Redução metalotérmica
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Redução metalotérmica
ENG06632-Metalurgia Extrativa dos Metais Não-Ferrosos II-A Nestor Cezar Heck - DEMET / UFRGS 21 7 REDUÇÃO METALOTÉRMICA 7.1 INTRODUÇÃO É o tratamento químico de redução de uma substância mineral pelo emprego de um metal como agente redutor para a produção de um outro metal de interesse. Uma reação que descreve o processo genericamente pode ser a seguinte: MeX + Me' = Me + Me'X, onde Me' é o metal (agente) redutor e X pode ser: oxigênio, cloro ou flúor – a substância mineral é, portanto, um óxido ou um haleto e pode ser natural ou o produto de um outro processo. Uma característica marcante desta operação é o fato do produto Me'X 1 não se apresentar no estado físico gasoso – estado em que ele é normalmente encontrado em algumas reações de redução química (compare, por exemplo, com a redução carbotérmica sob fusão). Isto complica o processo de separação física das fases após a redução, significa um volume perdido no reator e introduz o perigo potencial de perda do metal de valor pela sua dissolução neste produto. A presença do produto Me'X nem sempre significa um problema: às vezes ele encontra emprego como matéria-prima na indústria cerâmica ou de abrasivos. De uma maneira geral, tendo em vista as observações acima, para a redução metalotérmica, a carga do reator é idealmente uma mistura de compostos ‘pré-purificados’, colocados em íntimo contato – ao invés de ser uma massa de matéria-prima contendo associada a ela uma certa quantia de ganga, que é separada do metal durante o processo de extração. Nesse processo temos, no caso mais geral, reagentes no estado sólido e, por isso, uma boa mistura e compactação mecânica da carga pode ser essencial para que a reação tenha sucesso. Normalmente, a redução metalotérmica é empregada quando o metal a ser extraído apresenta uma forte tendência de formar carbonetos pela operação de redução carbotérmica (ela se apresenta como uma alternativa ao processo de redução eletrolítica em sais fundidos). A maior aplicação dessa técnica está justamente na produção de ferro-ligas – ou ligas-mãe – de baixo teor de carbono de alguns metais como: Ti, Nb, V, Cr. As matérias-primas minerais pertencem, neste caso, à classe dos óxidos; já na produção desses e de outros metais como, por exemplo, Be, Ta, Hf e Zr sob uma forma ‘pura’, usualmente a matéria-prima é quimicamente um haleto. Si, Al, Mg e, ocasionalmente, Ca, Na e K são empregados como agentes redutores; a operação leva, respectivamente, o nome de silicotermia, aluminotermia, calciotermia, etc., – genéricamente, de metalotermia. Normalmente se emprega um excesso de agente redutor na operação, daí pode ser necessário um tratamento final dos produtos com métodos adequados para recuperá-lo para a sua reutilização no processo. A redução metalotérmica normalmente é exotérmica. Quanto maior for a afinidade do agente redutor pelo oxigênio, tanto mais exotérmica será a reação. Isso faz com que algumas delas cheguem a se completar praticamente somente com uma ignição inicial. Quando o ponto de fusão do metal produzido é elevado, ele se apresenta sob a forma de um aglomerado ‘poroso’ sólido, trazendo entranhado em si os outros componentes. A separação física dos produtos e mesmo do excesso de agente redutor pode ser difícil e 1 O produto Me'X é, muitas vezes, fisicamente comparável a uma escória; esta é, contudo, a única semelhança entre eles, pois a escória tem basicamente origem na ganga – não se constituindo, portanto, do produto de nenhuma reação de redução. ENG06632-Metalurgia Extrativa dos Metais Não-Ferrosos II-A Nestor Cezar Heck - DEMET / UFRGS 22 depende de técnicas auxiliares, que fazem uso da existência de propriedades favoráveis em algum deles, tais como: boa solubilidade em água e pressão de vapor elevada. Os reatores usados na redução metalotérmica são geralmente especiais e quase sempre operam em batelada. Alguns – do tipo vaso de pressão, autoclave ou retorta (‘bomba’) – são selados, enquanto que outros, ao contrário, são totalmente abertos, se constituindo apenas de um cilindro na vertical recoberto internamente de material refratário. Na fabricação das ferroligas normalmente se usa o forno elétrico de redução. 7.2 TERMODINÂMICA DA REDUÇÃO METALOTÉRMICA É interessante observar que, na redução metalotérmica dos óxidos metálicos, não existe praticamente muita variação no valor de ∆G° ao serem comparadas diferentes temperaturas de reação. Isso se deve ao fato das linhas da variação da energia livre padrão de formação dos óxidos em função da temperatura serem praticamente paralelas (excetuando-se os casos em que o metal ou o óxido possuem pontos de fusão ou ebulição muito baixos). Assim, o valor prático do ∆G° da reação de redução é muito semelhante a aquele do ∆H° e, portanto, a reação que ocorre porque ∆G° é negativo – reação espontânea – também é exotérmica! Por outro lado, em alguns casos, o óxido do metal a ser produzido é mais estável do que os óxidos dos agentes redutores comuns. A redução metalotérmica da magnésia pelo silício é um exemplo clássico deste caso; a reação estequiométrica pode ser escrita como: 2 MgO(s) + Si(s) = 2 Mg(g) + SiO2(s). À 1200°C, o ∆G° da reação é +272kJ! Mesmo assim, pela utilização de condições termodinâmicas favoráveis (pressões e atividades adequadas para que ∆G seja menor do que zero) torna-se possível a produção comercial deste metal. Para as reações exotérmicas, o calor da reação pode ser computado a partir de uma reação genérica que, para o caso da ‘aluminotermia’, por mol de alumínio, é a seguinte: (3/2y) MexOy + Al = (3x/2y) Me + (1/2) Al2O3, O valor de ∆Ho para essa equação, expressa em termos da variação de entalpia de formação dos óxidos [energia/mol], é: ∆H° = 1/2 ∆H° [Al2O3] - (3/2y) ∆H° [MexOy]; e a soma das massa moleculares dos produtos, Mp [massa/mol], é dada por: Mp = (1/2) Al2O3 + (3x/2y) Me. O quociente ∆H°/Mp fornece informações valiosas a respeito do andamento da reação metalotérmica (veja a Tabela 1). Tabela 1: Efeitos do calor das reações metalotérmicas. Efeito ∆H°/Mp [cal/g] >1.100 Reação violenta, podendo até ser explosiva! 550 - 1.100 A reação ocorre de maneira controlada, sem a necessidade de calor externo. <550 O calor da reação é insuficiente para o aquecimento dos produtos até a fusão. Para se controlar uma reação muito violenta adiciona-se componentes inertes (por exemplo, Al2O3, etc.), que absorvem calor ao se aquecer, ou ativos (CaCO3, etc.), que ‘consomem’ calor ao se decompor e aquecer os produtos da sua decomposição. No caso contrário, para se ativar uma reação muito moderada, adiciona-se óxidos ‘superiores’ do metal de valor, ou de outro metal – desde que isto não contamine o produto –, ou então funde-se previamente os reagentes em fornos separados, antes de se juntá-los no reator. ENG06632-Metalurgia Extrativa dos Metais Não-Ferrosos II-A Nestor Cezar Heck - DEMET / UFRGS 23 Um simples balanço de calor permite verificar antecipadamente qual é a temperatura adiabática da reação que, em teoria, pode ser alcançada no processo e, portanto, qual será a sua posição em relação aos pontos de fusão das outras substâncias envolvidas: por exemplo, se está suficientemente acima do ponto de fusão do metal a ser obtido. Para o caso do alumínio, sem levar em conta as perdas térmicas (adiabaticamente), o balanço é o seguinte: ∆H° + (3x/2y)·{H Tm - H298}Me+ (1/2) ·{ H Tm - H298}Al2O3 = 0 , onde as expressões entre chaves se referem aos incrementos de entalpia. Como no caso da redução carbotérmica, também se deve averiguar a possibilidade do metal formar ligas ou compostos intermetálicos com o agente redutor; em um caso extremo isso pode inviabilizar a sua obtenção. Os fatores que influenciam o grau de contaminação do metal de valor – para o caso da formação de uma liga – podem ser estudados a partir da expressão de equilíbrio da reação genérica da metalotermia: K = (aMe · aMe'X) / (aMeX · aMe'). Por outro lado, K = exp (-∆G° / RT). Igualando-se as duas expressões e, rearranjando-se alguns termos, obtemos: exp (-∆G° / RT) = (aMe / aMe') · (aMe'X / aMeX); a razão aMe / aMe' exprime o grau de pureza do metal de valor. Fig.7.1 Relação entre o valor de K, constante de equilíbrio e o grau de pureza do metal de valor, Me; agente redutor: Me' Relacionando-se os elementos desta expressão em um gráfico (veja a Figura 7.1), pode se fazer alguns comentários importantes a respeito da pureza de um metal obtido a partir de um óxido por meio da redução metalotérmica. A contaminação é mínima quando o valor do quociente na ordenada é grande, ou seja, (i) quando o grau de pureza do óxido do metal de ENG06632-Metalurgia Extrativa dos Metais Não-Ferrosos II-A Nestor Cezar Heck - DEMET / UFRGS 24 valor é elevado e (ii) quando a atividade do Me'X na ‘escória’2 é pequena. Pela mesma razão se pode verificar que (iii) uma temperatura baixa (porém, com o real perigo de inviabilizar a separação dos produtos e perturbar a cinética da reação!) e (iv) um valor de ∆G° tão mais ‘negativo’ quanto possível (limitado, porém, pela disponibilidade de agentes redutores – já que ∆G° é praticamente insensível à temperatura) também são fatores que aumentam o grau de pureza do metal obtido. Um equilíbrio, ao final, se estabelece – como não poderia deixar de ser, pois as reações metalotérmicas são iguais às outras – onde parte do agente redutor permanece nãoreagido no produto metálico, e algo da matéria-prima resta na fase ‘escória’. 2 Entenda-se por escória, aqui, a solução de Me'X com algum outro composto como, por exemplo, CaO, formando uma única fase líquida.
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