Adubação Verde de Inverno - Centro Vianei de Educação Popular
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Adubação Verde de Inverno - Centro Vianei de Educação Popular
EXPEDIENTE Coordenação Executiva Selênio Sartori Grupo de Trabalho Centro Vianei - Zeferino Leite da Silva, Selênio Sartori, Simone Aparecida Pereira, Aldo Esmério, Natal João Magnanti Elaboração Natal João Magnanti Coordenação Editorial Natal João Magnanti Públio Sartori Projeto Gráfico Super Nova Comunicações Fotos Centro Vianei de Educação Popular Impressão Grafine – Gráfica e Editora Inês Ltda Tiragem 1.000 exemplares CENTRO VIANEI DE EDUCAÇÃO POPULAR Av. Papa João XXIII, 1565 – Bairro Ipiranga – CEP – 88505-200 – Lages – SC Fone/fax – 49-3222-4255 – correio eletrônico – [email protected] Esta publicação recebeu apoio financeiro do Ministério do Desenvolvimento Agrário através da Secretaria da Agricultura Familiar/Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural. Este material didático faz parte das atividades do projeto “Capacitação em agroecologia, comercialização, crédito rural, gênero e educação popular para Agricultores/Agricultoras Familiares e Jovens Rurais do Território do Planalto Catarinense, tendo em vista a formação de agentes de desenvolvimento”. O projeto tem como proponente o Centro Vianei e como parceiras as entidades da Rede de Agroecologia do Território Serra Catarinense. Este projeto foi aprovado na chamada para projetos de Assistência Técnica e Extensão Rural 2006 – Apoio a projetos de ATER para agricultores familiares e está conveniado sob o contrato nº 0201499-66 com a Caixa Econômica Federal. Setembro de 2008 Ficha Catalográfica Manejo Agroecológico de Solos no Território da Serra Catarinense. Elaboração: Natal João Magnanti Lages/SC:Centro Vianei, 2008, 32 p. 1. Agroecologia 2. Manejo de Solos 3. Adubação Verde 4. Calagem 5. Fosfatagem -- SUMÁRIO Agradecimentos ...............................................................................................................................................................04 Autor ......................................................................................................................................................................................04 Siglas ......................................................................................................................................................................................04 1. Apresentação..................................................................................................................................................................05 2. Histórico............................................................................................................................................................................07 3. Rede de Agroecologia do Território da Serra Catarinense..............................................................................08 4.Localização Geográfica.................................................................................................................................................08 5. Agroecologia como Paradigma................................................................................................................................09 6. O solo é um organismo vivo......................................................................................................................................10 7. Como trabalhar melhor o solo e devolver-lhe a vida.......................................................................................11 8. Os trabalhos com Adubação Verde.........................................................................................................................12 9. Experimentação com fosfato natural.....................................................................................................................21 10. Referências Bibliográficas........................................................................................................................................30 LISTA DE TABELAS Tab. 1 - Efeito do tipo de cultura anual sobre as perdas por erosão. Medidas pluviométricas de 1.300mm e declive entre 0,5 e 12,8%.......................................................................................................05 Tab. 2 - Informações técnicas de diferentes adubos verdes de inverno............................................................................13 Tab. 3 - Composição química na matéria seca de diferentes adubos verdes de inverno...........................................13 Tab. 4 - Apresentação do nº. de sementes produzidas e longevidade de sementes de plantas.............................16 Tab. 5 - Influência de diferentes métodos de preparo do solo sobre o número de minhocas.................................16 Tab. 6 - Número de artrópodos após um ano e meio de preparo do solo diferenciado. (Camada de 0 a 15 cm de profundidade) Latossolo Roxo, Londrina..................................................................16 Tab. 7 - Rendimento de massa seca total (acumulado em dois anos), cobertura de solo na oportunidade da semeadura de milho no segundo ano e temperatura máxima de solo proporcionado pelo cultivo de diferentes sequências de culturas. EEA – Guaiba – RS.......................................................................17 Tab. 8 - Resultados da determinação da capacidade de infiltração do solo da unidade Santo Ângelo em condições de mato, campo virgem, plantio direto e convencional. (Média de 6 repetições)..................18 Tab. 9 - Para trevo branco, vermelho e encarnado, alfafa e cornichão..............................................................................20 Tab. 10 - Para produção de adubação verde..............................................................................................................................20 Tab. 11 - Para produção de sementes de adubação verde....................................................................................................20 Tab. 12 - Disponibilidade média dos componentes de forragem em massa seca (kg/ha) de trevo vermelho (Trifolium pratense), trevo branco (Trifolium repens), cornichão (Lotus corniculatus), capim lanudo (Holcus lanatus) e outras espécies no período de outubro de 2002 a outubro de 2003, em função de tratamentos com fosfato natural (FN), superfosfato triplo (ST) e calcário............................................................25 Tab. 13 - Composição química do solo na implantação da pastagem e no final da avaliação do experimento....................................................................................................................................................................29 -- Agradecimentos Aos agricultores e agricultoras familiares agroecológicos do Território Serra Catarinense, bem como as suas organizações, que foram e são fundamentais para que este trabalho exista e possa continuar existindo e florescendo ao longo de muitas décadas. Ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que através da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF) e do Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural (Dater), financiaram o projeto “Capacitação em agroecologia, comercialização, crédito rural, gênero e educação popular para Agricultores/Agricultoras Familiares e Jovens Rurais do Território do Planalto Catarinense, tendo em vista a formação de agentes de desenvolvimento. E à Caixa Econômica Federal pelo apoio como agente financeiro”. Autor Natal João Magnanti, pedagogo e engenheiro agrônomo, mestre em Ciências do Solo pela UDESC/CAV, atualmente é Secretário de Administração e Finanças do Centro Vianei de Educação Popular e Presidente do Centro de Estudo e Cooperação da Agricultura de Grupo (Florianópolis/SC - CEPAGRO). Coordena o Núcleo Planalto Serrano da Rede Ecovida de Agroecologia, é membro do Conselho de Administração da Cooperativa Ecológica Ecoserra, membro da Comissão Estadual de Agricultura Orgânica do Estado de Santa Catarina, conselheiro do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional de Lages e do Estado de Santa Catarina. Cultivo mínimo de cebola em Alfredo Wagner, SC. Manejo ecológico de solos com piquetes em ‘plain ar’, Campos Novos, SC Consórcio de olerícolas e manejo do mato. Siglas AMURES – Associação dos Municípios da Região Serrana de Santa Catarina ECOSERRA – Cooperativa Ecológica Ecoserra MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário ATER – Assistência Técnica e Extensão Rural PTA – Projeto de Tecnologias Alternativas ASPTA – Assessoria e Serviços a Projetos de Tecnologias Alternativas ONG – Organização Não Governamental CEPAGRO – Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo SAF – Secretaria de Agricultura Familiar T.A Sul – Tecnologias Alternativas do Sul CAV – Centro de Ciências Agroveterinárias UDESC – Universidade do Estado de S. Catarina DATER – Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina -- 1. Apresentação Este material apresenta uma síntese dos trabalhos engendrados pelo Centro Vianei de Educação Popular e pela Rede de Agroecologia do Território Serra Catarinense em relação às temáticas de manejo do solo, adubação verde, controle da erosão, calagem e adubação. De maneira geral os solos ocupados pelos agricultores familiares possuem características de baixa fertilidade natural, alto teor de alumínio e matéria orgânica, presença mediana de pedras e relevo ondulado. Verificando-se os solos que são utilizados pelos agricultores (as) familiares que compõem a Rede de Agroecologia, nota-se que na maioria das vezes existe algum tipo de restrição para o seu uso com culturas anuais e pastagens anuais. Assim sendo, são necessárias medidas de controle e manutenção/melhoria do solo para utilização destes para a finalidade de semeadura de culturas e pastagens anuais. A partir de dados de produtividade média de Região Serrana de Santa Catarina pode-se perceber que os índices ficam abaixo das produtividades desejáveis. Segundo o Plano Básico de Desenvolvimento Regional da AMURES, a produtividade média dos cultivos convencionais do milho na região é de 40 sc/ha, o feijão é de 16 sc/ha e o arroz de sequeiro é de 36 sc/ha. Estas médias de produtividade são inferiores ao potencial produtivo destas culturas. As áreas onde se realizam os cultivos, normalmente, possuem alguma restrição para o plantio de culturas anuais, sendo que boa parte das áreas é suscetível à erosão hídrica do solo. Observando os dados da tabela 1 podemos perceber as perdas médias de solo por decorrência da erosão hídrica. Tabela 1 - Efeito do tipo de cultura anual sobre as perdas por erosão. Medidas pluviométricas de 1.300mm e declive entre 0,5 e 12,8%. Culturas Perda de solos (t/ha/ano) Feijão Arroz Soja Milho Milho + Feijão 38,1 25,1 20,1 12,0 10,1 A utilização de práticas convencionais de preparo do solo (aração/gradagem) tem provocado o empobrecimento do solo e, por conseguinte, do agricultor (a). Preparando-se o solo e enterrando-se os restos vegetais, o solo nu estará exposto, sem proteção ao impacto da gota de chuva. Seguindo dados de MEYER & MANNERING citados por DERPSCH, a energia do impacto, ou energia cinética das gotas de chuva que caem em um ano sobre um hectare de terra corresponde aproximadamente à energia liberada por 50 toneladas de dinamite. Esta energia de impacto fragmenta os agregados do solo em partículas diminutas que rapidamente entopem os macroporos de drenagem da água, logo após o início da chuva, selando a superfície do solo, impedindo assim a rápida infiltração da água da chuva. A água que escorre carrega o solo e provoca danos por erosão de diferentes dimensões. Para conter a erosão e os problemas decorrentes da sua ação são necessárias várias medidas de controle. O sistema de produção convencional de grãos da região é baseado nos cultivos de verão, que vão de setembro/ outubro a junho/julho para aqueles que plantam culturas anuais. Existem vários sistemas de condução convencional do solo na época de entressafra na região, alguns deles descrevemos a seguir: Fonte: A cultura do feijão em Santa Catarina. -- a) A maioria dos agricultores (as) após a colheita das culturas comerciais libera a área de lavoura para o gado alimentar-se da resteva das culturas de verão e de plantas “invasoras”, principalmente milha (Digitaria sanguinalis) e papuã (Brachiaria plantaginea) que estão normalmente presentes no local de cultivo. Esta forma de manejo agrava os problemas de solo substancialmente. Nesta situação o solo fica sob a ação do pisoteio dos animais por um período que varia de 4 a 6 meses e diminui significativamente sua cobertura. a manutenção/produção dos animais. Assim, a alimentação dos animais fica restrita à pastagem anual de inverno e eventualmente à silagem. Observações de campo demonstram que normalmente a quantidade de área destinada à pastagem não é compatível com o número de animais que as propriedades possuem e para o sistema de manejo que empregam. Neste caso os animais alimentam-se de maio a julho/agosto com a pastagem anual de inverno. De maneira geral o solo sofre um pisoteio intenso e a quantidade de palha e ou resteva de pastagem é insuficiente para assegurar o controle do impacto da gota de chuva e por conseguinte reduzir ou frear a erosão. b) Agricultores (as) um pouco mais tecnificados/capitalizados realizam a partir dos meses de março/abril a semeadura de pastagens anuais de inverno nas áreas de produção de grãos. Normalmente a pastagem utilizada é a aveia preta (Avena strigosa/SCHREB), sendo que se utiliza também o azevém (Lollium multiflorum LAM.) e em raros casos a ervilhaca (Vicia spp L.). Na maioria das vezes as sementes são adquiridas fora da propriedade e o solo é submetido ao preparo convencional para a implantação de pastagem. Assim sendo, 45 a 60 dias após a semeadura a pastagem é utilizada pelos animais de forma extensiva. Neste momento a pastagem naturalizada dos potreiros ou natural dos campos não oferece alimento suficiente para c) Ocorre ainda uma terceira situação, em que o agricultor faz a semeadura de pastagem anual de inverno da mesma forma que no caso anterior, mas procura dividir a área em piquetes e manter um controle sobre os animais na área. Desta forma é possível, no final do ciclo das plantas que estão sendo utilizadas como pastagem, retirar os animais da área e manter uma massa razoável de matéria verde, que irá ser incorporada por ocasião do preparo do solo para a semeadura das culturas comerciais de verão. Assim, os efeitos da erosão são menores que nos casos anteriores. Em todos os casos a pressão que o solo sofre é muito intensa, tendo em vista que, quando existe cobertura, ela é aproveitada pelos animais. Mas tendo em todos os casos que suportar uma carga animal normalmente acima de sua capacidade. Pode-se dizer com relativa segurança que boa parte dos problemas de solo da região só serão amenizados ou solucionados quando os problemas de alimentação e manejo principalmente dos bovinos forem equacionados. Na verdade o que se cria é um ciclo que começa com a destruição da estrutura física do solo e que mantém em constante fome os animais, ou seja, enquanto não for resolvido o problema da alimentação animal nas propriedades, sempre haverá, principalmente por boa parte dos bovinos, uma pressão sobre o solo destinado à produção de grãos. Assim sendo, nunca será possível um manejo adequado dos restos culturais, bem como da cobertura verde que se poderia lançar mão no inverno para dar suporte a um programa de manejo conservacionista Pastoreio rotativo, piqueteamento e melhoramento via sobressemeadura em Lages, SC (2000). do solo. -- Alternativas para a manutenção e melhoria dos solos da região Necessariamente, para resolver os graves problemas de degradação de solo e das baixas produtividades alcançadas nos cultivos de grãos de verão, é fundamental que se resolva a lacuna alimentar no período de inverno para os bovinos. Torna-se fundamental trabalhar a melhoria das pastagens naturais e naturalizadas, introduzindo espécies perenes de verão e inverno mais produtivas que as encontradas no campo nativo, eliminando assim a necessidade de os animais competirem em áreas com as culturas que produzem grãos. Além da introdução de espécies é vital a introdução do pastoreio rotativo nas pastagens naturais e naturalizadas, bem como nas pastagens anuais dentro das propriedades da agricultura familiar. Já é sabido que o melhoramento do campo nativo e o pastoreio rotativo podem ser realizados com bons resultados na região e também é de domínio da pesquisa as formas de se processar esta prática. O que falta é introduzir o sistema de melhoramento de campo nativo e o pastoreio rotativo nas propriedades dos agricultores familiares a um custo que possa ser adotado. Para tanto é necessário equacionar duas questões básicas de fertilidade: aumentar a disponibilidade de fósforo e diminuir a acidez dos solos. Além claro de introduzir um sistema de pastoreio rotativo adaptado à agricultura familiar. Outra prática que deveria ser utilizada de forma articulada com a primeira é a semeadura de plantas de cobertura de solo nas áreas de lavoura de grãos, que o protegeriam, bem como propiciariam benefícios como: a) manter elevada a taxa de infiltração da água no solo; b) aumentar a capacidade de retenção de água no solo; c) atenuar as oscilações térmicas das camadas superficiais do solo e diminuir a evaporação; d) promover mobilização e reciclagem mais eficiente de nutrientes; e) diminuir a lixiviação de nutrientes como o nitrogênio; f) promover o aporte de nitrogênio através da fixação biológica pelo uso de leguminosas; g) reduzir a população de ervas invasoras dado o crescimento rápido e agressivo dos adubos verdes; h) fornecer cobertura vegetal para preparos conservacionistas do solo; i) criar condições ambientais favoráveis ao incremento da vida biológica do solo; j) promover grande e contínuo aporte de fitomassa. Para complementar o trabalho das plantas de cobertura de solo poder-se-ia lançar mão do cultivo em nível de terraceamento e do cordão vegetado, bem como de outras formas de controle da erosão. Estas práticas citadas podem ser executadas com a utilização de aparelhos simples como o pé de galinha, nível de mangueira, arados e pás. Assim sendo, poder-se-ia, por meio de algumas ações citadas acima, implantar um sistema de cultivo mínimo ou semeadura direta, que proporcione maior sustentabilidade ao sistema de produção dos agricultores familiares. 2. Histórico Desde o início dos seus trabalhos, no início dos anos 80, até o momento, o Centro Vianei de Educação Popular vem trabalhando com a temática do manejo ecológico de solos. Esta temática, juntamente com o trabalho com agrobiodiversidade, educação popular e outras ações são históricas na entidade. Durante todos os vinte e cinco anos de trabalho do Centro Vianei sempre foram dedicados trabalhos com a temática de manejo ecológico de solos. O que variou neste período foram as intensidades de dedicação a esta importante temática para o desenvolvimento da agroecologia. Parceiros decisivos nesta área foram as entidades da Rede PTA ligadas a ASPTA (região Sudeste e Nordeste) e também a Rede Tecnologias Alternativas do Sul (Rede T. A. Sul). Durante esse período, estas instituições -- juntamente com pesquisadores comprometidos com a agroecologia construíram um Grupo de Trabalho de Solos dentro da Rede T. A. Sul, que foi responsável por inúmeras capacitações, intercâmbios, seminários e elaboração de vários trabalhos práticos com produção e multiplicação de sementes de adubos verdes, plantio direto e cultivo mínimo, manejo de restos culturais entre outras práticas. O Centro Vianei, por sua vez, participou ativamente deste processo junto à Rede T. A. Sul e também permaneceu com um trabalho de base junto aos agricultores (as) familiares e suas organizações ao longo do tempo. Todo este processo foi entremeado de inúmeras atividades de formação e produção de material (textos, informativos, folhetos). Durante este período foram realizadas dezenas de cursos municipais, regionais, bem como seminá- rios e oficinas para avaliar e reorientar o trabalho da entidade. Todos os trabalhos contaram com a parceria estratégica dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais do território, bem como dos grupos e associações de agricultores familiares agroecológicos e algumas entidades públicas. É necessário dizer que este processo continua em andamento com assessoria nas propriedades e nos grupos, associações e cooperativas, experimentação em unidades demonstrativas, intercâmbios entre os agricultores e suas organizações, produção de sementes entre outros trabalhos. Nossos parceiros prioritários são as associações de agricultores familiares agroecológicos, Sindicatos de Trabalhadores Rurais, Cooperativas de Crédito e Comercialização e movimentos sociais que estão congregados à Rede de Agroecologia do Território Serra Catarinense. 3. Rede de Agroecologia do Território Serra Catarinense A Rede de Agroecologia do Território da Serra Catarinense é um processo de interlocução que está consolidando a agroecologia como paradigma da agricultura familiar. A Rede tem como um de seus objetivos incluir novas famílias de agricultores e agricultoras familiares e novas organizações no contexto da agroecologia. Outro objetivo é aglutinar as entidades em torno da consolidação da agroecologia no Território, para tanto as entidades realizam um diálogo permanente entre si e com outras instituições governamentais e da sociedade civil organizada. Atualmente é composta por 38 organizações de 14 municípios. 4. Localização geográfica -- 5. Agroecologia como paradigma Conceituar a agroecologia é uma tarefa complexa, pois ela é processual e, ao longo do tempo, novas informações e elementos que até agora não foram objeto de análise poderão ser. Assim um conceito não pode ser fechado e sim uma base conceitual em evolução. Os princípios agroecológicos abaixo podem construir um conceito processual. Lembramos que os nossos princípios estão intimamente ligados ao conceito e às práticas da agricultura familiar. Desta maneira, agroecologia e agricultura familiar interagem entre si, formando um amálgama onde se completam. Os princípios são os seguintes: a) Produção baseada em tecnologias agroecológicas – inúmeras são as práticas agroecológicas que podem sustentar um sistema de produção. Algumas técnicas são: manutenção da cobertura vegetal, aprimoramento dos mecanismos de reciclagem de nutrientes, manutenção e aumento do suprimento de matéria orgânica, entre outras. b) Valorização do conhecimento tradicional – o conhecimento oral passado através de gerações, baseado na observação atenta e crítica dos agricultores familiares, é básico para implantar sistemas de produção agroecológicos. c) Policultivos e produção para o autoconsumo – são sistemas agrícolas complexos, em que se priorizam consórcios de plantas, rotações, sistemas agroflorestais, cultivos de inverno e verão, bem como valorizar a produção para a subsistência da família como um aspecto de economia de gastos e de priorização do valor biológico dos alimentos. d) Integração da produção animal e vegetal – a interação de cultivos e criações é vital para o equilíbrio do sistema de produção, já que a importação de biomassa (matéria orgânica) é relativamente cara e as fontes normalmente não são confiáveis do ponto de vista da isenção de contaminantes. e) Cooperação entre agricultores – é Intercâmbio entre agricultores e técnicos em Frei Rogério (2001), em parceria com a UFSC. Cultivo mínimo de cebola em Alfredo Wagner, SC (2005). vital para a implementação da agroecologia a priorização de ações em rede entre agricultores, técnicos, organizações de representação, movimentos populares, consumidores e outros setores organizados da sociedade. f) Comercialização – as relações estabelecidas no mercado convencional normalmente não são favoráveis aos agricultores familiares, nem tampouco aos consumidores finais. Assim, é necessário melhorar as formas não convencionais de mercado que já existem e criar novas formas que possam aproximar de forma solidária produtores e consumidores. g) Certificação participativa – promover formas alternativas de certificação da produção agroecológica, que promovam a discussão e o aprimoramento dos processos de confiança entre agricultores e consumidores. Devemos promover a disseminação participativa entre os agricultores e consumidores, tendo por base a ética no processo. h) Agroindustrialização da produção – a agregação de valor, através do beneficiamento e transformação da matéria-prima de forma cooperativa entre os agricultores, promove a valorização dos produtos, melhor aproveitamento da mão-de-obra durante o ano, melhoramento do fluxo de entrada de renda na propriedade, melhoria do aproveitamento dos produtos dentro da propriedade, entre outros aspectos. -- 6. O solo é um organismo vivo O solo é um organismo vivo, em virtude de não só abrigar, mas de formar um todo com uma infinidade de seres vivos, micro e macroscópicos, de origem animal e vegetal. O solo abriga bactérias, actinomicetos, algas, fungos, protozoários, nematoides, minhocas, cupins entre outros seres vivos. O desenvolvimento desses seres vivos se dá, principalmente, na camada superficial do solo, por ser mais rica em matéria orgânica. As raízes se acham envolvidas por colônias de micro-organismos, os quais se apresentam em concentração até 50 vezes maior que em regiões afastadas das raízes. O solo é formado por várias camadas chamadas horizontes (O, A, B, C ...), cada qual com características próprias. A união destas camadas é o que chamamos de solo. O solo é semelhante a uma esponja, possuindo macro e microporos, canais por onde circula o ar, a água e as raízes das plantas. Neste solo existem milhões de organismos vivos (animais e vegetais) que trabalham em benefício dele. Esses organismos vivos da terra são tão pequenos que a grande maioria não se enxerga a olho nu. Todos desenvolvem tarefas de fundamental importância para a vida da terra e consequentemente das plantas. Podemos dizer que sem eles a agricultura não existiria. Somando-se seu peso ao dos insetos, minhocas e outros pequenos organismos, chega-se 2,3 - 10 toneladas por hectare. Olhando este aspecto há mais vida na terra do que em cima dela. Mas, o número e a variedade destes organismos vivos depende em grande parte da quantidade de matéria orgânica, que é seu alimento. Por exemplo, em solos onde existe a presença de bactérias que conseguem retirar do ar nitrogênio, contribuem em torno de 100 a 300 Kg de nitrogênio por hectare, o que corresponde a 4,5 sacos de ureia.Quanto mais matéria orgânica mais vida a terra possui, melhor será o desenvolvimento das plantas. Solo sem vida, pobre, é sinal de agricultura e de agricultor pobre. A fertilidade do solo está intimamente ligada a vários fatores como pode ser observado no esquema abaixo. - A camada O é formada por material (restos de folhas, galhos,etc ) que não sofreu processo de mineralização (apodrecimento). Ocorre com mais intensidade em solos florestais nativos. - A camada A é a camada superficial, formada por matéria orgânica já decomposta. - A camada B caracteriza-se por apresentar acúmulo de materiais como argila e matéria orgânica decomposta. É a camada que as raízes das plantas mais exploram. - A camada C se caracteriza por apresentar resquícios de rochas (pedras). Teia de Hansjörg Rinklin. Fonte: Livro Verde II. - 10 - Adubação Verde com nabo forrageiro em Ponte Alta, SC (1997). 7. Como trabalhar melhor o solo e devolver-lhe a vida O solo é a base do trabalho da agroecologia, portanto qualquer agricultor (a) que venha a se dedicar e queira alcançar bons resultados, necessariamente, tem que pensar em melhorar as condições do seu solo. Através da utilização de algumas práticas conservacionistas de solo já se contribui enormemente para melhorar a terra e, consequentemente, a produtividade. O fator que mais ocasiona o empobrecimento do solo é a erosão. Ela é o processo pelo qual o solo, principalmente a camada fértil, é levado por ação da chuva e do vento. A consequência mais importante da erosão é a perda da ferti- lidade do solo, ou seja, a terra vai empobrecendo. A erosão hídrica ocorre principalmente pela falta de cobertura adequada do solo. O impacto da gota de chuva é o primeiro fator para iniciar o processo de degradação da camada superficial do solo e causa o selamento superficial desta mesma camada. Outros fatores também são importantes para ocasionar a erosão, como o preparo e manejo inadequados dos solos, falta de cobertura adequada, queimadas, não utilização de rotação de culturas entre outras práticas. Para diminuirmos os problemas gerados com a erosão - 11 - e para recuperarmos a fertilidade das nossas terras, temos que adotar algumas práticas conservacionistas como: Adubação verde, plantio em nível, cultivo mínimo, plantio direto, cordões vegetados, terraços Melhoramento de campo nativo com trevo, cornichão e capim lanudo. 8 . Os trabalhos com adubação verde É do plantio de plantas que irão ser incorporadas ou deixadas sobre a terra, com a finalidade de preservar e/ou melhorar a produtividade das terras de plantação. A adubação verde é uma prática muito antiga, ou seja, antes de Cristo os chineses, gregos e romanos já utilizavam-na. Adubação Verde de Inverno Consiste no plantio de plantas a partir de fevereiro e que ficarão sobre o terreno durante todo o inverno, sendo cortadas ou incorporadas no começo da primavera, conforme a cultura de verão que virá em seguida. Adubação de Tremoço após a cultura do milho. Adubação Verde de Verão Experimento com mucuna cinza em lavoura de milho crioulo na comunidade de Fundo do Campo, Otacílio Costa, SC. Consiste no plantio de plantas no meio das culturas de verão ou no plantio solteiro dos adubos de verão com o fim de recuperar uma determinada área. Plantas Utilizadas como Adubo Verde De Inverno São plantas que na nossa região podem ser semeadas a partir do final de fevereiro, antes mesmo da colheita do milho, que devem resistir bem às geadas e serem incorporadas ou cortadas conforme o tipo de uso e plantação que virá em seguida. São muitas as plantas que podem servir como adubo verde. A seguir será colocada uma tabela com as principais espécies, época de plantio e produção de sementes, quantidade de sementes por área, época de floração, quantidade de massa verde e seca por área, bem como o que deve ser plantado depois do adubo verde, o melhor consórcio com outras plantas e que tipo de adubo verde de inverno se presta para plantar no meio de um pomar de frutas. Intercâmbio em Urubici com o ICEA da Itália. - 12 - Tabela 2 - Informações técnicas de diferentes adubos verdes de inverno. Nome Época de plantio Distância entre as linhas (cm) Peso de 1000 grãos (g) Ervilhaca peluda Ervilhaca comum Chícharo Aveia preta Aveia branca Centeio Nabo forrageiro Espérgula Março a maio Março a maio Março a maio Março a junho Março a junho Março a maio Março a maio Março a maio 20 – 40 20 – 40 20 – 100 20 – 50 20 – 50 20 – 30 20 – 40 20 – 50 27 – 38 30 – 57 250 – 400 12 – 18 35 – 45 18 6 – 14 1 Massa Vegetal t/ha/ano VERDE 14 – 35 12 – 35 20 – 40 15 – 45 15 – 35 12 – 35 20 – 60 15 – 40 SECA 3–6 2 – 5.5 2 – 4.5 2.5 – 7 2.5 – 4.5 2 – 4.5 2–6 1.5 – 6 Esta outra tabela apresenta a composição química (o valor em nutrientes do adubo verde) de diferentes plantas de inverno. Tabela 3 - Composição química na matéria seca de diferentes adubos verdes de inverno Nome Chícharo Aveia preta Aveia preta Centeio Espérgula Ervilhaca peluda Ervilhaca comum Nabo forrageiro % na matéria seca Nitrogênio Fósforo Potássio Cálcio Magnésio Proteína 2,23 1,65 0,81 1,22 1,61 1,88 2,02 2,96 0,10 0,096 0,052 0,075 0,15 0,10 0,13 0,19 2,90 1,60 2,40 1,40 3,35 2,30 2,10 3,90 0,39 0,25 0,24 0,18 0,31 0,44 0,86 2,15 0,19 0,17 0,17 0,14 0,93 0,20 0,27 0,95 13,93 10,31 5,06 7,62 10,06 11,75 12,62 18,50 Fonte: Plantas para adubação verde de inverno (IAPAR – PR) De Verão São plantas que podem ser usadas de duas maneiras: pode-se plantar o adubo verde no meio das plantas comerciais ou plantar o adubo verde sozinho na área, ficando esta área em recuperação, sem utilização comercial por uma safra de verão. A grande vantagem destes tipos de adubos verdes é que, além de produzirem muita matéria seca e protegerem a terra numa época de muita chuva e consequentemente muita erosão, eles secam naturalmente após as geadas, não precisando serem cortados. Consórcio É a utilização de dois ou mais adubos verdes na mesma área, com a vantagem de explorar as vantagens que cada planta pode fazer na terra. Por exemplo, pode-se plantar junto (consorciar) ervilhaca (vica) com aveia preta. No caso a aveia como tem muitas raízes e elas são muito profundas, estas servem para segurar a terra (agregá-la) e para quebrar camadas duras (compactadas) além de ser uma planta que possui cana onde a vica pode se segurar. A vica é uma planta leguminosa (família do feijão) e que con- segue por isso fixar o Nitrogênio do ar e colocálo a disposição na forma de adubo, realizando um trabalho semelhante ao da ureia. Consórcio de aveia preta com ervilha em Anita Garibaldi, SC. - 13 - Vantagens de se Utilizar Adubação Verde Redução da Erosão A adubação verde pode reduzir muito a erosão causada pela chuva. A maior contribuição dos adubos verdes é a redução do impacto da gota de chuva na superfície da terra, já que os adubos verdes promovem uma cobertura de 60 a 80% do terreno já no segundo mês após o seu plantio. A principal causa da erosão é a desagregação causada pelo impacto da gota de chuva sobre o solo. Não parece, mas a velocidade que a gota de chuva alcança e a força com que bate no chão é muito forte, causando a quebra das partículas de terra em partes Instalação de experimento com adubos verdes de inverno em São José do Cerrito. cada vez menores, sendo que assim fica cada vez mais fácil a enxurrada carregar estas partículas. As pequenas partículas além de serem mais facilmente carregadas pela enxurrada, com o passar do tempo vão entupindo os poros (buracos da terra), prejudicando a infiltração da água e aumentando ainda mais a enxurrada da camada superficial de solo. Etapas do processo de erosão. Pelo impacto da gota de chuva sobre o solo nu (A), seus agregados são desintegrados em partículas minúsculas (B) que entopem os poros, formando um escorrimento superficial de água de chuva (C). A água que escorre carrega partículas de solo que são depositadas em locais morro abaixo, quando a velocidade de escoamento é baixa (D). Fonte: Derpsch, 1990. - 14 - Vantagens de se Utilizar Adubação Verde Quebra de Camadas Duras na Terra Uma boa parte das espécies de adubos verdes possui um sistema radicular (raiz) muito forte e profundo, capaz de trabalhar como um arado biológico na terra, quebrando camadas duras que na maioria das vezes são causadas pelo uso inadequado de grade e arado nos solos. As raízes, por exemplo, do nabo forrageiro ,são ótimas para quebrar estas camadas adensadas, fazendo um trabalho de escarificação que levaria muitas horas/máquina de um trator e que certamente custaria muito caro. Quando a terra está dura, o trabalho de aração e gradagem fica mais penoso e mais caro para o agricultor, além disto as plantas possuem raiz menor e exploram menor área de terra, ficando mais desprotegidas caso haja uma seca. Como a exploração de área é menor, a planta certamente terá problemas para se alimentar e no final deixará uma safra menor para o agricultor. Fonte da imagem: Guia Rural Abril, 1988 Ajuda a Controlar as Plantas Invasoras Caso se deixe a terra descoberta, a natureza sabiamente faz com que apareça na superfície um grande número de plantas que normalmente não têm valor comercial e que são chamadas de invasoras. Quando se faz adubação verde no local o que acontece é a redução da quantidade de invasoras na área, devido à rápida cobertura do solo, o seu baixo revolvimento e assim baixa exposição de sementes invasoras para a luz do sol e a temperaturas que facilitam a germinação destas plantas. Além da cobertura, outro fator importante é que os adubos verdes soltam substâncias que inibem (não deixam outras plantas germinarem) através de suas raízes e depois de secos através da palha. Esta ação de uma planta sobre a outra é positiva ou negativa conforme a planta que está na área e é conhecida como alelopatia. Um exemplo é a inibição causada pela vica sobre o milhã, as duas plantas se detestam. Um exemplo de efeito positivo é o consórcio de milho com feijão, ou seja, são plantas companheiras. Só para se ter uma ideia do potencial das plantas invasoras colocaremos duas tabelas, uma com a longevidade (capacidade de fi- 15 - car viva na terra) e outra com o número de sementes que cada planta invasora pode produzir. Cultivo mínimo de tomate na comunidade de Invernadinha, Alfredo Wagner, SC. Tabela 4 - Apresentação do nº. de sementes produzidas e longevidade de sementes de plantas. Número de sementes produzidas por algumas plantas espontâneas Longevidade das sementes de algumas plantas espontâneas em anos Caruru (Amaranthus retroflexus) 117.000 Beldroega (Portulaca oleracea) 52.300 Língua-de-vaca (Rumex crispus) 40.000 Cipó-de-veado (Polygonum convolvulus) 12.000 Erva-formigadeira (Chenopodium album) 72.400 Tançagem (Plantago major) 36.150 Capim-carrapinho (Cenchrus echinatus) 1.110 Capim-arroz (Echinochloa crusgalli) 7.160 Trigo sarraceno (Fagopyrum esculentum) 11.900 Caruru (Amaranthus retroflexus) 40 Língua-de-vaca (Rumex crispus) 100 Mentruz (Lepidium virginicum) 40 Beldroega (Portulaca oleracea) 40 Quinquilho (Datura stramonium) 80 Aumenta a Quantidade de Animais da Terra tas e este processo chama-se de reciclagem de nutrientes e é muito importante. Na reciclagem de nutrientes a primeira parte é feita pelos animais maiores (minhocas, por exemplo) o resto é realizado por bichinhos que não podemos enxergar, como as bactérias e fungos (micro-organismos) que transformam a matéria orgânica em matéria mineral que pode ser comida pelas plantas. Como existe uma grande quantidade de matéria orgânica na terra a população de microorganismos também é grande e muito diversificada, sendo assim existe um controle de uma espécie sobre as outras, provocando um controle dos microorganismos que causam as doenças nas plantas cultivadas. Quando se realiza adubação verde na terra, esta se torna mais fofa, possui mais matéria orgânica, é mais porosa, possui mais água, sua temperatura durante o dia e a noite é mais baixa, é mais fértil e sofre menos erosão. Assim, a quantidade e a qualidade dos animais de solo são muito maior esque numa situação de solo descoberto e erodido. Os animais que nós conseguimos ver, como as minhocas e besouros, entre outros, têm um papel muito importante em fazer buracos (poros), por onde irá infiltrar a água e por onde as raízes vão penetrar e crescer, além de comer a matéria orgânica e ajudar no processo de torná-la matéria mineral. Está assim servindo de adubo para as plan- Tabela 5 - Influência de diferentes métodos de preparo do solo sobre o número de minhocas. Número de minhocas Latossolo Roxo* por m2 a 0-30 cm de profundidade Terra Roxa Estruturada** por m2 a 0-10 cm de prof. 27,6 5,2 3,2 13,0 7,5 5,8 Plantio Direto Escarificação Preparo Convencional * após 4 anos - ** após 1,5 ano Tabela 6 - Número de artrópodos após um ano e meio de preparo do solo diferenciado. (Camada de 0 a 15 cm de profundidade) Latossolo Roxo, Londrina. Números de artrópodos/300 cm2 de solo Acarinae Colêmbolos Insetos Total Rotação de culturas: trigo/soja Plantio direto Convencional 31 6 0 0 2 1 33 7 Rotação de culturas: adubação verde/soja Plantio direto Convencional 176 21 15 0 Fonte: Kemper e Derpsch, 1981. - 16 - 1 2 192 23 Controle da Temperatura da Terra Quando existe cobertura verde ou palha sobre o terreno a diferença de temperatura entre o começo e o final do dia é muito grande, além disto a temperatura máxima do solo descoberto é muito maior que o solo que possui cobertura. A temperatura da terra influencia diretamente a absorção de água da planta, quanto mais calor mais a planta respira e gasta energia e menos energia ela tem para crescer. Quanto mais alta a temperatura e mais luz existir no solo, mais fácil a germinação de plantas invasoras na área. Para exemplificar estas colocações veja a tabela e o desenho abaixo. Contra a insolação em solos cobertos, a temperatura não excede a 32º. em solos nus, chega a 42º C. Fonte do gráfico: Anuário Guia Rural Abril, 1988 Tabela 7 - Rendimento de massa seca total (acumulado em dois anos), cobertura de solo na oportunidade da semeadura de milho no segundo ano e temperatura máxima de solo proporcionado pelo cultivo de diferentes sequências de culturas. EEA – Guaíba – RS. Sequencia de culturas Aveia/milho Aveia + vica/milho + caupi Milho + lab-lab/milho Aveia + trevo/milho Siratro Guandu/guandu + milho Pousio/milho Solo descoberto Massa seca total kg/ha Cobertura de solo % Temperatura máxima ºC 22.000 28.950 27.200 29.450 21.500 37.150 3.470 - 86 91 79 92 98 69 11 6 28,89 25,55 24,65 24,77 20,05 25,11 29,46 31,51 Fonte: Bragagnolo & Mielniczuk 1990. Aumenta a Capacidade de Infiltração de Água na Terra Como já discutimos anteriormente, a adubação verde cria melhores condições de vida para os animais de solo e estes contribuem com o aumento de poros na terra, além disto as raízes dos adubos verdes ao apodrecerem também criam buracos no solo. Estas con- dições de aumento de porosidade fazem com que a infiltração seja melhor num solo com adubação verde que num solo descoberto e com camadas duras (adensadas). Para mostrar esta condição apresentamos desenho e tabela. - 17 - Tabela 8 - Resultados da determinação da capacidade de infiltração do solo da unidade Santo Ângelo em condições de mato, campo virgem, plantio direto e convencional. (Média de 6 repetições). Tempo em Horas Tratamentos Plantio Direto mm Mato mm Campo mm Plantio Convencional (mm) 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º 136,8 92,9 82,6 82,0 77,0 75,0 73,0 73,0 72,3 96,1 66,3 63,0 52,7 51,8 46,7 44,2 42,5 41,6 113,1 78,9 74,5 62,7 61,0 54,8 51,5 50,4 49,5 48,0 33,0 31,5 25,5 24,0 23,0 22,0 21,0 20,5 Média do total de infiltração por hora. 84,9 56,1 66,3 27,6 Fonte: Machado, 1976. Uso como Planta Forrageira A maioria dos adubos verdes pode servir como pastagem para os animais, sendo assim uma vantagem a mais o plantio destes. Experimento com variedades de adubos verdes de inverno em Bom Retiro, SC. Fixação Biológica de Nitrogênio do Ar Este é um processo que é realizado pelas plantas leguminosas, ou seja da família do feijão. A vica, os trevos, o cornichão, a mucuna, o guandu e outras plantas são espécies da família do feijão e têm capacidade de retirar o nitrogênio do ar através de uma associação que fazem com as bactérias do solo chamadas de rizóbium. Esta associação é boa para a planta que fica nutrida com um nutriente muito importante e é boa para a bactéria que recebe comida da planta em troca para se manter durante a sua vida. Dependendo do tipo de adubo verde pode-se ter de 50 a 200 kg de nitrogênio por hectare, em um ano, fixado em uma área. Esta relação é tão importante que no caso da soja não é recomendado colocar adubo nitrogenado na terra e nem passar ureia na mesma, já que todo o trabalho de adubação é feito pela bactéria. Para que ocorra uma fixação biológica eficiente pode-se lançar mão de inoculantes produzidos de forma industrial. Normalmente os solos férteis e bem conservados já possuem os rizobium em quantidade suficiente, porém nos primeiros anos de cultivos pode-se fazer necessária a inoculação com estirpes apropriadas para determinadas leguminosas. Os inoculantes são produtos naturais e aprovados para o uso na agroecologia. Os rizóbios são esféricos na soja (1); bifurcados na luzerna (2); globulados na ervilha (3); e ovais no trevo branco (4). Fonte da imagem: Guia Rural Abril, 1988. - 18 - Inoculação e Peletização de Sementes de Adubos Verdes de Inverno A operação de inoculação e peletização das sementes é muito importante para o sucesso da adubação verde. É fundamental que se faça a inoculação no mínimo nos 2 primeiros anos. Depois deste tempo não é mais necessário fazer, porque a quantidade de bichos (bactérias) que a terra vai ter é suficiente para o número de plantas que se terá na área. O inoculante é um produto natural que pode ser trabalhado com as mãos, sem a utilização de luvas e máscaras. O inoculante é composto de milhões de seres vivos que não se pode enxergar com as vistas (bactérias) e de um pó preto chamado turfa, que é composto de matéria orgânica (folhas podres) esterilizadas. Para comprar o inoculante o agricultor precisa tomar alguns cuidados: 1- Verificar se o comerciante estava com o produto na geladeira e a data de fabricação do mesmo. Como dentro do inoculante existem seres vivos que são bactérias, elas precisam ficar num ambiente com temperatura baixa, ou seja, na parte da gaveta da geladeira. O tempo de validade do inoculante é de 3 meses, a partir da data de fabricação, sendo que se estiver vencido este prazo não se deve usar o mesmo. 2- O inoculante é usado somente para as plantas da família do feijão, ou seja, a ervilhaca, trevos, alfafa, cornichão, ervilha e chícharo. Para fazer a operação de inoculação e peletização das sementes é necessário seguir essas recomendações: 1- Misture polvilho doce em água; 2- Aqueça a mistura no fogo, mexendo sempre até que fique com uma cor transparente (forma de goma) e uma calda que gruda nas mãos; 3- Deixe esfriar a mistura (adesivo); 4- Coloque o inoculante com a mistura e mexa bem até ficar bem preto; 5- Adicione as sementes com a mistura e o inoculante e mexa bem; 6- Finalmente coloque calcário ou cal de construção na mistura total para soltar as sementes. Devese usar calcário ou cal de construção que estejam bem secos para que as sementes se soltem umas das outras. As sementes vão ficar maiores e com uma cor branca, ficando mais fácil de distribuir as mesmas na terra. OBSERVAÇÃO: Olhar as quantidades exatas conforme as tabelas 1 e 2. Observações para se fazer o trabalho de inoculação e peletização. 1- Para se fazer a inoculação e a peletização recomenda-se que sejam realizadas sempre na sombra; 2- Realizar a semeadura das sementes inoculadas no menor prazo possível após a inoculação (antes de 24 horas); 3- Para reconhecer se a inoculação está sendo boa: a- Observa-se se existe um grande número de nódulos (calos) nas raízes, estes calos devem ser cortados ao meio e se a cor dos mesmos for avermelhada é porque a inoculação foi um sucesso; b- Deve-se olhar também o tamanho dos calos, quanto maior o tamanho do calo melhor para a planta que foi inoculada. - 19 - Tabelas de quantidades para inoculação Tabela 9 - Para trevo branco, vermelho e encarnado, alfafa e cornichão. Sementes (kg) Inoculante (g) Polvilho (g) Água (ml) Calcário 5 10 50 100 200 1,2 2,5 13,0 25,0 50,0 25 50 250 500 1000 Até soltar Até soltar Até soltar Até soltar Até soltar 0,5 – 0,6 1,0 – 1,2 5,0 – 6,0 10,0 – 12,0 20,0 – 24,0 Fonte: EPAGRI Ervilhaca (vica) e chícharo. Sementes (kg) Inoculante (g) Polvilho (g) Água (ml) Calcário 1,5 – 2,0 7,5 – 10,0 15,0 – 20,0 30,0 – 40,0 10 50 100 200 2,5 13,0 25,0 50,0 50 250 500 1000 Até soltar Até soltar Até soltar Até soltar Fonte: EPAGRI Tabela 10 - Para produção de adubação verde. Espécie sementes sementes Época de –solteira consorcia- Floração plantio kg/ha da kg/ha Ervilhaca Peluda Mar./abr. 40 – 60 Ervilhaca comum Mar./maio 40 – 80 Chícharo Mar./junho 100 – 120 Aveia preta Mar./maio 60 – 80 Centeio Mar./junho 70 – 90 Nabo forrageiro Mar./maio 10 – 15 Gorga Mar./maio 8 – 10 Mar./junho 90 – 120 Triticale 30 – 40 30 – 60 60 – 90 40 – 50 50 – 70 8 – 10 6–8 70 – 90 Outubro Set./out. Ago./out. Set./out. Ago./set. Ago./set. Jul./ago. Ago./set. Espécie para consórcio Plantar Antes de Aveia, centeio Aveia, centeio Aveia, centeio, triticale Aveia, ervilhaca, chícharo Azevém, ervilhaca, chícharo Aveia Aveia Milho, arroz, girassol Milho, arroz, girassol Milho, arroz, girassol Milho, arroz, feijão e soja Milho, arroz, girassol Milho, arroz, feijão Milho e feijão Azevém, ervilhaca, chícharo Milho, feijão e soja Fonte: Epagri – Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A Tabela 11 - Para produção de sementes de adubação verde. Espécie Ervilhaca peluda Ervilhaca comum Época de plantio sementes / solteira kg/ha Época de Prod. de Sementes Mar./maio Mar./maio 30 – 40 20 – 50 Dez./jan. Nov./dez Consórcio Triticale ou centeio Solteira ou consorciada com centeio ou triticale (20 a 30 kg/ha) Chícaro Julho 40 – 60 Nov./dez Solteira ou consorciada com centeio ou triticale (20 a 30 kg/ha) Aveia preta Mar./jul 40 – 50 Nov./dez Solteira Centeio Julho 50 – 60 Nov./dez Solteira Nabo forrageiro Mar./maio 5 – 10 Out./nov Solteira Gorga Mar./jun 8 – 12 Set./dez Solteira Julho 90 – 120 Nov./dez Solteira Triticale Fonte: Epagri – Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A - 20 - 9. Experimentação com Fosfato Natural Desempenho do fosfato natural alvorada na introdução de pastagem perene de inverno comparado ao superfosfato triplo1 Resumo Os campos nativos e naturalizados apresentam baixa produtividade. A fertilização fosfatada é uma das estratégias-chave para melhorar a produção e a persistência em pastagens com leguminosas. O experimento foi conduzido objetivando avaliar o desempenho de um fosfato natural (FN) nacional em comparação ao fosfato solúvel super triplo na implantação e desenvolvimento inicial de pastagem perene de inverno. O experimento foi instalado no município de São José do Cerrito/SC, num Nitossolo Háplico. O delineamento experimental foi de Blocos Completamente Casualizados com quatro repetições e seis tratamentos. Os tratamentos foram constituídos da seguinte forma: testemunha – sem corretivo e adubo; correção da necessidade de fósforo através do uso de 417 kg/ha de FN (Só FN); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessidade de fósforo através do uso de 333 kg/ha de FN e 50 kg/ha de super fosfato triplo (CAL+FN+ST); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessidade de fósforo através do uso de 417 kg/ha de FN, considerando o P2O5 total da fosforita (CAL+FN1); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessidade de fósforo através do uso de 1.333 kg/ha de FN, numa dose de ¼ da quantidade de P2O5 solúvel em ácido cítrico (2%) (CAL+FN2); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessidade de fósforo com 244kg/ha de Superfosfato Triplo (CAL+ST). Usaram-se se 7,66 Mg/ha de calcário dolomítico para se chegar a pH 5,2. Foram realizados seis cortes espaçados em média de 45 dias entre si para estimativa da produção de massa seca, duas coletas de solo para determinação dos atributos químicos do solo. O uso isolado de fosfato natural não se mostrou recomendável para implantação de pastagens perenes nas condições de solo nas quais foi conduzido o experimento. Já a associação de calagem e diferentes fontes de fósforo (fosfato natural e/ou super triplo) mostrou-se eficiente na implantação dessas pastagens. O trevo vermelho e o cornichão foram as espécies que melhor aproveitaram as condições de solo criadas pela adição de calcário e fósforo. INTRODUÇÃO O fosfato natural (FN) é utilizado há décadas como fertilizante em diferentes culturas, sendo variável o nível de sucesso. As principais reservas brasileiras de fosfato natural estão localizadas nos estados de Minas Gerais, Goiás e São Paulo, sendo que nos estados de Pernambuco, Maranhão e Santa Catarina encontram-se minas menores (SOUZA, 1996). O fósforo (P) é o nutriente mais limitante da produtividade de biomassa em solos tropicais. Os solos brasileiros são carentes de P, em consequência do material de origem e da forte interação do P com o solo, em menos de 0,1% encontra-se em solução (CORRÊA, 2004). A estratégia de fertilização fosfatada é um dos elementos-chave para lograr melhoramento de produção e persistência em pastagens com leguminosas (BERMÚDEZ et al., 1998). O custo da fertilização representa um percentual elevado no valor total da implantação de uma pastagem perene, tanto para o estabelecimento como para a manutenção (OLIVEIRA et al. 1998). Os campos nativos e os campos naturalizados representam 81% das pastagens de Santa Catarina (VINCENZI, 1998) e constituem a base da alimentação das espécies herbívoras do estado. A produtividade dessas pastagens é considerada baixa, com lotação média de 0,5 cabeças por hectare durante o ano, em relação ao potencial de produção de uma pastagem melhorada com leguminosas hibernais. Essas pastagens estão normalmente sobre solos com alto teor de alumínio, baixo pH e baixos teores de fósforo. Segundo BANDINELLI (2005), como 1 - Artigo publicado na Revista de Ciências Agroveterinárias, Lages, v.4, n2, p. 133 - 144, 2005. Parte da dissertação de mestrado do autor. - 21 - os solos sob pastagens naturais são limitantes em nutrientes, principalmente o fósforo, e por vezes, ácidos, há necessidade de aplicação de fertilizantes e correção da acidez do solo para o sucesso da implantação das espécies exóticas na pastagem natural. As pastagens naturais da Região Sul caracterizam-se por terem sua composição botânica constituída predominantemente por gramíneas perenes de crescimento estival (GATIBONI, 1999). Isto confere sazonalidade na oferta de forragem, onde no verão há produção satisfatória de massa seca e no inverno há um déficit, o que determina perdas de peso dos animais neste período e consequente aumento da idade de abate. Uma alternativa para aumentar a rentabilidade da produção animal em solos ácidos e com baixa fertilidade natural é o cultivo de pastagens de melhor valor forrageiro e que produzam forragem de boa qualidade durante o período de outono-inverno, tanto para uso direto pelos animais como banco de proteína. Ainda pode-se utilizar tais pastagens como banco de sementes para transferência, através dos próprios animais, das espécies de interesse em outras áreas da propriedade. Nestes casos esbarra-se na necessidade de correção da acidez e também na baixa fertilidade natural destes solos, especialmente o fósforo. Paim & Riboldi afirmam que níveis adequados de fósforo e potássio no solo são necessários, para que as leguminosas aumentem a produção de matéria seca e persistam em pastagens densas, em associação com gramíneas. De maneira geral, na comparação entre gramíneas e leguminosas, as gramíneas são mais tolerantes a solos com baixos teores de fósforo, talvez por possuírem um sistema de raízes mais fino, com um comprimento total maior e com pelos desenvolvidos. Na região do Planalto Catarinense, há pelo menos duas décadas, existem trabalhos de cultivo de pastagens perenes de inverno. As espécies mais trabalhadas são os trevos branco e vermelho e o cornichão, sendo que os mesmos são cultivados de forma consorciada com outras forrageiras hibernais ou são introduzidas nos campos nativos e naturalizados. O intuito é fornecer forragem de melhor qualidade por um maior período para os animais. Porém, a introdução nos campos ou o cultivo puro têm que superar limitações como as condições de umidade na superfície do solo, a concorrência da vegetação existente, a correção das deficiências minerais dos solos, bem como o manejo das espécies (VINCENZI, 1998). O melhoramento da pastagem natural com a introdução de espécies de estação fria é uma estratégia plausível de ser utilizada para obtenção de forragem em ambas as estações. A introdução de espécies consiste na semeadura de uma ou mais espécies forrageiras de crescimento hibernal, visando aumentar o fornecimento de forragem da pastagem para os animais. Para que isso ocorra, a adubação é indispensável para aumentar o fornecimento de nutrientes e promover o estabelecimento ou manutenção das espécies introduzidas, já que a fertilidade natural dos solos é baixa (GATIBONI, 2000), sendo que esta mesma estratégia é válida para a implantação de pastagens perenes de inverno. A inclusão de novas áreas à agricultura brasileira, a baixa disponibilidade de P desses solos, a existência de grandes jazidas de fosfato natural (FN) em diversas regiões do País e as facilidades atuais de importação de FN de maior reatividade têm feito com que a utilização desses fosfatos in natura seja atrativa. Essa utilização tem como problema principal a baixa reatividade, particularmente dos FN brasileiros, e, como consequência, a baixa ou lenta liberação de P para as plantas. Todavia, alguns FN de maior reatividade, como o Gafsa e o Norte Carolina, têm-se mostrado tão ou mais eficientes para suprir P para plantas de ciclo curto quanto as formas mais solúveis, como os superfosfatos (NOVAIS e SMYTH, 1999). A adição de fosfato natural pode ser uma alternativa para o Planalto Serrano, já que a fosforita alvorada chega na região a um preço menor do que os fosfatos naturais importados como o Arad e o Gafsa. Rheinheimer et al (2001) afirmam que a aplicação de calcário também é necessária, mas a elevação do pH retarda o processo de dissolução do fosfato natural e diminui a disponibilidade de fósforo proveniente desse fertilizante às plantas, principalmente acima de pH 5,2. Considerando a indicação de Almeida et al (1999) de que em pH 5,2 já se minimizam os efeitos tóxicos do alumínio, esse pH parece ser o mais indicado para ser trabalhado quando da aplicação de fosfato natural. O valor nutritivo das pastagens nativas cai rapidamente no outono, quando as gramíneas de verão amadurecem. Esta baixa qualidade nutritiva pode ser melhorada pela utilização de pastagens perenes hibernais à base de leguminosas. As leguminosas têm um teor de proteína bem mais alto que as gramíneas, com pouca diferença entre as espécies tropicais e as tempera- 22 - das. A inclusão de até 10 % de leguminosas em pastagem de Pangola (Digitaria decumbens) madura aumentou o consumo de forragem por ovelhas, resolvendo a deficiência de proteína bruta da dieta obtida só com a gramínea (RITTER & SORRENSON, 1985). Além da maior qualidade da dieta, as leguminosas fixam nitrogênio atmosférico e estimulam o crescimento das gramíneas associadas, o que permite o aumento na lotação das pastagens. Para alcançar altos níveis de produção de carne em pastagens de leguminosas, é importante manter uma proporção adequada dessas espécies. Estudos realizados no Planalto Serrano demonstram uma relação entre a produção de carne bovina e a proporção de leguminosas existentes no pasto, ganhos médios de peso vivo de 290, 336 e 545 kg/ha ano foram obtidos com a participação de 13%, 20% e 35 % de leguminosas na pastagem, respectivamente (RITTER & SORRENSON, 1985). As pastagens também possuem importância na conservação do solo, por contribuírem com a diminuição de suas perdas por erosão (VINCENZI, 1987). Além disso, quando estrategicamente utilizadas em rotação de culturas, as pastagens não só atenuam o fenômeno da erosão, como podem recuperar solos já degradados. Klapp (1971) concluiu que em pastagens perenes temperadas, há completa renovação da massa de raízes a cada 3-4 anos, o que representa incorporação de matéria orgânica e criação de canais para infiltração de água no solo. Com a morte das raízes, o solo fica dotado de uma verdadeira malha de canais, o que melhora a estrutura e infiltração de água (VINCENZI, 1987). Quando integradas às lavouras de grãos, as plantas forrageiras contribuem, conservando e melhorando o solo, e ainda promovendo um melhor equilíbrio do ambiente através da diversidade. Além da conservação do solo, as espécies vegetais, segundo Corrêa (2004), são fundamentais na solubilização do P, principalmente do P nãolábil, pois existem espécies que possuem a capacidade de solubilizá-lo mediante a exsudação de suas raízes, a qual contém ácidos orgânicos, e estes, por sua vez, agem na dissolução do colóide, alimentando o P na solução do solo. Quando os alimentos são produzidos na propriedade, os custos de produção são mais baixos, contribuindo para o sucesso econômico da atividade leiteira (KRUG, 1993). Setelich e Almeida (2000) destacam que os sistemas de produção de leite a pasto apresentam uma receita menor que os sistemas em confinamento, po- rém uma margem bruta maior, associada a menores despesas com concentrados, combustíveis e mão-de-obra, além de menores investimentos em instalações. Os custos relativos das pastagens nos EUA são três vezes menores que a silagem e seis vezes menores que os concentrados (ABREU, 2001). Em experimentos conduzidos na Estação Experimental de Lages, a produção de leite à base de ração balanceada chega a ser 27 vezes mais cara que em campo nativo melhorado. Já o custo da silagem de milho, amplamente utilizada no Estado, é doze vezes maior do que o campo nativo melhorado. Uma pastagem cultivada, com composição botânica de inverno, semelhante ao campo nativo melhorado, apresentou um custo duas vezes superior ao do campo nativo (ABREU, 2001). Neste contexto realizouse um trabalho com o objetivo de avaliar o desempenho do FN comparado ao superfosfato triplo na implantação de pastagem perene de inverno (trevo branco, trevo vermelho, cornichão e capim lanudo). Esta comparação foi feita através de determinações da produção média de massa seca das espécies, como também de parâmetros de solo, como pH em H2O, pH SMP, pH CaCl2, potássio, fósforo, cálcio, magnésio e alumínio. Material e Métodos O experimento foi instalado no município de São José do Cerrito, na comunidade de Amola Faca. O clima do local do experimento, segundo a classificação de Köppen é do tipo Cfb (mesotérmico úmido com verão ameno), com temperaturas médias anuais de 13,5 ºC, precipitação média anual de 1.500 mm e altitude média de 950 m. Para recomendação de adubação do solo foi utilizado um laudo de análise de solo de uma área contígua que já vem sendo utilizada anualmente com experimento de cultivares de trigo. Esta amostragem foi realizada a uma profundidade de 20 cm e num período anterior à implantação deste experimento. As informações do laudo são as seguintes: 590 g kg-1 de argila, pH em H2O 4,5; pH (SMP) 4,7; fósforo (mg - 23 - dm-3 solo) 2,2; potássio (mg dm-3 solo) 70; matéria orgânica (g kg-1) 5,0; alumínio (cmolc dm-3) 3,0; cálcio (cmolc dm-3) 1,0 e; magnésio (cmolc dm-3) 0,9. Como a área já vem sendo utilizada anualmente com experimento de cultivares de trigo, não foi usado azevém neste experimento, porque esta espécie poderia invadir as parcelas do experimento. Assim, foi optado pelo capim lanudo para substituir o azevém. A área onde foi implantado o experimento estava em pousio e em regeneração da vegetação original e possuía plantas espontâneas arbustivas como guamirim e samambaia além de gramíneas nativas. Na área experimental foi semeada pastagem perene de inverno com as seguintes espécies: trevo vermelho (Trifolium pratense) na quantidade de sementes de 8 kg/ha, trevo branco (Trifolium repens) 2 kg/ha, cornichão (Lotus corniculatus) 8 kg/ha e capim lanudo (Holcus lanatus) 4 kg/ha. O experimento foi conduzido no delineamento em Blocos Completamente Casualizados, com 6 tratamentos e quatro repetições. As parcelas foram dimensionadas com 2,5 x 7 m, numa área experimental de aproximadamente 600 m2. O fosfato natural utilizado no experimento possui o nome comercial de Fosforita Alvorada e é originário do município de Registro-SP, possuindo 4 % de solubilidade em ácido cítrico conforme laudo técnico da empresa mineradora. Foram utilizadas 7,66 Mg/ha de calcário dolomítico para se chegar a pH 5,2. Tanto o calcário como os adubos fosfatados foram aplicados manualmente e a lanço sobre o solo e incorporados com enxada rotativa. Os tratamentos foram os seguintes: testemunha – sem corretivo e adubo (TEST.); correção da necessidade de fósforo através do uso de 417 kg/ha de Fosfato Natural, considerando o P2O5 total da fosforita (24%) (Só FN); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessidade de fósforo através do uso de 333 kg/ha de Fosfato Natural e 50 kg/ha de Super Fosfato Triplo (ST). Calculou-se a dose considerando o P2O5 total disponível na fosforita (4/5) + 1/5 da dose recomendada de Superfosfato Triplo (CAL + FN + ST); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessidade de fósforo através do uso de 417 kg/ha de Fosfato Natural, considerando o P2O5 total da fosforita (CAL + FN1); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessidade de fósforo através do uso de 1.666 kg/ha de Fosfato Natural, numa dose de ¼ da quantidade de P2O5 solúvel em ácido cítrico (CAL +FN2); aplicação de calcário para pH 5,2 e correção da necessi- dade de fósforo com 244 kg/ha de Superfosfato Triplo (CAL + ST). A implantação do experimento foi efetuada durante o mês de outubro de 2002, porém a época ideal de implantação destas forrageiras é durante os meses de março e abril. Durante a implantação do experimento foram realizadas as seguintes etapas: visita de reconhecimento da área para locação do experimento, verificação das condições de solo e amostragem do mesmo; locação do experimento e das parcelas; implantação do experimento, que consiste no preparo do solo e incorporação dos corretivos e adubos através de enxada rotativa acoplada em trator, preparo das sementes das leguminosas (inoculação e peletização), semeadura a lanço e incorporação superficial manual das sementes. O solo foi coletado pela primeira vez durante a implantação do experimento em outubro de 2002 e pela segunda vez em julho de 2003. As coletas foram efetuadas com trado a uma profundidade média de 10 cm. Foram procedidas as análises químicas dos seguintes nutrientes: fósforo, cálcio, magnésio, potássio e dos níveis de pH e alumínio, conforme descrito por Tedesco et al. (1995). Estas avaliações químicas foram realizadas para monitorar o comportamento dos nutrientes no solo, bem como avaliar as variações no pH e no teor do alumínio. Para a extração do fósforo foi utilizado o método Mehlich 1. Entre os meses de dezembro de 2002 e outubro de 2003 foram realizadas seis amostragens das forrageiras com um intervalo médio de 45 dias entre os cortes. As forrageiras foram cortadas rente ao solo com tesoura de tosa de ovelha, sendo que não foram utilizados animais no experimento. A amostra coletada de cada parcela foi determinada aleatoriamente e demarcada por um quadrado de 0,5 m de lado perfazendo uma área de 0,25 m2. Após o corte, o material foi colocado em sacos de papel e identificado. O material verde coletado foi trazido para o laboratório e separado manualmente por espécies, gerando cinco sub amostras: trevo vermelho (Trifolium pratense), trevo branco (Trifolium repens), cornichão (Lotus corniculatus), capim lanudo (Holcus lanatus) e outras espécies. Este material foi então colocado em estufa, a uma temperatura de 60˚C, por um período de 36 horas ou até atingir massa constante. Depois deste período, as amostras foram pesadas em balança eletrônica de precisão para quantificar a massa seca das forrageiras e obter um parâmetro de volume de - 24 - alimento disponível para os animais. Os dados foram analisados estatisticamente através da análise de variância, utilizando-se o teste F. Os valores de F obtidos para efeitos principais e interações foram considerados significativos ao nível de 5% (P<0,05). Quando alcançada significância estatística, a comparação de médias entre tratamentos foi realizada através do teste de Duncan, ao nível de 5% de probabilidade. Resultados e Discussão A análise da produção média de massa seca (MS) das espécies testadas detectou diferentes respostas. Para trevo vermelho, trevo branco e cornichão foi detectado efeito simples das fontes de fósforo e da época de coleta das amostras, mas sem interação entre estes fatores. Já para capim lanudo e outras espécies foi detectado apenas efeito simples de época de amostragem. Por outro lado, quando se analisou o total de material produzido, foi detectado tanto efeito simples, quanto interação entre as fontes de fósforo e as épocas de amostragem. Para trevo vermelho (Tri- folium pratense) e trevo branco (Trifolium repens) o maior valor de acúmulo total de MS foi observado no tratamento que recebeu calcário e superfosfato tripo (CAL +ST), embora este tratamento não tenha sido estatisticamente superior aos outros tratamentos que receberam calcário e uma das fontes de fósforo testadas (Tabela 12). Resultado semelhante foi obtido por Gatiboni (1999) para trevo vesiculoso. Para essas duas espécies, a testemunha apresentou o menor acúmulo de MS, semelhante estatisticamente ao tratamento que só recebeu fosfato natural (FN). Apesar disso, cabe ressaltar que o FN aumentou o acúmulo de MS do trevo vermelho em 159% e do trevo branco em 93%, em relação à testemunha. Para cornichão (Lotus corniculatus), o maior acúmulo de MS foi detectado no tratamento que recebeu calcário, FN e ST, mas também não diferiu dos demais tratamentos que receberam calcário e uma das fontes de fósforo (Tabela 12). Semelhante aos trevos, a testemunha e o tratamento só com FN foram os de menor acúmulo de MS, mesmo assim o tratamento só com FN produziu 46% a mais que a testemunha. Tabela 12 - Disponibilidade média dos componentes de forragem em massa seca (kg/ha) de trevo vermelho (Trifolium pratense), trevo branco (Trifolium repens), cornichão (Lotus corniculatus), capim lanudo (Holcus lanatus) e outras espécies no período de outubro de 2002 a outubro de 2003, em função de tratamentos com fosfato natural (FN), superfosfato triplo (ST) e calcário. Matéria seca disponível das espécies forrageiras (kg/ha) Tratamentos Trevo Vermelho Trevo Branco Cornichão Capim Lanudo Outras* ** Total Testemunha ** Só FN ** CAL+FN+ST ** CAL+FN1 ** CAL+FN2 ** CAL+ST ** CV (%) 541 b 1.384 b 4.184 ab 4.232 ab 5.274 a 6.177 a 28 76 d 159 d 861 ab 567 c 675 bc 966 a 18 540 b 855 b 3.360 a 3.469 a 2.741 a 2.547 a 17 312 ns 465 531 625 486 908 33 5.268 a 4.936 a 3.370 ab 3.688 ab 2.503 b 5.584 a 18 6.737 c 7.799 c 12.306 b 12.582 b 11.678 b 16.182 a 21 * Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem entre si pelo teste de Duncan (α = 0,05) ** Testemunha = sem corretivo e adubo *** O componente de outras são espécies nativas que colonizaram as parcelas – samambaia, tiririca e outras espécies. - 25 - O capim lanudo (Holcus lanatus) foi a única espécie para a qual não houve efeito significativo de fonte de P do calcário no acúmulo de MS (Tabela 12). Apesar disso, o uso desses corretivos determinou incrementos numéricos no acúmulo, que foram proporcionais à disponibilidade de fósforo. O tratamento com ST acumulou 221% a mais de MS que a testemunha. A ausência de significância possivelmente seja decorrente do elevado coeficiente de variação (33%) observado para essa espécie. Para os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul recomenda-se a calagem segundo o índice SMP para pH 6,0, tanto para aveia, como azevém, capim lanudo e centeio. Os resultados desse experimento, somados aos de Gatiboni (1999) e Morris et al. (1992), que observaram a ausência de resposta do azevém à calagem, indicam que o capim lanudo e o azevém são espécies tolerantes ao solo ácido. O trevo vermelho apresentou contribuição efetiva para a massa total das forrageiras de 37 a 58%, sendo a forrageira que mais contribuiu em massa no experimento (Tabela 12). Para o trevo branco, a contribuição variou de 5 a 10% do volume total das forrageiras, apresentando um melhor comportamento nos tratamentos que receberam calagem e adubação fosfatada, porém não houve diferença estatística de sua produção entre os tratamentos que foram adubados com FN e com ST. A contribuição do cornichão na MS total variou de 25 a 40% do volume total das forrageiras do experimento, sendo a segunda espécie em contribuição na massa total das forrageiras produzidas na pastagem. A contribuição em volume de massa seca do capim lanudo em relação às demais espécies forrageiras utilizadas no trabalho variou consideravelmente. No caso da testemunha e do tratamento só com FN, a contribuição foi de 18 e 15% do volume total, respectivamente. Já para os demais tratamentos as contribuições foram menores, ficando entre 6 e 8%. O trevo vermelho também apresentou maior participação nos cortes realizados no primeiro ano (40% a 80%), em experimento conduzido em Passo Fundo (RS) (FÃO et al., 1998). A taxa de crescimento do trevo vermelho foi influenciada pelas fontes de fósforo e modo de preparo do solo que interagiram com os cortes, onde o ST, em preparo superficial, apresentou vantagem ao FN, enquanto que, no preparo convencional a vantagem foi do FN. Nesse ex- perimento, o cornichão apresentou uma participação baixa nos cortes (5 % a 10%), portanto inferiores aos valores detectados no presente experimento. Assim, os autores consideraram o cornichão inadequado ao sistema, provavelmente, pela sua baixa tolerância ao sombreamento. O melhor desempenho do trevo vermelho no Planalto Catarinense e no Planalto Médio do Rio Grande do Sul possivelmente esteja relacionado ao fato do mesmo apresentar bom comportamento em solos semiprofundos, drenados e de boa fertilidade (FÃO et al., 1998). Normalmente é menos exigente em fósforo que o trevo branco, tolerando solos não corrigidos (COSTA et al., 1992). Em outro trabalho conduzido no CPPSul de Bagé e no CNPT de Passo Fundo, ambos da Embrapa, a participação na composição botânica da festuca (Festuca arundinaceae cv. El Palanque) foi de 48,8 %, o cornichão (Lotus corniculatus cv. São Gabriel) foi de 47,7 % e a participação do trevo branco (Trifolium repens cv. BR 1 Bagé), foi de 3,6% (GONZAGA et al., 1998). A definição dos tratamentos foi feita visando alguns aspectos específicos. Inicialmente pretendia-se testar a adição isolada de FN em solo característico da região do Planalto Catarinense (pH baixo e elevado teor de alumínio). Os resultados mostraram que não foi vantajoso, pois esse tratamento se igualou à testemunha (Tabela 12). Dessa forma, considerando três das quatro espécies testadas, não se deve recomendar implantar pastagens perenes usando somente FN. Esses resultados corroboram com os obtidos por Cantarutti et al., (1981). É bom estar atento que esses resultados foram obtidos num período de um ano, assim num prazo mais longo as condições podem ser alteradas pela dissolução de uma maior quantidade do FN no solo, desta forma recomenda-se a continuidade de trabalhos com este tipo de FN por um maior período. Os outros quatro tratamentos foram definidos com a adição de calcário, objetivando atingir pH 5,2. Segundo Almeida et al. (1999) nesse pH 5,2 já se minimizam os efeitos tóxicos do alumínio. Além disso, foram consideradas as afirmações de Rheinheimer et al. (2001) de que a aplicação de calcário retarda o processo de dissolução do fosfato natural e diminui a disponibilidade de fósforo proveniente desse fertilizante às plantas, principalmente acima de pH 5,2. Assim, além do calcário foram definidos os tratamentos com a utilização de di- 26 - ferentes fontes de fósforo. No tratamento com calcário, FN e ST (CAL +FN +ST) foi suprido 4/5 da necessidade de fósforo com FN e 1/5 com ST, isso porque o FN apresenta lenta solubilização no início de sua reação (NOVAIS e SMYTH, 1999), e, portanto o ST iria suprir a necessidade das plantas na fase inicial de estabelecimento da pastagem. Outros dois tratamentos foram definidos considerando a quantidade total de P2O5 na fosforita e ¼ da quantidade P2O5 solúvel em ácido cítrico. E finalmente o uso de ST como única fonte de fósforo. Para todas as espécies, independente da forma como foi suplementado o fósforo (FN ou ST), foi vantajoso conciliar o uso de calcário e FN ou ST. Esse resultado é interessante, pois a recomendação quanto à fonte de fósforo pode ser feita de acordo com a disponibilidade de recursos do agricultor. Analisando o acúmulo de massa seca das espécies forrageiras e de outras espécies ao longo do experimento (Figura 1) na média dos tratamentos com calcário, fosfato natural e triplo observa-se que o trevo vermelho e outras espécies foram as plantas que tiveram um destaque sobre as demais forrageiras no experimento. O trevo vermelho foi a forrageira implantada que mais produziu até 182 dias após a emergência. Após este período o trevo vermelho entrou em declínio e aos 348 dias a sua contribuição já era menor que a do cornichão. Esta curva de crescimento é característica de plantas anuais ou bienais. Estas plantas possuem um crescimento rápido no início do ciclo (COSTA et al., 1992), mas ao final do período o acúmulo de MS diminui drasticamente (Figura 1). Este comportamento é desejável em uma pastagem perene, pois o rápido crescimento permite a alimentação dos animais no primeiro ano da pastagem, como também há contribuição com a fixação de nitrogênio. Segundo Costa et al. (1992), o trevo vermelho é uma espécie que aos 90 dias após a emergência já pode ser utilizada em pastejo. Figura 1 - Distribuição de massa seca disponível de espécies forrageiras perenes e de outras espécies, na média de tratamentos com calcário, fosfato natural e superfosfato triplo. - 27 - A categoria outras espécies foi criada para incluir todas as espécies não implantadas no início do trabalho. Assim, plantas espontâneas que foram ocupando os espaços que as forrageiras semeadas não ocuparam, foram coletadas. Diversas espécies apareceram, mas destacaram-se samambaia e tiririca. Estas plantas ocuparam os espaços e tiveram uma contribuição importante na massa seca total do experimento. O comportamento do cornichão foi intermediário, sendo que o acúmulo de massa seca aumentou até os 182 dias após a emergência, após sofreu uma queda e voltou a crescer até o final da condução do experimento. Este comportamento é típico de uma planta perene que vai se estabelecendo aos poucos e mantém-se ao longo do tempo. O cornichão embora seja uma espécie bastante rústica, responde à correção da fertilidade, principalmente ao fósforo. O cornichão é de ciclo primaveril e sua forragem verde é de ótima palatabilidade, nutritiva, apresentando boa resistência ao pastoreio (COSTA et al., 1992). No Rio Grande do Sul em cultivo solteiro a produção de massa verde variou de 24 t/ha (sem adubação) até 53,6 t/ha (com adubação), em 4 cortes anuais. Normalmente, nesse estado, são obtidas produções de 4 a 6 t/ha de feno. Uma das grandes vantagens do cornichão é a de não produzir timpanismo nos animais (COSTA et al., 1992). O comportamento do trevo branco e do capim lanudo foi semelhante, tendo as suas curvas de acúmulo ficado abaixo do trevo vermelho, outras espécies e do cornichão. O trevo branco é uma espécie perene que demora a se instalar e é mais exigente em pH e em fertilidade do solo (COSTA et al., 1992). Desta forma o comportamento do trevo branco foi proporcional às condições que lhe foram impostas no experimento. O trevo branco é uma forrageira que ao longo do tempo aumenta de importância, como também com a melhoria das condições de solo. É uma planta que suporta muito bem o pisoteio e possui uma boa capacidade de fixação de nitrogênio no solo. O capim lanudo é uma espécie anual de comportamento primaveril que acompanhou o desempenho do trevo branco. A sua baixa participação no acúmulo de massa seca deveu-se à semeadura tardia (em meados de outubro) e à grande competição que sofreu das outras espé- cies, principalmente do trevo vermelho. A composição química do solo, avaliada na primeira coleta de solo, correspondente ao período de implantação da pastagem (outubro de 2002) evidenciou que a aplicação de fosfato natural não promoveu variações significativas nos resultados do tratamento só FN, quando comparado à testemunha sem aplicação de calcário (Tabela 13). A única diferença ocorreu com o teor de P que diferiu significativamente de um tratamento para outro. A elevação do pH foi observada em decorrência da calagem. Os valores de pH H2O dos tratamentos onde foi utilizado calcário ficaram muito próximos de 5,2 denotando a eficiência da calagem. Esta ação neutralizante proporcionou diminuição do alumínio trocável de 3,52 cmolc dm-3 para 1,38 cmolc dm-3 na média dos tratamentos que receberam o calcário. Ou seja, os valores de alumínio diminuíram 2,55 vezes nos tratamentos que receberam calagem em relação à testemunha. Para cálcio e magnésio também a calagem promoveu um efeito positivo, aumentando os teores de 2,3 cmolc dm-3 e 1,15 cmolc dm-3, respectivamente, para 5,27 cmolc dm-3 para o cálcio e 4,12 cmolc dm-3 para o magnésio (Tabela 13). Estes parâmetros demonstram a efetividade da calagem em disponibilizar cálcio e magnésio, sendo que nesta fase de implantação da pastagem os valores de cálcio aumentaram 2,3 vezes em relação à testemunha e os de magnésio aumentaram 2,8 vezes. Para o potássio não ocorreram alterações com a adição de calcário, fosfato natural ou supertriplo. Para fósforo, os maiores teores foram observados quando foi empregado o fosfato natural associado à calagem. Os demais tratamentos também foram superiores à testemunha (Tabela 13). Quando se utilizou calagem combinada com adição de superfosfato triplo, obteve-se um nível intermediário, semelhante à testemunha, porém também próximo aos valores obtidos para os tratamentos Só FN, CAL+FN+ST e CAL+FN1. Na segunda coleta, que corresponde ao final do período do experimento (outubro de 2003), os resultados de pH foram semelhantes aos da primeira e mantiveram os resultados decorrentes da aplicação ou não de calcário (Tabela 13). O mesmo ocorreu para os teores de fósforo, que apresentaram os maiores valores quando foi associado CAL+FN2. Para o po- 28 - Tabela 13 - Composição química do solo na implantação da pastagem e no final da avaliação do experimento. 1ª coleta: implantação da pastagem Tratamentos pHágua pHCaCl2 pHSMP P(mg dm-3) K(cmol dm-3) Testemunha Só FN Cal + FN + ST Cal + FN1 Cal + FN2 Cal + ST 4,67b 4,68b 5,56a 5,43a 5,66a 5,57a 4,01b 4,01b 5,03a 5,06a 5,13a 5,16a 5,08b 5,23b 5,85a 5,74a 5,81a 5,81a 10,91c 16,70b 19,80b 19,57b 32,69a 15,93bc 0,32a 0,37a 0,33a 0,31a 0,32a 0,30a Ca (cmol dm-3) 2,30b 2,10b 5,65a 5,27a 4,82a 5,32a Mg(cmol dm-3) 1,51b 1,30b 4,19a 4,37a 3,55a 4,37a Al(mg dm-3) 3,52a 3,97a 1,62b 1,15b 1,32b 1,42b 2ª coleta: final do período de avaliação Tratamentos pHágua pHCaCl2 pHSMP P(mg dm-3) K(cmol dm-3) Testemunha Só FN Cal + FN + ST Cal + FN1 Cal + FN2 Cal + ST 4,62b 4,49b 5,16a 5,11a 4,95a 5,09a 4,23bc 4,00c 4,77a 4,69a 4,54ab 4,61a 4,94c 4,83c 5,54a 5,56a 5,29b 5,44ab 13,45b 26,75b 21,27b 23,86b 50,92a 20,57b 0,43a 0,44a 0,44a 0,43a 0,41a 0,41a Ca (cmol dm-3) Mg(cmol dm-3) 3,00bc 2,55c 6,15a 5,45ab 5,72a 5,95abc 1,89b 1,51b 4,76a 4,24a 4,43a 5,44a Al(mg dm-3) 2,30a 2,55a 0,55b 0,57b 0,45b 0,25b As letras diferentes entre médias dos tratamentos representam diferenças significativas (α = 5%) pelo teste de Duncan. tássio, o comportamento foi semelhante em todos os tratamentos, enquanto que, para os elementos cálcio, magnésio e alumínio o efeito da calagem se manteve. Os resultados obtidos para os teores de P são maiores aos obtidos na primeira coleta, mas somente o tratamento CAL+FN2 apresentou teor sig- nificativamente superior aos demais tratamentos (Tabela 13), possivelmente, porque a quantidade de FN utilizada foi maior que nos demais tratamentos. De maneira generalizada os teores de P aferidos no experimento podem ser considerados altos. Estes teores estão altos em função da utilização do método Mehlich 1, que possui na sua constituição extratores ácidos (ácido sulfúrico e clorídrico) que superestimou os teores de P do experimento. Estes resultados estão de acordo com a afirmação de Kaminski & Peruzzo (1997) que observaram a superestimação dos teores de fósforo disponível em solos fertilizados com fosfatos naturais. CONCLUSÕES O uso isolado de fosfato natural não foi recomendável para implantação de pastagens perenes na região do Planalto Catarinense. Já a associação de calagem e diferentes fontes de fósforo (fosfato natural e/ou super triplo) mostraram-se eficientes na implantação dessas pastagens. O trevo vermelho e o cornichão foram as espécies que melhor aproveitaram as condições de solo criadas pela adição de calcário e fósforo. - 29 - 10. Referências Bibliográficas ABREU, C. L. Análise do projeto do DZDR/CCA/ UFSC de produção intensiva e coletiva de leite a base de pasto no oeste de Santa Catarina. Dissertação de mestrado, Florianópolis, 2001. ALMEIDA, J.A, ERNANI, P.R e MAÇANEIRO, K. C. Recomendação alternativa de calcário para solos altamente tamponados do extremo sul do Brasil. Ciência Rural, Santa Maria, v.29, n.4 p.651656, 1999. ARL, Valdemar & RINKLIN, Hansjorg. Livro verde 2. Cepagri e Terra Nova. Caçador, 1997, 68 p. BANDINELLI, D. G. Composição florística de pastagem natural afetada por fontes de fósforo, calagem e introdução de espécies forrageiras de estação fria. 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