crda - centro de referência em distúrbios de aprendizagem cláudia
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1 CRDA - CENTRO DE REFERÊNCIA EM DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO ESPECIAL CLÁUDIA BARLETTA SALVADOR REFLEXÕES SOBRE A INCLUSÃO SÃO PAULO 2009 2 CRDA - CENTRO DE REFERÊNCIA EM DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO ESPECIAL CLÁUDIA BARLETTA SALVADOR REFLEXÕES SOBRE A INCLUSÃO Monografia apresentada como parte dos requisitos para aprovação no Curso de Especialização Lato Sensu em Educação Especial e submetida ao Centro de Referência em Distúrbios de Aprendizagem – CRDA, sob orientação da Profª. Ms. Fabiana Maria Gomes Lamas 3 A meu marido e meu filho, pais, irmãos e amigos pelo apoio recebido durante a elaboração deste trabalho e todo o curso. 4 ÍNDICE INTRODUÇÃO.................................................................................................. 8 CAPÍTULO 1 1 INCLUSÃO.................................................................................................... 10 1.1 Inclusão no contexto educacional.............................................................. 10 1.2 Escolas Inclusivas..................................................................................... 15 1.3 Para incluir é preciso recriar o modelo educativo..................................... 17 1.3.1 A importância da Gestão Escolar........................................................... 22 1.4 A formação e atuação do professor.......................................................... 26 1.6 Família/Escola Inclusiva............................................................................ 29 CAPÍTULO 2 2 DESENVOLVIMENTO INFANTIL/NECESSIDADES ESPECIAIS .............. 31 2.1 Períodos do desenvolvimento.................................................................. 33 2.2 Desenvolvimento emocional...................................................................... 37 2.3 As Emoções e as Interações humanas..................................................... 38 2.4 Interação social......................................................................................... 39 2.5 A importância da afetividade no desenvolvimento e na Inclusão........... 40 CAPÍTULO 3 3 INCLUSÃO E LEGISLAÇÃO ATUAL........................................................... 43 3.1 Questão legal............................................................................................ 44 CONCLUSÃO................................................................................................. 58 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................... 60 5 RESUMO O presente trabalho é uma reflexão acerca da Inclusão, tema de muitos debates, tanto no contexto social como no contexto escolar, e de como os estímulos fornecidos pelo educador em conjunto com a família e as leis existentes podem ampliar o conhecimento e auxiliar os alunos que dela se beneficiam. A busca pelos direitos sociais iguais vem destacando a importância da educação escolar das pessoas com necessidades especiais na rede regular de ensino, por considerar que somente dessa forma as pessoas poderão desenvolver-se plenamente como seres humanos que são e assim viverem plenamente como sujeitos sociais. A inclusão é uma proposta, um ideal. Se quisermos que nossa sociedade seja acessível e que todas as pessoas possam dela participar com igualdade de oportunidades, é preciso fazer desse ideal uma realidade a cada dia. Palavras-chave: inclusão, afetividade, educação, sociedade. 6 ABSTRACT This work is a reflection of the inclusion, the subject of much debate in both the social context and the school context, and how the incentives provided by the educator with the family and existing laws may increase the knowledge and assist students who her benefit. The quest for equal social rights has been emphasizing the importance of education for people with special needs in the regular education system, considering that the only way people can develop themselves fully as human beings who are living fully and well as social subjects. Inclusion is a proposal, an ideal. If we want our society to be accessible and that all people can participate with it opportunities, we must make that ideal a reality every day. Keywords: inclusion, affection, education, society. 7 “Ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação.” Paulo Freire 8 INTRODUÇÃO Para a realização deste trabalho, utilizamos pesquisa bibliográfica, leituras e conhecimentos adquiridos. A partir disso, registramos nas páginas que seguem os fundamentos deste Trabalho de Conclusão de Curso. Coletamos a visão de vários autores como: Mantoan e Pietro (2003, 2005), Aranha (1994), Piaget (1978), Pacheco (2007), Mittler (2003), entre outros, que de forma semelhante, orientam em sua bibliografia pais e educadores para lidar com o desenvolvimento infantil e mais especificamente com crianças inclusivas. A escolha da bibliografia, e o critério de pesquisa que utilizamos possibilitou-nos abranger uma parte do problema em suas mais variadas dimensões. Esta pesquisa não baseou-se em critérios numéricos para garantir a sua representatividade, mas sim, na qualidade dos autores pesquisados. Atualmente, a inclusão é tema de muitos debates tanto no contexto social como no escolar. A idéia que se tem de inclusão é a de fazer parte, inserir-se numa totalidade. Neste sentido, a inclusão na perspectiva educacional significa que as escolas devem possibilitar o acesso de todas as crianças aos meios regulares de ensino sem que haja barreiras de participação dos alunos no processo de ensino e aprendizagem. É nesse sentido que, quando se fala em inclusão, é importante deixar claro que ela não se refere somente a alunos com necessidades educacionais especiais, mas também a todas as crianças, independentemente de cor, raça, religião, condição física. Contudo, para que as escolas desempenhem realmente este papel, há de se reconhecer que é necessária uma série de medidas que ofereçam essas oportunidades, tendo em vista que a escola sempre esteve acostumada a trabalhar o ensino de forma homogênea. Entendemos ainda que, a partir da relação afetiva, qualquer manifestação comportamental pode ser “aperfeiçoada e modificada” se existir uma troca significativa entre as pessoas envolvidas. A postura emocional e afetiva melhora a qualidade de vida das crianças com dificuldades de aprendizagem, a partir do 9 comprometimento e envolvimento constantes para integrar essas crianças ao meio social. Numa visão mais política educacional, o professor Paulo Freire propõe a postura do educador como alicerce fundamental para as relações educador e aluno, partindo do pressuposto que deve existir uma troca constante que servirá como meio para driblar as dificuldades específicas de cada um. 10 CAPÍTULO I INCLUSÃO 1.1 Inclusão no contexto educacional Conceito É dentro do contexto da educação geral que devem estar presente os princípios e as propostas que definem a “Política de Educação Especial Brasileira”. A expressão necessidades educacionais especiais pode ser utilizada para referir-se a crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua elevada capacidade ou de suas dificuldades para aprender. Tornou-se bastante conhecida no meio acadêmico, no sistema escolar, nos discursos oficiais e mesmo no senso comum. Surgiu na intenção de atenuar ou neutralizar a acepção negativa da terminologia adotada para distinguir os indivíduos em suas singularidades por apresentarem limitações. A palavra inclusão vem do verbo incluir, que significa, segundo o Dicionário Melhoramentos (1977) – inserir, introduzir, abranger, compreender, fazer parte. Segundo Mantoan, em entrevista a Revista Nova Escola, Inclusão é a nossa capacidade de entender e reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e compartilhar com pessoas diferentes de nós. A educação inclusiva acolhe todas as pessoas, sem exceção. É para o estudante com deficiência física, para os que têm comprometimento mental, para os superdotados, para todas as minorias e para a criança que é discriminada por qualquer outro motivo. (Mantoan, 2005) 11 Mazzotta (1996), define Educação Especial como: A modalidade de ensino que se caracteriza por um conjunto de recursos e serviços especiais organizados para apoiar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns. O termo "inclusão social" tem sido bastante discutido, frente ao conceito utilizado anteriormente, de "integração social”. Porém, há várias maneiras de definir este termo, que introduz um novo paradigma em nossa sociedade e marca uma nova etapa no processo de conquista dos direitos por parte das pessoas com necessidades especiais. Segundo Mantoan e Pietro (2006, p.14) o processo de integração escolar tem sido entendido de diversas maneiras. O uso do vocábulo “integração” referese mais especificamente à inserção de alunos com necessidades especiais nas escolas comuns, mas seu emprego dá-se também para designar alunos agrupados em escolas especiais para pessoas com deficiência, ou mesmo em classes especiais, grupos de lazer ou residências para deficientes. Os movimentos em favor da inclusão de crianças especiais surgiram nos Países Nórdicos, em 1969, quando se questionaram as práticas sociais e escolares de segregação. Sua noção de base é o princípio de normalização, que, não sendo específico da vida escolar, atinge o conjunto de manifestações e atividades humanas e todas as etapas da vida das pessoas, sejam elas afetadas ou não por uma incapacidade, dificuldade ou inadaptação. (MANTOAN e PIETRO, 2006, p.14) Como todo e qualquer cidadão, a pessoa com deficiência tem direito à educação pública e gratuita assegurada por lei, preferencialmente na rede regular de ensino e, se for o caso, à educação adaptada às suas necessidades em escolas especiais, conforme estabelecido nos artigos 58 e seguintes da Lei Federal 9.394, de 20 de dezembro de 1996, art. 24 do Decreto 3.298/99 e art. 2º da Lei 7.853/89. De acordo com os parâmetros curriculares nacionais: “O direito da pessoa à educação é resguardado pela política nacional de educação independentemente de gênero, etnia, idade 12 ou classe social. O acesso à escola extrapola o ato da matrícula e implica apropriação do saber e das oportunidades educacionais oferecidas à totalidade dos alunos com vistas a atingir as finalidades da educação, a despeito da diversidade na população escolar." (PCN, 1999) De acordo com a Lei 9394/96 - Capítulo V - Art. 58 “Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.”. Desse modo, inclusão no campo da Educação Especial, tem a intenção de que todos os alunos sejam incluídos nas escolas regulares e não apenas colocados nas classes comuns. A Inclusão não deve ser vista somente como uma palavra bonita, ou um vocábulo da moda, mas deve sim, ser encarada como mudanças na compreensão do que sejam as diferenças de um modo natural e sem preconceitos de nossa parte. A inclusão se aplica a todas as crianças, sem excluirmos as incapacidades severas. “As escolas regulares, seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios mais capazes para combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias, construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos; além disso, proporcionam uma educação adequada à maioria das crianças e promovem a eficiência, numa ótima relação custo-qualidade, de todo o sistema educativo.” (Declaração de Salamanca, 1994, p.7) Baseados nos dados acima, temos então o dever, de lutarmos contra todo tipo de preconceitos existentes na sociedade em relação ao deficiente e procurarmos fazer com que suas habilidades se sobressaiam em relação às incapacidades. Essas medidas farão surgir a escola verdadeiramente Inclusiva. A questão, entretanto, é que não se deve simplesmente colocar a criança com deficiência em uma classe comum da escola regular, esse é, sem dúvida, um passo importante e na direção certa, mas isso não é Educação Inclusiva. Para que a inclusão ocorra efetivamente, é fundamental que as crianças com dificuldades tenham o apoio de que precisam, isto é, acesso físico, equipamentos para locomoção, comunicação ou outros tipos de suporte. De acordo com os PCNs a prática da Educação Inclusiva pressupõe que o professor, 13 a família e toda a comunidade escolar estejam convencidos de que o objetivo da Educação Inclusiva é garantir que todos os alunos com ou sem deficiência participem ativamente de todas as atividades na escola e na comunidade. (2005, p. 16 e 20)1 (...) Cada aluno é diferente no que se refere ao estilo e ao ritmo da aprendizagem. E essa diferença é respeitada numa classe inclusiva. - Os alunos com deficiência não são problemas. A Escola Inclusiva entende esses alunos como pessoas que apresentam desafios à capacidade dos professores e das escolas para oferecer uma educação para todos, respeitando a necessidade de cada um. - Todos os alunos se beneficiam de um ensino de qualidade e a Escola Inclusiva apresenta respostas adequadas às necessidades dos alunos que apresentam desafios específicos. - É o aluno que produz o resultado educacional, ou seja, a 1 aprendizagem. (2005, p. 16 e 20) Origens Segundo Mazzota (1996), o atendimento escolar especial aos portadores de deficiência no Brasil teve seu início por volta de 1854, quando o Imperador D. Pedro II fundou, no Rio de Janeiro, o Imperial Instituto de Meninos Cegos. Três anos após, em 1857, o Imperador criou o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos. Anos depois, 1890, já no período republicano de nossa história, o primeiro passou a denominar-se Instituto Benjamin Constant – IBC – em homenagem a seu ex-professor de Matemática e ex-diretor, Benjamin Constant Botelho de Magalhães. O segundo somente ao completar seu primeiro centenário, em 1957, é que passou a denominar-se Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES. _______________________ 1 Texto retirado do livro “Educação Inclusiva: o que o professor tem a ver com isso?” Imprensa Oficial e Ashoka Empreendedores Sociais, São Paulo, 2005, p. 16 e 20. 14 Mazzota (1996), ainda coloca que, no começo deste século, alguns trabalhos científicos já eram publicados fazendo referência à educação dos portadores de deficiência mental. Exemplo típico foi à monografia intitulada “Da Educação e Tratamento Médico - Pedagógico dos Idiotas”, apresentada pelo Dr. Carlos Eiras, durante o IV Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia, no Rio de Janeiro, em 1900. Destaca-se, então, que até 1950, havia no país cerca de quarenta estabelecimentos de ensino regular mantidos pelo poder público, que prestavam algum tipo de atendimento escolar especial a deficientes mentais. Já o atendimento especializado a deficientes físicos (não-sensoriais) com propósitos educacionais só foi iniciado na década de 1930, em São Paulo, na Santa Casa de Misericórdia. Uma análise retrospectiva da educação especial no Brasil evidencia que sua trajetória acompanha a evolução da conquista dos direitos humanos. Partindo desse pressuposto, todos os alunos que tenham alguma deficiência, devem ser inseridos na escola regular e tratados como crianças normais, levando-se em consideração o que assegura o Estatuto da Criança e do Adolescente, que consolida antigas normas que a experiência brasileira mostrou serem adequadas para a condição infanto-juvenil, inovando com o estabelecimento de princípios que criam condições para a melhoria do padrão de vida dos brasileiros, lutando sempre pelo exercício de cidadania que lhes é inerente (MAZZOTTA, 1996). Assim durante séculos, os deficientes foram considerados seres distintos e à margem dos grupos sociais. Mas à medida que os direitos do homem à igualdade e à cidadania tornaram-se motivo de preocupação dos pensadores, a história da educação especial começou a mudar. É claro que esta mudança é considerada uma conquista mundial devido aos acordos internacionais que o país mantém com entidades, como por exemplo, a ONU (Organização das Nações Unidas), a OMS (Organização Mundial de Saúde) e a OIT (Organização Internacional do Trabalho). Há cerca de um século, as iniciativas governamentais, no âmbito da educação especial, foram assistemáticas e praticamente inexistentes. Pela falta 15 de atendimento, vários segmentos da sociedade organizaram-se no sentido de criar serviços especializados para os educandos portadores de deficiências. No Brasil, as iniciativas governamentais em Educação Especial surgiram em um Movimento Político tipicamente populista (1955 – 1964). Esse movimento deu origem às associações de pais, amigos, técnicos e professores, interessados em suprir as carências do sistema governamental. A partir de 1981, com o advento do Ano Internacional das Pessoas Portadores de Deficiências declarado pela ONU, houve maior conscientização por parte desse numeroso segmento, que representa cerca de 10% da população brasileira. Surgiram, então, as associações fundadas por pessoas portadoras de deficiência, de condutas típicas e de altas habilidades, com o objetivo de defender e garantir seus direitos (MEC/PNEE, 1997). Tais associações tomaram vulto, representando, até hoje, papel significativo no atendimento educacional especializado. Na maioria dos municípios brasileiros são elas que, em convênio com o Governo, prestam atendimento educacional. Têm igualmente atuação na conscientização da comunidade. Desenvolvem importante trabalho para a remoção das barreiras e preconceitos existentes, contribuindo para o cumprimento da legislação, o redimensionamento do espaço urbano, para as adaptações nos serviços de transporte, a organização do mercado de trabalho, e a melhoria da qualidade do sistema de ensino. Essa atuação tem provocado em última instância, uma mudança de atitude na sociedade brasileira, tornando-a lenta e progressivamente mais receptiva à conquista da cidadania por portadores de deficiências (MEC, 1997). 1.2 Escolas Inclusivas Segundo Mittler (2003), a inclusão não diz respeito a colocar as crianças nas escolas regulares, mas a mudar as escolas para torná-las mais responsivas às necessidades de todas as crianças; diz respeito a ajudar todos os professores a aceitarem a responsabilidade quanto à aprendizagem de todas as crianças nas 16 suas escolas e prepará-los para ensinarem aquelas crianças que estão atual e correntemente excluídas das escolas por qualquer razão. Isto se refere a todas as crianças que não estão beneficiando-se com a escolarização, e não apenas àquelas. (MITTLER, 2003, p. 16) Segundo Mantoan e Pietro (2006, p.15) nos debates atuais sobre inclusão, o ensino escolar brasileiro tem diante de si um desafio de encontrar soluções que respondam a questão do acesso e da permanência dos alunos nas suas instituições educacionais. Algumas escolas públicas e particulares já adotaram ações nesse sentido, ao proporem mudanças na sua organização pedagógica, de modo a reconhecer e valorizar as diferenças, sem discriminar os alunos nem segregá-los. Apesar das resistências, cresce a adesão de redes de ensino, de escolas e de professores, de pais e de instituições dedicados à inclusão de pessoas com deficiência, o que denota o efeito dessa experiência e, ao mesmo tempo, motiva questionamentos. Mantoan e Pietro (2006, p.15) De acordo com as autoras nosso sistema educacional, diante da democratização do ensino, tem vivido muitas dificuldades para equacionar uma relação complexa, que é a de garantir escola de qualidade para todos. E a inclusão ainda torna esse panorama mais confuso, já que o problema escolar brasileiro é dos mais difíceis, diante do número de alunos que precisam ser atendidos, das diferenças regionais, do conservadorismo das escolas, entre outros fatores igualmente importantes. A verdade é que o ensino escolar brasileiro continua aberto a poucos, e essa situação se acentua drasticamente no caso dos alunos com deficiência. O fato é recorrente em qualquer ponto de nosso território, na maior parte de nossas escolas, públicas ou particulares, e em todos os níveis de ensino, mas, sobretudo nas etapas do ensino básico: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. (MANTOAN e PRIETO 2006, p.23) Muito se têm discutido sobre a inclusão, em livros, palestras, artigos, todos buscando a compreensão e o modo mais adequado de transformar as escolas de ensino comum em escolas inclusivas. Mas, de acordo com Mantoan ainda existem muitas barreiras que impedem a transformação de nossas escolas: “O corporativismo dos que se dedicam às pessoas com deficiência e a outras minorias, principalmente dos que tratam de pessoas com deficiência mental; a 17 ignorância de muitos pais, a fragilidade de grande maioria deles diante do fenômeno da deficiência de seus filhos.” 1.3 Para incluir é preciso recriar o modelo educativo “A educação especial, desde o seu surgimento no final do Século XVIII, atende a dois interesses contraditórios: o de oferecer escolaridade a crianças anormais, no mesmo tempo em que serve de instrumento básico para segregação do indivíduo deficiente. (BUENO, 1997, p.38) Segundo Mantoan (2003, p. 33) “não se pode encaixar um projeto novo, como é o caso da inclusão, em uma velha matriz de concepção escolar — daí a necessidade de se recriar o modelo educacional vigente”. Para a autora, escolas que reconhecem e valorizam as diferenças apresentam projetos inclusivos de educação e o ensino que oferecem difere totalmente do proposto para atender às especificidades dos educandos que não conseguem acompanhar seus colegas, por problemas de deficiências até outras dificuldades como a relacional, motivacional ou cultural de seus alunos. Nesse sentido, elas contestam e não adotam o que é tradicionalmente utilizado para dar conta das diferenças nas escolas: as adaptações de currículos, a facilitação das atividades e os programas para reforçar aprendizagens, ou mesmo para acelerá-las, em casos de defasagem idade/série escolar. Superar o sistema tradicional de ensinar é um propósito que temos de efetivar com toda a urgência. Essa superação refere-se ao “que” ensinamos aos nossos alunos e ao “‘como” ensinamos, para que eles cresçam e se desenvolvam, sendo seres éticos, justos, pessoas que terão de reverter uma situação que não conseguimos resolver inteiramente: mudar o mundo e torná-lo mais humano. Recriar esse modelo tem a ver com o que entendemos como qualidade de ensino. (MANTOAN, 2003, p.34) Mantoan acrescenta que ainda vigora a visão conservadora de que as escolas de qualidade são as que ensinam a seus alunos datas, fórmulas, conceitos, fragmentados. Esse tipo de ensino, resulta da supervalorização do conteúdo acadêmico em todos os seus níveis. Persiste a idéia de que as escolas 18 de qualidade são as que centram a aprendizagem no racional, no aspecto cognitivo do desenvolvimento, e que avaliam os alunos, quantificando respostaspadrão. “Seus métodos e suas práticas preconizam a exposição oral, a repetição, a memorização, os treinamentos, o livresco, a negação do valor do erro. São aquelas escolas que estão sempre preparando o aluno para o futuro: seja este a próxima série a ser cursada, o nível de escolaridade posterior ou os exames vestibulares!” Uma escola se distingue por um ensino de qualidade, capaz de formar pessoas nos padrões requeridos por uma sociedade mais evoluída e humanitária, quando consegue: aproximar os alunos entre si; tratar as disciplinas como meios de conhecer melhor o mundo e as pessoas que nos rodeiam; e ter como parceiras as famílias e a comunidade na elaboração e no cumprimento do projeto escolar. (MANTOAN, 2003, p.34) De acordo com a autora, encontra-se um ensino de qualidade quando as ações educativas se baseiam na solidariedade, na colaboração, no compartilhamento do processo educativo com todos os que estão direta ou indiretamente nele envolvidos. Vale o que os alunos são capazes de aprender hoje e o que podemos oferecer-lhes de melhor para que se desenvolvam em um ambiente rico e verdadeiramente estimulador de suas potencialidades. Em suma, diz a autora: “As escolas de qualidade são espaços educativos de construção de personalidades humanas autônomas, críticas, espaços onde crianças e jovens aprendem a ser pessoas. Nesses ambientes educativos, ensinam-se os alunos a valorizar a diferença pela convivência com seus pares, pelo exemplo dos professores, pelo ensino ministrado nas salas de aula, pelo clima sócio-afetivo das relações estabelecidas em toda a comunidade escolar — sem tensões competitivas, mas com espírito solidário, participativo. Escolas assim concebidas não excluem nenhum aluno de suas classes, de seus programas, de suas aulas, das atividades e do convívio escolar mais amplo. São contextos educacionais em que todos os alunos têm possibilidade de aprender, freqüentando uma mesma e única turma.” (MANTOAN, 2003, p.35). Entendemos que a ação pedagógica diferenciada que sugere a autora, implica em mudanças sociais profundas. Contudo, implica mais especificamente, 19 numa mudança de enfoque da aprendizagem, pelo qual o processo é mai relevante do que produto da aprendizagem e em que o aluno é sujeito ativo do seu processo educativo. A inclusão questiona a educação especial, na sua concepção tradicional, enquanto a modalidade de ensino que, no dizer de Ferreira “consagra a deficiência na medida em que se distancia da educação” ao dedicar-se exclusivamente aos alunos com deficiência. (1994, p. 84, 85) Para incluir todos os alunos, incondicionalmente, nas turmas escolares e democratizar a educação, muitas mudanças já estão sendo percebidas em algumas escolas e redes públicas de ensino. Segundo Laplane (2004), a educação moderna define seus objetivos em termos de competências a serem atingidos pelos alunos, então a melhor escola é aquela que oferece um leque variado de competências e habilidades requeridas por um mercado de trabalho cada vez mais exigente cada vez mais competitiva. Para Laplane a escola é uma instituição bastante rígida, que tem dificuldade para receber, aceitar e trabalhar com a diferença, portanto, qualquer criança que se afaste dos padrões exigidos, tanto por um desempenho inferior como por um desempenho superior, deverá enfrentar problemas no seu caminho. Um dos motivos apresentados por Laplane (2004) é a necessidade da escola produzir resultados, ou seja, promover o maior número de alunos possível. Portanto, a convivência entre alunos diferentes (idades, gêneros, níveis de instrução, modos de aprender, que apresentam algum tipo de deficiência ou que são mais curiosos ou ativos que a maioria) dificulta o processo de ensino e contribui para a não realização dos objetivos da escola. Por isso, as escolas ainda hoje são contra a inclusão, pois “essas crianças” com necessidades especiais atrapalham o desenvolvimento e bloqueiam o processo dos demais alunos tidos como normais. É claro que hoje já sabemos que todos temos a ganhar com a inclusão e que a criança aprende e se desenvolve mais quando em contato com a diversidade. Em 1980, as idéias de Vygotsky (1989) já destacavam a importância da linguagem e do outro no desenvolvimento e na aprendizagem, sendo que o professor possuía um lugar fundamental no processo de ensino - aprendizagem. 20 Na teoria prospectiva de Vygotsky (1989), o indivíduo não possui funções internas que garantem sozinhas seu desenvolvimento. O simples contato com objetos por si só não possibilita o desenvolvimento, mas sim as relações sociais, nas intervenções das pessoas, principalmente na linguagem, que o desenvolvimento ocorre. (p.368) Sanfelice (1989) já alertava no texto “Escola pública e gratuita para todos, inclusive para os deficientes mentais” que “não é possível, no princípio de pedagogia formal, tratar igualmente toda a multiplicidade de substantivas diferenças que as distintas clientelas incorporam por razões históricas, culturais, sociais ou mesmo físico – mentais” (p.33). Por isso, devemos estar cientes que dar oportunidades iguais nem sempre significa dispensar o mesmo tratamento. A escola deve ter como objetivo possibilitar o mesmo acesso, o que não significa oferecer os mesmos meios e caminhos a serem percorridos. As escolas devem estar preparadas para receber os alunos com necessidades educacionais especiais, portanto, é comum encontrarmos em nossas escolas, alunos deficientes freqüentando o ensino regular, sem que a escola tenha passado por um processo de adequação de procedimentos didáticos, adaptação de materiais, construção de rampas para deficientes físicos, entre outros requisitos básicos. Para que a inclusão aconteça efetivamente é necessário alterar o direcionamento do currículo e das metodologias e estabelecer apoio efetivo ao professor, sem isso, as escolas não respondem ao compromisso com o desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos com necessidades educativas especiais. O primeiro passo a ser dado em direção a escola inclusiva é sensibilizar e treinar todos funcionários da escola: professores, orientadores e todo o pessoal que nela trabalham. É muito importante também sensibilizar os pais, sobretudo os não - deficientes. Todos, escola e comunidade, devem desempenhar um papel ativo no processo de inclusão, pois o projeto pedagógico para diversidade se constitui em um grande desafio para o sistema educativo como um todo e deve pensar a aprendizagem não apenas na dimensão individual, mas de forma 21 coletiva, manifesta nas formas de interação entre pessoas, escola, família e comunidade. Para Cláudia Werneck (1997), quanto mais à criança interage espontaneamente com situações diferenciadas, mas ela adquire o raro conhecimento e então, fica fácil entender porque a segregação não é prejudicial apenas ao aluno com deficiência. A segregação prejudica a todos, porque impede que as crianças das escolas regulares tenham oportunidades de conhecer a vida humana com todas as suas dimensões e desafios. Para que a escola seja verdadeiramente inclusiva é preciso que ela tenha um bom projeto pedagógico, que deve começar pela reflexão. De acordo com Mantoan (2005), um bom projeto deve valorizar a cultura, a história e as experiências anteriores da turma, segundo ela, as práticas pedagógicas também devem ser revistas. Os alunos, deficientes ou não, precisam de liberdade para aprender do seu modo, de acordo com o seu tempo e suas condições. Além de um bom projeto pedagógico e de adaptações físicas, a escola precisa também oferecer atendimento educacional especializado paralelamente às aulas regulares, de preferência no mesmo local. Para que a inclusão produza bons resultados, é importante para o aluno com deficiência que ele tenha contato com o diferente, mas também é importante que ele tenha contato com seu igual. Por isso, é interessante que em uma sala de aula, ou até mesmo na escola, não tenha apenas um aluno com necessidades especiais, para que a criança considerada “diferente” não se sinta tão sozinha nesse ambiente estranho a ela. Todavia, como diz Bueno, com relação à inclusão de alunos deficientes no ensino regular, não se pode deixar de considerar, Que a perspectiva de inclusão exige, por um lado, modificações profundas nos sistemas de ensino; que estas modificações [...] demandam ousadia, por um lado e prudência por outro; - que uma política efetiva de educação inclusiva deve ser gradativa, contínua, sistemática e planejada, na perspectiva de oferecer às crianças deficientes educação de qualidade; e que a gradatividade e a prudência não podem servir para o adiamento “ad eternum” para a inclusão [...] devem servir de base para a superação de toda e qualquer dificuldade que se interponha à construção de uma escola única e democrática (1997, p. 27). 22 Neste sentido MAZZOTTA (1996, p.75) reforça a idéia que: No contexto da sociedade democrática que pretendemos construir, temos que propugnar por uma educação de qualidade para todos, seja através da “escola democrática”, da “escola para todos”, da “escola compreensiva”, da “escola integradora”, da “escola inclusiva”, ou da “escola de candanga”. O fundamental é compreendermos que sua concretização depende de cada um e de todos nós, já que a inclusão ou não segregação implica essencialmente um sentimento ou atitude de respeito ao outro como cidadão. E tal proposta não comporta qualquer exclusão, sob qualquer pretexto. A educação inclusiva implica no envolvimento da sociedade como um todo, respeitando a individualidade e proporcionando que cada um seja sujeito na construção da aprendizagem, bem como cidadão apto ao exercício da cidadania. Diante destas colocações e da nossa realidade, acreditamos que ainda estamos engatinhando para que a inclusão aconteça de forma efetiva. Por outro lado, a sementinha da inclusão já foi plantada e aos poucos ela está crescendo e se fortificando em nosso meio. 1.3.1 A importância da Gestão Escolar Acredita-se que hoje os gestores devem ser profissionais comprometidos em atender às diversidades dentro de suas singularidades, buscando a formação integral do indivíduo e com a formação do cidadão, apto a exercer cidadania. Cabe aos gestores acompanharem e proporcionarem de perto o desenvolvimento integral dos educandos, buscando promover por um lado às conquistas individuais e coletivas e por outro lado, trabalhar com o conhecimento das diferenças individuais e o respeito por elas por meio de discussões, reflexões, interação com a família, comunidade, corpo docente e os demais no processo educativo. O estudo de organização e de gestão denominado democrático participativo acentua tanto a necessidade de estabelecer objetivos e metas quanto a de prever formas organizativas e procedimentos mais explícitos de gestão e de articulação das relações humanas. A organização torna-se um agrupamento humano formado por interações entre pessoas com cargos diferentes, especialidades distintas e histórias de vidas singulares que, entretanto, 23 compartilham objetivos comuns e decidem, de forma pública, participativa e solidária, os processos e os meios de conquista desses objetivos (LIBÂNEO, 2003, p.382). Por meio desse estilo de gestão, democrático-participativo, a educação pode ser exercida em sua totalidade. Para tanto, os gestores devem mediar as inter-relações e interações para que ocorra um processo de ensino-aprendizagem inclusivo e qualitativo, no qual todos os sujeitos terão voz e vez, ou seja, poderão cumprir os seus deveres e exigir os seus direitos, de forma que estejam sempre atentos a legislação e as políticas públicas vigentes. Segundo Aranha (2004, p.12) a direção de uma escola tem um papel fundamental na condução da prática educacional, tendo por horizonte os princípios, objetivos e metas estabelecidos no projeto político-pedagógico. A ela cabe promover a mobilização dos professores e funcionários e a constituição do grupo enquanto uma equipe que trabalhe cooperativa e eficientemente. A direção de uma escola precisa ser dinâmica, comprometida e motivadora para a participação de todos os atores sociais. Ela necessita saber delegar poderes e estimular a autonomia, valorizando a atuação e a produção de cada um. Ela precisa ser uma figura presente, ponto de referência da personalidade e missão da escola. Precisa, também, ser respeitosa nas relações interpessoais, inclusive nas ocasiões em que tem que promover ajustes no percurso de cada agente. (Aranha, 2004) De acordo com Aranha (1994, p.12), outro papel importante da direção é exercer liderança na comunidade. Trazer as famílias e demais setores da comunidade para dentro da escola, promover, em todos, o sentido da responsabilidade e do cuidado de um bem que é de todos. Contar com a participação da família e da comunidade, fortalece a segurança e faz com que a escola caminhe na direção de cumprir com sua missão e persiga nos seus diferentes objetivos. Para que a educação efetivamente cumpra com seu papel de reflexão crítica sobre a sociedade e de favorecimento do exercício da cidadania, a escola precisa parar para refletir, analisar e planejar. Precisa, também, desenvolver a 24 prática da avaliação contínua e da promoção de ajustes de percurso, sempre tendo como horizonte o projeto político-pedagógico. (ARANHA, 2004, p.13) Para Mantoan, a reorganização das escolas depende de uma seqüência de ações que estão centradas no projeto político-pedagógico. Esse projeto, já nomeado como “plano de curso” entre outros nomes, é uma ferramenta fundamental para que as diretrizes gerais da escola sejam traçadas com realismo e responsabilidade. Os dados do projeto político-pedagógico elucidam o diretor, professores, coordenadores, funcionários e pais sobre a clientela e sobre os recursos, humanos e materiais, de que a escola dispõe. Os currículos, a formação das turmas, as práticas de ensino e a avaliação são aspectos da organização pedagógica das escolas e serão revistos e modificados com base no que for definido pelo projeto político-pedagógico de cada escola. Sem os conhecimentos levantados por esse projeto, é impossível elaborar currículos que reflitam o meio sociocultural do alunado. O ensino individualizado/diferenciado para os alunos que apresentam déficits intelectuais e problemas de aprendizagem é uma solução que não corresponde aos princípios inclusivos, pois não podemos diferenciar um aluno pela sua deficiência. De acordo com Mantoan, na visão inclusiva, o ensino diferenciado continua segregando e discriminando os alunos dentro e fora das salas de aula. A inclusão não prevê a utilização de práticas de ensino escolar específicas para esta ou aquela deficiência ou dificuldade de aprendizagem. Os alunos aprendem nos seus limites e se o ensino for de boa qualidade, o educador levará em conta esses limites e explorará convenientemente as possibilidades de cada um. Não se trata de uma aceitação passiva do desempenho escolar, e sim de agirmos com realismo e coerência e admitirmos que as escolas existam para formar as novas gerações, e não apenas alguns de seus futuros membros, os mais capacitados e privilegiados. Ao serem modificados os rumos da administração escolar, os papéis e a atuação de diretor, coordenadores, supervisores e funcionários perdem o caráter controlador, fiscalizador e burocrático e readquirem teor pedagógico, deixando de 25 existir os motivos pelos quais esses profissionais ficam confinados em seus gabinetes, sem tempo para conhecer e participar mais intensiva e diretamente do que acontece nas salas de aula e nos demais ambientes educativos das escolas. A equipe escolar precisa estabelecer vínculos e relações nos espaços educativos para que o processo seja coletivo e contínuo. Portanto, fica implícito no Projeto Político Pedagógico que a finalidade da educação deve estar voltada para os alunos, neste caso oportunizando a “Educação para Todos”, na qual todos os alunos tenham as mesmas oportunidades de acesso, permanência e sucesso escolar, cabendo aos gestores mediarem todas as discussões em torno da educação inclusiva. Projeto político pedagógico adequado à demanda, bem como o atendimento de apoio especializado, metodologias, técnicas, estratégias, que contemplem tanto o corpo docente (formação continuada) como o corpo discente. Segundo VEIGA (1995, p.14) A principal possibilidade de construção do projeto político pedagógico passa pela relativa autonomia da escola, da sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isso significa resgatara escola como espaço público, lugar de debate, do dialogo, fundado na reflexão coletiva. Portanto, é preciso entender que o projeto político-pedagógico da escola dará indicações necessárias à organização do trabalho pedagógico (...). É pelo Projeto Político Pedagógico que a escola estabelece as relações com a sociedade na busca de parcerias para sanar ou minimizar as dificuldades encontradas no decorrer do processo educativo. A escola é desafiada a todo o momento quando proporciona uma proposta de educação inclusiva, pois é pelas diversidades que se constroem escolas críticas, responsáveis e comprometidas com a formação de cidadãos atuantes reflexivos na sociedade em que vivem. Ressalta-se a importância da construção coletiva do Projeto Político Pedagógico por todos os envolvidos no processo educativo, logo que por meio deste documento são propostos momentos e atividades que devem contemplar os diferentes setores, de maneira que os sujeitos possam participar democrática e reflexivamente, superando as limitações e batalhando por um ensino interativo e qualitativo que resulte em uma aprendizagem e crescimento significativos para todos os envolvidos no processo educativo. 26 Nesta concepção de totalidade cabe os gestores participarem, mediarem, construírem o processo educativo com os demais envolvidos. E, a equipe gestora precisa articular o processo da educação inclusiva, oportunizar a integração entre todos os envolvidos no processo educativo, estabelecer relações e inter-relações entre toda comunidade escolar e contemplar todos os educandos, considerando suas diferenças individuais e ressaltando as suas potencialidades. Todos os setores da escola devem se “comunicar” de maneira que a proposta, a fala e a ação sejam coerentes. É imprescindível que a gestão escolar esteja voltada para o que ocorre no cotidiano escolar (escola, família, comunidade), pois todos os acontecimentos relacionados ao aluno afetam diretamente seu desempenho escolar e suas atitudes/ comportamentos. Se o aluno é aceito na sua totalidade sente-se integrado na escola. 1.4 A formação e atuação do professor O século XXI tem sido um marco para as transformações para a inserção na sociedade, com várias tentativas de mudança. A formação de profissionais da educação tem novas propostas para o aprimoramento da qualidade. Uma delas diz respeito ao atendimento ás necessidades educacionais especiais. Cabe ao professor a responsabilidade de assegurar a todos o direito à educação. O professor é o centro deste processo. De acordo com Mittler (2003, p.35) todo professor tem o direito de receber preparação apropriada na formação e desenvolvimento profissional contínuo durante sua vida de trabalho. Essa formação deve ser repesada envolvendo a ampliação de habilidades para o trabalho inclusivo em seus diversos níveis. Essa formação se torna cada vez mais necessária devido às dificuldades que os professores têm ao lidar com alunos especiais. O professor deverá ser formado para detectar diferenças e necessidades diferenciadas nos alunos, alertando-se para os sinais que apontam tais diferenças. 27 A LDB (1996) , artigo 59, inciso III, estabelece que alunos com necessidades especiais terão professores com especialização adequada, em nível médio e superior, para atendê-los. Essa capacitação está de acordo com a Resolução CNE/CEB nº2, de 11/09/2001, artigo 18, inciso 1º que diz que para os professores serem considerados aptos para atuar em classes comuns, com alunos com necessidades especiais, eles terão que comprovar, em sua formação, conteúdos didáticos e teóricos sobre educação especial. Essa formação possui perfis distintos do ensino comum e determina que os professores desenvolvam competências para que eles sejam capazes de identificar as necessidades especiais e promovam estratégias de flexibilização, adaptação de currículos, procedimentos didáticos, pedagógicos e práticas alternativas de atendimento. A importância não é somente a formação com vistas à inclusão, como também valorizar as estratégias já existentes, adquiridas na formação inicial, para o desenvolvimento na formação continuada. Essa mesma Resolução aponta a possibilidade de oferecimento de formação continuada aos professores que já exercem o magistério, inclusive em nível de especialização. A formação continuada é muito importante no sentido de tornar possível a atualização novas aprendizagens e reflexões. O trabalho com alunos com necessidades educacionais especiais nas classes regulares de ensino, requer uma formação específica para tratar das especificidades de cada tipo de deficiências ou necessidade, para a completa integração nas classes. Para se atingir a prática inclusiva enfrenta-se muitas dificuldades. O mais complicado é a sensibilização de educadores, principalmente professores, capazes de planejar estratégias de capacitação para o atendimento aos alunos com necessidades especiais. A formação de novos professores tem que corresponder às demandas decorrentes das necessidades pessoais dos alunos. Isso requer uma avaliação de quais conhecimentos se devem partir, em detrimento de uma capacitação eficiente. Para tanto tem-se pensado em várias estruturas e lançadas as bases para o desenvolvimento profissional de que o professor precisa para aquisição de habilidades para o ensino inclusivo. 28 Por esse motivo, principalmente, o processo de desenvolvimento profissional requer a formação inicial e a continuada, que assegure a qualificação com as novas descobertas, temas e tecnologias envolvidas com a educação inclusiva. Muito mais que o compromisso de transformação da realidade, a formação de professores, para a inclusão social, tem um papel importante no processo de reforma educacional, complementando a formação como um todo. O acesso de todas as crianças aos meios regulares de ensino tem sido um grande desafio, levando-se em consideração a necessidade de superação da qualidade, a conscientização do pleno exercício da cidadania e democracia. A inclusão surge como uma nova abordagem educacional tornando-se mais eficiente quando se leva em conta as diferenças individuais. Apesar de a educação especial ser um campo que exige um preparo profissional diferenciado, a inclusão requer que todas as crianças sejam atendidas em escolas regulares e que elas sejam aceitas em todas as esferas da sociedade sem negar o suporte paralelo oferecido pela educação especial. Em todo o mundo já existem ações para que a educação inclusiva se torne possível. O magistério, bem como qualquer outra profissão, em sua trajetória histórica, vem sentido a necessidade de se adequar às novas exigências para a formação e atualização do professor na escola. A nova concepção de educador está sendo elaborada de acordo com discussões com temas sociais. Mesmo com algumas medidas de cunho didático, pesquisas em instituições de ordem social e educacional que viabilizem a capacitação do profissional da educação, ainda se revelam atuações insatisfatórias de profissionais da educação. Então o modelo de profissionalismo desejado requer uma fundamentação mais rígida, criteriosa, com maior atenção voltada á pesquisa. A qualificação específica para a educação inclusiva requer um compromisso com a esfera social, que, na maioria das vezes, os profissionais não se sentem preparados. 29 Esse tema implica em intermináveis discussões, onde questões de alta controversa se fazem sentir. Os pontos de problematização que ele insere vão carecer de estudos que serão, sem dúvida, o maior desafio para a Educação. 1.5 Família/Escola Inclusiva O papel dos pais na inclusão de seus filhos é de grande importância. O relacionamento entre os pais com filhos portadores de necessidades especiais, professores e profissionais da escola está entre os mais difíceis e, ao mesmo tempo, duradouros. Quando famílias e profissional interagem com um grande número de variáveis, afeta o estabelecimento e a manutenção de uma interação eficaz entre eles. Os professores se queixam da apatia e indiferença dos pais; falta de tempo, energia e compreensão em relação às necessidades da escola; a falta de compreensão do sistema escolar; a ausência do pai nas reuniões escolares; e o não reconhecimento do trabalho realizado pela escola em benefício de seus filhos. Por sua vez, os pais queixam-se desde os problemas com horários e a duração das reuniões e a falta de transporte até os de comunicação entre a escola e pais (uso de linguagem técnica), sentimentos de inferioridade por parte deles quando interagem com profissionais e incertezas sobre as dificuldades de seu filho e suas conseqüências e sobre como eles e a escola podem se ajudar. Quando esses problemas no relacionamento não são resolvidos, podem criar um muro invisível separando a família e a escola, desta forma, a tendência é colocar a culpa no outro. Hoje em dia tem se percebido que esse muro, aos poucos, vai sendo demolido e as famílias estão cada vez mais participando do processo de tomada de decisão sobre procedimentos e condutas a serem adotadas e sendo informadas sobre o progresso de seu filho. No que se refere ao papel da família nesse processo de inclusão, a Declaração de Salamanca demanda que se: 30 “(...) encorajem e facilitem a participação de pais, comunidade e organizações de pessoas portadoras de deficiências nos processos de planejamento e tomada de decisão concernentes à provisão de serviços para necessidades educacionais especiais” (1994, p.2). Além disso, afirma que “pais possuem o direito inerente de serem consultados sobre forma de educação mais apropriada às necessidades, circunstância e aspirações de suas crianças” e que: “(...) ao mesmo tempo em que escolas inclusivas provêem um ambiente favorável à aquisição de igualdade de oportunidades e participação total, o sucesso delas requer um esforço claro, não somente por parte dos professores e dos profissionais na escola, mas também por parte dos colegas, pais, famílias e voluntários” (Declaração de Salamanca, 1994, p. 5). Afirma também que “pais e voluntários deveriam ser convidados a assumir participação ativa no trabalho da escola” (p. 11) e que: “(...) a realização do objetivo de uma educação bem-sucedida de crianças com necessidades educacionais especiais não constitui tarefa somente dos Ministérios de Educação e das escolas. Ela requer a cooperação das famílias e a mobilização das comunidades e de organizações voluntárias, assim como o apoio do público em geral” (Declaração de Salamanca, 1994). Mais especificamente, aponta para uma parceria com os pais: 1. “A educação de crianças com necessidades educacionais especiais é uma tarefa a ser dividida entre pais e profissionais. Uma atitude positiva da parte dos pais favorece a integração escolar e social...”. 2. Pais constituem parceiros privilegiados no que concerne às necessidades especiais de suas crianças e, desta maneira, eles deveriam, o máximo possível, ter a chance de poder escolher o tipo de provisão educacional que eles desejam para suas crianças. 3. Uma parceria cooperativa e de apoio entre administradores escolares, professores e pais deveria ser desenvolvida e pais deveriam ser considerados enquanto parceiros ativos nos processos de tomada de decisão. 4. Governos deveriam tomar a liderança na promoção de parceria com os pais, por meio tanto de declarações políticas quanto legais no que concerne aos direitos paternos... (Declaração de Salamanca, 1994, p.17). 31 CAPÍTULO II DESENVOLVIMENTO INFANTIL NECESSIDADES ESPECIAIS “O nascimento do pensamento é igual ao nascimento de uma criança: tudo começa com um ato de amor. Uma semente há de ser depositada no ventre vazio. E a semente do pensamento é o sonho”. Rubem Alves A sociedade é constituída por indivíduos diferentes entre si, que se assemelham no anonimato do grupo. Os alunos de uma sala de aula, membros da sociedade como qualquer outra pessoa, também são aparentemente semelhantes, quando olhados como grupo, diferindo, entretanto, fundamentalmente, um do outro, nas peculiaridades de sua individualidade. Embora a seqüência das etapas do desenvolvimento seja a mesma para todos e o processo de construção de conhecimento envolva princípios e leis comuns a todos, a forma de vivência desses processos, bem como o ritmo com que são vivenciados difere de um aluno para outro. Segundo Piaget (1978), o aluno constrói seu próprio conhecimento, sendo assim, o professor deve agir como mediador e estimulador desse processo. Buscar interagir com o aluno, proporcionar diversos meios para se alcançar os objetivos propostos, levando sempre em conta que cada criança tem seu ritmo e tempo diferentes para aprender. “O professor é visto, então, como facilitador no processo de busca de conhecimento que deve partir do aluno. Cabe ao professor organizar e coordenar as situações de aprendizagem, adaptando suas ações às características individuais dos alunos, para desenvolver suas capacidades habilidades intelectuais.” (BRASIL - PCN, 1999 p. 31) 32 A principal preocupação de Piaget foi o sujeito epistêmico. Estudou o desenvolvimento do conhecimento da lógica, espaço, tempo, moralidade, linguagem, estudou diversos processos psicológicos: pensamento, percepção, memória, imaginação, imitação e ação. Piaget elaborou a psicologia genética com o intuito de investigar o processo de formação psicológica que pretende compreender as etapas do desenvolvimento do conhecimento. Para isso, pesquisou e observou a criança em desenvolvimento, desde o nascimento até a adolescência. Como podemos ver, sua preocupação é epistemológica: descobrir os processos do conhecimento em sua evolução. Piaget (1978), parte do princípio de que o conhecimento não é um estado, mas sim um processo contínuo, suscetível de progressos, o conhecimento é a passagem de um nível de menor conhecimento para outro de conhecimento mais elaborado. O autor considera que a própria criança constrói sua inteligência e seus conhecimentos, tal construção não é devida unicamente à experiência perceptiva, visto toda experiência comportar uma estruturação cuja importância a filosofia empirista ignora. Em seus estudos, Piaget concluiu que a inteligência progride por construções sucessivas em diferentes níveis e procede da ação geral. O conhecimento está sempre ligado à ação. É, portanto, interagindo com o meio, que a criança constrói sua inteligência. Para o autor no caso do desenvolvimento cognitivo, o ser vive em constante processo de equilíbrio entre o todo e a parte. O organismo interage continuamente com os objetos do meio. Essa integração é denominada assimilação, e a modificação que decorre dela, acomodação. Assim, a adaptação, implica tanto a assimilação como a acomodação. Piaget. In: Bringuier, p.61 “[...] A acomodação é determinada pelo objeto, enquanto a assimilação é determinada pelo indivíduo. Então, assim como não há acomodação sem assimilação, já que é sempre a acomodação de uma coisa que é assimilada [...] de igual modo não pode haver assimilação sem acomodação [...] Adaptação é o equilíbrio entre a assimilação e a acomodação. Porque na adaptação você tem sempre dois pólos: você 33 tem o pólo indivíduo-assimilação e o pólo objeto-acomodação [...].” (BRINGUIER, 1993, p.63) O autor mostra que o indivíduo estabelece desde o nascimento a relação de interação com o meio. E, é dessa relação com o mundo físico e social que acontece o desenvolvimento cognitivo da criança e conseqüentemente dessa relação se dá o conhecimento. Assim, a assimilação refere-se aquilo que é essencial a todo o conhecimento, já a acomodação representa o diferente, proporcionando a base para a mudança e conseqüentemente a aprendizagem. Piaget busca elaborar uma teoria do conhecimento, que possa explicar como o organismo conhece o mundo. Para o autor, existe uma realidade externa ao sujeito do conhecimento, e a presença desta realidade é que regula e corrige o desenvolvimento adaptativo. Entendemos então que, os processos de assimilação e acomodação são complementares e encontram-se presentes durante toda a vida do indivíduo, permitindo o desenvolvimento intelectual. Para podermos entender melhor a teoria de Piaget, devemos partir do princípio de que é no dia-a-dia, acompanhando os progressos das crianças, que compreenderemos o que o autor chama de períodos do desenvolvimento. Piaget elaborou uma estrutura de desenvolvimento cognitivo baseado em estágios: sensório-motor, pré-operatório, período das operações concretas e período das operações formais. 2.1 Períodos do desenvolvimento Para a estruturação da intervenção educativa é fundamental distinguir o nível de desenvolvimento real do potencial. O nível de desenvolvimento real se determina como aquilo que o aluno pode fazer sozinho em uma situação determinada, sem ajuda de ninguém. O nível de desenvolvimento potencial é determinado pelo que o aluno pode fazer ou aprender mediante a interação com outras pessoas, conforme as observa, imitando, trocando idéias com elas, ouvindo suas explicações, sendo desafiado por elas ou contrapondo-se a elas, sejam essas pessoas o professor ou seus colegas. Existe uma zona de desenvolvimento próximo, dada pela diferença existente entre o que um aluno pode fazer 34 sozinho e o que pode fazer ou aprender com a ajuda dos outros. (BRASIL - PCN, 1998 p. 38) De acordo com La Taille (1992, p. 15), os estágios de desenvolvimento de Piaget, caracterizam-se pelas diferentes formas do sujeito interagir com a realidade, de organizar seus conhecimentos visando a sua adaptação. Esse movimento deve-se ao amadurecimento físico, psicológico e social e é neste fenômeno que se dá a construção da inteligência. É o indivíduo, que desde criança, vai construindo o seu desenvolvimento mental. O estágio, forma de organização mental, deve ser considerado do ponto de vista motor, intelectual e afetivo. Estágio sensório-motor Segundo La Taille, (...) nesse estágio, Piaget considera abusivo falar em real socialização efetiva da inteligência. Essa é essencialmente individual, pouco ou nada devendo às trocas sociais. Em compensação, a partir da aquisição da linguagem, inicia-se uma socialização efetiva da inteligência. (LA TAILLE 1992, p.15) No estágio sensório-motor, a concepção de espaço, tempo e casualidade começa a ser construída, possibilitando à criança novas formas de ação prática para lidar com o meio. Esquemas cada vez mais complexos são construídos, de forma a preparar e dar origem ao aparecimento da função simbólica, ou seja, a capacidade de representar eventos futuros. O aparecimento da função simbólica altera a forma como à criança lida com o meio e anuncia uma nova etapa, denominada estágio pré-operatório. Pelo que entendemos é nesta fase que a criança tem maior necessidade de manipular objetos e vivenciar as situações do cotidiano de acordo com seus interesses para que assim, consiga assimilar os conceitos pertinentes a essa faixa etária. 35 E, é neste momento, que a observação do adulto é da máxima importância, para que interfira positivamente, estimulando o amadurecimento que proporcionará a aprendizagem. Estágio das operações concretas Esta etapa é dividida em dois sub-estágios: 1 Estágio pré-operatório De acordo com La Taille (1992, p. 15), o estágio pré-operatório é marcado pelo aparecimento da linguagem por volta dos dois anos, a criança entra em um mundo inteiramente novo, repleto de coisas para aprender e compreender, tornando-a capaz de lidar com suas experiências. A criança tornase mais ativa, ampliando seu universo social e individual. Seu mundo, nesta fase, é mágico, e o jogo do “faz de conta” domina todas as suas atividades. O estágio pré-operacional é caracterizado, então, pelo pensamento egocêntrico, onde o raciocínio da criança é muito influenciado por suas próprias vontades e desejos, suas percepções e explicações refletem apenas do seu ponto de vista. Outra característica do pensamento deste estágio é o animismo. A criança estende suas vivências pessoais a brinquedos, animais e objetos, atribuindo-lhes sentimentos e intenções do ser humano. Ainda neste estágio, a criança tende a passar por uma transição, pois se inicia a aquisição da linguagem lhe proporcionando maior facilidade de expor seus sentimentos e vontades, porém se vê diante de um conflito, onde terá que aceitar o mundo que a cerca conscientizando-se de que faz parte dele, porém ainda acredita que seus pensamentos estão voltados para si. Ainda encontra dificuldade em se colocar no ponto de vista do outro, fato que a impede de estabelecer relações de reciprocidade. 2 Estágio operatório-concreto Tem início aproximadamente aos 7 anos. Neste estágio a criança apresenta modificações consideráveis no seu comportamento, na sua linguagem, 36 nas suas interações com os colegas e principalmente na qualidade de raciocínio. O egocentrismo e a fantasia diminuem e a criança torna-se capaz de relacionarse com a realidade física e social de maneira mais objetiva, poderá simbolizar informações, transformando-as e organizando-as a fim de solucionar problemas. O pensamento é chamado operatório porque é reversível: o sujeito pode retornar, mentalmente, ao ponto de partida, ele agora se baseia mais no raciocínio do que na percepção. A criança operatória já possui noção quanto à massa, peso e volume dos objetos. Estágio operatório-formal Nesse estágio, o pensamento torna-se livre das limitações da realidade concreta. Este período ocorre a partir dos treze anos de idade. O adolescente pode pensar de modo lógico e correto mesmo com um conteúdo de pensamento incompatível com o real, permitindo, assim, trabalhar com a realidade. Pela primeira vez o raciocínio pode trabalhar com hipóteses e buscar conseqüências lógicas. Segundo La Taille (1992), ao chegar nessa etapa, o adolescente atinge o grau mais complexo de seu desenvolvimento cognitivo, a abstração, que lhe possibilita “refletir” e criar novas hipóteses e caminhos para que consiga agir coerentemente por si só. As faixas etárias previstas para cada etapa não são rígidas e demarcadas. Mas são sugeridas por preponderar nas faixas etárias pesquisadas por Piaget. Nem sempre o desenvolvimento de uma criança ocorre de maneira considerada normal. Através da comparação com o desenvolvimento da maioria das crianças podemos observar alguns fatos ou comportamentos que se desviam dos padrões de normalidade. Quando um atraso no desenvolvimento físico, mental, emocional ou na aquisição da fala for observado é conveniente consultar o pediatra, que poderá confirmar ou não a suspeita de um problema. Podem ocorrer atrasos globais ou específicos. Uma criança pode apresentar desenvolvimento físico normal e não falar, ou falar bem e não aprender. Mesmo possuindo inteligência normal, pode ter dificuldades 37 específicas, que estejam impedindo a aprendizagem. Todos os atrasos merecem atenção, pois a criança pode precisar de ajuda para superá-los. 2.2 Desenvolvimento Emocional Sabe-se que desde que nasce, enquanto cresce e se desenvolve a criança precisa sentir-se amada, para crescer emocionalmente equilibrada e desenvolver na vida adulta todo seu potencial humano. Quanto a emoção ser inata ou adquirida, há uma grande polemica, porém todos aceitam que o recém nascido apresenta reações que denotam sentimentos de prazer e desprazer. O estudo das emoções tem demonstrado que em sua formação há componentes orgânicos responsáveis pelo aparecimento de reações emocionais à medida que o indivíduo se desenvolve e amadurece. Segundo Davidoff, (1983) a emoção é um estado complexo, que envolve aumento da percepção de um objeto ou situação, grandes mudanças físicas, apreciação de atração ou repulsa sentidas, e organização do comportamento no sentido de aproximação ou afastamento. O comportamento emocional é determinado por um complexo jogo de predisposições hereditárias e condicionadas. As emoções básicas são: prazer, tristeza, raiva e medo. Entretanto, todas elas têm uma enorme escala de variação. Por exemplo, o prazer pode variar de satisfação ao êxtase, sendo que nesta escala estão incluídos o amor, a alegria, etc.; a tristeza pode variar do desapontamento ao desespero; o medo, da timidez ao terror; a raiva, do descontentamento ao ódio. Quanto ao papel da aprendizagem no desenvolvimento emocional os estudiosos apontam três processos de aquisição de respostas emocionais: Imitação – consiste na observação de um modelo e na posterior incorporação das respostas do mesmo. Condicionamento – uma resposta é aprendida através da associação de um estímulo neutro a outro capaz de provocar uma reação emocional. 38 Compreensão – através dos processos racionais e lógicos. A razão nos faz compreender as conseqüências de determinados eventos, e isto nos leva a sentir emoção. 2.3 As Emoções e as Interações Humanas Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser condicionado, mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser condicionado e o ser determinado. A diferença entre o inacabado que não se sabe como tal e o inacabado que histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado. Gosto de ser gente porque, como tal, percebo afinal que a construção de minha presença no mundo, que não se faz no isolamento, isenta da influência das forças sociais, que não se compreende fora da tensão entre o que herdo geneticamente e o que herdo social, cultural e historicamente, tem muito a ver comigo mesmo. (FREIRE, 1996 p.30) Freire nos fala da importância das interações sociais, dos sentimentos e emoções, da importância de nos entendermos como seres incompletos em constante transformação e crescimento. "Não há educação fora das sociedades humanas e não há homem no vazio" (Paulo Freire, 1996) Para darmos início a essa questão, analisemos a seguinte afirmação: “O homem é um ser essencialmente social, impossível, portanto, de ser pensado fora do contexto da sociedade em que nasce e vive. Em outras palavras, o homem não social, o homem visto como independente das influências dos diversos grupos que freqüenta, o homem visto como imune aos legados da história e da tradição, este homem simplesmente não existe.” (LA TAILLE, 1992, p. 11). Segundo Piaget, se tomarmos a noção do social nos diferentes sentidos do termo, isto é, englobando tanto as tendências hereditárias que nos levam à vida em comum e à imitação, como as relações dos indivíduos entre eles, entendemos 39 que, desde o nascimento, o desenvolvimento intelectual é, simultaneamente, obra da sociedade e do próprio individuo. Todavia, como escreve Piaget em seguida, tal postulado é demasiadamente amplo e, por conseguinte, vago. Uma interpretação possível seria afirmar que o futuro da razão individual é erguer-se acima desta base social comum, de lhe ser superior. Outra seria pensar que, no seu desenvolvimento, a razão é esculpida pelas determinações sociais, em suma, afirmar que o homem é ser social ainda não significa optar por uma teoria que explique como este social interfere no desenvolvimento e na capacidade da inteligência humana. Segundo La Taille (1992), o esclarecimento que Piaget dá a essa questão passa por dois momentos. O primeiro: definir de forma mais precisa, o que se deve entender por “ser social”. O segundo: verificar como os fatores sociais aparecem para explicar o desenvolvimento intelectual . Para Piaget, o ser social é aquele que consegue relacionar-se com seus semelhantes de forma equilibrada. Não se trata de traçar uma fronteira entre o social e o não social, mas sim de, a partir de uma característica importante das relações possíveis entre pessoas de nível operatório – que representa o grau Maximo de socialização do pensamento - , comparar graus anteriores de socialização. “Ás principais etapas do desenvolvimento das operações lógicas-, escreve ele, correspondem, de maneira relativamente simples, estágios correlativos do desenvolvimento social (... )”.(La Taille, 1992) É importante notar que na teoria de Piaget no que se refere às influências da interação social no desenvolvimento cognitivo. Em geral, quando se pensa em tais influências, aborda-se a questão da cultura: determinadas ideologias, religiões, classes sociais, sistema econômico, presença ou ausência de escolarização, características da linguagem etc. Isso significa que Piaget pensa o social e suas influências sobre os indivíduos pela perspectiva da ética. 2.4 Interação social De acordo com Vygotsky (1989), ao chegar à escola, a criança possui um repertório cognitivo, social, emocional, fruto da interação de seu organismo com o 40 meio, e também faz parte deste repertório, o vínculo que esta tem com os objetos internos e externos. A compreensão deste vínculo, a partir do comportamento habitual que a criança apresenta, é para seus professores um elemento a ser considerado no processo de aprendizagem. Uma criança cujas relações vinculares desde muito cedo estiveram comprometidas pela ausência da figura materna, primeira a exercer a função de ensinante na aprendizagem humana, tenderá a apresentar dificuldades no estabelecimento de vínculo com o professor, ou manterá o modelo de vínculo que vivenciou quando bebê. Buscar compreender como os alunos se relacionam com o professor, que projeções fazem nesta figura, o que querem dele, como o vêem nos aspectos de sua função, é importante para a atuação do professor, não mais para saber que conteúdos devem ser trabalhados, ou que metodologia deve ser estudada, mas para saber como se relacionar com esse aluno, como contribuir na construção de um vínculo que seja favorável ao processo de aprendizagem. Segundo Pacheco Uma das noções centrais da inclusão em escolas é ser aceito na comunidade social da escola, interagindo com os colegas e participando de atividades regulares. As escolas precisam construir uma política que promova esse pensamento em todos os níveis do funcionamento escolar, Encorajar a interação social, a participação e os relacionamentos é uma maneira de implementar essa política. (PACHECO, 2007, p.51) 2.5 A importância da afetividade no desenvolvimento e na Inclusão Não podemos negar que a afetividade é crucial para que aconteça a inclusão, desde um simples toque, um beijo, um abraço. A teoria de Wallon (apud Dantas, 1992) considera o desenvolvimento da pessoa completa integrada ao meio em que está imersa, com os seus aspectos afetivo, cognitivo e motor também integrados. Assim, a ênfase é para a afetividade e para a integração, entre organismo e meio e entre as dimensões cognitiva, afetiva, e motora na constituição da pessoa. A afetividade evolui 41 conforme as condições de cada pessoa e com formas de expressões diferenciadas, que se configuram como um conjunto de significados que o indivíduo adquire nas relações com o meio, com a cultura, ao longo da vida. Os significados representam para cada pessoa as diferentes situações e experiências vivenciadas num determinado momento e ambiente social. Por este motivo afetividade não permanece imutável ao longo da trajetória da pessoa. Afetividade segundo Wallon “A dimensão afetiva ocupa lugar central, tanto do ponto de vista da construção da pessoa quanto do conhecimento. Ambos se iniciam num período que ele denomina impulsivo-emocional e se estende ao longo do primeiro ano de vida. Neste momento a afetividade reduz-se praticamente às manifestações fisiológicas da emoção, que constituem o ponto de partida do psiquismo. (WALLON apud DANTAS, 1992) Wallon dedicou-se ao estudo de vários aspectos do desenvolvimento infantil (afetivos, cognitivos e motor). Nos domínios afetivos, cognitivos e motor, procurou mostrar como cada um deles se desenvolve, relaciona os vínculos entre cada um desses domínios, enfim, sua teoria resulta em quatro temas fundamentais: a afetividade, o movimento, a inteligência e a formação do eu como pessoa. Ao nível psicomotor, porque o ser humano desenvolve necessidades fisiológicas, gostos e atitudes corporais, que são condicionados pelos sistemas social e cultural. Ao nível afetivo, porque a expressão dos sentimentos é veiculada pelas modalidades, pelas restrições e pelas sanções que constituem os sistemas social e cultural. Ao nível mental, porque o processo de socialização fornece ao indivíduo as tipificações, as representações, as imagens, os conhecimentos, os preconceitos e os estereótipos que estruturam os sistemas de conhecimento. Para Wallon (Apud Dantas,1992) a emoção é a fonte principal do conhecimento, portanto conhecimento e afetividade encontram-se em sua teoria como algo indissociável. Hoje sabemos que as dificuldades de aprendizagem, podem se manifestar por diversas causas. Causas presumidamente devido a uma disfunção no sistema nervoso central, e pode ocorrer apenas por um período na vida. 42 Problemas de controle de comportamento, percepção social e interação social podem existir junto com as dificuldades de aprendizagem, mas elas não constituem por si só uma desordem de aprendizagem. Ela pode ter uma origem orgânica, intelectual/cognitiva, emocional (incluindo-se aí a estrutura familiar), sócio-cultural; porém, o que se percebe na maioria dos casos é que há um entrelaçamento destes fatores, responsável pela complexidade da situação. Entendemos que a relação afetiva entre os sujeitos envolvidos no processo ensinar-aprender, o exercício do diálogo, compartilhar, o respeito pelo outro, o manter-se aberto, o saber escutar, configuram-se como elementos de fundamental importância para a aprendizagem. Sabe-se que na prática pedagógica, podem surgir entre professor e aluno, sentimentos de atração ou de repulsão. Essas atitudes sentimentais têm o poder de influenciar a metodologia com risco de alterá-la, provocando no aluno, grandes transformações afetivas mais ou menos desfavoráveis ao ensino. A dimensão afetiva é um importante fator a ser considerado quando se pretende compreender o desenvolvimento da aprendizagem da criança. É indiscutível a importância da afetividade para o processo educacional. Pesquisas recentes têm demonstrado que afetividade e inteligência caminham juntas no processo de construção da personalidade da criança, conseqüentemente, essa relação tem influências sobre a aprendizagem escolar e fundamentalmente na inclusão de crianças com necessidades especiais na rede regular de ensino. 43 CAPÍTULO III INCLUSÃO E LEGISLAÇÃO ATUAL A busca pelos direitos sociais iguais vem destacando a importância da educação escolar das pessoas com necessidades especiais na rede regular de ensino, por considerar que somente dessa forma as pessoas poderão desenvolver-se plenamente como seres humanos que são e assim viverem plenamente como sujeitos sociais. Na legislação brasileira atual, observamos que, pela primeira vez, numa Lei de diretrizes e bases, é dedicado um capítulo à inclusão de portadores de necessidades especiais. A Educação Inclusiva (EI) é uma prática mundialmente difundida e que possui na Declaração de Samalanca, documentada em dezembro de 1990, sua principal arma de ação. Foi nessa declaração que inúmeros países, entre eles, o Brasil, assinaram um compromisso de fazer desse ideal uma realidade até 2010. (BRASIL, 1997, p.23) Muito se discutiu, mas as dúvidas e a exclusão ainda permanecem. Um exemplo concreto disso é o resultado do Censo 2000 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que mostrou que a universalização do Ensino Fundamental ainda não chegou aos portadores de necessidade especiais. Em 2000, apenas 5,5% das crianças de 7 a 14 anos estavam fora da escola no Brasil. Entretanto, quando se analisa as crianças com NEE pertencentes a essa mesma faixa etária, percebe-se que a porcentagem aumenta significativamente: 11,4%. Aqueles que possuem um grau maior de deficiência e que estão fora da escola apresentam um número ainda mais preocupante, 25,1%, o que representa cerca de um quarto da população de 7 a 14 anos. (BRASIL, 1997, p.23) 44 O IBGE utilizou como parâmetro para a sua pesquisa um padrão amplo em deficiência, comum em países desenvolvidos. Assim, uma pessoa com alguma dificuldade para enxergar, mesmo com uso de óculos escuros, foi considerada portadora de deficiência visual e os portadores de deficiência grave foram aqueles que disseram ser totalmente incapazes ou ter grande dificuldade para enxergar, ouvir ou caminhar. 3.1 Questão legal Ao abordar a questão legal, é importante conhecer e contextualizar os embasamentos legais que ampararam a área. O atendimento à pessoa com necessidades educacionais especiais pauta-se no respeito à dignidade do ser humano e no seu direito ao pleno desenvolvimento. Postura esta sinalizada por uma consciência crítica nacional e internacional, consolidada nos princípios e recomendações dos compromissos definidos em nível nacional, bem como em convenções, acordos e declarações internacionais das quais o Brasil é signatário (MEC, 1997) • Em princípios baseados na Declaração Universal de Direitos Humanos (1948) Todo ser Humano é elemento valioso qualquer que seja a idade, sexo, idade mental, condições emocionais e antecedentes culturais que possui, ou grupo étnico, nível social e credo a que pertença. Seu valor é inerente à natureza do homem e às potencialidades que traz em si; em todas as suas dimensões, é o centro e o foco de qualquer movimento para sua promoção. O princípio é válido tanto para as pessoas consideradas normais ou ligeiramente afetadas, como também para as gravemente prejudicadas, que exigem uma ação integrada de responsabilidade e de realizações pluridimensionais; tem direito de reivindicar condições apropriadas de vida, aprendizagem e ação, de desfrutar de convivência condigna e de aproveitar das experiências que lhe são oferecidas para desempenhar-se como pessoa e membro atuante de uma comunidade. • Na Convenção sobre os Direitos da Criança – Adotada pela assembléia Geral das Nações Unidas – 20/11/89: 45 Artigo 2º. Os Estados Partes respeitarão os direitos enunciados na presente Convenção e assegurarão sua aplicação a cada criança sujeita a sua jurisdição, sem distinção alguma, independentemente de raça, cor, sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional, étnica ou social, posição econômica, deficiências físicas, nascimento ou qualquer outra condição da criança, de seus pais ou de seus representantes legais. Segundo Carvalho (2002), a educação Especial tem sido uma preocupação tanto do Brasil como em outras partes do mundo. Assim passamos a mencionar algumas recomendações dos organismos internacionais: • Declaração de Sunderberg – Espanha/1981: Conferência Mundial sobre as Ações e Estratégia para a Educação, Prevenção e Integração dos Impedidos. Enfatiza a igualdade de oportunidades de educação, lazer e trabalho. • Declaração Mundial sobre Educação para Todos – Jomtien (Tailândia)/1996: Representa o consenso mundial sobre o papel da educação fundamental e traduz-se em compromisso de garantir o atendimento às necessidades básicas de aprendizagem a todas as crianças, jovens e adultos. • Seminário Organização Regional da Sobre Educação Políticas, Integrada Planejamento para alunos e com Necessidades Especiais – Caracas (Venezuela) 1992. O eixo temático girou em torno da aplicação das recomendações da conferência Mundial de Educação para Todos, para as pessoas com necessidades educativas especiais, “a educação tornou-se o eixo do atendimento, entendendo-se que todos os indivíduos podem e devem se apropriar do saber, do saber fazer e do saber pensar” (CARVALHO, 2002, p. 44). A proposta do Seminário foi sintetizada por Carvalho: A educação especial deixa de ser entendida como uma educação diferente para alunos diferentes, e se converte num conjunto de meios pessoais e materiais postos à disposição do sistema educativo, para que possa responder satisfatoriamente às necessidades particulares de todos os alunos (MEC, p.10 apud, CARVALHO, 2002, p.45). 46 • Declaração de Salamanca – Espanha/1994. Reafirmou-se o direito à educação de cada indivíduo, independentemente de suas condições lingüísticas físicas, ou outras. intelectuais, Muitas sociais, crianças emocionais, experimentam dificuldades de aprendizagem e têm, portanto, necessidades educacionais especiais em algum momento de sua escolarização. As escolas têm que encontrar a maneira de educar com êxito todas as crianças, inclusive as que têm deficiências graves. Embora o Brasil não tenha estado presente efetivamente em todos estes encontros; todos eles refletiram na elaboração de leis, decretos, pareceres e outros que vieram a favorecer uma melhor articulação dentro da Educação Especial no país. A Declaração de Salamanca, por exemplo, é o princípio norteador de todas as nossas políticas educacionais especiais na atualidade. No Brasil, na Constituição de 1946 a educação especial vem sendo tratada em suas Cartas Magnas: No capítulo II – Da educação e da Cultura, artigo 172º: cada Sistema de Ensino terá, obrigatoriamente, serviço de assistência educacional que assegurem aos alunos necessitados, condições de assistência escolar. Em 1967 o título IV – Da Família, da Educação e da Cultura, artigo 169º, § 2º: Cada sistema de ensino terá, obrigatoriamente, serviços de assistência educacional que assegurem, aos alunos necessitados, condições de eficiência escolar. Na emenda Constitucional 1969 reformulou no artigo, 175, § 2º que a Lei especial disporá sobre a assistência à maternidade, à infância e à adolescência e sobre a educação de excepcionais. 47 Já na emenda de 1978 é assegurada aos deficientes a melhoria de sua condição social e econômica; isto mediante, como está descrito em seu artigo I, a uma educação especial e gratuita. Na Constituição do Brasil – 05/10/1988, no seu artigo 205, estabelece que é direito de todos à educação de qualidade: Artigo 205º. “A educação, direito de todos e dever do e Estado e da família, será promovida e incentivada com colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Título VIII - Da Ordem Social. Capítulo III - Da Educação, da Cultura e do Desporto, artigo 208º, § 3º: atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. Nas duas primeiras constituições citadas (1946 e 1967), o texto é praticamente o mesmo, a diferença entre eles é que a primeira menciona condições de “assistência” escolar; isto é, condições para que o aluno assista, tão somente, às aulas. A segunda, por sua vez, fala de condições de “eficiência” escolar aos necessitados de educação especial, no sentido de que eles possam chegar a graus de qualificação considerados satisfatórios. Por sua vez, na Emenda Constitucional de 1969 falava-se na existência de Lei especial para tratar do assunto, enquanto que na emenda de 1978, já se enunciava o direito assegurado a uma educação especial e gratuita aos necessitados. Na atual Carta Magna (1988), é estabelecido que a Educação Especial deva ser oferecida, preferencialmente, na rede regular de ensino; ao invés de instituições centralizadoras; isto, claro, quando possível. Nas Leis de Diretrizes e Base da Educação Nacional Lei 4.024/61. Título X – Da Educação de Excepcionais, artigo 88º: A educação de excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade. Artigo 89º: toda iniciativa 48 considerada eficiente pelos conselhos estaduais de educação e relativa à educação de excepcionais, receberá dos poderes públicos tratamento especial mediante bolsas de estudo, empréstimos e subvenções. Lei 5.692/71. Capítulo I – Do Ensino de 1º e 2º Graus, artigo 9º: Os alunos que apresentam deficiências físicas ou mentais, os que se encontram em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial, de acordo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação. No âmbito político-administrativo, ainda em 1971, o MEC criou um grupo para realizar uma completa avaliação da educação especial no Brasil nos anos seguintes, foi criado o CENESP – Centro Nacional de Educação Especial – com a finalidade de promover, em todo o território nacional, a expansão e melhoria do atendimento aos excepcionais; marcados, portanto, o início das sistematizadas do atendimento educacional especial prestado no Brasil. Lei 9.394/96. Capítulo V – Da Educação Especial: Artigo 58º: Entende-se por educação especial, para efeitos desta lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. Esta Lei ainda dispõe sobre a qualificação do professor que atua em Educação Especial, sobre currículos e recursos específicos para as necessidades dos portadores entre outras. Nas leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, editadas em 1961 e 1971, a Educação Especial era apenas um título dentro do conjunto de leis, na qual evidenciava que esta modalidade de educação devia na medida do possível, enquadrar-se no sistema geral, com o objetivo da integração junto à comunidade. Indubitavelmente, na atual Lei de Diretrizes e Bases (1996), é que a Educação Especial ganhou um maior espaço, recebendo um capítulo inteiro para embasá-la (Capítulo V); refletindo as recentes preocupações e propostas 49 advindas dos encontros mundiais sobre educação especial; além de confirmar e ajustar o princípio estabelecido na Constituição Federal: ser oferecida, preferencialmente, na rede regular de ensino. Além das Constituições também a partir de 1990 podemos citar o Estatuto da Criança e do Adolescente: Título II – Dos Direitos Fundamentais. Capítulo I – Do Direito à vida e à Saúde, artigo 11, § lº; a criança e o adolescente portadores de deficiência receberão atendimento especializado. O § 2º acrescenta que incumbe ao poder público fornecer gratuitamente àqueles que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação. Capítulo IV – Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer. Artigo 54, § 3º: atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. Neste estatuto reforça-se o direito ao ensino especial aos necessitados, de preferência, na rede regular de ensino; além de mencionar a incumbência do poder público em fornecer próteses, medicamentos e outros recursos necessários aos portadores de necessidades especiais. O que se vê, porém, é que pouquíssimo tem sido feito neste sentido. Como se percebe, os parâmetros legais já outorgam o direito de todos à educação, faltando agora à conquista desses direitos dentro das próprias escolas, somente possível com a participação de todos: pedagogos, administradores escolares, pais, psicólogos, professores, alunos, funcionários e os que fazem a comunidade. A intenção não é mascarar a realidade pela qual passam a maioria das escolas, sucateadas pela política governamental que acelera o desmonte da educação, mas consideramos ser essa uma luta de todos que almejam uma escola de qualidade para os filhos das classes trabalhadoras, que são discriminados por serem pobres economicamente, aí incluídos deficientes que sofrem uma estigmatização na nossa sociedade. Assim, uma escola que prioriza a qualidade do ensino terá lugar para todos, lugar que não aparecerá pronto e acabado nos padrões ideais. Mas um 50 espaço que será construído e experimentado em ações concretas, em tentativas de acertos, que serão consolidadas em constantes avaliações e discussões, viabilizadas na vivência de um projeto político na escola. Na Política Nacional de Educação Especial – 1993 A Política Nacional de Educação Especial – PNEE compreende um conjunto de objetivos destinados a garantir o atendimento educacional ao alunado portador de necessidades especiais. Serve como fundamentação e orientação do processo global da educação de pessoas portadoras de deficiências, de condutas típicas e altas habilidades, criando condições adequadas para o desenvolvimento pleno de suas potencialidades, com vistas ao exercício consciente da cidadania. Aponta que a pessoa portadora de deficiência tem o direito às oportunidades educacionais, não só à educação. A PNEE deverá também inspirar a elaboração de planos de ação que definam responsabilidade dos órgãos públicos e das entidades não- governamentais, cujo êxito dependerá da soma de esforços e recursos das três esferas de governo e da sociedade civil. Atualmente, é a Secretaria de Educação Especial – SEESP / MEC, que se responsabiliza pela Educação Especial no Brasil. Em consonância com as atribuições do Ministério da Educação e do Desporto, coordena ações voltadas à formulação de políticas. Além de seguir os princípios democráticos de igualdade, liberdade e respeito à dignidade, a educação especial norteia sua ação pedagógica por princípios, que são, entre outros: princípios da normalização (oferecer aos portadores as mesmas condições e oportunidades a que outras pessoas têm acesso); princípio da integração (ações interativas exercidas com reciprocidades entre pessoas ou instituições); princípio da individualização (adequar o atendimento educacional às necessidades, respeitando as diferenças individuais); princípio da legitimidade (participação dos portadores de deficiências ou de seus 51 representantes legais, na elaboração de programas). Estes princípios vão se adaptar nos currículos dos PCNs. Assim, as adaptações nos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais), constituem, possibilidades educacionais de atuar diante das dificuldades de aprendizagem dos alunos. Pressupõe que se realize a adaptação do currículo regular, quando necessário, para torná-lo apropriado às peculiaridades dos alunos com necessidades especiais. Não se trata de um novo currículo, mas de um currículo dinâmico, alterável, passível de ampliação, para que atenda realmente todos os educandos. As questões colocadas são: o que o aluno deve aprender; que formas de organização do ensino são mais eficientes para o sucesso de aprendizagem; o que, como e quando avaliar o aluno. O objetivo é fazer com que os estudantes especiais possam participar integralmente, em um ambiente rico de oportunidades educacionais. Para isso, alguns aspectos precisam ser considerados, como a preparação e a dedicação da equipe educacional e dos professores, o apoio adequado e recursos especializados, quando forem necessários. Dentre adaptações curriculares e de acesso ao currículo que facilitam o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, destacam-se: a flexibilidade – isto é, a não obrigatoriedade de que todos os alunos atinjam o mesmo grau de abstração ou de conhecimento, num tempo determinado – e a consideração de que, ao planejar ativamente para uma turma, deve-se levar em conta a presença de alunos com necessidades especiais e contemplá-los na programação (MEC, 1999. nº 12). Falar de necessidades educacionais especiais, portanto, deixa de se pensar nas dificuldades específicas dos alunos e passa a significar o que a escola pode fazer para dar respostas às suas necessidades, de um modo geral, bem como aos que apresentam necessidades específicas muito diferentes dos demais. Segundo Sassaki (1997, p. 150), 52 (...) são cada vez mais necessárias as leis de caráter inclusivista, caminho ideal para que todas as pessoas, deficientes ou não, possam sentir que realmente pertencem à sociedade, com oportunidades iguais de participação como cidadãs de cada país. A inclusão ainda não existe de fato. O que presenciamos são aspectos da integração e até mesmo da exclusão social. A legislação, nesse sentido, torna-se de extrema importância, pois, mesmo que apenas teoricamente, as diretrizes de um país estão ligadas a ela. Sassaki (1997, p. 147) ainda acrescenta que “o grau de inclusividade de uma sociedade poderia, então, ser medido pela maior ou menor incidência de leis inclusivas sobre as leis integracionistas”. Mesmo sob a garantia da lei, podemos encaminhar o conceito de diferença para a vala dos preconceitos, da discriminação, da exclusão, como tem acontecido com a maioria de nossas políticas educacionais. Temos de ficar atentos! (MANTOAN 2003) De acordo com Mantoan (2003, p.23) a maioria dos alunos das classes especiais é constituída pelos que não conseguem acompanhar os seus colegas de turma, os indisciplinados, os filhos de lares carentes, os filhos de negros e outros. Pela ausência de laudos periciais competentes e de queixas escolares bem fundamentadas, esses alunos correm o risco de serem admitidos e considerados como PNEE. Segundo Mantoan, as indefinições da clientela justificam todos os desmandos e transgressões ao direito à educação e a não-discriminação que algumas escolas e redes de ensino estão praticando, por falta de um controle efetivo dos pais, das autoridades de ensino e da justiça em geral. O caráter duvidoso da educação especial, de acordo com a autora, é acentuado pela imprecisão dos textos legais que fundamentam os planos e as propostas educacionais e, ainda hoje, fica patente a dificuldade de se distinguir o modelo médico-pedagógico do modelo educacional-escolar dessa modalidade de ensino. Essa falta de clareza faz retroceder todas as iniciativas que visam à adoção de posições inovadoras para a educação de alunos com deficiência. Problemas conceituais, desrespeito a preceitos constitucionais, interpretações tendenciosas de nossa legislação educacional e 53 preconceitos distorcem o sentido da inclusão escolar, reduzindo-a unicamente à inserção de alunos com deficiência no ensino regular. Essas são, do meu ponto de vista, grandes barreiras a serem enfrentadas pelos que defendem a inclusão escolar, fazendo retroceder, por sua vez, as iniciativas que visam à adoção de posições inovadoras para a educação de alunos em geral. Estamos diante de avanços, mas de muitos impasses da legislação. (FÁVERO, 2004, p.19) A Constituição Federal de 1988 respalda os que propõem avanços significativos para a educação escolar de pessoas com deficiência, quando elege como fundamentos da República a cidadania e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, incisos II e III) e, como um dos seus objetivos fundamentais, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, inciso IV). Ela garante ainda o direito à igualdade (art. 5U) e trata, no artigo 205 e seguintes, do direito de todos à educação. Esse direito deve visar ao “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Além disso, a Constituição elege como um dos princípios para o ensino: “A igualdade de condições de acesso e permanência na escola” (art. 206, inciso I), acrescentando que o ‘‘‘dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um” (art. 208, inciso V). Segundo Mantoan, quando garante a todos o direito à educação e ao acesso à escola, a Constituição Federal não usa adjetivos e, assim sendo, toda escola deve atender aos princípios constitucionais, não podendo excluir nenhuma pessoa em razão de sua origem, raça, sexo, cor, idade ou deficiência. Para a autora, apenas esses dispositivos já bastariam para que não se negasse a qualquer pessoa, com ou sem deficiência, o acesso à mesma sala de aula que qualquer outro aluno. No Capítulo III — Da Educação, da Cultura e do Desporto —, artigo 205, a Constituição prescreve em seu artigo 208 que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de [...] atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. O “preferencialmente” refere-se a “atendimento educacional especializado”, ou seja: o que é necessariamente diferente no ensino para melhor atender às 54 especificidades dos alunos com deficiência, abrangendo principalmente instrumentos necessários à eliminação das barreiras que as pessoas com deficiência naturalmente têm para relacionar-se com o ambiente externo, como, por exemplo: ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras), do código braile, uso de recursos de informática, e outras ferramentas e linguagens que precisam estar disponíveis nas escolas ditas regulares. Na concepção inclusiva e na lei, esse atendimento especializado deve estar disponível em todos os níveis de ensino, de preferência na rede regular, desde a educação infantil até a universidade. A escola comum é o ambiente mais adequado para se garantir o relacionamento dos alunos com ou sem deficiência e de mesma idade cronológica, a quebra de qualquer ação discriminatória e todo tipo de interação que possa beneficiar o desenvolvimento cognitivo, social, motor, afetivo dos alunos, em geral. (FÁVERO, 2004, p.19) Na interpretação evolutiva das normas educacionais, há, portanto, que se entender e ultrapassar as controvérsias entre a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB de 1996) e a Constituição Federal de 1988. Segundo Mantoan, há mais uma razão para que a inclusão seja um mote em nossa educação escolar, ultrapassando-se os impasses de nossa legislação. A Constituição admite que o atendimento educacional especializado também pode ser oferecido fora da rede regular de ensino, em qualquer instituição, já que seria apenas um complemento, e não um substitutivo, do ensino ministrado na rede regular para todos os alunos. Mas na LDB (art. 58 e seguintes), consta que a substituição do ensino regular pelo ensino especial é possível. Segundo a opinião de juristas brasileiros ligados ao Ministério Público Federal (Fávero e Ramos, 2002), essa substituição não está de acordo com a Constituição, que prevê atendimento educacional especializado, e não educação especial, e somente prevê esse atendimento para os portadores de deficiência, justamente por este atendimento referir-se ao oferecimento de instrumentos de acessibilidade à educação. Práticas escolares que contemplem as mais diversas necessidades dos estudantes, inclusive eventuais necessidades especiais, devem ser regra no ensino regular e nas demais modalidades de ensino (como a educação de jovens 55 e adultos, a educação profissional), não se justificando a manutenção de um ensino especial, apartado. Além do mais, após a LDB de 1996 surgiu uma nova legislação, que revoga as disposições anteriores que lhe são contrárias. Trata-se da Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, celebrada na Guatemala, em maio de 1999. (MANTOAN, 2004, p.19) O Brasil é signatário desse documento, que foi aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 198, de 13 de junho de 2001, e promulgado pelo Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001, da Presidência da República. Esse documento, portanto, tem valor legal, já que se refere a direitos e garantias fundamentais da pessoa humana. A importância dessa convenção está no fato de que deixa clara a impossibilidade de diferenciação com base na deficiência, definindo a discriminação como [... ] toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, antecedente de deficiência, conseqüência de deficiência anterior ou percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais (art. 1º, nº 2 “a”). A mesma convenção esclarece, no entanto, que não constitui discriminação: [...] a diferenciação ou preferência adotada para promover a integração social ou o desenvolvimento pessoal dos portadores de deficiência, desde que a diferenciação ou preferência não limite em si mesma o direito à igualdade dessas pessoas e que elas não sejam obrigadas a aceitar tal diferenciação ou preferência (art. 1º, nº 2 “b”). De acordo com Mantoan, em nossa Constituição consta que educação visa ao pleno desenvolvimento humano e ao seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205), qualquer restrição ao acesso a um ambiente marcado pela diversidade, que reflita a sociedade como ela é, como forma efetiva de preparar a pessoa para a cidadania, seria uma “diferenciação ou preferência” que estaria limitando “em si mesma o direito à igualdade dessas pessoas”. 56 Essa norma, portanto, não se coaduna com a LDB de 1996, que diferencia a educação com base em condições pessoais do ser humano — no caso, a deficiência — admitindo a substituição do direito de acesso à educação pelo atendimento ministrado apenas em ambientes “especiais”. A LDB de 1996 não contempla o direito de opção das pessoas com deficiência e de seus pais ou responsáveis, limitando-se a prever as situações em que se dará a educação especial, normalmente, na prática, por imposição da escola ou da rede de ensino. Para essa nova corrente de interpretação jurídica da educação para pessoas com deficiência, as escolas atualmente inscritas como “especiais” devem, então, por força dessa lei, rever seus estatutos, pois, pelos termos da Convenção da Guatemala, a escola não pode intitular-se “especial” com base em diferenciações fundadas nas deficiências das pessoas que pretende receber. Segundo nossos juristas (Fávero e Ramos, 2002), nada impede, portanto, que os órgãos responsáveis pela emissão de atos normativos “infralegais” e administrativos relacionados à educação (Conselhos de Educação de todos os níveis, Ministério da Educação e Secretarias) emitam diretrizes para a educação básica, em seus respectivos âmbitos, considerando os termos da Convenção da Guatemala no Brasil, com orientações adequadas e suficientes para que as escolas em geral recebam com qualidade todas as crianças e adolescentes. Para os defensores da inclusão escolar é indispensável que os estabelecimentos de ensino eliminem barreiras arquitetônicas e adotem práticas de ensino adequadas às diferenças dos alunos em geral, oferecendo alternativas que contemplem a diversidade, além de recursos de ensino e equipamentos especializados que atendam a todas as necessidades educacionais dos educandos, com ou sem deficiências, mas sem discriminações (Mantoan, 1999, 2001). Todos os níveis dos cursos de formação de professores devem sofrer modificações nos seus currículos, de modo que os futuros professores aprendam práticas de ensino adequadas às diferenças. O acesso a todas as séries do ensino fundamental (obrigatório) deve ser incondicionalmente garantido a todos. Para tanto, os critérios de avaliação e de promoção, com base no aproveitamento escolar e previstos na LDB de 1996 (art. 24), devem ser reorganizados, de forma a cumprir os princípios constitucionais da 57 igualdade de direito ao acesso e à permanência na escola básica, bem como do acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um. Os serviços de apoio especializados, tais como os de intérpretes de língua de sinais, aprendizagem do sistema braile e outros recursos especiais de ensino e de aprendizagem, não substituiriam, como ainda ocorre hoje, as funções do professor responsável pela sala de aula da escola comum. As creches e escolas de educação infantil, dentro de sua atual e reconhecida função de cuidar e educar, não podem mais deixar de receber crianças PNEE, a partir de zero anos (art. 58, parágrafo 3º, LDB c.c. o art. 2º, inciso I, alínea “a”, da Lei nº. 7.853/89), oferecendo-lhes cuidados diários que favoreçam sua estimulação precoce, sem prejuízo dos atendimentos clínicos individualizados, que, se não forem realizados no mesmo ambiente, devem ser disponibilizados por meio de convênios, para sua facilitação. Como se esses motivos não bastassem para que a inclusão escolar revirasse o nosso quadro educacional de cabeça para baixo, a fim de que o conhecêssemos pelo avesso, temos ainda de considerar a organização pedagógica de nossas escolas. (MANTOAN, 2004, p.24) 58 CONCLUSÃO Desde muito cedo, a escola torna-se para a criança o centro da vida extra-familiar, ocupando a maior parte de seu dia-a-dia. Os professores que a criança tem, os métodos de ensino e os tipos de livros aos quais é exposta, terão efeitos importantes não apenas para o processo acadêmico, como também na capacidade geral para encarar a vida, dominar problemas e desafios novos, levando-a a adquirir autoconfiança e auto-estima. Podemos perceber que a maturação e a aprendizagem são processos diferentes, intimamente ligados, pois a maturação cria condições para que as aprendizagens ocorram. O desenvolvimento afetivo, o desenvolvimento motor e o desenvolvimento intelectual encontram-se no ser humano indissociáveis. Assim, para que a criança tenha um desenvolvimento saudável e adequado dentro do ambiente escolar, e conseqüentemente no social, é necessário que haja um estabelecimento de relações interpessoais positivas, como aceitação e apoio, possibilitando assim o sucesso dos objetivos educativos. Podemos dizer que é no interior das relações sociais que os indivíduos têm possibilidades de internalizar e transformar aquilo que aprenderam. A pessoa deficiente é também um ser sócio histórico, e através de sua relação com o meio desenvolverá todo o seu potencial de forma independente e autônoma. Para que haja a inclusão, é preciso que ocorram mudanças em vários níveis: nas escolas, nos equipamentos, no instrumental, nas informações disponíveis e nas atitudes dos profissionais envolvidos na tarefa da educação. Realizadas essas etapas, e rompendo as barreiras arquitetônicas, a escola terá melhores condições de atender aos alunos portadores de necessidades especiais em classes comuns. Entre os recursos humanos salientamos a necessidade de capacitação dos profissionais envolvidos no trabalho escolar. Essa capacitação exige desde o aumento ou implementação dos conhecimentos relativos à própria noção de deficiência até os recursos e técnicas pedagógicas que conduzam a equipe a um trabalho reconhecidamente produtivo e eficaz. 59 O papel do professor destaca-se como recurso humano essencial, a sua capacidade de contribuição com o processo educacional deve ser reconhecida e desenvolvida através de projetos de capacitação continuada, em que o professor se envolva integralmente, em condições adequadas de trabalho e cumprimento satisfatório de suas obrigações e responsabilidades éticas. Enfim, a escola, para ser considerada um espaço inclusivo, precisa deixar de ser uma instituição burocrática, que apenas cumpre as normas estabelecidas pelos níveis centrais. Para tal deve transformar-se num espaço de decisão, ajustando-se ao seu contexto real e respondendo aos desafios que se apresentem. A inclusão é uma proposta, um ideal. Se quisermos que nossa sociedade seja acessível, que dela todas as pessoas com deficiência possam participar em igualdade de oportunidades, é preciso fazer desse ideal uma realidade a cada dia. A ação de cada um de nós, das instituições e dos órgãos, deve ser pensada e executada no sentido de divulgar os direitos, a legislação e implementar ações que garantam o acesso de todos. 60 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ALMEIDA, Marina S. Rodrigues. Manual Informativo Sobre Inclusão Informativo Para Educadores [online] Disponível na internet via WWW Acesso em 17/04/2008 ARANHA, Maria Salete Fábio. Educação inclusiva: v. 3: a escola / coordenação geral SEESP/MEC; organização– Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 1994. ARANHA, M. S. F. Educação Inclusiva: transformação social ou retórica. In: OMOTE, S. (org.). Inclusão: intenção e realidade (pp. 37-60). Marília: Fundepe, 2004. ASHOKA, Empreendedores Sociais. Educação Inclusiva: o que o professor tem a ver com isso? 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