Alergia Alimentar
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Alergia Alimentar Alergia Alimentar é o termo utilizado para descrever reações adversas a alimentos dependentes de mecanismos imunológicos. Manifestações clínicas de leite de vaca), por imunocomplexos e mediadas Segundo o Consenso Brasileiro17, alergia alimen- A alergia à proteína do leite de vaca, denominada tar é o termo utilizado para descrever reações de APLV, é a mais prevalente em crianças, no en- adversas a alimentos, dependentes de mecanis- tanto, a sua real dimensão não é conhecida, pois A alergia alimentar pode ser classificada, conforme enterocolite, hemossiderose)17, que se tornam evi- mos imunológicos. As alergias a leite de vaca, ovo, os dados obtidos são muito variados, assim como o mecanismo imunológico envolvido, em três ca- dentes horas ou dias após a ingestão do alérgeno14. trigo e soja normalmente desaparecem ainda na os critérios empregados na sua obtenção. Em tegorias: mediada pela IgE, não mediada por IgE Representam a minoria das reações imunológicas infância, enquanto que alergias a frutos do mar, crianças menores a incidência tem variado entre e mista1, 7. a alimentos e são bem menos caracterizadas, mas, amendoim e oleaginosas tendem a permanecer 0,3 e 7,5% . na idade adulta6, 17. Alérgenos alimentares são os componentes específicos dos alimentos que são reconhecidos por células do sistema imunológico e induzem reações imunológicas específicas resultando em sintomas característicos2. A maioria dos alérgenos alimentares são glicoproteínas solúveis em água, com tamanho de 10 a 70 kDa que são estáveis ao calor, a ácidos e a proteases3. Em crianças, os principais alérgenos responsáveis pela alergia alimentar são: leite de vaca, ovo, soja, trigo, amendoim, peixes e frutos do mar . 2, 14 A alergia alimentar é mais comum em crianças e estima-se uma prevalência de até 6-8%. Já em adultos, a prevalência observada é de 3-4%, porém, estes valores vêm aumentando. A prevalência é ainda maior em crianças com dermatite atópica, sendo que 35% delas têm alergia alimentar mediada por imunoglobulina E (IgE), e ainda, 6-8% das crianças asmáticas podem ter sibilância induzida por alimentos6, 17. 2 O diagnóstico preciso de alergia alimentar é necessário para proteger as crianças de dietas inadequadas ou desnecessárias. por células (dermatite herpetiforme, proctocolite, 16 As reações mediadas por IgE decorrem da sensibi- normalmente, são devidas a uma inflamação aguda ou crônica no trato gastrintestinal, em que os A evolução da alergia alimentar depende do tipo lização a alérgenos alimentares com formação de de alimento envolvido, das características do pa- anticorpos específicos da classe IgE, que se fixam ciente e do mecanismo imunológico envolvido. a receptores de mastócitos e basófilos. Quando o Assim, embora, muitas crianças desenvolvam to- indivíduo entra em contato novamente com o alér- As manifestações mediadas por IgE com participa- lerância ao alimento desencadeante após o pri- geno e este se liga a duas moléculas de IgE, há a ção de linfócitos T e de citocinas pró-inflamatórias meiro ano de vida, outras podem levar de oito a liberação de mediadores vasoativos, que desenca- são conhecidas por reações mistas. Como exemplo, dez anos para ingeri-lo sem apresentar sintomas. deiam as manifestações clínicas imediatas como citam-se esofagite eosinofílica, gastrenterite eosi- Em relação ao leite de vaca, frequentemente, é reações cutâneas (urticária, dermatite atópica), nofílica, dermatite atópica e asma17. observada perda da sensibilidade progressiva gastrintestinais (vômito, diarréia, cólicas abdomi- com o avançar da idade: 50% até um ano, 70% até nais), respiratórias (asma, rinite, chiado) e sistêmi- os dois anos e 85% até os três anos de idade17. cas (anafilaxia com síncope, hipotensão e cho- O mecanismo fisiopatológico pelo qual se desenvolve a alergia alimentar envolve, além dos alérge- que)1, 17. Essas reações ocorrem dentro de minutos a 2 horas após a exposição ao alérgeno11. eosinófilos e os linfócitos T parecem desempenhar um papel importante10, 19. Enquanto as reações mediadas por IgE são bem reconhecidas com testes de diagnóstico validados, as reações imunológicas não mediadas por IgE, que podem surgir no trato gastrintestinal, não são bem definidas e são mais difíceis de reconhecer1. nos, a permeabilidade da barreira do trato gastrin- A anafilaxia é a reação alérgica mediada por IgE mais testinal e a predisposição genética. A imaturidade grave, enquanto que as manifestações cutâneas são fisiológica do aparelho digestório e o sistema imu- as mais comuns. Tem sido bem estabelecido que, nológico pouco desenvolvido nos dois primeiros aproximadamente, 30-35% das crianças que sofrem anos de vida são fatores importantes para que o de dermatite atópica moderada a grave apresentam Um diagnóstico preciso de alergia alimentar é desenvolvimento da alergia alimentar na infância alergia alimentar associada que agrava o eczema1, 15. necessário para proteger as crianças de dietas se estabeleça . 8 As reações não mediadas por IgE compreendem reações citotóxicas (trombocitopenia por ingestão Diagnóstico inadequadas ou desnecessárias. A história clínica continua a ser a base no processo de diagnóstico, assim como os relatos da dieta podem ser 3 A eliminação do leite de vaca sem substituição adequada pode prejudicar o crescimento e o desenvolvimento normais do lactente. nal, pode provocar agravo do estado nutricional introdução de fórmulas hipoalergênicas em pa- pelos seguintes mecanismos18: cientes com APLV, em que houve interrupção do • diminuição da assimilação de energia e nutrientes, em função de vômitos e/ou regurgitação; • redução da absorção intestinal nos casos com um complemento útil de uma história médica, especialmente em doenças crônicas. As dietas de eliminação são aplicadas tanto para fins diagnósticos quanto terapêuticos. Em alguns casos, tais como esofagite eosinofílica e gastrenterite eosinofílica, são necessárias várias semanas de dieta elementar com fórmulas de aminoácidos para estabilizar os doentes antes da realização de testes alimentares14. Outras investigações são também requeridas, como exames físicos, testes cutâneos, determinação de IgE sérica específica e testes de provocação oral aberto e fechado2. Estes testes são considerados os únicos fidedignos para se estabe- • perda de nutrientes pela mucosa intestinal in- mento adequados. A exclusão completa do alimento causador da rea- de proteínas extensamente hidrolisadas e, se e/ou deficiência de ferro isolada18. recomendadas as fórmulas parcialmente hidroli- de vaca e seus derivados. Os rótulos dos alimentos devem ser cuidadosamente analisados, pois até Diante disso, percebe-se a necessidade de um mesmo pequenas quantidades do alérgeno envol- suporte nutricional para esses pacientes, particu- vido podem estar presentes em alimentos supos- larmente, uma ingestão adequada de vitaminas, tamente tolerados, e que seriam suficientes para o proteína, cálcio e energia5. Nos lactentes, o alei- desencadeamento de uma reação alérgica . tamento materno exclusivo, sem a introdução do 6 adequada pode prejudicar o crescimento e o de- nação sem a adequada substituição, pode levar a prejuízos no crescimento e desenvolvimento12. ça e a piora das manifestações alérgicas, além de nos casos com perda de sangue). difícil de ser evitado, como o que ocorre com o leite do leite de vaca da dieta e, em lactentes, sua elimi- cadeamento dos sintomas, a progressão da doen- mais lactentes, recomendam-se fórmulas à base fórmulas à base de aminoácidos livres13. Não são A eliminação do leite de vaca sem substituição global do tratamento dietético é evitar o desen- flamada (proteínas nos quadros de colite e ferro na velocidade de crescimento e/ou desnutrição tamento para a APLV se baseia na exclusão total de fórmulas ou dietas hipoalergênicas9. O objetivo larmente após os seis meses de idade. Para os de- to é encontrado em vários produtos e, portanto, são do leite de vaca e de seus derivados da dieta. suspeito de causar os sintomas1, 4, 18 e na utilização por IgE, sem sintomas gastrintestinais, particu- não houver remissão dos sintomas, indica-se as ser realizados uma vez que a primeira linha de tra- é baseado na exclusão do alimento conhecido ou prescritas para pacientes com reações mediadas Assim, a APLV pode provocar basicamente déficit No caso da APLV, o tratamento baseia-se na exclu- O tratamento de pacientes com alergia alimentar da AAP, as fórmulas à base de soja podem ser ção nem sempre é fácil, especialmente se o alimen- lecer o diagnóstico de alergia alimentar, e devem Tratamento 4 proporcionar à criança crescimento e desenvolvi- enterite e má absorção intestinal; aleitamento materno. Segundo a recomendação leite de vaca, de fórmulas infantis à base de leite de vaca e de alimentos complementares, até os sadas (por conterem proteínas intactas do leite), os preparados à base de soja (por não atenderem às recomendações nutricionais para a faixa etária e por não conterem proteínas isoladas e purificadas), assim como produtos à base de leite de cabra, ovelha ou outros mamíferos (pela similaridade antigênica)17. seis meses de idade, tem sido recomendado para As fórmulas à base de aminoácidos livres, as úni- se evitar a APLV. Contudo, na impossibilidade do cas consideradas não alergênicas, são o produ- senvolvimento normais do lactente, com possibi- aleitamento materno, tem-se recomendado o to de primeira escolha nos casos de anafilaxia e lidade de repercussões clínicas, razão pela qual se uso de fórmulas com alergenicidade reduzida17. esofagite eosinofílica9, e são recomendadas para recomenda a utilização de fórmulas adequadas e São consideradas no tratamento da APLV as fór- crianças com persistência dos sintomas em uso de ressalta-se a importância de uma avaliação conti- mulas à base de proteínas extensamente hidro- fórmulas com proteínas extensamente hidrolisa- nuada, tanto da ingestão alimentar quanto do es- lisadas, à base de proteínas purificadas de soja e das ou síndrome de má absorção grave com inten- tado nutricional da criança, durante todo o perío- suplementadas para atingir as recomendações so comprometimento da condição nutricional17 e do de exclusão13. dietéticas dos lactentes e à base de aminoácidos crianças com alergias alimentares múltiplas1. Além disso, por se tratar de uma inflamação, a APLV pode comprometer o estado nutricional da criança, por aumentar as necessidades de energia e reduzir a ingestão energética por diminuição do apetite. Quando compromete o trato gastrintesti- livres, todas nutricionalmente completas e que atendam integralmente às necessidades nutricionais dos pacientes1, 17. Atualmente, o manejo dietético da APLV se baseia na utilização de fórmulas industrializadas, de acordo com o fluxograma de terapia nutricional A Academia Americana de Pediatria (AAP) e a (Figura 1) estabelecido pela Sociedade Brasileira Sociedade Brasileira de Pediatria preconizam a de Pediatria17. 5 A educação nutricional contínua e o reforço da importância da exclusão completa do leite de vaca e derivados Referências bibliográficas da dieta em todas as consultas, além da participação de uma equipe multidisciplinar são essenciais para o 1. Benhamou A.H.; Schäppi Tempia, M.G.; Belli, D.C.; Eigenmann P.A. 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J o s é Câ n d i d o d a S i l ve i ra , 2 1 0 0 • B a i r ro Ho r to 3 1 0 3 5 - 5 3 6 • B e l o H o r i z o n t e • M G • Te l [ 3 1 ] 3 4 8 6 4 1 6 7 w w w. i n v i t a n u t r i c a o. c o m . b r • s a c @ i n v i t a n u t r i c a o. c o m . b r
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