Abordagem coletiva Neste artigo, Dra Sheila trata dos hábitos de
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Abordagem coletiva Neste artigo, Dra Sheila trata dos hábitos de
HÁBITOS DE SUCÇÃO NÃO-NUTRITIVA: UMA ABORDAGEM EM SAÚDE COLETIVA Monografia apresentada ao Centro de Pesquisas Odontológicas São Leopoldo Mandic, como requisito para obtenção do título de Especialista em Saúde Coletiva. Autora: Sheila Oliveira Correa Martins Orientador(a): Prof(a) Vanessa Gallego Arias Pecorari RESUMO O hábito de sucção está presente no ser humano, desde a vida intra-uterina e, além de satisfazer a necessidade nutritiva, também deve satisfazer as necessidades psico-emocionais, que podem não ser alcançadas quando a amamentação materna não é conduzida adequadamente, acarretando no aparecimento de hábitos de sucção não-nutritiva. Pela revisão de literatura apresentada, a amamentação materna é, sem dúvida, a melhor estratégia para que estes hábitos não se instalem, porém se já estiverem presentes, a eliminação é possível de forma efetiva e atraumática. Como consequência destes hábitos, podem surgir as oclusopatias, consideradas como um problema de Saúde Pública, mas que através de atividades educativas e preventivas constituem-se de uma importante alternativa para tratá-lo coletivamente, sendo sua eficácia aumentada quando um programa de tratamento clínico interceptativo ocorre em paralelo. Outras considerações foram colocadas em relação aos tipos e tempo do hábito, aos tipos de oclusopatias e aos determinantes que podem interferir ou não no aparecimento destas. Tanto os profissionais como os pais têm papéis fundamentais na tarefa de promoção, proteção e recuperação em relação às oclusopatias, de maneira que todos utilizem a mesma linguagem. Palavras-chave: Amamentação. Oclusopatias. Sucção. Sucção não-nutritiva. ABSTRACT The habit of suction is present in the human being since intrauterine life and apart from satisfying nutritional needs, it must satisfy the psycho–emotional needs, which may not be achieved if the breast-feeding is not adequately done, leading to the appearance of non-nutritional suction habits. On reviewing the literature presented, breast-feeding is undoubtedly the best strategy to prevent such habits from turning up; however if they already exist, it is possible to eliminate them in an untraumatic and effective manner. As a consequence of such habits, malocclusion that is considered as a Public Health problem may ensue, but through educative and preventive activities they consist of an important alternative to treat it collectively, being its increased effectiveness when a program of interceptive clinical treatment occurs in parallel. Other considerations had been placed in relation to the types and time of the habit, to the types of malocclusions and the determinative ones that can intervene or not in the appearance of these. As much the professionals as the parents play an essential role in the task of promotion, protection and recovery in relation to the malocclusion in a way that everyone uses the same language. Keywords: Breast-feeding. Malocclusions. Suction. Non-nutritional suction. INTRODUÇÃO O hábito é o resultado da repetição de um ato com determinado fim, tornando-se com o tempo resistente a mudanças. A instalação do hábito ocorre por ser agradável e trazer satisfação e prazer ao indivíduo. Inicialmente, há participação consciente do indivíduo em realizar o ato, mas em função de sua repetição contínua, ocorre um processo de automatização e aperfeiçoamento, tornando-se assim inconsciente. É importante ressaltar que os fatores genéticos contribuem com cerca de 40% de sua influência para a futura determinação da normalidade, harmonia e beleza facial. Os restantes 60% do que vai acontecer à face de uma criança – em seu longo e continuado processo de crescimento e desenvolvimento – dependerão da interação da mesma com o meio ambiente, que inclui modo de vida, hábitos nocivos, doenças respiratórias/alérgicas, textura alimentar, forma de amamentação, etc (Koeler, Koeler, 2000). O ser humano, desde a vida intra-uterina, instintivamente realiza a sucção dos dedos, lábios e língua, de tal maneira que, no momento do nascimento, a função de sucção encontra-se plenamente desenvolvida. A sucção, além de satisfazer a necessidade nutritiva, proporciona a criança uma sensação de segurança, prazer e satisfação (sucção não-nutritiva), fazendo com que muitas vezes ela recorra à chupeta, dedo ou objetos quando atingiu a sensação de plenitude alimentar, mas não supriu suas necessidades emocionais. No recém-nascido, os lábios entrando em contato com o mamilo, a chupeta ou dedo, provocam movimentos de sucção. É um reflexo de alimentação e dele depende a manutenção da vida. Em decorrência deste evento, o sistema neuromuscular desenvolve mais precocemente a boca e depois as extremidades (Carvalho, 1995). A fase de sucção mal conduzida, leva à falência do correto desenvolvimento das estruturas, que irão garantir a perfeita evolução das funções seguintes, principalmente a respiração (Carvalho, 1995). Embora, todos os tipos de alterações da oclusão dentária sejam de interesse epidemiológico, à saúde pública interessa, principalmente, as alterações que interferem nas funções mastigatórias e de fonação. Tais casos incluem um componente estético que também é considerado no conjunto. Costuma-se falar em má-oclusão incapacitante. O percentual aceito universalmente é de que cerca de 1% das pessoas apresentam má-oclusão incapacitante. Nesses casos, mantida na dentição permanente, o tratamento ortodôntico seria indispensável. Do ponto de vista da saúde coletiva, pode-se atuar em todos os níveis de aplicação e de prevenção. Desta forma, deve-se tratar coletivamente o problema das oclusopatias, sendo de responsabilidade tanto do Cirurgião-Dentista quanto dos serviços públicos, identificálas, tratá-las, bem como promover estratégias para a aplicação de atividades educativas e preventivas. PROPOSIÇÃO Este trabalho teve como objetivo fazer uma abordagem sobre os hábitos de sucção não-nutritiva, suas consequências (oclusopatias), esclarecendo as formas de prevení-los e removê-los de maneira efetiva e atraumática. Enfatizou estratégias de promoção de saúde, proteção e recuperação das oclusopatias na Saúde Pública, com envolvimento multidisciplinar, destacando a importância dos pais nas ações a serem adotadas. REVISÃO DE LITERATURA A cavidade bucal humana tem seu crescimento, desenvolvimento e função intimamente ligados ao complexo muscular bucofacial. Durante o desenvolvimento normal da oclusão, os dentes irrompem num ambiente dinâmico onde atuam os músculos da mastigação, da língua e da face em geral, determinando um conjunto de atividades funcionais. Neste ambiente é imprescindível que sempre haja harmonia entre a atividade funcional e o crescimento das estruturas ósseas, e principalmente até que os dentes encontrem seus antagonistas na arcada oposta, entrando em oclusão. Quando tudo ocorre dentro dos padrões fisiológicos normais, predominam os papéis de “estimular” e “formar”. Assim sendo, qualquer modificação no mecanismo funcional poderá alterar o efeito de equilíbrio e formação, resultando em desvios e deformações no complexo craniofacial (Oliveira, 1995). Sucção fisiológica No primeiro ano de vida, a boca é a região mais importante do corpo, e a sucção, uma resposta natural própria da espécie; já nasce com o indivíduo (é um dos primeiros padrões comportamentais exibidos pelo recém-nascido). A partir da 29ª semana de vida intra-uterina, por meio de registros ultra-sonográficos já se pode observar a sucção, embora ela só esteja perfeitamente madura na 32ª semana. Também foram registradas imagens de fetos lambendo a placenta e o cordão umbilical, chupando dedo e deglutindo o líquido amniótico (Ross, Fisher, King, 1957). Gellin (1978) relatou que a partir do 5º mês de vida, quando a maioria dos bebês começa a etapa de coordenação entre a boca, as mãos e os olhos, a boca torna-se um meio de descobrir e investigar tudo o que aparece. Isto se deve ao fato de que a boca, nos bebês, caracteriza-se por sua alta sensibilidade tátil, maior até que a da polpa digital. Na literatura, os autores são unânimes em afirmar que a amamentação é o ponto de partida para um desenvolvimento harmonioso do sistema estomatognático e estético da face. Ela é a base para se evitar problemas futuros (Praetzel, Saldanha, Pereira et al., 2002; Zardetto, 2000; Zuanon, Oliveira, Giro et al., 1999). Amamentação materna O aleitamento materno é fundamental para a prevenção em saúde das crianças em todo o mundo, pois auxilia na redução da mortalidade infantil, diminui a ocorrência de processos alérgicos e gastrointestinais, favorecendo o adequado desenvolvimento das estruturas da face (Nascimento, Issler, 2003). Para Issler et al. (1994), a amamentação deveria ser uma atividade nata, ou seja, todas as mulheres deveriam estar preparadas para amamentar; no entanto isso não ocorre, sendo necessária a disponibilização de apoio psicossocial, suporte emocional e orientação didática para que as mães consigam oferecer o leite materno a seus filhos; portanto os programas de incentivo ao aleitamento materno são de suma importância ao aumento de sua prevalência. Todavia a campanha de incentivo ao aleitamento materno requer maior investimento na participação do pré-natal, dentro das maternidades, dos Centros de Saúde e uma retomada mais incisiva nas campanhas de conscientização (Figueiredo, Goulart, 1995), incluindo a equipe de saúde bucal. Arantes (1995), alegou que não se pode ignorar o lado negativo do amamentar e nem colocá-lo como fator impeditivo, tem que ser lançado mão dele como possibilidade de aproximação da mulher que amamenta, por meio de uma abordagem empática, para que, desse modo, possa abrir discussão e reflexão sobre a forma como a amamentação está se apresentando a ela. No momento em que isso emergir, haverá mais recursos na abertura de possibilidades para que a amamentação ocorra de modo real. Para isso é de fundamental importância a existência de vínculo entre profissional e mulher e, nesse sentido, propõe-se um trabalho individual com enfoque educativo. Ele apresentou um processo educativo com o propósito de discutir a amamentação sob a ótica de quem amamentou e, por meio dessas discussões, promover a reflexão sobre as dificuldades e ajudar a encontrar maneiras de lidar com elas. Assim, concluiu o autor que a educação para amamentação significaria habitar o espaço onde as mulheres, como seres humanos, estão ocupando com os outros, a partir da compreensão de que são possuidoras de horizonte de possibilidade. Granzoto et al. (1992) realizaram uma avaliação sobre a importância do incentivo à amamentação no período pré-natal feito por meio de palestras entre o oitavo e o nono mês de gestação com 348 primíparas de parto normal, sendo que 174 mães receberam incentivos pré-natal e as demais não, servindo estas como grupo de controle. As mães receberam alta hospitalar antes de 48 horas após o parto sem complicações, amamentando seus filhos exclusivamente ao seio. As visitas domiciliares iniciaram-se na primeira semana pós-parto e continuaram mensalmente até o sexto mês de vida do bebê. Encontraram uma diferença significativa estatisticamente a favor da amamentação no grupo que recebeu incentivo pré-natal, concluindo que estes são eficientes na prevenção da ocorrência do desmame precoce. A superioridade do leite humano como fonte de alimento e de proteção contra doenças e do ato de amamentar como fonte de desenvolvimento afetivo levou pesquisadores a recomendar a amamentação natural exclusiva por seis meses de vida (Souza et al.,1991; Siqueira et al., 1994 e Rea, 1998). Sendo assim a amamentação exclusiva até pelo menos o 6º mês, diminui a possibilidade de utilização de bicos artificiais evitando o fenômeno de “confusão de bicos” que leva ao desmame precoce. Os motivos já conhecidos, em favor da amamentação são muitos, como: a amamentação é prática; econômica; é a melhor opção como alimento, pois o leite da mãe é próprio da espécie; estabelece e desenvolve a relação afetiva mãe e filho; dá segurança emocional ao bebê; e muitos outros. A eles, podemos acrescentar que a amamentação promove o correto desenvolvimento das estruturas do aparelho estomatognático, através do equilíbrio das forças musculares de contenção interna e externa (Carvalho, 1995). Sucção não-nutritiva Os efeitos do ato de amamentar sobre o sistema orofacial têm produzido muitos estudos, relatando uma estreita relação entre tempo de lactância materna e hábitos deletérios, finalizando com as oclusopatias (Guerra, Mujica, 1977; Joseph, 1982; Junqueira, 1999; Martins, 1987; Melsen, 1987; Serra- Negra, 1997). As crianças tentam suprir suas necessidades neurais por meio de hábitos orais que, em muitos casos, levam a uma patogenicidade do sistema; portanto a importância da prevenção dos hábitos deletérios consiste em evitar ocorrências de oclusopatias (Queluz, Gimenes, 2000). Pastor & Franco (1999) alertaram que a chupeta não deve ser ofertada como apoio emocional, lazer e muito menos para substituir a atenção e carinho dos pais. Segundo alguns autores, quando este hábito perdura por muito tempo, tem-se observado, em muitos casos, que há falta de relacionamento materno-infantil (Sarmento, 1985). Commerford, em 1977, demonstrou que 92% das crianças que receberam amamentação natural exclusiva nos primeiros seis meses de vida não apresentaram hábitos bucais persistentes. Na deficiência do aleitamento materno não ocorre o amadurecimento físico e emocional da criança, promovendo então o aparecimento dos hábitos de sucção persistentes. A sucção é um reflexo natural e essencial só no início da vida e tende a desaparecer naturalmente por volta dos 4 anos de idade (Silva, 1986). Moss & Yong (1960) demonstraram que os músculos são os modeladores dos ossos. Se a função muscular não é plena e equilibrada, os ossos que têm origem e inserção nestes músculos terão desenvolvimento de maneira insatisfatória. A função desequilibrada conduzirá a uma arquitetura óssea também desequilibrada. Essa afirmação vem de encontro às conclusões de várias pesquisas que mostram o tempo de lactância materna influenciando nos hábitos e, por consequência, podendo levar a alguma oclusopatia (Guerra, Mujica, 1977; Serra-Negra, 1997; Robles, 1999; Baldrighi et al., 2001). Quando o hábito persiste até por volta de 3 anos de idade, provoca menos alterações na oclusão, de modo geral somente afetando a região anterior dos maxilares e, depois de retirado o estímulo, os mesmos seguem seu crescimento normal com equilíbrio oclusal. Quando o hábito persiste após essa idade, normalmente produz deformações significativas na oclusão, tais como: mordida aberta anterior, palato atrésico, hipodesenvolvimento mandibular e projeção do maxilar superior (Richetts, 1962; Segóvia, 1977; Moyers, 1991; Langlade, 1993). Os hábitos de sucção de chupeta, dedo, mamadeira e lábios geram grande polêmica entre os especialistas em reabilitação oral. O hábito é, a princípio, um reflexo que, com o tempo, se transforma em estímulos condicionados. Mudar ou eliminar esses hábitos é uma tarefa difícil que depende da idade, tempo e causa dos mesmos e a motivação do paciente (Gonçalves, 2001). Em sua tese de mestrado, Zardetto (2000) mostrou que, há muito, bicos artificiais são utilizados para acalmar as crianças que choravam. A chupeta, com bico de borracha como conhecemos, foi patenteada pela primeira vez em 1845; no entanto, há relatos históricos sobre bicos de 100 anos a.C. na Roma antiga, onde objetos de argila encontrados junto às sepulturas de crianças tinham formato de mamilo feminino. Mais tarde outros objetos em prata, marfim, etc. foram sendo usados. Encontraram-se até mesmo bicos de outras espécies “recheados” de esponja. Também precederam à chupeta, os chamados “trapos” de açúcar – retalhos de panos amarrados com migalhas de pão e açúcar dentro. No começo do século XIX, um inglês chamou a atenção para a falta de higiene e sugeriu que os alimentos fossem frescos e o pano sempre lavado. Somente a partir de 1864 é que a literatura começou a associar o uso destes artefatos com problemas de oclusão, diarréia, hidrocefalia e até mesmo morte. As chupetas são veículos de transmissão de enteroparasitos e coliformes fecais - em 49% das chupetas examinadas (Victora et al., 1993). Larsson (1975) fez um estudo e verificou que crianças que apresentam o hábito de sucção de chupeta estão mais predispostas a apresentar quadros de otite; isto pode ocorrer por que ao sugar a chupeta, a criança engole mais vezes, e se ela estiver com o nariz obstruído ou tampado, uma pressão negativa é criada na nasofaringe, o que é muito determinante para estabelecimento da otite. Devido ao padrão de respiração bucal que propiciam e à recidivantes infecções de amígdalas palatinas, há o risco de otite média aguda (Niemela et al.,1995). Koeler & Koeler (2000) alertaram para os casos de sucção de chupeta, nos quais cerca de um terço das crianças colocam o disco plástico dentro da boca, o qual pode ferir a gengiva marginal e o fino osso alveolar que suporta os dentes anteriores. Zardetto (2000) concluiu em seu estudo que tanto as chupetas convencionais quanto as ortodônticas podem causar alterações nos arcos dentais e na musculatura facial das crianças. Foram avaliadas características dos arcos dentais e de algumas estruturas faciais (lábios, bochechas, língua e palato duro) de 61 crianças, de 3 a 5 anos de idade, que apresentavam ou não o hábito de sucção da chupeta. Os resultados mostraram que 88% das 27 crianças que nunca usaram chupetas tinham uma relação favorável e normal dos arcos dentais e não apresentavam desvios miofaciais. E as crianças que utilizavam chupetas ortodônticas ou convencionais, 36% tinham os dentes da frente sobressalentes, e 50% apresentavam mordida aberta anterior. O erro está em pensar que as chupetas ortodônticas não fazem mal nenhum. Paunio, em 1993, estudou, em 1018 crianças de 3 anos de idade, na cidade de Turku, na Finlândia, a associação de hábito de sucção de chupeta e dedo com o aleitamento materno. Observou–se que, à medida que o tempo de aleitamento diminuía, aumentava o risco de a criança utilizar a chupeta até a idade de 3 anos, comparativamente às crianças que receberam aleitamento natural por 6 meses. Não foi possível estabelecer uma associação com o hábito de chupar dedo, devido ao pequeno número de crianças com esse hábito. Serra-Negra, em 1997, em trabalho realizado com 37 crianças de 3 a 5 anos, mostrou que aquelas com menos tempo de aleitamento materno desenvolveram maior frequência de hábitos bucais deletérios, com risco sete vezes superior às aleitadas no seio por período mínimo de seis meses; crianças com uso de mamadeira por mais de um ano apresentaram maior risco (10 vezes) de hábitos bucais viciosos do que aquelas que nunca utilizaram essa forma de aleitamento; e concluiu que hábitos bucais deletérios estão fortemente associados às maloclusões. Robles, em 1999, encontrou hábitos de sucção persistente (após os dois anos de idade) em 60% das crianças que não recebiam aleitamento materno e 71,74% entre as que foram amamentadas até 3 meses de idade. No entanto 55,55% das crianças que receberam amamentação além dos 9 meses de idade não apresentavam hábitos de sucção e, de todas as que tinham hábitos persistentes de sucção, 94,4% apresentavam oclusopatias. As crianças alimentadas no peito executam um intenso trabalho muscular ao sugar o seio materno, ficando a musculatura peribucal fatigada, o que faz com que a criança durma e não necessite da sucção da chupeta, dedo ou objetos (Moresca, Peres, 1992). Oclusopatias Christensen & Fields (1996) e Cunha et al. (1998) disseram que as alterações na dentição e na oclusão, provocadas pelo uso de chupeta ou por sucção digital, são, em geral, semelhantes. Mas a sucção do dedo, por ser este intracorpóreo, ter calor, odor e consistência muito aproximados aos do mamilo materno, e por estar sempre presente, torna mais difícil o controle e a remoção do hábito, persistindo após os três anos de vida, na maioria dos casos. Comparativamente, menos de um terço das crianças que usam chupeta a requerem além dos três anos de vida. A ocorrência, o tipo e a gravidade da má-oclusão, provocada pelo hábito de sucção de chupeta, dependem dos fatores relacionados com o próprio hábito (Tríade de Graber), da resistência alveolar e do padrão dentofacial inerente à criança (Graber, 1966; Silva, 1986). A Tríade de Graber é composta pela intensidade, que é a quantidade de força aplicada durante a sucção; pela frequência, ou seja, o número de ocorrências do hábito durante o dia; e pela duração, que se define como a quantidade de tempo que é dedicado ao hábito; este último é o fator mais crítico na movimentação dental produzida por um hábito de sucção (Christensen, Fields, 1996; Lino, 1982). Os problemas bucais mais frequentes, decorrentes dos hábitos de sucção nãonutritiva prolongados, são: mordida aberta anterior, normalmente com contorno circular; constricção da maxila e consequente mordida cruzada posterior; movimentação vestibular dos incisivos superiores e lingual dos inferiores; desenvolvimento de interposição lingual e alteração no padrão de deglutição e na articulação das palavras (Christensen, Fields, 1996; Cunha et al., 1998). Klein (1971), Zadik et al. (1977), Silva (1986), Estripeaut et al. (1989) e Cunha et al. (1998) afirmaram que, se a criança abandonar o hábito de sucção durante a primeira dentição, entre os três e os quatro anos de idade, existe a possibilidade de a mordida aberta anterior se auto-corrigir, embora essa correção espontânea possa ser prejudicada por outros hábitos deletérios, como interposição lingual e respiração bucal. Essa tendência de auto-correção diminui abruptamente quando o abandono do hábito ocorre na dentadura mista e, principalmente, na permanente. É importante destacar que os efeitos do hábito de sucção só se fazem sentir naqueles indivíduos cujo padrão esquelético facial predispõe à desvios mais drásticos. Da mesma forma, os padrões faciais corretos, definidos por forças inerentes ao crescimento, muitas vezes não são atingidos e, quando acontecem desvios, a simples remoção do hábito é o suficiente para a normalização do crescimento (Baer, 1987; Lino, 1982). As mordidas abertas anteriores geralmente estão presentes desde o início do desenvolvimento da dentição. Elas são mais frequentemente vistas na dentição decídua. Quando a mordida aberta é causada exclusivamente por sucção do polegar ou dedo, em geral corrige espontaneamente quando o hábito anormal é eliminado. A protrusão e a posição assimétrica dos incisivos superiores geralmente também desaparecem naturalmente. Estas correções usualmente ocorrem de modo espontâneo se o hábito anormal é interrompido antes da transição dos incisivos. (Van Hillegondsberg, 1959). Remoção do hábito de sucção não-nutritiva É impossível estabelecer uma idade para o início do tratamento de um hábito bucal indesejável. O momento oportuno varia de indivíduo para indivíduo, de acordo com o desenvolvimento da criança e a gravidade do hábito, sendo que cada criança deve ser examinada à luz de sua personalidade e de seu ambiente psicoafetivo (Langrade, 1995; Toledo, Bezerra, 1996). A remoção da chupeta deve ser gradativa, uma vez que o hábito de sucção está relacionado a fatores emocionais; há relatos de interrupção abrupta do uso da chupeta que levou ao desenvolvimento de hábitos ainda mais deletérios (Pastor, Franco, 1999). Por um consenso alcançado e disseminado entre os profissionais de saúde, a interrupção do hábito de sucção da chupeta é desejável o mais cedo possível, pois a flexibilidade óssea guarda uma relação inversa com a idade (Silva, 1986). Walter et al. (1996) sugeriu o uso de medidas não-traumáticas para remoção desse hábito, como por exemplo, sugestão noturna, que consiste na utilização da fala durante o sono profundo, com o objetivo de atingir o subconsciente, devendo ser utilizada frase curta e objetiva, evitando-se a palavra “não”; outro componente importante é não mencionar nada relativo ao uso da chupeta durante o dia. Black et al. (1990), Lino (1994) e Cunha et al. (1998) sugeriram o método da conscientização da criança e dos pais, que consiste no esclarecimento sobre as possíveis alterações clínicas que o hábito de sucção poderá determinar no paciente, através de visualização no espelho, fotografias, gravuras e livros e slides, associado ao reforço positivo, que pode ser qualquer elemento que fortaleça o comportamento adequado, tais como elogios, sorrisos, abraços e prêmios. As ameaças e medidas punitivas, em geral, são infrutíferas como tentativa de motivar a criança a deixar este hábito. Deve-se evitar colocar pimenta, pois isso não traz benefício algum. Areal et al. (2005) apresentaram uma técnica para remoção de hábitos de sucção não-nutritiva, em crianças alfabetizadas ou não, sendo em três etapas: conversa com os pais ou responsáveis; a apresentação do problema à criança e o desenvolvimento das atividades lúdicas. Lembrou que, é fundamental que a criança e a família estejam motivadas a abandonar o hábito, motivação que é mantida pelo diálogo e carinho proporcionados pelos momentos em família. O hábito é sempre prazeroso e sua substituição por esses momentos facilita seu abandono. Entretanto, frente às dificuldades familiares algumas crianças podem necessitar de acompanhamento psicológico especializado. Foram concluídos dez casos, sete com completa remoção do hábito em aproximadamente quatorze dias e três que necessitaram de quatro meses. Todos permaneceram sob monitoramento e sem a retomada do hábito. Saúde Pública e oclusopatias Saúde Pública é o diagnóstico científico dos problemas de saúde de uma comunidade e a aplicação de medidas individuais e coletivas para controlar esses problemas, evitando a sua progressão ou reduzindo sua ocorrência para níveis suportáveis do ponto de vista econômico e aceitáveis do ponto de vista social. O conceito de Saúde Pública transcende a saúde no plano individual e não deve ser confundida com aquela realizada apenas pelo Estado. A implementação de medidas coletivas que favoreçam a saúde de seus usuários, por estas e outras razões, denomina esta área do conhecimento de Saúde Coletiva (Frazão, 1999). O conjunto de ações que conformam um sistema de prevenção, quando bem planejado e executado, pode reduzir cárie dentária, doença periodontal, oclusopatias e câncer, levando a um movimento em direção à saúde coletiva, com conquistas de cidadania, resultando em maior acesso às ações de Serviços de Saúde (Frazão, Narvai, 1996). No Brasil, pode-se considerar que as oclusopatias ocupam a 3ª posição na hierarquia dos problemas de saúde bucal. Sua etiologia justifica-se pela interação de variáveis genéticas e ambientais incluindo estímulos nocivos que atuam principalmente durante a formação e desenvolvimento do complexo orofacial (Penteado, Almeida, Leite, 1995). A prevalência de problemas oclusais moderados ou severos foi de 14,5% no Brasil, variando de um mínimo 5,6% na Região Norte a um máximo de 19,4% na Região Sul, na idade de 5 anos. A prevalência da condição oclusal muito severa ou incapacitante foi de cerca de 21% nas crianças de 12 anos e cerca de 19% em adolescentes de 15 a 19 anos (Brasil, 2004). O nível de prevenção nobre em ortodontia é basicamente educacional; é o nível mais econômico e social de todos, não há a presença de oclusopatias, apenas alteração funcional do sistema estomatognático, atuando na amamentação, respiração, mastigação, dieta, higiene, dependendo fundamentalmente de fatores educacionais a serem divulgados à comunidade. Já o nível inferior primário não utiliza aparatologias para a atuação onde já existe a oclusopatia, atuando-se no restabelecimento do equilíbrio da mastigação com desgaste seletivo, orientação mastigatória e na dimensão vertical (Simões, 2003). DISCUSSÃO A sucção é um reflexo natural e essencial só no início da vida, e tende a desaparecer naturalmente por volta dos 4 anos de idade (Silva, 1986). As crianças tentam suprir suas necessidades neurais por meio de hábitos orais que, em muitos casos, levam a uma patogenicidade do sistema; logo, a importância da prevenção dos hábitos deletérios consiste em evitar ocorrências de oclusopatias. Na deficiência do aleitamento materno não ocorre o amadurecimento físico e emocional da criança, promovendo, então, o aparecimento dos hábitos de sucção persistentes (Queluz, Gimenes, 2000). Os efeitos do ato de amamentar sobre o sistema orofacial têm produzido inúmeros estudos, relatando uma estreita relação entre tempo de lactância materna e hábitos deletérios, finalizando com as oclusopatias (Guerra, Mujica, 1977; Joseph, 1982; Martins, 1987; Melsen, 1987; Serra-Negra, 1997; Junqueira, 1999). Após o nascimento e na primeira hora depois do parto, há um grande impulso neural de sucção. Não podemos, por exemplo, deixar que a rotina hospitalar interfira ou impossibilite a plenitude de satisfação desse impulso, pois esse é o momento que pode assegurar o sucesso da amamentação. A sucção é a primeira fase da mastigação, antes da evolução neurológica. Os músculos utilizados para esta função respondem aos estímulos e, na fase seguinte, estarão prontos para a mastigação. A sucção mantém a tonicidade e a postura musculares e, tanto na sucção, como na mastigação, temos a ação do mesmo conjunto de músculos (Carvalho, 1995). É importante destacar alguns aspectos quanto à sucção: ela pode estar presente desde os 4 meses de vida I.U., até os 4 anos de idade o hábito de sucção faz parte do desenvolvimento normal da criança, as alterações oclusais ocorridas até essa idade, geralmente, recidivam com a interrupção do hábito e, após os 4 anos de idade podem ocorrer alterações morfológicas permanentes. A orientação deve começar ainda na gestação, quando os pais, em especial a mãe, estão bem receptivos. A amamentação natural deve ser reforçada, pois irá satisfazer as duas “fomes” de sucção: a nutritiva e a muscular, além de promover o vedamento labial que será fundamental na prevenção da respiração bucal. Na ordenha, a língua comporta-se da seguinte maneira: coloca-se entre os rodetes gengivais, apanha o mamilo com a ponta voltada para cima e o coloca na papila incisiva. A mandíbula faz um movimento de retrusão, quando comprime as células lactíforas. Então a língua faz ligeira dobra nos bordos, como uma concha, para conter o leite. A musculatura central da língua começa então um movimento ondulatório, para levar o leite do palato mole até excitar a deglutição (Carvalho, 1995). No contexto da Saúde Coletiva, a amamentação natural exerce um papel socioeconômico fundamental, pois não resulta em ônus financeiro para a família, sendo um excepcional alimento sob a visão nutritiva, além dos benefícios imunológicos, emocionais e fonoaudiológicos exercidos pela mesma (Serra-Negra, 1997). Em relação ao hábito de sucção digital, frequentemente, a superfície ventral do polegar toca o palato e se apóia sobre os incisivos inferiores, atuando como alavanca. Algumas vezes, podemos observar a língua entre o polegar e os incisivos inferiores. A pressão exercida pelo dedo sobre os dentes, os lábios e o palato têm potencial para alterar a direção e interferir no crescimento craniano. As chupetas anatômicas - mais adaptáveis ao formato da boca - não são tão inofensivas como muitos pais pensam. O mesmo percentual de crianças que usaram o produto convencional e anatômico - 50% do total de ambos - tiveram alteração no espaço entre os dentes de cima e o de baixo. A alteração acabou causando dificuldades de fala e mastigação (Zardetto, 2000). “É preciso que nós, profissionais que trabalhamos com as funções do aparelho estomatognático experimentemos sugar qualquer líquido numa mamadeira para perceber a diferença de trabalho de sucção e na ordenha” (Carvalho, 1995). As maloclusões advêem da falta de espaço que, por sua vez, é gerada pela falta de função em decorrência da ausência de estímulo neural, não adquirido através da amamentação (Zardetto, 2000; Zuanon, Oliveira, Giro et al., 1999). Graber (1966), disse que as oclusopatias - desvios morfo-funcionais do aparelho mastigatório-, podem ser causadas por fatores gerais ou extrínsicos ou fatores locais ou intrínsicos e, neste caso os hábitos de sucção não-nutritiva, estão classificados como fatores gerais de oclusopatias. Dentre os determinantes da oclusopatia, devemos tomar por base a Tríade de Graber que relaciona frequência, duração e intensidade do hábito. As alterações morfológicas que podem ocorrer em decorrência da sucção são: mordida aberta anterior dento-alveolar circular, inclinação vestibular acentuada dos incisivos superiores, ausência de selamento labial passivo, diastemas entre os incisivos e atresia maxilar. São observados, também: maior incidência de traumas nos incisivos superiores por causa da hipotonicidade do lábio superior e à falta de proteção devido a sua inclinação, mordida cruzada posterior, aumento da sobremordida, redução na largura da arcada dentária superior em função da alta atividade muscular na região de molares durante a sucção, desenvolvimento de interposição lingual e alteração no padrão de deglutição e alteração na articulação das palavras. Outros parâmetros devem ser levados em consideração quanto a presença e o grau de severidade dos efeitos nocivos dos hábitos de sucção não nutritiva: posição da chupeta ou do dedo na boca; idade do término do hábito; padrão de crescimento da criança; grau de tonicidade da musculatura bucofacial. Em decorrência da sucção não nutritiva, o paciente poderá ter interposição labial e deglutição atípica, sendo esta última primária ou visceral e, secundária ou adaptativa. Além dos problemas relacionados com a cavidade bucal, o hábito de sucção do dedo pode ocasionar desde problemas de pele até deformidades na posição e função dos dedos, deformidades estas nem sempre reversíveis sem intervenção cirúrgica. Décadas se passaram após a desvalorização do aleitamento natural e os prejuízos pela falta da sua prática foram sendo percebidos e estudados também sobre o sistema estomatognático. Atualmente, a população apresenta alta frequência de oclusopatias, para cuja ocorrência muitos autores destacam a grande influência do tempo do aleitamento natural na etiologia e prevenção de oclusopatias (Simões, 2003). Após os seis meses de vida, paralelamente à amamentação natural, a introdução novos alimentos é um momento de especial atenção para que o hábito de sucção não-nutritiva se instale. Nessa fase a necessidade fisiológica de sucção vai aos poucos dando lugar a sorver (alimentos pastosos) e por fim de mastigar (alimentos mais sólidos). Por isso, não se deve liquefazer a sopa do bebê e nem colocar “mingaus” na mamadeira – utiliza-se a colher. Também nessa fase, o bebê já está apto a utilizar copos de transição ou, mais próximo de fazer um ano, os copos com canudos. Caso o hábito já esteja instalado, algumas medidas devam se aplicadas: não deixar o objeto (mamadeira, chupeta) à mão; a chupeta não deve ser presa com correntinhas, presilhas ou fraldas (muitas vezes, usadas como “cheirinhos”); quando o bebê estiver com a chupeta pendurada na boca, sem sugar, distraí-lo, pois provavelmente ele irá soltá-la; jamais utilizar a chupeta como “rolha” para que o bebê pare de chorar, pois o choro é um canal de comunicação enquanto ela não sabe falar. Para Black et al. (1990), a primeira medida a ser tomada é a de solicitar ao paciente que observe e tome conhecimento da presença do hábito e a eliminação é feita de maneira consciente. Alguns recursos lúdicos podem e devem ser adotados como auxiliares no abandono do hábito. O profissional pode desenhar bonecos nos dedos das crianças, os quais se tornam, assim, personagens. Quando a criança tem entre oito ou nove anos, ela mesma pode diariamente desenhar o boneco. Pela manhã ou quando o boneco se apagar, os responsáveis podem lembrá-la de desenhá-lo. Esses personagens serão controlados e dominados pelas crianças. Compete ao profissional, porém, despertar sua imaginação e fazer com que não levem mais seus dedos à boca. Pode-se dizer que a boca é um lugar escuro, úmido e que o “dedo (fulano)” não gosta de morar lá, que prefere um lugar mais confortável, por exemplo, o travesseiro. O mesmo pode ser feito com a chupeta, confeccionando uma “caminha” de papel para que a chupeta possa “dormir” em um local mais apropriado, que não seja a boca. As histórias devem ser conduzidas de acordo com as fantasias de cada criança, citar seus personagens favoritos, brincar com sua imaginação (Areal et al, 2005). Se a criança utilizar a chupeta para adormecer, os pais devem retirá-la assim que pegar no sono evitando que fique com a mesma a noite inteira. Este é um aspecto muito importante, pois nesta época se estabelece a conexão neurológica responsável pelo fechamento dos lábios e a presença do bico artificial por longos períodos dificulta esta conexão. Outro fator, é que a criança que está acostumada a permanecer com a chupeta a noite toda, acorda e chora assim que a “perde” no berço. Tanto o profissional como os pais têm papéis fundamentais nesta tarefa: o profissional deve atuar na motivação da criança por meio de slides, modelos ou fotos de dentes bonitos e feios, explicando como ocorreu cada uma destas situações. Deve-se falar sempre numa linguagem positiva e acessível à criança, de forma que ela compreenda o que lhe está sendo pedido. Não menos importante é a função dos pais, que em casa, devem reforçar tudo que for dito pelo profissional no consultório, de maneira que todos utilizem a mesma linguagem. Deve-se estabelecer metas e cada vez que a criança conseguir alcançála, deve ser recompensada. Situações nas quais a criança é ridicularizada devem ser evitadas. Na opinião da maioria dos profissionais, o método mais aconselhável é a motivação sem chantagens. Quando a decisão parte da criança, raramente haverá recaída. Deve-se respeitar o ritmo da criança, tomando cuidado com o excesso de atividades que pode gerar estresse. Reservar alguns momentos do dia para ficar exclusivamente com a criança. Uma criança feliz e bem assistida terá muito menos chance de desenvolver hábitos bucais nocivos. A amamentação natural é o nível de prevenção de oclusopatias mais econômico e social de todos, dependendo fundamentalmente de fatores educacionais a serem trabalhados na comunidade para que não aconteça o desmame precoce (Simões, 2003). No contexto da Saúde Coletiva, a amamentação natural exerce um fundamental papel sócio-econômico, pois não resulta em ônus financeiro para a família, sendo um excepcional alimento sob a visão nutritiva, além dos benefícios imunológicos, emocionais, fonoaudiológicos e de desenvolvimento da face, exercidos pela amamentação (Serra-Negra, 1997; Nascimento, Issler, 2003; Simões, 2003). Utilizando-se o índice da Organização Mundial da Saúde (1987), foi observada uma frequência na amostra, como se segue: oclusopatias leves 58,6% e oclusopatias moderada/severa 37,1% (total de 95,7%). Frazão (1999) observou que, aos 5 anos de idade, 22,9% das crianças apresentavam oclusopatia leve, 26,1% oclusopatia moderada/severa, totalizando 64,5% de oclusopatia e 35,5% de oclusão normal. O projeto SB Brasil 2003 (2004) obteve oclusopatias leves em 22%, oclusopatias moderada/severa em 14,5%, totalizando 36,5 de oclusopatia e 63,5% de oclusão normal. Observa-se que, quando se somam as frequências de oclusão normal e oclusopatias leves nos diversos levantamentos, os resultados se aproximam. Provavelmente, o índice utilizado para dentição mista e permanente não é um índice específico para o estágio de desenvolvimento da dentição decídua seja a causa das diferenças de resultados. Sugere-se que, em serviços públicos, especialmente em serviços de atenção primária e secundária, onde se insere boa parte das atividades ortodônticas, a equipe de saúde bucal trabalhe a questão do aleitamento materno, inserindo-se na realidade do cotidiano dessas mães, promovendo reflexão e buscando, ainda na fase de aleitamento, acompanhamento para encontrar maneiras de lidar com possíveis soluções para que não aconteça o desmame precoce, trabalhando, assim, a promoção de saúde do bebê. O tema “educar para a amamentação” deveria ser considerado também dentro da área de atenção básica dos serviços de Saúde Pública (Granzoto et al., 1992; Issler et al., 1994; Arantes, 1995), também em decorrência das implicações na etiologia e prevenção de oclusopatias, atuando dessa forma em nível nobre de prevenção em programas de prevenção ortodôntica (Simões, 2003). Dentre as estratégias de promoção, proteção e recuperação a serem adotadas, em relação às oclusopatias, temos: 1-promoção da amamentação (orientação às gestantes no pré e pós-natal e valorização da Norma Brasileira para Comercialização de Alimentos para Lactentes, crianças de primeira infância, bicos, chupetas e mamadeiras – NBCAL) (Senac, 2007); 2-remoção de hábitos deletérios (chupeta, mamadeira e dedo); 3-estímulo à ingestão de alimentos fibrosos (introdução de alimentos como maçã e cenoura crua, na dieta das crianças, nas EMEIs); 4-valorização da respiração nasal (higienização nasal supervisionada e acompanhamento fonoaudiológico) e 5-prevenção da cárie (atividades educativas em associação às atividades terapêuticas de higienização bucal e fluorterapia por grupo de risco). Os casos de oclusopatias (mordida aberta anterior, mordida cruzada anterior e posterior e perda precoce de molares decíduos) identificados deverão ser encaminhados a um profissional habilitado, seja de Instituição pública ou particular. CONCLUSÃO A sucção é um processo que se desenvolve antes mesmo do nascimento, durante a gestação. Deste reflexo depende a alimentação do bebê. Contudo, além da questão nutricional, a sucção também deve satisfazer as necessidades psico-emocionais, que podem não ser alcançadas quando a amamentação materna não é conduzida adequadamente, acarretando no aparecimento de hábitos de sucção não-nutritiva. O ponto fundamental do hábito é a sua prevenção, que por sua vez está baseada na educação; quanto antes for iniciada, melhores serão seus resultados. O uso de mamadeiras ou chupetas causa a “confusão de bicos”, podendo levar o bebê ao desmame precoce e, diferentemente do que algumas pessoas concluem, o uso da chupeta, tanto convencional como anatômica, favorece o desenvolvimento de oclusopatias. Existem várias formas para tentar eliminar o uso de objetos que causam o hábito de sucção-nutritiva, sendo mais efetivos os não-traumáticos. Atividades educativas e preventivas constituem-se de uma importante alternativa para tratar coletivamente o problema das oclusopatias, sua eficácia é aumentada quando um programa de tratamento clínico interceptativo ocorre em paralelo. Em relação à Saúde Pública, as oclusopatias devem ser objeto de preocupação dos especialistas, planejando e executando levantamentos epidemiológicos a fim de observar o comportamento do problema na população, e avaliando as medidas de prevenção e controle adotadas em programas de odontologia em saúde coletiva. REFERÊNCIAS 1. Arantes CIS. 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