Revista Futuro 2016
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Revista Futuro 2016
Futuro Não esperamos o futuro acontecer! Cinco países, um futuro? Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas Megacidades criativas Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade Missão a Marte O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade voestalpine AG voestalpine -Strasse 1 4020 Linz, Austria T. +43/50304/15-0 F. +43/50304/55-0 www.voestalpine.com www.voestalpine.com Edição 2016 magazine voestalpine “Não esperamos o futuro acontecer.” Cara leitora, caro leitor! Você provavelmente conhece esta sensação: com o ritmo sempre crescente de mudanças em nosso mundo, às vezes pode ficar um pouco difícil acompanhar sempre todos os temas. Mais do que nunca, o mundo se encontra em permanente transformação – e transformação sempre significa novos desafios. Na frase do naturalista inglês Charles Darwin, que se dedicou ao estudo das mudanças nas espécies biológicas, “nada na história da vida é tão constante como a mudança.” Com ela, Darwin chama a atenção para o que costumamos perder de vista, e muitos provavelmente prefeririam não ver: a mudança é uma das poucas constantes confiáveis. Para nós como grupo de empresas, mas também para cada indivíduo, isso significa que temos de enfrentar diariamente novos desafios – em termos econômicos, tecnológicos, mas também em termos sociais. Os artigos desta nossa edição de Futuro mostram as diversas formas como esses desafios são enfrentados. Eles refletem como as tecnologias transformam nosso mundo e qual o papel desempenhado pelas diferenças culturais na propagação e aceitação de novas técnicas e tecnologias. Nossa autora Luciana Ferrando, por exemplo, fala do entusiasmo pelo progresso na Argentina. Nesse país, a tecnologia é vista como motor de desenvolvimento cultural e tem uma influência positiva sobre a forma de pensar e agir da população, mesmo que em um ou outro canto do país recursos limitados dificultem o progresso. Na entrevista com nossa redação, Michael Lind, cofundador da New America Foundation, se pergunta se tecnologia demais não iria até mesmo contra a natureza humana, mas chega à conclusão que, em princípio, depende do que fazemos dela. E em seu ensaio, Paul Sullivan indaga em que medida a transformação tecnológica determina a nossa vida, e como, adotando uma nova perspectiva, podemos entendê-la também como uma chance. Uma visão comum da base une os dois autores: mudanças sempre afetam 2 nossa sociedade como um todo. Trabalhando em conjunto, operamos a transformação juntos, a enfrentamos juntos. Ela nos faz até mesmo mirar as estrelas, no verdadeiro sentido da palavra, como descreve nossa autora Louisa P reston: toda uma série de missões internacionais está, neste momento, empenhada em enviar os primeiros seres humanos a Marte. E não são poucos os cientistas que não só sonham em pesquisar o Planeta Vermelho, como também em colonizá-lo – são justamente perspectivas como essas que resultam de inovações tecnológicas contínuas e grandes visões. Esses são os temas com que nós, da voestalpine, estamos especialmente comprometidos, que nos fascinam. Devemos entender a força de inovação – ou, talvez melhor ainda, a vontade de inovar – das pessoas que apresentamos nesta edição como um convite a todos nós para nos unirmos a elas – porque só o engajamento consciente de cada um de nós pode mudar este mundo para melhor. Cordialmente Wolfgang Eder, CEO da voestalpine AG 3 Índice Estar sempre presente Antecipar o futuro Nunca perder a curiosidade 12 30Tecnologia Qual é o seu papel na solução de desafios globais? 60 38 66 Edição 2016 Mudança: indispensável para o progresso e melhoramento — Página 12 Tecnologia: três diferen tes abordagens — Página 30 Especialistas: quatro funcionários com habili dades especiais — Página 56 O poder da mudança Como as mudanças influenciam nossa vida privada e profissional 16 “Uma vida sem risco não é possível” 6 20 8Colaboradores As pessoas que fizeram esta revista 8Expediente A indústria sob o signo da transformação digital 22 Ideias que nos fazem avançar A todo vapor Como funcionarão as usinas do futuro 52 56 70 Quando comer aumenta o desempenho O que comemos pode nos deixar mais inteli gentes, saudáveis e bonitos? 74 Gigantes inteligentes Inovações em veículos utilitários Especialistas são insubstituíveis Apresentamos quatro pessoas que trabalham em nossa empresa As luzes da Terra vistas do espaço Satélite Suomi NPP capta imagens espetacu lares da Terra Megacidades criativas Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade Empresas tradicionais buscam a proximidade de jovens e dinâmicas oficinas de ideias Empreendedores criativos que querem mudar nosso mundo 4 48 Como pessoas da voestalpine veem o futuro Nosso mundo Como será nosso mundo amanhã? Nosso futuro O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas Entrevista com Wolfgang Eder 18 Cinco países, um futuro? Missão a Marte 76 A individualização do cotidiano Quando a prestação de serviços se centra nas pessoas 5 Nosso mundo Islândia Como será nosso mundo amanhã? Estes são os lugares onde procuramos a resposta nesta edição Vale do Silício, EUA O modelo é o Vale do Silício: para possibilitar inovações radicais, mais e mais empresas procuram a proximidade de startups A indústria sob o signo da transformação digital — Página 20 Alemanha Washington D.C. Mumbai Quênia Washington, D.C., EUA Em Washington, falamos com o autor Michael Lind sobre a tecnologia e seu papel no presente e no futuro “Não há volta” — Página 34 Islândia Nossa autora Louisa Preston caminha com o fundador do projeto Mars One pela paisagem da Islândia, que se assemelha à de Marte Missão a Marte — Página 60 6 Malásia Americana Americana, Brasil Lara Baralhas, de Americana, quer conhecer novos planetas Nosso futuro — Página 18 Argentina Na Argentina, robôs estão desempenhando um papel cada vez maior na educação Cinco países, um futuro? — Página 38 Japão Vale do Silício Melbourne Argentina Alemanha Usar o calor residual de usinas elétricas para gerar mais energia com combustíveis A todo vapor — Página 48 Mumbai, Índia As tool houses oferecem espaço para moradia e pequenas fábricas Megacidades criativas — Página 52 Japão Clichê ou realidade: coisas técnicas também podem possuir uma alma? Cinco países, um futuro? — Página 38 Quênia A gaseificação de combustíveis é interessante para países com redes elétricas rudimentares, como o Quênia A todo vapor — Página 48 Malásia Mohammad Asadullah quer gaseificar biomassa, porque isso necessita de menos combustível do que usinas a vapor A todo vapor — Página 48 Melbourne, Austrália Habitantes tiveram a ideia de criar a Little Library, uma minibiblioteca organizada pelos próprios usuários Megacidades criativas — Página 52 7 Expediente Colaboradores Pessoas por detrás de “Futuro” Colaboradores A mudança faz parte de nossa vida – sem ela, não há progresso. Nesta revista, lançamos um olhar para o futuro e perguntamos: como nossa vida vai mudar e qual o papel da tecnologia nessa mudança? Da Argentina ao Japão e da Califórnia à ustrália: enviamos nossos repórteres aos A quatro cantos do planeta, para que nos fizessem um relato sobre as mudanças mais fascinantes. Nestas páginas, queremos apresentar-lhes algumas das pessoas que contribuíram para esta edição de Futuro. Expediente Chris Schinke Luciana Ferrando Paul Sullivan Jornalista (Alemanha) Chris Schinke escreve principalmente sobre temas relacionados com tecnologia, cinema, literatura e teatro. Ele vive e trabalha como jornalista freelance em Munique e contribuiu para esta edição com um artigo sobre megacidades criativas. Jornalista (Alemanha) Para seu trabalho, Luciana Ferrando m ergulha sempre em novos mundos – para Futuro, apro fundou-se no mundo da tecnologia: em um artigo, ela examina sua aceitação em seu país natal, a A rgentina; em outro, como as pessoas se relacionam com a tecnologia. Autor e fotógrafo (Alemanha) Paul Sullivan é britânico e vive em Berlim. Seu trabalho abrange principalmente os temas cultura, lifestyle e viagem. No ensaio que escreveu para a edição deste ano de Futuro, ele se aproxima do tema mudança e transformação. — Página 52 — — Página 12 — — Página 32 — Proprietário e titular da mídia: voestalpine AG voestalpine-Strasse 1 4020 Linz, Áustria Editor: Peter Felsbach Chefe de redação: Maria Reibenberger T. +43/50304/15-5432 [email protected] Concepção e redação: Barbara Ecker, Anne Kammerzelt e Björn Lüdtke Design: Sandra Stäbler Impressão: Kontext Druckerei GmbH Spaunstrasse 3 a 4020 Linz, Áustria 8 Louisa Preston Raouia Kheder Björn Lüdtke Astrobióloga e astrogeóloga (Grã-Bretanha) Louisa Preston é astrobióloga e astrogeóloga, bem como membro da comunidade dos TED Fellows. Ela se ocupa da descoberta de vida em Marte e da colonização de outros planetas e luas pelo h omem, e convida os leitores de Futuro a acompanhá-la em sua missão. Jornalista e apresentadora de rádio (Tunísia) As reportagens de Raouia Kheder versam sobretudo sobre temas sociais e culturais de sua terra natal, a Tunísia, e do mundo árabe. Nesta revista, ela analisa o papel que a tecnologia desempenha na cultura de seu país. Redator (Alemanha) Desde o início, Björn Lüdtke é corresponsável pela concepção e redação da revista Futuro. O jornalista especializado freelance é expert em moda e marketing, mas para a voestalpine ele se dispôs de bom grado a discorrer sobre mudança e tecnologia. — Página 38 — — Página 38 — — Página 60 — 9 Estar sempre presente Dar firmeza e segurança Nossa estrutura descentralizada nos permite agir e reagir mais depressa. Assim, estamos sempre presentes para todos os nossos s takeholders e buscamos atender suas necessidades com um máximo de flexibilidade e dinâmica. Atacamos problemas pela raiz e não desistimos, porque vale a pena lutar pelo futuro. 12 O poder da mudança Como as mudanças influenciam nossa vida privada e profissional 16 “Uma vida sem risco não é possível” Entrevista com Wolfgang Eder 18 Nosso futuro Como pessoas da voestalpine veem o futuro 20 A indústria sob o signo da transformação digital Empresas tradicionais buscam a proximidade de jovens e dinâmicas oficinas de ideias 22 Ideias que nos fazem avançar Empreendedores criativos que querem mudar nosso mundo 10 11 Estar sempre presente Estar sempre presente O poder da mudança “Nada é permanente, exceto a mudança.” — Heráclito de Éfeso Texto Paul Sullivan © iStock Paul Sullivan sobre as mudanças e como elas influenciam nossa vida privada e profissional 12 A mudança também já não é mais o que era. Pelo menos, é o se poderia pensar quando se compara nossa geração com gerações anteriores. Estas certamente não viveram essa sucessão estonteantemente veloz de mudanças técnicas e tecnológicas radicais que hoje transformam nosso cotidiano. Em nenhuma cultura anterior se “surfou”, “escrolou” ou “atachou”, isto é certo, mas desde o início dos tempos quase todas as sociedades passaram, em maior ou menor grau, por processos de mudança e transformação intensos. Até mesmo nas supostamente tão rígidas sociedades pré-modernas houve acontecimentos que trouxeram mudanças radicais: disputas religiosas e guerras tribais, inundações e períodos de frio intenso, revoltas e epidemias e, não por último, todos os desenvolvi mentos graduais que, lenta porém seguramente, determinaram a forma como vivemos no presente. Na verdade, a mudança é uma parte fundamental de nossa vida e da natureza humana, como já confirmou Heráclito, o filósofo grego contem porâneo de Sócrates e um dos primeiros a se ocupar do conceito de mudança, com seu famoso dito “Nada é permanente, exceto a mudança”. E para deixá-lo ainda mais claro, o sábio acrescentou: “Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio.” Gostemos ou não, mudanças acontecem todos os dias, sejam elas pequenos incidentes do cotidiano aparentemente insignificantes, como mudanças dos horários de ônibus, o fechamento de uma loja preferida, um pequeno prêmio na loteria, ou experiências e acontecimentos marcantes, como nascimento e morte, mudança de moradia ou de profissão, uma nova amizade ou se apaixonar. Apaixonar-se, aliás, pode acontecer quase que de passagem e a qualquer momento e, no entanto, pode influenciar nossa vida de forma duradoura. Nós seres humanos tendemos a reagir a mudanças com um misto de temor e anseio. Mudanças são, por natureza, imprevisíveis e não raro comportam riscos. A mudança é uma força invisível, que influencia constantemente nosso mundo. Com o tempo e engenho, aprendemos a nos ajeitar com mudanças – o que é fundamental para uma visão proativa de futuro. Isto, por sua vez, é positivo para nós como indivíduos, mas também para o nosso comportamento profissional e para a sociedade como um todo. “Devemos ser nós mesmos a mudança que queremos ver no mundo.” — Mahatma Gandhi A mudança está inseparavelmente ligada à noção de progresso e melhoramento. Porque, afinal, progresso e melhoramento não são possíveis sem que haja um certo grau de mudança. Decerto não é nenhum exagero afirmar que tanto a sociedade como cada indivíduo trazem dentro de si o desejo de se desenvolver e melhorar. É só olharmos ao nosso redor: os lados positivos de mudanças estão por toda parte. Hoje, não conseguimos mais imaginar um mundo sem smartphones, MP3 Players ou viagens de avião – no entanto, há apenas alguns anos ou décadas, era completamente normal v iver sem isso. E quem, naquele tempo, teria imaginado que impressoras 3D, automóveis sem motorista ou inteligência artificial aplicada a diagnósticos médicos seriam coisas corriqueiras em 2016? O mesmo se aplica a desenvolvimentos sociais. Um dos fatores mais importantes em nossas sociedades em mudança permanente é o poder das ideias, as quais, por sua vez, passam por mudanças no decorrer do tempo. Nossas atuais democracias, apesar de estarem longe de ser perfeitas, são altamente desenvolvidas, e elas o são devido a importantes mudanças sociais no passado: a abolição da escravatura, a extensão do direito de voto às mulheres, os movimentos pelos direitos civis e, não por último, o Iluminismo e a revolução industrial. Mudanças como essas ainda acontecem também nos dias de hoje. Duas ou três décadas atrás, a mudança climática, por exemplo, não passava de um tema marginal, que não era levado a sério por muitos governos ou grandes empresas. Hoje, a problemática chegou ao meio da sociedade e medidas para enfrentá-la estão sendo tomadas em quase todos os níveis. A complicada situação de guerra na Síria e no Oriente Próximo desencadeou uma das maiores crises huma nitárias da História mais recente – pode ser que, ali, a História esteja apenas se repetindo, mas a situação também traz consigo desafios completamente novos. Também o feminismo, que tem suas bases numa tradição centenária de luta pela liberação da mulher, ultima mente vem ganhando novo impulso da internet e das mídias sociais, fazendo com que a superioridade masculina volte a ser colocada em questão e pessoas em todos os níveis se engajem pela igualdade de direitos dos sexos. Todos esses temas, que também se encontram em permanente transformação, proporcionam a indivíduos e governos a oportunidade de, juntos, promover mudanças sociais positivas. Assim como no passado, a evolução tecnológica que experimentamos hoje também pode ser motor de transformações sociais. A internet possibilitou um acesso nunca antes visto à informação e ao conhecimento (Wikipédia, YouTube, e-learning), e sempre novos 13 Estar sempre presente “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças.” — Charles Darwin Ainda que esses temas pareçam ser universais, eles naturalmente têm um efeito diverso em lugares diferentes: na América do Sul, a crise dos refugiados é percebida de forma diferente do que na Europa; a Europa sente as consequências diretas do aquecimento global de forma diversa do que, por exemplo, Bangladesh ou a Califórnia; o neofeminismo em sua expressão ocidental sofre fortes restrições em muitos países do Oriente Próximo. A estrutura cultural, política e social prevalecente em uma sociedade determina como ela é influenciada por mudanças. Não é por acaso que nos últimos anos o conceito – e a aceitação – de mudanças tem sido um tópico importante nas empresas. Elas estão sob uma permanente pressão para se manter no topo, seja com relação 14 à comunicação interna ou ao marketing externo. Ao mesmo tempo, o surgimento de novas tecnologias exige, diariamente, mudanças em muitos aspectos. O melhor exemplo disso são as mídias sociais: há dez anos, não tinham muita relevância; hoje, toda empresa tem de estar presente no Facebook ou Twitter e precisa ter visibilidade online. Com o advento da globalização, o mundo dos negócios tornou-se ainda mais aberto para mudanças. Quando os mercados se abriram com a internet, trazendo todo um mundo de novas possibilidades e oportunidades, termos como “mobilidade” e “flexibilidade” se tornaram parte do vocabulário padrão. A ultraflexível cultura startup talvez seja o que melhor ilustra este fato: em 2001, um grupo de 17 desenvolvedores de software reconheceu a necessidade urgente de se adaptar à nova realidade e publicou o chamado “Manifesto Ágil”. Um ponto central desse manifesto é a “necessidade de responder a mudanças, mais do que seguir um plano”. Essa nova cultura da flexibilidade se mostra da forma mais evidente nos departamentos de relações públicas e Evolução tecno lógica pode ser motor de transfor mações sociais marketing. A imagem ou a marca de uma empresa é de enorme importância, e para a maioria das empresas a sua definição e comunicação é um tema permanente e em contínuo desenvolvimento. Para os usuários, uma página web obsoleta, que não é amigável, ou uma conta desatualizada no Facebook ou no Twitter praticamente não existem. há como escaparmos do inevitável. Existe uma série de bons exemplos de como mudanças trazem novas possibilidades – sejam elas as novas tarefas no novo emprego, a satisfação que sentimos quando redecoramos a casa ou substituímos nossas roupas velhas por novas. Aprender a vencer o temor natural e aceitar mudanças, portanto, parece apenas sensato. Porque, no final das contas, as pessoas, empresas e governos dispostos a assumir riscos têm maiores chances de êxito. Adaptar-se a novos As regras para a sobrevivência são iguais em toda parte, também no mercado dos negócios. Quem não aceita e não se dispõe a enfrentar os desafios de um mundo em constante transformação, está fadado a desaparecer – como os dinossauros. Para aceitar essas condições é preciso flexibilidade e a capacidade de compreender, ou até mesmo de prever, as necessidades e sensibilidades dos clientes. “O pessimista vê a dificuldade em cada oportunidade; o otimista vê a oportunidade em cada dificuldade.” — Winston Churchill Apesar da profusão de exemplos de como mudanças podem influenciar de forma positiva nossa vida profissional ou pessoal, a maioria de nós tem uma postura crítica em relação a elas. Em seu livro de 2007 com o dramático título Change or Die (“Mude ou Morra”), o autor estadunidense especialista em temas econômicos Alan Deutschman revela que a maioria das pessoas prefere permanecer dentro de seus limites pessoais, onde se sente à vontade, a expor-se ao desconhecido – mesmo quando um final feliz é provável. Lançando mão dos mais diferentes exemplos – do doente cardíaco até empresas que ficaram para trás porque não conseguiram acompanhar o ritmo das transformações – Deutschman demonstra o quanto relutamos em aceitar mudanças e, ao mesmo tempo, somos dotados da capacidade inata de nos adaptar a elas. Em última análise, porém, não importa se tememos mudanças ou não. Nem o tempo vai parar, nem as mudanças que ocorrem com o passar do tempo vão deixar de acontecer por causa desse nosso temor. Não vimento, transformação, diversificação, aperfeiçoamento, variedade – não tardaremos a reconhecer que se trata de uma palavra cheia de entusiasmo e positividade. Uma outra possibilidade é recorrer a filosofias que veem mudanças com simpatia. Muitas filosofias orientais se ocupam do conceito de mudança. O I Ching ou Livro das Mutações, por exemplo, um texto chinês que conta 2.600 anos, nos ensina que as coisas boas em nossa vida são passageiras, mas as coisas ruins também o são. aceitamos as coisas como elas são, em vez de dizer ‘isto não pode acontecer assim’, e nos esforçamos mais ainda para dar uma outra direção às coisas.” Uma outra estratégia poderia consistir em adotar uma nova perspectiva. Nem toda mudança é igual. Quando as pequenas mudanças se tornam demais, talvez valha a pena dar um passo para trás e contemplar as mudanças maiores – que, muitas vezes, não têm tanto de mudança como pensávamos. Confuso? Um exemplo: quem se sente estressado pela torrente incessante de informações das mídias sociais, deveria lembrar-se de que os conteúdos que consome não são, em verdade, nada mais do que A mudança faz parte de nossa vida © iStock aplicativos fornecem, por exemplo, informações meteorológicas para agricultores africanos ou enviam um mapa com dados exatos que permitem localizar vítimas de terremotos. Plataformas digitais de mídia social como Twitter, WhatsApp e Facebook não só permitiram organizar rápida e eficientemente protestos ou ajuda em grande escala, como no caso da fuga em massa de refugiados, mas também ajudaram a superar distâncias e tornaram o mundo mais próximo. Através dessas plataformas, estamos em contato direto com pessoas de todo o mundo e assim temos a impressão de que também lugares muito distantes e longínquos fazem parte de nossa própria vizinhança global. Estar sempre presente ambientes, novas pessoas e situações, significa evoluir – em termos da própria personalidade, de renda, de sistema de valores. Existem diversos meios de se adaptar. Nenhum deles é difícil. Uma possi bilidade é conscientizar-se dos signi ficados positivos da palavra mudança. Se olharmos com atenção alguns de seus sinônimos – inovação, desenvol O taoismo talvez seja, dentre as filosofias orientais, a filosofia máxima da efemeridade. Uma de suas proposições centrais é: “Nade com a corrente”. No encantador livro O Tao do Pooh, de Benjamin Hoff, o ursinho Pooh nos transmite, à sua maneira, princípios taoistas: “Tudo acontece da forma certa e na hora certa. Pelo menos é assim quando o permitimos e histórias, que antes eram contadas e hoje são lidas. O meio de comunicação pode ser novo, mas no fundo é a mesma coisa. A paradoxa afirmação de Heráclito, que a mudança é algo permanente, pode igualmente servir de âncora. Ver o sol nascer todos os dias e ver as estrelas brilhar no céu todas as noites, ou presenciar as estações do ano em sua sucessão previsível, nos dá uma sensação de eternidade. Assim como o famoso dito de Heráclito, o provérbio francês Plus ça change, plus c’est la même chose (“Quanto mais muda, mais é a mesma coisa”) nos faz lembrar o que, no fundo, todos sabem: que a mudança é antes a norma do que a exceção. Quem aceitar isto vai poder aproveitar mudanças para seu próprio desenvol vimento pessoal e profissional. Quem não se opuser ao inevitável e nadar com a corrente, vai se sentir melhor como uma pessoa dinâmica e criativa do que como um triste e velho dinossauro. 15 Estar sempre presente Estar sempre presente “Uma vida sem risco não é possível” Texto Paul Sullivan Entrevista com Wolfgang Eder O senhor tem uma filosofia pes soal em relação a mudança e trans formação? Mudança e transformação são indispensáveis para o progresso em todos os setores da vida. Em outras palavras: parar é retroceder – ou, dito de uma forma mais elegante: nada é permanente, exceto a mudança. Por isso, para mim mudança e transformação são a regra, e não a exceção. Basta olharmos para os últimos 20 anos e vermos o quanto a sociedade e a economia mudaram nesse espaço de tempo comparativamente curto: nosso comportamento na comunicação, os processos de produção, a vida em casa – tudo está conectado em rede. Vejo muitas dessas coisas de uma forma bastante crítica, mas é precisamente por essa razão que devemos enfrentar esses desenvolvi- 16 mentos de uma forma ativa e procurar orientá-los para a direção certa. Como isso influi em seu papel de presidente do Conselho de Adminis tração, e em que relação estão o pes soal e o profissional? Para mim, como para a maioria das pessoas, os papéis na vida profissional e na vida privada envolvem tarefas diferentes, desafios dife rentes. Contudo, é sempre uma e a mesma pessoa que tem que lidar com eles. Para dar conta das diferentes situações da vida, seja como presidente do Conselho de Administração ou como pessoa privada, são precisos – apesar de todas as diferenças, que muitas vezes são apenas aparentes – os mesmos princípios e critérios, já por uma questão de credibilidade pessoal. Wolfgang Eder Wolfgang Eder é presidente e CEO da voestalpine AG Como pessoa privada, o senhor lida com mudanças de forma diversa do que na sua posição de CEO? Para mim pessoalmente, disposição para mudanças significa enfrentar novos desafios com a mesma abertura e falta de preconceito tanto na vida privada como na profissional. É claro que as tarefas em um grupo internacional de empresas com quase 50.000 funcionários são outras do que as que se tem em uma família. Em ambos os casos, contudo, trata-se essencialmente de assumir responsabilidade e conscientizar-se de que uma vida sem risco não é possível. No final das contas, assumir responsabilidade significa pesar um risco a ser assumido contra as oportunidades que ele abre – tanto na esfera privada como na profissional. Existe algo como uma política cor porativa oficial e objetiva com rela ção a mudanças, para refrear o gosto excessivo pelo risco, por exemplo? Eu acredito que não é possível, de uma maneira geral, regulamentar a disposição para mudanças por meio de diretrizes, ou mesmo decretar que ela tenha um determinado grau. Tudo o que se pode fazer é procurar criar uma cultura empresarial na qual a transformação constante e a disposição necessária para mudanças sejam parte da identidade corporativa, isto é, sejam vividas conscientemente e com convicção. Mas uma condição imprescindível para que isso se dê é deixar claro para todos os que trabalham na empresa que só se consegue obter excelência permanente e, com isso, também assegurar o melhor possível o próprio futuro, através da disposição para mudança. Naturalmente, mudança sempre significa também Não há inovação sem mudança risco. O decisivo é que tais riscos sejam sempre razoáveis, e portanto manejáveis. Esses riscos são, em grande medida, calculáveis. Mas o maior risco, sem dúvida alguma, é parar de se desenvolver, opor-se a mudanças. Como o senhor pode assegurar que suas decisões sejam, realmente, orientadas a longo prazo e susten táveis, e não sejam sobrepostas por metas de curto prazo e, com isso, desvalorizadas? Essa é uma questão do estilo básico de gestão. Na voestalpine, por exemplo, há muitos anos vimos seguindo, com uma consistência realmente inabalável, uma estratégia clara de longo prazo, nos afastando da imagem do clássico fabricante de aço para nos transformamos em um grupo de empresas que produz tecnologia baseada em metais. Essa orientação de longo prazo também norteia nossa atuação de curto prazo e seus respectivos objetivos. Ou seja, todas as decisões empresariais têm de se nortear pela estratégia de longo prazo. Se estiverem em contradição com ela, não têm nenhuma chance de ser implementadas. O que o senhor faz quando reco nhece que uma decisão foi errada? Empresas bem-sucedidas se distinguem pelo fato de viverem estratégias e modelos de negócios de uma forma consistente e, ao mesmo tempo, questionarem sempre de novo e, quando necessário, adaptarem essas estratégias e modelos de negócios a novos cenários futuros, sem, contudo, alterar seus princípios básicos. Uma das principais características de uma cultura empresarial aberta é a capacidade de lidar permanentemente com um ambiente econômico, político e social que muda a uma velocidade cada vez maior. Só assim poderemos melhorar sempre e continuar bem-sucedidos nesse ambiente em transformação constante. 17 Estar sempre presente Estar sempre presente Nosso futuro LARS BECKER (43) Gerente de Conta-Chave Löhne, Alemanha Texto Anne Kammerzelt Como pessoas da voestalpine veem o futuro 1.Que mudança positiva o próximo ano vai trazer para você pessoalmente? 2.Se você pudesse mudar uma coisa no mundo, o que mudaria? 3.Que tecnologia você acha que precisa ser inventada sem falta nos próximos anos? 4. O que você gostaria de perguntar a alguém que viesse do futuro? “O que poderíamos fazer diferente?” 1) Vou poder voltar a fazer música com a minha banda com mais frequência. 2) Se eu pudesse, impediria que tantas pessoas sofressem diariamente, em todo o mundo, com guerras, pobreza e doenças. 3) Como alguém que anda muito de carro a trabalho: um meio de transporte individual que ande – ou, por mim, que voe – de forma completamente autônoma. 4) Vocês estão bem? – e, caso não estejam, o que poderíamos fazer diferente hoje para ajudar vocês no futuro? E: minha resposta à pergunta número 3 já se transformou em realidade? LARA BARALHAS (5) Aluna da pré-escola Americana, Brasil “Quero conhecer outros planetas” 1) No próximo ano eu quero ir para o ensino fundamental e aprender a ler e escrever bem rápido. 2) As crianças pobres, que não têm brinquedos e chocolates. Gostaria que todo mundo pudesse brincar e comer coisas gostosas. 3) Carros que andam no céu, que voam com controle remoto. 4) Se no futuro vamos andar de foguete igual andamos de avião hoje. Quero conhecer outros planetas. OLESYA BONCHENKO (30) Gerente de Vendas Dubai, Emirados Árabes Unidos “Às vezes esquecemos a sorte que temos, que somos privilegiados” “Boa saúde e boa sorte” 1) Espero continuar tendo boa saúde e boa sorte. 2) Eu gostaria de poder parar o aquecimento global. 3) O aproveitamento da energia geotérmica. 4) O que deveríamos ter feito para que vocês estivessem melhor? 18 Página 18-19 © Private HELMUT RASENBERGER (77) Consultor Toronto (Ontário), Canadá 1) Vou ser mãe e ter de conciliar o trabalho com a maternidade. Com o apoio da minha família, espero poder aliar de forma equilibrada esses dois papéis. 2) Eu possibilitaria a todas crianças, no mundo inteiro, acesso livre e gratuito ao ensino. Quando crescemos em um país onde a escola é de graça e obrigatória para todas as crianças, às vezes esquecemos a sorte que temos e como somos privilegiados. 3) Sistemas de proteção contra emissões altamente desenvolvidos para todas as áreas, a começar pelos automóveis até grandes fábricas. 4) Eu perguntaria se viagens espaciais ou férias na Lua já se tornaram uma coisa corriqueira. 19 Estar sempre presente Estar sempre presente A indústria sob o signo da trans formação digital Texto Hans Schürmann Empresas tradicionais buscam a proximidade de jovens e dinâmicas oficinas de ideias A digitalização está transformando o mundo. Tecnologias que permitem acessar informações e dados a qualquer hora e num piscar de olhos conduzem a inovações que mudam não só a sociedade, como também empresas e mercados. Plataformas na internet que não só permitem às empresas ficar conhecendo melhor seus clientes, como também colaborar mais rápida e estreitamente com fornecedores, bem como a tendência rumo à fábrica conectada – essas são tendências que oferecem novas oportunidades, mas que são, ao mesmo tempo, um desafio para modelos usuais de negócio. Se até agora o foco estava principalmente nos produtos, no futuro ele estará mais em serviços inteligentes e individualizados. Em face da crescente digitalização, tanto conglomerados como médias empresas têm de se reinventar se 20 quiserem se manter competitivas no mercado global. Precisam se tornar mais inovadoras, adaptar velhos métodos de gestão e formas de organização em curto espaço de tempo. Mas isto não é tão simples. “Quando uma organização já existe há dezenas de anos, é difícil abandonar modos de pensar e agir estabelecidos e desenvolver ideias e modelos de negócio completamente novos”, diz Stephan Grabmeier. Durante vários anos, o consultor de empresas acompanhou a transformação digital na operadora alemã de telefonia Deutsche Telekom, e está apoiando duas startups não só financeiramente, como também com suas experiências práticas. Mas a transformação digital não é um problema que diz respeito apenas ao setor de telecomunicações, ela também afeta muitos setores do comércio e da indústria, como por exemplo o setor de construção de máquinas. A produção conectada torna as empresas mais flexíveis e lhes permite reagir com maior rapidez a desejos dos clientes, mas, ao mesmo tempo, os ciclos de inovação se tornam mais curtos e os mercados, mais globais. A consequência: as empresas se veem forçadas a desenvolver novos produ tos e lançá-los no mercado muito mais depressa, para poder fazer face à concorrência. Assim, a necessidade de inovações radicais está levando um número crescente de empresas a buscar a proximidade de startups. Startups têm grandes vantagens quando se trata de inovações transformadoras de mercado. “Elas não têm que se preocupar com um core business de margem forte e, além disso, sua estrutura lhes permite agir de forma mais rápida e flexível do que grandes conglomerados de empresas”, explica Markus Struppe, parceiro da empresa UnternehmerTUM © iStock Transformação digital na prática GmbH, o Centro de Inovação e Incubação de Startups da Universidade Técnica de Munique. As jovens empresas focadas em novas tecnologias experimentam coisas novas, sem saber de antemão se estas serão bem sucedidas no mercado. Para lidar com essas incertezas, elas utilizam um procedimento iterativo. Isto significa que não há um resultado final definitivo, e sim uma constante otimização dos resultados e adaptação das metas do projeto. Para isso, elas procuram sempre de novo o contato com clientes em potencial, elaboram protótipos e discutem com os futuros usuários. Na opinião do consultor da Unter nehmerTUM, essa é uma vantagem decisiva, sobretudo diante de ciclos de inovação cada vez mais curtos. Uma empresa estabelecida tem uma imagem a zelar e, por isso, não pode lançar no mercado produtos “inacabados” sob sua própria marca para que eles sejam testados por seus clientes. Struppe está convencido de que ambos os lados podem ganhar com uma cooperação logo no início. Enquanto que startups são inovadoras e flexíveis, grandes empresas dispõem de uma rede forte de empresas do setor e de clientes, e de know-how na implementação e escalonamento de novos produtos. Entre os ligados na cena de startups estão também grupos internacionais. Há pouco, o grupo BMW fundou uma startup garage, com grande repercussão na mídia. Seu objetivo é fomentar jovens empresas com potencial em fase inicial e aproveitar tecnologias de startups nos seus próprios processos de inovação. Já outros gostam de trabalhar mais em surdina, como um fabricante de máquinas de construção alemão, que coopera há anos com uma jovem empresa de software. Por trás dessa miniempresa estão engenheiros que têm vontade de experimentar e desenvolvem programas que fazem com que sistemas de controle de máquinas móveis fiquem cada vez mais inteligentes. Grupos energéticos também esperam que uma cooperação mais forte com empresas jovens e ágeis lhes traga ideias frescas, que os ajudem a levar a transformação a bom cabo. Grupos como a EnBW andam de olho em startups que desenvolveram inovações para a smart home, ou casa inteligente. Essas empresas poderiam, por exemplo, desenvolver soluções inteligentes que, em conexão com uma rede elétrica inteligente (smart grid), contribuam para que flutuações de tensão em uma rede alimentada por energias renováveis possam ser melhor compensadas. Já faz algum tempo que grandes empresas se interessam por startups. Seus motivos, porém, mudaram: “Enquanto que antes as grandes empresas estavam interessadas principalmente em participações financeiras, hoje o foco está sobretudo na gestão de inovações”, diz o consultor de transformações Stephan Grabmeier. A tendência de digitalização fez com que os dois lados se aproximassem e mostrou que eles se complementam muito bem e podem beneficiar-se um do outro. 21 Estar sempre presente Estar sempre presente Ideias que nos fazem avançar Texto André Uhl Brinquedo para a geração digital de amanhã: TinkerBots 22 Página 22-23 © Kinematics Empreendedores criativos que querem mudar nosso mundo Blocos de montar para a era digital Brinquedos são bons sobretudo quando estimulam a fantasia. E são melhores ainda quando as crianças se divertem ao montá-los e podem continuar a desenvolvê-los de acordo com suas próprias ideias. Os fundadores da empresa alemã Kinematics deram vida aos blocos de montar com seus TinkerBots. A peça central é o chamado “Power Brain”, um cubo vermelho dotado de sensores que comandam articulações, garras e motores. Todos os módulos são conectados sem fio e simples de montar. Os robôs prontos aprendem a executar sempre novos movimentos, e as crianças se transformam em pequenos pesquisadores curiosos. O brinquedo adequado para a geração digital de amanhã. 23 24 © Vitameter Juntos somos (mais) inteligentes Compartilhar ideias, trocar apontamentos, apoiar-se mutuamente – a maioria dos alunos sabe que estudar em conjunto é mais eficaz do que ruminar sozinho entre quatro paredes. Os criadores do BrainShare, um aplicativo educacional da Uganda, transferem esse princípio para o mundo digital. Sua plataforma online de mídia social mostra que pode ser divertido estudar em grupo e possibilita um compartilhamento simples de conteúdos didáticos, quer se trate de apontamentos individuais, artigos ou vídeos. Quando alunos, professores e pais se encontram numa sala de aulas virtual, ninguém fica sozinho – uma inovação social da qual todos podem se beneficiar. Estar sempre presente © iStock Estar sempre presente Conferindo as vitaminas A falta de vitaminas nos deixa mais vulneráveis para doenças – isto todos nós sabemos. O que todo mundo também sabe é que vitaminas em excesso podem ter efeitos negativos sobre a nossa saúde. Não seria prático, então, se pudéssemos avaliar nós mesmos nosso estado vitamínico? Graças aos inventores canadenses do Vitameter, isto já é possível. Utilizando descobertas da nanotecnologia e com a ajuda de biosensores, o aparelho faz a avaliação do nível vitamínico do usuário em questão de poucos minutos, permitindo-lhe assim compreender melhor seu próprio organismo, revisar seus hábitos alimentares e, no fim das contas, viver de uma forma mais saudável. 25 26 © Cityflo Novos conhecimentos em tempo recorde Quem já não desejou alguma vez poder assimilar o conteúdo de livros inteiros no mais curto espaço de tempo? Os fundadores da startup berlinense Blinkist transformaram esse desejo numa brilhante ideia de negócios. Em vez de ter que passar horas a fio lendo centenas de páginas, as ideias centrais de mais de 1.000 livros técnicos podem ser lidas comodamente em apenas poucos minutos nos intervalos livres, por meio de um aplicativo no smartphone, em um tablet ou em qualquer browser. Uma solução ideal para todos os que têm de adquirir rapidamente sempre novos conhecimentos e querem aproveitar os muitos momentos livres enquanto estão indo de um lugar para outro. Estar sempre presente © iStock Estar sempre presente Na rota certa Muitas vezes, as ideias mais simples são também as melhores. Como é possível desafogar o notoriamente sobrecarregado sistema de transporte público urbano na metrópole indiana de Mumbai? Jerin Venad, especialista indiano em TI e fundador da iniciativa Cityflo, tem a resposta: com miniônibus particulares que fazem os principais percursos, oferecendo uma alternativa real para os que viajam regularmente de casa para o trabalho. Através de um aplicativo, os p assageiros podem reservar assentos e comprar passagens, e os percursos podem ser consultados no Google Maps. Com o que fica, mais uma vez, provado que não é preciso reinventar a roda, basta utilizá-la da forma certa. 27 Antecipar o futuro Criar movimento e fornecer energia Nós promovemos mudanças – abertos para o novo e com a curiosidade do pesquisador, pensamos de forma visionária e muito além do presente. Riqueza de ideias caracteriza tanto nossos produtos e processos como o rela cionamento com nossos semelhantes. Porque nada é tão bom que não possa ser melhorado. 30 Tecnologia Qual é o seu papel na solução de desafios globais? 38 Cinco países, um futuro? Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas 48 A todo vapor Como funcionarão as usinas do futuro 52 Megacidades criativas Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade 56 Especialistas são insubstituíveis Apresentamos quatro pessoas que trabalham em nossa empresa 28 29 Antecipar o futuro Antecipar o futuro Tecnologia Texto Luciana Ferrando, Björn Lüdtke Em todas as partes do nosso planeta, vemo-nos confrontados com desafios que temos de enfrentar. Que papel a tecnologia pode desempenhar na sua solução? Ou compete a nós mesmos, ao fim e ao cabo, superar esses desafios? Três diferentes abordagens do tema Tecnologia por dentro: sala de servidores 30 31 Antecipar o futuro Antecipar o futuro “O homem e a máquina” — quem precisa de quem? elhor t ransmissão de conhecim mento. “Porém, em áreas sensíveis, é uma vantagem quando máquinas agem de forma autônoma, por exemplo, em missões no espaço”. Mas, mesmo nesses casos, é necessária uma cooperação entre humanos e máquinas, pois os homens têm que interpretar os dados coletados por computadores no espaço. Nos FabLabs, por outro lado, o foco se encontra na curiosidade e na criatividade humana. Nas oficinas hightech espalhadas pelo mundo, todos podem experimentar os mais novos equipamentos, como impressoras 3D ou cortadoras a laser. O objetivo? Ter a tecnologia nas próprias mãos, entendê-la melhor e usá-la para as próprias finalidades. Outra vantagem tecnológica que já se tornou indispensável é a ajuda no Texto Luciana Ferrando 32 Em sua opinião, o computador atual estaria sendo muito idealizado. Ele seria mais rápido e exato que o ser humano e nunca se cansaria. “Como se as máquinas fossem independentes e concorressem com os humanos”, complementa Villaplana. Entretanto, computadores têm desvantagens em relação ao homem: não possuem espontaneidade. Eles precisam de modelos e comandos claros, que determinam o caminho a ser seguido. “Computadores são excelentes na hora de seguir instruções, mas são terríveis quando se trata de improvisar”, constata Nicholas Carr em um artigo no jornal The New York Times. “Seus talentos terminam nos limites de seus programas. Já as capacidades humanas não conhecem essa limitação”. Para a pesquisadora de design Andrea Augsten, o maior desafio é transferir do analógico para o digital aquilo que faz do ser humano um ser humano. “Quando trabalhamos juntos em um workshop, sorrindo e trocando ideias, essa energia está no ar. Mas ela se perde assim que cada um volta para seu computador”, diz a especialista. “Nós tentamos preservar essa recordação de forma digital, mas ela só pode ser documentada em um canal, com imagens, por exemplo”. Para ela, fatores como experiência de vida ou inteligência emocional têm um papel importante. “O conhecimento tácito, aquilo que não sabemos expressar com palavras e que simplesmente carregamos dentro de nós, não pode ser reproduzido de forma digital”. Na abordagem de pesquisa “Affective Computing”, que se ocupa de computadores e emoções, houve resultados surpreendentes: emoções podem ser lidas nos rostos através de um software. Em 2013, um estudo da Universidade da Carolina do Norte mostrou como um software treinado foi capaz de reconhecer expressões faciais e associá-las a termos como “frustração” ou “motivação”. Esse software deverá ajudar profes sores em seu trabalho pedagógico. Para Álvaro Villaplana, todavia, apenas a combinação de capacidades humanas e técnicas pode trazer um progresso real. Na área educacional, o homem, para ele, ainda se encontra no centro e a informática seria uma ferramenta para uma mos”. Pelo contrário. Segundo ela, os seres humanos devem continuar a almejar uma otimização de sua relação com a tecnologia. O desenvolvimento da robótica para os cuidados de enfermos/idosos ou na indústria automobilística, por exemplo, mostraria claramente como máquinas podem facilitar nossa vida se forem controladas por nós. Porque o homem pode reagir a imprevistos, enquanto as máquinas somente sabem seguir regras. Cotidiana, próxima e sempre intensa: a relação do homem com a tecnologia está hoje tão presente em sua vida como seus relacionamentos interpessoais. Entretanto, o homem é indispensável também para as máquinas, já que é ele que as cria, as programa ou, quando necessário, puxa a sua tomada. Impressoras 3D: em breve cotidianas? Página 30-31 © iStock Direita © iStock R esponder à voz suave do sistema de navegação, ficar zangado com o smartphone ou confundir ruídos com toques de telefone – essas coisas não são mais vistas como comportamento estranho, e sim mostram como cresce nossa familiarização com equipamentos técnicos. A tecnologia se tornou algo trivial, que faz parte de nosso dia-a-dia. Máquinas assumem muitas de nossas tarefas e já tem gente com medo de que não demorará muito para o ser humano se tornar supérfluo. Será que isso realmente poderia ocorrer? Na era da digitalização, as pessoas muitas vezes se esquecem de que são elas mesmas que se encontram por trás desse desenvolvimento. Em meados do século XVIII, “computador“ era uma pessoa que fazia cálculos e resolvia questões matemáticas complexas ou fazia análises numéricas. “Sem pessoas como Alan Turing, que inventou o computador, ou Gottfried Wilhelm Leibniz, que criou o sistema de numeração binário, não teríamos hoje máquinas quase tão geniais como seus construtores”, diz Álvaro Villa plana, filósofo da tecnologia nas universidades de Madrid e Costa Rica. armazenamento de conhecimentos. Estudos comprovam que aqui o homem e a máquina se complementam bem. “O que acontece com os recursos liberados no cérebro quando dados são salvos externamente?” foi o que questionaram, no final de 2014, Ben Storm e Sean Stone, do Memory Lab da Universidade da Califórnia. “O armazenamento digital de dados que, de outro modo, teríamos que guardar na cabeça, facilita o aprendizado de novas informações”, escreveram os pesquisadores no jornal Psychological Science. As pessoas eram capazes de gravar melhor palavras de um arquivo PDF quando sabiam que poderiam salvar o arquivo. Na opinião de Andrea Augsten, não haverá um futuro “em que seremos controlados por máquinas e não saberemos mais pensar por nós mes- 33 Antecipar o futuro Antecipar o futuro “Não há volta” — uma entrevista sobre tecnologia com o autor Michael Lind Texto Björn Lüdtke E m todos os tempos, as pessoas tiveram e têm determinadas concepções de como poderia ser o futuro. Nos anos 60, por exemplo, elas imaginavam que na segunda década de 2000 estaríamos voando para nossas colônias na Lua em naves espaciais. Como sabemos, esse não é o caso. Em compensação, carregamos no bolso ou na bolsa telefones celulares que são computadores com uma capacidade de processamento completamente utópica naquela época. De uma forma ou de outra, novas técnicas e tecnologias desempenham um papel decisivo na maioria das visões do futuro. Procuramos descobrir qual é, exatamente, esse papel na entrevista a seguir com o autor Michael Lind. Além de autor, Lind é cofundador da “New America”, uma organização que se empenha junto a tomadores de decisão em prol, entre outras coisas, de uma reorientação da política dos Estados Unidos na era digital. 34 Hoje, novas tecnologias são frequen temente chamadas de disruptivas, ou seja, elas provocam mudanças fun damentais no mercado e no compor tamento dos consumidores. Elas são mesmo tão inovadoras assim? Sim. Mas, em minha opinião, hoje em dia muitas tecnologias são frequentemente categorizadas de forma errônea. A grande maioria dessas chamadas inovações disruptivas são, na verdade, tecnologias revolucionárias que já foram desenvolvidas em meados do século 20 e hoje estão, em essência, apenas sendo aperfeiçoadas ou utilizadas de uma forma mais ampla. Tomemos, por exemplo, a automatização de automóveis, a utilização crescente de tecnologias da informação e comunicação nas mais diversas áreas, ou as mídias sociais – as técnicas em que se baseiam já foram em parte desenvolvidas na década de 30. Muitas das atuais inovações não são tecnologias realmente transformadoras, que provocam mudanças radicais. Um exemplo: a invenção do motor elétrico equivale ao desenvolvimento do computador entre os anos 40 e 80. A eletrificação das cidades e áreas rurais equivale ao desenvolvimento da internet nos anos 90 e 2000. E os aplicativos de hoje equivalem aos programas de rádio e televisão, que só se tornaram possíveis com a expansão da rede elétrica. Nem a rede televisiva e nem tampouco um aplicativo nas mídias sociais são tecnologias inovadoras – totalmente ao contrário do motor elétrico. Sendo assim, o senhor diria que existe de fato uma revolução digital? Existe, sim, porque os verdadeiros ganhos de produtividade e as mudanças reais na sociedade não resultam do desenvolvimento inicial de chamadas tecnologias de base ou tecnologias pioneiras como a máquina a vapor, o motor elétrico ou o computador. A verdadeira transformação resulta da aplicação dessas tecnologias em vários setores que já existem. Esses setores são velhos conhecidos: a indústria, a agricultura, o comércio varejista, o setor de lazer, etc. A transformação em nossa sociedade existe, mas não devemos sobrestimar o número de tecnologias transformadoras. O senhor acha que, de um modo geral, colocamos esperanças demais em novas tecnologias? Sim, sobretudo nos Estados Unidos, não tanto em outros países como a Alemanha, por exemplo. Há um enfoque demasiado em tecnologias disruptivas. Dá-se muito pouca importância à utilização mais ampla de tecnologias já desenvolvidas – pelo menos no que toca as políticas públicas. E, no entanto, são precisamente elas que conduzem aos verdadeiros ganhos de produtividade e a uma melhora da nossa qualidade de vida. Vez por outra surgem setores que são de fato novos. Mas, na grande maioria das vezes, a tecnologia apenas transforma setores conhecidos há muito. Com o motor de combustão veio, por exemplo, a mecanização agrícola: o trator substitui o cavalo e o homem. Continua sendo agricultura, só que mais produtiva. Existe um movimento chamado Maker Movement», que propaga « que as pessoas voltem a fazer elas mesmas muitas coisas. O senhor acredita que o faça você mesmo é uma possibilidade de solucionarmos alguns dos nossos problemas, como a subnutrição ou o suprimento de energias renováveis? Em uma palavra: não. Sou um grande entusiasta do Maker Movement, e creio que é bom para uma sociedade que as pessoas não comprem tudo simplesmente em lojas. Nos Estados Unidos, essa tradição já existe há muito: lojas de bricolagem oferecem ferramentas com as quais as pessoas constroem suas próprias estufas nos fins de semana. Isto é bom, e eu acredito que este processo será acelerado por máquinas para a produção rápida de elementos de construção padronizados, o chamado Rapid Proto typing. Porém, é utópico acreditar que a eficiência econômica da produção em massa possa ser substituída por impressoras 3D na garagem. Faz sentido, e continuará fazendo, fabricar em massa produtos como automóveis ou aviões. Desde os inícios da revolução industrial existe a esperança de que possamos retornar a uma sociedade pré-urbana, rural, mas equipados com novas ferramentas. Não conseguimos isso até agora, e eu pessoalmente também creio que jamais conseguiremos. No seu ver, a complexidade da vida atual causa apreensão às pessoas? Sim, penso que sim. No meu ver, existe aí uma discrepância: eu acredito que, tradicionalmente, o ser humano funciona em pequenos grupos, que não exigem uma grande competência científica ou técnica. Mas a realidade é que vivemos em estados que têm fronteiras e em grandes comunidades como a União Europeia. Isso não só é uma nova experiência para o ser humano, eu também acredito que, de uma certa forma, isso é contra a nossa natureza. Os seres humanos querem viver como vivem os chimpanzés, nas florestas, em pequenos grupos. No entanto, estamos rodeados de um bulício constante, como se vivêssemos num formigueiro. Isso tem, forçosamente, de gerar toda sorte de problemas sociais e políticos. Entretanto, chegamos a um ponto no qual não há mais volta. Não é possível alimentar dez bilhões de pessoas com produtos produzidos localmente com a ajuda de energia elétrica solar. Os alemães estão tentando fazer isso no momento, mas não funciona. Um dilema: a situação atual causa apreensão a muitas pessoas, e mesmo assim confiamos mais e mais na tecnologia – basta olhar os mer cados financeiros, ou os pilotos auto máticos em aeronaves, que assumem cada vez mais funções. Eu diferenciaria entre tecnologia e técnica. A tecnologia é a máquina propriamente dita, a técnica é a utilização dessa máquina. A maioria desses exemplos de tecnologia são, na verdade, técnicas. Nos anos 90, antes dos Estados Unidos desregularem o setor financeiro, por exemplo, utilizava-se a mesma tecnologia que nos anos 2000, ou seja, depois da desregulação. O que mudou foram somente as condições legais. No fundo, temos completa liberdade quando se trata de estruturar as coisas. É como com as pessoas que pensam que rejeitam a tecnologia. Quando, na verdade, o que elas rejeitam são determinadas condições sociais, políticas e legais. Pouco importa que ferramentas usamos. Há custos e há benefícios, tudo é uma questão de ponderação – mas, no fim das contas, está em nossas mãos dar à sociedade a forma que queremos que ela tenha. Michael Lind Autor estadunidense que já trabalhou para o jornal “The New Yorker”, entre outros. Lind é cofundador do think tank “New America”. 35 Antecipar o futuro Antecipar o futuro “Um empurrãozinho na direção certa” — nudging como alternativa para soluções técnicas? Nudging Network, fundada em 2010 pelo dinamarquês Pelle Guldborg Hansen, realizou o seguinte experimento: pequenas placas ao lado dos interruptores de luz de uma universidade chamavam a atenção para o fato de que 85 por cento dos estudantes apagavam a luz quando deixavam o recinto. Isto fez com que a luz permanecesse acesa com menos frequência (uma redução de 20 a 26 por cento, no total) – resultando em economia efetiva de energia. Nos EUA também se usa o empurrãozinho: na quente Califórnia, é natural que os cidadãos liguem seu ar condicionado quando há ondas de calor. Em resultado disso, os colapsos do suprimento de energia Texto Björn Lüdtke 36 vações sociais são novas abordagens para satisfazer necessidades sociais. Exemplos conhecidos são comércio justo, microfinanciamentos, bancos de horas de trabalho, moedas comunitárias e apps móveis para a organização de grupos de carona. Como as pessoas podem ser estimu ladas a ter um com portamento mais social? Uma nova abordagem em termos de inovação social é o chamado nudging, que em inglês significa “dar um empurrãozinho”. Trata-se de uma abordagem que se ocupa da questão de como se pode estimular as pessoas a ter um comportamento mais social e produtivo, sem restringir sua liberdade de escolha. A teoria dos nudges diz que um feed back positivo ou estímulos indiretos – em outras palavras, um toque ou um empurrãozinho – influenciam grupos ou indivíduos de forma tão ou mais efetiva do que instruções diretas, leis ou coerção. Os chamados nudges são frequentemente utilizados como alternativa para soluções técnicas. Um hotel na Dinamarca, por exemplo, colocou maçãs na vitrine de um bufê sob um cartaz na parede com o velho ditado popular segundo o qual “uma maçã por dia mantém o médico longe” para estimular os participantes de um congresso a viver de forma mais salutar. Os hóspedes começaram a preferir o lanche saudável a um pedaço de bolo ou um chocolate, e o hotel se viu obrigado a ampliar sua oferta de frutas. A alternativa técnica? Desenvolver mais produtos dietéticos ou gastar mais dinheiro no setor de saúde. Estimular as pessoas a levar uma vida mais saudável da forma descrita acima, porém, é uma solução muito mais sustentável e econômica. Os nudges também podem ser um meio simples e proveitoso de estimular as pessoas a economizar energia. A associação de pesquisa Danish Clássico do nudging: um toque para apagar a luz © iStock E m todas as partes do nosso planeta, vemo-nos confrontados com inúmeros desafios: agricultura não sustentável, mudança climática, alto consumo de energia, envelhecimento da população e aumento dos custos no setor de saúde são apenas os mais urgentes. Com mais e mais frequência, as abordagens tradicionais falham na tentativa de solucionar esses complexos problemas. Na maioria dos casos, instrumentos estatais ou puras soluções de mercado não bastam. Por isso, inovações sociais são vistas, mais e mais, como complemento ou alternativa para soluções tradicionais e na maioria das vezes técnicas de problemas. E, no entanto, ainda não existe uma definição clara do que são inovações sociais. As discussões sobre esse conceito são longas e numerosas. No fundo, porém, trata-se simplesmente do seguinte: cada um faz a sua parte para produzir mudanças positivas para si próprio e seus semelhantes. O que mais distingue as inovações sociais das tecnológicas é que elas objetivam a mudança de determinadas práticas sociais e dão menos valor à introdução de novos produtos. Ino- energia responsável, foram economizados 2,8 terawatts-hora de energia elétrica desde 2007. Na frequentemente fria Grã-Bretanha, o problema é precisamente o contrário. Lá, muito calor (e portanto energia) sai pelo telhado. Para fazer com que as pessoas baixem a temperatura da calefação em suas casas – e, assim reduzir a emissão de CO2 –, o governo britânico tentou estimular os cidadãos a isolar seus telhados oferecendo-lhe subvenções. Mas o plano não funcionou, os pedidos de subvenção ficaram muito aquém das expectativas. Por quê? Acabaram descobrindo que as pessoas se esquivavam de uma reforma porque a maioria dos sótãos estavam repletos elétrica se tornaram cada vez mais frequentes. Psicólogos tiveram a ideia de informar os habitantes qual o seu consumo de energia elétrica em comparação com seus vizinhos, e as contas de luz seguintes passaram a vir com smiley faces, conforme a quantidade de energia economizada. Segundo a Opower, a empresa de de tralhas. P assaram então a oferecer não só subsídios financeiros ao isolamento, como também a remoção gratuita dos trastes. O resultado: os pedidos de subvenção triplicaram. A ideia de arrumar os sótãos partiu do primeiro “Behavioural Insigths Team” do mundo, um time de especialistas criado pelo governo britânico em 2010 para aplicar na prática os insights das ciências comportamentais em geral e a teoria dos nudges em especial. O objetivo do time é ajudar as pessoas a tomarem decisões que são melhores para elas. A primeira tarefa do time consistiu em aumentar a arrecadação de impostos. Como? Em vez de avisar os contribuintes de que ainda estavam em dívida com o fisco, eles eram informados de que a maioria dos moradores de sua cidade já estava com seus impostos em dia. Uma simples reformulação do texto bastou para aumentar a arrecadação em 200 milhões de libras esterlinas – e isso sem causar custos adicionais. Todos esses são pequenos estímulos que podem ter um grande efeito. A intenção do nudging não é proibir, e sim permitir que a pessoa decida livremente – mas direcionando sua escolha. A linha que separa o nudging da manipulação, todavia, é tênue, e assim não surpreende que ele também seja objeto de críticas. De acordo com a teoria, um empurrãozinho só é um nudge quando influencia o comportamento de pessoas de forma previsível, sem proibir a escolha de outras opções. Nem toda intervenção que influencia alguém que decide livre e racionalmente é um nudge. Nudges não impõem incentivos – positivos ou negativos. Se aproveitar-se de sentimentos de vergonha para dar um empurrãozinho ainda pode ser considerado neutro, certamente é um aspecto merecedor de discussão. Outro ponto questionado é se a mudança de comportamento é duradoura. Apesar de todas as críticas, o nudging pode produzir mudanças positivas de comportamento em indivíduos e em grupos inteiros. Muitas vezes, nudges são alternativas baratas para soluções técnicas dispendiosas. Se forem utilizados com bom senso e tato, cada um de nós pode ser estimulado a mudar o mundo – empurrãozinho por empurrãozinho. 37 Antecipar o futuro Antecipar o futuro Cinco países, um futuro? C Texto Björn Lüdtke, Yuki Sato, Ellen Lee, Angela Gruber, Luciana Ferrando, Raouia Kheder Robôs jogando futebol 38 Esquerda © Jiuguang Wang / Flickr (CC BY-SA 2.0) Direita © HUISTEN BOSCH Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas omo em todas as edições da revista Futuro, damos uma espiada em cinco países do mundo. Queremos ver onde estão as diferenças, mas também os pontos comuns. Desta vez, focamos nos novos desenvolvimentos tecnológicos. Quais são as peculiaridades culturais na proliferação e na aceitação da tecnologia na respectiva cultura? Qual a importância assumida por ela no Japão, nos EUA, na Alemanha, na Argentina e na Tunísia e qual seu lugar no cotidiano de cada um desses países? Começamos com nossa repórter Yuki Sato, no Japão. Os japoneses têm a fama de serem especialmente abertos para inovações técnicas. Isso é mesmo assim ou trata-se simplesmente de um clichê? E quais são as expectativas depositadas em robôs? Também os EUA estão sempre bem à frente quando se trata de novas aplicações. Segundo Ellen Lee, isso poderia ter a ver principalmente com o espírito pioneiro rebelde dos americanos. Lá, ela encontra uma cultura que “incentiva quem tem a coragem de enfrentar riscos e recompensa quem faz coisas inteligentes”. Já os alemães têm a imagem de céticos em relação a novas tecnologias – e isso apesar da Alemanha ser o país dos inventores e pensadores. Essa imagem é justificada? Angela Gruber busca responder essa pergunta. Luciana Ferrando dá uma olhada na situação na Argentina, onde as novas tecnologias têm um papel mais importante no dia-a-dia do que talvez possamos imaginar. Isso já começa na educação das crianças e se deve principalmente a um programa estatal. Raouia Kheder tenta esclarecer porque que na Tunísia as novas tecnolo gias – com exceção de tecnologias de informação e comunicação – têm tanta dificuldade de se estabelecer. E o motivo não parece se encontrar na população. Robôs na recepção de um hotel Japão — Robôs com alma No verão de 2014, a companhia japonesa de telecomunicações Soft Bank apresentou ao público o robô humanoide “Pepper”. Pepper tem um corpo similar ao humano, dois olhos que piscam para transmitir emoções e uma grande missão: ele deve fazer pessoas felizes através da “leitura” de suas emoções. Turistas podem ficar surpresos quando são atendidos por robôs humanoides em algumas lojas ou hotéis no Japão, mas para os japoneses isso tem se tornado algo cada vez mais trivial. É claro que aqui ainda não se vê robôs andando pelas ruas – isso é mais um clichê. Mas, ainda assim, robôs com semelhança com os humanos parecem assumir cada vez mais tarefas. Por que essa tão grande abertura no Japão para esse tipo de tecnologia? Um motivo pode ser a alta impor tância que se dá a valores seculares e racionais, ao contrário dos valores tradicionais relacionados à família, à comunidade local ou à religião. Em uma sociedade assim, prefere-se con- fiar na técnica a pedir ajuda à família ou à comunidade. Segundo Shunsuke Aoki, CEO da Yukai Engineering, uma empresa de Tóquio que produz gadgets e brinquedos digitais interativos, seus clientes dão preferência a produtos que apresentem a forma de bonecos ou figuras. Um de seus produtos é “Bocco”, um robô para famílias, que cuida para que parentes que vivem distantes permaneçam sempre em contato. Ele tem a aparência de um yokai, uma figura sobrenatural fol clórica japonesa. Aoki acredita que os yokais desempenham um papel importante na postura dos japoneses em relação a robôs. “Desde a Idade Média, os japoneses creem que coisas muito utilizadas, como uma xícara ou um prato, também possuem uma alma e podem se transformar em um yokai. Essa cultura ainda continua a influenciar a interação das pessoas com as coisas.” A expectativa de ter robôs como ajuda ativa no dia-a-dia parece fazer cada vez mais parte da sociedade japonesa moderna. A empresa pública de pesquisa e desenvolvimento “New Energy and Industrial Technology 39 Óculos de RV Oculus Rift Development Organization“ prevê para o mercado interno de robôs industriais e privados um crescimento de 1,6 trilhões de ienes em 2015 para 9,7 trilhões de ienes em 2039. Essa tendência é reforçada em muitas cidades de pequeno e médio porte pelas mudanças demográficas. O órgão de gestão de saúde de Nanto, por exemplo, utiliza para fins terapêuticos um robô em forma de foca chamado Paro, que teria um efeito calmante sobre pacientes. Após uma fase de testes bem-sucedida, a administração municipal decidiu empregá-lo para ajudar famílias que precisam cuidar de membros idosos. A população de Nanto caiu nos últimos 25 anos em 20 por cento para 55.000 habitantes, sendo que as pessoas com mais de 65 anos representam 34 por cento, 30 por cento acima da média japonesa. A queda da população e o envelhe40 cimento da sociedade são desafios que estão sendo enfrentados por muitas cidades japonesas – o que faz crescer as expectativas depositadas nos robôs. EUA — Abertos para o novo Uma máquina de lavar que avisa por SMS quando a roupa está pronta. Um carro que anda sem precisar de motorista. Óculos de realidade virtual, com os quais se pode jogar pingue-pongue sem raquete e bola. Na proliferação e na aceitação de novas tecnologias, os Estados Unidos sempre estabelecem novos padrões. Mas de onde vem uma cultura tão aberta assim para o novo? Essa cultura se encontra profundamente ancorada em uma sociedade que ainda hoje admira os rebeldes e aventureiros. Vemos isso na cultura popular americana, do rock ’n’ roll a Hollywood. Ou nas recordações do faroeste. Ou mesmo na história orgulhosa de imigrantes, entre eles grandes luminares da técnica, como Elon Musk da Tesla ou Sergey Brin da Google. “Imagine como deve ter sido quando a América foi povoada por imigrantes europeus. Eles tiveram que ser bastante criativos e aventureiros só para conseguirem chegar até aqui”, diz Lee Rainie, diretor de estudos de internet, ciência e tecnologia no Pew Research Center em Washington, D.C. “Isso gerou uma certa cultura, que incentiva quem tem a coragem de enfrentar riscos e recompensa quem faz coisas inteligentes”. Segundo um relatório da “Information Technology and Innovation Foundation”, um think tank sem fins lucrativos em Washington, D.C., a inovação tecnológica americana baseia-se também em um interesse profundamente arraigado dos norte-americanos em fazer eles mesmos, inventar e aperfeiçoar coisas. “Em combinação com uma marcante cultura de individualismo, isso facilita o questionamento de práticas institucionalizadas – tanto faz se se trata de Steve Jobs ou de um operário em uma fábrica”, constata o relatório. Mas há também os que alertam sobre uma cultura que só anda obcecada pela próxima inovação. O “American Enterprise Institute”, outro think tank em Washington, D.C., chama a atenção dos norte-americanos para que não se percam na “fascinação da ideologia tecnológica”. Isso prejudicaria a ética e as virtudes de uma sociedade. Pelo menos tem surgido ultimamente uma preocupação com a dependência da técnica – principalmente de smartphones – e com a © iStock Antecipar o futuro © Kārlis Dambrāns / Flickr (CC BY 2.0) Antecipar o futuro forma como ela interfere na interação entre nós, seres humanos. Teme-se, além disso, que os EUA percam o fôlego na área de inovações. Por um lado, acusa-se as empresas de desenvolverem apenas produtos para um pequeno grupo privilegiado de pessoas, ignorando problemas maiores e mais urgentes, como a pobreza e o aquecimento global. Por outro lado, E amonn Fingleton, por exemplo, o autor de In the Jaws of the Dragon: America’s Fate in the Coming Era of Chinese Dominance (Nas garras do dragão: o destino americano na futura era da dominância chinesa), adverte que empresas chinesas registraram nos últimos anos mais patentes técnicas do que empresas estadunidenses. Ainda assim, o desenvolvimento técnico no país continua a ser extremamente veloz. Um bom exemplo são os óculos de realidade virtual Oculus Rift. O primeiro protótipo desses óculos foi criado em 2012 por um jovem de 20 anos de idade que era entusiasmado por games, gerando uma verdadeira corrida entre os gigantes tecnológicos Sony, Microsoft e Google: qual deles conseguiria lançar o primeiro produto de realidade virtual para o mercado de massa? No ano de 2014, Facebook comprou a empresa Oculus VR. A mais nova versão dos óculos foi apresentada no ano de 2015, junta mente com um jogo de pingue-pongue virtual, que pode ser jogado por pessoas que se encontram até mesmo a milhares de quilômetros de distância uma da outra. “Acredito que vi em toda minha vida cinco ou seis demonstrações na área de computação, das quais pensei em seguida que elas iriam mudar o mundo”, diz Chris Dixon, um dos investidores do Oculus Rift, à revista Wired Magazine. “Apple II, Netscape, Google, iPhone – e agora Oculus, que faz parte da mesma incrível categoria”. Alemanha — Inventores e pensadores Quem chega à Alemanha e quer usar a internet, tem que começar perguntando por senhas. Enquanto que em outros países se pode entrar em uma rede WLAN aberta em qualquer café, as redes na Alemanha são protegidas. pode-se comprar lâmpadas controladas por um aplicativo. A digitalização chega cada vez mais ao centro da sociedade. Os alemães adoram a técnica, a eficiência e a utilidade dos aparelhos modernos. Ao mesmo tempo, eles questionam inovações como poucos de seus vizinhos. E isso não é uma contradição, por mais que pareça. “Pelo fato do novo atrapalhar processos com os quais já estamos familiarizados, ele não só é visto muitas vezes Engenheiros alemães em ação O motivo é a legislação vigente: se uma pessoa abusar do acesso à rede, o proprietário da conexão pode ser responsabilizado por isso. Ao mesmo tempo, o país é pioneiro no que diz respeito à energia verde: em todos os cantos se vê turbinas eólicas e usinas hidrelétricas, carros elétricos não são mera utopia. Os alemães investem em tecnologia também dentro de suas casas. Empresas de automação residencial bem-sucedidas são o melhor exemplo, como a Tado, uma startup de Munique, com seu sistema de aquecimento inteligente. Até na Ikea, a loja de móveis e decoração preferida no país, como inútil, mas também como incômodo”, critica a autora Kathrin Passig em seu texto “Situações-padrão da crítica à tecnologia”. O exame crítico do que é novo antes de integrá-lo no cotidiano é algo típico especialmente na Alemanha: um novo aparelho ou uma nova técnica têm primeiro que provar seu valor agregado. Portanto, mesmo que os alemães sejam altamente exigentes com inovações técnicas, eles, no final das contas, caminham em direção ao progresso de uma forma mais consequente que a maior parte das outras nações. Enquanto que em outras nações se aceita sem nenhuma preocupação 41 Antecipar o futuro os termos e condições de empresas internacionais como Facebook ou Skype, uma pesquisa realizada pelo portal Statista no ano de 2014 mostra que os alemães também reconhecem o potencial de vigilância e espionagem representado pela técnica – as revelações do whistleblower Edward Snowden contribuíram para isso. E em nenhum outro país europeu elas causaram tanta indignação. Mas pesquisas indicam também que a imagem do alemão como avesso a novas técnicas não é de forma alguma justificada. Numa pesquisa de 2014, um terço dos entrevistados disse não poder mais imaginar uma vida sem smartphones. E 47 por cento acham extremamente interessante como as possibilidades técni- Antecipar o futuro cas têm se multiplicado no âmbito da digitalização. Numa comparação com outros países da Europa, os alemães são mais críticos em relação a inovações técnicas que seus vizinhos e não partem logo cheios de entusiasmo para cima de novos “brinquedos tecnológicos”, afirma o tecnosociólogo Johannes Weyer, de Dortmund, em um estudo sobre o assunto. Mas, segundo ele, os dados mostram que os alemães se encontram bem próximos da média europeia. No setor de novas mídias, as grandes criações – como o novo smartphone ou o app mais quente – vêm mais da área anglo-saxônica. Mas isso não incomoda os alemães. Como país de tecnologia altamente avançada, a Alemanha é líder quando se trata de Argentina engenharia e construção de máquinas. Nesses setores clássicos são mostradas sua superioridade tecnológica e a alta consciência no que diz respeito à qualidade. Aqui a Alemanha se apresenta incontestadamente como a terra dos inventores e pensadores. O foco nessa área essencial faz do país o motor de inovação mais sustentável da Europa. Os alemães defenderam também em 2014 sua liderança no registro de patentes na União Europeia: foram registradas quase 32.000 patentes, a maioria delas da indústria. Foram mais registros do que em qualquer outro país europeu. E talvez isso seja algo típico alemão: não falar muito sobre sua capacidade inovadora, mas deixar que os números falem por si. — O olhar voltado o futuro 42 © TECHNIK BEGEISTERT e. V. © 2009, Intuitive Surgical, Inc. “Da Vinci”, o sistema de robôs cirúrgicos mais usado no mundo Excitação e entusiasmo reinaram na comunidade científica argentina quando Buenos Aires, a capital do país, sediou no final de julho de 2015 a Conferência Internacional Conjunta de Inteligência Artificial IJCAI. Com 1.200 participantes, a conferência mais importante do mundo na área de inteligência artificial foi realizada pela primeira vez na América do Sul. A escolha da Argentina não foi mera coincidência. “É o reconhecimento e uma comprovação de que a América Latina se encontra na vanguarda do avanço tecnológico”, afirma Professor Guillermo Simari, presidente do comitê local de organização da IJCAI. “Os argentinos se entusiasmam de imediato com novas ideias e veem tecnologia como impulsor do desenvolvimento cultural em todos os setores“, completa Guillermo Simari. O motivo para essa abertura é visto por Guillermo Simari, que também é diretor do Instituto de Ciência da Computação & Engenharia da Universidad Nacional del Sur em Bahía Blanca, nas peculiaridades culturais dos argentinos. A frase do autor mexicano Carlos Fuentes: “Os mexicanos vêm dos astecas, os argentinos dos navios” é para ele mais do que uma citação espirituosa. “A onda de imigração europeia que chegou à Argentina no início do século XX ocasionou uma diferença clara para outros países latino-americanos”, constata Guillermo Simari. “Imigrantes desejam que seus filhos recebam uma boa formação para conquistar uma melhor posição na sociedade. Esse impulso recebido de outras culturas nos influenciou positivamente Participante na Olimpíada Mundial de Robótica e é hoje parte de nosso modo de ser: caminhamos para a frente e temos o olhar voltado para o futuro.” Isso se reflete também no crescimento do uso de tecnologia e robótica na educação. Hoje em dia, temos tudo quanto é tipo de aplicações nas salas de aula. Crianças no ensino fundamental aprendem a programar, alunos constroem robôs, computadores fazem parte do equipamento básico. Tudo começou em 2010 com o programa estatal “Conectar Igualdad”, que distribuiu 5,4 milhões de netbooks a estudantes e professores de nível médio em todo o país. Até então, netbooks eram um luxo exclusivo. “Conectar Igualdad abriu uma janela para o mundo e r eduziu a desigualdade tecnológica na sociedade”, afirma Monika Paves, professora de física e gerente da Robot Group Argentina. Sua empresa, que fabrica robôs para o setor educacional, oferece workshops (também para professores), atua em projetos pedagógicos do Ministério da Ciência e produz kits didáticos de robótica. “Quando crianças programam, desen- volvem ideias próprias e veem então os robôs funcionarem da forma esperada, sua motivação só aumenta”, diz Monika Paves. É o mesmo que diz Marcelo De Vincenzi, da Universidad Abierta In teramericana (UAI): “Cada vez mais professores e pedagogos utilizam a robótica para explicar d isciplinas científicas básicas. As crianças aprendem matemática ou física, por exemplo, enquanto jogam futebol de robôs”. Há 16 anos, a UAI organiza as “Olimpíadas Nacionales de Robótica” com a participação de 250 times de escolas de todo o país. Ou os próprios alunos projetam peças para os robôs e as imprimem em uma impressora 3D, como é feito pela professora de informática Alicia Siri com jovens de suas classes. Até mesmo em casa, Alicia Siri é fã da técnica. Ela tem um robô-aspirador e controla suas máquinas de lavar roupa e louça através do smartphone. As pessoas jovens à sua volta ficam fascinadas, mas “gente com idade acima de 45 não enxerga motivos para gastar dinheiro com 43 Antecipar o futuro isso”. Já ela mesma entende o uso de tecnologia como algo que traz uma melhoria de sua qualidade de vida. Também por essa razão ela se deixou operar um rim por um robô no Hospital Italiano. Esse hospital, como também o Hospital El Cruce-Néstor Antecipar o futuro são unânimes: talento, ideias criativas e know-how é o que não falta na Argentina. E tendo em vista as novas gerações, que crescem com as novas tecnologias, eles estão convencidos de que vai ficar ainda melhor no futuro! “Novas tecnologias” significa para a maioria dos tunisianos unicamente “internet”. Adultos acima de 40 anos admitem usar somente aplicações básicas como e-mail ou Google e não possuir maiores conhecimentos em relação a aplicativos, streaming ou crowdsourcing. Abdullah, um vendedor de 35 anos, limita seu uso das novas tecnologias “Nosso projeto estava à frente de seu tempo em muitos aspectos, e, sobretudo, estava mais avançado do que os regulamentos que teriam sido necessários para seu sucesso. Apesar das pessoas se preocuparem com a segurança, elas se mostraram bem abertas para o produto. Claro que me refiro aqui a pessoas abaixo de 35 anos. Nosso problema foram os regulamentos, que simplesmente não apresentaram a flexibilidade necessária para o produto que desenvolvemos.” Tirando esse ceticismo, que já está mesmo diminuindo, há poucas barreiras culturais – na verdade, somente aquelas relacionadas com áreas sensíveis como religião e tradição: jogos de azar ou negócios com ações são coisas malvistas em muitos países árabes. O maior obstáculo é o acesso às novas tecnologias. “Não consigo imaginar nenhuma invenção ou tecno “E se alguém con seguir entrar em minha conta?” Kirchner, ambos em Buenos Aires, possuem “salas de operação inteligentes” da mais nova geração. “Há quarenta anos, meu pai ficou de cama por 15 dias por causa de uma operação semelhante e tinha uma corte de 30 centímetros. O meu foi de somente três centímetros e já pude voltar à vida normal após quatro dias.” Outra possibilidade de aplicação de inteligência artificial, na qual uma câmera auxilia cuidadores de idosos em seu trabalho, foi desenvolvida por Ricardo Rodriguez. Porém, essa solução nunca foi utilizada na prática. “Não houve investidores para o projeto. Esse é um problema infelizmente muito comum na Argentina, já que ainda somos um país em desenvolvimento”. Mas os especialistas 44 Tunísia — Com vontade de mais Com uma taxa de penetração de 53 por cento, a Tunísia ocupa o décimo lugar na África no que diz respeito ao uso da internet. Quase seis dos onze milhões de tunisianos a utilizam. Em número de usuários, o país se encontra até mesmo no 66o lugar no ranque mundial, segundo o instituto de pesquisas de mercado Tunisie Sondage. Isso é notável, mas não significa que a Tunísia faz jus à sua fama quando se trata de novas tecnologias em geral. Como acontece muitas vezes, a imagem que temos de outras culturas é impregnada por clichês. Pudemos esclarecer um ou outro desses clichês e ficamos sabendo que no Japão os robôs ainda não fazem parte da vida cotidiana, como imaginamos. Já na Argentina, eles já têm há alguns anos um grande papel na educação. Os alemães pensam bem antes de adotar novas tecnologias, mas isso não significa que não sejam abertos para elas. Na Tunísia, até que se gostaria de ter esses problemas. Lá, são circunstâncias externas que impedem que as novas tecnologias se estabeleçam mais rapidamente. Somente os americanos fazem jus à fama de desbravadores rebeldes – pelo menos em nossa pequena viagem pelo globo – e são vistos com razão como pioneiros intrépidos no que se refere a novas tecnologias. Porém, uma coisa todas as culturas têm em comum: a técnica faz parte do dia-a-dia e sua importância cultural cristaliza-se cada vez mais. Em um país talvez mais rapidamente que em outro, mas com a tendência de que os hábitos quanto ao seu uso se igualem em todo o mundo. Saber usar a técnica para nosso próprio progresso é algo que está em nossas mãos. Os cinco países em comparação Japão EUA Alemanha Argentina Tunísia A.Mesmo antes dos A.Existe uma preocu- A.Quase um terço dos A.71 % dos entrevista- A.Dois de cada três entrevistados em uma pesquisa disse não conseguir mais imaginar uma vida sem smartphones dos em uma pesquisa não saem de casa sem seu smartphone tunisianos gostariam de ter um smartphone smartphones, os celulares “normais” já tinham função de internet pação de que haja uma dependência dos smartphones B.Nas ruas da Califór- B.Robôs devem ajudar a cuidar de idosos em uma sociedade que envelhece cada vez mais C.A técnica também pode ter uma alma © iStock Novas formas de pagamento na Tunísia a smartphone, internet e Facebook: “Isso é tudo que posso usar. No mais, nada é acessível e seguro. É claro que sei que há outras áreas nas quais se usam novas tecnologias. A automação residencial é um bom exemplo. E é claro também que essas tecnologias existem na Tunísia, mas não me sinto bem ao imaginar minha casa inteira sendo vigiada à distância. E se alguém conseguir entrar em minha conta? Com certeza, algo assim pode funcionar em outros lugares, mas não na Tunísia”. Esse sentimento de desconfiança está profundamente enraizado e tem sua origem em experiências com corrupção – de sistemas de computadores, de empresas e até mesmo do governo. Muitos temem serem vítimas de fraudes ou ataques de hackers. Todavia, esse medo vem desapare cendo aos poucos nas gerações mais jovens. Nas cidades, existem comunidades de geeks de computador entre 20 e 30 anos de idade que experimentam de tudo: de cloud computing e streaming até sharing economy. Ramzi El Fekih, por exemplo, tentou provocar uma mudança na postura da sociedade em relação ao pagamento por celular com seu projeto “mdinar”. logia em especial que não seria aceita”, diz Ramzi El Fekih. “Penso que na Tunísia as barreiras são mais de natureza econômica do que cultural. A taxa de câmbio e a falta de possibilidade de conversão do dinar bloqueiam bastante o caminho para o desenvolvimento e a aplicação de novas tecnologias. Creio que os tunisianos aceitariam qualquer tecnologia nova se eles fossem bem informados e reconhecessem suas vantagens.” nia circulam os primeiros carros sem motorista B.Smart Homes ga- nham uma aceitação cada vez maior C.Os americanos são muito abertos para o novo e aventureiros B.Novas tecnologias B.Robôs são usados C.O novo tem primeiro que provar seu valor na educação são utilizadas prin cipalmente nas cidades C.Os argentinos veem a tecnologia como impulsor do desenvolvimento cultural C.As gerações mais jovens estão se abrindo para as novas tecnologias A. O uso do smartphone B. Tecnologia no dia-a-dia C. Peculiaridade cultural 45 Antecipar o futuro 46 Antecipar o futuro 47 Antecipar o futuro Antecipar o futuro A todo vapor ressão se abre. Movida pelo vapor, p a turbina gira com 3.000 ou mais rotações por minuto. Através de um eixo, essa energia mecânica é transferida ao gerador, cujo componente principal é um ímã, que, propulsionado pela turbina, move-se dentro de uma bobina e produz uma tensão que, por sua vez, gera a corrente elétrica. As usinas de carvão atualmente mais eficientes transformam aproximadamente 46 por cento da energia contida no combustível em energia elétrica. Porém, ainda não chegamos ao fim do desenvolvimento tecnológico, comenta o professor Alfons Kather, diretor do Instituto de Engenharia Energética da Universidade Técnica de Hamburgo-Harburg. “Seria possível, a médio prazo, uma efi- Texto Ralph Diermann Ilustração Jan Erlinghagen Combustível transforma-se em calor, calor vira movimento e movimento gera energia elétrica — esse é o princípio de muitas usinas. Cientistas e pesquisadores da indústria se esforçam para tornar esse processo ainda mais eficiente ciência de 50 por cento”, explica o cientista. O aspecto mais importante: quanto maiores a temperatura e a pressão na caldeira, mais energia elétrica se pode produzir com o carvão. Até agora, os limites se encontram em uma temperatura de aproximadamente 600 graus e uma pressão de 300 bar, já que valores maiores provocariam um desgaste muito rápido dos componentes do sistema. Por esse motivo, a indústria e a ciência estão desenvolvendo novos materiais mais resistentes à base de níquel, que deverão suportar uma temperatura de 700 graus e uma pressão de 350 bar. Isso poderá elevar o grau de eficiência em cerca de dois por cento. Também nas turbinas pode-se aumentar o ganho, afirma Alfons K ather. “A condução do fluxo de vapor pode ainda ser aperfeiçoada”, diz o pesquisador. A formação de turbilhões ou desvios quando o vapor atravessa as turbinas provoca a perda de energia. Cientistas da Rheinisch-Westfälische Technische Hochschule (RWTH) A achen e da Universidade de Hanôver trabalham atualmente em um novo perfil para as pás, que deverá evitar o máximo possível essas perdas. Já o especialista da Siemens S tefan Lampenscherf quer aproveitar o calor residual das usinas para gerar mais energia elétrica. Ele e sua equipe estão desenvolvendo geradores termoelétricos, isto é, semicondutores especiais que geram uma tensão em sua superfície assim que Q uando a União Europeia, há alguns anos, decidiu se despedir das lâmpadas incandescentes, dois empresários da Região do Ruhr, na Alemanha, tiveram uma ideia engenhosa. Para driblar a proibição, simplesmente declararam as lâmpadas como mini-aquecedores, argumentando que elas forneceriam em primeira linha calor, e a luz seria apenas um produto residual. De fato, a eficiência de uma lâmpada incandescente não passa de cinco por cento – apenas um vigésimo da corrente elétrica consumida é transformado em luz. Todo o resto é dissipado na forma de calor. Alto consumo, baixo rendimento: não é de se admirar que a UE tenha decidido banir essa tecnologia das prateleiras das lojas. A proteção climática exige que ener48 gia seja utilizada da forma mais produtiva possível. Eficiência é, portanto, a meta principal. Isso não vale, porém, somente A proteção climá tica exige que ener gia seja utilizada da forma mais pro dutiva possível para o consumo, mas também para a geração de energia, pois quanto mais energia elétrica se consegue gerar com os recursos empregados nas usinas, melhor é o balanço climático da planta. A Agência Internacional de Energia (AIE) estima que serão investidos até 2035 em todo o mundo um total de 23 trilhões de dólares americanos em usinas elétricas convencionais – especialmente em usinas de carvão. Principalmente a China, a Índia e vários países do sudeste asiático pretendem construir um grande número de usinas de carvão nos próximos anos. Por esse motivo, qualquer ganho de eficiência, por menor que seja, resulta em um alívio significativo para o clima. Usinas de carvão funcionam basicamente como uma panela de pressão: a água é aquecida pela combustão de carvão até que ela vire vapor, provocando uma alta pressão dentro do equipamento. O vapor é conduzido para uma turbina, aliviando a alta pressão ao passar pelas pás – de forma semelhante ao que acontece quando a válvula da panela de © iStock Barragem de uma hidrelétrica em Manitoba, Canadá 49 Antecipar o futuro vapor requerem uma quantidade gi gantesca de combustível e em muitos lugares não há biomassa suficiente para cobrir a demanda. Professor Mohammad Asadullah, da Universidade Técnica MARA, Turbina no interior de uma hidrelétrica ratura, maior o efeito. “No momento, concentramos a pesquisa na área de trânsito, visando, por exemplo, a ge ração de energia elétrica a partir do calor eliminado pelo motor de um veículo para aliviar o alternador”, ex plica Stefan Lampenscherf . “Com o aperfeiçoamento da técnica, veremos no futuro também aplicações na in dústria ou em usinas elétricas, sendo possível atingir potências na faixa dos quilowatts ou mesmo megawatts”. Vapor e pressão, turbina e gerador – esse princípio não funciona somente com carvão, mas também com com bustíveis com balanço neutro de CO 2, como madeira e outras biomassas. Do ponto de vista técnico, praticamente não faz quase nenhuma diferença qual o combustível usado para gerar o calor para a evaporação da água na caldeira da usina. Muito maior, entre tanto, é o desafio logístico quando se quer usar biomassa, pois usinas a 50 na Malásia, quer resolver esse pro blema de uma maneira incomum: ele sugere não queimar a biomassa, mas sim transformá-la em gás. Esses sistemas, por serem bem menores, necessitam de muito menos combus tível que usinas convencionais com turbina a vapor. Essa tecnologia de gaseificação não é nova. Mas agora a indústria e a ciên cia conseguiram resolver o problema da formação de alcatrão, algo que impediu por muito tempo o uso comer cial dessa técnica. “Os problemas fo ram resolvidos”, diz Mohammad Asa dullah. “A gaseificação de biomassa é realizável, tanto do ponto de vista técnico como econômico”. O charme especial dessa ideia está na diversi dade de combustíveis que podem ser utilizados – bagaço de cana é tão ade quado como palhas de arroz ou resí duos da produção de óleo de coco. Isso faz com que ela seja especialmente — Usina a gás e a vapor interessante para países com redes elétricas rudimentares (por exemplo, Vietnã, Nepal e Quênia) e que quei ram expandir seu abastecimento de energia elétrica de forma descentrali zada, com pequenas usinas. Usinas modulares descentralizadas, por exemplo, muitas vezes trabalham com turbinas a gás como as que são utilizadas também – em variantes bem mais potentes – em grandes usi nas. Elas não são movidas por vapor comprimido, mas sim por uma mis tura de gás e ar. Quando essa mistura é queimada, ela se expande e faz girar as turbinas. E por que não utilizar adicionalmente os gases de escape, que são cheios de energia, para gerar eletricidade? Essa ideia esteve presente no desenvolvi mento das usinas de cogeração a gás e vapor, que combinam uma ou vá rias turbinas a gás como uma turbina a vapor. Os gases de escape quentes da turbina a gás são utilizados para produzir vapor de água para a tur bina a vapor. Com essa combinação, os sistemas atingem um grau de efi ciência de até 60 por cento. Nenhuma outra tecnologia de usinas de gera ção elétrica aproveita melhor a ener gia contida nos combustíveis do que esses sistemas de cogeração. Além disso, eles são flexíveis – podem rea gir relativamente rápido a oscilações na geração de energia eólica ou solar. Desse modo, ela apresenta os melho res requisitos para ser precursora da transição energética global. Gás natural é misturado com ar quente comprimido e depois queimado. Isso re sulta em gases de combustão com temperaturas acima de 1.000 graus, que, com alta pressão, fazem as pás da turbina girar. Esse movimento rotatório aciona um gerador, que produz energia elétrica. Os gases de escape da turbina têm ainda uma 5 3 9 1 7 4 8 Rotações por minuto da turbina colocada em movimento: 3.000 10 2 6 © iStock nela ocorre uma diferença de tempe ratura – por exemplo, quando uma metade é aquecida pelo fluxo de ca lor e a outra metade fica exposta ao ar ambiente, que é muito mais frio. Quanto maior a diferença de tempe Antecipar o futuro 1 Alimentação de ar 2 Compressor 3 Alimentação de gás 4 Turbina a gás 5 Caldeira de recupe ração de calor 6 Turbina a vapor 7 Condensador 8 Geradores 9 Transformador 10 Rede elétrica temperatura em torno de 600 graus – suficiente para gerar vapor de água em uma caldeira de recuperação de calor, com o auxílio de um permutador térmico. Em se guida, o vapor é direcionado para uma turbina. Pressiona das pelo vapor, as pás da tur bina rodam e um eixo trans fere então esse movimento a um segundo gerador. Depois do vapor ter atraves sado a turbina, ele é resfriado em um condensador, trans formando-se novamente em água, que é bombeada de volta para a caldeira, criando assim um circuito fechado. Um transformador eleva a tensão da energia produzida por ambos os geradores, de forma que ela possa então ser injetada na rede elétrica. 51 Antecipar o futuro Antecipar o futuro Megacidades criativas Texto Chris Schinke Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade Arquétipo da cidade moderna: New York City, EUA 52 © iStock O s números soam impressionantes. Segundo estimativas atuais das Nações Unidas, até o ano de 2100 a população mundial poderia aumentar para 12,3 bilhões. De acordo com os pesquisadores da ONU, não se deve contar, por ora, com uma atenuação do crescimento. Mas onde viverão todas essas pessoas? E sobretudo, em que condições? As cifras da ONU indicam igualmente que no futuro dois terços da população mundial viverão em metrópoles. Ou seja, a tendência à urbanização continua inabalada. Assim, cidades se transformam em megacidades – que têm de enfrentar desafios completamente novos e nunca imaginados. Esse crescimento exige planejamento e um montão de criatividade. Porque onde tanta gente tem de dividir o espaço, é preciso que a convivência também seja organizada de forma que funcione. Essa é a tarefa de um planejamento urbano criativo e previdente. Além da administração pública, cada vez mais cidadãos criativos e engajados estão assumindo essa tarefa e No futuro, dois terços da população mundial viverão em metrópoles se unindo para formar iniciativas privadas. Muitas vezes, essas pessoas trabalham em ateliês, laboratórios de design e estúdios de arquitetura arejados. Sob o conceito de urba nismo tático, mentes criativas no mundo inteiro estão reunindo ideias para o futuro planejamento de nossas cidades, mas também de megacidades como Mumbai, Hong Kong, Lagos ou Nova Iorque. Mas, quem são esses criativos? E como eles imaginam nossa convivência no futuro? Um deles é Pedro Gadanho, curador de arquitetura contemporânea do MoMa, o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque. Recentemente, reuniu times multidisciplinares para trabalhar em estudos de caso urbanos para diversos projetos. Um tema particularmente importante para Pedro é o planejamento e futuro desenvolvimento de nossa realidade arquitetônica. Em sua opinião, é preciso que – para além do planejamento por autoridades – os cidadãos tomem em suas próprias mãos parte dessa tarefa. Para isso, também terão de utilizar métodos pouco convencionais. 53 Antecipar o futuro Antecipar o futuro 54 Iorque nos últimos anos, levando ao desenvolvimento de um mercado informal de aluguéis na metrópole às margens do Rio Hudson. A partir do engajamento de iniciativas locais, foi possível aliar os interesses de inquilinos, representantes Onde tanta gente divide o espaço, é preciso organizar a convivência de forma que funcione dos interesses da administração pública, empresas sem fins lucrativos e autoridades municipais e criar um cooperative housing trust, um consórcio habitacional cooperativo que, no longo prazo, deverá ao mesmo tempo assegurar o acesso a antigo shopping, com um sistema de empréstimo gratuito de livros organizado pelos próprios utentes. O princípio é o mais simples possível: pegue um livro emprestado, leia-o, traga-o de volta ou, caso queira ficar com ele, traga um outro no lugar dele. Seus idealizadores conceberam a minibiblioteca como projeto de desenvolvimento de comunidade – uma característica comum a muitas abordagens da iniciativa Uneven Growth – e que, para além disso, visa a aproximar leitores entusiastas através do seu amor comum pela literatura. E, na agitada cidade de Melbourne, com seus quatro milhões de habitantes, ela oferece um lugar ideal para relaxar um pouco do estresse cotidiano. Como demonstram esses e xemplos de urbanismo tático, a ideia no cen- tro desse movimento é adquirir conhecimentos, compartilhar esses conhecimentos com a comunidade e possibilitar o acesso do maior número possível de indivíduos a eles. Esses conhecimentos não são um fim em si, e sim destinam-se sempre a fornecer à realidade existente novos impulsos para o futuro e transformar teoria em prática vivida. Uma prática que tem por objetivo melhorar a vida do maior número possível de pessoas. Pedro Gadanho pensa da mesma forma. Como ele imagina a cidade ideal do futuro? “Ela é grande, vibrante, multifacetada, densa, extravagante e tem uma grande riqueza cultural – mas com um mínimo de trânsito e sem extremas desigualdades sociais.” Em suma, soa como uma cidade na qual valeria a pena viver. Organizada pelos próprios usuários: a Little Library em Melbourne, Austrália © The Shopping Sherpa / Flickr (CC BY-ND 2.0) Também as visões de Pedro Gadanho se inspiram no conceito cada vez mais popular do urbanismo tático. Perguntado como define esse termo para si próprio, Gadanho responde: “Entendo o conceito como intervenções espontâneas bottom-up em cidades.” Essa ideia de intervenções de baixo para cima prevê que os cidadãos lidem eles mesmos com os desafios do mundo real. “A implementação é feita por artistas, arquitetos e designers, em colaboração com as administrações locais. Mas inclui também iniciativas de particulares engajados, a cujas necessidades as autoridades nem sempre reagem.” Um exemplo de uma dessas intervenções bottom-up encontra-se praticamente às portas do MoMa: como se sabe, os preços das moradias em Nova Iorque são proibitivos. Os movimentos globais de investimentos e também a construção imobiliária orientada para o lucro alargaram imensamente o fosso social em Nova ção na plataforma online “uneven- growth.moma.org”, apelando a um amplo público para contribuir com seus próprios exemplos de táticas urbanas. A ação foi um grande sucesso. Centenas de respostas, que podem ser conferidas na página da Web, mostram que o conceito de urbanismo tático está incitando a criatividade no mundo inteiro. Ativistas engajados de toda a Europa, América Latina, Sudeste da Ásia e EUA formam um movimento cujas futuras visões urbanas será interessante ver. Uma contribuição particularmente criativa veio da metrópole australiana de Melbourne. Habitantes da segunda maior cidade do continente tiveram a ideia de instalar espontaneamente uma pequena biblioteca – chamada de Little Library – em um © iStock Estação em Mumbai, Índia habitação a preços acessíveis e justiça social. A ideia teve como ponto de partida a grande quantidade de imóveis habitacionais vagos em Nova Iorque e a sua aquisição pelo consórcio sem fins lucrativos. Desta forma, no decorrer dos últimos anos o consórcio logrou proporcionar moradias para quase 200.000 pessoas. Os beneficiados pela iniciativa foram famílias, idosos, pessoas de baixa renda e até mesmo sem-teto, que até então não tinham acesso ao mercado de locação. Mesmo que isto esteja longe de resolver o problema dos aluguéis proibitivos na metrópole da Costa Leste, essa iniciativa mostra que existem alternativas reais para a aparentemente imutável situação atual. Vale a pena dar também uma olhada em outras regiões do mundo para encontrar exemplos de urbanismo tático na prática, como na Índia. Na metrópole de Mumbai, com 12,5 milhões de habitantes o motor econômico e cultural do país, desenvolveram-se nos últimos anos algumas táticas particularmente criativas para conseguir acompanhar o crescimento vertiginoso da cidade. Uma expressão dessa criatividade arquitetônica é um modelo promissor: as chamadas tool houses, que oferecem tanto espaço para moradia como para empresas economicamente eficientes e pequenas fábricas. Em um mínimo de espaço, elas reúnem áreas de convivência comunitária e familiar. Graças à sua construção compacta, elas se inserem perfeitamente nos conjuntos arquitetônicos existentes na cidade, podem ser erguidas num instante e ampliadas à vontade, inclusive com mais um andar. Nos últimos tempos, a popularidade das tool houses de Mumbai aumentou de tal maneira, que até mesmo designers de moda, escritores e doutores estão se mudando para as robustas minicasas. Voltemos a Pedro Gadanho: no início de 2015, ele lançou uma convoca- 55 Antecipar o futuro Antecipar o futuro Especialistas são insubstituíveis O TÉCNICO ENGENHOSO Tobias Hägele, voestalpine Polynorm GmbH & Co. KG Schwäbisch Gmünd, Alemanha Há pessoas com habilidades bastante especiais. No caso de Tobias Hägele, são o poder de imaginação, o instinto para o que é realizável e principalmente a persistência. O chefe de projetos de tecnologia de série e novas tecno logias não só desenvolve processos nos mínimos detalhes, ele também os torna aptos para a produção em série, como, por exemplo, na produção de peças prensadas para automóveis. Ele e sua equipe unem genialidade a conhecimentos técnicos – o que termina resultando sempre em algo novo. Texto Björn Lüdtke Ilustração Philipp Herrmann Para que seja possível oferecer produtos da mais alta qualidade, é preciso ter funcionários em todo mundo com habilidades especiais na área em que atuam. Queremos apresentar-lhes quatro deles. O DESCOBRIDOR DE TALENTOS Harald Mühleder, voestalpine Stahl GmbH Linz, Áustria Harald Mühleder tem um olhar seguro para reconhecer talentos e contribui assim para nosso futuro. Ele estima o potencial que uma pessoa tem de progredir. Para isso, são necessários uma boa percepção para desenvolvimento técnico e humano, empatia e um olhar crítico sobre o progresso do talento encontrado. Se sua estimativa estava certa ou não, ele fica sabendo em competições para as quais os novos talentos são enviados. E ele é recompensado pelos diversos prêmios recebidos pelos talentos que ele tem descoberto e acompanhado. O ENCANTADOR DE ROLOS Wolfgang Hochfellner, voestalpine Schienen GmbH Leoben, Áustria Wolfgang Hochfellner é mestre de laminação na voestalpine Schienen GmbH na Áustria e cuida, com sua equipe, para que tudo corra bem na laminação de trilhos de até 120 metros. O processo de laminação é complexo e o produto não pode apresentar qualquer erro. Para que isso funcione, são importantes os ajustes prévios, mas também uma reação rápida e controlada quando ocorre alguma irregularidade. Wolfgang Hochfellner reconhece nos ruídos quando alguma coisa está errada – o que mostra como ele conhece bem o equipamento. 56 O INVENTOR DE AÇOS Sebastian Ejnermark, Uddeholms AB Hagfors, Suécia Sebastian Ejnermark é a pessoa certa para quem necessita de um novo tipo de aço. Ele é desenvolvedor de materiais e “o” especialista quando se trata de descobrir novas combinações de liga para atender necessidades individuais de nossos clientes. Sebastian Ejnermark sabe exatamente qual é o efeito de cada liga e qual a proporção correta para atingir a propriedade desejada do produto final – de altamente duro até extremamente resistente a corrosão. 57 Nunca perder a curiosidade Transformar ideias em realidade Como rede global de especialistas independentes, agregamos as cabeças e competências certas para cada projeto e oferecemos um máximo de experiência e know-how. Dessa forma, promovemos de várias maneiras a evolução e o progresso, e ao mesmo tempo asseguramos o sucesso do nosso Grupo. 60 Missão a Marte O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade 66 As luzes da Terra vistas do espaço Satélite Suomi NPP capta imagens espetaculares da Terra 70 Quando comer aumenta o desempenho O que comemos pode nos deixar mais inteligentes, saudáveis e bonitos? 74 Gigantes inteligentes Inovações em veículos utilitários 76 A individualização do cotidiano Quando a prestação de serviços se centra nas pessoas 58 59 Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade Missão a Marte Texto Louisa Preston O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade Colônia “Mars One” 60 61 Nunca perder a curiosidade 62 A questão é quem chegará a Marte primeiro e se esses corajosos seres humanos vão poder retornar por nós habitado exclusivamente por robôs: até hoje, 14 sondas e vários rovers (veículos de exploração) foram enviados para sua superfície, a fim de vasculhá-la à procura de indícios de vida baseada em carbono e outros sinais de vida. Homens já pisaram na Lua e neste momento alguns estão até mesmo vivendo no espaço. Eles nos sobrevoam a uma velocidade de quase oito quilômetros por segundo e dão a volta à Terra 15,5 vezes por dia. O objetivo último das agências espaciais, das organizações sem fins lucrativos e também do público, porém, é enviar o homem a Marte. A questão é apenas quem chegará a Marte primeiro e se esses corajosos seres humanos vão poder, um dia, retornar à Terra. Diante do ambiente inóspito e essencialmente tóxico que reina no planeta, também se coloca a questão por que alguém haveria de querer ir para lá. Uma resposta poderia ser: por autoproteção, como uma espécie de seguro de vida, para preservar a vida terrestre, que poderia ser extinta por uma multitude de catástrofes naturais ou causadas pelo próprio homem. Visitar e investigar Marte, por outro lado, também nos pode ensinar muito sobre a nossa própria história e a da Terra. E afinal nós, seres humanos temos um instinto explorador inato. Descobrir e explorar outros mundos no cosmo é o maior desafio para a humanidade e será, ao mesmo tempo, uma das nossas mais esplêndidas realizações, mesmo que apenas um Horta em uma cápsula “Mars One” Interior de uma cápsula “Mars One” © Bryan Versteeg / Mars One Sala de uma cápsula “Mars One” que em Marte a água é rara e o ar é tóxico, e que o planeta não tem mais um campo magnético. Sem esse escudo de proteção, grande parte da atmosfera do planeta se perdeu; a superfície de Marte ficou exposta à radiação solar e tornou-se praticamente inabitável. Mesmo assim, continuamos extremamente otimistas. Marte é, no momento, o único mundo conhecido Página 60-61 © Bryan Versteeg / Mars One Esquerda © Bryan Versteeg / Mars One J á antes do século 19, havia a crença popular de que Marte era habitado e que lá existia uma forma de vida avançada, que tinha coberto o planeta de canais de irrigação e talvez também estivesse prestes a colonizar a Terra. Quando então o avanço técnico o permitiu, foram desenvolvidos satélites com o objetivo de orbitar em torno de Marte e fazer as primeiras fotos em close-up da sua superfície. Muitas das primeiras missões terminaram de forma catastrófica antes ainda de sair da atmosfera terrestre. Foi só em março de 1965 que a sonda americana Mariner 4, depois de viajar 54,6 milhões de quilômetros pelo espaço durante sete meses e meio, conseguiu sobrevoar Marte e enviar as primeiras imagens do Planeta Vermelho. Mas esse sobrevoo, aguardado com tanta expectativa, destruiu toda e qualquer esperança de encontrar um mundo luxuriante, similar à Terra, com rios de água corrente e cidades habitadas por marcianos semelhantes ao homem. Ao invés disso, Marte revelou-se como um mundo coberto de pó, gélido e estéril, repleto de crateras e vales profundos. Um mundo que mais se assemelha à Lua, sem ar nem vida, do que à Terra. Hoje, sabemos Nunca perder a curiosidade punhado de seres humanos venha a pisar pessoalmente no solo de Marte. A parte mais complicada de uma missão a Marte não é chegar ao planeta, e sim regressar. A aterrissagem em um planeta estranho envolve muitos riscos. A taxa de sucesso para Marte é de 30 por cento – e partir de novo é mais difícil ainda. O lançamento de uma nave espacial na Terra já exige um esforço imenso de infraestrutura e pessoal, sem falar na quantidade de combustível necessária para superar a força da gravidade. Tudo isto não está disponível em Marte. Além disso, está longe de estar claro se os astronautas estariam realmente em condições físicas de retornar à Terra depois de terem vivido sob as condições de gravidade de Marte. Para a maior parte de nós, é moral e politicamente impensável deixar seres humanos em Marte para sempre, sem possibilidade de volta. Agências estatais como a Nasa ou a ESA não podem, e não vão, cogitar em fazê-lo. Mas existe uma iniciativa privada que não compartilha esses escrúpulos. A fundação de utilidade O objetivo último é enviar o homem a Marte pública Mars One quer estabelecer uma colônia humana permanente no planeta, e tornou-se conhecida com a ideia de uma missão sem volta a Marte. O presidente e cofundador da Mars One, Bas Lansdorp, pretende inicialmente enviar oito naves não tripuladas a Marte, com equi- pamentos, materiais e robôs para a construção de uma estação de base com 200 metros quadrados, onde os primeiros colonos de Marte deverão viver e trabalhar. A partir de 2027, a Mars One pretende enviar para lá um grupo de quatro voluntários a cada dois anos. A uma convocação lançada por Lansdorp em 2013, responderam impressionantes 202.000 voluntários de todo o mundo, que cumpriam o requisito de serem maiores de 18 anos. Os primeiros 1.058 candidatos tiveram de submeter-se a um exame de rotina no seu médico. Das 660 pessoas que restaram foram selecionados os 100 finalistas, 50 homens e 50 mulheres. Encontrei-me com Bas Landsdorp em 2015. Durante três dias, caminhei com ele pela paisagem desolada da Islândia, que se assemelha à de Marte, e pude me convencer de sua 63 Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade Módulo de pouso aterrisando paixão, dinamismo, persistência e determinação em fazer com que a Mars One “decole” no verdadeiro sentido da palavra. Se fosse possível realizar um projeto como esse só pela vontade e pela fé, esse homem o conseguiria. Infelizmente, isso não é possível. No fim das contas, é sempre uma questão de custos e financiamento. Lansdorp é reservado com relação à situação financeira da Mars One, que com certeza será decisiva para o êxito. A missão é totalmente financiada por meio de patrocinadores, parceiros e uma fonte de recursos muito controvertida: um reality show Descobrir outros mundos no cosmo é o maior desafio para a humanidade © Bryan Versteeg / Mars One Módulo de pouso em Marte 64 na televisão. A edição marciana do Big Brother com certeza será assistida por todo o mundo, mas o interesse provavelmente não durará. Por quê? Um bom reality show é movido a tensões, conflitos e dificuldades. Ou seja, precisamente o que que se quer evitar em Marte, para que a missão possa ser bem sucedida. Simplesmente assistir aos astronautas cuidando de seus afazeres diários não vai prender os espectadores por muito tempo e garantir altas receitas. Como, então, será financiada a sobrevivência dos colonos em Marte? Quem são essas pessoas que querem passar o resto de seus dias em Marte? “Tenho a oportunidade única de passar a metade de meus dias em um, e a outra metade em outro planeta – essa é a suprema aventura”, diz a finalista Clare Weedon, do Reino Unido. Quando mencionei a crítica e o ceticismo com que ela e os outros candidatos são vistos, ela respondeu: “É uma missão muito ambiciosa e arriscada, mas estou absolutamente convencida de que chegou a hora de a humanidade dar o passo seguinte.” E o que acham sua família e seus amigos de seu plano de passar o entardecer de sua vida em Marte? “Eles me apoiaram de uma forma fantástica. Eles me conhecem, e quando veem a paixão e o brilho nos meus olhos quando falo sobre a Mars One, não têm como não me apoiar.” Dizer que a mudança para Marte provavelmente implica mais desafios do que vantagens seria um eufemismo. “O que estou mais curiosa para saber é como vai ser estar exposta a um estresse e uma pressão extremos todos os dias, e ter de lutar diariamente pela sobrevivência; ao mesmo tempo, é disto que eu tenho o maior medo”, afirma Clare. “Isolamento, alimentação rigidamente regulamentada, só sair com roupa espacial – tudo isso vai ser completamente novo para mim, e eu só vou saber como lidarei com essas situações me expondo a elas.” Esses são apenas alguns de inúmeros desafios que ela e seus companheiros de grupo vão enfrentar em seu caminho para Marte. Construir e manter alojamentos, produzir alimentos, água, ar e energia – estes esses são apenas os primeiros passos rumo a uma colônia autônoma em Marte. Numerosos críticos do empreendimento se perguntam por que o homem tem de ir a Marte se na Terra ainda há tanto a fazer e consertar. É uma pergunta válida, mas para mim a resposta é clara: devemos primeiro mudar a humanidade e depois voar para Marte, não importa quando isso acontecer? Ou devemos mudar a humanidade voando para Marte? A exploração do cosmo e a conservação de nosso planeta não têm de ser excluir mutuamente. Podemos e devemos fazer ambas as coisas. E atualmente a Terra tem um número mais do que suficiente de habitantes para Louisa Preston está escrevendo seu primeiro livro, Goldilocks and the Water Bears: The Search for Life in the Universe, que deverá ser publi cado em julho de 2016 pela Blooms bury Sigma que se possa seguir as duas abordagens. Mesmo que Mars One acabe não decolando, o projeto conferiu novos impulsos ao instinto explorador humano. Muitas crianças ainda sonham em se tornar astronautas e visitar outros planetas quando crescerem. A geração atual pode fazer com que esse sonho se torne realidade. Distância Terra–Marte em milhões de quilômetros: 54,6 65 Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade As luzes da Terra vistas do espaço Texto André Uhl A missão do Suomi NPP é observar as condições climáticas e ambientais na Terra. Mas enquanto orbita a Terra a uma altitude de mais de 800 quilô metros e desempenha sua tarefa, o satélite também captura imagens particularmente deslumbrantes. Quando se faz noite, as metrópoles desta Terra reluzem em todo seu brilho — e, graças ao Suomi NPP, podemos admirá-lo numa qualidade nunca antes vista. A Terra noturna vista através das lentes do satélite Suomi NPP 66 67 Austrália 68 Página 66-67 e dir. © NASA Earth Observatory / NOAA NGDC No alto esq. © NASA Earth Observatory Embaixo esq. © Craig Mayhew and Robert Simmon, NASA GSFC Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade Europa, África do Norte e Oriente Médio Leste dos EUA 69 Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade Quando comer aumenta o desempenho Texto Christian Heinrich Laboratórios em todo o mundo estão trabalhando na alimentação do futuro: uma dieta personalizada para cada indivíduo, otimizada para a sua saúde e desempenho. Como novas tecnologias podem ajudar? A tendência: produtos orgânicos 70 © iStock S egundo pesquisadores da Universidade de Minnesota, mandar fazer um perfil nutricional individual custa 1.000 dólares. Trata-se de uma espécie de impressão digital do metabolismo atual do corpo. Quais são as vitaminas, nutrientes e minerais que faltam no organismo no momento e quais estão presentes em quantidades possivelmente altas demais? O perfil nutricional individual fornece um quadro completo do que estamos precisando e do que temos em excesso. Assemelha-se à determinação do nível de colesterol, que, na visita ao médico, é feita através do hemograma completo – com a diferença de que o perfil nutricional individual pode fornecer até várias dezenas de valores, da vitamina D até o magnésio. O projeto ainda se encontra numa fase inicial, mas se for bem-sucedido provocará uma pequena revolução: o advento da nutrição personalizada. Em outras palavras, cada um teria Continuaremos a comer juntos numa mesma mesa? sua dieta ideal, sob medida para seu corpo – não haveria mais uma comida para todos, e sim uma comida para cada um. Isto levanta questões sociológicas: será que vamos continuar a comer juntos numa mesma mesa? Ou comer em companhia vai se tor- nar mais importante se cada um de nós tiver uma dieta diferente? Além disso, uma nutrição personalizada tem consequências para o corpo e a mente. Conhecendo melhor nosso metabolismo individual, poderemos evitar dosagens insuficientes ou em excesso. Poderemos nos alimentar sistematicamente de forma a ficarmos mais saudáveis, e, à medida que forem sendo acrescentadas ao perfil nutricional mais e mais informações sobre o metabolismo cerebral e o metabolismo dérmico, talvez até de forma a ficarmos mais inteligentes e mais bonitos. Uma olhada no laboratório de pesquisas do gigante da alimentação Nestlé mostra que esses pensamentos não são mera fantasia; eles descrevem uma futura realidade. No 71 Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade Alimentos mais saudáveis 72 © The Orange Chef Co. © iStock High-tech na cozinha: o Prep Pad I nstituto de Ciências da Saúde da Nestlé (NIHS) em Lausanne, Suíça, quinze cientistas que trabalham no chamado programa Iron Man estão empenhados em construir uma máquina que, ao pressionar de um botão, prepara um pó misturado in dividualmente de acordo com o respectivo perfil metabólico. Os cientistas admitem que não é de esperar que a máquina seja lançada no mercado dentro dos próximos dez anos. Mas, quando este for o caso, “ela poderá ser o próximo micro-ondas nas cozinhas”, diz o diretor do NIHS Edward Baetge. Para Felix Tegeler, analista de inovações da agência de pesquisa de tendências TRENDONE, seria o estabelecimento definitivo de um processo que começou há muito tempo. Já hoje, camadas sociais se definem cada vez mais também pelo que comem e pelo que não comem. Uns – muitos deles vegetarianos – só consomem alimentos com selo orgânico, ao passo que outros comem carne várias vezes por dia, contribuindo para que a demanda aumente. Todos eles têm algo em comum: até certo ponto, se definem pelo que comem e como comem. “A alimentação está assumindo um caráter de lifestyle”, diz Tegeler. “A cada dia as pessoas estão exteriorizando mais seu estilo de alimentação; ele se torna, por assim dizer, parte de sua identidade.” E a identidade é hoje extremamente individual. Se, além disso, ainda houver uma alimentação high-tech sob medida para o corpo de cada indivíduo, isto também pode gerar conflitos. Aqueles que apostam no cultivo próprio e em alimentos produzidos naturalmente dificilmente se entusiasmarão com a nova ideia. Mas no gigantesco movimento rumo à crescente individualização certamente haverá lugar mais do que suficiente para ambas as tendências. O comércio e a tecnologia já atendem de forma crescente a necessidade de alimentação personalizada. Já é possível imprimir pasta e chocolates de design personalizado em impressoras 3D. Alguns restaurantes já estão oferecendo comida personalizada: o Vista Kitchen em Bangkok, na Tailândia, por exemplo, oferece um cardápio diferente para cada grupo sanguíneo. Cientistas consideram esse procedimento pouco sério, mas ele atrai uma verdadeira multidão de clientes curiosos. A IBM está desenvolvendo um computador que provavelmente também será útil para tendência rumo à nutrição personalizada. O usuário digita seus ingredientes prediletos – ou, no caso, os ingredientes que melhor promovem seu desempenho – e o computador, excelentemente informado sobre cozinhas e sabores de todo o mundo, fornece as receitas adequadas. Também o chamado Prep Pad, da startup estadunidense Orange Chef, aborda o tema da perspectiva da comida, e não do corpo. O Prep Pad, que em poucos anos talvez já se encontre na mesa da cozinha de muita gente, é uma espécie de tábua de cozinha que analisa a comida que a pessoa vai ingerir e, em seguida, faz recomendações personalizadas para o cardápio das próximas refeições. As duas abordagens – a análise do metabolismo e a análise dos alimentos – provavelmente vão se fundir cada vez mais no futuro. Pode ser que um dia a nossa própria mesa nos dê conselhos. Colocamos a mão sobre o tampo para um breve teste da situação atual no organismo, e a mesa, que sabe o que comemos nos meses passados, faz sugestões para o jantar. E se calhar ainda se encarrega de criar o ambiente adequado, com iluminação e música combinando com o cardápio. Bom apetite! Custo de um perfil nutricional individual em dólares: 1.000 73 Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade Gigantes inteligentes Texto Jan Wilms Ilustração Philipp Herrmann Inovações em veículos utilitários 2 1 6 4 5 3 1 Tração A tração do futuro será elétrica: já hoje circulam vans e veículos utilitários leves movidos a eletricidade e, com isso, sem emissões locais. Caminhões e escavadeiras leves combinam motores diesel e elétricos em seus sistemas híbridos. Em breve, esses sistemas poderiam ser usados em todo o mundo também no transporte pesado de longas distâncias em “e-Highways”. 74 2 Navegação O planejamento exato do trajeto poupa nervos e aumenta a eficiência e a segurança. Caminhões vinculam os dados de GPS do percurso com o controle do motor, por exemplo, em aclives e declives. Escavadeiras utilizam dados de satélite ainda mais precisos: é possível pré-programar até a posição exata e a profundidade do buraco a ser escavado. 3 Digitalização Todos os dados de operação e localização em autoestradas e obras podem ser coletados digitalmente em uma big data cloud e vinculados. Assim, a frota encontra-se sempre sob controle, permitindo reduzir viagens sem carga. Além disso, os veículos podem ser diretamente interligados em rede através de comunicação Car-to-X. 4 Construção leve Cada vez mais leves e estáveis: aços de alta resistência e ultrarresistência, além de outros materiais como alumínio, por exemplo, na suspensão de eixos de caminhões, guindastes, betoneiras e outras máquinas de construção, podem reduzir o peso do veículo em até 70 por cento, proporcionando maior desempenho de transporte, mais eficiência e menos CO 2. 5 Segurança Em caminhões e ônibus, inúmeros ajudantes garantem maior segurança: assistentes de frenagem de emergência, mudança de faixa e prevenção de colisões são alguns exemplos. Em escavadeiras e guindastes, o perigo maior é tombar ao elevar carga – por isso, as cabines de segurança são construídas de perfis especiais. 6 Condução autônoma A partir de 2020, caminhões deverão poder andar de forma autônoma, ou seja, sem intervenção do motorista. Isso poupa combustível e evita acidentes. O sistema será alimentado com dados e sensores já hoje existentes, como dados de GPS, mapas 3D, controle de cruzeiro adaptativo e sistema de frenagem de emergência. 75 Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade A individualização do cotidiano Sentir-se como em casa: lounge no aeroporto de Helsinki, Finlândia Texto Verena Dauerer A eroportos – lugares de trânsito fascinantes, com grande fluxo de pessoas, onde todos os dias circulam milhares de viajantes. Para muitos, não passam de uma escala necessária e, por vezes, bastante estressante, a caminho do destino final. Os visitantes de um aeroporto têm de se orientar, procurar informações, e alguns lutam com barreiras idiomáticas. Quando o tempo de espera por uma conexão é longo, o melhor é procurar aproveitá-lo da maneira mais eficiente possível. Quando o tempo é curto, o passageiro às vezes tem que suar para não perder a conexão, passar correndo pela alfândega e pela segurança e seguir rápido pelos saguões de espera à procura do portão de embarque certo. Mas viajar também pode ser uma experiência agradável e tranquila, como demonstra a operadora finlandesa de aeroportos Finavia no aeroporto de Helsinki. Seu projeto Travellab, ga76 nhador do Service Design Network Award, transformou um dos maiores centros de conexão para voos com destino à Ásia em um espaço quase contemplativo. Isto se deve sobretudo à oferta otimizada de serviços para Tudo tem que ser descomplicado, flexível e estar dis ponível em tempo integral tornar a estadia dos hóspedes o mais agradável possível, como uma área de ioga, entretenimento para a família e uma grill station no portão de embarque. Para tanto, a Finavia utilizou o método do design de serviços e atendeu diretamente as necessidades dos clientes, com base em uma pesquisa em larga escala sobre os desejos dos passageiros. O design de serviços é centrado nas pessoas. Não consiste em criar novos serviços a portas fechadas e apre sentá-los ao usuário prontos e acabados. Pelo contrário – designers e desenvolvedores trocam ideias com os consumidores e, junto com eles, elaboram a melhor solução possível. Essa área do design é hoje mais necessária do que nunca: para muitos, a tecnificação e digitalização do cotidiano traz diversos percalços. Todos nós, porém, queremos nos sentir bem em um ambiente em mudança constante. Para isso é preciso que o design de serviços se estenda a todos os setores da vida cotidiana. Nos últimos anos, o conceito “design de serviços” se estabeleceu através da oferta crescente de serviços digitais na internet e também para usuários finais móveis. “O design de serviços como método e disciplina permeia todas as áreas © Finavia Quando a prestação de serviços se centra nas pessoas 77 Nunca perder a curiosidade do desenvolvimento de produtos e empresas, como uma questão transversal, por assim dizer “, refere Peter Bihr. O berlinense se ocupa dos temas design de serviços e experiência do usuário também como curador da conferência anual NEXT. “No design de serviços, o foco está nas necessidades dos usuários, ou seja, é um caminho confiável rumo a produtos e serviços fáceis de usar”, complementa. Um outro exemplo de design de serviços bem sucedido na área da mobilidade é o estudo de viagem realizado pela agência internacional de design edenspiekermann. O estudo examinou o percurso porta a porta percorrido por alguém que viaja de Tóquio até Amsterdã, analisando uma quantidade enorme de dados. O resultado é o sistema de informação Info Connectivity System (ICS), que reúne e processa a informação existente em diferentes fontes ainda não conectadas entre si – como dados de diversos serviços de mobilidade e de transporte público urbano, informações sobre voos, dados de operadoras de aeroportos, informações turísticas 78 e dados de hotéis. Assim, o sistema não só permitirá que o usuário seja conduzido confortavelmente ao seu destino pelo seu smartphone, como também que ele possa consultar as informações relevantes para a sua viagem a qualquer hora em displays de terminais de aeroportos, máquinas de bilhetes e até mesmo nas telas de entretenimento a bordo do avião. Uma abordagem holística e inovadora, que pega o usuário pela mão do começo ao fim da viagem, com transições fluidas. E este é precisamente um critério para um bom design de serviços: quanto melhor, menos se percebe. Ao passo que a demanda por servi ços digitais cresce cada vez mais, as necessidades e desejos dos consumidores foram se desenvolvendo constantemente. Thomas Schönweitz, fundador e diretor da rede de estratégia Whitespring Service Design, sediada em Munique, explica: “Apesar de serem vendidos milhões de iPhones idênticos, nenhum é igual ao outro. Cada um deles está configurado individualmente, porque cada usuário baixou seus próprios aplica- Hans Freudenthaler, Chefe de Engenharia, Áustria Nossos suportes de turbinas forjados em ligas especiais resistem de forma cem por cento confiável aos enormes esforços e variações de temperatura no transporte aéreo moderno. Mesmo assim, continuamos a aperfeiçoá-los, junto com nossos © Finavia Espera agradável no aeroporto de Helsinki, Finlândia tivos, toques ou papéis de parede.” Segundo Schönweitz, os usuários hoje esperam esse tipo de produto individualizado também em outros setores da vida. Tudo tem que ser descomplicado, flexível e estar disponível em tempo integral – e sem risco algum, acrescenta. Um bom exemplo disto é o AirBnB, um serviço para reserva de alojamentos privados. Viajantes podem fazer a reserva por um site ou um aplicativo móvel e recebem um mapa da acomodação com muitos detalhes e fotos da mobília, bem como o perfil do anfitrião. A reserva e o pagamento são feitos de forma simples e rápida. Mas o design de serviços pode muito mais do que proporcionar uma experiência agradável de reserva. Smartphones e tablets e até mesmo sensores em nosso ambiente já se comunicam há muito – para proporcionar uma melhor oferta ao consumidor. A agência Fjord identificou a comunicação de objetos inteligentes entre si como uma das principais tendências atuais no design de serviços. Quanto mais inteligentes os gadgets se tornam, tanto melhor eles interagem e se adaptam ao usuário. Mas isto também significa que novas formas de interação estão disponíveis para os usuários – basta pensar nos óculos inteligentes Google Glass, comandados pela voz de quem os usa. Naturalmente, esse desenvolvimento também tem consequências para o comportamento social das pessoas e para a maneira como elas se relacionam. E isto demonstra, mais uma vez, que o design de serviços tem efeitos de longo alcance sobre a sociedade e que pode prestar uma contribuição importante para uma mudança positiva no setor de serviços. Uma coisa é certa: em dez anos, estaremos cercados de mais técnica ainda. O design de serviços faz com que nos sintamos bem com ela. Porque a tecnificação só nos traz vantagens enquanto o centro forem as pessoas. “Nossos suportes de turbinas proporcionam maior segurança para viajar acima das nuvens.” clientes – para mais liberdade e segurança. É essa confiabilidade, esse prazer em enfrentar um desafio, que nos diferencia. Não esperamos o futuro acontecer. www.voestalpine.com Futuro Não esperamos o futuro acontecer! Cinco países, um futuro? Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas Megacidades criativas Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade Missão a Marte O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade voestalpine AG voestalpine -Strasse 1 4020 Linz, Austria T. +43/50304/15-0 F. +43/50304/55-0 www.voestalpine.com www.voestalpine.com Edição 2016 magazine voestalpine