Texto completo - Programa de Pós

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Texto completo - Programa de Pós
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA – UFBA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
POLYANNA CASTRO ROCHA ALVES
O ENSINO DE INGLÊS COMO LÍNGUA DESNACIONALIZADA E A
DIMENSÃO CULTURAL:
A VISÃO DE PROFESSORES FORMADORES
SALVADOR
2015
POLYANNA CASTRO ROCHA ALVES
O ENSINO DE INGLÊS COMO LÍNGUA DESNACIONALIZADA E A
DIMENSÃO CULTURAL:
A VISÃO DE PROFESSORES FORMADORES
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Língua e Cultura, do Instituto
de Letras da Universidade Federal da Bahia,
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Mestre em Língua e Cultura.
Orientador: Prof.
Pimentel Siqueira
SALVADOR
2015
Dr.
Domingos
Sávio
POLYANNA CASTRO ROCHA ALVES
O ENSINO DE INGLÊS COMO LÍNGUA DESNACIONALIZADA E A
DIMENSÃO CULTURAL:
A VISÃO DE PROFESSORES FORMADORES
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Língua e Cultura, do Instituto
de Letras da Universidade Federal da Bahia,
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Mestre em Língua e Cultura.
Defendida em 24 de agosto de 2015 e APROVADA pela seguinte banca examinadora:
_______________________________________________________
Prof. Dr. Domingos Sávio Pimentel Siqueira
Universidade Federal da Bahia
(Orientador)
________________________________________________________
Profª. Drª. Lucielen Porfírio
Universidade do Estado da Bahia – Campus II
(Examinadora Externa)
________________________________________________________
Profª. Drª. Fernanda Mota Pereira
Universidade Federal da Bahia
(Examinadora Interna)
Dedico este trabalho ao meu esposo e a meus
pais que sempre me encorajaram a buscar e
concretizar novos projetos de vida.
AGRADECIMENTOS
Por tudo o que Ele tem me proporcionado, minha gratidão eterna a Deus, o qual zeloso tem
sido para comigo, capacitando-me a vencer todos os desafios que se apresentaram até aqui.
Pela disponibilidade em acompanhar todo o andamento do trabalho e por sempre iluminar as
minhas ideias com valiosos ensinamentos, o meu muito obrigado ao meu orientador prof. Dr.
Domingos Sávio Pimentel Siqueira.
Pelos momentos de aprendizagem e pelas fecundas discussões teóricas, sou muito grata aos
professores do Programa de Pós-Graduação em Língua e Cultura da UFBA.
Pelos agradáveis momentos de convivência, agradeço aos colegas do curso, aqui
representados por Cristiane Pereira, Mônica Borges, Michele Veloso, Patrícia Argôlo e
Tatiany Pertel. Sinto-me muitíssimo honrada com tantas amizades verdadeiras consolidadas
ao longo dessa jornada. Um agradecimento especial à companheira de viagem, amiga e colega
Sigrid Rochele Gusmão Paranhos Magalhães, com quem tive o prazer de trocar ideias,
compartilhar os medos, incertezas, mas também vitórias e conquistas.
Pelas contribuições que validaram a pesquisa, o meu agradecimento aos colegas informantes,
os professores formadores do curso de Letras/Inglês da Universidade do Estado da Bahia,
Departamento de Ciências Humanas, Campus VI, em Caetité-BA.
Pelo apoio financeiro, agradeço à Universidade do Estado da Bahia – UNEB.
Pela compreensão e colaboração no período em que estive afastada, agradeço a todos os
colegas do Colegiado de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI; e, também, à equipe do Centro
Estadual de Educação Profissional em Saúde e Gestão – CEEP, em Guanambi-BA,
representada aqui pelas figuras estimadas de Irene Carvalho e Marla Pimentel.
Pela prestatividade constante e por ser um grande exemplo de profissional que sempre me
inspirou, agradeço a Ginaldo Cardoso de Araújo.
Pela hospedagem em Salvador e amizade que perdura desde os tempos de estudo no Ensino
Fundamental, agradeço à querida Francielle Gomes Viana.
Por ser a grande responsável pela minha incursão no mestrado da UFBA, e pela participação
imprescindível em todas as etapas dessa trajetória, desde a elaboração do anteprojeto de
pesquisa, sou imensamente grata à prima sempre amiga Mariana Rocha Santos Costa.
Ainda, no ensejo da culminância dessa etapa, agradeço ao meu amado esposo, Thiago; aos
meus queridos pais, Jaldir e Francisco; e aos meus irmãos, Priscila, Plínio e Paloma, por
serem fonte de inspiração constante e pelo amor incondicional que sempre me dedicaram. A
vocês toda a minha gratidão, amor e carinho.
Não importa a versão que damos para o fenômeno
contemporaneamente notável da expansão do
inglês em escala planetária, não importa se nos
posicionamos como americanófilos ou como
americanófobos, ou se compreendemos que a
globalização é algo muito maior do que uma mera
americanização do mundo, todos estamos
conscientes da imprescindibilidade do inglês no
tempo presente (ASSIS-PETERSON; COX, 2007,
p. 10).
O inglês está aí, nas ruas, na mídia, trafegando
freneticamente pelas infovias da internet,
bombardeando nossos olhos, nossos ouvidos,
nossas vidas. Nas circunstâncias atuais, ignorá-lo é
um ato praticamente inconcebível. Não porque
queremos ou ansiamos por falar fluentemente a
língua nativa de uns Estados Unidos, mas porque
queremos falar de igual para igual com os Estados
Unidos e com o mundo (SIQUEIRA, 2008, p.338).
RESUMO
A difusão do inglês pelos quatro cantos do planeta tem colocado em discussão a forma como
a língua tem sido tratada em sala de aula. Novas perspectivas de ensino devem ser
consideradas posto que, ao avançar na sua viagem pelo mundo, o inglês se torna cada vez
mais plural e não mais se prende às normas da língua e cultura dos tradicionais falantes
nativos. Dado o novo papel da Língua Inglesa (LI) na contemporaneidade, este trabalho busca
investigar de que forma a sua condição de língua franca global, dentro de um construto
teórico em pleno desenvolvimento, e as questões concernentes à adoção de uma abordagem
intercultural de ensino são compreendidas e materializadas pelos professores formadores do
curso de Letras/Inglês da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus VI, em
Caetité/BA, uma vez que são eles que impulsionam as mudanças nos cursos de formação e
que influenciam as decisões de futuros professores. A literatura utilizada para embasar e
direcionar a pesquisa está fundamentada em trabalhos de pesquisadores afiliados aos recentes
estudos sobre o Inglês como Língua Franca (ILF) como Seidlhofer (2004, 2011), Jenkins
(2006, 2007, 2009), Widdowson (1994, 2012), Siqueira (2005, 2008, 2011, 2012), Sifakis
(2014), El Kadri e Gimenez (2013), além de outros reconhecidamente voltados para a área
dos estudos interculturais como Kramsch (1993, 2004), Byram (1997), Mckay (2002), Baker
(2009, 2011, 2012, 2015), Mendes (2007, 2008), só para citar alguns. Para a coleta de dados,
foi aplicado um questionário aos quatro docentes que atuam com o ensino de LI no curso de
Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, nos níveis básico, intermediário e avançado. Além disso,
com o intuito de melhor discutir as questões levantadas, foram observadas quatro aulas de
cada um dos professores pesquisados e realizada uma entrevista semiestruturada com todos os
participantes. Por fim, para servir de fonte complementar de informações, também fez parte
da tarefa de levantamento de dados uma análise documental acerca do currículo do curso. Os
dados foram analisados a partir de um estudo pautado no paradigma qualitativo de cunho
etnográfico. No que se refere aos resultados obtidos, foi possível observar que os professores
formadores pesquisados apresentam certa dificuldade ao traduzir as suas representações sobre
o ILF e sobre a interculturalidade para a realidade da sala de aula. Todavia, os participantes
mostraram-se dispostos em tornar tais questões mais centrais no processo de ensino e
aprendizagem da língua e a empenhar esforços para que os futuros professores de inglês
formados na instituição em pauta estejam melhor preparados para as demandas pedagógicas
atuais e, consequentemente, mais conscientes do real significado de ser professor de uma
língua franca global.
Palavras-chave: Inglês como Língua Franca. Perspectiva intercultural de ensino. Professores
Formadores.
ABSTRACT
The spread of English into four corners of the planet has called into question the way the
language has been taught in the classroom. New teaching perspectives should be considered
since, while it travels around the world, English is becoming more plural and no longer
follows the rules of traditional native speakers‟ language and culture. Given the new role of
the English Language in contemporaneity, this work investigates how its condition as a global
lingua franca, within a theoretical basis in full development, and issues concerning the
adoption of an intercultural approach to teaching are understood and materialized by teacher
educators of a Letters/English course at the State University of Bahia (UNEB), Campus VI, in
Caetité/BA, since they are the ones who set changes forth in training courses and influence
future teachers decisions. The literature used to support and direct this research is based on
works of researchers affiliated with recent studies about English as a Lingua Franca (ELF) as
Seidlhofer (2004, 2011), Jenkins (2006, 2007, 2009), Widdowson (1994, 2012), Siqueira
(2005, 2008, 2011, 2012), Sifakis (2014), El Kadri e Gimenez (2013), besides others
admittedly focused on the area of intercultural studies as Kramsch (1993, 2004), Byram
(1997), Mckay (2002), Baker (2009, 2011, 2012, 2015), Mendes (2007, 2008), to name a few.
To collect data, a questionnaire was applied to four English language teachers of
Letters/English course at UNEB, Campus VI, in basic, intermediate and advanced levels. In
addition, to better discuss the issues that were raised, four classes of each surveyed teachers
were observed and one semi-structured interview was carried out with all participants.
Finally, to serve as a complementary source of information, a documentary analysis on the
course curriculum was also an important part of the data collection task. Data were analyzed
based on a study guided by the qualitative paradigm of ethnographic nature. With regard to
the results, it was observed that the informants have some difficulties in translating their
representations on ELF and interculturality to classroom reality. However, participants were
willing to turn such issues more central in language teaching/learning process and to make
reasonable efforts so that future English teachers of the referred institution become better
prepared for current educational demands and consequently more aware of the real meaning
of being a global lingua franca teacher.
Keywords: English as a Lingua Franca. Intercultural perspective of teaching. Teacher
Educators.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1.
Os três círculos concêntricos do inglês .....................................................
47
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1.
Tempo de dedicação dos informantes ao ensino de LI e de atuação no
Ensino Superior ........................................................................................ 32
LISTA DE QUADROS
Quadro 1.
Perfil dos informantes da pesquisa ............................................................
32
Quadro 2.
Itens do questionário .................................................................................
34
Quadro 3.
Níveis de análise dos três círculos concêntricos de Kachru ......................
48
Quadro 4.
Contrastes entre ILE x ILF ........................................................................
62
Quadro 5.
Requisitos para os professores de ELT e cursos de treinamento ..............
72
Quadro 6.
Os quatro componentes da Competência Comunicativa ...........................
81
Quadro 7.
Saberes que constituem a CCI ...................................................................
85
Quadro 8.
Componentes da consciência intercultural ................................................
89
Quadro 9.
Saberes que constituem o professor interculturalista ................................
92
Quadro 10.
Requisitos necessários para o professor interculturalista ..........................
94
Quadro 11.
Variedades de inglês que os informantes tiveram contato no processo de
aprendizagem da língua ............................................................................. 106
Quadro 12.
Distribuição dos livros adotados entre os semestres do curso ..................
112
Quadro 13.
Temas norteadores dos semestres do curso de licenciatura em
Letras/Inglês da UNEB, Campus VI .........................................................
135
Ementas dos componentes curriculares Básico I, Intermediário I,
Intermediário III e Avançado II ................................................................
138
Quadro 14.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
A
Aluno(a)
AA
Alunos(as)
CA
Cultural Awareness
CCI
Competência Comunicativa Intercultural
CEP
Comitê de Ética em Pesquisa
EFL
English as a Foreign Language
EIL
English as an International Language
ELI
Ensino de Língua Inglesa
ELT
English Language Teaching
ENL
English as a Native Language
ESL
English as a Second Language
ICC
Intercultural Communicative Competence
ICA
Intercultural Awareness
IELTS
International English Language Testing System
ILE
Inglês como Língua Estrangeira
ILF
Inglês como Língua Franca
ILI
Inglês como Língua Internacional
ILN
Inglês como Língua Nativa
ISL
Inglês como Segunda Língua
L1
Língua Materna
L2
Segunda Língua
LA
Linguística Aplicada
LE
Língua Estrangeira
LI
Língua Inglesa
LF
Língua Franca
LFC
Língua Franca Core
LP
Língua Portuguesa
P
Professor(a)
TCLE
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TOEIC
Test of English for International Communication
TOEFL
Test of English as a Foreign Language
UNEB
Universidade do Estado da Bahia
VOICE
Vienna-Oxford International Corpus of English
WE
World English
WEs
World Englishes
CONVENÇÕES UTILIZADAS PARA AS TRANSCRIÇÕES DAS ENTREVISTAS 1
A
Anastácia
Pesq. Pesquisadora
H
Hermione
J
João
M
Marcos
[
Sobreposição de vozes
[]
Sobreposição localizada
...
Pausa
/
Truncamento brusco
(( ))
Comentário do transcritor
1
As convenções utilizadas para as transcrições das entrevistas foram orientadas por Dionísio (2004) e Marcuschi
(2003).
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 – DELINEAMENTOS INICIAIS ........................................................
16
CAPÍTULO 2 – O PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA .....................
24
2.1 Caracterização da pesquisa ......................................................................................
24
2.1.1 A pesquisa qualitativa ..............................................................................................
25
2.1.2 A etnografia .............................................................................................................
27
2.2 Caracterização do lugar de pesquisa ......................................................................
30
2.3 Caracterização dos informantes da pesquisa .........................................................
31
2.4 Caracterização dos instrumentos de coleta de dados ............................................
33
2.4.1 O questionário ..........................................................................................................
33
2.4.2 As observações de aula ............................................................................................
35
2.4.3 A entrevista ..............................................................................................................
35
2.4.4 A análise de documentos .........................................................................................
36
2.5 Descrição dos procedimentos de coleta e análise dos dados ..................................
37
CAPÍTULO 3 – O PROTAGONISMO DO INGLÊS NA CENA MUNDIAL:
ENREDAMENTOS PARA O ENSINO ........................................................................
41
3.1 LA – dos caminhos trilhados às tendências atuais .................................................
41
3.2 A difusão da LI em escala mundial .........................................................................
46
3.2.1 Inglês como Língua Franca – uma pormenorização do fenômeno ..........................
52
3.3 ILF: da cena do mundo para a cena da sala de aula .............................................
56
3.3.1 Embates entre o ILE e o ILF ....................................................................................
60
3.3.2 Novas prioridades para o ensino e aprendizagem de LI ..........................................
64
3.3.3 A questão dos sistemas avaliativos em/de LI ..........................................................
68
3.3.4 O ILF e a formação inicial de professores de inglês ................................................
70
CAPÍTULO 4 – A DIMENSÃO CULTURAL NO CONTEXTO DE ENSINO DE
LÍNGUA INGLESA .......................................................................................................
75
4.1 Língua, cultura e identidade na comunicação intercultural do inglês .................
75
4.2 A perspectiva intercultural no ensino de LI ...........................................................
78
4.2.1 Resgatando o conceito de Competência Comunicativa ...........................................
80
4.2.1.1 Limitações da Competência Comunicativa ..........................................................
82
4.2.2 Explorando a noção de Competência Comunicativa Intercultural ..........................
84
4.2.2.1 Consciência cultural e intercultural – construtos úteis para o ensino de cultura
86
4.2.3 Demandas e desafios para o professor interculturalista ...........................................
90
CAPÍTULO – 5 O ENSINO DE INGLÊS COMO LÍNGUA
DESNACIONALIZADA E A DIMENSÃO CULTURAL SOB A VISÃO DE
PROFESSORES FORMADORES: A PESQUISA .....................................................
96
5.1 As influências recebidas e exercidas pelos professores formadores ....................
97
5.2 A visão dos professores formadores sob análise e discussão .................................
100
5.2.1 A visão dos professores formadores sobre o paradigma do ILF .............................. 100
5.2.1.1 Análise dos dados do questionário .......................................................................
100
5.2.1.2 Análise dos dados das observações de aulas ........................................................ 114
5.2.1.3 Análise dos dados da entrevista ............................................................................ 120
5.2.2 A visão dos professores formadores sobre a interculturalidade ..............................
123
5.2.2.1 Análise dos dados do questionário .......................................................................
123
5.2.2.2 Análise dos dados das observações de aulas ........................................................ 127
5.2.2.3 Análise dos dados da entrevista ............................................................................ 132
5.3 Alinhavos sobre o currículo do curso ......................................................................
133
5.3.1 A visão dos professores formadores sobre o curso ..................................................
139
5.4 Tratamento holístico dos dados ...............................................................................
147
CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................................
151
REFERÊNCIAS ..............................................................................................................
157
APÊNDICES ...................................................................................................................
166
ANEXOS ..........................................................................................................................
174
16
CAPÍTULO 1 – DELINEAMENTOS INICIAIS
O inglês hoje, como causa e consequência da globalização, serve como o meio mais
comum para a comunicação internacional e intercultural. Para atender à comunidade global, a
Língua Inglesa (LI) passou a ter papéis e funções diferentes, dando lugar a uma variedade de
ingleses que se desenvolve pelo mundo com suas próprias normas. Diante disso, tem-se
argumentado que a internacionalização sem precedentes do inglês significa que a língua
deixou de ser domínio exclusivo dos seus tradicionais falantes nativos, tornando-se
propriedade de todos que a utilizam (SEIDLHOFER, 2011; WIDDOWSON, 1994). Como
bem salientado por Leffa (2001, p.346),
Uma língua multinacional, como o inglês, caracteriza-se por não ter
nacionalidade. Adapta-se como um camaleão não aos interesses da Inglaterra
ou dos Estados Unidos, mas aos interesses das pessoas que a falam e que
podem ser do Japão, da Suíça, ou mesmo do Brasil. Pode ser a língua da
Internet, da Globalização ou do capitalismo, mas não é a língua de um
determinado país.
Leffa (2001) aciona a questão da multinacionalidade da LI e afirma que uma das
condições para que uma língua seja multinacional é aceitar a diversidade dessa língua. Em
uma perspectiva semelhante, investimos na noção de uma língua desnacionalizada, pois o
termo ativa o campo de reflexão teórica da desconstrução. Compreendendo que desconstrução
não é destruição, entendemos que não há o apagamento da nação. O que existe, na verdade,
são múltiplas nações, que, por seu turno, não têm um centro, uma vez que o centro é uma
estrutura descentrada (DERRIDA, 1999). Como o centro é móvel e não fixo, ele não é
Estados Unidos ou Inglaterra, mas pode ser qualquer país que utilize a LI para fins
comunicativos. Por essa razão, a função de inglês como língua desnacionalizada serve tão
bem à tessitura deste trabalho.
Essa natureza plural do inglês que representa seus respectivos usuários, em contextos
diversos, é raramente reconhecida e legitimada nos meios educacionais. Contudo, a visão que
supõe que o inglês correto é aquele que adere às normas da língua e cultura do inglês como
língua nativa vem sendo amplamente contestada. Com efeito, o cenário contemporâneo de
ensino de LI sugere a necessidade de um conceito de inglês que aceita a pluralidade em
detrimento de visões monolíticas que enxergam o inglês como propriedade de determinada
17
cultura ou comunidade (JENKINS, 2006). Assim é que as discussões em torno do ensino de
Inglês como Língua Franca (ILF) têm sido validadas.
As características mais importantes do ILF, diz-nos House (2012, p. 364), “[...] são sua
enorme
flexibilidade
funcional,
sua
variabilidade
e
expansão
pelas diferentes áreas
linguísticas, geográficas e culturais [...]”2 . Em decorrência dessa orientação, o paradigma do
ILF pressupõe um processo de ensino e aprendizagem em que a inteligibilidade mútua e a
eficiência na comunicação sejam enfatizadas (HOUSE, 2012). O falante competente de
inglês, nessa perspectiva, é aquele que conserva uma identidade nacional e recorre a
estratégias de negociação para garantir a comunicação com o mundo.
Reconhecidamente, nos contextos dinâmicos do ILF, a interação ocorre entre
participantes com diferentes experiências culturais; logo, a relação entre o inglês e a cultura se
torna problemática, pois não há cultura alvo nem contexto cultural para a língua. O que há é a
necessidade de compreensão das conexões entre as línguas e os enredos socioculturais em que
elas são aprendidas e utilizadas que levem em conta a fluidez, diversidade e adaptação
(BAKER, 2009). Segundo Assis-Peterson e Cox (2013, p. 157), “[n]esses fluxos
transculturais, a mistura é a norma. Línguas, culturas e identidades se misturam”.
Na medida em que o inglês representa uma multiplicidade de culturas, torna-se
necessária a incorporação de uma abordagem intercultural ao ensino de LI, uma vez que tal
abordagem intenta promover o desenvolvimento da competência intercultural dos aprendizes,
levando-os a respeitar a cultura do outro e, simultaneamente, a valorizar a sua própria cultura
(MENDES, 2007). Por conseguinte, o ensino intercultural do inglês prepara os aprendizes a
serem sensíveis ao fato de que pessoas de diferentes culturas utilizam o inglês diferentemente
e que lidar com as diferenças é responsabilidade de todos que fazem parte da comunidade
global.
Não podemos perder de vista que pensar o ensino do ILF e da dimensão intercultural
implica na redefinição identitária do professor não nativo e de seus alunos (El KADRI, 2010).
Com isso em mente, neste ponto do trabalho (e somente neste ponto), utilizarei o verbo na
primeira pessoa do singular para relatar os caminhos que eu trilhei ao longo de minha
trajetória profissional que me levaram a reconsiderar a minha identidade como professora não
nativa de inglês e a reavaliar o tipo de conhecimento e habilidades que devem ser priorizados
nas salas de aula de LI. A minha motivação em enveredar pela discussão aqui proposta se
deve, exatamente, às reflexões impulsionadas no decorrer desses anos de dedicação ao ensino
2
[…]are its enormous functional flexibility, its variability and spread across many different linguistic,
geographical and cultural areas […]
18
de LI e, principalmente, pela minha atual condição de professora formadora do Curso de
Letras/Inglês da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus VI, em Caetité/BA.
A minha história com o ensino de LI teve início no ano 2000, um ano antes de
ingressar na universidade, quando surgiu a oportunidade de lecionar inglês nas séries iniciais
do Ensino Fundamental em uma instituição privada de ensino, localizada em Guanambi/BA.
No mesmo ano, passei a fazer parte do quadro de professores do curso de idiomas em que eu
estudava, onde permaneci ensinando inglês nos níveis básico, intermediário e avançado
durante quatro anos. Em 2004, atendendo a melhores propostas, comecei a trabalhar em outro
curso livre de idiomas da cidade, permanecendo nesse segmento por mais quatro anos. Até
então, ensinar inglês, em minha concepção, significava desenvolver nos alunos uma
proficiência que se aproximasse o máximo possível daquela dos falantes nativos.
No ano de 2006, prestei concurso efetivo e obtive êxito nessa demanda. Fui
convocada pela Secretaria de Educação do Estado da Bahia, em junho de 2007, para assumir o
cargo de professora de Inglês nível III, num regime de vinte horas semanais. Tal cargo ainda
hoje está sob minha responsabilidade. Em 2008, fiz uma seleção pública para Professor
Substituto de Língua Inglesa do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI. Tendo
conseguido a aprovação, no semestre letivo de 2008.2, ocupei a vaga, assumindo, naquela
ocasião, diversos componentes curriculares direcionados ao estudo de teorias linguísticas e
dos fundamentos da Linguística Aplicada. Essa experiência me permitiu entrever o processo
de ensino e aprendizagem de LI de forma mais crítica e consciente.
Em 2010, fui aprovada no concurso público para admissão de professor auxiliar de LI
do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, e empossada logo em seguida. A partir de
então, tenho atuado, sobretudo, com os componentes de Estágio Supervisionado, o que tem
me oportunizado acompanhar de perto os problemas teóricos e práticos que envolvem as
ações pedagógicas dos professores em formação. Sendo a supervisão da prática pedagógica
dos estagiários uma das pautas do meu trabalho, é minha função auxiliá-los na elaboração,
planejamento, avaliação, discussão e preparação do material didático. Essa responsabilidade
só reforça o meu compromisso em levar os futuros professores a proceder a uma “[...] análise
crítica fundamentada teoricamente e legitimada na realidade social em que o ensino se
processa” (PIMENTA; LIMA, 2005/2006, p.8).
Como visto, a soma de experiências com o ensino de inglês em diversos âmbitos
educacionais e níveis escolares me fez ativar um processo de avaliação dos meus pressupostos
linguísticos e a relativizar as minhas crenças culturais, valores e visões de mundo. Essa
tomada de consciência tem nutrido o meu desejo de estar sempre pesquisando, construindo o
19
conhecimento, inovando a minha prática e desconstruindo antigas concepções. Em face disso,
em meus espaços de atuação, tenho buscado criar uma atmosfera permanente de discussão e
aprofundamento sobre as novas demandas para o ensino de LI desencadeadas pelo processo
contemporâneo de globalização e ampliar os horizontes dos alunos para além de aspectos
meramente linguísticos.
Com a finalidade de descentralizar o modelo dos falantes nativos e ressignificar o
papel da cultura em sala de aula, os professores de LI precisam questionar alguns
pressupostos
enraizados
sobre
a língua e substituir a mentalidade normativa
pelo
entendimento de que a realidade multilíngue e multicultural está continuamente em mudança
(SIFAKIS, 2014). Para tanto, é importante que o currículo dos cursos de Letras/Inglês seja
revisado e ofereça subsídios para que os futuros professores sejam suficientemente preparados
para estarem seguros ao utilizarem o inglês como meio de comunicação, e, também,
devidamente equipados para exercerem suas funções de modo a atender as novas exigências
dessa nova realidade.
Cientes do papel fundamental desempenhado pelos cursos de formação na construção
de um posicionamento reflexivo e crítico por parte dos futuros professores de inglês, e de que
as ações e atitudes dos professores formadores refletem diretamente na prática dos professores
em formação, vêm à tona as seguintes inquietações: Como os professores formadores do
curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, concebem o ensino de LI na era
pós-moderna? Ainda, de que forma as questões linguísticas e culturais são tratadas na
formação
inicial
de
futuros
professores
de
inglês
nesse
mundo
de
vertiginosas
transformações?
Vale lembrar que a escolha pelo curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, como
cenário da nossa pesquisa e a definição dos professores formadores do referido curso, como
nossos informantes, devem-se ao fato de estarmos diretamente envolvidos na luta pela
qualidade do ensino e aprendizagem de LI dessa instituição superior de ensino. Tais escolhas
também foram firmadas porque defendemos que não há mais lugar na formação inicial de
professores de inglês para práticas educacionais homogeneizantes e conservadoras que tratem
a língua como um sistema estrutural que tem existência e funcionamento independente do
todo social que a envolve.
Embora já se acumule um número expressivo de estudos acerca do novo estatuto do
inglês como língua do mundo, bem como pesquisas voltadas para as implicações políticas,
pedagógicas e culturais advindas desse “fenômeno inédito na história da humanidade”
(RAJAGOPALAN, 2011, p. 46), essas discussões ainda não foram efetivamente integradas na
20
arena do ensino de LI nos cursos de formação. Por acreditar que professores formadores são
molas propulsoras para que possíveis mudanças ocorram no currículo do curso e,
consequentemente, nas práticas pedagógicas implementadas ao longo do processo de
formação do futuro professor de inglês, é que esta pesquisa se torna necessária.
O princípio orientador deste estudo, portanto, justifica-se pela necessidade da abertura
de um espaço que favoreça um movimento incessante de reflexão-ação em torno da formação
do futuro professor de inglês. Para mais, almejamos que os professores formadores sejam
capazes de promover “[...] o verdadeiro diálogo, a troca entre sujeitos-mundos diferentes,
entre línguas-culturas diferentes [...]” (MENDES, 2008, p. 71), reconstruir e fortalecer os
pilares nos quais o curso se firma e, finalmente, fazer prosperar uma prática que abarque os
matizes atuais do pluralismo linguístico e cultural da LI.
Tendo em vista as considerações tecidas até aqui, formulamos os seguintes
questionamentos centrais a fim de conduzir as nossas reflexões e nos induzir ao entendimento
mais preciso dos aspectos que constituem o fenômeno investigado:
a) Como os professores formadores do curso de Letras com licenciatura em inglês da
UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, entendem o ILF e como o visualizam no
contexto de ensino atual?
b) Em que medida os professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB,
Campus VI, estão preparados para transformar a sala de aula em um espaço onde a
interculturalidade se faça cada vez mais presente e reconhecida?
c) De que forma o projeto do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, poderá
viabilizar um ensino que considere o ILF e o desenvolvimento da competência
intercultural dos professores em formação?
Haja vista as perguntas de pesquisa acima relacionadas, o objetivo geral deste estudo
consiste em investigar de que forma a posição do inglês como língua franca global e as
questões concernentes à adoção de uma abordagem intercultural de ensino são compreendidas
e materializadas pelos professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus
VI, em Caetité/BA. Para alcançarmos esse objetivo mais amplo, configuramos os seguintes
objetivos específicos:
21
a) oportunizar a reflexão, pelos professores formadores do curso de Letras/Inglês da
UNEB, Campus VI, em torno do paradigma do ILF e da perspectiva intercultural de
ensino;
b) identificar se os docentes do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, estão
prontos para enfrentar o desafio de repensar a prática de ensino baseada na pretensa
unidade sistemática da língua e adotar perspectivas mais reais voltadas para a
diversidade da LI;
c) verificar quais são os caminhos que o projeto do curso de Letras/Inglês da UNEB,
Campus VI, propõe em direção ao ensino de LI que atendam às tendências
pedagógicas contemporâneas.
Por entendermos que a pesquisa em questão não pode estar dissociada do seu contexto
social e cultural, utilizamos o paradigma qualitativo de cunho etnográfico para nos ajudar a
responder aos questionamentos levantados e a alcançar os objetivos traçados. Para a fase
inicial de coleta de dados, aplicamos um questionário aos quatro professores formadores
participantes da pesquisa. Em seguida, observamos quatro aulas de cada um dos professores
informantes. Após a análise dos dados coletados e das constatações obtidas perante as aulas
observadas, os informantes da pesquisa foram convidados a participar de uma entrevista
semiestruturada. Por fim, procedemos a uma análise de documentos que incluiu o currículo do
curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, e as Diretrizes Curriculares Nacionais dos
cursos de Letras.
Todos os dados coletados foram analisados e discutidos com o fim de revelar a visão
dos professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, sobre as
implicações educacionais da desnacionalização da LI e da dimensão cultural. Ademais,
buscamos tracejar os caminhos apontados pelo currículo do curso que tendem a levar para o
centro da ação pedagógica cotidiana abordagens que propiciem a formação de futuros
professores de inglês aptos a desenvolver um trabalho diferenciado, aberto e questionador nas
aulas de LI.
Este trabalho de pesquisa está dividido em cinco capítulos, incluindo este introdutório,
“Delineamentos Iniciais”, que traz algumas considerações inaugurais sobre o novo estatuto do
inglês como língua franca global e sobre a perspectiva intercultural de ensino. Este capítulo
também abrange os fatores que nos motivaram e aqueles que justificam a realização do
presente estudo; apresenta o problema, as perguntas de pesquisa, os objetivos formulados e a
22
postura metodológica que nos guiaram ao longo da execução das etapas investigativas; além
de delinear, resumidamente, o conteúdo dos capítulos que se seguem.
O Capítulo 2, “O percurso metodológico da pesquisa”, fica reservado à trajetória
metodológica que molda este trabalho, explicitando a sua natureza, o lugar e os participantes
da pesquisa, os instrumentos utilizados e os procedimentos adotados para a coleta e análise
dos dados.
Os Capítulos 3 e 4 objetivam trazer as teorias que fundamentam este trabalho. No
Capítulo 3, “O protagonismo do inglês na cena mundial: enredamentos para o ensino”,
apresentamos, em um primeiro momento, os caminhos trilhados pela Linguística Aplicada
(LA) em direção à sua consolidação como ciência e apontamos as tendências que estão em
cena nesse campo de estudos, a fim de testificar o porquê que nossa pesquisa ocupa um
espaço legítimo dentro dessa área do conhecimento. Em seguida, ressaltamos a relevância da
LI na atual configuração mundial, salientamos os princípios do ILF e suas implicações para o
ensino, ao tempo em que contextualizamos com as vozes de vários teóricos de notabilidade
nacional e internacional sobre a temática.
O Capítulo 4, “A dimensão cultural no contexto de ensino de Língua Inglesa”, parte de
discussões mais gerais sobre as complexidades da relação entre língua, cultura e identidade
geradas pelo caráter dinâmico das comunicações interculturais e segue em direção a
considerações mais específicas voltadas para a perspectiva intercultural de ensino de inglês. O
capítulo nos oferece um amplo entendimento de determinados conceitos como competência
comunicativa e competência comunicativa intercultural, consciência cultural e consciência
intercultural; além de expor os principais desafios e demandas para o professor
interculturalista.
No Capítulo 5, “O ensino de inglês como língua desnacionalizada e a dimensão
cultural sob a visão de professores formadores: a pesquisa”, investimos nossos esforços
investigativos na análise, discussão e interpretação dos dados. Primeiramente, nos voltamos
aos registros que nos trouxeram informações adicionais sobre os nossos informantes. Depois,
nos detemos aos dados empíricos que nos permitiram captar a visão dos professores
formadores sobre o ILF e, na sequência, sobre a dimensão intercultural. Em um terceiro
momento, nos ocupamos das informações obtidas a partir da análise de documentos e também
dos dados gerados através do questionário e da entrevista acerca da matriz curricular. Nesse
mesmo capítulo, apresentamos o cotejo dos dados baseados na triangulação dos dados.
Após esse percurso, tecemos as nossas Considerações Finais. Nessa oportunidade,
correlacionamos os resultados da análise com alguns pontos da discussão teórica empreendida
23
em capítulos anteriores; retomamos as perguntas de pesquisa, oferecendo uma síntese das
respostas obtidas; também, apontamos as contribuições deste estudo; e, finalmente, as
conclusões a que chegamos. O texto conclusivo é seguido pelas Referências que guiaram a
nossa escrita e pelos Apêndices e Anexos.
Concluído este capítulo inicial, avançamos para o próximo que tem como propósito
apresentar a caracterização das etapas metodológicas desta pesquisa.
24
CAPÍTULO 2 – O PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA
Com o fito de apresentar os pressupostos metodológicos adotados nesta pesquisa,
subdividimos o presente capítulo em cinco seções distintas. Inicialmente, serão feitas algumas
considerações
especificaremos,
em torno
da
respectivamente,
natureza
da
pesquisa; nas três seções subsequentes,
o contexto pesquisado, os sujeitos participantes da
pesquisa, e os instrumentos utilizados para a coleta de dados; na quinta e última seção,
descreveremos os caminhos que foram percorridos para a realização desta pesquisa, bem
como os procedimentos empregados para a análise dos dados coletados.
2.1 Caracterização da pesquisa
É inegável a imprescindibilidade da produção do conhecimento científico, tanto ao
longo da história humana quanto no que diz respeito ao seu lugar na contemporaneidade
(SOUZA,
2005/2006).
Sabidamente,
a
pesquisa tem por objetivo
produzir novos
conhecimentos, corroborar ou refutar conhecimentos já existentes, constituindo-se em um
processo de aprendizagem tanto para o indivíduo que a desenvolve quanto para a comunidade
envolvida (RICHARDSON, 1999). Entendendo que é por meio do conhecimento construído
que se pode compreender e transformar a realidade, Pádua (1996, p. 29) nos diz que a
pesquisa
[...] é toda atividade voltada para a solução de problemas; como atividade de
busca, indagação, investigação, inquirição da realidade, é a atividade que vai
nos permitir, no âmbito da ciência, elaborar um conhecimento, ou um
conjunto de conhecimentos, que nos auxilie na compreensão desta realidade
e nos oriente em nossas ações.
Para além dessa declaração, podemos dizer que a pesquisa se prende em investigar um
problema,
baseada em uma metodologia que,
por sua vez, abrange determinados
procedimentos de coletas de dados, culminando em resultados válidos. Entretanto, é a base
teórica dos pesquisadores que vai determinar os caminhos pelos quais se chegam a tais
resultados, pois as diferentes visões de mundo dão lugar a diferentes concepções de ciência e
métodos. Consoante Siqueira (2014, p. 29), o estudioso precisa ter “[...] uma visão clara e
objetiva do seu objeto de estudo para que o processo de investigação leve-o a optar pelo
25
método de pesquisa que lhe ofereça os instrumentos e os procedimentos mais adequados ao
trabalho que pretende desenvolver”.
Nessa direção, o presente trabalho, situado no campo da Linguística Aplicada, é
caracterizado como uma pesquisa de natureza qualitativa e de cunho etnográfico. Nos dois
itens seguintes, propiciaremos uma visão panorâmica acerca das principais características dos
referidos métodos de pesquisa que, a nosso ver, servirão de auxílio na compreensão da
realidade que pretendemos recortar.
2.1.1 A pesquisa qualitativa
As noções teórico-metodológicas que orientam a pesquisa qualitativa estão embasadas
no paradigma interpretativista; isso “[...] significa que seus pesquisadores estudam as coisas
em seus cenários naturais, tentando entender, ou interpretar, os fenômenos em termos dos
significados que as pessoas a eles conferem” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17). Esta linha
investigativa diferencia-se da postura positivista que considera a realidade como estável,
como um dado objetivo que pode ser estudado de forma controlada, com intervenções
experimentais (REES, 2008).
É importante frisar que essas duas linhas de pesquisa apresentam teorias de mundo e
de conhecimento diferentes. Rees (2008) enfatiza que, de um lado, a pesquisa qualitativa
procura interpretar, holisticamente, os significados culturais; de outro, a pesquisa quantitativa
busca se inteirar de fenômenos que são comuns a grandes números de pessoas, utilizando-se
de modelos matemáticos, de tabelas estatísticas e de gráficos como formas de representação.
Podemos acrescentar ainda que enquanto os pesquisadores qualitativos buscam soluções para
as questões relacionadas à maneira como a experiência social é criada, os estudos
quantitativos se preocupam com a operacionalização e quantificação de variáveis, permitindo
a generalização das descobertas (DENZIN; LINCOLN, 2006).
Nesse embate, Denzin e Lincoln (2006, p. 24) ressaltam que “[m]uitos pesquisadores
quantitativos consideram não-confiáveis, impressionísticos e não objetivos os materiais
empíricos produzidos pelos métodos interpretativos”. Em contrapartida, a abordagem
quantitativa é posta em cheque pelos interpretacionistas por se apresentar incompleta na
tentativa de explicar a acelerada transformação social e a consequente diversificação dos
mundos através de metodologias dedutivas tradicionais (DENZIN; LINCOLN, 2006).
Contudo, há quem defenda que quantidade e qualidade estão intimamente relacionadas e
26
podem ser utilizadas conjuntamente, como técnicas complementares, e não dicotômicas
(ANDRÉ, 2008). De acordo com Telles (2002, p. 102), contemporaneamente,
[...] a opção por modalidades qualitativas de investigação tem sido cada vez
mais frequentes na pesquisa em educação, visto que os educadores e os
professores têm se interessado pelas qualidades dos fenômenos educacionais
em detrimento de números que muitas vezes escondem a dimensão humana,
pluralidade e interdependência dos fenômenos educacionais na escola.
Depreende-se daí que as questões educacionais são multifacetadas e complexas demais
para serem aprofundadas a partir do prisma da pesquisa laboratorial. Dado que a realidade é
vista como dinâmica e construída, os pressupostos qualitativos propõem o afastamento de
procedimentos que remetam à noção de objetividade e postula que a subjetividade deve ser
parte constitutiva de qualquer pesquisa humana para a sua efetiva compreensão. Dessa
maneira, o pesquisador torna-se parte integrante do contexto que está sendo investigado,
englobando
tanto
a
sua
voz
de
pesquisador/observador,
quanto
as
vozes
dos
participantes/observados em suas representações (REES, 2008). No entanto, Bortoni-Ricardo
(2008) nos lembra que
[...] a pesquisa qualitativa reconhece que o olho do observador interfere no
objeto observado, ou seja, o olhar do pesquisador já é uma espécie de filtro
no processo de interpretação da realidade com a qual se defronta. Esse filtro
está associado à própria bagagem cultural dos pesquisadores.
Em virtude da natureza subjetiva da análise do corpus investigado, a técnica de
triangulação dos dados, que consiste no “[...] uso de diferentes tipos de corpus, a partir da
mesma situação-alvo de pesquisa, com diferentes métodos e uma variedade de instrumentos
de pesquisa” (CANÇADO, 1994, p. 57), aparece como uma alternativa para uma maior
confiabilidade no tratamento dos dados. A esse respeito, Nunan e Bailey (2009 apud
SIQUEIRA, 2014, p. 40) argumentam que
A triangulação propicia ao pesquisador que trabalha com dados não
quantificados a possibilidade de estabelecer um confronto entre perspectivas,
ou seja, se mais de um tipo de fonte de dados leva a conclusões semelhantes,
para o pesquisador, incontestavelmente, elas serão muito mais confiáveis.
É válido salientar que a ampla variedade de métodos interpretativos empregados pelos
pesquisadores qualitativos, embora busquem melhores formas de compreender os contextos
pesquisados, não garantem a total compreensão de todas as sutilezas na experiência humana
27
(DENZIN; LINCOLN, 2006). Sempre haverá vozes que não são capturáveis às interpretações
e estratégias de representação do pesquisador, por mais que se pretenda oferecer um retrato
multidimensional e diverso da realidade estudada.
Existem inúmeras modalidades de pesquisa que estão associadas à abordagem
qualitativa; todas elas guardam em comum “[...] o foco na descrição e na análise de eventos
em seus contextos cotidianos, conferindo relevância central aos significados atribuídos
àqueles eventos pelos próprios atores neles envolvidos” (SOUZA, 2005/2006, p. 170).
Dentre a multiplicidade de métodos de desenho qualitativo existentes, Telles (2002)
destaca a pesquisa etnográfica, que é utilizada para tentar compreender o comportamento e as
relações entre grupos de pessoas dentro de um contexto social específico; a pesquisa-ação,
utilizada por um professor/pesquisador para tentar compreender, de forma sistemática, a
própria prática do cotidiano escolar; a pesquisa narrativa, cujas histórias pessoais e
profissionais dos sujeitos investigados possibilitam ao pesquisador vivenciar e interpretar os
acontecimentos ocorridos na escola e na vida; o estudo de caso, que, segundo Telles (2002, p.
108) é utilizado “[...] quando o professor-pesquisador deseja enfocar um determinado evento
pedagógico, componente ou fenômeno relativo à sua prática profissional”; e a pesquisa
heurística, destinada ao profissional que deseja realizar “[...] um estudo de si mesmo e sua
relação com a prática pedagógica” (TELLES, 2002, p. 110).
Para atender ao propósito deste trabalho, enfatizaremos, em particular, os aspectos
teórico-metodológicos da pesquisa etnográfica.
2.1.2 A etnografia
A metodologia de natureza etnográfica, utilizada para a geração e tratamento dos
dados deste estudo, é bastante propícia para pesquisas em que a cena da sala de aula e seus
atores estão envolvidos, uma vez que procura compreender o contexto investigado em toda
sua complexidade. Por essa razão, embora tenha sido desenvolvido originalmente pelos
antropólogos, o método etnográfico de pesquisa vem conquistando um amplo espaço no
campo da educação (CANÇADO, 1994), com forte vínculo sobre o contexto específico da
sala de aula de línguas (SOUZA, 2005/2006).
Etimologicamente, a palavra etnografia significa “escrevendo sobre nações”3 (REES,
2008). Na concepção de Cançado (1994, p. 55), a “[e]tnografia é literalmente a descrição de
3
Grafia é derivado do verbo grego que significa escrever; e etno origina-se da palavra grega que significa nação,
tribo, povo (ERICKSON, 1984, p. 52 apud REES, 2008, p. 259).
28
culturas ou de grupos de pessoas que são percebidas como portadoras de um certo grau de
unidade cultural”. De forma semelhante, Watson Gegeo (2010, p. 519) define a etnografia
como “[...] o estudo do comportamento das pessoas em contextos naturais e dinâmicos, com
foco especial na interpretação cultural do comportamento ”.
Tendo definido a etnografia, apresentamos alguns princípios, estabelecidos por
Watson Gegeo (2010), que norteiam a pesquisa etnográfica, “[...] seja ela conduzida por
antropólogos tentando documentar a vida cotidiana em comunidades desconhecidas, seja por
linguistas aplicados buscando entender algum fenômeno peculiar de uma sala de aula de
línguas” (SIQUEIRA, 2014, p. 35). O primeiro princípio da etnografia refere-se ao seu
enfoque no comportamento de um grupo de pessoas e nos padrões culturais que estão ligados
a esse comportamento. O autor explica que os etnógrafos enxergam os indivíduos como
representativos de um grupo, pois “[...] o comportamento cultural é por definição um
comportamento compartilhado” (WATSON-GEGEO, 2010, p. 520).
Como um segundo princípio, a autora indica que a etnografia é holística, ou seja, os
aspectos culturais e comportamentais devem ser explicados de modo a considerar todos os
sentidos e implicações que estão envolvidos no contexto em que tais aspectos fazem parte.
Para exemplificar esse princípio, Watson Gegeo (2010) menciona um estudo etnográfico do
processo de escrita de alunos do sexto ano, em que as atividades de escrita foram analisadas
levando-se em conta as demais atividades desenvolvidas, a formação dos professores, a
organização social da escola, o exame oficial de avaliação de escrita, dentre outros fatores.
Como bem salienta Davis (1995, apud REES, 2008, p. 261), “[o] etnógrafo, ao fazer a sua
pesquisa, considera todos os atos, não isoladamente, mas de forma situada dentro dos
contextos socioculturais”.
Um terceiro princípio consiste no fato de que o etnógrafo adentra o campo guiado por
teorias previamente definidas, com o intuito de direcionar os pontos fundamentais de sua
investigação. Caso contrário, a interpretação dos dados seria pautada apenas no que se
denomina “ontologia implícita” que está ligada aos valores, atitudes e suposições próprias do
etnógrafo
frente aos aspectos investigados. Todavia, vale lembrar, a observação e
interpretação etnográfica não são determinadas pela teoria selecionada, pois cada contexto
configura uma situação única (WATSON-GEGEO, 2010).
O último princípio da pesquisa etnográfica indicado por Watson Gegeo (2010) é o
princípio êmico-ético de análise que se caracteriza por sua natureza comparativa. É válido
explicitar que o termo “êmico” relaciona-se às interpretações dos participantes com relação às
situações específicas em que eles são observados, e o termo “ético” refere-se às interpretações
29
do observador externo. O autor deixa bem claro que a análise etnográfica não é
exclusivamente êmica, mas esta deve preceder e servir de base para uma análise ética que
possibilite comparações interculturais.
Ao passo que os antropólogos se interessam pela descrição da cultura (práticas,
hábitos, crenças, valores, etc.) de um grupo social, os estudiosos da educação, naturalmente,
preocupam-se com o processo educativo (ANDRÉ, 1995). Já que existe diferença de enfoque
nessas duas áreas, André (1995) informa que certos requisitos associados à etnografia
tradicional, como, por exemplo, a longa permanência do pesquisador em campo, o contato
com outras culturas, dentre outros, não precisam ser seguidos pelos investigadores de
questões educacionais.
Assim sendo, André (1995) aponta algumas características que fazem com que a
pesquisa em educação seja do tipo etnográfico. A primeira delas é o uso de técnicas como o
questionário, a observação, a entrevista e a análise de documentos; a segunda característica
diz respeito à interação constante entre o pesquisador e o objeto pesquisado, posto que “[...] o
pesquisador é o instrumento principal na coleta e na análise dos dados” (ANDRÉ, 1995, p.
28); a terceira característica desse tipo de pesquisa é que ela enfatiza o processo, e não os
resultados finais; outra característica importante é a preocupação dos pesquisadores com a
visão pessoal dos participantes; a quinta característica da pesquisa etnográfica é o trabalho de
campo em que “[o]s eventos, as pessoas, as situações são observados em sua manifestação
natural, o que faz com que tal pesquisa seja também conhecida como naturalística ou
naturalista” (ANDRÉ, 1995, p. 29).
Por fim, destaca-se a descrição e a indução dos dados pelo pesquisador. Bogdan e
Biklen (1994) esclarecem que nada é trivial para o pesquisador etnográfico, e, portanto, tudo
pode facilitar a compreensão do objeto de estudo. Desse modo, a descrição é bastante
vantajosa quando se deseja incorporar na análise todos os detalhes da cena investigada. Além
disso, os etnógrafos não recolhem os dados objetivando confirmar hipóteses previamente
construídas, mas, ao contrário, as abstrações são construídas somente quando os dados vão
sendo recolhidos e agrupados, ou seja, o quadro que se pretende constituir “[...] vai ganhando
forma à medida que se recolhem e examinam as partes” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 50).
No que tange ao corpus, mesmo que os dados de uma pesquisa etnográfica de sala de
aula possam ser obtidos através de um número reduzido de informantes, uma grande
quantidade de registros é gerada, sendo necessária uma filtragem conduzida pela habilidade
do pesquisador (CANÇADO, 1994). Porém, não se pode perder de vista que todo o material
coletado deve ser considerado na análise. Segundo Watson-Gegeo (2010), muitos estudos
30
falham em se basear em um número reduzido de relatos para dar suporte ao ponto de vista
teórico do pesquisador, cujos critérios de escolha não são apresentados aos leitores.
Quando exemplos são usados como ilustrações em um relatório etnográfico,
eles devem resultar de uma seleção sistemática de exemplos representativos,
em que tanto as variações quanto a tendência principal ou a recorrência dos
dados são refletidas. Qualquer outra coisa pode caricaturizar ao invés de
caracterizar o que o etnógrafo observou e registrou (WATSON-GEGEO,
2010, p. 530, grifos nossos).
Outro ponto que merece destaque está relacionado ao papel que o pesquisador
etnográfico deve desempenhar dentro da sala de aula. Cançado (1994) revela que deve ser
construída uma relação de confiança entre o pesquisador e o pesquisado, para que a imagem
de espião que, muitas vezes, é atribuída ao etnógrafo seja desconstruída. Além disso, embora
não seja possível uma completa neutralidade por parte do pesquisador, aconselha-se que ele
procure isentar-se, de certa forma, com relação ao seu foco de pesquisa e enxergue a interação
da maneira como ela ocorre no contexto, de modo a contemplar a visão dos investigados
(CANÇADO, 1994, p. 57).
Tendo delineado os princípios essenciais da pesquisa etnográfica, nos certificamos de
que esta perspectiva reúne o arcabouço teórico bem como os procedimentos e instrumentos
necessários para uma compreensão adequada dos fenômenos relativos à sala de aula de LI que
propomos investigar. Com nossas lentes etnográficas, passaremos, a partir de agora, a
pormenorizar os aspectos e caminhos metodológicos que foram trilhados para a consecução
dessa tarefa, a começar pela descrição do contexto de investigação.
2.2 Caracterização do lugar de pesquisa
Escolhemos o curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, como
contexto para a realização da presente pesquisa. Essa escolha se justifica porque além de ser
um curso bastante representativo para a região do Alto Sertão da Bahia 4 , também se trata do
lugar em que atuamos como docente e investimos esforços em prol da formação de futuros
professores de inglês aptos a exercer a sua profissão de maneira crítica, reflexiva e atualizada.
Para contextualizar o curso nos moldes em que hoje ele se encontra, cabe traçarmos um breve
4
O alto sertão da Bahia, região em que se situa a cidade de Caetité, localiza-se entre a Serra Geral e a Chapada
Diamantina e define-se pelas suas altitudes elevadas e posição frente à bacia do rio São Francisco, na Bahia.
31
percurso de sua constituição. As informações aqui apresentadas estão baseadas no Projeto
Pedagógico do referido curso.
Em 1994, o curso de Letras em Letras/ Português, Inglês e suas literaturas do
Departamento de Ciências Humanas de Caetité/ BA foi implantado e, em 25 de junho de
1997, foi reconhecido através da Portaria Ministerial n° 743. Em 2003, com o objetivo de
atender às determinações das Diretrizes curriculares advindas do Conselho Nacional de
Educação, a UNEB iniciou um processo de redimensionamento curricular, em que os cursos
de Licenciatura foram reformulados, dando origem a novas matrizes curriculares e até mesmo
a novos cursos.
Tal processo de reformulação viabilizou o surgimento do curso de licenciatura com
habilitação única em Letras/Inglês e suas literaturas, cuja implantação se deu através da
Resolução n° 271/2004 do CONSU. Ao longo da operacionalização desse Currículo
Redimensionado, com carga horária de 3.180 horas, emergiram entraves e dificuldades que
logo apontaram para a necessidade de avaliação e, consequentemente, alterações na sua
proposta. Dessa forma, em 2008, o CONSEPE, através das Resoluções n° 928 e n° 980,
aprovou as novas alterações e instituiu o currículo vigente com efeito retroativo a 2007.
Atualmente esse currículo é denominado Currículo Redimensionado com Ajustes, e possui
uma carga horária de 3.225 horas.
A estrutura curricular bem como os principais elementos norteadores do curso serão
expostos e detidamente analisados no Capítulo 5 deste trabalho. Munidos das informações
sobre o lugar em que será desenvolvida a pesquisa, cabe agora apresentarmos os sujeitos
participantes deste estudo.
2.3 Caracterização dos informantes da pesquisa
Com vistas a atingir os objetivos estabelecidos, convidamos quatro professores
formadores do curso de Letras/Inglês, acima descrito, para compor o grupo de informantes
desta pesquisa. A escolha não foi aleatória, pois definimos preliminarmente que os sujeitos
participantes seriam os professores responsáveis pelos componentes de ensino de LI nos
níveis básico, intermediário e avançado no período destinado à coleta de dados.
Cada docente convidado escolheu um nome fictício de sua preferência para ser
utilizado ao longo da análise dos dados. O quadro abaixo exibe o pseudônimo escolhido pelo
participante, acompanhado de sua formação acadêmica, e também do componente curricular
32
ministrado no semestre letivo de 2014.1, período em que fomos a campo para coletar os dados
necessários para a realização desta pesquisa:
Quadro 1. Perfil dos informantes da pesquisa
INFORMANTE
Hermione
Anastácia
Marcos
João
FORMAÇÃO ACADÊMICA
Licenciada em Letras Português/Inglês,
especialista em Inglês como Língua Estrangeira e
mestre em Letras: Cultura, Educação e
Linguagens.
Licenciada em Letras/Inglês e respectivas
Literaturas, especialista em Inglês como Língua
Estrangeira e mestre em Letras: Cultura,
Educação e Linguagens.
Licenciado em Letras Português/Inglês,
especialista em Língua Inglesa e mestre em
Linguística Aplicada
Licenciado em Letras Português/Inglês,
especialista em Língua Inglesa e mestrando em
Letras: Cultura, Educação e Linguagens.
COMPONENTE DE
LI MINISTRADO
Básico I
Intermediário I
Intermediário III
Avançado II
A partir das informações expostas, verificamos que todos os sujeitos pesquisados,
dentre eles 2 (dois) homens e 2 (duas) mulheres, são licenciados na área em que atuam,
possuem especialização na área de LI e continuaram a formação acadêmica, a nível de
mestrado, em áreas correlatas. Apenas um dos informantes é mestrando, os outros três já
obtêm o título de mestre. O tempo de dedicação dos informantes ao ensino de LI e o tempo de
atuação no Ensino Superior encontram-se especificados no gráfico a seguir:
Gráfico 1. Tempo de dedicação dos informantes ao ensino de LI e de atuação no Ensino Superior
33
O gráfico nos mostra que todos os informantes já possuem uma experiência
considerável com o ensino de LI que, como podemos observar, varia de 6 (seis) anos e 4
(quatro) meses a 16 (dezesseis) anos de dedicação ao ensino da língua. Quanto ao tempo de
ingresso no magistério superior, notamos que Hermione possui o menor tempo de experiência
dentre os pesquisados, atuando há 1 (um) ano e 10 (dez) meses como professora universitária;
Marcos é o professor que apresenta a experiência mais longa, pois já soma 9 (nove) anos de
atuação no Ensino Superior.
Foram esses os participantes, que, como sujeitos da ação social, contribuíram para que
o universo pesquisado se tornasse significativo e validado. Na próxima seção, seguiremos
com a descrição dos instrumentos de coleta de dados utilizados.
2.4 Caracterização dos instrumentos de coleta de dados
Nos estudos de caráter etnográfico, é preciso reunir uma ampla base de dados
provenientes de diferentes fontes para que as concepções, preferências e reações
culturalmente
condicionadas
do
pesquisador
sejam minimizadas
em suas conclusões
(SOUZA, 2005/2006). Souza (2005/2006, p. 177-178) diz que nesse tipo de pesquisa,
[...] é mais interessante que o pesquisador trabalhe com um volume pequeno
de dados de diversas fontes, tais como entrevistas com participantes,
observação direta dos eventos e análise de textos e documentos, do que com
um grande volume de dados de uma única fonte, como, por exemplo, apenas
entrevistas com participantes ou apenas observação direta.
O objetivo dessa orientação metodológica, continua Souza (2005/2006), é garantir
fidedignidade ao capturar e registrar o ponto de vista êmico, que, como vimos, está
relacionado aos olhares próprios dos atores típicos do interior do grupo observado. Com isso
em mente, utilizamos diversos instrumentos para a coleta e triangulação dos dados deste
trabalho, quais sejam, questionários, registros etnográficos de aulas observadas, entrevistas, e
análise de documentos.
2.4.1 O questionário
Por ser uma fonte importante de aquisição de dados, aplicamos um questionário (ver
Apêndice A) a cada um dos quatro informantes da pesquisa. Em conformidade com o que
34
preconizam Gil (2008) e Dörnyei (2003), na primeira parte do instrumento inserimos uma
nota introdutória em que apresentamos o propósito da pesquisa, enfatizamos a impessoalidade
no tratamento das respostas dadas, e garantimos o anonimato dos respondentes em todas as
etapas do estudo. A parte central do questionário contém 20 (vinte) questões abertas que, por
seu turno, foram divididas em 5 (cinco) blocos distintos. O quadro abaixo sintetiza os itens do
questionário formulado:
Quadro 2. Itens do questionário
BLOCO
TÓPICO
I
SOBRE VOCÊ
II
SOBRE O INGLÊS COMO LÍNGUA
FRANCA (ILF)
SOBRE A INTERCULTURALIDADE NO
ENSINO DE INGLÊS
SOBRE O MATERIAL ADOTADO
7 (sete)
SOBRE O CURSO DE LETRAS/INGLÊS
DA UNEB/CAMPUS VI
3 (três)
III
IV
V
TOTAL DE PERGUNTAS
QUANTIDADE DE
PERGUNTAS
4 (quatro)
3 (três)
3 (três)
20 (vinte)
O primeiro bloco de perguntas, com 4 (quatro) questões de cunho pessoal, buscou
obter informações sobre a formação acadêmica do professor, o tempo de atuação na área de
LI, o porquê da escolha da profissão e sobre a influência que os professores acham que
exercem na formação dos aprendizes. O segundo bloco apresenta 7 (sete) perguntas voltadas
para o estatuto do ILF. Nesse bloco, os professores tiveram que reagir escrevendo sobre suas
opiniões, crenças, atitudes, etc. acerca do referido paradigma de ensino.
O terceiro bloco, incluindo 3 (três) questões sobre a interculturalidade no ensino de
inglês, objetivou levantar dados sobre como os professores formadores compreendem a
competência intercultural, como a cultura tem sido tratada em sala de aula e também sobre os
desafios que atravessam a dimensão cultural. No quarto bloco, 3 (três) questões foram
formuladas na tentativa de verificar se o material adotado contempla o paradigma do ILF e se
favorece o desenvolvimento da competência intercultural dos futuros professores de inglês.
Por fim, o quinto bloco traz mais três perguntas que objetivaram sondar a opinião dos
professores sobre o currículo do curso.
35
Faz-se importante mencionar que uma das desvantagens do questionário reside no fato
de que os pesquisados não têm a oportunidade de usufruir de esclarecimentos e auxílio do
pesquisador ao responder as questões (DÖRNYEI, 2003). Em função disso, formulamos as
perguntas de forma clara e precisa, para evitar mal entendidos. Outro grande problema baseiase na constatação de que os respondentes nem sempre fornecem respostas verdadeiras sobre
eles. Dörnyei (2003, p. 12) endossa essa asserção pontuando que
[...] os resultados representam o que os respondentes dizem sentir ou
acreditar, em vez do que eles realmente sentem ou acreditam [...] Os
questionários são transparentes, ou seja, os respondentes conseguem supor
qual seja a resposta desejável/aceitável/esperada, e alguns deles irão dar essa
resposta mesmo que ela não seja verdadeira 5 (grifos do autor).
Diante dessas e de outras limitações apontadas por Dörnyei (2003), fomos a campo em
busca de dados válidos e confiáveis que pudessem confirmar as informações obtidas através
do questionário aplicado.
2.4.2 As observações de aula
A observação é o procedimento metodológico prototípico dos estudos de orientação
etnográfica, pois possibilita um contato pessoal e estreito do pesquisador com o que realmente
ocorre no contexto. Contudo, em virtude da presença do observador e da consciência de que
estão
sendo
observados,
os sujeitos pesquisados podem alterar o comportamento,
prejudicando a espontaneidade do grupo e comprometendo a confiabilidade dos resultados
(GIL, 2008).
Frente a essas considerações, julgamos necessária a observação de no mínimo 4
(quatro) aulas de cada participante da pesquisa, de modo que ao longo desse período, o grupo
fosse paulatinamente se habituando ao observador e se portasse o mais natural possível. Desta
feita, um total de 16 (dezesseis) aulas de LI dos níveis Básico I, Intermediário I, Intermediário
III e Avançado II foram observadas em turmas do I, III, V e VII semestres, uma vez que o
período de observação incidiu em semestre ímpar (2014.1).
2.4.3 A entrevista
5
[…] the results represent what the respondents report to feel or believe, rather than what they actually feel or
believe […] Questionnaire items are often 'transparent‟, that is, respondents can have a fairly good guess about
what the desirable/acceptable/expected answer is, and some of them will provide this response even if it is not
true.
36
Para garantir a validade da interpretação por parte do pesquisador e para abranger os
significados possíveis do objeto em estudo, também utilizamos a entrevista como fonte de
geração de dados. As entrevistas são eficazes porque possibilitam o esclarecimento e
aprofundamento de pontos específicos das informações, quando necessário; permitem a
abordagem mais personalizada da parte do entrevistado; e, ainda, oportunizam a obtenção de
pistas não verbais relevantes para a pesquisa. Sobre as entrevistas, Duarte (2004, p. 215)
esclarece que
[...] se forem bem realizadas, elas permitirão ao pesquisador fazer uma
espécie de mergulho em profundidade, coletando indícios dos modos como
cada um daqueles sujeitos percebe e significa sua realidade e levantando
informações consistentes que lhe permitam descrever e compreender a lógica
que preside as relações que se estabelecem no interior daquele grupo, o que,
em geral, é mais difícil obter com outros instrumentos de coleta de dados
(DUARTE, 2004, p. 215).
Gil (2008) assegura que a entrevista é a técnica de coleta de dados mais flexível dentre
todas as outras e informa que ela pode ser definida de acordo com o seu nível de estruturação:
as mais estruturadas predeterminam em maior grau as respostas a serem obtidas, e aquelas
menos estruturadas são desenvolvidas de forma mais espontânea. Neste estudo, realizamos
uma entrevista do tipo semi-estruturada, cujas perguntas foram definidas previamente com
base nas respostas dadas ao questionário e nos registros etnográficos das aulas observadas.
Cumpre registrar que o roteiro prévio (Ver Apêndice B) não impediu que atentássemos para
as falas dos entrevistados e procurássemos incentivá-los a falarem mais sobre tópicos que nos
parecessem relevantes para nosso estudo.
Em consonância com Gil (2008, p. 119), “[a] gravação eletrônica é o melhor modo de
preservar o conteúdo da entrevista”. Sendo assim, as entrevistas foram áudio-gravadas e,
posteriormente, transcritas (ver Anexos I, J e K). O roteiro contou com quatro questões
principais,
contendo
perguntas
secundárias,
que,
por sua vez,
foram desdobradas,
reformuladas ou descartadas conforme o andamento da conversa com os entrevistados.
2.4.4 Análise de documentos
A análise documental é vista por Lüdke e André (1986, p. 38) como uma “[...] técnica
valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas por
37
outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema”. Nessa linha,
utilizamos a análise de documentos como instrumento complementar de nossa pesquisa, com
vistas a identificar informações que atestassem os dados obtidos nas demais etapas e também
que lançassem novas luzes às nossas reflexões.
Para Philips (1974, p. 187 apud LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 38), são considerados
documentos “[...] quaisquer materiais escritos que possam ser usados como fonte de
informação sobre o comportamento humano”. Contudo, Appolinário (2009, p. 67 apud SÁSILVA et al., 2009, p. 8) amplia essa visão e define documento como “[q]ualquer suporte que
contenha informação registrada, formando uma unidade, que possa servir para consulta,
estudo ou prova. Incluem-se nesse universo os impressos, os manuscritos, os registros
audiovisuais e sonoros, as imagens, entre outros”.
Levando em conta que o nosso objeto de estudo se insere em um espaço institucional,
escolhemos a matriz curricular do Curso de Letras/ Inglês da UNEB, Campus VI, bem como
as Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de Letras homologadas pelo Ministério da
Educação em 2001 como fontes de informação. Estes documentos forneceram as evidências
necessárias para que pudéssemos identificar se os professores estão respaldados pelas
instâncias formativas do curso para desenvolver uma prática que considere o ILF e a
perspectiva intercultural de ensino. Dessa maneira, projetamos um olhar cuidadoso e crítico
em direção aos elementos norteadores do curso e aos protocolos disciplinares do currículo,
dispensando particular atenção às especificidades dos componentes de Laboratório de LI
oferecidos no período em que estivemos em campo (semestre 2014.1), a saber, Básico I,
Intermediário I, Intermediário III e Avançado II.
Uma vez lançadas as considerações em torno das particularidades dos instrumentos
utilizados para a coleta de dados, seguimos com a descrição dos procedimentos adotados no
transcurso de coleta e de análise dos dados gerados.
2.5 Descrição dos procedimentos de coleta e análise dos dados
O primeiro passo dado em direção ao trabalho de campo foi estabelecer contato com o
diretor da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, para que nos fosse concedida a autorização
para realizar a presente pesquisa na referida Instituição de Ensino Superior. Estando
devidamente autorizados, contatamos a coordenação do curso de Letras/Inglês com o fim de
solicitar a inclusão de um ponto de pauta na próxima reunião de colegiado para que, nessa
oportunidade, pudéssemos apresentar o projeto de pesquisa ao corpo docente do curso, bem
38
como convidar os quatro professores responsáveis pelos componentes de Laboratório de LI
para compor o quadro de informantes da pesquisa.
Com o desejo de que nosso estudo fosse regido por princípios éticos, e já tendo
definido o lugar, os participantes e os instrumentos de coleta de dados, submetemos o nosso
projeto ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP). Após aprovação do CEP, demos início ao
processo de coleta de dados. Vale lembrar que antes de procedermos a coleta, todos os
professores assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)6 , que, por sua
vez, foi elaborado com a finalidade de possibilitar aos sujeitos da pesquisa o mais amplo
esclarecimento sobre a investigação a ser realizada. Assim, os participantes puderam
manifestar a sua vontade em participar da pesquisa de maneira livre e consciente. O TCLE
também enfatizou a confidencialidade do estudo, objetivando garantir aos participantes o
caráter sigiloso dos dados.
Cientes do protocolo da pesquisa, os sujeitos participantes receberam via e-mail o
questionário, cujas respostas constituíram os dados primários da pesquisa. Não foi estipulado
o número de linhas para as respostas, os respondentes foram orientados a ficarem à vontade
para utilizar o espaço que desejassem. O prazo determinado para o retorno do formulário
respondido, também em formato digital, foi de um mês após o envio do instrumento.
Contudo, apenas um informante devolveu dentro desse prazo, os demais formulários foram
entregues com uma média de dois meses de atraso.
Depois de enviarmos os questionários, estabelecemos contato com os informantes para
comunicar o início das observações de aula. Embora tenhamos tentado agendar a observação
de apenas quatro aulas de cada participante, foi necessário um período de dois meses para
conseguirmos concluir essa etapa. Creditamos a maior parte dos imprevistos que surgiram ao
fato de que o período de observação coincidiu com o calendário de jogos da Copa do Mundo
sediada no Brasil.
Foram realizadas 2 (duas) visitas nas turmas de Básico I, Intermediário I e
Intermediário III, sendo 2 (duas) aulas observadas em cada visita. Devido a diferentes
circunstâncias (feriados, falta de comunicação com o professor, jogos da seleção brasileira na
Copa), as quatro aulas de Avançado II foram observadas em um só dia. Nos dias de
observação, as aulas aconteceram nos espaços de sala de aula, com exceção da turma de
Intermediário I, que teve as aulas ministradas no Laboratório de Idiomas.
6
Ver Apêndice C
39
No primeiro contato com cada turma, o professor nos concedeu um espaço da aula
para que fossem feitos alguns esclarecimentos acerca da natureza e objetivos da pesquisa.
Logo em seguida, por não termos o anseio de tomar parte das atividades desenvolvidas em
sala de aula, nos acomodamos em um lugar estratégico da sala, assumindo a postura de um
observador não-participante. Nossa tarefa restringiu-se em acompanhar, discretamente, todos
os acontecimentos da aula e registrá-los de forma livre e sucinta, para que no momento de
análise pudéssemos pinçar as cenas potencialmente relevantes para a pesquisa. Assim sendo,
os registros etnográficos das aulas observadas (Ver Anexos E, F, G e H) foram redigidos à
mão no decorrer da ocorrência do fenômeno e não se pautou em nenhum formulário préelaborado.
Terminada a coleta dos dados das fases anteriores, comunicamos aos professores
pesquisados a necessidade do agendamento de um horário para a realização da entrevista
semi-estruturada. A princípio, programamos entrevistar todos os participantes de uma só vez,
mas, por questões de incompatibilidade de horários, fomos impossibilitados de seguir com o
nosso plano inicial. Nesse sentido, foram necessárias três sessões para que todos os
informantes fossem entrevistados. No primeiro encontro, estiveram presentes os professores
Anastácia e João; no segundo, entrevistamos a professora Hermione e, no terceiro, o professor
Marcos.
Iniciamos cada entrevista com um preâmbulo. Neste ensejo, agradecemos a presença
dos informantes no horário e local combinados, pedimos permissão para a gravação da
conversa e também ratificamos o caráter estritamente confidencial das informações prestadas.
As entrevistas tiveram duração média de 13 (treze) minutos cada e foram integralmente
transcritas logo depois de gravadas. Depois de transcrita, a entrevista passou pelo processo
que Duarte (2004, p. 220) chama de conferência de fidedignidade que consiste em “[...] ouvir
a gravação tendo o texto transcrito em mãos, acompanhando cada frase, mudanças de
entonação, interjeições, interrupções, etc.”.
De posse dos registros provenientes dos três instrumentos de pesquisa acima
mencionados e dos documentos legais a que nos recorremos, quais sejam, a matriz curricular
do Curso de Letras/ Inglês da UNEB, Campus VI, e as Diretrizes Curriculares Nacionais dos
cursos de Letras, iniciamos a análise dos dados. Para este fim, nos associamos ao método da
análise de conteúdo que, segundo Bardin (1977, apud TRIVIÑOS, 1987, p. 161), compreende
três etapas básicas: (1) pré-análise, (2) descrição analítica e (3) interpretação inferencial.
Alinhando-nos a tais etapas, em um primeiro momento, todos os dados passaram pela
fase de pré-análise, para que depois da leitura flutuante dos dados, uma visão ampla do
40
material coletado fosse obtida. Em um segundo momento, cada instrumento foi explorado
separadamente à luz dos posicionamentos teóricos que subjazem este estudo. Nessa instância,
os dados foram categorizados para serem administrados sistematicamente. Com o objetivo de
tornar os dados válidos e significativos, em um terceiro momento, foi estabelecido um
aprofundamento nas conexões das ideias através da inferência e interpretação do material
empírico e dos documentos investigados (TRIVIÑOS, 1987).
Consoante Duarte (2004), o processo de análise é uma tarefa que exige ponderação,
principalmente no que concerne à interpretação e à tendência recorrente entre os
pesquisadores de tentar extrair dos dados elementos que corroborem suas hipóteses e
pressupostos teóricos. A autora nos alerta que
[...] muito do que nos é dito é profundamente subjetivo, pois trata-se do
modo como aquele sujeito observa, vivencia e analisa seu tempo histórico,
seu momento, seu meio social etc.; é sempre um, entre muitos pontos de
vista possíveis. Assim, tomar depoimentos como fonte de investigação
implica extrair daquilo que é subjetivo e pessoal neles o que nos permite
pensar a dimensão coletiva, isto é, que nos permite compreender a lógica das
relações que se estabelecem (estabeleceram) no interior dos grupos sociais
dos quais o entrevistado participa (participou), em um determinado tempo e
lugar (DUARTE, 2004, p. 219).
Para finalizar, cruzamos todos os dados obtidos ao longo das etapas de investigação,
com a pretensão de abranger a máxima amplitude na descrição, explicação e compreensão do
foco em estudo.
Tendo apresentado os pressupostos e aspectos metodológicos adotados nesta pesquisa,
apresentaremos a seguir o terceiro capítulo que visa a oferecer um aporte teórico sobre a
expansão do inglês pelo mundo e suas implicações para a sala de aula de língua, e que seja
capaz de esclarecer aspectos relevantes para o universo a ser investigado.
41
CAPÍTULO 3 – O PROTAGONISMO DO INGLÊS NA CENA MUNDIAL:
ENREDAMENTOS PARA O ENSINO
A trajetória dos indivíduos na contemporaneidade vem sendo descrita por um
momento histórico notadamente marcado por mudanças nos âmbitos econômico, social,
político e linguístico-cultural, em virtude da intensificação do atual processo de globalização e
dos avanços tecnológicos cada vez mais acentuados. Ante as metamorfoses testemunhadas
cotidianamente em contextos variados, que atingem o ensino e aprendizagem de línguas, é
que a produção de conhecimento na área da Linguística Aplicada (LA) vem sendo posta em
discussão.
À vista disso, neste capítulo, traçaremos inicialmente um breve panorama da
consolidação da LA como ciência independente da Linguística e apontaremos suas tendências
contemporâneas de desenvolvimento. Assim, será possível compreender com maior clareza
como o conhecimento desenvolvido nessa área pode auxiliar nas investigações voltadas para o
contexto de ensino e aprendizagem de línguas que busquem contemplar de forma crítica os
desdobramentos políticos e ideológicos decorrentes da atual organização mundial.
Na sequência, daremos particular atenção aos múltiplos desafios e mudanças de
paradigmas que incidem especificamente sobre o ensino de Inglês como Língua Franca (ILF).
Para tanto, buscaremos contrapor os fundamentos do ILF com aqueles relacionados ao ensino
de Inglês como Língua Estrangeira (ILE), acentuar as novas prioridades pedagógicas da visão
de inglês que inclui o mundo, ressaltar os questionamentos levantados sobre os testes de
proficiência em LI, além de discutir a necessidade de incorporar os princípios orientadores do
ILF na formação inicial de futuros professores de inglês.
3.1 LA – dos caminhos trilhados às tendências atuais
O surgimento da LA como área do conhecimento está relacionado à evolução do
ensino de línguas nos Estados Unidos durante e após a II Guerra Mundial, devido à
necessidade de contato com os aliados e mesmo com os inimigos falantes de outras línguas.
Por décadas, a LA se ocupou com o progresso dos princípios audiolingualistas 7 , que reunia
fortes bases linguísticas e um arcabouço behaviorista de ensino (ALMEIDA FILHO, 2005).
7
O método audiolingual, segundo Oliveira (2014), tem como objetivo principal capacitar o aluno a se comunicar
oralmente na língua estrangeira com um nível semelhante ao de um falante nativo.
42
Em razão disso, até os dias hodiernos, é comum associar a LA quase que exclusivamente ao
ensino e aprendizagem de língua estrangeira, sobretudo de inglês.
A princípio, a LA era tomada redutoramente como dependente do embasamento
teórico proveniente da Linguística, para muitos, a disciplina-mãe, e foi com esse sentido que,
nos anos 1960, ela foi apresentada ao Brasil. De acordo com Moita Lopes (2009, p. 12),
“Parecia natural que uma área que focalizava o fenômeno da linguagem, com influência tão
profunda no modo como o Estruturalismo se espraiou em muitas disciplinas, tivesse algo a
dizer àqueles que se interessavam pelo ensino de línguas”.
Entretanto, essa maneira equivocada de investigação baseada em princípios teóricos da
Linguística concebia o ambiente instrucional de forma idealizada, ou seja, o que deveria ser
feito nas salas de aulas era estabelecido sem que o professor e o aluno fossem sequer
consultados ou considerados. Opondo-se a essa tradição, Moita Lopes (2006a) declara que o
conhecimento que as pessoas têm sobre o fenômeno da linguagem é mais útil para o processo
de ensinar e aprender línguas do que uma descrição linguística formal informada por
determinada teoria.
Por esse motivo, apesar de a Linguística, em virtude do seu cunho científico, ter obtido
credibilidade acadêmica e consolidado sua posição como importante área de investigação nos
estudos da linguagem, ela vem, ao longo dos anos, apresentando certo descrédito social.
Afinal, a visão autônoma de língua que enfatiza os mecanismos internos da língua é de pouco
interesse e utilidade para a maioria das pessoas (PENNYCOOK, 2004). Em conformidade
com Rajagopalan (2004a, p. 33),
Todo cientista, inclusive o linguista, está autorizado a depurar de um
fenômeno observado o tipo de objeto que quer estudar. Mas há um preço a
pagar quando o grau de abstração é tão alto que o objeto estudado não tem
quase nenhuma semelhança com o modo como os homens e mulheres
comuns compreendem o mesmo fenômeno.
Depreende-se daí que os linguistas passaram a desenvolver suas teorias de forma cada
vez mais abstrata, formal e distante da realidade vivida pelos cidadãos no cotidiano. Isso se
deve, como já apontado, à cientificidade da Linguística, que tem como princípio não se
preocupar com a opinião pública sobre a linguagem e nem com o que ocorre nas situações
reais de uso (PENNYCOOK, 2004). Assim sendo, o que interessa aos linguistas teóricos é o
que o falante diz em sua língua e não o que ele fala sobre sua língua (RAJAGOPALAN,
2006). Por outro lado, Moita Lopes (2006a) salienta que na LA é fundamental que os sujeitos
pesquisados sejam convidados a avaliar os resultados das pesquisas, e também a opinar se as
43
questões estudadas estão sendo legítimas sob seus pontos de vista. Entende-se com isso, que o
linguista aplicado deve se interessar por um modelo que privilegie a perspectiva do usuário.
Após a metade da década de 1980, embora a linguística teórica continue sendo uma
ciência de contato influente, a LA passa a operar de modo interdisciplinar, e vai buscar outras
áreas do conhecimento para estabelecer liames entre saberes diferentes com o objetivo de
proporcionar uma percepção mais cristalina e abrangente das questões investigadas. Sob este
prisma, Moita Lopes (2006a) argumenta que a interdisciplinaridade permite à LA escapar de
visões predeterminadas e gerar configurações teórico-metodológicas próprias, à luz da lógica
de outras disciplinas, com o fito de vislumbrar alternativas para as questões com as quais se
defronta.
A preocupação com problemas de uso da linguagem para além da sala de aula de
línguas só se torna perceptível no Brasil a partir dos anos 1990, momento em que a linguagem
começa a ser vista como instrumento de construção do conhecimento e da vida social. Ao ser
propagada para outros contextos, a LA amplia os seus temas e tópicos de investigação e,
consequentemente, aumenta o apelo de natureza interdisciplinar para teorizá-los (MOITA
LOPES, 2009).
No final do século XX e início do século XXI, a LA passa por um processo de
reformulação com o intento de atender às exigências impostas pela modernidade. Nessa
direção, o linguista aplicado começa a questionar a forma descontextualizada em que são
tratadas as práticas investigadas e passa a enxergar os sujeitos em sua heterogeneidade.
Seguindo essa linha, Fabrício (2006, p. 52) ressalta que a LA, “em lugar de investir na
delimitação de um perfil disciplinar claramente contornado, passa a apostar no diálogo
transfronteiras”.
É assim que se chega à versão indisciplinar e transdisciplinar da LA, ou seja, a
produção de conhecimento nessa área constitui-se na ideia de que os limites disciplinares não
dão conta da complexidade do que se estuda. Dessa maneira, os paradigmas consagrados são
extrapolados e as fronteiras disciplinares são transpostas para se chegar a uma melhor
compreensão do mundo atual (MOITA LOPES, 2009).
A postura transdisciplinar em LA, vale lembrar, diferentemente da interdisciplinar,
requer não somente a integração, mas uma interação dinâmica entre os ramos do saber.
Segundo Celani (1998), o desenvolvimento de uma atitude transdisciplinar envolve mudança
e por isso mesmo exige que o linguista aplicado seja corajoso, intrépido, para alterar os
esquemas preestabelecidos e esteja disposto a conviver com incertezas e riscos que, sem
dúvidas, terá que enfrentar.
44
No entanto, Moita Lopes (2006a, p. 26) afirma que “não surpreende que essa visão da
LA como Indisciplina, além de causar desconforto, represente muitas vezes uma ameaça para
aqueles que vivem dentro dos limites disciplinares, com verdades únicas, transparentes e
imutáveis”. Moita Lopes (1998) confessa, então, que é natural que essa prática seja repelida,
visto que tais pesquisadores estão diante do que se chama “princípio da territorialidade em
desagregação, que desarticula os velhos caciques e seus poderes” (MOITA LOPES, 1998, p.
116).
Como visto, uma LA inter/transdisciplinar é encarada com temor porque a própria
sociedade nos ensinou a olhar com desconfiança para as misturas, os cruzamentos, as
metamorfoses e a diversidade. Mas o que já é manifesto, diz-nos Fabrício (2006), é que os
linguistas aplicados não
podem continuar a ancorar suas teorizações e ideias em
essencialismos, homogeneidades ou cristalizações, sob a pena de não atender às realidades
globais emergentes neste período que nos acostumamos a chamar de pós-modernidade.
Todavia, não há como negar que fazer LA fundada nessas novas configurações ainda continua
sendo um grande desafio.
Fazer LA no cenário atual, por consequência, significa considerar problemas e
questões relacionados à linguagem que sejam mais sensíveis às preocupações sociais,
culturais e políticas, e buscar soluções que sejam pertinentes e úteis para os sujeitos no âmbito
da vida cotidiana. Com base nesse propósito, Rojo (2006, p. 258) assinala que:
Já não se busca mais “aplicar” uma teoria a um dado contexto para testá-la.
Também não se trata mais de explicar e descrever conceitos ou processos
presentes em determinados contextos, sobretudo escolares, à luz de
determinadas teorias emprestadas, [...]. A questão é: não se trata de qualquer
problema – definido teoricamente –, mas de problemas com relevância social
suficiente para exigirem respostas teóricas que tragam ganhos a práticas
sociais e a seus participantes [...].
Portanto, a LA deve estar envolvida em contínuo questionamento dos princípios que
norteiam a vida dos atores sociais, apoiando-se em diferentes regimes de verdade e diferentes
áreas disciplinares (FABRÍCIO, 2006). Moita Lopes (2006a, p. 20) destaca que “[...] foi
certamente o viés de interdisciplinaridade que causou mais impacto no desenvolvimento da
LA contemporânea. E é esse viés que leva à formulação de uma LA mestiça e nômade [...]”.
Isso implica dizer que, apesar de muitos linguistas aplicados ainda persistirem em desenvolver
um trabalho ancorado em uma visão de linguagem apolítica e a-histórica, é preciso entender a
45
LA como área de estudos que tem como finalidade integrar perspectivas variadas para tentar
dizer algo que seja relevante ao mundo contemporâneo (MOITA LOPES, 2006b).
Ao lado dessa tendência, têm surgido, na esfera das pesquisas em LA, muitas
discussões em torno da necessidade de produzir conhecimento que também contemple as
vozes do Sul (cf. SOUSA SANTOS, 2004), isto é, que englobe as pessoas que vivem à
margem da sociedade como os pobres, os negros, os indígenas, os homossexuais, etc. Essa
agenda anti-hegemônica “[...] está na base da criação de um novo universalismo, ou
pluriversalismo, que desafia a hegemonia do mercado da globalização do pensamento único
[...], liderado pelos países centrais e suas agências” (MOITA LOPES, 2006b, p. 86).
Moita Lopes (2006b) entende que os indivíduos marginalizados têm muito a contribuir
para a construção de conhecimento sobre a vida social, no sentido não só de aceitar a
diferença, mas sim perceber o quanto essa diferença pode colaborar com novas formas de
assimilação de nossa realidade. Quanto a isso, Bohn (2005, p. 21) complementa que “talvez
seja crucial dar à periferia social, ou aos danos marginais, o direito de significar para
encontrar respostas às perguntas educacionais, tão essenciais para a construção da cidadania e
da nacionalidade”. Trata-se, nesse caso, de uma nova forma de teorizar e fazer LA com base
em um olhar não ocidentalista.
Nesse sentido, “a questão contemporânea parece ser relativa a como reinventar a vida
social, o que inclui a reinvenção de formas de produzir conhecimento, uma vez que a pesquisa
é um modo de construir a vida social ao tentar entendê-la” (MOITA LOPES, 2006b, p. 85).
Freire (1987, p. 33) já dizia que “só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca
inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os
outros”. Fabrício (2006) adverte que não se pode esquecer que essa prática deve estar atrelada
a valores e juízos éticos, já que as questões éticas são inerentes às situações em que o sujeito
social e sua relação com o outro são evidenciados. Também não se pode perder de vista que o
conhecimento produzido deve tentar responder às urgências de nossos tempos e objetivar uma
convivência mais harmoniosa.
A partir das ponderações apresentadas, Pennycook (1998) revela que é essencial que
os linguistas aplicados pós-modernos, ao entenderem que as mudanças devem e podem ser
concretizadas, comecem a se engajar na elaboração de um projeto crítico. Isso significa
romper com modos de investigação que estejam alicerçados em princípios positivistas e
estruturalistas, pois tais concepções, como já se sabe, limitam a capacidade de reflexão sobre
o planeta e a possibilidade de o indivíduo tentar mudá-lo.
46
Tendo rastreado os avanços e as contribuições da LA para o cenário contemporâneo
do ensino de línguas, chega-se aqui às reflexões em torno da nova dinâmica mundial marcada
pela consolidação do inglês como língua desnacionalizada.
3.2 A difusão da LI em escala mundial
A fase atual da globalização tem gerado inúmeros efeitos que afetam a sociedade
moderna como um todo. Dentre esses efeitos, pode-se sublinhar a diminuição de distâncias
entre os indivíduos e a necessidade premente de comunicação entre eles. De acordo com
Kumaravadivelu (2006, p. 131), “as vidas econômicas e culturais das pessoas no mundo todo
estão mais intensas e imediatamente interligadas”, e é exatamente nesse momento histórico
que a Língua Inglesa (LI) se destaca, assegurando a interação entre os diferentes povos.
Ratificando o exposto, Siqueira (2011a, p. 87) atesta que “[s]em sombra de dúvidas, o inglês é
a língua global da contemporaneidade. Sua „mundialidade‟ é fato consumado e encontra-se
fartamente documentada”.
Aqui cabe acentuar que uma língua não se torna global por causa das suas
propriedades estruturais intrínsecas, ou por causa da extensão de seu vocabulário, nem
tampouco por estar associada a uma grande cultura ou religião, mas por uma razão principal:
o poder político, econômico e militar de seu povo (CRYSTAL, 2003). Assim sendo, torna-se
compreensível o fato de o colonialismo britânico e o capitalismo americano terem sido os
responsáveis pelo progresso do inglês como um meio de comunicação através das fronteiras
geográficas. A esse respeito, Crystal (2003, p. 120) sublinha que
Nos séculos XVII e XVIII, o inglês era a língua da principal nação
colonizadora – a Grã-Bretanha. Nos séculos XVIII e XIX, era a língua da
nação que liderou a Revolução industrial – também a Grã-Bretanha. No final
do século XIX e início do século XX era a língua da maior potência
econômica – os EUA. Como resultado, quando as novas tecnologias
trouxeram novas oportunidades linguísticas, o inglês emergiu como a língua
mais importante [...]8
A partir desse momento, falar inglês para se comunicar com o mundo atual tornou-se
algo imprescindível. Dentre os modelos que representam a referida expansão mundial do
8
In the seventeenth and eighteen centuries English was the language of the leading colonial nation – Britain. In
the eighteenth and nineteenth centuries it was the language of the leader of the industrial Revolution – also
Britain. In the late nineteenth and the early twentieth it was the language of the leading economic power – the
USA. As a result, when new technologies brought new linguistic opportunities, English emerged as a first -rank
language in industries which affected all aspects of society.
47
inglês, a proposta de Kachru (1985), que consiste em dividir o uso do inglês em três
categorias (Figura 1), parece ser a mais influente.
Figura 1. Os três círculos concêntricos do inglês
Fonte: Crystal (2003, p. 61)
Este modelo une vários níveis de análise (quadro 3), pois propõe agrupar, em círculos
concêntricos, diferentes nações conforme a combinação dos tipos de falantes, das funções que
o inglês exerce, bem como das normas linguísticas do inglês em cada grupo (MOLLIN,
2006).
Como se pode observar no quadro 3 abaixo, os países que possuem o inglês como
língua nativa ou materna, a exemplo dos EUA, Inglaterra, Austrália, etc., estão concentrados
no Círculo Interno9 . Nesses países estão os chamados falantes nativos que utilizam o inglês
em todos os domínios e para todos os propósitos comunicativos. Tais comunidades são tidas
como provedoras da norma (norm providers) e possuem suas próprias variedades do inglês. O
Círculo Externo10 engloba os países em que o inglês opera como segunda língua (L2),
geralmente ex-colônias, como a Índia, Nigéria, Cingapura, etc. Estes países utilizam o inglês
para muitas funções intranacionais, e são vistos por Kachru como implementadores da norma
(norm developers), pois se encontram no processo de desenvolver suas próprias variedades, os
9
Inner Circle
Outer Circle
10
48
novos ingleses. Por fim, o Círculo em Expansão11 simboliza as nações que aprendem o inglês
como língua estrangeira, como o Brasil, Japão e China, por exemplo. Essas comunidades são
classificadas como dependentes da norma (norm dependent), pois por serem aprendizes da
língua, não lhes é dado o direito de desenvolver sua própria variedade (CRYSTAL, 2003;
MOLLIN, 2006; SIQUEIRA, 2011b).
Quadro 3. Níveis de análise dos três círculos concêntricos de Kachru
NAÇÕES
TIPOS DE
FALANTES
FUNÇÕES DO
INGLÊS
NORMAS
LINGUÍSTICAS
CÍRCULO
INTERNO
EUA, Inglaterra,
Austrália, Irlanda,
Nova Zelândia, etc.
Falantes nativos
O inglês é usado em
todos os domínios e
para todos os
propósitos
comunicativos.
Comunidades ditas
provedoras da norma
que possuem suas
próprias variedades
do inglês.
CÍRCULO
EXTERNO
Índia, Nigéria,
Cingapura, Filipinas,
etc.
Falantes
bi/multilíngues
O inglês é usado para
muitas funções
intranacionais.
Comunidades vistas
como
implementadoras da
norma e estão no
processo de
desenvolver suas
próprias variedades.
CÍRCULO EM
EXPANSÃO
Brasil, Japão, China,
Itália, Grécia, etc.
Falantes não nativos
O inglês é aprendido
como língua
estrangeira.
Comunidades
classificadas como
dependentes da
norma. Já que são
vistos como
aprendizes, os
falantes não possuem
o direito de
desenvolver sua
própria variedade.
Fonte: Mollin (2006)
Mas, como bem lembra Seidlhofer (2011), os três círculos concêntricos supracitados
são conceitualmente problemáticos e abertos à crítica. Um dos problemas que podemos
apontar nesse modelo é que essa categorização não leva em conta que as relações, até mesmo
nos países que constituem o Círculo Central, encontram-se cada vez mais híbridas. Clyne e
Sharifian (2008) advogam que o inglês, em razão da rápida globalização da língua, não tem
estado confortável dentro da demarcação dos círculos concêntricos acima descritos, e
constatam que as linhas que os separam têm se tornado cada vez mais porosas. Para
exemplificar, os autores acentuam que muitos falantes de países do Círculo Externo e do
Círculo em Expansão agora vivem em países do Círculo Interno, e vice versa. E acrescentam
que em alguns países do Círculo Externo, como Cingapura e Índia, a LI tem se tornado a
11
Expanding Circle
49
primeira língua de muitos falantes; por outro lado, em determinados países do Círculo em
Expansão, o inglês tem ganhado a condição de L2, isso inclui países como a Costa Rica,
Bélgica e Sudão (CLYNE; SHARIFIAN, 2008).
Embora haja limitações nesse modelo proposto por Kachru, os três círculos
concêntricos nos ajudam a estimar o número de falantes nativos e não nativos de inglês em
todo o globo. Segundo Crystal (2006), uma em cada quatro pessoas do mundo é capaz de se
comunicar em inglês em um nível intermediário de proficiência, e somente um em cada três
falantes de inglês no mundo é um falante nativo. Kachru e Smith (2008) ainda informam que
o Círculo Externo e o Círculo em Expansão têm, aproximadamente, 800 milhões de pessoas
que utilizam o inglês. Em contrapartida, apenas 300 milhões de pessoas usam o inglês como
língua materna (L1) no Círculo Interno.
É válido salientar que existem várias dificuldades em determinar com precisão o
número de usuários de inglês pelo planeta. Uma das restrições se deve ao fato de não haver
uma fonte única de informação com o total de usuários de inglês de todos os países do mundo.
Além disso, não há como estabelecer qual é a fluência que um falante deve ter para ser
considerado um usuário de inglês, tal fato se aplica, em particular, aos falantes do Círculo em
Expansão que aprendem o inglês como língua estrangeira. Outra dificuldade diz respeito às
discussões contenciosas que objetivam definir se os falantes de pidgin e crioulo devem ser
incluídos nessa estimativa (MCKAY, 2002).
É oportuno entender que a mundialização do inglês está ligada a duas situações
linguístico-culturais diferentes: por um lado, há os países do Círculo Externo, onde o inglês,
em decorrência da colonização, foi institucionalizado como um meio de comunicação local.
Por outro lado, existe o inglês global, que, por ser a língua mais difundida e amplamente
utilizada para a comunicação internacional e intercultural, transcende todas as fronteiras
nacionais. Portanto, a diferença entre as formas local e global do inglês naturalmente
transpõem a distinção Círculo Central/ Círculo Externo/ Círculo em Expansão, visto que as
comunidades que utilizam o inglês com propósitos domésticos no Círculo Externo, bem como
os falantes do Círculo Interno também participam dos usos globais do inglês, fato este que
marca a desterritorialização da língua. Dizendo de outro modo, o inglês em sua forma global é
utilizado entre pessoas de diferentes línguas maternas através de todas as regiões definidas por
Kachru (SEIDLHOFER, 2004).
Feitas essas considerações, Mollin (2006) afirma que é necessário reescrever o modelo
Kachruviano, essencialmente no que diz respeito às variedades e aos padrões do inglês. Tal
modelo, cumpre registrar, não engloba a nova e dominante função do inglês ao redor do
50
mundo, cujas especificidades já não conseguem mais ser representadas pelos termos Inglês
como Língua Estrangeira (ILE)12 , Inglês como Segunda Língua (ISL)13 ou Inglês como
Língua nativa (ILN)14 . Entretanto, por ser útil ao auxiliar na distinção entre os contextos de
uso da LI, a identificação dos três círculos será usada ao longo deste trabalho.
Ao ser tratado como língua da comunicação global, o inglês passou a receber
diferentes terminologias na literatura, conforme o seu estado de variação nos diversos
contextos geopolíticos em que se insere. Interessa notar que os múltiplos nomes ora
sublinham aspectos distintos da expansão e variação da língua, ora se apresentam sobrepostos
e intercalados. Deter-nos-emos a comentar, mesmo que brevemente, sobre os termos mais
usuais.
A expressão World Englishes (WEs), por exemplo, de acordo com Jenkins (2006a),
tem três possibilidades de interpretação. Primeiro, o WEs pode ser tomado como termo
guarda-chuva para as diferentes variedades do inglês propagadas pelo mundo afora, este
sentido do termo também é representado pelas expressões World English (no singular),
International English(es) e Global English(es). Segundo, o termo é utilizado para se referir
aos chamados novos ingleses emergentes nos países do Círculo Externo. Os estudos voltados
para essa abordagem focalizam as peculiaridades nacionais ou regionais do inglês, sem levar
em consideração a variação em nível transnacional (ZAIDAN, 2013). Por fim, a terceira
possibilidade de interpretação remete a uma abordagem pluricêntrica do estudo da LI, e é
comumente referida como abordagem Kachruviana, pois enfatiza o que Kachru cunhou de
world-englishness15 que se trata de “[...] um possível conjunto de traços sociolinguísticos que
identificariam os usuários da língua em nível transnacional, sublinhando o caráter difusivo e
multicultural de seu uso [...]” (ZAIDAN, 2013, p. 18).
O World English (WE), por sua vez, é definido por Rajagopalan (2004b) como um
fenômeno sui generis que pertence a todos os seus falantes, mas não se configura L1 de
ninguém. Nas palavras do autor, “[...] o WE é uma miscelânea de dialetos e sotaques em
diferentes estágios de nativização (ou, contrariamente, fossilização) na qual não existem
regras definidas de jogo, as regras são revisadas e reinventadas à medida que o jogo
progride”16 (RAJAGOPALAN, 2004b, p. 115). Com base nisso, entende-se que o WE, com
12
English as a Foreign Language (EFL)
English as a Second Language (ESL)
14
English as a Native Language (ENL)
15
Termo traduzido por Zaidan (2013) como “inglesidade mundial”.
16
WE is a hotchpotch of dialects and accents at different stages of nativization (or, contrariwise, fossilization)
where there are no real rules of the game; if anything, the rules are constantly being revised or reinvented even
as the game progresses.
13
51
seu caráter híbrido, rejeita a ideia de que os países do centro devem continuar ditando as
regras da língua.
Já o termo Inglês como Língua Global tornou-se comum desde a primeira edição do
livro English as a Global Language de David Crystal em 1997, e, conforme se observa em
Erling (2005), a expressão refere-se ao inglês utilizado em todas as circunstâncias do plano
global por pessoas de qualquer etnia. O seu uso está intimamente ligado à globalização
socioeconômica, pois está refletido nos diversos domínios sociais, culturais, econômicos e
políticos. Porém, Jenkins (2007) argumenta que o termo é vago porque não deixa transparente
o tipo de comunicação que se pretende representar. Ademais, a autora sugere que a partir
dessa expressão fica implícito que todas as pessoas em torno do globo falam inglês, mas como
o próprio Crystal (2003, p. 28) sinaliza, “[a]pesar do notável crescimento do uso do inglês,
pelo menos dois terços da população mundial ainda não o utiliza. Em certas partes do planeta
[...], o inglês ainda tem uma presença limitada”17 .
Inglês como Língua Internacional (ILI)18 é outro termo em circulação que se refere ao
uso do inglês pelo mundo, e se trata da interação entre pessoas de diferentes nações ou
culturas que utilizam diferentes L1s. Em consonância com Seidlhofer (2003, p. 8-9), “[...]
sempre que o inglês é escolhido como a opção preferida para a comunicação entre culturas,
ele pode ser chamado de ILI”19 . Mas não podemos deixar de mencionar que há controvérsia
em torno desse termo, pois não existe uma variedade unitária, codificada e claramente
distinguível chamada Inglês Internacional, o que existe é uma variedade de inglês dos falantes
nativos utilizada nas ocasiões globais em que se travam as relações mediadas por essa língua
(JENKINS, 2007; SIQUEIRA, 2011b).
Frente às múltiplas e conflituosas maneiras de se compreender o inglês nos tempos de
globalização, daremos preferência ao termo Inglês como Língua Franca (ILF)20 , pois, nos
colocamos ao lado de Jenkins (2007), quando ela diz que o ILF apresenta um número de
vantagens que nenhum outro termo apresenta. Dentre os vários pontos positivos, a autora
destaca que
[o] ILF enfatiza o papel do inglês na comunicação entre falantes de
diferentes línguas maternas, razão primária para se aprender inglês hoje em
17
Despite the remarkable growth in the use of English, at least two -thirds of the world population do not yet use
it. In certain parts of the world […], English has still a very limited presence.
18
English as an International language (EIL)
19
[…] wherever English is chosen as the preferred option for cross-cultural communication, it can be referred
to as EIL.
20
English as a Lingua Franca (ELF)
52
dia; sugere a ideia de comunidade em oposição à estrangeiridade; enfatiza
que as pessoas têm algo em comum apesar de suas diferenças; implica que a
„mistura‟ de línguas é aceitável... e, que, portanto, não há nada inerentemente
errado em manter certas características da língua materna, tal como o
sotaque; finalmente, a designação latina remove simbolicamente a
propriedade do inglês dos anglos para ninguém e ao mesmo tempo para todo
mundo21 (JENKINS, 2000, p. 11 apud JENKINS, 2007, p. 3-4).
Nos termos apontados pela autora, reconhecemos que o ILF, mais do que qualquer
outra denominação, deixa bem explícito que são os falantes não nativos do inglês que estão
estimulando o desenvolvimento da língua em seus usos locais e globais. Diante disso, na
próxima seção, buscaremos oferecer uma clara definição desse paradigma, bem como
apresentar algumas de suas principais características.
3.2.1 Inglês como Língua Franca – uma pormenorização do fenômeno
A atual situação linguística sem precedentes, na qual o inglês tem alcançado
dimensões globais, tem exigido uma reavaliação de várias dimensões-chave nos estudos da
Linguística Aplicada (CLYNE; SHARIFIAN, 2008), sobretudo no que diz respeito aos
construtos baseados na homogeneidade da língua. Com o prestígio de língua global, o inglês
passou a ser visto como uma língua com sistemas diversos e normas múltiplas que acomoda
valores e identidades plurais (CANAGARAJAH, 2006). Em virtude disso, o ILF ganhou
impulso e emergiu como um importante paradigma de pesquisa.
De início, convém ressaltar que, fundamentalmente, uma língua franca é concebida
como “uma língua de contato usada entre pessoas que não compartilham uma primeira língua,
e é comumente entendida como a segunda língua ou língua subsequente de seus falantes”22
(JENKINS, 2007, p. 1). Apreende-se dessa concepção que os falantes nativos devem ser
excluídos da definição do ILF. É o que se observa em House (1999, p. 74 apud
SEIDLHOFER, 2004, p. 211) quando ela afirma que “[a]s interações do ILF são definidas
como interações entre membros de duas ou mais linguaculturas diferentes em inglês, para
21
ELF emphasizes the role of English in communication between speakers of different L1s, i.e. the primary
reason for learning English today; it suggests the idea of community as opposed to alienness; it emphasizes that
people have something in common rather than their differences, it implies that “mixing” languages is acceptable
… and thus that there is nothing inherently wrong in retaining certain characteristics of the L1, such as accent;
finally, the Latin name symbolically removes the ownership of English from the Anglos both to no one and, in
effect, to everyone.
22
[…] a contact language used among people who do not share a first language, and is commonly understood to
mean a second (or subsequent) language of its speakers.
53
quem o inglês não é a língua mãe”23 . Da mesma maneira, Firth (1996, p. 240 apud
SEIDLHOFER, 2004, p. 211) define o ILF como uma “[...] língua de contato entre pessoas
que não compartilham uma língua nativa comum, nem uma cultura (nacional) comum, e para
quem o inglês é a língua estrangeira de comunicação”24 . Se o ILF é concebido desse modo,
então, obviamente, nenhum de seus falantes pode ser um falante nativo (JENKINS, 2007).
De fato, dado o caráter global da comunidade linguística, o ILF geralmente refere-se
ao inglês utilizado entre falantes não nativos do Círculo em Expansão, onde o potencial de
difusão contínua da língua é maior (MCKAY, 2002). Mas isso seguramente não implica que
os falantes dos círculos interno e externo estejam excluídos da definição de ILF (JENKINS,
2009). Com isso em mente, concordamos com Seidlhofer (2011, p. 7), para quem o ILF
consiste no “[...] uso do inglês entre falantes de línguas nativas diferentes, para os quais o
inglês é o idioma de comunicação escolhido e, geralmente, a única opção”25 . Também nos
apoiamos em Jenkins (2007, p. 2) que compreende o ILF “[...] como uma língua em
desenvolvimento que existe por mérito próprio e está sendo descrita em seus próprios termos,
e não em comparação com o ILN”26 (ênfase da autora).
Em face dessa perspectiva, podemos dizer que o ILF é uma língua de contato que não
depende das normas dos falantes nativos; esse inglês que tem se desenvolvido mundialmente,
diz-nos Widdowson (1994, p. 385), “[...] não é da conta de nenhum falante nativo da
Inglaterra, dos Estados Unidos, ou de qualquer outro lugar”27 . Afinal, os falantes não nativos
atuam em condições diferentes, possuem propósitos diferentes, têm outros recursos
linguísticos à sua disposição e, portanto, vão, naturalmente, utilizar a língua de formas
diferentes (SEIDLHOFER, 2011). Como resultado, Seidlhofer (2011, p. 65) observa que
“[n]ão é o inglês dos falantes nativos que tem se tornado dominante por ser adotado
mundialmente, [...] mas o inglês „em sua nova forma global‟”28 . Para perceber melhor a
natureza da LI no quadro de interações internacionais, Assis-Peterson e Cox (2007, p.8)
explicam que
23
ELF interactions are defined as interactions between members of two or more different linguacultures in
English, for none of whom English is the mother tongue.
24
[…] contact language” between persons who share neither a common native tongue nor a common (national)
culture, and for whom English is the chosen foreign language of communication.
25
[...] use of English among speakers of different first languages for whom English is the communicative
medium of choice, and often the only option.
26
“[…] an emerging language that exists in its own right and is being described in its own terms rather than by
comparison with ENL.”
27
[…] is no business whatever of native speakers in England, the United States, or anywhere else.
28
It is not native-speaker English that has become dominant by being adopted worldwide, [...] but English „in its
new global form‟.
54
O privilégio do inglês hoje até pode ter sua origem vinculada ao
imperialismo americano, mas esse fato torna-se secundário. Mundializado,
ele se desprende de suas raízes e ganha existência própria como idioma
desterritorializado, apto a ser camaleonicamente apropriado, re-significado,
re-entoado por falantes de diferentes línguas maternas [...].
Uma consideração relevante a fazer nesse ponto é que muito embora a LI se apresente
heterogênea e mestiçada, os falantes ao redor do mundo conseguem se comunicar
eficazmente, pois são auxiliados por estratégias sociolinguísticas, pragmáticas e discursivas
de negociação (CANAGARAJAH, 2006). Cogo (2010) explicita que pesquisas empíricas em
torno do ILF têm evidenciado que casos de mal-entendidos são raros e que quando eles
ocorrem, desde que seja conveniente para a situação, os falantes recorrem a diferentes
estratégias para negociar o significado e acomodar as diferenças. Não podemos nos furtar de
esclarecer que o ILF é uma questão de negociação mútua que envolve esforços e ajustes de
todas as partes, ou seja, trata-se de uma via de mão dupla, em que os nativos também são
responsáveis pelo sucesso na comunicação (JENKINS 2007, 2009).
As práticas interacionais estratégicas que os falantes empregam para evitar e adequar
os problemas de entendimento, como, por exemplo, mudança de código, repetição, paráfrase,
dentre outros, fazem parte de um “trabalho proativo” que é bastante característico da
comunicação do ILF (COGO, 2010). Schmitz (2012, p. 264) confessa que o que lhe chama
particular atenção nas interações do ILF “[...] é o fato de que quando os participantes não
conseguem se entender, eles [...] tentam negociar o significado de outra maneira. Além disso,
parece que os diferentes interlocutores não corrigem uns aos outros e nem monitoram o uso
um do outro”29 . O que se nota é que os usuários do ILF exploram os recursos próprios da
língua
[...] focalizando as características de valor funcional máximo e descartando
aquelas que são supérfluas às suas necessidades comunicativas [...] ao
fazerem isso, eles se concentram apenas no que a língua tem de essencial
para torná-la mais eficiente para seus propósitos, e também projetam suas
identidades de falantes não nativos30 (SEIDLHOFER, 2011, p. 156).
Sob essa ótica, o inglês com sua função de Língua Franca é um recurso vibrante,
poderoso e versátil, cujo objetivo está centrado na comunicação, inteligibilidade, e eficiência.
29
[…] is the fact that when the participants fail to u nderstand one another, they […] attempt to negotiate
meaning in a different way. In addition, it would appear that the different interlocutors do not correct one
another or monitor the usage of one another.
30
[…] by focusing on features of maximal functional value and discarding those that are surplus to their
communicative requirement […] they can be seen as focusing on what is essential in the language to make it
more efficient for their purposes, as well as projecting their non -ENL identities.
55
Parece-nos sensato dizer, então, que os falantes não nativos devem ser vistos como usuários
legítimos da língua, que utilizam o inglês a seu próprio favor, evidenciando suas identidades
através da língua e utilizando-a de forma criativa. Para reforçar esse pensamento, Seidlhofer
(2011, p. 64) declara que “[...] ao se apropriarem da língua, os falantes não nativos não
somente a adotam, mas adaptam-na para corresponder aos seus propósitos comunicativos: o
inglês que eles utilizam não é o mesmo inglês dos falantes nativos”31 .
Nesse sentido, o que podemos ver no ILF é que a língua passa por um processo
dinâmico de adaptação e alteração para atender às mais diferentes necessidades dos falantes
em cenários distintos (SEIDLHOFER, 2011). Trata-se de uma língua que pertence a todos que
a utilizam, e que é substancialmente moldada pelos inúmeros falantes multilíngues espalhados
pelos quatro cantos do planeta (SCHMITZ, 2012). Diante desse quadro, aqueles que são
contra a adoção do paradigma do ILF temem que, sem o controle sobre a língua, a LI irá se
desintegrar e tornar-se incompreensível. Widdowson (1994, p. 385) se posiciona a respeito
desse assunto explicando que
[u]ma língua internacional tem que ser uma língua independente, mas isso
não significa que ela irá se dispersar em variedades ininteligíveis. Ela irá se
estabilizar naturalmente em um padrão que atenda às necessidades das
comunidades envolvidas. Assim, é indispensável aos interesses da
comunidade internacional como, por exemplo, os cientistas ou pessoas de
negócios, independentemente da sua língua materna, preservar um padrão
comum de Inglês, a fim de assegurar padrões de eficácia comunicativa. 32
A partir desse posicionamento, fica nítido que, mesmo em meio à diversidade, há uma
tendência natural para a padronização da língua que, ao que tudo indica, será reforçada pela
amplificação das redes de interação devido à evolução da tecnologia da informação e
telecomunicações (WIDDOWSON, 1994). Pesquisas demonstram que não há nenhuma
relação válida e direta entre a eficiência na comunicação e a adesão a um conjunto de normas
linguísticas. Pelo contrário, como aponta Dewey e Leung (2010), estudos recentes sobre o ILF
demonstram que a flexibilidade no uso de recursos linguísticos pode melhorar a eficácia e
efetividade da comunicação. Fica explícito, então, que a consciência linguística e cultural, e
31
“[...] in appropriating the language, non-native users do not simply adopt it, but adapt it to suit their
communicative purposes: their English is not the same as that of native speakers.”
32
An international language has to be an independent language. It does not follow logically, however, that the
language will disperse into mutually unintelligible varieti es. For it will naturally stabilize into standard form to
the extent required to meet the needs of the communities concerned. Thus it is clearly vital to the interests of the
international community of, for example, scientists or business people, whatever their primary language, that
they should preserve a common standard of English in order to keep up standards of communicative
effectiveness.
56
ainda, a habilidade do falante de interagir e negociar com seus interlocutores irá influenciar
muito mais na estabilização da língua do que o conhecimento das normas padrão dos falantes
nativos.
Os usos da língua em contextos de interações mediados por tecnologias digitais de
comunicação,
muitas vezes temporários e instáveis, provocam mudanças radicais na
sociedade e inevitavelmente na maneira em que concebemos comunidade, variedade, dentre
outras categorias convencionais (DEWEY; LEUNG, 2010). Por pertencerem a diferentes
comunidades linguístico-culturais, os usuários do ILF não compõem uma comunidade de fala,
como
é
convencionalmente
concebido
pela
sociolinguística,
mas
constituem
uma
“comunidade de prática”, conforme discutido em Hülmbauer et al. (2008) e também em
Seidlhofer (2011). As comunidades de prática não dependem do contato face-a-face imediato,
por isso, são formadas a nível mundial, cujos membros não compartilham uma língua nativa.
Dessa perspectiva, para atender a contingências comunicativas práticas, o ILF entra em ação
“[...] como um novo tipo emergente de variedade, criado e usado por um novo tipo emergente
de comunidade [...]”33 (HÜLMBAUER et al., 2008, p. 29).
Como visto, no atual contexto de mudança paradigmática, temos que enfrentar
inúmeros desafios conceituais que não se limitam a ideias tradicionais do que se constitui uma
língua. Contudo, consoante Seidlhofer (2011), o reconhecimento de que o mundo tem
mudado não implica necessariamente que as pessoas vão rever velhos conceitos. “Mudança e
preservação, por conseguinte, estão em constante tensão [...] Como consequência, é natural
que haja um tempo de atraso entre perceber que a mudança ocorreu e realmente fazer os
ajustes conceituais necessários”34 (SEIDLHOFER, 2011, p. 82).
No que tange ao contexto educacional, os principais argumentos apresentados por
pesquisadores do ILF, representam desafios fundamentais aos pressupostos tradicionais da
natureza do ensino e aprendizagem de LI (DEWEY; LEUNG, 2010). É sobre as implicações
cruciais que o ILF traz para as atuais práticas pedagógicas que nos deteremos a seguir.
3.3 ILF: da cena do mundo para a cena da sala de aula
A realidade da expansão do ILF tem influenciado significantemente o modo de pensar
sobre ensino, aprendizagem e avaliação. Mas essa compreensão sobre o papel global do inglês
33
[…] as a new emergent kind of variety created and used by a new emergent kind of community […]
Change and preservation are thus in constant tension [...] As a consequence, it is natural for a time -lag to
develop between realizing that change has happened and actually making the necessary conceptual adjustments.
34
57
no mundo, diz-nos Jenkins (2007), parece que até agora não tem levado a uma mudança de
atitude entre os profissionais de Ensino de Língua Inglesa (ELI)35 . A prática diária de milhões
de professores continua atada à noção de que são os falantes nativos que possuem a custódia
do inglês e, consequentemente, devem ditar o que é aceitável na língua, sem considerar quem
o utiliza, nem em quais contextos e para quais propósitos ele é utilizado. Por essa razão, o
inglês falado e ensinado nos países do Círculo em Expansão continua sendo considerado
dependente da norma, cujo nível de proficiência depende da proximidade de uma determinada
variedade do Círculo Interno (JENKINS, 2009). Sobre essa questão, Seidlhofer (2011, p. 13)
comenta que
[i]sso deixa o inglês em uma espécie de limbo, preso entre inovações no
discurso sobre o ensino da língua e uma falta de inovação em termos do
atual conteúdo da língua. Essa situação permite que o simbólico poder do
„falante nativo de inglês‟ se afirme para além de sua relevância histórica e a
ser reproduzido [...] por todas as instituições e práticas de ELI em todo o
globo.36
Essa crença de que a única variedade legítima é a variedade padrão do falante nativo é
reflexo da chamada „ideologia da língua padrão‟, que alega que uma língua padrão nacional (o
inglês dos Estados Unidos ou o inglês britânico, por exemplo) deve ser válida não apenas
dentro de um determinado país, mas também globalmente e que todas as outras formas são
consideradas desvios (SEIDLHOFER, 2011). Widdowson (1994) denota que a ideia de
padrão implica estabilidade, mas a língua é, por sua natureza, instável. Ela adapta a sua forma
para corresponder às situações de mudança, do contrário, ela perderia a sua vitalidade e seu
valor comunicativo.
As práticas equivocadas, que priorizam o ensino de regras da gramática em detrimento
do ensino contextualizado que envolve o sujeito de interlocução, são supostamente edificadas
nos pressupostos estruturalistas, “[...] em que a língua é vista primariamente como uma
entidade abstrata e socialmente desconectada”37 (DEWEY; LEUNG, 2010, p. 11). Para
Saussure (1995), a língua deve ser estudada separadamente da fala, sendo assim, separa-se o
que é social do que é individual; o que é essencial do que é acessório (SAUSSURE, 1995). O
referido autor também atesta que “é necessário colocar-se primeiramente no terreno da língua
35
English Language Teaching (ELT)
This leaves English as a subject in a kind of limbo, caught between innovations in the discourse about
teaching of the language and a lack of innovation in terms of the actual language content. This state of affairs
allows the symbolic power of „native-speaker English‟ to assert itself beyond its historical relevance, and to be
reproduced […] throughout ELT institutions and practices worldwide.
37
[…] in which language is seen primarily as an abstract, socially disconnected entity.
36
58
e tomá-la como norma de todas as outras manifestações da linguagem” (SAUSURRE, 1995,
p. 16-17).
Contudo, o uso generalizado e crescente do inglês como uma língua franca para a
comunicação global requer uma reconsideração de como a língua tem sido percebida e
ensinada. O inglês (na verdade, qualquer idioma) deve ser aprendido, não como um conjunto
de convenções fixas a serem seguidas, mas como um recurso que pode ser adaptado para fazer
sentido. Em outras palavras, para ser proficiente em uma língua, o falante deve possuí-la, e
moldá-la segundo a sua vontade, em vez de simplesmente se submeter aos ditames de sua
forma padrão (WIDDOWSON, 1994). Com vistas no exposto, Seidlhofer (2011, p. 92) afirma
que
[...] ser comunicativamente competente em inglês não pode mais ser descrito
com referência às normas do conhecimento e comportamento que são
relevantes somente a determinadas comunidades de falantes nativos. A
obediência a essas normas não é necessária nem suficiente para atender às
demandas internacionais para o uso efetivo do inglês como língua franca. 38
Para desmontar as ações centradas em modelos estruturalistas, pensamos ser útil trazer
à discussão os pensamentos de Derrida (1999). Este autor propõe a desconstrução (não
confundamos com destruição!) da noção de estrutura. Como vimos, muitas práticas delegam
ao centro a função de orientar, equilibrar e organizar a estrutura (DERRIDA, 1999). E Derrida
(1999), em determinado momento, vem abalar esse mecanismo. Nas palavras do próprio
autor,
O acontecimento de ruptura, a disrupção a que aludia ao começar, ter-se-ia
talvez produzido no momento em que a estruturalidade da estrutura deve ter
começado a ser pensada [...] Desde então deve-se sem dúvida ter começado a
pensar que não havia centro, que o centro não podia ser pensado na forma de
um sendo-presente, que o centro não tinha lugar natural, que não era um
lugar fixo mas uma função, uma espécie de não-lugar. (DERRIDA, 1999, p.
131-132)
Nesse entendimento, Derrida torce as bases do estruturalismo e propõe, conforme já
foi dito, um descentramento de sentidos já consolidados. Essa concepção, da perspectiva do
ILF, deixa claro que não é mais procedente, nem congruente com a realidade mundial
38
[…] to be communicatively competent in English can no longer be described with reference to norms of
linguistic knowledge and behavior that are relevant only to particular native -speaker communities. Conformity
to these norms is neither necessary nor sufficient to meet the international demands for the effective use of
English as a lingua franca.
59
contemporânea, acreditar que existe apenas um centro de onde todas as formas são derivadas.
Isso quer dizer que o que constitui o objetivo principal nas aulas de inglês não pode continuar
sendo determinado com referência exclusiva às normas do falante nativo. Grosso modo,
insistir na ideia de que o inglês é propriamente hegemônico significa aceitar o pressuposto de
que as qualidades intrínsecas da língua permanecem imutáveis em diferentes comunidades e
contextos de uso (SEIDLHOFER, 2011).
Para substanciar a importância das interações sociais para a prática educacional de
ensino de línguas, recorremos às concepções de Bakhtin (2010), para quem o único objeto
real e material de que nos dispomos para entender o fenômeno da linguagem humana é o
exercício da fala em sociedade. Nessa ótica, a língua é construída a partir do momento que ela
é utilizada. Diferentemente do que preconizava o estruturalismo, Bakhtin considera o
enunciado como a unidade básica para o conceito de linguagem, e não o signo. Pois o signo
faz parte de uma construção teórica que dispensa os sujeitos reais do discurso, e, em
contrapartida, o enunciado exige o estabelecimento necessário de um diálogo. Sendo a língua
concebida como enunciação, o discurso não é visto como único, mas como uma coleção
ampla de outros enunciados. Por esse prisma, Bakhtin (2010, p. 33) assinala que:
Cada signo ideológico é não apenas um reflexo, uma sombra da realidade,
mas também um fragmento material dessa realidade [...] O próprio signo e
todos os seus efeitos (todas as ações, reações e novos signos que ele gera no
meio social circundante) aparecem na experiência exterior.
Seguindo essa linha de raciocínio, é coerente afirmar que além dos aspectos formais da
língua, também devem ser explorados os aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais
presentes no contexto de enunciação. Essa proposta, inspirada nas ideias bakhtinianas,
pressupõe um ensino e aprendizagem contextualizado e sensível ao momento histórico de
vivência dos aprendizes e às relações que se estabelece com mundo e com as pessoas à sua
volta.
Contrariamente, conforme apontado acima, o inglês ainda não passou por uma
reconceitualização radical e, de forma generalizada, o ensino e aprendizagem da língua têm
sido isolado dos desenvolvimentos sociais, culturais e linguísticos do mundo real (SCHMITZ,
2012). Tem-se observado a predominância do que Seidlhofer (2004, 2011) chama de “lacuna
conceitual”39 , isto é, o ensino da língua continua tão intimamente e automaticamente baseado
no modelo de ILE que tem sido difícil abrir um espaço conceitual para o ILF. Dessa forma,
39
conceptual gap
60
em vez do reconhecimento da pluralidade, vem sendo disseminada uma visão persistente do
ILF, na qual a variação tem sido percebida como desvio das normas dos falantes nativos e
classificadas como
erros ou fossilização
(SEIDLHOFER,
2004).
No item seguinte,
rumaremos para uma discussão em torno das principais diferenças entre considerar a LI como
LE40 e como LF41 , convidando à reflexão sobre a necessidade de rediscussões do que seja
ensinar inglês.
3.3.1 Embates entre o ILE e o ILF
O ensino de ILE está, convencionalmente, ligado à noção de que o inglês é apenas
uma disciplina no currículo escolar, não se configurando uma língua de comunicação, em
virtude da crença de que seu uso é bastante limitado fora do ambiente formal da sala de aula.
Todavia, essa maneira simplificada de enxergar as circunstâncias contemporâneas em torno
do uso do Inglês nos supostos contextos de ILE não corresponde mais à realidade
sociolinguística atual e, por consequência, tornou-se indiscutivelmente antiquada. Dado que a
LI pertence a todos os falantes que a utilizam como instrumento para a comunicação
internacional, a própria palavra “estrangeira”, segundo Dewey e Leung (2010), é bastante
problemática, pois está fortemente associada a conceitos como “intrusão”, “falta de
familiaridade”, “estranheza”, e ainda ao sentido de “não pertencimento”. Assim sendo,
podemos dizer que a LI tem se distanciado funcionalmente e conceitualmente de outras
línguas estrangeiras.
A visão que está subjacente quando o inglês é concebido como LE é a de que essa
perspectiva de ensino realça a importância de aprender sobre os aspectos culturais e a
sociedade dos falantes nativos; enfatiza a centralidade da metodologia nas discussões de
aprendizagem efetiva; e também reforça a necessidade de imitar o comportamento linguístico
do falante nativo (GRADDOL, 2006). Dito de outro modo, quando o inglês é aprendido e
usado como LE, os aprendizes são estimulados a fazer o que o falante nativo faz, e são
levados a aceitar sua autoridade como distribuidores da língua (SEIDLHOFER, 2011). Diante
disso, Graddol (2006, p. 82-83) nos diz que
As abordagens do ILE, como o ensino de todas as línguas estrangeiras,
posiciona o aprendiz como um estranho, como um estrangeiro; alguém que
luta para adquirir aceitação pela comunidade alvo. A língua alvo é sempre a
40
41
Língua Estrangeira
Língua Franca
61
língua materna de outra pessoa. O aprendiz é construído como um turista
linguístico – com permissão para visitar, mas sem direitos de residência,
devendo sempre respeitar a autoridade superior dos falantes nativos. 42
Aceitar a aprendizagem dessa maneira é ideal para os aprendizes que têm especial
interesse em estudar ou emigrar para um país pertencente ao Círculo Interno ou que têm
qualquer outra aspiração pessoal para adquirir o inglês igual ao do nativo. Nesse caso, as
normas linguístico-culturais dos falantes nativos do inglês podem, de fato, ser um modelo
significativo. Visto por esse ângulo, seria completamente aceitável para o ensino de LE
preocupado com outros idiomas, harmonizar a aprendizagem de uma língua à cultura a ela
associada, já que o propósito primário da aprendizagem de uma LE é engajar-se com a sua
respectiva comunidade (SEIDLHOFER, 2011).
Por esse viés, os aprendizes estarão sempre em desvantagem, pois, como visto, o apoio
ao inglês nativo “[...] inevitavelmente privilegia os seus falantes e desempodera todos os
outros usuários”43 (SEIDLHOFER, 2011, p. 55). Fica evidente, então, que esse modelo tem
evoluído para produzir um aparente fracasso, cujos aprendizes, segundo Jenkins (2007), são
vistos como falantes de uma interlíngua (se a aprendizagem continua) ou falantes de uma
língua fossilizada (se a aprendizagem já está concretizada).
No entanto, o que deve ficar patente é que este é um contexto bastante diferente
daquele em que os pesquisadores do ILF estão investigando. Os proponentes do ILF sugerem
que o inglês deve ser ensinado e avaliado conforme as necessidades e aspirações de um
número cada vez maior de falantes não nativos que utilizam o inglês para se comunicar com
outros não nativos (GRADDOL, 2006, p. 87). Assim, as normas da língua são estabelecidas
durante as interações e são reguladas pelas próprias exigências interacionais, em vez de serem
relacionadas ao que é correto ou apropriado sob o ponto de vista dos falantes nativos. Nessas
circunstâncias, conforme aponta Seidlhofer (2011), seria contraproducente para o processo
interacional, até mesmo absurdo em muitos casos, aderir às normas da língua e cultura do
ILN, quando nenhum nativo sequer se faz presente.
Faz-se oportuno assinalar, então, que, da perspectiva do ILF, em contraposição com o
ensino do ILE (ver quadro 4), a “inteligibilidade” é mais importante do que a “precisão” em
termos do padrão nativo; os conceitos de “natividade” e “autenticidade” são substituídos por
42
EFL approaches, like all foreign languages teaching, positions the learner as an outsider, as a foreigner; one
who struggles to attain acceptance by the target community. The target language is always someone else‟s
mother tongue. The learner is constructed as a linguistic tourist – allowed to visit, but without rights of
residence and required always to respect the superior authority of native speakers.
43
[…] inevitably privileges its speakers and disempowers all other users.
62
“práticas locais” e “relevância”; o conceito “repertório linguístico” torna-se mais elementar do
que “língua alvo”; a palavra “correção” dá lugar à “negociação”; e a aplicação de “regras
gramaticais”
se
torna
menos
eficaz
do
que
o
desenvolvimento
da
“consciência
metalinguística” (HÜLMBAUER et al., 2008).
Quadro 4. Contrastes entre ILE x ILF
ILE
Nativa, geralmente americana ou
britânica
ILF
Foco na inteligibilidade
internacional, mais do que uma
variedade específica
preexistentes
negociadas
Objetivos
Integração na comunidade de
falantes nativos
Inteligibilidade, comunicação
com falantes não nativos de
outros países
Processos
Imitação, adoção
Acomodação, adaptação
Motivação dos alunos
Mista, geralmente pouca
motivação
Geralmente instrumental
Habilidade dos professores
Proficiente, treinado em
metodologia
Ambiente de aprendizagem
Foco na sala de aula
Variedade
Normas linguístico-culturais
Bilíngue, com conhecimento
para compartilhar a experiência
de aprendizagem
A sala de aula é um contexto
importante, mas não suficiente
Fonte: Graddol (2006, p. 90-91); Seidlhofer (2011, p. 18)
Em vista do que foi discutido até aqui, percebe-se que o ILF e o ILE são dois
fenômenos distintos orientados por necessidades e interesses bastante diferentes. Com o fim
de sumarizar essa discussão, Jenkins, Cogo e Dewey (2011) tecem alguns comentários em
torno de tais diferenças: a) o ILF faz parte do paradigma dos ingleses globais, cujas
variedades, tanto nativa quanto não nativa, são igualmente aceitas. Em contrapartida, o ILE
pertence ao paradigma das línguas modernas, cujo objetivo é se aproximar ao máximo da
variedade nativa; b) da perspectiva do ILF, o distanciamento das normas do ILN é visto como
uma característica potencial e emergente a ser explorada. Da perspectiva do ILE, ao contrário,
tal distanciamento é visto como sinal de incompetência; c) o ILF é sustentado pelas teorias de
contato e evolução da língua, enquanto o ILE se sustenta em teorias de interferência e
fossilização da L1; e d) sob a ótica do ILF, a mudança de código é considerada um recurso
pragmático bilíngue crucial na comunicação, já para o ILE ela é considerada como uma
63
evidência lacunar no conhecimento dos falantes não nativos do inglês. Os autores avançam
dizendo que
Do ponto de vista do ILF, então, uma vez que os falantes não nativos não são
mais aprendizes de Inglês, eles não são os 'falantes nativos fracassados' do
ILE, mas – ao invés disso – comunicadores altamente qualificados que
fazem uso de seus recursos multilíngues, recursos estes que não estão
disponíveis para os falantes monolíngues do inglês, e que priorizam a
comunicação bem sucedida em detrimento de noções reduzidas de
„correção‟[...]44 (JENKINS; COGO; DEWEY, 2011, p. 284).
Porém, para que o ILF seja reconhecido como uma variante legítima e não como um
código linguístico deficiente, é necessário que ele esteja bem fundamentado em descrições
empíricas (HÜLMBAUER et al., 2008). Passos consideráveis nessa direção têm sido dados
por inúmeros trabalhos descritivos que abarcam vários aspectos do ILF e buscam fornecer
evidências de como os repertórios linguísticos funcionam como meio eficiente para a
comunicação internacional.
É provável que o maior, mais avançado e mais conhecido projeto de pesquisa sobre o
ILF, seja o Vienna-Oxford International Corpus of English (VOICE), que consiste em “um
corpus computadorizado de gravações e transcrições de áudio de interações orais em língua
franca”45 (SEIDLHOFER, 2011, p. 23). Este projeto, conduzido pela pesquisadora Barbara
Seidlhofer46 , propõe estabelecer uma base empírica sólida para a investigação do fenômeno do
ILF (GRADDOL, 2006). Embora o VOICE seja um corpus que visa fornecer base para
qualquer tipo de pesquisa relacionada ao ILF, o foco principal tem-se concentrado na léxicogramática, supostamente por ser um tópico de extrema importância para a pedagogia de
línguas (SEIDLHOFER, 2004).
O segundo principal corpus do ILF, o English as a Lingua Franca in Academic
Settings (ELFA), foi lançado dois anos depois do VOICE sob a coordenação de Anna
Mauranen na Universidade de Helsinki, Finlândia (JENKINS; COGO; DEWEY, 2011). De
acordo com Seidlhofer (2004, p. 222), essa compilação “[...] busca capturar interações orais
entre falantes de diferentes L1s, na maioria dos casos europeus, em programas de certificação
internacional e em outras atividades da universidade que são regularmente realizadas em
44
From an ELF perspective, then, once NNSEs [non-native speakers] are no longer learners of English, they
are not the „failed native speakers‟ of EFL, but – more often – highly skilled communicators who make use of
their multilingual resources in ways not available to monolingual NSEs [native speakers], and who are found to
prioritize successful communication over narrow notions of „correctness‟ [… ]
45
[…]a computer corpus of audio recordings and transcriptions of spoken ELF interactions.
46
Professora de inglês e Linguística Aplicada na Universidade de Viena.
64
inglês”47 . Vale ressaltar também que mais recentemente, em Hong Kong, Andy Kirkpatrick
começou a coordenar outro corpus potencialmente importante, o Asian Corpus of English
(ACE). Esse corpus reúne dados de várias partes da Ásia oriental onde o inglês é usado como
língua franca entre falantes multilíngues (JENKINS; COGO; DEWEY, 2011).
No nível fonológico, Jennifer Jenkins48 propõe o Lingua Franca Core (LFC), uma
espécie de núcleo linguístico que visa identificar as regularidades que obstruem – e aquelas
que não obstruem – a inteligibilidade da pronúncia quando o inglês é utilizado em contextos
de língua franca (SEIDLHOFER, 2004). Com o LFC, argumenta Jenkins (2007), muitos dos
“erros” que são considerados alvo de correção, passariam a ser vistos como características
autênticas do sotaque dos falantes não nativos. Sendo assim, os aprendizes interessados no
ILF poupariam esforços e não perderiam tempo de aula com aspectos que não se configuram
obstáculo para o sucesso comunicativo, pois o foco pedagógico estaria voltado para os itens
que são essenciais em termos de pronúncia inteligível. É válido notar que o LFC não é um
modelo de pronúncia e sim uma série de orientações, que, por sinal, ainda requer maiores
evidências empíricas (JENKINS; COGO; DEWEY, 2011).
Uma vez que as formas e os usos não convencionais dos falantes não nativos têm sido
substanciados pelo trabalho descritivo, surge a necessidade de reconsiderar radicalmente as
práticas de ensino e avaliação da LI. Com vistas nesse escopo, na seção que segue,
apresentaremos indicações de como as abordagens do ILE devem ser alteradas e o que deve
ser priorizado no ensino e aprendizagem do ILF como o melhor investimento pedagógico.
3.3.2 Novas prioridades para o ensino e aprendizagem de LI
Como vimos discutindo, para atender à comunidade global, o inglês passou a ter novos
papéis e variadas funções que têm gerado inúmeros questionamentos em torno dos princípios
e da prática convencional do ELI. Consoante Jenkins, Cogo e Dewey (2011, p. 305), as
implicações pedagógicas do ILF incluem, essencialmente, “[...] a natureza do PROGRAMA
DE ENSINO, MATERIAIS DE ENSINO, ABORDAGENS e MÉTODOS, AVALIAÇÃO
DA LI, e, por fim, a BASE DE CONHECIMENTO dos professores”49 (destaques dos
autores).
47
[…] seeks to capture spoken interactions among speakers of different, mostly European, L1s in international
degree programs and other university activities regularly carried out in English.
48
Professora de Língua Inglesa na Universidade de Southampton.
49
[…] the nature of the LANGUAGE SYLLABUS, TEACHING MATERIALS, APPROACHES and METHODS,
LANGUAGE ASSESSMENT and ultimately the KNOWLEDGE BASE of language teachers.
65
A variabilidade dinâmica do ILF requer uma pedagogia informada por uma teoria de
ensino e aprendizagem que seja suficientemente capaz de dar conta dessa diversidade, por
conseguinte, os objetivos e abordagens de ensino devem ser inadiavelmente repensados
(MCKAY, 2002). De acordo com McKay (2002, p. 129), “[o] conceito de pensar globalmente
e agir localmente é altamente relevante [...]”50 e traz consigo três pressupostos que devem ser
ponderados: a) a natureza transcultural do uso do inglês em comunidades multilíngues; b) a
descentralização dos modelos do falante nativo; e c) o reconhecimento das variedades do
inglês resultantes da expansão global da língua.
Tendo delineado tais pressupostos, McKay (2002) sugere os seguintes objetivos
pedagógicos: a) garantir a inteligibilidade em vez de insistir na correção, o foco deve ser
direcionado aos padrões particulares de pronúncia, gramática e inovações lexicais que causam
problemas na comunicação; b) ajudar os aprendizes a desenvolver estratégias que estimulem o
respeito nas relações com falantes de outras culturas, sendo necessário enfatizar que regras
pragmáticas variam transculturalmente e devem ser mutuamente acomodadas; c) promover a
competência textual, ou seja, desenvolver habilidades de leitura e escrita para fins
selecionados pelos aprendizes.
Quanto às abordagens de ensino, McKay (2002) pontua que é indispensável ser
culturalmente sensível à polifonia dos contextos em que o inglês é ensinado e utilizado. Isso
sugere que o uso predominante dos conteúdos culturais ocidentais nos materiais didáticos
deve ser contestado. Igualmente indispensável é a necessidade de respeitar a cultura local de
aprendizagem que, por sua vez, depende de uma análise minuciosa de cada uma das salas de
aula em particular (uma discussão mais aprofundada sobre a dimensão cultural no ensino de
LI será apresentada no capítulo 4). Semelhantemente, Siqueira (2011a, p. 90) ressalta que
Ensinar ILF requer uma visita diária a várias fronteiras, elegendo-se novas
prioridades, dentre as quais, as pedagogias mais adequadas para tal
realidade. Afloram, assim, desafios importantes como o modelo a ser usado
nas nossas salas de aula, o lugar da cultura e, por conseguinte, o
desenvolvimento da competência comunicativa intercultural dos aprendizes
[...].
Esse paradigma de ensino mais condizente com a realidade plural atual, como uma
questão de princípio, deve estar centrado no aprendiz, libertando-os de um confinamento
rigoroso à conformidade das normas dos falantes nativos, empoderando-os a se apropriarem
da língua, e, finalmente, encorajando-os a terem iniciativa e autonomia (SEIDLHOFER,
50
The concept of thinking globally but acting locally is highly relevant […]
66
2011). Para tanto, Jenkins, Cogo e Dewey (2011) informam que é imperativo fornecer
oportunidades para os aprendizes desenvolverem a capacidade de adaptar, negociar e mediar a
comunicação de forma dinâmica em qualquer contexto que seja significativo para as suas
necessidades individuais.
As decisões que os professores vão tomar, nos lembra Seidlhofer (2011), serão sempre
um problema local. Cabe aos profissionais de ELI decidirem os aspectos da língua que devem
ser selecionados e como devem ser apresentados, de forma a ativar o processo de
aprendizagem. Tendo em vista que o modelo de instrução adequado depende da familiaridade
com a realidade do aprendiz, os professores não nativos tem uma clara e decisiva vantagem
sobre os professores nativos, pois aqueles sabem o que é apropriado em contextos específicos
de
aprendizagem
e
podem
representar
modelos
relevantes
para
os
aprendizes
(WIDDOWSON, 1994).
Outra particularidade de valor singular a ser registrada é que o professor precisa
enxergar os aprendizes como pessoas que cresceram no contexto de uma cultura diferente
daquela dos falantes nativos da LI. Além disso, é preciso estar atento às diferenças e
similaridades que podem existir entre a L1 e a língua alvo (JENKINS, 2007). A experiência
linguística prévia dos aprendizes possui um papel preponderante na aprendizagem da LI, pois
a L1 ajuda a naturalizar a nova língua e age contra a “estrangeiridade”, levando os aprendizes
a apropriar-se da língua como um recurso comunicativo. Desse modo, vale frisar, não é a
obediência às formas linguísticas que devem ser focalizadas no processo de aprendizagem,
mas como essas formas efetivamente funcionam na comunicação (SEIDLHOFER, 2011).
Entende-se com isso que
[...] o que é crucial não é tanto que língua é apresentada como input, mas o
que os aprendizes fazem dessa língua e como eles a utilizam para
desenvolver a capacidade de expressar-se. A importância pedagógica da
perspectiva do ILF é que ela muda o foco de atenção para o aprendiz e para
o processo de aprendizagem [...] um entendimento do ILF não conduz à
especificação de como deve ser o conteúdo da língua (embora isso possa
sugerir alguma adaptação de prioridades), mas à necessidade de uma
mudança na atitude do professor. E isso, em contrapartida, provavelmente
mudaria a própria atitude dos aprendizes [...]51 (SEIDLHOFER, 2011, p.
198-199).
51
[…] what is crucial is not so much what language is presented as input but what learners make of it, and how
they make use of it to develop the capability for languaging. The pedagogic significance of an ELF perspective is
that it shifts the focus of attention to the learner and the learning process […] an understanding of ELF leads
not to the specification of ELF-like language content (although it might suggest some adaptation of priorities),
but to the need for a change in teacher attitude. And this, in turn, would of course be likely to change the
learners‟ own attitude […]
67
Podemos afirmar, então, que os falantes do ILF não devem ser considerados simples
aprendizes, mas, fundamentalmente, usuários da língua, cujo principal interesse não é a
correção formal, mas a efetividade funcional (HÜLMBAUER et al., 2008). Contudo, é
comum supor que primeiro a língua deve ser aprendida para depois ser utilizada. Outro
equívoco comum consiste em acreditar que se a língua não é aprendida de forma apropriada,
ela não pode ser utilizada de forma eficiente. Com os falantes do ILF, ao contrário do que se
pensa, uso e aprendizagem são processos simultâneos; ou seja, a língua é aprendida na medida
em que se faz uso dela, e ao utilizá-la em seus próprios termos, os falantes naturalmente
desenvolvem a capacidade de aprender ainda mais (SEIDLHOFER, 2011). Sob esse ponto de
vista, “[...] o inglês dos falantes nativos é somente uma forma, e não a única forma, de jogar o
jogo da língua inglesa[...]”52 (SEIDLHOFER, 2011, p. 119); logo, jogar o jogo de uma forma
diferente não pode ser considerado um erro, mas uma evidência de aprendizagem bem
sucedida.
É primordial que se entenda que o objetivo dos pesquisadores do ILF não consiste em
propor um modelo alternativo de inglês, muito menos uma versão monolítica da língua que
deve ser transplantada para todas as salas de aula. Quanto a esse assunto, Jenkins, Cogo e
Dewey (2011) esclarecem que um propósito central da pesquisa em torno do ILF é
sensibilizar professores e alunos acerca da natureza heterogênea da LI. Os autores
intensificam essa ideia, declarando que a pesquisa do ILF não pretende determinar
[...] o que deve e o que não deve ser ensinado na sala de aula de língua. Ao
invés disso, os pesquisadores do ILF sentem-se na responsabilidade de
disponibilizar estudos atuais que possibilitem aos professores
reconsiderarem suas crenças e práticas e tomarem decisões mais informadas
sobre o sentido do ILF em seus próprios contextos de ensino53 (JENKINS;
COGO; DEWEY, 2011, p. 306).
Diante do exposto, fica evidente que as investigações sobre o paradigma do ILF
buscam descrever e melhor compreender esse fenômeno emergente que tem se tornado tão
notável em nosso mundo globalizado. Reconhecer a natureza plural e complexa da LI em uso
é um passo elementar para pensar como as práticas tradicionais podem ser revisadas e
reconstituídas.
52
[...] ENL is only one way, not the only way, of playing the English language game […]
[…] what should or should not be taught in the language classroom. Rather, ELF researchers feel their
responsibility is to make current research findings accessible in a way that enables teachers to reconsider their
beliefs and practices and make informed decisions about the significance of ELF for their own individual
teaching contexts.
53
68
Não podemos perder de vista que as formas de avaliação da língua também devem
alterar-se substancialmente, para que a proposta firmada nos preceitos do ILF, que os
professores e alunos venham a abraçar, encontre respaldo nos alvos estabelecidos pelas
principais bancas examinadoras (JENKINS, 2006b). É sobre essa questão que discutiremos a
seguir.
3.3.3 A questão dos sistemas avaliativos de LI
A irrelevância dos modelos dos falantes nativos para a maioria dos usuários da LI tem
suscitado questionamentos em torno da maneira como as normas linguísticas são avaliadas em
testes de LI. Os exames de ELI, a exemplo do TOEIC (Test of English for International
Communication), IELTS (International English Language Testing System), dentre outros, são
internacionais, como os próprios nomes sugerem, não no sentido de refletirem as diferentes
formas do inglês ao redor do mundo, mas no sentido de serem administrados/ comercializados
internacionalmente. Afinal, diz-nos Jenkins (2006b), não há nada de internacional em
priorizar o conhecimento de apenas duas variedades da língua, cujos membros se limitam à
pequena minoria de falantes nativos de inglês, dentre os múltiplos ingleses mundiais.
O que se percebe em tais testes é a noção predominante de LE que está ligada à
suposição de que os candidatos aprendem a língua no intuito de se comunicar com os falantes
nativos, muitas vezes com propósitos acadêmicos. Assim, qualquer forma que se distancie dos
parâmetros da variedade padrão é vista como erro. Segundo as acepções de Jenkins (2007), o
sério equívoco consiste em não levar em conta que grande parte dos estudantes universitários
em ambientes acadêmicos, tanto em países do círculo em expansão como do círculo interno,
são falantes das variedades do ILF e não do ILE ou do ILN. Logo, parece não haver nenhuma
boa razão para permanecer avaliando os aprendizes conforme as normas acadêmicas do ILN
para que eles estejam aptos a se ingressar nos estudos.
Contrariamente às mudanças almejadas, a proficiência no uso da LI continua
intimamente ligada às normas dos falantes nativos. Isso implica dizer que quanto mais os
aprendizes se aproximam desse ponto de referência mais eles são considerados proficientes.
Partindo dessa premissa, sobressaltam três componentes essenciais para a aquisição de L2: a)
complexidade – definida da perspectiva do sistema da L2; b) precisão – habilidade de
produzir discurso livre de erros; e c) fluência – habilidade de processar a L2 com a mesma
rapidez do nativo. Como se pode notar, todos esses elementos estão voltados para o
69
desenvolvimento da proficiência relacionada aos padrões nativos, e não para a proficiência
comunicativa propriamente dita (SEIDLHOFER, 2011).
Essa visão de proficiência que, como vimos, também é prevalente nos parâmetros de
avaliação, tornou-se totalmente inconsistente frente à diversidade declarada do inglês. Com
base nessa constatação, Hall (2014) aponta para uma orientação pluralística 54 nos testes de LI
que consiste em avaliar, independentemente do critério linguístico, o efeito dos recursos que
os aprendizes desenvolvem, já que o que é apropriado pelos falantes não nativos é
qualitativamente diferente dos modelos do inglês padrão. O referido autor sugere que a
avaliação passe a se concentrar naquilo que as pessoas podem fazer com a língua e não na
língua como produto (HALL, 2014).
Hall (2014) ainda esclarece que embora o seu objetivo seja convidar os professores e
avaliadores a questionar a conduta monolítica que tem sido amplamente adotada, ele não
pretende propor o abandono das variedades padrão em todas as situações de aprendizagem e
mostra-se consciente, que em muitas circunstâncias, é necessário testar o conhecimento em
torno de tais variedades. O que o autor insiste em dizer é que a apresentação dessas normas
como únicas e absolutas para o sucesso no uso do inglês não é mais pertinente.
Inquestionavelmente, o inglês que os aprendizes têm acesso diariamente não condiz
com o modelo padrão que tem sido ensinado e moldado pelos professores, livros didáticos e
avaliações. O conhecimento da LI adquirido nas mais diversas situações de uso, como, por
exemplo, nas interações online – jogos, redes sociais, fóruns de interesse especial e similares
–, na convivência em ambientes multilíngues – comunidades de migrantes, zonas turísticas, e
principais centros urbanos – pode conduzir à fluência na língua, mas não à precisão quanto ao
padrão do inglês nativo (HALL, 2014). Com respeito à avaliação, assinala Hall (2014, p.
382), “[...] a implicação é clara: testar a conformidade com o sistema [alvo] externo é
inapropriado, a menos que a precisão no padrão da língua seja um requisito para futuros
contextos de uso [...]”55 .
É provável que, em curto prazo, a conduta pluralística seja considerada impraticável
em muitas salas de aula, principalmente por causa dos direitos adquiridos pelas grandes
organizações de testes e bancas examinadoras bem como das rigorosas convenções da escrita
acadêmica (HALL, 2014). Jenkins (2007, p. 241) assim se posiciona quanto a esse aspecto:
54
Plurilithic orientation
[…] the implication is clear: testing conformity with the external system is inappropriate unless accuracy in
SE is a requirement for future contexts of use […]
55
70
[...] embora ainda não tenhamos descrições definitivas do ILF, as bancas
examinadoras poderiam tornar as suas práticas mais relevantes para a
maneira em que o inglês é falado no círculo em expansão, priorizando
habilidades de acomodação em vez de penalizar formas que já estão
emergindo como frequentes, sistemáticas e inteligíveis entre os falantes
proficientes do ILF, independentemente do fato de que elas diferem da
maneira como os falantes nativos do inglês se comunicam uns com os
outros56 .
Desse ângulo, concluímos que a proficiência a ser desenvolvida e avaliada deve ser
localmente sintonizada com as necessidades e identidades individuais dos aprendizes. Jenkins
(2006b) deixa claro que isso não significa ignorar totalmente os padrões e adotar uma postura
em que qualquer coisa seja válida. O que a autora recomenda é que sejam estabelecidos
critérios, baseados em evidências empíricas já disponíveis, para que os aprendizes possam ser
avaliados pelo desempenho na LI que seja apropriado aos seus objetivos em situações
específicas e não pelo conhecimento das normas que representam a identidade sociocultural
de pessoas em outras realidades. Embora ainda haja muita resistência em abandonar os
modelos existentes, mudanças devem começar em algum lugar, e, como bem diz Seidlhofer
(2011, p. 201), “o lugar para começar [a problematizar tais questões] é na formação inicial de
professores”.
3.3.4 O ILF e a formação inicial de professores de inglês
Todos os desenvolvimentos em torno da expansão do inglês como língua franca global
tendem a afetar a formação de professores de uma maneira decisiva (SEIDLHOFER, 2004).
Como se sabe, para que os futuros professores estejam qualificados e habilitados para exercer
com êxito a missão de ensinar uma língua que pertence a vários países, e, por consequência, a
culturas diferentes, não é mais suficiente estar bem informado sobre as suas peculiaridades
gramaticais, mas também ter consciência das variedades desta língua e de suas especificidades
culturais e contextuais. El Kadri e Gimenez (2013) salientam que discussões dessa natureza
devem ser incluídas em cursos de formação a fim de que futuros professores possam dispor de
subsídios para determinar qual a informação linguística, o conteúdo cultural, a metodologia de
ensino e os processos avaliativos que são mais propícios ao contexto local.
56
[…] although we do not yet have definitive descriptions of ELF, examination boards could still make their
practices more relevant to the ways in which most English is spo ken in the expanding circle, by prioritizing
accommodation skills and not penalizing forms that are already emerging as frequent, systematic, and
intelligible among proficient ELF speakers, regardless of the fact that they differ from the way in which NSs of
English speak to each other.
71
Apoiados em Sifakis (2014), verificamos que os maiores obstáculos para aderir aos
princípios orientadores do
ILF englobam exatamente a preponderância das práticas
estabelecidas e as fortes percepções dos principais interessados, quais sejam, os responsáveis
pelas decisões políticas, os desenvolvedores de materiais didáticos e os professores. O autor
ainda explica que integrar o ILF no contexto de ensino é gradativo por causa da resistência
característica dos professores com relação à mudança, que acontece devido a uma série de
razões que incluem “[...] a incapacidade de reconhecer a necessidade de mudança, a força do
hábito e a sensação de segurança em fazer as coisas de maneira familiar, o medo do
desconhecido, bem como as ameaças aos conhecimentos e relações de poder existentes”57
(SIFAKIS, 2014, p. 325). Jenkins (2007, p. 141) amplia essa discussão argumentando que
[...] quando o inglês padrão dos falantes nativos é posto em xeque, o que está
sendo questionado, no que tange aos professores não nativos, é o preço de
terem investido uma vida inteira trabalhando em prol de um objetivo que
sempre entenderam representar a excelência. Em contrapartida, isso significa
que suas identidades como professores, que sempre dependeram em alcançar
tais objetivos, estão ameaçadas. 58
De maneira geral, os professores não nativos são bastante inseguros e autocríticos e,
comumente, estão descontentes com o conhecimento que possuem da LI. Não obstante, o ILF
seria uma vantagem para esses professores, trabalharia a favor deles, pois serviria para
produzir um sentimento de mais segurança e convencê-los de que eles não são falantes
nativos fracassados, mas falantes multicompetentes bem sucedidos, com identidade própria de
usuários internacionais de uma língua franca (JENKINS, 2007; EL KADRI; GIMENEZ,
2013).
Ressalta-se, no entanto, que o nível de proficiência desses profissionais precisa ser
compatível com as demandas da profissão, eles não podem simplesmente apresentar qualquer
nível de desempenho na língua. Nesse sentido, El Kadri e Gimenez (2013, p. 126) afirmam
que “[...] a tarefa de ensinar inglês como língua franca se torna ainda mais complexa, por
exigir outros conhecimentos que normalmente não são abordados em cursos de formação
profissional”. Nessa perspectiva, o professor, por ser responsável por orientar as experiências
de uso da língua e conduzir todo o processo de aprendizagem, deve, consoante Kirkpatrick
57
[…] failure to recognize the need for change, the strength of habit and the sense of security from doing things
in familiar ways, a fear of the unknown, as well as perceived threats to expertise and existing power relation s.
58
[…] when standard NS English is called into question, what is being questioned, as far as NNS teachers are
concerned, is the value of having invested their lifetime in working towards a goal that they have always
understood to represent excellence. This in turn means that their identities as teachers, which have always
depended on achieving this goal, are threatened.
72
(2007), atender a alguns requisitos específicos, os quais podem ser conferidos no quadro 5 a
seguir.
Quadro 5. Requisitos para os professores de ELI e cursos de treinamento
1. Ser multilíngue e multicultural, saber a língua dos alunos e entender os contextos educacional,
social e cultural em que estão trabalhando;
2. Ser capaz de fornecer um modelo adequado e alcançável para os alunos ou, se eles falam outra
variedade, entender que a variedade local do inglês é uma variedade apropriada e bem formada, e
que, por isso mesmo, não é inferior;
3. Entender como as diferentes variedades do inglês se desenvolvem linguisticamente e como elas se
diferenciam fonologicamente, lexicalmente, gramaticalmente, retoricamente e culturalmente;
4. Entender como o inglês tem se desenvolvido em contextos específicos e como ele tem se espalhado
pelo mundo;
5. Entender o papel do inglês na comunidade e como ele se inter-relaciona com outras línguas locais;
6. Ser capaz de avaliar criticamente os materiais de ELI para assegurar que eles, explicitamente ou
implicitamente, não promovam uma variedade particular de inglês ou cultura em detrimento de
outras;
7. Ser capaz de avaliar as necessidades específicas dos alunos e traçar objetivos de ensino que
contemplem tais necessidades; e
8. Estar preparado para contribuir com a vida extracurricular da instituição em que estão trabalhando.
Fonte: Kirkpatrick (2007, p. 195)
Se os professores são profissionais reflexivos, eles devem reconsiderar os pressupostos
em que suas práticas estão baseadas e questionar as supostas soluções universais para os
problemas pedagógicos. Não cabe aos pesquisadores dizer aos professores quais decisões
devem ser tomadas, cabe aos próprios profissionais de ELI, interessados em explorar o ILF,
dar forma ao processo de integração desse paradigma através de suas próprias ações,
conforme a sua própria realidade (SIFAKIS, 2014). Dessa forma, segundo Seidlhofer (2011),
o que se pretende não é promover um paradigma pedagógico totalmente novo e superior, mas
sugerir como o entendimento do ILF pode levar a alternativas mais viáveis para o ensino de
LI. Para tanto, uma distinção bem nítida entre formação e treinamento deve ser estabelecida.
[...] ao invés de somente ser treinado em um conjunto restrito de técnicas
pré-formuladas para contextos de ensino específicos, os professores
precisarão de uma formação mais abrangente que os tornem capazes de
julgar as implicações do fenômeno do ILF para seus próprios contextos de
ensino e adaptar o ensino para as exigências particulares dos aprendizes59
(SEIDLHOFER, 2004, p. 228).
59
[…] rather than just being trained in a restricted set of pre-formulated techniques for specific teaching
contexts, teachers will need a more comprehensive education which enables them to judge the implications of the
73
Ancorado nessa problematização, Sifakis (2014) afirma que os cursos de formação
devem passar por profundas transformações e sugere a transcendência de uma perspectiva
crítica para uma orientação transformativa na formação de professores. Aqui cabe abrir um
parêntese para evidenciar as diferenças entre tais perspectivas: “[d]e maneira simplificada, a
perspectiva crítica tipicamente focaliza o mundo exterior e tenta entender e mudar o contexto.
A perspectiva transformativa olha para dentro e tenta entender e mudar o indivíduo”60
(SIFAKIS, 2014, p. 326). Dando relevo à abordagem transformativa, o autor argumenta que
esta seria uma alternativa conveniente para os desafios que se apresentam aos professores
empenhados em integrar o ILF em suas performances cotidianas, pois primeiro eles a usariam
para mudar as suas próprias convicções sobre aspectos essenciais da língua e, posteriormente,
também gerar mudanças em suas práticas pedagógicas.
Em face das ponderações apresentadas, é possível perceber nitidamente o importante
papel que os cursos de formação inicial devem desempenhar na formação de professores aptos
a desenvolver um trabalho que seja capaz de reconstruir a prática conservadora que vem
sendo desenvolvida nas aulas de LI. Todavia, para que os futuros professores decidam com
segurança sobre o que, como e por que ensinar inglês nos dias de hoje, as configurações
básicas do sistema de formação de professores devem alterar-se significativamente. A esse
respeito, Kleiman (2013, p. 56) revela que “[...] a abertura epistemológica nos programas de
graduação enfrenta enormes dificuldades devido a estruturas inflexíveis, hierarquizadas com
rígidas
fronteiras
disciplinares
guardadas,
muitas
vezes,
por
verdadeiras
fortalezas
epistemológicas, intransponíveis”.
Se o currículo não abarca a complexidade da nova realidade circundante, os futuros
professores não conseguirão estar suficientemente preparados, nem em condições de tomar
decisões sobre qual a melhor maneira de ensinar uma língua sem uma identidade nacional
definida como o inglês na atualidade. Posto isso, um movimento contínuo de reflexão-ação
sobre o arcabouço teórico com que se tem trabalhado nos cursos de Letras/Inglês é salutar
para tentar diminuir a distância entre os “[...] construtos teóricos e as raízes socioculturais dos
fenômenos linguísticos e os seus sujeitos concretos, num mundo em que as distâncias, as
ELF phenomenon for their own teaching contexts and to adapt their teaching to the particular requirements of
their learners.
60
Put simply, the critical perspective typically focuses on the outside world and attempts to understand and
change the context. The transformative perspective looks inward and attempts to understand and change the
individual.
74
noções de tempo/espaço
e de territórios
estão profundamente alteradas” (CÉSAR;
CAVALCANTI, 2007, p. 60).
Portanto, faz-se imperiosa a necessidade de uma proposta pedagógica alicerçada em
abordagens críticas e transformadoras que possam permitir o desprendimento da célebre
figura do falante nativo. A visão de língua como caleidoscópio proposta por César e
Cavalcanti (2007, p. 61) se encaixa perfeitamente no novo modelo que se pretende seguir. De
acordo com as autoras,
O caleidoscópio, sendo feito por diversos pedaços, cores, formas e
combinações, é um jogo de (im)possibilidades fortuitas e, ao mesmo tempo,
acondicionadas pelo contexto e pelos elementos [...] No caleidoscópio
formam-se desenhos complexos a partir de movimentos, de combinações.
Parece uma imagem feliz para descolar as concepções de língua das
concepções de nação e território estabilizadas politicamente e de níveis
hierárquicos, num caso e num outro, totalidades que se mantêm como
“grande narrativa”, justamente por conta de um arcabouço teórico
anacrônico.
Enfim, o que se propõe é que os cursos de formação inicial preparem os profissionais
de ensino com uma visão mais flexível da língua, e os tornem capazes de compreender,
teorizar e incorporar na prática a atual diversidade da LI (DEWEY, 2007). Esse pode ser um
caminho para que professores em formação transitem com mais propriedade entre os critérios
que configuram os ambientes linguísticos, levando-os a obter maiores condições de trabalhar
com a dicotomia homogeneidade versus heterogeneidade, estabelecer uma aliança antihegemônica e antiexcludente em seu futuro campo de trabalho, e, finalmente, vislumbrar
maneiras de fazer prosperar uma prática que atenda às exigências que se apresentam.
Concluídas essas reflexões sobre o protagonismo do inglês na cena mundial e suas
implicações pedagógicas para a cena da sala de aula, no próximo capítulo, será constituída
uma discussão teórica em torno de outra força que emerge das relações empreendidas entre os
indivíduos na nova era globalizada: a interculturalidade. As proposições e posicionamentos
teóricos que serão apresentados se fazem úteis no sentido de ampliar o entendimento acerca
do papel da cultura no âmbito de ensino do ILF, da importância do desenvolvimento da
competência intercultural dos aprendizes e da necessidade de incluir a perspectiva
intercultural nas práticas pedagógicas e, sobretudo, nos currículos de formação de professores.
75
CAPÍTULO 4 – A DIMENSÃO CULTURAL NO CONTEXTO DE ENSINO DE LI
Os conceitos básicos consagrados relativos à língua, cultura e identidade não mais
conseguem corresponder à realidade marcada por novos fenômenos e tendências irreversíveis
como a globalização. Levando isso em conta, faremos, neste capítulo, uma breve reflexão da
imbricação existente entre tais concepções e discutiremos como elas devem ser caracterizadas
nas instâncias de interação intercultural no contexto em que o inglês é usado como língua
franca global. Além disso, também serão postos em discussão a reorientação dos objetivos do
ensino de cultura que implica na mudança de ênfase da competência comunicativa para a
competência intercultural, bem como os novos desafios para os professores interculturalistas.
4.1 Língua, cultura e identidade na comunicação intercultural do inglês
A capacidade que o ser humano possui de se comunicar uns com os outros por meio da
linguagem é talvez a principal característica que o distingue das outras espécies (LEFFA,
2001). Não é por acaso que inúmeros estudos em torno dessa habilidade humana têm sido
empreendidos desde a antiguidade pelas Ciências Humanas e Sociais e também pelas Ciências
Naturais. Conforme Kramsch (1998), a língua é o meio principal pelo qual conduzimos
nossas vidas sociais. Através dela, os indivíduos expressam suas identidades culturais,
valores, crenças, ideias e opiniões. Nessa lógica, a cultura e a identidade são co-construídas,
negociadas e transformadas o tempo todo por meio da língua.
O termo “cultura” tem sido discutido e explorado diferentemente em várias áreas do
conhecimento e tem sofrido constantes alterações ao longo do tempo. Com isso, podemos
pressupor que as definições de cultura são tão numerosas quanto os estudiosos que com ela
lidam (OLIVEIRA, 2007). Sabidamente, a cultura é parte fundamental dos indivíduos, de
como eles interagem e se comunicam, mas ainda assim é difícil dizer como ela se define e o
que ela significa para os sujeitos. Por isso mesmo, a sua definição vai depender de interesses,
objetivos e teorias específicas.
Neste trabalho, afiliamo-nos à definição de cultura de Arvizu, Snyder e Spinoza (1980,
apud AGULEDO, 2007, p. 188), por estar devidamente alinhada aos princípios da
comunicação intercultural. Na visão dos autores, “[c]ultura é um processo dinâmico, criativo e
contínuo que inclui comportamentos, valores e elementos aprendidos e compartilhados que
76
guiam as pessoas na sua luta pela sobrevivência e que dá significado as suas vidas”61 . A partir
dessa concepção, invalidamos todas aquelas que interpretam a cultura como um construto
fixo, monolítico, completo.
Evidentemente, os conceitos mais fluidos de língua e cultura são mais relevantes e
apropriados para o cenário em que os indivíduos utilizam a LI para interagir em contextos
socioculturais plurais. Nesse sentido, a correlação simplista, salvaguardada pelos princípios
modernistas, entre uma nação, uma língua e uma cultura é firmemente rejeitada por teorias
críticas que tentam entender as identidades linguísticas e culturais complexas e heterogêneas
nas sociedades globalizadas modernas (KRAMSCH, 2013). As perspectivas críticas pósmodernistas merecem destaque porque reconhecem que as línguas são continuamente
adaptadas e modeladas de acordo com as necessidades locais, influências globais e exigências
para a comunicação entre culturas (BAKER, 2009). Como aponta Kramsch (2013, p. 68),
Uma definição pós-modernista de cultura tenta dar conta dessas novas
realidades. Se a cultura não está mais ligada ao território de um estado-nação
e a sua história, então nós temos que enxergá-la como um processo
discursivo dinâmico, construído e reconstruído de várias formas por
indivíduos engajados em lutas pelo significado simbólico e pelo controle de
subjetividades e interpretações da história 62 .
Alinhada a essa tendência, Kramsch (1993) teoriza que a comunicação na L2 acontece
em um “terceiro espaço”, ou seja, no interstício entre a língua-cultura materna dos usuários e
a língua-cultura alvo. Para exemplificar, ela diz que pelo mundo há um número crescente de
pessoas culturalmente desacomodadas, que tendo emigrado para outro país, não se sentem
mais pertencentes à cultura original nem tampouco à cultura anfitriã (KRAMSCH, 1993). Sob
essa ótica, a autora declina a ideia de que haja uma “cultura alvo” homogênea com a qual a
língua possa ser conectada e sugere que o uso da língua esteja relacionado a contextos
culturais múltiplos, em que a cultura é uma característica emergente da comunicação e não
um construto definido.
Assim como a cultura, o conceito de identidade também precisa ser entendido “como
algo dinâmico, complexo, multifacetado e contraditório ao longo do tempo e do espaço”
61
Culture is a dynamic, creative, and continuous process including behaviors, values and substance learned and
shared by people that guides them in their struggle for survival and gives meaning to their lives.
62
A postmodernist definition of culture attempts to account for these new realities. If culture is no longer bound
to the territory of a nation-state and its history, then we have to see it as a dynamic discursive process,
constructed and reconstructed in various ways by individuals engaged in struggles for symbolic meaning and for
the control of subjectivities and interpretations of history.
77
(OLIVEIRA, 2007, p. 48). Hall (2006) propõe três concepções de identidade, tomando por
base conceitos distintos de sujeito: a primeira é a concepção baseada no sujeito unificado do
Iluminismo, cujo centro essencial do eu era a identidade fixa do indivíduo; a segunda consiste
na concepção de identidade do sujeito sociológico que não mais vê o indivíduo como
autossuficiente, mas sim formado na interação entre o eu e a sociedade. Vale dizer que, como
consequência dessa concepção, o próprio processo de identificação através do qual as
identidades culturais são projetadas, tornou-se mais provisório, variável e problemático; por
fim, a terceira concepção é a do sujeito pós-moderno que assume identidades diferentes à
medida que se vê diante de situações e representações culturais diferentes.
Frente ao caráter híbrido presente nas composições culturais e mesmo na própria
interioridade humana, Hall (2006, p. 13) é contundente ao postular que “[a] identidade
plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia”. Em concordância com
esse pensamento, Oliveira (2007, p. 36) reitera que
[a identidade] está continuamente em estado de transformação e sendo
reconstruída a cada momento, na medida em que o indivíduo encontra novos
valores, novas formas de ver o mundo em cada pessoa que conversa, em
cada livro que lê, ou a cada nova língua que aprende. Isto não quer dizer que
não temos uma identidade, mas que a nossa identidade não pode ser
interpretada de forma monolítica, como algo definido e imutável.
Nos termos apontados, verifica-se que a identidade é delineada na interação societária
com o outro, ou seja, a formação identitária do indivíduo é influenciada pela negociação de
significados e experiências com participantes de uma comunidade social, cultural e histórica
(BAKER, 2009). Contudo, nos diversos cenários socioculturais de comunicação intercultural
em que a LI é protagonista, essa relação se encontra cada vez mais paradoxal, pois, conforme
discutido no capítulo anterior, uma língua franca como o inglês não enxerga fronteiras
nacionais e contesta a noção de comunidades de fala perfeitamente delimitadas (KRAMSCH,
2013).
Desse modo, os interlocutores devem ser capazes de se envolver em uma comunicação
como seres humanos complexos, com múltiplas identidades e individualidade própria, e
devem ser vistos como indivíduos cujas qualidades devem ser descorbertas, ao invés de serem
vistos como estereótipos das culturas que representam (BYRAM et al., 2002). Seguindo essa
linha, Maher nos lembra que
A modernidade nos fornecia conceitos teóricos acabados, inertes,
encapsulados e, por isso mesmo, confortáveis, seguros: deles derivávamos
78
“certezas” que nos ofereciam sabores de verdade. A pós-modernidade, no
entanto, nos força a ter que sair desses casulos teóricos de modo a enfrentar a
turbulência provocada por comportamentos sociolinguísticos fluídos e a
acomodar o inesperado e o movimento que a compreensão do mundo atual
exige. (MAHER, 2007, p. 91)
Em vista do exposto, somos compelidos a levar essa discussão para o contexto de
ensino de LI, cujo componente cultural reclama desconstrução e reconstituição. Assim, para
dar conta da diversidade existente nas dimensões linguísticas e socioculturais dos sujeitos, a
perspectiva intercultural de ensino torna-se uma alternativa relevante e viável.
4.2 A perspectiva intercultural no ensino de LI
Embora seja inconteste o fato de que o panorama geopolítico e os avanços
tecnológicos tenham mudado a natureza e o papel da cultura no ensino de línguas, é inegável
que o componente cultural continua sendo estudado e ensinado por um viés modernista nas
salas de aula de LI (KRAMSCH, 2013). O que se observa são abordagens culturais
inexpressivas que, assim como os aspectos linguísticos, tendem a priorizar os modelos
provenientes dos países dominantes, ostentando conteúdos quase sempre irrelevantes para os
contextos locais. Siqueira (2011b, p. 350) certifica que em muitas salas de língua estrangeira,
tem-se focalizado “[...] não só os modelos linguísticos e comunicativos a serem repetidos e
copiados à exaustão, mas também as crenças, os valores, costumes, modos de vida,
comportamentos [...]” das sociedades em que a língua figura como idioma nativo.
Tais práticas pedagógicas homogeneizantes devem ser reavaliadas, pois não mais
correspondem à nova dinâmica mundial marcada pela consolidação do Inglês como Língua
Franca (ILF). Mckay (2002) menciona as seguintes razões para justificar o porquê que as
questões culturais voltadas para o ensino de inglês se complexificaram: a) como o inglês hoje
é uma língua desnacionalizada, o seu uso não está mais ligado à cultura dos países
pertencentes ao Círculo Interno, ou seja, aos países que possuem o inglês como língua nativa
ou materna; b) como língua de uso local, o inglês insere-se na cultura do país em que está
sendo utilizado; e c) em seu sentido global, uma das funções primárias do inglês consiste em
autorizar os falantes a compartilharem suas ideias e culturas por meio do diálogo e interação
com o outro.
Diante disso, as reconfigurações culturais dos tempos modernos exigem novas
posturas
e
estratégias
da
parte
de
professores
e
alunos
(SIQUEIRA,
2012).
Reconhecidamente, uma das principais razões para o ensino de cultura consiste em ajudar os
79
aprendizes a interagir uns com os outros em encontros transculturais (McKAY, 2002). Para
Rajagopalan (2003, p. 70),
O destronamento da famigerada figura do falante nativo [...] significa, antes
de mais nada, que o verdadeiro propósito do ensino de línguas estrangeiras é
formar indivíduos capazes de interagir com pessoas de outras culturas e
modos de pensar e agir. Significa transformar-se em cidadãos do mundo.
Com isso em mente, Kramsch (1993) denota que é necessário estabelecer uma esfera
de interculturalidade, na qual o indivíduo deve relacionar a sua própria cultura com a cultura
do outro no processo de aprendizagem. Em outras palavras, o ensino intercultural não se
resume em transferir informações entre culturas, mas estimular a reflexão sobre a cultura alvo
e também sobre a cultura nativa. Outra linha de pensamento proposta pela autora refere-se a
ensinar a cultura como diferença. Essa noção enfatiza que as identidades nacionais não são
monolíticas, principalmente por causa da crescente multietnicidade e multiculturalidade das
sociedades contemporâneas (KRAMSCH, 1993).
Como se nota, a incorporação das relações interculturais torna-se imprescindível ao
ensino de LI que se deseja, pois visa a despertar a curiosidade dos aprendizes com relação a
outras culturas (não necessariamente hegemônicas), auxiliá-los a reconhecer que as variáveis
socioculturais afetam o estilo de vida das pessoas e que a comunicação eficiente depende da
maneira como, culturalmente condicionadas, as pessoas pensam e agem. Consoante Mendes
(2008, p. 65), “ser e agir de modo intercultural inclui a atitude de contribuir para que esse
mundo que enxergamos, com todas as suas diferenças, transforme-se, torne-se também nosso,
faça-nos os mesmos, diferentes”. Dessa maneira,
As discussões que têm sido travadas no âmbito do ensino/aprendizagem de
língua em uma perspectiva intercultural objetivam empreender uma
mudança de foco e, sobretudo, de postura, que incorpore as questões
culturais ao conjunto de práticas pedagógicas de professores [...]. Isso
significa [...] adotar a perspectiva da cultura como meio de promover a
integração e o respeito à diversidade dos povos, à diferença, permitindo ao
aprendiz encontrar-se com a outra cultura sem deixar de ser ele mesmo
(MENDES, 2007, p.119).
A autora nos dá pistas de que durante todo o processo de aprendizagem, os alunos
precisam se preparar para estarem abertos para o diálogo, trocarem experiências, respeitarem
as diferenças, bem como avaliarem constantemente as suas crenças e posturas. Nesse
pormenor, Fleuri (2003, p.17) acrescenta que “o trabalho intercultural pretende contribuir para
80
superar tanto a atitude de medo quanto a de indiferente tolerância ante o „outro‟, construindo
uma disponibilidade para a leitura positiva da pluralidade social e cultural”. Esse
comportamento é o que possibilita a vivência intercultural e propicia a articulação de
elementos que se dizem conflituosos, quais sejam, as relações entre falante nativo/falante nãonativo,
padrão/não-padrão,
dominador/dominado,
desenvolvido/subdesenvolvido,
eu/outro
(MENDES, 2008).
A abordagem intercultural, como aponta Mendes (2008), propõe aos aprendizes a
construção de um terceiro espaço (cf. KRAMSCH, 1993) que promove experiências em zonas
fronteiriças, de modo que os sujeitos não se acomodem em seu próprio lugar, mas criem um
lugar de interlocução. Todavia, não existem respostas prontas para a implementação de
iniciativas no ensino e aprendizagem intercultural, esse tipo de ação em sala de aula é
extremamente complexo e, por essa razão, requer que o planejamento didático, a estrutura e a
avaliação de todo o processo sejam constantemente monitorados (MENDES, 2007).
Em um mundo que se torna cada vez mais diversificado e imprevisível, fica patente
que o objetivo principal da perspectiva intercultural para o ensino de línguas não é a
competência do falante nativo. Para dar suporte à nossa discussão, faremos um resgate do
conceito de competência comunicativa, apresentando as suas potenciais limitações, para,
então, explorar a noção de competência comunicativa intercultural que surge para contemplar
a multiplicidade de culturas nos diversos contextos globais.
4.2.1 Resgatando o conceito de Competência Comunicativa
Para colaborar com a proposta de revisitação do conceito de competência
comunicativa, cumpre registrar que a partir do conceito de “competência” (capacidade
linguística do falante-ouvinte ideal) proposto por Chomsky, Hymes “[...] propõe uma
competência comunicativa que envolve não só um sistema de regras da língua do falante, mas
também um sistema de regras do uso da língua pelo falante” (OLIVEIRA, 2007, p. 65). Além
disso, Hymes incorpora a esse conceito a dimensão social e a noção da habilidade de usar a
língua. Tal conceito proposto por Hymes, por sua vez, foi retomado mais tarde por Canale e
Swain para ser aplicado ao ensino e aprendizagem de L2 (OLIVEIRA, 2007).
Passadas algumas décadas de sua elaboração, o modelo de Canale e Swain (1980)
continua
influenciando
enormemente
a
estrutura convencional curricular e a prática
relacionada ao ensino comunicativo de línguas em muitos contextos educacionais, e, por esse
motivo, será enfatizado nesta passagem do trabalho. A noção de competência comunicativa
81
descrita por esses autores inclui quatro componentes distintivos que podem ser verificados no
quadro 6 exposto a seguir:
Quadro 6. Os quatro componentes da Competência Comunicativa
COMPETÊNCIA
GRAMATICAL
COMPETÊNCIA
SOCIOLINGUÍSTICA
COMPETÊNCIA
DISCURSIVA
COMPETÊNCIA
ESTRATÉGICA
Domínio do código linguístico dos falantes nativos. Capacidade de
manipular as características sintáticas, lexicais, morfológicas e
fonológicas para produzir palavras e frases bem formadas. Referese à competência linguística descrita por Chomsky.
Ocupa-se das regras sociais do uso da língua, que envolve um
entendimento do contexto social na qual a língua é usada. Aqui o
contexto social refere-se ao contexto cultural específico, incluindo
as normas, valores, crenças, e padrões de comportamento de uma
cultura. O uso apropriado da língua requer atenção a esses
construtos.
Habilidade de conectar uma série de sentenças ou enunciados para
formar um todo significativo. Essas conexões são muitas vezes
implícitas: ideias são ligadas umas às outras baseadas no
conhecimento geral das palavras bem como na familiaridade de
um contexto particular.
Habilidade de cooperar em uma situação comunicativa autêntica e
manter o canal de comunicação aberto. Isso requer o
conhecimento de estratégias de comunicação que podem ser
usadas para compensar o conhecimento imperfeito das regras da
língua, ou por fatores como fadiga, falta de atenção e distração que
limitam a aplicação de tais regras.
Fonte: Canale & Swain (1980)
O modelo de competência comunicativa, exposto acima, considera que o domínio da
língua alvo seja essencial para que os aprendizes de uma língua estrangeira possam participar
integralmente da cultura alvo. Logo, os falantes nativos representam elementos cruciais para o
modelo de ensino. Não se espera dos aprendizes que eles apenas adquiram formas precisas da
língua alvo, mas também que eles saibam como utilizá-las em determinadas situações sociais
para então transmitir significados apropriados, coerentes e estrategicamente efetivos aos
falantes nativos (ALPTEKIN, 2002). Para atingir tal propósito, Alptekin63 (2002, p. 59)
constata que
No caso do inglês, por exemplo, os professores de ILE são levados a não
somente familiarizar seus alunos com características culturais da GrãBretanha, mas também aumentar sua consciência sobre a diversidade do
país, enquanto, ao mesmo tempo, ensina uma variedade padrão do inglês de
modo a não ofender os falantes nativos, e ser entendidos por eles 64 .
63
Aqui o autor traz um exemplo que retrata o contexto da Turquia (seu país de origem) que é bastante
influenciado pelo British English.
64
In the case of English, for instance, EFL teachers are asked not only to familiarize their students with the
cultural diversity of the country, while at the same time teaching a standard variety of English so as not to offend
the native speakers, and to be understood by them.
82
Como se pode observar, mesmo que o modelo de competência comunicativa mostre-se
preocupado com a adequação sociocultural e estratégias de comunicação, ele tem sido
criticado porque focaliza e reforça inutilmente o mito do falante nativo (BAKER, 2015).
Embora tenha alcançado imensa popularidade nos meios educacionais de ensino de LE, como
pontuamos, o construto sempre esteve sob olhares críticos. A seguir, serão apresentados três
argumentos que questionam a validade desse modelo pedagógico no âmbito do Ensino de
Língua Inglesa (ELI).
4.2.1.1 Limitações da Competência Comunicativa
À luz dos princípios do ILF, Alptekin (2002) indica que a noção de competência
comunicativa tem uma essência utópica, irrealista e restritiva. O autor explica que a
competência comunicativa, com suas normas padronizadas dos falantes nativos, é utópica não
somente porque o falante nativo é um mito linguístico, mas também porque ela retrata uma
percepção
monolítica da língua e da cultura, referindo-se principalmente às formas
convencionais de pensar e se comportar dos falantes nativos.
Como efeito disso, o conceito de cultura com “c” minúsculo, que inclui os costumes
diários e modos de vida dos falantes nativos, passou a ser integrado ao código linguístico nas
práticas de ELI. Visto que as práticas culturais cotidianas são tão variadas quanto o uso da
língua, o foco de ensino recai “[...] nos comportamentos, comidas, celebrações e costumes
típicos, às vezes estereotipados, do grupo dominante ou do grupo de falantes nativos que seja
mais saliente aos olhos dos estrangeiros”65 (KRAMSCH, 2013, p. 66). Assim, Kramsch
(2013) ressalta que nas salas de aula de LE, em que não há contato com falantes nativos, a
cultura é tratada como uma curiosidade exótica, com instruções turísticas para aprender a
fazer as coisas no país da língua alvo.
Ainda aludindo ao caráter utópico do modelo de competência comunicativa,
Rajagopalan (2012) sentencia que é uma armadilha de um mito poderoso achar que as línguas
sejam coisas concretas do mundo, prontas para serem dissecadas pelos pesquisadores com
seus bisturis analíticos. Em face dessa asserção, Alptekin (2002, p. 60) questiona: “[q]uem
seria, então, o falante-ouvinte nativo real que representa o uso preciso e apropriado da língua,
65
[…]on the typical, sometimes stereotypical, behaviors, foods, celebrations an d customs of the dominant group
or of that group of native speakers that is the most salient to foreign eyes.
83
senão uma abstração, ou uma idealização?”66 . Se a ideia de uma língua como uma entidade
discreta já é problemática, mais problemática ainda é a ideia de um falante nativo dessa
língua, conclui Rajagopalan (2012).
A competência comunicativa é considerada irrealista por Alptekin (2002) porque ela
não reflete o estatuto de língua franca do inglês. Aqui cabe frisar, conforme discutimos no
capítulo anterior, que o inglês, nos dias atuais, opera como principal meio internacional de
comunicação entre os indivíduos ao redor do mundo, servindo às necessidades da
globalização social e econômica do século XXI. Nesse momento histórico, o idioma global é
usado para fins instrumentais, como contatos profissionais, estudos acadêmicos, atividades
comerciais, dentre outros. Tais interações, naturalmente, envolvem, na sua grande maioria,
falantes não nativos de inglês, o que conduz Alptekin (2002, p. 61) a levantar os seguintes
questionamentos:
O quão relevante, então, são as convenções de polidez britânica ou a
informalidade americana para os japoneses e turcos, por exemplo, quando
estão fazendo negócios em inglês? Qual é a relevância das amostras de
discurso culturalmente carregadas, como horários dos trens britânicos ou
anúncios de jornais americanos para os engenheiros industriais da Romênia e
do Egito ao conduzirem uma investigação técnica em Inglês? Qual é a
importância do contato visual dos anglo-americanos, ou a distância
socialmente aceitável para uma conversa [...] para acadêmicos finlandeses e
italianos ao trocarem ideias em uma reunião profissional? 67
Essas questões apontam para a necessidade de uma reavaliação radical da noção
tradicional de competência comunicativa, já que o modelo linguístico e cultural dos falantes
nativos é irrelevante para as interações globais. Além do mais, Alptekin (2002) revela que a
competência comunicativa é também restritiva porque reduz a autonomia do professor e do
aluno. Para aclarar essa visão, o autor destaca que um dos princípios da abordagem
comunicativa
está
associado
ao
conceito
de
autenticidade.
Isso
significa,
interpela
Widdowson (1994), representar a realidade de uso da língua do falante nativo, ou, ainda, de
contextos onde o inglês padrão é a norma, como, por exemplo, em reportagens de jornais,
artigos de revista, anúncios reais, receitas culinárias, horóscopos, etc.
66
Who then is the „real‟ native speaker-listener typifying accurate and proper language use, if not another
abstraction, or an idealization?
67
How relevant, then, are the conventions of British politeness or American informality to the Japanese and
Turks, say, when, doing business in English? How relevant are such culturally -laden discourse samples as
British railway timetables or American newspaper advertisements to industrial engineers from Romania and
Egypt conducting technical research in English? How relevant is the importance of Anglo -American eye contact,
or the socially acceptable distance for conversation […] to Finnish and Italian academicians exchanging ideas
in a professional meeting?
84
O que acontece, entretanto, é que essa língua é (e sempre será) culturalmente
carregada e só é autêntica nas condições originais de uso, ou seja, entre falantes internos que
compartilham das mesmas pressuposições culturais. A língua para os propósitos pedagógicos,
portanto, deve ser especialmente projetada de modo a ser real para o mundo dos próprios
alunos, com vistas a ativar o processo de aprendizagem. Permitir que os aprendizes sejam
autônomos implica deixá-los se apropriar da língua, identificar-se com ela (WIDDOWSON,
1994). Para Widdowson (1994, p. 387), “[u]ma pedagogia que combina autenticidade com
autonomia de aprendizagem é uma contradição. Não se pode ter as duas coisas”68 .
Sob o ponto de vista de Alptekin (2002), já que autenticidade é dependente da
autoridade do falante nativo, a autonomia dos professores não nativos fica comprometida em
dois aspectos: a) com o inglês direcionado para a cultura do falante nativo, a própria cultura
dos aprendizes fica marginalizada, senão completamente ignorada, quando não invisibilizada.
Contudo, esse é exatamente o ponto em que os professores não nativos poderiam dar o melhor
de si ao mediar saberes, pois, não há como negar, estão aptos a relacionar a informação nova
com aquelas que os alunos já estão familiarizados, devido aos conhecimentos linguísticos e às
experiências de vida que eles compartilham; b) mesmo sendo usuários multicompetentes da
língua, os professores não nativos são impedidos de desenvolver mentes multicompetentes,
graças à obsessão do sistema educacional com o modelo do falante nativo monolíngue.
Apesar das objeções aqui apresentadas, o modelo convencional de competência
comunicativa, com sua aderência restrita às normas e à cultura do falante nativo, continua
fortificado
no
ensino
de inglês e na pesquisa de Aquisição de Segunda Língua.
Inevitavelmente, essa prática desencadeia nos alunos e professores uma visão deficitária do
que seja uma comunicação bem sucedida (BAKER, 2015). A partir dessa constatação e da
necessidade premente de se repensar o conceito anteriormente discutido, a competência
comunicativa intercultural torna-se extremamente necessária, pois se trata de um construto
que acomoda o inglês como um meio internacional e intercultural de comunicação e que
enfatiza a importância da variedade, adaptação e mudança no ensino de língua e de cultura.
4.2.2 Explorando a noção de Competência Comunicativa Intercultural
68
A pedagogy which combines authenticity of use with autonomy of learning is a contradiction. You cannot have
it both ways.
85
O conceito de competência comunicativa intercultural (CCI)69 está diretamente ligado
à cultura e também à identidade dos sujeitos. O desenvolvimento dessa competência exige a
habilidade de se fazer entender e ser entendido em situações interculturais. Dessa forma, em
vez de se preocupar com a competência necessária para o sucesso na comunicação com
falantes nativos, o foco da CCI está centrado na comunicação entre participantes com
experiências linguístico-culturais distintas. Como ampliação da competência comunicativa, a
CCI leva em consideração as necessidades específicas, objetivos e dificuldades existentes na
interação entre culturas (CORBETT, 2003).
Embora os aprendizes sejam capazes de alcançar as habilidades de observação e
mediação que fazem parte da CCI, Byram et al. (2002, p. 11) explicitam que “[...] ser um
falante e mediador bem sucedido não requer competência completa e perfeita”. O autor
apresenta duas razões para dar suporte a essa assertiva: ele diz que não é possível adquirir
todo o conhecimento necessário para interagir com pessoas de outras culturas, e, em seguida,
afirma que a consciência em torno da necessidade de ajustar, aceitar e entender outras pessoas
deve ser constante.
Dentre as especificações do tipo de conhecimento e habilidades necessários para a
mediação entre culturas, destaca-se a formulação de Byram (1997). Tal formulação envolve
cinco saberes/savoirs ou capacidades que constituem a CCI, como elencados no quadro 7
abaixo:
Quadro 7. Saberes que constituem a CCI
1.
savoirs
conhecimento de si e do outro; de como a interação ocorre;
da relação do indivíduo com a sociedade.
2.
savoir être
saber como ser: como relativizar a si mesmo e valorizar as
atitudes e crenças do outro.
3.
savoir comprendre
saber como interpretar e relacionar a informação.
4.
savoir apprendre/faire saber como descobrir informação cultural.
5.
savoir s‟engager
ser criticamente consciente dos comportamentos culturais.
Fonte: Byram (1997); Corbett (2003, p. 32)
Com base em tal modelo, percebe-se que o conhecimento (savoirs) é um fator crucial
na interação intercultural. É válido assinalar que Byram (1997) não se refere a um
conhecimento sobre uma cultura específica, mas ao conhecimento de diferentes práticas
69
Intercultural Communicative Competence (ICC)
86
comunicativas em diferentes contextos socioculturais. Como nenhum professor domina todo o
conhecimento que os aprendizes irão precisar nas complexas contextualizações socioculturais
do
inglês,
as informações podem ser adquiridas conjuntamente.
Outro componente
fundamental da CCI está nas atitudes (savoir être) do falante/mediador intercultural, que
envolve a habilidade de descentrar e relativizar os próprios valores, crenças e expectativas
(BYRAM et al., 2002).
As habilidades são tão importantes quanto o conhecimento e atitudes. As habilidades
de interpretar e relacionar (savoir comprendre), por exemplo, são elementares porque
permitem aos falantes enxergarem como os maus entendidos podem surgir e como eles podem
ser resolvidos. Ao colocar informações de duas ou mais culturas lado a lado é possível
distinguir o que é dito, escrito ou feito por alguém que possui uma identidade social diferente.
As
habilidades
de
descobrir
novas informações sobre determinada cultura (savoir
apprendre/faire) e integrá-las ao conhecimento já adquirido são igualmente importantes,
posto que, como vimos, é difícil para os professores e aprendizes preverem todo
conhecimento que venha a ser necessário nas interações interculturais. Por fim, os
falantes/mediadores interculturais precisam ter uma consciência cultural crítica (savoir
s‟engager) que implica na habilidade de avaliar criticamente, com base em critérios
explícitos, a sua própria cultura e a do outro (BYRAM et al., 2002). Corbett (2003) observa
que esses saberes juntos indicam como os aprendizes podem alcançar a cultura do terceiro
tipo, acima discutida.
Em virtude da escassez de orientações em torno da aplicabilidade da abordagem
intercultural, parece-nos evidente que os professores ainda não tenham uma ideia clara de
como integrá-la ao ensino. A consciência cultural e a consciência intercultural, vistas como
características-chave da CCI, são dois construtos dignos de destaque porque desafiam a visão
limitada da competência comunicativa predominante nas práticas de ELI. Passaremos a
detalhar essas noções no item seguinte.
4.2.2.1 Consciência cultural e intercultural – construtos úteis para o ensino de cultura
O termo “consciência cultural” (cultural awareness) pode ser definido como um
entendimento consciente do papel que a cultura desempenha na aprendizagem de línguas e na
comunicação da L1 bem como da L2 (BAKER, 2009). A abordagem pedagógica relacionada
à consciência cultural tem sido problematizada por diversos autores de inúmeras formas, mas
o conceito de consciência cultural crítica formulado por Byram (1997), que, como vimos,
87
trata-se de um dos componentes da CCI, parece ser o mais completo. Byram (1997) frisa que
a inclusão desse elemento como escopo educacional para o ensino de uma língua estrangeira é
crucial, porque objetiva capacitar o aprendiz a adotar uma postura crítica que o permita
mediar entre modos de interação culturalmente diferentes.
Interessante notar que, pela perspectiva da consciência cultural crítica, os aprendizes
não deixam de lado a identidade cultural da L1 ao se engajarem no processo de interação.
Nenhum interlocutor, diz-nos Byram (1997), detém o modelo ideal com o qual o outro deve
conformar-se. Cooperando com essa declaração, Baker (2009, p. 79) pontua que
[...] os participantes da comunicação intercultural devem [...] ser capazes de
entender as normas culturais da própria L1 por perspectivas objetivas,
mostrar disposição em aceitar falhas na comunicação e estar preparados para
serem inicialmente vistos como representantes dos valores culturais préconcebidos de sua L1 [...]70
Ao reconhecer que os participantes podem ser vistos através de sua identidade cultural
pré-concebida, deparamo-nos com temas relacionados a estereótipos e a generalizações
culturais. Byram et al. (2002) esclarecem que essas são formas de rotular e categorizar grupos
particulares de pessoas, de modo a assumir que todos os membros daquele grupo pensam e
agem da mesma maneira. De acordo com Baker (2009), em vez de ignorar essas
caracterizações, é necessário admitir a sua existência e reconhecer que, em encontros iniciais,
os estereótipos e generalizações são as únicas referências de que os interlocutores se valem.
Nesse ponto, a importância da consciência cultural é enfatizada mais uma vez, dada a sua
contribuição para que os falantes/mediadores compreendam as intenções comunicativas dos
seus interlocutores, possibilitando a negociação bem sucedida na interação intercultural.
Embora o modelo proposto por Byram (1997) possa ser aplicado em diferentes
ambientes de aprendizagem, o autor tem concentrado os seus estudos, principalmente, em
salas de aula cujo foco incide nas interações entre aprendizes de L2 e falantes nativos da
língua alvo. Talvez seja este o fator que o tenha levado a afirmar que, por serem dominantes,
as culturas dos Estados Unidos e Reino Unido podem ser benéficas à pedagogia de inglês, até
mesmo em contextos internacionais. Quando o autor deixa de considerar a relação entre a LI e
as diversas culturas em que ela opera, ele está apoiando uma concepção nacional de língua
(BAKER, 2009).
70
[...] participants in intercultural communication should […] be capable of understanding their own L1
cultural norms from objective perspectives, show a willingness to accept miscommunication, and be prepared
initially to be viewed as a representative of the perceived cultural values of their L1 […]
88
Entretanto, Baker (2009) esclarece que o que é mais importante na descrição da
consciência cultural, que vimos discutindo, é a noção de que tanto o conhecimento quanto as
habilidades a serem desenvolvidas pelos aprendizes podem ser utilizados no entendimento de
culturas específicas e na comunicação entre culturas diferentes. Essa circunstância distancia a
consciência cultural de concepções mais tradicionais de ensino de cultura que se preocupam
tão somente com conhecimentos de uma cultura em particular.
Então, mesmo que muitas das habilidades associadas à consciência cultural sejam
relevantes, podemos dizer que sua limitação mais significativa reside no fato de ela estar
comumente ligada à comunicação intercultural entre grupos culturais nacionais definidos.
Notoriamente, este não é um objetivo apropriado para as complexidades da comunicação
intercultural através do inglês na função de língua franca, pois não se pode esperar que os
aprendizes conheçam todos os contextos culturais de comunicação com os quais eles estarão
sujeitos a se defrontar. Em razão disso, para atender aos requisitos da comunicação
intercultural em cenários heterogêneos e fragmentados, aflora o conceito de consciência
intercultural (BAKER, 2015).
Recentemente a noção de „consciência intercultural‟ tem sido apresentada
como uma abordagem que se baseia na consciência cultural, mas assume
uma perspectiva intercultural mais dinâmica. Enquanto a consciência
cultural explora a maneira nas quais concepções nacionais de cultura
moldam a comunicação intercultural, a consciência intercultural focaliza a
dimensão INTER ou TRANS cultural onde não há nenhuma correlação clara
entre língua-cultura-nação, especialmente nos usos globais do inglês 71
(BAKER, 2015, p. 131, grifos do autor).
Empenhando-se em explicar apropriadamente as características da consciência
intercultural, Baker (2009) delineia doze componentes (quadro 8) que, mesmo estando
sintonizados com princípios básicos da consciência cultural, sobretudo aqueles identificados
por Byram (1997), são estendidos a concepções mais fluidas da comunicação intercultural
através do inglês.
71
More recently the notion of „intercultural awareness‟ (ICA) has been put forward as an approach which
builds on CA [cultural awareness] but takes a more dynamic intercultural perspective. While CA explores the
manner in which national conceptions of culture frame intercultural communication, ICA focuses on the INTER
or TRANS cultural dimension where there is no clear language-culture-nation correlation, particularly in global
uses of English.
89
Quadro 8. Componentes da consciência intercultural
Nível 1: Consciência cultural básica
1. Consciência da cultura como um conjunto de comportamentos, valores e crenças
compartilhados;
2. Consciência do papel que a cultura e o contexto desempenham em qualquer interpretação do
significado;
3. Consciência dos próprios comportamentos, valores e crenças culturalmente induzidos e a
habilidade de articulá-los;
4. Consciência dos comportamentos, valores e crenças dos outros e a habilidade de compará los com os próprios comportamentos, valores e crenças culturalmente induzidos;
Nível 2: Consciência cultural avançada
5. Consciência da natureza relativa das normas culturais;
6. Consciência de que o entendimento cultural é provisório e aberto à revisão;
7. Consciência das múltiplas vozes ou perspectivas dentro de qualquer grupo cultural;
8. Consciência dos indivíduos como membros de muitos grupos sociais inclusive os culturais;
9. Consciência detalhada do terreno comum entre culturas específicas, bem como consciência
das possibilidades de divergência e falha na comunicação entre elas;
Nível 3: Consciência intercultural
10. Consciência de que os quadros de referência, formas e práticas comunicativas com base
cultural são relacionados a culturas específicas e também são emergentes e híbridos na
comunicação intercultural;
11. Consciência de que a interação inicial na comunicação intercultural pode ser baseada em
estereótipos culturais e generalizações;
12. Capacidade de negociar e mediar entre diferentes modos de comunicação e quadros de
referência socioculturalmente emergentes com base no entendimento de cultura na
comunicação intercultural.
Fonte: Baker (2012, p. 66)
Esses elementos da consciência intercultural procuram determinar quais são as
habilidades e conhecimentos que os usuários/aprendizes de uma língua franca, como o inglês,
precisam ter para estarem equipados para interagir com a multitude de contextos globais em
que as referências culturais não podem ser definidas a priori. Os componentes listados no
quadro acima impactam diretamente as tentativas de conceituar a dimensão cultural no que
tange à comunicação e também auxiliam na (re)configuração de objetivos pedagógicos
(BAKER, 2009).
Como se pode observar, os componentes são apresentados em uma ordem que se inicia
da compreensão básica de contextos culturais na comunicação, especialmente relacionada à
L1, segue para a compreensão mais complexa de língua e cultura e, finalmente, chega à
compreensão fluida, híbrida e emergente de culturas e línguas na comunicação intercultural
90
(BAKER, 2012). No entanto, o autor chama atenção para o fato de que essa abordagem requer
maiores pesquisas empíricas e que o conhecimento e as habilidades associadas à consciência
intercultural estarão sempre em processo de revisão, pois dependem de cada novo encontro
intercultural.
Dito
de
outro
modo,
a
consciência
intercultural estará
sempre
em
desenvolvimento, já que não é possível um entendimento finito das culturas envolvidas na
comunicação intercultural.
Para a implementação da consciência intercultural na sala de aula, é recomendado
investigar a relação entre cultura, língua e comunicação. Para tanto, Baker (2015, p. 131)
salienta que “[...] explorar as culturas locais; explorar materiais de aprendizagem de língua;
explorar mídias e artes tanto online quanto através de meios mais „tradicionais‟; recorrer a
informantes culturais; e engajar na comunicação cultural tanto face a face quanto
eletronicamente”72 são exemplos de como a cultura e a língua podem ser integradas nas salas
de ELI de modo a transgredir o modelo idealizado do falante nativo.
Atualmente, há pouca evidência da presença dessas questões na formação de
professores de inglês, nos materiais de ensino e no currículo dos cursos. Além disso, os testes
de grande escala, como o IELTS e o TOEFL, que persistem em se apoiar na visão monolíngue
e linguisticamente dominante da competência comunicativa, acabam por restringir as práticas
pedagógicas. Entretanto, como bem salientado ao longo de nossa discussão, a pesquisa em
torno da consciência intercultural e também da consciência cultural sugere mais flexibilidade
e liberdade por parte dos professores, permitindo-os focar no ensino dos elementos da língua e
da comunicação que melhor se adequem ao desenvolvimento de uma competência
intercultural que seja localmente relevante. Ampliar a discussão em torno das demandas e
desafios que se apresentam para o professor interculturalista é o que propomos fazer ao longo
do próximo item.
4.2.3 Demandas e desafios para o professor interculturalista
Em tempos em que autores, como Phillipson (1992), sinalizam para o imperialismo
linguístico que o inglês exerce sobre falantes de outras línguas, o professor torna-se peçachave no processo de ensino e aprendizagem do idioma. É o professor consciente, crítico,
autônomo e emancipado, capaz de mostrar a equidade entre línguas e culturas, que pode
72
[…] exploring local cultures; exploring language learning materials; exploring the media and arts both online
and through more „traditional‟ mediums; making use of cultural informants; and engaging in intercultural
communication both face to face and electronically.
91
enfatizar a L2 como uma possibilidade de quebrar barreiras de comunicação com falantes de
outras línguas do mundo e não tomá-la como forma de dominação (OLIVEIRA, 2007). A
ideia aqui consubstanciada encontra respaldo em Cox e Assis-Peterson (2001, p. 20-21),
quando elas dizem que
Quem ensina inglês não pode deixar de se colocar criticamente em relação
ao discurso dominante que representa a internacionalização do inglês como
um bem, um passaporte para o primeiro mundo. Quem ensina inglês não
pode deixar de considerar as relações de seu trabalho com a expansão da
língua, avaliando criticamente as implicações de sua prática na produção e
reprodução das desigualdades sociais. Quem ensina inglês não pode deixar
de se perguntar se está colaborando para perpetuar a dominação de uns sobre
os outros.
Cônscio de que língua é poder, Siqueira (2005, p. 20) acentua que se o professor não
for devidamente preparado para “[...] encampar uma prática transformadora e crítica, seus
alunos estão fadados a repetirem o discurso igualmente conformista, neutro e apolítico dos
seus mestres”. O autor prossegue afirmando que aos cursos de formação docente cabe a
responsabilidade de proporcionar ao professor o empoderamento necessário para que a “[...]
mera prática mecânica de transmissão de informações frágeis, sem significado e inúteis,
carregadas de (pré)conceitos e estereótipos” seja transposta (SIQUEIRA, 2005, p. 23). À vista
disso, Kramsch (2004, p. 43) é bastante enfática ao dizer que
Já se foram os dias em que os professores podiam se esconder atrás de regras
gramaticais e do regimento dos ditados para fazer com que os alunos
aprendam a língua. Também já se foram os dias em que era considerado
suficiente tentar ensinar o conhecimento comunicativo que o falante nativo
tem de sua língua (padrão nacional) e cultura (padrão nacional) 73 .
A autora ressalta que isso não implica que o professor não possa mais ensinar a língua
padrão nacional e as tradições nacionais. O que ela pretende esclarecer é que, devido às
tensões geopolíticas, os símbolos da identidade nacional tornaram-se múltiplos, híbridos,
mutantes e conflituosos. Por esse ângulo, o professor de inglês deve ser alguém que adquiriu a
habilidade de interagir com falantes nativos ou não nativos, alguém que aprendeu a aceitar
outras percepções do mundo e mediar entre diferentes perspectivas, sendo consciente de suas
avaliações da diferença (KRAMSCH, 2004).
73
Gone are the days where teachers could hide behind rules of grammar and the discipline of dictations to get
students to learn the language. Gone are also the days when they could rely o n the tacit, communicative
knowledge that the native speaker has of his/her (standard national) language and (standard national) culture.
92
Assim sendo, com a crescente onda de multilingualismo e multiculturalismo, os
professores são desafiados a serem menos autoritários, e convidados a serem mediadores de
várias identidades, discursos e diferentes visões de mundo. Afinal, a sala de aula de línguas é
o lugar ideal para discutir questões culturais, políticas e ideológicas relacionadas à língua,
poder e identidade. Mais do que qualquer outro profissional, o professor de inglês precisa se
tornar mais afinado com as necessidades locais dos alunos e com as exigências globais que
serão postas a eles (KRAMSCH, 2004). Tal postura certamente levará o professor a
redimensionar
[...] seu papel profissional, distanciando-se de uma postura de alienação e
aproximando-se de um comprometimento com a transformação social,
tornando-se um agente de mudança, engajado na desconstrução de
estereótipos e na promoção da tolerância das diferenças, da convivibilidade
internacional (MOTA, 2010, p. 51).
Na esteira dessa discussão e tomando como base os cinco saberes/savoirs que
constituem a CCI, concebidos por Byram (1997), Kramsch (2004) expande a temática e
formula seis saberes/savoirs que, na sua visão, constituem o professor interculturalista
(quadro 9). A formulação de Kramsch (2004) é profícua porque tenta caracterizar os atuais
professores de língua, pois é presumível que os próprios professores já devem possuir o
conhecimento, habilidades e atitudes que eles buscam desenvolver nos aprendizes.
Quadro 9. Saberes que constituem o professor interculturalista
1.
Savoir
conhecimento teórico
2.
savoir dire/faire
competência linguística, interacional
3.
savoir comprendre
competência interpretativa e relacional
4.
savoir enseigner
competência metodológica
5.
savoir être
atitudes e crenças interculturais
6.
savoir s‟engager
postura cultural crítica
Fonte: Kramsch (2004)
Os saberes indicados no quadro acima permitem capturar as complexidades que
envolvem o ensino de língua. O conhecimento teórico (savoir), por exemplo, inclui não
somente o que os professores sabem de gramática e vocabulário, mas também o conhecimento
de que o seu trabalho como profissionais ocorre dentro de instituições particulares de
93
aprendizagem que podem restringir e ampliar as opções disponíveis para o exercício
profissional e intelectual. A competência linguística e interacional (savoir dire/faire), por sua
vez, não se resume apenas à habilidade do professor de agir e interagir como falantes nativos
ou quase nativos da língua. Do contrário, exige que os professores, como membros de grupos
culturais diferentes, tornem suas próprias escolhas sociolinguísticas e pragmáticas de
interação e interpretação disponíveis aos seus alunos, fornecendo, assim, modelos autênticos
de falante multilíngue (KRAMSCH, 2004).
Segundo
Kramsch
(2004),
a
competência
interpretativa
e relacional (savoir
comprendre) do professor, para além de significar a habilidade de entender o que é dito ou
escrito, implica na habilidade de colocar o que foi dito em relação ao não-dito ou ao indizível.
Como mediadores, os professores devem estar sempre atentos à forma como os conceitos são
interpretados através de seus próprios discursos culturalmente situados, ao tempo em que
devem manter um olhar crítico sobre as posições ideológicas particulares que são
desenvolvidas por meio da língua. A competência metodológica (savoir enseigner), na
perspectiva da pedagogia mediadora, longe de ser reduzida à habilidade de planejar exercícios
eficazes, consiste em manter uma descentralização de princípios a partir do qual os
professores podem ensinar seus alunos a se enxergarem como o outro. Ela pode servir para
ensinar os alunos a reconhecer visões convencionais e assumir posturas mais críticas frente a
tais pontos de vista.
Kramsch (2004) ainda informa que as atitudes e crenças interculturais (savoir être)
envolvem um compromisso vitalício de procurar oportunidades para o desenvolvimento
profissional, intelectual e pedagógico e de se engajar em pesquisas etnográficas na própria
sala de aula. Por fim, a postura cultural crítica (savoir s‟engager), refratada em todas as
competências anteriormente mencionadas, trata-se do esforço em explorar a sua própria
identidade como um professor de línguas, o seu próprio relacionamento com a língua e com
seus falantes e o que se espera alcançar com o ensino.
Ao referir-se ao papel dos professores como mediadores interculturais, Kramsch
(2004) elabora uma lista que representa uma síntese do que deveria integrar um programa de
conscientização crítica para os professores de línguas. A autora empenha-se em delinear o que
os professores devem entender sobre eles mesmos e os objetivos que devem ser traçados para
atender às sociedades multiculturais e ao mundo multilíngue. No quadro 10, apresentamos
algumas dessas particularizações:
94
Quadro 10. Requisitos necessários para o professor interculturalista












Entender língua e cultura não como informação estática, mas como discurso;
Ser capaz de utilizar a língua tanto como falante nativo quanto como falante não
nativo;
Ser capaz de distinguir o significado ideal, interpessoal e textual dos textos e
conversas;
Ser capaz de ver a si mesmo como uma contingência histórica, como um entre muitos;
Considerar a dimensão política do ensino de línguas;
Permanecer flexível com relação à metodologia, e estar consciente de que não existe
metodologia certa ou errada, apenas metodologias apropriadas ou não para
determinados contextos;
Envolver os alunos na escolha dos métodos de ensino e de avaliação;
Mediar o que pode ser ensinado e avaliado, e o que deve ser ensinado, mas não pode
ser avaliado;
Manter um registro de autorreflexão;
Mediar as restrições institucionais e os valores educacionais;
Mediar os interesses comerciais dos editores de livros didáticos e as necessidades dos
alunos;
Buscar oportunidades de desenvolvimento profissional e de aprendizagem contínua.
Fonte: Kramsch (2004, p. 45-46)
Com base na discussão empreendida até aqui, fica claro que o contexto linguístico e
cultural que se apresenta para o professor de inglês exige uma redefinição de seu papel. Se,
como vimos, o propósito de ensinar uma língua franca global e a sua dimensão cultural
consiste em ajudar os alunos a obter um melhor entendimento de outras formas de fazer
sentido no mundo, os professores precisam se preparar para ir além de formas linguísticas e
discutir os significados gramaticais, semânticos, sociais, culturais, políticos e ideológicos
expressos na língua e através dela (KRAMSCH, 2004).
Finalmente, ainda nos apoiando em Kramsch (2013), concordamos ser interessante
que os professores pensem menos em ensinar cultura e mais em desenvolver nos alunos uma
competência intercultural ligada a um entendimento profundo de suas historicidades e
subjetividades como aprendizes de língua. Entende-se com isso, que uma metodologia de
ensino apropriada não depende somente dos conhecimentos teórico e acadêmico do professor,
mas também do conhecimento que se tem das pessoas envolvidas. Sobre essa questão,
Mendes (2007, p. 128) ressalta que “diferentes contextos educacionais pressupõem diferentes
situações de aprendizagem”, e ainda acrescenta que
[...] de acordo com uma perspectiva intercultural, o olhar de dentro, o conhecimento do
que acontece em sala de aula entre professores e alunos, entre os alunos, entre os alunos e
os materiais etc. constitui a principal fonte de respostas para que possamos construir
procedimentos, abordagens e materiais didáticos que aproximem os nossos aprendizes da
língua que queremos ensinar (MENDES, 2007, p. 130).
95
Fazer com que o conteúdo linguístico e cultural seja significativo, autêntico e
conectado com a vida dos alunos é, portanto, o maior desafio que os professores que se
propõem a adotar uma perspectiva intercultural de ensino têm que enfrentar.
Tendo apresentado o aporte teórico que deu sustento às discussões em torno dos temas
basilares de nosso estudo, seguimos com o quinto capítulo desta dissertação, que se ocupará
da descrição, análise e discussão dos registros coletados para a realização desta pesquisa.
Todas as informações auferidas servirão como auxílio para a ampliação de nosso
entendimento sobre os fenômenos investigados.
96
CAPÍTULO 5 – O ENSINO DE INGLÊS COMO LÍNGUA DESNACIONALIZADA E
A DIMENSÃO CULTURAL SOB A VISÃO DE PROFESSORES FORMADORES: A
PESQUISA
Conforme discutido
em capítulos anteriores,
o
mundo
tem se tornado tão
interconectado, e o inglês tão ligado aos processos de globalização, que a orientação
tradicional que prevê a deferência às normas da variedade padrão nativa para o ensino de LI,
definitivamente, não é mais viável: o foco de ensino deve voltar-se para um inglês “[...]
fluido, flexível, contingente, híbrido e profundamente intercultural”74 (JENKINS, COGO;
DEWEY, 2011, p. 284).
Tendo em vista que as velhas condições de relevância e adequação não mais se
aplicam aos modelos pedagógicos que satisfaçam às tendências da pós-modernidade, é
recomendável que os professores de LI comecem a adaptar as suas representações sobre a
realidade (WIDDOWSON, 2012). Assim sendo, torna-se necessário investigar de que forma a
posição do inglês como língua franca global e as questões concernentes à adoção de uma
abordagem intercultural de ensino são compreendidas e materializadas pelos professores
formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, na medida em
que são eles que impulsionam as mudanças nos cursos de formação e que influenciam as
decisões de futuros professores, com implicações diretas para a sala de aula.
Isso posto, no presente capítulo, apresentaremos a análise e os resultados dos dados
gerados por meio dos instrumentos e procedimentos utilizados para o desenvolvimento dessa
pesquisa. Propomos discutir, de forma detalhada, as respostas obtidas através da aplicação de
um questionário aos quatro docentes de LI dos níveis básico, intermediário e avançado do
curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI; os registros etnográficos das observações de
aulas de cada um desses professores; as informações colhidas por intermédio da entrevista
semi-estruturada, também realizada com todos os professores informantes; além das
informações complementares extraídas da análise documental da matriz curricular do referido
curso.
Aqui cabe esclarecer que o tratamento dos dados coletados ocorrerá em quatro seções
principais: na primeira seção, serão expostas informações sobre as influências que os nossos
informantes receberam para então se tornarem professores de inglês e também sobre as
influências que eles acreditam exercer na formação de seus alunos; na segunda seção,
74
[…] fluid, flexible, contingent, hybrid and deeply intercultural.
97
apresentaremos os registros que nos possibilitaram capturar a visão dos professores
formadores em torno do ensino do ILF e, depois, em torno da perspectiva intercultural de
ensino; na terceira seção deste capítulo, faremos alguns apontamentos sobre o currículo do
curso com vistas a alinhavar os caminhos propostos em direção ao ensino de LI que considere
o ILF e o desenvolvimento da competência intercultural dos professores em formação. Nesta
oportunidade, também será alvo de discussão a impressão que os informantes deixaram
sobressair nas respostas às questões do questionário e da entrevista semi-estruturada sobre o
documento analisado; e, para arrematar as considerações feitas, na quarta seção, faremos a
comparação das análises realizadas a partir dos instrumentos da pesquisa para nos certificar se
os dados oriundos dessas diferentes fontes se corroboram.
Como a nossa proposta consiste em apresentar os dados de acordo com os tópicos
acima discriminados, salientamos que, em determinados momentos, a abordagem não seguirá
necessariamente a sequência numérica em que as questões estão ordenadas no questionário
aplicado. Dessa forma, ao longo da análise, a prioridade será dada ao conteúdo das questões
que contribua para a discussão do item que estiver sendo desenvolvido. Lembramos também
que, conforme indicado no capítulo destinado à metodologia do trabalho, os informantes da
pesquisa serão identificados pelo nome fictício por eles escolhido na ocasião em que
responderam ao questionário. Assim, será a visão dos professores Anastácia, Hermione, João
e Marcos sobre as complexidades linguísticas e culturais do inglês como uma língua de
alcance global que servirá de subsídio para as nossas reflexões.
5.1 As influências recebidas e exercidas pelos professores formadores
Antes de nos concentrar nos dados que nos auxiliará a revelar a visão dos professores
formadores sobre o paradigma do ILF e sobre a perspectiva intercultural de ensino, julgamos
oportuno expor e comentar as respostas dadas às questões constantes no primeiro bloco de
perguntas do questionário que foram formuladas com o propósito de conhecer melhor o
professor investigado (os quatro questionários respondidos constam dos Anexos). As duas
primeiras questões do referido bloco já foram contempladas na oportunidade em que
caracterizamos os informantes desta pesquisa no Capítulo 2 (seção 2.3). Regressando a este
ponto específico do trabalho, verificamos que foram expostas informações sobre a formação
98
acadêmica dos professores (primeira questão 75), bem como sobre o tempo de atuação do
professor na área de LI e no Ensino Superior (segunda questão 76).
Cabe agora tratar da terceira questão 77 desse primeiro bloco de perguntas que visa a
explicitar o que levou os informantes a optar pela carreira de professores de inglês. As
respostas podem ser observadas a seguir:
Me identifiquei com a docência ainda quando fazia magistério. No
segundo ano do segundo grau comecei a fazer um curso de idiomas o que
despertou meu interesse pelo ensino de línguas. Após alguns módulos
comecei a lecionar inglês para crianças e desde então, tenho um interesse
especial pelo processo de ensino e aprendizagem de idiomas. 78 (Anastácia)
Sempre fui fascinada pelo estudo de línguas. Desde o início do Ensino
Fundamental, amava língua portuguesa e tinha muita facilidade para
aprender e para ensinar. Quando tive a primeira aula de inglês na quinta
série, fiquei ainda mais fascinada ao ouvir a minha professora entrando na
sala falando aquela língua estrangeira. Sempre gostei de todas as
disciplinas, mas meu amor pelas línguas portuguesa e inglesa só cresceu
cada vez mais e, no ensino médio, quando tive uma professora maravilhosa
de inglês – que mais tarde foi minha colega no curso de mestrado – decidi
fazer vestibular para Letras. Durante mais de dez anos, dei aula particular
de todas as disciplinas do Ensino Básico para séries diferentes, mas queria
mesmo dar aulas de português e inglês. Por isso, achei ótimo poder fazer a
habilitação dupla. Depois de terminar a graduação, atuei como professora
das duas disciplinas, mas acabei direcionando minha carreira para o ensino
de língua inglesa. (Hermione)
No início eu ajudava meus sobrinhos nas tarefas escolares e me identifiquei
com o ensino. (João)
O que me motivou a ser professor de língua inglesa foi o fato de ela me
ajudar a romper barreiras sociais no sentido de mudar de classe, de ter o
meu capital cultural acrescido. Eu, que venho de uma classe social menos
favorecida, tive através da língua inglesa, oportunidades melhores,
melhores condições de inserção social. Isso me motivou a ser um professor
de línguas para tentar ajudar os outros alunos a superarem, de certa forma,
suas dificuldades sociais através da aprendizagem de inglês. Como aluno da
universidade esse desejo só aumentou. Isso foi de fato o que me motivou a
ser professor de inglês, pois o inglês goza de uma posição privilegiada no
Brasil e abre espaço social, de certa forma, para quem dele se apropria.
(Marcos)
Diante das respostas acima apresentadas, notamos que um fator pessoal em particular,
a saber, o gosto pelo ensino de LI, contribuiu grandemente para que Anastácia, Hermione e
75
Qual é a sua formação acadêmica?
Há quanto tempo você atua como professor(a) de inglês? Especifique o tempo de atuação no Ensino Superior.
77
Por que você escolheu ser professor(a) de inglês?
78
Todos os dados coletados foram diferenciados com destaques em itálico no texto.
76
99
João se tornassem professores dessa língua. Além de sempre ter se interessado pelo ensino de
línguas, Hermione nos apresenta outra razão especial que justifica a sua vontade de ensinar a
LI: a influência de um bom professor. O fato de ter tido “uma professora maravilhosa de
inglês” no Ensino Médio foi decisivo para que a informante decidisse fazer o vestibular para
Letras, ingressasse no Ensino Superior e se tornasse uma profissional na área do ensino de
línguas.
Marcos, por sua vez, aponta a ascensão social e cultural que a LI propicia como fator
determinante para a sua escolha pela profissão. Fica claro, a partir de sua resposta, que a LI é
vista como uma oportunidade de transformação social. O docente carrega essa experiência e
informa que sempre foi seu objetivo conduzir o aprendiz na mesma direção. Siqueira (2008, p.
291) fortalece a postura de Marcos afirmando que o professor que se preocupa com os
reflexos de suas ações pedagógicas “[...] pavimenta o caminho para que seu aprendiz se
aproprie do conhecimento e dele faça uso da melhor maneira que o convier. Se não para
transformação „social‟, com certeza, para transformação „pessoal‟”.
Haja vista a importância do papel do professor, ou melhor, do conjunto de papéis que
o professor desempenha no sentido de auxiliar e orientar os aprendizes, vale a pena conferir o
que os pesquisados responderam sobre a quarta e última questão do primeiro bloco de
perguntas do questionário. A quarta questão79 objetivou investigar a opinião dos professores
formadores quanto à influência que eles acham que exercem sobre os estudantes do curso de
Letras/Inglês da UNEB, Campus VI. Eis o que responderam:
Acredito que todo docente, na condição de mediador do conhecimento, em
algum momento acaba por influenciar os seus estudantes com suas crenças,
atitudes, posturas. Tento mostrar aos futuros docentes algumas dessas
experiências em minha prática, alertando que uma mesma atitude/atividade
pode surtir efeitos diferenciados considerando as particularidades de cada
contexto e sujeito em questão. No entanto, penso que muitas das influências
(tanto negativas, quanto positivas) nem sempre são refletidas de imediato.
(Anastácia)
Sinto-me muito responsável na formação desses futuros docentes, pois eles
se espelham bastante em tudo o que fazemos. Além disso, alguns trazem
certas crenças construídas ao longo de seu ensino básico que atrapalham
seu desenvolvimento como aprendizes e como futuros professores. Des ta
maneira, é nosso papel ajudá-los na desconstrução destas crenças,
promovendo uma visão mais ampla do processo de ensino-aprendizagem e
oferecendo leituras/discussões que enriqueçam sua formação. (Hermione)
79
Na condição de professor(a) formador(a), como você avalia a influência da sua prática na formação dos
estudantes do curso de Letras/Inglês da UNEB/ Campus VI?
100
Como tenho certeza que a prática de meus professores influenciaram em
minha formação, tenho ciência de que preciso me comportar como
referência na formação de meus alunos. (João)
Na condição de professor formador, tenho feito um esforço para que meus
alunos e minhas alunas adquiram a língua inglesa e façam uso dela por um
viés crítico, ou seja, incentivo os meus alunos e minhas alunas a aprenderem
inglês para a vida social enquanto cidadãos e cidadãs do mundo
globalizado. (Marcos)
Todos os informantes mostraram-se conscientes da enorme responsabilidade que eles
têm na formação de futuros professores. Anastácia, Hermione e João reconhecem
explicitamente que suas práticas e concepções influenciam diretamente as decisões e
comportamentos dos estudantes. Já Marcos demonstra de forma implícita o quanto suas ações
podem influir na formação dos seus alunos e expõe o seu cuidado em preparar os futuros
professores para lidar com a LI em tempos de globalização. É por exercer tamanha influência
na formação dos aprendizes que os professores formadores devem desenvolver novas formas
de pensar criticamente sobre o que é o “inglês”, dada a sua nova função e posição mundial.
Para avançarmos na nossa discussão, os tópicos que se seguem estão precisamente
destinados a desvelar o que os professores pesquisados pensam sobre o paradigma do ILF e
sobre a perspectiva intercultural de ensino no contexto de formação de futuros professores de
inglês.
5.2 A visão dos professores formadores sob análise e discussão
Os dados a serem analisados aqui buscam revelar, respectivamente, a percepção dos
professores formadores acerca do paradigma do ILF e a concepção desses professores com
relação à perspectiva intercultural de ensino. Destacamos que, em ambos os tópicos de
discussão, analisaremos separadamente os dados obtidos em cada um dos instrumentos
utilizados: primeiro, serão apresentados e discutidos os dados do questionário; em seguida,
teremos como foco as constatações provenientes dos registros etnográficos; e, por último, os
dados gerados através da entrevista. Comecemos, então, pela descrição, análise e discussão
dos dados relacionados ao ensino do inglês sobre a perspectiva do ILF.
5.2.1 A visão dos professores formadores sobre o paradigma do ILF
5.2.1.1 Análise dos dados do questionário
101
Nesta etapa, a discussão envolverá nove questões do questionário, dentre as quais, sete
pertencentes ao segundo bloco de perguntas, e duas perguntas que fazem parte do quarto
bloco. As questões de 5 a 11 tratam especificamente sobre o ILF e buscam esclarecer as
concepções dos professores sobre esse fenômeno. As questões de número 15 e 16, embora
estejam incluídas no bloco relacionado ao material didático adotado pelos professores, serão
discutidas aqui por estarem intimamente ligadas ao tema em pauta. Convém ressaltar que as
respostas dos informantes ao questionário serão dispostas obedecendo à ordem alfabética de
seus pseudônimos.
Sabidamente, a visão que ainda impera nos meios educacionais é a de que o único
inglês que deve ser reconhecido e ensinado nas salas de aula é o padrão da língua definido
pelos falantes nativos do Círculo Interno (KACHRU, 1985), em especial, dos Estados Unidos
e da Inglaterra. Por esse viés, nota-se que uma das reações dos profissionais de ensino
relacionada ao ILF é a de fingir que ele simplesmente não existe (SEIDLHOFER, 2011).
Outra reação comum consiste em “[...] reconhecer a existência do ILF, e não enxergá-lo
positivamente como um estímulo para reflexão, mas, negativamente como uma ameaça para a
ordem pedagógica estabelecida”80 (SEIDLHOFER, 2011, p. 191). Uma vez que os professores
formadores têm a responsabilidade de levar os professores em formação a uma maior
consciência da presença global do inglês, faz-se necessário inquirir sobre o posicionamento
desses profissionais no que diz respeito à problematização do ILF na formação inicial de
professores de inglês. Este é exatamente o teor da quinta questão81. Vejamos as respostas:
Penso que o ensino de ILF não seja uma tarefa fácil e sim desafiadora, que
requer de nós docentes um posicionamento crítico e reflexivo, para que
possamos, mesmo nas coisas mais simples, instigar o nosso aluno a perceber
o aspecto multicultural que uma língua de comunicação global requer.
(Anastácia)
Acredito que é necessário considerar o ILF no processo de ensinoaprendizagem de LI, pois este não se limita ao conhecimento da forma padrão da língua. (Hermione)
Acho o tema muito relevante. (João)
Esse tema gera muitas controvérsias. É sabido que é importante aprender
inglês para estar inserido no mundo globalizado, para se tornar cidadão
crítico no/do mundo. Porém qual ou quais culturas específicas devemos
80
[...]to acknowledge the existence of ELF but to see it not positively as a stimulus for reflection but on the
contrary negatively as a threat to the established pedagogic order.
81
Como você se posiciona com relação à problematização do ILF na formação inicial de professores de inglês?
102
abordar/problematizar em nossas aulas de línguas? Língua é algo que não
deve ser desvinculado, separado de um contexto social, regido por
ideologias e relações assimétricas de poder. Partindo dessa premissa, quais
critérios tenho que traçar para incluir ILF em minhas aulas de línguas?
Essa questão ainda me remete a vários questionamentos, sem uma resposta
ainda satisfatória. (Marcos)
Diferentemente das reações apontadas por Seidlhofer (2011), Hermione e João
enxergam a perspectiva do ILF como uma questão necessária e relevante para o ensino. Já
Anastácia e Marcos, além de se mostrarem conscientes da importância de se considerar o
paradigma do ILF na pedagogia de LI, também se encontram cônscios dos desafios que
devem enfrentar. Os questionamentos levantados por Marcos, por outro lado, evidenciam a
insegurança em romper com as práticas instituídas em sala de aula, principalmente porque se
trata de ensinar uma língua híbrida e sem referências culturais específicas (SIQUEIRA,
2011b).
Na verdade, ainda não existe uma discussão pormenorizada de como as diferentes
variedades do inglês e a variabilidade dinâmica que a perspectiva do ILF carrega podem
impactar os modelos e metodologia de ensino da língua (JENKINS; COGO; DEWEY, 2011).
Nesse pormenor, Jenkins (2007) nos diz que a intenção dos pesquisadores do ILF tem sido
oferecer orientações para que os professores levem em consideração as premissas que estão
subjacentes à comunicação entre a maioria dos falantes de inglês ao redor do mundo.
Recomenda-se, por exemplo, que os aprendizes do Círculo em Expansão obtenham
familiaridade com uma série de sotaques do inglês e desenvolvam habilidades de
acomodação, e que os professores não gastem muito tempo em sala de aula corrigindo certos
aspectos que, embora não estejam de acordo com o inglês dos falantes nativos, tornaram-se
sistemáticos, frequentes e mutuamente inteligíveis entre os falantes do ILF.
Seidlhofer (2011) se expressa quanto a esse assunto dizendo que para vencer o desafio
de desenvolver novas pedagogias para o ensino de inglês, o professor precisa, primeiramente,
desafiar a superioridade do Inglês como Língua Nativa (ILN) e firmar-se como falante não
nativo competente. A autora também pontua que é essencial que as reformulações na
pedagogia e as reconceitualizações na descrição da língua encontrem lugar nos currículos e
nos materiais de ensino, pois se os professores continuarem insistindo em se submeter às
imposições de propriedade dos falantes nativos e não tiverem uma alternativa conceitual,
estímulos e resoluções para contrapor-se às normas centrais da língua, não haverá base
suficiente para a ação.
103
Mesmo entrevendo os desafios, constatamos que os pesquisados são favoráveis à
problematização do ILF na formação inicial dos futuros professores de inglês. Oportuno se
faz agora saber o que significa ensinar inglês sob a perspectiva do ILF na opinião dos
respondentes. Os informantes posicionaram-se quanto à sexta questão82 como consta abaixo:
Significa ensinar a língua inglesa sob uma perspectiva intercultural,
percebendo-a como um instrumento de comunicação global, desatrelado de
uma única cultura referencial. (Anastácia)
Considerar o ILF no ensino de inglês permite uma visão mais ampla de
como concebemos a comunicação nesta língua, levando-nos a perceber que
esta não se limita a um único padrão. (Hermione)
Ensinar ILF significa ter em mente que a LI é tanto de meus alunos quanto
dos ingleses. (João)
Significa estar atento à questão geopolítica do inglês. (Marcos)
A partir das respostas acima, percebemos que os informantes já estão familiarizados
com algumas noções que são privilegiadas no ensino do inglês sob o paradigma do ILF.
Anastácia dá pistas de que ela comunga com as ideias de Seidlhofer (2011) quando a autora
afirma que o ILF deve ser entendido “[...] como um meio intercultural de comunicação que
não está ligado a determinados países e etnias, um recurso linguístico que não está contido, ou
limitado por ideias tradicionais (e notoriamente tendenciosas) do que se constitui „uma
língua‟”83. Hermione, por sua vez, suscita a questão da diversidade de variedades resultantes
da expansão global da língua, reconhecendo que o ensino não deve permanecer pautado nas
normas da variedade padrão nativa. João põe em xeque a propriedade exclusiva do inglês por
falantes nativos, e deixa bem claro que ensinar inglês significa fazer com que os alunos se
apropriem da língua. Para contribuir com tal ponto de vista, Kalva e Ferreira (2011, p. 174)
dizem que a perspectiva do ILF
[...] vê o inglês como pertencente a todos sem que se dê mais ênfase a um ou
outro sotaque ou a uma ou outra identidade; pelo contrário, quanto maior o
número de identidades e sotaques que aparecerem no ensino, mais hábil
estará o aluno [para] comunicar-se com o mundo.
82
Para você, o que significa ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF?
[...] as a means of intercultural communication not tied to particular countries and ethnicities, a linguistic
resource that is not contained in, or constrained by, traditional (and notoriously tendentious) ideas of what
constitutes „a language‟.
83
104
Por último, Marcos salienta que a natureza geopolítica do inglês não pode ser deixada
de fora da cena da sala de aula em que se leva em conta o paradigma do ILF. Com efeito,
segundo Cox e Assis-Peterson (2001), a LI está imersa em lutas sociais, econômicas e
políticas e, por isso mesmo, os professores não podem reduzir o seu ensino a questões
puramente metodológicas, linguísticas e sociopsicológicas de motivação.
Como visto, todos os respondentes demonstram, em certo nível, estarem conscientes
do que seja ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF. Mas será que já estão preparados para
tal tarefa? Com o intento de obter uma resposta para essa pergunta, formulamos a sétima
questão84 do questionário. A seguir apresentamos as respostas obtidas:
Penso que nenhum docente está, ou estará um dia “preparado” quando se
trata de ensinar, pois, o processo de formação do professor é constante,
contínuo, uma vez que o próprio conhecimento está sempre em
transformação. Há muitas questões que perpassam o ensino de inglês como
língua estrangeira, língua global, língua franca. A cada dia, com novos
estudos e transformações na prática pedagógica, precisamos inovar e
modificar nossas ações para contemplar os anseios e necessidades da
sociedade contemporânea e seu constante estado de transição. Com o ensino
de ILF não seria diferente, sinto necessidade de orientações mais amplas na
abordagem do mesmo. (Anastácia)
Eu ensino inglês como LE, considerando a importância de reconhecer esta
língua como global, internacional e a existência do ILF, mostrando para
meus alunos que esta perspectiva é aceitável e possível, mesmo não s e
tratando de um inglês formal. (Hermione)
O fato de eu ter consciência da necessidade de adotar uma abordag em
intercultural em minhas aulas pode não significar total preparação, mas um
bom princípio. (João)
Ainda não. Muito me incomoda sobre a questão geopolítica da língua
inglesa. Acredito que o termo ILF esconde questões de desdobramentos
sociais, ideológicos e políticos inerentes a determinado(s) país(es) X ou Y.
(Marcos)
As respostas dadas permitem-nos afirmar que os professores investigados ainda não se
sentem totalmente preparados para a missão de ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF.
Com a finalidade de se sentir mais confiante para adotar aspectos relacionados ao ILF em suas
aulas, Anastácia revela que ela precisa de orientações mais consistentes sobre esse paradigma
de ensino. A respondente enfatiza ainda que o processo de formação é permanente e, por essa
razão, faz-se necessário estar sempre se atualizando. Pela resposta de Hermione, entendemos
84
Você se sente preparado(a) para ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF? Por quê (não)?
105
que ela já leva em conta a perspectiva do ILF em sua sala de aula, contudo, ela deixa
transparecer que as características desse paradigma só são implementadas às margens de sua
prática, pois, como atesta a própria respondente, a prioridade é dada ao ensino de ILE.
A resposta de João, por outro lado, nos remete ao que Jenkins (2007) tem
insistentemente afirmado: mesmo que o professor já tenha plena consciência do papel do
inglês no mundo em um nível teórico, muito pouco tem mudado na prática. Porém,
obviamente, como indica o próprio docente pesquisado, o reconhecimento da necessidade de
mudança pelos professores é, efetivamente, “um bom princípio”. Marcos admite que ainda
não se sente preparado para incluir questões relacionadas ao ILF em sua prática de ensino e
externa a sua dificuldade em lidar com os aspectos geopolíticos da língua, conforme
ressaltado pelo docente em questões anteriores.
Para dar consecução ao desenho de nossa pesquisa, perguntamos aos informantes se o
inglês que eles falam possui características do inglês americano, britânico, ou se possui
outra(s) marca(s). Os respondentes assim se manifestam:
Quando comecei a estudar a língua inglesa em cursos de idiomas, o
material adotado era elaborado sob uma perspectiva do inglês americano.
Mas, por desejar apenas aprender a língua não me apeguei a esses fatores,
só algum tempo depois, após algumas leituras teóricas é que me atentei a
essas particularidades linguísticas. No momento em que estava aprendendo,
o inglês era só inglês. (Anastácia)
O meu inglês tem características dos falantes brasileiros. Mesmo tendo um
grande contato com o inglês americano, eu falo “Brazilian English”.
(Hermione)
Eu tive experiência com a LI falada por falantes nativos americanos e
britânicos, contudo nunca me preocupei em definir uma marca. (João)
Acredito que meu inglês tem características estadunidenses. Aprendi inglês
assistindo telejornais, filmes, clipes de músicas, etc., lendo artigos, livros
(inglês estadunidense) e falando com pessoas oriundas dos Estados Unidos
da América, ou seja, o inglês estadunidense esteve muito presente em meus
momentos de formação. (Marcos)
Os dados auferidos nessa oitava questão 85 do questionário nos possibilitou elaborar o
quadro 11 abaixo constando as variedades que os informantes tiveram contato no processo de
aprendizagem da língua:
85
O seu inglês tem características dos falantes nativos americanos, britânicos ou possui outra(s) marca(s)?
Explique.
106
Quadro 11. Variedades de inglês que os informantes tiveram contato no processo de
aprendizagem da língua
Inglês americano
Anastácia
X
Hermione
X
João
X
Marcos
X
Inglês britânico
Outros “ingleses”
X
Como podemos notar, todos os professores pesquisados aprenderam a LI embasados
nos modelos linguísticos hegemônicos. Os quatro respondentes demonstraram que tiveram
contato com as normas do inglês americano, sendo que um deles relatou ter tido também uma
experiência considerável com o padrão britânico da língua. Nenhuma outra variedade, dentre
tantas que se proliferam com a mundialização do inglês, parece ter feito parte do processo de
aprendizagem dos docentes. Se sim, eles não as particularizaram. Esse dado é relevante
porque sobreleva uma das razões pelas quais os professores não conseguem abandonar tão
facilmente as atitudes enraizadas e visões tradicionais instauradas da autoridade do falante
nativo.
Quanto às marcas inerentes ao inglês falado pelos informantes, a partir das respostas
dadas, verificamos que Anastácia e João não se mostram preocupados com as características
do inglês falado por eles, embora relatem que receberam influências dos padrões nativos da
língua. Já Marcos assume que seu inglês traz no seu falar fortes marcas da variante
estadunidense, e explica que todo contato que teve com o idioma sempre esteve diretamente
ligado à variedade padrão daquele país. Apenas Hermione faz menção às marcas deixadas por
sua própria identidade nacional no inglês que ela utiliza, e afirma que fala Brazilian English,
apesar de ter tido um grande contato com o inglês americano. Ao se colocar dessa maneira, a
docente está assegurando as suas próprias reivindicações relativas à propriedade da língua
como um autêntico meio de comunicação internacional. A esse respeito, Assis-Peterson e Cox
(2013, p. 154) acentuam que o inglês
[a]o se desenraizar, reterritorializa-se no espaço da modernidade-mundo,
instituindo-se como bem simbólico a ser apropriado, manipulado, deformado
pelos falantes dos quatro cantos do planeta. O inglês da modernidade-mundo
é um espectro “glocal”, no sentido de que é, a um só tempo, global e local.
Visto que o inglês se encontra desterritorializado de sua origem anglo-saxônica,
sugere-se aos professores que repensem a premissa de que o falante americano ou britânico
107
culto é o modelo a que seus alunos devem aspirar. Para tanto, o processo de formação é de
suma importância para as tomadas de decisão e compreensão dos fatores que influenciam as
práticas pedagógicas que espelham e atendam às tendências atuais. Vimos que os professores
pesquisados não tiveram uma exposição substancial a outras variedades do inglês em suas
experiências prévias como aprendizes, o que nos parece uma situação natural no Brasil e em
muitos países, onde a LI não circula livremente. Posto isso, trazemos à tona os dados da nona
questão86 que busca investigar se os professores já participaram de eventos acadêmicos
(minicurso, conferência ou outra modalidade) cujas discussões giravam em torno do ILF. As
respostas seguem abaixo:
Participei em um evento no ano passado no qual tais questões foram
discutidas. Um dos aspectos positivos que me atentei foi o fato de como o
dia-a-dia dos alunos pode ser utilizado para trabalhar o ILF. No referido
evento, foi enfatizado como, às vezes, a língua inglesa é utilizada atrelada
ao conhecimento de mundo dos estudantes, podendo este ser um ótimo ponto
de partida para trabalhar a LI sobre uma perspectiva de língua franca.
(Anastácia)
Sim. Este tipo de discussão é sempre enriquecedor e nos faz refletir a
respeito do papel da LI como um instrumento para integração de diversas
culturas. É interessante pensar sobre a negociação de significados que
envolve o ILF e a importância de valorizar as maneiras de se expressar de
cada um. (Hermione)
Eu fiz um curso de 7 semanas oferecido pela CAPES na Universidade de
Londres e as discussões eram sempre em torno da relevância do ensino do
ILF. Algo que chamou minha atenção é que os ingleses também têm essa
inquietação com o ILF, mundo globalizado e abordagem intercultural no
ensino de LI. (João)
Não. O que eu sei sobre ILF vem de minhas leituras. (Marcos)
De uma forma ou de outra, todos os informantes tiveram a oportunidade de conhecer
melhor a proposta do ILF. Anastácia, Hermione e João já estiveram presentes em eventos e/ou
cursos que possibilitaram uma reflexão mais aprofundada acerca dos princípios do referido
paradigma. Somente Marcos declara nunca ter participado de eventos que tratavam do tema,
mas, em contrapartida, o docente revela que ele tem se atualizado quanto a essas questões por
meio de leituras realizadas de forma autônoma.
86
Você já participou de algum evento acadêmico (minicurso, conferência ou outra modalidade) cujas discussões
giravam em torno do ILF? Em caso afirmativo, quando? Registre algo significativo que você trouxe do evento.
108
Além disso, não podemos deixar de enfatizar duas das dimensões que emergiram das
respostas dos informantes. A importância de considerar a realidade dos aprendizes como
ponto de partida para o ensino do inglês sob a perspectiva do ILF, destacado por Anastácia, é
uma delas. Para reforçar a fala da docente, Widdowson (1994) assinala que o contexto de
aprendizagem, enredado dentro da sala de aula, deve ser informado, de alguma maneira, pelas
atitudes, crenças, valores do mundo cultural dos alunos. A resposta de Hermione desencadeia
outro ponto que também merece ser analisado, a saber, a necessidade de valorizar as
diferentes maneiras de se expressar dos aprendizes. Para nos ajudar a ampliar o entendimento
sobre esse aspecto, recorremos a Seidlhofer (2011) que nos diz que o interessante não é
centrar a atenção na língua como produto, mas na maneira como os aprendizes utilizam o que
eles sabem da língua. Portanto, na sala de aula, o que importa é enxergar o inglês como
conteúdo da perspectiva do aprendiz e não da perspectiva do professor. “Aqui não é o nível de
competência que conta, mas a capacidade de usar a língua explorando o seu potencial
comunicativo”87 (SEIDLHOFER, 2011, p. 202).
Em seguida, foi perguntado aos docentes se eles apresentam o inglês como LE ou
como LF em sala de aula. Para subsidiar a análise dos dados dessa questão, retomamos a
discussão posta no terceiro capítulo deste trabalho, quando foram expostas as principais
diferenças entre a perspectiva do ILE e aquela do ILF (subseção 3.3.1). El Kadri e Gimenez
(2013, p. 125) conseguem sintetizar o que foi elucidado naquele ensejo, ao dizerem que
“enquanto a perspectiva do inglês como língua estrangeira procura situar o aprendiz como um
„nativo imperfeito‟, a do inglês como „língua franca‟ requer a transcendência de uma
identificação marcada pelo território geográfico ou linguístico ”.
Com isso em mente, as respostas concedidas à décima questão 88, acima anunciada,
apontam que os participantes da pesquisa não só estão conscientes do papel que a LI
desempenha em escala planetária, como também tentam colocar em prática alguns dos
pressupostos sustentados pelo paradigma do ILF:
Tento ensinar a língua sobre a perspectiva da comunicação global,
deixando sempre claro aos estudantes a multiplicidade de aspectos
linguísticos e culturais envolvidos em tal processo. Normalmente não faço
tais distinções entre termos a menos que os estudantes tenham maturidade e
conhecimento teórico para percebê-las e fundamentá-las. (Anastácia)
87
Here it is not the level of competence that counts but the capability for using the language by exploiting its
communicative potential.
88
Em suas aulas, o inglês é apresentado como Língua Estrangeira ou como Língua Franca? Esclareça a sua
resposta.
109
Como LE, considerando-o uma língua internacional que faz parte da vida de
milhares de pessoas de diferentes partes do mundo, que possuem realidades
e culturas distintas. O ILF aparece naturalmente através da fala dos
próprios alunos ou, até mesmo, da minha, ou dos muitos exemplos que
discutimos na sala de aula. (Hermione)
Eu não me prendo na diferença de LE ou LF. Busco valorizar a cultura de
meus alunos e não exaltar a cultura americana ou britânica. O
conhecimento de outras culturas pode ser útil para a valorização da própria
cultura. (João)
Em minhas aulas o inglês é apresentado como língua estrangeira. Minha
asserção baseia-se no fato de essa língua não ser usada por uma
comunidade de prática fora do ambiente escolar. Porém tento fazer de meu
espaço de ensino um lugar de prática. Tento desestrangeirizá-la na medida
do possível, observando a necessidade e a realidade de meus alunos e de
minhas alunas. (Marcos)
É possível perceber que dois dos sujeitos pesquisados (Anastácia e João) não se
prendem à distinção de termos. Para eles, o que importa é ensinar a língua sob uma
perspectiva que englobe a multiplicidade linguística e cultural da LI. Os outros dois
respondentes (Hermione e Marcos) afirmam de modo resoluto que o ILE é a perspectiva de
ensino adotada em suas práticas. Contrariamente, porém, ao desdobrarem as respostas dadas,
os docentes explicitam ações e atitudes tomadas em suas salas de aula (Hermione apresenta o
inglês como “uma língua internacional que faz parte da vida de milhares de pessoas de
diferentes partes do mundo, que possuem realidades e culturas distintas”; e Marcos procura
desestrangeirizar a LI, observando a necessidade e a realidade dos alunos) que estão em
concordância com as ações e atitudes tomadas por aqueles que se subscrevem ao modelo de
ensino baseado nos objetivos do ILF.
Inferimos, que, na verdade, os quatro professores pesquisados compartilham da ideia
de que “[o] aprendizado de inglês se torna significativo porque não se trata apenas de
aprender uma língua estrangeira, mas de aprender a dizer-se, numa rede diversificada (e
conflitante) de dizeres” (GIMENEZ, 2011, p. 50).
A décima primeira questão89 ocupa-se em descobrir como os informantes lidam com
os desvios do inglês padrão decorrentes de pronúncia e gramática quando os alunos se
expressam oralmente em LI. Vejamos o que dizem os respondentes:
89
Em sua sala de aula, como você lida com os desvios do inglês padrão decorrentes de pronúncia e gramática
quando os alunos se expressam oralmente em LI?
110
Tento conduzir minhas aulas considerando o erro como parte da construção
do conhecimento. Sei que em alguns momentos a correção excessiva do erro
oral pode inibir o aluno e deixá-lo receoso a voltar a falar e ser corrigido
publicamente. Normalmente procuro não interromper o aluno durante as
construções, ou orientá-los na elaboração da sentença para se expressar.
Quando o erro é algo generalizado, reviso o conteúdo com a turma,
trabalho as pronúncias e construções com desvios recorrentes. Em casos
mais delicados, tento trabalhar individualmente. Com relação a pronúncias,
sugiro sempre aos alunos para ouvirem músicas, filmes, séries em língua
inglesa, orientando-os a se atentarem aos diferentes „englishes‟ que
encontrão nesses contextos, enfatizando sempre que o mais importante é se
comunicar, entender e se fazer entendido. (Anastácia)
Lido naturalmente, evito ficar corrigindo-os demais, mas incentivo cada um
deles a tentar se expressar de tal maneira que sejam bem compreendidos.
(Hermione)
Eu busco enfatizar que há uma diferença entre inferência de sotaque e
desvio de pronúncia quando falamos inglês. O sota que não significa
problema para a comunicação, enquanto desvio de pronúncia pode
dificultar a compreensão no ato de fala. Todo falante precisa buscar
expressar bem e ser claro na pronúncia, isso não significa adquirir
identidade americana, ou britânica para falar inglês. (João)
Tento incentivar a comunicação entre meus alunos. Em minhas aulas o mais
importante é a comunicação, sempre esclareço que a questão gramatical
está subordinada à atividade comunicativa. Desvios do inglês padrão
decorrentes de pronúncia e gramática são tolerados e problematizados.
(Marcos)
Reunidas essas respostas, observamos que todos os professores pesquisados estão em
sintonia ao concordarem que é mais importante focar na comunicação bem sucedida do que
centrar-se na habilidade de imitar o inglês dos falantes nativos. A resposta de Anastácia é
representativa dessa opinião: ela esclarece que costuma incentivar os futuros professores a
adquirir a capacidade de colocar a língua que eles estão aprendendo em efetivo uso
comunicativo, e demonstra estar consciente de que insistir que os aprendizes estejam
confinados a obedecer à norma padrão dos nativos só pode inibi-los de desenvolver tal
habilidade. João suscita em sua fala a questão do sotaque, e o que ele diz harmoniza
perfeitamente com as ideias de Seidlhofer (2011) quando ela argumenta que o sotaque é algo
natural, e até mesmo desejável como uma expressão de identidade. Sob uma perspectiva mais
democrática de aquisição de uma nova língua, é importante ter em mente que o que estamos
buscando é a garantia da inteligibilidade na comunicação.
Os informantes parecem concordar que é preciso reconhecer que pelo menos os erros
mais recorrentes dos alunos brasileiros são precisamente os pontos cuja identidade desses
falantes é expressa na língua. Afinal, “[a] língua não é um sistema impermeável; qualquer
111
língua (e especificamente o inglês) é penetrável, absorvendo e incorporando aspectos locais
de prática linguísticas, culturais e sociais de maneira a transformá-la”90 (DEWEY, LEUNG,
2010, p.4). Na concepção de Widdowson (2012, p. 23),
O que é mais difícil, e mais resistente à correção do professor, é,
provavelmente, o que é mais dispensável. Mas essas são as características
que os professores tendem a gastar mais tempo tentando, em vão, ensinar. Os
aprendizes constroem a sua própria versão da língua que está sendo ensinada
e isso fica patente quando eles escapam da sala de aula e se tornam usuários
do ILF. Esta versão é geralmente considerada uma interlíngua, uma fase
intermediária e inadequada de aquisição. Neste ponto de vista, a tarefa
pedagógica é conduzir os alunos em direção ao objetivo final da
competência do falante nativo, [...] o objetivo é inatingível, não somente
porque é uma ilusão. E não somente inatingível, mas irrelevante de qualquer
forma.91
A essas considerações, acrescenta-se que os aprendizes naturalmente priorizam o que é
funcionalmente saliente e desconsideram o que é prescindível ao requisito comunicativo,
desenvolvendo, dessa forma, a sua própria gramática funcional. Diante disso, o que faz
sentido é tentar entender como os aprendizes utilizam a língua, para, então, identificar o que
deve ser incentivado para o seu uso efetivo e não o que deve ser inútil e repetidamente
corrigido (WIDDOWSON, 2012).
É claro que a abordagem de ensino que contemple os pressupostos do ILF pode ser
restringida por fatores que estão fora do controle dos professores, quais sejam, os livros de
referência utilizados, o material de ensino adotado, as exigências da avaliação de proficiência
em LI, dentre outros (WIDDOWSON, 2012). Pretendendo verificar se o material utilizado em
sala de aula tem auxiliado ou limitado os professores pesquisados a manobrar as discussões
sobre o ILF, partiremos para a análise das questões 15 e 16 pertencentes ao quarto bloco de
perguntas do questionário aplicado. Aqui cabe registrar que João não respondeu às questões
que compõem o referido bloco de perguntas por ter decidido não adotar o livro no semestre
em que a pesquisa foi realizada.
90
Language is not an impermeable system; any language (and espe cially English) is pervious, absorbing and
incorporating local aspects of linguistic, cultural, and social practices in ways that transform it.
91
What is most difficult, and most resistant to teacher correction, is probably what is most dispensable. But
these are the very features that teachers tend to spend most time trying, in vain, to teach. Learners construct
their own version of the language they are being taught and this gets carried over and developed further when
they escape from the classroom and become ELF users. This version is generally taken to be an interlanguage,
an interim and inadequate stage of acquisition. The pedagogic task is, in this view, to move learners on towards
the final goal of native speaker competence, […] the goal is unattainable, not least because it is an illusi on. And
not only unattainable, but irrelevant anyway.
112
Antes de prosseguirmos com a análise, também convém informar que no curso de
Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, os professores optaram pela adoção dos volumes da
coleção TOP NOTCH, da editora Longman, que estão sendo utilizados desde o ano de 2011
nas aulas de Laboratório Instrumental de Língua Inglesa. Os volumes dessa coleção estão
distribuídos entre os oito semestres do curso, conforme demonstrado no quadro a seguir:
Quadro 12. Distribuição dos livros adotados entre os semestres do curso
BÁSICO I – Semestre I
BÁSICO II – Semestre II
TOP NOTCH FUNDAMENTALS
Da unidade 1 à unidade 7 (Split92 A)
TOP NOTCH FUNDAMENTALS
Da unidade 8 à unidade 14 (Split B)
INTERMEDIÁRIO I – Semestre III
INTERMEDIÁRIO II – Semestre IV
TOP NOTCH 1
Da unidade 1 à unidade 5 (Split A)
TOP NOTCH 1
Da unidade 6 à unidade 10 (Split B)
INTERMEDIÁRIO III – Semestre V
AVANÇADO I – Semestre VI
TOP NOTCH 2
Da unidade 1 à unidade 5 (Split A)
TOP NOTCH 2
Da unidade 6 à unidade 10 (Split B)
AVANÇADO II – Semestre VII
AVANÇADO III – Semestre VIII
TOP NOTCH 3
Da unidade 1 à unidade 5 (Split A)
TOP NOTCH 3
Da unidade 6 à unidade 10 (Split B)
De posse dessas informações, na décima quinta questão 93, perguntamos se os alunos
são expostos a diferentes variedades de inglês ao longo das atividades propostas pelo livro
adotado nas aulas de laboratório de LI. O posicionamento dos três professores que
responderam à questão é um tanto divergente quanto a esse ponto:
Sim, o material adotado como suporte, principalmente nas atividades de
listening apresenta falantes de diversos lugares do globo e suas
particularidades na pronúncia da língua. Cabe salientar que o material
adotado, conforme enfatizado, é um suporte, havendo a utilização de
recursos distintos para auxiliá-lo e suprir as lacunas deixadas, caso precise.
(Anastácia)
92
O livro adotado é dividido em duas partes. Cada metade (Split) é utilizada em semestres diferentes. Além do
livro completo com todas as lições do volume, a editora Longman também disponibiliza o Split A e o Split B de
cada volume.
93
Os seus alunos são expostos a diferentes variedades de inglês ao longo das atividades propostas pelo material
adotado nas aulas de laboratório de LI? Se sim, exemplifique.
113
Como trabalho com uma turma de iniciantes, não são expostos a muitas
variedades. O livro adotado não traz muitas variedades de inglês. Os alunos
se sentem mais familiarizados e mais confortáveis para compreender a
língua quando eu converso com eles e leio os textos. Dizem que sentem
dificuldades quando escutam um norte-americano, um britânico, um indiano
falando, por exemplo. (Hermione)
Não. Raramente os diálogos contemplam algumas variedades de inglês
provenientes de outros países (de forma superficial), porém a
predominância é o inglês estadunidense. (Marcos)
Por um lado, Anastácia afirma que as diferentes variedades da LI são sim
contempladas nas atividades oferecidas pelo livro. Por outro lado, Marcos é taxativo ao dizer
que o material traz uma orientação prevalecente em direção ao ILN (nesse caso, à variedade
padrão do inglês falado nos Estados Unidos). Curiosamente, ambos são professores do nível
intermediário. Já Hermione, professora do componente Básico I, revela que os aprendizes não
são expostos a muitas variedades, e parece tentar argumentar que, por se tratar de um volume
do nível básico, talvez ainda não seja o momento ideal de apresentá-los às diversas variedades
da língua. Outro dado que merece destaque é a disposição manifestada por Anastácia em
recorrer a outros recursos para compensar os lapsos deixados pelo livro.
Ainda sobre o material adotado, na décima sexta questão94, procuramos saber se os
textos, conteúdos e atividades são condizentes com a realidade, interesses e necessidades dos
estudantes. Aqui, novamente, há divergência de opiniões:
Nem sempre, uma vez que os alunos apresentam interesses e necessidades
distintos. Há sempre a necessidade de se mesclar o trabalho com outros
recursos. (Anastácia)
Sim. Os alunos estão começando a aprender a língua e estudando a parte
mais básica agora. Estamos sempre discutindo a importância de aprender
isto e/ou aquilo em LI, relacionando o que aprendemos em sala com nossas
vivências e experiências. Portanto, buscamos trabalhar de maneira
contextual no intuito de promover uma aprendizagem que seja significativa
para os estudantes. (Hermione)
Não. (Marcos)
Identificamos que, dessa vez, Hermione é categórica para o sim e Marcos para o não.
Todavia, entendemos que Hermione não se refere, necessariamente, ao Split adotado para as
aulas de Básico I, e sim à sua forma particular de tentar garantir o estabelecimento das
94
Os textos, conteúdos e atividades do material adotado nas suas aulas são condizentes com a realidade,
interesses e necessidades dos estudantes? Explique em caso positivo.
114
relações entre as experiências dos alunos e o conteúdo que está sendo ensinado em sala e aula.
Anastácia fica no meio termo, persistindo na feliz ideia de que o trabalho com o livro adotado
deve ser mesclado com outros recursos que possibilitem a integração dos interesses e
necessidades dos aprendizes.
Para dar continuidade ao tratamento dos dados voltados para o ILF, avançaremos para
a etapa em que serão explorados os registros etnográficos feitos a partir das observações de
aulas dos professores informantes.
5.2.1.2 Análise dos dados das observações de aulas
Sabendo que a sala de aula constitui um campo plural e permanente de construção de
saberes, não podíamos deixar de adentrar esse ambiente para tentar traduzir as singularidades
e regularidades que se fazem presentes nas práticas pedagógicas dos professores pesquisados.
Além disso, com as observações, buscamos contrastar o que os informantes dizem e como, de
fato, procedem em seus espaços cotidianos de atuação.
Assim sendo, como evidenciado no capítulo metodológico (subtópico 2.4.2), fomos a
campo e observamos quatro aulas de Língua Inglesa de cada um dos professores investigados
nos seguintes níveis: Básico I, Intermediário I, Intermediário III e Avançado II, o que
totalizou 16 aulas observadas em turmas do I, III, V e VII semestres. Os dados gerados que
foram mais significativos para a nossa argumentação nesta seção serão expostos de acordo
com o nível da turma: primeiro, analisaremos os dados referentes às quatro aulas de Básico I,
da professora Hermione; em seguida, focalizaremos os registros das aulas de Intermediário I,
conduzidas pela professora Anastácia; depois nos ocuparemos dos registros das aulas de
Intermediário III, ministradas pelo professor Marcos; e, por último, discutiremos os dados das
aulas de Avançado I, do professor João. Lembramos que o registro completo de todas as aulas
observadas encontra-se nos Anexos.
Observamos as quatro aulas da professora Hermione em duas visitas, sendo duas aulas
observadas no dia 07.07.14 e as outras duas no dia 15.07.14. Salientamos que a professora
conduziu as aulas em português, com algumas intercalações em inglês. Todas as aulas
observadas foram, predominantemente, sustentadas pelas atividades propostas pelo livro
adotado, que, conforme comentado anteriormente, apresenta uma forte tendência em se
concentrar no uso da língua pelos falantes nativos, sobretudo, dos Estados Unidos. Para
ilustrar essa asserção, selecionamos um exemplo específico da aula:
115
P 95 inicia uma atividade sobre ritmo e entonação de frases e executa o áudio
equivalente. Primeiro as frases são ditas uma após outra sem interrupção e
em seguida com pausas para os alunos repetirem em coro o que ouviram. Os
AA96 repetem com alguma dificuldade e P resolve ler as frases para que os
AA possam repetir com mais facilidade. (Hermione/ Básico I, aula 1)
Essa atividade proposta pelo livro é representativa de inúmeras outras que objetivaram
a precisão e correção com relação ao modelo padrão dos nativos. Foram raros os momentos
em que os alunos puderam se desprender do livro durante as aulas. Uma situação que
envolveu a interação mais espontânea dos aprendizes, mesmo tendo como plano de fundo o
conteúdo do livro, foi a seguinte:
P pede para os AA se reunirem em duplas e conversarem sobre eventos
pessoais. P sugere aos AA falarem sobre o jogo do Brasil que acontecerá no
dia seguinte ou sobre o jogo da Argentina que, na sua opinião, também será
um evento interessante e faz comentários envolvendo os argentinos, em tom
de brincadeira. (Hermione/ Básico I, aula 1)
O que se percebe através desse exemplo é que Hermione se esforça para integrar
situações vivenciadas pelos alunos no momento da aula em que a comunicação é privilegiada,
fazendo valer um dos requisitos da abordagem centrada no aprendiz. No período em que as
aulas foram observadas, a Copa do Mundo estava sendo sediada no Brasil e como a unidade
do livro que estava sendo trabalhada trazia o tema Events, a professora suscitou,
oportunamente, esse assunto para o diálogo entre as duplas.
Ao prosseguir com a sequência do livro, a professora apresenta a lição intitulada Ask
about birthdays e pergunta aos alunos se eles sabem pronunciar os números ordinais (ordinal
numbers) em inglês. Esse momento da aula merece nossa atenção:
P passa o áudio correspondente aos numerais ordinais e, primeiro, todos
ouvem atentamente a pronúncia de cada numeral. Depois, os AA ouvem
novamente a pronúncia de cada número e repetem logo em seguida. Nesse
momento, os AA dão risadas moderadas em razão da pronúncia insistente do
th ao final da maioria dos numerais ordinais. P adverte que o fonema que
causou certo desconforto entre os AA não pertence à LP 97, e por isso eles
têm mais dificuldades ao pronunciar. Ensina que para produzir um som
aproximado à pronúncia padrão eles devem posicionar a ponta da língua
entre os dentes. E todos aceitam a explicação de P sem questionar. Ao
repetirem todos os números mais uma vez, as risadas são novamente
inevitáveis. (Hermione/ Básico I, aula 2)
95
Professor(a)
Alunos(as)
97
Língua Portuguesa
96
116
Aqui a professora, na nossa ótica, deixa passar uma oportunidade interessante de
lembrar aos alunos que a LI está sendo espalhada e desenvolvida de forma independente pelo
mundo, e que, como toda língua natural, está sujeita à variação. Nessa brecha, os aprendizes
poderiam ter sido orientados acerca da irrelevância em copiar a pronúncia do falante nativo
para o cenário das interações globais. Na contramão dessas considerações, a professora dá
dicas de como melhor se aproximar da pronúncia que foi ouvida, e, assim, conforme
constatado, os alunos seguem desconfortáveis tentando reproduzir o som que tanto lhes
causou estranheza e lhes propiciou motivo de riso. Portanto, nesse ensejo, as duas orientações
poderiam dialogar com o intento de promover o ensino da língua sob a perspectiva do ILF.
Na sequência da aula, para praticar o que aprenderam, a professora Hermione solicita
que cada um dos alunos diga para a turma a data de aniversário dos membros de suas famílias.
Esse momento da aula foi registrado como consta abaixo:
Ao longo das falas, P passeia pela sala e se aproxima do A que está com a
palavra, demonstrando dar a devida atenção à fala do A. P faz algumas
intervenções, perguntando, por exemplo, o nome do membro da família a
que o A se refere, também se o A se refere ao irmão mais velho ou mais
novo, etc., só há auxílio na pronúncia das palavras e, especialmente, na
pronúncia dos ordinal numbers, se solicitado pelo A. Uma A menciona as
datas com alguma dificuldade, mas P não corrige problemas com pronúncia.
(Hermione/ Básico I, aula 3)
Tal trecho se faz útil porque nos permite observar que a professora não se mostra
apegada à correção linguística enquanto os alunos tentam se comunicar. Nessa lógica, ela
parece concordar que não é importante “[...] se a língua está de acordo com as regras de
código ou com as convenções de uso, desde que seja inteligível e pragmaticamente
eficiente”98 (WIDDOWSON, 2012, p. 21). Constatamos que as correções só aconteciam se os
próprios aprendizes sentissem a necessidade. Dessa forma, as intervenções da professora se
limitavam a fazer com que as falas dos alunos fluíssem de forma a garantir a inteligibilidade
na comunicação.
Também foram necessários dois dias de visita (15.07.14 e 21.07.14) para observar as
quatro aulas de Intermediário I. As aulas foram ministradas em inglês e embora todas elas
tenham sido direcionadas pelo livro adotado, a professora Anastácia oportunizou diversos
98
[…] whether the language conforms to established code rules or usage conventions so long as it is intelligible
and pragmatically effective.
117
momentos em que questões linguísticas e culturais puderam ser problematizadas. Nesse ponto
do trabalho, daremos destaque a um momento específico da aula em que foi realizada uma
atividade de Listening Comprehension constituída por cinco diálogos, todos eles entre uma
vendedora e um consumidor. Os consumidores são falantes não nativos da LI, e esse fato
concedeu à professora espaço para discutir aspectos relacionados ao sotaque:
[...] P faz comentários sobre os diferentes sotaques que foram ouvidos ao
longo da gravação, e pergunta se eles notaram a diferença entre os sotaques e
se eles conseguiram entender melhor um do que o outro. E lança a pergunta:
“Vocês acham que o sotaque do francês, da espanhola, da chinesa e do árabe
tem alguma diferença ou parece ser o mesmo na opinião de vocês?” Todos
os AA concordam que eles têm notadamente sotaques diferenciados. E um A
chega a dizer que o sotaque chinês é engraçado. P adverte que não é uma
questão de ser engraçado ou não, pois eles mesmos têm um sotaque peculiar
de baianos que falam inglês, e acrescenta que o sotaque deles os persegue
onde quer que estejam, falando a língua que for. P pergunta: “Have you ever
listened to Gilberto Gil or Caetano Veloso singing in English? Note, their
accent is there!” P ainda comenta que é possível perceber claramente
algumas particularidades na fala da chinesa falando inglês, reproduzindo as
próprias palavras de P: “she sounds like a Chinese girl talking in English”. E
assinala que com eles acontece a mesma coisa e propõe que os AA gravem
suas próprias vozes falando inglês para que eles possam observar sua
pronúncia e sotaque de brasileiros falando inglês. (Anastácia/ Intermediário
I, aula 3)
Tendo por base a atitude de Anastácia, podemos dizer que ela reconhece como
inevitável o fato de que todos os usuários que não tenham a LI como L1 utilizarão o inglês
com algum traço do sotaque de sua primeira língua. Tendo, supostamente, assumido esse
posicionamento, a professora consegue discutir eficientemente o referido tema com os alunos.
Constatamos, a partir dessa e de outras atividades trabalhadas ao longo das aulas, que o
material adotado realmente inclui falantes de diferentes nacionalidades para exemplificar a
diversidade da língua, mas, sem dúvida nenhuma, a ênfase é dada aos modelos linguísticos
hegemônicos.
Já as aulas do professor Marcos foram observadas nos dias 27.05.14 e 03.06.14. Por se
tratar de aulas de Intermediário III, professor e alunos só se comunicavam em inglês. O
professor reservou as duas aulas do primeiro dia de observação para uma apresentação
individual que privilegiou a produção oral dos alunos. Já nas duas aulas do segundo dia, as
aulas foram estritamente centradas no livro adotado. Tanto em uma ocasião como na outra,
pudemos notar o interesse do professor em incentivar a prática da língua pelos alunos. É o que
se pode conferir nos segmentos a seguir:
118
P concede a cada A 5 minutos para a apresentação e pede que os AA se
expressem naturalmente, e que sejam eles mesmos ao se comunicarem.
(Marcos/ Intermediário III, aula 1)
P diz que ele sabe que é desafiador ficar em frente às pessoas e falar inglês, e
explica que é necessário desconstruir essa ideia, que o importante não é a
perfeição e que quando eles tiverem uma oportunidade para praticar que
praticassem sem medo. (Marcos/ Intermediário III, aula 4)
P convida a segunda dupla voluntária para socializar o diálogo. Mais uma
vez P pede para que os AA não fiquem nervosos, que tentem ser eles
mesmos e deixem a conversa fluir. (Marcos/ Intermediário III, aula 4)
O incentivo do professor para os alunos não terem receio de se apropriarem da língua
que estão aprendendo é bastante positivo. Mas, mesmo assim, a certa altura da aula 3, o
professor comenta, de modo discreto com a pesquisadora, que é muito difícil fazê-los falar.
Por outro lado, foi possível perceber que os alunos se sentiam mais à vontade para conversar
em inglês com os colegas em particular do que com o professor em frente à turma toda. Para
ser mais eficaz em suas tentativas de encorajar os alunos a se expressarem naturalmente, seria
salutar, na nossa opinião, que o professor aliasse ao seu discurso alguns dos princípios
sustentados pelo paradigma do ILF e enfatizasse o porquê que, para se tornar um falante
competente, não é preciso se adequar totalmente às normas padrão dos falantes nativos. Na
realidade, acreditamos que os futuros professores precisam estar conscientes do pluralismo
envolvido no uso da língua para que, além de se sentirem mais seguros e capazes, também
propaguem esse conhecimento em suas futuras salas de aula.
Partimos agora para a análise do registro feito no início da aula 3, do dia 03.06.14:
A pesquisadora entra na sala e informa aos AA que mais duas aulas serão
observadas. Nesse momento, de modo reservado, P entrega à pesquisadora
uma folha com o script referente ao áudio de uma atividade de Listening
Comprehension. P solicita que a pesquisadora leia a fala de uma das duas
pessoas que participam de cada um dos quatro diálogos que os AA
precisarão ouvir para responder à atividade. P informa à pesquisadora que
não costuma levar o aparelho de som para a sala de aula e que é habitual que
ele mesmo faça a leitura dos scripts para os AA. Já sentada em seu lugar, a
pesquisadora observa que no script está sinalizado que um dos falantes de
um diálogo é chinês e em outro diálogo um falante australiano participa da
conversa. (Marcos/ Intermediário III, aula 3)
Este momento da aula se faz relevante porque nos dá a chance de destacar que a
exposição dos aprendizes tanto aos modelos nativos (não só os hegemônicos) quanto aos
modelos não nativos da língua é imprescindível para que eles possam tentar “responder de
119
forma mais realista à lógica mundial que hoje experimentamos” (SIQUEIRA, 2008, p. 314).
Nesse sentido, além de ser essencial possibilitar o contato dos alunos com o material de áudio
que acompanha o livro adotado, seria bastante oportuno, para os professores dispostos a
integrar o paradigma do ILF em seu contexto de ensino, complementar as suas aulas com
corpora dedicados ao uso do inglês por falantes de diferentes línguas maternas, a exemplo do
VOICE, que, como vimos, consiste em um banco de dados com gravações e transcrições de
áudio de interações orais em LF que foram disponibilizados online para pesquisadores de todo
o mundo interessados na área.
Consoante Seidlhofer (2004), os eventos de fala que são disponibilizados pelo VOICE
ocorrem em uma série de ambientes (profissionais, informais, educacionais), com funções e
domínios variados, a partir de interações em diálogos, grupos de discussão, conversas casuais
ou entrevistas. Como se pode ver, trata-se de um material valioso, cujo principal objetivo
consiste em descobrir as características mais comuns que emergem dos usos do ILF, e que
pode auxiliar o professor na desconstrução da representatividade do falante nativo como
sendo a autoridade máxima na língua, em sua sala de aula.
Diferentemente das demais observações, todas as aulas de Avançado II foram
observadas em um único dia (18.07.14). Importante ressaltar que em determinado momento
da aula 2, o professor explica, reservadamente, para a pesquisadora que preferiu não adotar o
livro no semestre em questão, porque ele detectou que a turma estava muito desnivelada, e,
portanto, julgou ser melhor selecionar o material conforme às necessidades apresentadas pelos
alunos. Desse modo, o professor revelou que um dia é destinado para conversação, outro para
revisão de tópicos gramaticais e assim por diante. Como não poderia deixar de ser, todos
interagiram somente em inglês ao longo das quatro aulas, que, por sinal, foram integralmente
dedicadas à prática da habilidade oral pelos alunos:
P pede à turma para se dividir em grupos de quatro alunos, e diz que serão
projetadas algumas warm up questions pelo data-show, ele esclarece que não
quer que tais perguntas sejam respondidas para ele ou para a turma toda, mas
deverão ser discutidas apenas entre os integrantes do grupo [...] P não faz a
leitura das perguntas e informa que não é necessário escrever, apenas
discutir. (João/ Avançado II, aula 1)
P entrega uma folha com uma lista de quinze provérbios em inglês e pede
para os AA permanecerem em grupos para discutir entre si o significado de
cada um deles. (João/ Avançado II, aula 3)
A primeira proposta de discussão perdurou as duas primeiras aulas e a segunda,
ocupou as duas últimas aulas. A tarefa do professor resumiu-se em supervisionar o diálogo
120
entre os alunos, esclarecendo dúvidas relacionadas ao vocabulário e contribuindo para a
correta compreensão dos provérbios da lista. O professor permitiu que os alunos se
comunicassem livremente, sem insistir na mimetização do Standard English, britânico ou
americano. Assim foi possível para os alunos colocar o inglês que eles aprenderam em
movimento, sem se intimidar com a expectativa de serem corrigidos.
Concluídas as nossas considerações acerca dos registros feitos sobre as observações de
aula, o próximo passo é descobrir o que os dados coletados por meio da entrevista semiestruturada revelam sobre a visão dos professores formadores pesquisados acerca de questões
atinentes ao ILF.
5.2.1.3 Análise dos dados da entrevista
Neste item, propomos analisar os dados gerados pela entrevista semi-estruturada (Ver
Anexos I, J e K) para a qual os quatro informantes da pesquisa foram convidados a participar.
Conforme ressaltado na seção destinada à descrição dos procedimentos de coleta de dados
(seção 2.5) no Capítulo 2 deste trabalho, foram necessárias três sessões para que a entrevista
fosse realizada com todos os participantes. No dia 06.08.14, conseguimos reunir os
professores Anastácia e João para uma entrevista coletiva. Já Hermione e Marcos foram
entrevistados cada um separadamente, a primeira no dia 01.09.14 e o segundo no dia
17.09.14.
Nessa parte do trabalho, nos interessam os dados derivados das duas primeiras
questões do roteiro (Ver Apêndice B). Vale lembrar que, conforme mencionado no capítulo
metodológico (subseção 2.4.3), o roteiro integra quatro perguntas principais que não
limitaram, mas apenas direcionaram a conversa. Os excertos que serão reproduzidos aqui se
referem às falas que melhor contribuíram para confirmar, esclarecer e/ ou complementar
informações obtidas ao longo das fases de coleta de dados anteriores. As respostas dos
entrevistados serão expostas de acordo com a necessidade da discussão.
A primeira questão tomou por base uma paráfrase de Crystal (2012 apud EL KADRI;
GIMENEZ, 2013, p. 130), em que o autor aponta que
[...] é preciso distinguir o que é recepção do que é produção [em LI]. Embora
seja necessário compreender diferentes variedades e tomá-las como
exemplos da diversidade linguística, na sua produção, não há como fugir da
ideia de se adotar uma variedade de ampla circulação como as dos países do
chamado Círculo Interno.
121
Depois de acompanharem a leitura do referido trecho, perguntamos aos professores se
eles concordam com tal afirmação. Todos os entrevistados admitem que os alunos devem ser
expostos às diferentes variedades do inglês, mas ainda se encontram muito apegados à ideia
de que o inglês que deve ser ensinado, pelo menos de início, é o padrão pertencente aos
falantes nativos. Nossa inferência encontra respaldo nas seguintes respostas, em especial:
A99 : [...] talvez fosse o caso de adotar ou tomar por base o Standard, um dos
referenciais, mas não deixar de expor os alunos às outras variedades, para
eles perceberem a presença das outras variedades [...]
H100 : Eu acredito que é necessário tomar como ponto de partida uma
variedade padrão. [...] muitas vezes a gente não trabalha só com a
variedade americana, mas também com a britânica, ou com a canadense,
com a australiana [...]
Um dado interessante na fala da professora Hermione é que mesmo quando ela diz
trabalhar com diferentes variedades do inglês, a ligação com o inglês padrão dos países do
Círculo Interno é mantida, é o que se observa quando ela cita os ingleses britânico, canadense,
australiano, como variedades legítimas de ensino. De igual modo, o professor Marcos
reconhece que são raros os momentos em que as diferentes variedades do inglês são
focalizadas em sua sala de aula e o que predomina mesmo é o trabalho com o inglês dos
Estados Unidos.
Por certo, os proponentes do ILF não defendem a rejeição de todas as normas e
padrões, mas orientam os professores a reavaliarem a justificativa desses parâmetros para o
ensino, principalmente em contextos em que o inglês será usado como língua internacional de
comunicação. Permitir que os aprendizes tenham contato com outras variedades do inglês
pode fazer com que eles relativizem a suposição do status superior do inglês padrão e refutem
o argumento de que o inglês dos falantes não nativos seja, por definição, defeituoso, incorreto
e indesejável (SEIDLHOFER, 2011).
Começamos a segunda questão do roteiro previamente elaborado para a entrevista,
afirmando que as noções de “falante nativo” e “propriedade do inglês” têm sido radicalmente
postas em xeque. Em seguida, procuramos saber dos entrevistados em que momento da
formação dos estudantes de Letras/Inglês, os aprendizes deveriam ser despertados para essa
realidade e para o fato de que eles precisam se sentir donos da língua que estão aprendendo.
Os professores responderam em tom uníssono que é necessário que os alunos aprendam a
99
Anastácia
Hermione
100
122
utilizar o inglês a seu próprio favor desde os primeiros contatos com a língua. O professor
João, por exemplo, se manifestou afirmando que, desde o início, os alunos precisam
“perceber que a LI é tanto deles quanto dos falantes nativos”. Já Anastácia, depois de
externar a sua opinião, ponderou que não se deve esquecer de considerar o nível de
maturidade dos aprendizes. Marcos, por sua vez, desenvolve a resposta da seguinte maneira:
M101 : então, a questão de falantes nativos, a questão de língua pura, nesse
mundo globalizado não há mais lugar, não é?[...]
Pesq.102 : exatamente.
M: então, a gente tem que começar a trazer para a sala de aula, questões
referentes à globalização como uma propulsora d essas questões
interculturais, da mestiçagem, não só de língua, como de pessoas também e
tentar mostrar como isso é construído, né?
Pesq.: então logo no início eles devem se familiarizar com essas questões
todas.
M: isso. Logo no início. Lógico, não trazendo textos muito teóricos, mas já
mostrando o aluno a necessidade de pensar dessa maneira, né? De buscar
mais uma perspectiva de desconstrução de modelos hegemônicos.
A partir da amostragem acima, somos levados a pensar que o professor Marcos, pelo
menos no âmbito desta pesquisa, reconhece o contexto da sala de aula como um espaço para a
desconstrução de “[...] concepções errôneas acerca das relações estabelecidas entre língua e
cultura, entre língua e ideologias, entre língua e poder, entre língua e seus falantes/usuários
[...]” (FIGUEREDO, 2011, p. 89). O professor em questão mostra-se igualmente consciente
de que distorções em torno desses construtos podem prejudicar o processo de ensino e
aprendizagem da língua. O excerto abaixo realça essa visão:
M: e, um problema que eu observo é, até na universidade, tem professores
que eles trazem aqueles rádios, né? Os CDs e até o pendrive, também, com
essa fala nativa, e eles querem que os alunos reproduzam igualmente aquela
fala nativa, ou seja, sotaque, a pronúncia... e a gente sabe que é impossível
isso. Então, os professores, a maioria, não tendo conhecimento, eles acabam
excluindo esses alunos do processo de aprender as línguas, né?
O ponto chave dessa enunciação do professor Marcos, nos permite estabelecer um
alinhamento àquilo que Seidlhofer (2011) propõe: ou os professores continuam insistindo em
101
102
Marcos
Pesquisadora
123
ensinar uma competência que os aprendizes raramente alcançam, ou passa-se a considerar
objetivos mais realistas que reflitam o processo de aprendizagem e correspondam aos
requisitos da maioria dos usuários da língua que se movem pelo desejo de comunicação em
uma sociedade global.
Concluída esta seção em que discutimos os dados relacionados ao ILF, partimos agora
para a descrição, análise e discussão dos dados do segundo pilar que sustenta o nosso trabalho
de pesquisa, isto é, a perspectiva intercultural no ensino de LI.
5.2.2 A visão dos professores formadores sobre a interculturalidade
5.2.2.1 Análise dos dados do questionário
A discussão deste tópico será desenvolvida com base nas questões 12, 13 e 14 que
compõem o terceiro bloco de perguntas relacionadas à interculturalidade, e também se
ocupará da questão 17 que trata da presença de aspectos interculturais no material adotado e
que consta do quarto bloco de perguntas do questionário. Zelaremos para que todos os dados
gerados a partir dessas quatro questões nos levem a uma melhor compreensão de como tais
fatores têm sido percebidos e tratados cotidianamente pelos profissionais investigados em
seus espaços de atuação.
Como vimos discutindo no Capítulo 4 deste trabalho, o professor de inglês que
reconhece a internacionalização da LI, estará em vantagem se levar em consideração a cultura
e as relações interculturais em sala de aula (SIQUEIRA, 2011a), pois essa prática visa a
promover a integração e o respeito à diversidade dos povos, permitindo ao aprendiz “uma
constante reflexão não somente sobre a língua-cultura-alvo, mas também sobre a línguacultura-nativa” (MENDES, 2007, p. 124). Com isso em vista, formulamos a décima segunda
questão103 do questionário que buscou investigar o que os professores entendem por
competência intercultural. As respostas coincidem com a teorização de Mendes (2007).
Vejamos:
A forma pela qual interagimos com culturas distintas, percebendo suas
particularidades em relação à cultura que convivemos, sem considerá-la
melhor ou pior, partindo sempre do respeito às diferenças. (Anastácia)
103
O que você entende por competência intercultural?
124
Acredito que seja a capacidade de interagir com diferentes culturas,
valorizando-as e respeitando-as. (Hermione)
Entendo como uma forma de trabalhar o respeito às diferenças culturais,
dessa forma o aluno descobre que não há cultura melhor que outra. (João)
Competência intercultural, em minha opinião, é a capacidade de o sujeito
colocar-se no lugar do outro com o objetivo de entender como esse outro
compreende o mundo social em sua volta. É tentar enxergar o mundo
através da lente dos olhos do “outro”. Porém essa compreensão não é, de
forma alguma, ingênua: “compreender” o outro (e sua cultura), “respeitar”
o outro (e sua cultura) é resultado de um processo de construção identitária
onde estão envolvidas questões de ideologia e poder. Essas questões devem
ser problematizadas e fazem parte da competência intercultural. (Marcos)
Todos os professores enfatizam de forma unânime a importância do respeito às
diferenças ao explicitarem como a competência intercultural é por eles concebida. Marcos
desenvolve a sua resposta indo além de questões meramente conceituais e faz emergir a sua
compreensão sobre as questões ideológicas que não podem ser divorciadas do processo da
construção identitária dos sujeitos. Tendo demonstrado consciência do que seja a competência
intercultural, procuramos saber dos informantes, por meio da décima terceira questão 104, de
que forma a cultura é tratada em suas salas de aula:
Procuro partir do local para o global, aproveitando situações do dia -a-dia
para introduzir situações mais amplas. (Anastácia)
Enquanto estudamos a língua inglesa, o componente cultural está sempre
presente, uma vez que falamos sobre nossa cultura brasileira – que é
extremamente plural – e a cultura do outro – do norte-americano, do
britânico, do italiano, do indiano, do argentino etc. Não consigo dissociar
língua de cultura. (Hermione)
Eu busco ter uma prática regular. Tento não cometer falhas que vão contra
minhas crenças e conhecimentos para o ILF, por outro lado, não sou
obcecado por ensinar cultura em minhas aulas. (João)
Eu sempre converso com meus alunos sobre questões de cultura sob um viés
crítico. Muitas vezes deixo de lado o livro didático e tento discutir com meus
alunos questões geopolíticas das línguas [...] (Marcos)
Nas respostas de Anastácia, Hermione e Marcos, há sinais de que entendimentos mais
complexos da relação entre língua e cultura ocupam um espaço importante em suas agendas;
parece haver, em particular, uma crescente conscientização do papel vital do inglês para a
comunicação intercultural. Um dado relevante a ser destacado é que quando Anastácia e
104
De que forma a cultura é tratada em sua sala de aula?
125
Hermione dizem priorizar tanto a cultura local quanto a global em sala de aula, elas deixam
transparecer uma consciência cultural crítica. A consciência cultural crítica, segundo Aguledo
(2007), instiga os professores a valorizarem a língua e cultura dos alunos para que, assim, haja
uma atitude positiva em direção à cultura alvo. Entretanto, o professor João deixa claro em
sua própria colocação que a cultura não encontra um lugar privilegiado em suas aulas.
Com base no exposto e a partir de nossas reflexões, entendemos que mesmo quando a
natureza plural das comunidades, línguas e culturas são reconhecidas no ensino de línguas,
desprender-se de perspectivas tradicionais baseadas na competência comunicativa permanece
desafiador. Em vista disso, perguntamos aos professores pesquisados qual é o maior desafio,
na opinião deles, para transformar a sala de aula em um espaço onde a interculturalidade se
faça cada vez mais presente e reconhecida. As respostas a essa décima quarta questão 105 estão
dispostas abaixo:
[...] o desafio maior começa fora da escola, se o aluno não respeita/ aceita,
um colega, vizinho, conhecido, parente, outro ser humano qualquer de cor,
opção sexual, religião, ou até mesmo um time de futebol diferente do seu,
vai ser difícil o professor trabalhar o ensino de línguas sobre a perspectiva
intercultural antes de romper tais barreiras. (Anastácia)
O grande desafio é apenas desejar fazer isto. Estudar a língua inglesa nos
permite naturalmente trabalhar sob uma perspectiva intercultural, pois se
trata de uma língua que faz parte da realidade de inúmeras culturas
diferentes. (Hermione)
Quando conseguirmos convencer a todos que a LI já é mais falada como L2
do que L1 e que as aulas de LI devem preparar os alunos para se
comunicarem com qualquer cidadão, independente de sua primeira língua.
(João)
O problema reside na má formação do professor de línguas, na graduação.
É necessário que haja um redimensionamento curricular e que a questão da
interculturalidade seja contemplada, de fato, no currículo. Porém reflito: a
universidade está preparada para abordar essas questões de forma crítica?
[...] Creio que haveria uma necessidade maior de professores mestres e
doutores com formação no campo aplicado. (Marcos)
Nos excertos em tela, diferentes variáveis são salientadas. Na opinião de Anastácia, o
desafio reside em fazer com que os alunos aceitem e respeitem as peculiaridades da cultura do
outro, a começar de suas relações cotidianas. A respondente indica, tacitamente, que o
reconhecimento da “[...]igualdade de direitos humanos como a base democrática para a
105
Em seu ponto de vista, qual é o grande desafio para transformar a sala de aula em um espaço para a difusão
da interculturalidade?
126
interação social” (BYRAM et al., 2002, p. 9) é fundamental para o ensino de língua sob a
perspectiva intercultural. Hermione e João se posicionam afirmando que o grande desafio está
na vontade do próprio professor em trabalhar sob essa perspectiva, pois a LI com seu status
global, por si só, já traz em seu bojo as questões ligadas à interculturalidade. Para Marcos, o
que é desafiador é capacitar futuros professores a serem mediadores culturais, e propiciar
oportunidades para que eles explorem suas próprias identidades culturais através de lentes
críticas e reflexivas. Em outras palavras, o informante defende que o grande desafio é fazer
com que mudanças curriculares ocorram nos cursos de formação.
Vimos considerando, ao largo de nossa discussão, que os professores têm a
responsabilidade de encorajar os alunos a refletir sobre as diversas visões de mundo para que
seja estabelecido um diálogo entre diferentes realidades e conhecimentos. Assim sendo,
materiais que trazem conteúdos estereotipados e superficiais de outras culturas e pessoas de
um território nacional definido são mais propensos a impedir do que auxiliar na comunicação
e colaboração intercultural (BAKER, 2015).
Levando isso conta, nos voltamos para a décima sétima questão106 do questionário, que
visou inquirir aos docentes pesquisados se a perspectiva intercultural é viabilizada no material
utilizado por eles. Aproveitamos para lembrar que o professor João não respondeu às questões
relacionadas ao livro adotado, por não tê-lo utilizado no semestre em que a pesquisa foi
realizada. As repostas dos outros três professores foram as seguintes:
Sim, principalmente nas atividades de listening apresenta falantes de
diversos lugares do globo e suas particularidades na pronúncia da língua.
Penso que este seja falho no que tange à parte imagética, embora traga
pessoas dos mais distintos lugares do globo com suas características físicas
particulares, enfatiza pouco suas atividades cotidianas, particularidades
inerentes as culturas dessas pessoas, cabendo ao docente esse papel muitas
vezes. (Anastácia)
O livro adotado, neste nível em que estamos, viabiliza pouco esta
perspectiva. Nos níveis mais avançados, ele proporciona uma relação mais
ampla entre culturas diferentes. Entretanto, mesmo utilizando este livro,
busco dialogar com as culturas dos alunos, com suas diferentes realidades.
Além disso, trabalho com outros materiais com este mesmo objetivo.
(Hermione)
O material didático não viabiliza a perspectiva intercultural. Mais uma vez
retomo a questão perguntando sobre quem produz esses materiais e por que
a questão da cultura não é problematizada nesses materiais. Acredito que o
não problematizar questões culturais nos exemplares didáticos é uma
posição política intencional. É resultado da ação dos intelectuais da classe
106
O material adotado viabiliza a perspectiva intercultural? Se afirmativo, de que forma?
127
hegemônica. É a perpetuação do poder e hierarquização das classes sociais.
(Marcos)
As respostas acima apresentam um posicionamento bastante semelhante àquele
defendido pelos professores quando foram questionados sobre a presença de diferentes
variedades do inglês nas atividades do livro. Aqui, Anastácia reafirma que o material inclui
uma grande variedade de ingleses e associações culturais. Contudo, ela revela que o
tratamento dessas questões é superficial e precisa ser complementado pelos docentes.
Hermione, mais uma vez, relata a incipiência do livro no nível básico no que se refere à
pluralidade linguística e cultural da LI, mas não deixa de nos informar sobre o seu cuidado em
suprir tais carências. Já a resposta de Marcos desliza novamente para o não. Ele acredita que o
material didático adotado não oportuniza aos alunos enxergar o mundo através de lentes
multicolores e acentua que a visão monocromática desses materiais é sustentada por interesses
políticos.
Para substanciar as colocações dos professores sobre a perspectiva intercultural de
ensino de LI analisadas neste item, seguimos para o próximo, com as constatações
interprendidas a partir das aulas observadas.
5.2.2.2 Análise dos dados das observações de aulas
Nesta etapa, nos concentraremos nos momentos de aula que nos permitiram visualizar
como as questões culturais são trabalhadas nas práticas pedagógicas dos professores
pesquisados. Continuaremos com o mesmo parâmetro de análise utilizado na discussão dos
registros etnográficos em torno do paradigma do ILF no subtópico 5.1.1.2 deste capítulo.
Nesse sentido, os dados serão dispostos a começar do nível mais básico em direção ao nível
mais avançado das turmas.
Nas aulas de Básico I, aspectos culturais foram raramente suscitados. Quando
suscitados, foram tratados de forma bastante breve e pontual. O momento da aula em que a
professora realiza uma atividade com uma cena de uma sitcom 107 pode ilustrar essa
constatação. Para contextualizar, convém informar que a cena reproduzida acontece em um
restaurante e tem como foco a conversa de um casal de namorados.
P faz perguntas utilizando o vocabulário utilizado na cena do vídeo.
Interessante dizer que o rapaz chega ao restaurante às 6:02 p.m. e o encontro
107
Top Notch Fundamentals – Unit 5 – Part 1
128
foi marcado às 6:00 p.m. A moça diz que ele está atrasado. P aproveita essa
situação para perguntar se os AA consideram que o rapaz está mesmo
atrasado, e a maioria responde que não. Nesse momento, um aluno informa
que só em algumas culturas como a Alemã, isso seria um atraso. (Hermione/
Básico I, aula 4)
Após a comparação feita pelo aluno, nenhum outro comentário foi acrescentado ao
assunto, o que demonstra um engajamento pouco significativo com as práticas culturais. No
tocante à temática, Baker (2015) adverte que as comparações culturais devem ser abordadas
com cuidado na sala de aula, pois imagens e afirmações simplistas acerca de outras culturas
podem resultar em representações essencialistas sobre o outro. A esse respeito, o autor denota
que abordagens transculturais que comparam afirmações generalizadas de determinada cultura
com afirmações generalizadas de outra cultura, tais como aquelas encontradas em muitos
materiais de ensino de línguas, são bastante problemáticas:
Primeiramente, elas focalizam a comparação de culturas em um nível
nacional, e negligenciam outros grupos ou identificações culturais. Em
segundo lugar, elas estão baseadas no equívoco de atribuir ao indivíduo
descrições culturais de práticas comunicativas de um grupo [...] Em terceiro
lugar, comparações transculturais assumem que as práticas comunicativas
das pessoas são imutáveis [...] Por último, elas podem obscurecer relações de
poder que podem estar implícitas em comparações que sugerem que um
conjunto particular de práticas comunicativas são mais normais e
„preferíveis‟ enquanto outras são anormais e „inferiores‟108 (BAKER, 2015,
p. 138).
Portanto, quando as comparações são feitas, as imagens e representações de outras
culturas devem sempre ser reconhecidas como parciais. Isso implica mostrar aos alunos uma
série de representações culturais diferentes e explorá-las de forma crítica, conforme esboçado
nos componentes da consciência intercultural, apresentados no capítulo anterior.
Com referência às aulas de Intermediário I, notamos uma maior preocupação por parte
da professora em propiciar momentos em que questões culturais fossem privilegiadas. Na
segunda aula observada, por exemplo, ocorrida no dia 15.07.14, antes de introduzir um tópico
da sequência do livro sobre entretenimentos e eventos culturais, a professora Anastácia
procede da seguinte maneira:
108
Firstly, they focus on comparing cultures at the national level, and neglect other cultural groupings or
identifications. Secondly, they are based on a misconception of cultural descriptions as synonymous with
individuals in ascribing descriptions of the aggregated communicative practices of a group to the individual […]
Thirdly, cross-cultural comparisons assume that people‟s communicative practices are unchanging. […] Lastly,
they can obscure power relationships that may be implicit in comparisons that su ggest a particular set of
communicative practices are more normal and „preferred‟ whereas others are deviant and „inferior‟.
129
P [...] exibe uma imagem, na TV de 42”, de um panfleto da Festa de Santana
(festa popular da padroeira da cidade de Caetité) que acontecerá na cidade,
na semana seguinte. P informa que têm atrações para todos os gostos
musicais e mostra os artistas que estarão presentes na festa. P faz uma série
de perguntas sobre cada uma das atrações [...] e as direciona ora ao coletivo,
ora a AA selecionados para que todos participem. Boa parte dos AA interage
entusiasmada. (Anastácia/ Intermediário I, aula 2)
Tendo iniciado o tema com a discussão sobre um evento cultural típico da cidade onde
os alunos moram/estudam, a professora demonstra consciência da importância de trazer para a
sala de aula informações que não estão exclusivamente ligadas à cultura alvo, conforme
preconiza a abordagem comunicativa. Desta feita, só depois de discutir sobre uma prática
cultural da perspectiva dos alunos é que a professora segue ampliando o tema e propõe uma
atividade de Listening comprehension que requer a compreensão dos alunos acerca da cultura
do outro (nesse caso, dos americanos).
Em outro momento da aula, a mesma estratégia mencionada acima foi utilizada para
trabalhar com o tema “gostos musicais”. Além disso, a professora suscitou uma breve
conversa sobre estereótipos e aproveitou para incentivar o respeito à diferença. É o que
podemos constatar no registro abaixo:
P pergunta a determinada A se ela gosta de Arrocha 109 , depois pergunta a
outro A se ele gosta de Country Music, sempre instigando que eles
expliquem porque gostam ou porque não gostam, o A responde que Country
Music não faz seu estilo, e que prefere Rock. Logo em seguida, P pergunta:
“Do you have some stereotypes related to your tastes on songs?” E, para
exemplificar, pergunta aos AA o que vem na mente deles quando eles ouvem
a palavra Reggae. Os alunos respondem que lembram de Bob Marley, de paz
e amor, de calmaria, de negros, da Jamaica. P ainda pergunta: “What about
Classical Music? Os AA respondem: “Beethoven, sono, tédio” e, assim, P
conclui “Did you see that you have some stereotypes? E, por fim, alerta
“Open your minds, guys, you can have your own opinion but you have to
respect the others”. Um A colabora com a fala de P e diz que ele não gosta
de Country Music, mas respeita aqueles que gostam. (Anastácia/
Intermediário I, aula 3)
Embora o assunto não tenha sido amplamente explorado, nota-se que a professora
apresenta uma consciência cultural que ultrapassa, de certa forma, o nível 1 do modelo de
consciência intercultural proposto por Baker (2011, 2012). A título de recapitulação, esse
nível de consciência está relacionado à compreensão da cultura materna e sua importância na
109
Ritmo musical originário do estado da Bahia. Estilo proveniente da seresta, influenciado pela música brega e
romântica, com modificações que o tornaram mais sensuais.
130
comunicação. Também envolve a consciência de que outras culturas são diferentes, mas não
inclui um conhecimento específico sistematizado dessas outras culturas. A isso, soma-se a
habilidade de articular a própria perspectiva cultural com a habilidade de fazer comparações
generalizadas entre a cultura nativa e a cultura do outro (BAKER, 2011). A nosso ver, é neste
ponto que a professora alcança, mesmo que tangencialmente, o nível 2 da consciência
intercultural, pois ela tenta desenvolver nos alunos a capacidade de ir além das generalizações
em resposta a instâncias culturais específicas.
Com o fim de continuar na discussão sobre os níveis de consciência intercultural
sistematizados por Baker (2011, 2012), observemos, agora, a sequência didática a seguir.
20:22 – P [...] pede para todos desenharem um quadro no caderno,
semelhante ao ilustrado no quadro branco. P explica que eles vão ouvir
algumas músicas e, à medida que forem ouvindo a canção, eles devem
pensar e escrever uma palavra que vem a cabeça com relação a um lugar,
pessoa, comida, cor e como eles se sentem ao ouvir cada uma das músicas.
20:27 – P reproduz a primeira música “Best day of my life” da banda de indie
rock American Authors e reforça que, enquanto estão ouvindo, eles devem
imaginar e completar as informações do quadro (Place, Person, Food,
Color, Feeling). Depois de passar a primeira música, P imediatamente
menciona um lugar que veio à cabeça dela ao ouvir a música, e depois
pergunta a alguns AA da turma sobre o lugar que eles pensaram, e procedeu
da mesma forma com todas as outras informações do quadro.
20:32 – P reproduz a segunda música “Summer nights” do filme
estadunidense Grease, e segue informando o que imaginou e interrogando os
AA sobre o que anotaram sobre cada um dos tópicos ao ouvirem a música.
Todos da turma demonstraram-se motivados em participar. A terceira
música é exibida: "I'm glad you came" da banda britânica The Wanted. Logo
em seguida, reproduz a quarta música "Wonderwall" da banda de rock
também britânica Oasis. (Anastácia/ Intermediário I, aula 3)
Se a professora não tivesse escolhido apenas músicas americanas e britânicas para a
realização da atividade acima descrita, mas, ao contrário, tivesse incluído no repertório
músicas que permitissem o movimento dinâmico entre o local e o global, esse mesmo formato
de atividade proposto poderia ter sido aplicado em sala de aula de maneira a alcançar o
terceiro e último nível de consciência intercultural apontado por Baker (2012). Explorar o
leque de possibilidades culturais de forma crítica pode fornecer oportunidades valiosas para o
desenvolvimento da consciência intercultural, diz o autor.
Como ressaltado em ocasião anterior, as duas primeiras aulas de Intermediário III,
observadas no dia 27.05.14, foram destinadas à realização de uma atividade individual e oral
que consistiu em apresentar para a turma o resultado da pesquisa feita sobre um filme,
131
escolhido pelo próprio aluno. O roteiro de apresentação foi guiado por questões previamente
propostas pelo professor. Para as apresentações, todos os alunos se basearam em produções
hollywoodianas, com a exceção de um aluno em especial que optou por priorizar o filme
brasileiro “Tropa de Elite”. O que nos chamou a atenção, no entanto, foi o fato de a maioria
da turma reagir com risadas frente à opção cinematográfica desse aluno. Tal reação, bem
como a escolha majoritária por filmes americanos para a realização do trabalho, nos dá pistas
de que os modelos hegemônicos, sejam eles linguísticos ou culturais, ainda são considerados
de maior prestígio para muitos alunos.
De forma semelhante às ponderações que fizemos a respeito da atividade proposta pela
professora Anastácia, cremos que o professor Marcos também poderia ter aproveitado o
ensejo das apresentações para incentivar o desenvolvimento da consciência intercultural
nessas duas aulas em análise. Encorajar os alunos a explorar imagens da cultura local e
também de outras culturas que não estejam ligadas apenas aos países do Círculo Interno pode
levá-los a desenvolver uma visão mais crítica e dinâmica das relações entre o inglês e os seus
múltiplos cenários socioculturais (BAKER, 2012). Se os alunos estivessem conscientes da
necessidade de se considerar diferentes representações culturais na aprendizagem de LI, eles
dificilmente reagiriam do modo como reagiram diante da presença de uma produção fílmica
nacional na aula de inglês.
Sobre as aulas do componente de Avançado II, podemos dizer que questões culturais
foram implicitamente discutidas por intermédio da atividade proposta pelo professor João. O
professor solicitou aos alunos que comentassem em grupos o significado e contexto de uso de
alguns provérbios listados em uma folha que lhes foi entregue. Foi advertido que não era
permitido traduzi-los e que o objetivo da atividade consistia em explicar o que foi possível
entender de cada um dos provérbios da lista. Os alunos violaram diversas vezes as regras
ditadas pelo professor, pois, não raro, eram flagrados tentando encontrar o provérbio
correspondente na L1.
É sabido que os provérbios são frases de caráter popular que escondem traços
peculiares de um meio cultural específico, e é exatamente por esta razão que a abordagem em
torno deles teria sido mais significativa, se os alunos pudessem compará-los com aqueles
utilizados em suas próprias experiências cotidianas. É válido esclarecer que, inspirados em
Baker (2012), não estamos rejeitando a ideia de que o conhecimento detalhado sobre
determinada cultura seja importante para o desenvolvimento da consciência intercultural,
estamos apenas salientando as limitações desse tipo de conhecimento e alertando para a
132
necessidade de um entendimento cultural mais amplo para a comunicação intercultural nos
diversos contextos de uso do ILF.
Evidente
e
inevitavelmente,
alguns elementos culturais serão
selecionados em
detrimento de outros na prática de sala de aula. Cabe ao professor revisar criticamente o que
deve e o que não deve ser selecionado e incentivar a apresentação de visões culturais de
diferentes quadros de referência socioculturalmente emergentes. Caso as culturas anglófonas
sejam de interesse e relevância para os aprendizes, elas precisam ser abordadas de maneira
igualmente crítica e complexa (BAKER, 2015).
Para dar continuidade a esse assunto, somaremos os dados obtidos por meio da
entrevista semi-estruturada.
5.2.2.3 Análise dos dados da entrevista
A terceira pergunta do roteiro utilizado para a entrevista e os seus desdobramentos
constituíram o insumo necessário para a discussão proposta neste item. Ressaltamos que não
foi estabelecida nenhuma ordem pré-definida para a análise das falas dos entrevistados. Para
iniciar a conversa sobre a perspectiva intercultural de ensino, comentamos sobre o episódio da
aula de Intermediário III em que os alunos ficaram surpresos quando notaram que um dos
colegas optou por fazer a apresentação em torno de um filme brasileiro, uma vez que todos os
outros se ocuparam de produções cinematográficas americanas.
Depois de exposta a situação, perguntamos aos professores a que eles atribuiriam esse
tipo de comportamento em sala de aula. As respostas resvalaram-se em várias direções. A
professora Anastácia comentou que já trabalhou de maneira similar e que em vez de uma
apresentação individual, ela propôs que os alunos fizessem uma encenação. Contou que uma
equipe também escolheu um filme brasileiro, mas que não houve problemas com relação à
aceitação. O professor João, por sua vez, reforçou a importância de trabalhar com a
perspectiva intercultural desde a fase inicial de aprendizagem, e completou: “na verdade, o
professor de inglês está querendo que ele [o aluno] fale inglês na sala e não que ele fale dos
ingleses [e americanos]”.
A professora Hermione, por sua vez, enxerga que o motivo das risadas pode não ter
sido porque se tratava de um filme brasileiro, mas por causa do filme em si e concluiu que por
não ter um aprofundamento da situação ocorrida não poderia falar com segurança sobre ela. O
professor Marcos, que conhecia bem a situação em pauta, foi o único que apontou o
imperialismo e colonialismo estadunidenses como causa da referida reação dos alunos, e
133
destacou que não há como se estar imune a essas influências e que até os professores, que já
têm um conhecimento mais aprofundado sobre essas questões, tendem a valorizar mais os
filmes, músicas, vestimentas das culturas ditas centrais do que o que lhes é próprio. Siqueira
(2005, p. 2) assim corrobora a resposta de Marcos:
Insistimos em minimizar o que é local, negligenciamos o que é próprio do
nosso povo, e o que é pior, importamos modos, modelos pré-fabricados e
formas de viver de culturas dos chamados países desenvolvidos sem a devida
filtragem e o cuidado necessário com os efeitos que a adoção de tais hábitos,
estilos e comportamentos pode acarretar às nossas vidas em todos os
aspectos.
Na opinião do professor Marcos, os alunos são influenciados pelos discursos
hegemônicos, assim como todos nós, e, em razão disso, seria oportuno que as práticas de
ensino oferecessem um aprofundamento de como tais discursos propagam as questões
culturais. Assim, os alunos estariam bem mais habilitados para ouvir outras vozes que
procedem de suas inúmeras interações socioculturais que não somente os auxiliam na
construção
de seus
próprios discursos, mas, também, influenciam na construção e
reconstrução de suas identidades.
Finda essa parte em que evidenciamos a visão dos professores formadores sobre o
paradigma do ILF e sobre a perspectiva intercultural de ensino, na seção que se segue,
faremos um esboço das práticas institucionais para o ensino e aprendizagem de LI orientadas
pelo currículo do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, contexto em que esta pesquisa
se inscreve.
5.3 Alinhavos sobre o currículo do curso
Importante se faz conhecer as epistemologias que fundamentam a proposta curricular
vigente do curso em que nossos informantes atuam, com o intento de verificar se eles estão
amparados pelo currículo para problematizar, em suas práticas cotidianas de ensino, as
questões que vimos discutindo. Expusemos no Capítulo 2 (seção 2.2), o caminho pelo qual o
currículo seguiu até assumir as suas atuais configurações. É sobre tais configurações e sobre
os seus elementos reguladores que nos debruçaremos a partir de agora.
O currículo Redimensionado do curso de licenciatura em Letras/Inglês e suas
literaturas da UNEB, Campus VI, propõe a compreensão de um fazer social que se reflete no
uso linguístico e traz em seu bojo a missão de “[...] habilitar profissionais para a percepção
134
das relações linguísticas como reflexo das relações sociais, históricas, políticas e culturais,
entendendo-as não como um elemento isolado, mas como parte de um todo que constitui o
universo globalizado [...]” (p.16). Ainda no Projeto Pedagógico do referido curso, consta que
o professor em formação
[...] deve ser crítico, com competência para refletir sobre os conhecimentos
que estão sendo adquiridos e para analisar as teorias linguísticas e literárias a
que está sendo exposto, correlacionando-as à sua realidade sócio-histórica e
cultural, de modo a estabelecer a necessária interseção entre a teoria, a
pesquisa e a prática pedagógica (p.17).
Em afinidade com o exposto, podemos dizer que, na ocasião da reforma curricular, a
função da língua dentro da sociedade foi levada em conta, bem como a forma na qual os
indivíduos a utilizam. O estudo da língua, nessa concepção adotada pelo currículo, não se
limita ao seu conhecimento formal, mas, ao contrário, prioriza o conhecimento das relações
sociais e políticas em torno dela, o seu potencial culturalmente produtivo, as marcas históricas
construídas pelos indivíduos e a sua percepção ideológica da sociedade.
O profissional que se quer formar é aquele capaz de analisar os elementos linguísticos,
reconhecendo a sua variação de usos e atuando como agente no processo de aprimoramento
contínuo. Para a formação desse profissional, busca-se o desenvolvimento de competências
linguísticas, literárias, e didático-pedagógicas, para que o futuro professor não seja somente
um mero transmissor de conteúdos, mas que esteja apto para solucionar possíveis problemas e
promover alternativas educacionais em seu meio profissional.
Todos esses direcionamentos estão fundados na proposta de Diretrizes Curriculares,
homologadas pelo Ministério da Educação em agosto de 2001, que preza por considerar os
desafios da educação superior diante das intensas transformações que têm ocorrido na
sociedade contemporânea, no mercado de trabalho e nas condições de exercício profissional.
Por esta razão, o documento apresenta como objetivo principal para os cursos de Letras, a
formação de “[...] profissionais interculturalmente competentes, capazes de lidar, de forma
crítica, com as linguagens, especialmente a verbal, nos contextos oral e escrito, e conscientes
de sua inserção na sociedade e das relações com o outro” (BRASIL, 2001, p. 30). Ademais,
“[...] o profissional em Letras deve ter domínio do uso da língua [...], em termos de sua
estrutura, funcionamento e manifestações culturais, além de ter consciência das variedades
linguísticas e culturais”.
Diante disso, é possível perceber que os pressupostos adjacentes que agem como base
para delinear o conteúdo das aulas de LI no curso em que estamos investigando, validam o
135
trabalho com as questões relacionadas ao novo estatuto da LI, e com os aspectos
interculturais, como condição essencial para a formação crítica do profissional de Letras.
É válido sublinhar ainda que o currículo do Curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus
VI, atendendo ao que é proposto no Parecer CNE/CP 009/2001, foi desenvolvido através de
quatro grandes eixos temáticos: 1) Eixo de Conhecimentos de Natureza CientíficoCultural que contém os conteúdos caracterizadores básicos do curso, sendo estes
responsáveis pela formação teórica do profissional; 2) Eixo de Formação Docente,
constituído pelos componentes de Prática Pedagógica e Estágio Curricular Supervisionado; 3)
Eixo Interdisciplinar que integra componentes da área de Letras, Leitura e Produção de
Texto, e também componentes de outras áreas, como Estudos Filosóficos, Estudos Sócioantropológicos, Tópicos de Língua Brasileira de Sinais; e 4) Eixo das Atividades
Acadêmico-Científico-Culturais, composto por atividades extracurriculares de natureza
diversificada. A organização curricular do curso pelos eixos de articulação encontra-se nos
Anexos.
Posto que o currículo do curso foi elaborado na perspectiva de fortalecer a construção
articulada
de
desenvolvimento
conhecimentos,
optou-se
por
uma
da interdisciplinaridade por meio
metodologia
que
favorecesse
o
de temas norteadores previamente
definidos, que funcionam como um fio condutor no encaminhamento dos trabalhos em sala de
aula. O quadro 13 abaixo expõe, de forma resumida, os oito temas que norteiam cada um dos
semestres do curso:
Quadro 13. Temas norteadores dos semestres do curso de licenciatura em Letras/Inglês da
UNEB, Campus VI
1º SEMESTRE
As Linguagens e as Produções Socioculturais e Históricas
Propõe uma reflexão sobre a relação entre as diversas linguagens que circulam na sociedade e
as produções socioculturais e históricas, produto das interações humanas.
2º SEMESTRE
Os Códigos, as Linguagens e as Produções Orais Socioculturais
Aborda os diversos códigos que dão suporte às linguagens, desenvolvendo competências que
dizem respeito à constituição de significados que são de grande valia para a aquisição e
formalização dos componentes curriculares, na constituição da identidade e no exercício da
cidadania, completando com as produções orais socioculturais.
136
3º SEMESTRE
A Tradução e as Produções Literárias na Contemporaneidade
Discute o ofício do profissional de língua inglesa, além de fazer um estudo sobre as produções
literárias na contemporaneidade. Discute também, questões relacionadas à tradução, que no
mundo de hoje, tem se tornado cotidiana e fundamental nos mais variados campos do
conhecimento e das atividades do homem.
4º SEMESTRE
Os Estudos e Análises dos Processos Político, Histórico e Social das Linguagens
Desenvolve estudos e análises do processo político, histórico e social das linguagens, através
da comparação entre a literatura da Língua Inglesa e da Língua Materna, das abordagens dos
conhecimentos sistêmicos de mundo e organização textual, do processo de ensinar e aprender a
Língua Inglesa, dando ênfase aos aspectos pragmáticos, semânticos e sociolinguísticos.
5º SEMESTRE
O Processo Sistemático e Comparativo entre as Culturas no Ensino da Língua Inglesa
Busca ampliar o conhecimento crítico em relação às diversas manifestações culturais e
artísticas dos povos em estudo, analisando-se textos narrativos e poéticos investigando
comparativamente os aspectos constitutivos do ato de escrever, criar e ler da literatura da
Língua Inglesa e da Língua Materna.
6º SEMESTRE
As Linguagens e as Novas Tecnologias em Língua Inglesa
Remete à constituição de competências e habilidades que permitem ao educando compreender
e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva
da realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação,
confrontando opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações
específicas. Possibilita também, que o aluno entenda os princípios das tecnologias da
comunicação e informação como integração de diferentes meios de comunicação, linguagens e
códigos.
7º SEMESTRE
A Interdisciplinaridade e o Ensino da Língua Inglesa
Enfoca o aspecto de que todo conhecimento precisa manter um diálogo contínuo com outros
conhecimentos através da relação dos diversos componentes curriculares, projetos de estudos,
pesquisa e ação transformada numa prática pedagógica e didática eficiente e adequada aos
objetivos do Curso de Língua Inglesa.
137
8º SEMESTRE
As Novas Tendências Pedagógicas, Tecnológicas e a Prática Docente
Aborda as novas tendências pedagógicas, tecnológicas e prática docente que culminam com a
conclusão do Curso através da apresentação do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) pelos
discentes.
Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Letras/Inglês da UNEB, Campus VI
Os temas expostos acima refletem a primazia da linguagem, evidenciando a sua
relação com o desenvolvimento social, histórico, cultural e científico da sociedade e o estudo
imprescindível das áreas de conhecimento para formação do profissional de letras: língua,
literatura e prática pedagógica. Esses temas podem ser redefinidos pelo Colegiado do curso,
sendo possível, então, ajustá-los de acordo com as necessidades que se apresentem. Dito isso,
fica claro o compromisso do currículo com a flexibilidade, a diversidade e a heterogeneidade
do conhecimento do aluno.
Nesse ponto, nos interessa analisar como o ensino de LI é constituído no currículo do
curso: da carga horária total de 3.225 horas, 705 horas são destinadas a componentes que
funcionam como laboratório de LI. Essa carga horária é distribuída ao longo da grade
curricular entre os níveis Básico (180horas), Intermediário (270 horas) e Avançado (255
horas). Além desses, são ofertados outros componentes curriculares que também oferecem aos
alunos a oportunidade de praticar a LI, a saber, Leitura e Produção Textual, Compreensão e
Produção Oral, Produção do texto oral e escrito, Estudos Fonéticos e Fonológicos, Prática de
Tradução, Língua Inglesa Instrumental, Ensino de Língua Inglesa para fins específicos.
Para contribuir com os propósitos deste estudo, vamos analisar somente as ementas
daqueles componentes cujas aulas foram observadas na fase de coleta de dados da pesquisa.
Nesse sentido, o quadro 14 expõe a ementa de Básico I, Intermediário I, Intermediário III e
Avançado II. As ementas programáticas completas desses componentes, conforme constam
no ementário do Currículo Redimensionado com Ajuste, encontram-se nos Anexos.
Com base em nossa análise, verificamos que mesmo tendo por base importantes
considerações quanto ao processo formativo dos professores em curso, as ementas revelam
contradições e falha nos nexos entre o que é proposto pelas diretrizes curriculares e o que é
materializado para o trabalho em sala de aula. As ementas de todos os componentes
analisados, por exemplo, apresentam-se inteiramente voltadas para a abordagem comunicativa
de ensino, que, por sua vez, tem por objeto a conversação cotidiana e não as formações sócio-
138
histórico-ideológicas
(COX;
ASSIS-PETERSON,
2001),
como
previsto
pela
fonte
documental.
Quadro 14. Ementas dos componentes curriculares Básico I, Intermediário I, Intermediário III e
Avançado II
COMPONENTE
CARGA
CURRICULAR
HORÁRIA
EMENTA
Desenvolve
BÁSICO I
90 HORAS
as
estruturas
básicas,
utilizando
as
habilidades linguísticas de ouvir, falar, ler e escrever
numa abordagem comunicativa.
Estuda e desenvolve as habilidades linguísticas, oral e
INTERMEDIÁRIO I
90 HORAS
escrita, em um nível de complexidade crescente.
Aquisição da
linguagem em diferentes situações
próximas à realidade.
Desenvolve e aprofunda o estudo das estruturas
INTERMEDIÁRIO III
90 HORAS
linguísticas numa perspectiva comunicativa, graduando
o nível de complexidade.
Desenvolve a proficiência linguística oral e escrita numa
AVANÇADO II
90 HORAS
abordagem comunicativa em nível avançado. Emprega
os
padrões
utilizados
internacionalmente
como
indicadores avaliativos.
Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Letras/Inglês da UNEB, Campus VI
Em face desses dados, nota-se ainda uma ligação a questões linguísticas em
detrimento de questões culturais. Em nenhum momento, a cultura é aludida como objeto
legítimo de ensino, nem, tampouco, faz-se menção às relações interculturais que são tão
nitidamente enfatizadas pelas diretrizes curriculares. Outro ponto crítico que devemos
acentuar é a aparente indiferença com as variedades da língua, fato este especialmente notado
quando os parâmetros internacionais de avaliação foram mencionados como alvo a ser
atingido pelo aluno na culminância do nível avançado.
Não podemos perder de vista que o processo formativo do aluno em questão “transita
entre duas esferas, ou seja, ele é, a um só tempo, aprendiz da língua, e do processo sobre
como ensiná-la” (FIGUEIREDO NETO, 2014, p. 124). Sob essa ótica, somos autorizados a
dizer que as ementas dos componentes em análise, em suas atuais concepções, contribuem
para que questões linguístico-culturais substanciais para a formação do aprendiz sejam
139
negligenciadas no trabalho dos professores formadores e, consequentemente, nas futuras
práticas dos professores em formação.
Uma vez detectado o formato convencional das ementas dos componentes de
laboratório de ensino de LI, apontamos para a necessidade de redesenhá-las de modo que
correspondam mais detidamente aos construtos basilares das diretrizes curriculares e que
venham a dar conta da complexidade do que seja ensinar inglês no mundo contemporâneo. À
luz de nossa pesquisa, sugerimos que as ementas venham a transcender a abordagem
comunicativa no ensino de inglês sob a perspectiva do ILE e sigam em direção à abordagem
intercultural sob a perspectiva do ILF. Desse modo, para o redesenho das ementas que
estamos propondo, seria interessante considerar a diversidade na dimensão cultural dos
sujeitos e as diferentes variedades da língua que se proliferam nesse mundo cujas fronteiras
linguísticas não mais existem. Por conseguinte, também seriam ajustados os conteúdos
programáticos linguísticos e culturais, bem como a bibliografia que dá suporte para a sua
transposição prática.
Depois de ter esboçado algumas considerações em torno do currículo do curso que
estamos investigando e de ter sinalizado a necessidade de uma revisão curricular sistemática,
rumaremos para a descrição, análise e discussão dos dados obtidos através do questionário e
da entrevista semi-estruturada que nos permitiram entrever a forma como os professores
formadores enxergam as práticas institucionais de ensinar e aprender a LI no curso em que
eles exercem as suas funções.
5.3.1 A visão dos professores formadores sobre o curso
As palavras que se seguem nos pareceram promissoras para dar início à discussão que
estamos propondo:
[…] a formação profissional trabalha com a possibilidade de renovação, de
inovação, de ousadia. A força impactante da socialização nos bancos
escolares sobre as identidades de futuros professores precisa ser
compreendida nos programas de formação profissional, sob a pena de não
desafiarmos as práticas que se repetem porque as condições para sua
existência permanecem as mesmas, embora os indivíduos sejam diferentes.
(GIMENEZ, 2011, p. 52)
Cientes de que o currículo é um espaço de luta, de contestação e de reflexão (EL
KADRI, 2010b) e que é através dele que transformações no âmbito educacional podem ser
140
verdadeiramente engendradas, direcionaremos os nossos holofotes para questões que
procuram clarificar se, na visão dos professores formadores, o currículo precisa ser
reformulado. Com isso, tentaremos perceber se eles estão dispostos a travar embates
acadêmicos em favor da ressignificação de suas práticas. Para esse fim, serão analisadas as
questões 18, 19 e 20 que compõem o quinto bloco de perguntas do questionário e também a
última pergunta direcionada aos participantes da pesquisa, na ocasião em que foram
entrevistados. O tratamento dos dados desses dois instrumentos será feito simultaneamente, a
depender da discussão que estivermos desenvolvendo.
Em se tratando da necessidade de reconfiguração do currículo, na décima oitava
questão do questionário, perguntamos: “Em sua opinião, o novo estatuto da LI no mundo
demanda uma reformulação no currículo do curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI? Por
quê (não)?” O posicionamento dos nossos informantes é divergente:
Acredito que sim, pois, os processos educativos formativos prec isam
acompanhar as transformações sociais e preparar os sujeitos para
conviverem nessa mesma sociedade de forma colaborativa e significativa. Se
a educação não acompanha essas transformações, deixa de cumprir tal
papel. A reforma curricular do curso já está sendo pensada, de forma a
atender as demandas que o novo contexto de ensino de LI requer.
(Anastácia/Questionário)
Acredito que todo curso deve ser flexível às novas necessidades que
envolvem o ensino e a aprendizagem de LI e dos outros componentes
curriculares, pois o conhecimento é essencialmente dinâmico.
(Hermione/Questionário)
Não. As ementas das disciplinas voltadas para o ensino-aprendizagem de LI
são flexíveis e não interferem no direcionamento em que o professor decida
tomar em sua práxis. O projeto do curso deixa claro uma visão atual e
adequada a uma formação docente para um mundo globalizado.
(João/Questionário)
Sim. Não há mais espaço para trabalhar o inglês deste ou daquele país
especificamente. Há a necessidade de uma reformulação curricular que
contemple a questão da linguagem como prática social, não desvinculada de
contextos sociais específicos. Os objetivos têm que partir da realidade dos
alunos. Perguntas como “Por que é importante aprender inglês?” Aprender
inglês para quê? devem fazer parte dos objetivos propostos, partindo da
perspectiva dos aprendentes e não do professor. (Marcos/Questionário)
Pela resposta de Anastácia, percebemos que ela acredita que a problematização do
currículo deve ser constante, devendo passar por questionamentos contínuos em torno de sua
validade ou relevância. Ao pensar dessa maneira, a professora nos leva a crer que a
reconfiguração do currículo seria uma alternativa para garantir que os profissionais estejam
141
preparados para enfrentar o mundo e suas transformações. Hermione não deixa claro se é ou
não a favor da reformulação, ela apenas defende a flexibilidade do curso de uma forma geral,
sem se posicionar diretamente. O professor João foi o único a dizer taxativamente que o
currículo do curso não precisa ser reformulado. Ao se justificar, ele afirma que as ementas dos
componentes de LI são flexíveis e que o projeto do curso apresenta “uma visão atual e
adequada a uma formação docente para um mundo globalizado”. Baseados em nossa análise
curricular, o que ele diz sobre o projeto do curso é válido; mas tendo analisado as ementas dos
componentes de LI, vimos que, embora teoricamente fundamentadas em um currículo que diz
privilegiar a flexibilidade, elas estão formatadas de maneira bastante hermética.
Por fim, do mesmo modo que Anastácia, o professor Marcos concorda que o currículo
deve passar por mudanças, e defende que “a linguagem como prática social” deve ser
contemplada no documento em questão. Ademais, sugere que os objetivos curriculares “tem
que partir da realidade dos alunos”. Aqui, interpretamos que tais argumentos são
direcionados especificamente aos programas disciplinares, pois, a proposta curricular prioriza
claramente a percepção da função da língua dentro de uma sociedade e a centralização do
aprendiz no processo de ensino e aprendizagem.
Em razão de ter nos defrontado com opiniões diferenciadas, empenhamo-nos em
desenvolver uma discussão mais ampla entre os pesquisados sobre esse assunto. Assim sendo,
para compor a quarta e última questão da entrevista semi-estruturada, incluímos, na íntegra, a
resposta do professor João (exposta acima) como motivo de reflexão e perguntamos se os
entrevistados estavam de acordo com aquela declaração.
Nessa fase da entrevista, todos reforçaram o ponto de vista apresentado à décima
oitava questão do questionário acima discutida, e, com isso, a discrepância de opiniões foi
mantida. Com referência ao excerto ilustrado na questão, Anastácia concorda com João
quando ele diz que as ementas são flexíveis, mas não abre mão de seu posicionamento
favorável à atualização do currículo:
O currículo do curso não é perfeito. Ele precisa realmente passar por
algumas modificações, ser atualizado, realmente. Mas as ementas realmente
não são ancoradas, creio que pelos componentes que eu já ministrei, é claro
que elas não são escancaradas, né? Você tem ali um limite, mas com
relação a conteúdo, a abordagem que o professor vai fazer em sala de aula,
quanto a isso, ele é livre, é flexível, nesse aspecto, sim.
(Anastácia/Entrevista)
142
É importante esclarecer que o sentido próprio da existência das ementas é exatamente
direcionar as decisões que os professores deverão tomar em suas práticas. Nesse viés, o que a
professora Anastácia parece querer dizer é que algumas ementas apresentam uma proposta
mais aberta de ensino, que permite aos docentes decidir mais livremente sobre os conteúdos e
abordagens que devem ser privilegiados. É isso que o professor João vem enunciar:
[...] A própria leitura das ementas, cabe ao coordenador ter um certo
cuidado, porque ela é tão ampla que o professor acaba fugindo da proposta
do curso, se não tiver um certo cuidado [...] (João/Entrevista)
Porém, esse não é o caso das ementas dos componentes de ensino de LI. Como
discutido, tais ementas apresentam uma proposta tendenciosa que pode contagiar e
comprometer o planejamento dos professores, pois se inclina para o ensino dos modelos
hegemônicos do inglês e invisibiliza a dimensão cultural da língua. Faz-se importante
mencionar ainda que, ao longo da entrevista, o professor Marcos consegue evidenciar que o
anacronismo a que ele tanto se refere recai, como imaginamos, nas ementas, e não,
necessariamente, na proposta curricular em si. É o que notamos quando ele lança o seguinte
exemplo:
[...] Linguística Aplicada tem que trabalhar a linguagem como prática
social, né? Linguagem como construtora do mundo social, e assim por
diante. Mas o que traz na ementa é diferente, eles trazem uma concepção de
linguagem ligada ao Estruturalismo, desvinculada do contexto social.
Então, nessa questão a gente vê que a ementa ela ainda puxa para um lado
ideológico, um lado acrítico que vai fazer com que o aluno também se torne
um sujeito acrítico. (Marcos/Entrevista)
Independentemente de sinalizarem positiva ou negativamente quanto à necessidade de
se revisar o currículo do curso, os entrevistados foram questionados acerca do que é preciso
ser feito para que sejam viabilizadas, na formação inicial dos estudantes de Letras/Inglês da
UNEB, Campus VI, abordagens mais relacionadas ao paradigma do ILF que levem em conta
as diferentes variedades do inglês, a natureza intercultural do uso do inglês e a
problematização do modelo do falante nativo. Quanto a esse propósito, o professor João logo
notificou que o curso oferece componentes que permitem tratar dessas questões com os alunos
em um nível teórico, e citou como exemplo os componentes: Estudos Sócio-Antropológicos,
Núcleo de Estudos Interdisciplinares IV e Linguística Aplicada ao Ensino de LE. Tendo
recorrido às ementas de tais componentes, verificamos que realmente existe essa abertura.
143
Complementando a sua resposta, o docente faz as seguintes considerações no que tange ao
provimento dessas questões no nível prático:
[...] Agora, quanto à questão prática, eu acho que é uma proposta nas
reuniões de área. Nosso colegiado tem um número muito resumido de
professores, então, nós não temos uma área de literatura definida, porque
são poucos os professores de literatura, então, isso acontece em todas as
áreas. Se nós tivéssemos definição das áreas, a gente poderia levantar essa
questão e colocá-la em prática [...] (João/Entrevista)
É perceptível que o professor João elege a falta de articulação entre os docentes do
curso como causa das dificuldades enfrentadas por eles ao integrar as atuais perspectivas de
ensino de LI em sala de aula. Anastácia, corroborando as palavras de João, pontua que os
docentes precisam “falar a mesma língua”, e que seria o momento de sociabilizar essas
questões entre os pares. Hermione, por seu turno, também partilha do mesmo entendimento e
atribui ao professor a responsabilidade de se atualizar e transmitir o conhecimento adquirido
para os seus alunos:
[...] Depende do interesse do professor, da própria articulação dos
professores dentro do curso, e o conhecimento do professor, né? Se o
professor está sempre indo a congressos, fazendo leituras, pesquisando,
estudando, e dar conta de que há a necessidade de ampliar esses saberes,
esse conhecimento da língua e perceber essa produção, esse estudo da LI,
não só como LE, mas também como Língua Franca, e o compromisso é esse,
de o professor não se prender em só transmitir aquele conhecimento básico
sobre a língua. Se ele levar em consideração o ensino de cultura na sala de
aula, ele vai considerar também a língua franca e não vai deixar de
trabalhar também com a língua nessa perspectiva. (Hermione/Entrevista)
Para completar, o professor Marcos não deixa de enfatizar a necessidade de um novo
redimensionamento do currículo e também acena que:
[...] Os grupos de estudo são importantes, e a gente não tem na UNEB, a
gente não senta para discutir. (Marcos/Entrevista)
Pelas colocações de nossos informantes, nos deparamos com a evidência inconteste,
reconhecida por todos eles, de que falta uma maior articulação entre o corpo docente do curso
no sentido de discutir como os elementos mais imediatamente ligados ao ensino, produção e
aprendizagem de LI são, de fato, postos no currículo. Além disso, seria uma oportunidade
para os professores dividirem conhecimentos, compartilharem experiências, redefinirem
objetivos e proporem mudanças para que haja no curso um maior “[...] engajamento com
144
discursos contemporâneos sobre o inglês, tanto em nível local quanto global” (EL KADRI,
2010a, p. 112).
Voltando novamente a nossa atenção ao questionário aplicado, na penúltima questão
(décima nona questão110), perguntamos aos informantes se uma redefinição de objetivos no
currículo do curso em direção a uma competência linguística não comparada à do falante
nativo proporcionaria um sentimento de mais confiança por parte dos futuros professores de
inglês. Eis as respostas dadas:
Embora ainda tenha o seu lugar, o falante “nativo” é descentralizado
quando se trata de uma perspectiva intercultural do ensino de línguas.
Apesar de tomarmos algum “padrão” a seguir conforme o próprio David
Cristal sugere, visto que não há possibilidades de ensinar aos alunos todas
as variedades da língua inglesa ao redor do globo, é relevante que os
alunos saibam que elas existem e tenham contato com elas, destacando
sempre a relevância comunicativa em detrimento de um suposto accent
“perfeito”. (Anastácia/Questionário)
Sempre oriento meus alunos, futuros professores, que não devem tentar
copiar a maneira de falar do falante nativo e que, assim como existem o
inglês americano, o inglês britânico, o inglês indiano etc., temos também o
inglês brasileiro no qual encontramos características que são próprias de
nossa forma de falar, de nos expressarmos. Conheço outros professores
que fazem o mesmo e possuem o mesmo sentimento. Vejo que o mais
importante é a construção contínua de uma maior consciência no que diz
respeito ao papel do docente de LI neste tempo de “world englishes”.
Considerando meu conhecimento sobre o curso, não percebo que os
objetivos deste vão em direção a uma competência linguística comparada
à do falante nativo. Cabe a cada docente reconhecer que a LI não está
vinculada apenas a determinados falantes nativos, nem à meia dúzia de
culturas. (Hermione/Questionário)
O currículo antigo do curso de Letras com Inglês do Campus VI constava
componentes que buscavam fazer análise contrastiva do ensino da LI e foi
muito criticado. Na prática, os pontos negativos destas disciplinas eram
superiores aos positivos. A preparação do professor para saber lidar com
as diversidades em sala foi considerada mais importante do que entender a
origem dos erros em que os alunos poderão cometer em sala de aula.
(João/Questionário)
Creio que sim. Acredito que a comparação ao falante nativo é uma forma
de exclusão social. Para mim não existem níveis de natividade. Se existem,
como definir esses níveis, com que autoridade poderíamos classificar a
que nível pertence o nosso aluno X ou Y? Por muito tempo, professores,
embora, às vezes muito bem intencionados, têm excluído muitos alunos do
processo de aprender inglês. Esses últimos (os alunos) uma vez tendo
“consciência” (produto de discursos hegemônicos) de não atingir uma
110
Uma redefinição de objetivos no currículo do curso em direção a uma competência linguística não comparada
à do falante nativo proporcionaria um sentimento de mais confiança por parte dos futuros professores de inglês ?
Justifique a sua resposta.
145
proficiência igualada à de um falante nativo (crenças propagadas e
perpetuadas pelo discurso das classes hegemônicas, através de instituições
autorizadas, a exemplo, a escola, a universidade, etc.) desistem de seu
sonho. Por outro lado, o aluno deve aprender inglês para defender suas
ideias, valores, crenças frente ao processo globalizante. O aluno deve
aprender inglês, sim, porém para sobreviver, lutar por identidades mais
valorizadas simbólica e socialmente (posicionar-se conscientemente) no
mercado global, tendo a sua identidade respeitada. Isso significa que o
mais importante é privilegiar a comunicação, independente de sotaque de
falante nativo (associado, muitas vezes, aos Estados Unidos).
(Marcos/Questionário)
Nesse patamar da nossa discussão, os professores reafirmam as suas convicções frente
ao ideário linguístico atual. As respostas dadas reportam às discussões entabuladas
anteriormente como, por exemplo, a necessidade de se privilegiar a comunicação e a
aprendizagem do inglês para a vida, e não a perfeição no uso da língua; a conscientização dos
aprendizes com respeito à existência de diferentes variedades do inglês; o papel do professor
de inglês em tempos globais; o inglês como instrumento de valorização e ascensão social,
dentre outras. Desta feita, todas as respostas são bastante expressivas ao indicar, mesmo de
forma indireta, que uma abordagem que privilegiasse a diversidade levaria os futuros
professores a se sentirem mais confiantes e preparados para assumir as suas identidades
próprias de professores bilíngues de inglês, como prefere Jenkins (2007).
Para finalizar, nos vimos impelidos a inquirir se os participantes dessa pesquisa
consideram que os alunos do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI estão conscientes
do que significa ser professor de uma língua global. As respostas a essa vigésima e última
questão111 oscilam:
Creio que os alunos estejam conscientes do que seja ser professor no
contexto contemporâneo e das responsabilidades inerentes à profissão, o
que às vezes os deixam animados, outras, receosos. Ao longo do curso ,
procura-se discutir as teorias que envolvem o ensino de línguas e muitas
delas podem ser experienciadas na prática no período de estágio. Mas
muitas situações só serão vivenciadas na prática cotidiana, o q ue faz do
processo de formação docente algo contínuo. (Anastácia/Questionário)
Com base no relacionamento que tenho com alguns alunos que estão prestes
a terminar o curso e com os primeiros semestres, acredito que aqueles
discentes que possuem leituras mais aprofundadas e já passaram pela
experiência do estágio possuem uma maior consciência em relação à
significância de se ensinar uma língua global. Os alunos que entraram no
curso há pouco tempo estão ainda se familiarizando com esta realidade.
(Hermione/Questionário)
111
De uma maneira geral, você acredita que os alunos do curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI estão
conscientes do que significa ser professor de uma língua global? Em que a sua resposta está baseada?
146
O curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI passou por uma recente
reformulação do quadro docente, alguns professores foram admitidos
recentemente, enquanto outros que eram substitutos tiveram o contrato
vencido, além de alguns professores terem pedido afastamento para
qualificação. Dessa forma, fica difícil generalizar o comportamento dos
alunos do curso. Creio que os alunos que se encontram na primeira metade
do curso estão adquirindo consciência do que significa ser professor de uma
língua global. (João/Questionário)
Acredito que não. Se não é abordada a questão de interculturalidade de
maneira crítica nos livros didáticos; se os nossos alunos não são
incentivados a pensar sobre essas questões de maneira mais reflexiva, o que
se espera deles de sua formação? Embora existam professores que tentam
enfocar aspectos interculturais de forma mais consistente e reflexiva,
convidando os alunos a lerem (artigos científicos extras) e refletir/discutir
sobre essas leituras nas aulas de línguas, acho que deveria ser inclusa uma
disciplina voltada especificamente para essa questão no currículo superior,
porque não uma disciplina denominada “Interculturalidade e Ensino aprendizagem de Línguas?” Minha resposta embasa-se em minhas leituras
teóricas, relacionadas à prática em sala de aula e fora dela (fruto de minha
formação continuada como professor de línguas). (Marcos/Questionário)
Como se vê, Anastácia externa a sua opinião dizendo que, com as leituras realizadas
ao longo do curso e as experiências adquiridas ao longo do estágio, os alunos conseguem
perceber sim o que significa ser professor de uma língua global. Contudo, ela destaca que a
aprendizagem plena só é adquirida mesmo quando o aluno vivencia a prática cotidiana. Esse
posicionamento se coaduna com as ideias de Leffa (2001, p. 340) quando ele diz que “[a]
formação de um verdadeiro profissional – reflexivo, crítico, confiável e capaz de demonstrar
competência e segurança no que faz – é um trabalho de muitos anos, que apenas inicia quando
o aluno sai da universidade”. Hermione, por sua vez, reitera o que Anastácia afirma sobre os
alunos que possuem leituras mais aprofundadas e já passaram pela experiência do estágio, e
acrescenta que os alunos que estão na primeira metade do curso também já estão adquirindo
essa consciência. Acréscimo este endossado por João.
Na contramão dos pontos de vista apresentados, Marcos atesta que os alunos do curso
não se encontram conscientes da responsabilidade que eles devem assumir ao ensinar uma
língua desnacionalizada como o inglês na atualidade. O professor sustenta a sua visão
argumentando que tentativas isoladas não são suficientes para dar conta dessa questão, e
sugere a inclusão de uma disciplina específica que ofereça o suporte necessário para os
alunos.
Concordamos que seja necessário criar novos espaços no currículo do curso para que a
perspectiva do ILF e a interculturalidade sejam problematizadas. Com efeito, a inclusão de
147
uma disciplina seria uma alternativa viável, mas para que os futuros professores de inglês
formados na instituição em pauta estejam mais bem preparados para as demandas
pedagógicas atuais e, consequentemente, mais conscientes do real significado de ser professor
de uma língua franca global, é interessante que as questões aqui discutidas transponham o
currículo de maneira transversal.
Tendo percorrido esse caminho de análise que atravessou os dados obtidos por meio
dos questionários, registros etnográficos e entrevista semi-estruturada sobre o paradigma do
ILF, sobre a perspectiva intercultural de ensino e sobre o currículo do curso, seguiremos com
a triangulação desses dados.
5.4 Tratamento holístico dos dados
Por se tratar de um estudo qualitativo, cuja análise do corpus é feita de forma
subjetiva, optamos por fazer a triangulação dos dados para validar a pesquisa através de
múltiplas estratégias. Sendo assim, nos propomos aqui a fazer considerações mais amplas à
luz das diversas informações provenientes das três fontes principais de coleta de dados
utilizadas. Com base nos dados gerados do questionário aplicado aos professores informantes,
dos registros etnográficos das aulas observadas e da discussão na entrevista realizada, foi
possível chegar a conclusões relevantes em torno da prática dos professores formadores do
curso de Letras/Inglês investigado e da compreensão que esses professores possuem sobre os
temas em questão.
Um primeiro ponto que merece ser destacado é que a partir das respostas dadas tanto
ao questionário quanto à entrevista, vimos que os professores reconhecem o papel global do
inglês e a importância da competência intercultural para o ensino de LI. Todos eles se
mostram conscientes da multiplicidade linguística e cultural da LI cada vez mais ampla e
complexa; concordam que os aprendizes devem ser expostos às diferentes variedades do
inglês; entendem que os alunos devem se sentir donos da língua que estão aprendendo;
enfatizam a relevância da interação com diversas culturas e do respeito às diferenças; dentre
outros aspectos. Porém, através das observações de aulas, notamos que essas questões ainda
não foram sistematicamente integradas às suas práticas, embora não possamos generalizar
qualquer assertiva aqui, em virtude do número reduzido de aulas observadas. Dessa forma,
levando em consideração as fases de análise, percebemos que mesmo que os professores
tenham respondido positivamente à noção do ILF e à adoção da perspectiva intercultural de
ensino, ainda existe uma lacuna entre teoria e prática.
148
Mesmo que os professores pesquisados tenham sido influenciados pelos modelos
hegemônicos da LI no processo de aprendizagem e de formação inicial, todos eles tiveram a
oportunidade de conhecer a proposta do ILF e os princípios da perspectiva intercultural de
ensino em outros momentos de sua formação. Ainda assim, podemos afirmar, no âmbito da
pesquisa, que o mundo anglófono continua orientando preponderantemente o planejamento
desses professores. Notamos também que os professores demonstraram certa insegurança em
desenvolver um trabalho consistente voltado para o pluralismo linguístico e cultural da LI e
sinalizaram para a necessidade de maiores esclarecimentos que os ajudem a traduzir os
estímulos recebidos sobre esses fenômenos emergentes para a própria sala de aula.
Todavia, não se pode negar que iniciativas em prol do atendimento a alguns
pressupostos do ILF, em maior ou menor grau, começaram a despontar em certos momentos
de aula. Para exemplificar, podemos citar a preocupação dos professores em considerar a
realidade dos aprendizes como ponto de partida para o ensino; a valorização das diferentes
maneiras de se expressar dos alunos e a preferência em priorizar a comunicação em sala de
aula em detrimento da habilidade de imitar o inglês dos falantes nativos.
De igual modo, com base em nossas constatações, a dimensão cultural não parece
ocupar um lugar privilegiado na lista de prioridades dos professores. Testemunhamos que,
apesar de demonstrarem entendimento da importância da competência intercultural na
aprendizagem de LI em um nível teórico, dentro dos limites deste estudo, foram mínimas as
evidências práticas que englobaram os tipos de conhecimento, habilidades e atitudes
necessárias para a comunicação intercultural bem sucedida. Apenas a professora Anastácia
apresenta sinais de uma consciência intercultural em um nível mais avançado dentre os três
níveis apontados por Baker (2011, 2012). Nas raras oportunidades em que questões culturais
constituíram o alvo de atenção nas demais aulas observadas, a discussão não conseguiu
transcender o componente sociolinguístico da competência comunicativa, em que se privilegia
um contexto cultural específico. Em contrapartida, Siqueira (2008, p. 193) postula que:
[...] ao se internacionalizar, o inglês abre um espaço não apenas para se falar
de cultura alvo, mas principalmente para se estabelecer um diálogo de
culturas, com ênfase exatamente na(s) cultura(s) nativa(s) do aprendiz, já
que, como vimos, um dos objetivos educacionais mais importantes de se
aprender uma LI é exatamente capacitar o aprendiz para falar de si.
Uma outra dimensão observada diz respeito ao material didático utilizado pelos
professores. As constatações ao longo da pesquisa nos forneceram evidências de que o livro
adotado realmente apresenta certa preocupação em expor os diferentes falares da LI dos mais
149
distintos lugares do planeta, principalmente nas atividades de listening. No entanto,
independentemente da realidade e dos contextos potenciais de comunicação dos aprendizes, a
prioridade ainda é direcionada para os modelos dos falantes nativos, em especial os tidos
como hegemônicos. Nesse pormenor, Widdowson (2012) comenta que a precisão e adequação
aos moldes do inglês dos nativos continuam sendo amplamente impulsionadas nos materiais
de Ensino de Língua Inglesa, e indica que, provavelmente, tais materiais não serão ajustados
ao novo papel da língua inglesa no mundo em curto prazo. Na mesma linha de pensamento do
autor, Seidlhofer (2011, p. 201) denota que
O que é crucial, entretanto, não é qual material de ensino é utilizado, mas
como ele é utilizado. Se o que pensamos sobre o ensino de língua tivesse que
ser determinado pelos livros didáticos que estão disponíveis, não haveria
possibilidade de adaptação para as circunstâncias de mudança e a pedagogia
iria simplesmente petrificar112 (grifos da autora).
Por esse motivo, aos professores emerge o compromisso de buscar alternativas viáveis
sobre o conteúdo que eles ensinam e tentar desconstruir os conceitos instituídos. Na visão de
Widdowson (2012, p. 25), isso envolve repensar “[...] a relação entre o que sabemos da língua
e o que fazemos com ela, entre competência e desempenho, entre forma e função, entre
aprendizes e usuários do inglês, e entre o ensino e a aprendizagem da língua como
conteúdo”113.
Um último aspecto a ser pontuado diz respeito ao currículo do curso. A análise
empreendida em torno desse documento serviu para nos certificar de que muitas das questões
que
vimos
defendendo
foram devidamente
contempladas após o
redimensionamento
curricular. Observamos, por exemplo, que o currículo propõe formar profissionais que sejam
capazes de perceber as relações linguísticas como reflexo das relações sociais, históricas,
políticas e culturais, que sejam interculturalmente competentes, que estejam prontos para lidar
com os desafios das intensas transformações da sociedade contemporânea, e, também, que
estejam conscientes das variedades linguísticas e culturais. Diante desses objetivos, é evidente
o compromisso da proposta curricular com a flexibilidade, a diversidade e a heterogeneidade
do conhecimento do aluno. Por outro lado, verificamos que as ementas programáticas, pelo
112
What is crucial therefore is not what teaching materials are used but how they are used. If what we think
about language teaching had to be determined by what textbooks are available there would be no possibility of
adaptation to changing circumstances at all and pedagogy would simply petrify.
113
[…] the relationship between what we know about the language and what we do with it, between competence
and performance, between form and function, between learners and users of English, and between the teaching
and learning of the language as a subject.
150
menos aquelas referentes aos componentes curriculares que serviram de base para o nosso
estudo, não colaboram com a problematização de tais questões em sala de aula.
Os dados recolhidos do questionário e da entrevista semi-estruturada evidenciaram as
opiniões dos professores formadores envolvidos na pesquisa quanto ao documento em pauta.
Quando perguntados sobre a necessidade de uma reforma curricular, os professores sustentam
opiniões diversificadas. Identificamos que apenas dois dos quatro professores investigados se
posicionaram favoráveis à reformulação do currículo, embora um, por conseguir discernir
pontos positivos no currículo, tenha apontado para uma reconfiguração parcial e o outro tenha
sugerido modificações gerais. Entretanto, todos concordam que deve haver uma maior
articulação entre os professores para que as mudanças necessárias e desejadas se tornem
realidade.
No decorrer de nosso trajeto de pesquisa, acreditamos ter alcançado os objetivos
específicos traçados para este trabalho: foi oportunizado aos professores formadores
investigados a reflexão em torno do paradigma do ILF e da perspectiva intercultural de
ensino; nos certificamos em que medida eles estão prontos para enfrentar o desafio de
repensar a prática de ensino baseada na pretensa unidade sistemática da língua e adotar
perspectivas mais reais voltadas para a diversidade da LI; e, também, verificamos quais são os
caminhos que o projeto do curso investigado propõe em direção ao ensino de LI que atendam
às tendências pedagógicas contemporâneas.
Tendo chegado a esse ponto do trabalho, partiremos para as nossas Considerações
Finais. Para tanto, retomaremos as perguntas de pesquisa que direcionam este trabalho e
dentro das possibilidades e limitações do presente estudo, buscaremos respondê-las. Ainda,
embasados nas reflexões interprendidas ao largo da pesquisa, faremos uma recapitulação geral
dos principais pontos discutidos.
151
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Chegada a fase final de nosso percurso, propomos a retomada das perguntas de
pesquisa com o propósito de sintetizar os resultados mais proeminentes de nossa investigação.
Em seguida, apresentaremos as implicações do presente estudo para o ensino de LI nas
escolas em geral, e, de modo específico, nos cursos de Letras/Inglês. As contribuições
ensejadas nas linhas de reflexão tecidas ao longo deste trabalho também serão consideradas.
Como já mencionado, esta pesquisa surgiu de dois temas de interesse. O primeiro
relacionado à natureza do Inglês como Língua Franca (ILF); e o segundo, referente ao ensino
de cultura nos contextos de comunicação intercultural. Como vimos, os usos e cenários
multifacetados do inglês põem em xeque qualquer tentativa de conexão entre uma língua, uma
cultura, um povo e uma nação. Por isso mesmo, torna-se necessário o questionamento da
proposta de aplicação de técnicas pré-estabelecidas que, nos seus fundamentos, insiste em
sustentar o ato de ensinar normativamente os fenômenos da linguagem e em abordar a cultura
como um conjunto de traços característicos de determinado país ou grupo de falantes. Em vez
disso, os aprendizes e os usuários da LI poderiam desenvolver habilidades e o conhecimento
necessário para se tornarem interculturalmente competentes e para estarem aptos a negociar
entre as diferentes variedades do inglês (BAKER, 2009).
Diante desse quadro, buscamos investigar de que forma a posição do inglês como
língua franca global e as questões concernentes à adoção de uma abordagem intercultural de
ensino são compreendidas e materializadas pelos professores formadores do curso de
Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, uma vez que são eles que impulsionam
as mudanças nos cursos de formação e que influenciam as decisões de futuros professores.
Com esse objetivo em mente, formalizamos três perguntas de pesquisa:
a) Como os professores formadores do curso de Letras com licenciatura em inglês da
UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, entendem o ILF e como o visualizam no
contexto de ensino atual?
b) Em que medida os professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB,
Campus VI, estão preparados para transformar a sala de aula em um espaço onde a
interculturalidade se faça cada vez mais presente e reconhecida?
152
c) De que forma o projeto do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, poderá
viabilizar um ensino que considere o ILF e o desenvolvimento da competência
intercultural dos professores em formação?
As respostas a esses questionamentos foram obtidas sob a ótica da pesquisa qualitativa
associada a uma abordagem etnográfica, em que o questionário, as observações de aula, a
entrevista e a análise de documentos serviram como instrumentos para a geração dos dados.
Lembramos, porém, que não é nossa intenção oferecer respostas definitivas às questões
levantadas, mas esperamos que a partir dos contornos aqui delineados sejam viabilizadas
evidências e contribuições que possam ser úteis para a projeção de novas luzes aos estudos
sobre o tema.
Em resposta à primeira pergunta de pesquisa, os dados revelaram que os professores
formadores além de reconhecerem o paradigma do ILF como legítimo, eles também o
enxergam positivamente, considerando-o como um estímulo necessário e relevante ao
processo de ensino e aprendizagem de LI na atualidade, em especial, sob tal perspectiva.
Contudo, não negam que se encontram em uma espécie de “limbo da insegurança”
(SEIDLHOFER, 2011, p. 56) e que sentem dificuldades em traçar novos critérios de ensino
que atendam aos pressupostos do
ILF,
principalmente, aqueles que questionam a
superioridade do ILN. Dito de outro modo, apesar de já terem desenvolvido uma
conceitualização coerente e sustentável do que seja o inglês que seus alunos devem ser
encorajados a aprender, os professores pesquisados ainda não se consideram totalmente
prontos para se desvencilhar da imposição das normas dos falantes nativos e, finalmente,
abordar a diversidade da LI em sala de aula.
Entretanto, não podemos deixar de mencionar um dado de vulto que não escapou de
nossas lentes: todos os professores demonstraram que, nos momentos em que a produção oral
dos alunos é privilegiada em suas práticas, a correção gramatical ocupa um lugar de
subordinação com relação à atividade comunicativa. Foi possível observar que os professores
preferem deixar a comunicação entre os alunos fluir, em vez de interrompê-los para corrigir
problemas referentes a regras de código ou a convenções de uso. A intervenção ocorre
somente quando há desvios que tornam o discurso ininteligível. Por via de regra, os
professores buscam incentivar os seus alunos a se apropriarem da língua que estão
aprendendo, fazendo valer um pressuposto importante sustentado pelo paradigma de ensino
do ILF.
153
Dotados de um entendimento concreto sobre o novo estatuto da LI, a visão que os
professores formadores pesquisados revelam é a de que o inglês não pode continuar sendo
tratado como uma língua absolutamente estrangeira no contexto atual de ensino; que eles não
devem prosseguir insistindo que os alunos atinjam o nível de proficiência de um americano ou
de um britânico, sob a pena de deixá-los inibidos de tanto serem corrigidos; e, tampouco,
continuar virando as costas para o que os alunos conhecem do inglês oriundo de seus
encontros cotidianos com a língua fora do espaço-tempo da educação formal. Em síntese, os
professores demonstram compreender que o modelo do falante nativo não pode continuar
funcionando “[...] como uma camisa de força que paralisa o aprendiz, ao esboçar o menor
gesto de enunciar na língua do outro, ante ao medo do ridículo” (ASSIS-PETERSON; COX,
2013, p. 161).
Levando em consideração a segunda pergunta de pesquisa formulada, a análise dos
dados nos permitiu constatar que todos os informantes são conhecedores das principais
orientações preconizadas pela abordagem intercultural. Dentre tais orientações, os professores
participantes enfatizaram o respeito à diversidade dos povos e a importância de valorizar a
própria cultura. Não obstante, ao longo de nossas observações, obtivemos indicativos de que
as práticas pedagógicas da maioria desses professores encontram-se sob o jugo de uma
abordagem comunicativa, cujas questões culturais (quando abordadas) não conseguem ir além
de conteúdos culturais estereotipados pertencentes a um território nacional definido. Se
considerarmos as complexas dimensões representadas no estabelecimento de um diálogo entre
culturas, o ensino nesses moldes é falho, pois visa a suprir os alunos com informações triviais
sobre países que possuem o inglês como língua nativa, e limita-se a prepará-los para futuros
encontros com representantes desses países.
Nas aulas de apenas um professor informante, observamos a cultura sendo tratada sob
um prisma bidirecional, ou seja, os alunos foram estimulados a olharem para a sua própria
cultura, para então relacioná-la à cultura do outro. Essa alternativa pedagógica é válida porque
pode ajudar os futuros professores a enfrentarem os novos desafios de ensinar e aprender a LI
no mundo globalizado. De acordo com Aguledo (2007, p. 211), “[e]sses desafios incluem os
mal-entendidos culturais, conflitos que poderiam ser espaços para o diálogo, e um apelo
urgente para reivindicar o local como válido e valioso”114 . Conforme discutimos, o diálogo
intercultural entre o local e a cultura alvo é uma prática essencial para o desenvolvimento da
consciência cultural crítica. Uma maior consciência das nuances que subjazem a cultura
114
These challenges include cultural misunderstandings, conflicts that should be spaces for dialogue, and an
urgent call to reclaim the local as both valid and valuable.
154
resultaria na formação de professores bem mais equipados para orientar seus futuros alunos a
se engajarem de maneira mais apropriada e efetiva nas relações entre os membros da
comunidade global (NUGENT; CATALANO, 2015).
De maneira geral, no âmbito desta pesquisa, podemos dizer que as práticas de ensino
dos professores formadores investigados ainda se encontram bastante limitadas no que tange à
natureza multifacetada da cultura. Nessa perspectiva, recomendamos um maior envolvimento
e aprofundamento teórico e prático, por parte desses professores, no que se refere ao tipo de
conhecimento, habilidades e atitudes necessárias (BAKER, 2011) para que a sala de aula seja
transformada em um espaço onde a interculturalidade se faça cada vez mais presente e
reconhecida. O que fica patente, frente às nossas constatações, é que a visão dos professores
pesquisados ainda não alcançou os níveis de consciência intercultural indispensáveis à
implementação de uma abordagem genuinamente intercultural capaz de incorporar relações
mais fluídas entre o inglês e os contextos culturais em cenários de língua franca.
Em última análise, sabemos que o aperfeiçoamento profissional é essencialmente uma
questão de tempo, luta, compromisso e apoio. E é exatamente por demandar apoio que as
mudanças só podem ser verdadeiramente concretizadas se estiverem respaldadas pela
proposta curricular. Por essa razão, nos empenharemos, a partir de agora, em responder a
terceira pergunta de pesquisa, tendo por base os dados gerados pelos nossos instrumentos de
investigação.
O projeto do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, longe de ser um
documento isento de conotações ideológicas, sociais, políticas e culturais, aponta para a
formação de profissionais críticos, capazes de refletir sobre o conhecimento adquirido. A
proposta curricular leva em conta as intensas transformações que têm ocorrido na sociedade
contemporânea e, por consequência, viabiliza caminhos para que os futuros professores de
inglês estejam preparados para questionar, problematizar, reavaliar, recriar e reformular
práticas que correspondam às verdadeiras necessidades dos aprendizes neste mundo em que
as relações se reverberam local e globalmente.
No entanto, nos deparamos com incongruências significativas entre as proposições do
projeto do curso para o processo formativo dos futuros professores de inglês e as ementas
programáticas dos componentes de ensino de LI analisadas. Para que a transposição prática
dos pressupostos da matriz curricular possa contemplar o inglês como um fenômeno
linguístico, valorizar suas múltiplas normas e priorizar estratégias e habilidades interculturais,
faz-se imperativo o redesenho dessas ementas. Entendemos que esse deva ser um esforço
conjunto dos professores formadores do curso.
155
Assim, é que na companhia de El Kadri (2010a) e embasados na proposta curricular
do curso que prevê a articulação dialética do conhecimento em diferentes áreas, propomos
discussões em todos os componentes do currículo obrigatório, de forma que cada um possa
abordar esses aspectos de acordo com seus próprios objetivos. Para mais, a realização de
projetos, minicursos e a oferta de disciplinas optativas, possibilitadas pelo currículo
complementar, poderiam gerar grandes mudanças na concepção do que significa ensinar
inglês na atualidade.
Nesse ponto em que nos aproximamos do término deste estudo, julgamos inevitável a
exposição de algumas recomendações que são comuns entre os propositores do ILF e entre
aqueles que defendem uma abordagem intercultural de ensino de inglês. Em meio a essas
instruções, destacamos as seguintes: a) a prioridade do ensino deve incidir no conteúdo e não
na forma; b) o papel do ILF deve ser enfatizado, tornando os alunos mediadores culturais e
não falantes nativos mal sucedidos e deficientes; c) o ensino de inglês não pode ter o foco
restrito em culturas nacionais tradicionais. A LI deve ser ensinada e aprendida como um meio
de ampla comunicação, comum a um grande número de indivíduos e, ao mesmo tempo, a
muitas culturas diferentes; d) a cultura não pode ser tratada como uma quinta habilidade, a
partir de conteúdo estático e de almanaque, introduzida esporadicamente, mas deve estar
entremeada em tudo que é feito em sala de aula; e) no lugar da pura informação de fatos,
devem ser discutidos valores e uma visão de cultura que seja dinâmica, fluida e heterogênea;
f) atividades que envolvem encontros interculturais devem ser promovidas com o intento de
despertar a empatia e o respeito à alteridade.
As ponderações e resultados aqui lançados podem servir como um ponto de partida
para as discussões entre os professores formadores, para o intercâmbio de ideias relacionadas
à integração do paradigma do ILF e da dimensão intercultural, e para iniciativas de
reconsiderar as práticas de ensino existentes. As nossas descobertas indicam, sobretudo, a
necessidade de um amplo debate acerca do papel hegemônico da LI no mundo, de buscar
soluções locais para as tensões enfrentadas pelos alunos e, finalmente, de preparar os futuros
professores não somente para lidar, mas também para contribuir com o mundo diverso e
intercultural em que vivemos.
A título de reflexão final, podemos dizer que, apesar das dissenções observadas entre o
posicionamento dos informantes e suas ações pedagógicas em sala de aula, já existe uma
mobilização sólida e contínua em direção a uma mudança de mentalidade entre os professores
formadores pesquisados. Os efeitos dessa disposição em tornar o paradigma do ILF e a
interculturalidade mais centrais na formação inicial dos professores, aliado ao devido
156
alinhamento das ementas às propostas da fonte documental, deve alcançar, no futuro próximo,
a prática diária de muitos professores de inglês.
Enfim, concluímos este trabalho, cônscios de que esta pesquisa não se encerra ao
colocarmos um ponto final em nosso texto. Ao contrário, as análises aqui empreendidas nos
remetem a novos caminhos que despontaram durante o decurso de nosso amadurecimento
nesse processo de investigação, reflexão e aprendizagem.
157
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166
APÊNDICES
167
APÊNDICE A – Modelo do questionário aplicado aos professores formadores
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
QUESTIONÁRIO
Prezado(a) professor(a) formador(a),
Este questionário é parte integrante do trabalho de pesquisa intitulado “A desnacionalização da Língua
Inglesa e sua faceta cultural: a visão de professores formadores”, que objetiva investigar como os
professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA, compreendem e
se identificam com o estatuto da Língua Inglesa como língua franca global e com as questões
concernentes à abordagem intercultural. Informamos que os dados serão tratados com a devida
impessoalidade e as respostas dadas serão utilizadas apenas para fins de cunho científico. Lembramos
ainda que, no âmbito da pesquisa, a identidade dos informantes será inteiramente preservada.
Agradecemos a sua atenção e colaboração.
 Por favor, escolha um nome fictício de sua preferência para ser utilizado ao longo da
análise:_____________________________________________________________
 Você está convidado a responder as seguintes questões:
I. SOBRE VOCÊ
1. Qual é a sua formação acadêmica?
2. Há quanto tempo você atua como professor(a) de inglês? Especifique o tempo de atuação
no Ensino Superior.
3. Por que você escolheu ser professor(a) de inglês?
4. Na condição de professor(a) formador(a), como você avalia a influência da sua prática na
formação dos estudantes do curso de Letras/Inglês da UNEB/ Campus VI?
“O privilégio do inglês hoje até pode ter sua origem vinculada ao imperialismo
americano, mas esse fato torna-se secundário. Mundializado, ele se desprende de
suas raízes e ganha existência própria como idioma desterritorializado, apto a ser
camaleonicamente apropriado, re-significado, re-entoado por falantes de
diferentes línguas maternas [...]” (ASSIS-PETERSON; COX, 2007, p. 8).
168
“Conceber o Inglês como Língua Franca e não como Língua Estrangeira traz
implicações educacionais, pois provoca a descentralização do modelo nativo, com
repercussões para a escolha de variedades a serem ensinadas, o papel da cultura
no ensino das línguas e aspectos de correção linguística. Trata-se, portanto, de
redefinição identitária do professor não-nativo assim como de seus alunos” (EL
KADRI, 2010, p. 13).
II. SOBRE O INGLÊS COMO LÍNGUA FRANCA (ILF)
5. Como você se posiciona com relação à problematização do ILF na formação inicial de
professores de inglês?
6. Para você, o que significa ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF?
7. Você se sente preparado(a) para ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF? Por quê
(não)?
8. O seu inglês tem características dos falantes nativos americanos, britânicos ou possui
outra(s) marca(s)? Explique.
9. Você já participou de algum evento acadêmico (minicurso, conferência ou outra
modalidade) cujas discussões giravam em torno do ILF? Em caso afirmativo, quando?
Registre algo significativo que você trouxe do evento.
10. Em suas aulas, o inglês é apresentado como Língua Estrangeira ou como Língua
Franca? Esclareça a sua resposta.
11. Em sua sala de aula, como você lida com os desvios do inglês padrão decorrentes de
pronúncia e gramática quando os alunos se expressam oralmente em LI?
“As discussões que têm sido travadas no âmbito do ensino/aprendizagem de
língua em uma perspectiva intercultural objetivam empreender uma mudança de
foco e, sobretudo, de postura, que incorpore as questões culturais ao conjunto de
práticas pedagógicas de professores [...]. Isso significa [...] adotar a perspectiva da
cultura como meio de promover a integração e o respeito à diversidade dos povos,
à diferença, permitindo ao aprendiz encontrar-se com a outra cultura sem deixar
de ser ele mesmo.” (MENDES, 2007, p.119).
III. SOBRE A INTERCULTURALIDADE NO ENSINO DE INGLÊS
12. O que você entende por competência intercultural?
13. De que forma a cultura é tratada em sua sala de aula?
14. Em seu ponto de vista, qual é o grande desafio para transformar a sala de aula em um
espaço para a difusão da interculturalidade?
169
IV. SOBRE O MATERIAL ADOTADO
15. Os seus alunos são expostos a diferentes variedades de inglês ao longo das atividades
propostas pelo material adotado nas aulas de laboratório de LI? Se sim, exemplifique.
16. Os textos, conteúdos e atividades do material adotado nas suas aulas são condizentes
com a realidade, interesses e necessidades dos estudantes? Explique em caso positivo.
17. O material adotado viabiliza a perspectiva intercultural? Se afirmativo, de que forma?
V. SOBRE O CURSO DE LETRAS/INGLÊS DA UNEB/CAMPUS VI
18. Em sua opinião, o novo estatuto da LI no mundo demanda uma reformulação no
currículo do curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI? Por quê (não)?
19. Uma redefinição de objetivos no currículo do curso em direção a uma competência
linguística não comparada à do falante nativo proporcionaria um sentimento de mais
confiança por parte dos futuros professores de inglês? Justifique a sua resposta.
20. De uma maneira geral, você acredita que os alunos do curso de Letras/Inglês da
UNEB/Campus VI estão conscientes do que significa ser professor de uma língua global?
Em que a sua resposta está baseada?
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de
Londrina
(UEL),
Londrina,
PR,
2010.
Disponível
em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/ download/texto/cp125685.pdf>. Acesso em: 19 set. 2012.
MENDES, E. A perspectiva intercultural no ensino de línguas: uma relação “entre culturas”. In:
ALVAREZ, M. L. O.; SILVA, K. A. da (Org.). Linguística aplicada: múltiplos olhares. Campinas:
Pontes, 2007. p.119-139.
170
APÊNDICE B – Modelo do roteiro da entrevista semi-estruturada
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
ROTEIRO DA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
1. Conforme Crystal (2012 apud EL KADRI; GIMENEZ, 2013, p. 130) “[...] é preciso
distinguir o que é recepção do que é produção [em LI]. Embora seja necessário
compreender diferentes variedades e tomá-las como exemplos da diversidade
linguística, na sua produção, não há como fugir da ideia de se adotar uma variedade de
ampla circulação como as dos países do chamado Círculo Interno”.
a) Você concorda com esta afirmação?
b) (Em caso positivo) Mesmo tendo essa opinião, você diria que os falantes
não-nativos de LI também estão habilitados para estabelecer as regras da
língua que eles utilizam? Explique.
2. Sabe-se que as noções de “falantes nativos” e de “propriedade do inglês” têm sido
radicalmente postas em xeque. A consciência para este fato e para o fato de que os
aprendizes precisam se sentir donos da língua que estão aprendendo, deve ser
despertada em que momento da formação dos estudantes de Letras/Inglês? Justifique.
3. Em uma determinada aula observada, foi proposta uma atividade oral que consistia
em contar a história de um filme, escolhido pelo próprio aluno, baseado em um roteiro
de perguntas. Diferentemente de todos que apresentaram sobre filmes Hollywoodianos,
um aluno aborda sobre um filme brasileiro e os colegas reagem dando risadas.
a) A que você atribui esse tipo de comportamento?
b) Não seria proveniente da falta de diálogo entre a cultura alvo e a cultura
materna nas aulas?
c) Como a cultura materna é trabalhada em sua sala de aula?
171
4. Em um excerto extraído de uma das respostas dadas no questionário, lê-se que “As
ementas das disciplinas voltadas para o ensino-aprendizagem de LI [do curso de Letras
da UNEB – Campus VI são flexíveis e não interferem no direcionamento que o
professor decida tomar em sua práxis. O projeto do curso deixa claro uma visão atual e
adequada a uma formação docente para um mundo globalizado.”
a) Você está de acordo com este posicionamento?
b) (Em caso positivo/negativo) A seu ver, o que precisa ser feito, de fato, para
que sejam viabilizadas, na formação inicial dos estudantes de Letras/Inglês
da UNEB/Campus VI, abordagens mais relacionadas ao paradigma do ILF
que levem em conta as diferentes variedades do inglês, a natureza
intercultural do uso do inglês e a problematização do modelo do falante
nativo?
172
APÊNDICE C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Título do Projeto: A DESNACIONALIZAÇÃO DA LÍNGUA INGLESA E SUA FACETA
CULTURAL: A VISÃO DE PROFESSORES FORMADORES
Pesquisador Responsável: Polyanna Castro Rocha Alves
Telefones para contato: (77) 9147-9172 / (77) 8114-2379
O presente termo, em atendimento à Resolução CNS 466/2012, tem por finalidade
possibilitar ao sujeito da pesquisa, o mais amplo esclarecimento sobre a investigação a ser
realizada, para que a sua manifestação de vontade em participar da pesquisa seja efetivamente
livre e consciente. Dessa forma, você, professor(a), está sendo convidado(a) a participar do
projeto de pesquisa do Mestrado em Língua e Cultura da Universidade Federal da Bahia
acima denominado.
O objetivo geral da pesquisa consiste em investigar de que forma a posição do inglês
como língua franca global e as questões concernentes à adoção de uma abordagem
intercultural de ensino são compreendidas e materializadas pelos professores formadores do
curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA. Para tanto, será desenvolvida
uma pesquisa qualitativa de natureza etnográfica. Como professor formador, a sua
participação na pesquisa envolverá responder um questionário contendo vinte questões, e
participar de uma entrevista semiestruturada juntamente com os demais professores
participantes, cujas respostas serão gravadas e transcritas. Além disso, o estudo conta com
observações de aulas do componente de ensino de Língua inglesa ministrado por você.
Concomitantemente aos procedimentos elencados, ocorrerá a análise documental que inclui a
consulta ao projeto do referido curso.
Com a sua participação nesta pesquisa, será possível propor reformulações no projeto
do curso que assegurem um ensino/aprendizagem que favoreça a discussão do novo estatuto
da LI no mundo, bem como o diálogo entre as culturas em seus diferentes aspectos e
contextos.
173
No que se refere à confidencialidade do estudo, a sua identificação será mantida em
sigilo, bem como qualquer informação que possa comprometer sua integridade moral e física.
É importante deixar claro que é garantido o livre acesso a todas as informações e
esclarecimentos adicionais sobre a pesquisa e suas consequências a todo e qualquer momento,
e que sua participação no projeto de pesquisa é voluntária e livre de qualquer forma de
remuneração.
Salienta-se que a participação nesta pesquisa não é obrigatória e o(a) voluntário(a)
participante pode recusar-se a participar ou retirar seu consentimento, em qualquer fase da
pesquisa, sem penalização alguma.
Polyanna Castro Rocha Alves
Pesquisadora responsável
Consentimento para participação:
Eu________________________________________________,
RG
nº.______________
declaro que concordo em participar, como voluntário(a), no projeto de pesquisa acima
descrito. Eu fui devidamente esclarecido(a) quanto aos objetivos da pesquisa e aos seus
procedimentos. A pesquisadora me garantiu disponibilizar qualquer esclarecimento adicional
que eu venha solicitar durante o decurso da pesquisa e o direito de desistir da participação em
qualquer momento, sem que a minha desistência implique em qualquer prejuízo à minha
pessoa e se necessário for, posso solicitar informações adicionais ao Comitê de Ética em
Pesquisa – CEP/UNEB, localizado no Pavilhão Administrativo – Térreo, Rua Silveira
Martins, 2555, cabula. CEP: 41.150-000, Salvador/BA, número de telefone (71) 3117-2445,
e-mail: [email protected], que funciona de segunda a sexta-feira de 8:00 às 11:30h e de 14:30
às 16:30h. Este termo será impresso em duas vias, sendo-me garantida uma via do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido assinado por ambas as partes.
174
ANEXOS
175
ANEXO A – Questionário respondido por Anastácia
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
QUESTIONÁRIO
Prezado(a) professor(a) formador(a),
Este questionário é parte integrante do trabalho de pesquisa intitulado “O ensino de inglês como língua
desnacionalizada e a dimensão cultural: a visão de professores formadores”, que objetiva investigar como
os professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA,
compreendem e se identificam com o estatuto da Língua Inglesa como língua franca global e com as
questões concernentes à abordagem intercultural. Informamos que os dados serão tratados com a devida
impessoalidade e as respostas dadas serão utilizadas apenas para fins de cunho científico. Lembramos
ainda que, no âmbito da pesquisa, a identidade dos informantes será inteiramente preservada.
Agradecemos a sua atenção e colaboração.
 Por favor, escolha um nome fictício de sua preferência para ser utilizado ao longo da
análise: Anastácia
 Você está convidado a responder as seguintes questões:
I. SOBRE VOCÊ
1. Qual é a sua formação acadêmica?
Sou Licenciada em letras inglês e respectivas Literaturas. Possuo pós graduação em
Inglês como língua estrangeira e Mestrado em Letras, Cultura, Educação e Linguagens
2. Há quanto tempo você atua como professor(a) de inglês? Especifique o tempo de atuação
no Ensino Superior.
Atuo como docente de Língua inglesa há aproximadamente 10 anos, sendo 2 anos e 8
meses no ensino superior
3. Por que você escolheu ser professor(a) de inglês?
Me identifiquei com a docência ainda quando fazia magistério. No segundo ano do
segundo grau comecei a fazer um curso de idiomas o que despertou meu interesse pelo
ensino de línguas. Após alguns módulos comecei a lecionar inglês para crianças e desde
então, tenho um interesse especial pelo processo de ensino e aprendizagem de idiomas.
176
4. Na condição de professor(a) formador(a), como você avalia a influência da sua prática na
formação dos estudantes do curso de Letras/Inglês da UNEB/ Campus VI?
Acredito que todo docente, na condição de mediador do conhecimento, em algum momento
acaba por influenciar os seus estudantes com suas crenças, atitudes, posturas. Tento
mostrar aos futuros docentes algumas dessas experiências em minha prática, alertando
que uma mesma atitude/atividade pode surtir efeitos diferenciados considerando as
particularidade de cada contextos e sujeitos em questão.No entanto, penso que muitas
das influenciada(tanto negativas, quanto positivas) nem sempre são refletidas de
imediato.
“O privilégio do inglês hoje até pode ter sua origem vinculada ao imperialismo
americano, mas esse fato torna-se secundário. Mundializado, ele se desprende de
suas raízes e ganha existência própria como idioma desterritorializado, apto a ser
camaleonicamente apropriado, re-significado, re-entoado por falantes de
diferentes línguas maternas [...]” (ASSIS-PETERSON; COX, 2007, p. 8).
“Conceber o Inglês como Língua Franca e não como Língua Estrangeira traz
implicações educacionais, pois provoca a descentralização do modelo nativo, com
repercussões para a escolha de variedades a serem ensinadas, o papel da cultura
no ensino das línguas e aspectos de correção linguística. Trata-se, portanto, de
redefinição identitária do professor não-nativo assim como de seus alunos” (EL
KADRI, 2010, p. 13).
II. SOBRE O INGLÊS COMO LÍNGUA FRANCA (ILF)
5. Como você se posiciona com relação à problematização do ILF na formação inicial de
professores de inglês?
Penso que o ensino de IFL não seja uma tarefa fácil e sim desafiadora, que requer de nós
docentes um posicionamento crítico e reflexivo, para que possamos, mesmo nas coisas
mais simples, instigar o nosso a aluno a perceber o aspecto multicultural que uma língua
de comunicação global requer.
6. Para você, o que significa ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF?
Significa ensinar a língua inglesa sob uma perspectiva intercultural, percebendo-a como
um instrumento de comunicação global, desatrelado de uma única cultura referencial.
7. Você se sente preparado(a) para ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF? Por quê
(não)?
Penso que nenhum docente está, ou estará um dia “preparado” quando se trata de
ensinar, pois, o processo de formação do professor é constante, contínuo uma vez que o
próprio conhecimento está sempre em transformação .Há muitas questões que
perpassam o ensino de inglês como língua estrangeira, língua global, língua franca. A
cada dia, com novos estudos e transformações na prática pedagógica, precisamos inovar e
modificar nossas ações para contemplar os anseios e necessidades da sociedade
contemporânea e seu constante estado de transição. Com o ensino de IFL não seria
diferente, sinto necessidade de orientações mais amplas na abordagem do mesmo.
177
8. O seu inglês tem características dos falantes nativos americanos, britânicos ou possui
outra(s) marca(s)? Explique.
Quando comecei a estudar a língua inglesa em cursos de idiomas, o material adotado era
elaborado sob uma perspectiva do inglês americano. Mas, por desejar apenas aprender a
língua não me apeguei a esses fatores, só algum tempo depois, após algumas leituras
teóricas é que me atentei a essas particularidades linguísticas. No momento em que estava
aprendendo, o inglês era só inglês.
9. Você já participou de algum evento acadêmico (minicurso, conferência ou outra
modalidade) cujas discussões giravam em torno do ILF? Em caso afirmativo, quando?
Registre algo significativo que você trouxe do evento.
Participei em um evento no ano passado no qual tais questões foram discutidas. Um dos
aspectos positivos que me atentei foi o fato de como o dia-a-dia dos alunos pode ser
utilizado para trabalhar o IFL. No referido evento, foi enfatizado como, às vezes, a língua
inglesa é utilizada atrelada ao conhecimento de mundo dos estudantes, podendo este ser
um ótimo ponto de partida para trabalhar a LI sobre uma perspectiva de língua franca.
10. Em suas aulas, o inglês é apresentado como Língua Estrangeira ou como Língua
Franca? Esclareça a sua resposta.
Tento ensinar a língua sobre a perspectiva da comunicação global, deixando sempre claro
aos estudantes a multiplicidade de aspectos linguísticos e culturais envolvidos em tal
processo. Normalmente não faço tais distinções entre termos a menos que os est udantes
tenham maturidade e conhecimento teórico para percebê-las e fundamentá-las.
11. Em sua sala de aula, como você lida com os desvios do inglês padrão decorrentes de
pronúncia e gramática quando os alunos se expressam oralmente em LI?
Tendo conduzir minhas aulas considerando o erro como parte da construção do
conhecimento. Sei que em alguns momentos a correção excessiva do erro oral pode inibir
o aluno e deixá-lo receoso a voltar a falar e ser corrigido publicamente. Normalmente
procuro não interromper o aluno durante as construções, ou orientá-los na elaboração da
sentença para se expressar. Quando o erro é algo generalizado, reviso o conteúdo com a
turma, trabalho as pronúncias e construções com desvios recorrentes. Em casos mais
delicados, tento trabalhar individualmente. Com relação a pronúncias, sugiro sempre ao
alunos para ouvirem músicas, filmes, séries em língua inglesas, orientando-os a se
atentarem aos diferentes „englishes‟ que encontrão nesses contextos, enfatizando sempre
que o mais importante e se comunicar, entender e se fazer entendido.
“As discussões que têm sido travadas no âmbito do ensino/aprendizagem de
língua em uma perspectiva intercultural objetivam empreender uma mudança de
foco e, sobretudo, de postura, que incorpore as questões culturais ao conjunto de
práticas pedagógicas de professores [...]. Isso significa [...] adotar a perspectiva da
cultura como meio de promover a integração e o respeito à diversidade dos povos,
à diferença, permitindo ao aprendiz encontrar-se com a outra cultura sem deixar
de ser ele mesmo.” (MENDES, 2007, p.119).
178
III. SOBRE A INTERCULTURALIDADE NO ENSINO DE INGLÊS
12. O que você entende por competência intercultural?
A forma pela qual interagimos com culturas distintas, percebendo suas particularidades
em relação à cultura que convivemos, sem considerá-la melhor ou pior, partindo
sempre do respeito às diferenças.
13. De que forma a cultura é tratada em sua sala de aula?
Procuro partir do local para o global, aproveitando situações do dia-a-dia para introduzir
situações mais amplas.
14. Em seu ponto de vista, qual é o grande desafio para transformar a sala de aula em um
espaço para a difusão da interculturalidade?
Penso que tanto a postura crítica e reflexiva do professor enquanto mediador da
construção dos conhecimentos em sala, como também a postura de respeito e aceitação
frente às peculiaridades da cultura do outro por parte dos estudantes, seja
fundamental.Porém, o desafio maior começa fora da escola, se o aluno não respeita/
aceita, um colega, vizinho, conhecido, parente, um outro ser humano qualquer de cor,
opção sexual, religião, ou até mesmo um time de futebol diferente do seu, vai ser difícil
o professor trabalhar o ensino de línguas sobre a perspectiva intercultural antes de
romper tais barreiras.
IV. SOBRE O MATERIAL ADOTADO
15. Os seus alunos são expostos a diferentes variedades de inglês ao longo das atividades
propostas pelo material adotado nas aulas de laboratório de LI? Se sim, exemplifique.
Sim, o material adotado como suporte, principalmente nas atividades de listening
apresenta falantes de diversos lugares do globo e suas particularidades na pronúncia da
língua. Cabe salientar que o material adotado, conforme enfatizado, é um suporte,
havendo a utilização de recursos distintos para auxiliá-lo e suprir as lacunas deixadas,
caso precise.
16. Os textos, conteúdos e atividades do material adotado nas suas aulas são condizentes
com a realidade, interesses e necessidades dos estudantes? Explique em caso positivo.
Nem sempre, uma vez que os alunos apresentam interesses e necessidades distintos. Há
sempre a necessidade de se mesclar o trabalho com outros recursos.
17. O material adotado viabiliza a perspectiva intercultural? Se afirmativo, de que forma?
Sim, principalmente nas atividades de listening apresenta falantes de diversos lugares do
globo e suas particularidades na pronúncia da língua. Penso que este seja falho no que
tange a parte imagética, embora traga pessoas dos mais distintos lugares do globo com
suas características físicas particulares, enfatiza pouco suas atividades cotidianas,
particularidades inerentes as culturas dessas pessoas, cabendo ao docente esse papel
muitas vezes.
179
V. SOBRE O CURSO DE LETRAS/INGLÊS DA UNEB/CAMPUS VI
18. Em sua opinião, o novo estatuto da LI no mundo demanda uma reformulação no
currículo do curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI? Por quê (não)?
Acredito que sim, pois, os processos educativos formativos precisam acompanhar as
transformações sociais e preparar os sujeitos para conviverem nessa mesma sociedade de
forma colaborativa e significativa. Se a educação não acompanha essas transformações,
deixa de cumprir tal papel. A reforma curricular do curso já está sendo pensada, de
forma a atender as demandas que o novo contexto de ensino de LI requer.
19. Uma redefinição de objetivos no currículo do curso em direção a uma competência
linguística não comparada à do falante nativo proporcionaria um sentimento de mais
confiança por parte dos futuros professores de inglês? Justifique a sua resposta.
Embora ainda tenha o seu lugar, o falante “nativo” é descentralizado quando se trata de
uma perspectiva intercultural do ensino de línguas. Apesar de tomarmos algum “padrão”
a seguir conforme o próprio David Cristal sugere, visto que não há possibilidades de
ensinar aos alunos todas as variedades da língua inglesa ao redor do globo, é relevante
que os alunos saibam que elas existe e tenham contato com elas, destacando sempre a
relevância comunicativa em detrimento de um suposto accent “ perfeito”.
20. De uma maneira geral, você acredita que os alunos do curso de Letras/Inglês da
UNEB/Campus VI estão conscientes do que significa ser professor de uma língua global?
Em que a sua resposta está baseada?
Creio que os alunos estejam conscientes do que seja ser professor no contexto
contemporâneo e das responsabilidades inerentes à profissão, o que às vezes os deixam
animados, outras, receosos. Ao longo do curso procura-se discutir as teorias que envolvem
o ensino de línguas e muitas delas podem ser experiênciadas na prática no período de
estágio. Mas muitas situações só serão vivenciadas na prática cotidiana, o que faz do
processo de formação docente algo contínuo.
REFERÊNCIAS
ASSIS-PETERSON, A. A; COX, M. I. P. Inglês em tempos de globalização: para além de bem e mal.
Calidoscópio, Vol. 5, n. 1, p. 5-14, jan/abr 2007.
EL KADRI, M. S. Atitudes sobre o estatuto do inglês como língua franca em curso de formação
inicial de professores. 2010. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem), Universidade
Estadual
de
Londrina
(UEL),
Londrina,
PR,
2010.
Disponível
em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/ download/texto/cp125685.pdf>. Acesso em: 19 set. 2012.
MENDES, E. A perspectiva intercultural no ensino de línguas: uma relação “entre culturas”. In:
ALVAREZ, M. L. O.; SILVA, K. A. da (Org.). Linguística aplicada: múltiplos olhares. Campinas:
Pontes, 2007. p.119-139.
180
ANEXO B – Questionário respondido por Hermione
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
QUESTIONÁRIO
Prezado(a) professor(a) formador(a),
Este questionário é parte integrante do trabalho de pesquisa intitulado “O ensino de inglês como língua
desnacionalizada e a dimensão cultural: a visão de professores formadores”, que objetiva investigar como
os professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA,
compreendem e se identificam com o estatuto da Língua Inglesa como língua franca global e com as
questões concernentes à abordagem intercultural. Informamos que os dados serão tratados coma devida
impessoalidade e as respostas dadas serão utilizadas apenas para fins de cunho científico. Lembramos
ainda que, no âmbito da pesquisa, a identidade dos informantes será inteiramente preservada.
Agradecemos a sua atenção e colaboração.
 Por favor, escolha um nome fictício de sua preferência para ser utilizado ao longo da
análise: Hermione
 Você está convidado a responder as seguintes questões:
I. SOBRE VOCÊ
1. Qual é a sua formação acadêmica?
Sou licenciada em Letras (Português/Inglês), especialista em Inglês como Língua
Estrangeira e mestre em Letras: Cultura, Educação e Linguagens pela UESB.
2. Há quanto tempo você atua como professor(a) de inglês? Especifique o tempo de atuação
no Ensino Superior.
Atuo no Ensino Básico desde fevereiro de 2008 e no Ensino Superior desde agosto de
2012.
3. Por que você escolheu ser professor(a) de inglês?
Sempre fui fascinada pelo estudo de línguas. Desde o início do Ensino Fundamental,
amava língua portuguesa e tinha muita facilidade para aprender e para ensinar. Quando
tive a primeira aula de inglês na quinta série, fiquei ainda mais fascinada ao ouvir a minha
professora entrando na sala falando aquela língua estrangeira. Sempre gostei de todas as
181
disciplinas, mas meu amor pelas línguas portuguesa e inglesa só cresceu cada vez mais e,
no ensino médio, quando tive uma professora maravilhosa de inglês – que mais tarde foi
minha colega no curso de mestrado – decidi fazer vestibular para Letras. Durante mais de
dez anos, dei aula particular de todas as disciplinas do Ensino Básico para séries
diferentes, mas queria mesmo dar aulas de português e inglês. Por isso, achei ótimo poder
fazer a habilitação dupla. Depois de terminar a graduação, atuei como professora das
duas disciplinas, mas acabei direcionando minha carreira para o ensino de língua inglesa.
4. Na condição de professor(a) formador(a), como você avalia a influência da sua prática na
formação dos estudantes do curso de Letras/Inglês da UNEB/ Campus VI?
Sinto-me muito responsável na formação desses futuros docentes, pois eles se espelham
bastante em tudo o que fazemos. Além disso, alguns trazem certas crenças construídas ao
longo de seu ensino básico que atrapalham seu desenvolvimento como aprendizes e como
futuros professores. Desta maneira, é nosso papel ajudá-los na desconstrução destas
crenças, promovendo uma visão mais ampla do processo de ensino-aprendizagem e
oferecendo leituras/discussões que enriqueçam sua formação.
“O privilégio do inglês hoje até pode ter sua origem vinculada ao imperialismo
americano, mas esse fato torna-se secundário. Mundializado, ele se desprende de
suas raízes e ganha existência própria como idioma desterritorializado, apto a ser
camaleonicamente apropriado, re-significado, re-entoado por falantes de
diferentes línguas maternas[...]” (ASSIS-PETERSON; COX, 2007, p. 8).
“Conceber o Inglês como Língua Franca e não como Língua Estrangeira traz
implicações educacionais, pois provoca a descentralização do modelo nativo, com
repercussões para a escolha de variedades a serem ensinadas, o papel da cultura
no ensino das línguas e aspectos de correção linguística. Trata-se, portanto, de
redefinição identitária do professor não-nativo assim como de seus alunos” (EL
KADRI, 2010, p. 13).
II. SOBRE O INGLÊS COMO LÍNGUA FRANCA (ILF)
5.Como você se posiciona com relação à problematização do ILF na formação inicial de
professores de inglês?
Acredito que é necessário considerar o IFL no processo de ensino-aprendizagem de LI,
pois este não se limita ao conhecimento da forma-padrão da língua.
6. Para você, o que significa ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF?
Considerar o ILF no ensino de inglês permite uma visão mais ampla de como concebemos
a comunicação nesta língua, levando-nos a perceber que esta não se limita a um único
padrão.
7. Você se sente preparado(a) para ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF? Por quê
(não)?
Eu ensino inglês como LE, considerando a importância de reconhecer esta língua como
global, internacional e a existência do IFL, mostrando para meus alunos que esta
perspectiva é aceitável e possível, mesmo não se tratando de um inglês formal.
182
8. O seu inglês tem características dos falantes nativos americanos, britânicos ou possui
outra(s) marca(s)? Explique.
O meu inglês tem características dos falantes brasileiros. Mesmo tendo um grande contato
com o inglês americano, eu falo “Brazilian English”.
9. Você já participou de algum evento acadêmico (minicurso, conferência ou outra
modalidade) cujas discussões giravam em torno do ILF? Em caso afirmativo, quando?
Registre algo significativo que você trouxe do evento.
Sim. Este tipo de discussão é sempre enriquecedor e nos faz refletir a respeito do papel da
LI como um instrumento para integração de diversas culturas. É interessante pensar sobre
a negociação de significados que envolve o ILF e a importância de valorizar as maneiras
de se expressar de cada um.
10. Em suas aulas, o inglês é apresentado como Língua Estrangeira ou como Língua
Franca? Esclareça a sua resposta.
Como LE, considerando-o uma língua internacional que faz parte da vida de milhares de
pessoas de diferentes partes do mundo, que possuem realidades e culturas distintas. O IFL
aparece naturalmente através da fala dos próprios alunos ou, até mesmo, da minha, ou dos
muitos exemplos que discutimos na sala de aula.
11. Em sua sala de aula,como você lida com os desvios do inglês padrão decorrentes de
pronúncia e gramática quando os alunos se expressam oralmente em LI?
Lido naturalmente, evito ficar corrigindo-os demais, mas incentivo cada um deles a tentar
se expressar de tal maneira que sejam bem compreendidos.
“As discussões que têm sido travadas no âmbito do ensino/aprendizagem de
língua em uma perspectiva intercultural objetivam empreender uma mudança de
foco e, sobretudo, de postura, que incorpore as questões cultu rais ao conjunto de
práticas pedagógicas de professores [...]. Isso significa [...] adotar a perspectiva da
cultura como meio de promover a integração e o respeito à diversidade dos povos,
à diferença, permitindo ao aprendiz encontrar-se com a outra cultura sem deixar
de ser ele mesmo.” (MENDES, 2007, p.119).
III. SOBRE A INTERCULTURALIDADE NO ENSINO DE INGLÊS
12. O que você entende por competência intercultural?
Acredito que seja a capacidade de interagir com diferentes culturas, valorizando-as e
respeitando-as.
13. De que forma a cultura é tratada em sua sala de aula?
Enquanto estudamos a língua inglesa, o componente cultural está sempre presente, uma
vez que falamos sobre nossa cultura brasileira – que é extremamente plural – e a cultura
do outro – do norte-americano, do britânico, do italiano, do indiano, do argentino etc. Não
consigo dissociar língua de cultura.
14. Em seu ponto de vista, qual é o grande desafio para transformar a sala de aula em um
espaço para a difusão da interculturalidade?
O grande desafio é apenas desejar fazer isto. Estudar a língua inglesa nos permite
183
naturalmente trabalhar sob uma perspectiva intercultural, pois se trata de uma língua que
faz parte da realidade de inúmeras culturas diferentes.
IV. SOBRE O MATERIAL ADOTADO
15. Os seus alunos são expostos a diferentes variedades de inglês ao longo das atividades
propostas pelo material adotado nas aulas de laboratório de LI? Se sim, exemplifique.
Como trabalho com uma turma de iniciantes, não são ex postos a muitas variedades. O
livro adotado não traz muitas variedades de inglês. Os alunos se sentem mais
familiarizados e mais confortáveis para compreender a língua quando eu converso com
eles e leio os textos. Dizem que sentem dificuldades quando escutam um norte-americano,
um britânico, um indiano falando, por exemplo.
16. Os textos, conteúdos e atividades do material adotado nas suas aulas são condizentes
com a realidade, interesses e necessidades dos estudantes? Explique em caso positivo.
Sim. Os alunos estão começando a aprender a língua e estudando a parte mais básica
agora. Estamos sempre discutindo a importância de aprender isto e/ou aquilo em LI,
relacionando o que aprendemos em sala com nossas vivências e experiências. Portanto,
buscamos trabalhar de maneira contextual no intuito de promover uma aprendizagem que
seja significativa para os estudantes.
17. O material adotado viabiliza a perspectiva intercultural? Se afirmativo, de que forma?
O livro adotado, neste nível em que estamos, viabiliza pouco esta perspectiva. Nos níveis
mais avançados, ele proporciona uma relação mais ampla entre culturas diferentes.
Entretanto, mesmo utilizando este livro, busco dialogar com as culturas dos alunos, com
suas diferentes realidades. Além disso, trabalho com outros materiais com este mesmo
objetivo.
V. SOBRE O CURSO DE LETRAS/INGLÊS DA UNEB/CAMPUS VI
18. Em sua opinião, o novo estatuto da LI no mundo demanda uma reformulação no
currículo do curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI? Por quê (não)?
Acredito que todo curso deve ser flexível às novas necessidades que envolvem o ensino e a
aprendizagem de LI e dos outros componentes curriculares, pois o conhecimento é
essencialmente dinâmico.
19. Uma redefinição de objetivos no currículo do curso em direção a uma competência
linguística não comparada à do falante nativo proporcionaria um sentimento de mais
confiança por parte dos futuros professores de inglês? Justifique a sua resposta.
Sempre oriento meus alunos, futuros professores, que não devem tentar copiar a maneira
de falar do falante nativo e que, assim como existem o inglês americano, o inglês britânico,
o inglês indiano etc., temos também o inglês brasileiro no qual encontramos
características que são próprias de nossa forma de falar, de nos expressarmos. Conheço
outros professores que fazem o mesmo e possuem o mesmo sentimento. Vejo que o mais
importante é a construção contínua de uma maior consciência no que diz respeito ao papel
do docente de LI neste tempo de “world englishes”. Considerando meu conhecimento
184
sobre o curso, não percebo que os objetivos deste vão em direção a uma competência
linguística comparada à do falante nativo. Cabe a cada docente reconhecer que a LI não
está vinculada apenas a determinados falantes nativos, nem à meia dúzia de culturas.
20. De uma maneira geral, você acredita que os alunos do curso de Letras/Inglês da
UNEB/Campus VI estão conscientes do que significa ser professor de uma língua global?
Em que a sua resposta está baseada?
Com base no relacionamento que tenho com alguns alunos que estão prestes a terminar o
curso e com os primeiros semestres, acredito que aqueles discentes que possuem leituras
mais aprofundadas e já passaram pela experiência do estágio possuem uma maior
consciência em relação à significância de se ensinar uma língua global. Os alunos que
entraram no curso há pouco tempo estão ainda se familiarizando com esta realidade.
REFERÊNCIAS
ASSIS-PETERSON, A. A; COX, M. I. P. Inglês em tempos de globalização: para além de bem e mal.
Calidoscópio, Vol. 5, n. 1, p. 5-14, jan/abr 2007.
EL KADRI, M. S. Atitudes sobre o estatuto do inglês como língua franca em curso de formação
inicial de professores. 2010. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem), Universidade
Estadual
de
Londrina
(UEL),
Londrina,
PR,
2010.
Disponível
em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/ download/texto/cp125685.pdf>. Acesso em: 19 set. 2012.
MENDES, E. A perspectiva intercultural no ensino de línguas: uma relação “entre culturas”. In:
ALVAREZ, M. L. O.; SILVA, K. A. da (Org.). Linguística aplicada: múltiplos olhares. Campinas:
Pontes, 2007. p.119-139.
185
ANEXO C – Questionário respondido por João
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
QUESTIONÁRIO
Prezado(a) professor(a) formador(a),
Este questionário é parte integrante do trabalho de pesquisa intitulado “O ensino de inglês como língua
desnacionalizada e a dimensão cultural: a visão de professores formadores”, que objetiva investigar como
os professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA,
compreendem e se identificam com o estatuto da Língua Inglesa como língua franca global e com as
questões concernentes à abordagem intercultural. Informamos que os dados serão tratados coma devida
impessoalidade e as respostas dadas serão utilizadas apenas para fins de cunho científico. Lembramos
ainda que, no âmbito da pesquisa, a identidade dos informantes será inteiramente preservada.
Agradecemos a sua atenção e colaboração.
 Por favor, escolha um nome fictício de sua preferência para ser utilizado ao longo da
análise: João
 Você está convidado a responder as seguintes questões:
I. SOBRE VOCÊ
1. Qual é a sua formação acadêmica?
Mestrando
2. Há quanto tempo você atua como professor(a) de inglês? Especifique o tempo de atuação
no Ensino Superior.
Ensino inglês há 16 anos. No Ensino Superior há 7 anos.
3. Por que você escolheu ser professor(a) de inglês?
No início eu ajudava meus sobrinhos nas tarefas escolares e me identifiquei com o ensino.
4. Na condição de professor(a) formador(a), como você avalia a influência da sua prática na
formação dos estudantes do curso de Letras/Inglês da UNEB/ Campus VI?
Como tenho certeza que a prática de meus professores influenciaram em minha formação,
tenho ciência de que preciso me comportar como referencia na formação de meus alunos.
186
“O privilégio do inglês hoje até pode ter sua origem vinculada ao imperialismo
americano, mas esse fato torna-se secundário. Mundializado, ele se desprende de
suas raízes e ganha existência própria como idioma desterritorializado, apto a ser
camaleonicamente apropriado, re-significado, re-entoado por falantes de
diferentes línguas maternas[...]” (ASSIS-PETERSON; COX, 2007, p. 8).
“Conceber o Inglês como Língua Franca e não como Língua Estrangeira traz
implicações educacionais, pois provoca a descentralização do modelo nativo, com
repercussões para a escolha de variedades a serem ensinadas, o papel da cultura
no ensino das línguas e aspectos de correção linguística. Trata-se, portanto, de
redefinição identitária do professor não-nativo assim como de seus alunos” (EL
KADRI, 2010, p. 13).
II. SOBRE O INGLÊS COMO LÍNGUA FRANCA (ILF)
5.Como você se posiciona com relação à problematização do ILF na formação inicial de
professores de inglês?
Acho o tema muito relevante.
6. Para você, o que significa ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF?
Ensinar ILF significa ter em mente que a LI é tanto de meus alunos quanto dos ingleses.
7. Você se sente preparado(a) para ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF? Por quê
(não)?
O fato de eu ter consciência da necessidade de adotar uma abordagem intercultural em
minhas aulas, pode não significar total preparação, mas um bom princípio.
8. O seu inglês tem características dos falantes nativos americanos, britânicos ou possui
outra(s) marca(s)? Explique.
Eu tive experiência com a LI falada por falantes nativos americanos e britânicos, contudo
nunca me preocupei em definir uma marca.
9. Você já participou de algum evento acadêmico (minicurso, conferência ou outra
modalidade)cujas discussões giravam em torno do ILF? Em caso afirmativo, quando?
Registre algo significativo que você trouxe do evento.
Eu fiz um curso de 7 semanas oferecido pela CAPES na Universidade de Londres e as
discussões eram sempre em torno da relevância do ensino da ILF. Algo que chamou
minha atenção é que os ingleses também têm essa inquietação com o ILF, mundo
globalizado e abordagem intercultural no ensino de LI.
10. Em suas aulas, o inglês é apresentado como Língua Estrangeira ou como Língua
Franca? Esclareça a sua resposta.
Eu não me prendo na diferença de LE ou LF. Busco valorizar a cultura de meus alunos e
não exaltar a cultura americana ou britânica. O conhecimento de outras culturas pode ser
útil para a valorização da própria cultura.
187
11. Em sua sala de aula, como você lida com os desvios do inglês padrão decorrentes de
pronúncia e gramática quando os alunos se expressam oralmente em LI?
Eu busco enfatizar que há uma diferença entre inferência de sotaque e desvio de pronúncia
quando falamos inglês. O sotaque não significa problema para a comunicação, enquanto
desvio de pronúncia pode dificultar a compreensão no ato de fala. Todo falante precisa
buscar expressar bem e ser claro na pronuncia, isso não significa adquirir identidade
americana, ou britânica para falar inglês.
“As discussões que têm sido travadas no âmbito do ensino/aprendizagem de
língua em uma perspectiva intercultural objetivam empreender uma mudança de
foco e, sobretudo, de postura, que incorpore as questões culturais ao conjunto de
práticas pedagógicas de professores [...]. Isso significa [...] adotar a perspectiva da
cultura como meio de promover a integração e o respeito à diversidade dos povos,
à diferença, permitindo ao aprendiz encontrar-se com a outra cultura sem deixar
de ser ele mesmo.” (MENDES, 2007, p.119).
III. SOBRE A INTERCULTURALIDADE NO ENSINO DE INGLÊS
12. O que você entende por competência intercultural?
Entendo como uma forma de trabalhar o respeito às diferenças culturais, dessa forma o
aluno descobre que não há cultura melhor que outra.
13. De que forma a cultura é tratada em sua sala de aula?
Eu busco ter uma prática regular. Tento não cometer falhas que vão contra minhas
crenças e conhecimentos para o ELF, por outro lado não sou obcecado por ensinar cultura
em minhas aulas.
14. Em seu ponto de vista, qual é o grande desafio para transformar a sala de aula em um
espaço para a difusão da interculturalidade?
Quando conseguirmos convencer a todos que a LI já é mais falada como L2 do que L1 e
que as aulas de LI devem preparar os alunos para se comunicarem com qualquer cidadão,
independente de sua primeira língua
IV. SOBRE O MATERIAL ADOTADO
Neste semestre não adotei livro como material de suporte para as aulas de LI.
15. Os seus alunos são expostos a diferentes variedades de inglês ao longo das atividades
propostas pelo material adotado nas aulas de laboratório de LI? Se sim, exemplifique.
16. Os textos, conteúdos e atividades do material adotado nas suas aulas são condizentes
com a realidade, interesses e necessidades dos estudantes? Explique em caso positivo.
17. O material adotado viabiliza a perspectiva intercultural? Se afirmativo, de que forma?
188
V. SOBRE O CURSO DE LETRAS/INGLÊS DA UNEB/CAMPUS VI
18. Em sua opinião, o novo estatuto da LI no mundo demanda uma reformulação no
currículo do curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI?Por quê (não)?
Não. As ementas das disciplinas voltadas para o ensino-aprendizagem de LI são flexíveis e
não interferem no direcionamento em que o professor decida tomar em sua práxis. O
projeto do curso deixa claro uma visão atual e adequada a uma formação docente para um
mundo globalizado.
19. Uma redefinição de objetivos no currículo do curso em direção a uma competência
linguística não comparada à do falante nativo proporcionaria um sentimento de mais
confiança por parte dos futuros professores de inglês? Justifique a sua resposta.
O currículo antigo do curso de Letras com Inglês do Campus VI constava componentes
que buscavam fazer análise contrastiva do ensino da LI e foi muito criticado. Na prática os
pontos negativos destas disciplinas eram superiores aos positivos. A preparação do
professor para saber lidar com as diversidades em sala foram consideradas mais
importante do que entender a origem dos erros em que os alunos poderão cometer em sala
de aula.
20. De uma maneira geral, você acredita que os alunos do curso de Letras/Inglês da
UNEB/Campus VI estão conscientes do que significa ser professor de uma língua global?
Em que a sua resposta está baseada?
O curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI passou por uma recente reformulação do
quadro docente, alguns professores foram admitidos recentemente, enquanto outros que
eram substitutos tiveram o contrato vencido, além de alguns professores terem pedido
afastamento para qualificação. Dessa forma fica difícil generalizar o comportamento dos
alunos do curso. Creio que os alunos que se encontram na primeira metade do curso estão
adquirindo consciência do que significa ser professor de uma língua global.
REFERÊNCIAS
ASSIS-PETERSON, A. A; COX, M. I. P. Inglês em tempos de globalização: para além de bem e mal.
Calidoscópio, Vol. 5, n. 1, p. 5-14, jan./abr. 2007.
EL KADRI, M. S. Atitudes sobre o estatuto do inglês como língua franca em curso de formação
inicial de professores. 2010. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem), Universidade
Estadual
de
Londrina
(UEL),
Londrina,
PR,
2010.
Disponível
em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/ download/texto/cp125685.pdf>. Acesso em: 19 set. 2012.
MENDES, E. A perspectiva intercultural no ensino de línguas: uma relação “entre culturas”. In:
ALVAREZ, M. L. O.; SILVA, K. A. da (Org.). Linguística aplicada: múltiplos olhares. Campinas:
Pontes, 2007. p.119-139.
189
ANEXO D – Questionário respondido por Marcos
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
QUESTIONÁRIO
Prezado(a) professor(a) formador(a),
Este questionário é parte integrante do trabalho de pesquisa intitulado “O ensino de inglês como língua
desnacionalizada e a dimensão cultural: a visão de professores formadores”, que objetiva investigar como
os professores formadores do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI, em Caetité/BA,
compreendem e se identificam com o estatuto da Língua Inglesa como língua franca global e com as
questões concernentes à abordagem intercultural. Informamos que os dados serão tratados com a devida
impessoalidade e as respostas dadas serão utilizadas apenas para fins de cunho científico. Lembramos
ainda que, no âmbito da pesquisa, a identidade dos informantes será inte iramente preservada.
Agradecemos a sua atenção e colaboração.
 Por favor, escolha um nome fictício de sua preferência para ser utilizado ao longo da
análise: Marcos
 Você está convidado a responder as seguintes questões:
I. SOBRE VOCÊ
1. Qual é a sua formação acadêmica?
R. Sou formado em Letras Português/Ingles pela UNEB, Campus VI. Especialista em Língua
Inglesa pela Faculdade da Região dos Lagos – Ferlagos, Rio de Janeiro e Mestre em Linguística
Aplicada pela Universidade de Brasília – UnB, Brasília.
2. Há quanto tempo você atua como professor(a) de inglês? Especifique o tempo de atuação
no Ensino Superior.
R. Há 09 anos.
3. Por que você escolheu ser professor(a) de inglês?
R. O que me motivou a ser professor de língua inglesa foi o fato de ela me ajudar a romper
barreiras sociais no sentido de mudar de classe, de ter o meu capital cultural acrescido.
Eu, que venho de uma classe social menos favorecida, tive através da língua inglesa,
oportunidades melhores, melhores condições de inserção social. Isso me motivou a ser um
professor de línguas para tentar ajudar os outros alunos a superarem, de certa forma, suas
dificuldades sociais através da aprendizagem de inglês. Como aluno da universidade esse
190
desejo só aumentou.
4. Na condição de professor(a) formador(a), como você avalia a influência da sua prática na
formação dos estudantes do curso de Letras/Inglês da UNEB/ Campus VI?
R. Na condição de professor formador, tenho feito um esforço para que meus alunos e
minhas alunas adquiram a língua inglesa e façam uso dela por um viés crítico, ou seja,
incentivo os meus alunos e minhas alunas a aprenderem inglês para a vida social enquanto
cidadãos e cidadãs do mundo globalizado.
“O privilégio do inglês hoje até pode ter sua origem vinculada ao imperialismo
americano, mas esse fato torna-se secundário. Mundializado, ele se desprende de
suas raízes e ganha existência própria como idioma desterritorializado, apto a ser
camaleonicamente apropriado, re-significado, re-entoado por falantes de
diferentes línguas maternas [...]” (ASSIS-PETERSON; COX, 2007, p. 8).
“Conceber o Inglês como Língua Franca e não como Língua Estrangeira traz
implicações educacionais, pois provoca a descentralização d o modelo nativo, com
repercussões para a escolha de variedades a serem ensinadas, o papel da cultura
no ensino das línguas e aspectos de correção linguística. Trata-se, portanto, de
redefinição identitária do professor não-nativo assim como de seus alunos” (EL
KADRI, 2010, p. 13).
II. SOBRE O INGLÊS COMO LÍNGUA FRANCA (ILF)
5. Como você se posiciona com relação à problematização do ILF na formação inicial de
professores de inglês?
R. Esse tema gera muitas controvérsias. É sabido que é importante aprender inglês para
estar inserido no mundo globalizado, para se tornar cidadão crítico no/do mundo. Porém
qual ou quais culturas específicas devemos abordar/problematizar em nossas aulas de
línguas. Língua é algo que não deve ser desvinculado, separado de um contexto social,
regido por ideologias e relações assimétricas de poder. Partindo dessa premissa, quais
critérios tenho que traçar para incluir ILF em minhas aulas de línguas. Essa questão ainda
me remete a vários questionamentos, sem uma resposta ainda satisfatória.
6. Para você, o que significa ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF?
R. Significa estar atento à questão geopolítica do inglês.
7. Você se sente preparado(a) para ensinar o inglês sob a perspectiva do ILF? Por quê
(não)?
R. Ainda não. Muito me incomoda sobre a questão geopolítica da língua inglesa. Acredito
que o termo ILF esconde questões de desdobramentos sociais, ideológicos e políticos
inerentes a determinado (s) país (es) X ou Y.
8. O seu inglês tem características dos falantes nativos americanos, britânicos ou possui
outra(s) marca(s)? Explique.
R. Acredito que meu inglês tem características estadunidenses. Aprendi inglês assistindo
(telejornais, filmes, clipes de músicas, etc), lendo artigos, livros (inglês estadunidense) e
falando com pessoas oriundas dos Estados Unidos da América, ou seja, o inglês
estadunidense esteve muito presente em meus momentos de formação.
191
9. Você já participou de algum evento acadêmico (minicurso, conferência ou outra
modalidade) cujas discussões giravam em torno do ILF? Em caso afirmativo, quando?
Registre algo significativo que você trouxe do evento.
R. Não. O que eu sei sobre ILF vem de minhas leituras.
10. Em suas aulas, o inglês é apresentado como Língua Estrangeira ou como Língua
Franca? Esclareça a sua resposta.
R. Em minhas aulas o inglês é apresentado como língua estrangeira. Minha asserção
baseia-e no fato de essa língua não ser usada por uma comunidade de prática fora do
ambiente escolar. Porém tento fazer de meu espaço de ensino um lugar de prática. Tento
desestrangeirizá-la na medida do possível, observando a necessidade e a realidade de
meus alunos e de minhas alunas.
11. Em sua sala de aula, como você lida com os desvios do inglês padrão decorrentes de
pronúncia e gramática quando os alunos se expressam oralmente em LI?
R. Tento incentivara comunicação entre meus alunos. Em minhas aulas o mais importante
é a comunicação, sempre esclareço que a questão gramatical está subordinada à atividade
comunicativa. Desvios do inglês padrão decorrentes de pronúncia e gramática são
tolerados e problematizados.
“As discussões que têm sido travadas no âmbito do ensino/aprendizagem de
língua em uma perspectiva intercultural objetivam empreender uma mudança de
foco e, sobretudo, de postura, que incorpore as questões culturais ao conjunto de
práticas pedagógicas de professores [...]. Isso significa [...] adotar a perspectiva da
cultura como meio de promover a integração e o respeito à diversidade dos povos,
à diferença, permitindo ao aprendiz encontrar-se com a outra cultura sem deixar
de ser ele mesmo.” (MENDES, 2007, p.119).
III. SOBRE A INTERCULTURALIDADE NO ENSINO DE INGLÊS
12. O que você entende por competência intercultural?
R. Competência intercultural, em minha opinião, é a capacidade de o sujeito colocar-se no
lugar do outro com o objetivo de entender como esse outro compreende o mundo social em
sua volta. É tentar enxergar o mundo através da lente dos olhos do “outro”. Porém essa
compreensão não é, de forma alguma, ingênua: “compreender” o outro (e sua cultura),
“respeitar” o outro (e sua cultura) é resultado de um processo de construção identitária
onde estão envolvidas questões de ideologia e poder. Essas questões devem ser
problematizadas e fazem parte da competência intercultural.
13. De que forma a cultura é tratada em sua sala de aula?
R. Eu sempre converso com meus alunos sobre questões de cultura sob um viés crítico.
Muitas vezes deixo de lado o livro didático e tento discutir com meus alunos questões
geopolíticas das línguas. Tenho consciência que o livro didático adotado não aborda
questões culturais e quando o faz, não problematiza tais questões. Elas são tratadas de
maneira superficial.
14. Em seu ponto de vista, qual é o grande desafio para transformar a sala de aula em um
espaço para a difusão da interculturalidade?
192
R. O problema reside na má formação do professor de línguas, na graduação. É
necessário que haja um redimensionamento curricular e que a questão da
interculturalidade seja contemplada, de fato, no currículo. Porém reflito: a universidade
está preparada para abordar essas questões de forma crítica? Onde encontraríamos
professores universitários mais bem qualificados que compreendem linguagem sob o viés
de uma perspectiva crítica e aplicada? Creio que haveria uma necessidade maior de
professores mestres e doutores com formação no campo aplicado. Outra questão
importante a mencionar é o material didático. Quem produz esses materiais. Por que a
questão da cultura não é problematizada nesses materiais? Não problematizar questões
culturais nesses exemplares é intencional ou não? Eis a questão.
IV. SOBRE O MATERIAL ADOTADO
15. Os seus alunos são expostos a diferentes variedades de inglês ao longo das atividades
propostas pelo material adotado nas aulas de laboratório de LI? Se sim, exemplifique.
R. Não. Raramente os diálogos contemplam algumas variedades de inglês provenientes de
outros países (de forma superficial), porém a predominância é o inglês estadunidense.
16. Os textos, conteúdos e atividades do material adotado nas suas aulas são condizentes
com a realidade, interesses e necessidades dos estudantes? Explique em caso positivo.
R. Não.
17. O material adotado viabiliza a perspectiva intercultural? Se afirmativo, de que forma?
R. O material didático não viabiliza a perspectiva intercultural. Mais uma vez retoma as
questão perguntando sobre quem produz esses materiais e por que a questão da cultura
não é problematizada nesses materiais. Acredito que o não problematizar questões
culturais nos exemplares didáticos é uma posição política intencional. É resultado da ação
dos intelectuais da classe hegemônica. É a perpetuação do poder e hierarquização das
classes sociais.
V. SOBRE O CURSO DE LETRAS/INGLÊS DA UNEB/CAMPUS VI
18. Em sua opinião, o novo estatuto da LI no mundo demanda uma reformulação no
currículo do curso de Letras/Inglês da UNEB/Campus VI? Por quê (não)?
R. Sim. Não há mais espaço para trabalhar o inglês deste ou daquele país especificamente.
Há a necessidade de uma reformulação curricular que contemple a questão da linguagem
como prática social, não desvinculada de contextos sociais específicos. Os objetivos tem
que partir da realidade dos alunos. Perguntas como “Por que é importante aprender
inglês?” Aprender inglês para quê?” devem fazer parte dos objetivos propostos, partindo
da perspectiva dos aprendentes e não do professor.
19. Uma redefinição de objetivos no currículo do curso em direção a uma competência
linguística não comparada à do falante nativo proporcionaria um sentimento de mais
confiança por parte dos futuros professores de inglês? Justifique a sua resposta.
R. Creio que sim. Acredito que a comparação ao falante nativo é uma forma de exclusão
193
social. Para mim não existe níveis de natividade. Se existem, como definir esses níveis, com
que autoridade poderíamos classificar a que nível pertence o nosso aluno X ou Y? Por
muito tempo, professores, embora, às vezes muito bem intencionados, tem excluído muitos
alunos do processo de aprender inglês. Esses últimos (os alunos) uma vez tendo
“consciência” (produto de discursos hegemônicos) de não atingir uma proficiência
igualada à de um falante nativo (crenças propagadas e perpetuadas pelo discurso das
classes hegemônicas, através de instituições autorizadas, a exemplo, a escola, a
universidade, etc.) desistem de seu sonho. Por outro lado, o aluno deve aprender inglês
para defender suas ideias, valores, crenças frente ao processo globalizante. O aluno deve
aprender inglês, sim, porém para sobreviver, lutar por identidades mais valorizadas
simbólica e socialmente (posicionar-se conscientemente) no mercado global, tendo a sua
identidade respeitada. Isso significa que o mais importante é privilegiar a comunicação,
independente de sotaque de falante nativo (associado, muitas vezes, aos Estados Unidos).
20. De uma maneira geral, você acredita que os alunos do curso de Letras/Inglês da
UNEB/Campus VI estão conscientes do que significa ser professor de uma língua global?
Em que a sua resposta está baseada?
R. Acredito que não. Se não é abordada a questão de interculturalidade de maneira crítica
nos livros didáticos; se os nossos alunos não são incentivados a pensar sobre essas
questões de maneira mais reflexiva, o que se espera deles de sua formação? Embora
existam professores que tentam enfocar aspectos interculturais de forma mais consistente e
reflexiva, convidando os alunos a lerem (artigos científicos extras) e refletir/discutir sobre
essas leituras nas aulas de línguas, acho que deveria ser inclusa uma disciplina voltada
especificamente para essa questão no currículo superior, porque não uma disciplina
denominada “Interculturalidade e Ensino-aprendizagem de Línguas?” Minha resposta
embasa-se em minhas leituras teóricas, relacionadas à prática em sala de aula e fora dela
(fruto de minha formação continuada como professor de línguas).
REFERÊNCIAS
ASSIS-PETERSON, A. A; COX, M. I. P. Inglês em tempos de globalização: para além de bem e mal.
Calidoscópio, Vol. 5, n. 1, p. 5-14, jan/abr 2007.
EL KADRI, M. S. Atitudes sobre o estatuto do inglês como língua franca em curso de formação
inicial de professores. 2010. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem), Universidade
Estadual
de
Londrina
(UEL),
Londrina,
PR,
2010.
Disponível
em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/ download/texto/cp125685.pdf>. Acesso em: 19 set. 2012.
MENDES, E. A perspectiva intercultural no ensino de línguas: uma relação “entre culturas”. In:
ALVAREZ, M. L. O.; SILVA, K. A. da (Org.). Linguística aplicada: múltiplos olhares. Campinas:
Pontes, 2007. p.119-139.
194
ANEXO E – Registros etnográficos das aulas de Básico I
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
REGISTROS ETNOGRÁFICOS DAS OBSERVAÇÕES DE AULA
BÁSICO I – PROFª. HERMIONE
OBS: As aulas foram conduzidas em português com algumas intercalações em inglês.
Primeira visita – dia 07.07.14
2 aulas: quarto e quinto horários
Sala de aula
Aula 1
21:25 – P inicia a aula entregando provas e atividades corrigidas.
21:29 – Ao terminar a entrega do material corrigido, P pergunta se há alguma dúvida
sobre a correção. E avisa que na aula seguinte fará uma revisão de algumas questões
que os AA já deviam saber e continuam errando.
21:31 – P pede para abrir o módulo na página 39 e pede algumas confirmações sobre a
realização de exercícios de Listening e Grammar. P concede um espaço da aula a
pedido dos AA para resolver questões referentes aos ensaios da quadrilha e das
providências a serem tomadas com relação à barraquinha de comidas típicas.
21:36 – P inicia a correção do exercício que foi deixado para ser respondido em casa
sobre Prepositions. Os AA acompanham a correção, alguns AA específicos respondem
sem dificuldade e P registra a resposta no quadro.
21:39 – Uma A pergunta se é correto dizer twelve noon e P responde que faz sentido
pois têm-se a opção twelve noon e twelve midnight, para ficar claro que se trata do
meio dia, pode-se dizer noon ou twelve noon, explica P.
21:41 – P dá início à atividade de Listening Comprehension, insere o CD no notebook,
perde um certo tempo para localizar a faixa correta e, finalmente, executa o áudio. P
comunica que os AA precisam ficar bem atentos porque eles escutarão um diálogo que
é mais longo do que os diálogos que eles têm costume de ouvir. P explica que o diálogo
consiste na descrição de eventos programados para a semana e pede para prestarem
especial atenção aos dias e horários de cada atividade. Todos ouvem atentamente ao
diálogo. O referido áudio foi repetido quatro vezes de forma ininterrupta. Os AA
confessam que é difícil compreender porque as falas são muito rápidas.
21:50 – P faz alguns questionamentos para checar o que os alunos conseguiram
entender do que ouviram e em seguida lê pausadamente todo o diálogo para a turma.
195
21:55 – P confere o dia e horário de cada evento com a turma e registra no quadro as
respostas do exercício. Perguntas como What day is the concert? What time is the
concert? são feitas para cada um dos eventos mencionados no diálogo.
22:02 – P informa para a turma que agora eles já conseguem conversar sobre eventos.
E pergunta qual é o dia e horário do próximo jogo do Brasil (a aula observada
aconteceu no período da Copa do Mundo 2014). Uma A responde on Tuesday at 5:00
pm. E outra A pergunta se é possível responder 17:00. P responde que essa opção não é
comum na Língua Inglesa, afirma que em alguns casos ouve-se essa forma, mas no
geral, os falantes de inglês usam a.m. e p.m.
22:05 – P inicia uma atividade sobre ritmo e entonação de frases e executa o áudio
equivalente. Primeiro as frases são ditas uma após outra sem interrupção e em seguida
com pausas para os alunos repetirem em coro o que ouviram. Os AA repetem com
alguma dificuldade e P resolve ler as frases para que os AA possam repetir com mais
facilidade.
22:10 – P pede para os AA se reunirem em duplas e conversarem sobre eventos
pessoais. P sugere aos AA falarem sobre o jogo do Brasil que acontecerá no dia
seguinte ou sobre o jogo da Argentina que, na sua opinião, também será um evento
interessante e faz comentários envolvendo os argentinos, em tom de brincadeira.
Depois diz para os AA que se acharem melhor, eles poderiam escrever o diálogo e
depois praticar oralmente. Os AA em pares discutem entre si e tentam realizar a
atividade solicitada. P adverte que todos devem interagir em inglês. Algumas duplas
solicitam ajuda de P, para o devido esclarecimento de dúvidas.
Aula 2
22:20 – Em meio à realização da atividade, P informa que quer duas duplas voluntárias
para demonstrar o diálogo para toda a turma.
22:22 – Um A chama P para questionar sobre a pronúncia do th e pergunta se o som
correto é produzido posicionando a língua entre os dentes. Nesse momento, P poderia
comentar sobre o Brazilian English, mas não o fez.
22:26 – P pede a atenção de todos para ouvirem o diálogo de uma dupla que se
disponibilizou a apresentar. A dupla lê o diálogo e logo em seguida P faz algumas
perguntas sobre a conversa, mas não elogia. P pede que outra dupla voluntária faça o
mesmo.
22:29 – P prossegue com a sequência do módulo, apresenta a lição intitulada Ask about
birthdays e pergunta se os AA conhecem os ordinal numbers, se sabem pronunciar. P
passa o áudio correspondente aos numerais ordinais e, primeiro, todos ouvem
atentamente a pronúncia de cada numeral. Depois, os AA ouvem novamente a
pronúncia de cada número e repetem logo em seguida. Nesse momento, os AA dão
risadas moderadas em razão da pronúncia insistente do th ao final da maioria dos
numerais ordinais. P adverte que o fonema que causou certo desconforto entre os AA
não pertence à LP, e por isso eles têm mais dificuldades ao pronunciar. Ensina que para
produzir um som aproximado à pronúncia padrão eles devem posicionar a ponta da
língua entre os dentes. E todos aceitam a explicação de P sem questionar. Ao repetirem
196
todos os números mais uma vez, as risadas são novamente inevitáveis.
22:37 – P ensina exemplificando no quadro que é necessário elevar as duas últimas
letras do nome de cada numeral ordinal ao número para substituir o sinal utilizado na
LP. Adverte que os AA devem esquecer o sinal utilizado na LP e segue apresentando
os meses do ano.
22:40 – Para apresentar a pronúncia dos meses do ano, P procede da mesma maneira:
reproduz o áudio com a pronúncia de cada mês duas vezes de forma ininterrupta e na
terceira vez pede aos AA para repetir em coro. Depois dá algumas dicas sobre a
maneira de escrever as datas em inglês, faz menção ao dia da Independência dos
E.U.A., que foi celebrado há três dias, na ocasião da aula, e diz que se pode dizer, July
4th ou fourth of July e faz comparações com a forma de escrever datas na LP.
22:43 – P inicia mais uma atividade de Listening Comprehension e, dessa vez, os AA
devem prestar atenção nas datas mencionadas e circular a data correspondente no
calendário. Aparentemente os AA realizam a atividade sem dificuldade. O áudio é
repetido para que os AA possam checar o que foi feito.
22:48 – No momento da correção, P diz o nome do mês e os AA complementam
dizendo o dia que eles escutaram, praticando assim a pronúncia dos ordinal numbers.
Todas as respostas dadas são registradas no quadro.
22:52 – P adianta que na aula seguinte, eles falarão sobre datas de aniversário,
e solicita que os alunos respondam as atividades indicadas no Workbook, para serem
corrigidas na quarta-feira seguinte.
Segunda visita – dia 15.07.14
2 aulas: terceiro e quarto horários
Sala de aula
Aula 3
20:44 – A turma já havia tido o primeiro e segundo horários de aula de Básico I nesse
mesmo dia. A pesquisadora combinou com P de observar o terceiro e quarto horários.
No momento em que a observação é iniciada, P pergunta aos AA, de forma aleatória,
quando é o aniversário dos colegas da turma (presume-se que em momento anterior
cada um dos AA falou a data de seu próprio aniversário). E os AA respondem
praticando a pronúncia dos meses e dos numerais ordinais em inglês.
20:57 – P ensina a diferença entre congratulations e happy birthday para a turma.
21:03 – P pede para cada um dos AA dizerem a data de aniversário de todos os
membros de sua família. Então cada aluno diz a data de aniversário da mãe, do pai, do
irmão mais velho, da irmã, etc. A maioria dos AA consultam informações anotadas no
caderno. Poucos conseguem se expressar espontaneamente. Ao longo das falas, P
passeia pela sala e se aproxima do A que está com a palavra, demonstrando dar a
devida atenção à fala do A. P faz algumas intervenções, perguntando, por exemplo, o
nome do membro da família a que o A se refere, também se o A se refere ao irmão
mais velho ou mais novo, etc., só há auxílio na pronúncia das palavras e,
197
especialmente, na pronúncia dos Ordinal numbers, se solicitado pelo A. Uma A
menciona as datas com alguma dificuldade, mas P não corrige problemas com
pronúncia. Também não elogia muito, limita-se a dizer "ok" e raramente "good" depois
das falas. Ao final da atividade, P reforça que os AA precisam falar (praticar).
21:20 – P indica a página do módulo a ser trabalhada e executa o áudio referente a um
texto constituído de quatro diálogos sobre a data e horário de alguns eventos. Todos os
AA escutam a leitura e, em seguida, respondem em silêncio aos exercícios que consiste
em completar informações baseadas no texto. Depois de alguns minutos, P inicia a
correção e pergunta se é necessário escrever as respostas no quadro, uma A (a que
demonstra ter mais dificuldade) sinaliza que sim. As perguntas sobre o texto são feitas
em inglês e os AA parecem não ter dificuldades em responder.
21:28 – P revisa o vocabulário e diz que no diálogo os falantes mencionam a meeting,
a party, a movie and a dance, e pergunta o que os AA preferem. Alguns AA dão a sua
opinião, e P faz outras perguntas que surgem a partir das respostas dadas.
Aula 4
21:35 – P introduz uma atividade com vídeo que contém uma cena de uma sitcom que
faz parte do módulo adotado. Ao final de cada unidade do livro, uma cena é trabalhada
e os AA respondem a questões relacionadas ao que assistiram. Assim, P reproduz o
vídeo da unidade, cuja cena, que acontece em um restaurante, transmite a conversa de
um casal, tentando definir o que vão fazer no dia do aniversário do mocinho. Dessa
forma, a conversa se desenrola baseada nas informações de um jornal que contém
alguns eventos que acontecerão no dia do aniversário. P distribui uma atividade
contendo questões objetivas sobre a cena. P exibe o sitcom três vezes e todos assistem
com atenção. P pergunta se todos conseguiram entender e alguns AA se manifestam
dizendo que não conseguiram entender completamente. P explica o que deve ser feito
em cada questão da atividade e passa mais uma vez a cena do vídeo.
21:50 – P pede aos AA para responderem à atividade com as informações que eles
conseguem se lembrar. Todos se empenham na tarefa. Ao terminarem, os alunos
entregam a atividade para ser corrigida posteriormente por P. Com as atividades
respondidas em mãos, P passa o vídeo, agora com legenda, pela última vez.
22:02 – P faz perguntas utilizando o vocabulário utilizado na cena do vídeo.
Interessante dizer que o rapaz chega ao restaurante às 6:02 p.m. e o encontro foi
marcado às 6:00 p.m. A moça diz que ele está atrasado. P aproveita essa situação para
perguntar se os AA consideram que o rapaz está mesmo atrasado, e a maioria responde
que não. Nesse momento, um aluno informa que só em algumas culturas como a
Alemã, isso seria um atraso.
22:07 – A coordenadora interrompe a aula para passar alguns informativos.
22:16 – P retoma às perguntas relacionadas ao vocabulário utilizado no vídeo. E
pergunta aos AA qual seria a programação, dentre as citadas no vídeo, que seria mais
interessante na opinião deles. Alguns AA emitem a sua opinião.
22:19 – P solicita que os alunos peguem o texto intitulado "Summer Taste" que foi
198
entregue em uma aula anterior. P havia solicitado aos AA que fizessem uma pesquisa
acerca do vocabulário do texto e respondessem às questões propostas. P pergunta se
eles gostaram do texto e todos respondem que sim. Em seguida, pergunta quem na sala
conhece o Rio de Janeiro. Ninguém responde afirmativamente. Um A interpela P:
“Professora, você conhece Brejinho da Ametistas (Distrito de Caetité)?” E todos riem.
P começa a ler o texto que aborda sobre as inúmeras opções oferecidas pelos quiosques
na praia de Copacabana que chegam a competir com os restaurantes. Ao longo da
leitura P faz pausas para fazer algumas perguntas, como, por exemplo, vocês gostam de
Copacabana? E um A responde que pelo que ele vê pela Globo sim. P segue com a
leitura e sempre faz intervenções para confirmar se os AA entenderam determinada
palavra. O texto traz o nome das várias comidas e drinks que são servidos nos
quiosques, e P faz várias perguntas, esclarecimentos e comentários sobre esse
vocabulário. P esclarece que o texto foi retirado de um guia turístico do Rio que traz o
mesmo texto nas versões em português e em inglês, P diz que vai mandar para os AA a
versão em português pela internet. Nesse momento, a pesquisadora se levanta, agradece
à turma e à professora e se retira.
199
ANEXO F – Registros etnográficos das aulas de Intermediário I
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
REGISTROS ETNOGRÁFICOS DAS OBSERVAÇÕES DE AULA
INTERMEDIÁRIO I – PROFª. ANASTÁCIA
OBS: Todas as aulas foram conduzidas em inglês
Primeira visita – dia 15.07.14
2 aulas: primeiro e segundo horários
Laboratório de idiomas
Aula 1
19:25 – A aula já havia começado quando a pesquisadora chega na sala. P apresenta a
pesquisadora para todos da turma e passa a palavra para que ela dê mais informações
sobre a pesquisa que está sendo desenvolvida.
19:33 – Ao retomar a aula, P lê no módulo (P e AA estão de posse do módulo adotado)
maneiras de aceitar ou recusar um convite. Ensina como ser educado nessas situações.
19:38 – Em seguida, P se volta novamente para o módulo e informa que na página
indicada há uma revisão sobre as preposições de lugar e de tempo e pergunta se os AA
estão se lembrando delas. Alguns AA dizem que não se lembram. P enfatiza o uso das
prepostions on, in e at com o suporte de um texto que traz informações sobre o lugar,
horário e dias dos shows da cantora e compositora Cassandra Wilson. P faz perguntas a
determinados AA e eles, acompanhando o texto, são estimulados a responder às
questões com as preposições adequadas. Depois, seguindo as informações da página
indicada no módulo, P reforça cada um dos casos em que as referidas preposições são
usadas com a ajuda dos AA. Ao lembrar a todos que se trata apenas de uma revisão, P
diz: “If you don‟t know, you should know, so study more!”
Aula 2
19:44 – P pergunta se os AA responderam a um pequeno exercício sobre preposições
na página 16, e como o exercício não foi feito por ninguém, P cede um tempo para essa
finalidade. A atividade consiste em completar as lacunas de um e-mail com as
preposições apropriadas.
19:51 – No momento da correção, P pergunta o assunto do e-mail e os AA respondem
que é um convite para um concerto de salsa, e pergunta a uma A se ela gosta de salsa,
ela responde que não gosta de dançar. Na sequência, P pede a um A para ler todo o email, dando ênfase nas preposições que ele utilizou para preencher as lacunas. Logo
em seguida, convida outra A para ler o e-mail novamente para que todos acompanhem
quais foram as preposições utilizadas por ela. P explica algumas palavras específicas
200
que apareceram ao longo do texto. P lê o e-mail pela última vez para que os AA
possam checar as preposições corretas. Alguns AA erram as resposta e pedem para P
esclarecer dúvidas.
19:57 – P começa a falar sobre gostos musicais, e exibe uma imagem, na TV de 42”, de
um panfleto da Festa de Santana (festa popular da padroeira da cidade de Caetité) que
acontecerá na semana seguinte na cidade. P informa que têm atrações para todos os
gostos musicais e mostra os artistas que estarão presentes na festa. P faz uma série de
perguntas sobre cada uma das atrações, como, por exemplo: “What‟s the best music
attraction, in your opinion?” “What do you think about Frejat?” “What kind of music
does Leo Magalhães sing?”, entre outras, e as direciona ora ao coletivo, ora a AA
selecionados para que todos participem. Boa parte dos AA interage entusiasmada.
20:05 – P fala um pouco sobre a festa, diz que haverá música ao vivo e, na sequência,
pergunta aos AA, em que lugares eles podem ir nas cidades onde eles moram para
ouvir música ao vivo. Também pergunta aos AA sobre bons lugares para comer em
suas respectivas cidades. Para estimular respostas satisfatórias, P exemplifica com
informações sobre sua própria cidade e, assim, incentiva a prática por parte dos alunos.
20:08 – P pede para os alunos abrirem o módulo na página indicada e executa o áudio
de uma série de palavras relacionadas a entretenimento e eventos culturais. Da segunda
vez que o áudio é reproduzido, os alunos repetem as palavras para praticar a pronúncia.
Sobre o vocabulário aprendido (movie, play, concert, talk, lecture, art exhibit), P faz
algumas explicações extras e direciona inúmeras perguntas aos AA, que respondem e
tiram dúvidas com P.
20:14 – P dá início a um exercício de Listening Comprehension e informa que, ao
longo dos quatro diálogos que serão reproduzidos, será necessário prestar a devida
atenção sobre qual tipo de evento as pessoas estão conversando, a que horas será o
evento mencionado e se as pessoas aceitam ou recusam os convites que são feitos, para
então preencherem o quadro da atividade que consta no módulo. Importante notar que
em todos os diálogos, os falantes são americanos. A professora repete o diálogo, duas
vezes seguidas, e, posteriormente, os AA completam com as informações que
conseguem apreender. P pergunta o que os AA conseguiram entender de cada um dos
diálogos e escreve as respostas dadas no quadro. Em seguida, passa o áudio mais uma
vez para os AA tentarem captar mais informações. P salienta que não é necessário
compreender todos os detalhes da conversa, mas aquilo que é essencial. Depois, voltase ao quadro para completar as informações que faltavam. Um A que demonstra ter um
melhor nível de inglês participa mais. P raramente estimula a participação daqueles AA
que permanecem quietos ao longo da correção.
20:24 – P explica que irá reproduzir o mesmo áudio para que os AA respondam à
atividade seguinte. Dessa vez, os AA precisam relacionar as informações da primeira
com a segunda coluna. Depois de passar o áudio mais uma vez, P pergunta se foi
suficiente ou se é necessário ouvir outra vez. Os AA optam por escutar mais uma vez
para que eles possam checar as respostas. P faz uma correção oral rápida e encerra a
aula, pois é chegada a hora do break.
201
Segunda visita – dia 21.07.14
2 aulas: segundo e terceiro horários
Laboratório de idiomas
Aula 3
19:50 – A pesquisadora chega na sala. (Os cinco horários foram agendados para a aula
de Intermediário I na turma).
19:55 – No primeiro horário, os AA deram início a um exercício de Listening
Comprehension. No momento em que a pesquisadora chega na sala, eles estão fazendo
a correção juntamente com P que passa o áudio pela última vez e pausa na ocasião em
que eles escutam a informação necessária para que a resposta certa seja certificada. O
Listening constitui-se de cinco diálogos, todos eles entre uma vendedora e um
consumidor. Os consumidores são falantes não nativos da língua inglesa e, por isso
mesmo, fica bem perceptível o sotaque diferente em relação ao do americano. P faz
questão de chamar atenção para esse fato e indica a nacionalidade de cada um deles.
Depois de corrigidas as respostas, P faz comentários sobre os diferentes sotaques que
foram ouvidos ao longo da gravação, e pergunta se eles notaram a diferença entre os
sotaques e se eles conseguiram entender melhor um do que o outro. E lança a pergunta:
“Vocês acham que o sotaque do francês, da espanhola, da chinesa e do árabe tem
alguma diferença ou parece ser o mesmo na opinião de vocês?” Todos os AA
concordam que eles têm notadamente sotaques diferenciados. E um A chega a dizer
que o sotaque chinês é engraçado. P adverte que não é uma questão de ser engraçado
ou não, pois eles mesmos têm um sotaque peculiar de baianos que falam inglês, e
acrescenta que o sotaque deles os persegue onde quer que estejam, falando a língua que
for. P pergunta: “Have you ever listened to Gilberto Gil or Caetano Veloso singing in
English? Note, their accent is there!” P ainda comenta que é possível perceber
claramente algumas particularidades na fala da chinesa falando inglês, reproduzindo as
próprias palavras de P: “she sounds like a Chinese girl talking in English”. E assinala
que com eles acontece a mesma coisa e propõe que os AA gravem suas próprias vozes
falando inglês para que eles possam observar sua pronúncia e sotaque de brasileiros
falando inglês.
20:08 – P retoma à proposta do módulo e lembra que eles falavam sobre gostos
musicais. P pergunta a determinada A se ela gosta de arrocha, depois pergunta a um
outro A se ele gosta de Country Music, sempre instigando que eles expliquem porque
gostam ou porque não gostam, o A responde que Country Music não faz seu estilo, e
que prefere rock. Logo em seguida, P pergunta: “Do you have some stereotypes related
to your tastes on songs?” E, para exemplificar, pergunta aos AA o que vem na mente
deles quando eles ouvem a palavra reggae. Os alunos respondem que lembram de Bob
Marley, de paz e amor, de calmaria, de negros, da Jamaica. P ainda pergunta: “What
about classical music? Os AA respondem: “Beethoven, sono, tédio” e, assim, P conclui
“Did you see that you have some stereotypes? E, por fim, alerta “Open your minds,
guys, you can have your own opinion but you have to respect the others”. Um A
colabora com a fala de P e diz que ele não gosta de Country Music, mas respeita
aqueles que gostam.
20:13 – P anuncia que na página indicada há três textos que correspondem às falas de
três pessoas de nacionalidades distintas revelando seus gostos musicais e esclarece que
eles vão ouvir o áudio referente a cada fala e na sequência alguns AA serão
202
selecionados para fazer a leitura. Todos ouvem silenciosamente. Ao longo da gravação,
escuta-se uma coreana falando e P pede para os alunos prestarem atenção no sotaque.
Ao final do áudio, P orienta que eles acabaram de ouvir pessoas de lugares diferentes
de variados gostos musicais, e inicia uma discussão sobre o assunto. Primeiro pergunta
quando os A costumam ouvir música. Uma A responde que não ouve música todo dia,
talvez três vezes por semana. P confessa que prefere ouvir musica antes de dormir, e
salienta que gosta de ouvir todo tipo de música. Outra A diz que ouve música quando
limpa a casa, outra ainda diz que ouve no caminho para a faculdade. P pergunta se
música faz parte da vida deles e todos concordam.
20:19 – Um A é convidado para começar a leitura do texto. P pede para ele ler a
metade da primeira fala e pede outro A para ler até o final. E repete o mesmo
procedimento com as duas outras falas. P elogia pouco. Ao final da leitura, P chama a
atenção para algumas palavras que apareceram ao longo do texto e, em seguida, faz
perguntas sobre o que foi lido.
20:22 – P diz para os AA que quer fazer algo diferente com a turma e pede para todos
desenharem um quadro no caderno, semelhante ao ilustrado no quadro branco. P
explica que eles vão ouvir algumas músicas e, à medida que forem ouvindo a canção,
eles devem pensar e escrever uma palavra que vem a cabeça com relação a um lugar,
pessoa, comida, cor e como eles se sentem ao ouvir cada uma das músicas.
20:27 – P reproduz a primeira música “Best day of my life” da banda de indie rock
American Authors e reforça que, enquanto estão ouvindo, eles devem imaginar e
completar as informações do quadro (Place, Person, Food, Color, Feeling). Depois de
passar a primeira música, P imediatamente menciona um lugar que veio à cabeça dela
ao ouvir a música, e depois pergunta a alguns AA da turma sobre o lugar que eles
pensaram, e procedeu da mesma forma com todas as outras informações do quadro.
20:32 – P reproduz a segunda música “Summer nights” do filme estadunidense Grease,
e segue informando o que imaginou e interrogando os AA sobre o que anotaram sobre
cada um dos tópicos ao ouvirem a música. Todos da turma demonstraram-se motivados
em participar. A terceira música é exibida: "I'm glad you came" da banda britânica The
Wanted. Logo em seguida, reproduz a quarta música "Wonderwall" da banda de rock
também britânica Oasis.
20:41 – Embora tenha programado passar cinco músicas, P interrompe a aula para o
intervalo.
Aula 4
21:00 – P pede aos AA para responderem aos exercícios da página 24, explica o que
deve ser feito e dá um tempo para os alunos realizarem a tarefa. Alguns AA apresentam
dúvidas e P se aproxima para auxiliá-los. P estimula a todos para responderem ao
exercício com empenho.
21:14 – P pergunta à turma se estão prontos para a correção, a maioria sinalizou
afirmativamente. Porém, alguns AA sinalizam que precisam de mais tempo. E um
tempo a mais é cedido.
203
21:18 – P diz para a turma que é hora de corrigir a atividade, e pede para um voluntário
ler a resposta da primeira questão que consiste em completar com a preposição correta.
Dessa vez, a resposta não é registrada no quadro, os AA respondem oralmente e P
ratifica ou retifica a resposta. P sempre se aproxima do A que está respondendo e o/a
ajuda com determinadas pronúncias. Alguns AA demonstram ter dificuldade em
entender a segunda questão da atividade, P nota que a maior parte da turma não
respondeu corretamente e explica pacientemente que eles devem organizar as frases
que estão embaralhadas de acordo com o que consta na imagem ao lado de cada frase.
E cede mais um tempo para os AA tentarem responder a referida questão.
21:30 – Os AA continuam respondendo à segunda questão da atividade.
21:36 – P retoma a correção e resolve escrever no quadro as respostas, dada a
dificuldade que a turma apresentou com a questão. As respostas são registradas no
quadro com a ajuda coletiva dos AA.
21:41 – P solicita que os AA se sentem em trios e escreva diálogos sobre uma imagem
que se encontra na página 29 do módulo, nela, pode-se visualizar alguns eventos. P
pede aos AA para utilizarem o vocabulário aprendido, e colocar em prática o
conhecimento adquirido. P informa ainda que a atividade deverá ser entregue para ser
avaliada com nota. Todos atendem ao pedido de P, reunindo-se em trios e se
empenhando para cumprir a tarefa.
21:45 – A pesquisadora agradece a cooperação da parte dos AA e de P no processo das
observações e se despede de todos.
204
ANEXO G – Registros etnográficos das aulas de Intermediário III
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
REGISTROS ETNOGRÁFICOS DAS OBSERVAÇÕES DE AULA
INTERMEDIÁRIO III – PROF. MARCOS
OBS: Todas as aulas foram conduzidas em inglês
Primeira visita – dia 27.05.14
2 aulas: quarto e quinto horários
sala de aula
Aula 1
21:40 – Após os cumprimentos iniciais, P apresenta a pesquisadora à turma e adianta o
propósito de sua presença na sala. Em seguida, é dada à pesquisadora a oportunidade
de explicar com detalhes o tema e os objetivos da pesquisa.
21:48 – Para dar início à programação da aula, P reforça a proposta prevista que
consiste em apresentar um resumo de um filme, escolhido pelo próprio A, seguindo um
roteiro previamente entregue. Antes de iniciar as apresentações, P explica o significado
de uma expressão idiomática, a saber, o idiom "to let somebody down", são feitas
algumas perguntas aos AA e alguns exemplos são dados para praticar a nova
expressão. Logo após, P enfatiza que todos deveriam se apresentar para aproveitar a
oportunidade de se expressar em inglês. Além das apresentações, os AA devem
entregar o resumo do filme de forma escrita, assim, é advertido que os textos não
poderiam ser cópias de material pronto da internet. P concede a cada A 5 minutos para
a apresentação e pede que os AA se expressem naturalmente, e que sejam eles mesmos
ao se comunicarem.
22:00 – Iniciadas as apresentações, o primeiro A aborda sobre o filme "A walk to
remember", fala sobre as principais características do filme, incluindo detalhes como:
quem estrelou, quem foi o diretor, e que o mesmo foi inspirado em um livro. Ao longo
da apresentação, P faz algumas interrupções para esclarecer alguns pontos obscuros na
fala do A. O A conta a história do filme exibindo imagens com legendas no data-show,
e vai satisfatoriamente narrando os pontos principais do enredo. Ao final da primeira
apresentação, P faz comentários encorajando o A a praticar sempre e o elogia.
22:10 – O segundo A a se apresentar demonstra bastante desenvoltura ao se expressar
em LI, e lê algumas informações expostas em slides sobre o filme “The Avengers".
Baseado em imagens dá alguns detalhes sobre a direção, elenco e enredo do filme.
Devido ao horário já avançado, o professor decide não fazer intervenções entre uma
apresentação e outra, uma vez que todos deveriam se apresentar até o final da segunda
aula.
205
Aula 2
22:23 – A próxima A dá prosseguimento às apresentações, falando de forma clara e
com desembaraço sobre a história e também sobre a lição do filme, desta vez sem o
suporte do data-show.
22:30 – Seguindo o mesmo padrão das apresentações anteriores, ou seja, tomando por
base o roteiro dado pelo P, o A seguinte apresenta a sinopse do filme, dá sua opinião
sobre ele, explica porque o recomenda e também aborda a lição que é deixada. O A não
utiliza nenhum material de apoio.
22:33 – A quinta apresentação gira em torno do filme “Short Term 12”. A A Expõe
sobre todos os tópicos solicitados no roteiro e ao final exibe a parte mais marcante do
filme em sua opinião.
22:42 – A apresentação seguinte baseia-se no filme brasileiro “Tropa de elite”. O que
surpreende é a reação de alguns AA que dão risadas pela escolha feita pelo colega. O A
apresenta os personagens e fala de forma satisfatória e de fácil entendimento sobre os
pontos solicitados por P. Ao longo de sua fala, faz algumas pausas para tirar dúvidas
sobre vocabulário, mas isso não compromete a comunicação.
22:50 – A última A a se apresentar, fala de forma espontânea sobre o filme. Com
pouca dificuldade, consegue atingir os objetivos da apresentação.
22:58 – P parabeniza os AA que se apresentaram, ressalta que todos deviam se sentir
bem, pois demonstraram que estão se esforçando. Visto que o tempo de aula não foi
suficiente para cumprir o que fora programado, P registra que na aula seguinte os
demais alunos se apresentarão e finaliza a aula.
Segunda visita – dia 03.06.14
2 aulas: quarto e quinto horários
Sala de aula
Aula 3
21:48 – A pesquisadora entra na sala e informa aos AA que mais duas aulas serão
observadas. Nesse momento, de modo reservado, P entrega à pesquisadora uma folha
com o script referente ao áudio de uma atividade de Listening Comprehension. P
solicita que a pesquisadora leia a fala de uma das duas pessoas que participam de cada
um dos quatro diálogos que os AA precisarão ouvir para responder à atividade. P
informa à pesquisadora que não costuma levar o aparelho de som para a sala de aula e
que é habitual que ele mesmo faça a leitura dos scripts para os AA. Já sentada em seu
lugar, a pesquisadora observa que no script está sinalizado que um dos falantes de um
diálogo é chinês e em outro diálogo um falante australiano participa da conversa.
21:53 – P inicia a aula fazendo uma pergunta à turma para introduzir o tema da lição
que será trabalhada na aula: “Check in”. A referida lição é parte de uma unidade do
módulo adotado, intitulada “Staying at hotels”. Uma A estava sem material, e na
oportunidade, P enfatiza a importância de todos terem o material em mãos para o bom
206
andamento da aula. Em seguida, P repete a questão: “what are the advantages to make
online hotel reservation?” P recomenda aos AA que não tenham receio de responder e
que tentem falar espontaneamente. Os AA têm algum tempo para pensar e responder
primeiro no caderno. Depois que P repete a pergunta, os AA começam a discutir
timidamente sobre as vantagens de fazer uma reserva online em um hotel. Na verdade,
só uma A responde, os demais AA se mantêm calados. P tenta estimular os AA a
falarem, e comenta: “todos nós vivemos em um mundo globalizado, então todos temos
computador em casa, vocês podem me dizer qual são as vantagens?” até sugerir a uma
A específica para responder a pergunta, então ela diz que não consegue responder
porque se trata de um assunto que não condiz com a realidade dela, e esclarece que
nunca fez reserva em um hotel. Outros AA são convidados a responder e estes o fazem
com a ajuda de P, que à medida que os ajudam, explica algumas expressões e faz novas
perguntas.
22:05 – Em seguida, P pede para os AA abrirem os livros em determinada página e
concede 2 minutos para que eles observem as imagens com o vocabulário específico
sobre hotéis. Enquanto os AA examinam o novo vocabulário, P comenta
reservadamente com a pesquisadora que é muito difícil fazê-los falar.
22:10 – P comenta que os AA realmente precisam aprender sobre esse tipo específico
de vocabulário, caso eles precisem fazer uma reserva em um hotel, e começa a fazer
perguntas sobre as imagens. Perguntas como “How many rooms are there in a single
room?”, “If you go to a hotel, what kind of bed would you ask for? A queen or a kingsize bed?”, “When is a suite a good choice?”, entre outras, são direcionadas aos AA
aleatoriamente. Após a conversação, P repete e reforça o vocabulário aprendido.
22:16 – P solicita que os AA se organizem em duplas e conversem durante 5 minutos
sobre alguma experiência que tiveram em um hotel. Os AA devem conversar sobre as
vantagens e serviços oferecidos pelo hotel, sobre o conforto e desconforto que tiveram
ao se hospedarem, fazer comentários sobre o atendimento, sobre os funcionários, etc. P
lembra que em caso de algum aluno nunca ter estado em um hotel, ele teria que fingir
que já esteve e praticar o inglês. Todos se empenham em desenvolver a atividade
solicitada. É notável que os AA se sentem mais à vontade para conversar com os
colegas em particular do que para P e a turma toda, algumas perguntas referentes a
vocabulário são direcionadas ao P. Todo o tempo disponibilizado por P é bem
aproveitado.
Aula 4
22:27 – P informa que duas duplas iriam se apresentar em frente à sala. E convida o
primeiro par para compartilhar o que foi discutido. P aconselha a dupla que fique à
vontade para falar. A primeira dupla se apresenta satisfatoriamente, mantendo um
diálogo fluente e inteligível sobre as questões propostas por P. Um A, em especial, tem
dúvidas com relação a algumas palavras e pede ajuda, logo recebe ajuda de P e dos
colegas. Ao longo do diálogo, P faz algumas interferências, estimulando o uso do
vocabulário aprendido na aula pela dupla. P diz que ele sabe que é desafiador ficar em
frente às pessoas e falar inglês, e explica que é necessário desconstruir essa ideia, que o
importante não é a perfeição e que quando eles tiverem uma oportunidade para praticar
que praticassem sem medo.
207
22:33 – P convida a segunda dupla voluntária para socializar o diálogo. Mais uma vez
P pede para que os AA não fiquem nervosos, que tentem ser eles mesmos e deixem a
conversa fluir. A segunda dupla desenvolve um diálogo bem direcionado ao que foi
solicitado por P e utiliza suficientemente e corretamente o vocabulário aprendido na
aula. E com o inglês individual bem peculiar, por vezes acentuando a sílaba errada das
palavras, eles alcançam o objetivo da atividade. P ressalta outra vez a importância de
praticar e elogia as duplas que se apresentaram.
22:38 – P reforça a importância de aprender sobre o tema, e segue adiante, pedindo que
os AA abram os livros na página indicada para a leitura de um diálogo. Antes da
leitura, P pede que os AA digam o que eles conseguem ver nas gravuras que estão no
topo da página. Uma A responde: “Someone are going to stay in a hotel”e P completa
“Ok. Someone is going to stay in a hotel”. Ao corrigir os AA, P costuma repetir a
mesma frase consertando o erro cometido, mas sem chamar atenção específica para
isso. P faz uma série de perguntas sobre as gravuras, enfatizando determinadas
palavras-chave e finalmente pede para que dois alunos façam a leitura do diálogo,
sendo um A o guest (hóspede) e o outro A o clerk (balconista).
22:40 – P escolhe dois AA para ler o diálogo, sem antes passar o cd com o respectivo
áudio que acompanha o material de P. À medida que os alunos vão lendo, P corrige
problemas de pronúncia. Após a primeira leitura, P solicita voluntários para ler
novamente o mesmo diálogo, e dessa vez não há nenhuma interrupção. Para certificarse de que os AA entenderam o diálogo lido, P faz algumas perguntas e as direcionam
aos AA individualmente. Cada pergunta é repetida pelo menos duas vezes. Quando
determinado A não responde, P repete a mesma pergunta e a direciona a outro A;
quando o A erra a resposta, P insiste dando dicas para que a resposta certa seja dada, e
quando a resposta dada é incompleta, P repete a resposta completando-a. Após cada
resposta dada, P elogia os AA.
22:50 – Para dar continuidade à aula, P lança oralmente algumas palavras e expressões
e solicita aos AA que identifiquem no texto sinônimos para tais palavras. P diz “help
me” e os alunos baseados no texto respondem “give me a hand”. P sempre
complementa cada resposta enfatizando o significado e dando exemplos.
22:55 – Para finalizar a aula, P lê algumas frases e pede aos AA que a julguem falsa ou
verdadeira e justifiquem a resposta. Os AA conseguem completar a atividade,
demonstrando que o vocabulário da lição foi bem absorvido.
23:03 – P agradece toda a turma e finaliza a aula. Como não houve tempo para a
realização da atividade de Listening Comprehension, mencionada no início da aula, a
pesquisadora devolve a folha com o script para P.
208
ANEXO H – Registros etnográficos das aulas de Avançado II
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
REGISTROS ETNOGRÁFICOS DAS OBSERVAÇÕES DE AULA
AVANÇADO II – PROF. JOÃO
OBS: As aulas foram ministradas em inglês
Visita única – dia 18.07.14
4 aulas: primeiro, segundo, terceiro e quarto horários
Sala de aula
Aula 1
19:28 – A pesquisadora chega na sala, cumprimenta a todos e explica brevemente sobre
a pesquisa que está sendo desenvolvida. Logo se senta.
19:35 – P pede à turma para se dividir em grupos de quatro alunos, e diz que serão
projetadas algumas warm up questions pelo data-show, ele esclarece que não quer que
tais perguntas sejam respondidas para ele ou para a turma toda, mas deverão ser
discutidas apenas entre os integrantes do grupo. Uma vez organizados, P exibe a
primeira pergunta em slide: "If you knew you had only a year left to live, what would
you do? P não faz a leitura das perguntas e informa que não é necessário escrever,
apenas discutir. Depois de algum tempo, exibe a segunda pergunta: "What is something
you have never done but would like to do? Os alunos se empenham na atividade,
tentando se comunicar em inglês. P supervisiona o diálogo entre os alunos, auxiliandoos com dúvidas relacionadas a vocabulário.
Aula 2
19:47 – A terceira pergunta é exposta: "Would you like to be tall and fat or short and
well built? Em seguida, P anuncia que será exibida a quarta questão: "Would you rather
be rich and ugly or poor and good-looking?" Depois expõe a Quinta: "As a kid, what
did you want to be when you grow up?" P repete o mesmo procedimento com as outras
cinco perguntas, o que totaliza dez questões expostas. P discute com a turma a resposta
das duas últimas perguntas, pois se tratam de pegadinhas. Os AA não conseguem
resolver o problema exposto na penúltima questão, mas logo P os auxilia a entender. E
também os ajuda a desvendar a resposta da última pergunta exposta.
20:19 – Os AA são liberados para o intervalo. Nesse momento, P se aproxima da
pesquisadora e diz, reservadamente, que preferiu não adotar o módulo no semestre
corrente, pois ele detectou que a turma estava muito desnivelada, e ele julgou ser
melhor selecionar o material conforme as necessidades dos AA. Assim um dia ele
reserva para conversação, outro para revisão de tópicos gramaticais e assim por diante.
209
Aula 3
21:12 – Ao retornar do intervalo, P entrega uma folha com uma lista de quinze
provérbios em inglês e pede para os AA permanecerem em grupos para discutir entre si
o significado de cada um deles. P lê o primeiro provérbio da lista e pede um sinônimo,
os AA se esforçam e conseguem responder corretamente. Depois, P lê o segundo
provérbio e os AA tentam adivinhar o correspondente em português. P adverte que não
é para traduzir, apenas explicar o que conseguiram entender do provérbio, lançando
mão de exemplos. P pede para os AA discutirem o significado dos demais provérbios
entre os componentes do grupo. Enquanto os AA discutem, P passa de grupo em grupo
para esclarecer dúvidas e contribuir para a correta compreensão de cada uma das
expressões da lista.
Aula 4
21:30 – P mantém o rodízio pelos grupos. Os AA discutem entre si em que situação
eles usariam os provérbios. P auxilia os grupos com dificuldade de compreender
determinados provérbios, e para que eles entendam, P descreve situações em que o
provérbio seria utilizado.
21:45 – A discussão de um grupo específico gira em torno do provérbio "Don't throw
out the baby with the bath water". Com dificuldades para compreender o seu
significado, P dá pistas para o grupo. Um outro grupo apresenta dúvidas com relação
ao mesmo provérbio supracitado, P explica novamente.
21:52 – P continua passando pelos grupos, auxiliando os AA a entenderem o
significado dos provérbios. Os AA tentam compreender, mas, na maioria das vezes,
acabam pedindo confirmação do provérbio equivalente na Língua Portuguesa.
21:56 – Sem mais, P pergunta se é suficiente para o dia, agradece à turma e finaliza a
aula.
210
ANEXO I – Transcrição da entrevista realizada com os professores Anastácia e João
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO DA ENTREVISTA REALIZADA COM OS
PROFESSORES ANASTÁCIA E JOÃO
Entrevista realizada no dia 06.08.14
Pesq.: Boa noite! Gostaria de iniciar esse momento agradecendo a presença de vocês e
a disposição em colaborar com esta pesquisa que chega agora à fase final de coleta de
dados. Como a nossa conversa está sendo gravada e posteriormente será transcrita,
informo que qualquer referência ao nome de vocês na gravação será substituída pelo
nome fictício que vocês indicaram no questionário. Para irmos direto ao assunto,
gostaria de saber a opinião de vocês sobre a seguinte questão. A primeira questão eu
começo com uma fala de Crystal (2012) que diz o seguinte: é preciso distinguir o que é
recepção do que é produção em LI. Embora seja necessário compreender diferentes
variedades e tomá-las como exemplos da diversidade linguística, na sua produção, não
há como fugir da ideia de se adotar uma variedade de ampla circulação como as dos
países do chamado Círculo Interno. Entenderam aqui? Trata-se da questão que envolve
a distinção entre recepção e produção, a gente pode entrar em contato com diferentes
variedades, mas no momento de produzir, a gente precisa se basear em uma variedade
que seja de ampla circulação como a dos países hegemônicos, não é isso? Eu preciso
saber se vocês concordam com essa afirmação.
A: bom, considerando o nosso contexto de formação docente, eu concordo em termos,
porque é complicado você colocar o aluno iniciante, o futuro docente iniciante em
contato com todas as variedades, no contexto de aprendizagem, então, talvez fosse o
caso de adotar ou tomar por base o standard, um dos referenciais, mas não deixar de
expor os alunos às outras variedades, para eles perceberem a presença das outras
variedades, colocá-los em contato com essas outras também. O próprio Crystal, em
uma entrevista que eu vi, ele coloca isso, não quer dizer que o professor vai adotar
todas as variedades para trabalhar em sala de aula, mas é importante que o aluno tenha
conhecimento e tenha contato com essas outras variedades.
Pesq.: que o professor proporcione esses momentos de contato.
J: a minha fala seria parecida com a de Anastácia.
Pesq.: por isso, talvez, a gente tem observado, ao longo das observações de aulas, por
exemplo, a gente percebe que, de fato, o suporte básico para as tomadas de decisões em
sala de aula, é o inglês baseado nos modelos hegemônicos. Agora, a questão número 2:
As noções de “falantes nativos” e de “propriedade do inglês” têm sido radicalmente
postas em xeque. A consciência para este fato e para o fato de que os aprendizes
211
precisam se sentir donos da língua que estão aprendendo para utilizá-la a seu favor,
deve ser despertada desde o início da formação dos alunos ou apenas em semestres
mais avançados?
J: posso começar?
Pesq.: sim. Fique à vontade.
J: eu acho que deve ser trabalhado desde o início, porque na prática a gente vê hoje que
alguém tem sempre uma opinião formada a respeito da LI. “Eu gosto”, “Eu não gosto”,
“É fácil”, “É difícil”, não é? E essa questão, ela também é uma das que a gente precisa
não deixar que seja algo para ser corrigido posteriormente, não é?
Pesq.: desde o início os alunos precisam perceber
J: /perceber que a LI é tanto deles quanto dos nativos.
Pesq.: exatamente.
A: concordo também. Desde os primeiros contatos, considerando o nível de maturidade
deles, o contato que eles já tiveram com as leituras, com os estudos, para eles não
acharem, levando em consideração a questão anterior, que eles têm que aprender todas
essas outras variedades, então considerando a maturidade deles.
Pesq.: exato. É importante eles já irem se familiarizando, né? Desde o princípio...
A: isso.
J: e até mesmo para eles associarem que eles estão aprendendo uma segunda língua e
não uma língua de alguém. Ele está adquirindo uma segunda língua pra ele e não
aprendendo a língua de alguém.
Pesq.: que ele vai utilizar conforme as necessidades, conforme os seus propósitos.
J:
[dentro do contexto dele que ele vai saber usar.
Pesq.: terceira pergunta: em uma determinada aula observada, foi proposta uma
atividade oral que consistia em contar a história de um filme de forma resumida,
escolhido pelo próprio aluno. Diferentemente de todos, que apresentaram sobre filmes
Hollywoodianos, um aluno aborda sobre um filme brasileiro e os colegas reagem
dando risadas. Entenderam a situação? A que vocês atribuem esse tipo de
comportamento?
J: essa pergunta dá pra gente fazer um link com a anterior. É como a gente falou no
início, pra não deixar esse tipo de coisa acontecer, por isso que é bom trabalhar desde a
fase inicial, porque ele vai falar de um filme, né? Na verdade, o professor de inglês está
querendo que ele fale inglês na sala e não que ele fale dos ingleses.
Pesq.: e daí eu já acrescento outra pergunta, que talvez vai até ajudar vocês a
desenvolver melhor essa questão. Eu queria saber se essa postura seria proveniente da
falta de diálogo entre a cultura alvo e a cultura materna nas aulas. Essa relação
212
dialógica, tá faltando isso então? Já que é tão estranho tratar da cultura brasileira, de
algo que é brasileiro na sala de aula de LI?
A: olha, ai depende. Os alunos podem ter rido do filme em si, a depender da temática...
não sei qual foi a situação...
Pesq.: /eu acho que eu posso falar, o filme foi Tropa de Elite. Pode ter sido, né?
A: pode ter sido. Porque eu já trabalhei dessa forma com eles, não era para apresentar,
mas para encenar, fazer uma apresentação, e os alunos fizeram uma apresentação de
um filme brasileiro também, e não houve problemas com relação à aceitação. Pode ser
a questão da maturidade também. Mas eles fizeram o trabalho. Que por sinal foi muito
mais difícil. Eu considero mais difícil porque era um filme de um contexto nordestino,
então havia as expressões, outras coisas que dariam muito mais trabalho do que se eles
tivessem pegado um trecho de um filme ou uma série e só reproduzissem.
Pesq.: [americano ou britânico mesmo, né?]
A: eles fizeram as adaptações e não houve problemas assim. Como atividades também
para eles falarem, de pessoas que eles acham relevantes para a vida deles, para a
formação, muitos escolhem personalidades brasileiras ou familiares. Então, com esse
tipo de problema específico, eu nunca me deparei não, no contexto daqui da
universidade.
Pesq.: ok. E a quarta e última pergunta: em um excerto extraído de uma das respostas
dadas no questionário, lê-se que “As ementas das disciplinas voltadas para o ensinoaprendizagem de LI ((do curso de Letras da UNEB – Campus VI)) são flexíveis e não
interferem no direcionamento que o professor decida tomar em sua práxis. O projeto do
curso deixa claro uma visão atual e adequada a uma formação docente para um mundo
globalizado.” Pergunta-se, vocês estão de acordo com essa afirmação?
A: o currículo do curso não é perfeito. Ele precisa realmente passar por algumas
modificações, ser atualizado, realmente. Mas as ementas realmente não são ancoradas,
creio que pelos componentes que eu já ministrei, é claro que elas não são escancaradas,
né? Você tem ali um limite, mas com relação a conteúdo, a abordagem que o professor
vai fazer em sala de aula, quanto a isso, ele é livre, é flexível, nesse aspecto, sim.
Pesq.: gostaria de complementar, João? Dizer se você concorda...
J: eu concordo. Eu trabalhei no projeto de reconhecimento do curso, então eu tive que
explicar o projeto para a Comissão de Reconhecimento, e uma das coisas que foi tanto
enfatizado quanto elogiado foi essa questão da flexibilidade do curso. Tanto que nós
não temos disciplinas, nós temos componentes curriculares, que a depender da proposta
da área, você pode direcionar o curso.
Pesq.: tem essa abertura, né? Não é um projeto hermético que você precisa seguir algo
J: /em todos os aspectos, em literatura, no próprio ensino da LI. Você pode, por
exemplo, vincular literatura ao ensino da língua... quando eu fui aluno, por exemplo,
não percebia, o professor chegava e era muito conteúdo, né? Era muito preso. Hoje
não. Nós temos o Seminário Interdisciplinar que dá liberdade, né? A própria leitura das
213
ementas, cabe ao coordenador ter um certo cuidado, porque ela é tão ampla que o
professor acaba fugindo da proposta do curso, se não tiver um certo cuidado. Acho que
chega exagerar.
A: é, Ao contrário, né? É o inverso de ser delimitado e ser fechado. Ela é ampla, bem
ampla.
Pesq.: isso... E só um desdobramento dessa última pergunta: porque já que a gente
enxerga o projeto dessa forma que foi colocada, o que precisa ser feito para que sejam
viabilizadas, na formação inicial dos estudantes de Letras/Inglês da UNEB – campus
VI, abordagens mais relacionadas ao paradigma do ILF que levem em conta as
diferentes variedades do inglês, a natureza intercultural do uso do inglês e a
problematização do modelo do falante nativo? Então, o que precisa ser feito, de fato, já
que o currículo dá margem para esse tipo de abordagem, mas a gente nota que ela ainda
não impera na sala de aula.
J: certo. Nós temos em cada semestre um componente que dá essa oportunidade de
trabalhar com os alunos uma parte mais teórica, né? Nós temos Estudos SócioAntropológicos, é... cada semestre tem um componente, NEI IV, né? Que trabalha
também...
A: /Linguística Aplicada
J: a Linguística Aplicada. Agora, quanto à questão prática, eu acho que é uma proposta
nas reuniões de área. Nosso colegiado tem um número muito resumido de professor,
então, nós não temos uma área de literatura definida, porque são poucos os professores
de literatura, então, isso acontece em todas as áreas. Se nós tivéssemos definição das
áreas, a gente poderia levantar essa questão e colocá-la em prática. Só que, assim, a
reunião que acontece é reunião de colegiado.
Pesq.: então não têm funcionado as reuniões de área, né? Como deveria...
J: então, assim, conhecimento a gente tem, liberdade pelo projeto do curso a gente tem.
Falta, talvez, essa articulação.
A: porque mesmo que cada um trabalhe de forma interdisciplinar no seu contexto, mas
falta talvez socializar entre todos, ao invés de cada um trabalhar nessa perspectiva,
seria um momento ou momentos a mais para socializar essas questões... falar a mesma
língua. É igual foi colocado, se o currículo tem essa abertura, se os professores têm as
leituras...
Pesq.: /exato! Os professores sentem-se preparados, conforme foi constatado. Então, a
gente poderia dizer que realmente falta essa articulação entre os pares, para que algo
comece a acontecer de forma mais aparente na sala de aula. Ok. Então, para terminar,
eu gostaria de agradecer mais uma vez a colaboração de vocês. Tenho plena certeza de
que todas respostas, as contribuições vão ser bastante valiosas para a minha pesquisa.
Muito obrigada!
214
ANEXO J – Transcrição da entrevista realizada com a professora Hermione
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO DA ENTREVISTA REALIZADA COM A
PROFESSORA HERMIONE
Entrevista realizada no dia 01.09.14
Pesq.: Boa tarde, professora!
H: boa tarde!
Pesq.: gostaria de iniciar esse momento, agradecendo a sua disposição em colaborar
com esta pesquisa que chega agora à fase final de coleta de dados. Como a nossa
conversa está sendo gravada e posteriormente será transcrita, informo que qualquer
referência ao seu nome na gravação será substituída pelo nome fictício que você
indicou no questionário.
H: ok.
Pesq.: podemos começar, então?
H: sim.
Pesq.: para irmos direto ao assunto, gostaria de saber a sua opinião sobre a seguinte
questão. Conforme Crystal (2012), é preciso distinguir o que é recepção do que é
produção em LI. Embora seja necessário compreender diferentes variedades e tomá-las
como exemplos da diversidade linguística, na sua produção, não há como fugir da ideia
de se adotar uma variedade de ampla circulação como as dos países do chamado
Círculo Interno. Gostaria de saber se você concorda com essa afirmação, professora.
H: eu acredito que é necessário você tomar como ponto de partida uma variedade
padrão. Mas essa variedade padrão, muitas vezes, até foge dessa variedade que é de
ampla circulação, por exemplo, a variedade americana, muitas vezes a gente não
trabalha só com a variedade americana, mas também com a britânica, ou com a
canadense, com a australiana, que acabam que, de alguma forma, né? Está dentro do
Círculo Interno, mas, pela própria dificuldade de se lidar com essas múltiplas
variedades, eu acredito que seja necessário, de alguma forma, tomar como base uma
quantidade menor de variedades ou uma variedade padrão, pelo menos, para começar.
Pesq.: certo. Então, ao que me parece, na sua opinião, os falantes não nativos da LI
também estão habilitados para estabelecer as regras da língua. É isso mesmo que você
215
acredita?
H: sim.
Pesq.: certo. Então, partindo para a segunda questão: sabemos que as noções de
“falantes nativos” e de “propriedade do inglês” têm sido radicalmente postas em xeque.
A consciência para este fato e para o fato de que os aprendizes precisam se sentir donos
da língua que estão aprendendo para utilizá-la a seu favor, deve ser despertada em que
momento da formação dos estudantes de Letras/ Inglês? Conseguiu compreender?
H: o início não.
Pesq.: certo. Eu vou repetir a pergunta, não tem problema. Sabemos que as noções de
“falantes nativos” e de “propriedade do inglês” têm sido radicalmente postas em xeque.
A consciência para este fato e para o fato de que os aprendizes precisam se sentir donos
da língua que estão aprendendo, deve ser despertada em que momento da formação dos
estudantes de Letras/ Inglês?
H: desde sempre.
Pesq.: certo. Então, desde o primeiro semestre, os professores já podem trazer essa
ideia, amadurecendo, não é isso? E familiarizando os alunos em relação a essa questão,
que, na verdade, a gente já sabe claramente que, hoje em dia, tem sido questionada, né?
A validade ou até mesmo a superioridade da língua dos falantes nativos e a questão da
propriedade desse inglês. Correto?
H: hmrum
Pesq.: indo para a terceira questão: trata-se de uma situação que foi constatada em uma
aula. Em uma determinada aula observada, foi proposta uma atividade oral que
consistia em contar a história de um filme de forma resumida, escolhido pelo próprio
aluno. Diferentemente de todos os colegas, que apresentaram sobre filmes
Hollywoodianos, um aluno aborda sobre um filme brasileiro e os colegas reagem
dando risadas. Frente a essa situação? A que você atribui esse tipo de comportamento?
H: depende do filme ((risos)). Porque a depender do filme que foi escolhido, a reação
dos alunos através da risada pode não ter sido porque não era um filme Hollywoodiano,
e era um filme brasileiro, mas sim qual era o filme brasileiro.
Pesq.: entendi. Nesse caso, você não acha que esse tipo de comportamento seria
proveniente da falta de diálogo entre a cultura alvo e a cultura materna nas aulas? Não
seria esse o motivo?
H: como eu não conheço, não tenho um aprofundamento do contexto do filme, é
complicado eu falar isso.
Pesq.: compreendo. Gostaria de saber, então, como a cultura materna é trabalhada em
sua sala de aula.
H: por meio das vivências dos próprios alunos, pois a gente sempre dialoga na sala de
216
aula a partir da vida deles, então, a cultura materna, ela é vivida através da própria vida
deles.
Pesq.: certo. E para finalizar, a quarta e última pergunta: em um excerto extraído de
uma das respostas dadas no questionário, lê-se que “As ementas das disciplinas
voltadas para o ensino-aprendizagem de LI [do curso de Letras da UNEB – Campus
VI] são flexíveis e não interferem no direcionamento que o professor decida tomar em
sua práxis. O projeto do curso deixa claro uma visão atual e adequada a uma formação
docente para um mundo globalizado.” Você está de acordo com esse posicionamento?
H: de acordo com a questão da flexibilidade, sim.
Pesq.: com a questão da interdisciplinaridade?
H: e a flexibilidade do currículo.
Pesq.: ah certo. Ok.
H: eu já tinha até dito isso no questionário.
Pesq.: ok. Então, se o currículo é flexível e se os professores afirmam estar a par das
mudanças em torno das discussões sobre a LI, sobre o atual estatuto da LI no mundo, o
que precisa ser feito, de fato, para que sejam viabilizadas, na formação inicial dos
estudantes de Letras/Inglês da UNEB – campus VI, abordagens mais relacionadas ao
paradigma do ILF que levem em conta as diferentes variedades do inglês, a natureza
intercultural do uso do inglês e a problematização do modelo do falante nativo? Deu
para entender?
H: sim. Depende do interesse do professor, da própria articulação dos professores
dentro do curso, e o conhecimento do professor, né? Se o professor está sempre indo a
congressos, fazendo leituras, pesquisando, estudando, e dar conta de que há a
necessidade de ampliar esses saberes, esse conhecimento da língua e perceber essa
produção, esse estudo da LI, não só como LE, mas também como Língua Franca, e o
compromisso é esse, de o professor não se prender em só transmitir aquele
conhecimento básico sobre a língua. Se ele levar em consideração o ensino de cultura
na sala de aula, ele vai considerar também a língua franca e não vai deixar de trabalhar
também com a língua nessa perspectiva.
Pesq.: entendido. Para terminar, professora, eu agradeço mais uma vez a sua
participação. E estou certa de que as informações coletadas serão determinantes para a
validação da minha pesquisa. Muito obrigada!
H: de nada!
217
ANEXO K – Transcrição da entrevista realizada com o professor Marcos
UFBA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA
ORIENTADOR: Prof. Dr. Sávio Siqueira
MESTRANDA: Polyanna Castro Rocha Alves
TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO DA ENTREVISTA REALIZADA COM O PROFESSOR
MARCOS
Entrevista realizada no dia 17.09.14
Pesq.: Boa noite, professor! Gostaria de iniciar esse momento, agradecendo a sua
disposição em colaborar com esta pesquisa que chega agora à fase final de coleta de
dados. Como a nossa conversa está sendo gravada e posteriormente será transcrita,
informo que qualquer referência ao seu nome na gravação será substituída pelo nome
fictício que você indicou no questionário. Para irmos direto ao assunto, gostaria de
saber a sua opinião sobre a seguinte questão. Conforme Crystal (2012), é preciso
distinguir o que é recepção do que é produção em LI. Embora seja necessário
compreender diferentes variedades e tomá-las como exemplos da diversidade
linguística, na sua produção, não há como fugir da ideia de se adotar uma variedade de
ampla circulação como as dos países do chamado Círculo Interno. Você concorda com
essa afirmação, professor.
M: bem, boa noite, Polyanna. Espero, assim, que você termine logo o seu trabalho, né?
E que as respostas aqui possam te ajudar.
Pesq.: obrigada!
M: bem, como Crystal fala...eh... eu concordo. Eu concordo com essa afirmação,
porque a gente, observando a questão do ensino de línguas, a gente tem que analisá-la
de uma perspectiva geopolítica, né? Como o próprio Rajagopalan fala. É geopolítica
porque há questões ideológicas, não é? E interesses na questão da divulgação de uma
língua. Eu creio assim, que os modos que a gente trabalha em sala de aula, eles são
muito voltados para o inglês, praticamente para o inglês dos Estados Unidos, né? Eu
nem falo o inglês da Inglaterra, mas dos Estados Unidos. E a gente observa pela
pronúncia, que embora eles falem na questão da interculturalidade, no sentido de trazer
outros ingleses, a participação desses ingleses é muito pouca, sempre predomina essa
questão do inglês voltado para os Estados Unidos.
Pesq.: então é um ensino mais apegado a esse modelo de LI que pertence aos Estados
unidos, principalmente.
M: é o que eu tenho observado no meu tempo de prática.
Pesq.: entendi. E mesmo tendo essa opinião, você diria que os falantes não-nativos da
218
LI também estariam habilitados para estabelecer as regras da língua que eles utilizam?
M: no caso a LI...
Pesq.: mesmo que em sala de aula a gente siga as regras de um modelo padrão, aqueles
falantes, que são os falantes do mundo todo, que utilizam a LI, que são os falantes nãonativos, eles também estariam habilitados para estabelecer as regras dessa língua? Já
que eles a utilizam e se apropriam dela?
M: se for observar em termos linguísticos, sim. Se formos observar em termos
linguísticos. Se ele está exposto àquele modelo, ele vai reproduzir aquele modelo, não
é? A questão da pronúncia, a questão da gramática, a questão vocabular, também,
voltada para um certo país, eles vão reproduzir esta questão. Agora, evidentemente,
cabe ao professor, depende do conhecimento do professor, do conhecimento teórico do
professor, para tentar desconstruir essas questões em sala de aula.
Pesq.: certo. Partindo para a segunda questão: Nós sabemos que as noções de “falantes
nativos” e de “propriedade do inglês” têm sido radicalmente postas em xeque. A
consciência para este fato e para o fato de que os aprendizes precisam se sentir donos
da língua que estão aprendendo, deve ser despertada em que momento da formação dos
estudantes de Letras/ Inglês?
M: a questão, você poderia repetir, por favor?
Pesq.: claro, eu posso repetir: sabe-se que as noções de “falantes nativos” e de
“propriedade do inglês” têm sido radicalmente postas em xeque. A consciência para
este fato e para o fato de que os aprendizes precisam se sentir donos da língua que
estão aprendendo, deve ser despertada em que momento da formação dos estudantes de
Letras/ Inglês?
M: eu creio que desde o início.
Pesq.: desde o primeiro semestre, no caso.
M: desde o primeiro semestre.
Pesq.: e por que você acredita que logo no início...?
M: porque tem até uma disciplina voltada para essas questões: Linguística Aplicada,
né? Que o objetivo dela é tentar desconstruir paradigmas hegemônicos, dar voz às
classes menos favorecidas, e assim por diante. E uma das questões para a gente dar voz
às classes menos favorecidas é ajuda-los a pensar criticamente, não é?
Pesq.: sim.
M: então a questão de falantes nativos, a questão de língua pura, nesse mundo
globalizado não há mais lugar, não é? Para pensar dessa maneira.
Pesq.: exatamente.
219
M: então, a gente tem que começar a trazer para a sala de aula, questões referentes à
globalização como uma propulsora dessas questões interculturais, da mestiçagem, não
só de língua, como de pessoas também e tentar mostrar como isso é construído, né?
Pesq.: então logo no início eles devem se familiarizar com essas questões todas.
M: isso. Logo no início. Lógico, não trazendo textos muito teóricos, mas já mostrando
o aluno a necessidade de pensar dessa maneira, né? De buscar mais uma perspectiva de
desconstrução de modelos hegemônicos.
Pesq.: certo.
M: e, um problema que eu observo é, até na universidade, tem professores que eles
trazem aqueles rádios, né? Os CDs e até o pendrive, também, com essa fala nativa, e
eles querem que os alunos reproduzem igualmente aquela fala nativa, ou seja, sotaque,
a pronúncia... e a gente sabe que é impossível isso. Então, os professores, a maioria,
não tendo conhecimento, eles acabam excluindo esses alunos do processo de aprender
as línguas, né?
Pesq.: é a questão de o aluno tentar imitar, e o aluno nunca vai conseguir imitar com
perfeição o falante nativo.
M: isso.
Pesq.: a terceira questão. Em uma determinada aula observada, foi proposta uma
atividade oral que consistia em contar a história de um filme, escolhido pelo próprio
aluno, baseado em um roteiro de perguntas. Diferentemente de todos os colegas, que
apresentaram sobre filmes Hollywoodianos, um aluno aborda sobre um filme brasileiro
e os colegas reagem dando risadas. A que você atribui esse tipo de comportamento?
M: é o imperialismo e o colonialismo estadunidense, ou seja, não há como está imune,
porque a gente observa, por exemplo, conforme Raja fala, 80%, quase 90% das coisas
que veiculam na internet está em LI, mas mais mesmo pelo inglês norte-americano, ou
seja, o inglês não norte-americano, mas estadunidense, né? Então, é uma política
estadunidense mesmo, né? De mercado, de colonialismo linguístico, imperialismo
linguístico...
Pesq.: sim, principalmente em torno dos filmes, das músicas...
M: em torno dos filmes, das músicas, das vestimentas, não é? A gente vê que, até
mesmo a gente que é professor, que já tem um conhecimento, a gente se pega, às vezes,
né?
Pesq.: sim... tentando copiar, ou tendo a tendência de adotar esse material proveniente
desses centros.
M: humrum
Pesq.: certo... Você diria, então, nesse caso, que falta diálogo entre a cultura alvo e a
cultura materna em sala de aula? Partindo desse pressuposto de que os alunos... que há
220
um estranhamento, quando se fala da cultura nativa em sala de aula...
M: é... abordar a questão cultural é um pouco complicado, né? Trazer atividades
culturais... O que é trazer atividades culturais e questão cultural? Eu acho um pouco
difícil, sabe, Polyanna? Tentar abordar essas questões em sala de aula... porque ainda...
a gente tem que trazer essas questões, problematizando essas questões com os alunos,
né?
Pesq.: e para isso você tem que está preparado, né?
M: de que forma o outro é construído, ou seja, se a gente for observar essa questão da
identidade, o outro será construído de maneira negativa ou positiva, né? Como esse
outro é construído... a gente tem que trazer, mostrar como esse outro é construído,
problematizando essa construção, não é? Não sei se fugir
Pesq.:
verifica
centro,
cultura
é que minha questão... minha inquietação, melhor dizendo, já que a gente
que há uma tendência em se apegar a esses modelos nativos, aos modelos do
né? Em sala de aula isso se explicaria por conta da falta de diálogo entre a
alvo e a cultura materna? Será que a cultura materna está sendo negligenciada?
M: eu partiria mais da questão da linguagem mesmo como propulsora desses
estereótipos, né? Porque trabalha no inconsciente das pessoas, trabalha no inconsciente,
porque às vezes a pessoa, sem querer, ela já faz aquilo automaticamente, porque ela
está... como é que se diz? Ela está sendo vítima dessa questão mesmo que eu falei
sobre o imperialismo. Então se houver mesmo uma discussão sobre o discurso, como o
discurso propaga essas questões culturais, e até mesmo a questão do racismo também,
porque o racismo não vem da cor, mas até mesmo intelectualmente, e ,assim por diante,
essas questões... como o discurso propaga essas questões, partindo daí um
conhecimento linguístico mais aprofundado de discurso responsável por produzir as
questões de identidade tanto do estrangeiro como também nacional, acho que a gente
teria um aluno mais bem habilitado.
Pesq.: exato. Tem que haver um aprofundamento dessas questões, né?
M: um aprofundamento das questões teóricas. Que a gente carece.... às vezes o
professor não tem esse conhecimento. Não sei se eu respondi, Polyanna...
Pesq.: não, tranquilo... a resposta foi satisfatória. Partindo, então, para a quarta e última
pergunta: em um excerto extraído de uma das respostas dadas no questionário, lê-se
que “As ementas das disciplinas voltadas para o ensino-aprendizagem de LI [do curso
de Letras da UNEB – Campus VI] são flexíveis e não interferem no direcionamento
que o professor decida tomar em sua práxis. O projeto do curso deixa claro uma visão
atual e adequada a uma formação docente para um mundo globalizado.” Você está de
acordo com esse posicionamento?
M: não!
Pesq.: poderia explicar, então?
M: não, assim, nas aulas... As ementas, assim, o que eu tenho observado, pelo menos a
221
de linguística Aplicada, pois eu trabalho com a I e a II, são ementas que estão
desvinculadas da realidade do aluno, não é? Pelo que eu vejo, tem ementas que dão
desdobramento para você fazer o seu plano de curso, né? O seu plano com os
conteúdos, tem ementas que sim.
Pesq.: deixa aberto, né? Para que você possa tomar as decisões.
M: deixa aberto. Mas tem ementas também que fogem totalmente o que é proposto. Por
exemplo, Linguística Aplicada tem que trabalhar a linguagem como prática social, né?
Linguagem como construtora do mundo social, e assim por diante. Mas o que traz na
ementa é diferente, eles trazem uma concepção de linguagem ligada ao Estruturalismo,
desvinculada do contexto social. Então, nessa questão a gente vê que a ementa ela
ainda puxa para um lado ideológico, um lado acrítico que vai fazer com que o aluno
também se torne um sujeito acrítico.
Pesq.: exatamente. Que siga modelos...
M: que siga modelos hegemônicos, perfeitamente.
Pesq.: e, a seu ver, pra gente finalizar essa conversa, o que precisa ser feito, de fato,
para que sejam viabilizadas, na formação inicial dos estudantes de Letras/Inglês da
UNEB – campus VI, abordagens mais relacionadas ao paradigma do ILF que levem em
conta as diferentes variedades do inglês, a natureza intercultural do uso do inglês e a
problematização do modelo do falante nativo? O que precisa ser feito, de fato, no
curso, para que essas discussões possam ser levadas para a sala de aula?
M: eu acho que deveria haver um redimensionamento do currículo.
Pesq.: uma vez que você reconhece que o currículo deixa a desejar nesse aspecto, não
é?
M: deixa a desejar. Trazer mais componentes voltados para essa questão da
comunicação mesmo. O quê que é ensinar comunicativamente?
Pesq.: sei... Componentes específicos, não é? Que trazem essas abordagens.
M: é. Ou se a gente pensa que a gente ensina a falar, mas ensina gramática, às vezes,
também, né? Então, a gramática tem que vir, como diz Almeida Filho, em segundo
plano na comunicação, né? Tem que trabalhar, por exemplo, com recortes da realidade,
fazer da sala de aula um lugar mesmo que ele sinta o uso lá fora, quando ele for para
outro lugar praticar aquela língua, né? E assim por diante, eu penso assim. E, também,
capacitar os professores também na formação continuada. Os grupos de estudo são
importantes, e a gente não tem na UNEB, a gente não senta para discutir.
Pesq.: inclusive as reunião de área, né? Que é uma proposta do curso, mas não acontece
de maneira efetiva.
M: a gente poderia trazer essas questões, por exemplo, teóricas que estão em voga hoje,
né? Como ensinar comunicativamente, a questão da interculturalidade, para a gente
debater em sala de aula e crescer também em sala de aula com os nossos colegas.
222
Pesq.: e até mesmo discutir o que deve ser mudado nas ementas, né? Que não estão
respondendo às necessidades dos alunos, e também do professor. Bem, então, para
terminar, professor, eu agradeço mais uma vez a sua participação. E estou certa de que
as informações obtidas serão determinantes para a validação da minha pesquisa.
M: eu espero, Polyanna.
Pesq.: muito obrigada!
M: sucesso!
Pesq.: Obrigada!!
223
ANEXO L – Fluxograma do curso de Letras/Inglês da UNEB, Campus VI
224
225
ANEXO M – Ementas dos componentes curriculares Básico I, Intermediário I, Intermediário
III e Avançado II
EMENTA
COMPONENTE CURRICULAR
FORMA DE
EXECUÇÃO
CARGA
HORÁRIA
PRÉREQUISITO
LÍNGUA INGLESA - BÁSICO I
LABORATÓRIO
INSTRUMENTAL
90
-
Desenvolve as estruturas básicas utilizando as habilidades linguisiticas de ouvir, falar, ler e escrever numa
abordagem comunicativa.
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
 Grammar: Verb to be/Possessive Adjective
 Vocabulary: Countries/Everyday Objects of nouns
 Grammar: verb to be(questions and negatives)/negatives and short answers/Possessive’s
 Vocabulary: Family/Opposite Adjective/Food and Drink
 Text interpretation; The word of work
 Grammar: Present Simple(questions and negatives)
 Vocabulary: Verbs(relax, go out, start)/Leisure activities(dancing, skiing)
 Listening and Speaking – Simple Dialogs
 Text interpretatio0n: take it easy
 Grammar: Present Simple
 Vocabulary: Verbs(help, make, pump)/Jobs
 Text interpretation: Where do you live?
 Grammar: There to be/How many/Prepositions of place/Indefinite adjectives/Demonstrative pronouns
 Vocabulary: Rooms/Household items/Parts of a plane/Places
 Text interpretation: Can you speak English?
 Grammar: Modal Verb/to be born
 Vocabulary: Countries and Languages/Verbs/Words that sound the same
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
HARMER, Jeremy. How to teach writing. England, Pearson Longman, 2007.
LIBERATO, Wilson. Inglês Doorway. vol. Único, São Paulo: FTD, 2004.
MASSCHERPE, Mário; ZAMARIN, Laura. Os falsos cognatos na tradução do inglês para o português. Rio
de Janeiro: Bertand Brasil, 2000.
MURPHY, Raymond. English Grammar in use 2nd Edition: Cambridge, 1994.
226
_______. Essential Grammar in Use. New York: Cambridge University Press, 1990.
SWAN, Michael; WALTER Catherine. The Good Grammar Book. New York: Oxford University Press, 2003.
TORRES, Nelson. Gramática prática Língua Inglesa: O inglês descomplicado. 10 ed. São Paulo: Saraiva,
2000.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
ALEXANDRE, L.G. Longman Advanced Grammar. 1 ed. Longman Gramp, Limited: UK, 1996.
WINDDOWSON, H.G. Linguistics. 1 ed .Oxford University Press, 1996.
EMENTA
COMPONENTE CURRICULAR
FORMA DE
EXECUÇÃO
LÍNGUA INGLESA – INTERMEDIÁRIO I
LABORATÓRIO
INSTRUMENTAL
CARGA
HORÁRIA
90
PRÉ-REQUISITO
LÍNGUA INGLESA –
BÁSICO II
Estuda e desenvolve as habilidades lingüísticas, oral e escrita, em nível de complexidade crescente.
Aquisição da linguagem em diferentes situações próximas à realidade.
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
 Listening and reading “numbers”. Understanding and processing numbers. Understanding sports scores
 Reading text “ Millionaires overnight”
 False Fiends (exercise)
 Listening and speaking, “Let’s eat”. Talking about food and places to eat. Inferring topics and
understanding suggestions
 Text, “ A note on separable idioms”
 Phrasal verbs I
 Listening and reading, “ On the border. Immigration” Understanding reading strategy.
 Reading strategy, what is it?
 Background Knowledge ( conhecimentos próprios )
 Prediction (antecipando informações)
 Skimming (explorando os recursos)
 Skinning (buscando informações específicas)
 Complementary activities
 Text –Alcohol and Society
 Grammar points – modal verbs I, modal verbs II
 Listening, reading and speaking – Text: For Free Time – Talking about free-time activities.
 Text: that’s a nice shirt – giving opinions about and describing clothing
227
 Reading and Speaking text: Furniture and houses. Describing things in a house and what they are for
 Grammar topic – Adjectives
 Phrasal verbs II
 Listening and Speaking – How do you start your day? Talking about routines
 Lexical guessing: inferindo significados
 The use of a dictionary
 Understanding the main points

Paragraph

Complementary activities
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ALLEN, Virginia. Techniques in Teaching vocabulary. New York: Oxford University Press, 1983.
AZAR, B.S. Understanding and Using English Grammar. 3 ed. Englewood Cliffs, NJ: Pretice Hall, 1988.
GEENBAWN, S & QUIRK R. A student’s Grammar of the english Language. London: Longman, 2000.
MURPHY, Raymond,. Essential grammar in use: a self-study reference and practice book for elementary
students of English. New York: Cambridge University Press,1990.
SPEDEN, John Andrew,. Inglês. São Paulo: Editora Marco, 1981.
SWAN, Michael. WALTER, Catharine. The Good Grammar Book. New York: Oxford University Press,
2001.
THOMSON A. J. ; MARTINET A. V. A practical English Grammar. 4 ed. Walton Street: Oxford University
Press, 1986.
THORNBURY, Scott. How to teach vocabulary. England: Longman, 2005.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
ALEXANDRE, L. G. Longman English Grammar. Longman: Group Uk limited 1998.
HELGESEN, Marc. Active Listening. Building Skills for Understanding. New York: Cambridge University
Press, 1985.
MURPHY, Raymond. English Grammar, Second Edition. New York: Cambridge University Press 1985.
228
EMENTA
FORMA DE
COMPONENTE CURRICULAR
EXECUÇÃO
LÍNGUA INGLESA – INTERMEDIÁRIO III
LABORATÓRIO
INSTRUMENTAL
CARGA
HORÁRIA
PRÉ-REQUISITO
90
LÍNGUA INGLESA –
INTERMEDIÁRIO II
Desenvolve e aprofunda o estudo das estruturas lingüísticas numa perspectiva comunicativa, gra duando o
nível de complexidade.
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
 Auxiliary verbs;
 Active and Passive;
 Past tenses;
 Modal verbs
 Future forms;
 -ING x Infinitive;
 Present Perfect;
 Conditionals and Time clauses
 Probability; so and neither;
 Present Perfect Continuous;
 Indirect questions and question tags
 Reported Speech
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
HARMER, Jeremy. The Pratice of English Language Teaching. 3 ed. England Longman: Person
Education Limited, 2003.
LARSEN-FREEMAN, Diane. Grammar. In CARTER, Ronaldo & NUNAN, David. The Cambridge Guide to
Teaching English to speakers of Other Languages. 7 ed. Cambridge University P ress, 2005.
LAROY, Clement. Pronunciation. New York: Oxford University Press, 1995.
MASCHERPE, Mário. Lessons in English pronunciation Grammar and vocabulary expansion. São
Paulo: Assis, FFCL, 1972.
MURPHY, Raymond. English grammar in use: a self-study reference and practice book for intermediate
students. New York: Cambridge University Press, 1991.
LAROY, Clement. Pronunciation. New York: Oxford University Press, 1995.
STEINBERG, Martha. Inglês Americano X Inglês Britânico: palavras diferentes para o mesmo
sentido, sentidos diferentes para a mesma palavra. 1 ed. São Paulo: Disal, 2003.
229
TORRES, N. Gramática Prática da Língua Inglesa: o inglês descomplicado. 10. Ed. São Paulo:
Saraiva, 2000.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
ALEXANDRE, L. G. Longman English Grammar. Longman: Group Uk limited 1998.
HELGESEN, M. Active Listening. Building Skills for Understanding. New York: Cambridge University Press, 1985.
MURPHY, Raymond. English Grammar, Second Edition. New York: Cambridge University Press 1985.
EMENTA
COMPONENTE CURRICULAR
FORMA DE
EXECUÇÃO
CARGA
HORÁRIA
PRÉ-REQUISITO
LÍNGUA INGLESA – AVANÇADO II
LABORATÓRIO
INSTRUMENTAL
90
LÍNGUA INGLESA –
AVANÇADO I
Desenvolve a proficiência lingüística oral e escrita numa abordagem comunicativa em nível avançado.
Emprega os padrões utilizados internacionalmente como indicadores avaliativos.
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
 Present Tenses
 Simple Present x Present Continuous
 Simple Present x Present Perfect
 Present x Perfect x Persent Perfect Continuous
 Past Tenses
 Simple Past x Past Continuous
 Simple Past x Past Perfect
 Past Perfect x Past Perfect Continuous
 Conjunctions
 Phrasal Verbs
 Prepositions
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
BEAUMONT, Digby; GRANGER, Colin. The heinemann English grammar: English grammar an
intermediate reference and practice book. Oxford: Heinemann, 1992.
COWIE, A. P. Mackin; R. MCCAIG, I. R. Oxford dictionary of current idiomatic English. New York:
Oxford University Press, 1983.
DIXON, Robert J. Everyday dialogues in English: a practice book in advanced conversation. With
230
adequate drills and exercises. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1972.
LEECH, Geoffrey N. O significado no verbo inglês. São Paulo: Ática, 1989
MARQUES, Amadeu. Time for English. 2 ed. São Paulo: Ática, 1980
MURPHY, Raymond. English Grammar in use: supplementary exercises. 2 ed. Cambridge. GB:
Cambridge University Press, 1994.
RICHARDS, Jack C. Longman dictionary language teaching and applied linguistics. Jack C. Richards,
Richard Schmidt. 3 ed. Londres: Person Education, 2002.
TORRES, Nelson. Dicionário prático de expressões idiomáticas e phrasal verbs. São Paulo: DISAL,
2003.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
SANDLIER, Michelle; RIGGENBACH, Heidi; SAMUDA, Virginia Grammar Dimensions: From, Meaning, and
use. Book 2. U.S.A: Heinle & Heinle-Thomson Learning, 2000.
YATES, Jean. The ins And outs of prepositions: A guidebook for ESL students. New York: Barron’s, 1999.