Apresentação 1 - Universidade Católica Editora
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Pedro Nuno Rodrigues A MODIFICAÇÃO OBJECTIVA DO CONTRATO DE EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS trabalhos a mais, trabalhos de suprimento de erros e omissões e a subsidiariedade dos fundamentos gerais NOTA PRÉVIA Salvo ligeiros ajustamentos, o presente texto reproduz a dissertação de mestrado científico que apresentei, no dia 6 de Dezembro de 2010, na Faculdade de Direito de Lisboa da Universidade Católica Portuguesa, sob a epígrafe «A modificação objectiva do contrato de empreitada de obras públicas: Da subsidiariedade dos fundamentos gerais», e que defendi, em provas públicas realizadas na mesma Faculdade, no dia 18 de Fevereiro de 2011, perante o Júri constituído pelo Senhor Dr. José Paulo Duque, pelo Senhor Professor Doutor Luís Fábrica e pelo Senhor Professor Doutor Rui Medeiros, que, nas provas que lhes prestei, muito me honraram com a sua presença e a quem expresso a minha sentida gratidão por essa generosidade. Ao Senhor Professor Rui Medeiros, meu orientador, quero agradecer, publicamente, o exemplo, que me marca desde os «tempos de Faculdade», seja pelos inestimáveis ensinamentos, seja pelo permanente espírito crítico, seja pela incondicional disponibilidade. Ao Senhor Dr. Manuel Rodrigues, sócio da M. Rodrigues & Associados, agradeço, com muita amizade, o incentivo que sempre me deu para concretizar este projecto académico de natureza pessoal, não obstante o evidente esforço da Sociedade «nas minhas ausências». Aos meus pais, agradeço o que sou. À Ana, um beijo de bem-haja pela alegria de todos os dias, também presente em cada linha do texto que agora publico. Lisboa, 12 de Março de 2011 INTRODUÇÃO RAZÃO E DELIMITAÇÃO DO TEMA É sabido que uma das premissas do instituto contratual é pacta sunt servanda, contractus lex inter partes. Não obstante, a Administração tem, não raras vezes, reconhecido interesse em modificar as prestações de uma relação contratual preestabelecida. O interesse justificante da novação objectiva no contrato jusadministrativo é, necessariamente, público, seja a modificação no sentido de corrigir insuficiências e implementar a obra conforme projectada, adaptá-la à melhor consecução do interesse público delineado ou, ainda, assegurar a manutenção do contrato perante uma grave perturbação dos seus pressupostos. Conformada pelo direito da União Europeia, segundo o primado da concorrência, esta modificação não é, todavia, regulada de forma idêntica nos ordenamentos jurídicos dos diversos Estados-Membros. As razões de interesse público, assim como a alteração anormal e imprevisível das circunstâncias subjacentes à decisão de contratar, são, expressa e autonomamente, estabelecidas como fundamento geral da modificação dos contratos administrativos, no artigo 312.º do Código dos Contratos Públicos (CCP) 1. Por sua vez, o regime especial do contrato de empreitada de obras públicas2, hodiernamente consagrado no 1 Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 18-A/2008, de 28 de Março, e alterado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, pelos DecretosLei n.os 223/2008, de 11 de Setembro, e 278/2009, de 2 de Outubro, e pela Lei n.º 3/2010, de 27 de Abril. As subsequentes referências normativas, sem indicação expressa do diploma em que se inserem, respeitam ao CCP, salvo se diversamente resultar do contexto. 2 Sobre o conceito de contrato de empreitada de obras públicas, v. M ARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, vol. II, 10.ª ed., 9.ª reimp., Almedina, Coimbra, 2008, 1001; J ORGE ANDRADE DA SILVA , Código dos Contratos Públicos Comentado e Anotado, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, 791-801. Considerando a definição do artigo 343.º, n.º 1, do CCP, sublinhamos, quanto ao conceito de contrato de empreitada de obras públicas: primeiro, é um contrato administrativo (de colaboração subordinada), além do mais, porque é qualificado pela lei [1.º, n.º 6, a), e 343.º]; segundo, é um contrato oneroso, o que pressupõe uma equivalência subjectiva de prestações, segundo a avaliação ou vontade dos contraentes, ainda que sem «um perfeito equilíbrio objectivo ou absoluta contrapartida 10 A MODIFICAÇÃO OBJECTIVA DO CONTRATO DE EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS capítulo I do título II da parte III do CCP, prevê diversos institutos especificamente reguladores da faculdade de o dono da obra, na prossecução geral do interesse público, variar o conteúdo ou as condições (jurídicas e técnicas) da execução das prestações de uma empreitada3 : os trabalhos a mais (370.º a 375.º), os trabalhos de suprimento de erros e omissões (376.º a 378.º), os trabalhos a menos (379.º a 381.º), a revisão ordinária de preços (382.º) e, embora não inseridos sistematicamente na secção especial das modificações objectivas da empreitada, a suspensão dos trabalhos (365.º a 369.º – que constitui fundamento para a prorrogação do prazo contratual de execução, nos termos do artigo 298.o, n.os 2 a 4) e a replanificação dos trabalhos com vista à recuperação de um perspectivado atraso na respectiva execução (404.º). Em face deste regime especial, é legítimo questionar a possibilidade de alteração das prestações objecto de um contrato de empreitada de obras públicas à luz dos fundamentos gerais da modificação dos contratos administrativos, estabelecidos no capítulo V do título I da parte III do CCP. Assim vem fazendo, aliás, o nosso Tribunal de Contas. É, pois, núcleo do objecto do presente estudo, indagar, no complexo normativo do CCP, e considerando a disciplina comunitária da contratação pública, os pressupostos e os limites da modificação do contrato de empreitada de obras públicas com os fundamentos gerais, particularmente com fundamento em razões de interesse público, nas situações em que a Administração pretenda introduzir no contrato prestações inicialmente não previstas. económica das prestações» (M ÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA , Direito das Obrigações , 12.ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, 368); terceiro , destina-se à realização de uma obra pública (343.º, n.º 2); quarto, pressupõe-se que a obra pública se enquadre nas subcategorias relativas à actividade da construção, actualmente descritas na Portaria n.º 19/2004, de 10 de Janeiro (aprovada ao abrigo do artigo 4.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de Janeiro); quinto, em consequência da caracterização legal da obra pública, a empreitada tem de ser realizada por conta de uma das entidades enunciadas no artigo 3.º do CCP (343.º, n.º 2, parte final); sexto , ainda que a lei não o enuncie expressamente, sendo executada por conta de um contraente público (mesmo que este seja uma entidade privada no exercício de funções materialmente administrativas, cf. artigo 3.º, n.º 2), a empreitada visa a prossecução de um fim de interesse público. O contrato de empreitada de obras públicas é, assim, o contrato administrativo de colaboração subordinada, celebrado entre um contraente público e uma entidade legalmente habilitada a exercer a actividade da construção, que tem por objecto a execução (ou, nos casos excepcionais do artigo 43.º, n.º 3, do CCP, conjuntamente, a concepção e a execução), por conta daquele, de uma obra pública que se enquadre numa das subcategorias relativas à actividade da construção, mediante o pagamento de um preço, com vista à consecução de um determinado fim de interesse público. INTRODUÇÃO 11 Destarte, (a) faremos um enquadramento do direito da União Europeia em matéria de modificação dos contratos públicos, analisando a disciplina das denominadas «obras complementares», (b) enunciaremos traços de regime das experiências jurídicas espanhola, italiana e francesa, (c) delimitaremos os pressupostos e possível incompletude das principais figuras de modificação objectiva previstas no regime especial do contrato de empreitada estabelecido no CCP4, (d) procuraremos, no âmbito do CCP e do direito comunitário, delimitar a admissibilidade da modificação do contrato de empreitada com fundamento nos pressupostos gerais da modificação dos contratos administrativos e, em especial, (e) à luz de um subjacente regime de controlo de custos das obras públicas 5 , concretizaremos o regime da modificação por razões de interesse público decorrentes de necessidades novas ou de uma nova ponderação das circunstâncias existentes. 3 A modificação do contrato administrativo pode incidir sobre o conteúdo das suas prestações ou sobre as condições convencionadas para as prestações – «de modificação muito mais frequente, de resto, que o seu conteúdo ( stricto sensu )» – MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA / PEDRO COSTA GONÇALVES / J. PACHECO AMORIM, Código do procedimento administrativo Comentado, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2003, 825; M ARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo , vol. I, 10.ª ed., 10.ª reimp., Almedina, Coimbra, 2010, 619. 4 Analisamos os trabalhos a mais e os trabalhos de suprimento de erros e omissões. No presente estudo não coube, por extravasar o seu escopo, a análise de outra figura de novação objectiva especialmente regulada na empreitada: a revisão ordinária de preços, que corresponde a um mecanismo legal, automático e obrigatório, de actualização dos preços contratuais, assente em circunstâncias alheias às partes, em especial, em flutuações económicas do mercado – C ONCEPCIÓN H ORGUÉ BAENA, La modificación del contrato administrativo de obra – El ius variandi, Marcial Pons, Madrid, 1997, 41; J OSÉ M ARIA F ERNÁNDEZ A STUDILLO, Contratación Pública, Tomo I, Bosh, Barcelona, 2008, 243; DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, vol. II, Almedina, Coimbra, 2001, 639-644; ARMÃO FERREIRA, Revisão de preços de empreitadas e fornecimentos de obras públicas, Porto, [s.n.], 1991; JOSÉ ALBERTO DE ALMEIDA M ARQUES VIDAL / J OSÉ SILVA CORREIA MARQUES, Empreitadas e fornecimentos de obras públicas: revisão de preços, Almedina, Coimbra, 1982. Reportada à supressão de prestações contratualmente previstas, desconsideramos ainda a figura dos trabalhos a menos (cf. artigos 379.º a 381.º do CCP). 5 A terminologia corresponde à epígrafe do revogado artigo 45.º do anterior regime jurídico das empreitadas de obras públicas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março (RJEOP). ÍNDICE Nota prévia ...........................................................................................5 Abreviaturas ..........................................................................................6 Modo de citar .......................................................................................7 Introdução...........................................................................................9 Capítulo I Subsídios do direito da União Europeia e de experiências jurídicas estrangeiras 1. Direito da União Europeia ...........................................................13 1.1. Em geral, a modificação dos contratos públicos ...........................13 1.1.1. A ausência de regulação expressa ..............................................13 1.1.2. A rejeição da modificação ilimitada ..........................................16 1.1.3. A jurisprudência do TJCE: os limites à modificação segundo o conceito de alteração substancial ...............................................18 1.1.4. Alteração substancial: o critério objectivo de Pressetext ............21 1.2. Em especial, a disciplina das obras complementares......................24 1.2.1. A contratação directa de obras complementares ........................24 1.2.2. Pressupostos e limites da contratação de obras complementares .....26 1.2.3. Articulação do regime das obras complementares com os pressupostos gerais da modificação dos contratos públicos ............34 2. A modificação unilateral em experiências jurídicas estrangeiras ...37 2.1. O direito espanhol ......................................................................37 2.1.1. Pressupostos e limites da modificação .......................................37 2.1.2. Modificação do contrato e obras complementares ....................40 2.2. O direito italiano ........................................................................41 2.2.1. Pressupostos e limites da modificação .......................................41 2.3. O direito francês.........................................................................44 2.3.1. Enquadramento .......................................................................44 2.3.2. Pressupostos e limites da modificação .......................................45 2.3.3. A modificação por acordo ........................................................46 124 A MODIFICAÇÃO OBJECTIVA DO CONTRATO DE EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS 2.3.4. A mitigada faculdade de modificação segundo as cláusulas administrativas gerais .........................................................47 2.3.5. Os trabalhos complementares...................................................48 3. Considerações conclusivas quanto à admissibilidade, no direito comunitário e em ordenamentos europeus, da modificação objectiva por razões de interesse público .......49 Capítulo II Delimitação recíproca das duas principais modalidades de modificação objectiva da empreitada previstas na parte especial 1. O modelo dualista da transposição das obras complementares ...51 2. Delimitação dos institutos na jurisprudência ............................53 3. Delimitação dos institutos na doutrina ......................................58 4. Insuficiência das propostas da doutrina à luz da natureza dos institutos ..................................................................................60 5. Posição adoptada.............................................................................64 5.1. Delimitação de figuras ................................................................64 5.2. A rejeição da teoria civilística do erro-vício.................................65 5.3. O problema dos factos supervenientes: o deficit de previsão segundo o critério da técnica mais moderna ...............................67 5.4. Pressupostos e limite dos trabalhos a mais....................................69 5.5. Trabalhos de suprimento de erros e omissões...............................71 5.5.1. Pressupostos e limite ................................................................71 5.5.2. Responsabilidade .....................................................................76 6. Considerações conclusivas quanto à delimitação e incompletude das figuras especialmente reguladas................78 ÍNDICE 125 Capítulo III A aplicabilidade do regime geral da modificação dos contratos administrativos às empreitadas de obras públicas 1. A subsidiariedade do regime geral: enquadramento.................85 2. A subsidiariedade do regime da alteração anormal e imprevisível das circunstâncias .................................................87 2.1. Justificação da subsidiariedade .....................................................87 2.2. Pressupostos e limites..................................................................89 3. A subsidiariedade do regime da modificação por razões de interesse público.......................................................................91 3.1. Justificação da subsidiariedade .....................................................91 3.2. Pressupostos................................................................................96 3.3. Limites .......................................................................................99 3.3.1. Questão prévia.........................................................................99 3.3.2. Limites materiais....................................................................100 4. Considerações conclusivas quanto à aplicabilidade dos fundamentos gerais e sua compatibilidade com o direito comunitário...........................................................111 Conclusões ........................................................................................113 Bibliografia........................................................................................119