Infinite Jest
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Infinite Jest
4 Variedades |Literatura| QUARTA-FEIRA, 23/01/2013 | DIÁRIO CATARINENSE O infinito de Wallace Na ilha de si mesmo BRUNO RINALDI E THIAGO MOMM* D DIVULGAÇÃO Intrincado e inédito em português, romance Infinite Jest, de David Foster Wallace, está sendo traduzido por professor curitibano Domínio da língua e fluxo de consciência marcam prosa do autor THIAGO MOMM “Este honesto tabelião era um dos homens mais perspicazes do século. Está morto: podemos elogiá-lo à vontade”, ironizou Machado de Assis no conto O Empréstimo. Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio que Longe de Tudo. Editora Companhia das Letras. Esgotado. Infinite Jest Editora Little Brown (EUA). Disponível em www.livrariacultura.com.br. R$ 51,30. Breves Entrevistas com Homens Hediondos Editora Companhia das Letras. R$ 62. M ais uma vez, aí está. Vai-se o homem, chegam os elogios. O norteamericano David Foster Wallace (1962-2008) foi um dos escritores mais perspicazes das últimas décadas. Suicidou-se em 2008, após tomar o antidepressivo Nardil por 20 anos, e teve suas cinzas jogadas na ilha chilena de Masafuera pelo amigo e também escritor Jonathan Franzen. Agora, lembrou Franzen em artigo na revista New Yorker,“um establishment literário que nunca pré-selecionou um dos seus livros para um prêmio nacional o declara um tesouro perdido do país”. Após o artigo, em 2011, um romance póstumo de Wallace, The Pale King (o rei pálido), foi finalista do Pulitzer e vencedor de outro prêmio, o Salon Book. Em 2012, uma biografia sobre o escritor veio à tona: Every Love Story Is a Ghost Story: A Life of David Foster Wallace (toda história de amor é uma história de fantasmas), de D.T. Max. Também em 2012 foi lançada a compilação de ensaios Both Flesh and Not (tanto com carne quanto não, em tradução livre). Em português, Wallace também ganha força. Após lançar Breves Entrevistas com Homens Hediondos, com 23 contos, em 2005, a Companhia das Letras publicou no ano passado Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio que Longe, com ensaios, e em breve colocará nas prateleiras Infinite Jest, o maior romance de Wallace. O livro consta, inclusive, em lista da revista Time como um dos 100 melhores em inglês publicados de 1923 até hoje. O lançamento deve ocorrer no final deste ano. A tradução é do curitibano Caetano W. Galindo, professor de Linguística da UFPR. Inifinite Jest é considerado um livro extremamente complexo de ser vertido para outras línguas, mas Galindo tem as credenciais certas: já traduziu Thomas Pynchon, a quem Wallace é comparado, e Ulisses, de James Joyce, quase um tabu entre tradutores. Leia, ao lado, entrevista com o professor. CALVÍCIE Dr. Carlos Uebel Rua Vitor Hugo, 78 - Porto Alegre/RS Fone: (51) 3330.1177 eprimido e um tanto grafomaníaco, David Foster Wallace era “um prisioneiro de vida inteira na ilha de si mesmo”, segundo Jonathan Franzen. Com essa personalidade, tinha uma rara capacidade para registrar fluxos de consciência. Isso fica evidente em Infinite Jest, que tem como temas principais o vício e a depressão, a satisfação e a felicidade. São sentimentos aos quais o leitor é conduzido durante a narrativa deste tijolo de 1104 páginas e 1,26 kg. Uma das descrições mais próximas da experiência de ler Infinite Jest é a de que a voz de Wallace é a voz que ouvimos dentro da nossa própria cabeça. Da cabeça pós-moderna, com diferentes pensamentos que se quebram, se interrompem e se cruzam. Essa é uma das principais razões de o autor insistir em generosas notas de rodapé, que tornam não linear a própria experiência de ler o livro. O domínio de Foster Wallace da língua é muito mencionado, mas nem sempre devidamente apreendido. Cada seção de Infinite Jest adota a linguagem do personagem principal naquela parte da história. Assim, em poucas páginas Wallace faz com que o leitor não só adote aquele jeito de comunicar mas também entenda aquele jeito de pensar. Para ler Infinite Jest, portanto, é preciso um amplo domínio de inglês. Os contos de Breves Entrevistas com Homens Hediondos também exploram o fluxo de consciência. Os personagens são autocentrados, inseguros, ansiosos. É o caso da casada paranoica sobre seu desempenho sexual. Suas dúvidas chegam ao leitor em uma torrente caótica e real de ideias. E quando um homem justifica para a namorada seu padrão de abandonar as mulheres depois de conquistá-las, desenrola-se um monólogo ora fluido, ora truncado, com dispersões e repetições, como só um escritor com dominío de sobra de uma língua é capaz. *Bruno Rinaldi, jornalista e designer formado pela Universidade de Oregon (EUA); Thiago Momm, jornalista formado pela UFSC ENTREVISTA Caetano W. Galindo Tradutor e professor de Linguística da UFPR Traduzindo uma prosa estranha Agência Gazeta do Povo ISADORA RUPP Infinite Jest foi lançado em 1996 e, até agora, permanece inédito no Brasil. Como aconteceu de você encarar essa tradução? Caetano W. Galindo – Esse é mais um fruto de uma parceria com o editor André Conti. A gente se conheceu em 2008, e imediatamente percebemos várias afinidades. Foi ele que montou e “vendeu” o projeto Ulisses. E a ideia de fazer Infinite Jest era algo com que a gente brincava desde a nossa primeira conversa “em pessoa”. Eu queria fazer a tradução desde que li o livro. Diretor - Cremers 5379 Técnica microcirúrgica de referência mundial, desenvolvida e publicada pelo autor. Para visualizar uma simulação em 3D, acesse o site: www.uebel.com.br 5 Essa é considerada a obra-prima de David Foster Wallace. Você concorda? Galindo – É difícil. Os americanos, às vezes, têm dito que a ensaística dele terá uma influência mais duradoura que a ficção. E agora saiu no Brasil um volume (Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio Que Longe de Tudo), traduzido por Daniel Galera e Daniel Pelizzari, com alguns ensaios dele. Vale a pena. Eu, pessoalmente, tendo a achar que Oblivion, seu último livro de contos, é mais “irretocável”. Mas a questão é que Infinite Jest, pelo tamanho, pretensão e virtuosismo da prosa, simplesmente ganha a competição na base da força bruta. É um livro imenso, com uma dose gigantesca de genialidade. Foster Wallace é considerado um autor difícil... Galindo – Ele não é mole. O mero assalto contra o leitor que representa um romance de mais de mil páginas, com centenas de complexas notas de rodapé, já aponta para um descomprometimento com qualquer facilitação. Ele lida com ideias difíceis e, às vezes, antipáticas. Tem uma fertilidade e uma velocidade que geram textos grandes, polimorfos, varia- dos, abundantes. Uma aluna minha contou mais de 50 personagens em um único conto de Oblivion. Ele usa uma linguagem extremamente rica, que vai do mais baixo e “feio” ao mais elevado e arcaico. O problema é que é como uma caminhada por uma trilha difícil de montanha. É tudo tão lindo pelo caminho que a dificuldade vira detalhe. Quais são os elementos da escrita de Wallace que dificultam a tradução? Galindo – Aquela prosa estranha. Um certo onivorismo. O vocabulário dele é imenso e vem dos cantos mais bisonhos do dicionário e da história do inglês. Mas, acima de tudo, é difícil achar o tom certo. Ele mistura oralidade, espontaneidade e artificialidade. Escreve uma prosa elaboradíssima que, lida em voz alta, parece a coisa mais natural do mundo. Ele usa uma voz para soar como a voz da cabeça de cada um de nós. A prosa dele é linda sendo feia. Destino Terapia Abaixo, Bruno Rinaldi traduz um trecho de Infinite Jest que pode ser considerado fácil, se comparado a tantas outras passagens do livro ainda sem versão em português. Abaixo, trecho de A Pessoa Deprimida, conto incluído na coletânea Breves Entrevistas com Homens Hediondos, publicado pela Companhia das Letras Almost nothing important that ever happens to you happens because you engineer it. Destiny has no beeper; destiny always leans trenchcoated out of an alley with some sort of ‘psst’ that you usually can’t even hear because you’re in such a rush to or from something important you’ve tried to engineer. Quase nada de importante que acontece com você acontece porque você assim planejou. O destino não tem alarme, o destino sempre aparece de um beco com um sobretudo e um ‘psst’ que você nem consegue ouvir porque está apressado indo ou vindo de alguma coisa importante que você tentou planejar. Só como exemplo, a pessoa deprimida revelou interurbanamente, havia descoberto na terapia e lutado para elaborar sua sensação de que era irônico e degradante, dada a doentia preocupação de seus pais com dinheiro e tudo que essa preocupação lhe custara em criança, que ela agora, adulta, tivesse de pagar noventa dólares por hora a uma terapeuta para ela ouvi-la e pacientemente reagir com honestidade e comiseração; i.e., era degradante e patético sentir-se forçada a comprar paciência e comiseração. 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