Maria Lucia Fattorelli - Auditoria Cidadã da Dívida

Transcrição

Maria Lucia Fattorelli - Auditoria Cidadã da Dívida
AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA
AUDITORIA
(Maria Lucia Fattorelli Carneiro)
A luta pela AUDITORIA DA DÍVIDA visa abrir a caixa preta da DÍVIDA e levantar
toda a verdade sobre o processo de endividamento brasileiro. Precisamos saber que
dívida é essa, que tanto afeta a nossa vida e que tem servido de tapete para propostas
ainda mais ofensivas à nossa já aviltada soberania, como a ALCA, que representa sério
risco de aprofundamento e agravamento dos processos de espoliação, dependência,
submissão e a proposta de renegociação de dívida apresentada pelo FMI, que será a
institucionalização do fim da soberania.
Proposta de renegociação
Embalada pela crise argentina, a diretora do FMI – Anne Krueger - se declarou,
em
novembro/2001,
preocupada
com
“as
crises
dos
mercados
financeiros
emergentes”. Por isso, apresentou ao mundo uma proposta que institui mecanismo
formal de reestruturação da dívida soberana dos países, a partir de uma nova
arquitetura financeira internacional, com a argumentação de que “a proposta ajudará
os países a evitar o colapso econômico, estimulará os fluxos de capital privado e
eliminará as operações de socorro multimilionárias do Fundo”.
Seu modelo é a instituição de um tribunal de insolvência, do qual participariam
os credores e devedores, e teria força de lei em sentido universal, ou seja, seria
superior às leis dos países; superior mesmo, à Constituição Federal de cada país! A
proposta do Fundo abarca tanto a dívida externa quanto a interna, e visa “reconstruir a
confiança dos investidores”, restaurando o crescimento dos países ao colocar, em
primeiro lugar, as políticas corretivas de ajuste fiscal (que são inversas as adotadas
pela maior potência mundial e demais países ricos), o fortalecimento do setor
financeiro e regimes mais flexíveis de câmbio.
A partir de 17 de abril último, essa proposta passou a ser comentada
publicamente também por Horst Köhler, diretor do FMI. Ele explicou que “os credores
poderiam decidir por uma maioria qualificada, sobre os termos da reestruturação” e
está defendendo a proposta de Krueger que “indica que os credores privados deveriam
fiscalizar a política econômica dos países devedores, garantindo assim que o
compromisso de pagamento acertado na reestruturação fosse honrado”.
A proposta de renegociação está avançando rapidamente entre os mandatários
do planeta, uma vez que já foi incluída, pelo G7, em seu plano para combater crises
financeiras dos “emergentes”, discutido na reunião de abril de 2002.
Não podemos deixar de temer que isso possa gerar situações absurdas, como
por exemplo, quando tribunais americanos deram ganho de causa a credores que
processaram países por terem alterado cláusulas de renegociação de dívidas e, em
2000, um juiz norte-americano determinou o seqüestro de bens do patrimônio estatal
do Peru (sedes de embaixada e aeronaves) como indenização por títulos vencidos.
Hoje, a Constituição Federal do Brasil impede tais práticas, mas o mecanismo proposto
pelo FMI poderá ter força legal superior, institucionalizando, dessa forma, o fim da
soberania dos países endividados,inclusive o Brasil.
Proposta Alternativa
Em contraponto a esse modelo autoritário e desrespeitoso proposto pelo FMI, que
institucionalizará o fim da soberania dos países endividados, representantes da
Campanha Jubileu de diversos países reuniram-se em Guayaquil, no Equador, nos dias
9 a 12 de março, a fim de discutir uma proposta alternativa a esse mecanismo
unilateral profundamente parcializado com o qual são tratados os países em
desenvolvimento.
Os dezoito países representados em Guayaquil – Equador, Argentina, Peru,
Bolívia, Colômbia, Brasil, Honduras, Ghana, Nigéria, Mali, Ilhas Maurício, Filipinas,
Alemanha, Inglaterra, Áustria, Austrália, Espanha e Canadá – discutiram a alternativa
de realização de um processo de arbitragem justo e transparente.
A proposta se fundamenta na defesa dos direitos humanos e dos direitos
fundamentais dos povos, que têm sido violentamente desrespeitados pelos governos
que circunscrevem suas ações aos interesses de pequenos grupos. As negociações das
dívidas têm sido, historicamente, desequilibradas. O juiz, FMI, é parte do time mais
forte, impõe as regras e não assume qualquer culpa ou responsabilidade pelos danos
que tem causado. Os exemplos mais recentes são Argentina e Uruguai, mas vários
países estão igualmente arrebentados. Por isso, é preciso discutir a criação de um
Código Financeiro Internacional, que regulamente as relações e dê maior equilíbrio e
justiça às negociações internacionais.
A proposta de Guayaquil busca uma reorganização da forma de negociação e
prevê o estabelecimento de um tribunal de dívida independente, não fixo. Para se
chegar a esse mecanismo, os países devem iniciar um processo de monitoramento,
audiências públicas e auditorias da dívida, para que se tenha pleno conhecimento da
natureza do endividamento – qual parte é legítima e qual é ilegítima.
No próximo dia 30 de agosto estaremos reunidos novamente em Belo
Horizonte, discutindo estas propostas de renegociação e tentando avançar na
construção de uma alternativa, em conjunto com outros companheiros da América
Latina: Beverly Keene (Argentina), Alberto Acosta (Equador) e Oscar Ugarteche (Peru)
estarão prestigiando-nos com sua presença nessa discussão que ocorre em momento
estratégico.
A essência dessa proposta alternativa é a transparência do endividamento de
cada país. A nós, diz respeito a dívida brasileira. Como chegaremos a esse ponto?
Como conseguiremos essa clareza?
Acredito que somente através de uma auditoria profunda e abrangente,
chegaremos à verdade.
Luta pela Auditoria da Dívida
A Auditoria da Dívida Externa está prevista na Constituição Federal promulgada
no ano de 1988, da qual consta dispositivo que determina a realização de “exame
analítico e pericial dos atos e fatos geradores do endividamento externo brasileiro"
(Artigo 26 das Disposições Transitórias).
Esse dispositivo inspirou uma das perguntas do grande Plebiscito que a
Campanha Jubileu Sul promoveu no ano 2000, quando foram coletados 6.030.329
votos em 3.444 cidades brasileiras, graças ao trabalho intenso de voluntários. A
pergunta era:
“O Brasil deve continuar pagando a Dívida Externa sem realizar uma Auditoria
Pública dessa dívida, como prevê a Constituição Federal de 1988?”.
Mais de 95% dos cidadãos que participaram do Plebiscito responderam que NÃO.
Respaldados no voto desses cidadãos que querem ver cumprida nossa
Constituição Federal, iniciamos, em abril de 2001, uma “Auditoria Cidadã da Dívida”,
que consiste no resgate de documentos, realização de estudos, levantamento de
dados, mas visa, especialmente, pressionar a realização da auditoria oficial, prevista
em nossa Constituição.
“Erro” de 32,7 bilhões de dólares
A luta pela auditoria da dívida ganhou impulso a partir de setembro de 2001,
quando o próprio Banco Central anunciou um “erro” em nossa Dívida Externa no
montante de 32,7 bilhões de dólares!!! Esse fato serviu, no mínimo, para comprovar
que é preciso realizar uma auditoria séria nessa dívida, que tanto tem sacrificado a
sociedade brasileira. Esse “erro” tem valor superior ao festejado acordo da semana
passada com o FMI, de US$30 bilhões.
Os argumentos apresentados pelo BC foram os seguintes:
-
A metade do “erro” seria, decorrente de reclassificação de empréstimos
como investimento direto;
-
A outra metade, se referia a dívidas que já haviam sido pagas, pasmem,
sem que o Banco Central soubesse!!!
Essa demonstração de total falta de controle é seríssima e reforça a necessidade de
uma auditoria séria e profunda.
O agradável e surpreendente anúncio de redução de 32,7 bilhões de dólares no
montante de nossa dívida externa pode, na verdade, estar ocultando outro meio de
propiciar mais garantias e crescentes ganhos ao capital internacional que, depois de
muito bem remunerado como empréstimo, na iminência de algum risco, se reveste da
forma de investimento direto, garante altos lucros e vai embora quando quer.
Precisamos exigir mais transparência.
Momento atual:
Empréstimo FMI – US$ 30 bilhões (SOCORRO)
Empréstimo BID – US$ 1 bi (criar novas linhas de crédito para as exportações)
Empréstimo BM – US$ 2 bi + 4bi (SOCORRO)
Na reta final do governo FHC, esses recentes empréstimos significam um acréscimo
à dívida externa correspondente a 37 BILHÕES DE DÓLARES.
E qual a destinação desses recursos? Apenas 1 bi – uma migalha, se comparado ao
volume total de recursos – serão destinados a créditos às exportações, condicionados à
aprovação da operação pela diretoria do BID, uma a uma... Só a saída de recursos
através das famigeradas CC-5, no mês de julho/2002, foi de US$1,25 bilhões, 25%
superiores ao valor destinado às linhas de crédito para exportações pelo BID. Cumpre
ressaltar que, somente agora, a Receita Federal anuncia que, a partir de 01.12.2002, irá
exercer controle sobre as contas CC-5, mediante a exigência de CPF, o que irá permitir a
identificação do responsável. Por que só no último mês do governo FHC?...
Por outro lado, só para honrar compromissos com o próprio FMI em 2003, serão
gastos 10,85 bilhões de dólares...
Segundo artigo de Walter Molano publicado na Folha de SP de 11/08/2002, o FMI
ofereceu apenas 6 bilhões em dinheiro novo, que será desembolsado ainda em 2002 e
permitirá que FHC chegue ao final de seu mandato sem sofrer o embaraço de uma
moratória ou de um colapso econômico... O resto do pacote foi simplesmente uma
autorização para que a equipe econômica que está saindo do poder esgote a maior parte
dos ativos líquidos brasileiros.
A proposta é vencedora para:
-
o Tesouro dos EUA, porque minimiza o uso do dinheiro dos “encanadores e
carpinteiros” que vai parar na Suíça;
-
o Departamento de Estado que causou a impressão de que os Estados
Unidos estão dispostos a apoiar seus aliados latino-americanos;
-
o Departamento de Comércio porque permite o avanço das negociações da
ALCA;
-
FHC, que chega ao final de seu governo sem grandes embaraços;
-
Bancos de investimentos porque permite que liquidem suas posições de
curto prazo e realizem “hedge” para as demais.
Como ainda podem argumentar que a política de FHC foi ideal? Ideal para quem?
Para o povo brasileiro é que não! É como pegar dinheiro com agiota. No caso do FMI,
podem até alegar que as taxas de juros não são tão elevadas assim, mas não falam da
manipulação embutida nas taxas de câmbio flutuantes...
É evidente que o socorro prestado pelo FMI ao país é apenas para garantir seus
próprios interesses e dos demais credores. Esse dinheiro nem virá para o Brasil; não
significará melhoria nas condições de vida da população ou da própria economia nacional,
servindo apenas para comprometer o próximo presidente a esse modelo de política
econômica dependente e subserviente que, além de deixar uma herança maligna,
representada pela dívida financeira monstruosa e pelo agravamento da dívida social,
ainda entregou nosso patrimônio público – lá se foram nossas estatais estratégicas e
lucrativas – e vem desmontando o Estado (cortando verbas orçamentárias, inclusive das
Forças Armadas) e desregulamentando todos os controles sobre o mercado, facilitando
cada vez mais as atividades especulativas.
A “generosa” concessão, inserida no recente acordo para que o Brasil possa reduzir
suas reservas até o limite de 5 bilhões de dólares significa, na verdade, que chegaremos
ao final da era FHC “zerados” e vulneráveis como nunca, o que obrigará o próximo
presidente a se ajoelhar diante do Fundo ou iniciar o governo como inadimplente. É o
cúmulo da IRRESPONSABILIDADE FISCAL, MONETÁRIA, CAMBIAL E SOCIAL:
-
Dívida monstruosa (Interna, perto de R$ 800 bilhões e Externa, de US$ 260
bilhões)
-
Parte significativa da dívida interna (mais de 1/3) atrelada ao câmbio
-
Reserva próxima de zero
-
Dólar em alta
-
Retorno da inflação
-
Pobreza – 53 milhões de brasileiros
-
Desemprego – 12 milhões de trabalhadores
-
Famintos – 28 milhões (Jean Ziegler - ONU)
-
Sem teto, sem terra
-
Analfabetismo (absoluto + funcional ) alcançando 1/3 da população adulta.
-
Concentração de renda (é a 4a. maior do mundo, apenas três países da
paupérrima África subsaariana ostentam índice de Gini mais vergonhoso que o
nosso)
-
A concentração de renda é ainda mais agravada por uma política econômica
injusta e um sistema tributário que onera principalmente o trabalho e que não
tributa o capital, os latifúndios e as grandes fortunas.
Durante os 8 anos de FHC, a dívida externa cresceu absurdamente, apesar da
entrega do nosso patrimônio, do enxugamento generalizado dos gastos públicos, arrocho
salarial dos servidores públicos e agravamento do quadro social. Por outro lado, temos
batido sucessivos recordes de arrecadação, mas ao invés de comemorarmos esses
recordes deveríamos ter vergonha, pois a metade de todos os tributos e contribuições
arrecadados anualmente pela Receita Federal nesses últimos quatro anos, com enorme
sacrifício da sociedade – cerca de R$ 200 bilhões anuais em média – está indo
diretamente para o bolso da banca financeira nacional e internacional, condenando o País
ao atraso e a miséria. Dinheiro que é subtraído das empresas e famílias, que deixa de
gerar
crescimento econômico, empregos e riqueza e que acaba nas mãos de
especuladores. A carga tributária na era FHC subiu de 27 para 35% do PIB, SUPERIOR À
DOS ESTADOS UNIDOS, A MAIOR DENTRE TODOS OS PAÍSES AMÉRICA LATINA, E
SUPERIOR À DE MUITOS PAÍSES EUROPEUS. ONDE FOI PARAR TANTO DINHEIRO??? Só
uma auditoria séria e profunda apurará.
Salta aos olhos que é absolutamente impossível para a sociedade brasileira resistir
a um aumento de carga tributária conjugado com mais cortes em gastos sociais,
combinados com uma política de juros estratosféricos. Tudo para garantir a produção de
um superávit primário em níveis cada vez mais elevados. Portanto, o modelo se
exauriu. O pior é que esse modelo gera um círculo vicioso. Os ajustes impostos pelo FMI
se traduzem em políticas econômicas perversas e recessivas: obrigam o enxugamento
cada vez mais cruel dos gastos orçamentários, levando a um agravamento do quadro
social. Digo cruel, porque países muito mais ricos que o Brasil não suportariam
enxugamento de gastos nessa ordem e nem taxas de juros tão elevadas. Enfim, os
Estados Unidos, superpotência hegemônica, impõe a países praticamente falidos, como
a Argentina, Moçambique e, por que não, Brasil(?), políticas econômicas suicidas, que
jamais implantariam em território americano, mas que são consideradas pelo FMI e o
Banco Mundial como essenciais para a rolagem das dívidas desses países.
No dia 05 de agosto último, vários representantes de entidades que participaram
do seminário “Estratégias Alternativas de Financiamento para o Desenvolvimento do
Brasil”, em Recife, tiveram uma reunião com 2 representantes do instituto de pesquisa do
FMI, Shinji Takagi e Kevin Barnes. Eles nos disseram que já haviam falado com órgãos
oficiais, empresários e instituições financeiras e que seria um erro não falar com os
movimentos sociais. Queriam saber o que pensávamos sobre o acordo de 1998, pois
estavam preocupados com críticas que estavam recebendo, provenientes de grupos da
Europa e Japão. Na visão dos precitados representantes, nem os Estados Unidos nem o
FMI ditaram ou impuseram coisa alguma... Todas as intenções foram redigidas na Carta
de 98 pelo governo brasileiro e adotadas pelo mesmo. O FMI não estava aqui. Quanta
ironia!
Se não foi o FMI que impôs as medidas de ajuste estrutural, como explicar a
adoção, por todos os países que a ele recorreram, das mesmas medidas? É evidente que
estão querendo se isentar da responsabilidade nas conseqüências desastrosas que
assolaram todos os países que as aplicaram.
A reação foi à altura. Ouviram bastante.
Mencionamos as metas e exigências estabelecidas na referida carta de 1998 que,
como todos sabemos, são previamente negociadas, sendo que cada item é acertado de
acordo com as exigências do Fundo e a mesma não é assinada até que tudo esteja
devidamente acertado.
Da mesma forma, os recursos só são liberados se atingidas as referidas metas,
monitoradas a cada 3 meses pelos técnicos que aqui vêem nos inspecionar, às nossas
custas.
Falamos da imposição de políticas de ajuste inversas às adotadas nos países que
comandam o FMI, o que demonstra que nos receitam um remédio que jamais
tomariam...
Falamos também do estrago causado à nossa economia pelo fato do FMI classificar
investimento como despesa para fins de cálculo do superavit primário, critério que
impediu fossem feitos os investimentos necessários no setor de energia elétrica, levandonos ao apagão, que trouxe enormes prejuízos à nossa economia e à sociedade...
Sugerimos que, se queriam saber o que pensamos do acordo de 98 e seus reflexos,
bastavam prestar atenção ao que acontece com TODOS os países que se submetem a
acordos semelhantes, atrelados a políticas de ajuste estrutural: as conseqüências são
sempre danosas para a macroeconomia. O caso mais emblemático é o da nossa vizinha
Argentina, que seguiu criteriosamente o receituário do FMI e durante alguns anos
recebeu elogios; quando de repente deu tudo errado, o país se viu em grandes
dificuldades, o FMI e o governo americano viraram-lhe as costas...
Acusamos o modelo de atuação do Fundo de estar provocando miséria e morte.
Apelamos para a questão moral e ética da sua atuação, pois o FMI não é fiel aos
objetivos para os quais foi criado. Não cuida da “saúde” econômica de seus membros,
mas visa APENAS a garantia dos credores. Não se preocupa com os povos dos países
endividados. A proposta de renegociação apresentada por Anne Krueger é prova disso: só
se preocupa com a garantia e com os interesses dos investidores, não se referindo uma
vez sequer aos direitos e interesses dos povos.
Questionamos:
-
Por que o FMI não apóia a instituição de uma taxa sobre as transações
financeiras internacionais (Taxa Tobin)? Essa taxa, além de render recursos que
poderiam ser destinados ao combate à miséria, serviria de instrumento de
identificação dos verdadeiros donos do dinheiro sujo. Poderia ajudar a comprovar
se o secretário do Tesouro Americano tinha razão quando acusou, há poucos dias,
os brasileiros de “ corruptos que enviam seus dinheiros para paraísos fiscais”.
-
Por que o FMI não exige a implementação de medidas saudáveis, semelhantes
às aplicadas pelos países que comandam o Fundo (taxas de juros reduzidas,
proteção comercial e fortalecimento do Estado), que garantam o crescimento
econômico e o PLENO emprego?
-
Se acreditam que o FMI tem sido “bom” para os países que “ajuda”, por que
não providenciam uma boa prestação de contas, discriminando claramente quanto
colocaram em cada país e quanto retiraram? Não adianta ficarmos discutindo;
precisamos verificar os números, que evidenciariam se ajudaram ou lucraram com
as “ajudas” prestadas.
Concluímos dizendo que as políticas ditadas pelo FMI têm gerado crescente miséria
e desigualdade social no mundo inteiro; que avaliar somente o acordo de 1998 era
insuficiente e que é urgente a inversão das prioridades: a garantia da dignidade de países
e povos deveria vir em primeiro lugar; o pagamento das dívidas financeiras é secundário;
que não se pode pensar na economia como um fim em si, mas como um instrumento à
serviço da pessoa humana. Precisamos defender o país e reorientar a economia para
atendermos às necessidades da maioria.
Um dos representantes do Fundo nos disse que já existem programas que cuidam
das questões sociais e só queriam ouvir comentários sobre o acordo de 1998.
Reagimos, dizendo que tudo que estávamos tratando se referia ao acordo de 1998.
Que era preciso conectar os estragos sociais às medidas econômicas adotadas por
imposição do Fundo.
Foi evidente a tentativa de convencer-nos de sua visão, de que não têm qualquer
responsabilidade...
Após compartilhar esse momento que tivemos junto aos representantes do
Instituto de pesquisa do FMI, pergunto: o que fazer diante de tamanha injustiça?
Recursos jurídicos
A imensa injustiça que tem permitido que o fluxo de capital dos países pobres
para os ricos tenha aumentado nas últimas décadas, em função dos processos de
endividamento a que esses povos foram submetidos (transfusão de sangue às
avessas), tem suscitado estudos interessantes, dentre os quais gostaria de destacar os
do Comitê de Bruxelas que aborda recursos jurídicos previstos no Direito Internacional,
como a “Dívida Odiosa” e a “Força Maior”, que podem ser invocados como justificativa
ao não-pagamento de dívidas, nos casos em que estas comprometem a VIDA.
Dívida Odiosa:
Eric Toussaint defende que “As dívidas dos Estados contraídas contra os
interesses das populações locais são juridicamente ilegítimas”.
Essa noção vem do fim do século XIX quando os Estados Unidos tomaram o
controle de Cuba, depois de uma guerra contra a Espanha, e esta lhes pediu que
assumisse a dívida cubana com a Coroa Espanhola, conforme estabelecia o direito
internacional. A comissão de negociação dos Estados Unidos recusou essa dívida,
qualificando-a de “peso imposto ao povo cubano sem acordo”. A comissão argumentou
que “a dívida foi criada pelo governo da Espanha para atender a seus próprios
interesses e por seus próprios agentes. Cuba não teve voz no capítulo”. Acrescentou
que “os credores aceitaram o risco de seus investimentos”.
Mais tarde, na década de 1920, uma corte de arbitragem internacional, da qual
participava o juiz Taft, presidente da Corte Suprema dos Estados Unidos, declarou que
os empréstimos concedidos por um banco britânico estabelecido no Canadá ao
presidente Tinoco, da Costa Rica, eram nulos, pois não haviam servido aos interesses
do país, mas sim, ao interesse pessoal de um governo não democrático. (Fonte: A
Bolsa ou a Vida, de Eric Toussaint)
O grupo de estudos da “Auditoria Cidadã” resgatou Relatório da Comissão
formada em 1987, no Senado Federal, cujo objetivo era analisar a moratória decretada
por Funaro. O relatório, de autoria do Senador Fernando Henrique Cardoso, comprova
que boa parte da dívida brasileira atendeu a outros interesses que não o do povo
brasileiro:
“O possível confronto entre os países produtores-exportadores e os países
consumidores
de
petróleo
foi
evitado
pelo
endividamento
dos
países
em
processo
foi
concediam
os
desenvolvimento, através da reciclagem dos petrodólares”.(página 6)
“O
engajamento
possibilitado,
dos
obviamente,
países
pelos
em
bancos
desenvolvimento
internacionais,
nesse
que
empréstimos; endossado pelo FMI, que acompanhava a avaliava, anualmente, as
economias dos seus membros; e, encorajado pelos governos dos países credores, que
deram apoio político à estratégia de crescimento econômico com financiamento
externo.
Torna-se evidente, desta perspectiva, que a crise da dívida externa do
Terceiro Mundo envolve a co-responsabilidade dos devedores e dos credores.” (página
6)
É evidente que os interesses em jogo nesse período do endividamento brasileiro
não eram os do nosso povo, portanto, trata-se de dívida infame, odiosa, segundo o
próprio Direito Internacional.
Há vários outros exemplos de dívida constituída por elites locais, em
cumplicidade
com
os
bancos
e
organismos
internacionais,
que contrariam
os interesses da sociedade, merecendo destaque fatos ocorridos no continente africano
e na Argentina:
Em vários países da África Subsaariana, o processo de endividamento financiou
o armamento de países, que foram utilizados contra a própria população (em Ruanda
houve o genocídio das etnias tutsi e hutu). Os ditadores Bokasa e Idi Amin também
são tristes exemplos.
As políticas de ajuste impostas pelo FMI aliadas ao controle internacional dos
preços dos produtos primários exportados por esses países os levaram a um
empobrecimento alarmante e à degradação social. A proliferação de doenças está
colocando a população em risco: primeiro foi Ebola e depois a AIDS. A miséria é TOTAL
e a dívida ainda sangra os parcos recursos desses países.
Na Argentina, a subserviência e cumplicidade de ditadores, sucedidos por
Alfonsín, Menem e Cavallo, que seguiram à risca os ditames do FMI durante anos,
levou o país ao caos econômico e social. O endividamento brutal, apenas para se
constituir reservas, a privatização em massa, o câmbio fixo e a abertura econômica
indiscriminada foram medidas adotadas para satisfazer outros interesses que não
os do povo argentino, que agora amarga as conseqüências, enfrentando desemprego,
fome e com mais da metade da população vivendo na miséria.
A
caracterização
da
dívida Argentina como
ODIOSA
ficou
evidente
no
julgamento ocorrido em 2000 do processo iniciado pelo jornalista Olmos Alejandro no
ano de 1982, ainda no tempo ditatorial. Nesse julgamento, provou-se que o
endividamento foi ponto de apoio fundamental à ditadura que prendeu, torturou e
matou arbitrariamente milhares de cidadãos, e serviu aos interesses das instituições
financeiras e elites corruptas que transferiram suas riquezas para o exterior,
especialmente para paraísos fiscais. Na transição do regime, dívidas privadas foram
tornadas públicas, destacando-se as dívidas dos próprios agentes financeiros que
figuravam também como credores: City Bank, First National Bank of Boston, Deutsche
Bank, Chase Manhattan Bank, Bank of America. Como diz Eric Toussaint: “Sem
comentários”...
Enquanto isso, o Estado foi se enfraquecendo e a população empobrecendo-se.
Esta é a dívida odiosa, ilegal e infame.
Força Maior:
O
Direito
Internacional
prevê
situações
nas
quais
um
Estado
pode,
legitimamente, decidir se deve ou não pagar suas dívidas, de acordo com suas
necessidades e capacidades. Um dos exemplos é o argumento da “FORÇA MAIOR”,
princípio do direito internacional que reconhece que uma mudança nas condições
econômicas vigentes, quando foi firmado um contrato pode justificar o seu não
cumprimento. É a repudiada “Cláusula Contratual Incerta”, que justifica anulação de
pacto feito sob boa fé. A regra denominada pela locução latina “rebus sic stantibus”,
que significa precisamente “o mesmo estado de coisas”, estabelece que as cláusulas
contratuais
são
válidas,
estabelecidas no pacto.
apenas
enquanto
subsistem
as
mesmas
condições
O argumento da “Força Maior” pode ser invocado quando um país se encontra na
impossibilidade de respeitar uma obrigação internacional, exatamente pelo fato de
estar submetido a um constrangimento exterior, que não provocou. O maior exemplo
disso foram as taxas de juros flutuantes, contidas nos contratos externos, que
permitiram a brutal elevação das taxas de juros, realizada unilateralmente pelos
Estados Unidos no início da década de 80, alterando-se completamente as condições
pactuadas. Esse fato levou os países que se encontravam altamente endividados a
crises econômicas e à moratória. Atualmente, as taxas de câmbio flutuantes e a
manipulação do “risco-país” por agências internacionais
exercem o mesmo papel
manipulador das antigas taxas de juros flutuantes. Com que autoridade estas agências
definem nosso nível de risco, já que elas estão sendo fortemente questionadas e até
mesmo processadas por seus recentes atos ilícitos, relacionados às fraudes de
balanços
nos
EUA? A
insegurança
nos
termos
das
negociações
financeiras
internacionais é enorme, e as condições são de total imprevisibilidade, ferindo as
normas do direito internacional, que precisamos resgatar.
Uruguai
Recentemente, a mesma crise econômica experimentada pelo Brasil e pela
Argentina se manifestou também no Uruguai. Com a queda na atividade econômica
dos 2 primeiros países, o Uruguai teve uma diminuição de 40% nas suas exportações
no primeiro trimestre do ano. Isso aprofundou a recessão uruguaia (que já dura 4
anos), fazendo com que o país, que já teve seu PIB decrescido em 1,5% em 2000,
experimentasse em 2001 uma diminuição de 2,5% em sua economia. O desemprego,
que já estava em 13,6% em 2000, aumentou para 15,4% em 2001.
A redução das exportações também diminuiu o nível das reservas cambiais
uruguaias, obrigando o país a recorrer aos empréstimos do FMI. Para evitar a fuga de
capitais, o governo uruguaio adotou o “corralito”, que, tal como na Argentina,
bloqueou os depósitos bancários da população e desencadeou uma onda de protestos
populares e de saques a supermercados. Hoje, no Uruguai, uma em cada 4 famílias
tem pelo menos um membro que abandonou o país.
Essa ocorrência de crises econômicas semelhantes em todos os países que
adotaram políticas recomendadas pelo FMI, demonstra o fracasso do receituário
neoliberal: as privatizações, a abertura comercial e financeira apenas trouxeram a
recessão, desemprego, fome, miséria e o aumento das dívidas externas dos países,
que agora estão completamente submissos aos ditames do Fundo.
Rússia
A Rússia não acatou as imposições de ajuste estrutural do FMI, decretou
moratória de sua dívida e conseguiu superar uma de suas piores crises. Seus índices
de crescimento econômico são da ordem de 8% ao ano, o que tem garantido melhoria
das condições de vida da população. É interessante ressaltar que a adoção dessas
medidas
não a isolou do comércio internacional nem do mercado de títulos, ao
contrário, seus títulos estão muito bem cotados e o risco-país está baixíssimo, apesar
da moratória...
Outros exemplos de países que se deram muito bem ao desafiarem o receituário
imposto pelo FMI foram China, Malásia e Vietnã. A China, por exemplo, também
alcança níveis de crescimento econômico de 8 a 10% ao ano.
Posição da ONU: Fundamentos Jurídicos Contra Ataques Especulativos Às Moedas
Nacionais Dos Países Endividados
A UNCTAD se pronunciou, em setembro de 1998, pelo direito dos países de
declararem uma moratória do pagamento de suas dívidas externas: “O país atacado
poderia então decidir por uma moratória do serviço de sua dívida, a fim de dissuadir
aos predadores e dispor de um balão de oxigênio que lhe permita implementar um
plano de reestruturação de sua dívida.... O artigo VIII dos Estatutos do FMI poderia
fornecer a base jurídica necessária à declaração de uma moratória do serviço da
dívida.... A decisão de impor uma moratória poderia ser tomada unilateralmente pelo
país sujeito a um ataque contra sua moeda.”
Os ataques que sofremos atualmente se revestem de manipulações
cambiais e “risco-país”.
Risco-país
Um dos trabalhos que o grupo de estudos da “Auditoria Cidadã” está se dedicando é o
cálculo do ônus representado pelas taxas de risco impostas ao Brasil ao longo dos
anos, conforme o gráfico abaixo.
Entendemos que, se o risco atribuído pelas “agências internacionais” não se efetivou, e
que temos sido os melhores e mais generosos remuneradores de capital do planeta, o
que pagamos a título de risco, ao longo das últimas décadas, foi INDEVIDO e essas
parcelas devem ser consideradas como pagamento antecipado do principal, abatendo o
valor da dívida ou até sendo devolvidas.
Por outro lado, há que se questionar o poder dessas agências internacionais de
risco, bem como as regras para tais “cálculos”. A maior potência econômica do mundo
é também o país mais endividado e seu risco é considerado ZERO. Mesmo depois de
sofrer violento ataque terrorista e após repetidos anúncios de fraudes contábeis nos
balanços das maiores corporações norte-americanas, VERDADEIROS ESCÂNDALOS
ECONÔMICOS E FINANCEIROS, que causaram enormes prejuízos, o risco-USA continua
zero! Há muita inconsistência nesse parâmetro do risco-país, que tanto tem nos
prejudicado. A posição em que classificam o Brasil é ridícula, se comparada à nossa
condição de excelente pagador.
Na verdade, nossa maior vulnerabilidade está exatamente nas elevadíssimas
taxas de juros, impostas pelo “mercado”, como declarou nosso presidente viajante,
quando se encontrava na Rússia.
Essa política de vultosas taxas de juros é uma política suicida, imposta pelo FMI, mas
inversa à aplicada pela maior potência mundial, cuja economia, quando em recessão,
cresce em cima de políticas que o governo adota (redução de juros, aumento dos
gastos públicos e investimentos internos), contrárias às políticas que prega através do
FMI.
Os últimos movimentos das agências internacionais de risco, depreciando ainda
mais os títulos brasileiros, diante do crescimento de candidato da esquerda em pesquisas
eleitorais, constituem uma clara e inescrupulosa tentativa de interferência no processo de
escolha democrática, inaceitável sob todos os aspectos. Recentemente, os jornais
publicaram falas do megaespeculador George Soros, que explicitou esta grave ofensa à
soberania política da nação brasileira: “Na Roma antiga, só votavam os romanos. No
capitalismo global moderno só votam os americanos; os brasileiros não votam”.
Trabalhos da Auditoria Cidadã
Para concluir, gostaria de mencionar alguns dos trabalhos desenvolvidos pelo
grupo de estudos da “Auditoria Cidadã”, além dos já mencionados sobre o risco-país,
realização de estudos sobre o “erro” anunciado pelo Bacen e sobre a proposta de
renegociação das dívidas:
-
Resgate de documentos:
Auditoria de 1931 por Osvaldo Aranha, quando foi apurado que apenas 40% dos
contratos encontravam-se documentados, não havia contabilidade regular e nem
controle das remessas ao Exterior. Naquela época, houve uma articulação entre 14
países da América Latina, o que hoje é proibido pelo FMI, que exige que cada país
se apresente sozinho. Precisamos reconstruir essa articulação;
Relatório FHC em 1987
A conclusão de FHC foi categórica:
“A situação que ora vivemos - arrocho salarial direto dos trabalhadores no setor
público e indireto de toda força de trabalho, submissão da política econômica às regras
e
monitoramento
do
FMI,
acomodação
aos
interesses
dos
grandes
bancos
internacionais, etc - não passa de uma encenação da inequívoca demonstração da falta
de governo no País.” (página 159)
Relatório Comissão de 1989 (Severo Gomes e Luiz Salomão)
“Sem qualquer sombra de dúvida, aqui está o ponto mais espantoso dos Acordos.
De notar, aliás, a grosseria dos credores, ou a pusilanimidade dos negociadores
brasileiros,
admitindo
uma
cláusula
que,
sobre
ferir
os
brios
nacionais,
é
fundamentalmente inútil, no contexto da negociação. ... Esta cláusula retrata um Brasil
de joelhos, sem brios poupados, inerme e inerte, imolado à irresponsabilidade dos que
negociaram em seu nome e à cupidez de seus credores... Este fato, de o Brasil
renunciar explicitamente a alegar a sua soberania, faz deste documento talvez o mais
triste da História política do País. Nunca encontrei ... em todos os documentos
históricos do Brasil, nada que se parecesse com esse documento, porque renúncia de
soberania talvez nós tenhamos tido renúncias iguais, mas uma renúncia declarada à
soberania do País é a primeira vez que consta de uma documento, para mim histórico.
Este me parece um dos fatos mais graves, de que somos contemporâneos.” (Senador
Severo Gomes)
-
Análise do Orçamento
JANEIRO A JUNHO DE 2002
GOVERNO FEDERAL
RELATÓRIO RESUMIDO DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA
DEMONSTRATIVO DA EXECUÇÃO DAS DESPESAS POR FUNÇÃO/SUBFUNÇÃO
ORÇAMENTOS FISCAL E DA SEGURIDADE SOCIAL
Orçamento
Previsto
(R$ mil)
(itens selecionados)
(Dotação Anual)
Realizado (R$ mil)
Liquidado
até Junho
(%)
(Valores Liquidados)
Segurança Pública
2.063.035
616.465
29,88
Assistência Social
6.430.810
2.727.952
42,42
Saúde
25.885.811
10.008.936
38,67
Educação
14.246.974
5.164.279
36,25
Cultura
358.681
67.239
18,75
Urbanismo
795.536
951
0,12
Habitação
226.099
0
0
Saneamento
248.984
0
0
Gestão Ambiental
2.786.295
224.209
8,05
Ciência e Tecnologia
2.013.536
519.021
25,78
Agricultura
8.710.736
1.584.687
18,19
Organização Agrária
1.561.023
298.832
19,14
Sub-total
65.327.520
21.212.571
32,47
Serviço da Dívida Interna
83.576.329
39.684.158
47,48
Serviço da Dívida Externa
Serviço da Dívida - Total
27.720.796
7.962.947
28,73
111.297.125
47.647.105
42,81
Fonte: Relatório resumido da execução orçamentária do Governo Federal e
outros demonstrativos, Junho de 2002, pág 10. Disponível no site:
www.fazenda.stn.gov.br
-
Resoluções do Senado Federal
Resoluções que aprovaram empréstimos de endividamento junto ao exterior,
desde o ano de 1946 – Planilha contendo 815 resoluções.
Selecionamos os temas POBREZA/MISÉRIA e ENERGIA ELÉTRICA.
Expedimos 59 ofícios para governadores e presidentes dos Tribunais de Contas dos
Estados envolvidos com os empréstimos selecionados.
Oficiamos também as companhias de energia elétrica e o que perguntávamos
nesses ofícios era:
1.
Se o empréstimo mencionado na resolução do Senado se efetivou;
2.
Solicitamos a disponibilização de cópia do contrato de empréstimo externo;
3.
Detalhamento completo sobre os projetos nos quais foram empregados os
recursos, informando nomes dos beneficiários, bem como o montante destinado a
cada caso, de forma a tornar transparente e clara a aplicação dos recursos
externos que motivaram o empréstimo;
4.
Se foram atingidos os objetivos dos referidos projetos/ Em que fase os mesmos
se encontram.
Recebemos 16 respostas:
I. O Presidente do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul, Sr. Hélio Saul
Mileski, nos informou que “a operação de crédito está resguardada pelo sigilo bancário,
na forma da Lei 4.595/64”
II. A Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE – informou que “as
operações financeiras mencionadas nas Resoluções do Senado Federal não foram
efetivadas por esta Companhia”.
III. O Tribunal de Contas de Roraima nos informou que é o Tribunal de Contas
da União o órgão competente para controle e acompanhamento das contratações de
operações de crédito, uma vez que é a República Federativa do Brasil que exerce o
papel de garantidor/avalista nos referidos contratos.
IV. O Presidente do Tribunal de Contas do Mato Grosso do Sul nos informou que
“nada foi encontrado naquele Tribunal do Contas que tratasse do assunto em questão”.
V. O Presidente do Tribunal de Contas de Pernambuco informou que “esta Corte
de Contas não dispõe das informações solicitadas naquele expediente”.
Os demais ofícios encaminhados não mereceram resposta, até o momento. Na
nossa avaliação, as respostas recebidas constituem uma boa amostra da necessidade
de se auditar essa dívida.
-
Processo de conscientização: Elaboração de materiais didáticos (cartilhas e
panfletos) e palestras em escolas, entidades, eventos diversos.
Conclusão
A nossa dívida é absurda, ilegítima e ilegal.
Foi montada como uma forma de dominação, espoliação e mutilação constante.
Não tem correspondência com a melhoria das condições de vida da população ou com
os investimentos feitos no país.
Se compararmos o que já foi pago, não compreendemos como ainda devemos
tanto, por isso defendemos uma auditoria completa desse processo que tem levado o
país ao mais dramático quadro de injustiças sociais.
Evolução da Dívida Externa – Valores em US$ bilhões
ANO
DÍVIDA EXTERNA
TOTAL
PAGAMENTOS
EFETUADOS
Juros
Amortizações
1988
113,511
9,832
17,087
1989
115,506
9,633
14,549
1990
123,439
9,748
8,826
1991
123,910
8,621
7,827
1992
135,949
7,253
8,572
1993
145,726
8,280
9,978
1994
148,295
6,338
50,411
1995
159,256
8,158
11,023
1996
179,935
9,840
14,271
1997
199,998
10,391
28,701
1998
243,163
11,948
33,587
1999
241,056
15,168
51,905
115,210
256,737
SOMA
Fonte: Conjuntura Econômica, fev e jun 2000 (pág XXVI e XXVII)
e Banco Central
A FOME, que atinge 1/3 da população brasileira, é sintoma de falta de ÉTICA. O
progresso tecnológico alcançado pela humanidade não está sendo competente o
bastante para resolver o problema da fome e da miséria do mundo: 19 mil crianças
morrem, por dia, no mundo, devido ao custo financeiro da dívida.
Não se pode falar em ÉTICA enquanto seres humanos são excluídos da
possibilidade de vida digna. Nada mudará se continuar prevalecendo a ganância e a
corrupção.
Postura ÉTICA é a da AUDITORIA, da TRANSPARÊNCIA do acesso à VERDADE.
No Brasil, os direitos humanos têm sido historicamente desrespeitados. Isso
decorre da falta de ÉTICA desse modelo perverso que se baseia na competição e no
lucro e só busca a satisfação do mercado e não das necessidades humanas. Ao
CAPITAL tudo, ao SOCIAL, nada.
Precisamos
romper
com
esse
processo
continuado
de
espoliação
URGENTEMENTE.
Somos um país potencialmente rico – em todos os sentidos. Nossas riquezas
humanas, culturais, naturais e econômicas são incompatíveis com esse quadro de
degradação social que estamos assistindo. Precisamos trabalhar para que esse
potencial se concretize, em favor do povo brasileiro, de forma que todos usufruam das
riquezas e tenham vida digna.
Convoco todos aqueles que amam este País a abraçarem essa luta pela auditoria.
O que está em jogo é a nossa verdadeira independência, até hoje não
conquistada, pois somos prisioneiros e reféns dessa dívida que nos massacra. Além dessa
grave ofensa à nossa soberania, os recursos sangrados pela dívida estão fazendo muita
falta no combate à miséria e à violência assustadora... estão impedindo os investimentos
necessários em saúde, educação, segurança, reforma agrária, geração de empregos;
estão atingindo a dignidade do nosso povo...
Abrir essa caixa preta será um ato de respeito para com os que estão morrendo ou
se encontram condenados à marginalidade social em função dessa dívida.
Precisamos colocar a satisfação das necessidades sociais no posto de comando, em
substituição à “lógica da morte” que domina a ação do capital. E quem pode colocar em
prática as medidas necessárias para atingir os objetivos prioritários da humanidade? As
instituições financeiras? Os organismos multilaterais? O G7? As multinacionais? Será que
são confiáveis?... Acredito que essa tarefa é nossa, dos movimentos sociais que lutam na
base da sociedade.
Para concluir, fico com as palavras do mestre Albert Jacquard:
A tarefa mais urgente não é a de submeter os despossuídos ao apetite dos abastados,
como fazem atualmente o Banco Mundial e o FMI, mas a de preservar de modo
duradouro as garantias sociais ou ecológicas obtidas, freqüentemente ao preço de
duras lutas, por alguns. Depois, a de estender estas garantias a todos os habitantes da
Terra.
Albert Jacquard, 1996