A COOPERAÇÃO FAZ A FORÇA
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A COOPERAÇÃO FAZ A FORÇA
b João Paulo Koslovski Luiz Roberto Baggio b A COOPERAÇÃO FAZ A FORÇA JOÃO PAULO KOSLOVSKI E LUIZ ROBERTO BAGGIO DISCUTEM OS DESAFIOS E OPORTUNIDADES DO COOPERATIVISMO PARANAENSE O cooperativismo é um caso de organização de sucesso no Paraná e representa um faturamento anual de R$ 16 bilhões. João Paulo Koslovski e Luiz Roberto Baggio, duas importantes personalidades da área, discutem os desafios e as oportunidades do cooperativismo paranaense. João Paulo é agrônomo, presidente da Ocepar e do Sescoop, autor de várias publicações e foi vice-presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras. Luiz Roberto Baggio é economista, mestre em Administração pela Esade, presidente da Cooperativa Bom Jesus e da Cooperativa de Crédito do Sudoeste do Paraná, e vice-presidente da Ocepar e da Organização das Cooperativas Brasileiras. 8 revista FAE BUSINESS número 12 setembro 2005 1 - O cooperativismo é um tipo de organização especial na sociedade de mercado. Quais são os alicerces e as bases do cooperativismo? BAGGIO – O cooperativismo apresenta algumas diferenças em relação às organizações mercantis. Funciona como um instrumento de organização econômica da sociedade, aglutinando solidariamente pessoas que tenham interesses comuns. O cooperativismo aborda sete princípios, universalmente aceitos: adesão voluntária; gestão democrática; participação econômica dos membros; autonomia e interdependência; educação e informação; cooperação entre cooperativas e interesse pela comunidade. Entre esses sete princípios, se eu tivesse de destacar um, diria que é o interesse econômico comum, compartilhado por pessoas de uma região, que se unem para desenvolver um negócio que ganhe escala e competitividade. KOSLOVSKI – O fundamento principal é a união cooperativa entre pessoas, objetivando suprir determinados serviços demandados por essa sociedade. O alicerce do cooperativismo é a solidariedade na somatória das economias individuais para se viabilizar um serviço em prol do cooperado. A cooperativa é uma ferramenta que o produtor tem para conseguir o que não consegue sozinho (Baggio) 2 - Como o cooperativismo promove ou auxilia o desenvolvimento econômico e social? BAGGIO – O cooperativismo funciona como um catalisador de negócios e de desenvolvimento. Tendo por base a união das pessoas, promove a formação de uma empresa que seja competitiva, eficiente e capaz de gerar resultado para seus associados. A cooperativa é uma ferramenta que o produtor tem para conseguir o que não consegue sozinho. Especialmente na agricultura, nenhum agricultor é grande o suficiente para interferir na demanda ou na oferta e nenhuma cooperativa sozinha é grande o suficiente para interferir na demanda, apesar de ela poder conduzir melhor essas coisas. Como? Em primeiro lugar, pela transferência de tecnologia. Esse é o pressuposto básico na agropecuária: aplicar a tecnologia mais adequada àquela região e àquele perfil de produtor. A cooperativa vai prospectar a melhor alternativa, onde ela exista, seja dentro ou fora do país. No caso das cooperativas industrializadas, elas vão além, ao agregar valor na produção do cooperado, o que é difícil de se fazer sozinho. A cooperativa também facilita o acesso ao mercado internacional. As cooperativas ainda auxiliam na implantação de novos modelos de administração e de gestão de pessoas, orientando o produtor a trabalhar seu negócio como se fosse uma empresa. KOSLOVSKI – O cooperativismo apóia aquelas pessoas que não têm condições de individualmente enfrentar os desafios do mercado e fazer com que o seu negócio prospere. Assim, permite que, na somatória do individual, o negócio possa ser viabilizado. No Paraná, parte do sucesso do cooperativismo está alicerçada na educação cooperativista, fruto de um conhecimento sobre cooperativismo trazido da Europa por imigrantes, especialmente holandeses, alemães, italianos, e enriquecido com a experiência no Rio Grande do Sul. Essa vivência, trazida para o Oeste e Sudoeste do Paraná, mais a experiência do cooperativismo do café paulista, permitiu que nós criássemos no Paraná a Ocepar. A instituição, no decorrer de seus 35 anos, tem auxiliado no processo de desenvolvimento, promovendo o planejamento estratégico conjunto, a implantação de infra-estrutura, de suporte técnico e de concessão de crédito rural. 3 - No Estado do Paraná, como estão divididas as cooperativas, em termos de segmento de produção? BAGGIO – O Paraná é vanguarda no cooperativismo. Hoje, 55% do PIB do Paraná provêm das cooperativas, que respondem por mais de R$ 16 bilhões de faturamento anual, envolvendo cerca de 20% da população do Estado. O setor agropecuário é o que mais se desenvolveu. Em segundo lugar, temos o ramo do crédito. Nos anos 70, do século há pouco passado, o ramo de crédito veio no vácuo do agropecuário e se desenvolveu muito nos últimos dois anos. O Sicredi (Sistema de Crédito Cooperativo) representa um novo modelo de crédito no Brasil, especialmente na Região Sul, suprindo a necessidade de recursos financeiros mais baratos que no sistema financeiro tradicional. Os demais ramos também começam a se desenvolver, como as Unimeds, do ramo de saúde. KOSLOVSKI – A Ocepar congrega todos os 13 ramos de cooperativismo que existem no Paraná: agropecuário, de consumo, de crédito, educacional, especial, habitacional, infraestrutural (eletrificação), mineral, de produção, de saúde, de trabalho, de transporte e turismo. No setor agropecuário, temos duas vertentes: as que trabalham com os produtos in natura e as cooperativas que já têm o processo de agroindustrialização. De 35 a 40% do processo de agroindustrialização do Estado passa pelas cooperativas. Em nosso planejamento estratégico, prevemos chegar a 55%, até 2010. Parte do sucesso das cooperativas do Paraná está alicerçada na educação cooperativista, fruto de um conhecimento sobre cooperativismo trazido da Europa por imigrantes, e enriquecido com a experiência no Rio Grande do Sul (Koslovski) 4 – Durante anos, o país patinou na marca de 80 milhões de toneladas de grãos. Porém, desde 2000, rompemos essa barreira e atingimos a casa das 120 milhões de toneladas. Qual deverá ser a futura política de investimentos das cooperativas do Paraná? Que áreas serão contempladas? b revista FAE BUSINESS número 12 setembro 2005 9 BAGGIO – No Paraná, o investimento das cooperativas, nos dois últimos anos, foi de R$ 1,1 bilhão. Houve um investimento maciço no setor de carnes. Esse desenvolvimento gerou um volume recorde de exportações e um aumento no valor agregado. Tem-se investido muito também no segmento de aves e na ampliação da capacidade de recepção e armazenagem logística de safra. No Brasil, há 40% de déficit de armazenagem. Do total da capacidade de armazenagem no Paraná, as cooperativas detêm 28%. A parceria com a Cooperativa de Pesquisa e Tecnologia (Codetec) permite que sejam geradas cerca de 30% das variedades de sementes de trigo e soja do Estado. Em 2003 e 2004, o Prodecop (Programa de Desenvolvimento do Cooperativismo) aumentou a capacidade de armazenagem, especialmente, da agroindústria. Nós estávamos com uma frota sucateada. Com o Modern Frota, rejuvenescemos a frota de tratores e colheitadeiras, promovendo o avanço da tecnologia no campo. As cooperativas do Paraná, em parceria com a Ocepar, estão desenhando seus planejamentos estratégicos para os próximos cinco anos, tendo como vetor a agregação de valor com a agroindustrialização. Precisamos de R$ 3,5 bilhões. Fizemos duas reuniões com o Ministro do Planejamento que se prontificou a defender uma linha de financiamento para as cooperativas do Paraná via BNDES. Hoje, 55% do PIB do Paraná provêm das cooperativas, que respondem por mais de R$ 16 bilhões de faturamento anual, envolvendo cerca de 20% da população do Estado (Baggio) KOSLOVSKI – Queremos aproveitar as boas condições do mercado internacional e estimular a adoção de tecnologia por parte dos produtores. Nas cooperativas do Paraná, temos 1.100 profissionais de nível superior atuando diretamente no campo, além de 300 profissionais de nível técnico. O investimento, nos próximos anos, deverá se concentrar na área de frangos, na qual o Paraná é o primeiro do mundo, como produtor e exportador. A área de suínos também tende a crescer. Estamos exportando queijos para o Japão, Coréia e Chile. Com relação a sucos, temos a Corol e a Cocamar trabalhando forte na área. Há ainda o arenito, com 2,3 milhões de hectares a serem explorados. O Iapar (Instituto Agronômico do Paraná), com apoio da Cocamar, começou a desenvolver pesquisa de plantio direto no arenito, com sucesso. Hoje temos de 350 a 400 mil hectares sendo plantados com soja e milho, em rotação com a pecuária. Isso vai melhorar o nível tecnológico da pecuária, a exploração de grãos e a produtividade daquela região. Teremos ainda de sofisticar a produção, agregar valor, como na área de verduras em que a Cooperativa LAR está produzindo vegetais supergelados. 10 revista FAE BUSINESS número 12 setembro 2005 Nos últimos três anos, foram treinados 180 mil pessoas no Paraná, por meio do Sescoop. Além do cooperado, do empregado e do dirigente, a família também participa de diversos cursos (Koslovski) 5 - Com o grande crescimento da produção e aumento das vendas externas, como tem sido o processo de profissionalização das cooperativas? BAGGIO – As cooperativas precisam evoluir para competir, por isso, é importante investir em treinamentos. Fiz um curso de agribusiness na FAE e depois um MBA. Vi que precisava buscar o conhecimento e “misturá-lo” com o de outros profissionais. A tendência no mundo inteiro é de profissionalizar a gestão. Mas não basta transferir conhecimento, temos de criar a educação cooperativista. São quatro as tendências do cooperativismo contemporâneo: educação cooperativista, gestão profissional do negócio, interesse pela comunidade e intercooperação estratégica. O Sescoop (Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo) oferece formação para o dirigente, o associado e o funcionário, estendendo-a à família do cooperado. KOSLOVSKI – A partir de 1999, o Sescoop nos possibilitou investir no desenvolvimento das pessoas. Nos últimos três anos, foram treinadas 180 mil pessoas no Paraná. Além do cooperado, do empregado e do dirigente, a família também participa de diversos cursos. Para os dirigentes, oferecemos um curso sobre exportação, pois eles não sabiam exatamente como funcionava essa área. A importância dessa formação se percebe quando sabemos que as cooperativas do Paraná foram responsáveis por 49% do total exportado pelo cooperativismo brasileiro no último ano. Também fizemos viagens ao exterior, levando dirigentes da área de leite que estão exportando leite em pó, queijo, etc. Criamos uma cultura para que eles pensem na possibilidade de exportar. Estamos dando bolsas de estudo para MBAs, especialização e mestrado. As ações de treinamento do Sescoop foram fundamentais para o desenvolvimento do cooperativismo no Paraná. 6 - Qual a importância das exportações para as cooperativas? BAGGIO – A importância da exportação não é só agregação de valor e faturamento em dólar, mas acesso ao mercado. Tem-se hoje uma produção de 120 milhões de toneladas de grãos e a tendência é crescer. O Brasil pode crescer mais 90 milhões de hectares e triplicar a produção. Onde vamos vender? Precisamos de acesso a mercados. A Coamo e a Cotriguaçu têm dois terminais de exportação em Paranaguá. Queremos crescer na Europa, com exportações de soja, derivados e frango. A prospecção é feita, o estudo é desenvolvido e as cooperativas começam a abrir contatos e fazer contratos para iniciar, preferencialmente, com os produtos da agroindústria processados. As commodities (produtos agrícolas in natura e matérias-primas) são mais tranqüilas de operar do que os produtos processados, porém, estes nos interessam mais, por terem valor agregado. KOSLOVSKI – Ainda não é muito grande. Do faturamento de R$ 16,5 bilhões, exportamos 1 bilhão de dólares, o que representa cerca de 20% do faturamento das cooperativas no Paraná. Há um espaço fantástico para o crescimento. Estamos exportando 30 produtos para 70 países. A gente tem defendido que se pulverize o máximo para que, a cada ano, se consigam mais mercados em mais países. 7 - A agricultura é o setor que mais consome água. Mais de 70% de toda a água retirada dos rios é utilizada na produção agropecuária. Além disso, há ainda os problemas de desmatamento. Como as cooperativas gerem os processos ambientais? BAGGIO – Para nós, produtores, a terra e a água são nosso instrumento de trabalho. As cooperativas dão grande importância a esse assunto. Não a “pura preservação burra”, mas o desenvolvimento sustentável tem sido o foco de atuação das cooperativas. Há vários programas de desenvolvimento ambiental. O corpo técnico das cooperativas orienta os produtores a utilizarem a tecnologia com o menor impacto ambiental. Começa com o plantio direto e vai até a proteção às nascentes e a recuperação da mata ciliar. As cooperativas têm seus postos de recepção de embalagens de agrotóxicos, encaminhando-as para o destino apropriado. É bom lembrar que o projeto paranaense “Cultivando a Água Boa” recebeu um prêmio da revista Globo Rural. KOSLOVSKI – Na Ocepar, nós constituímos um fórum de meio ambiente para discussão com o governo estadual e federal. A mata ciliar é o nosso foco. A cooperativa tem obrigação e responsabilidade não apenas com a propriedade, mas com a sociedade, em relação à mata ciliar. A obrigatoriedade da reserva legal é um problema, pois, em algumas propriedades, pode inviabilizar a sobrevivência do produtor. Queremos uma legislação que contemple o zoneamento econômico ecológico. Apenas nos projetos das matas ciliares, conseguiremos uma reposição florestal de 7% do Estado, pois o Paraná é cortado por muitos rios. O meio ambiente é uma área que nos preocupa muito, mas devemos evitar radicalismos. Precisamos ter bom senso, já que não se deve expulsar o agricultor do campo. Entretanto, este tem que cultivar a terra, cuidando de sua preservação. O Brasil produz hoje 120 milhões de toneladas de grãos. Podemos triplicar essa produção, mas onde vamos vender? Precisamos de acesso a mercados (Baggio) 8 - O atual contexto, de crescente globalização, tem levado empresas a procurarem ganhar escala, por meio de fusões. Como as cooperativas analisam essa possibilidade? BAGGIO E KOSLOVSKI – As cooperativas têm um trabalho bem diferente das grandes empresas, pois 77% dos agricultores que compõem as cooperativas são donos de menos de 50 hectares de terra. A preocupação da cooperativa vai além de propiciar lucros, visto que ela fornece assistência técnica e social, treinamento, seguro, saúde. No entanto, é sabido que as cooperativas terão de atuar em determinadas atividades, como as relacionadas a fertilizantes. No Paraná, consumimos 1,8 milhão de toneladas por ano e apenas a Copavel atua no setor. Nós estamos trabalhando na constituição de uma cooperativa que congregará 14 outras cooperativas para se produzir fertilizante. O estatuto está pronto. As cooperativas não precisam realizar fusões, pois podem manter sua atuação regional, ampliando as parcerias, como a Cocamar que esmaga soja para a Coamo. Essa interação maior das cooperativas é uma tendência, mas não é um processo fácil. É um item que foi demandado pelas cooperativas e que está sendo trabalhado pela Ocepar. f revista FAE BUSINESS número 12 setembro 2005 11