economia_mundializada
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UNICURITIBA Curso de Relações Internacionais História Econômica Professor Renato Carneiro Sistema Econômico Comercial: a Mundialização da Economia Mais de dois séculos e meio depois de iniciada a expansão ultramarina européia pelo sistema econômico comercial, o papel de cada região do mundo ia ficando cada vez mais definido no novo sistema que iniciava: o capitalismo. Um novo continente foi descoberto em 1492. Em 1498, outro continente foi circunavegado, dando acesso marítimo direto a um terceiro. Dessa forma, o sistema econômico europeu colocou-se no ponto central de uma economia mundializada que lhe permitiu um desenvolvimento sem precedentes. Novas formas de apropriação viabilizaram o desenvolvimento comercial e geraram uma divisão internacional do trabalho e a acumulação de capitais. Este sistema ainda era pré-capitalista e não capitalista comercial, pois o sistema comercial antecedeu e viabilizou a construção do capitalismo. O que distingue o capitalismo de outros sistemas é a relação que estabelece com o trabalho, transformando-o não em mercadoria, mas em fornecedor de um subproduto, a força de trabalho. A força de trabalho é a mercadoria fundamental do seu desenvolvimento, que prescinde de toda a forma de trabalho compulsório, tanto do trabalho em si, quanto do seu produto. O sistema que se estabeleceu no século XV foi o mesmo que se seguiu do XVI à maior parte do XVIII, mas pela amplitude econômica que proporcionou em épocas mais recentes da história da humanidade, este período intermediário merece uma atenção diferenciada. A partir do século XVI a Europa ocidental centralizou uma economia comercial que se utilizava de produtos e mercados da Europa oriental, Ásia, América e África, estabelecendo um sistema de trocas desiguais e regimes de monopólios comerciais a seu favor, recorrendo quando necessário à dominação política e militar direta. Com isto, várias áreas se organizaram para produzir tendo em vista o abastecimento da Europa ocidental, muitas vezes – no caso da América e da África – transformando as regiões em meras produtoras da primeira etapa do ciclo econômico – a produção de matéria prima – dependendo completamente da Europa para distribuição e consumo. Essa dependência estrutural da circulação de sua produção valorizava sobremaneira o transporte marítimo, mais uma vez beneficiando as economias centrais que tinham o controle dos mares como condição de segurança e prosperidade dos Estados europeus, atrelando as decisões políticas a razões de ordem econômica. A crescente vinculação entre economia e política acelerou a intervenção do Estado na vida econômica, prática comum desde a depressão do século XIV, viabilizando uma forma de Estado Absolutista. Esta aliança entre burguesia e Estado Absolutista seria esgarçada no decorrer do período em virtude da escalada cada vez maior na acumulação primitiva de capital. Nessa fase primitiva, pré-capitalista, a acumulação não se dava como no capitalismo bem definido, mas pela compulsoriedade do trabalho, até escravo, da força de trabalho, do saque na imposição de mercados monopolistas. Chegou-se mesmo a impor uma divisão social do trabalho em nível mundial. Em sua área mais central a Europa ocidental permitiu que se instalasse a forma mais barata de trabalho, a assalariada, como dominante. Dessa forma, o sistema comercial impôs ritmos diferentes às diversas áreas mundiais, caracterizando-as em termos de centro e periferias. Como o centro só consegue acumular capital em virtude do controle dessas áreas periféricas, passa a ser de vital importância a submissão dessas áreas. Isso explica a série quase ininterrupta de guerras, chegando a passar alguns Estados da qualidade de centrais para semi-periféricos, já no período de instalação do capitalismo, em fins do século XVIII. Áreas Periféricas da Economia-Mundo O tripé que impulsionou a expansão ultramarina foi: metais nobres, alimentos e especiarias, que podiam ser encontradas em quantidades crescentes em diferentes partes do globo, constituindo-se demandas externas às áreas produtoras que geravam regiões monocultoras em nível mundial. A dependência com relação à Europa era acompanhada por imposições político-militares, fazendo com que essa comercialização fosse ainda mais favorável à Europa. Suas populações foram sendo cada vez mais sujeitas a todo tipo de coação, visando maior produtividade e/ou adoção de formas de trabalho que melhor servissem às economias centrais. Toda possibilidade de um desenvolvimento natural, voltado para o atendimento de seus mercados internos foi abortada, formando o que se pode chamar de sistemas coloniais. Dois sistemas coloniais foram desenvolvidos: oriental e americano. As demais regiões européias (centro, Europa oriental e Mediterrâneo) tornaram-se economicamente dependentes, apesar de manterem sua autonomia política. Assim a Europa ocidental concentrou a acumulação primitiva de capital que a economia comercial propiciou, através da exploração econômica das demais regiões. Sistema Colonial do Oriente Compreendia o Oceano Índico, as regiões costeiras da Índia, da Birmânia e da península malaia e a atual Indonésia e as Filipinas. Também o Japão e a China, embora em escalas menores. A China contava com presença portuguesa desde 1514, enquanto o Japão recebeu lusitanos em 1540. Estabeleceram-se em Macau, em 1557, enquanto ingleses em holandeses tinham acesso ao porto de Cantão. O Japão expulsou toda a presença européia em 1638, mantendo acesso aos holandeses em Hirado, enquanto Nagasaki permanecia aberta ao comércio com a China, intermediado por portugueses, transportando seda chinesa em troca de prata japonesa. Os principais itens do comércio ultramarino português eram as especiarias. Desde a viagem de Vasco da Gama, em 1498, que gerou lucro de 600% sobre o capital investido, os lucros portugueses só fizeram aumentar. Dentre as diversas especiarias, a pimenta ocupava lugar especial. Seu comércio passou de 3.600 toneladas anuais no século XV, para 6.000 t. no XVI e cerca de 9.000 t. no XVII. Mas o comércio oriental também fornecia diamantes, pérolas, seda chinesa, tecidos de algodão indiano, tapetes, salitre e porcelana. Todo este volume de comércio só não foi mais proveitoso à Europa, pois as áreas orientais não precisavam de nenhum produto europeu, trocando seus produtos por prata, que não era abundante nas economias centrais. Até as produções de prata da Europa central e posteriormente da América seriam drenadas diretamente para as Filipinas. O resultado foi a descapitalização progressiva dos Estados que faziam este comércio: Portugal e Espanha. O sistema colonial oriental pode ser definido em duas fases: o monopólio lusitano no século XVI e a aberta competição entre ingleses, franceses e holandeses, a partir do XVII. Na primeira, os portugueses estabeleceram feitorias ao longo do Índico: Din, 1509; Málaca, 1511; Ormuz, 1515. Esses pontos de apoio comercial eram suportados pela presença constante da armada de guerra lusitana, que expulsa os mercadores árabes da região. No século XVII, o monopólio português foi quebrado pela concorrência anglo-holandesa e depois francesa, permanecendo com alguns pontos de apoio na Índia (Goa, Damão e Din), em Macau, na China e na Ilha das Especiarias, hoje Timor. As novas companhias de comércio – holandesa, de 1601; inglesa, de 1608 e francesa, de 1666 – competiram ferozmente entre si, expulsando os portugueses, adotando, porém, o sistema de feitorias, por eles desenvolvidos. Os holandeses conseguiram, no entanto, se apoderar da Indonésia (Java, Bornéu, Sumatra, Célebes, Molucas e Flores), deixando os poderes locais intactos, monopolizando a produção de pimenta, cravo, mostarda e sândalo, mas também café, açúcar e arroz, condicionados à demanda mundial. O Sistema Colonial Americano Na América foi montado o sistema colonial de maior eficiência. Aqui se montou uma ampla estrutura de produção baseada no trabalho compulsório operou-se comercialmente no regime de monopólio, cuja finalidade última era extrair o máximo de excedente econômico em direção à Europa ocidental, Quase todo o continente foi dividido em colônias de exploração, completamente dependentes das metrópoles. Assim, os dois mecanismos de extração do excedente basearam-se, independente de qual metrópole estivesse dominando determinada área, no trabalho compulsório e no exclusivo colonial. Pagavamse os produtos quase no seu custo de produção. Podia-se revendê-los ao preço que se quisesse, também em decorrência do monopólio e, por fim, vendiam os insumos necessários aos preços mais altos que as colônias podiam pagar. Ganhava-se triplamente com este sistema, mantendo-se as colônias permanentemente endividadas e devedoras de sua metrópole. A regulamentação desse comércio, para manter-se eficiente, deveria ser controlada energicamente pelas metrópoles. Portugal, Inglaterra, Holanda e França exerciam o monopólio por meio de companhias de comércio privilegiadas. A Espanha restringia a um porto único (Sevilha, depois Cádiz) de saída e a três únicos portos de importação de mercadorias metropolitanas e exportação de produtos coloniais: Vera Cruz, no México; Porto Belo, no Panamá e Cartagena de las Índias, na Colômbia. Isto para toda a extensão controlada pela Espanha, da Califórnia a Patagônia. Isto fazia com que um produto da região da Prata tivesse que seguir em lombo de mulas até o Panamá, para seguir para Sevilha. É evidente que um sistema com tal rigidez gerasse uma grande atividade de contrabando, ainda mais que os controles metropolitanos eram relativamente frágeis (pela extensão de costas a fiscalizar) e pelo fato que a metrópole espanhola era fracamente industrializada. Na estrutura espanhola havia uma instituição chamada Casa de la Contratación, que regulava todas as atividades comerciais, inclusive na manutenção de frotas que ligavam a Espanha às colônias. Havia também o Conselho das Índias que legislava e nomeava funcionários para as colônias. Existiam quatro vice-reinos (Nova Espanha, no México; Nova Castela, no Peru e região andina; Nova Granada, Colômbia, Venezuela e Equador e Prata, na Argentina); audiências, corregimientos e cabildos. Espanha submeteu inicialmente populações indígenas ao sistema de mitas (Peru, nas minas) e encomiendas (México) com fornecimento de indígenas por certo período de tempo. Ambos os sistemas já estavam arraigados nos hábitos anteriores aos espanhóis. Portugal iniciou a exploração de suas colônias pelo sistema de capitanias hereditárias, pois tinha mais interesse no oriente. Com o sucesso da produção açucareira no Nordeste, passou a um sistema de Governo Geral, a partir de 1548, com um controle político mais rígido. Junto com o Governo Geral, instalou um ouvidor geral (encarregado da justiça), provedor-mor da fazenda (na cobrança de impostos) e o capitão-mor (para prover a defesa da colônia). O trabalho compulsório adotado por aqui foi o mais caro que se pode conseguir: a escravidão africana. Mas era o que dava mais lucro aos detentores do monopólio do tráfico. Os ingleses usaram o trabalho compulsório de “escravos temporários”: criminosos, órfãos, desempregados e arruinados que assinavam contratos para cinco anos de trabalhos contra as despesas de viagem à América. Aos poucos esse tipo de trabalho compulsório foi sendo abandonado em favor da escravidão africana. Um fato que talvez explique a importação de mão de obra africana foi o declínio acentuado das populações indígenas. No México, de 25 milhões no início do século XVI restavam apenas 1,5 milhões de nativos em 1650/70, devido principalmente a doenças trazidas da Europa. Os africanos, que no século XVI se restringiam à América Portuguesa, no XVII já estavam na América espanhola (mais fortemente a partir de 1630). Na América britânica, a partir de 1619 e nas colônias antilhanas da França e Holanda, depois de 1650. Calcula-se que foram trazidos à América de 12 a 15 milhões de africanos entre o século XVI e meados do XIX.
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