Jornalismo de investigação em África – “Travessia de um campo
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Jornalismo de investigação em África – “Travessia de um campo
Jornalismo de investigação em África – “Travessia de um campo minado à noite” Com contribuições de Gwen Ansell, T. Kenechi Serino, Edem Djokotoe e Eric Mwamba, assim como pesquisas baseadas em material do Artigo 19, do Comité para a Protecção de Jornalistas (CPJ), dos Repórteres sem Fronteiras, do The Guardian do Reino Unido e da Associated Press (AP). Quando iniciámos as pesquisas sobre o presente manual, descobrimos milhares de páginas na Internet dedicadas ao alcance, às técnicas e aos dilemas do jornalismo de investigação. Mas havia uma lacuna enorme: em nenhum lado havia informação compilada sobre as contribuições heróicas – que muitas vezes eram sacrifícios – prestadas em nome da profissão por jornalistas de investigação africanos em todo o continente. Escrever a história ou uma narrativa exaustiva sobre o jornalismo de investigação africano está fora do âmbito do presente projecto. Mas, oferecemos aqui uma série de contribuições – algumas actuais, outras históricas – sobre o tema, as quais, esperamos, virão a lançar as bases para maior investigação e dissipar definitivamente o mito de que o jornalismo que denuncia os problemas sociais e critica os poderosos é ‘anti-africano’. Introdução Uma certa tenacidade Moçambique, Namíbia e Quénia, por T. Kenichi Serino O jornalista Carlos Cardoso foi o chefe de redacção do Metical, o popular diário moçambicano distribuído por fax. No dia 22 de Novembro de 2000, depois de ter publicado artigos reveladores de corrupção no Banco Comercial de Moçambique, foi abatido a tiro quando saía do escritório do seu jornal. No mesmo dia, um outro jornalista, Custódio Rafael, que estava também a investigar o Banco Comercial de Moçambique, foi agredido. Os relatos de imprensa naquela altura acusaram-no de “falar de mais”. Os seus agressores cortaram-lhe a língua. Depois de uma série caricata de investigações engroladas, evasões de prisões e outros infortúnios, os assassinos de Cardoso acabariam por ser julgados e condenados. De acordo com a imprensa, muitos dos envolvidos apontaram o dedo a Nyimpine Chissano, filho de um antigo presidente, como o homem que havia encomendado o crime. O assassinato de Cardoso não foi um incidente isolado. Os jornalistas africanos que ousam dizer a verdade em relação ao poder acabam sendo, muitas vezes, vítimas tanto de valdevinos como de autoridades governamentais (ou por vezes em conluio). Agressões, detenções, tortura, censura e mortes são bem conhecidas. E contudo… os jornalistas africanos continuam a efectuar investigações. Estão plenamente cientes dos riscos acima descritos mas muitas vezes são outros problemas que dificultam o seu trabalho, particularmente a falta de recursos. Muitos jornalistas deparam-se com dificuldades para investigar sem recursos, mas há muitos outros que se arranjam. John Grobler é um jornalista investigativo independente e veterano em Windhoek, Namíbia: “Não chamaria ao jornalismo independente um modo de vida, mas antes uma existência”, afirma. Como profissional independente, Grobler auto-financia-se e aceita frequentemente pesquisas por contrato para subsidiar as suas investigações. Quando descobre uma pista potencial, primeiro tenta averiguar a viabilidade da ideia. “Sempre que possível, também solicito aos jornais que se chegue a um acordo sobre um mínimo de despesas. Mas os valores envolvidos raramente passam da recuperação das despesas de combustível. Os maiores custos são na verdade o tempo necessário para desenterrar factos, especialmente se as informações forem de difícil obtenção”, acrescenta. Grobler também faz uso de websites, como a Global Witness, e de uma vasta rede de colegas, fontes e outros viajantes. Obviamente, também usa a Internet, mas acautela: “as fontes públicas, incluindo a Internet, apenas nos mostram metade do caminho. Porém, torna-se extremamente fácil contactar alguém em Dubai ou em Anwérpia, ao passo que no passado teria sido muito oneroso fazê-lo. Os jornais aqui são pequenos, não existem grandes orçamentos, mas a Internet certamente tornou as oportunidades iguais a este respeito”. “O jornalismo de investigação apenas exige uma certa tenacidade e faro para as notícias… normalmente, as primeiras pistas vêm de fontes humanas; ensaiamo-las e desenvolvemo-las confrontandoas com documentos públicos, procuramos interligações, voltamos às fontes ou achamos outras novas”, explica. A prática de Grobler de encontrar primeiro pistas de fontes humanas é partilhada com outros jornalistas investigativos, por exemplo os do jornal The Nation do Quénia. Contrariamente às dificuldades financeiras de Grobler, o The Nation pode dedicar três jornalistas a tempo integral às investigações, com outros 5-10 profissionais dedicando-se às mesmas a tempo parcial. O jornal conseguiu muitas matérias de investigação nos últimos anos, sendo uma das mais recentes a “Anglo-Extorsão”, que relevou o facto de que os concursos militares adjudicados por funcionários públicos e burocratas tinham sido fraudulentos. De acordo com Steve Agutu, um jornalista que esteve ao serviço do The Nation, as informações são muitas vezes fornecidas por deputados e funcionários. E embora à primeira vista estas denúncias “tornem o trabalho [do jornalista] muito fácil”, os políticos e funcionários públicos que revelam os factos não o fazem por serem bons cidadãos. Muitas vezes o fazem por vingança política. Muitos dos políticos e funcionários públicos que deviam os seus postos ao antigo presidente Daniel Arap Moi gozavam de extremamente poucas simpatias entre os seus colegas. Também se mostraram tão propensos à corrupção como o seu patrono. Estes factores conjugados fizeram deles um alvo de investigações por parte de jornais. Assim, as denúncias oficiais, parecem, no mínimo, facas de dois gumes. Mas Agutu está convencido de que trazem alguns benefícios. “Por uma razão qualquer, o povo queniano sai beneficiado. Por causa das fugas de informação, os políticos são mais cuidadosos. É um passo rumo à boa governação e combate à corrupção”. Mas não se sabe ainda em que forma de cultura de comunicação social investigativa os colocados em altos postos viverão depois de o último nomeado de Moi, com o seu cortejo de 2 Introdução ressentimentos políticos, deixar o seu cargo. O julgamento do assassinato de Cardoso foi um evento público clamoroso em Moçambique. Foi conduzido em tribunal aberto e emitido para toda a nação, tendo sido mencionados nomes de poderosas. Alguns daqueles que estavam directamente implicados no crime foram condenados. Chissano, que estava implicado, foi constituído arguido pela procuradoria da República em Maio de 2006, mas com mandado suspenso, alegadamente depois da intervenção dos seus pais. Chissano viria a ser posteriormente encontrado morto na sua residência, em Novembro de 2007, aos 37 anos de idade. Não obstante o nome mais poderoso mencionado nunca ter chegado a enfrentar um tribunal aberto, o carácter público do julgamento serviu para deixar a mensagem de que os poderosos já não podiam pensar que os seus actos vis se manteriam em segredo, e de que os assassinos de jornalistas já não gozavam de impunidade. Foi uma vitória para o jornalismo de investigação, mas uma vitória que deve ser constantemente defendida. O denunciador incansável Uma homenagem ao jornalista burquinabé Norbert Zongo, por Eric Mwamba Norbet Zongo era natural do Burquina Faso e um jornalista de renome pela sua obstinada recusa de se manter calado relativamente a uma morte que envolvia o círculo próximo do Presidente Blaise Campaoré. David Ouedraogo trabalhava na residência de François Campaoré, irmão mais novo do presidente da República, e foi acusado de ter roubado dinheiro do seu local de serviço. Viria depois a ser torturado por soldados (que foram identificados pelo nome) e a perecer num incêndio que calcinou a enfermaria do presidente. Foram oferecidas enormes somas de dinheiro a Zongo para que arquivasse o caso e se mantivesse calado. Depois de ter rejeitado os subornos, Zongo foi queimado vivo, juntamente com três outras pessoas que se encontravam no seu carro, no dia 13 de Dezembro de 1998. O assassinato teve lugar a 100 quilómetros da capital, Ouagadougou. Volvidos dez anos, a justiça do Burquina Faso ainda não apresentou nenhum veredicto sobre este assunto. No país de Thomas Sankara, o mistério não desvendado da sua morte continua a ser um tema da actualidade e o simbolismo da sua vida mantém a sua importância. Zongo foi um modelo de coragem e integridade diante de qualquer desafio, duas armas indispensáveis para qualquer jornalista de investigação. No seu livro Ces journalistes qu’on veut faire taire (Estes jornalistas que querem fazer calar), Robert Ménard, co-fundador dos Repórteres sem Fronteiras, resume assim a vida do jornalista : “Zongo denunciou incansavelmente casos de corrupção, atacou políticos desonestos, revelou escândalos, fossem eles grandes ou pequenos”. A contragosto O artigo sobre a investigação do caso “Willowgate”, por Edem Djokotoe Em finais dos anos 80 (anos antes de ser consagrada na lei a rígida censura da imprensa de hoje), o Zimbábue ofereceu o único exemplo conhecido de um grande projecto de investigação levado a cabo por um jornal titulado pelo governo, rejeitando o mito de que apenas a imprensa comercial pode efectuar trabalhos de jornalismo de investigação. O jornal em causa foi o The Chronicle, um periódico regional que fazia parte do Zimbabwe News Group. O chefe de redacção que deu o passo decisivo de investigar os excessos do governo foi Geoffrey Nyarota, que viria depois a escrever sobre as suas experiências num livro publicado em 2006: “Against the Grain: Memoirs of a Zimbabwean Newsman” (Zebra) (A Contragosto: Memórias de um Jornalista Zimbabueano). Nyarota tornou-se famoso por causa da peça jornalística que muitos zimbabueanos e observadores da comunicação social recordam como o Escândalo de Willowgate. Em 1998, o jornal deu início a investigações em relação a negócios irregulares na Indústria de Veículos Mazda Willowvale, uma 3 Introdução central de montagem de viaturas propriedade do estado, em que ministros e altos funcionários do governo estavam a usar o seu estatuto para comprar carros ao desbarato – porque oficialmente tinham o direito de o fazer – mas para revendê-los depois a preços exorbitantes – um direito que já não lhes assistia. Antes de o caso se tornar público, o Ministro da Defesa do Zimbábue, Enos Nkala, intimou Nyarota e o seu adjunto, Davison Maruziva, a comparecerem no seu escritório. Disse-lhes que se não pusessem termo ao assunto mandaria soldados que os arrastariam até ao comando das forças armadas para lhes ensinar uma lição de que nunca se esqueceriam. Antes pelo contrário, os dois redactores intensificaram as suas investigações, acabando por divulgar o caso. As investigações do The Chronicle foram tão comprometedoras para o governo que o Presidente Robert Mugabe criou uma comissão de inquérito judicial para efectuar uma sindicância sobre o assunto. As constatações da comissão confirmaram as notícias do jornal e vários ministros, incluindo Nkala, demitiramse por vergonha. O caso Willowgate pode ter trazido a Nyarota e Maruziva muitos elogios vindos de dentro do Zimbábue e de além fronteiras, mas não agradou absolutamente nada ao governo. Nyarota foi ‘promovido’ a director de relações públicas (um posto criado para ele) no Zimbabwe Newspapers Group. Os jornalistas que tinham trabalhado com ele no caso Willowgate também foram colocados noutros postos dentro da empresa. Um ano depois, Nyarota e alguns daqueles que com ele tinham trabalhado deixaram o Zimbabwe Newspapers Group para ingressar na corporação Associated Newspapers of Zimbabwe (ANZ), os editores de cinco semanários regionais e do famoso Daily News. O resto, como se diz no sector, é história. À volta do continente Argélia Mohamed Benchicou é o director do jornal argelino Le Matin. Em Junho de 2004, foi condenado a dois anos de prisão depois de ter publicado uma autobiografia em que denunciava situações de corrupção durante o mandato do Presidente Abdelaziz Bouteflika. Benchicou cumpriu a sua sentença e em Julho de 2006 recebeu o Prémio PEN de Liberdade para Escrever. Chade Daniel Bekoutou é um jornalista chadiano que em 2000 estava a trabalhar para o diário senegalês Walfadjiri, produzido em Dakar, e a cobrir sobretudo as áreas de direitos humanos, saúde e ambiente. Mas tinha também reunido provas que foram usadas para indiciar o antigo ditador chadiano Hissene Habré (então residente no Senegal como exilado) por tortura e outras violações de direitos humanos. Assim que foi apresentada a acusação formal, Bekoutou começou a receber ameaças de morte na sua residência e no seu escritório. “Qual era o meu alegado “crime”? Talvez era um artigo que publiquei na edição do Walfadjiri do dia 26 de Janeiro de 2000, que continha revelações incómodas sobre o desaparecimento de dois cidadãos senegaleses das prisões de Habré. Ao que parecia, as autoridades senegalesas nunca foram informadas dessa ocorrência; Habré e os seus prosélitos levantaram uma objecção junto de um jornalista chadiano que noticiou o caso na imprensa senegalesa, com o argumento de que o facto prejudicaria as suas relações com um governo generoso que lhes tinha concedido asilo político. “Isto explicaria por que razão me viam não como um jornalista mas um traidor chadiano que tinha intencionalmente enveredado por prejudicar a sua reputação numa altura em que a sua situação jurídica já era precária. “Na verdade não se punha nenhuma questão de eu trair alguém ou mesmo ajustar qualquer tipo de ‘contas’. É um facto provado e bem documentado que cidadãos senegaleses, nigerianos, camaroneses, franceses e outros nacionais estrangeiros, juntamente com milhares de chadianos, morreram sob este regime tirânico. É meu dever, como jornalista, escrever sobre o assunto. “Mas este não foi o único incidente que me pôs em maus lençóis… Também encontrei várias vítimas de Habré a viver em Dakar e convenci-as a depor contra o antigo presidente. Naturalmente, levei a cabo esse trabalho com a máxima discrição, para que não desse indícios ao ‘Pinochet africano’. Porque 4 Introdução de outro modo teria fugido”. Bekoutou acabaria por ser transferido para Paris por uma organização ligada aos direitos humanos por causa das crescentes ameaças contra a sua vida. No entanto, conta a história de jornalistas chadianos que não tiveram tanta sorte: “No dia 28 de Janeiro de 1992, um repórter chamado Maxime Kladoumbaye, que trabalhava para o diário N’djaamena-Hebdo, foi abatido a tiro pela polícia. No dia 28 de Novembro de 1992, o apresentador da televisão estatal Djerabe Declaud, que era conhecido como sendo um opositor do regime apesar do seu cargo, teve o mesmo fim trágico. Declaud recebeu duas balas nas costas no momento em que saía dos estúdios da televisão, depois de ter apresentado a última edição noticiosa da noite. “Outros jornalistas chadianos morreram por envenenamento, como Nehemie Benoudjita, o brilhante director de redacção do jornal Le Temps, ou foram injustamente encarcerados, como é o caso de Coumbo Singa Gali, o director de redacção do L’Observateur, e um dos seus colegas que tinha publicado um artigo controverso sobre o envenenamento de Benoudjita”. Bekoutou cita um colega seu que descreve a condição de ser jornalista em África como “atravessar um campo minado à noite”. Cote d’Ivoire “Seguir o rasto de dinheiro é arriscar a vida”. Guy-André Kieffer, um jornalista independente com dupla nacionalidade franco-canadiana, casado e pai de dois filhos, foi visto pela última vez no dia 16 de Abril de 2004. Desapareceu num centro comercial em Abidjan, Cote d’Ivoire, alegadamente raptado por quatro homens fardados. Kieffer, habilitado com um título de engenheiro agrónomo, escrevia artigos para publicações tanto francesas como ivoirienses (sob um pseudónimo), e exercia funções de conselheiro de um consórcio de produtos de cacau. Nessa época, a Cote d’Ivoire exportava quase metade do cacau mundial. Kieffer publicou vários artigos sobre contratos de cacau nebulosos, cujos lucros tanto enriqueceram a elite como ofereceram armas para alimentar a guerra civil do país. Tinha recebido ameaças de morte antes do seu desaparecimento. Jacques Huillery, chefe do escritório da AFP em Abidjan, disse ao The Guardian: “Aqui, pode-se falar de políticas com palavras contundentes, mas o única coisa que deixa as pessoas fora de si é o dinheiro. Seguir o rasto de dinheiro é arriscar a vida. O mundo do cacau é sombrio e confuso. Não se sabe aonde vai o dinheiro. E neste mundo entrou Guy-André, obcecado por dizer a verdade”. Jornais pró-governo afirmaram que Kieffer estava escondido para “desestabilizar” o governo. Mas, durante uma investigação conjunta franco-ivoiriense (em que o magistrado francês alegou que era sistematicamente impedido de trabalhar), as provas começaram a apontar para várias figuras próximas do presidente ivoiriense Gbagbo, incluindo Michel Legré, cunhado da primeira-dama. Legré continua detido, mas aparentemente as suas condições de encarceramento não são severas, e ainda não foram tomadas quaisquer medidas contra aqueles que Legré terá mencionado como cúmplices ou instigadores. Nigéria Dele Giwa, chefe de redacção e fundador do semanário Newswatch, produzido em Lagos, foi morto por um embrulho embuste, entregue à sua residência familiar no dia 19 de Outubro de 1986. Despachos da imprensa nigeriana alegaram que o embrulho apresentava um carimbo com as armas do estado nigeriano e que Dele Giwa estava a investigar um caso que envolvia a primeira-dama Mariam Babangida por altura da sua morte. Dois dias antes de ser morto, Giwa tinha sido intimado a comparecer na sede dos Serviços de Segurança do Estado da Nigéria e acusado de preparação de uma revolução e contrabando de armas. Viria depois a receber uma chamada telefónica a perguntar pela direcção da sua residência para que pudesse ser entregue um “convite oficial”. Em 2001, o antigo presidente Ibrahim Babangida, que dirigia o país no período em que Giwa morreu, recusou-se a depor perante a comissão de direitos humanos que inquiriu sobre a morte de Giwa, apesar dos apelos vindos de organizações nacionais e internacionais ligadas aos direitos humanos e de jornalistas no sentido de o fazer. Nunca ninguém foi alvo de acção judicial pela morte de Giwa. Christine Anyanwu, chefe de redacção e editora da revista The Sunday Magazine, foi equivocamente 5 Introdução condenada por preparar um golpe de estado contra o General Sani Abacha, o sucessor de Babangida. Foi encarcerada, torturada e quase ficou cega enquanto esteve presa. Anyanwu exigiu e recebeu um pedido de desculpas pelo sofrimento que lhe tinha causado Alhaji Zahari Biu, segundo comandante policial reformado, que tinha sido um dos seus algozes. Dele Olojede foi o primeiro jornalista nascido em África a receber o Prémio Pulitzer Internacional de Jornalismo. O prémio foi-lhe atribuído no ano de 2005 em reconhecimento por um seriado referente ao rescaldo do genocídio ruandês que havia produzido para a revista US Newsday, com assistência do fotógrafo afro-americano Conrad J. William e do chefe de redacção afro-americano Lonnie Isabel. Antes de emigrar para os EUA, Olojede tinha trabalhado com Giwa na equipa fundadora do Newswatch em Lagos. As suas investigações em 1986 sobre a detenção do músico nigeriano Fela Anikulapo-Kuti levaram à soltura do artista. O juiz que tinha ordenado injustamente a detenção de Kuti foi destituído. Senegal Sentinelas da democracia Quando o presidente senegalês Abdou Diouf foi finalmente afastado do poder em 2000, após 40 anos, muitos comentadores atribuíram à crescente imprensa independente um papel nas mudanças. Só nos anos 90 é que os meios de comunicação social estatais começaram a ser confrontados por publicações e estações independentes, depois de Diouf ter liberalizado as leis da imprensa. Os jornalistas, segundo a agência AP, passaram a ser chamados ‘sentinelas’ (como em ‘sentinelas da democracia’). Durante a campanha, apresentaram noticiaram casos de compra de votos, violação de urnas e outros abusos. Jornalistas de estações de rádio anunciaram o resultado das eleições à medida que as assembleias de voto iam concluindo a contagem, facto importante num país em que os níveis de analfabetismo são altos e a rádio desempenha um papel crucial na divulgação de informações. A agência cita um radialista de Dakar, Oumar Fall, como tendo dito: “Ninguém poderia contrariar a vontade do povo porque nós, os jornalistas, estávamos em todo o lado e registámos tudo”. De modo algum este é um quadro abrangente da comunicação social investigativa em África. Trata-se meramente de uma série de instantâneos que mostram os perfis, a bravura e os feitos de alguns jornalistas africanos. Existem mais estudos de casos nos capítulos que se seguem, demonstrando que a missão de buscar e revelar verdades convincentes ainda está viva e de saúde em todo o continente. E esperamos que esses capítulos venham a inspirar mais jornalistas a erguerem o facho investigativo, oferecendo ferramentas e métodos que deverão contribuir para tornar o trabalho mais eficaz. Mas talvez não tornarão esse trabalho mais fácil porque, como vimos, a tarefa dos jornalistas de investigação africanos raramente é fácil. Ao compilar estes capítulos, fiquei muitas vezes impressionada com o milagre de os repórteres trabalharem com redes de computadores e electricidade pouco fiáveis (ou inexistentes), orçamentos limitados, longas distâncias a percorrer e frequentemente sob vigia e ameaças, mas que mesmo assim conseguem produzir peças jornalísticas em pé de igualdade com colegas muito melhor dotados em recursos noutras partes do mundo. É um verdadeiro milagre: requer verdadeira paixão, coragem e trabalho extremamente árduo. Assim, a todos os jornalistas de investigação – principiantes ou veteranos, onde quer que estejam a trabalhar – e aos modelos e mentores que os antecederam, muitos dos quais deram as suas vidas pelo seu trabalho: estes capítulos são-vos dedicados. Gwen Ansell Revisora 6