A Indústria Farmacêutica em Portugal – Saber Investir

Transcrição

A Indústria Farmacêutica em Portugal – Saber Investir
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Ficha Técnica
Coordenação global
José António Aranda da Silva
Coordenação editorial
João Moreira dos Santos
Coordenação executiva e produção
Boa Disposição, Lda.
Design gráfico
Boa Disposição, Lda.
Revisão de texto
Adelaide Correia
Edição
Apifarma
– Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica.
Impressão
Jorge Fernandes, Lda.
Dep. legal
???????
ISBN
978-989-99258-0-9
1.ª edição, 1000 exemplares – Dezembro, 2014.
Este livro foi escrito segundo o antigo Acordo Ortográfico.
Créditos fotográficos
Apifarma: páginas. 77, 79, 87 (diteita), 95, 117, 125-128, 133-135, 139 (inferior), 141-142; 206, 213, 216. Arquivo Diário de Notícias: pág. 78; Arquivo Nacional da
Torre do Tombo/DGARQ: capa, sobrecapa e páginas. 61, 64, 74, 76; Atral-Cipan: 87 (esquerda), 98 (direita), 105, 108, 109 (superior); Bayer Portugal: 121, 132; BIAL:
71, 72 (superior), 139, 149, 151; Biblioteca de Arte – Fundação Calouste Gulbenkian: 72, 81 (inferior), 81-83, 85, 88, 89 (inferior), 93, 98 (esquerda), 100, 102-103,
107 (superior), 119; Biblioteca Nacional: 63, 68, 69, 70 (superior), 91, 105, 107 (inferior), 108, 109 (superior), 112, 116, 120, 123 (inferior); Bluepharma: 136,137,
(superior); Câmara Municipal de Lisboa - Divisão de Arquivo Municipal Fotográfico: 66, 99; Centro de Documentação Farmacêutica - Ordem dos Farmacêuticos: 65 e 70
(inferior); Iberfar: 109 (inferior); Infarmed: 130, 131 (inferior); João Moreira dos Santos: 114-114; Medinfar: 122; Museu da Farmácia: 12, 30, 58, 144, 154, 162, 190,
202, 208, 218, 222; Pfizer: 110; Tecnimede: 129.
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Nota: As ilustrações dos separadores de capítulos deste livro fazem parte da colecção iconográfica do Museu da Farmácia, representando excertos de uma colecção de cartazes
de publicidade farmacêutica e parafarmacêutica (na época, as águas minerais e os vinhos nutritivos eram considerados produtos medicinais) produzida no início do século XX pela
Empresa Técnica Publicitária, de Raúl de Caldevilla, e também pela Litografia Luzitana (Água Oxigenada da Companhia Portuguesa Higiene) e por A Editora, Lda. (Aseptal).
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Agradecimentos
A Apifarma agradece a todas as individualidades e autores que participaram neste livro e também às personalidades e instituições
que, através do seu testemunho ou da cedência de documentos e materiais fotográficos, contribuíram para a investigação histórica
sobre o estabelecimento e desenvolvimento da indústria farmacêutica em Portugal: António José de Barros Veloso (médico); Arquivo
Nacional da Torre do Tombo/DGARQ; AtralCipan; Bayer; Bial; Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian; Biblioteca Nacional; Bluepharma; Câmara Municipal de Lisboa - Divisão de Arquivo Municipal Fotográfico; Centro de Documentação Farmacêutica da
Ordem dos Farmacêuticos; Grupo Tecnimede; Irene Flunser Pimentel (investigadora); José Pedro Sousa Dias (Faculdade de Farmácia
da Universidade de Lisboa); Labesfal-Fresenius Kabi; Maria das Neves; Maria João Macieira; Medinfar; Museu da Farmácia/Associação
Nacional das Farmácias; Laboratórios Pfizer, Lda.; Nuno Coelho Rodrigues (farmacêutico de indústria); Sofarimex.
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Índice
INTRODUÇÃO 11
João Almeida Lopes
I. TESTEMUNHOS INSTITUCIONAIS 12
Eurico Castro Alves (Presidente do Infarmed) 15
José Manuel Silva (Bastonário da Ordem dos Médicos) 17
Carlos Maurício Barbosa (Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos) 19
Laurentina Pedroso (Bastonária da Ordem dos Médicos Veterinários) 21
Orlando Monteiro da Silva (Bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas) 23
Germano Couto (Bastonário da Ordem dos Enfermeiros) 25
Associações de Doentes 26
II. PASSADO PRESENTE E FUTURO 30
II.1 Uma Visão da Indústria Farmacêutica 33
Luís Portela 34
Thebar Miranda 37
II.2 Duas Lideranças, Duas Perspectivas 40
João Gomes Esteves 41
Luiz Chaves Costa 46
II.3 Testemunhos Apifarma 48
Eduardo Pinto Leite 49
Leonardo Santarelli 50
Eduardo Leyva 51
Antónia Nascimento 52
António Chaves Costa 53
Cristina Lains 54
Mafalda Araújo 55
Manuel Dargent Figueiredo 56
Teresa Alves 57
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III. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL: PERSPECTIVA HISTÓRICA 58
Da Companhia Portuguesa Higiene ao primeiro medicamento original de patente mundial:
120 anos de Indústria Farmacêutica em Portugal
João Moreira dos Santos 61
IV. INVESTIGAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E SEU CONTRIBUTO PARA A EVOLUÇÃO CIENTÍFICA
E PARA A SAÚDE PÚBLICA 144
Francisco Batel Marques 147
Patrício Soares da Silva 149
V. O VALOR DO MEDICAMENTO E O SEU CONTRIBUTO PARA A SOCIEDADE 154
José Aranda da Silva 157
VI. O SECTOR FARMACÊUTICO NACIONAL E MUNDIAL 162
Mercado do Medicamento Mundial, Europeu e Nacional
Heitor Costa 165
Medicamento Veterinário
Helena Ponte 186
Diagnósticos in vitro
Isabel Abreu 188
VII. VALOR DOS RECURSOS HUMANOS E SUA EVOLUÇÃO 190
Helda Azevedo 193
VIII. IMPORTÂNCIA ECONÓMICA E ESTRATÉGICA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA 202
Pedro Ferraz da Costa 205
IX. RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLATAFORMAS DE COLABORAÇÃO E DESENVOLVIMENTO 208
Apifarma 211
X. RELAÇÕES INTERNACIONAIS 218
Apifarma 221
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XI. DIAGRAMA ILUSTRATIVO DE MOMENTOS-CHAVE DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL 222
João Moreira dos Santos 224
“Iremos, enfim,
até onde as circunstâncias
nos permitirem no sentido da
perfeição da nossa indústria”.
Excerto do discurso de Francisco Cortez Pinto, primeiro Presidente do Grémio,
na cerimónia de entrega do Alvará do GNIEF, em 14 de Fevereiro de 1939.
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INTRODUÇÃO
João Almeida Lopes
Presidente da Direcção da Apifarma
Celebrar os 75 anos da Apifarma – Associação Portuguesa
da Indústria Farmacêutica é uma oportunidade única para
reconhecer o forte compromisso das empresas farmacêuticas com a disponibilidade contínua de respostas mais adequadas às necessidades em Saúde dos portugueses e, simultaneamente, assinalar a capacidade demonstrada para
construir soluções de futuro para o País.
Desde o Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas, criado em 1939, até hoje, foram inúmeras, e muitas vezes complexas, as mudanças atravessadas
pelas empresas farmacêuticas em Portugal.
As transformações sociais e tecnológicas vividas pelo País
repercutem-se directamente na investigação, desenvolvimento e produção de medicamentos e meios de diagnóstico
in vitro em Portugal e obrigam a saber acompanhar permanentemente a mudança, sem colocar em causa a missão de
inovação da Indústria Farmacêutica.
Um exemplo desta capacidade de adaptação e criação da
Indústria Farmacêutica em Portugal está no contínuo crescimento das parcerias entre empresas e centros nacionais
de mérito reconhecido internacionalmente, procurando aumentar a taxa de sucesso entre a investigação de novas moléculas e o seu desenvolvimento clínico.
Simultaneamente, e porque a inovação farmacêutica só
assume verdadeiramente o seu valor quando é colocada à
disposição dos doentes que dela necessitam, o garantir da
acessibilidade ao medicamento e aos meios de diagnóstico
in vitro assume-se, também, como uma missão das empresas farmacêuticas em Portugal e da sua Associação.
Repercutindo a postura dos seus associados na sua intervenção, a Apifarma soube, também, ao longo destas décadas, procurar modelos mais dinâmicos e representativos
da diversidade empresarial que a constitui, tendo sempre
presente que o envolvimento das empresas associadas é
fundamental para a solidez da sua acção.
Com a edição desta obra, pretendemos dar a conhecer o
que foram esses momentos de mudança e o que caracteriza
o investimento em inovação por parte das empresas farmacêuticas associadas da Apifarma, bem como o impacto positivo da sua actividade na Saúde, na Ciência e na Economia
nacionais.
É, ainda, extremamente gratificante constatar, através dos
nomes que assinam os vários capítulos desta obra, a disponibilidade de tantas personalidades de mérito reconhecido
para se associarem à Apifarma nesta iniciativa.
Tal só pode ser entendido como uma demonstração de
que, enquanto associação, soubemos ser parceiros responsáveis de todos os que pensam e se preocupam com a Saúde em Portugal.
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1.
Excerto de cartaz publicitário do «Sanogenol: Poderoso Tónico»
Companhia Portuguesa de Higiene (1910-1916)
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TESTEMUNHOS INSTITUCIONAIS
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Eurico Castro Alves
Presidente do Infarmed
Há quem diga, e as estatísticas confirmam, que atingem
maior longevidade aqueles que mais aniversários celebram! Este princípio, que alguns interpretam como graça,
encerra, contudo, em si uma filosofia de vida. Na verdade,
são os que melhor sabem fazer o seu caminho que mais
aniversários cumprem.
É acreditando nisso, e considerando que estas datas são
sempre bons motivos para expressar o que pensamos, que
saudamos e cumprimentamos a Apifarma pela sua já longa existência, destacando o papel preponderante que tem
tido ao longo destes anos na Indústria Farmacêutica portuguesa. Conforme disse Louis Pasteur, “a sorte joga a favor de uma mente preparada” e, portanto, pode afirmar-se
que esta instituição alcançou já uma notável maturidade
do alto dos seus 75 anos de vida.
É incontornável reconhecer que a Apifarma é hoje, graças ao empenho que tem demonstrado em apoiar a ciência, uma instituição que tem merecido o respeito de todo
o sector da Saúde e que vem conquistando e contando
com o apreço dos nossos parceiros internacionais enquanto mediador e elemento proactivo e estabilizador, sendo
mesmo por muitos considerada um alicerce iniludível da
indústria dos medicamentos.
Acompanhando esse esforço, o Infarmed, I.P., enquanto
regulador e supervisor do sector dos medicamentos de
uso humano, não pode deixar de elogiar tal empenho.
Ciente de que vem cumprindo a sua missão, notamos,
positivamente, a atenção e o apoio entregues ao desenvolvimento de terapias inovadoras que vêm contribuindo
para dar resposta às constantes buscas de novos tratamentos num mundo sujeito a riscos e desafios e onde o
conhecimento pode significar, em último ratio, a resposta
para o futuro da Humanidade.
Foi Isaac Newton que lembrou: “o que sabemos é uma
gota, o que ignoramos é um oceano”. Imbuído deste sentimento de compromisso e seguro do sucesso deste esforço
de harmonia entre os vários agentes da Indústria Farmacêutica, o Infarmed releva a vontade expressa pela prática
diária da Apifarma em defender a segurança necessária
aos que lutam pelo desenvolvimento da verdadeira e séria ciência de inovação, proporcionando o alargamento
da longevidade e o bem-estar das pessoas e contribuindo
também, de forma inquestionável, para o desenvolvimento
económico e social do nosso País.
Não menos importante, e enquanto testemunhas da sua
firmeza em defender os seus associados e os seus interesses, é de toda a justiça referir que apreciamos a forma
como o tem feito, guiando-se por regras de uma sociedade
ocidental livre e democrática e no respeito pelos princípios sagrados de um Estado de Direito.
Ainda recentemente, a par com o sentido de responsabilidade social adequado ao funcionamento do sector do
medicamento, num momento tão delicado para o nosso
País como o atual, soube reger-se por princípios éticos
e deontológicos, observando sempre padrões de rigorosa
defesa da qualidade.
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Na área da Saúde, os desafios estabelecidos representam um equilíbrio difícil entre a manutenção e a aplicação
de medidas que visam a sustentabilidade do Sistema de
Saúde. Por um lado, é necessário garantir a qualidade e
equidade no seu acesso, mas, por outro lado, é necessário
permitir a redução da despesa sem sacrificar o acesso
equitativo de todos os cidadãos aos cuidados de Saúde.
É conhecida a pressão que os agentes envolvidos no circuito do medicamento têm suportado nos últimos anos.
No entanto, é necessário ter em consideração a importância de garantir o acesso a medicamentos seguros, de
qualidade, eficazes e a preços comportáveis, reduzindo o
esforço financeiro dos cidadãos.
Neste contexto, todos têm sido chamados a contribuir
e a fazer parte da solução, e o Infarmed tem encontrado
junto dos agentes do sector, nomeadamente nos representantes da Indústria Farmacêutica, um espírito de missão
que muito nos tem impressionado.
Reconhecendo esse empenho, o Infarmed assistiu à sua
materialização através de diversos compromissos assumidos entre a Apifarma e o Ministério da Saúde no âmbito do controlo da despesa com medicamentos. É justo e
merecido o agradecimento ao contributo que a Indústria
Farmacêutica tem realizado neste domínio, bem como
no cumprimento dos objectivos estruturais assumidos no
contexto do Programa de Assistência.
Associando-se a este alento, não podemos deixar passar
esta ocasião sem destacar o melhor exemplo deste espírito de compromisso, que é o Banco de Medicamentos.
Este projecto, que permite vincar os valores que nos
unem enquanto sociedade – a entreajuda e a solidariedade –, mediante pontes de entendimento entre o Ministério
da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, o Ministério
da Saúde (através do Infarmed), a Indústria Farmacêutica
e a União das Misericórdias Portuguesas, concretizou um
sistema de apoio complementar à população mais vulnerável, promovendo o acesso dos mais idosos ao medicamento. Desde o início do projecto do Banco de Medicamentos,
a 1 de Dezembro de 2012, já foram doadas cerca de 145
mil embalagens, correspondentes a um Preço de Venda ao
Público de aproximadamente um milhão e 500 mil euros.
O Infarmed encontra-se, actualmente, a implementar um
sistema de avaliação de tecnologias de Saúde aplicado aos
medicamentos e dispositivos médicos. Este sistema contempla a selecção das tecnologias de Saúde com base em
critérios de custo-efectividade e permitirá a monitorização
da sua utilização, estimulando e premiando o desenvolvimento de inovação relevante.
A finalidade é garantir a equidade de acesso a nível nacional de medicamentos e dispositivos médicos, disponibilizando os tratamentos mais aconselhados à situação
clínica de cada doente, adequando-os aos recursos do Sistema de Saúde Nacional.
Ao nível da Agência Europeia do Medicamento, têm-se
promovido diversos projetos-piloto no âmbito da avaliação
de tecnologias de Saúde, nos quais o Infarmed participa,
que visam redefinir os modelos de avaliação custo-efectividade de medicamentos e dispositivos médicos utilizados
a nível europeu, com vista a estabelecer as bases para a
implementação de um futuro Sistema Europeu de Avaliação de Tecnologias de Saúde. O objectivo é permitir uma
maior celeridade na introdução de inovação e, acima de
tudo, tornar mais equitativo o acesso entre os cidadãos
dentro do espaço europeu, no seio do qual, estamos certos, a Apifarma desempenhará um papel preponderante,
como tem sido sua prática.
Termino com uma palavra de apreço e reconhecimento
a todos os dirigentes e funcionários da Apifarma que, ao
longo destes anos, a souberam dignificar e tornar num tão
importante parceiro na complexa cadeia de Saúde, de tal
forma que não é possível vislumbrar um futuro em que a
Indústria Farmacêutica não esteja presente.
Ao actual presidente da Apifarma, Dr. Almeida Lopes,
endereço um especial cumprimento e formulo votos dos
maiores sucessos na continuidade do excelente trabalho
até agora desenvolvido.
José Manuel Silva
Bastonário da Ordem dos Médicos
A Apifarma vista por um Médico
Um aniversário de diamante é um tempo de congratular,
festejar, parabenizar, mas também de analisar, repensar,
futurar.
Para um médico comum, a Apifarma não diz muito, visto
que com ela não tem contactos directos.
São os laboratórios da Indústria Farmacêutica, individualmente, que contactam com os médicos, simbolizando a investigação, o medicamento, a terapêutica, a recuperação.
É através dos recursos desenvolvidos essencialmente
pela Indústria Farmacêutica que o médico exerce a sua
nobre e difícil missão, que visa a cura, o tratamento ou o
alívio do sofrimento.
Foi o desenvolvimento da investigação e da Indústria Farmacêutica que permitiram o crescimento da Medicina e a
realização do médico como verdadeiro médico.
É o apoio da Indústria Farmacêutica que facilita, e em
muitos casos é a única forma de tal ser possível, o acesso
dos profissionais de Saúde ao conhecimento científico actualizado, às reuniões científicas e discussão interpares, à
assinatura de revistas científicas, a tratados de medicina,
a tecnologia inovadora, a projectos de investigação, etc.
A Indústria Farmacêutica faz tudo aquilo que o Estado
também devia fazer, mas não faz e critica!...
Felizmente, e com a cooperação da Apifarma, a relação
entre indústria e profissionais de Saúde é cada vez mais
escrutinada e transparente. Ainda bem que assim é porque ninguém deve ter nada a esconder.
Os tempos actuais são bem diferentes daqueles em que
foi criado, há 75 anos, o Grémio Nacional dos Industriais de
Especialidades Farmacêuticas.
São os problemas próprios de um País perdido nos labirintos de uma democracia jovem e impreparada, em crise de
evolução e austeridade, com o desbravar de novos, desafiantes e contraditórios caminhos para a Indústria Farmacêutica.
Cada vez mais, o associativismo é essencial para a sobrevivência colectiva. Por isso mesmo, a Apifarma adquire
agora um maior protagonismo e visibilidade públicas, que
se renovam ciclicamente na dialética dos complexos acordos com o Governo.
Tigre de papel, a Apifarma deve reconstruir-se para o
futuro.
Fazer 75 anos em tempos de grave crise, cuja espiral se
continuará a agravar, impõe novos paradigmas e obriga a
um reflexivo e audaz desbravar das estradas do futuro.
Da parte dos médicos e dos doentes, num caminho que
tem algumas pedras e alçapões, felizmente em menor número do que os êxitos, tem o reconhecimento pelo insubstituível papel como parceiro na locomotiva do desenvolvimento da Medicina científica.
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Carlos Maurício Barbosa
Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos
Fundada em 1975, sucedendo ao Grémio Nacional dos
Industriais de Especialidades Farmacêuticas, criado em
1939, a Apifarma tem sabido congregar as empresas farmacêuticas que operam em Portugal, nacionais e multinacionais, defendendo os seus legítimos interesses, procurando corresponder às suas necessidades e expectativas e
contribuindo para o desenvolvimento do cluster português
da Saúde e para a modernização do Sistema de Saúde e,
por conseguinte, para o fortalecimento da competitividade do País.
A Apifarma tem, por razões de história, de função e de
competência, um lugar na primeira linha do sector da
Saúde em Portugal. Assume-se e é considerada como um
importante parceiro e interlocutor para a definição das políticas do sector.
A História da Apifarma e da Indústria Farmacêutica em
Portugal cruzam-se em muitos pontos com a História da
profissão farmacêutica dos últimos 75 anos.
Numa época em que Portugal era um País relativamente
rural e pouco industrializado, com fronteiras predominantemente fechadas e com uma população de baixos níveis
de qualificação escolar, em que, aliás, o analfabetismo era
vulgar, os industriais do sector farmacêutico, muitos dos
quais farmacêuticos de formação, iniciaram um caminho
de desenvolvimento de uma indústria que, hoje, tem um
papel essencial na redução da mortalidade e da morbilidade e na promoção da qualidade de vida das populações.
E, simultaneamente, reveste-se de interesse estratégico
para o País, assumindo uma posição de elevado relevo na
economia nacional e na captação de investimento.
Ao longo destes anos, centenas de farmacêuticos têm
sido parte integrante, por mérito próprio, do desenvolvimento da Indústria Farmacêutica em Portugal. Recordo,
em particular, a criação, pouco depois da transformação
do Grémio na Apifarma, do Grupo de Farmacêuticos de
Indústria (na época conhecido por GRUFIS), cuja primeira
reunião teve lugar em 1977, e que, mais tarde, veio a dar
origem ao actual Conselho do Colégio de Especialidade de
Indústria Farmacêutica da Ordem dos Farmacêuticos.
Actualmente, o título de especialista em Indústria Farmacêutica, atribuído pela Ordem dos Farmacêuticos, é condição consagrada na lei para o exercício da direcção técnica
das unidades industriais de produção de medicamentos.
E, de forma crescente, os farmacêuticos têm vindo a exercer funções de maior diferenciação e responsabilidade na
Indústria Farmacêutica, designadamente nas áreas da investigação científica, desenvolvimento tecnológico e inovação, gestão, planeamento, produção, controlo de qualidade, assuntos regulamentares, farmacovigilância, acesso
ao mercado, avaliação económica, logística, comercial,
promoção, informação e formação científica.
Neste momento de comemoração, gostaria de prestar a
minha homenagem aos fundadores da Apifarma, pela sua
visão estratégica e pelo importante contributo que deram
ao sector da Indústria Farmacêutica em Portugal. E na
pessoa do seu ilustre presidente, Dr. João Pedro Almeida
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Lopes, gostaria de homenagear todos os dirigentes, desde
a fundação, que souberam construir o prestígio institucional da Apifarma. Todos colocaram o seu empenho, conhecimento e bom nome ao serviço do sector e do capital
intangível que, hoje em dia, a Apifarma detém.
Nos anos mais recentes, a cadeia de valor do medicamento tem sido chamada a contribuir de forma marcada
para a redução da despesa pública com medicamento, de
que são exemplo os sucessivos acordos assinados pela
Apifarma com o Ministério da Saúde. Reconhecidamente,
esta constitui uma situação sem par no sector da Saúde e
mesmo nos outros sectores da economia portuguesa.
Neste contexto, parece ser de elementar prudência que
se registem preocupações sobre o uso recorrente e cumulativo de um tal mecanismo de política orçamental (é disso que, no fundo, se trata), pois ele pode afectar alicerces
da viabilidade empresarial, despromover a estabilidade e
a previsibilidade do sector, desincentivar o investimento e
o reinvestimento das empresas.
A Ordem dos Farmacêuticos cultiva o espírito de cooperação, diálogo, auscultação e, tanto quanto possível, entendimento com todas as entidades do sector da Saúde
em geral e da área farmacêutica em particular. Sempre
em absoluto respeito pelas posições institucionais de cada
um. Estes são princípios fundamentais que assumi e que
norteiam a minha acção na direcção da Ordem.
Ora, no caso das relações com a Apifarma, há naturalmente confluências e complementaridades, o que muito
me apraz registar, porque são condições propiciadoras de
elevados graus de cooperação entre as duas instituições,
em prol da valorização do papel do Farmacêutico e da Indústria Farmacêutica na sociedade.
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Laurentina Pedroso
Bastonária da Ordem dos Médicos Veterinários
Os desafios colocados hoje em dia à Classe Médico-Veterinária são, em tudo, coincidentes com os princípios defendidos pela Indústria Farmacêutica, nomeadamente no
que se relaciona com a inovação, a responsabilidade ética
e social do bem-estar e Saúde animal, a defesa da qualidade dos produtos de consumo produzidos em Portugal,
bem como com a preservação da qualidade do Ambiente.
A Classe Médico-Veterinária, representada pela OMV,
sempre atenta e receptiva, em primeira mão, à inovação
do conhecimento ligada à Farmacologia e produtos para
o tratamento animal, não pode deixar de se associar a
um marco tão significativo, em Portugal, reafirmando o
empenho dos seus membros na continuidade do desenvolvimento de uma cada vez maior evidência e necessidade
de “Uma Só Saúde”.
Não há fronteiras e são cada vez menores as barreiras
entre os organismos patogénicos que afectam, simultaneamente, o Homem e o animal.
O desenvolvimento de produtos inovadores é um facto
reconhecido e da responsabilidade e cooperação entre a
indústria e os diversos profissionais de Saúde.
O utente destes produtos mudou significativamente nos
últimos 75 anos, bastando por si só uma pequena análise
à esperança e qualidade de vida da população portuguesa.
Em grande parte, o profissional Médico Veterinário esteve
presente, ajudando e aplicando a inovação da Indústria
Farmacêutica.
Hoje, são ambos (Indústria e Classe Médico-Veterinária)
colocados perante novos desafios, não podendo deixar de
ser referida a luta contra as bactérias e organismos resistentes aos antibióticos.
O passado e a ligação de parcerias entre a OMV (e anteriores organismos de Classe) e a indústria, representada
em Portugal pela ApifarmaVet, são a razão e um desafio
cada vez maior de futuro ao empenho de muitas das empresas da Apifarma e profissionais que trabalham juntos
no mesmo sentido.
Cabe-me, portanto, em nome de todos os profissionais
Veterinários, uma palavra de reconhecimento e felicitação
pelo actual momento, agradecendo à presente Direcção a
continuidade desta ligação.
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Orlando Monteiro da Silva
Bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas
Em nome de todos os médicos dentistas portugueses,
saúdo a Apifarma por este aniversário especial. De facto,
75 anos são um marco que certamente orgulha todos os
associados, mas deve orgulhar, também, todos os portugueses. A Vossa instituição é um dos garantes da evolução
dos nossos Sistemas de Saúde e da evolução do exercício
das profissões da Saúde no País. Uma representação digna, dinâmica e activa da indústria responsável pela produção e importação de medicamentos.
Por vezes, não é fácil e evidente ver para além do que
nos é dado pela nossa realidade. Realidade muito formatada pelas circunstâncias de cada um e por um sistema
mediático que nos leva a processar e a simplificar muita
da informação que nos chega. São estes momentos, estes marcos temporais, que nos fazem reflectir um pouco
mais e ver um pouco mais além. Quando me pediram, enquanto bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas, um
texto sobre os 75 anos da Apifarma, o primeiro impulso
foi escrever sobre o relacionamento institucional entre as
nossas duas instituições. E seria fácil. O relacionamento é
bom e o País tem nestas duas instituições dois parceiros
leais, empenhados na construção diária de um Portugal
com mais Saúde e mais força económica. Seriam palavras
verdadeiras e com sentido.
Mas este é o momento de ver e ir mais além. Achei que
não me podia deixar tomar pelo fácil, pelo apenas politicamente correcto. Assim, considerei que este é momento
de homenagear os associados da Apifarma, uma comunidade dinâmica e activa que, pela sua acção – nem sempre
visível ao primeiro olhar, tem levado a que muitos jovens
portugueses nela vejam uma referência, um modelo, e invistam numa formação nestas áreas, e se entreguem a
ambiciosos projectos de investigação. Projectos que colocam, hoje, Portugal, apesar da sua dimensão e escassez de meios, na primeira linha da Indústria Farmacêutica
mundial. Vários são os prémios conquistados, várias são
as referências internacionais às nossas universidades, vários são os galardões de reconhecimento a empresas e
centros de investigação nacionais. Este é um sector que
encarna bem o potencial do conhecimento português.
Esta capacidade de gerar conhecimento é motivante e alavanca o País.
Obrigado, Apifarma!
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Germano Couto
Bastonário da Ordem dos Enfermeiros
No ano em que a Apifarma comemora os seus 75 anos, a Ordem dos Enfermeiros (OE) comemora o seu 16.º aniversário.
Apesar do sector da Saúde estar a passar por vários cortes
orçamentais, as duas entidades continuam a pugnar, cada
uma na sua vertente, pela manutenção do Sistema de Saúde
português, tendo sempre em vista a segurança e a qualidade
de vida da população residente em Portugal.
Ao longo dos seus 75 anos de existência, a Apifarma tem
evoluído e contribuído, de forma inequívoca, para o desenvolvimento e a melhoria da Saúde no nosso País e, consequentemente, para o aumento da esperança média de vida dos portugueses. A aposta na inovação, tanto ao nível do medicamento
como nos meios de diagnóstico, faz da Apifarma uma parceira
de relevo na área da Saúde, na medida em que permite que os
doentes tenham acesso a novas terapias e tratamentos.
A área do medicamento tem evoluído exponencialmente ao
longo das últimas décadas e esta realidade tem reflexo na sociedade na medida em que permite ao cidadão ter uma vida
mais prolongada, mas, acima de tudo, com mais qualidade.
Esta melhoria na qualidade de vida da população traduz-se
também no desenvolvimento económico e social do País visto
que permite que o cidadão seja mais produtivo, a nível profissional. O acesso a medicamentos de qualidade reflecte-se,
também, na diminuição da procura de outros cuidados de
Saúde e, consequentemente, na redução de encargos a médio
e a longo prazo.
Numa sociedade em que a esperança média de vida tem
vindo a aumentar e, em contraste, a taxa de natalidade a diminuir, é fundamental a existência de uma instituição como
a Apifarma, que tem como missão «fomentar a inovação e
o desenvolvimento de terapêuticas que respondam às necessidades de tratamento e prevenção de novas patologias». A
investigação clínica e o conhecimento científico são factores
essenciais para o desenvolvimento de uma sociedade, e o domínio destas áreas permite que o País e os seus profissionais
de Saúde se destaquem a nível internacional.
O trabalho desenvolvido ao longo dos anos, tanto pela Apifarma, como pela Ordem dos Enfermeiros, tem como principal destinatário o cidadão. Neste sentido, ambas as instituições zelam pela defesa de elevados padrões de qualidade e
segurança e, no actual contexto económico, em que sofremos
as consequências dos cortes impostos pelo Memorando da
Troika, é importante que todas as entidades da área da Saúde
se mobilizem e caminhem lado a lado, para transmitir aos decisores políticos que é fundamental o investimento no sector.
Não é fácil, na actual conjuntura, conseguir mudar mentalidades, mas não é impossível. Os avanços tecnológicos permitem melhorar a qualidade de vida da população cada vez
mais envelhecida. Contudo, a Saúde deve ser encarada como
um investimento e não apenas como um custo. Como refere
o ponto 1, do artigo 64.º, da Constituição da República Portuguesa, «todos têm direito à protecção da Saúde e o dever de
a defender e promover». Neste sentido, a Apifarma e a Ordem
dos Enfermeiros têm um papel preponderante no desenvolvimento da Saúde e, acima de tudo, na defesa da qualidade dos
cuidados de Saúde prestados.
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Associações de Doentes
Vitórias de uma Parceria
Em 75 anos o padrão da doença alterou-se radicalmente. E,
com ele, a própria sociedade e as suas expectativas relativamente à Saúde. Neste processo, as empresas farmacêuticas
souberam acompanhar a evolução e, dando destaque ao estabelecimento de parcerias, procurar responder às necessidades dos doentes, os seus primeiros interlocutores.
Se, no início do século XX, as doenças transmissíveis constituíam a principal preocupação em Portugal, a melhoria das
condições de higiene e de vida das populações, e um crescente acesso à mais recente investigação farmacêutica, contribuíram, decisivamente, para alterar este cenário e reduzir
drasticamente a incidência daquelas doenças no País.
Este tremendo ganho para a Saúde Pública em Portugal
elevou, naturalmente, as expectativas, legítimas, da sociedade portuguesa face à sua Saúde, para as quais é imperativo
saber continuar a encontrar respostas vencedoras.
A emergência de novos problemas de Saúde, associados
a estilos de vida mais sedentários, que ganharam peso com
as mudanças sociais dos últimos 30 anos, e a crescente preponderância das doenças não transmissíveis, com carácter
crónico, geraram um novo contexto desafiador para a Saúde.
Simultaneamente, a capacidade de adaptação e emergência
dos microrganismos contribuiu para o aparecimento de novas doenças e para o ressurgimento de patologias anteriormente controladas.
Actualmente, as doenças crónicas constituem uma das
principais causas de mortalidade e, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, representam um dos principais
factores a contribuir para o contínuo crescimento das despesas em Saúde.
A par da maior prevalência das doenças crónicas na população, o crescimento da despesa é também impulsionado
pelo aumento da esperança média de vida, que, por sua vez,
beneficiou de um considerável incremento devido à contínua
melhoria nos tratamentos disponíveis.
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Além dos custos directos na Saúde, as doenças crónicas
colocam também pressão em muitas outras áreas da vida
social, como é o caso da Economia, tendo em conta as
limitações à actividade diária que acarretam para os seus
portadores.
Desde sempre que as empresas farmacêuticas se constituíram como parceiro dos Sistemas de Saúde na busca de
soluções que contribuam para o crescente bem-estar das
populações. O forte investimento que estas organizações
aplicam à sua missão, a contínua investigação e desenvolvimento de novos medicamentos e exames de diagnóstico
– são elementos com um papel decisivo nas alterações
positivas registadas no controlo das doenças transmissíveis e no aumento da esperança média de vida a que se
assistiu nos últimos anos.
Perante os novos desafios que se perfilam na Saúde, as
empresas farmacêuticas têm respondido com capacidade de adaptação para acompanhar a crescente exigência
e complexidade na investigação e desenvolvimento (I&D)
de medicamentos inovadores e na busca de terapias cada
vez mais seguras e eficazes. Neste processo, ganha cada
vez mais relevo a capacidade de assegurar parcerias com
todos os agentes da Saúde – doentes, serviços e profissionais, de modo a que o investimento em I&D se traduza em
reais ganhos em Saúde e em maior qualidade de vida.
Para a concretização deste objectivo, é necessário que
o Sistema de Saúde coloque o doente no centro da sua
atenção e, simultaneamente, que o doente seja um participante activo e envolvido na intervenção da sua doença. Primeiro que tudo, porque o cuidado da maioria das
doenças crónicas envolve directamente o paciente numa
base diária. É ele o responsável pelas decisões que toma
e que impactam, de forma determinante, o seu estado de
Saúde e a sua qualidade de vida. E quando os doentes são
encorajados a um maior envolvimento nas opções para a
sua patologia, melhores são os resultados em Saúde, tanto para o próprio paciente como para o Sistema de Saúde
que o apoia.
Neste investimento na capacitação do doente para gerir
a sua patologia, a educação é uma ferramenta fundamental, pelo que o primeiro passo na preparação dos doentes
para assumirem um papel mais activo na gestão da sua
patologia é a sua educação para a Saúde. Doentes mais
informados sobre o que envolve e implica a sua patologia
são também os principais agentes da mudança no sentido de um melhor controlo da mesma, com consequentes
resultados positivos na sua qualidade de vida. Também a
mudança de hábitos e comportamentos que o controlo das
doenças crónicas implica exige, igualmente, um paciente
informado e motivado e que saiba construir a mudança na
sua vida através de passos sucessivos.
A educação para a Saúde e a informação ao doente são
áreas em que as empresas farmacêuticas têm, desde há
vários anos, desenvolvido um trabalho contínuo, cientes
de que pacientes mais informados serão também os melhores utilizadores dos medicamentos e das tecnologias
de Saúde desenvolvidos em seu benefício. Este trabalho,
realizado em conjunto com as associações que representam os doentes e com os profissionais de Saúde, passa
por elementos tão diversos como a disponibilização de informação actualizada sobre as patologias, acções de formação sobre as mesmas e o seu controlo, até à contínua
clarificação da linguagem utilizada, adequando termos
científicos às decisões com que o doente é confrontado no
seu dia-a-dia.
Para as empresas farmacêuticas associadas da Apifarma, este investimento contínuo na educação para a Saúde
concretizou-se em 1999, com a criação de uma Parceria
entre a Associação e as associações de doentes, visando
congregar esforços que permitissem beneficiar crescentemente um maior número de pessoas em matéria de acesso a informação transparente e credível sobre Saúde. As
quatro primeiras associações que se reuniram com a Apifarma foram a Associação Protectora dos Diabéticos de
Portugal, a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos
de Doentes de Alzheimer, a Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla e a Associação Portuguesa de Doentes de
Parkinson. Hoje, são 42 as Associações que fazem parte
desta Parceria, cujos objectivos passam pela permuta de
informações sobre patologias, uma melhor acessibilidade
dos doentes às terapêuticas e a sua crescente participação nas estratégias da área da Saúde.
Ao longo de 15 anos a Parceria desenvolveu inúmeras
actividades, respeitando sempre a independência e a autonomia das associações que a integram e actuando com
a máxima transparência para um crescente acesso dos
doentes a informação sobre Saúde.
No ano em que a Apifarma assinala o seu 75.º aniversário, a celebração desta Parceria é essencial, representando um caminho que, sem dúvida, é o do futuro.
AFID – Associação Nacional de Famílias para a Integração
da Pessoa Deficiente
Domingos Rosa – Presidente do Conselho de
Administração
Alzheimer Portugal – Associação Portuguesa de
Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer
João António Carneiro da Silva – Presidente
ADEB – Associação de Apoio aos Doentes Depressivos
e Bipolares
Delfim Oliveira – Presidente da Direcção
ANDAR – Associação Nacional de Doentes com Artrite
Reumatóide
Arsisete Saraiva – Presidente
ANEA – Associação Nacional da Espondilite Anquilosante
Justino Romão – Presidente
ANEM – Associação Nacional Esclerose de Múltipla
Maria José Meyer – Presidente da Direcção
ANFQ – Associação Nacional de Fibrose Quística
Christian Bastos Andersen – Presidente
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APADP – Associação de Pais e Amigos de Deficientes
Profundos
Fernando Valente – Presidente da Direcção
APAHE – Associação Portuguesa das Ataxias Hereditárias
Vera Brito – Presidente
APART – Associação de Pais e Amigos de Portadores
do Síndrome de Rubinstein – Taybi
Elvira Dias – Presidente
APCDG-DMR – Associação Portuguesa Síndrome CDG
e outras Doenças Metabólicas Raras
Vanessa Ferreira – Presidente da Direcção
APCL – Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral
Núcleo Regional do Sul
José Manuel Antelo – Presidente
APDI – Associação Portuguesa da Doença Inflamatória
do Intestino, doença de Crohn e Colite Ulcerosa
João Carlos Silva Machado – Presidente da Direcção
APDPk – Associação Portuguesa de Doentes de Parkinson
José Luís Quental Mota Vieira – Presidente da Direcção
Nacional
APDPróstata – Associação Portuguesa de Doentes
da Próstata
Joaquim da Cruz Domingos – Presidente da Direcção
APELA – Associação Portuguesa de Esclerose Lateral
Amiotrófica
Conceição Pereira – Presidente
APIR - Associação Portuguesa de Insuficientes Renais
João Augusto Cunha Cabete – Presidente da Direcção
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APLL – Associação Portuguesa de Leucemias e Linfomas
Isabel Leal Barbosa – Presidente da Direcção
APN – Associação Portuguesa de Doentes
Neuromusculares
Joaquim Brites – Presidente da Direcção
APNF – Associação Portuguesa de Neurofibromatose
Lúcia Lemos – Presidente
APOFEN – Associação Portuguesa de Fenilcetonúria
e Outras Doenças Metabólicas
Rui Barros Silva – Presidente da Direcção
APSA – Associação Portuguesa de Síndrome de Asperger
Piedade Líbano Monteiro – Presidente
ARP – Associação de Retinopatia de Portugal
Rui Manuel Fontinha Vasconcelos – Presidente
Associação Grupo de Apoio SOS Hepatites
Emília Rodrigues – Presidente
Associação Portuguesa de Fertilidade
Cláudia Vieira – Presidente
Europacolon Portugal – Apoio ao Doente com Cancro
Digestivo
Vitor Neves – Presidente
Fundação Rui Osório de Castro
Karla Osório de Castro – Presidente
Myos – Associação Nacional Contra a Fibromialgia
e Síndrome de Fadiga Crónica
Cristina Fidalgo Sequeira – Presidente
PSOPortugal – Associação Portuguesa da Psoríase
João António Lopes Vaz Martins – Presidente
RARÍSSIMAS – Associação Nacional de Deficiências
Mentais e Raras
Paula Brito e Costa – Presidente
Respira – Associação portuguesa de Pessoas com DPOC
e outras Doenças Respiratórias Crónicas
Luísa Soares Branco – Presidente
SER+ Associação Portuguesa para a Prevenção e Desafio
à Sida
Margarida Prieto – Presidente da Direcção
SPEM – Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla
Manuela Duarte Neves – Secretária-Geral
29
2.
Excerto de cartaz publicitário do «Aseptal: O Anti-séptico - Perfume»
Farmácia Normal (1910-1917)
30
PASSADO, PRESENTE E FUTURO
31
32
II.1 UMA VISÃO DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
33
INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL: UMA APOSTA DE FUTURO
Luís Portela
Presidente da Bial
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A Indústria Farmacêutica em Portugal tem já uma história
longa de mais de um século, que resulta de um processo de especialização de competências e profissões ainda
mais longo.
No final do século XIX, surgiram em Portugal os primeiros investimentos industriais, como a criação da Companhia Portuguesa Higiene, em 1891. No início do Século
XX, começaram a surgir as primeiras presenças de companhias estrangeiras em Portugal, empresas químicas de
origem, com produção de especialidades farmacêuticas,
como a Bayer, em 1909.
Portugal não foi precursor de mecanismos de protecção na doença para os trabalhadores, como foram outros
países europeus, no contexto das transformações sociais
propiciadas pela Revolução Industrial. Apenas em 1935,
surgiram, no contexto do Estado Novo, os primeiros mecanismos mais amplos de proteção, com a criação das
instituições de previdência. Mas só em 1950 foi regulada
a “assistência medicamentosa”, um primeiro regime de
comparticipações, que permitiu alargar o acesso aos medicamentos.
Grandes mudanças surgiram durante a Segunda Guerra Mundial, pelo papel que os antibióticos, a penicilina,
as tetraciclinas e a estreptomicina, os anti-histamínicos,
as anfetaminas, os antimaláricos, proporcionados pelas
empresas farmacêuticas europeias, permitiram na grande
evolução no combate a diversas doenças, com grande prevalência na época, em particular no controlo das doenças
epidémicas.
Nos trinta anos a seguir à guerra houve uma mudança radical da resposta colectiva às doenças. A articulação
das políticas de protecção social prosseguidas pelos Estados, com o desenvolvimento científico e com o investimento das empresas farmacêuticas internacionais, potenciou
essas mudanças, diminuindo a mortalidade, aumentando
fortemente a esperança de vida e proporcionando condições de vida em melhoria constante.
Em Portugal, essas mudanças foram mais tardias. Apenas nos anos 60 foi alargado o regime de comparticipação
dos medicamentos aos familiares dos abrangidos pelos
regimes de previdência.
O impacto virtuoso que os Países mais avançados tiveram na articulação entre as políticas de protecção social
e o esforço industrial foi muito menor no nosso País. A
opção por um “regime de cópias”, na resposta às necessidades crescentes de medicamentos, num contexto de
um mercado protegido pelo condicionamento industrial
e pela protecção aduaneira, permitiu criar um mercado
abastecido pela produção local, de companhias nacionais
e internacionais, a que acresciam os mercados africanos
de domínio português.
Salientaram-se, nessa época, dois grandes projectos industriais portugueses que visaram a produção própria de
matérias-primas e a internacionalização: o Grupo Luso-Fármaco, liderado por Diogo Bravo, e o Grupo AtralCipan,
liderado por Sebastião Alves. Do primeiro, resta atualmen-
te a Lusomedicamenta, essencialmente dedicada à produção para terceiros, e a Tecnifar, focada na comercialização
de algumas marcas próprias e de licenças de multinacionais. O segundo grupo mantém-se activo na produção e
comercialização de matérias-primas e medicamentos,
embora com uma dimensão bastante menor.
A seguir ao 25 de Abril, foi alargado o acesso aos regimes de protecção social e, especificamente, o acesso aos
medicamentos, por redefinição dos regimes de comparticipação, independentemente da sua origem. O mercado
de medicamentos cresceu e o papel da indústria de medicamentos também.
Mas a dinâmica económica induzida foi algo limitada.
Se, num primeiro período, o esforço de investimento industrial associado a capacidades produtivas internas
cresceu e surgiram bons projectos, o impacto da criação
do mercado interno europeu e do alargamento a leste teve
consequências na Indústria Farmacêutica, com uma crescente presença das empresas multinacionais, que foram
adquirindo algumas das mais importantes empresas nacionais e encerrando um considerável número de unidades produtivas no País.
Deste modo, o período final do Século XX e os anos mais
recentes têm um balanço algo contraditório. Se é bem patente uma enorme evolução das qualificações e das competências, as quais permitiram, por impulso de políticas
públicas e de investimentos privados, a estruturação dum
sistema científico mais forte e mais orientado para a I&D;
se é também patente um dinamismo forte em novos projectos centrados no conhecimento; é ainda evidente que
as plataformas industriais do medicamento são menos
fortes do que o desejável.
Algumas empresas, como a Bial e a Medinfar, focaramse na produção e comercialização de licenças de medicamentos inovadores de multinacionais, outras, como os
Laboratórios Azevedos e a Iberfar, dedicaram-se sobretudo à produção para terceiros, e ainda outras, como a Tecnimede, a Generis, a Bluepharma e a Basi, focaram-se na
produção e comercialização de genéricos. A Edol focou-se
na produção e comercialização de produtos de especialidade. Várias destas empresas têm investido na internacionalização dos seus produtos.
Apesar do sistema das Ciências da Vida ter hoje uma abrangência, complexidade e dimensão que em muito extravasa a
tradição industrial em torno dos medicamentos, tanto ao nível da oferta de cuidados de Saúde, de diversidade de produtos e serviços especializados, Portugal tem um forte défice
comercial em medicamentos, um baixo nível de investimento em I&D empresarial e uma baixa capacidade de atracção
de investimentos estruturantes neste domínio.
Contudo, em 2009, a Bial empresa fundada em 1924
por Álvaro Portela e que, hoje, é gerida pela quarta geração da família, conseguiu fazer aprovar pela EMA (European Medicines Agency) e iniciar a comercialização, a nível
internacional, do primeiro novo medicamento de origem
portuguesa, o antiepiléptico Zebinix. Esta empresa tem
vindo a investigar outros novos medicamentos, que irá
comercializar nos próximos anos, procurando robustecer
um forte projecto de internacionalização.
Outras empresas farmacêuticas nacionais e algumas
startups, como a Technophage, a Luzitin, a Cell2B e a
Biotecnol, têm anunciado terem em investigação e desenvolvimento outros novos fármacos, que poderão vir a ser
lançados nos próximos anos, contribuindo para dar continuidade ao notável crescimento das exportações do sector
no último quinquénio.
Mas a dimensão do mercado português do medicamento, em termos comparados com os países da OCDE, não
tinha, antes do início do processo de ajustamento, um padrão muito diferenciado dos valores médios. Nem em termos estruturais, nem em termos de taxas de crescimento.
Também no que se refere à despesa global em Saúde ou
em Medicamento, os nossos valores comparavam bem.
O impacto global do recente processo de ajustamento
sobre o sector do medicamento e o seu futuro ainda não é
totalmente claro.
35
A opção por concentrar o essencial do ajustamento em
Saúde num forte corte administrativo na despesa com medicamentos não tem como explicação a existência de um
diferencial de despesa, nem um diferencial de preços ou
de custos de intermediação com padrões anormais, parecendo ser ditada por uma solução de oportunidade política.
O papel das instituições da Troika neste domínio não foi estrutural, de melhor organização dos mercados, de eficiência
na utilização dos recursos, de objectivos consistentes na despesa, mas por sobrevalorização dos aspectos financeiros e
menorização das consequências económicas.
No período do ajustamento, cerca de um terço da despesa
pública total com medicamentos foi cortada, sendo esse corte muito mais acentuado no segmento ambulatório, basicamente por resultado de cortes administrativos dos preços.
O limitado impacto da reforma do sistema hospitalar, a
continuação de problemas estruturais de atrasos de pagamentos e o atraso no acesso aos produtos inovadores são
situações que colocam sérias questões ao modo como deve
o sistema evoluir para garantir o bom acesso dos doentes, a
valorização dos produtos inovadores e o controlo dos custos
da política do medicamento.
Neste domínio, parece que alguns elementos nucleares devem ser equacionados:
- Acordos de médio prazo entre o Estado e a Indústria, aliviando a enorme pressão restritiva dos últimos anos;
- Aposta consistente na prevenção, nos cuidados primários
e nos cuidados continuados;
- Avaliação e definição de preços sensatos e prazos decisionais curtos para os produtos inovadores;
- Fortes estímulos fiscais e financeiros à I&D mantidos no
longo prazo;
- Ajustamento dos regimes de comparticipação, com diminuição dos factores de excesso na despesa;
- Melhor articulação entre centros de investigação e empresas, com mobilidade de investigadores, e incentivos à ligação
entre empresas nacionais e internacionais;
- Alocação à inovação dos ganhos de eficiência.
36
Em Portugal, a Saúde em geral, e a Indústria Farmacêutica
em particular, têm um enorme potencial de desenvolvimento
futuro, no sentido de servir adequadamente os interesses das
populações. Mas importa criar espaço para que essa capacidade de realização se transforme numa bonita realidade.
AS ESTÓRIAS QUE FAZEM A HISTÓRIA DA INDÚSTRIA
FARMACÊUTICA EM PORTUGAL
Thebar Miranda
Presidente do Grupo Azevedos
Quando me lançaram o convite para escrever um testemunho
para e sobre os 75 anos da Apifarma que começo, desde
já, por felicitar por tão honrosa data, comecei de imediato
a percorrer, no pensamento, a minha ligação a este universo. Pertenço a uma família que esteve, desde sempre,
ligada ao medicamento, sendo eu um dos elementos da
terceira geração com essa relação à Saúde. Na verdade,
uma das primeiras memórias que tenho da minha infância
é estar, de bata branca, na farmácia do meu avô, a ajudar
na preparação de manipulados.
No entanto, a história começa antes. Remonta a 1755,
ano em que a marca Azevedos lançou as bases do que é
hoje o grupo farmacêutico português de origem mais antigo e um dos mais históricos da Europa. Actuamos em todo
o circuito do medicamento – Investigação & Desenvolvimento, Produção e Distribuição, comercializamos marcas
próprias e licenciadas. Somos dos primeiros produtores
de medicamentos em Portugal e líderes na exportação.
Empregamos cerca de 650 colaboradores e temos presen-
ça directa em quatro mercados: Portugal, Brasil, Angola
e Moçambique. Os medicamentos que produzimos estão
presentes em mais de quarenta países.
Mas a história não acaba aqui. Há mais estórias a contar
para se perceber as circunstâncias em que surge a Apifarma, há 75 anos atrás, e essas estórias são protagonizadas
por pessoas e empresas como o Grupo Azevedos. Porque
a razão de existir da nossa empresa, bem como de todos
os players do sector da Saúde, é melhorar e prolongar a
vida das pessoas.
No nosso caso, a base industrial tem sido um dos pilares
estratégicos do negócio. É, na minha opinião, uma das fases mais críticas e importantes do ciclo do medicamento.
A nossa unidade de produção, a Sofarimex, fabrica para
empresas de todo o mundo e mais de 75% da sua produção tem como destino o mercado internacional. Estamos,
dessa forma, não só a assegurar emprego altamente especializado, como a fomentar o equilíbrio da balança comercial portuguesa, contribuindo largamente para o aumento das exportações nacionais. A visão internacional tem
sido, desde sempre, parte da nossa ambição. A dimensão
do mercado português é muito limitada e limitante para
quem pretende desenvolver uma Indústria Farmacêutica
competitiva. Além disso, quem investe numa estrutura
industrial e em todo o know-how e rigor tecnológico exigidos, necessita de capitalizar o esforço e, para isso, há
que levantar a cabeça e procurar oportunidades por esse
mundo. Foi o que fizemos há mais de 30 anos. Na década
de oitenta do século XX, iniciámos um processo de pesquisa e estudo de mercados internacionais para identificar
destinos para os nossos produtos. África foi a opção inicial.
Começámos por Marrocos, seguiu-se Cabo Verde e, depois, Angola, Moçambique e Brasil. Neste momento, os
mercados lusófonos são core para o Grupo Azevedos.
Não podemos deixar de contemplar nesta história, também, a importância que representa, em todo o universo da
Saúde, o tema da Investigação & Desenvolvimento (I&D).
Essa aposta é fundamental enquanto estratégia de diferen-
37
38
ciação. Na disponibilização de melhores soluções terapêuticas, a opção do Grupo Azevedos assenta na manipulação
e estudo de moléculas conhecidas com o objectivo de melhoria e aperfeiçoamento. Deste investimento, surgem novos medicamentos genéricos e novas combinações, além
de novas formas de aplicação. Os medicamentos genéricos
são, aliás, um fenómeno importante e têm vindo a ganhar
escala e dimensão em Portugal. Ainda bem. De certa forma,
democratizam o acesso à Saúde. O que não pode acontecer é um desvirtuar do “bem” medicamento. Uma caixa de
medicamentos para uma doença crónica, como a Diabetes,
não pode custar o mesmo do que um refrigerante. Quando isto acontece, é porque algo está errado. É desprezar
todos os recursos e exigências tecnológicas que suportam
o fabrico de um medicamento. Temos, também, situações
irrealistas em medicamentos inovadores que, por oposição,
apresentam níveis de preços absolutamente inacessíveis,
o que não favorece nem beneficia a Saúde Pública, nem o
mercado. É necessário alcançar um sistema de maior justiça social e económica, e, nesse contexto, o Estado deve
intervir de forma responsável e conciliadora de interesses,
procurando o equilíbrio e o bem comum e evitando as distorções no sector. Já que os Estados sociais induzem a politização do medicamento, espera-se que o papel do Estado
se oriente para a sustentação do Sistema de Saúde numa
óptica de longo prazo e não em soluções imediatistas.
Pensando em sustentabilidade, e agora na vertente empresarial, surgem outros desafios, entre eles, a questão
da dimensão reduzida das companhias, nomeadamente as nacionais, de origem familiar, no mercado global.
Coincidência (ou talvez não) é verificarmos que, no nosso
País, não existiram processos de fusões/aquisições entre
empresas de capital nacional. Quando, mais uma vez, levantamos a cabeça e olhamos lá para fora, constatamos
que fenómenos de fusões e aquisições são comuns entre
as empresas farmacêuticas, o que não se passa entre os
players lusos. Pode ser um traço da nossa característica e
cultura, somos muito individualistas, mas sem dúvida que
esse traço acaba por ter um impacto profundo na ambição
e na capacidade de desenvolver e internacionalizar os negócios. Sem ganhar escala e dimensão, o que pode surgir
através de fenómenos de concentração, é mais difícil às
nossas empresas encetarem processos de expansão internacional. Numa altura como a que vivemos, de elevada contracção e estagnação do mercado interno, é algo em que os
líderes da Indústria Farmacêutica nacional devem reflectir.
Afigura-se, também, como fundamental uma mudança de
paradigma no nosso sector. Este imperativo de mudança
não está, necessariamente, relacionado com a crise financeira e económica. Está, isso sim, associado à evolução
vertiginosa do nosso mundo e das percepções e hábitos
da população em geral, relativamente a uma permanente
expectativa de mais e melhor Saúde.
A Indústria Farmacêutica caiu do pedestal, se assim
podemos dizer. Deixou de ser um “mundo à parte”, elitista e com mais recursos que as demais. Somos, neste momento, uma indústria igual a tantas outras, como
a aeronáutica ou a electrónica, de elevada componente
tecnológica. Temos, por isso, de nos reger pelos padrões
de eficiência e produtividade que as congéneres de outras
indústrias têm feito desde sempre. Com níveis de rigor e
eficácia elevados e sem espaço para desperdícios. Temos,
nesse campo, ainda um longo caminho a percorrer. Mas
ele tem de ser percorrido, para bem de todos. Literalmente todos. A começar pela opinião pública, que necessita
ajustar a imagem e as expectativas que tem relativamente
à Indústria Farmacêutica. Não podemos ser vistos como
uma commoditie. Como fabricantes de bens cujo valor é imperceptível, todo o bem que desenvolvemos, produzimos e
comercializamos é muito mais valioso. A Indústria Farmacêutica dá vida. Melhora e trata a dor e o sofrimento, com todo o
impacto que isso tem no mundo. Não há muito tempo, ainda
existiam pessoas a morrer de sarampo ou de diarreia. Por
vezes temos memória curta e não valorizamos quem nos faz
bem. Esta relação tem que evoluir para bem do progresso e
do desenvolvimento.
Quero, de facto, acreditar que ainda vou viver num País em
que a Indústria Farmacêutica vai ser vista e reconhecida pelo
seu contributo na geração de valor e riqueza para a nação,
a criação de emprego qualificado, o aumento das exportações nacionais e a internacionalização da marca Portugal.
Para esta esperança e ambição contribui ver que a História
é feita de evolução e de pequenas estórias. Que, ao contrário do que aconteceu comigo, a quinta geração da nossa
família não anda de bata branca a preparar manipulados
numa farmácia. Anda, sim, a percorrer a nossa unidade de
produção e a descobrir como desenvolver e fabricar melhor
os milhões de medicamentos que têm como destino Países
dos cinco continentes. Porque são estórias como esta que
fazem a nossa História.
Para concluir, deixo os meus sinceros parabéns à Apifarma pelo seu 75.º aniversário e, principalmente, por tudo
o que tem feito e continua a fazer na defesa dos interesses da Indústria Farmacêutica em geral, nomeadamente,
na conciliação dos denominadores comuns entre todos os
stakeholders do mercado. No final do dia, os sucessos e as
vitórias da Apifarma são, sem dúvida, em prol e benefício do
sistema do medicamento e da Saúde em Portugal.
Parabéns à Apifarma e a todos os seus associados, cujas
estórias, como algumas das que conto hoje, são as que fazem a História destes 75 anos.
39
II.2 DUAS LIDERANÇAS, DUAS PERSPECTIVAS
40
João Gomes Esteves
Presidente da Direcção da Apifarma (1991-1993 e 1998-2006)
Presidente da Mesa da Assembleia-Geral (desde 2007)
A Apifarma faz 75 anos! Três quartos de século, dos quais
cerca de 30 correspondem a uma parte da minha vida
no associativismo. Comecei no século passado e, por períodos distintos, fui Presidente da Direcção da Apifarma
durante mais de uma dezena de anos.
E, embora mantendo a ligação à Apifarma, presidindo à
mesa da Assembleia-Geral, é sobre estes anos, dos quais
guardo boas memórias e grandes Amigos, que vos falarei
em jeito de viagem, recordando os temas que enquadraram as transformações regulamentares e institucionais
necessárias e obrigatórias pela adesão à Comunidade Europeia, que balizaram a intervenção pública da Indústria, e
moldaram o seu relacionamento com sucessivos Governos
e diferentes parceiros, criando um espaço e projectando
uma imagem que se espelhou na Apifarma.
E é, também, a todos os que me acompanharam neste
percurso, tanto nas sucessivas Direcções, como nos quadros da instituição, que presto tributo ao empenho e profissionalismo, lealdade e entrega que permanentemente de-
monstraram, ajudando, muitas vezes de forma anónima, ao
sucesso das intervenções e ao brilho das cerimónias.
Sempre defendi, e esse foi o entendimento das Direcções
a que presidi, que quando falamos de Apifarma falamos
de associados, as Empresas da Indústria Farmacêutica,
e que a sua acção devia assentar em dois pilares: representar e defender de forma inequívoca e organizada os
interesses dos seus sócios.
E esta representação organizada foi sempre a par com
o reforço de representatividade, bem demonstrado nas
Comissões Especializadas, que têm liderado, com grande
autonomia e indiscutível capacidade técnica, as matérias
da Saúde Animal, dos Medicamentos de Venda Livre, dos
Meios de Diagnóstico, dos Assuntos Hospitalares e das
Vacinas, áreas específicas do negócio farmacêutico de
grande valia para o Sector da Saúde. A representatividade
reflectida nesta estrutura organizativa estava acompanhada de Órgãos igualmente eleitos, que sempre ajudaram e
aconselharam a Direcção.
Juntamente com a representatividade, o segundo pilar de
acção consistiu em assegurar uma Apifarma independente,
aberta à cooperação com a Sociedade e o Estado, assertiva
e rigorosa, projectando ideias e princípios, antecipando alterações estruturais, influenciando o olhar dos decisores.
A visão equilibrada da Indústria Farmacêutica, situada
entre os problemas de Saúde Pública e os interesses económicos, promotora de emprego qualificado, da investigação
e do desenvolvimento tecnológico, contribuinte activa para
a riqueza do País e, sobretudo, para a Saúde e Qualidade de
vida dos Portugueses, foi sempre o norte das acções da Apifarma enquanto tive a responsabilidade e gosto de a dirigir.
A ECONOMIA, O MERCADO E AS EMPRESAS
A Indústria Farmacêutica é um sector com características pouco usuais. Totalmente regulamentada, espartilhada entre a indispensável protecção da Saúde Pública e
o necessário desenvolvimento empresarial, submetida a
41
42
normas estritas e escrutínios regulamentares em todo o
seu ciclo produtivo, é também um dos sectores que mais
investe em Pesquisa e Desenvolvimento, contribuindo, como
poucos, para o desenvolvimento tecnológico do País.
Acresce que os bens que produz são, na maioria dos mercados, subsidiados pelo Estado, por instituições públicas
ou por entidades privadas, facto que torna sensível e controversa a matéria dos preços dos medicamentos.
Os aspectos regulamentares, traduzidos pelo esforço de
transpor para a ordem jurídica interna mais de 30 anos de
Legislação Comunitária, foram acompanhados na segunda metade dos anos 90 do Século XX por uma crescente
preocupação do Ministério da Saúde com o crescimento
da factura dos medicamentos, uma, senão a única, rubrica da despesa do Ministério que, na época, era conhecida
em tempo real.
A tentação de utilizar o factor “preço” de medicamentos
era de difícil resistência, pois sendo tecnicamente fácil era
também politicamente compensadora.
No entanto, e na opinião da Apifarma, outros elementos
mereciam urgente reflexão e cuidada análise, pois também eles induziam despesa em Saúde, como, por exemplo, a crescente e qualificada oferta de cuidados de Saúde
traduzida em mais médicos, mais consultas, novos hospitais com melhores condições e diversificadas valências, o
aumento da esperança de vida, patologias emergentes e
o progresso científico acelerado, tanto nas terapêuticas,
como nos meios de diagnóstico.
Na época, um relatório da OCDE sobre a Saúde em Portugal reconheceu progressos, comparou diversas variáveis
e evidenciou distorções na despesa pública e privada com
Saúde e na despesa com medicamentos, ajudando a clarificar ideias e equacionar tendências.
Partindo de um modelo complexo, a que acrescentámos
as variáveis da criação do Mercado Interno, da adopção
do Euro e da Declaração do Conselho de Ministros que
considerou a Indústria Farmacêutica um Sector Estratégico, iniciámos um trabalho em várias frentes, colaborando,
sempre que possível, com o Governo, num quadro de afirmação da valia do nosso contributo para o País.
A estabilidade legislativa foi uma das exigências que emergiu da nossa reflexão interna, pois sem ela não havia estratégia empresarial ou sectorial que conseguisse chegar ao fim.
Mas também nos chegavam sinais preocupantes nas
áreas das autorizações de introdução de novos medicamentos no mercado, dos preços e das comparticipações,
com referências espaçadas e mais ou menos explícitas
a um sistema de preços de referência, primo direito dos
medicamentos genéricos, que ainda não tinham o devido
enquadramento num Código da Propriedade Industrial alinhado pelos valores da protecção dos direitos referentes a
Patentes e Registos de Marcas.
À medida que o mercado se desenvolvia e o Serviço Nacional de Saúde se aprofundava, emergia o problema dos atrasos de pagamento dos hospitais. A tudo isto acudimos.
Lançámos inquéritos destinados a avaliar, quantificadamente, prazos de concessão de AIM e de comparticipações, bem como os prazos, montantes e hospitais
em incumprimento continuado. Deste último inquérito, e
após análises e negociações demoradas, foi constituída a
PRESIF, empresa prestadora de serviços aos associados
que entendessem confiar-lhe os créditos que detinham sobre os hospitais.
Promovemos encontros, debates e seminários, onde tivemos como oradores políticos e académicos, administradores hospitalares, directores-gerais, jornalistas, consultores
internacionais, dirigentes associativos europeus e internacionais, altos funcionários da Comissão Europeia, advogados ilustres e dirigentes de Organismos do Estado.
Promovemos, tanto quanto julgo saber, pela primeira vez,
um ciclo de conferências dedicado à Economia da Saúde,
tema que veio a revelar-se central nas preocupações dos
Governos e das Empresas.
Trabalhámos e ouvimos. Problemas foram esclarecidos,
legislação rectificada, crispações esbatidas, soluções encontradas. E, de todo este movimento, nasceram estudos,
livros e publicações, notícias, tomadas de posição, cartas,
muitas cartas a todos os que, directa ou indirectamente,
tinham capacidade para interferir no sector e na vida das
empresas, dando testemunho da urgência de mantermos
em Portugal uma indústria competitiva, geradora de riqueza e de emprego qualificado.
Sendo coerentes com os princípios que defendíamos e
os Planos de Acção que aprovávamos, fomos pioneiros na
contratualização do crescimento do Mercado – primeiro só
ambulatório e mais tarde hospitalar, celebrando três Protocolos com o Estado, os quais tiveram como enquadramento a co-responsabilidade e a estabilidade numa perspectiva
de estabelecer a confiança dos agentes económicos.
Estes Protocolos, inicialmente olhados com suspeição,
revelaram-se, também, instrumentos promotores de conhecimento e estabilizadores da sustentabilidade financeira do
SNS. Os mecanismos reguladores do mercado hospitalar e
a sua monitorização, bem como a discussão de um tema
até então interdito, uma nova metodologia da formação
dos preços, foram inovações que permitiram, dentro de
parâmetros amplamente discutidos com as empresas, o
envolvimento institucional e técnico da Apifarma em níveis
e temas dificilmente conseguidos sem esta estrutura.
Criámos um Centro de Estudos da Indústria Farmacêutica – CEIF, com o objectivo de dotar a Apifarma de um conjunto de informações e estudos temáticos que, em ligação
com centros congéneres e instituições académicas, permitissem uma defesa fundamentada dos pontos de vista
da Indústria Farmacêutica, bem como a possibilidade de
antecipar e responder a políticas potencialmente gravosas
para o sector e para a Saúde.
Atentos às necessidades de crescimento das empresas
e em parceria estratégica com empresas de capital nacional, o Infarmed e o ICEP, criámos a PharmaPortugal, que,
com êxito, promoveu a internacionalização das empresas,
introduzindo os seus medicamentos em mercados onde a
presença da Indústria Farmacêutica Portuguesa era praticamente inexistente.
Esta actividade interna era acompanhada de uma intensa representação internacional, traduzida pela presença
na Direcção da EFPIA - European Federation of Pharmaceutical Industry Associations, com sede em Bruxelas, e
ainda na Direcção da IFPMA – International Federation of
Pharmaceutical Manufacturers Associations, com sede
em Genebra.
No âmbito desta representação, tive oportunidade de participar em diversas acções que, na época, deram grande
visibilidade à Indústria Farmacêutica, graças ao trabalho
conjunto entre as associações nacionais e instituições europeias, nomeadamente a Federação Europeia, parceiros
da área da Saúde e a Comissão Europeia, que elaboraram
um conjunto de Recomendações relacionadas com Acesso ao Mercado, Regimes de Preços e Comparticipações,
Reconhecimento da Inovação, matérias que, entre outras,
condicionam a competitividade da Indústria Farmacêutica. O ponto de partida para este trabalho ficou a dever-se
ao reconhecimento de que a Indústria Farmacêutica, sendo embora uma das mais inovadoras no contexto europeu,
estava, por comparação com os Estados Unidos, a perder
competitividade. Uma das métricas foi a verificação do número de moléculas inovadoras que chegavam ao mercado
Europeu e ao mercado Americano.
Por outro lado, a Directiva da Transparência, que tinha
vindo a balizar as condicionantes temporais e técnicas
para a concessão de Preços e Comparticipações, procurando, em nome da construção do Mercado Interno, uma
certa harmonização de procedimentos dos Estados-Membros, revelou, após alguns anos de experiência, que a convergência nesta matéria não só não tinha sido conseguida
como, no limite, a cada Estado Membro correspondia um
sistema de Preços e Comparticipações.
Foi um tempo determinante, e talvez único até hoje, para
a Indústria Farmacêutica – tradicionalmente olhada como
geradora de despesa e não como investimento –, que começou a ser encarada como indústria chave para o desenvolvimento tecnológico.
43
E se na Federação Europeia, as questões de enquadramento económico do sector eram preponderantes, na Federação Internacional, privilegiavam-se as matérias da
Propriedade Industrial, o contacto com a Organização
Mundial de Saúde e os problemas de ajuda e apoio aos
Países menos desenvolvidos.
Muitas das acções humanitárias em que a Apifarma colaborou tiveram o apoio da IFPMA.
A SOCIEDADE E OS PARCEIROS
O comprometimento com a Economia, o Mercado e as Empresas não impediu uma atenção especial à Sociedade e aos
Parceiros. Neste contexto, reconhecida que foi a necessidade de estruturar a informação para os diferentes parceiros,
bem como de dar corpo a normas que a auto regulassem, foi
reformulado o Código Deontológico e complementada a sua
actividade com o regulamento do seu Conselho. Protocolos
com a Ordem dos Médicos e dos Farmacêuticos fecharam
um círculo de colaboração institucional que projectava a dignidade das instituições e dos seus colaboradores.
Reconhecendo a necessidade de dar a conhecer a Indústria Farmacêutica e o seu contributo para a Saúde e Qualidade de Vida, foram realizadas diversas campanhas públicas na televisão, rádio, imprensa escrita e outdoors, que
abrangeram áreas tão diversas como a automedicação e a
diabetes, e, pela primeira vez, desencadeou-se uma acção
pedagógica junto das escolas, no sentido de explicar a importância dos medicamentos.
Também nesta perspectiva, e no âmbito da Conferência
Internacional, realizou-se a exposição itinerante “Mãos que
Partilham Vida”, composta por vários módulos temáticos,
onde as novas linhas de investigação e desenvolvimento
molecular, a revolução genética e a dimensão da pessoa
humana eram explicadas com recurso às novas tecnologias de informação.
Aceitámos, também, o desafio para, em conjunto com
um grupo de empresas, patrocinarmos a reconstrução do
44
Laboratório Chimico da Faculdade de Ciências de Lisboa,
reconstrução esta realizada com materiais originais, o que
o torna único na Europa.
Preocupados com as questões ambientais, fundámos,
juntamente com a ANF-Associação Nacional das Farmácias, a FECOFAR Federação de Cooperativas de Distribuição
Farmacêutica e a GROQUIFAR Associação de Grossistas de
Produtos Químicos e Farmacêuticos, a empresa Valomed,
integralmente financiada pela Indústria Farmacêutica e
responsável pela gestão dos resíduos de embalagens e de
medicamentos.
Ainda, e não por último, uma referência a um projecto que
ultrapassou as fronteiras institucionais e que fez e faz parte
do mundo dos afectos e da responsabilidade social: trabalho com as Associações de Doentes. Este projecto revelou-se de uma grande riqueza humana. Tive a oportunidade de
conhecer novos mundos de edificação e generosidade e de
perceber melhor a capacidade de superação e de resiliência
a situações adversas que existem em cada um.
A Parceria com as Associações de Doentes tem como
pressuposto o direito de participação dos doentes nos
processos de decisão que tenham a ver com a sua doença
e, no espaço de pouco mais de um ano, dobrou o número
de associações participantes, demonstrando a valia e interesse da iniciativa.
O perfil histórico e clínico das Associações foi compilado e
projectaram-se o trabalho, as expectativas e os objectivos de
todos os que o quiseram fazer, através de múltiplas actividades na área da formação, em programas de televisão, em
encontros com outros parceiros e, também, com a tutela.
Foi das tarefas mais recompensadoras, cuja recordação
faz parte do grupo das boas memórias que guardo da minha actividade na Apifarma.
A APIFARMA, AS PESSOAS
Tenho como primeira memória de quando cheguei à Apifarma um andar de habitação adaptado a escritório, sombrio
e solene, com móveis pesados e tristonhos reposteiros de
veludo. Com um corpo técnico reduzido, mantinha-se a casa
administrativamente arrumada. No rigor dos factos, deve
dizer-se que pouco mais se esperava da estrutura interna,
recaindo sobre as Direcções as tarefas de representação e
de contactos institucionais.
Cedo, porém, foi percebido que uma reestruturação era
necessária como forma de dotar a Apifarma de um corpo
profissional que, em estreita colaboração com a Direccão,
assegurasse, de forma continuada, o que se pedia de uma
instituição representativa da Indústria Farmacêutica: competência técnica, rigor e credibilidade nas intervenções, visibilidade e independência.
A escolha de um Director executivo foi o primeiro passo,
a contratação de recursos técnicos e a adequação da organização interna o segundo, e a aquisição de novas instalações adequadas, o terceiro.
Estou convicto de que, sem esta sequência e sem as pessoas que a corporizaram, não teria sido possível projectar
a Indústria Farmacêutica e obter o reconhecimento do seu
valor e da sua capacidade de intervenção.
Ao longo dos anos e das Direções a que presidi, ou com as
quais colaborei, fui acompanhado por homens e mulheres
com diversos perfis e diferentes personalidades que, sem
prejuízo de divergências, tiveram sempre em comum o interesse pela vida associativa e o respeito pela instituição.
Alguns já partiram e recordo o António Ferreira de Almeida,
uma força da natureza; o Luís Seita, sempre a fervilhar de
ideias e iniciativas; o António Cavaco, tranquilo e prudente.
Outros mantêm uma presença activa na vida associativa,
como a família Chaves Costa, que, já na terceira geração,
continua a colaborar com a Apifarma.
Outros, ainda seguiram caminhos distintos, como vários
elementos da família Baptista de Almeida, que, em diferentes épocas, deixaram marca na Associação.
Todos eles colaboraram na busca do talento, na pesquisa
do local mais adequado para a sede, na definição da estrutura interna. Foi com a colaboração de todos, e de cada
um, que se alargou o quadro de pessoal e de consultores, que foi reformulado o funcionamento e a comunicação
interna, utilizando as novas tecnologias da informação, e
que foram encontradas e recuperadas instalações adequadas às necessidades e à imagem da Indústria.
Em todos eles confiei nos momentos de exaltação e na
inquietação das derrotas, mas foi com a Isabel Saraiva, o
esteio desta corrente feita de esforço e de dedicação, que
todos sempre contámos.
Trabalhadora infatigável, adversária temível, tecnicamente segura, coordenou a estrutura interna, representou a Associação em momentos difíceis em que muitos viraram a
cara, viu chegar e partir Presidentes, Directores, Ministros
e Secretários de Estado, servindo a Apifarma com lealdade
e eficácia durante mais de duas décadas.
Ao quadro de pessoal da Apifarma, em todos os seus
escalões, é devido um tributo de gratidão. Sem eles, as
tarefas teriam sido mais árduas, os objectivos mais difíceis
de conseguir, a visibilidade da Apifarma bem menor.
A componente humana é o mais importante; são as pessoas o que fica na minha memória e no balanço final da
minha actividade.
45
também, o enquadramento político, regulamentar e económico da Indústria Farmacêutica em Portugal.
FACTORES EXTERNOS
FALTA
FOTO
Luiz Chaves Costa
Presidente da Direcção da Apifarma (1986-1989)
Presidente da Mesa da Assembleia-Geral (1990-2006)
46
A pedido da Apifarma e conforme sugestão do meu amigo e
actual Presidente, João Almeida Lopes, é com todo o gosto
que incluo algumas notas referentes à minha passagem enquanto Presidente da Direcção da Apifarma (1986-1989).
Indico, seguidamente, um esboço resumido, com comentários posteriores que acho oportunos.
Na elaboração do esboço, tive o contributo inestimável
da minha amiga, Dra. Isabel Saraiva, que foi admitida
como Directora Executiva no meu primeiro mandato, sendo inovador ter-se escolhido uma senhora para este cargo.
A história dos anos seguintes, a capacidade de trabalho,
inteligência e lealdade à minha e posteriores direcções,
vieram a demonstrar o acerto e benefício para a instituição da decisão então tomada.
Assim, podemos resumir com o seguinte:
A Presidência foi marcada por um conjunto de factores
de carácter externo e interno, cujas consequências enformaram as estruturas e o posicionamento da Apifarma e,
Em 1985, um ano antes do início da Presidência, tinha
sido assinado o Tratado de Adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia, que previa uma derrogação de
cinco anos para a transposição de trinta anos de Directivas
referentes ao Medicamento e à Indústria Farmacêutica.
Também em 1985, tinha terminado o Segundo Programa de Ajustamento do FMI.
O PIB per capita era, em 1986, de 2777,7 Euros (em
2012, a previsão apontou para 15 702) e crescia ao ritmo
de 3,23 % ao ano (em 2012, -2,84%).
Em 1986, a Despesa total do SNS per capita era de 83,3
Euros (em 2012, 894).
Foi o início de um processo de crescimento económico
de alteração de comportamentos e de modernização das
estruturas, tanto dos serviços do Estado como da sociedade em geral.
O Ministério da Saúde iniciou um conjunto de alterações, das quais se salientam a criação da Direccção-Geral
dos Assuntos Farmacêuticos, com competências próprias
na área do Medicamento e da Indústria Farmacêutica. Existiam, então, 3597 marcas registadas (em 2012, 8738).
A preocupação com o crescimento das despesas com
Medicamentos ganhou preponderância e condicionou o relacionamento da Indústria Farmacêutica, reunida na Apifarma, com o Ministério da Saúde.
FACTORES INTERNOS
A Apifarma em 1986, tinha completado um delicado processo de unificação com a estrutura associativa que representava os importadores de medicamentos, conseguindo
ser uma voz única na defesa dos interesses das empresas
nacionais e internacionais. Posteriormente, as associações
dos sectores da “venda livre” e dos meios de diagnóstico
também se juntaram à Apifarma.
Procedeu-se à reestruturação interna, profissionalizando
os serviços e diversificando o apoio aos associados, ganhando capacidade técnica e política, bem como visibilidade nos
Órgãos de Comunicação Social.
Iniciou-se um amplo debate público sobre as questões
da Indústria Farmacêutica, nomeadamente as relacionadas com a Adesão de Portugal à CEE.
Realizou-se a primeira Campanha de Sensibilização, explicando a função social da Indústria Farmacêutica.
Adaptou-se o Primeiro Código Deontológico da Indústria Farmacêutica.
Pela primeira vez, a Apifarma integrou a Direcção da
EFPIA e da IFPMA, dando inicio a um processo de reciprocidade e de entreajuda que muito beneficiou o espaço de
intervenção da Apifarma, tanto internamente como a nível
internacional.
Traçadas as linhas gerais, não quero deixar de referir a
dificuldade que eu, pessoalmente, tive no relacionamento
com os Ministros Arlindo Carvalho e Leonor Beleza. Porventura, o mandato de Leonor Beleza foi o mais difícil para
nós, pois é bastante inteligente e determinada na actividade que desenvolve.
Era, na época, Bastonário da Ordem dos Médicos o Professor Manuel Eugénio Machado Macedo, um grande senhor e um grande profissional, presidente da Associação
Europeia de Cirurgia Toráxica, se a memória não me falha
e coube-lhe defender a classe de algumas generalizações
que resultaram da disciplina que o Ministério pretendia,
e bem, impor no exercício dos actos médicos e que era
consensual ser necessária.
Nesse meu mandato, foi também criado o Conselho
Deontológico, a que presidi, e incluía como elementos os
três Bastonários: Médicos, Advogados e Farmacêuticos.
A curto prazo, verificou-se não ser exequível que o empresário da Indústria Farmacêutica, ainda que Presidente,
pudesse integrar esse órgão, que poderia decidir, porven-
tura, sobre actividades de colegas seus. Se bem recordo,
o cargo passou a ser ocupado por um juiz, independente
da Apifarma.
Para terminar este curto depoimento, quero referir que a
Apifarma integrou, pela primeira vez, a direcção da EFPIA,
através da minha representação, tendo ocupado o lugar
vago deixado por Espanha, e, mais tarde foi meu sucessor
o representante da associação da indústria grega.
Integrámos, também, a representação europeia que,
em Washington, votou no Dr. Alberto Aleotti, da Menarini,
para a associação internacional, sendo ele na época o Presidente da associação da Indústria Farmacêutica italiana.
Com a minha saída, foi eleito Presidente da Apifarma o
Dr. José António Baptista de Almeida, a que se seguiu o
Dr. João Gomes Esteves, cujo contributo foi determinante
para a valorização da indústria e para consolidar a ideia
da importância económica para Portugal desta actividade,
quer a nível da Saúde quer a nível da investigação e produção industrial para exportação.
Hoje, podemos dizer que, com o trabalho de muitos, se
valorizou um segmento importante da actividade económica em Portugal e um contributo muito valioso para a
melhoria da assistência médica à nossa população.
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II.3 TESTEMUNHOS APIFARMA
48
Eduardo Pinto Leite
Vice-Presidente da Direcção
Convidado a prestar um testemunho no âmbito da comemoração dos 75 anos da Apifarma, como Vice-Presidente
da Direcção, pareceu-me missão impossível, considerados
os escassos anos de actividade profissional desenvolvida em
Portugal de prática associativa.
Assim sendo, não posso exprimir-me sobre um passado
não vivido. Posso, sim, falar na experiência presente duma
associação que reflecte todo um percurso histórico que se
revela herança de grande valia no suporte à afirmação e
defesa da Indústria Farmacêutica enquanto sector estratégico nacional.
A Apifarma é, hoje, um interlocutor incontornável junto
dos organismos tutelares, o centro agregador das diferentes
áreas representadas, onde se equacionam as melhores, ou
possíveis, soluções para os muitos obstáculos recentes ao
expectável desenvolvimento das empresas, desencadeados
pela grave conjuntura económica dos últimos anos, por sua
vez geradora de medidas políticas de grande incidência no
sector da Saúde e na Indústria Farmacêutica em particular.
A este propósito, não posso deixar de aqui evocar intermináveis horas de reflexão conjunta em busca de modelos de
cooperação que, sem comprometer a viabilidade das empresas associadas, permitissem contribuir para a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde; intermináveis horas de
reflexão conjunta para desenhar soluções de superação do
impacto das reduções de preços e da descapitalização das
empresas por avultadas e prolongadas dívidas do Estado pelos fornecimentos ao SNS; intermináveis horas de reflexão
conjunta para reequacionar a revitalização da debilitada cadeia de valor do medicamento.
Comemorar o 75.º aniversário da Apifarma é, na minha
perspectiva, o momento propício para olhar para o futuro da
Indústria Farmacêutica em Portugal e exortar à capacidade
de reagir aos novos paradigmas, reafirmar e desenvolver o
espaço de intervenção da associação, repensar abordagens
que ajudem as empresas a fortalecer a missão de compromisso com as populações, contribuindo para melhores
cuidados de Saúde no nosso país, congregar esforços para
que não se ergam barreiras ao acesso dos doentes portugueses à Inovação farmacêutica, pugnar por um ambiente
regulamentar de estabilidade e sustentabilidade financeira
das empresas que estimule o investimento em Portugal. Sob
pena de perda da sua identidade, a Apifarma não poderá
nunca abdicar do princípio fundador, e patriótico desígnio,
de reivindicar para os doentes portugueses o direito de acederem aos melhores padrões de Saúde e a novas terapias
disponíveis nos restantes países da Europa desenvolvida.
49
Leonardo Santarelli
Vice-Presidente da Direcção
Constitui para mim uma honra fazer parte desta homenagem aos 75 anos de actividade da Associação Portuguesa
da Indústria Farmacêutica – Apifarma, que, desde a sua
fundação, em 1939, tem contribuído para o prestígio da Indústria Farmacêutica em Portugal. Se não fosse a entrega,
muitas vezes sacrificada, à causa do associativismo, desde
os primeiros tempos do Grémio e, depois, da Associação,
dificilmente teríamos alcançado a notoriedade que hoje
temos. É em memória desse trabalho, esforçado, tenaz,
determinado, que ganhámos impulso para continuar.
Enquanto profissionais que operam, há décadas, numa
área com as especificidades da Indústria Farmacêutica,
estamos conscientes de que, unindo esforços e pontos de
vista, temos um contributo único a prestar a todos os cidadãos. É por isso que as empresas do sector são membros
desta Associação. Sentimo-lo como um dever decorrente
da nossa própria cidadania e do sentido do nosso importante papel social.
50
Acreditamos que todos os portugueses devem ter acesso
a medicamentos inovadores, de qualidade e de reconhecido valor acrescentado para as pessoas. É nesse sentido
que temos caminhado a par e passo para que, em conjunto, as empresas farmacêuticas e os seus dirigentes, nacionais e internacionais, das mais diversas nacionalidades,
actuem, de forma construtiva e sinérgica, com o objectivo
de transformar este objectivo em realidade. Para as empresas associadas, produzir e disponibilizar medicamentos de
uso humano e animal, vacinas, e meios de diagnóstico in
vitro cada vez mais eficazes e seguros, para o tratamento
e prevenção de um maior número possível de patologias,
é a mais importante acção que podemos realizar junto da
comunidade. Ajudar a que os nossos concidadãos vivam
mais tempo e com mais qualidade.
Por outro lado, num mundo em constante mutação, com
desafios que se impõem por si mesmos, sabemos que é
cada vez mais necessário um pensamento interactivo e
interdisciplinar. A convergência dos diferentes saberes e
perspectivas, adquiridos nos mais diversos ambientes, nacionais e de outros países, é, também, cada vez mais, uma
realidade que não podemos desprezar. É todo este capital
de conhecimento e de experiência que a heterogeneidade
da Apifarma nos transmite e que deve ser colocado ao serviço de todos os portugueses.
Ocorre-me parafrasear António Gedeão, poeta e homem
de ciência: “[…] sempre que o Homem sonha, o Mundo
pula e avança […]”
Eduardo Leyva
Vice-Presidente da Direcção
DESAFIOS ACTUAIS E FUTUROS
Parabéns!
Orgulho é a primeira palavra que me surge na comemoração do 75.º aniversário da Apifarma. Orgulho por fazer parte
dos elementos da Direcção da Associação que representa
uma das mais prestigiadas indústrias em Portugal e uma
das que mais contribuiu para o desenvolvimento do sector
técnico ou especializado.
A Indústria Farmacêutica tem fomentado o desenvolvimento da sociedade em todo o mundo e Portugal não é excepção. A Saúde das pessoas é uma marca indiscutível de
evolução social e a Indústria Farmacêutica é, sem sombra
de dúvidas, uma das raízes e, certamente, uma bandeira
dessa evolução.
Ao longo dos anos, a Indústria Farmacêutica contribuiu
para o progresso no ensino avançado, salientando a necessidade de criação de novas especializações nas áreas das
ciências e das engenharias. Para muitos, a Indústria Far-
macêutica é, apenas, uma componente do fabrico químico,
limitada à elaboração de novos compostos e novas terapêuticas. Mas não é só isto: a Indústria Farmacêutica contribuiu para o desenvolvimento de um leque muito alargado
de intervenções na população, com um impacto notável na
sociedade.
Os novos medicamentos são apenas uma amostra da capacidade de investigação, inovação e produção da Indústria
Farmacêutica. Nos laboratórios das empresas, são produzidos, diariamente, avanços científicos que constituem, na
sua génese, o passo para uma nova realidade no campo da
Saúde, na investigação e, por seu todo, na Humanidade.
Apreciar o desenvolvimento da Indústria Farmacêutica
portuguesa ao longo dos 75 anos da sua existência, enquanto associação industrial em Portugal, é em si uma
vitória e um orgulho da história conseguida. Portugal alcançou um nível de excelência na investigação e desenvolvimento, que nos coloca sob observação de universidades
e centros de investigação em todo o mundo.
Hoje, ao escrever as linhas deste texto de celebração, apercebo-me da experiência conseguida e, simultaneamente, da
jovialidade na vontade de aprendizagem. A evolução desta
indústria e as descobertas permanentes fazem-me acreditar que há, ainda, um longo caminho para percorrer neste
conhecimento. A experiência dá-nos o sentido crítico para
observar a realidade nacional e entender que a contribuição
da indústria só fará sentido se trabalhar com o objectivo da
sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde e no interesse no investimento em novas soluções. A jovialidade está
no espírito de descoberta e assombro que deve guiar uma
indústria que busca fazer a diferença e está, também, na
procura constante de novos caminhos e de novas soluções.
Deve, igualmente, estar na irreverência com que devemos
encarar a realidade e os obstáculos que nos são colocados.
A indústria celebra 75 anos da sua associação, e esta
idade deve significar experiência, maturidade e segurança, sem perder de vista a capacidade de se admirar para
inovar, evoluir e desafiar.
51
Antónia Nascimento
Vice-Presidente da Comissão Especializada de Meios
de Diagnóstico In Vitro
52
É muito gratificante prestar um testemunho comemorativo
de 75 anos de história da Apifarma na dupla condição de
membro da Direcção e de Vice-Presidente da Comissão
Especializada de Meios de Diagnóstico in vitro. Olhar pelo
lado de dentro, com o saber de experiência feita, reforça a
minha compreensão sobre a extensão e profundidade da
missão envolvida.
Neste percurso associativo, a Apifarma tem constituído
o suporte agregador necessário para as empresas melhor conseguirem perspectivar os caminhos de defesa do
sector, ultimamente atingido pelos efeitos devastadores
de uma das mais graves crises económicas da história
do País, com todas as perplexidades e interrogações de
quem, diariamente, tem de tomar as melhores decisões
empresariais, contribuindo para a segurança e bem-estar
dos doentes e promovendo ganhos em Saúde.
Para a Comissão Especializada de Meios de Diagnóstico
in vitro, o foco de trabalho dos últimos anos concentrou-se
muito em torno do gravíssimo problema dos atrasos nos
pagamentos do Estado às empresas, pelos fornecimentos
ao Serviço Nacional de Saúde; atingiram-se prazos e valores desmedidos e a globalidade das empresas teve de recorrer a reestruturações para sobreviver, com deslocação
geográfica dos centros de decisão e inerente sacrifício de
recursos humanos.
Sob esta conjuntura, foi com o suporte da Apifarma que
se promoveu a realização de diversos estudos, em 2013 e
2014, que ajudaram a suprir lacunas informativas, constituindo ferramentas de suporte à gestão empresarial e
ao próprio conhecimento sobre a visão dos diversos intervenientes no sector da Saúde, incluindo a dos doentes,
primeiros destinatários da nossa actividade. Pela sua valia, destaco “A Percepção de Valor das Análises Clínicas”,
“Caracterização do Sector dos Diagnósticos in vitro em
Portugal”, “Valor do Sector dos Diagnósticos in vitro em
Portugal”, “Estudo Simetria – Caracterização do Mercado
de Tiras-Teste de Glicémia”.
Os Diagnósticos in vitro são uma das tecnologias de Saúde mais sujeitas a um permanente desafio de inovação
para responder às exigências dos avanços da Medicina,
das novas patologias civilizacionais e acompanhar o ritmo
da contínua evolução tecnológica, acelerando os tempos
de resposta e qualidade de resultados. Cerca de 70% das
decisões clínicas são sustentadas pelos resultados dos
testes laboratoriais, permitindo direccionar com precisão
a opção terapêutica ou monitorizando a eficácia do tratamento, em suma, encurtando caminho, gerando benefícios clínicos e económicos, obviando a melhores decisões
nos cuidados de Saúde.
Acreditamos que o grande desafio para os decisores políticos e gestores de Saúde radica na resolução do paradigma: Custos de Saúde, Despesa ou Investimento?
Porventura, a mais difícil das missões, para a qual continuamos a contar com a Apifarma.
António Chaves Costa
Vice-Presidente da Comissão Especializada de Produtores e Exportadores
No ano em que celebra os seus 75 anos de instituição, a
Apifarma depara-se com desafios decisivos para a sua identidade, missão e relevância no sector da Saúde. Está nas
mãos dos associados, através do seu empenho e participação construtivos, contribuir para que estes desafios sejam conduzidos no sentido de termos uma Apifarma ainda
mais forte, à altura das exigências actuais e futuras do
Sistema de Saúde e da economia do País.
Esta minha convicção assenta no privilégio de ter participado em todas as Direcções presididas pelo Dr. João
Pedro Almeida Lopes, desde 2007, o que me permite ter
uma perspectiva histórica e evolutiva da Associação nos
últimos anos, sobre a qual melhor possa apontar caminhos para o futuro.
Ao longo deste período, pautado pelos constrangimentos
crescentes impostos ao sector do medicamento, já sobejamente conhecidos e analisados, a Apifarma promoveu
uma maior participação dos seus associados, espelhada
no alargamento dos órgãos sociais e no reforço de várias
Comissões e Grupos de Trabalho, conseguindo, assim, fazer face aos importantes desafios que se lhe depararam.
Este caminho trouxe, naturalmente, alguma complexidade acrescida na governação, coordenação das Comissões
e Grupos de Trabalho e comunicação da Associação. São
estes aspectos que deverão, do ponto de vista interno, requerer maior atenção e trabalho. Não devemos, por outro
lado, diminuir, de uma forma relevante, a representatividade e participação dos associados que o modelo actual encerra, e que se revelaram tão importantes para, por
exemplo, concluirmos, no presente ano, o Acordo de Sustentabilidade entre a Apifarma e o Governo.
O nosso maior esforço deverá, no entanto, ser materializado no plano externo. A Apifarma tem de se apresentar
como uma associação forte e una na defesa dos interesses
da Indústria Farmacêutica na sua globalidade. O doente é
também ele único e, a cada momento, anseia, legitimamente por um acesso adequado às melhores propostas
terapêuticas que a indústria investiga, produz e disponibiliza, independentemente da forma como lhe chegam.
Neste espírito, a Apifarma deve prosseguir a sua missão e
a implementação do seu plano estratégico com um reforço
acrescido nas áreas da comunicação do valor do medicamento, da cooperação institucional, com enfoque no contributo para a sustentabilidade do Sistema de Saúde e, por último, liderando proactivamente os temas de agenda comum
com as outras associações da fileira do medicamento.
53
Cristina Laíns
Vice-Presidente da Comissão Especializada de Vacinas
54
Passaram mais de dois séculos desde que foi desenvolvida a primeira vacina que permitiu erradicar a varíola. Um
feito único na História da Medicina. Desde então, a ciência
evoluiu muito e as actuais vacinas encontram-se entre as
medidas de Saúde Pública mais custo-efectivas e de maior
sucesso para a prevenção de doenças e a diminuição da
mortalidade do século XXI.
A Comissão Especializada de Vacinas (CEV), da Apifarma,
tem, desde a sua criação em 2005, focado a sua missão
na defesa do valor da vacinação como a mais importante
estratégia de Saúde Pública. Trabalhamos há vários anos
desenvolvendo parcerias e acções, de carácter educativo e
institucional, que promovem ‘o valor da vacinação’ e onde
está integrada a visão de todos os intervenientes: autoridades, academia, sociedades médicas e associações ou
ordens profissionais, sociedade civil, comunicação social,
organizações não-governamentais, entre outros.
Outro aspecto que acrescenta valor a esta complexa ma-
triz diz respeito à perícia técnica e científica altamente qualificada que a indústria das vacinas, a par com universidades
e instituições públicas e privadas, tem promovido em Portugal. A indústria contribui para que Portugal tenha acesso a
soluções inovadoras que respondem a necessidades médicas não satisfeitas e a contextos epidemiológicos locais.
Existe cada vez mais evidência que demonstra que a vacinação conduz a benefícios durante toda a vida do indivíduo, com substanciais ganhos em Saúde e ganhos económicos transversais a toda a sociedade. E é inegável que
estes benefícios têm contribuído para a melhoria significativa de muitos dos indicadores de Saúde em Portugal.
A prevenção é uma das melhores formas de ajudar a população a ser mais saudável e a viver mais anos com qualidade, aumentando a produtividade e gerando riqueza para
o País. Ao valorizar políticas de prevenção versus políticas
de tratamento, estamos a centrar os nossos esforços na
Saúde e não na doença e estamos a utilizar os recursos
financeiros de forma mais eficiente.
Na Apifarma, pretendemos fortalecer a concretização
destes objectivos com ética, rigor, profissionalismo e seriedade, lado a lado com os parceiros do sector, para que,
em conjunto, possamos ultrapassar os actuais desafios
sociais, económicos e demográficos e contribuir para uma
vida mais saudável, uma sociedade mais justa e uma economia mais forte.
Mafalda Araújo
Vice-Presidente da Comissão Especializada Apifarma/OTC
Em 75 anos de História, a Apifarma converteu-se num parceiro incontornável no sector da Saúde em Portugal, moderando o diálogo da Indústria Farmacêutica com uma multiplicidade de interlocutores que inclui diferentes instituições
de Saúde, públicas e privadas, associações de profissionais
de Saúde e numerosas associações de doentes, interagindo
também com vários organismos nacionais e internacionais,
junto dos quais representa os interesses nacionais.
A evolução acelerada do sector do medicamento, motivada por sucessivos impactos legislativos e pelas exigências dos próprios cidadãos, colocou um desafio adicional
à Apifarma: o de ampliar a sua actuação, representando e
conciliando interesses de sectores tão diversos como medicamentos sujeitos a receita médica, medicamentos não
sujeitos a receita médica (OTC), diagnóstico in vitro, vacinas
e veterinária.
A área dos medicamentos não sujeitos a receita médica
(MNSRM) tem vindo a evoluir muito rapidamente, enfren-
tando desafios de grande complexidade e tendo a particularidade de ser impactada não só por medidas específicas
do sector como pelas dos medicamentos de uso humano
em geral.
Liberalização de preços e margens de comercialização,
abertura de novos canais de distribuição, norma sobre nomes de medicamentos e, mais recentemente, a terceira lista
de medicamentos não sujeitos a receita médica de dispensa
exclusiva em farmácias, são apenas exemplos de desafios
significativos, nos quais a credibilidade e a cooperação da
Apifarma/OTC com as autoridades foram determinantes.
A representação da Indústria Farmacêutica portuguesa
junto das organizações internacionais é, igualmente, uma
constante, sendo os resultados mais visíveis a isenção dos
MNSRM na Directiva Europeia sobre Falsified Medicines e
o êxito da 49.ª Conferência Anual da AESGP – Associação
Europeia de Medicamentos de Venda Livre, realizada em
Lisboa, em Junho de 2013, com uma forte presença de autoridades e organizações nacionais e internacionais.
Hoje, a Apifarma/OTC mantém-se dinâmica e inovadora, lançando projectos como o “Tratar de Mim”, destinado a informar o cidadão, a apoiá-lo nas suas escolhas em
self-medication e a promover uma atitude proactiva e responsável para a manutenção da sua Saúde.
Olhando sempre para o futuro, a Apifarma/OTC continua
motivada para antecipar e propor acções que simplifiquem
e salvaguardem os interesses dos seus associados, com o
objectivo último de proporcionar os melhores cuidados de
Saúde ao cidadão português.
55
Manuel Dargent Figueiredo
Vice-Presidente da Comissão Especializada da ApifarmaVET
56
A comemoração de 75 anos de vida da Apifarma é, por si
só, uma evidência da importância do associativismo empresarial e um testemunho de que, bem cedo, a Indústria
Farmacêutica em Portugal se organizou através de uma
estrutura representativa para defesa do seu desenvolvimento. Desde cedo, também, há já cerca de 40 anos, e
por idênticas razões, que o sector da Indústria Farmacêutica de Saúde Animal aceitou e se organizou como parte
integrante da Apifarma.
Em sintética retrospectiva histórica, recordo que o sector da Veterinária se integrou funcionalmente na Apifarma
nos anos 80 do século passado, constituindo-se estatutariamente em Comissão Especializada de Saúde Animal,
em 1990, sob o acrónimo CESA, passando a designar-se
ApifarmaVET desde 2013, designação que melhor se entendeu dar maior foco e visibilidade quer ao sector que
representa, quer ainda ao âmbito global da Apifarma. Foi
sob este chapéu agregador que as empresas associadas
foram desenvolvendo a sua actividade e através deste que
a Comissão se tornou membro efectivo da então FEDESA
– Federação Europeia da Saúde Animal, actual IFAH Europe, estreitando laços de trabalho com os organismos de
cúpula internacionais.
Não cabe fazer aqui um balanço exaustivo do trabalho
realizado, mas cumpre evidenciar, como denominador comum do passado e do presente, que a nossa actividade
está primordialmente centrada na defesa da Saúde Pública, através de uma atenção particular à Saúde e bem-estar
animal, e Segurança Alimentar, reflectidas em permanente
articulação com as autoridades tutelares, universidades,
Ordem dos Médicos Veterinários, associações sectoriais,
entre muitas outras. Foram, e são, temas centrais o permanente acompanhamento dos assuntos regulamentares,
a promoção da Farmacovigilância, a defesa do Código Deontológico de Boas Práticas de Comercialização, a divulgação das recomendações sobre Boas Práticas no Uso de
Antimicrobianos em animais destinados ao consumo humano (EPRUMA) e a participação activa no âmbito do Plano de Acção Nacional para a Redução do Uso de Antibióticos
nos Animais (PANRUAA). Uma menção muito especial para
o Simposium Veterinário Apifarma de Medicamentos e Produtos de Saúde Animal, que se constituiu como instrumento
de referência e utilização, não só da própria indústria mas
também das Faculdades de Medicina Veterinária nacionais
e dos profissionais de Saúde do sector.
Uma palavra de especial apreço a todas as associadas
e diferentes Direcções pela forma empenhada que têm
demonstrado na afirmação da importância da presença
e contributo da ApifarmaVET nas organizações Europeias
de Saúde Animal.
Parabéns à Apifarma, com votos de que prossiga a sua
importante missão, contribuindo positivamente para os
grandes desafios que se perfilam no horizonte futuro da
Indústria Farmacêutica ao serviço da Saúde Animal.
Teresa Alves
Vice-Presidente da Comissão Especializada de Biotecnologia
A biotecnologia tem sido fundamental na exploração e manipulação das estruturas e processos da vida a um nível molecular, tendo marcado o ritmo de inovação da Medicina
moderna.
Nos últimos vinte anos, a biotecnologia permitiu avanços muito relevantes, e muitos milhões de doentes, em
todo o mundo, beneficiam de centenas de medicamentos
ou terapias de base biotecnológica. Além disso, as inovações introduzidas pela biotecnologia ajudam a revelar
e descobrir mecanismos de doença, alvos terapêuticos,
e a desenvolver novas moléculas terapêuticas ou terapias
inovadoras. Adicionalmente, têm um impacto positivo em
ensaios clínicos, métodos de diagnóstico, medicina personalizada, monitorização das terapias, providenciando
marcadores, modelos, plataformas, etc.
Graças aos desenvolvimentos conseguidos pela biotecnologia, a Indústria Farmacêutica fornece tratamentos
para doenças para as quais havia poucas ou nenhuma
opção terapêutica, aumentando as taxas de sobrevivência
para alguns tipos de cancro, VIH/SIDA, artrite reumatóide
e Hepatite C, entre tantas outras patologias. Resumindo,
estas tecnologias e os novos biofármacos têm melhorado
a qualidade de vida e a longevidade de doentes em todo
mundo, sendo que os avanços em Medicina Personalizada
prometem uma cada vez maior segurança e eficácia dos
medicamentos e terapias.
Não menos importante é o facto de estes avanços resultarem de uma dinâmica e de um investimento em investigação e desenvolvimentos colossais e da capacidade
produtiva da própria Indústria Farmacêutica, a qual, também por estes motivos, é um dos principais pilares para a
competitividade das economias.
A Indústria Farmacêutica, que tem como principal motor
a inovação, está consciente de que a investigação e desenvolvimento de hoje conduzirão aos medicamentos inovadores de amanhã. No futuro, à medida que as empresas
farmacêuticas continuam o seu ciclo de inovação e envolvem cada vez mais neste processo centros académicos e
outros centros de investigação, a biotecnologia continuará
a transformar e a melhorar a qualidade de vida de milhões
de pessoas em todo o mundo.
A Apifarma, como associação da Indústria Farmacêutica,
continuará a suportar todas as empresas suas associadas
no sentido de garantir o respeito de todos os aspectos
relevantes do sector, nomeadamente o apoio e desenvolvimento de actividades relacionadas com a investigação e
inovação em Saúde.
57
3.
Excerto de cartaz publicitário do «Fosfo-Iodo Metilarsinado»
Farmácia Souza (1916-1919)
58
A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL:
PERSPECTIVA HISTÓRICA
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60
DA COMPANHIA PORTUGUESA HIGIENE AO PRIMEIRO MEDICAMENTO ORIGINAL
DE PATENTE MUNDIAL: 120 ANOS DE INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL
João Moreira dos Santos* (Remissão para o final)
Empacotamento de produtos na Companhia Portuguesa Higiene (1932).
A Indústria Farmacêutica despontou em Portugal no último
quartel do século XIX, não obstante a existência prévia das
oficinas de farmácia e do papel pioneiro desempenhado,
entre outros, pelos farmacêuticos Manuel Vicente de Jesus
(1825-1889), celebrizado pelas suas pílulas de proto-iodeto
de ferro, e Pedro Augusto Franco, da Farmácia Franco, famoso pelo popular vinho nutritivo de carne.
As origens da fase industrial encontram-se intimamente ligadas à criação da Companhia Portuguesa Higiene (CPH), que
representou o primeiro investimento de monta na Indústria
Farmacêutica em Portugal, tendo contado com capital angariado fora deste sector e com a colaboração de um conjunto
de médicos, farmacêuticos e comerciantes de drogas. Fundada em Abril de 1891, a partir da antiga casa Estácio & C.ª,
61
o seu principal mentor foi Emílio Faria Estácio (1854-1919),
farmacêutico empreendedor cujas maiores marcas eram a
Farmácia Estácio, estabelecida no Rossio em 1883, e também a Fábrica a Vapor de Produtos Químicos e Farmacêuticos, iniciada em 1888. A CPH emergiu, porém, num período
muito particular e adverso da histórica política e económica de Portugal. Com efeito, o seu parto deu-se no rescaldo
do ultimato inglês de 1890 e em plena crise financeira de
1891, beneficiando, todavia, da promulgação, em 1892, de
uma pauta aduaneira proteccionista, emanada do Ministério
da Fazenda, então dirigido por Oliveira Martins (1845-1894).
Consequentemente, em Fevereiro de 1893, e não obstante o
atraso face às congéneres europeias e americanas, estabelecidas industrialmente entre o primeiro e terceiro quartéis do
século XIX, já a CPH anunciava no seu boletim:
Os grânulos da Companhia Portuguesa Higiene, fabricados
por meio de máquinas perfeitíssimas, contêm os princípios
activos da maior pureza dosados com o mais absoluto rigor,
e nada cedem aos similares dos diferentes fabricantes estrangeiros, seja na perfeição da sua preparação, seja na eficácia
da sua acção, como provam numerosos atestados de distintos médicos. São mais baratos que os estrangeiros. À venda
em todas as farmácias.
62
O pioneirismo e o esforço de qualidade assumidos pela
Companhia Portuguesa Higiene levantam, todavia, reacções
desfavoráveis por parte de diversos farmacêuticos, nomeadamente entre os reunidos na Sociedade Farmacêutica Lusitana. Em causa estava, entre outras questões, a contenda que,
no quadro da reforma do exercício farmacêutico, se vivia,
então, entre farmacêuticos e droguistas, por um lado, e médicos, por outro, sendo certo que a CPH se colocou no olho
do furacão ao agregar ambos os grupos na composição dos
subscritores do seu capital social. A referida oposição não tra-
vou, todavia, as sucessivas inovações que a Companhia veio
a implementar em Portugal, muito especificamente a produção de medicamentos dosimétricos, comprimidos – de que
foram primeiros representantes as “pastilhas comprimidas”
de cloreto de potássio e de bicarbonato de sódio –, de cápsulas de essência de sândalo e de sais efervescentes, de extractos fluidos e de mediscos medicinais. Sobre as pastilhas
comprimidas, explicitava a CPH no seu boletim de Março de
1894: “Têm-se nos últimos tempos generalizado as pastilhas
comprimidas, preparadas pela Companhia Portuguesa Higiene na sua fábrica do Campo Pequeno, com o maior esmero e
escrúpulo na pureza dos produtos”.
Estes fármacos eram, em 1895, vendidos através de mais
de 40 depositários, sendo muitos deles, claramente, de inspiração estrangeira, como se depreende de um artigo publicado na edição de Agosto de 1894 do Boletim da Companhia Portuguesa Higiene, o qual é, também, um testemunho do início
da Indústria Farmacêutica em Portugal e, em certa medida,
uma resposta aos seus críticos:
O que é a indústria farmacêutica, senão a laboração em grande, servida ou não de aparelhos industriais, dos produtos que
a farmácia emprega?
E quais são esses produtos?
Noutros tempos eram apenas extractos, espíritos, emplastros, etc., hoje a indústria estrangeira introduziu novas formas de medicamentos, como os grânulos, sais efervescentes,
pastilhas comprimidas, vesicatório já preparado, etc., etc.
Pois a indústria farmacêutica portuguesa não pode ser outra
coisa, senão a laboração destes produtos, e todos eles realmente produz.
A indústria nacional pode sim aperfeiçoar, melhorar o que se
tem feito; inventar é difícil, é impossível mesmo atendendo à
idade dessa indústria em Portugal, que pode dizer-se saída
das faixas da infância.
Exigir, pois, dela que construa de todas as peças um formulário completamente novo é querer o impossível […].
Primeiro número do Boletim da Companhia Portuguesa Higiene (1893).
63
Laboratório da Companhia Portuguesa Higiene (1932).
64
Apesar do pioneirismo da Companhia Portuguesa Higiene, tal não assegurou o seu sucesso comercial e, tão pouco, a sua constituição como marco no desenvolvimento
técnico-científico da Indústria Farmacêutica portuguesa.
Concorreu para tal o alheamento de Emílio Estácio em relação às aplicações farmacêuticas da Biologia – nomeadamente no desenvolvimento de vacinas e de antitoxinas –,
ciência que em rigor desconhecia em função da sua especialização académica nas áreas da farmácia e da química.
A colmatar tal lacuna, surgiram o Parque Vacinogénico de
Lisboa, fundado em 1888 pelos médicos Carlos Barral Moniz Tavares (1844-?) e Guilherme José Enes (1839-1920),
o Instituto Pasteur de Lisboa, fundado em 1895 por Virgínio Leitão Vieira dos Santos (1873-1946) – que no início
da sua actividade se limitava, porém, à importação, sendo
depositário de todos os soros e vacinas do Instituto Pasteur e do Instituto de Vacina Animal de Paris –, e os laboratórios da farmácia dos irmãos Francisco (?-1885) e Albino
Freire de Andrade (1856-1955). Deve-se a estes últimos o
início da preparação em Portugal de medicamentos injectáveis em ampolas de vidro, cuja produção remonta à última década do século XIX, tendo contado com o decisivo
apoio e o incentivo de Câmara Pestana, então director do
Instituto Bacteriológico.
Instalaram-se, assim, gradualmente, as bases para a produção em série de medicamentos, num regime semi-industrial,
processo que, ao longo dos anos, tornou obsoleta e fez cair
em desuso a tradição oficinal de preparar os fármacos em
doses unitárias e de forma personalizada em função de cada
doente. Enquanto alguns dos novos laboratórios se dedicaram, sobretudo, à produção de preparados galénicos, como
foi o caso do Laboratório Farmacêutico J. Neves & Cª, fundado em Lisboa, em 1892, pelo farmacêutico José Vicente das
Neves, outros enveredaram pelas especialidades farmacêuticas. Foi o caso, entre outros, da firma João José da Costa &
C.ª, da farmácia e drogaria Pires & Barata, dos laboratórios
da Farmácia Formosinho e da sociedade Pires & Mourato.
Esta última foi criada em 1904 pelos farmacêuticos Manuel
Adriano Mourato Vermelho e Serafim Pires Coelho David,
que adquiriram a Farmácia Costa, instalada na actual Rua
da Prata, tendo mudado o seu nome para Farmácia Normal.
Um dos seus produtos bandeira nos anos seguintes foi o
célebre Dynamol.
ANOS 1900: DA FARMÁCIA OFICINAL À FARMÁCIA
INDUSTRIAL
Nos últimos anos do regime monárquico, já em pleno século
XX, assistiu-se à constituição em Portugal de diversos laboratórios que tiveram como embrião, tal como sucedera com
diversos colossos da Indústria Farmacêutica mundial, uma
farmácia comunitária ou de oficina.
Embalagem de soro dos laboratórios da Farmácia Normal.
65
Fachada da Farmácia Formosinho, em Lisboa.
66
Esta década marcou, também, o estabelecimento em Portugal da Bayer, que iniciou actividade no País através da sucursal Federico Bayer & Companhia, pondo fim à representação anterior através de agentes.
Além da componente industrial, é de assinalar a criação,
em 1900, da Associação de Farmacêuticos Portugueses,
cuja atividade se prolongou até 1933, ano de entrada em
vigor da nova Constituição Portuguesa e do início do Estado
corporativo, o que implicou a reorganização do movimento
associativo. Deram-se também passos importantes no ensino da farmácia, devido, em parte, ao papel que a Sociedade
dos Farmacêuticos, fundada em 1835, desenvolveu junto dos
sucessivos governos. Foi assim que, em 1902, Hintze Ribeiro,
Presidente do Conselho de Ministros, levou ao parlamento a
sua reforma do ensino farmacêutico, apresentando-o como
“o mais abandonado do todos os ramos de ensino nacional”.
Embora importantes, as mudanças limitaram-se à extinção
do curso irregular de Farmácia, mantendo as Escolas de Farmácia anexas às Escolas Médicas.
ANOS 1910: ARRANQUE EM TEMPO DE GUERRA
Após a Implantação da República, em 5 de Outubro de
1910, assistiu-se a um significativo surto de desenvolvimento da Indústria Farmacêutica de origem nacional, o
qual ficou a dever-se, em larga medida, à eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Com efeito, se a superveniente dificuldade de manter o fluxo de importações
da Alemanha – principal País fornecedor nacional das especialidades farmacêuticas e onde se haviam registado
enormes progressos devido à colaboração de farmacologistas, químicos e bacteriologistas – levou à escassez, e
ao consequente encarecimento dos medicamentos, abriu
também portas ao desenvolvimento de um conjunto de laboratórios industriais portugueses aptos a seguir, de certa
forma, o exemplo da Companhia Portuguesa Higiene.
Ao repto lançado pelo vespertino A Capital, que, em artigo publicado em Março de 1915, indagava se não havia
“maneira de substituir esses indispensáveis medicamentos
[alemães]?”, parecem ter respondido, entre outros, os Laboratórios Sicla, iniciados nesse mesmo ano pela Sociedade
de Indústria Chímica, Lda., com o objectivo de fazer face à
referida carência de fármacos, nomeadamente de éter etílico, o Laboratório Únitas, constituído em 1916 pelo farmacêutico António Ferreira Pinto, o Laboratório Farmacológico
J. J. Fernandes, Lda., criado em 1917 pelo farmacêutico José
Joaquim da Costa Fernandes – que o sediou na Rua Filipe da
Mata, em Lisboa, tendo sido pioneiro na introdução em Portugal do fabrico de drageias com cobertura de glúten e que-
ratina –, o Laboratório Sano, fundado em 1918, em Vila Nova
de Gaia, pelo farmacêutico Alcibíades de Barros, e ainda o
Laboratório Farmacêutico Saúde, estabelecido em 1919 pelo
farmacêutico José Bento de Almeida. Data também desta
década, provavelmente, o Laboratório Farmacêutico de Óscar Alvim, sediado na Anadia.
Instalações dos Laboratórios J. J. Fernandes, em Lisboa.
Antes destes, e previamente à eclosão da Primeira Guerra
Mundial, tinham já arrancado os Laboratórios Sanitas – fundados em Abril de 1911, por iniciativa do major e médico
Francisco Cortez Pinto (1885-1974) e do farmacêutico Horácio Pimentel – e a sociedade farmacêutica Davita, Lda., que
Álvaro Pereira de Lacerda impulsionara por volta de 1912.
Uma publicação dos anos 50 do Laboratório Sanitas dá bem
conta do panorama da Indústria Farmacêutica nacional nos
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anos 1910 e do contexto que levou à fundação daquela sociedade:
Situa-se em 1911 esse primeiro balbuciar de indústria farmacêutica. Todas as tentativas feitas, até então, não tinham qualquer carácter de continuidade, eram meramente esporádicas
e, na maior parte dos casos, cingiam-se a um só produto.
Todavia a infiltração das especialidades farmacêuticas estrangeiras no nosso mercado agigantava-se de ano para ano,
aproveitando-se do campo que lhe estava aberto por ausência
de uma indústria nacional efectiva e de quaisquer disposições
oficiais que dificultassem essa infiltração.
Também o Instituto Pasteur de Lisboa iniciara em 1913
a industrialização do processo de fabrico de medicamentos, evidenciando uma dinâmica, uma organização e umas
instalações praticamente ímpares, na época, ao nível da Indústria Farmacêutica.
Além do referido conflito bélico, terá, igualmente, contribuído para o desenvolvimento da Indústria Farmacêutica nacional o regulamento do imposto do selo das especialidades
farmacêuticas, aprovado pelo Decreto n.º 162, de 14 de Outubro de 1913. De facto, segundo o relatório da direcção do
Grémio Nacional das Indústrias de Especialidades Farmacêuticas (GNIEF), de 1946, deveu-se-lhe “em grande parte o
progresso da indústria nacional, [...]. Instituiu ele taxas diferentes para a especialidade nacional, para a especialidade
estrangeira e para a estrangeira fabricada em Portugal”.
Na década da introdução dos compostos arsenicais anti-sifilíticos, de que foi exemplo o «606», o primeiro fármaco
desenvolvido para a terapêutica da, então, temível e devastadora Sífilis, desenvolveu-se também – ainda que timidamente, e uma vez mais seguindo o exemplo da Companhia Portuguesa Higiene – o processo de comunicação directa dos
laboratórios com a classe médica. Foi precursora neste domínio a Sociedade Pires & Mourato, do Laboratório Normal,
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Laboratório de Farmácia do Instituto Pasteur de Lisboa, Secção do Norte, Porto (1913).
que, em Junho de 1914, iniciou a publicação de Esculápio:
Pequena Revista Médica. Os termos da sua apresentação revelam a existência, à época, de uma significativa acção de
propaganda médica, sabendo-se que também o Laboratório
Farmacêutico de Óscar Alvim iniciou, em 1917, uma “publicação gratuita de propaganda”:
Diariamente chegam às mãos do médico dezenas de papéis
de todos os feitios e tamanhos que visam a conquistar-lhe as
suas graças e a dar-lhe conhecimento das mil e uma substâncias que o comércio farmacêutico, excitado pela concorrência, pela febre de produção e pelo veloz rodopio das doutrinas
médicas, lança em roldão, sob vários rótulos.
No meio desta avalanche de papéis figuram vários jornais que
têm, justamente logrado chamar a atenção do médico, e merecer-lhe o interesse, porque servem de veículo a notícias e a
conhecimentos que lhe aproveitam e que uma vida afadigada
impede ou dificulta ir buscar noutras fontes melhores, mas
menos acessíveis: livros e revistas especiais.
ESCULÁPIO é mais uma folha que o vento do reclamo farmacêutico vem trazer à mão do médico. Visa, honestamente
se deve confessar, a dar-lhe conhecimento dos produtos que
a Farmácia Normal de Lisboa vem, de há muito, pondo à sua
disposição.
va agregada desde a sua criação em 1899) e a assunção
da sua Direcção por Ricardo Jorge (1858-1939) –, deu-se,
igualmente, um importante passo na reformulação do ensino farmacêutico em Portugal. Com efeito, as reformas
de 1911, 1915 e 1918 vieram trazer mudanças significativas, nomeadamente a almejada autonomia face ao ensino médico e uma maior exigência no grau académico que
dava acesso ao curso de Farmácia. A estrutura dos cursos
ministrados apresentava, porém, pouca ou nenhuma ligação com o processo de industrialização em curso.
ANOS 1920: DESENVOLVIMENTO CONTRA TODAS
AS PROBABILIDADES
Boletim informativo do Laboratório Normal (1914).
Em paralelo ao desenvolvimento laboratorial e à reorganização, em 1911, dos Serviços de Saúde e Higiene em
Portugal – com a autonomização da Direcção-Geral da
Saúde face à Beneficência Pública (à qual se encontra-
Os anos 1920 ficaram marcados politicamente por uma
acentuada instabilidade, fruto da rápida sucessão de governos, alguns dos quais duravam escassos dias, o que
conduziu à dificuldade de realizar e, sobretudo, manter
reformas políticas, nomeadamente no que se refere ao
sector farmacêutico. Economicamente, foi determinante
a nova pauta aduaneira de 1923, que exerceu um inquestionável efeito pernicioso junto dos laboratórios farmacêuticos instalados em Portugal, pois não só diminuiu a
protecção alfandegária às especialidades nacionais, ao
reduzir os direitos sobre os produtos manufacturados,
como encareceu as matérias-primas. Ao nivel industrial,
faltavam em Portugal grandes indústrias químicas, conforme notou Raúl Lupi Nogueira, em palestra realizada,
em Março de 1925, na Sociedade Farmacêutica Lusitana,
constituindo excepção a fábrica da Solvay, na Póvoa de
Santa Iria: “A Farmácia portuguesa é largamente tributária da indústria química estrangeira”. Positivamente, a Indústria Farmacêutica beneficiou, no final da década, do
69
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Decreto n.º 17.636, de 19 de Novembro de 1929, que era
já um princípio de condicionamento industrial, pois fazia
depender de autorização ministerial a instalação de novos
laboratórios.
Apesar de tão adverso, e até contraditório, contexto, a
indústria nacional conseguiu, na segunda década do século XX, lançar três raízes importantes, alargando as bases
que suportaram a transição da Farmácia de Oficina para a
Farmácia Industrial.
A primeira delas remonta a Junho de 1923, data de fundação da Sociedade Industrial Farmacêutica, S.A.R.L.,
proprietária dos famosos Laboratórios Azevedos, a qual
teve por base a Farmácia Azevedo, Irmão & Veiga, localizada em Lisboa. Um ano volvido, em 1924, surgiu um
pequeno laboratório farmacêutico nas traseiras da Farmácia Padrão, localizada na Baixa do Porto. O seu mentor foi Álvaro Portela que, juntamente com o proprietário
da referida farmácia, o senhor Almeida, criou a Bial, cuja
designação resultou da junção do duplo “AL” de Álvaro e
Almeida. Cinco anos depois, em 1929, foi registada a primeira marca de grande sucesso do laboratório, a Benzo-Diacol, um produto para a tosse. A importância que a
Bial rapidamente alcançou encontra-se patente num elucidativo testemunho do então Ministro da Instrução, o Professor Alfredo de Magalhães (1870-1957), que, no final
desta década, escreveu: “A visita que acabo de fazer aos
laboratórios Bial deixa-me plenamente, sinceramente satisfeito, e não é preciso ser profeta para lhes assegurar um
futuro excelente que também me desvanece como português e como médico”. Também os Laboratórios J.A.B.A.
tiveram a sua génese numa farmácia, devendo-se a sua
criação, em 1927, ao farmacêutico José António Baptista
d’Almeida (1887-1950).
Estatutos da Sociedade Industrial
Farmacêutica (1923).
Embalagem de preparações esterilizadas dos Laboratórios JABA.
Sede dos Laboratórios Bial, no Porto
(anos 1940).
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Laboratórios Bial, no Porto (anos 1940).
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Escritórios da Bayer, em Lisboa, situados no andar
inferior ao consultório do Dr. Egas Moniz.
Além das referidas sociedades, iniciaram, ainda, actividade, nos primeiros anos desta década, os Laboratórios
de Biologia e Quimioterapia do Dr. Seixas Palma. Fundados por José Seixas Palma, docente e investigador da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, e pelo
farmacêutico José Carvalho da Fonseca Júnior, coube-lhes
o pioneirismo da introdução em Portugal da opoterapia,
isto é, a terapêutica farmacológica baseada em drogas de
origem animal. Relativamente aos laboratórios internacionais, destacou-se a Bayer, Lda., empresa, que nos anos
1920 representava em Portugal os produtos químicos e
farmacêuticos da Bayer, I.G.
Sobre o panorama global da Indústria Farmacêutica nesta década, testemunhou José do Souto Teixeira quando da
realização, em 1968, do I Congresso Nacional da Indústria
Farmacêutica:
Dava então a indústria farmacêutica nacional os seus primeiros passos, sequência natural da evolução industrial
dos fins do século passado, em virtude da qual foram desaparecendo as fórmulas galénicas da antiga usança e nascendo um novo conceito completamente novo de aproveitamentos das drogas.
O referido evento sucedeu ao realizado 41 anos antes
em Lisboa. Com efeito, em Dezembro de 1927 teve lugar na sede da Sociedade Farmacêutica Lusitana (SFL)
o Primeiro Congresso Nacional de Farmácia, promovido,
entre outros, pela própria SFL, pela Associação dos Farmacêuticos Portugueses e pelas Faculdades de Farmácia
de Lisboa, Porto e Coimbra. Ocorreu o mesmo num período-chave na História da Farmácia, o da referida transição
da oficina para a indústria, processo que acarretou o estabelecimento de uma nova e diferente relação dos farmacêuticos e dos médicos entre si e com os medicamentos,
assim como acrescidas necessidades de incentivo e regulação por parte dos executivos políticos. Não surpreende,
portanto, que entre as “questões de interesse colectivo”
inscritas na lei orgânica do congresso para debate pelos
cerca de quinhentos participantes inscritos se encontrassem as “medidas a propor aos Poderes Públicos para o
desenvolvimento da Indústria Farmacêutica”, as “possibilidades da criação da indústria químico-farmacêutica no
País” e a eterna e sempre presente questão das “especialidades farmacêuticas estrangeiras”. Sobre a indústria em
si, testemunhou neste congresso António Maria da Gama
Júnior, salientando que a mesma existia “em Portugal
muito desenvolvida e adiantada”, e estimando que devia
“empregar uns 40 mil contos de capital e alguns milhares
de pessoas, muito especializadas e com difícil colocação
em outros ramos de actividade”. Advogou, aliás, o investimento da indústria nacional nas Colónias face à invasão
do mercado nacional pelas especialidades estrangeiras.
Destas últimas – mas também da necessidade de maior
investimento público no ensino farmacêutico e nos laboratórios –, ocupou-se o professor Dr. Raúl de Carvalho na sua
conferência sobre a “Farmácia Moderna”, apresentando-as como “tentáculos sugadores do nosso ouro e do nosso
sangue de farmacêuticos” e salientando “o nosso atraso;
que há-de ser a nossa ruína, se mão hercúlea e bem avisada não fechar essa torneira de dupla via por onde sai o
nosso ouro e por onde entra a miséria em nossos lares”.
Paralelamente ao congresso, decorreu uma exposição da
Indústria Farmacêutica portuguesa, concebida para demonstrar a “competência e honestidade profissional dos
farmacêuticos portugueses, revelando ao público, à Classe
Médica e mesmo à Classe Farmacêutica, até que ponto a
Indústria Nacional pode, desde já, competir com os produ-
73
Stand da CPH, na exposição do Primeiro Congresso de Farmácia (1927).
tos estrangeiros”. Organizado por uma comissão de farmacêuticos liderada por Manuel Adriano Mourato Vermelho,
o referido certame granjeou a participação de laboratórios
oriundos,maioritariamente, de Lisboa – nomeadamente os
Laboratórios Davita, Iatria, Gaya, Saúde, Mattos Cid, Sicla,
Jaba, Unitas, Laboratório de Biologia e Quimioterapia - Dr.
Seixas Palma, Instituto Pasteur de Lisboa, Farmácia Freire
de Andrade & Irmão, Laboratório de Dr. Mendes Ribeiro,
etc – e do Porto, cidade onde, entre outros, se encontrava
sediado o Laboratório Therapia (Isis). Fizeram-se igualmente representar no referido evento laboratórios e farmácias
do Algarve, de Viseu (Laboratório Vaz), da Figueira da Foz
(Laboratórios Sigma), de Tomar, de Vila Nova de Famalicão
e até do Funchal. Nas palavras de José do Souto Teixeira,
nesta exposição, “ainda a farmácia tradicional estava lar-
74
gamente representada, mas já se antevia que dela devia
nascer a Indústria Farmacêutica moderna”. Também Ricardo Jorge, à época dirigente da Direcção-Geral de Saúde,
deixou o seu testemunho, tendo escrito no livro de honra da
referida exposição:
Esta exposição é um testemunho eloquente do adiantamento da técnica farmacêutica, tão necessária no combate e na
prevenção das enfermidades. Demonstra o valor e a utilidade
das especialidades, sobre as quais tantos prejuízos reinaram.
O êxito obtido é um penhor da sua crescente actividade e um
incentivo para que o Estado, por todos os modos, favoreça o
progresso da indústria farmacêutica que é ao mesmo tempo
uma riqueza pública além de necessidade e benefício para
todos.
De referir que, nesta década, em 1921, foi concedido às
Escolas de Farmácia o estatuto de Faculdades, passando a
existir três: a de Lisboa, a de Coimbra e a do Porto. As respectivas leis orgânicas foram definidas em 1926, revelando
uma estrutura curricular na qual se incluía uma cadeira tri-semestral de Farmácia Galénica e, agregado a esta, um
curso semestral de Indústria Farmacêutica. A nível governamental, destacou-se a criação, mediante o Decreto n.º
12 447, de 12 de Outubro de 1926, da Inspecção do Exercício Farmacêutico, organismo colocado na dependência
da Direcção-Geral de Saúde. Neste mesmo ano, fundou
o médico Ernesto Roma (1887-1978) a Associação Protectora dos Diabéticos Pobres, a primeira associação de
diabéticos criada a nível mundial.
ANOS 1930: CONDICIONAMENTO INDUSTRIAL,
AGREMIAÇÃO E INTERNACIONALIZAÇÃO
Na década em que a Indústria Farmacêutica começou a
desenhar-se tal como a conhecemos actualmente, e em
que se massificou a produção das sulfonamidas e da insulina, em Portugal, entrava-se em pleno no Estado Novo.
Alicerçado numa nova constituição, a de 1933, e marcado pelo corporativismo, com a criação de grémios do comércio e da indústria, uma das medidas do novo regime
político foi o condicionamento industrial, o qual, nas palavras do então Ministro do Comércio e da Indústria, João
Pinto da Costa Leite (1905-1975), servia para “evitar que
se prejudiquem iniciativas já estabelecidas sem vantagem
para a economia nacional, mas [...] também para estimular o aparecimento no País de novas indústrias, o florescer
de novas técnicas, para promover em suma o desenvolvimento industrial e económico da Nação”. Se o primeiro
diploma publicado, genericamente, com tal objectivo foi
o Decreto n.º 19.354, de 3 de Janeiro de 1931, relativamente à Indústria Farmacêutica, em particular, aplicou-se-lhe, inicialmente, o Decreto n.º 29 537, de 18 de Abril
de 1939. No respectivo preâmbulo, que assumia a “conveniência de proteger a Indústria Farmacêutica nacional”,
encontram--se entre os motivos para o condicionamento
“o aperfeiçoamento técnico” e a obtenção de “garantias
de pureza dos seus produtos”, mas também “os inconvenientes que resultariam da multiplicação de pequenos
laboratórios por todo o País, sem nenhum interesse industrial e sem as funções de assistência farmacêutica que
pertencem às farmácias”.
A formação, neste mesmo ano de 1939, do Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas
(GNIEF) não pode ser entendida fora deste novo contexto
legislativo. Com efeito, os procedimentos de implementação do condicionamento industrial – que se aplicavam
aos novos empreendimentos, às alterações de empresas
já existentes e também às transferências de localização –
eram geridos pelo Ministério do Interior, com parecer da
Direcção-Geral da Saúde, mas neles participavam, igualmente, os Grémios, tendo uma palavra a dizer nos novos
empreendimentos industriais a realizar sectorialmente.
Por outro lado, a criação do GNIEF surgiu, também, quando já se vislumbrava no horizonte a criação da Comissão
Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos e a
promulgação do Regulamento do Comércio dos Medicamentos Especializados, que entrou em vigor dois anos depois, após um longo processo de debate entre as partes
interessadas.
Foi, pois, neste quadro global que, quatro aos após a fundação do Sindicato Nacional dos Farmacêuticos (1935)
75
e um ano volvido sobre a criação da Ordem dos Médicos
(1938), veio a ser formalmente constituída – fruto da acção de uma comissão organizadora presidida por Cortez
Pinto (Sanitas) – a primeira associação da Indústria Farmacêutica a operar em Portugal, cujos estatutos mereceram, em Fevereiro de 1939, a aprovação pelo Subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social.
Entrega do Alvará ao GNIEF (Fev. 1939).
76
Instituído ao abrigo do Decreto-Lei n.º 24.715, de 3 de
Dezembro de 1934, que estabelecia que as “empresas sociedades ou firmas que exerçam a sua actividade no mesmo ramo de comércio, desde que se agrupem em termos
de reunir, pelo menos 50 por cento do número total das
empresas, sociedades ou firmas comerciais existentes no
seu distrito e representem 50 por cento, pelo menos, do
valor médio das transacções do respectivo ramo de comér-
cio da mesma área, podem requerer […] a sua constituição
em grémios”, o GNIEF apresentava os seguintes objectivos
estatutários:
1.º – Estudar e submeter à aprovação do Governo enquanto
não estiver constituída a Corporação os regulamento que
[…] vierem a ser elaborados, bem como todas as medidas
que possam vir a concorrer para garantir o aperfeiçoamento da indústria a bem da saúde pública e da Nação;
2.º – Exercer as funções políticas conferidas pela lei aos
elementos primários da organização corporativa;
3.º – Prestar aos associados as informações que lhe sejam
solicitadas e por sua iniciativa todas as que interessem à
respectiva indústria;
4.º – Dar parecer sobre os assuntos da sua especialidade
ou de interesse para a indústria acerca dos quais for consultado pelos órgãos corporativos de grau superior ou pelo
Estado, nomeadamente sobre:
a) – Situação, condições e necessidades do seu ramo de
indústria ou modalidades de exploração económica e
meio de lhes promover o desenvolvimento ou suprir as
insuficiências, e bem assim a forma de coordenar com
outros a respectiva actividade;
b) – Situação do pessoal e maneira de melhorar as suas
condições económicas e sociais;
c) – Higiene e segurança dos locais de trabalho.
5.º – Assegurar por todos os meios legítimos ao seu alcance
a execução dos acordos e contratos colectivos de trabalho
e demais compromissos de carácter corporativo, fazendo
fiscalizar o bom cumprimento das disposições adoptadas
e promovendo a aplicação de sanções aos delinquentes.
6.º – Cooperar na fundação progressiva de instituições sindicais de previdência destinadas a proteger todos os que
se empreguem nos respectivos ramos de indústria da área
da sua influência, contra a doença, a invalidez e o desemprego involuntário, e a garantir-lhes pensões de reforma;
7.º – Desempenhar quaisquer outras funções que lhes forem incumbidas pelo Regimento das corporações.
Os associados, que pagavam uma quota mensal de
30$00, eram, estatutariamente, “as empresas singulares
ou colectivas que, no continente, explorem laboratórios de
Alvará do GNIEF (Fev. 1939).
O primeiro logótipo do Grémio surgiu nos anos 1940.
77
O GRÉMIO DOS LABORATÓRIOS DE ESPECIALIDADES
FARMACÊUTICAS NACIONAIS RECEBEU ONTEM
O ALVARÁ DO SUB-SECRETARIADO DE ESTADO
DAS CORPORAÇÕES
78
Entrou ontem em funcionamento legal um novo organismo corporativo: o Grémio dos Laboratórios de Especialidades Farmacêuticas
Nacionais [sic]. Os respectivos trabalhos de organização começaram
há mais de um ano. Nessa altura, foi nomeada uma comissão, composta pelos srs. Manuel Leite da Silva, pelos Laboratórios «Bial», dr.
Francisco Cortez Pinto, pelos Laboratórios «Sanitas», e Valentim Duque, pelos Laboratórios J. Nobre, que elaborou os estatutos e ontem
recebeu a aprovação oficial e o alvará do Subsecretário de Estado das
Corporações.
O acto foi presidido pelo sr. dr. Mário Madeira, secretário-adjunto
do Instituto Nacional do Trabalho, assistindo, entre outras pessoas, os
srs. Dr. França Vigon, chefe dos Serviços de Acção Social do I.N.T.;
dr. Guilhermino Nunes, deputado; José Maria Alvarez, presidente da
Associação Industrial Portuguesa; general Teixeira Botelho e os industriais Álvaro Portela, coronel Correia dos Santos, Horácio Pimentel,
comandante Morais, Alfredo Cavalheiro, Álvaro de Lacerda, Ribeiro da
Costa, Cruz, Raúl Machado, etc.
O sr. dr. Mário Madeira mostrou a sua satisfação pelo bom êxito dos
trabalhos da comissão organizadora, que ficou constituída em direcção
até Janeiro de 1940, data das primeiras eleições de corpos gerentes.
Assegurou-lhes a melhor colaboração por parte do Instituto Nacional
do Trabalho e exortou os dirigentes do novo Grémio a que seguissem
a orientação tomada no sentido de dignificarem a indústria dentro das
bases da organização corporativa.
Terminou afirmando que deveria existir sempre bom entendimento
entre dirigentes e dirigidos e acrescentou que os directores do novo
Grémio, entre os quais tem alguns amigos, poderão contar com a melhor cooperação do Subsecretariado das Corporações para a execução
do seu programa.
Em nome dos industriais falou o sr. dr. Cortez Pinto, que apresentou
agradecimentos ao sr. dr. Mário Madeira e às individualidades presentes e referiu-se depois às vantagens da constituição do novo Grémio,
afirmando:
– É Portugal um dos países mais abertos à entrada das especialidades estrangeiras, e isto dá-se quando a maior parte procura nacionalizar esta indústria. Somos de opinião que, facilitando a entrada de
todos os produtos de reconhecido valor científico e terapêutico e que
se não fabricam em Portugal, deveremos, a pouco e pouco, defender
a nossa economia, os diplomados portugueses e a mão de obra nacional. Sem usurpações ou atropelos, nem constrangimentos de qualquer espécie, antes com aplauso de todos, esperamos chegar a uma
salutar disciplina do fabrico, condições de venda, base indispensável
da honestidade industrial e comercial, à verificação científica em laboratório adequado, para que o crédito da nossa técnica produtora
possa afrontar vantajosamente o da produção similar de procedência
estrangeira; iremos, enfim, até onde as circunstâncias nos permitirem
no sentido da perfeição da nossa indústria. Regista a comissão com
imenso prazer a possibilidade, que por este diploma lhe é conferida,
de incluir no seu Grémio, como aliás estava naturalmente indicado,
todos os fabricantes de especialidades farmacêuticas.
Os industriais do novo Grémio reúnem-se amanhã num almoço de
confraternização, a que preside o sr. dr. Mário Madeira.
Reprodução do texto da reportagem publicada no Diário de Notícias de 15
de Fevereiro de 1939, por ocasião da constituição do GNIEF.
Ficha de sócio da Sociedade Industrial Farmacêutica (1939).
especialidades farmacêuticas” e as “empresas proprietárias de farmácias que exerçam […] em larga escala a indústria de especialidades farmacêuticas”, estando, porém,
vedada a admissão a “falidos”. O Primeiro Presidente da
Direcção foi Cortez Pinto, integrando, ainda, o executivo Valentim Duque (F. Nobre), Manoel Leite da Silva (Bial), Joaquim Novaes (Sicla), Alfredo Cavalheiro (Sociedade de Produtos Ciência), Neves Pereira (Apirol), Correia dos Santos
(Farmacológico), Manuel Mourato Vermelho (Laboratório
Normal) e Álvaro Pereira de Lacerda (Davita, Lda.). A título
de curiosidade, refira-se que a constituição do Grémio foi
celebrada, a 16 de Fevereiro de 1939, com um banquete
realizado no restaurante do café Chave d’Ouro, no Rossio,
no qual participaram Cortez Pinto, Mário Madeira, Secretário-Adjunto do Instituto Nacional do Trabalho, e José Maria
Álvares, Presidente da Associação Industrial Portuguesa.
No que se refere à actividade da Indústria Farmacêutica,
saliente-se que, em 1933, tinham sido fundados, no Porto,
os Laboratórios Vitália – Sociedade Comercial Farmacêutica, Lda., ligados à Farmácia Vitália, o Laboratório Lemos
e a sociedade Paracélsia. Também os Laboratórios Horus,
presumivelmente sediados em Guimarães, terão iniciado
a sua actividade nesta década, período em que se licenciou na Universidade do Porto (1932) o seu fundador, o
farmacêutico Manuel de Jesus de Sousa, especializado em
Ciências Bromatológicas. Foram igualmente fundados nesta década os laboratórios Lab, iniciativa do Major farmacêutico e Professor Bernardo Augusto da Costa Simões,
os laboratórios de Quimiatria Kevel, da firma Eduardo de
Almeida & C.a, os laboratórios Zimaia, estabelecidos por
Carlos Cândido Coutinho e por José Pedro Alves, e o laboratório Isis, dirigido pelo Professor Afonso de Albuquerque,
da Faculdade de Farmácia do Porto.
79
Escolas Médicas, que todos os anos fazem uma visita de
instrução ao nosso Laboratório”. Fruto do desenvolvimento
comercial que alcançara em menos de 20 anos, em Junho
de 1930, o Sanitas inaugurou novas instalações, concentrando perto das Amoreiras, na então Rua Silva Carvalho,
toda a componente fabril. Num conjunto edificado que
ocupava mais de 7000 metros quadrados, os laboratórios
em si encontravam-se instalados em seis edifícios com 40
metros de comprimento e 8 de largura. Destas novas instalações deu eco o jornal O Século, que, em notícia publicada quando da inauguração das mesmas, reportou:
Cortez Pinto, primeiro Presidente do Grémio.
Entre as indústrias já estabelecidas nas décadas anteriores, destacou-se o Laboratório Sanitas, que adquiriu uma
dimensão inédita no cômputo da Indústria Farmacêutica
nacional, como deixou, aliás, bem claro no seu Catálogo
Geral de 1934: “Tal como está actualmente organizado, o
Laboratório Sanitas é um dos melhores estabelecimentos
do género na Europa, não só pela proficiência como estão
montadas todas as suas secções, como ainda pela organização científica que a elas preside. As suas instalações
são constantemente visitadas por Médicos, Professores de
Medicina e pelos cursos dos últimos anos de medicina das
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Por toda a parte se admiram os mais modernos maquinismos, tanto nos laboratórios propriamente ditos, com os
seus aparelhos de emulsionar, comprimir, encher ampolas,
fabrico de pastas, pensos e outros produtos, como nas salas de estufa, empacotamentos, galeria de máquinas, instalação de caldeiras, gabinete de consultas e tratamento e
oficinas de lavagem de garrafas e frascos.
Os serviços são extraordinariamente simplificados pelo
emprego mecânico, que lhes assegura o máximo da produção com um mínimo de pessoal.
Nos mesmos edifícios encontram-se os depósitos de embalagens. A colagem de rótulos, o encher dos frascos, dos
tubos, a rolhagem, tudo tem o seu maquinismo apropriado
a assegurar-lhe a perfeição do acabamento.
Nos vastos terrenos onde se encontram os laboratórios estão situadas todas as instalações fabris da Sanitas, num
conjunto de edifícios. Assim, logo à entrada fica a secção
de contabilidade, numa casa própria e os armazéns de drogas num grande pavilhão com anexos, onde se faz a distribuição dos produtos químicos e se recebem os já manufacturados, a fim de serem transportados para as secções de
Expedição e Exportação.
Há também um serviço especial de bacteriologia, com salas de preparação, salas de estufa, geleiras, etc., sob a direcção de três técnicos especializados, distintos bacteriologistas, ocupando outro edifício, em cujo primeiro andar
fica a sala de Conferências.
Sede do Laboratório Sanitas, na Avenida D. João V, em Lisboa (anos 1960).
A par do sucesso alcançado ao nível das exportações
para as então províncias ultramarinas e para mercados
como a Índia inglesa e os Congos belga e francês, o Laboratório Sanitas iniciou, nesta década, um verdadeiro processo de internacionalização. Em 1930, fruto do sucesso
dos seus produtos no mercado brasileiro, e por intermédio de Thomaz Pimentel, foi instalado um laboratório na
cidade de São Paulo, denominado Laboratório Sanitas do
Brasil. Relativamente ao mercado português, o posicionamento era outro, alinhando com o pleito da indústria nacional pela limitação das importações de especialidades:
“Preferindo os medicamentos nacionais, V. Exa. combate
o desemprego dos portugueses. Preferindo produtos estrangeiros contribuirá V. Exa. para o desemprego dos portugueses, protegendo os estrangeiros”.
Nos anos 30, o Instituto Pasteur de Lisboa era também já
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Sede do Instituto Pasteur de Lisboa, na Rua Nova do Almada (anos 1940).
82
Viatura promocional do Instituto Pasteur de Lisboa (anos 1940).
um importante laboratório, possuindo delegações em Lisboa (chefiando a direcção farmacêutica Alberto Malafaya
Baptista, licenciado em Farmácia e assistente da Faculdade de Medicina do Porto), em Coimbra e no Porto (com a
direcção farmacêutica confiada a Manuel de Lucena Sampaio, licenciado em Farmácia) e agências na Madeira, nos
Açores e, também, nas Colónias, nomeadamente na Guiné,
na Índia Portuguesa e em Macau, S. Tomé e Príncipe, Angola e Moçambique. O facto do Instituto Pasteur representar em Portugal os laboratórios Lilly permitiu-lhe comercializar a insulina Lilly, “a primeira lançada nos mercados
de todo o mundo”, como a anunciava nos anos 30, a qual
concorria, por exemplo, com a Sintalina-B, antidiabético
de administração interna da Schering S.A. Portuguesa.
Ao nível dos laboratórios estrangeiros, assinala-se a entrada da Merck em Portugal, cuja primeira representação
data de 1934, e também dos Produtos CIBA, Lda, presentes no mercado nacional, pelo menos, desde 1939,
com sede na Rua da Madalena, em Lisboa, e da Schering
alemã, com actividade no País desde, pelo menos, 1934,
através da Schering, S.A. Portuguesa, tendo sede em Lisboa, no Largo da Anunciada. Na Bayer, por seu lado, foi
nesta década que se incrementou a acção dos delegados
de propaganda médica, elo de contacto personalizado entre a Indústria Farmacêutica e os médicos, e que começou
a circular pelo País uma carrinha que, através da projecção de filmes promocionais, procedia à divulgação de produtos da marca não sujeitos a receita médica.
83
Francisco Cortez Pinto, fundador do Laboratório Sanitas,
esteve, no âmbito da Associação Industrial Portuguesa, ligado à Grande Exposição Industrial Portuguesa de 1932,
realizada no Pavilhão de Exposições do Parque Eduardo
VII, tendo sido um dos seus idealizadores e organizadores. Nela participaram vários ramos da indústria nacional,
nomeadamente da farmacêutica. Foi neste contexto que
o coronel Correia dos Santos, do Laboratório Farmacológico, deu ao jornal O Século o seu testemunho sobre os
progressos da indústria química em Portugal:
A indústria química, em geral, estacionou: pouco tem progredido. Na parte farmacêutica, em especial, tem-se caminhado consideravelmente. Assim, por exemplo, o fabrico
de produtos injectáveis, nos laboratórios portugueses, é
tão perfeito como nos laboratórios estrangeiros. A indústria dos comprimidos desagregáveis, que tem uma grande
importância, como v. sabe, não existia, antes da guerra, entre nós. Usava-se o comprimido «pedra», que atravessava o
corpo humano, sem perder a sua rigidez.
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Importa ainda salientar que uma das áreas subsidiárias
da Indústria Farmacêutica que conheceu significativos desenvolvimentos na década de trinta foi a da distribuição de
medicamentos. Com efeito, em Setembro de 1935 criou-se a União dos Farmacêuticos de Portugal (UFP). Sediada
em Lisboa, na Rua da Madalena, a UFP granjeou de imediato a adesão de 96 farmacêuticos, tendo-se mantido até
meados dos anos 60 como única cooperativa do sector. A
logística nesta época era, porém, rudimentar já que as encomendas de medicamentos para as farmácias da área da
grande Lisboa eram levantadas nas instalações da União
dos Farmacêuticos de Portugal ou, em alternativa, distribuídas através de uma carroça puxada por burro.
ANOS 1940: DESENVOLVIMENTO, ASSOCIATIVISMO,
INVESTIGAÇÃO E REGULAÇÃO
Os anos 1940 foram marcados pelos notórios progressos
alcançados no desenvolvimento e na produção industrial
de sulfonamidas, de antibióticos – nomeadamente a penicilina e a estreptomicina, que revolucionaram a terapêutica antituberculosa – e de anti-histamínicos, mas também
pela Segunda Guerra Mundial.
Não obstante a neutralidade de Portugal, o conflito bélico,
que se desenvolveu entre 1939 e 1945, teve um iniludível
impacto na Indústria Farmacêutica nacional. Impotentes,
os laboratórios assistiram ao enorme aumento do preço
das matérias-primas, que, em alguns casos, atingiu 200%
ou mesmo 300%, e à rarefacção das mesmas, fenómeno
que foi mitigado mediante a intervenção do GNIEF, que,
através de entidades estatais, recebia matérias-primas indispensáveis à indústria, provenientes principalmente dos
EUA, procedendo, posteriormente, à sua distribuição pelos associados. Somou-se a estas dificuldades o imposto
lançado sobre os lucros de guerra dos laboratórios. A partir de 1945, finda a contenda bélica, foi a quebra dos preços das matérias-primas e dos produtos estrangeiros que
colocou dificuldades à indústria nacional, obrigada, por
questões de concorrência, ao desagravamento dos preços
de fármacos produzidos ainda com matérias-primas que
haviam sido adquiridas a preços elevados. Por outro lado,
o fim da guerra levou os laboratórios estrangeiros a tentar
restabelecer as suas anteriores posições, assistindo-se a
“uma invasão de medicamentos especializados estrangeiros” em Portugal, conforme o Grémio deixou expresso no
seu relatório de 1947.
Apesar das contrariedades, o volume de vendas de me-
Sede e fábrica dos Laboratórios Vitória, na Venda Nova (anos 1960).
dicamentos nacionais e estrangeiros aumentou sempre
durante os anos 1940. Movidos, porventura, pelas oportunidades que se abriam, foram criados, nesta década,
quatro importantes sociedades farmacêuticas em Portugal: os Laboratórios Vitória, os Laboratórios Atral, o Instituto Luso-Fármaco e a Medicamenta. Presidiu à fundação
do primeiro o objectivo de instalar no País um laboratório
moderno e apto a suprir as carências que, então, se fa-
ziam sentir no mercado nacional, muito particularmente
na preparação de arsenicais. Para tal, em Abril de 1943, a
antiga sociedade por quotas de responsabilidade limitada
foi transformada em sociedade anónima e viu o seu capital social aumentado de 180 000$00 para 5 000 000$00,
tendo como accionistas e administradores três engenheiros: Paulo Teixeira Queiroz de Barros, que assumiu a presidência da empresa, Luiz de Sá Pereira e José Humberto
85
Vieira da Silva Zimbarra. Para cumprir o seu objecto social – “Importar, adquirir, transformar, elaborar, vender e
exportar toda a espécie de matérias, produtos químicos e
especialidades farmacêuticas, de acordo com os alvarás
ou licenças que actualmente possui ou venha a possuir” –,
iniciara-se já a construção de instalações próprias no pólo
industrial da Venda Nova. A guerra em curso ditou, porém,
atrasos significativos na conclusão do projecto, o que prejudicou o início dos testes de fabrico, realizados a partir de
Março de 1943, e, consequentemente, o arranque da actividade comercial, que só veio a concretizar-se na Primavera
de 1944. Não obstante a carestia e as dificuldades na obtenção de matérias-primas e de materiais de embalagem,
em 1946, os Laboratórios Vitória encontravam-se já em
pleno funcionamento, tendo lançado, nesse ano, cerca de
20 novos produtos, distribuídos através de uma delegação
instalada no norte do País (Porto) e outra na região centro (Coimbra). A produção de antibióticos teve início ainda
nesta década, por volta de 1948, notoriamente influenciada pelo exemplo norte-americano:
86
Quando da iniciação do estudo por nós feito sobre possibilidades de lançar antibióticos e, consequentemente, das
melhores técnicas a utilizar quanto às manipulações várias
a que podiam sujeitar-se, consultámos diversos livros e revistas que, citando factos, nos esclareceram «teoricamente» de como deveríamos trabalhar. Algo, contudo, nos obrigava a «desconfiar» um pouco das facilidades que alguns
livros e revistas deixavam ver em tais manipulações e nem
uma súmula de fórmulas citadas em revistas americanas e
por outras estrangeiras transcritas, nos obrigavam a acreditar em tudo tal qual se «escrevia». Não fomos enganados,
é certo, mas a tal simplicidade «teórica» não se aliava à
simplicidade de pormenor, este o que mais cativou a nossa
atenção; aquele que constitui efectivamente o grande êxito
de uma preparação de antibióticos. Assim foi reconhecida
indispensável uma viagem de estudo aos Estados Unidos,
para completar os nossos conhecimentos teóricos.
Da visita realizada a algumas fábricas no “País dos antibióticos”, expressão utilizada pela delegação dos serviços técnicos dos Laboratórios Vitória que se deslocou, na
época, aos Estados Unidos da América, ficou o “assombro
causado pelos números” e pelas máquinas de enchimento e capsulagem dos frascos de penicilina e estreptomicina, mas sobretudo o conhecimento para avançar para
a produção nacional de antibióticos, sendo que em 1949
a sociedade apresentava já um significativo catálogo de
produtos próprios. Mereceu também especial atenção de
benchmarking a produção de arsenobenzóis, concluindo-se que “se é verdade que a nossa produção por comparação é demasiado pequena, também é verdade serem os
nossos ensaios mais rigorosos”.
Comparativamente aos Laboratórios Vitória, as origens
dos Laboratórios Atral foram mais modestas e, sobretudo,
menos planeadas. Esta sociedade iniciou a sua existência
em 1947 sob a forma de uma modesta farmácia localizada no bairro de Alcântara, em Lisboa. A grave crise financeira que se fez sentir um ano depois colocou Sebastião
Alves (1920-2012), então agente de propaganda médica,
na gestão do negócio. Sob a sua direcção, foram contratados novos técnicos e iniciou-se, com o objectivo da exportação, um alargado processo de contacto com mercados
estrangeiros, esforços de que resultou o incremento do
volume de facturação da empresa.
O processo de constituição, em 1948, do Instituto Luso-Fármaco, o terceiro importante laboratório criado nesta década, é bem paradigmático de como se fundavam,
então, em Portugal, as novas indústrias farmacêuticas.
O testemunho dessas já remotas origens ficou registado
numa publicação editada em Outubro de 1975 pelo referido Instituto:
Sede dos Laboratórios Atral (anos 1940).
Grandes foram as barreiras a vencer para se obter o indispensável alvará de laboratório, dado que, na época, além
de outras, imperava a da exigência de uma farmácia atingir
1000 contos de vendas de especialidades farmacêuticas,
aprovadas então pela Comissão Reguladora dos Produtos
Químicos e Farmacêuticos e fabricadas na própria farmácia, que pretendia ultrapassar esta importante fase para
requerer o seu pedido de alvará.
Conseguiu-se, assim, efectuar um contrato com uma farmácia, situada então na Rua Damasceno Monteiro – Farmácia ALB – e ali, em condições difíceis, iniciou-se, por assim
dizer, o arranque para se alcançarem os nossos objectivos.
Trabalhou-se afanosamente, dia e noite, sem quaisquer auxílios ou compreensões oficiais.
Na origem deste laboratório encontravam-se António Diogo Bravo e Miguel Cocco. A produção artesanal inicial deu
lugar, progressivamente, à industrialização, para o que contribuiu a deslocação que os referidos fundadores realizaram, no início dos anos 50, aos EUA, País onde adquiriram
Ficha de sócio do Instituto Luso-Fármaco (1948).
equipamentos para a criação da primeira unidade nacional
de síntese farmacêutica dos antibióticos e dos seus sais: “Os
meses que passámos nos Estados Unidos deram-nos a conhecer a necessidade de enveredarmos por novos caminhos
que não só o da importação de matérias-primas, e sim a
possibilidade de sintetizarmos, também nós, algumas das
substâncias então de maior relevância”.
Entre os quatro principais laboratórios fundados nesta década, encontrava-se ainda a Medicamenta, criada em 1949
mediante a aquisição, por cessão, dos direitos do alvará do
Laboratório Cardita, propriedade da Cardita, Lda. Além deste, mas com menor importância, surgiram, também neste
período, os Laboratórios Delta, constituídos em 1943, e os
Laboratórios Fidelis, propriedade da empresa Laboratórios
Bios, Lda., tendo como director técnico Ferreira Pinto. É
também possível que datem dos anos 40 o Laboratório Cas-
87
telo, dirigido pelo farmaceutico A. Matos do Vale, que, no
final da década, passou a designar-se Laboratório Ulzurrun,
os laboratórios de Biologia e Quimioterapia Vicente Ribeiro
& Carvalho e os Laboratórios de Benfica, propriedade da sociedade Cunha Reis, Lda. e sediados na Estrada de Benfica, em Lisboa, tendo como director técnico o farmacêutico
Carlos Macedo Pires.
Laboratórios de Benfica.
88
Os anos 1940 testemunharam, igualmente, um primeiro
e importante esforço de associativismo por parte dos industriais farmacêuticos. Com efeito, por iniciativa de Alfredo Cavalheiro, começou a desenhar-se no seio do GNIEF a
constituição de um “grande Laboratório para preparação de
produtos que a Indústria não fabricava, tornando-nos por
completo independentes do estrangeiro, no que respeita à
importação dos referidos produtos”. Granjeada a adesão exclusiva de cerca de 60% dos associados do Grémio, num total
de 30 laboratórios de variadas dimensões – sendo maiores
accionistas os laboratórios Sanitas, Lab e Cardita, o Instituto
Pasteur de Lisboa e os laboratórios Vitória, Bial, Farmacológico J.J. Fernandes, Únitas e Zimaia –, em 15 de Dezembro
de 1944, foi formalmente fundado o Instituto Nacional Bioterapêutico. O seu objecto social era o “fabrico de produtos
químicos, de vitaminas, de soros e vacinas, de produtos opoterápicos, de alcalóides e de glicósidos” e “a transformação
ou aproveitamento de matérias-primas existentes no País e
no Império Colonial Português, que tenham ou possam vir a
ter aplicação terapêutica”.
A dimensão e os recursos financeiros adquiridos pelos laboratórios mais antigos, nomeadamente por via da internacionalização e da exportação, permitiu, pela primeira vez,
o seu investimento no apoio à investigação científica desenvolvida pelo mundo académico. Foi neste contexto que os
Laboratórios Sanitas, em parceria com a Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa, instituíram, em 1946, cinco prémios
“com o fim de estimular a produção científica, tão necessária à Indústria Farmacêutica portuguesa, que se deve apoiar,
precisamente, nas mais modernas aquisições das ciências
médicas”. Com um valor global anual de 25 000$00, os prémios Sanitas sucederam ao prémio trienal oferecido pelo
Instituto Pasteur à Faculdade de Medicina de Lisboa, marcando, como referiram, entre outros, os eminentes médicos
e professores Egas Moniz, Celestino da Costa e Salazar de
Sousa, “uma etapa nova e importantíssima no movimento de
colaboração entre as ciências médicas e as indústrias que
para elas trabalham”. A referida colaboração materializou-se,
igualmente, nas publicações periódicas que alguns laboratórios desenvolveram nesta década como parte do seu esforço
de comunicação com os médicos, nomeadamente a Terapêutica: Revista de Informação Médico-Farmacêutica, publicada a
partir de 1947 pelos Laboratórios Vitória, e os Summarium
JABA e Anais Azevedos, ambos iniciados em 1949. É tam-
Brochura do Prémio Sanitas (1948).
Laboratório Normal, Mem Martins (anos 1940).
89
bém muito significativo o facto de, a partir do início dos
anos 1940, o Instituto Pasteur de Lisboa ter começado a
editar, através dos seus Serviços de Bibliografia Científica,
um boletim com extractos de artigos científicos publicados
em revistas nacionais e estrangeiras, do qual foram dados à
estampa pelo menos 30 números.
Ao nivel da investigação e desenvolvimento na indústria
assumiu pioneirismo o Laboratório Normal, que, em 1949,
contratou para dirigir esta área Alberto Ralha (1921-2010),
então regente da disciplina de Química Orgânica Farmacêutica, da Escola de Farmácia, da Universidade de Lisboa.
A preponderância que os laboratórios de especialidades
farmacêuticas foram conquistando nesta década levantou,
porém, algum “cepticismo da parte de uns, malquerenças
da parte de outros, incompreensão de bastantes”. Era assim que os Laboratórios Vitória caracterizavam, no seu Memorandum Therapêutico de 1945, a reacção ao impacto económico das novas indústrias e à mudança de paradigma de
produção que lhes estava subjacente, com a crescente substituição da farmácia de oficina pela farmácia industrial:
Sussurram outras «vozes», se porventura não são as mesmas, em tom agora lamentoso, que as farmácias, em face
da invasão dos produtos farmacêuticos especializados, já
não são mais do que meras lojas de venda, decaídas da
sua dignidade de laboratórios manipuladores, Mercearias
de drogas!
Neste sussurro se encerra um lastimoso «de profundis».
A Farmácia, porém, continua a ser inalteravelmente, uma
unidade imprescindível da Indústria Farmacêutica.
90
No início dos anos 40, o sector farmacêutico encontrava-se, porém, não só desregulado ao nível da concorrência
e dos preços praticados, como apresentava agentes pouco especializados, sobretudo na área da comercialização,
confundindo-se as funções dos importadores com as dos
armazenistas. Foi neste contexto que se deu a criação, mediante o Decreto n.º 30 270, de 12 de Janeiro de 1940,
da Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos (CRPQF). Organicamente dependente do Ministério
do Comércio e Indústria, os seus objectivos foram definidos
nos seguintes termos:
1.º – Orientar, disciplinar e fiscalizar as actividades relacionadas com a importação, o comércio interno e a indústria
dos produtos químicos e farmacêuticos, tendo principalmente em vista a garantia do normal abastecimento do
país, o desenvolvimento da produção nacional e a manutenção do justo preço dos produtos;
2.º – Criar a consciência corporativa e fomentar a solidariedade e a compreensão dos interesses comuns entre os
componentes das actividades que coordena.
Entre as suas competências contavam-se a regulação da
“actividade económica das indústrias química e farmacêutica” e a fiscalização do “exacto cumprimento das normas
legais e das suas próprias determinações pelas actividades
que disciplina”, podendo “aplicar penalidades às infracções
verificadas”, mas também a fixação de preços. Por outro
lado, ao abrigo do referido decreto e do despacho ministerial
de 13 de Maio de 1940, o exercício de actividade no ramo
dos produtos químicos e farmacêuticos passou a ficar sujeito à inscrição obrigatória na CRPQF de “laboratórios de produtos farmacêuticos”, “armezenistas-importadores e armazenistas de medicamentos especializados” e “armazenistas
e importadores de drogas medicinais, produtos farmacêuticos e produtos químicos medicinais e para análise”. Uma
das suas primeiras medidas foi a criação do Regulamento do
Comércio dos Medicamentos Especializados, que entrou em
vigor em 1941, procurando disciplinar o sector, como se
infere do relatório da CRPQF sobre Fabrico e Importação de
Medicamentos Especializados, publicado em 1948:
A desordem existente neste sector em 1940, e já então
com grandes raízes, era altamente prejudicial para todas
as classes interessadas na produção e venda de medicamentos e designadamente para as farmácias; era-o também para a saúde pública, pois a concorrência sem limites
no campo dos medicamentos afecta, mais cedo ou mais
tarde, a sua composição e valor terapêutico.
Elaborou-se e, depois de largamente discutido por representantes de todos os interessados, foi aprovado por despacho de 15 de Abril de 1941 de Sua Excelência, o Ministro
da Economia, o Regulamento do Comércio de Medicamentos Especializados…”.
Souto Teixeira, tendo ficado sediado na Estrada de Benfica,
em Lisboa. Este organismo era, aliás, uma das “mais antigas aspirações” do Grémio, representando para a “Indústria
das Especialidades Farmacêuticas enorme elevação do nível
moral e material” e “a mais segura garantia da pureza e genuinidade das especialidades farmacêuticas”.
Ao abrigo deste regulamento, os preços de venda ao público dos medicamentos especializados eram propostos pelos
fabricantes à CRPQF e por esta aprovados, só podendo ser
alterados a requerimento dos interessados ou por iniciativa
da referida comissão. Esta questão desagradava ao GNIEF,
que invocava não poder “a indústria nacional de especialidades farmacêuticas, ao contrário do que sucede com a totalidade ou quase totalidade das restantes indústrias, fixar e
alterar livremente os preços dos seus preparados”. No relatório da direcção do Grémio, de 1942, afirmava-se mesmo:
[…] tem sido a Comissão Reguladora tão escrupulosamente cautelosa, que, ao ser-lhe submetido algum pedido de
fixação ou alteração de preços, exige do requerente uma
justificação detalhada e documentada, só concedendo a
solicitada autorização, depois de se assegurar de que nos
preços a autorizar não há sombra de especulação.
Para esse fim, exige dos requerentes a mais minuciosa
discriminação e justificação do preço exacto do custo, e,
por vezes, não se conformando com os preços propostos,
altera-os, reduzindo-os.
Outra das medidas iniciais tomadas pela CRPQF foi a criação, em Março de 1941, de um Laboratório de Ensaio e Verificação de Medicamentos e Substâncias Medicinais, o qual
entrou em funcionamento em 1942, sob direcção de José do
Fachada do Laboratório de Ensaio da CRPQF, em Benfica (anos 1940).
O GNIEF, por seu turno, teve como primeiros passos visíveis
a participação no referido Regulamento do Comércio dos
Medicamentos Especializados – para o que encetou negociações com o Grémio dos Armazenistas de Drogas, Produtos
Químicos e Farmacêuticos, o Grémio Distrital dos Proprietários de Farmácias e o Sindicato Nacional dos Farmacêuticos –, o registo de marcas na Repartição de Propriedade
91
Industrial e, sobretudo, a defesa de “um melhor e mais eficaz condicionamento da Indústria Farmacêutica, tendente a
contribuir para o seu aperfeiçoamento, evitando uma montagem inútil de novos laboratórios, a sua transferência para
a propriedade de empresas estrangeiras e o lançamento de
novos produtos, que, não correspondendo a uma verificada
necessidade, só servirão para alimentar uma concorrência
prejudicial”. Esta questão colocou-se logo em 1940, já que,
em Outubro daquele ano, a direcção do Grémio submeteu
ao Ministro do Interior um parecer que sintetizava a sua posição face a esta matéria:
A Direcção deste organismo corporativo é de parecer:
1.º – O fabrico em Portugal de medicamentos estrangeiros
ou de marca estrangeira que já tenham venda no País só
não prejudicará a indústria nacional se esta não fabricar
preparados similares ou não estiver apta a fabricá-los.
2.º – No caso de estar apta a fabricá-los, mas ainda os não
fabricar, só deverá ser concedida licença para o fabrico no
País de medicamentos estrangeiros quando a indústria nacional se desinteressar da concorrência, não se obrigando,
depois de consultada, a fabricá-los em um prazo a determinar, devendo, neste último caso, a licença ser concedida
por prazos limitados (não superiores a cinco anos), embora com a possibilidade de renovação.
92
No final da década, defendia o Grémio a imperiosa necessidade de regulamentar o Decreto-Lei n.º 29 337, de
1939 – que, como vimos, estabelecera o condicionamento da Indústria Farmacêutica –, legislação que considerava
“deficiente e incompleta” face à “evolução que a técnica e
o aperfeiçoamento industrial fizeram no segundo quartel
do presente século”. Foi precisamente nesse período, em
1949, que o GNIEF foi chamado a dar parecer sobre um
processo remetido ao Ministro do Interior pela Sociedade
Portuguesa de Produtos Wander, fundada em 1945 por
J. P. Beck e V. Chagas Franco, a qual “pretendia ser autorizada a «instalar um laboratório de medicamentos especializados farmacêuticos»” e a “«preparar no País os medicamentos de marca e patente suíças Wander»”. Apesar da
aguerrida oposição do Grémio, que considerava o referido
projecto uma “«audaciosa pretensão» do início da instalação entre nós da indústria estrangeira”, foi o mesmo aprovado, em Julho de 1949, pelo Subsecretário de Estado da
Assistência Social. Tal levou a direcção do GNIEF à realização de diversas audiências com o Ministro do Interior,
nas quais expôs “os inconvenientes económicos que para
a indústria nacional inexoravelmente advêm da instalação
da indústria estrangeira entre nós”. Goradas as expectativas, o Grémio conseguiu, no entanto, autorização para
“dar conhecimento às entidades interessadas dos documentos que constituem o processo de autorização”, o que
veio a concretizar em 1950, mediante a publicação de um
livro intitulado A Instalação do Laboratório Wander.
Associada ao condicionamento industrial estava a defesa
do condicionamento das especialidades farmacêuticas importadas, tida como premente em face da participação de
Portugal na Organização Europeia de Cooperação Económica, a qual deixava antever o fim das restrições administrativas à importação de medicamentos. Foi com tal propósito que, na segunda metade dos anos 1940, a Direcção do
Grémio se correspondeu, directamente, com o Presidente
do Conselho de Ministros, Oliveira Salazar. Além da referida questão, o GNIEF respondeu, também, à intervenção do
deputado José Martins de Mira Galvão (1887-1961), na Assembleia Nacional, que afirmara, em Dezembro de 1946,
que a Indústria Farmacêutica era “rica” e que “os lucros
auferidos pelos fabricantes de especialidades farmacêuticas são muito grandes”. Contrapôs o GNIEF:
Instalações dos Laboratórios Wander, em Cabo Ruivo (anos 1960).
O seu desenvolvimento [indústria farmacêutica] e evolução, nos últimos dez anos, é evidente, orgulhando-se de ter
prestado largo contributo à Economia Nacional. E, se lhe
forem dados os elementos de protecção necessários, a sua
quota parte será apreciável, quer na Economia, quer no
bom nome da produção científica em Portugal.
Pelo volume dos capitais investidos nesta indústria, pelo
número e qualidade dos elementos ao seu serviço, pela
soma das contribuições e impostos pagos ao Estado, pelos importantes subsídios que dá a outras indústrias, pelo
serviço que presta à saúde pública e, até, pelo serviço que
prestou durante a guerra contribuindo para o abastecimento do País em medicamentos – este sector da indústria
merece ser acarinhado pelos Poderes Públicos.
Outro elemento importante da actuação do GNIEF nesta
década foi a negociação, com o Sindicato Nacional dos
Ajudantes de Farmácia e Ofícios Correlativos dos Distritos
de Lisboa e do Porto, do Contrato Colectivo de Trabalho
na Indústria Farmacêutica, o qual entrou em vigor em Setembro de 1946. Considerava o Grémio, no seu relatório
da direcção de 1947, que, com tal acordo, “se elevou o
nível não só da prestação de trabalho pelos empregados e
assalariados, como também o da situação material de uns
e outros, sem prejuízo, e antes com manifesto benefício,
93
para os resultados práticos da exploração industrial”. O
GNIEF investiu também na propaganda da Indústria Farmacêutica. Nesse âmbito, realizou, logo em 1941, uma
campanha, tendo endereçado aos médicos portugueses
uma elucidativa circular sobre os propósitos da mesma:
[…] ousamos vir apelar para o patriotismo de V. Exa., solicitando-lhe que, sempre que o entender possível, dê preferência, no seu receituário, às especialidades nacionais
contribuindo, por essa forma, para dar trabalho a muitos
milhares de portugueses e evitando que saiam do nosso
País somas avultadíssimas, que, em benefício de todos,
aqui poderão ficar.
Esta campanha não terá sido alheia ao artigo que um
“Farmacópola” lograra publicar, em 10 de Fevereiro de
1940, no Jornal do Comércio e das Colónias, sob o esclarecedor título “Farmacopistas”. Referia-se o seu autor à
Indústria Farmacêutica como um “raquítico ramo de actividade nacional”, considerando que as especialidades farmacêuticas nacionais pecavam, “na sua maioria, pelo defeito da técnica de decalque, única que lhes é conhecida”
e por não terem, “na sua maior parte, o valor terapêutico
dos moldes estrangeiros, nem sequer se lhes [assemelharem] na eficácia que o doente ou o médico procuram”.
O GNIEF respondeu ao abrigo da lei de imprensa, tendo
a carta do seu presidente sido publicada a 12 de Março
de 1940. Bernardo A. Costa Simões deixava entender que
tal artigo fora obra de um “representante ou importador
de especialidades estrangeiras”, defendendo a indústria
nacional e apontando, simultaneamente, más práticas de
alguns laboratórios estrangeiros:
94
É também para estranhar que o mesmo senhor ignore, ou
finja ignorar, que cerca de 90% das especialidades que nos
vêm do estrangeiro são simples misturas de drogas, sem
qualquer dificuldade de preparação ou de inovação na téc-
nica farmacêutica. Deve saber também que um laboratório estrangeiro, acusado em tribunal do seu país de ter no
mercado um produto que não correspondia às indicações
do rótulo, se defendeu alegando que essa especialidade
não era para consumo interno, mas se destinava a ser exportado para Portugal, facto que veio relatado nos jornais
desse tempo.
O artigo não merecia referência se não estivesse eivado de
falsas afirmações, escritas com transparente má fé.
Em primeiro lugar, qualquer indústria, em qualquer país,
tem sempre produtos similares de outra indústria estrangeira; o que se pretende com as indústrias nacionais é
precisamente evitar a importação de produtos congéneres
e impedir, por essa forma, a exportação de ouro nacional.
Mas os laboratórios não se limitam a copiar o que a indústria estrangeira, algumas vezes com pouco escrúpulo, tem
enviado para Portugal: existem no mercado nacional especialidades originais e mesmo naquelas que o articulista
chama «decalques com defeitos de técnica» pode citar-se
o exemplo frisante dos solutos injectáveis de gluconato de
cálcio.
Em Maio de 1947, foi o Diário de Lisboa que publicou uma
série de três artigos sobre o “alto preço dos medicamentos
portugueses”, tendo como ponto de partida as exposições
que o deputado Artur Águedo de Oliveira (1894-1978)
apresentara na Assembleia Nacional sobre esta matéria.
A questão levantada nestas peças, não assinadas, era não
só de foro económico, mas também técnico, já que o seu
autor argumentava que os medicamentos manipulados,
preparados de forma personalizada pelos farmacêuticos,
por indicação dos médicos, eram, além de mais baratos,
superiores às modernas especialidades standardizadas
de origem industrial: “Hoje, as coisas passam-se de modo
diferente: fazem-se remédios em série, com composições
em série, que se receitam em série – processos que desprezam o indivíduo, tomando o todo, segundo escalas,
bitolas, gráficos, que, na grande parte dos casos, só em
Ficha de sócio individual do GNIEF: António Pereira Forjaz (1948).
teoria dão a média exacta de cada caso clínico”. Outra
questão abordada era a proliferação de especialidades,
com as consequentes dificuldades que tal colocava:
E aqui surge, portanto, o outro aspecto moral da questão:
não há conhecimento médico que abranja, por exemplo,
mais de uma centena de rótulos de cálcio; e não há farmácia que possa ter nas vitrinas tantos frascos de idêntico preparado. Por isso, a receita vai rolando, de bairros
mais distantes, até aos grandes magnates da Baixa que
são ao mesmo tempo armazenistas e, como tais, de tudo
dispõem. Nesta pesquisa angustiosa, de farmácia em farmácia, perdeu-se tempo, dinheiro – e quantas vezes a vida
do doente, se o caso não é de cálcio mas de coisa de aplicação mais urgente?
O GNIEF não só rebateu na Assembleia Nacional as
questões levantadas por Águedo de Oliveira, como reagiu
também aos artigos do Diário de Lisboa, cujos títulos, antetítulos e subtítulos eram notoriamente contrários aos
interesses da indústria: “Os remédios estão caros porque
se multiplicaram à roda da sua industrialização interesses
que é preciso restringir”; “As «especialidades farmacêuticas»: Os lucros fabulosos das indústrias e a via sacra do
doente que paga caros medicamentos baratos”. Na carta
que Luís Figueira endereçou, em representação do Grémio, ao referido jornal detecta-se, porém, uma tomada de
posição muito discreta: “aguardar que se pronunciem sobre o caso debatido os Poderes Públicos, em especial a
Assembleia Nacional”. Esta atitude foi mantida nos anos
imediatamente seguintes, revelando a direcção da GNIES,
no seu relatório de 1948: “A Direcção julgou dever manter-se alheia ao ataque [da imprensa], evitando entrar em
polémica, pois continua a não reputar vantajoso para a
defesa do bom nome da indústria este sistema”. A questão não ficou, porém, resolvida, pois, um ano volvido, em
Maio de 1949, foi o jornal O Século que, animado pela
95
96
intervenção do deputado João Cerveira Pinto (n. 1908) na
Assembleia Nacional, e pela contenda mediática entre o
deputado Manuel França Vigon (1906-1974) e o bastonário
da Ordem dos Médicos, Manuel Cerqueira Gomes (1894-1973), relançou para o debate público o elevado preço dos
medicamentos, pedindo a intervenção, neste âmbito, dos
poderes públicos.
Ainda relativamente ao GNIEF, esta década marcou a
filiação de várias farmácias e empresas proprietárias de
farmácias – as quais puderam ser associadas por terem
atingindo a revenda de especialidades em larga escala,
conforme previsto no artigo 10.º dos Estatutos do Grémio
– e também dos Laboratórios Pecus, que, ao abrigo de um
alvará emitido em Abril de 1949, iniciaram a produção de
“soros, vacinas e produtos similares para uso veterinário”.
O crescimento registado no número de associados permitiu ao GNIEF chegar ao final dos anos 40 com uma representação total de 100 laboratórios, os quais tinham à sua
disposição uma pequena sede que, desde 1942, se encontrava instalada – por acção de Cortez Pinto, então presidente da Associação Industrial Portuguesa – no edifício da
AIP, localizado na Avenida da Liberdade, em Lisboa.
Importa, ainda, referir que foi nos anos 40 que se constituiu o Grémio dos Armazenistas de Drogas e Produtos
Químicos do Norte, cujos estatutos foram aprovados em
Julho de 1942, entidade corporativa que representava os
armazenistas e importadores com actividade nos distritos
de Aveiro, Braga, Bragança, Coimbra, Guarda, Porto, Viana
do Castelo, Vila Real e Viseu. Três anos antes, em Maio de
1939, fora criado o Grémio dos Armazenistas de Drogas
e Produtos Químicos do Sul, que representava as empresas sediadas nos distritos de Beja, Castelo Branco, Évora,
Faro, Leiria, Lisboa, Portalegre, Santarém e Setúbal.
ANOS 1950: ENTRE O MINISTÉRIO DA SAÚDE
E A ACREDITAÇÃO PELA FDA
Marcados, mundialmente, pelo desenvolvimento da psicofarmacologia e dos corticosteróides, os anos 50 representaram, em Portugal, um maior investimento do Estado na
gestão do Sistema de Saúde Pública, o que ficou consubstanciado pela criação do Ministério da Saúde e Assistência –
mediante o Decreto-Lei n.º 41 825, de 13 de Agosto de 1958
–, cujas funções tinham sido anteriormente desempenhadas
pelo Ministério do Interior.
Pouco antes, começara a debater-se a reorganização da Indústria Farmacêutica, processo que teve início em Junho de
1957, quando o GNIEF organizou uma série de colóquios em
que participaram representantes da indústria e da CRPQF.
Da parte do Governo, a motivação de fundo era a redução
do preço dos medicamentos, preconizando-se, para o efeito,
a concentração industrial como via para uma produção em
maior escala, mais económica e em melhores condições. A
indústria, por seu turno, via a reorganização como pertinente
e actual em função, entre outros factores, da rápida evolução
das técnicas e dos meios de produção, do desenvolvimento
inédito da investigação científica aplicada ao sector, da crescente democratização do medicamento industrializado e da
formação de um mercado comum europeu – no âmbito da
fundação, em 1957, da Comunidade Económica Europeia
– possuidor de um nível técnico e económico superior ao
nacional. Um dos industriais que participou activamente no
debate desta questão foi Manuel Adriano Mourato Vermelho,
que, em Julho de 1957, publicou, numa separata da Revista
Portuguesa de Farmácia, a sua «Contribuição ao estudo para
reorganização da Indústria Farmacêutica Portuguesa». Entre
outros pontos, defendia este farmacêutico a constituição de
agrupamentos empresariais coordenados pelo GNIEF, no âmbito dos quais se procederia à redução de marcas e produtos
similares, à normalização das embalagens e à diminuição
“voluntária e gradual” do número de unidades fabris.
A ambicionada reorganização foi sediada, governamentalmente, numa comissão criada, para o efeito, pela Portaria
n.º 17 147, de 2 de Maio de 1959, a qual se encontrava
colocada na dependência da Direcção-Geral dos Serviços Industriais do Ministério da Economia. Seria, contudo, necessário esperar pelos anos 60 para que surgissem os primeiros
resultados desta unidade de missão.
Ao nível da actividade industrial, o panorama era cada vez
mais marcado pela preponderância dos modernos laboratórios face às farmácias de oficina. De facto, dos 90 preparadores nacionais inscritos no GNIEF, em 1954, a maioria (59)
era laboratórios detidos por sociedades comerciais e os restantes (31) eram propriedade de farmácias, empregando, no
total, cerca de 4300 pessoas e apresentando um valor global
de venda ao público de, aproximadamente, 315 milhões de
escudos. Esta nova realidade foi descrita por Carlos Silveira
e Manuel Mourato Vermelho, no artigo “Apontamentos sobre
o exercício da profissão farmacêutica em Portugal e no Estrangeiro”, publicado, em 1959, numa separata da Revista
Portuguesa de Farmácia:
“[…] um laboratório da indústria farmacêutica constitui
hoje um todo complexo cuja direcção ultrapassa a competência de um só técnico especializado, havendo que, para o
dirigir, constituírem-se equipas de técnicos especializados,
de que o farmacêutico fará naturalmente parte tal como o
médico, o químico, o engenheiro, o farmacologista e tantos
outros.
[…]
Para desempenharem convenientemente a sua missão, tais
laboratórios precisam de largas somas de capitais constituindo empresas de grandes dimensões. Em geral, só sociedades anónimas consentem a sua realização.
A indústria nacional continuava, porém, a sofrer de várias
condicionantes, como apontou a CRPQF em relatório de
1956. Desde logo, “a sua dispersão por grande número de
pequenos laboratórios sem a necessária especialização e,
em alguns casos, carecendo até de uma organização técnica adequada, aliada à ausência de uma séria investigação
científica”, o que não invalidava a existência de “umas tantas unidades modernas que meritoriamente se esforçam por
acompanhar a evolução dos processos de trabalho que correntemente se verificam nos laboratórios estrangeiros”. Por
outro lado, detectava-se, em grande parte, a “dependência
dos fornecimentos estrangeiros, não só da especialidade
farmacêutica, produto de alta e cara investigação científica
[…], mas também até do medicamento banal, que poderia,
ou melhor, que já é capazmente fabricado no País, mas em
que o público ou o médico muitas vezes pouco acredita”.
A indústria nacional era, também, penalizada pela “gama
de variedades de medicamentos que correm e que em impetuoso afluxo se lançam no mercado”, questão entendida
como podendo contribuir “para que o avanço quantitativo se
faça à custa do qualitativo”. Finalmente, e de extrema importância, uma “outra circunstância desfavorável, mas cuja
responsabilidade não pode ser imputada ao sector […], é a
ausência de uma indústria químico-farmacêutica nacional”,
argumentando a CRPQF que um “País que não disponha de
um certo número de indústrias químicas não pode alimentar
esperanças de criar verdadeiros laboratórios de especialidades farmacêuticas que, no essencial, o ponham a coberto da
dependência dos mercados fornecedores estrangeiros”.
Neste enquadramento, foram fundados, na presente década, vários laboratórios nacionais, nomeadamente os Novil
(constituídos em 1950 por Henrique António Rodrigues, proprietário da Farmácia Novil), a Labesfal (1951), a Iberfar (que
97
iniciou a sua actividade industrial em 1951, sendo detida pela
firma Ferraz Lynce, S.A., estabelecida em 1924 como agente
da empresa alemã Boehringer Mannheim), a Edol (1952), a
Confar – Consórcio Farmacêutico, Lda. (fundada, em 1954,
por João Afonso Tavares e Alberto Rodrigues), a Produfarma,
Lda. (criada, em 1955, por Luís Alexandre Branquinho e Laura de Jesus Henriques Lucas), a Basi (1956), os Laboratórios de Investigação Técnica – Laquifa (1956) e os Laboratórios Dávi, estes últimos estabelecidos em meados de 1950,
quando Manuel Rasoilo Cristiano adquiriu a Farmácia Jaime
José da Costa, alterando o seu nome para Farmácia Dávi.
Laboratórios Atral (1958).
Laboratórios Novil.
98
Um caso à parte, porque atípico, foi o estabelecimento
da Hovione em Portugal, fundada em 1959 por três refugiados húngaros – Ivan Villax (e a sua mulher, Diane Villax),
Nicholas de Horthy e Andrew Onody –, de cujos apelidos
(Horthy, Villax, Onody) esta empresa derivou a sua denominação.
Além dos referidos, encontravam-se em funcionamento
outros laboratórios cuja data de criação se revela difícil de
determinar, tendo ocorrido, previsivelmente nos anos 50:
Asclepius (Lisboa), Profinal (Porto), Nostrum (Aveiro) e Efil
(Estoril). É ainda de referir que, em 1958, as instalações
fabris dos Laboratórios Atral foram aprovadas pela Food
Edifício do Instituto Pasteur de Lisboa, na Avenida Marechal Gomes da Costa (1971).
and Drug Administration (FDA), o que abriu as portas à exportação para os Estados Unidos, via ilhas Virgens, de importantes quantidades de produtos semiterminados desta
empresa. Neste mesmo ano, ganhou o prestigiado Prémio
Valmor o novo edifício dos laboratórios do Instituto Pasteur
de Lisboa, projectado pelo arquitecto Carlos Manuel Ventura Ramos (1922-2012).
Os Laboratórios Vitória tiveram também uma boa prestação comercial nesta década, tendo lançado, entre outros
antibióticos, a Ebercina (cloroanfenicol), a Biocina (com
base na estreptomicina), a Penil-Estreptomicina (associação de penicilina e estreptomicina), a Bronco-Penil e a Bi-Estreptomicina. E se a sucessiva diminuição do preço de
venda ao público dos antibióticos se agravou no final da
década, tal quebra foi, todavia, compensada pelo aumento
das exportações para Países tão díspares como o Vietname, a Arábia, as Honduras, S. Salvador, a Grécia e o Peru.
Por outro lado, foram estabelecidos importantes contratos
com laboratórios estrangeiros, nomeadamente a Rhône-
-Poulenc, com vista à preparação nacional dos seus produtos, o que implicou novos investimentos na modernização
e no apetrechamento das unidades de produção, tendo levado à construção de um novo edifício contíguo aos já existentes. Os Laboratórios Vitória beneficiaram, também, do
fim do Instituto Nacional Bioterapêutico – Bioter, Lda., o
qual, numa acção litigiosa que perdeu por incumprimento
contratual, se viu obrigado a entregar-lhes a sua unidade
industrial, a maquinaria e os direitos industriais.
Facto iniludível foi a eclosão, nos anos 50, de um primeiro surto de estabelecimento de sucursais portuguesas
pelas multinacionais farmacêuticas. Contavam-se entre essas os Laboratórios Lepetit (empresa italiana representada
em Portugal pela Soc. Química Lepetit, Lda.), a Química
Hoechst, Lda., a Abbott Laboratórios, Lda., os Produtos
Sandoz, Lda., a Hubber Farmacêutica Portuguesa, Lda., a
OM Portuguesa e a Pfizer Portuguesa, sociedade esta que
já se encontrava anteriormente representada em Portugal,
tendo criado, em 1955, os prémios Pfizer. Outros laborató-
99
Sede da Pfizer, em Lisboa (anos 1960).
Sede da Lepetit, em Lisboa (anos 1960).
100
Sede da Química Hoechst, Lda., em Lisboa (anos 1960).
rios estrangeiros mantinham, apenas, presença indirecta,
sendo representados por firmas portuguesas, destacando-se a Abecassis (Irmãos) & C.ª, que comercializava especialidades produzidas, entre outros, pela Lederle, pela
Schering Corporation (Americana) e pela Winthrop
Products, e a Crocker Delaforce & CIA, SARL, que representava a Merck, Sharp & Dohme.
A robustecida presença internacional veio agravar a concorrência, que era crescente, tal como testemunha o relatório de 1954 da Sociedade Industrial Farmacêutica (Laboratórios Azevedos): “No decorrer do Exercício findo houve
que enfrentar as mesmas dificuldades dos anos anteriores,
avolumadas pelos desvarios duma concorrência comercial
ainda mais impiedosa”. Agravou também o elevado número de medicamentos especializados, que, de acordo com
um relatório da CRPQF, se cifrava, em 1956, em 22 846
fármacos, dos quais cerca de 30% eram importados. A
proliferação de especialidades conduziu, aliás, ao início
da publicação, nesta década, do Simposium Terapêutico:
Enciclopédia de Especialidades Farmacêuticas, tal como se
depreende do texto que os respectivos editores publicaram
na primeira edição, em 1956:
O número sempre crescente de especialidades farmacêuticas existentes no nosso País atingiu uma cifra de tal modo
elevada que se impunha, por manifesta necessidade, a
existência de um elemento informativo claro e fidedigno,
que junto de médicos e farmacêuticos facilitasse o trabalho árduo do receituário para os primeiros e a efectivação
do mesmo, para os segundos.
Esta publicação anual dá-nos, por seu lado, uma perspectiva bastante aproximada do que foi a evolução quantitativa
dos laboratórios nos anos 50. Se, na edição de 1956, estavam inscritos 47 nacionais e 64 estrangeiros, em 1957,
eram já 69 nacionais e 116 estrangeiros, a esmagadora
maioria sediada em Lisboa, e, em 1958, ambos ascendiam,
respectivamente, a 85 e 184 laboratórios.
Que a questão, em concreto, da proliferação de medicamentos preocupava a indústria nacional, prova-o o artigo
que Alberto Mourato publicou, em 1954, numa separata da
Revista Portuguesa de Farmácia, intitulado “Aspectos da Indústria Farmacêutica Nacional: Sugestões para o Condicionamento das Especialidades Farmacêuticas”. Segundo este
autor, a “falta de critério no lançamentos das especialidades
farmacêuticas” tinha gerado uma situação inconveniente e
marcada pela “Abundância de marcas e a Inexistência ou
insuficiência de «controle»”. Tal problema tinha já sido apontado pela imprensa dos anos 40, mas era agora visto pela
perspectiva da indústria:
Os inconvenientes desta situação são grandes e tendem a
acentuar-se. Do primeiro aspecto, a abundância de marcas, resultam os seguintes: Os médicos vêem-se impossibilitados de conhecer todos os produtos que a indústria lhes
oferece e nem podem seleccionar os de maior interesse. Os
laboratórios industriais vêem-se forçados a fabricar uma
grande variedade de produtos de pouca venda, com grande
aumento de trabalho e despesas de estudo e propaganda,
sem que recebam compensação material para o seu esforço. As farmácias são prejudicadas no seu comércio, pois
não conseguem abastecer-se de todos os produtos existentes no mercado, e são obrigadas, além disso, a empregar
uma parte considerável dos seus lucros na aquisição das
novas especialidades.
Do segundo aspecto da situação, a insuficiência de «controle», resultam inconvenientes cuja gravidade pode ser
maior ou menor mas que, em todos os casos, são grandes,
como seja a preparação e venda de produtos nem sempre
bem realizados.
Atento a esta problemática, o GNIEF efectuou ao mais
alto nível governamental a defesa da indústria nacional
e do condicionamento das especialidades estrangeiras,
para o que o Governo não dispunha, porém, de instru-
101
102
mentos legais adequados. Foi com esse propósito que, em
Setembro de 1954, o Grémio realizou uma “exposição,
muito circunstanciada”, ao Presidente do Conselho, invocando o princípio da preferência pelos produtos nacionais
que se encontrava consagrado no Decreto n.º 22 037, de
27 de Dezembro de 1932. Além de assinalar a “assustadora evolução da venda, entre nós, dos medicamentos estrangeiros, desde o ano de 1940, em que fora de
64 468 785$60, até ao de 1952, em que atingira a cifra de
28 949 0260$00!”, rogava-se “que fossem adoptadas as
providências necessárias para a justa e pronta solução
deste momentoso problema – de tão grande repercussão,
quer na nossa indústria, quer na Economia Nacional”.
Foi, pois, com “prazer” que o GNIEF acolheu a criação da
Comissão Técnica dos Novos Medicamentos (CTNM), instituída mediante o Decreto n.º 41.448, de 18 de Dezembro
de 1957, com o objectivo de resolver muitos dos inconvenientes elencados pela indústria e não só. Colocada na
dependência da Direcção-Geral de Saúde (DGS), a CTNM
deu corpo ao primeiro verdadeiro sistema de autorização
de medicamentos no País, o qual implicou que os laboratórios passassem a depender de três entidades distintas
para o lançamento de novos produtos: a DGS, que procedia à autorização da introdução dos medicamentos, a
CTNM, que emitia um parecer técnico em função da avaliação segundo critérios farmacológicos, terapêuticos e económicos, e a CRPQF, que aprovava os respectivos preços
de venda. Refira-se que esta Comissão era pluridisciplinar,
sendo composta pelo Director-Geral de Saúde, que presidia
à mesma, por um representante da CRPQF, por um médico
indicado pela Ordem dos Médicos, por um Professor ou
Assistente da Faculdade de Farmácia ou de uma das Escolas de Farmácia, por um Professor ou Assistente da uma
das Faculdades de Medicina e por um Farmacêutico indicado pelo Sindicato Nacional dos Farmacêuticos.
Laboratório Normal.
O próprio GNIEF registou importantes desenvolvimentos
nos anos 50. De facto, logo no primeiro ano da década,
passou por uma importante remodelação, com a criação de
oito secções: antibióticos; sulfonamidas; vitaminas; opoterápicos e hormonas; soros e vacinas; dietéticos; produtos
para uso veterinário; medicamentos galénicos e outros. O
objectivo era, como ficou patente no Relatório e Contas da
direcção de 1950, “a obtenção de um meio expedito que
mantivesse assíduo e estreito contacto entre os industriais
e a Direcção”. A cada uma destas secções foram atribuídas
as seguintes responsabilidades:
a) estudar, relatar e dar parecer sobre todos os assuntos
que a Direcção lhe cometa;
b) propor à Direcção a adopção de quaisquer normas que
sejam de interesse para o respectivo sector industrial;
c) acompanhar e estudar a movimentação e desenvolvimento da actividade comercial dos seus componentes, de forma a evitar que entre si façam concorrência
desleal, designadamente através do aviltamento de
preços;
d) defender os legítimos interesses e direitos dos seus
componentes;
e) promover e realizar os inquéritos e estudos que foram
determinados pela Direcção;
f) desempenhar quaisquer outras funções que lhe forem
cometidas pela Direcção.
A secção de antibióticos interveio logo em 1952, data
em que o Ministério das Finanças, através do Decreto n.º
38 791, de 21 de Junho, criou um novo regime aduaneiro
para os antibióticos estrangeiros, o qual o GNIEF considerava estar em “acabada colisão com os legítimos direitos e interesses do sector da indústria nacional de medicamentos
especializados que prepara produtos cujo princípio activo é
Laboratório Normal.
um antibiótico”. A questão de fundo, para a indústria, era
que tal decreto determinava que “o medicamento especializado estrangeiro e a matéria-prima para o medicamento
especializado manipulado em Laboratórios nacionais – paguem agora os mesmos direitos”, razão pela qual o Grémio
pediu a reposição da anterior pauta aduaneira, estabelecida
pelo Decreto n.º 37.977, de 21 de Setembro de 1950.
Além das já referidas questões, e das preocupações com
o impacto exercido na indústria pelo sistema de fornecimento de medicamentos aos Serviços Médicos-Sociais
das Caixas de Previdência, a acção do GNIEF, crescentemente mais complexa, centralizou-se, ao longo da década,
em quatro áreas fulcrais: condicionamento da indústria
de especialidades farmacêuticas, patentes, regulamentação das amostras e propaganda da Indústria Farmacêutica. De entre estas questões, mereceu especial atenção
103
o novo regime de condicionamento, estabelecido mediante os Decretos n.º 2052, de 11 de Março de 1952, e n.º
39 633, de 5 de Maio de 1954, com o pressuposto do
sector “só comportar um número reduzido de empresas em
condições óptimas de produção”. Em duas exposições que
dirigiu ao Governo, a Direcção do Grémio defendeu a necessidade de introduzir alterações no referido diploma – para
cuja elaboração não fora ouvido –, muito especificamente
no art.º 18.º, referente às “autorizações para montagem,
renovação ou substituição de equipamento fabril ou industrial”. Neste mesmo ano, e no âmbito do condicionamento
em vigor, foi o GNIEF chamado a pronunciar-se sobre um
projecto para a instalação em Portugal de uma fábrica de
antibióticos promovida por um grupo holandês, para o que
decidiu ouvir, mediante inquérito, os agremiados preparadores de antibióticos. A resposta que o Grémio endereçou
à Direcção-Geral dos Serviços Industriais (DGSI) passou
não só pela rejeição da referida unidade industrial, mediante “dados objectivos e ponderosos”, mas também pela
expressão do “desejo sincero” e da “possibilidade real dos
Laboratórios nacionais porem de pé uma unidade industrial portuguesa produtora de antibióticos. A direcção do
GNIEF iniciou, desde logo, contactos internacionais com
vista à criação da referida fábrica, tendo, em articulação
com a DGSI, dialogado com empresas dinamarquesas, norte-americanas e espanholas. O processo foi, porém, interrompido “quando um laboratório nacional informou estar
de posse de uma nova técnica, altamente eficiente e muito
mais económica, para o fabrico de antibióticos”, como se
revelava no Relatório e Contas da Direcção de 1954.
A década de 1950 trouxe, também, para o debate a questão das patentes. A visão do GNIEF sobre esta questão encontra-se explicitada no Relatório e Contas da Direcção de
1957:
104
Ensinados por uma experiência que nós ainda não aprendemos, os grandes gigantes industriais não tardaram a
estabelecer, à escala mundial, uma política comum, cujos
traços fundamentais são os seguintes: segurar em suas
mãos o processo geral da produção, da matéria prima ao
produto acabado, defendendo-o com patentes que lhes assegurem o exclusivo comercial das vendas e lhes garantam
a absorção dos lucros integrais das diversas fases de produção; especializar cada uma delas em linhas coerentes
de fabrico, que as defenda de uma concorrência infrutífera
entre si.
E desta maneira, nos últimos dois ou três anos, foi o nosso
país invadido por pedidos de patentes de invenção, na sua
maioria desprovidos de um mínimo de condições legais,
ou então, mesmo quando as possuíam, destinados não a
obter um exclusivo de fabrico mas a obter um monopólio
comercial. Esta transgressão do fim da lei é de tal maneira
flagrante que não podemos deixar de chamar para ela a
maior atenção das repartições portuguesas sobre que recai a responsabilidade da sua apreciação.
O nosso clamor parece-nos tanto mais justificado quanto
é certo dever reunir-se em 1958 o Congresso Internacional
de Marcas e Patentes, em Lisboa, e tudo indicar que os
países industriais mais evoluídos pretendem modificar a lei
portuguesa em sentido que lhes seja ainda mais favorável.
Não pode também ser ignorada, na acção do Grémio, a
questão das amostras, a qual remontava à década anterior,
tendo levado o GNIEF a colaborar com o Grémio Nacional
das Farmácias para “ser feita, junto da Exma. Classe Médica, uma diligência no sentido de se tentar pôr cobro aos
graves abusos que neste domínio se têm verificado e se
acentuam cada vez mais”. O citado relatório resumia assim esta problemática:
É do conhecimento geral que a Farmácia portuguesa luta
com dificuldades de vária ordem – a que ainda não foi possível prestar uma solução decisiva. Parte dessas dificuldades,
porém, parece relacionar-se com o facto dos laboratórios
excederem largamente os limites razoáveis da distribuição
de amostras dos seus preparados, verificando-se que doen-
Registos de patentes dos Laboratórios
Atral-Cipan (anos 1970).
105
tes de todas as categorias sociais se aproveitam abusivamente das facilidades encontradas na obtenção de uma
amostra que substitua a embalagem receitada.
Também a Exma. Classe Médica, incomodada por uma
legião crescente de doentes, conhecidos e amigos, que
transformaram o significado da amostra para ensaio clínico num abuso que atinge proporções que se torna necessário refrear, se mostra interessada num movimento
colectivo que ponha cobro à liberalidade excessiva de certos laboratórios.
106
Finalmente, a Direcção do GNIEF continuou, nos anos
1950, a investir na propaganda do sector, elevando-a a novos patamares. Com o objectivo de “mostrar a importância e a perfeição da nossa indústria”, decidiu, por volta
de 1950, realizar um filme sobre “a vida dos laboratórios
portugueses”, o qual recebeu o título Ao Serviço da Saúde –
A Indústria Portuguesa de Medicamentos Especializados. Para
a sua realização, foi convidado Sousa Pimentel, tendo a
estreia do filme ocorrido em 1951 num dos principais cinemas da capital, a que se seguiu um périplo pelas províncias. Este projecto não pode ser desligado das críticas que
a imprensa continuou, nos anos 1950, a dirigir, ainda que
pontualmente, à Indústria Farmacêutica. Afirmava-se, a
este propósito, no Relatório e Contas da Direcção de 1957:
“O assunto é velho e apresenta-se sob o mesmo aspecto
de sempre: medicamentos a mais, medicamentos caros, medicamentos falsificados”. “[…] ainda não foi possível encontrar uma forma de reacção adequada a estas campanhas,
quase sempre marcadas com o sinal da irresponsabilidade”. Também Luís da Silva Carvalho, Director Técnico dos
Laboratórios Atral, se manifestou publicamente sobre as
notícias negativas veiculadas pela imprensa durante esta
década, nomeadamente pelo Diário Ilustrado, tendo, em
1959, publicado, em separata da Revista Portuguesa de
Farmácia, um artigo intitulado «A Indústria Farmacêutica
Nacional». Referia o autor:
A indústria farmacêutica nacional representa hoje uma
força enorme no concerto da economia da Nação e uma
posição de prestígio no campo das realizações técnicas do
País.
Milhares de pessoas de todas as categorias sociais, desde
a simples empregada até aos técnicos de diversa natureza
(farmacêuticos, médicos, químicos, engenheiros, veterinários, etc.), trabalham nesta indústria, representando muitas famílias que vivem desta já vultuosa actividade.
A par desta importância económica que ocupa e que deve
ser considerada quando a ela se façam referências, procura a indústria farmacêutica nacional trabalhar em condições de seriedade que devem merecer respeito a todas as
pessoas esclarecidas e conscientes.
Não obstante tudo isto constituir uma verdade evidente,
certas pessoas, não suficientemente esclarecidas, não deixam de denegrir esta indústria e, concomitantemente, o
bom nome dos profissionais que nela laboram, atingindo,
igualmente, em última análise, o prestígio pátrio, todas as
vezes que a elas se referem.
A insistência com que o facto se está a assinalar é deveras
preocupante e inadmissível.
Dois eventos houve, porém, nesta década, através dos
quais a indústria do medicamento pôde melhorar a sua
imagem pública. O primeiro foi o 2.º Congresso Luso-Espanhol de Farmácia, que decorreu, em Maio de 1952,
na Faculdade de Farmácia do Porto (FFP). A indústria esteve representada na quarta secção – Farmácia galénica
e Indústria Farmacêutica –, tendo-se destacado, entre as
comunicações apresentadas, a de Silvina Fontoura de Carvalho, Directora da revista Eco Farmacêutico, com o título
«Definição Legal de Especialidade Farmacêutica». Concluiu
a autora, após uma significativa revisão bibliográfica, pela
seguinte formulação: “Especialidade Farmacêutica é todo o
produto de acção medicamentosa, simples ou composto,
cuja preparação apresente inovação de ordem científica ou
técnica, sem similares até então conhecidos e resultantes
do estudo, investigação e trabalho do farmacêutico que o
elabore e acondicione em embalagem própria, com nome
Stand dos Laboratórios da Farmácia Barral na Feira das Indústrias (1957).
e marca privativos”. No âmbito deste congresso, decorreu,
ainda, uma exposição histórico-bibliográfica e da Indústria
Farmacêutica, tendo esta última sido realizada no corredor
central da FFP, no qual foram dispostos mostruários de diversos laboratórios da Indústria Farmacêutica portuguesa
– tendo participado, entre outros, a Companhia Portuguesa Higiene, Laboratórios Vitória, Instituto Luso-Fármaco,
Laboratório Saúde, Laboratório Únitas, Cortez Pinto & Pimentel, Lda., Laboratório Zimaia e a Sociedade Industrial
Farmacêutica – e também do GNIEF.
Alguns laboratórios nacionais participaram, cinco anos depois, na Feira das Indústrias Portuguesas, realizada, entre 26
de Maio e 16 de Junho de 1957, na Feira Internacional de
Lisboa. Estiveram presentes, entre outros, o Instituto Pasteur
de Lisboa, os Laboratórios Dávi, os Laboratórios Novil e os
Laboratórios da Farmácia Barral.
Exposição da indústria farmacêutica no II Congresso Luso-Espanhol de Farmácia, vendo-se
à direita o painel do GNIEF (1952).
107
Ainda relativamente ao GNIEF, no que concerne à sua
vida interna, chegou o mesmo ao final dos anos 50 com
126 associados e com sede própria, localizada no n.º
31 da Rua Camilo Castelo Branco, para onde se mudou
em 1956, beneficiando da proximidade geográfica com a
CRPQF, esta sediada na Rua Barata Salgueiro. Ao Grémio,
foram também atribuídas, contra a sua vontade, competências disciplinares, impostas pelo Decreto n.º 41 204, de
24 de Julho de 1957, o que o obrigou a aplicar sanções a
alguns laboratórios que transgrediram o Regulamento do
Comércio dos Medicamentos Especializados.
rios ATRAL, empresa líder de um grupo de expressão internacional presidido por Sebastião Alves, ao qual pertencia
a CIPAN. No seu conjunto, as instalações fabris do grupo
Atral-Cipan ocupavam uma área coberta de 32 mil metros
quadrados, com uma capacidade de produção de cerca de
350 mil contos anuais, contemplando, ainda, um infantário,
uma escola, uma cantina com capacidade para mais de 500
pessoas e um bairro habitacional com 150 fogos destinados
aos trabalhadores, o qual foi edificado nos anos 70.
ANOS 1960: DESENVOLVIMENTO, EXPORTAÇÃO
E ESBOÇO DE REORGANIZAÇÃO
108
Os anos 1960 abriram, no que concerne à Indústria Farmacêutica nacional, com a inauguração, na Vala do Carregado,
do complexo fabril da CIPAN – Companhia Industrial Produtora de Antibióticos, ocorrida oficialmente em Outubro
de 1965, fruto de um investimento global de cerca de 70
mil contos, muito embora a produção se tivesse já iniciado
cerca de um ano antes. Fundada em 1963, na sequência
de experiências realizadas numa fábrica-piloto adquirida
em 1956, a actividade da CIPAN centrava-se “no fabrico
de antibióticos de larga escala bacteriana, nomeadamente
a tetraciclina, a oxitetraciclina, a clorotetraciclina, a eritromicina e respectivos sais”. Cerca de 30% da produção
destinava-se à exportação, a granel, para diversos Países,
nomeadamente os EUA – tendo as instalações fabris da
CIPAN sido aprovadas pela Food and Drug Administration
–, África do Sul, Austrália, Espanha, Holanda, Inglaterra,
Turquia e Vietname do Sul. Neste mesmo conjunto industrial, integrava-se, também, a futura fábrica dos Laborató-
Sebastião Alves durante o discurso de inauguração da Cipan (1965).
Panorâmica do complexo fabril da Atral-Cipan, na Vala do Carregado (anos 1960).
Ao nível fabril, merece também destaque a mudança dos
Laboratórios Azevedos para as modernas e amplas instalações da Portela da Ajuda, ocorrida em 1963, e a sua gradual aposta na produção local para conceituadas marcas
estrangeiras, nomeadamente a Schering AG e a E. Merck.
Igualmente importante foi a inauguração, em 1968, das
fábricas da Medicamenta e da Pfizer (Coina) e o arranque
do complexo industrial da Hovione, instalado em Loures a
partir de 1969, mas que somente em 1970 iniciou as actividades de produção. Já entre as sociedades criadas nesta década, destacaram-se o Laboratório Mundial (1960),
Manuel Ferraz da Costa com funcionárias na inauguração da fábrica da Iberfar (1965).
a Euro-Labor, a Iberfar (1965), a Crefar (1965), a Seber
Portuguesa (1967), a Farmofer (1967) e a Tecnifar (1969),
esta última inicialmente ligada ao Instituto Luso-Fármaco
e à Medicamenta. Ainda que a braços com algumas debilidades crónicas, nomeadamente a dificuldade de obtenção
de patentes e de matérias-primas novas, a crescente concorrência estrangeira e a falta de adequação das indústrias
subsidiárias às exigências de qualidade, a Indústria Farmacêutica nacional registou, nos anos 60, uma taxa média
anual de expansão de cerca de 13,5%, representando cerca
de 1% do Produto Interno Bruto. Uma parte significativa
deste contributo para a economia nacional, cerca de 12%,
era proveniente da exportação, que aumentou fortemente.
Com efeito, nesta década os medicamentos portugueses
chegavam já a cerca de 60 Países, podendo identificar-se
três grupos bem distintos de mercados-alvo. O primeiro,
e mais importante porque com maior volume de vendas,
era formado pelo Reino Unido, E.U.A. e Holanda. O segundo, com menor volume, integrava, entre outros, o Japão, a
França, a Alemanha Ocidental e a Grécia. No último grupo
encontravam-se Países como o Líbano, o Vietname do Sul, a
Suécia, Israel e a Argentina. Também os Países do Ultramar
eram muito significativos como mercados de exportação,
representando, em 1969, cerca de 12% e tendo registado,
a partir de 1967, uma taxa de crescimento de dois dígitos.
A actividade exportadora da Indústria Farmacêutica nacional deparava-se, porém, com alguns problemas, nomeada-
109
John E. Mcken (Presidente da Pfizer Inc.) e comitiva observam a maqueta do complexo industrial e administrativo
da Pfizer, por ocasião da cerimónia de lançamento da primeira pedra dos futuros edifícios. (Coina, Janeiro de 1966).
110
mente a dificuldade de prospecção de novos mercados, o
que se devia à falta de quadros especializados e de fundos
para o efeito, a dificuldade em obter seguros de crédito à
exportação em condições vantajosas e a existência de um
tecido empresarial fragmentado e composto por unidades
de reduzida dimensão.
Os anos 1960 ficaram também marcados pela entrada
em Portugal dos grandes laboratórios estrangeiros, alguns
dos quais tinham estado presentes através de representantes, mas passaram a operar com sucursais próprias
criadas para o efeito. Assim sucedeu com a Lilly – que, em
1964, entrou no mercado nacional através da linha de produtos de cosmética Elizabeth Harden –, a Beiersdorf Portuguesa, a Boehringer-Ingelheim, Lda. (C. H. Boehringer
Sohn, Lda.), a Farmacêutica Knoll Portuguesa, os Laboratórios Roussel, Lda., a Sterling Farmacêutica Portuguesa,
os Laboratórios UpJohn, Co., a Merck Portuguesa, Lda., a
Schering Lusitana – representante da Schering AG, tendo,
em 1963, lançado no mercado nacional a primeira embalagem de pílula contraceptiva (Anovlar 21) –, a Inibsa Portuguesa Químico-Farmacêutica, Lda. e a Gist Brocades (que,
em 2005, passou a denominar-se Astellas Farma, Lda.,).
Algumas destas empresas, e também as já anteriormente
implantadas no País, investiram na investigação científica,
como foi o caso da Hoecht, que,em 1968, em parceria com
a Sociedade Portuguesa da Cardiologia, instituiu o «Prémio Hoechst de Cardiologia».
O facto porventura mais importante da década de sessenta foi o estudo da reorganização da Indústria Farmacêutica, iniciado, como vimos, nos anos 1950, mas prejudicado
por sucessivos atrasos, pois a comissão nomeada para o
efeito pela Portaria n.º 17.147, de 2 de Maio de 1959, teve
breve e infrutífera existência e a designada pela Portaria
n.º 18.947, de 12 de Janeiro de 1962, não chegou a ser
empossada. O processo só arrancou verdadeiramente em
1965, data em que uma Portaria conjunta do Ministério
da Economia e do Ministério da Saúde e Assistência, publicada em 30 de Junho, ordenou a constituição de uma
nova “comissão para proceder ao estudo da reorganização
da indústria de produtos farmacêuticos”. Integravam este
organismo, presidido por Rui da Fonseca Garcia Pestana,
auditor jurídico junto da Presidência do Conselho, representantes de cinco entidades: Serviço Técnico do Exercício
de Farmácia e Comprovação de Medicamentos, Instituto
Nacional de Investigação Industrial, Comissão Reguladora
dos Produtos Químicos e Farmacêuticos, laboratórios farmacêuticos dos serviços hospitalares e industriais de especialidades farmacêuticas. Participaram também, como
agregados, representantes das farmácias preparadoras de
produtos especializados, do Ministério do Ultramar e do
Ministério das Corporações e Previdência Social.
O relatório resultante desta comissão foi entregue em
1966 e publicado um ano depois, sistematizando bem as
diversas dificuldades, endógenas e exógenas, que se colocavam então à Indústria Farmacêutica nacional:
a) Acentuada dependência do estrangeiro, no que se refere a elevada percentagem das matérias-primas que
utiliza;
b) Larga dependência de firmas estrangeiras, quanto às
patentes necessárias para produção de muitas especialidades;
c) Dispersão da produção por um grande número de unidades, com dimensões e condições tecnológicas muito diferenciadas e níveis de custo muito diferenciados,
mas geralmente bastante elevados;
d) Produções pulverizadas por grande número de fórmulas, deficientemente racionalizadas, com evidente
influência numa elevação e distorção dos respectivos
custos;
111
Capa do relatório da Comissão Reorganizadora da Indústria dos Produtos Farmacêuticos.
112
e) Deficiência de equipamento conveniente, pela carência dos investimentos necessários e pela sua não rentabilidade em virtude da falta de racionalização das
produções e consequente diminuto volume destas;
f) Dificuldade de recrutamento de pessoal técnico nos
vários sectores e graus de especialização exigidos,
pela falta de técnicos necessários, em número e em
qualidade;
g) Insuficiência da actividade de investigação científica,
manifesta no que se refere à descoberta de novos produtos, e ainda acentuada, nalguns sectores da produção, quanto ao progresso da tecnologia dos fabricos
e seus controlos;
h) Insuficiente garantia da boa qualidade dos medicamentos, nalguns sectores da produção;
i) Mercado muito heterogéneo e oscilante, com grande
dificuldade de fixação de critérios que se adaptem de
forma satisfatória às condições da procura;
j) Forte e agressiva concorrência dos importadores de
medicamentos estrangeiros, especialmente dirigida
aos consumidores e às zonas do mercado com maior
poder de compra;
l) Elevados encargos de propaganda e distribuição, indispensáveis na competição com a importação, mas
com apreciáveis reflexos nos preços;
m) Dificuldades burocráticas na entrada nas províncias
ultramarinas das especialidades farmacêuticas nacionais, mercê dos regimes legais naquelas vigentes;
n) Dificuldade de obtenção, nas indústrias nacionais, de
materiais de acondicionamento com as características legais exigidas ou nas condições indispensáveis
para o ritmo e processos de produção.
Entre as medidas enunciadas para responder a estas dificuldades contavam-se a concentração (mediante a aposta
em processos voluntários, mas impulsionados por apoios
estatais às pequenas empresas e pelo estabelecimento de
medidas obrigatórias de carácter tecnológico), a contenção de nova dispersão da indústria (mantendo-se o regime
de condicionamento), a abertura ao capital estrangeiro, o
estabelecimento de protocolos de fabrico, o fomento da
produção de matérias-primas pelos próprios produtores
de medicamentos, o alargamento do âmbito da indústria
(concedendo aos laboratórios o exclusivo no fabrico dos
cosméticos e permitindo-lhes a produção, também, de artigos de fitofarmácia, de higiene, dietéticos e produtos semelhantes), a criação de um corpo consultivo para apoio
técnico-científico aos Serviços da Propriedade Industrial
(agindo na área das patentes), a garantia da efectiva exploração das patentes, a necessidade de denunciar o acordo
de Madrid (que criou o registo internacional das marcas de
fábrica ou de comércio), a normalização das embalagens,
a gestão pelos organismos corporativos das aquisições de
medicamentos pelos serviços hospitalares e assistenciais,
e a reorganização como condição, por via da diminuição
dos custos de produção, para uma baixa generalizada dos
preços dos medicamentos.
Em face de tais medidas, compreende-se a enorme expectativa que o Grémio colocou nesta reorganização, a
qual tem de ser equacionada no quadro da profunda reformulação que este organismo via desenhar-se, nos anos
1960 ao nível da Indústria Farmacêutica internacional,
com a tendência para a concentração empresarial e para
a criação de grandes conglomerados, o alargamento da
área de actividade e da gama de produtos dos laboratórios
– ao contrário da especialização que caracterizara o período anterior à Segunda Guerra Mundial –, a protecção dos
medicamentos por patentes exclusivas, a aposta dos laboratórios multinacionais na presença directa nos diferentes
mercados e a eliminação das barreiras alfandegárias pelos poderes políticos. Toda esta dinâmica tinha contornos
entendidos pelo Grémio como desfavoráveis à indústria
nacional, os quais eram agravados pela preferência dos
portugueses pelos produtos estrangeiros.
Sucede, porém, que a tão ambicionada reorganização
nunca veio a ser implementada. Foi neste contexto que o
GNIEF se movimentou durante esta década, pugnando,
isoladamente, pela resolução de algumas das questões
mais impactantes, negativamente, no desenvolvimento
da Indústria Farmacêutica nacional. Uma delas foi, desde
logo, a renegociação do acordo celebrado em 1961 com os
Serviços Médico-Sociais da Federação de Caixas de Previdência (FCP), o qual tinha sido considerado pelo Grémio
“um passo muito positivo no caminho da normalização do
circuito comercial dos medicamentos”, mas evoluiu para a
discriminação dos produtos nacionais face aos estrangeiros
no que se referia à desigualdade nos descontos realizados
nas farmácias a favor da FCP. Assumiram também impor-
tância a defesa da necessidade de regulamentar o diploma
que criara a Comissão Técnica dos Novos Medicamentos,
a negociação de um novo regulamento do comércio de medicamentos especializados, as negociações para a fixação
pela CRPQF duma nova fórmula de cálculo do preço dos
medicamentos e o incremento das relações com a Repartição da Propriedade Industrial, “para estudo de problemas
da maior importância para a indústria”, ou seja, a questão
das patentes. O que estava em causa era a reivindicação
do Grémio de que as patentes depositadas e não aplicadas
pelos laboratórios estrangeiros deviam caducar ao fim de
um período a estabelecer ou, em alternativa, obrigar ao
fabrico industrial do produto patenteado.
Algumas destas questões arrastaram-se, tal como a reorganização, por toda a década de sessenta, ficando órfãs
de resolução, como sucedeu, em particular, com a revisão
do acordo com a Caixa de Previdência e com a revisão da
fórmula de cálculo do preço dos medicamentos especializados nacionais. Mas se houve um ponto de sistemática frustração por parte do GNIEF, foi ele, sem dúvida, o carácter
infrutífero dos pareceres que emitiu ao longo desta década,
e também na anterior, a propósito dos diferentes pedidos
de alvarás para instalação de novos laboratórios no País.
Começou, também, a surgir nos relatórios da direcção a
questão dos débitos das entidades assistenciais, isto é, dos
atrasos nos pagamentos devidos aos laboratórios fornecedores por parte dos hospitais e das misericórdias.
Não obstante a dificuldade de encontrar uma solução adequada para as questões de fundo e para as que decorriam
do alargamento dos Sistemas de Saúde e de assistência
medicamentosa, a década de sessenta consubstanciou-se
num período de expansão para o GNIEF, que viu alargada a sua actividade a vários níveis. Desde logo, pelo início
da filiação por parte de alguns laboratórios estrangeiros,
113
como os Roussel e Pfizer, processo obviamente conectado com a aludida proliferação nacional das farmacêuticas
multinacionais. Por outro lado, o próprio GNIEF ampliou a
sua esfera de influência mediante o ingresso, em 1960, na
Pharmaceutical Industries’ Association (PIA), adesão que
teve, conforme se infere do Relatório e Contas da Direcção
para o ano de 1960, o seguinte contexto:
Como é já do conhecimento de todos os associados, a
P.I.A. formou-se, sem que o nosso Grémio tenha sido previamente consultado, apenas nos tendo sido solicitada a
nossa adesão quando aquele organismo se encontrava já
em funcionamento. A nossa entrada era sem dúvida a única alternativa válida na presente conjuntura internacional
e, por isso mesmo, ela foi decidida por toda a classe sem
hesitação. Os trabalhos realizados por aquele organismo
são já hoje numerosos e todos eles tendem a procurar articular medidas que levem, no domínio dos medicamentos,
à realização prática dos princípios de integração europeia
tal como os definiram os respectivos governos.
114
Iniciaram-se, assim, as relações internacionais do GNIEF,
sendo muito importante o contacto com as associações estrangeiras congéneres, as quais levaram a que, em 1964, o
Grémio publicasse e distribuísse, pelos associados e pela
autoridades de regulação do sector, as Regras Básicas da
Indústria Farmacêutica e um Código de Conduta. O próprio
GNIEF procedeu à revisão dos estatutos, os quais foram
aprovados em 1968, pondo fim ao longo período de vigência dos homologados originalmente em 1939.
A partir de 1964, o GNIEF começou, também, a desenvolver, pelo menos de forma mais visível, relações institucionais com diversas entidades ligadas ao sector da Saúde, tendo estabelecido protocolos de colaboração com a
Ordem dos Médicos e com o Sindicato Nacional dos Farmacêuticos. Iniciou, ainda, uma política de patrocínios
a actividades científicas, tendo apoiado as jornadas farmacêuticas, projectos de investigação – sobretudo os re-
alizados pelos laboratórios de Indústria Farmacêutica da
Faculdade de Farmácia do Porto e pelos laboratórios de
química farmacêutica da Escola de Farmácia da Universidade de Coimbra – e, ainda, a deslocação ao estrangeiro
de finalistas do Centro Universitário da Escola de Farmácia
de Lisboa. A nível internacional, destacou-se o patrocínio
concedido, em conjunto com o Ministério da Saúde, para o
apetrechamento mobiliário e sonoro de uma sala de reuniões da Organização Mundial de Saúde, em Genebra, espaço baptizado “Sala de Portugal”, no qual foi colocado uma
placa com os dizeres “Oferecida pela Indústria Farmacêutica Portuguesa”. No quadro das já antigas actividades de
propaganda, a direcção do GNIEF entendeu que era necessário “levar ao público a confiança que é justo ter nos
produtos farmacêuticos nacionais”. Para tal, patrocinou,
em 1964, o documentário Faça Segundo a Arte, realizado
por Manuel Guilherme Faria de Almeida (n. 1934), com a
participação de Alfredo Tropa, filme que estreou no cinema
em 1965.
Faça Segundo a Arte (1965).
Cópia do documentário Faça Segundo a Arte
(Cinemateca Nacional).
Procurando responder à aludida falta de mão-de-obra qualificada para a Indústria Farmacêutica, a acção do Grémio
estendeu-se igualmente à formação. Foi nesse âmbito que,
em 1967, disponibilizou a sua nova sede – inaugurada, neste mesmo ano, no n.º 95, da Avenida Duque de Ávila – para
o primeiro curso da Escola de Preparação de Delegados de
Propaganda Médica, cujo sindicato fora criado em meados
da década. Dois anos depois, e com o apoio do GNIEF, iniciou-se na Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra o primeiro curso livre aplicado à farmácia industrial,
cujo modelo foi baseado em curso idêntico ministrado no
Instituto de Farmácia Industrial, integrado na Faculdade de
Farmácia de Montepellier. Refira-se que, mediante o Decreto-Lei n.º 48 696, as Escolas de Farmácia tinham, em 1968,
sido transformadas, novamente, em Faculdades.
Neste mesmo ano de 1968, concretizou-se aquela que foi
a maior realização do GNIEF nesta década, o I Congresso
Nacional da Indústria Farmacêutica, que decorreu, de 19
a 23 de Junho, na Feira das Indústrias de Lisboa (FIL),
com a participação de industriais, técnicos, professores e
dirigentes de serviços públicos e privados de Saúde. Este
evento começou a ser preparado em 1965, ano de nomeação da referida nova comissão para o estudo da reorganização da Indústria Farmacêutica nacional, tendo a direcção
do Grémio vislumbrado “a oportunidade e necessidade da
realização de uma reunião magna da indústria onde todos
os seus problemas de fundo, específicos ou mais gerais,
fossem avivados e debatidos”. A alocução de abertura de
Sebastião Alves, deputado, presidente do Congresso e do
Grupo Atral-Cipan, ilustrou bem que os objectivos políticos
não eram alheios a este congresso:
Quando ao Governo pareceram essenciais certas produções
básicas, como electricidade, os adubos e o aço, cuidaram
os seus órgãos, e bem, de estabelecer normas, facilitar licenças, ceder meios e erguer defesas para as respectivas
actividades nascentes.
Com a indústria farmacêutica, ao invés, ainda há bem pouco tempo parecia até contestar-lhe o mérito de existir! Ele
eram organismos de assistência que pareciam – e às vezes
ainda parecem – apostados em preferir o que é estrangeiro, ele são os consumidores a mostrarem frequentemente
a mesma estranha e hoje sempre injusta preferência, ele
são tribunais e certos técnicos a hesitarem perante evidências legais bem gritantes, ele são repartições públicas a
aceitarem pedidos de patentes que, na maioria dos casos,
não correspondem a coisa nenhuma, ele eram e são os
Serviços Médico-Sociais da Federação das Caixas de Previdência que pareciam e parecem actuar fora das fronteiras,
por tão alheados da produção portuguesa, ele é um mundo
de coisas e factos que se discutem e se descrêem, digo-o
com profunda amargura e digo-o porque são coisas e factos portugueses!
Pois há-de ser nestes pontos que havemos de ser firmes no
reclamar e decididos no prosseguir.
115
No âmbito do congresso, foram, aliás, aprovados 14 votos
para a Indústria Farmacêutica nacional, os quais permitem
perceber qual a posição do sector nesta década:
1. Que o poder público estude e ponha em vigor medidas
adequadas para impulsionar a investigação científica nas
empresas da Indústria Farmacêutica, designadamente através de isenções fiscais, autorizações de desvalorização rápida e financiamento directo de projectos de investigação;
2. Que se promova o estudo e execução de projectos concertados de investigação científica e tecnológica em que
participem as Universidades, os laboratórios do sector público e as empresas da Indústria Farmacêutica nacional e
nacionalizada;
3. Que no sector da investigação fundamental, necessariamente consignada às instituições do ensino superior devido
às condições e recursos do País, sejam particularmente fomentadas as actividades que se mostrarem mais pertinentes à expansão e progresso da Indústria Farmacêutica;
4. Que seja dada urgentemente ao ensino da farmácia
uma estrutura adequada à formação de pessoal universitário, devidamente habilitado a integrar-se nas necessidades
actuais da indústria;
5. Que se considere e promova a preparação de quadros
de pessoal técnico auxiliar e de promoção de vendas, através de cursos apropriados e de nível conveniente;
6. Que seja ponderada pelo poder público a manifesta
inconveniência de qualquer acordo internacional que conduza à alteração do actual regime de registo de patentes,
devido aos graves prejuízos que resultariam dessa alteração para a indústria nacional de produtos farmacêuticos;
7. Que seja chamada a atenção da Administração para
as vantagens que adviriam da substituição do sistema de
licença obrigatória definido no art.º 30.º do Código da Propriedade Industrial pelo sistema de caducidade das paten-
116
Capa do programa do I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica (1968).
Stand do Grémio no I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica (1968).
tes não efectivamente exploradas no País, isto é, que não
sejam objecto de fabricação do produto patenteado;
8. Que seja criado um corpo consultivo para apoio técnico-científico dos Serviços da Propriedade Industrial no que
se refere a patentes da indústria química ou, não se considerando viável esse propósito, que seja imediatamente
constituída para aquele fim uma comissão especializada,
com representação universitária e corporativa;
9. Que seja dada preferência à indústria nacional nas
aquisições de medicamentos pelos serviços do Estado, da
Assistência Pública e da Previdência Social;
10. Que seja urgentemente revisto o acordo da Indústria
Farmacêutica com os Serviços Médico-Sociais da Federação das Caixas de Previdência;
11. Que a Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e
Farmacêuticos tenha em atenção, ao fixar os preços de venda ao público, a necessidade de estimular a investigação
científica e tecnológica na indústria, estabelecendo para
esse efeito uma verba apropriada e variável em função dos
encargos suportados pelas empresas com essa actividade
nos casos em que ela seja efectivamente exercida;
12. Que o esforço exportador da indústria de produtos
farmacêuticos seja eficaz e positivamente apoiado pelo sector público, designadamente no que respeita a estudos de
mercado, crédito e ajudas de comercialização;
13. Que seja considerada pelos serviços oficiais competentes a simplificação dos condicionalismos burocráticos
que dificultam e oneram as actividades da indústria, e que
seja suprimida a aposição obrigatória do selo fiscal nas
embalagens;
14. Que seja chamada a atenção do poder público para a
necessidade de se adoptarem, com urgência, as providências necessárias a um «controlo» analítico global de toda a
produção farmacêutica.
Política à parte, o congresso acolheu diversas palestras
sobre temas como investigação e desenvolvimento e formação de pessoal. Paralelamente, organizou-se uma exposição – na qual participaram, com stands próprios, algumas
117
empresas do sector e a própria Apifarma – e procedeu-se à
exibição de filmes e documentários sobre a Indústria Farmacêutica e sobre diversos temas na área da Educação
para a Saúde.
ANOS 1970: DO GRÉMIO À APIFARMA E AO SERVIÇO
NACIONAL DE SAÚDE
118
As mudanças políticas introduzidas em Portugal pela revolução de 25 de Abril de 1974 e fixadas pela Constituição de
1976 tiveram um impacto determinante nas políticas de
Saúde Pública e na própria Indústria Farmacêutica.
Um dos primeiros sinais de mudança de regime, com o
fim do Estado corporativo, foi a substituição do antigo Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas pela Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica, criada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 315-C/75, de 30 de
Abril de 1975. A primeira Direcção, eleita em 2 de Outubro
do mesmo ano, foi dirigida por José Luís Costa Ribeiro Gomes (Laquifa), integrando o secretário Luís João da Mata
Caldeira Pires (Instituto Pasteur de Lisboa – Virgínio Leitão
Vieira dos Santos & Filhos), o tesoureiro Luís Filipe Castela
(Zimaia) e os vogais Ulrich Eberhard Althoff (Centrofarma),
Pedro Ferraz da Costa (Farmácia Internacional), João Baptista d’Almeida (J. A. Baptista de Almeida), Luís Filipe Valadas Preto Martins (Abbott Portuguesa), António Almeida
Igreja Ramos (Roussel) e Luís Manuel Mexia Chaves Costa
(Medicamenta). Através desta e das seguintes direcções, a
actuação da Apifarma abrangeu ao longo da década, seis
grandes eixos: a revisão dos preços dos medicamentos; o
acompanhamento da situação económica e financeira das
empresas do sector farmactêutico, a qual, como veremos
adiante, foi uma questão preocupante; o posicionamento
da Indústria Farmacêutica no novo enquadramento político
do País, o que foi realizado em articulação com o Ministério dos Assuntos Sociais e o Ministério da Indústria e
Tecnologia; as relações internacionais, com a manutenção
na EFPIA – European Federation of Pharmaceutical Industries and Associations (anterior PIA), a adesão à IFPMA –
International Federation of Pharmaceutical Manufacturers
Primeiro logótipo e símbolo da Apifarma.
& Associations, e a participação nas reuniões da Associação Europeia das Especialidades do Grande Público e da
Federação Mundial dos Produtores de Medicamentos do
Grande Público; a contratação colectiva, tendo a Apifarma
participado na negociação do Contrato Colectivo de Trabalho Vertical; e a prestação de informação e de formação
aos associados.
As entidades de gestão, promoção e regulação da Saúde passaram, também, nos anos 1970, por um profundo
processo de mudança. Em Setembro de 1971, a reorganização dos serviços do Ministério da Saúde e Assistência,
mediante o Decreto-Lei n.º 413/71, levou à criação do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, que substituiu
o anterior Instituto Superior de Higiene Dr. Ricardo Jorge.
A este novo organismo foi confiada a comprovação de medicamentos, ali passando a funcionar, também, a antiga
CTNM. A reorganização em causa não alterou, todavia, a
tutela dos medicamentos e da actividade farmacêutica,
que se manteve na Direção-Geral de Saúde, através da Direcção de Serviços de Farmácia e Medicamentos, ficando
a fixação dos preços cargo da Direçcão-Geral do Comércio
Não-Alimentar, organismo do Ministério do Comércio. Dois
anos depois, em 1973, foi criado o Ministério da Saúde,
que se autonomizou face à Assistência, através do Decreto-Lei n.º 584/73, de 6 de Novembro. A instauração do regime democrático levou à transformação deste organismo
na Secretaria de Estado da Saúde, que ficou integrada, até
1983, no Ministério dos Assuntos Sociais. Foi neste enquadramento político e institucional que se deu a criação do
Serviço Nacional de Saúde (SNS), estabelecido pela Lei n.º
56/79, de 15 de Setembro, e no âmbito do artigo 64.º da
nova Constituição, o qual consagrava o direito universal à
Saúde. O SNS teve como consequência o alargamento sem
precedentes do mercado do medicamento.
Sede da Ciba, em Lisboa (anos 1960).
119
Maqueta das instalações da Hoechst Portuguesa, em Mem Martins, vendo-se à esquerda a fábrica para os produtos farmacêuticos (anos 1970).
Ao nível da Indústria Farmacêutica, acentuou-se, nesta década, o investimento estrangeiro, o qual foi expresso pelo estabelecimento de contratos de produção com
produtores nacionais e, sobretudo, pelo fabrico local em
unidades próprias, de que foram exemplo as instalações
industriais da Bayer, inauguradas, em 1972, em S. Martinho do Bispo, e as unidades fabris edificadas em Mem
Martins pela Hoechst (1971), pela Essex/Soprol/Schering
USA (1974), vocacionada para a produção de corticoesteróides, e pela Schering Lusitana. Este fenómeno foi a expressão do processo de representação directa em Portugal
dos grandes laboratórios multinacionais, o qual continuou
ao longo dos anos setenta, tendo-se estabelecido, entre outras empresas, a Merck, Sharp & Dohme, Lda., a Wellcome
de Portugal, Lda., a Ciba-Geigy Portuguesa, Lda., a Wyeth
Laboratórios (cujos produtos eram fabricados em Portugal
pelo Instituto Pasteur de Lisboa), a Beecham Portuguesa –
Produtos Farmacêuticos e Químicos, Lda., a Glaxo Farmacêutica, Lda, a Johnson & Johnson, Lda., a Roche Farmacêutica Química, Lda., a Squibb Farmacêutica Portuguesa,
120
Lda., a Smith Kline & French Portuguesa e a Sidefarma.
De iniciativa nacional, foram criadas, entre outras empresas farmacêuticas, a Medinfar (1970), a Centrofarma
(1970), a Gestafarma (1971), a Vetlima (1972), a Cosmofarma (1976) e a Sofex Farmacêutica (1977).
A Indústria Farmacêutica não teve, porém, existência
fácil no Portugal dos anos 1970. Desde logo, porque as
mudanças de Abril de 1974 e a agudização, em 1975,
do clima político e social levaram não só à ocupação de
instalações, de que foi exemplo a ocorrida, neste último
ano, nos Laboratórios Novil, como, de acordo com Ferraz
da Costa, conduziram, também, o governo presidido por
Vasco Gonçalves a ponderar a nacionalização da Indústria
Farmacêutica: “Recordo, aliás, um convite para almoçar do
Tenente Rosário Dias, Chefe de Gabinete do Primeiro-Ministro, para que eu lhe fornecesse argumentos para justificar politicamente a não-nacionalização do sector na onda
de nacionalizações que se seguiram ao 11 de Março desse
ano [1975]”. O contexto revolucionário afectou, também,
as empresas de capital estrangeiro, como a Hovione, que
Fábrica da Schering Lusitana, em Mem Martins.
121
Instalações da Medinfar (anos 1990).
se debateu com a inoperância de certos organismos estatais, tal como relatado no livro do seu 50.º aniversário:
Os maiores problemas foram, porventura, criados pelos
organismos governamentais, mais até do que pela atmosfera revolucionária. Nunca houve um risco real de nacionalização porque a firma era pequena e o seu negócio incompreensível para a maioria do povo. 50% do capital era
de origem estrangeira, as patentes eram, na época, ainda
detidas individualmente e os trabalhadores eram bem tratados e não tinham queixas.
No entanto, a Hovione era um grande exportador e também
um importador de matérias-primas e equipamentos. Todas
as formalidades de import/export e de controlo cambial se
tornaram muito pesadas e demoradas, envolvendo infinitas
justificações, formulários e selos. Além disso, a burocracia
estava constantemente a mudar, as leis eram concebidas
mas ficavam por implementar, nada era fácil.
122
Economicamente, a década apresentou desafios de contexto enormes, sendo marcada por altos índices de inflacção, pela limitação do crédito bancário e pela intervenção
do Fundo Monetário Internacional, em 1977, a qual conduziu à desvalorização do Escudo e ao consequente aumento
exponencial do custo das matérias-primas importadas pela
indústria, já de si difíceis de obter devido aos entraves burocráticos à obtenção das necessárias licenças de importação. Agravou esta situação a continuidade dos atrasos
registados no pagamento aos laboratórios por parte dos
organismos estatais e para-estatais do sector da Saúde, a
falta de liquidez dos clientes privados e o aumento, pelos
Serviços Médico-Sociais da Previdência, da taxa de imposto
de selo sobre o preço de venda ao público das especialidades farmacêuticas, a qual passou, em 1978, de 0,5% para
5%. Nem tudo correu, porém, mal. Se a descolonização
comprometeu, por um lado, os mercados de exportação de
língua portuguesa, ampliou, por outro, o mercado nacional,
tal como descreveu a administração dos Laboratórios Vitória no relatório de actividades referente ao ano de 1976: “o
mercado interno apresentou durante o ano findo um crescimento muito elevado, devido essencialmente ao aumento
da população pelo regresso das populações do ex-ultramar
português, que se traduziu num alargamento do mercado,
permitindo uma evolução muito satisfatória do nosso volume de vendas”. A indústria considerou também positivo
o facto de, em 1977, ter sido concedido, pela Direcção-Geral do Comércio Não-Alimentar, o tão ambicionado aumento dos preços de venda ao público dos medicamentos.
Ainda no âmbito industrial, na segunda metade dos anos
1970, foi criado o Grupo de Farmacêuticos de Indústria
(GRUFIS), cuja primeira reunião decorreu em 1977 e que
veio a dar origem ao Conselho do Colégio de Especialidade
de Indústria Farmacêutica da Ordem dos Farmacêuticos.
Foi no âmbito do GRUFIS que se realizou, em Junho de
1978, no anfiteatro da Feira Internacional de Lisboa, um
simpósio sobre «Tratamento e Controlo de Água na Indústria Farmacêutica», no qual participaram representantes
dos laboratórios Sanitas (Arminda Pereira), do Laboratório
Normal (Ascensão Ceia), da Iberfar (Céu Seabra e Elisabeth Franco), da Hoechst Portuguesa (Guerreiro Gomes e
Medicamentos da Atral-Cipan (anos 1970).
Teresa Azevedo), da Schering Alemã (Martinho Cabeça), da
Wyeth-Pasteur (Orlando Silva) e do Laboratório Imunológico de Lisboa (Queiroz da Fonseca).
entre outras, pela União dos Farmacêuticos de Portugal,
fundada nos anos 1930, e pela COFANOR – Cooperativa
dos Farmacêuticos do Norte, CRL., estabelecida em 1967.
Com efeito, em Agosto de 1973, foi fundada a Codifar –
Cooperativa Distribuidora Farmacêutica, S.C.R.L. Dois
anos depois, em 1975, iniciou actividade a Cooprofar Farmácia. Nas décadas seguintes, surgiram novas empresas,
nomeadamente as internacionais, de que se destaca a
Alliance Healthcare, resultante da parceria entre o Grupo
Alliance Boots, a Associação Nacional das Farmácias e a
José de Mello Participações II, SGPS.
ANOS 1980: NOVAS OPORTUNIDADES E NOVOS
DESAFIOS EM CONTEXTO EUROPEU
Aspecto do simpósio do GRUFIS, realizado, em 1978 , no anfiteatro da FIL.
Foram também dados passos importantes no domínio
da distribuição farmacêutica, que era, até esta década,
ainda bastante rudimentar e limitada, sendo assegurada,
A Indústria Farmacêutica instalada em Portugal conheceu,
nos anos 1980, um novo conjunto de oportunidades e desafios. Desde logo, o desenvolvimento do Serviço Nacional
de Saúde (SNS), ao qual foi concedida autonomia administrativa e financeira. Assim, foram criadas, em 1982, as
Administrações Regionais de Cuidados de Saúde (ARS),
que sucederam às Administrações Distritais dos Serviços
123
de Saúde – desenvolvidas, sem sucesso, a partir de 1975
–, e em 1983, foi aprovado, pelo Despacho Normativo n.º
97/83, de 22 de Abril, o regulamento dos Centros de Saúde, dando lugar aos chamados Centros de Saúde de segunda geração. Neste mesmo ano, mediante o Decreto-Lei n.º
344-A/83, de 25 de Julho, que aprovou a Lei Orgânica do
IX Governo Constitucional, foi criado, novamente, o Ministério da Saúde. Finalmente, em 1984, deu-se a criação da
Direcção-Geral dos Cuidados de Saúde Primários, através
do Decreto-Lei n.º 74-C/84, de 2 de Março, a qual marcou o fim dos Serviços Médico-Sociais da Previdência e
a expansão do SNS. O ano de 1984 foi, aliás, importante
para a Indústria Farmacêutica já que testemunhou a criação da Direcção-Geral de Assuntos Farmacêuticos (DGAF),
organismo que assumiu a tutela da Comissão Técnica de
Novos Medicamentos e recebeu as atribuições da CRPQF,
que foi formalmente extinta em 1988, na sequência do
Decreto-Lei n.º 466/88, de 15 de Dezembro. Antes disso,
em 1982, fora publicada a Lista de Produtos Comparticipáveis, estabelecido o regime da codificação dos medicamentos e autonomizadas, legalmente, as especialidades
farmacêuticas de venda livre.
Constituiu, também, um desafio à Indústria Farmacêutica a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE), iniciada em 1977, mas formalizada somente
em 1985. O novo paradigma emergente foi bem retratado
por Luís Chaves Costa, à época Presidente da Apifarma,
que, em editorial do boletim Informação CEE, publicado em
Junho de 1986 pela Associação, afirmou:
O desafio que se nos coloca é duplo: por um lado, temos
de vencer rapidamente o atraso que nos separa dos nossos
parceiros europeus; por outro, em plena terceira revolução
industrial, a própria CEE se encontra numa fase crucial da
sua política de desenvolvimento, já que corre o risco de
124
perder competitividade em face dos colossos Estados Unidos e Japão. […].
O desenvolvimento da economia assentará, no futuro, em
modelos diferentes dos que caracterizaram a expansão da
década de 60. Estamos mergulhados no que já se classifica de sociedade da informação – ficando para trás a sociedade da indústria – que obriga os agentes económicos,
principalmente dirigentes e empresários, a actuações inovadoras e lúcidas. A informação, hoje, transformou-se num
importante valor económico na nova sociedade.
Acresce dizer que a indústria farmacêutica portuguesa
tem vindo, nos últimos anos, por motivos conhecidos, a
ser afectada por uma forte e incorrecta, às vezes, intervenção estatal. Daí que, para além de ter de enfrentar os
factores de crise comuns à economia, luta, também, com
problemas específicos que lhe são postos pela adesão ao
Mercado Comum. Que Direito comunitário aplicar? Que
condições para concorrer com as indústrias farmacêuticas mais desenvolvidas dos seus parceiros? Que políticas a
realizar pelo Governo para que ela possa competir em pé
de igualdade e desenvolver-se? Que regime de patentes?
De forma a informar os seus associados sobre este processo, a Apifarma não só desempenhou um importante papel
na interpretação e debate das primeiras directivas da CEE
transpostas para a legislação nacional no sector das especialidades farmacêuticas, como promoveu, em 1985 e
1986, dois seminários subordinados ao tema “A Indústria
Farmacêutica portuguesa e a CEE”, nos quais participaram especialistas nacionais e estrangeiros. Do primeiro,
evento resultaram quatro grandes conclusões e linhas de
força a este respeito:
1.º – Torna-se indispensável que o Governo defina, urgentemente, uma correcta política industrial para o sector. […];
2.º – Torna-se fundamental, igualmente, que o Governo desenvolva uma política de Saúde transparente e sem ambiguidades, designadamente ao nível orçamental e no enquadramento do medicamento nessa política. […];
3.º – A indústria farmacêutica portuguesa, por razões de
natureza de política económica, é um sector ainda bastan-
Seminário promovido pela Apifarma a propósito da Adesão de Portugal à CEE.
Capa do boletim Informação CEE, publicado, em Junho de 1986, pela Apifarma.
te dependente do exterior, no plano científico e tecnológico.
Cabe ao Governo elaborar políticas que fomentem uma mais
frutuosa ligação escola/indústria e permitam às empresas e
ao sector modernizarem-se, para no futuro poderem concorrer com êxito num mercado alargado como o da CEE. […];
4.º A adesão à CEE, com a supressão das barreiras aduaneiras e a livre circulação de mercadorias e capitais, cria um
novo quadro ao comércio do medicamento.
Somavam-se a estas questões a unificação das patentes,
a introdução do IVA e da Tarifa Aduaneira Comum e, de
forma mais abrangente, a necessidade de reformar o quadro legislativo português, imposta pela transcrição para o
Direito nacional de regras e normas comunitárias, nomadamente ao nível do sector do medicamento. Intrinsecamente, a Indústria Farmacêutica debatia-se, no início dos
anos 1980, com dois grandes problemas: o preço dos medicamentos e o imposto de selo sobre especialidades farmacêuticas. Estas questões foram abordadas, em Outubro
de 1980, pelo jornalista Fernando Ulrich, que as enquadrou no jornal Expresso sob o título “O controverso exemplo
dos produtos farmacêuticos”. O problema dos preços, que
transitou da década anterior, tinha a ver com a fórmula utilizada para a sua formação – considerando a Apifarma que
o método da Direcção-Geral do Comércio Não-Alimentar
(DGCNA), ao partir dos custos do ano anterior, ignorava a
inflacção e a desvalorização do Escudo – e, também, com
os atrasos registados no processo de fixação e revisão dos
125
mesmos, o que causava prejuízos ao sector. Não satisfaziam também a Apifarma os 5% de imposto de selo aplicado aos medicamentos e, ainda menos, os critérios de
isenção definidos em Janeiro de 1981, ano em que o referido imposto foi extinto, sendo substituído por uma taxa de
1%. A posição da Associação espelhava, naturalmente, a
das empresas do sector, entre as quais se encontrava a Sociedade Industrial Farmacêutica (Laboratórios Azevedos),
que, no seu Relatório e Contas referente a 1980, deu nota
da imperiosa necessidade de sanar estas questões:
Não foi ainda em 1980 que se concretizaram as esperadas
e desde há muito reclamadas correcções das anomalias
já referidas em anteriores Relatórios, designadamente [a]
abolição da taxa do imposto de selo de 5% sobre especialidades farmacêuticas que por imposição arbitrária não nos
é consentido reflectir nos preços de custo.
[…] Em face porém da rápida evolução dos custos todos os
dias agravados das matérias-primas, energia, e encargos
de toda a ordem, impõe-se que seja revista e melhorada
a metodologia utilizada pela Direcção Geral do Comércio
Não Alimentar por forma a que os processos de revisão
de preços sejam apreciados não só de forma mais célere,
mas também com mais realismo. De contrário a indústria
farmacêutica nacional continuará a definhar, enquanto se
favorece a expansão dos grandes consórcios mundiais do
sector. Não é assim certamente que os poderes públicos
apoiarão a reestruturação da indústria nacional por forma
a que a adesão de Portugal à C.E.E. se processe sem grandes perturbações na vida das Empresas.
126
A esta problemática, que foi tratada, a partir de 1984,
por quatro grupos de trabalho criados no âmbito da Apifarma (Assuntos Económicos, Política Industrial, Politica
do Medicamento e Integração na CEE), somaram-se duas
outras dificuldades de contexto. Por um lado, a adopção
pelo Ministério dos Assuntos Sociais de medidas que visaram a redução do consumo de medicamentos. Por outro lado, o agravamento da situação económica do País,
que culminou, em 1983, com a segunda intervenção do
FMI em Portugal. Sectorialmente, tiveram impacto muito
negativo os crónicos atrasos no pagamento dos serviços
públicos aos fornecedores de medicamentos, o que criou
dificuldades acrescidas às empresas, que não só se encontravam descapitalizadas, em função da conjuntura adversa, e impedidas de recorrer a um inexistente mercado de
capitais, como dificilmente conseguiam atrair novos investidores, dado que os títulos do Estado e os depósitos a prazo proporcionavam taxas de juro anuais na ordem dos dois
dígitos. Este difícil contexto explicou que empresas como
a Sociedade Industrial Farmacêutica tenham apresentado,
pela primeira vez, resultados negativos.
Nos anos 1980, a Indústria Farmacêutica foi, também,
afectada por uma incompreensão sem precedentes por
parte do poder político, significativamente indiferente às
suas reivindicações e posições, tal como a Direcção da Apifarma deixou expresso, por exemplo, no seu Relatório e
Contas de 1986:
Na primeira metade do ano a Associação não foi ouvida
nem atendida pelos órgãos do poder que exerciam a tutela
sobre o Sector. Não foi ouvida na metodologia dos preços;
não foi ouvida no estudo do redimensionamento das embalagens; não foi ouvida sempre que solicitou à Tutela uma
política correcta e estável para o Sector. Por outro lado,
apesar de parceiros indispensáveis na construção do sistema de saúde do País, os seus legítimos interesses têm
vindo a ser, dum modo geral, ignorados.
Esta questão marcou, aliás, os primeiros anos da década, tendo levado a Apifarma a criar, em 1984, um grupo de trabalho dedicado às relações públicas, o qual se
encarregou do posicionamento e da imagem da Indústria
Farmacêutica e da própria Associação, agindo junto dos
órgãos de comunicação social, da Administração Pública
das, nesta década, as primeiras campanhas de sensibilização para a Saúde e para a Segurança na utilização dos
medicamentos, tendo a primeira decorrido em 1981, com
a impressão de um poster subordinado ao tema “Não deixe
os medicamentos ao alcance das crianças”. Um ano antes,
arrancara o boletim da Apifarma, projecto que remontava
a 1978, mas que só em 1980 se concretizou, graças à
iniciativa do seu Gabinete de Imprensa, que se responsabilizou pela edição mensal do Informativo Apifarma.
1.º Seminário da Apifarma para Industriais e Importadores Associados.
e da Assembleia da República. Neste contexto, realizou-se,
em Julho de 1986, um seminário para industriais e importadores associados, o primeiro de dois eventos promovidos
pela Apifarma com o objectivo de “expressar publicamente
a valia intrínseca da indústria e os critérios éticos em que
a mesma se move”, tendo, sob a temática da contribuição
para uma política do medicamento em Portugal, sido debatidos diversos temas, nomeadamente o dimensionamento
das embalagens dos medicamentos, a influência dos serviços nacionais de Saúde estatais nos medicamentos e nos
cuidados médicos em geral e, ainda, as perspectivas para
o sector farmacêutico em Portugal. Dois anos depois, em
1988, decorreu, também por iniciativa da Associação, uma
importante campanha de imagem do sector farmacêutico,
iniciativa suportada por 62 empresas do sector, que comparticiparam com cerca de 80 mil contos. A Apifarma terá
sido, aliás, pioneira neste domínio, ao realizar, enquanto
associação sectorial, a primeira campanha nacional de defesa e promoção da imagem de um sector de actividade
económica. Ao nível do público em geral, foram promovi-
Primeira campanha pública
de sensibilização promovida
pela Apifarma (1981).
127
Apesar do amplo investimento efectuado na comunicação
com diferentes stakeholders, a Apifarma viu-se confrontada,
no final dos anos 1980 com duas decisões importantes por
parte do poder político que escaparam substancialmente
à sua intervenção. A primeira delas remonta a 1988, ano
em que, não obstante os contactos da Associação com os
quatro ministros responsáveis pela Portaria 973/88, de 31
de Dezembro, foi decidido o congelamento, por nove meses, do preço dos medicamentos de venda ao público com
preço superior a 250 escudos. Seguiu-se a divulgação do
projecto de Decreto-Lei dos medicamentos genéricos, em
1989, facto que levou a uma “tomada de posição pública de
inequívoca rejeição e denúncia de alguns aspectos contidos
na redacção do projecto”, conforme a Apifarma comunicou
no Relatório e Contas relativo a esse mesmo ano:
da Apifarma. Assim, o Código Deontológico de Promoção de
Medicamentos foi adoptado em 1987, e o Código de Práticas
de Comercialização de Medicamentos foi apresentado publicamente em Janeiro de 1988. Toda esta nova dinâmica foi,
simultaneamente, causa e consequência da reestruturação
da Apifarma, processo que teve como expressão mais visível a admissão de uma Directora Executiva.
Quanto à actividade industrial e comercial, a década de
oitenta foi berço, entre outras empresas farmacêuticas,
da Tecnimede (criada em 1980 por Jorge Ruas da Silva),
da Labialfarma (1981) e da Lecifarma (1985), esta última apostada no desenvolvimento galénico de produtos, de
produtos farmacêuticos, de suplementos alimentares, de
cosméticos e de produtos de cuidado corporal, produzindo
exclusivamente para terceiros. Os Laboratórios Azevedos,
Sucederam-se as 4 Cartas-Abertas à Sra. Ministra da Saúde, às quais foi dada a mais ampla divulgação, foram concedidas entrevistas em diversos meios de comunicação social e houve até um debate na Radiotelevisão em que nos
defrontámos com a posição da A.N.F. Isto, obviamente, a
par dos diversos documentos críticos enviados à Administração Pública.
128
Ao nível interno, os anos 1980 marcaram o alargamento
do âmbito da Apifarma às empresas ligadas às actividades de importação, de medicamentos de venda livre, de
produtos auxiliares de diagnóstico, de substâncias activas
e do sector da veterinária, o que levou ao aumento do número de associados, que, em 1986, passou de 82 para
100, atingindo os 111 membros no final da década. A expansão atingiu também as relações internacionais, tendo a
Apifarma aderido, em 1989, à FEDESA – Fédération Européenne de la Santé Animal e sido eleita, pela primeira vez,
para os órgãos directivos da EFPIA e da IFPMA. Remontam
também aos anos 80 os primeiros códigos deontológicos
Capa do primeiro Código Deontológico
da Apifarma (1987).
por seu turno, instalaram, nesta década, um novo bloco
de antibióticos, “projecto pioneiro em Portugal, utilizando
tecnologias de ponta”. Desenvolveu-se, também, a JABA,
que construiu uma unidade industrial em Sintra (Abrunheira) para o fabrico de sólidos e de injectáveis, de cremes, de
líquidos e de supositórios. Quanto ao investimento estrangeiro, destacou-se a Hikma Farmacêutica (Portugal), S.A.,
criada em 1989 como subsidiária portuguesa de um grupo
farmacêutico multinacional baseado na Jordânia. Foi também nos anos 80 que se instalaram em Portugal as sociedades Angelini, BioMérieux Portugal - Aparelhos e Reagentes de Laboratório, Lda., Bristol-Myers Squibb, Calier
Portugal, Izasa Portugal – Distribuições Técnicas, Lda., e
Novo Nordisk Comércio de Produtos Farmacêuticos, Lda.,
Ferring Portuguesa, Quimedical, Daiichi Sankyo Portugal e
UCB Pharma.
Sede do Grupo Tecnimede.
ANOS 1990: SOB AS DIRECTIVAS COMUNITÁRIAS
E UMA NOVA REGULAÇÃO
Os anos 1990 foram extraordinariamente importantes no domínio da Saúde, particularmente no sector do medicamento.
Com efeito, na esteira da adesão de Portugal à Comunidade
Económica Europeia, e face à necessidade de transpor directivas comunitárias para o Direito interno do País, produziram-se
não só diversos diplomas legais determinantes – nomeadamente a Lei de Bases da Saúde (1990), o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (1993) e, muito particularmente, o
primeiro Estatuto do Medicamento (Decreto-Lei n.º 72/91) e o
que criou o Sistema Nacional de Farmacovigilância (Despacho
Normativo n.º 107/92) –, como surgiu, igualmente, a necessidade de se organizar um sistema de garantia da qualidade e
da segurança do medicamento, tendo por base uma instituição eficaz e credível em três frentes bem diferenciadas: profissionais de Saúde, consumidores e Indústria Farmacêutica.
Foi neste contexto, e quando se davam passos determinantes
no sistema europeu de avaliação e supervisão do medicamento – nomeadamente com a criação, no início dos anos 1990,
da Agência Europeia do Medicamento, arquitectada em Lisboa –, que, em Janeiro de 1993, ao abrigo do Decreto-Lei n.º
10/93, emergiu o Infarmed – Instituto Nacional da Farmácia e
do Medicamento, ao qual foi atribuída exclusiva responsabilidade “pela orientação, avaliação e inspecção da actividade farmacêutica”. Dotado de autonomia financeira e administrativa,
e financiado através das taxas de comercialização dos medicamentos, este organismo centralizou competências anteriormente dispersas pela Direcção-Geral de Saúde, pelo Instituto
Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge e pela Direcção-Geral dos
Assuntos Farmacêuticos, tendo esta última sido extinta pelo
referido diploma. Presidido por José Aranda da Silva (19932000), o Infarmed integrou a antiga Comissão Técnica dos
129
Novos Medicamentos, entretanto renomeada Comissão Técnica de Medicamentos (pela Portaria 258/91), a qual passou a
constituir um órgão consultivo deste Instituto, sendo posteriormente designada por Comissão de Avaliação de Medicamentos. A nível estrutural, o Infarmed ficou sediado no interior do
Hospital Júlio de Matos, que passara a denominar-se Parque
de Saúde de Lisboa. Em 1999, o seu laboratório, que estivera
durante três anos instalado, provisoriamente, no Instituto Nacional de Investigação Industrial, situado no Lumiar, transitou
para um novo edifício construído de raiz no referido Parque, o
qual recebeu a denominação Tomé Pires, em homenagem ao
destacado boticário português do século XVI.
Ao nível da indústria, os anos 1990 ficaram indelevelmente
marcados pelas grandes fusões internacionais, tendo surgido
novos e importantes players no sector farmacêutico, muito
Sede do Infarmed no Parque da Saúde, em Lisboa.
130
particularmente a Aventis, nascida da fusão da Rhône-Poulenc
com a Hoechst Marion Roussel, a Novartis, formada pelo processo de fusão da Ciba-Geigy com a Sandoz, e, também, a
AstraZeneca, surgida da união da Astra com o grupo Zeneca,
e a Janssen-Cilag, empresa que nos anos 90 construiu uma
nova e moderna fábrica em Queluz.
Em Portugal, despontaram novos e importantes investimentos industriais, nomeadamente a Sofarimex, per
tencente ao Grupo Azevedos, que se orientou, sobretudo, para
a produção para terceiros, tendo como clientes, entre outros, a
Sanofi-Aventis, a Novartis, a GlaxoSmithkline e a Pfizer. Inaugurada em 1994, no Cacém, esta fábrica especializou-se
na produção farmacêutica de pequenas e médias séries à
escala europeia, fabricando sólidos (pós, granulados, comprimidos, comprimidos revestidos, drageias e cápsulas),
Instalações fabris da Sofarimex, Agualva-Cacém.
Edifício Tomé Pires, no Parque da Saúde, em Lisboa, sede do Laboratório do Infarmed.
líquidos (xaropes, soluções, suspensões e solutos), pastosos
(pomadas e cremes) e estéreis (colírios, injectáveis líquidos de
pequeno volume e liofilizados), tendo desenvolvido, ao longo
dos anos, um portefólio superior a 650 produtos e exportando,
para os cinco continentes, 75% dos seus produtos fabricados.
Em complemento à indústria, refira-se que a área da distribuição grossista de produtos farmacêuticos contou, nesta década,
com um novo membro, a Distrifarma, fundada em 1993.
Quanto aos laboratórios estrangeiros, instalaram-se em Portugal as seguintes empresas: Amgen - Biofarmacêutica, Lda.,
Baxter Médico-Farmacêutica, Almirall (estabelecida em 1997
por fusão com a Prodesfarma, que estava presente em Portugal
desde 1993), Divasa Farmavic de Portugal – Produtos e Equipamentos Veterinários, Esteve Farma, Grunenthal (através da
Euro-Labor), Leo Farmacêuticos, Lda., Ipsen Portugal, Servier
Portugal, Merial Portuguesa Saúde Animal, Lda. (fundada em
Agosto de 1997 pela fusão dos negócios de Saúde Animal da
Rhône Mérieux e da MSD Agve), Zambon – Produtos Farmacêuticos, Lda., Bio-Rad Laboratories – Aparelhos e Reagentes para
Laboratórios, Lda., Satis – Radioisótopos e Protecções Contra
Sobretensões Eléctricas, Lda., Byk Portugal, Actavis, Fresenius
e Mepha. Por outro lado, a promulgação, no início dos anos 90,
dos primeiros diplomas que vieram regular, em Portugal, os
medicamentos genéricos – o Decreto-Lei n.º 81/90, de 12 de
Março, o Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de Fevereiro, e a Portaria 623/92, de 1 de Julho, que alterou o regime de formação
dos preços dos medicamentos genéricos, estabelecendo que os
mesmos deveriam situar-se 20% abaixo do PVP do medicamento de referência – abriu oportunidades às empresas multinacionais que já actuavam neste mercado. Foi em tal contexto que a
Ratiopharm se estabeleceu no País, em 1990, beneficiando da
primazia para alcançar a liderança neste segmento.
A questão dos genéricos suscitou, todavia, reacções por parte
da indústria nacional, tendo levado a Apifarma a endereçar, em
1995, uma detalhada exposição ao Ministério da Saúde, “enumerando razões e explicitando fundamentos, os quais, esperamos, contribuam definitivamente para a compreensão de que
o posicionamento que a associação vem tomando assenta em
preocupações e visa objectivos de alcance bem mais sério do
que meras intenções de obstrução”, tal como se lia no Relatório
e Contas referente ao ano em causa:
Partindo do princípio da aceitação pacífica de que os genéricos poderão ter um contributo específico a desempenhar no mercado dos medicamentos, a Apifarma outra posição não poderia assumir que não fosse a de alertar para
a necessidade essencial de fazer condicionar a introdução
131
Presente em Portugal desde 1909, a Bayer inaugurou, em 1991, uma nova sede,
localizada em Carnaxide.
desta classe de medicamentos à criação, por parte dos organismos de tutela, das condições básicas e instrumentos
necessários à garantia técnica e cientificamente comprovada da qualidade dos mesmos. Não parece credível, aliás,
que possa ser implementada uma medida desta natureza,
descurando implicações de Saúde Pública, sacrificando
elementares regras de concorrência ou até permitindo a
subversão dos diferentes papéis legalmente definidos para
os agentes económicos envolvidos, como chegou a parecer
desenhar-se no horizonte do sector.
132
Além da problemática dos genéricos – que levou a Apifarma a propor, em 1992 e em 1993, a criação, pelo Ministério
da Saúde, de um Instituto da Qualidade do Medicamento
–, a actividade da Associação centrou-se, nesta década, no
desenvolvimento das relações institucionais. Desde logo,
com a Ordem dos Médicos (OM), com a qual assinou em
Junho de 1992 um protocolo de cooperação que visava o
cumprimento dos códigos deontológicos pelos membros
de ambas as instituições. O referido documento foi revisto e complementado pelos protocolos subscritos em 1997
e em 1999, tendo o último destes criado uma Comissão
Paritária de acompanhamento presidida por uma personalidade independente, à qual foi acometida a atribuição de
observar o cumprimento do protocolo e dar conhecimento
das eventuais violações aos Conselhos Deontológico e Disciplinar da OM e da Apifarma.
Mais tensas foram as relações com o Ministério da Saúde, não obstante o novel Infarmed ter possibilitado uma
melhoria muito substancial no relacionamento da Associação com a regulação. Em causa estavam as dívidas dos
hospitais aos laboratórios farmacêuticos, que se agudizaram nos primeiros anos desta década, tendo atingido uma
inédita mediatização. Foi neste contexto, e para evitar a
ruptura institucional, que a Apifarma e o Ministério da Saúde estabeleceram, em Novembro de 1993, um protocolo
que conduziu à criação de uma Comissão Paritária constituída por representantes da Apifarma, da Direcção-Geral
da Concorrência e Preços (DGCP), do Instituto de Gestão
Informática e Financeira do Ministério da Saúde (IGIF) e do
Infarmed. Esta comissão reuniu por diversas vezes e levou,
também, à criação, na Apifarma, de seis Grupos de Trabalho – Autorização de Introdução no Mercado, Comparticipações, Mercado Ambulatório, Dívidas Hospitalares, Preços,
Promoção/Publicidade – constituídos por representantes
das empresas suas associadas. Ao referido protocolo sucedeu um outro, firmado em Março de 1997 pela Apifarma e
pelos Ministérios da Saúde e da Economia, o qual levou a
uma nova Comissão Paritária. No âmbito desta estrutura
debateu a Associação questões tão prementes como o relacionamento da Indústria com os médicos, a informação
médica e as regras de acesso de delegados de informação
médica, as comparticipações, a autorização de introdução
no mercado, os preços, os genéricos, a I&D no âmbito do
PEDIP II e a Economia e Saúde.
Outro importante ponto de preocupação da Apifarma, ao
longo dos anos 1990, foi a questão ambiental, sobretudo,
quando se começou a perspectivar a entrada em vigor da
legislação nacional decorrente da transposição parcial da
Directiva Europeia 94/62/CE, que regulamentou a gestão
de embalagens e de resíduos de embalagens. A Associação
participou, para o efeito, na Comissão de Acompanhamen-
Newsletter Notícias Apifarma (1992).
to e de Gestão de Embalagens e Resíduos de Embalagens
(CAGERE), procurando encontrar as melhores soluções
para o sector farmacêutico, o que a levou, também, a efectuar um processo de benchmarking com práticas implementadas noutros Países comunitários. Deste processo, e
das reuniões realizadas com a Associação Nacional das
Farmácias (ANF), a Associação de Grossistas de Produtos
Químicos e Farmacêuticos (GROQUIFAR) e a Federação das
Cooperativas de Distribuição Farmacêutica (FECOFAR), resultou a criação, em 1999, da Valormed, que iniciou actividade um ano depois. Foi confiada a esta sociedade sem fins
lucrativos a gestão do Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens (SIGREM), que integrou todo o circuito
de comercialização dos medicamentos, incluindo a produção, a distribuição e a comercialização nas farmácias.
Mereceu também crescente atenção por parte da Associação a questão deontológica, tendo a década de 90 ficado marcada pelo início de funções da Comissão Executiva
do Conselho do Código Deontológico, cujo regulamento foi
aprovado em Assembleia-Geral de Novembro de 1990. Cinco anos depois, e em resultado de notícias amplamente
veiculadas pelos meios de comunicação social sobre “alegadas práticas de promoção de medicamentos, violadoras
dos princípios éticos defendidos pela Apifarma”, propôs
a Direcção um novo Código Deontológico de Práticas de
Comercialização, que veio a ser aprovado pela Assembleia-Geral Extraordinária de 5 de Junho de 1995.
A imagem da Indústria Farmacêutica foi, porém, afectada
pelas referidas notícias e por outras que se lhes seguiram,
nomeadamente em 1997. Por isso mesmo, a Apifarma promoveu, na Primavera de 1998, uma alargada campanha de
comunicação pública sob o lema «Saúde para si. Saúde
para todos», a qual marcou presença na comunicação social através de spots radiofónicos e televisivos, de outdoors
e de anúncios na imprensa. O objectivo foi, uma vez mais,
133
sensibilizar a opinião pública para a importância e o papel
desempenhado pela indústria a nível social e económico.
É de sublinhar que a Apifarma se desenvolveu significativamente ao longo dos anos 1990, o que ficou patente não
só no aumento do número de associados, que, em 1999,
totalizava 130 membros, mas também na mudança para
uma nova sede, a qual ficou, a partir de 1993, instalada no
n.º 22 da Rua Pero da Covilhã, no Restelo. Subjacentes a
esta dinâmica de progresso estiveram importantes passos,
nomeadamente a criação, em 1990, da Comissão Especializada de Saúde Animal (CESA) e o início, em 1991, do
Grupo de Trabalho Meios de Diagnóstico. Neste mesmo
ano, iniciou a Associação um importante investimento na
formação profissional, tendo beneficiado das verbas disponibilizadas para o efeito pelo Fundo Social Europeu, e
instituiu, também, conjuntamente com a Escola Nacional
de Saúde Pública, um prémio anual de investigação com o
objectivo de “promover e incentivar a investigação no domínio do desenvolvimento da administração de hospitais
e outros serviços de Saúde”. Já no final da década, em
Dezembro de 1999, realizou-se um workshop que marcou
o início de uma importante parceria entre a Apifarma e as
associações de doentes, a qual teve como objectivo fundador o debate de questões relacionadas com a qualidade dos
serviços médicos, o acesso dos doentes a novas terapêuticas, os medicamentos órfãos, as doenças raras e as grandes prioridades de investigação da Indústria Farmacêutica.
ANOS 2000 E 2010: DOS GENÉRICOS AO PRIMEIRO
MEDICAMENTO ORIGINAL DE PATENTE MUNDIAL
Brochura institucional da Apifarma (1997/1998).
134
O novo milénio abriu com os medicamentos genéricos no
horizonte, impulsionados pelo Ministério da Saúde, que os
perspectivou como importante medida de redução e controlo do aumento da despesa do Estado com os fármacos.
Para vencer a estagnação que caracterizara, na última década, este mercado, o qual não representava sequer 0,5% do
total de vendas do sector farmacêutico, o Infarmed iniciou,
no ano 2000, um Programa Integrado de Promoção dos
Medicamentos Genéricos, envolvendo, simultaneamente, a
indústria, os profissionais de Saúde e o público em geral.
Consubstanciou-o um significativo conjunto de legislação,
particularmente o Decreto-Lei 205/00, de 1 de Setembro,
que introduziu uma majoração de 10% na comparticipação
ricos autorizados. Paralelamente, o Infarmed desenvolveu
um conjunto de iniciativas de sensibilização e educação,
nomeadamente através de uma equipa de Técnicos de Divulgação de Genéricos – que realizaram centenas de sessões a nível nacional, tendo contactado com cerca de 6300
médicos, em ambiente hospitalar e em Centros de Saúde,
e mais de 900 farmacêuticos –, mediante a criação de uma
linha telefónica informativa, de um website específico, de
campanhas de publicidade – realizadas entre 2001 e 2004
– e pela publicação periódica do Guia de Medicamentos Genéricos, destinado a médicos e farmacêuticos.
A posição da Apifarma relativamente a esta matéria foi,
desde logo, explicitada numa brochura publicada no ano
2000, sob o título Sobre os Medicamentos Genéricos em
Portugal: Algumas Notas & Reflexões, à qual se seguiu, em
Sede actual da Apifarma, no Restelo.
do Estado no preço desta classe de medicamentos, e o Decreto-Lei 271/02, de 2 de Dezembro, que instituiu a prescrição obrigatória por denominação comum internacional
(DCI) para substâncias activas com medicamentos gené-
Como se fossem o tema de uma sinfonia sempre incompleta, os medicamentos genéricos surgem ciclicamente no
debate sobre o SNS.
Para muitos, supostos de saber o que dizem e de cumprir o
que prometem, os genéricos seriam o remédio santo para
todos os problemas que afligem a saúde dos portugueses.
Derramando-os sobre o País, este transformar-se-ia num
verdadeiro paraíso. E a saúde, que a Constituição consagra
como um direito de todos e cada um, estaria para sempre
assegurada.
[…] os medicamentos genéricos não são o remédio decisivo para a doença que mina, na União Europeia, os meios
dos serviços públicos de saúde. E que, sobre ser injusto,
será incorrecto e perigoso dar a entender, ou deixar acreditar, que eles devem constituir-se como a prioridade das
prioridades de uma política de saúde responsável e eficiente. Convém, com efeito, ter presente que, nas grandes patologias, os genéricos não são medicamentos decisivos, não
obstante poderem, e deverem, ser utilizados em termos
complementares.
135
2001, o Livro Branco sobre Genéricos:
Procedimento de embalagem de medicamento genérico da Bluepharma.
136
Pese embora o pioneirismo da Ciclum Farma, fundada no
ano 2000, e da Generis, iniciada em 2001, foi sobretudo a
partir de 2002, com a publicação do referido Decreto-Lei
271/02, que a indústria nacional apostou no mercado dos
genéricos, como sucedeu com a ToLife, que iniciou a sua
actividade em 2003.
Este segmento interessou também aos laboratórios já
existentes, alguns dos quais reorientaram a sua acção comercial e produtiva para estes fármacos, merecendo destaque, entre outros, a Farmoz – criada em 1995 para a comercialização e promoção de medicamentos no mercado
hospitalar, mas que, em 2002, lançou uma gama de produtos farmacêuticos genéricos –, a Tecnimede e a Basi. Foi,
aliás, fruto da iniciativa de nove empresas dedicadas à produção e comercialização de medicamentos genéricos com
actividade em território português que se fundou, em Maio
de 2003, a APOGEN – Associação Portuguesa de Medica-
mentos Genéricos, com a missão de “divulgar o conceito
do medicamento genérico, contribuindo activamente para
o desenvolvimento deste mercado em Portugal”. Refira-se
que a abertura do mercado dos genéricos atraiu, também
os players internacionais, que, nesta década, abriram em
Portugal sucursais para o efeito, como sucedeu com a
Germed Portugal (2004), a Teva Portugal (2004), a Pharmakern Portugal (2005) e a Mylan Portugal (2008). A par
destas, e para além dos genéricos, instalaram-se, igualmente, no País as seguintes sociedades: Alfa Wassermann (por
aquisição da BioSaúde), Bene Farmacêutica, Codilab, Covidien, Diasorin Ibéria, Eisai Farmacêutica, Isdin – Laboratório
Farmacêutico, Kironfarma – Produtos Farmacêuticos, Lda.,
Laboratórios Galderma, SA, Lundbeck Portugal, Medac Portugal, Norgine Portugal Farmacêutica, Phadia, Reckitt Benckiser Healthcare, Smith & Nephew, Takeda - Farmacêuticos
Portugal, Lda., Vetoquinol, ViiVHIV Healthcare e Virbac de
Instalações fabris da Bluepharma, em Coimbra.
Instalações fabris da Labesfal-Fresenius Kabi, em Tondela.
137
Portugal – Laboratórios, Lda. Posteriormente, já em 2012,
chegaram a Beckman Coulter, a BSG Pharmaceuticals, a Ferrer Hospitalar, a Stago Portugal e a Zoetis Portugal, Lda.
O arranque do mercado de genéricos, mas também o
aprofundamento do Mercado Comum Europeu e a deslocalização geográfica da indústria, iniciada globalmente
e transectorialmente nos anos 1990, conduziram, nesta
década, ao desinvestimento das multinacionais nas unidades de produção que tinham estabelecido em Portugal nos
últimos 30 anos, sendo uma das excepções a OM Pharma, que em 2009, desenvolveu a sua fábrica de Alfragide. Diversos grupos e empresas portugueses do sector
farmacêutico aproveitaram a oportunidade que se abriu
com a desindustrialização, local, dos colossos farmacêuticos mundiais, tendo adquirido algumas das suas fábricas.
Assim sucedeu com o Grupo Medinfar – que, em 2001,
comprou a Farmalabor à Grunenthal, passando a deter o
complexo fabril de Condeixa-a-Nova –, com a Bluepharma
– fundada em Coimbra, em 2001, por um grupo de profissionais do sector farmacêutico, na sequência da aquisição
à Bayer das suas instalações industriais em S. Martinho do
Bispo – e, ainda, com a Lusomedicamenta – instalada em
2004 na antiga unidade fabril da Janssen-Cilag, em Queluz
– e com a Generis Farmacêutica, SA, empresa criada em
2001 e que, em 2008, adquiriu a fábrica da Sanofi Aventis,
em Loures, a qual pertencia, desde 2005, ao Grupo JABA.
O processo de desinvestimento pelas farmacêuticas multinacionais teve continuidade na década seguinte, período
em que a Merck, Sharp & Dohme encerrou a fábrica do
Cacém, anteriormente pertencente à Schering norte-americana, e em que a Bayer alienou a unidade de produção
que comprara, em 2007, à Schering Lusitana.
Em sentido contrário, assistiu-se nesta década à aquisição de importantes grupos industriais portugueses por
138
parte de empresas estrangeiras, de que são exemplo a venda da Labesfal à Fresenius, ocorrida em 2004, e a compra
do Grupo JABA pelo Grupo Recordati, realizada em 2006,
poucos anos depois da JABA ter efectuado um importante
investimento numa nova fábrica localizada na Abrunheira,
visando reforçar a sua capacidade de produção no fabrico e
embalagem de comprimidos, cápsulas e saquetas (líquidos
e sólidos).
O aludido processo de desinvestimento, por um lado, e
de aquisições, por outro, conduziu a um menor conjunto de indústrias farmacêuticas a operar em Portugal, mas
também a uma maior capacidade de produção, o que se
deveu à modernização das unidades fabris e ao aumento
da produtividade registado pela incorporação de novos métodos e equipamentos.
Se algumas indústrias portuguesas se dedicaram, como
vimos, aos genéricos, outras houve que se focaram na produção e comercialização de licenças de medicamentos
inovadores de multinacionais e, também, de produtos próprios, como foi o caso da Bial. Em 2014, este quase centenário laboratório logrou entrar no mercado norte-americano com um medicamento original, o qual se tornou no
primeiro fármaco de patente e investigação portuguesas a
ser aprovado pelo regulador do mercado farmacêutico dos
Estados Unidos. Comercializado na Europa desde 2009,
sob a marca ZEBINIX, este anti epiléptico, que recebeu nos
EUA o nome comercial APTIOM, ficou disponível nos cerca
de 40 Países a que a Bial fez chegar os seus produtos mediante a aposta na internacionalização, possuindo, desde
2012, uma fábrica e um centro de pesquisa e desenvolvimento em Bilbau. Neste campo particular, teve a companhia, entre outros, do Grupo Azevedos, que, em 2000,
inaugurou uma unidade industrial no Brasil, a Laboris. Foi
precisamente a pensar na internacionalização que a Api-
Complexo da Bial nos arredores do Porto.
Brochura institucional do PharmaPortugal.
farma, o Infarmed e a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) lançaram, em 2005, o
PharmaPortugal, um projecto estratégico para exportação
e internacionalização da Indústria Farmacêutica.
Outro fenómeno que começou a ganhar maior expressão
nesta década, apesar de remontar aos anos 1990, foi o desenvolvimento das biofarmacêuticas. Além dos laboratórios
internacionais que se instalaram em Portugal – como a Genibet Biopharmaceuticals, SA, a Gilead Sciences (anterior
Nexstar Farmacêutica), a Celgene Portugal e a Biogen Idec
Portugal –, surgiram, também, empresas nacionais, de que
são exemplo a Ecbio – Investigação e Desenvolvimento em
Biotecnologia, fundada em 1999 como empresa consultora na área da biotecnologia, mas que iniciou, em 2003, o
seu próprio laboratório de I&D, a Technophage e a Cell2B.
Foi também nesta década que iniciaram actividade algumas
startups – como a Luzitin (2010) e a Biotecnol, esta última
sediada originalmente em Oeiras, mas incorporada, posteriormente, no Reino Unido – e também as empresas Korangi
– Produtos Farmacêuticos, Lda. e CPCH – Companhia Portuguesa Consumer Health. Constituiu-se, igualmente, no domínio da distribuição grossista, a Udifar, fundada em 2009.
Ao nível da regulação e fiscalização, os anos 2000 presenciaram um robustecimento da actividade do Infarmed,
que, em 2006, se transformou em Autoridade Nacional do
Medicamento e Produtos de Saúde, IP, mantendo, porém,
o anterior acrónimo. Com efeito, em 2001, foram encerrados diversos laboratórios – sobretudo devido ao funcionamento dos mesmos sem os respectivos directores técnico
e laboratorial ou por apresentarem instalações degradadas
–, procedimento que foi amplamente mediatizado pelos órgãos de comunicação social.
Igualmente importante no sector do medicamento foi a
constituição, em 2005, da Comissão de Ética para a Investigação Clínica (CEIC), organismo que veio responder
a uma velha aspiração da Apifarma, que, já na década de
noventa, tinha solicitado ao Ministério da Saúde legislação
adequada sobre os ensaios clínicos de novos medicamentos. As origens da CEIC remontam ao final dos anos 1980,
com a criação do Centro de Estudos de Bioética, do qual
surgiu, em 1990, o Conselho Nacional de Ética para as
139
140
Ciências da Vida. Na década seguinte, foi determinante a
publicação do Decreto-Lei 97/94, de 9 de Abril – que estabeleceu as normas a que deviam obedecer os ensaios
clínicos a realizar em seres humanos, obrigando à obtenção do parecer favorável de uma comissão de ética –, e do
Decreto-Lei 97/95, de 10 de Maio, que definiu a composição e funcionamento das Comissões de Ética para a Saúde
(CES), definindo a criação de uma CES por cada instituição
e Serviço de Saúde público e privado e outorgando-lhes
a responsabilidade de se pronunciarem sobre os pedidos
de autorização para a realização de ensaios clínicos e de
fiscalizar a respectiva execução. Este modelo não se adequava, porém, às novas exigências do sector farmacêutico,
revelando-se impossível de compaginar, também, com a
Directiva 2001/20/CE, do Parlamento e do Conselho Europeus, a qual subentendia a criação, em cada País da União
Europeia, de uma única comissão de ética com competência para avaliar os ensaios clínicos com medicamentos
para uso humano. A CEIC nasceu, precisamente, da lei que
transpôs para a legislação portuguesa o conteúdo desta
Directiva – a Lei 46/2004, de 19 de Agosto –, tendo ficado
responsável, a partir de 2005, de emitir parecer ético e
científico sobre a realização de ensaios clínicos com medicamentos de uso humano e deliberando o Infarmed sobre
os benefícios e os riscos envolvidos. Dotada de independência técnica e científica, e funcionando na dependência
do Ministro da Saúde, foi instituidor da CEIC e seu primeiro presidente o médico António José de Barros Veloso.
Quanto à actuação da Apifarma, foi marcada, desde logo,
pela eclosão de novas realidades no sector do medicamento, as quais decorreram de medidas legislativas tomadas
pelos diferentes Governos. Uma delas foi a da prescrição
por Denominação Comum Internacional (DCI), tendo a posição da Associação passado por explicitar que Portugal
seria o único País da Europa a implementar tal medida
com carácter de obrigatoriedade e, também, por expor as
implicações subjacentes. Informou a Apifarma no seu Relatório de Actividade de 2002:
De facto, a prescrição e dispensa de medicamentos com
a utilização obrigatória da DCI altera a cadeia de responsabilidades dos intervenientes neste processo. O acto de
escolha do medicamento deixa de ser baseado em conhecimentos médicos e técnico-científicos, passando para a
cadeia de distribuição e/ou para o utente. Com a obrigatoriedade de prescrição por DCI e com as modalidades de
dispensa de medicamentos na farmácia não há garantia
da consistência do tratamento nem de adesão do doente a
esse tratamento. Por outro lado, não há garantia, por parte
do Ministério da Saúde, de que o medicamento dispensado
nas farmácias cumpra as disposições legais. Isto é: não há
garantia de que seja o «medicamento com um preço mais
baixo», como manda a lei. Para além destes princípios,
desde o início deste processo, a Apifarma defendeu que a
DCI não deveria ser aplicada a todas as categorias de medicamentos, facto que acabou por se reflectir na legislação.
Outro vector importante foi o dos prazos de introdução
dos novos medicamentos no mercado, tendo a Associação
realizado várias iniciativas para alertar para esta questão, nomeadamente através do workshop «A Espera dos
Doentes por Novos Medicamentos: Pode a Europa Fazer
Melhor?», que, em Outubro de 2005, organizou, conjuntamente com a EFPIA, no Centro Cultural de Belém. Também
o novo Estatuto do Medicamento, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 176/2006, de 30 de Agosto, e a dispensa de medicamentos por unidose – regulamentada pelas Portarias n.º
697/2009, de 1 de Julho, e n.º 455-A/2010, de 30 de Junho –, medida tomada pelo Ministério da Saúde com o objectivo de “evitar o desperdício e permitir uma maior poupança”, foram alvo da atenção da Associação. Finalmente,
e tal como no passado mais recente, a Apifarma continuou,
nos anos 2000 e 2010, a acompanhar e a gerir o constante
Exposição «Mãos que Partilham Vida».
aumento das dívidas dos hospitais à indústria, as quais se
agravaram, tendo atingido, em Dezembro de 2000, cerca
de 86,5 milhões de contos e um prazo médio de pagamento de 402 dias. Neste âmbito, foram celebrados protocolos
trianuais com o Ministério da Saúde, procurando-se, assim,
criar “condições de estabilidade e de desenvolvimento sustentado da Indústria Farmacêutica, num quadro de alguma
previsibilidade de evolução do Sector e de colaboração da
Indústria relativamente às dificuldades financeiras do SNS
nas despesas com medicamentos”.
Porventura motivada pela Resolução do Conselho de Ministros, de 28 de Junho de 2001, que declarou a Indústria
Farmacêutica como estratégica para Portugal, a Apifarma
realizou, em Novembro deste mesmo ano, o «1.º Fórum da
Indústria Farmacêutica», o qual teve lugar no Centro de
Congressos da AIP. Em análise e debate estiveram temas
tão diversos quanto a Investigação, as Ciências Biomédicas,
as questões éticas e o futuro do mercado farmacêutico.
Em simultâneo, decorreram um ciclo de cinema dedicado
a temas da Medicina e dos medicamentos, uma mostra
de desenvolvimento tecnológico aplicado ao diagnóstico in
vitro e as exposições «Os Doentes e a Arte» e «Mãos que
Partilham Vida», esta última de âmbito interactivo e direccionada, especificamente, para os mais jovens, envolvendo
as escolas e as comunidades.
O ênfase na Deontologia, que transitara das anteriores
décadas, acentuou-se, nos anos 2000 e 2010, mediante
a renovação, em 2001, do Protocolo Deontológico com a
Ordem dos Médicos, a celebração, em 2003, de um Protocolo Deontológico com a Ordem dos Farmacêuticos, a
aprovação, em 8 de Novembro de 2005, de um novo Código
Deontológico das Práticas Promocionais da Indústria Farmacêutica, e a adopção, em 2008, de um Código de Conduta para
as Relações entre a Indústria Farmacêutica e as Associações de
141
Campanha de adesão à terapêutica, desenvolvida, em 2007, pela Apifarma.
142
Doentes. Aprofundaram-se, também, as relações internacionais, tendo a Apifarma reforçado a sua participação nos principais organismos do sector ao integrar a Direcção da EFPIA
(no ano 2000 e entre 2004 e 2008) e o Executivo da IFPMA
(em 2001 e entre 2004 e 2006).
Uma das áreas de actividade que mais progressos registou
foi a da Comunicação. De facto, a Apifarma deu um salto
qualitativo nos anos 2000, o que se materializou na abertura
do site institucional, lançado no ano 2000, e sucessivamente
melhorado e renovado, na produção do programa televisivo
Bem-Estar, sediado no Canal Saúde (2003), na criação de
uma extranet para comunicação com os associados, a qual
teve início em Maio de 2005, e na gestão da identidade visual
da Associação, que foi renovada, em 2007, mediante a criação de um novo logótipo e de um novo símbolo, este último
inspirado numa cadeia de ADN. Em simultâneo, a Apifarma
investiu, também, mais na investigação científica, que fo-
mentou através de diversas parcerias, nomeadamente com a
Fundação Calouste Gulbenkian, no desenvolvimento sustentável, tendo subscrito, em 2007, o Pacto Global das Nações
Unidas, e na responsabilidade social, actuando ao nível dos
doentes, dos cidadãos e das empresas, da ciência e da investigação científica, do ambiente e da deontologia. No âmbito
dos doentes e dos cidadãos, mereceram especial destaque
as campanhas públicas de sensibilização realizadas pela Associação nos domínios do diagnóstico, da prevenção e da
informação para a Saúde.
BIBLIOGRAFIA
Fontes
Apifarma
Arquivo Diário de Notícias
Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT
Biblioteca Nacional
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Centro de Documentação Farmacêutica - Ordem dos Farmacêuticos
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(*) Doutorando em Ciências da Comunicação pelo ISCTE/IUL, é
autor de vários livros presentes nas colecções da Library of Congress, da New York Public Library e das bibliotecas das universidades de Harvard e Columbia. Foi Director de Comunicação das
empresas ABB Portugal e Ericsson Telecomunicações e desempenhou cargos de assessoria e consultoria no Ministério da Saúde,
na Comissão de Luta contra a SIDA, no programa Saúde XXI e na
Sociedade Portuguesa de Medicina Interna. A convite do Dr. António José de Barros Veloso, participa, actualmente, no livro «Para a
História da Medicina Portuguesa no Século XX».
143
4.
Excerto de cartaz publicitário do «Invicta Quina:
Velho Quinado – Preciosa Jóia»
144
Farmácia Souza (1919-1923)
INVESTIGAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E SEU
CONTRIBUTO PARA A EVOLUÇÃO CIENTÍFICA
E PARA A SAÚDE PÚBLICA
145
146
Francisco Batel Marques
Faculdade de Farmácia de Coimbra
AIBILI Coimbra
A Indústria Farmacêutica funcionou, classicamente, com o
objectivo de encontrar soluções terapêuticas para necessidades médicas. Actualmente, procura opções que acrescentem valor terapêutico e, na perspectiva da sociedade,
rácios custo/efectividade mais favoráveis. Com a hierarquização da robustez da natureza de prova da relação causa-efeito a comandar as avaliações das relações benefício/
risco e com a regulação e regulamentação farmacêutica e
do medicamento a convergir para a efectividade comparativa, é a perspectiva do financiamento dos ganhos documentados pela utilização do medicamento que se afigura,
e não a do financiamento do medicamento em si mesmo.
Contudo, tornar disponíveis medicamentos inovadores
destinados ao tratamento de patologias, ainda, não-tratáveis, ou insuficientemente tratadas, depende, em muito
larga extensão, dos esforços de investimento que a Indústria Farmacêutica multinacional, baseada e orientada por
princípios e valores de mercado, esteja disposta e disponível a realizar e concretizar.
Porém, o modelo clássico de Indústria Farmacêutica, enquanto linha sequencial e integrada dos desenvolvimentos
químico, farmacêutico, clínico, industrial e comercial, modelo típico dos meados do século XX, já não existe.
Desde um mosaico de entidades de filiação pública e privada, algumas com forte componente universitária (empresas de história operacional limitada – start-up – ou baseadas
num produto ou serviço de alta tecnologia – spin-off), até à
emancipação de projectos exclusivamente fabris, passando pela externalização dos desenvolvimentos pré-clínico e
clínico, por exemplo, criaram-se novos processos identitários do que é, hoje, a Indústria Farmacêutica.
Se é verdade que o velho figurino de Indústria Farmacêutica contribuiu para disponibilizar medicamentos que,
sem qualquer sombra de dúvida, melhoraram a Saúde Humana num contributo insubstituível para o aumento da
esperança e da qualidade da vida, não é menos verdade
que a universalização do acesso ao medicamento, o vale
da queda cronológica da protecção das patentes e a entrada de novas empresas não oriundas do tradicional mundo
ocidental industrializado, rapidamente tornadas gigantes,
a transfigurou, conferindo-lhe uma imagem mais generalista e uma identidade muito mais próxima de outras indústrias baseadas na investigação e no desenvolvimento.
A construção dos equilíbrios necessários à compatibilização de necessidades sociais, à eficiência industrial
farmacêutica e à sustentabilidade económico-financeira
dos sistemas, públicos ou privados, de financiamento dos
medicamentos, tem sido um desafio constante para os decisores políticos em Saúde. Porém, num país pobre, com
um Estado fraco, os fracassos de Estado tornam-se mais
acentuados, pelo que a expectativa relativamente aos contributos mútuos deverão permanecer baixas.
Numa pesquisa orientada para avaliar o contributo científico da Indústria Farmacêutica, entre nós, apenas conseguimos identificar, de forma consistente, um caso em
que a publicação proveniente de colaborações Indústria
Farmacêutica/universidade se saldou por um período de
tempo relativamente longo numa sequência de publicações internacionais indexadas e arbitradas, com muito
bons indicadores de impacto, designadamente citações.
Tal é revelador da existência de capacidade instalada, da
possibilidade da sua potenciação, da viabilidade da cooperação inter-institucional, bem como da exequibilidade, entre
nós, da translação rápida entre momentos sequenciais.
Não se detectam, porém, movimentos do lado da Saúde
Pública, exceptuando a produção, a intervalos de tempo
147
regulares, do Plano Nacional de Saúde, que não identifica
movimentos de articulação, nomeadamente o de ajustamento de prioridades ao financiamento.
A Indústria Farmacêutica de capital nacional tem-se associado, sobretudo, à produção industrial de medicamentos, ao passo que a investigação e desenvolvimento clínicos se associam, em muito maior extensão, às empresas
multinacionais, de capital internacional.
Portugal verifica, ainda e no presente, a centralização da
inovação terapêutica quase exclusivamente nos hospitais.
É cedo para identificar as consequências e os impactos
deste brutal alargamento do perímetro terapêutico hospitalar, muito alicerçado em questões de natureza orçamental pública, em preços livres e em negociações directas do
número de doentes a tratar.
A evolução dos padrões epidemiológicos de doença, bem
como as determinantes do seu desenvolvimento e ocorrência, continuarão forças orientadoras da actividade da
Indústria Farmacêutica, agora moduladas por outras determinantes dos processos de investigação e desenvolvimento de novas entidades com potencial utilização clínica.
Cremos, contudo, que a grande área de negócio futuro da
Indústria Farmacêutica será transaccionar conhecimento
e translacionar utilidades.
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Patricio Soares da Silva
Faculdade de Medicina do Porto
Laboratórios Bial
A Indústria Farmacêutica é um sector de actividade a nível mundial que canaliza em média 14-17% do volume de
negócios para a vertente da investigação e desenvolvimento (I&D) [1]. Esta política de forte investimento em I&D
pretende assegurar a disponibilização de novas opções terapêuticas, um dos sustentáculos de uma melhor Saúde
Pública. O facto de ser a Indústria Farmacêutica o garante
da inovação do medicamento, e consequente melhoria das
medidas terapêuticas disponibilizadas às populações, radica no princípio, ainda que não de todo linear, de não pertencer ao Estado Providência este tipo de actividade. Esta
tem sido uma prática mais do que secular, em distintos
territórios e culturas, que, de parte a parte, não é desinteressada. O sector público concentra-se em proporcionar
às populações melhores condições assistenciais, Cuidados
Médicos de Saúde Primários e Hospitalares, na expectativa de que a Indústria Farmacêutica cumpra com o seu
desígnio investigue e desenvolva novos medicamentos e assegure os investimentos necessários. Nesta vertente, são
por demais conhecidos os custos elevados referentes ao
investimento para desenvolver um medicamento, as altas
taxas de insucesso que esta actividade comporta e a longa
duração que estes projectos exigem.
A Bial-Portela & C.ª S.A., desde há longa data a maior
companhia farmacêutica portuguesa, apostou, nas duas
últimas décadas, numa estratégia de desenvolvimento de
novos medicamentos, sob a orientação inicial do Professor José Ruiz de Almeida Garrett, a quem sucedi a partir
de 1995. Contando com uma sólida equipa em diversas
vertentes científicas, a Bial sintetizou e tem vindo a investigar, nas vertentes farmacodinâmica, farmacocinética, toxicológica e clínica, várias novas entidades químicas (NEQ)
Instalações laboratoriais da Bial.
149
150
destinadas à terapêutica de patologias do sistema nervoso
central e cardiovascular. A estratégia da Bial nesta matéria assentou em dois pontos: 1) a identificação precisa de
áreas de investigação susceptíveis de gerar oportunidades,
como o são as doenças cerebrais e cardiovasculares, e 2)
a incorporação na companhia de competências científicas
e tecnológicas. Presentemente, o processo de descoberta
e o lançamento de um novo medicamento envolve equipas
interdisciplinares, reunindo competências diversas, sendo
que a Bial centraliza as fases estruturantes e sigilosas do
processo, estabelecendo acordos e contratos de cooperação com diversas instituições – centros de ensaios clínicos,
hospitais, universidades – nas fases posteriores. A investigação faz-se em rede, em cooperação, e nesse sentido, entre 1993 e 2013, a Bial estabeleceu contratos de I&D com
116 instituições. Este ambicioso programa de I&D tem
sido alimentado por consideráveis investimentos, que, no
caso vertente correspondem anualmente a cerca de 20%
da facturação, 40 milhões de euros, o que está acima da
média dos investimentos da Indústria Farmacêutica.
O acetato de eslicarbazepina (com o nome de código BIA
2-093 e comercializado sob as designações de Zebinix®
e Aptiom®) foi o primeiro dos novos medicamentos que a
Bial se prontificou desenvolver. Tratava-se de um fármaco
destinado ao tratamento da epilepsia e, à data de 1993,
resultou de uma opção estratégica de testar os objectivos
ambiciosos da companhia na área habitualmente reservada às grandes companhias farmacêuticas multinacionais,
com um mínimo de investimento inicial. Sublinho o facto
de este projecto ter sido concebido em 1993, em parceria
com o químico Jan Benes, e os primeiros compostos terem ainda sido testados nesse mesmo ano num espartano
laboratório de farmacologia, em que pontuava o sistema
de aplicação de electrochoques cerebrais por via de eléctrodos corneanos. Avaliou-se o perfil farmacodinâmico de
quase duas centenas de NEQ e a nossa escolha, em 1994,
recaiu sobre o composto número 93 [2]. Seguiram-se o pedido de patente em 1996, concedido pelo European Patent
Office e pelo United States Patent Office em 1998 [3] e
[4], e o início da avaliação toxicológica em 1997. Três anos
depois, em 2000, foi administrado, pela primeira vez, na
espécie humana (voluntários saudáveis), e, em Fevereiro de
2002, iniciou-se a avaliação terapêutica em doentes epilépticos, envolvendo perto de 150 doentes e 17 centros de
investigação de nove países da Europa Central, um marco
histórico na Farmacologia Clínica portuguesa. Por fim, realizaram-se os ensaios confirmatórios de eficácia (fase III),
alargados a grande número de doentes em distintas regiões do globo e que visaram, para além de provar a eficácia,
determinar a tolerabilidade e a segurança do novo fármaco. Nesta etapa, o acetato de eslicarbazepina foi testado
em mais de 1400 doentes refractários aos antiepilépticos
convencionais em diferentes pontos do globo. Resultado
de 14 anos de investigação e de investimentos na ordem
dos 300 milhões de euros, em Abril de 2009, o acetato
de eslicarbazepina, sob a marca comercial Zebinix®, foi
aprovado pela Comissão Europeia para o tratamento adjuvante de adultos com crises epiléticas parciais, com ou
sem generalização secundária. A aprovação do acetato de
eslicarbazepina pela Food and Drug Administration teve
lugar em Novembro de 2013 e a comercialização nos Estados Unidos da América, sob a designação de Aptiom®,
iniciou-se em 2014, vinte anos depois da respectiva descoberta. De salientar que o processo de desenvolvimento do
Departamento de I&D do Grupo Bial.
acetato de eslicarbazepina ainda não terminou. Estão em
curso estudos que se destinam a avaliar novas indicações
terapêuticas, nomeadamente a sua utilização na epilepsia
em regime de monoterapia em adultos e como tratamento
adjuvante em crianças epilépticas. Sublinha-se que a epilepsia é uma das doenças neurológicas mais comuns, afectando aproximadamente uma em cada cem pessoas. Em
Portugal, estima-se que, em cada mil portugueses, quatro
a sete sofrem da doença. Aproximadamente 50 milhões de
pessoas em todo o mundo sofrem de epilepsia.
Cada vez mais, pensamos os novos medicamentos como
sabotadores moleculares, em que os seus efeitos curativos
se manifestam através da anulação do trabalho de proteínas-chave existentes no organismo. Os medicamentos mais
eficazes e mais bem tolerados acomodam-se intimamente
nas reentrâncias das superfícies de dadas proteínas-alvo e
deixam outras intocáveis. Por não ser fácil conceber medicamentos que escolham os seus alvos com esta eficiência,
é aceitável o facto de o desenvolvimento de medicamentos
no passado se ter baseado em ensaios de tentativa e erro,
testando milhares de potenciais medicamentos e encontrando poucos que efectivamente curam sem prejudicar.
Para quem concebe medicamentos, o futuro passa pela
utilização exaustiva das novas tecnologias da genómica,
proteómica e bioinformática, de forma a dar resposta à
procura de melhores alvos para obter medicamentos mais
eficazes e seguros. O segundo produto de investigação Bial,
um novo agente para tratamento da doença de Parkinson,
151
152
a opicapona, surge já como resultado de um processo de
investigação radicalmente diferente do primeiro, em que
pontuou a capacidade de delinear a nível molecular a interacção da estrutura química com a entidade biológica, recorrendo-se a sofisticados meios bioinformáticos [5] que,
em devido tempo, foram incorporados no departamento de
investigação e desenvolvimento da Bial. A opicapona, cujos
ensaios confirmatórios de eficácia já estão concluídos com
assinalável êxito, foi alvo de um contrato de licenciamento
exclusivo com uma empresa japonesa, tendo em vista o
seu desenvolvimento e comercialização no Japão.
Resultado do trabalho consistente que tem vindo a ser realizado, a Bial tem, em diversas fases de desenvolvimento,
uma gama de outros potenciais novos medicamentos em
distintas áreas terapêuticas, explorando inovadores mecanismos de intervenção. Hoje, é reconfortante pensar que
os medicamentos disponíveis durante o século XX tiveram
como alvo apenas 300 diferentes entidades biológicas, existindo a promessa de que 3000 a 5000 produtos proteicos
oriundos de genes humanos e patogénicos se venham a provar como interessantes novos alvos para medicamentos.
As próximas décadas perspectivam-se francamente dinâmicas sob o ponto de vista científico e podem levar a
desvendar mistérios que ainda fazem parte de uma vertente parcial ou totalmente incompreensível. Ainda que as
oportunidades sejam muitas, as dificuldades no percurso do desenvolvimento de novos medicamentos são uma
constante, pelo que o mais esperado sejam os permanentes desafios à inventividade e o prazer de os ultrapassar.
A crise de produtividade da Indústria Farmacêutica, sobre
que tanto se escreve [6] e [7], é também uma oportunidade para alterar rotinas e criar novas formas de atingir
objectivos, a menor custo, com mais assertividade, e de
onde possa resultar um melhor e maior benefício colectivo.
Para aqueles cuja vida se apresenta doente e sem esperança, um fármaco em fase experimental é uma alternativa
e, se este prova ser eficaz e bem tolerado, então o novo
medicamento é uma segunda oportunidade para muitos.
Cabe-nos, a cada qual, na medida da sua capacidade e
responsabilidade sectorial – porque são muitos e diversos
os intervenientes, nomeadamente cientistas, empresários,
reguladores, legisladores e governantes, fazer com que as
novas terapias medicamentosas cheguem em tempo útil
àqueles que mais delas necessitam. Que se valorize o que
a ciência e a técnica podem permitir, a um custo aceitável
sob o ponto de vista social e que seja economicamente
sustentável.
BIBLIOGRAFIA
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figures 2012. In, International Federation of Pharmaceutical
Manufacturers & Associations, http://www.ifpma.org/fileadmin/
content/Publication/2013/IFPMA_-_Facts_And_Figures_2012_
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azepines, method for their preparation, their use in the treatment
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[4] Benes J, Soares-da-Silva P. Substituted dihydrodibenzo/b,f/
azepines, method of their preparation, their use in the treatment
of some central nervous system disorders, and pharmaceutical
compositions containing them. Application number 673,819. Patent number US 5,753,646. Grant date 1998-05-19.
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153
5.
Excerto de cartaz publicitário do «Urol:
Dissolvente Enérgico do Ácido Úrico»
154
Farmácia Formosinho (1916-1919)
O VALOR DO MEDICAMENTO E O SEU
CONTRIBUTO PARA A SOCIEDADE
155
156
O VALOR DO MEDICAMENTO E O SEU CONTRIBUTO PARA A SOCIEDADE
José Aranda da Silva
Primeiro Presidente do Infarmed (1993-2000)
Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos (2001-2007)
As últimas décadas foram caracterizadas por um elevado ritmo de inovação científica e tecnológica nas diversas
áreas da Ciência. A inovação é mais visível na área das tecnologias de informação e comunicação (telemóveis, computadores, televisão, por exemplo), cuja utilização está
massificada e tem impacto no dia-a-dia do cidadão, tanto
dos países mais desenvolvidos, como nos países em vias
de desenvolvimento.
Muitas destas tecnologias permitiram que países menos
desenvolvidos galgassem etapas em poucos meses, as quais
os países mais desenvolvidos levaram anos a percorrer.
No entanto, as tecnologias com impacto na comunicação e informação só serão totalmente úteis se os seres hu-
manos que as utilizam conseguirem atingir um bem-estar
que permita a utilização dessas tecnologias de forma eficiente e ao longo da vida.
As tecnologias da Saúde, nomeadamente o medicamento, apesar de não terem no dia-a-dia do cidadão a mesma
visibilidade que as tecnologias associadas a bens de consumo corrente, têm sido determinantes para que indicadores como a esperança de vida à nascença e a mortalidade infantil tenham melhorado espectacularmente nos
últimos cinquenta anos.
Por outro lado, o desenvolvimento económico não é possível sem populações saudáveis. A criação, nos finais do
século XIX, de Sistemas de Saúde organizados (Alemanha,
por exemplo) resultou, em parte, da necessidade da Revolução industrial, então em marcha, ter mão-de-obra saudável. A necessidade do desenvolvimento económico e de
aumento de competitividade das economias do centro da
Europa, na sequência da Revolução Industrial, levou a que
os governos propusessem às organizações patronais e às
organizações sindicais a implementação de sistemas de
protecção social, nomeadamente na área da Saúde. O desenvolvimento económico não era possível com uma força de trabalho fragilizada e com fraca produtividade, pelo
que era necessário dar resposta a esse problema melhorando o estado de Saúde dos trabalhadores. Entretanto,
em muitos países tinham sido criadas, por iniciativa dos
trabalhadores, organizações mutualistas e cooperativas.
Em meados do século XX, o desenvolvimento económico
resultante da reconstrução Europeia esteve associado à
organização de Sistemas de Saúde por toda Europa, com
figurinos Bismarkianos, Beveridgeanos ou, na esmagadora maioria dos casos, mistos.
Com efeito, poucos sistemas actuais (se é que algum)
157
têm todas as características dos modelos iniciais, pois evoluíram ao longo do tempo, adaptando-se às condições sociais,
económicas e políticas, com complexidade variável e a diferentes ritmos de crescimento.
É de notar que estes modelos surgem no pós-guerra, numa
fase de grandes dificuldades e de crise económica e financeira, em que os governos dispunham de poucos recursos e
em que era necessário estabelecer prioridades. A criação e
desenvolvimento de Sistemas de Saúde, com financiamento
público, foi uma prioridade em todos os países hoje considerados os mais desenvolvidos da Europa. Eles foram um
suporte indispensável ao desenvolvimento económico, só
interrompido pela crise petrolífera do início da década de
setenta.
Portugal, dada a natureza do Regime Ditatorial, o atraso
económico e o isolamento internacional, só no final dos anos
setenta arrancou definitivamente com a criação do Serviço
Nacional de Saúde (SNS).
É, no entanto, a partir da segunda metade do século XX,
com o desenvolvimento dos Sistemas de Saúde e a criação
de novas necessidades, que aparecem novas tecnologias associadas ao emergente mercado da Saúde. As tecnologias de
diagnóstico e os medicamentos, a cobertura total da população por sistemas de saneamento público, e o crescente nível
educacional vão modificar radicalmente o estado de Saúde
das populações, com incrementos nunca vistos em diversos
indicadores. A esperança de vida à nascença aumentou nos
países da OCDE mais de dez anos, desde 1960 e a média da
esperança de vida após os 65 anos é de cerca de 20 anos nas
mulheres e de 17 anos nos homens.
Alguns autores (Miguel Gouveia, 2013/CIP) ao reflectirem
sobre o valor criado pelos Cuidados de Saúde e interrogando-
158
-se sobre a proporção do aumento da esperança de vida que
se deve às inovações nos cuidados de Saúde, consideram que
esse valor é de 10%. Consideram ainda que o valor anual da
esperança de vida gerado nos cuidados de Saúde é de cerca
de 3,1% do PIB per capita em 2010. Analisando o aumento
médio anual dos custos reais per capita com Saúde concluem
que o Sistema de Saúde português terá gerado benefícios incrementais 9,2 vezes maiores que os acréscimos de custos.
No que se refere aos medicamentos, analisemos o que se
passou nas últimas décadas e qual o contributo que deram
à sociedade.
A descoberta das sulfonamidas, em 1940, foi uma verdadeira revolução no tratamento das doenças infecciosas, à
qual se seguiu a descoberta de outros anti-infecciosos como
as penicilinas, o cloranfenicol, as tetraciclinas e a estreptomicina. Obtiveram-se, assim, resultados nunca antes imaginados no controlo das infecções, consideradas na época, como
uma das principais causas de morte.
Antes dos anos cinquenta, o tratamento da tuberculose
envolvia estruturas complexas e com elevados custos, baseando-se, fundamentalmente em tratamentos sintomáticos. A
descoberta de medicamentos antituberculosos, como o PAS,
e de antibióticos, como a estreptomicina, alterou totalmente
os paradigmas existentes, observando-se resultados espectaculares ao nível do tratamento.
A evolução científica nas áreas da Fisiologia e da Biologia
humanas permitiu que fossem identificadas estruturas e receptores que ajudaram a compreender a patofisiologia de
numerosas doenças. A evolução da Química, nomeadamente
da Química Orgânica, permitiu a síntese de numerosas moléculas, numa primeira fase tentando imitar produtos naturais
com acções terapêuticas e, numa segunda fase, tentando
responder aos conhecimentos adquiridos sobre o mecanismo de diversas patologias (doenças cardiovasculares, neurológicas e do foro psiquiátrico).
Da fase da investigação química, em que se colocaram
no mercado centenas de moléculas (anti-histamínicos, anti-convulsivantes, anti-hipertensores, anti-psicóticos, anti-ácidos, anti-inflamatórios, entre outros), assiste-se a uma
fase em que aparecem numerosas entidades terapêuticas
de natureza proteica, produtos que actuam ao nível dos
sistemas enzimáticos e de origem biotecnológica, nomeadamente as vacinas.
Actualmente, têm sido aplicadas, em diversas áreas, novas
entidades terapêuticas, como os anticorpos monoclonais, e
a terapêutica celular e a terapêutica génica estão na ordem
do dia.
A utilização de biomarcadores como testemunhos de um
processo normal ou patológico tem cada vez mais importância, nomeadamente em oncologia.
A nanotecnologia aplicada a diversas áreas da ciência
desperta grandes esperanças na terapêutica com substâncias medicamentosas.
Tal como tinha acontecido na década de sessenta do século XX com a tuberculose, as doenças infecciosas, como
o VIH/SIDA, que há vinte anos eram prioridade das autoridades sanitárias de todos os continentes, estão hoje controladas, não só pela prevenção primária, mas fundamentalmente devido ao contributo dos medicamentos. Existem
diversos estudos publicados que comprovam o papel determinante dos medicamentos na diminuição do número
de mortes por VIH (Lichtenberg FR, 2009).
159
Com base em estudos efectuados no Canadá (Lichtenberg
FR. 2009), calcula-se que a introdução de novos medi-
160
camentos nas últimas três décadas reduziu, na população
estudada, o risco de morte em 51%.
As doenças cardiovasculares são, nas sociedades desenvolvidas, ainda, a principal causa de morte, seguida pelas
doenças oncológicas.
Nos últimos anos foram introduzidos no mercado numerosos medicamentos na área cardiovascular (anti-hipertensores, anti-arrítmicos, anti-dislipidémicos) que, associados
ao investimento da prevenção primária, conseguiram inverter a carga social desse tipo de patologias. Num estudo
publicado (Cutler DM, 2007) referente aos EUA, concluiu-se que, entre 1999 e 2000, a média estimada de pressão arterial era 10% a 13% mais elevada sem o uso de
anti-hipertensores. O uso de novos medicamentos cardiovasculares promoveu, também, a diminuição do tempo de
hospitalização (Lichtenberg FR, 2009).
Os resultados obtidos no aumento da esperança de vida deram lugar a questões associadas ao envelhecimento, nomeadamente o incremento da carga das doenças oncológicas,
o que tem trazido novos desafios à investigação clínica. O
número de medicamentos oncológicos aprovados pelas autoridades reguladoras tem aumentado nos últimos anos e prevê-se que corresponda a mais de 60% das novas entidades
terapêuticas a serem aprovadas nos próximos cinco anos.
A investigação clínica reorienta-se ao longo do tempo
para áreas referentes a patologias com maior importância
para os Sistemas de Saúde, respondendo às necessidades
dos Sistemas de Saúde e à procura de rentabilidade empresarial por parte das companhias farmacêuticas.
O balanço das últimas dezenas de anos sobre o papel
da terapêutica medicamentosa na melhoria do estado de
Saúde das populações é muito positivo. Os medicamentos,
a par com outras medidas sanitárias, tiveram um papel
determinante na evolução positiva de diversos indicadores
que traduzem ganhos significativos em Saúde.
Para além da influência directa em resultados em Saúde,
os medicamentos têm efeitos na melhoria da capacidade
das sociedades para produzirem bens e serviços.
Alguns autores (Lichtenberg FR, 2009) consideram que o
benefício dos novos medicamentos no aumento da capacidade de trabalho é nove vezes maior que o custo dos novos
medicamentos.
Quando se aborda o tema dos medicamentos, a actualidade é dominada pelas dificuldades existentes no seu financiamento. Vivemos num período de contenção orçamental,
sendo que grande parte do financiamento dos medicamentos é público (60% em Portugal).
Por outro lado, há a percepção, por parte das autoridades
financiadoras e do público em geral, que os preços dos medicamentos inovadores são demasiado elevados tendo em conta a capacidade de financiamento dos Sistemas de Saúde.
Há países que consideram que a Indústria Farmacêutica
tem grande importância no desenvolvimento do sistema
científico nacional e na promoção de riqueza e emprego
qualificado (Alemanha, França, Itália, Reino Unido e Suíça).
Outros países mais periféricos, apesar de considerarem,
nas sucessivas declarações dos governos, que a Indústria
Farmacêutica nacional tem interesse estratégico e é geradora de exportações significativas e muito importantes na
conjuntura actual, acabam por tomar medidas que denotam
encararem a actividade da Indústria Farmacêutica como geradora de despesa pública.
Não se conhecem alternativas à Indústria Farmacêutica na
geração de inovação terapêutica. Mesmo que se considere
importante criarem-se alternativas a essa dominância científica, a obtenção de resultados levaria mais de uma década.
Queremos com isto dizer que estamos perante uma situação em que, para bem dos doentes, os principais beneficiários da inovação terapêutica, é necessário encontrar soluções que alterem os paradigmas e comportamentos das
diversas partes que neste contexto são interdependentes.
Os medicamentos, com os impressionantes resultados
obtidos, provaram ao longo dos anos o seu valor social e
económico.
Num quadro global em que a Saúde e o Bem-Estar das populações é unanimemente considerada uma prioridade por
parte do poder político e dos cidadãos, e em que os recursos são limitados, é necessário encontrarem-se soluções.
A diabolização mútua reflecte uma prática medieval que
não aponta soluções e leva-nos para o abismo.
São condenáveis práticas de abuso de posição dominante
na fixação de preços num mercado imperfeito. Serão também
condenáveis medidas administrativas cegas, que pretendem
efeitos a curto prazo de contenção de despesa, não tendo em
conta o interesse dos doentes e a importância económica de
um sector dinâmico e gerador de novidade e inovação.
As soluções passam pelo estabelecimento de pontes de
diálogo transparente, por procedimentos com base na evidência científica que valorizem a eficiência e efectividade,
e não, apenas, os interesses de curto prazo.
Miguel Gouveia. O Valor Económico da produção de um Sistema de
Saúde; Conferências CIP 2013.
Pierre Joly.; Les Médicaments du futur. Odile Jacob 2009.
BIBLIOGRAFIA
Cutler DM et al. The value of antihypertensive drugs ;Health Aff
2007;26;97-110.
Lichentberg et al. The impact of Drug Vintage on Patient
Survival.;Value in Health 2009; 12:6.
161
6.
Excerto de cartaz publicitário do «Plasma Phosphatado»
Instituto Doyen (1916-1919)
162
O SECTOR FARMACÊUTICO NACIONAL E MUNDIAL
163
164
MERCADO DO MEDICAMENTO MUNDIAL, EUROPEU E NACIONAL
Conta-nos uma acta do ano de 1939:
Heitor Costa
Director Executivo da Apifarma
1939-1975: A ERA DO GRÉMIO NACIONAL DOS
INDUSTRIAIS DAS ESPECIALIDADES FARMACÊUTICAS
Em 1939, enquanto a Europa vivia sob o fantasma da Grande Guerra e da consequente degradação da condição humana, em Portugal, um grupo de homens une esforços e
forma o Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades
Farmacêuticas, com o objectivo de organizar o sector.
Com a Guerra, o desenvolvimento de recursos e medicamentos para o tratamento dos feridos e das doenças surgidas pelas más condições existentes, catapultam a Indústria
Farmacêutica para um dos seus pontos mais altos.
“Que se dê conhecimento ao Grémio Distrital dos Proprietários de Farmácia de Lisboa, das resoluções tomadas quanto a
descontos, justificando-os, como medida transitória imposta
pelo estado actual de coisas, frisando-se que se terá em atenção, em melhor oportunidade, uma melhoria que se repute
razoável, visto que de interesses comuns se tratar e não ser
intenção do Grémio, ao proceder assim, sacrificar o interesse próprio, o justo e legiítimo interesse farmacêutico, que à
mesma entidade se peça, por parte dos seus agremiados, o
rigoroso respeito pelo preço marcado, pondo-se assim cobro à
irregularidade do desconto de favor, que de tal modo já entrou
nos hábitos do público, sobretudo do dos grandes centros,
que a sua existência, o que leva a pensar numa margem de
lucros que nunca existiu, mas que, concedido como tem sido,
permite o relaxamento de preços, em concorrência desleal,
com o consequente descrédito das classes interessadas”, in
Relatório da Direcção do GNIEF, Exercício de 1940.
Pela primeira vez na História da Indústria Farmacêutica Portuguesa, estavam consagradas as regras de comercialização
de medicamentos entre as empresas da Indústria Farmacêutica, os Armazenistas e as Farmácias – o Regulamento do
Comércio dos Medicamentos Especializados.
Também inovadoras eram as elevadas preocupações destes industriais relativamente às questões de registo de marcas na Repartição de Propriedade Industrial e as questões
relacionadas com a importação de medicamentos estrangeiros e de fabrico nacional.
Nos primeiros anos da década de 1950, a propriedade
industrial ganha importância. É assim na Europa e em Portugal, com a regulamentação do comércio dos medicamentos especializados pela Comissão Técnica dos Novos
Medicamentos.
165
Primeiras estatísticas de vendas da Indútria Farmacêutica
(Relatório e Contas da Direcção 1960)
166
O País registava vendas de 9 254 127 de unidades de
especialidades farmacêuticas nacionais, pela importância de 199 910 200$00. O preço médio de medicamento situava-se nos 21$60. E em termos de unidades de
especialidades farmacêuticas estrangeiras, registavam-se vendas de 6 042 321 unidades, pela importância de
184 500 220$00, e com um custo médio de 30$53.
Estes números evidenciavam já os benefícios da indústria nacional de especialidades farmacêuticas para os doentes e para a economia do País.
Os anos 1950 marcam, ainda, o lançamento no mercado
dos antibióticos manipulados, o que fez com que se registasse uma subida efectiva do preço dos medicamentos.
Por outro lado, a concorrência gerada entre laboratórios
nacionais e estrangeiros originou a baixa dos preços dos
antibióticos e, em consequência, a descida do preço médio das especialidades importadas que, também, beneficiaram de uma redução dos direitos alfandegários.
Por sua vez, os anos 1960 ficam marcados por um movimento mais geral de concentração de meios, quer económicos, quer tecnológicos e científicos, no sentido da
criação de grandes complexos industriais. Na verdade, sobretudo nos países mais desenvolvidos, assiste-se, nestes
anos, a um movimento vertiginoso de fusão de empresas,
gerador de grande concentração de meios.
Simultaneamente, a Medicina organiza-se, a Assistência
Médica institucionaliza-se e o fornecimento de medicamentos assume carácter de utilidade pública.
Para além disso, as empresas asseguram, por meio de
patente, o direito ao uso exclusivo das especialidades farmacêuticas, para as venderem directamente ao público.
É nesta década de 60 que se regista uma taxa média
anual de crescimento da produção de 14,5%. É uma taxa
que supera, para a época, as previsões do planeamento
e ultrapassa, francamente, os índices de crescimento da
economia nacional, sendo, nomeadamente, superior em
cerca de 50% à da indústria transformadora.
Em 1970, os valores da produção ascendem a 2 458 000
contos, o que representa um contributo de 1,5% para o PIB.
Estes números referentes à produção assumem particular
significado, se tivermos em consideração que o conjunto
das indústrias transformadoras participa na constituição
do PIB com cerca de 36,9% e que o valor acrescentado no
sector dos medicamentos ronda os 63%.
A realidade da época evidencia que a indústria nacional
perde prosperidade face à indústria internacional que se
instala em Portugal, directamente ou através dos seus produtos, ocupando uma parcela cada vez maior do mercado.
Paralelamente, verificam-se valores médios de crescimento das exportações e de fornecimentos ao Ultramar
de 11,4% desde 1963. Nesta altura, são significativos os
principais países importadores de medicamentos e matérias-primas portuguesas, revelando que a Indústria Farmacêutica não se dirige somente, nem mesmo predominantemente, aos países menos desenvolvidos, sinal claro de
elevados padrões de qualidade.
Ainda nesta década, o mercado interno regista uma taxa
média de crescimento de 13%. Dado que a propensão e
necessidade de consumo de medicamentos ainda estava
longe do ponto de saturação, verifica-se, na presente década, uma evolução favorável da taxa de crescimento.
Nos anos 1970, começam a verificar-se alterações profundas no exercício e enquadramento da actividade da Indústria Farmacêutica que opera em Portugal, alterações
essas que acompanham outras áreas na sociedade.
A institucionalização do Serviço Nacional de Saúde (SNS),
em 1979, o regime de comparticipação de medicamentos,
a valorização da profissão farmacêutica incentivada por
instituições como a Associação Nacional das Farmácias, e,
depois, mais tarde, a entrada de Portugal na Comunidade
Económica Europeia (CEE) foram decisivas para a revalorização da Farmácia e do Farmacêutico.
O peso da tecnologia e da investigação começa, agora, a
impor-se, e como sector altamente inovador, a qualidade
e a técnica são factores essenciais. De facto, a década de
setenta marca, também, a aquisição, de forma generalizada, de novas tecnologias, com o objectivo de melhorar
a produtividade, de tornar mais apurada a preparação e o
controlo das especialidades farmacêuticas, de comprovar
a eficácia dos produtos e, ainda, de melhorar as condições
de embalagem e conservação ou facilitar o manuseamento
pelos doentes.
Assim, a década de setenta marca, também, o surgimento
de novos produtos, cada vez mais específicos, que tornaram
obsoletas algumas das matérias-primas em utilização.
Para além disso, a concorrência acentua-se e as empresas vêem-se, agora, obrigadas a aumentar os custos
comerciais. Neste condicionamento, a definição de uma
política de preços impõe-se, por forma a garantir a viabilidade da Indústria Farmacêutica Portuguesa. Os industriais
desta época manifestam a preocupação no controlo dos
preços, à margem das leis da concorrência, sobretudo com
o constante aumento dos diferentes componentes nos preços dos medicamentos: aumento do custo do dinheiro, da
mão-de-obra e dos produtos subsidiários, mas, também,
as exigências de renovação tecnológica – a substituição
constante do equipamento fabril e de controlo, a utilização
de novas técnicas de pesquisa em relação a novos produtos ou ao aperfeiçoamento dos existentes, e a renovação
da organização administrativa e o consequente aumento
do seu custo.
167
“Não e possível admitir que, num mundo que não dominou
nem está em vias de dominar a inflação, se possa atingir
o desiderato da contenção dos preços, quanto mais o de
provocar a sua descida. Felizes seremos todos se formos
capazes de manter a sua subida dentro de limites razoáveis,
porque a estabilização só se poderá conseguir a custo da
sobrevivência das empresas. Mas, esta seria a melhor forma de provocar, depois, de uma subida galopante, porque,
ninguém tenha dúvidas, os preços dos medicamentos nos
últimos 20 anos só mantiveram a estabilidade que todos
conhecem porque existiu uma indústria nacional válida, sem
ela a subida teria sido em flecha”, in Relatório da Direcção
do GNIEF, Exercício de 1970.
O PÓS-25 DE ABRIL DE 1974
168
A 30 de Abril de 1975, o Grémio Nacional dos Industriais
das Especialidades Farmacêuticas transforma-se na Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica. Os principais temas de destaque para a época são a contratação
colectiva de trabalho; a situação económico-financeira
das empresas, designadamente na área dos preços; e o posicionamento da Indústria Farmacêutica no quadro da política geral do País. O problema da viabilidade económica e
financeira da generalidade das empresas constitui uma das
principais preocupações vigentes na época, para além da inflação e da desvalorização cambial do Escudo.
Em 1980, a formação dos preços dos medicamentos parte dos custos do ano anterior (custos históricos), ignorando a inflação e a desvalorização do Escudo, bem como os
prejuízos provocados pelos atrasos dos despachos dos processos de fixação ou revisão de preços. Destes problemas,
emergem, também, baixos índices de rentabilidade e uma
profunda debilidade da estrutura financeira das empresas.
O ano de 1982 fica marcado por uma recessão económica, especialmente devido à incorrecta política de preços
seguida pelo Governo e às restrições de mercado resultante da entrada em vigor das taxas moderadoras. Em Junho
de 1982, é introduzida a incorporação nos preços da desvalorização cambial do Escudo.
O ano de 1983 é, particularmente, relevante em termos
de política do Medicamento: é publicada a lista de produtos não comparticipáveis; é estabelecido o regime de codificação dos medicamentos; as especialidades farmacêuticas de venda livre recebem tratamento legal autónomo;
é proposto diferenciar os níveis de comparticipação, por
parte dos serviços de Saúde do Estado, de acordo com o
grupo ou natureza terapêutica do medicamento, tema com
influência directa nas condições do mercado e no planeamento das empresas.
Em 1984, um relatório de diagnóstico sobre a posição
da Indústria Farmacêutica face à CEE, conclui que “[…] a
posição do sector no quadro internacional é débil, confrontando-se com dificuldades (a despeito de alguns aspectos
positivos) cuja amplitude é de natureza a comprometer a sua
recuperação e o arranque para uma evolução mais dinâmica.
Daí a necessidade de inversão da situação actual e que, entre
outros aspectos, passa, necessariamente, por uma reorientação do sector no sentido de uma maior especialização e da
acentuação da sua vocação exportadora (condições essenciais a um maior equilíbrio na balança comercial do sector e
de um melhor ajustamento às exigências do consumo) e por
um novo enquadramento económico e concorrencial para o
sector (liberalização dos preços dos medicamentos) […]”.
De 1979 a 1984, a projecção do sector da Indústria Farmacêutica no conjunto da economia portuguesa não sofreu
alteração significativa. Com efeito, o peso do sector no total
nacional do PIB situa-se à volta dos 0,3% a 0,4%.
Ao nível do conjunto da CEE, a participação do sector no
total das trocas comunitárias, em 1983, era de 0,7% para as
importações e de 1,8% para as exportações, verificando-se,
portanto, que, tanto em Portugal como na CEE, a Indústria
Farmacêutica ocupava no conjunto das trocas comerciais
uma posição análoga (à volta dos 2,5%), embora o peso das
importações do sector no nosso País fosse mais importante
que na CEE (respectivamente, 1,8% e 0,7%), sendo a situação respeitante às exportações o contrário (Portugal = 0,9%;
CEE = 1,8%).
Apesar disso, verifica-se um crescimento mais rápido do
comércio de exportação (+26,1%) do que da importação
(+22,1%), em valores médios de 1980 a 1983, devendo-se
essencialmente à forte progressão que registaram as vendas de matérias-primas ao exterior (+38,1%). Por outro lado,
é de referir que tanto as importações como as exportações
globais do sector (matérias-primas e especialidades farmacêuticas) cresceram menos rapidamente do que o comércio
externo português em geral, sendo esse desnível particularmente sensível no comércio de exportação – 26,1% para as
exportações globais do sector e 30,7% para as exportações
totais do País. Trata-se de um sector dependente das importações (representam 4/5 do VBP), e sendo as exportações
de valor mais reduzido (cerca de 3 milhões de contos, em
média, entre 1980 e 1983), o sector é deficitário. Com efeito,
entre 1980 e 1983, o défice da balança comercial do sector
quase que duplicou, tendo subido de 6,5 milhões de contos
para 11,3 milhões. Para esse défice – que representa quase
60% do VBP do sector –, contribuem fundamentalmente os
produtos farmacêuticos (75%). Por outro lado, é de salientar que o sector ocupa no PIB da indústria transformadora
comunitária uma posição mais forte (1,8%, com valores que
atingem os 2,4% para Itália e os 2,6% para a Dinamarca) do
que em Portugal (1,1% em 1981).
Na verdade, durante este período, o índice de preços no
consumidor em termos globais acusa um crescimento médio
na ordem dos 20% ao ano, enquanto no sector esse crescimento não é superior a 8,2%. Esta disparidade respeitante à
evolução dos preços é, em grande parte, resultado do bloqueamento imposto pelo Governo aos preços das especialidades
farmacêuticas, constituindo, assim, um poderoso freio à livre
expansão do sector, resultando num agravamento contínuo
da situação com incidências fortemente negativas ao nível da
estrutura financeira das empresas.
Durante o período de 1979 a 1982, a produção na Indústria Farmacêutica regista uma evolução francamente positiva
quando comparada com a expansão que, durante o mesmo
período, se verifica para o conjunto da produção nacional.
Entre 1979 e 1982, a taxa média de crescimento do VAB na
Indústria Farmacêutica é, em termos reais, três vezes superior à taxa de expansão verificada para o PIBpm a nível nacional; a preços correntes, a diferença entre as taxas médias de
crescimento (respectivamente, 23,8% e 19,8%) já não é tão
acentuada, o que se deve, fundamentalmente, ao facto de
os preços na Indústria Farmacêutica crescerem a um ritmo
muito mais lento do que o verificado para o conjunto da economia portuguesa.
A estrutura da produção do sector, bem como a contribuição de cada produto para o crescimento global da produção,
encontra-se concentrada, fundamentalmente, em quatro
produtos – medicamentos para o aparelho digestivo e metabolismo, anti-infecciosos, medicamentos para o aparelho
cardiovascular e para o sistema nervoso central – os quais
representam em conjunto 56% da produção.
O sector ocupa, no conjunto do volume de emprego da indústria transformadora, uma expressão bastante reduzida
(1,1%). A taxa média de crescimento do volume de emprego
no sector é de -0,8%, entre 1979 e 1982, sendo no total da
indústria transformadora de 2,1%. Nos restantes países europeus, a evolução do volume de emprego no sector é bastante
divergente. A Holanda, o Reino Unido e a Espanha registam
uma tendência para a redução, com o contrário a registar-se em países como a França, Itália e Escandinávia.
169
170
A tendência na produtividade, na Indústria Farmacêutica
é, neste período, de uma baixa acentuada, ao ponto de, em
1981, já não atingir o nível de produtividade constatada
para o conjunto da indústria transformadora, depois de, em
1979 e 1980, ser superior em 1/4 e 1/5, respectivamente.
Entre 1979 e 1982, o consumo total de medicamentos
para uso humano (que representa 93% do consumo total de
medicamentos), medido em Escudos, cresce à taxa média
anual de 17,8%, com uma redução drástica em 1982, em
grande parte resultado das medidas de contenção de utilização de medicamentos postas em prática pelo Governo.
Importa frisar que uma boa parte do crescimento do consumo é satisfeito com recurso à produção nacional, não
obstante as importações deterem, ainda, uma parte bastante significativa no consumo de medicamentos em Portugal. A parte do consumo de produção nacional sobe de
45%, em 1979, para 56%, em 1983, enquanto a relativa às
importações desce de 40% para 35% no mesmo período. O
que revela o esforço desenvolvido pelo sector produtivo no
sentido de satisfazer as exigências do mercado, em termos
quantitativos e qualitativos, e a consequente necessidade
de um menor recurso aos fornecimentos do exterior.
Não obstante as elevadas taxas de crescimento do consumo de medicamentos verificadas, o consumo per capita de
medicamentos em Portugal é dos mais baixos da Europa,
o que traduz as profundas carências que se verificavam no
nosso País em matéria de assistência medicamentosa, e
o esforço que era necessário desenvolver para nos aproximarmos da situação vigente nos países mais desenvolvidos. À semelhança dos medicamentos, também os gastos
com a Saúde em Portugal são consideravelmente inferiores aos despendidos por outros países europeus: Espanha
gasta, em termos de despesas per capita, mais do dobro
do que Portugal, o Reino Unido 5 vezes mais, a República
Federal Alemã 7 e a França e a Holanda 10.
A metodologia de preços em vigor, em Julho de 1985,
é completamente adulterada em 1986, com a imposição
de limites aos aumentos dos preços dos medicamentos,
originando uma descida de 0,6% nos preços dos produtos,
comparativamente aos preços em Dezembro de 1985.
No ano de 1985, é adoptado o regime de I.V.A. para o
sector da Indústria Farmacêutica, de particular importância no que se refere ao problema das matérias-primas e
excipientes incorporados nos produtos.
Num relatório de 1981-1985, refere a Direcção da Apifarma, que “as medidas impostas no sector continuam a ser
feitas sem se ter em atenção a realidade prática do que é
uma empresa; têm sido tomadas como se de um exemplo
teórico se tratasse. A alteração de preços provocada pela
Portaria de 10 de Janeiro de 1987 é um bom exemplo do
desfasamento entre quem faz as leis e quem as tem que
praticar. A ambiguidade e a falta de conhecimento quanto
às próximas acções das entidades governativas, no sector
da Saúde, continuam a constituir um entrave ao desenvolvimento de todos os sectores da actividade farmacêutica”.
O ano de 1987 é particularmente difícil, porque não são
claras para a Indústria as orientações do Governo para o
sector, porque se desconhecem os tempos necessários
para a alteração da legislação portuguesa e a sua adaptação à legislação comunitária, e, ainda, porque a ideia de
uma Política de Saúde, e mais particularmente do Medicamento, assente na base da livre iniciativa, da competição e
no livre funcionamento do mercado, é bastante difusa.
O ano de 1988 assinala a publicação do novo Regime de
Comparticipação dos Medicamentos e a revisão das Especialidades Farmacêuticas. As empresas vêem determinado
o congelamento dos preços dos medicamentos – de PVP
superior a 250 escudos – por um período de seis meses,
fundamentado na necessidade de proceder à revisão da
metodologia e formação de preços em vigor. Posteriormen-
te, com data de 13 de Agosto, é publicada a Portaria n.º
548/88 e o Despacho Normativo n.º 69/88, que regulamentam a formação e o aumento dos preços para vigorarem de Outubro de 1988 a Abril de 1989.
O sector entra nos anos 1990 com um enquadramento
conjuntural de grande expectativa. Diz o Relatório da Direcção do Exercício de 1991, que “[…] não nos enganámos na
mudança de relacionamento que efectivamente se operou,
mas encerramos o ano com a mesma carga de expectativa
e interrogações quanto ao futuro”.
O ESTATUTO DO MEDICAMENTO
Na legislação portuguesa, o Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de
Fevereiro, é o primeiro diploma oficial a abordar o medicamento com base nas directivas europeias e ficou conhecido por “Estatuto do Medicamento”. Com a sua publicação,
“inicia-se uma nova era no sector farmacêutico, designadamente no domínio da introdução no mercado, controlo
de qualidade e fabrico de medicamentos de uso humano”,
conforme preâmbulo do referido diploma. Revoga a legislação existente, alguma dela dos anos 1930 e inadequada
face aos progressos sociais, económicos, técnicos e científicos. Este diploma vem modernizar o sistema de regulação do medicamento desde a introdução no mercado até
à comercialização, introduzindo tópicos inovadores em diversas áreas do medicamento: os processos nacionais e
europeus de autorização de introdução no mercado (AIM),
as regras a observar no que diz respeito a medicamentos
derivados de sangue e do plasma humano, bem como medicamentos imunológicos e radiofármacos.
Nesta altura, assinala-se, também, a alteração em termos
de rotulagem e do folheto informativo, que surge mais pormenorizado e mais virado para o aconselhamento ao utente.
A publicidade é amplamente alterada com o Decreto-Lei
de 1991. As inovações a nível da legislação da publicidade a
medicamentos são profundas, quer para medicamentos sujeitos a receita médica obrigatória, como para medicamentos não sujeitos a receita médica, visando a defesa da Saúde,
a sua protecção, a satisfação das necessidades da população e a racionalização do consumo dos medicamentos.
O Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, revoga o
Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de Fevereiro. Este novo Estatuto
do Medicamento, transpõe para o Direito português novas
directivas comunitárias sobre o fabrico, controlo da qualidade, segurança e eficácia, introdução no mercado e comercialização dos medicamentos para uso humano.
Neste diploma, foi necessário legislar de acordo com o
progresso das ciências e das técnicas, bem como, os avanços operados no sector da regulação do mercado do medicamento, das políticas de Saúde e do Medicamento e que
necessitavam de leis e de regulamentos adaptados.
A intervenção do Estado na área do medicamento é total – AIM, preços, comparticipações, publicidade, farmacovigilância, ensaios clínicos, etc., sendo que as razões de
Saúde Pública obrigam ao reforço da supervisão do sector.
Por isso, do ponto de vista institucional, o diploma de 2006
vem dotar a Autoridade Reguladora Nacional de ferramentas para uma acção mais activa no plano da fiscalização
relativamente ao cumprimento da legislação em vigor e no
vector do aconselhamento científico da Indústria Farmacêutica em Portugal, tendo em conta o contexto europeu.
INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL:
CONTRIBUTO PARA A PRESTAÇÃO DE MAIS
E MELHORES CUIDADOS DE SAÚDE
Em 1991, surgem as primeiras preocupações relacionadas
com as dívidas dos hospitais aos Laboratórios. Em Maio de
1992, a dívida dos hospitais às empresas associadas atinge
171
os 16 milhões de contos e o atraso nos pagamentos dos fornecimentos hospitalares atinge os 17 meses.
A Direcção da Apifarma desenvolve esforços no sentido de
resolver o problema, alertando o Ministério da Saúde para
o agravamento da situação e chegando, até, a propor a celebração de um protocolo financeiro. Isto sem êxito, uma
vez que o montante das dívidas a mais de 90 dias cresceu
136,6% entre Maio de 1991 e Maio de 1992. Esta situação
de não satisfação dos compromissos por parte das instituições dependentes do Ministério da Saúde, bem como o montante dos valores em causa, colocava as empresas no limite
do esforço financeiro que podiam suportar. Não obstante, as
empresas farmacêuticas asseguravam, através do fornecimento de medicamentos aos hospitais, a prestação de mais
e melhores cuidados de Saúde e a sua contribuição para um
bom funcionamento dos cuidados hospitalares.
Em 1994, as empresas decidem, pela primeira vez, elaborar um contrato de factoring, numa tentativa de resolução definitiva das dívidas dos hospitais. Ao mesmo tempo,
o Orçamento de Estado para 1995 prevê um montante de
70 milhões de contos para pagamento de dívidas atrasadas do Serviço Nacional de Saúde, onde está incluída a Indústria Farmacêutica, facto que condiciona a aplicação da
solução de factoring. Em Dezembro de 1999, o valor atinge
os 80 milhões de contos e um prazo médio de recebimento de 378 dias e, no ano seguinte, atinge 86,5 milhões de
contos e um prazo médio de recebimentos de 402 dias.
Em 2001, a dívida atinge o nível mais elevado de sempre, chegando aos 140 milhões de contos, no mês de
Agosto, correspondendo a um atraso médio da ordem
dos 493 dias. Após a publicação do Despacho Conjunto
n.º 791-A/2001, de 30 de Agosto, os hospitais são dotados
de 290 milhões de contos, com o objectivo de liquidar as dívidas vencidas até Dezembro de 2000 pelos fornecimentos
172
ao SNS. Desse montante, e na sequência da monitorização
dos pagamentos dos hospitais, realizada pela Apifarma, a
Indústria apura o recebimento de apenas 59,5 milhões de
contos, ficando por liquidar cerca de 25% da dívida global anterior a 31 de Dezembro de 2000. Assim, após um
período de redução dos prazos médios de recebimento,
resultante do reforço de verbas atrás referido, as dívidas
hospitalares sobem de novo, registando-se, em Dezembro
de 2001, uma dívida de 110,490 milhões de contos e um
prazo médio de cobrança de 368 dias.
O início do novo milénio regista o contínuo agravamento
dos valores em dívida, apesar dos sucessivos esforços dos
Governos para inverter esta tendência de crescimento. Actualmente, a dívida dos hospitais do SNS à Indústria Farmacêutica totalizou, em Setembro de 2014, 1073 M€, com
um prazo médio de recebimento na ordem dos 506 dias, o
que representa já mais de um ano e meio de fornecimentos
sem juros.
Fonte: IMS.
Devido à falta de protecção de patente de produtos até 1995,
e o consequente permitir de um mercado de cópias com preços inferiores aos dos medicamentos originadores, os genéricos têm o seu espaço ocupado por produtos mais baratos.
Com a entrada no ano de 2000, o tema dos medicamentos genéricos está na ordem do dia. O Governo anuncia um
conjunto de medidas com o objectivo de reforçar a quota de
mercado destes medicamentos, sendo que o ano de 2002
marca o início das medidas relativas à prescrição por Denominação Comum Internacional (DCI) e à introdução do sistema de preços de referência.
estabelecimento de limites de crescimento da despesa com
medicamentos e acordando a contribuição das empresas,
caso o crescimento do mercado viesse a ser superior ao estipulado. Corporiza-se, deste modo, a colaboração das empresas farmacêuticas na procura de soluções para os problemas do financiamento do SNS, criando condições de apoio
ao desenvolvimento sustentado da Indústria Farmacêutica.
A CRISE ECONÓMICA E A TROIKA
No que se refere ao mercado de genéricos, os últimos
anos mostram um forte crescimento e consolidação do
mercado, que atinge, no mercado total, uma quota em volume unitário de 35,3% e de 18,6% em valor.
A 25 de Novembro de 1993, a Apifarma, o Ministério da Saúde e o Ministério do Comércio e Turismo assinam um protocolo que conduz a uma redução no preço global dos medicamentos para 1994.
Desde 1997, têm vindo a ser assinados diversos Protocolos entre o Governo e a Indústria Farmacêutica, visando o
O ano de 2009 é marcado pelo impacto da crise económica
e pela discussão em torno de eventuais modificações do regime de preços e margens, bem como pela necessidade de
desencadear acções face a situações de verticalização e limitações da concorrência existentes no sector.
O ano de 2010 fica sujeito a medidas sucessivas e inesperadas de reduções no preço dos medicamentos e de restrições no seu acesso ao Sistema de Saúde. A Saúde surge
como a principal área de medidas de contenção, com en-
173
PROTOCOLOS DE COLABORAÇÃO
Indústria Farmacêutica/Governo
Protocolos
1997
1998
1999
Limite Crescimento dos encargos do SNS
com medicamentos comparticipados
+
Valor máximo da contribuição
% da Contribuição
+
Valor real da contribuição
Limite
Entre 4% e 11% relativamente ao ano 1996.
% de Contribuição da Indústria
64,3% do crescimento dos encargos do SNS
com a comparticipação de medicamentos.
Contribuição máxima
6,3 Milhões de contos
Valor da contribuição
6,3 Milhões de contos
31,420 Milhões €.
(crescimento:11,48% => Contribuição. Máxima)
31,420 Milhões €.
Limite
Acima de 4% acrescido de 75% do valor
da taxa de inflação do ano anterior.
% de Contribuição da Indústria
64,3% do crescimento dos encargos do SNS
com a comparticipação de medicamentos.
Contribuição máxima
6 Milhões de contos
29,928 Milhões €.
Valor da contribuição
3,3 Milhões de contos
Limite
Acima de 4% acrescido de 80% do valor
da taxa de inflação.
% de Contribuição da Indústria
64,3% do crescimento dos encargos do SNS
com a comparticipação de medicamentos.
Contribuição máxima
5,5 Milhões de contos
Valor da contribuição
3,3 Milhões de contos
27,434 Milhões €.
Limite
Entre 6,5% e 10,5% relativamente ao ano anterior.
2001
16,470 Milhões €.
26,302 Milhões €.
% de Contribuição da Indústria
64,3% do crescimento dos encargos do SNS
com a comparticipação de medicamentos.
Valor da contribuição
19,783 milhões €.
2004
Limite
Acima de 8% dos encargos do SNS
verificados no ano anterior.
% de Contribuição da Indústria
64,3% do crescimento dos encargos do SNS
com a comparticipação de medicamentos.
Valor da contribuição
9,980 Milhões €.
174
Protocolos
2006
2007
2011
Limite Crescimento dos encargos do SNS
com medicamentos comparticipados
+
Valor máximo da contribuição
% da Contribuição
+
Valor real da contribuição
Limite
Até 4% do crescimento dos encargos do SNS
de 2006 em relação a 2005
% de Contribuição da Indústria
69,6% da parte dos encargos que ultrapassaram os limites previstos.
Contribuição máxima
35 Milhões €.
Valor da contribuição
0€ (Não houve crescimento dos Enc. SNS)
Limite
Até 4% acima do crescimento do PIB previsto p/ 2007
[a partir do crescimento do PIB para 2007 e até + 4%]
% de Contribuição da Indústria
69,6% do crescimento dos encargos do SNS
com a comparticipação de medicamentos.
Contribuição máxima
45 Milhões €.
Valor da contribuição
(Não se atingiu o limite de crescimento Enc. SNS)
Limite dos encargos do SNS:
• 1440 Milhões € - M. Amb.
• 2% Inferior ao valor de 2010 - M. Hosp.
Valor da contribuição
(Cumpridos os objectivos dos Enc. SNS)
Limite dos encargos do SNS:
2.038 Milhões €
• 1196 Milhões € => M. Amb.
• 842 Milhões € => M. Hosp.
2012
2013
2014
Contribuição máxima
300 Milhões €
• 130 Milhões € => M. Amb.
• 170 Milhões € => M. Hosp.
Limite
Não estabelecido
Contribuição máxima
122 Milhões €.
Valor da contribuição
136,7 Milhões €.
Valor da contribuição
122 Milhões €.
Limite
Mercado total do SNS de 2000 Milhões €
Contribuição máxima
160 Milhões €.
Valor da contribuição
160 Milhões €.
175
176
foque particular no medicamento, traduzidas em reduções
de preços que atingem os 13%, sem paralelo em qualquer
outro ano e em qualquer outro sector.
Ente 2011 e 2013, período em que Portugal esteve sob
programa de assistência económica e financeira, com a assinatura do Memorandum of Understanding (MoU), em Maio
de 2011 (com o Fundo Monetário Internacional, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu), o País está sob
fortes medidas de austeridade, o que condiciona fortemente a actividade económico-financeira com implicações no
agravamento do desemprego, na desaceleração do consumo privado e do investimento público.
Com a taxa de desemprego a disparar para níveis inéditos, atingindo o máximo de 17,7%, no 1.º trimestre de
2013, uma redução constante deo PIB, que atingiu um mínimo de contracção de -4% no 1º trimestre de 2013.
Uma das áreas públicas mais atingida é a área da Saúde,
e em particular do medicamento, que contribui com mais
de 50% para a redução de encargos do sector. Durante
estes anos, as medidas de contenção de custos sobre o
medicamento fazem-se sentir com a produção de muita
legislação específica. Destacam-se:
- a implementação total da obrigatoriedade de prescrição
electrónica para efeitos de comparticipação pelo SNS;
- a alteração das margens de comercialização dos medicamentos;
- a revisão anual de preços com escolha de países de referência que estão entre os que têm dos preços mais baixos
a nível europeu;
- o incentivo à prescrição de medicamentos genéricos;
- o controlo e monitorização de prescrições, através das
Normas de Orientações Cliínicas;
- o controlo dos gastos a nível hospitalar, com o alargamento da instituição da compra centralizada.
Neste contexto, a Indústria Farmacêutica tem um papel
de grande responsabilidade, contribuindo para a Sustenta-
bilidade do SNS, não só por encaixar o efeito das medidas,
que se repercutem a nível da perda de postos de trabalho
e da capacidade de investimento, mas, sobretudo, porque
tem colaborado activamente com o Governo, assinando
Acordos para a redução de encargos do SNS com medicamentos, em ambulatório e a nível hospitalar, durante vários anos consecutivos – 2011, 2012, 2013 e 2014 -, os
quais se saldam numa contribuição total efectiva por parte dos associados da Apifarma em 325 milhões de euros
(418,7 M€ de toda a Indústria Farmacêutica). Os resultados de tal contexto encontram-se espelhados nas figuras
abaixo.
O valor do mercado farmacêutico Português está em contracção desde 2010, tendo totalizado 3421 milhões de euros em 2013, ou seja, menos -20% do valor registado em
2010.
Fonte: Infarmed.
Este decréscimo é o resultado das sucessivas medidas na
área do medicamento, focalizadas na redução dos preços.
Em termos de classes terapêuticas, verificou-se que, em
2013, as vendas em valor no mercado ambulatório con-
centraram-se nos medicamentos para a hipertensão, para
a diabetes, os antidislipidémicos e para a saúde mental,
muito em linha, aliás, com o que se observa no mercado
mundial. As oito principais classes terapêuticas na figura
abaixo representaram 45% das vendas registadas no mercado ambulatório.
à introdução de medicamentos genéricos e biossimilares.
O enquadramento do mercado farmacêutico em Portugal
com os restantes países da Europa, para que tenha uma
base comparável, deve ser realizado em valor per capita, e
corrigido pela paridade do poder de compra. Tal comparação, de acordo com os dados mais recentes da OCDE,
mostra que, já em 2011, antes dos cortes registados em
2012 e 2013, Portugal estava abaixo da média europeia.
Fonte: OCDE; * dados de Portugal referem-se a 2011.
A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA A NÍVEL NACIONAL
Fonte: IMS.
Já para o mercado hospitalar, em 2013, verificou-se que os
medicamentos responsáveis por 58,8% da despesa foram os
Imunomoduladores, Antivíricos e Citotóxicos. Sendo que, em
termos de tendências, se destaca o crescimento dos Citotóxicos (+3,5%) e, em sentido oposto, os Factores estimulantes
da hematopoiese (-34,6%) e Antibacterianos (-17,8%), devido
Actualmente, as empresas farmacêuticas estabelecidas em
Portugal são, na sua maioria, de capital estrangeiro. Este
panorama está relacionado com o historial do condicionamento industrial em Portugal e a capacidade de inovação das indústrias farmacêuticas portuguesas. Isto poderia
fazer-nos entrar, igualmente, na questão das patentes e nas
alterações operadas a este nível com a entrada em vigor, em
1996, do Registo de Patentes de Produto em substituição
do Registo de Patentes de Processo, que terá contribuído
para o declínio da quota de mercado de capital nacional
existente na indústria farmacêutica no nosso País.
177
São mais de 140 as empresas farmacêuticas (importadoras
ou produtoras de medicamentos) a operarem em Portugal.
De acordo com os dados mais recentes, a indústria farmacêutica é responsável por mais de 8000 postos de trabalho directos no nosso País (Apifarma, 2013).
A produção em Portugal de matérias-primas e de produtos
farmacêuticos registou, nos últimos anos, uma tendência de
decréscimo, com excepção do ano de 2013, em que a produção voltou a crescer, registando 1434 milhões de euros.
Em termos da balança comercial, a indústria farmacêutica em Portugal é dependente das importações, mas o
rácio de exportações face às importações tem vindo a
crescer em resultado do crescimento das exportações,
que, em 2013, totalizaram 732 milhões de euros, correspondendo a um crescimento homólogo de 4%.
Fonte: INE.
178
Fonte: INE.
Em 2013, os principais destinos de exportação foram a
União Europeia com 64%, seguida dos países dos PALOP
com 13% do valor das exportações.
Fonte: INE.
Relativamente a empresas portuguesas, em 2013, o seu
volume de negócios cifrou-se em 340,6 milhões de euros
(valor PVA) no mercado ambulatório, o que representou
18,2% do total das vendas do ambulatório. Comparativamente com o seu peso em 2010, a sua importância relativa
no mercado aumentou em 1,7%.
Embora as empresas líderes de mercado em Portugal
sejam as grandes multinacionais, detentoras dos medicamentos de marca, se analisarmos no contexto estrito nacional, e para o mercado ambulatório, podemos verificar
que as principais empresas portuguesas a operarem no
mercado, em ternos de vendas em valor, são as que se
encontram na figura, que considera os grandes Grupos farmacêuticos portugueses e o seu posicionamento relativo,
em 2013, no âmbito do mercado ambulatório total.
Fonte: INE.
COMPARTICIPAÇÕES EM PORTUGAL
Os apoios/benefícios sociais aparecem em Portugal em
1919, com o Seguro Social Obrigatório na Doença, uma viragem na História da Assistência Social e na História da
Saúde em Portugal. Em 1935, foram criadas as instituições
de Previdência Social do Estado Novo Corporativo. Inicialmente, os apoios/benefícios não incluíam os medicamentos e só o Decreto n.° 37 762, de 1950, é que vem regular
a assistência medicamentosa, como era à altura conhecida,
dos beneficiários das instituições e seus familiares.
Mas havia muitas instituições de previdência que, já antes,
concediam medicamentos injectáveis, sulfamidas e vacinas
aos seus beneficiários, restrição abolida pelo referido decreto. Limitava-se o receituário aos medicamentos, injectáveis,
ou não, constantes de lista ou formulário adequado. Foram
estabelecidas senhas de consulta e um limite máximo de
tempo para usufruir de assistência medicamentosa.
O alargamento efectivo das comparticipações aos familiares só ocorre em 1960, bem como a comparticipação dos
medicamentos de origem nacional. Medicamentos estrangeiros só eram comparticipados se não houvesse equivalente nacional. As fases que se seguiram foram o alargamento a
medicamentos originários de países da EFTA e, mais tarde,
a todos os medicamentos, independentemente da origem.
Os escalões de comparticipação são estabelecidos pela primeira vez em 1984. O Estatuto do Medicamento incluiu um
capítulo referente à comparticipação de medicamentos (Capítulo VI), mas que não introduziu grandes novidades.
Em 2000, dá-se também início à revisão do sistema de
comparticipações de medicamentos pelo SNS. Politicamente recompensadora e tecnicamente de fácil aplicação,
179
a utilização dos regimes de preços e do regime de comparticipações é uma constante destes últimos anos.
Seguem-se cortes nas percentagens de comparticipação
do Estado, a criação do Regime Especial e mais uma série
sucessiva de alterações até à actualidade, sempre com o
objectivo último de alcançar a tão desejada sustentabilidade do sistema.
Em consequência de todos os reajustamentos e cortes de
preços, verifica-se que a taxa média de comparticipação
registou uma forte redução em 2010, verificando-se que
foi de 63,6% em 2013, implicando um dos mais elevados
níveis de co-pagamento em Portugal, quando comparado
com os restantes países europeus.
I&D em Portugal
Em Portugal, só em finais da década de oitenta, surge o
Centro de Estudos de Bioética, que dá origem, em 1990,
ao Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida,
vocacionado para a reflexão teórica e para a definição das
grandes directrizes no campo da Bioética. Em 1994, foi
publicado o Decreto-Lei 97/94, que estabelece “as normas
180
a que devem obedecer os ensaios clínicos a realizar em
seres humanos” e que obriga, entre outros requisitos, ao
parecer favorável de uma Comissão de Ética. Mas este diploma só se torna exequível com a publicação do DecretoLei 97/95, que define a composição e funcionamento das
Comissões de Ética para a Saúde (CES). Uma por cada
instituição, as CES possuem um vasto conjunto de competências entre as quais a de se pronunciar sobre os pedidos
de autorização para a realização de ensaios clínicos e a de
fiscalizar a sua execução.
A Directiva 2001/20/CE, vem procurar obter uma harmonização das várias legislações europeias e uma maior
rapidez na apreciação dos projectos de ensaios clínicos,
emitindo, também, um claro sinal no sentido do parecer
único que apontava para a criação, em cada país europeu,
de uma só comissão de ética com competência para avaliar
os ensaios clínicos com medicamentos para uso humano.
A Lei 46/2004, que transpõe para a legislação portuguesa o conteúdo da Directiva, cria a Comissão de Ética para a
Investigação Clínica (CEIC) que, a partir de Junho de 2005,
passa a ser a autoridade competente para emitir parecer
sobre a realização de ensaios clínicos com medicamentos
de uso humano.
A maioria dos ensaios clínicos realizados em Portugal é promovida por empresas farmacêuticas multinacionais. Por cada
euro investido, estima-se que haja um retorno de quase dois
euros no total da economia portuguesa, tornando esta uma
das actividades com maior retorno de investimento do País.
No entanto, o número de ensaios clínicos submetidos em
Portugal, entre 2006 e 2012, caiu 26%, de 160 para 118
estudos, colocando a taxa de ensaios clínicos, por milhão
de habitantes em Portugal, entre as mais baixas da Europa
Ocidental.
De acordo com os dados mais recentes do IPCTN 2011,
do total de despesas em I&D em 2011, 47% foram realizadas pelo sector empresas, no qual a “Fabricação de produtos farmacêuticos de base e de preparações farmacêuticas” representou 7,2% do valor, ocupando a 4.ª posição
em termos de despesa por actividade económica.
Ao longo dos últimos três anos, a despesa em I&D no
sector da IF tem vindo a aumentar, atingindo, em 2011,
87,5 M€, correspondendo a um aumento de 12,3% face a
2010. De ressalvar que 80,6% do investimento provém de
fundos próprios, isto é, das próprias empresas.
A actividade de ensaios clínicos foi responsável por um
VAB global de 72 milhões de euros, em 2012, e, por cada
euro investido, estima-se que haja um retorno de 1.,98 euros no total da economia portuguesa, sendo assim uma das
actividades com maior retorno de investimento do País.
Para além disso, é recentemente publicada a Lei n.º
21/2014, de 16 de Abril, que cria um quadro de referência
global para a Investigação Clínica em Portugal, aplicável a
todas as áreas da iInvestigação Clínica.
Generaliza-se o registo dos estudos pelas próprias instituições e a apreciação e acompanhamento pelas comissões de ética, Comissão de Ética para a Investigação Clínica (CEIC) e o Infarmed, I.P., ao mesmo tempo que se
clarificam as responsabilidades e papéis do promotor, investigador, monitor e centro de estudo clínico.
É também criado o Registo Nacional de Investigação Clínica e a obrigação implícita de os vários intervenientes no
processo se registarem no mesmo, constituindo a criação
de uma plataforma total e completa para o registo dos estudos clínicos, com base na Plataforma Nacional de Ensaios Clínicos dinamizada pelo Infarmed, I.P.
Fonte: IPCTN 2011.
A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA A NÍVEL MUNDIAL
No ano de 2012, o investimento realizado por estas empresas na actividade de ensaios clínicos atingiu o valor de
36 milhões de euros, contribuindo, adicionalmente, para
uma poupança da despesa pública em medicamentos e
meios complementares de diagnóstico no valor 3,5 milhões de euros.
No mesmo ano, a análise dos dados de empregabilidade
revelou a existência de mais de mil postos de trabalho dedicados aos ensaios clínicos.
A indústria farmacêutica a nível mundial é dominada por
empresas de larga escala, multinacionais, que comercializam os seus produtos em todo mundo.
Na indústria farmacêutica, existem as empresas que investem em I&D, trazendo novos medicamentos para o mercado, e empresas que fabricam produtos genéricos (que
são produtos já sem patente).
As vinte maiores empresas a nível mundial que formam
mais de metade do valor do mercado, investem activamente
181
em I&D e são extremamente dependentes do sucesso da
inovação. Estas empresas utilizam as marcas e patentes
para proteger os novos medicamentos descobertos e maximizarem o seu lucro potencial. Os lucros obtidos estão, em
larga medida, dependentes do número de medicamentos
que ainda têm patente. São estes lucros que geram a receita necessária para conduzir o dispendioso processo de
descoberta e desenvolvimento de um novo medicamento.
Como o desenvolvimento de um medicamento é intensivo
em investigação, as companhias farmacêuticas reinvestem
em I&D maior percentagem dos seus lucros do que qualquer outra indústria.
No continente europeu, a indústria farmacêutica é um
elemento essencial da economia e representa um dos sectores com melhor desempenho ao nível da elevada tecnologia.
O VALOR DO MERCADO FARMACÊUTICO MUNDIAL
De acordo com o IMS, as vendas globais da indústria farmacêutica totalizaram, em 2012, 964 mil milhões de US
dólares, correspondendo a um crescimento de 2,4%, em resultado, fundamentalmente, do crescimento nos mercados
emergentes (China, Brasil, Rússia, etc.), já que nos mercados maduros se assistiu ao pico da queda de patentes e
forte contenção de custos por parte dos financiadores.
Os Estados Unidos continuam a ser o maior mercado,
mas o resto do mundo, onde se incluem os países emergentes, já representam 29,4% do valor de mercado.
Nos últimos anos, a indústria farmacêutica é marcada
pelo crescimento dos genéricos e a expiração de grande
número de patentes. Esperando-se que o mercado de genéricos continue a crescer, para além do surgimento de
182
uma nova área dos biossimilares, é também verdade que,
para a indústria inovadora, a pior fase de queda de patentes já foi ultrapassada. No entanto, continuarão a entrar
no mercado novos genéricos à medida que o período de
protecção das patentes vai caducando, mas já não terá o
impacto dos últimos anos.
Em termos de classes terapêuticas, em 2012, as vendas
concentram-se nos medicamentos oncológicos, para o tratamento da dor, anti- hipertensores, anti- diabéticos e para
a Saúde Mental, totalizando 29,5% do valor de mercado.
Por outro lado, de acordo com o IMS, a dinâmica de crescimento é retomada, estimando-se que o mercado chegue
aos 1,2 mil milhões de USD, em 2016, representando uma
taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 3-6%, de
2012 a 2016.
Em termos de inovação, é também expectável o aparecimento de soluções disruptivas, isto é, de medicamentos
muito mais específicos e eficazes, que curam a doença,
como é já o exemplo da Hepatite C. Estes medicamentos
serão essencialmente de base biotecnológica e direccionados, em grande parte, para as doenças oncológicas, autoimunes e neurológicas.
EMPRESAS LÍDERES
As empresas líderes na Indústria Farmacêutica são, simultaneamente, das maiores empresas a nível mundial.
São empresas internacionais em termos de vendas, de
actividade de produção, com subsidiárias e filiais. O domínio de empresas de larga escala tem vindo a aumentar,
principalmente nos últimos anos, em resultado de movimentos de concentração via aquisições e fusões.
Em 2012, as 15 maiores empresas farmacêuticas mundiais concentraram 52% das vendas globais.
TENDÊNCIAS DO MERCADO
Apesar da contínua expansão do mercado farmacêutico, a
dinâmica subjacente continua a alterar-se. Segundo o IMS,
os produtos em que as vendas excediam os 18 mil milhões
de dólares perderam a patente em sete mercados- chave,
incluindo o dos EUA, que representa 14 mil milhões das
suas vendas. Os genéricos têm vindo a assumir cada vez
mais um papel central na restrição das despesas de saúde, com a elevada adesão a terapêuticas de baixo custo,
substituindo os produtos de marca em classes como os
antidislipidémicos, antidepressivos, inibidores de agregação plaquetária, antieméticos e agentes respiratórios.
Um outro factor a influenciar o mercado é o forte aumento do papel dos doentes ao cuidarem da sua Saúde
e procurarem o acesso a tratamentos que melhorem ou
prolonguem a sua vida. Dado que são consumidores finais,
183
ganham influência em relação às decisões relativas ao
acesso aos medicamentos. As empresas de maior sucesso
serão aquelas que têm o foco nos consumidores finais e
doentes, sem perderem a perspectiva do crucial papel dos
médicos.
Para manter o crescimento, as empresas farmacêuticas
terão de estar conscientes da dinâmica do mercado mundial, designadamente as oportunidades dos mercados maduros e emergentes e um compromisso para melhor demonstrar o valor dos seus medicamentos junto das partes
interessadas-chave, incluindo os pagadores.
Segundo um relatório sobre o futuro da Indústria Farmacêutica, publicado pela Pricewaterhouse Coopers, intitulado Pharma 2020: The Vision - Which Path Will You Take?,
haverá uma expansão do mercado farmacêutico global,
podendo atingir 1,3 trilião de Dólares em 2020. Este crescimento é baseado, sobretudo, no maior recurso a tratamentos preventivos, à medida que a população mundial
cresce e que aumenta a proporção de idosos e de obesos,
em virtude da maior esperança de vida e do maior poder
de compra.
Estas últimas previsões apontam para a tendência de
crescimento do mercado farmacêutico mundial, de acordo
com o que se tem verificado nos últimos anos. Desse modo,
países emergentes como a Índia, a China, a Indonésia, o
México, a Rússia e a Turquia deverão ser responsáveis por
1/5 das vendas globais de produtos farmacêuticos. O estudo prevê, ainda, que o quadro de doenças crónicas nos
países em desenvolvimento será cada vez mais similar ao
do mundo desenvolvido. No entanto, o actual modelo de
negócios da Indústria Farmacêutica é economicamente difícil de sustentar e operacionalmente incapaz de produzir,
ao ritmo necessário, os tratamentos inovadores exigidos
184
pelo mercado global. Para aproveitar essa futura oportunidade de crescimento, a indústria tem, fundamentalmente,
vindo a mudar o seu modus operandi.
O relatório da Pricewaterhouse Coopers afirma, ainda,
que, apesar da procura sem precedentes, a Indústria Farmacêutica encontra-se num momento decisivo em que
precisa de aperfeiçoar a sua capacidade para poder aproveitar as oportunidades de desenvolvimento. As empresas
enfrentam uma situação de escassez no desenvolvimento
de novos produtos, de fraco desempenho financeiro (o índice FTSE Global Pharmaceuticals registou um crescimento de 1,3% nos seis anos encerrados em 30 de Março de
2007, enquanto o índice Dow Jones World cresceu 34,9%),
de maiores restrições legais e regulatórias e de problemas
de reputação. Ao mesmo tempo, os fornecedores e utentes
dos sistemas de Saúde em todo o mundo estão a perceber
que a despesa está a tornar-se insustentável, a menos que
disponham de benefícios tangíveis e de equilíbrio na relação custo-benefício no longo prazo.
“O desafio para a indústria farmacêutica é aumentar a sua
produtividade em I&D para poder capitalizar as oportunidades. Embora o investimento nessa área tenha duplicado
nos últimos 10 anos, a produção de novos medicamentos
caiu 60%, isso indica que o actual modelo de negócios
é insustentável”, afirma o Dr. Steve Arlington, líder global
em consultoria de I&D da indústria farmacêutica global da
Pricewaterhouse Coopers e coordenador do estudo.
TENDÊNCIAS DA INOVAÇÃO E I&D NA INDÚSTRIA
FARMACÊUTICA MUNDIAL
A Indústria Farmacêutica é uma das maiores contribuintes
privadas para fundos de I&D a nível mundial.
Fonte: EFPIA.
As empresas de sucesso da Indústria Farmacêutica inovam
e fazem I&D em tempo útil e de forma eficaz. Para esta indústria, a maior parte dos lucros e do valor da organização
depende da actividade de I&D. Em média, o tempo de desen-
volvimento de um novo medicamento é de 10 a 15 anos e
custa cerca de 1,2 mil milhões de Dólares (PhRMA, 2014).
A análise dos dados de empregabilidade revela a existência de 810 mil postos de trabalho directos dedicados às
actividades de I&D (PhRMA, 2014).
Entre 2000 e 2013, há mais de 400 novos medicamentos aprovados e encontram-se em fase de desenvolvimento
mais de 400 novos potenciais medicamentos. Por exemplo,
em relação às doenças oncológicas, houve, desde 1980,
um aumento de 83% da esperança de vida destas doenças
devido a novos tratamentos. Já em relação às doenças cardiovasculares, de acordo com uma estatística de 2013 da
Sociedade Americana de Cardiologia, verifica-se uma redução de 39% do número de mortes provocados por doenças
cardiovasculares. Em relação à infecção pelo VIH/SIDA, e
desde a aprovação dos anti-retrovíricos, em 1995, a taxa de
mortalidade diminuiu mais de 80%. Actualmente, os doentes com VIH/SIDA aos 20 anos podem esperar viver até aos
70 anos de vida, mantendo, assim, uma esperança média
de vida próxima da população em geral (PhRMA, 2014).
O investimento do processo de I&D está concentrado,
sobretudo, na fase de ensaios clínicos (43,1%), sendo a
fase III destes ensaios a de maior investimento, totalizando
25,3% do investimento do total do processo de I&D. De seguida, a etapa do processo de I&D de maior investimento
é a dos ensaios pré-clínicos (25,7%) e, por fim, a fase IV
(13,3%). Os restantes 11% de investimento são considerados como não categorizados (PhRMA, 2014).
Em 2012, a Indústria Farmacêutica investiu mais de
€30 000mil milhões de euros em I&D na Europa.
185
MEDICAMENTO VETERINÁRIO
Helana Ponte
Médica Veterinária
Os medicamentos veterinários foram, inicialmente, regulamentados na União Europeia pela Directiva n.º 81/851/
CEE e, posteriormente, pela Directiva n.º 2001/82/CE, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro,
que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos veterinários, alterada pela Directiva n.º 2004/28/
CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, e demais legislação comunitária complementar.
Este enquadramento, distinto da moldura legal do medicamento de uso humano, cria, também, Comités distintos
ao nível da Comissão Europeia, designadamente o Comité
Permanente de Medicamentos Veterinários e o Comité Farmacêutico de Medicamentos Veterinários e envolve, igualmente distintos Grupos de Trabalho, ao nível do Conselho, da Agência Europeia do Medicamento (EMA), da EFSA
(Agência Europeia da Segurança Alimentar) e do Codex
Alimentarius, cuja actividade é um reflexo da especificidade e complexidade das matérias relacionadas com medicamentos veterinários, Saúde Animal e Bem-Estar animal,
Saúde Pública Veterinária e Proteção Ambiental. Também
a OIE (Organização Mundial da Saúde Animal) engloba,
no contexto da sua missão, a observância da regulação do
medicamento veterinário que, na União Europeia, é legislado no que respeita à sua autorização de introdução no
mercado, fabrico, comercialização e utilização.
Inicialmente, a definição de “medicamento veterinário”
era, apenas, a de “um medicamento destinado aos animais”, mas, desde 2008, passou a ter redacção própria,
porque a política do medicamento veterinário, inicialmente decalcada da do medicamento humano com as adaptações possíveis, cedo se afirmou pelas suas particularidades ou diferenças, modelando-se progressivamente e
186
adequadamente a sua moldura legal. “The veterinary system needs its own specific organization and regulation and
no longer being a mirror legislation of the human legislation”
(E.C – EMA January 2010. Final Report).
Em Medicina Veterinária, o valor do medicamento veterinário, mais do que o de um medicamento, encontra-se
intimamente ligado ao respectivo impacte clínico e económico, sobretudo nos animais produtores de alimentos
para consumo humano, de forma que, no seu desenvolvimento, se torna importante seleccionar variáveis de resposta apropriadas e o tipo de investigação apropriada, de
acordo com as espécies, sistemas orgânicos, condições
patológicas envolvidas, e géneros alimentícios de origem
animal a produzir, em quantidade e com a qualidade, química, microbiológica e organoléptica exigida, pelo que o
critério de segurança, primária e secundária, de um medicamento veterinário é, certamente, o que maiores diferenças evidencia e maiores investimentos acarreta, relativamente ao medicamento de uso humano.
O equilíbrio deste binómio, condiciona a disponibilidade de medicamentos veterinários no mercado, por vezes
bastante crítica para as espécies ditas menores, que, sem
definição comunitária, são, afinal, aquelas que menos consumo têm na União Europeia, mas não forçosamente em
cada um dos seus Estados-Membros.
O medicamento veterinário é uma ferramenta de trabalho
da Medicina Veterinária de que a Saúde Animal beneficia,
quando utilizado sob orientação e controlo adequados, de
acordo com as boas práticas veterinárias, quer na clínica
dos animais de companhia, comoquer na clínica dos animais de pecuária.
E é por isso que, na óptica da DGAV, enquanto Autorida-
de Nacional Competente para o Medicamento Veterinário,
o medicamento veterinário sempre foi algo mais do que
um medicamento que se destina aos animais, sem comprometer a Saúde Pública, cumprindo-lhe, antes, a defesa
e observância da relação risco/benefício para os animais,
para o ser humano e para o ambiente, reconhecendo, desde muito cedo, na ApifarmaVET um parceiro de uma enorme facilidade de comunicação, responsável, à altura do
papel que desempenha neste sector.
187
DIAGNÓSTICOS IN VITRO
Isabel Abreu
Farmacêutica
Os dispositivos médicos para diagnóstico in vitro (DIV) são
componentes cruciais usados na prestação de cuidados de
Saúde, imprescindíveis para a tomada de decisão clínica,
orientando o tratamento ou intervenção mais adequada, podendo evitar ou retardar as doenças e as suas complicações.
São instrumentos fundamentais na eficiência e sustentabilidade dos Sistemas de Saúde. O diagnóstico precoce, fornecido por um DIV, permite a obtenção de melhores resultados
em Saúde a longo prazo ou mudanças significativas no estilo de vida das populações. Os DIV, a par de outras tecnologias de Saúde, contribuem para que as pessoas vivam com
mais Saúde, que sejam mais produtivas, socialmente activas,
constituindo tudo isto um pré-requisito para o bem-estar e a
prosperidade económica
Abrangem uma vasta gama de produtos, desde testes de
autodiagnóstico, usados pelo cidadão comum, até sistemas
sofisticados, usados na análise de um largo número de amostras e para múltiplos parâmetros em áreas da Química Clínica, da Imunologia, da Imunoterapia, do Diagnóstico Molecular, da Hematologia, da Microbiologia, entre outras.
A segurança dos utilizadores de DIV tem sido objecto de
crescente atenção e preocupação por parte das autoridades
nacionais e internacionais, designadamente a OMS e a Comissão Europeia, reflectindo-se esta preocupação na elaboração e publicação de vários diplomas legislativos com o fim de
garantir a qualidade, a segurança e o desempenho funcional
destes dispositivos.
Até 1997, os DIV eram colocados no mercado sob a responsabilidade exclusiva do fabricante, sem qualquer controlo
pelas autoridades nacionais. A ocorrência de incidentes com
dispositivos médicos para diagnóstico in vitro para a detecção
de marcadores de infecção por HIV deu origem, por decisão
188
governamental, à publicação do Decreto-Lei nº. 306/97, de
11 de Novembro.
A decisão de publicar legislação nacional, quando estava
em curso a discussão de uma directiva comunitária para este
sector, não foi isenta de dificuldades e de sérios constrangimentos colocados pela Comissão Europeia. É importante
realçar o papel e a atitude positiva da indústria de DIV que,
em colaboração com o Infarmed, permitiram que a mesma
fosse implementada, dentro dos prazos definidos.
A legislação nacional previa a obrigatoriedade de uma autorização de colocação no mercado para os dispositivos utilizados no contexto da grupagem sanguínea e na detecção,
confirmação e quantificação de marcadores de infecção usados nos estudos de unidades de sangue, sendo esta avaliação baseada em critérios científicos, relativos à sensibilidade
analítica, à sensibilidade clínica, à especificidade clínica e à
especificidade – interferentes para a área da Virologia e, à
especificidade, à sensibilidade e à potência para a área da
Imuno-hematologia. Iguais critérios suportam as “Especificações Técnicas Comuns” publicadas como EN (Normas Europeias) e utilizadas na avaliação da conformidade dos dispositivos médicos para diagnóstico in vitro, no âmbito da Directiva
98/79/CE.
A publicação da Directiva 98/79/CE, relativa a dispositivos
médicos para diagnóstico in vitro, procedeu à harmonização
das legislações nacionais dos diferentes Estados-Membros
no que diz respeito à concepção, fabrico, colocação no mercado e supervisão do mercado e foi transposta para o Direito
interno pelo Decreto-Lei nº. 189/2000, de 12 de Agosto.
Seguiu a técnica e a filosofia legislativa da Nova Abordagem
e da Abordagem Global, tal como para as restantes directivas relativas a dispositivos médicos, permitindo a garantia
da qualidade, da segurança e do desempenho funcional dos
DIV, bem como a eliminação de barreiras ao comércio e a
livre circulação de produtos. Por outro lado, dá resposta à
procura das soluções inovadoras desenvolvidas pela indústria, garantindo o acesso atempado a dispositivos com níveis mais elevados de especificidade e sensibilidade, com
evidente reflexo na maior robustez dos resultados obtidos e
na tomada de decisão clínica.
A directiva descreve a amplitude e o conteúdo dos requisitos essenciais aplicáveis a cada tipo de dispositivo e os
possíveis processos de avaliação de conformidade, considerados susceptíveis de proporcionarem o nível de protecção
necessário, estabelecendo os critérios que determinam as
condições em que o fabricante pode fazer a sua opção, caso
exista mais de uma opção prevista.
A avaliação e o controlo dos dispositivos médicos para diagnóstico in vitro em todo o seu ciclo de vida é suportada pela
aplicação de um sistema gradual de controlo correspondente ao nível do risco potencial inerente ao tipo de dispositivo,
de acordo com critérios relacionados com o uso pretendido
e as indicações de utilização definidas pelo fabricante, a experiência técnica, científica, clínica do utilizador, a importância da informação para o diagnóstico, tendo em atenção
o racional da doença ou da alteração fisiológica, incluindo a
presença de sinais ou sintomas que possam dar orientação
ao médico, e o impacto do resultado para um doente e/ou
para a Saúde Pública.
A adaptação ao progresso técnico e à inovação está, também, reflectida na proposta de Regulamento que irá substituir a Directiva 98/79/CE e que prevê o alargamento da definição e do âmbito de aplicação de modo a incluir os testes
genéticos, os testes para selecção terapêutica, os dispositivos de alto risco utilizados numa só instituição e o software
médico. A determinação do gradiente de risco que suporta
a classificação dos DIV seguindo os princípios elaborados
pelo GHTF (Global Task Force Harmonization) e introduzindo
diferentes classes de risco mediante regras bem definidas e
objectivas. Os requisitos aplicados aos estudos clínicos que
suportam a avaliação do desempenho funcional e que são
proporcionais à classe de risco. A Identificação Única do Dispositivo (IUD) enquanto elemento fundamental para a rastreabilidade dos dispositivos bem como para a identificação
dos intervenientes no circuito comercial. A possibilidade de
designação de laboratórios de referência com intervenção na
verificação da conformidade de DIV de maior risco ou que
envolvam perigo ou tecnologias específicas.
O sector dos DIV é composto por diferentes stakeholders
com funções diferentes e bem definidas, desde a concepção ao acesso ao mercado, destacando-se os fabricantes, os
distribuidores, os organismos notificados, os organismos de
normalização nacionais e internacionais, as entidades reguladoras e as entidades financiadoras.
Apesar de, no mercado Português, não haver um número
significativo de empresas da indústria dos DIV que se dediquem a actividades associadas à produção, e tendo as
empresas nacionais como principal função a venda e distribuição de DIV, importa chamar a atenção para a actividade
científica de desenvolvimento e concepcção praticada em
diferentes pólos de investigação nacionais. Importa criar e
reforçar sinergias entre estes centros de investigação, a autoridade competente e as empresas, no sentido de transformar a actividade científica de desenvolvimento e concepcção
em actividade produtiva, permitindo a comercialização e internacionalização de DIV de produção nacional, com reflexos
na prosperidade económica do País.
189
7.
Excerto de cartaz publicitário das «Águas de Pedras Salgadas»
Águas de Pedras Salgadas (1910-1917)
190
VALOR DOS RECURSOS HUMANOS
E A SUA EVOLUÇÃO
191
192
VALOR DOS RECURSOS HUMANOS E A SUA EVOLUÇÃO
Helda Azevedo
Economista
O investimento em Saúde é definido como prioridade no
Pacote de Investimento Social da Comissão Europeia,
adoptado a 20 de Fevereiro de 2013, (European Commission, 2013-a), onde se reconhece a Saúde como parte integrante da Estratégia Europa 2020, no sentido de
se impulsionar um crescimento inteligente, sustentável e
inclusivo da União Europeia (UE). Este pacote foi precedido por um comunicado da Comissão a 18 de Abril de
2012 – Towards a Job Rich Recovery (Pacote Emprego) – o
qual integra o Action Plan for the EU Health Workforce, salientando-se os Cuidados de Saúde como um factor-chave
no desenvolvimento económico e na criação de emprego
especializado. O referido documento define o sector da
Saúde como intensivo em mão-de-obra e realça o facto de
este ser responsável por cerca de 8% dos empregos em
toda a UE, com perspectiva de criar oito milhões de novos
postos de trabalho diferenciados entre 2010 e 2020. O
envelhecimento da população e o aumento da procura de
cuidados de Saúde têm sido factores reconhecidos como
determinantes na criação de emprego. O Annual Growth Survey 2014 (European Commission, 2013-b) também realça
o potencial que pode ser aproveitado futuramente no sector
através do desenvolvimento de competências adequadas.
Por outro lado, a escassez, a má distribuição e os diferentes níveis de qualidade e desempenho dos recursos
humanos para a Saúde são desafios que afectam a generalidade dos países e que se agravam em tempos de
fortes restrições orçamentais. De acordo com a Proposta
do Governo – “Um Estado melhor” (Governo de Portugal,
2013) –, Portugal também se depara com a questão do
“insuficiente financiamento global do Sistema de Saúde,
da escassez de profissionais, da pressão demográfica e
da gestão de unidades desadequadas em termos clínicos,
geográficos e com necessidades de modernização”. Adicionalmente, o desemprego e a emigração em Saúde têm sido
uma realidade que suscita especial preocupação pelo forte
desinvestimento que representa. De acordo com o relatório
do 3.º Fórum Global sobre RHS, os Países que têm conseguido uma melhor atracção de médicos e profissionais
de Saúde têm as suas necessidades satisfeitas, enquanto
outros podem ver os benefícios dos seus investimentos em
educação a reverter para outros Países da região (Norwegian Directorate of Health, WHO and the Alliance, 2013).
Urge, portanto, os Sistemas de Saúde encontrarem soluções inovadoras, através de novas tecnologias, produtos e
mudanças organizativas, que dependem de profissionais altamente motivados e com competências ajustadas à procura crescente de cuidados de Saúde (European Commission,
2012). O Plano de Acção tem como objectivo ajudar os Estados-Membros a dar resposta a estes desafios e a estabelecer acções para promover a cooperação europeia com vista
à melhoria do planeamento e previsão da força de trabalho
e o recrutamento e retenção dos profissionais de Saúde, de
forma a mitigar os efeitos negativos da migração.
CORTAR OU INVESTIR EM SAÚDE?
UMA MUDANÇA DE PARADIGMA
É, naturalmente, reconhecido que maior riqueza gera
mais Saúde, mas será o contrário verdade? Saúde gera
riqueza? Esta foi a base de trabalho da Commission on
Macroeconomics and Health (WHO, 2001), cujo relatório
deu um forte contributo à alteração do debate político,
chamando-se a atenção para a relação bidireccional entre
193
Saúde e Desenvolvimento Económico. Se este estudo teve
por base os Países em desenvolvimento, incentivou outras
análises semelhantes na UE, como é exemplo a de Suhrcke
, Mckee, Arce, Tsolova e Mortensen – The contribution of
health to the economy in the European Union (2005) –, que
demonstrão uma forte evidência dos benefícios económicos
através de melhorias na Saúde da população.
Em 2008, os Países da região Europeia da Organização
Mundial da Saúde (OMS) reuniram-se em Tallinn, para
discutir esta nova forma de pensar sobre os Sistemas de
Saúde, reafirmando-se a despesa pública enquanto investimento. Os participantes abordaram um modelo de relações bidireccionais entre Sistemas de Saúde, Saúde e Riqueza, valorizando-se o facto da Saúde, para além do seu
valor intrínseco, contribuir para o bem-estar social através
do seu impacto no desenvolvimento económico, competitividade e produtividade (WHO, 2008). A resolução da
conferência incitou os Estados-Membros a assegurar que
os seus Sistemas de Saúde continuem a proteger os mais
vulneráveis, demonstrem eficácia na prestação de serviços
e, também, que se comportem como actores económicos
responsáveis em áreas como o investimento, a despesa e
o emprego (Mladovsky et al 2012).
Na sequência da crise económica internacional, em Abril
de 2009, a OMS, em cooperação com o Ministério da Saúde norueguês, organizou um encontro em Oslo (Abril de
2009), levantando-se a questão da Saúde em tempos de
crise nos Países da UE. Esta discussão foi retomada em
Abril de 2013 na conferência Health Systems in Times of
Global Economic Crisis: an Update of the Situation in the WHO
European Region, cujas conclusões chamam a atenção
para os cortes excessivos e prolongados nos orçamentos
da Saúde, na medida em que as necessidades em Saúde das populações aumentam rápida e significativamente
com o aumento do desemprego e reduções no rendimento
das famílias, excepto quando é claro que esses ajustamentos no orçamento não ameaçam o acesso da população a
cuidados de Saúde.
194
Existem, portanto, fortes argumentos para uma abordagem anticíclica da despesa pública, no sentido de se manter ou aumentar a prestação de serviços num momento
de procura crescente que, por sua vez, requer políticas
fiscais e económicas responsáveis durante os períodos de
crescimento económico. Intervenções na Saúde Pública
podem desempenhar um papel de relevo na recuperação
económica através, por exemplo, da protecção da Saúde
mental, do aumento da produtividade e de intervenções
que poupam gastos futuros ao Sistema de Saúde.
A necessidade de criar um novo ciclo de investimento em
Saúde por parte dos Governos Europeus está inteiramente
relacionada com o debate da Agenda de Lisboa, que tem
como objectivo fazer com que a economia Europeia seja
a mais competitiva de todo o mundo, sendo necessário
aumentar o conhecimento dos benefícios do investimento
em capital humano, nomeadamente ao nível da Saúde da
população. A Agenda de Lisboa e a consequente Agenda da
UE 2020 pretendem valorizar a competitividade económica e a coesão social, bem como desafiar a visão simplista
de que a despesa em Saúde é uma ameaça à viabilidade
financeira (Figueras et al, 2012).
Assiste-se, portanto, a uma mudança de paradigma,
onde a Saúde e os Sistemas de Saúde não são vistos apenas pela pressão que exercem sobre a despesa pública
mas também como indutores do crescimento económico.
Numa perspectiva microeconómica, uma população mais
saudável aufere maiores rendimentos e recorre menos ao
absentismo e às reformas antecipadas, é mais produtiva
no trabalho e, prevendo-se uma vida mais longa, é esperado que invista mais em educação e que poupe mais para
a reforma, disponibilizando dinheiro para investimento de
capital (McKee et al, 2009), resultando, ao nível macroeconómico, numa sociedade mais produtiva e próspera
(Figura 1). Adicionalmente, uma melhor Saúde permite
reduzir a procura de Cuidados de Saúde e apoios sociais,
com um forte impacto na riqueza do País, libertando-se
recursos para outras áreas prioritárias.
Fig 1. Riqueza, Sistemas de Saúde e Saúde
Por sua vez, o sector da Saúde, para além de contribuir para
a Saúde da população e sua produtividade, é um factor de desenvolvimento económico, simplesmente pela sua dimensão,
tendo um peso significativo no PIB, que, por sua vez, contribui
para um investimento substancial em capital e tem um papel
significativo enquanto dinamizador e consumidor de inovação
tecnológica e I&D. Adicionalmente, o investimento em Saúde
é responsável pela geração de emprego com um elevado grau
de diferenciação técnica, o que se traduz num motor para o
desenvolvimento da sociedade (Silva, 2010). A participação
média deste sector no emprego total tem aumentado e ronda
actualmente os 10% nos Países da OCDE, com os níveis mais
elevados para os Países da Escandinávia (20% na Noruega). O
emprego no sector da Saúde em Portugal é relativamente baixo (5.9%), o que indica que melhorias podem ser feitas a favor
do bem-estar da população e do desenvolvimento económico.
Desta forma, o sector da Saúde não só é importante para
uma melhor produtividade laboral e bem-estar social, como
também é essencial na geração de empregos e oportunidades de negócio, com efeitos multiplicadores significativos no
crescimento económico (Poças, 2012).
As inter-relações evidenciadas na Figura 1 mostram-se desequilibradas com a política de austeridade seguida em Portugal, na medida em que as restrições aos recursos económi-
195
cos e financeiros afectam o sector da Saúde, dificultando, de
várias formas, o acesso aos Cuidados de Saúde e desvalorizando o investimento em reformas estruturais que preparam
o Serviço Nacional de Saúde (SNS) para o futuro.
Os gastos em Saúde não podem, portanto, “ser avaliados
de forma míope, descurando a natureza de ‘investimento’ que
lhe está associada e as suas repercussões na competitividade
do cluster e da economia” (Mateus, 2010).
EVOLUÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS EM PORTUGAL
NO CONTEXTO DA CRISE ECONÓMICA INTERNACIONAL
A austeridade na Europa teve um impacto negativo muito superior ao esperado na economia e na perda de postos de trabalho, resultado do multiplicador orçamental se revelar ex-post muito mais elevado do que o previsto, questão abordada pelos Working Papers do FMI (Blanchard e Leigh,
2013).
Portugal passou por um período de forte recessão, com
impactos devastadores na criação de emprego, provocando novos e preocupantes fenómenos demográficos – à
imigração menos qualificada verificada nos últimos anos,
junta-se agora uma emigração notória dos quadros mais
qualificados, sendo este outro factor de empobrecimento
do País. Segundo o Secretário de Estado das Comunidades, emigraram, em 2012, mais de 100 mil Portugueses,
um número que se aproxima à onda migratória dos anos
60 (Ribeiro, 2013).
No que se refere ao sector da Saúde, a realidade diverge
da generalidade dos sectores, dado haver um grande e
crescente número de profissionais nos Países da OCDE,
resultado do envelhecimento da população, do progresso
tecnológico e das expectativas dos cidadãos. Contudo, a
preocupação com a escala da mobilidade tem aumentado
nos últimos anos.
Portugal foi um País “importador” de profissionais de
Saúde desde os anos 90 tendência que se tem vindo a
inverter. Actualmente, o País é exportador de profissionais
196
de Saúde, com destaque para os enfermeiros, conforme
noticia um artigo do Expresso Emprego (Mateus, 2013).
A emigração de profissionais de Saúde deve-se essencialmente à procura de melhores condições de trabalho
e a mais oportunidades de desenvolvimento profissional
e, no caso concreto de Portugal, acresce-lhe a dificuldade
recente de enfermeiros, dentistas e técnicos de diagnóstico e terapêutica encontrarem emprego, os baixos salários
nos sectores público e privado, a sobrecarga de trabalho,
a remuneração não relacionada com o desempenho, as
baixas perspectivas de progressão na carreira e a falta de
incentivos para trabalhar nas regiões do interior. Desde
2009, o contexto de crise económica, com elevadas taxas
de desemprego, cortes nos salários, maior tributação, redução de efectivos no sector público, pode ser considerado
o maior incentivo à saída destes profissionais.
Os efeitos negativos da migração para os Países de origem, como a perda do investimento na formação de profissionais qualificados ou a redução do acesso a Cuidados
de Saúde, tem sido motivo de preocupação, levando a que
a Assembleia Mundial da Saúde adoptasse, em 2010, o
Código de Práticas sobre o Recrutamento Internacional de
Profissionais de Saúde, de forma a restringir o recrutamento de profissionais de Saúde em Países que apresentam
grande escassez de recursos humanos.
Por outro lado, a acrescentar aos profissionais que imigram para Portugal por sua iniciativa, o Ministério da Saúde (MS) tem contratado profissionais estrangeiros para
colmatar a escassez de recursos humanos no SNS em algumas zonas do País, essencialmente no interior. Segundo Ribeiro et al (2014), o MS contratou, desde 2006, 50
médicos de Cuba, Costa Rica, Colômbia e Uruguai para
ocuparem vagas disponíveis no SNS, argumentando que os
profissionais Portugueses não estão dispostos a trabalhar
em regiões mais pobres e isoladas e que o Estado tem o
dever de dar acesso a serviços de Saúde à população dessas regiões. As organizações médicas têm-se oposto, embora sem sucesso, a esta estratégia, argumentando que a
questão não é a falta de médicos, mas a falta de incentivos
para que os médicos concorram a essas posições Conceição et al, 2011; Ribeiro et al, 2014).
Neste contexto, importa perceber o comportamento dos
profissionais de Saúde e seus efeitos na alteração da disponibilidade de recursos em tempos de recessão económica. Apesar de não haver monitorização da emigração dos
profissionais de Saúde de Portugal, este fenómeno pode
ser analisado indirectamente pelo uso de proxys como o
número de pedidos de declaração de reconhecimento de
qualificações profissionais fora de Portugal.
É notório o interesse por parte dos enfermeiros em trabalhar no exterior, com um número de pedidos de declarações a mais do que triplicar entre 2009 e 2012, tendo
havido 2,814 pedidos no último ano em análise (Figura 2).
A Ordem dos Enfermeiros divulgou que, em 2008, 929 enfermeiros Portugueses suspenderam ou cancelaram a sua
licença, o que não significa que saíram do País (Ribeiro et
al, 2014). A emigração tem sido, portanto, uma solução
para os problemas de empregabilidade que assolam este
grupo profissional, mostrando uma imagem real do nível de
aproveitamento de recursos humanos em Portugal.
197
Em relação aos médicos, a realidade é bem diferente
dado não ser, ainda, conhecido o desemprego nesta classe
profissional; no entanto, é bem visível o interesse crescente na emigração pelo aumento do número de pedidos de
declaração nos últimos anos (81%, entre 2009 e 2013).
Segundo a Ordem dos Médicos, em 2013, foi solicitada a
isenção do pagamento de quotas por ausência no estrangeiro por 133 médicos.
As agências de recrutamento, mais direccionadas para
a retenção de enfermeiros, estão activas em Portugal, fornecendo informação e dando apoio aos candidatos que
decidam emigrar. Por exemplo, em Abril decorreu na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa a primeira edição
do evento Healthcare Mobility Day, com aproximadamente
700 postos de trabalho, essencialmente para enfermeiros.
É evidente o desaproveitamento do investimento realizado
na formação destes profissionais, agravado pelo facto de
Portugal também ter carências ao nível de recursos humanos. A emigração de médicos não era preocupante, mas
esta situação parece estar a mudar. O evento Medpharm
Careers, que ocorreu no início do ano corrente em Portugal,
trouxe 300 vagas, na maioria para médicos especialistas.
No que se refere ao sector farmacêutico, este é o que
mais tem contribuído para a redução da despesa total em
Saúde nos últimos anos, com consequências ao nível da
insolvência de farmácias, nas dificuldades financeiras de
alguns grossistas e na redução do investimento e despedimentos na indústria financeira. Segundo João Almeida Lopes, presidente da Apifarma, as empresas farmacêuticas
perderam cerca de 1500 postos de trabalho entre 2012 e
2013, havendo uma tendência crescente para concentrar
numa gestão ibérica actividades que, até então, possuíam
estruturas autónomas em Portugal e em Espanha (Lopes,
2013). As dificuldades financeiras que grande parte das
farmácias atravessam devem reflectir-se na redução de
novas contratações e, por conseguinte, no aumento do desemprego nesta classe.
Como acontece com a classe médica e de enfermagem,
198
não é fácil estimar o número real de desempregados no
sector farmacêutico, bem como o número dos que emigraram, dado que os profissionais não são obrigados a
notificar a sua situação à Ordem dos Farmacêuticos. Os
números mais fidedignos são, por isso, as declarações solicitadas para exercer actividade no estrangeiro. Em 2013,
segundo dados da Ordem, foram emitidas 138 declarações para efeitos de exercício profissional no estrangeiro.
A Ordem refere, ainda, que 260 profissionais comunicaram a sua situação de desemprego e 267 comunicaram a
sua decisão de emigrar, representando a realidade actual
para os licenciados em Ciências Farmacêuticas.
Sendo a formação farmacêutica um investimento maioritariamente público, urge perceber como aproveitar os recursos e utilizá-los da forma mais adequada. Silva (2011)
defende que a Farmácia tem de ser encarada como uma
unidade de Saúde, como os Centros de Saúde e Unidades
de Saúde Familiar, indo para além da componente comercial, devendo as farmácias e farmacêuticos privilegiar a
prestação de serviços no acto da dispensa e outros associados à promoção da Saúde e prevenção da doença.
NECESSIDADE DE PLANEAMENTO DE RECURSOS
HUMANOS EM SAÚDE
Segundo o Relatório Europeu das Ofertas de Emprego e de
Contratação (European Commission, 2014), as profissões
de Saúde pertencem às principais profissões com escassez de mão-de-obra na Europa, sendo um dos sectores
com maior potencial na criação de emprego. Os critérios
de distribuição dos recursos humanos em Saúde também
se mostram insuficientes, havendo uma distribuição irregular, com consequências ao nível da acessibilidade de alguns grupos populacionais (Biscaia et al, 2007; Dussault
e Fronteira, 2010). A título de exemplo, Lapão e Dussault
(2012) referem que a falta de recursos humanos no âmbito dos Cuidados de Saúde Primários, mais acentuada em
ACES rurais, tem limitado a disponibilidade de serviços
e o acesso aos cuidados. Se, até 2008/2010, a preocupação política passava por haver pessoal suficiente, desde então os Países têm referido como questões principais
da política de recursos humanos em Saúde a distribuição
geográfica dos médicos, as especialidades médicas, com
destaque para as falhas em Medicina Geral, a melhor divisão de funções entre profissionais e uma melhor prestação
de serviços em equipa (Norwegian Directorate of Health,
WHO and the Alliance, 2013).
Em Portugal, não se verifica um pensamento estratégico
de recursos humanos. A ausência de critérios e estratégias
para a formação, alocação e combinação de competências
profissionais tem resultado numa gestão ineficiente dos recursos humanos em Saúde, que se traduz pela existência
de disparidades entre a procura e a oferta de Cuidados
de Saúde. Como resultado, assiste-se, nos últimos anos,
à saída de profissionais que, não sendo devidamente monitorizada, pode resultar em reduções críticas no stock de
profissionais, com consequências para a acessibilidade
aos serviços de Saúde e para a perda de acessibilidade
por utentes de comunidades que têm dificuldade na fixação dos mesmos. Segundo Ribeiro et al (2014), apesar de
a imigração de outros Países da UE estar limitada, esta
questão pode-se alterar com a entrada da Directiva de Cuidados transfronteiriços, sendo necessário que as autoridades façam uma avaliação dos possíveis cenários e seus
efeitos nos profissionais de Saúde.
Portugal apresenta, portanto, uma combinação de grandes desafios: envelhecimento da força de trabalho, escassez e excesso, devido a uma combinação de competências
desequilibrada, ausência de processos e mecanismos que
ajustem a formação às mudanças de necessidades em
Saúde e desequilíbrios geográficos e entre níveis de cuidados (Ribeiro et al, 2014). Simultaneamente, verifica-se um
aumento expressivo na “exportação” de profissionais de
Saúde. A ausência de discussão no sentido de responder
a estas questões dificultará a identificação de respostas
adequadas.
Há uma necessidade óbvia de um sistema de informação
integrado que permita fazer uma análise válida da situação
dos profissionais de Saúde, bem como a monitorização do desemprego e dos fluxos migratórios, para que seja possível o
planeamento estratégico dos recursos humanos em Saúde.
CONCLUSÃO
Não obstante a importância económica da Saúde e dos
Serviços de Saúde ser cada vez mais reconhecida a nível
internacional, verifica-se, com a crise económica actual,
um desinvestimento no sector da Saúde. A perda de capital humano, através do desemprego e da emigração é
um tema que suscita especial preocupação, na medida em
que tem sido ignorada por parte dos responsáveis pelas
políticas públicas nacionais e europeias nestes domínios.
Sendo inquestionável a escassez de profissionais de Saúde
no futuro e dado haver elevados investimentos na formação, como é possível continuar a tolerar a perda de capital
humano que hoje tem lugar na Saúde?
A “exportação” de portugueses, maioritariamente jovens
qualificados, acarreta um custo económico considerável,
sendo que muitos dos que partem não regressam, havendo
um forte investimento público que é desperdiçado e aproveitado pelos Países de acolhimento. A emigração de capital humano representa, assim, uma perda de investimento
dos Países de origem que é aproveitada por outros a custo
zero.
Um diálogo aberto no que respeita às necessidades de
profissionais de Saúde, ao aumento da sua eficiência e à
sua melhor distribuição geográfica, bem como à mobilização dos recursos existentes, parece necessário.
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201
8.
Excerto de cartaz publicitário da «Salutaris: Grande Água Purgativa»
Águas Minerais Salutaris (1924-1929)
202
IMPORTÂNCIA ECONÓMICA E ESTRATÉGICA
DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
203
204
IMPORTÂNCIA ECONÓMICA E ESTRATÉGICA
DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
Pedro Ferraz da Costa
Presidente da Direcção da Apifarma (1980-1981)
Presidente da Mesa da Assembleia-Geral (1982-1990)
Presidente da CIP (1981-2001)
“It was a good business, now it’s only a business”
Desde o início dos anos 1950, ou seja, desde que fui para
o colégio infantil, que vi e ouvi falar da Indústria Farmacêutica. Não posso, no entanto, referir-me aos 75 anos
da Apifarma com conhecimento integral da sua vida. Mas
posso, com certeza, falar do que foi a sua evolução.
Nos anos 1950 a distribuição de medicamentos era tão
limitada que muitas empresas, entre as quais a nossa que
foi fundada em 1924, distribuíam os medicamentos nuns
enormes cestos transportados às costas.
A percentagem da população com acesso a medicamentos era muito reduzida em qualquer País do mundo nessa
época.
A criação do Serviço Nacional de Saúde no Reino Unido
e o progressivo alargamento, em todos os Países europeus,
do acesso aos medicamentos, representaram um crescimento exponencial do sector. Em muitos casos, uma só fábrica
abastecia o mercado interno e todas as exportações de qualquer grande País. Hoje, algumas grandes empresas internacionais têm mais de 100 fábricas. Mas querem vendê-las.
A partir dos anos 60, do século XX, a criação dos Serviços
Médico-Sociais pela Previdência permitiu subsidiar o consumo e simultaneamente diferenciar favoravelmente os produtos fabricados localmente dos que eram importados, dando
origem ao crescimento da fabricação de medicamentos em
Portugal, através da celebração de contratos de licença ou
por “cópia”, versão da época de genéricos com marca.
As entidades oficiais eram da opinião que Portugal, com
um mercado interno muito reduzido, não deveria apostar
na investigação e desenvolvimento nesta área. E nos anos
que se seguiram à revolução de 1974, apesar do objectivo proclamado de ter uma economia socialista, não havia
nem a reflexão necessária a lançar programas de desenvolvimento industrial nesse sentido, nem o irrealismo de
afrontar os Países mais desenvolvidos, cerceando importações que poderiam levar a deixar as prateleiras das farmácias portuguesas tão vazias como acontecia, por exemplo, em Cuba. Foi, aliás, uma visita de Otelo Saraiva de
Carvalho a esse País, em 1975, que levou Vasco Gonçalves
a desistir de nacionalizar a Indústria Farmacêutica. Recordo, aliás, um convite para almoçar do Tenente Rosário
Dias, Chefe de Gabinete do Primeiro-Ministro, para que eu
205
Brochura institucional do 60.º aniversário da Apifarma (1999).
lhe fornecesse argumentos para justificar politicamente a
não-nacionalização do sector na onda de nacionalizações
que se seguiram ao 11 de Março desse ano.
Até aos anos 1990, foi possível infringir as patentes de
medicamentos estrangeiros, sem grandes restrições, e a
maioria das empresas portuguesas desenvolveu-se dessa
maneira. A aprovação do chamado “TRIPS”, no quadro do
acordo da World Trade Organisation, veio pôr fim a esta
estratégia de desenvolvimento, como contrapartida exigi-
206
da pelos Países mais desenvolvidos para a abertura do seu
mercado interno às importações de países terceiros.
O crescimento contínuo das vendas e o alinhamento dos preços dos novos produtos pelos que eram praticados nos países
de origem levaram a um crescimento substancial do peso dos
medicamentos nas despesas totais do sector da Saúde.
Em 2005, o Governo decidiu privilegiar o consumo de
genéricos, dando início a uma profunda mudança das condições económicas em que o sector vivia. A prescrição por
DCI e a progressiva redução dos preços de venda, quer dos
genéricos quer dos medicamentos de marca, têm significado uma marcada deterioração das margens das empresas. A primeira resposta foi a redução das actividades de
marketing – o que já tinha acontecido nos outros Países da
União Europeia e a redução da actividade em Portugal de
muitas filiais de empresas internacionais. Tinham entrado
para tirar partido do crescimento do mercado, ao abrigo
da liberdade de estabelecimento no período pós-adesão à
CEE, e viriam a sair nestes últimos anos.
Fechou-se, assim, um ciclo de expansão da actividade e,
a partir de 2008, a produção de matérias-primas e produtos farmacêuticos tem vindo a descer, com uma quebra
que, desde 2011, ultrapassou os 10% anuais.
No entanto, as exportações subiram desde 2005 a uma
taxa média de 11,4% e o sector passou duma fase virada
quase exclusivamente para o mercado interno, com algumas e honrosas excepções, para uma actividade cada vez
mais virada para o exterior.
A Indústria Farmacêutica é um dos quatro sectores com
aumento de emprego de 2010 a 2012, sendo os outros o
vestuário, o calçado e os automóveis e seus componentes.
No fundo, saem os que podem sair e os nacionais não têm
outro remédio senão redescobrir-se e virar-se para o exterior.
Durante todos estes anos a Apifarma foi acompanhando,
que não precedendo, esta evolução e o seu papel foi mais
o de tentar conquistar tempo para que as empresas se pudessem adaptar – e todos sabemos – como as mudanças
em Portugal são lentas, difíceis e caras do que o de impor
uma agenda de mudança rápida para uma actividade mais
internacionalizada.
O reduzidíssimo papel do Ministério da Economia perante o Ministério da Saúde comprador tem dificultado a compreensão da necessidade para nós evidente, de não deixar
baixar tanto os preços que venham a inviabilizar a exportação. Para exportar e enfrentar a incerteza, inevitavelmente
associada à presença em novos mercados, é preciso ter
margens. E, em muitos casos elas baixaram a zero. A visão
de curto-prazo mata cenários mais ambiciosos de desenvolvimento a longo-prazo.
O crescimento das despesas de investigação e desenvolvimento do sector, que representaram, aliás, 19% do investimento da indústria em I&D e 6,2% do investimento total
do País em 2012, deixa prever que teremos no futuro um
sector mais inovador e bem inserido na necessidade de Portugal aumentar a sua quota de exportação no mercado dos
produtos mais evoluídos e de maior valor acrescentado.
207
9.
Excerto de cartaz publicitário do «Sudorol»
208
Farmácia Sousa (1916-1949)
RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLATAFORMAS
DE COLABORAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
209
210
RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLATAFORMAS DE COLABORAÇÃO
E DESENVOLVIMENTO
Apifarma
A Indústria Farmacêutica, porventura mais do que qualquer outra, contribui activamente para prolongar e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, nomeadamente
através dos medicamentos cada vez mais avançados que
desenvolve e produz. Não obstante tal papel social intrínseco, as empresas que integram este sector ampliam a sua
missão essencial ao desempenharem, em simultâneo, uma
cidadania activa inserida no quadro das boas práticas de
responsabilidade social. Fazem-no, principalmente, ao fomentar melhores condições sociais, apoiando causas meritórias, sendo solidárias e pedagógicas e desenvolvendo esforços para uma maior sustentabilidade ambiental da sua
actividade industrial.
Também a Apifarma, que representa cerca de 120 empresas do sector, tem, ao longo dos últimos anos, realizado um
extensivo trabalho de cooperação, solidariedade e incentivo
ao desenvolvimento social, científico e pedagógico dos portugueses. A sua participação activa na comunidade assenta
em cinco pilares de responsabilidade social – doentes, cidadãos e empresas, ciência e investigação científica, ambiente
e deontologia – no âmbito dos quais tem desenvolvido múltiplas iniciativas.
DOENTES
Assume especial importância, neste domínio, a parceria
estabelecida, em Dezembro de 1999, com as associações
de doentes, visando debater questões relacionadas com a
qualidade dos serviços médicos em Portugal, o acesso dos
doentes a novas terapêuticas, os medicamentos órfãos, as
doenças raras e as grandes prioridades de investigação da
Indústria Farmacêutica. Iniciada com a Associação Protecto-
ra dos Diabéticos de Portugal, a Associação Portuguesa de
Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer, a Sociedade
Portuguesa de Esclerose Múltipla e a Associação Portuguesa
de Doentes de Parkinson, a referida parceria evoluiu, gradualmente, para 42 membros, excluindo quaisquer actividades
de financiamento por parte da Apifarma ou a promoção dos
serviços desta por parte das associações de doentes, ambas
incompatíveis com o código de conduta que, desde Julho de
2008, vincula, ao nível dos Países membros da União Europeia, a relação entre as empresas da Indústria Farmacêutica e as associações de doentes. Para cumprir os objectivos
delineados nos princípios que presidem à referida colaboração, foi criada a plataforma “Somos Doentes”, um espaço
de encontro e de diálogo na Internet que permite a partilha
de conhecimentos e de experiências entre as associações
de doentes, os familiares, o público em geral e os profissionais de Saúde. Além deste, têm sido desenvolvidos outros
projectos informativos, designadamente a Newsletter digital
ADN - Associações de Doentes News – criada em 2009 para
dar a conhecer as actividades das associações de doentes
parceiras e fomentar a partilha entre as mesmas – e a edição
de factsheets comemorativas dos dias em que se assinalam
as doenças representadas pelas associações parceiras, contribuindo para uma melhor e mais aprofundada informação
pública sobre questões de Saúde.
Um cuidado especial tem merecido o esclarecimento dos
doentes relativamente aos ensaios clínicos, nos quais estes
desempenham um papel fundamental. Inseriram-se neste
âmbito as sessões de formação realizadas em Lisboa em
2011, sob o tema «Ensaios clínicos: da molécula ao medicamento, nas quais participaram com ampla participação das
associações de doentes portuguesas.
211
A Apifarma vem, igualmente, desenvolvendo esforços no
sentido do bem-estar dos doentes em contexto hospitalar.
Foi com tal propósito que, em 2009, assinou, conjuntamente
com o Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco
Gentil e a Associação Portuguesa de Música nos Hospitais
e Instituições de Solidariedade (APMHIS), um protocolo de
colaboração e mecenato para a implementação do projecto “Música nos Hospitais”. Desenvolvida no IPO de Lisboa,
esta iniciativa visou melhorar a qualidade de vida de doentes, familiares e profissionais de Saúde, contribuindo para
um ambiente hospitalar mais humanizado.
Finalmente, foram também realizadas diversas iniciativas
no domínio da formação, nomeadamente a Convenção Europeia de Doentes, que decorreu em Portugal em 2006.
CIDADÃOS E EMPRESAS
212
Remontam ao início dos anos 1980 as primeiras iniciativas
dirigidas pela Apifarma ao grande público, nomeadamente através de campanhas de sensibilização para as boas
práticas de Saúde, a defesa do medicamento e o combate
aos riscos da contrafacção. Tais acções têm prosseguido
até ao presente, cobrindo temas como o diagnóstico laboratorial, a diabetes, a adesão à terapêutica, a vacinação da
gripe e a embalagem original.
A criação do Banco de Medicamento Solidário, no âmbito do Programa de Emergência Social, elevou, porém,
a um novo patamar a prática de responsabilidade social
pela Apifarma, tendo presidido à sua realização a promoção do acesso dos mais idosos e necessitados à Saúde
e ao medicamento. Ao abrigo do protocolo firmado, em
Novembro de 2012, entre o Ministério da Solidariedade
e da Segurança Social, a Apifarma, o Infarmed e a União
das Misericórdias Portuguesas, as empresas farmacêuticas
passaram a poder doar medicamentos e produtos de Saúde
com prazo de validade não inferior a seis meses de modo a
serem utilizados, em perfeitas condições de qualidade e de
segurança, por utentes de instituições particulares de solidariedade social (IPSS). Até ao final de Março 2014, as empresas farmacêuticas associadas já tinham entregue mais de
135 mil embalagens de medicamentos a 78 instituições.
Outra das áreas em que a Apifarma tem sido particularmente interventiva no acompanhamento do plano nacional
para a redução, é a redução do consumo de antibióticos
e, consequentemente contribuindo para a diminuição da
taxa de bactérias resistentes aos mesmos, preservando-se, assim, a eficácia dos fármacos, que permitiram baixar
a mortalidade devida a doenças infecciosas e aumentar
significativamente a esperança de vida média na segunda
metade do século XX. Nesse sentido, a Apifarma foi uma
das vinte entidades nacionais signatárias da Aliança Portuguesa para a Preservação do Antibiótico (APAPA), apresentada no Porto em Novembro 2011, por ocasião do Dia
Europeu do Antibiótico.
Também a contrafacção de medicamentos é um fenómeno cada vez mais actual e preocupante, colocando
em causa a Saúde dos cidadãos que os consomem. Esta
questão levou a Apifarma a celebrar, em Junho de 2011,
um protocolo com o Infarmed, a Direcção-Geral das Alfândegas e Impostos Especiais sobre o Consumo e a Valormed – Sociedade Gestora de Resíduos de Embalagens de
Medicamentos. O objecto desta colaboração tripartida é a
destruição dos medicamentos e produtos de Saúde transportados por via postal ou por carga expresso que, por terem
sido alvo de processo de contrafacção ou por não serem conformes, constituem uma ameaça para a Saúde Pública.
A nível internacional, e ainda no âmbito dos protocolos,
foi relevante a subscrição, em 2007, do Pacto Global das
Nações Unidas, instituído em 1999 por Kofi Annan, quando
do seu exercício das funções de Secretário-Geral da ONU, ao
abrigo do qual a Apifarma submete anualmente às Nações
Unidas a sua Communication on Progress (COP). O referido
pacto advoga, actualmente, dez princípios universais derivados da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da
Declaração da Organização Internacional do Trabalho, da
Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento e da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção.
A Apifarma desempenha também um importante papel
no domínio cultural, abrangendo diversas áreas. No quadro da sua actividade de patrocínio e mecenato, tem contribuído para diversos projectos editoriais, nomeadamente os livros ARS de Lisboa e Vale do Tejo (editado em 2010
por ocasião dos 30 anos da criação do Serviço Nacional
de Saúde), Um Livro para os Pais (editado pela Acreditar
Associação de Pais e Amigos das Crianças com Cancro),
Clínica, Arte e Sociedade: A Sífilis no Hospital do Desterro e na
Saúde Pública (2011), Omnia Sanctorum Histórias da História
do Hospital Real de Todos-os-Santos e seus sucessores (2012)
e Regulamentação Farmacêutica nos PALOP (2013). Museologicamente, destaca-se a participação no desenvolvimento do
Museu da Saúde – visando a criação de uma área dedicada
à Indústria Farmacêutica e ao medicamento, através de protocolo instituidor assinado, em 2008, pelos presidentes do
Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) e
da Apifarma – e o apoio, juntamente com as suas empresas
associadas, à recuperação e abertura ao público do Labo-
ratorio Chymico da Escola Politécnica, estrutura integrada
no Museu Nacional de História Natural e da Ciência da Universidade de Lisboa, que reúne uma das mais importantes
colecções de Química da Europa.
Newsletter Notícias Apifarma (2005).
213
CIÊNCIA E INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA
214
O contributo da Apifarma para a ciência e a investigação
científica tem-se materializado através de vários programas de apoio a cursos ministrados por prestigiadas universidades e instituições. Inseriu-se neste âmbito o Master in Clinical Research, iniciado em 2010 pela Faculdade
de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, em
parceria com a Northeastern University (Estados Unidos),
e o Programa de Formação Médica Avançada, promovido pela Fundação Calouste Gulbenkian, pelo Ministério
da Saúde, pela Fundação Champalimaud e pela Fundação
para a Ciência e Tecnologia. Lançado em 2008, e destinado a médicos internos ou jovens especialistas, o referido
programa teve por objectivo incentivar a ligação entre a
actividade médica diária e a investigação clínica, encorajando o desenvolvimento de projectos de investigação clínica de qualidade e internacionalmente competitivos. É ainda
de assinalar que, em 2005, foi celebrado um protocolo com
a Fundação Calouste Gulbenkian que teve como intuito a
instalação em Portugal de novos grupos de investigação biomédica. A iniciativa foi considerada inovadora por fomentar
o intercâmbio de conhecimentos entre as universidades portuguesas e as empresas da Indústria Farmacêutica.
O apoio à investigação tem passado, de igual forma,
pelos programas de estágios na Indústria Farmacêutica,
nomeadamente o desenvolvido conjuntamente com a Ordem dos Farmacêuticos, a Associação Portuguesa de Estudantes de Farmácia (APEF) e a Associação Portuguesa
de Jovens Farmacêuticos (APJF). Em Maio de 2011, as
três instituições assinaram um protocolo de colaboração
destinado a reforçar as qualificações técnico-profissionais
dos estudantes e jovens farmacêuticos, promovendo o seu
contacto directo com a realidade do mundo empresarial.
Similar objectivo presidiu à parceria da Apifarma com o
Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz (ISCSEM), que deu início, em 2014, a um programa conjunto
com o propósito de fomentar o intercâmbio entre os meios
académico e empresarial e estimular a interacção dos estudantes de ciências farmacêuticas e dos jovens farmacêuticos com as empresas nacionais e internacionais do
sector a operarem em Portugal.
A Apifarma tem, também, mantido um envolvimento directo no apoio a conferências na área da Saúde – nomeadamente a primeira Conferência Internacional sobre a gripe A (2009) e o IV Congresso Ibero-Americano de Ciências
Farmacêuticas (2011) – e sobre grandes temas da actualidade política e económica, entre as quais o seminário “O
Orçamento de Estado e Medidas de Austeridade – Políticas
Alternativas para o Crescimento e o Emprego”, organizado
em 2010 pelo Fórum para a Competitividade.
Finalmente, com o objectivo de facilitar a transmissão
pública de informação científica actualizada e relevante
sobre as áreas da Saúde e do medicamento, foram estabelecidas parcerias com diversos meios de comunicação global, designadamente os programas Especial Saúde (RTP
Informação) e Sociedade Civil (RTP2) e as publicações Jornal Saúde Pública e Revista Saúde & Sociedade.
AMBIENTE
As preocupações ambientais assumem uma importância
crucial para as sociedades contemporâneas. De igual forma, também para a Apifarma, a promoção de comporta-
mentos ambientalmente responsáveis constitui uma prioridade, nomeadamente na área de actuação da Indústria
Farmacêutica: o medicamento.
Foi neste contexto que, juntamente com a Associação
Nacional de Farmácias (ANF), a Federação das Cooperativas de Distribuição Farmacêutica (Fecofar) e a Associação de Grossistas de Produtos Químicos e Farmacêuticos
(Groquifar), foi fundada em 1999, a Valormed, o primeiro
Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Medicamentos (SIGREM). Exclusivamente financiado pela Indústria
Farmacêutica, este programa é responsável pela eliminação dos resíduos das embalagens de medicamentos e dos
medicamentos fora de uso, antecipando-se à legislação
que enquadra tal matéria. Com efeito, a Valormed abrange
todo o ciclo do medicamento, agrupando consumidores,
farmácias, grossistas e Indústria Farmacêutica. Para garantir total segurança e salvaguarda da Saúde Pública, o
destino final deste circuito integrado é a incineração com
aproveitamento energético.
Ainda no âmbito da responsabilidade ambiental, em
Maio de 2011, a Apifarma assinou com a ANF, a Groquifar
e a Valormed um protocolo de entendimento sobre o sistema de tratamento de devoluções de medicamentos. O referido protocolo tem como objectivo, entre outros, definir
um novo sistema de tratamento das devoluções por forma a assegurar a qualidade e segurança do medicamento
nos diferentes processos de armazenamento e transporte,
bem como promover um manuseamento mais cuidado na
embalagem.
A nível internacional, a Apifarma passou a acompanhar
o grupo de trabalho criado pela European Federation of
Pharmaceutical Industries and Associations (EFPIA) para
gerir as crescentes preocupações da Indústria Farmacêutica com o meio ambiente, cujo projecto Pharmaceuticals
in the Environment tem como objectivo a promoção da
sustentabilidade ambiental deste sector.
DEONTOLOGIA
As questões deontológicas têm constituído ao longo dos
anos uma preocupação constante da Indústria Farmacêutica portuguesa. Imbuídas deste imperativo normativo, a
Apifarma e as empresas suas associadas foram precursoras na delimitação e aprovação de princípios de conduta internos que visam conciliar, de forma responsável e
transparente, os interesses económicos das empresas, as
relações com os profissionais de Saúde e a responsabilidade perante os doentes e a sociedade.
Com efeito, há três décadas que a Apifarma vem desenvolvendo um importante processo de auto-regulação, o qual
teve o seu início em 1987, ano em que foi adoptado o primeiro Código Deontológico de Promoção de Medicamentos.
Reflectindo a evolução legislativa nacional e comunitária,
bem como a permanente necessidade de clarificar conceitos e práticas, os códigos que a Indústria Farmacêutica
se auto impôs têm sofrido alterações ao longo dos anos.
Presentemente, encontram-se em vigor três normativos
deontológicos cujas regras foram livremente discutidas
e voluntariamente aceites, vinculando todas as empresas
associadas da Apifarma:
– Código Deontológico para as Práticas Promocionais da
Indústria Farmacêutica e para as Interacções com os Profissionais de Saúde e Instituições, Organizações ou Associações Constituídas por Profissionais de Saúde. A versão
215
216
aprovada na Assembleia-Geral Extraordinária de 9 de Dezembro de 2013 defende uma informação científica objectiva que permita uma utilização racional dos medicamentos
e meios de diagnóstico in vitro comercializados pelas empresas da Indústria Farmacêutica associadas da Apifarma.
– Código de Conduta para as Relações entre a Indústria
Farmacêutica e as Associações de Doentes (versão aprovada
na Assembleia-Geral Extraordinária de 28 de Novembro de
2011). No sentido de assegurar uma relação ética e transparente neste domínio, a Apifarma transpôs para Portugal
o Código de Conduta da EFPIA para as Relações entre a Indústria Farmacêutica e as Associações de Doentes de forma
a vincular as relações entre as empresas suas associadas e
qualquer organização de doentes, independentemente desta estar, ou não, constituída em associação.
– Código Deontológico para as Práticas Promocionais
da Indústria Farmacêutica Veterinária (versão aprovada
em reunião geral de empresas, em 22 de Novembro de
2010). Visa assegurar um ambiente em que o público em
geral, em especial os produtores pecuários e proprietários
de animais de companhia, possa estar seguro de que as
escolhas relativas aos seus medicamentos são efectuadas
pelos profissionais de Saúde animal com base no mérito
de cada produto e nas necessidades clínicas dos animais.
Em reforço da importância desta matéria, foi também em
9 de Dezembro de 2013 que a Assembleia-Geral aprovou a
alteração estatutária que consagrou o Conselho Deontológico como órgão da Apifarma constituído por três personalidades independentes, a eleger em Assembleia Geral.
Na prossecução dos objectivos de auto-regulação, a Apifarma celebrou, igualmente, protocolos com a Ordem dos
Médicos e com a Ordem dos Farmacêuticos, os quais vi-
Newsletter Notícias Apifarma (2005).
sam promover a cooperação entre instituições, valorizando
a inovação e a melhoria da terapêutica medicamentosa.
PLATAFORMAS DE COLABORAÇÃO
Ao nível das plataformas de colaboração, destaca-se a criação, em 2005, do PharmaPortugal – Projecto Estratégico
para Exportação e Internacionalização da Indústria Farmacêutica. Foram seus instituidores a Apifarma, o Infarmed e a Agência para o Investimento e Comércio Externo
de Portugal (AICEP), que protocolaram a conjugação de
esforços para dar a conhecer a capacidade de inovação
e investigação das empresas portuguesas, aumentar as
exportações de produtos e serviços nacionais – desenvolvendo os actuais mercados e visando a abertura de novos
pontos comerciais para os medicamentos portugueses –
e projectar e consolidar a imagem industrial de Portugal
como exportador de produtos e serviços tecnologicamente evoluídos. Este projecto tem-se mostrado, ao longo dos
anos, bastante relevante e profícuo, com as exportações
de medicamentos e produtos farmacêuticos portugueses a
abrangerem cerca de 70 Países e representando, em 2012,
cerca de 700 milhões de euros, valor que mais do que duplicou os 331 milhões de euros atingidos no ano de início
do projecto. Tem contribuído para tal sucesso a actuação
complementar das três instituições participantes: a Apifarma e as empresas farmacêuticas, através da valorização
dos seus produtos e serviços – mediante o incremento da
Investigação e Desenvolvimento (I&D) obtidos pela cooperação com universidades e empresas de base tecnológica
–, da identificação de mercados prioritários e da cooperação entre si e com sectores afins, nacionais e internacio-
nais; o Infarmed, que assegura a agilização dos contactos
e procedimentos regulamentares, no sentido de promover o
reconhecimento entre autoridades reguladoras homólogas,
e presta assistência técnica nas áreas da sua competência;
a AICEP, cujo contributo passa por agilizar e fomentar contactos com o estrangeiro, criando oportunidades relevantes
para a afirmação da Indústria Farmacêutica portuguesa nos
mercados externos. O PharmaPortugal desenvolve, também
um importante efeito intramuros, consubstanciado no seu
papel de catalisador para o desenvolvimento mais estruturado da actividade industrial em Portugal. Com efeito, para
melhor competir no mercado internacional, o tecido empresarial português tornou-se não só mais robusto, como
ampliou o seu contributo para a empregabilidade nacional.
217
10.
Excerto de cartaz publicitário
do «LYSINE: Desinfectante Ideal»
218
Farmácia Santos (1910-1916)
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
219
220
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Apifarma
O ano de 1977 marca o ano em que a Apifarma participa,
pela primeira vez, embora ainda não na qualidade de sócia,
nas reuniões anuais da então P.I.A. (Pharmaceutical Industries
Association) actual EFPIA (Federação Europeia da Industria
Farmacêutica [1]) e da IFPMA (Federação Internacional da
Indústria Farmacêutica [2]) efectivando, em 1978, a sua
condição de associada nas duas organizações. A partir de
então, mantém um relacionamento estreito com as matérias
regulamentares e legislativas em discussão na Europa.
No entanto, só anos mais tarde, mais precisamente em
1989, é que a Apifarma é convidada, pela primeira vez, a
integrar a Direcção de ambos os organismos internacionais.
Desde então e até à actualidade, a Apifarma tem mantido
regular presença nas reuniões dos diferentes grupos de
trabalho e integrando, com regularidade, as Direcções desses
mesmos organismos.
Com o alargamento estatutário a novas áreas sectoriais,
nomeadamente Medicamentos Não Sujeitos a Receita Médica,
Meios de Diagnóstico in Vitro e Saúde Animal, a Apifarma
passou a integrar, nos anos de 90, as respectivas associações
europeias AESGP (Associação Europeia dos Medicamentos de
Venda Livre) EDMA[3] (Associação Europeia dos Produtores
de Diagnósticos) e IFAH Europa e Internacional (Associação
Europeia e Internacional de Saúde Animal).
Em 2008, para além da habitual presença nas reuniões anuais
da EFPIA, da IFPMA e restantes associações referenciadas,
a Apifarma decidiu reforçar a sua presença internacional,
alargando a participação nos principais grupos de trabalho
da EFPIA e criou, internamente, um grupo de trabalho para
coordenação dos assuntos europeus e internacionais, com o
objectivo de articular a informação entre os representantes
e optimizar as matérias tratadas. A Apifarma passa a
acompanhar mais de quinze grupos de trabalho, destacandose o Comité de Política Económica e Social e os grupos de
trabalho em áreas dedicadas à contrafacção, codificação de
medicamentos, marcas, boas práticas de fabrico, informação
aos doentes e avaliação de tecnologias de Saúde.
O aprofundamento das relações com as associações
homólogas internacionais iniciou-se ainda nos anos de 90
e foi sendo incrementado até ao presente, particularmente
com os Países de referência para Portugal em matéria de
política do medicamento.
BIBLIOGRAFIA
[1] European Federation of Pharmaceutical Industries
and Associations.
[2] International Federation of Pharmaceutical Manufacturers
& Associations.
[3] European Diagnostic Manufacturers Association
221
11.
Excerto de cartaz publicitário da «Água Oxigenada Pura»
Companhia Portuguesa Higiene (1910)
222
DIAGRAMA ILUSTRATIVO DE MOMENTOS-CHAVE
DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL
223
• 1904
Laboratório
Normal.
• 1911
Laboratórios
Sanitas.
• 1923
Sociedade
Industrial
Farmacêutica.
• 1924
Bial.
• 1895
Instituto
Pasteur
de Lisboa.
• 1927
Laboratórios Jaba.
Anos Sector da Saúde
Grémio/Apifarma
Indústria
• 1891
Companhia
Portuguesa
Higiene.
224
. 1892
Pauta aduaneira proteccionista
da indústria nacional.
1890
1900
• 1911
Autonomização
da Direcção-Geral
de Saúde.
• 1926
Inspecção
do Exercício
Farmacêutico.
• 1913
Regulamento
do imposto de selo
das especialidades
farmacêuticas.
• 1927
I Congresso
Nacional
de Farmácia.
1910
1920
Indústria
• 1930
Laboratório
Sanitas do Brasil.
• 1935
União dos Farmacêuticos
de Portugal.
• 1939
Grémio dos Armazenistas
de Drogas e Produtos
Químicos do Sul.
• 1942
Grémio dos Armazenistas
de Drogas e Produtos
Químicos do Norte.
• 1943
Laboratórios Vitória.
• 1947
Laboratórios Atral.
• 1951
Labesfal; Iberfar.
• 1958
Fábrica dos Laboratórios Atral
aprovada pela FDA.
• 1959
Hovione.
• 1948
Instituto Luso-Fármaco.
Sector da Saúde
Grémio/Apifarma
• 1949
Medicamenta.
• 1939
Grémio Nacional
dos Industriais
de Especialidades
Farmacêuticas.
• 1944
Instituto Nacional
Bioterapêutico.
• 1935
Sindicato
Nacional
dos Farmacêuticos.
• 1940
Comissão Reguladora
dos Produtos Químicos
e Farmacêuticos.
• 1938
Ordem dos Médicos.
• 1941
Regulamento do Comércio
dos Medicamentos Especializados.
• 1939
1.ª lei de condicionamento
da Indústria Farmacêutica.
1930
• 1946
1.º Contrato Colectivo de Trabalho
na Indústria Farmacêutica.
• 1951
Documentário Ao Serviço da
Saúde - A Indústria Portuguesa
de Medicamentos Especializados.
• 1956
1.ª sede própria do Grémio,
na Rua Camilo Castelo Branco.
• 1952
Novo Regime Aduaneiro
para os antibióticos.
• 1957
Comissão Técnica
dos Novos Medicamentos.
• 1958
Ministério da Saúde e Assistência.
• 1959
1.ª Comissão de Reorganização
da Indústria Farmacêutica.
1940
1950
225
Indústria
• 1963
Cipan.
• 1965
Iberfar; Euro-Labor.
• 1967
Seber Portuguesa.
Grémio/Apifarm
Sector da Saúde
• 1971
Fábrica da Hoechst em Mem Martins.
• 1980
Tecnimede.
• 1989
Hikma Farmacêutica.
• 1972
Fábrica da Bayer, em Coimbra.
• 1973
Codifar.
• 1969
Tecnifar.
• 1974
Fábrica Essex / Soprol / Schering USA,
em Mem Martins.
• 1960
Ingresso do Grémio na PIA.
• 1975
Apifarma.
• 1985-1986
Seminários «A Indústria Portuguesa e a CEE».
• 1978
Adesão da Apifarma à IFPMA e à EFPIA.
• 1964
Documentário Faça Segundo a Arte.
• 1987
Código Deontológico de Promoção
de Medicamentos.
Comissão Especializada de Venda Livre
(ApifarmaOTC).
• 1967
1.º Curso Livre aplicado à Farmácia Industrial.
Nova sede da Apifarma, na Avenida Duque
d´Ávila.
• 1989
Apifarma adere à Fedesa.
Apifarma convidada pela primeira vez a
integrar a direcção da EFPIA e da IFPMA.
• 1968
I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica.
• 1965
Nova Comissão de Reorganização
da Indústria Farmacêutica.
• 1967
Publicação do Relatório da Comissão
Reorganizadora da Indústria dos
Produtos Farmacêuticos.
• 1971
Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge.
• 1982
Administrações Regionais de Saúde.
. 1972
Ordem dos Farmacêuticos.
• 1983
Ministério da Saúde.
Centros de Saúde.
• 1973
Autonomização do Ministério da Saúde
face à Assistência.
• 1984
Direcção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos.
• 1979
Serviço Nacional de Saúde.
1960
226
• 1970
Inauguração do Complexo Fabril
da Hovione, em Loures.
Medinfar.
1970
.
1980
• 2000
Ciclum Farma
Inauguração da Laboris, fábrica
do Grupo Azevedos, no Brasil.
Sector da Saúde
Grémio/Apifarm
Indústria
• 1993
Distrifarma.
• 1994
Sofarimex.
• 2001
Bluepharma; Generis.
• 1995
Farmoz.
• 2004
Lusomedicamenta.
Aquisição da Labesfal pela
Fresenius.
Aquisição do Grupo Jaba
pela Recordati.
. 1990
Comissão Especializada de Saúde
Animal (ApifarmaVET).
• 1993
Nova sede da Apifarma, no Restelo.
Comissão Especializada de Meios de
Diagnóstico in vitro.
• 2005
Pharma Portugal.
Comissão Especializada de Vacinas;
Comissão Especializada de Produtores
e Exportadores.
• 2012
Fábrica e Centro de Pesquisa
da Bial, em Bilbau.
• 2014
1.º fármaco de patente de
investigação portuguesa
aprovado nos EUA, produzido
pela Bial.
. 2010
Comissão Especializada de Biotecnologia.
• 1995
Código Deontológico de Práticas
de Comercialização.
• 1999
Valormed / Sigrem.
• 1990
Lei de Bases da Saúde.
• 2002
Prescrição obrigatória por DCI.
• 1991
Primeiro Estatuto do Medicamento.
Ordem dos Médicos Veterinários.
• 2005
Comissão Ética para a Investigação Clínica.
• 1992
Sistema Nacional de Farmacovigilância.
• 1993
Infarmed.
. 1998
Ordem dos Médicos Dentistas.
Ordem dos Enfermeiros.
• 1999
Laboratório do Infarmed.
1990
.
2000
2010
227
228