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Mulheres foram fundamentais na gênese da computação
Observatório da Imprensa - 17/02/2015 10:22:17 | Neutra | NotíciaDt. Transmissão: 17/02/2015 10:22:17Duração: Min
Por Sérgio Matsuura
Elas são minoria na indústria de tecnologia, mas, sem seu trabalho, provavelmente os computadores não existiriam
como os conhecemos hoje. Mulheres como Ada Lovelace e Grace Hopper foram fundamentais para o avanço dos
softwares. As seis programadoras do projeto Eniac criaram o sistema do primeiro computador eletrônico digital, mas
nenhuma recebeu o devido crédito. Mesmo exercendo papel central em estudos e pesquisas, elas ficaram relegadas a
segundo plano, mas projetos recentes buscam recolocá-las na História.
–A história das mulheres ainda não foi escrita – diz Lindamir Salete Casagrande, professora da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná, autora de trabalho sobre a contribuição das mulheres para a computação. – Ada
Lovelace e Grace Hopper até conseguiram algum reconhecimento, mas elas não foram as únicas.
Um programa lançado no início do ano pela Casa Branca tenta resgatar a história de mulheres nas ciências e na
tecnologia para inspirar maior participação feminina nesses campos. Augusta Ada Byron, conhecida como Ada
Lovelace, foi uma delas. Se Charles Babbage é considerado o “pai da computação”, Ada deveria ser a “mãe”. Ela
criou o primeiro algoritmo para ser lido por uma máquina e seu trabalho serviu de inspiração para Alan Turing, cujo
trabalho resultou no computador como o conhecemos.
Nascida em Londres, em dezembro de 1815, Ada era a única filha legítima do poeta Lorde Byron, fruto de um rápido
casamento com a baronesa Anne Isabella Byron. Durante sua curta vida – ela faleceu em novembro de 1852, aos 36
anos –, Ada nunca teve contato com o pai, que morreu quando ela tinha oito anos. Sua mãe, mulher muito inteligente
com formação em literatura clássica, filosofia, ciências e matemática, também era distante, mas sempre contratou
tutores para garantir a melhor educação para filha.
Contudo, biógrafos apontam que o desenvolvimento intelectual da filha não era a única preocupação de Anne Isabella.
Religiosa, ela temia que Ada herdasse o comportamento do pai. O sobrenome, a jovem ganhou do marido, William
King, que veio a se tornar conde de Lovelace. Os dois se casaram em 1835, quando Ada tinha 19 anos, e tiveram três
filhos: Byron, Anne Isabella e Ralph Gordon.
Pelas mãos de Mary Somerville, reconhecida astrônoma e matemática, Ada conheceu Babbage quando tinha 18 anos,
e ele, 42. O interesse de ambos pelas máquinas fez com que se tornassem amigos rapidamente. Ela estava
interessada nos inventos do novo conhecido, e ele se impressionara com o intelecto e habilidades matemáticas da
jovem.
Na época, Babbage trabalhava no desenvolvimento da Máquina Analítica, poderoso equipamento, considerado o
primeiro projeto de um computador mecânico de uso geral. Em 1842, Babbage fez uma apresentação de seu projeto
na Universidade de Turim. O engenheiro italiano Luigi Menabrea estava na plateia e fez anotações em francês, que
foram entregues a Ada para tradução para o inglês. O trabalho foi concluído no ano seguinte, com a tradução integral
do texto de Menabrea e sete notas adicionais. Na última, ela descreve um algoritmo que permitiria à Máquina Analítica
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realizar cálculos pré-determinados.
“A Máquina Analítica não tem pretensões de originar nada. Ela pode fazer qualquer coisa que nós soubermos ordenála a fazer. Ela pode seguir análises, mas não tem poder de antecipar relações analíticas ou verdades”, descreveu Ada.
Esse trecho foi citado em artigo um século depois por Alan Turing, pai da computação moderna. O texto foi publicado
durante a II Guerra, quando Turing trabalhava com a também brilhante criptoanalista Joan Clarke na decodificação das
comunicações alemãs. Ada sugeria que os computadores não poderiam aprender ou criar algo original, do que Turing
discordava, mas dizia que “as evidência disponíveis para a senhora Lovelace não a encorajavam a crer” que as
máquinas seriam tão capazes.
– Babbage idealizou o primeiro computador do mundo, e Ada fez o primeiro programa, uma série de instruções que
eram processadas e geravam um resultado – comenta Breno Valle, curador do Museu do Computador. – Infelizmente,
eles não viram a Máquina Analítica ser concluída. Por falta de financiamento, ela nunca saiu do papel.
As programadoras do Eniac
O primeiro computador eletrônico de uso geral só foi criado em 1946. O Eniac (Electronic Numerical Integrator and
Computer) foi projetado para fazer cálculos de artilharia para o exército americano. O contrato de construção foi
assinado em 1943 e, da mesma forma que na Máquina Analítica de Babbage, a programação foi feita por mulheres.
De um grupo de 80 matemáticas que trabalhavam com cálculos balísticos na Universidade da Pensilvânia, Kathleen
McNulty, Mauchly Antonelli, Jean Jennings Bartik, Frances Synder Holber, Marlyn Wescoff Meltzer, Frances Bilas
Spence e Ruth Lichterman Teitelbaum foram selecionadas para participarem de um projeto secreto para automatizar o
processo.
O Eniac foi apresentado em fevereiro de 1946, e se mostrou capaz de realizar complexos cálculos em segundos. Toda
a programação foi feita pelo grupo de mulheres, mas elas nunca receberam o crédito por isso. No ano passado, o
documentário “The Computers”, com relatos das seis programadoras, tentou recuperar parte dessa história.
– Demorou muito para se perceber o que as programadoras do Eniac fizeram, e como fizeram. Elas aprenderam como
o Eniac funcionava e o programaram sem linguagens de programação ou manual – diz Kathy Kleiman, coprodutora do
documentário.
Aliás, também foi uma mulher a responsável por acelerar o desenvolvimento das linguagens de computação. A
almirante Grace Hopper era uma visionária que, em 1949, quando os computadores ocupavam salas inteiras,
acreditava que eles poderiam atender ao público em geral.
Nascida em dezembro de 1906, em Nova York ela se graduou em matemática em 1928 da Faculdade Vassar, onde se
tornou professora, e completou o doutorado em Yale, seis anos depois. Ela continuou em Vassar até 1943, quando
ingressou na Marinha, onde foi designada para trabalhar em um laboratório da Universidade Harvard, com o icônico
Mark 1.
Impressionada com os computadores, Grace arriscou sua carreira militar para ingressar, em 1949, na Eckert-Mauchly
Computer Corporation para produção de softwares comerciais. Para facilitar o trabalho, ela teve a ideia de compartilhar
códigos entre os programadores, formando bibliotecas, para reduzir os erros e evitar o retrabalho. Mas seu grande feito
foi a criação dos compiladores (programas capazes de “traduzir” uma linguagem para outra, em geral mais simples). O
Flow-Matic, lançado em 1955, foi a primeira linguagem de programação que funcionava com palavras em inglês. Até
então, todos os softwares eram escritos em notação matemática. Ela também participou da criação do Cobol,
linguagem até hoje amplamente utilizada.
– Para lembrá-la, existe uma conferência anual nos EUA que leva seu nome – diz Juliana Freitag Borin, professora do
Instituto de Computação da Universidade de Campinas.
***
Sérgio Matsuura, do Globo
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