trabalhoeeducacao - Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania
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CENTRO UNIVERSITÁRIO PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALTO VALE DO ITAJAÍ JILBERTO SILVEIRA O TRABALHO E A EDUCAÇÃO EM PROL DA REINSERÇÃO SOCIAL DA PESSOA RECLUSA FLORIANÓPOLIS JANEIRO 2013 JILBERTO SILVEIRA O TRABALHO E A EDUCAÇÃO EM PROL DA REINSERÇÃO SOCIAL DA PESSOA RECLUSA Trabalho de Conclusão de Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Gestão Penitenciária do Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí. Orientador: Profª Dr. Marcos Erico Hoffmann FLORIANÓPOLIS JANEIRO 2013 JILBERTO SILVEIRA O TRABALHO E A EDUCAÇÃO EM PROL DA REINSERÇÃO SOCIAL DA PESSOA RECLUSA Monografia apresentada ao Curso de PósGraduação Lato Sensu em Gestão Penitenciária do Centro Universitário para o Alto Vale do Itajaí como requisito parcial à obtenção do título de especialista em Gestão Penitenciária a ser avaliada pela seguinte Banca Examinadora: _______________________________________ Prof. Dr. Marcos Erico Hoffmann Professor Orientador Banca Examinadora: _______________________________________ Prof. MSc. Ilson Paulo Ramos Blogoslawski Coordenador da Pós-Graduação _______________________________________ Florianópolis, 21 de janeiro de 2013. 6 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a todos os que ousam e acreditam e não temem trilhar os caminhos para as grandes realizações. 7 AGRADECIMENTOS À minha esposa, pela paciência e aos meus pais, por tudo o que fizeram por mim. Aos colegas agentes penitenciários, pelo apoio dado a este projeto. Aos grandes amigos, por ajudarem a superar os entraves encontrados durante a realização deste trabalho. Ao meu orientador, por ter compartilhado seus conhecimentos e experiências e contribuir significativamente para a conclusão desta pesquisa. 8 RESUMO A legislação nacional, incluindo a Constituição Federal Brasileira, torna obrigatória a implementação de medidas de reintegração social de presidiários e de apoio aos egressos. Neste escopo, destacam-se a educação e o trabalho, além das medidas e garantias que levem em conta as condições humanas dignas a que todo o cidadão tem direito. Todavia, são frequentes as situações de medidas esparsas e meramente paliativas em muitos estabelecimentos penais do País. Quanto à assistência ao egresso, são raras as casas albergue, exceção feita ao Estado do Paraná, apesar de o mesmo não conseguir atender a demanda. Este quadro sugere que é frágil o apoio do Estado, por meio de seus organismos representativos. Por sua vez, a sociedade parece demonstrar escasso conhecimento acerca do que ocorre nas prisões, suas consequências e suas possibilidades. A legislação pertinente está longe de ser atendido, o que em grande parte explica os elevados índices de reincidência. Por outro lado, tem-se mostrado evidente que as ações voltadas para a reinserção na sociedade por meio do trabalho e da educação, quando iniciadas no cárcere e alinhadas a um efetivo apoio ao egresso, são vitais para minimizar os efeitos negativos que o aprisionamento e a falta de perspectivas acarretam no indivíduo recluso. Palavras Chaves: Trabalho, Educação, Presidiário, Legislação, Reinserção social. 9 SUMMARY National legislation, including the Federal Constitution, mandates the implementation of measures of social reintegration of prisoners and support for graduates. In this scope, we highlight education and work, beyond the measures and safeguards that take into account the human condition worthy that every citizen is entitled. However, there are frequent cases of sparse and merely palliative measures in many prisons in the country The egress assistance, shelter houses are rare, except for the State of Paraná, although the same cannot meet demand. This framework suggests that the fragile state support, through their representative bodies. In turn, society seems to show little knowledge about what happens in prisons, its consequences and its possibilities. The relevant legislation is far from being met, which largely explains the high rates of recidivism. On the other hand, has shown clearly that the actions aimed at reintegration into society through work and education, when initiated in prison and aligned to support an effective egress, are vital to minimize the negative effects that imprisonment and lack of prospects lead in the individual inmate. Key Words: Work, Education, Luke, Legislation, Social reintegration. 10 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ..............................................................................................................9 1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PRISÕES ATRAVÉS DO TEMPO ..................13 1.1 O Desenvolvimento Histórico da Pena .....................................................................14 1.2 Das Penas Na Ordem Jurídica no Brasil e no Mundo ..............................................19 1.3 Os Estabelecimentos Penais nos Dias Atuais ...........................................................27 1.4 A Instituição da Pena no Direito Brasileiro ..............................................................28 2 O ATUAL SISTEMA PENAL NO BRASIL .........................................................34 2.1 Uma Visão Geral do Direito Penal no Brasil ...........................................................36 2.2 O Surgimento das Reformas Contemporâneas .........................................................39 2.3 A Lei de Execução Penal com seus Objetivos e Aplicabilidade ..............................41 3 O INSITUTO DA RESSOCIALIZAÇÃO INSERIDO NA LEI DE EXECUÇÃO PENAL ............................................................................................................................42 4 A REINTEGRAÇÃO SOCIAL COMO META MEIOR ...........................................46 4.1 A Assistência do Egresso e suas Principais Características .....................................50 5 EDUCAÇÃO E TRABALHO PARA EGRESSOS E SEUS FUNDAMENTOS .......54 5.1 Ações Reintegradoras Visando Minimizar a Reincidência ......................................61 5.2 A Reintegração Social e as Atividades Desempenhadas pelo Preso em Penitenciarias e Presídios .......................................................................................................................64 5.3 As Políticas Públicas de Reinserção Social em Face da Realidade do Sistema Prisional de Santa Catarina .............................................................................................65 6 O TRABALHO DO RECLUSO COMO DIREITO, DEVER SOCIAL E CONDIÇÃO DE DIGNIDADE HUMANA ................................................................66 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................70 REFERÊNCIAS ...........................................................................................................73 11 INTRODUÇÃO A história do Direito Penal vem acompanhando a evolução do próprio homem, ou seja, o conceito da penalização existe desde os mais remotos tempos. A finalidade da prisão, ao longo da história, foi se adaptando às mudanças e aos interesses de cada sociedade. O condenado tem sido recolhido ao cárcere por diversos motivos, desde a garantia do cumprimento da pena final que, em casos extremos, podia ser a morte e servia como intimidação, até os dias de hoje, em que se pretende alcançar a finalidade de reinserir o presidiário na sociedade, após o cumprimento de sua pena. Conforme o artigo 32, em seus incisos I, II e III do Código Penal Brasileiro, as espécies de penas vigentes em nosso País são: Pena Privativa de Liberdade; Penas Restritivas de Direitos e a Pena de Multa. O trabalho e a educação constituiriam mecanismos de reinserção social do condenado que, apesar dos obstáculos enfrentados para sua implementação, consiste num caminho que merece ser considerado. O trabalho realizado pelo preso no interior do estabelecimento penitenciário pode ser divido em três categorias: administrativo, industrial e artesanal. O direito ao trabalho é considerado pela lei como um dever social e condição de dignidade humana, com finalidades educativa e produtiva. A humanidade tem utilizado diversas formas de punição para aqueles que transgridem as regras construídas. Do castigo, retribuição pelo crime cometido, a pena evoluiu, sob influências das ideias humanitárias, para a finalidade de prevenir o crime, seja de modo geral ou especial. Nos dias atuais a possibilidade de reinserir o preso na sociedade passou a ser uma das ações mais discutidas hodiernamente. A pena privativa de liberdade alastrou-se pelas legislações de quase todo o mundo, uma vez que abandonava o castigo do corpo do indivíduo, bem como as outras modalidades de penas cruéis e infamantes. Contemporaneamente, esta espécie de pena tem sido questionada, uma vez que deixou de atender a finalidade de prevenir o crime e de contribuir para a reinserção do indivíduo na sociedade, como cidadão. Os direitos e garantias do condenado elencados na Constituição Federal de 1988 ainda são, em sua maioria, letra morta, uma vez que não se concretizaram eficazmente e têm se mantido distantes dos reais objetivos estabelecidos com as penas privativas de liberdade. Neste cenário, vislumbra-se o trabalho do preso como forma de prepará-lo para o seu retorno à sociedade, com a possibilidade de prover sua própria subsistência, bem como a de sua família, evitando assim que retorne ao mundo do crime. 12 Diante disso, emerge o interesse em desenvolver a pesquisa intitulada: O trabalho e a educação em prol da reinserção social da pessoa reclusa. As questões que sobressaem dizem respeito à dificuldade do cumprimento do objetivo da pena privativa de liberdade como forma de reinserção social do condenado. São também verificados problemas crônicos, como a superlotação do sistema carcerário, maus tratos físicos e verbais, condições deficientes de trabalho, má alimentação, dentre vários outros. Surge então a pergunta: o trabalho e a educação no cárcere poderiam ser considerados meios para a concretização do objetivo da reintegrar o condenado na sociedade? Com a presente pesquisa pretendemos então examinar, mediante uma apreciação dedutiva-crítica, a evolução da pena de prisão, seus fundamentos, além do trabalho e da educação como instrumentos de reinserção do condenado na sociedade. O trabalho foi desenvolvido com base em pesquisa bibliográfica, jurisprudencial e na legislação vigente. Sua estrutura está sistematizada em tópicos que tratam da evolução histórica do sistema prisional, tendo como princípio a ressocialização do preso, destacando o início da utilização da mão de obra de presidiários que, à época, sequer havia o objetivo de prepará-los para o retorno à sociedade, mas sim de simplesmente castigá-los. Com o advento da pena privativa de liberdade surgiu também o trabalho e a educação como forma de disciplina e de favorecer a posterior reinserção social. Destacam-se também os tipos de estabelecimentos penais existentes no Brasil. No primeiro capitulo abordaremos a Evolução Histórica das prisões na história e no tempo e, em seguida, discorreremos sobre as espécies de penas existentes na legislação brasileira, dando ênfase maior na modalidade de privação de liberdade. Este tipo de pena restringe o direito de ir e vir do condenado, podendo ser classificada como de reclusão e de detenção e pode ser cumprida em regimes fechado, semiaberto e aberto. Destacaremos também o trabalho e a educação do preso como um direito, um dever social e como um ato de dignidade humana, com finalidades educativa, produtiva e reintegradora. Por fim, será apresentado o trabalho do preso desenvolvido pelas Penitenciárias e Unidades Prisionais do Estado de Santa Catarina. Serão destacados os aspectos estruturais, bem como o quadro funcional e as possibilidades de lotação dos internos do estabelecimento. 13 1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PRISÕES ATRAVÉS DO TEMPO Priorizamos, inicialmente, uma explanação sobre o conceito da pena. Conforme Delmanto (2000, p. 1078), “Pena é a imposição da perda ou diminuição de um bem jurídico, prevista em lei e aplicada pelo órgão judiciário, a quem praticou ilícito penal”. Dessa forma o autor mencionado aponta a terminologia pena como a formalização de uma sanção expiatória, onde se for impingida por um ato irregular cometido por um indivíduo, a mesma se identifica em qualquer localidade em que houver agrupamentos humanos. Já para Fragoso (1991, p. 585), “Pena é a perda de bens jurídicos imposta pelo órgão da justiça a quem comete crime. Trata-se de sanção característica do direito penal, em sua essência retributiva”. Retributiva de forma essencial porque sua operação causa um mal a quem transgride em virtude de violação de norma jurídica. Nesse sentido o ilustre Mirabete (2002, p. 453) aponta os conceitos de dois grandes doutrinadores: Para Luiz Vicente Cernicchiaro, a pena pode ser encarada sobre três aspectos: substancialmente consiste na perda ou privação de exercício do direito relativo a um objeto jurídico; formalmente está vinculado ao principio da reserva legal, e somente é aplicada pelo Poder Judiciário, respeitando o principio do contraditório; e teleologicamente mostra-se, concomitantemente, castigo e defesa social. Para Soler, “a pena é uma sanção aflitiva imposta pelo Estado, através da ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico e cujo fim é evitar novos delitos”. Segundo José Frederico Marques (1996, p. 103), pena é “a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração como retribuição de seu ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, cujo fim é evitar novos delitos”. Para Beccaria (2002, p. 139) “uma pena para ser justa precisa ter apenas o grau de rigor suficiente para afastar os homens da senda do crime”. Afirma-se através dessas conceituações que pena então é a perda ou privação de exercício do direito relativo a um objeto jurídico, um castigo e também uma suposta forma de defesa social. Sendo o objeto jurídico maior de uma pessoa a sua liberdade, enquanto que transgredida uma norma jurídica pelo ofensor, este se obriga a pagar um castigo se abstendo de um bem jurídico seu para reparar a ofensa social. As principais diretivas estão encontradas na Constituição Federal de 1988, a qual trata a pena e os princípios que o legislador deve seguir, para nortear o seu embasamento jurídico, que são: o 14 princípio da legalidade, da responsabilidade personalíssima, da individualização e da humanização. O primeiro que é o princípio da Legalidade: consiste na existência prévia de lei para a imposição da pena, princípio expresso do art. 5º, XXXIX. Já o Princípio da Responsabilidade Personalíssima: impossibilidade de estenderse a terceiros a imposição da pena. Pelo preceito constitucional, ninguém responderá por um ilícito penal se não o tiver praticado, tem-se em vista art. 5º, XLV, enquanto que o Princípio da Individualização: cada espécie de infração penal tem um tratamento individualizado, e poderá ser adotada esta ou aquela modalidade de sanção conforme a necessidade, a proporcionalidade e outros fatores a serem verificados, por exemplo, art. 5º, XLVI. E por fim no Princípio da humanização: decorre de diversos dispositivos da Constituição que estabelecem limites à atuação do Estado, em respeito à vida e à dignidade da pessoa humana, consoante art. 5º, XLILX. As garantias que amparam a pena estão, portanto inseridas nos princípios constitucionais, o que se deve ser levado à barca, bem como se os princípios constitucionais definitivamente são respeitados. Por exemplo: consideração pela dignidade humana do infrator, se a punição está elencada dentro dos parâmetros legais definidos pelo Estado, se ocorre reintegração social eficaz do apenado ou se o instituto da reincidência do condenado faz parte do processo penal brasileiro, além da não reificação do condenado e em nossos presídios e penitenciárias. 1.1 O Desenvolvimento Histórico da Pena Com a sociedade surgem os regramentos de condução social permeados pelo direito, pois surgem os problemas de convívio em sociedade. Dessa forma adotam-se princípios diversos na aplicação das penas, mas nos períodos primordiais predominam os ideais primitivos baseados na vingança do ofendido ou de seu grupo familiar. Nota-se que a sanção expiatória esteve presente sempre nos agrupamentos humanos como forma coercitiva em virtude de praticas delituosas que ameaçassem o grupo. Afinal, não seria correto afirmar que as relações sociais entre os homens no início da civilização tenham sido fraternais e amistosas. De maneira alguma tal ideia será defendida, pois os relatos históricos farão sucumbir os pilares de sustentação da aludida assertiva (DELMANTO, 2000, p. 1078). Em períodos primitivos, não havia a predominância de códigos ou leis escritas. Dessa forma, episódios naturais eram utilizados para justificar a ira dos deuses e, assim, 15 justificar a criação de proibições e a aplicação de castigos ao transgressor da norma. Nas sociedades primitivas o direito nada mais era do que um dos aspectos da religião, visto que todos os fenômenos naturais maléficos aconteciam em virtude da cólera das forças divinas, de sorte que a reação punitiva também apresentava caráter religioso. A pena tinha um caráter vingativo e o castigo imposto era a retirada da vida do transgressor. A vingança de sangue exercida pela vítima ou de seus parentes é dever sagrado, visando aplacar a ira da divindade. Vê-se, assim, a pena em sua origem como vingança, um revide à agressão sofrida desproporcionada com a ofensa e aplicada sem a menor preocupação com a justiça. Após uma primeira fase de vingança surgem outras onde, segundo Fragoso (1991, p. 585): A reação penal torna-se represália por parte da vítima, situando-se na esfera privada, limitando-a pelo talião e pela composição com a vítima (preço da paz), para em seguida assumir o Estado o monopólio da justiça punitiva. A composição a princípio voluntária, depois imposta pelo Estado e finalmente abolida, passando as penas a serem públicas. Para impedir que as tribos fossem eliminadas por completo, surge o talião, que limita a reação à ofensa a um mal idêntico ao praticado (sangue por sangue, olho por olho, dente por dente), um grande avanço, por reduzir a abrangência da ação punitiva (MIRABETE, 2003, p. 36). Ocorre aí a utilização do Código de Hamurabi, no Êxodo (hebreus) e na Lei das XII Tábuas da antiga Roma. Desta feita a dimensão da organização social faz com que a pena perca a sua caracterização religiosa, onde se impõe por uma autoridade pública representativa dos interesses da comunidade, onde a figura do príncipe ou soberano tranveste-se de autoridade pública e divindade religiosa causando um paradoxo, onde muitas vezes a pena era cruel e severa, onde, por exemplo, aponta Mirabete (2003, p. 36) que, o soberano na Grécia governava em nome de Zeus, e era seu intérprete e mandatário. Ao fim da República romana a vingança privada desaparece e o magistério penal é exercido pelo Estado, salvo o pater familias que se mantém com restrições. Tribunais com jurados permanentes fazem o inquérito e julgamento sendo estes tribunais presididos por um magistrado em substituição aos julgamentos populares pelos comícios. O processo penal torna-se regra e é praticamente abolida a pena de morte sendo as penas mais graves de exílio e deportação que deveriam estar expressamente 16 previstas, uma vez que nesta época o direito romano era regido pelo princípio da reserva legal (FRAGOSO, 1991, p. 585). Foi durante a época de Augustus (27 d.C) que existe maior liberdade ao Estado na apreciação dos delitos e a imposição das penas sem a necessidade de uma acusação formal. A pena de morte volta a ser aplicada para os crimes mais graves e a prisão, o cárcere em si, não era considerado pena. Segundo Mirabete (2003, p. 37) “Contribuiu o Direito Romano decisivamente para a evolução do Direito Penal com a criação de princípios penais como o erro, a culpa, dolo, imputabilidade, coação irresistível, agravantes, atenuantes, legítima defesa, etc.”. Já no Direito Germânico não existia a distinção entre caso fortuito, dolo e a culpa do agente e, o resultado de como o agente feria a vitima era contado para aplicar sua pena.Quando aos processos dos povos bárbaros vigoravam as ordálias ou juízes de deus (prova da água fervente, do ferro em brasa, etc.) ou os duelos judiciários com os quais se decidiam os litígios, pessoalmente ou através de lutadores profissionais (MIRABETE, 2003, p. 37). Enquanto que no Direito Canônico procurou-se estabelecer o domínio da Igreja sobre o Estado esta criou várias disposições legislativas para impor seu poder punitivo, onde, proclamou-se a igualdade entre os homens, acentuando a subjetividade do crime, o fortalecimento da justiça pública e o fim das ordálias e duelos judiciários bárbaros, introduzindo penas privativas de liberdade em substituição as penas patrimoniais para possibilitar o arrependimento do réu, e ainda promoveu-se a mitigação das penas que passaram a não ter como fim só a expiação, mas também a regeneração do criminoso pela purgação da culpa, o que levou, paradoxalmente, aos excessos da Inquisição, através do Concílio de Latrão, em 1215, e possibilitava o procedimento de ofício, sem necessidade de prévia acusação, pública ou privada. Nesse sentido aponta Mirabete (2003, p. 38): No período medieval houve um entrelaçamento entre os direitos romano, germânico e canônico, com prevalência do romano nos casos omissos. Destrincha Mirabete os pontos do direito penal medieval doutrinando que as penas de morte eram comuns e cruéis (fogueira, afogamento, soterramento, etc.) sendo executadas com o nítido propósito de intimidação. As sanções eram desiguais, dependendo da condição social e política do réu. O processo é exercido em defesa do Estado e da religião, mas a justiça ganha contornos de incerteza, insegurança e terror. 17 Já nos séculos XVII e XVIII a classe social que comandava o capitalismo chamada de burguesia entrava em conflito com os interesses da nobreza, dando vazão ao movimento de liberalismo clássico, que serviu como base para o iluminismo visando dar ao homem um pensamento livre sobre questões tradicionais na época. No campo do Direito os pensadores contestavam as ideias absolutistas. A base ideológica desse período era a reforma das leis e das instâncias judiciais a fim de humanizar a aplicação da Pena (BITENCOURT, 2003, p. 952). No direito penal, vemos a figura de Cesar Bonesana, o Marquês de Beccaria que inspirado na concepção do contrato social de Rousseau enxerga um novo direito penal, propondo um novo fundamento à justiça penal onde seu escopo seria utilitário e político que deve, porém, ser limitado pela lei moral. Em sua obra Do delito e das Penas, publicada na segunda metade do século XVIII, afirma Beccaria (FRAGOSO, 1985, p. 40) que: O fim da pena é apenas para evitar que o criminoso cause novos males e que os demais cidadãos o imitem, sendo tirânica toda punição que não se funde na absoluta necessidade. Defendia a conveniência das leis claras e precisas, não permitindo sequer o arbítrio do juiz a sua interpretação. Combateu a pena de morte, a tortura e o processo inquisitório. Opunha-se à justiça medieval que ainda vigorava em seu tempo bem como ao direito comum romanocanônico da época que aqui se encerra. Beccaria, com seus pensamentos, deu início ao movimento Humanitário baseado, sobretudo, no respeito à personalidade humana fundada na piedade e na compaixão em que o acusado deveria ser submetido ao processo penal e regime carcerário da época. Imediatamente o Estado teve que repensar a forma da execução penal, sendo obrigado a atender aos anseios humanitários da sociedade para com a justiça criminal. Por isso que se afirma que, nesta fase, o povo teve a mais importante atuação na aplicação da pena, pois foi ele o principal responsável pela sua humanização (BITENCOURT, 2003, p. 952). As ideias fundamentais de Beccaria foram expostas por diversos doutrinadores na primeira metade do século XIX no que se resolveu nomear Escola Clássica em que foi reforçada a noção retributiva da sanção penal como exigência de justiça bem como, na postulação de Carrara, o crime visto como violação de direito e não como uma norma jurídica do direito positivo e a responsabilidade penal subjetiva (FRAGOSO, 1985, p. 43). 18 Foi durante o fim do século XIX, com a concepção naturalista do movimento positivista que Lombroso instituiu os métodos estatísticos onde surgia o homem delinquente com base nas anomalias físicas e mentais, porém esse vetor logo foi descartado. Os princípios dessa escola baseiam-se no crime como fenômeno natural e social, estando sujeito às influencias do meio, exigindo o método experimental ou positivo para explicação de suas causas; responsabilidade penal atrelada a responsabilidade social; pena como medida exclusiva de defesa social; o criminoso é sempre psicologicamente anormal, de forma temporária ou permanente, e muitas vezes apresenta defeitos físicos (FRAGOSO, 1985, p. 47). A Escola mista e a Escola Moderna Alemã contribuíram para o estudo do direito penal, em que a premissa partia de que o crime ocorre por casualidade, e na Escola Moderna Alemã houve a contribuição na instituição das medidas de segurança, o livramento condicional e sursis. Nos primórdios da colonização brasileira, entre as tribos indígenas, prevalecia o direito costumeiro, caracterizado pela vingança privada, a vingança coletiva e a lei de talião. Nesta fase, muitas vezes a pena não era proporcional à ofensa, pois atingia não só o ofensor, mas também todo o seu grupo familiar. Para Bitencourt, (2002, p41): Pode-se afirmar, sem exagero, que instalou tardiamente um regime jurídico despótico, sustentado em um neofeudalismo luso-brasileiro, com pequenos senhores, independentes entre si, e que, distantes do poder da coroa, possuíam um ilimitado poder de julgar e administrar os seus interesses. De certa forma, essa fase colonial brasileira reviveu os períodos mais obscuros, violentos e cruéis da História da Humanidade, vividos em outros continentes. Com a proclamação da Independência em 1830, foi sancionado o Código Criminal do Império, que regulava a individualização da pena e previa também a pena de morte. Proclamada a República em 11 de outubro de 1890, é editado o Código Penal, abolindo a pena de morte e instalando o regime penitenciário de caráter correcional. Em 1942 entra em vigor o Código Penal, pelo decreto lei n. 2.848 de 7/12/1990, o qual tem sua vigência prolongada até os dias atuais. De acordo com Mirabete, (2005, p.44): 19 A nova lei é o resultado de um influxo liberal de uma mentalidade humanista em que se procurou criar novas medidas penais para os crimes de pequena relevância, evitando-se o encarceramento de seus autores por curto lapso de tempo. Respeita a dignidade do homem que delinquiu, tratando como ser livre e responsável, enfatizando-se a culpabilidade como indispensável à responsabilidade penal. Todavia, a nova lei não foi suficiente para trazer a tão almejada tranquilidade social. A modernidade favoreceu não apenas as altas tecnologias, mas também as concentrações urbanas, o não planejado êxodo rural e as mudanças de comportamento, implicando também em aumento da criminalidade. As instituições públicas brasileiras não acompanharam essas mudanças, pois a superlotação dos presídios e penitenciárias parece inibir ainda mais uma das mais almejadas funções da pena, qual seja, a de contribuir para a reintegração social do apenado. 1.2 Das Penas Na Ordem Jurídica no Brasil e no Mundo No ordenamento jurídico brasileiro existem várias formas de punir o infrator. Essas formas são chamadas de penas, classificáveis em restritivas de direitos, privativas de liberdade e de multa. Pena refere-se à sanção que o Estado impõe contra a prática de um fato definido pela lei como crime, tendo como base a privação de determinados bens jurídicos. De acordo com Damásio (1995), pena é a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal ao autor de uma infração, como retribuição de seu ato ilícito, consistindo na diminuição de um bem jurídico, com o escopo de evitar novos delitos. Conforme Fragoso (1991, p. 279), a pena pode ser vista da seguinte forma: Pena é a perda de bens jurídicos impostos pelo órgão da justiça a quem comete crime. Trata-se da sanção característica do direito penal, em sua essência retributiva. Sanção penal é em essência retributiva porque opera acusando um mal ao transgressor Por sua vez, Capez (2004, p.19) assim conceitua: A pena é a sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cujas finalidades são aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade. 20 O autor ainda salienta que pena pode também ser concebida como o ato de punir imposto pelo Estado contra o cidadão que praticou um delito. São características da pena: legalidade, personalidade, proporcionalidade e inderrogabilidade. Segundo Mirabete, (2005, p.246): Devem existir nas penas várias características: legalidade, personalidade, proporcionalidade e inderrogabilidade. O princípio da legalidade consiste na existência prévia de lei para imposição da pena (nulia poema sine lege), previsto no artigo 1º do Código Penal. A característica da personalidade refere-se à impossibilidade de estender-se a terceiros a imposição da pena, por isso, determina-se que "nenhuma pena passara da pessoa do condenado" (art. 5º, XLVI, primeira parte, da CF), proibindose, por exemplo, as penas infamantes. A aplicação da pena deve seguir o princípio da legalidade, prevista no art. 1º no Código Penal: não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem a prévia cominação legal. A constituição Federal Brasileira de 1988, assim dispõe no art. 5º, inciso XXXIX. “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal,” e no inciso II, que menciona: " ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei". A pena também deve respeitar a personalidade, ou seja, atingir apenas o autor do crime. Encontra-se contido no art. 5º, inciso XLV da Constituição Federal: Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra ele executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido. Portanto, a pessoabilidade é uma característica da pena que está ligada aos seus fins e fundamentos, a pessoabilidade ou personalidade impõe-se pela finalidade de retribuição da pena, devendo assim, recair a pena sobre quem praticou o mal e somente sobre ele, não atingindo outros entes estranhos ao fato. A pena não pode ser muito exagerada, nem muito leve, mas justa, adequada e idônea, em qualidade e quantidade suficientes para conter a prática da infração e promover a proteção da sociedade. O Estado é possuidor do direito de punir, detém o ius puniendi, busca o conforto geral, impõe normas de conduta e prevê sanções àqueles que descumprem suas regras. As sanções penais aparecem como meio de prevenir e reprimir os atos delinquentes, no intuito de promover a segurança e a conservação da sociedade. O Código Penal, com a reforma de 1984, concedeu à pena uma natureza mista, definindo-a como retributiva e preventiva. Assim dispõe o art. 59, caput do Código Penal: 21 Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Como consequência, a pena tem como destinação a retribuição do mal praticado. Todavia, a precaução apresenta-se como seu propósito maior, mesmo porque o Direito Penal manifesta-se como ordenamento dirigido a seu fim último, que é a convivência em harmonia na sociedade. A Política Criminal, por sua vez, na busca de suas finalidades, atua tanto por meio da prevenção especial, quanto pela prevenção geral. A prevenção geral está pautada em que a ameaça de uma pena sirva para intimidar os potenciais infratores, bem como o sofrimento do indivíduo aprisionado possa ajudar na dissuasão para a prática de delitos. Nesse sentido, Bitencourt, (2002, p.77) assim conceitua: A prevenção geral fundamenta-se em duas ideias básicas: a ideia da intimidação ou da utilização do medo, e a ponderação da racionalidade do homem. Essa teoria valeu-se dessas ideias fundamentais para não cair no terror e no totalitarismo absoluto. Teve, necessariamente de reconhecer, por um lado, a capacidade racional absolutamente livre do homem – que é uma ficção como livre-arbítrio-, e, por outro lado, um Estado absolutamente racional em seus objetivos, que também é uma ficção. A prevenção especial está destinada ao transgressor castigado com uma pena. A pena seria um instrumento de atuação preventiva sobre a pessoa do infrator, com o fito de evitar que, no futuro, pratique novos delitos. Nessa linha, Bitencourt (2002, p.81) esclarece: A prevenção especial não busca a intimidação do grupo social nem a retribuição do fato praticado, visando apenas aquele indivíduo que já delinquiu para fazer com que não volte a transgredir as normas jurídicopenais. É importante destacar o caráter ressocializador atribuído à pena. De acordo com o que estabelece o Código Penal Brasileiro, por força da Lei n° 7.209, de 11/07/1984, que deu nova redação à Parte Geral, e da Lei n° 9.714, de 25/11/1998, que modificou o art. 43, as penas são classificadas em: privativas de liberdade (reclusão e detenção), restritivas de direitos (prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de 22 serviço à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana e multa). A Carta Magna, em seu art. 5º, inciso XLVI, prevê as penas de privação ou restrição alternativa, bem como suspensão ou interdição de direitos. Já o inciso XLVII, do mesmo dispositivo constitucional, proíbe a pena de morte, assim como as de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento, e as cruéis. A lei prevê também as medidas de segurança, que constituem forma de sanção penal, mas diferem das penas, uma vez que estas possuem natureza retributivo-preventiva, enquanto que as medidas de segurança são tidas como essencialmente preventivas, no sentido de resguardar a sociedade da ação de infratores supostamente perigosos, e de submetê-los a tratamento curativo. A lei estabelece que a sanção seja imposta por tempo indeterminado, enquanto não for detectada a cessação de periculosidade. Antes de adentrar no cerne da questão proposta: “O trabalho como meio de reintegração social do preso”, infere-se que a real compreensão dos institutos jurídicos pressupõe o estudo da história do Direito. Mais especificamente, no caso em tela, do Direito Penal, mormente no que são pertinentes as diversas espécies de sistemas prisionais que surgiram ao longo dos tempos e a importância do trabalho prisional para que o recluso volte para a sociedade com possibilidades de reinserir-se nela e recomeçar sua vida como cidadão. Reavendo o passado, podemos citar John Howard apud Bitencourt, (2001, p. 41) que: “considerava o trabalho obrigatório inclusive penoso, serviria de meio adequado para a regeneração moral”. Entendia ele que o trabalho seria um meio reabilitador do condenado. A história do Direito Penal vem acompanhando a evolução do próprio homem, ou seja, existe desde os mais remotos tempos. A finalidade da prisão, ao longo da história, acompanhou a evolução e os interesses de cada sociedade. O condenado tem sido recolhido à prisão por diversos motivos, a começar pela garantia do cumprimento da pena final que, em casos extremos, poderia ser a morte e servia como intimidação para os demais. Nos dias atuais, discute-se a intenção de reinserir na sociedade o indivíduo que cumpriu pena de prisão em algum estabelecimento prisional. Bitencourt (2001, p.01) afirma que “A prisão é uma exigência amarga, mas imprescindível. A história da prisão não é a de sua progressiva abolição, mas a de sua reforma”. Entende-se assim que o sistema prisional vem acompanhando a evolução da sociedade atendendo suas necessidades, passando pelos períodos da história da humanidade até chegar aos dias atuais com a pena privativa de liberdade. 23 Na Antiguidade, não existia a pena privacidade de liberdade, mas sim castigos ou punições que poderiam ir desde a tortura até a morte ou as sanções infamantes. Durante muito tempo esses locais que seriam mais tarde utilizados como prisões serviam basicamente de depósito, contenção e custódia do réu, que geralmente aguardava, em condições subumanas, a celebração de sua execução. Nessa época surgiram dois tipos de cárceres: a prisão de Estado e a prisão eclesiástica. A prisão de Estado destinava-se àqueles que se colocavam contra o governo. Como salienta Bitencourt (2001, p.09): “Na prisão Estada, na Idade Média, somente podiam ser recolhidos os inimigos do poder, real ou senhorial, que tivessem cometidos delitos de traição, e os adversários políticos dos governantes”. Destacam-se ainda, segundo Bitencourt, duas modalidades: a prisão custódia, onde o réu esperava a execução da verdadeira pena aplicada; e a prisão temporal ou perpétua, onde o réu poderia receber o perdão real ou passar o resto da vida encarcerado. Com relação à prisão eclesiástica, tem-se em conta que ela destinava-se aos religiosos insubordinados, objetivava a penitência e a meditação, como salienta Bitencourt: A prisão eclesiástica, por sua vez destinava-se aos clérigos rebeldes e respondia as ideias de caridade, redenção e fraternidade da igreja, dando ao internamento um sentido de penitência e meditação. A prisão canônica era mais humana que a do regime secular, baseada em suplícios e mutilações, porém impossível compará-la com a idade moderna. E foi por iniciativa eclesiástica que surgiram as prisões subterrâneas, pois os réus que desciam para essas prisões dificilmente saíam com vida. Mas foi com a igreja que se começou a ter o direito punitivo procurando a reabilitação. (BITENCOURT, 2001. p. 10). Essa modalidade prisional exerceu grande influência na evolução da pena privativa de liberdade até o surgimento da prisão moderna, principalmente no que diz respeito aos aspectos arquitetônicos e psicológicos. Psicológicos no sentido de que a ideia da oração e do arrependimento contribuía mais para a reabilitação do que a coação física. Os suplícios foram sendo reduzidos e substituídos pela pena de prisão e de trabalhos forçados. A pena de morte ficou restrita aos casos de homicídio. Portanto, apesar da existência de penas rigorosas, é possível perceber algum abrandamento, principalmente com relação à pena de morte, uma vez que a mesma passou a ser substituída, na maioria dos casos pela de reclusão. De início, essas mudanças atingiram os clérigos que transgrediam as normas eclesiásticas e, posteriormente, por disposições legais, também os hereges e outros transgressores da lei. 24 Assim, a prisão surge como o locus de cumprimento da pena privativa de liberdade, daí o termo penitenciário descrito por Teles (1996, p.54), também substituindo as penas mais graves anteriormente citadas. Ao reportar-se à pena como privação de liberdade, Shecaira (1995) diz: A Idade Média, também chamada idade das trevas, produziu aquela que seria a maior substituta da pena capital. A Igreja do séc. V, para punir clérigos faltosos, usava aplicar como penalidade a reclusão em celas ou a internação em mosteiros. Era o surgimento da privação da liberdade como pena, sem embargo de ser posteriormente utilizada, [...], com outras finalidades no decorrer da História. (SHECAIRA, 1995. p. 19). Foi, portanto, a prisão eclesiástica que germinou a semente que, mais tarde, viria a transformar-se na pena privativa de liberdade, inserindo-se nos sistemas punitivos dos tempos modernos. Por sua vez, o trabalho forçado aplicado aos condenados nesse período não tinha o objetivo de prepará-los para o retorno à sociedade, tinha sim o objetivo de castigar. Considerando-se o modelo de prisão eclesiástica, iniciou-se um movimento de construção de prisões para o recolhimento e a correção de criminosos. Nesse sentido, Bitencourt, lembra que esses movimentos tiveram como causa a pobreza que se abateu em toda a Europa nesse período, crescendo consideravelmente o número de vagabundos e mendigos que passaram a constituir uma ameaça ao poder do Estado. Não sendo possível aplicar a pena de morte, tendo em vista o número excessivo de marginalizados, a pena privativa de liberdade, para o momento, seria a solução. Lembra ele que foram “[...] sobretudo razões econômicas e de necessidade de dominação que propiciaram o nascimento da pena privativa de liberdade”. (BITENCOURT, 2001, p. 31). A partir daí, a construção de prisões, com a finalidade de transformar o condenado pelo trabalho e pela disciplina ganhou cada vez mais adeptos. Na Idade Moderna, a principal finalidade das instituições prisionais era a reforma do preso por meio do trabalho e da disciplina. A mais antiga arquitetura carcerária construída foi a Amsterdã Rasphuis, em 1506, para homens, na cidade de Amsterdã na Alemanha. Dava ênfase ao castigo laboral e ao ensino religioso, destinava-se principalmente a mendigos e malfeitores com penas leves e longas, e o trabalho era obrigatório. Em 1597 foi criada a Amsterdã Spinhis, para o encarceramento de mulheres e, em 1600, uma seção especial para meninas adolescentes. As prisões de Amsterdã contavam com um programa de reforma e a elas foi atribuído êxito. Foram imitadas em muitos países europeus, pois chamavam atenção. 25 Dois séculos se passaram até que prisões fossem consideradas um lugar de possível correção e mudança e não de simples custódia do detento à espera de julgamento. Na busca de resultados mais eficazes com a aplicação da pena, surgiram vários sistemas prisionais conforme a época e a ideologia vigente. Dentre eles destacam-se: o Sistema Pensilvânico, o Sistema Auburniano e o Sistema Progressivo. No Estado da Filadélfia, nos Estados Unidos da América, foi experimentado um sistema que se tornou conhecido como Pensilvânico Filadélfico, em que o preso cumpria sua sentença de modo celular ou de confinamento solitário (solitary confinement). Consistia num regime de isolamento, em cela individual, sem mobília, de tamanho reduzido, sem atividades laborais e sem visitas, onde o preso era incentivado unicamente a ler à bíblia. As condições rigorosíssimas em que viviam asseguravam um ambiente de ordem e disciplina, quase que inteiramente isento de fugas. Bitencourt (2001, p. 68) assim descreve: Das boas intenções que impulsionaram os homens idealizadores do sistema celular restou somente um feito irrefutável: o confinamento solitário converteu-se em excelente instrumento de dominação e controle e, por essa razão, ainda é utilizado nas prisões modernas. Dentro desse inevitável paradoxo desenvolvem-se muitos dos sistemas penitenciários modernos. Tendo em vista as limitações e falhas desse sistema e a busca por superação, foi criado o sistema que ficou conhecido como Auburniano. Teve início em 1818, no estado de New York, nos Estados Unidos, com a construção da Penitenciária de Auburn. Os reclusos eram mantidos em isolamento noturno, mas foi nessa época que se criou o trabalho dos presos, sendo primeiramente em suas celas e, posteriormente, em lugares próprios e em comum com os outros internos. Outra característica desse sistema consiste no absoluto silêncio entre os condenados, mesmo quando em grupos. O Sistema Auburniano difere do Pensilvânico, que tinha por base motivações místicas e religiosas. O trabalho era tido como agente de transformação e reabilitação do condenado. Este pensamento recebe críticas de Bitencourt (2001, p. 76), para quem “o trabalho não seria uma forma de tratamento, mas um instrumento adequado para transformar o delinquente em elemento útil à fábrica e ao sistema capitalista. O que interessa é que o recluso se submeta e seja útil ao regime políticoeconômico”. Apesar das críticas recebidas, principalmente no que se refere ao “economicismo”, o Sistema Auburniano parece ter servido de embasamento para a 26 implementação dos Sistemas Progressivos, ainda hoje aplicados em diversos países. No Século XIX surgiu, na Inglaterra, o Sistema Progressivo, no qual era levado em conta o comportamento e o desempenho do preso, especialmente no que se refere à conduta e ao trabalho. Estes sistemas estabeleciam uma escala progressiva no tratamento do condenado. O tempo da condenação seria distribuído em períodos, cujo rigor decrescia à medida que passava para o estágio seguinte. Os privilégios a serem usufruídos eram ampliados, de acordo com a conduta e o aproveitamento demonstrado no sistema. Outro fator importante é a possibilidade de reincorporação do condenado à sociedade antes mesmo do término da condenação. Dentre outros sistemas similares, cabe destacar o Sistema Inglês Progressivo ou Mark System, na Austrália, o Sistema Progressivo Irlandês na Irlanda e o Sistema de Montesinos, na Espanha. O Sistema Inglês Progressivo ou Mark System consistia, segundo Bitencourt (2001, p. 84), “em medir a duração da pena por uma soma de trabalho e de boa conduta imposta ao condenado”. Estabelecia três períodos no cumprimento da pena: o primeiro período era o de prova, consistia em isolamento celular absoluto, os presos acorrentados faziam serviços no interior da prisão, inclusive os de limpeza; o segundo período iniciava com a permissão do trabalho em comum, em silêncio e, aos poucos, outros privilégios poderiam ser agregados, como o de escolher as oficinas aonde iriam trabalhar; o terceiro período abria a possibilidade de visita à família, realização de trabalhos externos e obtenção de livramento condicional. O Sistema Progressivo Irlandês originou-se do aperfeiçoamento do sistema anterior, trabalho efetivado por Walter Crofton, diretor das prisões na Irlanda. A diferença estava na inclusão de uma fase intermediária entre a prisão e a liberdade condicional, que prepararia o condenado para seu retorno à sociedade. Essa fase facilitar-lhe-ia o contato com o mundo exterior, abrangia transferência para prisões agrícolas, semiabertas, com permissão de diálogo e trabalho no campo. O Sistema Progressivo Irlandês era dividido em quatro períodos. O primeiro era de recolhimento celular contínuo, o preso ficava recolhido nos períodos diurno e noturno, sem comunicação, alimentação reduzida e sem qualquer beneficio; o segundo era de isolamento noturno, com trabalho e ensino em comum durante o dia; o terceiro era de semiliberdade, em que o condenado trabalha fora da penitenciária e recolhe-se à noite; e o quarto era o de livramento condicional. 27 Destaca-se ainda o Sistema Montesinos, criado por Manuel Montesinos e Molina que, em 1835 foi nomeado Governador do Presídio de Valência. Tendo em conta o pensamento de Bitencourt (2001, p. 91) “Montesinos tinha a firme convicção de que a prisão deveria buscar a recuperação do recluso. A função do presídio era devolver à sociedade homens honrados e cidadãos trabalhadores”. Montesinos participa da ideia, que ainda se mantém sólida, de que o trabalho é o melhor instrumento para conseguir o propósito reabilitador da pena. O trabalho tem a propriedade de Diminuir a repugnância que tinha o antigo mal-estar dos presidiários, e inspirar-lhes, sobretudo, o amor pelo trabalho, que fosse capaz de conter ou de extinguir a poderosa influência de seus vícios e maus hábitos. (BITENCOURT, 2001. p. 92) Por derradeiro, vale lembrar que o Direito Penal sofreu influência de vários fatos e movimentos que passaram a lhe conferir uma roupagem mais humanitária. Podem ser aí incluídos o Renascimento, o Iluminismo e a Revolução Francesa, que foram os pioneiros a perseguirem esse caminho. Além desses movimentos, há também a influência de vários pensadores, como Cesare Beccaria, John Howard e Rousseau, os quais introduziram ideias mais humanas com relação à pena de prisão. Cumpre destacar ainda outro expoente das ideias reformadoras do sistema punitivo, que foi Jeremy Bentham. Baseava-se no princípio utilitarista, segundo o qual o “homem sempre busca o prazer e foge da dor”. (BITENCOURT, 2001, p. 45). Sua maior contribuição foi à ideia do panóptico, figura arquitetônica cujo efeito mais importante, segundo Foucault (1987, p. 166) seria: “Induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder. Serve de maneira bastante perfeita à função de criar e manter uma relação de poder, independentemente de quem o exerça”. 1.3 Os Estabelecimentos Penais nos Dias Atuais Entende-se como estabelecimento penal todo aquele utilizado pela Justiça com a finalidade de alojar pessoas presas, podendo ser provisórios, condenados, ou ainda aqueles que estejam submetidos à medida de segurança. No Brasil, os artigos 82 a 104 da Lei de Execuções Penais (LEP) Lei n. 7.210/84 tratam dos diferentes tipos de estabelecimentos Penais, quais sejam: 28 Cadeias Públicas: estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas em caráter provisório. Estabelecimentos para Idosos: estabelecimentos penais próprios, ou seções ou módulos autônomos, incorporados ou anexos a estabelecimentos para adultos, destinados a abrigar pessoas presas que tenham no mínimo 60 anos de idade ao ingressarem ou os que completem essa idade durante o tempo de privação de liberdade. Penitenciárias: estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas com condenação à pena privativa de liberdade de reclusão em regime fechado. Apresenta maior segurança com o objetivo de impedir fuga. Penitenciárias de Segurança Máxima Especial: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas condenadas à pena privativa de liberdade de reclusão em regime fechado, que cujo crime ou comportamento exija maior segurança e vigilância. Penitenciárias Femininas: estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de presas mulheres, com condenação a pena privativa de liberdade em regime fechado. Deverá ser dotada de seção para gestante com berçário onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentar por um período de até seis meses. Deverá ter ainda seção para parturiente, além de creches com a finalidade de assistir o menor desamparado cuja responsável esteja presa. Colônias Agrícolas, Industriais ou Similares: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas que cumprem pena em regime semiaberto. Casas do Albergado: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas que cumprem pena privativa de liberdade em regime aberto, ou pena de limitação de fins de semana. Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas submetidas à medida de segurança. 1.4 A Instituição da Pena no Direito Brasileiro Inicialmente, demonstrou-se que em toda a história da humanidade sempre houve preocupação em castigar ou punir aqueles que transgridem os ditames impostos pela sociedade. E assim evoluíram os castigos corporais para a pena privativa de liberdade, cumprida em estabelecimentos prisionais. Estes também foram se adaptando e sofrendo transformações, conforme as necessidades, limitações e o arranjo sociopolítico e ideológico de cada época. 29 Segundo, Delmanto, (1998, p. 67) “Pena é a imposição da perda ou diminuição de um bem jurídico, prevista em lei e aplicada pelo órgão judiciário, a quem praticou ilícito penal. Ela tem finalidade retributiva, preventiva e ressocializadora”. Capez conceitua a pena como sendo a: Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade (CAPEZ. 2002 p. 336). Almeida (2002, p. 57), salienta que “a pena tem caráter intimidativo e inibitório, pois visa a desencorajar e a desestimular o infrator e todas as pessoas que tenham em potencial a vocação para delinquir (animus deliquendi)”. Assim, verifica-se que pena é a denominação dada a toda sanção imposta por lei para punir ou castigar quem praticar algum tipo de infração. A pena imposta é de interesse público, por isso que é de competência do Estado. Entretanto, questões controvertidas surgiram no decorrer da história da pena com relação aos seus objetivos. Calorosas discussões em torno do tema ainda centralizam a atenção de estudiosos e dão margem a contínuos questionamentos. Todavia, tendo por pressupostos os elementos cognitivos constantes no capítulo anterior, importa, no presente capítulo, apresentar as espécies de pena vigentes na legislação penal brasileira, bem como os fins a ela atribuídos e o direito ao trabalho como forma de atendimento a esses fins. Conforme o artigo 32, em seus incisos I, II e III do Código Penal Brasileiro, as espécies de penas vigentes em nosso país são: Pena Privativa de Liberdade; Penas Restritivas de Direitos e a Pena de Multa. A Constituição Federal brasileira de 1988, elenca no art. 5º, inciso XLVI as seguintes espécies de penas: privação ou restrição de liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos. Pena Privativa de Liberdade: É a espécie de pena que priva a liberdade individual do individuo o seu direito de ir e vir. Será cumprida em estabelecimentos penais, sendo a reclusão e a detenção espécies de pena privativa de liberdade cujo cumprimento poderá ser em regime fechado, semiaberto ou aberto no caso de reclusão e regime semiaberto ou aberto no caso de detenção. Penas Restritivas de Direitos: São substitutivas das penas privativa de liberdade quando o condenado preencher os requisitos do art. 44 do Código Penal, ou seja: pena não 30 superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, ou qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo. Na realidade, são sanções mais brandas a fim de evitar a aplicação de pena de prisão para crimes de menor gravidade, tendo em vista os intensos problemas que são hoje detectados no sistema prisional brasileiro. Conforme o Artigo 43, incisos I ao VI do Código Penal, as penas restritivas de direito podem ser: prestação pecuniária; prestação de outra natureza; perda de bens e valores; prestação de serviço à comunidade ou entidades públicas; interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana. Pena de Multa: consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença, sendo calculada em dias-multa. Será de no mínimo 10 dias e no máximo 360 dias-multa. O valor a ser cobrada por dia-multa não pode ser inferior a um trigésimo do salário mínimo vigente na data em que foi cometido o delito e nem superior a cinco vezes a esse salário. Ressalta-se o art. 60 do Código Penal que possibilita a elevação da pena de multa até o triplo sendo o máximo da pena aplicada ineficaz ao considera-se a situação econômica do condenado. O sistema do dia-multa deverá observar, para sua aplicação, a situação financeira do condenado, além de sua culpabilidade. A pena privativa de liberdade é aquela que restringe o direito de liberdade individual do agente que sofreu uma condenação pelo delito cometido. O cumprimento da pena não pode ser superior a 30 anos e, caso ocorra condenação superior a este limite, deve ser procedida a unificação da pena. As espécies de pena privativa de liberdade são: reclusão e detenção. Reclusão é a modalidade de pena em que o condenado poderá cumpri-la em qualquer um dos três regimes, ou seja, regime fechado, semiaberto ou aberto. Detenção, quando o regime inicial é o semiaberto ou aberto, conforme elenca o art. 33 do Código Penal Brasileiro. Os fundamentos da pena encontram-se ligados às mudanças que ocorreram nas concepções de Estado, de sociedade e de Direito ao longo da História. Em dado momento da história da pena ela apresentou características retributivas. A pena como retribuição tem suas raízes no Estado absolutista que, entre suas características mais significativas, apresentava uma identidade entre soberano e Estado, e entre Estado e religião, além de propagar que o poder soberano era concedido diretamente por Deus. Vale ressaltar que o fundamento religioso defendia que a pena seria apenas um castigo pelo ato cometido. No regime do Estado absolutista, aplicava-se uma pena a quem ousasse ficar contra o soberano e, desse modo, estaria também contra o próprio Deus. 31 Após o surgimento do Estado burguês, o Estado passou a ser uma expressão soberana do povo, e a pena passou a ser aplicada como retribuição a uma perturbação da ordem jurídica adotada pelos homens de forma consensual e legitimada pelas leis. Ou seja, a retribuição nada mais é que a troca da pena divina por uma pena imposta pela justiça. Pode-se dizer que, no momento que a ordem jurídica é perturbada, a pena viria como retribuição a essa perturbação, a fim de restaurar a ordem jurídica. A função preventiva da pena pode ser dividida em duas partes conforme aponta Baratta (1999): prevenção geral e prevenção especial. A prevenção geral subdivide-se em positiva e negativa. A prevenção geral positiva teria o papel de normalizar as relações sociais, garantindo a ordem através da estabilização das expectativas da sociedade. De sua parte, a prevenção geral negativa, por meio do poder intimidante que caracteriza o Direito Penal, funcionaria como inibidora de futuras ações criminosas, pela certeza da punição. Bettiol apresenta o seguinte conceito de prevenção geral: A doutrina da prevenção geral parte da consideração que o fim único é afastar os delitos da sociedade, em razão do que através da ameaça, deve-se considerar presente na aplicação e na execução da pena a ideia que a generalidade dos cidadãos é colocada psicológica de não cair no delito. A sociedade defende-se de melhor modo contra o crime quando, através da ameaça da pena em geral e sua aplicação ou execução em particular, suscita nos cidadãos inibições capazes de frustrar aquelas forças psicológicas que podem existir no ânimo dos cidadãos como determinante do crime (BETTIOL, 2000, p 654). A prevenção especial, segundo Bitencourt, busca coibir a prática delitiva, mas de modo diferente da prevenção geral, dirigindo-se ao delinquente com o intuito de que ele não mais cometa crimes. Conforme preceitua Mir Puig, apud Bitencourt, prevenção especial: Independentemente do interesse que possa despertar cada uma dessas correntes, foi o pensamento de Von Liszt que deu origem, na atualidade, a comentários de alguns penalistas sobre um ‘retorno a Von Liszt', para o qual "a aplicação da pena obedece uma ideia de ressocialização e reeducação do delinquente, à intimidação daqueles que não necessitam ressocializar-se e também para neutralizar os incorrigíveis. Essa tese pode ser sintetizada em três palavras: intimidação, correção e inocuização (BITENCOURT, 2002, p. 80). Ou seja, o infrator ocasional era intimidado, aquele que transgredisse as leis era reprimido e era promovida a inocuização daquele que resistisse ou se negasse a mudar 32 suas práticas. Hoje, no Brasil, a inocuização fere os princípios dos direitos do homem, sendo proibida a aplicação de penas cruéis pela Constituição Federal de 1988. Contemporaneamente, as penas privativas de liberdade no Brasil apresentam três espécies de regimes: o fechado; o semiaberto e o aberto. O regime fechado é cumprido em estabelecimentos de maior segurança, ou seja, em penitenciárias. No que se refere ao trabalho, o art. 28 da Lei de Execução Penal (LEP) estabelece: “o trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva”. No regime fechado o interno é obrigado a trabalhar, na medida de suas aptidões e capacidade. Conforme o art. 36 da LEP, o trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas às cautelas contra a fuga e em favor da disciplina. Neste tipo de regime o apenado tem direito ao estudo, mas somente ao ensino fundamental. O Regime semiaberto se cumpre em albergues, colônias agrícolas ou industriais, e quando o preso for condenado a uma pena superior a quatro anos e inferior a oito anos. Neste regime o condenado trabalha durante o dia e fica detido durante a noite, podendo prestar serviços externos, tanto para o serviço público quanto para o privado, sendo devidamente acompanhado por um agente penitenciário. Conforme os preceitos da LEP, a pena em Regime aberto é cumprida em casa do albergado, onde o preso fica livre durante o dia para trabalhar ou estudar, retornando a casa do albergado para pernoite e nos finais de semana e feriados. Neste regime o apenado poderá cursar ensino profissionalizante e ensino superior. Em cidades que não possuem casa do albergado, o condenado poderá ficar em casa, mas terá de ir diariamente assinar um livro no estabelecimento penal local. As transferências de um regime mais rigoroso para um regime mais brando ocorrem quando o condenado preenche determinados requisitos definidos em lei. Mais precisamente, no art. 112 da Lei de Execução Penal: a pena privativa de liberdade será executada de forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos 1/6 da pena no regime anterior e apresentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. No que se refere aos crimes classificados como hediondos, a chamada Lei dos crimes hediondos prevê que a progressão de regime será possível quando houver o cumprimento de 2/5 da pena, se o condenado for primário, e de 3/5 da pena, quando for 33 reincidente. Além disso, o condenado que cometer falta disciplinar classificada como grave perderá o direito a progressão, regredindo ao regime mais rigoroso. 34 2 O ATUAL SISTEMA PENAL NO BRASIL O Sistema Penal atual é novo no direito penal, embora a aplicação das penas exija que ocorra a detenção e o encarceramento por períodos determinados em lei conforme os períodos mais antigos da história como aponta Fragoso (1985, p. 298): Um texto de Ulpiano contido no Digesto (48.8.19) esclarecia que o cárcere deveria ser usado para detenção, não para punição. Essa passagem parece indicar a tendência para o uso abusivo do cárcere como pena. O encarceramento fazia-se em poços, em masmorras, em mosteiros e castelos, como etapas preliminares de penas corporais, notadamente a de morte, ou como fruto do arbítrio dos príncipes. Porém, na antiguidade o infrator ficava isolado até que ocorresse a pena capital, na idade média é possível verificar os indícios da forma mais característica desse tipo de prisão, alguns historiadores apontam os monastérios na Idade Média, onde, “como punição imposta aos monges, fazendo com que se recolhessem às suas celas para se dedicarem, em silêncio, à meditação e se arrependerem da falta cometida, reconciliando-se assim com Deus”. (PIMENTEL, 1983, p. 34). Em que pese essa ideia, o crescimento das cidades nessa época fez surgirem casas de trabalho e casas de correção para mendigos e vagabundos. Partindo deste princípio, um castelo abandonado em Bridewell, Inglaterra, inspirou a construção da primeira prisão destinada ao recolhimento de desocupados e desordeiros, a House of Correction, construída entre 1550 e 1552, difundindo-se de modo marcante no século XVIII. O escopo dessas casas de correção era fazer com que seus internos trabalhassem de forma obrigatória para o seu sustento e evitar com que outros se dedicassem a vagabundagem e à vadiagem (FRAGOSO, 1985, p. 298). No período que abrange o século XVIII a pena de prisão tornou-se uma forma de controle do indivíduo, onde o criminoso encarcerado passa a ser disciplinado na busca de sua correção. Já no fim desse século XVIII, em função das deficiências apresentadas pelas prisões da época, John Howard divulgou suas idéias no livro The state of prision in England and Wales, em 1776. Em 1764, Beccaria com uma nova filosofia penal publicava sua obra prima, Dos delitos e das penas. Foi então que, em 1818, Jeremias Bentham edita a Teoria das penas e recompensas. Essas três obras tiveram decisiva influência na revolução do tratamento penal nas prisões, propiciando que Estados norte-americanos desenvolvessem métodos 35 de cumprimento de penas privativas de liberdade diferentes durante o final do século XVIII e início do século XIX. No estado da Filadélfia desenvolveu um regime baseado na segregação e no silêncio. O chamado sistema pensilvânico, ou celular, previa a total abstenção de álcool, oração e isolamento celular, que poderia durar todo o cumprimento da pena para os autores de crimes mais graves. Aos demais, estes podiam trabalhar em comum durante o dia, em silêncio (FRAGOSO, 1985, p. 299). Ocorre que a possibilidade de reinserção social seria praticamente impossível mantendo o condenado em total isolamento, esse sistema dito pensilvânico consistente de silencio e isolamento dificilmente contribuiria com o retorno ao convívio social , ao contrário causava loucuras, doenças mentais suicídios e mortes. Dessa desumana imposição do silêncio, originou-se uma prática ainda hoje é utilizada, que é o costume dos presos se comunicarem com as mãos, nas prisões onde a disciplina é mais rígida, caso das prisões de segurança máxima (PIMENTEL, 1983, p. 138). A prisão então passa a ser sistematizada para a vigilância e controle total sobre o preso, nesse período Jeremy Bentham publicou em 1791 sua ideia de construção de um sistema prisional chamado Panóptico, que fomentaria instituições de educação, assistência e trabalho em um só ambiente, com a intenção de espalhar o sistema Panóptico que compreendia uma estrutura como o Hospício, o Hospital, a Fábrica e a Escola. Na lição de Oliveira (2002, p. 52), “o panóptico era um tipo de Prisão celular, caracterizada pela forma radial, em que uma só pessoa podia exercer em qualquer momento, de um posto de observação, a vigilância dos interiores das celas”. Sendo uma construção circular, com raios convergentes para um ponto central, um único vigilante poderia realizar o trabalho de observação. Esse modelo introduzido possibilitava a locação de vários indivíduos em um mesmo ambiente, com um pequeno número de vigilantes, com poder de controle embasada na vigília dos detentos o tempo todo, mesmo, às vezes não o sendo. Conclui Bittencourt (2003, p. 952) sobre o modelo Panóptico sendo: Uma construção que respondia a uma condição da própria sociedade moderna, ou seja, ele assegurava a ordenação, a normalização e a normatização dos diversos campos de atuação dos sujeitos. Foi a partir de um processo crescente de desenvolvimento de estratégias de esquadrinhamentos e objetivações que o panoptismo respondeu a uma necessidade imperiosa da modernidade: a inclusão, pela fixação, do maior número de sujeitos. 36 Na Inglaterra surge o sistema progressivo inglês, no século XIX, com a introdução do capitão Alexandre Maconochie e Sir Walter Crofton. Onde valorizava o comportamento do apenado e sua boa conduta no trabalho, onde a sua situação embasada nessa premissa ia melhorando gradativamente. A essência deste regime consiste em distribuir o tempo de duração da condenação em períodos, ampliando-se em cada um os privilégios que o recluso pode desfrutar em face de sua conduta, culminando com o retorno à vida social antes mesmo do término do cumprimento da Pena como forma de premiar sua conduta adequada, fruto de sua reforma moral (BITENCOURT, 2003, p. 952). Fragoso (1985, p. 303) apresenta sabiamente os estágios de cumprimento de pena no sistema irlandês: Esse sistema começava com um estágio de nove meses de isolamento celular. Um segundo estágio era de obras públicas, no qual se aplicava um critério de marcas ou de pontos, pelo qual o condenado progredia através de cinco classes, podendo acelerar a passagem de uma a outra pelo bom comportamento e dedicação ao trabalho. Um terceiro estágio era uma espécie de teste para a liberação. Nele o preso trabalhava sem supervisão e sem vigilância, sem emprego de medidas disciplinares, mas podendo voltar a etapas anteriores. Finalmente um quarto estágio era do livramento condicional (ticket of leave), que poderia ser revogado se não houvesse bom comportamento. O sistema mencionado caracterizou-se como um regime progressista, rapidamente difundido, originador do livramento condicional, que mais tarde foi adotado em diversos países, com específicas alterações locais, ou seja de acordo com a adequação de cada pais. 2.1Uma Visão Geral do Direito Penal no Brasil Durante o periodo do descobrimento perduravam as ordenações Afonsinas e, logo em seguida, as Manuelinas. No direito penal brasileiro, os índios é que foram os precursores. A pena resumia-se na entrega do agente que cometeu o delito à própria vítima ou a seus parentes, para sofrer a aplicação de castigos corporais e morte (BORGES, 2001, p. 23). Era uma forma arcaica de penalização, baseada nos costumes de cada tribo. Neste direito costumeiro indígena, tínhamos em diferentes estágios a vingança privada, a vingança coletiva e o talião (MIRABETE, 2002, p. 42). 37 O sistema de capitanias adotado na epóca do descobrimento não permitia a aplicação do direitopois havia ausência de poderes públicos juridicos e de repressão, no início do século XVII surgem as Ordenações Filipinas, onde era comum a pena de morte com requintes de crueldade, como aponta Mirabete (2002, p. (42) as Ordenações Filipinas refletiam o direito penal dos tempos medievais. Estatuto penal cruel que continha formas desumanas de aplicação das sanções, como a pena de morte, tortura, mutilação do corpo, confisco, e multa. Analisava-se além da gravidade da pena a qualidade de quem o cometeu. Aos pobres eram dados castigos cruéis e humilhantes, enquanto aos mais abastados, aplicavam-se penas de multa. Aponta Fragoso (1985, p. 60) que: As ordenações representavam bem o estado de justiça penal que vigorava ao surgir o movimento humanitário, à época do Iluminismo. Permaneceram no Brasil, mesmo após a independência, até o advento de nosso primeiro código penal, em 1830. Com a proclamação da Independência em 1824, promulgada assim Constituição tornou-se essencial um novo código penal, quando em 1830 o Brasil obtém o seu primeiro Código Penal autônomo o chamado Código Criminal do Império de 1830, era possuidor de influências iluministas e influências legislativas do código francês e o Código napolitano, de 1810 e 1819, embora as influências européias predominassem,o Código Criminal do Império de 1830 inovau com a exclusão da pena de morte por crime político, a imprescritibilidade das penas, a consideração do agravamento da pena diante do ajuste prévio de duas ou mais pessoas para a prática criminosa, previsão de atenuante no caso da menoridade, a introdução dos dias-multa na constrição patrimonial do delinquente, entre outras. A pena privativa de liberdade instituída pelo Código Criminal do Império, previa o surgimento da pena de prisão com trabalho, onde o condenado era obrigado a trabalhar dentro do próprio presídio. Foi então que em 1850, no Rio de Janeiro, surgiram as Casas de Correção com o objetivo de adaptar as prisões e previsões do Código Criminal do Império. Eram modernas instituições prisionais para a época, porém, as duas casas possuíam calabouços que serviam para açoitamento de escravos, abrigos para presos correcionais, não-sentenciados, índios, menores, desordeiros e vadios (SALLA, 1999, p. 399). 38 Dos poucos pontos negativos apresentados pelo Código Criminal do Império estão o da não previsão dos crimes culposos, adotada por lei em 1887, e a pena de açoite para os escravos, abolida somente em 1886 (FRAGOSO, 1985, p. 61). Nosso Código Criminal do Império de 1830 influenciou a legislação espanhola que serviu, mais tarde, de modelo para muitos Código penais na América Latina.Chegamos à República, e com a abolição da escravatura dois anos antes, em 1888, várias disposições foram afetadas, fazendo-se necessário a construção de novo arcabouço penal. Entretanto, feito aos atropelos e antes da primeira Constituição republicana, este Código Penal de 1890 foi remendado por diversas leis que, futuramente, foram reunidas na Consolidação das Leis Penais, em 1932. Em que pese todos os abalos e críticas à nova legislação, esta trouxe a importante inovação da abolição da pena de morte (BORGES, 2001, p. 30). Então em 1940 surge o Código Penal, reunindo ideias modernas da doutrina bem como as melhores indicações das Consolidações das Leis Penais de 1932. Nas palavras de Mirabete (2002, p. 43): Teve o Código origem em projeto de Alcântara Machado, submetido ao trabalho de uma comissão revisora composta por Nelson Hungria, Viera Braga, Narcélio de Queiroz e Roberto Lira. É uma legislação eclética, em que se aceitam os postulados das escolas clássica e positiva, apoveitando-se, em geral, o que de melhor havia nas legislações modernas de orientação liberal, em especial os códigos italiano e suiço. Seus princípios básicos, conforme assinala Heitor Costa Júnior, são: a adoção do dualismo culpabilidade-culpa e periculosidade-medida de segurança; a consideração a respeito da personalidade do criminoso; a aceitação excepcional da responsabilidade objetiva. Também são incorporados ao Código Penal de 1940 a pluralidade das penas privativas de liberdade (detenção e reclusão), o sistema progressivo para o cumprimento das penas privativas de liberdade, a suspensão condicional da pena e o livramento condicional. Não há no Código pena de morte nem prisão perpétua e o máximo da pena privativa de liberdade é de 30 anos (FRAGOSO, 1985, p. 66). O Código Penal de 19410 ainda serve como fonte de legislação penal, mesmo com suas modificações com a Lei n. 6.416 de 25 de maio de 1977 onde surgem novas disposições sobre a pena e sua execução. Em 1961 Nelson Hungria elaborou o anteprojeto de Código Penal Promulgado pelo Decreto-Lei n. 1.004 em 1969 para vigorar a partir 1º de janeiro de 1970, seu perído de vacância foi sucessivamente prorrogado por divergências político- 39 insitucionais da Junta Militar que governava em nosso país à época. Após quase dez anos de vacância, o Código Penal de 1969 foi finalmente revogado pela Lei n. 6.578 de 1978. 2.2 O Surgimento das Reformas Contemporâneas Em 1984 passa a vigorar a nova parte geral do Código Penal brasileiro. Obra legislativa que ganhou o seguinte comentário do mestre Mirabete (2002, p. 44): A nova lei é resultado de um influxo liberal e de uma mentalidade humanista em que se procurou criar novas medidas penais para os crimes de pequena relevância, evitando-se assim o encarceramento de seus autores por curto lapso de tempo. Respeita-se a dignidade do homem que delinquiu, tratado como ser livre e responsável, enfatizando-se a culpabilidade como indispensável à responsabilidade penal. Por meio da Lei 7.209, de 11 de julho de 1984, adotaram-se ideias básicas onde se desenvolveria todo o esquema proposto das reações criminais. A comissão elaborada em 1980 entendia que a Pena de morte é inadmissível num Estado social e democrático de Direito, e fora mantida a Pena de Prisão, ensejando a Pena privativa de liberdade nas formas de reclusão, para os ilícitos graves, e detenção, para os ilícitos menos graves. Fragoso (1985, p. 68) ainda aponta a: Extinção das Penas acessórias, passando a cominar Penas restritivas de direitos, distribuídas em prestação de serviços à comunidade, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana, assim também como a revisão das medidas de segurança, estabelecendo-se que as mesmas não poderiam mais ser dirigidas contra autores imputáveis. Dentre as vitorias alcançadas pela nova legislação esta a possibilidade de cumprir pena fora do cárcere na casa do albergado, evitando assim a convivência com presos de alta periculosidade em ambientes prisionais. Ocorre, porém que a casa do albergado nunca comportou todos os indivíduos, ocasionando que os indivíduos permanecessem trancafiados no regime semiaberto. Em que pese essas críticas, houveram outras quanto a nova lei penal, aponta Mirabete (2002, p. 44) que essas críticas estavam consubstanciada na: Insegurança resultante do progressivo aumento de violência urbana e criminalidade em geral que não encontrou resposta na nova lei que, neste passo, apenas possibilitou ao juiz a aplicação de penas mais elevadas nos crimes continuados praticados com violência e ameaça. Parece-nos criticável 40 também o repúdio ao critério da periculosidade e à ausência da distinção entre criminosos perigosos e não perigosos como tema básico para a aplicação e execução das penas e das medidas de segurança (a lei não se refere praticamente à periculosidade do agente). Essa omissão, que só não ocorre com o criminoso reincidente, pode dificultar ainda mais a repressão penal como forma de defesa social. Com a falta de lugares adequados para cumprimento do regime aberto e o aumento da criminalidade surge a lei Lei n. 8.072/1990 chamada de Lei dos Crimes Hediondos em virtude do clamor público face a expantosa elevação de crimes violentos, principalmente nos grandes centros, visando regulamentar o inciso XLIII do artigo 5º da Carta Magna estabelecendo também para os crimes de tráfego de entorpecentes e terrorismo, a impossibilidade de anistia, graça e indulto, fiança e liberdade provisória e a proibição de livramento condicional ou o aumento do prazo de cumprimento da pena para sua obtenção nos crimes nela enumerados, de natureza grave, especialmente praticados com violência ou grave ameaça. Com o fracasso da implantação do regime aberto de pena, como as casas de albergados, foi aprovada a Lei 9.714/98, alterando o sistema de penas de nosso ordenamento jurídico, ampliando o rol e das circunstâncias para aplicação de penas alternativas. Objetivava resolver a questão da superlotação carcerária, aplicando a pena como retributiva e sócio educativa. Houve alteração nos artigos 44, 45 e 46 e acrescentou-se regras aos artigos 43, 47, 55 e 77 do Código Penal, constando nesses dispositivos que a pena privativa de liberdade não seja superior a quatro anos ao crime doloso não cometido com violência ou grave ameaça à pessoa. Ao crime culposo, independente da pena imposta, ampliou o rol das penas restritivas de direito, onde incluiu a prestação pecuniária, a perda de bens e valores, a prestação de serviços à comunidade, interdição temporária de direitos de limitação de fim de semana, mantendo-se a autonomia e a substituição destas em relação às penas privativas de liberdade, por regra devendo possuir a mesma duração da pena substituída. Em seguida, a instituição dos Juizados Criminais Especiais pela Lei 9.099 de 1995 possibilitou a transação penal suspendendo o processo, com significativa redução do número de processos nas varas criminais, observa-se que todas essas medidas foram tomadas a pretexto de buscar a reinserção do apenado na sociedade e com menos custo para o Estado. 41 2.3 A Lei de Execução Penal com seus Objetivos e Aplicabilidade Parte-se do princípio de que a reintegração social do condenado é a partida para a prevenção de novas práticas delituosas. Tem-se em vista que, uma vez cumpridas as disposições criminais expostas na sentença condenatória, o apenado, dentro do regime que lhe foi imposto, passa a ter, em tese, a garantia estatal de ter para si, dentro deste sistema, todas as condições possíveis para sua reintegração. Em 29 de junho de 1983, a Lei de Execução Penal é aprovada pelo nº 7.210, promulgada a 11 de julho de 1984 e publicada no dia 13 seguinte, para vigorar concomitantemente com a Lei de reforma da Parte Geral do Código Penal, o que ocorreu em 13 de Janeiro de 1985. Sua aplicação se dá com o inicio da execução penal conforme seu artigo 1º “A execução da pena tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. Objetivou-se assim a integração social do condenado e do interno, visando a reinclusão social como escopo principal da execução penal, em que a meta principal da execução penal esbarra na incompatibilidade entre uma ação pedagógica reintegradora e o castigo que necessariamente deriva da privação da liberdade. Fragoso (1985, p. 300) aponta as falhas do sistema carcerário como meio de reintegração do indivíduo: Países desenvolvidos inverteram grandes somas em seus programas correcionais, construindo prisões que supunham ser capazes de ressocializar ou de emendar o condenado, sem qualquer êxito. As taxas de reincidência se mantêm, qualquer que seja a prisão. Demonstrou-se o efeito devastador do confinamento sobre a personalidade humana e a contradição insolúvel entre as funções de custódia e de reabilitação. (...) Como instituição total, a prisão necessariamente deforma a personalidade, ajustando-se à subcultura prisional. A reunião coercitiva de pessoas do mesmo sexo num ambiente fechado, autoritário, opressivo e violento, corrompe e avilta. (...) Nos tempos atuais a prisão ainda é constituída de uma realidade violenta, permeada por um sistema de justiça desigual e opressivo. Aponta Fragoso (1985, p. 301) que “o sistema será mais eficiente se evitar, tanto quanto possível, mandar os condenados para a prisão, nos crimes pouco graves, e se, nos crimes mais graves, evitar o encarceramento demasiadamente longo”. 42 3 O INSITUTO DA RESSOCIALIZAÇÃO INSERIDO NA LEI DE EXECUÇÃO PENAL A Lei nº 7210 de 11 de julho de 1984, Lei da Execução Penal, reúne em seus 204 artigos desde a sua justificativa de institucionalização, passando pelo tratamento dispensado ao preso até os procedimentos judiciais, o trabalho com o criminoso político e as prisões civil e administrativa, Enfim, prevê as condições para bem lidar com o preso, enquanto cumpre a pena a ele estipulada, tendo como objetivo dispor sobre as sentenças ou decisões criminais, ao mesmo tempo propiciando condições para uma (re) inserção do preso na sociedade. (DEQUES, 2003) Em seu art. 3º a Lei de Execução Penal trata da não descriminação a ninguém, incluindo nisso o preso. A não discriminação prevê igualdade de direitos para sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas. Já no Capítulo II da Lei, que trata da Assistência, tem como objetivo fazer do preso “uma pessoa com a intenção e a capacidade de viver respeitando a lei penal, procurando, na medida do possível, desenvolver no reeducando uma atitude de apreço por si mesmo e de responsabilidade individual e social com respeito à sua família, ao próximo e à sociedade em geral”. Em suma, obter os valores necessários para uma boa convivência social que regem as normas legais e segui-las de forma que possa conviver dignamente na sociedade. O dispositivo é considerado um grande avanço em termos de legislação, pois dispõe desde a assistência ao preso como um dever do Estado, como estende essa assistência às áreas material, de saúde, jurídica, educacional, social e religiosa, conforme seu art.11 é possível observar nos seus artigos subsequentes da Lei de Execução Penal, onde se esclarece sobre a prestação de assistência: material, contida nos arts. 12 e 13, sobre a assistência a saúde que todo preso tem direito trata o art. 14; sobre a assistência jurídica versam os artigos 15 e 16 e instituindo, no artigo 17 e subsequentes, sobre a assistência educacional, nela incluindo a formação profissional do preso: Art. 11 - A assistência será: I - material; Il - à saúde; III - jurídica; IV educacional; V - social; VI – religiosa (BRASIL, 1986). Art. 12 - A assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas. Art. 13 - O estabelecimento disporá de instalações e serviços que atendam aos presos nas suas necessidades pessoais, além de locais 43 destinados à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela Administração (BRASIL, 1986). Art. 14 - A assistência à saúde do preso e do internado, de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico. § 1º - (Vetado). § 2º - Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento (BRASIL, 1986). Art. 15 - A assistência jurídica é destinada aos presos e aos internados sem recursos financeiros para constituir advogado. Art. 16 - As unidades da Federação deverão ter serviços de assistência jurídica nos estabelecimentos penais (BRASIL, 1986). Art. 17 - A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado. Essa assistência refere-se às condições materiais, à saúde, às jurídicas, à educacional, à social e à religiosa; no trabalho penitenciário que não deve ser doloroso, nem mortificante, deverá ser um complemento do processo de reinserção social para prover a readaptação do preso, prepará-lo para uma profissão, inculcar-lhe hábitos de trabalho e evitar a ociosidade. E em seguida em outro capítulo há referências sobre deveres, direitos e disciplina dos internos, estão previstos entre a previdência social, o descanso e a recreação, a proteção contra o sensacionalismo, igualdade de tratamento; na disciplina estão previstas o poder disciplinar e as penas restritivas de direito, faltas disciplinares, sansões, recompensas, isolamento e detratação; também se conhece na Lei o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, o Juízo de Execução que trata das saídas e das medidas de segurança; o Ministério Público; do Conselho Penitenciário; do Patronato, da Penitenciária. Tais disposições têm embutidas, em si, um caráter pedagógico, deixando claro não só o respeito aos direitos humanos dos detentos, como a preocupação com uma eventual formação que o leve, em uma situação futura, ao exercício de uma cidadania plena. Nessa mesma perspectiva, o capítulo III trata do trabalho dos detentos, instituindo o seguinte: Art. 28 - O trabalho do condenado, como um dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva. § 1.º - Aplicam-se à organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e à higiene. O sistema penitenciário em todo mundo mostra-se em todas as esferas e tempos complexo e com dificuldades para cumprir seu papel que, não se limita a proteger a sociedade de pessoas julgadas criminosas, privando-os por tempo determinado da liberdade, mas, também tem a função de proporcionar ao preso condições de aprendizagem e ressocialização, objetivando assim o fim principal do sistema penitenciário recuperar o detento, para este após o cumprimento da pena, quando do seu reingresso na sociedade, saiba, além de respeitar a lei e se autossustentar, adquirir a capacidade de fazê-lo (BRASIL, 1986). Conforme Leão Júnior (2001, p.1): 44 A sanção penal é em essência retribuitiva porque opera causando um mal ao transgressor em virtude de haver violado a norma jurídica. Mas o magistério punitivo do estado não se funda na retribuição, no castigo, porquanto a pena deve ter por escopo a ressocialização do condenado, para reincorporá-lo na sociedade, e não lhe infligir sofrimento. Os tratadistas se inclinam a afirmar que a pena deve ser tanto uma medida de defesa da sociedade com deve ter um fim humanístico de correção dos criminosos. Em termos de legislação brasileira, a própria Constituição Federal de 1988 estabelece que, a execução da pena, além de se constituir numa atividade administrativa, adquiriu status de garantia constitucional, como se depreende do art. 5º XXXIX, XLVI, XLVII, XLVIII e XLIV, tornando o sentenciado sujeito de relação processual, detentor de obrigações, deveres e ônus, e também, titular de direitos, faculdades e poderes” (RJDTACRIM 32/422). Seguindo este mesmo fundamento, a ONU (1985) estabeleceu no documento “Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros” que a pena de prisão ou de qualquer medida privativa de liberdade tem como fim e também justificação, a proteção da sociedade contra o crime, sendo que este somente poderá ser alcançado, caso sejam proporcionadas ao preso, durante o processo de cumprimento da pena, condições para sua ressocialização e, após seu regresso à sociedade e “para” o alcance desse objetivo devem ser utilizados meios, em particular, recorrendo-se “(...) à assistência religiosa (...) à orientação e à formação profissionais, aos métodos de assistência social individual, ao assessoramento relativo ao emprego, ao desenvolvimento físico e à educação de caráter moral, em conformidade com as necessidades individuais de cada preso” (Regra, 66). Tais meios e condutas são devidamente seguidas pela lei de Execução Penal Brasileira (LEP, nº 7.210, de 11 de julho de 1984) (MARCÃO, 2004). Segundo Kuehne (2001, p.123) explica que a Lei de Execução Penal, em seu artigo 80, prevê a criação em cada comarca, de pelo menos um Conselho da Comunidade. Este Conselho é incumbido de fiscalizar os estabelecimentos prisionais, conversar com os presos, encaminhar mensalmente relatórios ao juiz da Vara de Execuções Penais e ao Conselho Penitenciário, e, ainda, procurar obter recursos que possam dar maior assistência ao encarcerado, atuando em conjunto com a direção dos estabelecimentos penais. Nesse sentido: É imprescindível a participação da comunidade desde que essa seja a principal, a primordial vítima da criminalidade, cabendo a esta sugerir e decidir sobre o melhor tratamento destinado aos presos, através de reuniões, discussões e diálogos, enfim programas e atividades que atendam às necessidades em clima de reciprocidade, atentando para os princípios morais 45 e éticos, sem preconceitos ou discriminações. Além disso, a comunidade deverá ser responsável pela fiscalização da Lei, sempre cobrando as reais condições de tratamento previstas para o condenado. (DEQUE, 2003, p.03) Com relação às penas, o Código Penal em seu capitulo V evidencia o sistema adotado, que é a progressividade da execução da pena, sendo essa forma observada de acordo com critérios objetivos e subjetivos, fazendo com que o condenado inicie o cumprimento de sua pena em determinado regramento carcerário, progredindo, do mais rigoroso ao mais brando (pelos regimes fechado, semiaberto e aberto). Deste modo, o condenado que ingressa numa penitenciária para o início do cumprimento de sua pena, o faz no regime fechado, ou na colônia agrícola ou industrial, no regime semiaberto, para ao final passar ao regime aberto, transferindo-se para a casa do albergado. O mecanismo básico, segundo o Código Penal, para a progressão encaminhando o condenado ou condenada a um regime menos severo, reside em ter cumprido um sexto da pena (requisito objetivo) quando primário. E quando gozando de bom comportamento (elemento subjetivo), após avaliação da comissão técnica de classificação. Em se tratando de progressão da pena, a Lei nº 8.072/90 estabelece que o cometimento de crime hediondo ou equiparado não poderá ser beneficiado por liberdade provisória e deverá cumprir pena em regime integralmente fechado. Não obstante, há várias decisões que concedem liberdade provisória quando ausentes os requisitos da prisão preventiva e concedem progressão de regime quando não tenha a sentença estabelecido de forma explícita ou implícita que o regime é integralmente fechado. Mezzomo (2005, p.135) explica, entretanto, o estabelecimento de um regime integralmente fechado não implica em tratar-se o apenado como um objeto. Regime não tem nada a ver com tratamento do preso. Não há incompatibilidade alguma. O apenado não perde a condição de titular de direitos, sem dúvida, e principalmente, não perde a condição de ser humano, como tal devendo ser tratado. Mas impedir-se a progressão de regime não significa dar-lhe outra condição que não esta. A Constituição Federal em momento algum estabeleceu a progressão como regra. Esta foi estabelecida por lei ordinária e pode ser proibida por lei ordinária sem qualquer espécie de ofensa à legalidade ou à Constituição. 46 4 A REINTEGRAÇÃO SOCIAL COMO META MAIOR De acordo com Foucault (1987, p. 133), além de possibilitar a aplicação de “castigos” em períodos determinados, através do estabelecimento de equivalências quantitativas “delito-duração” a prisão também se fundamenta pela função de transformar os indivíduos. Santo (2005, p.67), fundamentado em Foucault, explica que, até o principio do Século XIX, a prisão era utilizada unicamente como um local de contenção de pessoas – detenção. Não havia proposta de requalificar os presos. Esta proposta veio a surgir somente quando se desenvolveram dentro das prisões os programas de tratamento para requalificar os presos, mediante medidas educativas. Antes disso, não havia qualquer forma de trabalho, ensino religioso ou laico. Pensava-se que somente a detenção proporcionaria transformação aos indivíduos enclausurados. A ideia era que estes refizessem suas existências dentro da prisão para depois serem levados de volta à sociedade. Entretanto, percebeu-se o fracasso desse objetivo. Os índices de criminalidade e reincidência dos crimes não diminuíram e os presos em sua maioria não se transformavam. A prisão mostrou-se em sua realidade e em seus efeitos visíveis denunciadas como “grande fracasso da justiça penal” (FOUCAULT, 1987). A reinserção aparece como meio para minimizar os graves problemas que a prisão, sem qualquer forma de requalificação trouxe como consequência. Reeducar Como explica a reeducar envolve conceitos fundamentais como família, amor, dignidade, respeito, regras de convívio social, trabalho, educação, cidadania. O autor ainda enfatiza a necessidade de trabalhar o ato antissocial e as consequências desse ato, os transtornos legais, as perdas pessoais e o estigma social (GADOTTI 1999). A ideologia da ressocialização foi, originariamente, um movimento de reação a uma criminalidade de massas operárias pela falta de trabalho e o empobrecimento da população. Foi uma forma encontrada para minimizar as graves injustiças sociais contra pessoas mais pobres ou excluídas. Observa-se assim que um dos motivos que originaram a ressocialização não foram aspectos internos do sistema prisional, mas dos graves problemas da própria sociedade. É a ética evidenciada a partir de movimentos sociais e do trabalho de estudiosos que não se conformam com o tratamento diferenciado de acordo com a classe social, o credo, as etnias e etc. (FOUCAULT 1987). 47 A ideia de ressocialização implantada no sistema penal surgiu ainda no século XIX, com bases empíricas, especialmente quando se iniciou um processo de concepção humana das relações sociais e da própria cultura jurídica. A crença na racionalidade da observação impôs-se não só nas ciências, mas na totalidade da vida pública e cotidiana e iniciou-se a crença na inconstância do mundo e o seu domínio através da intervenção técnica. Esta crença favoreceu intensamente os fins penais preventivos; serviu-lhes de base a certeza de que se podiam influenciar os fenômenos da conduta desviante, do crime e da criminalidade –em longo prazo– através de intervenções empiricamente apropriadas. Nesse sentido: O que ocorreu é que a corrente iluminista passou a defender ideias mais humanistas em todas as áreas e o sistema jurídico não ficou de fora. Pensadores iluministas como Montesquieu, Voltaire, Rousseau e D’Alembert que prepararam o advento do humanismo e o início da radical transformação liberal e humanista do Direito Penal (LINS e SILVA, 2001. p.14). Outro fator que explica a ideia de reinserção de apenados é relacionado com o problema de legitimação do Estado moderno, responsável pelo poder punitivo, ou seja, todo o sistema jurídico é parte do Estado. Dessa forma, já que ele é responsável pelas punições aos cidadãos que infringem a lei, também deve prover estes de condições de recuperar-se de tal erro e ingressar novamente na sociedade de forma digna (HASSEMER 1982). Dessa forma o Estado moderno que se quer estruturar democrática e positivamente deve se orientar pelas consequências, que deverá comprovar que as intervenções incriminadoras produzem consequências favoráveis, que elas também se importam com os interesses mais relevantes dos afetados. Para uma justificação desta espécie é sobremaneira apropriada a ideia de ressocialização, afinal ela toma ao Estado sancionador o ódio do carcereiro e comunica-lhe a função de médico. A solução “cura em vez de penas”, não é só uma exigência particular da humanidade, ela é também um meio de fuga de uma crise de legitimação estatal, que leva à certeza de que a execução penal é o que o autor de um fato punível deveria esperar como racional. Conforme Linz e Silva (2001, p.14), os pensadores iluministas fundamentaram uma nova ideologia: o pensamento moderno, que repercutiria até mesmo na aplicação da justiça: à arbitrariedade se contrapôs a razão, à determinação caprichosa dos delitos e das penas se pôs a fixação legal das condutas delitivas e das penas. Os povos clamavam 48 pelo fim de tanto barbarismo disfarçado, onde os excessos praticados pelo Estado e pelas pessoas com poder passaram a ser criticados inicialmente por pensadores e, em seguida pela população. As penas injustas e diferenciadas também foram alvo das mais duras críticas e, assim, iniciou-se um processo de democratização do Estado e de humanização dos poderes e da própria justiça. No meio desse contexto, surge a ideia de que a pena imposta por um crime ou delito cometido, não poderia restringir-se a privação de liberdade apenas, mas sim deveria levar em conta os aspectos humanos, sociais e emocionais do apenado, sugerindo assim, que este poderia em seu tempo de permanência na prisão executar atividades que pudessem melhora-lo como ser humano, como profissional e como ser social e dessa forma, ao reingressar na sociedade ter menor possibilidade de incorrer novamente nos erros ou crimes cometidos. A ressocialização enfim, tem como objetivo a humanização da passagem do detento na instituição carcerária, implicando sua essência teórica, numa orientação humanista, passando a focalizar a pessoa que delinqüiu como o centro da reflexão científica. Damásio de Jesus (apud Silva, 2003) entende o modelo ressocializador como sistema reabilitador, que indica a ideia de prevenção especial à pena privativa de liberdade, devendo consistir em medida que vise ressocializar a pessoa em conflito com a lei. Nesse sistema, a prisão não é um instrumento de vingança, mas sim um meio de reinserção mais humanitária do indivíduo na sociedade. Esse modelo tem como característica a reinserção social da pessoa que cometeu a infração; onde a posição da vítima é secundária; admite progressão na execução da pena de acordo com o comportamento do condenado, iniciando-se no regime mais rigoroso até chegar ao regime mais ameno, sendo os regimes fechado; semiaberto; e, aberto, não necessariamente, o sentenciado inicia-se no regime fechado. O modelo ressocializador destaca-se por seu realismo, pois não lhe importam os fins ideais da pena, muito menos o delinquente abstrato, senão o impacto real do castigo, tal como é cumprido no condenado concreto do nosso tempo; não lhe importa a pena nominal que contemplam os códigos, senão a que realmente se executa nas penitenciárias hoje. Importa sim, o sujeito histórico, concreto, em suas condições particulares de ser e de existir. A progressão da pena, portanto, nada mais é do que o sujeito, a partir de um bom comportamento ter seus dias de reclusão diminuídos. Ou seja, é uma compensação pelo comportamento e a ressocialização também visa esse aspecto. O indivíduo que 49 estuda e trabalha pode ter reduzidos seus dias de pena de acordo com uma tabela préfixada em lei. O que parece estar evidente no modelo ressocializador das penas é ideia da natureza social do problema criminal. Aspecto este evidente já que o crime ocorre na sociedade e a afeta diretamente, sendo o Estado responsável não somente por punir, mas por encontrar meios de evitar, prevenir e corrigir tais atos, responsabilidade esta dividida também pela sociedade em geral e seus grupos, que colaboram na criação das regras sociais e das leis e, portanto, responsável também por seus efeitos. Considerando que a sociedade nem sempre dá aos indivíduos as mesmas oportunidades educacionais, profissionais e de relações e em muitas ocasiões prima por grupos os privilégios é também um pouco responsável pelos desvios de conduta que originam os crimes. Assim, deve buscar não somente as soluções políticas, sociais, legais e humanitárias para impedir o avanço da violência e do crime, como, quando eles ocorrem buscar meios para que o indivíduo apenado retorne a sociedade com oportunidades para não reincidir. Nesse sentido, salienta o eminente autor: O modelo ressocializador propugna, portanto, pela neutralização, na medida do possível, dos efeitos nocivos inerentes ao castigo, por meio de uma melhora substancial ao seu regime de cumprimento e de execução e, sobretudo, sugere uma intervenção positiva no condenado que, longe de estigmatizá-lo com uma marca indelével, o habilite para integrar-se e participar da sociedade, de forma digna e ativa, sem traumas, limitações ou condicionamentos especiais (MOLINA, 1994, p.383). Em uma sociedade que somente pode desenvolver-se com regras, a pena é necessária, porém, esta precisa ser efetiva de uma forma que possibilite o indivíduo apenado a recompor-se, e voltar ao convívio social de forma integra e integral. No Estado Social o castigo deve ser útil para a pessoa que cometeu o crime, o mais humano em termos de tratamento, não podendo tapar os olhos para os efeitos nocivos da pena, caminhando contra o efeito dissuasório preventivo (repressivo), que prefere ignorar os reais efeitos da pena. E, é nesse contexto, que a ressocialização se mostra como um caminho válido e positivo para minimizar os efeitos negativos da pena e reintegrar o apenado ao convívio social. Como explica com primor Falconi (1998, p. 163): A reinserção passa (...) pelo aprimoramento sociocultural do condenado, enquanto naquela condição. Ali, deverá receber tratamento para as eventuais doenças psicossomáticas, treinamento profissional e condicionamentos 50 elementares à vida em uma sociedade aberta. Quando libertado, deverá ter à sua disposição ampla e eficaz infraestrutura para que materialmente se realize tudo aquilo que formalmente lhe foi transmitido. Para tanto nunca é demais repetir, torna-se imperiosa a criação material desses órgãos já previstos, mas não devidamente implantados, quando não é o caso de sequer iniciado o programa de implantação, como é o caso dos patronatos. Os estudos em defesa da ressocialização e reinserção social efetivados nos presídios, portanto, são inúmeros, porém, a realidade ainda está longe que conseguir programar medidas eficazes nesse sentido. 4.1 A Assistência do Egresso e suas Principais Características Considera-se egresso, nos termos do art. 26 da Lei de Execução Penal: “I - o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da saída do estabelecimento; II- o liberado condicional, durante o período de prova” (BRASIL, 1986). Portanto, o egresso do sistema prisional é todo aquele que cumpriu sua pena e está ou em estado de condicional, parcialmente liberado de sua dívida para com o Estado e a sociedade, bem como aquele liberado definitivamente, isto que cumpriu sua pena total. Esse é considerado egresso pelo período de um ano a cantar da data da saída. Já o preso, evidentemente, é aquele que se encontra recolhido em estabelecimento prisional, cautelarmente ou em razão de sentença penal condenatória com trânsito em julgado. Portanto, preso provisório ou definitivo. O trabalho de ressocialização envolve tanto o apenado e é nesse contexto que inicia quanto o egresso e envolve entre as diversas questões sociológicas, filosóficas, e jurídicas, a questão da assistência social e reinserção social. Consoante dispõe o art. 10 da Lei de Execução Penal, "a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade". E arremata o parágrafo único: "a assistência estende-se ao egresso”. O objetivo da assistência, como está expresso, é prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Portanto, a assistência não se restringe somente ao egresso, mas inicia-se na prisão através de ações ressocializadoras. A assistência aos condenados e aos internados é exigência básica para se conceber a pena e a medida de segurança como processo de diálogo entre os destinatários e a comunidade. A assistência ao egresso consiste em orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade e na concessão, se necessária, de alojamento e alimentação em estabelecimento adequado, por dois meses, prorrogável por uma única 51 vez mediante comprovação idônea de esforço na obtenção de emprego (MARCÃO, 2001). A assistência ao egresso, portanto, é medida de extrema necessidade, na forma de moradia temporária, de empregabilidade, de regularização de sua documentação civil, trabalhista, eleitoral e militar e de gradual adaptação às condições da vida em liberdade. A maioria dos Estados brasileiros, porém não dispõem de serviços ou lugares que sirvam de referências para os egressos e os auxiliem na obtenção dessas e outras necessidades. Sobre este posicionamento Silva (2001, p. 45), se pronuncia afirmando que: Inexplicavelmente não temos uma única casa de albergado na maior metrópole do país. O serviço público de atendimento a egressos não consegue atender mais do que 5% da demanda, deixando milhares de pessoas e suas famílias ao desamparo e a mercê da própria sorte. As iniciativas das empresas nesse campo podem ser fundamentais para alterar esse cenário. Cabe, destarte, ao Estado, no período determinado em lei dar assistência ao egresso, de forma que o mesmo possa reingressar na sociedade de forma a ter as mínimas condições de sobrevivência digna e isso implica necessariamente em um trabalho de ressocialização que deve se iniciar intramuros, envolvendo educação, trabalho, assistência de saúde e psicológica. A assistência ao apenado e ao egresso é uma das funções de ressocialização e é parte do contexto de inclusão ou reinserção social. A reinserção social objetiva criar a possibilidade de facultamento dos meios necessários e adequados para que, assim, o preso tenha condições de voltar ao convívio social. (RODRIGUES 1982) Importante esclarecer em que consiste cada uma das espécies de assistência em obediência aos princípios e regras internacionais sobre os direitos da pessoa presa, especialmente as que defluem das regras mínimas da ONU (item 41 da Exposição de Motivos da LEP). “A assistência a ser prestada, conforme elenca o art. 11 da Lei de Execução Penal, será: I - material; II - à saúde; III - jurídica; IV - educacional; V social; VI – religiosa”. A abordagem deste estudo tratará efetivamente dos aspectos relativos à assistência educacional e, dirigindo-se também as questões de trabalho e profissionalização. Os meios para promover a assistência ao egresso e a reinserção social não diferem dos da sociedade externa à prisão. Assim, enfoca-se o trabalho como um fator 52 determinante de segurança, de estabilidade, de estruturação individual e social; fator determinante de inclusão / exclusão (inserção e de reinserção), especialmente quando se leva em conta a exclusão social externa, ou seja, quando a própria sociedade exclui em termos de oportunidades de trabalho, de educação, de renda, etc. (SILVA 2003). Dessa forma, quando se pensa em prisão, pena e ressocialização, deve-se levar em conta a complexidade da sociedade e o modelo de exclusão e discriminador que a própria sociedade possui o que explica, em parte, os graves problemas criminas e de delinquência que existem hoje e que sobrecarregam o sistema judiciário e prisional. O sistema prisional pode inserir em seu contexto, aspectos que a própria sociedade e o Estado não têm cumprido: de oportunizar todas as condições de vida dignas. Como explica Mezzomo (2005, p.127) falar-se em ressocialização e reinserção social é uma perspectiva profundamente paradoxal em relação a um direito penal humanitário e do fato. Fala-se do apenado como se ele estivesse fora da sociedade, como se seus valores devessem ser mudados. Ora, em um Estado Democrático cada um pode ter os valores, certos ou errados, que quiser cultivar. Ninguém, nem mesmo o Estado pode obrigar quem quer que seja a ter determinado valor como correto. O que o Estado pode isso sim, é exigir determinado comportamento, comissivo ou omissivo, em vista da prejudicialidade em relação a outras pessoas ou mesmo ao próprio Estado. A pretendida ressocialização, portanto, se mal aplicada pode implementar uma violência psíquica contra o apenado, tomando-o verdadeiramente violento. O indivíduo não tem o dever de pensar de determinada forma, ele tem o dever de comportar-se de determinada forma sob pena de sanção. Ele não pode ser obrigado a reinserir-se em um status quo. Em síntese, a pena não pode ter uma função educativa, pelo simples fato de que uma medida de força do Estado não pode ser utilizada para compelir o indivíduo a pensar desta ou daquela forma. Isso é arbitrariedade. Conforme Rodrigues, 1982, p. 29: O Direito Penal assume a função de proteção da sociedade, sem, entretanto, modificar ou alterá-la, clarificando, assim, a concepção de ressocialização que pressupõe repassar ao preso o mínimo ético indispensável à conveniência em sociedade. O crime, nessa perspectiva, é tido como um déficit de socialização. Então, a prisão deve ser o espaço onde haja um programa de ressocialização que visa integrar o indivíduo no mundo dos seus concidadãos, sobretudo nas coletividades sociais básicas como, por exemplo, a família, a escola ou o trabalho, proporcionando o auxílio necessário que o faça ultrapassar a situação de defasa mento social em que se encontra. 53 Portanto, a reinserção social visa, antes de tudo, dar uma oportunidade ao preso de realizar o que a sociedade não lhe concedeu, como estudo e profissão, mas isso não pode ser imposto e sim oportunizado ao detento. 54 5 EDUCAÇÃO E TRABALHO PARA EGRESSOS E SEUS FUNDAMENTOS A educação no sistema penitenciário é iniciada a partir da década de 1950. Foucault (1987, p. 224) diz: “A educação do detento é, por parte do poder público, ao mesmo tempo uma precaução indispensável no interesse da sociedade e uma obrigação para com o detento”. O Art. 6º da Constituição Federal de 1988 preconiza que “São direitos sociais: a educação, a saúde e o trabalho [...]”. Já no artigo 205, consigna por sua vez, que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Esse artigo da Constituição indica claramente que todos possuem inclusive os presos, direito à educação, mesmo a educação formal. O Estado tem o dever de criar mecanismos para que essa condição seja atendida e com qualidade. Mirabete (2002, p. 73) é enfático quanto a este aspecto: A assistência educacional deve ser uma das prestações básicas mais importantes não só para o homem livre, mas também àquele que está preso, constituindo-se, neste caso, em um elemento do tratamento penitenciário como meio para a reinserção social. Isso também está claro na Resolução 1990/20 do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, que trata da educação nas prisões, recomendando que todos os presos devem ter acesso à educação, inclusive a programas de alfabetização, educação fundamental, formação profissional, atividades criativas, religiosas e culturais, educação física e desportos, educação superior e bibliotecas. A mesma Resolução enfatiza, ainda, que "a educação nas prisões deve visar ao desenvolvimento da pessoa como um todo, tendo em mente a história social, econômica e cultural do preso”. A Seção V da Lei de Execução Penal trata da Assistência Educacional e informa que esta deve abranger a instrução escolar e também a formação profissional, a obrigatoriedade do ensino de primeiro grau e como elas podem ser realizadas. Nesse sentido: Assim, os sentenciados presos sem instrução de primeiro grau têm o direito, como qualquer pessoa, de recebê-la do Estado. É mister que, nos estabelecimentos penais, haja escola ou um dos substitutivos da escola (na configuração tradicional) que atualmente existem, [...] pelas escolas públicas 55 ou particulares que ofereçam cursos especializados [...]. (MIRABETE, 2002, p. 74). O ensino profissionalizante não possui o caráter da obrigatoriedade, como no caso do ensino fundamental, mas deve ser igualmente estimulado nos ambientes prisionais e sua importância não deve ser relegada a segundo plano. (SILVA e INOCÊNCIO, 2005). Onde conforme o autor: A habilitação profissional é uma das exigências da função das funções utilitárias da pena, pois facilita a reinserção do condenado no convívio familiar, comunitário e social, a fim de que não volte a delinquir. Assim, se houver continuadamente grande número de sentenciados em condições de receber o ensino técnico de habilitação profissional, o estabelecimento penal deverá manter o funcionamento da escola destinada a essa formação. (MIRABETE, 2002, p. 75). É dever do Estado inserir e estimular o apenado ao ensino fundamental, mas também viabilizar a possibilidade de ensino profissionalizante. Quando se observa o contexto do sistema prisional e do preso em si, é possível perceber que são indivíduos com poucas possibilidades de escolher uma profissão e com poucas habilidades em geral. Por outro lado, é importante pensar no apenado como alguém que possui família, necessidades básicas e que pode desejar conseguir atender essas necessidades por seu próprio esforço. Mesmo estando preso, deve ser ofertadas condições para que possa exercer uma função remunerada, a fim de prover seu sustento e o dos seus, assim como aprender novas atividades e aperfeiçoar as que já conhecem. Nesse sentido: Os presos se configuram como trabalhadores que se encontram, em sua grande maioria, ociosos, trabalhadores necessitados de políticas que supram suas necessidades básicas, bem como, de suas famílias, e que precisam nesse período de vida, - de extrema fragilidade existencial - ter, na penitenciária, um espaço de redescoberta de seu potencial enquanto ser humano, um espaço de educação pelo trabalho. (MIRABETE, 2002, p. 99) O trabalho é um dos fatores importantes da autoestima, da confiança em si mesmo e das possibilidades de desenvolvimento intelectual, moral e social. Por outro lado, ele influencia diretamente nos relacionamentos e permite a própria evolução humana e a da sociedade. (HERZEBERG , 1975). Como afirma Souza et al (apud PINTO, 2002, p. 26): 56 O trabalho prisional deve atender ao princípio do interesse social, acima dos resultados econômicos. Isto porque, a maior contribuição da atividade laboral sistemática reflete no comportamento do detento, seja porque provoca redução dos níveis de estresse da população carcerária, melhorando o ambiente do presídio, seja porque evita a ociosidade e, sobretudo, por se constituir em promissora perspectiva de absorção pelo mercado de trabalho, quando do retomo desse segmento, ao convívio familiar e social. O trabalho é importante para a manutenção individual, pois é necessário ao abastecimento material e ao desenvolvimento social, além de um forte estimulante da remição da pena. Dentro dos limites de segurança e saúde, possibilita a satisfação das necessidades básicas e, segundo o autor, associa aspectos como necessidades fisiológicas, cognitivas, de motivação e de desenvolvimento. O trabalho surge como um elemento ainda maior, pois constitui um mecanismo por meio do qual se poderá manter ou ampliar a capacidade produtiva do detento, restabelecer seu amor-próprio, paralelamente possibilitando sua preparação para o acesso ao mercado de trabalho. (MACGREGOR, 1973) O trabalho em estabelecimentos prisionais é de necessidade primordial. No Brasil, até 1995, cerca de 55% dos presos não trabalhavam. O trabalho é visto como fator determinante de segurança, de estabilidade, de estruturação individual e social: fator determinante de inclusão/exclusão (inserção e de reinserção). O trabalho mostra-se um facilitador da reinserção do preso na sociedade. (VASCONCELOS 2001). Assim, o trabalho realizado com e pelo preso pode ser resumido em dois aspectos: o ocupacional e o humano. O aspecto ocupacional refere-se ao trabalho propriamente dito, isto é, à atividade que planeja e executa o trabalho, colhendo seus resultados. Geralmente, seu progresso e resultado podem ser quantitativamente reconhecidos. O outro aspecto é o ser humano. Esse se refere á atividade voltada para o homem, visando manter a confiança entre o preso e o administrador do presídio e dos presos entre si. A Human Rights Watch (HRW, 2002, apud PINTO, 2002) considera que, de acordo com a Lei de Execução Penal, todos os presos condenados devem trabalhar. No entanto, deve-se observar que as obrigações legais com relação ao trabalho prisional são recíprocas: da mesma forma que os detentos têm o direito de trabalhar, as autoridades carcerárias devem lhes as oportunidades de trabalho. Portanto, o trabalho é uma oportunidade que deve ser dada ao preso e não uma imposição. Esse processo obviamente não é fácil, dado que muitos dos apenados têm problemas emocionais, falta de instrução, dificuldades de relacionamento e não compreendem a importância do trabalho em suas vidas. Por isso, a função reintegradora 57 envolve outras dimensões como a educação, o trabalho psicossocial e a busca de novo sentido a sua vida. Desse modo, conforme preconizam os autores: Deve-se ressaltar que o reduzido número de detentos empregados é resultado da escassez de oportunidades de trabalho, e não de falta de interesse da parte dos detentos. Para começar, de acordo com a LEP o trabalho deveria ser obrigatório, e não opcional. Mas ainda mais convincente, na prática, é o incentivo criado pela própria lei para a redução de sentenças. De acordo com esse dispositivo legal, para cada três dias de trabalho, um dia deve ser debitado da sentença do detento. Ansiosos para sair da prisão o mais rápido possível, quase todos os detentos estão dispostos a trabalhar, mesmo sem receber. Na verdade, os detentos reclamaram muitas vezes da falta de oportunidades de trabalho. A escassez de trabalho nas carceragens das delegacias é uma das muitas razões pelas quais os detentos se revoltam para serem transferidos para as prisões (HRW, 2002, apud PINTO, 2002, p. 20). Os fundamentos que justificam a implementação de projetos para o trabalho de detentos, portanto, são: a ocupação do tempo ocioso na prisão; o ensino de atividades profissionais; o seu sustento e de seus familiares; a melhora da autoestima e, especialmente a sua preparação para quando voltar ao convívio social. Hoffmann (1992, p.78) destaca os seguintes aspectos do trabalho do detento: a) Incentivo às atividades ocupacionais que visem à empregabilidade quando da saída do Sistema Penitenciário; b) Implementação de técnicas de escoamento da produção e comercialização do trabalho no ambiente prisional, em relação aos produtos resultantes de atividades industriais, agroindustriais, agrícolas, manuais e artesanais, por meio de parcerias com Entidades Especializadas; c) Favorecimento a uma cultura de associativismo e cooperativismo junto aos egressos do Sistema Penitenciário, através de parcerias com instituições e Organizações Não governamentais; d) Incentivo a projetos de geração de renda para os detentos, egressos e familiares, com aplicação de métodos de empreendedorismo, como: capacitação gerencial apoio a microcrédito e assessoramento técnico ao segmento; e) Estímulo a trabalhos que valorizem a aptidão, a habilidade, as condições físicas e mentais, a profissão anterior dos detentos, bem como, as oportunidades oferecidas pelo mercado; f) Segurança da percepção de uma remuneração adequada ao trabalho interno e externo realizado pelo detento; g) Garantia de mecanismos de proteção às questões de segurança e saúde no trabalho dentro das unidades prisionais; h) Estímulo à vinculação do trabalhador preso ao sistema previdenciário, por meio da contribuição como autônomo. Programar sistemas de gestão empreendedora no sistema carcerário, a fim de proporcionar ao preso condições de sobrevivência segura e digna, constitui função do Estado e tem sido efetivamente pouco praticada. Quando do cumprimento da pena e sua 58 reintegração na sociedade, outros problemas surgem: quem vai garantir-lhe um emprego? Como a sociedade irá recebê-lo? Que condição terá para que sua efetiva reintegração social ocorra? O trabalho intramuros, por mais eficiente que seja, nem sempre garante essas condições. Em alguns poucos casos o ex-presidiário sai do presídio já com emprego garantido. Mesmo assim, em muitas situações, especialmente quando o período da pena foi muito longo, sua reintegração social é muito difícil, principalmente quando a própria família não o aceita de volta. É então necessário o estabelecimento de políticas e ações que promovam intermediação para a reintegração, que é também uma função do Estado e que não é cumprida. A assistência ao egresso, portanto, é medida de extrema necessidade, na forma de moradia temporária, de empregabilidade, de regularização de sua documentação civil, trabalhista, eleitoral e militar e de gradual adaptação às condições da vida em liberdade. A maioria dos Estados brasileiros, porém, não dispõem de serviços ou lugares que sirvam de referências para os egressos e os auxiliem na obtenção dessas e outras necessidades essenciais a uma vida digna. Sobre este posicionamento Silva (apud SILVA e INOCÊNCIO, 2005, p. 29), se pronuncia afirmando que: Inexplicavelmente não temos uma única casa de albergado na maior metrópole do país. O serviço público de atendimento a egressos não consegue atender mais do que 5% da demanda, deixando milhares de pessoas e suas famílias ao desamparo e a mercê da própria sorte. As iniciativas das empresas nesse campo podem ser fundamentais para alterar esse cenário. A sociedade civil organizada tem timidamente procurado cuidar da defesa e promoção de direitos (OAB, ONGs, universidades e entidades de direitos humanos) e da “reabilitação” do preso (igrejas). Já as empresas, por convite de dirigentes penitenciários ou por iniciativa própria, descobriram a possibilidade de utilizar a mão de obra do preso, servindo-se da infraestrutura dos estabelecimentos prisionais, apresentando motivações simplistas: perspectiva de utilização de mão de obra constante e barata ou a intenção de realizar a filantropia. (SILVA e INOCÊNCIO 2005). A utilização da mão de obra de presos é legal, necessária e algumas ações podem ser desenvolvidas pela empresa que utiliza ou pretende utilizar essa mão de obra, se o objetivo for o de exercer sua responsabilidade social. Os primeiros passos passam por pagamento justo e digno e por ações educativas. 59 Para isso, a empresa deve, segundo Silva (2001, p.21): [...] remunerar o preso-trabalhador por produção, e não apenas por salário fixo; fornecer uniformes e equipamentos de segurança e de proteção; fornecer transporte e alimentação; prestar assistência aos filhos e à família do preso-trabalhador; inserir o preso-trabalhador na cultura do trabalho; incluir o preso-trabalhador ou sua família em planos de assistência médica; proporcionar oportunidades de capacitação e de aperfeiçoamento profissional; subsidiar treinamentos que visem o aprimoramento técnicoprofissisonal; assegurar emprego após a obtenção da liberdade. Por sua vez, Silva (2001, p. 18) recomenda: Pode-se incluir no rol da defesa de direitos toda e qualquer ação empresarial que vise assegurar ao preso direito não atingido pela sentença de condenação. Investimentos em educação, profissionalização, trabalho, saúde, artes, cultura e esportes visam elevar o grau de capacitação da pessoa para enfrentar a vida, caracterizando-se como uma promoção de direitos. Ainda que algumas ações da sociedade civil tenham mostrado um claro direcionamento para incentivar as medidas de ressocialização, a sociedade em geral ainda é muito discriminadora e tem sido motivadora de muitos casos de reincidência. Raramente aceita o egresso, mesmo após este ter cumprido sua pena, excluindo-o e não lhe dando oportunidades de levar uma vida digna. Isso denota a complexidade do problema e indica a real necessidade de uma reinserção de valores e conceitos da própria sociedade. Como defende Pinto (2002, p. 14): Desse contexto, vem o entendimento de que existem aspectos sociais prévios, decorrentes de situações associadas a fatores como educação, economia e outros, que, uma vez levando aos primeiros procedimentos delituosos, desenvolvem um movimento de retroalimentação dos procedimentos originais, tornando difícil o processo de reintegração do indivíduo à sociedade, agora pela ação discriminatória. O último censo do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), feito em 1995, revelou que 85% dos presos são reincidentes. Alega-se que os números não são precisos, por falhas na metodologia de pesquisa. O que se subtende, porém, é que de cada dez presos nas cadeias brasileiras, entre cinco e sete já teriam passado pelas mãos do Estado, que perdeu a chance de procurar afastá-lo do crime. Alega-se ainda, que a maioria da população carcerária é formada por pequenos assaltantes ou traficantes sem poder na hierarquia da vida delituosa. Ao entrar pela primeira vez numa prisão, selam 60 seu destino. Mesmo depois de cumprir pena e “acertar” as contas com a Justiça e, por extensão, com a sociedade, dificilmente voltam a conseguir emprego e retornam à prisão (DO RIO, 2002). No entanto, o que se observa, é que essa “reeducação” que pretende o Estado, não existe na prática. Ao contrário, o sistema mostra-se ineficaz, produzindo ainda mais o crime e tratando o preso com indiferença. Tal situação se prolifera com a conivência do Estado, permitindo a perpetuação de uma cultura arcaica. De acordo com Frei Betto (apud KOTSCHO, 2003, p.41): O sistema penitenciário, tal como ele existe na sociedade capitalista, principalmente aqui no Brasil, é extremamente cruel, não só porque confina fisicamente o homem, sem que esse homem possa compreender o problema da liberdade, senão em relação à sua locomoção física, mas ele destrói a subjetividade do homem, no sentido de não lhe oferecer nenhuma possibilidade de racionalização da situação em que se encontra. Na prática, portanto, como entende Leal (apud PINTO, 2002), no Brasil existe um claro descompasso entre o que diz a norma jurídica e a realidade das prisões, no que concerne à aplicação dos Direitos Humanos. No entanto, a Lei de Execução Penal e a própria Constituição evidenciam e enfatizam os Direitos básicos ao respeito e à sua dignidade, estabelecendo direitos como: cumprimento da pena em estabelecimentos distintos conforme o tipo de crime, idade e sexo do apenado, garantia da integridade física e indenização por erro judiciário, dentre outros aspectos. Embora o Legislador Ordinário, ao editar a Lei 7.210/84, Lei de Execução Penal, o tenha feito com bastante sapiência, o Poder Executivo não se aparelhou para executar devidamente os comandos insculpidos nos seus 204 artigos. Diga-se, se fossem bem executados, certamente poderiam ter impedido que o sistema penitenciário apresentasse o caos que hoje ostenta. Como exemplifica o eminente desembargador: É público e notório que o sistema carcerário brasileiro ainda não se ajustou à programação visada pela Lei de Execução Penal. Não há, reconhecidamente, presídio adequado ao idealismo programático da Lei de Execução Penal. É verdade que, em face da carência absoluta dos presídios, notadamente no Brasil, os apenados recolhidos sempre reclamam mal-estar nas acomodações, constrangimento ilegal, impossibilidade de readaptação à vida social. Por outro lado, é de se sentir que, certamente, maior seria a reposição à convivência da sociedade de apenado não recuperado provadamente, sem condições de com ela 61 coexistir (HC 14.467-T). Pleno – j. 7-8-1996-Rel. Des. Amaury Moura (RT736/685). É necessário não somente condenar e prender quem comete um delito. É essencial dar condições de reabilitação e de reinserção social. Porém, na prática, a falta de recursos físicos e humanos, a não capacitação dos colaboradores das prisões, a não elaboração de projetos de reinserção social, a ausência de políticas públicas coerentes e, em um âmbito mais geral, o caos social, a discriminação, as políticas econômicas excludentes, o desemprego que geram mais violência e um excessivo número de presos, parecem impedir ações reintegradoras. O tema, portanto, é complexo e não cabem medidas paliativas. Exige o envolvimento do Estado e da sociedade na busca de efetivar ações coerentes de ressocialização e efetivamente eficazes. É assim cumprida a legislação vigente. De acordo com Silva (2003, p.132), é notório que nas prisões brasileiras pouco há de eficácia e isto ocorre em razão do baixo número de profissionais capacitados para traçar o perfil do preso e para indicar para ele o tratamento penal de acordo com o seu perfil, por meio de subjetividade, observando os motivos e as circunstâncias que o levaram a cometer o delito. Um dos aspectos fundamentais, quando se pretende reinserir socialmente o preso, é a preparação dos colaboradores. É essencial, para minimizar essa distorção, a obrigatoriedade de criação em todos os estabelecimentos prisionais um quadro de técnicos, como almejou o legislador ao lapidar a Lei de Execução Penal. Esse quadro deve ser composto por profissionais do ramo de direito, psicologia, serviço social, e medicina. Enfim, profissionais com treinamento direcionado para atuação dentro do sistema penitenciário. Busca-se, com essa medida, valorizar o sujeito recluso, ao tempo em que se implanta uma política de prevenção dentro dos presídios. Ganha assim o Estado, a sociedade e o próprio infrator, pois este terá mais possibilidade de reabilitação e, consequentemente, diminuir a probabilidade reincidir. 5.1 Ações Reintegradoras Visando Minimizar a Reincidência Conforme afirma Pinto (2002, p.74), observa-se que o trabalho, a educação e o treinamento profissional dos detentos desempenham um papel significativo na estratégia de reabilitação dessa Lei. Aprendendo um ofício ou profissão e adquirindo bons hábitos de trabalho, um detento pode aumentar muito suas chances de se integrar com sucesso à 62 sociedade após ser solto. Não obstante, apenas uma minoria entre os detentos brasileiros tem a oportunidade de trabalhar. As oportunidades de educação e treinamento são poucas e muitas vezes oferecem poucas chances de uma ação construtiva para suas energias. De acordo com Silva (2001, p. 17), algumas iniciativas e investimentos nesta área podem permitir a inversão do atual papel das prisões, a saber: Aperfeiçoar os mecanismos de gestão penitenciária; aperfeiçoar a formação do pessoal penitenciário; maior eficiência da legislação penal e da Justiça criminal; maior eficácia para a pena de privação da liberdade; aperfeiçoar os mecanismos de informações e estatísticas criminais; dotar a prisão dos meios necessários para o cumprimento de sua missão; proporcionar tratamento terapêutico à pessoa presa; criar meios para a autossustentabilidade do preso e de sua família; intervenção nos fatores que dificultam a reinserção social do presidiário; intervenção nos fatores que alimentam a reincidência criminal; criar mecanismos que viabilizem, gradualmente, a substituição da pena de privação da liberdade pelas chamadas penas alternativas. Argumenta Macgregor (1973, p.58), o modelo de cumprimento progressivo da pena possibilita que sejam implementados projetos relativos à profissionalização do preso, mediante um processo de formação contínua, que vai desde a aplicação de testes de habilidade profissional, passando pelo recrutamento, seleção, treinamento e empregabilidade. Todas essas fases, segundo a autora, devem estar de acordo com a progressão da pena de forma que, ao ter cumprido sua pena tenha descoberto sua vocação, ou suas habilidades, tenha apreendido o valor do trabalho para a vida e para sua ressocialização, bem como possa reingressar na sociedade com autoestima e conhecimento necessário para buscar um trabalho que o possibilite seus sustento e/ou de seus familiares. Nesse sentido: O trabalho prisional deve atender ao princípio do interesse social, acima dos resultados econômicos. Isto porque, a maior contribuição da atividade laboral sistemática reflete no comportamento do detento, seja porque provoca redução dos níveis de estresse da população carcerária, melhorando o ambiente do presídio, seja porque evita a ociosidade e, sobretudo, por se constituir em promissora perspectiva de absorção pelo mercado de trabalho, quando do retomo desse segmento, ao convívio familiar e social. (SOUZA et al., 2002, p. 2). Por outro lado, as parcerias com empresas para que os apenados possam trabalhar e ter possibilidades reais de, ao sair da detenção manter-se empregados, é fundamental. A utilização de mão de obra de presos é legal e tem se mostrado eficiente, desde que, seja permitido um salário justo, de acordo com suas funções. Além da educação formal, ao preso também lhe é dado o direito legal de trabalhar, aspecto 63 também deficitário no sistema prisional brasileiro. Ainda que em regiões bem segmentadas, alguns modelos de parceria entre presídios e empresas privadas têm mostrado que o trabalho, devidamente remunerado do detento o estimula e auxilia de forma direta na sua ressocialização e não reincidência, além do benefício da redução da pena que motiva o preso a não voltar ao crime, como também diminui os gastos do estado e a quantidade de presos amontoados nos presídios. Como bem explica Barros et al. (2000,p.89): Ao encontro das disposições da Lei de Execução Penal, iniciativas vêm sendo empreendidas em diversos institutos prisionais do País, como é o caso do “Programa de Trabalho” desenvolvido pela Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso do DF – FUNAP, desenvolvido entre 1989 e 1998, cujo objetivo era “qualificar a pessoa presa para o trabalho intramuros e extramuros, ao mesmo tempo preparando-a para a (re) inserção no mercado de trabalho e fortalecendo os vínculos familiares”. A Human Rights Watch (HRW, 2002 apud PINTO, 2002) considera que nos institutos prisionais cujas oficinas são controladas pela FUNAP, os presos trabalham em serviços de costura e carpintaria. De maneira geral, porém, o tipo de trabalho oferecido aos detentos varia, na maioria das prisões, entre manutenção, limpeza e reparos, ao emprego em companhias particulares, as quais contratam detentos para produzir itens como pastas, caixas e cadernos. Portanto, aliada ao trabalho ou não, a questão da educação é outro aspecto fundamental na reinserção do preso na sociedade e nas possibilidades de não reincidência do egresso. Silva e Inocêncio (2005, P.95) entendem que a educação e o trabalho para os detentos não podem ser vistos como uma concessão ou benemerência. Não se trata, portanto, de exercício de filantropia por parte de alguns ou concessões do Estado, pois são direitos previstos em lei, carecendo tão somente de exigir a sua implementação ou observância. Na questão da educação aos detentos, vê-se hoje que, pelo formato da educação de jovens e adultos, é possível inserir o detento neste programa tanto por meio da inserção de professores no interior das prisões, como pela possibilidade de o detento dirigir-se a um Centro de Educação para Adultos para cumprir o currículo. De outra forma, cabe, quando o preso cumprir sua pena, que continue seus estudos, caso não o tenha concluído durante o cumprimento da pena. 64 O coexistir, a valorização do ser humano, pode ser percebida com precisão no presídio quando não foram vistos cadeados nas celas, ou melhor, nos cubículos, quando o ir e vir dos reeducandos nos espaços abertos para tomar sol é constante, quando os agentes prisionais e o diretor conversam tocando carinhosamente no ombro dos reeducandos; quando com alegria é comunicado a uma reeducanda que o ‘Alvará de Soltura’ tinha sido deferido e que a mesma estava em liberdade e todos, espontaneamente festejaram. Constatamos que o ser humano quando valorizado, respeitado e partícipe de uma proposta organizada e coerente de valorização, aprende partilhar, viver em comunidade vivem em comunhão, sem a ‘marca’ da exclusão (CAMPESTRINI, 2002, p. 16). Falconi (1998, p.64) explica que os trabalhos de reeducação do detento precisam passar por reciclagens no quadro funcional do presídio, devendo haver sincronização entre o trabalho sociocultural agregado aos labores próprios dos programas de ressocialização, até que se atinja a reinserção social – trabalho de equipe. O trabalho e a educação, aqui tratados com maior ênfase, são, portanto, apenas parte do processo de reintegração que envolve diversos aspectos que permitem as condições mínimas de dignidade ao cidadão apenado. Vale lembrar que muitos dos crimes cometidos estão diretamente relacionados à exclusão social, à discriminação e à falta de perspectivas econômicas e de acesso à educação, à profissionalização, ao saneamento básico e à saúde. 5.2 A Reintegração Social e as Atividades Desempenhadas pelo Preso em Penitenciarias e Presídios Observa-se que nas unidades prisionais que grande parte dos presos pratica algum tipo de religião e participa dos cultos que ocorrem no interior do estabelecimento. Muitas vezes, para que aconteçam, são utilizados os espaços normalmente destinados às práticas esportivas. O ensino fundamental ainda é precário, cerca de 52% (cinquenta e dois porcento) dos presos não possuem o 1º Grau completo. No que tange às atividades profissionalizantes, estas são direcionadas aos presos do regime semiaberto, existem diversos tipos de fábricas nos presídios, como as de brinquedos, confecção de colchões e embalamento de produtos derivados de plásticos. Ocorre que estas atividades não atendem à demanda necessária para os demais regimes, além de não possibilitarem a remição de pena aos interessados no benefício. Via de regra, não há uma separação dos internos, nem quanto aos tipos de delitos, tampouco concernente à idade, grau de instrução ou ambiente de origem. A maioria dos apenados ficam confinados em suas galerias ou setores, com total ausência 65 ações voltadas para trabalho, educação e outras atividades que possam contribuir para o seu retorno à sociedade. Observa-se que os problema estruturais dão margem aos problemas de ordem pessoal, afetando a reincerssão do apenado. Muitas vezes os rótulos e pré-conceitos marcam profundamente os indivíduos que ocupam as prisões e aqueles que dela são libertados, o que não contribui para sua reintegração ao meio social. 5.3 As Políticas Públicas de Reinserção Social em Face da Realidade do Sistema Prisional de Santa Catarina O Sistema carcerário Catarinense não chega a ser um modelo daquilo que é previsto pela Lei de Execução Penal. Tal como ocorre em outras organizações prisionais brasileiras, é carente de espaço físico adequado, de materiais e equipamentos, além de pessoal suficientemente preparado, tanto em número quanto em qualificação para as atividades no ambiente prisional. Mormente, nas lides voltadas para a reintegração social dos apenados. As capacidades de absorção de programas educacionais para os internos visando o desenvolvimento de profissões não suprime as demandas impostas pelo índice de reclusos. Essa realidade parece demonstrar que a Lei de Execução Penal não encontra espelho na realidade carcerária. Por outro lado, existe um movimento contínuo para a abertura de novas vagas nas prisões, mantendo-se estáticas as políticas que possam incrementar as ações que favoreçam o reingresso do apenado no meio social. Esse quadro leva a considerar que a pena não atende seu fim preventivo e reintegrador, mas mostra sua natureza retributiva em relação ao condenado. 66 6 O TRABALHO DO RECLUSO COMO DIREITO, DEVER SOCIAL E CONDIÇÃO DE DIGNIDADE HUMANA O modelo de Estado brasileiro atual é o Estado Democrático de Direito, cujo preâmbulo da Constituição Federal de 1988 assim prescreve: Nós representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil. Destarte, o Estado e a sociedade assumiram junto um compromisso no sentido de assegurar os direitos de todos os cidadãos sem discriminação. Logo, os direitos do preso estão incluídos. A forma de execução da pena privativa de liberdade é regulada pela Lei de Execução Penal, Lei 7.210/84, cuja sigla é LEP. Foi editada em 1984, com a finalidade de regulamentar o cumprimento ou execução da pena privativa de liberdade. A referida lei traça as normas a serem seguidas para o cumprimento da pena e também elenca o rol de direitos e deveres do condenado. Em vista disso, faz-se necessário repensar a pena privativa de liberdade, buscando reavivar antigos e atuais anseios, quais sejam de buscar no trabalho novas perspectivas e expectativas de vida fora dos muros da prisão. A Lei de Execução Penal brasileira Lei n. 7210 de 11/07/1984 preconiza: Art. 28. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva. Art. 31. O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidade. Art. 32. Na atribuição do trabalho deverão ser levadas em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidades oferecidas pelo mercado. Apesar da lei claramente estabelecer a obrigatoriedade do trabalho aos presos apenas pequena parte deles consegue usufruir de tal oportunidade, devido à escassez de vagas. Conforme o que se depreende, o trabalho seria um dos mecanismos de reinserção social do condenado. Apesar dos obstáculos enfrentados para sua implementação, é um caminho que merece ser considerado. O trabalho realizado pelo preso no interior do 67 estabelecimento penitenciário pode ser dividido em três categorias: administrativo, industrial e artesanal. Pode também ser incluído o terceirizado, qual seja, o trabalho prestado para empresas externas privadas ou públicas. O trabalho é direito e dever dos presos, será sempre remunerado, mas não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis Trabalhistas. A lei determina a remição de um dia da pena por três dias trabalhados, sendo mais um estímulo, quando ocorre, para a reinserção social do preso. Em grande parte do Estado de Santa Catarina, os estabelecimentos penitenciários contam com funcionários efetivos, como o agente penitenciário, com ocupantes de cargos comissionados, com contratados que exercem a função de vigilante, além de estagiários de diversos cursos, principalmente os de Direito, Administração, Assistência social e Agropecuária. Alguns modelos implantados com sistemas de fábricas ou penitenciárias agrícolas destacam-se dentro do Sistema Prisional de Santa Catarina. O trabalho desenvolvido pelos detentos dentro da instituição pode ser voltado para a sua valorização. Constitui também um retorno em benefício da comunidade e do Poder Público. Dentre os principais benefícios para a comunidade, podemos apontar o retorno econômico. Com produção própria, o custo de manutenção da unidade pode ser reduzido significativamente. Por meio da venda, produtos produzidos nas hortas e granjas rendem valores que são incorporados ao Fundo Rotativo da Penitenciárias e utilizados para a aquisição de equipamentos e a reposição do plantel de aves, suínos e bovinos da unidade. As estruturas funcionais dos estabelecimentos Penitenciários de forma geral compreendem: Direção: Gerência de Execuções Penais. Gerência de Saúde, Ensino e Promoção Social Gerência de Apoio Operacional Gerência de Revisões Criminais Gerência de Atividade Laboral. A Gerência de Execuções Penais: é subordinada diretamente à Direção e a ela compete planejar, organizar, coordenar e controlar as atividades do Serviço Penal, quais sejam, manter atualizado o prontuário dos sentenciados, individualizando os benefícios (progressões de regime, do fechado para o semiaberto, do semiaberto para o aberto, 68 comutações de penas, livramento condicional, extinção das penas, indulto, remição, saída temporária) que poderão pleitear durante o curso da execução da pena. A Gerência de Saúde, Ensino e Promoção Social: é responsável pela Assistência Social, individual e familiar a sentenciados, bem como pelo atendimento médico e hospitalar. São controladas as visitas aos sentenciados feitas por familiares e amigos. Providencia o auxílio reclusão, controla os encontros íntimos, promove o acompanhamento de cursos profissionalizantes e os oferecidos por entidades externas à prisão. No setor de Saúde (enfermagem) é prestada assistência aos sentenciados, são providenciados atendimentos de primeiros socorros, consultas médicas, atendimentos odontológicos, internação hospitalar, exames laboratoriais, fisioterapia, exame radiológico, distribuição de preservativos (sentenciados), distribuição de medicamentos, encaminhamento para próteses e óculos. No que se refere à educação, em algumas Penitenciarias é oferecido aos detentos o ensino fundamental de 1º a 4º e 5º a 8º, e alfabetização com o programa Brasil alfabetizado. A educação é uma parceria com o CEJA (Centro de Educação de Jovens e Adultos) que disponibilizam os professores para as atividades educacionais. A Gerência de Apoio Operacional: Planeja, programa, organiza, executa e controla as atividades relacionadas com o planejamento e orçamento e finanças; articula-se com os sistemas de Recursos Humanos, mantém atualizado o cadastro dos funcionários, promove o controle das fichas funcionais, horário, frequência, escala de férias; emite empenho; promove a execução de serviços diversificados, como: abastecimento de veículos, controle e fornecimento de alimentação para os Presídios e desenvolve outras atividades relacionadas com a área de Apoio Operacional. A Gerência de Revisões Criminais: É ocupada por Advogado, que promove as Revisões Criminais e defesas de custas. A Supervisão de Segurança: Ocupada por um agente Penitenciário, tendo como auxiliares 4 (quatro) supervisores de turmas, que com os agentes prisionais cuidam e controlam a segurança interna da Penitenciária de uma forma geral. O Setor de Pecúlio: Setor responsável pela folha de pagamento dos sentenciados. Todos os recursos financeiros que o detento recebe são contabilizados neste setor que também coordena as compras que os sentenciados realizam rotineiramente. Todo o trabalho desenvolvido em penitenciárias é realizado por sentenciados que atuam nas diversas áreas oferecidas pela instituição. O condenado que trabalha tem o direito à remição de pena, à razão de um dia a cada três trabalhados. Ou seja, será 69 descontado da pena a cumprir, os dias remidos que o apenado obteve trabalhando. Todos os reclusos recebem pelos serviços prestados junto ao estabelecimento penal. A ideia é que o trabalho não sirva apenas para obter dinheiro, mas também como meio de ocupação, valorização e aprendizado. Muitas unidades prisionais atuam na produção de grampos de varal, que são transportados para as celas dos detentos de regime fechado para montagem, retornando à fábrica para o processo de plastificação e empacotamento. Sendo que este tipo de atividades estão inseridas as unidades prisionais de Videira no setor de grampos, juntamente com a Penitenciaria de São Cristovão, que também se destaca no trabalho agrícola, onde na lavoura, os apenados desenvolvem trabalhos relacionados ao preparo da terra, sendo utilizados produtos orgânicos e maquinário adequado para o plantio de milho e outros alimentos conforme a época do ano. Na horta são produzidos hortaliças e temperos dos mais variados tipos. Serviços como ampliação e reformas são efetuados por profissionais com habilidades nos serviços de serralheiro. As ampliações e os trabalhos de manutenção relacionados à construção civil contam com uma equipe de presidiários que são pedreiros, encanadores, eletricistas, carpinteiros e pintores. Todos os detentos que trabalham em atividades de regime semiaberto utilizam uniformes, sendo que os serviços gerais efetuados pelos detentos estão relacionados à limpeza, corte de grama, roçadas, recolhimento de lixo, ajardinamento, aterros, drenagem, calçamento e organização dos espaços físicos da unidade prisional. A manutenção destes serviços se faz necessária visando à organização dos espaços e à sua higiene. No que se refere à alimentação, os trabalhos nas penitenciarias e unidades prisionais do Estado envolvem a preparação de café da manhã, almoço, além de janta com sopas e café. Muitas unidades possuem padaria para a produção de pães, a serem distribuídos aos apenados juntamente com o café. A alimentação conta com o acompanhamento de nutricionistas da Secretaria de Justiça e Cidadania. Os serviços mais simples e rotineiros, conhecidos como “regalias”, são realizados por presidiários que contam com maior confiança dos funcionários. Dentre as atividades, estão: a condução de materiais e alguns documentos, distribuição de alimentos e correspondências, além dos trabalhos de limpeza e conservação. No que concerne aos ganhos pecuniários, parte é destinada à compra de produtos de limpeza, alguns alimentos e objetos simples para uso no dia a dia do encarcerado (envelopes, canetas, pilhas, etc.). Uma outra parte é guardada em poupança e muitos também enviam dinheiro para auxiliar sua família. 70 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo de toda a história das prisões, não há relatos confiáveis sobre efetivo sucesso e eficácia do cárcere como meio de favorecer a reinserção social dos que estiveram confinados entre suas paredes e muros. Por outro lado, é sabido que a prisão é conhecida como o “mal necessário”, apesar de todos os revezes acumulados para a segurança pública. Diante de resultados tão desalentadores, o que fazer? A resposta parece estar no que vem sendo conhecido como redução de danos. Cada unidade prisional precisa organizar seus grupos de trabalhadores a fim de planejar e implementar políticas de ação que possam contribuir para o efetivo retorno do interno na sociedade. Afinal, os apenados não ficam a vida toda reclusos nas prisões. Neste sentido, as políticas inexoravelmente passarão pela educação, trabalho, preparo profissional, além de tratamento digno que contemple os aspectos de saúde, respeito, harmonia e valorização de uma cultura de paz. Para atingir os objetivos aqui discutidos, podem ser fundamentais as alternativas de parcerias com outras organizações externas. É para lá que irão os egressos assim que deixarem as prisões. Para tanto, podem ser destacadas as empresas privadas e mistas. Muitas delas podem contar com a mão de obra dos internos, com grandes vantagens relacionadas á economia de encargos sociais. Num segundo momento, podem contratar os egressos, muitos deles já devidamente observados e avaliados enquanto internos dos estabelecimentos. Outro tipo de parceria pode ser efetuado com instituições educacionais. Equipes mistas de estudo, pesquisa e discussão podem ser formadas, priorizando a multidisciplinaridade. Igualmente, estagiários podem ser contratados, com ganhos importantes para todas as partes envolvidas. São também recomendáveis avaliações constantes desses projetos, com o fim de melhorá-los, modernizá-los e ampliá-los, tornando-os parte da realidade dos presídios. Ao Estado cabe fazer cumprir a lei, auxiliar financeiramente os projetos e favorecer a organização e a implementação dos mesmos. Desse modo, o trabalho de reintegração torna-se possível, com resultados positivos, evidenciado assim que o trabalho de ressocialização não somente é possível, como traz resultados positivos em várias áreas. Pode ser efetivamente aplicado em todo o sistema penitenciário, desde que organizado de forma planejada e coerente, de acordo com as possibilidades de cada apenado. 71 É inegável que as políticas sociais básicas nas áreas de educação, saúde e habitação auxiliam e promovem efeitos preventivos em relação à criminalidade e à violência. Além disso, são importantes as políticas de segurança pública relacionadas ao controle, principalmente se levarmos em conta a realidade que vivemos. Dentre elas, o controle do porte de armas, policiamento ostensivo e tantas outras, sem esquecer das políticas criminais voltadas para os ambientes prisionais, espalhados por todo o país, envolvendo mais de meio milhão de prisioneiros. Convém não esquecer que a sociedade vem mostrando resistências para aceitar o ex-detento e tratá-lo sem discriminação. Surge então um novo contexto a envolver o ex-presidiário. A rotulação a ele atribuída, bem como os preconceitos inibem a sua reinserção, inclusive no âmbito do trabalho. Faz-se necessário, portanto, incluir a sociedade externa e suas organizações nos processos de reintegração do ex-detento. A ausência desta continuidade, que deve iniciar já no cotidiano prisional, pode jogar por terra qualquer projeto iniciado, por mais rico e substancioso que seja. Na história do sistema prisional, em seus primeiros registros, não constava a pena privativa de liberdade. Os presos recebiam castigos e punições e eram largados em calabouços e torres de castelos, não no sentido de privação de liberdade, mas sim de permanência até o julgamento final. Sob a influência das ideias humanitárias surge a pena privativa de liberdade que, com o avanço dos anos, passou a ser cumprida em ambientes conhecidos como prisões, estabelecimentos estes que existem até os dias atuais. As penas vigentes na legislação brasileira são as restritivas de direito, de multa e de privação de liberdade, que podem ser divididas em detenção e reclusão, sendo cumpridas em regimes fechado, semiaberto e aberto. Os estabelecimentos prisionais contemporâneos encontram-se em situação degradante, impossibilitando o cumprimento das finalidades da pena privativa de liberdade, que seriam não só a retribuição pelo crime cometido, mas a prevenção geral e especial. Prioritariamente, a reinserção social do preso na sociedade. O trabalho nas penitenciárias apresenta-se como um direito, um dever social e como princípio da dignidade humana, elencado inclusive na Lei de Execução Penal. Com o trabalho, o preso evita a ociosidade e encontra um meio de subsistência para o período de seu aprimoramento e, eventualmente, para quando estiver em liberdade. Além do trabalho e da educação, algumas penitenciárias e unidades prisionais preocupam-se com o preso no sentido de lhe oportunizar atendimentos médico, 72 odontológico e social, além de acompanhamento psicológico. A função do setor penal consiste em controlar o prontuário dos condenados, para que todos os direitos e deveres elencados na Lei de Execução Penal sejam cumpridos. Diante do que foi constatado com relação às oportunidades de trabalho oferecidas ao preso nos estabelecimentos prisionais, observa-se que não é algo impossível de ser concretizado. O trabalho é um direito do preso e uma obrigação do Estado, mostrando-se extremamente necessário para minimizar o caos enfrentado hoje no sistema prisional. Existindo planejamento, vontade política, interesse das autoridades envolvidas e participação da sociedade, a lei pode ser aplicadas e asseguradas as tão decantadas ações de reintegração social dos apenados. Com o atendimento aos ditames da lei e o desenvolvimento de atitudes de respeito à dignidade do presidiário, muito se estará contribuindo para a efetiva reinserção do preso na sociedade. Muito há para refletir, pesquisar e realizar, a fim de que a pena privativa de liberdade cumpra com a finalidade tão sonhada por Beccaria e outros pensadores que dedicaram sua vida buscando apontar soluções para os problemas atinentes ao sistema prisional. Pensar e agir em função da reintegração social do preso não se refere a um ato humanitário. Mais que isso, é cuidar dos interesses da própria sociedade. É dela que ele veio e é para ela que ele irá após o seu período de confinamento. 73 REFERÊNCIAS ALVES, José Deques. DO TRATAMENTO PENAL À REINSERÇÃO SOCIAL DO CRIMINOSO. 2003. Coritiba, Paraná. BARATTA, Alessandro. Resocialización o control social – por um concepto crítico de reintegración social del condenado. In: ARAUJO JUNIOR, João Marcello (org.). 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