NeuroAtual, volume 2, número 1, 2006
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NeuroAtual, volume 2, número 1, 2006
2 NeuroAtual, volume 2, número 1, 2006 NEUROLOGIA GERAL Aneurysmal subarachnoid hemorrhage. Suarez JI et al. N Engl J Med 354: 387, 2006. A hemorragia subaracnóide não traumática é uma emergência neurológica caracterizada por extravasamento de sangue no espaço subaracnóide. Em aproximadamente 80% dos casos é resultante da ruptura de aneurisma intracraniano, estando associada a altas taxas de letalidade e de complicações. A hemorragia subaracnóide não aneurismática, incluindo a hemorragia perimesencefálica isolada, ocorre em 20% dos casos e apresenta bom prognóstico, com complicações neurológicas infreqüentes. O presente artigo enfoca especificamente a hemorragia subaracnóide aneurismática. Cerca de 46% dos sobreviventes de hemorragia subaracnóide pode ter comprometimento cognitivo duradouro com conseqüências na capacidade funcional e na qualidade de vida. A incidência global é de 10,5 casos por 100.000 habitantes/ano, aumentando com a idade (idade média de 55 anos). O risco da mulher é 1,6 vezes o do homem e dos afrodescendentes de 2,1 vezes o dos brancos. A taxa de letalidade média é de 51% e aproximadamente um terço dos sobreviventes necessitam de cuidados pelo resto da vida. A maioria dos óbitos ocorre no período de 2 semanas após o evento, sendo 10% antes do atendimento médico e 25% nas primeiras 24 horas. No cômputo geral, a hemorragia subaracnóide é responsável por 5% dos óbitos por acidente cerebrovascular. Os principais fatores associados a mau prognóstico são: nível de consciência à admissão, idade e o volume de sangue perceptível na tomografia computadorizada inicial. Os principais fatores de risco modificáveis são: tabagismo, hipertensão arterial, uso de cocaína e etilismo pesado. Outros fatores de risco são: antecedentes familiares de hemorragia, doenças hereditárias do tecido conjuntivo associadas com a presença de aneurisma e hemorragia, incluindo rim policístico, síndrome de Ehlres-Danlos (tipo IV), pseudoxantoma elástico e displasia fibromuscular. O risco de ruptura depende da dimensão e da localização do aneurisma. De acordo com um estudo internacional de aneurismas intracranianos íntegros, a taxa cumulativa em 5 anos de ruptura de aneurismas localizados na a. carótida interna, a. comunicante anterior, a. cerebral anterior ou a. cerebral média é zero para aneurismas menores que 7mm, 2,6% para 7 a 12 mm, 14,5% para 13 a 24mm e 40% para 25mm ou mais. Em contraposição, a taxa é de 2,5%, 14,5%, 18,5% e 50%, respectivamente, para aneurismas de mesma dimensão na circulação posterior e a. comunicante posterior. O diagnóstico deve ser suspeitado nos pacientes apresentando quadro típico: cefaléia intensa (a pior dor já sentida), de início abrupto, náusea, vômitos, rigidez de nuca, fotofobia e perda da consciência. O exame físico pode revelar hemorragia retiniana, meningismo, rebaixamento do nível de consciência e sinais localizatórios. Este último achado pode incluir: III nervo craniano (aneurisma da comunicante posterior), VI nervo craniano (hipertensão intracraniana), fraqueza de ambos os membros inferiores ou abulia (aneurisma da comunicante anterior) e a combinação de hemiparesia e afasia ou negligência vísio-espacial (aneurisma da cerebral média). Na ausência dos sinais e sintomas clássicos, o aneurisma pode ter diagnósticos errôneos, ocorrendo em cerca de 50% dos casos. Os diagnósticos incorretos mais comuns são enxaqueca e cefaléia tensional. A não realização de exames de imagem é responsável por 73% dos erros e a interpretação errada ou a não realização do LCR por 23%. 3 A tomografia computadorizada (TC) deve ser o primeiro exame nos casos suspeitos. A achado característico é a presença de extravasamento de sangue, que é visível como área de hiperdensidade. Para evitar que sangramentos pequenos passem desapercebidos, recomenda-se a realização da TC com cortes finos pois a boa qualidade revela a hemorragia subaracnóide em 100% dos casos dentro de 12 horas do início dos sintomas e em mais de 93% nas primeiras 24 horas. Por causa da rápida absorção do sangue, um exame tardio pode ser normal e a sensibilidade cair para 50% no 7º dia. O LCR revela elevação da pressão, persistência do aspecto hemorrágico em 4 tubos diferentes, presença de hemáceas e xantocromia; esta última pode surgir somente após 12 horas. A angiografia digital por subtração é considerada exame de padrão ouro para identificação de aneurisma. Contudo, a angioTC tem se tornado cada vez mais popular por seu caráter não invasivo e níveis de sensibilidade e de especificidade comparáveis aos da angiografia. Além dos cuidados gerais, há duas opções terapêuticas específicas: a clipagem neurocirúrgica e a intervenção endovascular. The International Subarachnoid Aneurysm Trial comparando ambos métodos, concluiu que a intervenção endovascular propiciou evolução mais favorável que a clipagem. Adicionalmente, o risco de epilepsia foi substancialmente menor. Entretanto, o risco de ressangramento foi maior do que a clipagem, em que a oclusão completa do aneurisma foi mais frequente. Mas, independentemente do tipo de intervenção escolhido, a maioria dos cirurgiões neurovasculares recomenda sua realização precocemente, pois reduz o risco de ressangramento. No algoritmo, os autores sugerem a realização nas primeiras 72 horas. As complicações neurológicas mais freqüentes são: vasoespasmo sintomático (46%), hidrocefalia (20%) e ressangramento (7%). Mais de 50% dos sobreviventes referem distúrbios da memória, do humor ou da função neuropsicológica. A metade ou dois terços dos sobreviventes são capazes de reassumir seu trabalho um ano após a hemorragia. Nota: Os autores apresentam um excelente algoritmo prático para diagnóstico e tratamento de hemorragia subaracnóide por ruptura de aneurisma intracraniano, além de um guia terapêutico detalhando cuidados gerais, uso de anticonvulsivantes de forma preventiva ou quando do surgimento de crises, manejo das complicações sistêmicas e neurológicas e medidas de reabilitação. Adverse effects of antiepileptic drugs. Perucca E et al. Acta Neurol Scand 112 (suppl 181): 30, 2005. As reações adversas de drogas antiepilépticas (DAE) são muito freqüentes, acometendo 61% dos pacientes recebendo DAE convencionais, tais como fenitoína, carbamazepina, valproato ou fenobarbital. Podem comprometer o esquema terapêutico inicial e prejudicar intensamente a qualidade de vida dos pacientes. As reações adversas dependem do tipo de medicamento e a decisão sobre o perfil de reação adversa não é simples, pois os dados diferem de acordo com os métodos de avaliação, mesmo de ensaios clínicos cuidadosamente conduzidos (relato espontâneo dos pacientes, chechlist, teste de função cognitiva, etc.). As reações adversas podem ser classificadas de diferentes formas. Os autores dividem, nesta revisão, em agudas (tipo A), em idiossincráticas (tipo B) e em crônicas ou de natureza tardia (tipo C). Os autores discutem também efeitos na prole e os carcinogênicos, assim como as reações adversas resultantes de interação medicamentosa. As reações agudas relacionadas com o mecanismo de ação das DAE, do tipo A, são comuns e geralmente previsíveis. As reações envolvendo o SNC são freqüentemente 4 relacionadas com a maioria das DAE: sonolência, tontura, fadiga, ataxia e déficit cognitivo. Todas as DAE podem prejudicar a função cognitiva e o risco é maior com politerapia, doses elevadas e níveis plasmáticos altos. Os estudos avaliando as novas DAE, como gabapentina, lamotrigina e levetiracetam, têm mostrado praticamente nenhum impacto na cognição e no comportamento, embora haja alguns trabalhos evidenciando maior prejuízo cognitivo com topiramato quando comparado a valproato e a gabapentina. As reações do tipo B, idiossincráticas, são aquelas que aparentemente não são relacionadas aos mecanismos de ação da DAE e podem resultar da sensibilidade individual do paciente, por processos imunológicos, genéticos ou outros. Podem ser triviais (dermatite alérgica) mas, eventualmente, envolvem alto risco, como a síndrome de Steven-Johnson, hepatotoxicidade fuminante e anemia aplástica. Embora muito menos freqüentes que as reações do tipo A, são altamente preocupantes, pois são totalmente imprevisíveis e por vezes de difícil resolução. Costumam surgir nas primeiras semanas, mas podem aparecer tardiamente, após meses de tratamento. Não raramente, reações do tipo B podem ser identificadas apenas anos após sua introdução no comércio. Por exemplo, a hepatotoxicidade do valproato foi detectada 10 anos após sua introdução no mercado. As reações adversas crônicas, do tipo C, são aquelas que são plenamente perceptíveis após um período prolongado de exposição, variando de alguns meses a vários anos. Algumas têm seu mecanismo desconhecido, como a hiperplasia gengival da fenitoína e a síndrome ombro-mão induzida pelo fenobarbital. Em outros casos, as reações surgem gradualmente por mecanismos bioquímicos ou metabólicos. Neste grupo estão as reações de osteomalácia por estímulo do catabolismo de vitamina D e os distúrbios endócrinos e reprodutivos em pacientes recebendo uma variedade de DAE. Uma reação crônica importante de algumas DAE é a alteração do peso corporal. Topiramato, felbamato e zonisamida podem causar perda de peso, enquanto valproato, pregabalina, gabapentina, vigabatrina e carbamazepina podem provocar ganho de peso. Além das implicações cosméticas, essas reações podem prejudicar a aderência ao tratamento ou, até mesmo, motivar sua interrupção. O ganho de peso pode ter sérias conseqüências à saúde pelo maior risco de diabete mellitus ou doença cardíaca e, no caso do valproato, alterações endócrinas levando à síndrome de ovário policístico. As reações na prole são aquelas causadas por exposição pré-natal. Incluem morte fetal, malformações congênitas, dismorfismos e comprometimento cognitivo ou do desenvolvimento do filho. Os efeitos teratogênicos de DAE são preocupantes no tratamento de mulheres férteis. Os dados atuais sugerem que as DAE mais antigas, se administradas durante o primeiro trimestre da gravidez, são associadas com um aumento de risco de malformação em duas a três vezes; a magnitude do risco aumenta com politerapia e pode estar também relacionada com a dose do medicamento. A maioria dos estudos sugere que o risco teratogênico é maior com valproato do que com outras DAE. Não é sabido se as novas DAE são mais seguras que as mais antigas. A única que conta com dados mais consistentes é a lamotrigina cujo risco de malformações congênitas é similar ao registrado com a carbamazepina. Há também evidências de que algumas DAE podem afetar o desenvolvimento intelectual pós-natal da prole. Vários estudos recentes têm avaliado particularmente o valproato como possível causa de comprometimento neuropsicológico, especialmente QI verbal, em crianças expostas durante o período prénatal. A fenitoína e o fenobarbital têm sido inequivocamente associados à carcinogênese em animais experimentais. Entretanto, esta associação não está claramente demonstrada no ser humano. 5 A interação de DAE é causa importante de reações adversas (6%), especialmente com DAE mais antigas. Carbamazepina, fenitoína, fenobarbital e primidona apresentam alto risco de produzir interação medicamentosa pois são indutores de várias isoformas do citocromo P450. A indução dessas enzimas pode diminuir a concentração plasmática e, portanto, a eficácia de muitas drogas psicotrópicas, imunosupressoras, antineoplásicas, antimicrobianas e cardiovasculares. A interação com drogas anticoncepcionais são também fonte de preocupação. Carbamazepina, fenitoína, fenobarbital, oxcarbazepina, felbamato e topiramato (em doses superiores a 200mg/d) elevam o clearance dos anticoncepcionais, podendo reduzir sua eficácia e aumentando o risco de gravidez indesejada. A lamotrigina exibe uma interação mútua: de um lado aumenta moderadamente o clearance de levonorgestrel; de outro, os anticoncepcionais elevam o clearance de lamotrigina, o que pode levar à perda da eficácia antiepiléptica. A nova geração de DAE, tais como levetiracetam, gabapentina, tiagabina, pregabalina e zonisamida, parece não interagir com os anticoncepcionais. As DAE com menor risco de interação são aquelas que não são metabolizadas significativamente por enzimas hepáticas: levetiracetam, gabapentina e pregabalina. A freqüência de reações adversas depende de vários fatores. Por exemplo, crianças e idosos são mais susceptíveis e requerem maior cuidado. Os idosos apresentam freqüentemente comorbidades necessitando tratamento concomitante, aumentando o risco de interações, afetando a eficácia e aderência à terapia antiepiléptica. O comprometimento cognitivo pode ser exacerbado naqueles com déficit previamente existente relacionado à idade. As DAE mais modernas são melhor toleradas pelos idosos pelo menor risco de interações. Binocular diplopia. A practical approach. Rucker JC et al. The Neurologist 11: 98, 2005. É um artigo de revisão sobre uma das queixas mais freqüentemente encontradas na clínica: a diplopia. A anamnese fornece detalhes que podem, por si só, auxiliar na suspeita da etiologia. É importante o questionamento se a diplopia é horizontal, vertical ou oblíqua; se é pior numa determinada direção da mirada e se é pior na visão de objetos próximos ou distantes. A diplopia que piora numa determinada direção do olhar sugere que a motilidade ocular naquela direção esteja comprometida. A diplopia que piora à visão distante habitualmente é associada ao comprometimento da abdução ou divergência dos olhos e a diplopia para perto ao comprometimento da adução ou convergência. Uma boa anamnese permite localizar o processo em poucos minutos. Por exemplo, se o paciente descrever diplopia horizontal, que é pior à mirada para o lado direito e à visão distante, o quadro é altamente sugestivo de comprometimento da abdução do olho direito. Questionamentos sobre o modo de instalação, se persistente ou intermitente e, neste caso, a freqüência e duração, podem facilitar o diagnóstico. A diplopia que piora com a fadiga ou com a luminosidade pode sugerir doença da junção neuromuscular, enquanto que a piora matinal pode sugerir localização muscular extraocular. Esta queixa é particularmente evidente da doença ocular tireiodeana e o provável mecanismo é a congestão venosa nos músculos extraoculares quando o paciente está em posição supina. Deve-se questionar sobre presença ou ausência de dor. Se presente, sugere uma causa inflamatória ou isquêmica. Deve-se questionar sobre eventual fraqueza da musculatura proximal dos membros, dispnéia e disfagia, pois esses sintomas sugerem doença da junção neuromuscular. 6 Alterações da face, deterioração da visão monocular, protrusão do olho ou edema facial sugerem uma doença na órbita. No exame neurológico, deve-se lembrar que são 6 os músculos extraoculares que controlam os movimentos de cada olho e que devem ser testadas 9 posições diagnósticas: 1- posição de repouso; 2- para cima; 3- para baixo; 4- para direita; 5- para esquerda; 6para cima e para direita; 7- para baixo e para direita; 8- para cima e para esquerda e 9- para baixo e para esquerda. A seguir, deve-se examinar o alinhamento ocular. Ocasionalmente, embora o paciente refira diplopia, o exame da motilidade ocular acima descrito é aparentemente normal. Isto ocorre nos casos de desvios oculares muito leves ou desalinhamentos congênitos. Nessa situação, deve-se efetuar o teste da luz refletida na córnea (teste de Hirschberg). É particularmente útil nos pacientes com comprometimento cognitivo e naqueles incapazes de cooperar. No caso de desalinhamento, a incidência da luz no centro da pupila de um olho é refletida na córnea com um desvio cuja direção é oposta à do desvio ocular. O teste de cobrir alternadamente os olhos pode também auxiliar na detecção de foria. Os autores discutem, a seguir, detalhes do comprometimento de cada um dos nervos oculomotores e as síndromes clínicas associadas, incluindo testes da junção neuromuscular e exames complementares sugeridos. Debatem diferentes tipos de tratamento, incluindo oclusão (tampão ocular), uso de prismas, de toxina botulínica, exercícios musculares (ortóptica) e correções cirúrgicas. Chronic insomnia. Silber MH. N Engl J Med 353: 803, 2005. A insônia é definida como dificuldade em iniciar, em manter, na duração ou na qualidade do sono com prejuízo na função diurna, apesar da haver condições adequadas para o ato de dormir. A maioria dos estudos adota a definição arbitrária de demora de mais que 30 minutos para o início do sono. Entretanto, na prática clínica, o julgamento subjetivo do próprio paciente sobre o grau e a qualidade do sono é mais relevante. A insônia crônica, isto é, maior que um mês, tem uma prevalência de 10 a 15%, ocorrendo mais freqüentemente nas mulheres, em adultos mais velhos e pacientes com doenças psiquiátricas ou problemas crônicos de saúde. A anamnese cuidadosa obtida com o paciente e com seu parceiro de leito permite habitualmente uma categorização precisa das causas de insônia. A polissonografia é raramente necessária, exceto se houver forte suspeita de apnéia do sono ou no insucesso terapêutico. A insônia pode ser classificada em primária, cujo mecanismo é desconhecido, e secundária. Esta é mais freqüente que a primária, tendo como causas: stress, hábitos de higiene para o sono inadequados, associada a doenças psiquiátricas, condição médica (dor crônica, tosse e/ou dispnéia noturnas), consumo ou interrupção de drogas (drogas ilícitas, álcool, cafeína). A terapia comportamental cognitiva compreende um conjunto de medidas que auxiliam na melhora da insônia, independente de sua causa, e que são: 1- terapia de controle de estímulo - Vá para a cama apenas quando sonolento - Use o quarto apenas para dormir e para sexo - Vá para outro cômodo se não conseguir dormir em 15 a 20 minutos, leia ou pratique algo tranqüilo e retorne ao leito apenas quando sonolento; repita, caso necessário - Adote um horário regular para despertar, independentemente da duração do sono 7 - Evite dormir durante o dia 2- terapia de restrição do sono - Reduza o tempo de permanência na cama para estimar o tempo total de sono (mínimo de 5 horas) - Aumente o tempo de permanência na cama em 15 minutos semanalmente quando a eficiência estimada do sono (taxa de tempo dormido em relação ao tempo de permanência na cama) for de pelo menos 90% 3- terapia de relaxamento - componente físico: relaxamento muscular progressivo, bio-feedback - componente mental: treinamento mental, meditação, hipnose 4- terapia cognitiva - educação para alterar crenças e atitudes errôneas sobre o sono, tal como a idéia de que são necessárias 8 horas de sono para a saúde 5- educação na higiene para o sono - corrija fatores extrínsecos afetando o sono, tais como interrupção ambiental (animais de estimação ou cônjuge que ronca), temperatura do quarto, fixação no despertador, etilismo, tabagismo, ou ingestão de cafeína, sedentarismo ou prática de exercícios muito próximos da hora de dormir O tratamento medicamentoso inclui benzodiazepínicos (temazepan, estazolan, triazolan) agonistas do receptor de benzodiazepínicos (eszopiclone, zolpiden, zaleplon) e agonista do receptor de melatonina (ramelteon), todos aprovados pelo FDA americano para insônia. Vários estudos randomizados e controlados têm comparado a terapia comportamental cognitiva com a medicamentosa e o tratamento combinado. Uma meta-análise comparando a terapia comportamental cognitiva com os hipnóticos mostrou desfecho similar a curto prazo, exceto que a terapia comportamental reduziu a latência do sono. Vários estudos compararam a combinação dos dois tipos de tratamento com a terapia comportamental isolada. Todos eles mostraram que, com 10 a 24 meses de seguimento, a melhora persistiu com a terapia comportamental isolada, mas não com a combinação. A explicação mais plausível é que os que receberam tratamento medicamentoso adotaram menos intensamente a prática da terapia comportamental, pois a insônia pôde ser controlada com o uso de medicamentos. O autor recomenda um período inicial de terapia comportamental cognitiva; esta não deve ser combinada com o uso de hipnóticos pois reduziria o benefício a longo prazo da primeira. No tratamento medicamentoso, o autor recomenda zolpiden ou zalepron na insônia associada ao início do sono; benzodiazepínicos de ação intermediária, como temazepan ou eszopiclone, naquela associada à manutenção do sono. O zaleplon pode também ser administrado no despertar na parte tardia da noite. O uso dos benzodiazepínicos de longa ação na insônia é, na opinião do autor, questionável, a menos que coexista ansiedade importante. Nota: a lista de medicamentos apresentada pelo autor é restrita àqueles aprovados pelo FDA americano para insônia; no Brasil, temos outras opções. Experiencing and detecting happiness in humans: the role of the supplementary motor area. Krolak-Salmon P et al. Ann Neurol 59: 196, 2006. A gargalhada é um importante comportamento social e sua base neural é pouco conhecida. A dificuldade em esclarecê-la é reforçada pela impossibilidade de investigá-la em animais 8 de experimentação. Da mesma forma, o reconhecimento e a compreensão de emoções de outras pessoas devem envolver estruturas neurais implicadas tanto na percepção quanto na ação. As técnicas eletrofisiológicas com eletrodos profundos oferecem uma rara oportunidade de analisar as estruturas neurais associadas no processamento de emoções. Os autores relatam um caso muito interessante de obtenção de sorriso e de gargalhada com estímulo elétrico na área pré-motora associativa do lado E. Esta paciente tinha sido submetida a implante de eletrodos profundos nos lobos frontal e temporal do lado esquerdo, incluindo a área motora suplementar, para investigação da área epileptogênica de epilepsia refratária. O estímulo mínimo para desencadear o fenômeno da gargalhada foi de 0,6mA, a 50Hz, por 1 segundo. Nessa condição, a paciente sorria e, a seguir, passava a gargalhar. Ela relatou posteriormente que surgia um sentimento de felicidade e de alegria, além de uma sensação hilariante como se estivesse assistindo a um filme de “O gordo e o magro”. Em contrapartida, um estímulo de 0,8mA provocou um sorriso inicial, seguido de gargalhada, um gemido e uma distonia com mioclonias do braço direito. Dois minutos após o estímulo, ela chorou, sentiu-se triste e manteve voz afetada por 15 minutos. Questionada, ela relatou ter sido incapaz de evitar o sorriso e o choro. O estímulo de áreas frontais vizinhas provocou apenas o impedimento da fala e a presença de movimentos anormais na face e no membro. Portanto, este fenômeno comportamental pareceu ser restrito à estimulação da área pré-motora suplementar do lado esquerdo. Posteriormente, os autores submeteram a mesma paciente ao potencial evocado visual como parte do mapeamento funcional antes da cirurgia de epilepsia. Os estímulos visuais consistiram em mostrar-lhe 40 figuras humanas cujas imagens faciais expressavam emoção (4 homens e 4 mulheres expressando 5 tipos diferentes de emoção: medo, felicidade, repugnância, surpresa e neutro). A resposta à visão de figuras expressando felicidade foi especificamente registrada na área pré-motora suplementar, diferindo de todas as demais imagens de emoção. Constataram, adicionalmente, que a reação à visão de faces felizes era muito rápida, demorando apenas 150 milisegundos, na mesma área que provocou gargalhada quando estimulada eletricamente. Is mood chemistry? Castrén E. Nature, 6: 241, 2005. Os primeiros antidepressivos, iproniazida e imipramina, foram descobertos acidentalmente há quase 50 anos, quando se percebeu que drogas desenvolvidas para outras doenças melhoravam o humor de pacientes psiquiátricos, revolucionando o tratamento de doenças do humor. Descobriu-se que essas drogas elevavam a concentração extracelular de dois importantes neurotransmissores no cérebro: serotonina e noradrenalina, bloqueando a recaptação ou inibindo a principal enzima metabolizante, a monoamina oxidase. Essas drogas elevariam a concentração extracelular dessas substâncias. Tais achados embasaram a hipótese monoaminérgica da depressão, que propôs que as doenças do humor seriam causadas pela deficiência de serotonina ou de noradrenalina nos receptores funcionalmente importantes no cérebro e a idéia de um desequilíbrio químico no cérebro foi amplamente aceita entre os cientistas, clínicos e o público em geral. Esta hipótese foi enfocada também pelas indústrias, promovendo o desenvolvimento de antidepressivos mais modernos que inibissem a recaptação de serotonina ou noradrenalina e de outros que atuassem sobre a monoamina oxigenase. Percebeu-se, no entanto, que a hipótese monoaminérgica não poderia explicar todos os efeitos dos antidepressivos. A redução de triptofano na dieta alimentar, que reduz 9 significativamente a concentração de serotonina no cérebro, não promove qualquer benefício do humor nos pacientes com depressão. Além disso, a melhora da depressão ocorre tipicamente após um intervalo de algumas semanas de tratamento continuado, e não de imediato. Estudos recentes propiciaram o surgimento de uma hipótese alternativa da depressão: a de rede neural ou circuitária (network hypothesis). Propõe que a depressão resultaria de dificuldades na comunicação neuronal e que os antidepressivos melhorariam o processo de informação na circuitaria neural afetada. O aspecto chave desta visão é o reconhecimento de que o principal papel do sistema nervoso está no armazenamento e processamento de informações e não propriamente no manejo ou controle de substâncias químicas. Arvid Carlsson (prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina de 2000), um dos principais defensores do conceito de neurotransmissão química no cérebro, afirmou em seu discurso ao receber o prêmio Nobel: “However, it must be recognized that the brain is not a chemical factory but an extremely complicated survival machine”. Embora os neurotransmissores químicos sejam cruciais na transferência de informações entre neurônios, a informação no cérebro não é armazenada sob a forma química, mas sim processada por interações complexas de neurônios em circuitos neurais. O desenvolvimento dessas redes ocorreria através de interações com o meio ambiente e sua estrutura neuronal e a neurotransmissão são constantemente refinadas pela plasticidade sináptica dependente de atividade para otimizar o processamento e armazenamento de informações relevantes. Assim, as doenças do sistema nervoso, incluindo a depressão, poderiam representar distúrbios no processamento de informações do cérebro, mais do que um desequilíbrio químico de moléculas. Deve-se ressaltar que as hipóteses química e circuitária não são mutuamente excludentes, mas complementares. Assim como a síntese e liberação de diversas moléculas são reguladas pela atividade neuronal, as alterações na atividade circuitária neural produzem modificações na concentração dessas moléculas. Daí, embora o efeito inicial dos antidepressivos seja químico e, na maioria dos casos, dirigido ao metabolismo das monoaminas, as alterações subseqüentes adaptativas nas concentrações dessas moléculas são intimamente relacionadas com a estrutura dos circuitos neurais e poderiam ser uma conseqüência do processo de informação alterada do que propriamente sua causa. De acordo com essa visão, os antidepressivos iniciam um processo de “auto-reparação”, pelo qual cooperam indivisivelmente a plasticidade na rede neural e a neurotransmissão química, acarretando melhora gradual do humor. As evidências a favor da hipótese circuitária da depressão e da ação dos antidepressivos são limitadas e, mormente, indiretas. Talvez a mais importante seja a recente observação de que os antidepressivos aumentam a produção de novos neurônios no hipocampo de roedores. Essa neurogênese resultante do uso crônico de antidepressivos está relacionada com efeitos comportamentais e os novos neurônios se diferenciam com o tempo e estão suficientemente maduros para participar no processo de informação apenas várias semanas após sua formação. Logicamente, esse processo levaria certo tempo para se desenvolver e amadurecer, pois envolveria, além da neurogênese, a eliminação neural seletiva, arborização e retração de axônios e dentritos e formação sináptica. Este fato é plenamente congruente com o início tardio do benefício observado na prática clínica com os medicamentos antidepressivos. Durante o processo de desenvolvimento e, nos adultos, o treinamento e a reabilitação produzem alterações funcionais e anatômicas na rede neural. Analogamente, a psicoterapia, a terapia comportamental cognitiva e outras formas de reabilitação psicológica podem também produzir efeitos terapêuticos nas doenças do humor através da plasticidade neuronal. Portanto, os tratamentos psicológicos e farmacológicos, 10 eletrochoque e efeito placebo podem acarretar melhor processamento de informações e recuperação humoral através de mecanismos que iniciam processos similares de plasticidade. Nesse cenário, a combinação de tratamento medicamentoso com reabilitação psicológica seria mais benéfica que qualquer um isoladamente e há evidências nesse sentido. Em síntese, a visão das doenças do humor e do papel desempenhado pelos antidepressivos está começando a mudar, da hipótese química para a perspectiva de rede neural em que o processamento de informações e a conectividade neuronal no cérebro seriam os pontos centrais. Nota: Arvid Carlsson recebeu o prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina de 2000 e seu discurso (Nobel Lecture), citado no artigo, está disponível na íntegra em http://nobelprize.org/medicine/laureates /2000carlsson-lecture.pdf (acessado em 25 de Janeiro de 2006) Low-grade gliomas: an update on pathology and therapy. Cavaliere R et al. Lancet Neurol 4: 460, 2005. Os gliomas de baixo grau (GBG) não são neoplasias benignas. Incluem os astrocitomas, oligodendrogliomas e oligoastrocitomas e são menos comuns que os gliomas de alto grau. Envolvem mais frequentemente os hemisférios cerebrais e são localizados tipicamente nos lobos frontal, parietal e temporal. Nos adultos, GBG raramente compromete o cerebelo, o tronco encefálico ou a medula espinhal. Crises epilépticas são as manifestações clínicas inaugurais em mais de 80% dos pacientes. Podem ser encontrados também: cefaléia, sinais localizatórios e comprometimento mental. A tomografia computadorizada revela lesão iso ou hipodensa. Sinais de hemorragia ou de calcificação são mais comuns nos tumores oligodendrogliais. Na aquisição T2 da ressonância magnética, os GBG são hiperintensos e podem ser difusos, com limites imprecisos, ou focais, com bordos bem delimitados. O epicentro do astrocitoma está tipicamente dentro da substância branca enquanto os oligodendrogliomas podem ser mais superficiais, empurrando o giro envolvido. As lesões expandem pela substância branca, comumente através do corpo caloso, passando para o hemisfério oposto. Raramente, tumores de maior dimensão envolvem 3 ou mais lobos cerebrais (gliomatose cerebral). As lesões apresentam reforço ao contraste em 15% a 39%, tipicamente de forma heterogênea podendo, raramente, ser do tipo anelar ou nodular. Os GBG são hipometabólicos na PET, uma característica que freqüentemente permite a distinção com os de alto grau. A espectroscopia-RM revela um pico dominante de colina e níveis não quantificáveis de lipídeos ou de lactato (sugerindo ausência de necrose, uma característica dos gliomas de alto grau). Embora sejam mais indolentes que os de alto grau, são associados com incapacidade neurológica e podem ser fatais. Metástases extraneurais são raras, mas células neoplásticas podem infiltrar o parênquima cerebral circunjacente. Células tumorais adquirem modificações genéticas que resultam em transformação anaplástica para padrão de alto grau e 50% a 70% das lesões apresentam esta característica por ocasião da progressão tumoral. Entre os fatores clínicos, a idade superior a 40 anos é fator preditivo de pior prognóstico. Pacientes que apresentam crises epilépticas isoladas, sem outras anormalidades neurológicas, têm melhor prognóstico. A mediana de sobrevida dos pacientes com oligodendroglioma é de 10 anos, um prognóstico melhor que com astrocitomas, cuja mediana é de 7 anos. Os astrocitomas gemistocíticos, um subtipo de grau II dos astrocitomas, são mais agressivos do que o esperado pelo grau. Tumores de 11 grande dimensão, gliomas não lobares e os que cruzam a linha média são associados a menor sobrevida e a elevada freqüência de transformação maligna. Alguns estudos, mas não todos, apontam que a presença de reforço na fase contrastada é associada a pior prognostico. A cirurgia é fundamental tanto para o diagnóstico como para o tratamento. Embora a presença de uma massa que não capte contraste nos exames de neuroimagem sugira GBG, cerca de 30% são de alto grau, particularmente em pacientes mais idosos. O diagnóstico requer pelo menos a realização de biópsia estereotáxica, pois é menos invasiva que a craniotomia e abrevia o período de hospitalização. Contudo, a biópsia fornece apenas uma amostra de uma lesão potencialmente heterogênea e pode ser insuficiente para testes moleculares e genéticos complementares. Alternativamente, a cirurgia citoredutiva permite rápida descompressão de lesões maiores com efeito de massa. O efeito da cirurgia sobre a sobrevida e sobre a isenção de progressão é incerto. A natureza infiltrativa dos GBG significa que não são curáveis cirurgicamente. Embora a radioterapia seja considerada parte importante do tratamento dos GBG, sua eficácia tem sido motivo de debate pelos dados conflitantes dos estudos retrospectivos. Na prática, a maioria dos pacientes recebe radioterapia de campos parciais (e não de todo o cérebro), dirigida ao tumor, com uma pequena margem circundante; isto reduz a toxicidade do tratamento sem comprometer o prognóstico. A encefalopatia por radiação, uma síndrome neurocomportamental similar a hidrocefalia de pressão normal, é uma reação tardia, surgindo meses ou anos após o término da radioterapia. O quadro é caracterizado por alterações do comportamento, distúrbios da marcha e do equilíbrio, incontinência urinária, declínio da atenção e da memória, de caráter progressivo, podendo culminar em óbito mesmo com controle do tumor. O mecanismo não é claro, suspeitando-se de desmielinização e vasculopatia de pequenos vasos. Até recentemente, pensava-se que a quimioterapia fosse pouco benéfica. Entretanto, os oligodendrogliomas anaplásticos, com ou sem um componente astrocítico, são considerados quimiossensíveis. Os pacientes com reforço das lesões na neuroimagem respondem melhor que aqueles sem reforço. Foi observada uma resposta similar com astrocitomas e tumores oligodendrogliais. A quimioterapia tem se tornado um procedimento alternativo à radioterapia. Accuracy and diagnostic yield of stereotactic biopsy in the diagnosis of brain masses: comparison of results of biopsy and resected surgical specimens. Aker FV et al. Neuropathology 25: 207, 2005. O objetivo deste trabalho retrospectivo foi investigar o valor diagnóstico e a precisão da biópsia estereotáxica em pacientes portadores de lesões cerebrais tumorais. De uma amostra inicial de 130 pacientes submetidos à biópsia, 23 foram tratados com ressecção tumoral por craniotomia, dentro de 10 dias. Durante a biópsia, o patologista, presente na sala operatória, examinou um pequeno fragmento do material. As amostras foram diagnósticas em 122 casos (valor diagnóstico global de 94%). O diagnóstico histológico dos dois procedimentos foi idêntico (concordância completa) em 16 casos. Em outros 3, o diagnóstico histológico foi ligeiramente diferente entre os dois procedimentos, sem prejuízo na conduta (concordância maior). O diagnóstico fornecido pela biópsia estereotáxica foi completamente modificado após a ressecção em 4 casos (discordância maior). A precisão do diagnóstico histológico foi de 83%. Ocorreu apenas uma complicação maior que envolveu hemorragia intracerebral. Apesar do número limitado de pacientes submetidos à ressecção subseqüente, os resultados sugerem que a biópsia 12 estereotáxica de lesões tumorais cerebrais é um procedimento seguro e preciso, permitindo obter uma amostra adequada para o diagnóstico histológico. Death, unconciousness and the brain. Laureys S. Nat Rev Neurosci 6: 899, 2005. O conceito de morte tem se modificado ao longo do tempo, acompanhando a evolução tecnológica, passando do enfoque cárdio-respiratório para o cerebral. A antiga idéia de que a morte seria caracterizada pelo não batimento cardíaco foi substituída somente na década de 1950 com a invenção do ventilador mecânico de pressão positiva, por Bjorn Ibsen, e da disseminação de centros de cuidados intensivos, na década de 1960, quando foi possível manter o batimento cardíaco e a respiração com o apoio de respiradores artificiais de pacientes com lesões cerebrais graves. Mollaret e Goulon, em 1959, foram os pioneiros na descrição clinica do que é atualmente conhecido como morte encefálica, utilizando a expressão “coma dépassé”. Infelizmente, por ter sido escrito em francês, este artigo permaneceu ignorado pela comunidade científica internacional. Em 1968, um Comitê da Escola Médica de Harvard publicou um documento definindo coma irreversível como sendo morte. Alguns anos mais tarde, os estudos neuropatológicos mostraram que o comprometimento do tronco encefálico é crucial para a morte cerebral, introduzindo a noção de “morte do tronco encefálico”. O aparente consenso sobre a definição de morte não tem contudo aplacado todas as controvérsias. Persistem inúmeras preocupações éticas, morais e religiosas sobre a morte, havendo até uma questão de uma possível ampliação do conceito de morte incorporando o estado vegetativo ou sobre os terríveis vieses envolvidos na formulação de critérios para transplante de órgãos. O recente episódio da morte de Terri Schiavo alertou o mundo para as dificuldades envolvidas no conceito de estado vegetativo como significado de morte. Este excelente artigo de revisão discute questões médicas, filosóficas, legais e éticas na determinação de morte. A definição de morte tem formulação do cérebro como um todo, do tronco encefálico e neocortical. No momento, apenas os dois primeiros conceitos possuem embasamento médico aceito. De acordo com a definição neocortical de morte, os pacientes em estado vegetativo seriam considerados mortos. Este artigo debate as diferenças entre morte encefálica e estado vegetativo, argumentando que a definição de morte neocortical não pode ser aceita com base nos critérios anatômicos ou nos testes clínicos. Discute também os aspectos legais e éticos da morte e o fim da vida. Persistent low back pain. Carragee EJ. N Engl J Med 352: 1891, 2005. A dor lombar (sem compressão ciática, estenose ou deformidade da coluna) é uma queixa freqüente (prevalência de 33%). Este é um artigo de revisão sobre os fatores associados à dor lombar crônica e persistente, não associada à compressão ciática. Os achados dos exames de imagem são inespecíficos (degeneração discal, ruptura anelar, etc.) que podem ser encontrados em indivíduos assintomáticos. Os estudos prospectivos revelam que nenhum tipo de alterações na ressonância magnética (RM) é preditivo de aparecimento subseqüente de dor lombar. A RM é melhor usado para excluir quadros de infecção, trauma ou tumor. Este exame está indicado nos pacientes com dor lombar apresentando sinais e sintomas neurológicos, presença de manifestações sistêmicas ou fatores de risco 13 para câncer, infecção ou fratura oculta e quadro persistente por período superior a 4 ou 8 semanas, mesmo na ausência de alterações neurológicas. Os pacientes devem estar cientes de que o motivo do exame é a exclusão de quadros mais sérios e que é esperada a constatação de alterações degenerativas mais simples, pois a expectativa da RM elucidar o diagnóstico pode reforçar a idéia de uma doença grave, valorizar a importância de achados inespecíficos ou estabelecer algum diagnóstico incorreto. A indicação de discografia é altamente questionável. Não há consenso a respeito do tratamento da dor lombar com achados estruturais inespecíficos. Os fatores psicossociais e a tolerância à dor influem no grau de comprometimento e o tratamento deve ser direcionado na recuperação funcional e técnicas de suporte adaptativo, em contraposição à conduta cirúrgica ou medicamentosa do tratamento das anormalidades estruturais da coluna. O tratamento medicamentoso da dor lombar crônica inclui analgésicos, antiinflamatórios, relaxantes musculares, mas os estudos clínicos não têm revelado benefícios consistentes quando comparados a placebo. Drogas antidepressivas, especialmente os tricíclicos e tetracíclicos, parecem ser úteis na redução da dor, embora sem melhora funcional convincente, além da ocorrência de reações colaterais em 20% dos casos. Os inibidores da recaptação seletiva de serotonina e a trazodona não são mais eficazes que placebo. Os exercícios parecem aumentar a taxa de retorno às atividades normais. Uma revisão Cochrane de ensaios randomizados sobre diferentes tipos de exercício mostrou que musculação, alongamento geral, método McKenzie de exercícios passivos e a fisioterapia convencional (calor local, massagem, alongamento, flexibilidade e exercícios de coordenação) eram semelhantes. Em geral, programas regulares de exercícios, tais como 2 a 3 horas de sessões semanais, de uma hora, durante 4 a 6 semanas, apresentam efeitos moderados com melhora de 5-10% nas escalas de avaliação funcional, quando comparados com placebo. Os estudos randomizados e as revisões sistemáticas comparando exercícios físicos, massagem, manipulação por quiroprático ou outras práticas manuais, exercícios aeróbicos de baixo impacto, recondicionamento em equipamentos revelaram que nenhum método especifico é superior a outro. Os dados disponíveis sugerem que a combinação de cuidados médicos com fisioterapia ou manipulação é mais efetiva na redução da dor e da incapacidade do que um método terapêutico isolado, além de aumentar o grau de confiança do paciente no tratamento. Em contrapartida, os pacientes com dor persistente devem evitar o repouso e/ou o confinamento ao leito. Os tratamentos invasivos e cirúrgicos têm sido indicados com grande freqüência, mas são onerosos e nem sempre eficazes. A injeção de glicocorticóides ou de agentes anestésicos no espaço epidural, nos discos, nas facetas lombares ou nos pontos desencadeantes de dor não melhoram o desfecho nos pacientes com dor crônica sem radiculopatia. Ablação por radiofreqüência de pequenos nervos mostrou ser ineficaz em um estudo randomizado. O tratamento cirúrgico permanece controverso. Laminectomia não é indicada na ausência de radiculopatia ou da síndrome da cauda eqüina. A excisão de disco com prolapso é realizada ocasionalmente, mas não há estudos controlados para consubstanciar esta técnica. O tratamento cirúrgico mais comumente realizado em pacientes com dor lombar e alterações degenerativas é a fusão de vértebras. Um pequeno estudo randomizado, comparando cirurgia de fusão e programas intensivos de reabilitação, mostrou que após um ano, 22% dos pacientes submetidos ao procedimento cirúrgico e 33% daqueles submetidos a reabilitação retornaram ao trabalho. Mesmo um estudo com maior número de participantes, embora tenha mostrado excelente evolução em 2 anos, não revelou benefícios da fusão 5 anos após a cirurgia. A tomada de decisão deve levar em consideração o desejo e a expectativa do paciente. 14 As recomendações internacionais encorajam os pacientes a assumirem uma conduta ativa precoce e gradual, além de valorizar os fatores psicossociais. A Sociedade Norteamericana de Coluna não recomenda um determinado medicamento ou método não farmacológico em particular. Sugere que a cirurgia seja considerada apenas após 2-4 meses de tratamento não cirúrgico e somente se houver achados objetivos de alterações estruturais, embora não especifique se os achados degenerativos simples devam ser considerados suficientes. A Associação Médica do Estado de Washington recomenda a fusão apenas se houver instabilidade demonstrável, deformidade ou comprometimento neurológico. Em termos práticos, o autor recomenda iniciar o tratamento com um antidepressivo tricíclico, p. ex. amitriptilina, 25-50mg/d, elevando a dose, caso necessário. Se o paciente revelar forte preferência por certos tratamentos adicionais de curto prazo, tais como manipulação da coluna ou massagem, é razoável incluí-los, pois podem propiciar maior confiança no tratamento prescrito. Deve ser orientado que o objetivo do tratamento é de maximização funcional e que alguma persistência ou recorrência da dor não envolve qualquer perigo. A cirurgia deve ser evitada na ausência de doença grave da coluna ou radiculopatia. Comparing yoga, exercise, and a self-care book for chronic low back pain. A randomized, controlled trial. Sherman KJ et al. Ann Intern Med 143: 849, 2005. A maioria dos tratamentos para a dor lombar crônica tem uma eficácia no máximo modesta. Yoga é uma terapêutica alternativa popular de “corpo-mente”. Estima-se que 14 milhões de americanos pratiquem yoga, incluindo 1 milhão de indivíduos utilizando-a como tratamento de dor lombar. Seu beneficio pode resultar simplesmente por envolver exercícios ou por seu efeito mental. Pela inexistência que qualquer informação publicada na literatura ocidental, os autores desenharam um ensaio clínico para avaliar sua eficácia e segurança na dor lombar crônica. Através de um estudo randomizado e controlado, os autores compararam os efeitos de sessões de yoga (viniyoga) com exercícios convencionais e com a leitura de um livro de auto-ajuda denominado “The Back Pain Helpbook na melhora dos sintomas após 12 semanas e na condição geral de saúde após 12 e 26 semanas. Foram selecionados 101 indivíduos com dor lombar persistente por pelo menos 12 semanas, com exclusão de ciática, estenose de canal, cirurgia prévia da coluna, neoplasias, espondilolistese, fratura óssea, e que foram distribuídos ao acaso nos grupos yoga (36 casos), exercícios (35) e o livro de auto-ajuda (30). A sensação incomodativa dos sintomas declinou em todos os grupos de tratamento durante o período de 12 semanas de intervenção. Entretanto, entre as semanas 12 e 26, os sintomas continuaram a melhorar apenas no grupo praticando yoga enquanto os participantes de exercícios e da auto-ajuda referiram piora sintomática. Os membros do grupo yoga referiram desfecho consistentemente superior àqueles do grupo exercícios, embora nenhuma das diferenças tenha sido estatisticamente significante. O uso de medicamentos, inicialmente similar nos 3 grupos, diminuiu mais nitidamente no grupo praticando yoga. Apenas 21% daqueles do grupo yoga referiram uso de medicamentos na semana antecedendo a última entrevista (26 semanas); por outro lado, a freqüência foi de 50% no grupo praticando exercícios e 59% nos que receberam o livro de auto-ajuda. Os resultados sugerem que yoga é eficaz no tratamento da dor lombar crônica, com persistência do beneficio mesmo 14 semanas após o término das sessões. Embora yoga seja encarada como uma forma de exercício, sua prática 15 enfatiza enormemente o aspecto mental e considera a respiração como ponto chave na busca de benefícios físicos e mentais. Os autores concluem que yoga é um tratamento seguro e eficaz da dor lombar crônica e que seus benefícios perduram por pelo menos vários meses. Are the clinical effects of homoeopathy placebo effects? Comparative study of placebo-controlled trials of homoeopathy and allopathy. Shang A et al. Lancet 366: 726, 2005. A homeopatia é amplamente utilizada sob a premissa básica de “like is cured by like”, isto é, doenças podem ser tratadas por substâncias que produzem os mesmos sinais e sintomas num indivíduo saudável. A preparação dos medicamentos envolve diluição seriada, para que as moléculas da substância original ali permaneçam, e agitação vigorosa entre as diluições (potencialização). Durante o processo, acredita-se que a informação seja transferida da substância diluída para o diluente, o que parece implausível à luz do conhecimento atual. Portanto, a homeopatia deve possuir efeito placebo inespecífico. Uma possível explicação para a obtenção de resultados favoráveis seria a ocorrência de viés na condução e no relato dos estudos tanto de homeopatia assim como de alopatia (medicamentos convencionais). Tais vícios afetariam mais os estudos menores que os maiores; quanto menor o estudo, maior o efeito do tratamento necessário para que os resultados sejam estatisticamente significantes, enquanto que os estudos maiores são, mais provavelmente, de melhor qualidade metodológica e publicados mesmo que seus resultados sejam negativos Os autores analisaram os efeitos da homeopatia e da alopatia, em estudos controlados com placebo, pareados, avaliando a qualidade metodológica e a probabilidade da ocorrência de viés de publicação. Efetuaram levantamento de 19 bancos de dados, incluindo MEDLINE, EMBASE, para medicamentos homeopáticos e buscaram o Registro de Ensaios Controlados Cochrane para os alopáticos. Identificaram ensaios pareados de medicamentos convencionais para cada estudo homeopático, com doenças e desfechos similares. Selecionaram 110 estudos de cada grupo: 21 (19%) dos estudos homeopáticos e 9 (8%) alopáticos foram considerados de alta qualidade. Concluíram que os efeitos observados nos ensaios controlados com placebo de homeopatia podem ser explicados pela combinação de deficiências metodológicas e viés de relato. Em contraposição, postularam que os mesmos vícios não poderiam explicar os efeitos comparáveis nos estudos com medicamentos convencionais. Os resultados confirmam a hipótese de que quando a análise é restrita aos ensaios maiores e de melhor qualidade, não há evidências convincentes de que a homeopatia seja superior ao placebo, enquanto que os estudos alopáticos têm seus resultados confiáveis. Em síntese, o presente estudo fornece subsídios para a hipótese de que os efeitos clínicos da homeopatia são do tipo placebo. Community-acquired bacterial meningitis in adults. Van de Beek et al, N Engl J Med 354: 44, 2006. Nos Estados Unidos da América, a incidência anual de meningite bacteriana purulenta em adultos é de 4-6 casos/100.000 habitantes, tendo como agentes principais (80%) 16 Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis. A sensibilidade da tríade de febre, rigidez de nuca e distúrbio da consciência é baixa (44%) mas quase todos os pacientes apresentam pelo menos 2 dos 4 sintomas: cefaléia, febre, rigidez de nuca e alteração do nível de consciência. A realização de neuroimagem, TC ou RM, antes da punção do LCR é recomendada se houver suspeita de efeito de massa, pelo risco de herniação cerebral. Esta situação de risco pode ser identificada clinicamente pela presença de sinais localizatórios, crises epilépticas, imunodeficiência ou comprometimento moderado a grave da consciência. Se os exames de neuroimagem não forem disponíveis, a punção do LCR deve ser efetuada nos casos prováveis de meningite bacteriana com comprometimento da consciência ou nos imunodeprimidos. Entretanto, aqueles apresentando sinais sugestivos de lesão com efeito de massa (crises, papiledema, sinais de herniação) não devem ser submetidos ao LCR antes da neuroimagem. Nessa condição, como a demora do início da antibioticoterapia pode comprometer o prognóstico, o tratamento deve ser instituído antes da neuroimagem. O LCR revela aumento da pressão na maioria dos casos (> 40cm H2O em 40%), pleocitose (100-10.000 leucócitos/mm3), predomínio de neutrófilos, hiperproteinorraquia (>50mg/100ml) e hipoglicorraquia (<40% da glicemia). A coloração pelo Gram apresenta sensibilidade de 60-90% e especificidade >97%. A pesquisa de antígenos apresenta sensibilidade limitada mas é útil na situação de negatividade do Gram e da cultura. O exame de PCR requer refinamentos para ser recomendado rotineiramente. A escolha do antibiótico é baseada no agente mais provável, de acordo com a idade e características do paciente e no padrão de susceptibilidade antimicrobiana. Pelo aumento global da prevalência de pneumococos resistentes à penicilina, a terapia combinada de vancomicina e uma cefalosporina de 3ª geração (ceftriaxona ou cefotaxima) tornou-se o esquema padrão de terapia antimicrobiana empírica. O tratamento pode ser otimizado com o resultado da cultura e do antibiograma. A administração de dexametasona antes ou concomitantemente à primeira dose de antibióticos reduz o risco de desfecho desfavorável de 25% para 15%. A mortalidade é reduzida de 15% para 7% e o benefício é maior nos casos de gravidade intermediária, definida pela escala de coma de Glasgow de 8 a 11 e naqueles com meningite pneumocócica, em que o desfecho desfavorável é reduzido de 52% para 26%. Nos pacientes com meningite pneumocócica, ocorre redução de mortalidade de 34% para 14%. A dose recomendada de dexametasona é de 10 mg, de 6/6 horas, por 4 dias e seu início deve preceder ou ser concomitante à primeira administração de antibióticos. Este esquema deve ser interrompido caso não haja confirmação de meningite bacteriana. Numa recente revisão de 5 ensaios clínicos, a corticoterapia esteve associada a redução significativa de mortalidade e de seqüelas neurológicas. O início da corticoterapia precedendo a antibioticoterapia parece ser mais efetivo do que o inverso. O isolamento respiratório por 24 horas é indicado nos casos suspeitos de infecção meningocócica e as pessoas que estiveram em contacto direto devem receber quimioprofilaxia. Pacientes apresentando rebaixamento do nível de consciência ou não evidenciando melhora após o início da antibioticoterapia devem ser submetidos a novo exame de neuroimagem. Uma causa comum de declínio da consciência é a meningencefalite, com quebra da barreira hematencefálica, edema cerebral e hipertensão intracraniana, em que os diuréticos osmóticos podem ser úteis. Outras causas freqüentes de deterioração da consciência são crises epilépticas e hidrocefalia aguda. Na meningite bacteriana purulenta, os sinais localizatórios (hemiparesia, monoparesia ou afasia) são mais freqüentemente causados por acidente vascular cerebral, crises epilépticas 17 ou ambas. Sinais de infarto cerebral e edema citotóxico nos exames de neuroimagem sugerem arterite séptica ou endarterite obliterante, tromboflebite venosa, ou eventos tromboembólicos. O empiema subdural deve ser considerado nos casos de rápida deterioração clinica cujos indícios são: presença de sinusite ou mastoidite ou cirurgia recente dessas condições. Crises e epilepsia parcial contínua são relativamente freqüentes nos pacientes com empiema subdural. A TC costuma evidenciar coleção hipodensa mas a RM pode ser necessária para evidenciar a presença de empiema na convexidade. A drenagem cirúrgica por craniotomia está indicada na maioria dos casos de empiema subdural. O comprometimento de nervos cranianos é causado pelo processo inflamatório meníngeo ou por hipertensão intracraniana. O nervo craniano mais freqüentemente acometido é o VIII, com hipoacusia em 14% dos casos, requerendo eventualmente o implante coclear nos pacientes mais intensamente afetados. A repetição do LCR está indicada nos pacientes cuja condição clínica não evidencia melhora após 48 horas de antibioticoterapia adequada. Uma nova punção do LCR é essencial na meningite pneumocócica causada por linhagem resistente a penicilina ou a cefalosporina e que receberam corticosteróide e vancomicina. O corticosteróide reduz o processo inflamatório, diminuindo a permeabilidade de agentes microbianos através da barreira hematencefálica e, conseqüentemente, dificulta a penetração de vancomicina no espaço subaracnóideo; falhas terapêuticas têm sido descritas em adultos recebendo vancomicina e dexametasona. O coeficiente de letalidade da meningite por S. pneumoniae é elevada (19% - 37%) e a freqüência de sequelas neurológicas afeta 30% dos sobreviventes, incluindo hipoacusia e outros déficits focais. Na meningite meningocócica a mortalidade é de 3% a 13% e a morbidade de 3% a 7%. Os fatores de risco de desfecho desfavorável são envolvimento sistêmico, comprometimento do nível de consciência, baixa pleocitose e infecção por S. pneumoniae. O comprometimento cognitivo é de ocorrência freqüente após meningite bacteriana. Num estudo prospectivo, esta complicação esteve presente em 27% dos adultos que tinham apresentado boa recuperação de meningite pneumocócica. Em relação à prevenção, a vacina contra Haemophilus influenzae tipo B praticamente eliminou no Ocidente a meningite causada por este agente. A introdução de vacinas conjugadas contra S. pneumoniae pode reduzir significativamente a freqüência de meningite pneumocócica nas crianças e até mesmo proteger os adultos. A aprovação em 2005 de uma vacina meningocócica conjugada contra os sorogrupos A, C, Y e W135 representa também enorme avanço na redução da incidência desta infecção devastadora. Chronic meningitis. Cohen BA. Curr Neurol Neurosci Rep 5: 429, 2005. A meningite crônica é uma síndrome definida pela presença de inflamação meníngea continuamente persistente por pelo menos 4 semanas de duração. O início pode ser agudo e persistente mas é mais comumente subagudo e insidioso. O quadro clínico inclui cefaléia, rigidez de nuca, ataxia, letargia, náusea, distúrbio da consciência e da função cognitiva. O comprometimento de nervos cranianos não é raro. Os sinais localizatórios podem ocorrer por hidrocefalia, mielite ou envolvimento vascular levando a infarto. Os exames de neuroimagem são importantes para exclusão de abscessos, neoplasias e focos parameníngeos de infecção nos seios paranasais ou paravertebrais. No entanto, a maioria dos pacientes com meningite crônica apresenta exames normais ou achados inespecíficos 18 de hidrocefalia e reforço meníngeo. Os achados do LCR são também inespecificos, com pleocitose linfocitária, eventualmente associada a neutrófilos, hiperproteinorraquia, glicorraquia normal ou diminuída. Nos dias atuais, a condição imunológica do paciente representa importante fator influindo na ocorrência de uma variedade de doenças neurológicas, incluindo meningite. A maior sobrevida de pacientes submetidos a tratamento de imunossupressão, a transplantes e infectados pelo HIV expande a população de risco a infecções oportunistas crônicas. A imunossupressão pode também modificar a evolução clínica clássica e as anormalidades do LCR associadas a essas doenças. Conseqüentemente, é prudente a verificação de eventual infecção pelo HIV ou outra condição de imunodeficiência em qualquer paciente apresentando meningite crônica. O autor apresenta uma extensa lista de possíveis causas de meningite crônica, incluindo processos infecciosos, inflamatórios, neoplásicos e exposições tóxicas. A presente revisão pretende discutir algumas causas selecionadas ao invés de catalogar numerosas etiologias, deixando propositadamente de lado as etiologias virais que causam mais comumente meningites subagudas e que podem ser identificadas por técnicas de biologia molecular. Entre as causas infecciosas não virais de meningite crônica o autor discute tuberculose, criptococose, brucelose, borreliose, histoplasmose, candidíase e sífilis. E, entre as causas não infecciosas, lupus eritematoso sistêmico, neurosarcoidose, doença de Behçet, angeíte primária, neoplasias e tóxicas (anti-inflamatórios não hormonais, trimetropin, imunoglobulina endovenosa). Sugere, ainda, uma lista de exames no sangue periférico, no LCR e outros métodos de investigação, incluindo biópsia de meninge. Nota: este artigo não está disponível na Internet. O conteúdo foi obtido com o próprio autor que nos enviou, gentilmente, a versão final do manuscrito. The use of ventriculoperitoneal shunts for uncontrollable intracranial hypertension without ventriculomegally secondary to HIV-associated cryptococcal meningitis. Woodworth GF et al. Surg Neurol 63: 529, 2005. Os riscos associados à implantação de derivação ventricular em pacientes imunocomprometidos apresentando infecção liquórica têm desencorajado os cirurgiões na indicação desse procedimento em pacientes com HIV e meningite criptocócica. Entretanto, os pacientes necessitam de punções freqüentes do LCR para controlar a hipertensão intracraniana secundária à meningite criptocócica. Até o momento foram descritos apenas 7 casos de derivação ventrículo-peritoneal no tratamento da meningite criptocócica associada ao HIV e é incerto se a derivação é eficaz a longo prazo no tratamento da hipertensão intracraniana. Os autores descrevem 2 casos de HIV/Aids com meningite criptocócica com hipertensão liquórica (>500 mmLCR) sem hidrocefalia na tomografia computadorizada. Ambos apresentaram reversão rápida dos sintomas com drenagem externa do LCR, requerendo a continuidade da drenagem após 2 semanas de anfotericina e fluconazol. Apesar da meningite fúngica não estar ainda sob controle, os pacientes foram submetidos a derivação ventrículo-peritoneal e receberam alta hospitalar recebendo fluconazol. Ambos permaneceram assintomáticos aos 12 e 16 semanas, respectivamente, sem qualquer indício de infecção ou malfuncionamento da derivação. Concluem os autores que os pacientes apresentando hipertensão intracraniana por meningite criptocócica associada ao HIV que não tolerarem a interrupção da drenagem externa do LCR ou 19 punções freqüentes podem ser candidatos à derivação ventrículo-peritoneal apesar da imunodeficiência e da persistência da infecção criptocócica. Demographic factors influence cognitive recovery after shunt for normal-pressure hydrocephalus. Chang S et al. The Neurologist 12: 39, 2006. A hidrocefalia de pressão normal, caracterizada por distúrbios na marcha, incontinência urinaria, demência, dilatação ventricular e pressão normal do LCR, ocorre classicamente em pacientes na 7ª ou 8ª décadas de vida. É a causa tratável mais freqüente das demências, através da interposição de derivação ventrículo-peritoneal ou ventrículo-atrial. Entretanto, muitos médicos hesitam em indicar tais procedimentos pelo risco de complicações e pela incerteza quanto aos benefícios. A marcha é tida como o quadro que apresenta melhora mais evidente. Contudo, apenas uma pequena parcela dos pacientes apresenta mudanças da função cognitiva, sendo pior naqueles com demência acentuada. O estudo teve como objetivo a análise dos fatores demográficos que possam influir na melhora do desempenho cognitivo após a derivação. O estudo envolveu 36 casos consecutivos de hidrocefalia de pressão normal com a realização de testes cognitivos antes e após a cirurgia. Dos 36 pacientes, 12 (33%) apresentaram melhora cognitiva em pelo menos 25% em pelo menos metade dos testes aplicados. A recuperação da função cognitiva foi mais pronunciada nos testes de retenção e de memória lógica. A média de idade dos pacientes que apresentaram melhora cognitiva foi significativamente menor que a daqueles sem melhora. Não houve diferença estatisticamente significativa em relação à melhora cognitiva mínima de 25% em pelo menos metade dos testes. Nos testes outros que a memória, como nos de fluência verbal, agilidade motora para a escrita e o desenho, o percentual de melhora foi maior nos pacientes do sexo feminino que do masculino. Este estudo não foi delineado para avaliar a eficácia da derivação ventricular na melhora cognitiva, mas sim para identificar as variáveis demográficas relacionadas à melhora. Concluem os autores que os pacientes mais jovens apresentam maior probabilidade de melhora que os mais idosos. A idade, portanto, é um fator preditivo de melhora nos testes de memória. Por outro lado, o sexo feminino apresenta ser melhor fator preditivo da melhora nos testes outros que a memória. Esses fatores, portanto, devem ser levados em consideração na decisão sobre os riscos e benefícios da derivação em pacientes com hidrocefalia de pressão normal. Epidemiology of vestibular vertigo. A neurotologic survey of the general population. Neuhauseer HK et al. Neurology, 65: 898, 2005. A queixa de tontura e vertigem é uma das mais frequentes na prática médica, afetando de 20% a 30% da população geral. O objetivo do estudo foi determinar a prevalência e a incidência de vertigem vestibular na população geral e avaliar as características clínicas e fatores associados. Através de um Sistema de Nacional de Entrevistas sobre Saúde por Telefone da Alemanha, 8.318 adultos, selecionados ao acaso, foram questionados se apresentavam sintomas de tontura ou vertigem de moderada ou acentuada intensidade. A prevalência foi de 29,5%. A seguir, 1.003 indivíduos foram submetidos a uma entrevista 20 neurotológica detalhada, verificando a presença de vertigem vestibular. Esta foi definida como tendo características de vertigem rotacional, postural ou tonturas recorrentes com náusea, além de queixas de oscilopsia ou episódios de desequilíbrio. A prevalência de vertigem vestibular em algum momento da vida foi de 7,8%, a de um ano de 5,2% e a incidência de 1,5%. Em 80% dos indivíduos afetados, a vertigem acarretou atendimento médico, interrupção das atividades diárias ou absentismo. Concluem os autores que a vertigem vestibular é comum na população em geral, afetando mais que 5% dos adultos em um ano, e que tanto sua freqüência como o impacto no sistema de saúde têm sido subestimados. Young-onset dementia. A practical approach to diagnosis. Ridha B et al. The Neurologist 12: 2, 2006. A demência de início precoce é definida como demência de instalação antes dos 65 anos de idade. Embora relativamente incomum, representa importante desafio neurológico pela diversidade de apresentação clínica e de causas, com uma vasta lista de diagnóstico diferencial. Os autores discutem detalhes clínicos e laboratoriais que podem ser úteis no diagnóstico, buscando principalmente a exclusão de causas tratáveis. Central nervous system involvement in systemic connective tissue diseases. Cikes N. Clin Neurol Neurosurg, in press. Este é um excelente artigo de revisão sobre o envolvimento do SNC em pacientes com doenças do tecido conjuntivo. Várias delas podem acarretar sérias conseqüências por afetar o cérebro, meninges, medula espinhal, nervos cranianos e periféricos. Em condições normais, o SNC é protegido das reações imunológicas sistêmicas pela barreira hematencefálica. Há a participação de diversos mecanismos fisiopatológicos no surgimento de comprometimento neurológico, particularmente lesões mediadas por células T ou por autoimunidade. Entretanto, inexiste registro de qualquer anticorpo específico definido como sendo patogenético. O pronto reconhecimento das anormalidades neurológicas pode auxiliar no diagnóstico diferencial e no esclarecimento etiológico, permitindo o inicio do tratamento e prevenção da progressão da lesão ou da função cognitiva. O autor destaca e discute com profundidade as seguintes doenças: lupus eritematoso sistêmico, síndrome antifosfolípide, artrite reumatóide, síndrome de Sjögren, esclerose sistêmica, síndrome de Behçet, vasculite sistêmica e outras vasculites. Neuropsychiatric syndromes in patients with systemic lupus erythematosus and rheumatoid arthritis. Hanly JG et al. J Rheumatol 32: 1459, 2005. As manifestações neurológica e psiquiátrica em pacientes com lupus eritematoso sistêmico são multifatoriais e incluem mecanismos primariamente imunopatogênicos, seqüelas inespecíficas de doença crônica e moléstias associadas. Este estudo tem como objetivo a 21 comparação da prevalência, diversidade e a repercussão clínica das síndromes neuropsiquiátricas em amostras pareadas de 53 pacientes com lupus eritematoso sistêmico (LES) e 53 com artrite reumatóide (AR). A prevalência de eventos neuropsiquiátricos foi de 28% nos pacientes com LES e os mais freqüentes foram cefaléia, transtornos do humor e ansiedade. Naqueles com AR, a prevalência foi maior, de 47%, com quadros semelhantes aos do outro grupo. O intervalo entre o evento atribuível e o início da doença foi semelhante nos dois grupos. As manifestações presentes em ambas doenças foram: estado confusional agudo, ansiedade, doença cérebro-vascular, disfunção cognitiva, cefaléia e transtornos do humor, destacando-se em freqüência cefaléia e transtornos do humor. A síndrome desmielinizante e crises epilépticas estiveram restritas aos pacientes com LES e a mononeuropatia ocorreu apenas naqueles com AR. Os eventos foram classificados de acordo com o grau de vínculo específico com as doenças e não com outros fatores. Utilizando essa regra, uma maior proporção de eventos foi atribuída a LES que a AR. Os pacientes com LES e vítimas de eventos neuropsiquiátricos cumulativos prévios revelaram mais sintomas de depressão e disfunção cognitiva quando comparados àqueles com AR e eventos anteriores, mas sem comprometimento significativo dos testes de avaliação da qualidade de vida, sugerindo que, entre as manifestações neuropsiquiátricas, existem também causas não ligadas diretamente ao LES. DC DE DOENÇAS CEREBROVASCULARES Stroke recurrences in patients with symptomatic vs asymptomatic middle cerebral artery disease. Kern R et al. Neurology 65: 859, 2005. Embora a história natural da doença arteriosclerótica da artéria carótida tenha sido investigada sistematicamente, conhece-se pouco sobre a evolução da doença ateromatosa da artéria cerebral média. Métodos: os autores analisaram 102 pacientes (67 homens e 35 mulheres, com idade média de 61.8 anos) com estenose ou oclusão significativa da artéria cerebral média (ACM) através de Doppler Transcraniano e Ultrasonografia Duplex colorida-codificada. Durante o estudo, todos foram tratados ou com anti-agregantes plaquetários (75) ou com anticoagulante oral (27). Dos 102 pacientes, 46 eram sintomáticos, sendo 17 com ataques isquêmicos transitórios (AIT) e 29 com infarto cerebral. Os demais 56 eram assintomáticos. Investigação neurológica e estudos por ultrasom foram realizados num período de 6 a 117 meses, numa média de 31 meses. Resultados: ocorreram 19 eventos isquêmicos (11 AVCs isquêmicos e 8 AIT) durante o seguimento, numa média anual de incidência de 7.3%. Desse total, houve 8 casos de isquemia cerebral (infarto) e 5 de AIT atribuídos ao território ipsilateral da ACM. Os pacientes sintomáticos de doença da ACM que deram entrada no estudo apresentaram um risco anual de AVC de 12.5% ao ano (ipsilateral = 9.1%) enquanto a incidência anual nos assintomáticos foi de 2.8% (ipsilateral = 1.4%). A estenose sintomática da ACM apresentou-se por si só como um risco alto, independente, para eventos cerebrovasculares isquêmicos e o risco de novos eventos nos assintomáticos, de 2.8% anual, compara-se aos pacientes assintomáticos de doença de carótida. 22 Os autores salientam sobre a limitação de suas investigações quanto ao diagnóstico de estenose da ACM, pois só 75% dos pacientes foram submetidos a estudos complementares e que constituíram-se de Doppler Transcraniano e Duplex Ultrasonografia e confirmam que o método diagnóstico mais específico e padrão ouro é arteriografia digital computadorizada cerebral. Chamam a atenção para a importância diagnóstica da patologia intracraniana, pois com o advento de Angioplastia intracraniana e Stent e os avanços tecnológicos atuais qual melhor alternativa de tratamento, além de antiagregantes plaquetários e anticoagulantes, deverá ser tomada? No estudo WASID (Warfarin-Aspirin Symptomatic Intracranial Disease) a anticoagulação não se mostrou efetiva na prevenção de novos eventos isquêmicos mas esse estudo incluiu pacientes com estenose de qualquer artéria intracraniana, altas doses de aspirina e foi de tempo bem mais curto de observação. No presente estudo os pacientes sintomáticos tratados com warfarin obtiveram bem menor risco de novos eventos isquêmicos e os autores sugerem que pacientes sintomáticos com estenose de alto grau de ACM seriam melhor candidatos à anticoagulação e os assintomáticos teriam maior benefício com antiagregantes plaquetários. Prognostic implications of right-sided insular damage, cardiac autonomic derangement, and arrhythmias after acute ischemic stroke. Colivicchi F et al. Stroke 36: 1710, 2005. Objetivo: o AVC isquêmico agudo está associado a um desequilíbrio da autonomia cardíaca e a um aumento na incidência de arritmias. Estas anormalidades tornam-se mais relevantes quando a área de isquemia localiza-se na região insular direita. Este estudo visa avaliar o impacto da lesão insular isquêmica direita, disfunção cardíaca autonômica e arritmias no desfecho final de uma isquemia cerebral aguda. Métodos: 208 pacientes com primeiro evento isquêmico agudo foram observados com Holter-Monitor durante 24 horas. Tempo, variabilidade, freqüência cardíaca, assim como arritmias cardíacas foram observadas e registradas em todos os pacientes. Os mesmos foram acompanhados por um período de 12 meses após o evento inicial. Resultados: durante os 12 meses de acompanhamento 48 pacientes faleceram (probabilidade de morte em 1ano, 0.23; 95% CI, 0.17 a 0.30). A análise multivariada demonstrou que idade, gravidade do AVC na hora da internação, presença de infarto isquêmico insular direito, assim como valores baixos da SD nos intervalos RR e a presença de taquicardia ventricular não sustentada foram fatores prognósticos, independentes, de mortalidade em 1 ano. O risco cumulativo para o desfecho final primário do estudo que era mortalidade ao final de 1 ano baseou-se no método de Kaplan-Meier. Nenhum paciente foi tratado com trombolítico. Discussão: acredita-se que o córtex insular direito desempenha um papel importante na modulação autonômica da atividade cardíaca e nos aspectos do comportamento humano no que se refere a afetividade e atenção. Estudos anteriores têm demonstrado que a lesão no córtex insular direito conduz a uma ativação simpática patológica do sistema cardiovascular assim como comportamentos de indiferença e está associado a um resultado clínico desfavorável. Há também evidências de redução da atividade vagal. Os autores salientam que estudaram um grupo relativamente grande de pacientes, homogêneos, avaliando fatores prognósticos de mortalidade em 1 ano e confirmaram de acordo com estudos prévios que idade e maior gravidade do déficit neurológico tiveram um grande 23 impacto no resultado final da isquemia cerebral e observaram que a mortalidade em 1 ano é significativamente influenciada pela presença de infarto insular direito, redução e instabilidade da freqüência cardíaca e arritmia ventricular complexa não sustentada durante monitorização por Holter. Conclusões: a alta freqüência de AVCs isquêmicos, com manifestações clínicas e resultados finais variáveis e diversos reforçam a necessidade de identificação de fatores de risco para prognóstico exato e quando possível intervenção clínica terapêutica. O artigo demonstra que infartos isquêmicos agudos envolvendo o córtex insular direito levaram a um índice de aumento da mortalidade precoce em 1 ano independentemente de outros fatores e que esses pacientes devem ser cuidadosamente avaliados através de estudos de monitorização para disautonomia simpático-vagal e arritmias cardíacas. C-reactive protein and cerebral small-vessel disease. The Rotterdam Scan Study. Dijk EJ van et al. Circulation 112:900, 2005. Introdução: os processos inflamatórios estão envolvidos no desenvolvimento da arterioesclerose.Não se sabe até hoje se os vasos cerebrais de pequeno calibre estão envolvidos nesse processo. Lesões difusas na substância branca e infartos lacunares originam-se de doença dos pequenos vasos e são comumente observadas através de Ressonância Magnética (RM). Estas lesões estão associadas ao aumento de risco para AVC e demência. Métodos: o estudo “Rotterdam Scan Study” contou com 1033 participantes e análise da proteína C-reativa (PCR) e Ressonância Magnética, todos na faixa etária de 60 a 90 anos e sem sinais de demência. Desses, 636 foram posteriormente submetidos a outra RM no período médio de 3.3 anos. Usou-se modelos de análise de regressão multivariada para avaliar as associações dos níveis de PCR e marcadores para doença dos pequenos vasos. Encontrou-se níveis elevados de PCR associados à presença e progressão de lesões na substância branca, particularmente com progressão intensa na substância branca periventricular e subcortical. Essas relações persistiram após correção para os fatores de risco cardiovascular e arterioesclerose da carótida. Pessoas com níveis elevados de PCR apresentaram também maior prevalência e incidência de infartos lacunares. Conclusões: a PCR constitui um marcador sensível para processos inflamatórios e também está envolvida na resposta inflamatória da injúria endotelial. Embora a fisiopatologia da doença dos pequenos vasos cerebrais ainda não esteja totalmente esclarecida, hipertensão arterial e idade são os principais fatores de risco. A diminuição do lúmen vascular e falha na auto regulação cerebral resultam em lesão isquêmica da substância branca e da substância subcortical cinzenta. Os autores sugerem que mais de um mecanismo possa estar envolvido na elevação do PCR como marcador de atividade inflamatória na doença dos pequenos vasos cerebrais e ressaltam para a utilidade de confirmação de seus achados em outros trabalhos e salientam que as estatinas, anti-inflamatórios não esteróides e aspirina seriam potenciais candidatos para atenuar a progressão de lesões relacionadas a doenças dos pequenos vasos por terem a possível capacidade de reduzirem atividade inflamatória. 24 Patent foramen ovale in young adults with unexplained stroke. Kizer, JR et al. N. Engl J Med 335: 2361, 2005. Aproximadamente 43% dos AVCs isquêmicos em adultos jovens são criptogênicos sem causa etiológica após intensa investigação. A fonte mais prevalente em potencial de cardioembolismo em adultos jovens com AVC criptogênico é foramen oval patente (FOP) o qual é detectado em mais de 50% desses pacientes submetidos a investigação. Essa discussão focaliza-se na presença de FOP ocorrendo em pacientes jovens (com menos de 45 anos) ou pacientes de idade média (entre 45 a 64 anos) com fatores de risco mínimos para arteriosclerose nos quais as avaliações para doença vascular ou sistêmica são negativas. Conclusões e recomendações Em pacientes com AVC isquêmico criptogênico é recomendada a pesquisa da presença de FOP e outras causas potenciais de cardioembolismo; o Ecotransesofágico (ETE) é mais sensível que o Ecotranstorácico (ETT). O fato de presumir-se que a fisiopatologia do AVC criptogênico em pacientes jovens com FOP deve-se a embolia paradoxal com trombos ricos em fibrina e devido a alguns estudos serem mais favoráveis ao tratamento com Warfarin do que com aspirina. Os autores sugerem tratamento com Warfarin por 3 a 6 meses nesses pacientes e ressaltam que os estudos recentes ainda não são suficientes para indicar que a terapêutica com Warfarin x Aspirina seja uma superior sobre a outra. Investigação apropriada para trombose venosa profunda e trombofilia é essencial. Os mesmos recomendam substituir Warfarina por aspirina depois de um curso de anticoagulação, mas mantêm os pacientes anticoagulados por longo prazo nos casos de associação de tromboembolismo venoso, casos selecionados de Hipercoagulabilidade e provavelmente em pacientes de alto risco associados a aneurisma do septo atrial, shunts importantes, infartos isquêmicos em vários territórios e antecedentes isquêmicos no transcurso de atividade evocando manobra de Valsalva. Quanto ao fechamento foraminal via endovascular percutânea, encorajam os pacientes a participarem de ensaios clínicos envolvendo terapêutica médica x endovascular. Atualmente o fechamento endovascular é indicado somente para pacientes que não respondam ao tratamento com anticoagulação e o fechamento cirúrgico é considerado para aqueles de alto risco quando a anticoagulação está contraindicada. Determinants of vascular dementia in the Cardiovascular Health Cognition Study. Kuller LH et al. Neurology 64:1548, 2005. Os autores analisaram 3.375 participantes sem demência durante realização de Ressonância Magnética (RM), entre 1991 a 1994, e para investigação de incidência e tipo de demência em 480 pacientes. Desses, 44% (213) foram considerados como possíveis ou prováveis pacientes com demência vascular. A incidência e os fatores de risco para demência vascular foram avaliados utilizando os critérios de revisão pré-RM e de revisão modificada pelos Centros de Diagnóstico e Tratamento de Doença de Alzheimer (ADDTC) do Estado da Califórnia e pós-RM e posteriormente classificadas como doença de Alzheimer pelo critério do National Institute of Neurological and Communicative Disorders and Stroke e Alzheimer´s Disease and Related Disorders Association (NINCDS - ADRDA). 25 A incidência de demência vascular aumentou com a idade e foi maior em negros que em brancos. Os fatores de risco encontrados para demência vascular foram: idade, alteração no exame de Mini-Mental, alto grau de hiperintensidade na substância branca, número de infartos na RM, tamanho ventricular e história de AVC. A incidência de demência vascular aumentou dramaticamente pela inclusão de medidas variáveis pela Ressonância Magnética tais como de hipersinal na substância branca e de infartos cerebrais. A alta incidência de casos mistos de demência de Alzheimer com demência vascular (35%) tem implicações importantes na pesquisa terapêutica e etiológica. Hipertensão arterial, diabetes e outros marcadores subclínicos para doença vascular cerebral são fatores de risco para demência, pois podem sinalizar doença vascular subclínica silenciosa no cérebro. Muitos casos de demência, na ausência de RM, seriam classificados como D. de Alzheimer. É possível que existam determinantes comuns para ambas, alta prevalência de doença vascular no cérebro e de emaranhados neurofibrilares e placas senis da D. de Alzheimer. Estudo recente relatou uma associação positiva entre arterioesclerose no círculo de Willis e D. de Alzheimer comparado com controles. Além disso, encontrou-se uma forte asssociação entre o número de placas de amilóide e emaranhados neurofibrilares e o grau de estenose das artérias do círculo de Willis. Entretanto outros estudos patológicos recentes não sugerem associação entre a D. de Alzheimer e mecanismo vascular. As alterações vasculares identificadas na RM poderiam estar relacionadas a doença dos pequenos vasos cerebrais que não estariam sendo detectadas na RM, especialmente nos vasos cerebrais corticais. Doença dos pequenos vasos pode ser a origem da patogenia da D. de Alzheimer. O aumento de depósito amilóide pode ter um efeito adverso nas artérias cerebrais. Podem coexistir duas doenças distintas e concomitantes, uma vascular associada a infartos subcorticais pequenos e hipersinal na substância branca na RMN e outra associada a características patológicas de Alzheimer. Os pacientes poderiam ter um ou outro tipo de demência ou, em muitos casos, a combinação dos dois, dada a alta prevalência de doença vascular no cérebro. A alta prevalência de demência vascular ou a associação com Alzheimer, isto é, demência mista, têm importantes significados por existirem terapêuticas eficazes que podem retardar o aparecimento de demência vascular. Se essas terapêuticas forem eficazes em reduzir a demência vascular, poderão ocasionar grande impacto na incidência de demência numa comunidade. Mechanical thrombolysis in ischemic stroke attributable to basilar artery occlusion as first-line treatment. Bergui M et al. Stroke 37: 145, 2006. Propósito: relatar os resultados da dissolução e resgate mecânicos de trombos como primeira opção de tratamento em pacientes com AVC atribuído a oclusão da artéria basilar, em particular no que se refere a segurança e eficácia. Resultados: Em 12 pacientes consecutivos com AVC agudo por oclusão da artéria basilar submetidos a trombólise mecânica intraarterial, 6 apresentaram recanalização completa. Ocorreu um único infarto cerebral, possivelmente atribuído a embolização distal. Três pacientes obtiveram um bom resultado. Em 5 dos 6 remanescentes, a artéria foi recanalizada utilizando r-tPA. Nesses ocorreu uma hemorragia assintomática; 3 pacientes apresentaram um bom resultado. A duração do procedimento e dose de r-tPA foram significativamente 26 reduzidas com a trombólise mecânica bem sucedida (43.33 minutos e 13.33mg x 112.33 minutos e 55.83mg respectivamente). Limitações do estudo: os autores observam várias limitações nos seus trabalhos principalmente do ponto de vista científico pois o procedimento não foi padronizado e dependeu diretamente do operador, o r-tPA foi administrado conjuntamente com a trombólise mecânica e algumas manobras mecânicas com cateteres e guias foram usadas durante a trombólise intraarterial local. Além do mais, o número de pacientes foi pequeno e sem estudo controle. Comparação direta dos resultados, principalmente no desfecho, de pacientes com recanalização mecânica, com sucesso ou fracasso, e o impacto do tratamento devem ser considerados com precaução. A trombólise mecânica permitiu redução no tempo do procedimento e na dose de r-tPA. Isto pode significar menos hemorragias e melhor resultado mas o impacto global no resultado final não pode ser avaliado definitivamente. A experiência dos autores limitou-se à artéria basilar que é um vaso de grande diâmetro com ramos arteriais distais que podem eventualmente ser “embolizados”, sem maiores conseqüências clínicas. O contrário pode acontecer em outros sítios anatômicos, primariamente na circulação anterior ou em ramos periféricos. Finalmente, suas séries têm as mesmas limitações e restrições que as séries sem estudos controle de outros centros. Ressaltam os autores que estão lidando com uma técnica que pode ser usada somente nos poucos casos entre um pequeno número de pacientes referidos para tratamento experimental como trombólise local intraarterial. As pequenas séries são um obstáculo e Smith e col. formaram 25 centros durante 2 anos e meio, recrutando 125 pacientes com apenas 10 deles apresentando oclusão vértebro-basilar. Conclusão: apesar das dificuldades acima descritas, os autores sugerem que a técnica de trombólise mecânica permite uma recanalização rápida e segura com poucas complicações e que a mesma deva ser considerada como primeira opção nos casos de isquemia cerebral aguda devido a oclusão da artéria basilar. DC DE DOPPLER TRANSCRANIANO Derivation of transcranial Doppler criteria for rescue intra-arterial thrombolysis: multicenter experience from the Interventional Management of Stroke study. Saqqur M et al. Stroke, 36:865, 2005 O Doppler transcraniano (DTC) pode potencialmente identificar os pacientes com AVC nos quais o trombolítico (rtPA) intravenoso não recanalizou a oclusão arterial. Os autores examinaram a utilidade clínica e o prognóstico do DTC em paciente arrolados em um estudo piloto de trombólise intravenosa e intra-arterial com rtPA (estudo “Interventional Management of Stroke” [IMS]). Os pacientes que realizaram DTC antes da trombólise intra-arterial foram incluídos, sendo que foi calculada a razão entre a velocidade de média de fluxo da artéria cerebral média (ACM) ipsilateral e contralateral ao AVC (razão ACMi / ACMc). A utilidade clínica do DTC foi determinada como sua capacidade para predizer prognóstico e identificar oclusão proximal da ACM que necessitasse de trombólise intraarterial segundo o protocolo IMS. Vinte e nove dos 80 pacientes incluídos no estudo IMS tinham DTC realizado antes da trombólise intra-arterial (idade média 61 ± 11 anos, razão sexo masculino/feminino 17:12, NIHSS médio 17). Três pacientes não apresentavam janela temporal adequada para a 27 insonação (10%). A angiografia cerebral foi realizada numa média de 174 ± 36 minutos após o início dos sintomas do AVC. O DTC foi realizado em uma média de 93 minutos após o início dos sintomas. A razão ACMi / ACMc < 0,6 teve sensibilidade de 94% (95% IC 63% a 99%), especificidade de 100% (95% IC 54% a 100%), valor preditivo positivo de 100% (95% IC 80% a 100%) e valor preditivo negativo de 86% (95% IC 42% to 99%) para identificar pacientes com oclusão proximal na circulação anterior que precisasse de trombólise intra-arterial. Os 6 pacientes com ausência de fluxo na ACM tiveram prognóstico ruim (escala modificada de Rankin ≥ 3) (P=0,014). Os autores concluem que o DTC é um método útil para avaliar a circulação anterior em pacientes na fase aguda do AVC e que tem potencial importante como método de “screening” em protocolos de trombólise combinada (intravenosa / intra-arterial). Absence of microemboli on transcranial Doppler identifies low-risk patients with asymptomatic carotid stenosis. Spence JD et al. Stroke, 36: 2373, 2005. A endarterectomia de carótida tem benefício significativo em pacientes com estenose sintomática, mas o risco de AVC em pacientes com estenose assintomática é tão pequeno que o número necessário para tratar (NNT) é muito alto. Os autores estudaram a detecção de êmbolos pelo Doppler transcraniano (DTC) como método para identificar pacientes com alto risco de AVC, e conseqüentemente um NNT baixo. Pacientes com estenose de carótida ≥ 60% pelo Doppler de carótidas que nunca tiveram sintomas (81%) ou pacientes assintomáticos há pelo menos 18 meses (19%) foram estudados com DTC por 1 hora em 2 ocasiões distintas com intervalo de 1 semana. Os pacientes foram acompanhados por 2 anos. No total, 319 pacientes foram estudados, com idade de 69,68 ± 9,12 anos, dos quais 32 (10%) tiveram microêmbolos no DTC (DTC+). A maior parte dos eventos ocorreu no primeiro ano de acompanhamento. Pacientes com microêmbolos tiveram uma chance maior de apresentar microêmbolos no ano seguinte (34,4% vs. 1,4%; P<0,0001) e de apresentar AVC no primeiro ano de acompanhamento (15,6% [95%CI: 4,1-79] vs. 1% [95%CI:1,01-1,36]; P<0,0001]. Os achados indicam que pacientes com estenose assintomática e sem microêmbolos detectados pelo DTC provavelmente não se beneficiariam de endarterectomia ou angioplastia a não ser que estas estivessem associadas a um risco de complicações menor do que 1%. Pacientes DTC+ podem ter benefício tão grande quanto ao de pacientes com estenose sintomática. Os dados sugerem que pacientes com estenose carotídea assintomática possam ser tratados clinicamente a não ser que apresentem sintomas ou embolia no DTC. 28 DC DE MOLÉSTIAS INFECCIOSAS Vasculite cerebral secundária à infecção pelo vírus da Varicella zoster. Outteryck O et al. Rev Neurol (Paris) 161: 836, 2005. O envolvimento neurológico pelo vírus da Varicella zoster (VZV) pode cursar com mielite, meningite, ventriculite e encefalite com comprometimento de grandes ou de pequenos vasos. A encefalite, com o envolvimento de grandes vasos, manifesta-se com o aparecimento de lesão cutânea no território do nervo trigêmio, seguida de déficit focal contralateral algumas semanas depois. Na encefalite com comprometimento de pequenos vasos, é mais freqüente em indivíduos imunodeprimidos e cursa com cefaléia, hipertermia, déficits focais e distúrbios de comportamento. Através de um caso clínico, os autores relatam as dificuldades no diagnóstico da encefalite pelo VZV. Foi apresentado o caso de um homem de 57 anos, imunocompetente, que apresentava, havia 3 semanas, apatia e confusão mental progressivas, alterações de memória, febre e cefaléia frontal. A ressonância magnética (RM) de encéfalo mostrava sinais de necrose dos núcleos amigdalianos e dilatação dos ventrículos laterais, o exame do líquido cefalorraqueano (LCR) apresentava pleocitose de 240 leucócitos/mm3 com predomínio linfomonocitário, 30 hemácias/mm3, hiperproteinorraquia (167 mg/dL) e PCR para herpes vírus negativo. O EEG evidenciava sinais de sofrimento cerebral difuso. Após seis dias de internação e recebendo aciclovir endovenoso, o paciente apresentou hemiparesia direita . Após uma semana, a RM mostrava, além das alterações iniciais, infartos cerebrais múltiplos no cerebelo, substância branca e tronco cerebral, e aumento da captação de contraste meníngeo ao redor do bulbo, da ponte e dos pedúnculos cerebrais. Foi introduzida corticoterapia sem melhora do quadro clínico e um segundo exame do LCR (punção atraumática) mostrava pleocitose linfomonocitária com hiperproteinorraquia e 290 hemácias/ mm3. O PCR para herpes mantinha-se negativo. A arteriografia cerebral revelou-se normal. Após 1 mês do início dos sintomas, o paciente apresentava piora progressiva. A RM mostrava lesão hemorrágica temporal esquerda e o exame do LCR as mesmas alterações anteriores, mas dessa vez o PCR para VZV positivara-se. O paciente morreu ao final de 45 dias de evolução clínica de choque séptico com foco originalmente pulmonar. Num contexto como esse, ou seja, um quadro encefalítico associado a acidentes vasculares isquêmicos, multifocais e hemorrágicos a hipótese de encefalite pelo VZV deve ser aventada. Os infartos observados nesse paciente eram pequenos, não apresentavam distribuição vascular precisa e predominavam nos territórios mais profundos, levando à conclusão de vasculite de pequenos vasos, hipótese essa confirmada pela negatividade da arteriografia. Embora a vasculite cerebral de pequenos vasos na encefalite pelo VZV seja mais freqüente nos indivíduos imunodeprimidos, o paciente em questão não apresentava deficiências imunológicas. Com relação ao exame do LCR, a presença de hemácias reflete uma lesão necrohemorrágica, semelhante à meningoencefalite herpética pelo Herpes simplex tipo 1. A menor sensibilidade da PCR para VZV no LCR, sobretudo quando comparada ao PCR para Herpes simplex, pode ser explicada pelo grande tropismo celular do VZV e pela forma subaguda de evolução da doença, que diminui a carga viral no LCR devido à maior quantidade de anticorpos já presentes. A detecção de anticorpos de classe IgM, assim como o aumento do índice de anticorpos permitem afirmar o diagnóstico. Os autores concluem que se deve suspeitar de VZV como causa de meningoencefalite sempre que haja evolução sub aguda ou crônica com vasculite, mesmo na ausência de lesões cutâneas e PCR negativa. Insistem, ainda, importância da repetição dos exames imunológicos e de PCR no LCR e no soro. 29 Clinical course in young patients with sporadic Creutzfeldt-Jakob disease. Boesenberg C, et al. Ann Neurol 58:533, 2005. Os autores pretendem, nesse trabalho, estudar as características clínicas e laboratoriais da doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ), forma esporádica, em indivíduos jovens. A DCJ forma esporádica é caracterizada por perda neuronal, gliose, degeneração espongiforme e acúmulo de uma forma anormal de proteína priônica (PrP Sc). Afeta sobretudo indivíduos na faixa dos 60-70 anos e cursa com quadro demencial rapidamente progressivo e alguns sinais focais neurológicos, como mioclonias, sinais piramidais e extrapiramidais, mutismo acinético. Alterações no EEG, presença da proteína 14.3.3 no líquor e alterações de sinal da ressonância magnética (RM) nos núcleos da base são sinais sugestivos, mas não específicos. A classificação molecular dos diversos subtipos da DCJ forma esporádica é baseada na análise do genótipo do polimorfismo do códon 129 do gene da proteína priônica (PRNP). Indivíduos mais jovens podem apresentar a foram esporádica da DCJ, mas o quadro clínico difere daquele de pacientes mais idosos. Uma forma variante da DCJ também foi descrita e afeta indivíduos mais jovens (3a década de vida) e difere das formas esporádicas pela precocidade com que aparecem os sintomas psiquiátricos. O objetivo dos autores é mostrar as diferenças clínicas, laboratoriais, genéticas e neuropatológicas da DCJ forma esporádica nos indivíduos jovens e idosos, e verificar se há similaridade dos sinais clínicos nos indivíduos jovens com DCJ forma esporádica e variante. Foram estudados 52 pacientes com idades até 50 anos com diagnóstico provável ou de certeza da forma esporádica da DCJ. Do ponto de vista clínico, 65% dos pacientes apresentavam os sinais clínicos clássicos, como mioclonias, mutismo acinético, sinais piramidais, cerebelares e/ou extra-piramidais. Alterações psiquiátricas foram observadas em 81%. Demência foi observada em 94% dos casos, na maior parte das vezes nos estágios mais precoces da doença. Os estudos genéticos mostraram que no início da doença as manifestações clínicas variam de acordo com o genótipo, o grupo MM apresentava mais alterações visuais enquanto que os grupos VV e MV apresentavam-se mais freqüentemente com quadros demenciais. Com relação aos exames subsidiários, o grupo MM mostrou alterações mais típicas no EEG que os outros grupos. Na determinação da proteína 14.3.3, não houve alterações significativas entre os genótipos, sendo a sensibilidade encontrada de 92%. O estudo mostrou diferenças nos sinais clínicos e neuropatológicos entre os indivíduos jovens e idosos na DCJ forma esporádica. Os indivíduos mais jovens apresentam evolução clínica mais prolongada e alterações neuropatológicas mais severas. Os indivíduos mais jovens apresentam menos freqüentemente alterações típicas no EEG e na RM. Apesar da alta freqüência de manifestações psiquiátricas e do longo tempo de evolução da doença poder dificultar o diagnóstico diferencial entre as formas esporádica e variante, na forma esporádica, os sinais neurológicos focais aprecem mais precocemente, a freqüência de positividade da presença de proteína 14.3.3 no LCR é maior e a RM mostra, com mais sensibilidade, aumento de sinal em núcleos da base, enquanto que na forma variante o sinal é mais intenso no pulvinar. 30 DC DE MOLÉSTIAS NEUROMUSCULARES Skeletal muscle involvement in Human Immunodeficiency Virus (HIV)–infected patients in the era of Highly Active Antiretroviral Therapy (HAART). Authier FJ et al. Muscle & Nerve 32: 247, 2005. Este é um artigo de revisão sobre as miopatias relacionadas à infecção pelo HIV levandose em conta a nova terapia antiretroviral altamente ativa (HAART), que consiste no emprego de duas drogas inibidoras da transcriptase reversa análoga a nucleosídeo (NRTI), com uma ou mais drogas inibidoras de protease (PI). Esta nova terapia aumentou a sobrevida dos pacientes, fazendo com que nos deparemos com mais freqüência na prática clínica com miopatias iatrogênicas, ou de origem autoimune, ou mesmo ligadas ao ressurgimento da imunidade após imunodepressão, tornado incomuns as miopatias pelos agentes oportunistas, as quais veremos apenas em pacientes não tratados, sobretudo nos países mais pobres da África. O artigo divide as miopatias em: 1. Miopatias relacionadas ao HIV. 1.1. Dentre elas a polimiosite na qual a ênfase quanto à etiopatogenia é para o papel do linfócito CD8 citotóxico dirigido contra um auto antígeno ainda não determinado, além da interação com moléculas pró inflamatórias. O papel do HIV provavelmente estaria ligado à quebra da tolerância imunológica já que não foi detectado diretamente na fibra muscular. O tratamento é semelhante aos casos não infectados pelo HIV. Os autores chamam a atenção para o surgimento da polimiosite em pacientes que tiveram sua imunidade restaurada pelo uso da HAART, e cujo diagnóstico diferencial deve ser feito como miopatia iatrogênica (Síndrome da restauração imunológica). 1.2. Miosite por corpos de inclusão. Também de origem autoimune e semelhante à forma habitual. 1.3. Miopatia nemalínica em casos de pacientes com fraqueza, atrofia muscular e aumento de CK, nos quais a biópsia mostra a presença dos corpos nemalínicos intracitoplasmáticos, e atrofia de fibras tipo I. 1.4. Síndrome da linfocitose difusa infiltrativa (DILS) Nela ocorre linfocitose CD8 com invasão da parótida e outros órgãos, causando síndrome sicca, podendo cursar com neuropatia periférica e polimiosite. 1.5. Na síndrome comsumptiva, caracterizada pela perda de peso, diarréia por período superior a 30 dias, fraqueza, febre por período maior do que 30 dias, ocorre atrofia de fibras tipo II. O papel do HIV estaria na ativação de moléculas pró-inflamatórias geradoras de caquexia, ou no aumento da expressão de agentes reguladores negativos da miostatina que atua na regeneração muscular. 1.6. Vasculite necrotizante Geralmente cursa associada à polineuropatia, sendo raramente isolada. Pode ser induzida pelo HIV ou outro agente infeccioso e por drogas. A polineuropatia é sobretudo simétrica, distal, com mialgia. O padrão de mononeuropatia ou polineuropatia assimétrica não é o mais comum. O tratamento consiste em drogas antiretrovirais e imunomodulação (Ig EV, plasmaferese). 1.7. Foram descritos alguns casos de miastenia gravis. Neles pode não haver Ac antireceptor de acetilcolina detectável e pode surgir após o uso do ritonavir. 2. Complicações musculares da terapia antiretroviral: 2.1. Miopatias induzidas por drogas (NRTI) como a zidovudina. Trata-se de miopatia mitocondrial tóxica em pacientes submetidos a doses altas e cumulativas da droga. A 31 mesma age reduzindo o complexo IV da cadeia respiratória (cox, citocromo c oxidase). Preconiza-se nestes casos o uso de suplementos dietéticos antioxidantes como as vitaminas C e E. Existe ainda o papel da deficiência em selênio nestes pacientes. O selênio atua removendo radicais livres. Esta deficiência agrava ainda mais a miopatia iatrogênica. 2.2. Síndrome de acidose lática, esteatose hepática, pancreatite e possibilidade de miopatia mitocondrial com acúmulo lipídico Ocorre com o uso da estavudina associada a outros análogos e inibidores da protease. 2.3. Síndrome da lipodistrofia que consiste em hiperlipidemia, resistência à insulina e alteração morfológica com distribuição anormal de gordura corpórea, principalmente relacionada ao uso dos inibidores das proteases. Esta lipodistrofia causa confusão com quadro miopático franco. 3. Infecções oportunistas Raramente reconhecidas como as piomisites causadas por Staphylococcus aureus, CMV, toxoplasmose, criptococo, Mycobacterium avium, entre outros. Ocorre em pacientes imunossuprimidos. 4. Tumores. Do tipo linfoma não Hodgkin ocorre também em estados avançados de imunodeficiência. 5. Rabdomiólise. Pode ser causada pelo HIV, por drogas como a didanosina, lamivudina, ritonavir, indinavir, sulfametoxazol e trimetropim, além de agentes infecciosos oportunistas 6. Por último, e não menos comum ou menos grave, o surgimento de miopatia e até mesmo rabdomiólise causadas por estatinas usadas para controle de hiperlipidemia induzida pelos inibidores de proteases.
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