ExEmplo dE boa govErnança E dE como EnfrEntar a crisE

Transcrição

ExEmplo dE boa govErnança E dE como EnfrEntar a crisE
| Capa / Investimentos
Exemplo de boa
governança e de
como enfrentar a crise
Grupo Pão de Açúcar exibe resultados espetaculares em
meio à crise, contrata mais de mil empregados e pode
investir 1,2 bilhão de reais em 2009. Em entrevista exclusiva
à LIDE, Abílio Diniz conta como alcançou esse desempenho
Giovanna nucci
N
18 | LIDE
o início do mês de
março, em meio ao
nevoeiro despertado
pela crise internacional, o Grupo Pão de Açúcar, uma das
maiores corporações do país, revelou seu balanço financeiro de 2008.
O que se viu é que as duas rochas
que o simbolizam continuam, exuberantes, no mesmo lugar – e mais
sólidas do que nunca. Com reservas
de 1,7 bilhão de reais em caixa, lucro
líquido de 372 milhões de reais, 30%
superior ao registrado em 2007, e orçamento de 1,2 bilhão de reais para
2009, bem superior aos 550 milhões
de reais investidos no ano passado, a holding de capital aberto que
controla quatro bandeiras do varejo
supermercadista atravessa um dos
melhores momentos de sua história.
“Nos preparamos para a crise e estamos colhendo os resultados de boas
práticas de governança corporativa”,
resumiu à LIDE o empresário Abílio
Diniz, presidente do Conselho de
Administração do Pão de Açúcar e
uma das vozes mais respeitadas do
empresariado nacional. “A econo-
mia estava caminhando para um
mundo de fantasia, irreal, e nós percebemos isso a tempo.”
Para alcançar os resultados espetaculares de 2008 e entrar em
2009 a plena força – a ponto de ter
contratado nada menos que 1,4 mil
funcionários em janeiro –, Abílio e
seu grupo redimensionaram o plano de investimentos da companhia,
executaram um exaustivo trabalho
de baixa de estoques e, agora, criaram um comitê destinado exclusivamente a atuar pela melhor performance de suas ações na Bolsa de
Valores. Movimentos de quem não
tem medo da crise. “Para enfrentar
esse momento, é preciso ter caixa,
ficar quieto, abaixar a cabeça e esperar a tempestade passar”, aconselha, com bom humor, o empresário
eleito mais de uma vez, por órgãos
como os jornais Valor Econômico,
Gazeta Mercantil e a revista IstoÉ
Dinheiro, a personalidade empresarial do ano no Brasil. À LIDE, para
analisar a crise, ele concedeu uma
entrevista exclusiva cujos trechos
principais estão a seguir:
LIDE | 19
Divulgação
“Os primeiros
sinais da crise
puderam ser
vistos por todos,
mas foram
ignorados pela
maioria”
LIDE – Qual o seu diagnóstico
sobre a crise?
Abílio Diniz – O que dá para ver
é que esta é uma crise que já vinha
sendo anunciada há muito tempo.
Havia uma percepção muito grande de que a economia caminhava,
cada vez mais, para um mundo irreal, que pode até ser chamado de
mundo da fantasia. Os ativos estavam supervalorizados, os múltiplos pagos pelas empresas vinham
muito acima do que seria um retorno considerado adequado, o
mercado estava muito especulativo e com apostas excessivamente
altas. Ganhava-se muito dinheiro
ou, ao menos, havia expectativa de
se ganhar muito. A verdade é que
estava fácil ganhar dinheiro, este é
um ponto que temos de reconhecer. Mas também, evidentemente,
estava fácil perder. Quando uns ganham muito, outros têm de perder.
LIDE – Quais foram os sinais
mais evidentes de que a crise batia à porta?
Diniz – Os primeiros sinais puderam ser vistos por todos, mas ignorados pela maioria. Aquilo que é
considerado o início da crise, a bolha imobiliária nos Estados Unidos
e na Europa, teve seus sinais evidenciados durante muito tempo. O
problema que ocorreu no mercado
financeiro também já era anunciado. O que aconteceu foi um aumento muito grande da desregulamentação do setor financeiro. E a
maneira como esse setor concedia
o crédito, com grande facilidade, já
era uma preparação para um dia
perder. Os ativos podres, hoje, estão nos bancos, e isso não aconteceu por acaso. Não é obra de fatalidade nenhuma. Isso foi construído,
e construído durante muito tempo,
com uma certa complacência dos
órgãos reguladores, quer sejam os
bancos centrais, os governos, as
Bolsas de Valores e os mecanismos
de fiscalização das companhias
abertas. Outro ponto que explica a
crise está nos erros cometidos pelos executivos com a negligência
dos donos do capital, os acionistas.
Hoje, principalmente nos Estados
Unidos, culpa-se muito os executivos pela má condução das companhias. Mas e os donos, os acionistas, o que eles fizeram? É claro que
eles deram liberdade demais para
seus executivos.
LIDE – No ápice dos ganhos fáceis, muita gente aproveitou para
enterrar as empresas familiares.
Diniz – Existe muita negligência
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Giovanna nucci
| Capa / Investimentos
“O que eu digo é que os detentores do capital
não assumiram a sua responsabilidade de
controlar as decisões estratégicas das empresas”
também na empresa familiar. O
que eu digo é que os detentores
do capital não assumiram a sua
responsabilidade de controlar as
decisões estratégicas das empresas. Além disso, é preciso haver
regras muito claras para o trabalho
executivo. E como isso é feito nas
companhias abertas ou familiares,
de todos os tipos? Por meio do que
se chama governança corporativa.
Foi essa governança que falhou – e
muito – nesse processo, o que permitiu que os executivos falhassem
mais ainda. Tudo isso levou a uma
situação muito irreal.
LIDE – Como está o Grupo Pão
de Açúcar neste cenário?
Diniz – Muito bem. Nós acabamos entrando na crise muito bem
preparados para enfrentá-la. No
ano passado, sentimos que alguma coisa iria acontecer. Mantivemos o caixa alto, seguramos um
pouco os investimentos no final
de 2008 e agora continuamos nossos planos absolutamente dentro da tranquilidade. A questão é
que eu não vou olhar o Brasil e a
situação do mundo por meio da
imagem que eu tenho da minha
empresa.
LIDE – Mas é um fator positivo o
grupo ter contratado 1,4 mil colaboradores em janeiro.
Diniz – O varejo funciona assim.
Janeiro é um mês em que ocorrem
muitas recontratações de pessoas.
De qualquer forma, nós estamos
bem. Aliás, o comércio como um
todo está bem, e o consumo interno, muito bem.
LIDE – Qual é a melhor fórmula
para enfrentar a crise?
Diniz – Tem de ter caixa, ficar quieto, abaixar a cabeça e esperar a tempestade passar. E tem de aguentar.
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Divulgação
| Capa / Investimentos
soa, mesmo aí existe o bloco controlador. Esse bloco tem de exercer
as suas atividades e responsabilidades dentro da companhia. A diretriz
estratégica vem do dono, isto é, do
conselho, daqueles que representam o capital. Os executivos podem
dialogar muito, colocar suas opiniões, ideias e até a sua criatividade,
mas a palavra final tem de ser dada
pelo conselho, os chamados donos.
“No passado, sofremos críticas que diziam
que essa era uma empresa de um rosto só.
Hoje, acredito, não é mais assim”
Nós aqui estamos fazendo isso. O
Cláudio Galeazzi está fazendo um
excelente trabalho na diminuição
do volume total do estoque, com
um índice de performance bastante bom. Nos últimos anos, tivemos
certas dificuldades na parte administrativa, com presidentes que não
tiveram o desempenho que a gente
esperava. Mas desde a chegada do
Galeazzi, as coisas voltaram a ficar muito tranquilas e resgatamos
nossa performance. Se trabalhar
certinho, dá. Se começar a inventar,
criar muito, vai ter problemas.
LIDE – É o melhor momento da
história do grupo?
Diniz – É um momento muito
bom, repito. No passado, sofremos
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críticas que diziam que essa era uma
empresa de um rosto só. Hoje, acredito, não é mais assim. Não somos
mais uma empresa familiar desde
1995. Gostamos de participar do
mercado aberto. Quando iniciei a
profissionalização, cometi o erro de
dar um espaço muito grande para
os executivos. Nós nunca deixamos,
dentro do conselho de administração, de dar as diretrizes principais,
mas aconteceu de, em nome da
profissionalização, abrir um espaço
operacional muito grande para os
dois presidentes que estiveram aqui
antes do Galeazzi. Isso não foi bom,
principalmente no período de 2006
e 2007. A parte operacional ficou
muito na mão dos executivos, e isso
não foi bom. Com a chegada do Ga-
leazzi, em 2008, balizamos um pouco mais o caminho para ele, e isso foi
excelente. Promovemos um alinhamento maior entre os acionistas e os
executivos. Daí, voltamos a ser o que
éramos, voltamos a trabalhar com
tranquilidade e ter uma performance muito boa. Nada mais precisou
mudar, apenas ter esse alinhamento
entre conselho e profissionais, donos de capital e executivos.
LIDE – Ou seja, o dono tem sempre de estar em campo atuando,
é isso?
Diniz – Não tenho dúvida nenhuma sobre isso. O papel do dono é
fundamental. Mesmo quando a
companhia não tem mais de 10%
de suas ações na mão de uma pes-
LIDE – Como o senhor se posiciona no debate sobre as remunerações de executivos?
Diniz – Nós, aqui, remuneramos bem. Essa é uma empresa
que paga bem. Estamos sempre
pesquisando o mercado. É fácil
saber o que os outros fazem. Nós
procuramos nos posicionar, em
matéria de salário, acima do mercado. Trabalhamos muito com
bônus, e é por isso que temos
bons executivos. Uma coisa é
acreditar que basta pagar bem ao
executivo para ele fazer milagre.
Isso não acontece. O que eu defendo é o alinhamento de toda a
governança corporativa, com responsabilidades compartilhadas
entre os detentores do capital e
os executivos. Quando se está alinhado, você pode até errar, mas
erra com todo mundo junto.
Giovanna nucci
LIDE – Tem hora, então, que
a democracia acaba na gestão
da empresa?
Diniz – Não é isso. Podem di-
zer que o Abílio prega um certo autoritarismo. Não, o que eu
prego é que as pessoas tenham
suas responsabilidades muito
bem definidas. E, no final, quem
manda é o dono. Afinal, quem
tem o controle tem responsabilidade maior.
“O papel
do dono é
fundamental.
Os executivos
podem dialogar
muito, colocar
suas opiniões,
ideias e até a
sua criatividade,
mas a palavra
final tem de ser
dada pelo dono”
LIDE | 23
| Capa / economia
“É preciso resgatar
a confiança”
Ex-presidente do Banco Central, Gustavo Loyola diz
que o mercado interno é uma das armas mais poderosas
para enfrentar as turbulências na economia
Delfim Netto afirma que o Brasil vai continuar a crescer,
fala da quebra de confiança no mercado financeiro
internacional e propõe uma queda nos juros
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do que outros emergentes e do que
muitos países ricos da Europa e os
Estados Unidos.” Loyola assinala
que o país foi poupado do “aspecto mais agudo da crise” à medida
que os bancos públicos e privados
se mantiveram sólidos, enquanto
grandes instituições financeiras
internacionais se derretiam.
Essa solidez do sistema financeiro nacional e a amplitude do
mercado interno são dois alicerces que sustentarão a volta do investimento estrangeiro produtivo
no Brasil, segundo o economista.
“Em meio a essa forte tempestade
mundial, a economia brasileira
está dando um recado de que é
resistente. O investidor estrangeiro já está percebendo que, ao
colocar dinheiro aqui, inclusive
diretamente no setor produtivo,
corre menos riscos do que se fizer o mesmo em outros lugares”,
diz. “Já provamos ser bem mais
resistentes, por exemplo, do que
as economias do Leste Europeu,
em especial a da Rússia, cujos
problemas são bem mais graves
do que os nossos. Eles, e muitos
outros, por entrarem mais fundo
na crise, terão mais dificuldades
para dela saírem. O Brasil sairá
mais rapidamente.”
Loyola observa muita cautela entre os empresários com os
quais têm contato. “Essa cautela é
absolutamente natural, mas ninguém está com medo. O que dá
para perceber é que alguns estão
replanejando seus investimentos,
esticando um pouco mais a aplicação de recursos em seus negócios
enquanto o quadro mundial vai
ficando mais claro”, conta. “Muitos
que pensavam fazer aportes em 12
meses vão fazer isso em 18 meses.”
N
o auge da forma
intelectual aos 80
anos, o professor e
ex-ministro Antônio
Delfim Netto não tem medo da crise econômica. “O Brasil tem pelo
menos 25 anos pela frente de uma
estrada concretada livre; basta ter
ousadia e inteligência para usá-la”,
diz, certo de que o país criou sólidas bases econômicas e políticas.
“Temos um mercado interno em
expansão. O mundo sabe que existem aqui todas as condições para
abrigar e executar projetos extraValter Campanato/ABr
C
om a bagagem de ter
sido presidente do
Banco Central por
duas vezes (19921993/1995-1997), o economista
Gustavo Loyola é o tipo de observador que possui os instrumentos
mais úteis para medir a temperatura e a pressão da economia – e projetar o futuro. Além da experiência
e dos inúmeros contatos no Brasil e no exterior, Loyola faz parte
do conselho de administração de
diversas companhias e é um dos
diretores da Tendências Consultoria Integrada. Ele não apenas está
certo de que a economia brasileira
exibe muitos requisitos para enfrentar a crise e até condições de
vencê-la, como vislumbra a volta
do investimento estrangeiro direto ao país a médio prazo. “Acredito que o Brasil possa sair fortalecido, ou ao menos desfrutar de
uma situação relativamente boa,
certamente melhor do que a de
muitos outros países, depois que
a crise passar”, afirmou à revista
LIDE. “No curto prazo, neste ano e
no início do próximo, certamente
vamos sentir os impactos da crise,
mas num grau menos acentuado
Divulgação
“O Brasil vai sair
mais forte da crise”
ordinários.” Delfim acredita que,
quando a espuma da crise baixar,
os investidores internacionais reconhecerão no Brasil um porto seguro para o capital se transformar
em negócios produtivos. “Entre
Brasil, Rússia, Índia e China – os
países do Bric –, o Brasil é o único
que resolveu seus problemas. Por
isso, quando o mundo recuperar
um pouco a confiança, será o lugar preferido para investimentos
estrangeiros.”
Presidente do Conselho Superior de Economia do Instituto
Roberto Simonsen, da Fiesp, e integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
do governo federal, Delfim explica a crise pela ótica da “quebra
de confiança” entre os agentes do
mercado. “No momento em que
a Secretaria do Tesouro dos EUA
negou socorro ao Banco Lehman
Brothers, quebrou-se a confiança
no mercado financeiro mundial”,
avalia. “Aquilo foi uma barbeiragem, cujos efeitos são sentidos
até hoje.” Neste sentido, ele saúda
o início da gestão Obama. “Ninguém mais acreditava no Bush.
Agora, as pessoas depositam no
novo governo a possibilidade de
reconstrução da confiança perdida. É um começo.”
A falta de crédito é, para o exministro, o problema mais grave
a ser superado no momento. “É
natural que aqueles que contavam com o funding externo estejam agora preocupados”, afirma.
“Afinal, o crédito externo sofreu
uma morte súbita.” Essa questão
só será superada, frisa, com o resgate da confiança. Enquanto isso
não acontecer, porém, Delfim
acredita que os fundamentos macroeconômicos bem ajustados no
Brasil servirão de garantia para
que as empresas sofram menos
com a crise. “O Brasil quebrou em
1998 e quebrou em 2002, mas isso
já não irá acontecer mais”, acredita. “Desfrutamos de uma situação
externa confortável, com 200 bilhões de dólares em reservas.” No
plano interno, um corte na taxa
básica de juros (Selic), que será
realizado pelo Banco Central, é,
para ele, uma medida imprescindível. “Não há justificativa técnica para o BC não cortar os juros,
além de ser uma demonstração
de insensibilidade monstruosa.”
LIDE | 25
Stockxpert
Silvio Simões/AMCHAM
| capa / estratégia
Um olho em custos,
outro no futuro
As empresas reveem seus planos, para se ajustarem
a um cenário econômico menos favorável, buscando
novos nichos e dando prioridade à geração de caixa
A
s convenções anuais da Nívea Brasil, uma das líderes da
indústria de beleza, costumam acontecer em hotéis localizados à beira de belas praias do Nordeste. Este ano, vai
ser diferente: o encontro será realizado em São Paulo. “A
palavra de ordem é olhar com atenção cada despesa”, explica Nicolas Fischer, presidente da companhia. Não significa que a empresa,
subsidiária do poderoso grupo alemão Beiersdorf, esteja amargando
uma retração em seus negócios. Em 2008, a Nívea superou sua meta
de crescimento – a receita subiu mais de 15% – e a previsão para este
ano é de um aumento superior a 10%. Mas, diante do cenário eco 26 | LIDE
“Estamos cortando
custos, mas sem afetar
duas áreas estratégicas
para a companhia:
pessoal e publicidade”,
diz Nicolas Fischer,
presidente da
Nívea Brasil
nômico mundial, acha necessário
reforçar a busca de eficiência.
Como a Nívea, a maior parte
das empresas está revendo sua
estratégia para se adaptar a uma
conjuntura menos favorável do
que a observada nos últimos anos.
“É fundamental estar preparado”,
alerta Otto von Sothen, presidente
de alimentos da Pepsico, dona de
marcas como Elma Chips, Toddy,
Gatorade e Coqueiro. Uma das
medidas adotadas pela Pepsico foi
a criação de um comitê interdisciplinar, que reúne todas as áreas da
empresa para discutir práticas que
contribuam para manter uma boa
geração de caixa. Outra providência foi rever o orçamento, montado
com base em pontos essenciais e
não mais com referência em gastos
dos anos anteriores.
Na Casas Bahia, maior rede
varejista de móveis e eletroeletrônicos do país, a reação ao novo
quadro econômico levou a uma
mudança de prioridades. A empresa está investindo em regiões nas
quais tem menos participação e,
portanto, mais condições de crescer. É o caso do Nordeste, onde deverão ser inauguradas 20 lojas em
2009. Outro passo importante para
ampliar a base de clientes foi a
criação de um portal on-line, com
a finalidade de passar a atender
um público de maior poder aquisitivo, que suas lojas não atingem.
Reduzir custos é um ponto em
comum nos planos das empresas
para se ajustarem aos novos tempos, mas a intensidade das medidas varia de acordo com os efeitos sofridos pelas companhias. A
Nívea, por exemplo, planeja uma
economia de 5% em seus gastos.
Uma das soluções é explorar mais
os recursos oferecidos por instrumentos como a teleconferência,
para evitar viagens ao exterior.
Viajar, só quando for absolutamente necessário, e sempre na
classe econômica.
Essa política, porém, não se
aplica a todas as áreas. A empresa
não planeja fazer cortes de pessoal, nem diminuir os recursos
destinados à publicidade. Pessoal
e marca são importantes diferenciais competitivos, resultados de
pesados investimentos realizados
ao longo dos anos, e que, segundo
Fischer, não podem ser perdidos.
Uma coisa é cortar gorduras, outra
é abrir mão de trunfos capazes de
garantir o futuro.
LIDE | 27
| Capa / gestão de pessoas
Expandir em
tempos difíceis
Uma das maiores empregadoras do Brasil, a Contax contrata
2,5 mil funcionários em fevereiro e acredita que efeitos da
crise serão menores aqui do que no restante do mundo
P
Fotos: Divulgação
elo seu tamanho e posição no mercado, certas
empresas são pontos
privilegiados de observação para análises a respeito da
economia real. Uma das três maiores empregadoras de mão-de-obra
do país, com 75 mil funcionários e
um portfólio de 58 clientes, todos
grandes grupos empresariais dos
setores financeiro e de serviços, a
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Contax desfruta desse posicionamento especial. A companhia, que
tem a Andrade Gutierrez como
acionista, projeta, executa e opera
contact centers e, neste papel, tem
relacionamento direto não apenas
com o público e seus humores,
mas, também, com as prestadoras
de serviços, seus fornecedores e
parceiros. “Nas áreas em que fazemos a interface entre as grandes
empresas e seus clientes, posso
garantir que ainda não há sinais
de que a crise global tenha chegado”, afirmou à LIDE o presidente
da Contax, James Meaney. “E olha
que não me considero otimista, estou apenas apontando o que estamos vivendo.” Em fevereiro, a partir da conquista de novos clientes,
como a TAM, a Contax contratou
nada menos que 2,5 mil novos colaboradores. “O setor de serviços
continua aquecido e as empresas
estão se movimentando bastante
para responder a essa demanda”,
completa Meaney.
Com mais de 1 bilhão de reais
em investimentos próprios em oito
anos de atuação no Brasil, a Con-
O setor de call
center trabalha
com projeção
de crescimento
entre 10% e
12% em 2009,
muito acima da
média mundial
tax experimentou um crescimento
de 30% – duas vezes o aumento do
mercado setorial – no ano passado. Os executivos da companhia
trabalham com projeções segundo
as quais o setor de contact centers
deverá se expandir este ano entre
10% e 12%. “Na maioria dos países
da Europa e nos Estados Unidos,
o incremento do setor vai ficar
próximo a zero”, adianta Meaney.
“Isso quer dizer que, mesmo com
uma perspectiva de se desenvolver
menos do que no ano passado, o
Brasil terá um expressivo aumento
de atividade na nossa área de atuação.” Os contact centers da empresa prestam serviços de Atendimento ao Consumidor, Recuperação de
Crédito, Televendas e Retenção. A
companhia opera 32 mil posições
de atendimento.
No momento em que os reflexos da crise global assustam
muitas companhias, a Contax demonstra uma posição bastante
sólida graças a métodos de gestão.
“Abrimos mais de 150 vagas para
coordenadores, gerentes e diretores este ano”, assinala Meaney, sem
medo de estar correndo o risco de
pagar salários exorbitantes. “Para
a definição das remunerações e
benefícios, trabalhamos com pesquisas próprias de mercado e métodos corporativos que privilegiam
a geração de valor para o acionista.” Com esse tipo de fórmula, a
Contax combate na prática o mal
das remunerações excessivas, que
acometeu grandes empresas, especialmente nos Estados Unidos.
“Desenvolvemos uma tecnologia
de gestão que foi aprovada e tem
acompanhamento direto do nosso conselho de administração. O
desempenho dos funcionários é
monitorado por cerca de 1,4 mil
indicadores individuais. Aqui, privilegiamos a produtividade.”
Por tudo isso, o líder da Contax
está entre os executivos que não
têm medo da crise. “Não há como
o Brasil deixar de sentir os efeitos
do que está havendo no mundo,
mas podemos acreditar que os
efeitos não serão graves como os
verificados lá fora”, diz Meaney.
Ele acredita que três importantes
fusões empresariais ocorridas recentemente – a dos bancos ABN
com o Santander e do Itaú com o
Unibanco, além da compra da BrasilTelecom pela OI – podem mudar
um pouco o perfil do mercado de
trabalho para executivos. “A tendência é que melhores currículos
apareçam no mercado. O empresário que estiver disposto a investir
na crise captando bons quadros
terá excelentes oportunidades”,
avalia Meaney.
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| capa / executivos
O perfil certo para
o novo cenário
O consultor de empresas Robert Wong concorda integralmente. “No universo de sabedoria chinês, crise e oportunidade vêm da
mesma matriz”, explica. “O segredo
para se lidar com essa crise é ter
atitude, e isso só um executivo que
é um verdadeiro agente de mudança consegue ter. E ele não pode ser
independente, tem que ser interdependente, tem que cooperar”,
acrescenta Wong.
O reputado psicanalista Jorge
Forbes vai além. “O sociólogo Alain
Touraine, que foi professor do expresidente Fernando Henrique
Cardoso, já havia alertado: basta
de medirmos o mundo pelos parâmetros econômicos. A nova forma
de ser líder impõe criatividade e,
sobretudo, responsabilidade. Precisamos deixar de ser manobrados
por esses meninos de bancos de
te de celulares, corte dos carros da
diretoria, etc. Isso me lembra um
banco que, anos atrás, mandou todos os seus funcionários cortarem
o cabelo, como forma de enquadrá-los em um modelo próprio de
expansão dos negócios.”
Arthur Vasconcellos, sócio da
CTPartners Brasil, empresa de
headhunters especializada na captação de profissionais altamente
qualificados, acredita em outro fenômeno decorrente da crise: a valorização dos “executivos de cabelo
branco”. Tendência que, segundo
ele, “se contrapõe ao movimento
observado nos últimos anos, quando o sucesso de empreendimentos
modernos, arrojados e capitaneados por jovens talentosos, como o
Google, a Apple e a Microsoft, ajudou a valorizar o passe dos executivos com menos de 40 anos”.
n
Stockxpert
Divulgação
Empreendedores, headhunters, consultores e
psicanalistas começam a delinear o gestor ideal para
enfrentar os tempos difíceis da economia mundial
investimento, que só pensam em
ganhar lucros cada vez maiores e
fazer ginástica nos fins de semana”,
receita Forbes.
Para o consultor português Antônio Álvaro de Gusmão Ramos,
representante para a América Hispano-Portuguesa da consultoria
europeia Euromanagement, “o executivo ideal para lidar com a crise
tem que ser frio e ter visão de longo
prazo, para não permitir a demissão
de talentos que serão imprescindíveis quando a crise amainar e sua
organização necessitar de novos
planos para retomar o crescimento”.
Jorge Forbes é bastante crítico.
“Tenho medo dos remédios que
alguns providenciam para consertar o desastre. Certos executivos só
conseguem pensar em fórmulas
velhas, de uma sociedade disciplinar, que enxerga a saída pelo cor-
E
m resposta ao impacto da crise financeira internacional, começam a surgir, aqui e ali, pistas acerca dos profissionais e dos
procedimentos mais adequados para lidar com aquilo que empresários de todo o mundo pensavam conhecer (e, obviamente,
ainda não conhecem em toda a sua plenitude): a globalização.
“O que diferenciará um empreendedor do outro é a capacidade de criar
soluções para escapar dos problemas. Ou seja, usar os obstáculos como desafios e superar”, escreveu recentemente o empresário Luiz Fernando Garcia, consultor credenciado pela Organização das Nações Unidas para administrar programas de empreendedorismo.
30 | LIDE
O consultor Robert
Wong define o executivo
adequado aos tempos
de crise como um
profissional que
possa ser “o agente
da mudança”, alguém
aberto à cooperação
LIDE | 31