PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA

Transcrição

PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA
PROTOCOLO Nº:
AÇÃO PENAL Nº
INDICIADO:
VÍTIMA:
ASSUNTO:
EMENTA:
4085/2015-MPPR-PGJ
0005649-61.2015.8.16.0013, DA 1ª VARA CRIMINAL DE
CURITIBA
CÍCERO RAFAEL DA SILVA
CLAUDECIR OLIVEIRA e LUIZ ANTONIO AVELINO DE BARROS
ART. 28 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
PROMOÇÃO DE ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL.
CORRUPÇÃO DE MENORES (ART. 244-B, ECA). AUSÊNCIA DO
ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO. RATIFICAÇÃO DO
PRONUNCIAMENTO MINISTERIAL DE 1º GRAU. A falta de
indícios da intenção dos acusados em corromper ou facilitar a
corrupção do menor de idade justifica, conforme o princípio
da culpabilidade, o arquivamento dos autos.
EXCELENTÍSSIMA SENHORA
SUBPROCURADORA-GERAL DE JUSTIÇA PARA ASSUNTOS JURÍDICOS
1. RELATÓRIO
O presente expediente foi instaurado, inicialmente, para apurar a
prática de roubo qualificado pelo concurso de agentes (art. 157, §2º, inciso II, do
Código Penal) atribuído a CÍCERO RAFAEL DA SILVA.
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Consta dos autos que, no dia 22 de fevereiro de 2015, por volta das 22
horas, no interior do estabelecimento comercial denominado “Companhia da Pizza”,
localizado na Rua Luiz França, nº 738, Bairro Cajuru, Curitiba-Pr., o denunciado,
CÍCERO RAFAEL DA SILVA, juntamente com o adolescente Elder Santos Damázio da
Silva e dois outros indivíduos não identificados, previamente ajustados entre si, com
identidade de propósitos e em comunhão de esforços, subtraíram para todos,
mediante grave ameaça ao simulares estarem armados contra as vítimas Claudecir
Oliveira e Luiz Antonio Avelino Barros, 01 (um) aparelho de telefonia celular da marca
Motorola e R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), avaliados em R$ 850,00 (oitocentos e
cinquenta reais), conforme auto de exibição e apreensão de fls. 22, auto de avaliação
de fls. 53.
O ilustre Promotor de Justiça, JACSON ZILIO, às fls. 04/06, ofereceu
denúncia pelo delito de roubo qualificado pelo concurso de agentes, deixando de
fazê-lo no tocante à prática do delito de corrupção de menores (art. 244-B do
Estatuto da Criança e do Adolescente), aduzindo que não existiriam nos autos indícios
concretos da corrupção do adolescente por seu comparsa no presente caso.
O digno magistrado, JOSÉ DANIEL TOALDO, às fls. 14-verso/15,
discordando do pronunciamento ministerial em relação ao arquivamento, assinala
que, por se tratar de delito formal e independe de prova da efetiva corrupção do
menor. Assim, remeteu os autos a esta Procuradoria-Geral de Justiça para os fins do
art. 28 do Código de Processo Penal.
II. FUNDAMENTAÇÃO
Preliminarmente, faz-se necessária uma análise do conjunto
probatório até o momento carreado aos autos.
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O policial militar, LEANDRO ADELINO LOPES, às fls. 21, aduziu que:
“foram informados pelo Copom do roubo da pizzaria, e após serem
informados das características e do que foi subtraído, se depararam
na Rua Olga Balster, bairro Cajuru, comum elemento com as
características de um dos autores, e após efetuarem a abordagem,
e identificarem como Cícero Rafael da Silva, foi localizado em seu
bolso um aparelho de telefone celular, que foi reconhecido por uma
das vítimas posteriormente; QUE assumindo participação no roubo,
Cícero levou a equipe até a residência de um dos partícipes,
localizada na Rua Professora Olga Balster, nº 740, fundos, Cajuru,
no entanto o indivíduo identificado como Eldes Santos Damazio não
se encontrava; QUE com relação aos outros dois autores Cícero não
soube informar qualquer dados; QUE ato contínuo, Cícero foi
levado a presença das vítimas, que o reconheceram como um dos
autores do roubo”.
O policial Militar, CLAUDECIR OLIVEIRALEANDRO ADELINO LOPES, às
fls. 21, corroborou integralmente a versão apresentada por seu colega de farda.
A Vítima, CLAUDECIR OLIVEIRA, às fls.23, disse que:
“4
elementos
simulando
estarem
armados,
entraram
no
estabelecimento e deram voz de ‘assalto’, dizendo que queriam que
abrissem o cofre da pizzaria; QUE um dos elementos subtraiu uma
quantia do caixa e após subtraíram o celular do declarante; QUE ato
contínuo evadiram-se, e 15 minutos depois, policiais militares
chegaram no local e o declarante informou o ocorrido e as
características dos elementos, sendo logo depois detido pelos
policiais e reconhecido como um dos autores do roubo; QUE com
relação a Elder Santos Damázio da Silva, o declarante o reconhece
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como um dos autores, e que inclusive, é morador próximo à sua
residência.
A vítima, LUIZ ANTONIO AVELINO BARROS, às fls. 25-verso/26,
corroborou integralmente o depoimento prestado pela outra vítima.
O interrogado, CÍCERO RAFAEL DA SILVA, às fls. 29/30, assumiu a
autoria do crime, dizendo que:
“estava em companhia do menor de idade Eldes e outros dois
elementos que não sabe suas qualificações ou qualquer meio de
localizá-los; QUE alega ainda que estava bebendo em um bar,
quando decidiram realizar o roubo, porém não estavam armados;
QUE com relação ao dinheiro subtraído, disse não ter
conhecimento, e que apenas o celular da vítima estava em sua
posse.”
Diante do exposto, pelas provas até o momento carreadas aos autos,
verifica-se que o envolvimento do adolescente no roubo é fato incontroverso,
confirmado pela vítima, pelos policiais militares responsáveis pela prisão e pelo
investigado.
O tipo penal em apreço – art. 244-B, ECA – cuida de apenas uma
maneira de corrupção: a inserção do jovem na criminalidade.
O delito de corrupção de menores é crime de natureza formal,
conforme já consolidado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não se
exigindo para sua configuração, portanto, demonstrativo de que o inimputável tenha
sido corrompido, basta a participação do indivíduo no ilícito.
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O objeto jurídico tutelado pelo crime em questão é a proteção da
moralidade do menor que, por óbvio, com sua contribuição para a prática delitiva, já
foi afetada com a mera inserção no mundo da criminalidade.
Muito embora seja incontroversa a participação do adolescente, Eldes
Santos Damázio da Silva, no roubo perpetrado na ‘Companhia da Pizza’, não restou, até
o presente momento, delineada claramente a existência do elemento subjetivo do
tipo consistente na intenção do denunciado em corromper ou facilitar a corrupção do
menor (art. 244-B, ECA).
Todos os delitos sejam eles materiais, formais e de mera conduta
devem ser enfocados sob o ponto de vista natural (do resultado naturalístico). Não se
fala em crime sem a presença de dois desvalores: da ação e do resultado jurídico.
Não é correto desconsiderar completamente o desvalor do resultado. O crime, na
atualidade, de acordo com a teoria constitucionalista do delito, não deve resultar
configurado apenas com o desvalor da ação. Não se deve ignorar o princípio da
ofensividade, nem que a norma penal é puramente imperativa, mas também
valorativa, ou seja, toda norma existe para proteger um valor.
Logo, não basta o plano formal da participação do menor no ato
criminoso. Mais que isso. É preciso averiguar se houve intenção para a efetiva
corrupção do menor. A norma existe não para proibir a participação do menor em
atos criminosos, mas sim, para evitar sua corrupção.
Destarte, o elemento subjetivo do tipo é essencial à caracterização do
delito de corrupção de menores, à luz da natureza sancionatória do art. 244-B da Lei
nº 8.069/1990, o que afasta, dentro do nosso ordenamento jurídico, a
responsabilidade penal objetiva.
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No caso dos autos, não se vislumbra elementos de prova que indiquem
ter sido o denunciado o responsável por induzir o adolescente à prática do crime,
pois a mera participação deste na empreitada criminosa não deve, por si só, gerar a
responsabilidade criminal ao acusado, sob pena de se desconsiderar o princípio da
culpabildiade em matéria penal.
O principio da responsabilidade penal subjetiva, que preconiza a
maxima do nullum crimen sine culpa, afasta a possibilidade de atribuir-se a pratica de
crime sem que seja mensurado o elemento subjetivo do tipo.
Nesse sentido:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ESPECIAL. CONTRABANDO DE MATERIAL ELETRÔNICO. AUSÊNCIA
DE DOLO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. TRANCAMENTO DA AÇÃO
PENAL VIA HABEAS CORPUS. POSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO
PROVIDO. 1. É certo que o dolo opera diretamente no tipo penal,
que na hodierna estrutura funcionalista da teoria do crime, leva em
consideração, também, os aspectos formais (conduta, resultado
jurídico, nexo de causalidade e subsunção legal) e os materiais
(imputação objetiva, desvalor da conduta e desvalor do resultado).
2. Por força do princípio da responsabilidade penal subjetiva
ninguém pode ser punido senão a título de dolo ou culpa, sob
pena de caracterizar a responsabilidade penal objetiva, rechaçada
em nosso ordenamento. 3. Segundo a boa doutrina, dolo nada mais
é do que a consciência (desejo ou aceitação) dos requisitos
objetivos do tipo penal. Sua ausência descaracteriza o tipo e, por
consequencia, afasta a ocorrência do crime. 3. Inexistindo crime,
não há justa causa para a deflagração da ação penal, nos termos do
art. 397, III, do CPP. (STJ, AgRg no REsp 1243193 / ES, Ministro
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JORGE MUSSI, 5ª T, julgamento 22/05/2012, publicação DJe
31/05/2012). (destaque nosso)
Assim, pela prova colhida nos autos, não restou caracterizada a
tipicidade da conduta prevista no art. 244-B do ECA pelo acusado, pelo que o
arquivamento é medida adequada à espécie.
III. CONCLUSÃO
Diante
do
exposto,
estando
fundamentado
e
adequado
o
pronunciamento do Ministério Público de 1º Grau, somos pela sua ratificação por
esta Douta Procuradoria-Geral de Justiça.
É a manifestação que submetemos à análise, sempre criteriosa, de
Vossa Excelência.
Curitiba, 17 de março de 2015.
REGINALDO ROLIM PEREIRA
Procurador de Justiça
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