nem confetes, nem serpentina: o bloco brasa viva no
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nem confetes, nem serpentina: o bloco brasa viva no
NEM CONFETES, NEM SERPENTINA: O BLOCO BRASA VIVA NO CARNAVAL DE RUA DE BAGÉ RS (1) Rafael Rosa da Silva(2), Caiuá Cardoso Al-Alam(3), (1) Trabalho realizado do projeto da disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso, do curso de Produção e Política Cultural, da Unipampa campus Jaguarão RS; (2) Graduando no curso de Bacharelado em Produção e Política Cultural, Campus Jaguarão, UNIPAMPA. Bolsista no Projeto de extensão Catalogação e Digitalização de Documentação Histórica; [email protected]; (3) Professor da Universidade Federal do Pampa, campus Jaguarão, licenciado em História pela Universidade Federal de Pelotas, mestre em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos e doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; [email protected]; RESUMO: O carnaval de rua de Bagé vem sofrendo diversas mudanças ao longo dos anos, seja na padronização do samba, do tempo de desfile ou na aceleração das baterias. Com isso, este trabalho procurou registrar a trajetória do Bloco Burlesco Brasa Viva, fundado na década de 1960 na cidade de Bagé RS, mostrando como se deu o processo de interação do bloco com as transformações ocorridas no carnaval Bageense. Três pontos foram abordados e discutidos no trabalho, sendo eles a história do Bloco, mostrando como se deu o processo de fundação; como o bloco se organiza no carnaval atual, ensaios e desfiles e como o bloco interage com as diversas transformações ocorridas no carnaval de rua de Bagé. Sendo assim, foram analisados os pontos positivos e negativos na perspectiva dos integrantes do bloco. A memória, atrelada à história oral e a trajetória de vida dos membros fundadores do bloco foram analisados e discutidos ao longo do trabalho. Com isso se pode entender, na visão desses agentes, como o bloco vem interagindo com as transformações ao longo dos anos, num misto de saudade e frustração, saudade pelos desfiles que priorizavam as brincadeiras e frustração pela descaracterização dos blocos burlescos. Palavras-Chave: samba, cultural popular, carnaval. INTRODUÇÃO Diversas são as discussões e os estudos em torno do carnaval no Brasil, talvez devido às diversas manifestações existentes nesse período e que variam de um estado para o outro, ou mesmo por ser um campo de estudo que traz em si uma pluralidade de aspectos que podem ser analisados em diversas áreas do conhecimento. A respeito do carnaval do Rio Grande do Sul, existem poucos trabalhos, principalmente no que diz respeito ao carnaval interiorano. Sendo assim, pretendo preencher essa lacuna e mostrar como o carnaval do interior também é afetado pelas transformações ocorridas nos grandes centros. Analisando a cultura popular como resistência no carnaval burlesco de Bagé, há um compartilhamento, tanto no núcleo familiar quanto na comunidade onde o bloco está inserido, do que o povo produz. Dessa maneira, eles podem de maneira comunitária, nem que seja entre eles, expressar sua realidade das mais diversas maneiras, pois há uma produção “local”, existindo, por exemplo, diversos músicos e compositores que pertencem a essas comunidades. Silva (2006) atenta para analise do samba como fator de afirmação social, de compreensão de uma realidade desigual, compreendendo a história de preconceito e perseguições que fizeram parte da trajetória dos sambistas ao longo do carnaval. Com isso, pensar o samba, motor que move os Blocos Burlescos de Bagé e que sempre moveu o Bloco Brasa Viva é de extrema importância, tendo em vista que existiam muitos sambistas na comunidade onde o bloco está inserido. O universo dos blocos burlescos de Bagé, em seu particular, tem no seu principal contexto a autonomia, que faz com que cada bloco tenha em sua comunidade o seu modelo de organização e construção do seu carnaval. Esse fato se coloca em risco diante de um carnaval que busca a padronização mediante um desfile “igual para todos”. O carnaval burlesco de Bagé pode ser analisado como um carnaval do esquecimento do dia a dia, o momento fuga da realidade ao mesmo tempo em que pode ser entendido como um processo de inversão e negação dessa realidade (DAMATTA, 1997). METODOLOGIA O trabalho teve como público-alvo os membros fundadores do Bloco Burlesco Brasa Viva, as pessoas que participam na organização e desfile do Bloco, assim como os membros que frequentam e desfilam categoria dos Blocos Burlescos no carnaval de rua de Bagé. Neste trabalho, foi usado o método de pesquisa não experimental e a partir do levantamento de dados, o trabalho está dividido em três categorias de análise. a) história do bloco, desde sua fundação, passando pelos seus integrantes até os dias de hoje. Anais do VII Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão – Universidade Federal do Pampa Contar a história do Bloco é fundamental para entendermos a história do carnaval de Bagé, pois o Brasa Viva é um dos Blocos Burlescos mais antigos da cidade e importante no cenário do carnaval de rua; b) processos de organização, ensaios e desfile do bloco Brasa Viva na avenida; c) reprodução e resistência do bloco, tendo em vista que nem sempre as transformações ocorridas no carnaval são aceitas pelos Blocos. A pesquisa em documentos, como por exemplo, a ata de fundação e as entrevistas foram importantes para lançar provocações acerca de todas as mudanças que vem ocorrendo no carnaval de Bagé. Foi realizada uma pesquisa de campo, no qual realizei entrevistas e visitei a sede do Bloco Brasa Viva, pois assim tive contato com muitos documentos pertencentes ao Bloco, como por exemplo, fotos antigas e recentes. A história oral também foi importante, pois assim pude trabalhar com a memória e a trajetória de vida do pesquisado (BONI; QUARESMA, 2005). RESULTADOS E DISCUSSÃO O Bloco Burlesco Brasa Viva teve sua história contada através de dois fundadores, sendo eles seu Alípio Oliveira Dias e Antônio Jorge Ritta Berdet. Seu Alípio e seu Antônio passaram, junto com o bloco, por todo o processo de transformação que o carnaval de rua de Bagé sofreu e vem sofrendo. Fica nítido o descontentamento com o carnaval atual, pois os dois relatos mostraram que assim que a categoria Burlesca no carnaval de rua foi criada, o que importava era a brincadeira, as sátiras e a fuga de uma realidade cansativa. Pintor e Padeiro aposentados, seu Alípio e seu Antônio, junto de muitos membros da comunidade do Alto da Santa Casa, localizada na região central da cidade de Bagé, sempre tiveram no bloco Brasa Viva e no futebol suas paixões. As entrevistas foram importantes para entender todo o processo de padronização que o bloco sofreu, como por exemplo, na bateria, que por conta de um padrão imposto pelas escolas de samba do Rio de Janeiro, ao tempo foi acelerando e com isso deixando de lado instrumentos que segundo os entrevistados eram de muita importância para o bloco, como por exemplo, o sopapo. Segundo Maia (2008) ao tempo que as baterias foram sofrendo influencia do Rio de Janeiro, foram deixando de ser utilizados, tendo em vista que as baterias foram acelerando seu ritmo e deixando de ser “suingada”. Seu Alípio deixa claro o descontentamento com o jeito “novo”, segundo ele de se tocar, pois não há mais espaço para brincadeiras, para dança e nem mesmo para sambar. Tinhorão (2012) enfatiza que na década de sessenta as escolas de samba do Rio de Janeiro começaram a sofrer um processo de profissionalização, tendo em vista a entrada de agentes externos, segundo o autor, como, por exemplo, coreógrafos e bailarinos e que com isso as escolas começaram a perder suas identidades. Em contraponto a Tinhorão, acredito que por mais que o carnaval de rua de Bagé tenha sido influenciado em vários aspectos por essa padronização, os blocos buelscos ainda conseguiram preservar sua organização de maneira autônoma. CONCLUSÕES Enfim, pude compreender como o bloco interagiu com as transformações ocorridas no carnaval Bageense, como a profissionalização, decorrente também da padronização imposta a categoria burlesca, que obriga os blocos, por exemplo, a terem um samba enredo e alegorias que fazem alusão ao tema. Ao passo em que os desfiles foram se profissionalizando, muitos blocos burlescos fecharam por conta de não se adaptar à um modelo quadrado de desfile. O Bloco Burlesco Brasa Viva ainda resiste em um carnaval onde não se pensa mais a manifestação cultural do samba, da cultura popular e sim o que se pode ganhar em cima de grupos que entendem o carnaval como manifestação cultural e não como comércio. REFERÊNCIAS BONI, V.; QUARESMA, J. Aprendendo a entrevistar: Como fazer entrevistas em Ciências Sociais. Em Tese. Vol. 2 nº 1 (3), 68-80, 2005. DAMATTA, R. Carnavais, Malandros e Heróis: Para uma Sociologia do dilema Brasileiro. 6.ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. MAIA, M. S. O Sopapo e o Cabobu: Etnografia de uma Tradição Percussiva no Extremo Sul do Brasil. Porto Alegre: UFRGS/Programa de Pós-Graduação em Música (tese de doutorado) 2008. SILVA, Á. D. No balanço da “Mais Querida”: música, socialização e cultura negra na escola de samba Embaixada Copa Lord – Florianópolis (SC). São Paulo: UNESP/Programa de Pós-Graduação em Música (dissertação de mestrado) 2006. TINHORÃO, J. R. Música Popular: Um tema em debate. 4.ed. São Paulo: Editora 34, 2012. Anais do VII Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão – Universidade Federal do Pampa