“as duas tartarugas” uma pintura atribuída a albert - acd
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“as duas tartarugas” uma pintura atribuída a albert - acd
ISSN 0100-6304 PUBLICAÇÕES AVULSAS DO MUSEU NACIONAL NÚMERO 112 RIO DE JANEIRO Agosto de 2006 ISSN 0100-6304 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO REITOR Aloísio Teixeira MUSEU NACIONAL DIRETOR Sérgio Alex K. Azevedo EDITORES Miguel Angel Monné Barrios Ulisses Caramaschi EDITORES DE ÁREA Adriano Brilhante Kury Alexander Wilhelm Armin Kellner Andrea Ferreira da Costa Cátia Antunes de Mello Patiu Ciro Alexandre Ávila Débora de Oliveira Pires Izabel Cristina Alves Dias João Alves de Oliveira João Wagner de Alencar Castro Marcela Laura Monné Freire Marcelo de Araújo Carvalho Marcos Raposo Maria Dulce Barcellos Gaspar de Oliveira Marília Lopes da Costa Facó Soares Rita Scheel Ybert Vânia Gonçalves Lourenço Esteves NORMALIZAÇÃO Vera de Figueiredo Barbosa DIAGRAMAÇÃO E ARTE-FINAL Lia Ribeiro NORMALIZAÇÃO Vera de Figueiredo Barbosa CONSELHO EDITORIAL André Pierre Prous-Poirier Universidade Federal de Minas Gerais Maria Carlota Amaral Paixão Rosa Universidade Federal do Rio de Janeiro David G. Reid The Natural History Museum - Reino Unido Maria Helena Paiva Henriques Universidade de Coimbra - Portugal David John Nicholas Hind Royal Botanic Gardens - Reino Unido Maria Marta Cigliano Universidad Nacional La Plata - Argentina Fábio Lang da Silveira Universidade de São Paulo Miguel Trefaut Rodrigues Universidade de São Paulo François M. Catzeflis Institut des Sciences de l’Évolution - França Miriam Lemle Universidade Federal do Rio de Janeiro Gustavo Gabriel Politis Universidad Nacional del Centro - Argentina Paulo A. D. DeBlasis Universidade de São Paulo John G. Maisey American Museum of Natural History - EUA Philippe Taquet Museum National d’Histoire Naturelle - França Jorge Carlos Della Favera Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rosana Moreira da Rocha Universidade Federal do Paraná J. Van Remsen Louisiana State University - EUA Suzanne K. Fish University of Arizona - EUA Maria Antonieta da Conceição Rodrigues Universidade do Estado do Rio de Janeiro W. Ronald Heyer Smithsonian Institution - EUA PUBLICAÇÕES AVULSAS DO MUSEU NACIONAL NÚMERO 112 AGOSTO – 2006 RIO DE JANEIRO MUSEU NACIONAL Publ. Avul. Mus. Nac. Rio de Janeiro n.112 p.1-24 ago.2006 Publicações Avulsas do Museu Nacional é um periódico editado pelo Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro desde 1945, com tiragem de 650 exemplares. Relativo a artigos científicos inéditos nas áreas de Antropologia, Arqueologia, Botânica, Geologia, Paleontologia e Zoologia, está indexado nas seguintes bases de dados bibliográficos: Biological Abstracts, C.A.B. International, ISI - Thomson Scientific, NISC Colorado, Periodica, Ulrich’s International Periodicals Directory, Zoological Record. As normas para preparação dos manuscritos encontram-se em http://acd.ufrj.br/~museuhp/publ.htm. Os artigos são avaliados por, pelo menos, dois especialistas na área envolvida, que, eventualmente, pertencem ao Conselho Editorial. O conteúdo dos artigos é de responsabilidade exclusiva do(s) respectivo(s) autor(es). Os manuscritos deverão ser encaminhados para Museu Nacional/UFRJ, Quinta da Boa Vista, São Cristóvão, 20940-040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Publicações Avulsas do Museu Nacional is a scientific journal edited by the Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro since 1945. For each volume 650 copies are printed and distributed. This journal publishes original contributions in the following fields: Anthropology, Archaeology, Botany, Geology, Paleontology and Zoology. It is indexed in the following bibliographical databases: Biological Abstracts, C.A.B. International, ISI - Thomson Scientific, NISC Colorado, Periodica, Ulrich’s International Periodicals Directory, Zoological Record. Guidelines for manuscript preparation are provided at http://acd.ufrj.br/~museuhp/publ.htm. It is a peerreviewed journal and each contribution is analyzed by at least two specialists on the subject that may, eventually, belong to the Editorial Board. Authors are the sole responsible for the content of the text. The manuscripts should be sent to Museu Nacional/UFRJ, Quinta da Boa Vista, São Cristóvão, 20940-040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Capa – “As Duas Tartarugas”, pintura sobre papel atribuída a Albert Eckhout (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia). © 2006 – Museu Nacional/UFRJ Publicações Avulsas do Museu Nacional – n.1 (1945) Rio de Janeiro: Museu Nacional 1945 – 2006, 1 – 111 2006, 112 Irregular ISSN 0100-6304 1. Ciência – Periódicos. I. Museu Nacional (Brasil) CDD500.1 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610 - 1666), ARTISTA DO BRASIL HOLANDÊS1 (Com 13 figuras) DANTE MARTINS TEIXEIRA2,3 RESUMO: Nascido em Groningen por volta de 1610, Albert Eckhout até hoje constitui um autêntico enigma, não havendo detalhes sobre seu início de carreira e tampouco maiores informações acerca dos trabalhos que executou no Brasil como um dos integrantes da comitiva de Johan Maurits van Nassau-Siegen. A dispersão do acervo de Nassau levada a cabo nas décadas seguintes faria com que poucas obras atribuíveis a Eckhout permanecessem em solo holandês, autoria esta muitas vezes discutível ou comprovadamente equivocada. Nos últimos anos, tal desconfiança se estenderia à pintura conhecida como “As Duas Tartarugas”, um “gouache” e têmpera sobre papel que retrata dois jabutis em atitude belicosa. A particularidade de ambos exemplares representados pertencerem a Geochelone carbonaria – única espécie do gênero até hoje registrada para o território brasileiro onde Eckhout permaneceu durante sete anos – reforça a possibilidade de um quadro de sua lavra, caso estejamos realmente diante de um original do século XVII. Além disso, a técnica e o material empregados recordam bastante outras pinturas imputadas ao mesmo artista. Tais detalhes tornam a recente datação desse trabalho para o século XIX ainda mais surpreendente, inclusive por contrariar resultados anteriores que falam de um papel fabricado no século XVII. Como a presença de eventuais restauros pode ter exercido uma influência decisiva sobre as últimas análises efetuadas, torna-se imprescindível aguardar a realização de novos testes capazes de esclarecer as dúvidas pendentes. Palavras-chave: “As Duas Tartarugas”. Albert Eckhout. Johan Maurits van Nassau-Siegen. Geochelone carbonaria. Brasil Holandês. ABSTRACT: “Two Brazilian Tortoises”: a painting attributed to Albert Eckhout (ca. 1610-1666), artist of Dutch Brazil. Born in Groningen around 1610, Albert Eckhout constitutes a veritable enigma even today, as there are no details concerning the beginning of his career and neither is there a great deal of information about the work he carried out in Brazil as one of the artists that had accompanied Johan Maurits van Nassau-Siegen to the New World. The posterior dispersal of the Nassau’s collection and inevitable misfortunes meant that few works attributable to Eckhout remained on Dutch soil, and even then often of arguable or proven mistaken authorship. During the last years, a similar questioning would appear referring to the painting known as “Two Brazilian Tortoises”, a gouache and tempera on paper portraying two tortoises assuming a bellicose attitude. The particularity of both the animals portrayed belonging to the Red-footed Tortoise (Geochelone carbonaria) – the only species of the genus found in the part of Brazil where Albert Eckhout stayed for seven years – reinforces the possibility of the painting being of his authorship, if we are really faced with a work from the 17th century. In addition, the technique and the material employed in “Two Brazilian Tortoises” are extraordinarily reminiscent of some of the originals attributed to the same artist. Such details would make the 19th century dating of this work even more surprising, also for contradicting previous results that speak of paper manufactured during the 17th century. As the presence of possible restorations could have had a decisive influence on the last analyses to be carried out, we must await the realisation of further tests capable of eliminating the existing doubts. Key words: “Two Brazilian Tortoises”. Albert Eckhout. Johan Maurits van Nassau-Siegen. Geochelone carbonaria. Dutch Brazil. INTRODUÇÃO Pouco tempo após sua chegada ao Recife em janeiro de 1637, Johan Maurits van NassauSiegen daria início à construção de dois palacetes na ilha de Antônio Vaz, até então quase deserta. O primeiro deles, denominado “Schoonzigt” (a rigor “Bela Vista”, apesar de a tradução “Boa Vista” ser bastante utilizada) servia de residência oficial , enquanto o de 1 2 Submetido em 02 de fevereiro de 2006. Aceito em 23 de março de 2006. Museu Nacional/UFRJ, Departamento de Vertebrados. Quinta da Boa Vista, São Cristóvão, 20940-040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). 4 D.M.TEIXEIRA “Vrijburg” (“Friburgo”) – situado à beira do rio Capibaribe – possuía uma área arborizada aberta à visitação da elite local, tendo sido concluído após dois anos de trabalhos. Objeto da admiração de diversos cronistas da época, esse parque abrigava uma autêntica “ménagerie” renascentista, descrita por Frei Calado como “uma casa de prazer” que custaria “muitos reais” a Nassau1. “Naquele areal estéril e infrutuoso”, o Conde plantaria “um jardim com todas as castas de árvores de frutos que se dão no Brasil e ainda muitas que lhe vinham de diferentes partes. E à força de muita outra terra frutífera trazida de fora em barcas rasteiras – e muita soma de esterco – fez o sítio tão bem acondicionado como a melhor terra frutífera. Pôs nesse jardim dois mil coqueiros, trazendo-os de vários lugares, porque os pedia aos moradores e eles lh’os mandavam trazer em carros. Deles fez umas carreiras compridas e vistosas, a modo da alameda de Aranjués2, e por outras partes muitos parreirais e tabuleiros de hortaliça e de flores, com algumas casas de jogos e entretenimentos aonde iam as damas – e seus afeiçoados – a passar as festas no verão e a ter seus regalos, fazer suas merendas e beberetes, como se usa na Holanda, com seus acordes instrumentos” (CALADO, 1648). O gosto do Conde “era de que todos fossem ver suas curiosidades e ele mesmo por regalo as andava mostrando”. Ali estavam “todas as castas de aves e animais que pode achar e como os moradores da terra lhe conheceram a condição e o apetite, cada um lhe trazia a ave ou animal esquisito que podia achar no sertão. Ali trazia os papagaios, as araras, os jacus, os canindés, os jabutis, os mutuns, as galinhas da Guiné, os patos, os cisnes, os pavões, os perus e galinhas em grande número, tantas pombas que não se podia contar. Ali tinha os tigres, a onça, a suçuarana, o tamanduá, o bugio, o quati, o saguim, o apereá, as cabras do Cabo Verde, os carneiros de Angola, a cutia, a paca, a anta, o porco javali e grande multidão de coelhos. Finalmente não havia coisa curiosa no Brasil que ali não tivesse, porque os moradores lh’as mandavam por a boa inclinação que viam de os favorecer e assim também lhe ajudaram a fazer as suas duas casas, assim esta do jardim aonde morava como a da Boa Vista” (CALADO, 1648)3. Apesar da oportuna descrição de Frei Calado, certos detalhes sobre essas instalações ainda inspiram dúvidas, haja vista que a planta do “Vrijburg” esboçada em BARLAEUS (1647) mostra apenas um “estábulo para 29 cavalos” (“stabulum 29 ex ordine equarium”), um galinheiro (“gallinarium”), um pombal (“retus columbarium”) e três tanques de peixes (“vivaria”) cercando terrenos de tamanho variável, um dos quais ocupado por cisnes (“sedes olorina”) e outro por uma coelheira (“moas cuniculorum”) (Fig.1). Embora algumas destas ilhotas – ou até mesmo o galinheiro e o pombal – provavelmente extrapolassem suas primitivas funções, salta aos olhos não haver qualquer referência concreta a alojamentos para animais silvestres, tanto mais que a manutenção de mamíferos de grande porte e até mesmo de um plantel significativo de aves implica em certas exigências, pois onças não podem ser enjauladas sem maiores cuidados e tampouco gaviões se prestam a viver com galinhas. Semelhante lacuna revela-se ainda mais intrigante pela narrativa de Frei Calado conferir a inequívoca impressão de considerável variedade de espécies ter sido acomodada lado a lado nesse cativeiro, tarefa nada desprezível tanto em termos de espaço quanto de recursos humanos e materiais. De qualquer forma, parece fora de dúvida que o palacete de Friburgo não apenas possuía uma “ménagerie” em seus jardins, como encerrava um verdadeiro “gabinete de curiosidades” em suas dependências, onde as “faianças de Delft”, os “vidros caros de Veneza” e as “miniaturas, marfins e esmaltes de paciente execução” confundiam-se com as “pinturas a fresco ou sobre tela que revestiam as paredes” e os “primorosos painéis recordavam a natureza do sertão” brasileiro, fornecendo admirável ambiente para as “preciosas coleções relativas aos indígenas do Brasil e aos povos africanos” compostas por “tangapemas, arcos, setas e azagaias, ornatos de penas, colares e cocares, redes e utensílios domésticos, talhas de barro e canoas” (teste LIMA, 1885; NOGUEIRA, 1900). No entanto, a julgar pelo testemunho de BARLAEUS (1647), o acervo de Johan Maurits van Nassau-Siegen também compreendia numerosos “naturalia” entre peles de quadrúpedes, peixes e aves, todos levados para a Holanda quando do retorno do Conde à Europa em julho de 16444. Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 5 Fig.1- O palácio de Friburgo e a planta de seus jardins conforme gravuras do “Rerum per Octennium in Brasilia”, obra de Gaspar Barlaeus publicada em Amsterdam no ano de 1647. A despeito de parcela dos exemplares brasileiros terminar no recém formado “Theatrum Anatomicum” de Leiden ou nas mãos de particulares como Albert Seba, Frederick Ruysch e Olaus Worm (teste BLANCKEN, 1698; BOESEMAN, 1970; JOPPIEN, 1979; KAMPEN & VEEGENS, 18381840; LAND, 2001; MARTIUS, 1853; SMIT, 1986; WHITEHEAD, 1970, 1971, 1973), a maior parte seria levada para a “Mauritshuis” em Haia, integrando um vasto “gabinete de curiosidades” destinado a crescer ainda mais ao longo dos anos. Descrita com indisfarçável entusiasmo por HENNIN (1661), essa coleção incluía “armas das Índias”, “espadas curtas e curvas, zagaias, machados, lanças e outras armas”, “tambores” e “trombetas”, bem como valiosas peças laqueadas provavelmente oriundas do Japão (teste SCHEURLEER, 1979), “embornais de tecido” africanos, adornos de cabeça, escudos e leques de penas do Novo Mundo. Entre os “naturalia”, Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 6 D.M.TEIXEIRA destacava-se a presença de “um crocodilo”, uma “extraordinária serpente aquática” de grande porte, tartarugas de diversos tamanhos, um rinoceronte empalhado, um leão marinho, um pequeno elefante e peles de leões, “tigres” e “leopardos”, além de um rato-almiscarado, uma civeta e diferentes macacos. As aves estavam representadas por um “belo avestruz”, um pelicano, uma cacatua, uma ave-do-paraíso e vários outros espécimens dignos de nota, tais como araras, papagaios, pavões e gansos. Havia também um licorne, chifres de rinocerontes, plantas odoríferas com valor comercial, conchas, madrepérolas, corais vermelhos ou brancos, pórfiros, mármores, amostras de minério de ouro, prata, mercúrio, cobre e ferro, ouro em pó e um conjunto de pedras preciosas com diamantes, rubis, topázios, ametistas, cristais de rocha, jaspes e lápis-lazúlis. Mesmo que não possa ser comparado à “Mauritshuis”, o palacete de Friburgo mostrar-se-ia opulento o suficiente para estimular fortes críticas dos “Heeren XIX” sobre o principesco estilo de vida mantido por Johan Maurits no Recife5. Enquanto membro legítimo de uma elite renascentista (teste MOUT, 1979), o Conde diferia consideravelmente dos hábitos e expectativas da burguesia mercantilista integrante da cúpula da Companhia das Índias Ocidentais, detalhe capaz de explicar, ao menos em parte, o esforço subentendido na manutenção de uma vasta “ménagerie” e na organização de um extenso “gabinete de curiosidades”. Por outro lado, cumpre notar que acervos dessa natureza cumpriam o papel de autêntica “reserva de valor” no universo da aristocracia seiscentista, constituindo ferramenta muito efetiva no processo de ascensão social e enriquecimento de seus proprietários, os quais terminavam por dispor de um contingente nada desprezível de cobiçadas raridades passíveis de serem transformadas em dignidades – ou mesmo em ganhos mais efetivos – ao sabor de um sofisticado jogo de trocas bem a gosto dos fidalgos da época6. Não deve causar surpresa, portanto, o fato de Nassau ter oferecido tanto cavalos brasileiros, quanto veados mateiros, Mazama sp. (Cervidae), aos Príncipes Friedrich Heinrich (1584-1647) e Wilhelm II (1626-1650) da casa de Orange, além de utilizar Zacharias Wagener como portador para uma outra “encomenda de papagaios” enviada à Holanda7. No entanto, o verdadeiro poder de barganha dos “tesouros” acumulados no Brasil tornar-se-ia assaz evidente nas três grandes “permutas” realizadas por Johan Maurits na segunda metade do século XVII (vide adiante). Em 1644, desavenças com a Companhia das Índias Ocidentais culminariam no retorno de Nassau à Holanda após sete anos de permanência no Brasil. Entre os tesouros levados para a Europa nessa ocasião, destacava-se um número expressivo de quadros, pinturas avulsas, estudos e desenhos executados por Albert Eckhout, Frans Post e outros membros da comitiva flamenga sediada no Recife. Ao lado dos textos de naturalistas (vide MARCGRAVE, 1648; PISO, 1648, 1658) e dos relatos avulsos de soldados, pequenos funcionários e outros elementos excluídos da cultivada elite cortesã, o legado desses artistas ajudaria a compor um impressionante corpo documental sobre os animais, as plantas e os habitantes das terras do Brasil, elenco capaz de satisfazer e estimular a irresistível atração da Europa seiscentista pelas maravilhas de um Novo Mundo ignoto e fabuloso. Malgrado se manifestasse de maneira distinta entre a nobreza e as camadas menos abonadas da população, o fascínio pelas novidades parece constituir o principal fio condutor dessa febre que grassava em todos os ambientes sociais, alcançando mesmo os elementos avessos ao latim dos eruditos e às preocupantes questões filosóficas suscitadas pelas surpreendentes descobertas levadas a cabo no outro lado do oceano8. Embora pouco afetasse o inequívoco utilitarismo sempre presente nas relações do Ocidente Cristão com o chamado “mundo natural”, o afã renascentista pelo desconhecido contribuiria para atenuar o estigma religioso que perseguiu a curiosidade humana a partir da Idade Média9, propiciando a multiplicação dos chamados “livros de viagem” e das coleções de História Natural (CAMPBELL, 1988; DELAUNAY, 1962; IMPEY & MACGREGOR, 2001; RADL, 1988; SCHNAPPER, 1988). No campo das artes plásticas, semelhante tendência levaria à representação cada vez mais freqüente de plantas e animais exóticos, gênero de pintura que – apesar de secundário pelos cânones absolutistas – terminaria por consagrar grandes mestres como Jan van Huysum, Albert Dürer, Jan Brueghel “O Velho”, Jan Davidsz de Heem e Michelangelo da Caravaggio10. Pertencendo a um período no qual a exatidão das imagens superava as incipientes técnicas Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 7 descritivas, esses trabalhos muitas vezes se revelariam indispensáveis para o melhor entendimento de uma realidade além de qualquer especulação, constituindo veículo perfeito para o encanto de uma Europa ávida por descobertas e tesouros ultramarinos (BERGSTRÖM, 1956, 1977; SCHNEIDER, 1992). Não deve causar surpresa, portanto, que integrantes da nobreza e da alta burguesia da época cada vez mais se ocupassem com a organização de amplas “ménageries” e de sortidos “gabinetes de curiosidades”, ou mostrassem crescente interesse por tapeçarias e ricos manuscritos ilustrados capazes de mesclar elementos da fauna e flora da Europa com raridades vindas da América, da África ou do Oriente longínquo. No ano de 1652, fração substantiva das coleções de Nassau passaria às mãos de Friedrich Wilhelm, Eleitor de Brandemburgo, em troca de certas dignidades nobiliárquicas e uma grande soma empregada na compra do castelo de Freudenberg nos arredores de Cléves. Além de móveis, utensílios e despojos de animais do Brasil, o pecúlio enviado a Berlim compreendia aquarelas e desenhos já encadernados em dois tomos, os chamados “Libri Principis” ou “Manuais”, assim como numerosas pinturas sobre papel e “crayons” avulsos que seriam pouco a pouco organizados por Christian Mentzel, médico particular de Friedrich Wilhelm, nos quatro fólios do “Theatrum rerum naturalium Brasiliae” e no pequeno volume da “Miscellanea Cleyeri”. Dois anos depois, haveria uma segunda doação a Frederik III, Rei da Dinamarca, envolvendo 26 soberbos óleos – 23 dos quais da autoria de Eckhout – além de algumas “curiosidades” do Novo Mundo. A última dessas grandes permutas, aparentemente realizada com nítido objetivo pecuniário, teria sido levada a cabo em 1679 com Luís XIV de França, o qual recebeu quadros de Frans Post, objetos diversos, espécimens científicos e várias figuras em cartões baseadas nos originais de Eckhout, material empregado anos mais tarde na confecção da famosa “Tenture des Indes” da manufatura de tapeçarias Gobelin (teste DRIESEN, 1849; JOPPIEN, 1979; LARSEN, 1962; PANHUYS, 1925; SCHNAPPER, 1994; SOUSA-LEÃO, 1948, 1961; THOMSEN, 1938; WINTER, 1981; WHITEHEAD & BOESEMAN; 1989)11. Ao contrário do que ocorreu com Frans Post, entretanto, a obra de Albert Eckhout logo cairia no esquecimento, tendo sua importância reconhecida apenas há poucas décadas. “AS DUAS TARTARUGAS” Nascido em Groningen por volta de 1610, Albert Eckhout até hoje constitui um autêntico enigma, não havendo detalhes sobre seu início de carreira e tampouco maiores informações acerca dos trabalhos executados a mando de Nassau no Brasil. Quanto às atividades desenvolvidas posteriormente na Europa, sabe-se que em 1653 – por indicação do próprio Johan Maurits – Eckhout receberia o convite de atuar na corte da Saxônia, onde permaneceu até 1663 a serviço dos Príncipes Eleitores Johann Georg I (1611-1656) e Johann Georg II (1656-1680). Nesse período, teria produzido várias obras decorativas e quadros diversos, a maioria dos quais destruída em fevereiro de 1945 durante o bombardeio de Dresden12. De volta à cidade natal, Eckhout conseguiria filiar-se à guilda dos pintores locais já em 1664, falecendo no ano seguinte ou logo nos primeiros meses de 1666 (BESINOVICH, 1943; BUVELOT, 2004a; EGMOND & MASON, 2004; LEITE, 1967; MASON, 2002; SCHAEFFER, 1958, 1959, 1965; SOUSALEÃO, 1956; THOMSEN, 1938; VALLADARES & MELLO FILHO, 1981; WHITEHEAD & BOESEMAN, 1989). A dispersão do acervo promovida por Nassau e os inevitáveis azares da sorte fariam com que poucos trabalhos imputáveis a Eckhout continuassem em solo holandês, atribuição esta amiúde discutível ou nitidamente equivocada. Durante as extensas mostras sobre o artista promovidas no Brasil (setembro de 2002 a maio de 2003) e na Holanda (março a junho de 2004), tal desconfiança se estenderia à pintura conhecida como “As Duas Tartarugas”, um “gouache” e têmpera sobre papel no qual são retratados dois jabutis em atitude belicosa (Fig.2). Arrolada entre as peças da “Jacques Goudstikker Gallery”, Amsterdam, em 1936, essa obra permaneceria na coleção privada de J.C.H. Heldring, Oosterbeek, entre 1942 e 1963, ano de sua aquisição para a “Mauritshuis” pelos “Friends of the Mauritshuis Foundation” (BUVELOT, 2004b). A julgar pela silhueta dos animais representados, o presumível original teria sofrido um corte à direita que reduziu suas medidas para os atuais 51,0 x 30,5cm. Em algum momento, a figura resultante Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 8 D.M.TEIXEIRA acabaria sendo colada em um painel de madeira, obstáculo considerável para a exata identificação do papel utilizado. Apesar de certas fontes contestarem a autoria de Eckhout sem fornecer maiores justificativas (e.g. BRIENEN, 2001), as dúvidas atuais parecem basear-se sobretudo no fato de as últimas análises apontarem para um material do século XIX ou mesmo mais recente, resultado contrário ao papel do século XVII encontrado por exames concluídos em torno de 1960 (compare BUVELOT, 2004c versus GELDER, 1960). Conferida a Eckhout graças ao minucioso estudo de H.E. van Gelder publicado em 1960, “As Duas Tartarugas” já havia sido antes relacionada a nomes tão diversos como Albrecht Dürer, Pieter Brueghel “o Velho”, Jacob de Gheyn, Adam Willaerts, Pieter Claesz, Cornelis Cornelizoon e Hendrik Goltzius (GELDER, 1960), artistas conhecidos por representarem diversos animais, inclusive tartarugas. Malgrado não ocupem uma posição de destaque, os quelônios revelamse mais comuns nas pinturas dos séculos XVI e XVII do que se poderia supor a princípio, também estando presentes em obras de outros mestres como Paolo Porpora, Michelangelo Pace, Jan van Kessel “o Velho”, Pieter Boel, Jan Brueghel “o Velho” e Pieter Paul Rubens. Na “Luxuria” de Pieter Brueghel (Fig.3), nos arranjos de frutas de Michelangelo Pace e nos “bodegones” de Cornelis Cornelizoon ou de Pieter Claesz, as tartarugas talvez estabeleçam um contraponto à gula e ao desejo carnal, pois esses répteis simbolizariam não a temperança mas a pudícia no casamento, servindo de exemplo às mulheres por nunca deixarem sua “casa” (i.e. a carapaça) e sempre observarem o silêncio, crença por sinal equivocada (COOPER, 1992; VRIES, 1984). Contudo, em trabalhos de Adam Willaerts, Paolo Porpora e Jan van Kessel, as tartarugas parecem surgir como elementos típicos de uma dada paisagem, seja uma marinha, um ambiente ribeirinho ou mesmo o obscuro solo de uma floresta. Em um dos painéis de sua famosa “Alegoria dos Continentes” (in TEIXEIRA, 2002a), van Kessel chegaria mesmo a ilustrar uma águia carregando uma tartaruga nas garras, provável alusão ao lendário episódio da morte de Ésquilo, célebre poeta e dramaturgo grego13. Outrossim, não se pode esquecer que a carapaça de certas espécies marinhas era um artigo muito valioso e cobiçado por artífices e colecionadores de curiosidades do século XVII (COUPIN, ca. 1900; IMPEY & MACGREGOR, 2001; SCHNAPPER , 1988), enquanto determinadas variedades terrestres constituíam xerimbabos bastante usuais, conforme atesta o detalhe de Albert Dürer ter possuído uma pequena tartaruga de estimação (EISLER, 1991). Fig.2- “As Duas Tartarugas”, pintura sobre papel atribuída a Albert Eckhout (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 9 Muito diferentes sob os mais diversos pontos de vista, as contribuições dos vários pintores mencionados têm em comum o fato de mostrarem sempre as mesmas tartarugas, na verdade um elenco muito limitado composto apenas pelas poucas formas existentes na Europa. Com efeito, tanto as marinhas de Adam Willaerts quanto aquelas de Jan van Kessel retratariam uma tartaruga-cabeçuda, Caretta caretta (Linnaeus, 1758), ao passo que um comuníssimo cágado de água doce, Emys orbicularis (Linnaeus, 1758) também seria figurado por Jan van Kessel e Pieter Fig.3- Detalhe dos cágados de água doce (Emys Brueghel. Sem embargo, um jabuti do orbicularis) retratados na “Luxuria” de Pieter gênero Testudo – Testudo graeca Linnaeus, Brueghel, “o Velho” (1558). 1758 ou Testudo hermanni Gmelin, 1789 – aparece como o grande predileto, podendo ser visto nos quadros de artistas como Paolo Porpora, Michelangelo Pace, Jan van Kessel, Pieter Claesz, Cornelis Cornelizoon, Pieter Boel, Jan Brueghel e Pieter Paul Rubens, por exemplo no esplêndido “Jardim do Éden” da autoria desses dois últimos (Fig.4). Nenhum dos nomes da época, porém, teria dedicado tanta atenção a esses répteis quanto Jan van Kessel, que chegou ao cúmulo de reunir em uma mesma composição – o painel dedicado à África de sua “Alegoria dos Continentes” – todas as espécies supracitadas mais um segundo tipo de cágado de água doce – Mauremys leprosa (Schweigger, 1812) ou Mauremys caspica (Gmelin, 1774) – ilustrando assim representantes dos três gêneros de quelônios assinalados em território europeu (A RNOLD & BURTON , 1978; E RNST & BARBOUR , 1989). Fig.4- “O Jardim do Éden” de Jan Brueghel, “o Velho”, e Pieter Paul Rubens (ca. 1615), com detalhe mostrando o jabuti (Testudo sp.) representado (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 10 D.M.TEIXEIRA Em uma época onde a avidez e curiosidade pelas maravilhas de terras distantes eram fortes o suficiente para converter os mais ínfimos animais exóticos em evento destinado a atrair o público às estalagens (Fig.5), destaca-se o feito de apenas tartarugas locais terem sido normalmente aproveitadas como motivo. A presença de um quelônio estranho à fauna européia em um pretenso quadro seiscentista revela-se, por conseguinte, assaz peculiar e evoca de imediato a possibilidade de uma construção artística sem qualquer relação com a verdade dos fatos. Afinal de contas, embora a obra considerada seja muito realista e de indiscutível qualidade, os dois jabutis representados transmitem uma atitude intensa e belicosa muito distante da opinião corrente sobre esses répteis, particularidade que levaria van Gelder a encará-los como “bichos de má índole” Fig.5- Publicado por Jan Velten em 1702, esse panfleto convida o público de Amsterdam a visitar a taverna do “Elefante Branco” (“Witte Oliphant”) no antigo “Botermarkt” (atual “Rembrandtplein”) para tomar suas colações e conhecer um exótico pangolim, Manis sp., do Ceilão e um estranho lagarto, aparentemente um iguana sul-americano, Iguana iguana (Linnaeus, 1758). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 11 (G ELDER , 1960). No entanto, a proverbial mansidão e placidez das tartarugas seriam, ao menos em parte, mera ficção, conforme atestam os sugestivos nomes ingleses de “snapping turtle” ou “alligator turtle” conferidos a Chelydra serpentina (Linnaeus, 1758) e Macroclemys temminckii (Troost, 1836), duas variedades aquáticas do Novo Mundo famosas por infligir sérios ferimentos a pescadores desavisados. Exceto por uma mordida ou outra, os jabutis não costumam chegar a tal extremo, mas travam curiosíssimas disputas por comida ou durante o período reprodutivo (Fig.6). Nessa ocasião, os machos de espécies como Chersina angulata (Schweigger, 1812), Geochelone elegans (Schoepff, 1795), Geochelone pardalis (Bell, 1828) e Geochelone carbonaria (Spix, 1824) tornam-se mais agressivos, mordendo, dando cabeçadas e golpeando os adversários (ERNST & BARBOUR, 1989). Alguns indivíduos chegam mesmo a utilizar diferentes partes da carapaça como um verdadeiro aríete, investindo contra seus oponentes até virá-los de pernas de para cima, castigo que pode ser fatal caso os perdedores não consigam retomar sozinhos a postura correta. Qualquer artista do século XVII capaz de transportar confrontos desse tipo para uma tela dominaria um conhecimento do animal retratado bem superior à média de seus pares, detalhe sobremodo indicativo no caso de uma tartaruga exótica. Não obstante, o neoplatonismo corrente na Europa após o Renascimento poderia fornecer uma explicação bem mais simples pois, ao apagar as diferenças entre a matéria e o espírito e visualizar o cosmo como uma unidade indissolúvel governada por uma complexa rede de influências Fig.6- Comparação entre adultos de Geochelone carbonaria em postura agressiva (foto Márcia Mocelin) e “As Duas Tartarugas” (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 12 D.M.TEIXEIRA vitais e espíritos invisíveis, essa doutrina postulava que cada parte do todo mantinha com as outras uma estreita relação imposta por uma série de “simpatias” e “antipatias” ocultas, princípio válido inclusive para os organismos vivos. Um dos reflexos mais imediatos nas artes plásticas seria a popularização de quadros dedicados a combates promovidos entre animais vistos como “inimigos naturais”, prática às vezes estendida a lutas entre indivíduos de uma mesma espécie (TEIXEIRA, 2002a). De qualquer maneira, chama a atenção que os dois jabutis tenham sido figurados com a boca eriçada de dentes agudos prestes a morder, pois tais répteis possuem maxilares lisos sem qualquer sinal de estrutura parecida14. Detalhe muito destoante em uma pintura de excepcional realismo, esse equívoco talvez possa ser entendido como uma licença artística destinada a conferir um certo ar de ferocidade a seres de aparência tão inofensiva. DISCUSSÃO A maioria dos autores concorda que os jabutis representados em “As Duas Tartarugas” pertenceriam ao gênero Geochelone da América do Sul, argumento de grande peso na atribuição dessa pintura a Albert Eckhout (GELDER, 1960; WHITEHEAD & BOESEMAN, 1989). Contudo, certas fontes identificariam ambos exemplares como jabutis-piranga, Geochelone carbonaria, enquanto outras proporiam o jabuti-tinga, Geochelone denticulata (Linnaeus, 1766), discussão assaz intrincada por envolver duas formas muito semelhantes que passariam a ser consideradas espécies independentes apenas em 1960 (ERNST & BARBOUR, 1989; WILLIAMS, 1960) (Fig.7). A solução do problema reveste-se de particular interesse pelas diferenças observadas na distribuição geográfica desses répteis, pois Geochelone carbonaria surge como o único jabuti assinalado para os antigos domínios da Companhia das Índias Ocidentais. Com efeito, sua área de ocorrência se estenderia do nordeste ao sul do Brasil e grande parte da Amazônia, enquanto Geochelone denticulata é um quelônio da Amazônia e do Brasil Central com uma população isolada no sudeste do país (Fig.8). Podendo alcançar 55cm de comprimento, Geochelone carbonaria sempre foi bastante apreciada como alimento ou animal de estimação, habitando tanto as paisagens mais secas do interior quanto as florestas úmidas do litoral nor destino (FREITAS & SILVA, 2005; LUEDERWALDT, 1926; PRITCHARD & TREBBAU, 1982; VANZOLINI, 1994). Ao contrário do que indicam os nomes popu lares mencionados acima, o colorido desses dois répteis não constitui uma indicação confiável, pois as escamas da cabeça e patas podem ser amarelas ou alaranjadas em Geo Fig.7- Exemplares típicos de Geochelone carbonaria (esquerda) e chelone denticulata e Geochelone denticulata (direita), com detalhes da cabeça de ambas amarelas, alaranjadas ou espécies (fotos Márcia Mocelin). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 13 vermelhas em Geochelone carbonaria15. Na verdade, os autênticos caracteres diagnósticos estão no plastrão, carapaça e escamas da cabeça, detalhes muito difíceis ou mesmo impossíveis de visualizar na pintura em foco. Não obstante, a cabeça dos exemplares retratados parece apresentar escamas pré-frontais pequenas, enquanto a carapaça é indiscutivelmente negra, ostentando escudos centrais com anéis de crescimento bem definidos ao redor da auréola e os primeiros escudos marginais com a borda sem projeções (Fig.9). Fig.8- O Brasil Holandês comparado com a distribuição geográfica de Geochelone denticulata e Geochelone carbonaria na América do Sul (modificado de VANZOLINI, 1994). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 14 D.M.TEIXEIRA Apesar de o ângulo escolhido pelo artista não ser nada favorável, essas quatro características apontam para Geochelone carbonaria, pois Geochelone denticulata teria escamas pré-frontais alongadas e a carapaça marrom, possuindo escudos centrais com anéis de crescimento discretos ou ausentes e os primeiros escudos marginais com a borda denticulada (ERNST & BARBOUR, 1989; WILLIAMS, 1960). A conclusão de que os jabutis figurados pertencem ao único representante do gênero até hoje registrado para o território brasileiro onde Albert Eckhout permaneceu durante sete anos reforça a possibilidade de uma obra da sua autoria, caso estejamos realmente diante de um trabalho do século XVII. Cabe lembrar, portanto, haver relatos sobre “jabutis” na “menágerie” do palacete de Friburgo, bem como referências a “tartarugas de diversos tamanhos” no “gabinete de curiosidades” montado por Nassau em Haia (teste CALADO, 1648; HENNIN, 1661). Tampouco devem ser esquecidas as notícias acerca de Geochelone carbonaria existentes em vários manuscritos ilustrados do Brasil Holandês (e.g. o “Thierbuch” de Zacharias Wagener e o “Diário” de Caspar Schmalkalden fide TEIXEIRA, 1997, 1998) e nos livros dos naturalistas Georg Marcgrave e Willem Piso (Fig.10). Segundo esses textos, o jabuti-piranga alimentava-se de raízes, frutos silvestres, vermes e insetos, sendo muitas vezes mantido em cativeiro como xerimbabo ou para abate. Acima da carne e dos ovos, o fígado era reputado como de “excelente paladar” (MARCGRAVE, 1648; PISO, 1658), opinião até hoje compartilhada pelos habitantes da Amazônia brasileira. De autoria desconhecida, a imagem de uma jovem Geochelone carbonaria encontrada nos “Libri Principis” (Fig.11) desperta a atenção por reaparecer no “Le Cheval Rayé”, uma das tapeçarias da renomada “Tenture des Indes” da manufatura Gobelin (in TEIXEIRA, 2002b), coincidência notável pelos numerosos indícios de os cartões relativos à primeira série, dita “Anciennes Indes”, estarem calcados em trabalhos de Albert Eckhout (BESINOVICH, 1943; SOUSA-LEÃO, 1944, 1969; WHITEHEAD & BOESEMAN, 1989). Décadas mais tarde, ao aceitar a incumbência de produzir novos cartões para as “Nouvelles Indes”, o artista francês François Desportes voltaria a figurar a mesma Geochelone carbonaria ao lado de peixes e crustáceos encontrados nos “Libri Principis” ou no “Theatrum rerum naturalium Brasiliae” (Fig.12). Fig.9- Comparação entre as escamas da cabeça e os escudos da carapaça de Geochelone denticulata e Geochelone carbonaria (desenho original Márcia Mocelin), com detalhes dos exemplares retratados em “As Duas Tartarugas” (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 15 Apesar de substantivas, as evidências acumuladas não permitem a atribuição definitiva de “As Duas Tartarugas” a Albert Eckhout, pois jabutis desse tipo tanto poderiam ter chegado à Europa seiscentista como curiosidades oriundas do Novo Mundo quanto ter servido de inspiração para um dos numerosos artistas europeus vindos ao Brasil a partir do primeiro quartel do século XIX16. Fig.10- Exemplar de Geochelone carbonaria segundo gravura da “De Indiae Utriusque re naturali et medica”, obra de Willem Piso publicada em Amsterdam no ano de 1658. Tal hipótese, no entanto, revela-se bastante factível no caso de um quadro holandês do século XVII, pois raros pintores do período tiveram a oportunidade de conhecer répteis sulamericanos vivos. Além disso, a técnica e o material empregados recordam bastante alguns originais do “Theatrum rerum naturalium Brasiliae” conferidos a Eckhout (Fig.13), detalhe que torna a datação de “As Duas Tartarugas” para o Fig.11- Jovem de Geochelone carbonaria figurado nos “Libri Principis” (“Biblioteki Jagielloñskiej”, Cracóvia). século XIX ainda mais surpreendente, inclusive por contrariar referências anteriores sobre o papel empregado remontar ao século XVII (compare BUVELOT , 2004c versus G ELDER , 1960). Como eventuais restauros poderiam ter exercido influência decisiva nas últimas análises efetuadas, parece imprescindível aguardar a realização de novos testes capazes de esclarecer as dúvidas pendentes. Fig.12- Detalhe do exemplar de Geochelone carbonaria figurado em um dos estudos de François Desportes, artista encarregado de compor os cartões utilizados na confecção das “Nouvelles Indes”, série de tapeçarias da Manufatura Gobelin (“Manufacture Nationale de Sèvres”, Sèvres). Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 16 D.M.TEIXEIRA Fig.13- “Pitus e Lagarto”, pintura sobre papel atribuída a Albert Eckhout pertencente ao “Theatrum rerum naturalium Brasiliae” (“Biblioteki Jagielloñskiej”, Cracóvia). NOTAS A curiosidade e a busca do luxo que marcaram a Renascença parecem ter sido bastante favoráveis para a formação de jardins botânicos, “ménageries” e “gabinetes de curiosidades”. A partir do final do século XV, coleções de plantas e animais vivos começariam a ser organizadas por vários príncipes europeus, com destaque para o Duque Ferrante de Nápoles (1433-1494). Tomando impulso durante os séculos XVI e XVII, essa tendência permitiria a criação, em Pádua, do primeiro jardim botânico ligado a uma universidade (1545), exemplo seguido pelas instituições de Pisa (1547), Bolonha (1567), Leiden (1577), Montpelier (1598) e Oxford (1621), enquanto o insuperável tirocínio do Cardeal Richelieu (1585-1642) levaria à fundação do “Jardin des Plantes” de Paris em 1626 (SINGER, 1959). Entretanto, poucos acervos eram capazes de ombrear-se com aquele de Rodolph II de Habsburgo (1552-1612), que logrou reunir uma variedade surpreendente de animais vivos e espécimens zoológicos das mais diferentes partes do mundo (HAUPT et al., 1990). Entre essas raras exceções estava a famosa “ménagerie” mantida pelo Príncipe Maurits van Nassau da casa de Orange (1567-1625), primo em segundo grau de Johan Maurits van Nassau-Siegen, cujo plantel incluía até mesmo um dodo, Raphus cucullatus (Linnaeus, 1758), das ilhas Mascarenhas, exemplar retratado por artistas como Roelandt Savery (teste JACKSON, 1993, 1999). 2 Frei Calado pretende comparar as alamedas do palacete de Friburgo à suntuosidade dos jardins de Aranjuez, cidade à margem do Tejo que abrigava uma das residências dos reis de Espanha. Segundo BARLAEUS (1647), Nassau teria mandado transplantar um total de “700 coqueiros, estes mais altos, aqueles mais baixos, elevando uns o caule a 50 pés, outros a 40, outros a 30 antes de atingirem a separação das palmas”, diferença talvez motivada por razões estéticas de uma inusitada topiaria. Contrariando a crença de tais árvores não suportarem qualquer manejo, “mandou o Conde buscar [coqueiros] à distância de três ou quatro milhas em carros de quatro rodas, desarraigando-os com jeito e transportando-os para a ilha em pontões lançados através dos rios”. Para grande surpresa de todos, a iniciativa seria coroada de tamanho sucesso que até mesmo árvores “septuagenárias e octogenárias” mostrar-se-iam fecundas, “produzindo frutos copiosíssimos logo no primeiro ano”. Completavam o jardim “252 laranjeiras, além de outras 600 que serviam de cerca ... 50 pés de limões grandes, 80 de limões doces, 80 romãzeiras e 66 figueiras”, bem como “mamoeiros, jenipapeiros, mangabeiras, cabaceiras, cajueiros, uvalheiras, palmeiras, pitangueiras, 1 Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 17 romeiras, araticuns, jamacarús, bananeiras, tamarineiros, castanheiros e tamareiras” (BARLAEUS, 1647). Em vários aspectos, o parque de Friburgo seguia a típica tradição holandesa de organizar um “jardim utilitário” com pomares e canteiros de hortaliças (teste DIEDENHOFEN, 1979). Vide também SILVA & ALCIDES (2002). 3 Segundo WÄTJEN (1921), “todo o habitante da Nova Holanda que tinha a ocasião de encontrar uma planta rara ou um animal observado com pouca freqüência, contribuía com seu espécimen para a coleção do Conde”. De forma bem menos marcada, essa mesma tendência de reunir animais seria mantida nos outros edifícios de Johan Maurits van Nassau-Siegen, pois aquele de Haia possuía um lago com espátulas, faisões e patos, enquanto o de Cleves contava com uma “leporaria” e um parque para a caça de cervos (teste DIEDENHOFEN, 1979). 4 Barlaeus comenta que Nassau teria levado para a Holanda todos os “tesouros” (“cimeliarchum”) acumulados durante sua estadia no Brasil, cujo conteúdo compreendia, entre outros itens, “peixes”, “aves”, “peles de quadrúpedes”, “armas”, “ferramentas nativas” e “adereços para a cabeça e pescoço”, todos “admirados aqui [na Europa] como objetos raros ou desconhecidos” (BARLAEUS, 1647). 5 De acordo com algumas fontes, a construção do palacete de Friburgo teria custado a impressionante soma de 600.000 florins, não contabilizado o preço do terreno pago pelo próprio de Nassau (LESSA, 1937; TERWEN, 1979). Embora tal quantia pudesse ser coberta pelos 2% das presas de guerra devidos ao governador (LARSEN, 1962), um estilo de vida suntuoso provavelmente implicava em gastos adicionais para a Companhia das Índias, constituindo motivo suficiente para a reprimenda imposta pelos “Heeren XIX”. 6 Desde a Antigüidade, animais exóticos de terras distantes foram vistos como presentes dignos dos mais altos potentados, conforme demonstra a girafa, Giraffa camelopardalis (Linnaeus, 1758), oferecida pelo Califa de Bagdá ao Duque Ferrante de Nápoles (LAUFER, 1928; SINGER, 1959), ou o famoso rinoceronte indiano, Rhinoceros unicornis Linnaeus, 1758, remetido a Dom Manuel I, Rei de Portugal, por Afonso de Albuquerque, governador das recém-conquistadas possessões portuguesas na Índia (COSTA, 1937). Algumas vezes, particulares ou associações de comerciantes decidiam trazer para a Europa espécies raras para exibição e/ou venda posterior, fato bem exemplificado pela trajetória de uma fêmea de casuar, Casuarius casuarius (Linnaeus, 1758), obtida em Java por mercadores holandeses de especiarias no ano de 1596 (HAMEL, 1849; STRESEMANN, 1951). Perdurando até bem pouco tempo, semelhante prática era muito comum no século XIX, havendo numerosas alusões literárias sobre viajantes ou ex-combatentes desvalidos que viviam de pequenos espetáculos com xerimbabos oriundos das colônias. Algo semelhante ocorreria no Brasil pelo menos desde o Império, pois os jornais da época abrigam diversos anúncios conclamando o público carioca a conhecer “elefantes”, “zebras africanas” e até mesmo répteis como um “giararacussú vivo de tamanho extraordinário”, certamente um exemplar de Bothrops sp. bem desenvolvido (RENAULT, 1969). 7 Nos comentários que escreveu nos “Libri Principis” (in TEIXEIRA, 1995), Nassau explicita ter enviado “exemplares vivos [de veado-mateiro] a sua majestade [Wilhelm II, Príncipe de Orange], mas eles morreram de frio”, enquanto Zacharias Wagener (in TEIXEIRA, 1997) menciona ter passado por Haia, Delft, Rotterdam e Leiden “para entregar aquilo que me fora encarregado pelo Senhor Conde [Johan Maurits]: cartas, desenhos e papagaios”. 8 A descoberta de uma multidão cada vez maior de seres vivos sem nada em comum com a fauna e flora conhecida pelos europeus não só tornava premente a necessidade de um sistema de referência universal que a todos nomeasse, como reforçava indiscretas conjeturas acerca da pluralidade da criação – além de dúvidas heréticas sobre a cronologia exposta no Livro Sagrado – criando sérias indagações quanto à verossimilhança e pertinência de diversas passagens bíblicas (BROWNE, 1983; GERBI, 1978, 1993; GLACKEN, 1976; PAPAVERO et al., 1997). Na verdade, seria de fato possível construir uma arca grande o suficiente para abrigar semelhante quantidade de animais? Caso positivo, se estes haviam sido salvos juntos de um “dilúvio universal”, porque tantos ocorriam apenas em Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 18 D.M.TEIXEIRA determinadas partes da terra e não em outras? Toda essa inacreditável diversidade poderia ser realmente originária de um único local? Durante os séculos XVI e XVII, algumas das tentativas mais brilhantes de responder a tais perguntas seriam articuladas pelos jesuítas Joseph de Acosta e Athanasius Kircher (ACOSTA, 1590; KIRCHER, 1675). 9 Estigmatizada como um pecado capital por Santo Agostinho (vide “Confissões” V: 3, 4; X: 35, 55) e outros teólogos, a chamada “curiositas” inspirava profunda desconfiança por parte da Igreja da Idade Média, sendo vista como um desejo quase carnal. Ao promover a “soberba do intelecto”, essa “volúpia por coisas novas” terminaria substituindo a desejada perplexidade e reverência ante os mistérios da Criação por ímpias tentativas de explicar e entender a natureza, iniciativa muitas vezes executada à revelia da Bíblia e de opiniões há muito consagradas. Não surpreende, portanto, que certos renascentistas chegassem a ocultar seu afã pelo saber e marcado gosto pelas surpresas vindas do além-mar empregando argumentos tortuosos amiúde utilizados pelos próprios religiosos do medievo, os quais contrapunham ser possível louvar e exaltar o Todo Poderoso através do estudo das maravilhas criadas pela graça divina. 10 As escolas e academias de arte fundadas no século XVII consideravam a representação de animais, plantas e objetos inanimados com um gênero menor segundo os ideais absolutistas vigentes, privilegiando a reprodução de passagens bíblicas, cenas mitológicas, atos oficiais e retratos de príncipes ou potentados. Por compreender implicitamente uma escala de valores que ascendia da matéria inferior inanimada até o homem possuidor de alma imortal, semelhante hierarquia terminaria sendo associada à famosa “Árvore de Porfírio” por autores como SCHNEIDER (1992), embora tal raciocínio na verdade se aplique à “Scala Naturae”. De qualquer forma, esses rígidos cânones seiscentistas parecem refletir sobretudo alguns princípios gerais bastante arraigados do Cristianismo, bem como a complexa realidade social do Absolutismo (vide PAPAVERO et al., 1995). 11 Embora não haja qualquer prova conclusiva nesse sentido (teste WHITEHEAD, 1973), LARSEN (1962) aventa a hipótese de uma quarta permuta ter ocorrido durante a missão diplomática de Nassau à Inglaterra na época da Restauração (1660). 12 Até janeiro de 1945, Dresden havia sofrido apenas dois bombardeios pouco significativos em pequenas indústrias localizadas nos subúrbios. Nos dias 13 e 14 de fevereiro desse mesmo ano, entretanto, a capital da Saxônia seria alvo de 650.000 bombas incendiárias lançadas por 311 Fortalezas Voadoras da USAF e 796 Lancaster da RAF, os quais sobrevoaram a cidade em três ondas sucessivas tendo como único alvo o velho centro histórico. Nada menos de 135.000 vítimas sucumbiriam sob o impacto de mais de 1.500 toneladas de altos explosivos e 1.200 toneladas de artefatos incendiários, o que transformaria essa operação no mais cruento ataque aéreo desfechado ao longo de toda a Segunda Grande Guerra, superando até mesmo a terrível carnificina de Hiroxima. Em termos culturais e históricos, as perdas ultrapassariam todos os limites imagináveis, pois os verdadeiros “furacões de fogo” criados pelos bombardeios maciços consumiram cerca de 400.000 títulos pertencentes ao acervo da “Sächsische Landesbibliothek” e um elevadíssimo número de monumentos e obras de arte, inclusive dez quadros pintados por Albert Eckhout entre 1653 e 1663. Com a derrocada de Dresden, as duas potências ocidentais pretendiam sobretudo promover uma demonstração de força dentro do incipiente jogo da “Guerra Fria”, tendo escolhido os quarteirões medievais e barrocos ricos em madeirame exatamente para testar de forma cabal suas teorias acerca da capacidade destrutiva de um bombardeio de saturação. Maiores detalhes sobre o assunto e impressionantes fotografias de Dresden destruída estão disponíveis em CARTIER (1965), DEAR & FOOT (1995), IRVING (1963) e VERRIER (1968). 13 Um dos maiores dramaturgos de todos os tempos, Ésquilo retirou-se para a Sicília após ser derrotado por Sófocles em uma disputa poética, falecendo no exílio por volta de 456 a.C. De acordo com a fábula apócrifa amplamente conhecida, seu crânio teria sido esmagado por uma tartaruga precipitada das alturas por uma águia, que confundiu a calva do teatrólogo com uma rocha. Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.112, p.3-24, ago.2006 “AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT ECKHOUT (ca. 1610-1666) 19 14 Ao contrário de determinadas variedades fósseis como Proganochelys, os adultos dos quelônios atuais não apresentam vestígios de dentes, possuindo as queixadas recobertas por uma ranfoteca córnea. Entretanto, dentes transitórios ou cristas dentárias que logo desaparecem podem ser observadas em embriões de espécies como Trionyx triunguis (Forskål, 1775) e Chelonia spp. (GRAVILOV, 1961; PIRLOT, 1976). 15 Embora consagrada nos dias de hoje, a atribuição desses nomes populares revelase assunto controverso que reflete a considerável variação de colorido observada em Geochelone denticulata e Geochelone carbonaria. Exemplos das diferentes opiniões existentes podem ser obtidos em ANÔNIMO (1935), COUTINHO (1868), IHERING (1935) e V ANZOLINI (1999). 16 A presença de um jabuti do Novo Mundo em originais holandeses seiscentistas não implica necessariamente na existência de espécimens trazidos por Nassau do Brasil, pois o tráfico de animais e de seus despojos já era muito intenso nessa época (TEIXEIRA, 1999). Como a ampla distribuição de Geochelone carbonaria alcança o norte da América do Sul (teste PRITCHARD & TREBBAU, 1982), cumpre lembrar que anfíbios e répteis vindos do Suriname ou do Caribe também foram remetidos para a Holanda na segunda metade do século XVII. De fato, um curiosíssimo sapo-parteiro proveniente de Curaçao, Pipa pipa (Linnaeus, 1758), seria figurado pelo médico Hendrik d’Acquet em 1689 (in BELL, 1992), enquanto a famosa artista Maria Sibylla Merian não apenas retratou a herpetofauna do Suriname (e.g. MERIAN, 1705), como chegou a vender exemplares preservados para colecionadores flamengos e alemães após retornar à Europa em 1701 (WETTENGL, 1998). AGRADECIMENTOS Nossos agradecimentos a Quentin Buvelot e ao “Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia, pelo convite efetuado e empréstimo de reproduções de quadros pertencentes à coleção institucional. Da mesma forma, cabe manifestar nosso reconhecimento a Elly de Vries (Instituto Cultural Banco Real, São Paulo) pelos comentários sobre o manuscrito e generosidade demonstrada na concessão de várias imagens de seu acervo privado. Outrossim, devemos particular menção a Márcia Mocelin (Fundação RIOZOO, Rio de Janeiro), que gentilmente colocou ao nosso dispor numerosas informações e ilustrações de Geochelone carbonaria e Geochelone denticulata de sua autoria, além de facilitar a observação de exemplares vivos mantidos no plantel da Fundação RIOZOO. Durante os estudos prévios sobre “As Duas Tartarugas”, também contamos com a indispensável colaboração de Ulisses Caramaschi e Ronaldo Fernandes (Museu Nacional/UFRJ), Nelson Papavero (Museu de Zoologia/USP) e Sérgio Alex Kugland de Azevedo (Museu Nacional/UFRJ), cujas sugestões mostraram-se de grande valia para a execução deste trabalho. Cabe agradecer ainda a Paulo Martins Teixeira e Tatiana Papavero pela arte final das figuras do texto, bem como a Vera de Figueiredo Barbosa, Antônio Carlos Gomes Lima (Biblioteca do Museu Nacional/UFRJ) e Margareth Elisabeth Cardoso (Livraria Carioca Rio Antigo) pelo auxílio prestado na reunião da bibliografia pertinente e/ou na análise das referências utilizadas. Por fim, cumpre destacar o apoio concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) às pesquisas realizadas pelo autor durante os últimos anos. REFERÊNCIAS ACOSTA, J. de, 1590. Historia natural y moral de las Indias, en que se tratan de cosas notables del cielo, y elementos, metales, plantas y animales dellas y los ritos y ceremonias, leyes y gobiernos, y guerras de los indios. Sevilla: Juan de León. ANÔNIMO, 1935. Notas biologicas sobre os chelonios brasileiros (tartarugas, jabotís e cágados). Chacaras e Quintaes, 52(6):793-797. Publ. Avul. Mus. 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