alguns problemas na adoção do distinguishing no - Libertas
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alguns problemas na adoção do distinguishing no - Libertas
Precedentes:algunsproblemasna adoçã ododistinguishingnoBrasil. DierleNunes UniversidadeFederaldeMinasGerais AlexandreFreire UniversidadeFederaldoMaranhã o DanielPolignanoGodoy UniversidadeFederaldeMinasGerais DaniloCorrêaLimadeCarvalho UniversidadeFederaldeMinasGerais INTRODUÇÃO Como já se teve oportunidade de tematizar em outras oportunidades, 1o Brasil, e os tradicionais sistemas de civil law, vê m vivenciando um movimento de convergê ncia com o common law que nã o pode mais ser consideradoaparente,devidoacolocaçã odecadavezmaiordestaqueaouso dajurisprudê nciacomofundamentodeprolaçã odedecisõ espeloJudiciá rio pá trio. Há deseperceberqueapó saefetivafalê nciadomodeloreformistaimposto, entre nó s, apó s a dé cada de 1990, que apostou, em apertada sın ́ tese, prioritariamente em reformas legislativas (e nã o em uma abordagem panorâ mica e multidimensional, nominada de “processualismo constitucionaldemocrá tico”)2 1THEODOROJUNIOR,Humberto;NUNES,Dierle;BAHIA,Alexandre.Brevesconsideraçõ esdapolitizaçã o do judiciá rio e do panorama deaplicaçã o no direito brasileiro – Aná lise da convergê ncia entre o civillaweocommonlawedosproblemasdapadronizaçã odecisó ria.RevistadeProcesso,vol.189, p. 3, Sã o Paulo: Ed. RT, nov. 2010. NUNES, Dierle. Processualismoconstitucionaldemocrático e o dimensionamento de té cnicas para a litigiosidade repetitiva.Alitigância de interessepúblicoe as tendê ncias“nã ocompreendidas”depadronizaçã odecisó ria.RevistadeProcesso,vol.199,p.38,Sã o Paulo:Ed.RT,set.2011. 2NUNES,Dierle.Processualismoconstitucionaldemocráticoeodimensionamentodeté cnicasparaa litigiosidade repetitiva. A litigância de interesse públicoe as tendê ncias “nã o compreendidas” de padronizaçã odecisó ria.Cit.p.38 ARTIGOS RevistaLibertas,UFOP,v.1,n.1,jan./jun. 2013 enoidealsocializadordebuscadereforçotã osó doprotagonismojudicial, 3 algunsvê ma algunsanos, em faceda explosã o exponencial de demandas e dosaltosın ́ dicesde‘congestionamentojudicial’,defendendoumpeculiaruso dos precedentes (vistos como padrõ es decisó rios) para dimensionar a litigiosidaderepetitiva. O pressuposto equivocado é o de que mediante o julgamento de um ú nico caso, sem um contraditó rio dinâ mico como garantia de in luê ncia e nã o surpresaparasuaformaçã o,medianteaté cnicadecausapiloto, 4oTribunal Superior(eexisteamesmatendê nciadeampliaçã odessapadronizaçã onos juıźos de segundo grau no CPC Projetado) formaria um julgado (interpretadopornó scomoprecedente) quedeveriaseraplicadoatodos oscasos“idênticos”. Pode-senotaraintençã odeestenderoâ mbitodeaplicabilidadedasdecisõ es judiciais, fazendo com que o Judiciá riono menornú merodevezespossıv́el tenhaqueseaprofundarnaaná lisedequestõ essimilares,tornando-semais e iciente quantitativamente atravé s do estabelecimento de padrõ es a serem seguidos nos casos idê nticos subsequentes, sob o argumento de preservaçã odaisonomia,daceleridade,daestabilidadeedaprevisibilidade do sistema. Neste particular, o movimento reformista brasileiro converge para uma aproximaçã o com o sistema do common law, ao adotar julgados que devem ser seguidos nas decisõ es futuras – o que con iguraria uma peculiar forma de precedente judicial, com diferentes graus de força vinculante. Pretende-se, nesses termos, para muitos, em suma: a) proporcionar tratamentoigualitá rioaoslitigantesqueseencontrememsituaçã oidê ntica, apesar de nã o se sondar com pro iciê ncia, em abordagem constitucional adequada, o que seria esta identidade; b) dotar de estabilidade e previsibilidade o Poder Judiciá rio pá trio; c) e abreviar a duraçã o dos processos – seja pondo um im prematuro ao seu curso por uma decisã o imediata (sentença de improcedê ncia prima facie – 285A), seja pela inadmissã o de recursos em face daquele provimento por contrariar posicionamento jurisprudencial trazido por sú mulas vinculantes, sú mulas impeditivas de recursos, repercussã o geral, incidentes de recursos repetitivos. No contexto ora discutido, e que se projeta no CPC vindouro, que foram criadosoincidentedeaferiçã odarepercussã ogeral(art.543-BdoCPC)eo julgamento de recursos especiais repetitivos (art. 543-C do CPC) por amostragem, instituı́dos, o primeiro, pela Emenda Constitucional nº 45/04 (comaregulamentaçã odadapelaLein.11.418/2006),eosegundo,pelaLei 3Para uma aná lise mais consistente dos equı́vocos do movimento reformista brasileiro conferir: NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático: uma análise critica das reformas processuais.Curitiba:Juruá ,2008. 4“Trata-sedeumaté cnicaconhecida emdiversospaıs ́ es,que adenominamde‘caso-piloto,‘casoteste’ ou ‘processo-mestre’. Consiste o mecanismo em permitir que, entre vá rias demandas idê nticas, seja escolhida umasó , a ser decidida pelo tribunal,aplicando-se a sentença aos demais processos, que haviam icado suspensos. Esse mé todo é utilizado pela Alemanha, Austria, Dinamarca, Noruega e Espanha (nesta, só para o contencioso administrativo)’.” (GRINOVER, Ada Pellegrini. “O tratamento dos processos repetitivos”. JAYME, Fernando Gonzaga; FARIA, Juliana Cordeiro de; LAUAR, Maira Terra (coord). Processocivil:novastendências:estudosemhomenagem aoprofessorHumbertoTheodoroJunior.BeloHorizonte:DelRey,2008,p.5 nº11.672/2008,respectivamente. 5 Percebe-se,assim,queapreocupaçã ocomacoerê nciaeauniformidadedos pronunciamentos judiciais no Brasil é algo indiscutivelmente presente no legislativo, no fó rum e na academia. A necessidade de estabilizaçã o e uniformizaçã o da interpretaçã o das normas que compõ em o direito brasileiroé inegá vel.Nadaobstante,exigirrespeitoaosprecedentesjudiciais, noBrasil,é ,naverdade,enosdiasatuais,umamedidapertinente,desdeque bem compreendida e delineada uma teoria dos precedentes, para conferir segurança,igualdadeeprevisibilidadenoDireito,dentreoutrosmotivosque ajusti icam.6 Noentanto,emquepeseanecessidadedesealcançartaisdesideratos,vá rias questõ essuscitampreocupaçõ esnousodeprecedentesemsistemasqueos levamasé rio(oqueaindainocorrenoBrasil),bastandoaquisecitaremdois: a) se realmente seria possıv́el que apenas uma decisã o isolada pudesse se tornar e ser aplicada como um precedente;7b) qual seria o papel da doutrina8e doprocessoconstitucionalnacrıt́ica,pelaprimeira,enoauxıĺio deconstruçã odestesprecedentes,dosdois. Ademais,comoumdosautoresjá defendeuemoutrasede,naaplicaçã odos padrõ esdecisó riosdeveriaseguir-seumitermın ́ imodeaplicaçã o: Nesse aspecto, o processualismo constitucional democráticopornó sdefendidotentadiscutiraaplicaçã o de uma igualdade efetiva e valoriza, de modo policê ntricoecomparticipativo,umarenovadadefesade convergê ncia entre o civillaw e commonlaw, ao buscar uma aplicaçã o legıt́ima e e iciente (efetiva) do Direito para todas as litigiosidades (sem se aplicar padrõ es decisó rios que pauperizam a aná lise e a reconstruçã o interpretativadodireito),edefendendoodelineamento de uma teoria dos precedentes para o Brasil que suplante a utilizaçã o mecâ nica dos julgados isolados e sú mulas em nosso paıś. Nesses termos, seria essencial para a aplicaçã o de precedentes seguir algumas premissas essenciais: 1.º – Esgotamento pré vio da temá tica antes de sua utilizaçã o como um padrã o decisó rio (precedente): ao se proceder à aná lise de aplicaçã odosprecedentesnocommonlawsepercebeser muito difıćil a formaçã o de um precedente (padrã o 5Nesse sentido: NUNES, Dierle, PATRUS, Rafael Dilly. Uma breve notıc ́ ia sobre o procedimento - modeloalemã oesobreastendê nciasbrasileirasdepadronizaçã odecisó ria:umcontributoparao estudo do incidente de resoluçã o de demandas repetitivas brasileiro. In. FREIRE, Alexandre, DANTAS,NUNES,Dierle,DIDIERJR,Fredie,MEDINA,José MiguelGarcia,FUX,Luiz,CAMARGO,Luiz HenriqueVolpe,OLIVEIRA,PedroMirandade.NovasTendê nciasdoProcessoCivil:estudossobreo projetodonovoCó digodeProcessoCivil.Salvador:Juspodivm,2013.p.471ess. 6Nesse sentido: FREIRE, Alexandre, FREIRE, Alonso Reis, MEDINA, José Miguel Garcia. Para uma compreensã o adequada do sistema de precedentes no projeto do novo có digo de processo civil brasileiro.In.FREIRE,Alexandre,DANTAS,NUNES,Dierle,DIDIERJR,Fredie,MEDINA,José Miguel Garcia,FUX,Luiz,CAMARGO,LuizHenriqueVolpe,OLIVEIRA,PedroMirandade.NovasTendê ncias doProcessoCivil:estudossobreoprojetodonovoCó digodeProcessoCivil. Salvador:Juspodivm, 2013.p.686. 7HONDIUS,Ewoud.Precedentanthelaw:ReportstotheXVIIthCongressInternationalAcademyof ComparativeLawUtrecht,16-22July2006.Bruxelles,Bruylant,2007,p.16-17. 8Idem.p.23. decisó rio a ser repetido) a partir de um ú nico julgado, salvo se em sua aná lise for procedido um esgotamento discursivo de todos os aspectos relevantes suscitados pelosinteressados.Nestestermos,mostra-seestranhaa formaçã odeum“precedente”apartirdeumjulgamento super icial de um (ou poucos) recursos (especiais e/ou extraordiná rios) pinçados pelos Tribunais (de Justiça/regionais ou Superiores). Ou seja, precedente (padrã odecisó rio)di icilmente se formaa partirdeum ú nico julgado. 2.º – Integridade da reconstruçã o da histó ria institucional de aplicaçã o da tese ou instituto pelo tribunal: ao formar o precedente o Tribunal Superior deverá levarem consideraçã o todoo histó rico de aplicaçã o da tese, sendo inviá vel que o magistrado decidadesconsiderandoopassadodedecisõ esacercada temá tica.E mesmoque seja umahipó tesede superaçã o doprecedente(overruling)9omagistradodeverá indicar 9Como explica Bustamante: “O overruling é uma espé cie do gê nero das denominadas judicial departures, ou seja, dos casos de afastamento de uma regra jurisprudencial. Uma hipó tese de afastamentosedá quandootribunalresolveumproblemajurıd ́ icosolucioná velporumprecedente judicial, mas de forma diferente. O juiz apela, nesses casos, para uma nova regra jurı́dica que conduz a um resultado diverso do previsto pelo precedente. Como explicam Summers e Eng [1997:521],nasjudicialdepartures‘adecisã oprecedentedeveserapropriadamentesemelhanteao casosubsequente.Emú ltimainstâ ncia,oprecedenteeocasoaserdecididodevemtrazerà tonaas mesmasquestõ esjurıd ́ icas,eocasoprecedentedevejá terresolvidoaquestã o.(...).Empaıśesde commonlaw,umadepartureouafastamentodeumprecedenteporumacortesuperiorpode,viade regra, ser prontamente identi icada como um regramento [ruling] diferente para uma questã o postaporfatosmateriaisrelevantementesemelhantesaosdadecisã oprecedente’. (...)Assituaçõ es quedã oocasiã oaooverruling–aanulaçã odeumprecedentepelopró prioó rgã ojurisdicionalqueo estabeleceu – costumam variar, em cada sistema jurı́dico, em funçã o dos fatores institucionais e extra-institucionaisquein luemsobreaforçadoprecedentejudicial.Noentanto,aregra-de-ouro sobre as departures – e o overruling, em especial – deve ser a mesma, nã o importam a tradiçã o jurıd ́ icaouaforçadoprecedentenocasoconcreto:semprequeumjuizoutribunalforseafastarde seu pró prio precedente, este deve ser levado em consideraçã o, de modo que a questã o do afastamento do precedente judicial seja expressamente tematizada. (...) Diferentemente do que ocorre com os precedentes meramente persuasivos, a superaçã o de um precedente formalmente vinculante normalmente é encarada como um ‘evento polı́tico e jurı́dico signi icativo’, pois representa uma “forma dramá tica de modi icaçã o do Direito” [Spriggs/Hansford 2001:1.092]. Mesmonossistemasjurıd ́ icosemqueasestatıśticasapontamumgrandenú merodeoverrulingsna jurisprudê nciadamaisaltacorte,comoodosEstadosUnidosdaAmé rica,aprá ticadeab-rogaçã o da jurisprudê ncia formalmente vinculante é ao menos teoricamente descrita como excepcional e encontraumasé riedelimitesnormativos.(...)NoReinoUnido,J.W.Harrisconseguiusistematizar umnú cleodurodeprincı́piosqueorientamaprá ticadooverrulingelimitamseuexercıćio,osquais podem ser genericamente quali icados como de inidores da teoria do ‘overruling’ adotada pela House of Lords. De inıćio, Harris demonstra que para a House of Lords uma decisã o deve ser overruled quando o Direito presente, levados todos os fatores relevantes em consideraçã o, for incrementado [improved] com o estabelecimento do novo precedente judicial [Harris 1990:149]. Fatorescomoajustiça,certezaecoerê nciadoDireito–consideradocomoumsistemadenormas destinado a reger nã o apenas ocaso particular,mas todo o universo dequestõ es futuras sobreo mesmoassunto–devemserponderadoscomo itodejusti icaraconclusã odequearevogaçã oda normacontidaemumprecedentejudicialirá contribuirparaoprogressodosistemajurıd ́ ico,queé o principal parâ metro a ser seguido pela Corte no momento em que esta decide sobre a manutençã o ou revisã o da regra jurı́dica posta em xeque em um caso concreto. As vezes, por exemplo,é justi icá velarevogaçã odeumaregrajurisprudencialparaevitarautilizaçã oexcessiva daté cnicadodistinguishing,quegeraaconsequê nciaindesejá veldafragmentaçã odoDireitoedá margem a diferenciaçõ es capazes de comprometer a coerê ncia geral do ordenamento jurıd ́ ico. Nesse sentido, valetranscrevero seguinte dictum de Lord Reid: ‘E notó rio que onde uma decisã o existente é reprovada mas nã o pode ser ab-rogada [overruled] ostribunais tendem a distingui-la combaseemfundamentosinadequados.Eunã oachoqueelesagemerroneamenteaofazê -lo:eles estã o adotando a menos danosa das poucas alternativas que lhes estã o abertas. Mas isso está fadadoa causarincerteza,poisningué m podedizerdeantemã o seemumcaso particularaCorte irá , ou nã o, se sentir vinculada a seguir a velha decisã o insatisfató ria. Ponderando-se ambos os lados,parece-mequeaab-rogaçã o[overruling]detaldecisã oiriapromoverenã oreduzirograude a reconstruçã o e as razõ es (fundamentaçã o idô nea)10 para a quebra do posicionamento acerca da temá tica.11 3.º – Estabilidade decisó ria dentro do Tribunal (stare decisis12horizontal): o Tribunal é vinculado à s suas pró prias decisõ es: como o precedente deve se formar comumadiscussã opró ximadaexaustã o,opadrã opassa a ser vinculante para os Ministros do Tribunal que o formou.Eimpensá velnaquelastradiçõ esqueaqualquer momentoumministrotentepromoverumentendimento particular (subjetivo) acerca de uma temá tica, salvo quandosetratardeumcasodiferente(distinguishing)ou de superaçã o (overruling). Mas nestas hipó teses sua fundamentaçã o deve ser idô nea ao convencimento da situaçã o de aplicaçã o. 4.º – Aplicaçã o discursiva do padrã o (precedente) pelos tribunais inferiores (stare decisisvertical):asdecisõ esdostribunaissuperioressã o consideradas obrigató rias para os tribunais inferiores (“comparaçã o de casos”):13o precedente nã o pode ser aplicado de modo mecâ nico pelos Tribunais e juıźes (como v.g. as sú mulas sã o aplicadas entre nó s). Na tradiçã o do common law, para suscitar um precedente como fundamento, o juiz deve mostrar que o caso, inclusive,emalgunscasos,noplanofá tico,é idê nticoao precedente do Tribunal Superior, ou seja, nã o há uma repetiçã o mecâ nica, mas uma demonstraçã o discursiva daidentidadedoscasos.5.º–Estabelecimentode ixaçã o e separaçã o das ratione decidendi dos obter dicta da decisã o: a ratio decidendi 14 (elemento vinculante) certeza do Direito’.” BUSTAMANTE , Thomas. Umateorianormativadoprecedentejudicial:opesoda jurisprudêncianaargumentaçãojurídica.TesedeDoutorado,RiodeJaneiro,PUC,2007.p.235. 10“Isso nã o signi ica, poré m, que a Corte assim o fará tã o prontamente, sem que haja uma “justi icaçã oespecial”paraembasarumafastamentodoprecedente”. SELLERS,MortimerN.S.Op.cit. Cf.Dickersonvs.UnitedStates,430U.S.428,120S.Ct.2326,2336(2000),citando UnitedStatesvs. InternationalBusinessMachinesCorp., 517U.S. 843, 856,citando Paynev.Tennessee, 501 U.S. 808, 842(Souterconcordando)eArizonavs.Rumsey,467U.S.203,212(1984). 11Ao lembrar do precedente Caseyvs.PlannedParenthoodofPennsylvania (505U.S. 833de 1992) Sellersinformaque“constantessuperaçõ esprecedenciaisiriamexigirdemaisdacrençadoPaıśna boa-fé daCorte,particularmentequandorevisitandocasosdivisó riosecontroversos”.Traduçã ode André Frederico de Sena Horta. Graduando da UFMG. Membro do grupo de pesquisa “processualismo constitucional democrá tico e circulaçã o dos modelos de civillaw e commonlaw” sobacoordenaçã odoProf.Dr.DierleNunes. Nooriginal:“Frequentoverruling wouldovertaxthe Country’s beliefin the Court’s good faith,” particularly when revisiting divisive and controversial cases.”SELLERS,MortimerN.S.ThedoctrineofprecedentintheUnitedStatesofAmericacit. 12Aexpressã ocompletaseria:Staredecisisetquietanonmovereou“mantenha-seoquefoidecidido enã omolesteoqueestá paci icado” 13Cf. uma busca de aplicaçã o dialé tica da “comparaçã o de casos” em: ROTH, Bram; VERHEIJ, Bart. DialecticalArguments and Case Comparison. In: GORDON, T. (ed.) Legalknowledgeandinformation systemsjuris2004:theseventeenthannualconference.Amsterdam:IOSPress,2004.p.99-108. 14ComoexplicaBustamante:“Adi iculdadeparadeterminararatiodecidendideumcasoqualquer decorre,emminhaopiniã o,dapressuposiçã odequehá apenasumaratioemcadacasojulgado.Tal premissaapenasresultariaplausıv́elenquantoseadmitissecomoinquestioná velatesepositivista de que as razõ es dadas pelo juiz para sua decisã o sã o irrelevantes para determinar a regra jurisprudencial. Uma teoria dos precedentes quesupere o PositivismoJurıd ́ ico e suaexasperaçã o domomentoauctoritasnoraciocı́niojurı́diconã opodeaceitaressatese.Enasrazõ esqueosjuı́zes dã oparajusti icarsuasdecisõ esquedevemserbuscadososprecedentes[MacCormick1987:155]. A ausê ncia dessas razõ es ou sua superaçã o por outras consideradas mais fortes em uma argumentaçã o imparcial afeta a aplicaçã o e, em casos mais graves, a pró pria validade da norma adscritaproduzidapeloJudiciá rio.Enamotivaçã ooufundamentaçã odassentençasjudiciaisqueas justi icaepodeservirdepadrã oparaasoluçã odocaso futuro; já o obter dictum constituem-se pelos discursos nã o autoritativos que se manifestam nos pronunciamentos judiciais “de sorte que apenas as consideraçõ es que representam indispensavelmente o nexo estrito de causalidade jurıd ́ ica entre o fato e a decisã ointegrama ratiodecidendi,ondequalqueroutro aspecto relevante, qualquer outra observaçã o, qualquer outra advertê ncia que nã o tem aquela relaçã o de causalidade é obiter: um obiterdictum ou, nas palavras de Vaughan, um gratisdictum.” 156.º – Delineamento de té cnicas processuais idô neas de distinçã o (distinguishing) e superaçã o (overruling) do padrã o decisó rio:Aideiadesepadronizarentendimentosnã ose presta tã o só ao im de promover um modo e iciente e rá pido de julgar casos, para se gerar uma profusã o numé rica de julgamentos. Nestes termos, a cada precedente formado (padrã o decisó rio) devem ser criadosmodosidô neosdesedemonstrarqueocasoem que se aplicaria um precedente é diferente daquele padrã o,mesmoqueaparentementesejasemelhante,ede proceder à superaçã o de seu conteú do pela inexorá vel mudançasocial–comoordinariamenteocorreempaıśes decommonlaw.16 Partindo do necessário resgate do papel e da importância da doutrina na interlocução com esse recente e poderoso novo uso do Direito Jurisprudencial entre nó s brasileiros, especialmente no trato da litigiosidaderepetitiva,oobjetivodopresentebrevetextoserá odeexplicitar alguns aspectos do sistema de commonlaw americano, para na sequê ncia, perceber e demonstrar a ausê ncia de té cnicas de distinguishing no Brasil há beis a permitir uma discussã o mais efetiva e democrá tica dos casos, especialmenteaoseperceberapremissaacimainformadadenecessá riouso destaté cnicanatradiçã odocommonlaw. Nesse aspecto, se analisará , em especial, a existê ncia (ou nã o) de té cnicas processuais postas no Brasil à disposiçã o das partes para o controle das decisõ es que sobrestem recursos nã o idê nticos aos afetados para o julgamento por amostragem, ou que apliquem soluçã o engendrada nos “recursos-modelo”equivocadamente.Naessê ncia,trata-sedanecessidadede criaçã o de mecanismos de distinçã o entre o recurso afetado ao julgamento por amostragem e o recurso sob exame (similar ao distinguishing dos sistemas de common law)17e de superaçã o do precedente (denominado overrulingnaquelessistemas). Referidasté cnicas,comodefendemoshá muito,fazempartedaestruturados regras jurisprudenciais devem ser encontradas [Bernal Pulido 2005:211].” BUSTAMANTE , Thomas. Op.cit.,p.236. 15BUSTAMANTE ,Thomas.Op.cit. 16NUNES,Dierle.Processualismoconstitucionaldemocráticoeodimensionamentodeté cnicaspara a litigiosidade repetitiva.Alitigânciadeinteressepúblicoe as tendê ncias “nã o compreendidas” de padronizaçã odecisó ria.RevistadeProcesso,vol.189,p.38,Sã oPaulo:Ed.RT,set.2011. 17DIDIERJR.,Fredie;BRAGA,PaulaSarno;OLIVEIRA,Rafael. Cursodedireitoprocessualcivil.4ªed. Salvador:JusPodium,2009,v.2,p.392-395. sistemas de common law e sã o essenciais a qualquer ordenamento que pretenda atribuir força vinculante a precedentes judiciais, sob pena de “engessar”oDireitoque,paraserdemocrá ticoeconstitucional,necessitaser comparticipativo,dinâ micoediscursivo. Algumasbrevesdigressõesdocommonlaw–adi iculdadenaobtençãode identidadeentreoscasos Segundo Church, no sistema de commonlaw, as decisõ es judiciais de hoje sã o derivadas de decisõ es precedentes dos tribunais. Para determinar a resposta para uma questã o jurıd ́ ica, o aplicador deve revisar decisõ es judiciaispassadasefazerumexameanaló gicodetaisdecisõ es,aplicadoaos fatos do caso sob aná lise. O commonlaw é prioritariamente caracterizado porsua reverê nciaà sabedoriadasdecisõ es judiciaiscoletivasdo passado, comoafonteprimeiradastesesaplicadasparaosproblemasdopresente. 18 No caso Allegheny County General Hospital v. NLRB, julgado em 1979, a Corte de Apelaçõ es da Terceira Regiã o dos Estados Unidos, explicou que “umprecedente judicial atribui uma consequê ncia jurı́dica especı́ ica para um conjunto detalhado de fatos em um caso julgado ou decisã o judicial, passando, entã o a ser considerado como algo que fornece a regra para a determinaçã odeumcasosubsequenteenvolvendofatosmateriaisidê nticos ousemelhantesquesurgemnomesmotribunalouemumjuıźoinferiorna hierarquiajudicial.19 Um aspecto ú nico sobre o commonlaw, para o mesmo, é o modo como as aná lisesdopassadosã oincorporadasdecasospassados(precedentes)para as decisõ es do presente. Church considera que em nenhum outro grande sistema legal existe tanta ê nfase nas opiniõ esdos pró priostribunaiscomo fonteprincipaldodireito.Namaioriadosoutrossistemas,ostribunaistêm de dividir seu poder de fazer o direito e interpretar com instituições políticaseadoutrina,umavezqueostribunaistendemabuscaremoutros lugaresasopiniõ esjurıd ́ icas,mais doque emsi mesmos,parade inirqual institutodeveseraplicadoaumcasoemparticular. 20 E esta seria a essê ncia do Stare decisis no common law, com a inerente vinculatividadeà sdecisõ esdostribunais. 21 No entanto, como aponta Church, a simplicidade do stare decisis é , no entantoenganosa.QuandosedizqueostribunaisextraemoDireitodeum 18CHURCHW.L.TheAmericanLegalSystem.UniversityofWisconsinLawSchool.2011,p.10. 19608f.2d965,968-69(3edcir.1979) 20CHURCHW.L.TheAmericanLegalSystem.cit.p.15. 21Nesse sentido: FREIRE,Alexandre, FREIRE, AlonsoReis, MEDINA, José Miguel Garcia. Para uma compreensã o adequada do sistema de precedentes no projeto do novo có digo de processo civil brasileiro.In.FREIRE,Alexandre,DANTAS,NUNES,Dierle,DIDIERJR,Fredie,MEDINA,José Miguel Garcia,FUX,Luiz,CAMARGO,LuizHenriqueVolpe,OLIVEIRA,PedroMirandade.NovasTendê ncias doProcessoCivil:estudossobreoprojeto donovoCó digodeProcessoCivil.Salvador:Juspodivm, 2013.P.686ess. precedente e aplicam os resultados em situaçõ es do presente, está -se falando apenas em um simples esboço do que realmente acontece na prá tica.22 Para começar, apenas casos “idê nticos” devem ser utilizados como precedentes. No entanto, os casos nunca sã o completamente idê nticos – semprehá diferençasfá ticasentre eles.Damesmaforma,doiscasosnunca sã o absolutamente diferentes – sempre existem semelhanças fá ticas a ambos. Ocatedrá tico de Winsconsinaduzqueumarevisã o re inadadomé todo do common law, revela que ele nã o pode signi icar apenas a localizaçã o e aplicaçã o de um precedente “aná logo”. O ‘mé todo’ envolve, ao contrá rio, uma seleçã o a partir de uma multidã o quase in inita de precedentes relativamente aná logos. O ponto crıt́ico desse processo é : o que torna um casoaná logoaooutro,equalgraudesimilitudefá ticaé necessá riaperante umcasoparaquepossaserconsideradain luentenaresoluçã odeoutro.Tal processosempredesa ioudescriçã oprecisa,abstrata. 23 O procedimento de aplicaçã o de precedentes envolveria um agrupamento defatosemcategoriasouclassesdeacordocomasuarelevâ nciaparauma particular teoria normativa considerada aplicá vel a ambos os casos, de modoquealgunsfatospodemserconsideradoscomosigni icanteseoutros desconsiderados,porseremirrelevantes. A im de descobrir uma teoria jurıd ́ ica aplicá vel a um caso a im de dar coerê ncia a seus fatos, o recurso utilizado tradicionalmente tem sido a recorrê nciaà spró priasquestõ esdocaso,asdecisõ esdotribunalacercadas questõ es e a fundamentaçã o para dar suporte à decisã o, a chamada ratio decidendi. Entretanto, tal clari icaçã o verbal do processo nã o trouxe maior clarezaparaomé tododeaná liseanaló gicadoscasos:nã oexisteumaú nica forma considerada correta de compreender as questõ es, decisõ es e fundamentaçã odeumcaso. Muito pelo contrá rio, Church a irma que existem diversas formas de percepçã odoposicionamentojurıd ́ icodeumcaso,assimcomohá variadase persuasivascrıt́icaspararevertalposicionamento. Seria, assim, inteiramente possıv́el para um caso, particularmente os chamados hard cases, produzir interpretaçõ es baseadas em questõ es jurıd ́ icas que nã o estã o nele diretamente relacionados. Existiriam vá rios exemplos de tal fato na tradiçã o americana, como o conhecido precedente Shelley v. Kraemer, 334 U.S. 10 (1948), no qual convê nios particulares estabeleciamrestriçõ esracistasaousodosserviçosimobiliá rioseque,por esta razã o, foram derrubados por proibiçõ es constitucionais contra discriminaçã o racial. Segundo Church, uma leitura isolada de Shelley v. 22CHURCHW.L.TheAmericanLegalSystem.cit.p.17. 23CHURCHW.L.TheAmericanLegalSystem.cit.p.17. Kraemernã orevela, enã oconseguerevelar,qualé adecisã oouconclusã o inaldocaso.Nã ohá umú nicojeitodeatingirumadeterminaçã oprecisa–o caso é maleá vel o su iciente para permitir mais de uma interpretaçã o ou nenhuma. Assim,ousofuturodoprecedentedependedequalinterpretaçã oserá aceita pelostribunaisnofuturo–issoquerdizer–oseusigni icado inalnã opoder serde inidoanã oseratravé sdainterpretaçã oaserconduzidaemmomento posterior. Pode-sea irmarqueumprecedentejudicialé umadecisã oestabelecidaem umcasojurı́dicoanteriorquesejavinculante oupersuasivaparaomesmo ó rgã o judicial ou para outro ao decidircasos subsequentes como questõ es jurıd ́ icasoufatossimilares. Church a irma que existem vá rias outras razõ es pelas quais seria algumas vezes difıćil ou impossıv́el veri icar uma clara ratio decidendi em um precedente. Obviamente, ainda que haja uma ú nica teoria plausıv́el para explicaradecisã odeumtribunalemumprecedente,aindaexistirá grande ambiguidade na busca do grau com que o tribunal aplicará aquela teoria posteriormente. Existem em todos os casos diversas maneiras de se interpretar uma decisã o, todas condizentes com o mesmo princıp ́ io gené rico, mas dissonantes no tocante ao aspecto mais gené rico ao mais especı́ ico. Percebe-se, assim, a di iculdade de se proceder de modo “tão certo e evidente” a identidade entre os casos para aplicação de precedentes, como as reformas processuais vêm implementando no direito brasileiro, especialmente em face do modelo processual de formação desses padrões decisórios pela técnica de pinçamento (causa piloto) pela via dos recursos extraordinários e especiais repetitivos, sem viabilizarumcontraditóriodinâmicodeformaçãoeaplicação. Taruffo ao comentar a experiê ncia italiana, em per spectiva assustadoramente semelhante à brasileira, informa que o emprego da “jurisprudê ncia” tem caracterıśticas claramente diversas da aplicaçã o do “precedente”naperspectivacomparada. 24 No emprego da jurisprudê ncia falta a aná lise comparativa dos fatos, ao menos na maioria dos casos. Os enunciados das ementas, com recorrê ncia citados nas decisõ es, sã o formulaçõ es verbais concentradas em uma ou poucas frases, que tê m por regras jurıd ́ icas super iciais. Os textos que servemdesubstratonamaioriadashipó teses(jurisprudê ncia)nã oincluem osfatosqueforamobjetodasdecisõ es. Pode-se dizer, com Taruffo, que, em verdade, a ut ilizaçã o de precedentes pelo julgador brasileiro, em alguns casos, chega ao requinte de nã o 24TARUFFO, 2011.p.143. Michele. Precedente e Jurisprudência. Revista de Processo. Sã o Paulo: RT, vol. 199, representar verdadeiros e pró prios precedentes, sã o simples julgados isolados,masquevê msimplesmente usadascomoexemplos.Asuafunçã o, por isso, nã o é aquela de indicar o crité rio da decisã o que deveria ser seguidonoscasossucessivos,massimplesmentedemostrarqueanormada qualsetratafoiaplicadadecertomodoemcertocaso. 25 Ademais, seria absolutamente necessá ria para aplicaçã o adequada de precedentes viabilizar té cnicas processuais de distinguishing o que, como veremos,vemsendoinviabilizadopelostribunaisSuperiores. Aausênciadetécnicasdedistinçãonautilizaçãodajurisprudência Segundo Como dito acima, a necessidade da criaçã o de mecanismos de distinguishinge overruling é decorrê ncia natural da atribuiçã o de cada vez maisforçavinculanteaoprecedentenosistemajurıd ́ icopá trio. Naturalmente, com a utilizaçã o cada vez mais recorrente do incidente de julgamento de recursos repetitivos e com a obrigatoriedade da aná lise da repercussã ogeral nos REs, os Tribunais Superiores já foram provocadosa semanifestaremrelaçã oaosmeiosdecontroledasdecisõ esquesobrestem recursosrelativosatemá ticasdistintasouqueapliquempadrõ esdecisó rios oriundosdojulgamentoderecursosrepetitivosoudarepercussã ogeralde formasupostamenteincorreta. Passa-se, entã o, à aná lise do posicionamento adotado pelos Tribunais Superiores em relaçã o a cada um dos mecanismos que tentaram ser utilizadosparaabrirasportasdasinstâ nciasextraordiná rias. Reclamação O instituto da reclamaçã o surge no cená rio jurıd ́ ico a partir de criaçã o eminentemente jurisprudencial, como té cnica de aplicaçã o, pelo STF, da teoriadospoderesimplıćitos,deprocedê nciadaexperiê nciaconstitucional norte-americana. Mas recentemente, com o advento da Constituiçã o Federal de 1988, a reclamaçã o institucionalizada no art. 102, I, l, assim como no art. 105, I, f, comas inalidadesdepreservaçã odacompetê nciaegarantiadaautoridade dasdecisõ esdoSTFeSTJ. Em2004,comoadventodaEmendaConstitucionaln.45,instituiu-seo§3º do art. 103-A, que prevê outra hipó tese de cabimento para a reclamaçã o quando ato administrativo ou decisã o judicial contrariar ou nã o aplicar sú mulavinculanteincidenteparaocaso. Poré m, a reclamaçã o nã o se presta tã o somente para as hipó teses acima elencadas. O cabimento da reclamaçã o constitucional como mecanismo de 25TARUFFO, 2011.p.151. Michele. Precedente e Jurisprudência. Revista de Processo. Sã o Paulo: RT, vol. 199, distinguishing foi analisado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento daReclamaçã onº7.569/SP,emSessã oPlená ria,sobarelatoriadaMinistra EllenGracie26. Novotocondutor,aMinistrarelatorachamouaatençã odeseusparesparaa relevâ nciadocaso,diantedaquantidadedereclamaçõ esqueinvocavamas mesmasrazõ esdaquelapostaemjulgamento:ausurpaçã odacompetê ncia do STF pelos Tribunais ordiná rios ao impedir a subida de recursos extraordiná rios e de agravos que nã o seriam idê nticos aos casos afetados parajulgamentoporamostragem. No acó rdã o, foram citados dois julgados anteriores, as Reclamaçõ es 7.523/SP e 7.557/SP, julgadas monocraticamente pelos Ministros Menezes Direito e Eros Grau, respectivamente, em que as Reclamaçõ es foram admitidasetiveramomé ritoapreciado,determinandooprosseguimentono exame de admissibilidade de um recurso extraordiná rio no primeiro e o processamentoeremessadeumagravodeinstrumentoà CorteSupremano segundo. Nã o obstante, o STF entendeu, à unanimidade pelo nã o conhecimento da Reclamaçã osobumfundamentopredominantementepragmá tico:oriscode oTribunalserinvadidoporumaenxurradadereclamaçõ espretendendoa demonstraçã o da distinçã o de recursos obstados em relaçã o ao caso paradigma. Com efeito, o fundamento que predomina na decisã o é o que está sintetizadonosseguintestrechos: Pensonã oseradequadaa ampliaçãodautilizaçãoda reclamaçãoparacorreçãodeequívocosnaaplicaçã o da jurisprudê ncia desta Corte aos processos sobrestadosnaorigem. Isso acarretaria aumento na quantidade de processos distribuı́dos e desvirtuamento dos objetivos almejados comainstituiçã odomecanismodarepercussã ogeral. Aaná liseindividualizadadaaplicaçã odajurisprudê ncia irmada poresta Corte no â mbito da repercussã o geral acarretará um drá stico aumento do nú mero de reclamaçõ es a serem apreciadas neste Supremo Tribunal, o que certamente nã o estará em harmonia comoobjetivopretendidocomacriaçã odorequisitoda repercussã ogeral. Esse aumento já está ocorrendo. Enquanto nos primeirosoitomesesdoanopassadoforamdistribuıd ́ as 702 reclamaçõ es, até agosto deste ano já recebemos 1.422reclamaçõ es. A prosseguir esse ı́ndice de incremento, no futuro provavelmente teremos que pedir ao Congresso 26BRASIL,STF,PLENO,Rcln.7 569/SP,RelatoraMin.EllenGracie,j.em19/11/2009,publicadono DJede11/12/2009. Nacionalquelegisleemrelaçã oà aplicaçã odoinstituto darepercussã ogeralà reclamaçã o27. Alé m disso, o Tribunal entendeu serincabıv́ela interposiçã odo agravo do art.544doCPC–queeraorecursoqueareclamaçã opretendiadestrancar– contra a decisã o do Tribunal de origem que julga prejudicado recurso idê ntico contrá rio à posiçã o irmada no julgamento por amostragem, por inexistirjuıźodeadmissibilidadepeloTribunalaquo. Contudo, a Corte Suprema reconheceu a necessidade de criaçã o de um instrumento para a correçã o da decisã o que erroneamente classi ique o recurso no caso concreto, elegendo o agravo interno como meio adequado. No Superior Tribunal de Justiça també m houve o julgamento de uma reclamaçã o que visava desobstruir a tramitaçã o de um recurso especial considerado acobertado pelo julgamento de recurso representativo da contrové rsia. Trata-se da Reclamaçã o nº 3.652/DF, julgada pela Segunda Seçã o e relatada pela Ministra Nancy Andrighi. Contudo, o argumento utilizado era completamente distinto, consistente na perplexidade da reclamante à constataçã o de que o STJ continuava julgando recursos especiaiscomdiscussõ esidê nticas,enquantooseuhaviasidosuspensopor decisã odoTribunaldeJustiçadoDistritoFederaleTerritó rios. O STJ consignou que a decisã o de sobrestamento dos recursos especiais sobretemá ticaidê nticaproferidapeloTribunal localnã opodeseestender aos outros tribunais pá trios, sob pena de violaçã o do pacto federativo. Assim, “apesar de ser esta uma situaçã o indesejá vel, deve-se reconhecer que, nosistema jurıd ́ icopá trio,ascoisasnã opoderiam sepassardeforma diversa” 28 . Assim, nã o havia afronta à autoridade e, tampouco, à competê nciadoSTJ,nã ohavendosustentá culoparaareclamaçã o. Na oportunidade, nã o foram dados indıćios do posicionamento da Seçã oseareclamaçã ofosseutilizadacomomecanismodedistinçã oentreo recursosobrestadoeoafetadocomorepresentativodacontrové rsia. MedidaCautelar No julgamento da Medida Cautelar nº 17.226/RJ, de relatoria do Ministro Massami Uyeda, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça manifestou-se pelo nã o cabimento da Medida Cautelar para demonstraçã o das diferenças entre um recurso sobrestado de forma equivocada e a maté ria posta em aná lise no incidente de julgamento de recursos repetitivos, ao menos até o exercıćio do juıźo de admissibilidade e do reconhecimento da adequaçã o do recurso afetado como representativo da 27BRASIL,STF,PLENO,Rcln.7569/SP,RelatoraMin.EllenGracie,j.em19/11/2009,publicadono DJede11/12/2009. 28BRASIL, STJ, 2ª Seçã o, Rcl n. 3652/DF, Rel. Min. Mi nistra Nancy Andrighi, j. em 14/10/2009, publicadonoDJede04/12/2009. contrové rsia. No caso examinado, a instauraçã o do incidente de julgamento de recursos especiais repetitivos e o sobrestamento dos recursos tidos como idê nticos foramrealizadospor iniciativadoPresidentedoTribunaldeJustiçadoRio de Janeiro e a medida cautelar foi ajuizada antes mesmo do juıźo de admissibilidade dos recursosafetadosaojulgamento poramostragem pelo STJ e de sua manifestaçã o sobre a representatividade dos recursos escolhidos. Nesta situaçã o, o STJ entendeu que ainda nã o podia exercer o controle diretoatravé sdamedidacautelarsobreaidentidadedematé riasconstantes no recurso especial suspenso na origem e no recurso representativo da contrové rsia, pois a contrové rsia considerada representativa ainda nã o estavadevidamentedelineada.Senã o,veja-se: Isso porque o pretendido controle direto desta augusta Corte sobre a adequação das matérias constantes no recurso especial suspenso na origem e no recurso representativo da controvérsia somente se a iguraria possível, em caráter excepcional,necessariamenteapósojuízoinicialdo recurso representativo da controvérsia, em que o relator,casoreconheçaapresençadosrequisitosde admissibilidade e a correta representatividade da controvérsia, afete o julgamento ao colegiado competente, momento a partir do qual a controvérsia, tidaporrepresentativa,encontrar-seádevidamentedelineada. Sobreleva deixar assente que osRecursos Especiais ns. 1.117.859/RJ, 1.117035/RJ e 1.117.021/RJ, apontados, segundoinformaarequerente,comoosrepresentativos da contrové rsia, ainda nã o obtiveram qualquer deliberaçã o do Ministro-relator designado, no sentido de afetá -los ou nã o ao julgamento do colegiado competente,oque,porsisó ,já revelaaimpossibilidade de se confrontar, como pretende a ora requerente, a maté riaconstantedeseurecursoespecial,queteve seu trâ mite suspenso, com as maté rias constantes dos recursos especiais encaminhados a essa Corte, como representativosdacontrové rsia. Portanto, enquanto os recursos especiais representativos da contrové rsia nã o se encontrarem devidamente afetados ao julgamento do ó rgã o colegiadocompetente deste Tribunal Superior, inviá vel apretensã oparaqueestaa.Corteproceda,emcará ter excepcional,aumjuıźodeadequaçã o,talcomoora requerido.(negritosnossos) Notrechodestacadoacima,oSuperiorTribunaldeJustiçademodoindireto a irmouque,emuma situaçã ona qualjá houvessesidorealizadoumjuıźo inicialpositivopeloSTJemrelaçã oà instauraçã odoincidentedejulgamento de recursos especiais repetitivos, seria possıv́el, excepcionalmente, o exercıćio do controle direto sobre o sobrestamento de recurso que verse sobrematé riadistintadapostaemjulgamento. Outrostrechosdojulgadocorroboramestaa irmativa: Sobaspremissasatéentãodelineadas,indaga-sese a parte, que teve um recurso especial indevidamente suspenso pelo Tribunal de origem, nahipóteseexclusivadeamatériaversadaemseu recursoespecialnãocondizercomaquestãoposta no recurso representativo da controvérsia, também deveria se submeter a este controle diferido. Caso efetivamente demonstrado pela parte o equívoco da suspensão do trâmite de seu recurso especial, na hipótese acima aventada, seria razoável, a despeito disso, que aquela fosse submetida ao mesmo procedimento dos recursos repetitivos? A resposta, desenganadamente, é negativa. Incasu,aargumentaçã oexpendidapelaorarequerente, ressalte-se, centra-se justamente na alegaçã o de que a maté ria constante em seu recurso especial nã o se coaduna com aquela constante nos recursos representativosdacontrové rsia,o queteriaacarretado oindevidosobrestamento. Diante do posicionamento sufragado pela colenda Segunda Seçã o desta a. Corte e em razã o de algumas ponderaçõ esdeordemprá tica,aseguirexpostas, temse que a presente medida cautelar, tal como ora engendrada, nã o permite que esta a. Corte conheça, até este momento, da presente insurgê ncia. (negritos nossos) Nodesenrolardocaso,osrecursosespeciaisnº1.117.859/RJ,1.117035/RJ e1.117.021/RJ,remetidospeloTribunaldeorigemcomorepresentativosda contrové rsia não foram considerados aptos a representar a multiplicidadedosrecursose,porisso,nãohouveoportunidadeparaa utilizaçãodacautelarnomomentoconsideradoadequadopeloSTJ.. Agravodoart.544doCPC Até a ediçã o da Lei nº 12.322/2012, o recursocabıv́el contra a decisã odo Presidente do Tribunal de Justiça que inadmitia os recursos especial e extraordiná rio era o agravo de instrumento dirigido aos respectivos Tribunais Superiores. Depois de referida lei, tornou-se desnecessá ria a formaçã o do instrumento, sendo o agravo juntado nos pró prios autos (agravoderetençã o). O Agravo Regimental no Agravo deInstrumentonº 1.223.072julgado pela SegundaTurmadoSuperiorTribunaldeJustiça,sobarelatoriadoMinistro Humberto Martins analisou o cabimento do, à quela é poca, agravo de instrumentodoart.544doCPCparaademonstraçã odadiferençaentreum recursosupostamentesobrestadodeformaequivocada,pordizerrespeitoa maté riadistintadaquelasubmetidaaoincidentedejulgamentoderecursos repetitivos. Na oportunidade, o STJ entendeu que a decisã o de sobrestamento do recursoespecialnã opossuicunhodecisó rio,poisojuıźodeadmissibilidade dorecursoespecialnã ohaviasido,sequer,realizado.Assim,oagravoseria incabıv́el,já queojuıźodeadmissibilidade–hipó teseparaaqualhaviasido previstoocabimentodoagravodoart.544doCPC–nã oforaalcançado. ATurmanã oseaprofundouemoutrasconsideraçõ es. MandadodeSegurança A Segunda Seçã o do STJ enfrentou a possibilidade de impetraçã o de mandado de segurança contra decisã o que inadmite, na origem, recurso especial interposto contra acó rdã o que se coaduna com o posicionamento adotadopeloTribunalSuperiornojulgamentoderecursosrepetitivos 29. Restou assentado que oSuperior Tribunal deJustiça nã otem competê ncia paraconheceroriginariamentedemandadodesegurançaimpetradocontra decisã odotribunalde origem,nos termos dasú mulanº41daquela Corte: “O Superior Tribunal de Justiça nã o tem competê ncia para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra atos de outros tribunaisoudosrespectivosó rgã os”. No julgamento, foram reforçados també m argumentos pragmá ticos, relativosà interpretaçã oteleoló gicadalei: 4.Admitir-sequalquertipodeirresignaçã oporpartedo recorrente para se "destrancar" o recurso especial inadmitidonaformadosartigos543-Be543-CdoCPC, seria o mesmo que desconstituir as diretrizes traçadas pela reforma da Justiça e uma afronta ao ditame da razoá velduraçã odoprocesso,assimcomoaceleridade de sua tramitaçã o (art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/88), salvoemcasosdesobrestamentoequivocado,emquea partedevedemonstrarexplicitamenteadiferençaentre oseucasoconcretoeorepetitivo. 29BRASIL, STJ, 2ª Seçã o,AgRg noMS 17.942/RJ,Rel. MinistroMassami Uyeda,j. em 27/06/2012, publicadonoDJede01/08/2012. Em complemento,decidiu o STJ 30que, em casode decisã o manifestamente teratoló gicaou lagrantementeilegal,seriacabıv́elomandadodesegurança para o pró prio tribunal de origem. No caso o Terceiro Vice -Presidente do TJRJinadmitiu,comamparo noart. 543-C,§7º, doCPC,orecursoespecial manejado pelo impetrante e, em seguida, nã o conheceu do agravo regimentalporeleinterposto,sobofundamentodeserdescabidoaoOrgã o EspecialdoTribunaldeJustiçaatuarcomoinstâ nciarevisora. AgravointernonoTribunalaquo Conforme mencionado acima, o acó rdã o da Reclamaçã o nº 7569/SP de relatoriadaMinistraEllenGraciesinalizouparaoentendimentodeque,por ora,aú nicaté cnicaendoprocessualcabıv́elcontraasdecisõ esdostribunais de origem que determinem o sobrestamento de recursos idê nticos ao selecionado para o julgamento por amostragem é o agravo interno, para o pró priotribunalaquo.Noentanto,arelatoramesmaanotouemseuvotoa fragilidadedoagravointernoparaodesempenhodetã oelevadopapel: Tendoemvistaaausênciadeoutromeioe icazpara a correção da aplicação da jurisprudência irmada neste Plenário, concluo que o agravo interno a ser interposto no Tribunal de origem contra o ato da presidê ncia que haja erroneamente classi icado o caso concreto há de ser o instrumento adequado a ser utilizado. Este instrumento recursal possibilitará a correçã o, na via do juıźo de retrataçã o, ou por decisã o colegiada31. Oagravo doart.544do CPC,queseria uma formadeimpugnaçã odirigida diretamente ao STF seria incabıv́el, por nã o haver se inaugurado a competê ncia deste, ante a inexistê ncia de juıźo de admissibilidade. Tampoucoseriacabıv́elqualqueroutromeiodeimpugnaçã odireta,comoa reclamaçã oquefoiintentadanocasopostoemaná lisenaquelaocasiã o. OentendimentoadotadopeloSTFnojulgadoacimafoiseguido ipsislitteris peloSuperiorTribunaldeJustiça,quejá consignouemmaisdeumdeseus acó rdã ososeguinte: 3. O STJ aplica o entendimento de que a mencionada decisã o somente pode ser atacada por Agravo Regimental a ser processado e julgado no Tribunal de Origem.32 30BRASIL,STJ,2ªT.,RMSn.35.441/RJ,Min.HermanBenjamin,j.06/12/2012,publicadonoDJede 19/12/2012. 31BRASIL,STF,PLENO,Rcln.7569/SP,RelatoraMin.EllenGracie,j.em19/11/2009,publicadono DJede11/12/2009. 32BRASIL,STJ,2ªT.,RMSn.35.441/RJ,Min.HermanBenjamin,j.06/12/2012,publicadonoDJede 19/12/2012. AnálisedosEfeitosdosposicionamentosdosTribunaisSuperiores Dos posicionamentos dos Tribunais Superiores analisados acima – que reiteramveementementeainadmissibilidadetantodorecursodeagravodo art.544doCPC,quantodossucedâ neos recursais(mandadode segurança, medida cautelar e reclamaçã o) –, pode-se concluir que há uma marcada tendê ncia à vedaçã o de qualquer tipo de insurgê ncia contra as decisõ es preferidas nos julgamentos por amostragem, sejam elas de inadmissã o de recursos que confrontam o entendimento irmado no julgamento por amostragem, sejam de sobrestamento dos recursos idê nticos ao afetado como representativo dacontrové rsia. Nosegundocaso,a restriçã o é ainda maissevera,chegandoaseargumentarqueadecisã oquesobrestarecursos idê nticosaorepresentativodacontrové rsianãopossuicunhodecisório33. Em consonâ ncia com parte da doutrina 34, a restriçã o do acesso aos Tribunais Superiores é medida conveniente no sistema processual pá trio, com vistas a reduzir o comprometimento da capacidade funcional destas Cortes – que deveriam se prestar, primordialmente, à guarda da Constituiçã oeà inteligibilidadeeuniformizaçã odainterpretaçã odalei–se vejam cada vez mais tomadas por julgamentos burocrá ticos – simples reiteraçõ esde julgamentosanteriores e deposicionamentosdasinstâ ncias ordiná rias. Contudo, també m nã ose podemenosprezaraimportâ nciaqueo acessoà s Cortes Superiores representa para a democracia, constituindo um verdadeiropilardoEstadoDemocrá ticodeDireito. Nocommonlawosurgimentodosmecanismosdedistinguishingeoverruling foi uma exigê ncia natural para a manutençã o da coesã o do ordenamento jurıd ́ icoque,apesardavinculaçã oaoprecedente,nã opodia icarengessado. Vê -se, assim, que nem mesmo no sistema em que se originou a teoria do precedente judicial, no qual a jurisprudê ncia tem força vinculante, foi considerado salutar reduzir o juiz a um mero autô mato, reproduzindo a soluçã odadaporoutroó rgã ojurisdicionalseminterpretá -ladevidamente35. Assim,há queseanalisarcomcautelaaposiçã oasetomarfrenteà temá tica, com vistas a equilibrar a inalidade da criaçã o dos julgamentos por amostragem com a garantia de acesso aos Tribunais Superiores – uma 33BRASIL,STJ,2ªT.,AgRgnoAgn.1.223.072/SP,Rel.Min. HumbertoMartins,j.em 09/03/2010, publicadonoDJede18/03/2010. 34Comoporexemplo:GRINOVER,AdaPellegrini.“Otratamentodosprocessosrepetitivos”.JAYME, Fernando Gonzaga; FARIA, Juliana Cordeiro de; LAUAR, Maira Terra (coord). Processocivil:novas tendências:estudosemhomenagemaoprofessorHumbertoTheodoroJunior.BeloHorizonte:DelRey, 2008,p.1-9. 35“Percebe-se, com isso, certa maleabilidade na aplicaçã o dos precedentes judiciais, cuja ratio decidendi (tese jurıd ́ ica) poderá , ou nã o, se aplicada a um caso posterior, a depender de traços peculiares que o aproximem ou afastem dos casos anteriores. Isso é um dado muito relevante, sobretudoparadesmisti icaraideiasegundoaqual,diantedeumdeterminadoprecedente,ojuiz se torna um autô mato, sem qualquer outra opçã o senã o a de aplicar ao caso concreto a soluçã o dadaporumoutroó rgã ojurisdicional.Nã oé bemassim.Comoojuizprecisarinterpretaraleipara veri icar se os fatos concretos se conformam à sua hipó tese normativa, cumpre-lhe també m interpretaroprecedente paraveri icaroutraopçã osenã oa deaplicarao casoconcretoasoluçã o dadaporumoutroó rgã ojurisdicional.”DIDIERJR.,Fredie;BRAGA,PaulaSarno;OLIVEIRA,R afael. Cursodedireitoprocessualcivil.4ªed.Salvador:JusPodium,2009,v.2,p.394. formadeproteçã oaoEstadoDemocrá ticodeDireito. Aqui, vale citar o voto do Ministro Teori Albino Zavascki 36na Questã o de OrdemsuscitadanojulgamentodoAgravodeInstrumentonº1.154.599/SP ejulgadapelaCorteEspecialdoSuperiorTribunaldeJustiça 37,naqualfoio ú nico Ministroa nã oacolher a questã o de ordem queversava sobre o nã o cabimentodoagravodeinstrumentocontraadecisã oquenegaseguimento ao recurso especial com base no art. 543-C, § 7º, inciso I, do Có digo de ProcessoCivil.Nojulgamentodaquestã odeordem,oMinistrofez ressalvas convergentescomaspresentesconsideraçõ es: 3. Inobstante as conseqüências positivas que tal orientação pode acarretar na redução da carga de recursos dirigidos ao STJ, ela esbarra, no meu entender,emsériosempecilhosdeordemjurídica. Antes de mais nada, porque institui, por via pretoriana, um requisito negativo de admissibilidade de recurso especial não contemplado na Constituição (art. 105, III), fonte normativa primá ria dessa maté ria, nem previsto na lei processual (CPC, arts. 541 e seguintes). Seria um peculiaríssimo e atípico requisito negativo, distinto dos comuns porque, como reconhece o voto do relator na questã o de ordem, estaria vinculado à própria matériademéritoobjetodacausa.Eimportante considerarqueoart.543-CdoCPCinstituiu,apenas,um sistema novo de julgamento do recurso especial, mas nã o limitou as hipó teses de admissibilidade dessa via recursal.(negritosnossos) O voto prossegue, abordando exatamente a questã o da necessidade de criaçã o de mecanismos de superaçã o do precedente – overruling – e remontandoaossistemasdeprecedentejudicialvinculante: 4.Poroutrolado,negando-seacessoaoSTJ,emcasos tais, o que se faz, na prática, é conferir aos precedentes julgados pelo regime do art. 543-C nã o apenasum efeito vinculante ultrapartes, mastambém um caráter de absoluta imutabilidade, eis que não subsistiria, no sistema processual, outro meio adequado para provocar eventual revisão do julgado. Essa de iciência não seria compatível com nosso sistema,nemcomqualqueroutrosistemade direito. Mesmo os sistemas que cultuam 36Na data do julgamento, 16/02/2011, o Ministro Teori Albino Zavascki ainda era Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Em 29/11/2012, o Ministro Teori Albino Zavascki tomou posse no STF, em substituiçã o ao Ministro Cezar Peluso, aposentado em razã o do limite constitucional de idade. 37BRASIL, STJ, Corte Especial, QO no Agr n. 1.154.599/SP, Min. Cesar Asfor Rocha, j. em 16/02/2011,publicadonoDJe12/05/2011. rigorosamente a força vinculante dos precedentes judiciais admitem iniciativas dos jurisdicionados tendentes a modi icar a orientação anterior, especialmente em face de novos fundamentos jurídicosoudenovascircunstânciasdefato.Équea e icáciadasdecisõesjudiciaisestánecessariamente subordinada à cláusula rebus sic stantibus, comportando revisão sempre que houver modi icaçãonoestadodefatooudedireito. Traça,ainda,uminteressanteparaleloentreoefeito“quase-vinculante”dos paradigmas irmadosemjulgamentosderecursosespeciaisrepetitivoscom osmecanismosdesuperaçã oourevisã odos“precedentes”commaiorforça vinculante no sistema processual pá trio, que sã o as sú mulas vinculantes. Referidas sú mulas obedecem a requisitos mais rigorosos que os julgamentos por amostragem e, nem por isso, prescindem de um meio de revisã o das mesmas, que está previsto expressamente na Constituiçã o da Repú blica, noart. 103-A, § 2º e na Lei 11.417/06, nosarts. 3º a 6º. E nem mesmoasdecisõ esdoSTFquenegamexistê nciaderepercussã ogeraleas sú mulasdoSTJestã oimunesà superaçã o–oqueé salutarparaodireito: Até mesmo para as súmulas vinculantes editadas peloSTFhámecanismosdeacessoàCorteSuprema para ins de revisão (CF, art. 103-A, § 2º e Lei 11.417/06, arts. 3º a 6º). O mesmo ocorre com as decisões do STF que negam existência de repercussão geral, que também estão sujeitas a revisão (CPC, art. 543-A, § 5º). São igualmente passíveis de revisão – e não são raros os casos em que isso ocorre na prática – as súmulas editadas pelo STJ (Regimento Interno, art. 125). (negrito nosso) Ressaem, assim, argumentos para reforçar a tese de que os Tribunais pá trios terã o de enfrentar a questã o da criaçã opretoriana de mecanismos desuperaçã o(overruling)doparadigmasedimentadonosjulgamentospor amostragem,principalmentenocasodosrecursosespeciaisrepetitivos,que nã opossuemnenhummeioprevistoemleiparatanto. Valedestacardovoto,ainda,duasconsideraçõ esimportantes: 6. Por outrolado, ainda que se acolhesseaquestão de ordem, para a irmar não ser cabível recurso especialouagravodeinstrumento,é certoquenão se poderia estender o requisito negativo de admissibilidade quando o recurso, além de versar matéria julgada nos termos do art. 543-C do CPC, trouxer também fundamento autônomo, por si só aptoareformarouaanularoacórdãorecorrido.Eo queocorrenahipó teseobjetodaquestã ode ordem,em que a parte recorrente, alé m da maté ria de mé rito, invoca ofensa, pelo acó rdã o recorrido, ao art. 535 do CPC,oque,seacolhida,levaà nulidadedojulgado.Enã o é difıćil imaginar que esta será uma porta larga para acessoaoSTJ,mesmoseacolhidaaquestã odeordem. 7. Aliás, a experiência brasileira tem mostrado que as tentativas de eliminar drasticamente o cabimento de recursos podem produzir resultados contrários aos pretendidos, já que a via recursal acaba sendo substituída por meios alternativos, nomeadamente o do mandado de segurança, o das medidascautelaresouodareclamação.Nocasoem exame, a proposta de substituir o recurso especial ou o agravo de instrumento por agravo interno perante o tribunal local pode, na prática, signi icar apenas a instituição de um degrau a mais ou um desvio para o próprio recurso especial, a ser interpostocontra a decisão colegiada produzida no julgamentodoagravointerno.(negritosnossos) Pode-se conceber que, independentemente do mecanismo processual que eventualmente venha a ser considerado adequado para a realizaçã o do distinguishing(edooverruling),sejaexigidaumafundamentaçã ovinculada, concernente à demonstraçã o objetiva de peculiaridades que justi iquem a nã o aplicaçã o do precedente à quele caso, ou à exposiçã o de novos argumentos que nã o tenham sido levados em conta no julgamento paradigma (com o objetivo v.g. de convencer o Tribunal a realizar o overruling). Amerainsurgê nciacontraatesejurıd ́ ica ixadanoparadigma,arepetiçã o deargumentosjá enfrentadosnojulgamento-modeloouasimplesexposiçã o deargumentosquenã osevoltemao imespecı́ icodeprocederà distinçã o ou superaçã o do precedente seriam motivos para obstar, com base em razõ esprocessuais,atentativadeaberturadasinstâ nciasextraordiná rias,à semelhança do que já ocorre, hoje, com o juıźo de admissibilidade dos recursosespeciaispordivergê nciajurisprudencial 38. Note-sequeapossibilidadedeinsurgê nciacontraasdecisõ esproferidasem julgamentosporamostragemcombaseemargumentosnovosfaria comque os Tribunais Superiores tivessem que se apronfudar mais nas questõ es a seremdecididas,evitandoaformaçã odeparadigmaslastreadosemaná lises super iciais. Seria de interesse do tribunal enfrentar o maior leque de argumentos possıv́el para obstar, de imediato, insurgê ncias posteriores. Alé m disso, o enfrentamento posterior de novos argumentos permitiria a complementaçã o do debate que tivesse sido travado sem levar em conta 38Nestesrecursos,seorecorrentenã odemonstrarclaramenteocotejoanalıt ́ icoentreoseucasoe oacó rdã oparadigma,orecursoespecialé inadmitido. certa argumentaçã o relevante, bem como a oxigenaçã o do paradigma, rea irmado mesmo diante de novos argumentos, trazidos à lume com as mudançasdeinterpretaçã ododireito 39. Por im,importaressalvarqueasdecisõ esdoSTFquenegamexistê nciade repercussã o geral, excepcionalmente, tê m um mecanismo de overruling, poisestã osujeitasarevisã o,naformadoart.543-A,§5ºdoCPC. ConsideraçõesFinais Comosedemonstrou,existehá algunsanosatendê nciadeseutilizaro direitojurisprudencialcomofontedodireitoespecialmenteparaabuscade resoluçã odasquestõ esenvolvendoalitigiosidaderepetitiva. Osexemplosmaisevidentessã oasté cnicasdejulgamentoporamostragem (Causa piloto) mediante o incidente de julgamento de recursos especiais repetitivos e repercussã o geral – sob os pressupostos dos artigos 543-B e 543-CdoCó digodeProcessoCivilpelosTribunaisSuperioresbrasileiros. Contudo,oposicionamento absolutamenterestritivo queos Tribunais vê m adotando em relaçã o à recorribilidade das decisõ es proferidas em consonâ ncia com os paradigmas irmados tende a “engessar” o direito, praticamente suprimindo a possibilidade de que discussõ es sobre teses jurıd ́ icas já decididas cheguem à s instâ ncias superiores, mesmo diante de circunstâ ncias que aconselhem a superaçã o do precedente ou a sua nã o aplicaçã o ao caso concreto (distinçã o), em razã o de peculiaridades essenciais. Ademais,acredulidadedebuscadeumaidentidadeevidenteentrecasosse mostraindubitavelmentesuper icialemfacedadi iculdadedesepromover aformaçã odeumpadrã odecisó riorealmentepanorâ mico(comrespeitoao processoconstitucional)edoqualseextraiamcomnaturalidadeasratione decidendi. Assim,é de se esperar que asmesmas razõ es que induziram a criaçã odas té cnicas de overruling e distinguishing no commonlaw se façam sentir na 39Há que se destacar que Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha, em sua obra conjunta, apontam a reclamaçã o constitucional como mecanismo processual adequado, “tal entendimento revela-se preocupante. Imagine-se que determinado recurso especial ou extraordiná rio foi sobrestadoindevidamente,pornã oguardarpertinê nciacomocasoescolhidoparajulgamentopor amostragemouporversarsobrematé riadiversa.Oquedeveapartefazer?Segundoaorientaçã o ministradapeloSTF,deveinterporagravointerno.Esetalagravonã oforprovido?Oquefazer?A demonstraçã o de que há um distinguishing ou um overruling deve ser feita perante o tribunal superior, e nã o perante o tribunal local. Parece mais adequado que se admita uma reclamaçã o constitucional ao tribunal superior para que determine ao tribunal local que nã o mantenha o recursosobrestado,pornã oversarsobreomesmoassuntodorecursoescolhidoparajulgamento poramostragemoupornã oselheaplicarmaisoprecedente,emrazã odeumnovocontextofá tico ounormativo.Manterumrecursoindevidamentesobrestadoequivale,emú ltimaaná lise,ausurpar competê ncia do tribunal superior, a quem cabe veri icar se realmente o caso escolhido para julgamento por amostragem há ou nã o de se aplicar aquele que foi sobrestado pelo tribunal de origem”DIDIERJR., Fredie;CUNHALeonardoJosé Carneiro da. Cursodedireitoprocessualcivil.9ª ed.Salvador:JusPodium,2011,v.3,p.317. prá tica forense pá tria. Oexemplohistó rico do commonlawdemonstraque umarigidezexcessivaemrelaçã oà aplicaçã odosprecedentesjudiciaispode levar a resultados indesejá veis, sendo necessá rio admitir mecanismos que con iram alguma maleabilidade à atividade judicante, mesmo diante de casosaparentementejá assentadosnajurisprudê ncia. A necessidade de que os Tribunais Superiores reconheçam algum mecanismoprocessualparaarealizaçã odo distinguishing(edooverruling) no â mbito dos julgamentos por amostragem deverá aumentar, naturalmente, exigindo alguma construçã o pretoriana capaz de compatibilizar os objetivos dos julgamentos por amostragem (segurança jurıd ́ ica, isonomia, celeridade) com o cará ter dinâ mico e discursivo do direito.AlgoquenaatualidadesebuscamedianteoCPCprojetado,ora em aná lisenaCâ maradosDeputados Há se de viabilizar urgentemente alguma via de acesso à s instâ ncias superiores que permita um distinguishing caso nã o haja similitude entre seus casos e os respectivos paradigmas que autorizaram o sobrestamento/inadmissã o. Cabe chamar a atençã o, aqui, para o fato de que até mesmo as Sú mulas Vinculantes – espé cie de “precedente judicial” formulado sob requisitos ainda mais rigorosos que nos casos da repercussã o geral e julgamento de recursos especiais repetitivos – tê m mecanismos previstos expressamente em lei para sua revisã o (art. 103-A, § 2º da Constituiçã o da Repú blica, Lei Federalnº11.417/2006eRegimentoInternodoSTF),sendoum paradoxo nã oadmitirapossibilidadederevisã oparaoutrashipó teses. Destaque-se, també m que dentro do pró prio STF já foram admitidas reclamaçõ es para controle das decisõ es proferidas pelos tribunais locais – Reclamaçõ es 7.523/SP e 7.557/SP, de relatoria dos Ministros Menezes Direito e Eros Grau, respectivamente –, tendo sido este entendimento suplantado no julgamento da Reclamaçã o nº 7569/SP, de relatoria da MinistraElenGracieesubmetidoaoplenodaqueletribunal. Oquepareceserindubitá velé queosTribunaisSuperioresserã oinstadosa enfrentar a questã o, construindo pretorianamente algum caminho para a realizaçã o do distinguishing (e do overruling), ao menos enquanto no CPC projetado nã o implemente regramento té cnico, que se espera ser mais precisoelegı́timo. E só como provocaçã o inal aos defensores da e iciê ncia quantitativa, com Damaš kadevemosperceberque “de fatohá uma preocupaçã oonipresente com a maior e iciê ncia. Em meio a essa preocupaçã o, é perceptıv́el a tendê ncia em desenfatizar as preocupaçõ es processuais sobre a forma – incluindodiferençasresiduaisentreosregimescommonlaweocivillaw–e se concentrando em medidas que possam contribuir para o bom funcionamento da justiça civil. Mas consideramos que a e iciê ncia, quando bem entendida, é uma medida darelaçã oentre oresultado,ou objetivo de umaatividade,aocusto dealcançá -lo.Avelocidadeecustoqueumsistema de justiçaincorre paraa resoluçã odoscasosnos dizempoucosobreasua e icá cia se nã o formos informados de suas metas: sem referê ncia a elas, a e iciê ncia é um ideal sem conteú do. Agora, seria errado acreditar que as metas e sistemas de valor de má quinas mais ou menos burocratizadas de justiçasã oiguais.Suasavaliaçõ essobreimportâ nciadadescobertaacurada dos fatos, a coerê ncia na tomada de decisõ es, a dissidê ncia, a discriçã o o icial ou a terceirizaçã o das açõ es o iciais, tudo isso se difere de maneira signi icativa. Assim, enquanto persistem vestıǵios no processo civil de atitudesdıśparesnasestruturasdeautoridadeentreo commonlaweocivil law,elesnã odevemserdesconsiderados,mesmoseapreocupaçã oprincipal é oaumentodae iciê nciaprocessual.També mnã oé algodopassado,paraa inalidade de orientaçã o aproximada sobre uma sé rie de questõ es processuais, manter em mente que o processo civil continental conserva resquıćios de atitudes processuais e concisõ es propıćias para um mecanismo hierá rquico-burocrá tico da justiça, enquanto seu homó logo no commonlaw manté m resquıćios de um ambiente mais igualitá rio e menos burocrá tico.” 40 40DAMASKA, Mirjan. TheCommonLaw-CivilLawDivide:ResidualTruthofaMisleadingDistinction. CARPI Federico. The future of categories. Toronto: International Association of Procedural Law, 2009.–Traduçã olivredosmembrosdogrupodepesquisaegraduandosdaUFMG“processualismo constitucional democrá tico e circulaçã o dos modelos de civil law e common law”: Anna Carolina Pedroso Tameirã o Ferreira e Silva, Fernanda Costa Gouthier, Lıd ́ ia Gonçalves, Patrıćia Fernanda Gonçalves, Gustavo Costa Ferreira, Tereza de Assis Fernandes, Fernanda Costa Gouthier, Lı́dia Gonçalves. No original “And indeed there is ubiquitous concern with increased ef iciency. In the midst of this concern, a tendency is discernible to deemphasize preoccupations with procedural form—includingresidualdifferencesbetweencommonlawandcivillawregimes—andconcentrate insteadonmeasureslikelytocontributetotheef icientfunctioningof civiljustice.34But consider thatef iciency,properlyunderstood,isameasureoftherelationofthevaluedoutput, orgoalofan activity,tothecostofachievingit.Thespeedandcostatwhichajusticesystemdisposesofingested casestelluslittleaboutitsef iciencyunlessweareinformedofitsgoals:withoutreferencetothem, ef iciencyisacontentlessideal.Now,itwouldbewrongtobelievethatgoalsandvaluesystemsof moreorlessbureaucratizedmachineriesofjusticearealike.Theirassessmentsoftheimportance of accurate fact- inding, consistency in decision-making, dissent, of icial discretion, or the outsourcingofof icialaction,alldifferinsigni icantways.Thus,solongasvestigespersistincivil procedureofattitudestraceabletodisparatecommonlawandcivillawstructuresofauthority,they shouldnotbedisregarded,evenifone’sprincipalconcernistheincreaseofproceduralef iciency. Norisitreallypassé ,forthepurposeofroughorientationonanumberofproceduralissues,tokeep inmindthatcontinentalcivilprocedureretainsremnantsofproceduralattitudesandarrangements congenial to a hierarchical-bureaucratic machinery of justice, while its common law counterpart keepsalivevestigesofamoreegalitarianandlessbureaucratizedinstitutionalenvironment.”
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