GT 7 - PIZZI, Jovino
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GT 7 - PIZZI, Jovino
REPRESENTAÇÕES DA JUSTIÇA E LUTA POR RECONHECIMENTO Jovino Pizzi- UFPel Vanessa dos Santos Nogueira- UFPel Introdução A problemática desse trabalho está centrada na reflexão sobre como a representação da justiça pode ser vista desde vários aspectos. Todavia, o foco principal não pode deixar de lado os atores-sujeitos da própria justiça. Por isso, qualquer tentativa de refletir a questão, deve ter em vista os envolvidos para, desta forma, poder ver as articulações concretas do fenômeno. Nesse sentido, Paul Ricoeur apresenta uma formulação importante que permite avançar nessa discussão. Ele propõe três pontos essenciais: o que é, como e quem. Essas três referências presumem um estudo que não se atém apenas a conceituação (o que é), mas a representação do processo que envolve os sujeitos (quem) e o procedimento (como). Desta forma, pretendese desmistificar a ideia da imagem enquanto mera representação dos fenômenos a partir do reconhecimento intersujetivo proposto por Axel Honneth. O trabalho, de cunho bibliográfico, com base na filosofia prática que: “[..] trata-se de uma temática preocupada com o sentido da própria filosofia e de sua responsabilidade frente às questões cruciais de nosso tempo” (Pizzi, 2012, p. 12), bem como suas contribuições para compreender as representações justiça e as articulações concretas do fenômeno da justiça. Pensar as representações de justiça como uma simples análise das imagens imprimidas nos remete a mera representação de justiça que reforça as suspeitas e consagra a desconfiança frente à simples representação dos fenômenos. Na verdade, a representação está vinculada a uma idealização que, às vezes, desqualifica as evidências da vida cotidiana. Essa ambivalência apresenta conotações que, no processo compreensivo do fenômeno, provoca o menosprezo e acaba gerando indícios enigmáticos a respeito da contextualidade vivencial das representações. Por um lado, há a referência idealizada do próprio fenômeno e, por outro, uma desconfiança desmedida. Nesse caso, a experiência vivencial cotidiana não passa de representações indecifráveis. Em Platão, por exemplo, a ideia de um mundo efêmero e visível indica o descrédito e o menosprezo ao mundano, isto é, ao horizonte ligado às circunstancialidades vivenciais. A realidade vinculada à doxa, para utilizar a expressão mais pertinente, não passa de um horizonte inapropriado, isto é, um pseudo-horizonte e, portanto, completamente deslocado e esvaziado de qualquer sentido. Por isso, os que se detêm à realidade mundana vivem, segundo o filósofo grego, uma vida inautêntica e, em razão disso, suas pretensões podem ser simplesmente desqualificadas. Representações de Justiça A representação da justiça pode ser vista desde vários aspectos. Todavia, o foco principal não pode deixar de lado os atores-sujeitos da própria justiça. Por isso, qualquer tentativa de refletir a questão, deve ter em vista os envolvidos para, desta forma, poder ver as articulações concretas do fenômeno. Nesse sentido, Paul Ricoeur apresenta uma formulação importante que permite avançar nessa discussão. Ele propõe três pontos essenciais: o que é, como e quem. Essas três referências presumem um estudo que não se atém apenas a conceituação (o que é), mas a representação do processo que envolve os sujeitos (quem) e o procedimento (como). Desta forma, pretende-se desmistificar a ideia da imagem enquanto mera representação dos fenômenos. De acordo com Fornet-Betancourt, esse descrédito vai de “Platão, com o mito da caverna, até Heidegger com sua análise da cotidianidade como lugar de vida inautêntica” (2010, p. 39). Em vista disso, não há como superar o caráter alienador do mundo da vida, pois se trata do “lugar de alienação, falta de verdade, de sentido e de autenticidade” e, portanto, como lugar impróprio para alcançar a “verdadeira” vida (Fornet-Betancourt, 2010, p. 41). Essa concepção alimenta uma “forte desvalorização da existência carnal e terrestre, rebaixada ao escalão de aparência ilusória da qual o homem deve buscar fugir se aspira a viver em conformidade com os impulsos superiores da alma” (Schimitt, 2006, I, p. 254). Assim, as circunstancialidades do mundo da vida não passam de empecilhos relacionados ao processo de racionalização sistêmica e, pois isso, elas bloqueiam a possível efetivação da justiça entre os sujeitos, permanecendo, portanto, em uma mera representação formal – quando não quantitativa e midiática. Nesse sentido, as figuras ou representações como as do exílio ou do sofrimento, por exemplo, acenam para o aspecto de fragilidade e fugacidade, em sentido oposto ao da plenitude, para o “qual nos orientamos moral ou espiritualmente” (Taylor, 2010, p. 18). Nessa contraposição, há uma espécie de dilema entre o que seja justiça e a certificação de quem são realmente os “sujeitos” da justiça e da injustiça. Nesse sentido e o melhor dos casos, a justiça se resume ao âmbito judicial; e nada mais. É nesse sentido que se insiste na dicotomia entre a idealização e o âmbito vivencial, conquanto o agir voltado ao modo “habitual” da vida e a projeção de um ideal transcendente e de “vida plena”. Essa vida plena – e, portanto, vinculada à noção de eternidade – se traduz em uma linguagem ideal e reflete uma forma de vida imbricada à plenitude, à perfeição e à harmonia. Na verdade, a perspectiva da plenitude é, ao mesmo tempo, o oposto da realidade circunstancial e, em decorrência, modeladora e protótipo da vida terrenal. Esse aspecto eidético exprime, pois, uma “intemporalidade” (Merleau-Ponty, 1984, p. 30). Essa perspectiva aponta para a necessidade de “renunciar esse lugar” comum, esse horizonte de sentido – embora seu caráter relativamente enigmático – ligado às situações cotidianas. Enfim, a realidade cotidiana se relaciona ao perecível e, por isso, não serve como base para qualquer tentativa de fundamentação racional. O protótipo está, pois, ausente do mundo, de forma a negar qualquer possibilidade de realização – ou, então, de salvação. Por isso, o “lugar da plenitude” é compreendido “como fora ou além da vida humana” (Taylor, 2010, p. 29). Em Platão, o sentido das vivências aparece ligado à preocupação em afiançar um entendimento que “só podem ser compreendidas por meio das ideias” (Taylor, 2010, p. 29). Em outras palavras, o “verdadeiro” e a plenitude só podem ser representados desde o horizonte transcendente, pois o patamar da justificação pertence a outro nível, separado da realidade mundana e terráquea. Na verdade, o ideal de vida se vincula a um ideal forâneo, ou seja, uma imagem com dupla representação. Nesse plano, vigora um tipo eidolon (εἴδωλον, ghost), isto é, uma disposição com caráter ideal que se sobrepõe ao sensível e ao cotidiano. Esse caráter forâneo reflete um projeto hegemônico e unilateral, anulando, portanto, a reflexividade crítica, porque a unidade do cosmos e seu caráter transcendente impõe um tipo de harmonia que não pode ser factível com as circunstancialidades do mundo dos humanos e de não humanos. Nesse sentido, o imperativo da submissão conduz à uniformização de um estilo de vida conforme o modelo desenhado desde fora. No caso, as historias particulares e circunstanciais, o passado e o presente do peculiar e do singular sofrem a condenação de um horizonte vinculado ao “desprezo e à difamação” (Fornet-Betancourt, 2010, p. 40). Nesse sentido, a intenção volta-se a delinear do sujeito pronominal, vale dizer, insistir na ideia de um sujeito participante e, portanto, sem qualquer possibilidade de neutralidade. A nossa proposta se origina da leitura de Paul Ricoeur (2007), quando insiste na separação entre a abordagem “objetual” e a forma pronominal de reconhecer o sujeito participante. Na verdade, ninguém questiona a forma falante versus ouvintes, tão preciosa para a grande maioria dos que assumiram o giro linguístico da filosofia. Não se trata de questionar a importância dessa transformação, nem que reassumir os padrões da filosofia da consciência ou de perspectiva egológica da experiência intersubjetiva. Por isso, quando Ricoeur utiliza a “forma pronominal” (2007, p. 23), ele, de uma forma ou de outra, redimensiona a categorização do sujeito comunicativo. A mudança indica uma forma de tratamento pronominal que não se resume ao binômio falante-ouvinte, aspecto tão precioso para a Teoria do Agir Comunicativo. Nesse sentido, a forma pronominal requer que todos os pronomes pessoais sejam reconhecidos e admitidos como atores. Em outras palavras, não há pronome pessoal neutro e, em decorrência, um sujeito neutro que deva ser considerado na sua absoluta neutralidade. Talvez possamos afirmar que o nível gramatica suporta, por exemplo, que a terceira pessoa (singular ou plural) seja admitida enquanto indicam um sujeito não-presente ou aparentemente sem uma intervenção direta na ação. Todavia, as exigências pragmáticocomunicativa presumem um tratamento pronominal do sujeito, de forma a garantir tanto ao sujeito falante (singular ou plural = eu ou nós), se defronta com ouvintes (singular ou plural = tu ou vós), e também – no mesmo nível –, assim como não pode ignorar a perspectiva do pronome pessoal ele e/ou eles. Esse abandono ou, então, a suposição de que há terceiras pessoas neutras tem consequências desastrosas para a própria fundamentação discursiva da moral, como também para o conceito de democracia, de esfera pública e assim por diante. Em Ricoeur, a exigência do pronome pessoal salienta a atitude reflexiva. A forma como Ricoeur justifica tem em vista três perguntas: o que; quem; e como. Segundo o autor, colocar a pergunta “o que” antes da pergunta “quem” implica na prevalência do “lado egológico da experiência”, traduzindo em um impasse (2007, p. 23). Na verdade, o agir delineado em termos do eu-sujeito tende a refletir o aspecto coletivo como se fosse um conceito analógico. Em outras palavras, o sujeito da ação desde a primeira pessoa do singular pode introduzir no coletivo uma compreensão analógica, às vezes até mesmo um “corpo estranho”, desenhado desde o falante sujeito-ator. Em termos da teoria do agir comunicativo, o ato locucionário na primeira pessoa do singular, o falante não se comporta apenas como ator proponente, como também pode induzir uma justificação que nada mais é do que a sua compreensão. No caso, o e os ouvintes nada mais conseguem a não ser assimilar e admitir essa proposição como se ela fosse expressão da vontade de todos os concernidos. Por isso, Ricoeur inverte a ordem das questões e coloca a pergunta “quem” antes do perguntar-se sobre o “que” isso significa. Para Ricoeur, uma boa doutrina fenomenológica deve preocupar-se em primeiro lugar com “a questão intencional”, isto é com os sujeitos em “todas as pessoas gramaticais” (2007, p. 23). Em outras palavras, o desdobramento da pergunta “quem” representa o lado pragmático, enquanto a pergunta “o que” revela o lado propriamente cognitivo. Por isso, há uma prevalência do lado pronominal, o que significa, em outras palavras, que nenhuma dos pronomes gramaticais pode ser considerado como neutro ou desinteressado. Em síntese, o que pretende-se apresentar trata de mostrar que o binômio “sujeito versus ouvinte” pode dar entender a possibilidade considerar a terceira pessoa (singular e plural) enquanto pronomes de caráter neutro ou desinteressado. Se isso for assim, haveria a necessidade de um novo giro ao linguistic turn. No fundo, haveria a necessidade de configurar uma teoria do agir que pudesse garantir um papel participante aos sujeitos coautores, mesmo que no pronome pessoal estivesse na terceira pessoa (singular ou plural). Teoria do Reconhecimento Entende-se que a teoria do reconhecimento, através do reconhecimento intersubjetivo, apresenta-se como uma possibilidade de repensar as relações sociais que são estabecidas pelos sujeitos na sua organização social e como fundamentar o ponto de vista moral encarnado numa teoria da justiça. Pensar sobre as relações sociais de reconhecimento intersubjetivo, nos leva destacar que: “Não é o possibilitar a liberdade moral sob leis igualitárias o ponto de referência decisivo e normativo para Honneth, mas o possibilitar social da liberdade ética de uma autorrelação bem sucedida. (Habermas, 2011, p. 340). Essa relação cooperativa remete às relações sociais onde: "a categoria do reconhecimento assume as exigências da teoria do agir comunicativo. No caso, o reconhecimento aparece como um elemento inerente ao reconhecimento social. " (Pizzi, 2012, p. 10). Destaca-se aqui, uma breve descrição dos três padrões de reconhecimento intersubjetivos propostos por Honneth (2009a) fundada em três vertentes teóricas: […] o modelo hegeliano, a perspectiva de “poder” de Foucault e a psicologia social de G. H. Mead. Dessas releituras, ele procura desenvolver uma teoria normativa e substancial da sociedade vinculada à idéia de compromisso moral e desenvolvimento social do sujeito. Nesse sentido, a filosofia re-situa o foco e redefine seu papel, re-contextualizada na realidade da vida social para, deste modo, delinear um marco normativo capaz de mediar linguisticamente a convivência social. (Pizzi, 2012, p. 9). A teoria do reconhecimento é divida em três esferas: o amor (relações primárias), o direito (relações jurídicas) e a solidariedade (comunidade de valores). O autor embasou essa construção teórica na psicologia social de George Mead1 e na teoria social de teor normativo do jovem Hegel, avaliando as aproximações das pesquisas desses dois autores e buscando 1 George Herbert Mead (1863-1931) foi um dos fundadores do interacionismo simbólico, pertenceu a escola de psicologia de Chicago e da corrente pragmática da filosofia americana. estabelecer relações entre elas para sustentar a sua tese de reconhecimento (Honneth, 2009a). Pode-se vizualizar a estrutura das relações sociais de reconhecimento no quadro abaixo: Estrutura das relações sociais de reconhecimento Modos de reconhecimento Dedicação emotiva Dimensões da Natureza carencial personalidade e afetiva Formas de Relações primárias (amor, reconhecimento amizade) Potencial evolutivo Autorrelação Autoconfiança prática Formas de Maus-tratos desrespeito e violação Componentes Integridade física ameaçados da personalidade Fonte: Honneth (2009a, p. 211). Respeito cognitivo Estima social Imputabilidade moral Relações jurídicas (direitos) Generalização, materialização Autorrespeito Capacidades e propriedades Comunidades de valores (solidariedade) Individualização, igualização Autoestima Privação de direitos e exclusão Integridade social Degradação e ofensa “Honra”, dignidade Esse quadro de categorias apresenta uma síntese da tese de reconhecimento do outro de Honneth, realizando uma reconstrução atualizada das teorias de Hegel e Mead através do que o autor chama de “fenomenologia empiricamente controlada de formas de reconhecimento” (Honneth, 2009a, p. 121). A primeira forma de reconhecimento, descrita por Honneth, é o amor, em especial, a relação primária estabelecida entre mãe e filho como uma representação simbiótica, considerando que toda relação amorosa está ligada à empatia e à atração, numa relação simultânea da afirmação da autonomia apoiada pela dedicação (Honneth, 2009a). Em seu livro, publicado em conjunto com Nancy Fraser, Redistribuição e Reconhecimento (Umverteilung und Anerkennung), e no posfácio da nova edição de seu livro Luta por Reconhecimento (Kampf um Anerkennung), Honneth corrigiu uma das principais teses de sua teoria: hoje ele considera que também na esfera do amor pode ser encontrado um potencial normativo, que é desenvolvido historicamente através de conflitos e lutas sociais. (Saavedra, 2008, p.25). A segunda forma de reconhecimento proposta é a do direito, diferenciado do amor no sentindo que este “[...] só pode se constituir na sequência de evolução histórica” (Honneth, 2009a, p. 180). Essa forma de reconhecimento pode variar de acordo com o cenário histórico e a forma de organização social de determinada sociedade. Nesse sentido, o autor faz referência a uma aplicação específica: “[...] um direito universalmente válido deve ser questionado, à luz das descrições empíricas da situação, no sentido de saber a que círculo de sujeitos ele deve se aplicar, visto que eles pertencem a classes de pessoas moralmente imputáveis” (Honneth, 2009a, p. 186). A terceira forma de conhecimento, a estima social, difere do direito, pois esta trata das propriedades particulares que definem o sujeito como diferente dos outros, enquanto que a outra caracteriza o reconhecimento do sujeito a partir das normas da sociedade. Destaca-se ainda que a busca por reconhecimento se apresenta como: […] uma luta (que) só pode ser caracterizada de ‘social’ na medida em que seus objetivos se deixam generalizar para além do horizonte das intenções individuais, chegando a um ponto em que eles podem se tornar a base de um movimento coletivo (Honneth, 2009a, p. 256). As três esferas do reconhecimento (Honneth, 2009a), fundadas na luta de classes e no desrespeito, buscam descrever as formas como os sujeito co-autores se reconhecem ma medida em que reconhece o outro e se reconhece na sociedade. A consciência de injustiças e exclusões sociais não omite a tendência de um tensionamento provodado pela normalização das patologias sociais. O que predomina, na maioria das vezes, como moralmente relevantes, são apenas as experiências de sofrimento e os aspectos deficitários da convivência, fazendo com que os sujeitos tenham a sensação de incapacidade de identificar, inclusive, as situações de injustiça que sequer conseguem ganhar a atenção pública (Honneth, 2006). Nesse sentido: "Honneth procura salientar o compromiso moral, cujo foco é uma filosofia re-contextualizada na realidade social (Pizzi, 2012, p. 10). Essa nova proposta de uma filosofia engajada com a realidade social nos remete aos modelos imprimidos ao longo da história e ao modelo normativo alternativo de justiça proposto por Honneth. O esforço de Honneth para propor um novo modelo de justiça recai sobre num primeiro momento em atualizar a noção de justiça/direito desenvolvidas pelo jovem Hegel em Jena, vendo nessa vertente teótica a possibilidade de reconstrução de uma teoria social que considerando os conflitos sociais como alernativa para solucionar o defict sociológico da teoria crítica, o segundo movimento do autor é contrapor uma teoria da justiça atualizada em Hegel e o pensamento procedimentalisda de John Rawls, que tem como base para seu modelo de justiça o pensamento kantiano (Werle; Melo, 2007). A consciência de injustiças e exclusões sociais não omite a tendência de um tensionamento provocadado pela normalização das patologias sociais. O que predomina, na maioria das vezes, como moralmente relevante, são apenas as experiências de sofrimento e os aspectos deficitários do cotidiano, fazendo com que os sujeitos tenham a sensação de incapacidade de identificar, inclusive, as situações de injustiça que sequer conseguem ganhar a atenção pública (Honneth, 2006). Nesse sentido: "Honneth procura salientar o compromiso moral, cujo foco é uma filosofia re-contextualizada na realidade social (Pizzi, 2012, p. 10). Essa nova proposta de uma filosofia engajada com a realidade social nos remete aos modelos imprimidos ao longo da história e ao modelo normativo alternativo de justiça proposto por Honneth, envolvento as três esferas da Teoria do Reconhecimento. Assim, as formas de reconhecimento demarcam-se para uma leitura do nosso tempo, possibilitando identificar não só o reconhecimento como o não reconhecimento, oferecendo subsidios para uma reorganização social. Na questão da justiça Honneth considera que: O objeto central da teoria que tenho em mente é formado por relações de reconhecimento deste tipo, historicamente sempre já dadas; face a elas, nós não podemos nos colocar no papel de um legislador solitário ou discursivo, mas precisamos primeiro contentar-nos com a perspectiva da tomada de conhecimento e da aceitação (HONNETH, 2009b, p. 351). Tanto o amor como a solidadidade são latentes para o funcionamento de uma filosofia intercultural, e o papel da justiça posto não como um conjunto de normas que garante no papel que todos os cidadãos de bens tenham a garantia de um estado de bem estar e sim na medida em que reconhece a todos como conscientes e atuantes frente aos problemas sociais. Considerações finais Refletir sobre as representações de justiça nos remete a considerar assim como Ricoer, a transcender o campo da conceituação (o que é), mas considerar também a representação do processo que envolve os sujeitos (quem) e o procedimento (como). Do ponto de vista moral, deve-se salientar o “como” podemos fundamentar o ponto de vista moral e, ainda, “como” de fato os sujeitos coautores podem se posicionar frente a situações de justiça/injustiça, solidariedade/não solidariedade, compromisso moral/apatia. Nesse sentido, qualquer estudo a respeito do tema não deve apenas averiguar o que se entende por justiça e/ou injustiça, mas estudar prioritariamente o quem e como são configuradas as políticas de reconhecimento e verificar se elas conseguem superar as “debilidades motivacionais” e proporcionar uma educação comprometida com a justiça e a solidariedade. Nesse sentido, o modelo normativo de justiça proposto por Honneth considera o vínculo entre uma teoria da justiça encarnada com a sua época e com os conflitos que se apresentam como pano de fundo para o reconhecimento e o não reconhecimentos dos sujeitos coautores. Contudo, segundo o autor o princípio normativo de justiça que prevalece nas sociedades modernas está alicerçado na busca de condições necessárias para auto-realização individual, apresentando as três esferas de reconhecimento como possibilidade de reconstrução de uma teoria social que considere os conflitos sociais como caminho para superação do deficit sociológico da teoria crítica. Refletir sobre uma teoria da justiça, que tem como pano de fundo a teoria do reconhecimeno, que abarca os conflitos sociais considerando todos os sujeitos co-autores do mundo da vida, nos oferece um aporte-tórico embasado numa filosofia prática que não se detem a um sujeito descolado do seu cenário social, cultural e histórico. Não se limitanto a ideia de justiça separada da realidade ou como um conjunto de leis e normas dadas que balizam a contuda e normatização da vida em sociedade. Referências: FORNET-BETANCOURT, R. Introducción. In: Dokumentation des XIV. Internationalen Seminars des Dialogprogramms Nord-Süd. Verlagsgruppe Mainz: Aachen, 2010, p. 39-48. MERLEAU-PONTY, M. Sobre a fenomenologia da linguagem. In: Coleção Os Pensadores. 2 ed., São Paulo: Abril Cultural, 1984, p. 129-140. NOBRE, Marcos. Apresentação. In: HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. Tradução de Luiz Repa. 2. ed. Editora 34: São Paulo, 2009a. HONNETH, Axel. Redistribución como reconocimiento: respuesta a Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribución o reconocimiento? Trad. Pablo Manzano. Colecion Pedagogía Educacicón crítica. Paidéia; Ediciones Morata: Madrid, 2006. HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. Tradução de Luiz Repa. 2. ed. Editora 34: São Paulo, 2009a. HONNETH, Axel. A textura da justiça : Sobre os limites do procedimentalismo contemporâneo. Civitas, 2009b. PIZZI, J. Honneth frente ao definhamento da Teoia Crítica 'originnária' e a proposta de resgate da filosofia prática. Revista Reflexões, v. 1, p. 1-13, 2012. RICOEUR, P. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Editora Unicampo, 2007. SAAVEDRA, G. A. Reificação versus Reconhecimento. Sobre a Dimensão Antropológica das Teoria de Axel Honneth. Teoria e cultura (UFJF), v. 2, p. 25-38, 2008. SCHMITT, J.-C. Corpo e alma. In: SCHMITT, Jean-Claude; LE GOFF, Jacques. Dicionário temático do Ocidente Medieval. São Paulo: Edusc, 2006 (dois volumes), p. 253-267. TAYLOR, C. Uma era secular. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2010. WERLE, Denilson; MELO, Rúrion Soares. Teoria Crítica, teorias da justiça e a “reatualização” de Hegel. In: HONNET, Axel. Sofrimento de indeterminação: Uma reatualização da filosofia do direito de Hegel. São Paulo: Esfera Pública, 2007.
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