Artigo Pioneer
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MOBILIZAÇÃO TRADICINAL VERSUS MOBILIZAÇÂO DE CONSERVAÇÂO Henrique Chia1 Vasco Correia2 O trabalho de preparação do solo tem sido durante grande parte da existência da humanidade uma actividade dominante, representando o verdadeiro símbolo da Agricultura. A sua importância foi realçada por Jethro Tull, um agricultor inglês do Sec. XVIII, defensor de profundas e abundantes lavouras, chegando mesmo a afirmar que a mobilização do solo poderia substituir a fertilização. Segundo ele, "um solo perfeitamente pulverizado era condição necessária para as partículas de terra poderem ser absorvidas pelas raízes das plantas". Assim, a intensidade de trabalho do solo tem vindo a aumentar, conduzindo a uma degradação progressiva da sua estrutura, com a consequente diminuição a longo prazo das suas capacidades produtivas, facto que ainda hoje não é reconhecido em muitas partes do mundo (Sprague, 1986). A evolução das técnicas de mobilização do solo, devido à necessidade de aumentar e melhorar as produções, traduziu-se essencialmente pela substituição da tracção animal pela tracção mecânica e pela intensificação cultural daí resultante. Estas modificações, além de contribuírem para o progresso da agricultura, também têm colocado em causa a manutenção dos recursos naturais disponíveis (Azevedo, 1990). A redução da mobilização surgiu então como uma alternativa à mobilização convencional aparecendo na bibliografia da especialidade diversas designações para os novos sistemas de mobilização (Sprague, 1986; Carvalho et al., 1991). Nas regiões com estação seca bem marcada, os sistemas de mobilização de conservação podem ser utilizados como forma de conservar a água, reduzindo as perdas por evaporação e ser eventualmente este o seu principal objectivo (Carvalho et al., 1991). Magleby & Schertz (1988), consideram que no sistema de mobilização na zona, o solo é deixado inalterado até à data da sementeira, altura em que é feita uma pequena mobilização na zona da linha, conjuntamente com a sementeira, com um pequeno cultivador rotativo ou com um dente de chisel ou subsolador. As infestantes são habitualmente combatidas com herbicidas e sachas. Na opinião de Magleby & Schertz (1988) e da Sociedade Americana para a Conservação do solo (cit. por Sánchez & Renedo, 1993), este sistema de mobilização faz parte de uma filosofia de mobilização do solo que tem vindo a aumentar a sua importância nos últimos anos e que é normalmente designada por mobilização de conservação. Nos últimos 30 anos, verificaram-se alterações importantes nas técnicas convencionais de mobilização do solo. Muitas dessas técnicas tornaram-se desaconselháveis, algumas delas por motivos puramente económicos perante a diminuição do rendimento verificado na maioria das explorações agrícolas, devido ao aumento do preço dos factores de produção relativamente à evolução do preço dos produtos. Simultaneamente com o desenvolvimento de novas máquinas de preparação do solo, o aparecimento no mercado de herbícidas capazes de controlar o desenvolvimento das infestantes sem recorrer à lavoura, tiveram um papel importante no desenvolvimento de novos sistemas de produção (Bernat & Gil, 1993). Uma característica comum a todos estes novos sistemas de mobilização é a substituição da lavoura convencional com charrua de aivecas, por outras formas de mobilização com alfaias que reduzem a intensidade de trabalho sobre o solo ou a superfície afectada, com a preocupação de reduzir os gastos energéticos, mantendo em maior ou menor grau os resíduos das colheitas sobre o terreno. Surgem assim os sistemas de mobilização mínima e mobilização de conservação que dependendo, na maior parte dos casos, da aplicação de herbícidas para controlo das infestantes, permitem aos agricultores reduzir significativamente os custos de preparação do terreno para a sementeira (Bernat & Gil, 1993). Entre nós a primeira pessoa a desenvolver trabalho experimental na área da sementeira directa (sistema de mobilização de conservação), foi o Prof. Ário de Azevedo, no Instituto Superior de Agronomia, no final da década de 60. Com a saída do Prof. Ário de Azevedo do I.S.A. esta linha de trabalho perdeu-se, sendo mais tarde retomada na Universidade de Évora, conjuntamente com o Prof. Mário de Carvalho. De acordo com a bibliografia, podem ser apontadas como vantagens do sistema de mobilização de conservação as seguintes situações: 1 2 Engº Agrónomo - Assistente Departamento Engenharia Rural - Universidade de Évora - Mitra - Évora Engº Agrónomo - Ecotill Consultores de Agricultura de Conservação - Rua Distrito de Évora, 40 - 7000 Évora a) redução de custos - quando comparada com o sistema convencional, a mobilização de conservação permite reduzir os custos de investimento em maquinaria, os custos das reparações, consumo de combustível e trabalho (Griffith et al., 1990), uma vez que permite eliminar as operações primárias e secundárias de preparação do solo (Lal, 1990) e reduzir o tempo gasto com a preparação da cama de semente (Vyn et al., 1990). Neste sistema, os custos do combate aos inimigos das culturas poderão aumentar, especialmente quando estiverem presentes infestantes perenes. No entanto, este custo adicional é habitualmente igualado ou excedido pelo benefício resultante da economia de outros factores de produção (Griffith et al., 1990). b) controlo da erosão - o sistema de mobilização de conservação quando correctamente executado, pode proporcionar um adequado controlo da erosão hídrica em encostas com mais de 6% de declive, quando a cultura anterior for o milho, mesmo nas situações em que as linhas de cultura se encontram orientados no sentido do maior declive. Se as inclinações excederem estes limites, as linhas de cultura devem contornar a encosta, por forma a conseguir-se um adequado controlo da erosão pela água (Griffith et al., 1990). O sistema de mobilização de conservação favorece a luta contra a erosão, uma vez que deixa o solo coberto com os resíduos da cultura até à sementeira seguinte, mesmo após esta operação, pelo menos 30% da superfície do solo fica coberta com resíduos, normalmente concentrados na entre-linha (Selley & Eisenhauer, 1987; Dickey et al., 1988). A cobertura do solo durante os 12 meses do ano diminui consideravelmente o risco de erosão do solo. Por um lado não há destacamento de solo pela chuva, uma vez que os resíduos existentes à superfície absorvem a energia cinética das gotas de chuva antes que estas antinjam o solo. Por outro lado, devido à melhoria das propriedades físicas do solo, a água da chuva infiltra-se com maior facilidade, evitando-se o escoamento superficial (Orberste-Lehn, 1990). c) alargamento do período de sementeira - enquanto a preparação da cama para a semente em sistemas de mobilização convencionais baseados na lavoura é atrasada pelo elevado teor de humidade do solo, nos sistemas com mobilização de conservação a cultura pode ser semeada mais cedo (Griffith et al., 1990). Assim, enquanto na mobilização convencional se prepara o terreno para a sementeira, no sistema de mobilização de conservação já se está a semear (Fausey, 1990; Griffith et al., 1990). d) fertilidade do solo - Segundo Langdate et al. (1984), a presença dos resíduos da cultura anterior, à superfície do solo, constitui um excelente meio de armazenamento de nutrientes na camada superficial, evitando que estes sejam percolados durante a época das chuvas, para as águas subterrâneas. Os sistemas de mobilização de conservação aumentam o teor em matéria orgânica do solo, por acção dos resíduos à superfície e por acção das raízes das culturas, havendo uma clara correlacção entre o aumento do teor em matéria orgânica e o aumento da porosidade e da permeabilidade e uma diminuição da densidade aparente (Phillips & Yong, 1973). Efectivamente os sistemas tradicionais de mobilização do solo com lavoura e várias gradagens, têm vindo a contribuir ao longo do tempo para a degradação deste recurso natural, provocando a redução da sua capacidade produtiva, sobretudo devido ao aumenta da erosão potenciada pelas acções resultantes da utilização de alfaias como a charrua, grade de discos, etc. A utilização em larga escala destas técnicas de mobilização do solo entre nós, encontrava-se até à pouco tempo limitada pela ausência de adequadas alfaias que permitam a sua realização, nomeadamente subsolador adubador para “zone tillage”, capaz de trabalhar satisfatoriamente na presença de elevadas quantidades de resíduos da cultura anterior. Esta cobertura do solo é indispensável à redução dos riscos de erosão e ao aumento do teor de matéria orgânica na camada superficial do solo. Para colmatar esta lacuna foi desenvolvida uma alfaia de mobilização na linha de sementeira, por uma equipa que engloba membros de várias instituições, nomeadamente: Universidade de Évora, Galucho - Alfaias Agrícolas Lda e Ecotill - Consultores de Agricultura de Conservação Lda. Como foi referido, a alfaia por nós desenvolvida (Figura 1), destina-se a dar resposta a uma limitação existente no mercado de maquinaria agrícola nacional, onde não existiam até ao momento alfaias adequadas à prática das técnicas de mobilização de conservação. Associados à utilização desta alfaia surge um conceito de agricultura diferente daquele em que assenta a produção de culturas de regadio actualmente, que visa a conservação do solo, da água e contribui simultaneamente para a redução significativa dos custos de produção. De entre os vários campos semeados do Baixo Alentejo até Aveiro, escolhemos um que consideramos ser representativo das explorações onde pensamos que o sistema venha a ser aceite numa primeira fase. Esta exploração situa-se no Alentejo e cultiva anualmente cerca de 140 ha de milho para grão. Em 2002 efectuou 80 ha com o sistema convencional e 60 ha com mobilização na zona. Simultaneamente com a operação de subsolagem foi efectuada a aplicação de 800 Kg de adubo líquido de fundo. Após esta operação foi efectuada a sementeira com um semeador John Deere modelo Max-Emerge (Figura 2). Na Figura 3 podemos observar um aspecto do campo após emergência do milho. Figura 1 - ECOSUB 4/75 L - Máquina de 4 linhas com adubação liquida Figura 2 - Semeador John Deere em trabalho após passagem de ECOSUB 4/75L Figura 3 - Aspecto da cultura de milho após emergência 8,0 Tempo Dispendido (Horas/ha) 10,00 8,00 3,5 6,00 4,00 2,00 0,00 Convencional Mob. Zona Figura 4 - Tempo Dispendido para realizar 1 ha (Sistema Convencional versus Mobilização na Zona) Consumo (Litros/ha) Nesta situação podemos verificar uma efectiva redução do tempo para realizar um ha no sistema de mobilização na zona (Figura 4), bem como uma redução considerável de combustível por ha (Figura 5). 110,8 120,00 100,00 80,00 30,2 60,00 40,00 20,00 0,00 Convencional Mob. Zona Figura 5 - Consumo de Gasóleo para realizar 1 ha (Sistema Convencional versus Mobilização na Zona) Na Figura 6 e Figura 7 podemos observar, respectivamente, o tempo dispendido para realizar um há e o consumo de gasoleo por há para as diferentes operaçãoes do sistema convencional. 2,4 Tempo Dispendido (Horas/ha) 2,5 2,0 1,7 2,0 1,2 1,5 1,0 0,4 0,4 0,5 0,0 Figura 6 - Tempo dispendido nas diversas operaçãoes para realizar 1 ha (Sistema Convencional) 37,1 34,4 40,0 Consumo (Litros/ha) 28,7 35,0 30,0 25,0 20,0 7,8 15,0 1,6 10,0 1,2 5,0 0,0 Figura 7 - Consumo de Gasóleo nas diversas operaçãoes para realizar 1 ha (Sistema Convencional) Na Figura 8 e Figura 9 podemos observar as mesmas variáveis para o sistema de mobilização na zona. Nos gráficos anteriores podemos observar que no sistema convencional os grandes consumidores de tempo e combustível são as operações de lavoura, gradagem e vibrocultor, enquanto na mobilização na zona os maiores consumos vão para a subsolagem/adubação e sementeira. Tempo Dispendido (Horas/ha) 2,5 2,0 1,5 1,1 0,5 1,1 0,4 0,4 1,0 0,5 0,0 Consumo (Litros/ha) Figura 8 - Tempo dispendido nas diversas operaçãoes para realizar 1 ha (Sistema de Mobilização na Zona) 40,0 35,0 30,0 25,0 20,0 15,0 10,0 5,0 0,0 18,0 4,7 1,3 5,0 1,2 Figura 9 - Consumo de Gasóleo nas diversas operaçãoes para realizar 1 ha (Sistema de Mobilização na Zona) Referências Bibliográficas: ASAE Standards (1985) - Terminology and definitions for soil tillage and soil-tool relationships. TRANSATION of the American Society of Agricultural Engineers. St. Joseph, Michigan. pp. 185 - 187. Azevedo, A. L. (1990) - Changes in agricultural systems in the Mediterranean Region and soil conservation. 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