Confissões de abuso sexual
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Confissões de abuso sexual
Centro Universitário São José de Itaperuna Curso de Graduação em Psicologia MONIQUE RIGHETI THURLER VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR CONTRA CRIANÇAS E ADOLECENTES Itaperuna/RJ Dezembro/2012 1 MONIQUE RIGHETI THURLER VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR CONTRA CRIANÇAS E ADOLECENTES Artigo apresentado à Banca Examinadora do Curso de do Centro Universitário São José de Itaperuna como requisito final para a obtenção do título de Psicólogo. Orientadora: MS. Sandra Maria Valadão Castelo. Itaperuna/RJ Dezembro/2012 2 MONIQUE RIGHETI THURLER VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR CONTRA CRIANÇAS E ADOLECENTES Artigo apresentado à Banca Examinadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna como requisito final para a obtenção do título de Psicólogo. Orientador: MS. Sandra Maria Valadão Castelo. Itaperuna-RJ, 07 de dezembro de 2012. Banca Examinadora: _____________________________ Prof. Ms. Sandra Maria Valadão UNIFSJ – Itaperuna-RJ _____________________________________ Prof. Esp. Carlos Eduardo Corrêa de Oliveira UNIFSJ – Itaperuna-RJ _____________________________ Prof. Esp. Fátima Aguiar Faria Ximenes 3 UNIFSJ – Itaperuna-RJ VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR CONTRA CRIANÇAS E ADOLECENTES Monique Righeti Thurler* ¹ Sandra Maria Valadão* ² Resumo: Este artigo tem como tema Violência Sexual Intrafamiliar contra Crianças e Adolescentes, que ocorre em toda sociedade e classes sociais. Esse é um assunto muito preocupante, pois envolve crianças e adolescentes sendo vítimas de pessoas da própria família ou até mesmo próximas da família, das quais se tem uma relação afetiva e de dependência, e, muitas vezes, este fato fica oculto por essas razões. Desta forma se torna necessário identificar as condições as quais propiciam tais situações abusivas, identificar os comportamentos de risco e as consequências físicas e psicológicas que a vítima de abuso sexual pode ter. O tema e a abordagem sobre o abuso sexual contra crianças e adolescentes ainda é recente no serviço público e envolve tabus importantes. Iniciativas do governo federal, suportadas pelo ECA e pela Constituição Federal, têm assegurado novas investidas no combate e denúncia do abuso sexual contra crianças e adolescentes; contudo, ainda são evidentes os serviços desarticulados nas instituições. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu as plenas garantias do Estado de Direito, definindo ser dever não só do Estado, mas também da família e de toda a sociedade colocar a salvo de qualquer tratamento desumano, humilhante ou degradante as crianças e os adolescentes, os legítimos representantes da sociedade no futuro. Com estes conhecimentos podemos então prevenir e fazer valer os direitos das crianças e adolescentes. Tendo como abordagens a Violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes, fatores ambientais e interpessoais que favorecem o abuso de crianças e adolescentes, tipos de violências que ocorre nas vítimas e atuação do psicólogo em crianças que sofreram abuso. Palavras-chave: Violência, abuso, crianças, adolescentes e família. INTRODUÇÃO No presente trabalho, abordar-se-á a violência sexual intrafamiliar contra crianças e adolescentes. Trata-se de atos violentos que acontecem dentro dos lares, onde o prejuízo individual, familiar e social é catastrófico, chegando a alguns casos, ao homicídio. __________________________________________________________________________ ¹ Graduanda do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna (UNIFSJ), Itaperuna/RJ. E-mail: [email protected]² Professora, Orientadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna (UNIFSJ), Itaperuna/RJ. E-mail: [email protected] 4 A violência intrafamiliar tem sido foco de constantes matérias na mídia e de estudo de pesquisadores de áreas diversas, principalmente, por essa violência vir de pessoas que deveriam dar proteção, amor, carinho e educação. Importante ressaltar que questões relacionadas à violência contra crianças e adolescentes ocorrem não só no Brasil como em outros países, apesar de existirem inúmeros mecanismos legais de proteção aos direitos humanos. Trata-se de uma forma de violência que não obedece a fronteiras, princípios ou leis, transformandose num dos mais graves problemas a ser enfrentados pela sociedade atualmente. A violência sexual intrafamiliar ocorre em todas as classes sociais e, na maioria das vezes, parte de alguém que a criança conhece, confia e ama. Assim, a escolha desse tema se justifica por buscar enfatizar os mecanismos de garantia e defesa dos direitos da criança e ressaltar a necessidade de se assegurar maior proteção a ela quando verificada a violência sexual, principalmente em seu próprio lar, de modo a priorizar o bem-estar físico e psicológico da vítima. A violência sexual contra crianças e adolescentes é um fenômeno complexo e de difícil enfrentamento, apesar deste fato ter ganhado certa visibilidade nos últimos tempos a sua compreensão ainda precisa ganhar muito espaço. A violência cometida contra crianças e adolescentes em suas variadas formas faz parte de um contexto histórico-social maior de violência em nossa sociedade. Essa forma de violência contra crianças e adolescentes se configura na mais difícil de ser detectada e conseqüentemente combatida, pois na maioria das vezes se dá dentro de casa, por parentes próximos ou vizinhos e amigos mais chegados da família e um dado mais assustador é que a maioria desses abusadores nem sempre são padrastos como se pensava, em uma pesquisa da ABRAPIA ficaram comprovados que os principais abusadores são os pais biológicos. É muito comum, portanto, crianças serem abusadas e outros membros da família como mãe e irmãos mais velhos protegerem o abusador com medo de represálias, a mãe a maioria das vezes protege o marido por não ter como sustentar a casa caso o marido vá embora. Romper com os aspectos que silenciam e encobrem as situações de abuso sexual é uma das questões cruciais do enfrentamento da violência sexual contra criança e adolescentes. Denunciar é o primeiro e decisivo passo, sem qual nada pode ser feito. A denúncia e a notificação permitem a elucidação de um crime e a responsabilização de seu autor, bem como a proteção e defesa das pessoas envolvidas na situação, principalmente a criança vítima. Isso implica pessoas 5 dispostas a correr riscos e a contribuir para o desmonte desses pactos de silêncio que alimentam a impunidade e criam um círculo vicioso explorando a vítima, e, continuar a ser abusada por tempo indefinido. O tema e a abordagem sobre o abuso sexual contra crianças e adolescentes ainda é recente no serviço público e envolve tabus importantes. Iniciativas do governo federal, suportadas pelo ECA e pela Constituição Federal, têm assegurado novas investidas no combate e denúncia do abuso sexual contra crianças e adolescentes; contudo, ainda são evidentes os serviços desarticulados nas instituições. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu as plenas garantias do Estado de Direito, definindo ser dever não só do Estado, mas também da família e de toda a sociedade colocar a salvo de qualquer tratamento desumano, humilhante ou degradante as crianças e os adolescentes, os legítimos representantes da sociedade no futuro. 1 VIOLENCIA INTRAFAMILIAR CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE A violência intrafamiliar constitui, hoje, uma das grandes preocupações das políticas públicas, devido ao crescente número de denúncias quanto a esse tipo de prática, reprovada moralmente, quando não considerada delito, contra a criança. A relação entre indivíduos é regulamentada pelos códigos éticos e jurídicos e existem direitos e deveres, normas e princípios morais considerados fundamentais para tal prática, inclusive no âmbito familiar, como a tutela da dignidade e/ou vulnerabilidade da pessoa humana. Por violência intrafamiliar entende-se que toda ação ou omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o pleno desenvolvimento de um membro da família. Pode ser cometida dentro e fora de casa, por qualquer integrante da família que esteja em relação de poder com a pessoa agredida. Inclui também as pessoas que estão exercendo a função de pai ou mãe, mesmo sem laços de sangue. (OLIVEIRA, 2008). A violência contra crianças e adolescentes ocorre em todos os países, atinge todas as raças e todas as classes sociais. Contudo, a violência intrafamiliar, como as demais violências, manifesta-se sob formas complexas e possui características que a fazem peculiar. Devido às suas características, a violência intrafamiliar é multifacetada e polifórmica, surgindo na sociedade por meio de ações que se interligam, interagem e se fortalecem possuindo como expressão concreta, os 6 diferentes meios e métodos de coerção e dominação utilizados com a finalidade de conquistar, reter poder ou obter privilégios. A violência intrafamiliar se difere da violência doméstica por incluir como sujeitos ativos outros membros do grupo, sem função parental, que convivam no espaço doméstico, por exemplo: empregados, pessoas que convivem esporadicamente, agregados. Essas manifestações de violência estão intimamente ligadas a fatores psicológicos, socioeconômicos, culturais e características patológicas do pai, da mãe e do filho. Umas das principais características a ser ressaltada é a posição de vantagem ocupada pelo agressor, seja porque tem mais idade, seja porque ocupa uma posição de autoridade. Nessa posição de poder, aproveita-se da vulnerabilidade maior da pessoa indefesa, a criança. Trata-se de um assunto muito complexo, por atingir diferentes classes sociais, e, em sua maioria, a violência é praticada por pessoas conhecidas em seu meio como familiares, amigos, vizinhos, professores etc., alguém que a criança conhece, confia e ama. A Constituição Federal de 1988 previu expressamente uma gama de direitos e respectivos deveres em relação às crianças e adolescentes, ressaltados abaixo: Art. 227. È dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Vê-se, pois, que a preocupação com a integridade da criança e do adolescente é uma questão fundamental, devendo a família, o Estado e a sociedade se integrarem para o bem estar físico, moral e intelectual deste segmento social. A Constituição Federal de 1988 no seu Artigo 226, afirma ser a família, a base da sociedade, tem especial proteção do Estado. No parágrafo 4º salienta ainda que se entende também como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. A nova Constituição assegura ainda igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres na sociedade conjugal consagram o divórcio e anuncia a criação de mecanismos para impedir a violência no âmbito familiar. A família, enquanto uma das instituições responsáveis pela criança e adolescentes, cabe o exercício de direito cumprindo sua função constitucional. 7 Paradoxalmente, tem-se constatado por meio de dados estatísticos que, em grande maioria, os casos denunciados ocorrem dentro da própria casa do agredido, tendo como agressores, na maior parte das vezes, pais biológicos ou adotivos, comprovando que o ambiente familiar é, em muitos casos, perigoso e não proporciona proteção para a criança. Houve ainda a necessidade da regulamentação de um texto mais abrangente acerca da situação da criança e do adolescente, quando, em 1990, foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente, trazendo normas de efetiva proteção integral e moral da Criança e do Adolescente, como se verifica em seu art. 5º: Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. (BRASIL, Lei Federal nº. 8069 de 13 de julho de 1990). Ciente dessa realidade, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 98, considerou que as mediadas de proteção deveriam ser aplicadas sempre que houvesse violação dos direitos estabelecidos no próprio Estatuto, por ação ou omissão da sociedade ou do Estado ou, ainda, por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis. Essas medidas projetivas foram elencadas no art.101 do ECA que assim traz: Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I- encaminhamento aos pais ou responsável mediante termo de responsabilidade; II- orientação, apoio e acompanhamento temporários; III- matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV- inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; V- requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI- inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII- acolhimento institucional; VIII- inclusão de acolhimento familiar; IX – colocação em família substituta. Contrariando o que prevê o mencionado artigo, a violência intrafamiliar no contexto doméstico está relacionada às pessoas ligadas por parentesco consanguíneo ou por afinidade que, em determinado contexto, sofrem ou cometem algum tipo de violência. Essas agressões, em geral descontroladas, são consideradas como medida de educar e disciplinar, própria do poder dos pais. No 8 entanto com frequência, tais medidas educativas ultrapassam o razoável e tornamse atos violentos de abuso do poder parental. Muitos dos crimes investigados ocorrem na própria casa da criança, em seu meio social e familiar, o que na maioria das vezes deixam de existir estatisticamente, porque o agressor e a própria vitima se calam perante as autoridades policiais e judiciárias. Notadamente tem-se observado que, na maioria das vezes, a vítima busca ajuda ou mesmo relata a agressão à pessoa de sua confiança, quando esta já fora cometida há tempos, o que na verdade resulta em impunidade ao agressor, ou mesmo, pelo descrédito da própria vítima, haja vista o tempo entre a agressão e a confissão da vítima. O abuso sexual de crianças e adolescentes configuram-se como gratificação sexual de um adulto ou adolescente mais velho, baseado numa relação de poder. Uma característica importante do abuso sexual é a falta de consentimento da criança na relação com o adulto, faltando a ela, muitas vezes, a capacidade emocional ou cognitiva para permitir ou julgar o que está acontecendo. O abuso sexual é o caso de um indivíduo ser submetido por outro para obter gratificação sexual, envolvendo o emprego, uso, persuasão, indução, coerção ou qualquer experiência sexual que interfira na saúde do indivíduo, incluindo componentes físicos, verbais e emocionais. O abuso sexual contra criança e adolescente é uma construção histórica, social, cultural e pode manifestar-se através da violência física, sexual, psicológica, abandono, negligência, podendo atingir indistintamente qualquer classe social, faixa etária e ambos os sexos e se apresenta nas formas descritas a seguir. 2 FATORES AMBIENTAIS E INTERPESSOAIS QUE FAVORECEM AO ABUSO SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES 2.1 Abandono O abandono constitui uma violência contra criança e adolescente e é uma prática que se processa ao longo do tempo em nossa sociedade, das mais diferentes formas e nos diversos contextos históricos, por meio da entrega dos filhos para que fossem cuidados por outras pessoas, outra família, entre outros. 9 Geralmente, as situações de efetivo abandono são o ponto de culminância de uma seqüência de abandonos familiares, que vão dos aspectos mais objetivos ligados a questões financeiras e a outros mais subjetivos, também relacionadas aos vínculos afetivos. O abandono e a negligência são de longe a forma mais comum de abuso de crianças representando mais de 60% do total dos casos de maus tratos à criança. Alguns fatores que contribuem com o número de crianças abandonadas são: o baixo rendimento salarial e o desemprego. Outro agravante do número de abandonos está na gravidez precoce, dentre outros. (AMETISTA; VENEZIANO, Deby; BRAGA, Miguel, set. 2012). Caracteriza-se como abandono a ausência do responsável pela criança ou adolescente. Considera-se abandono parcial a ausência temporária dos pais expondo-a a situações de risco. Entende-se por abandono total o afastamento do grupo familiar, ficando as crianças sem habitação, desamparadas, expostas a várias formas de perigo. Constata-se, pois, que o abandono de crianças e adolescentes está vinculado a importantes fatores socioeconômicos, mas a referida atitude não justifica a falta de responsabilidade de seus pais, os responsáveis pela integridade física e moral de seus filhos. 2.2 Negligencia Maria Amélia Azevedo e Viviane Guerra definem: Negligência intrafamiliar pode ser considerada como omissão de pais e responsáveis em prover as necessidades físicas e emocionais de uma criança ou adolescente. Pode ser percebida através de faltas constantes às aulas, de roupas rasgadas e sujas, de falta de higiene, entre outros sinais. (AZEVEDO; GUERRA, 2012, p.184). A negligência consiste em uma omissão em termos de prover as necessidades físicas e emocionais da criança ou adolescente. Configura-se quando os pais (ou responsáveis) falham em termos de alimentar, de vestir adequadamente seus filhos, de prover educação e supervisão adequadas, e quando tal falha não é o resultado das condições de vida além do seu controle. A negligência pode se apresentar como moderada ou severa. Nas residências em que os pais negligenciam severamente os filhos, observa-se, de modo geral, que os alimentos nunca são providenciados, não há rotinas na habitação e para as 10 crianças, não há roupas limpas, o ambiente físico é muito sujo, com lixo espalhado por todos os lados, as crianças são muitas vezes deixadas sós por diversos dias. É registrado, entre esses pais, um consumo elevado de drogas, de álcool, uma presença significativa de desordens severas de personalidade. Recentemente, o termo vem sendo ampliado para incorporar a chamada supervisão perigosa. Abandono e negligência são fatores facilitadores do abuso sexual de crianças e adolescentes que se justifica pela falta de responsabilidade de seus pais, ou responsáveis pela vida de seus filhos. Que ambos necessitam de suas presenças, dos cuidados que lhes faltam, do afeto, entre outros. Considerando também que o desenvolvimento cognitivo, físico, emocional da criança e do adolescente que sofreram abuso, depende dos cuidados e estímulos que recebem no ambiente em que vivem, que na maioria das vezes são pouco estimuladores. Crises familiares, desagregação familiar, são fatores que favorecem a ocorrência do abuso sexual. Geralmente negligencia e abandono são freqüentes em famílias de baixa renda, por não ter com quem deixar seus filhos em casa, os pais saem para trabalhar e na maioria das vezes não voltam. 3 FORMAS DE VIOLÊNCIA 3.1 Violência Física Caracterizada por qualquer ação ou omissão que coloque em risco ou cause dano à integridade física de uma pessoa. É a mais freqüente. Como a vítima é indefesa e está em desenvolvimento, o caráter disciplinador da conduta exercida pelo progenitor ou por quem o substitua é um aspecto bastante relevante, variando de uma “palmada”, a espancamentos e homicídios. Não há um consenso quanto aos métodos que se consideram violentos no processo educacional entre pais e filhos, embora mais recentemente, a tendência mundial é considerar violência qualquer modalidade ou ato disciplinar que atinja o corpo da criança ou adolescente. Em alguns países, a palmada é proibida por lei. Segundo estatísticas, a mãe é a maior agressora nestes casos, embora os pais, em números absolutos, prevaleçam. 3.2 Violência Sexual 11 O Dicionário Aurélio define violência como “Qualidade de violento; Ato violento; Ato de violentar”. (FERREIRA, A. B. H. 2008, p. 56). A violência sexual, é a prática de atos de libidinagem com o uso de violência física ou psíquica (coação, ameaça etc) a fim de que possa concretizá-los sem intenção de auferir vantagem material. Com base nestas definições, a categoria “abuso” diluiria o peso das questões relativas às práticas violentas, que seriam de aniquilamento do outro enquanto sujeito social. A violência sexual é toda a ação na qual uma pessoa em relação de poder e por meio de força física, psicológica, coerção ou intimidação psicológica, obriga outra pessoa ao ato sexual contra a sua vontade, ou que a exponha em interações sexuais que propiciem sua vitimização, na qual o agressor venha obter gratificação. Pode ocorrer em uma variedade de situações como estupro, abuso sexual infantil, abuso incestuoso, apresentando-se sob formas de carícias indesejadas, penetrações forçadas com pênis ou objetos, masturbação forçada (pai, mãe, entre outros). Quando o abuso sexual é praticado por membros da família nuclear (pai, mãe, padrasto, madrasta, irmãos), ou membros da família extensa (avós, tios (as), primos (as), ou outros), configura-se o abuso sexual intrafamiliar. (MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Políticas de Saúde. 2005, p. 15). 3.3 Violência Psicológica O abuso físico, em suas diversas manifestações, pode estar entrelaçado ao abuso sexual, psicológico, abandono, negligência, entre outras, e envolve diversos agentes. Crianças e adolescentes são os que mais sofrem violência física. O abuso psicológico também designado como “tortura psicológica”, ocorre quando o adulto constantemente deprecia a criança, bloqueia seus esforços de autoaceitação, causando-lhe grande sofrimento mental. Ameaças de abandono também podem tornar uma criança medrosa e ansiosa, representando formas de sofrimento psicológico. Pode se manifestar de várias formas: a) Isolamento emocional; b) Dificuldades de fala ou linguagem; c) Ausência de contato olho-a-olho; d) Medo (real ou aparente) da vítima em relação ao agressor. O abuso psicológico normalmente está associado às demais configurações da violência e assume diversas expressões, não necessariamente acompanhadas da violência física. Pode ocorrer através de intimidações, isto é, de diferentes tipos de jogos de palavras que ferem, de ameaças, de manipulações, de chantagens de ordem emocional e mesmo material, configurando uma violência simbólica e que poderá se transformar em abuso físico. 12 A violência psicológica, na maioria das vezes, pode ser caracterizada pelos agressores como formas de rejeição, desprezo, menosprezo, desdém, depreciação, restrição, diminuição, cerceamento, discriminação, humilhação, desrespeito, cobrança ou punição exagerada da criança ou adolescente para atender necessidades estabelecidas objetiva ou subjetivamente pelo adulto. O autor Marcelo Neumann ressalta que “Entende-se por abuso psicológico o conjunto de atitudes, palavras e ações dirigidas para envergonhar, censurar e pressionar a criança de forma permanente”. “Ameaças, humilhações, gritos, injúrias, privações de amor, rejeição, etc”. (CRAMI - Campinas). A violência psicológica é a mais difícil de ser identificada, é uma forma de agressão decorrente de palavras, gestos, olhares dirigidos a vítima, ameaças, humilhações, chantagem, cobranças de comportamento (em casa, na rua ou em qualquer lugar), discriminação, exploração, não deixando a criança ou adolescente sair de casa, provocando o isolamento de amigos e familiares, sem necessariamente ocorrer o contato físico, influenciando assim as vítimas. Já o abuso sexual é um ato de agressão corporal, na qual a criança ou adolescentes passam por uma situação ou ação, onde são obrigadas a realização das práticas sexuais. No abuso sexual geralmente a violência psicológica é efetivada, pois crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual são marcadas psicologicamente por seus agressores, com ameaças, humilhações, exploração, terror gerando grande sofrimento à vítima. 4 CONSEQUÊNCIAS DOS ABUSOS SEXUAIS NAS VÍTIMAS As consequências da violência, do abuso sexual na saúde das crianças e adolescentes podem ser classificadas em eixos. O primeiro eixo seria as consequências traumáticas (o físico da vítima), as emocionais e as afetivas. O segundo seria as consequências com relação ao tempo decorrido entre a exposição à violência e o aparecimento do agravo. Neste sentido, as consequências podem ser imediatas, mediatas ou de longo prazo. As imediatas são mais fáceis de serem identificadas, já que tendem a deixar marcas visíveis, principalmente na pele ou no sistema ósteo-articular. Geralmente a mediana e longo prazo, as consequências emocionais são também de identificação 13 difícil. A gama de resultados do abuso emocional, físico e sexual continuados é vasta. Autores relatam distúrbios psicossomáticos gastrointestinais crônicos e remitentes, ou dores abdominais inespecíficas; repercussões psicoemocionais, como a ansiedade ou a depressão; dificuldade de relacionamento e comportamento manifestada por agressividade, timidez, isolamento social progressivo e distúrbios do sono e do apetite; ou ainda, problemas na esfera de atividades, como por exemplo, o baixo desempenho social e intelectual. (Kashani et al., 1992; Hendricks-Matthews,1993; Straus & Gelles, 1995; Gelles, 1997). (Reichenheim M. E, Hasselman M. H, Moraes C. L, 1999, p. 113). Essas consequências não trazem danos somente para as vítimas do abuso e da violência, traz também para a família, ou seja, os responsáveis por essas crianças e adolescentes. Como já foi dito, danos físicos que deixam marcas, lesões por dentro e por fora do corpo da vítima, e os danos emocionais que são marcas ainda maiores que possam existir na vida das crianças a adolescentes. Essas marcas, lesões, jamais serão apagadas, esquecidas, elas nunca serão as mesmas. Sempre terá a lembrança do momento do acontecido. Depois de crescidas, essas vítimas podem seguir dois caminhos, o caminho do bem, em que elas podem levar esse fato como um lado positivo para sua vida, onde ajudarão outras vítimas. E o caminho do mal, onde poderão fazer essa violência com outras crianças e adolescentes, se tornar um abusador. Existem essas duas hipóteses. Independentemente da forma de apresentação da violência, quer física, psicológica, sexual ou por negligência, um expressivo número de autores aponta que as principais consequências dos maus-tratos na infância ocorrem no desenvolvimento infantil nas esferas física, social, comportamental, emocional e cognitiva (Kashani et al., 1992; Straus & Gelles, 1995; Gelles, 1997). (Reichenheim M. E, Hasselman M. H, Moraes C. L, 1999, p. 112). As pesquisas relacionadas sobre abuso sexual de crianças e adolescentes, sugerem que a intensidade do problema depende de vários fatores, tais como o desenvolvimento psicológico e a capacidade intelectual da criança; o vínculo afetivo entre o abusador e a vítima; a representação do abuso para a criança e a duração do mesmo; a natureza da agressão; ou ainda, as medidas em curso para a prevenção de abusos futuros. 14 5 A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO Quanto ao papel do psicólogo, constata-se a necessidade de um olhar mais amplo, que contemple, além das demandas particulares de cada sujeito (tratamento do abusador e do abusado), um envolvimento maior com o social, pois não se pode descolar a violência do contexto social em que ela está inserida. Os Psicólogos que optam em trabalhar com questões jurídicas acabam, muitas vezes, formando uma pele de proteção que os torna rígidos, deslocando mais para questões que dizem respeito a leis fixas, deixando de lado o olhar singular às questões trazidas por cada sujeito. Talvez pelo fato de que trabalhar com violência sexual intrafamiliar é trabalhar com frustrações constantes, com situações que remetem a sentimentos diversos e confusos em alguns momentos, onde o profissional que não está preparado acaba deixando-se levar por atravessamentos pessoais que o impedem de ter uma visão clara da situação apresentada. Um novo olhar se faz necessário no entendimento desta prática, onde somente os testes psicológicos e as leis jurídicas não podem dar conta da imensidão existente na configuração familiar, uma vez que esta traz situações e sentimentos que não podem ser mensurados unicamente pelo objetivo, isto é, pela mensuração e aplicação de normas. Para isto, parcerias devem ser efetivadas e fortalecidas. Os profissionais devem estar mais flexíveis, dispostos a traçar novos percursos, criar novas alternativas que possam contemplar as demandas trazidas de forma mais saudável possível. A violência sexual intrafamiliar deve ser tratada e também punida. O papel do psicólogo não é mais o de técnico que só atua do ponto de vista do conhecimento específico, principalmente dos testes. O papel do psicólogo agora é a atenção na proteção integral, e ele deve considerar a criança e o adolescente sujeitos de sua história, sujeitos de direitos, protagonistas; tem que atuar em rede, interdisciplinarmente. (Conselho Federal de Psicologia, 2003). “Tal profissional precisa de clareza sobre os cuidados éticos envolvidos a da obrigatoriedade de notificação em casos de abuso, de forma a compreender que a confidencialidade do cliente é limitada.” (Williams, L. C. A, 2009, p. 37). Os profissionais fazem, em sua maioria, atendimento psicoterápico individual, aconselhamento, psicoterapia em grupo, trabalho educativo-informativo, escuta, oficinas e visitas domiciliares. 15 CONSIDERAÇÕES FINAIS Após a pesquisa sobre o abuso sexual intrafamiliar contra crianças e adolescentes, é possível reconhecer que a preocupação com os direitos da criança e do adolescente tem aumentado consideravelmente. Trata-se de uma violência devastadora para a criança, por se tratar de um ser indefeso, inocente, que está sendo usado para o prazer sexual de um adulto, o que evidentemente traz consequências muito sérias para a vítima. Observa-se, dessa forma, que a norma visa cercar crianças e adolescentes de proteção, a fim de evitar ou amedrontar os abusadores de crianças, buscando garantir às mesmas uma condição de vida digna, apesar de ser o Brasil, um país que ainda vem sofrendo desgaste com esta forma de violência. O tema e a abordagem sobre o abuso sexual contra crianças e adolescentes ainda é recente no serviço público e envolve tabus importantes. Iniciativas do governo federal, suportadas pelo ECA e pela Constituição Federal, têm assegurado novas investidas no combate e denúncia do abuso sexual contra crianças e adolescentes; contudo, ainda são evidentes os serviços desarticulados nas instituições. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu as plenas garantias do Estado de Direito, definindo ser dever não só do Estado, mas também da família e de toda a sociedade colocar a salvo de qualquer tratamento desumano, humilhante ou degradante as crianças e os adolescentes, os legítimos representantes da sociedade no futuro. Com estes conhecimentos podemos então prevenir e fazer valer os direitos das crianças e adolescentes. Violência Sexual Intrafamiliar contra Crianças e Adolescentes, que ocorre em toda sociedade e classes sociais. Esse é um assunto muito preocupante, pois envolve crianças e adolescentes sendo vítimas de pessoas da própria família ou até mesmo próximas da família, das quais se tem uma relação afetiva e de dependência, e, muitas vezes, este fato fica oculto por essas razões. Desta forma se torna necessário identificar as condições as quais propiciam tais situações abusivas, identificar os comportamentos de risco e as consequências físicas e psicológicas que a vítima de abuso sexual pode ter. 16 REFERENCIAS AMETISTA; VENEZIANO, Deby; BRAGA, Miguel. Abandono e Negligência. Disponível em: http://www.myspace.com. Acesso em: 25 set. 2012. AZEVEDO, Maria Amélia; GUERRA, Viviane. Abuso Infantil. Disponível em: http://pt.wikipédia.org. Acesso em: 25 set. 2012. BRASIL, Constituição Federal de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 16 de mai. de 2012. _____, Lei Federal nº. 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Publicada no Diário Oficial da União em 13 jul. 1990, Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em:16 de mai. de 2012. CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. (2003). Relatório do II Seminário Nacional de Psicologia e Políticas Públicas. Políticas Públicas, Psicologia e Protagonismo Social. João Pessoa: Conselho Federal de Psicologia. FERREIRA, A. B. H. Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª ed. Curitiba: Positivo, 2008, p. 56. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Políticas de Saúde. Violência intrafamiliar: orientações para prática em serviço. Brasília: MS, 2005, p. 15. NEUMANN, Marcelo Moreira. O que é violência doméstica contra criança e o adolescente. CRAMI – Campinas, SP, 2000, p. 3. Disponível em: http://www.cedeca.org.br. Acesso em: 25 set.. 2012. OLIVEIRA S. Débora, PSICOLOGIA JURÍDICA: A violência familiar e o papel do Psicólogo Jurídico. Disponível em: http://violenciaintrafamiliarfmp.blogspot.com/2007. Acesso em: 16 de mai. de 2012. REICHENHEIM, Michael E, HASSELMANN, Maria Helena, MORAES Claudia Leite. Ciência Saúde Coletiva, 1999. Disponível em: http://www.scielo.br. Acesso em: 07 nov. 2012. REICHENHEIM, M. E, HASSELMAN, M. H, Moraes C. L, Kashani et al., 1992; Straus & Gelles, 1995; Gelles, 1997. Consequências da violência familiar na saúde da criança e do adolescente: contribuições para a elaboração de propostas de ação 1999. Disponível em: http://www.scielo.br. Acesso em: 07 nov. 2012. WILLIAMS, L. C. A, Prevenção do Abuso Sexual Infantil: um enfoque interdisciplinar. 1ª ed. Curitiba 2009, p. 37.)
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