Revista Futuro 2016

Transcrição

Revista Futuro 2016
 Futuro
Não esperamos o futuro acontecer!
Cinco países,
um futuro?
Como novas tecnologias
­influem na vida de pessoas
em diferentes culturas
Megacidades
criativas
Como cidadãos podem
­participar ativamente
do ­desenvolvimento da
sua cidade
Missão a Marte
O sonho de viver em Marte
poderia tornar-se realidade
voestalpine AG
voestalpine -Strasse 1
4020 Linz, Austria
T. +43/50304/15-0
F. +43/50304/55-0
www.voestalpine.com
www.voestalpine.com
Edição 2016
magazine voestalpine
“Não esperamos
o futuro acontecer.”
Cara leitora, caro leitor!
Você provavelmente conhece esta sensação:
com o ritmo sempre crescente de mudanças em
nosso mundo, às vezes pode ficar um pouco
difícil acompanhar sempre todos os temas. Mais
do que nunca, o mundo se encontra em permanente transformação – e transformação sempre
significa novos desafios. Na frase do naturalista inglês Charles Darwin, que se dedicou ao
estudo das mudanças nas espécies biológicas,
“nada na história da vida é tão constante como
a mudança.” Com ela, Darwin chama a atenção
para o que costumamos perder de vista, e muitos provavelmente prefeririam não ver: a mudança é uma das poucas constantes confiáveis.
Para nós como grupo de empresas, mas também
para cada indivíduo, isso significa que temos
de enfrentar diariamente novos desafios – em
termos econômicos, tecnológicos, mas também
em termos sociais. Os artigos desta nossa edição de Futuro mostram as diversas formas como
esses desafios são enfrentados. Eles refletem
como as tecnologias transformam nosso mundo
e qual o papel desempenhado pelas diferenças
culturais na propagação e aceitação de novas
técnicas e tecnologias. Nossa autora Luciana
Ferrando, por exemplo, fala do entusiasmo pelo
progresso na Argentina. Nesse país, a tecnologia é vista como motor de desenvolvimento
cultural e tem uma influência positiva sobre a
forma de pensar e agir da população, mesmo
que em um ou outro canto do país recursos limitados dificultem o progresso. Na entrevista
com nossa redação, Michael Lind, cofundador da New America Foundation, se pergunta
se tecnologia demais não iria até mesmo contra a natureza humana, mas chega à conclusão
que, em princípio, depende do que fazemos
dela. E em seu ensaio, Paul Sullivan indaga
em que medida a transformação tecnológica
determina a nossa vida, e como, adotando uma
nova perspectiva, podemos entendê-la também
como uma chance. Uma visão comum da base
une os dois autores: mudanças sempre afetam
2
nossa sociedade como um todo. Trabalhando
em conjunto, operamos a transformação juntos,
a enfrentamos juntos. Ela nos faz até mesmo
mirar as estrelas, no verdadeiro sentido da palavra, como descreve nossa autora Louisa P
­ reston:
toda uma série de missões internacionais está,
neste momento, empenhada em enviar os primeiros seres humanos a Marte. E não são poucos os cientistas que não só sonham em pesquisar o Planeta Vermelho, como também em
colonizá-lo – são justamente perspectivas como
essas que resultam de inovações tecnológicas
contínuas e grandes visões. Esses são os temas
com que nós, da voestalpine, estamos especialmente comprometidos, que nos fascinam. Devemos entender a força de inovação – ou, talvez
melhor ainda, a vontade de inovar – das pessoas
que apresentamos nesta edição como um convite a todos nós para nos unirmos a elas – porque só o engajamento consciente de cada um
de nós pode mudar este mundo para melhor.
Cordialmente
Wolfgang Eder, CEO da voestalpine AG
3
Índice
Estar sempre presente
Antecipar o futuro
Nunca perder a curiosidade
12
30Tecnologia
Qual é o seu papel na solução de desafios
globais?
60
38
66
Edição 2016
Mudança: indispensável
para o progresso e
­melhoramento
— Página 12
Tecnologia: três diferen­
tes abordagens
— Página 30
Especialistas: quatro
­funcionários com habili­
dades especiais
— Página 56
O poder da mudança
Como as mudanças influenciam nossa vida
­privada e profissional
16
“Uma vida sem risco não é
­possível”
6
20
8Colaboradores
As pessoas que fizeram esta revista
8Expediente
A indústria sob o signo da transformação digital
22
Ideias que nos fazem avançar
A todo vapor
Como funcionarão as usinas do futuro
52
56
70
Quando comer aumenta o
­desempenho
O que comemos pode nos deixar mais inteli­
gentes, saudáveis e bonitos?
74
Gigantes inteligentes
Inovações em veículos utilitários
Especialistas são insubstituíveis
Apresentamos quatro pessoas que trabalham
em nossa empresa
As luzes da Terra vistas do
­espaço
Satélite Suomi NPP capta imagens espetacu­
lares da Terra
Megacidades criativas
Como cidadãos podem participar ativamente
do desenvolvimento da sua cidade
Empresas tradicionais buscam a proximidade
de jovens e dinâmicas oficinas de ideias
Empreendedores criativos que querem mudar
nosso mundo
4
48
Como pessoas da voestalpine veem o futuro
Nosso mundo
Como será nosso mundo amanhã?
Nosso futuro
O sonho de viver em Marte poderia tornar-se
realidade
Como novas tecnologias influem na vida de
­pessoas em diferentes culturas
Entrevista com Wolfgang Eder
18
Cinco países, um futuro?
Missão a Marte
76
A individualização do cotidiano
Quando a prestação de serviços se centra
nas pessoas
5
Nosso
mundo
Islândia
Como será nosso
mundo amanhã? ­Estes
são os lugares onde
procu­ramos a resposta
nesta edição
Vale do Silício, EUA
O modelo é o Vale do Silício: para possibilitar inovações radicais, mais e mais empresas procuram a proximidade de startups
A indústria sob o signo da transformação
digital — Página 20
Alemanha
Washington D.C.
Mumbai
Quênia
Washington, D.C., EUA
Em Washington, falamos com o autor
­Michael Lind sobre a tecnologia e seu papel
no presente e no futuro
“Não há volta” — Página 34
Islândia
Nossa autora Louisa Preston caminha
com o fundador do projeto Mars One pela
paisagem da Islândia, que se assemelha
à de Marte
Missão a Marte — Página 60
6
Malásia
Americana
Americana, Brasil
Lara Baralhas, de Americana, quer conhecer
novos planetas
Nosso futuro — Página 18
Argentina
Na Argentina, robôs estão desempenhando
um papel cada vez maior na educação
Cinco países, um futuro? — Página 38
Japão
Vale do Silício
Melbourne
Argentina
Alemanha
Usar o calor residual de usinas elétricas
para gerar mais energia com combustíveis
A todo vapor — Página 48
Mumbai, Índia
As tool houses oferecem espaço para moradia e pequenas fábricas
Megacidades criativas — Página 52
Japão
Clichê ou realidade: coisas técnicas também
podem possuir uma alma?
Cinco países, um futuro? — Página 38
Quênia
A gaseificação de combustíveis é interessante para países com redes elétricas rudimentares, como o Quênia
A todo vapor — Página 48
Malásia
Mohammad Asadullah quer gaseificar biomassa, porque isso necessita de menos combustível do que usinas a vapor
A todo vapor — Página 48
Melbourne, Austrália
Habitantes tiveram a ideia de criar a Little
Library, uma minibiblioteca organizada
­pelos próprios usuários
Megacidades criativas — Página 52
7
Expediente
Colaboradores
Pessoas por detrás de
“Futuro”
Colaboradores
A mudança faz parte de nossa vida – sem ela,
não há progresso. Nesta revista, lançamos um
olhar para o futuro e perguntamos: como nossa
vida vai mudar e qual o papel da tecnologia
nessa mudança?
Da Argentina ao Japão e da Califórnia à
­ ustrália: enviamos nossos repórteres aos
A
­quatro cantos do planeta, para que nos fizessem
um relato sobre as mudanças mais ­fascinantes.
Nestas páginas, queremos apresentar-lhes
­algumas das pessoas que contribuíram para
esta edição de Futuro.
Expediente
Chris Schinke
Luciana Ferrando
Paul Sullivan
Jornalista (Alemanha)
Chris Schinke escreve principalmente sobre temas
relacionados com tecnologia, cinema, literatura e
teatro. Ele vive e trabalha como jornalista freelance
em Munique e contribuiu para esta edição com
um artigo sobre megacidades criativas.
Jornalista (Alemanha)
Para seu trabalho, Luciana Ferrando m
­ ergulha
sempre em novos mundos – para Futuro, apro­
fundou-se no mundo da tecnologia: em um
­artigo, ela examina sua aceitação em seu país
natal, a A
­ rgentina; em outro, como as pessoas
se ­relacionam com a tecnologia.
Autor e fotógrafo (Alemanha)
Paul Sullivan é britânico e vive em Berlim. Seu
trabalho abrange principalmente os temas cultura,
lifestyle e viagem. No ensaio que escreveu para
a edição deste ano de Futuro, ele se aproxima do
tema mudança e transformação.
— Página 52 —
— Página 12 —
— Página 32 —
Proprietário e titular da mídia:
voestalpine AG
voestalpine-Strasse 1
4020 Linz, Áustria
Editor:
Peter Felsbach
Chefe de redação:
Maria Reibenberger
T. +43/50304/15-5432
[email protected]
Concepção e redação:
Barbara Ecker,
Anne Kammerzelt e
Björn Lüdtke
Design:
Sandra Stäbler
Impressão:
Kontext Druckerei GmbH
Spaunstrasse 3 a
4020 Linz, Áustria
8
Louisa Preston
Raouia Kheder
Björn Lüdtke
Astrobióloga e astrogeóloga (Grã-Bretanha)
Louisa Preston é astrobióloga e astrogeóloga, bem como membro da comunidade dos
TED Fellows. Ela se ocupa da descoberta de vida
em Marte e da colonização de outros planetas e
luas pelo h
­ omem, e convida os leitores de Futuro
a ­acompanhá-la em sua missão.
Jornalista e apresentadora de rádio (Tunísia)
As reportagens de Raouia Kheder versam
­sobretudo sobre temas sociais e culturais de sua
terra natal, a Tunísia, e do mundo árabe. Nesta
revista, ela analisa o papel que a tecnologia
­desempenha na cultura de seu país.
Redator (Alemanha)
Desde o início, Björn Lüdtke é corresponsável pela
concepção e redação da revista Futuro. O jornalista
especializado freelance é expert em moda e marketing, mas para a voestalpine ele se dispôs de bom
grado a discorrer sobre mudança e tecnologia.
— Página 38 —
— Página 38 —
— Página 60 —
9
Estar sempre presente
Dar firmeza e segurança
Nossa estrutura descentralizada nos permite agir e reagir mais depressa.
­Assim, ­estamos sempre presentes para todos os nossos s­ takeholders e ­buscamos
atender suas necessidades com um máximo de flexibilidade e
­dinâmica. ­Atacamos problemas pela raiz e não desistimos, porque vale a
pena lutar pelo futuro.
12
O poder da mudança
Como as mudanças influenciam nossa vida
privada e profissional
16
“Uma vida sem risco não é ­possível”
Entrevista com Wolfgang Eder
18
Nosso futuro
Como pessoas da voestalpine veem o futuro
20
A indústria sob o signo da
transformação digital
Empresas tradicionais buscam a proximidade de
jovens e dinâmicas oficinas de ideias
22
Ideias que nos fazem avançar
Empreendedores criativos que querem
mudar nosso mundo
10
11
Estar sempre presente
Estar sempre presente
O poder
da mudança
“Nada é permanente,
­exceto a mudança.”
— Heráclito de Éfeso
Texto Paul Sullivan
© iStock
Paul Sullivan sobre as mudanças e como
elas influen­ciam nossa vida privada e profissional
12
A mudança também já não é mais
o que era. Pelo menos, é o se poderia pensar quando se compara nossa
geração com gerações anteriores.
Estas certamente não viveram essa
sucessão estonteantemente veloz de
mudanças técnicas e tecnológicas
radicais que hoje transformam nosso
cotidiano. Em nenhuma cultura anterior se “surfou”, “escrolou” ou “atachou”, isto é certo, mas desde o início
dos tempos quase todas as sociedades passaram, em maior ou menor
grau, por processos de mudança e
transformação intensos. Até mesmo
nas supostamente tão rígidas sociedades pré-modernas houve acontecimentos que trouxeram mudanças
radicais: disputas religiosas e guerras tribais, inundações e períodos de
frio intenso, revoltas e epidemias e,
não por último, todos os desenvolvi­
mentos graduais que, lenta porém
seguramente, determinaram a forma
como vivemos no presente.
Na verdade, a mudança é uma parte
fundamental de nossa vida e da natureza humana, como já confirmou
Heráclito, o filósofo grego contem­
porâneo de Sócrates e um dos primeiros a se ocupar do conceito de mudança, com seu famoso dito “Nada
é permanente, exceto a mudança”.
E para deixá-lo ainda mais claro, o
sábio acrescentou: “Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio.”
Gostemos ou não, mudanças acontecem todos os dias, sejam elas pequenos incidentes do cotidiano aparentemente insignificantes, como
mudanças dos horários de ônibus, o
fechamento de uma loja preferida,
um pequeno prêmio na loteria, ou
experiências e acontecimentos marcantes, como nascimento e morte,
mudança de moradia ou de profissão,
uma nova amizade ou se apaixonar.
Apaixonar-se, aliás, pode acontecer
quase que de passagem e a qualquer
momento e, no entanto, pode influenciar nossa vida de forma duradoura.
Nós seres humanos tendemos a reagir
a mudanças com um misto de temor
e anseio. Mudanças são, por natureza,
imprevisíveis e não raro comportam riscos. A mudança é uma força
invisível, que influencia constantemente nosso mundo. Com o tempo e
engenho, aprendemos a nos ajeitar
com mudanças – o que é fundamental para uma visão proativa de futuro.
Isto, por sua vez, é positivo para nós
como indivíduos, mas também para o
nosso comportamento profissional e
para a sociedade como um todo.
“Devemos ser nós mesmos a mudança que queremos ver no mundo.”
— Mahatma Gandhi
A mudança está inseparavelmente
ligada à noção de progresso e melhoramento. Porque, afinal, progresso e
melhoramento não são possíveis sem
que haja um certo grau de mudança.
Decerto não é nenhum exagero afirmar que tanto a sociedade como cada
indivíduo trazem dentro de si o desejo de se desenvolver e melhorar.
É só olharmos ao nosso redor: os lados positivos de mudanças estão por
toda parte.
Hoje, não conseguimos mais imaginar um mundo sem smartphones,
MP3 Players ou viagens de avião –
no entanto, há apenas alguns anos
ou décadas, era completamente normal v
­ iver sem isso. E quem, naquele
tempo, teria imaginado que impressoras 3D, automóveis sem motorista
ou inteligência artificial aplicada a
diagnósticos médicos seriam coisas
corriqueiras em 2016?
O mesmo se aplica a desenvolvimentos sociais. Um dos fatores mais importantes em nossas sociedades em
mudança permanente é o poder das
ideias, as quais, por sua vez, passam
por mudanças no decorrer do tempo.
Nossas atuais democracias, apesar de
estarem longe de ser perfeitas, são
altamente desenvolvidas, e elas o são
devido a importantes mudanças sociais no passado: a abolição da escravatura, a extensão do direito de voto
às mulheres, os movimentos pelos
direitos civis e, não por último, o Iluminismo e a revolução industrial.
Mudanças como essas ainda acontecem também nos dias de hoje. Duas
ou três décadas atrás, a mudança
climática, por exemplo, não passava
de um tema marginal, que não era
levado a sério por muitos governos ou
grandes empresas. Hoje, a problemática chegou ao meio da sociedade e
medidas para enfrentá-la estão sendo
tomadas em quase todos os níveis.
A complicada situação de guerra na
Síria e no Oriente Próximo desencadeou uma das maiores crises huma­
nitárias da História mais recente –
pode ser que, ali, a História esteja
apenas se repetindo, mas a situação
também traz consigo desafios completamente novos.
Também o feminismo, que tem suas
bases numa tradição centenária de
luta pela liberação da mulher, ultima­
mente vem ganhando novo impulso
da internet e das mídias sociais, fazendo com que a superioridade masculina volte a ser colocada em questão e pessoas em todos os níveis se
engajem pela igualdade de direitos
dos sexos. Todos esses temas, que
também se encontram em permanente transformação, proporcionam
a indivíduos e governos a oportunidade de, juntos, promover mudanças
sociais positivas.
Assim como no passado, a evolução
tecnológica que experimentamos hoje
também pode ser motor de transformações sociais. A internet possibilitou
um acesso nunca antes visto à informação e ao conhecimento (Wiki­pédia,
YouTube, e-learning), e sempre novos
13
Estar sempre presente
“Não é o mais forte que
sobrevive, nem o mais
­inteligente, mas o que
melhor se adapta às
­mudanças.”
— Charles Darwin
Ainda que esses temas pareçam ser
universais, eles naturalmente têm um
efeito diverso em lugares ­diferentes:
na América do Sul, a crise dos refugiados é percebida de forma diferente do que na Europa; a Europa
sente as consequências diretas do
aquecimento global de forma diversa
do que, por exemplo, Bangladesh ou
a Califórnia; o neofeminismo em sua
expressão ocidental sofre fortes restrições em muitos países do Oriente
Próximo. A estrutura cultural, política
e social prevalecente em uma sociedade determina como ela é influenciada por mudanças.
Não é por acaso que nos últimos
anos o conceito – e a aceitação – de
mudanças tem sido um tópico importante nas empresas. Elas estão
sob uma permanente pressão para
se manter no topo, seja com relação
14
à comunicação interna ou ao marketing externo. Ao mesmo tempo, o surgimento de novas tecnologias exige,
diariamente, mudanças em muitos
aspectos. O melhor exemplo disso são
as mídias sociais: há dez anos, não
tinham muita relevância; hoje, toda
empresa tem de estar presente no
Face­book ou Twitter e precisa ter visibilidade online.
Com o advento da globalização, o
mundo dos negócios tornou-se ainda
mais aberto para mudanças. Quando
os mercados se abriram com a internet, trazendo todo um mundo de
novas possibilidades e oportunidades,
termos como “mobilidade” e “flexibilidade” se tornaram parte do vocabulário padrão. A ultraflexível cultura startup talvez seja o que melhor
ilustra este fato: em 2001, um grupo
de 17 desenvolvedores de software
reconheceu a necessidade urgente
de se adaptar à nova realidade e publicou o chamado “Manifesto Ágil”.
Um ponto central desse manifesto é a
“necessidade de responder a mudanças, mais do que seguir um plano”.
Essa nova cultura da flexibilidade se
mostra da forma mais evidente nos
departamentos de relações públicas e
Evolução tecno­
lógica pode ser
motor de transfor­
mações sociais
marketing. A imagem ou a marca de
uma empresa é de enorme importância, e para a maioria das empresas a
sua definição e comunicação é um
tema permanente e em contínuo desenvolvimento. Para os usuários, uma
página web obsoleta, que não é amigável, ou uma conta desatualizada
no Facebook ou no Twitter praticamente não existem.
há como escaparmos do inevitável.
Existe uma série de bons exemplos
de como mudanças trazem novas
possibilidades – sejam elas as novas
tarefas no novo emprego, a satisfação que sentimos quando redecoramos a casa ou substituímos nossas
roupas velhas por novas. Aprender
a vencer o temor natural e aceitar
mudanças, portanto, parece apenas
sensato. Porque, no final das contas,
as pessoas, empresas e governos dispostos a assumir riscos têm maiores
chances de êxito. Adaptar-se a novos
As regras para a sobrevivência são
iguais em toda parte, também no mercado dos negócios. Quem não aceita e
não se dispõe a enfrentar os desafios
de um mundo em constante transformação, está fadado a desaparecer –
como os dinossauros. Para aceitar essas condições é preciso flexibilidade e
a capacidade de compreender, ou até
mesmo de prever, as necessidades e
sensibilidades dos clientes.
“O pessimista vê a dificuldade em cada oportunidade; o otimista vê
a oportunidade em cada
­dificuldade.”
— Winston Churchill
Apesar da profusão de exemplos de
como mudanças podem influenciar
de forma positiva nossa vida profissional ou pessoal, a maioria de nós
tem uma postura crítica em relação a
elas. Em seu livro de 2007 com o dramático título Change or Die (“Mude
ou Morra”), o autor estadunidense
especialista em temas econômicos
Alan Deutschman revela que a maioria das pessoas prefere permanecer
dentro de seus limites pessoais, onde
se sente à vontade, a expor-se ao
­desconhecido – mesmo quando um
final feliz é provável. Lançando mão
dos mais diferentes exemplos – do
doente cardíaco até empresas que ficaram para trás porque não conseguiram acompanhar o ritmo das transformações – Deutschman demonstra
o quanto relutamos em aceitar mudanças e, ao mesmo tempo, somos
dotados da capacidade inata de nos
adaptar a elas.
Em última análise, porém, não importa se tememos mudanças ou não.
Nem o tempo vai parar, nem as mudanças que ocorrem com o passar
do tempo vão deixar de acontecer
por causa desse nosso temor. Não
vimento, transformação, diversificação, aperfeiçoamento, variedade –
não tardaremos a reconhecer que se
trata de uma palavra cheia de entusiasmo e positividade.
Uma outra possibilidade é recorrer
a filosofias que veem mudanças com
simpatia. Muitas filosofias orientais
se ocupam do conceito de mudança.
O I Ching ou Livro das Mutações, por
exemplo, um texto chinês que conta
2.600 anos, nos ensina que as coisas
boas em nossa vida são passageiras,
mas as coisas ruins também o são.
aceitamos as coisas como elas são, em
vez de dizer ‘isto não pode acontecer
assim’, e nos esforçamos mais ainda
para dar uma outra direção às coisas.”
Uma outra estratégia poderia consistir em adotar uma nova perspectiva.
Nem toda mudança é igual. Quando
as pequenas mudanças se tornam
demais, talvez valha a pena dar um
passo para trás e contemplar as mudanças maiores – que, muitas vezes,
não têm tanto de mudança como
pensávamos. Confuso? Um exemplo:
quem se sente estressado pela torrente incessante de informações das
mídias sociais, deveria lembrar-se de
que os conteúdos que consome não
são, em verdade, nada mais do que
A mudança faz
parte de nossa vida
© iStock
aplicativos fornecem, por exemplo,
informações meteorológicas para
agricultores africanos ou enviam um
mapa com dados exatos que permitem localizar vítimas de terremotos.
Plataformas digitais de mídia social
como Twitter, WhatsApp e Facebook
não só permitiram organizar rápida e
eficientemente protestos ou ajuda em
grande escala, como no caso da fuga
em massa de refugiados, mas também
ajudaram a superar distâncias e tornaram o mundo mais próximo. Através dessas plataformas, estamos em
contato direto com pessoas de todo
o mundo e assim temos a impressão
de que também lugares muito distantes e longínquos fazem parte de
nossa própria vizinhança global.
Estar sempre presente
ambientes, novas pessoas e situações,
significa evoluir – em termos da própria personalidade, de renda, de sistema de valores.
Existem diversos meios de se adaptar.
Nenhum deles é difícil. Uma possi­
bilidade é conscientizar-se dos signi­
ficados positivos da palavra mudança.
Se olharmos com atenção alguns de
seus sinônimos – inovação, desenvol­
O taoismo talvez seja, dentre as filosofias orientais, a filosofia máxima
da efemeridade. Uma de suas proposições centrais é: “Nade com a
corrente”. No encantador livro O Tao
do Pooh, de Benjamin Hoff, o ursinho
Pooh nos transmite, à sua maneira,
princípios taoistas: “Tudo acontece da
forma certa e na hora certa. Pelo menos é assim quando o permitimos e
histórias, que antes eram contadas
e hoje são lidas. O meio de comunicação pode ser novo, mas no fundo é a
mesma coisa.
A paradoxa afirmação de Heráclito,
que a mudança é algo permanente,
pode igualmente servir de âncora.
Ver o sol nascer todos os dias e ver
as estrelas brilhar no céu todas as
noites, ou presenciar as estações do
ano em sua sucessão previsível, nos
dá uma sensação de eternidade. Assim como o famoso dito de Heráclito,
o provérbio francês Plus ça change,
plus c’est la même chose (“Quanto
mais muda, mais é a mesma coisa”)
nos faz lembrar o que, no fundo, todos sabem: que a mudança é antes
a norma do que a exceção. Quem
aceitar isto vai poder aproveitar mudanças para seu próprio desenvol­
vimento pessoal e profissional. Quem
não se opuser ao inevitável e nadar
com a corrente, vai se sentir melhor
como uma pessoa dinâmica e criativa do que como um triste e velho
dinossauro.
15
Estar sempre presente
Estar sempre presente
“Uma vida sem risco
não é possível”
Texto Paul Sullivan
Entrevista com Wolfgang Eder
O senhor tem uma filosofia pes­
soal em relação a mudança e trans­
formação?
Mudança e transformação são indispensáveis para o progresso em
todos os setores da vida. Em outras
palavras: parar é retroceder – ou, dito
de uma forma mais elegante: nada
é permanente, exceto a mudança.
Por isso, para mim mudança e transformação são a regra, e não a exceção. Basta olharmos para os últimos
20 anos e vermos o quanto a sociedade e a economia mudaram nesse
espaço de tempo comparativamente
curto: nosso comportamento na comunicação, os processos de produção,
a vida em casa – tudo está conectado
em rede. Vejo muitas dessas coisas
de uma forma bastante crítica, mas
é precisamente por essa razão que
devemos enfrentar esses desenvolvi-
16
mentos de uma forma ativa e procurar
orientá-los para a direção certa.
Como isso influi em seu papel de
presidente do Conselho de Adminis­
tração, e em que relação estão o pes­
soal e o profissional?
Para mim, como para a maioria das
pessoas, os papéis na vida profissional e na vida privada envolvem
tarefas diferentes, desafios dife­
ren­tes. Contudo, é sempre uma e
a mesma pessoa que tem que lidar
com eles. Para dar conta das diferentes situações da vida, seja como
presidente do Conselho de Administração ou como pessoa privada, são
precisos – apesar de todas as diferenças, que muitas vezes são apenas
aparentes – os mesmos princípios
e critérios, já por uma questão de
credibi­lidade pessoal.
Wolfgang Eder
Wolfgang Eder é presidente e CEO
da voestalpine AG
Como pessoa privada, o senhor lida
com mudanças de forma diversa do
que na sua posição de CEO?
Para mim pessoalmente, disposição
para mudanças significa enfrentar
novos desafios com a mesma abertura
e falta de preconceito tanto na vida
privada como na profissional. É claro
que as tarefas em um grupo internacional de empresas com quase 50.000
funcionários são outras do que as que
se tem em uma família. Em ambos
os casos, contudo, trata-se essencialmente de assumir responsabilidade
e conscientizar-se de que uma vida
sem risco não é possível. No final
das contas, assumir responsabilidade
significa pesar um risco a ser assumido contra as oportunidades que ele
abre – tanto na esfera privada como
na profissional.
Existe algo como uma política cor­
porativa oficial e objetiva com rela­
ção a mudanças, para refrear o gosto
excessivo pelo risco, por exemplo?
Eu acredito que não é possível, de
uma maneira geral, regulamentar a
disposição para mudanças por meio
de diretrizes, ou mesmo decretar
que ela tenha um determinado grau.
Tudo o que se pode fazer é procurar
criar uma cultura empresarial na qual
a transformação constante e a disposição necessária para mudanças sejam parte da identidade corporativa,
isto é, sejam vividas conscientemente
e com convicção. Mas uma condição
imprescindível para que isso se dê é
deixar claro para todos os que trabalham na empresa que só se consegue
obter excelência permanente e, com
isso, também assegurar o melhor possível o próprio futuro, através da disposição para mudança. Naturalmente,
mudança sempre significa também
Não há inovação sem mudança
risco. O decisivo é que tais riscos sejam sempre razoáveis, e portanto manejáveis. Esses riscos são, em grande
medida, calculáveis. Mas o maior
risco, sem dúvida alguma, é parar de
se desenvolver, opor-se a mudanças.
Como o senhor pode assegurar
que suas decisões sejam, realmente,
orientadas a longo prazo e susten­
táveis, e não sejam sobrepostas por
metas de curto prazo e, com isso,
desvalorizadas?
Essa é uma questão do estilo básico
de gestão. Na voestalpine, por exemplo, há muitos anos vimos seguindo,
com uma consistência realmente
inabalável, uma estratégia clara de
longo prazo, nos afastando da imagem do clássico fabricante de aço
para nos transformamos em um grupo
de empresas que produz tecnologia
baseada em metais. Essa orientação
de longo prazo também norteia nossa
atuação de curto prazo e seus respectivos objetivos. Ou seja, todas as
decisões empresariais têm de se nortear pela estratégia de longo prazo.
Se estiverem em contradição com ela,
não têm nenhuma chance de ser
implementadas.
O que o senhor faz quando reco­
nhece que uma decisão foi errada?
Empresas bem-sucedidas se distinguem pelo fato de viverem estratégias e modelos de negócios de uma
forma consistente e, ao mesmo tempo,
questionarem sempre de novo e,
quando necessário, adaptarem essas
estratégias e modelos de negócios a
novos cenários futuros, sem, contudo,
alterar seus princípios básicos. Uma
das principais carac­terísticas de uma
cultura empresarial aberta é a capacidade de lidar perma­nentemente com
um ambiente econômico, político e
social que muda a uma velocidade
cada vez maior. Só assim poderemos
melhorar sempre e continuar bem-sucedidos nesse ambiente em transformação constante.
17
Estar sempre presente
Estar sempre presente
Nosso futuro
LARS BECKER (43)
Gerente de Conta-Chave
Löhne, Alemanha
Texto Anne Kammerzelt
Como pessoas da voestalpine veem o futuro
1.Que mudança positiva o próximo ano vai trazer para você pessoalmente?
2.Se você pudesse mudar uma coisa no mundo, o que mudaria?
3.Que tecnologia você acha que precisa ser inventada sem falta nos próximos anos?
4. O que você gostaria de perguntar a alguém que viesse do futuro?
“O que poderíamos fazer
­diferente?”
1) Vou poder voltar a fazer música com a minha banda
com mais frequência. 2) Se eu pudesse, impediria que
tantas pessoas sofressem diariamente, em todo o mundo,
com guerras, pobreza e doenças. 3) Como alguém que
anda muito de carro a trabalho: um meio de transporte
individual que ande – ou, por mim, que voe – de forma
completamente autônoma. 4) Vocês estão bem? – e, caso
não ­estejam, o que poderíamos fazer diferente hoje para
ajudar vocês no futuro? E: minha resposta à pergunta
­número 3 já se transformou em realidade?
LARA BARALHAS (5)
Aluna da pré-escola
Americana, Brasil
“Quero conhecer outros
­planetas”
1) No próximo ano eu quero ir para o ensino fundamental e aprender a ler e escrever bem rápido. 2) As crianças
pobres, que não têm brinquedos e chocolates. Gostaria
que todo mundo pudesse brincar e comer coisas gostosas.
3) Carros que andam no céu, que voam com controle remoto. 4) Se no futuro vamos andar de foguete igual andamos de avião hoje. Quero conhecer outros planetas.
OLESYA BONCHENKO (30)
Gerente de Vendas
Dubai, Emirados Árabes Unidos
“Às vezes esquecemos a
sorte que temos, que somos
­privilegiados”
“Boa saúde e boa sorte”
1) Espero continuar tendo boa saúde e boa sorte. 2) Eu
gostaria de poder parar o aquecimento global. 3) O aproveitamento da energia geotérmica. 4) O que deveríamos
ter feito para que vocês estivessem melhor?
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Página 18-19 © Private
HELMUT RASENBERGER (77)
Consultor
Toronto (Ontário), Canadá
1) Vou ser mãe e ter de conciliar o trabalho com a maternidade. Com o apoio da minha família, espero poder aliar
de forma equilibrada esses dois papéis. 2) Eu possibilitaria
a todas crianças, no mundo inteiro, acesso livre e gratuito
ao ensino. Quando crescemos em um país onde a escola
é de graça e obrigatória para todas as crianças, às vezes
esquecemos a sorte que temos e como somos privilegiados.
3) Sistemas de proteção contra emissões altamente desenvolvidos para todas as áreas, a começar pelos automóveis
até grandes fábricas. 4) Eu perguntaria se viagens espaciais ou férias na Lua já se tornaram uma coisa corriqueira.
19
Estar sempre presente
Estar sempre presente
A indústria sob
o signo da trans­
formação digital
Texto Hans Schürmann
Empresas tradicionais buscam a proximidade
de jovens e dinâmicas oficinas de ideias
A
digitalização está transformando o mundo. Tecnologias que permitem acessar
informações e dados a qualquer hora
e num piscar de olhos conduzem a
inovações que mudam não só a sociedade, como também empresas e
mercados. Plataformas na internet
que não só permitem às empresas ficar conhecendo melhor seus clientes,
como também colaborar mais rápida
e estreitamente com fornecedores,
bem como a tendência rumo à fábrica conectada – essas são tendências que oferecem novas oportunidades, mas que são, ao mesmo tempo,
um desafio para modelos usuais de
negócio. Se até agora o foco estava
principalmente nos produtos, no
­futuro ele estará mais em serviços
inteligentes e individualizados.
Em face da crescente digitalização,
tanto conglomerados como médias
empresas têm de se reinventar se
20
quiserem se manter competitivas no
mercado global. Precisam se tornar
mais inovadoras, adaptar velhos métodos de gestão e formas de organização em curto espaço de tempo. Mas
isto não é tão simples. “Quando uma
organização já existe há dezenas de
anos, é difícil abandonar modos de
pensar e agir estabelecidos e desenvolver ideias e modelos de negócio
completamente novos”, diz Stephan
Grabmeier. Durante vários anos, o
consultor de empresas acompanhou
a transformação digital na operadora
alemã de telefonia Deutsche Telekom,
e está apoiando duas startups não só
financeiramente, como também com
suas experiências práticas.
Mas a transformação digital não é um
problema que diz respeito apenas ao
setor de telecomunicações, ela também afeta muitos setores do comércio
e da indústria, como por exemplo
o setor de construção de máquinas.
A produção conectada torna as empresas mais flexíveis e lhes permite
reagir com maior rapidez a desejos
dos clientes, mas, ao mesmo tempo,
os ciclos de inovação se tornam mais
curtos e os mercados, mais globais.
A consequência: as empresas se veem
forçadas a desenvolver novos produ­
tos e lançá-los no mercado muito
mais depressa, para poder fazer face
à concorrência. Assim, a necessidade
de inovações radicais está levando
um número crescente de empresas
a buscar a proximidade de startups.
Startups têm grandes vantagens
quando se trata de inovações transformadoras de mercado. “Elas não
têm que se preocupar com um core
business de margem forte e, além
disso, sua estrutura lhes permite agir
de forma mais rápida e flexível do
que grandes conglomerados de empresas”, explica Markus Struppe, parceiro da empresa ­UnternehmerTUM
© iStock
Transformação digital na prática
GmbH, o Centro de Inovação e Incubação de Startups da Universidade
Técnica de Munique. As jovens empresas focadas em novas tecnologias
experimentam coisas novas, sem
saber de antemão se estas serão bem
sucedidas no mercado. Para lidar com
essas incertezas, elas utilizam um procedimento iterativo. Isto significa que
não há um resultado final definitivo,
e sim uma constante otimização dos
resultados e adaptação das metas do
projeto. Para isso, elas procuram sempre de novo o contato com clientes em
potencial, elaboram protótipos e discutem com os futuros usuários.
Na opinião do consultor da Unter­
nehmerTUM, essa é uma vantagem
decisiva, sobretudo diante de ciclos
de inovação cada vez mais curtos.
Uma empresa estabelecida tem uma
imagem a zelar e, por isso, não pode
lançar no mercado produtos “inacabados” sob sua própria marca para
que eles sejam testados por seus
clientes. Struppe está convencido de
que ambos os lados podem ganhar
com uma cooperação logo no início.
Enquanto que startups são inovadoras e flexíveis, grandes empresas dispõem de uma rede forte de empresas
do setor e de clientes, e de know-how
na implementação e escalonamento
de novos produtos.
Entre os ligados na cena de startups
estão também grupos internacionais. Há pouco, o grupo BMW fundou uma startup garage, com grande
repercussão na mídia. Seu objetivo
é fomentar jovens empresas com
potencial em fase inicial e aproveitar tecnologias de startups nos seus
próprios processos de inovação. Já
outros gostam de trabalhar mais em
surdina, como um fabricante de máquinas de construção alemão, que
coopera há anos com uma jovem
empresa de software. Por trás dessa
miniempresa estão engenheiros que
têm vontade de experimentar e desenvolvem programas que fazem
com que sistemas de controle de máquinas móveis fiquem cada vez mais
inteligentes.
Grupos energéticos também esperam
que uma cooperação mais forte com
empresas jovens e ágeis lhes traga
ideias frescas, que os ajudem a levar
a transformação a bom cabo. Grupos
como a EnBW andam de olho em
startups que desenvolveram inovações para a smart home, ou casa inteligente. Essas empresas poderiam,
por exemplo, desenvolver soluções
inteligentes que, em conexão com
uma rede elétrica inteligente (smart
grid), contribuam para que flutuações
de tensão em uma rede alimentada
por energias renováveis possam ser
melhor compensadas.
Já faz algum tempo que grandes
empresas se interessam por startups.
Seus motivos, porém, mudaram: “Enquanto que antes as grandes empresas estavam interessadas principalmente em participações financeiras,
hoje o foco está sobretudo na gestão
de inovações”, diz o consultor de
transformações Stephan Grabmeier.
A tendência de digitalização fez com
que os dois lados se aproximassem e
mostrou que eles se complementam
muito bem e podem beneficiar-se
um do outro.
21
Estar sempre presente
Estar sempre presente
Ideias que nos
fazem avançar
Texto André Uhl
Brinquedo para a geração digital de amanhã: TinkerBots
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Página 22-23 ©
Kinematics
Empreendedores criativos que querem mudar
nosso mundo
Blocos de montar para a era digital
Brinquedos são bons sobretudo quando estimulam a fantasia. E são melhores ainda quando as crianças se divertem ao
montá-los e podem continuar a desenvolvê-los de acordo com suas próprias ideias. Os fundadores da empresa alemã
Kinematics deram vida aos blocos de montar com seus TinkerBots. A peça central é o chamado “Power Brain”, um cubo
vermelho dotado de sensores que comandam articulações, garras e motores. Todos os módulos são conectados sem fio
e simples de montar. Os robôs prontos aprendem a executar sempre novos movimentos, e as crianças se transformam
em pequenos pesquisadores curiosos. O brinquedo adequado para a geração digital de amanhã.
23
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© Vitameter
Juntos somos (mais) inteligentes
Compartilhar ideias, trocar apontamentos, apoiar-se mutuamente – a maioria dos alunos sabe que estudar em conjunto
é mais eficaz do que ruminar sozinho entre quatro paredes. Os criadores do BrainShare, um aplicativo educacional
da Uganda, transferem esse princípio para o mundo digital. Sua plataforma online de mídia social mostra que pode ser
­divertido estudar em grupo e possibilita um compartilhamento simples de conteúdos didáticos, quer se trate de apontamentos individuais, artigos ou vídeos. Quando alunos, professores e pais se encontram numa sala de aulas virtual,
­ninguém fica sozinho – uma inovação social da qual todos podem se beneficiar.
Estar sempre presente
© iStock
Estar sempre presente
Conferindo as vitaminas
A falta de vitaminas nos deixa mais vulneráveis para doenças – isto todos nós sabemos. O que todo mundo também
sabe é que vitaminas em excesso podem ter efeitos negativos sobre a nossa saúde. Não seria prático, então, se pudéssemos avaliar nós mesmos nosso estado vitamínico? Graças aos inventores canadenses do Vitameter, isto já é possível.
­Utilizando descobertas da nanotecnologia e com a ajuda de biosensores, o aparelho faz a avaliação do nível vitamínico
do usuário em questão de poucos minutos, permitindo-lhe assim compreender melhor seu próprio organismo, revisar
seus hábitos alimentares e, no fim das contas, viver de uma forma mais saudável.
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© Cityflo
Novos conhecimentos em tempo recorde
Quem já não desejou alguma vez poder assimilar o conteúdo de livros inteiros no mais curto espaço de tempo? Os
­fundadores da startup berlinense Blinkist transformaram esse desejo numa brilhante ideia de negócios. Em vez de ter
que passar horas a fio lendo centenas de páginas, as ideias centrais de mais de 1.000 livros técnicos podem ser lidas
­comodamente em apenas poucos minutos nos intervalos livres, por meio de um aplicativo no smartphone, em um tablet
ou em qualquer browser. Uma solução ideal para todos os que têm de adquirir rapidamente sempre novos conhecimentos e querem aproveitar os muitos momentos livres enquanto estão indo de um lugar para outro.
Estar sempre presente
© iStock
Estar sempre presente
Na rota certa
Muitas vezes, as ideias mais simples são também as melhores. Como é possível desafogar o notoriamente sobrecarregado sistema de transporte público urbano na metrópole indiana de Mumbai? Jerin Venad, especialista indiano
em TI e fundador da iniciativa Cityflo, tem a resposta: com miniônibus particulares que fazem os principais percursos,
ofere­cendo uma alternativa real para os que viajam regularmente de casa para o trabalho. Através de um aplicativo,
os p
­ assageiros podem reservar assentos e comprar passagens, e os percursos podem ser consultados no Google Maps.
Com o que fica, mais uma vez, provado que não é preciso reinventar a roda, basta utilizá-la da forma certa.
27
Antecipar o futuro
Criar movimento e fornecer energia
Nós promovemos mudanças – abertos para o novo e com a ­curiosidade do
pesquisador, pensamos de forma visionária e muito além do ­presente.
Riqueza de ideias caracteriza tanto nossos produtos e processos como o rela­
cionamento com nossos semelhantes. Porque nada é tão bom
que não possa ser melhorado.
30
Tecnologia
Qual é o seu papel na solução
de desafios globais?
38
Cinco países, um futuro?
Como novas tecnologias influem
na vida de pessoas em diferentes culturas
48
A todo vapor
Como funcionarão as usinas do futuro
52
Megacidades criativas
Como cidadãos podem participar ativamente
do desenvolvimento da sua cidade
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Especialistas são insubstituíveis
Apresentamos quatro pessoas
que trabalham em nossa empresa
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Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
Tecnologia
Texto Luciana Ferrando, Björn Lüdtke
Em todas as partes do nosso planeta, vemo-nos
confrontados com desafios que temos de enfrentar.
Que papel a tecnologia pode desempenhar na
sua solução? Ou compete a nós mesmos, ao fim e
ao cabo, superar esses desafios? Três diferentes
abordagens do tema
Tecnologia por dentro: sala de servidores
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31
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
“O homem e a máquina” —
quem precisa de quem?
­ elhor t­ ransmissão de conhecim
mento. “­Porém, em áreas sensíveis,
é uma vantagem quando máquinas agem de forma autônoma, por
exemplo, em missões no espaço”.
Mas, mesmo nesses casos, é necessária uma coope­ração entre humanos e máquinas, pois os homens têm
que interpretar os dados coletados
por computadores no espaço.
Nos FabLabs, por outro lado, o foco
se encontra na curiosidade e na
criatividade humana. Nas oficinas
hightech espalhadas pelo mundo,
­todos podem experimentar os mais
novos equipamentos, como impressoras 3D ou cortadoras a laser. O objetivo? Ter a tecnologia nas próprias
mãos, entendê-la melhor e usá-la
para as próprias finalidades.
Outra vantagem tecnológica que já
se tornou indispensável é a ajuda no
Texto Luciana Ferrando
32
Em sua opinião, o computador atual
estaria sendo muito idealizado. Ele
seria mais rápido e exato que o ser
humano e nunca se cansaria. “Como
se as máquinas fossem independentes e concorressem com os humanos”,
complementa Villaplana. Entretanto,
computadores têm desvantagens
em relação ao homem: não possuem
espontaneidade. Eles precisam de
modelos e comandos claros, que determinam o caminho a ser seguido.
“Computadores são excelentes na
hora de seguir instruções, mas são
terríveis quando se trata de improvisar”, constata Nicholas Carr em
um artigo no jornal The New York
­Times. “Seus talentos terminam nos
limites de seus programas. Já as capacidades humanas não conhecem
essa limitação”.
Para a pesquisadora de design Andrea Augsten, o maior desafio é
transferir do analógico para o digital
aquilo que faz do ser humano um
ser humano. “Quando trabalhamos
juntos em um workshop, sorrindo e
trocando ideias, essa energia está
no ar. Mas ela se perde assim que
cada um volta para seu computador”,
diz a especialista. “Nós tentamos
preservar essa recordação de forma
digital, mas ela só pode ser documentada em um canal, com imagens,
por exemplo”. Para ela, fatores como
experiência de vida ou inteligência
emocional têm um papel importante.
“O conhecimento tácito, aquilo que
não sabemos expressar com palavras
e que simplesmente carregamos dentro de nós, não pode ser reproduzido
de forma digital”.
Na abordagem de pesquisa “Affective Computing”, que se ocupa de
computadores e emoções, houve resultados surpreendentes: emoções
podem ser lidas nos rostos através
de um software. Em 2013, um estudo da Universidade da Carolina
do Norte mostrou como um software
treinado foi capaz de reconhecer expressões faciais e associá-las a termos
como “frustração” ou “motivação”.
Esse software deverá ajudar profes­
sores em seu trabalho pedagógico.
Para Álvaro Villaplana, todavia,
apenas a combinação de capacidades humanas e técnicas pode trazer
um progresso real. Na área educacional, o homem, para ele, ainda se
encontra no centro e a informática
seria uma ferramenta para uma
mos”. Pelo contrário. Segundo ela,
os seres humanos devem continuar
a almejar uma otimização de sua
relação com a tecnologia. O desenvolvimento da robótica para os cuidados de enfermos/idosos ou na indústria automobilística, por exemplo,
mostraria claramente como máquinas podem facilitar nossa vida se forem controladas por nós. Porque o
homem pode reagir a imprevistos,
enquanto as máquinas somente sabem seguir regras.
Cotidiana, próxima e sempre intensa: a relação do homem com a
tecnologia está hoje tão presente
em sua vida como seus relacionamentos interpessoais. Entretanto,
o homem é indispensável também
para as máquinas, já que é ele que
as cria, as programa ou, quando necessário, puxa a sua tomada.
Impressoras 3D: em breve cotidianas?
Página 30-31 © iStock Direita © iStock
R
esponder à voz suave do
sistema de navegação, ficar
zangado com o smartphone
ou confundir ruídos com toques de
telefone – essas coisas não são mais
vistas como comportamento estranho,
e sim mostram como cresce nossa familiarização com equipamentos técnicos. A tecnologia se tornou algo trivial, que faz parte de nosso dia-a-dia.
Máquinas assumem muitas de nossas
tarefas e já tem gente com medo de
que não demorará muito para o ser
humano se tornar supérfluo. Será que
isso realmente poderia ocorrer?
Na era da digitalização, as pessoas
muitas vezes se esquecem de que são
elas mesmas que se encontram por
trás desse desenvolvimento. Em meados do século XVIII, “computador“
era uma pessoa que fazia cálculos e
resolvia questões matemáticas complexas ou fazia análises numéricas.
“Sem pessoas como Alan Turing, que
inventou o computador, ou Gottfried
Wilhelm Leibniz, que criou o sistema
de numeração binário, não teríamos
hoje máquinas quase tão geniais como
seus construtores”, diz Álvaro Villa­
plana, filósofo da tecnologia nas universidades de Madrid e Costa Rica.
armazenamento de conhecimentos.
Estudos comprovam que aqui o homem e a máquina se complementam
bem. “O que acontece com os recursos liberados no cérebro quando
dados são salvos externamente?” foi
o que questionaram, no final de 2014,
Ben Storm e Sean Stone, do Memory
Lab da Universidade da Califórnia.
“O armazenamento digital de dados
que, de outro modo, teríamos que
guardar na cabeça, facilita o aprendizado de novas informações”, escreveram os pesquisadores no jornal
Psychological Science. As pessoas
eram capazes de gravar melhor palavras de um arquivo PDF quando sabiam que poderiam salvar o arquivo.
Na opinião de Andrea Augsten, não
haverá um futuro “em que seremos
controlados por máquinas e não
saberemos mais pensar por nós mes-
33
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
“Não há volta” —
uma entrevista sobre tecnologia
com o autor Michael Lind
Texto Björn Lüdtke
E
m todos os tempos, as pessoas
tiveram e têm determinadas
concepções de como poderia
ser o futuro. Nos anos 60, por exemplo, elas imaginavam que na segunda
década de 2000 estaríamos voando
para nossas colônias na Lua em naves
espaciais.
Como sabemos, esse não é o caso.
Em compensação, carregamos no
bolso ou na bolsa telefones celulares
que são computadores com uma capacidade de processamento completamente utópica naquela época. De
uma forma ou de outra, novas técnicas e tecnologias desempenham um
papel decisivo na maioria das visões
do futuro.
Procuramos descobrir qual é, exatamente, esse papel na entrevista a
­seguir com o autor Michael Lind.
Além de autor, Lind é cofundador da
“New America”, uma organização
que se empenha junto a tomadores
de decisão em prol, entre outras coisas, de uma reorientação da política
dos Estados Unidos na era digital.
34
Hoje, novas tecnologias são frequen­
temente chamadas de disruptivas, ou
seja, elas provocam mudanças fun­
damentais no mercado e no compor­
tamento dos consumidores. Elas são
mesmo tão inovadoras assim?
Sim. Mas, em minha opinião, hoje
em dia muitas tecnologias são frequentemente categorizadas de forma
errônea. A grande maioria dessas
chamadas inovações disruptivas são,
na verdade, tecnologias revolucionárias que já foram desenvolvidas
em meados do século 20 e hoje estão,
em essência, apenas sendo aperfeiçoadas ou utilizadas de uma forma
mais ampla.
Tomemos, por exemplo, a automatização de automóveis, a utilização crescente de tecnologias da informação e
comunicação nas mais diversas áreas,
ou as mídias sociais – as técnicas em
que se baseiam já foram em parte desenvolvidas na década de 30.
Muitas das atuais inovações não são
tecnologias realmente transformadoras, que provocam mudanças radicais.
Um exemplo: a invenção do motor
elétrico equivale ao desenvolvimento
do computador entre os anos 40 e 80.
A eletrificação das cidades e áreas
­rurais equivale ao desenvolvimento
da internet nos anos 90 e 2000. E os
aplicativos de hoje equivalem aos
programas de rádio e televisão, que
só se tornaram possíveis com a expansão da rede elétrica. Nem a rede
televisiva e nem tampouco um aplicativo nas mídias sociais são tecnologias inovadoras – totalmente ao contrário do motor elétrico.
Sendo assim, o senhor diria que
existe de fato uma revolução digital?
Existe, sim, porque os verdadeiros
ganhos de produtividade e as mudanças reais na sociedade não resultam
do desenvolvimento inicial de chamadas tecnologias de base ou tecnologias pioneiras como a máquina a
vapor, o motor elétrico ou o computador. A verdadeira transformação resulta da aplicação dessas tecnologias
em vários setores que já existem.
Esses setores são velhos ­conhecidos:
a indústria, a agricultura, o comércio
varejista, o setor de lazer, etc. A transformação em nossa ­sociedade existe,
mas não devemos sobrestimar o número de tecnologias transformadoras.
O senhor acha que, de um modo
geral, colocamos esperanças demais
em novas tecnologias?
Sim, sobretudo nos Estados Unidos,
não tanto em outros países como
a Alemanha, por exemplo. Há um
enfoque demasiado em tecnologias
disruptivas. Dá-se muito pouca importância à utilização mais ampla de
tecnologias já desenvolvidas – pelo
menos no que toca as políticas públicas. E, no entanto, são precisamente
elas que conduzem aos verdadeiros
ganhos de produtividade e a uma
melhora da nossa qualidade de vida.
Vez por outra surgem setores que
são de fato novos. Mas, na grande
maioria das vezes, a tecnologia apenas transforma setores conhecidos há
muito. Com o motor de combustão
veio, por exemplo, a mecanização
agrícola: o trator substitui o cavalo e
o homem. Continua sendo agricultura, só que mais produtiva.
Existe um movimento chamado
­ Maker Movement», que propaga
«
que as pessoas voltem a fazer elas
mesmas muitas coisas. O senhor
acredita que o faça você mesmo é
uma possibilidade de solucionarmos
alguns dos nossos problemas, como
a subnutrição ou o suprimento de
energias renováveis?
Em uma palavra: não. Sou um grande
entusiasta do Maker Movement, e
creio que é bom para uma sociedade
que as pessoas não comprem tudo
simplesmente em lojas. Nos Estados
Unidos, essa tradição já existe há
muito: lojas de bricolagem oferecem
ferramentas com as quais as pessoas
constroem suas próprias estufas nos
fins de semana. Isto é bom, e eu acredito que este processo será acelerado
por máquinas para a produção rápida de elementos de construção padronizados, o chamado Rapid Proto­
typing. Porém, é utópico acreditar
que a eficiência econômica da produção em massa possa ser substituída
por impressoras 3D na garagem. Faz
sentido, e continuará fazendo, fabricar em massa produtos como automóveis ou aviões.
Desde os inícios da revolução industrial existe a esperança de que
possamos retornar a uma sociedade
pré-urbana, rural, mas equipados
com novas ferramentas. Não conseguimos isso até agora, e eu pessoalmente também creio que jamais
conse­guiremos.
No seu ver, a complexidade da vida
atual causa apreensão às pessoas?
Sim, penso que sim. No meu ver,
existe aí uma discrepância: eu acredito que, tradicionalmente, o ser humano funciona em pequenos grupos,
que não exigem uma grande competência científica ou técnica. Mas a
realidade é que vivemos em estados
que têm fronteiras e em grandes comunidades como a União Europeia.
Isso não só é uma nova experiência
para o ser humano, eu também acredito que, de uma certa forma, isso
é contra a nossa natureza. Os seres
humanos querem viver como vivem
os chimpanzés, nas florestas, em pequenos grupos. No entanto, estamos
rodeados de um bulício constante,
como se vivêssemos num formigueiro.
Isso tem, forçosamente, de gerar toda
sorte de problemas sociais e políticos.
Entretanto, chegamos a um ponto no
qual não há mais volta. Não é possível alimentar dez bilhões de pessoas
com produtos produzidos localmente
com a ajuda de energia elétrica solar.
Os alemães estão tentando fazer isso
no momento, mas não funciona.
Um dilema: a situação atual causa
apreensão a muitas pessoas, e
mesmo assim confiamos mais e mais
na tecnologia – basta olhar os mer­
cados financeiros, ou os pilotos auto­
máticos em aeronaves, que assumem
cada vez mais funções.
Eu diferenciaria entre tecnologia e
técnica. A tecnologia é a máquina
propriamente dita, a técnica é a utilização dessa máquina. A maioria
desses exemplos de tecnologia são,
na verdade, técnicas. Nos anos 90,
antes dos Estados Unidos desregularem o setor financeiro, por exemplo,
utilizava-se a mesma tecnologia que
nos anos 2000, ou seja, depois da
desregulação. O que mudou foram
somente as condições legais.
No fundo, temos completa liberdade
quando se trata de estruturar as coisas.
É como com as pessoas que pensam
que rejeitam a tecnologia. Quando, na
verdade, o que elas rejeitam são determinadas condições sociais, políticas
e legais. Pouco importa que ferramentas usamos. Há custos e há benefícios,
tudo é uma questão de ponderação –
mas, no fim das contas, está em nossas
mãos dar à sociedade a forma que
queremos que ela tenha.
Michael Lind
Autor estadunidense que já trabalhou
para o jornal “The New Yorker”, entre outros. Lind é cofundador do think
tank “New America”.
35
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
“Um empurrãozinho na direção certa” —
nudging como alternativa para soluções
técnicas?
Nudging Network, fundada em 2010
pelo dinamarquês Pelle Guldborg
Hansen, realizou o seguinte experimento: pequenas placas ao lado dos
interruptores de luz de uma universidade chamavam a atenção para o fato
de que 85 por cento dos estudantes
apagavam a luz quando deixavam o
recinto. Isto fez com que a luz permanecesse acesa com menos frequência
(uma redução de 20 a 26 por cento,
no total) – resultando em economia
efetiva de energia.
Nos EUA também se usa o empurrãozinho: na quente Califórnia, é
natural que os cidadãos liguem seu
ar condicionado quando há ondas
de calor. Em resultado disso, os colapsos do suprimento de energia
Texto Björn Lüdtke
36
vações sociais são novas abordagens
para satisfazer necessidades sociais.
Exemplos conhecidos são comércio
justo, microfinanciamentos, bancos
de horas de trabalho, moedas comunitárias e apps móveis para a organização de grupos de carona.
Como as pessoas
podem ser estimu­
ladas a ter um com­
portamento mais
social?
Uma nova abordagem em termos de
inovação social é o chamado nudging,
que em inglês significa “dar um empurrãozinho”. Trata-se de uma abordagem que se ocupa da questão de
como se pode estimular as pessoas a
ter um comportamento mais social e
produtivo, sem restringir sua liberdade de escolha.
A teoria dos nudges diz que um feed­
back positivo ou estímulos indiretos –
em outras palavras, um toque ou um
empurrãozinho – influenciam grupos
ou indivíduos de forma tão ou mais
efetiva do que instruções diretas, leis
ou coerção.
Os chamados nudges são frequentemente utilizados como alternativa
para soluções técnicas. Um hotel na
Dinamarca, por exemplo, colocou
maçãs na vitrine de um bufê sob um
cartaz na parede com o velho ditado
popular segundo o qual “uma maçã
por dia mantém o médico longe”
para estimular os participantes de
um congresso a viver de forma mais
salutar. Os hóspedes começaram a
preferir o lanche saudável a um pedaço de bolo ou um chocolate, e o
hotel se viu obrigado a ampliar sua
oferta de frutas. A alternativa técnica? Desenvolver mais produtos
dietéticos ou gastar mais dinheiro
no setor de saúde. Estimular as pessoas a levar uma vida mais saudável
da forma descrita acima, porém, é
uma solução muito mais sustentável
e econômica.
Os nudges também podem ser um
meio simples e proveitoso de estimular as pessoas a economizar energia.
A associação de pesquisa Danish
Clássico do nudging: um toque para apagar a luz
© iStock
E
m todas as partes do nosso
planeta, vemo-nos confrontados com inúmeros desafios:
agricultura não sustentável, mudança
climática, alto consumo de energia,
envelhecimento da população e aumento dos custos no setor de saúde
são apenas os mais urgentes. Com
mais e mais frequência, as abordagens tradicionais falham na tentativa
de solucionar esses complexos problemas. Na maioria dos casos, instrumentos estatais ou puras soluções de
mercado não bastam. Por isso, inovações sociais são vistas, mais e mais,
como complemento ou alternativa
para soluções tradicionais e na maioria das vezes técnicas de problemas.
E, no entanto, ainda não existe uma
definição clara do que são inovações
sociais. As discussões sobre esse
conceito são longas e numerosas. No
fundo, porém, trata-se simplesmente
do seguinte: cada um faz a sua parte
para produzir mudanças positivas
para si próprio e seus semelhantes.
O que mais distingue as inovações
sociais das tecnológicas é que elas
objetivam a mudança de determinadas práticas sociais e dão menos valor
à introdução de novos produtos. Ino-
energia responsável, foram economizados 2,8 terawatts-hora de energia
elétrica desde 2007.
Na frequentemente fria Grã-Bretanha, o problema é precisamente o
contrário. Lá, muito calor (e portanto
energia) sai pelo telhado. Para fazer
com que as pessoas baixem a temperatura da calefação em suas casas –
e, assim reduzir a emissão de CO2 –,
o governo britânico tentou estimular
os cidadãos a isolar seus telhados
oferecendo-lhe subvenções. Mas o
plano não funcionou, os pedidos de
subvenção ficaram muito aquém das
expectativas. Por quê? Acabaram
descobrindo que as pessoas se esquivavam de uma reforma porque a
maioria dos sótãos estavam repletos
elétrica se tornaram cada vez mais
frequentes. Psicólogos tiveram a
ideia de informar os habitantes qual
o seu consumo de energia elétrica
em comparação com seus vizinhos, e
as contas de luz seguintes passaram
a vir com smiley faces, conforme a
quantidade de energia economizada.
Segundo a Opower, a empresa de
de tralhas. P
­ assaram então a oferecer não só sub­sídios financeiros ao
isolamento, como também a remoção
gratuita dos trastes. O resultado: os
pedidos de subvenção triplicaram.
A ideia de arrumar os sótãos partiu do
primeiro “Behavioural Insigths Team”
do mundo, um time de especialistas
criado pelo governo britânico em
2010 para aplicar na prática os insights das ciências comportamentais
em geral e a teoria dos nudges em
especial. O objetivo do time é ajudar
as pessoas a tomarem decisões que
são melhores para elas.
A primeira tarefa do time consistiu
em aumentar a arrecadação de impostos. Como? Em vez de avisar os
contribuintes de que ainda estavam
em dívida com o fisco, eles eram informados de que a maioria dos moradores de sua cidade já estava com
seus impostos em dia. Uma simples
reformulação do texto bastou para
aumentar a arrecadação em 200 milhões de libras esterlinas – e isso sem
causar custos adicionais.
Todos esses são pequenos estímulos que podem ter um grande efeito.
A intenção do nudging não é proibir,
e sim permitir que a pessoa decida
livremente – mas direcionando sua
escolha. A linha que separa o nudging da manipulação, todavia, é tênue, e assim não surpreende que ele
também seja objeto de críticas.
De acordo com a teoria, um empurrãozinho só é um nudge quando influencia o comportamento de pessoas de
forma previsível, sem proibir a escolha
de outras opções. Nem toda intervenção que influencia alguém que decide
livre e racionalmente é um nudge.
Nudges não impõem incentivos – positivos ou negativos. Se aproveitar-se de
sentimentos de vergonha para dar um
empurrãozinho ainda pode ser considerado neutro, certamente é um aspecto merecedor de discussão. Outro
ponto questionado é se a mudança de
comportamento é duradoura.
Apesar de todas as críticas, o nudging
pode produzir mudanças positivas
de comportamento em indivíduos
e em grupos inteiros. Muitas vezes,
nudges são alternativas baratas para
soluções técnicas dispendiosas. Se
­forem utilizados com bom senso e
tato, cada um de nós pode ser estimulado a mudar o mundo – empurrãozinho por empurrãozinho.
37
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
Cinco países,
um futuro?
C
Texto Björn Lüdtke, Yuki Sato, Ellen Lee, Angela Gruber, Luciana Ferrando, Raouia Kheder
Robôs jogando futebol
38
Esquerda © Jiuguang Wang / Flickr (CC BY-SA 2.0) Direita © HUISTEN BOSCH
Como novas tecnologias influem na vida de pessoas
em diferentes culturas
omo em todas as edições
da revista Futuro, damos
uma espiada em cinco países do mundo. Queremos ver onde
estão as diferenças, mas também
os pontos comuns. Desta vez, focamos nos novos desenvolvimentos
tecnológicos.
Quais são as peculiaridades culturais na proliferação e na aceitação
da tecnologia na respectiva cultura?
Qual a importância assumida por ela
no Japão, nos EUA, na Alemanha,
na Argentina e na Tunísia e qual
seu lugar no cotidiano de cada um
desses países?
Começamos com nossa repórter Yuki
Sato, no Japão. Os japoneses têm a
fama de serem especialmente abertos para inovações técnicas. Isso
é mesmo assim ou trata-se simplesmente de um clichê? E quais são as
expectativas depositadas em robôs?
Também os EUA estão sempre bem à
frente quando se trata de novas aplicações. Segundo Ellen Lee, isso poderia ter a ver principalmente com o
espírito pioneiro rebelde dos americanos. Lá, ela encontra uma cultura que
“incentiva quem tem a coragem de
enfrentar riscos e recompensa quem
faz coisas inteligentes”.
Já os alemães têm a imagem de céticos em relação a novas tecnologias –
e isso apesar da Alemanha ser o país
dos inventores e pensadores. Essa
imagem é justificada? Angela Gruber
busca responder essa pergunta.
Luciana Ferrando dá uma olhada na
situação na Argentina, onde as novas
tecnologias têm um papel mais importante no dia-a-dia do que talvez
possamos imaginar. Isso já começa na
educação das crianças e se deve principalmente a um programa estatal.
Raouia Kheder tenta esclarecer porque que na Tunísia as novas tecnolo­
gias – com exceção de tecnologias
de informação e comunicação – têm
tanta dificuldade de se estabelecer.
E o motivo não parece se encontrar
na população.
Robôs na recepção de um hotel
Japão
— Robôs com alma
No verão de 2014, a companhia
­japonesa de telecomunicações Soft­
Bank apresentou ao público o robô
humanoide “Pepper”. Pepper tem um
corpo similar ao humano, dois olhos
que piscam para transmitir emoções
e uma grande missão: ele deve fazer
pessoas felizes através da “leitura”
de suas emoções. Turistas podem
ficar surpresos quando são atendidos
por robôs humanoides em algumas
lojas ou hotéis no Japão, mas para os
japoneses isso tem se tornado algo
cada vez mais trivial.
É claro que aqui ainda não se vê robôs andando pelas ruas – isso é mais
um clichê. Mas, ainda assim, robôs
com semelhança com os humanos parecem assumir cada vez mais tarefas.
Por que essa tão grande abertura no
Japão para esse tipo de tecnologia?
Um motivo pode ser a alta impor­
tân­cia que se dá a valores seculares
e racionais, ao contrário dos valores
tradicionais relacionados à família, à
comunidade local ou à religião. Em
uma sociedade assim, prefere-se con-
fiar na técnica a pedir ajuda à família ou à comunidade.
Segundo Shunsuke Aoki, CEO da
Yukai Engineering, uma empresa de
Tóquio que produz gadgets e brinquedos digitais interativos, seus
clientes dão preferência a produtos
que apresentem a forma de bonecos
ou figuras. Um de seus produtos é
“Bocco”, um robô para famílias, que
cuida para que parentes que vivem
distantes permaneçam sempre em
contato. Ele tem a aparência de um
yokai, uma figura sobrenatural fol­
clórica japonesa.
Aoki acredita que os yokais desempenham um papel importante na
postura dos japoneses em relação
a robôs. “Desde a Idade Média, os
japoneses creem que coisas muito
utilizadas, como uma xícara ou um
prato, também possuem uma alma e
podem se transformar em um yokai.
Essa cultura ainda continua a influenciar a interação das pessoas
com as coisas.”
A expectativa de ter robôs como
ajuda ativa no dia-a-dia parece fazer
cada vez mais parte da sociedade japonesa moderna. A empresa pública
de pesquisa e desenvolvimento “New
Energy and Industrial Technology
39
Óculos de RV Oculus Rift
Development Organization“ prevê
para o mercado interno de robôs industriais e privados um crescimento
de 1,6 trilhões de ienes em 2015
para 9,7 trilhões de ienes em 2039.
Essa tendência é reforçada em muitas
cidades de pequeno e médio porte
pelas mudanças demográficas. O órgão de gestão de saúde de Nanto,
por exemplo, utiliza para fins terapêuticos um robô em forma de foca
chamado Paro, que teria um efeito
calmante sobre pacientes. Após uma
fase de testes bem-sucedida, a administração municipal decidiu empregá-lo para ajudar famílias que precisam
cuidar de membros idosos. A população de Nanto caiu nos últimos 25 anos
em 20 por cento para 55.000 habitantes, sendo que as pessoas com mais
de 65 anos representam 34 por cento,
30 por cento acima da média japonesa.
A queda da população e o envelhe40
cimento da sociedade são desafios
que estão sendo enfrentados por
muitas cidades japonesas – o que faz
crescer as expectativas depositadas
nos robôs.
EUA
— Abertos para o
novo
Uma máquina de lavar que avisa
por SMS quando a roupa está pronta.
Um carro que anda sem precisar de
motorista. Óculos de realidade virtual, com os quais se pode jogar
pingue-pongue sem raquete e bola.
Na proliferação e na aceitação de
novas tecnologias, os Estados Unidos
sempre estabelecem novos padrões.
Mas de onde vem uma cultura tão
aberta assim para o novo? Essa cultura se encontra profundamente ancorada em uma sociedade que ainda
hoje admira os rebeldes e aventureiros. Vemos isso na cultura popular
americana, do rock ’n’ roll a Hollywood. Ou nas recordações do faroeste.
Ou mesmo na história orgulhosa de
imigrantes, entre eles grandes luminares da técnica, como Elon Musk da
Tesla ou Sergey Brin da Google.
“Imagine como deve ter sido quando
a América foi povoada por imigrantes europeus. Eles tiveram que ser
bastante criativos e aventureiros só
para conseguirem chegar até aqui”,
diz Lee Rainie, diretor de estudos de
internet, ciência e tecnologia no Pew
Research Center em Washington, D.C.
“Isso gerou uma certa cultura, que
incentiva quem tem a coragem de enfrentar riscos e recompensa quem faz
coisas inteligentes”.
Segundo um relatório da “Information Technology and Innovation
Foundation”, um think tank sem fins
lucrativos em Washington, D.C., a
inovação tecnológica americana baseia-se também em um interesse
profundamente arraigado dos norte-americanos em fazer eles mesmos,
inventar e aperfeiçoar coisas. “Em
combinação com uma marcante cultura de individualismo, isso facilita
o questionamento de práticas institucionalizadas – tanto faz se se trata
de Steve Jobs ou de um operário em
uma fábrica”, constata o relatório.
Mas há também os que alertam sobre
uma cultura que só anda obcecada
pela próxima inovação. O “American Enterprise Institute”, outro think
tank em Washington, D.C., chama
a atenção dos norte-americanos para
que não se percam na “fascinação
da ideologia tecnológica”. Isso prejudicaria a ética e as virtudes de uma
sociedade. Pelo menos tem surgido
ultimamente uma preocupação com
a dependência da técnica – principalmente de smartphones – e com a
© iStock
Antecipar o futuro
© Kārlis Dambrāns / Flickr (CC BY 2.0)
Antecipar o futuro
forma como ela interfere na interação entre nós, seres humanos.
Teme-se, além disso, que os EUA
­percam o fôlego na área de inovações. Por um lado, acusa-se as empresas de desenvolverem apenas
produtos para um pequeno grupo
privilegiado de pessoas, ignorando
problemas maiores e mais urgentes, como a pobreza e o aquecimento
global. Por outro lado, E
­ amonn
Fingle­ton, por exemplo, o autor de
In the Jaws of the Dragon: America’s
Fate in the Coming Era of Chinese
Dominance (Nas garras do dragão:
o destino americano na futura era da
dominância chinesa), adverte que
empresas chinesas registraram nos
últimos anos mais patentes técnicas
do que empresas estadunidenses.
Ainda assim, o desenvolvimento técnico no país continua a ser extremamente veloz. Um bom exemplo são
os óculos de realidade virtual Oculus Rift. O primeiro protótipo desses
óculos foi criado em 2012 por um jovem de 20 anos de idade que era entusiasmado por games, gerando uma
verdadeira corrida entre os gigantes
tecnológicos Sony, Microsoft e Google: qual deles conseguiria lançar o
primeiro produto de realidade virtual
para o mercado de massa? No ano de
2014, Facebook comprou a empresa
Oculus VR.
A mais nova versão dos óculos foi
apresentada no ano de 2015, junta­
mente com um jogo de pingue-pongue virtual, que pode ser jogado
por pessoas que se encontram até
mesmo a milhares de quilômetros
de distância uma da outra. “Acredito que vi em toda minha vida
cinco ou seis demonstrações na área
de computação, das quais pensei
em seguida que elas iriam mudar
o mundo”, diz Chris Dixon, um dos
investidores do Oculus Rift, à revista Wired Magazine. “Apple II,
Net­scape, Google, iPhone – e agora
Oculus, que faz parte da mesma incrível categoria”.
Alemanha
— Inventores e
pensadores
Quem chega à Alemanha e quer usar
a internet, tem que começar perguntando por senhas. Enquanto que em
outros países se pode entrar em uma
rede WLAN aberta em qualquer café,
as redes na Alemanha são protegidas.
pode-se comprar lâmpadas controladas por um aplicativo. A digitalização chega cada vez mais ao centro da
sociedade.
Os alemães adoram a técnica, a eficiência e a utilidade dos aparelhos
modernos. Ao mesmo tempo, eles
questionam inovações como poucos
de seus vizinhos. E isso não é uma
contradição, por mais que pareça.
“Pelo fato do novo atrapalhar processos com os quais já estamos familiarizados, ele não só é visto muitas vezes
Engenheiros alemães em ação
O motivo é a legislação vigente: se
uma pessoa abusar do acesso à rede,
o proprietário da conexão pode ser
responsabilizado por isso.
Ao mesmo tempo, o país é pioneiro
no que diz respeito à energia verde:
em todos os cantos se vê turbinas
eólicas e usinas hidrelétricas, carros
elétricos não são mera utopia. Os
alemães investem em tecnologia
também dentro de suas casas. Empresas de automação residencial
bem-sucedidas são o melhor exemplo,
como a Tado, uma startup de Munique, com seu sistema de aquecimento
inteligente. Até na Ikea, a loja de
móveis e decoração preferida no país,
como inútil, mas também como incômodo”, critica a autora Kathrin Passig
em seu texto “Situações-padrão da
crítica à tecnologia”. O exame crítico do que é novo antes de integrá-lo
no cotidiano é algo típico especialmente na Alemanha: um novo aparelho ou uma nova técnica têm primeiro
que provar seu valor agregado. Portanto, mesmo que os alemães sejam
altamente exigentes com inovações
técnicas, eles, no final das contas,
cami­nham em direção ao progresso
de uma forma mais consequente que
a maior parte das outras nações.
Enquanto que em outras nações se
aceita sem nenhuma preocupação
41
Antecipar o futuro
os termos e condições de empresas
internacionais como Facebook ou
Skype, uma pesquisa realizada pelo
portal Statista no ano de 2014 mostra
que os alemães também reconhecem
o potencial de vigilância e espionagem representado pela técnica – as
revelações do whistleblower Edward
Snowden contribuíram para isso. E
em nenhum outro país europeu elas
causaram tanta indignação.
Mas pesquisas indicam também que
a imagem do alemão como avesso
a novas técnicas não é de forma alguma justificada. Numa pesquisa
de 2014, um terço dos entrevistados disse não poder mais imaginar
uma vida sem smartphones. E 47 por
cento acham extremamente interessante como as possibilidades técni-
Antecipar o futuro
cas têm se multiplicado no âmbito da
digitalização.
Numa comparação com outros países
da Europa, os alemães são mais críticos em relação a inovações técnicas
que seus vizinhos e não partem logo
cheios de entusiasmo para cima de novos “brinquedos tecnológicos”, afirma
o tecnosociólogo Johannes Weyer,
de Dortmund, em um estudo sobre o
assunto. Mas, segundo ele, os dados
mostram que os alemães se encontram
bem próximos da média europeia.
No setor de novas mídias, as grandes
criações – como o novo smartphone
ou o app mais quente – vêm mais da
área anglo-saxônica. Mas isso não
incomoda os alemães. Como país de
tecnologia altamente avançada, a
Alemanha é líder quando se trata de
Argentina
engenharia e construção de máquinas. Nesses setores clássicos são mostradas sua superioridade tecnológica
e a alta consciência no que diz respeito à qualidade. Aqui a Alemanha
se apresenta incontestadamente como
a terra dos inventores e pensadores.
O foco nessa área essencial faz do
país o motor de inovação mais sustentável da Europa. Os alemães
defenderam também em 2014 sua
liderança no registro de patentes na
União Europeia: foram registradas
quase 32.000 patentes, a maioria delas da indústria. Foram mais registros
do que em qualquer outro país europeu. E talvez isso seja algo típico
­alemão: não falar muito sobre sua capacidade inovadora, mas deixar que
os números falem por si.
— O olhar voltado
o futuro
42
© TECHNIK BEGEISTERT e. V.
© 2009, Intuitive Surgical, Inc.
“Da Vinci”, o sistema de robôs cirúrgicos mais usado no mundo
Excitação e entusiasmo reinaram
na comunidade científica argentina
quando Buenos Aires, a capital do
país, sediou no final de julho de
2015 a Conferência Internacional
Conjunta de Inteligência Artificial
IJCAI. Com 1.200 participantes, a
conferência mais importante do
mundo na área de inteligência artificial foi realizada pela primeira vez
na América do Sul.
A escolha da Argentina não foi mera
coincidência. “É o reconhecimento
e uma comprovação de que a América Latina se encontra na vanguarda
do avanço tecnológico”, afirma Professor Guillermo Simari, presidente
do comitê local de organização da
­IJCAI. “Os argentinos se entusiasmam de imediato com novas ideias
e veem tecnologia como impulsor
do desenvolvimento cultural em todos os setores“, completa Guillermo
Simari.
O motivo para essa abertura é visto
por Guillermo Simari, que também
é diretor do Instituto de Ciência da
Computação & Engenharia da Universidad Nacional del Sur em Bahía
Blanca, nas peculiaridades culturais
dos argentinos. A frase do autor mexicano Carlos Fuentes: “Os mexicanos vêm dos astecas, os argentinos
dos navios” é para ele mais do que
uma citação espirituosa. “A onda
de imigração europeia que chegou
à Argentina no início do século XX
ocasionou uma diferença clara para
outros países latino-americanos”,
constata Guillermo Simari. “Imigrantes desejam que seus filhos recebam
uma boa formação para conquistar
uma melhor posição na sociedade.
Esse impulso recebido de outras culturas nos influenciou positivamente
Participante na Olimpíada Mundial de Robótica
e é hoje parte de nosso modo de ser:
caminhamos para a frente e temos o
olhar voltado para o futuro.”
Isso se reflete também no crescimento do uso de tecnologia e robótica na educação. Hoje em dia, temos
tudo quanto é tipo de aplicações nas
salas de aula. Crianças no ensino
fundamental aprendem a programar,
alunos constroem robôs, computadores fazem parte do equipamento
básico. Tudo começou em 2010 com
o programa estatal “Conectar Igualdad”, que distribuiu 5,4 milhões de
netbooks a estudantes e professores
de nível médio em todo o país.
Até então, netbooks eram um luxo
exclusivo. “Conectar Igualdad abriu
uma janela para o mundo e r­ eduziu
a desigualdade tecnológica na sociedade”, afirma Monika Paves, professora de física e gerente da Robot­
Group Argentina. Sua empresa, que
fabrica robôs para o setor educacional, oferece workshops (também
para professores), atua em projetos
pedagógicos do Ministério da Ciência
e produz kits didáticos de robótica.
“Quando crianças programam, desen-
volvem ideias próprias e veem então
os robôs funcionarem da forma esperada, sua motivação só aumenta”, diz
Monika Paves.
É o mesmo que diz Marcelo De Vincenzi, da Universidad Abierta In­
teramericana (UAI): “Cada vez mais
professores e pedagogos utilizam
a robótica para explicar d
­ isciplinas
científicas básicas. As crianças
aprendem matemática ou física, por
exemplo, enquanto jogam futebol de
robôs”. Há 16 anos, a UAI organiza
as “Olimpíadas Nacionales de Robótica” com a participação de 250 times de escolas de todo o país.
Ou os próprios alunos projetam peças para os robôs e as imprimem em
uma impressora 3D, como é feito
pela professora de informática Alicia Siri com jovens de suas classes.
Até mesmo em casa, Alicia Siri é
fã da técnica. Ela tem um robô-aspirador e controla suas máquinas
de lavar roupa e louça através do
smartphone. As pessoas jovens à sua
volta ficam fascinadas, mas “gente
com idade acima de 45 não enxerga
motivos para gastar dinheiro com
43
Antecipar o futuro
isso”. Já ela mesma entende o uso
de tecnologia como algo que traz uma
melhoria de sua qualidade de vida.
Também por essa razão ela se ­deixou
operar um rim por um robô no Hospital Italiano. Esse hospital, como
também o Hospital El Cruce-Néstor
Antecipar o futuro
são unânimes: talento, ideias criativas e know-how é o que não falta
na ­Argentina. E tendo em vista as
novas gerações, que crescem com as
novas tecnologias, eles estão convencidos de que vai ficar ainda melhor
no futuro!
“Novas tecnologias” significa para a
maioria dos tunisianos unicamente
“internet”. Adultos acima de 40 anos
admitem usar somente aplicações
básicas como e-mail ou Google e não
possuir maiores conhecimentos em
relação a aplicativos, streaming ou
crowdsourcing.
Abdullah, um vendedor de 35 anos,
limita seu uso das novas tecnologias
“Nosso projeto estava à frente de seu
tempo em muitos aspectos, e, sobretudo, estava mais avançado do que os
regulamentos que teriam sido necessários para seu sucesso. Apesar das
pessoas se preocuparem com a segurança, elas se mostraram bem abertas
para o produto. Claro que me refiro
aqui a pessoas abaixo de 35 anos.
Nosso problema foram os regulamentos, que simplesmente não apresentaram a flexibilidade necessária para o
produto que desenvolvemos.”
Tirando esse ceticismo, que já está
mesmo diminuindo, há poucas barreiras culturais – na verdade, somente aquelas relacionadas com
áreas sensíveis como religião e tradição: jogos de azar ou negócios
com ações são coisas malvistas em
muitos países árabes.
O maior obstáculo é o acesso às novas tecnologias. “Não consigo imaginar nenhuma invenção ou tecno­
“E se alguém con­
seguir entrar em
­minha conta?”
Kirchner, ambos em Buenos Aires,
possuem “salas de operação inteligentes” da mais nova geração. “Há
quarenta anos, meu pai ficou de cama
por 15 dias por causa de uma operação semelhante e tinha uma corte de
30 centímetros. O meu foi de somente
três centímetros e já pude voltar à
vida normal após ­quatro dias.”
Outra possibilidade de aplicação de
inteligência artificial, na qual uma
câmera auxilia cuidadores de idosos
em seu trabalho, foi desenvolvida
por Ricardo Rodriguez. Porém, essa
solução nunca foi utilizada na prática. “Não houve investidores para o
projeto. Esse é um problema infelizmente muito comum na Argentina,
já que ainda somos um país em desenvolvimento”. Mas os especialistas
44
Tunísia
— Com vontade de
mais
Com uma taxa de penetração de
53 por cento, a Tunísia ocupa o décimo lugar na África no que diz respeito ao uso da internet. Quase seis
dos onze milhões de tunisianos a
utilizam. Em número de usuários, o
país se encontra até mesmo no 66o
lugar no ranque mundial, segundo
o instituto de pesquisas de mercado
Tunisie Sondage. Isso é notável, mas
não significa que a Tunísia faz jus à
sua fama quando se trata de novas
tecnologias em geral.
Como acontece muitas vezes, a imagem que temos de outras culturas é
impregnada por clichês. Pudemos
esclarecer um ou outro desses clichês
e ficamos sabendo que no Japão os
robôs ainda não fazem parte da vida
cotidiana, como imaginamos. Já na
Argentina, eles já têm há alguns anos
um grande papel na educação.
Os alemães pensam bem antes de
adotar novas tecnologias, mas isso
não significa que não sejam abertos
para elas. Na Tunísia, até que se gostaria de ter esses problemas. Lá, são
circunstâncias externas que impedem
que as novas tecnologias se estabeleçam mais rapidamente.
Somente os americanos fazem jus
à fama de desbravadores rebeldes –
pelo menos em nossa pequena viagem pelo globo – e são vistos com
razão como pioneiros intrépidos no
que se refere a novas tecnologias.
Porém, uma coisa todas as culturas
têm em comum: a técnica faz parte do
dia-a-dia e sua importância cultural
cristaliza-se cada vez mais. Em um
país talvez mais rapidamente que em
outro, mas com a tendência de que os
hábitos quanto ao seu uso se igualem
em todo o mundo. Saber usar a técnica para nosso próprio progresso é
algo que está em nossas mãos.
Os cinco países em comparação
Japão
EUA
Alemanha
Argentina
Tunísia
A.Mesmo antes dos
A.Existe uma preocu-
A.Quase um terço dos
A.71 % dos entrevista-
A.Dois de cada três
entrevistados em
uma pesquisa disse
não conseguir mais
imaginar uma vida
sem smartphones
dos em uma pesquisa não saem de casa sem seu smartphone
tunisianos gostariam de ter um
smartphone
smartphones, os
­celulares “normais”
já tinham função de
internet
pação de que haja
uma dependência
dos smartphones
B.Nas ruas da Califór-
B.Robôs devem ajudar
a cuidar de idosos
em uma sociedade
que envelhece cada
vez mais
C.A técnica também
pode ter uma alma
© iStock
Novas formas de pagamento na Tunísia
a smartphone, internet e Facebook:
“Isso é tudo que posso usar. No mais,
nada é acessível e seguro. É claro
que sei que há outras áreas nas quais
se usam novas tecnologias. A automação residencial é um bom exemplo. E é claro também que essas tecnologias existem na Tunísia, mas não
me sinto bem ao imaginar minha casa
inteira sendo vigiada à distância. E se
alguém conseguir entrar em minha
conta? Com certeza, algo assim pode
funcionar em outros lugares, mas
não na Tunísia”. Esse sentimento de
desconfiança está profundamente
enraizado e tem sua origem em experiências com corrupção – de sistemas
de computadores, de empresas e até
mesmo do governo. Muitos temem
serem vítimas de fraudes ou ataques
de hackers.
Todavia, esse medo vem desapare­
cendo aos poucos nas gerações
mais jovens. Nas cidades, existem
comunidades de geeks de computador entre 20 e 30 anos de idade
que experimentam de tudo: de cloud
computing e streaming até sharing
economy.
Ramzi El Fekih, por exemplo, tentou
provocar uma mudança na postura da
sociedade em relação ao pagamento
por celular com seu projeto “mdinar”.
logia em especial que não seria
aceita”, diz Ramzi El Fekih. “Penso
que na Tunísia as barreiras são mais
de natureza econômica do que cultural. A taxa de câmbio e a falta de
possibilidade de conversão do dinar
bloqueiam bastante o caminho para
o desenvol­vimento e a aplicação
de novas tecnologias. Creio que os
tunisianos aceitariam qualquer tecnologia nova se eles fossem bem
informados e reconhecessem suas
vantagens.”
nia circulam os primeiros carros sem
motorista
B.Smart Homes ga-
nham uma aceitação cada vez maior
C.Os americanos são
muito abertos para o novo e aventureiros
B.Novas tecnologias
B.Robôs são usados
C.O novo tem primeiro
que provar seu valor
na educação
são utilizadas prin­
cipalmente nas cidades
C.Os argentinos veem
a tecnologia como
impulsor do desenvolvimento cultural
C.As gerações mais
jovens estão se
abrindo para as novas tecnologias
A. O uso do smartphone B. Tecnologia no dia-a-dia C. Peculiaridade cultural
45
Antecipar o futuro
46
Antecipar o futuro
47
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
A todo vapor
­ ressão se abre. Movida pelo vapor,
p
a turbina gira com 3.000 ou mais rotações por minuto. Através de um eixo,
essa energia mecânica é transferida
ao gerador, cujo componente principal é um ímã, que, propulsionado
pela turbina, move-se dentro de uma
bobina e produz uma tensão que, por
sua vez, gera a corrente elétrica.
As usinas de carvão atualmente mais
eficientes transformam aproximadamente 46 por cento da energia contida no combustível em energia elétrica. Porém, ainda não chegamos ao
fim do desenvolvimento tecnológico,
comenta o professor Alfons Kather,
diretor do Instituto de ­Engenharia
Energética da Universidade Técnica de Hamburgo-Harburg. “Seria
possível, a médio prazo, uma efi-
Texto Ralph Diermann Ilustração Jan Erlinghagen
Combustível transforma-se em calor, calor vira
movimento e movimento gera energia elétrica —
esse é o princípio de muitas usinas. Cientistas e
pesquisadores da indústria se esforçam para tornar
esse processo ainda mais eficiente
ciência de 50 por cento”, explica o
cientista. O aspecto mais importante:
quanto maiores a temperatura e a
pressão na caldeira, mais energia elétrica se pode produzir com o carvão.
Até agora, os limites se encontram
em uma temperatura de aproximadamente 600 graus e uma pressão de
300 bar, já que valores maiores provocariam um desgaste muito rápido
dos componentes do sistema. Por esse
motivo, a indústria e a ciência estão
desenvolvendo novos materiais mais
resistentes à base de níquel, que deverão suportar uma temperatura de
700 graus e uma pressão de 350 bar.
Isso poderá elevar o grau de eficiência em cerca de dois por cento.
Também nas turbinas pode-se aumentar o ganho, afirma Alfons K
­ ather.
“A condução do fluxo de vapor pode
ainda ser aperfeiçoada”, diz o pesquisador. A formação de turbilhões
ou desvios quando o vapor atravessa
as turbinas provoca a perda de energia. Cientistas da Rheinisch-Westfälische Technische Hochschule
(RWTH) A
­ achen e da Universidade
de Hanôver trabalham atualmente
em um novo perfil para as pás, que
deverá evitar o máximo possível essas perdas.
Já o especialista da Siemens S
­ tefan
Lampenscherf quer aproveitar o
calor residual das usinas para gerar mais energia elétrica. Ele e sua
equipe estão desenvolvendo geradores termoelétricos, isto é, semicondutores especiais que geram uma
tensão em sua superfície assim que
Q
uando a União Europeia,
há alguns anos, decidiu
se despedir das lâmpadas
incandescentes, dois empresários
da Região do Ruhr, na Alemanha,
tiveram uma ideia engenhosa. Para
driblar a proibição, simplesmente
declararam as lâmpadas como mini-aquecedores, argumentando que
elas forneceriam em primeira linha
calor, e a luz seria apenas um produto residual.
De fato, a eficiência de uma lâmpada incandescente não passa de
cinco por cento – apenas um vigésimo da corrente elétrica consumida é transformado em luz. Todo
o resto é dissipado na forma de
calor. Alto consumo, baixo rendimento: não é de se admirar que a
UE tenha decidido banir essa tecnologia das prateleiras das lojas. A
proteção climática exige que ener48
gia seja utilizada da forma mais produtiva possível.
Eficiência é, portanto, a meta principal. Isso não vale, porém, somente
A proteção climá­
tica exige que ener­
gia seja utilizada
da forma mais pro­
dutiva possível
para o consumo, mas também para a
geração de energia, pois quanto mais
energia elétrica se consegue gerar
com os recursos empregados nas usinas, melhor é o balanço climático da
planta. A Agência Internacional de
Energia (AIE) estima que serão investidos até 2035 em todo o mundo
um total de 23 trilhões de dólares
americanos em usinas elétricas convencionais – especialmente em usinas
de carvão. Principalmente a China, a
Índia e vários países do sudeste asiático pretendem construir um grande
número de usinas de carvão nos próximos anos. Por esse motivo, qualquer
ganho de eficiência, por menor que
seja, resulta em um alívio significativo para o clima.
Usinas de carvão funcionam basicamente como uma panela de pressão:
a água é aquecida pela combustão
de carvão até que ela vire vapor,
provocando uma alta pressão dentro do equipamento. O vapor é conduzido para uma turbina, aliviando
a alta pressão ao passar pelas pás –
de forma semelhante ao que acontece quando a válvula da panela de
© iStock
Barragem de uma hidrelétrica em Manitoba, Canadá
49
Antecipar o futuro
vapor requerem uma quantidade gi­
gantesca de combustível e em muitos
lugares não há biomassa suficiente
para cobrir a demanda.
Professor Mohammad Asadullah,
da Universidade Técnica MARA,
Turbina no interior de uma hidrelétrica
ratura, maior o efeito. “No momento,
concentramos a pesquisa na área de
trânsito, visando, por exemplo, a ge­
ração de energia elétrica a partir do
calor eliminado pelo motor de um
veículo para aliviar o alternador”, ex­
plica Stefan Lampenscherf . “Com o
aperfeiçoamento da técnica, veremos
no futuro também aplicações na in­
dústria ou em usinas elétricas, sendo
possível atingir potências na faixa dos
quilowatts ou mesmo megawatts”.
Vapor e pressão, turbina e gerador –
esse princípio não funciona somente
com carvão, mas também com com­
bustíveis com balanço neutro de CO 2,
como madeira e outras biomassas. Do
ponto de vista técnico, praticamente
não faz quase nenhuma diferença
qual o combustível usado para gerar
o calor para a evaporação da água na
caldeira da usina. Muito maior, entre­
tanto, é o desafio logístico quando
se quer usar biomassa, pois usinas a
50
na Malásia, quer resolver esse pro­
blema de uma maneira incomum:
ele sugere não queimar a biomassa,
mas sim transformá-la em gás. Esses
sistemas, por serem bem menores,
necessitam de muito menos combus­
tível que usinas convencionais com
turbina a vapor.
Essa tecnologia de gaseificação não é
nova. Mas agora a indústria e a ciên­
cia conseguiram resolver o problema
da formação de alcatrão, algo que
impediu por muito tempo o uso comer­
cial dessa técnica. “Os problemas fo­
ram resolvidos”, diz Mohammad Asa­
dullah. “A gaseificação de biomassa
é realizável, tanto do ponto de vista
técnico como econômico”. O charme
especial dessa ideia está na diversi­
dade de combustíveis que podem ser
utilizados – bagaço de cana é tão ade­
quado como palhas de arroz ou resí­
duos da produção de óleo de coco. Isso
faz com que ela seja especialmente
— Usina a gás e
a vapor
interessante para países com redes
elétricas rudimentares (por exemplo,
Vietnã, Nepal e Quênia) e que quei­
ram expandir seu abastecimento de
energia elétrica de forma descentrali­
zada, com pequenas usinas.
Usinas modulares descentralizadas,
por exemplo, muitas vezes trabalham
com turbinas a gás como as que são
utilizadas também – em variantes
bem mais potentes – em grandes usi­
nas. Elas não são movidas por vapor
comprimido, mas sim por uma mis­
tura de gás e ar. Quando essa mistura
é queimada, ela se expande e faz
girar as turbinas.
E por que não utilizar adicionalmente
os gases de escape, que são cheios de
energia, para gerar eletricidade? Essa
ideia esteve presente no desenvolvi­
mento das usinas de cogeração a gás
e vapor, que combinam uma ou vá­
rias turbinas a gás como uma turbina
a vapor. Os gases de escape quentes
da turbina a gás são utilizados para
produzir vapor de água para a tur­
bina a vapor. Com essa combinação,
os sistemas atingem um grau de efi­
ciência de até 60 por cento. Nenhuma
outra tecnologia de usinas de gera­
ção elétrica aproveita melhor a ener­
gia contida nos combustíveis do que
esses sistemas de cogeração. Além
disso, eles são flexíveis – podem rea­
gir rela­tivamente rápido a oscilações
na geração de energia eólica ou solar.
Desse modo, ela apresenta os melho­
res requisitos para ser precursora da
transição energética global.
Gás natural é misturado
com ar quente comprimido
e ­depois queimado. Isso re­
sulta em gases de combustão
com temperaturas acima de
1.000 graus, que, com alta
pressão, fazem as pás da
turbina girar. Esse movimento
rotatório aciona um gerador,
que produz energia elétrica.
Os gases de escape da
­turbina têm ainda uma
5
3
9
1
7
4
8
Rotações por minuto da turbina
colocada em movimento:
3.000
10
2
6
© iStock
nela ocorre uma diferença de tempe­
ratura – por exemplo, quando uma
metade é aquecida pelo fluxo de ca­
lor e a outra metade fica exposta ao
ar ambiente, que é muito mais frio.
Quanto maior a diferença de tempe­
Antecipar o futuro
1 Alimentação de ar
2 Compressor
3 Alimentação de gás
4 Turbina a gás
5 Caldeira de recu­pe­
ração de calor
 6 Turbina a vapor
 7 Condensador
 8 Geradores
 9 Transformador
10 Rede elétrica
­temperatura em torno de
600 graus – suficiente para
gerar vapor de água em uma
caldeira de recuperação de
calor, com o auxílio de um
permutador térmico. Em se­
guida, o vapor é direcionado
para uma turbina. Pressiona­
das pelo vapor, as pás da tur­
bina rodam e um eixo trans­
fere então esse movimento
a um segundo gerador.
Depois do vapor ter atraves­
sado a turbina, ele é resfriado
em um condensador, trans­
formando-se novamente em
água, que é bombeada de
volta para a caldeira, criando
assim um circuito fechado.
Um transformador eleva a
tensão da energia produzida
por ambos os geradores, de
forma que ela possa então
ser injetada na rede elétrica.
51
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
Megacidades
criativas
Texto Chris Schinke
Como cidadãos podem participar ativamente
do desenvolvimento da sua cidade
Arquétipo da cidade moderna: New York City, EUA
52
© iStock
O
s números soam impressionantes. Segundo estimativas atuais das Nações
Unidas, até o ano de 2100 a população mundial poderia aumentar para
12,3 bilhões. De acordo com os pesquisadores da ONU, não se deve contar, por ora, com uma atenuação do
crescimento. Mas onde viverão todas
essas pessoas? E sobretudo, em que
condições?
As cifras da ONU indicam igualmente
que no futuro dois terços da população mundial viverão em metrópoles.
Ou seja, a tendência à urbanização
continua inabalada. Assim, cidades se
transformam em mega­cida­des – que
têm de enfrentar desafios completamente novos e nunca imaginados.
Esse crescimento exige planejamento
e um montão de criatividade. Porque
onde tanta gente tem de dividir o
espaço, é preciso que a convivência
também seja organizada de forma que
funcione. Essa é a tarefa de um planejamento urbano criativo e previdente.
Além da administração pública, cada
vez mais cidadãos criativos e engajados estão assumindo essa tarefa e
No futuro, dois
­terços da ­população
mundial viverão
em metrópoles
se unindo para formar iniciativas privadas. Muitas vezes, essas pessoas
trabalham em ateliês, laboratórios
de design e estúdios de arquitetura
arejados. Sob o conceito de urba­
nismo tático, mentes criativas no
mundo inteiro estão reunindo ideias
para o futuro planejamento de nossas cidades, mas também de megacidades como Mumbai, Hong Kong,
­Lagos ou Nova Iorque. Mas, quem
são esses criativos? E como eles imaginam nossa convivência no futuro?
Um deles é Pedro Gadanho, curador
de arquitetura contemporânea do
MoMa, o Museu de Arte Moderna
de Nova Iorque. Recentemente, reuniu times multidisciplinares para
trabalhar em estudos de caso urbanos
para diversos projetos. Um tema particularmente importante para Pedro
é o planejamento e futuro desenvolvimento de nossa realidade arquitetônica. Em sua opinião, é preciso
que – para além do planejamento por
autoridades – os cidadãos tomem em
suas próprias mãos parte dessa tarefa.
Para isso, também terão de utilizar
métodos pouco convencionais.
53
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
54
Iorque nos últimos anos, levando ao
desenvolvimento de um mercado
informal de aluguéis na metrópole às
margens do Rio Hudson.
A partir do engajamento de iniciativas locais, foi possível aliar os interesses de inquilinos, representantes
Onde tanta gente
divide o espaço,
é preciso organizar
a convivência de
forma que funcione
dos interesses da administração
pública, empresas sem fins lucrativos e autoridades municipais e
criar um cooperative housing trust,
um consórcio habitacional cooperativo que, no longo prazo, deverá ao
mesmo tempo assegurar o acesso a
antigo shopping, com um sistema de
empréstimo gratuito de livros organizado pelos próprios utentes. O princípio é o mais simples possível: pegue
um livro emprestado, leia-o, traga-o
de volta ou, caso queira ficar com ele,
traga um outro no lugar dele. Seus
idealizadores conceberam a minibiblioteca como projeto de desenvolvimento de comunidade – uma característica comum a muitas abordagens
da iniciativa Uneven Growth – e que,
para além disso, visa a aproximar leitores entusiastas através do seu amor
comum pela literatura. E, na agitada
cidade de Melbourne, com seus quatro milhões de habitantes, ela oferece
um lugar ideal para relaxar um pouco
do estresse cotidiano.
Como demonstram esses e
­ xemplos
de urbanismo tático, a ideia no cen-
tro desse movimento é adquirir conhecimentos, compartilhar esses
conhecimentos com a comunidade
e possibilitar o acesso do maior número possível de indivíduos a eles.
Esses conhecimentos não são um fim
em si, e sim destinam-se sempre a
fornecer à realidade existente novos
impulsos para o futuro e transformar
teoria em prática vivida. Uma prática que tem por objetivo melhorar
a vida do maior número possível de
pessoas. Pedro Gadanho pensa da
mesma forma. Como ele imagina a
cidade ideal do futuro? “Ela é grande,
vibrante, multifacetada, densa, extravagante e tem uma grande riqueza
cultural – mas com um mínimo de
trânsito e sem extremas desigualdades sociais.” Em suma, soa como uma
cidade na qual valeria a pena viver.
Organizada pelos próprios usuários: a Little Library em Melbourne, Austrália
© The Shopping Sherpa / Flickr (CC BY-ND 2.0)
Também as visões de Pedro Gadanho se inspiram no conceito cada
vez mais popular do urbanismo tático. Perguntado como define esse
termo para si próprio, Gadanho responde: “Entendo o conceito como
intervenções espontâneas bottom-up
em cidades.” Essa ideia de intervenções de baixo para cima prevê
que os cidadãos lidem eles mesmos
com os desafios do mundo real. “A
implementação é feita por artistas,
arquitetos e designers, em colaboração com as administrações locais. Mas inclui também iniciativas
de particulares engajados, a cujas
necessidades as autoridades nem
sempre reagem.”
Um exemplo de uma dessas intervenções bottom-up encontra-se praticamente às portas do MoMa: como
se sabe, os preços das moradias em
Nova Iorque são proibitivos. Os movimentos globais de investimentos
e tam­bém a construção imobiliária
orientada para o lucro alargaram
imensamente o fosso social em Nova
ção na plataforma online “uneven-­
growth.moma.org”, apelando a um
amplo público para contribuir com
seus próprios exemplos de táticas urbanas. A ação foi um grande
­sucesso. Centenas de respostas, que
podem ser conferidas na página da
Web, mostram que o conceito de urbanismo tático está incitando a criatividade no mundo inteiro. Ativistas
engajados de toda a Europa, América
Latina, Sudeste da Ásia e EUA formam um movimento cujas futuras
visões urbanas será interessante ver.
Uma contribuição particularmente
criativa veio da metrópole australiana de Melbourne. Habitantes da
segunda maior cidade do continente
tiveram a ideia de instalar espontaneamente uma pequena biblioteca –
chamada de Little Library – em um
© iStock
Estação em Mumbai, Índia
habitação a preços acessíveis e justiça social. A ideia teve como ponto
de partida a grande quantidade
de imóveis habitacionais vagos em
Nova Iorque e a sua aquisição pelo
consórcio sem fins lucrativos. Desta
forma, no decorrer dos últimos anos
o consórcio logrou proporcionar
moradias para quase 200.000 pessoas. Os beneficia­dos pela iniciativa
foram famílias, idosos, pessoas de
baixa renda e até mesmo sem-teto,
que até então não tinham acesso ao
mercado de locação. Mesmo que isto
esteja longe de resolver o problema
dos aluguéis proibitivos na metrópole da Costa Leste, essa iniciativa
mostra que existem alternativas
reais para a aparentemente imutável
situação atual.
Vale a pena dar também uma olhada
em outras regiões do mundo para
encon­trar exemplos de urbanismo tático na prática, como na Índia. Na metrópole de Mumbai, com 12,5 milhões
de habitantes o motor econômico e
cultural do país, desenvolveram-se
nos últimos anos algumas táticas particularmente criativas para conseguir
acompanhar o crescimento vertiginoso da cidade.
Uma expressão dessa criatividade
arquitetônica é um modelo promissor:
as chamadas tool houses, que oferecem tanto espaço para moradia como
para empresas economicamente eficientes e pequenas fábricas. Em um
mínimo de espaço, elas reúnem áreas
de convivência comunitária e familiar.
Graças à sua construção compacta,
elas se inserem perfeitamente nos
conjuntos arquitetônicos existentes
na cidade, podem ser erguidas num
instante e ampliadas à vontade, inclusive com mais um andar. Nos últimos tempos, a popularidade das tool
houses de Mumbai aumentou de tal
maneira, que até mesmo designers de
moda, escritores e doutores estão se
mudando para as robustas minicasas.
Voltemos a Pedro Gadanho: no início
de 2015, ele lançou uma convoca-
55
Antecipar o futuro
Antecipar o futuro
Especialistas são
insubstituíveis
O TÉCNICO ENGENHOSO
Tobias Hägele, voestalpine Polynorm GmbH & Co. KG
Schwäbisch Gmünd, Alemanha
Há pessoas com habilidades bastante especiais. No caso
de Tobias Hägele, são o poder de imaginação, o instinto
para o que é realizável e principalmente a persistência.
O chefe de projetos de tecnologia de série e novas tecno­
logias não só desenvolve processos nos mínimos detalhes, ele também os torna aptos para a produção em série, como, por exemplo, na produção de peças prensadas
para automóveis. Ele e sua equipe unem genialidade a
conhecimentos técnicos – o que termina resultando sempre em algo novo.
Texto Björn Lüdtke Ilustração Philipp Herrmann
Para que seja possível oferecer produtos da mais alta
qualidade, é preciso ter funcionários em todo mundo
com habilidades especiais na área em que atuam.
Queremos apresentar-lhes quatro deles.
O DESCOBRIDOR DE TALENTOS
Harald Mühleder, voestalpine Stahl GmbH
Linz, Áustria
Harald Mühleder tem um olhar seguro para reconhecer
talentos e contribui assim para nosso futuro. Ele estima o
potencial que uma pessoa tem de progredir. Para isso, são
necessários uma boa percepção para desenvolvimento
técnico e humano, empatia e um olhar crítico sobre o
progresso do talento encontrado. Se sua estimativa estava certa ou não, ele fica sabendo em competições para
as quais os novos talentos são enviados. E ele é recompensado pelos diversos prêmios recebidos pelos talentos
que ele tem descoberto e acompanhado.
O ENCANTADOR DE ROLOS
Wolfgang Hochfellner, voestalpine Schienen GmbH
Leoben, Áustria
Wolfgang Hochfellner é mestre de laminação na ­voestalpine
Schienen GmbH na Áustria e cuida, com sua equipe, para
que tudo corra bem na laminação de trilhos de até 120 metros. O processo de laminação é complexo e o produto não
pode apresentar qualquer erro. Para que isso funcione, são
importantes os ajustes prévios, mas também uma reação
rápida e controlada quando ocorre alguma irregularidade.
Wolfgang Hochfellner reconhece nos ruídos quando alguma
coisa está errada – o que mostra como ele conhece bem o
equipamento.
56
O INVENTOR DE AÇOS
Sebastian Ejnermark, Uddeholms AB
Hagfors, Suécia
Sebastian Ejnermark é a pessoa certa para quem necessita de um novo tipo de aço. Ele é desenvolvedor de
materiais e “o” especialista quando se trata de descobrir novas combinações de liga para atender necessidades individuais de nossos clientes. Sebastian Ejnermark
sabe exatamente qual é o efeito de cada liga e qual a
proporção correta para atingir a propriedade desejada
do produto final – de altamente duro até extremamente
resistente a corrosão.
57
Nunca perder a curiosidade
Transformar ideias em realidade
Como rede global de especialistas independentes, agregamos as cabeças
e competências certas para cada projeto e oferecemos um máximo de
­experiência e know-how. Dessa forma, promovemos de várias maneiras
a evolução e o progresso, e ao mesmo tempo asseguramos o sucesso
do nosso Grupo.
60
Missão a Marte
O sonho de viver em Marte poderia
tornar-se realidade
66
As luzes da Terra vistas do ­espaço
Satélite Suomi NPP capta
imagens espetaculares da Terra
70
Quando comer aumenta
o desempenho
O que comemos pode nos deixar
mais inteli­gentes, saudáveis e bonitos?
74
Gigantes inteligentes
Inovações em veículos utilitários
76
A individualização do cotidiano
Quando a prestação de serviços se centra nas pessoas
58
59
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
Missão
a Marte
Texto Louisa Preston
O sonho de viver em Marte poderia tornar-se
realidade
Colônia “Mars One”
60
61
Nunca perder a curiosidade
62
A questão é quem
chegará a Marte
primeiro e se ­esses
corajosos seres
­humanos vão poder
retornar
por nós habitado exclusivamente por
robôs: até hoje, 14 sondas e vários
rovers (veículos de exploração) foram
enviados para sua superfície, a fim
de vasculhá-la à procura de indícios
de vida baseada em carbono e outros
sinais de vida.
Homens já pisaram na Lua e neste
momento alguns estão até mesmo
vivendo no espaço. Eles nos sobrevoam a uma velocidade de quase
oito quilômetros por segundo e dão a
volta à Terra 15,5 vezes por dia. O objetivo último das agências espaciais,
das organizações sem fins lucrativos
e também do público, porém, é enviar o homem a Marte. A questão é
apenas quem chegará a Marte primeiro e se esses corajosos seres humanos vão poder, um dia, retornar à
Terra. Diante do ambiente inóspito e
essencialmente tóxico que reina no
planeta, também se coloca a questão
por que alguém haveria de querer ir
para lá. Uma resposta poderia ser: por
autoproteção, como uma espécie de
seguro de vida, para preservar a vida
terrestre, que poderia ser extinta por
uma multitude de catástrofes naturais ou causadas pelo próprio homem.
Visitar e investigar Marte, por outro
lado, também nos pode ensinar muito
sobre a nossa própria história e a da
Terra. E afinal nós, seres humanos
temos um instinto explorador inato.
Descobrir e explorar outros mundos
no cosmo é o maior desafio para a
humanidade e será, ao mesmo tempo,
uma das nossas mais esplêndidas
realizações, mesmo que apenas um
Horta em uma cápsula “Mars One”
Interior de uma cápsula “Mars One”
© Bryan Versteeg / Mars One
Sala de uma cápsula “Mars One”
que em Marte a água é rara e o ar é
tóxico, e que o planeta não tem mais
um campo magnético. Sem esse escudo de proteção, grande parte da
atmosfera do planeta se perdeu; a superfície de Marte ficou exposta à radiação solar e tornou-se praticamente
inabitável.
Mesmo assim, continuamos extremamente otimistas. Marte é, no momento, o único mundo conhecido
Página 60-61 © Bryan Versteeg / Mars One Esquerda © Bryan Versteeg / Mars One
J
á antes do século 19, havia a
crença popular de que Marte
era habitado e que lá existia
uma forma de vida avançada, que
tinha coberto o planeta de canais de
irrigação e talvez também estivesse
prestes a colonizar a Terra. Quando
então o avanço técnico o permitiu,
foram desenvolvidos satélites com o
objetivo de orbitar em torno de Marte
e fazer as primeiras fotos em close-up
da sua superfície. Muitas das primeiras missões terminaram de forma
catastrófica antes ainda de sair da
atmosfera terrestre. Foi só em março
de 1965 que a sonda americana Mariner 4, depois de viajar 54,6 milhões
de quilômetros pelo espaço durante
sete meses e meio, conseguiu sobrevoar Marte e enviar as primeiras
imagens do Planeta Vermelho. Mas
esse sobrevoo, aguardado com tanta
expectativa, destruiu toda e qualquer
esperança de encontrar um mundo
luxuriante, similar à Terra, com rios
de água corrente e cidades habitadas por marcianos semelhantes ao
homem. Ao invés disso, Marte revelou-se como um mundo coberto de
pó, gélido e estéril, repleto de crateras e vales profundos. Um mundo que
mais se assemelha à Lua, sem ar nem
vida, do que à Terra. Hoje, sabemos
Nunca perder a curiosidade
punhado de seres humanos venha a
pisar pessoalmente no solo de Marte.
A parte mais complicada de uma missão a Marte não é chegar ao planeta,
e sim regressar. A aterrissagem em
um planeta estranho envolve muitos
riscos. A taxa de sucesso para Marte
é de 30 por cento – e partir de novo é
mais difícil ainda. O lançamento de
uma nave espacial na Terra já exige
um esforço imenso de infraestrutura
e pessoal, sem falar na quantidade
de combustível necessária para superar a força da gravidade. Tudo isto
não está disponível em Marte. Além
disso, está longe de estar claro se os
astronautas estariam realmente em
condições físicas de retornar à Terra
depois de terem vivido sob as condições de gravidade de Marte. Para
a maior parte de nós, é moral e politicamente impensável deixar seres
humanos em Marte para sempre,
sem possibilidade de volta. Agências estatais como a Nasa ou a ESA
não podem, e não vão, cogitar em
fazê-lo. Mas existe uma iniciativa
privada que não compartilha esses
escrúpulos. A fundação de utilidade
O objetivo último
é enviar o homem
a Marte
pública Mars One quer estabelecer
uma colônia humana permanente
no planeta, e tornou-se conhecida
com a ideia de uma missão sem volta
a Marte. O presidente e cofundador
da Mars One, Bas Lansdorp, pretende inicialmente enviar oito naves
não tripuladas a Marte, com equi-
pamentos, materiais e robôs para a
construção de uma estação de base
com 200 metros quadrados, onde os
primeiros colonos de Marte deverão
viver e trabalhar. A partir de 2027, a
Mars One pretende enviar para lá
um grupo de quatro voluntários a
cada dois anos. A uma convocação
lançada por Lansdorp em 2013, responderam impressionantes 202.000
voluntários de todo o mundo, que
cumpriam o requisito de serem maiores de 18 anos. Os primeiros 1.058
candidatos tiveram de submeter-se a
um exame de rotina no seu médico.
Das 660 pessoas que restaram foram
selecionados os 100 finalistas, 50 homens e 50 mulheres.
Encontrei-me com Bas Landsdorp
em 2015. Durante três dias, caminhei com ele pela paisagem desolada
da Islândia, que se assemelha à de
Marte, e pude me convencer de sua
63
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
Módulo de pouso aterrisando
paixão, dinamismo, persistência e
­determinação em fazer com que
a Mars One “decole” no verdadeiro
sentido da palavra. Se fosse possível realizar um projeto como esse só
pela vontade e pela fé, esse homem
o conseguiria. Infelizmente, isso não
é possível. No fim das contas, é sempre uma questão de custos e financiamento. Lansdorp é reservado com
relação à situação financeira da Mars
One, que com certeza será decisiva
para o êxito. A missão é totalmente
financiada por meio de patrocinadores, parceiros e uma fonte de recursos
muito controvertida: um reality show
Descobrir outros
mundos no cosmo
é o maior desafio
para a humanidade
© Bryan Versteeg / Mars One
Módulo de pouso em Marte
64
na televisão. A edição marciana do
Big Brother com certeza será assistida por todo o mundo, mas o interesse provavelmente não durará. Por
quê? Um bom reality show é movido
a tensões, conflitos e dificuldades.
Ou seja, precisamente o que que se
quer evitar em Marte, para que a
missão possa ser bem sucedida. Simplesmente assistir aos astronautas
cuidando de seus afazeres diários
não vai prender os espectadores por
muito tempo e garantir altas receitas.
Como, então, será financiada a sobrevivência dos colonos em Marte?
Quem são essas pessoas que querem
passar o resto de seus dias em Marte?
“Tenho a oportunidade única de
passar a metade de meus dias em
um, e a outra metade em outro planeta – essa é a suprema aventura”,
diz a finalista Clare Weedon, do
Reino Unido. Quando mencionei a
crítica e o ceticismo com que ela e
os outros candidatos são vistos, ela
respondeu: “É uma missão muito
ambiciosa e arriscada, mas estou absolutamente convencida de que chegou a hora de a humanidade dar o
passo seguinte.” E o que acham sua
família e seus amigos de seu plano
de passar o entardecer de sua vida
em Marte? “Eles me apoiaram de
uma forma fantástica. Eles me conhecem, e quando veem a paixão e
o brilho nos meus olhos quando falo
sobre a Mars One, não têm como não
me apoiar.” Dizer que a mudança
para Marte provavelmente implica
mais desafios do que vantagens seria
um eufemismo. “O que estou mais
curiosa para saber é como vai ser
estar exposta a um estresse e uma
pressão extremos todos os dias, e
ter de lutar diariamente pela sobrevivência; ao mesmo tempo, é disto
que eu tenho o maior medo”, afirma
Clare. “Isolamento, alimentação rigidamente regulamentada, só sair
com roupa espacial – tudo isso vai ser
completamente novo para mim, e eu
só vou saber como lidarei com essas
situações me expondo a elas.” Esses
são apenas alguns de inúmeros desafios que ela e seus companheiros de
grupo vão enfrentar em seu caminho
para Marte. Construir e manter alojamentos, produzir alimentos, água, ar
e energia – estes esses são apenas
os primeiros passos rumo a uma colônia autônoma em Marte.
Numerosos críticos do empreendimento se perguntam por que o homem tem de ir a Marte se na Terra
ainda há tanto a fazer e consertar.
É uma pergunta válida, mas para
mim a resposta é clara: devemos primeiro mudar a humanidade e depois
voar para Marte, não importa quando
isso acontecer? Ou devemos mudar
a humanidade voando para Marte?
A exploração do cosmo e a conservação de nosso planeta não têm de ser
excluir mutuamente. Podemos e devemos fazer ambas as coisas. E atualmente a Terra tem um número mais
do que suficiente de habitantes para
Louisa Preston está escrevendo
seu primeiro livro, Goldilocks and the
Water Bears: The Search for Life in
the Universe, que deverá ser pu­bli­
cado em julho de 2016 pela Blooms­
bury Sigma
que se possa seguir as duas abordagens. Mesmo que Mars One acabe
não decolando, o projeto conferiu
novos impulsos ao instinto explorador
humano. Muitas crianças ainda sonham em se tornar astronautas e visitar outros planetas quando crescerem.
A geração atual pode fazer com que
esse sonho se torne realidade.
Distância Terra–Marte
em milhões de quilômetros:
54,6
65
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
As luzes da
Terra vistas
do espaço
Texto André Uhl
A missão do Suomi NPP é observar as condições
climáticas e ambientais na Terra. Mas enquanto
orbita a Terra a uma altitude de mais de 800 quilô­
metros e desempenha sua tarefa, o satélite também
captura imagens particularmente deslumbrantes.
Quando se faz noite, as metrópoles desta Terra
reluzem em todo seu brilho — e, graças ao Suomi
NPP, podemos admirá-lo numa qualidade nunca
antes vista.
A Terra noturna vista através das lentes do satélite Suomi NPP
66
67
Austrália
68
Página 66-67 e dir. © NASA Earth Observatory / NOAA NGDC No alto esq. © NASA Earth Observatory Embaixo esq. © Craig Mayhew and Robert Simmon, NASA GSFC
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
Europa, África do Norte e Oriente Médio
Leste dos EUA
69
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
Quando comer
aumenta
o desempenho
Texto Christian Heinrich
Laboratórios em todo o mundo estão trabalhando
na alimentação do futuro: uma dieta personalizada
para cada indivíduo, otimizada para a sua saúde e
desempenho. Como novas tecnologias podem ajudar?
A tendência: produtos orgânicos
70
© iStock
S
egundo pesquisadores da Universidade de Minnesota, mandar fazer um perfil nutricional
individual custa 1.000 dólares. Trata-se de uma espécie de impressão digital do metabolismo atual do corpo.
Quais são as vitaminas, nutrientes e
minerais que faltam no organismo
no momento e quais estão presentes
em quantidades possivelmente altas
demais? O perfil nutricional individual fornece um quadro completo
do que estamos precisando e do que
temos em excesso. Assemelha-se à
determinação do nível de colesterol,
que, na visita ao médico, é feita através do hemograma completo – com
a diferença de que o perfil nutricional
individual pode fornecer até várias
dezenas de valores, da vitamina D
até o magnésio.
O projeto ainda se encontra numa
fase inicial, mas se for bem-sucedido
provocará uma pequena revolução:
o advento da nutrição personalizada.
Em outras palavras, cada um teria
Continuaremos a
comer juntos numa
mesma mesa?
sua dieta ideal, sob medida para seu
corpo – não haveria mais uma comida
para todos, e sim uma comida para
cada um. Isto levanta questões sociológicas: será que vamos continuar
a comer juntos numa mesma mesa?
Ou comer em companhia vai se tor-
nar mais importante se cada um de
nós tiver uma dieta diferente? Além
disso, uma nutrição personalizada
tem consequências para o corpo e a
mente. Conhecendo melhor nosso
metabolismo individual, poderemos
evitar dosagens insuficientes ou em
excesso. Poderemos nos alimentar
sistematicamente de forma a ficarmos mais saudáveis, e, à medida que
forem sendo acrescentadas ao perfil
nutricional mais e mais informações
sobre o metabolismo cerebral e o
metabolismo dérmico, talvez até de
forma a ficarmos mais inteligentes
e mais bonitos.
Uma olhada no laboratório de pesquisas do gigante da alimentação
Nestlé mostra que esses pensamentos não são mera fantasia; eles descrevem uma futura realidade. No
71
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
Alimentos mais saudáveis
72
© The Orange Chef Co.
© iStock
High-tech na cozinha: o Prep Pad
I­ nstituto de Ciências da Saúde da
Nestlé (NIHS) em Lausanne, Suíça,
quinze cientistas que trabalham no
chamado programa Iron Man estão empenhados em construir uma
máquina que, ao pressionar de um
botão, prepara um pó misturado in­
dividualmente de acordo com o respectivo perfil metabólico. Os cientistas admitem que não é de esperar
que a máquina seja lançada no mercado dentro dos próximos dez anos.
Mas, quando este for o caso, “ela
poderá ser o próximo micro-ondas
nas cozinhas”, diz o diretor do NIHS
Edward Baetge.
Para Felix Tegeler, analista de inovações da agência de pesquisa de
tendências TRENDONE, seria o estabelecimento definitivo de um processo que começou há muito tempo.
Já hoje, camadas sociais se definem
cada vez mais também pelo que comem e pelo que não comem. Uns –
muitos deles vegetarianos – só consomem alimentos com selo orgânico,
ao passo que outros comem carne
várias vezes por dia, contribuindo
para que a demanda aumente. Todos
eles têm algo em comum: até certo
ponto, se definem pelo que comem
e como comem. “A alimentação está
assumindo um caráter de lifestyle”,
diz Tegeler. “A cada dia as pessoas
estão exteriorizando mais seu estilo
de alimentação; ele se torna, por assim dizer, parte de sua identidade.”
E a identidade é hoje extremamente
individual. Se, além disso, ainda houver uma alimentação high-tech sob
medida para o corpo de cada indivíduo, isto também pode gerar conflitos. Aqueles que apostam no cultivo
próprio e em alimentos produzidos
naturalmente dificilmente se entusiasmarão com a nova ideia. Mas no
gigantesco movimento rumo à crescente individualização certamente
haverá lugar mais do que suficiente
para ambas as tendências.
O comércio e a tecnologia já atendem de forma crescente a necessidade de alimentação personalizada.
Já é possível imprimir pasta e chocolates de design personalizado em
impressoras 3D. Alguns restaurantes
já estão oferecendo comida personalizada: o Vista Kitchen em Bangkok,
na Tailândia, por exemplo, oferece
um cardápio diferente para cada
grupo sanguíneo. Cientistas consideram esse procedimento pouco sério,
mas ele atrai uma verdadeira multidão de clientes curiosos.
A IBM está desenvolvendo um computador que provavelmente também será útil para tendência rumo
à nu­trição personalizada. O usuário
digita seus ingredientes prediletos – ou, no caso, os ingredientes que
melhor promovem seu desempenho –
e o computador, excelentemente
informado sobre cozinhas e sabores
de todo o mundo, fornece as receitas
adequadas.
Também o chamado Prep Pad, da
startup estadunidense Orange Chef,
aborda o tema da perspectiva da comida, e não do corpo. O Prep Pad,
que em poucos anos talvez já se encontre na mesa da cozinha de muita
gente, é uma espécie de tábua de
cozinha que analisa a comida que a
pessoa vai ingerir e, em seguida, faz
recomendações personalizadas para
o cardápio das próximas refeições.
As duas abordagens – a análise do
metabolismo e a análise dos alimentos – provavelmente vão se fundir
cada vez mais no futuro. Pode ser
que um dia a nossa própria mesa nos
dê conselhos. Colocamos a mão sobre
o tampo para um breve teste da situação atual no organismo, e a mesa,
que sabe o que comemos nos meses
passados, faz sugestões para o jantar. E se calhar ainda se encarrega de
criar o ambiente adequado, com iluminação e música combinando com
o cardápio. Bom apetite!
Custo de um perfil nutricional
individual em dólares:
1.000
73
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
Gigantes
inteligentes
Texto Jan Wilms Ilustração Philipp Herrmann
Inovações em veículos
utilitários
2
1
6
4
5
3
1
Tração
A tração do futuro será elétrica: já hoje
circulam vans e veículos utilitários leves
movidos a eletricidade e, com isso, sem
emissões locais. Caminhões e escavadeiras leves combinam motores diesel e
elétricos em seus sistemas híbridos. Em
breve, esses sistemas poderiam ser usados em todo o mundo também no transporte pesado de longas distâncias em
“e-Highways”.
74
2
Navegação
O planejamento exato do trajeto poupa
nervos e aumenta a eficiência e a segurança. Caminhões vinculam os dados
de GPS do percurso com o controle do
motor, por exemplo, em aclives e declives. Escavadeiras utilizam dados de
satélite ainda mais precisos: é possível
pré-programar até a posição exata e a
profundidade do buraco a ser escavado.
3
Digitalização
Todos os dados de operação e localização em autoestradas e obras podem ser
coletados digitalmente em uma big data
cloud e vinculados. Assim, a frota encontra-se sempre sob controle, permitindo
reduzir viagens sem carga. Além disso,
os veículos podem ser diretamente interligados em rede através de comunicação
Car-to-X.
4
Construção leve
Cada vez mais leves e estáveis: aços de
alta resistência e ultrarresistência, além
de outros materiais como alumínio, por
exemplo, na suspensão de eixos de caminhões, guindastes, betoneiras e outras
máquinas de construção, podem reduzir
o peso do veículo em até 70 por cento,
proporcionando maior desempenho de
transporte, mais eficiência e menos CO 2.
5
Segurança
Em caminhões e ônibus, inúmeros
ajudantes garantem maior segurança:
assistentes de frenagem de emergência, mudança de faixa e prevenção de
colisões são alguns exemplos. Em escavadeiras e guindastes, o perigo maior
é tombar ao elevar carga – por isso, as
cabines de segurança são construídas
de perfis especiais.
6
Condução autônoma
A partir de 2020, caminhões deverão
poder andar de forma autônoma, ou
seja, sem intervenção do motorista.
Isso poupa combustível e evita acidentes. O sistema será alimentado com
dados e sensores já hoje existentes,
como dados de GPS, mapas 3D, controle de cruzeiro adaptativo e sistema
de frenagem de emergência.
75
Nunca perder a curiosidade
Nunca perder a curiosidade
A individualização
do cotidiano
Sentir-se como em casa: lounge no aeroporto de Helsinki, Finlândia
Texto Verena Dauerer
A
eroportos – lugares de trânsito fascinantes, com grande
fluxo de pessoas, onde todos os dias circulam milhares de
via­jantes. Para muitos, não passam
de uma escala necessária e, por vezes, bastante estressante, a caminho do destino final. Os visitantes
de um aeroporto têm de se orientar, procurar informações, e alguns
lutam com barreiras idiomáticas.
Quando o tempo de espera por uma
­conexão é longo, o melhor é procurar aproveitá-lo da maneira mais
eficiente possível. Quando o tempo
é curto, o passageiro às vezes tem
que suar para não perder a conexão, passar correndo pela alfândega
e pela segurança e seguir rápido
pelos saguões de espera à procura
do portão de embarque certo. Mas
viajar também pode ser uma experiência agradável e tranquila, como
demonstra a operadora finlandesa de
aeroportos Finavia no aeroporto de
Helsinki. Seu projeto Travellab, ga76
nhador do Service Design Network
Award, transformou um dos maiores
centros de conexão para voos com
destino à Ásia em um espaço quase
contemplativo. Isto se deve sobretudo
à oferta otimizada de serviços para
Tudo tem que ser
descomplicado,
­flexível e estar dis­
ponível em tempo
integral
tornar a estadia dos hóspedes o mais
agradável possível, como uma área
de ioga, entretenimento para a família e uma grill station no portão de
embarque. Para tanto, a Finavia utilizou o método do design de serviços e
atendeu diretamente as necessidades
dos clientes, com base em uma pesquisa em larga escala sobre os desejos dos passageiros.
O design de serviços é centrado nas
pessoas. Não consiste em criar ­novos
serviços a portas fechadas e apre­
sentá-los ao usuário prontos e acabados. Pelo contrário – designers e desenvolvedores trocam ideias com os
consumidores e, junto com eles, elaboram a melhor solução possível. Essa
área do design é hoje mais necessária
do que nunca: para muitos, a tecnificação e digitalização do cotidiano traz
diversos percalços. Todos nós, porém,
queremos nos sentir bem em um ambiente em mudança constante. Para
isso é preciso que o design de serviços
se estenda a todos os setores da vida
cotidiana. Nos últimos anos, o conceito “design de serviços” se estabeleceu através da oferta crescente de
serviços digitais na internet e também
para usuários finais móveis.
“O design de serviços como método
e disciplina permeia todas as áreas
© Finavia
Quando a prestação de serviços se centra
nas pessoas
77
Nunca perder a curiosidade
do desenvolvimento de produtos e
empresas, como uma questão transversal, por assim dizer “, refere Peter
Bihr. O berlinense se ocupa dos temas design de serviços e experiência
do usuário também como curador
da conferência anual NEXT. “No
design de serviços, o foco está nas
necessidades dos usuários, ­ou seja,
é um caminho confiável rumo a
produtos e serviços fáceis de usar”,
complementa.
Um outro exemplo de design de serviços bem sucedido na área da mobilidade é o estudo de viagem realizado pela agência internacional de
design edenspiekermann. O estudo
examinou o percurso porta a porta
percorrido por alguém que viaja de
Tóquio até Amsterdã, analisando uma
quantidade enorme de dados. O resultado é o sistema de informação
Info Connectivity System (ICS), que
reúne e processa a informação existente em diferentes fontes ainda não
conectadas entre si – como dados de
diversos serviços de mobilidade e de
transporte público urbano, informações sobre voos, dados de operadoras
de aeroportos, informações turísticas
78
e dados de hotéis. Assim, o sistema
não só permitirá que o usuário seja
conduzido confortavelmente ao seu
destino pelo seu smartphone, como
também que ele possa consultar as
informações relevantes para a sua
viagem a qualquer hora em displays
de terminais de aeroportos, máquinas de bilhetes e até mesmo nas
telas de entretenimento a bordo do
avião. Uma abordagem holística e
inovadora, que pega o usuário pela
mão do começo ao fim da viagem,
com transições fluidas. E este é precisamente um critério para um bom
­design de serviços: quanto melhor,
menos se percebe.
Ao passo que a demanda por servi­
ços digitais cresce cada vez mais,
as necessidades e desejos dos consumidores foram se desenvolvendo
constantemente. Thomas Schönweitz,
fundador e diretor da rede de estratégia Whitespring Service Design,
sediada em Munique, explica: “Apesar de serem vendidos milhões de
iPhones idênticos, nenhum é igual ao
outro. Cada um deles está configurado individualmente, porque cada
usuário baixou seus próprios aplica-
Hans Freudenthaler, Chefe de Engenharia, Áustria
Nossos suportes de turbinas forjados em ligas especiais resistem de forma cem por
cento confiável aos enormes esforços e variações de temperatura no transporte
aéreo moderno. Mesmo assim, continuamos a aperfeiçoá-los, junto com nossos
© Finavia
Espera agradável no aeroporto de Helsinki, Finlândia
tivos, toques ou papéis de parede.”
Segundo Schönweitz, os usuários
hoje esperam esse tipo de produto
individualizado também em outros
setores da vida. Tudo tem que ser
descomplicado, flexível e estar disponível em tempo integral – e sem
risco algum, acrescenta. Um bom
exemplo disto é o AirBnB, um serviço
para reserva de alojamentos privados. Viajantes podem fazer a reserva
por um site ou um aplicativo móvel
e recebem um mapa da acomodação
com muitos detalhes e fotos da mobília, bem como o perfil do anfitrião.
A reserva e o pagamento são feitos
de forma simples e rápida.
Mas o design de serviços pode muito
mais do que proporcionar uma experiência agradável de reserva.
Smartphones e tablets e até mesmo
sensores em nosso ambiente já se
comunicam há muito – para proporcionar uma melhor oferta ao consumidor. A agência Fjord identificou a
comunicação de objetos inteligentes
entre si como uma das principais tendências atuais no design de serviços.
Quanto mais inteligentes os gadgets
se tornam, tanto melhor eles interagem e se adaptam ao usuário. Mas
isto também significa que novas formas de interação estão disponíveis
para os usuários – basta pensar nos
óculos inteligentes Google Glass, comandados pela voz de quem os usa.
Naturalmente, esse desenvolvimento
também tem consequências para o
comportamento social das pessoas e
para a maneira como elas se relacionam. E isto demonstra, mais uma vez,
que o design de serviços tem efeitos
de longo alcance sobre a sociedade
e que pode prestar uma contribuição
importante para uma mudança positiva no setor de serviços. Uma coisa é
certa: em dez anos, estaremos cercados de mais técnica ainda. O design
de serviços faz com que nos sintamos bem com ela. Porque a tecnificação só nos traz vantagens enquanto
o centro forem as pessoas.
“Nossos suportes de turbinas
proporcionam maior segurança
para viajar acima das nuvens.”
clientes – para mais liberdade e segurança. É essa confiabilidade, esse prazer em
enfrentar um desafio, que nos diferencia. Não esperamos o futuro acontecer.
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Futuro
Não esperamos o futuro acontecer!
Cinco países,
um futuro?
Como novas tecnologias
­influem na vida de pessoas
em diferentes culturas
Megacidades
criativas
Como cidadãos podem
­participar ativamente
do ­desenvolvimento da
sua cidade
Missão a Marte
O sonho de viver em Marte
poderia tornar-se realidade
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Edição 2016
magazine voestalpine