Baixar este arquivo PDF
Transcrição
Baixar este arquivo PDF
SALMO 91: UMA EXALTAÇÃO DE YHWH PROTETOR Ruben Marcelino Bento da Silva RESUMO O artigo analisa o Salmo 91, que exalta YHWH como Deus protetor judaico. A partir da metodologia de exegese histórico-crítica, propõe-se um estudo dessa peça literária, assinalandose a crítica textual, a análise literária, a análise da redação e a análise da forma. PALAVRAS-CHAVE: YHWH; Divindade protetora; Salmo 91; Bíblia judaica. ABSTRACT This article analyzes Psalm 91, which exalts YHWH as the Jewish protector God. Using the historical-critical methodology of exegesis, a study of this literary piece is proposed, pointing out the textual criticism, literary analysis, analysis of writing and formal analysis. KEY WORDS: YHWH; Protective divinity; Psalm 91; Jewish Bible. Introdução O artigo pretende apresentar uma breve análise exegética histórico-crítica do Salmo 91. Em primeiro lugar, procurar-se-á, através da crítica textual, estabelecer o texto hebraico para a exegese. A seguir, realizar-se-á uma análise literária do Salmo 91. Após a segmentação, apresentar-se-ão uma proposta de tradução e um esquema estrutural, seguindo-se uma discussão de sua integridade e coesão. Depois, proceder-seá à análise da redação, situando a composição em seu contexto literário atual. Por fim, será feita a análise da forma e procurar-se-á determinar o ambiente de origem do texto. Doutorando em Teologia pela Faculdades EST, São Leopoldo, RS. Mestre em Teologia pela Faculdades EST, São Leopoldo, RS. Licenciado em Letras pela Universidade Estácio de Sá, Rio de Janeiro, RJ. Este artigo foi realizado com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq – Brasil. E-mail: [email protected]. Agradeço à Profa. Ms. Marie Ann Wangen Krahn pela tradução do resumo do artigo para a língua inglesa 1 Crítica textual1 Em 1a, somente o texto grego da Septuaginta2 traz, antes do particípio bveyO (yōšēb: “aquele que se senta”), o enunciado (ainos ōdēs Dauid), que traduz a dedicatória hebraica dwId"l. rAmz>mi ryvi (šîr mizmôr ledāwid) – “Um cântico, um salmo para Davi”.3 Tão somente variando as fórmulas de dedicação em que aparece a expressão (tō Dauid: “para Davi”), a LXX consagra ao filho de Jessé quase todas composições reunidas no quarto (90 [89] – 106 [105])4 dos cinco livros de que se constitui o volume dos Salmos: 91 (90), 93 (92), 94 (93), 95 (94), 96 (95), 97 (96), 98 (97), 99 (98), 101 (100), 103 (102) e 104 (103). Dessas, o TM dedica a Davi somente os Salmos 101 e o 103. Não fornece, portanto, assim como os demais testemunhos, apoio para o cabeçalho introduzido pela Septuaginta no Salmo 91. É possível que os redatores gregos tenham resolvido consagrar essa composição ao “mais belo dos cantores de Israel” (2Sm 23,1) tendo em vista algumas expressões que aparecem vinculadas a ele em outros lugares. Um exemplo é 91,1b.4a, em que os substantivos lce (sēl: “sombra”) e @n"K' (kānāp: “asas”) são usados como metáforas para a proteção da divindade. Esses dois termos aparecem formando uma única expressão com esse mesmo sentido no Salmo 17,8: ^yp,n"K. lceB. (besēl kenāpeykā), “sob a sombra das tuas asas”. Esse salmo recebe o cabeçalho dwId"l. hL'piT. (tepillâ ledāwid), “uma oração para Davi”. Outro exemplo é 91,7: “Cairá do teu lado um milhar e dez milhares do teu lado direito, a ti não se achegará”. Essas palavras fazem lembrar a canção com que as mulheres receberam Davi quando retornou do combate em que matara Golias: “Saul matou seus milhares e Davi seus dez milhares” (1Sm 18,7). Ainda outro exemplo é 91,11, em que a proteção de YHWH está ligada à expressão wyk'a'l.m; (mal‟ākāw), “os seus emissários”. Nos Salmos 34,8 e 35,5.6, 1 O Texto Hebraico Massorético (TM) e o aparato crítico que discute as variantes verificadas em outros textos hebraicos e versões encontram-se em ELLIGER; RUDOLPH, 1990, p. 1174. Os manuscritos que representam o TM possuem um elevado padrão de uniformidade textual, resultado de um rígido sistema de preservação e transmissão adotado por escribas judeus na Idade Média, os massoretas (FRANCISCO, 2003, p. 131). 2 Usar-se-á também, neste trabalho, o numeral LXX (70) para referir-se à Septuaginta. 3 Para a transliteração dos termos hebraicos adotada, cf. BOTTERWECK; RINGGREN, 1986, p. xxi. No caso do grego, cf. BROWN, 2000, p. 1. 4 “A enumeração diferente [em relação ao TM] ocorre pelo fato de que a LXX considera tanto os Sl 9 e 10 quanto os 114 e 115 como um único salmo e decompõe cada um dos Sl 116 e 147 em dois salmos” (ZENGER, 2003, p. 308, 314). As numerações em colchetes, na indicação do conteúdo do quarto livro, e nos parênteses, na listagem dos salmos com a dedicatória (tō Dauid), é aquela que consta na LXX. 2 que contêm o cabeçalho dwId"l. (ledāwid: “para Davi”), aparece a expressão correlata hw"hy>- %a;l.m; (mal‟ak yehwāh: “o emissário de YHWH”) indicando o cuidado e o livramento divino.5 Portanto, manter-se-á a leitura do TM, a qual omite o cabeçalho. Em 1b, a Peshita6 substitui o imperfeito hitpalel !n"Alt.yI (yitlônān), “ele pernoitará”, pela expressão ( : “será louvado”). O aparato crítico propõe a retroversão do siríaco para o imperfeito hitpolel !nEArt.yI (yitrônēn) – “ele será aclamado” – mas mantém-na como incerta. Além de a proposta não receber apoio dos demais testemunhos, a associação da raiz verbal !yli (lîn: “pernoitar”) com o substantivo lce (sēl: “sombra”) no contexto do oferecimento de hospedagem para a noite pode ser encontrada em outro lugar: em Gn 19,2.8, narra-se como Ló convida os dois emissários de YHWH7 para pernoitarem em sua casa e a maneira pela qual tenta defendê-los, por se acharem à sombra do seu teto, dos homens de Sodoma. Manter-se-á, por conseguinte, a leitura do TM. Em 2a, a LXX corrige a forma verbal hebraica para rm;aOy (yō‟mar), “ele dirá”. Trata-se certamente de uma tentativa de harmonização com o sujeito do verbo !yli (lîn), “pernoitar”, que está na 3a pessoa do singular. Manter-se-á a leitura do TM. No versículo 3, em primeiro lugar, remete-se a Os 9,8, onde o substantivo vWqy" (yāqûš: “passarinheiro”) aparece vocalizado vAqy" (yāqôš). Não há necessidade de ocupar-se com essa variação. Em seguida, assinala-se que vários manuscritos hebraicos medievais, a LXX e a Peshita acrescentam a conjunção W (û: “e”) antes da expressão rbdm (mdbr). O acréscimo não altera o sentido do texto, pelo que a leitura do TM pode ser mantida. Por fim, a LXX, a versão grega de Símaco 8 e a Peshita possivelmente leram rb;D>mi (middebar; [apó lógou], “da palavra”) em lugar de rb,D<mi (middéber: “da pestilência”), assim como, no versículo 6, fez-se outra leitura da mesma expressão. Pode tratar-se aqui de uma alteração voluntária com o objetivo de apagar a 5 Para outros exemplos, cf. BRIGGS; BRIGGS, 2004, p. 279. Tradução siríaca do século II da Era Comum (EC) provavelmente (FRANCISCO, 2003. p. 208). 7 Optou-se por verter o tetragrama sagrado que representa o nome do Deus israelita, hw"hy> (yehwāh), utilizando apenas as consoantes correspondentes no alfabeto latino, sem representação vocálica, haja vista o silêncio quanto à sua pronúncia decorrente da reverência do povo judeu (KELLY, 1998, p. 55s). 8 Surgida no século II EC, manteve estrita fidelidade ao original, ao lado de representar uma composição em grego de elevada qualidade literária (FRANCISCO, 2003, p. 195). 6 3 referência provável a uma deidade maligna personificada.9 Vocalizando o termo como rb;D>mi (middebar), passa-se apenas a fazer menção de um dito imprecatório que poderia ter sido proferido contra o interlocutor do salmista. Logo, a leitura do TM deve ser preferida. Em 4a, o aparato crítico indica que se deve ler wyt'roba . ,B. (be‟ebrōtāw: “com as suas penas”) em lugar de Atr'b.a,B. (be‟ebrātô: “com a sua pena”), conforme se observa na LXX e na Peshita. Tendo em vista a construção paralela com o dual wyp'n"K. (kenāpāw: “as suas asas”), a mudança é preferível. Seguir-se-á, assim, a leitura do aparato crítico. Em 4b, a expressão ATmia] hr"xesow>) hN"ci (sinnâ wesōhērâ ‟amittô: “[São] um escudo e um muro a sua sustentação”) é considerada uma provável adição que deveria ser transposta para o final do versículo 7. De fato, essa frase fica isolada entre as estruturas de paralelismos em 4a e em 5s: wyt'rob.a,B. Com as suas penas, %l' %s,y" tapar-te-á A B 4a wyp'n"K.-tx;t;w> e, debaixo das suas asas, hs,x.T, abrigar-te-ás. A‟ B‟ hl'y>l"+ dx;P;ämi ar'ytiâ-al{ 5a `~m'(Ay @W[ïy" #xeªme÷ 5b %l{=h]y: lp,aoåB' rb,D,miâ 6a `~yIr")h\c' dWvïy" bj,Q,ªmi÷ 6b A Não estremecerás do espanto da noite, B da flecha (que) voa de dia, A‟ da pestilência (que) anda na escuridão, da epidemia (que) arruína (ao) meio-dia. 9 É dessa maneira que G. del Olmo Lete (TOORN; BECKING; HORST, 1999, p. 231s) interpreta a ocorrência de rb,D< (déber) aqui. 4 B‟ Todavia, tratando-se de uma inserção posterior que não aparece deslocada do lugar que ocupa no TM em nenhum outro testemunho, parece mais adequado mantê-la desse modo. De mais a mais, se permanecer após 4a, não perde o caráter de expressão metafórica da proteção de YHWH no que se refere às circunstâncias arroladas nos versículos 5, 6 e 7. Ainda em 4b, a LXX, seguida pela Peshita, em lugar do substantivo hr'xeso (sōhērâ; neste trabalho, traduzido por “um muro”), lê (kuklōsei se), “rodear-te-á”. O aparato crítico propõe a retroversão do grego para o imperfeito qal ^r>x's.ti (tishārkā) – “rodear-te-á” – mas mantém-na como incerta. É provável que, por ser difícil a tradução do substantivo 10, os redatores da LXX preferiram ater-se ao significado básico da raiz verbal e, então, “esclareceram” a leitura: (hoplō kuklōsei se hē alētheia autou) – “a sua verdade rodear-te-á com um escudo”. Por ser a mais difícil, manter-se-á a leitura do TM. Em 5a, poucos manuscritos hebraicos medievais, o texto da LXX do Códice Sinaítico11 e a Peshita acrescentam a conjunção W (û) antes da expressão #xeme (mēhēs: “da flecha”). O acréscimo não altera o sentido do texto, pelo que manter-se- á a leitura do TM. Em 6a, a LXX e alguns documentos que dependem dela (a versão grega de Áquila12 e a Peshita) leem (apo pragmatos), o que corresponderia a rb'D"mi (middābār: “da coisa”). Como no versículo 3, pode tratar-se de um mecanismo para apagar a referência provável à ação de uma deidade maligna personificada, substituindo-a pela indicação de uma circunstância trágica manifesta especificamente à noite. Permanecerá a leitura do TM. Em 6b, a Peshita lê (wmn rw ’: “e do vento”) em lugar de bj,Q,mi (miqqéteb: “da epidemia”). Pode haver aqui nova tentativa de fazer desaparecer o nome de uma divindade causadora de mal, bj,q, (qéteb), pondo em seu lugar a noção de um evento natural, talvez o ar quente durante o sol do meio-dia, cujos raios seriam capaz de 10 Essa questão será discutida na tradução do Salmo 91. Datado do século IV EC, o Códice Sinaítico (a ou 01) foi descoberto em 1859 no mosteiro de Santa Catarina do Monte Sinai por Constantin von Tischendorf. Encontrado em bom estado de conservação, esse manuscrito reproduz integralmente o texto do Novo Testamento e parcialmente o do Antigo Testamento (MAINVILLE, 1999, p. 31s). 12 “Áquila (cerca de 130 [EC]): foi estudante do rabino Aquiba e fez uma tradução literalíssima [...]” (SIMIAN-YOFRE, 2000, p. 56). 11 5 debilitar o corpo e provocar doenças (WEISER, 1994, p. 465). Uma outra maneira de entender o siríaco (rw ’) seria como uma manifestação destrutiva do próprio Deus (cf. Jó 4,9) ou então uma personificação desta na forma de um intermediário (cf. 1Rs 22,20-23). De qualquer maneira, fica preservada a unicidade de YHWH. Diante, pois, da hipótese de que a leitura da Peshita representa uma correção teológica, manter-se-á o TM. A LXX, ainda em 6b, em lugar do imperfeito qal dWvy" (yāšûd: “arruína”) que aparece no TM, lê (kai daimoniou: “e o demônio”), que equivaleria ao hebraico dvew> (wešēd: “e o šēd”13). Parece haver aqui uma ocorrência de metátese, isto é, troca na ordem das letras da palavra (no caso, o w). A eliminação do y faz pensar, contudo, numa correção intencional. Reconhecendo no termo bj,q, (qéteb) o nome de uma antiga divindade14, o redator da tradução grega resolveu fornecer uma interpretação mais adequada ao seu ponto de vista teológico, a saber, a unicidade de YHWH. Sendo assim, reforçou a ideia de que bj,q, (Qéteb) é um demônio. Permanecerá, então, a leitura do TM. Em 9a, o aparato crítico propõe que se leia ^s,x.m; (mahsekā: “teu abrigo”) em vez de, com o TM, ysi_x.m; (mahsî: “meu abrigo”). A sugestão parece querer preservar o paralelismo de membros por meio do ajuste do sufixo pronominal para a 2a pessoa masculina do singular em 9a assim com está em 9b: C o teu abrigo B – (é) YHWH C‟ B‟ A‟ ^s,x.m; A hw"hy> 13 9a A palavra šēd provavelmente vem do acádico šêdu, que fazia referência às entidades protetoras dos palácios reais assírios, representadas como touros alados colossais de cabeça humana (Brown; Driver; Briggs, 1978, p. 993; RITTER, p. 2010). Na Bíblia judaica, os šēdîm são colocados em oposição a YHWH (cf. Dt 32,17; Sl 106,37). 14 Tanto o paralelismo entre as expressões ~m'Ay @W[y" #xeme (mēhēs yā„ûp yômām)/“da flecha (que) voa de dia” e ~yIr"h\c' dWvy" bj,Q,mi (miqqeteb yāšûd sāhorāyim)/“da epidemia (que) arruína (ao) meio-dia” como a estrutura que se verifica em Dt 32.24a – yriyrIm. bj,q<w> @v,r< ymexul.W b['r' yzEm. (mezê rā„āb ûlhumê réšep weqéteb merîrî)/“enfraquecidos de fome e devorados pelo Réšep e pelo Qéteb amargo” – associam bj,q< (Qéteb) com @v,r< (Réšep) [#xe é a flecha de @v,r]< . De acordo com P. Xella, Réšep era um antigo deus cananeu da batalha e das doenças, as quais ele espalhava através de seu arco e suas flechas. Possuindo um caráter ambivalente, podia ferir mas também curar. Réšep e Qéteb seriam, portanto, duas divindades cananeias transformadas, na Bíblia judaica, em demônios malignos voadores que acompanhavam YHWH em sua ação destrutiva (TOORN; BECKING; HORST, 1999, p. 673, 701, 703). 6 ^n<)A[m. T'm.f;ä !Ay©l.[,÷ a tua morada puseste (Em) ‘Elyôn 9b Provavelmente, a proposta do aparato crítico pretende ainda harmonizar o versículo 9 com o bloco 91,3-13, o qual se dirige integralmente à 2a pessoa masculina do singular. A leitura do TM é a mais difícil porque destoa do conjunto. Sendo assim, deve ser preferida. Em 9b, a LXX e a Quinta ( )15 leem (katafugēn sou), que traduz o hebraico ^Z<W[m' (mā„ûzzekā: “o teu refúgio”), em lugar de ^n<A[m. (me„ôneka: “a tua morada”), conforme o TM. Segundo Carl Schultz, palavra zA[m' (mā„ôz) indica lugares de refúgio naturais ou feitos pelo homem, por exemplo, uma fortaleza na montanha (HARRIS; ARCHER JR.; WALTKE, 1998, p. 1089). Embora o substantivo que aparece no TM, !A[m' (mā„ôn), seja usado para descrever ruínas abandonadas que passaram a ser ocupadas por animais selvagens (HARRIS; ARCHER JR.; WALTKE, 1998, p. 1092), é também empregado várias vezes para designar o Templo de Jerusalém como morada de YHWH (p.ex. 2Cr 36,14s; Sl 26,8). Não há maiores razões para optar pela leitura da LXX, que pode representar uma correção, dada a ambiguidade de sentido de !A[m' (mā„ôn), ou uma tentativa de harmonização com os substantivos hs,x]m; (mahaseh: “abrigo”) e hd"Wcm. (misûdâ: “cidadela”) em 91,2a. Em 10b, muitos manuscritos hebraicos medievais e o Targum, em lugar da leitura do TM, ^l,h\a'B. (be‟āholekā: “à tua tenda”), trazem ^yl,h'aoB. (be‟ōhāleykā: “às tuas tendas”). Não se trata de uma alteração tão importante, razão pela qual a versão do TM será mantida. Em 13a, no tocante ao substantivo lx;v; (šahal: “leão”), que aparece no TM, a LXX (seguida pela Peshita) apresenta a leitura (aspida), acusativo singular de (aspis: “áspide”). O aparato crítico propõe a retroversão do grego para o particípio masculino hebraico lxezO (zōhēl: “rastejando”, “rastejante”), porém mantendo-a como incerta. Essa alteração é problemática porque desfaz o quiasmo que há entre os dois membros do versículo: 15 A Quinta é um dos textos bíblicos em grego que Orígenes de Alexandria usou para compor a sua Héxapla, concluída em torno de 250 EC. A Héxapla dispunha, em seis colunas paralelas, o texto hebraico consonantal, o texto hebraico transliterado em letras gregas, a versão grega de Áquila, a versão grega de Símaco, a Septuaginta (Quinta) e a versão grega de Teodocião (FRANCISCO, 2003, p. 190, 197). 7 !t,p,w" lx;v;-l[; Sobre o leão e a serpente peçonhenta A 13a %rod>Ti pisarás, smor>Ti pisotearás B B‟ 13b !yNIt;w> rypiK. o leãozinho e a cobra grande. A‟ Além disso, o paralelismo entre os substantivos lx;v; (šahal: “leão”) e rypiK. (kepîr: “leãozinho”) aparece em duas outras passagens, cujo contexto é poético: Jó 4,10 e Os 5,14. Por outro lado, não há ocorrências de paralelismo entre lxezO (zōhēl: “rastejando”, “rastejante”) e !t,p, (péten: “serpente peçonhenta”) na Bíblia judaica, tampouco entre lxezO (zōhēl) e !yNIt; (tannîn: “cobra grande”). Há, porém, entre !t,p, (péten) e !yNIt; (tannîn) em um texto também poético: Dt 32,33. Mas como explicar a leitura da LXX? A resposta pode estar na relação entre a raiz verbal %r:d" (dārak: “pisar”) e o substantivo !t,p, (péten). É provável que o redator do texto grego a julgasse de maior plausibilidade, ou seja, “pisar uma serpente venenosa” seria mais fácil que “pisar um leão”. Por essa razão, e haja vista uma conveniente semelhança consonantal, modificou lx;v; (šahal) para lxezO (zōhēl), formando um paralelismo com !t,p, (péten). Logo, há motivos suficientes para preferir a variante do TM. Em 16b, o aparato crítico propõe o imperfeito hifil WhwEr>a;w> (we‟arwēhû: “e embriagá-lo-ei”) em lugar do imperfeito hifil Whaer>a;w> (we‟ar‟ēhû: “e fá-lo-ei ver”), a leitura do TM, porém chama a atenção para o Sl 50,23, onde se observa a expressão ~yhiil{a/ [v;yEB. WNa,r>a; (‟ar‟ennû beyēša„ ‟elōhîm : “fá-lo-ei ver com a largueza de Deus”). Apesar dessa ocorrência, a proposta é plausível, uma vez que hw"r" (rāwâ: “embriagarse”16) forma um paralelismo metafórico com [;bf e ' (śābē„a: “fartar-se”17), no que se 16 KIRST, 1988, p. 224. Dahood (1968, p. 329, 334) segue essa proposta ao traduzir 16b assim: and (will) make him drink deeply of my salvation (“e fá-lo-ei beber profundamente de minha salvação”). 17 Segundo Bruce K. Waltke (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 1463), a raiz possui o sentido usual de “estar satisfeito por ter-se alimentado”. 8 refere à liberalidade divina. Portanto, já que não destoa do estilo e nem da teologia do autor, será adotada em lugar do TM. 2 Análise literária Na tradução18 apresentada a seguir, procurou-se, tanto quanto possível, respeitar a ordem original das palavras. A segmentação do texto obedeceu às indicações do acento massorético disjuntivo atnah (b+), que é o principal acento divisor do versículo. !Ay=l.[, rt,seäB. bveyO 1a `!n")Alt.yI yD;ªv;÷ lceBî . 1b yti_d'Wcm.W ysiäx.m; hw"hyl;â( rm;ªao 2a `AB*-xj;ba. , yh;ªl{a/÷ 2b Quem se sentar sob a cobertura19 de ‘Elyôn20 sob a sombra de Šadday pernoitará. Direi para YHWH: Meu abrigo e minha cidadela, meu ’Elōah. Apoiar-me-ei21 nele. 18 Essa tradução do Salmo 91 foi extraída de SILVA, Ruben Marcelino Bento da. Louvor ao Guardião da Cama: Uma Análise do Salmo 91 à Luz da Veneração à Divindade Protetora Bés. In: COLÓQUIO DE HISTÓRIA, 4, 2010, Anais Eletrônicos. Recife: FASA, Universidade Católica de Pernambuco, 2010. p. 421432. Para este artigo, ela foi revista e ampliada. 19 Em Brown; Driver; Briggs (1978, p. 711s), os significados básicos para rt,se (sēter) são covering (“cobertura”), hiding-place (“esconderijo”) e secrecy (“segredo”). Para a ocorrência do termo em Sl 91,1, especifica-se hiding-place. Todavia, levando-se em conta que, no mesmo dicionário, a raiz rt;s' (sātar) é traduzida por hide, cujo sentido pode ser “encobrir”, e que também covering já foi arrolado como sentido válido para o substantivo hebraico, optou-se pela tradução em português “cobertura”. A razão disso é enfatizar a formulação construída com a palavra lce (sēl), “sombra”. 20 Preferiu-se deixar sem tradução nomes ligados, no passado, a outras divindades (‘Elyôn, Šadday, ’Elōah) e usados aqui em paralelo com YHWH. Mantê-los em sua forma original pretende sinalizar um fenômeno histórico-cultural de reunião de várias divindades em uma só. Como em outros casos na Bíblia judaica (Gn 17,1; Sl 77,11s; Jó 6,4), trata-se aqui do final de um processo de assimilação, pelo qual nomes de múltiplos deuses passaram a denotar um único Deus, YHWH. ‘Elyôn (“Altíssimo”), por exemplo, teria sido uma divindade celeste em Ugarit, na Fenícia (cf. Is 14,13s), um epíteto do deus da fertilidade Baal. No encontro com as religiões de Canaã, o Deus israelita YHWH pode ter apropriado essa designação de Baal (GERSTENBERGER, 1981, p. 161s, 171s). O nome Šadday, por sua vez, costuma ser vinculado à raiz dd:v' (šādad), “agir violentamente com” (to deal violently with), resultando daí a tradução “Todo-Poderoso” (BROWN; DRIVER; BRIGGS, 1978, p. 994s). Outra possibilidade de compreendê-lo, conforme Brown; Driver; Briggs (1978, p. 994), seria recorrer à raiz hd"v' (šādâ), “umedecer” (to moisten), e ao substantivo ~yId:v' (šādayim), “seios” (breast). Chouraqui (1995, p. 34, 171) apoia a leitura “Deus dos seios fecundos”, assinalando que os empregos de Šadday no livro de Gênesis ocorrem em meio a promessas de fecundidade. Desse modo, evoca-se, para a interpretação da divindade, a ideia da amamentação e, por conseguinte, da maternidade. 9 `tAW*h; rb,D,îmi vWqªy" xP;îmi ^l.yCiy( :â aWhå yKiÛ 22 Porque ele arrancar-te-á destruidora23. 3 da armadilha do passarinheiro, da pestilência hs,_x.T, wyp'än"K.-tx;t;(w> %l'â %s,y"å Ÿ wyt'rob.a,B. 4a Com as suas penas, tapar-te-á e, debaixo das suas asas, abrigar-te-ás. 24 25 `AT*mia] hr'äxesow>) hN"ßci 4b hl'y>l"+ dx;P;ämi ar'ytiâ-al{ 5a `~m'(Ay @W[ïy" #xeªme÷ 5b 26 (São) um escudo e um muro a sua sustentação . Não estremecerás27 do espanto28 da noite, 29 da flecha (que) voa de dia, 21 Schökel (1997, p. 97s) destaca, em primeiro lugar, o aspecto físico descrito pela raiz verbal xj;B' (bātah), “apoiar-se em algo”, do qual se deriva o sentido mais abstrato de “sentir-se seguro”. 22 Em Koehler; Baumgartner (1995, p. 717), fornecem-se para a raiz lc;n' (nāsal), no grau hifil, as seguintes acepções: to tear from (“rasgar de”); to remove, withdraw (“remover”); to pull out (“puxar para fora”, “arrancar”), save (“salvar”). 23 Em Brown; Driver; Briggs (1978, p. 217), destructive pestilence. 24 O vocábulo hN"ci (sinnâ) refere-se a um escudo grande, retangular, que cobria toda a parte da frente do corpo. Outra palavra, !gEm' (māgen), indicava um tipo de escudo redondo e menor, usado pela infantaria ligeira e por oficiais (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 279). 25 Em Koehler; Baumgartner (1995, p. 750), para hr"xeso (sōhērâ), é dada a acepção wall (“muro”), inclusive com referência a Sl 91,4. Embora R. D. Patterson (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 1307) traduza o substantivo como “escudo pequeno”, o qual seria usado no combate corpo a corpo, apresenta, como alguns dos sentidos básicos para a raiz rx;s' (sāhar), “circundar” e “rodear”. Schökel e Carniti (1998, p. 1159) dizem que a tradução de hr"xeso (sōhērâ) é incerta, mas sugerem que se refira a “algo que rodeia”, especificando, como possibilidades, “escudo” e “muralha”. A preferência pela tradução “muro” justifica-se ainda pela suposição de um paralelismo com o substantivo hd"Wcm. (mesûdâ), “cidadela”, que aparece em 91,2a. 26 No qal, o grau simples, a raiz verbal !m;a' (‟āman) comunica a ideia básica de sustento ou firmeza. De acordo com Charles L. Feinberg (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 85-87), ela é usada com o sentido de braços fortes que amparam uma criança necessitada. Desse significado fundamental, derivam-se as noções de certeza e verdade, pelas quais geralmente traduz-se o substantivo tm,a, (‟émet). 27 Uma das possibilidades para a etimologia de arEy" (yārē‟) arroladas por H. F. Fuhs (BOTTERWECK; RINGGREN, 1990, p. 291) deriva a palavra da raiz semítica r„, cujo significado fundamental seria to tremble (“estremecer”). Chouraqui (1998, p. 139) traduz a forma verbal ar"yti (tîrā‟) por “estremecerás”. 28 Em Koehler; Baumgartner (1996, p. 922), o substantivo dx;P; (pahad) recebe, como primeiras acepções, trembling (“trêmulo”), dread (“espanto”). Brown; Driver; Briggs (1978, p. 808) também fornecem, como primeira opção de tradução, dread. Kirst (1988, p. 193) traz: tremor, pavor, susto, temor, medo, terror. Andrew Bowling (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 1209) esclarece que dx;P; pode referir-se tanto a uma forte sensação de medo ou pavor como à fonte externa que provoca o pavor. A fim de ressaltar o aspecto físico comunicado pela palavra hebraica, optou-se por vertê-la através do vocábulo “espanto”. Essa opção de tradução é também observada em Schökel e Carniti (1998, p. 1157, 1164). A expressão hl'y>l' dx;P; (pahad lāylâ) poderia fazer alusão ao sintoma decorrente do ataque de um demônio noturno, talvez tyliyli (Lîlît), nome relacionado, segundo M. Hutter (TOORN; BECKING; HORST, 1999, p. 520), ao substantivo hl'y>l' (“noite”) por etimologia popular. 29 Como já foi dito, os substantivos #xe (hēs: “flecha”), rb,D< (Déber: “pestilência”) e bj,q, (Qéteb: “epidemia”) designavam, na origem, divindades, símbolos vinculados a elas ou demônios relacionados à 10 %l{=h]y: lp,aoåB' rb,D,miâ 6a `~yIr")h\c' dWvïy" bj,Q,ªmi÷ 6b ^n<+ymiymi hb'îbr' >W @l,a,ª Ÿ^’D>Cimi lPoÜyI 7a do Déber (que) anda na escuridão, 30 do Qéteb (que) arruína (ao) meio-dia. Cairá do teu lado um milhar e dez milhares do teu lado direito, `vG")yI al{å ^yl,ªae÷ 7b jyBi_t; ^yn<åy[eB. qr;â 8a `ha,(r>Ti ~y[iäv'r> tm;ÞLuviw> 8b ysi_x.m; hw"åhy> hT'äa;-yKi( 9a `^n<)A[m. T'm.f;ä !Ay©l.[,÷ 9b h['_r' ^yl,äae hN<åaut.-al{) 10a `^l<)h\a'B. br;îq.yI-al{ [g:n<©w>÷ 10b %L"+-hW<c;y> wyk'a'l.m;â yKiä 11a `^yk,(r'D>-lk'B. ^ªr>m'v.li÷ 11b a ti não se achegará. Somente com teus olhos observarás e a retribuição dos malvados verás. Porque tu (és) YHWH, meu abrigo. (Em) ‘Elyôn puseste a tua morada. Não sucederá contra ti o mal e o flagelo 31 não se ajuntará32 à tua tenda. Sim, instruirá os seus emissários quanto a ti, para guardarem-te em todas as tuas pisadas. doença, à guerra e à morte. De acordo com Kilpp (2002, p. 28s), na Bíblia judaica, há a tendência de fazer desaparecer a divindade ou o demônio e apenas referir-se aos fenômenos naturais associados. 30 Quando relacionado etimologicamente com ocorrências da raiz na literatura targúmica e no árabe, o substantivo bj,q, (Qéteb) tem recebido o significado de “aquilo que é cortado”. Contudo, geralmente lhe tem sido dado o sentido básico de “destruição”. As traduções por “peste”, “pestilência”, “epidemia” apoiam-se no uso em paralelo com outros substantivos como rb,D< (Déber) e @v,r< [Réšep] (TOORN; BECKING; HORST, 1999, p. 673; BROWN; DRIVER; BRIGGS, 1978, p. 881). 31 De acordo com Leonard J. Coppes (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 918), o substantivo [g:n< (nega„) designa o golpe físico com que um suserano castigava um vassalo. Sugere também a punição infligida pela divindade. Em Levítico 13s, refere-se a doenças contagiosas. A tradução “flagelo” justificase por tratar-se de uma palavra que possui tanto o sentido de “tortura” como de “enfermidade”. 32 A raiz br:q' (qārab) indica a posição mais próxima e íntima do objeto (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 1367). Pode ter conotação sexual (SCHÖKEL; CARNITI, 1998, p. 590). 11 ^n>Wa+F'yI ~yIP:ïK;-l[; 12a `^l<)g>r; !b,a,äB' @GOàTi-!P, 12b %ro=d>Ti !t,p,äw" lx;v;ä-l[; 13a `!yNI)t;w> rypiäK. smoßr>Ti 13b WhjeL_ .p;a]w: qv;x'â ybiä yKiÛ 14a Sobre as palmas das mãos carregar-te-ão, para que não batas33 teu pé em uma pedra. Sobre o leão e a serpente peçonhenta34 pisarás, 35 pisotearás o leãozinho e a cobra grande . Sim, prendeu-se em mim fortemente36 e eu trá-lo-ei para fora do perigo 37. 38 `ymi(v. [d;îy"-yKi( WhbeªG>f;a]÷ 14b hr'_c'b. ykiînOa'-AM)[i WhnE©[/a,w>) ŸynIae’r'q.yI 15a 39 Pô-lo-ei em um lugar alto porque penetrou o meu nome. 33 A raiz @g:n" (nāgap: “bater”, “golpear”, “ferir”) é um sinônimo para [g:n" (“tocar”, “ferir”, “lesar”), de onde provém o substantivo [g:n< (nāga„: “golpe”, “lesão”, “flagelo”) que aparece em 91,10b. 34 A tradução de !t,p, (péten) por “serpente peçonhenta” ou “cobra venenosa” (a venomous serpent) segue Brown; Driver; Briggs (1978, p. 837) e Harris; Archer, Jr..; Waltke (1998, p. 1252). Segundo Schökel e Carniti (1998, p. 1166), !t,p, “[...] é nome genérico de ofídio venenoso”. Em Kirst (1998, p. 202), oferecem-se “cobra” e “víbora”. 35 O significado de !yNit; (tannîn) é incerto. De acordo com Ronald F. Youngblood (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 1651), refere-se a qualquer grande réptil; aqui, a uma cobra grande especificamente. É possível traduzi-lo também por “crocodilo”, opção indicada em Kirst (2003, p. 268) e assumida por Chouraqui (1998, p. 141). Desse modo, a bênção de YHWH protetor assegura que o fiel pisoteará o leãozinho e o crocodilo. Esse é um retrato que se reconhece de imediato numa estela de esteatita, exposta no Museu Britânico, na qual se vê o menino Hórus, filho de Ísis, pisando sobre crocodilos, as mãos agarrando serpentes e, sobre sua cabeça, a efígie de Bēs (KEEL, 1978, figura XXVIII [apêndice de imagens entre as páginas 242 e 243]). Bēs era uma divindade popular egípcia, representada pela imagem de um pigmeu barbudo de aparência leonina que trazia na cabeça um cocar e na face, uma careta. Protetor do quarto de dormir e das parturientes, afastava demônios, serpentes e escorpiões. As descobertas arqueológicas sugerem que a veneração desse deus esteve bastante difundida na Palestina durante as Idades do Bronze Recente (1550 – 1150 AEC) e do Ferro (1150 – 586 AEC). Logo, não é impossível que essa formulação do Salmo 91 tenha sido apropriada pelo culto de YHWH do âmbito da religiosidade ligada a Bēs. Para maiores informações sobre Bēs, cf. SILVA, 2012, p. 43-49. 36 Em Koehler; Baumgartner (1994, p. 362), o primeiro sentido apresentado para qv;x' (hāšaq) é to be very attached to (“estar fortemente preso a”). Em seguida, to love somebody (“amar alguém”). 37 Em Koehler; Baumgartner (1996, p. 931), o primeiro sentido para o grau piel (ativo intensivo) de jl;P' (pālat) é to bring out (“trazer para fora”), isto é, to save (“salvar”). 38 O sentido do grau piel de bg:v' (šāgab) aqui é tornar seguro ou inacessível, proteger, defender (SCHÖKEL, 1997, p. 636). 39 No comentário sobre a ocorrência de [d:y" (yāda„) em Gn 4,1, Chouraqui (1995, p. 66) esclarece que essa raiz, cujo sentido é “conhecer por experiência concreta”, é usada com muita frequência para relações sexuais íntimas entre casais. Ressalta ainda: “O rigor do sentido concreto de „penetrar‟, com a ambivalência desta expressão, parece mais próximo do hebraico do que o eufemismo „conhecer‟, propagado em todas as traduções.” No comentário ao Salmo 91, traduz, portanto, a forma verbal hebraica do mesmo modo (CHOURAQUI, 1998, p. 141). 12 Clamará a mim e responder-lhe-ei; no aperto, eu mesmo (estarei) com ele, `Whde(B.k;a]w:) WhceªL.x;a]÷ 15b Wh[e_yBif.a; ~ymiy"â %r,aoå 16a `yti(['WvyBi( WhwEr>a;w>÷ 16b retirá-lo-ei e fá-lo-ei vultoso40. (Com) prolongamento de dias fartá-lo-ei e embriagá-lo-ei com minha largueza41. O Salmo 91 e as composições anterior e posterior possuem contornos bem marcados. O Salmo 90 recebe um cabeçalho: ~yhil{a/h'-vyai hv,mol. hL'piT. (tepillâ lemōšeh ‟îš hā‟elōhîm), “Uma oração para Moisés, o homem de Deus” (90,1). Esse tipo de frase designativa falta no Salmo 91, porém os dois primeiros versículos indicam o assunto do poema: YHWH é uma divindade protetora. Já o Salmo 92, por outro lado, apresenta cabeçalho: tB'V;h; ~Ayl. ryvi rAmz>mi (mizmôr šîr leyôm haššabbāt), “Um salmo, um cântico para o dia de sábado” (92,1). No Salmo 90, o texto é composto para ser proferido por um grupo de pessoas em uníssono. Isso pode ser percebido pelo uso exclusivo, por parte do eu-lírico42, da 1a pessoa do plural (“nós”). A divindade é a destinatária do poema. No Salmo 91, ouvemse, pelo menos, três declamadores: o primeiro, uma espécie de “arauto”, declara de que maneiras a divindade agirá em favor daquele que se coloca sob a proteção dela (91,1.38.19-13); o segundo é o protegido, o qual responde às declarações do primeiro declamador com expressões de confiança na divindade (91,2.9a); o terceiro declamador apresenta-se como a própria divindade, que faz promessas ao seu protegido (91,14-16). No Salmo 92, o eu-lírico divide-se em dois declamadores que se alternam na exaltação das obras e da justiça de YHWH e na afirmação da prosperidade dos justos. O primeiro declamador (92,2-4.8s.13s) é coletivo, o que é sugerido pelo discurso em 3a pessoa com 40 O grau piel da raiz db;K' (kābad) traduz-se como “fazer pesado”, no sentido de “honrar”. Usa-se aqui o adjetivo “vultoso” por comunicar bem, ao mesmo tempo, as acepções literal (“volume”) e metafórica (“honra”) expressas pelo termo hebraico. O sujeito “vultoso”, portanto, é alguém honrado, distinto, importante. Para o piel, Brown; Driver; Briggs (1978, p. 457), relacionam tanto to make heavy (“fazer pesado”) como to honour (“honrar”). 41 A tradução segue o sentido da raiz no árabe, “alargar” (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 680). Por isso, a fim de compor um paralelo com 16a, verteu-se o substantivo h['Wvy> (yešû„â) por “largueza”, isto é, liberalidade, generosidade. 42 O eu-lírico toma a palavra no texto poético a fim de expressar seus sentimentos e suas emoções (PEREIRA; PELACHIN, 2004, p. 24). 13 uma ocorrência da 1a pessoa do plural (92,14b); o segundo declamador (92,5-7.1012.15s) é individual, pois predomina o discurso na 1a pessoa do singular. No Salmo 90, a divindade é chamada pelos seguintes nomes: yn"doa] (‟adōnāy: “meu Senhor” [90.1, 17a]), lae (“’Ēl” [90,2b]), hw"hy> (“YHWH” [90,13a]) e Wnyhel{a/ (‟elōhênû: “Nosso ’Elōhîm” [90.17a]). No Salmo 91, a divindade recebe estas designações: !Ayl.[, (“‘Elyôn” [91.1a, 9b]), yD;v; (“Šadday” [91,1b]), hw"hy> (“YHWH” [91,2a, 9a]), yh;l{a/ (‟elōhay: “Meu ’Elōah” [91,2b]), ysix.m; (mahsî: “Meu abrigo” [91,2a, 9a]) e ytid"Wcm. (mesûdātî: “Minha cidadela” [91,2a]). No Salmo 92, denomina-se a divindade hw"hy> (“YHWH” [92,2a.5a.6a.9.14a.16a]), !Ayl.[, (“‘Elyôn” [92,2b]), Wnyhel{a/ (‟elōhênû: “Nosso ’Elōhîm” [92,14b]) e yrIWc (sûrî: “Minha rocha” [92,16b]). O Salmo 90 possui como tema a fragilidade do ser humano perante a perpetuidade de YHWH. Conforme indicado anteriormente, a matéria do Salmo 91 é a atividade protetora de YHWH em favor daquele que se põe sob seu cuidado. O Salmo 92, destinado para o culto no sábado, exalta as obras e a justiça de YHWH, afirma a prosperidade dos justos e decreta a ruína dos ímpios. A conclusão do Salmo 90 faz-se com uma fórmula de bênção e uma súplica (90,17): WhnEn>AK WnydEy" hfe[]m;W Wnyle[' hn"n>AK Wnydey" hfe[]m;W Wnyle[' Wnyhel{a/ yn"doa] ~[;nO ŸyhiywI (wîhî nō„am ‟adōnāy ‟elōhênû „ālênû ûma„aśeh yādênû kônenâ „ālênû ûma„aśeh yādênû kônenēhû), “E seja o favor do Senhor, nosso ’Elōhîm, sobre nós, e o fazer de nossas mãos firma sobre nós, e o fazer de nossas mãos, firma-o”. O Salmo 91 termina com a fala de YHWH, o qual faz promessas ao seu protegido (91,14-16). Encerra o Salmo 92 uma declaração feita na 1a pessoa do singular sobre a justiça de YHWH: AB ht'l'w>[;-aOlw> yrIWc (sûrî welō‟ „awelātâ), “Minha rocha e não (há) injustiças nele”. O conteúdo do Salmo 91 pode ser separado em três partes principais: abertura (1s), desenvolvimento do tema (3-13) e encerramento (14-16). É possível ainda identificar sete seções organizadas na forma de um quiasmo concêntrico: ABERTURA I – Promessa ao que se coloca sob a proteção de YHWH (1-2) A ARAUTO DE YHWH (1o DECLAMADOR): Sentar-se sob a cobertura de ‘Elyôn assegura o pernoite sob a sombra de Shadday (1). 14 PROTEGIDO DE YHWH (2o DECLAMADOR): YHWH é para ele abrigo, cidadela e apoio (2). DESENVOLVIMENTO DO TEMA II – As manifestações de YHWH em favor de seu protegido (3-4) ARAUTO DE YHWH: II.1 – Livramento (3): II.1.1 – Da armadilha do passarinheiro; II.1.2 – Da pestilência destruidora. II.2 – Abrigo sob as asas divinas (4a). II.3 – Sustentação (4b). B III – As ameaças que YHWH afastará de seu protegido (5-8) C ARAUTO DE YHWH: III.1 – O espanto da noite (5a); III.2 – A flecha que voa de dia (5b); III.3 – A pestilência que anda na escuridão (6a); III.4 – A epidemia que arruína ao meio-dia (6b); III.5 – A mortandade (7ab); III.6 – A impunidade dos malvados (8ab). IV – Declarações sobre “YHWH protetor” (9) X PROTEGIDO DE YHWH: YHWH é para ele abrigo (9a). ARAUTO DE YHWH : O protegido pôs sua morada em ‘Elyôn (9b). V – As ameaças que YHWH afastará de seu protegido (10) C’ ARAUTO DE YHWH: V.1 – O mal não sucederá ao protegido (10a); V.2 – O flagelo não se juntará à tenda do protegido de YHWH (10b). VI – As manifestações de YHWH em favor de seu protegido (11-13) B’ ARAUTO DE YHWH: VI.1 – A guarda dos emissários de YHWH (11s); VI.2 – A prevalência sobre animais perigosos (13ab). ENCERRAMENTO VII – As promessas de YHWH ao seu protegido (14-16) YHWH (3o DECLAMADOR): VII.1 – Resgate do perigo porque se prendeu fortemente em YHWH (14a); VII.2 – Colocação em lugar alto porque penetrou o nome divino (14b); 15 A’ VII.3 – Resposta ao clamor e companhia na aflição (15a); VII.4 – Resgate da aflição e honraria (15b); VII.5 – Prolongamento de dias (16a); VII.6 – Largueza (16b). O texto da composição apresenta-se bastante coeso. Conforme foi observado na delimitação da unidade literária, as mudanças nas pessoas do discurso ao longo do Salmo 91 podem ser explicadas como resultado da possível intenção do autor de que a composição fosse recitada por pelo menos três declamadores. A diagramação do conteúdo revelou a presença de um quiasmo concêntrico, cujo elemento central é um versículo constituído de dois membros paralelos que ressaltam a fé em YHWH como protetor. Na análise da crítica textual, chamou-se a atenção para 4b, que seria uma provável adição e deveria ser transposta para depois do versículo 7. Entretanto, segundo a argumentação exposta, sendo mantida após 4a, não perde o caráter de expressão metafórica da proteção de YHWH no que se refere às circunstâncias arroladas nos versículos 5, 6 e 7. Não representa, portanto, alteração tão significativa do fluxo textual. 3 Análise redacional O Salmo 91 faz parte das composições do quarto livro que integra o volume dos Salmos (90 – 106). Antecedendo o conjunto 93 – 100, os Salmos do reinado de YHWH (ZENGER, 2003, p. 314), aloja-se entre o Salmo 90, que recebe a designação hL'piT. (tepillâ: “oração”) no cabeçalho, mas já foi catalogado como “lamentação comunal” (GOTTWALD, 1988, p. 490), e o 92, cujo cabeçalho classifica-o com as nomenclaturas rAmz>mi (mizmôr: “Um salmo”) e ryvi (šîr: “Um cântico”), porém a análise literária moderna identifica-o como “cântico de ação de graças individual” (GOTTWALD, 1988, p. 491). Pode-se dizer que esses três salmos constituem uma espécie de preparação litúrgica para a celebração da realeza de YHWH. No Salmo 90, lamentam-se as faltas cometidas e as desgraças trazidas pela ira da divindade, seguindo-se, logo após, súplicas por sua piedade e seu amor. O Salmo 91 anuncia àquele que se coloca sob a proteção de YHWH o livramento de calamidades variadas. Por fim, o Salmo 92 é um cântico de 16 júbilo por causa das obras de YHWH que testemunham o seu amor e a sua fidelidade para com o justo. Desse modo, o contexto menor do Salmo 91 é formado pelos Salmos 90 e 92. Já que, com o 90 e o 92, prepara a celebração de YHWH como rei, é plausível delimitar o contexto maior do Salmo 91 no bloco 90 – 100 ([90 – 92] + [93 – 100]). A função do Salmo 91 aí é proporcionar a fé pela catequese, isto é, alentar, com o anúncio da proteção divina, aquele que suplica a piedade e o amor de YHWH em meio às desgraças. É significativo que o Salmo 92 utilize a imagem dos justos como “árvores plantadas na casa de YHWH”. Desse modo, fecha, no Templo de Jerusalém, o ciclo de preparação litúrgica para a aclamação do rei YHWH, a qual é também encerrada com a entrada triunfal pelas portas do santuário, seguida pela declaração: “Porque YHWH é bom, seu amor é perpétuo” (100,4.5a). 4 Análise da forma De acordo com Gottwald (1988, p. 493), o Salmo 91 é um “salmo de sabedoria”, destinado à instrução. Esse autor descreve a categoria, inscrita no conjunto dos gêneros literários de instrução e de meditação, desta maneira: Existe número considerável de salmos [...] que ostentam características familiares de escritos de sabedoria: (1) palavras-chave como “sabedoria”, “temor de Iahweh”, destinatários como “filhos”; (2) artifícios retóricos, como técnicas de perguntas e respostas, ditos numéricos, macarismos (“feliz aquele que...”); (3) tom acentuado de ensino e de admoestação; (4) preocupação com o sofrimento injusto, os ricos perversos, guia e proteção divinas dos piedosos [grifo nosso], e os dois caminhos, de obediência que conduz à vida e de desobediência que conduz à morte. Outras nomenclaturas têm sido sugeridas. Sellin e Fohrer (1977, p. 414, 423), por exemplo, consideram-no um “poema sapiencial e didático”. Noronha (2007, p. 169) prefere “salmo sapiencial”. Já Monloubou (1996, p. 66) propõe “salmo de proteção divina”. Raguer (1998, p. 33), de opinião semelhante, sugere “oráculo que promete a proteção divina”. O comentário de Schökel e Carniti (1998, p. 1159) arrola ainda mais possibilidades: Se atendermos ao tema e ao desenvolvimento, este salmo é sem dúvida um ato de confiança. Se atendermos a critérios e indícios formais, assomam gêneros diversos a partir do salmo. Os comentadores, tomando algum ou 17 alguns dos indícios, elevam-nos à categoria definitória, em instrutiva divergência de diagnósticos: liturgia de enfermo, liturgia de asilo no templo, liturgia real, liturgia de entrada no templo, exortação sapiencial, catequese. Cada tentativa de catalogação apóia-se em algum dado certo e lança mão de alguma conjetura. A maioria das propostas orienta-se para a liturgia, a qual pode ser o gênero ou a situação: um texto que fixa as fases da cerimônia ou um texto que se recita em contexto cultual. A referência litúrgica é provocada pela mudança de vozes no salmo. Dos pareceres expostos acima, emergem ao menos três categorias básicas: salmo sapiencial, salmo de proteção divina, liturgia. Todavia, parece claro que o tema do Salmo 91 é a proteção divina. Retomando a estrutura proposta anteriormente para essa composição, será que poderia servir como modelo literário para o gênero “salmo de proteção divina”? Pode ser feita uma tentativa com o Salmo 121, o qual Monloubou (1996, p. 66) e Raguer (1998, p. 33) reúnem na mesma classificação que dão ao Salmo 91. No quadro comparativo abaixo, percebe-se, de fato, que os conteúdos de ambos organizam-se basicamente nos mesmos elementos, com exceção de o quiasmo não ser concêntrico no caso do Salmo 121. É comum, inclusive, a presença de mais de uma voz. SALMO 91 SALMO 121 ABERTURA I. I.1 I.2 Promessa ao que se coloca sob a proteção de YHWH A [Arauto de YHWH]: Sentar-se sob I.1 [Protegido de YHWH]: Elevando a cobertura de ‘Elyôn assegura o os olhos para os montes, pergunta pernoite sob a sombra de Shadday por seu socorro (1) (1) [Protegido de YHWH]: YHWH é I.2 [Protegido de YHWH]: Declara para ele abrigo, cidadela e apoio (2) que seu socorro vem de YHWH (2) DESENVOLVIMENTO DO TEMA II. III. [Arauto de YHWH]: [Arauto de YHWH]: As manifestações de YHWH em favor de seu protegido B II.1 Livramento (3) II.1 O guarda de Israel, que não dorme II.1.1 Da armadilha do nem cochila, não deixará seu pé passarinheiro tropeçar (3s) II.1.2 Da pestilência destruidora II.2 Abrigo sob as asas divinas (4a) II.2 YHWH guarda-o (5) II.3 Sustentação (4b) II.3 YHWH é sua sombra à sua direita (5) As ameaças que YHWH afastará de seu protegido C III.1 O espanto da noite (5a) III.1 O sol que fere de dia (6) 18 III.2 III.3 III.4 III.5 III.6 IV. IV.1 IV.2 V. A flecha que voa de dia (5b) III.2 A lua que fere de noite (6) A pestilência que anda na escuridão (6a) A epidemia que arruína ao meio-dia (6b) A mortandade (7ab) A impunidade dos malvados (8ab) Declarações sobre “YHWH protetor” [Protegido de YHWH]: YHWH é abrigo para ele (9a) [Arauto de YHWH]: O protegido pôs sua morada em ‘Elyôn (9b) X [Arauto de YHWH]: As ameaças que YHWH afastará de seu protegido C’ V.1 O mal não lhe sucederá (10a) YHWH irá guardá-lo de todo mal (7a) V.2 O flagelo não se juntará à sua tenda (10b) VI. VI.1 VI.2 As manifestações de YHWH em favor de seu protegido B’ A guarda dos emissários de YHWH: YHWH guardará a garganta (vida) os pés do protegido não tropeçarão dele (7b) (11s) A prevalência sobre animais perigosos (13ab) ENCERRAMENTO VII. [YHWH]: As promessas de YHWH ao seu protegido VII.1 Resgate do perigo porque se prendeu fortemente em YHWH (14a) VII.2 Colocação em lugar alto porque penetrou o nome divino (14b) VII.3 Resposta ao clamor e companhia na aflição (15a) VII.4 Resgate da aflição e honraria (15b) VII.5 Prolongamento de dias (16a) VII.6 Largueza (16b) A’ YHWH guardará sua entrada e saída, agora e sempre (8) Quanto ao ambiente social de origem do Salmo 91, sugeriu-se que fora destinado ao culto no Templo de Jerusalém, provavelmente no período pós-exílico (SELLIN; FOHRER, 1977, p. 423). A frase de abertura (“Quem se sentar sob a cobertura de ‘Elyôn sob a sombra de Šadday pernoitará”), se comparada com Sl 27,4s43, por exemplo, sugeriria o Segundo Templo como local de origem da composição. Não é de estranhar que o sacerdócio comprometido com a exclusividade de YHWH e de seu 43 Observar a presença do vocábulo lk'yhe (hêkāl: “templo”) e da expressão Alh\a' rt,seB. (besēter ‟āholô: “sob a cobertura de sua tenda”). 19 culto no santuário de Jerusalém (REIMER, 2009, p. 48-50) estivesse também interessado em tornar aquele local o dispensador autorizado de medidas “profiláticas”. A assimilação de algumas divindades (‘Elyôn, Šadday, Bēs[?]) por YHWH, o rebaixamento de outras à categoria de demônios ou nomes genéricos para acontecimentos naturais (Réšep, Déber e Qéteb) e o empoderamento de YHWH como Deus único, cujo poder é manifesto na terra por meio de emissários (mal‟ākîm, no hebraico; ângueloi, no grego), são fenômenos que parece terem assumido contornos mais incisivos no período pós-exílico, isto é, a partir do final do século VI AEC.44 Considerações finais Com sua breve exegese, este artigo quer estimular outras investigações sobre o Salmo 91. É plausível perguntar que influência teve sobre a literatura judaica posterior. O livro de Tobias, que deve datar do início do século II AEC (LÍNDEZ, 2006, p. 30), parece desenvolver, em forma narrativa, várias de suas imagens: Deus envia o anjo Rafael para curar Tobit e Sara (Tb 3; Sl 91,10-12); Rafael guia Tobias à Média e ajudao a dominar um grande peixe que queria devorar seu pé (Tb 6; Sl 91,11-13); com as instruções de Rafael, Tobias livra Sara do demônio Asmodeu que atacava na noite de núpcias (Tb 8; Sl 91,5s.10s); Tobias presencia a derrota dos assírios (Tb 14; Sl 91,8). Sem dúvida, a poesia do Salmo 91 continuará a enriquecer a espiritualidade de tantos quantos quiserem refletir acerca de sua exaltação a YHWH protetor. Referências BOTTERWECK, G. Johannes; RINGGREN, Helmer (Ed.). Theological Dictionary of the Old Testament. Grand Rapids, Michigan: William B. Eerdmans Publishing Company, 1986. v. 5. 44 Um excelente estudo sobre como as memórias do Antigo Israel relativas às suas divindades foram moldadas pelo monoteísmo que se configurou entre os judeus no exílio e no pós-exílio acha-se em SMITH, 2006. 20 ______________. Theological Dictionary of the Old Testament. Grand Rapids, Michigan: William B. Eerdmans Publishing Company, 1990. v. 6. BRIGGS, Charles Augustus; BRIGGS, Emilie Grace. A critical and exegetical commentary on the book of Psalms. London; New York: T & T Clark Internacional LTD, 2004. v. 2. BROWN, Colin (Org.). Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2000. v. 1. BROWN, Francis; DRIVER, S. R.; BRIGGS, Charles A. A Hebrew and English Lexicon of the Old Testament. Oxford: Oxford University Press, 1978. CHOURAQUI, André. A Bíblia: No princípio (Gênesis). Rio de Janeiro: Imago, 1995. ______________. A Bíblia: Louvores (Salmos). Rio de Janeiro: Imago, 1998. DAHOOD, Mitchell. Psalms II: 50-100. Garden City, New York: Doubleday & Company, 1968. ELLIGER, K.; RUDOLPH, W. Biblia Hebraica Stuttgartensia. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1990. FRANCISCO, Edson de Faria. Manual da Bíblia Hebraica: Introdução ao texto massorético. São Paulo: Edições Vida Nova, 2003. GERSTENBERGER, Erhard (org.). Deus no Antigo Testamento. São Paulo: ASTE, 1981. GOTTWALD, Norman K. Introdução socioliterária à Bíblia Hebraica. São Paulo: Paulus, 1988. HARRIS, R. Laird; ARCHER, JR., Gleason L.; WALTKE, Bruce K. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998. KEEL, Othmar. The symbolism of the biblical world: Ancient Near Eastern iconography and the book of Psalms. New York: The Seabury Press, 1978. KELLY, Page H. Hebraico bíblico: Uma gramática introdutória. São Leopoldo: Sinodal, 1998. KILPP, Nelson. Os poderes demoníacos no Antigo Testamento. Estudos bíblicos, Petrópolis, n. 74, 23-36, 2002. KIRST, Nelson et al. Dicionário hebraico-português e aramaico-português. São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis: Vozes, 2003. 21 KOEHLER, Ludwig; BAUMGARTNER, Walter. The Hebrew and Aramaic Lexicon of the Old Testament. Leiden; New York; Köln: E. J. Brill, 1994. ______________. The Hebrew and Aramaic Lexicon of the Old Testament. Leiden; New York; Köln: E. J. Brill, 1995. ______________. The Hebrew and Aramaic Lexicon of the Old Testament. Leiden; New York; Köln: E. J. Brill, 1996. LÍNDEZ, José Vílchez. Tobias e Judite. São Paulo: Paulinas, 2006. MAINVILLE, Odette. A Bíblia à luz da história: Guia de exegese histórico-crítica. São Paulo: Paulinas, 1999. MONLOUBOU, L. et al. Os Salmos e os Outros Escritos. São Paulo: Paulus, 1996. NORONHA, Maria do Carmo. Os Salmos. São Leopoldo: CEBI, 2007. PEREIRA, Helena Bonito; PELACHIN, Marcia Maisa. Na trama do texto: Língua Portuguesa. São Paulo: FTD, 2004. RAGUER, Hilari. Para compreender os Salmos. São Paulo: Loyola, 1998. REIMER, Haroldo. Inefável e sem forma: Estudos sobre o monoteísmo hebraico. São Leopoldo: Oikos; Goiânia: UCG, 2009. RITTER, Nils C. Human-headed winged bull. Iconography of Deities in the Ancient Near East: an Iconographic Dictionary with special emphasis on firt-millennium BCE Palestine/Israel. Last Revision: November 2nd 2010. Disponível em: http://www.religionswissenschaft.unizh.ch.idd/prepublication_3.php. Acesso em: 05 nov. 2012. SCHÖKEL, Luis Alonso. Dicionário bíblico hebraico-português. São Paulo: Paulus, 1997. SCHÖKEL, Luis Alonso; CARNITI, Cecília. Salmos II: Salmos 73-150. São Paulo: Paulus, 1998. SELLIN, Ernst; FOHRER, Georg. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Paulinas, 1977. SILVA, Ruben Marcelino Bento da. Assombrações na Bíblia judaica: Estudo classificatório sobre tradições folclóricas de demônios e fantasmas difundidas no Antigo Israel e subjacentes aos textos hebraicos canônicos. 2012. 122 p. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Teologia, Escola Superior de Teologia, São Leopoldo, 2012. 22 ______________. Louvor ao Guardião da Cama: Uma Análise do Salmo 91 à Luz da Veneração à Divindade Protetora Bés. In: COLÓQUIO DE HISTÓRIA, 4, 2010, Anais Eletrônicos. Recife: FASA, Universidade Católica de Pernambuco, 2010. SIMIAN-YOFRE, Horácio. Metodologia do Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 2000. SMITH, Mark S. O memorial de Deus: história, memória e a experiência do divino no Antigo Israel. São Paulo: Paulus, 2006. TOORN, Karel van der; BECKING, Bob; HORST, Pieter W. van der. Dictionary of deities and demons in the Bible. Leiden; Boston; Köln: Brill, 1999. WEISER, Artur. Os Salmos. São Paulo: Paulus, 1994. Artigo recebido em 05.11.2012 Artigo aprovado em 22.12.2012 23