeira coincidência: a mesma esquerda que sucederá o governo ao qual Weffort serviu e que bancou, certamente por mérito, a publicação dos seus textos. O Setor de Pesquisa da Rádio Atrás desta porta de vidro escrito em jato de areia – um presente da SOARMEC ao Setor de Pesquisa – há tudo isso que Celina Grether Ferreira descreve no texto abaixo. Setor de Pesquisa da Rádio MEC nasceu em 1984, no 6º andar desse edifício, numa sala pequenininha dividida com outro funcionário do setor de documentação e arquivo. Com apenas uma funcionária, aos poucos foram chegando outros e a questão era: como começar o acervo com tão pouco recursos? Iniciou-se o recorte de jornais dos assuntos a ver com a programação da casa. Foram solicitados livros e enciclopédias que se encontravam espalhados por todos os setores, para que ficassem centralizados nesse Setor toda a fonte de pesquisa. Assim com o passar dos anos, com as compras, doações e com o material colhido através dos meios de comunicação: Televisão, revistas, jornais, livros e rádio, o acervo da pesquisa foi crescendo e armazenando informações preciosas sobre personalidades de todas as áreas, assim como sobre assuntos gerais, tais como: meio ambiente, folclore, carnaval, fome, favelas, sexo, doenças, fumo, 10 Foto J.C. Mello O religião, crenças, longevidade, alimentos animais, arqueologia, tecnologia, planetas, artes, esportes, festivais de música, cinema, teatro, música, televisão, rádio, literatura, tombamentos, e muito mais. Foram criadas pastas de janeiro a dezembro com as datas de nascimento e morte de personalidades e também de acontecimentos importantes como fundação de órgãos, criação de industrias, guerras e mais. As revistas “Veja” e “Isto É” foram catalogadas destacando-se os documentos pertinentes à programação da Rádio, como figuras do meio artístico e literário. Existem livros de música popular e clássica, com muitas informações sobre compositores e cantores famosos, como Cartola, Radamés Genattali, São Ismael do Estácio, Francisco Alves, Candeia, Villa-Lobos, Geraldo Pereira ... Importante falar sobre o material com o histórico da Rádio MEC, que contem toda a tragetória, desde a sua criação, com registro de aniversários da Rádio, fotos e documentos. Com certeza, com todo esse acervo, que na medida do possível vai sendo atualizado, é possível se fazer uma pesquisa substancial capaz de atender às necessidades de todo os gêneros radiofônicos. 2 Versos próprios A fim de estimular a divulgação da literatua brasileira no exterior, o Ministétio da Cultra concedeu bolsa de US$4.500 para um editor espanhol traduzir o livro “Algaravias”. Trata-se de obra de Waly Salomão, poeta e coincidentemente secretário do Livro e Leitura do ministério. Os dois textos acima foram publicados no jornal Folha de São Paulo. O primeiro, do colunista Mário Magalhães, em 31 de dezembro de 2002, e o segundo em 19 de março de 2002, na seção Painel, cujo editor é o jornalista Rogério Gentile. Falar é fácil, escrever é que são elas Notificada, por pessoas que lá estiveram, das injuriosas críticas feitas à Sociedade dos Amigos Ouvintes da Rádio MEC por um dos participantes da reunião sindical ocorrida dia 9 de agosto, no Auditório Paulo Tapajós, a diretoria da SOARMEC, para não ficar apenas com a versão das testemunhas do fato, solicita ao responsável que se responsabilize por elas, ou seja, que coloque-as no papel e remeta-as para o Amigo Ouvinte - o informativo oficial da Sociedade. Certos de que o autor de tais críticas não se lembrou da possibilidade de fazê-las em nosso jornal, e certos de que não nos negará o direito de defesa e/ou repúdio, já estamos reservando espaço para a matéria, no próximo número, para que nossos sócios e leitores possam tirar suas próprias conclusões a respeito do real tamanho dos personagens nela envolvidos NOTA DA REDAÇÃO O texto acima, que ficou afixado por várias semanas em nosso quadro-de-avisos, foi redigido logo após tomarmos conhecimento de que um determinado funcionário da Emissora, em reunião sindical realizada no auditório Paulo Tapajós, lançou uma diatribe contra a SOARMEC, na presença de diretores sindicais, alguns funcionários e da filha de Roquette-Pinto, Dona Carmem Lúcia. Como o leitor pode constatar neste número, o autor das críticas verbais achou melhor não fazê-las por escrito. Estamos publicando o aviso, aqui, apesar do tempo já decorrido, porque ele não só atesta nossa intenção de manter a transparência, como reafirma o papel de nosso jornal de servir como fórum natural onde se discutam os problemas da Rádio MECe da própria SOARMEC, e onde todos possam apresentar suas críticas e sugestões. Escrevam. A Rádio do meu tempo Allan Lima e Ieda Oliveira programa infantil na Rádio Guanabara, o "Campeonato Infantil Toddy". Era feito por um locutor esportivo, o Helio Paiva. De lá saíram muitas cantoras: Claudete Soares, Dóris Monteiro Havia uma sessão de instrumentistas, uma de cantores, e um "sketch" – antigamente se falava "esqueti", né? Eu cantava, mas um dia faltou alguém para o esqueti, e a diretora me disse: "Tem muitos cantores, aí. Hoje você vai fazer esqueti". E eu fiz. Depois ela disse: "Você agora vai fazer só esqueti". Eu reagi: "Mas eu quero ser cantora." – "Não! Você vai fazer esqueti." E eu fiquei. Todo domingo saía um vencedor de cada categoria e , no esqueti, eu ganhei todos os prêmios. Quando acabou o patrocínio da Toddy, o Hélio Paiva me disse: "Você é muito talentosa, não pode ficar aqui, porque isto é uma estação comercial, mas eu vou te mandar para o René Cavé, na Rádio Ministério". Eu ainda estava no Ginásio. Cheguei aqui, e a primeira pessoa que encontrei foi o René Cavé. Aí, contei a minha história, e ele: "Você quer ficar no rádioteatro infantil, ou no da mocidade?" Preferi o infantil, e ele disse: "Então você vai entrar naquela sala, e procurar a Geny Marcondes." Essa mulher fantástica, responsável por toda a minha vida artística. Eu então entrei, me apresentei, e fiquei com ela todo o tempo em que ela escreveu e dirigiu o programa. Eu fiquei aqui de 47 até 85, quando fui transferida para a UFF, levada pelo Pedro Paulo Collin Gil. Ele era professor de lá, e nós montamos uma estação de rádio com técnicos daqui da Rádio. Mas, depois de montada, não se sabe qual foi a política que aconteceu: nós não pudemos assumir e eu fiquei lá até minha aposentadoria, em 1990. •A Geny Marcondes chegou antes de você? IO - Ela chegou em 1945 ou 1946. Ela era professora de música, e estava casada com o maestro Kolreuter. Dona Geni foi contratada para fazer um programa musical infantil. Naquela época os programas iam ao ar ao vivo, das 17:30h às 18h. Às16:30h começávamos a ensaiar, não só o texto – sempre uma historinha –, como também as músicas. E as crianças eram ótimas! Uma vez ela disse pro Orlando Prado, um grande ator: "Ô, Orlando, imagine que você é um peixe debaixo d'água, e fale com voz de peixe." Como o imaginário da criança é fantástico e como a não-censura ajuda! E ele falou com uma voz de peixe, uma voz borbulhante... Ninguém sabe como é que ele conseguiu fazer aquilo sem estar com um copo d'água! Mas ele ficou olhando, pensou, e conseguiu fazer. Dona Geny era uma mulher de uma cultura muito grande, uma cultura musical enorme. Desse programa saíram grandes atores. Fernanda Montenegro trabalhou conosco... •Ela trabalhou com Geny, também? IO – Trabalhou! Nós fazíamos uma série, "O Rei Pimpão". Ela era a Rainha Finoca, o Magalhães Graça era o Rei Pimpão e eu era a filhinha deles, a Princesinha Não-metoques. Tinha música, e ela e o Graça cantavam maravilhosamente bem. E trabalhamos também com a Teresinha Amayo, que igualmente passou pelo programa. Quando o Jaime Barcelos teve que deixar a Rádio, para se dedicar ao Teatro, Dona Geni chamou o Magalhães Graça – que nunca tinha ouvido o trabalho do Jaime – deu o script para ele e mandou que lesse. Ele pegou o texto e, à primeira vista, você jurava que era o Jaime Barcelos! Como os dois sentiram o personagem exatamente igual! Nós ficamos boquiabertos, não é? AL – Ainda lembro da apresentação (cantando): "Eu sou o Rei Pimpão, atchim! Pimpão, atchim! Pimpão! Também sou bonachão, chão-chão, chão-chão! E faço um figurão, rão-rão, rão-rão! Porque sou bonitão, tão-tão, tão-tão!" Era a música do Rei Pimpão, que tinha o contracanto fininho da Rainha Finoca, que era a Fernanda. •A Ieda já possuía prática de rádioteatro, porque trabalhou na Rádio Guanabara. E o Orlando Prado e os outros? Qual era a formação deles? AL - Isso eu posso contar. O Orlando Prado, inclusive, é o culpado por eu ter ocupado o microfone pela primeira vez. Nós éramos do Colégio Pedro II, que mantinha um programa estudantil, na Rádio Roquette-Pinto. E o Orlando Prado era um dos astros. Eram dois os intérpretes principais: o Orlando e o Habib Haias. E eu ficava lá, com o nariz colado ao vidro, doido para fazer qualquer coisa, doido para o professor Libânio Guedes – que era o responsável pelo programa –, me dar uma oportunidade qualquer. E um dia, exatamente num dia em que o Orlando Prado iria fazer um dos seus muitos protagonistas, ele faltou, e não havia mais ninguém ali por perto. O professor Libânio Guedes pegou o script e pôs na minha mão. Oba! – era a minha grande oportunidade... de ser o grande fracasso que foi. Foi horrível! Não digo nem mal interpretado; foi mal lido! O professor Libânio botou a mão no meu ombro e disse: "Olha, você tem muito jeito para escrever, procura entrar por esse caminho... Não pensa em microfone, não, porque não é o teu campo de batalha." Aí eu fui para casa, tristinho da vida, e continuei escrevendo – que eu já escrevia para esse programa –, até que uma semana lá o professor me chamou e disse: "Allan, você hoje vai para o microfone. Tem um papel perfeito para você. Nós vamos fazer 'Mensagem a Garcia', e você vai fazer aquele que leva a mensagem a Garcia." Eu não dormi, não é? Fiquei em casa, bolando como seria a inflexão... Bom, meu papel se resumia a esta frase: "Mas... onde está o General Garcia?" – isso era toda a minha participação. Mas o professor fazia questão da pausa certa nas reticências!!! Eu estou contando isso para falar do Orlando Prado, e também de Theresa Amayo, Inácio Singer, Félix Cohen, Ivan Meira, Aryon Romita – todos viemos desse mesmo embrião. Depois, o programa saiu da Roquette-Pinto e veio para cá, chamando-se "A Juventude Cria", e deu muita cria, aqui, para a Rádio MEC – a nossa antiga Rádio Ministério da Educação e Saúde... •Yedda, o que você aprendeu aqui? IO - Eu vim com 13 anos, e com essa idade a gente não tem dimensão de nada. Muitos anos depois, foi que eu tive a dimensão de como foi a minha formação aqui dentro. Todos os atores que eu conheci, de Rádioteatro, eram pelo talento. Primeiro tinha que se ter uma voz bonita, e depois o talento – que é uma coisa que nasce com a gente. E nós pegamos muitos bons diretores. Então, o diretor é quem vai te lapidar. Nós tivemos o Edmundo Lys, o Mário Jorge, o Sadi Cabral, o Sérgio Viotti, o Paulo Salgado, a Luiza Barreto Leite e o Magalhães Graça, com quem fiquei muito tempo – devo tudo ao Magalhães Graça... Foto Fabio Pimentel Foto Fabio Pimentel •Como e quando você veio para a Rádio? Ieda Oliveira – Vim em 1947, de um Entrevista com dois ícones do rádioteatro e da radiodifusão brasileira, Ieda Oliveira e Allan Lima, realizado por Renato Rocha e transcrita e editada por Renata Mello e Gisélia Pimentel. O Sadi Cabral gostava muito do Gil Vicente! O teatro português! E foi a coisa mais difícil que nós tivemos, justamente pela forma, pela grafia da língua portuguesa, que era aquele português arcaico, não é? Aí a gente lia e tinha que reler tudo outra vez, porque era "ph", "sh", então ficava difícil! E quando a gente começava a falar, automaticamente, já ficava com um tom português. Mesmo que a gente não quisesse já falava sobre os dentes... Foi a coisa mais difícil, o teatro mais difícil. E nós fizemos, também, todo o Teatro Grego... Foi com o Magalhães Graça. Outro ensaiador muito bom foi o Martinho Severo! Um declamador português que era ensaiador dos programas de poesia. Era ao vivo, sábado à noite, de 22 às 23. AL – Tudo era ao vivo! Não havia gravação. IO - Interessante: depois que passou para a fita, como a gente errava! Antes a gente não errava nada, não é, Allan? Passou para a fita, a gente errava à beça! •Allan, como e quando você chegou? AL - Eu vim com o programa do Pedro II, "A Juventude Cria", que integrava um dia da semana do "Reino da Alegria". Eu comecei escrevendo. "A Juventude Cria" era formado de seções, e cada estudante fazia uma seção. Exatamente nessa época, em 49, dona Geny tinha viajado para a Europa – estava dona Neuza Feital... Então, eu passei a escrever para o "Reino da Alegria", a convite de dona Neuza, e comecei também a fazer umas coisas para eu próprio ler – não vou nem dizer "interpretar". Nisso, Geny Marcondes volta, já me encontra integrado ao "Reino da Alegria", mantém a minha posição e começa a me dar papéis, e aí eu sou chamado para o "Rádioteatro da Noite". •Quem eram as pessoas? AL – Eu tenho aqui uma lista de pessoas que participavam, que não está obedecendo a nenhuma cronologia: são nomes retirados de scripts de antigos programas, nomes, como, por exemplo: Jair Miranda, Gonzaga Filho, Zélia Guimarães, Arlete Pinheiro... IO – ...que é a Fernanda Montenegro. (continua na página seguinte) 11 AL – E é até muito interessante, porque era assim:"Programa de Fernanda Montenegro, narrado por Arlete Pinheiro", ou vice-versa, "Programa de Arlete Pinheiro narrado por Fernanda Montenegro". E às vezes ela entrava – eu tenho até um script em casa, é muito interessante –, ela entrava em dois papéis no mesmo programa. Então, na relação "tomaram parte no programa de hoje fulano de tal, fulana de tal, Arlete Pinheiro, Fernanda Montenegro, e tal...", como se fossem duas pessoas diferentes. Mas, então, voltando: J.Nogueira, Francisco Nunes, Paulo Renato, Augusto Araújo, Afonso Soares, Karlos Couto famoso Karlos Couto "com K" -, Batista Rodrigues, Antônio Carlos, o humorista, José Ricardo, Carlos de Souza, Célio Rodrigues, Martins Filho, Carmem Fernandes, Aldo César, Francisco José, Dália Garcia, Aristeu Bergher, Iracema Lopes. •Fale do Edmundo Lyz. AL – Sob a direção de Edmundo Lys, eu fiz uns dois ou três programas. Era muito bom diretor. Ele era severo e muito cioso do que o programa tinha que ser, da maneira como teria que sair o programa, a ponto de, se a coisa não fosse como ele queria, ele jogava o script e ia embora. Jogava o script em cima da bancada onde ele estava assistindo, ao lado do operador, e ia embora. Textualmente, ia embora! Ensaiava-se, ensaiava-se mesmo! Não era ensaio "para inglês ver", nem leitura de programa. Ensaiva-se. O diretor dizia o que queria e como queria que fosse feito. Aí, voltando à minha trajetória, quando o Edmundo Lys sai da direção, vem o Mário Jorge. E, com o Mário Jorge, eu fui aumentando a participação nos papéis. O programa do Pedro II terminou, eu continuei no "Reino da Alegria", já como fixo, e o tempo foi rolando, e daquele "Mas... onde está o General Garcia?", eu terminei sendo diretor de Rádioteatro da casa. •Como a coisa era feita. Como os atores ensaia- vam? Como era a contraregra e a sonoplastia? AL – Os atores chegavam e já encontravam quase sempre, em cima do piano do estúdio, os vários scripts com o nome de cada um. Cada um pegava o seu e começava a marcar o seu papel do jeito que costuma marcar – uns sublinhando só o nome do personagem, outros passando uma linha embaixo do nome e da fala que vai dizer. •Os scripts vinham de onde? AL – De uma seção chamada "Setor de Preparo de Irradiação" - SPI. O autor do programa entregava o original; esse original ia para a Datilografia, a Datilografia batia em estêncil – aquele que tem a letra roxa – que era rodado naquele mimeógrafo a álcool em cima de papel-jornal, meio amarelado. Isso era posto ali, cada um dava sua "passadinha de olhos" e esperava o ensaio. O diretor chegava e: "Vamos lá!". Quem tinha que começar a falar, começava. Ele interrompia, quando precisava interromper; dava a linha do personagem, 12 quando achava necessário; e o ensaio seguia sem maiores problemas, como é um ensaio de leitura de teatro. •E a contra-regra e a sonoplastia? AL – Dentro do estúdio havia um microfone para o contra-regra e um tablado, com um pouco de areia, um pouco de cascalho; uma porta de um metro de altura, com fechadura, trinco e tal – para fazer todos os ruídos. Fora isso, havia o material necessário. Dois cocos para fazer o cavalo, na terra, ou no cascalho; papel celofane, para fazer incêndio; o papel comprimido no lápis para fazer a porta que range; uma folha de flandres; uma folha de zinco, para fazer a trovoada. Tudo isso é da criatividade do contra-regra. E a contra-regra era muito fruto também da imaginação, porque às vezes vinham pedidos absolutamente loucos! Vou contar uma que aconteceu na Rádio Nacional. Num programa, lá, pediram o ruído de um corpo sendo devorado por formigas, e o Edmo do Valle – que era o contra-regra lá e que depois veio para cá –, deve ter queimado as pestanas para chegar à conclusão de que um comprimido efervescente, na água, posto ao lado do microfone, dava o ruído que se queria. •Não havia o efeito gravado? AL – O efeito gravado existia, mas entrar no momento exato, ao vivo, era muito difícil. A sonoplastia era com discos de 78 rotações, um pouco maiores, de 12 polegadas, que eram marcados com lápis vermelho em cima do próprio sulco, com vários círculos. E cada círculo, correspondia a um trecho mais suave, menos suave... Me lembro bem que o sonoplasta que fez a maioria dos programas era o Paulo Santos. Ele adorava uma peça chamada "André de Leão e o Demônio de Cabelo Vermelho", do Hekel Tavares. Então, os vários discos do "André de Leão" eram todos marcados, e ele punha no script para o operador: "Disco tal, lado A, sétima faixa". Mas não era faixa - a face era contínua -, era a sétima marcação que ele havia feito. Aí, sim, ele marcava o ponto no script onde deveria começar a música e vinha com aquele risco por cima da fala, até o ponto em que deveria sair, onde ele dava dois traços oblíquos. Alí, o operador sabia que a música deveria já ter sumido. •Voltando á lista, quem mais você citaria? AL – O Brandão Reis, sem dúvida. Quando eu cheguei ele era o grande astro da narração. Era um senhor que fumava um cachimbo britânico e um ótimo narrador! E o Mário Jorge, que era um excelente rádioator, que foi depois diretor, ensaiador, e também o Júlio Cezar Costeira. Ele era o galã da época. Fazia os programas com a Fernanda Montenegro como primeira dama. Isso também eu assisti, não me contaram. Os dois estavam fazendo uma cena de amor e acabaram dando a maior demonstração de profissionalismo que eu já vi, no Rádio. Eles Acervo Allan Lima Na frente do painel de Maria Tereza Vieira, que existia na sala da direção. Em pé, da esquerda para a direita: Maurício Quadrio, René Cavé, ?, Edmundo Lys e mais 3 ?. Sentados:Sra. e senhor José Fernandes, Ieda e Allan. No chão: Magalhães Graça e Hamilton Santos. estavam cada um de um lado do microfone. A cena era a mais melosa que se possa imaginar. De repente, devido ao fato de um parafuso da girafa estar frouxo, o microfone começa a baixar lentamente. Os dois, sem a menor hesitação, foram se acocorando – sem parar de interpretar – e terminaram quase de gatinhas no chão. Mas fizeram a cena inteira. IO - Tem também o Álvaro Costa e a Dona Cora Costa. AL - Foram duas figuras maravilhosas, vindas do teatro. Casados os dois, ele com sotaque de português, um sotaque fortíssimo... E ele era baiano! Por quê? Porque o teatro, na época em que eles faziam, privilegiava o sotaque português. Tem o Paulo Alberto, que foi locutor da casa, narrador e ator também de vários dos meus programas, e fez muita transmissão ao vivo do Municipal, do "Concertos Para a Juventude" – este Paulo Alberto é o atual Senador Arthur da Távola. Deixa eu ver quem mais, aqui... Antônio Vicente da Costa Júnior, que foi nosso rádioator, também, foi diretor da Faculdade de Direito aqui do lado, e acho que ele é Desembargador, atualmente. Mais: Agnes Fontoura, Elza Martins e o Jefferson Duarte, que merece um capítulo especial. O Jefferson era operador e eu diretor de Rádioteatro. Ele tinha muita vontade de interpretar, e me pediu. Foi fazendo papéis pequenos, foi indo, e foi a pessoa que eu convidei para trabalhar comigo quando fui para o Consulado Britânico. Ele foi meu "braço direito", lá, durante 14 anos. Era uma figura espetacular, uma voz linda. E revelou-se um excelente intérprete, além de continuar sendo operador. Tanto é que, no Consulado. ele era narrador e operador. •E o Chico Anysio? IO – Não me lembro dele aqui, não... A L - Eu, também não. Sei que houve um concurso de rádioteatro, na Rádio Guanabara – feito pelo Afredo Souto de Almeida, que era da Guanabara, também – e o Chico Anysio foi o segundo colocado. Se ele trabalhou aqui – o que pode ter acontecido, porque muita gente desse rádioteatro veio pra cá –, eu não tive a oportunidade de trabalhar com ele.. •E o José Vasconcelos? AL – Ele era locutor, e teve participações eventuais como radiator. Tinha um programa, produzido pelo doutor Darcy Evangelista, que foi uma figura famosíssima, na época – era caricaturista num jornal, escrevia sobre puericultura em outras publicações e, aqui, ele tinha um programa dedicado as mães, com músicas de Geny Marcondes. E os participantes eram o próprio doutor Evangelista, o Zé Acrisio, que era um locutor daqui – eu também participei várias vezes – e o José Vasconcelos, que fazia várias vozes num programa só, que é a peculiaridade dele. Era capaz de dizer um poema, de fazer um garotinho jogando futebol com a turma, e também de ser um locutor sério. IO – E ele imitava outros locutores. O Jatobá Dentro do horário dele, ele imitava outros locutores. Dava na cabeça e ele imitava outras pessoas também •Ieda, vocês fizeram todo o Monteiro Lobato com a Geny conduzindo? IO – Não, eu acho que essa fase já foi da Silvia Regina. Fizemos as Reinações de Narizinho, O Poço do Visconde, Os Doze Trabalhos de Hercules, A Reforma da Natureza, e por ai vai... Toda a série infantil do Monteiro Lobato foi feita aqui na rádio. Sadi Cabral, Telmo de Avelar, Paulo Salgado, e Dilmo Elias. Na época do Governo JK, houve uma invasão de mineiros, aqui, desde o diretor, Celso Brant, que trouxe consigo o "Minastério". E aqui veio parar um diretor de rádio teatro... acompanhado de caboclos, e contando histórias realmente maravilhosas. A partir daí, ele se tornou produtor de primeira linha, ele fez "Esse mundo maravilhoso"... IO – F. Andrade Eu ia falar dele agora IO - Fez "Novos horizontes", também, e no "Tribunal da historia". Acervo Allan Lima IO - O Sr. F. Andrade era uma pessoa muito tímida e quando ele pegou o elenco – um elenco muito bom, porque estávamos juntos há muitos anos, né? – , ele ficou deslocado. Mas ele não se colocou arrogantemente, não. Foi bem humilde. Ele veio da rádio lá de Minas, e tinha um programinha chamado "Conversa puxa conversa" – sempre era um assunto atual e era muito rapidinho, Década de 50. Ieda e Allan, gravando. tinha uma boa dinâmica. Mas ele conseguiu levar bem o tempo todo. •Todo dia tinha rádioteatro? IO – Não, o Reino da Alegria era de segunda a sexta, de 5:30 às 6:00 da tarde. •Havia dramatizações para as efemérides? IO -Sim, as datas importantes eram comemoradas na Rádio MEC. Natal, Independência... Muitos desses acontecimentos eram dramatizados, como rádioteatro.. • E quem escrevia? AL- Dona Geny escrevia bastante. Silvia Regina escrevia, também. IO - Ela era jornalista e professora. Tinha uma enorme facilidade, e um grande um poder de síntese. Uma peça que levava 2 horas ela condensava em 30 minutos e não perdia nada. • E o Magalhães Graça? IO - O Graça veio pra substituir o Jaime Barcelos. Era um grande ator. AL - Embora ele tenha chegado um pouco depois da minha época, a influência dele na maneira de interpretar foi geral. Ele veio dirigir o rádioteatro à noite e depois ele dirigiu um pouco o Reino da Alegria. Digase de passagem que, além de ser um ator maravilhoso, o Graça era pianista – pianista concertista. Então, a sensibilidade dele como artista era enorme. Ele foi aluno dileto da Madalena Tagliaferro. • Luiza Barreto Leite? AL – Ela teve uma passagem rápida, como diretora. Mas foi uma figura de teatro de bastante importância, que a gente deve considerar como integrante dos quadros da antiga Rádio Ministério, assim como Sadi Cabral e Sérgio Viotti. Eu relacionei aqui os diretores que a minha memória registrou, desde Edmundo Lys: Mario Jorge, • E o Pascoal Longo? AL - Pascoal Longo, quando cheguei aqui, era o principal produtor de programas da Rádio. Uma pessoa com uma facilidade enorme de escrever, de criar, e que fez, na minha opinião, a série de programas mais importante que já houve aqui. Chamava-se "Clube dos 13", por volta de 1956...57. Ele reuniu 13 escritores famosos, da época. Eu me lembro de Dináh Silveira de Queiroz; José Condé, que depois ficou escrevendo pra Rádio; Marques Rebello, que também depois escreveu outros programas, enfim, 13 autores, e cada um escreveu uma história especial para o rádioteatro. E havia uma expectativa de quem seria o 13º programa. E o programa dava um livro de presente, porque a Rádio tinha muito disso. "O Reino da Alegria" dava sempre livros aos ouvintes - sorteava entre as cartas que recebíamos • Otto Maria Carpeaux? AL - O Carpeaux tinha uma crônica diária, aqui. Era uma figura facilmente encontrável nos corredores. Era um pouco difícil falar com ele, porque ele tinha um problema de articulação – além de ser estrangeiro – e falava com muita dificuldade. • Miécio Hônkis? AL - Esse, pra mim, também merece um pedestal aqui na Rádio. Miécio Araújo Jorge Hônkis. Era médico – quando jovem fez uma viagem à Amazônia – e, nunca tendo feito nada no rádio, achou que aquilo dava uma história. Chegou aqui com os textos em baixo do braço, e o René Cavé, que tinha uma visão espetacular – ele pressentia as coisas que poderiam dar certo –, concordou, e ele começou a escrever o programa, que se chamava "Viagem Maravilhosa" – as aventuras de um jovem médico na Amazônia, descendo, não me lembro se era o Amazonas ou o rio Negro, • Como era o formato desses programas? Acervo Allan Lima AL – Nessa época, eu era diretor de rádioteatro e fui deslocado, voltei pra função de interprete; e o F. Andrade, sem conhecer o elenco, passou a ser o diretor de rádioteatro. Por isso eu prefiro que você fale, porque o que eu disser talvez possa soar como uma certa magoa que, realmente, não existe. AL Rádioteatro. "Tribunal da História" era muito interessante. Era um Tribunal, que contava Allan Lima, em 1951, ainda de uniforme colegial, com um Relator e um com o locutor Ivan Meira em segundo plano. Juiz como personagens fixos. O Meirinho iniciava o programa dizendo : "Está aberta a sessão! Em pauta, • E a Aymê? o julgamento de Maria Antonieta. Tem a IO - Aymê foi do rádioteatro, também. Ela palavra o senhor Relator para a leitura do fazia teatro de comédia, daquelas bem processo." Isso era fixo. Ai, o Relator, que apimentadas, não é?, com aquele sotaque era o narrador, dizia: "De tanto a tanto, de baiana. Sou muito amiga dela e, quando aconteceu isso, isso..." Então, num ela veio pra cá, eu fui uma das pessoas que determinado ponto na narrativa, entrava o ajudaram, porque ela, com aquele sotaque e rádioteatro e voltava depois o narrador. E, vindo do teatro O rádio é muito quando terminava a exposição da figura ou diferente do teatro. Mas ela se achou num do caso histórico, o Juiz dizia: "Tem a programa de poesia que nós tínhamos. palavra o Sr. Promotor, para a acusação". Aí, o promotor dizia: " Ela deve ser • Dilmo Elias? condenada, por isso, por isso..." – e relatava IO - Dilmo Elias foi um dos últimos. Mas os pontos de condenação, de acordo com o ele teve sorte, porque pegou um elenco que havia sido apresentado antes. Depois fabuloso e não teve trabalho nenhum. Ele era dada a palavra ao Advogado de Defesa, atuava muito pouco como diretor, porque que expunha seus argumentos. E os só havia estrelas aqui. Nós fazíamos tudo, e ouvintes, por carta, condenavam ou ele quase não dizia nada. Agora no final, absolviam – para ganhar um livro. O muitas pessoas foram saindo, umas foram programa era super-inteligente. para a dublagem, e entraram pessoas novas. Aí, sim, ele pode usar os conhecimentos IO – E era muito ouvido. O volume de dele como ensaiador e diretor de teatro. cartas era imenso. Um dia ele falou assim: Mas ele foi um bom diretor e é uma boa "Eu me surpreendi ao perceber que a pessoa. maioria das cartas era enviada por marinheiros que estavam em alto mar e que • E o Telmo Avelar? ouviam a Rádio MEC". E os julgamentos AL – Telmo D. Avelar. Ele vazia questão deles eram muito inteligentes, e ele ficou desse "D". Um intérprete de enorme bastante feliz com isso. E "Novos Hori- talento, que veio do rádio comercial e foi zontes" é porque ele também gostava muito um diretor que honrou sua presença, aqui. de ciência, principalmente astronomia. O Aliás, foi com a saída dele que eu assumi a Miécio foi o fundador do Planetário da direção do Rádioteatro. Quando foi emboGávea Ele andava muito no Obser- ra, ele escreveu um bilhete pra botar na vatório Nacional e sabia de todas as tabela onde nós deixávamos as comuninovidades científicas. Foi ai que ele bolou cações. Um bilhete super-simpático, que esse programa "Novos Horizontes". guardo com muito carinho, dizendo que deixava nas minhas mãos o rádioteatro. O • E o Sadi Cabral? Telmo foi um diretor que passou por aqui AL – Sadi Cabral foi um grande mestre. deixando sua marca brilhante. Foi meu mestre, não só aqui, como no teatro. Havia um espetáculo anual, chama- •Allan, fale do seu trabalho como diretor. do "Poeira de Estrelas", que reunia gente de AL - Quando passei a dirigir o rádioteatro, todos os elencos, e, num deles, eu tive o eu já redigia programas. É interessante privilégio de ser dirigido pelo Sadi e ter dizer que, quando eu redigia o programa, a contracenado com Oscarito. Depois, foi voz da pessoa para quem eu estava feita uma montagem do Mambembe, escrevendo, o tempo de leitura, a respiração também dirigida por Sadi Cabral, em da pessoa, estava tudo na minha cabeça. Você trabalha tanto tempo com as pessoas benefício da Casa dos Artistas, e eu estava que passa a saber como elas respiram, com no elenco, também. De modo que, quando que ritmo elas falam, qual interpretação que ele veio para cá dirigir o rádioteatro, nós já vão dar. Então dirigir era muito fácil – o nos conhecíamos. Ele modificou o ritmo elenco era maravilhoso, Não houve uma do nosso rádioteatro, que era um pouco vez que eu dissesse: "Puxa, escalei mal". descansado. Para mim, ele foi um mestre. (continua na página seguinte) 13 •O Estúdio A era conhecido como estúdio de •A Rádio MEC produziu alguma novela? AL - Novela, não. Mas teve coisas seqüenciadas. Por exemplo, eu fiz "Fogo Morto", seqüenciado, mas não posso chamar isso de novela. Era uma história que continuava no dia seguinte, mas não terminava num ponto de suspense, como é normal em novela. IO - Quero lembrar o Garcia Xavier, que era o narrador do Fogo Morto. Era marido da Agnes Fontora, e também foi ator. Ele me disse que foi você, Allan, que trouxe ele pra cá. Depois ele ficou no lugar do Paulo Santos, transmitindo os concertos do Teatro Municipal. • Allan, fale sobre importância da contribuição do rádioteatro nos programas educativos. AL – É evidente que alguma coisa apresentada a várias vozes e dramatizada tem muito mais encanto que um programa feito a uma só voz ou a duas. Existe o que nós chamamos de "programa do sabido", onde o locutor sabe e todos os ouvintes não sabem. Estou me referindo a programas educativos, tipo depoimento ou palestra. O segundo formato primário de programa é "o burro e o sabido". São duas personagens: um entrevistador e um entrevistado – o entrevistador é o "burro" e o entrevistado, o "sabido"; o entrevistador é aquele que não sabe (posição que se acredita ser a do ouvinte), e o entrevistado é aquele que sabe, e vai transmitir os seus conhecimentos ao entrevistador e a todos aqueles que ouvem. Existe uma forma muito mais suave de transformar aquilo que tem que ser passado aos ouvintes, aquilo que tem que ser mensagem positiva de educação, no sentido amplo da palavra, e que é muito mais encantadora, muito mais suave e muito mais gostosa de se ouvir – quando há várias vozes e, principalmente, quando é dramatizado. Portanto, a utilização do rádioteatro em programas educativos é da maior importância – é a maneira mais suave e interessante de se passar para o ouvinte aquilo que se deseja que ele aprenda. Não vejo outra forma, melhor, no rádio. IO – Tanto a obra cientifica, como a literária, em rádioteatro acho que a gente assimila muito mais rápido. AL – E deixamos de tocar no que eu considero o ponto mais importante: o apelo à imaginação – aquilo que o rádio tem 12 Foto Fábio Pimentel rádioteatro. Houve algum plano de se fazer ali um estúdio mais completo? AL - Não, acho que nunca passou na cabeça de ninguém fazer qualquer reforma ali. Para nós, ele era um verdadeiro estúdio de rádioteatro. Servia perfeitamente. Tinha duas girafas, cada uma com um microfone bilateral – isso no começo, depois era um microfone omni-direcional, que capta o som de todos os lados –, um cantinho da contra-regra, cadeiras para os atores se sentarem enquanto esperavam, em suma, um ambiente perfeito para radioteatro, com visão plena da técnica e contato visual com diretor e operador – quando o diretor ficava do lado de fora. Allan e Ieda, hoje, em frente de foto dos anos 50 na qual aparecem Geny Marcondes ao piano (encoberta), Edith Ada Levy, Ieda, Nancy Nascimento e Gisela Gerlaca. de mais poderoso e que deixa a televisão a centenas de anos luz. A televisão dá tudo como pronto – quem assiste a televisão não tem margem pra criar, na imaginação, o que é o ambiente, a figura, o comportamento da figura, a maneira de falar. Ouvindo pelo rádio, você cria na sua imaginação a figura que quiser – a mulher bonita do rádio é a mulher bonita que você quer, é a mulher que você imagina bonita; um ambiente pobre no rádio é um ambiente pobre que você sabe que é um ambiente pobre, e não aquele ambiente pobre que um cenógrafo idealizou. O mais forte do rádio é onde, infelizmente, ele não está sendo aproveitado: o apelo à imaginação. As crianças de hoje recebem tudo pronto. A imaginação, o poder de criatividade dessas novas gerações estão sendo tolhidos. Não sei como serão os escritores do futuro. •Há pouco vocês falaram que quando as peças começaram a ser gravadas, vocês erravam muito, e antes, não. Por quê? IO - A gente errava porque, muitas vezes, você não concorda com o que falou. Antes, a gente acabava de falar e: "puxa podia ter dito isso melhor" – mas era ao vivo e ia assim mesmo, e dava certo. O nosso nível de exigência fica maior quando você tem uma fita. Eu lembro que o Allan, quando vieram as fitas, ele mandava a gente ouvir. "Você concorda com o que você disse?", e muitas vezes a gente não concordava, não.. •Ao que parece, de todo o rádioteatro feito aqui, o que sobrou foram cerca de 60 peças radiofônicas, adaptadas, traduzidas ou mesmo escritas pelo Sérgio Viotti. Fale do Viotti e desse trabalho. IO – Quando eu comecei, quem estava no radioteatro eram pessoas que não eram de teatro: eram de rádio, mesmo. A dinâmica do teatro é muito diferente da dinâmica do rádio, e o Sérgio Viotti, eu sinto que ele se adaptou muito bem ao radioteatro. Ele é um homem de muita cultura e sensibilidade, e sabia extrair do ator o máximo que ele podia dar. O elenco de suporte 11daquela época não era muito grande, mas éramos muito competentes e muito amigos. •Como era a mecânica do trabalho? IO – Como bom diretor de teatro, ele explicava e dava a linha do personagem. Veja bem, a pessoa tem uma formação de radioteatro e ele vem com uma personagem de teatro francês, por exemplo, que eram peças ligeiras, e que tem que ter um ritmo também rapidinho. Então, ele falava sobre a peça, falava sobre o autor, falava sobre a época em que a peça foi escrita, como era a linguagem da época, e inseria a peça. Mas era como se fosse um teatro. •Rememorando os textos que foram feitos aqui. Tem "Fogo Morto", tem todo o Monteiro Lobato, tem as peças do Miécio Hônkis, tem "O Clube dos 13", e o Teatro Sérgio Viotti. O que mais? AL – Tem o "Ouvindo, Lendo e Contando", que era o programa que eu herdei da Fernanda Montenegro. A Fernanda tinha um programa chamado "Lendo e Contando". Ela se afastou da Rádio e eu continuei. Fiz alguns com o mesmo título, e depois passei para "Ouvindo, Lendo e Contando", que também eram radiofonizações de contos. Esse programa ficou no ar 5 anos. •Foi gravado? AL – Claro que nada foi gravado. Quer dizer, houve gravações, sim, em discos de acetato de 16 polegadas. O técnico de gravação era o Antônio Tognetti, o "seu" Tognetti, como o chamávamos. O equipamento que ele manejava tinha um microscópio. A agulha tinha que ser colocada no ponto certo, para começar a riscar os sulcos. A gravação começava e, de repente, alguém errava. Era como se pisassem num calo do seu Tognetti: com uma chave de fenda, ele riscava os sulcos já feitos e iniciava um novo sulco mais adiante. Se acontecia outro erro, ele jogava aquele acetato fora e pegava outro disco virgem. Mas isso tudo se perdeu. O que o Sérgio Viotti gravou agora, é resultado de uma tecnologia mais avançada, que permitiu que tudo fosse gravado com facilidade. Nós, Ieda e eu pegamos a gravação em fio, em arame, que, de repente, embolava e todo o trabalho era jogado fora, porque não servia mais pra nada. Depois, veio a fita, mas o acetato foi anterior a tudo isso. Mas era uma dificuldade gravar um acetato. Os programas eram sempre feitos ao vivo e, quando o ator tomava conhecimento de que, naquele dia, ia ser gravado, ficava mais apavorado do que os atores de hoje em dia (cujos trabalhos são todos gravados e só são exibidos depois de devidamente editados, equalizados, etc.), ao receberem a notícia de que terão de fazer uma apresentação "ao vivo". Eles vão tremer do mesmo jeito que nós tremíamos, quando diziam, "vai ser gravado". É estranho, mas é verdadeiro. IO - Verdade. Sobre o trabalho de poesia, nós tivemos a Íris de Carvalho, que tinha um programa muito bonito chamado "Presença da Poesia". E outro dela, também, é "Mulheres Inesquecíveis", todas as mulheres da história ela enfocou, utilizando o radioteatro. Geir Campos tinha o "Poesia Viva", ele fazia um concurso em que os poetas novos traziam seus trabalhos e, ao final, o primeiro colocado tinha as poesias editadas e os demais recebiam um livro de poesia. Foi uma figura muito importante na Rádio MEC, o poeta Geir Campos. AL – Seria bom deixar registrado, fosse no radioteatro, fosse na música, na locução, fosse no que fosse, o nome de René Cavé, a quem essa rádio, se não deve tudo, deve quase tudo. IO – Uma pessoa, um diretor de radioteatro que a gente esqueceu foi José Valuzi. José Valuzi ainda está na ativa e foi uma pessoa que também teve uma passagem brilhante pela Rádio MEC. • Allan, você acha possível haver uma revitalização do radioteatro, no Brasil? AL – A cabeça dos nossos dirigentes é como a pena do juiz: você nunca sabe o que vai sair dali. Há pouco tempo, um governante brasileiro teve a idéia feliz de tentar revitalizar o rádioteatro, lá no extremo norte, no Amapá. Num primeiro momento, fui convidado a orientar um grupo de intérpretes locais. Fui e me apaixonei. É uma gente séria, talentosa, que pode surpreender, se houver interesse dos governantes em proporcionar as mínimas facilidades necessárias, o que estou aguardando até agora. Aquilo fez sacudir o meu coração. Vai sair dali um gen que pode se desenvolver por esse Brasil a fora. Porque a não existência do rádio de broadcasting, do radioteatro, a triste constatação de que o rádio transformou-se nesse monocórdico vitrolão, é triste pra nós que conhecemos uma outra importância do rádio, servindo a um outro propósito. Agora, tudo mais que se poderia dizer entra no terreno da utopia aquilo que nós gostaríamos que fosse e que não é. Um dia, ainda haveremos de ter um dirigente, alguém com força suficiente pra dizer: "Vamos renascer o rádioteatro" e aí, todos vão saber, essas novas gerações, qual a importância desse gênero de arte. O Ouvinte Permanente Os cães ladra e as caravana passam Desenho de Seth por Carlos Acselrad “Also sprach” (assim falou) Ibrahim, pioneiro do “colunismo social”. Para os desinteressados em cultura popular: neste ditado a caravana simboliza os poderosos, que lá vão montados em seus camelos; a nós, que os elegemos, só nos resta correr atrás, latindo nossa indignação que se limitará a ecoar no próprio deserto – a caravana tem mais o que fazer: passa. Cabe a ressalva: é tempo de esperança. Afinal, nas áreas que nos interessam, temos dois caras legais que podem soprar novos ventos na educação e na cultura, apeando de seus camelos e nos dispensando de ladrar contra. Por ora dói-nos dizer: na única emissora carioca comprometida com educação e cultura, as coisas estão mais para Ibrahim do que para Buarque e Gil. Como registramos aqui anteriormente, a programação de música em gravações respeitava algum critério, embora sob rótulos os mais vagos e abrangentes: (“Música sinfônica”, “Harmonia”, “Música de câmara”) . Pois agora, certamente após um “brain-storming” criador, eliminaram-se as fronteiras no tempo ou no espaço, nos gêneros e estilos, vozes ou instrumentos, aparentemente inspirados no velho choro “Mistura e manda”, de Nelson Alves. O período que reúne algumas horas de programação leva agora o instigante título de... “Manhã MEC-FM”. Dissemos instigante? Dissemo-lo bem. Mas não o é apenas o título. Instiga-nos, por exemplo, a originalidade: em nenhuma outra emissora, mesmo as evan-gélicas ou as de “música” pop-funk-bregbabababy (ou seja, todas) a locução perpetra coisas como “orquéssinfônica” ou “PssstaRepúbca”. No primeiro caso, sejamos tolerantes: é evidente que a intenção do texto era anunciar uma orquestra sinfônica; já no segundo, mais hermético, a tradução é “Presidente da República”. Pelas mesmas razões fonoaudiológicas aliadas a uma visível desinformação, o histórico ícone do violino, Heifetz, vira “Heftez”. Por outro lado, deveremos dar-nos por satisfeitos com certas compensações? Digamos, uma hora semanal reservada a compositores brasileiros contemporâneos. Infelizmente, não só o tempo é pouco: há uma grande indigência propriamente musical da produção que acaba se resumindo a elogios enfaticamente retribuídos pelo convidado. Esta indigência não é apanágio da MEC-FM: num programa ao vivo subtitulado “Entre amigos”, mostra-se músicos geralmente ainda desconhecidos ou principiantes, frequentemente bisonhos, cuja seleção obedece a critérios insondáveis. Pois a produção-apresentação-locução do programa, adequando-se ao caráter popular do evento, repete-se exaustivamente em gírias as mais sovadas: os músicos são sempre “da pesada”, já têm muito tempo “de estrada” ou – caso se trate de cantora – acaba de “partir para carreira solo”. Julga também eficiente fingir alguma intimidade com “essa rapaziada super-qualquer coisa”, tão “maravilhosa” que esse público igualmente maravilhoso está chegando para “segurar a onda de vocês” (?) . Ora, direis, rabujices... Ocorre, porém, que o rádio parece ter sua sintaxe própria, sua filosofia, sei lá, sua ética próprias. As agravantes agravam e as atenuantes nunca atenuam. Dois músicos – um compositor erudito e um instrumentista popular – produzem e apresentam seus programas. Ambos legislam em causa própria divulgando sua obra. São artistas reconhecidos e de fama internacional. Pois nem por isso se atenua o desagrado, o incômodo, o constrangimento mesmo que assaltam a quem ouve. Por mais condescendentes, compreensivos ou otimistas que sejam os ouvintes, é inevitável constatar: regra geral, piorou. Pequenas peculiaridades da estação resultam em maiores ou menores desmoralizações: chamadas para programas ou eventos culturais que já passaram, transmissões interrompidas por defeito da gravação ou do equipamento, repetições de produções já levadas ao ar anos antes, clientelismos e amadorismos de vários calibres... tudo convergiria para a definitiva desistência, à derradeira cotovelada no botão de desligar e a adesão final ao BigBrotherBrasil. Mas um momento, meu caro! Dê mais uma olhada no planalto: a caravana é outra. Não é propriamente um absurdo pensar que, breve, a campanha fome-zero chegará ao deserto da rádio cultural e educativa, e acordaremos um belo dia ao som de verdadeiras instigações na área das artes, da ciência, da informação e do debate. Por ora, au au! NÚMEROS DA CAO Tabulação feita por Renata Mello, com base nos relatórios semanais da Central de Atendimento ao Ouvinte, de 25/07/2002 a 17/03/2003. Total de ligações: 3093 em 83 dias, numa média de 37,2 ligações por dia MEC AM Total de ligações • Para o Caderno Manhã • Para o Cia. do Samba • Reclamações sobre a transmissão • Sugestões • Elogios •Críticas • Pedido informações • Reserva Ao Vivo ent. Amigos • Reservas p/ Parede 800 AM • Participaram de promoções • Demanda de Grade Programação • Participação em Escutar e Pensar • Ao vivo entre amigos 1557 396 68 05 115 152 24 163 127 180 280 09 17 19 MEC FM Total de ligações • Participaram das promoções • Informações • Reservas Sala de Concerto • Atendendo aos Ouvintes • Reclamações sobre a transmissão • Pedidos de grade • Elogios • Críticas • Sugestões 1536 150 344 447 282 46 45 56 122 44 Central de Atendimento ao Ouvinte - CAO Tel: 2252-8413 Coluna do Conselheiro Notas do editor: 1) Yacira Peixoto, eleita em novembro de 2001 para substituir Paulo Borges, no Conselho da ACERP, como conselheirarepresentante dos funcionários da Rádio e da TVE, novamente preferiu adiar sua estréia nesta coluna.. 2) Para sublinhar o fato de que a falta de assunto a respeito do Conselho, após tantos meses, já é, em si, uma notícia que merece ser desenvolvida, pensamos, inícialmente, em publicar a coluna em branco, deixando o vazio falar com toda sua eloquência. Mas decidimos não desperdiçar espaço, pois há informações que não podem passar em branco. 3) Apuramos que a SECON permanece com a mesma sigla, mas teve seu nome ampliado para Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica da Presidência da República, e que o Conselho Administrativo da ACERP foi recomposto, mas ainda está incompleto. Os 7 membros atuais são: Aspásia Camargo, que volta à presidência do Conselho; o ex-ministro Bresser Pereira; Wilson Timótheo, Secretáro-adjunto de Comunicação e Imprensa do Palácio do Planalto; Marcus di Flora, da SECON ; Emerson José Menin (Assessor de Comunicação da Petrobrás); Márcio Fortes de Almeida, Secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indúsria e Comércio Exterior, além da própria Yacira. Espera-se completar o colegiado em uma próxima reunião. Vamos torcer para que tal aconteça num futuro imediato e que, desta vez, o Conselho de Administração – que é o sangue ético, o motor ideológico e o braço operacional da Sociedade Civil na ACERP – tenha uma escalação duradoura e produtiva. 4) Em seu pronunciamento, na cerimônia de posse de Beth Carmona, a presidente do Conselho Administrativo da ACERP, usou mais de 10 vezes a palavra "televisão” e referiu-se à TVE, pelo menos outras três. Mas a palavra "rádio" não foi pronunciada uma só vez. É possível que alquém precise lembrar à presidente do Conselho que a Rádio MEC existe e está fazendo 80 anos? E é possível que, na sequência de sua fala, a presidente do Conselho sugira a criação de uma sociedade de amigos da TVE – o que é uma boa proposta –, sem falar, também, na Sociedade de Amigos da Rádio MEC, que está indo para o 12º ano de existência exemplar e acaba de receber o maior prêmio cultural do Estado? Por que isso ainda acontece? No horizonte deste novo tempo que se anuncia, os Amigos Ouvintes esperam por sinais claros de que a nova administração da ACERP não tenha olhos apenas para a TVE, mas dê ouvidos também à Rádio MEC, dando um passo para acabar com esse triste preconceito tecnológico que tanto prejuizo causa à Cultura. Esperamos também que a SOARMEC seja reconhecida e respeitada pelos seus méritos e direitos, e possa, desta vez, ser atendida em sua antiga reivindicação de ocupar um acento no citado Conselho de Administração. Vamos aguardar com esperança. 15 Ópera Completa por Zito Baptista Filho MEC FM Domingos, 17 hs PROGRAMAÇÃO MARÇO 2003 02 - Mozart: As Bodas de Fígaro 09 - Verdi: Otello 16 - Puccini: Tosca 23 - Bizet: Carmen 30 - Thomas: Mignon ABRIL 2003 06 - Gounod - Mireille 13 - Wagner: Rienzi 20 - Puccini: La Rôndine 27 - Massenet: Hérodiade 19
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