Monografia – Neuromarketing
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Monografia – Neuromarketing
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL – PUCRS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – PUBLICIDADE E PROPAGANDA HENRIQUE ULLMANN GIRARDI NEUROMARKETING: A UNIÃO DA NEUROCIÊNCIA E DO MARKETING Porto Alegre 2014 HENRIQUE ULLMANN GIRARDI NEUROMARKETING: A UNIÃO DA NEUROCIÊNCIA E DO MARKETING Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Publicidade e Propaganda, pelo Curso de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Orientadora: Profª Dra. Silvia Koch Porto Alegre 2014 HENRIQUE ULLMANN GIRARDI NEUROMARKETING: A UNIÃO DA NEUROCIÊNCIA E DO MARKETING Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Publicidade e Propaganda, pelo Curso de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Aprovado em: ____de__________________de________. BANCA EXAMINADORA: ______________________________________________ Orientadora: Professora Dra. Silvia Koch ______________________________________________ Professora Ma. Susana Gib Azevedo ______________________________________________ Professor Me. José Fernando F. de Azevedo Dedico este trabalho a todas as pessoas que me inspiram e que contribuem para o meu desenvolvimento. Em especial a minha avó, Nilza, falecida em 2005, e ao meu pai, Humberto Girardi, meu verdadeiro mentor. AGRADECIMENTOS Nesse período acadêmico, muitas pessoas contribuíram e foram importantes para o meu desenvolvimento e minha formação. Logo no início da Faculdade, recebi a oportunidade de iniciar minha carreira no mercado publicitário. Sou muito grato aos meus amigos Pedro Menezes e Diego Dornelles pela oportunidade. Na Propale, fiz amigos para a vida toda e aprendi muito com todos vocês. Um abraço especial para Endrigo Valadão, Fagner Nogueira, Lucas Aita e Rennan Mager. Durante a graduação, tive o privilégio de conhecer pessoas maravilhosas, especialmente Christopher Ceron, Maurício Ataíde, Maurício Dornelles, Rodrigo Viegas, Thiago Brandes, e a minha namorada, Raquel Saliba. Fora da rotina acadêmica, meus grandes amigos Henrique Cafruni Kuhn, Felipe Dias e família, Matheus Coelho, Vinícius Lumertz de Paula, Gilberto Camargo e família, foram muito importantes. Obrigado pela parceria em todos esses anos. Vocês são demais. À minha namorada e companheira, Raquel Saliba, aos meus pais, Humberto Girardi e Maria das Graças, aos meus tios, Alexandre e Fábio Girardi e ao meu avô, Aquilino Girardi, obrigado por tudo. Vocês são especiais. Amo vocês! E, por último, mas não menos importante, à minha orientadora, Silvia Koch, obrigado por ter me ajudado e me apoiado. O interesse pelo tema deste trabalho começou em uma de suas aulas e tive o privilégio de contar com o seu apoio durante a pesquisa. Muito obrigado. O homem deve saber que de nenhum outro lugar; mas apenas do encéfalo, vem a alegria, o prazer, o riso e a diversão, o pesar, o luto, o desalento e a lamentação. E por isso, de uma maneira especial, nós adquirimos sabedoria e conhecimento e enxergamos e ouvimos e sabemos o que é justo e injusto, o que é bom e o que é ruim, o que é doce e o que é insípido.. E pelo mesmo órgão nos tornamos loucos e delirantes, e medos e terrores nos assombram.. Todas essas coisas nós temos de suportar do encéfalo quando não está sadio.. Nesse sentido, opino que é o encéfalo quem exerce o maior poder sobre o homem. Hipócrates RESUMO Este trabalho de conclusão tem por objetivo compreender a área de neuromarketing e sua contribuição para as áreas de marketing e branding. Para tal, foi realizado levantamento bibliográfico dos principais elementos que compõem e influenciam essa nova metodologia de pesquisa: o marketing, o branding, a neurociência e o neuromarketing. No levantamento de neurociência, foi identificada a necessidade de descrever também o funcionamento de seus principais objetos de estudo: o sistema nervoso, o cérebro e os neurônios. No capítulo de neuromarketing, foi abordado o conteúdo teórico necessário para compreender a disciplina e, em seguida, foram apresentados estudos e pesquisas. Considera-se que o neuromarketing é uma metodologia eficaz em seu propósito de medir as reações de consumidores aos estímulos de marketing. Palavras-chave: Comportamento. Consumidor. Branding. Marketing. Neurociência. Neuromarketing. ABSTRACT This paper intends to understand the area of neuromarketing and its contribution to marketing and branding. For this, it was done a bibliographical survey of the main elements that compose and influence this method: marketing, branding, neuroscience and neuromarketing. On the research about neuroscience, it was identified the necessity of describe, also, the way that works its primary objects of study: the nervous system, the brain and neurons. On the chapter about neuromarketing was approached the theoretic contents necessary to understand this matter and introduced studies and researches. This work consider neuromarketing as a methodology effective in its purpose of measure the reactions of consumers to marketing stimuli. Key-words: Behavior. Consumer. Branding. Marketing. Neuroscience. Neuromarketing. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Orientação de venda e orientação de marketing. ..................................... 15 Quadro 1 - Evolução da definição de marketing........................................................ 17 Figura 2 - As quatro dimensões do marketing holístico ............................................. 20 Figura 3 - As três considerações subjacentes ao conceito de marketing societário.. 22 Figura 4 - Modelo de matriz baseada em valores. .................................................... 25 Figura 5 - Sistema Nervoso Central (SNC) ............................................................... 32 Figura 6 - Forebrain, empresa brasileira, realizando estudo com o aparelho EEG ... 61 Figura 7 - Equipamento de Ressonância Magnética Funcional ................................ 62 Figura 8 - Parâmetros Neurométricos: atenção, emoção, memória, intenção de comprar, novidade, percepção e eficácia global. ...................................................... 67 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11 2 MARKETING E BRANDING .................................................................................. 13 2.1 EVOLUÇÃO DO MARKETING ............................................................................ 13 2.2 MARKETING HOLÍSTICO ................................................................................... 19 2.3 MARKETING SOCIAL ......................................................................................... 21 2.4 MARKETING 3.0 ................................................................................................. 22 2.5 BRANDING ......................................................................................................... 25 3 NEUROCIÊNCIA.................................................................................................... 31 3.1 FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO ................................................... 31 3.2 CÉREBRO........................................................................................................... 34 3.3 NEURÔNIOS....................................................................................................... 37 3.4 A EVOLUÇÃO DA NEUROCIÊNCIA ................................................................... 39 3.5 CONCEITOS DE NEUROCIÊNCIA ..................................................................... 43 3.6 OS PROTAGONISTAS DA NEUROCIÊNCIA ..................................................... 48 4 NEUROMARKETING ............................................................................................. 50 4.1 EVOLUÇÃO DO NEUROMARKETING ............................................................... 50 4.2 DEFINIÇÃO DE NEUROMARKETING ................................................................ 56 4.3 APLICAÇÃO DA DISCIPLINA ............................................................................. 59 4.4 PARÂMETROS NEUROMÉTRICOS .................................................................. 64 4.4.1 Parâmetros Neurométricos Principais .............................................................. 64 4.4.2 Parâmetros Secundários .................................................................................. 65 4.4.3 Parâmetro Resposta Subconsciente ................................................................ 67 4.5 RELAÇÃO DOS CONSUMIDORES E MARCAS ................................................ 68 4.6 ESTUDOS E CASOS .......................................................................................... 70 4.6.1 Neurônio-Espelho ............................................................................................. 71 4.6.2 Mensagem Subliminar ...................................................................................... 73 4.6.3 Rituais e Superstição........................................................................................ 74 4.6.4 Fé, Religião e Marcas....................................................................................... 75 4.6.5 Marcadores Somáticos ..................................................................................... 78 4.6.6 O Poder dos Cinco Sentidos ............................................................................ 80 4.6.6.1 Olfato ............................................................................................................ 81 4.6.6.2 Cores ............................................................................................................ 82 4.6.6.3 Som............................................................................................................... 83 4.6.6.4 Sabores ........................................................................................................ 85 4.6.6.5 Tato ............................................................................................................... 86 4.6.6.6 Sexo na Publicidade.................................................................................... 87 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 90 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 93 11 1 INTRODUÇÃO O interesse por realizar esta pesquisa surgiu na cadeira de Linguagens de Mídia e Recepção da Professora Silvia Koch. Em sala de aula, foi a oportunidade de conhecer o tema quando a professora indicou a leitura do livro Lógica do Consumo de Martin Lindstrom. Na etapa de construção do projeto, antes de iniciar o desenvolvimento do trabalho de conclusão, tive a oportunidade de visitar e de conhecer o Instituto do Cérebro da PUCRS (InsCer) e conversar um pouco com o Dr. Alexandre Franco, coordenador de Pesquisa em Neuroinformática e Pós-processamento de imagens. Nessa etapa também tive o privilégio de conhecer os professores Oswaldo Paleo e Stefania de Almeida. Nos encontros com esses profissionais foi possível conhecer melhor o neuromarketing e a neurociência. Eles contribuíram muito para a compreensão dessas disciplinas. Nas atividades acadêmicas e profissionais, sempre foi uma curiosidade identificar os fatores essenciais e decisivos para o desempenho das organizações. Em 2009, na Faculdade de Publicidade e Propaganda, surgiu o interesse de identificar e analisar o porquê de algumas empresas terem melhores desempenhos de marketing do que outras. Nos primeiros contatos com o neuromarketing foi possível perceber o potencial dessa disciplina de transformar as estratégias de marketing e melhorar os resultados das empresas através de novos conhecimentos sobre o comportamento do consumidor. Esta monografia tem como objetivo principal identificar e analisar a contribuição do neuromarketing para a administração de marketing e branding, com casos e pesquisas para ilustrar a teoria apresentada anteriormente. Os procedimentos metodológicos que, ao longo dos capítulos, irão fundamentar esta pesquisa serão técnicas de pesquisa exploratória, descritiva, bibliográfica e documental para a análise e compreensão dos conceitos de marketing, branding, neurociência e neuromarketing. O trabalho está dividido em três capítulos. O primeiro apresentará uma breve descrição de conceitos nas áreas de marketing e branding, através de autores de marketing como Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), Sandhusen (1998), Kotler e Keller (2010) e Kotler e Armstrong (1999); e autores de branding como Roberts (2005), Aaker (1996), Tybout e 12 Carpenter (2001), Calder e Reagan (2001), Kotler e Pfoertsch (2008), Tybout e Sternthal (2001). O objetivo é identificar e analisar como o marketing e o branding evoluíram e quais os seus principais conceitos e definições. O segundo capítulo abordará a neurociência, seus principais componentes, sua evolução, seu funcionamento e seus principais conceitos, através de autores como Gazzaniga e Heatherton (2007), Lent (2008), Kandel, Schwartz e Jessel (1997), Bear, Connors e Paradiso (2010), Augustine (2010) e Herculano-Houzel (2008). O objetivo desse capítulo é de identificar e compreender a disciplina de neurociência, uma das áreas responsáveis pela criação do neuromarketing. O terceiro capítulo apresentará o neuromarketing, sua evolução, definição, aplicação, casos e estudos realizados por Lindstrom (2009), pesquisador reconhecido mundialmente. O neuromarketing será abordado através de autores como Pradeep (2012), Lindstrom (2009), Gobé (2002) e Underhill (2012). 13 2 MARKETING E BRANDING Neste capítulo será feita uma breve apresentação de conceitos nas áreas de marketing e branding. A pesquisa bibliográfica foi iniciada com essas disciplinas por considerar que são as duas áreas que apresentam o maior potencial de aplicação e influência para o neuromarketing. Ambas as disciplinas evoluíram seus conceitos e suas abordagens para relações mais próximas e emocionais com seus consumidores, tratando-os, acima de tudo, como seres humanos. Para ter sucesso nesse contato, as empresas precisam, necessariamente, compreender as reais necessidades e desejos de seus consumidores, conquistando suas mentes, corações e espíritos. Embora o conceito de marketing tenha passado por muitas adaptações ao longo dos anos, Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010) afirmam que o marketing, de forma resumida, gira em torno de três disciplinas essenciais: gestão do produto, gestão de clientes e gestão de marca. Os conceitos de marketing passaram do foco na gestão do produto, em 1950 e 1960, para o foco na gestão do cliente em 1970 e 1980. Recentemente, foi acrescentada a disciplina de gestão de marca nas décadas de 1990 e 2000. Na primeira parte do capítulo, será abordada a evolução dos conceitos de marketing e suas definições mais recentes, conforme visão de Kotler, Kartajaya, Setiawan (2010), Sandhusen (1998), Kotler e Keller (2010) e Kotler e Armstrong (1999). No segundo momento, será feita uma breve introdução de conceitos de branding, conforme visão de Roberts (2005), Aaker (1996), Tybout e Carpenter (2001), Calder e Reagan (2001), Kotler e Pfoertsch (2008), Tybout e Sternthal (2001). 2.1 EVOLUÇÃO DO MARKETING A orientação de produção, segundo Kotler e Keller (2010), é um dos conceitos mais antigos nas relações comerciais. Nela, os consumidores priorizam os produtos de fácil localização e de baixo custo. A ênfase - dessa orientação - na produção e na distribuição de produtos em quantidade suficiente para satisfazer a crescente demanda, para Sandhusen (1998), 14 é o que caracterizou o mercado descentralizado até o final do século XIX, quando ocorreu a Revolução Industrial e a maioria dos centros atacadistas foi estabelecida. Ainda segundo o autor Sandhusen (1998), o pensamento que prevaleceu - na época - era de que “um bom produto vende a si mesmo” e todo o foco era em produção, em vez de vendas. A segunda orientação de marketing, chamada de orientação de produto, é sustentada, segundo Kotler e Keller (2010), pela preferência em produtos que oferecem qualidade, desempenho superior e características inovadoras. Nessa orientação, as empresas concentram-se em fabricar produtos com alta qualidade e em aperfeiçoá-los ao longo do tempo. Mas esse foco, em alguns casos, tornou-se uma armadilha para os profissionais de marketing, conforme descrito pelos autores: “Um produto novo ou aperfeiçoado não será necessariamente bem-sucedido, a menos que tenha o preço certo e seja distribuído, promovido e vendido de forma adequada.” (KOTLER; KELLER, 2010, p.13) A terceira orientação, a de vendas, conforme Kotler e Keller (2010), parte do princípio de que os consumidores não compram os produtos nas quantidades suficientes. Para contornar isso, as organizações precisam dedicar esforço em vendas e promoções. Essa filosofia de vendas surgiu, segundo Sandhusen (1998), quando a tecnologia de produção em massa, criada pela Revolução Industrial, excedeu a capacidade de absorção de muitos mercados, e quando houve aumento da renda do consumidor. Esses fatores levaram a uma ênfase nas forças de vendas e campanhas publicitárias com objetivo de encontrar novos clientes, além de persuadir os que resistiam a comprar. Essa orientação, para Kotler e Keller (2010), é praticada de maneira agressiva com produtos de baixa procura, ou quando há excesso de produção por parte da empresa. Kotler e Keller (2010, p.13) complementam apresentando a filosofia presente nessa orientação “[...] seu objetivo é vender aquilo que fabrica, em vez de fabricar aquilo que o mercado quer [...]” e alertam para alguns riscos: Mas o marketing fundamentado em venda agressiva esconde altos riscos. Ele pressupõe que clientes persuadidos a comprar um produto gostarão dele; caso isso não ocorra, imagina-se que esses clientes não vão devolvê-lo, não falarão mal dele, tampouco reclamarão a um órgão de defesa do consumidor - e talvez até voltem a comprá-lo. (KOTLER; KELLER, 2010, p.13) 15 Sandhusen (1998) destaca, nessa orientação, a falta de uma área unificadora dentro das organizações para integrar essas atividades de vendas e satisfação de clientes. A comunicação com os clientes é unilateral, e a área de vendas é subordinada às funções de finanças, produção e engenharia. Ainda segundo o autor (1998), muitas empresas, no final dos anos 20 e começo dos anos 30, perceberam a necessidade de integrar as atividades de pesquisa, aquisição, produção e de vendas. Em 1950 surgiu a orientação de marketing, com o foco nas necessidades do cliente. Segundo Sandhusen (1998), essa orientação estabelece ênfase à comunicação bilateral para identificar e satisfazer as necessidades dos consumidores. Kotler e Keller (2010) acreditam que, com essa nova orientação, houve uma mudança no espírito organizacional. As empresas deixaram a filosofia voltada aos produtos e passaram para uma orientação centrada no cliente. No entendimento dos autores (2010), antes as empresas produziam produtos e os vendiam. Com a orientação de marketing, as empresas buscam primeiro entender as necessidades dos consumidores para depois começar a produzir produtos mais adequados aos desejos deles. Para isso, Sandhusen (1998), defende a implementação dessa filosofia com informatização e estrutura organizacional capacitada para procurar e servir às necessidades do cliente com lucratividade. Figura 1 - Orientação de venda e orientação de marketing. Fonte: Kotler e Armstrong (1999, p.11). Kotler e Keller (2010) acreditam que, com essa orientação, o novo papel do profissional de marketing é de integrar e de direcionar recursos da empresa para satisfazer o cliente. 16 Para eles Kotler e Keller (2010, p.14) “[...] o que se precisa não é mais encontrar os clientes certos para seu produto, mas sim os produtos certos para seus clientes [...]”. Sandhusen (1998) reforça a ideia, afirmando que a ênfase na comunicação unilateral para persuadir pessoas a comprarem produtos já fabricados, o foco exclusivo no planejamento a curto prazo para alcançar os objetivos do volume de vendas, o esforço dos departamento individuais e da força de vendas, ficaram no passado. Na orientação de marketing é feito o planejamento tanto a longo quanto a curto prazo e há uma total integração do sistema de todos os departamentos para alcançar as metas de lucros da empresa. Essa mudança de orientação, entre outros fatores, deve-se muito à transição de uma economia industrial para uma economia na era da informação. A Era Industrial, segundo Kotler e Keller (2010), caracterizou-se pela produção e pelo consumo em massa, lojas cheias de mercadorias, grande volume de anúncios e descontos aos consumidores. Para os autores (2010), a mudança tecnológica e a revolução digital foram as responsáveis pela criação da Era da Informação, que opera em níveis de produção mais precisos, comunicações direcionadas e determinação de preços em bases mais consistentes. Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010) afirmam que, desde que a expressão “mix de marketing” foi apresentada por Neil Borden, na década de 1950, e os 4Ps foram apresentados por Jerome McCarthy, na década de 1960, os conceitos de marketing passaram por transformações significativas, conforme as diferentes épocas da vida humana. Um dos conceitos centrais de marketing, segundo Kotler e Keller (2010), é de entender as necessidades, os desejos e as demandas do mercado-alvo. Necessidades são requisitos humanos básicos, os desejos são moldados pela sociedade e as demandas são desejos por produtos específicos apoiados pela capacidade de comprá-los. Kotler e Armstrong (1999) já haviam definido marketing como: “o processo social e gerencial através do qual indivíduos e grupos obtêm aquilo que desejam e de que necessitam, criando e trocando produtos e valores uns com os outros”. (KOTLER; ARMSTRONG, 1999, p.3) A seguir quadro com a evolução da definição de marketing, conforme Cobra (1997). 17 Quadro 1 - Evolução da definição de marketing Ano American Marketing Association Ohio State University Kotler e Sidney Levvy William Lazer David Luck Kotler e Gerald Zaltman Robert Bartis Robert Haas Robert Haas Kotler Definição "O desempenho das atividades de negócios que dirigem o fluxo de bens e serviços do produtor ao 1960 consumidor ou utilizador." "O processo na sociedade pelo qual a estrutura da demanda para bens econômicos e serviços é antecipada ou abrandida e satisfeita através da concepção, promoção, troca e distribuição física de 1965 bens e serviços." 1969 "O conceito de marketing deveria abranger também as instituições não lucrativas." "O marketing deveria reconhecer as dimensões societais, isto é, levar em conta as mudanças 1969 verificadas nas relações sociais." 1969 "O marketing deve limitar-se às atividades que resultam em transações de mercado." "A criação, implementação e controle de programas calculados para influenciar a aceitabilidade das ideias sociais e envolvendo considerações de planejamento de produto, preço, comunicação, 1969 distribuição e pesquisa de marketing." "Se o marketing é para ser olhado como abrangendo as atividades econômicas e não econômicas, talvez o marketing como foi originalmente concebido reapareça em breve com outro nome." 1974 "É o processo de descoberta e interpretação das necessidades e desejos do consumidor para as especificações de produto e serviço, criar a demanda para esses produtos e serviços e continuar a 1978 expandir essa demanda." "MARKETING INDUSTRIAL - é o processo de descoberta e interpretação das necessidades, desejos e expectativas do consumidor industrial e das exigências para as especificações do produto e serviço e continuar através de efetiva promoção, distribuição, assistência pós a venda a convencer mais e 1978 mais clientes a usarem e a continuarem usando esses produtos e serviços." "É o processo de planejamento e execução desde a concepção, preço, promoção e distribuição de ideias, bens e serviços para criar trocas que satisfaçam os objetivos de pessoas e das organizações." 1997 Fonte: Cobra (1997) Reforçando a evolução apresentada pelo autor (1997), Kotler e Keller (2010) acreditam que diversas tendências e forças estão pressionando novas crenças e práticas por parte das empresas e serão bem-sucedidas as organizações que conseguirem adaptar suas organizações no mesmo ritmo das mudanças de seus mercados. Dessa forma, Kotler e Keller (2010) apresentam 14 grandes mudanças na administração de marketing colocadas em prática por empresas no século XXI. A primeira mudança envolve disseminar as atividades de marketing por toda a organização. Em geral, as empresas centralizam com o setor de marketing as atividades de marketing, vendas e atendimento ao cliente. Kotler e Keller (2010) defendem que o esforço de marketing deve ser feito em equipes de diversos setores com gestão integrada e contínua de processos de negócios essenciais, como o desenvolvimento de novos produtos, a aquisição e a retenção de clientes e o preenchimento de pedidos. Os autores (2010) citam o falecido David Packard, fundador da Hewlett-Packard, que dizia que o marketing é uma atividade importante demais para que as empresas deixem apenas sob-responsabilidade do departamento de marketing. O segundo fator diz respeito às organizações que deixaram de ser centradas unicamente em produtos, com gerentes de produto e divisões para gerenciá-los e 18 que passaram para a gestão de segmentos de clientes. A terceira mudança engloba o uso de serviços terceirizados. Kotler e Keller (2010) afirmam que muitas empresas estão terceirizando todos os processos que outros podem fazer melhor e mais barato. O quarto fator refere-se ao relacionamento das empresas com fornecedores e distribuidores. Muitas organizações, segundo os autores (2010), deixaram de tratar os intermediários como clientes e passaram a tratá-los como parceiros na entrega de valor para os seus clientes finais. A quinta mudança descreve a necessidade das organizações avançarem com programas de marketing, produtos e serviços inovadores, observando as necessidades dos clientes. Para Kotler e Keller (2010), as empresas devem buscar novas vantagens e não devem depender de suas antigas potencialidades. O sexto fator estabelece a transição da ênfase em ativos tangíveis para a ênfase em ativos intangíveis. Os autores (2010) acreditam que as empresas inteligentes estão reconhecendo que seu valor de mercado é resultado de ativos intangíveis: suas marcas, sua base de clientes, seus funcionários, seu capital intelectual, suas relações com fornecedores e distribuidores. O sétimo item refere-se à mudança da construção de marcas por meio da propaganda para a construção de marcas por meio do desempenho e das comunicações integradas. Kotler e Keller (2010) defendem que os profissionais estão deixando de executar suas atividades com apenas uma ferramenta de comunicação, como a propaganda ou a força de vendas. Os profissionais modernos estão integrando várias ferramentas para entregar uma imagem de marca consistente aos seus cientes. A oitava mudança é referente ao avanço da internet e a consequentemente atração de clientes através da disponibilização de produtos on-line. O nono fator diz respeito à mudança da empresa deixar de estabelecer vendas em massa para atender mercados-alvo bem definidos. Esse foco é facilitado pela disseminação de canais de comunicação segmentados. A décima mudança envolve a adaptação necessária no espírito das organizações e profissionais. As empresas, normalmente, têm como objetivo obter lucro em cada transação, mas atualmente muitas organizações estão concentrando seu foco nos clientes, produtos e canais mais lucrativos. Essas empresas, segundo Kotler e Keller (2010), estão estimando o valor do cliente ao longo do tempo e projetando ofertas e preços para alcançarem lucros durante o ciclo de vida desse cliente. A ênfase está na retenção 19 de clientes e o foco passou de transações lucrativas para o foco no valor do cliente ao longo do tempo. O próximo item refere-se à outra mudança de foco. Dessa vez, as empresas deixam de obter participação de mercado e passam a ter o foco na construção de participação no cliente. Kotler e Keller (2010) acreditam que isso é possível quando as organizações oferecem uma variedade maior de produtos aos seus clientes. A próxima mudança reforça a atuação da empresa, passando de local para ao mesmo tempo global e local. Segundo os autores, (2010) muitas empresas estão adotando uma combinação de centralização e descentralização e, com isso, estão equilibrando melhor a adaptação local e padronização global. Outra mudança é do foco no resultado financeiro para o foco no resultado de marketing. Kotler e Keller (2010) afirmam que as organizações devem avaliar além das simples receitas de vendas e devem examinar os resultados de marketing. Eles (2010) argumentam que mudanças nos indicadores de marketing podem prever mudanças nos resultados financeiros. O último fator descrito pelos Kotler e Keller (2010) é a de foco nos interessados. As organizações devem respeitar a importância de criar prosperidade para todos os públicos e, para isso, precisam desenvolver políticas e estratégias para equilibrar os retornos para todos os interessados. 2.2 MARKETING HOLÍSTICO A orientação de marketing holístico, denominada pelos autores (2010), considera o conjunto de forças que surgiram na última década, que exigem novas práticas de marketing e de negócios. Kotler e Keller (2010) acreditam que o marketing holístico é uma abordagem mais completa, que envolve o desenvolvimento, o projeto e a implementação de programas, processos e atividades de marketing, com a certeza de sua amplitude e de interdependências de seus efeitos. Kotler e Pfoertsch (2008) reforçam essa ideia, argumentando que essa orientação, da mesma forma que a gestão holística da marca reconhece que tudo tem sua importância, por isso, é fundamental contar com uma perspectiva ampla e integrada de suas atividades. Para os autores: 20 As empresas precisam refletir profundamente sobre como operar e competir em um novo ambiente de marketing. Profissionais de marketing do século XXI reconhecem cada vez mais a necessidade de uma abordagem mais completa e coesa que transcenda as aplicações tradicionais da orientação de marketing. (KOTLER; KELLER, 2010, p.14) Para atender essa necessidade mais ampla e profunda dos consumidores, Kotler e Keller (2010) apresentam as dimensões do marketing holístico: marketing de relacionamento, marketing integrado, marketing interno e marketing de responsabilidade social. Para eles (2010), o marketing holístico caracteriza-se pelo forte alinhamento de todas as atividades de marketing. Figura 2 - As quatro dimensões do marketing holístico Fonte: Kotler e Keller (2012, p.16) No marketing de relacionamento, a meta é construir relacionamentos de longo prazo mutuamente satisfatórios com os clientes, fornecedores, distribuidores e outros parceiros de marketing, para conquistar, manter e construir fortes relações econômicas, técnicas e sociais. A segunda dimensão - o marketing integrado - tem como objetivo montar programas de marketing totalmente interdependentes para criar, comunicar e entregar valor aos consumidores. Esse programa consiste em diversas decisões quanto às atividades de marketing e pode assumir muitas formas. Para os autores Kotler e Keller (2010), uma maneira tradicional de descrever essa variedade de atividades é através do mix de marketing, reconhecido como o 21 conjunto de ferramentas que a empresa usa para atingir seus objetivos de marketing. A terceira dimensão, o marketing interno, garante que todos os colaboradores acolham os princípios de marketing apropriados, desde a gerência sênior até outros departamentos da organização. A eficiência nessa dimensão é importante para entregar o que foi prometido, segundo os autores: “não tem sentido prometer um serviço excelente antes que a equipe esteja pronta para fornecê-lo” (KOTLER; KELLER, 2010, p.18). Por isso, o marketing interno necessita de atividades de contratação, treinamento e motivação dos funcionários para atenderem bem os clientes. A quarta dimensão, o marketing socialmente responsável, engloba a compreensão e as preocupações mais abrangentes, assim como os contextos ético, ambiental, legal e social das atividades e dos programas da empresa. Segundo os autores (2010), as causas e os efeitos do marketing extrapolam as fronteiras das organizações e dos clientes para impactar de forma positiva a sociedade. Essa prática exige das empresas comportamento ético e social em suas ações de marketing. As empresas devem equilibrar os critérios conflitantes de lucros empresariais, satisfação do cliente e interesse público. Ainda segundo Kotler e Keller (2010), essa dimensão dá a oportunidade da empresa melhorar sua reputação, aumentar a consciência da marca, aumentar a fidelidade do cliente e obter mais vendas e exposição na mídia. 2.3 MARKETING SOCIAL O marketing social, segundo Kotler e Armstrong (1999), sustenta que a empresa deve determinar as necessidades, desejos e interesses dos mercados-alvo e, com isso, proporcionar aos clientes um valor superior para manter ou melhorar o bem-estar do cliente e da sociedade em que está inserida. Esse conceito questiona; se o marketing tradicional é adequado aos problemas ambientais, escassez de recursos naturais, rápido crescimento populacional, problemas econômicos e serviços sociais negligentes em todo o mundo; e se a empresa que serve e satisfaz desejos individuais está fazendo o melhor para os consumidores e para a sociedade a longo prazo. O marketing social defende que conceito tradicional não percebe os possíveis conflitos entre os desejos 22 de curto prazo do consumidor e seu bem-estar de longo prazo. Para Sandhusen (1998), no marketing social, os gerentes precisam balancear três interesses: o dos compradores, o dos vendedores e o da sociedade como um todo. Kotler e Armstrong (1999) complementam, afirmando que as empresas precisam equilibrar os lucros, os desejos dos consumidores e os interesses da sociedade. Kotler e Armstrong (1999) acreditam que, no início, a maioria das empresas tomou decisões com foco nos lucros em curto prazo. Mais tarde, perceberam a importância a longo prazo de satisfazer os consumidores e, com isso, surgiu o conceito de marketing. Os autores (1999) afirmam que muitas companhias passaram a pensar nos interesses da sociedade antes de tomar suas decisões. Figura 3 - As três considerações subjacentes ao conceito de marketing societário. Fonte: Kotler e Armstrong (1999, p.13). 2.4 MARKETING 3.0 O marketing, para Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), evoluiu do foco na gestão do produto, marketing 1.0, nas décadas de 1950 e 1960 para o foco na gestão do cliente, marketing 2.0, nas décadas de 1970 e 1980. Nas décadas de 1990 e 2000, foi acrescentada a disciplina de gestão da marca. Os autores (2010) afirmam que o marketing, de forma resumida, é composto por três disciplinas essenciais: gestão do produto, gestão de clientes e gestão de marca. A ideia de marketing 3.0 foi concebida na Ásia, em novembro de 2005, por 23 um grupo de consultores da MarkPlus, empresa de serviços de marketing do Sudeste Asiático liderada por Hermawan Kartajaya. No marketing 3.0, as empresas precisam tratar os consumidores como seres humanos plenos. Stephen Covey, citado por Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), argumenta que os componentes básicos de um ser humano pleno são: o corpo físico, a mente capaz de pensar e analisar, coração capaz de sentir emoção e espírito. Em marketing, o conceito de relevância na mente dos consumidores, segundo os autores (2010), começou com o livro Posicionamento de Al Ries e Jack Trout. Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010) acreditam que, mais tarde, os profissionais de marketing começaram a reconhecer que o componente emocional da psique humana estava sendo negligenciado. Além da mente humana, os profissionais precisam também atingir o coração dos consumidores. O conceito de marketing emocional, conforme Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), foi descrito em vários livros como Marketing Experimental, de Bernd Schmitt, A Emoção das Marcas, de Marc Gobé, e Lovemarks: futuro além das marcas, de Kevin Roberts. Para os autores (2010), as empresas precisarão evoluir para um terceiro estágio do marketing o qual se refere ao espírito dos consumidores. Os profissionais terão de compreender as ansiedades e os desejos dos consumidores para se manterem relevantes, e as empresas deverão tratar os consumidores como seres humanos plenos, feitos de alma, coração e espírito. No estágio 3.0, o marketing é definido como um triângulo harmonioso entre marca, posicionamento, diferenciação, identidade, integridade e imagem da marca. Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010) reforçam, afirmando que somente o triângulo completo tem credibilidade no marketing 3.0. O triângulo tem como objetivo ser relevante para o ser humano como um todo: mente, alma e espírito. A marca é inútil apenas articulando seu posicionamento. Ela pode ter uma identidade clara na mente dos consumidores, mas isso não significa que seja boa. A identidade da marca, conforme Kotler, Hermawan e Setiawan (2010), deve estar posicionada na mente dos consumidores, e, para ser ouvida e notada, deve ter um posicionamento singular. Deve também ser relevante para as necessidades e os desejos racionais dos consumidores. A integridade da marca é a concretização do posicionamento e da diferenciação comunicada aos consumidores, ou seja, é preciso cumprir com as promessas e conquistar a confiança dos públicos. Os autores (2010) afirmam que o alvo da integridade da marca é o espírito dos 24 consumidores. A imagem da marca, por sua vez, refere-se à conquista das emoções dos consumidores. Kotler, Hermawan e Setiawan (2010) acreditam que as marcas devem focar as necessidades e os desejos emocionais dos consumidores, superando as funcionalidades e as características do produto. No Marketing 3.0, os profissionais de marketing para alcançar eficácia em suas ações, devem atingir mente e espírito dos consumidores simultaneamente para chegar ao seu coração. O posicionamento de marca, segundo Kotler, Hermawan e Setiawan (2010), fará a mente considerar uma decisão de compra. A marca, por sua vez, exige diferenciação autêntica para que o espírito humano confirme a decisão. Por último, o coração guiará o consumidor a agir e efetivar a compra. O modelo dos 3Is – integridade da marca, identidade e imagem da marca - também é decisivo para o marketing no contexto das mídias sociais. Com o empowerment do consumidor induzido pela abundância de informações e pelas comunidades em rede, diferenciação e o posicionamento, segundo Kotler, Hermawan e Setiawan (2010), são dois fatores fundamentais para o sucesso da marca. Sem autenticidade, as marcas não sobreviverão em um ambiente em que o boca a boca é o novo meio de propaganda. Os consumidores acreditam mais em estranhos de sua comunidade do que em empresas. Os autores (2010) afirmam que o marketing no estágio 3.0 é a era da comunicação horizontal e que o controle vertical não funcionará mais. O que funcionará será a honestidade, a originalidade e a autenticidade das marcas. Para isso, as empresas precisarão realizar a transição para o marketing baseado em valores. Os profissionais, para Kotler, Hermawan e Setiawan (2010), precisam identificar as ansiedades e desejos dos consumidores e, com isso, conquistar suas mentes, corações e espíritos. O desejo dos consumidores, de forma geral, é de transformar a sociedade em um lugar melhor. Segundo Kotler, Hermawan e Setiawan (2010), assim como foi defendida a integração do marketing entre os setores da empresa, em outro momento; a melhor forma de incluir boas ações da empresa é incorporá-las à missão, visão e valores da empresa, conforme figura abaixo. Os líderes devem encarar essas declarações como seu DNA corporativo. 25 Figura 4 - Modelo de matriz baseada em valores. Fonte: Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010, p.47). O marketing, para Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), não deve ser considerado uma ferramenta para gerar demanda ou apenas sinônimo de vendas. Ele deve ser visto como a principal ferramenta para recuperar a confiança do consumidor. 2.5 BRANDING A trajetória de produtos para marcas registradas, para Roberts (2005), é uma das grandes histórias do século passado. Esse processo representou grande impacto sobre o modo como as empresas relacionam-se com os seus consumidores, e como eles lidam com as suas marcas. Evidencias pré-históricas indicam a criação de marcas registradas nas cerâmicas da Mesopotâmia com mais de 3000 mil anos a.C. Ao longo de todos esses anos, o comércio expandiu-se para além das fronteiras locais e a importâncias das marcas registradas aumentou proporcionalmente. Na perspectiva da empresa, a marca registrada representou defesa contra a concorrência e possíveis imitações. Na perspectiva dos consumidores, representou segurança. Segundo Roberts (2005), 26 para ambos, a marca registrada representou um sinal de continuidade em um ambiente em constante mudança. Tybout e Carpenter (2001) acreditam que as marcas representam papel importante na vida das pessoas, pois proporcionam funcionalidade, imagens e experiências. As marcas trabalham para poupar o tempo dos consumidores, assegurando um nível adequado de qualidade e simplificando o ato de escolher entre tantas possibilidades disponíveis no mercado. Para Roberts (2005), as marcas foram criadas para diferenciar produtos. Essa afirmação do autor (2005), aproximase do conceito de branding descrito por alguns autores. A importância do branding, conforme Tybout e Carpenter (2001), evoluiu à medida que o comportamento dos consumidores e a competição dos mercados foram se modificando ao longo dos anos. Desde que os mercados tornaram-se mais competitivos e a qualidade dos produtos ficou semelhante, as marcas evoluíram para oferecer mais valor aos seus clientes. Os autores reforçam que: As marcas são um componente universal dos mercados modernos. Existem porque têm valor para os consumidores. Elas asseguram um nível de qualidade, simplificam as escolhas e auxiliam os consumidores na obtenção de uma ampla gama de objetivos que vai desde a satisfação de necessidades funcionais básicas até a própria atualização. As marcas também trazem benefício às empresas que as criam. Elas suportam melhor as margens de lucro que apenas as diferenças existentes entre os produtos poderiam permitir e, desse modo, protegem as empresas contra concorrentes que imitam seus produtos. As marcas também podem permitir que uma empresa ganhe influência sobre seus clientes, como no caso da Intel. Em resumo, as marcas servem de ponte entre uma empresa e seus clientes - são os símbolos do valor que a empresa cria. (TYBOUT: CARPENTER, 2001, p.131). Ainda na definição de branding, Calder e Reagan (2001) defendem que branding é um esforço para tornar os produtos mais significativos para os consumidores. Segundo os autores (2001), a fonte para definir os significados reside na vida e nas experiências do consumidor. Tybout e Carpenter (2001) também afirmam que as marcas poderosas não residem nas empresas, mas nos consumidores. Para Tybout e Carpenter (2001), são os pensamentos e as sensações dos consumidores que formam a essência do valor de marca. Os autores enfatizam: 27 O sucesso requer a criação de valor nas fábricas e na mente dos compradores. Esse processo de criar e manter o valor de mercado de uma marca pode, ao mesmo tempo, enriquecer a vida dos consumidores, bem como o resultado da operação de uma empresa. (TYBOUT; CARPENTER, 2001, p.131) Essa relação com os clientes, também é abordada por Aaker (1996) que acredita que o valor de marca é criado pela fidelidade conquistada com os clientes e que essa conquista impacta de forma positiva os custos de marketing e torna-se decisivo para muitas empresas, pois representa uma barreira substancial à penetração de novas empresas. Por outro lado, Kotler e Pfoertsch (2008) afirmam que as marcas, as percepções, as expectativas e as crenças estão na mente dos consumidores, potenciais clientes, ou qualquer pessoa que possa influenciar o ramo da empresa. Para Tybout e Carpenter (2001), os consumidores, em contato com as marcas e estímulos, associam as sensações psicológicas. Para eles (2001), o número de combinações e associações é infinito e pode ser representada visualmente por uma rede de pensamentos e associações feitas na cabeça do consumidor. Eles (2001) definem marca como um nome, símbolo ou estampa associada a um serviço ou produto. Por outro lado, Calder e Reagan (2001) complementam, apresentando a importância do significado e conceituando branding como o ato de ‘destruição criativa’, que altera o significado de produto, conforme a vida dos consumidores é modificada ao longo do tempo. Para os autores (2001), em meio ao contexto competitivo, o significado é a essência das marcas e o verdadeiro diferencial. Esse significado para Tybout e Sternthal (2001) é o que uma empresa deve oferecer para os clientes. Uma razão atraente para ser escolhida e preferida em detrimento às outras várias opções que podem ser consideradas. Os autores ainda afirmam que: “Para que uma marca tenha valor, é preciso que as associações que normalmente são feitas em relação a ela tornem-se parte da vida dos compradores.” (TYBOUT; CARPENTER, 2001, p.107) Ainda na construção de valor, Kotler e Pfoertsch (2008) acreditam que consolidar marcas de sucesso é um processo que vai muito além da simples ideia de criar consciência da marca e de suas promessas aos clientes, conforme abordado anteriormente. De acordo com Aaker (1996), a construção e as associações na mente dos consumidores são impulsionadas pelo que a organização 28 deseja que a sua marca represente para os clientes. Segundo o autor (1996), os elementos fundamentais para construir marcas de sucesso é o desenvolvimento e a implementação da identidade da marca. Para Kotler e Pfoertsch a construção de marca: é uma jornada para a construção de uma alma corporativa e da comunicação desse sentimento a todos os seus sócios como um vírus por dentro e por fora da empresa, de maneira que os clientes recebam realmente tudo aquilo que a marca promete. (KOTLER; PFOERTSCH, 2008, p.13) Para ter sucesso nessa construção, Aaker (1996) afirma que a estratégia de marca deve ser influenciada pela estratégia de negócios, visão e cultura corporativa. O autor (1996) chama atenção e alerta que a identidade de marca não deve prometer o que a estratégia não pode ou não quer oferecer. Ainda segundo Aaker (1996), o desenvolvimento de marcas envolve decisões estratégicas e táticas que criam desafios para a organização. A importância dessa construção de marcas de sucesso representa para as organizações, segundo Kotler e Pfoertsch (2008): O poderio de uma marca empresarial, mensurado em valor de marca, reside no fato de que ela pode ser um dos mais importantes ativos de uma empresa. Trata-se de um tremendo engano considerar o desenvolvimento da marca, ou a percepção positiva de uma marca, apenas como uma variável das despesas de marketing. Consolidar marcas fortes é um investimento, voltado para a criação de ativos subjetivos de longo prazo. Capitalizar sobre marcas fortes representa, para qualquer empresa, a oportunidade de atingir seus objetivos de crescimento de longo prazo não apenas mais rapidamente, mas também de maneira mais lucrativas. Marcas não são apenas aquilo que a empresa vende, pelo contrário, elas representam o que a empresa faz e, mais significativamente, o que a empresa realmente é. Na verdade, muitas marcas são a razão da existência de um negócio, e não o contrário. (KOTLER; PFOERTSCH, 2008, p.68) Ainda segundo os autores (2008), marcas duradouras podem impulsionar os negócios mais do que qualquer outro ativo, servindo como atalho emocional entre a empresa e seus clientes. Sobre o lado emocional, Roberts afirma que “as emoções são uma oportunidade séria de entrar em contato com os consumidores” (ROBERTS, 2005, p.43). Segundo o autor (2005), a emoção é um recurso ilimitado e pode ser aproveitada com novas ideias, inspirações e experiências. Para Kotler e 29 Pfoertsch (2008), a personalidade, a reputação e o bom desempenho da marca conseguem diferenciá-la de seus concorrentes, alcançando a lealdade dos clientes: Marcas verdadeiramente de sucesso quase sempre ocupam posições exclusivas na mente do consumidor. Uma identidade forte e motivadora que os clientes conhecem e na qual confiam pode ficar acima da questão de preços e artigos da concorrência. (KOTLER; PFOERTSCH, 2008, p.69). A empresa, segundo Calder e Reagan (2001), deve ir além do produto para vender uma marca. As empresas devem criar e transmitir o significado do produto. Roberts (2005, p.42) defende a apropriação e o relacionamento emocional entre marcas e consumidores, afirmando que: “a diferença essencial entre emoção e razão é que a primeira leva à ação, enquanto a segunda leva a conclusões”. Segundo o autor (2005), a emoção e a razão estão entrelaçadas, mas, quando entram em conflito, a emoção sempre ganha. Roberts (2005) ainda afirma que sem estímulo da emoção, o pensamento racional torna-se lento e se desintegra. Segundo Tybout e Sternthal (2001), os consumidores, em geral, não tomam decisões com base, apenas, em atributos do produto ou em imagens. Os consumidores utilizam atributos e imagens para inferir os benefícios. Um benefício, segundo os autores (2001), é um conceito abstrato, assim como conveniência, prazer e diversão. Kotler e Pfoertsch (2008) acreditam que as marcas funcionam como uma espécie de atributos, benefícios, crenças e valores, incorporando todas as características da empresa, de seus produtos e serviços. Para Roberts (2005), ter marca registrada não garante sucesso na diferenciação e na competição com os concorrentes, mas pode ser um grande começo. Segundo o autor (2005), no século XX, algumas marcas registradas transformaram-se em ícones duradouros. Porém, Roberts (2005) acredita que qualquer produto pode virar commodity, caso haja competição suficiente no mercado. Por esse motivo, as marcas foram valorizadas como diferenciais competitivos em muitos mercados para combater essas pressões. Embora produtos e serviços possam se tornar obsoletos e ser imitados, Kotler e Pfoertsch (2008) defendem que as marcas de sucesso são únicas e infinitas. Roberts (2005) acredita que é possível, pois as pessoas estão à procura de conexões novas e emocionais. A competição entre as empresas está mais intensa e a expectativa entre os 30 consumidores está maior: por isso, os consumidores precisam de estímulos emocionais que os ajudem a tomar decisões. Por fim, Roberts (2005) afirma que o poder nas mãos dos consumidores, os aspectos intangíveis dos relacionamentos e a valorização das emoções, deve aproximar ainda mais os consumidores e as companhias. Para entender o comportamento do consumidor e o relacionamento deles com suas marcas, será abordado no próximo capítulo a disciplina de neurociência, seus principais componentes, sua evolução, definição e pesquisadores. Esse conteúdo científico formará a neuromarketing. base necessária para a compreensão do 31 3 NEUROCIÊNCIA Neste capítulo será apresentada a neurociência, uma das áreas responsáveis pela criação do neuromarketing. A assimilação do conhecimento dessa disciplina é essencial para a compreensão da origem, funcionamento, definição e aplicação do neuromarketing. Na primeira parte do terceiro capítulo serão apresentados alguns dos principais objetos de estudo da neurociência – o sistema nervoso, o cérebro e os neurônios. Esses objetos foram escolhidos, pois são os principais elementos estudados no neuromarketing. Na segunda parte será abordada a evolução, as definições e os pesquisadores da área. O tema será apresentado através de autores como Gazzaniga e Heatherton (2007), Lent (2008), Kandel, Schwartz e Jessel (1997), Bear, Connors e Paradiso (2010), Augustine (2010) e Herculano-Houzel (2008). 3.1 FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO Para Lent (2008), o sistema nervoso é complexo e interligado entre sistema nervoso central e periférico. O sistema nervoso é um órgão de alta complexidade anatômica: opaco ao que está no seu interior, convoluto e, portanto, cheio de saliências e reentrâncias que escondem umas às outras, variável entre as espécies animais e extensamente conectado com estruturas da periferia corporal. (LENT, 2008, p.20) O sistema nervoso central é definido pelo autor (2008) como o conjunto de componentes presentes em caixas ósseas - o crânio e a coluna vertebral - enquanto o sistema nervoso periférico apresenta seus elementos espalhados por todo o organismo. O Sistema Nervoso Central, por sua vez, pode ser dividido em encéfalo, presente dentro do crânio, e medula espinhal, contida no interior da coluna vertebral. O encéfalo pode ser dividido em cérebro, cerebelo e tronco encefálico. Por outro lado, o Sistema Nervoso Periférico tem em sua classificação os neurônios e as células gliais, responsáveis respectivamente pela comunicação do sistema nervoso 32 central com os órgãos periféricos e pela distribuição dos aglomerados de células nervosas nos vários órgãos. Ambos sistemas – Nervoso Central e Periférico - são anatomicamente separados, mas interconectados e interdependentes funcionalmente. Segundo Gazzaniga e Heatherton (2007), o sistema nervoso central apresenta partes fundamentais para o seu funcionamento e pode ser dividido em sete principais partes, representadas em partes na figura abaixo: Figura 5 - Sistema Nervoso Central Fonte: SÓ Biologia (2008-2014). A primeira delas, a medula espinhal, recebe e processa a informação sensorial oriunda da pele, das articulações e dos músculos dos membros e do tronco e controla os movimentos do tronco e dos membros. A medula espinhal é subdividida em regiões cervical, torácica, lombar e sacra. A medula, depois, continua como o tronco cerebral (ou encefálico), que transmite informação, nos dois sentidos, entre a medula espinhal e o cérebro. O tronco cerebral contém diversos grupos distintos de corpos celulares. Alguns desses núcleos recebem informações da pele e dos músculos da cabeça e outros controlam a eferência motora para os músculos da face, do pescoço e dos olhos. Enquanto isso, outros núcleos são especializados em receber informação advinda dos sentidos, da audição, do equilíbrio e do paladar. O tronco também regula os níveis de ativação e da atenção. Por meio da formação 33 reticular, transmite informação nos dois sentidos entre a medula espinhal e o cérebro e é dividido em três partes: o bulbo, a ponta e o mesencéfalo. O bulbo, a segunda parte, é situado logo acima da medula espinhal e é responsável por funções autonômicas, como digestão, respiração e controle da frequência cardíaca. A terceira parte, a ponte, fica acima do bulbo e transmite informação do movimento do cérebro para o cerebelo. O cerebelo, a quarta parte, fica, por sua vez, atrás da ponte e é ligado ao tronco cerebral por diversas fibras, chamadas de pedúnculos. O cerebelo é responsável por gerenciar a força e o alcance dos movimentos e participar do aprendizado de habilidades motoras. A quinta parte principal, o mesencéfalo, é responsável por controlar muitas funções sensoriais e motoras, inclusive os movimentos oculares e a coordenação dos reflexos visuais e auditivos. A sexta parte, o diencéfalo, contém duas estruturas: o tálamo e o hipotálamo. O tálamo processa grande parte da informação que chega ao córtex cerebral, vinda do resto do sistema nervoso central; e o hipotálamo regula as funções autonômicas, endócrinas e viscerais. A sétima parte, os hemisférios cerebrais, consistem no córtex cerebral e suas três estruturas: os gânglios da base, o hipocampo e o núcleo amigdaloide. Os gânglios participam da regulação do desempenho motor; o hipocampo participa do armazenamento das memórias; e o núcleo amigdaloide coordena as respostas autonômicas e endócrinas, em conjunto com os estados emocionais. Cada um dos territórios neurais tem a capacidade de desempenhar funções específicas. Para Kandel, Schwartz e Jessel (1997), a ideia de que as diferentes regiões são especializadas em diferentes funções é aceita como um dos principais pilares da neurociência. Essas conclusões foram dificultadas, segundo os autores (1997) durante tantos anos, pois cada função é, em geral, desempenhada por mais de uma via neural. Quando uma região ou via é lesada, outras, muitas vezes, são capazes de compensar parcialmente a perda, mascarando a evidência comportamental de localização e demonstrando o poder de adaptação do organismo. Cada hemisfério cerebral, conforme Kandel, Schwartz e Jessel (1997) está relacionado aos processos sensoriais e motores ao lado oposto do corpo. A informação sensorial que chega à medula, pelo lado esquerdo, cruza para a metade direita do sistema nervoso, antes de ser conduzida até o córtex cerebral. Essa relação também acontece com as áreas motoras que controlam os movimentos da metade oposto do corpo. 34 3.2 CÉREBRO Embora tenha havido grande repercussão da neurociência nos últimos anos, o cérebro é estudado há muitos anos e nem sempre foi visto como a morada da mente. A seguir breve histórico sobre o estudo do cérebro e definições sobre seu funcionamento, segundo o olhar de neurocientistas. Segundo Gazzaniga e Heatherton (2007), no século IV a.C, Hipócrates (460 – 379 a.C) descreveu o cérebro como a localização da mente. Mais tarde, Aristóteles descreveu o cérebro como um órgão resfriador, que dissipa o calor em excesso produzido pelo coração. No século II a.C, Galeno, médico romano, ignora e não aceita as concepções de Aristóteles e atribui funções mentais ao cérebro. Esse pensamento foi aceito pelos pesquisadores nos próximos 14 séculos. Porém, na década de 1650, René Descartes apresenta a teoria dualista da mente e do corpo. Essa teoria defende que os movimentos do corpo são controlados por reflexões mecânicas que interagem com uma “não física”, localizada na glândula pineal do cérebro. Mais tarde, na década de 1800, o alemão Franz Joseph Gall desenvolve a frenologia com a teoria de que os traços de personalidade e as capacidades mentais habitam diferentes áreas do cérebro e podem ser avaliadas medindo suas dimensões externas. Duas décadas depois, Marie-Jean-Pierre Flourens argumenta contra a frenologia, afirmando que todas as partes do córtex contribuem para todas as funções mentais. Em 1848, um acidente grave proporciona uma análise fundamental para a evolução do estudo do cérebro e do seu funcionamento. Neste ano, o operário de uma ferrovia é acidentalmente lobotomizado por um tirante de ferro e mudanças importantes são observadas em sua personalidade e impulsos, mas sem apresentar déficits. Mais tarde, em 1861, Paul Broca, médico francês, apresenta a área de broca e sua importância para a fala. Essa teoria foi amplamente aceita e rigorosamente substanciada de uma função específica para uma área cortical particular. Em 1920, Karl Lashley remove pedaços do córtex de um rato, estudando os traços de sua memória. Erroneamente, Karl concluiu que grande parte do córtex contribui igualmente para a maioria das funções mentais. Na década de 1940, o pesquisador Wilder Penfield experimenta a corrente elétrica aplicada a diferentes áreas do cérebro para examinar suas funções e suas contribuições para as reações e o comportamento. Em 1953, durante a remoção cirúrgica bilateral do hipocampo, 35 um paciente perde toda a sua capacidade de reter novas memórias para novos acontecimentos. Esse caso foi estudado por Brenda Milner e representa um clássico da neurofisiologia. Na próxima década, o psicobiólogo Roger Sperry e Michael Gazzaniga realizam pesquisas com pacientes que tiveram seus hemisférios cerebrais desconectados para tratamento da epilepsia. Nesse estudo os pesquisadores descobrem que os hemisférios podem funcionar independentemente. A década de 1980 foi marcada pela invenção da imagem cerebral com novos equipamentos para o rastreamento das reações cerebrais. O avanço da tecnologia permitiu a visualização do cérebro humano em funcionamento e proporcionou novas descobertas sobre esse estudo tão complexo. Na década de 1990, a biologia molecular traz instrumentos novos para as pesquisas, como os ratos transgênicos e os indicadores moleculares de atividade neuronal, para resolver e compreender o cérebro. Como é possível perceber o estudo do cérebro evoluiu muito desde os primeiros registros. Gazzaniga e Heatherton (2007) acreditam que, ao longo dos anos, o cérebro foi fundamental para a sobrevivência e prosperidade humana: O cérebro é um conjunto de estruturas único e notável, que evoluiu coletivamente para controlar o organismo conforme ele tratava das questões de sobrevivência e reprodução. Nos humanos, essa adaptatividade evolutiva permitiu o desenvolvimento de comunicações, cultura e pensamento complexos. (GAZZANIGA; HEATHERTON 2007, p.142) O cérebro, para Pradeep (2012), é uma série de redes neurais complexas, entrelaçadas e conectadas. Outros autores (Bear, Connors e Paradiso, 2010), descrevem o cérebro como a porção mais rostral e mais larga do encéfalo. Kandel, Schwartz e Jessel (1997), complementam afirmando que o cérebro é uma rede precisa com mais de 100 milhões de células neurais individuais, interconectadas em sistemas que produzem a percepção do mundo exterior, controlam nossa atenção e nossas ações. Para Gazzaniga e Heatherton (2007, p.127): “A melhor maneira de ver o cérebro é como uma coleção de circuitos neuronais interatuantes que foram acumulando-se e desenvolvendo-se ao longo da evolução humana”. Apesar das conexões no cérebro serem precisas, Kandel, Schwartz e Jessel (1997), afirmam que elas não são exatamente as mesmas em todos os indivíduos, 36 demonstrando claramente a complexidade em entender o funcionamento desse órgão. As conexões entre as células podem ser alteradas, conforme as experiências vividas, as atividades e o aprendizado ao longo dos anos, fortalecendo o potencial humano de aprendizado. Para Gazzaniga e Heatherton (2007, p.140), o cérebro está em constante adaptação: “Embora a plasticidade diminua com a idade, o cérebro mantém a capacidade de refazer sua rede neural durante toda a vida. Essa é a base da aprendizagem”. Segundo os autores (2007), para produzir esse comportamento complexo, o cérebro conta com um número extraordinário de células neurais que se comunicam entre si por meio de interconexões específicas. Apesar de seu grande número de células neurais, elas têm em comum muitas características que ajudam a explicar o seu funcionamento. Ainda segundo os autores (2007), com estudos ao longo dos anos, foi possível descobrir que o potencial para o comportamento não depende da variedade das células neurais, mas do número de células e de conexões precisas entre elas, os receptores sensoriais e os músculos. Atualmente sabe-se que a superfície do cérebro, longe de ser uma estrutura uniforme, é uma colcha de retalhos de muitas áreas altamente especializadas. Entretanto, em vez de estarem organizadamente divididas em regiões correspondentes a complexos traços de personalidade, como os frenologistas argumentaram, as áreas cerebrais são, na verdade, especializadas para componentes bem mais rudimentares da percepção, do comportamento e da vida mental. Uma grande área do cérebro é dedicada a diferentes aspectos da visão, por exemplo, e outra, dedicava a gerar movimentos rudimentares. Segundo Lent (2008), esse cenário mudou com o avanço dos métodos de abordagem e iniciou uma nova evolução na pesquisa em neurociências em 1990. Esse desenvolvimento foi possível com o aperfeiçoamento das técnicas de visualização do cérebro em funcionamento. Essa técnica baseia-se na relação da atividade mental e do metabolismo cerebral. Ainda segundo o autor (2008), essa relação foi estudada a partir de 1940 com a medição do fluxo sanguíneo e do consumo de oxigênio no cérebro, mas só foi possível ser testada nas últimas décadas, graças ao avanço da tecnologia. 37 3.3 NEURÔNIOS Outro elemento importante na compreensão do comportamento humano e do funcionamento do sistema nervoso são as células neurais. Conforme apresentado por Kandel, Schwartz e Jessel (1997), existem duas classes distintas de células no sistema nervoso, as células neurais – neurônios – e as células glia. Ainda que exista um grande número de neurônios no encéfalo humano, em torno de 100 bilhões, ás células glia apresentam cerca de dez vezes o número de neurônios. Segundo Bear, Connors e Paradiso (2010), mesmo com esses números, os neurônios, no entanto, são as células mais importantes para as funções exclusivas do encéfalo. Kandel, Schwartz e Jessel (1997) acreditam que a tarefa da neurociência é explicar o comportamento em termos da atividade cerebral e estudar essa variedade de células neurais individuais atuam para produzir o comportamento e como elas são influenciadas pelo meio ambiente e pelo comportamento de outras pessoas. Conforme Gazzaniga e Heatherton (2007), os neurônios são as unidades básicas do sistema nervoso, pois são as células que promovem a comunicação do sistema nervoso central e periférico. Eles se diferenciam de outras células por operarem por meio de impulsos elétricos e se comunicarem com outros neurônios por sinais químicos. Para os autores (2007), os neurônios têm três funções principais: de recepção, condução e transmissão. Na primeira, o neurônio recebe informações dos neurônios vizinhos; enquanto na segunda, o neurônio integra esses sinais; e na terceira função transmite esses sinais para outros neurônios. Ainda segundo Gazzaniga e Heatherton (2007), esse processo forma a comunicação do sistema nervoso e está presente em todos os animais. Kandel, Schwartz e Jessel (1997) argumentam que é com os receptores sensoriais que os humanos obtêm informação sobre o seu ambiente. Os autores (1997) explicam que essa informação é transformada pelo cérebro em percepções e em comandos para o movimento Todas essas atividades são realizadas pelas células neurais e suas conexões. Kandel, Schwartz e Jessel acreditam que o primeiro passo para compreender a mente, é entender como os neurônios se organizam em vias sinalizadoras e como as células neurais individuais do cérebro se comunicam uma com as outras, por meio da transmissão sináptica. Para entender o funcionamento dos neurônios, é importante compreender suas divisões. 38 Os neurônios são divididos em quatro regiões: o corpo celular, os dendritos, o axônio e suas terminações pré-sinápticas. Para Gazzaniga e Heatherton (2007), o corpo celular é a região do neurônio onde a informação de milhares de outros neurônios é coletada e processada. Já os dendritos são extensões do neurônio que detectam informações de outros neurônios. O axônio, por sua vez, é o prolongamento pelo qual a informação é transmitida para outros neurônios. Lent (2008) aponta que o axônio e os dendritos são as regiões que diferenciam as células nervosas. A última região, as terminações pré-sinápticas são pequenos nódulos nas extremidades dos axônios, que liberam sinais químicos dos neurônios para uma área chamada sinapse, que é o local de comunicação química entre os neurônios. Segundo Gazzaniga e Heatherton (2007), os neurônios ainda podem ser classificados em três tipos, os neurônios sensoriais, os motores e os interneurônios. Os sensoriais detectam informação do ambiente físico e enviam para o cérebro, normalmente, via medula espinhal. Os neurônios motores dirigem os músculos para contrair ou relaxar e, assim, produzem o movimento. Os interneurônios se comunicam em circuitos locais ou de curta distância, integrando a atividade neural dentro de uma única área, por isso, frequentemente apresentam axônios curtos. Para Kandel, Schwartz e Jessel, o que torna o comportamento complexo são as conexões precisas entre as células neurais: As unidades básicas do cérebro, as células neurais, são bastante simples. O cérebro é capaz de produzir comportamento altamente complexo, por conter número extraordinariamente grande de células neurais - cerca de 100 bilhões - que se comunicam entre si por meio de interconexões específicas. Apesar de seu grande número, as células neurais têm em comum muitas características. Descoberta fundamental para a compreensão do cérebro é a de que o potencial para o comportamento complexo não depende muito da variedade das células neurais, mas, sim, do número dessas células e das conexões precisas umas com as outras e com os receptores sensoriais e com os músculos (KANDEL; SCHWARTZ; JESSEL,1997, p.17). Os neurônios, segundo Bear, Connors e Paradiso (2010), percebem as modificações no ambiente, comunicam essas alterações a outros neurônios e comandam as respostas a essas sensações. Lent (2008) complementa afirmando que os neurônios formam uma extensa rede capaz de receber do ambiente, processar, armazenar e enviar ao ambiente uma diversidade de informações. Enquanto isso, para Bear, Connors e Paradiso (2010), as células gliais contribuem 39 com a função encefálica, isolando, sustentando e nutrindo os neurônios vizinhos. Segundo os autores (2010), o termo glia origina-se da palavra grega “cola” e tem como principal função impedir que o encéfalo “escapasse pelas orelhas”. Para Lent (2008), as células gliais participam da regulação dessa rede de comunicação, interferindo na transmissão das informações, proporcionando condições para o seu funcionamento. Os dois elementos – neurônios e células gliais – formam extensas famílias e tipos morfológicos diversos, de acordo com a região em que se localizam. Já para Gazzaniga e Heatherton: 3.4 A EVOLUÇÃO DA NEUROCIÊNCIA A curiosidade e a necessidade de buscar novas respostas sobre o comportamento humano impulsionou a evolução da neurociência. Conforme descrito por Bear, Connors e Paradiso: É da natureza humana sermos curiosos a respeito do que vemos e ouvimos, do porquê de algumas coisas serem prazerosas, enquanto outras nos magoam, do modo como nos movemos, raciocinamos, aprendemos, lembramos e esquecemos, da natureza da raiva e da loucura. Esses mistérios estão começando a ser desvendados pela pesquisa básica em Neurociências (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2010, p.4). Ainda segundo os autores (2010), esses e outros mistérios estão começando a ser desvendados graças aos esforços de inúmeros pesquisadores da neurociência. É essa curiosidade e a necessidade de entender o comportamento humano que moveu a neurociência ao longo dos anos. Para compreender o atual momento dessa área, é necessário entender como esta ciência evoluiu e chegou ao seu estágio atual. Segundo Kandel, Schwartz e Jessel (1997), a pesquisa do comportamento tem suas raízes no começo da ciência ocidental, na filosofia clássica grega. Questões fundamentais sobre o comportamento, especialmente na área de percepção, foram investigações formuladas nos escritos de René Descartes, falecido em 1650, de John Locke, falecido em 1704, e de David Hume, falecido em 1776. Na metade do século XIX, o pensamento darwiano sobre a evolução formou o palco para a observação sistemática da ação e do comportamento. Esse enfoque originou a psicologia experimental, o estudo do comportamento humano e animal 40 sob condições controladas, e a etologia, o estudo do comportamento animal em seu ambiente natural. Segundo Bear, Connors e Paradiso (2010), os primeiros registros da neurociência foram feitos pelos nossos ancestrais pré-históricos. Apesar de ser uma ciência com recente repercussão, a pesquisa sobre o comportamento humano por meio da neurociência é mais antiga do que muitos imaginam. Nossos ancestrais já compreendiam que o encéfalo era vital para a vida humana, pois os registros de mais de um milhão de anos ou mais apresentam sinais de lesões cranianas letais feitas por outros hominídeos. Há cerca de 7 mil anos, os homens faziam orifícios nos crânios de homens vivos. Esse processo era chamado de trepanação e tinha o objetivo de curar e não de matar. Registros da época comprovam esse objetivo, pois, em alguns casos, os crânios mostraram sinais de cura após as perfurações, indicando ainda que este procedimento era realizado em homens vivos. Alguns indivíduos sobreviveram, inclusive, a muitos procedimentos de perfurações no crânio e embora não se tenha muita certeza do que esses homens queriam realizar, há quem acredite que esse procedimento era feito para tratar dores de cabeça e outros transtornos mentais. Ainda segundo os autores (2010), outros registros recuperados também foram importantes para a evolução da neurociência. Médicos do Egito antigo, de quase 5 mil anos atrás, indicam que eles também estavam cientes dos sintomas de lesões cerebrais. Para os egípcios, o coração, e não o encéfalo, era a sede de espírito e de repositório de memórias e ao longo dos anos, esse pensamento foi disseminado, mas aos poucos foi sendo questionado, conforme a evolução e a presença de mais interessados na área. Nessa época, no Egito, enquanto o resto do corpo era cuidadosamente preservado após a morte, o encéfalo era removido pelas narinas e jogado fora. Esse ponto de vista permaneceu até a época de Hipócrates a.C no século IV, pai da medicina ocidental e o mais influente dos médicos. Ele, por sua vez, acreditava que o encéfalo não estava apenas envolvido nas sensações, mas era também responsável pela sede de inteligência. Esse pensamento não era universalmente aceito e era contestado até mesmo pelos seus colegas egípcios. Conforme descrito por Bear, Connors e Paradiso, o médico, Hipócrates, já chamava a atenção, em sua época, para a importância do encéfalo: 41 O homem deve saber que de nenhum outro lugar; mas apenas do encéfalo, vem a alegria, o prazer, o riso e a diversão, o pesar, o luto, o desalento e a lamentação. E por isso, de uma maneira especial, nós adquirimos sabedoria e conhecimento e enxergamos e ouvimos e sabemos o que é justo e injusto, o que é bom e o que é ruim, o que é doce e o que é insípido..E pelo mesmo órgão nos tornamos loucos e delirantes, e medos e terrores nos assombram.. Todas essas coisas nós temos de suportar do encéfalo quando não está sadio.. Nesse sentido, opino que é o encéfalo quem exerce o maior poder sobre o homem. (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2010, p.4) Segundo Bear, Connors e Paradiso (2010), Aristóteles (384-322 a.C), filósofo grego, por exemplo, acreditava que o coração era o centro do intelecto e que o temperamento racional dos homens era explicado e influenciado pela capacidade de resfriamento do encéfalo, uma espécie de radiador que resfriava o sangue, o qual era superaquecido pelo coração. A figura mais importante na medicina romana foi o escritor e médico grego Galeno (130-200 d.C), que apoiava a ideia de Hipócrates. Cutucando com o dedo um encéfalo recentemente dissecado, percebeu que o cerebelo é mais firme, e o cérebro, mais macio. A partir dessa observação, Galeno sugeriu que o cérebro deveria ser o receptáculo das sensações, e o cerebelo deveria comandar os músculos. O médico reconheceu que, para formar memórias, sensações devem ser impressas no tecido nervoso. Com isso, Galeno concluiu que isso deveria ocorrer no cérebro, na parte mais macia. E, apesar de suas deduções, Bear, Connors e Paradiso (2010) afirmam que Galeno não estava tão longe da verdade. O cérebro, segundo os autores (2010), é comprometido com as sensações e percepções, e o cerebelo é primariamente um centro de controle motor, enquanto o cérebro é um repositório da memória. Ainda conforme descrito por Bears, Connors e Paradiso (2010), esse não foi o único exemplo histórico em que a conclusão geral estava correta, mesmo que partindo de raciocínio e observações errôneas. Porém, essa visão de Galeno prevaleceu por quase 1.500 anos. Andreas Vesalius, por sua vez, adicionou novos detalhes à estrutura do encéfalo durante a Renascença. Entretanto, a localização ventricular da função cerebral permaneceu inalterada, e todo esse conceito foi reforçado no início do século XVII, quando inventores franceses começaram a desenvolver dispositivos mecânicos controlados hidraulicamente. Esses dispositivos reforçaram a noção do encéfalo como um tipo de máquina executando uma série de funções ou um fluido forçado para fora dos 42 ventrículos através dos nervos poderia literalmente "bombear" e movimentar os membros. Ainda segundo os autores (2010), o grande defensor dessa "teoria de fluído mecânico" do funcionamento encefálico foi o matemático e filósofo francês René Descartes (1596-1650). Apesar de pensar que essa teoria explicava o encéfalo e o comportamento de outros animais, era inconcebível para ele que essa teoria explicasse o amplo espectro de comportamentos humanos. Descartes considerava que, diferentente de outros animais, as pessoas possuíam intelecto e uma alma dada por Deus. Assim, o filósofo francês apresentou a ideia de que mecanismos cerebrais controlavam o comportamento humano somente à medida que esse se assemelhasse ao dos animais. Para Descartes (1596-1650), capacidades mentais exclusivamente humanas existiriam fora do encéfalo, na mente. A mente era uma entidade espiritual que recebia sensações e comandava os movimentos, comunicando-se com a maquinaria do encéfalo por meio da glândula pineal. Hoje em dia, algumas pessoas ainda acreditam que existe um "problema mente-cérebro", e que, de alguma maneira, a mente humana é distinta do cérebro. Complementando, Gazzaniga e Heatherton (2007) defendem que em 1637, René Descartes propõe que a mente e o corpo são entidades separadas e interrelacionadas, com uma afetando a outra. Essa proposta de Descartes contestou a antiga crença de que a mente, ou a alma, é que comanda o corpo. Mais tarde, em 1859, a teoria de Charles Darwin (1809-1882) de seleção natural estabelece os fundamentos biológicos básicos do comportamento e de que a mente humana evoluiu junto com as características físicas e comportamentais. Duas décadas depois, a área da psicologia adapta os instrumentos da ciência e Wilhelm Wundt monta o primeiro laboratório psicológico e começa a medir o comportamento. Sua primeira experiência envolve solicitar às pessoas para refletirem sobre suas experiências mentais. Em 1890, influenciado pela teoria de Darwin, outro estudioso, William James, apresenta os Princípios de Psicologia e evidencia a necessidade de compreender as funções adaptativas do comportamento. Em 1900, Sigmund Freud introduz a ideia do inconsciente e o papel desempenhado na vida mental cotidiana e sua proposta chama atenção de terapeutas e de cientistas por quase meio século. Em 1912, Max Wertheimer, psicólogo alemão, propõe que a percepção é uma experiência subjetiva 43 que não pode ser compreendida pelo exame isolado de seus componentes elementares. Em 1925, John B. Watson e B.F Skinner apresentam e defendem que todos os comportamentos podem ser compreendidos como um resultado da aprendizagem e que as forças ambientes devem ser examinadas. Ainda segundo Gazzaniga e Heatherton (2007), nos anos 40, Karl Lashley e Roger Sperry conduzem pesquisas cerebrais, utilizando animais para entender o funcionamento da mente humana. Depois, em 1944, Kurt Lewin apresenta a teoria do campo e argumenta que a dinâmica situacional desempenha um papel fundamental na predição do comportamento humano. Em 1957, George A. Miller lança, na Harvard University, o campo da psicologia cognitiva que posteriormente foi formalizada por Ulric Neisser, em seu livro integrador de 1967, denominado de Psicologia Cognitiva. Nos anos 60, os avanços dos medicamentos apoiaram e reforçaram a teoria de base biológica em muitos tipos de transtornos mentais. Transtornos como depressão e esquizofrenia estão ligados a anormalidades neuroquímicas. Nos anos 80 e 90, David Buss, Leda Cosmides, John Tooby e Steve Pinker estão entre os que desenvolveram a psicologia evolutiva, que retoma o pensamento de Darwin sobre o entendimento da mente e do comportamento. De 1982 até os anos 2000, algumas áreas, entre elas a neurociência, a psicologia cognitiva, a ciência da computação e a neurologia, criam um novo campo interdisciplinar, a neurociência cognitiva (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2007). 3.5 CONCEITOS DE NEUROCIÊNCIA A neurociência, segundo Herculano-Houzel (2008), na obra organizada por Robert Lent, é o conjunto de disciplinas que tratam do sistema nervoso. Esse conjunto envolve e abrange a atuação de profissionais interessados de diferentes áreas em entender o funcionamento do sistema nervoso central e periférico. Para Bear, Connors e Paradiso (2010), as fundações históricas dessa ciência foram lançadas por muitas pessoas, ao longo de muitas gerações, e essa evolução só foi possível com o avanço da tecnologia que permitiu o estudo prático e a observação das reações cerebrais. Homens e mulheres estão trabalhando em todos os níveis de análise, utilizando todos os tipos de tecnologia para trazer à luz e novas descobertas sobre o estudo do encéfalo. 44 Essa ciência, de acordo com Augustine (2010), envolve uma vasta gama de questões acerca de como o sistema nervoso se desenvolve e se organiza, e de como ele funciona e gera o comportamento dos homens e dos animais. O maior desafio dos estudantes da área, para o autor (2010), é integrar conhecimentos oriundos de diversos níveis de análises e de áreas em uma compreensão mais o menos coerente da função e da estrutura do encéfalo, um dos principais objetos de pesquisa da neurociência. Bear, Connors e Paradiso (2010) argumentam que a palavra neurociência é jovem e que a área é reconhecida e independente recentemente. Segundo os autores (2010), a Sociedade Americana de Neurociências foi fundada apenas em 1970, como prova dessa recente repercussão. Seus integrantes vieram de diferentes disciplinas científicas, entre elas a medicina, a biologia, a psicologia, a física, a química e a matemática. De acordo com os autores (2010), a Sociedade de Neurociências, nos Estados Unidos, já é a maior associação de cientistas profissionais em toda a biologia experimental e a que cresce mais rápido. Seu campo é tão amplo quanto o das ciências naturais, com o sistema nervoso servindo de denominador comum a diferentes áreas. Compreender como funciona o encéfalo requer conhecimento de diversos temas. Kandel, Schwartz e Jessel (1997) chamam atenção para o desafio dos neurocientistas e profissionais dedicados a compreender o comportamento humano: a compreensão da base biológica da consciência e dos processos mentais pelos quais os humanos percebem, agem, aprendem e lembram. Nas duas últimas décadas, segundo Kandel, Schwartz e Jessel (1997), emergiu uma notável unidade entre as ciências biológicas, que resultou na fusão da ciência neural com o resto da biologia celular e molecular. Outro fator importante para o desenvolvimento do conhecimento sobre o sistema nervoso ao longo dos anos foram os experimentos realizados com animais. Na maioria dos casos, os animais são mortos neuroanatomicamente, para que o encéfalo neurofisiologicamente e possa ser examinado neuroquimicamente. Esses experimentos levantam questões a respeito da ética. Para os autores (1997), o passo seguinte é a fusão entre o estudo do comportamento e a ciência neural. Por outro lado, para Herculano-Houzel (2008), a neurociência tem como origem a busca das bases cerebrais da mente humana e a sua evolução, e seu objetivo mais ambicioso e ousado é o de explicar como a cognição e a consciência humana nascem da atividade do cérebro. Kandel, Schwartz e Jessel (1997) também 45 abordam a origem da neurociência em estudos sobre o sistema nervoso em diversas disciplinas clássicas desde o século passado. Para eles (1997), o desafio primário da neurociência é o de compreender como o cérebro produz a notável individualidade da atividade humana. Outro ponto de vista é de Kandel, Schwartz e Jessel (1997), que argumentam que a neurociência emergiu durante o século passado, a partir de cinco importantes disciplinas experimentais: anatomia, embriologia, fisiologia, farmacologia e psicologia. Para compreender as diferentes áreas que abordam e contribuem para o desenvolvimento da neurociência, Herculano-Houzel (2010) apresenta o significado e a definição das principais áreas, conforme descrito no dicionário American Heritage Dictionary. A neuroanatomia é o ramo da anatomia que lida com o sistema nervoso, ou a estrutura neural de um órgão ou parte dele. A neurobiologia é o estudo biológico do sistema nervoso e de suas partes. A neuroendocrinologia estuda a interação entre o sistema nervoso e as glândulas endócrinas e suas secreções. A neurofarmacologia busca o entendimento das ações de drogas sobre o sistema nervoso. A neurofisiologia estuda as funções do sistema nervoso. A Neurogenética é o estudo de fatores genéticos que contribuem e influenciam o desenvolvimento de distúrbios neurológicos. A neurologia é a ciência médica que lida com o sistema nervoso e seus distúrbios. A neuropatologia é o estudo científico de doenças presentes no sistema nervoso. Ainda segundo a autora (HERCULANO-HOUZEL, 2010) e apresentado no dicionário, a Neuropsicologia estuda a relação entre o sistema nervoso, principalmente o cérebro, e as funções cerebrais ou mentais com a linguagem, a memória e a percepção. A Neuropsiquiatria é a pesquisa combinada de distúrbios neurológicos e psiquiátricos. Já a neuroquímica busca a compreensão da composição química e dos processos do sistema nervoso e dos efeitos de substância químicas sobre ele. Por último, a neurorradiologia estuda o sistema nervoso e o uso de raios X no diagnóstico e tratamento de distúrbios do sistema nervoso. Com todas essas áreas interessadas em entender o sistema nervoso, é possível identificar a amplitude do tema e a sua importância para diversas áreas da ciência e para a compreensão do comportamento humano. Para o entendimento de alguns termos utilizados no trabalho, Gazzaniga e Heatherton (2007) definem a ciência psicológica como o estudo da mente, do 46 cérebro e do comportamento. Segundo os autores, (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2007) a mente é a atividade mental, como os pensamentos, a experiência e os sentimentos humanos, e o cérebro é o órgão localizado no crânio que produz a atividade mental, enquanto o comportamento é qualquer ação ou resposta observável e é empregado para descrever uma ampla variedade de ações sutis, complexas e físicas. Ainda segundo os autores (2007), nos últimos anos, desenvolvimentos importantes abriram novas possibilidades e contribuíram para o estudo da vida mental. Hoje os profissionais têm métodos eficazes para observar o cérebro em ação. Técnicas de imagem cerebral avaliam mudanças nas atividades metabólicas do cérebro, identificando para onde o sangue flui no momento em que a pessoa processa as informações. Essas mudanças no fluxo sanguíneo sinalizam e evidenciam a atividade cerebral e quais partes do cérebro estão envolvidas em determinados comportamentos e atividades mentais, segundo Gazzaniga e Heatherton (2007). Ainda assim, por sua amplitude, a neurociência é uma área complexa. Para reduzir essa complexidade e facilitar sua compreensão, os profissionais da área fragmentam o encéfalo em pedaços menores para uma análise experimental, chamada de abordagem reducionista. O tamanho da unidade estudada define aquilo que é chamado de nível de análise. Conforme Bear, Connors e Paradiso (2010), em ordem ascendente de complexidade, esses níveis são: molecular, celular de sistemas, comportamental e cognitivo. O primeiro nível de análise, a neurociência molecular, é o estudo mais elementar do encéfalo. A matéria encefálica consiste de uma variedade de moléculas, muitas das quais são exclusivas do sistema nervoso, e essas moléculas têm diferentes funções de comunicação, crescimento neuronal e arquivos de experiências passadas. A neurociência celular é o estudo feito para compreender como todas as moléculas interagem para dar ao neurônio suas prioridades particulares. Esse nível tem como objetivo pesquisar as diversas funções e tipos de neurônios e a influência de um neurônio para outro e a conexão entre eles. O segundo nível, a neurociência de sistemas, estuda os diferentes circuitos neurais que realizam determinadas funções, como a visão e o movimento voluntário. Nesse nível de pesquisa, os neurocientistas estudam como os diferentes circuitos analisam as informações sensoriais, formando percepções do mundo externo, tomando decisões e executando movimentos. 47 Ainda segundo Bear, Connors e Paradiso (2010), o terceiro nível de análise, a neurociência comportamental, estuda como os sistemas neurais trabalham juntos para produzir comportamentos integrados. O quarto nível, a neurociência cognitiva, é o mais complexo; portanto, é considerado o maior desafio para os profissionais da área, pois é ele que investiga como a atividade do encéfalo cria a mente e estuda os mecanismos neurais responsáveis pelas atividades mentais superiores do homem, como a consciência, a imaginação e a linguagem. Além da divisão de níveis de análise, há também a divisão dos modelos de pesquisas, o modelo clínico e experimental. Segundo Bear, Connors e Paradiso (2010), o primeiro é basicamente conduzido por médicos e as principais especialidades dedicadas ao sistema nervoso humano são a neurologia, a psiquiatria, a neurocirurgia e a neuropatologia. Muitos dos que conduzem as pesquisas clínicas tentam deduzir as funções das várias regiões do encéfalo a partir dos efeitos comportamentais das lesões, e outros conduzem estudos para verificar os riscos e os benefícios de novos tipos de tratamento. O segundo modelo, as pesquisas experimentais, é amplo e inclui quase qualquer metodologia concebível e compatível com a área, variando, conforme a especialidade do profissional. Os neuroanatomistas, muitas vezes, utilizam microscópios para traçar conexões no encéfalo. Os neurofisiologistas utilizam eletrodos, amplificadores e osciloscópios para medir a atividade elétrica cerebral. A neurofarmacologistas usam drogas talhadas para estudar a química da função cerebral. Os neurobiólogos sondam o material genético dos neurônios para pesquisas as estruturas das moléculas no encéfalo. Independente do modelo de pesquisa adotado, todos os profissionais trabalham de acordo com o método científico, obedecendo as seguintes etapas, de observação, replicação, interpretação e verificação. A observação é realizada com experimentos elaborados para testar uma determinada hipótese, e a replicação é etapa essencial para posteriormente ser aceita como um fato. Para isso, o profissional deve repetir o experimento em diferentes sujeitos e fazer observação similar em pacientes diferentes, quantas vezes necessárias para descartar a possibilidade de que a observação tenha ocorrido apenas uma vez. A terceira etapa, a interpretação, é feita quando o cientista acredita que a observação está correta e sua replicação foi realizada com sucesso. Esta interpretação depende de seu estado de conhecimento, ou ignorância, no momento 48 da observação e de suas ideias preconcebidas. Sendo assim, a interpretação nem sempre resiste ao teste do tempo. Algumas vezes, grandes descobertas são feitas quando velhas observações são interpretadas sob um novo ângulo e um novo ponto de vista. (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2010) 3.6 OS PROTAGONISTAS DA NEUROCIÊNCIA A neurociência atualmente conta com a contribuição e a dedicação de diversos pesquisadores no mundo inteiro. Para identificar e apresentar os principais pesquisadores, foram pesquisados os profissionais mais citados em trabalhos de conclusão e outras publicações cientificas com objetivo de contribuir com a apresentação da neurociência. As apresentações abaixo foram todas retiradas dos livros escritos pelos próprios autores. A maioria desses profissionais foram citados nesta monografia. Michael S. Gazzaniga, professor no Dartmounth College, fundador e presidente do Cognitive Neuroscience Institute e editor-chefe do Journal of Cognitive Neuroscience. O foco de sua pesquisa está voltado a pacientes com cérebro secionado (split-brain). Seu companheiro de pesquisa, Tood F. Heatherton, também é professor no Dartmounth College, estuda os processos situacionais, individuais, motivacionais e afetivos que interferem na auto-regulação. Mark F. Bear, professor de neurociência na Howard Hughes Medical Institute e na Massachusetts Institute of Technology. Barry W. Connors, professor de neurociência na Brown University Providence. Michael A. Paradiso também é professor de neurociência na Brown University Providence. Eric R. Kandel, James H. Schwartz e Thomas M. Jessel, professores no Center For Neurobiology and Behavior College of Physicians & Surgeons Of Columbia University e The Howard Hughes Medical Institute. Steven Pinker é professor de psicologia em Harvard, foi professor assistente da Universidade de Stanford e diretor do Centro de Neurociência Cognitiva do MIT. António Damásio é professor e chefe do Departamento de Neurologia da Universidade de Iowa, professor adjunto do Instituto Salk de Estudos Biológicos em La Jolla, Califórnia. Roberto Lent, professor e pesquisador no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Suzana Herculano-Houzel, também pesquisadora no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio 49 de Janeiro. Ivan Izquierdo, Lia R.M. Bevilaqua e Martin Cammarota, pesquisadores no Instituto de Pesquisas Biomédicas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Miguel Nicolelis, é considerado um dos pesquisadores brasileiros mais importantes na área de neurociência. É professor de neurociência na Universidade Duke e pesquisador no laboratório Duke’s Center for Neuroengineering, base física das avançadas experiências com implantes de microeletrodos neurais em macacos. A revista científica Scientific American o elegeu um dos vinte cientistas mais influentes no mundo. Miguel Nicolelis é membro das Academias de Ciências do Brasil, da França e da Pontifícia Academia das Ciências em Roma, é também fundador e diretor científico do Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra, entidade dedicada ao fomento da pesquisa científica e ao desenvolvimento socioeconômico do Rio Grande do Norte e da região nordeste do Brasil. 50 4 NEUROMARKETING Para finalizar a pesquisa bibliográfica, este capítulo concentra-se em apresentar o neuromarketing e sua contribuição como metodologia de pesquisa complementar para a administração de marketing e branding. Na primeira parte do capítulo será abordada a evolução, a definição e a aplicação do neuromarketing. Por ser uma disciplina prática e com viés experimental, casos e estudos pesquisados serão apresentados ao longo do capítulo, concentrado ao final, com experimentos realizados por Lindstrom (2009). O neuromarketing é abordado através de autores como Pradeep (2012), Lindstrom (2009), Marc Gobé (2002) e Underhill (2012). O conteúdo de neuromarketing será complementado, quando necessário, com temas e contribuições de autores de marketing, branding e neurociência, mencionados anteriormente. 4.1 EVOLUÇÃO DO NEUROMARKETING O homem sempre buscou entender o funcionamento do processo de tomada de decisão. Para Chavaglia Neto, Ramalheiro e Filipe (2012), a busca se intensificou com o surgimento da neurociência. Segundo os autores (2012), o estudo do funcionamento do cérebro humano sofreu, nas últimas quatro décadas, uma grande revolução com o surgimento de novas tecnologias. Ainda segundo os autores (2012), com essas novas possibilidades, profissionais e pesquisadores de marketing adotaram a neurociência para entender melhor os motivos de compra de um produto ou serviço e para obter mais sucesso com suas estratégias de marketing. O termo “neuromarketing”, conforme Chavaglia Neto, Ramalheiro e Filipe (2012), foi cunhado por Ale Smidts, professor de Marketing na Erasmus University em Roterdã na Holanda. Sem a metodologia de neuromarketing, marcas cometeram erros em suas estratégias e ações. Em 1975, executivos da Pepsi-Cola Company realizaram uma experiência denominada como “Desafio Pepsi”. O estudo contou com centenas de representantes da marca que armavam mesas em shoppings e supermercados de todo o mundo e que distribuíam dois copos iguais para cada 51 homem, mulher e criança que passasse em frente ao estande. Em um copo havia Pepsi; no outro, Cola-Cola. Os representantes perguntavam ao público qual bebida eles preferiam. Quando o departamento de marketing da Pepsi contabilizou os resultados, os executivos da empresa ficaram satisfeitos e surpresos. Mais da metade dos voluntários preferiram o sabor da Pepsi. Lindstrom (2009), de acordo com os dados, argumenta que a Pepsi deveria estar ganhando da Cola-Cola em todo o mundo no mercado de refrigerantes. Mas não estava. O autor (2009) cita Gladwell (2005) e sua nova interpretação para o caso. O experimento feito, na verdade, era um teste de degustação. No teste de degustação, a tendência é das pessoas gostarem do produto mais doce – nesse caso, a Pepsi -, mas quando bebem uma lata inteira, sempre há a possibilidade de hiperglicemia. Esse é o motivo pelo qual a Pepsi alcançou mais da metade da preferência no experimento e a Coca-Cola continuou a liderar o mercado. Mais tarde, em 2003, o Dr. Read Montague, diretor do laboratório de neuroimagem Humana na Faculdade Baylor de Medicina, em Houston, decidiu sondar os resultados do “Desafio Pepsi”. Conforme descrito por Lindstrom (2009), dessa vez, usando um aparelho de IRMF para monitor o cérebro de 67 pessoas. Primeiro, Dr. Read Montague, perguntou aos voluntários a preferência entre CocaCola, Pepsi ou se não tinham preferência. As respostas apresentaram resultados semelhantes ao experimento original. Mais da metade dos pesquisados relataram uma preferência pela Pepsi. O cérebro deles respondeu da mesma maneira. Ao tomar um gole de Pepsi, a região do cérebro ativada foi o putâmen ventral, parte que é estimulada quando gostamos de um sabor. Em um segundo momento do experimento, Dr. Read Montague deixou os pesquisados saberem as marcas antes de provarem o refrigerante. O resultado foi que 75% dos pesquisados disseram que preferiam Coca-Cola. Dr. Read Montague também percebeu uma mudança na localização da atividade cerebral, além de ativar o putâmen ventral, houve fluxos sanguíneos registrados no córtex pré-frontal, região do cérebro responsável pelo raciocínio e discernimento mais altos. Ainda segundo o autor (2009), esses resultados, indicaram que duas áreas no cérebro estavam participando de ‘um cabo de guerra’ entre pensamento racional e emocional, mas foi nesse momento que a Coca-Cola venceu. Para Roberts (2005), as emoções são oportunidades de entrar em contato com os consumidores. O autor (2005) acredita que, quando a emoção e 52 a razão entram em conflito, a emoção sempre ganha. Lindstrom (2009) complementa: Todas as associações positivas que os pesquisados tinham em relação à Coca-Cola – história, logomarca, cor, design e aroma; suas próprias lembranças de infância que remetiam à Coca-Cola, os anúncios na televisão e na mídia impressa ao longo dos anos, a indiscutível, inexorável, inelutável emoção ligada à marca Coca-Cola – derrotaram sua preferência racional e natural pelo sabor da Pepsi. Por quê? Porque é por meio das emoções que o cérebro codifica as coisas que têm valor, e uma marca que nos cativa emocionalmente – pense em Apple, Harley-Davidson e L’Oréal, só para início de conversa – vencerá todos os testes. (LINDSTROM, 2009, p.32). Reforçando a ideia apresentada, Chavaglia Neto, Ramalheiro e Filipe (2012) afirmam que os resultados indicam que a preferência estava relacionada com a identificação da marca e que não havia relação com o sabor do refrigerante. Kotler e Pfoertsch (2008) consideram que a personalidade e a reputação da marca conseguem diferenciá-la da de seus concorrentes. Para compreender o neuromarketing, Pradeep (2012) propõem o regaste de sua evolução. O primeiro elemento importante, segundo o autor (2012), foi o eletroencefalograma (EEG), principal tecnologia e equipamento usado em laboratórios de neuromarketing em todo o mundo. Os primeiros registros com o aparelho foram realizados pelo cientista Hans Berger na década de 1920. O cientista foi o primeiro a desenvolver eletrodos (sensores) capazes de captar os sinais elétricos do cérebro. Por outro lado, conforme descrito por Chavaglia Neto, Ramalheiro e Filipe (2012), o médico e pesquisador de Harvard, Gerald Zaltman, foi o precursor na utilização de aparelhos de ressonância magnética com objetivo de explorar e entender o comportamento dos consumidores e utilizar este conhecimento na área de marketing. Ainda segundo as descobertas de Hans Berger, Pradeep (2012) acredita que o cientista compreendeu, desde o início, que a sua invenção poderia e deveria ser usada no mapeamento das atividades elétricas de todo o cérebro e não apenas de uma pequena parte dele. O conhecimento sobre neurociência e a tecnologia eram limitados em 1920, por isso Pradeep (2012) acredita que a descoberta foi uma ideia avançada demais para a época. Mesmo captando os poucos microvolts de eletricidade da atividade cerebral ainda não existia, na época, um aparelho capaz de integrar e analisar as informações, o que dificultou muito o avanço do experimento. 53 Muitas décadas depois, esse cenário mudou, com o advento de transistores, microprocessadores e o avanço da tecnologia digital. Para Pradeep (2012), esses elementos ajudaram a analisar e compreender melhor a interação e a dinâmica elétrica produzida pelo cérebro. Para isso, foi preciso alinhar as tecnologias de microchips e microvolts para aproveitar todas as descobertas de Berger nos anos de 1920. Com a tecnologia do EEG associada a computadores, os cientistas finalmente puderam explorar e compreender os mecanismos internos do cérebro. Rose é citado por Pradeep (2012) declara que aprendemos mais sobre o cérebro nos últimos anos do que em toda a história da humanidade. Mesmo com esse grande avanço da tecnologia e do neuromarketing, os cientistas estão iniciando a busca e o entendimento pela complexidade do cérebro humano, conforme descrito pelo autor: “No entanto, mesmo hoje em dia, com toda a capacidade de processamento na ponta dos dedos, ainda estamos sondando as profundezas desse órgão fantástico e fazendo novas descobertas diariamente”. (PRADEEP, 2012, p.20). Por ser uma ciência recente, Lindstrom (2009) acredita que o neuromarketing está limitado pela compreensão ainda restrita do cérebro humano. Por outro lado, a combinação da tecnologia e uma série de aspectos práticos revolucionaram e expandiram os recursos do mundo. Para Pradeep (2012), essa combinação também ocorreu em outras áreas, como a química no século XVII, a física no século XIX, a microbiologia no século XX e agora, no século XXI, com a neurociência. O segundo elemento relacionamento ao nascimento e a evolução da área, para Pradeep (2012), diz respeito à estrutura cerebral e seu funcionamento. A grande interconectividade do cérebro humano é a responsável pelas ações impressionantes dos seres humanos, desde andar ereto e mascar chicletes ao mesmo tempo, até compor músicas e realizar cirurgias. O autor (2012) indica que para entender a verdadeira complexidade da mente humana, é preciso adotar uma ‘abordagem de sistema’, e complementa: só assim podemos mostrar aos profissionais de marketing toda a atividade elétrica de diversas regiões do cérebro. Essa abordagem é essencial para que possamos compreender como o cérebro está respondendo aos estímulos. (PRADEEP, 2012, p.21). Ainda na evolução da disciplina, as experiências de Hans Berger foram decisivas e prepararam terreno para a aquisição desses conhecimentos 54 neurológicos e o desenvolvimento do neuromarketing nas últimas décadas. O autor (2012) ainda apresenta o terceiro elemento responsável pelo desenvolvimento da área: as atuais metodologias de pesquisa. Para Pradeep (2012), os limites apresentados pelas tradicionais pesquisas de mercado impulsionaram o neuromarketing. Nos últimos anos, a necessidade de conhecimento mais preciso, confiável e aplicado da área de pesquisa de mercado, para que as decisões de marketing fossem tomadas com maior embasamento e segurança, foram fatores fundamentais no avanço do neuromarketing. Essa necessidade também é apresentada por Bear, Connors e Paradiso (2010), como estimulante e responsável pela evolução da neurociência. Para Pradeep (2012), esse desejo tornou-se ainda mais intenso, com o avanço da competitividade entre as empresas e as economias, o aumento exponencial dos conhecimentos científicos sobre o cérebro, os avanços obtidos na área de informática, e os limites das atuais abordagens de pesquisa. Tybout e Carpenter (2001) afirmam que, desde que os mercados tornaram-se mais competitivos e a qualidade dos produtos ficou semelhante, as marcas evoluíram para oferecer mais valor aos seus clientes. Segundo Lindstrom (2012), a forma tradicional para que as empresas entendam os consumidores é observando-os, ou perguntando a eles diretamente. Reforçando, Underhill (2009) também critica as atuais metodologias e apresenta suas limitações, conforme segue: Podemos parar as pessoas enquanto caminham pelo corredor do shopping, telefonar para elas, convidá-las para discussões de grupo ou pedir para que participem de um painel pela internet. Minha longa experiência me diz que o que as pessoas dizem que fazem e o que elas realmente fazem são duas coisas diferentes. (UNDERHIL, 2009 apud LINDSTROM, 2009, p.9) Ainda nesse sentido, Pradeep (2012) afirma que os consumidores não sabem o que os leva a tomar certas decisões e, por isso, jamais poderão dizer por que fazem o que fazem. Por esse motivo, as tradicionais pesquisas de mercado estão apresentando limitações para responder com precisão as necessidades e os comportamentos dos consumidores. Para o autor, há um risco grande de as empresas serem induzidas ao erro "se nos basearmos somente no que elas dizem que gostam e não gostam, poderemos muito bem ser induzidos a erros". (PRADEEP, 2012, p.17). Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), reforçam, afirmando 55 que as empresas e profissionais precisarão entender as ansiedades e os desejos dos consumidores para se manterem relevantes. Por esses motivos, Pradeep (2012) afirma que o neuromarketing é uma metodologia complementar as tradicionais pesquisas de mercado: “O problema dos profissionais de marketing e de desenvolvimento de produtos continua o mesmo. Descobrir o que as pessoas querem e o que precisam. É aí que entram os neurocientistas”. (PRADEEP, 2012, p.17) Em 2005, segundo o autor (2012), as empresas nos Estados Unidos gastaram mais de US$ 7,3 bilhões em pesquisas de mercado. Em 2007, esse valor subiu para US$ 12 bilhões. Esses dados evidenciam e sustentam a necessidade de mudança na aplicação de pesquisas e na compreensão do comportamento dos consumidores. Lindstrom (2009, p.27) questiona: ”[...] se as estratégias ainda funcionam, porque oito em cada dez novos produtos lançados fracassam nos três primeiros meses? (No Japão, são 9,7, em cada dez produtos lançados)” Para Pradeep (2012), é inerente aos métodos tradicionais serem incapazes de reproduzir o que o cérebro faz, como ele opera e como forma imagens de coisas de produtos, de serviços, de lojas, anúncios e de tudo o que está ligado ao marketing moderno. Bear, Connors e Paradiso (2010) afirmam que as sensações e as percepções só podem ser encontradas no cérebro. Kandel, Schwartz e Jessel (1997) complementam, afirmando que as conexões no cérebro são diferentes entre os indivíduos, e isso ilustra a complexidade em entender o comportamento individual. Quando os consumidores são entrevistados em pesquisas tradicionais, eles são solicitados a recordar a maneira como reagiram a determinado estímulo. Quando isso acontece, o cérebro, segundo Pradeep (2012), altera os dados originais que registrou anteriormente. Portanto, há um imenso desafio em sondar com os consumidores como eles realmente se sentiram em relação a determinado estímulo, pois as pessoas têm uma enorme dificuldade em descrever com precisão as emoções sentidas. Para o autor, esses métodos podem funcionar quando são usados para registrar os fatos relatados de forma espontânea pelos participantes. Estamos pedindo que o nosso consciente reconstrua o que o nosso subconsciente registrou e que traduzia isso em uma linguagem específica capaz de reproduzir com precisão como nós nos sentimentos em um momento do passado ou o que lembramos de uma situação anterior. (PRADEEP, 2012, p.22) 56 Ainda reforçando as limitações das pesquisas tradicionais de mercado, Lindstrom (2009) descreve que: Globalmente, segundo o IXP Marketing Group, cerca de 21 mil novas marcas são lançados por ano em todo o mundo. No entanto, a história nos diz que quase todas desaparecem das prateleiras um ano depois. Só entre os produtos de consumo, 52% das novas marcas e 75& dos produtos individuais fracassam. (LINDSTROM, 2009, p.30) Conforme Tybout e Carpenter (2001), as marcas precisam evoluir para oferecer mais valor e serem mais relevantes aos seus consumidores. Os autores Chavaglia Neto, Ramalheiro e Filipe (2012) afirmam que, entre todas as possibilidades, os profissionais de marketing usarão o neuromarketing para melhorar as métricas de preferência do consumidor. A simples resposta verbal dada em pesquisas de mercado nem sempre representa a verdade do que passa na mente do consumidor. Para Lindstrom (2009), a pesquisa tradicional, com questionários, levantamentos, grupos focais, entre outras abordagens, desempenhará gradualmente um papel cada vez menor nas atividades de marketing. Para o autor (2009), o neuromarketing se tornará a principal ferramenta para as empresas preverem o sucesso ou o fracasso de seus produtos. 4.2 DEFINIÇÃO DE NEUROMARKETING Lindstrom (2009) e Pradeep (2012) definem neuromarketing como a união do marketing e da neurociência. O objetivo dessa disciplina, segundo Lindstrom (2009), é compreender os pensamentos, sentimentos e desejos subconscientes que impulsionam as decisões de compra dos consumidores. Se por um lado Kotler e Keller (2010) acreditam que o marketing é composto por atividades interdependentes, os neurocientistas, Gazzaniga e Heatherton (2007) também afirmam que o sistema nervoso central e o periférico são interconectados e interdependentes funcionalmente e que a melhor maneira de compreender o cérebro é encará-lo como uma coleção de circuitos neuronais interatuantes. E, assim como o cérebro nem sempre foi visto como o responsável pela morada da mente e responsável pelo comportamento humano, conforme descrito por Gazzaniga e Heatherton, o marketing também nem sempre foi centrado na satisfação dos 57 clientes. Conforme Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), o marketing evoluiu do foco na gestão do produto para o foco no cliente. Reforçando a importância de uma abordagem mais precisa e confiável sobre o comportamento dos indivíduos, Tybout e Carpenter (2001) argumentam que o sucesso de marcas requer a criação de valor em suas fábricas e na mente dos consumidores. O estudo do neuromarketing, segundo Lindstrom (2009), concentrase nas marcas e produtos com mais chances de sucesso, identificando os centros de recompensa dos consumidores e revelando quais estratégias de marketing ou publicidade são mais estimulantes, atraentes, memoráveis, repulsivas, aflitivas e esquecíveis. Os autores de marketing, Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010), defendem que os profissionais devem buscar a satisfação funcional, emocional e espiritual de seus consumidores, tratando-os como seres humanos plenos, com mente, coração e espírito. Por outro lado, a neurociência, conforme Augustine (2010), também envolve uma vasta gama de questões e seu estudo envolve como o sistema nervoso desenvolve, organiza e gera o comportamento dos homens. Para o autor (2010), o maior desafio da área é integrar conhecimentos de diversos níveis de análises e disciplinas para compreender a estrutura do cérebro. Pradeep (2012) acredita que a neurociência pode proporcionar a capacidade das empresas entenderem de que maneira o consumidor se conecta, no seu nível subconsciente mais profundo, em relação aos vários conceitos ligados as marcas. Ainda reforçando a ideia de entender o comportamento dos clientes, Calder e Reagan (2001) defendem que as marcas devem tornar os produtos mais significativos para os consumidores e que a fonte de potenciais significados reside na vida e nas experiências dos consumidores. Para Pradeep (2012), o neuromarketing representa uma vantagem competitiva em um mercado abarrotado e congestionado. Roberts (2005), também acredita na necessidade de diferenciar marcas e argumenta esse é o papel delas, pois foram desenvolvidas para criar diferenças e vantagens entre produtos semelhantes. Por ser uma área emergente, ainda necessita da adaptação e disseminação entre os profissionais de marketing para sua melhor compreensão. Scott (apud 2012, PRADEEP, 2012, p.9) afirma que: [...] durante todos esses anos eu concentrei em apenas uma pequenina parte do cérebro dos consumidores! Assim como a maioria dos profissionais de marketing, fiquei obcecado pela ponta do iceberg – essa parte dos consumidores que é possível ver, tocar e ouvir. 58 Lindstrom (2009) acredita que a primeira grande questão para os profissionais de marketing é que o cérebro está constantemente ocupando, coletando e filtrando informação, ou seja, algumas informações chegarão à memória, mas a maior parte será perdida e esquecida. Esse processo, segundo o autor (2009), é inconsciente, instantâneo e acontece todos os dias. Mas, por outro lado, Tybout e Carpenter (2001) afirmam que os consumidores, em contato com marcas e estímulos, associam às sensações psicológicas. A parte consciente do cérebro, segundo Pradeep (2012), processa, no máximo, 40 bits de informação por segundo. O restante é processo no nível subconsciente, ou seja, informações armazenadas em um nível que não temos acesso espontaneamente. A solução para o marketing, segundo Lindstrom (2009), é pesquisar o verdadeiro comportamento dos indivíduos e, para isso, os profissionais da área terão de analisar os cérebros dos consumidores. Kotler e Keller (2012) manifestam a importância do marketing de relacionar e de construir relação a longo prazo mutuamente satisfatória para conquistar, manter e construir fortes relações econômicas, técnicas e sociais. Aaker (1996) acredita que o valor da marca é criada pela fidelidade conquista com os clientes. Roberts (2005) reforça a ideia de relacionamento emocional com os clientes, afirmando que a emoção leva à ação, enquanto a razão leva a conclusões. O neuromarketing, por sua vez, incorpora o desafio da neurociência proposto por Kandel, Schwartz e Jessel (1997) de compreender como cérebro produz a notável individualidade da atividade humana. Lindstrom (2009) acredita que o entendimento de como a mente impulsiona o comportamento está aumentando e alguns dos principais pesquisadores em todo o mundo estão fazendo importantes descobertas. O autor complementa: “[...] logo percebi que o neuromarketing, um intrigante casamento do marketing com a ciência, era a janela para a mente humana que esperávamos havia tanto tempo” (LINDSTROM, 2009, p.13). Com o neuromarketing, segundo Chavaglia Neto, Ramalheiro e Filipe (2012), é possível identificar a reação dos consumidores em relação à cor da embalagem, aos sons e cheiro de determinado produto, entre outras possibilidades. Ainda segundo os autores, o neuromarketing também pode ser utilizado na área de recursos humanos, negociação, vendas, entre outras atividades. Kotler e Armstrong 59 (1999) argumentam que o marketing deve captar as necessidades, desejos e interesses dos mercados-alvo e, posteriormente, proporcionar valor superior aos clientes para manter e melhorar o bem-estar do público e da sociedade. O objetivo do neuromarketing é exatamente esse, para Lindstrom (2009). Revelar o que está presente na cabeça dos consumidores, denominado pelo autor de “Lógica do Consumo”. Por fim, o autor (2009) acredita que as pesquisas tradicionais de marketing estão prestes a se juntar as técnicas de neuromarketing e, com isso, adotar um aspecto mais cerebral em suas atividades. Por ser uma metodologia recente, o neuromarketing ainda necessita de alto investimento e, por isso, inviabiliza sua disseminação e sua utilização no mercado, mas Lindstrom (2009) acredita que à medida que for utilizado e mais requisitado, o neuromarketing ficará mais barato e acessível para as empresas. 4.3 APLICAÇÃO DA DISCIPLINA Segundo Pradeep (2012), as respostas mais complexas e significativas aos estímulos são formadas no cérebro. Os elementos essenciais ao sucesso do marketing: o interesse inicial por um produto, intenção de compra e fidelidade à marca, estão presentes, mais especificamente, no nível subconsciente do ser humano. Kandel, Schwartz e Jessel (1997) acreditam que a aplicação de técnicas de imagem está fornecendo informações importantes sobre quais regiões cerebrais participam de comportamentos complexos e específicos. Conforme descrito por Gazzaniga e Heatherton (2007), a invenção da imagem cerebral com equipamentos para rastreamento das reações cerebrais, em 1980, ampliou as possibilidades de estudo do sistema nervoso. Com os equipamentos é possível analisar as operações mentais mais simples, em regiões cerebrais igualmente específicas e conectadas entre si. Lent (2008) argumenta que o avanço dos métodos de abordagem, iniciou uma nova evolução nas pesquisas de neurociências. Esse desenvolvimento foi possível pelo aperfeiçoamento das metodologias de visualização e análise do cérebro em funcionamento. Para Kandel, Scwartz e Jessel (1997), com esses instrumentos disponíveis, a neurociência e o neuromarketing estão vivendo uma nova fase de otimismo e convicção de que os princípios subjacentes à biologia da função mental serão 60 melhores compreendidos em breve. Por muitos anos, os pesquisadores focaram suas observações nas atitudes dos indivíduos, e não nos seus estados mentais. Gazzaniga e Heatherton acreditam que isso era feito porque as técnicas objetivas para avaliar o cérebro em funcionamento ainda não estavam disponíveis. Reforçando, Bear, Connors e Paradiso (2010) afirmam que, utilizando métodos sofisticados de imagem, os pesquisadores estão começando a ver quais as regiões do encéfalo humano se ativam sob diferentes condições e determinados estímulos. É possível, segundo Pradeep (2012), identificar as atividades elétricas cerebrais, que estão além do nível consciente do consumidor, em regiões subconscientes onde ocorrem o registro inicial de estímulos e reações. Ao contrário das pesquisas tradicionais que precisam de amostras de tamanhos substanciais e que devem incluir um número grande de pessoas para contornar variáveis como idioma, cultura, nível de instrução e outros fatores que podem influenciar as respostas, os testes neurológicos, segundo Pradeep (2012), produzem resultados mais embasados cientificamente e rigorosos, com amostras menores. O autor explica que: “Embora o cérebro do ser humano difira em alguns aspectos – por exemplo, entre homens e mulheres e entre crianças pequenas e pessoas idosas – o fato é que nosso cérebro tem muito mais semelhanças do que diferença”. (PRADEEP, 2012, p.23) Essas semelhanças, segundo Pradeep (2012), permitem um projeto de pesquisa de neuromarketing com cerca de 10% do número de participantes das pesquisas tradicionais. O autor ainda complementa: Por maior que possa ser a amostra, os resultados das pesquisas convencionais também são suscetíveis a um fator neurológico básico: o que o nosso cérebro de fato percebe e do que se recorda não é o mesmo que dizemos que percebemos e de que nos lembramos se nos perguntam. O processo de acessar essas informações armazenadas e transformá-las em uma reação física acaba fazendo com que o cérebro altere a sua reação inicial (PRADEEP, 2012, p23). Os dois principais equipamentos tecnológicos de neuromarketing para realizar testes neurológicos são o eletroencefalograma (EEG) e a imagem por ressonância magnética funcional (IRMF). Essas técnicas de pesquisa, segundo Chavaglia Neto, 61 Ramalheiro e Filipe (2012), estão proporcionando estudos e verificações precisas dos locais do cérebro que reagem aos estímulos em uma campanha publicitária. O primeiro equipamento, conforme Pradeep (2012), é o EEG, que utiliza eletrodos, uma espécie de microfones minúsculos sensíveis, para captar os fracos sinais gerados pela atividade elétrica cerebral. Segundo o autor: Essa é uma técnica totalmente não invasiva e prática. Há décadas os laboratórios de neurociências de todo o mundo utilizam essa tecnologia. Para abranger todo o cérebro, padrão científico empregado por toda empresa conceituada que realizada teste neurológicos com EEG, um grande número de eletrodos é embutido em uma touca leve (muito parecida com uma touca de natação). Cada eletrodo registra até duas mil vezes por segundo os sinais de baixíssima voltagem emitidos pela atividade cerebral. (PRADEEP, 2012, p.24) Figura 6 - Forebrain, empresa brasileira, realizando estudo com o aparelho EEG Fonte: Forebrain (2013) Pradeep (2012) afirma que é necessário abranger todo o cérebro, pois muitas áreas são responsáveis por diversas funções e, por isso, é preciso adotar essa abordagem para saber com exatidão quais regiões estão operando simultaneamente e em conjunto em resposta a determinado estímulo. Gazzaniga e Heatherton (2007) afirmam que a ideia de que as diferentes regiões do cérebro são especializadas em diferentes funções é um dos principais pilares da neurociência. Com o EEG, é 62 possível garantir que as ondas cerebrais interconectadas sejam captadas e uma quantidade considerável de dados sejam coletados para uma análise eficaz. O EEG é o mapeamento da atividade elétrica cerebral, registrada na velocidade real do pensamento humano. Lindstrom (2009) complementa, afirmando que o equipamento é portátil e menos caro que o IRMF. É ideal para registrar a atividade cerebral no momento em que as pessoas estão assistindo aos comerciais e programas de tevê ou a qualquer outro tipo de estímulo visual, em tempo real. Para Pradeep (2012), é possível aliar a metodologia de EEG com equipamentos de rastreamento dos movimentos oculares, que registra exatamente para onde a pessoa está olhando ao receber determinado estímulo. Essa combinação, segundo o autor (2012), permite correlacionar a reação do cérebro a determinado estímulo com o ponto exato em que seus olhos estão focados no mesmo milissegundo. O segundo equipamento utilizado em exames de neuromarketing é o IRMF. Com ele é possível medir as propriedades magnéticas da hemoglobina, componente presente nos glóbulos vermelhos do sangue que transportam oxigênio pelo corpo (LINDSTROM, 2009). Figura 7 - Equipamento de Resonância Magnética Funcional Fonte: BOURGOIN JALIEU. L'IRM Pradeep (2012) afirma que o IRMF é utilizado pela comunidade médica há muitos anos. Para realizar os exames, a pessoa deve ficar deitada em um tubo longo e estreito, composto por ímãs que são ativados e produzem campos elétricos 63 que são convertidos em imagens em um computador, revelando as estruturas interna do cérebro. Lindstrom (2009, p.17) descreve a precisão do equipamento, “o IRMF mede a quantidade de sangue oxigenado no cérebro e pode identificar com precisão até uma área de apenas um milímetro”. O cérebro ao realizar uma tarefa específica, segundo o autor (2009), requer mais ‘combustível’, principalmente, glicose e oxigênio, e quanto mais uma certa região estiver trabalhando, maior será o consumo de combustível e fluxo de sangue oxigenado para aquela região. Para Pradeep (2012), a ressonância magnética funcional pode indicar com precisão quando há um aumento de atividade em determinada área do cérebro, pois, quando isso acontece, o cérebro precisa de mais sangue para manter essa atividade. Com essa atividade, é possível identificar as alterações e as regiões mais afetadas. Lindstrom (2009) afirma que, quando determinada região do cérebro está sendo utilizada, ela acende em cor vermelho-fogo, e, com isso, os cientistas conseguem identificar quais áreas específicas do cérebro estão trabalhando em um determinado momento. Com outro ponto de vista, Pradeep (2012) alega que o equipamento de IRMF apresenta desvantagens para pesquisas de marketing, pois pode levar até cinco segundos para que o fluxo sanguíneo cerebral atinja essa área específica do cérebro e, com isso, os resultados podem perder sua precisão. O autor complementa: Por exemplo, se estivermos testando as reações neurológicas de um consumidor a um comercial de TV, o cérebro dele poderá responder instantaneamente a um carro vermelho que aparece no anúncio – mas o aumento de fluxo sanguíneo requerido pelo cérebro em resposta a essa maior atividade pode levar cinco segundos para atingir a área ativa. (PRADEEP, 2012, p.26) Portanto, segundo o autor (2012), é difícil dizer com precisão temporal o estímulo exato à indicação da resposta cerebral a esse estímulo, em razão do tempo transcorrido entre os dois eventos. Outras desvantagens apontadas pelo autor são: o alto custo, a necessidade de instalações específicas, técnicos treinados e voluntários para ficarem totalmente imóvel. Segundo Pradeep (2012), um movimento mínimo pode inutilizar os resultados. 64 Com todas as desvantagens apontadas, Pradeep (2012) considera que o equipamento de IRMF tem deficiências estruturais, que reduzem sua eficácia como metodologia de pesquisa de marketing. Por outro lado, Lindstrom (2009) utiliza o IRMF em suas pesquisas e acredita que é a técnica mais avançada de rastreamento cerebral disponível atualmente e está proporcionando revelações a respeito de como as emoções afetam o processo de tomada de decisões. Ainda segundo o autor, o IRMF é capaz de identificar com precisão no cérebro uma área tão pequena quanto um milímetro. 4.4 PARÂMETROS NEUROMÉTRICOS Pradeep (2012) apresenta os elementos fundamentais que estão por trás de seu trabalho e de suas descobertas. Apesar da indicação desses parâmetros, o autor (2012) resalta que está sempre desenvolvendo novos parâmetros Neurométricos e novas metodologias. 4.4.1 Parâmetros Neurométricos Principais Os três parâmetros Neurométricos principais medem o nível de atenção, o envolvimento emocional e a retenção na memória. Os três parâmetros secundários medem a intenção de compra, novidade e percepção, entendimento e compreensão. Pradeep (2012) acredita que a atenção é o ponto de partida de todo ação de marketing e é uma função fundamental do cérebro que produz um padrão distinto de ondas cerebrais. O autor (2012), complementa: Nosso Parâmetro Neurométrico de Atenção baseia-se nas flutuações desses padrões de onda cerebral em cada momento. O resultado é uma medida relativa que revela como o nível de Atenção aumenta e diminui em menos de um segundo (PRADEEP, 2012, p.133). Para Pradeep (2012), esse parâmetro permite detectar com precisão que aspecto de uma mensagem publicitária despertou a atenção de alguém. A atenção, conforme descrito por Gazzaniga e Heatherton (2007), é regulada pelo tronco cerebral. O segundo parâmetro principal, o envolvimento emocional, pode aumentar e diminuir com o tempo. Segundo ele (2012), embora as percepções conscientes das 65 emoções pareçam constantes, no nível subconsciente o cérebro está o tempo todo atualizando o envolvimento emocional com o mundo que o cerca. Esse parâmetro permite avaliar a excitação emocional, ou seja, a tendência do cérebro e do sistema nervoso serem ativados com maior ou menor intensidade pelos estímulos recebidos e a ligação com aquilo que é vivenciado em determinado momento. Segundo o autor Pradeep (2012), o envolvimento emocional está abaixo da percepção consciente e influencia o comportamento de maneiras que não podem ser acompanhadas conscientemente. Memória, o terceiro parâmetro principal, é um dos aspectos mais estudados do cérebro em ação. Pradeep (2012) chama a atenção, pois, assim como no caso da Atenção e da Emoção, a memorização também gera padrões de ondas cerebrais sistemáticos e mensuráveis indicados quando o processamento da memória está ativo. Conforme descrito por Gazzaniga e Heatherton (2007), o armazenamento de memória é feito pelo hipocampo, estrutura presente no córtex cerebral. O autor (2012) afirma também que é possível em exames registrar as ondas cerebrais durante uma tarefa de memorização. Com essa análise, os pesquisadores conseguem prever se, mais tarde, a pessoa conseguirá ou não se lembrar da tarefa memorizada. Esses testes são feitos para identificar marcadores da atividade de memorização com pessoas assistindo a uma mensagem publicitária ou passando por uma experiência de consumo. A memória implícita pode influenciar o comportamento dos consumidores, pois ela permite que as recordações influenciem atitudes, decisões e comportamentos sem entrar no pensamento consciente do indivíduo. Por isso, segundo o autor (2012), é preciso avaliar a probabilidade de que uma memória persistente tenha sido formada no momento da codificação. Essa é a única maneira de determina se essa memória poderá surtir algum efeito posteriormente. 4.4.2 Parâmetros Secundários Os três parâmetros secundários variam, cada um, da combinação de dois parâmetros principais. Depois de analisar milhares de anúncios e mensagens de marketing, Pradeep (2012) chegou à combinação de dois dos principais parâmetros neurométricos que 66 fornecem uma previsão sensível do sucesso no mercado. Nesse caso, a combinação é do envolvimento emocional e da memória. Segundo o autor (2012), desempenho alto nesses parâmetros costuma estar associado a mais compras. Esse parâmetro secundário também pode ser chamado de Parâmetro de Persuasão, pois nem sempre as mensagens estão tentando estimular uma compra, como no caso de propagandas incentivando a assistir determinado programa de televisão. Pradeep complementa, afirmando que: Como esse Parâmetro Neurométrico é formado por dois componentes que mudam a cada momento, a própria intenção de compra/persuasão tem a propriedade útil de variar a cada momento, além de construir um indicador resumido. Isso pode ser muito importante para identificar com precisão não apenas o poder geral de persuasão de um anúncio, mas também os momentos do comercial que contribuem mais – ou menos – para essa persuasão. (PRADEEP, 2012, p136) O envolvimento emocional e a memória, segundo o autor (2012), fornecem uma previsão extremamente sensível do sucesso no mercado. O próximo parâmetro secundário, a novidade, é formada a partir da combinação dos parâmetros principais de atenção e de memória. A novidade aumenta o interesse, atrai a atenção e pode influenciar uma decisão de compra. Como no caso da intenção de compra, esse parâmetro também pode oscilar de um momento para outro e pode revelar quais partes de um comercial ou mensagem representam algo mais novo na experiência do consumidor. O terceiro parâmetro, a percepção, avalia se os consumidores compreendem a mensagem recebida. Para realizar esse teste, Pradeep argumenta que basta combinar os parâmetros principais de atenção e envolvimento emocional. Com esse parâmetro secundário de percepção, é possível prever com bastante precisão o grau de compreensão de comerciais e mensagens de marketing. Além dos parâmetros principais e secundários, Pradeep (2012) também descreve o parâmetro resumido, denominado de Eficácia. Para medir esse parâmetro é preciso combinar os três parâmetros principais de atenção, envolvimento emocional e memória. O parâmetro resumido, segundo o autor (2012), é eficaz e é um indicador preciso, confiável e neutro em termos de linguagem, calculado diretamente a partir dos registros das ondas cerebrais em tempo real. 67 Figura 8 - Parâmetros Neurométricos: atenção, emoção, memória, intenção de comprar, novidade, percepção e eficácia global. Fonte: Pradeep (2012, p.139) 4.4.3 Parâmetro Resposta Subconsciente O último parâmetro, a metodologia Resposta Subconsciente Profunda, avalia com precisão de que modo uma experiência afeta a receptividade do cérebro a um determinado processo. A metodologia abrange a avaliação do grau de receptividade inicial de um consumidor a um conjunto de conceitos previamente fornecidos pelo cliente. Em seguida, o consumidor passa por uma experiência, como assistir a um comercial ou comer determinado alimento. Com essa experiência, é possível verificar a efetividade do conceito fornecido pelo cliente na mente dos consumidores. Nesse caso, a experiência pode reforçar o conceito, ou não. Pradeep (2012) argumenta que essa metodologia não é um indicador momentâneo, e sim um indicador resumido de impacto no cérebro do consumidor. Para o autor (2012), o ponto forte dessa metodologia é ser totalmente não verbal e remeter a processos subconscientes verdadeiros. Com a Resposta Subconsciente Profunda é possível classificar o conceitos de acordo com seu grau de afinidade 68 com a experiência e identificar quais conceitos foram mais associados e os que foram menos associados. 4.5 RELAÇÃO DOS CONSUMIDORES E MARCAS Essa parte abordará como os consumidores se relacionam com as marcas e os produtos por intermédio do uso e da experiência. Para isso, é necessário entender as fases de afinidade com os produtos ou marca na mente dos consumidores. O primeiro pré-requisito é a conscientização. Nesse estágio, segundo Pradeep (2012), o consumidor tem conhecimento de um produto, marca ou categoria. A conscientização pode ocorrer no nível subconsciente ou no nível consciente, acessível e racional do indivíduo. Para o autor (2012), existem maneiras de trazer para a consciência o que está na mente subconsciente. Propagandas, programas de entretenimento e marketing interativo são algumas ações de promover a conscientização. A segunda etapa envolve a disponibilização de informações por parte das marcas. Pradeep (2012, p.145) alerta: “dar informações de maneira eficaz não significa sobrecarregar o consumidor com fatos e números, mas basicamente apresenta-lhe o contexto e as associações inerentes ao produto que o levem a quere saber mais”. Segundo o autor (2012), o objetivo é criar, na mente do consumidor, o desejo e a necessidade de conhecer melhor o produto. A razão de disponibilizar as informações não é gerar intenção de compra, mas aumentar o nível de conscientização já existente e incentivar o consumidor a se aprofundar no assunto. O terceiro elemento é um processo de mão dupla, iniciado principalmente pelo consumidor. Após a obtenção de informações, o consumidor busca conhecer melhor o produto em questão. Segundo o autor (2012), nesse momento a necessidade de saber mais sobre o produto é transformada em uma busca por fatos e motivos. Em muitos casos, o consumidor está em processo de decisão de compra de determinado produto e, por isso, está engajado em um processo racional de levantamento de fatos e números para justificar e orientar sua decisão. A quarta etapa, a análise, é o momento que antecede a efetivação da compra. Após ter feito as indagações necessárias, ele analisa seriamente a possibilidade de adquirir o produto. Para decidir, o consumidor compara o produto ou serviço com 69 suas opções alternativas. Kotler (2010) afirma que, com o avanço da tecnologia, os consumidores são mais bem informados e podem comparar várias ofertas de produtos semelhantes. Para Pradeep (2012), os profissionais de marketing podem tornar o processo de análise mais fácil e influenciar positivamente a decisão do consumidor, transmitindo uma ideia de boa vontade e criando um sentimento profundo de obrigação no subconsciente do consumidor. O autor exemplifica: Quando, por exemplo, uma companhia de seguros ajuda o consumidor a comparar preços e outras características, além de facilitar um processo que, de outra forma, seria complicado para o consumidor, também exibe um valor central que reforça a imagem da sua marca. Implicitamente, ela está não apenas dizendo que pode facilitar o processo de compra, mas também mostrando o que o consumidor pode esperar do restante do processo de cobertura do seguro. (PRADEEP, 2012, p.146) Pradeep (2012) argumenta que é difícil o consumidor dizer não a alguém que se esforçou para facilitar o seu trabalho de comparar produtos. Esse processo pode conquistar a fidelidade e a disposição do consumidor em relação ao preço. A quinta etapa, a compra, envolve a primeira interação do consumidor com a oferta da marca, produto ou serviço. Pradeep (2012) ressalta que, por mais diferenciado que o produto seja, o ato de pagar durante o processo de compra é algo absolutamente doloroso na mente do consumidor. O autor complementa: “de fato, estudos de neuroimagem mostraram que a atividade cerebral observada durante uma dor física é semelhante à atividade cerebral observada durante o ato de gastar dinheiro” (PRADEEP, 2012, p.146). Todo o prazer proporcionado ameniza a dor associada à transação, e Pradeep (2012) acredita que uma experiência de compra eficaz pode superar esse obstáculo. Segundo o autor: Quando o consumidor leva um produto ao caixa e se prepara para despender aquela quantia, uma gestão neurologicamente inteligente dessa etapa da sua jornada deve lembrá-lo mais uma vez o prazer que ele está prestes a obter com essa compra. Isso não apenas facilita a venda, mas também gera outro sentimento de vínculo emocional na mente do consumidor, que agora se sente mais fiel e até mesmo grato à marca. (PRADEEP, 2012, p.147) A sexta etapa, a de uso, é o momento em que o consumidor consome o produto. Em muitos casos, segundo Pradeep (2012), é a primeira vez que o consumidor tem contato com alguns aspectos do produto e características que 70 talvez não fossem aparentes ou comunicadas antes. É importante que, nesse momento, a empresa facilite esse processo para que o consumidor possa consumir o produto da melhor maneira possível. Para Pradeep (2012), nesse momento os rituais e as tarefas sensoriais associadas ao produto podem representar um papel importante para a satisfação do cliente, como no caso dos vinhos. A última etapa, a defesa, é o momento em que o cliente indica e gera a propaganda boca a boca. Para o autor (2012), essa atitude pode representar uma grande intenção de compra por parte de outros indivíduos. Pradeep (2012) acredita que o design, a experiência interativa e a propaganda do produto podem criar virais nas redes sociais. 4.6 ESTUDOS E CASOS Considerado o maior estudo de neuromarketing já realizado no mundo, cerca de 25 vezes maior do que qualquer outro experimento realizado na área de neuromarketing, a pesquisa de Lindstrom contou com 102 rastreamentos por IRMF e 1.979 estudos realizados com EEG. Na divisão de níveis de análise proposta por Bear, Connors e Paradiso (2010), o estudo de Lindstrom (2009) é classificado como experimental. Segundo os autores (2010), as pesquisas experimentais envolvem muitas metodologias, variando, conforme a especialidade do profissional. Todos os profissionais, conforme Bear, Connors e Paradiso (2010), devem trabalhar de acordo com o método científico de observação, replicação, interpretação e verificação, apresentados nos estudos de Lindstrom (2009). No estudo do autor (2009), houve uma disparidade entre a utilização dos equipamentos EEG e IRMF. Lindstrom (2009) explica que os exames de ressonância magnética envolvem planejamento, análise, realização da experiência e interpretação dos resultados, e, por isso, são mais caros. De qualquer jeito, segundo o autor (2009), os exames de IRMF foram quase duas vezes mais abrangentes do que qualquer outro estudo realizado, e ninguém havia misturado IRMF e EEG para obter análises de neuromarketing em grande escala até a data de sua publicação. 71 4.6.1 Neurônio-Espelho O termo “neurônio-espelho”, segundo Lindstrom (2009), foi denominado por Giacomo Rizzolati, cientista italiano, após seu experimento, em 1992, com uma espécie de macaco, o Rhesus, para descobrir como o cérebro organiza seus comportamentos motores. A denominação de “neurônio-espelho” refere-se ao efeito causado pela ativação de neurônios quando uma ação é realizada e, ao mesmo tempo, é observada. Conforme descrito por Gazzaniga e Heatherton (2007), os neurônios se diferenciam de outras células por operarem por meio de impulsos elétricos e se comunicam com outros neurônios por sinais químicos. Em seu experimento, o cientista observou uma atitude espontânea de um aluno de graduação que voltou para o laboratório após o almoço segurando um sorvete e notou que o macaco o estava encarando. Conforme o estudante levantava o sorvete até a boca e dava uma lambida no sorvete, o monitor eletrônico conectado à região pré-motora do macaco se ativava. O macaco não havia feito nenhum movimento, mas observava atentamente o aluno. Giacomo Rizzolati percebeu que o cérebro do macaco havia mentalmente imitado o mesmo gesto. Lindstrom (2009) argumenta que imagens de IRMF e TEE das regiões do cérebro humano indicam que esse mesmo efeito acontece quando alguém está realizando uma ação, e também quando uma pessoa observa a ação da outra. Conforme explicação do autor (2009), esse fenômeno também acontece com os seres humanos: Assim como os macacos de Rizzolati, quando assistimos a alguém fazendo algo, seja um pênalti convertido em gol ou um arpejo perfeito em um piano de cauda Steinway, nosso cérebro reage como se nós mesmo estivéssemos realizando aquelas atividades. Em suma, é como se ver e fazer fossem a mesma coisa. (LINDSTROM, 2009, p.56) Por esse motivo, os neurônios-espelho são, muitas vezes, o motivo pelo qual os indivíduos imitam involuntariamente o comportamento de outras pessoas. Mas o neurônio-espelho também entra em ação na situação inversa. Sentimos prazer com a desgraça alheia. Segundo o autor (2009), os pesquisadores da UCLA usaram o 72 aparelho IRMF para obter imagens do cérebro de algumas pessoas que estavam lendo descrições de uma série de ações, como “morder um pêssego” e “pegar uma caneta”. Quando assistiram a vídeos de pessoas realizando essas ações, as mesmas regiões corticais do cérebro se ativaram. Além de ajudar a imitar outras pessoas, os neurônios-espelho também são responsáveis pela empatia humana, pois mandam sinais para o sistema límbico ou para a região emocional do nosso cérebro – área que nos ajuda a entrar em sintonia com os sentimentos e reações alheios. Gazzaniga e Heatherton (2007) afirmam que os neurônios, em suas três funções principais, recepção, condução e transmissão, formam a comunicação do sistema nervoso. Os neurônios-espelho, segundo Pradeep (2012), operam no subconsciente e absorvem a cultura, as experiências, os sentimentos e os atos das pessoas que estão à sua volta. Por outro lado, suas ações e emoções também alimentam e modificam aqueles que o cercam. Kandel, Schwartz e Jessel (1997) descrevem que a informação captada é transformada pelo cérebro em percepções e em comandos para o movimento e ações dos indivíduos. Essa ideia é reforçada por Bear, Connors e Paradiso (2010) que acreditam que os neurônios captam as informações no ambiente, comunicam essas modificações a outros neurônios e comandam as respostas a essas sensações. Para Lindstrom (2009), esse fenômeno de imitação é decisivo na motivação de compra dos consumidores. O simples fato de ver repetidamente determinado produto o torna mais desejável. A decisão de compra ativa as células cerebrais que liberam dopamina e que resultam no bem-estar. Esse fluxo de dopamina alimenta o instinto de continuar comprando, até mesmo quando nossa mente racional diz que já chega. Segundo a Dra. Brookheimer (apud LINDSTROM, 2009, p.62) esse processo de liberação de dopamina faz parte do instinto humano “a atividade da dopamina no cérebro aumenta quando há expectativa de muitos tipos diferentes de recompensa, desde aquelas ligadas a jogos de azar até recompensas de ordem monetária ou social”. Os neurônios-espelho, segundo o autor (2009), ajudam a estabelecer uma conexão emocional, até mesmo com as realidades virtuais. Esse processo acontece em jogos de computador e sites de ambientes virtuais. Para Pradeep (2012), os neurônios-espelho são decisivos no comportamento dos consumidores: 73 A ativação do sistema de neurônios-espelho é uma das maneiras mais eficazes de se conectar com o consumidor. Mostre os produtos sendo consumidos, o golinho refrescante de água ou de café quente. Deixe os consumidores desfrutarem a ação que está sendo executada. Por exemplo, estremecerem de prazer com a leve acidez de uma maça verde crocante. Quando eles estiverem num ponto de venda, essas sensações fantásticas de desejo serão acessadas no nível subconsciente. (PRADEEP, 2012, p.123) 4.6.2 Mensagem Subliminar Lindstrom (2009) define as mensagens subliminares como mensagens visuais, auditivas ou sensoriais que estão abaixo do nível de percepção consciente. São sutis e só podem ser detectadas pela mente no subconsciente. Embora, muitas vezes, não sejam tão discretas assim. Segundo o autor (2009), algumas lojas tocam músicas, disponíveis na internet, com mensagens ocultas que incentivam os consumidores a gastarem mais ou desestimulam os casos de furtos. Segundo Lindstrom (2009), o faturamento total dessas lojas subiu 15%, e os furtos diminuíram 58%. A mensagem subliminar é mais frequente do que muitas pessoas imaginam. Em um mundo excessivamente cheio de estímulos, mensagens passam despercebidas pela consciência. Considerando esses fatores, muitas empresas, segundo o autor (2009), começaram a usar publicidade sem logomarcas, e com ótimos resultados. Um dos casos mais bem sucedidos é da indústria de tabaco. Lindstrom (2009) realizou testes de IRMF com pacientes fumantes com imagens subliminares sem ligação com marcas de cigarro. Após esse teste, exibiu imagens explícitas de publicidades de cigarro como o Homem Malboro, Joe Camel em uma motocicleta e as logomarcas das empresas. Segundo o autor (2009), as imagens de ressonância magnética funcional revelaram uma reação no nucleus accumbens, área que está ligada à recompensa, desejo e dependência, quando viram maços de cigarro e logomarcas. Ao serem expostos a imagens implícitas, como a Ferrari vermelha, os caubóis a cavalo e o camelo no deserto, foi registrada atividade nas regiões ligadas ao desejo. A diferença foi que as mensagens subliminares, ou implícitas, geraram mais atividade no córtex visual primário. Com imagens subliminares, houve mais atividade nos centros de recompensa e desejo. As mensagens sem logomarca desencadearam mais desejo nos fumantes do que as imagens explícitas com logomarcas e maços de cigarro. 74 Lindstrom (2009) apresenta dois fatores determinantes para esse resultado. Como as imagens subliminares não mostravam nenhuma logomarca visível, os fumantes sem saber conscientemente que estavam assistindo a uma mensagem publicitária, ficam despreparados e mais vulneráveis a esses estímulos. Lindstrom (2009) explica que, sem a logomarca, o cérebro reage de forma subsconsciente ao estímulo. O segundo fator determinante são as associações construídas pela indústria de tabaco. Em 1997, a Silk Cut, preparando-se para a proibição da publicidade que estava para ser adotada no Reino Unido, começou a anunciar sua logomarca sobre um fundo de seda roxa em todos as suas propagandas. Os consumidores logo associaram aquela faixa de seda à logomarca da empresa. Quando a proibição dos anúncios entrou em vigor, a empresa criou outdoors sem nenhuma menção a marca. Logo após, uma pesquisa revelou que 98% dos consumidores identificavam os outdoors como algo relaciona à Silk Cut, embora a maioria das pessoas não soubesse exatamente por quê. As marcas de cigarro, segundo Lindstrom (2009), contornaram as regras governamentais criando estímulos para substituir a publicidade tradicional. 4.6.3 Rituais e Superstição Os rituais e as superstições têm muita influência no comportamento dos consumidores. Em um mundo veloz e inconstante, Lindstrom (2009) acredita que os consumidores estão sempre buscando estabilidade e familiaridade, e que os rituais de produtos proporcionam a ilusão de conforto e participação. Em um ambiente cada vez mais padronizado, esterilizado e homogêneo, Lindstrom (2009) argumenta que os rituais ajudam os consumidores a diferenciar as marcas. Ao encontrar um ritual ou uma marca de sua preferência, o consumidor fica mais confortável. Segundo o autor (2009), é por esse motivo que franquias da rede Subway montam sanduíches sempre na mesma ordem, para que os clientes saibam exatamente como instruir o funcionário. Outro exemplo é o da Cold Stone Creamery, que tem um ritual dos atendentes cantarem e dançarem uma canção para os seus clientes na hora de entregar os sorvetes. Para o autor (2009), os rituais passam despercebidos, enquanto são executados pelo indivíduo. 75 Lindstrom (2009) acredita que o consumo, na maioria das vezes, é mais um processo comportamento ritualizado do que uma decisão consciente. A obsessão por marcas tem muito em comum com rituais e comportamentos supersticiosos, pois ambos envolvem ações habituais, reincidentes, com pouca ou nenhuma base lógica. Nascem da necessidade de ter uma sensação de controle em um mundo complexo. Tybout e Carpenter (2001) acreditam que, para uma marca ter valor, é preciso que as associações feitas em relação a ela tornem-se parte da vida dos consumidores. Um caso de sucesso são os biscoitos Oreo. Segundo Lindstrom (2009), algumas pessoas gostam de abrir o biscoito, lamber o recheio branco que fica no meio e depois comer as duas porções de massa. Outros gostam de molhar o biscoito intacto em um copo de leite frio. Sabendo desse último ritual, a Nabisco, fabricante dos biscoitos, fez parceria com os produtos da famosa campanha “Got Milk”. Na época, o diretor sênior dos produtos Oreo, declarou: “O Oreo não é apenas um biscoito, é um ritual” (LINDSTROM, 2009, p.92). Os consumidores, para Lindstrom (2009), sentem segurança com os seus hábitos e não querem alterar certos comportamentos. O autor (2009) acredita que conscientemente ou não, o consumidor não quer mexer com a região do cérebro constituída pela memória implícita, que engloba tudo o que sabe fazer sem pensar a respeito, desde andar de bicicleta até estacionar o carro de ré, ou comprar um livro pela internet. As coleções também transmitem o sentimento de segurança e proteção. Para Lindstrom (2009), os consumidores buscam conforto em produtos e objetos conhecidos. Eles querem padrões sólidos e consistentes em suas vidas, e as marcas devem proporcionar isso. 4.6.4 Fé, Religião e Marcas Segundo Lindstrom (2009), em 2006, Mario Beauregard e Vincent Paquette, neurocientistas da Universidade de Montreal, no Canadá, realizaram estudo com 15 freiras entre 23 e 64 anos com exames de imagem de ressonância magnética funcional, para verificar a forma como o cérebro vivencia crenças e sentimentos religiosos. Na primeira parte da pesquisa, foi pedido às freiras que relembrassem a experiência religiosa mais profunda que tiveram. Os exames revelaram que, ao recordar aquelas experiências, as freiras produziam uma grande atividade neural no 76 núcleo caudado, uma pequena região no centro do cérebro que produz sentimentos de alegria, serenidade, autoconsciência e amor. Outra área ativada foi a ínsula, que está relacionada aos sentimentos associados a conexões com o divino. Em seguida, os cientistas pediram às freiras para lembrarem uma experiência emocional profunda que tiveram com outro ser humano. Curiosamente, a atividade neural registrada era bem diferente da anterior. Os cientistas concluíram que, embora não haja um ‘Ponto Divino’ específico no cérebro humano, existem, entre as pessoas com fortes crenças religiosas, padrões diferentes de atividade durante pensamentos sobre religião e pensamentos sobre seres humanos. Esse estudo serviu de inspiração para Lindstrom (2009) realizar seu próprio experimento. O autor (2009) pesquisou a ligação entre religiões e o comportamento de consumo e verificou; se haveria semelhanças entre o modo como o cérebro reage a símbolos religiosos e espirituais e a maneira como os consumidores reagem a produtos e marcas e se marcas poderiam provocar o mesmo tipo de emoção ou inspirar a mesma devoção e lealdade provocada pela religião. Em preparação para sua pesquisa, o autor (2009) entrevistou 14 líderes proeminentes de várias religiões ao redor do mundo para identificar as características e as qualidades em comum entre as religiões. Suas entrevistas revelaram dez pilares comuns: sensação de pertencimento, visão clara, poder sobre inimigos, apelo sensorial, narração de histórias, grandiosidade, evangelismo, símbolos, mistério e ritual. Segundo Lindstrom (2009, p.100), “esses pilares têm muito em comum com as nossas marcas e produtos mais amados”. Kotler e Pfoertsch (2008) sustentam a ideia do autor, afirmando que marcas de sucesso quase sempre ocupam posições exclusivas na mente do consumidor. Para eles (2008), uma identidade forte, motivadora, conhecida e de confiança dos consumidores pode superar muitas questões, entre elas, preço e concorrência. O estudo de Lindstrom (2009) foi o primeiro a tentar provar a existência de uma ligação científica entre as marcas e as religiões no mundo. As marcas examinadas foram: Apple, Guinness, Ferrari e Harley-Davidson. Segundo o autor (2009), são marcas que tendem a ser mais fortes, cativantes emocionalmente, e seus seguidores são passionais e leais. A fim de obter um quadro mais claro da relação com marcas fortes, selecionou também marcas fracas, como Microsoft, BP e outras que têm o mesmo perfil. Para Lindstrom (2009), essas marcas causam 77 emoções limitadas, negativas ou simplesmente deixam os consumidores indiferentes. O estudo foi realizado com 65 participantes. No início, foi pedido a eles para classificarem a própria espiritualidade em uma escala crescente de um a dez. A maioria posicionou a devoção entre sete e dez. O experimento restringiu os voluntários a apenas homens, pois estava correlacionado com outro estudo. Esse segundo estudo envolvia a pesquisa sobre o esporte, seus heróis e as atividades ativadas no cérebro pelas imagens de religiões. O autor (2009) explica que, assim como os membros de uma religião, os fãs de esporte também têm uma forte sensação de pertencimento. Os times têm uma missão clara de vencer, forte conceito de ‘nós contra eles’ e apelo sensorial com o cheiro de grama recémcortada, cachorros-quentes no estádio ou som do hino nacional antes do início da partida. O autor explica os procedimentos adotados em seu experimento: A sala ficava escura, e as imagens começavam a ser exibidas em sequencia: uma garrafa de Coca-Cola. O papa. Um Ipod. Uma lata de Red Bull. Contas de um rosário. Uma Ferrari esportiva. A logomarca do eBay. Madre Teresa. Um cartão American Express. A logomarca da Microsoft. Por fim, imagens de alguns times e indivíduos do mundo do futebol americano, críquete, boxe, futebol e tênis. Um banco de igreja, seguido por David Beckham, seguido pelo hábito de uma freira, seguido pela Copa do Mundo. E assim por diante. (LINDSTROM, 2009, p.111) Depois de analisar os dados do IRMF, foi possível verificar que marcas fortes geravam mais atividade do que marcas fracas em muitas áreas do cérebro ligadas a memória, emoção, tomada de decisões e significado. Outra descoberta foi que, quando as pessoas viam imagens associadas a marcas fortes – Ipod, HarleyDavidso, Ferrari e outras -, o cérebro registrava exatamente os mesmo padrões de atividade registrados anteriormente quando viam as imagens religiosas. Segundo o autor, “não havia diferença perceptível entre a maneira como o cérebro dos participantes reagia a marcas fortes e a ícones e figuras religiosas” (LINDSTROM, 2009, p.111). Outra descoberta foi que, apesar de tudo que o mundo do esporte compartilha com as grandes religiões, os astros do esporte ou imagens esportivas não representaram reações emocionais tão fortes no cérebro quanto as marcas fortes e fracas. Segundo o autor (2009), ver as imagens dos astros do esporte ativava a parte do cérebro associada à sensação de recompensa, o córtex orbitofrontal medial 78 inferior, em uma intensidade semelhante aos padrões gerados pelos ícones religiosos, sugerindo que os sentimentos de recompensa associados a uma vitória esportiva eram semelhantes aos sentimentos associados a uma prece comovente na igreja ou sermão. As marcas fortes e as fracas tinham muito mais poder do que as imagens esportivas para estimular e ativar as regiões cerebrais de armazenamento, lembranças e tomada de decisões. Para o autor (2009), essa ideia faz sentido, pois, quando o consumidor está pensando em comprar determinado produto, nosso cérebro evoca todos os tipos de informações a respeito do produto – preço, recursos, nossas experiências passadas com ele – e, com isso, toma uma decisão adequada. Por outro lado, quando o assunto é esporte, há pouca busca de informações para a tomada de decisões; o indivíduo torce para determinado time simplesmente porque sim. Segundo Lindstrom (2009), as reações dos voluntários às marcas e aos ícones religiosos foram quase idênticas. Enquanto isso, as marcas fracas não evocaram as mesmas associações, pois ativaram diferentes partes do cérebro, demonstrando baixo nível de envolvimento emocional. Para Kotler e Pfoertsch (2008), marcas de sucesso ocupam posições exclusivas na mente dos consumidores. 4.6.5 Marcadores Somáticos A verdadeira base lógica por trás das escolhas, segundo Lindstrom (2009), está alicerçada nas associações inconsciente formadas em toda uma vida. No processo de tomada de decisão de consumo, o cérebro evoca e rastreia uma quantidade de lembranças, fatos e emoções, e compacta-as em uma reação rápida. Essa decisão envolve uma espécie de atalhos que permitem, em alguns segundos, escolher sobre determinado produto ou marca. Esses atalhos cognitivos estão por trás da maioria das decisões de compra e são uma série completamente inconsciente de avisos no cérebro que levam os consumidores a reações emocionais. Segundo o autor (2009), Antonio Damasio denominou de marcadores somáticos esses atalhos e essas cadeias de conceitos. Os marcadores somáticos guiam os consumidores em direção a uma decisão que irá gerar o melhor resultado ou o resultado menos arriscado. As experiências anteriores de recompensa e 79 punição conectam uma experiência ou emoção a uma reação específica, por isso os marcadores somáticos são decisivos no processo de tomada de decisão. Lindstrom (2009) acredita que sem eles os seres humanos não são capazes de tomar nenhuma decisão, desde estacionar o carro, andar de bicicleta, decidir quanto dinheiro tirar no caixa eletrônico até tirar uma assadeira quente do forno. Os marcadores somáticos, segundo o autor (2009), são muito mais memoráveis e duradouros do que outras associações formadas ao longo da vida, pois geralmente são associações entre dois elementos incompatíveis que impactam e que chocam os seres humanos. É por esse motivo que muitos anunciantes visam a criar associações surpreendentes, até mesmo chocantes, entre dois elementos diferentes. Lindstrom questiona: por que tantos consumidores optam por comprar um Audi e não outro carro com design igualmente atraente, pontuação de segurança comparável e preços semelhantes? Para o autor (2009), é bem capaz que tenha a ver com o slogan da empresa de progresso e de vantagem através da tecnologia. O cérebro do consumidor faz conexões entre “automóvel” e “Alemanha” e a tudo o que foi captado ao longo da vida sobre a avançada fabricação automobilística alemã, com parâmetros elevados de precisão, consistência, rigor e eficiência, confiabilidade. O consumidor não tem consciência dessas ligações, e um marcador somático que liga Alemanha e excelência tecnológica influencia a preferência. Conforme descrito pelo autor (2009), um estudo realizado pela marca alemã Gruppe Nympnhenberg descobriu que mais de 50% de todas as decisões de compra são tomadas espontaneamente no ponto de venda. Lindstrom complementa: De repente, você “simplesmente sabia” qual marca queira, mas não tinha consciência alguma dos fatores – a forma da embalagem do produto, lembranças de infância, preço e um momento de outras associações – que o levaram a tomar aquela decisão. (LINDSTROM, 2009, p.117) Para o autor (2009), os marcadores somáticos não são apenas uma coleção de reflexos da infância e da adolescência, pois todos os dias o consumidor fabrica novos marcadores, adicionando-os à ampla coleção já existente. Quanto maior a coleção de marcadores somáticos, maior a capacidade de tomar decisões de compra. 80 4.6.6 O Poder dos Cinco Sentidos Hoje, os consumidores estão mais sobrecarregados de estímulos visuais do que nunca. Estudos demonstram, conforme descrito por Lindstrom (2009), que quanto mais os consumidores são estimulados, maior a dificuldade de captar a atenção deles. Uma empresa de rastreamento cerebral chamada Neuroco realizou um estudo para a 20th Century Fox que media a atividade cerebral elétrica e os movimentos oculares em resposta a comerciais inseridos em um videogame. Em um passeio virtual por Paris, os voluntários observavam, no game, anúncios em cartazes, pontos de ônibus e na lateral dos ônibus para verificar o que mais chamava a atenção deles. Os pesquisadores, ao final da experiência, descobriram que o resultado foi a saturação visual, sem nível de atenção ou vendas. Conforme descrito por Tybout e Sternthal (2001), os consumidores não tomam decisões somente com base em atributos do produto e imagens. Para Lindstrom (2009), as empresas gastaram milhões de dólares criando, ajustando, alterando e testando suas logomarcas e certificando-se de que elas estavam bem posicionadas visivelmente e, por isso, os publicitários se concentraram por muito tempo em atividades para guiar e motivar os consumidores visualmente. O autor (2009) acredita que as imagens visuais são mais eficazes e memoráveis quando são associadas a outro sentido, ou seja, para cativar emocionalmente, é melhor integrar os sentidos e não apenas utilizar estímulos visuais. As informações advindas dos sentidos, da audição, do equilíbrio e do paladar, conforme descrito por Gazzaniga e Heatherton (2007), são recebidas por núcleos presentes no tronco cerebral. As iniciativas das marcas, no desenvolvimento de produtos, no projeto de embalagens e em publicidade, não aproveitam toda a abrangência possível das experiências sensoriais. Essas experiências, segundo Lindstrom (2009), são imediatas, poderosas e podem alterar a vida dos consumidores. Para Gobé (2002, p.117): “do ponto de vista da experiência, as consequências do consumo derivam do prazer que o consumidor sente pelo produto – o prazer que o produto oferece e o prazer que o produto provoca”. Em um mundo com oferta de produtos similares, o branding sensorial pode ser o fator-chave na decisão dos clientes, proporcionando experiências aos consumidores em suas compras. Muitos indivíduos, segundo Gobé (2002), não 81 estão buscando deliberadamente informação a respeito de produto, por isso estimular a emoção e o sentimento são formas de distinguir um produto e atrair a atenção dos consumidores. Para Gobé (2002), as empresas que combinarem sentidos de forma dinâmica serão mais agradáveis. Underhill (2012) reforça, afirmando que todas as compras, planejadas ou não, resultam do fator do consumidor relacionar-se com algo que promete prazer. A seguir serão apresentados os cinco sentidos, de forma separada, e sua relevância e efetividade em ações de marketing. 4.6.6.1 Olfato Em um estudo para testar o papel dos sentidos no comportamento de compra dos consumidores, Lindstrom (2009) testou, na primeira etapa da experiência, duas fragrâncias com seus voluntários para uma cadeia de restaurantes de fast-food. Os voluntários deveriam escolher qual fragrância era a melhor opção para acompanhar determinado item do cardápio. Durante um mês, os voluntários foram expostos a imagens, logomarcas e fragrâncias. Os elementos foram apresentados separadamente e, depois, ao mesmo tempo. As imagens e as fragrâncias incluíam a rede de fast-food, Johnson & Johnson, Dove e Coca-Cola. Os voluntários podiam controlar a aparição das imagens e das fragrâncias por meio de um botão nos consoles de mão e podiam também classificar o apelo em uma escala de nove pontos, desde muito desagradável a muito agradável. A primeira descoberta indicou que os consumidores são seduzidos igualmente tanto pela visão de um produto quanto pelo seu aroma. Também foi possível identificar que a combinação das imagens e das fragrâncias são mais atraentes do que elas apresentadas separadamente. Conforme descrito pelo autor (2009), a preferência por algumas combinações de imagem e fragrâncias em relação a outras ocorre quando o consumidor enxerga e sente, ao mesmo tempo, o cheiro de algo de que ele gosta. Com essa associação, várias regiões do cérebro ativam simultaneamente. Nos casos em que há má combinação entre marca e fragrância, acontece uma ativação na região do cérebro ligada à aversão ou repulsa. Lindstrom (2009) ainda reforça que combinando os dois elementos, os consumidores percebem a associação como algo mais agradável e ficam mais propensos a lembrar das marcas. 82 Na terceira descoberta, o odor ativou várias regiões cerebrais iguais às ativadas pela imagem de um produto. Com isso, Lindstrom (2009) acredita que as empresas podem capturar o interesse dos consumidores pelo olfato com a mesma eficácia alcançada pelos estímulos visuais. 4.6.6.2 Cores As cores podem ser muito poderosas para as marcas estabelecerem uma conexão emocional com os consumidores. Segundo Gobé (2002), elas desencadeiam respostas específicas no sistema nervoso central e no córtex cerebral e podem ativar os pensamentos, a memória e as percepções dos consumidores. Essa atividade pode ser decisiva no processamento e no armazenamento da informação, além de promover uma melhor compreensão do que a marca representa. Em teste realizado com seiscentas mulheres, Lindstrom (2009) deu a cada participante uma caixa azul da Tiffany’s. Dentro da caixa não havia nada. Mesmo sem saber disso, a reação das participantes foi surpreendente. Quando receberam a caixa, os batimentos cardíacos das mulheres subiram 20% sem ver nenhuma logomarca, apenas com a cor e as associações envolvendo noivado, casamento, bebês e fertilidade. A frequência cardíaca, conforme Gazzaniga e Heatherton (2007), são controladas pelo bulbo, parte presente no tronco cerebral. Para Gobé (2002), a cor pode fixar a atenção dos consumidores e transmitir mensagens conscientemente imperceptíveis: Geralmente é desejável selecionar uma cor facilmente associada ao produto: a John Deere, fabricante de tratores, usa o verde para o seu produto; o verde é a cor da natureza. A IBM tem um azul forte, que comunica estabilidade e confiabilidade. O comprimento de ondas de azul tem um impacto de segurança sobre a mente. (GOBÉ, 2002, p.128) Para reforçar a importância e influência das cores, Lindstrom (2009) também apresenta o estudo realizado pela Seoul International Color Expo que revela que a cor chega a aumentar o reconhecimento de uma marca em até 80%. Outros estudos, segundo o autor (2009), mostraram que as pessoas, quando fazem um julgamento subconsciente sobre uma pessoa, um ambiente ou um produto em um intervalo de noventa segundos, entre 62% e 90% dessa avaliação é baseada na cor. 83 4.6.6.3 Som O branding sonoro existe há décadas. Segundo Lindstrom (2009), a General Eletric criou, em 1950, o seu som de três notas, representando sua logomarca sonora. A Kellogg’s investiu muitos anos cultivando um som característico para os seus produtos e chegou a contratar um laboratório dinamarquês para desenvolver um som único para que as crianças identificassem a diferença entre o cereal matinal genérico e um cereal da Kellogg’s. Outro exemplo é da Ford Motor Company que criou um novo sistema para fechar as portas do Taurus, que faz um som único, semelhante ao de um cofre. Para Gobé (2002), o som é efetivo, pois ilude a mente racional e afeta o lado emocional, região onde os desejos são estimulados. Gazzaniga e Heatherton (2007) descrevem que as funções sensoriais e motoras, os movimentos oculares e a coordenação de reflexos visuais e auditivos são controladas pelo mesencéfalo, presente no tronco cerebral. O autor (2002) descreve o estudo The Effects of Music in Advertising on Choice Behavior realizado por Gerald Gorn. Em uma apresentação de produtos acompanhada por música de fundo, 80% dos consumidores escolheu os produtos que foram acompanhados pela música que mais apreciaram. Os consumidores atribuíram a preferência às qualidades do produto e não à música de fundo. Outro estudo, dessa vez descrito por Lindstrom (2009), apresentou uma experiência em que música clássica influenciou a ociosidade e reduziu os crimes violentos e vandalismo em parques, estacionamentos de lojas e metrôs no Canadá. Em Londres, quando músicas clássicas foram difundidas por alto-falantes no metrô, os furtos chegaram a cair 33%; as agressões contra funcionários, 25%; e o vandalismo, 37%. Lindstrom (2009), também descreve o estudo realizado por dois pesquisadores da Universidade de Leicester, que comprovou que o som pode influenciar a decisão de compra. Os pesquisadores transmitiram, nos alto-falantes da seção de vinhos dentro de um grande supermercado, canções que eram facilmente reconhecidas como francesas, e outras como alemãs. Nos dias em que era transmitida música francesa, 77% dos consumidores compraram vinho francês. Nos dias de música alemã, a grande maioria dos consumidores foi direto para a seção alemã da loja. Segundo apresentado pelo autor (2009), dos 44 clientes que 84 concordaram em responder algumas perguntas antes de sair da loja, apenas um mencionou a música como uma das razões que o fez comprar o vinho. Lindstrom (2009) realizou estudo com imagens cerebrais para descobrir se um som característico torna uma marca mais ou menos atraente, com quatro categorias diferentes de produtos: telefones, software, companhias aéreas e várias imagens de Londres. Para cada categoria foram escolhidos sons associados. Depois os voluntários receberam dez imagens separadas por marca e também imagens que não estavam relacionadas a sons característicos. Primeiro, os voluntários visualizaram marcas individualmente, em segmentos separados com dez minutos de duração, durante as quais eram apresentados primeiro aos participantes só os sons, depois imagens e sons simultaneamente. Esse processo foi repetido cinco vezes e foi pedido aos voluntários para assinalarem suas preferências de imagens, sons ou combinações de sons e imagens, em uma escala de 1 a 9. Os primeiros resultados indicaram que os sons e as imagens, quando apresentados simultaneamente, são percebidos de maneira mais favorável do que quando são apresentados individualmente. Nesse caso, atividades nas regiões cerebrais indicavam que os voluntários estavam prestando atenção, que gostaram do que haviam visto e ouvido, que achavam a combinação agradável e que lembrariam da marca, provavelmente também a longo prazo. Com essas informações, foi possível concluir que a atenção e a lembrança dos consumidores são maiores quando eles ouvem uma melodia característica de um produto e simultaneamente veem uma imagem ou logomarca. A música, segundo Gobé (2002), é uma ferramenta para construir a identidade da marca, principalmente, com os consumidores da geração X e Y. Para o autor (2002), a associação entre marca e um gênero específico de música pode contribuir para a distinção da organização em seu mercado. Ainda no seu estudo, Lindstrom (2009) descobriu que o toque de telefone da Nokia não passou no teste. As imagens da marca apresentaram desempenho satisfatório, mas os resultados das imagens de ressonância magnética funcional mostraram, em todos os níveis, uma reação emotiva negativa ao famoso toque da Nokia. A neurocientista Dra. Calvert observou o córtex pré-frontal ventrolateral, região que processa informações relacionadas a emoção, dos voluntários. Dra. Calvert descobriu que o som transformou a visão do telefone em um marcador somático negativo, evocando associações indesejáveis. Os voluntários fizeram 85 associações a momentos de intrusão, interrupção e sentimentos de incômodo e, por isso, passaram a renegar e a odiar o toque conhecido da Nokia. 4.6.6.4 Sabores Segundo Underhill (2009), quase 90% dos novos produtos alimentícios fracassam. Para o autor (2009), esse resultado é devido a falta de experimentação dos produtos. Gobé (2002) acredita que o comércio já está conscientizado da importância de oferecer alimentos aos consumidores, mas muitas empresas ainda não se preocupam com a parte afetiva envolvida nessa relação. Disponibilizar e oferecer alimentos pode criar uma espécie de parentesco e familiaridade e fazer as pessoas se sentirem à vontade em suas experiências de consumo. Para o autor (2002), esse ritual é feito em casa quando as pessoas recebem visitas, então por que não pode ser feito para os clientes? As pessoas procuram locais e momentos para relaxar e fugir das preocupações profissionais e das responsabilidades do lar. É por esse motivo que foram instalados restaurantes e lanchonetes dentro de lojas. Esses ambientes são confortáveis e permitem que os clientes fiquem à vontade, saboreando alimentos e bebidas, enquanto fazem suas compras. Gobé (2002, p.135) afirma também que: “para muitas pessoas, esse serviço é muito mais valioso do que a etiqueta de preço que o acompanha, tanto pelo benefício tangível como pelo valor simbólico do gesto”. A Livraria Barnes & Noble, segundo o autor (2002), é uma das primeiras varejistas americanas a praticar iniciativas eficazes de gastronomia. Ao contrário de muitos concorrentes e de outros varejistas, em vez de instalar uma barraca de cachorro quente na entrada da loja, a livraria valorizou seu serviço e o significado de sua marca. A Barnes & Noble ofereceu café e salgadinhos, dentro de seu estabelecimento, para que os clientes possam saborear os alimentos enquanto folheiam jornais, livros ou revistas. Essas ideias simples podem proporcionar resultados surpreendentes. A oferta de alimentos pode tornar-se o fator final para atrair os consumidores, assim como reter os mais cansados que gostariam de continuar as compras, mas precisam de um momento para relaxar. Ainda segundo Gobé (2002, p140): [...] “é certo que os momentos gostosos passarão a fazer parte da memória associativa dos visitantes” 86 4.6.6.5 Tato O tato, conforme descrito por Gobé (2002), é um dos principais sentidos e o mais imediato, pois permite ao consumidor tocar, segurar e sentir as formas básicas de qualquer objeto. Esse contato faz parte da experiência da marca. e pode proporcionar aos clientes conexões emocionais com os produtos, com satisfação imediata do desejo de possuir e sentir o produto. Para Gobé (2002, p.141): “enquanto os sentidos em geral nos informam sobre as coisas do mundo, muitas vezes é o toque que nos permite finalmente possuir o mundo, envolvê-lo em nossa consciência”. Em um mundo privado de tato e limitado pelo advento da Internet, as empresas que incentivarem o toque serão recompensadas pelos seus clientes. Sentir e tocar os produtos proporciona aos consumidores sentimentos de prazer e de pertencimento, antes mesmo de adquirir o produto. Algumas embalagens inibem esse contato e, por isso, é possível, muitas vezes, encontrar produtos com embalagens violadas. Quando o produto necessitar ser lacrado, a marca deve disponibilizar uma amostra para apreciação do púbico. Gobé (2002) defende que, nesses casos, há algo de errado com os projetos. As organizações devem desenvolver projetos inspiradores com o objetivo de proporcionar um toque agradável a seus produtos. O autor completa: “se uma mulher vai aplicar um batom, ela quer conhecer a textura do produto; como ela o sentiria em sua pele, como sentiria o toque do próprio invólucro em suas mãos; e como ela sentiria a tampa ao abrir e fechá-la” (GOBÉ, 2002, p.142). Outro exemplo citado pelo autor é das curvas da garrafa da Coca-Cola que são agradáveis ao toque e prazerosa de segurar. A garrafa transmite a identidade da marca ao simples toque. Além dos objetos, os ambientes das lojas também precisam ser projetados e organizados para serem experimentados, sentidos e descobertos. Segundo o autor (2002), muitos gerentes de marketing consideram o tato como o simples ato praticado com as mãos. Gobé (2002) defende que a experiência existe desde o contato da sola de sapato com o piso da loja. As iniciativas, segundo o autor (2002), para integrar experiências sensoriais palpáveis podem ser incrivelmente simples e econômica. A Banana Republic, em 1998, disponibilizou faixas elásticas aos seus consumidores para reforçar a elasticidade dos tecidos usados em sua nova coleção. Em experimento realizado, Lindstrom (2009) disponibilizou dois controles remotos Bang & Olufsen para cem consumidores. O primeiro com alumínio dentro e 87 o segundo sem alumínio. A reação imediata dos consumidores foi considerar que o segundo controle estava quebrado. Após descobrirem que o aparelho leve funcionava, os consumidores continuaram achando que a sua qualidade era inferior. Lindstrom (2009) também apresenta o caso da Duracell que projetou pilhas com a forma de projéteis. Ainda em fase de testes e desenvolvimento, os pesquisadores identificaram que os homens que haviam substituído as pilhas normais de suas lanternas por pilhas com o novo formato, achavam que as novas pilhas eram mais potentes do que as tradicionais, embora o novo formato reduzisse a força da pilha. Para Lindstrom (2009), a sensação tátil de um produto desempenha papel importante na tomada de decisão dos consumidores. 4.6.6.6 Sexo na Publicidade O sexo está por toda parte e é usado na publicidade há quase um século. Para Lindstrom (2009), o impacto nos americanos foi tanto, que nas décadas de 1960 e 1970, a população questionou o que estava acontecendo com a cultura do país: “Será que a publicidade está indo longe demais?”. Esse contexto resultou do exagero praticado pelas marcas. Lindstrom (2009) argumenta que os anúncios de televisão e impressos de 1960 e 1970 eram recatados quando comparados com os atuais. Na época, as (os) modelos estavam totalmente vestidas, e hoje em dia é comum ver homens e mulheres quase nus em anúncios. O autor (2009) cita o livro Sex In Advertising: Perpectives on the Erotic Appeal, publicado em 2005, que apresenta dados surpreendentes. Cerca de um quinto de toda a publicidade utiliza conteúdo abertamente sexual. Para examinar a eficácia do sexo na publicidade, foram realizados alguns experimentos nos últimos anos. Em uma experiência realizada, em 2007 no University College em Londres, foi analisada a lembrança dos consumidores com comerciais sexualmente sugestivos. O experimento contou com 60 adultos divididos em quatro grupos. Dois grupos assistiram a um episódio de Malcolm in the Middle, comédia familiar e sem conteúdo erótico, e os outros dois grupos assistiram a um episódio de Sex and the City no qual as personagens conversam sobre temas eróticos. Nos intervalos dos programas, dois grupos assistiram a uma série de anúncios sexualmente sugestivos de produtos como 88 cerveja, xampu e perfume, enquanto os outros dois assistiam a anúncios sem nenhum conteúdo sexual. Após a exibição dos programas e dos anúncios, os voluntários foram questionados do que eles lembravam. A primeira descoberta revelou que os participantes que assistiram a anúncios com conteúdo erótico não tiveram mais facilidade para se lembrar de produtos e marcas do que os participantes que assistiram a anúncio sem conteúdo sexual. A segunda descoberta indicou que os dois últimos grupos que assistiram Sex and the City lembravam menos dos anúncios do que outros dois grupos que assistiram a Malcolm in the Middle. Aparentemente, a lembrança dos comerciais sexualmente explícitos foi influenciada negativamente pelo conteúdo sexual do próprio programa. Com isso, os pesquisadores do University College em Londres concluíram que o sexo não vende nada, além de si mesmo. Em outro estudo realizado, dessa vez pela empresa MediaAnalyzer Software & Research, foi possível identificar que, em alguns casos, os elementos eróticos podem até mesmo interferir na eficácia do anúncio. A empresa realizou pesquisa com 400 participantes e apresentou anúncios de cigarros e cartões de crédito. Os voluntários poderiam usar o mouse de seus computadores para indicar o ponto exato da tela a que o seu olhar dirigia-se instintivamente. Ao contornar o nome, logomarca e texto dos anúncios, os participantes indicaram as regiões dos anúncios onde estavam as mulheres. O conteúdo erótico deixou os participantes cegos. Os resultados da pesquisa revelaram que 9,8% dos homens que haviam visto os anúncios com conteúdo sexual eram capazes de lembrar da marca ou do produto e que 20% dos homens que haviam visto os anúncios sem conteúdo erótico lembraram das marcas e dos produtos. Segundo Lindstrom (2009), esse resultado também foi observado com mulheres, pois 10,85% lembrou corretamente da marca ou do produto presente nos anúncios com conteúdo erótico, enquanto que 22,3% lembrou da marca ou produto nos comerciais sem conteúdo sexual. O autor (2009) cita o caso da marca Calvin Klein, que utilizou elementos e mensagens eróticas em muitas campanhas e ações. A atmosfera sexual fez parte da estratégia de marketing da marca por muitos anos. A tática da empresa era veicular anúncios sexualmente sugestivos, deixar os consumidores tensos e, depois, retirar os anúncios repentinamente. Essa tática chamou tanta atenção quanto os próprios 89 anúncios, ou seja, o fator chave para o sucesso nas vendas estava na polêmica e não no sexo. Em meio a campanhas polêmicas, os resultados nas vendas da marca corresponderam positivamente a muitas ações, com vendas de dois milhões de pares de calças por mês e controle de 70% do mercado de jeans de importantes varejistas como a Bloomingdale’s. Segundo Lindstrom (2009, p.159): “o crescimento de Klein foi espetacular ao longo dos anos 1970 e no início dos anos 1980 – sua marca era tão onipresente que os jeans passaram a ser chamados apenas de “Calvins”. Posteriormente, muitas empresas utilizaram a mesma tática e exploraram o fato de que a polêmica vende. A American Apparel, com sede em Los Angeles, começou a exibir anúncios ousados com modelos jovens em poses provocantes e alcançou seu objetivo de gerar polêmica. Desde 2005, a empresa foi acusada de promover a pornografia e até incentivar estupros. Mesmo com as acusações, a empresa tem se saído melhor do que nunca, com 151 lojas em 11 países diferentes e vendas estimadas em trezentos milhões de dólares em 2006. Lindstrom (2009) e sua equipe investigaram cientificamente a reação de consumidores as mensagens sexuais. Para o autor (2009) os neurônios-espelho permitem aos consumidores pensarem que, assim como os modelos, são igualmente atraentes. Lindstrom (2009, p.164) afirma que: só de observar uma modelo deslumbrante usando uma roupa de baixo rendada em um catálogo da Victoria’s Secret, a maioria das mulheres consegue imaginar a sensação daquela roupa sobre sua pele – e se sente tão sensual e sedutora quanto a mulher no anúncio. Para o autor (2009), o sexo inserido na publicidade tem tudo a ver com a satisfação de um desejo e com a introdução de desejos no cérebro dos indivíduos. Por esse motivo, Lindstrom (2009) acredita que a utilização de mensagens sexuais e elementos eróticos aumentarão em todo o mundo. A fácil e intensa exibição de imagens de sexo a que os indivíduos estão expostos resultará no aumento da utilização por parte das empresas. com mensagens cada vez mais presentes. Por outro lado, o autor (2009) argumenta que a super exposição causará, no futuro, a falta de atenção para essas mensagens, e por esse motivo o sexo se tornará mais oculto e mais sutil. 90 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao fim desta pesquisa, é possível considerar que o trabalho alcançou o objetivo de compreender e analisar a contribuição do neuromarketing para a administração de marketing e branding. No segundo capítulo esta pesquisa bibliográfica abordou a evolução dos conceitos de marketing e de branding para identificar e analisar as principais definições e elementos das duas disciplinas. Nas últimas décadas, o marketing evoluiu, acompanhando as mudanças na economia, nas tecnologias e no comportamento dos indivíduos. Essa constante adaptação do conceito, alcançou o estágio de valorização dos clientes, além do simples papel de consumidores para seres humanos com mente, coração e espírito. A atuação de marketing deixou de ter o foco em produto, passou a ter o foco em clientes e recentemente incorporou a gestão de marcas. As empresas passaram a valorizar e a buscar o relacionamento emocional com os seus públicos. Nesse capítulo foi possível analisar o atual contexto das disciplinas e perceber que o marketing e que o branding estão valorizando e buscando identificar as reais necessidades e desejos dos consumidores para estabelecerem relacionamentos emocionais com seus clientes. No terceiro capítulo foram apresentados os principais elementos da neurociência, sua evolução, definição e pesquisadores. No levantamento foi identificada a necessidade de abordar e explicar os principais objetos de estudo da neurociência: o sistema nervoso, o cérebro e os neurônios. Esse capítulo permitiu conhecer e compreender o funcionamento e os principais componentes da neurociência. Entende-se que esse conteúdo é pré-requisito e essencial para a compreensão do neuromarketing, pois foi através de seus elementos e de suas técnicas que o neuromarketing evoluiu nos últimos anos. Na primeira parte do quarto capítulo foi abordado o neuromarketing, sua evolução e suas definições. Na segunda parte do capítulo, elementos foram apresentados para reforçar o neuromarketing como disciplina prática, com uso de equipamentos tecnológicos que rastreiam as atividades cerebrais, parâmetros neurométricos que medem o desempenho de ações de marketing, o processo de relacionamento entre consumidores e marcas, casos e estudos realizados com essa 91 metodologia. Esse capítulo proporcionou conhecimento sobre a origem, os principais conceitos e funcionamento do neuromarketing. O aprendizado adquirido ao longo desta pesquisa bibliográfica permite afirmar que o neuromarketing é uma metodologia eficaz em seu propósito de medir as reações de consumidores aos estímulos de marketing. As tradicionais metodologias de pesquisa, tanto qualitativa, quanto quantitativa, apresentam limitações para explicar com precisão e detalhar o comportamento dos consumidores. Acredita-se que essa situação é resultado da dificuldade de os próprios indivíduos explicarem seus comportamentos, devido aos processos subconscientes e inconscientes que são vislumbrados na neurociência. O neuromarketing, por sua vez, busca preencher esse espaço deixado pelas pesquisas tradicionais. Sua aplicação é feita com tecnologia e aparelhos consagrados na área da neurociência, que permitem avaliar o real comportamento dos indivíduos, identificando até mesmo as reações na parte subsconsciente do cérebro. O estudo dessa área proporcionará grandes benefícios ao marketing e ao branding, como o melhor entendimento do comportamento do consumidor, a lógica de consumo e a compreensão dos aspectos emocionais e subconscientes relacionados ao comportamento e à tomada de decisão dos indivíduos. Portanto, o neuromarketing contribui com descobertas sobre os reais efeitos de ações de marketing. Com essa nova metodologia é possível entender os motivos de compra e quais áreas do cérebro são ativadas quando o consumidor está em contato com os estímulos de marcas e de produtos. Esse estudo é mais preciso e confiável, pois com as reações cerebrais as empresas podem diagnosticar o verdadeiro comportamento e interação dos consumidores com suas marcas. Com a competição acirrada em muitos mercados e produtos semelhantes, as empresas, que pretendem obter vantagem competitiva em seus mercados e que desejam alcançar melhor desempenho em suas atividades de marketing, precisam adotar iniciativas inovadoras e acredita-se que o neuromarketing é uma estratégia decisiva para conquistar esses objetivos. As empresas podem encontrar nessa nova metodologia uma importante estratégia para compreender e explorar as necessidades e os desejos de seus públicos. Com esses resultados, este trabalho de conclusão torna-se relevante aos acadêmicos e profissionais de marketing interessados em conhecer essa disciplina. 92 Por ser uma metodologia recente, o estudo dessa área deve ter continuidade e ser mais explorado. O tema ainda é pouco debatido nas universidades e empresas. Espera-se que essa pesquisa bibliográfica inspire novos trabalhos na área. Desenvolver este trabalho foi de extrema satisfação, principalmente, por acreditar, que a meta pessoal de identificar fatores essenciais e decisivos para o desempenho de organizações, foi atingida. Por fim, acredita-se que aplicando essa nova metodologia, as empresas podem obter melhores resultados em suas atividades de marketing e branding. 93 REFERÊNCIAS AAKER, David A. Como construir marcas líderes. São Paulo: Futura, 2000. AAKER, David A. Criando e administrando marcas de sucesso. São Paulo: Futura, 1996. AUGUSTINE, George J. Neurociências. Porto Alegre: Artmed, 2010. 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