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Transcrição

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comportamento
MÃE,
posso dormir
com você?
O recém-nascido chora
durante a noite, a criança
acorda de madrugada com
medo… Inevitável pensar
se não é o caso de colocar
o filho na cama junto e
voltar rápido ao sono. Veja
as diversas formas como as
famílias lidam com esse tipo
de situação
Por MARIANA MEIRA, filha de Marisa e Celso
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S
abe aquela frase que todo mundo repete “depois que você tiver um filho, nunca
mais vai dormir direito”? Pois é, pode ser
verdade de formas diversas ao longo da
vida. Quando o bebê nasce, demora para ele entender o que é dia e o que é noite, entrar no ritmo
da casa e ficar satisfeito por mais de três horas.
Depois que cresce, descobre que do quarto dele
até o seu é só um pulo – e vira e mexe vai lá se
enfiar no meio da cama. A criança tem medos e
se sente mais segura perto dos pais, que, por seu
lado, ficam cheios de pena, culpa, sono e vontade de resolver logo.
Cada família vai se virar de um jeito – como dá.
Seja assumindo que dorme junto com as crianças
mesmo, seja levando-as de volta noite após noite.
Há prós e contras de ambas as estratégias – veja
como funciona melhor na sua casa.
Quem não chora, não mama
Recém-nascido vive em um acorda e dorme... Quando ele acorda, chora e, em um instante, a mãe também desperta. Para facilitar o sono entrecortado na
madrugada afora, é comum a opção de deixar o bebê
ao lado da cama dos pais, em um berço, carrinho ou
moisés, até que se faça a transição para o quarto
dele. “A mãe fica esgotada nos primeiros dias, e ter o
bebê por perto facilita as mamadas noturnas”, justifica a psicoterapeuta Fernanda de Camargo Vianna,
mãe de Sophia. A transição para o
quarto do bebê pode ser feita com
“Quando o Bruno
calma, quando ele já dorme perínasceu, eu e meu
odos maiores, o que acontece em
marido optamos
geral antes dos 6 meses.
por deixá-lo dormir
Alguns pais escolhem colocar o
à noite no carrinho
recém-nascido dormindo na mesma
ao lado da minha
cama que eles. Segundo a Associacama. Achamos
ção Americana de Pediatria, conque ali ele ficaria
tudo, o hábito traz consigo risco de
mais confortável e
sufocamento. “O risco é maior em
ao mesmo tempo
bebês menores de 6 meses”, diz o
próximo da gente.
pediatra Francisco Lembo Neto, pai
Fizemos assim até ele
de Gabriel, Bruno, Victor e Danilo.
ter quase 2 meses.
Depois de passada essa idade,
O processo de
a preocupação é com a respiração
transição para
dos pais sobre o bebê. “Exalar o
ele dormir no
ar perto do filho durante a noite
quartinho foi feito aos
toda facilita a transmissão de dopoucos. Hoje não
enças respiratórias”, explica. Pais
temos o hábito de
fumantes? Alerta vermelho, prindeixá-lo dormir com
cipalmente se as crianças tiverem
a gente na cama.”
bronquite ou asma.
Ana Baula Balog,
publicitária, mãe de Bruno
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comportamento
“A Flora tem 2 anos e
meio e dorme em um
berço no quarto dela.
Agora vai para uma
cama e pode querer ir
para o nosso quarto à
noite. Mas eu e minha
esposa achamos que
a privacidade deve
ser mantida. O casal
precisa se manter como
casal, e não só como
pai e mãe. Vamos
conversar com ela e
levá-la de volta quantas
vezes for preciso, até
ela perceber. Claro,
haverá exceções e a
porta ficará sempre
encostada, mas dormir
na nossa cama não
será um hábito.”
João Correia, pai de Flora
No fundo, muita coisa é questão
de bom senso. Faz parte da função do
pai e da mãe ponderar o quanto ter o
filho por perto – até compartilhando a
cama – é bom para ele e para os pais, e
o momento certo de fazer a separação.
“Temos que escapar do certo e errado
e pensar na postura e na opção dos
pais perante a situação”, diz a psicoterapeuta Fernanda Vianna.
Em algumas famílias, dormir com
o filho é a melhor opção e todo mundo vive bem assim. “Eu trazia a Maria
Eduarda para a minha cama. É mais
prático e eu sentia que ela ficava mais
segura”, conta a mãe, a secretária Fernanda Mônico. Caso a opção seja dormir todo mundo junto mesmo, o pediatra Franciso sugere que a cama seja
maior e o quarto, arejado, para que o
ar circule bem.
Tem um monstro no meu quarto
Pesadelo, xixi na cama, medo do que tem dentro
do armário, saudade da mãe, chegada de um irmão... Quando chega a madrugada, são muitos os
motivos que levam a criança a buscar a segurança
dos pais – no quarto ao lado!
Segundo a psicóloga Christine Bruder, mãe de Paulo e Isabela, devolver a criança para o quarto dela pode
ser mais trabalhoso, mas, a longo prazo, dá mais confiança e autonomia tanto para ela quanto para os pais.
“Eles devem acalmá-la e dizer que está segura”, orienta.
Embora possa fazer parte do desenvolvimento
um período de medos noturnos, é importante enten-
der o que pode estar acontecendo. “É preciso analisar
o que está passando pela cabeça dela”, diz Fernanda
Vianna. Segundo ela, procurar ajuda também é válido se os pais não conseguirem decifrar sozinhos.
Na madrugada, as opções são variadas: a família
pode escolher deixar o filho dormir junto na cama,
ou levá-lo de volta. Dá pra acalmá-lo ainda na cama
dos pais e carregá-lo para o quarto dele depois,
ou levá-lo direto, explicando que ele está seguro ao
lado dos pais, e até contar uma historinha se for o
caso. Mas sem pânico: tudo isso costuma passar naturalmente e não é tão preocupante assim. “Os pais
ficam com medo de estarem criando algum tipo de
comportamento viciante. Existem momentos em que
a criança precisa ser atendida mesmo, mas uma hora
ela vai querer ir dormir sozinha”, tranquiliza Christine.
Juntos por opção
Tamara Hiller, uma parteira nascida na Alemanha,
notava que as mães que atendia estavam sempre
cansadas e estressadas por levantar tantas vezes à
noite. Desde então, sugere a cama compartilhada e
hoje pratica isso com a filha, Sun. “Quando o bebê
acorda, espera que
a mãe esteja ali. É
“O Lucas tem 3 anos
ancestral: ambos
e meio e todas as
precisam ficar colamadrugadas, por
dos e não é seguro
volta da 1h, vai para a
estar sozinho. Ele
nossa cama, sempre
entra em pânico e
falando que está com
chora ainda mais”,
medo. Sei que ele faz
justifica Tamara.
isso porque eu e meu
É que ela demarido permitimos que
fende a “criação
ele fique conosco, e
com apego”, do in-
A psicóloga Christine Bruder propõe estas questões
quando os filhos começam a dormir na cama do casal:
1. Quando a criança vem para a minha cama,
a necessidade é dela ou minha?
2. Que questão meu filho tem para querer dormir
comigo? Aconteceu algo perturbador?
3. Qual a melhor maneira de eu cuidar disso:
no quarto dela ou no meu?
fazemos isso por três
motivos: adoramos
dormir com ele, temos
dó da carinha que ele
faz e acordo 5h todos
os dias para trabalhar
(portanto estou sempre
muito cansada!). Todos
me criticam quando
conto. Mas quando
olho para o Lucas e
vejo quanto cresce
rápido, penso: ‘Deixa
eu aproveitar’.”
Kátia Dezotti, mãe de Lucas
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“Quando o Bernardo
tinha 4 meses, eu
estava muito cansada
pela rotina. Uma
noite eu contei: ele
acordou literalmente
vinte vezes. Nesse dia
decidi colocá-lo para
dormir de vez na cama
conosco. Para mim
não é problema. Foi
a melhor escolha que
eu fiz. É bom para o
meu descanso, pois
ele precisava de uma
mãe bem para cuidar
dele. E descobrimos
um vínculo gostoso. Eu
descanso melhor e, se
ele acorda assustado,
estou do lado.
Estamos amando.”
glês “attachment parenting”,
um movimento que ganhou
nome e força com o pediatra
americano William Sears na
década de 90. Compartilhar
a cama é um dos princípios,
além de amamentar em livre
demanda e carregar o bebê
com o auxílio do sling. Ela fala
sobre tudo isso em seu blog,
o Slingando, que criou quando veio morar no Brasil.
Sobre risco de sufocamento ou dependência
emocional da criança? Ela
não acha que isso realmente
seja um problema e garante
que há evidências científicas
Nanda Olegário,
de que a cama compartimãe de Bernardo
lhada é saudável. Cita, por
exemplo, uma pesquisa do
médico americano David
Waynforth, que aponta que
dormir na cama com os pais diminui no corpo do bebê os níveis de cortisol, hormônio do
stress, fazendo com que ele chore menos e fique menos irritado.
Na casa de Tamara, a cama fica encostada
na parede, e Sun fica sempre nesse canto ou
entre os pais. “Me sinto mais no controle. Posso checar durante a noite se ela está com os
pés frios, por exemplo”, conta.
Ela acha que a cama compartilhada não
“vicia” a criança. Pelo contrário: ela dá o passo
da independência sozinha. “Ficando mais equilibrada e feliz na segurança da família, a criança
tem a necessidade satisfeita e se solta na idade
que considerar certa”, acredita ela.
Em muitas culturas, é natural que a família durma reunida. Isso pode funcionar
para você ou não – depende de muitos
fatores, entre eles a maneira como o
casal se relaciona. Qualquer que seja
a escolha, o importante é que todos
durmam bem. &
Quando o buraco
é mais embaixo
O casal não anda
se relacionando muito
bem e a criança ganha
cada vez mais espaço
na cama. Xi, pode ser
uma furada. “Muitas
vezes o filho entra para
proteger o casamento
e tapar buracos na
relação conjugal. Aí
o hábito de dormir
junto acaba
encobrindo questões
importantes, mesmo
sem o casal perceber”,
aponta Fernanda. Se
for o caso, pode ser
indicado buscar a
orientação
de um psicólogo.
Consultoria
christine Bruder, mãe de Paulo e Isabella,
é psicóloga e psicanalista do Primetime Child
Development; Fernanda de Camargo Vianna,
mãe de Sophia, é psicoterapeuta e coordenadora
do Serviço de Psicologia do Hospital e
Maternidade São Luiz; Francisco Lembo
Neto, pai de Gabriel, Bruno, Victor e Danilo, é
coordenador da Pediatria do Hospital Samaritano
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