CARTA MENSAL ECONOMIA MUNDIAL

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CARTA MENSAL ECONOMIA MUNDIAL
CARTA MENSAL
Abril de 2009
Por George Bezerra
ECONOMIA MUNDIAL
Diante da gradual percepção da magnitude da crise
econômica, em setembro de 2008 o governo Bush
deu início a uma fase de intensificação de medidas,
conduzidas no âmbito do Tesouro, que passaram
a complementar o arsenal mobilizado pelo FED de
maneira cada vez mais ampla e heterodoxa. O conjunto
de medidas adotadas ou anunciadas até agora, além
da redução da taxa de juros, não tem precedentes na
história econômica moderna - e ainda não é possível
afirmar que elas já tenham sido concluídas. Mesmo para
os economistas que acompanham permanentemente
a evolução destas medidas vai se tornando difícil ter
um balanço compreensivo e atualizado do que já foi
feito. E este balanço é importante para se avaliar as
perspectivas da crise, já que os efeitos das medidas
ocorrem ao longo do tempo, em alguns casos durante
anos.
A seguir faremos um breve retrospecto dessas
principais medidas, cujo entendimento atualizado
é indispensável para avaliar a melhora recente dos
mercados financeiros em todo o mundo.
Resumo do Arsenal de Medidas já Adotadas
nos Estados Unidos
No dia 07 de setembro de 2008 o prejuízo de
US$ 14,0 bilhões e as preocupações do mercado
sobre a capacidade de Fannie Mae e Freddie Mac de
levantarem recursos no mercado levaram o Tesouro a
se comprometer a investir até US$ 200 bilhões nestas
duas empresas (subscrevendo ações preferenciais)
e a assumir suas gestões (por meio da Federal
Housing Finance Agency – FHFA), para mantê-las
em funcionamento. No dia 15 de setembro de 2008
ocorreu a quebra da Lehman Brothers, considerada
um marco destacado do agravamento da crise. No dia
seguinte, o Federal Reserve concedeu um empréstimo
de emergência de US$ 85 bilhões para salvar a empresa
americana de seguros American International Group
(AIG), a maior do mundo neste setor. Em setembro de
2008 o Secretário do Tesouro do governo Bush, Henry
Paulson, submeteu à House of Representatives (HR)
dos Estados Unidos uma proposta de três páginas
para comprar ativos tóxicos das carteiras dos bancos
nacionais e estrangeiros atuando nos Estados Unidos,
visando restaurar a confiança no sistema e superar
o credit crunch que nele se instalara. O texto foi
expandido pela HR para 110 páginas e a Emenda que
dele resultou foi rejeitada numa votação ocorrida no dia
29 de setembro, produzindo, de novo, grande stress nos
mercados financeiros de todo o mundo.
Logo no dia 01 de outubro, o Senado apreciou e
aprovou uma nova emenda sobre o mesmo tema,
agora expandida em mais de 300 páginas e US$ 150
bilhões, sobre a versão original rejeitada na HR. Esta
emenda foi devolvida à HR e por ela aprovada no dia 03
de outubro. De imediato, o Presidente Bush sancionou
uma lei denominada Emergency Economic Stabilization
Act criando o Troubled Assets Relief Program (TARP),
que contava com US$ 700 bilhões para comprar ativos
tóxicos dos bancos (US$ 350 bilhões liberados no dia
03 de outubro e a outra metade a ser liberada no dia 15
de janeiro de 2009).
A idéia de tentar superar o credit crunch por meio
da compra direta de ativos tóxicos dos bancos foi,
desde o início, objeto de críticas de um grande número
de analistas especializados. E uma das grandes
dificuldades práticas atribuídas a esta alternativa era
a impossibilidade de se precificar corretamente cada
um dos inúmeros ativos existentes nas carteiras dos
bancos. Numa visita à Casa Branca o Primeiro Ministro
da Inglaterra, Gordon Brown, convenceu o governo Bush
de que uma melhor alternativa já estava sendo adotada
no seu país, que era a capitalização dos bancos por meio
da compra de ações preferenciais. No dia 14 de outubro,
o Secretário do Tesouro e o Presidente Bush anunciaram
mudanças no TARP, comunicando a decisão de comprar
ações preferenciais dos bancos dos Estados Unidos
(sob um conjunto de condições). Os primeiros US$ 250
bilhões dos recursos aprovados para o TARP foram então
alocados na compra de ações de um grande número de
bancos.
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CARTA MENSAL
Abril de 2009
No dia 12 de novembro, o Secretario Paulson anunciou
que a reativação do mercado de ativos securitizados de
créditos de consumo seria uma nova prioridade para
alocação dos recursos do TARP.
No dia 19 de dezembro, o Presidente Bush fez uso da
sua autoridade executiva para decidir que os recursos
do TARP poderiam ser gastos em qualquer programa
que, sob seu julgamento, fosse considerado necessário
para lidar com a crise financeira. Com base nesta
ampliação foram usados recursos do TARP para dar
apoio à indústria automobilística.
De Volta aos Ativos Tóxicos
No dia 10 de fevereiro de 2009, o novo Secretário do
Tesouro Timothy Geithner anunciou as linhas gerais de
um plano que abrangia a utilização dos aproximadamente
US$ 300 bilhões de recursos remanescentes do
TARP, além de financiamentos do FED oriundos do
TALF (ao qual nos referiremos mais adiante). E parte
destes recursos seria utilizada para financiar um novo
programa voltado para a aquisição de ativos tóxicos dos
bancos (que fora, com vimos, o objetivo inicial do Plano
de Paulson, em seguida substituído pela capitalização,
via compra de ações preferenciais). Este plano incluía
os seguintes programas:
1. Um programa de capitalização dos bancos que
previa a utilização de recursos do Tesouro como uma
ponte para o capital privado. Estes recursos seriam
colocados num Financial Stability Trust. E para terem
acesso a estes recursos, entre outras exigências, os
bancos teriam que se submeter a testes de stress
em cenários de continuidade da crise e aumento do
desemprego. Os recursos públicos seriam oriundos do
TALP;
2. Foi anunciada a criação de um Public-Private
Investment Fund que se destinaria a comprar
empréstimos e ativos tóxicos dos bancos. Introduziuse a idéia de utilizar gestores privados para ajudar
a fornecer capital e mecanismos de mercado para
avaliação dos preços dos ativos e empréstimos a serem
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adquiridos. Os recursos públicos, também oriundos do
TARP, alavancados com recursos privados, deveriam
prover fundos iniciais da ordem de US$ 500 bilhões,
que seriam aumentados gradualmente, podendo vir a
alcançar até US$ 1,0 trilhão;
3. Anunciou-se que se encontrava em elaboração um
programa para lidar com a crise dos imóveis residenciais.
O foco seria a redução dos valores dos pagamentos das
hipotecas e das suas taxas de juros. Os recursos já
haviam sido autorizados pelo Congresso no Emergency
Economic Stabilization Act;
4. Finalmente, foram anunciadas as linhas gerais de
um programa chamado Consumer and Business Landing
Initiative. Tratou-se de uma ampliação do TALF, que havia
sido lançado em novembro, com uma pequena parte de
recursos do Tesouro e financiamentos do FED.
A falta de detalhamento deste plano de Geithner e a
avaliação de muitos analistas de que ele não incluía a
estatização temporária de bancos, por eles considerada
inevitável, produziu uma grande frustração nos
mercados, naquele dia 10 de fevereiro (ver nossa Carta
Mensal de janeiro de 2009).
Poucos dias depois foram apresentados o programa
completo para lidar com a crise dos imóveis residenciais,
e o maior detalhamento do Consumer and Business
Landing Initiative. Esse TALF ampliado veio com um
potencial de gerar até US$ 1,0 trilhão de empréstimos
para empresas e famílias. Foi desenhado para reativar
o mercado de asset-backed securities (ABS) originados
de empréstimos ao setor automobilístico, cartões
de crédito, empréstimos a estudantes e a pequenas
empresas.
Finalmente, no dia 23 de março foi apresentado
o mais esperado de todos: o Programa dos Fundos de
Investimento Público-Privado. Desta vez a recepção dos
mercados a este programa foi bem mais positiva do que
em 10 de fevereiro. Mas ainda persistem dúvidas às
quais nos referiremos mais adiante.
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CARTA MENSAL
Abril de 2009
Expansão de Liquidez pelo FED
Após reduzir gradualmente a taxa básica de juros até
próximo de zero, o Banco Central americano continuou
expandindo seus financiamentos ao mercado, adotando a
política denominada quantitative easing. A Ata da reunião
do FOMC de março de 2009 informou que “... a economia
continuou a se contrair. Destruição de empregos, perda de
riqueza nos segmentos de imóveis e ações, e condições
apertadas de crédito pesaram sobre o sentimento e os
gastos dos consumidores”. Nestas condições, além da
já anunciada manutenção do target range para a taxa de
juros básica entre 0 e 0,25% foi anunciado novo aumento do
tamanho do balanço do FED destinado a: compra adicional
de US$ 750 bilhões de títulos lastreados em hipotecas
(elevando estas compras para até US$ 1,25 trilhão em
2009); aumento das compras de agency debt em mais
US$ 100 bilhões (elevando para US$ 200 bilhões o total
destas compras em 2009); e a medida mais surpreendente
de todas, que foi a decisão de comprar US$ 300 bilhões de
títulos longos do Tesouro no mercado, com o objetivo de
melhorar as condições nos mercados privados de crédito.
O FED também anunciou a decisão de ampliar o range
de títulos colaterais elegíveis para se beneficiarem do
programa TALF.
The American Recovery and Reinvestment Act of 2009
No dia 13 de fevereiro de 2009 o Congresso americano
aprovou um pacote fiscal de US$ 787 bilhões destinado a
criar 3 a 4 milhões de empregos na economia americana,
ao longo dos próximos anos. As principais metas do
programa são: modernizar o sistema de saúde pública;
estimular a indústria de energia renovável; modernizar
75% dos prédios públicos federais e mais de 01 milhão
de residências; prover financiamentos para acesso de
estudantes às escolas; investimentos em estradas, pontes
e sistemas de transportes de massa; cortes de impostos
para mais de 100 milhões de chefes de famílias.
Decisões da Última Reunião do G20
No dia 03 de abril os membros do G20, que reúne as 20
economias mais importantes do planeta, se reuniram em
Londres para discutir a adoção de estratégias e medidas
conjuntas contra a crise. As expectativas dos agentes
econômicos em todo o mundo, sobre esta reunião, eram, de
um modo geral, muito negativas. No entanto, os resultados
foram melhores que o esperado, com destaque para os
seguintes aspectos:
1. uma demonstração concreta de interesse
em aumentar a cooperação global para fortalecer os
instrumentos de combate à crise;
2. consciência de todos os participantes sobre a
importância crucial de se evitar as medidas protecionistas
no comércio e movimento de capitais;
3. intenção de promover um aumento de capital da
ordem de US$ 1,0 trilhão do Fundo Monetário Internacional
para aumentar a capacidade deste organismo de apoiar os
países emergentes que enfrentam dificuldades nos seus
balanços de pagamentos.
Estas decisões do G20 acenaram com a possibilidade
de se enfrentar doravante um gravíssimo problema para o
qual ainda não se vislumbrava uma solução: as crises nos
balanços de pagamentos de alguns países emergentes,
especialmente do Leste Europeu, que representavam
uma ameaça adicional de perdas para bancos de diversos
países da Europa ocidental.
Anúncio dos Resultados dos Testes de Stress nos
Bancos
No dia 07 de maio foram finalmente anunciados os
resultados dos testes que foram realizados nos dezenove
maiores bancos americanos em um cenário de stress para
os próximos dois anos. Esses testes revelaram que alguns
bancos precisariam de recursos adicionais para reforçar o
seu capital.
Individualmente, o banco para o qual foi identificada
a maior necessidade de reforço de capital foi o Bank of
America, num montante da ordem de US$ 34 bilhões. O valor
total da capitalização adicional necessária para 10 destes
19 bancos alcançou US$ 74,6 bilhões. As simulações
do FED indicaram também que estes 19 bancos teriam
prejuízos adicionais da ordem de US$ 600 bilhões até o
final de 2010.
Os bancos que necessitam de capitalização adicional
terão um prazo de seis meses para obtê-la sem o auxílio do
governo. Aqueles que eventualmente não consigam terão
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acesso a fundos adicionais do Tesouro sob a forma de
maior participação acionária (os recursos remanescentes
do TARP ainda se encontram pouco acima de US$ 100
bilhões).
Efeitos das Medidas e Expectativas
Trata-se do maior e mais abrangente conjunto de
medidas de natureza monetária, creditícia e fiscal que
já foi praticado nos Estados Unidos em tão curto espaço
de tempo. A esta altura, as maiores dúvidas que ainda
persistem sobre os efeitos destas medidas dizem respeito
aos futuros leilões para compra dos ativos tóxicos dos
bancos. Ainda é difícil avaliar até que ponto estes leilões
serão capazes de contribuir para aliviar os balanços dos
pagamentos, melhorar sua situação patrimonial e de
liquidez, e portanto contribuir adicionalmente para a volta
gradual da normalidade ao mercado de crédito.
Seja como for, ao longo dos últimos meses começaram
a surgir alguns sinais de resposta mais relevante do
organismo econômico às influências dessas medidas. São
muitos os analistas que avaliam que os piores momentos da
crise já foram superados. Alguns indicadores de atividade
econômica e emprego reduziram sensivelmente o ritmo de
deterioração. Mas os sinais mais fortes foram observados
na maioria dos prêmios de risco nos mercados de crédito,
que voltaram a níveis próximos da época pré-crise.
Seria surpreendente e assustador se um conjunto
tão abrangente e profundo de medidas ainda não
tivesse produzido resultados. E a redução dos spreads,
especialmente no mercado interbancário, resulta
fundamentalmente de dois aspectos destas medidas: 1º)
o próprio aumento impressionante do volume de dinheiro
que está sendo injetado nos mercados; 2º) a percepção
clara de parte de todos os agentes econômicos de que
o governo americano não permitirá a quebra de nenhum
banco relevante, o que virtualmente elimina o risco da
contra-parte neste mercado.
Mas ainda haverá um longo caminho a percorrer até que
as condições dos fluxos de crédito retornem inteiramente
à normalidade. E ainda não se pode descartar inteiramente
o risco de fases de piora nas condições da economia,
capazes de causarem depreciações nos preços dos ativos
em geral.
Diante da gravidade e complexidade sem precedentes
desta crise foram adotadas medidas bastante heterodoxas,
que quebraram alguns paradigmas da atuação dos bancos
centrais modernos. Os aumentos adicionais dos déficits
públicos em todo o mundo desenvolvido cobrarão um
preço elevado, ao longo dos próximos anos. Um certo
aumento dos controles e regulamentações dos mercados
será necessário e inevitável. Mas ainda não se sabe até que
ponto isso poderá ser feito de modo a não comprometer a
eficiência das economias e dos mercados. Provavelmente
a discussão sobre o grau desejável de ativismo das política
monetária e fiscal consumirá muito mais tempo dos
acadêmicos, dos governos e dos políticos, nos próximos
anos.
Os sinais mais recentes são animadores. Mas nos
parece que o cenário mais favorável ainda será o de uma
lenta recuperação da atividade econômica nos Estados
Unidos, e mais lenta ainda na Europa e no Japão. E que
dificilmente o mundo desenvolvido voltará a crescer a
taxas próximas do seu potencial de longo prazo antes de
2011.
ECONOMIA BRASILEIRA
Por limitações de espaço vamos nos limitar a observar
que os dados mais recentes parecem confirmar uma
avaliação que sempre fizemos sobre a posição do Brasil
diante desta crise: desde que ela não se mostrasse
excessivamente longa, o Brasil teria condições de estar
relativamente bem posicionado, na fase da retomada.
Nossos maiores riscos se encontram na área fiscal, mas
não adquiririam grande relevância a curto prazo.
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