ANO III (2004) - Nº 22 a Nº 33

Transcrição

ANO III (2004) - Nº 22 a Nº 33
Artigo do Mês-Ano III - Nº 33-Dezembro de 2004
VERGONHA? O QUE É
ISSO MESMO?
“Meu filho, procure nunca ser de todos ao mesmo tempo.
Dizem que ‘quem não tem vergonha todo o mundo é seu’;
a verdade, porém, é que quem não tem vergonha é que é
de todo o mundo.”
(Barão de Cotegipe)
Brasília presenciou, na semana passada, um espetáculo
deprimente de atraso mental, de vagabundagem oficial e de falta
de vergonha federal. Como todos fomos informados, hordas de
esquerdopatas crônicos ocuparam a Esplanada dos Ministérios
para protestar contra a “reforma educacional” e a política
econômica do governo petista e para exigir do mesmo que
acelere o programa de reforma agrária.
O atraso mental dos estudantes que não estudam, dos
intelectuais que não pensam e dos agricultores que não plantam
ali reunidos só é comparável ao do governo petista, que não
governa. Equivale, para usarmos uma linguagem popular, a
alguém, em pleno ano da graça de 2004, declarar-se torcedor do
Rio Cricket Team, equipe de futebol há bastante tempo extinta,
que disputou os primeiros campeonatos do “velho e violento
esporte bretão” na cidade, naqueles tempos de fato maravilhosa,
de São Sebastião do Rio de Janeiro... Sim, ser comunista hoje
em dia, depois do que a história do século XX nos ensinou, é
como torcer pelo Rio Cricket, ou como cheirar rapé para espirrar,
ou tentar comprar roupas nas falecidas lojas Ducal.
A vagabundagem oficial, no sentido de ser exercida às
claras, sem qualquer preocupação com a necessidade de
esconder os próprios erros que a maioria das pessoas
experimenta – como a dos estudantes que, às escondidas,
cabulam aulas, por exemplo – pode ser resumida em poucas
perguntas: será que aqueles milhares de tontos não tinham nada
de útil para fazer durante uma semana inteira? Será que todos
estavam de férias? Será que aqueles estudantes, em época
bastante próxima da realização dos exames finais, estão levando
a sério os seus pretensos “estudos”? Será que aqueles pseudoagricultores não tinham mais o que fazer no campo, sei lá,
plantar, regar, colher, secar, descascar? Será que aquele bispo e
alguns religiosos presentes não tinham um trabalho
importantíssimo para fazer em suas dioceses e paróquias e o
deixaram de lado para protestar contra o que não conhecem a
fundo e para exigir o inexeqüível?
A falta de vergonha federal é que – pasmem-se! – tudo
aquilo contou com o patrocínio financeiro de dois ministérios, do
Banco Popular do Brasil, da Petrobrás e da Caixa Econômica
Federal, segundo a imprensa toda divulgou!
Falta de vergonha, falta de compostura, falta de ética e de
respeito a padrões morais mínimos exigidos pelo sistema
democrático! Como podemos aceitar que um governo patrocine
um protesto...contra ele próprio? Será que o PT não se deu
ainda conta que, desde o primeiro dia de 2002, deixou a
oposição que sempre exerceu com rancor e passou a ser
governo, que até aqui, já na metade do mandato, jamais exerceu
com um mínimo de pendor?
Dizer que a reforma agrária que aquelas hordas pretendem
é uma exaltação ao carro de boi e um abandono da tecnologia
moderna é chover no molhado; falar que a reforma educacional
que os “movimentos sociais” pretendem consegue ser pior e
mais atrasada do que o próprio projeto cubanizante engendrado
pelo Ministério da Educação é regar o mar e atestar que a única
fonte razoável de decisões deste governo, que é a chamada
equipe econômica, é soprar em meio a um vendaval. Por isso,
não vamos aqui perder tempo mostrando que a roda é redonda.
O que desejamos deixar à reflexão do leitor é a falta de
vergonha de nossas autoridades, quando gastam o dinheiro dos
contribuintes para patrocinar um evento claramente político, bem
como – com o perdão da palavra – a burrice de, em o fazendo, o
referido exemplo ser contra quem o está pagando diretamente. E
já não é a primeira e nem a segunda vez que isto ocorre neste
governo da falsa esperança: houve o caso da ex-ministra
Benedita, que foi rezar com o dinheiro público, o do show do PT
patrocinado pelo Banco do Brasil e muitos outros exemplos de
falta de compostura pública.
Sinceramente, para quem tem o hábito de raciocinar e de
respeitar a ética – além, naturalmente, o de pagar impostos – é
água demais, até mesmo para um camelo...
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Artigo do Mês-Ano III - Nº 32-
Novembro de 2004
DUAS
DU S MAÇÃS PODRES
“Entre maçãs podres, a margem de escolha é pequena”
(W. Shakespeare, “A Megera Domada”, palavras de Hortênsio)
Há mais diferenças entre “política fiscal e política
monetária” e “regime fiscal e regime monetário” do que a vã
filosofia keynesiana costuma vislumbrar e elas são tão
marcantes quanto a falta de atenção, ou a ignorância geral a
respeito de sua existência. Isto, infelizmente, sempre levou e
continua a levar muita gente boa – inclusive a grande maioria
dos economistas, especialmente os da tradição keynesiana – a
produzir análises inteiramente equivocadas e que levam,
evidentemente, a recomendações também incorretas sobre o
verdadeiro
estado
dos
chamados
“fundamentos
macroeconômicos” da economia brasileira, o que é terrível,
porque, desde Hipócrates, sabe-se que, se os diagnósticos são
mal feitos, as terapias, além de não curarem, podem ser fatais.
Enquanto as expressões “política fiscal e política
monetária” referem-se ao estado atual, à situação corrente das
variáveis fiscais e monetárias, tais como o superávit corrente, o
déficit nominal (necessidades de financiamento do setor público),
a carga tributária, as despesas do setor público, a base
monetária, a dívida interna e a taxa de juros, os termos “regime
fiscal e regime monetário” aplicam-se não apenas ao que está
acontecendo com as variáveis fiscais e monetárias, mas,
principalmente, com o que vai acontecer, ou que se espera que
venha a acontecer, à sua evolução futura, mês a mês, trimestre
a trimestre, ano a ano, por um considerável horizonte de tempo.
É a velha diferença, conhecida por todos os iniciados em
Matemática Financeira, entre valor corrente e valor atual: se xt é,
por exemplo, o total de despesas do governo no ano corrente t,
o valor atual (Vx) dessas despesas em um período de, digamos,
15 anos, é dado, sendo e a base do sistema natural de
logaritmos e r a taxa de juros, utilizada como fator de desconto,
por:
Vx = t
∫ t+15
e
– rt
f (t) dt
Seguindo os ensinamentos de Alfred Marshall, em carta a
um ex-aluno datada de 1906, devemos agora lançar fora a
matemática e fixarmo-nos no que ela nos forneceu de
importante. Escrevendo em bom português, a fórmula acima
expressa tão somente a soma de todos os dispêndios públicos,
do ano t até os quinze anos seguintes, calculados todos no
momento atual, que é o próprio período t. Este seria o regime de
gastos; o regime fiscal seria o valor atual dos gastos e receitas
calculados conjuntamente, assim como o regime monetário seria
o valor atual dos fluxos das variáveis monetárias, tais como a
base monetária, o M1 e o crédito..
Dessas considerações e da observação daquilo que o governo
como um todo (equipe econômica e “equipe política”) vem fazendo e
que produz efeitos nas variáveis fiscais e monetárias, emerge
naturalmente um fato importante, que decorre da simples aritmética,
sem qualquer conotação com doutrinas econômicas: embora a política
fiscal esteja produzindo superávits primários (da ordem de 4,25% do
PIB neste ano e de 4,5% do PIB em 2005, como deseja o governo), o
regime fiscal não pode ser caracterizado como sendo de austeridade, já
que, se considerarmos o valor presente dos gastos do setor público,
podemos observar, facilmente, que tende a ser bastante alto, para não
dizermos explosivo. O fato concreto, de que muitos se esquecem ou
fingem não saber, é que um funcionário contratado hoje aumenta a
despesa pública hoje e no futuro, até o limite de vida do referido
funcionário; uma estatal criada (como a Hemobrás) ou ressuscitada
agora (como a Sudene), uma polpuda indenização presenteada a um exterrorista qualquer, ou um novo ministério, comissão ou conselho,
significam gastos agora e no futuro, deste governo e dos demais que se
lhe sucederem, mesmo que algum desses, governos, por um laivo de
bom senso, resolva pôr um termo nesse furor gastador .
Não podemos deixar de enfatizar que, se a política fiscal pode ser
conduzida pela equipe econômica do governo, o regime fiscal depende
da “equipe política” e do Congresso, já que nenhum ministro da
Fazenda tem poderes, por exemplo, para fazer uma reforma tributária ou
para demitir funcionários públicos ociosos.
A política monetária, por sua vez, depende do Banco Central,
mas o regime monetário, isto é, o comportamento das autoridades
monetárias não apenas hoje, mas também no futuro, depende
fundamentalmente de duas coisas: (a) a independência ou não do Banco
Central em relação a pressões de natureza política e (b) o regime fiscal,
que vai determinar as necessidades de financiamento do setor público.
Assim, na inexistência da autonomia de fato e de direito da autoridade
monetária, permanece a iminência de que, cedo ou tarde, acabe
prevalecendo a dominância política, o que determinará que aquilo que
hoje é fato – o aperto monetário -, por não ter garantias de direito de que
poderá ser mantido, seja compulsoriamente abandonado, trazendo de
volta o “tigre” da inflação. Nas condições atuais, o Banco Central do
Brasil fica engaiolado nas paredes do curtíssimo prazo, sem qualquer
garantia de que poderá ver o sol do longo prazo, ou seja, de que poderá
anunciar com segurança metas de inflação (ou dos agregados
monetários) para prazos maiores. Isto, evidentemente, prejudica tanto o
controle da inflação quanto as possibilidades de investimentos de longo
prazo, essenciais para o crescimento da economia.
Por isso, o que o Copom vem fazendo ao elevar a taxa de juros
para manter a inflação dentro das metas estabelecidas, embora
represente uma postura correta, não garante, em uma perspectiva de
médio e longo prazos, que a inflação possa ser mantida sob controle,
dado, primeiro, que a autonomia do Banco Central é uma permanente
dúvida, dependendo mais dos rumores políticos e dos humores do
ocupante do Palácio do Planalto do que de um arranjo institucional e,
segundo, que o valor presente das contas do setor público é, claramente,
deficitário.
A conclusão é que o governo está, na verdade, trocando duas
maçãs podres: ao aumentar a taxa Selic, o Copom consegue manter sob
controle a taxa de inflação, mas está fazendo subir a dívida interna, o
que significa que está contribuindo para elevar o valor presente do
déficit nominal (ou necessidades de financiamento) do setor público, o
que importa que, na ausência de alteração considerável no regime fiscal
(evento de probabilidade nula em governos de esquerda, como os do
PSDB e o atual), a manutenção da inflação dentro das metas exigirá
taxas de juros cada vez maiores e, portanto, necessidades de
financiamento também cada vez mais fortes.
Portanto, a ser mantida essa falta de coordenação entre o que as
equipes econômicas fazem e o que é feito (ou deixa de ser) pelas
“equipes políticas”, as maçãs estarão, mais cedo ou mais tarde,
inteiramente apodrecidas, até que a possibilidade de troca desapareça.
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Artigo do Mês-Ano III - Nº 31-Outubro de 2004
SERÁ PROPOSITAL?
“Lasciate ogni speranza, voi che entrate”
( Dante Alighieri, “ Divina Comédia”, pórtico do Inferno)
Infelizmente, viver e trabalhar em nosso país nestes
últimos tempos vem sendo um verdadeiro inferno. Poder-se-ia
perfeitamente colocar nas salas de desembarque de cada porto
e aeroporto internacional o pórtico que o genial escritor italiano
imaginou orlar a entrada do inferno...
Se você é honesto, chamam-no de trouxa; se trabalhador,
de otário; se
religioso, de conservador ultrapassado; se
empreendedor, de ladrão; se não é de esquerda, de entreguista;
se é da classe média, de burguês e, se é isso tudo, de um ser
execrável.
Nesta semana, moleques de uma favela do Rio tomaram
um ônibus (cuja passagem não pagaram), fumaram maconha
dentro dele, desceram na praia do Leblon e assaltaram pessoas
que passeavam pelo calçadão ou na areia, derrubando-as e
tomando-lhes os pertences. Em vídeo mostrado na TV, a cena –
que, diga-se de passagem, tem sido freqüente naquela área em
que se paga um dos IPTU´s mais altos do Brasil – aparece um
bando desses marginais, todos com idade e musculatura para, já
que não querem estudar, trabalhar, cercando uma pessoa,
jogando-a na areia, agredindo-a e roubando-a, até que surgem
dois policiais militares que, ao verem o que se passa,
simplesmente, dão as costas e vão-se embora...
Há poucos dias, um advogado publicou artigo em um jornal
de grande circulação no Rio de Janeiro defendendo
veementemente – como só advogados o fazem – o voto dos
presidiários, pois, segundo ele, isto seria expressão da mais
pura democracia e contribuiria para aperfeiçoar o sistema
prisional do país...
Um outro articulista do mesmo jornal, sociólogo da
Unicamp (como não poderia deixar de ser), defende a atual
greve dos bancários, que já se estende por semanas e vem
prejudicando milhões de aposentados e de correntistas, primeiro,
utilizando o surrado eufemismo de trocar a palavra greve por
“movimento” e segundo, mostrando que seria justíssima como
fonte legítima de se mostrar à sociedade que os banqueiros
seriam uma quadrilha de ladrões a assaltar os cofres públicos e
os bolsos dos cidadãos...
O governo federal, por sua vez, anuncia com estardalhaço
as PPP´s (Parcerias Público- Privadas), com vistas a viabilizar
os investimentos em infra-estrutura, que se constituem em um
verdadeiro hino - talvez inspirado no da Internacional Socialista ao capitalismo Sem Riscos e sob o controle do Estado, uma vez
que o este – vale dizer, o contribuinte – vai atuar nas duas
pontas, emprestando via BNDES os recursos aos candidatos a
“empresários” e cobrindo no longo prazo seus eventuais
prejuízos, uma nítida transgressão à Lei de Responsabilidade
Fiscal;
além disso, prevê o anteprojeto das PPP´s que
remunerará todos os projetos apresentados nas licitações,
mesmo os que não forem vencedores, o que gerará certamente
uma verdadeira indústria de projetos; e, para completar, declara
que o controle de toda a festa, para que não haja corrupção,
ficará a cargo da “ sociedade civil”, o que é o mesmo que afirmar
que não haverá controle algum...
O ministro-cantor-compositor da Cultura, Gilberto Gil,
declara, em palestra na FINEP sobre a questão dos direitos
autorais, que “existe um conflito neste campo, pois uma obra de
arte, embora pertença ao seu autor, também pertence à
sociedade”, sem mencionar, contudo, se ele próprio abre mão
dos polpudos direitos autorais que suas composições devem lhe
render...
Cidadãos honestos vivem enjaulados em suas casas nas
grandes cidades, aterrorizados diante do quadro lamentável de
violência urbana que estamos presenciando. No Rio de Janeiro,
traficantes fecham, pela milésima vez, o comércio de um bairro –
desta vez, nas proximidades da Central do Brasil – em “
protesto” contra a morte de um deles pela polícia...
Um “banqueiro” do jogo do bicho, conhecido por sua
truculência e violência, é assassinado ao sair de uma academia
de ginástica na Zona Oeste e os jornais relatam que o crime
deve ter sido praticado por um grupo de policiais, que com ele
disputavam o controle sobre atividades ilegais...
O ex-governador, marido da atual governadora do Rio,
declara que o estado fluminense não tratará com igualdade os
municípios em que os candidatos apoiados por ele não forem
eleitos para as prefeituras...
A Ministra do Meio Ambiente bate o pé e recusa-se a
admitir o plantio de soja transgênica, o Presidente Luiz Inácio
lava as mãos e empurra a decisão para o Congresso que, por
sua vez, em sua tartaruguesca lerdeza, não se manifesta, o que
leva agricultores do Rio Grande do Sul a anunciarem que irão
fazer o plantio mesmo sem a votação da lei.
Funcionários da Justiça paulista ficam mais de 90 dias em
greve...
Funcionários e técnicos administrativos da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro permanecem de braços cruzados por
quase quatro meses, invadem as dependências da Divisão de
Informática e promovem churrascos de confraternização,
enquanto professores e alunos mantêm normalmente as suas
atividades.
O MST invade, depreda o que não lhe pertence, mata e
vende gado que não é seu, praticamente em todo o Brasil...
Moradores de uma “comunidade carente” carioca invadem
um edifício na Barra da Tijuca cujas obras estão paralisadas há
anos...
O Ministro Chefe da Casa Civil palpita sobre a taxa de
juros e deita falação sobre a economia brasileira, além de
mostrar que possui o dom da ubiqüidade, já que preside vinte e
um conselhos, comissões e grupos de estudos, desses que são
constituídos quando não se pretende resolver problema algum...
Poderíamos desfilar inúmeros outros fatos como esses,
mas cremos que os que mencionamos são necessários e
suficientes para percebermos que vivemos em um Estado sem
lei e sem autoridade e que a situação social gerada por esse
lamentável estado de coisas é bastante preocupante. Onde
vamos parar? Onde vai dar tudo isto?
Será que é de propósito? Será que é uma cizânia social
planejada pelo gramscismo militante, para que da
desorganização possa nascer o que eles chamam de “um outro
mundo possível”? Sinceramente, tudo leva a crer que sim, pois o
mais rupestre dos cérebros há de convir que é a única resposta
plausível para a pergunta que nos sai do peito: a quem pode
interessar o atual estado de coisas?
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Artigo do Mês-Ano III-Nº 30 Setembro de 2004
CRIME SEM CASTIGO
“Uno dei più grandi freni dei delitti non è la crudeltà delle pene, ma
l’infalibilità di esse”
(Cesare Beccaria, “Dei delitti e delle pene”)
O que pensaria o grande jurista italiano do século XVIII de
um ministro da Justiça que, reconhecendo a total falência do
sistema penal brasileiro dos preâmbulos do século XXI, em que
quadrilhas organizadas continuam a comandar o crime de dentro
de presídios superlotados, sob a aparente conivência de quem
deveria cuidar de seu isolamento, propusesse duas medidas
para “resolver” a questão: primeira, alterar a nomenclatura dos
delitos, abrandando-a com eufemismos como o da abolição da
classificação de “hediondos” para crimes verdadeiramente
hediondos e segunda, propor, ao invés da construção de mais
presídios e do aparelhamento técnico e moral das forças que
devem zelar pela segurança pública, a adoção de penas ditas
“alternativas”, a serem cumpridas fora dos muros das casas de
detenção?
Certamente, diria algo como “questo è um paese di pazzi”.
Sim, porque escapa à mais rudimentar das inteligências e ao
mais elementar bom senso que tais propostas possam ser
apresentadas como pretensas soluções para problema tão grave
quanto o da violência que campeia, livre, leve e solta – nos dois
sentidos – nesta terra que encantou Caminha. Causa espanto,
também, que tenha partido de um eminente advogado, na
avaliação de seus próprios pares.
Embora nossa praia não seja a do Direito, como estudiosos
da Escola Austríaca de Economia, esforçamo-nos para nos
incluir entre aqueles economistas que Hayek denominava de
“bons”, isto é, aqueles que procuram esgarçar o seu
conhecimento para além das tímidas fronteiras da Teoria
Econômica, investigando as relações da Economia com os
demais ramos das ciências humanas, entre os quais,
evidentemente, está o que estuda a Lei. Ao procurar interligar as
diversas ciências sociais, nada mais fazemos do que seguir os
conselhos praxeológicos de Mises, magistralmente expostos em
seu Human Action.
Mas o que chama a atenção é que, mesmo que nos
atenhamos exclusivamente à Teoria Econômica, não
conseguimos encontrar explicação plausível para as duas
propostas acima mencionadas, no sentido de que possam
contribuir para reduzir os índices de criminalidade.
Primeiro, porque o ministro Bastos, ao propor que se deixe
de considerar como “hediondos” diversos crimes, como os de
seqüestro e estupro, brande um argumento extremamente
falacioso, o de que, desde que tais delitos passaram a ser
considerados como tal pela lei, seu número aumentou e que,
portanto, o maior rigor classificatório teria sido não apenas
inócuo, mas prejudicial. Advogados não costumam ser versados
nas matemáticas, mas parece-nos que, pelo menos enquanto
cursam o segundo grau, têm que aprender a diferença entre
números absolutos e números relativos! O que importa não é o
número de crimes, mas sim a sua quantidade em relação a
algum total, que pode ser, por exemplo, a população como um
todo, ou o número total de delinqüentes de todos os tipos de
crimes. Assim, se o número de crimes “hediondos” subir em um
determinado período, mas esses totais subirem mais do que
proporcionalmente, é evidente que o número relativo, ou a
“taxa” de crimes hediondos, irá declinar. Não estamos afirmando
– na ausência de dados – que isto tenha acontecido, apenas
estamos mostrando com lógica elementar que o argumento do
Dr. Bastos é precário e carece de maiores e melhores
quantificações e qualificações.
Em segundo lugar, a partir de meados dos anos 60, graças
ao trabalho pioneiro excepcional de economistas do calibre de
George Stigler, Gary Becker (laureados com o Nobel), Sam
Peltzman e Isaac Ehrlich, entre outros – todos da Universidade
de Chicago - , a Teoria Econômica passou a meter o nariz onde
deveria ter sido chamada há muito tempo, já que, dentre todas
as ciências sociais, é a que possui o instrumental de análise
mais poderoso, para investigar as causas que levam as pessoas
a delinqüir. Infelizmente, parece que este ente holístico
denominado “sociedade” prefere, quando se trata de elaborar
análises sobre a criminalidade, as opiniões de sociólogos,
politicólogos, cujas ferramentas de análise, comparadas às que
os economistas dispõem, parecem-se com estilingues diante de
fuzis AR-15...
Em seu hoje clássico Crime and Punishment, o mais
criativo dentre todos os economistas de Chicago, Gary Becker,
aplica os fundamentos microeconômicos da Teoria da Utilidade
para explicar as escolhas face às atividades ilegais, mostrando,
com as ferramentas lógicas da moderna Economia, o que a
sensibilidade de juristas pretéritos, como Beccaria, já havia
captado: que, diante da escolha entre cometer ou não um delito,
a probabilidade de que venha a ser punido é tão ou mais
importante do que o rigor da pena esperada a ser imposta ao
criminoso. O peso de cada uma dessas variáveis – pena e
probabilidade de punição – varia de acordo com cada tipo de
delito, conforme trabalhos posteriores de Peltzman e,
especialmente, Ehrlich, demonstraram, utilizando sofisticadas
técnicas econométricas.
Assim, pode ser que de nada adiante estabelecer uma
pena como a de cortar as mãos de todos os ladrões, se a
probabilidade de que eles venham a ser pegos, condenados e
apenados for baixa; pelo contrário, quando prevalece a perversa
combinação de penas brandas com baixíssima probabilidade de
apenamento, muitas vezes abrandada por “bom comportamento”
e em ambiente em que grassa a corrupção, os criminosos
potenciais podem sentir-se estimulados a delinqüir, mesmo
porque o seu grau de risco diminui.
As sugestões do excelentíssimo ministro da Justiça
tendem, inequivocamente, a abrandar o rigor das penas de um
lado e, de outro, a manter intacta a já reduzidíssima
probabilidade de punição, já que o dr. Bastos nada anunciou
nesse sentido, que pudesse alterar a avaliação da utilidade
esperada pelos potenciais infratores dos delitos que planejam
cometer. Resumindo, a proposta do encarregado-mor da Justiça
brasileira, infelizmente, tenderá, caso venha a ser transformada
em lei, a aumentar os benefícios auferidos pelos que vierem a
cometer crimes hediondos e a reduzir os custos impostos a
esses inimigos da sociedade.
Não seria mais prudente e sensato, mesmo sem recorrer à
Teoria Econômica, construir mais presídios? Em suma, não seria
mais sensato tratar bandidos – ou quem comete crimes
hediondos é “gente boa”, apenas vítima da “sociedade injusta”?
– como devem ser tratados e como são de fato tratados em
países adiantados?
Imaginemos o que poderá ser para um cidadão correto,
cumpridor de seus deveres e da lei e que já vive engaiolado
dentro de sua própria casa, premido pelo medo e espremido pelo
pânico, viajar em um coletivo ao lado de um seqüestrador
cumprindo pena “alternativa”, ou para uma mulher transitar pelas
ruas sabendo que poderá estar perto de um estuprador posto
em liberdade, ou para um correntista permanecer na fila bem na
frente de um marginal que já assaltou a mesma agência
bancária.
Resta-nos esperar que o bom senso, manifestado pelo
grito dos oprimidos – os cidadãos de bem – venha a prevalecer e
que as descabidas e infelizes propostas do sr. ministro sejam
descartadas. Até mesmo a inversão de valores tem limites!
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Artigo do Mês - Ano III - Nº 29 - Agosto de 2004
PARA ONDE VAMOS?
“Carpent tua fruta nepotes”.
(“Os netos colherão os frutos de tuas árvores”)
(Virgílio, Éclogas)
Para onde este governo está levando o país e, portanto,
todos nós? Esta é sempre, em qualquer governo e em qualquer
época, uma indagação transcendental para os seres humanos,
pois determina muitas ações do presente com base naquilo que
se espera do futuro. O tempo não é como um tapete, daqueles
que compramos, por exemplo, na aprazível Atibaia, apertamos
na mala do carro e, ao chegarmos em casa, o abrimos, com toda
a sua arte já pronta, sendo nosso único trabalho o de desenrolálo, posto que nos revela surpresas, na medida em que cada
instante é único e pode determinar muitos “instantes” futuros.
Embora seja impossível para a teoria econômica – mesmo com
todo o poderoso arsenal dos modelos matemáticos de previsão –
prever o que vai acontecer com exatidão, é relativamente
simples, se nos lembrarmos que o presente já foi futuro, que o
presente foi passado e que o futuro será presente, desde que se
escreveu no Eclesiastes, a inelutável tautologia do “fugit
irreparabile tempus”, é perfeitamente possível – e, mais do que
isto, desejável - olhar para trás e aprender com a experiência
própria e alheia.
Para onde foram, em que destino foram aportar países que
adotaram trajetórias pretéritas semelhantes ãs que o governo
petista, o Legislativo, o Judiciário, a imprensa e as demais
instituições estão, mesmo contrariando os desejos da maioria,
levando as árvores que nossos avós plantaram para nós?
Estarão substituindo-as por outras, menos profícuas no
oferecimento de bons frutos, impedindo-nos de colher a boa
semeadura de nossos ancestrais? E quanto a essas árvores que
estão substituindo as antigas, o que podemos afirmar quanto às
frutas que um dia irão gerar e que serão colhidas por nossos
netos?
A geração de nossos avós nos deixou um legado
insubstituível sob todos os aspectos que se queira considerar,
que é a herança do respeito, da ética do trabalho, da
honestidade, da poupança, da retidão de propósitos, da religião
(só alguns ateus estúpidos ou libertários fanatizados podem
negar isto) e da família, herdados todos da tradição judaicocrstã. Deixaram-nos um país imenso, com possibilidades infinitas
de aproveitamento de seu território e da mobilização dos valores
morais em benefício do sistema econômico. Poucas são as
economias com tantas possibilidades de lograr um crescimento
sustentado com aumento do bem-estar para as suas
populações, apenas se suas instituições estimularem árvores
que sabidamente dão bons frutos, adubando-as, regando-as e
podando seus galhos podres, do que a economia brasileira. Não
falamos aqui, simplesmente, de riquezas naturais que, enquanto
não forem exploradas, permanecerão como meros fósseis
geológicos, mas cuja utilidade continuará restrita apenas aos
discursos e gorjeios dos nacionalistas ingênuos ou nem tanto.
Nem tampouco estamos adotando, conforme certos idiotas da
objetividade poderão dizer, postura que se possa chamar de
“saudosista”. Ou o que é bom não precisa ser preservado, a não
ser que seja substituído por algo melhor?
Nosso Estado, nossos meios de comunicação, nossa
política, nossa economia, nossa cultura, nossa linguagem e
nosso modo de viver atuais são um perigo para as árvores do
respeito, da ética do trabalho, da honestidade, da parcimônia,
dos bons propósitos e da família que nossos valorosos avós,
desde os portugueses que primeiro cá chegaram e passando
pelos que aqui aportaram vindos de tantos outros países, por
diversos motivos, mas embalados todos pela esperança de
cuidar bem delas, plantar outras e colher bons frutos.
Experimente “dar duro” na vida,
ser estudioso e
respeitador, manter relações econômicas e sociais estáveis e
cumprir com a palavra empenhada. Experimente tentar poupar
reles caraminguás, ou abrir uma empresa, por menor que seja,
ou tentar vencer na vida sem pisar em seus semelhantes.
Experimente tentar pagar, como seria de bom alvedrio, todos os
impostos que o Estado exige, fazer todas as vistorias em seu
carro nos Detrans da vida, esperar pacientemente na fila de uma
repartição pública até ser atendido. Experimente, depois, fechar
a empresa que, com muitas dificuldades abriu, mas que foi à
bancarrota, porque o governo mudou as regras do jogo
abruptamente, ou porque lhe tomaram tudo o que ganhava na
forma de tributos. Experimente, se for – com o perdão da
expressão – um tanto simplório, acreditar nas promessas dos
candidatos aos cargos executivos e legislativos nas três esferas
do poder, ou, se depender de alguma decisão judicial,
experimente crer que a Justiça seja realmente cega como
naquela bela estátua que todos conhecemos. Experimente crer
que os professores de seus filhos estejam ensinando a eles os
conhecimentos e valores que você mesmo gostaria de transmitir,
com o intuito de torna-los homens e mulheres de bem.
Experimente, se você for uma jovem, preservar o pudor, ou
manter-se casta até se casar ou, se você for um jovem, respeitar
a sua namorada ou rejeitar qualquer tentação que apareça na
sua frente, seja a das drogas, a da prostituição ou a do sexo fácil
e desregrado.
Experimente tudo isso, meu irmão. Pois, se você não
experimentar, estará jogando fora todo o verdadeiro bem que as
gerações passadas lhe deixaram.
Mas, se você experimentar e não for bem sucedido, não se
recrimine, porque o seu fracasso está em ser brasileiro, em ter
nascido em uma terra sem igual, em que Deus depositou muito
da Sua confiança, mas que não tem sabido cuidar das árvores
que recebeu para cuidar, fazendo mau uso dos talentos
recebidos e em que as instituições, cada vez mais apodrecidas –
e sob o comando deste governo para o qual é difícil encontrar
outro adjetivo que não seja medíocre - fazem diariamente
queimadas, destruindo todo o verde da esperança e fazendo
surgir em seu lugar incontáveis espirais da fumaça enegrecida
do desencanto, dos maus propósitos, da ideologia e do descaso
para com os cidadãos.
Se não experimentarmos contribuir, cada um de nós, para
que as tentativas de experimentação sugeridas levem a
respostas positivas – em outras palavras, se não mudarmos
nossas instituições e resgatarmos o verde das árvores que estão
destruindo -, nossos netos, daqui a cinqüenta, oitenta anos, não
vão ter motivos para se orgulharem de nós.
Cada um de nós é chamado nestes difíceis momentos que
o Brasil atravessa, a honrar os sobrenomes herdados, sejam
portugueses, italianos, espanhóis, poloneses, africanos,
japoneses ou de qualquer outra origem. Para que, no futuro –
que chegará bem mais depressa do que supomos, diante do
infinito da eternidade, nossos descendentes tenham do que se
orgulhar das árvores que estamos plantando e possam desfrutar
das suas boas dádivas.
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Artigo do Mês - Ano III - Nº 28 - Julho de 2004
O CENTAURO
“A horse! A Horse! My kingdom for a horse!”.
(Shakespeare)
Decorridos dezoito meses de exercício do poder executivo,
o governo do PT ainda não mostrou a que veio, limitando-se,
exatamente como os tucanos fizeram entre 1995 e 2001, ao uso
de uma política monetária voltada para impedir a recidiva da
inflação, mas sem qualquer respaldo sólido, no que diz respeito
a ações claras, corajosas e voluntariosas para promover a
inadiável reengenharia do Estado, sem a qual a sobrecarga de
mais desemprego tende a ser cada vez maior e a perpetuar-se.
Se o tucanato foi mais coerente em termos de responsabilidade
fiscal – embora muito mais nas areias movediças dos discursos
do que nas estradas pavimentadas das realizações práticas -, o
petelhato tem sido mais zeloso no que diz respeito à austeridade
monetária necessária, até mesmo pela necessidade de desfazer
as fortes desconfianças existentes em todos os mercados,
internos e externos, que o partido criou, cultivou e ampliou
enquanto não logrou atingir o poder.
Tal postura dúbia faz com que o governo petista
assemelhe-se a um ceutauro, o mitológico ser com pernas e
tronco de cavalo e cabeça humana. Enquanto o cérebro,
representado pelo reconhecimento, por parte da Fazenda e do
Banco Central, envia sinais bastante claros de que nenhum
governo decente pode ceder à tentação de inflacionar, o corpo,
formado pela base política, despeja incessantemente por onde
passa dejetos eqüinos, sob a forma de trapalhadas,
envolvimento em prováveis casos de corrupção, falta de
coerência, incapacidade de tomar decisões, clientelismo,
estatismo e diversas outras formas de evacuação, emanadas de
seus grossos intestinos. O Presidente, montado no centauro, tal
como naquelas vaquejadas típicas de seu Nordeste natal, tudo
faz para equilibrar-se, dando evidentes sinais de que não sabe
se deve guiar-se pelos comandos emitidos pelo cérebro ou pelos
movimentos – em sentido oposto – executados pelo corpo. Uma
cavalgada que seria apenas cômica, não fosse o fato de estar
afetando negativamente a vida dos muitos milhões de
brasileiros, tanto os que confiaram nas vãs promessas de
campanha, quanto os que já conseguiam prever os efeitos
trágicos resultantes da delegação do poder a um indivíduo – e a
um partido! - simplório, sem o menor preparo administrativo e
intelectual. O Brasil, definitivamente, é maior do que um
sindicato... ou do que o auditório de uma universidade “pública,
gratuita, de qualidade e socialmente referenciada”...
O desagrado com relação ao governo de Lula é geral:
gregos e troianos, tricolores e rubro-negros, “conservadores” e
(pretensos) “progressistas”, professores e alunos, chefes e
subordinados, motoristas e passageiros, pobres e remediados,
todos estão descontentes, insatisfação que tem se refletido nas
quedas contínuas dos índices de popularidade dos atuais
inquilinos do Planalto, divulgadas nos últimos meses.
Os liberais atacam o governo por um lado, os radicais de
esquerda arremetem contra ele do outro. Entre as inumeráveis
queixas dos verdadeiros liberais – infelizmente, um grupo que, a
exemplo da torcida do América, cabe em duas ou três kombis –
podemos destacar: a absoluta imobilidade administrativa do
governo; a estupidez estarrecedora de nosso sistema tributário;
a estultice gritante dos encargos trabalhistas; o número de
ministérios, secretarias, forums, comissões e sub-comissões,
quase maior do que a torcida do Corinthians; o comportamento
escandalosamente confrontador da lei por parte de alguns dos
denominados “movimentos sociais”, como o MST; a mania, mais
do que obsoleta, manifestada por alguns ministros, de
centralizar, estatizar e desconfiar da iniciativa privada; a
leniência (para não dizermos estímulo) à violência nas cidades e
no campo; as acusações não apuradas de corrupção,
envolvendo altas figuras do petelhato; as distribuições de verbas
para emendas a parlamentares, visando a fins políticos; a
pol[itica externa terceiro-mundista e as volumosas contratações
de membros do partido em todos os escalões da administração
direta e indireta, em flagrante ação de partidarização do
funcionalismo público.
De outro lado, os virulentos ataques dos radicais de
esquerda, principalmente dos que, sentindo-se alijados do poder,
congregaram todo o seu atraso ideológico no recém-fundado
Partido do Socialismo e da Liberdade (como se fosse possível
conciliar vício com virtude), bem como das chamadas
“esquerdas” menos radicais (um grupo heterogêneo, que
congrega organizações não governamentais, garotinhos,
menininhas com vestidos de chita cor-de-rosa, viúvas do
trabalhismo brizolista, jornalistas, artistas e vigaristas, entre
outros integrantes). Reclamam todos, para resumir, que o
chamado “núcleo duro” do PT teria renunciado ao seu passado
de defensor do socialismo – ou à sua “história”, como gostam de
dizer -, que teve que compor, para poder governar, com velhas e
matreiras raposas do galinheiro político (o que é verdade), que
está favorecendo o “capital financeiro” , que subordina os
interesses do país aos bodes expiatórios que habitam o
paupérrimo pasto de seu repertório de falsos argumentos, como
o FMI, os Estados Unidos, o “grande capital”, a globalização, a
Europa, e o “neoliberalismo” do “Consenso de Washington” e,
por fim, que nada está sendo feito “contra” qualquer indivíduo,
empresa, instituição, país ou região que tenha cometido o grave
pecado de ter obtido sucesso.
Eis o navio petista! Pragmatismo econômico de um lado,
obtusidade política-ideológica de outro; Banco Central
responsável a bombordo, irresponsabilidade nos gastos públicos
a estibordo; Palocci na proa, Dirceu na popa; Meirelles no
convés, Rebelo nos porões. A que destino levará? Nem o
Comandante sabe, mesmo porque, para fazer girar o timão,
precisaria primeiro descer do centauro...
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Artigo do Mês - Ano III - Nº 27 - Junho de 2004
OS LIMITES DA POLÍTICA
ECONÔMICA
“Naturam expellas furca tamen usque recurret”.
(Expulsai a natureza, ela voltará correndo).
A política econômica, só, não pode fazer nem verão e
tampouco milagres, embora a maioria das pessoas – nela
incluída a quase totalidade dos economistas – costume pensar o
contrário. O problema é muito sério e decorre de, pelo menos,
setenta anos de um academicismo calcado em moldes
keynesianos ou marxistas, em que os profissionais são
treinados, no primeiro caso, para o intervencionismo das
políticas de regulação da demanda agregada, em busca da
“sintonia fina” que, segundo Keynes e seus seguidores, seria
capaz de levar a economia a operar sempre próxima ao nível de
“pleno emprego” ou, em linguagem moderna, a trabalhar perto
de seu nível “normal” ou “natural” de produção e, no segundo
caso, para decidir sobre o que, o quanto, como e para quem
produzir.
Poucas falácias são tão perigosas quanto a de se crer que,
mediante políticas macroeconômicas (fiscal, monetária e
cambial, principalmente) “corretas”, ou seja, bem planejadas por
meia dúzia de iluminados (talvez da Unicamp, da USP ou da
UFRJ), as grandes doenças da economia podem ser eliminadas.
Primeiro, porque, se tal argumento fosse verdadeiro, não haveria
praticamente mais desemprego, desde que Lord Keynes
publicou sua extremamente pretensiosa Teoria Geral - cujo título
correto deveria ser “Teoria Particular” – e viu suas
recomendações especialíssimas, feitas para a Grande
Depressão (e, mesmo assim, passíveis de críticas contundentes)
serem colocadas em prática pelos governos, em todo o mundo,
como fruto de uma união bastarda e interesseira entre
economistas e políticos, todos ávidos de fama e sequiosos de
poder. Segundo, porque, ao se acreditar na falsa tese de que os
economistas do governo podem fazer mais do que aquilo que a
realidade lhes impõe, termina-se caindo infalivelmente em um
tipo de crítica do tipo: “nossa economia vai indo mal por conta da
política do ministro A ou B; portanto, se ela fosse entregue ao
ministro C ou D, ou se houvesse uma mudança de rumo, tudo
melhoraria”. E terceiro, porque, de intervenção em intervenção,
de controle em controle, de “preço administrado” em “preço
administrado”, caminha-se inescapavelmente, em algumas
décadas, para o intervencionismo total, para a táxis de que nos
falou Hayek.
O fato inelutável é que a afirmativa de que uma simples
troca de ministros ou guinada na política econômica pode
resolver os males econômicos e sociais só poderia conter
alguma verdade no caso de estar sendo aplicada uma política
econômica totalmente incorreta, como, por exemplo, todas as
que nos foram impostas nos cinco congelamentos de preços que
o Brasil decretou, entre os “cruzadeiros” de 1986 e o período
daquela ignorante, despreparada e arrogante senhora, que foi
ministra da Economia de Collor. É óbvio que, se uma política
econômica está errada, ela pode e deve ser modificada para
melhor. Mas, quando a equipe econômica (Fazenda e Banco
Central) de um governo está atuando de forma correta e, mesmo
assim, a economia do país vai mal das pernas, deveria ser claro
para todos que o problema não está na política econômica em si,
está fora dela, está, mais precisamente, ou na sua “equipe
política”, ou nas instituições (como o Congresso e o Judiciário)
ou em ambas.
Este é, resumidamente, o estado das coisas no Brasil.
Palocci e Meirelles vêm desempenhando suas funções de forma
correta e, mesmo, de modo mais eficiente do que a maioria dos
que os antecederam no comando da economia. Sem medo de
cometermos um exagero, podemos afirmar que, desde que
Roberto Campos e Octavio Gouvêa de Bulhões, auxiliados por
Dênio Nogueira no Banco Central, assumiram o pesado encargo
de cuidar da economia do país, não se viu tanta competência,
talvez com uma ou duas exceções.
Por que, então, os resultados estão deixando a desejar? E
por que, caso a dupla venha a ser substituída e sua política
monetária, por conseguinte, mudada, no sentido de reduzir a
taxa básica de juros de forma a reaquecer a demanda, não
podemos esperar nada além de inflação, mais desemprego e
ausência absoluta de crescimento econômico e, talvez, de uma
crise cambial?
A resposta, simples e cristalina para qualquer economista
não contaminado pelo virus keynesianus, tem duas partes, que
se encaixam como as lâminas de uma tesoura. A primeira é que
qualquer governo é forçado a trabalhar, especialmente em um
país em que a maioria de suas instituições, tais como os partidos
políticos, evidenciam grande fragilidade programática, com duas
equipes, a econômica e a política. Ora, a economia pode ser
vista como um jogo, já que se trata de milhões de decisões
tomadas, por parte dos agentes econômicos, sob condições de
incerteza genuína. Desse jogo participam três jogadores, a
saber: a equipe econômica (E), que determina as políticas
macroeconômicas (monetária, fiscal e cambial), definidas como
o conjunto das ações de curto prazo em cada uma dessas
áreas tomadas pelas autoridades; a equipe política (P), que deve
prover a sustentação (ou a sua falta) do governo no Congresso e
os demais agentes (A) que tomam decisões econômicas, desde
uma simples dona de casa, até um grande banco, passando
pelas empresas e por todos os setores da economia, ligados ou
não com o setor externo.
A segunda lâmina da tesoura aparece quando E, mesmo
agindo corretamente, (como no caso de Palocci e Meirelles), tem
a sua atuação prejudicada por P e, ainda, quando P é o jogador
dominante, aquele que determina a forma de agir de E,
condições em que o jogo deixa de ser cooperativo, o que impõe
pesados custos a A, ou seja, à “sociedade”. Isto fica claro
quando nos damos conta de que E, nestas condições de
dominância de P, fica restrito apenas a ações de curto prazo, às
“políticas de demanda” de cunho keynesiano, mas não tem como
desenvolver ações de longo prazo, estruturais, que possam de
fato modificar os regimes monetários, fiscal e cambial. O
resultado é bastante conhecido: a Fazenda e o Banco Central
(E) apertam, apertam, apertam e os políticos afrouxam,
afrouxam, afrouxam ou, quando não o fazem imediatamente,
pressionam até que consigam fazê-lo, mais cedo ou mais tarde.
Um exemplo simples esclarece este ponto: E mantém a
taxa de juros elevadíssima e aumenta a carga tributária
fortemente, mas P ressuscita a Sudam e a Sudene, cria mais
estatais, contrata miríades de “companheiros”, aumenta, enfim, a
estrutura e o valor presente dos gastos públicos e emite sinais
claros de que continuará a fazê-lo. Neste caso, o resultado não
pode ser outro: recessão e desemprego no curto prazo, sem
nenhuma perspectiva de crescimento sustentado. No longo
prazo, ou morrerão todos de fome – a começar, obviamente, por
A – ou P, que é o jogador dominante, substituirá E e alterará a
política econômica, adequando-a a seus interesses, levando a
resultados
desastrosos
após
algum
tempo:
inflação
acompanhada por um espasmo de crescimento, abortado em
seguida pelo recrudescimento da inflação e estagnação da
economia. Os economistas austríacos já sabiam disto desde o
início do século XX. Mises, por exemplo, chamava a atenção
para esse problema de descoordenação em 1912, na sua
monumental obra Teoria da Moeda e do Crédito.
Este é o jogo praticado atualmente no Brasil: dominância
de P sobre E e A, irresponsabilidade, falta de patriotismo e de
ética e incompetência por parte de P, passividade – por índole e
por ignorância – de A. E esta maldita crendice generalizada no
mito de que a política econômica é capaz de fazer mais do que o
que seus limites demarcam. O marxismo e o keynesianismo,
com todas as as suas sub-corrente,s ricas de adjetivos, porém
paupérrimas de conteúdo, precisam ser varridos dos currículos
dos cursos de Economia!
De nossa parte, fizemos o possível quando montamos o
curso de graduação em Economia das Faculdades Ibmec, no
Rio de Janeiro, há exatos dez anos. No currículo original, esses
assuntos eram tratados nos cursos de História do Pensamento
Econômico. Isto, como era de se esperar, durou pouco, a rigor,
apenas três anos, ao cabo dos quais, mesmo em uma instituição
que nem de longe pode ser chamada de “esquerdista”, foram
compulsoriamente introduzidos nos programas e ementas, o que
motivou minha saída daquela instituição. Nba Faculdade de
Economia da UERJ, mesmo ocupando na época a importante
função de Diretor, o máximo que o assembleísmo ali reinante
nos permitiu foi introduzir no currículo um curso – eletivo! – sobre
a Escola Austríaca de Economia. Na Universidade Estácio de
Sá, no período em que Roberto Campos era o chanceler,
convidou-nos para refazer o currículo do curso de graduação em
Economia e a experiência durou enquanto ele permaneceu
naquele cargo... Observemos que as três instituições citadas
foram avaliadas pelo Ministério da Educação com o conceito “A”.
Estes são os economistas formados naquilo que nosso
iletrado Presidente chama, ad nauseam, de “nosso país”. Este é
o nosso país, de economistas intervencionistas. O que podemos
esperar diante de um quadro destes?
Aqui, pode-se
permanentemente expulsar a natureza, porque, ao que tudo
indica, ela não volta, nem a galope, nem correndo e nem a pé...
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Artigo do Mês - Ano III - Nº 26 - Maio de 2004
SALÁRIO, MÍNIMO;
DEMAGOGIA, MÁXIMA!
“Quid Romae faciam? Mentiri nescio...”
(Que hei de fazer em Roma? Não sei mentir) - Juvenal
O espetáculo tragicômico, protagonizado pelo Presidente e
vários de seus ministros, sobre o novo salário mínimo, encenado
em dias e mais dias de intermináveis e sonolentas reuniões que
varavam a escuridão solitária das noites brasilienses, é mais um
exemplo típico da velha doença que contaminou o mundo e, de
forma muito mais forte, a América Latina, a partir do início do
século passado, em que assuntos estritamente econômicos –
como é, evidentemente, o caso dos salários e de quaisquer
outros preços – passaram a ser objeto de uma crescente
politização, na crença, que Hayek chamou de fatal conceit, de
que as soluções políticas seriam superiores às soluções de
mercado.
Essas atitudes são em tudo semelhantes, para recorrermos às
surradas imagens de que o grotesco e despreparado sr Luís
Inácio gosta de fazer uso, à de um técnico de futebol que
dissesse a seus jogadores, antes de uma partida, que
vencessem o adversário por, digamos, 3 a 1, pois este seria o
resultado “possível”, ou “justo”. Eleger um placar ad hoc antes do
jogo ou afirmar que um salário – ou qualquer outro preço
previamente determinado em gabinetes - é “justo” ou “injusto”,
são atitudes que denotam desconhecimento, no primeiro caso,
de que o futebol é um jogo dinâmico e, no segundo, de que a
economia do mundo real comporta-se da mesma forma! Como já
afirmava com inteira razão o Prof. Mises nos anos 20, a própria
aceitação do conceito de salário mínimo já seria indício de
ignorância máxima...
É que a economia é um jogo dinâmico e cooperativo, em
que milhões de decisões (vender, comprar, emprestar, poupar,
pagar impostos, trabalhar, etc.) são tomadas ao longo do tempo
e sob condições de incerteza genuína, não probabilística, um
jogo que está sendo permanentemente jogado e cujo resultado
pode mudar a cada momento, de acordo com os cursos
passados, presentes e esperados dos conjuntos de ações
praticadas por seus participantes, o que torna impossível
predefinir-se qualquer resultado como “o justo”! Isto torna-se
ainda mais relevante quando conideramos o conceito, importado
da Teoria dos Jogos, de jogador dominante, aquele que, por
suas características, determina a forma de jogar de toda a
equipe. No caso da fixação de qualquer preço, este jogador é o
governo, vale dizer, os políticos e burocratas sentados nas
cadeiras estofadas de seus gabinetes em Brasília.
Por que o “número mágico” seria R$260, ou os R$ 240 anteriores, e
não R$ 812, ou R$165, ou R$533, ou outro qualquer? Outro
absurdo em termos de economia elementar é que, em um país de
enorme extensão territorial como o nosso, não há lógica que nos
diga que um trabalhador de um vinhedo em Bento Gonçalves deva
ganhar o mesmo salário mínimo recebido por outro em uma fazenda
de soja em Dourados, no Mato Grosso do Sul! Salários (mínimos ou
não) devem ser negociados dentro de cada empresa, que é quem
sabe onde lhe doem os próprios calos! Pior do que ser “explorado”
pelo capital – o que pode ser perfeitamente evitado com uma
moderna reforma sindical – é, para o trabalhador, ser explorado pelo
Estado.
Politizar o salário mínimo encobre algo pior do que
desconhecer economia: a demagogia, aquela arte de tentar iludir
o povo com o intuito de obter votos... Uma coisa é dizer que os
salários reais no Brasil são baixos, o que é verdade, por uma
simples questão de baixas produtividades e elevadíssimos
encargos; outra é pretender fixá-los na marra, por “leis”.
Estadistas de verdade lutariam, primeiro, pela extirpação dos
encargos trabalhistas, que oneram o custo da mão-de-obra e
perpetuam o desemprego; segundo, por boas políticas
educacionais e de saúde, que elevariam a produtividade dos
trabalhadores e, portanto, os salários; terceiro, por um sistema
tributário bem menos voraz, que estimularia empregos; quarto,
por
uma
reengenharia
do
Estado;
quinto,
prla
desregulamentação das relações econômicas e sexto – porém
como requisito básico para os demais - respeitariam a ética e a
dignidade da pessoa humana, abandonando definitivamente o
populismo.
Chega ao espantoso percentual de 103% o total de
encargos que incidem sobre a contratação de mão-de-obra, com
carteira de trabalho assinada, no Brasil. Isto significa que um
trabalhador que ganhe R$ 260, custa, para o seu empregador, R
$ 260 vezes 2,03, o que dá R$ 527,80, que é igual a R$ 260
mais R$ 267,80. Caso um maná de bom senso caísse sobre as
cabeças de nossos legisladores e formuladores de “políticas” e
os fizesse reduzir os encargos trabalhistas e tributários para,
digamos, a metade (o que ainda seria muito, dada a quase
absoluta existência de retorno desses gastos para os
trabalhadores), o custo desse empregado para o patrão cairia
para R$ 393,90, ou seja, R$ 133,90 a menos do que nas atuais
condições ou 0,25 do custo total de contratação de um
trabalhador, sob a descomunal cunha trabalhista vigente. Em
outras palavras, um empregador que gaste, hoje, mensalmente,
suponhamos, R$ 5.278,00 com dez trabalhadores que ganham o
salário mínimo, pelo mesmo valor poderia empregar, caso o
bem-aventurado maná chovesse do alto, 13,4 empregados ou -
como não se podem cortar pessoas em fatias como fazia Jack, o
Estripador – 13 funcionários e mais um décimo quarto em tempo
parcial! Um crescimento acima de 30% no número de pessoas
que ganham o salário mínimo empregadas!
Caso uma outra chuva de dignidade e de bom senso
tornasse possível o redesenho do Estado, reduzindo, entre
outras medidas urgentes, a atual orgia de Baco dos mais de
5.000 municípios com menos de 50.000 habitantes – que
representam mais de 90% das 5.561 municipalidades existentes
– teríamos algo em torno de 550 municípios apenas, com
substanciais economias para os cofres públicos e,
principalmente, para os explorados contribuintes. Medidas como
essa poderiam reduzir ainda mais fortemente os encargos sobre
a mão-de-obra, mesmo que a carga tributária permaneça na
exorbitância dos 38% do PIB atuais e mesmo que nossos
pretensos homens públicos não venham a acabar de uma vez
por todas com a obtusa e retrógrada obrigatoriedade da
previdência estatal, permitindo a cada trabalhador descontar
para o fundo de pensão de sua escolha, tal como ocorre, por
exemplo, há cerca de vinte anos, no Chile.
Para termos uma pálida idéia de como os encargos
excessivos sobre a mão-de-obra podem ser responsabilizados
por uma considerável parcela do desemprego e da
informalidade, suponhamos que fossem reduzidos dos atuais
103% para 15%. Com o novo salário mínimo de R$ 260, o custo
por trabalhador baixaria dos atuais R$ 527,80 para algo muito
perto de R$ 300, ou seja, quem hoje emprega 10
trabalhadores poderia, ao mesmo custo de R$ 5.278,00,
passar a empregar 17,5, ou 17 funcionários e mais um
décimo oitavo trabalhando em meio expediente, um
crescimento de 75% no número de empregados com carteira
assinada e ganhando R$ 260 por mês!
O conceito de salário mínimo é, por definição, uma
excrescência a ser definitivamente eliminada; quando a essa
anomalia econômica se soma o jurássico Estado que todos
conhecemos e a ambos, desafortunadamente, se adiciona o
populismo no melhor estilo latino-americano, podemos afirmar
categoricamente o que cantava, nos primórdios da Bossa Nova,
o extraordinário pianista e cantor brasileiro Dick Farney: “não
tem solução”.
Ou o Brasil redesenha o Estado saúva ou o Estado acaba
com o Brasil. Mas é fácil entendermos porque essas simples
propostas de cunho prático estão condenadas a permanecer
sabe-se lá quantos anos ainda nas gavetas de nossos sonhos:
é, simplesmente, porque a imensa maioria dos que não sabem
mentir não tem nem espaço e nem o que fazer em Roma – ou no
Planalto, ou no Guanabara, ou na Câmara, ou no Senado, ou
nas prefeituras, ou na vereança...
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Artigo do Mês - Ano III - Nº 25 - Abril de 2004
CAÇAMBA SEM CORDA
“Faites nous de bonne politique et je vous ferai de bonnes
finances”.
(Fazei-nos boa política e eu vos farei boas finanças)
BARÃO LOUIS, Ministro da Fazenda da Restauração e do
reinado de Luís Felipe
As críticas à política econômica do governo do PT vêm se
multiplicando mais do que coelhos, desde que foram divulgados
os pífios resultados da economia brasileira em 2003 e que
explodiu a bomba do caso Waldomiro. Entre os críticos,
podemos arrolar desde fedegosos comunistas adoradores de
Fidel Castro até fisiológicos políticos do PMDB, PL e PTB,
passando por importantes setores dentro do próprio PT, por
alguns arautos da oposição, por economistas heterodoxos atrás
de fama e por nacionalóides (maus nacionalistas), sem
conhecimentos de teoria econômica. As críticas à dupla Palocci
e Meireles tendem a ganhar intensidade na razão direta tanto da
proximidade das eleições municipais quanto da percepção
crescente, por parte da opinião pública, do desastre político e
administrativo protagonizado pelo governo do despreparado sr.
Luís Inácio.
Critica-se acerbamente, apenas por criticar, sem que se
apresentem alternativas sólidas ao que a Fazenda e o Banco
Central vêm executando para manter a inflação sob controle e
dentro das metas anunciadas, talvez para dar substância ao
veredicto de Flaubert, para quem “faz-se crítica quando não se
pode fazer arte, como quem se torna delator quando não pode
ser soldado”. No centro das diatribes e invectivas contra essa
política econômica de cunho neoliberal que está aí está a taxa
básica de juros. Há detratores que chegam mesmo a pensar que
a economia poderia encontrar a rota do crescimento sustentado
mediante uma simples decisão mais ousada do Copom,
acompanhada, provavelmente, de gestos histriônicos à la
Kirschner, que brinca há tempos de esconde-esconde com o
FMI, de políticas industriais elaboradas por gênios com bolas de
cristal e de macaquices acadêmicas de cunho heterodoxo
semelhantes às que foram utilizadas durante o governo de
Sarney e por aquela senhora que comandou a economia – sem
ter sequer vaga idéia do que estava a comandar – na primeira
fase do governo Collor.
Um outro Brasil é possível? É claro que sim, uma vez que,
na realidade, há uma infinidade de brasis possíveis, desde
aquele da opulência, da pujança e da igualdade de
oportunidades com que todos sonhamos até aquele outro da
pobreza que beira a miséria acompanhada da mais completa
falta de liberdade, como no regime do carniceiro do Caribe,
passando
pela
colombianização,
mexicanização
e
venezualização, já que não devemos descartar o fato de que
tanto o odioso regime mantido a ferro e fogo por Castro, quanto
o terrorismo do narcotráfico das Farc, a identificação entre
Estado e partido do PRI mexicano e o estúpido populismo do
débil mental Hugo Chávez são totens cultuados pela seita
petista, desde a primeira reunião do Fórum de São Paulo...
Assim como caçamba sem corda não pode descer ao
poço, regimes monetários sem respaldo em regimes fiscais
sólidos não podem gerar crescimento! Esta é, em síntese, a
grande questão e da qual todas essas posturas pró “mudanças”
revelam profundo desconhecimento! Essa falta de percepção de
que sem uma profunda alteração no regime fiscal, baseada em
um forte enxugamento do Estado - que possibilite necessidades
de financiamento de longo prazo duradouramente menores - e
em uma reforma tributária corajosa e capaz de libertar o
aprisionamento da energia a que o setor privado vem sendo
submetido, sem uma descentralização administrativa de caráter
federalista, sem, enfim, uma reforma política profunda que
possa possibilitar todos esses requisitos, com toda esta tamanha
falta de compreensão de que a caçamba da política monetária
precisa estar atada à corda da política fiscal, estaremos
condenados a continuar caminhando em círculos, sem
crescimento e com a inflação contida às custas de um
desemprego - que teria tudo para ser transitório, mas que acaba
perpetuando-se – crescente, caso a atual política seja mantida
ou a caminhar rapidamente para o caos cambial, monetário,
político e social, caso ela venha a ser mudada como seus
despreparados críticos vêm, irresponsavelmente, sugerindo.
A questão é muito séria:a continuar do jeito que está - com
o governo inchando cada vez mais o setor público, extorquindo
sempre mais dos agentes privados, espantando com excessos
de controles e sinais equivocados os investidores externos e
tentando ludibriar o FMI com essa estúpida proposta de que
gastos com investimentos na área “social” não são gastos (como
se leopardos não fossem felinos) – teremos necessidade de uma
taxa de desemprego cada vez mais elevada para que a inflação
permaneça controlada; se optarmos pela heterodoxia de reduzir
o superávit primário mediante mágicas contábeis, de colocar
barbudos e mais barbudos com carteirinhas do PT em cargos
públicos e de diminuir artificialmente a taxa básica de juros, sem
o necessário respaldo fiscal, caminharemos para o precipício
mais rapidamente.
Só há uma solução para que os nós em que nos
prendemos possam ser desatados, que é a busca de uma
coordenação – não simbólica, de fachada, de curto prazo, mas
permanente e que possa ser percebida como tal – entre os
regimes fiscal, monetário e cambial: política monetária
exatamente como vem sendo executada, câmbio efetivamente
flutuante e reformas liberais no Estado brasileiro!
Os liberais vêm dizendo isto há bastante tempo, desde,
pelo menos, o primeiro choque do petróleo, em 1973-74. Entre
aquele evento e 1989, preferimos sempre, com Delfim, Funaro,
Bresser e Maílson, apelar para mágicas heterodoxas, todas
fracassadas, tanto as conduzidas com competência pelo
primeiro, quanto as executadas a quilômetros de distância, em
termos de conhecimento de economia, pelos demais. Com a
eleição de Collor, parecia que o Brasil ia, enfim, encarar os
problemas de frente, esperança logo desfeita no primeiro dia de
governo pela equipe econômica comandada por aquela
incompetente e arrogante senhora que confiscou cerca de 80%
dos ativos do sistema financeiro e decretou novo congelamento
de preços. Dona Zélia nem desconfiava que, há duzentos anos,
David Hume, Adam Smith, Richard Cantillon e outros já haviam
ensinado que, para acabar com a inflação, não é preciso jogar
fora a água que está no balde, basta parar de jogar mais água
no balde... Com o excêntrico Itamar, houve uma tentativa de
paralisar uma liberalização que mal começara, pois Collor fora
posto para fora a pontapés e, com Fernando Henrique, entramos
em uma fase em que muito se falava em reformas do Estado e
em privatizações, mas pouco se fez naqueles oito anos, diante
das expectativas, confirmadas em duas eleições, do que poderia
e deveria ter sido feito.
Na campanha presidencial de 2002, tivemos o fato
inusitado de apresentarem-se seis candidatos, todos de
esquerda, todos – inclusive o do PSDB - com críticas ao modelo
neoliberal supostamente adotado pelo Brasil. Modelo que, para
quem entende o que é o liberalismo, nunca foi adotado. A culpa,
definitivamente, não era do mordomo, mesmo porque, no dia do
crime, ele estava de folga, curtindo a vida em outro local que não
o do crime...
Com a ocupação das cadeiras estofadas de Brasília por
parte do petelhato e a surpreendente ortodoxia monetária
adotada, desamarrou-se de vez a corda da caçamba: apertos e
mais apertos no lado monetário, frouxidão e mais frouxidão no
lado dos gastos para manter a máquina estatal, e que tendem a
crescer na medida em que o PT sempre prestou culto ao falso
deus-Estado.
O Barão Louis estava certo: não pode haver boas finanças
onde não há boa política. No caso brasileiro, as finanças até que
estão sendo razoáveis face à política, que é péssima.
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Artigo do Mês - Ano III - Nº 24 - Março de 2004
ESTRELA CADENTE,
DESEMPREGO CRESCENTE
E INFLAÇÃO LATENTE
“Quando vim da materna sepultura
De novo ao mundo, logo me fizeram
Estrelas infelizes obrigado;
Com ter livre alvedrio, mo não deram,
Que eu conheci mil vezes na ventura /
O melhor, e o pior segui, forçado.”
CAMÕES,
Canções
Custou, mas aconteceu. É possível iludir a muitos durante
muito tempo, é factível enganar as massas por anos a fio e é
exeqüível ludibriar quem não tem o hábito de pensar por
períodos consideráveis, desde que se esteja na oposição. Mas é
absolutamente impossível manter por mais de alguns meses a
máscara ilídima da hipocrisia e da incompetência, quando se
senta nas cadeiras estofadas do poder. O saudoso Roberto
Campos, em seus tempos de senador, costumava dizer que o
PT era o partido dos trabalhadores que não trabalhavam, dos
estudantes que não estudavam e dos intelectuais que não
pensavam; agora, depois de apenas quatorze meses no poder,
podemos afirmar que o PT já deu provas cabais de ser, também,
o partido dos governantes que não governam...
Este caso do senhor Waldomiro, aquele homem probo que
cobra “apenas”1% de comissão, de estrita e absoluta confiança
do ministro-chefe da Casa Civil, constatação federal das ligações
do PT com o jogo do bicho e os bingos que, em nível estadual,
todo o Rio Grande do Sul já conhecia há anos, desde que o exgovernador e atual ministro das “cidades” - aquele bigode com
um homem chamado Olívio escondido por trás - foi apenas a
gota d’água necessária e suficiente para molhar e desmanchar a
máscara de papel maché envergada por vinte e quatro anos, a
fantasia de partido do bem, o disfarce da preocupação com os
pobres, o escabeche da ética e os paetês da conduta reta e
ilibada. Como diz uma belíssima canção napolitana de 1930 Dicitencello Vuje, de Fusco e Falvo –, cantada por todas as
grandes vozes da Itália desde então, “levammece ‘sta
maschera / Dicimmo ‘a verità!”, é tempo de tirar a máscara e de
dizer a verdade. No caso da canzonetta, a verdade revelada é
que o compositor declara o seu amor por sua musa, mas, no do
eleitorado brasileiro, a realidade exposta é que é tempo de dizer
que se descobriu a.perfídia, a arrogância e a estultice do pessoal
da estrela vermelha: perfídia, porque o PT, contrariamente ao
que o senhor Duda Mendonça levou os incautos a crerem, não
tinha e não tem qualquer idéia de como governar sequer uma
escola de samba, quanto mais um programa para governar um
país complexo como o Brasil; arrogância, porque sempre se
considerou o dono de todas as verdades, em todos os assuntos
e estultice porque seus quadros, sendo inteiramente
despreparados e sem o mínimo cacoete de como administrar um
botequim pé-sujo, sempre tentaram levar-nos a crer que seriam
mais capazes do que os realmente capazes, mas que não
pertencem à sua seita.
Do triste episódio Waldomiro em diante, a opinião pública
passará a ver o partido que sempre se arvorou em guardião da
correção moral com a mesma e justa desconfiança com que vê
as condutas éticas dos demais partidos, o que é bom para uma
sociedade livre e aberta. E quanto mais fatos novos tentar gerar
para apagar o escândalo, quanto mais tramóias políticas
procurar arquitetar - sob o manto interesseiro do ex-presidente
Sarney e de outras tristes figuras - para impedir a CPI clamada
pelo povo, mais os barbudos estrelados irão afundar a sua
agremiação na areia movediça fabricada por eles próprios, com
a sua arrogante incompetência.
No plano econômico, o PIB encolheu 0,2% no primeiro ano
do governo petista, apesar de, no último trimestre, a economia
ter ensaiado uma tentativa, fugaz e sem forças, de recuperação,
ainda sob o fogo de artifício das taxas Selic em queda e sem
desconfiar que poderiam surgir escândalos de impacto maior do
que os protagonizados, por exemplo, pela senhora Benedita da
Silva com aquela sua viagem a Buenos Aires custeada pelos
contribuintes. Mas, para quem anunciou um espetáculo de
crescimento digno de um Maracanã lotado, o que se viu foi um
joguinho de segunda categoria, em um campo de várzea, com
meia dúzia de gatos pingados nas arquibancadas. E – ironia das
ironias! – os setores que impediram que o desastre fosse mais
retumbante foram justamente a agropecuária, com crescimento
de 5% e as exportações, que subiram 14,2%, resultados sem
dúvida muito bons para o país, mas, no mínimo, desmoralizantes
para um partido que só sabia falar em “reforma agrária” e cujos
economistas jamais foram adeptos da abertura comercial...
De outra parte, o tigre da inflação vem dando sinais de que
está novamente faminto e pronto a devorar as vítimas de
sempre, o que tem levado o Copom a adotar a postura correta
de ajustar a taxa de juros às novas expectativas de inflação, sob
intenso bombardeio de economistas despreparados, de
empresários mal acostumados, de jornalistas desinformados e
de políticos defasados.
Em suma, até aqui, o governo do PT não disse a que veio!
Se a política econômica – entenda-se como tal a política
monetária – vem seguindo o rumo correto, o mérito não é de
nenhum economista do partido, nem tampouco do dr. Palocci,
que não tem conhecimentos sólidos do assunto, mas de um
banqueiro (o mais odiado dos espécimes no infantil imaginário
petista) posto no Banco Central e de dois economistas para lá de
ortodoxos, Marcos Lisboa, na Fazenda e Joaquim Levy, no
Tesouro Nacional, ambos com doutorados obtidos nos Estados
Unidos. O único mérito de Palocci é o de confiar neles e
defendê-los contra as tentativas de novas feitiçarias heterodoxas
e de bruxarias políticas irresponsáveis de elementos mais
radicais dentro e fora do partido. Quando alguém diz algo como
“precisamos mudar esta política econômica que está aí”, ou
“precisamos ousar mais na economia”, o que temos a fazer é
perguntar como seria, em todos os seus pormenores, a efetiva
mudança, bem como lembrar que, se o negócio é ousar, os
homens bombas e os suicidas em geral são bem mais ousados,
só que o prêmio à sua ousadia é a própria vida.
Se o governo, para abafar a crise política, resolver trocar a
política monetária, precipitará o desastre, pois baixar a taxa de
juros agora, controlar câmbio e capitais, além de expandir ainda
mais um regime fiscal para lá de deficitário, só irá precipitar a
inflação, provocar fugas de capitais e criar uma crise cambial
sem precedentes, sem sequer atacar o problema do
desemprego. Não se pode dizer do presidente argentino, Nestor
Kirchner, que não seja ousado, mas pode-se afirmar que é um
populista inconseqüente. O tempo demonstrará isto, muito mais
depressa do que pensam os que hoje o aplaudem, sempre
afeitos a bravatas, muitos dos quais já aplaudiam as moratórias
tão prejudiciais ao país praticadas por Funaro, Bresser, Maílson
e por aquela senhora que nos seqüestrou os ativos monetários
em 1990...
Se o governo não trocar a política monetária, mas
continuar mantendo a inchação do setor público que vem
promovendo, bem como a criminosa carga tributária, vamos
continuar andando para trás por um bom tempo e a implosão
demorará mais, mas não deixará de ocorrer.
Só não podemos aceitar que se diga que o governo Lula
moveu-se para a direita, ou que é um governo “neoliberal”. Que
liberalismo cria, apenas em um ano, em um estado já
paquidérmico, mais de 40.000 vagas no serviço público e quase
3.000 novos cargos gratificados? Que liberalismo suga 40% de
impostos de quem trabalha e produz? Que liberalismo governa
com medidas provisórias? Que liberalismo acredita que o
somatório das pobrezas (Brasil, Argentina, Venezuela, Índia,
Líbia, Cuba e outros países) é sinal líquido e certo de riqueza?
Que liberalismo propõe estatizar as universidades privadas? Que
liberalismo ainda cria, em pleno século XXI, novas estatais? O
PT sempre foi um partido de esquerda, ainda é um partido de
esquerda e vai continuar, durante muito tempo, a ser um partido
de esquerda. A tal “sociedade com justiça social” de que tanto
falam seus membros nada mais é do que um nome diferente,
escamoteado, para o velho monstro senil e caquético do
socialismo!
Cai a estrela, sobem o desemprego e a inflação. Cai a
esperança, sobem a frustração e o sentimento de que o eleitor
brasileiro foi vítima, em 2002, do maior estelionato eleitoral
jamais praticado – para falarmos como o presidente – “neste
país”!
Artigo do Mês - Ano III - Nº 23 - Fevereiro de 2004
INQUIETAÇÃO
ACADÊMICA?
“Autonomia do Banco Central é inquietação acadêmica”.
(Luiz Inácio da Silva, Presidente da República Federativa do Brasil, em
29/01/04)
Cada pronunciamento feito por nosso presidenteviajante e que escape ao que tenham cuidadosamente colocado no
papel, é uma evidência assustadora de que, para dar palpites infelizes
e ainda continuar a ser bajulado, basta ser Presidente do Brasil...
Mal chegado da Índia, de onde conclamou os
exportadores brasileiros a reclamarem menos e vender mais,
ignorando, naturalmente, que os impostos, a burocracia, os encargos
trabalhistas e previdenciários e as trapalhadas do seu governo são os
verdadeiros obstáculos à nossa atividade empresarial, nosso
endeusado, incensado e iletrado, porém sempre falante mandatáriomor declarou, em pleno território suíço – logo na Suíça, cujo Banco
Central sempre foi um modelo em termos de autonomia das
autoridades monetárias! -, que a idéia de que os bancos centrais
devem ser independentes é coisa de acadêmicos, sem qualquer
significado prático, pois basta, segundo seu rico vocabulário de cinco
páginas formato memorando, que o governo disponha de um Banco
Central “sério”, para que a estabilidade da moeda seja mantida.
Confesso que cheguei a pensar o que seria um
Banco Central sério, mas que demorei bastante tempo para atinar com
a resposta. Talvez fosse um com diretores de caras amarradas e com
problemas de fígado, ou um outro em que toda a diretoria e os
principais assessores usassem barbas negras cerradas, alisadas
lentamente de cima a baixo a cada cinco segundos para denotar que
seus donos estariam sublimados em estado de febril atividade
intelectual ou, ainda, um terceiro que tivesse a sede e as delegacias
regionais decoradas com móveis antigos e escuros, talvez de estilo
colonial, e onde fosse proibido para todos os funcionários trabalhar de
bom humor. Após profunda reflexão, pude perceber que não seria
bem isso; no entanto, devo confessar que não foi nada fácil chegar a
alguma conclusão.
Tivemos excelentes presidentes em nosso Banco Central
de temperamento bem humorado, como, por exemplo, o primeiro
deles, Dênio Nogueira – que ocupou o posto exatamente quando
nossa autoridade monetária gozava de “independência”, isto é, de
autonomia em relação às pressões políticas, algo que o Presidente
Costa e Silva, pouco depois de assumir, fez questão de abolir, sob a
inspiração de Delfim Netto, ad usum Delphini... Já Affonso Pastore,
também um excelente economista que presidiu o Banco Central,
aparentava publicamente ser uma pessoa mal humorada. O mesmo
podemos dizer acerca de ministros da área econômica: o Prof.
Bulhões, talvez o melhor de todos os tempos, era um homem de
fisionomia circunspecta, embora de coração e alma boníssimos; já o
sr. Bresser Pereira, um de nossos piores ministros, sempre mostrouse bem-humorado e sorridente: sorria quando anunciava as altas
taxas de inflação mensais ocorridas em sua época, continuava a sorrir
quando o plano que levou se nome fez água por todos os lados e
mantém-se gargalhando até hoje, quando ainda se sentem os efeitos
do Plano Bresser, de 1987.
Bem, se a solução do mistério do que vem a ser um banco
central “sério” não está em caras amarradas – foi o que pensei – deve
estar na barba. Lembrei-me, imediatamente, que Gustavo Loyola e
Armínio Fraga portavam barbas e que o próprio Dênio Nogueira
ostentava um cavanhaque. Mas lembrei-me, também rapidamente,
que Carlos Langoni e Antônio Carlos Lemgruber, aparentemente,
escaneavam suas faces diariamente antes de seus motoristas levá-los
a seus gabinetes.
Restava analisar a aparência dos prédios e do mobiliário e
fui tentado a crer que talvez a sisudez da primeira sede do Banco
Central, na Avenida Presidente Vargas 84, no Rio de Janeiro, pudesse
decifrar o enigma proposto – mesmo sem o seu próprio conhecimento
– por nosso presidente-retirante, grande apreciador de vinhos que
custam mais de quatro mil reais a garrafa. Mas também não está aí a
resposta, pois lá mesmo, naquela antiga sede, foram geradas
inúmeras políticas de subsídios ao crédito que tornaram, durante um
bom período, as taxas de juros reais negativas. Ademais, os gabinetes
modernos da sede do banco, em Brasília, já foram o nascedouro de
rios e mais rios de tolices em termos de política monetária e cambial,
em diversas épocas.
O que pode ser, então – descartado todo o meu arsenal de
suspeitas iniciais – um banco central “sério”? Para solucionar este
inquietante dilema, descobri que a única alternativa seria a de tentar
raciocinar como nosso presidente, colocar-me em seu mundo,
internalizar seus valores, entoar uma berceuse para meus neurônios
adormecerem e tentar sentir suas palavras como se fossem minhas.
Foi muito difícil – afinal, ainda não inventaram aquela máquina do
tempo mostrada em muitos filmes, que nos transporta, em questões
de segundos, para o passado remoto -, mas, depois de muito esforço,
creio que consegui!
Para Lula e os que pensam como ele, um banco central
“sério” não vem a ser nada mais do que um banco central dirigido por
alguém afinado com a maneira de pensar do restante do governo. Se
hoje o presidente do Bacen pensa de acordo com os ditames do
“núcleo duro” - existe, por acaso, “núcleo mole” ? -, então está ótimo,
vamos mantê-lo no cargo. Mas, se amanhã ou depois, o infeliz achar,
por exemplo, que não fica bem para a autoridade monetária manter a
taxa de juros artificialmente baixa para que a economia ganhe um gás
passageiro e o governo e seus aliados possam obter vitórias
expressivas nas eleições municipais, então ele não serve e vamos
demiti-lo...
Se até aqui o tom deste artigo foi jocoso, é porque,
com toda a sinceridade, pensamos que um país que tem o
presidente que nós temos, que tem os políticos que nós temos e
que tem as instituições e o modo de pensar que nós, brasileiros,
em nossa maioria, temos, não mereceria ser levado a sério.
Mas, apesar dessa enorme tentação, como aqui
nascemos, aqui pretendemos continuar a viver e aqui veremos
nossos descendentes nascerem e crescerem, temos a obrigação
moral de levar o Brasil a sério! Por isso, deste parágrafo em
diante, vamos falar a sério, embora não no sentido “sério” do
presidente.
Existe
uma
enorme
necessidade
de
tornar
institucionalmente os bancos centrais - cuja missão principal deve ser
a de guardar o valor da moeda – imunes a qualquer pressão de
natureza política. Isto pode ser obtido, teoricamente, de três maneiras.
Todas foram testadas, duas obtiveram êxito e a terceira fracassou.
A primeira é a adotada pela maioria dos países que têm
taxas de inflação baixas, especialmente após a segunda guerra
mundial e é mais conhecida como “independência do Banco Central”,
embora alguns autores, como James Buchanan e Pamela Brown, por
exemplo, a denominem de “solução constitucionalista”. Consiste,
simplesmente, em estabelecer mecanismos na constituição para que a
autoridade monetária ganhe imunidade às pressões políticas.Trata-se
das conhecidas práticas de estabelecer mandatos alternados para os
diretores do Banco Central entre si e entre estes e o presidente do
país, de dar a eles autonomia para formularem e executarem metas de
crescimento dos agregados monetários e de inflação para períodos
longos (cinco anos, por exemplo, como no Chile), de forma a tornar a
política monetária fortemente previsível, sem surpresas para os
agentes econômicos. É a viabilização da famosa x rule formulada por
Milton Friedman, ainda nos anos cinqüenta, quando muitos ainda
achavam que a inflação não seria, sempre e em qualquer lugar, um
fenômeno essencialmente monetário, inclusive nos países abaixo da
linha do equador... É evidente que o presidente de um banco central
autônomo, de tempos em tempos, vai ao Congresso e explica as
diretrizes gerais da política monetária para as sumidades econômicas
que lá costumam campear. Isto acontece nos países que,
tradicionalmente, possuem bancos centrais autônomos. Já na Nova
Zelândia há um dispositivo constitucional estabelecendo que, se a
inflação anual exceder os 3%, toda a diretoria do Banco Central estará
automaticamente demitida, a não ser que a causa da expansão dos
preços tenha sido de natureza absolutamente extraordinária. A
primeira medida do esquerdista – para os padrões civilizados – Tony
Blair foi a de estabelecer a chamada “independência” do Banco da
Inglaterra. Há esquerdistas sensatos e insensatos, como se pode ver.
Lula, logo após ser eleito e antes de tomar posse, emitiu sinais –
escreveram isto para ele dizer, na verdade – de que poderia fazer o
mesmo, mas que político, nesta terra em que a insensatez é fato
consumado, uma vez sentado na cadeira de todo-poderoso, vai abrir
mão de qualquer milímetro de poder? Por isso, o discurso do
presidente foi mudando até que, da Suíça, ele emitiu a pérola de que
Banco Central independente é coisa de acadêmicos, de teóricos
desligados da realidade. A inflação, senhor presidente, não é
provocada por acadêmicos, mas por políticos – sempre assessorados
pelos economistas heterodoxos - que fizeram cinco congelamentos de
preços no Brasil, em detrimento de todo o povo, especialmente dos
mais pobres!
A segunda é o modelo adotado por Menem na Argentina,
sob a influência do ministro Domingo Cavallo: uma âncora cambial,
com conversibilidade plena e paridade fixa (no caso Argentino, de 1:1).
Se esse sistema tem o mérito de isolar os gatos (políticos) do pires de
leite (a gestão da moeda), tem o demérito de levar o pires de leite para
o exterior, pois, tal como ocorreu na Argentina, a política monetária do
país desaparece, já que, uma vez estabelecida a paridade, a inflação
doméstica passa a ser determinada pela política monetária dos
Estados Unidos. Outra desvantagem desse sistema é que, se ele
consegue debelar inflações fortes e crômicas rapidamente e sem
impor custos elevados à sociedade no curto prazo, com o decorrer do
tempo, pela asfixia de divisas provocada pela defasagem inevitável da
taxa de câmbio, acaba provocando custos sociais insuportáveis.
Nossos vizinhos argentinos estão aí mesmo para nos contar sua triste
história.
Por fim, o terceiro modo de proibir o acesso dos gatos ao
pires de leite é seguir a sugestão formulada por Hayek em 1974, a de,
para mantermos a comparação, dividir o leite em vários pires menores
e entregar cada um deles para um guardião; se este for cooptado
pelos gatos, seu leite será bebido e o prejuízo será seu. Trata-se da
proposta de “desnacionalização do dinheiro”, em que se permitiria a
vários bancos emitir cada um deles a sua moeda, evidentemente
sobre um certo lastro a ser definido, estabelecendo uma salutar
competição entre moedas alternativas: os bancos que emitissem mais
do que os seus lastros recomendassem, veriam as demandas pelos
seus ativos monetários caírem, provocando desvalorização em suas
moedas e valorização nas demais. Tal sistema poderia até convergir,
depois de algum tempo, para uma única moeda, mas seu emissor –
que poderia até ser o próprio banco do governo – ficaria
permanentemente sujeito à competição: se emitisse mais do que o
adequado, para atender, por exemplo, aos apelos dos gatos políticos,
seu leite desapareceria, pois surgiriam novas moedas emitidas por
competidores, antes inviáveis, mas agora tornadas viáveis pela má
atuação do monopolista. A pergunta relevante deixada por Hayek é:
existe fundamento para o fato de apenas governos poderem emitir
moeda? Que história é esta de monopólio legal? Por que um
monopólio legal sobre o petróleo, por exemplo, é criticado, ao passo
que ninguém questiona o monopólio legal de emissão de moeda dos
bancos centrais?
Os três modos de isolamento dos gatos foram testados:
bancos centrais autônomos, onde quer que tenham sido implantados,
conseguiram manter a inflação bastante baixa e previsível, bem como
lograram guardar uma boa distância dos sempre famintos felinos; a
âncora cambial conseguiu derrubar rapidamente a inflação, mas
causou problemas seriíssimos após algum tempo e o sistema de
coexistência simultânea de várias moedas dentro do mesmo território
era fato corriqueiro na Renascença, em cidades como Florença e
Veneza e na Escócia (onde até hoje há duas moedas, uma oficial e
outra não), sem que se tenha notícia de inflação nesses casos.
É evidente que a lição que devemos tirar de tudo isto é que
a proposta de Hayek, apesar de interessante teoricamente, ainda é
absolutamente inviável no mundo atual (aí, sim, o presidente teria
razão, embora fosse difícil para ele chegar a entender o que seria
“desnacionalização do dinheiro”). Caminharia no sentido oposto, por
exemplo, ao que culminou com a adoção do euro. A “âncora cambial”
de Domingo Cavallo - e que o Brasil, sob a gestão de Gustavo Franco
no Banco Central (1995/1999) adotou, embora de forma muito mais
tímida, através do sistema de “bandas cambiais” - foi um retumbante
fracasso . Resta a da autonomia do Banco Central.
Dois tipos de pessoas costumam ser contra a referida
autonomia. As primeiras são os economistas da tradição keynesiana,
que ainda imaginam, mesmo após uma história de fracassos de quase
sete décadas, que o papel dos bancos centrais deva ser o de manter
a taxa de juros baixa para “estimular” o crescimento da economia. A
farta evidência empírica aponta claramente que o máximo que tais
políticas conseguiram foram provocar surtos de “crescimento” artificiais
e efêmeros, logo abortados por inflação e desemprego ou, na hipótese
extrema, pela hiperinflação. As segundas pessoas que se manifestam
contra a autonomia das autoridades monetárias são os políticos de
todas as partes do mundo, já que gatos, por definição, gostam de
leite...
Experimentemos, por exemplo, tentar mostrar ao sr.
Sarney, ou ao sr. Dirceu, ou a qualquer outro político que possamos
imaginar e que esteja detendo alguma fração do poder nas mãos, que
a proposta de autonomia do Banco Central é interessante para o
país...
Sou também um acadêmico e confesso que estou de fato
inquieto. Mas a causa de minha inquietação é o rumo que nosso país
está trilhando, ao pálio da imprensa e da maioria dos intelectuais, para
quem parece justificar-se automaticamente tudo aquilo que Lula
declara que é bom e criticar-se sem qualquer análise aquilo que ele
julga ser mau.
É o Brasil ad usum Luli...
Artigo do Mês - Ano III - Nº 22 - Janeiro de 2004
ANO NOVO, VELHOS
PROBLEMAS...
“Baixai o pano, a farsa está terminada”.
(Últimas palavras atribuídas a Rabelais- 1494/1553)
A cada início de ano, é costume renovar esperanças e
alimentar confianças em relação ao futuro. Tempo de arrumar
armários, limpar gavetas, fazer faxinas e vestir cores que – acreditam
muitos – possam ajudar a realizar antigos desejos e aspirações. Nada
existe de errado com esses hábitos, descontado o teor de superstição
que costuma motivá-los, nem com o fato de se os estender para o
campo das relações econômicas. Afinal, também na economia a
esperança pode, assim como a fé, mover montanhas. Mas, para tal,
precisa fundamentar-se em atitudes concretas e não em crenças
escatológicas ou ideológicas.
Um pouco de realismo só pode fazer bem, mesmo ao elevado
custo de eventualmente enfraquecer as confianças e esperanças que,
muito justamente, os cidadãos brasileiros pacientemente procuram
robustecer a cada virada de ano, desde que Cabral aqui aportou.
Os atos econômicos não são praticados em um vazio
institucional, já que o homo economicus, aquele robô frio, calculista e
sempre pronto a maximizar resultados, sejam eles lucros, utilidades,
taxas de retornos ou quaisquer outros, só existe nos livros de
economia. Na vida real, as relações entre economia, política, direito,
ética e outros campos da ação humana objetiva e subjetiva são fatos
inevitáveis e a soma de suas inter-relações é que constitui o que
comumente se chama, reverentemente, de sociedade. Em outras
palavras, lembrando o sábio Professor Eugenio Gudin, coeteris non
sunt paribus... O hábito arraigado de separar-se o econômico do
social, do político, do ético e do legal, praticado, por exemplo, quando
se tenta isolar o “mercado” do “social” – quase sempre denegrindo o
primeiro e enaltecendo o segundo – é uma das causas das repetidas
frustrações das esperanças de crescimento econômico sustentado.
Embora se diga que pessimistas sejam apenas otimistas bem
informados, tentemos não ser nem uma coisa nem outra, para sermos,
tão somente, realistas. Olhemos para as instituições que nos
circundam. O que vemos, neste início de ano, não é diferente do que
sempre vimos em muitos outros janeiros.
Primeiro, um cabo-de-guerra, particularmente perigoso em ano
de eleições, no seio do próprio governo, dividido entre, de um lado,
pragmáticos que em boa hora acolheram o bom princípio moral da
responsabilidade fiscal e, de outro, pretensos progressistas, incapazes
de enxergar além dos dogmas ideológicos que decoraram e para
quem responsabilidade fiscal é coisa de neoliberais.
Segundo,
observando
o
episódio
das
convocações
extraordinárias do Congresso e de algumas assembléias estaduais,
para não citarmos outros episódios, vemos um legislativo
desacreditado e alheio aos males que uma explosão de gastos
públicos provocará em nossa precária situação externa e fiscal.
Terceiro, o judiciário, em condições semelhantes de descrédito,
politizado e revelando diversos casos de pouco zelo para com sua
missão maior, que é a de, com simplicidade e discrição, prover justiça.
Juízes, por definição, não podem ser nem de esquerda nem de direita,
nem tampouco deste ou daquele partido político: devem, tão somente,
abster-se de seguidas entrevistas na mídia e julgar seguindo a letra da
lei.
Quarto, uma carga tributária extorsiva e sempre crescente, a
inviabilizar toda e qualquer possibilidade de crescimento sustentado,
pois, entre outras conseqüências nocivas, penaliza tanto a produção
quanto o consumo, além de desestimular a poupança. Um caso
perdido, pelo menos durante este governo, tal como nos anteriores.
Quinto, uma burocracia sufocante, cada vez maior, mais
politizada e menos profissionalizada. Quando um dos critérios de
nomeações para cargos públicos é o do indicado ser sindicalista, sem
que se atente para a sua competência (ou para a falta dela), é sinal de
que está ocorrendo uma politização criminosa da res publica, em
detrimento de sua profissionalização. Se nos lembrarmos que no ano
passado o governo federal promoveu cerca de vinte e cinco mil
nomeações, vemos facilmente a tragédia que isto representa.
Sexto, uma crença generalizada em que a pobreza de muitos é
causada pela riqueza de poucos. Parece que os que se intitulam de
progressistas desconhecem a História que tanto costumam
reverenciar como promotora de mudanças, que nos mostra fartamente
que para combater a pobreza não é preciso eliminar a riqueza: antes,
é preciso estimular a sua geração.
Sétimo, uma perigosa incitação ao ódio, derivada do conceito de
lutas de classes, em que se lança, em nome de uma indefinível
igualdade, negros contra brancos, pobres contra bem sucedidos,
mulheres contra homens, homossexuais contra heterossexuais,
minorias contra maiorias. A generalização de políticas de cotas,
qualquer que seja a sua natureza, é um incentivo à incompetência,
uma punição à competência e um estímulo à desagregação social.
Tais imposições – denominadas de ações afirmativas – na verdade,
afirmam apenas um fato lamentável, que é a extraordinária
incapacidade de discernimento entre causas e efeitos. Querem
implantar o que no Brasil? Ódio racial, competição entre sexos,
alimentação para a inveja? Para que? Para implantar aqui um
socialismo cubano, que se assemelha a uma competição de Fórmula 1
sem platéia por não ter a menor motivação, já que todos os carros
cruzam a linha de chegada ao mesmo tempo, desde ferraris até
carrinhos feitos na oficina da esquina, sejam pilotados por gênios
como Schumacher ou por cabeças-de-bagre?
Oitavo, uma clara decomposição dos valores morais. O
progresso de qualquer sociedade só pode existir e persistir enquanto
houver respeito a princípios de ética universais que tornem possível o
convívio em sociedade. Violência, corrupção, interesses escusos,
degradação da educação, banalização do sexo, impontualidade,
trabalho profissional mal executado, ódio entre irmãos e muitos outros
males presentes em nossa sociedade são meros sintomas desse
afastamento, sob o beneplácito dos meios de comunicação e – o que
é ainda pior – de muitos professores em todos os níveis de educação.
Trata-se da velha rejeição do marxismo à moral judaico-cristã, que
leva seus seguidores a detratá-la mediante um lento processo
gramsciano, já que, sob a sua presença, nenhum sistema totalitário
consegue germinar.
E por fim, para ficarmos apenas nesses problemas, uma
centralização crescente de poder em Brasília, em detrimento do
federalismo. Aqui, fecha-se o ciclo necessário para a implantação de
um regime totalitário: domínio da linguagem e da cultura, centralização
econômica, administrativa, politização em todas as atividades,
estímulos ao ódio. É, de fato, preocupante. Não se trata de ver chifres
em cabeças de cavalos, mas apenas de ver barbas em barbudos,
todos admiradores e imitadores de Marx, de Fidel e de outros
assassinos tresloucados. Será que essa gente não vê que, dada a
natureza do povo brasileiro, regimes totalitários sempre serão aqui
rejeitados? Será que não percebem que cerca de 70% dos que
votaram em Lula em 2002 o fizeram apenas porque não estavam
satisfeitos com o governo do PSDB, sem qualquer motivação de
natureza “socialista”?
A conseqüência disso tudo, além da estagnação econômica e do
decorrente aumento da pobreza, é uma anomia generalizada, em que
o cidadão, feito servo de um Estado que nada lhe dá em troca,
simplesmente, descrê das instituições. Precisamos, urgentemente –
governo, oposição, legislativo, judiciário, estados, municípios,
empresários, intelectuais, formadores de opinião e cidadãos – de um
banho de bom senso.
Em caso contrário, toda a feliz esperança dos rituais de
passagem de ano não passará de um triste transtorno obsessivo
compulsivo coletivo, repetido ano após ano, até o fim dos tempos...