I Simpósio da Câmara Técnica de Bioética do CRM MG, 14
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I Simpósio da Câmara Técnica de Bioética do CRM MG, 14
A Personalidade Jurídica do Nascituro e do Embrião Maria de Fátima Freire de Sá Professora dos Programas de Graduação e Pós-Graduação lato e stricto sensu em Direito na PUC Minas. Pesquisadora do Centro de Estudos em Biodireito – CEBID www.cebid.com.br • No Direito Civil brasileiro, vingou a idéia de que a personalidade é determinada pelo nascimento. Tanto o Código de 1916, no art. 4º, quanto o Código Civil de 2002, em seu art. 2º, filiaram-se à Teoria Natalista: • “Art. 2º - A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.” • A práxis, no entanto, demonstrou incongruências: se o nascituro pode receber doação; ser legatário; ver-se representado por um curador ao ventre em caso de conflito de interesses com a mãe ou o mesmo em caso de incapacidade dessa; possuir capacidade para ser parte em ação judicial, como não lhe atribuir personalidade? www.cebid.com.br A Personalidade Jurídica e a Personalidade do Nascituro na Fundamentação Clássica: • Na Idade Média a questão da personalidade era trabalhada de maneira difusa. Ser pessoa era condição restrita a certa classe, em que a idéia de igualdade se fazia dentro dos estamentos sociais, aos escravos, por exemplo, não era atribuída a personalidade, eles eram patrimônios de um sujeito proprietário. • Com a formação do capitalismo, o trabalhador adquiriu liberdade formal. A burguesia clamava pelo fim da escravidão como meio de valorar a força de trabalho. www.cebid.com.br • “ A implantação do modo de produção capitalista acarretou assim a necessidade de universalização destes conceitos: todos passam a ser proprietários, ou de bens que lhes permitam subsistir, ou de força de trabalho que vendam. Por isso, todos passam a ser sujeitos jurídicos, todos passam a ter capacidade negocial.” ( PRATA, 1982) • A todo homem foi conhecida a condição de sujeito de direitos, originariamente por vincular-se à capacidade de exercício do direito de propriedade. • O abstracionismo culminou na elaboração da teoria clássica da relação jurídica, explicada pela existência de dois sujeitos contrapostos, dotados de personalidade. www.cebid.com.br • Sendo a personalidade e a capacidade criações da necessidade patrimonial burguesa, errôneo seria pensar em situações que envolvessem o nascituro pois, esse ser não contribuiria para o desenvolvimento econômico. Logo, todas as questões atinentes à personalidade e, portanto, envolvendo sujeitos de direito, eram travadas no campo patrimonial. • A personalidade foi inserida nos códigos civis como exigência do direito natural: “todos os homens são necessariamente livres, cabendo-lhes, pois, personalidade.” O código era a fonte perfeita do Direito, desnecessária, pois, qualquer interpretação. www.cebid.com.br • O Direito aproximara-se das ciências naturais e seu método deveria ser descrito em fórmulas simples, garantidoras de segurança jurídica. As categorias positivas conteriam definições reais. Porém, a cientificização do Direito criou uma ampla esfera de exclusões. • O Estado Democrático de Direito reconhece que o ordenamento jurídico só ganha sentido em um contexto lingüístico; descrições adquirem sentido tão-somente na argumentação, mas parece que nossa Ciência do Direito disso tem-se esquecido. Afirmações de que a personalidade é inerente, natural ou consentânea à própria realidade humana reduzem o Direito à esfera moral. www.cebid.com.br Teorias de Personalidade do Nascituro: Teoria Concepcionista: • A personalidade se inicia desde a concepção. O nascituro é pessoa, pois gerado, embora não nascido. www.cebid.com.br Teoria da Personalidade Condicional: • Defende o início da personalidade a partir da concepção, desde que a criança nasça com vida. A aquisição de direitos pelo nascituro seria feita pelo implemento da condição resolutiva “nascer com vida”. • Condição é cláusula voluntariamente aposta em negócio jurídico que subordina seus efeitos a evento futuro e incerto. www.cebid.com.br Teoria Natalista: • A personalidade surge a partir do nascimento, portanto, nascituro não é pessoa, ainda que receba alguma proteção legal. A sua realidade biológica é distinta dos seres nascidos. • Este argumento é uma ontologização pois, trazem uma essência única para o ser humano, diferenciando-o daquele em formação. www.cebid.com.br • Existem justificativas para a proteção do nascituro, sem atribuir-lhes a personalidade: o nascituro tem expectativa de direito e seria tutelado em virtude de interesse público na proteção da vida. • “ A expectativa de direito é direito subjetivo com eficácia suspensa ou em formação. Nesse sentido, o disposto no § 2º do art. 6º da LICC. Falar-se em condição ou expectativa de direito é reconhecer-se o nascituro como titular de direitos em formação, o que pressupõe titularidade, obviamente, personalidade. [...] só pode ser titular de direitos quem tiver personalidade, donde concluir-se que, formalmente, o nascituro tem personalidade jurídica.” (AMARAL, 2003) www.cebid.com.br • No Direito Civil brasileiro, vingou a idéia de que a personalidade é determinada pelo nascimento. Tanto o Código de 1916, no art. 4º, quanto o Código Civil de 2002, em seu art. 2º, filiaram-se à Teoria Natalista: • “Art. 2o - A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.” www.cebid.com.br A Personalidade Como Centro de Imputação: • A concepção de relação jurídica está intimamente ligada à direito subjetivo. Relação jurídica é o vínculo entre dois ou mais sujeitos, estabelecido em virtude de um objeto. São sujeitos dessa relação aqueles entes dotados de personalidade jurídica. Para esta corrente, sujeitos são os entes a que o ordenamento outorga direitos e deveres. • Porém, além da relação jurídica, haveria situações anômalas, que dispensam a intersubjetividade; seriam as situações subjetivas. • Pietro Perlingieri esboça uma teoria da situação jurídica subjetiva em sua obra Perfis do Direito Civil. www.cebid.com.br • A situação jurídica subjetiva é categoria geral de avaliação do agir humano; é um centro de interesses tutelados pelo ordenamento jurídico que ainda não possuem um titular. Esta é a situação do nascituro, que pode até receber doação (art. 542 do Código Civil), há o interesse tutelado mas seu titular não existe, pois só se constitui “sujeito”, a partir do nascimento com vida. • O Direito não pode limitar-se a afirmar partícipes de situações jurídicas apenas entes nascidos. • O nascituro é centro de imputação, e as situações jurídicas das quais participa, seja como direito, dever, ônus, sujeição e faculdade dependerão do caso concreto. www.cebid.com.br • No Rio Grande do Sul, magistrados vêm decidindo por deferir aos genitores o seguro obrigatório por acidente (DPVAT) ao fundamento de que: “Não tem o nascituro somente expectativas de direitos, sendo, no tocante aos mesmo [direitos de personalidade], de forma efetiva, sujeito de direito. Todos os fatos relacionados à sua vida desde o momento da concepção, geram consequências jurídicas.” www.cebid.com.br • Outro acórdão inovador foi em relação ao registro de um natimorto. A discussão se verificou em razão de um aborto espontâneo na 14ª semana de gestação. O Tribunal rechaçou a alegação do Ministério Público e do Magistrado singular que se ampararam em um critério médico ao afirmarem que natimorto é o nascituro que vem a morrer após a 22ª semana de gestação. Em razão disso, deram provimento ao apelo dos pais para que lhes fosse confeccionada certidão de natimorto, conforme o art. 33, V e art. 53 § 1º da Lei n.6.015/73: • “Art. 33 - Haverá, em cada cartório, os seguintes livros, todos com 300 (trezentas) folhas cada um: V - "C Auxiliar - de registro de natimortos;” • “Art. 53 - No caso de ter a criança nascido morta ou no de ter morrido na ocasião do parto, será, não obstante, feito o assento com os elementos que couberem e com remissão ao do óbito. • § 1º No caso de ter a criança nascido morta, será o registro feito no livro "C Auxiliar", com os elementos que couberem.” www.cebid.com.br • Existem autores que afirmam ser o nascituro detentor apenas de capacidade processual. A legitimatio ad processum implica, no mínimo a possibilidade de ter direitos, e sabemos que apenas à pessoa pode-se atribuir direitos. Logo, se há possibilidade judiciária de se discutir situações jurídicas, ao nascituro não cabe apenas capacidade processual, mas personalidade civil. www.cebid.com.br O Embrião é Pessoa em Sentido Jurídico? www.cebid.com.br Lei de Biossegurança, art.5º • “Art.5º - É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, nas seguintes condições: I – sejam embriões inviáveis; ou II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento. §1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores. www.cebid.com.br Considerações Finais: • Sendo o nascituro o centro de imputação, errônea é a filiação a alguma teoria para atribuir-lhe personalidade. Esta se faz diante de situações jurídicas a ele previstas normativamente. • O embrião humano é passível de tutela, porém o ordenamento jurídico não lhe imputa situações jurídicas. Assim, não há como considerar detentor de direitos subjetivos, deveres jurídicos, direitos potestativos, sujeição, poderes, ônus ou faculdades. www.cebid.com.br • As teorias são úteis em um discurso de justificação, pois justificam moral, física ou psicologicamente. Se o direito subjetivo paira sobre nós, mas é alcançado argumentativamente, não precisamos recorrer àquelas teorias para atribuir personalidade ao nascituro. Esse, como referencial de imputação, pode participar de situações jurídicas, e é isso que lhe confere personalidade. www.cebid.com.br OBRIGADA! www.cebid.com.br www.cebid.com.br
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