AP e Afecções Medulares

Transcrição

AP e Afecções Medulares
LUIZ EDUARDO CARVALHO BUQUERA
ACUPUNTURA NO TRATAMENTO DAS AFECÇÕES
COMPRESSIVAS DA MEDULA ESPINHAL CERVICAL
E LOMBOSSACRA
Botucatu
2003
LUIZ EDUARDO CARVALHO BUQUERA
ACUPUNTURA NO TRATAMENTO DAS AFECÇÕES
COMPRESSIVAS DA MEDULA ESPINHAL CERVICAL
E LOMBOSSACRA
Monografia apresentada à Faculdade de
Medicina
Veterinária
e
Zootecnia
da
Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho”, campus de Botucatu, como
parte integrante do Curso de Especialização
em Acupuntura Veterinária.
Orientadores: Prof. Dr. Stélio Pacca L. Luna.
Prof. Jean G. F. Joaquim.
Botucatu
2003
Dados curriculares do autor
LUIZ EDUARDO CARVALHO BUQUERA
NASCIMENTO:
FILIAÇÃO:
27.11.1974 – CURITIBA/PR
Luiz Affonso de Loyola Buquera
Maria Helena Carvalho Buquera
1992/1997:
Curso de graduação em Medicina Veterinária –
Universidade Federal do Paraná (UFPR).
1998/2000:
Curso de Pós-graduação em Cirurgia Veterinária
– Nível: Mestrado – Faculdade de Ciências
Agrárias e Veterinárias / Universidade Estadual
2000/2003:
Curso de Pós-graduação em Cirurgia Veterinária –
Nível: Doutorado – Faculdade de Ciências Agrárias e
Veterinárias
/
Universidade
Estadual
(FCAV/UNESP) – em andamento.
Paulista
À
Ivia
pelo
amor,
companheirismo
e
sonhos
compartilhados que serviram de estímulo para que eu
persistisse, mesmo diante de dificuldades.
Aos meus pais, Luiz Affonso e Maria Helena, pelo
amor, educação, esforço e sacrifício, que foram
decisivos em todas as etapas que superei em minha
vida.
Aos animais que contribuíram para minha formação
profissional, me ensinaram a valorizar ainda mais o
prazer de sua companhia e me estimularam a lutar pelo
seu bem-estar.
Dedico.
Agradecimentos
Aos meus irmãos, avós, tios, primos, cunhados, sogros e
sobrinhos pelo convívio e apoio.
Ao Professores Stelio, Jean e Diniz pela orientação, pelos
ensinamentos e pela disponibilidade ao atender os alunos.
Á professora Lílian pelos ensinamentos.
Aos amigos Cássia, Daniel e Malú, pela amizade e
hospitalidade com que me receberam em suas casas durante o
período de realização do curso.
Ao Eduardo, companheiro de trabalho e das viagens à
Botucatu.
Aos colegas do Curso de Especialização em Acupuntura
Veterinária pelo convívio harmonioso.
À funcionária Roberta pela atenção dispensada quando
solicitada.
À bibliotecária Cássia pelo auxílio com a pesquisa na
internet.
Aos meus amigos caninos (Ardley, Thor, Tobi, Alpha,
Diana, Beta, Fred, Negão, Branquinho e Feiosa) e felinos
(Cookie e Let It Be), pela amizade e muitos momentos felizes
que proporcionaram.
À Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da
Universidade Estadual Paulista - Câmpus de Botucatu, em
particular
ao
Curso
de
Especialização
Veterinária, por ter me acolhido.
em
Acupuntura
“Os cães são nosso elo com o paraíso. Eles não sabem o que é
maldade, inveja ou insatisfação. Sentar numa colina ao lado de um cão,
numa tarde maravilhosa, é estar de volta ao Éden, onde não fazer nada
não era tédio – era paz”.
Milan Kundera
Sumário
LISTA DE ABREVIATURAS E SÍMBOLOS................................................6
1 INTRODUÇÃO.........................................................................................7
2 REVISÃO DA LITERATURA....................................................................9
2.1 Afecções Compressivas da Medula Espinhal Cervical – Medicina
Ocidental.....................................................................................................9
2.1.1 Doença do Disco Intervertebral Cervical............................................9
2.1.2. Espondilomielopatia Cervical Caudal..............................................14
2.2 Afecções Compressivas da Medula Espinhal Lombossacra – Medicina
Ocidental ..................................................................................................19
2.3 Afecções Compressivas da Medula Espinhal Cervical – Medicina
Tradicional Chinesa...................................................................................24
2.3.1- Doença do Disco Intervertebral Cervical.........................................24
2.3.2 – Espondilomielopatia Cervical Caudal............................................31
2.4 Afecções Compressivas da Medula Espinhal Lombossacra – Medicina
Tradicional Chinesa...................................................................................32
2.4.1 - Síndrome da cauda eqüina............................................................32
2.4.2 - Dor lombar......................................................................................34
3 CONCLUSÕES......................................................................................38
4 REFERÊNCIAS......................................................................................40
Lista de Abreviaturas
B - meridiano bexiga
BP - meridiano baço-pâncreas
C - meridiano coração
C - vértebra cervical
DDIC - doença do disco intervertebral cervical
DDITL – doença do disco intervertebral toracolombar
DIV - disco intervertebral
E - meridiano estômago
ECC - espondilopatia cervical caudal
EMCC - espondilomielopatia cervical caudal
Hz – hertz
ID - meridiano intestino delgado
IG - meridiano intestino grosso
L - vértebra lombar
MTC – medicina tradicional chinesa
mV – milivolt
NMI - neurônio motor inferior
Pc - meridiano pericárdio
R - meridiano rim
S - vértebra sacral
SNC - sistema nervoso central
TA - meridiano triplo aquecedor
VB - meridiano vesícula biliar
VC - meridiano vaso concepção
VG - meridiano vaso governador
1 - Introdução
A doença do disco intervertebral toracolombar (DDITL) e a doença
do disco intervertebral cervical (DDIC) ocorrem com importante freqüência
na
prática
veterinária
de
pequenos
animais,
afetando,
predominantemente, cães de raças condrodistróficas, principalmente
entre
5
a
6
anos
de
idade.
Ambas
são
responsáveis
por
aproximadamente 15% e 85% das hérnias de disco. O tratamento pode
consistir de cirurgia, de medicação ou de ambos. A acupuntura também
tem sido utilizada como tratamento para DDIC e DDITL. Com poucas
exceções, os resultados do tratamento com acupuntura para DDITL e
DDIC são favoráveis e comparáveis aos dos tratamentos cirúrgicos
(JANSSENS, 1992).
O mecanismo de ação da acupuntura para doença do disco
intervertebral ainda não é completamente entendido (JANSSENS, 2001).
Existem muitas evidências de que os efeitos da acupuntura, incluindo
seus efeitos analgésicos, são mediados pelo sistema nervoso central. A
liberação de fatores humorais específicos e não-específicos está
envolvida (STILL, 1989).
Os seguintes mecanismos podem ocorrer. A acupuntura pode
destruir trigger points (pontos dolorosos) e assim abolir a dor muscular, o
encurtamento muscular, a rigidez, e a dor referida. Também pode atuar
ativando a recuperação dos axônios destruídos na medula espinhal e
diminuindo a inflamação espinhal local, o edema, a vasodilatação ou a
vasoconstrição e a liberação de cininas ou de histamina. Isto diminui a
formação de tecido cicatricial, a compressão da medula espinhal e a dor
(JANSSENS, 2001).
Os resultados clínicos do tratamento com acupuntura e o
prognóstico
para
a
completa
recuperação
funcional
decrescem
proporcionalmente à severidade dos danos morfológicos à medula
espinhal (STILL, 1989).
A despeito dos diversos casos relatados de tratamentos bem
sucedidos com acupuntura, em cães com doença do disco intervertebral,
somente dois autores executaram estudos detalhados em grandes grupos
de cães com DDITL, e somente um em cães com DDIC (JANSSENS,
2001).
O presente estudo tem como finalidade abordar as principais
afecções compressivas dos segmentos cervical e lombosacral da medula
espinhal sob os aspectos da medicina ocidental e da medicina tradicional
chinesa e de suas adaptações realizadas no ocidente.
No capítulo referente à medicina tradicional chinesa, alguns trechos
do texto adotam abordagens miscigenadas com a visão ocidental da
medicina, uma vez que os artigos consultados foram redigidos por
clínicos, cujo raciocínio apresenta-se, de alguma forma, vinculado à
medicina ocidental.
2 - Revisão de Literatura
2.1 - Afecções Compressivas da Medula Espinhal Cervical – Medicina
Ocidental.
2.1.1 – Doença do Disco Intervertebral Cervical (DDIC)
As discopatias intervertebrais constituem os distúrbios neurológicos
mais comuns diagnosticados em pacientes veterinários (SEIM III, 2001). A
DDIC representa cerca de 14% a 16% das doenças que afetam o disco
intervertebral (DIV), sendo a segunda forma de doença mais comum
nesta estrutura (PADILHA FILHO & SELMI, 1999).
Animais de raças de pequeno porte, particularmente aqueles com
características
condrodistróficas,
são
mais
comumente
afetados
(PADILHA FILHO & SELMI, 1999; WHEELER & SHARP, 1999; SEIM III,
2001). As raças Dachshund, Poodle miniatura e Beagle representam
aproximadamente 80% dos casos observados mais freqüentemente nos
animais entre quatro e oito anos de idade (PADILHA FILHO & SELMI,
1999; SEIM III, 2001). Não existe preponderância da afecção com relação
do sexo do animal (WHEELER & SHARP, 1999; SEIM III, 2001).
Afecções dos DIV são muito raras em cães com menos de um ano
de
idade,
portanto,
outras
condições
devem
ser
primeiramente
consideradas, tais como, afecção inflamatória do sistema nervoso central,
subluxação atlanto-axial ou discoespondilite (WHEELER & SHARP,
1999).
Cães da raça Dobermann sofrem de DDIC como parte da síndrome
de espondilomielopatia cervical caudal (WHEELER & SHARP, 1999).
A degeneração discal é dividida em duas categorias distintas,
referidas como Hansen de Tipo I e Hansen de Tipo II. A degeneração
contínua e protrusão (Hansen de Tipo II) ou extrusão (Hansen de Tipo I)
subseqüentes
dos
fragmentos
discais,
ocorrem
espontânea
ou
secundariamente a traumatismos (SEIM III, 2001). A maioria das
ocorrências é do tipo I de Hansen (extrusão). Hérnias do tipo II de Hansen
(protrusões) ocorrem geralmente em cães de raças de grande porte
(WHEELER & SHARP, 1999; SEIM III, 2001). O espaço intervertebral
C2/C3 é atingido com maior freqüência, com a incidência diminuindo
caudalmente (PADILHA FILHO & SELMI, 1999; WHEELER & SHARP,
1999; SEIM III, 2001). O acometimento dos três primeiros discos
intervertebrais cervicais representa cerca de 90% da localização da
doença (PADILHA FILHO & SELMI, 1999). O DIV C6/C7 raramente é
afetado, com exceção dos Dobermanns e de outras raças de grande
porte, como parte da espondilomielopatia cervical caudal (WHEELER &
SHARP, 1999). Segundo Padilha Filho & Selmi (1999), as freqüências de
acometimento dos discos intervertebrais são C2/C3 (40%), C3/C4 (25%),
C4/C5 (15%), C5/C6 (10%) e C6/C7 (10%).
Os sinais clínicos podem variar desde dor cervical a ataxia,
hemiparesia, tetraparesia ou plegia. Não é rara a presença de dor cervical
associada à claudicação em membro torácico (PADILHA FILHO & SELMI,
1999). O sinal clínico predominante é dor acentuada no pescoço, que
pode ser aguda ou crônica. Freqüentemente, a dor é constante e nãoresponsiva à medicação. Esta é uma das poucas condições que
produzem vocalização espontânea por dor em cães (PADILHA FILHO &
SELMI, 1999; WHEELER & SHARP, 1999).
Cães afetados podem ser relutantes para se alimentar, a menos
que o alimento esteja elevado em relação ao piso. Ao examinar o
paciente, geralmente não é necessário flexionar e estender o pescoço
para se ter demonstração de dor (WHEELER & SHARP, 1999).
Normalmente, observa-se espasticidade da musculatura cervical e
exacerbação da dor durante a palpação da região (PADILHA FILHO &
SELMI, 1999; WHEELER & SHARP, 1999).
Se o material discal extruir na direção dorsolateral (entre o
ligamento longitudinal dorsal e o seio venoso vertebral), ocorrerão
compressão da raiz nervosa e dor. Esta é a localização mais comum de
extrusão discal cervical em cães. Se o material discal extruir diretamente
na linha média (entre as fibras do ligamento longitudinal dorsal), causará
uma compressão do cordão espinhal e tetraparesia subseqüente. Esses
pacientes também podem exibir dor cervical como resultado do
aprisionamento das raízes nervosas nos forames intervertebrais (SEIM III,
2001).
Ocasionalmente, os pacientes sofrem dor cervical e claudicação do
membro torácico (monoparesia) como resultado de uma extrusão discal
dorsolateral na espinha cervical inferior (C4-C7), aprisionando uma raiz
nervosa que supre o plexo braquial (SEIM III, 2001).
Deficiências neurológicas relacionadas à compressão do segmento
cervical da medula espinhal podem ser notadas: paresia ou claudicação
em membro torácico são mais freqüentes. Contudo, qualquer sinal
relacionado com a compressão do segmento cervical da medula espinhal
pode ocorrer, incluindo hemiparesia e tetraparesia (WHEELER & SHARP,
1999).
Radiografias laterais e ventrodorsais bem posicionadas da espinha
cervical podem ser diagnósticas, quanto à presença de discopatias
cervicais. Os achados clássicos em radiografias simples incluem
estreitamento do espaço intervertebral, colapso das facetas articulares,
opacificação do forame intervertebral e “trilha” de material discal
calcificado no canal espinhal. Os pacientes com herniação de disco
cervical exibem sinais compatíveis com uma massa extradural (SEIM III,
2001).
Radiografias cervicais oblíquas são indicadas quando se deseja
observar extrusão de disco intraforaminal ou lateral. O paciente deve ser
colocado em decúbito dorsal, com a espinha cervical posicionada em
ângulo de 45 a 60o em relação à mesa. Os forames intervertebrais
esquerdos devem ser vistos quando a espinha ficar em posição oblíqua
direita e vice-versa. A opacificação do forame é diagnóstica de extrusão
de disco intraforaminal (SEIM III, 2001).
O diagnóstico é confirmado através de exame radiográfico simples
em 60% dos casos, sendo necessária a mielografia nos outros 40%, que
deverá ser realizada após exclusão de outras afecções que podem
apresentar a mesma sintomatologia como: discoespondilite, meningite,
subluxação atlanto-axial, entre outras (PADILHA FILHO & SELMI, 1999).
Não obstante, SEIM III (2001) indica a mielografia em 90 a 95% dos
pacientes com alteração em disco cervical.
O diagnóstico diferencial varia conforme a idade do animal e a
presença de dor:
- Cão jovem com dor na região cervical: subluxação atlanto-axial, afecção
inflamatória do sistema nervoso central, discospondilite, distúrbio
congênito, traumatismo e neoplasia;
- Cão adulto com dor na região cervical: discospondilite, neoplasia,
traumatismo e afecção do sistema nervoso central;
- Cão sem dor na região cervical: mielopatia isquêmica e neoplasia
(WHEELER & SHARP, 1999).
Os
tratamentos
variam
desde
restrição
ao
exercício
e
administração de corticosteróides a procedimentos cirúrgicos como
fenestração
ventral,
descompressão
ventral,
hemilaminectomia
e
facetectomia por acesso lateral e laminectomia dorsal (PADILHA FILHO &
SELMI, 1999).
O tratamento pode ser conservador ou cirúrgico.
O tratamento conservador requer repouso em gaiola e uso de
medicação antiinflamatória. É apropriado experimentar este método em
qualquer paciente, a menos que marcantes deficiências neurológicas
estejam presentes. Geralmente, drogas antiinflamatórias não-esteróides
são utilizadas. A dor observada na discopatia cervical parece ser menos
responsiva ao tratamento não cirúrgico do que a produzida por discopatia
toracolombar. A progressão dos sinais ou a falta de resposta em uma ou
duas semanas indica falha no tratamento. Recidiva dos sinais clínicos
depois deste tipo de tratamento ocorre em 36% dos pacientes (WHEELER
& SHARP, 1999).
O tratamento cirúrgico é indicado no caso de falha do tratamento
anteriormente descrito, da presença de deficiências neurológicas
marcantes ou progressivas e de dor incessante. Os procedimentos mais
freqüentemente praticados são fenestração ventral ou descompressão
ventral.
Raramente
são
requeridas
laminectomia
dorsal
ou
hemilaminectomia (WHEELER & SHARP, 1999).
Atualmente, acredita-se que a descompressão ventral seja o
melhor tratamento. Uma acurada identificação do disco envolvido é
necessária antes de se praticar a descompressão ventral. A remoção do
material do disco do canal vertebral fornece a mais rápida resolução dos
sinais clínicos. Cães que tenham dor de longa duração e deficiências
neurológicas, geralmente responderão bem à descompressão (WHEELER
& SHARP, 1999).
A fenestração é procedimento profilático útil e pode ser praticada
em outros discos cervicais por ocasião da descompressão (WHEELER &
SHARP, 1999). A fenestração ventral produz bons resultados com taxa de
recidiva nula, apresentando-se como excelente alternativa no tratamento
das hérnias do disco intervertebral cervical, desde que bem selecionados
os pacientes, principalmente quanto aos diagnósticos diferenciais. A
fenestração ventral é uma técnica relativamente simples, que não requer
instrumental específico ou oneroso, sendo, portanto, passível de
utilização pela maioria dos cirurgiões veterinários (PADILHA FILHO &
SELMI, 1999).
Os resultados obtidos no estudo de Padilha Filho & Selmi (1999)
mostraram que a fenestração ventral foi excelente alternativa para o
tratamento das hérnias de disco cervicais, uma vez que produziu
resultados satisfatórios, sem que fosse necessário maior trauma tecidual,
como é o caso dos procedimentos descompressivos. O tempo de
recuperação completa dos pacientes, porém, foi mais demorado quando
comparado à descompressão ventral, realizada por outros autores.
2.1.2. – Espondilomielopatia Cervical Caudal
Espondilomielopatia cervical caudal (EMCC) é uma síndrome de
cães de raças de grande porte ou gigantes, também conhecida como
síndrome de Wobbler (WHEELER & SHARP, 1999). Os Dogues Alemães
e os Dobermanns são afetados com maior freqüência (LINCOLN, 1992;
WHEELER & SHARP, 1999).
A EMCC é uma doença multifatorial, caracterizada pela presença
de estenose do canal vertebral ocasionada por má formação da lâmina
vertebral, hipertrofia do ligamento amarelo, alargamento das facetas
articulares, produção de osteófito ou hipertrofia dos tecidos periarticulares
(proliferação da cápsula articular, por exemplo) (LINCOLN, 1992;
WHEELER & SHARP, 1999).
Estenose é observada na porção cranial das vértebras cervicais e
ocorre com maior freqüência nas vértebras C4 a C6 em Dogues Alemães
e C5 a C7 em Dobermanns (WHEELER & SHARP, 1999).
Alterações secundárias à má formação dos corpos e das placas
terminais vertebrais causam instabilidade e subseqüente falência do disco
intervertebral e protrusão dentro do canal vertebral. Protrusões de disco
do tipo II de Hansen são vistas predominantemente em Dobermanns
adultos, possivelmente como resultado de má formação dos corpos
vertebrais de C6 ou C7 (LINCOLN, 1992).
A compressão afeta principalmente a porção caudal da medula
espinhal cervical, resultando em ruptura dos tratos motores e sensoriais e,
conseqüentemente, disfunção neurológica (LINCOLN, 1992; WHEELER &
SHARP, 1999). Os sinais clínicos refletem lesão da medula espinal
(mielopatia) ou lesão das raízes nervosas espinais (radiculopatia), ou
ambas. A radiculopatia é, provavelmente, importante fator contribuinte
para a dor, claudicação e atrofia da musculatura do ombro (WHEELER &
SHARP, 1999).
A apresentação mais comum é de distúrbio na locomoção, mais
grave nos membros pélvicos, variando desde ligeira ataxia e paresia, até
marcante hipermetria dos membros pélvicos e marcha de passo curto nos
membros torácicos. Hiperestesia cervical, proteção do pescoço e baixa
sustentação da cabeça podem ser notadas. Claudicação e atrofia
muscular em um membro torácico, e dor quando tração é aplicada ao
membro, sugerem que está ocorrendo compressão de raiz nervosa
(WHEELER & SHARP, 1999).
Os sinais clínicos podem ser observados em cães jovens,
particularmente Dogues Alemães com estenose grave do canal vertebral.
Entretanto, a maioria dos cães de outras raças demonstra sinais a partir
da meia idade (WHEELER & SHARP, 1999).
Atenção especial deve ser dada ao exame físico, evitando ignorar a
presença de outras afecções tais como displasia coxofemoral, ruptura dos
ligamentos cruzados bilateralmente, ou poliartropatia como a causas de
fraqueza nos membros pélvicos (LINCOLN, 1992). Hipotireoidismo,
moléstia de Von Willebrand, cardiomiopatia e hepatite crônica são
afecções importantes que podem coexistir com a EMCC e devem ser
pesquisadas (WHEELER & SHARP, 1999).
O exame neurológico demonstra reflexos normais ou exagerados
nos membros pélvicos. Deficiências proprioceptivas conscientes são mais
pronunciadas nos membros pélvicos. Nos membros torácicos, a atrofia
dos músculos espinosos geralmente constitui-se na única manifestação
de acometimento do neurônio motor inferior (NMI) (WHEELER & SHARP,
1999).
Radiografias de triagem devem ser obtidas sob anestesia geral e
são úteis para excluir outras afecções, embora não indiquem a localização
exata do ponto de compressão da medula espinal (LINCOLN, 1992;
WHEELER & SHARP, 1999).
O auxílio diagnóstico mais importante para definir a natureza e a
localização da compressão da medula espinhal é a mielografia. Projeções
radiográficas em dois planos (látero-lateral e ventro-dorsal) devem ser
realizadas para avaliação adequada (LINCOLN, 1992; WHEELER &
SHARP, 1999). Devido à possibilidade de ocorrer convulsão após
mielografia, drogas pré-anestésicas tais como derivados fenotiazínicos e
neurolépticos deverão ser evitadas, pois elas diminuem o limiar
convulsivo. O pré-tratamento com diazepam é recomendado. É realizada
punção
na
cisterna
magna,
seguida
por
colheita
de
líquido
cerebroespinhal para análise, e infusão cuidadosa de agente de contraste
no espaço subaracnóide. Os modernos agentes de contraste solúveis em
água são seguros (LINCOLN, 1992).
Quando a compressão da medula espinhal está presente devido à
estenose do canal vertebral observada em cães jovens, perda
circunferencial da coluna de contraste e estreitamento da medula espinhal
serão notados. Se estiver presente protrusão de disco intervertebral,
haverá compressão do aspecto ventral da medula espinhal. Em lesões
mais crônicas, a compressão será vista associada com alterações
proliferativas e degenerativas circundando as facetas articulares e com
espessamento das cápsulas articulares e ligamento amarelo (LINCOLN,
1992).
A tração a e flexão do pescoço geralmente resultam em redução
marcante na compressão da medula espinal causada por anel fibroso ou
tecido ligamentar redundantes. Uma lesão que melhora desta maneira é
denominada dinâmica. Se o pescoço for estendido, a compressão se
tornará mais severa. A extensão do pescoço de um cão com lesão
dinâmica e sob anestesia geral é desaconselhável devido à possibilidade
de ocorrer compressão e lesão adicional da medula espinhal. Não
obstante, a herniação do núcleo pulposo não melhora significativamente
pela tração e é denominada estática (LINCOLN, 1992; WHEELER &
SHARP, 1999).
Afecção degenerativa da medula espinal, mielopatia isquêmica,
anomalias congênitas, discospondilite, afecção inflamatória do SNC,
neoplasia espinal, tumor do plexo braquial, cisto aracnóide, traumatismo e
lesão tóraco-lombar (se os sinais estiverem limitados aos membros
pélvicos) devem ser considerados no diagnóstico diferencial (WHEELER
& SHARP, 1999).
O tratamento conservador pode ser recomendado para cães que
estão andando e apresentam déficits neurológicos leves. Contudo, a
cirurgia deve ser considerada, visto que a maioria dos cães sofrerá lenta,
porém, progressiva deterioração (LINCOLN, 1992; WHEELER & SHARP,
1999).
O tratamento conservador inclui restrição a exercícios, restrição da
mobilidade da coluna cervical, e terapia com corticosteróides. Quando
uma lesão dinâmica está presente, exercício restrito ou repouso em gaiola
ajudarão a diminuir a mobilidade na lesão, desse modo retardando
significativamente sua natureza progressiva. O uso de colar cervical tem
sido sugerido, embora os cães freqüentemente não o tolerem. Quando os
proprietários de cães com lesões dinâmicas selecionam o tratamento
conservador, eles deverão ser alertados que a doença é progressiva e
que atividades de esforço podem rapidamente resultar em exacerbação
aguda dos sinais clínicos (LINCOLN, 1992).
Diferentes técnicas cirúrgicas têm sido propostas para o tratamento de
EMCC, com muitos dos autores alegando taxas entre 70 e 80% de
sucesso. O meio para se obter os melhores resultados é considerar os
três tipos básicos de cirurgia, e para praticá-los estar seguro de suas
indicações.
As indicações básicas para cada um dos procedimentos cirúrgicos
estão resumidas no quadro 1 (WHEELER & SHARP, 1999).
Quadro 1 – Indicações gerais para o procedimento cirúrgico na
Espondilomielopatia Cervical Caudal.
PROCEDIMENTO
INDICAÇÃO
LESÃO
Lesão estática (ventral) Hérnia de disco
Descompressão
ventral
Distração
(afastamento)
/fusão
vertebral
Metal e cimento ósseo Lesão
(ou parafuso e arruela)
dinâmica Anel
simples
fibroso
protuberante
ou
ligamento amarelo
Parafusos e arruela
Lesões
dinâmicas Anel
múltiplas
fibroso
protuberante
ou
ligamento amarelo
Descompressão dorsal Lesão estática (dorsal) Estenose
canal
óssea
do
vertebral,
osteofitose
do
processo articular
Múltiplos
locais
compressão
de Todos
os
tipos
de
lesão
A localização exata da lesão compressiva deverá ser conhecida
antes de se iniciar o tratamento cirúrgico. Corticosteróides deverão ser
administrados antes da cirurgia para reduzir a inflamação causada pela
manipulação da medula espinhal. Succinato sódico de metilprednisolona
é atualmente o corticosteróide de escolha. A terapia pode ser mantida
após a cirurgia com dexametasona (LINCOLN, 1992).
A deterioração pós-operatória ocorre freqüentemente em cães
portadores de EMCC. As razões potenciais para tal deterioração incluem
as seguintes:
• Remoção
inadequada
do
material
do
disco
durante
a
descompressão ventral;
•
Exacerbação
da
instabilidade
devido
a
procedimentos
descompressivos;
•
Lesão isquêmica ou de reperfusão da medula espinhal;
•
Traumatismo auto-induzido;
•
Falha no implante (quantidade excessiva de cimento ósseo, por
exemplo);
• Efeito dominó (tensão anormal imposta a um espaço intervertebral
pela fusão do espaço imediatamente cranial ou caudal) (WHEELER &
SHARP, 1999).
Devido às variações das lesões da medula espinhal, o prognóstico não
é previsível (LINCOLN, 1992). Dos cães que estavam caminhando antes
da cirurgia e apresentavam lesões simples, em torno de 80%, terão
resultados favoráveis. Contudo apenas cerca de 40% daqueles que não
podiam
andar,
se
recuperarão.
Estas
taxas
de
sucesso
são
aproximadamente 20% menores para cães com duas lesões (WHEELER
& SHARP, 1999).
2.2 Afecções Compressivas da Medula Espinhal Lombossacra – Medicina
Ocidental.
As doenças que acometem as articulações lombosacrais são
importantes causas de disfunções neurológicas e diferem das outras
afecções da coluna vertebral devido à anatomia singular desta região
(SELMI & PEREIRA, 1998; WHEELER & SHARP, 1999). O canal
vertebral da porção caudal da coluna vertebral lombar não contém medula
espinhal, sendo ocupado porém, pela cauda eqüina. Esta é o conjunto de
nervos periféricos que constituem a porção terminal da medula espinhal.
A medula espinhal termina no nível da vértebra L6 na maioria dos cães e
em L7 nos gatos (WHEELER & SHARP, 1999).
Crê-se que a degeneração do disco intervertebral entre L7 e S1,
seguida da formação de osteófitos, sejam os agentes causadores desta
patologia. Associado à perda da função do disco intervertebral ocorre
estreitamento do forame intervertebral e subluxação das facetas
articulares. Tal fato pode levar a espessamento e invaginação do
ligamento amarelo. A asssociação de tais processos causaria então a
compressão da cauda eqüina (SELMI & PEREIRA, 1998).
A articulação lombossacra é local de considerável transferência de
forças, estando sujeita a alterações degenerativas. O principal movimento
desempenhado por esta articulação é a flexão, embora possa ocorrer
algum movimento rotacional. A movimentação é limitada por várias
estruturas
ligamentares
e
pelo
disco
intervertebral.
Alterações
degenerativas nestas estruturas, particularmente a degeneração de disco
do tipo II de Hansen, podem alterar a mobilidade, conduzindo
freqüentemente a alterações esqueléticas compensatórias, tais como
espondilose deformante, proliferação de osteófitos e crescimento de
tecidos moles das cápsulas articulares. Estas alterações, por si só, podem
levar a problemas clínicos derivados da compressão de estruturas neurais
do canal vertebral e forame intervertebral (WHEELER & SHARP, 1999).
O termo patologia lombossacral indica qualquer disfunção destas
articulações, enquanto que compressão da cauda eqüina implica no
déficit neurológico localizado à medula espinhal terminal e raízes
nervosas adjacentes. A patogênese da compressão e seu tratamento
variam de acordo com a alteração presente (SELMI & PEREIRA, 1998).
Doenças da articulação lombosacra provavelmente envolvem os nervos
de L7, sacrais e caudais. Estes nervos contribuem para a inervação dos
membros pélvicos, cauda, períneo, bexiga e esfíncter anal (WHEELER,
1992).
Cães de raças de grande porte são mais freqüentemente
envolvidos, principalmente entre os 5 e 6 anos de idade. Contudo,
ocasionalmente cães de raças de pequeno porte são afetados (SELMI &
PEREIRA, 1998; WHEELER & SHARP, 1999). Pastores Alemães, Border
Collies e Retrievers do Labrador são acometidos com maior freqüência.
Os machos são mais predispostos do que as fêmeas, particularmente
entre os Pastores Alemães (WHEELER, 1992; SELMI & PEREIRA, 1998).
A condição é vista em grande variação de idade de cães, mas é rara em
gatos. Cães jovens muito ativos, submetidos anteriormente a treinamento
para trabalho são particularmente propensos a apresentar este distúrbio
(SELMI & PEREIRA, 1998; WHEELER & SHARP, 1999).
A etiologia da síndrome da cauda eqüina é amplamente descrita,
incluindo extrusão aguda de disco intervertebral, espondilose, estenose
do canal vertebral, proliferação dos tecidos moles (cápsula articular ou
estruturas
ligamentares),
discoespondilite,
neoplasia
primária
ou
secundária, trauma e embolia fibrocartilaginosa (SELMI & PEREIRA,
1998;
WHEELER
&
SHARP,
1999).
A
estenose
lombossacral
degenerativa é a forma mais comum de patologia lombossacral (SELMI &
PEREIRA, 1998).
As articulações lombossacrais são freqüentemente acometidas por
processos patológicos que podem levar a sintomas como dor ou déficits
neurológicos do neurônio motor inferior. Os sinais clínicos associados à
dor lombosacral incluem anormalidade postural, ataxia, tolerância
reduzida a exercícios, relutância a subir e descer degraus, enrijecimento
dos membros pélvicos, porte alterado da cauda e dor à sua elevação. Os
achados clínicos mais freqüentes são: déficits proprioceptivos dos
membros pélvicos, paraparesia, diminuição dos reflexos flexores, ciático e
anal, incontinências urinária e fecal, hiperreflexia patelar e atonia da
cauda (WHEELER, 1992, SELMI & PEREIRA, 1998, WHEELER &
SHARP, 1999).
Se existe um déficit marcante do nervo ciático, pode ser aparente
exacerbação do reflexo patelar. Este fenômeno de pseudohiperreflexia
deve ser diferenciado do aumento de reflexo visto em lesões típicas de
neurônio motor superior craniais ao segmento L4 (WHEELER, 1992;
SELMI & PEREIRA, 1998). O reflexo anal que indica a integridade do
nervo pudendo poderá estar normal ou diminuído. O tônus anal poderá
estar diminuído apesar da presença de reflexo anal, então palpação retal
e observação da região perineal quanto à presença de matéria fecal
auxiliam no diagnóstico. A incontinência urinária, com uma bexiga
facilmente esvaziada por palpação abdominal, indica lesão do nervo
pudendo. Atonia da cauda e auto-mutilação secundária à disestesia
também são observadas em alguns animais, sendo a primeira, indicativa
de comprometimento dos nervos caudais (SELMI & PEREIRA, 1998).
O sinal clínico mais consistente é a dor à palpação da articulação
lombossacral. O teste de lordose, apesar da dificuldade de realização,
geralmente elicita dor nos animais mais estóicos. O teste consiste da
extensão dos membros pélvicos e compressão dos processos espinhosos
de L7 e S1 com o animal em estação quadrupedal, porém é
desnecessário naqueles animais que apresentarem dor à simples
palpação da referida região (SELMI & PEREIRA, 1998).
Em Pastores Alemães com claudicação ou paresia de membros
pélvicos, pode haver uma combinação de osteoartrite coxofemoral,
mielopatia degenerativa, e doença lombossacra. Diferenciação da lesão
significativa pode ser difícil, e avaliação clínica cuidadosa é requerida para
alcançar o diagnóstico correto (WHEELER, 1992). Tumores, fraturas e
discospondilite devem ser considerados no diagnóstico diferencial
(WHEELER & SHARP, 1999).
Indica-se a realização de exame radiográfico simples, contrastado
e em posição de estresse. As prováveis alterações incluem: redução do
espaço intervertebral, esclerose ou lise das bordas articulares vertebrais,
espondilose, estenose do canal vertebral, desalinhamento lombossacro e
vértebras transicionais. Entretanto, a presença destas alterações não é
patognomônica de compressão da cauda eqüina, podendo ser indicativas
de outros processos. O estresse radiográfico em flexão e extensão é
bastante
útil
no
diagnóstico
de
instabilidade
das
articulações
lombossacrais (SELMI & PEREIRA, 1998).
O diagnóstico da afecção nem sempre é fácil, e em várias
ocasiões, o uso de exames radiográficos não evidencia alterações que
podem estar envolvidas no desencadeamento do processo (SELMI &
PEREIRA, 1998).
A mielografia é um método criticado por alguns autores, porque o
saco dural e o espaço subaracnóideo terminam cranialmente ao espaço
vertebral de interesse em alguns animais (SELMI & PEREIRA, 1998). A
despeito dessas opiniões, a mielografia tem se mostrado extremamente
útil nas investigações da região lombossacra (WHEELER, 1992). A
discografia é uma técnica que permite demonstrar a direção e a extensão
da protrusão do disco intervertebral, sendo considerada diagnóstica em
67% dos casos. A epidurografia é uma técnica radiográfica de fácil
aplicação, que identifica a compressão ou a estenose do canal vertebral
em 78% dos casos de suspeita de síndrome da cauda eqüina (SELMI &
PEREIRA, 1998).
A maioria dos cães acometidos por afecções lombossacrais é
tratada inicialmente de forma não-cirúrgica. O tratamento conservador
inclui o uso de analgésicos, antiinflamatórios não-esteróides, repouso e
perda de peso, porém não produz resultados uniformes. Se a dor for o
principal sinal clínico, pode-se obter sucesso com esta forma de
tratamento (SELMI & PEREIRA, 1998; WHEELER & SHARP, 1999).
O tratamento cirúrgico é indicado para cães com deficiências
motoras
ou
no
caso
de
falha
do
tratamento
não-cirúrgico.
A
descompressão da cauda eqüina e nervos espinais é obtida pela prática
da laminectomia dorsal e foramenotomia. A descompressão fornece alívio
rápido da dor, com melhoria das anormalidades da locomoção e
deficiências neurológicas menos severas. Isto não é dirigido para os
problemas de instabilidade, onde esta é um fator contribuinte (WHEELER
& SHARP, 1999).
O
prognóstico
dos
animais
acometidos
por
patologias
lombossacras dependerá da causa, da gravidade dos sinais neurológicos
e da duração da doença. Normalmente espera-se êxito no tratamento de
aproximadamente 70% dos animais com compressão da cauda eqüina,
embora indivíduos com lesões neurológicas crônicas possam apresentar
recuperação incompleta. Pacientes com discoespondilite apresentam
prognóstico bom, com 80% de resultados satisfatórios nos animais
tratados exclusivamente por terapia conservadora (SELMI & PEREIRA,
1998).
2.3 - Afecções Compressivas da Medula Espinhal Cervical – Medicina
Tradicional Chinesa.
2.3.1 - Doença do Disco Intervertebral Cervical (DDIC)
Na medicina tradicional chinesa (MTC), todos os casos de dor
cervical são enquadrados no padrão de síndrome bi (síndrome de
obstrução dolorosa) (MURATA et al., 2003a). Por definição, a síndrome bi
é causada pela invasão do organismo por vento, frio e umidade, que
interferem com o fluxo apropriado de Qi e de sangue (Xue) no meridiano,
ocasionando estagnação e resultando em um quadro de dor (SCHOEN,
2001; HOEDTKE, 2003; MURATA et al., 2003a; MURATA et al., 2003b).
Esta invasão pode ser facilitada por diversos fatores, entre os quais, a
exposição a fatores patogênicos externos, trabalho ou exercícios
repetitivos, deficiência de Xue ou de Yin, traumas, além de alterações
emocionais e mentais (HOEDTKE, 2003; MURATA et al., 2003a;
MURATA et al., 2003b). Para que esta síndrome se desenvolva é
necessário que ocorra um enfraquecimento das defesas do organismo
(Wei-Qi) (HOEDTKE, 2003). Diversos outros padrões de energia podem
facilitar esta evolução, principalmente padrões de Shen (rim) e Gan
(fígado) (MURATA et al., 2003b).
A condição patológica de órgão mais comum é deficiência de yang
do rim. Os animais podem ter uma história de doença articular
degenerativa, doença renal crônica e surdez geriátrica (SCHOEN, 2001).
Na medicina ocidental, reumatismo, artrite, osteoartrite, bursite,
mialgia, lombalgia, disfunção ciática, espondilite e espondilose são
referidos como síndrome bi (SCHOEN, 2001; HOEDTKE, 2003). Esta se
manifesta como dor, inflamação, dormência, ou edema das articulações,
ossos, músculos, e tendões (SCHOEN, 2001).
A síndrome bi pode manifestar-se nas formas de vento, frio,
umidade, calor e doenças ósseas. Pode ocorrer manifestação de mais do
que uma forma ao mesmo tempo (HOEDTKE, 2003). A síndrome bi pode
ser dividida em bi errante, bi dolorosa, bi fixa, bi febril e bi óssea
(SCHOEN, 2001).
A síndrome bi dolorosa é caracterizada por dor severa em uma
determinada área muscular que piora com o clima frio e melhora com o
aquecimento e pela capacidade reduzida de movimento. O tratamento
principal é eliminar frio e aquecer o corpo. Os acupunturistas
freqüentemente utilizam moxibustão para tratar esta condição (SCHOEN,
2001; HOEDTKE, 2003).
De acordo com a MTC, a síndrome bi errante é causada pelo
vento. Ela tem início rápido e dor errante que parece mover-se de uma
articulação para outra. É caracterizada por dor fraca e capacidade limitada
de movimentos. O tratamento principal é selecionar pontos para eliminar
vento (SCHOEN, 2001; HOEDTKE, 2003).
Na síndrome bi fixa a umidade é o agente patogênico, causando
edema articular e muscular. A dor é localizada em uma determinada área.
Rigidez é mais evidente que dor. Alterações climáticas intensificam os
sintomas (piora no clima úmido). O tratamento principal é eliminar
umidade (SCHOEN, 2001; HOEDTKE, 2003).
Na síndrome bi febril, o calor predomina. Esta pode surgir como
resultado de vento, umidade e frio invadindo o interior do organismo e
transformando-se em calor. Portanto, deficiência de Yin é necessária. Há
dor severa, vermelhidão, e edema das articulações. O tratamento principal
é eliminar umidade-calor (SCHOEN, 2001; HOEDTKE, 2003).
A síndrome bi óssea é a condição mais avançada e pode ser
resultado dos quatro tipos descritos acima, sendo observada em casos
crônicos. Desta maneira, resultam em atrofia muscular e deformação do
esqueleto (SCHOEN, 2001; HOEDTKE, 2003).
Hoedtke (2003) enfatiza que em primeiro lugar, os agentes
patogênicos têm que ser dispersados. Pontos relacionados ao shu-riacho
(pontos de transporte) e jing-rio desempenham importante papel na
dispersão dos agentes patogênicos porque os mesmos podem ser
transportados para o interior do organismo através dos pontos shu-riacho.
De outro modo, a defesa Qi reúne-se nos pontos shu-riacho. Os pontos
jing-rio têm um efeito particular nas articulações e ossos. Os agentes
patogênicos estão seguindo os pontos jing-rio para as articulações. Outro
tratamento possível consiste da utilização de pontos do meridiano
pareado yin-yang (ponto Luo) (HOEDTKE, 2003).
Num segundo momento, o tratamento dos órgãos internos, fígado,
rim e baço está implicado no tratamento dos fatores patogênicos. Isso
significa que para tratar vento o fígado tem que ser tratado, para tratar frio
o fogo do yang do rim tem que ser intensificado e com o objetivo de tratar
umidade o baço tem que ser fortalecido. Além disso, estes órgãos têm
uma função essencial, como as funções do rim no osso, as funções do
baço nos músculos, e as funções do fígado nos ligamentos e tendões
(HOEDTKE, 2003).
Em terceiro lugar, as obstruções têm que ser removidas dos
meridianos afetados pelo tratamento de pontos distais ou locais. Pontos
distais ao cotovelo e ao joelho (pontos distais) têm forte influência nas
articulações proximais e nas áreas afetadas. Pontos em áreas dolorosas
são conhecidos como pontos locais (HOEDTKE, 2003).
A deficiência de yang do rim é a causa subjacente e deverá ser
tratada em adição ao tratamento com pontos locais ao redor da
articulação afetada. Baseado nos princípios da MTC, os objetivos do
tratamento são os seguintes: eliminar obstruções dolorosas, tonificar Qi,
promover a circulação de Qi e sangue, desbloquear canais, fornecer Qi
original, dispersar vento e expelir umidade (SCHOEN, 2001).
Os pontos distais não necessariamente precisam localizar-se no
mesmo meridiano. Eles podem ser localizados em meridianos do mesmo
eixo como ID e B (Tay-Yang), TA e VB (Shao-Yang) e IG e E (YangMing).
Os
meridianos
pareados
yang-yang
são
usados
mais
freqüentemente no tratamento da síndrome bi do que os meridianos
pareados yin-yin. Isto se deve ao fato de que eles estão mais
estreitamente relacionados entre si do que os meridianos pareados yin-yin
(HOEDTKE, 2003).
A utilização isolada de pontos locais, não associados a pontos
distais, não conduz a efeitos terapêuticos prolongados (HOEDTKE, 2003).
Uma grande variedade de pontos, métodos de estimulação e
intervalos de tratamento têm sido utilizados no tratamento de DDIC por
acupuntura. Somente um estudo descreve resultados de um protocolo de
tratamento padronizado. Pontos locais e distais são utilizados para tratar
DDIC. Os pontos locais são VG13, VG16, VB20, VB21, TA16, ID15, ID16,
IG15, IG16, B8, B9, B10, B11, B20, B21, B23, B25, B28 e trigger points
locais (dolorosos ou ah shi). Pontos distantes utilizados para tratar DDIC
são IG4, IG11, ID3 E TA5 (JANSSENS, 2001). Neste estudo,
aproximadamente 80% dos cães com DDIC grau I (dor cervical)
recuperam-se após 3 ou 4 tratamentos num período de 1 a 2 semanas.
Aproximadamente 67% dos cães com DDIC grau II (dor cervical e
paresia) recuperam-se após 5 ou 6 tratamentos num período de 3 a 4
semanas. Poucos casos de grau III (dor cervical, paralisia e sensibilidade
profunda preservada) têm sido descritos para oferecer resultados
fidedignos. Cerca de 33% dos cães tratados com sucesso apresentaram
recorrência dentro de três anos. Esta percentagem é mais alta do que
para DDITL e a mesma que para outros tratamentos conservadores. Cães
que não responderem à acupuntura podem beneficiar-se de fenestração
de disco cervical e de descompressão ventral (JANSSENS, 2001).
Altman (1995) preconizou as seguintes combinações de pontos
para o tratamento de DDIC com acupuntura:
Para uso primário – VG20, B10, B11, VG14 e VG16;
Para uso secundário – VB21, ID3, TA5, IG4, IG11.
Indicou ainda a permanência das agulhas por 15 a 20 minutos em dores
severas e agudas e por 8 a 12 minutos em dores leves a moderadas e
crônicas.
O
mesmo
autor
afirma
que
existem
diversos
protocolos
recomendados para o tratamento de DDIC, diferentes do listado acima e
que somente um estudo em grande escala foi publicado utilizando um
protocolo fixo.
Janssens apud Altman (1995) utilizou a inserção de agulha nos
pontos VB20, Ah Shi (pontos locais dolorosos), TA15, IG11, ID3 e VB34
por 15 a 20 minutos, sem manipulação ou estimulação das agulhas em
um ou dois tratamentos semanais. Dos 35 cães estudados, 69%
apresentaram recuperação completa (alguns tratados previamente sem
sucesso com métodos médicos ou cirúrgicos) e 10 apresentaram
recorrência. O número médio de tratamentos foi de 2 a 5 e o tempo médio
de recuperação foi de aproximadamente 2 semanas.
Tais resultados demonstraram que a terapia por acupuntura
apresentou taxa de recorrência similar a dos cães submetidos ao
tratamento
médico
conservador
e
resultados
favoráveis
comparativamente à fenestração. Concluiu-se que a acupuntura parece
ser um tratamento efetivo em cerca de 70% das protrusões de disco
cervicais e que a acupuntura não tem efeito profilático quanto à
recorrência. Se as recorrências forem comuns, a cirurgia pode ser
indicada. Na opinião do mesmo autor, o tratamento com acupuntura não
deverá ser mantido por mais de 2 a 3 semanas se resultados favoráveis
não forem notados.
Em pacientes com doença do DDIC, os resultados da acupuntura
são menos favoráveis do que em doença do disco intervertebral
toracolombar (DDITL). Aproximadamente 80% dos pacientes com dor
cervical e dois terços dos que têm dor cervical associada à paresia são
curados dentro de 2 a 4 semanas. Na maioria das situações o tratamento
é realizado uma vez por semana, embora em casos agudos severos,
tratamentos
mais
freqüentes
sejam
benéficos.
É
extremamente
importante, nos pacientes com DDIC, tratar eficientemente todos os
trigger points na região cervical. O tratamento de animais tetraparéticos
com acupuntura não é recomendado. Embora cães nesta situação
tenham sido tratados com sucesso, o tempo de recuperação é muito
longo, a taxa de complicações muito alta e a dor excessiva. Bons
cuidados gerais em animais com DDIC consistem de repouso em gaiola,
sedativos, laxativos, analgésicos potentes e drogas antiinflamatórias nãoesteróides ou baixas doses de corticosteróides. Em cães com DDIC, a dor
pode ser torturante, duradoura, exaustiva e não responsiva à medicação,
sugerindo-se a realização de cirurgia descompressiva se os animais não
responderem à acupuntura em 21 dias, se a dor for excessiva ou se existir
recorrência freqüente. Cães que sofrem de dor após a cirurgia são
rotineiramente tratados com acupuntura com ênfase nos trigger points
(JANSSENS, 2000). O mesmo autor obteve taxas de recorrência de
aproximadamente 25% num período acima de 5 anos na DDITL e de 33%
num período acima de 3 anos na DDIC.
Murata et al. (2003a) relataram tratamento bem sucedido com
apenas duas sessões de acupuntura em três animais com quadro clínico
de dor cervical, devido à estagnação local de Qi e Xue, embora
provocados por diferentes fatores etiológicos. Os mesmos autores
escolheram pontos de acupuntura que têm como função energética
normalizar a circulação de Qi e Xue da área cervical. ID3, VB34, VB39 e
B60 foram os principais, sendo empregados em todos os tratamentos.
ID3, que é o principal ponto distal a ser utilizado quando a dor é
localizada no occipital e na região cervical, ao longo do meridiano da
bexiga (Pangguang), expele o vento. Este ponto é ainda conhecido por
abrir o vaso extraordinário Du (vaso governador), cujo trajeto, em parte,
está na linha média sagital, na coluna. O ponto VB34 foi prescrito por
tratar-se do ponto mestre dos tendões e articulações. O ponto VB39, além
de ser um ponto à distância utilizado no tratamento de dor cervical
localizada na lateral do pescoço, ainda tem a característica energética de
ser o ponto mestre da medula, ajudando na produção de sangue (Xue)
que muitas vezes apresenta-se em deficiência em quadros de dor. O
ponto B60 foi prescrito devido à sua potente ação analgésica, além ter
influência na área cervical (MURATA et al., 2003a).
Na dor cervical aguda, a acupuntura e a moxibustão são muito
efetivas como técnicas terapêuticas, enquanto na dor cervical crônica, a
terapia herbal chinesa é mais eficiente. Para síndrome bi, muitas fórmulas
podem ser usadas, na dependência do tipo e do padrão de Zang Fu
previamente diagnosticado: Xiao Huo Luo Dan, Da Huo Luo Dan, Du Huo
Ji Shen Tang and Rhizoma Corydalidis, podendo ser combinadas entre si
ou com outras fórmulas chinesas (MURATA et al., 2003b).
Dos animais com sintomas de dor cervical crônica, e que foram
tratados com terapia herbal chinesa, associados ou não à acupuntura ou
à moxibustão, 65% apresentaram resolução total dos sintomas (sem
qualquer medicação para o controle da dor), 20% resolução parcial com
redução significativa na intensidade e na freqüência de episódios de dor
(necessidade de medicação para controle da dor, esporadicamente) e
15% de falhas (MURATA et al., 2003b).
2.3.2 – Espondilomielopatia Cervical Caudal
O diagnóstico da MTC para a espondilomielopatia cervical caudal
(ECC) é multifatorial e pode ser representado por uma combinação de
estagnação (bloqueio) de Qi e de sangue nos meridianos do vaso
governador (VG) e da bexiga e uma deficiência subjacente de sangue do
coração e de Qi do rim. O rim é incapaz de segurar o Qi e há deficiência
de Yang do rim, resultando em fraqueza, manifestações cardíacas,
incontinência urinária e hipotireoidismo (KLINE et al., 2001).
O tratamento da ECC com acupuntura depende do tipo de
compressão observada, das complicações subjacentes aos processos
patológicos e da sintomatologia do paciente. Este pode ser benéfico
quando o uso de antiinflamatórios não-esteróides e a realização de
cirurgia não são opções exeqüíveis (KLINE et al., 2001).
Os pontos de acupuntura deverão ser utilizados craniais e caudais
à lesão (aqueles utilizados para DDIC), associados à técnica de
tonificação com pontos mestre e de comando. A tonificação destes pontos
por meio de agulha ou aquapuntura deverá ser utilizada nos casos
envolvendo hipertrofia ligamentar isolada ou uma combinação desta e de
DDIC do tipo II (geralmente animais mais jovens). As técnicas de sedação
deverão ser utilizadas para animais idosos com DDIC primária isolada.
São indicados pontos locais tais como B10, B11, B13, VG14,
VG16, VG20 por 10 minutos e pontos distais que incluem IG4, IG11, E36,
VB34 e ID3 para ajudar a mover Qi e sangue, clarear vento e fortalecer os
tendões e ligamentos. Em acréscimo, pontos utilizados para tonificar o Qi
do rim, o sangue do coração, e Yang do rim podem ser utilizados (E36,
VC6, VC17, R3, R7, BP6, B23, VC4,VG4, P7, R6 [Ren Mai], Pc5, Pc6,
Pc7, C5, C6, C7, B14, B15, B17 e B20). Eletroacupuntura pode ser
utilizada nos pontos B10 e B13 para sedação. Pontos dos oito meridianos
extra, tais como ID3 e B62 [Du Mai] também podem ser adicionados aos
pontos cervicais locais por 5 minutos para ajudar a tonificar o VG e a
medula espinhal (KLINE et al., 2001).
Joaquim et al. (2003) referiu um período de 11 semanas de
tratamento com acupuntura em casos de síndrome de Wobbler. O mesmo
autor relatou que casos de síndrome de Wobbler e de doença de disco
intervertebral
com
ausência
de
sensibilidade
à
dor
profunda,
apresentaram resultados pobres ou melhora tardia quando tratados com
acupuntura.
Sumano et al. (2000) realizaram estudo comparativo entre
eletroacupuntura e intervenções médicas e cirúrgicas ortodoxas para o
tratamento de 40 cães com síndrome de Wobbler. Os tratamentos de
acupuntura foram feitos em dias alternados, fornecendo 150 a 300mV a
125Hz, equivalentes a aproximadamente 20 microAmperes, em 10 pontos
de acupuntura por tratamento, com inserção profunda das agulhas. O
número de tratamentos de acupuntura requeridos para recuperação
completa dependeu da severidade do caso, variando de 16 a 40 sessões
nos casos mais leves e severos, respectivamente. O percentual de
sucesso obtido com métodos ortodoxos foi de 20%, ao passo que com a
eletroacupuntura correspondeu a 85%.
2.4 - Afecções Compressivas da Medula Espinhal Lombossacra –
Medicina Tradicional Chinesa.
2.4.1- Síndrome da cauda eqüina
O diagnóstico da Síndrome da Cauda Eqüina na MTC enquadra-se
na categoria de obstrução dolorosa. Esta é causada pela estagnação
localizada de Qi e estase de sangue e pela obstrução do fluxo de Qi e
sangue, resultando em dor. Este é um padrão de excesso, porque a dor
nestes animais aumenta com a palpação. Os meridianos da bexiga e
vesícula biliar estão envolvidos neste processo patológico porque seus
trajetos viajam ao longo do caminho da medula espinhal e nervo
isquiático, respectivamente. Portanto, existe obstrução dolorosa do fluxo
de Qi nos canais da bexiga e vesícula biliar (KLINE et al., 2001).
O tratamento envolve primariamente a escolha de pontos ao longo
dos meridianos da bexiga, vesícula biliar e vaso governador. O objetivo é
promover o fluxo de Qi e tonificar a circulação sanguínea para aliviar a
dor. Os pontos incluem VB30, B57, B54, B37, B40, VB34, VB40, VB39,
VB31 e B64. O tratamento pode ser feito uma vez ao dia ou uma vez por
semana durante 20 minutos, tanto com manipulação de agulha como com
estimulação elétrica para sedar (KLINE et al., 2001).
Pontos craniais e caudais à lesão, localizados nos meridianos da
bexiga e do vaso governador, devem ser estimulados em adição aos
pontos específicos de extremidade tais como R3 e B67. B64 é o ponto
fonte do meridiano da bexiga, e a estimulação deste ponto facilita o fluxo
de Qi nos canais, pois os pontos fonte são pontos ao longo do meridiano
onde o Qi se concentra. Forte estimulação destes pontos elimina a estase
sanguínea e fortalece o fluxo de Qi para aliviar a dor. As sessões de
tratamento podem ser variáveis, dependendo da resposta à terapia
(KLINE et al., 2001).
Hielm-Bjorkman (2003) obteve sucesso ao tratar com acupuntura
um cão macho da raça Pastor Alemão de 11 anos que apresentava
propriocepção diminuída e severa atrofia muscular dos membros pélvicos.
O animal demonstrava ainda, dor cervical, lombar e lombossacra
(principalmente quando os membros eram estendidos para trás) à
palpação. A despeito da utilização da acupuntura, o autor estabeleceu o
diagnóstico segundo a medicina ocidental, de síndrome da cauda eqüina
associada
a
espondilose,
displasia
coxo-femoral
e
dor
cervical
compensatória. Após 17 meses e nove sessões de acupuntura o paciente
recuperou a propriocepção e não apresentava dor ou espasmo. Os
pontos utilizados com maior freqüência no decorrer do tratamento foram:
B28, Bai Hui, VB34, E36, B23, VB29, VB30, B54, B11, B60, IG4 e IG11. O
mesmo autor refere que o prognóstico não será bom se estiverem
presentes compressões estenóticas no canal vertebral ou proliferação
óssea no forame intervertebral.
Joaquim et al. (2003) relatou período de 18 a 20 semanas de
tratamento com acupuntura em casos de síndrome da cauda eqüina. O
mesmo autor relatou que casos de síndrome da cauda eqüina e de
mielopatia
degenerativa,
tratados
com
acupuntura,
apresentaram
resultados pobres ou melhora tardia. Hielm-Bjorkman (2003) não obteve
resultados animadores com acupuntura no tratamento de um cão que
provavelmente apresentava mielopatia degenerativa, cujo tratamento foi
interrompido após 5 meses e 6 sessões. Kline et al. (2001) afirmam que
em cães com mielopatia degenerativa a utilização de agulhas e de
eletroacupuntura apresentaram eficácia mínima. Os pontos utilizados
incluíram: pontos locais no meridiano da bexiga e pontos ting, incluindo
B67, VB44 e E45.
2.4.2 - Dor lombar
De acordo com a MTC, o rim (Shen) é o órgão responsável pela
estocagem de uma substância vital muito importante chamada essência
(Jing), que é a base material de todas funções desempenhadas pelo
organismo. Além desta função, o Shen também comanda a área lombar, a
coluna, a medula (matéria responsável pela formação de medula óssea,
ossos e sistema nervoso, entre outros) e as funções reprodutivas. Esta
substância é fixa em quantidade e qualidade, o que significa que com o
passar do tempo o Jing diminui, a área lombar torna-se fraca, causando
dor e desconforto, permitindo a invasão de fatores patogênicos externos
que geralmente são responsáveis pela piora do quadro de dor lombar. É
importante observar que com a deficiência do Shen Jing, outros Zang Fu
podem tornar-se envolvidos, mais comumente fígado e baço-pâncreas.
Jing Luo pode tornar-se envolvido, pois eles não são nutridos
apropriadamente (MURATA et al., 2003c).
De acordo com a MTC, em qualquer lombalgia temos uma
deficiência de Qi (Yang ou Yin) do rim, além de uma estagnação de Qi e
de Xue (sangue) responsáveis pela dor (TORRO, 1997).
Dor lombar crônica pode ser causada por umidade-frio ou por
deficiência de Yang do Rim, que resulta em invasão dos canais por
umidade-frio. Esta dor também pode ser indistinta e contínua e resultar
em fraqueza dos membros pélvicos. A outra causa é trauma, como
mencionado acima, que geralmente é a causa de estase de sangue e o
resultante início agudo de dor penetrante que é sensível ao toque (KLINE
et al., 2001).
O tratamento envolve o aquecimento dos canais para expelir a
umidade-frio e normalizar o fluxo de Qi e sangue (doença crônica) e em
casos agudos (condição de excesso) para eliminar estagnação nos canais
e dispersar a estase de sangue para aliviar a dor. A seleção de pontos
inclui B40, B25, B59, B23 e B65 para casos agudos e crônicos (KLINE et
al., 2001).
Diversos animais com diferentes graus de dor lombar e alterações
locomotoras (variando de ataxia a impotência funcional total dos
membros, com presença ou ausência de sensação superficial e profunda)
foram tratados pela MTC, utilizando acupuntura, moxibustão e terapia
herbal chinesa (MURATA et al., 2003c).
Em concordância com o diagnóstico (deficiência e/ou estagnação
de Qi e Xue, deficiência de Shen Jing, padrões de fígado, baço-pâncreas
ou rim, síndrome bi ou wei bi), diversas medicações herbais foram
prescritas (mais comumente: Guei Fu Di Huang Wan, Guei Lu Ell, Liu Wei
Di Huang Wan, Chi BaoMei Ran Dan, Du Huo Ji Shen Tang, Rhizoma
Corydalidis, Bu Zhong Yi Qi Tang). Diferentes pontos de acupuntura foram
selecionados. Considerando o diagnóstico diferencial utilizando a MTC os
pontos B18, B20, B23, B25, B26, B60, B62, R3, R6, R7, VB30, VB34,
VB39, ID3, E36, VG4, BP6 foram utilizados com maior freqüência. Os
pontos foram tratados com agulhas ou moxibustão (MURATA et al.,
2003c).
Observou-se que 10% dos pacientes interromperam o tratamento
após a primeira consulta ou após a primeira sessão de acupuntura,16%
tiveram cura parcial e 74% cura total (MURATA, 2003c).
Torro (1997) relatou dois casos de lombalgia crônica em cães
idosos de pequeno porte. No primeiro caso, pela piora do quadro ao
esforço físico, principalmente no frio, pela poliúria, e pela ausência de
sintomas de calor, diagnosticou-se uma deficiência do Yang Qi do rim. A
língua se apresentava mole (deficiência de Qi) e com um revestimento
fino e branco (padrão normal para cães, diferente do patológico por frio,
que é mais evidente). O pulso se mostrava profundo e vazio, de difícil
palpação. Poderíamos classificar este padrão de desequilíbrio energético
como uma síndrome de obstrução dolorosa (síndrome bi), mais
especificamente, uma síndrome bi por vento frio (no início) evoluindo para
uma síndrome bi óssea. Como tratamento foram utilizados os seguintes
pontos:
B23 (Shenshu) (agulha em harmonização e moxa): com o objetivo
de tonificar o Qi dos rins e aquecer o frio.
VC6 (Qihai) (moxa): para tonificação do Qi dos rins e do Qi em
geral. Com a moxa tonifica o Yang Qi.
E36 (Zusanli) (agulha e moxa): para tonificação do Qi e do Xue
(sangue). Tonifica o Qi dos rins, dispersa o frio, fortalece o Qi mediano.
VB34 (Yanglingquan) (agulha em harmonização): ativação da
circulação do Xue (sangue), regulação da mobilidade das articulações,
relaxamento e fortalecimento dos tendões e dos músculos. Fortalece os
ossos e os joelhos.
B60 (Kunlun) (agulha em harmonização): fortalece o Qi dos rins,
relaxa tendões e músculos, harmoniza a circulação de Qi e Xue (sangue).
M-DC-35 (Jiaji) (agulha em harmonização): pontos extras nas
regiões dos osteófitos. Fortalece a coluna vertebral, fortalece e relaxa os
tendões, restaura o fluxo de Qi e de Xue (sangue) nos meridianos da
bexiga e do vaso governador.
B54 (Weizhong) (agulha em sedação): relaxa músculos e tendões.
B11 (Dazhu) (agulha em harmonização): ponto de reunião dos
ossos.
Os sintomas foram desaparecendo de forma gradativa ao longo de
oito sessões semanais, mas ainda são efetuadas sessões (mensais ou
bimestrais) com a finalidade de prevenir recidivas. Ao longo do tratamento
inicial foi utiliizada fitoterapia chinesa (Gu Zhi Jung Shen Wan), indicada
em casos de síndrome bi óssea.
No segundo caso, estabeleceu-se diagnóstico de deficiência de
Yang Qi do rim. Com o tratamento (agulhas e moxa) os sintomas
regrediram totalmente em dois meses, sem necessidade de outras
medicações. Durante este período evidenciou-se cio de maior duração,
que demonstrava deficiência de Yang Qi do baço-pâncreas, que não
conseguia governar o xue (sangue). Uma poliúria transitória evidenciava a
deficiência de Yang Qi do Rim. Tempos depois foi diagnosticada uma
deficiência de Yang Qi do coração (dispnéia evidenciada ao esforço,
letargia, arritmia, edema e língua mole, pálida e cianótica) complicada
pela relação com o pulmão através do Qi do tórax (Zhong Qi) e de uma
desarmonia do xue (sangue) do coração. Uma antiga hérnia inguinal
aumentou ligeiramente de tamanho, o que demonstra a inabilidade do
Yang Qi do baço-pâncreas em manter as estruturas corpóreas fixas em
seus lugares. Este caso serve para ilustrar que uma deficiência primária
de Yang Qi do rim leva a uma deficiência de Yang Qi do baço-pâncreas e
do coração. O animal referido apresentou melhora substancial da
sintomatologia após sessões de acupuntura com agulhas e moxa.
3 - Conclusão
O tratamento das afecções compressivas da medula espinhal, pelo
caráter debilitante das alterações neurológicas e pela dor associada,
constitui um desafio considerável tanto para a medicina ocidental quanto
para a medicina tradicional chinesa, pois a percentagem de êxito
completo nos estágios mais avançados destas doenças não é animadora.
Se levarmos em conta os trabalhos científicos, o tratamento
cirúrgico nestas situações ainda é o mais promissor, embora diversos
relatos isolados apontem para o sucesso da acupuntura e para sua
indicação em casos outrora considerados essencialmente cirúrgicos.
Nos estudos disponíveis atualmente, quando é considerado o
controle da dor, a acupuntura apresenta resultados similares aos demais
tratamentos, com a vantagem de ser praticamente isenta de efeitos
colaterais. Já foram referidos alguns bons resultados em animais com
alterações neurológicas leves a moderadas.
Existem ainda suspeitas de que a acupuntura poderia estimular um
andar inconsciente em cães que apresentam lesão neurológica grave e
ausência de sensibilidade a dor profunda, situação na qual muitos autores
desaconselham a realização de procedimentos cirúrgicos. Embora tal
andar não caracterize a resolução dos sinais neurológicos, poderia
melhorar a qualidade de vida dos animais e estimular os proprietários a
persistirem no seu tratamento.
Para assumir uma postura ética perante aos proprietários e aos
pacientes, os clínicos, os cirurgiões e os acupunturistas devem realizar
todas as manobras diagnósticas disponíveis (exame neurológico, exame
radiográfico, mielografia, etc.) para estabelecer a natureza da afecção e o
grau de acometimento e conseqüentemente adotar ou indicar as
manobras terapêuticas mais prováveis de conduzirem o paciente à
recuperação, de maneira desvinculada de preferências pessoais e
corporativismos.
Para fornecer ao veterinário, elementos que facilitem essa tarefa,
muitos outros estudos devem ser realizados, comparando ou avaliando
isoladamente os tratamentos clínicos, cirúrgicos e por acupuntura para as
afecções compressivas da medula espinal.
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